Guia de Filosofia Prepub-1769

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    COLECÇÃOSABER & EDUCAÇÃO

    :

    1 BREVE HISTÓRIA DA FILOSOFIA MODERNA |Roger Scruton

    2 ANIMAL RACIONAL OU BÍPEDE IMPLUME?Um ensaio sobre acção, explicação e racionalidade |António Zilhão

    3 HISTÓRIA DE PORTUGAL E DO IMPÉRIOPORTUGUÊS (VOL. I) | A. R. Disney

    4 A POESIA DE JORGE DE SENA Testemunho,Metamorfose, Peregrinação | Jorge Fazenda Lourenço

    5 HISTÓRIA DE PORTUGAL E DO IMPÉRIOPORTUGUÊS (VOL. II) | A. R. Disney

    6 GUIA DE FILOSOFIA PARA PESSOASINTELIGENTES | Roger Scruton

    7 UMA VIAGEM ÀS NOSSAS ORIGENS Uma História da Evolução Humana |Maria José Aragão

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    : An Intelligent Person’s Guide to Philosophy: Roger Scruton

    © Roger Scruton, 1996© Guerra e Paz, Editores S.A., 2007Reservados todos os direitos

    : Maria João Madeira: Alice Figueiras: Ilídio J.B. Vasco: Nuno Rodrigues da Costa

    : 978-989-702-005-6 : 327605/111.ª : Março de 20072.ª : Julho de 2011

    Guerra e Paz, Editores S.A.

    R. Conde Redondo, 8 – 5.º Esq.1150-105 LisboaTel.: 21 314 44 88Fax: 21 314 44 89E-mail: [email protected]

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    ROGER

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    GUIA DE

    FILOSOFIAPARA PESSOASINTELIGENTES

    Maria João Madeira

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    1 Porquê? 13

    2 Verdade 27

    3 O Demónio 37

    4 Sujeito e Objecto 43

    5 Pessoas 59

    6 Tempo 75

    7 Deus 87

    8 Liberdade 99

    9 Moral 113

    10 Sexo 129

    11 Música 141

    12 História 153

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    PREFÁCIO

    E ste livro tenta tornar a filosofia interessante; con--centrei-me portanto em ideias que tornam a filoso-fia interessante para mim. Do ponto de vista acadé-mico o resultado está longe de ser ortodoxo, mas a minhaesperança é a de que o leitor abandone este livro com umsentido da relevância da filosofia, não apenas para as ques-

    tões intelectuais, mas também para a vida no mundomoderno.Aqui e ali refiro grandes filósofos, em particular Kant e

    Wittgenstein, que têm sido as influências mais importantesdo meu pensamento. Mas não tento fazer uma história ouuma síntese do assunto. Este livro oferece-se como um guiaao leitor que estiver preparado para se aventurar na filosofia,e não pressupõe senão o conhecimento que uma pessoa inte-ligente provavelmente já detém.

    Uma pessoa destas quererá, no entanto, saber de que for-ma o livro se relaciona com outras produções da área, e sepertence a uma escola de pensamento mais ampla – a algu-ma «ologia» ou «ismo» que pudessem servir para o indexarno arquivo imenso e sempre crescente do não lido. Basta di-zer que cheguei à filosofia quando era estudante, insatisfeitocom a educação científica, e suspeitando da existência dequestões mais sérias e mais profundas para que a ciência não

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    tem resposta. Mas encontrei, no tema académico da filosofia,

    resmas de pseudo-ciência contra as quais a minha consciên-cia se revoltou. Consequentemente parti em busca de umafilosofia  literária – não um «ismo» mas um prisma, atravésdo qual a luz intelectual brilhasse em múltiplas cores.

    A filosofia não é o único tema que tem sido «cientificiza-do» pela universidade moderna: a literatura tem sido reduzi-da a «teoria literária», a música tem sido colonizada por umasérie de teorias, análise Schenkeriana e linguística generativa,e a arquitectura foi praticamente abolida pela engenharia. Naeconomia intelectual, o que era honesta especulação foi afas-tado por suposta ciência, tal como a má moeda afasta a boamoeda. Esta lei de Gresham do intelecto funciona onde querque os professores universitários de humanísticas troquem oconhecimento e a imaginação pela quimera da «investiga-ção» científica. Um filósofo tem certamente que arranjar es-paço para o trabalho académico: mas o trabalho académiconão tem «resultados», não tem «teorias» explicativas, nãotem métodos de experimentação. É, na melhor das hipóteses,uma disciplina espiritual, e o que pode surgir do trabalho aca-démico depende intimamente da alma da pessoa que se ocupadele. Quando filósofos académicos mascaram os seus textoscomo relatórios científicos, e cultivam a ficção de avançosgraduais rumo a uma teoria, podemos ter a certeza de que al-guma coisa correu mal com a sua concepção do tema. O re-sultado é entediante para o estudante, em parte porque nasce

    do tédio – o tédio que surge quando o nosso mundo se rendeà ciência. Se este livro tem uma mensagem, é a de que a ilusãohumana faz parte da verdade científica como seu produto in-cidental, e que a filosofia é, das que dispomos, a mais certadas armas para tentar resgatar a verdade destes apuros.

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    Não devemos esperar que a filosofia seja fácil; ou que

    possa estar isenta de tecnicismos. É que as questões filosófi-cas surgem na periferia do pensamento comum, quando aspalavras falham e nos dirigimos ao desconhecido com umdiscurso inventado. Por esta precisa razão o leitor de filoso-fia tem que estar atento a fraudes que exploram a conhecidadificuldade do tema para dissimular premissas não verifica-das como conclusões arduamente obtidas. Tive uma destasfraudes – Michel Foucault – em conta no que se segue; masa minha intenção não é criar uma sottiserie1 para os nossostempos, ainda que fosse provavelmente necessário fazê-lo.É montar um argumento filosófico, que mostre a filosofiacomo uma extensão natural do nosso interesse pela verdade,e uma terapia para as nossas confusões modernas.

    Estou grato a Robin Baird-Smith, que me encorajou a es-crever este livro, e a David Wiggins, que esmeradamente ten-tou dissuadir-me dos erros de lógica e estilo, o que o absolvede qualquer responsabilidade pelos muitos que restaram. Es-tou também grato a Fiona Ellis e Sophie Jeffreys, as duasmulheres inteligentes que primeiro testaram o livro, e que su-geriram melhorias vitais.

    Malmesbury, Primavera de 1996

    1  Em francês no original. De sottise, tolice, disparate. (N. da T.)

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    1PORQUÊ?

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    filosofia – o «amor da sabedoria» – pode ser abor-dada de duas maneiras: produzindo-a, ou estudan-do a forma como tem sido produzida. A segunda

    abordagem é familiar aos estudantes universitários que dãopor si confrontados com o mais amplo corpo de literaturaalguma vez devotado a um só tema. Este livro segue um mol-de mais antigo. Tenta ensinar filosofia fazendo filosofia. Ain-da que remeta para os grandes filósofos, não forneço umguia fidedigno para as suas ideias. Expor cerimoniosamenteos seus argumentos seria frustrar o meu principal objectivo,que é o de tornar viva a filosofia.

    A vida como a conhecemos não é muito parecida com avida em que a nossa tradição filosófica tomou forma. Platãoe Sócrates eram cidadãos de uma pequena e íntima cidade--estado, com padrões de virtude e de gosto publicamente

    aceites, onde a classe instruída fazia derivar as suas perspec-tivas de uma colecção única de poesia incomparável, masonde todas as outras formas de conhecimento eram raras epreciosas. O reino do intelecto ainda não tinha sido divididoem territórios soberanos, e o pensamento era uma aventura

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    que corria livremente em todas as direcções, detendo-se ma-ravilhado perante esses abismos do espírito que agora conhe-cemos como filosofia. Ao contrário dos grandes atenienses,vivemos num mundo apinhado de estranhos, onde os pa-drões de gosto praticamente desapareceram, onde a classeinstruída não mantém uma cultura comum, e onde o conhe-cimento tem sido parcelado em especializações, cada uma de-las reclamando o seu interesse monopolista contra as ondas

    de ideias nómadas. Nada neste mundo está fixado: a vida in-telectual é uma enorme confusão, em que uma miríade de vo-zes faz o possível para se dar a ouvir por cima do ruído. Mas,à medida que se intensifica a quantidade de comunicação, asua qualidade declina; e o sinal mais importante desta reali-dade é ter deixado de ser aceitável dizê-lo. Criticar o gostopopular é convidar acusações de elitismo, e defender as dis-tinções de valores – entre o virtuoso e o vicioso, o belo e ofeio, o sagrado e o profano, o verdadeiro e o falso – é ofendero único juízo de valor comummente aceite, o juízo de que osjuízos são errados. Nestas circunstâncias a tarefa da filosofiatem que mudar. Para Platão, a filosofia minou as certezas deuma cultura comum e, através da dúvida e do espanto, con-duziu ao domínio da verdade. Agora não há certezas e umacultura comum digna desse nome. A dúvida é o refrão da co-municação popular, o cepticismo estendeu-se em todas as di-recções, e a filosofia foi destituída do seu tradicional ponto departida na fé de uma comunidade estável. Uma filosofia quecomeça na dúvida toma de assalto aquilo em que ninguémacredita e não nos convida a nada em que acreditar. Por maisimportante que seja aquilo que alcança na descrição da natu-reza e dos limites do pensamento racional, tal filosofia correagora o risco de se distanciar da vida que a rodeia, e de des-dizer a antiga promessa da filosofia, que é a de nos ajudar,mesmo se indirectamente, a viver bem e sabiamente.

    No seu justamente célebre livro, Os Problemas da Filoso-fia, Bertrand Russell descreve a filosofia nos termos implica-dos no seu título: como uma série de problemas. «A filosofiaé para ser estudada», escreveu, «não por quaisquer respostasdefinitivas às suas questões, já que, por regra, não existem

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    respostas definitivas que possam ser tomadas como verdadesabsolutas, mas antes pelas questões elas próprias». Mas qualé, podemos perguntar, a pertinência de um estudo destes?Porque devemos nós, que temos tão poucas respostas, devo-tar as nossas energias a questões que não têm nenhumas?Para Russell, o propósito é o de atingir «um intelecto livre,um intelecto que veja como Deus pode ver, sem um aqui eagora, sem esperanças e medos, sem os obstáculos das cren-

    ças usuais e dos tradicionais preconceitos, calmamente, desa-paixonadamente, no único e exclusivo desejo do conheci-mento – um conhecimento tão impessoal, tão puramentecontemplativo, quanto é possível ao homem alcançar». É fá-cil ser tentado por esta visão de um estudo puramente abs-tracto, que é simultaneamente um exercício da maior liberda-de e uma libertação dos costumes, dos preconceitos e do aquie agora. Mas a máscara da retórica é fina, e a ânsia de Russellbrilha através dela. Ele sabe que temos que viver no aqui eagora, e que a dificuldade de o fazer surge justamente porqueas «crenças usuais e os tradicionais preconceitos» perderama sua credibilidade. Nós, criaturas tementes, estamos à espe-ra, e sem as nossas esperanças e medos, não inspiraremosamor e não seremos amáveis. Ver calmamente e «desapaixo-nadamente» está certo – mas apenas às vezes, e só no que res-peita a determinados assuntos. Além disso, Russell publicouestas palavras em 1912, quando o cepticismo era o luxo deuma classe dirigente, não a dieta diária da humanidade.

    Enfatizando questões abstractas, Russell é fiel à históriada filosofia. A virtude destas questões reside em libertar-nosdas ilusões do interesse próprio; colocam-nos à distância domundo da emoção e permitem que, por um momento, o ve-jamos como se nós próprios não estivéssemos envolvidos.Mas os filósofos, como os outros seres humanos, têm umatendência para representar o seu próprio modo de vida como

    o melhor modo de vida – talvez como o único caminho paraa redenção. Libertando-se de um repertório de ilusõestornam-se vítimas de outras, igualmente auto-centradas, ecom a vantagem acrescida de enobrecerem a pessoa que aspromove. Exaltam a vida «desapaixonada» e «contemplati-

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    va» uma vez que é a vida que escolheram. Dizem-nos, comoPlatão, que a vida conduz a uma visão de um mundo supe-rior, ou como Spinoza, que dá a ver o nosso mundo a umaoutra luz, «sob o aspecto da eternidade». Censuram-nos pe-los nossos modos sensuais, e lembram-nos gentilmente, naspalavras de Sócrates, que «a vida não examinada não é vidapara um ser humano». É tentador concordar com Nietzsche,que o filósofo não está interessado na verdade, mas apenas

    na minha verdade e que a coisa que para ele se mascara deverdade não é senão o resíduo das suas próprias emoções.O juízo não é justo. Nenhum dos juízos de Nietzsche o é.

    Mas alguma razão tem. Na nossa tradição a filosofia as-sumiu a existência de um simples senso comum na aborda-gem às coisas, característico das pessoas comuns, e que a fi-losofia tem como dever questionar. O resultado pode sersubverter a visão habitual, como no próprio Nietzsche; oupode ser questionar a questão, como emWittgenstein, e devolver- -nos à nossa «forma de vida» partilhada como a única coisaque temos. No entanto, sem uma certeza de base, não há ne-nhuma normalidade para subverter ou reafirmar, e a filosofiatem dificuldade em começar. A peculiaridade da nossa condi-ção é a de que a certeza já não pode ser estabelecida. Con-frontados com a ruína dos modos populares, tradições, con-venções, costumes e dogmas, só podemos sentir uma ternuraimpotente por estas coisas que se mostraram, como tudo oque é humano, muito mais fáceis de destruir do que de criar.Mas o que tem a filosofia a dizer face a esta mudança decisi-va – como alguns a descreveram, a mudança do cepticismomoderno para a condição pós-moderna, na qual todas ascrenças são simultaneamente postas em dúvida e afirmadas,embora entre aspas?

    O filósofo checo T.G. Masaryk (1850-1937) atribuiumuitas das doenças do mundo moderno à «meia-educação».

    Segundo sugeriu, foi a proeminência na vida pública dossemi-educados que estimulou as esperanças e destruiu as cer-tezas da espécie humana. A fé foi lançada na dúvida, a moralrelativizada, e o simples contentamento destruído pela críti-ca sarcástica daqueles que podem ver suficientemente longe

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    para questionar os fundamentos da ordem social, mas nãosuficientemente longe para os proteger.

    À semelhança da declaração de fé no pensamento abstractode Russell, a queixa de Masaryk pertence a outro mundo –um mundo que desapareceria rapidamente no tumulto daGrande Guerra, em que Masaryk emergiu como Presidente doestado recentemente formado da Checoslováquia. No entanto,tem uma profunda relevância para nós, cujo mundo tem sido

    atacado pelo cepticismo e que desejamos saber como seguirem frente, quando ninguém nos dá orientação para alémdaqueles que são desprezados por o fazerem. Se a meia--educação debilita as nossas certezas, haverá uma educaçãototal que no-las devolva? Ou será que depois de todo o nossopensamento não sobra nada, salvo uma mão cheia de poeira?

    Neste livro tento mostrar o que a filosofia tem para ofere-cer sob esta nova condição. O seu trabalho, tal como o enca-ro, é reparar reflectidamente o que foi irreflectidamente es-tragado. Este estrago não é a religião, a moral ou a cultura,é o mundo humano vulgar: o mundo na sua inocência, omundo apesar da ciência. Russell está seguramente certoquando supõe que a filosofia começa pelas questões; tam-bém está certo quanto ao facto de que ela procure respostasnum domínio de abstracção, onde os interesses comuns re-trocedem e a contemplação toma o lugar deles. Mas o seutrabalho não cessa nesta busca incessante. Há um caminho apercorrer de volta ao mundo humano, através do mesmopensamento abstracto que o corrói.

    Somos seres racionais e é nossa natureza fazer perguntas.Os cães e os gatos vivem «num mundo de percepção», parausar uma frase de Schopenhauer. Para eles a experiência dopresente é tudo, e o pensamento resume-se a uma frágil pontede antecipação, que conduz desta experiência à seguinte. Nós,

    no entanto, somos assaltados pela necessidade de explicar.Confrontados com algo de invulgar, o nosso pensamento nãoé «E depois?» mas «Porquê?» Respondendo à segunda destasquestões podemos responder à primeira. Eis, em resumo, ométodo científico. Onde reside então a diferença entre a ciên-

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    cia e a filosofia? Ou a filosofia é apenas uma espécie de ciênciageneralizada como era para os seus primeiros praticantes –aquelas figuras titânicas, como Tales ou Heráclito, que emer-gem da escuridão pré-histórica para nos dizer «Tudo é água.»ou «Existe apenas fogo.», ressoando as suas enigmáticas pa-lavras séculos fora como misteriosos gritos primitivos? Estaquestão é da maior importância, já que nada mudou tanto aposição da filosofia como o sucesso da ciência moderna.

    As explicações científicas fornecem as causas daquilo queobservamos. Mas o conhecimento científico seria muitomenos útil do que é – não mais útil do que o conhecimentohistórico – se não pudesse ser traduzido em profecias. O dis-positivo pelo qual o diagnóstico se torna profecia é a «leicausal», a lei que não só nos diz que um acontecimento é oefeito de um outro, como que o segundo tipo de aconteci-mentos torna os acontecimentos do primeiro tipo mais pro-váveis. Se me sentir doente depois de beber água da torneirado Alfredo, posso suspeitar que foi a água que me causou adoença. Por enquanto é apenas uma hipótese; é confirmadaquando eu descobrir que, tendo bebido dessa torneira, tam-bém outras pessoas contraíram uma doença semelhante. Ar-risco a lei segundo a qual beber da torneira do Alfredo tornaa doença provável. Esta declaração é interessante por duasrazões: primeiro, fica em aberto: não se refere apenas a ca-sos já observados, é universal. Estabeleceu o seu podercomo diagnóstico tornando-se uma profecia. Em segundolugar, está expressa em termos de probabilidade: não dizque toda a gente que beba da torneira do Alfredo vá ficardoente, mas apenas que tal efeito é provável. A possibilida-de, ou probabilidade, é mensurável. Se 60 por cento doscasos observados produziram o resultado referido, concluí-mos, pela evidência, haver 60 por cento de probabilidade deque aconteça o mesmo com o caso seguinte.

    Trata-se de um exemplo científico grosseiro. À pergunta«Por que estava eu doente?» oferece a resposta «Porquebebi da torneira do Alfredo.» Mas esta resposta convida auma outra pergunta: «Por que é que beber da torneira doAlfredo causa doença?» Vai-se atrás destas perguntas até ao

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    ponto em que as leis causais se tornam «leis da natureza» –leis que para além de registarem as nossas observações tam-bém descrevem o mecanismo subjacente. Descobrimos queum organismo vive no reservatório de água do Alfredo, eque este organismo também pode viver no sistema digestivohumano causando inflamação. É uma lei da natureza queorganismos deste género vivam desta maneira, e uma lei danatureza que o sistema digestivo humano reaja como reage

    à sua presença. Não é uma afirmação meramente observa-dora, mas uma afirmação sobre como são as coisas. Pode-mos aprofundar o assunto, descobrindo a exacta reacçãoquímica que precipita a inflamação e por aí fora. E quantomais fundo formos, quanto mais saibamos sobre a doença,mais provável é que encontremos uma cura, e que mais ca-pazes sejamos de prevenir a sua propagação.

    A natureza e os limites do método científico são aguerrida-mente debatidos entre os filósofos académicos. Mas o meuexemplo sugere pelo menos isto. Em primeiro lugar, que aprocura das causas envolve a procura de leis; em segundo, queas leis são declarações de probabilidade; em terceiro, que asleis são elas próprias explicadas por leis mais amplas e maisgerais; em quarto, que por mais longe que vamos na investiga-ção das causas de alguma coisa, podemos sempre ir mais lon-ge ainda; e finalmente, que quanto mais longe vamos, maisdistantes nos encontramos do mundo da observação. No ter-mo da nossa pesquisa podemos estar a descrever processosque não são de todo observáveis – mesmo processos, como osdas mecânicas quânticas, que não podemos observar e que di-ficilmente podemos descrever na linguagem da observação.Como mostra a mecânica quântica, o conceito da probabili-dade, que cabe na nossa primeira hipótese, reaparece no diag-nóstico final: o mundo da natureza é governado por leis, mas,por mais profunda que seja, nenhuma lei científica é mais do

    que uma declaração de probabilidade. Não há nada no mun-do natural de que se possa dizer que tem que ser assim, mas,no melhor dos casos, que é altamente provável que assim seja.

    Numa certa fase da sua história recente, a filosofia foi do-minada pelos «positivistas lógicos», cuja escola teve origem

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    em Viena entre as guerras e cujas ideias foram trazidas parao público leitor inglês por A.J. Ayer no seu famoso livro Lin- guagem, Verdade e Lógica (1936). Os positivistas estavamfascinados pela ciência, cujos resultados e métodos pareciamclaríssimos e incontestáveis quando postos ao lado do absur-do pomposo da filosofia. Procuravam explicar por que razãoas pessoas podem discutir de maneira fecunda sobre ques-tões científicas, a partir do conhecimento comum do seu sig-

    nificado ao passo que a disputa filosófica parece infindável,com cada participante a inventar as regras. Concluíram quea massa das proposições filosóficas não tem significado e,como modo de encerrar o assunto, propuseram um critériode sentido chamado «princípio de verificação». Isto declaraque o sentido de uma frase é conferido pelo método da suaverificação – pelo procedimento que determina se ela é ver-dadeira ou falsa. As proposições científicas têm sentido umavez que são testadas pela observação. Nenhuma observação,experiência ou análise pode determinar se «O Absoluto éUm e Todo-poderoso» é verdade; por conseguinte, devemosrejeitar a frase como desprovida de sentido.

    O positivismo lógico já não tem seguidores e é fácil verporquê. O princípio da verificação não pode ser verificado:condena-se portanto a si mesmo por falta de sentido. Aindaassim, a perspectiva positivista da ciência permanece alta-mente influente. Muitos filósofos consideram a observaçãonão meramente como o caminho para a verdade científica,mas também como o verdadeiro assunto da ciência. Leis eteorias generalizam-se a partir das observações e tecem-nasnuma tapeçaria sem costura. Em última análise, é isso quequerem dizer. A realidade é aparência sistemática, e as teo-rias são sumários de observações.

    Voltem ao meu exemplo, e verão quão estranho é essequadro. A ciência pode partir da observação. O seu objecti-

    vo não é, no entanto, o de sumariar a aparência, mas o dedistinguir a aparência da realidade. A ciência é uma viagemde descoberta que passa do observado ao que não se obser-va e daí ao não observável. Os seus conceitos e teorias des-crevem uma realidade tão distante do mundo da aparência

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    que dificilmente podemos encará-la, e embora os seus acha-dos sejam testados pela observação, isso não é mais do queuma consequência trivial do facto de a observação ser o que«testar» significa. A ciência explica a aparência do mundo,mas não a descreve.

    Isto significa que a reclamação frequentemente feita emnome da filosofia, de que ela mostra a realidade por trás dasaparências, podia igualmente, e mais plausivelmente, ser fei-

    ta em nome da ciência. E se os métodos da ciência são acei-tes, seguros e incontestáveis enquanto que os da filosofia sãoobscuros, controversos e vagos, que necessidade temos nósde filosofia? Qual é o contributo que a filosofia pode dar ànossa visão do mundo?

    Aqui está uma resposta a essas perguntas. A ciência começaquando colocamos a questão «Porquê?» Conduz-nos doacontecimento observado às leis que o governam e para diantea leis superiores e mais gerais. Mas onde acaba o processo? Secada nova resposta levanta outra questão, então as explica-ções científicas ou são incompletas ou intermináveis (o que éoutra forma de serem incompletas). Mas, nesse caso, a ciênciadeixa pelo menos uma questão por responder. Ainda não sa-bemos porque existem as séries de causas: o porquê desteacontecimento pode ser encontrado naquele; mas e quanto aoporquê do mundo? Os cosmologistas debatem as «origens douniverso», alguns defendendo um Big Bang, outros uma con-densação lenta. Em relação à natureza do caso, no entanto,tais teorias deixam uma questão crucial por responder. Mes-mo se concluirmos que o universo começou em determinadomomento do nada, há uma outra coisa que precisa de ser ex-plicada, a saber, as «condições iniciais» então obtidas. Algo foiverdade no momento zero do universo, designadamente queeste notável acontecimento estava prestes a irromper para aexistência, e para gerar efeitos de acordo com leis que já eram,

    nesse instante inicial, soberanas. E qual é o porquê disso?Um positivista rejeitaria uma questão destas por falta de

    sentido. O mesmo fariam muitos cientistas. Mas se o únicofundamento para proceder deste modo é o de que a ciêncianão pode responder-lhe, então a resposta é auto-justificativa.

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    É claro que a questão não tem uma resposta científica: é aquestão para além da ciência, a questão abandonada quandotoda a ciência estiver por escrito. É uma questão filosófica.

    Bem, sim, dirá o céptico; mas daqui não resulta que nãohaja uma resposta. Talvez as questões filosóficas surjam nasmargens do nosso pensamento, onde o mandado da razãoexpira, e já não há mais respostas a esperar. Na Crítica daRazão Pura, Kant tentou mostrar que é possível que assim

    seja. Mas foi preciso um filósofo para defender o ponto, e seKant está certo, há pelo menos uma questão filosófica comresposta. Trata-se de uma questão filosófica e não científica,a de saber se a explicação do universo tem ou não uma res-posta; e, segundo Kant, a resposta é não.

    Nem todos os filósofos concordaram com ele. Há um ar-gumento, conhecido pelo nome que Kant lhe atribuiu, masque se deve a Santo Anselmo, arcebispo de Cantuária no sé-culo XI, que oferece a explicação completa e definitiva detudo, mostrando que pelo menos uma coisa existe por neces-sidade. O «argumento ontológico» é normalmente oferecidocomo uma prova da existência de Deus. Mas é capaz de umainterpretação mais ampla, e reaparece em Spinoza e Hegelcomo a resposta definitiva a todos os «Porquê?» Diz-nos queDeus é, por definição, a soma de todas as perfeições, e por-tanto a existência, que é parte da perfeição, pertence à suaessência. Ele tem que existir, e a resposta ao porquê da suaexistência responde-se a si própria. Uma vez que a existênciade Deus explica tudo o resto, nenhum «Porquê?» fica semresposta, nem mesmo o porquê do mundo.

    Assim exposto, lacónica e secamente, o argumento tem aaparência de um sofisma. Daí que nunca seja exposto lacóni-ca ou secamente, mas embrulhado em astutas subtilezas. Defacto, é o único argumento da existência de Deus que aindaestá vivo, e aquele que provavelmente sempre esteve  vivo,

    mesmo antes de Santo Anselmo lhe dar explicitamente voz.Qual é realmente o significado das sublimes palavras queabrem o Evangelho segundo S. João? No princípio, escreve oevangelista, era o verbo, o logos. Na filosofia grega, logos significa não apenas a palavra, mas razão, argumento, expli-

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    cação: qualquer resposta à questão «Porquê?» Por outraspalavras, ou melhor, nas mesmas palavras se uma pessoa secingir ao grego: no princípio era o porquê que se respondiaa si próprio.

    Reflectindo nesta passagem, o Fausto de Goethe, propõeum avanço: não foram as palavras mas os actos que começa-ram as coisas, e se o mundo tem sentido para nós, é porqueim Anfgang war die Tat : no princípio era o acto. Não per-

    guntemos «O acto de quem?», porque tal questão limita-se amergulhar-nos outra vez na incessante torrente das causas.Perguntemos em vez disso de que modo o «Porquê» das coi-sas é mudado quando as vemos não como meros aconteci-mentos mas como acções. Quando o juiz me pergunta porque pus arsénico no chá da minha mulher, não ficará satisfei-to se lhe responder «Porque impulsos eléctricos do meu cére-bro levaram a minha mão a pegar na garrafa e a vertê -lapara a chávena de chá de serviço» – apesar desta poder seruma resposta verdadeira à pergunta «Porquê?» construídada forma que os cientistas a constroem, enquanto um pedidopara a causa. É que se trata de uma resposta do tipo errado.

    Parece, portanto, que a questão «Porquê?» é ambígua.Por vezes é respondida apontando uma causa, outras apon-tando uma razão. O juiz está a perguntar qual era a minhaintenção. Se responder que me enganei na garrafa e a troqueipor aquela que continha o whisky, que tencionava adminis-trar apenas uma pequena dose de arsénico como um tiro deaviso, ou que tencionava matá-la pois, com franqueza, já erademais – então, em cada um dos casos, dei uma razão para aminha acção, e a resposta é pertinente. Há filósofos que di-zem que as razões são causas, embora causas de tipo espe-cial . As três respostas que esbocei são explicações válidas, eo que é uma explicação se não mencionar uma causa? Masisto não atinge o cerne da questão. A peculiaridade das ra-

    zões é que se pode argumentar com elas; é possível aceitá-lasou rejeitá-las, é possível propor contra-razões; e louvar oucondenar o agente por causa delas. Mesmo que as razões se-jam causas, foram arrancadas ao reino neutral da teoriacientífica, e dotadas de um sentido moral.

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    A ambiguidade pode aqui ser expressa de um outro modo.Por vezes explicamos as nossas acções; por vezes justificamo--las. E enquanto as explicações ou são verdadeiras ou falsas,as razões podem ser boas ou más. Pertencem ao infindável di-álogo moral de acordo com o qual as pessoas se relacionamumas com as outras e com o mundo, e não é surpreendente setiverem uma estrutura inteiramente diferente, e fizerem uso deconceitos inteiramente diferentes dos das explicações propos-

    tas pela ciência do comportamento. A minha resposta originalao juiz era absurda, não porque fosse falsa, mas porque remo-via a minha acção da esfera do julgamento e a descrevia emtermos que não a referem como minha. No entanto, são pre-cisamente estes os termos que devemos esperar que a ciênciado comportamento empregue: porque eles identificam o me-canismo subjacente que explica aquilo que observamos.

    Encontramos aqui, e não é a primeira vez neste trabalho,um paradoxo persistente. Parece que descrevemos o mundode duas maneiras bastante diferentes – como o mundo quenos contém e como o mundo em que agimos. Somos parte danatureza, obedientes a leis naturais. Mas também nos distan-ciamos da natureza, e fazemos escolhas que acreditamosserem livres. A natureza tem para nós um sentido – muitossentidos – e classificamo-la de formas que não podem encon-trar um lugar na teoria científica. Quando vemos um sorrisode outra pessoa vemos carne humana a mover-se em obedi-ência a impulsos dos nervos. Nenhuma lei da natureza sesuspende neste processo; sorrimos não apesar de, mas porcausa da natureza. Mesmo assim, entendemos um sorriso deuma maneira bastante diferente: não como carne, mas comoespírito, livremente revelado. Um sorriso é, para nós, sempremais do que carne, mesmo que seja só carne.

    Quando aplicada a um sorriso, a questão «Porquê?», estáà procura de um sentido. Talvez se esteja a sorrir por uma ra-

    zão; mas mesmo que não haja uma razão pode haver umporquê para o sorriso. Posso entendê -lo como um gesto deserena aceitação. E isso responde à pergunta do porquê dosorriso, ainda que não designe nem justificação nem causa.A descrição torna o sorriso inteligível . Eis então outro «Por-

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    quê?», e um que pode ser aplicado mais amplamente do quesó aos seres humanos. O porquê de uma nota de música, oude um traço numa pintura, é assim. Entendemos por que oacorde de abertura de Tristão e Isolda se converte na sétimadominante do Lá menor, não por estudarmos a razão deWagner para escrever assim, ainda menos por procurarmosuma causa, mas alcançando o significado do peso destes doisacordes à medida que balançam um contra o outro, ouvindo

    a sensibilidade da voz que se movimenta entre eles, esuspendendo-nos momentaneamente com a música, na ex-pectativa de outra resolução que nunca chega. A crítica des-creve o porquê desta música; mas a descrição não é necessá-ria para compreender o que se ouve, como não é necessáriapara compreender um sorriso. A compreensão é sui generis,faz parte do modo como nos relacionamos com o mundo,quando nos relacionamos com ele como seres livres.

    E aqui encontramos outra tarefa para a filosofia, e talvez asua tarefa mais importante nas nossas condições. Quandorespondemos ao mundo como seres livres, procuramos senti-dos e razões, e dividimos o mundo de acordo com os nossosinteresses, e não de acordo com a sua natureza intrínseca, talcomo ela é revelada à ciência. De facto, o sentido do mundoestá salvaguardado em conceitos que, sendo indispensáveisao «Porquê?» da liberdade, não encontram lugar na lingua-gem da ciência: conceitos como beleza, bondade e espíritoque crescem no fino húmus do discurso humano. Este húmusé rapidamente corroído quando a flora lhe é retirada, e há orisco de que nada volte a crescer depois disso. Pode ver-se ofuncionamento do processo na questão do sexo. A sexualida-de humana foi geralmente compreendida através das ideiasde amor e de pertença. Um bosque encantado de ideias e ima-gens literárias protegeu essas concepções, e homem e mulherviveram nelas com felicidade, ou em todo o caso, com uma

    infelicidade com que foi possível lidar. O sexólogo limpatodo este emaranhado de ervas, para revelar a verdade cientí-fica das coisas: os órgãos animais, os impulsos amorais, assensações de formigueiro que constam desses deprimentes re-latórios sobre o comportamento dos humanóides america-

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    nos. O sentido da experiência não representa um papel nadescrição científica. Uma vez que a ciência tem, ou pelo me-nos assume ter, soberania absoluta sobre aquilo que é verda-de, o sentido acaba por ser encarado como uma ficção. Aspessoas podem brevemente tentar reinventá-lo, algumas ve-zes esperando mesmo fazer um melhor trabalho. No entanto,quando falham caem num estado de hedonismo cínico, escar-necendo dos bota-de-elástico que acreditam que, para além

    da biologia, o sexo tem mais que se lhe diga.Isto é um exemplo de um processo que o grande sociólo-go Max Weber (1864-1920) chamou Entzauberung – desen-cantamento. A filosofia é-nos útil, precisamente porque ela, esó ela, pode vindicar os conceitos através dos quais entende-mos e agimos no mundo: conceitos como o de pessoa, quenão tem lugar na ciência mas que descreve aquilo que nósentendemos, quando nos relacionamos com o mundo comoele é verdadeiramente para nós. A tentativa científica de ex-plorar a «profundidade» das coisas humanas é acompanha-da de um perigo singular. Ameaça destruir a nossa resposta àsuperfície. É, no entanto, na superfície que vivemos e agi-mos: é lá que somos criados, como aparências complexasmantidas pela interacção social que, como aparências, tam-bém criamos. É nesta fina camada de húmus que as sementesda felicidade humana são lançadas e o desejo imprudente dea sacudir para longe – um desejo que inspirou todas essas«ciências do homem», de Marx e Freud à biologia social –priva-nos da consolação. A filosofia é importante, por conse-guinte, como um exercício de ecologia conceptual. É uma úl-tima tentativa para re-encantar o mundo, e desse modo«salvar as aparências». E como disse Oscar Wilde, só umapessoa muito fútil não julga pelas aparências.

    A filosofia surge, portanto, de dois modos contrastantes:primeiro, tentando completar o «Porquê» da explicação; em

    segundo lugar, tentando justificar os outros tipos de «Por-quê?» – o «Porquê?» que procura uma razão, e o «Porquê?»que procura um sentido. A maioria dos ramos tradicionaisda disciplina deriva destas duas tentativas, a primeira delasdesesperada, a segunda a nossa melhor fonte de esperança.