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Duarte pacheco e book

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Instituto Superior Técnico

[s.d], Mário NovaisGaleria de Biblioteca de Arte/Fundação Calouste Gulbenkian

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TítuloDUARTE PACHECODO TÉCNICO AO TERREIRO DO PAÇO

DirecçãoComissão do Centenário do Instituto Superior Técnico

ApresentaçãoAntónio Cruz Serra

PrefácioAntónio Costa

Coordenação científicaPalmira F. Silva

TextosAna Homem de Melo e Sandra Vaz Costa

Pesquisa de fontes documentais e legendasNúcleo de Arquivo do IST: Ana Rigueiro, Catarina Abranches e Filipa Soares

Direcção executivaFilipa Soares

EditoraAlthum.com

EditorLuís Nazaré Gomes

Revisão de textosAna Mateus

Design gráficoHenrique Cayatte Design com Ana Machado, Rita Múrias e Sara Aguiar

ImpressãoPrinter Portuguesa

TIRAGEM2.000 exemplares

ISBN978-989-683-016-8

DEPÓSITO LEGAL328 718 / 11

Lisboa, Junho de 2011

URL | 100.ist.utl.pt Av. Rovisco Pais1059-001 LISBOA

URL | althum.comRua Conde de Sabugosa, 7 – 1.º Dt.º1700-115 [email protected]

Fotografia da capaNovo Campus do Instituto Superior Técnico[s.d], Horácio NovaisSecretaria-Geral do Ministério de Educação

AgradecimentosArquivo Municipal de Lisboa | Núcleo Arco do Cego, Núcleo FotográficoArquivo Nacional Torre do Tombo | Divisão de ComunicaçãoCâmara Municipal de Lisboa | Divisão Municipal de Cultura | Gabinete de Estudos OlisiponensesMuseu Municipal de Loulé | Centro de Documentação | FototecaNúcleo de Arquivo e Documentação do ISTNúcleo de Arquivo do IST – NArQ.Secretaria-Geral do Ministério da Educação

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14 | APRESENTAÇÃO ANTÓNIO CRUZ SERRA | PRESIDENTE DO IST

18 | PREFÁCIO ANTÓNIO COSTA | PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA

46 | OS ANOS DE FORMAÇÃO (1900-1923) UMA FAMÍLIA DE POLÍTICOS

24 | O PAÍS A RÉGUA E ESQUADRO A OBRA PÚBLICA DE DUARTE PACHECO NOTA INTRODUTÓRIA

ESBOÇO BIOGRÁFICO

O MITO

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58 | DUARTE PACHECO O POLÍTICO NA ACADEMIA DO PARDIEIRO DA BOAVISTA

AO COLOSSO DA ALAMEDA: O TÉCNICO NOVO

A CONSTRUÇÃO DO TÉCNICO: O DECRETO,

O PROJECTO E O CONCRETO

90 | O ENGENHEIRO NA “RES PUBLICA” A INSTRUÇÃO: SETE MESES E UM PAÍS

DUARTE PACHECO E LISBOA:

AS MUDANÇAS NA CIDADE

OBRAS PÚBLICAS E COMUNICAÇÕES (1932-1936/1938-1943):

O PLANO METÓDICO

152 | FONTES DOCUMENTAIS

154 | BIBLIOGRAFIA

Instituto Superior Técnico

[s.d], Mário NovaisGaleria de Biblioteca de Arte/Fundação Calouste Gulbenkian

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Em Outubro de 1910, a I República foi implantada num Portugal abalado por crises profundas; uma crise social provocada pelo fraco desenvolvimento industrial e pela deslocação da população para as grandes cidades, nas quais não conseguiam trabalho; uma grave cri-se económico-fi nanceira associada a uma crescente dívida pública, à falência de bancos e à falta de investimento, interno e externo, e uma crise de confi ança nos poderes políticos, despoletada pelos fre-quentes escândalos de corrupção.A receita republicana para vencer esta crise generalizada da socie-dade portuguesa assentava na educação, uma educação voltada para o «esclarecimento das consciências», isto é, como escreveu Rómulo de Carvalho, «uma instrução segura e experimental que permitisse ao Homem adquirir o esteio que haveria de fi rmar o edifício moral da sua alma». Uma educação que permitisse tirar Portugal da cauda do mundo ocidental e que possibilitasse a modernização a todos os níveis de que o País necessitava.A 23 de Novembro de 1910, Brito Camacho foi nomeado Ministro do Fomento do Governo Provisório da recém-criada República Portu-guesa. Uma das suas prioridades, como escreveu uns anos depois no periódico A Lucta, era a reforma do Instituto Industrial e Comercial de Lisboa (IICL), para o que imediatamente convidou Alfredo Ben-saude, que nomearia director do IICL no início de Dezembro.O relatório que em poucos meses Alfredo Bensaude elaborou para Brito Camacho indicava o óbvio: para reformar o tecido produti-vo nacional e concretizar a mudança do país era necessário alterar radicalmente o paradigma do ensino da engenharia. A reforma do ensino industrial e comercial em Portugal proposta por Bensaude foi aceite na íntegra por Brito Camacho. Assim, o Decreto de 23 de Maio de 1911 desdobrou, o IICL em duas novas escolas, o Instituto Superior Técnico e o Instituto Superior do Comércio, actual ISEG. «Com um Ministro menos inteligente e menos livre dos preconcei-tos da rotina do que o Sr. Dr. Brito Camacho, a criação do Institu-to, em bases que conduziram a bons resultados imediatos, não teria sido possível», escreveria Bensaude uns anos depois nas suas Notas Histórico-pedagógicas, reconhecendo o momento histórico inédito

«O homem  vale, sobretudo, pela educação que possui, porque só ela é capaz de desenvolver harmoniosamente as suas faculdades, de maneira a elevarem-se-lhe ao máximo, em proveito dele e dos outros»Primeiro diploma legislativo da República para a reforma do ensino básico, 29/03/1911.

O Ministro das Obras Públicas

discursando durante

a inauguração do bairro

económico de Belém

12 de Junho de 1938, autor desconhecidoArquivo Nacional Torre do Tombo/

Fundo Empresa Pública

Jornal O Século

APRESENTAÇÃOProf. António Cruz Serra

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ÃO que presidiu a criação do IST. Estas bases foram a total autonomia científico-pedagógica com que o Instituto foi criado e que permiti-ram a criação de uma escola com elevados padrões de excelência e exigência, desenvolvendo uma cultura muito própria, o «espírito de escola» que nos distingue. Mas esse momento histórico seria apenas isso: um momento que se esfumou rapidamente. E essa autonomia começou quase imediata-mente a ser atacada. Quatro anos depois, em 1915, Bensaude escrevia uma Representação dirigida pelo Conselho Escolar ao Parlamento, pedindo a revogação de uma lei que comprometia a continuidade dos cursos superiores de engenharia. «A irresistível ânsia reforma-dora dalguns dos nossos governantes ia arruinando a obra do Insti-tuto», explicou. Para além disso, nunca foi concretizada a promessa de construção de instalações condignas ao ensino da engenharia que, citando ainda Bensaude, «carece de grandes laboratórios, salas de desenho, oficinas, etc.,» e que «não se poderá desenvolver entre nós, enquanto não possuirmos um edifício apropriado onde esse ensino se possa fazer convenientemente».Em 1919, sem esperanças de conseguir financiamento para a ambi-cionada construção de um edifício condigno e cansado dos ataques legislativos à nova instituição, Bensaude pediu a demissão de direc-tor do Técnico, cargo que abandonou definitivamente em 1920. Foi preciso esperar por 1925 e pela entrada de Duarte Pacheco no corpo docente do IST para a situação se alterar.No primeiro Conselho Escolar do IST a que teve direito da palavra, em 1926, Duarte Pacheco propôs-se resolver, no espaço de um ano, o problema das instalações degradadas em que funcionava a Escola. Um homem de acção que se movimentava com muito à vontade nos meios políticos, Duarte Pacheco conseguiu o que tantos tinham infrutifera-mente tentado nos 15 anos de existência do Técnico: os fundos e as con-dições necessárias ao arranque das obras de construção de um Técnico novo. Essas condições passavam por uma autonomia financeira tão iné-dita quanto o fora a autonomia científico-pedagógica conseguida por Alfredo Bensaude. Com essa autonomia e com uma gestão rigorosa dos dinheiros públicos, Duarte Pacheco conseguiu construir o primeiro campus universitário pensado e criado de raiz, concretizando nos edifí-cios da Alameda os ideais pedagógicos do fundador do IST.As primeiras obras no futuro campus tiveram início logo em 1928 e cinco anos depois suscitavam já inúmeras críticas, em particular às suas dimensões, consideradas exageradas por muitos. Indiferente às críticas, à amplitude da construção, que pasmava alguns, e à compo-sição estética, que afligia outros tantos, Duarte Pacheco persistiu e as obras foram prosseguindo, mesmo depois da mudança, em 1935, para as novas e nunca inauguradas instalações.Também em 1928, Duarte Pacheco deu início a uma actividade polí-tica que colocou o país na rota da modernidade que Brito Camacho

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17/16 desejava com a criação do Técnico. Em 1938, as solicitações políticas obrigaram Duarte Pacheco a abandonar o cargo de director do Téc-nico. No entanto, nunca abandonou a sua Escola, como se comprova pelo facto de em 1942 ter subscrito ao IST verba para o início da construção do laboratório de Hidráulica. Em 1943, faleceu o minis-tro das Obras Públicas e Comunicação que marcou não só o Técnico que hoje somos como todo um país. Os pavilhões de Hidráulica e de Máquinas e Motores ficaram por construir embora os projectos que deixou tenham orientado as obras públicas muito para além da sua morte.Camus afirmava que a verdadeira generosidade para com o futu-ro consiste em dar tudo ao presente. Quer Alfredo Bensaude quer Duarte Pacheco, os directores do Técnico Velho e do Técnico Novo que permitiram a transformação do IST numa Escola de re-ferência a nível nacional e internacional, poderiam ser os inspira-dores deste aforismo. Ambos extraordinários, estes dois homens conjugam o que deve ser um engenheiro do Técnico, alguém que sabe e que sabe fazer.

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“Duarte Pacheco não só escolheu uma localização privilegiada para a suaEscola, como redefiniu (...) os limites do território urbanizado da cidadeinscrevendo o Técnico num vector de expansão de Lisboa.”Dr. António CostaPresidente da Câmara Municipal de Lisboa

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O ano de 1938 foi um ponto de viragem na história da cidade de Lis-boa. No primeiro dia desse ano, Duarte Pacheco tomou posse no cargo de Presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Convidado de novo para o cargo de Ministro das Obras Públicas meses depois, Du-arte Pacheco, retomou o lugar com poderes reforçados, que lhe per-mitiram concretizar os planos de urbanização, pensados pela pri-meira vez a nível territorial na sua primeira passagem pelo Ministério, entre 1932 e 1936.

Director do Instituto Superior Técnico aos vinte e seis anos, a obra pública de Duarte Pacheco começou com a revolução urbanística que promoveu nas imediações das novas instalações do seu Institu-to. A escolha da localização do primeiro campus universitário não foi acidental, a informação que recolheu no gabinete Beirão da Vei-ga, vereador da Câmara e docente do IST, permitiu ao Sonhador de Grandes Coisas delinear o seu primeiro sonho. Duarte Pacheco não só escolheu uma localização privilegiada para a sua Escola, como re-defi niu com essa escolha os limites do território urbanizado da cida-de inscrevendo o Técnico num vector de expansão de Lisboa.

Pela mão de Duarte Pacheco, uma nova geração de arquitectos foi integrada nos serviços técnicos do gabinete de urbanismo da Câma-ra Municipal de Lisboa. Entre eles destaco, para além de Étienne de Gröer, que defi niu o Plano Geral de Urbanização e Expansão de Lis-boa e as grandes linhas de desenvolvimento da cidade, Faria da Cos-ta, o primeiro urbanista português, e Keil do Amaral.

O programa de melhoramentos urbanos desenvolvido sob a presi-dência de Duarte Pacheco é demasiado extenso para enumerar. Mais do que as grandes obras a que normalmente se associa Duarte Pacheco, gostaria de relembrar a sistematização que imprimiu ao planeamento da cidade, um trabalho pioneiro que deu origem ao primeiro Plano Director de Lisboa, um trabalho com a precisão, ri-gor e exigência que bebeu na Escola que o formou.

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PREFÁCIODr. António Costa

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IO A ligação da cidade ao Técnico foi assim estreitada por um dos seus insignes directores, aquele que lançou não só a sua Escola como a própria cidade na rota da modernidade. Duarte Pacheco foi um en-genheiro político ou um político engenheiro que, há mais de sete décadas, nos mostrou que a colaboração entre a cidade e a academia é um factor importante para o seu crescimento e sustentabilidade. Hoje, no contexto de uma economia do conhecimento, competitiva e dinâmica, essa colaboração é cada vez mais indispensável. Este li-vro, que nasce de uma colaboração entre o IST e um Gabinete da CML, o Gabinete de Estudos Olisiponenses do Município de Lis-boa, mostra-nos o passado muito específico e desejavelmente irre-preensível, hoje no Portugal democrático.

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O Ministro Duarte Pacheco

[s.d.], autor desconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro

de Documentação/Fototeca

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José Duarte Pacheco

[c. 1942] Alvão, PortoMuseu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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Do extenso quadro de nomes que integraram o Governo de Oliveira Salazar, Duarte Pacheco é, seguramente, o mais conhecido dos seus ministros.A vida de Duarte Pacheco foi curta: 43 anos, 7 meses e 7 dias. Em vin-te anos de causa pública reformou, legislou, programou e construiu. Nesse mesmo espaço de tempo angariou admiradores e adversários. A sua presença não foi discreta e a sua forma de fazer política não foi consensual.Empregou mão-de-obra barata para erguer as infra-estruturas que o País não tinha. E porque o País não tinha recursos, escudado no braço forte da lei, expropriou propriedades esventrando quintas e demolindo imóveis, para encurtar espaço no rasgar de uma estrada, ou para defi nir o perímetro de salvaguarda de um monumento.A classe política estremecia à exposição das suas ideias, e o Governo oscilava entre o temor do embaraço e a certeza da obra feita.Vítima de acidente de viação aos 43 anos de idade, legou ao País uma obra impressionante em número, mas vazia de herdeiros políticos. Mas dentro nesse vazio a política fez nascer o mito: um mito cons-truído, encenado e alimentado; a elegia de um homem que votara a sua vida à causa pública e que morrera ao serviço da Nação.No limiar dos setenta anos volvidos sobre a morte de Duarte Pa-checo, o carisma do ministro permanece, permanecendo também a dualidade de opiniões. Não se questiona a capacidade de trabalho, a necessidade ou a qualidade da obra construída, questiona-se mui-tas vezes sobre o modus operandi do ministro e o regime político que integrou.Com a queda do Estado Novo desmoronou-se um sistema político e com ele muitas instituições e reputações. A Ponte Salazar mudou de nome, o Viaduto Duarte Pacheco manteve-se.Pelo País existem avenidas, ruas, escolas e edifícios Duarte Pacheco porque as fi guras incontornáveis da história são as mesmas que ha-bitam o nosso quotidiano.

1 IHA – Centro de Investigação do Insti-tuto de História da Arte da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

NOTAINTRO DUTÓRIA Sandra Vaz Costa 1

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Duarte Pacheco nasceu em Loulé no dia 19 de Abril. Atesta o assento de baptismo que terá nascido no ano de 1899. Afi rmava o político que nascera em 1900 e que o pároco, por engano, lhe atribuíra mais um ano de vida.Quarto fi lho de José Azevedo Pacheco e de Maria do Carmo Pacheco teve três irmãos e sete irmãs. Órfão de mãe aos seis anos de idade e de pai aos catorze anos, frequentou o ensino em Loulé até ao tercei-ro ano do liceu. No ano lectivo de 1916/17 transitaria para o Liceu de Faro, concluindo o 7º ano com a classifi cação de 17 valores.Matriculado no Instituto Superior Técnico em Lisboa no ano lectivo de 1917/18, nas disciplinas de Engenharia Geral, concluiria o curso de Engenharia Electrotécnica e Máquinas no ano lectivo de 1922/23.Professor interino do IST para a disciplina de Matemáticas Gerais em 1925, passaria a professor efectivo em 1926. No mesmo ano, seria nomeado director interino do IST e em 1927 director efectivo.De 19 de Abril a 10 de Novembro de 1928 desempenharia o cargo de Ministro da Instrução Pública, regressando à direcção do IST ainda em Novembro do mesmo ano e até ao dia 5 de Julho de 1932, data em que seria nomeado Ministro do Comércio e Comunicações. A 7 de Julho de 1932 o mesmo Ministério, com atribuições reforçadas, pas-saria a denominar-se Ministério das Obras Públicas e Comunicações. Na remodelação ministerial de 18 de Janeiro de 1936, o seu nome era preterido e regressava à direcção do IST até 31 de Dezembro de 1937. No dia 1 de Janeiro de 1938 tomaria posse como Presidente da Câma-ra Municipal de Lisboa, cargo de que viria a abdicar a 25 de Maio do mesmo ano por impossibilidade de acumulação de cargos públicos: a partir desta data Duarte Pacheco integraria de novo o corpo governa-mental como Ministro das Obras Públicas e Comunicações.No desempenho dos cargos públicos que lhe foram confi ados, foi distinguido com a Grã-cruz da Ordem Militar de Cristo a 29 de Ju-nho de 1933 e com a Grã-cruz da Ordem de Santiago de Espada a 9 de Dezembro de 1940. A 9 de Junho de 1941 foi homenageado pelos Municípios do País, como forma de agradecimento pela pronta res-posta como reagiu aos prejuízos causados pelo ciclone que assolou o País a 15 de Fevereiro desse mesmo ano.

ESBOÇOBIOGRÁFICO

EM CIMA

Mãe de Duarte Pacheco,

Maria do Carmo Pacheco

[s.d], autor não identifi cadoIn Revista Municipal: número especial

dedicado à memória do Engenheiro Duarte

Pacheco. Lisboa: Câmara Municipal

de Lisboa, Jan. 1944.

Museu Municipal de Loulé/Centro

de Documentação

Família de Duarte Pacheco,

(Duarte é o 4º elemento da esquerda

para a direita, no topo)

[c. 1902], autor não identifi cadoIn Revista Municipal: número especial

dedicado à memória do Engenheiro

Duarte Pacheco. Lisboa: Câmara

Municipal de Lisboa, Jan. 1944.

Museu Municipal de Loulé/Centro

de Documentação

Casa onde nasceu Duarte Pacheco

[s.d], autor desconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro

de Documentação/Fototeca

À ESQUERDA

Duarte Pacheco

[c. 1902], Atelier Veiga, FaroMuseu Municipal de Loulé/Centro

de Documentação/Fototeca

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Duarte Pacheco, aluno do IST

[c. 1918], autor desconhecidoIn Revista Municipal, número especial

em memória a Duarte Pacheco

Museu Municipal de Loulé/Centro

de Documentação

A 16 de Novembro de 1943 mor-reria no Hospital de Setúbal, ví-tima dos graves ferimentos cau-sados pelo acidente de viação sofrido cerca de Vendas Novas, quando regressava a Lisboa, de-pois de mais uma vistoria a uma das obras em curso: causa da morte; esmagamento da perna direita e colapso circulatório2.

2 A causa clínica da morte de Duarte Pacheco está descrita no Livro de Assento de defuntos do Cemitério do Alto de São João, Livro de Registo n.º 4356, de 17 de Novembro de 1943, Nº de Guia 505, Freguesia de Santa Isabel; “Nome Duarte José Pacheco ou Duarte Pacheco, com local de se-pultura no Mausoléu dos Beneméri-tos da Cidade, por Ordem de Serviço Nº 59 da Câmara Municipal de Lisboa em 16 de Novembro de 1943”.

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Na manhã do dia 15 de Novembro, o ministro saíra de Lisboa com destino a Vila Viçosa, com o objectivo de vistoriar os trabalhos fi nais do Monumento a D. João IV que tinha data de inauguração marcada para dia 8 de Dezembro. A pressa não movia o ministro, movia-o a insistência. Inscrito no calendário das Comemorações dos Cente-nários, o Monumento a D. João IV deveria ter sido inaugurado em 1940, mas por vicissitudes várias a obra arrastara-se no tempo3. Du-arte Pacheco deslocou-se a Vila Viçosa com uma equipa de 5 cola-boradores e terminada a sessão de trabalho no paço ducal, a equipa regressava de imediato a Lisboa: na agenda, o expediente encerrava com uma reunião do Conselho de Ministros. Contudo, viagem de regresso nunca se concluiu. Na Cova do Lagarto, ao km 65 da Estra-da Nacional nº 4 que liga Montemor-o-Novo a Vendas Novas, cerca das 17h30 ocorreu um despiste. O carro do ministro embateu vio-lentamente contra uma árvore e capotou. Dos seis ocupantes da via-tura, quatro sofreram ferimentos ligeiros, Jorge Gomes de Amorim teve morte imediata e o ministro apresentava um grave ferimento na perna direita. Assistido nos Serviços de Saúde da Escola Prática de Artilharia de Vendas Novas, foi depois evacuado para o Hospital de Setúbal, e aí foi assistido pela equipa médica residente. A hi-pótese de amputação da perna não poderia salvar o ministro: a violência do embate no momen-

3 Sobre a cronologia da obra do Monu-mento a D. João IV no Paço Ducal de Vila Viçosa V. SAIAL, Joaquim, Esta-

tuária Pública Portuguesa. Os Anos

30 (1926-1940), Lisboa, Bertrand Editora, 1991, pp. 171-179.

O Buick que transportava

Duarte Pacheco

1943, autor desconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro

de Documentação/Fototeca

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“Uma vida velozmente vivida e inteiramente consagrada ao progresso pátrio”António de Oliveira Salazar in Monumento de Duarte Pacheco em Loulé

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to do acidente provocara graves hemorragias in ter nas. Duarte Pa-checo viria a falecer na madrugada de dia 16.O Governo decretou funerais nacionais com todas as honras militares4. O corpo do ministro chegou a Cacilhas em ambulância cerca das 7h00, atravessou o Tejo num cacilheiro que atracou ao Cais do Sodré às 8h05 e daí seguiu para o Salão Nobre dos Paços do Concelho, onde ficou em câmara ardente até às 11h00 do dia seguinte.No dia 16 desceu um vazio sobre o País: o Rádio Clube Português can-celou a emissão, as bandeiras dos serviços públicos, dos municípios, das universidades e dos institutos desceram a meia haste e no dia 17, dia das exéquias, Lisboa saiu à rua em silêncio e vestida de negro. As direcções da União de Grémios de Lojistas de Lisboa e dos Grémios Concelhios de Comerciantes de todos os géneros, bens e serviços, fi-zeram um convite a todos os associados para que encerrassem portas5.No Salão Nobre da cidade, pelas 10h00 da manhã, na estrita regra protocolar de Estado, o ar cebispo de Mitilene celebrou missa de corpo presente que foi acompanhada pela Orquestra Sin fónica da Emissora Nacional.Terminada a homilia, seguiu-se o cortejo fúnebre com traçado definido pelo protocolo, sendo o féretro precedido por um grupo de esquadrões de cavalaria e escoltado por esquadrões de infantaria da Guarda Nacio-nal Republicana. Chegados ao Cemitério do Alto do S. João, ficaram os restos mortais do ministro depo-sitados no Mausoléu dos Benemé-ritos da Cidade de Lisboa.Duarte Pacheco extinguira-se fisicamente. Mas não mais que isso. O Governo acabara de per-der o Ministro das Obras Públi-cas. Um homem solteiro, sem herdeiros directos e um minis-tro sem herdeiros políticos6. Na semana sequente à sua morte, os jornais agitaram-se na publica-

4 Diário do Governo, I Série, Suplemen-to, Decreto-Lei n.º 33.240. de 16 de Novembro de 1943.

5 Diário de Lisboa, 16 de Novembro de 1943.

6 No dia 18 de Novembro o Diário do

Governo decretava a nomeação interina de Duarte João Pinto da Costa Leite como Ministro das Obras Públicas e Comunicações. Só na remodelação ministerial de 6 de Setembro de 1944 surgiria a nomeação definitiva de Augusto Cancela de Abreu como Ministro das Obras Públicas e Comunicações.

Funeral de Duarte Pacheco

em Lisboa

1943, autore desconhecidoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete

de Estudos Olisiponenses

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Funeral de Duarte Pacheco

em Lisboa

1943, autor desconhecidoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete

de Estudos Olisiponenses

ção de textos com vincado elogio fúnebre7. Em uníssono relatam a precoce orfandade de Duarte Pacheco na cidade onde nasceu, Lou-lé; exaltam o brilhante percurso e distinção obtida no Liceu de Faro; clamam a ascensão meteórica no Instituto Superior Técnico, onde de aluno caloiro a director não mediou 10 anos. Quanto ao enorme edifício que compõe a sua acção política, os mesmos jornais são unâ-nimes na classificação da actividade ministerial: plano grandioso, pensamento e acção, cultura disciplinada, capacidade de trabalho, são apenas algumas das palavras-chave.No dia 18 de Novembro, em sessão da Câmara Municipal de Lis-boa, Eduardo Rodrigues de Carvalho protagoniza o primeiro dis-curso institucional sobre o falecido ministro8. Presidente substi-tuto da Câmara Municipal de Lisboa desde 1938, altura em que Duarte Pacheco renuncia ao cargo por incompatibilidade de acu-mulação com a pasta das Obras Públicas, conhecedor do trabalho e do método do ministro, seu colaborador desde os tempos de trabalhos preparatórios ao projecto das Gares Marítimas, Rodrigues de Carvalho foi se-guramente um dos homens de confiança do político.No discurso proferido, Rodri-gues de Carvalho enaltece a obra

7 Cfr. O Século, “Esboço Biográfico”, 16.11.1943; Idem, “O último sonho de Duarte Pacheco” 17.11.1943; Ibi-

dem, “O Duro Ofício de Governar”, 22.11.1943. Cfr. Jornal de Notícias “Ao serviço da Nação”, 19.11.1943; Cfr. Diário de Notícias “O último adeus a Lisboa”, 20.11.1943.

8 A Exposição de Eduardo Rodrigues de Carvalho estender-se-ia ainda pela sessão camarária de 25 de Novembro.

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Funeral de Duarte Pacheco

em Lisboa

1943, autor desconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

“ Ele está e perdurará consciente ou inconscientemente, na alma (…) de mui gerações vindouras, que sofrerão a influência dinâmica desse génio nacional que cruzou, fugaz o espaço português.”Jaime Rua, in A Voz de Loulé

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operada por Duarte Pacheco na cidade de Lisboa, relembrando o impulso inédito promovido pela construção das novas instalações do IST. Relembra obras como a requalificação no abastecimento de água à cidade e sublinha ainda a boa relação município-ministério face à iniciativa do ministro em promover a elaboração do tão neces-sário plano de urbanização e extensão da cidade.Em reconhecimento dos melhoramentos operados pelo ministro, Rodrigues de Carvalho lança quatro propostas: que a título póstumo lhe seja concedida a medalha de ouro da cidade e o nome aposto na lista de beneméritos; que seja dado o seu nome a uma das principais artérias da cidade, relacionada com a sua obra; que se proceda ao estudo e realização de um mausoléu funerário e que se proceda ao estudo da forma e local onde se perpetue o reconhecimento muni-cipal pela obra ministerial9.A proposta lançada por Rodrigues de Carvalho dará início a um de-bate velado acerca da edificação de um monumento em memó-ria de Duarte Pacheco, situação que perdurará até 195210.A 25 de Novembro, a 2ª sessão le-gislativa da III Legislatura da As-sembleia Nacional foi consagrada à memória do falecido ministro. Proferiram discurso o Presidente da Assembleia, o Presidente do Conselho e três deputados. Num discurso breve e linear, o Presi-dente da Assembleia Nacional enunciou as características mais evidentes de Duarte Pacheco: per-sonalidade forte e rica, capacida-de de trabalho, espírito de inicia-tiva, agudeza mental, poder de re-alização e força de vontade. Equi-

9 CARVALHO, Eduardo Rodrigues de, “A Obra do Engenheiro Duarte Pache-co no Município de Lisboa”, in Boletim

do Comissariado do Desemprego, Lisboa, Imprensa Nacional, 1934-1974, Boletim de 1943, pp. 89-105.

10 Data em que em definitivo tem início a construção do Monumento a Duar-te Pacheco, em Loulé.

Cfr. CML, Actas das Sessões da Câ-

mara Municipal, Actas Nº 74 e 75, sessões da CML realizadas nos dias 18 e 25 de Novembro e dias 9, 18, 27 e 30 de Dezembro de 1943.

Cfr. ELIAS, Helena Catarina da Sil-va Lebre, Arte Pública e Instituições

do Estado Novo – Arte Pública das

Administrações Central e Local do

Estado Novo em Lisboa: Sistemas de

Encomenda da CML e do MOPC/MOP

(1938-1960), Barcelona, dissertação de mestrado apresentada ao Depar-tamento de Escultura da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Barcelona, 2006, pp. 320-322.

Desenho e maqueta do mausoléu previsto

para acolher os restos mortais de Duarte

Pacheco no cemitério do Monsanto,

da autoria do Arquitecto Keil do Amaral

1943, autor desconhecidoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete

de Estudos Olisiponenses

Aspecto geral do projecto do monumento

em homenagem a Duarte Pacheco previsto

para a Serra do Monsanto – Parque

Florestal, da autoria do Arquitecto

Keil do Amaral

1943, autor desconhecidoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete

de Estudos Olisiponenses

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Inauguração do Monumento

ao Engenheiro Duarte Pacheco em Loulé

1953, autor desconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro

de Documentação/Fototeca

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para a morte do ministro a proporções de uma verdadeira perda nacional11.

O discurso do Presidente do Conselho, muito breve, como o próprio reconhece, abre o espaço político necessário à instrumentalização da memória do falecido ministro: um ministro com impulso de dinamismo, intensa felicidade de criar, poder de resolução e vontade de aço. Um engenhei-ro que detestava as improvisações, que adiava os problemas até ao seu estu-

do exaustivo mas definitivamente resolvido. Um ministro desinteressado até

à renúncia, resignado ante a incompreensão, mas confiante no sentimento de

gratidão do povo. Um ministro que podia ter morrido na função, envelhecido

precocemente mas que em lugar disso, morreu ao serviço dela, vítima dela. Um homem público que tomava a peito servir o interesse de todos12.No início do discurso, Salazar remetia para um outro momento aquelas

palavras de louvor e de justiça para dizer um dia. Demoraria dez anos para voltar a proferir palavras em memória de Duarte Pacheco13.No dia 20 de Dezembro, pouco mais de um mês após a morte do po-lítico, na abertura da sessão plenária do Conselho Superior de Obras Públicas, sessão a que presidiu o ministro interino Costa Leite, o presidente do douto conselho, António Vicente Ferreira, profe-ria o último discurso do ano e o último dos elogios fúnebres.Para o presidente do CSOP, aquele que havia sido seu aluno,

colega, director no IST e seu amigo,

era um homem raro. No discurso de Vicente Ferreira surge um novo, ténue, mas decisivo por-menor: Duarte Pacheco é o exe-cutor de um plano maior, traça-

11 Cfr. “Uma Sessão na Assembleia Na-cional: O Discurso do Presidente da Assembleia Nacional” in Boletim do

Comissariado do Desemprego, Lis-boa, Imprensa Nacional, 1934-1974, Boletim de 1943, pp. 78-79.

12 SALAZAR, António Oliveira, “Na Mor-te de Duarte Pacheco”, in Discursos

e Notas Políticas, vol. IV, 1943-1950, Coimbra, Coimbra Editora Lda., 1951, pp. 23-27.

13 Salazar só voltaria a mencionar o nome de Duarte Pacheco em Novem-bro de 1953, em Loulé, por ocasião da inauguração do monumento em memória do ministro.

O Presidente do Conselho

e alguns membros do Governo

à porta dos Paços do Concelho

à saída do funeral do Ministro

das Obras Públicas,

Eng. Duarte Pacheco.

17 de Novembro de 1943, autor desconhecidoC.M.L./Secção de Propaganda e Turismo

Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete

de Estudos Olisiponenses

Page 39: Duarte pacheco e book

39/38 do por mão mestra: nas palavras do presidente do CSOP, o falecido

ministro era o colaborador ideal que Oliveira Salazar encontrara para a execução do seu plano de obras públicas14.

Os números de Dezembro de 1943 das revistas da Ordem dos En-genheiros, do Sindicato dos Arquitectos e da Associação de Estu-dantes do IST, a par de tantas outras, prestam também, ao fale-cido ministro, as suas homenagens. Nos números publicados no primeiro trimestre do ano de 1944, alguns periódicos retomam o acontecimento. A Revista Municipal da Câmara de Lisboa dedica um número especial à memória do falecido ministro elencando a relação das obras mais emblemáticas da capital planeadas e dirigi-das pelo gabinete ministerial e publica um dos raros discursos de Duarte Pacheco15. O Boletim do Comissariado do Desemprego reserva o primeiro capítulo à memória do ministro, reúne um dossier de imprensa com artigos publicados sobre Duarte Pacheco à data do seu falecimento e faz uma listagem estimativa das obras mandadas executar pelo ministro, ao abrigo do programa de financiamento subsidiado pelo Fundo de Desemprego:

“Basta dizer que foram lavradas portarias para com par ti cipações de 7.100 obras, num valor total de 300.000 contos”. 16

No primeiro número de 1944 da Revista Panorama, revista de arte e tu-rismo editada pelo SPN/SNI, enfatiza a vida e obra do falecido ministro e publica um texto de António Ferro e um texto de Cottinelli Telmo.Na opinião de Cottinelli, Duar-te Pacheco é o Sonhador de Gran-

des Coisas17. Não se distanciando do conteúdo e do estilo da alo-cução feita aos microfones da Emissora Nacional, aquando da morte do ministro18, o texto que António Ferro encerra um ciclo que se vinha formando desde Novembro de 1943. Em três meses a memória e a ima-gem do ministro fora burilada ao pormenor, e Ferro, no seu estilo gongórico daria o último retoque:

“Estou a vê-lo...máscara viva (...) máscara dinâmica (...) o que foi grande na vida cine-matográfica deste homem vertiginoso, mais ainda que

14 CSOP, Livro de Actas das Sessões

Plenárias, Acta nº 8, de 20 de Dezem-bro de 1943.

15 O número especial de 1944 da Re-

vista Municipal da Câmara Municipal de Lisboa publica o discurso Duarte Pacheco aquando da tomada de pos-se no segundo mandato de Ministro das Obras Públicas e Comunicações, cerimónia que teve lugar no dia 25 de Maio de 1938.

16 “A obra do Engenheiro Duarte Pache-co através do Comissariado do De-semprego”, in Boletim do Comissaria-

do do Desemprego, ano 1944, Lisboa, Imprensa Nacional, pág. 26.

17 TELMO, José Ângelo Cottinelli, “Um Grande Homem de Acção” in Panora-

ma, Revista de Arte e Turismo, Lis-boa, SPN-SNI, ano 3, nº 19, Fevereiro de 1944, s/p.

18 Cfr. Alocução proferida pelo Sr. An-tónio Ferro, presidente da direcção da Emissora Nacional ao microfone da mesma Emissora”, in Boletim do

Comissariado do Desemprego, ano 1944, Lisboa, Imprensa Nacional, pág. 106-108.

“Seria errado chamar-lhe um produto típico da Escola, porque ele foi um homem verdadeiramente singular, fora de todos os esquemas.”Eduardo R. Arantes e Oliveira, in Obras Públicas em Portugal no Século XX

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DRO a sua obra foi o seu sonho (...) Não! O engenheiro Duarte Pacheco

não morreu, não morrerá! Difícil, até, desejar paz à sua alma! A sua alma continuará a trabalhar. Os seus restos mortais são imortais (...) assim a sua alma continuará a ser, por muitos anos, a grande construtora do Estado Novo, da Pátria ressurgida, do Portugal de Salazar”. 19

Este mesmo texto estaria na base da locução do pequeno docu-mentário realizado também em 1944 por António Lopes Ribeiro. Numa curta-metragem de 11 minutos, a par das teatrais palavras de Ferro, surgiam as poderosas imagens do funeral de Estado do fa-lecido ministro. Enfatizada a solenidade da homenagem prestada na morte de Duarte Pacheco, as imagens sucediam-se na demons-tração da obra produzida pelo homem que votara a vida ao serviço público20.Contudo, em vinte anos de vida pública Duarte Pacheco angariara admiradores na exacta proporção em que angariara inimigos. Não esquecendo a referencial e conveniente vénia ao presidente do Con-selho, todos os que concordavam com o modo de actuação do minis-tro das Obras Públicas não hesitavam em classificar os melhoramen-tos estruturais do País como as obras do Duarte Pacheco21 ou intitular o ministro com o cognome de o Edificador22.Do lado oposto, todos os que foram atropelados pela máquina cons-trutiva das Obras Públicas, que por ela foram materialmente prejudica-dos ou politicamente enfraquecidos, não hesitavam em reunir esforços para deter, não tanto a política instituída pelo Governo e assegurada pelo braço forte da lei, mas o seu implacável e determinado executor: Duarte Pacheco. Por Lisboa e pelo País era usual a graçola:

“A pior província do País é o Algarve.A pior vila Loulé.A pior família os Pachecos.E o pior dos Pachecos o Duarte!”

Se em vida Duarte Pacheco não reunira nunca o consenso, quan-do soou a notícia da sua morte, o facto foi assinalado com lágrimas

e champanhe23. Entre lamentos e festejos, a dualidade manteve-se.Contudo, o choque e a surpresa esfumaram-se em breves mo-mentos. A morte do ministro alterava o quadro político. O mi-

19 FERRO, António, “O Engenheiro Du-arte Pacheco” in Panorama, Revista de Arte e Turismo, Lisboa, SPN-SNI, Ano 3, n.º 19, Fevereiro de 1944, s/paginação.

20 V. Arquivo Nacional de Imagens em Movimento (ANIM), “A Morte e a Vida do Engenheiro Duarte Pacheco”, n.º extraordinário do Jornal Português, Sociedade Portuguesa das Actuali-dades, Realização e Locução de An-tónio Lopes Ribeiro, 1944.

21 FERREIRA, António Vicente Ferreira, Discurso em Memória de Duarte Pa-checo, in CSOP, Livros de Actas das

Sessões Plenárias, Acta n.º 8 de 20 de Dezembro de 1943.

22 MARTINS, Rocha, “Lisboa quem te viu!”, in Diário de Notícias, 11 de Novembro de 1943. Artigo publicado cinco dias antes da morte de Duarte Pacheco.

23 DACOSTA, Fernando, “Um Confisca-dor”, in Máscaras de Salazar, Lisboa, Casa das Letras, 2006, pp. 164.

Engenheiro Duarte Pacheco,

Ministro das Obras Públicas

e Comunicações

[c. 1942], Cecil BeatonCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete

de Estudos Olisiponenses

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nistro que morrera solteiro e sem descendentes directos ou herdei-ros políticos, extinguia-se fisicamente, mas muito rapidamente seria aclamado como poucos: não ne cessitava de memórias, discursos ou notas políticas. Em lugar de palavras, o País herdava a obra. Obra aplaudida pelos seguidores e obra onde continuariam a tropeçar todos aqueles que já haviam sido colhidos pela máquina constru-tiva do Edificador. Assiste-se assim à progressiva neutralização dos aspectos negativos associados a uma prática ministerial que, rege-nerada politicamente num processo selectivo de memória, retirava à figura pública todas as inconveniências a ela usualmente associadas. Dos elogios fúnebres de Novembro de 1943 aos textos panegíricos de 1944 decorre este esvaziamento de inconveniências, da mesma forma que se procede à superlativação de capacidades e qualidades. Duarte Pacheco é então petrificado numa imagem de homem que encara a causa pública como um sacerdócio; um homem despojado e desinteressado de bens terrenos. A sua capacidade de trabalho é elevada a uma categoria quase sobre-humana, não só pela argúcia, sagacidade, agilidade mental e domínio transversal das matérias e da argumentação, mas também pela tenaz resistência física ao can-saço e à fome24.A circunstância que envolveu a morte do ministro: acidental, brutal e arbitrária, aos 43 anos de idade, no fulgor de todas as capacidades físicas e mentais,

24 CARVALHO, Eduardo Rodrigues de, “A Obra do Engenheiro Duarte Pacheco no Município de Lisboa”, in Boletim do Co-

missariado do Desemprego, ano 1944, Lisboa, Imprensa Nacional, pág. 103.

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O Ministro das Obras Públicas

e Comunicações, Engenheiro

Duarte Pacheco nas Festas

Centenárias em Arcos de Valdevez.

1940, Brigada de Estudos do Rio VezCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete

de Estudos Olisiponenses

Sua Excelência o Sr. Presidente

da República cortando a fita que abre

a nova linha à exploração com

a assistência de Suas Excelências

os Srs. Ministros das Obras Públicas,

Interior, Governador Civil do Distrito

Major Gaspar Ferreira e casa civil

e militar da Presidência.

1932, Companhia Portuguesa para a Construção e Exploração de Caminho-de-ferro do Vale do VougaCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete

de Estudos Olisiponenses

fez emergir essa imagem paradigmática de político – homem público, que serviu a pátria até ao último momento. Com todas as virtudes e nenhum defeito, talvez uma ou outra marca de carácter mais forte mas em prol do bem comum, a figura do ministro, outrora objecto das maiores controvérsias e alguns embaraços de Governo, passa-ria a ser utilizada como símbolo e como forma de legitimação dos que herdaram a sua obra: os políticos, os mesmos políticos que, reservando para si a iniciativa das homenagens a prestar à memória do Eng.

Duarte Pacheco, e a orientação sobre a forma de o fazer 25, levariam dez anos a erguer um monumento em sua memória. Nas vésperas da inauguração, Frederico Ulrich, ministro das Obras Públicas, infor-mava o Presidente do Conselho que as coisas estariam bem afinadas e, embora não tendo visto a obra concluída, acreditava que com 17 metros de altura, o impacto visual e imponência do monumento, sortisse efeito26.E deste modo o dia 16 de Novembro de 1953 amanhecia em Loulé com a certeza de uma consagração nacional, a uma década de distância.Do discurso inaugural de Olivei-ra Salazar, uma magistral oração,

uma peça literária do melhor quila-

te27 o DN retiraria as seguintes “head-lines”:

“Duarte Pacheco não era um político na acepção cor-

25 CML, Actas das Sessões da Câmara, Acta número 75 da reunião de Câma-ra efectuada a 9 de Dezembro e com continuação a 18, 27 e 30 de Dezem-bro, pp. 111, nesta perspectiva citada por ELIAS, Helena Catarina da Silva Lebre, Op. Cit. pág. 322, nota 439.

26 Idem. 27 Cfr. Diário de Notícias, 17 de Novem-

bro de 1953.

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DRO rente do termo, mas homem de Governo extreme, como os permite

um regime em que a governação tem podido ser quase tudo e a pe-quena política quase nada”.28

Duarte Pacheco, não fora de facto, um político na usual acepção do termo. Ao contrário de Oliveira Salazar e dos vários ministros que constituíram os Governos do Presidente do Conselho, Pacheco ra-ras vezes discursou, dispensava as notas políticas e revelava-se arre-dio de cerimónias protocolares. Duarte Pacheco impregnava o exercício da sua actividade como mi-nistro com o pensamento e o método em que a Engenharia o havia moldado: para a obtenção de um resultado, uma obra; demorando-se na concepção dos elementos, no processo de conjugação desses mes-mos elementos até à fase de conclusão. Obra concluída, resultado ob-tido. Para as cerimónias de inauguração, outros políticos cumpririam a função, os da política do discurso inflamado, da política do quase nada.Mas para o regime, o ano de 1953 terminava com um balanço po-sitivo: em Abril o Presidente do Conselho recebera em Lisboa as maiores ovações populares por ocasião da celebração do “Jubileu Ministerial” e em Novembro, em Loulé, numa moldura humana considerável, encerrava-se definitivamente a questão incómoda e por dez anos adiada: o Monumento de Homenagem a Duarte Pa-checo. Com o mesmo discurso, Salazar, que sabia jogar com pala-vras, reclamava para si e para o seu Governo neste acto de home-nagem a legitimidade da celebração de uma obra que, afinal era o próprio regime: um regime em que a governação tem podido ser quase

tudo, e podendo ser tudo podia ser também a vida e obra do minis-tro homenageado. Em Loulé prestava-se tributo ao desempenho de Duarte Pacheco, mas a obra era do regime.Publicamente Oliveira Salazar não voltaria a mencionar o nome do mi-nistro, contudo, politicamente e sempre que a situação se afigurasse favo-rável e a bem da Nação, políticos e literatos evocariam o nome do ministro.A obra que Duarte Pacheco construiu é extensa e em grande parte devida à tenacidade e convicção com que defendia os seus objec-tivos. Mas uma obra não se explica por si só, pelas leis e políticas vigentes, muito menos por modelos de carácter. Um homem não faz uma obra, e Duarte Pacheco não foi excepção. Uma obra explica-se se integrada numa perspectiva maior e resulta do trabalho de uma equipa que age na prossecução de objectivos comuns.Duarte Pacheco foi, em essência, um político. Um político com um método de trabalho minucioso no plano e técnico no modelo; mas em política não existem coincidências, existem convergências de interesse.As novas instalações do Institu-to Superior Técnico, erguidas entre 1929 e 1942, constituem a primeira obra pública de Duarte

28 “Discurso de Oliveira Salazar a Inau-guração do Monumento Duarte Pa-checo, em Loulé”, in Diário de Notí-

cias, 17 de Novembro de 1953.

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Pacheco, constituindo também um bom exemplo de convergência de interesses. Na construção do IST, Duarte Pacheco liderou o processo político que lhe deu origem, centralizou no seu gabinete a direcção da obra, mas não agiu sozinho nem foi o único a colher benefícios da obra construída.Por outro lado, e ao contrário do propalado pela historiografia do re-gime, Duarte Pacheco não viveu uma orfandade desprotegida. Teve família de sangue, de credo político e de manobra social. Importa pois, à luz de novos elementos e de uma leitura desapaixonada dos factos, fazer a reconstituição de uma moldura familiar, social e polí-tica que permitiria a este homem, dotado de uma capacidade invul-gar de trabalho de, no espaço de vinte anos, modificar materialmente uma escola, uma cidade e um País.

Tomada de posse do segundo mandato

como Ministro das Obras Públicas

e Comunicações

1938, autor desconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro

de Documentação/Fototeca

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“A verdadeira generosidade em relação ao futuro consiste em dar tudo no presente”.Albert Camus

Não sendo clara a data de nascimento de Duarte Pacheco, 19 de Abril de 1899 ou de 1900, não existem dúvidas sobre a intensidade com que viveu uma vida curta em anos mas longa em obra.O assento de baptismo de Duarte Pacheco, para além da sua fi liação, fornece informação sobre a ocupação dos seus progenitores: do pai, chefe da repartição de Finanças do concelho de Loulé, e da mãe, doméstica. Em 1894, data a que respeita o assento de baptismo de Humberto, o irmão mais velho de Duarte e segundo fi lho dos Pachecos, o pai desempenhava o cargo de escrivão de Fazenda29. Nos anos que me-deiam os assentos de baptismo destes seus dois fi lhos, José de Azeve-do Pacheco progrediu na carreira de funcionário público e ascendeu também na importância da participação política local: monárquico convicto, era um dos dirigentes locais do Partido Regenerador30.A família Pacheco retratava o estrato social médio-alto do País no início do século: José de Aze-vedo Pacheco integrava a lista dos cerca de 19 mil funcionários públicos do reino e pertencia aos 53% que trabalhavam na administração fi scal31. A vida política activa de José de Aze-vedo Pacheco conferia-lhe um acréscimo de importância face ao estrato social médio. A uma escala regional, era um homem infl uente que executava as di-rectivas gerais do partido a que pertencia.A tradição de compromisso po-lítico nesta família iniciara-se com dois tios de Duarte Pache-co, Marçal de Azevedo Pacheco (1847-1896) e Joaquim da Ponte (1866-?)32, ambos elevados a Par

29 IST, Núcleo de Arquivo, Colecção deProcessosIndividuaisdeProfessores.A cópia do assento de baptismo deHumberto Pacheco consta do pro-cessoindividualdeDuartePacheco.

30 POLICARPO, Verónica, “Duarte JoséPacheco”, in Dicionário Biográfi co Parlamentar (1935-1974), direcçãode Manuel Braga da Cruz e AntónioCostaPinto,Lisboa,ColecçãoParla-mento,2005,pp.284-289.

31 RAMOS,Rui,D. Carlos, Lisboa, CírculodeLeitoreseCentrodeEstudosdoPo-voseCulturasdeExpressãoPortugue-sa–TemaseDebates,2007, p.173.

32 Natural de Boliqueime, concelho deLoulé, Joaquim da Ponte licenciou--seemDireitoem1893.MembrodoPartidoProgressista,foieleitodepu-tado à Câmara dos Pares do Reinopelo círculo eleitoral de Loulé, VIDE MOREIRA, Fernando, “Joaquim daPonte”, in Dicionário Biográfi co Par-lamentar 1834-1910, vol. III (N-Z),coordenaçãodeMariaFilomenaMó-nica, Lisboa, Colecção Parlamento,2006,p.363.

UMA FAMÍLIADE POLÍTICOS

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do Reino. Marçal Pacheco, que fora eleito presidente da Câmara Municipal de Loulé em 1874, acumulou o cargo com as funções de deputado pelo Partido Regenerador. Em 1883, Marçal Pacheco deti-nha as funções de conselheiro e par do reino, o que lhe conferia uma elevada importância política, intervindo em permanente defesa da região algarvia 33. Joaquim da Ponte, membro do Partido Progressis-ta, foi governador civil de Faro.No entanto, embora pai e tios fossem notáveis monárquicos, Du-arte Pacheco cedo se assumiu como Republicano. Em 1919 ter-se-á alistado no batalhão académico que combateu uma revolta mo-nárquica aquartelada em Mon-santo no episódio que ficou conhecido como “A Escalada de Monsanto”34.De todos os irmãos, Humberto Pacheco parece ter sido aquele que maior importância desem-penhou na forma como a per-sonalidade de Duarte Pacheco se estruturou. Da precoce or-fandade em Loulé à partilha do espaço em que viveram em Lis-boa ou até ao companheirismo político, estes dois irmãos pa-recem ter vivido uma relação de cumplicidade. Por outro lado, a actividade profissional de Humberto35, que embora formado em Direito nunca

33 PACHECO, Marçal, bacharel em Di-reito, Marçal Pacheco exerceu ad-vocacia e foi presidente da Câmarade Loulé. Fixando posteriormenteresidência em Lisboa, desempenhouocargodechefederepartiçãodoMi-nistério da Justiça e Negócios Ecle-siásticos. Em 1895, Marçal PachecopublicouA Resposta do País,panfletopolíticoquerelatavaafrágilsituaçãoeconómica,financeiraepolíticaentãovivida.V. A Resposta do Paiz,Lisboa,3.ª edição, Typographia IndustrialPortugueza,1895.

34 JoséAugustoFrança,MargaridaAc-ciaiuoli,JorgeBorgesdeMacedoen-treoutrosautores.

35 Aliás, a actividade de HumbertoPacheco no ramo das seguradorasmanteve-se nas décadas seguintes,pois,em1960,quandoencetoudiálo-gocomaCMLparaexecutaradoa-çãodoespóliodeDuartePacheco,nacorrespondência trocadacomomu-nicípio,porváriasvezesanexouoseucartãopessoaledessecartãoconstaque é Administrador da Companhia de Seguros Ourique, sita na AvenidadaLiberdade,n.º211-1.ºandar.

Tio de Duarte Pacheco, Deputado e par do reino, Dr. Marçal Pacheco[s.d],autordesconhecidoÓleosobretelaSta. Casa de Misericórdia de Loulé

Pai de Duarte Pacheco, José Azevedo Pacheco[s.d],autordesconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

Irmão de Duarte Pacheco, Dr. Humberto Pacheco [s.d],autordesconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centrode Documentação/Fototeca

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exerceu advocacia36 tendo optado pelo ramo dos Seguros, e com quem, de acordo com Borges de Macedo37, Duarte Pacheco teria colaborado, permitiu não só o desafogo da autonomia financeira, como o acesso a um outro mundo; o mundo dos negócios.Enquanto Humberto pertencia ao Partido Republicano Democráti-co38, de acordo com Cunha Leal Duarte Pacheco terá ingressado no partido União Liberal Republicana a 30 de Maio de 192639. Este novo partido resultava da dissidência da ala nacionalista do Partido Libe-ral Republicano, tendo o apoio de Alberto da Cunha Rocha Saraiva, e de um importante grupo de militantes evolucionistas simpatizan-tes de António José de Almeida. No domínio político, Duarte Pa-checo integrava a ala republica-na liberal que apoiava a ditadura militar mas que a prazo preten-dia a restauração da Constitui-ção republicana de 191140. E foi ciente desta crença política que em 1926 foi empossado no car-go de director do IST e em 1928, tomando posse como Ministro da Instrução, jurou honrar o car-go para o qual foi nomeado em prol dos ideais republicanos41.

36 Criadaem1936,aOrdemdosAdvo-gadosherdouosficheirosarquivadosnaextintaAssociaçãodosAdvogadosde Lisboa e cujos estatutos remon-tam a 1838. Do arquivo histórico daOrdem dos Advogados, que guardaosacervosdocumentaisdaprofissãodesde 1838, não consta o nome deHumbertoPachecocomoadvogado.

37 MACEDO, Jorge Borges de, Op. Cit., p.12.

38 MACEDO,JorgeBorgesde,“Cerimó-nia Comemorativa a Duarte Pache-co”, in Técnica, Lisboa, 1994, n.º 2,1994.

39 LEAL,Cunhal,Coisas de tempos Idos: as minhas memórias,Lisboa,1966.

40 POLICARPO, Verónica, “Duarte Pa-checo”, in Dicionário Biográfico Par-lamentar 1935-1974, vol. II M-Z,direcçãodeManuelBragadaCruzeAntónioCostaPinto,Lisboa,Impren-sadeCiênciasSociais–AssembleiadaRepública,2005,p.284.

41 ACCIAIUOLI,Margarida,Op. Cit.,pág.390.

Embora pai e tios fossem notáveis monárquicos, Duarte Pacheco cedo se assumiu como Republicano.Em 1919 ter-se-á alistado no batalhão académico que combateu uma revolta monárquica aquartelada em Monsanto no episódio que ficou conhecido como “A Escalada de Monsanto”.José Augusto França, Margarida Acciaiuoli, Jorge Borges de Macedo entre outros autores

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51/50 O PERCURSOACADÉMICO

Duarte Pacheco[c.1917],autordesconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

Em 1914, quando José de Azevedo Pacheco morreu, Humberto tinha 20 anos e Duarte 14. Duarte frequentava nessa altura o Liceu de Faro em regime de internato. Em 1917, Duarte concluiu o ensino liceal com distinção e nesse mesmo ano seguiu para Lisboa, ao encontro do irmão Humberto.Humberto matriculou-se em 1912 no Instituto Superior Téc ni co42 mas no ano seguinte inscreveu-se na Faculdade de Direito. No ano lectivo de 1917/18 Duarte inscreveu-se no curso geral de engenharia do recém-criado IST43, escolhendo Engenharia Electrotécnica em 1920, curso que concluiria três anos depois44. Tendo concordado em reservar apenas às irmãs a herança paterna, os irmãos, com possibilidades fi nanceiras que permitiriam a sua edu cação, cedo se autonomizaram. Duarte Pacheco, ainda aluno de Liceu, ter-se-á iniciado nas “explicações” a colegas menos expeditos nas matérias leccionadas. Em Lisboa, a situação manter-se-ia. Nos relatos de Herculano de Carvalho, professor do IST e seu sucessor na direcção do instituto:

“Já durante o curso ele se distinguira pela sua actividade docente, servindo-se dos seus conhecimentos de matemática para viver ma-terialmente independente, com as numerosas lições particulares que dava”.45

A par das explicações, há registos da vida estudantil activa de Duarte Pacheco. A 15 de Fevereiro de 1918, ainda no decorrer do primeiro ano lectivo de Duarte Pacheco, teve lugar no IST uma assembleia geral de alunos que visava o debate sobre o projecto de re-novação do Regulamento do Instituto criado em 1911. A ne-cessidade desta revisão relacio-nava-se com duas questões pre-mentes, por um lado a colisão de interesses entre engenheiros e condutores de obra na dispu-ta de soluções e categorias pro-fi ssionais46 e, por outro lado, a normativa governamental que visava a uniformização da du-ração dos cursos superiores de Engenharia, de cinco para seis anos em Lisboa e no Porto, fac-to que se veio a concretizar. Sendo uma das características do IST o incentivo da vida aca-démica livre e activa, desta as-

42 IST,NúcleodeArquivo,RegistoIndivi-dualdeAlunos,anode1916.

43 Decretode23deMaiode1911.44 Pornormaahistoriografiaestabele-

ceoanode1922comodatadacon-clusãodocursodeDuartePacheco,contudo,nosregistosencontradosnoNúcleodeArquivodoISTnoanolec-tivo de 1922-1923, Duarte Pachecosurge inscritoemsetedisciplinas.V.ApêndiceDocumental,Documento7.

45 CARVALHO, Herculano de, “DuartePachecomatemáticoerealizador”,inRevista Internacional, in Memoriam,Lisboa,1951.

46 Sobre esta questão V. RODRIGUES,MariadeLurdes,Os Engenheiros em Portugal,Oeiras,CeltaEditora,1999.V. ainda GRÁCIO, Sérgio, “Notas so-bre a emergência e a consolidaçãodoensinodaengenharia”,inMomen-tos de Inovação e Engenharia em Portu gal no Século XX,vol. I,Lisboa,coordenação Manuel HEITOR, JoséMariaBrandãodeBRITOeFernandaROLLO,Lisboa,PublicaçõesD.Quixo-te,2004,pp.231-239.

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-1923 sembleia geral de alunos resultou a criação de um documento que

sustentava a posição dos mesmos face à situação criada. Informavam os alunos que, no caso de não serem acautelados os interesses do Instituto, deveria o director demitir-se. Deste documento, redigi-do pelos estudantes e endereçado ao director do Instituto Alfredo Bensaude, constavam 178 assinaturas. Duarte Pacheco assinava em 136º lugar, como aluno do curso geral47. Encetado o diálogo com o Conselho Escolar do IST, a comissão de representação dos alunos conseguiu um acordo que satisfazia estudantes e corpo docente48.Este facto, ocorrido logo no início do curso, revelava um jovem Du-arte Pacheco que toma consciência de que uma mera deliberação política poderia ter consequências profundas na escola que ele pró-prio frequentava. Deste modo, e volvidos apenas quatro meses após o ingresso no IST, Duarte Pacheco envolvia-se activamente na vida do Técnico, postura que marcaria a sua vida49.Duarte Pacheco concluiu, segundo os cadernos de assento do IST, o curso de Engenharia Electrotécnica com a classificação final de 14,3 valores, não atingindo as médias brilhantíssimas que alguma histo-riografia lhe atribuiu.No mesmo registo individual de aluno, não existe qualquer referên-cia ao serviço militar prestado ou ao local, instituição ou empresa onde o jovem engenheiro poderá ter realizado o tirocínio, designa-ção da época para o período de estágio. Oficialmente, Duarte Pache-co não tirocinou e, se o fez, foi a título particular e sem registo nos seus certificados de habilitações. Os anos de licenciatura de Duarte Pacheco são anos de formação intensiva: formação académica, política e social. Aluno inteligente e sociável, rapidamente angariou a simpatia de colegas e a atenção de professores. Por outro lado, a consciência e a convicção políticas, que desde cedo demonstrou, agiram como factor de integração, de per-tença a um grupo. Do mesmo modo, quer a boa prestação estudantil, quer o processo de identificação política, foram factores que permiti-ram a distinção de Duarte Pacheco da massa anónima da estudantina.

47 IST,NúcleodeArquivo,ActasdoCon-selhoEscolardoISTeCorrespondên-ciaRecebida,Documenton.º6,lidonasessãodoConselhoEscolardoISTde15deFevereirode1918.

48 IST,NúcleodeArquivo,ActasdoCon-selhoEscolardoISTeCorrespondên-ciaRecebida,Documenton.º6,lidonasessãodoConselhoEscolardoISTde20deFevereirode1918.

49 Emboraadirecçãodo ISTeaAsso-ciaçãodeAlunosdoISTtenhamche-gadoaumpontodecompromisso,onovoregulamentodoInstitutoSupe-riorTécnicosósurgiráem1921pelodecreto7.727de6deOutubro.

imagens das páginas anteriores

Registo de matrícula com identificação do aluno, disciplinas realizadas e resultados finais.1917-1923In“Matrículadealunosordinários”:livros2e3Instituto Superior Técnico/Núcleo de Arquivo

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Duarte Pacheco num dos anfi teatros do Instituto Superior Técnico [c.1937],autordesconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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Notas Biográficas do funcionário José Duarte Pacheco, cargos que desempenhou no ensino técnico, nomeações, outros cargos públicos, comissões de serviço, títulos honoríficos, condecorações, louvores, etc.1925-1938In“ProcessoindividualdeDocente”Instituto Superior Técnico/Núcleo de Arquivo e Documentação

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59/58 “Só em Portugal é que se ligou à Arquitectura a idéa da fachada, da pele, da superfície exterior da parte construída. É êste um erro em que por ignorância quási sempre, e por conveniência algumas vezes, muito boa gente cae, na nossa terra”.Porfírio Pardal Monteiro, Revista Arquitectos, 1940.

Após a conclusão do curso de Engenharia Electrotécnica em 1923, Du-arte Pacheco só voltou a ser referido na documentação do IST em 1925, data em que integrou os quadros docentes como professor interino da cadeira de Matemáticas Gerais. Contudo, como nos informa Caetano Maria Beirão da Veiga, numa homenagem póstuma a Duarte Pacheco, realizada em 1951 na Casa do Algarve, o Técnico continuou presente nos dois anos que medeiam a data de conclusão do curso e a data de entrada no IST como professor:

“Quando Duarte Pacheco terminou o curso de Engenheiro Electro-técnico eu ocupava o cargo de Administrador Delegado da Empresa Nacional de Publicidade, proprietária e editora do Diário de Notícias.Nessa época, o Duarte passava horas a meu lado, no meu gabinete par-ticular e servia-se dele como se seu fosse”.50

Duarte Pacheco manteve-se muito próximo do seu professor Caetano Beirão da Veiga e usou o gabinete deste como se seu fosse. Durante os anos em que estu-dou no Técnico, a relação entre Duarte Pacheco e Beirão da Vei-ga tinha-se transformado numa relação de amizade quase paternal como o segundo reconheceria51.Caetano Maria Beirão da Veiga (1884-1962) foi professor catedrá-tico da disciplina de Contabilida-de no IST e no Instituto Superior de Comércio. Mas, a par da acti-vidade docente, exerceu também actividade privada no sector dos seguros, previdência e aplicações fi nanceiras52.

50 CaetanoMariaBeirãodaVeiga,“Duar-tePacheco.Inteligência,DinamismoeInfatigabilidade”,inRevista Internacio-nal,1951,s/p.

51 V.ApêndiceDocumental,Documento8.52 A Universidade de Lisboa e os seus Mes-

tres. Notas Biográfi cas,Lisboa,1956,pp.539-541.CaetanoMariaBeirãodaVeigaconcluiu o curso superior de Comércioem1904,noInstitutoIndustrialeComer-cialdeLisboa.Noiníciodasuaactivida-de profissional, desempenhou funçõesdiplomáticas na Direcção-Geral dosNegócios Políticos e Diplomáticos e noGabinetedoMinistrodosEstrangeiros.

Na carreira docente, foi professor doIST,doInstitutoSuperiordeComércioedoInstitutoSuperiordeCiênciasEco-nómicaseFinanceiras.Foinomeadodi-rectorefectivodesteúltimoinstitutoefoi,pordiversosperíodos,directorinte-rinodoIST.Em1923,foieleitovereadordaCâmaraMunicipaldeLisboa.Nodo-míniodaactividadeprivada,BeirãodaVeigaexerceucargosdeadministraçãonaCompanhiadeSegurosA SoberanaenoBanco Português do Atlântico,foiactuáriodoMontepioGeralepresiden-te do conselho de administração doBancoPortuguêsdoContinenteeIlhas.

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MIA 60 Em 1923, como o próprio informa, desempenhava o cargo de adminis-

trador delegado da Empresa Nacional de Publicidade, detentora do Diário de Notícias. À época, a Empresa Nacional de Publicidade pertencia ao grupo económico Companhia Industrial de Portugal (CIP) - Caixa Geral de Depósitos. Em suma, a amizade de Beirão da Veiga permi-tiu a Duarte Pacheco o acesso a um grupo maior: o da alta finança e do capital. Mas, em 1923, Beirão da Veiga desempenhava ainda uma outra função: a de vereador da Câmara Municipal de Lisboa, e foi no gabinete do vereador que Duarte Pacheco estudou as plantas da cidade e planeou a localização das novas instalações do Técnico.No Verão de 1925, ausente de Lisboa e na impossibilidade de estar presente na sessão do Conselho Escolar do IST agendada para 31 de Julho, Aureliano Mira Fernandes53 enviava no dia 18 do mesmo mês, uma carta a Eduardo Ferrugento Gonçalves (1863-1942)54, então director do Técnico. Na missiva, que iria produzir modifica-ções no quadro docente da Escola no ano lectivo seguinte55, Mira Fernandes afirma que a regência das três cadeiras é demasiado cargo para um professor só. O docente declara que é seu desejo que o Conselho o faça substituir na re-gência da primeira cadeira, o que corresponde à disciplina de Matemáticas Gerais, e adianta que a sua substituição acarreta dois problemas: o técnico e o legal. A situação de sobrecarga horária e pedagógica atribuída a Mira Fernandes era uma situação par-tilhada por todos os professores regentes do IST. Era pois remo-ta a hipótese de algum docen-te assoberbar ainda mais a sua agenda lectiva com a regência da disciplina que Mira Fernan-des queria deixar de leccionar. Daí o facto de o matemático, na missiva endereçada ao director, referir que sobre o primeiro [o pro-blema técnico], no caso de nenhum dos nossos ilustres colegas querer incumbir-se da regência, sabe V. Exª, o que eu penso. E o director sabia. A escolha do novo docente esta-va tomada mas colocava-se um problema, como afirmava Mira Fernandes: o problema legal.

53 Aureliano de Mira Fernandes (1884-1958), doutorado em Matemática,eraprofessorcatedráticodoISTedoInstitutoSuperiordeCiênciasEconó-micaseFinanceiras(ISCEF).NoTéc-nico, era regente das três cadeirasdeMatemáticasPuras(MatemáticasGerais,CálculoDiferencialIntegraledasVariaçõeseMecânicaRacional),enoISCEFregiaadisciplinadeAnáliseMatemática. Pertencia ainda a duassociedades científicas: a AcademiadasCiênciasdeLisboaeaAcademiadeCiênciasExactas,TécnicaseNatu-raisdeMadrid.Eminentematemáticoereconhecidonacomunidadecientí-ficainternacional,entrelivros,liçõeseartigos,asuabibliografiaascendeua118títulos.MiraFernandeseraas-sim um dos mais conceituados pro-fessores do IST. Cfr. A Universidade Técnica de Lisboa e os seus mestres,Notas Biográficas, Lisboa, 1956,pp.768-775.

54 Eduardo Augusto Ferrujento Gonçal-ves ingressou na Escola do Exércitoem1881ealiconcluiuocursodeEn-genhariaMilitareCivilem1885,ten-do-sededicadoàcarreiradocente.Foiprofessor da disciplina de MáquinasMarítimas, Topografia e Geodesia naEscola Naval e na Escola de Guerra.FoitambémprofessordoIST,regendoadisciplinadeMáquinaseGeradores.De1921a1926foidirectordoIST.

55 IST, Núcleo de Arquivo, Correspon-dênciaRecebidaaActasdoConselhoEscolar(1918-1927),ActadaSessãodoConselhoEscolarde18deJulhode1925.

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60 61/O regulamento do IST determinava que, vagando uma das disci-plinas, o Conselho Escolar poderia convidar para seu provimento qualquer pessoa com provas de competência técnica demonstrada por trabalhos e matérias que constituíssem o programa da dita ca-deira. Nas palavras do fundador do IST, Alfredo Bensaude, o Conse-lho Escolar atribuía muito menos valor aos diplomas académicos do que à sua actividade científica ou técnica post-escolar56, medidas pela produção científica e pela colaboração em trabalhos da técnica ou da indústria.57.Até 1930, data em que o Instituto passou a integrar a Universidade Técnica de Lisboa, o recrutamento de docentes era feito pelo Con-selho Escolar. Nas palavras de Bensaude, a vontade do Conselho Escolar não é secreta58. Avaliando a produção científica e técnica dos nomes propostos, o eleito era defendido em parecer por três professores e pelo director. Esse mesmo parecer era proposto ao ministro da tute-la e publicado em Diário de Governo.Na sessão do Conselho Escolar de 31 de Julho de 1925, o Conselho resol-veu por unanimidade que Mira Fernandes fosse substituído na regência da cadeira de Matemáticas Gerais pelo ex-aluno do instituto, o Sr. Duarte José Pacheco, na qualidade de professor interino59. Contudo, a questão legal foi relembrada por dois membros do Conselho. O professor Silva Pinto lembrou que seria conveniente Duarte Pacheco apresentar tese, a fim de não criar um mau precedente. O professor Lino Neto acrescentou que a exigência do mesmo exame final para um caso destes, ou seja, para ingres-so no corpo docente, seria bom para prestigiar a escola. Beirão da Veiga contra-argumentou afirmando que o proposto é um espírito brilhantíssimo e não exigindo o regulamento o exame final para a nomeação de professores interi-nos, essa formalidade pode bem dispensar-se no caso presente60.De facto, o regulamento não exigia tese final para a nomeação de professores interinos, mas atentando nas palavras cautelosas de Sil-va Pinto e de Lino Neto, a inexistência de um trabalho final de cur-so poderia abrir um mau precedente. Este simples facto acrescenta duas informações. Por um lado ficamos a saber que Duarte Pacheco nunca apresentou tese final de curso. Por outro lado, sabemos tam-bém que antes dele, nunca nenhum outro docente do IST havia sido recrutado sem a titularidade desta credencial académica.Esta situação vem demonstrar que o ingresso de Duarte Pa-checo no corpo docente do IST não correspondeu ao método normal de recrutamento de professores. Tendo em linha de conta os requisitos estipulados por Bensaude aquando da cria-ção da escola, Duarte Pacheco não correspondia ao perfil dos engenheiros recrutados para

56 BENSAUDE, Alfredo, “O Recruta-mento dos Professores do InstitutoSuperior Técnico”, Notas Histórico-Pedagógicas sobre o Instituto Supe-rior Técnico, in Revista Técnica, AnoXXII,n.º175,Junhode1947,p.435.

57 Idem, Op. Cit.,p.435.58 Idem, Op. Cit., p.435.59 IST, Núcleo de Arquivo, Correspon-

dênciaRecebidaaActasdoConselhoEscolar(1918-1927),ActadaSessãodoConselhoEscolarde31deJulhode1925.

60 Idem.

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docentes do Técnico. Não havia demonstrado de 1923 a 1925, espa-ço de tempo que medeia entre a conclusão do curso no Técnico e o seu ingresso como professor no mesmo instituto, saber tratar, com originalidade e proficiência, os assuntos que constituem o programa da cadeira a prover, do mesmo modo que não existe notícia de ter colaborado em trabalhos de técnica ou indústria61. Estes eram, de facto, os requisitos base de recrutamento do IST: a produção científica e a aplicação prática e técnica do saber. Duarte Pacheco não cumpria nenhum dos dois requisitos.A sua entrada no corpo docente do IST revela que existiria um outro interesse que legitimava o ingresso de um novo elemento numa escola em ascensão e explica a decisão do Conselho, por unanimidade, de atri-buir a docência da disciplina de Matemáticas Gerais a Duarte Pacheco.

61 BENSAUDE,Alfredo,Op. Cit.,p.435.

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Instalado na Rua da Boavista desde a sua criação, o IST carecia de con-dições dignas. Vivendo a escola uma situação deplorável, era necessária e inadiável a criação de condições para a existência de novas instalações:

“Havia muito já, que toda a gente considerava indecorosas as instala-ções do instituto, situadas no Conde Barão, abarracadas, inestéticas, anti-higiénicas e provisórias – como tanta coisa nesta quadra nacio-nal; todos falavam, maldiziam, censuravam, mas ninguém actuava”.62

Duarte Pacheco seria o homem de acção indispensável à concre-tização do projecto. E no Conselho Escolar do IST, senão no todo dos seus elementos constituintes, pelo menos nos elementos de maior peso de decisão, existia a plena consciência do facto. Antes de Duarte Pacheco nada se conseguiu e depois dele nada de mate-rial se lhe acrescentaria63.Desde a sua criação, a 23 de Maio de 1911, que a questão das novas instalações do IST transcendia o conceito de mero equipamento educativo, apontando Alfredo Bensaude as necessidades premen-tes: “o ensino da engenharia carece de grandes laboratórios, sa-las de desenho, ofi cinas, etc.,” pelo que “não se poderá de-senvolver entre nós, enquanto não possuirmos um edifício apropriado onde esse ensino se possa fazer convenientemen-te”.64 Albergar condignamente o IST era assim uma necessida-de indiscutível. As condições mínimas de ensino teórico não estavam garantidas e o ensino prático, tão querido a Alfredo

DO PARDIEIRO DA BOAVISTA AO COLOSSO DA ALAMEDA: O TÉCNICO NOVO

62 VEIGA,CaetanoMariaBeirãoda,Op. Cit., s/p.

63 Com a morte de Duarte Pachecoem1943,cessaramemdefinitivoasobras das novas instalações do IST.Previstosnoprojectoinicialeaedifi-carapoentedoPavilhãoCentral,doispavilhões (Hidráulica e LaboratóriodeMáquinas)nãoforamconstruídos.

64 IST, Núcleo de Arquivo. Copiador deCartasn.º5,Novembrode1915a30de Abril de 1918, Alfredo Bensaudeao administrador da Caixa Geral deDepósitoseInstituiçõesdePrevidên-cia,em21deJaneirode1916.

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MIA 66 Bensaude, estava seriamente comprometido, uma vez que os espa-

ços para laboratórios eram escassos e o material rareava. As trans-formações estruturais de mercado iniciavam-se nos restantes Paí-ses europeus e, com condições tão precárias, o ensino técnico em Portugal não poderia competir com os seus congéneres. E numa sociedade em transformação célere, os engenheiros eram reconhe-cidamente os agentes produtores de riqueza e progresso65.

Em 1916, Alfredo Bensaude conseguira verba governamental para a construção do novo edifício destinado ao IST, 400 contos. Con tudo, o projecto nunca avan çou66. Bensaude conseguiu que a Caixa Geral de Depósitos disponibilizasse os primeiros 100 contos para o arranque das obras, mas, apesar de inúmeras diligências, o processo ficou bloqueado. Bensaude recorreu ao Ministro da Instrução Pública, ao presidente da Comissão do Orçamento da Câmara dos Deputados e ao secretário do Conselho Superior da Administração Financeira, mas o projecto nunca se concretizou67. Com os 100 contos Bensaude poderia iniciar o pro-jecto, mas sem a certeza da posse efectiva dos restantes 300 contos, a desbloquear a 50% nos anos económicos de 1917-1918 e 1918-1919, o director do IST receava ver-se na contingência de em determinada altura ter de suspender as obras por falta de recursos68. E a verba prometida nunca foi desbloqueada.Aquando da sua criação, ficou o Técnico instalado na Rua da Boavis-ta, ao Conde Barão. Herdara as instalações do extinto Instituto In-dustrial e Comercial de Lisboa69. Ficou também na posse de alguns terrenos na área do extinto Convento das Francesinhas, proprieda-de que administraria como me-lhor lhe aprouvesse.O barracão da Boavista, designa-ção pela qual eram conhecidas as instalações do Técnico, poucas condições oferecia à prática do ensino. As salas de aulas teóricas eram exíguas, os laboratórios e as oficinas, não sendo construí-dos de raiz, não apresentavam as características necessárias ao en-sino, a iluminação era deficien-te, o aquecimento inexistente e as infiltrações de água eram permanentes, ao ponto de colo-carem em risco a segurança de alunos, professores e do próprio edifício70.Bensaude pautou o mandato como director do IST pela in-

65 BENSAUDE,Alfredo,Op. Cit.,p.436.66 Peloartigo31daLeiOrçamentaln.º

220 de 30 de Junho de 1914, o Go-vernoautorizouoempréstimode400contos para a construção do novoedifíciodoInstitutoSuperiorTécnico.

67 NúcleodeArquivo,CopiadordeCar-tasn.º5,Novembrode1915a30deAbrilde1918.

68 NúcleodeArquivo,cartadeAlfredoBensaude ao presidente da Comis-são do Orçamento da Câmara dosDeputados.

69 Aquando da criação do Instituto In-dustrial,optara-seporaquelalocali-zaçãotendoemcontaagrandecon-centraçãoindustrialnazonadaBoa-vista. Sobre o tema, Cfr. CUSTÓDIO,Jorge, “Reflexos da Industrializaçãona fisionomia e vida da cidade”, in O Livro de Lisboa,coord.IrisalvaMoita,Lisboa94-Expo98,1998,pp.461-462.

70 As precárias condições de funciona-mentodoISTnaBoavistasãorecor-rentemente lembradas nas SessõesdoConselhoEscolardoISTentreosanosde1911a1935.

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67/66 sistente luta por instalações condignas para o seu instituto e para “o desenvolvimento da primeira escola superior de engenharia do País, aquela de que mais directamente depende o progresso”71. Apenas com promessas, Ben-saude não procurou terrenos para a edificação das novas instalações do Instituto. Na posse de parte dos terrenos do extinto Convento das Francesinhas, resolveu, a 15 de Agosto de 1916, adjudicar a Francisco Vital dos Santos Teixeira a empreitada de demolição e terraplanagens necessárias para levar a cabo o programa das novas instalações72 com projecto arquitectónico de Miguel Ventura Terra. Contudo, a falta de verbas não permitiria a construção de um novo edifício.De 1919 a 1926 a questão das precárias condições de instalação do IST continuaria a ser referida em Conselho Escolar, mas das inten-ções à viabilização de um projecto de melhoramentos, nada acon-teceu. É precisamente na sessão imediatamente anterior à primeira presença de Duarte Pacheco como membro do Conselho Escolar que a questão das instalações do Instituto é novamente relançada e questionada.A entrada de Duarte Pacheco no corpo docente do IST não alterou a evidência das necessidades prementes da Escola. A sua entrada alte-rou, drasticamente, o modo de agir. Como os seus colegas do Conse-lho, também Duarte Pacheco acreditava que urgiam novas instalações para a Escola. Mas Duarte Pacheco acrescentou um outro factor de importância a este projecto. Um factor decisório – o político.No ano lectivo de 1925-1926 leccionou a disciplina de Matemáticas Gerais e representou o director do IST na comissão nomeada pelo Governo para o estudo das reclamações de alunos em greve e, em Outubro de 1926, seria nomeado professor efectivo da escola, esta-tuto que lhe permitiu tomar assento no Conselho Escolar, o órgão decisório e deliberativo do Instituto nas questões de organização e planificação científica, técnica, pedagógica e financeira.No primeiro Conselho Escolar do IST a que teve direito da palavra, Duarte Pacheco não perdeu oportunidade nem tempo e expôs a sua opinião. Na breve intervenção, o jovem docente não se limitou a constatar o óbvio e a lamentar o infortúnio. Com a objectividade e dinamismo que iriam pautar a sua vida pública, Duarte Pacheco revelou nesta breve exposição o seu método de trabalho: análise das situações; identificação dos er-ros, definição de prioridades e construção das soluções:

“O Sr. Professor Pacheco afirma que, enquanto o ins-tituto estiver tão deficiente-mente instalado e tão po-bre, não pode progredir (...) Outro problema que julga

71 IST, Núcleo de Arquivo. Copiador deCartas n.º 5, Novembro de 1915 a30deAbrilde1918,cartadeAlfredoBensaudeaodirectordoPostodeDe-sinfecçãoPúblicadeLisboa,em18deSetembrode1916.

72 IST, Núcleo de Arquivo. Copiador deCartas n.º 5, Novembro de 1915 a30deAbrilde1918,cartadeAlfre-do Bensaude a Francisco Vital dosSantosTeixeira,em15deAgostode1916.

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MIA 68 necessário resolver é o do recrutamento do professorado. O sistema

de contratar professores estrangeiros deve acabar (...) urge pensar na criação de bolsas de estudo, a fim de os rapazes formados nas nossas escolas (...) possam ir ao estrangeiro especializar-se e vir depois exer-cer o professorado. Outro assunto que também necessita de ser re-solvido é o dos laboratórios. De todos os laboratórios do instituto só o de Química desempenha a sua missão e trabalha regularmente”.73

Inconformado e assertivo, Duarte Pacheco afirmou que a manter-se a situação de precariedade das instalações, o IST não teria como progredir. E, sob o seu ponto de vista, a estagnação do Instituto devia-se não só às deficientes instalações, mas também à falta de material, falta de laboratórios e falhas nos critérios de renovação do pessoal docente. Identificados os erros, Duarte Pacheco giza as prioridades: resolver no espaço de um ano o problema das instalações. E como a reno-vação das instalações e a criação de bolsas de estudo para recruta-mento de professorado exigem fundos monetários, Duarte Pacheco apontou a forma de os conseguir: fazer pressão sobre os poderes públicos e tomar a iniciativa de ida de todos os professores a Sua Exa. o Ministro do Comércio74. A pressão, sob o ponto de vista de Duarte Pacheco, seria política ao utilizar os argumentos e as acções do próprio Governo: se o Estado pode sobrecarregar o seu orçamento com mais 10.500 [contos] anu-ais, por motivo das últimas reformas de ensino, também pode proporcionar ao instituto os meios de efectivar esta pretensão.Em suma, se era pretensão do Governo reformar o ensino, a legi-timação do discurso político poderia passar por uma obra efecti-va: as novas instalações do Técnico. E foi com este argumento que Duarte Pacheco pressionou constantemente o poder político até à obtenção dos fundos necessários ao arranque das obras do Téc-nico. Elevando o projecto das novas instalações do IST a porta-es-tandarte das reformas de ensino, da projecção do ensino técnico e da formação da nova classe profissional geradora de riqueza, entre Novembro de 1926 e Junho de 1927 Duarte Pacheco conseguiu do Governo a publicação de três decretos fundamentais ao arranque de uma obra estrutural. A uma distância de 25 anos, Herculano de Carvalho diria que:

“a acção dificílima que por vontade de ferro e por um optimismo invencível, Duarte Pacheco desenvolveu para conseguir do Parla-mento que então votasse a concessão da primeira ver-ba para compra dos terre-nos e início da construção e depois para promover as expropriações necessárias, demolições, etc.”.75

73 IST, Núcleo de Arquivo. Correspon-dênciaRecebidaeActasdoConselhoEscolar(1918-1927),ActadaSessãodoConselhoEscolarde6deNovem-brode1926.

74 Idem.75 CARVALHO, Herculano de, Op. Cit.,

sempaginação.

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69/68 Logo a 1 de Fevereiro de 1927 foi publicado o Decreto n.º 13 113 que permitiu ao IST contrair um empréstimo com a Caixa Geral de De-pósitos no valor de 3.500 contos para construção do novo edifício. A 2 de Junho o mesmo ano o Decreto n.º 13 717 explicitou a necessida-de de atribuição de bolsas de estudo no estrangeiro para professores e alunos diplomados pelo IST; e o Decreto n.º 13 718, publicado no mesmo dia, elevou para 10.500 contos a verba destinada à constru-ção do novo edifício.A confiança do Conselho Escolar estava conquistada. Entre Novem-bro de 1926, data em que Duarte Pacheco tomou pela primeira vez assento no Conselho, e Junho de 1927, acumulando com a regência de disciplinas e com a responsabilidade técnica e científica inerente a cada um dos professores com assento no Conselho, todas as ques-tões burocráticas, de consultadoria, delegação e comissão passaram a ser atribuídas por unanimidade a Duarte Pacheco. O argumento era por demais repetido: Duarte Pacheco era o professor mais novo, e no perfeito domínio da argúcia e inteligência revelava total dispo-nibilidade. Como se não bastasse, era ainda bem conhecedor de todos os assuntos76.Com a presença de Duarte Pacheco, as perspectivas para o novo Técnico alteraram-se por completo. De 1911 a 1926, o Instituto não conseguiu sequer transferir-se para um outro edifício que apresen-tasse melhores condições. Duarte Pacheco ingressara no corpo do-cente do IST no ano lectivo de 1925/26, tomando pela primei-ra vez assento no Conselho Es-colar do Instituto no ano lectivo de 1926/27. A 6 de Novembro de 1927, no primeiro momento em que no Conselho Escolar teve o uso da palavra, Duarte Pache-co identificou os problemas do Instituto e avançou com as solu-ções. Entre 1 de Fevereiro e 2 de Junho de 1927, o poder político ao publicar os decretos n.º 13 113, n.º 13 717 e n.º 13 718, torna-va força de lei as palavras de um homem, que recém-chegado ao IST, conseguiria o que o Conse-lho Escolar e dois directores de um Instituto Público não con-seguiram em 15 anos: terreno e verba para construção.Na sessão do Conselho de 5 de Fevereiro de 1927 foi lido o decre-

76 IST, Núcleo de Arquivo, Correspon-dênciaRecebidaeActasdasSessõesdo Concelho Escolar (1918-1927),Actas das Sessões do Conselho Es-colarde6deNovembrode1926a8deJunhode1927.

Neste espaço de tempo Duarte Pa-checo representouodirectordo ISTnaComissãonomeadapeloGovernoparaestudarasreclamaçõesdealu-nos em greve; procedeu à reformada tabela de horários para todos oscursos leccionados no IST; por de-legaçãodo IST integrouaComissãoencarregada pela Direcção Geraldo Ensino Industrial e Comercial declassificaroscandidatosavagasdeprofessores agregados das escolasdo ensino elementar industrial ecomercial; ficou encarregue de for-mular a resposta ao Instituto Elec-trotécnico e de Mecânica AplicadadeToulosequesolicitadaa inclusãodo ISTnalistaoficialdeescolases-trangeirascujoscursosdeveriamserequivalentesaoscursosdasescolassuperiores de engenharia portugue-sas; foidelegadodo ISTàComissãoOrganizadora do I Congresso Nacio-nal de Engenharia, entre outras re-presentações.

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MIA 70 to 13 113, o documento em que o Governo autorizava o IST a negociar

com a Caixa Geral de Depósitos um empréstimo de 3.500 contos para a construção das novas instalações e, de harmonia com o disposto no ar-tigo 5º do mesmo decreto tornava-se necessário eleger os dois represen-tantes do Conselho para, juntamente com a Comissão Administrativa, dirigir e fiscalizar a construção do novo edifício, tendo sido escolhidos:

“Os professores Duarte Pacheco que tanto se tem interessado pelo assunto e Francisco Maria Henriques em vista das suas qualidades e da sua especialização”.77

Neste primeiro momento de leitura do decreto que autorizava o em-préstimo para o início da construção do novo edifício, foi alvitrado em Conselho Escolar o nome de um arquitecto, Álvaro Machado, o regente da disciplina de Arquitectura no Técnico, contudo, a questão de direcção arquitectónica da obra não será nunca referida, como se a uma esfera superior se tivesse já decido o nome do arquitecto que projectaria o novo edifício: Porfírio Pardal Monteiro. Anos mais tarde, num registo de memórias, Pardal Monteiro recordaria a forma como Duarte Pacheco lhe fizera a encomenda do projecto:

“Tenho a seu respeito boas informações, dadas por pessoas que me merecem a maior confiança. Você é o arquitecto que eu e o Conse-lho escolhemos. Portanto só tenho um caminho a seguir: entregar-lhe o projecto para o Instituto ou confiar este trabalho a um arqui-tecto estrangeiro, portanto escolha!”78

O projecto do novo Técnico fora gizado na esfera da política públi-ca e não no âmbito de um exercício voluntário de cidadania como o fora na sua criação. Bensaude fora o cientista, o pedagogo defensor de um projecto de ensino revolucionário legitimado pelo poder po-lítico que o contactou num momento não muito habitual na nossa História. Mas esse momento de presciência pouco comum nos nossos governantes foi isso mesmo, apenas um momento: Bensaude nunca conseguiu concretizar a sua ideia de escola ratificada no decreto que a criou. O projecto de Escola que Bensaude pensou foi retomado por Duarte Pacheco, fazendo o percurso inverso. Ou seja, foi Duarte Pa-checo que contactou e pressionou ao mais alto nível os decisores po-líticos. Como o próprio afirmaria a propósito da concessão de crédito para a construção do novo edifício do Instituto, tinha acesso directo aos ministros, à cúpula do poder:

“Disse-lhe Sua Excelência o Ministro que não podendo o Estado dar de uma só vez o dinheiro necessário para

77 Idem, Ibidem.78 MONTEIRO,PorfírioPardal,Memo-

rial,7deNovembrode1956,pp.57.

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71/70 a conclusão da obra, entendia que os 3.500 [contos] não deviam ser gastos apenas nos alicerces. Devia a obra ir sendo feita parcialmente concluindo o que fosse começado, pois assim mais fácil lhe parecia conseguirem-se os meios necessários para a conclusão da obra”.79

Mas a par da concessão de verba para o financiamento de obra, Du-arte Pacheco tinha também a segunda e imprescindível questão já resolvida – a do terreno. E pensando numa perspectiva global, de con-gregação de esforços mas também de interesses, pensara também a angariação de parceiros:

“Pensou interessar também os industriais na realização deste desejo e pede aos colegas que o coadjuvem nesta iniciativa. Sabe que não há muito o que se pode conseguir mas o efeito moral será enorme e leva-rá o Governo a dar mais facilmente o que faltar. Relata já terem sido ence tadas as negociações com o proprietário do terreno, tendo este fixado o pagamento em duas prestações: um no acto da escritura e a segunda até ao fim de Junho depois de retiradas as colheitas”.80

E, focando a questão dos terrenos, relembre-se, como atrás foi dito, que Duarte Pacheco, nos dois anos que decorreram entre a conclusão do curso em 1923 e o seu ingresso no IST como professor interino em 1925, não exerceu engenharia. Como referiu Beirão da Veiga: quando terminou o curso passava horas a meu lado, no meu gabinete e servia-se dele como se seu fosse. Relembre-se ainda que Beirão da Veiga, professor ca-tedrático do IST, do ISCEF e vereador da CML, exercia ainda, para além dessas duas actividades, uma outra a título privado, na banca e nas seguradoras, as entidades que avaliam e validam a posse e a tran-sacção de propriedade, nomeadamente no mercado de terrenos. Nestes dois anos, entre 1923 e 1925, Duarte Pacheco, por estreita relação pessoal ou por actividade própria, tendo trabalhado com o irmão no ramo das seguradoras, teve acesso directo ao mercado do imobiliário. Na proximidade ou no exercício pleno da actividade seguradora, teve também acesso ao mercado financiador da transac-ção de bens e propriedades: a banca.A utilização do gabinete de Beirão da Veiga demonstra a plena con-fiança e a estreita amizade que o professor tinha pelo ex-aluno. Mas revela outros dados. Duarte Pacheco utilizaria o gabinete com um propósito, um propósito que seria do conhecimento de Beirão da Veiga, tendo o seu consentimento e a sua aprovação: procurar a lo-calização das novas instalações do Técnico.Desde logo, existia o interesse maior de professores e alunos que, desde a fundação do Institu-to, reclamavam no domínio da

79 IST, Núcleo de Arquivo, Correspon-dênciaRecebidaeActasdasSessõesdo Concelho Escolar (1918-1927),Actas das Sessões do Conselho Es-colarde6deNovembrode1926a8deJunhode1927.

80 Idem, Ibidem.

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Duarte Pacheco, entre os seus pares do Instituto Superior Técnico, numa visita às obras do Técnico Novo[post.1927],autordesconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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MIA 74 esfera política, a credibilidade e a adesão não se conseguiam com pa-

lavras, mas com acção, com obra. E a verdadeira reforma do ensino, o desenvolvimento da primeira escola de engenharia do País, só seria possível com o seu efectivo melhoramento material: o novo edifício. Deste modo, também no domínio político, a viabilidade deste projecto apresentaria como uma medida benéfica. Como dissera o ministro do Comércio a Duarte Pacheco, devia a obra ir sendo feita concluindo o que fosse começado.A construção do IST seria conseguida numa conjugação de esforços e no encontro dos vários interesses em jogo. Cada um a seu modo, buscava legitimidade e reconhecimento. E se todos o poderiam con-seguir, todos o conseguiram.Neste processo Duarte Pacheco foi a pedra de fecho de uma abó-bada, de uma cúpula, e não o expedito e voluntário professor de 26 anos que recém chegado ao corpo docente do Instituto se lançara solitário num projecto que dependeu unicamente da sua vontade e esforço, como diria Beirão da Veiga numa versão abonatória:

“Animado daquela confiança firme, impulsionado por uma visão larga (...) eis que se mete na Câmara Municipal de Lisboa, co-berto com o simples título de professor do Instituto, e de alto a baixo, esquadrinha a planta da cidade (…) decide que se elevaria imponente o edifício do Técnico, condigno e adequado à finali-dade da Escola. E aí se ergueu”.81

Margarida Acciaiuoli coloca em questão como foi possível que um jovem e desconhecido professor tivesse entrado assim pelas Repartições do Município de Lisboa, fazendo prevalecer as suas ideias82.Para Duarte Pacheco o acesso às repartições do município foi muito fácil. Entre 1923 e 1925 “o jovem desconhecido” utilizara o gabinete de Beirão da Veiga como se seu fosse, e eis que se mete na Câmara cober-to com o simples título de professor porque o próprio Beirão da Veiga lhe permitiu esse acesso. Duarte Pacheco entrou nas repartições do município não como simples e desconhecido professor, mas como amigo pessoal do vereador camarário.Acresce ainda um outro facto. Desde a sua fundação que o IST viveu uma situação de insalubridade de instalações. E desde a mesma data existiu uma comissão encarregada do exame de viabilidade de mudança do ins-tituto. Esta designação é muitas vezes utilizada na documentação pro-duzida pelo Conselho Escolar do Técnico, pois a questão das instalações é assunto recorrente nas discussões do professorado83.Acrescido também da qualida-de de membro desta comissão, Duarte Pacheco terá tido acesso aos serviços camarários que lhe

81 VEIGA,CaetanoMariaBeirãoda,Op. Cit., s/p.

82 ACCIAIUOLI, Margarida, Op. Cit., p.397.

83 IST,NúcleodeArquivo,Corposdocu-mentais referentes aos CopiadoresdeCorrespondênciade1911a1926eActasdasSessõesdoConselhoEs-colarde1911a1926.

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permitiram o escrutinar de terrenos livres na cidade de Lisboa. E o mais indicado docente do IST e membro da referida comissão seria Duarte Pacheco, uma vez que, de todos os professores do Instituto, era ele o que reunia mais informação sobre a questão, pois colabo-rara com o irmão no ramo dos seguros, tendo por isso os contac-tos e os acessos directos aos proprietários e intervenientes do ramo imobiliário. Acresce ainda o facto de que, caso lhe faltasse o modo de chegar a alguns proprietários de forma directa, outro meio havia para estabelecer o contacto: o gabinete de Beirão de Veiga, ilustre professor que trazia a este projecto a credibilidade financeira, social e que como vereador da Câmara, acrescentava também ao projecto o necessário manejo político.Como político que também era, Duarte Pacheco agarrou este pro-jecto como a primeira das suas obras. Para Duarte Pacheco, o Técni-co seria um projecto de obra e um projecto político e os dois decre-tos que conseguiu em 1927 assim o demonstram.Sete meses antes, quando pela primeira vez tivera o uso da palavra no Conselho Escolar, Duarte Pacheco afirmara que no espaço de um ano a questão da construção do novo edifício estaria resolvi-da. Afirmara também a necessidade de criação de bolsas de estudo para formação de professores. As diligências do jovem professor tinham sortido o efeito desejado pela escola e a escola estava dis-posta a retribuir.Havia já algum tempo que, por razões de saúde, o director do IST ha-via pedido dispensa de funções. Na sua ausência, e no cumprimento do regulamento, fora substituído por Beirão da Veiga, à data o pro-fessor com mais tempo de serviço prestado ao instituto.Na sessão do Conselho Escolar de 21 de Junho de 1927, Beirão da Veiga informava que não pretendia continuar a dirigir interinamen-te o Instituto. Da mesma forma que, em 1925, Mira Fernandes criara o momento oportuno para a entrada de Duarte Pacheco no IST, em 1927 Beirão da Veiga colocava à disposição o cargo de director inte-rino, no exacto momento em que os destinos do Instituto iniciavam um novo e decisivo rumo. Perante a posição de Beirão da Veiga, o nome de Duarte Pacheco surgiria no Conselho Escolar como solu-ção única e unânime para a direcção interina do IST84.Com 27 anos de idade, Duarte Pacheco sendo o professor do IST com menos tempo de serviço, era reconhecido pelos seus pares como o único membro do Conselho Escolar com o conhecimento profundo das necessidades do Instituto e com todas as qualidades e o tempo que aos restantes falta[va] quase em absoluto85. A 10 de Agosto de 1927, seria nomeado pelo Go-verno como director efectivo do Instituto Superior Técnico.

84 IST, Núcleo de Arquivo, Correspon-dênciaRecebidaeActasdasSessõesdo Concelho Escolar (1918-1927),ActadaSessãodoConselhoEscolarde21deJunhode1927.

85 Idem.

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MIA 76 Como director do IST, Duarte Pacheco estava agora investido de

plenos poderes de representação e negociação. Como atrás se refe-riu, a 5 de Fevereiro de 1927, Duarte Pacheco informara o Conselho de que haviam já sido iniciadas as negociações com o proprietário do terreno sobre o qual se construiria o novo edifício do IST86. Este terreno situava-se nas imediações do bairro do Arco do Cego, o pri-meiro bairro social de Lisboa, ideia da I República mas ainda ina-cabado. Em 1927, arrancava em definitivo a obra do bairro do Arco do Cego, iniciando-se também o projecto do IST. A CML tomaria a responsabilidade de execução do projecto do bairro social que esta-ria concluído em 1935. Em 1935, tinha também início o primeiro ano lectivo nas novas instalações do IST.Esta campanha de obra concertada, este duplo interesse que deci-diu a retoma de um projecto e a aceitação de um outro que lhe era contíguo, materializava os diálogos e os objectivos comuns de duas instituições. Em 1927, Duarte Pacheco era director do IST e na mes-ma data era presidente da CML o coronel Vicente de Freitas. Numa iniciativa concertada, estes dois homens, encabeçando as institui-ções que dirigiam, marcariam a urbanização e a extensão daquela zona da cidade. Alguns arruamentos estavam já lançados, contudo a determinação na conclusão do bairro do Arco do Cego e a escolha do local de implantação do campus universitário seriam duas obras que, decisivamente, iriam valorizar os terrenos circundantes. A Câ-mara Municipal de Lisboa avançou com a conclusão da obra do bair-ro, actualizando contudo a faixa social destinada a ocupar os fogos; já não os operários mas antes a burguesia de serviços, nomeadamen-te a dos próprios serviços camarários87.Com esta mesma percepção e com o empréstimo contraído com a CGD, o IST comprou os terrenos necessários à área de construção do novo edifício. Mas foi literalmente mais longe. Adquirindo uma área bem mais alargada do que a necessária à construção, o Instituto inves-tiu capital na compra de prédios rurais, pois o que ali existiam eram quintas. Apresentado o plano de obra à Câmara Municipal de Lisboa obter-se-ia o licenciamento de construção. Mas na licença obtida foi contemplada toda a área adquirida e não apenas a área necessária à construção das novas instalações da escola. Com esta medida, o in-vestimento feito pelo IST havia capitalizado num muito curto espaço de tempo. Tendo adqui-rido prédios rurais, o IST era agora proprietário de prédios urbanos, pois tinha já licenciada pela câmara a área de terrenos para construção. Licenciada a urbanização, seria possível pen-sar no saneamento e nos arrua-

86 IST, Núcleo de Arquivo, Correspon-dênciaRecebidaeActasdasSessõesdo Concelho Escolar (1918-1927),ActadaSessãodoConselhoEscolarde5deFevereirode1927.

87 SILVA, Raquel Henriques da, “BairroSocialdoArcodoCego”,Portugal: Ar-quitectura do Século XX, TOSTÕES,Ana; BECkER, Annette; WANG, Wil-fried (com.), Munique, Nova Iorque,Frankfurt,Lisboa,Prestel/DAM/PF97,1998,p.162.

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77/76 mentos, e com a valorização obtida na alteração de valor de mercado, o IST venderia parcelas do terreno a um preço superior ao da aqui-sição. Esta situação permitiria o acumular de valores que seriam ca-nalizados para o fortalecimen to de uma segunda verba necessária ao Instituto: a verba des tinada ao financiamento da construção. É já como proprietário que o IST faz permutas de terrenos com a CML88, permutas essas necessárias a obras camarárias e não a obras de extensão do campus universitário. Com efeito, só no ano de 1929 a troca de terrenos ascendeu ao valor total de 10 970,72/m2 destinados a leitos de rua.Mas a autarquia não foi caso único. Outras instituições públicas comprariam ao Técnico terreno necessário à construção. Foi o caso do Instituto Nacional de Estatística. A 23 de Março de 1933, o IST re-cebia do INE a quantia de 300 000$00 correspondente à segunda prestação do pagamento de um lote de terreno89. A 11 de Maio de 1934 o mesmo INE pagaria a quantia 200 000$00, correspondente à terceira prestação90.O mesmo aconteceria com particulares. A 13 de Novembro de 1932 o Instituto recebia de Augusto Pontes dos Santos Chaves como sinal de princípio de pagamento de um terreno na Av. Miguel Bombarda e com a área de 430,08 m2 ao preço de 100$00 cada 1m2 a quantia de 5 000$0091.Em carta datada de 25 de Novembro de 1932 e endereçada ao director-geral do Ensino Téc-nico, o IST informava que nos anos económicos de 1927 a 1932 obtivera 1419 121$18 em receitas próprias, verba que entregara ao Tesouro92. No ano de 1933 a receita obtida na venda de terrenos atingiria os 917 529$3093.Todas estas actividades estavam contudo consignadas em lei. O decreto n.º 13 113 de 1 de Feve-reiro de 1927 previra que:

“As importâncias prove-nientes da venda dos terre-nos sobrantes dos que vão ser adquiridos, poderão ser alienados pelo Instituto Su-perior Técnico”.94

O decreto n.º 13 718, de 2 de Ju-nho de 1927 acrescia ao Institu-to uma ainda maior margem de manobra de negociação:

88 Entreosanosde1929e1942,oISTpermutou dezenas de parcelas deterrenoscomaCâmaraMunicipaldeLisboa.

CML, Arquivo Intermédio – ArquivoMunicipal do Arco do Cego, Escri-turasdeTrocasdeTerrenos.A9deFevereiro, em documento assinadopelos dois outorgantes, Câmara e oInstituto Superior Técnico, está des-critoqueaCâmaraentrounapossede10950,72m2deterrenodestinadoaoprolongamentodaAvenidaMiguelBombarda, dando em troca dois ta-lhõesdeterreno,umcomaáreade1485,49m2 e outro com 646,56m2,Fls48v(7).Comdatade2deFeve-reirode1929existeumaescrituradepermuta de terrenos entre a CML eoIST,permutaessaquevisaconclu-sãodaAvenidan.º20.A26deMarçode 1942, a CML compra ao IST umterreno com 113m2, sito próximo daAvenidaAlmiranteReis.

89 IST, Núcleo de Arquivo, Copiador deCartassemnumeração(1932-1936).

90 Idem, Ibidem.91 Idem, Ibidem.92 Idem, Ibidem.93 Idem, Ibidem.94 Alíneaa)doArtigo4ºdodecreto13

113de24deJaneirode1927,publi-cadonoDiário do Governo,ISérie,de1deFevereirode1927.

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MIA 78 79 “É autorizada a comissão administrativa do Instituto Superior Téc-

nico a alienar, por venda ou simples cedência, parcelas ou faixas de terreno adquiridos para as suas futuras instalações, sem o prejuízo do fim a que os mesmos terrenos estão destinados, e a adquirir, por compra ou troca com a Câmara Municipal de Lisboa, ou com quais-quer outras entidades públicas ou particulares, outras faixas ou parcelas de terrenos confinantes, para compensação das que tiver alienado ou cedido”.95

Em todo este processo, e principalmente a partir do momento em que Duarte Pacheco foi nomeado director do IST, tornara-se difícil dissociar a sua figura do Instituto. Seria também muito difícil disso-ciar o Instituto da figura. Duarte Pacheco encabeçava um projecto: o Técnico. E o Técnico seria o que Duarte Pacheco dele conseguis-se fazer ser. O professorado e o Governo já o haviam entendido. E tê-lo-iam entendido ao ponto de académica e politicamente terem delegado neste homem de 27 anos o futuro material de uma escola e a projecção política que daí pudesse advir.Na última referência oficial a Duarte Pacheco, Oliveira Salazar disse-ra que o seu ministro não era um político na acepção corrente do termo. Do mesmo modo, e em essência, Duarte Pacheco divergia também do modelo de engenheiro, como em 1994, numa cerimónia celebrada no IST, Arantes e Oliveira reconheceria:

“Seria errado chamar-lhe um produto típico da Escola, porque ele foi um homem verdadeiramente singular, fora de todos os esquemas”.96

Em Duarte Pacheco todos reconhecemos a convicção. Para os po-líticos ele era o engenheiro; para os engenheiros era o político. E o que cada um destes grupos encontrava em Duarte Pacheco era a singularidade, a estranheza da faceta que não conseguiam identifi-car. A ambição de Duarte Pacheco foi simples: a política investia-o do poder de agir. Duarte Pacheco era um político de acção e não de discurso. Acreditava na possibilidade de desenvolvimento através da obra, gerando esta obras subsequentes. Este jovem político acredi-tava na mudança, no progresso através da acção. Uma acção que aba-laria os alicerces das atitudes e das certezas de um conservadorismo que olhava a tradição como a única certeza de futuro.

Construção do Instituto Superior Técnico[c.1934],PinheiroCorrêaArquivo Municipal de Lisboa/Núcleo Fotográfico

Conclusão da construção do Instituto Superior Técnico[c.1942],PinheiroCorrêaArquivo Municipal de Lisboa/Núcleo Fotográfico

95 Artigo7.ºdoDecreto13718de27deMaio de 1927, publicado no Diário de Governo,ISérie,de2deJunhode1927.

96 OLIVEIRA, Eduardo R. Arantes e,“ObrasPúblicasemPortugalnoSé-culoXX”, inMomentos de Inovação e Engenharia em Portugal no Século XX, Lisboa, D. Quixote, 2004, vol. I,p.395.

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MIA 80 81 As novas instalações do Instituto Superior Técnico, construídas entre

1929 e 1942, constituem o primeiro campus universitário erguido em Portugal97. O arquitecto do primeiro projecto edifi cado de raiz voca-cionado para o ensino superior, Porfírio Pardal Monteiro, enfrentava um projecto de obra complexo e vasto e, simultaneamente, contido nos custos.O programa das novas instalações do IST, escola técnica por excelên-cia, implicava a existência de salas de aulas teóricas, salas de trabalhos práticos, laboratórios, anfi teatros, salas de professores, salas de assis-tentes, sala de conferências, biblioteca, museus de secção e museu de engenharia, salão de festas, dependências da associação de estudan-tes, serviços de tipografi a, serviços administrativos, piscina, ginásio e demais dependências desportivas. A tudo isto acresciam as com-petências e as especifi cidades de cada um dos ramos da Engenharia leccionados no IST.Sobre as questões de concepção e organização do programa peda-gógico, técnico e científi co com vista à estruturação de uma escola modelo, lembraria Pardal Monteiro:

“ (…) [d]a organização do programa das futuras instalações para o ensino das diversas engenharias (…) se incumbiu Duarte Pacheco com alguns professores das diversas especialidades (…) O progra-ma inicial era por tal forma vasto que Duarte Pacheco se viu na necessidade de o comprimir fortemente”.98

Este vasto programa era o mes-mo que Alfredo Bensaude giza-ra anos antes99. De igual modo, e fi xado o programa defi nitivo, Duarte Pacheco acompanharia de perto a adaptação do progra-ma das instalações ao projecto arquitectónico:

“ (…) durante a preparação do projecto Pacheco pas-sava dias e noites no meu atelier numa impaciência enervante (…)”.100

Embora condicionadas pelo li -mitado orçamento, as obras de construção arrancaram a bom ritmo, mas as críticas não se

Construção do Instituto Superior Técnico[c.1934],PinheiroCorrêaArquivo Municipal de Lisboa/Núcleo Fotográfi co

97 Em 1934 o decreto n.º 294 de 4 deDezembro, publicado em Diário deGoverno,IISériede15deDezembrode 1934, determinava a construçãodaCidadeUniversitáriadeCoimbraecriavaaprimeiradetrêsdasComis-sões Administrativas do projecto deobra.AsobrasdaCidadeUniversitá-riativeraminícioem1939,oprimeiroedifício foi inaugurado em 1942 e oúltimoem1975.OprojectogeraldaCidadeUniversitáriadeCoimbraédaautoriadeCottinelliTelmo.Em1948,na sequência da morte inesperada,Cottinelli, Cristino da Silva toma-va posse como arquitecto-chefe daobra.

Em 1949, arrancava o projecto deconstrução da Cidade Universitáriade Lisboa. Porfírio Pardal MonteiroreceberiaaencomendadosprojectosparaaFaculdadedeDireito,LetraseReitoriadaUniversidade.

98 MONTEIRO, Porfírio Pardal, Memo-rial, Entrada de Diário de 9 de No-vembrode1956.

99 V.A Génese do Técnico – Alfredo Bensaude, Lisboa,Althum,2010,pp.78-81.

100 MONTEIRO, Porfírio Pardal, Op. Cit.,EntradadeDiáriode10deNovembrode1956.

A CONSTRUÇÃO DO TÉCNICO: O DECRETO, O PROJECTO E O CONCRETO

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Na história da arquitectura portuguesa, o técnico seria considerado a primeira grande obra pública moderna

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MIA 84 85 fizeram esperar. Em 1933, ainda apenas as paredes do Técnico es-

tavam levantadas, já as vozes se levantavam também. As obras do Técnico eram o espelho do País: o 8 e o 80. Do pardieiro da Boavis-ta os alunos de engenharia passariam para o colosso da Alameda101. Para o engenheiro Armando Ferreira, autor do ácido artigo de opinião, uma escola que diplomava uma média de 30 engenheiros por ano, sendo que a maioria dos seus estudantes do curso geral cumpriam um programa escolar quase idêntico ao da Faculdade de Ciências, bem podia o Técnico ceder o espaço nos seus vazios pavilhões de especialidade que diplomavam 2 ou 3 alunos por ano para outros alunos de outras escolas, pois existiam faculdades in-teiras em casas alugadas!Alfredo Bensaude apelava à razão:

“Tenho ouvido dizer que algumas pessoas consideram exageradas as dimensões da nova escola. Parece-me essa crítica injustificada. Os que assim pensam terão talvez em mente o tipo da nossa escola tradicio-nal, em que o ensino se fazia quase exclusivamente por meio de giz e quadro negro (...) As boas escolas técnicas modernas aproximam-se cada vez mais dum aglomerado de laboratórios e de oficinas que se assemelham a verdadeiras instalações industriais”.102

Se a amplitude da construção pasmava alguns, a composição estética afligia outros tantos. Afinal, o Técnico era um caixote!103 Pese embora o facto de a contenção orçamental ter determinado que apenas parte do projecto se concretizasse, uma vez que os edifícios correspondentes aos laboratórios de Hidráulica e de Máquinas e Motores, a poente do pavi-lhão central, não chegaram a ser construídos, na história da arquitectura portuguesa, o Técnico seria considerado a primeira grande obra pública moderna104, sendo também a primeira obra de Duarte Pacheco, aquela onde ele vivia quase todo o tempo105. A mesma que não quis deixar morrer mesmo quando foi convi-dado a integrar o Governo, como confessara a Pardal Monteiro:

“Veja você como é que eu posso deixar uma obra des-tas, nesta altura, para ir para o Governo. Eu não entrego isto a ninguém e não posso deixar de levar por diante a construção do novo Institu-to. Não posso aceitar, não devo aceitar, quando não isto morre”.106

101 FERREIRA,EngenheiroArmando, “OColossodoIST”,inGazeta dos Cami-nhos-de-ferro,Lisboa,n.º1084,16deFevereirode1933,pp.107-108.

102 BENSAUDE, Alfredo, “O InstitutoSuperiorTécnico”, inTécnica,Lisboa,Ano XII, n.º 88, Dezembro de 1937,p.339.

103 “Como poderemos aceitar que emLisboa e em todo o País se ergamcaixotesdeMoscovo,deMunique,detodaaparte,menosdePortugal?”,inArquitectura Portuguesa,n.º38,Maiode1938,p.9.Nestaperspectivacita-daporCALDAS,JoãoVieira,Op. Cit.,p.49.

104 CALDAS,JoãoVieira,Op. Cit.,p.50.105 MONTEIRO,PorfírioPardal,Me-

mórias,EntradadeDiáriode22deNovembrode1956.

106 IDEM,Op. Cit..

Piscina e Auditório do novo Campus do Instituto Superior Técnico[s.d],MárioNovaisGaleria de Biblioteca de Arte/Fundação Calouste Gulbenkian

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Perspectiva da Alameda D. Afonso Henriques tirada do IST com a Fonte Luminosa como pano de fundo[s.d],MárioNovaisGaleria de Biblioteca de Arte/Fundação Calouste Gulbenkian

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87/86 Em 1928, no arranque das obras do Técnico, Duarte Pacheco inte-graria a equipa governamental do coronel Vicente de Freitas desem-penhando o cargo de Ministro da Instrução Pública e, entre os anos de 1932 e 1935 anos em que decorrem as obras de maior fôlego na construção das novas instalações do IST, desempenhou o cargo de Ministro das Obras Públicas e Comunicações. Por todo este tempo, embora auxiliado por Beirão da Veiga na direcção do IST, Duarte Pa-checo manteve o comando das obras107, mas à medida que o campus se erguia acima da cota soleira, erguiam-se vozes de crítica, sobretu-do em relação aos capitais investidos no projecto:

“Custou já, assim incompleta, ao País, uns 17 mil contos e sabe-se lá o que é preciso gastar para terminar”. 108

Apesar das críticas e das desconfianças de alguns, o Técnico não crescia apenas numa nova forma, crescia também em prestígio téc-nico, credibilidade e confiança.Apostada a aplicar em prémios escolares a quantia de 1% do valor to-tal obtido anualmente, a empresa Lampada Lumiar, sucursal da Empreza Nacional de Aparelhagem Eletrica (ANAE), pretendia entregar 35% desse valor ao IST109. Propunha a empresa que com esse mesmo fundo fossem criados dois prémios anuais e denominados Lampada Lumiar. Propunha ainda a empresa a atribuição dos prémios da seguinte forma:

“(...) ao aluno que terminar o curso de Engenheiro electrotécnico com a maior classificação e ao aluno mais classificado da especiali-dade de Electrotecnia”.110

Também a Companhia Cimen-to Tejo, tendo tomado conheci-mento de que seria criada bre-vemente no Instituto uma cadei-ra especial para o ensino de cimento armado e suas aplicações, e porque um ensino tão específico só fa-ria progredir a construção civil entre nós, vinha por carta informar a direcção do Instituto da seguin-te intenção:

“no primeiro ano que fun-cionar a dita cadeira, entre-gará mil escudos para serem aplicados como prémio a conferir ao aluno que nela tiver a mais alta classificação

107 IST; Núcleo de Arquivo, Correspon-dênciaRecebidaeActasdoConselhoEscolar(1927-1940),ActadasessãodoConselhoEscolarde23deJulhode1933.

108 FERREIRA,Armando,Op. Cit.,p.108.109 Na proposta da empresa os restan-

tes 65% seriam atribuídos à EscolaComercial Patrício Prazeres, EscolaIndustrial Afonso Domingues, Esco-la Industrial Marquês de Pombal esecção Industrial da Escola Fonse-ca Benevides e Secção de Arte damesma Escola. Cfr. IST, Núcleo deArquivo,CorrespondênciaRecebidaeActasdasSessõesdoConcelhoEs-colar1927-1940,ActadaSessãodoConselhoEscolarde31deJulhode1934.

110 IST, Núcleo de Arquivo, Correspon-dênciaRecebidaeActasdasSessõesdo Conselho Escolar 1927-1940,ActadaSessãodoConselhoEscolarde31deJulhode1934.

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MIA e esta importância, enquanto subsistir a cadeira será anualmente pos-

ta à disposição para o mesmo fim, no mês em que for necessária”.111

Algo mudara.Nos primeiros dez anos de existência do IST, Alfredo Bensaude enviava cartas às várias empresas existentes para que recebessem como tirocinantes os alunos finalistas do Técnico. Em meados dos anos 30, a construção material do Técnico começara a anga-riar definitivamente o interesse dos industriais. Esta aliança, este interesse comum entre o IST e empresariado industrial e cientí-fico, teria aqui o seu início. Os prémios escolares funcionariam não só como incentivo às boas prestações escolares mas também como forma de incentivo à criação de projectos de investigação e angariação de profissionais competentes. Este tipo de parceria entre a escola e o mercado manter-se-ia e mantêm-se até hoje.Em 1934, o Técnico atingia um dos objectivos que haviam presidido à sua criação: os seus alunos formandos e engenheiros diplomados eram considerados pelos industriais como agentes de progresso. O IST era finalmente reconhecido como a escola de mérito e de exce-lência que fora criada para ser.Afastado do Governo em Janeiro de 1936, Duarte Pacheco retomava a direcção efectiva do Instituto. Pela mesma data decorria o projec-to de reforma do ensino técnico, matéria em que o IST não havia sido consultado, nem em termos pedagógicos nem em termos de conteúdos programáticos e métodos de ensino. Agarrando de forma directa e contundente a questão, Duarte Pacheco procurou saber de forma taxativa qual a posição do Conselho Escolar face à situação. Por outro lado, o facto de argumentar que, contra ou a favor da re-forma do ensino técnico, a opinião do Conselho tinha de ser unâni-me e presente ao ministro da tutela, é um facto que revela uma vez mais o modo de actuação de Duarte Pacheco: directo e objectivo. A última sessão do Conselho Escolar do Técnico presidida por Duar-te Pacheco teria lugar a 31 de Julho de 1937. Saía do IST para cum-primento do segundo mandato nas Obras Públicas, abdicando em definitivo da direcção do Instituto mas não esquecia que o projecto delineado em 1927 não estava ainda concluído Em 1942 o gabinete ministerial de Duarte Pacheco subscreveria ao IST verba para o iní-cio da construção do laboratório de Hidráulica112. Em 1943 o minis-tro falecia precocemente. Os pavilhões de Hidráulica e de Máquinas e Motores ficariam por construir.

O Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Duarte Pacheco, no seu Gabinete1938,autordesconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

111 IST, Núcleo de Arquivo, Correspon-dênciaRecebidaeActasdasSessõesdo Conselho Escolar 1927-1940,ActadaSessãodoConselhoEscolarde31deJulhode1934.

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A obra pública de Duarte Pacheco teve início em 1925, data do seu ingresso no corpo docente do IST. No desempenho do cargo de di-rector do Técnico, foi responsável pela concretização do plano re-formador do seu fundador, Alfredo Bensaude, dando início à reno-vação material, política, técnica e científi ca que a Escola assumiria a partir do segundo quartel do século XX.Ao projecto inovador realizado por Duarte Pacheco para o IST, se-guiram-se aqueles que realizou na direcção do Ministério da Instru-ção Pública, no Ministério das Obras Públicas e Comunicações e na Câmara Municipal de Lisboa.No domínio da produção legislativa, Duarte Pacheco foi hábil na construção de um tecido legal que lhe permitiu concretizar os seus projectos de forma rápida e objectiva, mas também autoritária, na medida em que todos os procedimentos e interesses de Estado pre-valeceram sobre os interesses e os direitos individuais. O carisma, a convicção e o braço forte da lei constituíram os instrumentos que permitiram a Duarte Pacheco realizar em quinze anos uma obra pública impressionante em número e em escala. Mas uma obra im-pressionante também no avanço tecnológico, na precisão técnica e na qualidade construtiva. Carismático e portador de uma profunda convicção na possibilidade de desenvolvimento material do País, Duarte Pacheco parecia conseguir transformar simpatizantes em apoiantes de causa. Centralizador no modo de agir politicamente, revelou-se cooperante, fl exível e bom ouvinte no modo de trabalhar os projectos, talvez pelo facto de ter sido formado por uma Escola em que o trabalho de equipa sempre foi valorizado como uma das condições inerentes ao sucesso de um projecto. Neste sentido, sou-be munir-se de uma equipa de trabalho multidisciplinar, efi ciente, confi ante e produtiva, criando um gabinete de trabalho inédito.Da actividade ministerial de Duarte Pacheco na Instrução Pública e nas Obras Públicas e Comunicações e da sua actividade na ges-tão camarária da cidade de Lisboa como presidente do município, a historiografi a tem traçado em linhas gerais a sua acção política à luz das linhas arquitectónicas e artísticas das principais obras saídas do seu gabinete. Trabalhadas e já discutidas as considerações estilísticas,

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importa identificar as circunstâncias e as condições que permiti-ram o surgimento da obra pública de Duarte Pacheco. E, traçado o cenário político, económico e social em que foi realizada, impor-ta igualmente identificar o método de trabalho do ministro. Com maior ou menor dotação orçamental, mas com objectivos precisos e uma equipa de trabalho constituída por técnicos especializados, Duarte Pacheco programou todo um País. Num programa que construiu ou reconstruiu as infra-estruturas nacionais, a “gran-de obra pública” teve o mesmo peso processual que o pequeno melhoramento do caminho vicinal. Se nos manuais da História a grande obra tem tido lugar de destaque, no gabinete de trabalho do ministro mereceu a mesma importância que o pequeno melho-ramento. Isto porque, em tudo, Duarte Pacheco considerava que deveria existir coordenação, unidade e eficiência. E neste modelo de actuação, embora pensado de forma particular e exaustiva, cada projecto era parte constituinte e indivisível de um todo. Da análise de vinte anos de discurso do método e obra de Duarte Pacheco emerge um homem profundamente convicto de que a construção material do Técnico, a Cidade, a Instrução, os Equipamentos e as Comu-nicações tinham uma origem comum na formação dos indivíduos e na construção do País: a viabilidade do futuro. E o futuro para Duarte Pacheco chegou cedo. Se à direcção do Técnico chegara com 27 anos apenas, foi com convicção que o jovem director do Técnico, na véspera de completar 28 anos de idade, tomou posse como Ministro da Instrução Pública. Integrava a equipa governa-mental do coronel José Vicente de Freitas, o mesmo que anos antes fora presidente da Câmara Municipal de Lisboa. A mesma Câmara na qual Beirão da Veiga fora vereador municipal.Contudo, antes de se lançar por completo à empresa que Vicente de Freitas lhe havia confiado, teria de se deslocar a Coimbra com um propósito: retornar a Lisboa com a certeza de que Oliveira Salazar integraria o Governo como ministro das Finanças. Duarte Pacheco, convincente perante políticos ao ponto de conseguir o decreto de contracção de empréstimos e verbas para construção de uma escola, convincente perante proprietários na venda e permuta de terrenos

Com maior ou menor dotação orçamental, mas com objectivos precisos e uma equipa de trabalho constituída por técnicos especializados, Duarte Pacheco programou todo um País.

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e convincente perante um colégio senatorial de professores cate-dráticos de um instituto público, que não por mero acaso, o tinham elegido como director de todos eles, parecia talhado para a tarefa.Duarte Pacheco não se deslocou a Coimbra como mero cidadão. Mais do que um republicano de direita incumbido de convencer um anti-republicano a integrar uma equipa governamental113, Duarte Pacheco era um ministro já empossado que ia a Coimbra falar directamente com um pro-fessor. Quando Oliveira Salazar recebeu Duarte Pacheco em Abril de 1928, estava a receber a visita do seu ministro, o Ministro da Instrução Pública. Oliveira Salazar poderia até não estar re-ceptivo ao convite, mas ficou de-certo receptivo aos argumentos de Duarte Pacheco: serviço pú-blico e condições necessárias ao exercício do cargo114. Salazar to-mou posse da pasta das Finanças a 27 de Abril de 1928, não mais tendo regressado ao professora-do de Coimbra.

113 Designação utilizada por GonçaloCanto Moniz na obra Arquitectura e Instrução. O projecto do liceu mo-derno 1836-1936,Coimbra,Departa-mentodeArquitecturadaFaculdadedeCiênciaseTecnologiadaUniversi-dadedeCoimbra,2007,p.135.

114 FernandoRosasafirmaqueemMarçode 1928, quando após a desastrosagerência financeira de Sinel Cordes,aditadurafica sem finanças nem po-lítica financeira (...) todas as atenções se viram para o prestigioso professor de Finanças de Coimbra (...) que se faz caro a Duarte Pacheco – enviado a Coimbra para o convencer a aceitar a pasta das Finanças – e impõe condi-ções draconianas que serão aceites.

Defendemos que Duarte PachecovaiaCoimbraemAbril, jáempossa-dodocargodeMinistrodaInstruçãoPúblicaumavezqueOliveiraSalazarsótomapossecomoMinistrodasFi-nançasnovediasdepoisdePacheco.NaformaçãoinicialdoGovernoeatéOliveiraSalazaraceitarocargo,foiocoronelVicentedeFreitasqueinteri-namentegeriuapasta.Cfr. FernandoROSAS,“AntóniodeOliveiraSalazar”in Dicionário de História do Estado Novo, direcção de Fernando ROSASeJ.M.BrandãodeBRITO,Lisboa,Cír-culodeLeitores,1996,vol.II,pp.864.

O Ministro das Obras Públicas,Duarte Pacheco à chegada ao aeroportoda Portela de Sacavém[s.d.],autordesconhecido,Arquivo Municipal de Lisboa/Núcleo Fotográfico

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ICA” Vicente de Freitas, designado presidente do Conselho de Ministros

na sequência da eleição de Óscar Carmona para Presidente da Re-pública, convidou, a 18 de Abril de 1928, Duarte Pacheco a integrar a sua equipa governamental. O coronel escolhia como novo rosto da Instrução Pública o jovem e dinâmico director da escola de Enge-nharia mais prestigiada do País. A primeira página do Diário de Notí-cias desse dia traçava o perfi l do novo ministro:

“Tomou conta da pasta da Instrução Pública o ilustre matemático e professor sr. Dr. Duarte Pacheco, que muito novo também, é já hoje um dos homens de ciência mais ilustres da nossa terra e desempe-nhava ultimamente, apesar de ser dos professores mais modernos, por votação unânime do Conselho, as elevadas funções de director do Instituto Superior Técnico, nas quais revelou sempre a maior competência e raras qualidades de ponderação e acção”.115

Assinado o termo de posse, nesse mesmo dia pelas duas horas da tarde116, Duarte Pacheco recolhia ao gabinete ministerial e fazia pu-blicar no Diário do Governo as duas primeiras medidas políticas117. O Programa do ministério sob a tutela de Duarte Pacheco estava in-dicado na alínea 7 do Programa do Governo empossado em Abril de 1928. Nas palavras do chefe de Governo:

“É esse um dos nossos maiores empenhos. A instrução primária ministrar-se-á a todos e será gratuita. A secundária e a superior não será preciso desen-volvê-las com tanta intensida-de e serão pagas por aqueles que as quiserem receber (…) Mas, além dessas classes de instrução, existe ainda a ins-trução técnica e é essa que procuraremos intensificar o mais possível, especialmente a de carácter agrícola, não para criarmos novas legiões de en-genheiros e de doutores, mas para organizarmos um verda-deiro exército de práticos com conhecimentos necessários à melhor valorização da terra”.118

Duarte Pacheco tutelou a pasta da Instrução Pública de 18 de Abril a 10 de Novembro de 1928. Neste período o ministério pro-duziu cerca de 80 diplomas119.

A INSTRUÇÃO: SETE MESES E UM PAÍS

115 Diário de Notícias,primeirapágina,18deAbrilde1928.

116 Idem,p.1.117 Logonatardede18deAbrilde1928,

regulaanomeaçãodereitoresevice-reitoresdosliceusedosdirectoresdeclasseedefineoprogramadeexamesdeadmissãoaosInstitutosSuperioresdeComérciodeLisboaedoPorto.V.decreto-lei n.º 15 392, publicado emDiário do GovernoISérien.º88.

A19deAbrilregulaasituaçãodospro-fessorescontratadosdoEnsinoTécnicoElementarComercialeIndustrialqueàdatadapublicaçãododecreton.º12147estavaemexercíciodefunçõesepubli-caaindaaportarian.º5323querevogaaportarian.º4825queordenavadispensadeserviçoatodoopessoalassalariadodaBibliotecaNacional.V.decreto-lei15398,publicadoemDiário do Governo, ISérie n.º 89 da Biblioteca Nacional. V.Decreto-Lei15398,publicadoemDiário do Governo,ISérien.º89.

118 Idem,p.2.119 CaetanoMariaBeirãodaVeiga, “Du-

arte Pacheco. Inteligência, Dinamis-mo e Infatigabilidade” in Revista In-ternacional,1951,s/p.

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Duarte Pacheco na tomada de posse enquanto Ministro da Instrução Pública19deAbrilde1928,autordesconhecidoArquivo Nacional Torre do Tombo/Fundo Empresa Pública Jornal O Século

Este facto revela, acima de tudo, o método de trabalho deste políti-co: disciplinar legislativamente o que pode ser corrigido e legislar a construção de novas soluções.Tendo por base a análise da produção legislativa exarada pelo gabi-nete ministerial, numa primeira fase do mandato Duarte Pacheco procedeu a uma “gestão de recursos humanos e administrativos do ensino”, tendo por objectivo regulamentar de modo uniforme a má-quina administrativa do ensino.Esta primeira fase corresponde à etapa inicial do método de tra-balho de Duarte Pacheco, a fase reguladora. Na segunda fase do mandato, Duarte Pacheco dá início a uma nova etapa desse mes-mo método: a fase de projecto ou das “comissões”. Procedendo à selecção de áreas específicas de actuação política, o ministro cria para cada uma dessas áreas uma comissão de estudo que reúne uma equipa com conhecimentos científicos e técnicos multidis-ciplinares. Com esta medida o ministro pretende obter não só o diagnóstico aprofundado dos problemas existentes como pro-postas para a sua solução.Neste sentido, a 21 de Julho de 1928, Duarte Pacheco nomeia uma comissão composta por nove elementos que desempenham funções

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na área do ensino primário, liceal ou superior120. Alguns membros da equipa desempenham cargos de direcção enquanto outros de-senvolvem actividade na área da docência. A pluralidade técnica e curricular dos elementos seleccionados por Duarte Pacheco es-tende-se até à polaridade das opiniões políticas121, mas, para o mi-nistro, o credo político dos elementos constituintes das comissões parecia ser um dado acessório uma vez que interessava somente a contribuição que cada um deles poderia trazer a assuntos que o go-vernante julgava de necessária e urgente resolução. A esta comis-são estavam atribuídas seis propostas de trabalho sintomáticas de seis situações existentes na Instrução. O ministro procurava assim optimizar esforços e encontrar soluções eficazes para o combate ao analfabetismo, uma forma eficaz de articulação entre o ensino oficial e o ensino particular, um método rápido de execução de edi-ficações escolares, o cumprimento de normas de higiene e prática desportiva no ensino primário, o estabelecimento da base or-ganizativa das escolas normais primárias e reorganização do seu inspectorado e articulação do ensino primário praticado com os níveis seguintes de es-colaridade, nomeadamente o secundário, e o técnico indus-trial, comercial e agrícola.No domínio do ensino liceal, foi reunida uma comissão de estudo para a criação de resi-dências estudantis de apoio a alunos deslocados. Para Duarte Pacheco, o estudo era a viabili-dade de futuro e era necessário dar um futuro a todos, indepen-dentemente das suas origens. No ensino superior, os decretos de 1923 e 1924122 não produziram nenhum efeito no apoio aos inves-tigadores portugueses123. Duarte Pacheco considerou indispensá-vel a criação de um organismo permanente de supervisão e gestão do serviço das bolsas de estudo atribuídas a professores e alunos, em Portugal e no es-trangeiro, considerando ainda

120 Osmembrosdacomissãocriadaeramosseguintes:AníbalValdezdePassoseSousa,director-geralinterinodoEn-sinoPrimárioNormal;JoséGuilhermePachecodeMiranda,inspector-adjun-todaSanidadeEscolareEducaçãoFí-sica;engenheiroFranciscoMariaHen-riques,professordoInstitutoSuperiorTécnico;BentodeJesusCaraça,pro-fessordoInstitutoSuperiordeComér-cio;AntónioLeitão,directordaEscolaNormalPrimáriadeCoimbra;AlfredodeCarvalho,professordoLiceuJoãodeDeus;AlbanodosSantosRamalho,inspectordoCírculoEscolardeCaste-loBranco;AntónioFigueirinhas,publi-cistaeeditordaEducação Nacional;eMárioAugustoVieira,professoroficialdoEnsinoPrimárioElementar.

Cfr.Diário do Governo,IISérie,n.º166de21deJulhode1928.

121 OhistoriadorJoaquimVeríssimoSer-rãoassinalaestasituaçãodepolarida-de política nos elementos que cons-tituem a comissão encarregada deelaborarparecersobrearealidadeli-ceal.Contudo,tambémnestaprimeiracomissãoexistemnomesdeoposiçãodirectaepúblicaà linhadeactuaçãodaditaduramilitarcomoéocasodeBentodeJesusCaraça.Cfr.SERRÃO,JoaquimVeríssimo,História de Portu-gal (1926-1935), vol.XIII,Lisboa,Edi-torialVerbo,1996,p.s610-611.

122 Refere-seDuartePachecoaosdecre-tos n.º 9332 de 29 de Dezembro de1923en.º10074de6deSetembrode1924.

123 Portariade13deAgostode1928,Di-ário do Governo,IISérien.º167de16deAgostode1928.

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necessidade do mesmo organismo promover e orientar os trabalhos de investigação científica através da possibilidade de criação de cen-tros de estudo, de forma a desenvolver e coordenar a actividade in-telectual e científica portuguesa.Esta era uma realidade que Duarte Pacheco conhecia bem. No pri-meiro dia em que tomara assento na sala do Conselho Escolar do IST e exercera o direito do uso da palavra, afirmara a necessidade de incentivo e apoio à investigação e melhor qualificação da classe docente e dos alunos recém-formados do instituto124. Em 1927, por intervenção política directa de Duarte Pacheco, o IST obtivera do Governo uma verba considerável para atribuição de bolsas de estu-do125. Contudo, porque a lei vigente não pressupunha a existência de um organismo regulador, gestor e tutelar no domínio da formação e investigação científica, a aplicação prática das bolsas tornava-se di-fícil e morosa. Como professor e director do IST, Duarte Pacheco tinha experimentado as falhas do sistema. Como membro da equi-pa governativa e no uso do poder legislativo do cargo que agora de-sempenhava, decidiu nomear uma comissão cujo objectivo era o de apresentar, no mais curto espa-ço de tempo, um plano de orga-nização do necessário organis-mo tutelar de atribuição, regu-lamentação e gestão de bolsas e projectos de investigação.

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124 IST, Núcleo de Arquivo, Correspon-dênciaRecebidaeActasdoConselhoEscolarActa daSessãodoConselhoEscolarde6deNovembrode1926.

125 Diário do Governo, decreto-lein.º 13717de2deJunhode1927.

Duarte Pacheco e a Comissão encarregada de elaborar parecer sobre a realidade escolar numa visita a uma escola da rede pública[c.1928];autordesconhecidoMuseu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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ICA” 98 Mas no domínio da Instrução, a actuação política deste jovem mi-

nistro foi mais longe: com a redacção da Portaria de 13 de Agosto de 1928126, Duarte Pacheco determinou a necessidade de intervenção ao nível do ensino liceal. A 11 de Setembro de 1928, criava aquela que ficou conhecida pela designação de Junta dos 40 Mil, embora o decre-to a denominasse de Junta Administrativa do Empréstimo para o Ensino Secundário127. A este programa de acção, o ministro aplicava o mesmo método de viabilidade que aplicara um ano antes no projecto das novas instalações do IST: o recurso ao crédito. À Junta assim criada competiria a administração dos 40 000 000$00 a contrair com a Cai-xa Geral de Depósitos e visando objectivos a cumprir a curto prazo. A Junta dos 40 Mil, criada com o objectivo de planificar as obras dos liceus teria de proceder a um exame das condições materiais de modo a dar balanço às suas necessidades. E para a eficaz elaboração desse exame, o ministro nomeara um representante do Conselho de Inspecção do Ensino Secundário, um engenheiro, um arquitecto, um médico e um representante da Contabilidade Pública128.Nos sete meses de desempenho das funções ministeriais que lhe foram atribuídas, Duarte Pacheco demonstrou saber dar resposta às directri-zes traçadas pelo chefe de Governo para a pasta da Instrução. Contudo, na reforma ministerial de Novembro de 1928 o nome de Duarte Pacheco não consta na formação da nova equipa governativa. Cumprindo as di-rectivas respeitantes ao ensino primário e técnico, Duarte Pacheco igno-rou as directivas do programa do Governo e foi mais longe, reformulou e pensou o ensino como um todo: do primário ao superior. Defenden-do o conceito de “zona pedagógica”, acreditou na criação de uma nova orgânica nas escolas, uma orgânica onde todos os recursos, humanos, administrativos, pedagógicos, didácticos, de conteúdos programáticos e materiais, respeitassem uma mesma unidade e assim actuassem de forma coordenada e eficiente. Em escassos meses e simultaneamente, Duarte Pacheco cumprira e distanciara-se do programa apresentado por Vicente de Freitas em Abril de 1928:

“A [instrução] secundária e a superior não será preciso desenvolvê-las com tanta intensidade e serão pagas por aqueles que as quiserem receber”.129

Duarte Pacheco não alterou regimes de propinas no ensino liceal nem no ensino superior, mas ao decretar a necessidade de existência de residências es-tudantis para alunos dos dois

126 Portariade13deAgostode1928,Di-ário do Governo,IISérien.º187de16deAgostode1928.

127 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 15942,ISérie,de11deSetembrode1928.

Leia-se MONIZ, Gonçalo Canto, Op. Cit.,pp.135-138.

128 O representante do Conselho de Ins-pecção do Ensino Secundário e presi-dentedaJuntaseriaEusébioTagma-nini,oengenheironomeadoseriaFran-cisco Maria Henriques, professor doIST,oarquitectonomeadoseriaLeonelGaia,omédicooDr.FranciscoGentileorepresentantedaContabilidadePúbli-caseriaAbelMariaDiasdaSilva.

129 DeclaraçõesdeVicentedeFreitasementrevistaaoDiário de Notícias,19deAbrilde1928,p.4.

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Os Presidentes da República e do Conselho com o Engenheiro Duarte Pacheco, após o compromisso de honra por ter assumido o cargo de ministro das Obras Públicas25deMaiode1938,autordesconhecidoArquivo Nacional Torre do Tombo/Fundo Empresa Pública Jornal O Século

níveis de instrução, abriu caminho a uma nova linha de actuação po-lítica: a assistência social no ensino. E quando o ministro decretou a criação da Junta dos 40 Mil, reconhecia oficialmente a necessidade de renovação material do ensino secundário. Ou seja, o ministro re-conhecia ao ensino secundário e ao superior tanta “intensidade de desenvolvimento” quanto ao ensino primário oficial ou particular.Contas feitas, de todos os níveis de ensino em que o jovem ministro actuou politicamente, o menos tocado foi o ensino técnico: uma das bandeiras de salvação erguidas no discursos político de Vicente de Freitas que defendia a intensificação do ensino técnico agrícola130. Talvez seja este facto que justifica a saída prematura de Duarte Pa-checo do Governo.Duarte Pacheco regressou assim em Novembro de 1928 à direcção do Técnico. No Ministério da Instrução Pública seria substituído por Gustavo Cordeiro Ramos. Até 1936, o Ministério percorreria um gradual mas firme trajecto de decomposição do sistema de ensino republicano que Duarte Pacheco consolidara até se transformar no sistema educativo do Estado Novo. Republicano convicto, Duarte Pacheco defendera o ensino e incentivara hábitos de leitura pois acreditava que ler constituía um elemento de principal importância para o desenvolvimento de cidadãos plenos; para o projecto edu-cativo nacional de Carneiro Pacheco, as primeiras letras bastariam para que a nação apreendesse a lição de Salazar. 130 Vide Supranota18.

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A acção de Duarte Pacheco, quer como presidente da Câmara quer como ministro das Obras Públicas, provocou grandes alterações na ci-dade de Lisboa. A criação da Lei dos Planos Gerais de Urbanização132, a qual vinculava as Câmaras ao estudo da sua topografi a e a um con-sequente plano de urbanização, veio reforçar a ideia de que a cidade deve ser pensada como um todo, sujeito a um plano que abarque toda a sua área. Os planos locais de urbanização, as pequenas obras, as in-tervenções particulares deveriam estar sujeitas a um desígnio maior, a própria organização da cidade. A sua acção obedeceu a um plano de urbanização, só concretizado depois da sua morte, que acabaria por promover novos eixos de desenvolvimento da cidade.A sua primeira intervenção no tecido urbano, a construção do Ins-tituto Superior Técnico133, foi o laboratório onde Duarte Pacheco testou a sua visão do que deveria ser a organização do território, primeiro em Lisboa e depois alargada a todo o País. Para esta zona da cidade tinha a Câmara Municipal de Lisboa planeado um con-junto de novos arruamentos134, para expansão da urbe, em terrenos até então ocupados pelo que restava de antigas propriedades agríco-las de séculos passados, pelo que o Arquitecto teve de desenhar o seu projecto incluindo esse plano pré-existente. De entre os arruamentos então projectados, previa-se a abertura de uma larguíssima alameda a qual acabaria por infl uenciar o projecto de Pardal Monteiro que, na sua direcção, fez edifi -car a principal fachada do Ins-tituto. A Alameda, que em 1932 receberia o nome do monarca fundador de Portugal, realizou-se entre 1936 e 1946, década que assistiu também à construção dos conjuntos habitacionais que formam o chamado Bairro dos Actores135. Nesse ano de 1932 um artigo de jornal anunciava o pro-jecto da alameda dizendo: “Fo-ram aproveitadas as magnífi cas condições topográfi cas dos terre-nos a cortar pela nova alameda, em forma de bacia, o que permi-tirá de qualquer local ver toda a alameda. Esta alameda vai dar um grande realce ao conjunto de avenidas a construir ali e que-brará a monotonia das grandes rectas (…)”136. No topo norte da

DUARTE PACHECO E LISBOA: AS MUDANÇAS NA CIDADE

131 Gabinete de Estudos Olisiponenses,CâmaraMunicipaldeLisboa.

132 Decreto-lei24802de21deDezem-brode1934

133 O Instituto funcionava até então eminstalações na Rua da Boavista, asquais se mostravam reconhecida-menteinsuficientesparaonúmerodealunoseparaaqualidadedeensinoquesepretendiaparaainstituição.

134 Terá sido o projecto aprovado emSessãode7deAbrilde1928,poisnaSessão de 23 de Março de 1932 naqualéaprovadootopónimoAlamedaD.AfonsoHenriqueseoutrostopóni-mosparaamesmazona,faz-serefe-rênciaaesseprojecto.Veja-seActasdasSessõesdaCâmaraMunicipaldeLisboa.Anos1928e1932.Lisboa:Im-prensa Democrática,1886-1982.

135 Este Bairro dos Actores edificadosegundoumprojectode1939,englo-bou edificado anterior que formavaoBairrodosAliados(dosanos20)eestendeu-se por terrenos da QuintadaSaúdeedaHortadaCera.

136 A grande alameda da Lisboa. InDiá-rio de Notícias,Lisboa (04/04/1932).Consultadoem:D. Afonso Henriques, Alameda – Ficheiro Toponímico Luís Pastor de Macedo.GabinetedeEstu-dosOlisiponenses

Ana Homem de Melo131

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Planta da cidade de Lisboa com indicação das obras realizadas pelo Engenheiro Duarte Pacheco e principais artérias do plano de urbanização da cidade.[194?]RevistaMunicipal:númeroespecialdedicadoàmemóriadoEngenheiroDuartePacheco.Lisboa:CâmaraMunicipaldeLisboa,Jan.1944.Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação

1 – Instituto Superior Técnico2 – Abastecimento de Água a Lisboa3 – Instituto Nacional de Estatística4 – Bairros de casas económicas5 – Emissora Nacional6 – Estação marítima de Alcântara7 – Casa da Moeda8 – Estrada marginal Lisboa-Cascais9 – Acesso ao estádio Nacional10 – Ponte sobre o vale de Alcântara11 – Estádio Nacional12 – Castelo de S. Jorge13 – Teatro de S. Carlos

14 – Comemorações Centenárias15 – Palácio da Assembleia Nacional16 – Estação Fluvial de Belém17 – Obras novas da Praça do Império18 – Museu Nacional de Arte Antiga19 – Novas artérias do plano de urbanização20 – Parque florestal de Monsanto21 – Aeroporto de Lisboa22 – Novas edificações23 – Mercado de Arroios24 – Museu da Cidade25 – Exposições Nacionais de Floricultura26 – Parques infantis

27 – Jardins públicos28 – Nova fábrica de gás da Matinha29 – Bairro da Quinta da Calçada30 – Alameda D. Afonso Henriques31 – Centrais Telegráfica, Telefónica e Circunscrição Técnica de Lisboa32 – Edifícios Universitários33 – Praça do Areeiro34 – Bloco de construções para a Rua Eiffel35 – Parque Florestal de Monsanto36 – Novo cemitério de Monsanto

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Alameda foi projectada uma monumental fonte luminosa celebrando a chegada das águas do canal do Tejo à cidade, através de obras de melhoramento do canal do Alviela, iniciativa de Duarte Pacheco. A Fonte remataria a nova alameda contrapondo-se ao modernista Insti-tuto o qual poderia ser apreciado a partir dos terraços expressamente construídos para tal. Projectada em 1939 pelos arquitectos Rebelo de Andrade e com a valiosa participação dos escultores Diogo de Macedo e Maximiano Alves137 e do pintor Jorge Barradas, a fonte foi edifi cada em terrenos da Quinta do Alperche e viria a ser inaugurada em Maio de 1948 por ocasião da I Exposição de Obras Públicas, organizada pelo Ministério das Obras Públicas e patente no Instituto Superior Técnico.Ainda junto ao Técnico foram construídos de raiz dois edifícios para albergar serviços do Estado: o Instituto Nacional de Estatística e a Casa da Moeda. O primeiro foi projectado em 1931 por Pardal Mon-teiro, começado a edifi car em 1932 em terrenos que pertenciam ao vizinho Instituto Técnico e inaugurado em 1935, ano em que o actual Instituto de Estatística foi criado. Situado num gaveto, escolheu o ar-quitecto o lado poente (central) para principal fachada e chamou a colaborar Leopoldo de Almeida para a sua decoração exterior. Com projecto do arquitecto Jorge Segurado, de 1934, inaugurou-se em 1941 a nova sede da Casa da Moeda, até então a funcionar num palacete na Rua de São Paulo. Ocupando todo um quarteirão, é formado por um corpo destinado à administração e os restantes às ofi cinas, de aspecto exterior propositadamente racional, sem embelezamentos desnecessários num edifício que se pretendia fabril138.Mas para além da criação das novas instalações do “seu” Ins-tituto, Duarte Pacheco viria a provocar alterações em quase toda a cidade de Lisboa. No arranque da década de 1930,

137 Estes mesmos arquitectos e Maxi-mianoAlvesforamosautoresdoar-ranjoestéticodoSifãodoAlviela.

138 Veja-se TOSTÕES, Ana – Casa daMoedaeValoresSelados.[Emlinha][Cônsul.2001-04-04].Disponívelemhttp://www.igespar.pt/pt/patrimonio/pesquisa/geral/patrimoniomovel/de-tail/330093/

Fonte Monumental Luminosa[post.1948],autordesconhecidoCâmaraMunicipaldeLisboa/GabinetedeEstudosOlisiponenses

Perspectiva da Alameda D. Afonso Henriques tirada do topo da Fonte Luminosa com o IST como pano de fundo[post.1948],autordesconhecidoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

DE ENTRE OS ARRUAMENTOS ENTAO PROJECTADOS,PREVIA-SE A ABERTURA DE UMA LARGUISSIMAALAMEDA A QUAL ACABARIA POR INFLUENCIAR O PROJECTO DE PARDAL MONTEIRO QUE, NA SUA DIRECCAO, FEZ EDIFICAR A PRINCIPAL FACHADA DO INSTITUTO

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DE ENTRE OS ARRUAMENTOS ENTAO PROJECTADOS,PREVIA-SE A ABERTURA DE UMA LARGUISSIMAALAMEDA A QUAL ACABARIA POR INFLUENCIAR O PROJECTO DE PARDAL MONTEIRO QUE, NA SUA DIRECCAO, FEZ EDIFICAR A PRINCIPAL FACHADA DO INSTITUTO

DE ENTRE OS ARRUAMENTOS ENTAO PROJECTADOS~

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Vista frontal do Instituto Nacional de Estatística1932,Lisboa,autordesconhecidoCâmaraMunicipaldeLisboa/GabinetedeEstudosOlisiponenses

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Casa da Moeda1940,Alvão,PortoCâmaraMunicipaldeLisboa/GabinetedeEstudosOlisiponenses

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ICA” Lisboa persistia em manter-se nas orientações expansionistas ainda

provenientes do final do século XIX, ao longo dos eixos criados pela Avenida da Liberdade (1886) e Avenidas Novas (1904) rumo a norte até ao Campo Grande, de grandes quarteirões e arquitectura cuida-da, e do eixo a oriente, formado pela Avenida Almirante Reis, onde a iniciativa particular fizera construir bairros mais económicos de prédios de rendimento. Em 1938, quando foi dado a conhecer o rela-tório elaborado por António Emídio Abrantes, Elementos para o estudo do plano de urbanização da cidade de Lisboa139, afirmava este engenheiro da Direcção dos Serviços de Urbanização e Obras: “A tendência natural do desenvolvimento da capital tem sido feita no sentido norte e não ao longo do Tejo e para a zona ocidental, como tudo indicava. As causas determinantes dessa tendência são as facili-dades de transporte para a zona norte da cidade e a existência ali de materiais e terrenos apropriados para construções, servidos por redes de canalizações. (…) Atribui-se o pouco desenvolvimento da capital para a sua parte ocidental, exactamente a mais bela, a mais higiénica, aquela de onde se desfrutam melhores perspectivas e mais deslumbrantes panoramas (em contraste com a aridez e monotonia da parte norte), à existência do vale de Alcântara, com as suas encostas muito declivosas, que dificultam a expansão urbana para esta zona, onde só se tem construído junto à mar-gem do Tejo”. 140

Sobre a qualidade da habitação o autor apresentava um quadro de-solador afirmando que ela era no geral deficiente pela falta de redes de esgoto e de abastecimento de água. Chamava a atenção para o problema dos bairros de barracas que alojavam então 41 796 habi-tantes; para o facto de, excep-tuando os operários que habi-tavam os poucos bairros particu-lares e do Estado141 construídos para essa classe, as casas operá-rias serem insalubres. Relata que a classe média habitava em casas de renda antiga mas muito pou-co higiénicas ou então em casas de renda elevada o que obrigava à partilha dessa casa por mais do que uma família. Quanto à classe que designava por abastada ou burguesa afirmava que optavam muitas vezes por porem a render as propriedades que possuíam, residindo antes em casas de pio-res condições. Na sua apreciação sobre o estado da habitação An-

139 A intenção de fazer um relatório demelhoramentosarealizaremLisboa,fora já apresentado por este enge-nheiro, em 1932, numa conferênciade imprensa. (V. Costa; Sandra Vaz– O País a régua e esquadro: urba-nismo, arquitectura e memória na obra pública de Duarte Pacheco.Dis-sertaçãoparaaobtençãodograudeDoutoremHistória,naespecialidadedeArte,PatrimónioeRestauro.Uni-versidade de Lisboa, Faculdade deLetras,2009,p.287eseguintes).

140 LISBOA.CâmaraMunicipal.DirecçãodosServiçosdeUrbanizaçãoeObras- Elementos para o estudo do plano de urbanização da cidade de Lisboa[dactilografado] / Câmara Municipalde Lisboa, Direcção dos Serviços deUrbanização e Obras, elaborado porAntónioEmídioAbrantes.Lisboa,Câ-maraMunicipal,1938,pp.21-22.

141 “(…)ultimamenteedificados,noArcodoCego,AltodaAjuda,TerrasdoFornoeAltodaSerafina.”Op. Cit.,p.35.

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tónio Abrantes concluiu afirmando que era para as classes pobres que faz mais falta a construção de habitação. Na Lisboa de então, ao núcleo histórico da Baixa/Chiado/Castelo densamente urbanizado e povoado, contrapunham-se junto dos limites do concelho, pequenos núcleos povoados e extensas áreas de cultivo. As zonas industrializadas (a ocidente, Alcântara e Be-lém e a oriente, Beato, Xabregas e Marvila) de forte ligação ao Tejo para a chegada de matérias e saída de produtos, atraíam numerosa população que se alojava em condições precárias de habitabilida-de. A importância do Porto de Lisboa fora já alvo da atenção do Estado que, em 1930, iniciara obras de ampliação do mesmo, dado o volume de transporte de passageiros e de mercadorias que ele atingia. O mesmo se passava com as restantes “ligações com o ex-terior” como as designou António Abrantes: a ligação entre o ca-minho de ferro e uma gare marítima; a criação de novas gares ma-rítimas de passageiros e cargas; o projecto de construção de uma auto-estrada Lisboa-Cascais e da estrada Marginal; a construção do Aeroporto da Portela para substituir o aeródromo da Granja do Marquês, em Sintra. No campo da Educação, António Abrantes depois de elencar as escolas primárias, as profissionais e as de ensino médio referia-se ao campus universitário projectado para os terrenos junto da actual Avenida das Forças Armadas onde seriam concentradas algumas das Faculdades dispersas pela cidade em edifícios impróprios para tal função142.A partir do início da década de 1930, com a consolidação do Estado Novo, criaram-se as condições político-económicas para uma nova fase de desenvol-vimento de Lisboa, procurando

142 NaCidadeUniversitáriaficariamreu-nidasasFaculdadesdeLetras(entãona Rua do Arco a Jesus), de Direito(noCampodosMártiresdaPátria),adeFarmácia (naQuintadaTorrinha)eoHospitalEscolar(FuturoHospitaldeSantaMaria).

Estrada Marginal Lisboa-Cascais1940,Alvão,PortoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

O Chefe de Estado e o Ministro das Obras Públicas no Aeroporto de Lisboa. [c.1940],autordesconhecidoArquivo Nacional Torre do Tombo/Fundo Empresa Pública, jornal O Século

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Bairro de Belém 1940,Alvão,PortoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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ICA” dar resposta ao constante crescimento demográfico143 e às conse-

quentes necessidades habitacionais, viárias e de equipamentos. A existência de condições degradantes de habitação operária em Lis-boa foi mal que acompanhou desde cedo a formação de uma tímida industrialização da cidade. Apesar de inúmeras vezes debatido pela Câmara, e demais entidades competentes, o meio para urbanizar al-guns terrenos perto das zonas operárias, nunca foi levado avante tal projecto. Os bairros que foram nascendo destinados a alojamento da população operária, com preocupações sanitárias, eram de iniciativa particular. Foi necessário esperar pela I República para que a questão fosse mais eficazmente debatida e para que começassem a surgir no-vos projectos de iniciativa pública destinados a alojar uma crescente população operária e de pequena e média burguesia. Em 1919 o Go-verno legislou a favor da criação de bairros residenciais económicos (decreto de 14 de Abril de 1919), dos quais o primeiro a arrancar foi o do Arco do Cego (1919) e o segundo o da Ajuda (1920) mas que em 1927 ainda não tinham sido concluídos. Seriam inaugurados em 1935 e 1934 respectivamente.A partir da década de 1930, a questão ganha novo alento com a promul-gação dos Planos Gerais de Urbanização (1934) os quais delegavam nas Câmaras o papel de agentes urbanizadores dos seus concelhos, vindo permitir a execução de obras de melhoramento de habitação social. Por outro lado, a Lei das Expropriações e um novo regime de financiamen-to da construção, com o apoio do Fundo do Desemprego e da previ-dência social permitiram um ritmo constante na edificação de bairros sociais para alojamento de diferentes tipos de população.Assim, para as famílias que viviam em barracas, e atendendo à urgência em extingui-las, projectaram-se os Bairros de Casas Desmontáveis144. Estes bairros dariam uma resposta imediata às necessidades básicas destes agrupamentos familiares pois estava incluída a mudança para ca-sas já mobiladas, com rendas de valor entre 60 e 90 escudos, consoante o número de divisões (de 3 a 6), e o pagamento de água e luz. Para além de uma nova casa, as famílias recebiam o apoio da assistência social que funcionaria em instalações construídas dentro do próprio bairro, onde existiam também vários equipamentos (creches, cantinas escola-res, mercado, igreja, campos de jogos, etc.). Entendia-se que as famílias alojadas nestes bairros seriam “reeducadas” de modo a permitir a aquisição de novas aptidões sócio-laborais, o que as levaria a um novo patamar social e à mudança para casas permanentes. Em 1948, consi-derava-se este projecto um êxi-to145, afirmando-se que bastava

143 Em1900,Lisboatinha352210habi-tantes; em 1911, 431 738; em 1920,484664;em1930,591939;em1940,694389habitantes.InFERREIRA;Ví-torMatias,A Cidade de Lisboa: de ca-pital do império a centro da metrópole.Lisboa,DomQuixote,1987,p.91.

144 Enquanto os outros tipos de BairrosSociaisseestenderamatodooPaís,estatipologiaapenasfoiutilizadaemLisboa.

145 Seguimos aqui Lisboa. Câmara Mu-nicipal – Le problème de logement. Lisboa,CâmaraMunicipal,1948.

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Bairro da Quinta da Calçada1940,Alvão,PortoCâmaraMunicipaldeLisboa/GabinetedeEstudosOlisiponenses

Bairro do Alto de Serafina 1940,Alvão,PortoCâmaraMunicipaldeLisboa/GabinetedeEstudosOlisiponenses

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um máximo de 4 anos para que as famílias pudessem transitar para o nível seguinte de habitação. Até então tinham sido construídos três destes bairros de casas desmontáveis, o que era considerado o sufi-ciente para as necessidades. Eram eles o Bairro da Quinta da Calça-da, da Quinta das Furnas e o da Boavista. Para além desta construção provisória, quer a Câmara Municipal quer o Estado investiram noutras tipologias destinadas a classes sociais me-nos desfavorecidas, mas que tinham de ser realojadas devido às novas obras em curso na cidade. Os bairros de renda popular destinavam-se a um segmento de população que possuía rendimentos mensais entre 1 000$ e 3 000$ escudos, provenientes do seu trabalho e que formavam famílias legalmente constituídas. Muitos deles serviriam para realoja-mento de população que veria as suas casas demolidas ao abrigo das transformações que se iam operando em Lisboa. A mudança era feita a expensas da Câmara Municipal e as rendas eram estabelecidas em fun-ção dos rendimentos familiares. Predominantemente destinados ao operariado, é exemplo deste tipo o bairro da Quinta do Jacinto, edifica-do em terrenos onde existira a quinta de Jacinto Gonçalves146 e de que era proprietária a sua viúva. Localizado entre a Calçada da Tapada e o Estádio da Tapadinha, o seu pro-jecto é de 1937 e a sua construção desenvolveu-se até 1958, pelo que abarca várias tipologias, desde as pequenas moradias geminadas, unifamiliares até aos prédios co-lectivos plurifamiliares. Foi uma das primeiras iniciativas camará-rias para a habitação operária. Os Bairros de Casas Económicas, que foram construídos em maior número do que as restantes tipo-logias, serviram para alojamento de famílias de melhores rendimen-tos e que adquiriam o estatuto de

146 JacintoGonçalves(n.1853,PóvoadaGalega–m.1920,Lisboa)veiomui-to novo para Lisboa trabalhar comomarçano, passando rapidamente amerceeiro.Vendidaaloja,investiunoramodetransportesdecarga(1878)edepassageiros(1886).Assuasco-cheiras localizavam-se de início notopodaactualRuaFelicianodeSou-sa, passando depois para a Calçadada Tapada onde, após desactivar asua empresa, se dedicou à agricul-tura. Veja-se: CALIXTO, Vasco, “OsvelhoscarrosdoJacinto”,inDiário de Notícias, Lisboa (25-02-1960). (Con-sultadoemBibliografia Olisiponense:recortesdejornais/PastordeMace-do;vol.4,p.45.GabinetedeEstudosOlisiponenses).

Bairro de Campolide 1940,Alvão,PortoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

Escola Primária do Bairro de Campolide1940,Alvão,PortoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

Diferentes tipologias de escolas primárias da Vila de Tábua[s.d.],fotosearranjodeMáriodeAlmeida,OvarCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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locatários adquirentes o que permitia, como o nome indica, a aquisição da propriedade ao fim de um período longo de tempo. Estes bairros eram compostos por moradias unifamiliares (geminadas ou não) rodeadas por terreno destinado a horta ou/e jardim. Distribuíam-se por 9 tipos dife-rentes, consoante o número de divisões, e destinavam-se a agregados fa-miliares mais ou menos numerosos. Também a renda variava conforme o agregado e os seus rendimentos, e foram financiados por várias institui-ções. Desta última tipologia são exemplos os Bairros da Encosta da Ajuda, da Madre de Deus e da Encarnação.Além da questão da habitação, Duarte Pacheco dedicou grande par-te da sua actividade à renovação da rede viária de Lisboa. Dentro do perímetro urbano, reorganizou a circulação na Avenida Almirante Reis (1938-1939), retirando a placa central que até então existia, per-mitindo o alargamento das faixas de rodagem. No Largo do Rato, en-tão chamada Praça do Brasil, realizaram-se obras de melhoramento (1939), demolindo algumas das antigas casas para dar mais espaço para a circulação. O prolongamento da Avenida Almirante Reis147, rasgada para norte, permitindo o acesso ao aeroporto, foi outro dos projectos realizados durante a sua gestão (1939). Fora do perímetro da cidade, lançaram-se novos eixos de saída. A Marginal, aberta junto ao Tejo, para ligação à Costa do Sol, também ela objecto de um plano de urbanização específico, tinha o duplo objectivo de ligação a Cascais, e o de percurso turístico, explorando a beleza da paisagem e das localidades que atravessava. A sua cons-trução, limitada pela existência da linha férrea, de património cons-truído, das zonas balneares, colocou entraves a uma traçado rectilí-neo, optando-se antes pelo acompanhamento marginal e curvilíneo do curso de água. A construção da auto-estrada Lisboa-Cascais, primeira no género em Portugal, arrancou em 1940, foi inaugurada em 1944, mas só viria a ser terminada, em toda a sua extensão, em 1991. Até este ano, apenas atingia o Estádio Nacional, no vale do Jamor. O principal obstáculo à construção de uma ligação entre

147 A Avenida viria a ser designada porAvenida do Aeroporto e, a partir de1960, recebeuonomedeAlmiranteGagoCoutinho.

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Lisboa e a sua zona ocidental, era, segundo o parecer de António Abrantes, o vale de Alcântara. Tal obstáculo foi ultrapassado com a construção do Viaduto, projecto do engenheiro Barbosa Carmona e edificado pela Junta Autónoma das Estradas, considerado uma das maiores obras de engenharia de então, com o comprimento de 358 m, 24 m de largura e no tramo central com um vão de 91 m por 36 de altura. Inaugurado em 1944 recebeu o nome do seu mentor numa das cerimónias de homenagem prestadas em Lisboa. Ainda na área dos transportes, novos projectos foram apresentados. Para norte, Duarte Pacheco apostou na criação de uma outra auto-estrada com saída entre os recém-criados Bairro da Encarnação e Aeroporto da Portela, iniciada em 1940, mas que não ultrapassou a saída da Encarnação. As obras só viriam a ser retomadas em 1963. Desde 1919 que os aviões aterravam num denominado Campo In-ternacional de Aterragem, em Alverca, ou no Aeródromo da Quinta da Granja, em Sintra. Os voos transatlânticos eram realizados em hi-droaviões, e os passageiros só viajavam em aviões em voos continen-tais, pelo que sendo Lisboa a cidade mais ocidental da Europa era um nó fundamental na jovem aeronáutica. Em 1928 foi apresentado um projecto para a construção de um aeroporto na Portela, projecto esse que não se realizou. Porém, quando na década de 1930 se determi-nou a construção de um aeroporto manteve-se a escolha do planalto en-tre a Charneca e a Portela de Sacavém, zona agrícola, criando-se um novo projecto, da autoria do arquitecto Francisco Keil do Amaral (edifícios e espaços exteriores) e engenheiros Santos Silva e Lopes Monteiro (pistas). Iniciaram-se as obras em 1938 neste local e em

Panorama do Viaduto Duarte Pacheco [1940],autordesconhecidoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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CONSIDERADO UMA DAS MAIORES OBRAS DE ENGENHARIA DE ENTAO FOI INAUGURADO EM 1944 RECEBEU O NOME DO SEU MENTOR NUMA DAS CERIMONIAS DE HOMENAGEM PRESTADAS EM LISBOA

CONSIDERADO UMA DAS MAIORES OBRAS DE ENGENHARIA DE ENTAO FOI INAUGURADO EM 1944 RECEBEU O NOME DO SEU MENTOR NUMA DAS CERIMONIAS DE HOMENAGEM PRESTADAS EM LISBOAPRESTADAS EM LISBOA

DE ENGENHARIA DE ENTAO FOI INAUGURADO ~

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CONSIDERADO UMA DAS MAIORES OBRAS DE ENGENHARIA DE ENTAO FOI INAUGURADO CONSIDERADO UMA DAS MAIORES OBRAS DE ENGENHARIA DE ENTAO FOI INAUGURADO DE ENGENHARIA DE ENTAO FOI INAUGURADO ~DE ENGENHARIA DE ENTAO FOI INAUGURADO EM 1944 RECEBEU O NOME DO SEU MENTOR NUMA DAS CERIMONIAS DE HOMENAGEM EM 1944 RECEBEU O NOME DO SEU MENTOR NUMA DAS CERIMONIAS DE HOMENAGEM NUMA DAS CERIMONIAS DE HOMENAGEM ´NUMA DAS CERIMONIAS DE HOMENAGEM

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ICA” Cabo Ruivo onde funcionaria até 1950 o local de amaragem dos

hidroaviões. O objectivo era que os dois aeroportos ficassem ligados entre si por uma larga avenida designada Avenida Entre Aeroportos (actual Avenida de Berlim) por onde os passageiros eram levados de carro entre os dois aeroportos. As estruturas ligadas à navegação marítima foram melhoradas com a construção das Gares Marítimas da Rocha do Conde de Óbidos, projectada por Pardal Monteiro148 em 1934 e construída entre 1945-48, e a de Alcântara, do mesmo autor e inaugurada em 1943. Ambas com estrutura em betão armado e de linhas modernistas, tinham à altura do primeiro andar a área reservada aos passageiros e no piso inferior os serviços para carga e uma forte presença da arte moder-nista nos murais da autoria de Almada Negreiros. O embarque/de-sembarque dos passageiros seria feito directamente através de uma ponte móvel entre a galeria exterior do primeiro andar e o barco. O projecto inicial previa que as duas gares estariam ligadas entre si por uma extensão da referida galeria com o comprimento de um quiló-metro, nunca realizada.Já em 1940, por ocasião da Exposição do Mundo Português, fora inaugurada a Estação Fluvial de Belém, projecto do arquitecto F. Ca-etano de Carvalho, para facilitar o transporte de passageiros entre as duas margens do Tejo.A Exposição do Mundo Português provocou, aliás, uma das maio-res transformações num espaço urbano lisboeta. Em 1938, a 27 de Março, era anunciada publicamente, através de uma nota oficiosa da Presidência do Conselho de Ministros, a iniciativa das Comemo-rações Centenárias, as quais celebrariam em 1940 o 8.º centenário da Fundação de Portugal e o 3.º centenário da Restauração da In-dependência. Para essa dupla comemoração, foi apresentado um vastíssimo programa, que incluía um conjunto de obras de constru-ção e melhoramento de infra-estruturas (estações ferroviárias, rede viária, hotéis e pousadas, aeródromo), a realização de congressos internacionais, cortejos e festas e a edição de livros, mas cujo ponto alto era a realização de uma Exposição Histórica do Mundo Portu-guês na cidade de Lisboa. Para a capital previa-se ainda a conclusão de várias obras como a Casa da Moeda, o corpo anexo ao Museu de Arte Antiga149, das obras do Pa-lácio de São Bento, o restauro do Teatro de São Carlos a cons-trução da auto-estrada Lisboa-Cascais e da estrada Marginal, do Estádio Nacional150, o arran-que dos Hospitais Escolares, o desenvolvimento do Parque Florestal de Monsanto e da ha-bitação social.

148 Para toda a equipa de arquitectos eengenheiros que participaram nosprojectos, veja-se COSTA, SandraVaz,Op. Cit., p.320.

149 ProjectodoarquitectoGuilhermeRe-belodeAndrade,iniciadoem1930einauguradoem1940comumaexpo-siçãodedicadaaosPrimitivosPortu-gueses.

150 Projectode1939daautoriadoarqui-tectoMiguelJacobettyRosa,inaugu-radoem1944.

Estação Fluvial de Belém1940,Alvão,Porto

Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

Hospital Escolar de Santa Maria, fachada principal

[post.1953],Alvão,PortoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete

de Estudos Olisiponenses

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ICA” Para a execução das comemorações foi criada a Comissão Nacional

dos Centenários com várias secções151 dirigida por Augusto de Castro, que tomou posse em Dezembro de 1938 e da qual fazia parte Duar-te Pacheco como presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Neste cargo, o engenheiro insistiu especialmente em três das iniciativas camarárias necessárias à execução do programa das celebrações, nomeadamente a saída da fábrica do gás dos terrenos da Torre de Belém152, para as instalações da Quinta da Matinha; as ligações da cidade à nova auto-estrada Lisboa-Cascais; e o avanço da arboriza-ção do Parque Florestal de Monsanto de modo a criar um verdejante pano de fundo quer a Belém, quer à própria auto-estrada. A passa-gem, em Maio de 1938, de Duarte Pacheco da Câmara de Lisboa para Ministro das Obras Públicas, sendo substituído na autarquia por um homem da sua confiança, Eduardo Rodrigues de Carvalho, veio per-mitir acelerar o programa de execução das obras para a Exposição, cuja abertura estava prevista para Maio de 1940153. Para a Exposição do Mundo Português pensou-se desde o início na zona de Belém, antigo embarcadouro das caravelas que tinham construído o Império Português que se pretendia exaltar. A área estendia-se desde o Tejo, a sul, até ao mosteiro e à Rua Bartolomeu Dias, a norte e desde a Praça Afonso de Albuquerque, a leste, e a doca de Belém, a oeste. As-sim, procedeu-se às inevitáveis expropriações das propriedades que até então existiam em frente do Mosteiro dos Jerónimos de maneira a per-mitir a abertura da Praça do Império. Para as expropriações seguiu-se o modelo utilizado no Parque Florestal de Monsanto, onde se envolveu todos os interessados no proces-so, permitindo um consenso que acelerava o habitualmente moro-so processo de expropriações. Demolido o casario, em 1938, reordenou-se a praça, centro da Exposição, e à qual foi atribuído oficialmente o nome de Praça do Império, em 1948154. Para a monu-mental praça, projecto do arqui-tecto chefe Cottinelli Telmo, pre-tendeu-se criar um amplo espaço de circulação para os visitantes ao mesmo tempo que se reordenava urbanisticamente toda a zona em função desta nova centralidade reforçada por uma fonte lumino-sa traçada pelo arquitecto Antó-nio Lino155.O espaço da Exposição foi pro-longado até ao rio através de

151 Veja-se ACCIAIUOLI, Margarida, Ex-posições do Estado Novo: 1934-1940, Lisboa,LivrosHorizonte,1998,p.113.

152 Afábricalaboravanosterrenosjuntoda Torre de Belém, desde 1887, co-meçou a ser desactivada em 1938,numa tentativa de desimpedir osterrenosedesafogaromonumentoatempodaExposição,masosterrenossóforamentreguesàCMLem1949,passadaaIIGuerraMundialeasca-rênciasdeabastecimento.

153 AExposição,porém,sóseriainaugu-rada em 23 de Junho de 1940. En-cerrariaa2deDezembrodomesmoano,apóstersidovisitadaporcercadetrêsmilhõesdepessoas.

154 AactualPraçadoImpériocorrespondeapartedaantigaPraçadeDomVascodaGamaerecebeuoseunomenoâm-bitodaExposição,deformanãooficial.

155 Paraaquestãodaornamentaçãodafonte,veja-seSEIXAS,MiguelMetelo,TELES,JoãoBernardoGalvão– Pe-regrinações heráldicas olisiponen-ses: a freguesia de Santa Maria de Belém.Lisboa:UniversidadeLusíada,FreguesiadeSantaMariadeBelém,2005,p.215esegs.

Perspectiva da exposição “O Mundo Português” do telhado

do Mosteiro dos Jerónimos com a Nau de Portugal

como pano de fundo1940,autordesconhecido

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Vistas aéreas da Exposição “O Mundo Português”1940,PinheiroCorrêaCâmaraMunicipaldeLisboa/GabinetedeEstudosOlisiponenses

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Exposição “O Mundo Português”1940,Alvão,PortoCâmaraMunicipaldeLisboa/GabinetedeEstudosOlisiponenses

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O Engenheiro Duarte Pacheco a analisar o projecto do Parque Florestal de Monsanto[post.1938],autordesconhecidoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

passagens superiores à linha férrea. Junto ao Tejo construíram-se pavilhões irregulares e outros pontos de interesse, alguns dos quais subsistem até aos nossos dias. O actual Museu de Arte Popular, projecto dos arquitectos António Reis Camelo e João Simões, foi o Pavilhão da Vida Popular; o Espelho de Água, de António Lino, restaurante desde a sua fundação; o Padrão dos Descobrimentos, construído em materiais efémeros, segundo projecto de Cotinelli e do escultor Leopoldo de Almeida, e, em 1960 inaugurado em pedra, com alterações no seu interior, de Pardal Monteiro, e na zona envol-vente com projecto de Cristino da Silva; e o Pavilhão dos Desportos Náuticos, antigo Pavilhão dos Descobrimentos, projecto de Pardal Monteiro, muito alterado, tendo-lhe sido retirada a esfera armilar que o encimava. Terminada a Exposição, saía reforçada a imagem de Belém, e de toda a zona ocidental de Lisboa, como ponto turístico numa antecâmara do que se previa para a sua natural continuação – a Costa do Sol.A zona ocidental de Lisboa mereceu especial atenção de Duarte Pacheco com a realização do Parque Florestal de Monsanto, que já aqui referimos. Lançado em 1934, sendo da responsabilidade da Câmara Municipal de Lisboa e a arborização da responsabilidade do Ministério da Agricultura, o Parque vinha dar solução à já muito antiga e debatida questão de um parque da cidade, questão que se

Acto simbólico da plantação de uma árvore pelo Ministro das Obras Públicas e Comunicações no início da florestação

do Parque do Monsanto[post.1938],autordesconhecido

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Início da plantação do Parque Florestal de Monsanto[post.1938],autordesconhecidoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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Panorama do Parque Florestal de Monsanto[1940],autordesconhecidoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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ICA” 128 arrastava desde os finais do século XIX, sempre pensada como uma

reordenação ou um prolongamento do Parque Eduardo VII. Optan-do por criá-lo de raiz no limite com a Costa do Sol, Duarte Pacheco eliminava muitos dos obstáculos e fazia avançar o projecto. O Par-que Eduardo VII tomava um papel de parque urbano, enquanto que o Parque Florestal de Monsanto ganhava um estatuto de vastíssima área de lazer para toda a capital. Para o projectar foi escolhido o arquitecto Keil do Amaral, que entrara na Câmara um mês depois da nomeação de Duarte Pacheco como presidente. Em simultâneo com o processo de expropriação das terras e a divisão dos 700 hec-tares do Parque em seis zonas156, iniciava-se o projecto da criação de um “bosque natural e selvagem com centros de interesse para todas as classes da capital”157 onde antes estavam terras de semea-dura de cereais e moinhos. Aproveitando estas ruínas de moinhos e a própria topografia do parque, Keil do Amaral criou um circuito si-nuoso, com excelentes pontos de vista, e equipamentos espalhados por toda a área: os miradouros de Montes Claros, dos Moinhos do Mocho e da Luneta dos Quartéis, e o Parque Infantil, o Centro de Té-nis, a Casa de Chá dos Montes Claros158. Exceptuando a auto-estrada, que atravessava o Parque, embora desnivelada, apenas se considerava a criação das estradas essenciais para o acesso ao parque, escolhendo-se investir em caminhos para cavaleiros e peões, que assim podiam usufruir da tranquilidade do local. Abordadas que foram as principais obras de Duarte Pacheco, mi-nistro ou presidente da Câmara, dentro dos limites do concelho de Lisboa, concluímos que Lisboa antes e depois dele (quase) não é a mesma cidade. Nas suas iniciativas, a par das alterações legis-lativas que as permitiram e orientaram, como o reforço do papel da Câmara num plano de urbanização global, podemos encontrar algumas características que viriam a marcar os anos seguintes no desenvolvimento de Lisboa: o predomínio da escolha de zonas li-mítrofes ou ainda muito ruralizadas para as grandes urbanizações sociais; a construção na cidade de infra-estruturas necessárias a uma urbe moderna; a escolha de equipas de arquitectos e en-genheiros das novas gerações; a construção de uma rede viá-ria que permitiu o crescimen-to da cidade e a sua ligação para os concelhos vizinhos; a valorização da zona ocidental enquanto destino de lazer e cultura. Planeando a urbaniza-ção de Lisboa, Duarte Pacheco traçou-lhe o futuro.

156 Paraasfasesdeexpropriaçãoveja-seasupracitadaobradeAnaTostões.

157 AMARAL,FranciscoKeildo,Relatório de Viagem (Agosto 1939). Relatórioapresentado à Câmara Municipal deLisboa, Arquivo da Direcção GeraldosServiçosdeUrbanização.Citadoem TOSTÕES, Ana, Monsanto, Par-que Eduardo VII, Campo Grande. Keil do Amaral, Arquitecto dos Espaços Verdes de Lisboa,Lisboa,EdiçõesSa-lamandra,1992,p.49.

158 Outras construções planeadas nãose chegaram a executar ou foramfeitasmuitomaistarde:umsegundoparqueinfantil,naSerafina,umanfi-teatro,umcentrodedesportoseummemorialaDuartePacheco.

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129/128 NA CIDADE OBRAS PÚBLICAS E COMUNICAÇÕES (1932-1936/1938-1943):O PLANO METÓDICO

A 5 de Julho de 1932 Oliveira Salazar era empossado chefe do Gover-no e, no mesmo dia, Duarte Pacheco tomava posse como ministro do Comércio e Comunicações. Dois dias depois, era publicada no Diário do Governo a nova arrumação dos serviços dos Ministérios do Comércio e Comunicações e da Agricultura159.Numa reestruturação orgânica ministerial, e tendo em vista reunir sob a mesma direcção os principais serviços relativos à produção nacional, Duarte Pacheco passaria a ministro das Obras Públicas e Comu-nicações.O decreto de 7 de Julho de 1932, exarado pela Presidência do Conselho de Ministros, não pretendia efectuar uma mera altera-ção de designação destes dois gabinetes ministeriais. Reconhecia a necessidade funcional de separação orgânica de vários serviços que, havendo nascido em 1852 sob uma mesma origem de âmbito legal e prático, demonstravam há muito a urgência de reconhe-cimento autónomo no domínio técnico e científico, do mesmo modo que demonstravam uma necessidade de execução política distinta.Oitenta anos volvidos, e nas palavras de Duarte Pacheco, estava de-cretado o restabelecimento do:

“antigo Ministério das Obras Públicas, para nele se promover a con-centração de todas as obras de fomento que interessam à melhoria dos serviços do Estado e das condições económicas da Nação, mor-mente aquelas que pela sua importância técnica e valor económico mais convém integrar num plano metódico de realização em todo o País”.160

O antigo Ministério das Obras Públicas ao qual Duarte Pacheco se re-feria era o ministério de Fontes Pereira de Melo. O ministério de poder em que as infra-estruturas, os equipamentos, o património, o saber técnico e o saber científi co convergiam num único objectivo: o desenvolvimento material do País. À data da criação do MOPC, o mercado interno português evidenciava a incapacidade produtiva do País. A caracterização populacional era o espelho da nação: quatro quintos rural161. As condições de vida neste Portugal traduziam-se na crueza dos números revelados pelos in-quéritos e estatísticas da época162: um Portugal 80% analfabeto, com uma taxa de mortalidade infantil a rondar os 150 mortos por mil nascimentos, com pouca margem deixada à indústria e ao comércio.

159 Diário do Governo,Decreto-Lein.º21454de7deJulhode1932.

160 Definição de missão e objectivosdo Ministério das Obras Públicas eComunicações dada por Duarte Pa-checo no preâmbulo do decreto-leique faz transitar do Ministério daMarinhaparaoMOPCoprocessodeconstruçãodaBaseNavaldoAlfeite.Cfr.Diário do Governo,Decreto-Lein.º22055,ISériede31deDezembrode1932.

161 FRANÇA, José-Augusto, Os Anos Vinte em Portugal, Lisboa, EditorialPresença,1992,p.265.

162 AMARAL,Op. Cit., pp.41-59.

Sandra Vaz Costa

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ICA” 130 Num País com uma produção agrícola quase artesanal, o mercado era

muito limitado: faltavam alimentos, matéria-prima e consumidores163. No início do segundo quartel do século XX, Portugal era um País periférico, dependente dos combustíveis sólidos e líquidos vindos do exterior. Cerca de 90% do comércio externo era efectuado por via marítima. E embora crescesse o debate sobre a necessidade de industrialização do País, o Estado optava por dar primazia às vias de comunicação, acreditando que a mobilidade de pessoas e bens bastaria para incrementar o mercado interno. Contudo, o mercado interno vivia maioritariamente de uma produção agrícola pouco de-senvolvida e de uma indústria pouco mais que tradicional.O plano metódico de Duarte Pacheco levaria três meses a ser traça-do. A 30 de Setembro de 1932, o Diário do Governo publicava o pla-no do ministro. Dos catorze organismos que constituíam o MOPC, três desempenhariam um papel crucial na transformação material do País164.À Junta Autónoma de Estradas, organismo a que, desde a sua cria-ção em 1927, competia o serviço de manutenção corrente das vias existentes, bem como os serviços de construção e grande reparação, novas competências seriam atribuídas. Na orgânica do MOPC, as atribuições da JAE não se limitavam ao universo das vias de comuni-cação. Duarte Pacheco atribuía a este organismo o programa de me-lhoramentos rurais. A “obra de melhoramentos rurais” fora decre-tada em 1931165 com o intuito de o Estado dotar as populações rurais de trabalhos públicos locais. Em Setembro de 1932 Duarte Pacheco reconhecia a necessidade de intensificar esses mesmos trabalhos e considerava como melhoramentos rurais:

“ (…) as obras de interesse local e vantagem colectiva a executar fora dos centros urbanos e das sedes dos concelhos, compreendendo a construção ou reparação de estradas municipais, estradas não clas-sificadas, caminhos vicinais, pavimentos, chafarizes, tanques, lava-douros e obras semelhantes”.166

À Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais que, des-de a data de criação em 1929, zelava pela manutenção, conservação e restauro do património arquitectónico e arqueológico classificado, passaria a estar agregado o programa de melhoramentos urbanos:

“São considerados melhora-mentos urbanos as obras de interesse local e vantagem colectiva a executar fora dos grandes centros, compreen-dendo a realização de planos de urbanismo, a construção,

163 ALVES, Carlos Garcia, “A indústrianacional” inHistória de Portugal,dir.JoséMattoso,Lisboa,CírculodeLei-tores,1994,pp.61-99.

164 Diário do Governo,Decreto-Lein.º21454de7deJulhode1932.

165 Diário do Governo,Decreto-Lein.º19502de20deMarçode1931.

166 Diário do Governo,Decreto-Lein.º21696de30deSetembrode1932.

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Sr. Presidente da República e o Sr. Ministro das Obras Públicas e Comunicações, Engenheiro Duarte Pacheco, no Palácio de S. Bento após as obras de restauro.[post.1938],autordesconhecidoArquivo Nacional Torre do Tombo/Fundo do Secretariado Nacional de Informação

O RESTABELECIMENTO DO ANTIGO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICAS, PARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO DE TODAS AS OBRAS DE FOMENTO QUE INTERESSAM A MELHORIA DOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAO

MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICASMINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICAS

E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAODOS SERVICOS DO ESTADO

PARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO PARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO

E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAOE DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAOE DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAOE DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAO

O RESTABELECIMENTO DO ANTIGO O RESTABELECIMENTO DO ANTIGO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICASO RESTABELECIMENTO DO ANTIGO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICASO RESTABELECIMENTO DO ANTIGO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICASO RESTABELECIMENTO DO ANTIGO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICASO RESTABELECIMENTO DO ANTIGO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICASO RESTABELECIMENTO DO ANTIGO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICASO RESTABELECIMENTO DO ANTIGO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICAS,PARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICASPARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICASPARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO PARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO DE TODAS AS OBRAS DE FOMENTO PARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO DE TODAS AS OBRAS DE FOMENTO PARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO PARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO DE TODAS AS OBRAS DE FOMENTO QUE INTERESSAM A MELHORIA DE TODAS AS OBRAS DE FOMENTO QUE INTERESSAM A MELHORIA DE TODAS AS OBRAS DE FOMENTO QUE INTERESSAM A MELHORIA DOS SERVICOS DO ESTADO QUE INTERESSAM A MELHORIA DOS SERVICOS DO ESTADO QUE INTERESSAM A MELHORIA DOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAODOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAODOS SERVICOS DO ESTADO DOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAODOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAODOS SERVICOS DO ESTADO DOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAODOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAODOS SERVICOS DO ESTADO DOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAODOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAODOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAOE DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAOE DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAOE DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAO

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Castelo de S. Jorge, após as obras de restauro1940,Alvão,PortoCâmaraMunicipaldeLisboa/GabinetedeEstudosOlisiponenses

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ICA” 134 a transformação e reparação de escolas primárias, escolas profissionais

elementares, liceus municipais, hospitais e outros edifícios de assistên-cia, museus e monumentos nacionais”.167

À DGEMN competia a orientação técnica e a fiscalização das obras de melhoramentos urbanos e, segundo o decreto, competia tam-bém ao mesmo organismo o estabelecimento de um acordo com as entidades locais sobre os programas de urbanismo a realizar. Aos organismos locais competia a apresentação de um programa de obras necessárias, do mesmo modo que competia ao Ministé-rio da Instrução Pública a apresentação de um programa geral de construção, ampliação ou reparação de escolas.Reconhecendo a necessidade de resolver o estado sanitário do País, à Ad-ministração-Geral dos Serviços Hidráulicos e Eléctricos passaria a competir a orientação técnica das câmaras municipais na realização do programa de melhoramentos de águas e saneamento, bem como a elaboração dos estudos e projectos de obras a realizar, reforma das obras existentes e fiscalização do universo construído:

“São consideradas melhoramentos de águas e saneamento as obras de captação e distribuição de água e o estabelecimento, beneficiação e ampliação de redes de esgoto nas vilas e povoações importantes e nas cidades com excepção dos grandes centros”.168

A par dos programas específicos que compunham os melhoramentos ru-rais, urbanos e de águas e saneamento, programas de trabalhos a realizar a uma escala municipal, todos os catorze organismos que compunham o MOPC trabalhavam de forma articulada a uma escala total do território naquilo a que Duarte Pacheco designava de grandes obras públicas169, ou seja, as infra-estruturas de interesse nacional e vantagem colectiva. A questão das verbas orçamentais, condição indispensável à viabilidade de qualquer projecto, foi também programada pelo ministro. A 30 de Setembro, quando decretou o plano de ataque à escala regional, o plano de melhoramentos rurais, urbanos e de saneamento, o MOPC decretou também a criação do Comissaria-do e do Fundo do Desemprego170.O engenheiro que, em 1927, conseguira o financiamento das obras de construção das novas instalações do IST171 e que, em 1928, conseguira um plano de financiamento para a renova-ção material dos Liceus172, ex-perimentava agora a uma escala nacional uma solução de finan-ciamento dos melhoramentos

167 Diário do Governo,Decreto-Lein.º21697de30deSetembrode1932.

168 Diário do Governo,Decreto-Lein.º21698de30deSetembrode1932.

169 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lein.º21699de30deSetembrode1932.

170 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lein.º21699de30deSetembrode1932.

171 Diário do Governo,ISérie,Decreto-Lein.º13.113de1deFevereirode1927.

172 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lein.º15942de11deNovembrode1928.

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135/materiais do País, do mesmo modo que canalizava para as obras públicas uma parte considerável da mão-de-obra necessária à sua concretização.No preâmbulo ao decreto que institui a criação do Comissariado do Desemprego, encontramos a crueza do Portugal “quatro quintos rural” traduzida em números. Em Agosto de 1931 o Estado iniciara um inquérito sobre a crise do desemprego173 e os resultados revela-ram-se preocupantes. Num primeiro apuramento registaram-se 38 200 desempregados, mas em Dezembro do mesmo ano o número subiria para os 39 200. Em Março de 1932 era já de 40 100 e em Ju-nho atingiria os 41 600. Até ao final do mês de Julho uma descida acentuada da taxa de desemprego cifrava-se nos 26 400. Contudo, o decréscimo não correspondia a nenhuma medida de combate ao desemprego, significava apenas que cerca de 150 000 indivíduos que de Outubro a Março não encontravam colocação, chegada a época das colheitas e das debulhas de trigo a sul do Tejo, encontravam nos meses de Verão o único trabalho possível: o sazonal. Finda a colheita e a debulha do trigo e, pelo Outono, a apanha da azeitona, os nú-meros do desemprego voltariam a subir até Junho do ano seguinte.Tomando por referência o censo de Junho de 1932 (41.600 desem-pregados), cumpria ao Governo organizar o auxílio. Contudo, e ao contrário das medidas operadas em Países de elevada cultura, o Go-verno não pretendia distribuir qualquer subsídio gracioso ou esmola do erário. Considerando o Governo que Portugal não se encontrava na situação de Países como os Estados Unidos da América, Ingla-terra ou Alemanha, encarava-se o problema do desemprego de uma outra forma:

“Não se dão esmolas, procura dar-se trabalho (...) Num País em que tanta coisa útil há para fazer, é quase ironia que nele haja alguém que não tenha trabalho”. 174

Num País em que tanta coisa de útil havia para fazer, considerava o Go-verno como prioritários os trabalhos de melhoramentos rurais, me-lhoramentos urbanos, águas e saneamento, limpeza de valas e ribeiras e arborização. Estando o plano de melhoramentos materiais definido e a mão-de-obra necessária à sua execução recrutada nos números for-necidos pelo Comissariado do Desemprego, bastava encontrar uma forma de financiamento que assegurasse o pagamento dos salários e dos projectos de obra. E a fórmula estava já estabelecida.Porque não bastava o braço protector dos poderes públicos, e porque o interesse era colectivo e exemplo de humanidade e de civismo, o Go-verno chamava a esta iniciativa a contribuição dos particulares empregados e empregadores:

173 Diário do Governo, ISérie, Decreto-Lein.º20222de15deAgostode1931.

174 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lein.º21699de30deSetembrode1932,p.1976.

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“Todos os que empreguem normalmente um ou mais empregados e operários em indústria ou comércio concorrerão em cada mês, para o Fundo de Desemprego com 1 por cento da importância paga em sa-lários, vencimentos, gratificações, percentagens, subsídios, prémios, diuturnidades ou quaisquer outras remunerações fixas ou eventuais e, correspondentemente cada um dos empregados ou operários com 2 por cento do que no mesmo mês receber, sob qualquer rubrica”. 175

Na prática, por cada trabalhador activo no ramo privado, o Fundo de Desemprego passaria a auferir mensalmente 3% do valor salarial pra-ticado. Se o empregado contribuía com 2% do vencimento, a entidade empregadora contribuía com 1%.Contudo, a contribuição obrigatória para o Fundo de Desemprego não se limitava às actividades de comércio e indústria. Também as actividades liberais eram chamadas a esta contribuição. À contribuição de 2% esta-vam ainda obrigados os trabalhadores assalariados e os administradores dos estabelecimentos ou empreitadas do Estado,176 bem como os pro-prietários rústicos e urbanos177.A totalidade das contribuições seria mensalmente depositada na Caixa Geral de Depósitos. Ao Comissariado do Desemprego cabia a gestão do fundo monetário obtido bem como o recrutamento, a distribuição e o transporte dos desempregados preferencialmente para as obras de melhoramentos da área da sua residência ou região, mas, se necessário fosse, para as regiões onde houvesse falta de braços e oferta de trabalho.Com a criação do Fundo de Desemprego e do seu órgão gestor, o Co-missariado, o MOPC conseguia de uma só vez chamar à sua guarda não só o controlo e distribuição da mão-de-obra para os planos de melho-ramento material do País como o pagamento dessa mesma mão- -de-obra através de um fundo financeiro paralelo à dotação or-çamental anual do ministério. Se à capacidade de aglutinação de projectos e unicidade do poder, a que o MOPC se reservava desde

175 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lein.º21699de30deSetembrode1932,Artigo20º,p.1979.

176 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lein.º21699de30deSetembrode1932,§p.1979.

177 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lein.º21699de30deSetembrode1932,Artigo22º,p.1980.

Folheto do Comissariado do DesempregoInMINISTÉRIODASOBRASPÚBLICASECOMUNICAÇÕES.15AnosdeObrasPúblicas:[s.l.],1932-1947.Museu Municipal de Loulé/Centrode Documentação

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ICA” 138 que operou a nova orgânica ministerial, se aliar esta manobra de

engenharia financeira e recrutamento de mão-de-obra e se anexar ainda a “sempre que necessária” lei das expropriações ao abrigo da utilidade pública, reúnem-se todas as condições para compreender a forma de blindagem legal da qual o MOPC se muniu para poder pôr em prática o plano metódico de realização em todo o País, que Duarte Pacheco afirmava ser possível para, através dele, se promover a concen-tração de todas as obras de fomento178. É pois importante sublinhar que não são apenas os projectos e as obras que crescem em número e avançam no terreno. É o próprio ministério que, na sua renovação orgânica e na crescente e especializada composição técnica e profis-sional, avança coerente e construído.De Janeiro de 1936 a Maio de 1938 Duarte Pacheco seria afastado do po-der político efectivo. Um Estado que se queria Novo tinha um País por cons-truir e num País onde tudo estava por fazer, a construção deste teria de se im-plantar num terreno. Mas o terreno tinha dono. Por natureza, um dono servil ao Estado Novo se o Estado de algum modo também o servisse. Mas quando o Estado, na figura do Ministro das Obras Públicas e Comunica-ções, sobrepôs ao direito da propriedade o dever do serviço e da utilidade pública para construir os equipamentos que o País não tinha, surgiu um clima de fricção. O regime político entrava em contradição uma vez que a tensão se exercia substancialmente sobre a propriedade, essa proprieda-de quase e sempre pertença dos que constituíam o próprio Estado, essa propriedade reconhecida como o sempiterno baluarte de poder.Mais do que centrada em questões de teoria política, a cúpula do Esta-do Novo concentrava-se no desenho político e administrativo do País, traçado pelo Governo e em torno do qual orbitava uma classe abasta-da detentora de saber, propriedade e poder. De católicos monárqui-cos a republicanos, de religiosos a civis, de industriais a empresários, de literatos a construtores, o regime político sustentava-se numa base social e económica em que a serventia de interesses legitimava e re-forçava a máquina do Estado. Este regime de interesses e conflitos era gerido pelo Presidente do Conselho, que despachava sozinho e sozinho demitia ou empossava os ministros. Houve ministros que se souberam destituídos das pastas ao ler os jornais pela manhã, como outros houve que foram agraciados com a consideração da palavra.Apenas um ministro mereceu do Presidente do Conselho o reco-nhecimento público da justificação de afastamento, do sacrifício por pressão política: e esse ministro foi Duarte Pacheco. Entre o eufe-mismo e a hipérbole, consoante a maior ou menor simpatia face à situação, as várias facções que compunham o Estado Novo ouviram, e interpretaram na figura de estilo correspondente às suas posições, as palavras do Chefe do Governo quando este reconheceu que tivera por uma vez de sacrificar o ministro. E quando o Presidente do Con-selho retirou a Duarte Pacheco

178 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 22055,ISériede31deDezembrode1932.

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139/o poder político, fê-lo por reconhecer a tensão que estava a exercer sobre o tecido social e financeiro em que assentava o regime.Em 1936 fora politicamente oportuno afastar o ministro. Mas, em 1938, o cenário político internacional alterara-se consideravelmen-te. Numa Europa em conflito bélico e numa Espanha em guerra civil, a propriedade atingira o estatuto de território político de na-ções, não de Países. E Portugal não era excepção. Em 1938, na Nota Oficiosa de 27 de Março, ao afirmar que por oito séculos a nação portuguesa permanecera definida e estável nas suas linhas de fron-teira, o Presidente do Conselho atribuía à terra o seu mais alto valor: o patriótico. A terra e a História nela plantada, desempenhariam um papel estruturante nas Comemorações Centenárias. Mas para a efectivação do projecto, tornava-se necessário chamar de novo à cena política o homem que, não olhando aos interesses instalados, dava garantias de cumprimento da agenda política e do programa de obras. Contudo, limitar o regresso de Duarte Pacheco à pasta das Obras Públicas e Comunicações no cumprimento preciso do pro-grama previsto para as Comemorações Centenárias, traduz-se numa interpretação redutora do significado desta retoma política, pois o ministro, embora avançando de imediato com as obras mais adian-tadas, não irá descurar os planos gerais, como o próprio afirma em decreto e na sequente acção política179.Na Nota Oficiosa de 27 de Março de 1938, Salazar elencava as obras que atestariam o “poder realizador” do regime: a empreitada de restauro e be-neficiação do palácio, jardim e parque de Queluz; o novo edifício da Casa da Moeda; o anexo do Museu de Arte Antiga; a auto-estrada Lisboa-Cas-cais; o Estádio Nacional e sequentes ligações viárias à auto-estrada e à es-trada marginal; a libertação da Torre de Belém pela deslocação da Fábrica de Gás para outro local; as obras do Palácio de São Bento e respectiva ur-banização da zona envolvente; resolução urbanística do prolongamento da Avenida da Liberdade; beneficiação do Teatro Nacional de São Carlos; o maior avanço possível no projecto do Parque Florestal de Monsanto; conclusão da primeira fase de construção dos Hospitais Escolares de Lis-boa e Porto; maior impulso na criação de bairros de casas económicas em Lisboa e ligação radiofónica de Lisboa às terras coloniais.Umas ainda em decreto ou projecto, e outras já em fase de execução, todas estas obras partilhavam de uma origem comum: o Ministério das Obras Públicas e Comunicações, o organismo detentor do poder realizador do regime e que, pelos anos de 1932 a 1936, pensara, decretara e projectara a execução destas obras.Salazar disse um dia que em política, aquilo que parece é, mas em polí-tica o que existe é o que se fez, e, com Duarte Pacheco afastado do MOPC de 1936 a 1938, o substituto Silva Abranches não só não fez nada novo como desacelerou o que até então vinha sendo feito, principalmente em Lisboa, a ci-

179 Diário do Governo,ISérie,Decreto-Lein.º29043de7deOutubrode1938.

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Conselho elencara na nota oficiosa de Março como testemunhos do poder realizador do ser português.No período de tempo que Duarte Pacheco presidiu à Câmara Munici-pal de Lisboa, os projectos do Parque Florestal de Monsanto; o desafo-go da Torre de Belém pela transferência da Fábrica de Gás; os trabalhos de urbanização da área envolvente ao Palácio de São Bento, o prolonga-mento da Avenida da Liberdade ou o desenho dos arruamentos e vias de ligação à auto-estrada Lisboa-Cascais e Estrada Marginal, foram pro-jectos trabalhados no domínio das atribuições camarárias.Regressado ao gabinete ministerial, num espaço de seis semanas Duarte Pacheco abriria dois créditos para reforço de dotações or-çamentais para as obras em curso e despesas de gabinete180. Mas este segundo mandato ditaria um passo maior e definitivo: a con-cretização do plano de urbanização de Lisboa, plano a que a pres-são de agenda do cumprimento da Exposição do Mundo Português serviria de álibi para o ordenamento do território. No domínio do plano de urbanização, Duarte Pacheco não avançava unicamente na direcção de Belém, pensava a cidade num todo programado. As ac-ções políticas necessárias à concretização do plano de urbanização de Lisboa seriam ainda facilitadas pela publicação de um outro decreto exarado pelo gabinete do ministro das Obras Públicas e Comunica-ções: o decreto que permitia a expropriação por utilidade pública ao abrigo de doze obras inscritas no programa dos Centenários:

“Aeroporto de Lisboa, estradas e arruamentos de acesso a Lisboa e ao aeroporto; construção de casas económicas em Lisboa e Porto; arranjo e integração do Castelo de S. Jorge; urbanização do Parque Eduardo VII; arranjo do bairro de Alfama; Auto-estrada e estrada marginal Lisboa-Cascais; arranjo urbanístico das zonas dos Palá-cios da Ajuda, Assembleia Nacional e de Queluz, em Lisboa, e dos Carrancas no Porto; avenida marginal ao Tejo; urbanização da Praça dos Jerónimos; edifícios universitários de Lisboa e novos hospitais de Lisboa e Porto; as obras de urbanização da cidade de Lisboa e novos edifícios para quartéis”.181

Embora este decreto contemplasse numa das suas alíneas as obras de ur-banização de Lisboa que o Governo aprovar para serem iniciadas até 1940, das restantes onze alíneas que cumpriam o programa de obras contempla-do por este decreto, apenas os quartéis se localizavam por todo o País e o Palácio dos Carrancas e um dos Hospitais Escolares se situavam no Porto. Já a auto-estrada e a estrada marginal Lisboa-Cascais, cumpriam objectivos de um pla-no urbano e rodoviário de escala

180 Diário do Governo,ISérie,Decreto-Lein.º28743de7deJunhode1938eDecreto-Lein.º28892de30deJulhode1938.

181 Diário do Governo,ISérie,Decreto-Lein.º28797de1deJulhode1938.

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Estrada Marginal Lisboa-Cascais1940,Alvão,PortoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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ICA” 144 regional, mas a sua aplicação técnica e prática continha no plano de ur-

banização de Lisboa uma importância de extrema relevância. Quando às restantes seis obras, os trabalhos de urbanização surgiam no mesmo patamar de importância que as obras de edificação ou beneficiação. Tal significa que o decreto n.º 28 797 de 1 de Julho de 1938, se assumiu de uma importância extrema e mesmo definitiva para o arranque político e jurídico do Plano de Urbanização da Cidade de Lisboa.Duarte Pacheco reclamou para si a autoria da fórmula que reserva ao Estado a expropriação sem processo de recurso. Ao abrigo do decreto n.º 28 797, entre 1938 e 1943, o Estado, aqui protagonizado pelo MOPC e pelo seu ministro Duarte Pacheco, expropriou em Lisboa cerca de 1300 hectares de terreno conseguindo assim as condições básicas para a execução de um Plano de Urbanização da cidade182. O mesmo plano que, de Janeiro a Maio de 1938, nos breves meses que dirigira a Câmara Municipal de Lisboa, preparou ao pormenor. Um plano onde o territó-rio ordenado, planeado, seria um grau zero sobre o qual assentariam os vários programas e tipologias que a arquitectura e a engenharia conce-beriam na organização de uma Lisboa Moderna.Existe um denso e coeso conjunto de obras infraestruturais ergui-das em Lisboa e cuja responsabilidade política recai sobre Duarte Pacheco. De 1928 a 1938, sob acção directa de Duarte Pacheco assis-tiu-se a uma inegável transformação, extensão, e melhoramento da cidade. Mas a acção de Duarte Pacheco não se restringiu a Lisboa. Além de todos os trabalhos realizados no domínio das Comunica-ções, Duarte Pacheco assumiu a liderança de um processo de obras infraestruturais, urbanísticas e de construção sistemática de equipa-mentos por todo o País que incluiu, para além de escolas, estações dos CTT, tribunais, agências e filiais da Caixa Geral de Depósitos, quartéis, hospitais e prisões, entre outros.Como primeiro presidente da Câmara Municipal de Lisboa nomeado pelo Governo, Duarte Pacheco teve por principal preocupação regu-lar a máquina administrativa municipal em concordância directa com o Código Administrativo de 1936-1940. Em cinco meses de gerência camarária procurou dar resposta às deploráveis questões sanitárias da cidade183, procurou regular as actividades comerciais e industriais, atribuiu aos arquitectos a responsabilidade de assinar os projectos de edificações urbanas e teve a cora-gem de apontar ao município a quota-parte de responsabilidade no caótico regime de construção da cidade. Mais do que um pro-motor do Prémio Municipal de Arquitectura, Duarte Pacheco foi o político que declarou existir uma profunda diferença entre Arquitectura e Construção Civil.

182 FERREIRA, Vitor Matias, Op. Cit., p.158.

183 Relembremos questões como a re-colhado lixo,aproibiçãodealimen-tação dos suínos de consumo comlixos domésticos, solução químicareguladoradosníveisdecloro-fenóisexistentesnaredepúblicadeabaste-cimento de água, a regulação de docomércio de carne, da circulação detáxis,doregimedetoldoseesplana-das,entreoutros.

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145/Uma vez mais, a frontalidade da acção e a linearidade das suas pala-vras produziriam mais vozes de desagrado do que aplausos. Muitos interesses estavam instalados há décadas senão mesmo gerações, e a política urbana de Duarte Pacheco abalara já alguns alicerces. Sub-jacente a todas as obras estruturais e infra-estruturais realizadas por Duarte Pacheco na cidade de Lisboa estaria o plano de urbanização, esse grau zero planificador e regulador da extensão e edificação da capital.Como Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Duarte Pacheco imprimiu em cinco meses de gestão um regime regulador a todas as actividades que compunham a vida citadina. E se como ministro, entre os anos de 1932 a 1936 atribuíra à cidade de Lisboa um número considerável de obras infraestruturais, a partir de 1938 as mesmas avançariam até à conclusão mas sob estritas e exigentes condições de garantia: com um homem da plena confiança do ministro nos Pa-ços do Concelho e com Duarte Pacheco no Terreiro do Paço.A obra pública de Duarte Pacheco tem uma dimensão esmagadora no número, na consistência, na abrangência e na transversalidade de formas, temas e programas. Das propostas de reformas educativas e dos projectos de apoio social à educação ou dos programas das edificações escolares, a acção política de Duarte Pacheco nos sete meses que liderou o gabinete da Instrução Pública, abriu novas perspectivas à condição legal, processu-al e material do ensino.No Ministério das Obras Públicas e Comunicações Duarte Pacheco rea-lizou uma obra verdadeiramente estrutural. Da reorganização do Minis-tério e de organismos dele dependentes, à produção normativa e cons-trutiva, o seu legado é absolutamente impressionante. No domínio das Comunicações, os portos marítimos de Leixões, Viana do Castelo e Setúbal, foram alvo de uma profunda reorganização e dotados de novos equipamentos. Só neste programa infraestrutural, e até 1939, o Ministério absorveu 40% do seu orçamento. No domínio das vias de comunicação, de entre estradas nacionais, municipais e vicinais, pontes e viadutos, foram construídos cerca de 500 quilómetros de extensão. Este plano rodoviário não se circunscreveu unicamente ao factor quantitativo. Os perfis das estradas construídas apresentaram um salto qualitativo na medida em que existiu a preocupação de en-quadramento paisagístico e inserção urbanística dos traçados.As obras de hidráulica agrícola permitiram uma maior extensão de terrenos produtivos e os trabalhos hidroeléctricos permitiram o re-forço do abastecimento eléctrico doméstico, comercial e industrial.No domínio dos programas arquitectónicos, a actuação ministerial de Duarte Pacheco foi também transversal e abrangente.Na Educação, todos os níveis de ensino foram contemplados com no-vas construções escolares. Das creches às escolas primárias e liceus, dos institutos às universidades, a preocupação do Ministério não se revelou unicamente com o “levantamento de paredes”. Procurou-se

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ICA” pensar e construir cada escola com a orgânica que Duarte Pacheco

defendia já em 1928 e que se centrava no campo pedagógico.No domínio das Construções Hospitalares, o Ministério deu início à construção dos equipamentos necessários ao serviço nacional de assistência médica e abarcou várias áreas de intervenção. Do posto de vacinação ao sanatório terapêutico, do centro radiológico ao hos-pital escolar, verificou-se a construção programada nas várias escalas e nas mais diversas dimensões regionais.O programa habitacional, e também os programas de abastecimento de água e saneamento, mereceram de Duarte Pacheco a maior preocu-pação. Na vigência dos dois mandatos ministeriais, o volume de docu-mentação produzida reflecte a profunda mudança na questão sanitária do País184. Duarte Pacheco concentrou meios e moveu inúmeros esforços para levar a cabo as obras de saneamento básico e abastecimento de água potável aos dezoito distritos do continente.A par da política de restauros monumentais, realizada por um dos organismos dependentes do Ministério, a DGEMN, o gabinete mi-nisterial de Duarte Pacheco concentrou também tempo e verbas consideráveis na beneficiação e na construção dos repositórios do património móvel: os museus.E se a obra pública de Duarte Pacheco passou também pela acção polí-tica dirigida ao património móvel e imóvel, é ainda de considerar a sua acção na valorização do património natural e paisagístico. Neste último domínio, o pontuado das estradas ou a implantação das primeiras pou-sadas portuguesas revelam a minúcia que, no gabinete de trabalho do ministro, era dada a cada projecto. Esse mesmo projecto que encerrava em si, a parte indivisível do todo.E neste todo é importante não esquecermos a equipa. Duarte Pa-checo foi um político hábil.Mas em política a sorte não existe, a sorte faz-se. E Duarte Pacheco percebeu cedo que em política não se vive, apenas se sobrevive e ainda assim com uma equipa. E a sua maior força, a sua maior autoridade advinha da equipa que formou. Uma equipa plural de técnicos especializados no domínio da engenharia e da arquitectura. A esta equipa restrita, com acesso directo ao gabi-nete ministerial, tinham também acesso os técnicos especializados em cada uma das áreas de actuação do Ministério. E eram os enge-nheiros, os arquitectos e os técnicos especializados que, compondo as “comissões administrativas de obra” dos projectos exarados pelo MOPC, compunham de facto o gabinete ministerial e actuavam pelo País numa frente construtiva incansável.Duarte Pacheco não foi um homem viajado. Pelo País viajou muito, li-teralmente até à morte, mas do País só saiu uma vez, na companhia de Pardal Monteiro para ver Paris, Roma e Nápoles. Mas Duarte Pa-checo, que não viveu o suficiente para viajar, percebeu cedo que

184 Expressão inúmeras vezes utilizadaporDuartePacheconospreâmbulosaosdecretos-leieaosdespachosmi-nisteriais.

Fachada principal do Teatro Nacional de S. de Carlos1940,Alvão,PortoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

Palácio Nacional de Queluz, após as obras de restauro1940,Alvão,PortoCâmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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ICA” era importante colher informações no exterior, saber de outras expe-

riências e aprender com os exemplos. E por isso insistiu na formação externa dos licenciados do Técnico, e pela mesma razão, já ministro, enviou os engenheiros e os arquitectos ao exterior em comissões de estudo. E porque era necessário construir escolas, hospitais, pontes, viadutos, gares, museus, prisões e teatros, com os engenheiros e os ar-quitectos seguiram técnicos tão distintos como professores, médicos, historiadores ou conservadores de obras de arte. E neste gabinete mi-nisterial, além da pluralidade de ofícios, houve também lugar à plurali-dade de gostos e de ideias. O traço de Cottinelli, o de Carlos Ramos ou de Keil do Amaral conviveram em harmonia. E a engenharia militar de Eduardo Rodrigues de Carvalho não colidiu nunca com a engenharia de pontes de Barbosa Carmona ou com a engenharia de construções de Guimarães Lobato.A obra construída pelo ministro é evidente e inegável, contudo, o modo, a cadência, o método, os avanços e os recuos, as hesitações ou as cedências, são elementos que consideramos tão decisórios na con-figuração final na obra construída quanto uma directiva da Presidên-cia do Conselho de Ministros ou a rigidez de uma dotação orçamental fixa. Sem a força do Estado e da Lei que teve ao seu dispor, Duarte Pacheco não teria construído o que construiu. Mas com as condições que lhe foram permitidas e com as condições que ele próprio insti-tuiu a partir do seu gabinete de trabalho, construiu quase ininterrup-tamente durante quinze anos. E se em História um quarto de século é uma geração, Duarte Pacheco construiu uma geração de País.Com o braço forte e centralizador da lei, Duarte Pacheco teve ao seu dispor uma máquina legal que lhe permitiu a criação de uma blinda-gem orçamental inédita. Sem um braço legislativo forte, pouco teria sido possível, mas o mé-todo de trabalho do ministro explica a capacidade de concretização que o seu gabinete teve e outros não tiveram, ainda que ao seu dis-por tivessem a mesma malha legal.Nas palavras de Duarte Pacheco existia um plano metódico de realização em todo o País, e, para a execução plena desse plano metódico, era necessário primeiro regulamentar e depois implementar os diplomas legais neces-sários à optimização dos serviços. Na fase de projecto, criou comissões de estudo que conceberam propostas de soluções viáveis às necessidades relevadas nos trabalhos de diagnóstico e posteriormente, na fase admi-nistrativa, geriu técnica e financeiramente a construção das soluções.A coordenação era estabelecida pelo gabinete ministerial. A unida-de tinha já sido por ele definida no período de regulamentação, na tal fase reguladora, de “acalmia”, como definia o próprio. E a efici-ência existia porque do gabinete ministerial eram lançadas equipas de trabalho precisas e com objectivos traçados.Assim, mais do que autoritário, Duarte Pacheco foi um homem exi-gente. Exigente até ao esgotamento, como o próprio afirmava. Mas

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Sé de Lisboa, após as obras de restauro1940,Alvão,PortoCâmaraMunicipaldeLisboa/GabinetedeEstudosOlisiponenses

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185 TELMO,JoséÂngeloCottinelli, “UmGrande Homem de Acção” in Pano-rama,RevistadeArteeTurismo,Lis-boa,SPN-SNI,ano3,n.º19,Fevereirode1944,s/p.

para os poucos que conseguiram aguentar o seu ritmo, pronunciar o nome Duarte Pacheco provocava um sorriso, que antecedia uma ca-tadupa de histórias com peripécias num gabinete de trabalho onde parecia existir sempre luz.Talvez um hábito que o próprio ministro tivesse levado do Técnico para o Terreiro do Paço. A todas as horas do dia e da noite há sempre uma luz numa qualquer sala do Técnico. No Terreiro do Paço, as luzes apagaram-se cedo, há muito tempo.No dia 15 de Novembro de 1943, Duarte Pacheco assinava o último dos seus decretos, o decreto n.º 33 237, e o último dos seus diplomas para a execução de obras, o decreto n.º 33 236 que “Autoriza a Direc-ção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais a celebrar contrato para a execução das obras de adaptação do antigo edifício da Alfânde-ga a Ministério das Finanças”.Mais um reforço de dotação orçamental, mais uma obra. No dia se-guinte, os decretos eram publicado no Diário do Governo e, logo pela manhã, Duarte Pacheco sairia de Lisboa com destino a Vila Viçosa, a visitar uma outra obra. Deveria chegar ao final da tarde para a reunião do Conselho de Ministros. Não chegou a comparecer a tal reunião. No lugar da Cova do Lagarto, entre Montemor-o-Novo e Vendas No-vas, o veículo oficial que o conduzia a alta velocidade despistou-se e capotou. Na madrugada de dia 16 de Novembro morria no Hospital de Setúbal o Sonhador de Grandes Coisas185.

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Núcleo Fotográfico

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Estudos e Projectos de Urbanismo

(1887-1997), Planos Directores

de Urbanização (1938-1967)

Livros de Notas da Câmara

Municipal de Lisboa

Projecto Geral do Aeroporto de Lisboa

arquivo Histórico do ministério

da educação

Livros de Actas das Sessões

do Conselho Superior de Instrução

Pública (1926-1929)

arquivos nacionais torre do tombo

Arquivo Oliveira Salazar/

Correspondência Oficial

Arquivo Oliveira Salazar/

Correspondência Particular

Fundo Empresa Pública

jornal “O Século”

Fundo do Secretariado Nacional

de Informação

museu municipal de Loulé/centro

de Documentação /Fototeca

Fundo Duarte Pacheco

Biblioteca e arquivo do ministério

das obras Públicas

CAPOPI, Comissão Administrativa

para as Obras da Praça do Império

CIP - Processos Individuais

de Funcionário

Gabinete do Ministro/Correspondência

Particular

Livros de Despachos Ministeriais

Gabinete de estudos olisiponenses

Espólio Duarte Pacheco

Actas das Sessões da Câmara

Municipal de Lisboa

Galeria de Biblioteca de arte/

/Fundação calouste Gulbenkian

Colecção Mário Novais

instituto superior técnico – núcleo

de arquivo

Processos Individuais de Alunos

instituto superior técnico – núcleo

de arquivo e Documentação

Processos Individuais de Funcionários

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