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Material didático 2.6. Do Estelionato e outras fraudes (171-179). 2.6.1-Estelionato : Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento: Pena-reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa. § 1º. Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena conforme o disposto no art. 155, § 2º. Stellio-onis = camaleão, lagarto que muda de cor conforme o ambiente Cabe suspensão condicional do processo (caput, §§ 1º e 2º I a VI) Uso de fraude (artifício), ardil ou outro meio fraudulento para enganar ou manter alguém em engano já existente, visando vantagem ilícita. Artifício é a utilização de qualquer aparato ou objeto para enganar a vítima (disfarce, efeitos especiais, documentos falsos e outros). Ardil é uma história enganosa (conto do vigário). Outro meio fraudulento : estratagema, artimanha e até o silêncio, desde que capaz de enganar a vítima na sua capacidade individual. A Exposição de Motivos do C. Penal (item 61) esclarece que o agente que percebe o estado de erro de alguém que estando prestes a lhe entregar um objeto, e, maliciosamente, permanece em silêncio para efetivamente receber o bem, comete estelionato”.(Gonçalves). 1

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Material didático

2.6. Do Estelionato e outras fraudes (171-179).

2.6.1-Estelionato: Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento: Pena-reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

§ 1º. Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena conforme o disposto no art. 155, § 2º.

Stellio-onis = camaleão, lagarto que muda de cor conforme o ambienteCabe suspensão condicional do processo (caput, §§ 1º e 2º I a VI)Uso de fraude (artifício), ardil ou outro meio fraudulento para enganar

ou manter alguém em engano já existente, visando vantagem ilícita.Artifício é a utilização de qualquer aparato ou objeto para enganar a

vítima (disfarce, efeitos especiais, documentos falsos e outros).Ardil é uma história enganosa (conto do vigário).Outro meio fraudulento: estratagema, artimanha e até o silêncio, desde

que capaz de enganar a vítima na sua capacidade individual.A Exposição de Motivos do C. Penal (item 61) “esclarece que o

agente que percebe o estado de erro de alguém que estando prestes a lhe entregar um objeto, e, maliciosamente, permanece em silêncio para efetivamente receber o bem, comete estelionato”.(Gonçalves).

“Com o emprego de artifício, ardil ou fraude, o agente deve visar, inicialmente, induzir ou manter a vítima em erro. Na primeira hipótese, é o agente quem faz a vítima ter uma percepção errônea da realidade e, na segunda, aquela espontaneamente se equivoca em relação a uma determinada situação, e o agente, percebendo tal erro, a mantém nesse estado. O art. 171 exige que ‘alguém’ seja induzido ou mantido em erro, e que, por isso, entregue um bem, próprio ou alheio, ao agente. Esta pessoa pode ser a mesma que sofre o prejuízo ou terceiro. É necessário, porém, que o agente engane uma pessoa, não havendo estelionato, mas furto, por parte de quem ‘engana’ uma máquina, p. ex., clonando um cartão bancário e sacando o dinheiro da conta corrente alheia junto a um caixa eletrônico. Neste caso, não existe ‘alguém’ que tenha sido ludibriado. Ademais, houve subtração dos valores”. (Gonçalves-2003).

A vantagem deve ser ilícita, (contrário: exercício arbitrário, 345-CP).O estelionato tem duplo resultado: obtenção da vantagem ilícita de um

lado e efetiva ocorrência de prejuízo para a vítima.

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Consuma-se quando o agente efetivamente consegue obter a vantagem ilícita pretendida.

Estelionatário: É o mais esperto e inteligente dos criminosos.Tentativa é possível: a) o agente emprega fraude idônea e não

consegue enganar a vítima, se inidônea, crime impossível, por absoluta ineficácia do meio (não pessoa em geral, mas no caso real); b) o agente emprega a fraude, engana a vítima, mas não consegue obter a vantagem ilícita visada.

Sujeito Ativo: tanto o que emprega a fraude, como o que recebe a vantagem ilícita. Quando o objeto é recebido por terceiro que por sua vez, desaparece ficando com o mesmo, acontece que: se esse destinatário tiver estimulado o crime, será partícipe do estelionato; se não tiver, mas, posteriormente, ao receber o objeto das mãos do estelionatário, estiver ciente da sua origem, responderá por receptação; se não tiver ciência da origem, não responderá por qualquer infração penal.

Sujeito Passivo. Pode ser tanto quem sofre o prejuízo quanto quem é ludibriado pela fraude, na maioria das vezes a mesma pessoa.

Condutas visando pessoas indeterminadas e incertas como adulteração de taxímetro, de bombas de gasolina ou de balanças, mesmo que constituam fraudes com intuito de vantagem ilícita, tipificam crime contra a economia popular (Lei 1.521/51, art. 2º, XI), bem como as “correntes” ou “pirâmides” no inciso IX desta lei.

Se o agente se aproveita de inexperiência de pessoa menor de 18 anos ou alienada mental para induzi-la a praticar ato suscetível de provocar-lhe prejuízo, pratica o crime de abuso de incapazes (art. 173-CP).

São quatro, os entendimentos sobre qual crime responde quem falsifica cheques ou documentos em geral, para ludibriar a vítima:

a) Estelionato e falsificação de documentos (Art. 297- CP) devendo ser aplicados autonomamente em concurso material, vez que atingem bens jurídicos diversos, impedindo que um absorva o outro;

b) Autonomamente, mas em concurso formal (dosimetria da pena);c) Falsificação de documento público absorve estelionato (R.2-6a);d) Falsificação absorvida pelo estelionato (crime meio=consunção).O último entendimento prevalece em virtude da Súmula 17, do STJ:

“Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido”.

“Ocorre torpeza bilateral, quando a vítima também age de má-fé no caso concreto, ou seja, se também possui intenção de obter lucro ilícito. É

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o caso, por exemplo, de quem é ludibriado pelo agente e compra uma máquina pensando que ela faz dinheiro falso.

Nelson Hungria entende que não há estelionato porque a lei não pode amparar a má fé da vítima. Além disso, o agente não poderia responder pelo ilícito penal, já que a própria vítima estaria proibida de requerer a reparação do dano na esfera civil por não poder pleitear em juízo alegando sua própria torpeza.

Prevalece, entretanto, a opinião no sentido de que existe o crime de estelionato (Heleno C. Fragoso, M. Noronha, Júlio F. Mirabete). Os argumentos que justificam tal posicionamento são os seguintes: a) o fato é típico, pois não se pode ignorar a má-fé do agente que empregou a fraude e obteve a vantagem, nem o fato de a vítima ter sido enganada e sofrido o prejuízo; b) a reparação do dano na esfera civil é matéria que interessa apenas a vítima, mas a punição do estelionatário visa proteger toda a sociedade.

Quem banca jogo de azar comete estelionato?Não, comete a contravenção do art. 50 da Lei das Contravenções

Penais. Haverá estelionato, entretanto, se for utilizada alguma fraude no sentido de excluir totalmente a possibilidade de vitória por parte dos jogadores.

Qual a diferença entre o estelionato e o crime de tráfico de influência previsto no art. 332 do Código Penal?

O tráfico de influência é crime contra a Administração Pública, pois o agente visa obter alguma vantagem a pretexto de influir na conduta do funcionário público no exercício de suas funções.

A falsa promessa de cura caracteriza estelionato ou crime de curandeirismo?

Depende. Se o agente receber remuneração em troca da cura impossível, responderá por estelionato, ficando absorvido o curandeirismo.

Nota-se no título dos crimes contra o patrimônio que vários delitos têm a característica de a própria vítima entregar o objeto ao agente. É, contudo, facilmente perceptível a diferença entre eles:

a) Na apropriação indébita (art. 168), como o próprio nome diz, a vítima faz a entrega de livre e espontânea vontade, ou seja, não foi coagida e não está em erro;

b) Na apropriação de coisa havida por erro (art. 169), como o próprio nome diz, a vítima entrega o objeto porque está em erro. Tal equívoco não foi provocado pelo agente e ele só o percebe depois de estar na posse do bem e resolve não o restituir;

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c) No estelionato (art. 171) podem acontecer duas situações: na primeira a vítima entrega o bem por estar em erro provocado por uma fraude empregada pelo agente; na segunda, a própria vítima incide em erro e o agente, antes de receber o objeto, percebe o equívoco e emprega a fraude justamente para mantê-la em erro e, assim, receber o objeto;

d) Em uma das modalidades do crime de extorsão (art. 158) é a própria vítima quem entrega seus pertences ao agente, mas o faz em razão do emprego de violência ou grave ameaça por parte deste” (Rios Gonçalves, obra citada p. 79,80).

A fraude civil recebe o nome técnico de dolo como todo artifício empregado para enganar alguém. O dolus bonus é irrelevante (ex.: mero elogio da mercadoria, mas o dolus malus, de certo vulto, pode anular o negócio. No Direito Penal o dolo tem outra definição: vontade livre e consciente de praticar a ação ilícita, de forma que a fraude penal é mais grave e a diferença é de grau e não da essência.

Predomina o entendimento de que no art. 171 caput ao contrário do que ocorre no art. 171, § 2º, VI (cheque sem fundo), a reparação do dano antes da denúncia não obsta à ação penal (RT 508/389).

Estelionato privilegiado (art. 171, § 1º). Se o criminoso é primário e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode (deve) aplicar a pena da mesma forma que no furto privilegiado (art. 155, § 2º).

“Não há possibilidade de consumar-se o estelionato praticado com cartão de crédito cancelado, já assinalado na ‘lista negra’”(STF, RTJ 84/396). “Pratica estelionato quem assina cartão de crédito, que sabe não lhe pertencer, logrando efetuar compras em loja” (TACrSP, RJDTACr 15/83). “A utilização de papel-moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, da competência da Justiça Estadual”(STJ, Súmula 73; STJ, CComp 6.895, 14.3.94, p. 4468, in RBCCr 6/233). “A simples mentira, mesmo verbal, mas que leve a vítima a erro, pode configurar ”(STF, RTJ 100/598; (TACrSP, julgados 70/311; TJSC, RT 541/429).

“Pratica estelionato o agente que, fazendo uso de folha de cheque cedida por um amigo, adquire veículo da vítima, sendo o pagamento sustado pelo correntista, que não havia autorizado o preenchimento da cártula naquele valor” (TACrSP, RT 776/604).

Manter curso de teologia, sem autorização do Conselho Federal de Educação, oferecendo-o ao público como se fosse de nível superior. Alunos são mantidos em erro (TRF da 1ª R., RT 768/700)

2.6.2. Disposição de coisa alheia como própria (art. 171, § 2º,I)

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Nas mesmas penas incorre quem: I vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como própria;

O agente passa por dono de um bem móvel ou imóvel e o negocia com terceiro de boa fé, sem possuir autorização para tanto, causando assim, prejuízo para essa pessoa. Consuma-se com o recebimento do preço, na venda, mesmo sem a tradição, ou transcrição dos imóveis; na locação com o recebimento do aluguel; na permuta com o recebimento da coisa permutada; na dação em pagamento ao receber a quitação, na dação em garantia, com o recebimento do empréstimo.

Se o agente tem a posse ou detenção da coisa: art.168-Aprop. Indébita.Na alienação fiduciária em garantia: Lei 4.728/65, art. 66, § 8º,com a

redação do Decreto-Lei 911, de 1.10.69 (Busca Apreensão com prisão).A ciência do adquirente descaracteriza o crime. “A penhora judicial é ato processual e não pode ser classificada entre

as garantias ou ônus que constituem gravame do imóvel” (TACrSP, RT 497/329). “O art. 171, § 2º, I, absorve a falsa declaração de que o imóvel é do agente, pois se trata de meio necessário” (TJSP, RT 609/319).

2.6.3. Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria: Art. 171, § 2º, II – vende, permuta, dá em pagamento ou em

garantia coisa própria inalienável, gravada de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias;

Quem vende, permuta, doa em pagamento ou garantia deve alertar o comprador que: não se trata de coisa inalienável (por lei, contrato ou testamento); inexistência de ônus (direito real, hipoteca, anticrese); inexistência de discussão judicial referente à coisa; inexistência de compromisso de compra e venda a prestação do imóvel, firmado anteriormente com terceiro. Penaliza-se o silencio, mesmo que haja o registro público pois aqui não vigora a presunção.

Admite-se a tentativa. Na hipótese do depositário que aliena coisa própria penhorada (três posições): a) não há crime, só sanção civil; b) há crime de fraude à execução - art. 179; c) há crime deste inciso, II.

2.6.4. Defraudação de penhor (art. 171, § 2º, III – defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a garantia pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;

O objeto empenhado deve estar na posse do devedor. A conduta incriminada é defraudar mediante venda, troca, doação, etc ou por outro modo (desvio, consumo, destruição, abandono, inutilização, deterioração etc.). Parcial ou total, sem o consentimento do credor.

Consuma-se com o recebimento da contraprestação ou vantagem.

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Ação penal: pública incondicionada. O exame pericial é prescindível. 2.6.5. Fraude na entrega da coisa (art. 171, § 2º, IV)Art. 171, § 2º:

Nas mesmas penas incorre quem: (R.1-5 anos e multa).

IV - defrauda, substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve ser entregar a alguém;

“A presente infração penal pressupõe a existência de um negócio jurídico envolvendo duas pessoas e que a responsável pela entrega do objeto, de alguma forma, modifique-o fraudulentamente e o entregue à vítima. Essa alteração pode recair sobre a própria substância (entregar objeto de vidro no lugar de cristal, cobre no lugar de ouro), sobre a qualidade (entregar mercadoria de segunda no lugar de primeira, objeto usado como novo) ou sobre a quantidade (dimensão, peso). O crime somente se consuma com a efetiva entrega do objeto, e a tentativa é admissível (se a vítima, p. ex., percebe a fraude e rejeita o objeto)”. “Não basta à tipificação a simples falta de quantidade ou de qualidade, pois é imprescindível a ocorrência de fraude” (TACrSP, RT 436/406). Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa ao contrário do artigo 175 (fraude no comércio) onde o agente tem de ser comerciante.Aplica-se a bens móveis e imóveis. Não há crime se a entrega é gratuita. Sem forma culposa.

2.6.6. Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro Art. 171, § 2º, Nas mesmas penas incorre quem: (R.1-5 anos e multa)

V – destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou agrava as conseqüências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou valor de seguro;

O estelionatário usa como artifício a destruição ou a ocultação de coisa própria, ou a lesão do próprio corpo ou da saúde, com o intuito de receber indenização ou valor de seguro. A autolesão só passa a ser punida em razão do objetivo fraudulento. Sujeitos: ativo: segurado; passivo: seguradora. O pressuposto é a existência de contrato de seguro. O beneficiário do seguro pode ser o próprio agente ou pessoa diversa (para Noronha só o próprio agente). Formal, consuma-se no momento da conduta típica: destruir, ocultar, autolesionar etc, ainda que o agente não consiga receber o que pretendia. “Quando a conduta é de ocultar o bem objeto de contrato, o momento consumativo coincide com a própria conduta física de ocultar” (TJSC, RT 767/683). A tentativa é possível: Jogo meu carro ladeira abaixo, mas terceiros impedem. “(descoberta da coisa ocultada, agente socorrido a tempo, lesão inidônea)”.(Führer, 2004)

2.6.7. Fraude no pagamento por meio de cheque. Art. 171, § 2º, Nas mesmas penas incorre quem: (Reclusão, 1 a 5 anos e multa)

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VI – emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o pagamento.

Duas condutas típicas: a) emissão do cheque sem provisão (fundos): o agente preenche e põe o cheque em circulação, sem possuir a quantia correspondente na sua conta bancária; b) frustração do pagamento do cheque: o agente possui a quantia no banco, por ocasião da emissão, mas, antes de o beneficiário recebê-la, aquele saca o valor ou susta o cheque.

“a) Para que exista o crime é necessário que o sujeito tenha agido de má-fé quando da emissão do cheque. Assim, não responde pelo delito quem imaginou possuir a quantia no banco ou quem não conseguiu ou se esqueceu de ‘cobrir’ a conta corrente após a emissão do cheque. Nesse sentido a Súmula 246 do Supremo Tribunal Federal: ‘Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos’.

b) O cheque tem natureza jurídica de ordem de pagamento à vista e, assim, qualquer atitude que lhe retire esta característica afasta a incidência do crime. É o caso por exemplo, da emissão de cheque pré-datado ou do cheque dado como garantia de dívida.

Nada impede, porém, a responsabilização por estelionato comum se comprovado o dolo de obter vantagem ilícita no momento da emissão.

c) É necessário que a emissão do cheque tenha sido a causa direta do convencimento da vítima e, portanto, a razão de seu prejuízo e do locupletamento do agente. Por isso, entende-se que não há crime na emissão de cheque sem fundos para pagamento de dívida anterior e não paga, pois, nesse caso, o prejuízo da vítima é anterior ao cheque e não decorrência deste. É o que ocorre, por exemplo, quando uma pessoa causa um acidente, provocando danos materiais em outro automóvel, e, como pagamento pelos prejuízos por ela causados, emite um cheque sem fundos. Não há crime porque o prejuízo era anterior, ou seja, foi a colisão entre os veículos que causou o prejuízo e não a emissão do cheque. Veja-se, ainda, que, com o recebimento do cheque, o dono do carro abalroado passa a ter uma situação jurídica mais vantajosa, pois, antes de sua emissão, se ele quisesse receber o valor em juízo teria de ingressar primeiro com uma ação de conhecimento e, posteriormente, com outra de execução. Ao contrário, estando em poder do cheque, poderá executá-lo diretamente, já que se trata de um título executivo extrajudicial.

d) Também não há crime na emissão de cheque sem fundos em substituição de outro título de crédito não honrado. Trata-se também, de hipótese de prejuízo anterior.

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e) Quando o agente susta o cheque ou encerra a conta corrente antes de emitir a cártula, responde pelo estelionato comum (CP, art. 171, caput). Não incide no crime do art. 171, § 2º, VI, do Código Penal, porque a fraude empregada foi anterior à emissão do cheque.

f) Para a configuração do delito exige-se que a emissão do cheque tenha gerado algum prejuízo patrimonial para a vítima. Assim, entende-se não configurar ilícito penal a emissão de cheque sem fundos para pagamento de dívida de jogo proibido ou de programa com prostituta.

g) Nas hipóteses de cheque especial, em que o banco garante o pagamento até um determinado valor, somente haverá crime se este for ultrapassado. Por outro lado, se o banco honra o cheque por estar dentro do limite garantido e o cliente não efetua a composição da importância, não há crime, porque o cheque não foi emitido em favor do banco. Há nessa hipótese, mero ilícito civil, decorrente do descumprimento de obrigação contratual entre as partes.

h) Existe divergência na hipótese em que alguém recebe um cheque nominal e, ao tentar sacá-lo no banco, fica sabendo da inexistência de fundos mas resolve não ficar com o prejuízo, dessa forma, usa o cheque para fazer uma compra perante terceiro, e, para tanto, endossa a cártula. Argumentam alguns que o endosso equivale à emissão porque recoloca o título em circulação, e, por isso, configura o crime do art. 171, § 2º, VI. Para outros, endosso e emissão são institutos distintos, de forma que o endossante responde por estelionato comum.” (Gonçalves, 2003).

Consuma-se quando o banco sacado recusa formalmente o pagamento, por falta de provisão ou de contra ordem de pagamento. Assim versa a Súmula 521 do STF: “O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato, sob a modalidade de emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos, é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado”. O STJ editou a Súmula 244, na mesma linha: “Compete ao foro do local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos”. Basta uma apresentação do cheque.

“Assim, não é suficiente a simples emissão do cheque para que o crime esteja consumado, e, por isso, ainda que a emissão do cheque sem fundos tenha sido dolosa, se o agente se arrepende e deposita o valor respectivo no banco antes da apresentação da cártula, haverá arrependimento eficaz e o fato tornar-se-á atípico.

E se o agente somente se arrepender depois da consumação (após a recusa por parte do banco) e ressarcir a vítima?

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Depende. Se o pagamento ocorrer antes do recebimento da denúncia, a pena será reduzida de um a dois terços, em face do instituto do arrependimento posterior (art. 16 do CP). Antes da reforma penal de 1984 não existia tal instituto, e, nos termos da Súmula 554 do Supremo Tribunal Federal, o pagamento efetuado antes do recebimento da denúncia retirava a justa causa para o início da ação penal. Essa Súmula, apesar de revogada tacitamente pelo art. 16 do Código Penal, continua sendo muito aplicada na prática, por razões de política criminal.

Já o pagamento do cheque efetuado após o recebimento da denúncia, mas antes da sentença de 1ª instância, implica o reconhecimento da atenuante genérica prevista no art. 65, III, b, do Código Penal.” “São circunstâncias que sempre atenuam a pena: ...III, ter o agente: a)...; b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano”.

A tentativa é possível em ambos os subtipos:“a) o agente, de má-fé, emite um cheque sem fundos, e um parente ou

um amigo deposita o valor no banco antes da apresentação da cártula, sem que o sujeito tenha feito qualquer pedido nesse sentido;

b) após a emissão dolosa de um cheque sem fundos, o agente envia correspondência para o banco sustando o título de crédito, mas a carta se extravia.” (Gonçalves, 2003).

“Se uma pessoa se apodera de cheque de outrem, preenche-o sem autorização do correntista e faz aquisições com referida cártula, comete crime de estelionato comum (CP, art. 171, caput), ainda que o banco não tenha percebido a existência da falsificação e o tenha devolvido por insuficiência de fundos. Aliás, tal estelionato consumou-se no exato instante em que o agente fez a aquisição, uma vez que a consumação do estelionato comum ocorre no momento da obtenção da vantagem ilícita. Nesse sentido, a Súmula 48 do Superior Tribunal de Justiça: “Compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato cometido mediante falsificação de cheque”. O sujeito passivo é aquele que sofre o prejuízo em decorrência da recusa de pagamento pelo banco sacado”. (Gonçalves, 2003).

“Dado o cheque sem fundos como princípio de pagamento de lance aceito, desclassifica-se para a fraude em arrematação judicial do art. 358 do CP” (TACrSP, RT 524/382). “Se há processo falimentar, apura-se nele o crime de cheque sem fundos”(STF, RHC 65.109,DJU 4.9.87, p.18286)

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Art. 171, § 3º. A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

“O aumento aplica-se, portanto, quando a infração penal atinge o patrimônio da União, dos Estados, Municípios e Distrito Federal, bem como suas autarquias e entidades paraestatais. A Súmula 24 do Superior Tribunal de Justiça estabelece, ainda, que “aplica-se ao crime de estelionato, em que figure como vítima entidade autárquica da Previdência Social, a qualificadora do § 3º do art. 171 do Código Penal”. Além disso, será aplicável aumento quando o delito atingir instituto de economia popular, entidade de assistência social ou beneficência, uma vez que o prejuízo causado a tais instituições reflete em todos os seus beneficiários.” (Gonçalves, 2003).

2.6.8. Duplicata simulada. Art. 172. Emitir fatura, duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado:

Pena – detenção, de dois a quatro anos, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorrerá aquele que

falsificar ou adulterar a escrituração do Livro de Registro de duplicatas. Caput com a redação dada pela Lei 8.137, de 27.12.90 (Lei dos Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e contra as Relações de Consumo); parágrafo com redação determinada pela Lei 5.474/68.

Cabe a suspensão condicional do processo para todos os fatos ocorridos antes da vigência da Lei 8.137/90 (detenção, de 1 a 5 anos e multa equivalente a vinte por cento sobre o valor da duplicata). Com a alteração deste artigo feita em 1990 deveria passar a designar-se: “Fatura, duplicata ou nota de venda simulada”

O objeto jurídico básico é o patrimônio particular, mas visa indiretamente os interesses da fazenda pública que pode ser lesada concomitantemente com o particular ante as condutas descritas no artigo.

2.6.8.1-A fatura, duplicata ou nota de venda simulada. “Nas vendas a prazo, com a emissão da nota e da fatura, é possível que o vendedor emita uma duplicata, que, por tratar-se de título de crédito, pode ser colocada em circulação. Assim, o vendedor pode descontar antecipadamente o valor nela contido com terceira pessoa (instituições financeiras, na maioria das vezes), e esta, por ocasião do vencimento, receber do comprador a quantia respectiva.

Veja-se que uma duplicata também pode ser emitida em decorrência da prestação de um serviço. Acontece que, se a duplicata, fatura ou nota de venda for emitida sem que corresponda a uma efetiva venda ou

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serviço prestado, poderá gerar prejuízo para quem a descontar. Isso porque, na data do vencimento da duplicata, é evidente que a pessoa que constar no título como adquirente da mercadoria negar-se-á a pagar o seu valor, já que, na realidade, nada adquiriu. Por essa razão, o legislador incriminou a simples conduta de ‘emitir’, ainda que disso não advenha efetivo prejuízo para terceiros. Trata-se de crime formal, que se consuma com a simples emissão da duplicata, fatura ou nota fiscal.

A tentativa, por sua vez, é inadmissível, pois, ou o agente emite o documento, e o crime está consumado, ou não o faz, e o fato é atípico. Crime comum quanto ao sujeito ativo, doloso, formal e unissubsistente.

Ação penal: pública incondicionada (art. 181 a 183-CP).2.6.8.2-Falsidade no livro de registro de duplicatas (Art. 172, § único):As penas e a ação penal são idênticas. Se após a falsidade na

escrituração a duplicata é expedida, a falsidade é absorvida pela expedição; caso a falsidade seja cometida após a expedição, será impunível. A figura restringe-se, assim, à hipótese em que a falsidade é praticada na escrituração, mas a duplicata não entra em circulação. Uns admitem (flagrado iniciando a execução do crime) e outros não admitem tentativa. Visa à boa fé dos títulos e documentos. É necessário que o fruto da falsificação ou adulteração seja capaz de iludir, pois, se a falsificação for grosseira, perceptível ictu oculi, o fato será atípico.

Retroatividade e Ultratividade: “Se o crime foi praticado antes da vigência da Lei nº 8.137/90, deve-se aplicar a pena máxima de acordo com esta e a pena mínima de acordo com a Lei nº 5.474/68” (TAMG. RT 710/330). “Inexiste o crime do art. 172 quando não há assinatura do emitente no título” (STF, RT 778/526).

2.6.9. Abuso de incapazes: Art. 173. Abusar, em proveito próprio ou alheio, de necessidade, paixão ou inexperiência de menor, ou da alienação ou debilidade mental de outrem, induzindo qualquer deles à prática de ato suscetível de produzir efeito jurídico, em prejuízo próprio ou de terceiro: Pena – reclusão, de dois a seis anos, e multa.

Abusar, com o sentido de fazer mau uso, aproveitar-se de alguém. Consiste em valer-se da necessidade, paixão ou inexperiência de

pessoa menor de dezoito anos ou portadora de doença mental e, assim, convencê-la a praticar ato jurídico que possa produzir efeito prejudicando esta mesma ou terceiro de boa fé. Urge o dolo direto ou eventual com a intenção de obter vantagem econômica para si ou para outrem. Crime formal porque se consuma com a prática do ato pela vítima, mesmo que não advenha qualquer vantagem efetiva para o agente ou terceiro. A tentativa é possível. Difere do estelionato, pois é sem fraude e formal.

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2.6.10. Induzimento à especulação: Art. 174. Abusar em proveito próprio ou alheio, da inexperiência ou da simplicidade ou inferioridade mental de outrem, induzindo-o à prática de jogo ou aposta, ou à especulação com títulos ou mercadorias, sabendo ou devendo saber que a operação é ruinosa: Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) e multa. (Suspensão condicional do processo-L.9099/95,art.89).

Sujeitos: a) ativo: qualquer pessoa; b) passivo: pessoa simples, inexperiente ou de mentalidade inferior, sem ser louca nem débil mental.

Tipo objetivo: Semelhante ao artigo 173-(abuso de incapazes), a conduta incriminada é abusar, induzindo. O agente convence a vítima ao jogo, à aposta ou à especulação com títulos ou mercadorias.

Tipo subjetivo: É o dolo, acompanhado do elemento subjetivo do tipo que é a finalidade de obter proveito próprio ou alheio. Na modalidade de especulação, o dolo pode ser direto (sabendo) ou eventual (devendo saber que a operação é ruinosa). Erro quanto ao estado da vítima exclui o dolo. Não há forma culposa.

Consumação: “Com a efetiva prática do jogo, aposta ou especulação, independentemente da obtenção de real proveito pelo agente ou terceira pessoa. Para a maioria dos comentadores, o crime estará consumado, ainda que a vítima obtenha lucro com o ato. Tal interpretação, embora tecnicamente certa, será rigorosa, na prática; além disso, o lucro apurado pela vítima tornará, muitas vezes, questionável a existência do elemento subjetivo do tipo que se requer.” (in C.P.Comentado/Celso Delmanto... [et al]. – 6. ed. atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Renovar, 2002 p. 417).

Tentativa: admite-se. Crime comum quanto ao agente,doloso e formal Ação penal: Pública incondicionada (conforme artigos 181 a 183-CP).2.6.11. Fraude no comércio: Art. 175. Enganar, no exercício de

atividade comercial, o adquirente ou consumidor: I – vendendo como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada

ou deteriorada;II – entregando uma mercadoria por outra: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa. § 1º. Alterar em obra que lhe é encomendada a qualidade ou o

peso de metal ou substituir, no mesmo caso, pedra verdadeira por falsa ou por outra de menor valor; vender pedra falsa por verdadeira; vender, como precioso, metal de outra qualidade:

Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa. § 2º. É aplicável o disposto no artigo 155, § 2º.Cabem: a transação no caput, nos crimes de competência da Justiça

Federal conforme a Lei nº 10.259/01, artigo 2º com aplicação analógica

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aos crimes de competência da Justiça Estadual. Pena alternativa. Suspensão condicional do processo em todas as figuras deste dispositivo.

Sujeitos: a) passivo: comerciante ou comerciário (crime próprio) para a maioria dos comentaristas. Segundo Bento de Faria: “sujeito ativo pode ser todo aquele que realize tais práticas no exercício de atividade comercial, pouco importando seja ou não estabelecido, tenha ou não licença, pague ou não impostos”.(Não sendo:171,§2º,IV-fraude ent.coisa) b) passivo: qualquer pessoa desde que não indeterminada.(C.ec.popular).

Tipo objetivo: A figura principal (caput) é iludir, de dupla maneira: A primeira conduta típica é “vender” mercadoria falsificada ou

deteriorada como se fosse verdadeira ou perfeita, ( a permuta ou doação não foram alcançadas pelo tipo). Hoje em dia, entretanto, é difícil imaginar situação que não esteja revogada pelo art. 7º da Lei 8.137/90, que trata dos crimes contra a relação de consumo. O inciso III do mencionado artigo, refere-se a hipóteses de mercadoria falsificada ao punir com detenção, de dois a cinco anos, ou multa “quem misturar gêneros e mercadorias de espécies diferentes, para vendê-los ou expô-los à venda como puros; misturar gêneros e mercadorias de qualidades desiguais para vendê-los ou expô-los à venda por preço estabelecido para os de mais alto custo”. De outro lado, o inciso IX do mesmo artigo refere-se a situações de mercadoria deteriorada, ao prever a mesma pena para quem “vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias para o consumo”.(Inciso-175,I)

A segunda conduta prevista no tipo simples do artigo 175 consiste em entregar uma mercadoria por outra enganando o consumidor. O engano pode referir-se à substância, qualidade, quantidade ou procedência de origem da mercadoria (inciso II). Mercadoria: qualquer coisa móvel e apropriável que se negocie.

O § 1º prevê a fraude no comércio de metais ou pedras preciosas, com quatro figuras alternativas: a) alterar a qualidade ou peso de metal, em obra encomendada; b) substituir pedra verdadeira por falsa ou de menor valor, também em obra encomendada; c) vender pedra falsa por verdadeira;d) vender,como precioso,metal de outra qualidade.Ouro-cobre

Tipo subjetivo: Dolo genérico. Não há forma culposa. Admite-se a tentativa. Consuma-se com a entrega pelo agente e aceitação pela vítima.

Classificação: crime próprio quanto ao sujeito ativo, doloso, material.Confronto: Tratando-se de substância alimentícia ou medicinal, art.

272, § 1º, (R.4-8+m) 273, § 1º, (R.10-15+m) ou 280-CP. Não sendo comerciante ou comerciário, art. 171, § 2º, IV ou Lei 1.521/51, art. 2º, III

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e V (crimes contra a economia popular). Quanto à venda de uísque nacional como estrangeiro, há posições conflitantes, enquadrando a conduta no art. 171 e § 2º, IV, 175, 275, 276 ou 277(R.1-5+m, cada tipo) e ainda, os artigos 66 a 70 da Lei 8.078/90 (CDC) e 7º, III e IX, da Lei 8.137/90, (relações de consumo: Detenção, de 2 a 5 anos ou multa).

Ação Penal: Pública incondicionada conforme artigos 181 a 183-CP.“Em tese, configura a colocação de peças inadequadas em objeto

recebido para conserto, com o intuito de enganar a vítima (TACrSP, RT 714/385). “Configura fraude no comércio e não estelionato a venda, por

comerciante, de piano inutilizado” (STF, RTJ 60/79). “Tipifica se entrega móvel fabricado em madeira diversa do tipo avençado e que se encontrava deteriorado por cupins (TACrSP, RJDTACr 22/209). “Ainda que a mercadoria seja falsificada, é atípica a conduta se a vítima não foi enganada, pois sabia que a mercadoria não era verdadeira” (TACrSP, RT 546/352). Compra para processar o vendedor.

2.6.12. Outras fraudes: Art. 176. Tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento:

Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 2 (dois) meses, ou multa.Parágrafo único. Somente se procede mediante representação, e o

juiz pode, conforme as circunstâncias, deixar de aplicar a pena.Cabem: Conciliação; transação penal e suspensão condicional do

processo, conforme artigos 72-74; 76 e 89, respectivamente, da 9099/95.Sujeitos: a) ativo: qualquer pessoa; b) passivo: quem presta o serviço.Tipo objetivo: Três fraudes previstas: a) tomar refeição em restaurante

sem dispor de recursos para efetuar o pagamento. Refeição inclui bebidas Restaurante é qualquer estabelecimento que sirva refeições: bares, lanchonetes, pensões etc. Em face da expressão: tomar refeição em restaurante, fica fora do tipo, aquela encomendada “para viagem”.b) alojar-se em hotel, sem dispor de recursos para efetuar o pagamento. Hotel com significação ampla: hospedarias, motéis, pensões, etc. c) utilizar-se de meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento. Relaciona-se com o transporte pessoal, em que não se exige pagamento antecipado: táxis, ônibus etc. Em todas as modalidades do artigo, há necessidade de que o agente não disponha de recursos para pagar, mas apresentando-se como se os tivesse. Não haverá, portanto, a tipificação se esqueceu o dinheiro em casa, ou não quiserem aceitar seu cheque ou cartão de crédito ou ainda se tendo recursos no momento, discordar da conta apresentada, por conter erro. Questões de ordem civil.

Tipo subjetivo: dolo genérico. Não há forma culposa. O estado de necessidade é excludente de ilicitude (arts. 23, I e 24-CP- não há crime).

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Consuma-se com a efetiva tomada, alojamento ou utilização.Delito comum quanto ao sujeito, doloso, material, de dano.Confronto: Segundo vários autores, havendo falsificação do bilhete de

passagem, o crime seria de estelionato ou falsidade; e caso de transporte clandestino seria estelionato.

Perdão judicial (parágrafo único): O juiz pode concedê-lo, “conforme as circunstâncias”.(causa de extinção da punibilidade-107,IX).

Ação penal: Pública condicionada à representação do ofendido.“Para configurar-se o crime, é necessário que o agente faça a refeição

sem ter dinheiro para pagá-la; se tem recursos, mas não paga, como acontece nos “pinduras” estudantis, o ilícito é só civil e não penal” (TACrSP, Julgados 90/83). “O pagamento de conta de restaurante com cheque furtado não autoriza a desclassificação do crime do art. 171, caput para o deste art. 176 (TACrSP, Julgados 72/356). Não desclassifica o crime do art. 171, § 2º, VI, para o delito do art. 176 do CP, o pagamento de conta de restaurante com cheque sem fundos (RJRJ, RT 452/437).

Interpretação extensiva dos locais e transportes, por beneficiar o réu, trata-se da analogia in bonam partem.

2.6.13. Fraudes e abusos na fundação ou administração de sociedade por ações. Art. 177. Promover a fundação de sociedade por ações, em prospecto ou em comunicação ao público ou à assembléia, afirmação falsa sobre a constituição da sociedade, ou ocultando fraudulentamente fato a ela relativo:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, se o fato não constitui crime contra a economia popular.

§ 1º. Incorrem na mesma pena, se o fato não constitui crime contra a economia popular:

I – o diretor, o gerente ou o fiscal de sociedade por ações que, em prospecto, relatório, parecer, balanço ou comunicação ao público ou à assembléia, faz afirmação falsa sobre as condições econômicas da sociedade, ou oculta fraudulentamente, no todo ou em parte, fato a elas relativo;

II – o diretor, o gerente ou o fiscal que promove, por qualquer artifício, falsa cotação das ações ou de outros títulos da sociedade;

III – o diretor ou o gerente que toma empréstimo à sociedade ou usa, em proveito próprio ou de terceiro, dos bens ou haveres sociais, sem prévia autorização da assembléia geral;

IV – o diretor ou o gerente que compra ou vende, por conta da sociedade, ações por ela emitidas, salvo quando a lei o permite;

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V – o diretor ou o gerente que, como garantia de crédito social, aceita em penhor ou em caução ações da própria sociedade;

VI – o diretor ou o gerente que, na falta de balanço, em desacordo com este, ou mediante balanço falso, distribui lucros ou dividendos fictícios;

VII – o diretor, o gerente ou o fiscal que, por interposta pessoa, ou conluiado com acionista, consegue a aprovação de conta ou parecer;

VIII – o liquidante, nos casos dos nºs I, II, III, IV, V e VII; IX – o representante da sociedade anônima estrangeira,

autorizada a funcionar no País, que pratica os atos mencionados nos nºs I e II, ou dá falsa informação ao Governo.

§ 2º. Incorre na pena de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, o acionista que, a fim de obter vantagem para si ou para outrem, negocia o voto nas deliberações de assembléia geral.

Cabem: a transação no caput, nos crimes de competência da Justiça Federal conforme a Lei nº 10.259/01, artigo 2º com aplicação analógica aos crimes de competência da Justiça Estadual. Pena alternativa. Suspensão condicional do processo em todas as figuras deste dispositivo.

Na primeira parte (artigo 177, caput) pune instituidores de sociedade anônima que divulguem informações falsas ou ocultem fraudulentamente fatos relevantes a ela relativos. Na segunda parte traz sanções penais referentes a regras de conduta a serem seguidas por diretores, gerentes, fiscais ou liquidantes da empresa (§ 1º, I a VIII), incluindo o representante de sociedade estrangeira (§ 1º, IX). Na terceira parte pune acionista que negociar seu voto nas deliberações da assembléia geral (§2º).Esta última figura perdeu importância prática depois que o art. 118 da Lei nº 6.404/76 permitiu o acordo de acionistas, inclusive quanto ao exercício do direito de voto. Dessa forma, somente existe esta última modalidade de infração penal se a negociação envolvendo o voto não estiver revestida das formalidades legais ou contrariar texto de lei.

Confronto: “O mestre Damásio de Jesus ensina que ‘o fato incide na Lei de Economia Popular (Lei n. 1.521/1951), art. 3º, incs. VII a X) quando atinge um número indeterminado de pessoas; caso em que a sociedade por ações é organizada por subscrição pública, apresentando-se com natureza popular; aplica-se o Código Penal (art. 177) quando lesa ou expõe a perigo de lesão uma pessoa ou um número determinado e pequeno de pessoas’” (Código Penal Anotado, p. 641), in Führer, 2004, p. 109.

Também se confronta com os crimes contra o mercado de capitais, Lei 6.385/76, com atualização da Lei 10.303/2001 e se a sociedade por ações

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for instituição financeira, oficial ou privada, será hipótese da Lei nº 7.492/86. Subsidiário: todas formas, a crimes contra a economia popular.

“Interventor de cooperativa agrícola que se utiliza, em proveito próprio e de terceiros, de dinheiro pertencente à sociedade, sem prévia autorização da assembléia geral, pratica, em tese, o delito do art. 177, §1º III, do CP” (STF, mv – RT 533/424).

2.6.14.Emissão irregular de conhecimento de depósito ou “warrant”: Art. 178. Emitir conhecimento de depósito ou “warrant”, em desacordo com disposição legal:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.Cabe: Suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei 9099/95).Warrant, palavra inglesa, significa em português: fiança ou garantia.São dois títulos de crédito, emitidos ao mesmo tempo pelos armazéns

gerais, mas, com finalidades diferentes. O endosso do conhecimento de depósito transfere a propriedade da mercadoria depositada e o endosso do warrant significa que a mesma foi dada em garantia de um empréstimo ou de alguma obrigação. Assim, quem possui ambos os títulos tem a plena propriedade da mercadoria em depósito no armazém geral emitente

Sujeitos: a) Ativo: qualquer pessoa que emite em desacordo com a lei; b) passivo: portador ou endossatário que recebe o título com ilegalidade.

Tipo objetivo: Circulação desses títulos em desacordo com disposição legal. Trata-se de norma penal em branco, complementada pelo Decreto nº 1.102, de 21.11.1903, considerando irregular a emissão dos títulos em apreço, quando: a) a empresa não está legalmente constituída (art. 1º); b) inexiste autorização do governo federal para a emissão (art.2º e 4º); c) inexistem as mercadorias especificadas como depósito; d) há emissão de mais de um título para a mesma mercadoria ou gêneros especificados nos títulos; e) o título não apresenta as exigências legais (art.5º).

Tipo subjetivo: O dolo genérico, ou seja, a vontade livre e consciente de emitir os títulos, ciente da sua irregularidade. Inexiste forma culposa.

Consumação: com a circulação dos títulos, sem dependência de efetivo prejuízo. A tentativa é admissível.

Classificação: Comum quanto ao agente, doloso, formal e de perigo.Ação penal: pública incondicionada.“A emissão irregular de conhecimento de depósito e warrant,

inexistindo a respectiva mercadoria no armazém, configura o art. 178 do CP” (TJSP, RT 501/265).

“A emissão de warrants e conhecimentos falsos, para a obtenção de empréstimos bancários, é crime-meio para alcançar o estelionato, sendo por este absorvida” (TFR, Ap. 4.480, DJU 26.5.83, p.7399).

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2.6.15. Fraude à execução: Art. 179. Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa.Parágrafo único. Somente se procede mediante queixa.Cabem: Conciliação nos crimes de competência da Justiça Federal

conforme a Lei nº 10.259/01, artigo 2º com aplicação analógica aos crimes de competência da Justiça Estadual. Aplicável a transação, desde que haja sempre a aquiescência do querelante.

Sujeitos: a) Ativo: o devedor demandado judicialmente; se for comerciante o crime poderá ser falimentar; b) passivo: o credor que está promovendo a ação.

Tipo objetivo: É imprescindível à tipificação que haja uma ação judicial cobrando o agente. Fraudar a execução é frustrar a execução de sentença judicial ou fundada em título executivo preconstituído, pela inexistência provocada ou simulada de bens pela alienação, desvio, destruição, danificação dos bens, ou, ainda, simulando dívidas. Urge que o devedor tenha conhecimento da ação judicial proposta e que a redução do seu patrimônio torne impossível a execução da dívida. A conduta somente se enquadra neste tipo penal quando o ato for configurado como fraude de execução, conforme os termos do artigo 393 do Código de Processo Civil: “Considera-se em fraude de execução a alienação ou oneração de bens: I – quando sobre eles pender ação fundada em direito real; II – quando ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência; III – nos demais casos expressos em lei.”

Tipo subjetivo: O dolo específico, ou seja, a vontade livre e consciente de alienar, desviar, destruir, danificar ou simular, e o elemento subjetivo do tipo, que é o fim de fraudar a execução. Inexiste culpa.

Consumação: No momento em que a execução torna-se irrealizável pela alienação, desvio, destruição etc.

Tentativa: Admite-se. Classificação: Delito próprio quanto ao sujeito, doloso, material, de

conduta e resultado.Confronto: Tratando-se de devedor comerciante, ver crimes

falimentares no Decreto-Lei nº 7.661/45 – Lei das Falências. Declarada a falência, dá-se, então, o concurso formal entre este crime comum e o crime falimentar, como dispõe o artigo 192 daquela lei.

Ação penal: Privada (art. 179, parágrafo único) processa-se mediante queixa do querelante (credor/vítima) contra o querelado (devedor/agente)

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“Em tese, poderia configurar o ato do executado que, após a penhora dos bens em ação de execução, os vende a terceiro, com prejuízo para o arrematante (TACrSP, RT 536/313), ou os substitui por outros de menor valor” (TACrSP, RJDTACr 22/206).

“O art. 179 exclui a incidência de qualquer outro tipo penal” (TJSP, RT 637/261).

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