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ARTIGO ARTICLE 151 1 Faculdade Latino Americana. Av. Universitária 683, Centro. 75080-150 Anápolis GO. [email protected] 2 Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Goiás. Crenças de pacientes diabéticos acerca da terapia nutricional e sua influência na adesão ao tratamento Beliefs of diabetic patients about nutritional therapy and its influence on their compliance with treatment Resumo O sistema de crenças em saúde influen- cia o processo de adesão ao tratamento de diabetes. A adesão à terapia nutricional é um dos maiores desafios. O objetivo desse estudo de abordagem qua- litativa foi analisar as crenças de pacientes diabé- ticos tipo 2 a respeito da terapia nutricional e sua influência na adesão. Participaram do estudo nove pacientes em tratamento em um centro de refe- rência para atendimento à diabéticos. Os procedi- mentos envolvidos foram coleta de sangue para dosagem de hemoglobina glicada, aplicação de ques- tionário, entrevista semi-estruturada gravada e consulta ao prontuário. A análise das falas foi feita a partir do modelo de categorias temáticas de Bar- din, e segundo os modelos de crenças de Rosenstock e Rokeach. Todos os participantes apresentaram níveis de hemoglobina glicada acima de 7%, deno- tando dificuldade para o controle glicêmico e pos- sível falta de adesão. Pela análise das falas, foram identificadas duas categorias temáticas: “Reco- mendações recebidas sobre alimentação” e “Ade- são à terapia nutricional”. Elas revelam crenças de autoridade e de consenso zero, e de barreiras à terapia nutricional, percebida como imposição restritiva. São crenças que influenciam negativa- mente a adesão; assim, precisam ser consideradas no atendimento à população. Palavras-chave Diabetes, Aceitação do paciente de cuidados de saúde, Terapia nutricional Abstract The system of health beliefs influences the process of compliance with diabetes treatment. Compliance with nutritional therapy is one of the greatest challenges found. The purpose of this qualitative approach study was to analyze the beliefs of type 2 diabetic patients regarding nutri- tional therapy and its influence on the compli- ance with it. The participants of the study were nine patients being treated in a reference unit for diabetic patients’ treatment. The procedures in- volved were blood exam to check the glycated he- moglobin, a questionnaire, semi-structured re- corded interview and patient report checking. The analysis of the speeches was made using the the- matic categories of Bardin (2000), and the mod- els of Rokeach (1981) and Rosenstock (1974). All participants showed glycated hemoglobin levels higher than 7%, what shows that is difficult for them to control their glicemic levels and possible non compliance. After the analysis of the speech- es, two thematic categories were identified: “Rec- ommendations received about feeding” and “Nu- tritional therapy compliance”. Both categories showed authority beliefs and consensus zero, and barriers to nutritional therapy, which the par- ticipants see as a restrictive imposition. Those beliefs have negative influence on the compliance, and so, they have to be considered when provid- ing health assistance to the population. Key words Diabetes, Patient acceptance of health care, Nutritional therapy Flavia Melo Pontieri 1 Maria Márcia Bachion 2

Crenças de Pacientes Diabéticos Acerca Da Terapia Nutricional

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    1 Faculdade LatinoAmericana. Av.Universitria 683, Centro.75080-150 Anpolis [email protected] Faculdade de Enfermagem,Universidade Federal deGois.

    Crenas de pacientes diabticos acerca da terapia nutricionale sua influncia na adeso ao tratamento

    Beliefs of diabetic patients about nutritional therapyand its influence on their compliance with treatment

    Resumo O sistema de crenas em sade influen-cia o processo de adeso ao tratamento de diabetes.A adeso terapia nutricional um dos maioresdesafios. O objetivo desse estudo de abordagem qua-litativa foi analisar as crenas de pacientes diab-ticos tipo 2 a respeito da terapia nutricional e suainfluncia na adeso. Participaram do estudo novepacientes em tratamento em um centro de refe-rncia para atendimento diabticos. Os procedi-mentos envolvidos foram coleta de sangue paradosagem de hemoglobina glicada, aplicao de ques-tionrio, entrevista semi-estruturada gravada econsulta ao pronturio. A anlise das falas foi feitaa partir do modelo de categorias temticas de Bar-din, e segundo os modelos de crenas de Rosenstocke Rokeach. Todos os participantes apresentaramnveis de hemoglobina glicada acima de 7%, deno-tando dificuldade para o controle glicmico e pos-svel falta de adeso. Pela anlise das falas, foramidentificadas duas categorias temticas: Reco-mendaes recebidas sobre alimentao e Ade-so terapia nutricional. Elas revelam crenas deautoridade e de consenso zero, e de barreiras terapia nutricional, percebida como imposiorestritiva. So crenas que influenciam negativa-mente a adeso; assim, precisam ser consideradasno atendimento populao.Palavras-chave Diabetes, Aceitao do pacientede cuidados de sade, Terapia nutricional

    Abstract The system of health beliefs influencesthe process of compliance with diabetes treatment.Compliance with nutritional therapy is one ofthe greatest challenges found. The purpose of thisqualitative approach study was to analyze thebeliefs of type 2 diabetic patients regarding nutri-tional therapy and its influence on the compli-ance with it. The participants of the study werenine patients being treated in a reference unit fordiabetic patients treatment. The procedures in-volved were blood exam to check the glycated he-moglobin, a questionnaire, semi-structured re-corded interview and patient report checking. Theanalysis of the speeches was made using the the-matic categories of Bardin (2000), and the mod-els of Rokeach (1981) and Rosenstock (1974). Allparticipants showed glycated hemoglobin levelshigher than 7%, what shows that is difficult forthem to control their glicemic levels and possiblenon compliance. After the analysis of the speech-es, two thematic categories were identified: Rec-ommendations received about feeding and Nu-tritional therapy compliance. Both categoriesshowed authority beliefs and consensus zero, andbarriers to nutritional therapy, which the par-ticipants see as a restrictive imposition. Thosebeliefs have negative influence on the compliance,and so, they have to be considered when provid-ing health assistance to the population.Key words Diabetes, Patient acceptance of healthcare, Nutritional therapy

    Flavia Melo Pontieri 1

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    Spiritual VirusNotahttp://www.scielo.br/pdf/csc/v15n1/a21v15n1.pdf

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    Introduo

    O diabetes mellitus (DM) pode ser definido comouma sndrome de etiologia mltipla, decorrenteda falta de insulina e/ou incapacidade da insulinade exercer adequadamente seus efeitos. Caracte-riza-se por hiperglicemia crnica com distrbiosdo metabolismo de lipdios e protenas1-3. Entreos seus vrios tipos, destaca-se o DM tipo 2, querepresenta 90% dos casos da sndrome, apare-cendo geralmente na idade adulta4.

    As complicaes do DM podem ser agudasou crnicas. Entre as complicaes agudas estoa hiperglicemia e a hipoglicemia. As complicaescrnicas podem ser macrovasculares (doena car-daca coronria, doena vascular perifrica e do-ena cerebrovascular), microvasculares (retino-patia e nefropatia) e neurolgicas (neuropatia)5.

    Atualmente, estima-se que existem em todoo mundo cerca de 150 milhes de pessoas porta-doras de diabetes e esse nmero poder duplicarat o ano de 2025. O DM juntamente com ou-tras doenas crnicas, atingiu propores queatualmente permitem consider-lo como umapandemia, atingindo todos os pases, indepen-dente do seu grau de desenvolvimento1,2,6-9.

    Essa alta incidncia e prevalncia na popula-o mundial podem implicar problemas econ-micos e sociais, tais como a diminuio da pro-dutividade, altos custos do tratamento, piora daqualidade de vida e diminuio da sobrevida dospacientes. O DM ainda contribui de forma signi-ficativa para o aparecimento de outras doenas,o que agravado na vigncia de tratamento ina-dequado ou ausente1,2,6,7.

    O maior desafio para o controle da sndro-me manter a glicemia dentro de parmetrosadequados. O controle glicmico almejado gli-cemia de jejum menor que 126 mg/dl e hemoglo-bina glicosilada menor que 7%10.

    essencial uma reorganizao de hbitos ali-mentares para o controle do DM tipo 2. Paratanto, necessrio que haja integrao entre aalimentao e os demais cuidados desenvolvidospelo paciente. O comportamento alimentar modificado de acordo com as exigncias e limita-es impostas pela sndrome, devendo ser revis-tas escolhas alimentares, diminuindo as caloriaspara evitar ganho de peso, aumentando a ativi-dade fsica, moderando a ingesto de gordura,espaando as refeies e monitorizando a glice-mia, objetivando, finalmente, seu controle2,11,12.

    A dieta hipocalrica, responsvel pela perdaponderal, particularmente significante logo apso diagnstico de DM tipo 2, quando a secreo

    de insulina ainda adequada. Essa dieta temmostrado importante papel regulador no con-trole da hiperglicemia ainda que no haja perdaponderal, o que torna o valor da ingesto calri-ca mais importante que o peso em si5.

    Devido gama de alteraes do estilo de vidaque so impostas s pessoas portadoras do DMtipo 2, numa fase da vida em que seus hbitos jesto bastante consolidados, a adeso destas aotratamento tem sido um grande desafio e este fen-meno nosso objeto de estudo neste momento.

    Adeso da pessoa diabtica ao tratamento

    Adeso muito mais que simplesmente cumprirdeterminaes do profissional de sade. Se en-tendida dessa maneira, supe que o paciente notenha autonomia, sendo completamente exclu-do do controle do seu estado de sade, cabendoesse papel exclusivamente ao profissional. Supetambm que no haja influncia ou interfernciade familiares, amigos ou vizinhos, nem das re-presentaes de sade, corpo e doena para opaciente. A realidade que, no processo de ade-so, os pacientes tm autonomia e habilidade paraaceitar ou no as recomendaes dos profissio-nais de sade, tornando-se participantes ativosdo processo de cura13.

    Avaliar o processo de adeso no significaento apenas avaliar o cumprimento de deter-minaes de profissionais de sade, mas nos per-mite, embora numa perspectiva limitada, verifi-car fatores que tornam a incorporao de deter-minadas atitudes necessrias ao tratamento desade to difceis e distantes da realidade de par-te dos pacientes.

    Alguns fatores tm apresentado grande im-portncia com relao adeso dos pacientes aotratamento. Entre eles esto respostas corporais,tais como diminuio dos episdios de hipergli-cemia/hipoglicemia e diminuio dos nveis deglicemia, variveis socioeconmicas (sexo, idade,raa, estado civil, ocupao, renda e educao),relao custo-benefcio do tratamento, interaoentre mdicos e pacientes, efeitos e interaesmedicamentosas (efeitos adversos e colaterais),concepes e conhecimentos a respeito da pr-pria sndrome e participao da famlia. O vn-culo do paciente com a unidade de sade, con-tando com terapias e profissionais atualizados,tambm parte importante desse processo11,13,14.

    A adeso a terapias em pases desenvolvidosgira em torno de 50% e pode ser ainda muitomenor em pases em desenvolvimento, em face

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    ao baixo acesso a servios de sade pela popula-o em geral. A baixa adeso a tratamentos lon-gos, como o caso do diabetes, compromete aefetividade dos mesmos, tornando-se um pro-blema crtico para a sade da populao, no to-cante diminuio da qualidade de vida relacio-nada a aspectos econmicos15.

    Segundo Lessa6, o reconhecimento do DMtipo 2 como uma enfermidade crnica que afetamilhes de pessoas no mundo tem motivado asorganizaes de sade a buscarem metodologiasque favoream um delineamento real do proble-ma, assim como das melhores estratgias a se-rem adotadas para favorecer a adeso dos paci-entes ao tratamento, buscando conhecer fatoresat ento no considerados importantes. Segun-do Aruz16, esses fatores se relacionam aos co-nhecimentos, s percepes, s atitudes, aos me-dos e s prticas dos pacientes em um contextofamiliar e comunitrio. Estes fenmenos por suavez esto ligados s crenas das pessoas.

    Crenas em sadee sua relao com a adeso ao tratamento

    De uma forma geral, no universo da sade, pode-mos dizer que as crenas so definidas como idi-as, conceitos, convices e atitudes tomadas pelospacientes que esto relacionadas sade ou do-ena e como estes fatores acabam por influir naqualidade de vida e na sade dessas pessoas17.

    Existem formas diferentes de classificaopara as crenas em sade. Rokeach18, diferenciaas crenas em cinco tipos:

    1) Crenas primitivas consenso 100% soapreendidas pelo encontro direto com o objeto dacrena, reforadas por um consenso social unni-me entre todas as referncias de pessoas ou gru-pos. Representam as verdades bsicas do indiv-duo sobre a realidade fsica, social e a natureza doeu, no sendo sujeitas discusso ou controvrsia;

    2) Crenas primitivas consenso zero dife-rem das anteriores pelo fato de que sua manuten-o no depende do fato de ser compartilhadacom outros: no h referncia de grupos ou pes-soas fora do eu que possam discutir tal crena;

    3) Crenas de autoridade so crenas inici-almente primitivas que se modificam a partir daexpanso do sistema de crenas, desenvolvendoa parte no-primitiva deste. So crenas modifi-cadas pela interao com o meio social, normal-mente submetidas a uma autoridade consentida;

    4) Crenas derivadas so provenientes (ouderivadas) das crenas em determinadas autori-

    dades. Exemplos dessas so as crenas ideolgi-cas, originadas mais pela identificao com aautoridade religiosa ou poltica do que com oobjeto da crena. Ainda esto neste grupo cren-as obtidas atravs de fontes confiveis, tais comojornais ou revistas;

    5) Crenas inconsequentes crenas que re-presentam questes de gosto, so mais ou me-nos arbitrrias. Tm pouca ligao com as ou-tras crenas e sua modificao no traz implica-o para a organizao do sistema de crenas doindivduo.

    Esse modelo nos permite avaliar a fora dascrenas no sistema organizado pelo indivduo, oque pode servir de base para a abordagem domesmo caso deseje a modificao de determina-da crena. Acredita-se que quanto mais se apro-xime da crena primitiva de consenso 100%, maisimutvel seja, mas isso no uma regra18.

    Outra abordagem que contribui para com-preender o comportamento das pessoas na reade sade a de Rosenstock19, cujo modelo foiproposto por Becker20. Este modelo, conhecidocomo modelo de crenas em sade (MCS), incluium forte componente de motivao e do mundoperceptual do indivduo. uma teoria que nos tenta explicar um problema particular de sa-de, mas que tambm pode ser adaptada a outroscontextos de comportamento21.

    As caractersticas iniciais do modelo procu-ram prever aes e atitudes dos indivduos emrelao s doenas, tendo em vista quatro vari-veis que so interdependentes19:

    1) Susceptibilidade percebida a varivelque avalia a aceitao da possibilidade de contra-ir uma determinada condio ou patologia. Anfase dada realidade subjetiva e no a objeti-va, explicada pelo fato de que as pessoas variamde forma acentuada na interpretao no que dizrespeito a uma realidade objetiva;

    2) Severidade percebida essa varivel dizrespeito percepo da seriedade de uma dadacondio de sade. O grau de seriedade pode serjulgado pelo grau de estimulao emocional cri-ado pelo pensamento de uma doena, pelos ti-pos de dificuldade que o indivduo acredita queuma dada condio de sade poder criar paraele ou mesmo pelo simples conhecimento dascomplicaes que aquela doena poder trazerpara a sua sade e qualidade de vida;

    3) Benefcios percebidos o comportamentodo indivduo depender ainda da crena de quobenficas, para o seu caso, sero as alternativaspara reduzir a ameaa dada condio de sade.Deve haver pelo menos uma ao que seja subje-

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    tivamente possvel, seja ela relacionada redu-o da susceptibilidade ou da severidade da do-ena;

    4) Barreiras existentes essa varivel diz res-peito aos aspectos negativos percebidos pelo in-divduo em relao s aes em sade. Ele podeperceber essas aes como caras, inconvenientes,desagradveis, dolorosas ou que exigem muitotempo disponvel. Essas qualificaes das aesse tornam barreiras e criam motivos conflitantes.

    Para determinao dos fatores facilitadores edificultadores da adeso, deve-se observar e esta-belecer relaes entre as vrias instrues que sofeitas ao paciente, suas aes de autocuidado, asconsequncias a curto, mdio e longo prazo.

    Entre fatores j detectados como facilitado-res da adeso esto o tratamento dos pacientespor mdicos especialistas, maior tempo de diag-nstico, apoio social e familiar, escolaridade dopaciente, tratamento flexvel, simplificao dasprescries e objetivos claros, focalizando mu-danas graduais. Entre as barreiras estariam osproblemas de baixa auto-estima, estresse e con-trole aversivo do paciente para aderir ao trata-mento. A ausncia de sintomas, mesmo com asndrome j diagnosticada, pode ser tambmuma importante barreira22.

    A piora do quadro clnico tambm tem umarelao com o aumento da adeso ao tratamen-to, sendo difcil verificar se existe algum patamar(medicao, exerccio ou alimentao) que seja demais fcil adeso. Existe uma tendncia de menoradeso prescrio alimentar, por ser considera-do o fator comportamental e social de mais difcilmodificao. Quanto mais mudanas forem exi-gidas na rotina do paciente, mais difcil ser suaadeso. Quanto menores as complicaes queestiverem existindo, menor a adeso22.

    Um dos fatores que tem sido pouco estuda-do em relao adeso de pessoas diabticas terapia nutricional a anlise do seu sistema decrenas. Assim, foi desenvolvido o presente estu-do, com o objetivo de analisar as crenas de pa-cientes portadores de diabetes tipo 2 acerca daterapia nutricional, com a finalidade de contri-buir para compreender essa faceta de um fen-meno to complexo que a adeso.

    Os achados dessa pesquisa podero redireci-onar tanto a formao dos profissionais em sadecomo sua atuao, no sentido de prestar melhoratendimento populao diabtica. Alm disso,podem subsidiar pesquisas futuras, no sentidode buscar a razo da formao das crenas, demodo a orientar intervenes.

    Metodologia

    Trata-se de um estudo de abordagem qualitati-va, realizado em uma unidade de referncia paraatendimento de pessoas diabticas no sistemapblico de sade de uma cidade do Estado deGois. O estudo foi realizado mediante aprova-o do Comit de tica em Pesquisa da Universi-dade Federal de Gois.

    O recrutamento foi feito junto aos partici-pantes do Programa de Diabetes da Unidade, queconta com cerca de 4.200 inscritos. Nesse pro-grama, que atende a populao de toda a cidadeonde se localiza e entorno, os pacientes recebematendimento mdico, nutricional e da equipe deenfermagem.

    A abordagem dos participantes foi realizadauma vez por ms, s quartas-feiras, no perodode novembro de 2004 a maio de 2005, no mo-mento em que aguardavam a consulta com anutricionista. Nesse encontro, foram prestadasinformaes sobre a pesquisa, suas finalidades,objetivos, procedimentos envolvidos, riscos ebenefcios. Aqueles que concordaram, assinaramtermo de consentimento livre e esclarecido.

    A cada ms, duas ou trs pessoas foram in-cludas no estudo. Os nicos critrios estabeleci-dos foram que a idade do participante fossemaior ou igual a dezoito anos e que o diagnsti-co mdico fosse diabetes tipo 2, independente deoutras comorbidades existentes.

    Aps o consentimento dos participantes, foiagendada data para coleta de dados que constoudos seguintes procedimentos:

    - Coleta de 5 ml de sangue venoso perifricopara dosagem de hemoglobina glicosilada, emlaboratrio de anlises clnicas conceituado, porum tcnico desta instituio, respeitando as de-vidas medidas de biossegurana;

    - Aplicao de questionrio com questespara caracterizao socioeconmica e cultural eentrevista registrada com auxlio de gravador, apartir de um questionrio semi-estruturado, nodomiclio dos participantes;

    - Consulta aos pronturios na Unidade Bsi-ca de Sade, para obteno de informaes com-plementares sobre o tratamento ambulatorial.

    Quando prontos, os resultados de dosagemde hemoglobina glicosilada foram disponibiliza-dos para todos os participantes, que receberamas devidas orientaes sobre as taxas obtidas.

    A determinao do contingente de participan-tes se deu a partir do momento em que ocorreu asaturao das falas, ou seja, a partir do momen-

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    to em que os contedos das entrevistas passa-ram a ser repetitivos.

    Para anlise dos dados, aps transcrio dasfalas, foram utilizados procedimentos de anlisede contedo, adotando o modelo de categoriasde Bardin23, modalidade temtica. Nesse mode-lo, so preconizados os seguintes passos:

    1) Pr-anlise fase de organizao dos da-dos, na qual fazemos a leitura flutuante, a esco-lha dos documentos, a formulao de hiptesese objetivos, e referenciao dos ndices e elabora-o de indicadores e a preparao do material;

    2) Explorao do material consiste essenci-almente em operaes de codificao e enumera-o do material;

    3) Tratamento dos resultados, inferncia einterpretao consiste em dar aos dados signi-ficados. A partir da, o pesquisador pode proporinferncias a propsito dos objetivos ou a outrasdescobertas inesperadas. Em seguida, deve serfeita uma interpretao a partir de referenciaistericos ou pragmticos. Essa interpretao podefornecer orientaes para uma nova anlise.

    O processo de categorizao, para a anlisede categorias, se insere neste modelo bsico, sen-do um processo estruturalista que comportaduas etapas:

    1) Inventrio a partir de uma leitura exaus-tiva, isolam-se os elementos;

    2) Classificao os elementos so reparti-dos a partir das categorias determinadas. As cate-gorias devem possuir as seguintes caractersticas:excluso mtua (um elemento no pode existirem duas categorias), homogeneidade (um nicoprincpio de classificao deve nortear a organiza-o), pertinncia (adaptam-se ao material esco-lhido), objetividade, fidelidade, reprodutividade.

    As categorias identificadas foram interpreta-das utilizando-se os referenciais de Rosenstock19

    e Rokeach18.Os resultados dos exames de hemoglobina

    glicosilada foram interpretados de acordo comparmetros especficos tcnica utilizada e pre-conizados pela ADA10, que considera valores nor-mais at 7,0%.

    Apresentao e discusso dos resultados

    Participaram do estudo nove pessoas, sendo trshomens e seis mulheres. Sete eram casados, umsolteiro e um vivo. Quatro eram aposentados,dois do lar, um agente administrativo, um hor-ticultor e um agente de sade. A escolaridade va-

    riou de nenhuma a terceiro grau completo. Asidades variaram entre trinta e setenta e cinco anos,a renda per capita (representada pelo total derendimentos dos moradores da casa dividido poresse mesmo nmero) variou de 108 a 750 reais.

    Quanto s caractersticas relacionadas sn-drome e ao tratamento em si, o tempo de diag-nstico variou de trs meses a 25 anos, enquantoo tempo de atendimento na unidade de sadevariou de um ms a oito anos. O nmero deconsultas mdicas na unidade variou de zero a31, enquanto o nmero de consultas com nutri-cionista variou de um a 22.

    Os resultados obtidos nos exames de hemo-globina glicosilada aplicados revelaram nveisentre 7,3 a 13,9%, todos considerados acima dopreconizado, o que, segundo Cramer24, pode sig-nificar baixa adeso ao tratamento e/ou medica-o inadequada.

    No processo de anlise das falas, foram iden-tificadas duas categorias, denominadas Reco-mendaes recebidas sobre a alimentao e Ade-so terapia nutricional.

    Trata-se de contedo extremamente rico, quesuscita reflexes acerca das atividades de atendi-mento dos profissionais de sade, sobre a formados mesmos lidarem com questes de sade emsituaes extremamente delicadas para os pacien-tes, como o caso das doenas crnicas, que envol-vem fatores no s de estar bem ou estar malfisicamente, mas estar adoecido, ser e existir numcontexto socioeconmico, cultural e familiar.

    Recomendaes recebidassobre a alimentao

    A respeito das recomendaes recebidas, pu-demos observar, a partir das falas dos depoen-tes, que a alimentao indicada pelos profissio-nais ao diabtico restritiva e impositiva, carre-gada de expresses proibitivas como no pode:

    E comer menos coisas de acar e refrigerante,retirar tudo n, e massa tambm (P1).

    Falou pra eu fazer regime, comer muita fruta,verdura (P3).

    At me deu uma tabelinha das coisas que euno posso comer (P5).

    Depois ela mandou tomar s o caldo do feijo,no pode comer o bagao no (P6).

    Menos massa, comer mais verduras e legumes,e suco s base de adoante, e no de todas asfrutas, ele recomendou mais suco de caju (P8).

    As falas dos participantes so muito seme-lhantes, denotando o sentido de restrio aos ali-

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    mentos a serem ingeridos. Parece que o prprioprofissional de sade, ao tentar uma adeso maissignificativa do paciente ao tratamento, utilizaorientaes simplistas cuja tnica a proibio.

    A proposta geral para a alimentao do dia-btico no deve ser proibitiva, e sim formada porum cardpio variado, balanceado, dentro de umlimite preestabelecido5,10,25.

    Parece uma recomendao simples e fcil deser seguida, mas dependendo dos hbitos alimen-tares anteriores, a limitao da quantidade decalorias pode representar uma mudana drsti-ca e originar crenas acerca da terapia nutricio-nal que podem ser barreira adeso por remetera prticas restritivas. Como j foi verificado porTorres-Lpez8, proibir o paciente de ingerir ali-mentos populares e de consumo frequente, taiscomo o arroz e o po, pode determinar uma bai-xa adeso ao tratamento. No existe mais a indi-cao da reduo desses alimentos para os dia-bticos, abaixo do recomendado para a popula-o no geral. A determinao da quantidade decarboidratos deve ser individualizada10.

    Essas crenas podem ser classificadas comocrenas de autoridade, sendo as figuras que apa-recem como referncia os profissionais de sade,que, no cenrio da presente pesquisa, so dasreas de nutrio e de medicina.

    As recomendaes alimentares parecem ad-vir de um processo unilateral, o paciente no chamado para o dilogo, para a tomada de deci-so em parceira, dentro de suas condies de vida.

    A formao dos profissionais de sade nessesentido deve ser redirecionada, pois durante afase de ensino clnico, em que os alunos exerci-tam o atendimento aos usurios do sistema desade, o que se observa ainda a preleo, o acon-selhamento, sem que o paciente seja chamado ase pronunciar sobre suas crenas, suas prefern-cias, suas informaes anteriores.

    A abordagem do diabtico necessita de umaviso holstica, interdisciplinar, na qual haja atua-o de vrios profissionais de sade, tendo em vis-ta o controle e a preveno do diabetes, assim comoa preveno e o controle das complicaes da sn-drome2,26, de modo convergente e integrado.

    Adeso terapia nutricional

    A necessidade de mudana de hbitos per-cebida pela maioria dos participantes como par-te essencial do tratamento, mas difcil fazer essapassagem. Algumas vezes, o tipo de trabalho dapessoa pode ser uma barreira para uma alimen-tao mais adequada.

    A verdade a seguinte: eu achei ruim ter quecomer seis vezes por dia. Por causa do servio, eu notenho muito tempo pra comer durante o dia (P5).

    Uai, a dificuldade maior que a gente cozi-nheira, a gente fica sempre lambiscando algumacoisinha, e isso piora muito a vida da gente (P1).

    Em outras vezes, atitudes da prpria famlia que se tornam uma barreira.

    Eu tomo aquele adoante ali, mas o meu meni-no, quando eu vou fazer um suco ele no gosta,ento eu boto acar no suco e tomo junto (P3).

    A participao da famlia, eles no ajudam eeu no esforo tambm porque eles fazem o quefazem, eles no tm assim aquela ateno viradapara me ajudar nessa parte. Ela [a esposa] boapra cozinhar, ela faz, eu como. Eles comem, eu comotambm. Mas tambm se eles fizessem uma especi-al, no vou dizer que tirasse ela da rotina, mas quefosse mais fcil, uma alimentao pra mim maispassiva a esse tratamento, eu acharia bom e seriamais fcil (P8).

    As prticas relativas alimentao so deter-minadas no convvio familiar e social. A modifi-cao da dieta e a proposta de formao de novoshbitos alimentares devem respeitar as prefern-cias dos indivduos, levando em considerao seuambiente familiar e seu meio social. A pessoa res-ponsvel pela preparao dos alimentos para oindivduo diabtico deve estar ciente das suas ne-cessidades e das suas preferncias. Muitas vezes, preciso ainda que outras pessoas irmos, pais,filhos, cnjuges abram mo de suas prticasno saudveis em funo de uma alimentaomais adequada ao paciente diabtico.

    Em funo de no haver acordo entre os fa-miliares, pode ser necessria ao diabtico a ado-o de uma alimentao separada dos demais.Esse fator pode ser uma barreira na adeso terapia nutricional, pois muitas vezes ele no capaz de elaborar seus prprios alimentos, nosente motivao para alimentar-se separadamen-te dos demais e acaba por no seguir as reco-mendaes necessrias ao seu tratamento.

    Por outro lado, as preferncias alimentarespodem ser muito poderosas:

    Eu gosto de um pozinho, no posso comer mais,queijo at que eu no acho ruim, no dou muitocerto com salada e nem com fruta, eu como, masno aquele trem atrativo. Eu gosto de comidamais com massa, um churrasquinho, no vou men-tir, carne gordurosa, eu gosto de comida bem tem-peradinha, bem arrumadinha, entendeu? (P5).

    Os hbitos alimentares das pessoas so cons-trudos ao longo da vida e so influenciados peloconvvio social e familiar. A necessidade de rees-

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    truturao dos hbitos alimentares dos diabti-cos torna-se, por isso, uma atitude ainda maisabrangente, pois se percebe que, para que se te-nha uma mudana efetiva por parte das pessoasadoecidas, preciso que o meio no qual ela estinserida passe tambm por transformaes.

    O que se pode observar atualmente que oshbitos alimentares da populao em geral estoinadequados. No s em pases desenvolvidos,como em pases em desenvolvimento, em virtudede transformaes sociais, econmicas e cultu-rais, a forma de se alimentar e a composio dadieta das pessoas foram alteradas. Essa transfor-mao fez com que a populao passasse a inge-rir mais alimentos com alto valor calrico, gran-de quantidade de acar refinado, grande quanti-dade de gorduras, principalmente gorduras satu-radas, e maior quantidade de protenas, enquan-to que a quantidade de fibras e gorduras insatu-radas diminuiu9.

    Dessa forma, necessrio um processo de re-educao alimentar global, envolvendo todas aspessoas de forma geral, embora isso seja prementepara as pessoas diabticas e seus familiares.

    s vezes a pessoa interpreta a quantidade in-dicada como insuficiente s suas necessidades,apresentando, assim, dificuldade de atender sexigncias de reestruturao do padro alimen-tar, pois sua percepo das mesmas que soimpossveis de serem seguidas.

    Eu tenho que comer pouco arroz, pouco feijo,mas se eu no comer d fraqueza, d aquela treme-deira (P3).

    O profissional deve estar atento para verifi-car o grau de compreenso que o paciente tevedas recomendaes feitas. Ele deve ser capaz dedetectar possveis distores do que foi recomen-dado. Deve existir um dilogo entre o profissio-nal e o paciente e um espao para que o pacientecoloque suas dvidas, caso contrrio poderocorrer a dificuldade de adeso por interpreta-o errada das informaes.

    Alguns depoentes citam como uma dificul-dade de adeso dieta sua restrio financeirapara adquirir os alimentos prescritos:

    A gente no d conta de comprar a alimenta-o, pra alimentar corretamente como eles man-dam. Porque muito caro as frutas. A gente comeaquelas coisas que so mais baratas (P4).

    Alm da dificuldade em adquirir alimentosbsicos, os depoentes acrescentam a dificuldadepara comprar produtos dietticos:

    Voc no acha coisas para diabticos acess-veis, voc acha um acar, caro, voc acha umsorvete, um trenzinho diferente, caro, voc no

    tem muita opo. Pra nossa renda no t dandocerto seguir esse tipo de dieta assim (P5).

    Muitas vezes, ao receber as primeiras orien-taes sobre a alimentao adequada, o diabti-co depara com sua condio financeira como umabarreira intransponvel. Cabe ao profissional queo acompanha estar habilitado a propor aquisi-es acessveis de acordo com as condies fi-nanceiras do paciente8,27 e discutir as possibilida-des de substituies.

    Algumas vezes, os entrevistados citam umprocesso de vaivm na adeso, demonstrandoserem necessrios persistncia e empenho parapermanecer dentro dos novos padres:

    No incio difcil, porque a gente sente muitafome, mas depois fica fcil. De vez em quando agente come uma coisinha fora da dieta, mas mui-to de vez em quando (P4).

    Direito e direto, constantemente no fao. Umpouco comodismo meu (P8).

    Fiz essa mudana de alimentao. Mas frutaeu no como no. De vez em quando a gente saium pouquinho, mas muito de vez em quando(P5).

    As pessoas diabticas precisam se manter emtratamento como um processo contnuo, que sefor quebrado ou interrompido poder trazerconsequncias indesejadas. Como essas conse-quncias no so aparentes a princpio, os paci-entes podem acreditar que pequenos excessos nosero capazes de prejudicar seu estado de sadegeral.

    O profissional deve estar ciente de que, navigncia de uma condio de alterao crnica desade, so esperados perodos de flutuao naadeso. Deve mostrar-se sensvel para compre-ender os limites dos outros. Entender que para odiabtico o tratamento representa em certa me-dida o cerceamento de sua liberdade.

    Para alguns, a dificuldade foi apenas inicial,sendo progressivamente superada. Para outros,a transio foi tranquila:

    A dieta eu fao direto. Acar eu no como enada que faz com acar (P6).

    No achei a dieta difcil de fazer no (P7).Essa menor dificuldade verificada quando a

    pessoa apresenta hbitos alimentares semelhan-tes aos propostos no plano alimentar do diab-tico e, portanto, no h dificuldade para fazeradaptaes menores.

    Embora refiram no terem dificuldade emseguir a orientao alimentar, os entrevistadosdesignados como P6 e P7 apresentaram valoresde hemoglobina glicosilada acima do preconiza-do (9,1 e 13,2%, respectivamente). Assim, pode

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    ter havido incongruncia entre o discurso e a pr-tica ou incongruncia de crenas, que so as per-cepes mais profundas e autnticas acerca domundo real.

    Na categoria adeso terapia nutricional, foiidentificada a crena primitiva de consenso zerode que a dieta difcil de ser seguida, podendoconstituir-se como barreira adeso do pacienteao tratamento.

    Frente complexidade da sndrome, que en-volve alteraes e complicaes orgnicas, im-pacto pessoal, familiar e ambiental, os gestores eprofissionais de sade precisam desenvolveraes de atendimento, contando com a partici-pao de equipes multiprofissionais que estejamvoltadas para compreender a subjetividade dapopulao, de modo a produzir estratgias parapotencializar as transformaes das crenas emsade.

    O termo dieta, usado comumente tanto pe-los entrevistados como pelos profissionais desade de modo geral, traz uma conotao de res-trio. Esta palavra poderia ser substituda porplano alimentar, alimentao saudvel, ou ade-quada, por exemplo.

    Outra tnica que poderia ser adotada na re-lao dos profissionais com os usurios de quea alimentao recomendada aquela que maissaudvel, e que deveria ser adotada por todas aspessoas de modo geral, sob pena de complica-es futuras para a sade de todos.

    Consideraes finais

    Existe na rea de diabetes uma grande preocupa-o devido s caractersticas de pandemia que asndrome vem adquirindo. Para os profissionaisde sade, um dos maiores desafios a baixa ade-so das pessoas diabticas ao tratamento, no qualse insere a terapia nutricional. Este estudo de cren-as dos pacientes diabticos tipo 2 nessa rea per-mitiu fazer algumas inferncias nessa temtica.

    Os depoentes evidenciam crenas que deno-tam barreiras e no foram mencionadas crenasrelativas a benefcios percebidos. Pode estar ha-vendo um crculo vicioso, no qual a baixa adesono favorece a obteno de benefcios, que, porsua vez, desencoraja a adeso. Por outro lado, aterapia nutricional que relatam ter sido recomen-dada percebida como proibitiva e muito restri-tiva, sendo muito diferente do estilo de alimenta-o que praticam ou praticavam usualmente.

    Foram identificadas crenas primitivas, con-senso 100% e consenso zero, e crenas de autori-dade e derivadas. No foram detectadas crenasinconsequentes. O conjunto das crenas identifi-cadas denota baixa adeso terapia nutricional.A predominncia de crenas mais centrais podeindicar que a baixa adeso ao tratamento seja emparte definida pelo fato de que as mudanas ne-cessrias ao indivduo para que ele tenha sucessono seu tratamento no estejam acontecendo porno estarem sendo abordadas de maneira ade-quada, no processo de atendimento em sade.

    Os resultados fornecidos por esse estudo nosremetem a um panorama que sugere que, atual-mente, a terapia nutricional est de certa formamassificada, os profissionais esto presos a con-ceitos e valores tradicionais, que no facilitam oprocesso de conhecimento dos pacientes a respei-to da terapia que est sendo utilizada. Os pacien-tes recebem as prescries de forma unilateral,deixando uma lacuna onde caberia a orientao,o dilogo e a construo do conhecimento.

    Eles reforam a posio de alguns autores aodemonstrar que a falta de adeso, como refere oprofissional de sade, um reflexo da abordageminadequada que est sendo feita. Essa abordagemno considera o paciente como um todo, fsico,mental, social e cultural, e no permite que seusconhecimentos prvios interajam com suas novaspercepes e ensinamentos sobre a doena28.

    Nesse contexto, a educao item primordialno sentido de preparar o indivduo para lidarcom suas novas necessidades, garantindo suaparticipao efetiva no processo de preveno dapatologia e das suas complicaes11.

    A educao alimentar deve habilitar o paci-ente a tomar decises pautadas em dados tcni-cos e informaes cientficas, pois dessa formaele ter capacidade para traar seus prpriosobjetivos no sentido de melhorar o estado geralde sua sade e da qualidade de vida1,29.

    Trata-se de um processo progressivo, que exi-ge flexibilidade por parte da equipe. As mudanasvo correr de forma lenta e gradual, e pode serque ocorram alguns retrocessos, dependendo deacontecimentos na vida do paciente, como casa-mento, separao, perda de entes queridos, perdade emprego, novo emprego, mudana de cidade,entre outras. Os profissionais precisam estabele-cer contratos com os pacientes, como forma depromover uma relao de responsabilidades en-tre eles, de forma que cada avano seja parte deum pacto de sade estabelecido.

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    O paciente tambm deve se sentir livre paraexpressar suas dificuldades, suas insatisfaes epara relatar com sinceridade os passos dados e osfatos ocorridos, sejam eles positivos ou negati-vos, de forma que o profissional tenha sempreuma viso transparente e verdadeira do que acon-tece com ele.

    O modo de viver e pensar de cada indivduotem influncia significativa na adeso do mesmo aqualquer tipo de tratamento. O seu ponto de vistae a maneira de se envolver socialmente ampliamas discusses para alm da abordagem clnica.

    Essa mudana prev uma alterao na essn-cia do sistema de sade, quando se deve valori-

    zar os trabalhadores no apenas pelo volume deconsultas e atendimentos realizados, mas pelaqualidade do servio prestado ao paciente15.

    Conhecer a percepo do paciente refora aperspectiva da necessidade de um atendimentomais humanizado, tal como proposto por Bene-vides30, em que os sujeitos (usurios), quandomobilizados, so capazes de transformar reali-dades, e os profissionais devem desenvolver umaatitude de valorizao das dimenses subjetivase sociais, do trabalho multiprofissional, compro-metendo-se em ajudar a desenvolver as capaci-dades de enfrentamento da populao atendidana obteno de melhores condies de sade.

    Colaboradores

    FM Pontieri trabalhou na concepo da pesquisa,elaborao do projeto, execuo da coleta e anli-se de dados, alm da redao final e MM Bachiontrabalhou na concepo da pesquisa, orientou aelaborao das atividades de pesquisa, realizou orefinamento do projeto, contribuiu na anlise dedados e refinamento da redao final.

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    Artigo apresentado em 06/11/2006Aprovado em 14/12/2006Verso final apresentada em 30/01/2007

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