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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
INSTITUTO DE LETRAS
PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM
CARLA MOTA REGIS DE CARVALHO
INTERFERÊNCIA DA L1 SOBRE A L2: UMA ABORDAGEM PSICOLINGUÍSTICA
SOBRE O PARÂMETRO DO SUJEITO NULO NO PB E NO ESPANHOL
Niterói, RJ
2016
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
INSTITUTO DE LETRAS
PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM
CARLA MOTA REGIS DE CARVALHO
INTERFERÊNCIA DA L1 SOBRE A L2: UMA ABORDAGEM PSICOLINGUÍSTICA
SOBRE O PARÂMETRO DO SUJEITO NULO NO PB E NO ESPANHOL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Estudos de Linguagem da
Universidade Federal Fluminense, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Linguística.
Linha de Pesquisa 1: Teoria e análise
linguística
ORIENTADOR: Prof. Dr. Eduardo Kenedy Nunes Areas
Niterói, RJ
2016
CARLA MOTA REGIS DE CARVALHO
INTERFERÊNCIA DA L1 SOBRE A L2: UMA ABORDAGEM PSICOLINGUÍSTICA
SOBRE O PARÂMETRO DO SUJEITO NULO NO PB E NO ESPANHOL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Estudos de Linguagem da
Universidade Federal Fluminense, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Linguística.
Linha de Pesquisa 1: Teoria e análise
linguística.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________________________________
Prof. Dr. Eduardo Kenedy Nunes Areas - UFF
Orientador
___________________________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Aline Fernanda Alves Dias - INES
___________________________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Katia Nazareth Moura de Abreu - UERJ
Niterói – RJ
2016
À minha mãe, Maria de Nazaré Mota da Silva, que sempre me
encorajou com seu otimismo, força, fé e amor.
AGRADECIMENTOS
A realização deste trabalho contou com a presença de pessoas com as quais pude
partilhar diferentes momentos do percurso percorrido até a chegada a esta etapa final. Como
este trabalho não aconteceria sem o apoio e a compreensão dessas pessoas, expresso com
muita alegria meus agradecimentos.
Primeiramente agradeço ao Prof. Dr. Eduardo Kenedy, meu orientador, por tudo o que
me ensinou desde a IC com sua didática, brilhantismo e dedicação. Obrigada por todo
incentivo, apoio e compreensão durante toda a produção desta dissertação, pelo aprendizado
nas reuniões do grupo de pesquisa e por seu exemplo de competência e profissionalismo
dedicados à Linguística.
À Prof. Dra. Aline Dias e à Prof. Dra. Kátia Abreu pelas proveitosas contribuições
feitas durante a Qualificação.
Aos professores do curso de idiomas Prolem, ao Prof. Dr. Paulo Antonio Pinheiro
Correa e ao Prof. Dr. Xoán Lagares por me cederem gentilmente parte de suas aulas para a
aplicação dos experimentos.
Ao Prof. Dr. Antonio Ribeiro por contribuir com a sua experiência para este trabalho.
Aos colegas do Gepex, Grupo de Estudos em Psicolinguística Experimental da UFF,
Joana, Simone, Aline, Adiel, Victor, Helicéa e Juliana por tudo o que prendemos juntos em
congressos, disciplinas, encontros do grupo de pesquisa, conversas que me ajudaram muito no
processo de elaboração deste trabalho.
Aos alunos do Prolem, aos alunos da graduação em Letras português/espanhol da
Universidade Federal Fluminense e aos espanhóis que participaram dos experimentos.
À minha amiga Franciane Soares que gentilmente me ajudou a aplicar o experimento
com os espanhóis.
À CAPES pelo apoio financeiro concedido.
À minha tia Lia e à Noni por todo o incentivo e cuidado ao longo de minha vida
escolar.
Às colegas da graduação que se transformaram em amigas e com as quais vivenciei
muitos momentos de alegria, estudo e muito aprendizado, Agata, Joci, Aline, Camila Carla e
Amanda.
Ao meu marido, amor da minha vida, Wagner Moreira, pela vida partilhada, pelo
respeito, pela união, pelo amor e pela paciência nos momentos em que precisei estar ausente
mesmo estando em casa. Obrigada por transformar a minha trajetória de vida mais leve.
À minha amiga Camila por toda a paciência e companheirismo ao longo de tantos
anos, por me incentivar sempre, por vivenciar comigo toda esta trajetória desde o resultado no
processo seletivo do mestrado, todo o percurso de produção deste trabalho até a alegria de
concluí-lo. Obrigada por estar sempre presente em todos os momentos da minha vida.
Aos amigos Ieda, Joaquim, Paula, Jurandyr pelo incentivo e pelos momentos de boas
conversas e aprendizados.
Às minhas cunhadas Érida e Jaqueline pelas palavras de carinho e reconhecimento.
Finalmente, à minha mãe, ao meu pai, aos meus irmãos Claudia e Claudio, aos meus
sobrinhos João Paulo, Sophya e Heitor, todos que são parte de mim e dos quais sempre recebi
muito amor, incentivo, carinho e muita compreensão em todos os momentos da minha
trajetória acadêmica até aqui.
A todos que foram citados só posso dizer: Muito obrigada por tudo!
Uma das razões para estudar a linguagem (exatamente a
razão gerativista) – e para mim, pessoalmente, a mais
premente delas – é a possibilidade instigante de ver a
linguagem como um “espelho do espírito”, como diz a
expressão tradicional.
(CHOMSKY, 1980)
RESUMO
A discussão sobre como acontece a aquisição de uma segunda língua (L2) e em que medida a
língua materna (L1) pode interferir neste processo tem se mostrado bastante produtiva e
complexa na literatura. O PB tem sido considerado uma língua parcialmente pro drop,
segundo Duarte (1995) por apresentar a preferência pelo preenchimento de sujeitos
referenciais. Já o espanhol, segundo Pinheiro-Correa (2010), caracteriza-se como uma língua
pro drop prototípica por preencher o sujeito em situações específicas, como as de foco
contrastivo ou quando aparecem complementos apositivos ou adjetivais. Estas diferenças
relacionadas ao preenchimento do sujeito sintático entre o PB e o espanhol permitiram uma
comparação, à luz da teoria de Princípios e Parâmetros (P&P) (CHOMSKY, 1981, 1995,
2011), por meio de uma abordagem metodológica da psicolinguística experimental, com o
intuito de investigar o processamento das estruturas de sujeito nulo e pleno em falantes
nativos do PB e do espanhol e verificar se há transferência do PB na aquisição de espanhol
como L2 com relação ao preenchimento do sujeito pronominal e, ainda, se tal transferência é
anulada e substituída pelo parâmetro da língua alvo durante o curso do aprendizado da L2.
Para isso, foram realizados dois experimentos off-line de produção induzida que consistiam na
continuação de pequenas narrativas incompletas em espanhol divididas em quatro condições
experimentais (1ª e 3ª pessoas do singular e 1ª e 3ª pessoas do plural), ambos foram realizados
com aprendizes de espanhol como L2. O experimento I contou com alunos do curso de
idiomas Prolem e o experimento II contou com alunos da graduação da Universidade Federal
Fluminense, além disso, os dados de um grupo de nativos (controle) foram utilizados nos dois
experimentos. Coube aos participantes experimentais divididos em três níveis de proficiência
(básico, intermediário e avançado) continuar as 12 pequenas narrativas experimentais com
duas ou três palavras apenas. A hipótese que orientou este trabalho é a de que o parâmetro do
sujeito nulo da L1 seja transferido para a L2, tendo sua interferência diminuída em função do
aumento da proficiência na língua-alvo. Todos os resultados foram submetidos ao teste
estatístico qui-quadrado e indicaram que o valor do parâmetro do sujeito nulo do PB, como
L1, parece ser transferido para o espanhol como L2 mais visivelmente em aprendizes do curso
de idiomas, mas que o mesmo acontece em menor escala com os aprendizes de espanhol,
como L2, alunos da graduação e, ainda, que a interferência entre estas línguas parece diminuir
em função do aumento da proficiência na língua-alvo de acordo com os resultados dos dois
experimentos.
Palavras-chave: Sujeito; L2; Processamento; Interferência; Psicolinguística.
ABSTRACT
The discussion on how the acquisition of a second language (L2) happens and the extent that
the mother language (L1) can interfere in this process is being very productive and complex in
literature. BP (Brazilian Portuguese) is being considered a partially pro drop language,
according to Duarte (1995) because it presents the preference for filling reference subjects.
Spanish, according to Pinheiro-Correa (2010), is characterized as a prototypical pro drop
language because it fills the subject in specific situations, such as contrastive focus or when
appositive or adjectival complements appear. These differences related to the fulfillment of
the syntactical subject between BP and Spanish allowed a comparison, in according to the
theory of Principles and Parameters (P&P) (CHOMSKY, 1981, 1995, 2011), through the
methodological approach of the experimental psycholinguistics, in order to investigate the
processing of structures of null and full subject in native speakers of BP and Spanish and
check for transfer from BP in the acquisition of Spanish as L2 in relation to the completion of
the subject pronoun, and even if such transfer is canceled and replaced by the target language
parameter during the L2 learning course. For this, we performed two off-line experiments of
induced production that consisted of the continuation of short narratives incomplete in
Spanish divided into four experimental conditions (1st and 3rd person of singular and 1st and
3rd person of plural), both were conducted with apprentices of Spanish as L2. The experiment
I had students of the language course Prolem and experiment II had undergraduate students of
Universidade Federal Fluminense, in addition, data from a group of native speakers (control)
were used in both experiments. It was up to the experimental participants divided into three
proficiency levels (basic, intermediate and advanced) to continue 12 small experimental
narratives with two or three words only. The hypothesis that guided this work is that the L1
null subject parameter is transferred to L2, and its interference is decreased due to the
increased proficiency in the target language. All results were submitted to the statistical test
chi-square test and they indicated that the parameter value of the null subject of BP, as L1,
seems to be transferred to the Spanish as L2 most visibly in the learners language course, but
it is also true in smaller scale with learners of Spanish as L2, graduate students, and also the
interference between these languages seems to decrease due to increased proficiency in the
target language according to the results of two experiments.
Key words: Subject; L2; Processing; Interference; Psycholinguistics.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 13
1 O PARÂMETRO DO SUJEITO NULO ............................................................................... 17
1.1 A Gramática Universal ....................................................................................................... 17
1.1.2 Princípios e Parâmetros ................................................................................................... 17
1.1.3 O Princípio EPP ............................................................................................................... 21
1.1.4 O (Parâmetro do) Sujeito Nulo ........................................................................................ 24
1.2.1 Sujeito nulo no PB ........................................................................................................... 28
1.2.2 Sujeitos referenciais ......................................................................................................... 30
1.2.3 Sujeitos referenciais de 3ª pessoa .................................................................................... 32
1.3.1 Sujeito pronominal no espanhol ...................................................................................... 36
2. AQUISIÇÃO DE SEGUNDA LÍNGUA ............................................................................. 38
2.1 A aquisição de L2 ............................................................................................................... 38
2.1.2 Hipótese da Transferência e Acesso total (Full Transfer and Full Acess) ..................... 39
2.1.3 Hipótese de Árvores Mínimas (Minimal Trees) .............................................................. 40
2.1.4 Hipótese dos Traços Valorados (Valueless Features) ..................................................... 41
2.1.5 Hipótese do Acesso Total (sem Transferência) (Full Acess (without tranfer)) ............... 41
2.2 Teoria do Bilinguismo Universal ....................................................................................... 42
3 PSICOLINGUÍSTICA EXPERIMENTAL .......................................................................... 43
3.1 A Psicolinguística e a linguística gerativa .......................................................................... 43
3.2 Principais métodos e técnicas da psicolinguística .............................................................. 45
3.3 Revisitando Viegas ............................................................................................................. 48
4. EXPERIMENTOS ................................................................................................................ 52
4.1 Experimento continuação de narrativas I ........................................................................... 52
4.1.1 Design experimental ........................................................................................................ 52
4.1.2 Hipóteses e previsões....................................................................................................... 53
4.1.3 Variáveis e condições ...................................................................................................... 54
4.1.4 Participantes (grupos experimentais)............................................................................... 54
4.1.4.1 Controle ........................................................................................................................ 55
4.1.5 Procedimentos ................................................................................................................. 57
4.2 Resultados ........................................................................................................................... 57
4.3 Experimento continuação de narrativas II .......................................................................... 63
4.3.1 Design experimental ........................................................................................................ 64
4.3.2 Variáveis e condições ...................................................................................................... 64
4.3.3 Materiais .......................................................................................................................... 66
4.3.4 Procedimentos ................................................................................................................. 66
4.4 Resultados ........................................................................................................................... 67
4.5 Discussão ............................................................................................................................ 72
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 76
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 80
ANEXOS .................................................................................................................................. 85
Índice de Ilustrações
Tabela 1: Quadro flexional e pronominal em PB adaptado de Duarte (1995) ......................... 28
Tabela 2: Quadro pronominal e flexional do espanhol adaptado de Soares da Silva (2006) ... 35
Tabela 3: Desenho experimental .............................................................................................. 53
Tabela 4: Condições experimentais do experimento I .............................................................. 54
Tabela 5: Distribuição dos alunos de graduação em níveis de proficiência. ............................ 65
Figura 1: Sistema Computacional, Spell-Out e Níveis de Interface e Desempenho ................ 19
Figura 2: Conjunto e subconjunto de Raposo. .......................................................................... 21
Figura 3: Movimento de um SN para o especificador de ST, licenciando-o com o caso
nominativo. ............................................................................................................................... 22
Figura 4: Hierarquia da Referencialidade de Cyrino, Duarte e Kato.(2000) ............................ 31
Figura 5: Modelo Full Transfer and Full Access (White, 2003, p.61) ..................................... 39
Figura 6: Modelo Full Acess (without Transfer) (White, 2003, p.90) ..................................... 41
Gráfico 1: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nas 1ª e 3ª pessoas nos três diferentes
níveis de proficiência. ............................................................................................................... 58
Gráfico 2: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nas 1ª e 3ª pessoas do grupo controle
.................................................................................................................................................. 59
Gráfico 3: Produção de frases com sujeito nulo e pleno em singular e plural, nos três
diferentes níveis de proficiência. .............................................................................................. 60
Gráfico 4: Produção de frases com sujeito nulo e pleno em singular e plural no grupo controle
.................................................................................................................................................. 60
Gráfico 5: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nos três diferentes níveis de
proficiência ............................................................................................................................... 61
Gráfico 6: Padrões de produção de frases dos níveis de proficiência e grupo controle ........... 62
Gráfico 7: Padrões de produção de frases dos níveis de proficiência e grupo controle (valores
de sujeito nulo) ......................................................................................................................... 63
Gráfico 8: Distribuição dos estudantes de graduação em níveis de proficiência. .................... 66
Gráfico 9: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nas 1ª e 3ª pessoas nos três diferentes
níveis de proficiência. (Graduação) .......................................................................................... 67
Gráfico 10: Produção de frases com sujeito nulo e pleno em singular e plural, nos três
diferentes níveis de proficiência. (Graduação) ......................................................................... 68
Gráfico 11: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nos três diferentes níveis de
proficiência (Graduação). ......................................................................................................... 69
Gráfico 12: Produção de frases com sujeito pleno nos três níveis de proficiência (Graduação)
e grupo controle. ....................................................................................................................... 69
Gráfico 13: Padrões de produção de frases dos níveis de proficiência (Graduação) e grupo
controle. .................................................................................................................................... 71
Gráfico 14: Padrões de produção de frases dos níveis de proficiência (Graduação) e grupo
controle (valores de sujeito nulo) ............................................................................................. 72
13
INTRODUÇÃO
Pesquisadores como Duarte (1993, 1995, dentre outros), Soares da Silva (2006),
Pinheiro-Correa (2010), entre outros, têm se dedicado à investigação sobre o possível
distanciamento do português brasileiro (PB) das outras línguas românicas, incluindo o
português europeu (PE), no que diz respeito ao parâmetro do sujeito nulo. Estas investigações
indicam uma mudança em curso ocorrendo com o PB, fato que estaria afastando esta língua
das línguas de sujeito nulo ou pro drop. Tais pesquisas se relacionam com as ideias de
Chomsky (1981 e posteriores), que assume a existência de um módulo cognitivo específico da
linguagem constituído por um sistema computacional mental que funciona a partir de traços
do léxico adquiridos pela língua do ambiente à qual um indivíduo é exposto. Esses traços
seriam codificados segundo uma marcação binária positiva ou negativa e, a partir da fixação
de uma destas opções, as diferenças entre as línguas são estabelecidas e, dentre elas, seriam
fixadas as diferenças entre línguas de sujeito pronominal nulo e de sujeito obrigatoriamente
preenchido.
A teoria de Princípios e Parâmetros (P&P) (CHOMSKY, 1981, 1995, 2011) aponta
como princípios da Gramática Universal (GU) todas as propriedades gramaticais comuns às
diferentes línguas naturais existentes. Já os parâmetros, segundo essa teoria, consistem nas
diferenças sintáticas também universais, segundo uma marcação positiva ou negativa de cada
parâmetro específico. De acordo com a P&P, a existência de sujeitos gramaticais nas línguas
naturais constitui-se como um princípio (nomeado como EPP – Extended Projection
Principle), mas permitir que uma categoria vazia ocupe a posição de sujeito em orações
finitas representa uma das propriedades do parâmetro do sujeito nulo. Em suma, o parâmetro
do sujeito nulo caracteriza-se por permitir que algumas línguas admitam o apagamento do
sujeito em orações, estas são as línguas de sujeito nulo [+pro drop], ao passo que outras,
optam majoritariamente pelo apagamento, são as línguas [-pro drop].
O espanhol peninsular e o PE são exemplos de línguas de marcação positiva, ou,
dizendo de outra forma, são línguas pro drop prototípicas. Por outro lado, estudos vêm
demostrando uma crescente diferença no parâmetro do sujeito nulo no PB, em relação ao PE.
O PB tem sido considerado uma língua parcialmente pro drop por apresentar uma tendência
ao sujeito pleno, fato que, segundo Duarte (1995), foi precipitado pela redução nas formas
desinenciais do paradigma flexional dos verbos. Os exemplos (1) e (2) abaixo ilustram,
respectivamente, uma sentença com sujeito nulo e outra com sujeito pleno.
(1) __ comprei o anel.
14
(2) Eu comprei o anel.
Em contextos discursivos neutros nos quais não ocorrem demandas discursivas como
contraste ou pressuposição, o exemplo (1), com a categoria vazia ocupando o lugar de sujeito,
é típico do PE, ao passo que (2), cuja posição de sujeito está preenchida com o pronome eu, é
típico do PB ainda que a realização (1) também seja possível nesta língua.
O espanhol, por outro lado, caracteriza-se, segundo Pinheiro-Correa (2010), por ser
uma típica língua de sujeito nulo - como pode ser observado no exemplo (3)-, isto é, além de
permitir que uma categoria vazia ocupe o lugar de sujeito, o espanhol só preenche o sujeito
em situações de demandas discursivas específicas, tais como as de foco contrastivo – quando
o sujeito é o foco numa sentença e tem valor de contraste, exemplificado em (4) - e nas
situações em que aparecem complementos apositivos ou adjetivais- respectivamente,
exemplificadas em (5) e (6)-, ou seja, o espanhol peninsular opta pela omissão do sujeito
como estratégia default, preenchendo-o apenas em alguns contextos discursivos ora
exemplificados.
(3) __ comí la tarta de banana.
(4) ¿Quién lo hizo?
No haría yo tamaña crueldad.
(5) Él, que está enfermo, puede volver a su casa.
(6) Tú mismo lo resolviste.
Em (3), o sujeito é representado por uma categoria vazia sendo identificado através da
flexão verbal. Em sentenças como (4), (5) e (6) o sujeito pleno é um componente obrigatório,
do contrário, estas sentenças seriam agramaticais na língua.
A possível mudança em curso na parametrização do PB, que o transfere do grupo das
línguas pro drop para o grupo das línguas de sujeito preenchido, - mesmo que o
preenchimento do sujeito no PB não se dê ainda em todas as categorias sintáticas, como, por
exemplo, o preenchimento de um sujeito expletivo -, pode ser confrontada no aprendizado de
línguas que possuem sujeito nulo, por parte dos nativos do PB, pois se há um preenchimento
robusto do sujeito é evidência de que o PB está transformando-se numa língua de sujeito
pleno.
Pesquisas sobre aquisição de línguas estrangeiras, como segunda língua (L2), buscam
estabelecer qual seria o papel de uma língua materna (L1) no aprendizado de uma L2, isto é,
como se dá o aprendizado de uma L2. Uma das questões que norteiam esses tipos de pesquisa
15
é indagar se haveria o acesso à GU durante o processo de aquisição/aprendizagem de uma
língua estrangeira e em que medida a gramática da L1 poderia influenciar a aquisição de uma
L2. Existe, na literatura especializada, a hipótese de que a gramática da interlíngua seja guiada
pela GU em todos os estágios. Neste caso, a competência de uma L2 na mente de um
indivíduo poderia ser equiparada a de um falante nativo (WHITE, 2003a apud VIEGAS,
2014). Por outro lado, há a hipótese de que o acesso aos parâmetros estabelecidos para a L1
aconteça apenas na fase inicial de aquisição de L2, isto significa que em algum momento há
acesso direto à GU (cf. WHITE, 2000, 2003).
A partir desta diferença entre o parâmetro do sujeito nulo no PB e no espanhol, o
objetivo desta pesquisa é verificar em que medida se dá a transferência do parâmetro da L1
sobre a L2 e, consequentemente, confirmá-la à luz da teoria de Princípios e Parâmetros. E,
ainda, contribuir para a discussão sobre as hipóteses de acesso à GU durante o processo de
aquisição/aprendizado de uma L2 (cf. WHITE, 2000, 2003). Além disso, espera-se que esta
pesquisa possa oferecer contribuições aos estudos sobre transferência e acesso dos parâmetros
da L1 para a L2 por meio de uma abordagem experimental. Tal pesquisa visa investigar o
processamento das estruturas de sujeito nulo e pleno em falantes nativos do PB e do espanhol,
verificando se há transferência do parâmetro pro-drop parcial do PB ao espanhol entre
aprendizes dessa língua como L2 e se, ao longo do aprendizado da língua estrangeira, tal
transferência é anulada e substituída pelo parâmetro da língua alvo. Isto é, será verificado se
ocorre interferência do status do parâmetro pro drop do PB no aprendizado do espanhol por
brasileiros, pressupondo-se que são línguas com marcações diferentes neste parâmetro. Esta
comparação pretende averiguar se brasileiros, aprendizes de espanhol como língua
estrangeira, em diversos níveis de proficiência (básico, intermediário e avançado),
aprenderiam a inibir a produção de sujeitos plenos durante a produção de frases em espanhol
no curso do aprendizado da L2.
À luz da Teoria de Princípios e Parâmetros e sob a abordagem da Psicolinguística
Experimental, foi elaborado, durante a pesquisa, um experimento off-line de produção
induzida ou eliciada. Tal experimento foi aplicado a um grupo controle – nativos falantes do
espanhol peninsular - e a três grupos experimentais - brasileiros aprendizes de espanhol como
língua estrangeira nos três níveis de proficiência básico, intermediário e avançado.
Esta dissertação está organizada em cinco capítulos. No primeiro, encontram-se os
pressupostos teóricos que fundamentam a pesquisa. Desta maneira, abordaremos algumas
propriedades da teoria de Princípios e Parâmetros (CHOMSKY, 1981, 1995, 2011) que
serviram para a realização deste trabalho, bem como as principais características sobre o
16
Parâmetro do Sujeito Nulo e uma revisão da literatura acerca das características do sujeito
nulo no PB e no espanhol.
O segundo capítulo, apresenta as principais hipóteses que norteiam o processo de
aquisição/aprendizagem de uma L2 e em que medida ocorre o acesso à GU durante as fases
de aquisição de L2 (White, 2000, 2003), além de abordar a teoria do Bilinguismo Universal
(Roeper, 1999).
O terceiro traz as relações entre a Psicolinguística e a linguística Gerativa (Chomsky,
1981), a descrição dos principais métodos e técnicas da Psicolinguística e, ainda, revisita o
trabalho de Viegas (2014) no qual a autora utiliza a metodologia experimental para apresentar
as possíveis interferências do parâmetro do sujeito nulo do PB sobre o aprendizado de inglês
como L2, por brasileiros.
No quarto capítulo são apresentados detalhadamente os dois experimentos realizados
ao longo desta pesquisa com seus objetivos, hipóteses, previsões, variáveis, condições,
procedimentos, resultados e uma análise teórica dos mesmos.
Por fim, o quinto capítulo traz as considerações finais, bem como alguns dos aspectos
abordados ao longo do trabalho e, ainda as contribuições a serem feitas ao estudo da
interferência da L1 sobre a L2 relacionadas ao Parâmetro do Sujeito Nulo.
17
1 O PARÂMETRO DO SUJEITO NULO
1.1 A Gramática Universal
A Teoria Gerativa estabelece o pressuposto de que apenas a espécie humana seja capaz
de adquirir uma língua, processo que acontece de maneira natural, com relativa rapidez e,
além disso, apresenta grande regularidade a despeito das particularidades idiossincráticas de
cada língua. Neste sentido, a aquisição de uma língua assumiria perspectivas inatas e levaria à
criação do conceito de Gramática Universal (GU). A GU compreende o ponto de partida para
a aquisição de uma língua e caracteriza-se como o estágio inicial da faculdade da linguagem,
um mecanismo inato que permite o acesso aos Princípios Universais e a ativação dos
parâmetros segundo os estímulos recebidos por uma determinada língua ambiente para a
construção da competência linguística, isto é, a língua-I. Neste sentido, o processo de
aquisição da linguagem acontece a partir do momento em que um indivíduo recebe um input
de uma língua-E qualquer, iniciando o processo de parametrização desta língua e, então,
quando esta está totalmente parametrizada por sua GU, esse indivíduo constrói sua
competência linguística.
Os termos língua-I e língua-E foram criados por Chomsky (1986) para fazer uma
distinção entre língua como representação interna, cognitiva, que representa o conhecimento
linguístico - gramática interna – e língua como representação externa, coletiva que simboliza
a língua usada por uma população em seu ambiente linguístico. Esta concepção externalista
de língua corresponde ao que Chomsky chamou de língua-E, uma língua externa interpretada
como idioma no senso comum (cf. KENEDY, 2013, p.29) e concepção internalista de língua
representa a competência linguística de um falante, sua gramática interna, sua língua-I
construída a partir de informações retiradas da língua de seu ambiente e o conhecimento tácito
de sua GU. Assim, um falante exposto a uma língua-E extrai informações desta língua e, a
partir destas informações, constrói na sua mente uma língua-I.
1.1.2 Princípios e Parâmetros
Na tentativa de descrever os mecanismos de funcionamento da GU, Chomsky (1981)
formulou a teoria que estabeleceu a existência de princípios universais invariáveis e de
parâmetros limitados variáveis segundo uma marcação binária (positiva ou negativa), tal
teoria ficou conhecida como a Teoria de Princípios de Parâmetros. Esta teoria sofreu (e sofre)
reformulações no âmbito do Programa Minimalista, assim, os parâmetros relacionados,
primeiramente, aos princípios da gramática passaram a ter relação com as propriedades do
18
léxico – categorias funcionais – responsáveis pelas especificidades das línguas. (AUGUSTO,
2005 apud VIEGAS, 2015).
No Programa Minimalista, Chomsky (1995 e posteriores), com o objetivo de
determinar as propriedades da faculdade da linguagem e como esta faculdade é desenvolvida,
apresenta a estruturação de um novo modelo de gramática (cf. MAIA, 2001). A faculdade da
linguagem seria constituída por um léxico, um sistema computacional e os sistemas de
interface. Neste sentido, o novo modelo de gramática apresentaria níveis de representação
linguística especificados pela GU funcionando como sistemas simbólicos, estes são: o nível
Forma Fonética (FF) que faz interface com o sistema articulatório- perceptual e o nível Forma
Lógica (FL) que faz interface com o sistema conceptual- intencional.
O léxico, que é formado por um conjunto de itens com traços semânticos, fonológicos
e formais passa a ser o responsável por especificar os itens que irão entrar no sistema
computacional, por meio de uma Numeração, gerando a derivação de uma expressão
linguística específica.
Os itens do léxico são decomponíveis em traços: fonológicos, semânticos e
formais. Os traços formais desempenham um papel na sintaxe, já que o
sistema computacional opera sobre traços formais. São traços formais os
traços categoriais (N e V, por exemplo), os traços phi (gênero, número e
pessoa) e os traços estritamente formais (o traço de Caso e o traço EPP do
inglês Extended Projection Principle). Este último pressupõe uma
informação parametrizada relativa à disponibilidade de uma posição de
especificador, para a qual um dado sintagma pode se mover; como, por
exemplo, o DP sujeito. Os traços formais são de dois tipos, os com
motivação semântica - traços-phi e categoriais, e os estritamente formais –
Caso e EPP. (MARTINS, 2007, p.26)
Consequentemente, este novo modelo de gramática estabelece que as representações
linguísticas sejam resultado de derivações geradas no sistema computacional - a partir de
certos traços lexicais e por meio de um conjunto de operações sintáticas (Select, Merge,
Agree/Move) – acessíveis, ao final, aos sistemas de desempenho. Assim, o sistema
computacional seleciona um conjunto de itens do léxico – conhecido como Numeração – para
o espaço derivacional, estes itens serão submetidos à operação Merge que os organizará
criando representações linguísticas complexas e, logo após, a operação Movimento deslocará
parte desta representação linguística complexa segundo as exigências paramétricas de uma
determinada língua, isto é, uma subparte será deslocada de sua posição sintática para outra
mais distante deixando uma cópia na posição original respeitando as propriedades
paramétricas da língua cujas marcações podem ser positiva ou negativa. Então, em algum
19
momento da derivação acontece uma divisão por meio da operação Spell- Out. (cf.YRINO,
1997, MAIA, 2001 e KENEDY, 2013, dentre outros).
Spell-Out é o momento computacional em que a derivação em curso é
retirada do Sistema Computacional e enviada para a FF e FL. Essa
‘operação’ é, na verdade, um ponto de bifurcação da derivação, uma espécie
de fronteira divisória cuja função é identificar quando uma derivação já se
encontra ao ponto de ser enviada para os sistemas que mais diretamente
lidam com as interfaces. (KENEDY, 2013: p. 133)
A Figura 1 abaixo visa demonstrar os elementos que constituem a estrutura da
faculdade da linguagem e o momento no qual a operação Spell-Out acontece.
De acordo com o que foi dito e observado na figura 1 acima, a operação Spell-Out é
responsável por retirar o resultado da derivação do sistema computacional e levá-lo para FF e
FL para que os traços fonológicos e semânticos sejam recuperados. (cf. CYRINO, 1997;
MAIA, 2001; KENEDY, 2013, dentre outros)
Como visto anteriormente, a GU contém princípios universais, rígidos, e parâmetros
flexíveis, associados a propriedades do léxico. Um dos princípios invariáveis da GU é
conhecido como o Princípio de Projeção Estendido (Extended Projection Principle - EPP),
Figura 1: Sistema Computacional, Spell-Out e Níveis de Interface e Desempenho
20
este princípio determina que toda sentença deva obrigatoriamente apresentar uma posição
sintática para o sujeito gramatical, podendo este ser ou não foneticamente realizado, de acordo
com a propriedade paramétrica de cada língua. Ou seja, todas as línguas possuem uma
posição estrutural para o sujeito, mas permitir que este sujeito esteja ou não realizado
foneticamente constitui-se como uma particularidade de acordo com a parametrização de cada
língua. Se uma língua caracteriza-se por apresentar o sujeito pronominal referencial realizado
foneticamente de maneira obrigatória em uma sentença finita, tem-se uma língua de sujeito
preenchido, mas se outra língua apresenta sentenças com o sujeito não realizado
foneticamente como configuração básica em sentenças finitas, tem-se uma língua de sujeito
nulo. O inglês e o francês são exemplos de línguas que preferencialmente preenchem o sujeito
foneticamente, já o espanhol e o PE são exemplos de línguas de sujeito nulo prototípicas.
As línguas românicas de sujeito nulo, como é o caso, por exemplo, do espanhol e do
PE, são caracterizadas assim por apresentar uma marcação paramétrica positiva em relação ao
parâmetro [+ pro drop], ou seja, estas línguas licenciam o apagamento do sujeito admitindo
uma categoria vazia na sua posição, preenchendo foneticamente tal categoria basicamente em
situações de focalização ou de contraste. Já as línguas que preenchem majoritariamente
sujeito, como o inglês1, por exemplo, apresentam uma marcação paramétrica negativa [- pro
drop], sendo conhecidas por línguas de sujeito pleno. Raposo (1992 apud SOARES DA
SILVA, 2006) estabelece o Princípio do Subconjunto, segundo o qual o valor positivo de um
parâmetro possui um subconjunto com valor negativo, sendo assim, uma língua marcada
positivamente em relação ao parâmetro do sujeito nulo como [+pro drop] admite sentenças
com sujeito nulo (língua maior) – uma categoria vazia pro sem realização fonética – e
sentenças com sujeito pleno – preenchido foneticamente - em situações de contraste e
focalização, por exemplo. Por sua vez, as línguas marcadas negativamente em relação ao
parâmetro do sujeito nulo, marcado como [-pro drop], possuem tipicamente sentenças com
sujeito pleno (língua menor), conferindo o status de agramaticalidade na maioria das
sentenças cuja posição de sujeito seja preenchida por uma categoria vazia. Observe a Figura 2
abaixo adaptada de Soares da Silva (2006).
1 O inglês é considerado uma língua [- pro drop] por optar tipicamente pelo preenchimento do sujeito
pronominal, embora existam situações mais restritas em que é possível verificar a ocorrência do sujeito nulo,
como, por exemplo, em notas, telegramas e diários.
21
Então, um indivíduo que recebe um input de uma determinada língua cuja marcação
seja negativa em relação ao parâmetro do sujeito nulo, a exemplo do inglês, terá
majoritariamente acesso a sentenças com sujeito pleno - o que o fará fixar este parâmetro
negativamente na aquisição de sua língua-I. Por outro lado, um indivíduo que recebe um input
de uma determinada língua com marcação positiva em relação ao mesmo parâmetro, a
exemplo do espanhol, terá acesso a sentenças preferencialmente de sujeito nulo e a sentenças
com sujeito pleno em contextos específicos e este fato o fará fixar positivamente este
parâmetro na aquisição de sua língua-I, permitindo o acesso a estas duas marcações, cada qual
em seu ambiente de ocorrência.
1.1.3 O Princípio EPP
O princípio EPP pertence ao quadro de princípios e parâmetros de Chomsky (1981) e
é fortemente relacionado ao caso nominativo por sua exigência estrutural de que alguns
núcleos apresentem seu respectivo especificador obrigatoriamente preenchido, ou seja, tal
princípio é responsável pela projeção da posição sintática para o sujeito nas línguas naturais.
O EPP exige que algum constituinte nominal seja movido para o especificador (spec) de ST2
porque é nesta posição que a identificação do caso nominativo da sentença torna-se possível,
conferindo a esta um sujeito. Observe o exemplo (7), no qual [João] recebe o caso nominativo
e, por este motivo, é reconhecido como o sujeito da sentença.
(7) João comprou um carro.
2 Tempo (T) é uma categoria funcional, acionada no decorrer da derivação sintática, que marca propriedades de
verbo (V) e com isso definem se a sentença é [+ finita] ou [- finita]. Assim, ST corresponde ao sintagma
temporal.
Figura 2: Conjunto e subconjunto de Raposo.
22
Agora observe a Figura 3 abaixo, adaptada de Kenedy (2013), cuja representação
ilustra o movimento de [João] para o spec de ST.
Como é possível observar em 3 acima, o argumento externo [João] foi movido para a
posição funcional de especificador de ST, sendo então licenciado com o caso nominativo e,
assim, identificado como o sujeito gramatical da sentença: João comprou um relógio.
O caso (como nominativo, acusativo, ergativo, locativo, entre outros), segundo
Chomsky (1981), é a propriedade responsável pela identificação dos argumentos - externo ou
interno - selecionados por um predicador. Algumas línguas identificam o caso por meio da
morfologia – línguas de Caso -, outras o fazem pela chamada ordenação linear, isto é, através
da ordem dos constituintes em uma sentença e estas são as línguas de Caso abstrato -, como o
PB, por exemplo, que é considerado uma língua cuja ordenação linear básica é SVO, ainda
que existam as ordens OSV ou OV relacionadas ao tópico3 (cf. PEZZATTI e CAMACHO,
1997, dentre outros). O caso nominativo “identifica o sujeito da sentença, que tipicamente
será o argumento externo do predicador de uma dada frase” (KENEDY, 2013: p. 241). Ao
serem movidos para a posição funcional de ST – especificador de T -, como exemplificado na
figura 3, os argumentos externos de um predicador são licenciados com o caso nominativo
3As mudanças por que passou o PB fazem-no ter uma postura diferenciada em relação ao tópico, de modo que,
quando este aparece numa sentença, geralmente leva à concordância com o verbo, assumindo o status de
“sujeito” da sentença. Para maiores informações sobre tópico ver PONTES (1987), NEGRÃO (1990), VASCO
(1999, 2006), ORSINI (2003) e PINHEIRO-CORREA (2010).
Figura 3: Movimento de um SN para o especificador de ST, licenciando-
o com o caso nominativo.
23
fato que acontece, inclusive, com aqueles predicadores conhecidos por selecionar apenas
argumento interno, como os verbos inacusativos. Seus argumentos também são movidos para
a posição ST a fim de que seja satisfeito o EPP, como no exemplo (8) e (9) abaixo:
(8) [argumento interno Maria] cresceu.
(9) [caso nominativo Ela] cresceu.
Assim, os sintagmas nominais Maria e Ela são deslocados da posição de argumento
interno para a posição de argumento externo a fim de que seja atribuído a eles o caso
nominativo.
Na derivação dessas estruturas intransitivas, os NPs se deslocam da posição
de argumento interno para a posição de argumento externo, uma vez que, na
posição em que os NPs são originalmente gerados, não é possível que
recebam caso. Assim, os NPs, que já receberam papel de tema ou paciente
do verbo, em sua posição de origem, devem se mover para a posição de
especificador de IP para receber caso nominativo, deixando um vestígio nas
suas posições de base, segundo proposto por Keyser & Roeper, 1984;
Roberts, 1987; Di Sciullo, 2005, entre outros. (SANTOS, 2012 p. 14)
Mas, além dos predicadores que selecionam argumento externo e dos que selecionam
argumento interno, existem os verbos que não selecionam argumento como, por exemplo, os
meteorológicos. Para estes o EPP também exige o preenchimento da posição de especificador
de ST, conferindo ao item puramente funcional o caso nominativo e, consequentemente, o
status de sujeito (expletivo) ou, ainda, esta posição será preenchida por um expletivo nulo
representado por uma categoria vazia. Veja-se um exemplo do expletivo it do inglês e do
expletivo nulo do português, respectivamente, em (10) e (11) abaixo.
(10) [expletivo It] rains.
(11) [expletivo nulo__] Chove.
Neste sentido, o princípio EPP estabelece que todas as línguas naturais tenham
obrigatoriamente um sujeito.
Essa obrigatoriedade de identificação do sujeito de uma sentença, com o
nominativo, é representada na linguística gerativa pelo chamado traço EPP.
Tal traço é de fato uma imposição formal do sintagma temporal/flexional:
todo ST deve licenciar um sujeito, em seu especificador, com o caso
nominativo. (KENEDY, 2013: p. 244)
24
Em outras palavras, o EPP exige que o especificador de ST tenha um item movido
para essa posição a fim de receber o caso nominativo e o status de sujeito da sentença e, como
visto ao longo desta seção, este sujeito pode ser lexical, expletivo ou uma categoria vazia a
que chamaremos de pro.
1.1.4 O (Parâmetro do) Sujeito Nulo
O parâmetro do sujeito nulo foi inicialmente apresentado a partir de comparações entre
as línguas românicas de sujeito nulo – línguas pro drop prototípicas – e o inglês – língua de
sujeito pleno – e o licenciamento do sujeito nulo estaria relacionado a uma flexão verbal rica.
Os diversos estudos acerca do parâmetro do sujeito nulo preocupam-se em encontrar as suas
propriedades em diversas línguas a fim de classificá-las como línguas que licenciam o
apagamento do sujeito, tendo uma marcação positiva relacionada a este parâmetro [+ pro
drop], ou línguas nas quais o sujeito aparece foneticamente realizado, tendo, portanto uma
marcação negativa relacionada a este parâmetro, [- pro drop]. Há, ainda, a preocupação em
observar as possíveis transformações nestas propriedades para justificar uma existente
mudança na parametrização de determinada língua.
Chomsky (1981) apresenta uma lista das propriedades que licenciam o apagamento do
sujeito, ou seja, tais propriedades caracterizam uma língua [+ pro drop] e a ausência delas
caracteriza uma língua [- pro drop] (cf. SOARES DA SILVA, 2006). A lista de propriedades
exemplificadas em (12), (13), (14), (15) e (16) abaixo foram retiradas de Chomsky (1981) e
contêm sentenças gramaticais em italiano (língua de sujeito nulo), as respectivas traduções4
para o PB aparecem em (12a), (13a), (14a), (15a) e (16a):
* Sujeito pronominal nulo:
(12) ____ Ho trovato il libro.
(12a) ____ Achei o livro.
* Inversão livre de sujeito:
(13) L’ha mangiato Giovanni.
(13a) comeu o Giovanni. (O Giovanni comeu.)
* Movimento longo de qu- sujeito:
(14) L’uomoi [chei mi domando [chi ____i abbia visto]]
4 Traduzido do inglês.
25
(14a) O homem [que me pergunto [quem ele viu]]
* Pronomes resumptivos nulos em orações encaixadas:
(15) Eco la ragazzai [chei mi domando [chi crede [che ____i possa SV]]]
(15a) Essa é a garota [que eu me pergunto [quem pensa [que pode SV]]]
* Aparentes violações do filtro *[that-trace]:
(16) Chii credi [che ____i partirà]
(16a) Quem você acha [que vai sair]
Observando os exemplos em italiano acima é possível verificar as propriedades típicas
das línguas pro drop prototípicas que não estão presentes em línguas de sujeito preenchido,
como o inglês e o francês, por exemplo. Contudo, o PB também tem apresentado
comportamento distinto com relação a estas propriedades (DUARTE, 1995, 2003) fato que
será tratado na seção que se segue.
Em línguas pro drop prototípicas, segundo Chomsky (1981) há uma correlação entre o
paradigma flexional rico e as propriedades exemplificadas acima e o sujeito só aparecerá
expresso foneticamente em casos de contraste, para desfazer ambiguidades ou, ainda, em
casos de ênfase porque o sujeito nulo é uma forma default5, ou seja, uma forma não marcada.
Assim, para Chomsky (1986) uma categoria pro, sem realização fonética pode representar o
sujeito e tal categoria vazia6 aparece em oposição aos sujeitos lexicais, com referência
específica ou expletivos.
Esta categoria vazia, sem realização fonética, que apresenta uma matriz
gramatical atribuída a partir de traços relativos a número, gênero, pessoa e
caso, pode ser interpretada como um pronome referencial, o qual pode
apresentar valores definidos, ou referência arbitrária, ou pronome expletivo,
quando não possui nenhum tipo de significação ou referência. (VIEGAS,
2014, p.36)
Podemos observar o que isto significa através dos exemplos (17), (18) e (19) abaixo:
5 Para Xavier (1999 apud VIEGAS, 2014) existem diferentes tipos de línguas pro-drop: o italiano é considerado
um exemplo do pro-drop prototípico; o chinês, pro-drop unipessoal e o PB pro-drop misto. Em línguas pro-drop
prototípicas, a concordância é responsável por identificar o sujeito nulo; em línguas pro-drop unipessoais o
sujeito nulo é o default e, em línguas semi- pro-drop, como o PB os sujeitos nulos são os nulos não-argumentais
ou expletivos e o nulo referencial de 3ª pessoa.
6 Chomsky aponta, ainda, outras categorias vazias, tais como t e PRO.
26
*pronome referencial de valor definido
(17) pro Fomos ao cinema.
*pronome de referência arbitrária
(18) pro Roubaram o carro do vizinho.
*pronome expletivo sem significação ou referência
(19) pro Parece que meu vizinho está mal.
Línguas de sujeito pleno, como o inglês, preenchem obrigatoriamente os sujeitos
referenciais (lexicais), ao contrário das línguas de sujeito nulo, que utilizam a categoria vazia
pro com valores gramaticais ocupando a posição de sujeito. Neste sentido, como será possível
verificar mais adiante, há uma correlação entre o paradigma flexional dos verbos com o
parâmetro do sujeito nulo, isto significa que línguas de sujeito nulo teriam uma morfologia
flexional rica e, por isso, licenciariam a categoria vazia pro, porque permitem a recuperação
da informação pela desinência e as línguas de sujeito pleno justificariam o preenchimento da
categoria de sujeito pelo fato de possuírem uma morfologia flexional pobre (cf. DUARTE,
1995).
Contudo, é importante ressaltar que existem línguas como o chinês, por exemplo, que
permitem a omissão do sujeito apesar de apresentar uma flexão verbal pobre, sem qualquer
marca flexional no paradigma verbal. De acordo com Huang (1984), esta é uma língua
orientada para o discurso e, por este motivo, o sujeito tem natureza discursiva, ou seja, é
deduzido através do contexto. O mesmo parece ocorrer com a LIBRAS, que embora seja,
segundo Dias (2014), uma língua com alta frequência de sujeitos nulos, orientada para a
sentença, o sujeito também tem natureza discursiva e pode ser deduzido através do contexto.
No entanto, Rizzi (1986) apresenta a existência de um paradigma flexional rico como
condição imprescindível para a ocorrência do sujeito pronominal nulo, visto que um módulo
formal licenciaria este sujeito, enquanto um módulo semântico se encarregaria de recuperar a
informação através do contexto. Assim, só seria permitida a ocorrência de um sujeito
pronominal nulo em línguas que possuem a capacidade de licenciá-lo.
Jaeggli e Safir (1989) sugerem, por outro lado, que um paradigma flexional rico não
seria exatamente responsável por licenciar o sujeito nulo, mas a condição necessária para o
licenciamento seria a existência de paradigmas morfologicamente uniformes, isto é, quando o
paradigma verbal apresenta todas as formas flexionadas, o sujeito é identificado através da
27
concordância e pode não aparecer foneticamente realizado, mas quando o paradigma flexional
não apresenta todas as formas flexionadas, o sujeito seria identificado através do contexto
pelo tópico discursivo. E, ainda, para os autores, línguas de paradigma verbal misto, que
apresentam formas morfologicamente complexas e simples, não licenciam o sujeito.
Duarte (1995) baseia-se nas pesquisas de Roberts (1993) para justificar a mudança
pela qual passa o PB semelhante ao que aconteceu no francês antigo que possuía um
paradigma funcionalmente rico compatível com uma desinência zero e isto possibilitou a
convivência com o sujeito nulo até que mudasse definitivamente a sua marcação para [- pro
drop]. Para Roberts (1993) um paradigma verbal rico admite uma desinência zero e um
sincretismo (formas iguais que se referem a diferentes pessoas) mantendo uma riqueza
funcional que permite o licenciamento e a identificação de sujeitos.
Para Duarte (1993, 1995), o PB, anteriormente considerado como uma língua de
sujeito nulo sofreu algumas mudanças morfossintáticas, tais como a perda da inversão livre,
que permite manter o sujeito em posição pós-verbal (Chomsky, 1981), e a perda do princípio
“Evite Pronome”, que permite não realizar o sujeito foneticamente sempre que a sua plena
identificação seja possível, isto é, a prioridade sempre incide na utilização do pronome nulo,
mas em situações de focalização ou contraste é feita a utilização do pronome pleno. Com isso,
o PB tem apresentado a preferência pelo sujeito preenchido em todas as pessoas gramaticas,
inclusive na primeira, cuja flexão verbal permitiria facilmente a identificação do sujeito, e
esse fato teria levado o PB a perder o status de uma língua pro drop prototípica, como é o PE,
e a caminhar na direção das línguas de sujeito pleno. A redução do paradigma flexional dos
verbos a partir da perda de “tu” e “vós” e da substituição de “nós” por “a gente”, permitindo
a utilização da mesma forma verbal de terceira pessoa “ele” para a primeira pessoa “a gente”,
como exemplificado na Tabela 1 abaixo, resultou em mudanças relacionadas à identificação e
ao licenciamento do sujeito nulo de referência definida ocasionando a perda gradativa do
Princípio “Evite Pronome”.
28
Pess./N.º Pronome Séc. XVI Contemporâneo
Contemporâneo
(jovens)
Variedade
Popular
1ª sing. Eu canto canto canto canto
2ª sing. Tu
Você
cantas
canta
-
canta
-
canta
-
canta
3ª sing. Ele/Ela canta canta canta canta
1ª plur. Nós
A gente
cantamos
canta
cantamos
canta
cantamos
canta
-
canta
2ª plur. Vós
Vocês
cantais
cantam
-
cantam
-
cantam
-
canta
3ª plur. Eles/Elas cantam cantam cantam canta
Tabela 1: Quadro flexional e pronominal em PB adaptado de Duarte (1995)
O PB teria reduzido, de acordo com Duarte (1995), o seu quadro flexional de seis para
quatro formas – presente na fala de pessoas cuja faixa etária é mais elevada – ou para três
formas na fala de pessoas mais jovens e, ainda, “nas variedades em que se associa a
desinência <Ø> também a segunda e à terceira pessoas do plural, apenas duas” (cf. DUARTE,
1995, p.33) fato que induziria ao preenchimento da categoria pro.
Nesta subseção, vimos algumas características importantes relacionadas ao Parâmetro
pro drop para compreender o que seria uma língua de sujeito nulo e uma língua de sujeito
pleno, neste sentido o termo (LSN) será doravante utilizado para designar as línguas de sujeito
nulo que são marcadas positivamente [+ pro drop] com relação ao Parâmetro do Sujeito Nulo
(PSN), pro drop.
1.2.1 Sujeito nulo no PB
A observação dos exemplos em italiano retirados de Chomsky - seção anterior -, nos
quais se apresentam as propriedades das línguas pro drop prototípicas, possibilitou a
averiguação de que o PB tem apresentado comportamento distinto de tais línguas e verificam-
se mudanças em relação a algumas destas propriedades. Observe nos exemplos (20), (21),
(22), (23) e (24) abaixo como se comporta o PB diante das propriedades ora citadas nos
exemplos retirados de Chomsky.
(20) Eu achei o livro.
(21) O Giovanni comeu./ O Giovanni que comeu.
(22) O homem que me pergunto quem ele viu.
29
(23) Essa é a garota que eu me pergunto quem pensa que ela pode...
(24) Quem você acha que ____ vai sair./ *Quemi você acredita que elei vai sair.
Segundo Duarte (1995), o PB estaria passando por uma mudança na marcação do PSN
apresentado tipicamente a preferência por preencher o sujeito pronominal em todas as pessoas
gramaticais, ainda que, na primeira pessoa, por exemplo, a flexão verbal possa permitir a
retomada dos sujeitos referenciais com mais clareza do que as outras pessoas gramaticais,
como exemplificado em (20). Além disso, o PB teria perdido a propriedade de “inversão
livre” para verbos transitivos (BERLINCK, 1989 apud MARINS, 2009), preferindo a ordem
linear SVO, já que rejeita o verbo em primeira posição com pronome nulo referencial ou
expletivo nulo como ilustrado em (21) (DUARTE, 2005) e, ainda, de acordo com Duarte
(1995), o PB apresenta preferência por pronomes resumptivos em orações encaixadas, como
em (22) e (23), contudo, com relação ao filtro that-trace, o PB tem apresentado
comportamento semelhante ao italiano não respeitando tal filtro, já que o pronome ele
expresso correferente ao pronome quem torna a sentença agramatical como em (24).
Outro fator importante relacionado à mudança na marcação do PSN no PB consiste
ainda na verificação do tempo verbal. Neste sentido, observou-se que em tempos verbais cujas
desinências possuem maior distinção a ocorrência de sujeito nulo é maior, por outro lado, em
tempos verbais com desinências menos distintas, maior é o índice de sujeito pleno. Assim, o
pretérito perfeito nos termos de Duarte aparece como o tempo verbal que mais favorece a
ocorrência de sujeito nulo, visto que 39% das orações neste tempo têm seu sujeito nulo,
seguido do pretérito imperfeito com 27% e do presente com 26% (cf. DUARTE, 1995). Estes
percentuais sugeririam que “as desinências do pretérito perfeito resistem mais ao degaste pelo
qual passa o paradigma flexional”. (DUARTE, 1995, p.57).
As investigações feitas por Duarte (1993, 1995), que apontam para uma possível
mudança paramétrica do PB foram feitas com textos de peças de teatro escritos em sete
períodos diferentes entre o final do século XIX e o século XX. Há, segundo a autora, uma
grande relação entre a preferência pelo sujeito pleno e a redução do paradigma flexional de
seis para três formas verbais, como visto na tabela 1. Contudo, é importante ressaltar que,
segundo Ferreira (2000), o PB não apresenta sujeito preenchido em todos os tipos de
sentenças, visto que ainda admite sujeito nulo, representado por um proexpl em situações
específicas tais como sentenças com verbos meteorológicos, impessoais, existenciais e de
alçamento, como mostram os exemplos abaixo (25- 28).
(25) pro Trovejou muito hoje.
30
(26) pro É verão no Brasil.
(27) pro Tem um homem na sala.
(28) pro Parece que a universidade entrará em greve.
Assim, Ferreira (2000) sugere que o PB tem apresentado mudanças que impossibilitam
a ocorrência de uma categoria vazia na posição de sujeito de orações finitas, fato que o afasta
de LSN prototípicas, como o espanhol, mas, além disso, o PB mantém características que o
distanciam de línguas prototípicas de sujeito preenchido, como o inglês e o francês, visto que
“admite sujeitos nulos expletivos e indefinidos, mas não sujeitos nulos referenciais” 7. Isto,
segundo Duarte (2003a apud VIEGAS 2014), parece indicar que itens não referenciais
resistiriam mais ao preenchimento do sujeito, ao contrário dos itens referenciais. Tais
características, então, permitem dizer que o PB estaria num processo de mudança linguística
relacionada ao PSN e, por isso, não tem se comportado como uma LSN prototípica sendo
considerado por alguns autores (Duarte, 1995 e Kato, 1999) como uma língua pro drop
parcial.
1.2.2 Sujeitos referenciais
Existe no PB de acordo com Duarte (1995) a preferência pelo preenchimento do sujeito em todas as
sujeito em todas as pessoas gramaticais, contudo, nota-se que o índice de preenchimento do sujeito se dá
sujeito se dá em maior número na primeira e na segunda pessoa, já a terceira pessoa se mostra mais
mais resistente à mudança do PB, isto é, tal resistência parece estar relacionada ao traço [+/- animado] do
animado] do referente. Segundo Cyrino, Duarte e Kato (2000) há uma hierarquia de referencialidade
referencialidade determinando que itens mais referenciais – a primeira e a segunda pessoa – cujos traços
cujos traços são [+ humano] [+ específico] e [+ referencial] ocupam a posição mais alta da hierarquia
hierarquia sendo mais suscetíveis à mudança, enquanto a terceira pessoa que apresenta os traços [+/–
traços [+/– humano], [+/– específico] seria mais resistente à mudança. Na
Figura 4 abaixo podemos ver a hierarquia da referencialidade proposta por Cyrino,
Duarte e Kato (2000: p. 57).
7 Como é possível verificar com os exemplos abaixo retirados de Ferreira (2000: p. 15)
(1) a. Está chovendo.
b. Mataram o prefeito.
c. Não usa mais saia no Brasil.
d. * Comprou um carro novo.
Para que a sentença (1 d) se torne gramatical, é preciso introduzir um pronome pleno (ele ou você, por exemplo).
31
Figura 4: Hierarquia da Referencialidade de Cyrino, Duarte e Kato.(2000)
Assim, de acordo com Duarte (2003), “o traço [+ humano] se mostra como
favorecedor do preenchimento do sujeito, confirmando a atuação da hierarquia referencial
proposta em Cyrino, Duarte & Kato (2000)”. Neste sentido, uma vez que se verifica a
hierarquia de referencialidade dando conta de processos de mudança relacionados à
pronominalização, é possível perceber que os sujeitos não referenciais cuja posição é a mais
baixa como visto na figura acima, apresentam enorme resistência ao preenchimento do sujeito
por um pronome expletivo lexical no PB. Sujeitos não referenciais permanecem nulos em PB
representados por um proexpl. (FERREIRA, 2000) em sentenças com verbos meteorológicos,
impessoais, existenciais, de alçamento e apresentativas (VIEGAS, 2014), como em (25 - 28)
na seção anterior e (29) abaixo.
(29) pro Apareceu uma barata no armário.
Vale ressaltar que tanto o proexpl do PB quanto o “It” expletivo do inglês, por exemplo,
existem apenas por motivos estruturais a fim de que seja satisfeito o EPP. E este fato reforça
ainda mais o que dizem Duarte (1995) e Kato (1999) sobre o PB apresentar um status de
língua pro drop parcial, diferente de línguas de sujeito preenchido como o inglês e, ainda
diferente de línguas pro drop prototípicas como o espanhol, visto que, como observado na
seção anterior, o PB perdeu algumas propriedades responsáveis por caracterizar uma língua
prototipicamente pro drop e mantém apenas os sujeitos nulos não referenciais como
característica semelhante a estas línguas. Veja em (30), (31) e (32) exemplos de expletivos
nulos do PB e do espanhol e pleno do inglês.
(30) pro Chove muito no Rio.
(31) pro Llueve mucho en Río.
(32) It rains a lot in Rio.
32
Contudo, para Duarte (2003) o PB parece buscar naturalmente outras formas de
preenchimento do sujeito não referencial ou expletivo
[...] seria natural esperar que os sujeitos não referenciais ou expletivos
começassem também a se realizar foneticamente, apresentando nosso
sistema um conjunto de estruturas em que tal posição, antes categoricamente
vazia, passaria a se mostrar preenchida. Entre as estratégias apresentadas em
Duarte (1997, 1999, 2000) como possíveis recursos para evitar a posição de
expletivo nulo, foi apontada a significativa ocorrência do pronome você com
os verbos ter e ver em construções variantes daquelas que exibem os verbos
ter e haver existenciais. (Duarte, 2003, p.2)
como exemplificado em (33)8,
(33) a. _____ Há/Tem muito concreto na tua frente
b. Você vê muito concreto na tua frente.
Assim, as sentenças com a posição de sujeito nula, como em (a), passariam a ter o
sujeito pleno como em (b). Neste sentido, o PB caminha rumo às línguas de sujeito pleno e
em algum momento pode deixar de ser uma LSN parcial para ser uma língua com todas as
características das línguas de sujeito pleno.
1.2.3 Sujeitos referenciais de 3ª pessoa
Pesquisadores como Duarte (1995) e Ferreira (2000) afirmam que o PB teve uma
enorme redução com relação às possibilidades de utilização do sujeito nulo, visto que sujeitos
pronominais de referência definida e indeterminada têm sido caracterizados por preferir o
sujeito pleno. Assim, restaria a possibilidade de sujeitos nulos a uma pequena parte, tais como
os sujeitos não referenciais ou expletivos. No entanto, Duarte (1995) aponta o fato de os
sujeitos referenciais de terceira pessoa serem mais resistentes ao processo de mudança em
curso no PB rumo ao sujeito pronominal pleno e, segundo Ferreira (2000) e Rabelo (2010), o
sujeito nulo referencial de terceira pessoa só é possível quando há um antecedente numa
sentença matriz, como em (34).
(34) Meu paii disse que ___i viu meu carro na rua.
Entretanto, para Ferreira (2000), o sujeito nulo referencial no PB não corresponde a
um pronome nulo, tampouco a uma categoria vazia, e sim a vestígios causados pelo
alçamento para uma sentença mais alta, visto que sentenças como (35) precisam ser
8 Exemplos retirados de Duarte (2003).
33
encaixadas em outra oração que contenha um elemento para servir de antecedente ao sujeito
como em (36), caso contrário, são agramaticais.
(35) *comprou uma casa.
(36) O Luizi disse [que ____i comprou uma casa].
Ferreira (2000) defende, então, que estes vestígios são cópias apagadas
fonologicamente como resultado do um alçamento de um DP sujeito de uma oração finita
para o spec de T de uma oração mais alta.
[...] as instâncias de sujeito nulo referencial encontradas em PB não
correspondem a um pronome nulo, nem a uma categoria vazia vinculada a
um operador nulo, mas sim a um vestígio, resultado de uma operação de
alçamento a partir da posição de especificador de T finito para uma oração
mais alta (hiperalçamento, na terminologia de Ura (1994)). (FERREIRA,
2000, p.16)
Assim, é possível verificar como aconteceria a derivação até que se tenha como
resultado o exemplificado em (36). Veja abaixo em (37)
(37) a. [vP Luiz comprou uma casa].
b. [TP Luiz T [vP Luiz comprou uma casa.]]
c. [vP disse [CP que [TP Luiz T [vP Luiz comprou uma casa.]]]]
d. [vP Luiz disse [CP que [TP Luiz T [vP Luiz comprou uma casa. ]]]]
e. [TP Luiz T [vP Luiz disse [CP que [TP Luiz T [vP Luiz comprou uma casa.]]]]]
Neste sentido, é possível compreender que a redução no paradigma flexional dos
verbos tenha influenciado a diminuição de sujeitos nulos no PB, tal como postula Duarte
(1995), uma vez que estes só aparecem em orações encaixadas como em (36) e não aparecem
em orações matrizes como em (35). Para Ferreira (2000, p. 20), o sujeito nulo de terceira
pessoa no PB deve estar localizado em uma oração encaixada como uma condição necessária
para a sua legitimação, mas, além disso, o sujeito nulo referencial no PB deve estar c-
comandado9 por um antecedente na oração imediatamente mais alta, como em (38).
(38) Mariai acha [que ___i é linda].
9 O termo c-comando representa o vínculo sintático entre dois constituintes, no qual um constituinte x c-comanda
um constituinte y de acordo com um ponto de referência, ou seja, um nódulo sintático qualquer, isto é, o
primeiro elemento que domina um item também é o primeiro elemento que domina outro. No caso do exemplo
(38) o elemento Maria c-comanda a categoria vazia, ou seja, o sujeito nulo é c-comandado por seu antecedente
na oração imediatamente mais alta. (cf. REINHART, 1976)
34
1.3 Sujeito nulo no espanhol
O espanhol caracteriza-se por ser uma língua de sujeito nulo, isto é, uma língua pro
drop prototípica por apresentar a marcação positiva típica destas línguas, visto que manifesta
a obrigatoriedade em deixar a posição de sujeito nula em orações finitas não marcadas,
sobretudo com relação à categoria pronominal. Aponta-se que tal característica seja resultado
da existência de uma riqueza flexional nesta língua, como apresenta Fernández Soriano (1999
apud SOARES DA SILVA, 2006, p. 42):
El español permite omitir los pronombres de sujeto, esto es,
junto a una oración como Ella ha venido existe la posibilidad de
la paralela sin pronombre, Ha venido (...) Así, nuestra lengua
difiere de otras, como el inglés, que sólo permiten, con verbos
conjugados, construcciones en que el sujeto aparece expresado (He saw her).
Esta posibilidad, que se da también en italiano y en otras lenguas no
emparentadas, se ha puesto en relación con la riqueza que presenta el
paradigma verbal, es decir, con el hecho de que la desinencia flexiva del
verbo permita, por sí sola, distinguir entre las distintas personas
gramaticales. (FERNANDEZ SORIANO, 1999, p.1224)
Ao contrário do PB, o espanhol possui, nos termos de Duarte (1995), um paradigma
flexional rico que permitiria a categoria vazia recuperar os traços gramaticais de
licenciamento e identificação, isto, segundo Soares da Silva (2006), permite a possibilidade de
apagamento do pronome em todas as seis pessoas gramaticais. Assim, de acordo com Rizzi
(1986 apud VIEGAS, 2014, p.37), “o módulo formal licenciador visa especificar as condições
de ocorrência da categoria vazia e o módulo semântico licenciador especifica como o
conteúdo da categoria vazia será recuperado pelo contexto linguístico”.
Neste sentido, a flexão do verbo tem traços pronominais que permitem o
preenchimento de sujeitos referenciais ou expletivos por uma categoria vazia, sem realização
fonética, que pode recuperar os traços gramaticais de gênero, número, pessoa e caso. Veja a
Tabela 2 abaixo com o quadro pronominal e flexional do espanhol peninsular.
35
Pess./N.º Pronome
1ª pess. sing. Yo canto
2ª pess. sing. Tú cantas
3ª pess. sing. Él/ Ella/ Ello
Usted
canta
canta
1ª pess. plural Nosotros/ Nosotras cantamos
2ª pess. plural Vosotros/ Vosotras cantáis
3ª pess. plural Ellos/ Ellas
Ustedes
cantan
cantan
Tabela 2: Quadro pronominal e flexional do espanhol adaptado de Soares da Silva (2006)
Para Duarte (1995) o espanhol, como LSN prototípica, apresenta a obrigatoriedade em
deixar a categoria de sujeito referencial vazia, ocorrendo a realização fonética do sujeito
pronominal apenas em situação marcada, para desfazer ambiguidades, marcar ênfase ou em
situações de contraste. Isto se deve ao fato de o espanhol possuir um paradigma pronominal
nominativo com traços de número e pessoa e, ainda, marca de gênero, como é possível
observar na tabela 5. Segundo Fernández Soriano (1999 apud SOARES DA SILVA, 2006), os
pronomes de primeira e segunda pessoa do plural em espanhol também se flexionam em
gênero, devido à união do adjetivo otro(a) às formas primitivas nos e vos (nosotros, vosotros),
que se deu no final do século XV. Para Rizzi (1989) e Jaeggli & Safir (1989 apud SOARES
DA SILVA, 2006), o espanhol encaixa-se no grupo de LSN, visto que, possui a categoria
Agr10 caracterizada como [+ pronominal] porque não projeta o especificador de ST, já línguas
de sujeito pleno, como o inglês são [- pronominal] porque projetam o especificador de ST
representado por um pronome fraco e quando o sujeito é expresso por um pronome numa
LSN, este pronome é forte. Assim, o sujeito pronominal pleno numa língua de marcação
positiva em relação ao PSN tem a característica de ser forte e ocupar a mesma posição alta
que ocupa nas línguas de sujeito pleno e nestas línguas marcadas negativamente em relação
ao PSN, o pronome fraco aparece à esquerda e pode ser duplicado por um pronome forte
(KATO, 1999 apud SOARES DA SILVA, 2006).
De acordo com Raposo (1992) “o sistema gramatical formal das línguas naturais
especifica de modo discreto a sua categoria Agr como ‘forte’ ou ‘fraca’. Em línguas de Agr
forte, como é o caso do espanhol peninsular, pro é licenciado e em línguas de Agr fraco, como
o inglês, pro não é licenciado”. Neste sentido, é possível perceber que o traço EPP é satisfeito
10 Agree = marca flexional que é responsável pela concordância
36
em espanhol através do preenchimento da categoria de sujeitos, tanto referenciais como
expletivos, por pro.
1.3.1 Sujeito pronominal no espanhol
O espanhol peninsular permite que o sujeito não realizado foneticamente ocorra em
todas as pessoas gramaticais e, segundo Fernández Soriano (1999 apud SOARES DA SILVA,
2006) em todos os tempos verbais, exceto nas formas impessoais, isto é, as que não
selecionam argumento, como exemplificado em (39) abaixo.
(39) Hace calor hoy.
(Faz calor hoje.)
Tal fato vem sendo atribuído ao paradigma de flexão verbal rico nesta língua já que
sujeitos referenciais e expletivos são nulos. Veja em (40) e (41), respectivamente.
(40) ____ comimos mucho./ ____ llaman al teléfono.
(Comemos muito.)/ (Chamam ao telefone./Alguém está ligando.)
(41) ____ Es necesario comer más./ ____ Llueve.
(É necessário comer mais.)/ (Chove.)
Dentre as possibilidades de ocorrência de sujeito foneticamente realizado em
espanhol, é importante destacar que este somente se refere a pessoas, ou seja, não existe a
possibilidade de um sujeito pleno retomar um referente inanimado, porque neste caso existe a
obrigatoriedade de manter o sujeito nulo, como no exemplo (42) abaixo.
(42) He visto el móvil de María. _____ Tiene una interfaz sencilla.
Ao contrário do que se observa em PB. Veja o exemplo acima utilizado em (43)
abaixo no PB.
(43) Vi o celular de Maria. Ele tem uma interface simples.
Desta maneira, é possível observar que o espanhol peninsular é uma língua pro drop
prototípica, que preenche obrigatoriamente os sujeitos referenciais apenas em situações de
foco contrastivo, quando o pronome se associa a um elemento adjetival ou apositivo, como
ora exemplificado, respectivamente em (44), (45) e (46) abaixo (Rizzi, 1998).
(44) ¿Quién fue? (Quem foi?)
Fuimos nosotros. (Fomos nós.)
37
(45) Ella, que está hambrienta, puede comer ahora. (Ela, que está faminta, pode comer
agora).
(46) Él mismo lo resolvió. (Ele mesmo resolveu.)
Contudo, de acordo com Luján (1999 apud SANTOS, 2013), sempre que houver uma
sentença com sujeito pleno em espanhol, este será distintivo ou contrastivo e denotará ênfase.
Em (47) é possível observar um exemplo de (foco) contrastivo.
(47) Él trabaja demasiado. (No otro)
(Ele trabalha muito. (Não outra pessoa))
Para a autora, quando o sujeito pleno aparece anteposto ao verbo possui função
distintiva, mas se aparecerem após verbo expressa contraste, como nos exemplos (48) e (49),
respectivamente.
(48) Ella no puede comer pan. (Pero yo puedo comerlo).
(Ela não pode comer pão. (Mas eu posso))
(49) Ha visto la película usted11. [No ella, no María]
(O senhor viu o filme. (Não ela, não Maria))
O espanhol peninsular preserva todas as características de uma língua pro drop
prototípica, semelhante ao PE, ao contrário do PB que vem sendo considerado uma LSN
parcial. Dias (2008) utiliza um corpus de língua escrita para comparar quatro línguas,
espanhol (de Buenos Aires), italiano, PE e PB, a fim de verificar as taxas de sujeito nulo
nestas línguas e o PB se distancia das demais com um número bem menor de ocorrência do
sujeito nulo, enquanto o espanhol se aproxima do italiano e do PE no na utilização do sujeito
pronominal nulo.12
11 O pronome de cortesia de segunda pessoa, usted apresenta propriedades diferentes dos outros pronomes
pessoais. Ele não é associado a uma marca flexional distintiva, uma vez que se combina com a desinência verbal
Ø. Isso, entretanto, não impede que o pronome seja omitido: seu preenchimento só ocorre quando há
necessidade de o falante reforçar a sua atitude de respeito ou para desfazer uma interpretação ambígua, já que
não há desinência distintiva (FERNÁNDEZ SORIANO, 1999, 1235). 12 Ver Dias (2008).
38
2. AQUISIÇÃO DE SEGUNDA LÍNGUA
2.1 A aquisição de L2
Estudos gerativistas têm investigado o que há em comum entre a representação de uma
gramática de L1 e uma de L2. Ao contrário do que acontece com a aquisição da língua
materna por uma criança, o processo de aquisição de uma segunda língua por um adulto
parece acontecer de maneira mais custosa e pouco natural, visto que, os aprendizes de uma L2
nem sempre são bem-sucedidos na sua tarefa de aquisição e, por isso, muitas vezes sua
gramática diverge da de um falante nativo (cf. SAMPAIO, 2011, dentre outros).
Para White (2003a apud VIEGAS, 2014) a aquisição de uma L2 é semelhante à
aquisição de L1 porque necessita de acesso a um sistema que represente o input da L2 e,
ainda, os aprendizes de L2 constroem representações mentais que vão além do input a que são
expostos, já que na gramática existem propriedades abstratas, complexas e sutis não
determinadas pelo input. Tal processo levaria o aprendiz a construir a gramática da
interlíngua, que, segundo Selinker (1972 apud XAVIER, 2006), é sistemática, regida por
regras e, não necessariamente, determinada pela L1 ou L2:
Essa gramática pode possuir traços da L1 e da L2 ou de nenhuma delas.
Mesmo não apresentando traços de L1 e/ou L2, essa gramática se conforma
com as restrições universais sobre a língua, ou seja, é uma gramática prevista
pela GU. (XAVIER, 2006, p.101)
Além disso, aprendizes de L2 em estágio avançado atingiriam um nível de
competência linguística que permitiria a comparação ao nível de um nativo (BIRDSONG,
1992 apud XAVIER, 2006). Todavia, a aprendizagem de uma L2 pode envolver processos
totalmente diferentes da aquisição de uma L1, visto que a GU já não está mais acessível ao
aprendiz de uma segunda língua, apenas o conhecimento já adquirido da L1. (cf. CLAHSEN:
MUYSKEN, 1986)
De acordo com Xavier (2006) existem diferentes propostas acerca do acesso à GU no
contexto de aquisição de L2, visto que, neste momento, já existe na mente do aprendiz adulto
a sua gramática da L1. Neste sentido, segundo Viegas (2014) algumas teorias defendem que o
estado inicial de uma L2 é a gramática da L1, outras defendem que a aquisição de uma L2
acontece como a aquisição de L1. (cf. SCHWARTZ E SPROUSE, 1994, 1996; VAINIKKA E
YOUNG-SCHOLTEN, 1994, 1996, EPSTEIN et. al., 1996, dentre outros).
39
White (2003) apresenta as principais teorias segundo as quais o aprendiz acessa aos
parâmetros fixados na gramática da sua L1 durante o processo de aquisição de uma L2, isto é,
o estado inicial desta L2 será a própria L1. A saber, hipótese da Transferência e Acesso Total
(Full Acess/ Full Transfer), hipótese de Árvores Mínimas (Minimal Trees) e a hipótese dos
Traços não Valorados (Valueless Features). A autora, ainda, apresenta a hipótese do Acesso
Total (sem transferência) (Full Acess (Without a Transfer)) segundo a qual o aprendiz de L2
tem acesso total a GU, sem nenhuma interferência de qualquer propriedade da gramática da
L1 no estado inicial da interlíngua.
2.1.2 Hipótese da Transferência e Acesso total (Full Transfer and Full Acess)
Segundo Schwartz e Sprouse (1994, 1996 apud XAVIER, 2006), o estado final da
gramática da L1, com suas projeções funcionais e propriedades abstratas, compreende o
estado inicial da interlíngua na aquisição de uma L2 e o desenvolvimento da segunda língua é
decorrente por parte do input e parte do estado inicial e da GU. A partir da primeira exposição
aos dados do input da língua, o aprendiz de L2 transfere os valores dos parâmetros presentes
na gramática da sua L1 generalizando-os para a L2, ocorrendo o acesso total. Contudo,
quando a gramática da L1 não satisfaz as propriedades do input da L2, este força a
reestruturação da gramática do estado inicial de maneira que o aprendiz tenha, neste
momento, acesso às opções da GU não instanciadas na L1, incluindo novos parâmetros,
categorias funcionais, valores e traços. Assim, de acordo com os autores, a transferência total
acontece porque todas as propriedades da gramática da L1 são transferidas para a gramática
da L2 e, ainda, o acesso total acontece porque a gramática da interlíngua que difere da L1 será
construída pela GU. Veja na
Figura 5 abaixo modelo de Transferência Total e Acesso Total
retirado de White (2003).
L2 PLD13
Figura 5: Modelo Full Transfer and Full Access (White, 2003, p.61)
13 PLD = Primary Linguistic Data (Dados Linguísticos Primários). Os Dados Linguísticos Primários
correspondem aos dados do input da língua, isto é, segundo Chomsky (1965 apud Simioni, 2007) a partir do
contato entre PLD e o estado inicial da Faculdade da Linguagem, emerge a gramática da língua. Observe o
esquema abaixo retirado de Simioni (2007, p. 24)
Primary Linguistic Data (PLD) B Generative Grammar
GU
S0=L1 Ss IL Gn IL Ss
IL1 G1
40
De acordo com o modelo de White (2003) representado na figura 6 acima, o estado
inicial de uma L2 é a gramática da L1 com suas propriedades abstratas. Ao entrar em contato
com o input da L2, o aprendiz transfere as estruturas de sua L1 para construir a sua gramática
da interlíngua (IL), mas, na medida em que não encontra na L1 estruturas equivalentes à L2,
este aprendiz acessa à GU e vai reestruturando sucessivamente a sua gramática da interlíngua
(IL G1 a IL G n), fixando novos parâmetros até resultar no estado final da sua interlíngua (IL
Ss). Neste sentido, White (2003a apud VIEGAS, 2014) aponta como evidência de que o
estado inicial da L2 é a L1, o fato de haver propriedades da L1 na gramática da interlíngua e,
ainda, o fato de aprendizes de uma mesma L2 com L1 diferentes apresentarem
comportamentos distintos. Contudo, caso apresentem comportamentos semelhantes
relacionados a algum fenômeno em particular na L2, isto se justifica através da restruturação
que a gramática da interlíngua faz ao interagir com a GU, em resposta às propriedades do
input da L2 e isso possibilitará que as propriedades relevantes das duas gramáticas desses
aprendizes de L2 com L1 diferentes possam convergir.
2.1.3 Hipótese de Árvores Mínimas (Minimal Trees)
Embora a hipótese de Árvores Mínimas de Vainikka e Young Scholten (1994, 1996)
defenda - assim como a hipótese de Transferência e Acesso Total - que o estado inicial da L2
seja a gramática da L1, estas duas hipóteses divergem, pois para aquela, somente parte da
gramática da L1 integra o estado inicial da L2. De acordo com White (2003a apud VIEGAS,
2014) os autores postulam que as gramáticas nos estágios iniciais são diferentes das
gramáticas nos estágios finais, porque não apresentam algumas propriedades cujo surgimento
só se dará ao longo do desenvolvimento. De acordo com esta hipótese de Vainikka e Young
(1994, 1996 apud WHITE, 2003) as categorias funcionais da L1 não podem ser transferidas
para o estado inicial da L2, visto que a gramática inicial da interlíngua não tem aspectos
funcionais, somente categorias lexicais. No entanto, o conjunto completo das categorias
funcionais ficaria disponível para que os aprendizes de L2 as adicionem gradativamente à
gramática da interlíngua, a partir de propriedades da L2 obtidas através do input.
Neste sentido, segundo Viegas (2014), para a hipótese de Árvores Mínimas o estado
inicial dos aprendizes de L2 estará de acordo com as categorias lexicais da L1, isto é,
aprendizes com L1 diferentes terão estados iniciais diferentes. Assim, a aquisição de uma L2
e uma L1 é análoga em relação às categorias funcionais e suas projeções.
41
2.1.4 Hipótese dos Traços Valorados (Valueless Features)
Segundo Eubank (1994, 1996 apud WHITE, 2003) a hipótese dos Traços Valorados
difere da hipótese de Árvores Mínimas uma vez que as categorias funcionais e lexicais da L1
são possíveis no estado inicial da interlíngua, mas os valores dos traços não estão
especificados como fortes ou fracos e, com isso, mantêm-se indefinidos no estado inicial.
Assim, são as questões da interface da L1 que refletem na L2. (Viegas, 2014)
Desta maneira, para esta hipótese o estado inicial é a gramática da L1, porém Eubank
(1994, 1996 apud VIEGAS, 2003) defende que o estado inicial da interlíngua será
amplamente, não totalmente, determinado pela gramática da L1.
2.1.5 Hipótese do Acesso Total (sem Transferência) (Full Acess (without tranfer))
Tal qual a hipótese da Transferência e Acesso Total, para a hipótese de Epstein, Flynn
e Martohardjono (1996 apud WHITE, 2003) ocorre o acesso à GU no processo de aquisição
de L2, estando a interlíngua relacionada à GU em todos os estágios. No entanto, surgem
divergências na determinação da natureza do estado inicial. Para as hipóteses mencionadas
nas três seções anteriores, o estado inicial da L2 é uma gramática particular, contudo, a
hipótese do Acesso Total (sem transferência) rejeita esta possibilidade, uma vez que a
aquisição de L2 acessa a GU semelhante à aquisição de uma L1. Portanto, de acordo com
Epstein et al. (1996 apud WHITE, 2003) ao serem expostos ao input da L2, são geradas
sucessivas gramáticas de interlíngua levando ao estado final desta L2 através de um processo
totalmente restrito pela GU. Observe o modelo de Acesso Total (sem transferência) de White
(2003) na
Figura 6 abaixo:
L2 PLD
Figura 6: Modelo Full Acess (without Transfer) (White, 2003, p.90)
Deste modo, para Epstein et al. (1996 apud VIEGAS, 2014), a GU guia a gramática da
interlíngua em todos os estágios, visto que a L1 não constitui o estado inicial, por isso a
gramática da interlíngua de diferentes aprendizes será a mesma.
GU
L1 Ss IL G1 IL Gn L2 Ss
42
2.2 Teoria do Bilinguismo Universal
Roeper (1999 apud XAVIER, 2006, 2008) propõe a teoria do Bilinguismo Universal,
segundo a qual somos todos potencialmente bilíngues, isto é, podemos ter duas gramáticas:
uma com os parâmetros selecionados no valor (+) = G1 e outra no valor (-) = G2. O falante é
considerado como bilíngue stricto sensu quando usa a G1 e a G2 como gramáticas nucleares
distintas.
De acordo com o autor, a GU define um conjunto de representações default que todos
os falantes possuem e que ele denomina de Minimal Default Grammar (MDG). Assim, as
estruturas da MDG refletem princípios de economia, no sentido de que elas projetam menos
do que as gramáticas particulares. Para Xavier (2008) a proposta de Roeper (1999) pode ser
interpretada tanto como uma hipótese de acesso indireto como total à GU através da periferia
marcada.
Diferentemente do bilíngue “stricto sensu”, Roeper (1999), apresenta um
bilinguismo em nível desigual em que G1 = gramática nuclear e G2 =
periferia marcada. A periferia marcada pode conter conjuntos lexicais
marcados (por exemplo, itens que se comportam de forma diferente dos
demais, no que se refere ao valor do parâmetro selecionado na gramática
nuclear), ou mesmo uma mini-gramática selecionada por gênero, diferente
da gramática nuclear. (XAVIER, 2008 p. 122)
Neste sentido, a autora sugere que o acesso à GU pode ocorrer de duas formas: acesso
indireto através da L1 ou acesso direto através da gramática default. O acesso indireto à GU
ocorrerá sempre que o valor do parâmetro for o mesmo para L1 e L2 e, nessa situação, a L1
constituirá o estado inicial para a L2 (S0 = L1). Já o acesso direto irá ocorrer toda vez que o
valor paramétrico da L1 for distinto daquele da L2. Nesse caso, o estado inicial será
constituído pelo valor default do parâmetro em questão (S0 = valor default do parâmetro).
Este capítulo abordou as principais teorias de acesso à GU que norteiam as pesquisas
sobre aquisição/aprendizagem de L2 e em que medida pode ocorrer a transferência de
aspectos da L1 para a L2. Assim, as hipóteses mencionadas ao longo deste capítulo são
relevantes para este trabalho que pretende verificar, através da metodologia experimental –
descrita no próximo capítulo - como se dá a transferência do PSN parcial do PB, como L1,
para o espanhol, como L2.
43
3 PSICOLINGUÍSTICA EXPERIMENTAL
3.1 A Psicolinguística e a linguística gerativa
O conjunto das chamadas Ciências Cognitivas possui diversos modelos que buscam
investigar a cognição humana, dentre os quais, aqueles que procuram explicar como é o
conhecimento linguístico existente na mente das pessoas e, para isso, formulam teorias sobre
como funciona tal conhecimento. A psicolinguística, por sua vez, caracteriza-se como uma
ciência empírica e tem como objeto de investigação os processos cognitivos implícitos na
produção e compreensão da linguagem relacionada ao estudo do processamento adulto em
tempo real e na aquisição da linguagem por uma criança. A psicolinguística possui caráter
experimental, ou seja, é uma ciência empírica que se caracteriza pelo emprego de métodos e
técnicas experimentais da psicologia cognitiva (cf. KENEDY, 2013).
A psicologia cognitiva é uma das áreas mais recentes das pesquisas em
psicologia, tendo surgido ao final dos anos 1950, com a revolução cognitiva.
Trata-se da área da psicologia que procura estudar, através de experimentos
científicos, a natureza e o funcionamento da cognição humana. Um
psicólogo cognitivo dedica-se a fenômenos como, dentre outros, memória,
atenção, percepção, raciocínio, resolução de problemas, linguagem,
emoções. A psicolinguística é uma das subdisciplinas da psicologia
cognitiva. (KENEDY, 2013 p. 19)
Dessa maneira, há muita interação entre psicolinguística e teoria gerativa, pois aquela
se utiliza dos métodos da psicologia cognitiva para testar empiricamente as previsões
formuladas pelos gerativistas através de modelos abstratos e, de acordo com os resultados
destes testes, a teoria linguística pode “formular ou reformular suas hipóteses para construir
modelos baseados na realidade psicológica do funcionamento real da linguagem”, já que a
psicolinguística tem como objetivo o estudo da realidade psicológica das línguas naturais em
seu funcionamento real, ou seja, o estudo da língua-I.
[...] a psicolinguística experimental tem como objetivo básico descrever e
analisar a maneira como o ser humano produz a linguagem, observando
fenômenos linguísticos relacionados ao processamento da linguagem. Ou
seja, esses fenômenos são tratados e focalizados do ponto de vista de sua
execução pelos falantes/ouvintes a partir de seu aparato
perceptual/articulatório e de seus sistemas de memória. (LEITÃO, 2008,
p.221)
A linguística gerativa, por sua vez, preocupa-se, em formular hipóteses sobre a
realidade teórica ou epistemológica do conhecimento linguístico, abordando a língua no nível
44
computacional enquanto a psicolinguística busca observar e descrever tais hipóteses sobre
como o conhecimento linguístico é processado na mente humana através de pesquisas
experimentais. Segundo Kenedy (2013), o modelo linguístico mais influente é o gerativismo -
ou linguística gerativa –, que visa descrever, com objetividade científica, o conhecimento
linguístico dos falantes, isto é, descrever as estruturas da linguagem construídas através de
procedimentos mentais. Neste sentido, a linguística gerativa vê a linguagem como fenômeno
cognitivo e formula teorias abstratas na tentativa de descrevê-la.
No final da década de 1950, a linguística gerativa (CHOMSKY, 1957) inaugura um
novo modelo teórico formal utilizado para descrever e explicar o funcionamento da
linguagem humana a partir do ponto de vista mental. Para Chomsky, as pessoas adquirem a
linguagem humana naturalmente a partir de um dispositivo inato que permite construir na
mente humana uma gramática da língua a partir de um número reduzido de estímulos e isso só
acontece porque o ser humano é dotado de uma competência linguística – capacidade natural
e inconsciente de produzir e compreender frases. Assim, a aquisição de uma gramática
pressupõe a existência de uma GU, como explicitada no primeiro capítulo, que se configura
como o estágio inicial de aquisição da linguagem. Este modelo teórico, gerativista, passou e
passa por diversas formulações na tentativa de dar conta de algumas questões como, as
diferenças e semelhanças entre todas as línguas naturais, a maneira como o indivíduo adquire
o conhecimento linguístico, dentre outras.
A psicolinguística, por outro lado, situa-se, segundo Corrêa & Augusto (2006) no
nível representacional e é caracterizada por utilizar essencialmente modelos procedimentais
de processamento linguístico, representação e acesso lexical, de um ponto de vista funcional.
Com isso, esta abordagem metodológica possui caráter essencialmente experimental que
consiste em fornecer hipóteses que buscam estabelecer relações de causa e efeito entre
variáveis dependentes e independentes, observando o processo além do produto para tentar
explicar como o processamento linguístico se estrutura na mente dos falantes. Para tanto, a
psicolinguística “lança mão de uma série de procedimentos metodológicos de acordo com o
tipo de fenômeno ou de objeto linguístico que se está focalizando nas pesquisas.” (LEITÃO,
2008) Tais pesquisas compreendem subdomínios associados à compreensão e à produção de
linguagem.
45
3.2 Principais métodos e técnicas da psicolinguística
Na tentativa de compreender como funcionam os processos mentais envolvidos nos
modelos de representação e processamento linguístico, a psicolinguística utiliza-se de
métodos experimentais - a depender das variáveis dependentes usadas - conhecidos como
métodos não-cronométricos (ou off-line) e cronométricos (ou on-line), (cf. DERWING e DE
ALMEIDA, 2005). Os experimentos off-line produzem dados sobre o momento de reflexão
das frases ou enunciados, já que capturam reações a estímulos após ter havido uma integração
entre todos os níveis linguísticos: fonológico, morfológico, lexical, sintático e semântico. Os
experimentos on-line, por sua vez, utilizam majoritariamente o tempo e reação ou resposta
como variável dependente produzindo dados a respeito de processos mentais que acontecem
antes que essa integração esteja completa, durante o momento reflexo. (cf. LEITÃO, 2008)
Métodos off-line possuem uma abordagem simples e objetiva, isto é, dispensam o uso de
equipamentos para coletar as respostas relacionadas ao tempo de processamento como ocorre
com os métodos on-line (cf. DERWING E DE ALMEIDA, 2005). Além disso, os
experimentos off-line podem ser aplicados simultaneamente a um grande número de
participantes, gerando grande quantidade de novos dados. Dentre as técnicas off-line mais
utilizadas, destacam-se:
Preenchimento de questionário;
Os participantes recebem um questionário com frases relacionadas ao objeto que se
presente investigar, leem as frases e respondem a perguntas sobre as frases lidas.
Decisão lexical
Os participantes devem decidir se uma sequência de letras constitui uma palavra ou não.
Espera-se que o participante demore menos tempo para acessar uma palavra precedida
por outra palavra que tenha características semânticas, fonológicas ou morfológicas
parecidas, como por exemplo, enfermeira/médico.
Julgamento de aceitabilidade/gramaticalidade
Os participantes leem frases e devem julgar se estas são aceitáveis (gramaticais) ou não e
este julgamento sempre ocorre de forma binária, ou seja, os participantes precisam
escolher uma das duas possibilidades como aceitáveis.
Ranqueamento de aceitabilidade;
Os participantes leem frases ou estruturas de acordo relacionadas ao objeto de
investigação e devem escolher numa escala de cinco pontos (0 a 4), por exemplo, uma
nota para as frases como mais ou menos aceitáveis.
46
Produção induzida
Os participantes recebem pequenos estímulos que permitem uma continuação, então
estes devem completá-los construindo novas sentenças. Esta é uma técnica muito
utilizada na psicolinguística e visa acessar a produção de enunciados linguísticos de
forma controlada de acordo com os objetivos que se deseja investigar.
Para a realização de experimentos psicolinguísticos é necessário controlar o material
de testagem e isolar os fatores que se pretende investigar, elencando variáveis independentes
que serão testadas, observando-se sua influência nas suas variáveis dependentes. Contudo,
antes de elaborar o experimento, faz-se necessária a escolha do método mais adequado a ser
utilizado, on-line ou off-line. Nos experimentos off-line, a variável dependente é medida após
o processamento da informação, ou seja, os processos mentais dos participantes não são
observados ao longo do processamento e sim após a conclusão do processamento,
contrariamente ao que acontece nos experimentos on-line, nos quais essa mesma variável é
medida durante o processamento da informação linguística, inferindo os processos cognitivos
inconscientes, isto é, obtêm-se dados durante o processamento.
De acordo com Mitchell (2004), o método on-line utiliza ferramentas capazes de
capturar efeitos bem próximos ao momento em que ocorre o processamento reflexo, de outro
modo, o método off-line, como anteriormente citado, utiliza questionários ou outras
ferramentas que não captam com precisão o momento reflexo do processamento, por este
motivo, tal método não é capaz de medir o processamento mais automático, sem influência da
integração do conteúdo semântico-pragmático. Neste sentido, os métodos on-line tendem a
capturar o tempo de reação (Reaction Time - RT) medido em milésimos de segundo, quanto
mais complexo o processamento, maior será o RT, isto é, acontecem mais computações
mentais. Veja abaixo as principais técnicas experimentais on-line utilizadas pela
psicolinguística:
Rastreamento ocular (Eyetracking);
O participante utiliza o computador para ler frases/ textos ou observar imagens e tem os
movimentos dos seus olhos rastreados por um aparelho chamado Eyetracker. Este
aparelho acompanha o movimento da pupila do participante enquanto uma câmera
captura todos os movimentos oculares realizados pelo participante ao ler ou observar o
que está na tela do computador.
Existem alguns tipos de Eyetracker: móveis com formato de óculos e com base fixa e
apoio para o queixo, que captam com mais precisão os movimentos, por exemplo, ambos
percebem tanto as sacadas quanto o padrão de fixações. As sacadas são os saltos que o
47
olho faz de uma palavra/imagem para outra e as fixações são as paradas que o olho faz
em uma determinada palavra ou determinados pontos da leitura/ imagem.
Leitura automonitorada (Self-Paced Reading)
O participante ao apertar um botão lê as frases segmentadas mostradas uma a uma na tela
de um computador, à medida que aperta o botão um novo segmento aparece na tela. O
computador, então mede em milissegundos o RT, ou seja, o tempo que o participante
utilizou para ler cada segmento. Para um experimento on-line, usando esta técnica é
necessário que o pesquisador utilize alguns softwares, tais como o Psyscope (compatível
com Mac), o Linger (PC e Mac), (DMDX), dentre outros.
Efeito de reativação
O participante é apresentado ao objeto linguístico relevante à pesquisa, como por
exemplo, uma palavra. Depois, uma pista reduzida ou estímulo associado, como uma
palavra semântica ou fonologicamente relacionada à primeira palavra também é
apresentada. O efeito de reativação está relacionado à propriedade que as unidades
cognitivas têm na memória de apresentar variação no nível de ativação ou excitação.
Partindo de um nível de ativação zero, uma unidade cognitiva pode ser ativada por causa
do processamento perceptual ou linguístico. O conceito de “copo”, por exemplo, é
ativado quando alguém vê um copo ou ouve a palavra copo. (TULVIN & SCHACTER,
1990 apud VIEGAS, 2014).
Este capítulo abordou algumas características da psicolinguística, que possui caráter
estritamente experimental, e da linguística gerativa (CHOMSKY, 1957), responsável por
estabelecer um modelo formal que busca dar conta da estrutura e funcionamento da
linguagem humana. Neste sentido, a escolha pela utilização da metodologia experimental para
a investigação de fenômenos inerentes à linguagem humana se deu pela escassez de trabalhos
experimentais relacionados à aquisição e transferência de aspectos do PB como L1 para o
espanhol como L2, sendo assim, utilizaremos nesta pesquisa a técnica off-line de produção
induzida. Espera-se, portanto, que os resultados obtidos neste trabalho contribuam para as
futuras pesquisas experimentais que tenham como foco o mesmo objeto de pesquisa, bem
como, para as teorias sobre aquisição de L2.
Além disso, na seção que se segue revisitaremos o trabalho de Viegas (2014) no qual a
pesquisadora utiliza a técnica off-line de julgamento de gramaticalidade a fim de investigar a
interferência do PSN parcial do PB na aquisição de inglês como L2.
48
3.3 Revisitando Viegas
Pesquisas sobre aquisição de L2 fundamentam-se em análises estatísticas de dados
obtidos através de testes experimentais on-line ou off-line. Neste sentido dentre os trabalhos
cuja investigação baseia-se na interferência da L1 sobre a L2, destacamos e utilizamos como
referência o de Viegas (2014), que propõe uma averiguação sobre a interferência do PB no
aprendizado de inglês como L2 durante processo de aquisição da segunda língua. A
pesquisadora utiliza-se dos pressupostos gerativistas no âmbito do programa minimalista de
Chomsky (1995), utilizando a metodologia da psicolinguística experimental para apresentar as
possíveis interferências que o parâmetro do sujeito nulo do PB, considerando-se como LSN
parcial, conforme citado em (HOLMBERG, 2010; MODESTO, 2000 apud VIEGAS, 2014)
teria sobre os aprendizes de inglês, uma língua de sujeito pleno. Viegas (2014) baseia-se na
investigação de Kim (2007) sobre a influência do coreano, língua de tópico, na aquisição de
inglês como L2 e replica parcialmente o seu experimento, chamando-o de piloto.
Para este experimento piloto, Viegas utilizou o método off-line de julgamento de
gramaticalidade e contou com 10 participantes aprendizes de inglês como L2 distribuídos em
dois grupos, 10 do nível básico e 10 do nível avançado. Cada participante realizou o
experimento off-line dentro da sala de aula de um curso de idiomas, com o tempo livre para a
realização do mesmo e tal tarefa consistia em responder a um questionário que continha 5
sentenças de tipo 1 e 5 (abaixo) sentenças de tipo 2 (abaixo), somando um total de 10
sentenças agramaticais. Além disso, havia 6 sentenças gramaticais com o sujeito referencial
ou expletivo it e 12 sentenças distratoras (10 gramaticais e 2 agramaticais). Além disso, as
sentenças distratoras continham erros como inversão da ordem entre substantivos e adjetivos.
Veja abaixo exemplos dos tipos 1 e 2 retirados do experimento piloto de Viegas (2014).
Tipo 1 – estrutura sem tópico de sujeito nulo de tipo expletivo ou referencial.
I saw Sandy at a school party. *was a beautiful girl.
(Eu vi Sandy numa festa da escola. Era uma menina bonita.)
*Rained very hard when Peter came home.
(Choveu muito forte quando Peter chegou em casa.)
Tipo 2 – estrutura com tópico – locativo ou temporal- de sujeito nulo referencial ou expletivo.
Tom had lots of fun yesterday. *Today is busy with many things to do.
(Tom se divertiu muito ontem. Hoje está ocupado com muitas coisas pra fazer.)
*Yesterday rained a lot in this city.
49
(Ontem choveu muito nesta cidade.)
Os dados obtidos por Viegas foram submetidos ao pacote estatístico ANOVA. De
acordo com os dados, a autora sugere que há interferência de L1 na L2 nos níveis mais baixos,
visto que os aprendizes de nível avançado mostraram melhor desempenho que os aprendizes
de nível básico e, ainda, julgaram como mais agramaticais as sentenças do tipo 1 do que as do
tipo 2. De acordo com Viegas (2014), tal comportamento sugere que a possibilidade de um
locativo ou temporal poder satisfazer a exigência de EPP no PB estaria sendo transferida para
o inglês, e tais resultados confirmariam as suas previsões de que, no processo de aquisição do
parâmetro do sujeito nulo em inglês, existe a construção de uma interlíngua na qual é possível
identificar aspectos da L1 influenciando a aquisição de L2.
O seu segundo e último experimento, também de julgamento de gramaticalidade com
escala (yes, probably yes, probably no, no), possuiu 45 participantes divididos em três níveis
de proficiência (15 nível básico, 15 intermediário e 15 avançado) e ainda contou com 15
nativos que constituíram o grupo controle. Este experimento teve como variável dependente o
número de respostas corretas: (no, probably no) e como variável independente o nível de
proficiência, (o tipo de sentença e o tipo de sujeito pronominal). As sentenças foram de três
tipos:
Tipo1 - Com sujeito nulo expletivo ou referencial sem tópico;
I saw Sandy at the school party. *Was a beautiful girl.
Tipo 2 - Com sujeito nulo referencial ou expletivo com tópico locativo ou temporal na
periferia esquerda;
Tom had lots of fun yesterday. *Today is busy with many things to do.
Tipo 3 - Com sujeito nulo referencial ou expletivo, com conjunção na periferia esquerda.
*The children didn’t want to eat anything, when were sick.
(As crianças não queriam comer nada, quando estavam doentes.)
Os participantes responderam aos questionários da mesma maneira como responderam
no experimento piloto.
50
Os resultados deste experimento final foram submetidos a um modelo de regressão
logística de efeitos mistos e a testes de comparações múltiplas com os contrastes de Tukey14
e, ainda, ao cálculo dos percentuais de acerto para as condições avaliadas. O modelo de
regressão lógica de efeitos mistos não apresentou resultados significativos para o teste de
proficiência como efeito fixo, contudo, o teste de comparações múltiplas com os contrastes de
Tukey apresentou diferenças significativas para os níveis de proficiência básico e avançado,
intermediário e avançado, básico e nativo, intermediário e nativo, tendo ainda um efeito
marginal entre avançado e nativo. Para os níveis básico e intermediário não houve diferença
significativa. O nível de proficiência mostrou que os aprendizes do nível básico possuem
desempenho abaixo da média, os aprendizes do intermediário estão na média e os aprendizes
do nível avançado têm um desempenho bastante satisfatório (VIEGAS, 2014, p. 84).
Ainda sobre os dados, os tipos de sentenças 2 e 3 foram comparados e verificou-se que
a ausência do expletivo não é facilmente reconhecida como agramatical em nenhum desses
dois tipos, fato que, segundo Viegas (2014), contraria os dados obtidos no experimento piloto
no qual houve maior dificuldade de percepção de gramaticalidade no tipo 2. De acordo com a
autora os dados sugerem que há interferência da L1 sobre a L2, mas a caracterização do PB
como língua de tópico não parece ser a responsável direta pela dificuldade em julgar os tipos
de sentença, e sim, tal dificuldade parece ter natureza mais ampla. Como sentenças possíveis
em inglês, aceitas pelos aprendizes, aparecem as com tópicos e expletivos omitidos e as
iniciadas por uma conjunção, visto que a presença de uma conjunção parece dificultar a
percepção de que o tópico está ausente.
A comparação entre o tipo de sentença vs. nível de proficiência não apresentou efeitos
significativos para os níveis básico e intermediário, mas houve um efeito marginal entre as
sentenças do tipo 3 do nível básico se comparadas as do nível intermediário, fato que segundo
Viegas (2014) indica maior dificuldade dos aprendizes de nível básico em perceber a
agramaticalidade de sentenças iniciadas por conjunção. E, ainda, os dados de sujeito
gramatical sugerem que o nível básico reconheceria mais facilmente as sentenças do tipo 1
como agramaticais. Para os dados de sujeito expletivo, os resultados indicaram que os
aprendizes estariam atentos à necessidade do expletivo, sem, contudo, perceber a sua ausência
nas sentenças do tipo 2 com tópico locativo ou temporal, fato que para Viegas (2014) deve-se
à interferência da possibilidade de preenchimento de EPP por tópico como ocorre no PB.
14 Ver: http://www.portalaction.com.br/anova/31-teste-de-tukey
51
Quanto à percepção da agramaticalidade dos sujeitos nulos em inglês, os aprendizes de
nível básico parecem estar mais atentos à impossibilidade de sujeito nulo referencial do que
meteorológicos, de outro lado, estão os aprendizes de nível intermediário, que se mostraram
menos atentos aos pronomes referenciais e mais atentos ao preenchimento do sujeito
expletivo com verbos meteorológicos e de alçamento. Isso, de acordo com Viegas, parece
indicar que os aprendizes de nível básico são mais sensíveis às restrições básicas do inglês,
mas ainda não estão atentos aos verbos meteorológicos, por outro lado, os aprendizes de nível
intermediário já estão familiarizados com o fato de os pronomes referenciais possuírem
necessidade de estar explícitos, mas não voltam sua atenção a este aspecto e sim, dedicam sua
atenção ao preenchimento do sujeito expletivo em verbos meteorológicos e de alçamento. No
entanto, este comportamento não se apresenta em sentenças do tipo 2, o que parece indicar
que a possível interferência do PB não permite que o aprendiz perceba a omissão do
expletivo.
Os resultados deste experimento indicam então que os aprendizes são mais sensíveis
aos pronomes referenciais e que existe uma tendência maior em perceber a agramaticalidade
em sentenças cujo elemento a periferia esquerda não existe. Além disso, opostamente ao
experimento piloto, não houve maior dificuldade em julgar sentenças com sujeito referencial e
expletivo nulo com presença de tópico – locativo ou temporal – como agramaticais, já que os
aprendizes mostraram um comportamento semelhante em relação às sentenças do tipo 3. E,
ainda, não foi confirmada a satisfação de EPP por tópico. Neste sentido, tais resultados
parecem confirmar a Hipótese da Transferência e Acesso Total (Full Transfer and Full Acess)
apresentada por White (2003) e servem como base para esta pesquisa, pois indicam que valor
do parâmetro do sujeito nulo é transferido de L1 para a L2, que há interferência de restrições
gerais da gramática de L1 na L2, que a interferência da L1 se mostra mais evidente em
relação aos sujeitos expletivos e, ainda, que diminui com o aumento da proficiência em L2
(VIEGAS, 2014 p. 87).
52
4. EXPERIMENTOS
Os capítulos anteriores preocuparam-se em apresentar os pressupostos teóricos que
orientam este trabalho, bem como as possíveis influências que a marcação do parâmetro do
sujeito nulo no PB pode ter sobre a aquisição do espanhol como L2 para falantes do PB, além
de apresentar os modelos teórico-metodológicos que embasam esta pesquisa e as relações
existentes entre a linguística gerativa e a psicolinguística com seus métodos e técnicas
experimentais. Na sequência, dedica-se à descrição do experimento off-line de produção
induzida ou eliciada aplicado aos brasileiros aprendizes de espanhol como L2 alunos de um
curso de idiomas, e replicado aos alunos da graduação de letras/espanhol, tendo como grupo
controle nativos espanhóis que nunca tiveram contato com o PB.
4.1 Experimento continuação de narrativas I
De acordo com Garman, Carrol e Harley (1990, 1994, 1997 apud RODRIGUES,
2006), questões metodológicas são a principal justificativa para pesquisas em psicolinguística
focarem no estudo da compreensão em maior escala que no estudo da produção. Isso se deve
ao fato de existir maior dificuldade em controlar a variável dependente na produção, ao
contrário do que acontece na compreensão, na qual há maior possibilidade de manipular o
material a ser analisado e compreendido pelos participantes durante o experimento. Na
produção, por outro lado, não é possível uma manipulação direta, visto que torna-se
impossível prever quais os dados serão obtidos durante a produção, ou seja, a partir de tarefas
criadas que permitam a indução da produção investigada (cf. RODRIGUES, 2006 p. 142).
Neste trabalho, visa-se investigar por meio de uma tarefa off-line de produção
induzida (continuação de narrativas) a interferência do PSN parcial do PB sobre o
aprendizado do espanhol, língua prototípica de sujeito nulo, como L2 por brasileiros. A tarefa
consistia em pequenas narrativas escritas em espanhol, permitindo a continuação em língua
escrita com palavras ou frases com o objetivo de investigar o padrão de respostas dos
aprendizes do espanhol como L2. A tarefa, portanto, possibilitava a utilização de uma
categoria vazia pro no lugar de sujeitos referenciais animados nas 1ª e 3ª pessoas do singular e
1ª e 3ª pessoas do plural. Padrões de resposta com sujeitos preenchidos podem indicar uma
possível interferência do parâmetro da L1 sobre a L2, fato que pode confirmar de acordo com
White (2003) a evidência de propriedades da L1 na gramática da interlíngua do aprendiz.
4.1.1 Design experimental
O método off-line de produção induzida consiste numa importante ferramenta para
investigar o processamento no âmbito da produção. Neste experimento foi utilizada a técnica
53
de continuação de narrativas, tendo sido manipulado o paradigma número-pessoal de cada
uma delas, ao passo que as distratoras foram elaboradas de maneira que seus referentes
tivessem traço [- animado]. Todas as narrativas escritas em espanhol tinham referentes com
traço [+ animado], que, de acordo com Duarte (2003) favorecem o preenchimento do sujeito
em PB, ao contrário do espanhol, que possui a característica de não preenchimento do sujeito
mesmo com traço [+ animado]. Além disso, esta tarefa experimental contou com participantes
em três níveis de proficiência, divididos em três grupos experimentais (básico, intermediário e
avançado), de acordo com o nivelamento feito pelo próprio curso de idiomas Prolem,
localizado na Universidade Federal Fluminense, e um grupo controle. A tarefa dos
participantes consistia apenas em continuar as narrativas. Observe na Tabela 3 abaixo o
desenho experimental.
1ª P Sg. 3ª P Sg. 1ª P Pl. 3ª P Pl.
Nulo
Pleno
Tabela 3: Desenho experimental
4.1.2 Hipóteses e previsões
Após terem sido esclarecidas as distinções entre o PB e o espanhol com relação ao
PSN e a possível interferência da L1 sobre a L2 de acordo com a Hipótese da Transferência e
Acesso Total, a hipótese que orienta este trabalho é a de que o PSN da L1, neste caso, parcial
do PB, é transferido para o espanhol como L2, LSN prototípica, havendo, portanto,
interferência da L1 sobre a L2. Complementarmente, a hipótese é também de que esta
interferência diminua em função do aumento da proficiência da língua-alvo.
Com base nas hipóteses levantadas, são feitas as seguintes previsões:
a) Se existe transferência do parâmetro do sujeito nulo da L1 para a L2, os participantes,
aprendizes de espanhol, provavelmente produzirão frases com sujeito pleno em maior número
do que frases com sujeito nulo de acordo com os mecanismos de satisfação do EPP em PB;
b) Se a interferência diminui com o aumento da proficiência, prevê-se diferenças
significativas na produção de frases com sujeito pleno nos três níveis, isto é, mais frases com
sujeito nulo em níveis de proficiência avançados semelhante ao que se espera para o grupo
controle;
54
4.1.3 Variáveis e condições
Neste experimento foram selecionadas como variáveis independentes os níveis de
proficiência (básico, intermediário e avançado) e o tipo de narrativa a ser eliciada em 1ª ou 3ª
pessoas do singular ou plural. Obteve-se, assim, um desenho experimental 3x4 apresentado
em quatro condições: 1ª e 3ª pessoas do singular e 1ª e 3ª pessoas do plural, como
exemplificado na Tabela 4 abaixo.
Condições experimentais
1ª Pessoa Sg. Salí de vacaciones a conmemorar la defensa de mi
tesis de postgrado en un lugar diferente y el día fue
muy provechoso en una playa paradisiaca de México.
De los manjares mexicanos nunca había probado, por
eso…
3ª Pessoa Sg. Tuve en la niñez una tía muy querida que me
llevaba a su casa en las vacaciones, salía
conmigo y con mis hermanos en casi todos los
fines de semana. Era una mujer espectacular,
trabajadora y muy feliz, pero un día…
1ª Pessoa Pl. Mi esposo y yo descubrimos que personas con altos
niveles de colesterol tienen una posibilidad
significativamente mayor de desarrollar cáncer, por
eso decidimos ir al spa para reducir el antojo de
comidas basura. Después de algunos días…
3ª Pessoa Pl. Conocí a unos muchachos en un sitio para
jóvenes amigos, charlamos por lo menos unos
cinco meses hasta que decidí encontrarlos en
un retiro espiritual. En el primer día, los
muchachos parecieron muy amables, pero
después…
Tabela 4: Condições experimentais do experimento I
Como variáveis dependentes, têm-se número de frases produzidas com sujeito nulo ou
pleno em cada uma das quatro condições e em cada um dos três níveis de proficiência.
Cada uma das condições como as exemplificadas na tabela 4 acima conduz à
continuação de uma narrativa em uma das duas pessoas, 1ª ou 3ª, e em um dos números,
singular ou plural, mas cabe ao participante dar continuidade à narrativa. Ao fazer isso,
espera-se que ele mantenha as pessoas e o número com sujeito nulo ou com sujeito
preenchido, mas existe a possibilidade de não haver retomada com o sujeito e sim com
perífrases e, ainda há a possibilidade de outra produção totalmente imprevisível, tal resultado
é comum em se tratando de produção.
4.1.4 Participantes (grupos experimentais)
Participaram deste experimento 60 brasileiros aprendizes tardios de espanhol como
L2, - isto é, brasileiros que iniciaram seu aprendizado de espanhol como L2 na fase adulta-,
dos quais 20 são do nível básico, 20 do nível intermediário e 20 do nível avançado, todos
alunos do curso de idiomas da Universidade Federal Fluminense, o Prolem e residentes no RJ.
55
A idade média dos participantes foi de 25 anos, o grupo contou com 13 homens e 47
mulheres, e todos são residentes no RJ.
4.1.4.1 Controle
Além do grupo experimental composto por 60 participantes divididos em três grupos,
como mencionado na seção anterior, este experimento contou com a participação de 10
espanhóis para constituir o grupo controle. Todos estes participantes são falantes nativos do
espanhol peninsular que nunca estiveram no Brasil. A escolha desta variedade do espanhol
deveu-se ao fato de que algumas variedades do espanhol americano têm apresentado um
comportamento distinto de uma LSN prototípica e, com isso, poderiam apresentar
semelhanças estruturais com o PB.
Casos extremos de esse fenómeno pueden observarse em variedades de la
lengua habladas em zonas de la costa de Venezuela y em la República
Dominicana, entre otros sítios, que pertenecen a uma macro variedade
denominada español caribeño. (PINHEIRO-CORREA, 2010, p. 37)
Neste sentido, a diferença entre estas variedades e a variedade peninsular poderia ser
encontrada em outras variedades americanas, ainda que com relação ao sujeito nulo, o
espanhol da argentina, por exemplo, seja uma variedade americana próxima da variedade
peninsular. (SOARES DA SILVA, 2006).
4.1.5 Materiais
O material utilizado neste experimento de produção induzida contou com 12 narrativas
experimentais incompletas, permitindo 3 exposições para condição experimental. Além disso,
contou com a distribuição whitin subjects permitindo que todos os participantes de todos os
grupos fossem expostos a todas as condições experimentais. O experimento contou ainda com
24 distratoras em 1ª e 3ª pessoas também incompletas. Veja os exemplos abaixo.
1- NARRATIVAS EXPERIMENTAIS:
1ª pessoa do singular
Salí de vacaciones a conmemorar la defensa de mi tesis de postgrado en un lugar diferente y
el día fue muy provechoso en una playa paradisiaca de México. De los manjares mexicanos
nunca había probado, por eso…
56
(Saí de férias para comemorar a defesa da minha tese de doutorado em um lugar diferente e o
dia foi muito proveitoso numa praia paradisíaca do México. Das deliciosas comidas
mexicanas nunca havia experimentado, por isso...)
3ª pessoa do singular
Tuve en la niñez una tía muy querida que me llevaba a su casa en las vacaciones, salía
conmigo y con mis hermanos en casi todos los fines de semana. Era una mujer espectacular,
trabajadora y muy feliz, pero un día…
(Tive na infância uma tia muito querida que me levava a sua casa nas férias, saía comigo e
com meus irmãos quase todos os finais de semana. Era uma mulher espetacular, trabalhadora
e muito feliz, mas um dia...)
1ª pessoa do plural
Mi esposo y yo descubrimos que personas con altos niveles de colesterol tienen una
posibilidad significativamente mayor de desarrollar cáncer, por eso decidimos ir al spa para
reducir el antojo de comidas chatarras. Después de algunos días…
(Meu marido e eu descobrimos que pessoas com altos níveis de colesterol têm uma
possibilidade significativamente maior de desenvolver câncer, por isso decidimos ir ao spa
para reduzir o desejo de comer comidas calóricas. Depois de alguns dias...)
3ª pessoa do plural
Conocí a unos muchachos en un sitio para jóvenes amigos, charlamos por lo menos unos
cinco meses hasta que decidí encontrarlos en un retiro espiritual. En el primer día del retiro
los muchachos parecieron muy amables, pero después…
(Conheci a uns rapazes num site para amizade jovem, conversamos por pelo menos uns cinco
meses até que decidi encontra-los em um retiro espiritual. No primeiro dia do retiro os rapazes
pareceram muito amáveis, mas depois...)
2- NARRATIVAS DISTRATORAS:
La presidenta de la empresa anunció que el cafecito y la leche de los intervalos serán
cobrados de los empleados porque subió el precio de la crema desnatada que los
compone. Algunos trabajadores sonaron la alta alarma de incendio como…
57
(A presidente da empresa anunciou que o cafezinho e o leite dos intervalos serão
cobrados dos empregados porque subiu o preço do creme que os compõe. Alguns
trabalhadores tocaram o alarme de incêndio como...)
Actualmente, los mensajes electrónicos forman parte del cotidiano de millones de
personas que los utilizan para tratar de asuntos personales, profesionales o comerciales
con agilidad. Sin embargo, todavía se escriben cartas de amor, comerciales...
(Atualmente, as mensagens eletrônicas fazem parte do cotidiano de milhões de pessoas
que as utilizam para tratar de assuntos pessoais, profissionais ou comerciais com
agilidade. No entanto, ainda se escreve cartas de amor, comerciais...)
O objetivo das narrativas distratoras é garantir que os participantes não possam
distinguir quais são as narrativas experimentais, tampouco sobre o que se pretende aferir com
o experimento.
Cada narrativa experimental possuía o total de 38 a 40 palavras e seu referente
possuía o traço [+animado]. Todas as narrativas foram apresentadas em espanhol distribuídas
aleatoriamente no papel, assim, cada narrativa permitiu a continuação com a posição de
sujeito nula.
4.1.5 Procedimentos
Os participantes realizaram a tarefa experimental na própria sala do curso de espanhol
situado na Universidade Federal Fluminense, em aproximadamente trinta minutos antes de
terminar as aulas, tempo este cedido pelos professores, e a média de duração de cada
participante foi de, aproximadamente, 25 minutos. Ao terminar a aula, todos recebiam as
folhas contendo as narrativas experimentais e distratoras, mantendo-as viradas enquanto
ouviam uma breve explicação sobre o que deveria ser feito. A mesma orientação foi dada em
todas as turmas. Foi solicitado que ao término da leitura de cada uma das narrativas,
imediatamente completassem com as primeiras palavras surgidas na mente e, ainda, que
escrevessem duas ou três palavras apenas. As dúvidas relacionadas ao vocabulário foram
sanadas durante a aplicação do experimento. Ao terminar o experimento, cada participante
saía da sala.
58
4.2 Resultados
Os dados obtidos neste experimento foram submetidos ao teste estatístico qui-
quadrado. Os resultados relacionados ao tipo narrativa em primeira e terceira pessoas,
descritos no
Gráfico 1 abaixo, apontam que houve um efeito significativo da variável tipo de narrativa em
relação à pessoa gramatical e o tipo de sujeito produzido nas frases dos três grupos de
proficiência. De acordo com o teste qui-quadrado (X²= 158, 7978836, p<0,05) narrativas em
primeira ou terceira pessoas interferem no efeito da variável, visto que a primeira pessoa
apresenta maior incidência de frases com sujeito nulo em comparação a terceira pessoa em
todos os níveis de proficiência, ainda que o percentual de frases com sujeito pleno tenha sido
bastante elevado na terceira pessoa do nível básico (68,34% sujeito pleno) e nas primeira (55,
84% sujeito pleno) e terceira ( 70,84 % sujeito pleno) pessoas do nível intermediário.
Gráfico 1: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nas 1ª e 3ª pessoas nos três diferentes níveis de
proficiência.
BA_1ªP. BA_3ªP. IN_1ªP. IN_3ªP. AV_1ªP. AV_3ªP.
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
1.4
Nulo
Pleno
68,34%
55,84%
70,84%
59
Contudo, não há um efeito estatístico significativo desta mesma variável para o grupo
controle, no qual se verifica a ocorrência 98,33% de frases produzidas com sujeito nulo na
primeira pessoa e 91,66% na terceira (X²= 1,578947368, p>0,05). Este resultado é esperado,
visto que o grupo controle é composto por nativos do espanhol, uma língua pro drop
prototípica. Veja no Gráfico 2 abaixo.
Gráfico 2: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nas 1ª e 3ª pessoas do grupo controle
Além disso, a variável tipo de narrativa relacionada ao número, singular ou plural,
também apresenta efeito significativo nos três diferentes níveis de proficiência (X²=
132,5206349, p<0,05), ou seja, o percentual de frases produzidas com sujeito nulo nas
narrativas de plural são maiores do que nas narrativas de singular, ainda que os níveis básico e
intermediário apresentem um percentual maior de frases com sujeito pleno. Veja no Gráfico 3
abaixo.
1ª_P. 3ª_P.
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
1.4
Nulo
Pleno
BA_sg. BA_pl. IN_sg. IN_pl. AV_sg. AV_pl.
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
Nulo
Pleno
60
Gráfico 3: Produção de frases com sujeito nulo e pleno em singular e plural, nos três diferentes níveis de
proficiência.
Novamente, com relação ao grupo controle os resultados mostram que não parece
haver efeito significativo da variável tipo de narrativa relacionada ao número (X²=
0,175438596, p>0,05), visto que 93,33% das narrativas no singular e 96,66% das narrativas
no plural tiveram frases produzidas pelos nativos com sujeito nulo, fato que mais uma vez
está relacionado ao parâmetro do espanhol. Veja no Gráfico 4 abaixo.
Gráfico 4: Produção de frases com sujeito nulo e pleno em singular e plural no grupo controle
Sg. Pl.
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
1.4
Nulo
Pleno
61
Em relação ao nível de proficiência, os resultados registraram que há efeito principal
desta variável de acordo com os dados estatísticos (X²= 129,3206349, p<0,05) se observados
os três níveis, já que no nível avançado os participantes produziram 85,41% de frases com
sujeito nulo em comparação aos percentuais dos níveis básico, 46,66%, e intermediário,
36,66%, o que parece comprovar a previsão (b), o participante tende a usar o parâmetro da
língua-alvo para satisfação do EPP no nível mais elevado de proficiência, isto é, a
interferência da L1 sobre a L2 diminui com o tempo de exposição à língua. O Gráfico 5
abaixo ilustra estes resultados.
Gráfico 5: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nos três diferentes níveis de proficiência
No entanto, os níveis básico e intermediário se, observados isoladamente, apresentam
resultados que vão de encontro à previsão (b), visto que possuem, respectivamente, 53,34% e
63,34% de frases produzidas com sujeito pleno, isto é, não houve diminuição significativa na
produção de frases deste tipo do nível básico para o intermediário como o esperado e, sim um
aumento já que o nível intermediário apresenta um índice maior de frases com sujeito pleno.
E ainda se observarmos apenas os resultados referentes às produções com sujeito pleno dos
níveis básico e intermediário é possível dizer que a previsão (a) parece se comprovar, pois há
um percentual maior de produção de frases com sujeito pleno nestes dois níveis
comparativamente ao nível avançado. Isso permite dizer que os participantes aprendizes do
espanhol como L2, - estudantes de curso de idiomas que, geralmente, assistem a duas aulas
por semana e que iniciam o aprendizado de L2 a partir do nível zero, isto é, sem nunca terem
BÁSICO INTERMEDIÁRIO AVANÇADO
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
Nulo
Pleno
85,41%
36,66%
46,66%
62
tido contato com a língua estrangeira-, produzem mais frases com sujeito pleno nos níveis
iniciais de proficiência até que, ainda não se sabe o porquê, passam a produzir frases com
sujeito nulo no nível avançado como demonstra o gráfico 5 acima. Além disso, se se observa
o gráfico 6 no qual encontram-se também os resultados do grupo controle, é possível verificar
que a previsão (b) parece ser comprovada, pois o nível avançado possui 85,41% e o grupo
controle 95% de frases produzidas com sujeito nulo. Assim, o nível de proficiência apresenta
efeito principal (X²=200,202042, p<0,05), de acordo com o Gráfico 6 abaixo, tendo um papel
fundamental no processamento linguístico e, consequentemente, na transferência do PSN
parcial do PB como L1 no aprendizado do espanhol como L2.
Gráfico 6: Padrões de produção de frases dos níveis de proficiência e grupo controle
De acordo com os resultados, não houve um efeito significativo de interação entre a variável
tipo de narrativa em primeira e terceira pessoa e tipo de narrativa em singular e plural, em
todos os níveis de proficiência e também no grupo controle, (X²= 3,719893232, p>0,05).
Como é possível verificar no Gráfico 7 abaixo.
BÁSICO INTERMEDIÁRIO AVANÇADO CONTROLE
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
1.4
Nulo
Pleno
85,41%
95%
63
Gráfico 7: Padrões de produção de frases dos níveis de proficiência e grupo controle (valores de sujeito
nulo)
As análises indicam que as previsões (a) e (b) foram confirmadas, pois parece haver
transferência de aspectos da L1 para a L2 durante o processo de aquisição desta segunda
língua e, ainda a interferência parece diminuir quando, enfim, se alcança certo grau de
proficiência. Cabe ressaltar embora sobre os níveis básico e intermediário nos quais houve,
surpreendentemente, um aumento da produção de sujeito nulo daquele para este, isto é, o
nível intermediário apresentou um índice maior de produção com sujeito nulo do que o
básico, mas isto não se estendeu até nível avançado. Talvez porque nos níveis básico e
intermediário o aprendiz de L2 ainda não esteja atento a este aspecto.
4.3 Experimento continuação de narrativas II
A aplicação deste experimento II surgiu a partir da necessidade de averiguação dos
resultados obtidos no experimento I e, por este motivo, teve igualmente ao primeiro
experimento a tarefa de continuação de pequenas narrativas visando investigar o padrão de
respostas dos aprendizes do espanhol como L2, agora, alunos da graduação. Assim tiveram
também como tarefa a possibilidade de utilizar-se de sentenças com sujeito nulo a partir de
referentes animados nas 1ª e 3ª pessoas do singular e 1ª e 3ª pessoas do plural. Então, padrões
de resposta com sujeitos nulos poderiam indicar que os estudantes da graduação são mais
resistentes a possível interferência do parâmetro da L1 sobre a L2 ou do contrário, padrões de
respostas com sujeitos preenchidos confirmariam os resultados do primeiro experimento,
BA_1ª BA_3ª IN_1ª IN_3ª AV_1ª AV_3ª CO_1ª CO_3ª
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
SINGULAR
PLURAL
64
indicando uma possível interferência do parâmetro da L1 sobre a L2 e a evidência de
propriedades da L1 na gramática da interlíngua do aprendiz, de acordo com White (2003)
4.3.1 Design experimental
O experimento II teve o mesmo desenho experimental que o primeiro experimento
contendo narrativas distratoras com traço [- animado] e narrativas experimentais escritas em
espanhol, tendo seus referentes com traço [+ animado] e manipuladas de acordo com o
paradigma número-pessoal de cada uma delas. Para esta tarefa experimental off-line de
continuação de narrativas, participaram aprendizes de espanhol, alunos do curso de graduação
em Letras português/espanhol da Universidade Federal Fluminense, divididos em três grupos
experimentais (básico, intermediário e avançado) segundo uma divisão em níveis de
proficiência feita a partir de uma avaliação após terem respondido um formulário de
nivelamento15.
4.3.2 Hipóteses e previsões
Com base nas hipóteses ora mencionadas na descrição do experimento I de que o
espanhol como L2 sofre interferência do PSN parcial do PB como L1 e, ainda, que essa
interferência diminui com o aumento da proficiência na língua-alvo são feitas as mesmas
previsões (a), se existe transferência do parâmetro do sujeito nulo da L1 para a L2, os
participantes aprendizes de espanhol, provavelmente produzirão frases com sujeito pleno em
maior número do que frases com sujeito nulo de acordo com os mecanismos de satisfação do
EPP em PB, e (b), se a interferência diminui com o aumento da proficiência, prevê-se
diferenças significativas na produção de frases com sujeito pleno nos três diferentes níveis, ou
seja, mais frases com sujeito nulo em níveis de proficiência avançados semelhante ao que se
espera para o grupo controle, para este experimento II e, complementarmente, a estas duas, é
feita a previsão:
(c) Se a interferência do PSN parcial da L1 diminui apenas no nível avançado, os
participantes aprendizes de espanhol em ambiente universitário, produzirão maior número de
frases com sujeito pleno nos níveis básico e intermediário comparativamente ao nível
avançado.
4.3.2 Variáveis e condições
As variáveis independentes do experimento II compreendem as mesmas do
experimento I: níveis de proficiência (básico, intermediário e avançado) e o tipo de narrativa a
15 Formulário adaptado de DA SILVA (2015). Está em anexo na página 87.
65
ser produzida em 1ª ou 3ª pessoas do singular ou plural. Desta maneira, o desenho
experimental também é 3x4 apresentado em quatro condições: 1ª e 3ª pessoas do singular e 1ª
e 3ª pessoas do plural. O número de frases produzidas em cada uma destas condições e em
cada um dos níveis de proficiência constituem as variáveis dependentes.
4.3.3 Participantes
Este experimento contou com a participação de 60 brasileiros estudantes da graduação
em Letras da Universidade Federal Fluminense com habilitação em português e espanhol
(como L2). Os participantes estavam cursando os 1º, 5º e 9º períodos que compreendem ao
início, meio e fim da graduação e após terem respondido o formulário de nivelamento, foram
distribuídos em três níveis de proficiência: 20 no nível básico, 20 no nível intermediário e 20
no nível avançado. Como é possível verificar na Tabela 5 abaixo.
BÁSICO INTERMEDIÁRIO AVANÇADO
1º PERÍODO 17 8 0
5º PERÍODO 0 9 1
9º PERÍODO 0 3 19
TOTAL 17 20 20
Tabela 5: Distribuição dos alunos de graduação em níveis de proficiência.
Contudo, vale ressaltar que, neste experimento houve a necessidade de descartar os
dados de produção de frases de três participantes do nível básico que escreveram a maioria
das frases em português, sendo assim, este nível de proficiência passou a ter apenas 17
participantes. Veja abaixo no Gráfico como ficou a distribuição dos estudantes de graduação
nos níveis de proficiência.
66
Gráfico 8: Distribuição dos estudantes de graduação em níveis de proficiência.
Todos os participantes deste experimento residem no RJ e possuem a idade média de 25 anos
e para o grupo controle foram utilizados os mesmos resultados já obtidos no experimento I.
4.3.3 Materiais
As mesmas 12 narrativas experimentais incompletas, permitindo 3 exposições para
condição experimental juntamente com as 24 distratoras também incompletas foram utilizadas
no experimento II. E, de igual maneira, para a aplicação deste experimento foi utilizada a
distribuição whitin subjects na qual todos os participantes de todos os grupos são expostos a
todas as condições experimentais.
4.3.4 Procedimentos
Para a realização da tarefa experimental, os professores cederam, ora os trinta e cinco
minutos finais da aula, ora os trinta e cinco minutos iniciais, assim, o experimento foi
realizado na própria sala de aula da Universidade. Antes de começar a aula ou após o seu
término, os alunos recebiam o formulário de nivelamento a ser preenchido, logo depois
ouviam uma breve explicação sobre como produzir as frases experimentais – continuando as
narrativas com as primeiras duas ou três palavras surgidas na mente – e somente depois
recebiam as folhas contendo as narrativas experimentais e distratoras. A média de duração de
cada participante para cumprir a tarefa foi de, aproximadamente, 25 minutos e após o término
do experimento os alunos entregavam a folha junto ao formulário e aguardavam o início da
aula em silêncio ou, quando a aula já tinha terminado, entregavam as folhas e iam embora. As
67
poucas dúvidas surgidas com relação ao vocabulário foram sanadas no decorrer da aplicação
do experimento.
4.4 Resultados
Este segundo experimento teve os dados obtidos submetidos ao teste estatístico qui-
quadrado e de acordo com este teste é possível observar que, referente à variável tipo de
narrativa em primeira e terceira pessoas, os resultados parecem indicar que houve efeito
significativo em relação ao tipo de sujeito produzido nas frases dos três níveis de proficiência.
Assim de acordo com o teste qui-quadrado (X²= 100,8254158, p<0,05), observa-se no
Gráfico 9 abaixo, que a primeira pessoa apresenta maior índice de produção de frases com
sujeito nulo comparativamente a terceira pessoa nos três níveis de proficiência.
Gráfico 9: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nas 1ª e 3ª pessoas nos três diferentes níveis de
proficiência. (Graduação)
A mesma variável tipo de narrativa relacionada agora ao número, singular ou plural,
apresenta novamente efeito significativo nos três níveis de proficiência (X²=98,07942388,
p<0,05), já que o plural apresentou maiores índices de produção de frases com sujeito nulo do
que o singular, como verifica-se no Gráfico 10 abaixo.
BA_1ªP. BA_3ªP. IN_1ªP. IN_3ªP. AV_1ªP. AV_3ªP.
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
1.4
Nulo
Pleno
68
Gráfico 10: Produção de frases com sujeito nulo e pleno em singular e plural, nos três diferentes níveis de
proficiência. (Graduação)
Os resultados relativos ao nível de proficiência apresentaram de acordo com os dados
estatísticos (X²=67,13253088, p<0,05) efeito principal desta variável nos três níveis de
proficiência. Os participantes do nível básico apresentaram 66,66% de produção de frases
com sujeito nulo, os do nível intermediário 83,33% e do nível avançado 94,16% e estes
resultados parecem comprovar a previsão (b), a interferência da L1 sobre a L2 diminui com o
aumento da proficiência na língua alvo, mas não parece comprovar a previsão (c), a
interferência do PSN da L1 diminui apenas no nível avançado, visto que, em todos os três
níveis o percentual de produção de frases com sujeito nulo é maior que o de sujeito pleno.
Tais resultados, talvez, se justifiquem a partir do perfil do aprendiz de L2, estudante de
graduação, que desde o início de seu aprendizado, em ambiente universitário, tem atenção a
este parâmetro e, além disso, possui um tempo maior de exposição à segunda língua. Veja
abaixo no Gráfico 11 no qual é possível verificar tais resultados.
BA_sg. BA_pl. IN_sg. IN_pl. AV_sg. AV_pl.
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
1.4
Nulo
Pleno
69
BÁSICO INTERMEDIÁRIO AVANÇADO
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
1.4
Nulo
Pleno
Gráfico 11: Produção de frases com sujeito nulo e pleno nos três diferentes níveis de proficiência
(Graduação).
Ainda que os índices de produção de frases com sujeito nulo tenham sido maiores em
todos os três níveis de proficiência, fato que vai de encontro à previsão (a), como observado
no Gráfico 11 acima, é possível verificar, no entanto, isolando apenas os resultados referentes
à produção de frases com sujeito pleno, que o nível básico produziu gradativamente mais
frases deste tipo do que os outros níveis. Veja no Gráfico 12 abaixo.
Gráfico 12: Produção de frases com sujeito pleno nos três níveis de proficiência (Graduação) e grupo
controle.
66,66%
83,33%
94,16%
70
Tal resultado talvez possa ser atribuído, como dito anteriormente, ao fato de que os
aprendizes de espanhol como L2 são expostos por mais tempo a essa L2 do que os aprendizes
de um curso de idiomas.
Observando o Gráfico 13 abaixo, no qual se encontram os resultados referentes aos
três níveis de proficiência junto ao resultado do grupo controle, é possível perceber
novamente que o nível de proficiência não apresenta efeito significativo, de acordo com os
dados estatísticos (X²=83,53709904, p<0,05), e grande influência na transferência do PSN
parcial do PB como L1 sobre o espanhol como L2.
71
BÁSICO INTERMEDIÁRIO AVANÇADO CONTROLE
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
1.2
1.4
Nulo
Pleno
Gráfico 13: Padrões de produção de frases dos níveis de proficiência (Graduação) e grupo controle.
Os resultados referentes a produção de frases com sujeito nulo relacionados ao tipo de
narrativa em singular e plural e ao tipo de narrativa em primeira e terceira pessoas revelam
que não houve, entre estas variáveis, um efeito significativo de interação (X²= 6,056675793,
p>0,05) em todos os níveis de proficiência. Observe no Gráfico 14 abaixo.
72
BA_1ª BA_3ª IN_1ª IN_3ª AV_1ª AV_3ª CO_1ª CO_3ª
Gráfico da Tabela Cruzada
Proporção
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
1.0
SINGULAR
PLURAL
Gráfico 14: Padrões de produção de frases dos níveis de proficiência (Graduação) e grupo controle
(valores de sujeito nulo)
Embora as previsões (a) e (c) não pareçam ter sido confirmadas inicialmente de acordo
com as análises, é possível supor que existe transferência de aspectos da L1 para a L2 durante
o curso de aquisição da segunda língua, por outro lado, verificou-se ainda que a previsão (b)
se confirmou através dos resultados, pois a interferência parece diminuir gradativamente em
função do aumento da proficiência.
4.5 Discussão
Nos dois experimentos de produção induzida que constituíram este trabalho foram
utilizadas três narrativas de cada uma das condições (1ª P.Sg., 1ª P.Pl., 3ª P.Sg., 3ª P.Pl.) que
permitiram a produção de frases com sujeito nulo ou pleno e todos os dados foram
submetidos ao teste estatístico qui-quadrado. Entretanto, participaram do experimento I
brasileiros aprendizes de espanhol como L2 alunos do curso de idiomas Prolem e do
experimento II participaram brasileiros aprendizes de espanhol como L2 alunos da graduação
em Letras português/espanhol, ambos localizados na Universidade Federal Fluminense.
Os experimentos I e II mostram em seus resultados efeitos significativos da variável
tipo de narrativa em relação à pessoa gramatical – experimento I (X²= 158, 7978836, p<0,05),
experimento II (X²= 100,8254158, p<0,05) – e em relação ao número – experimento I (X²=
132,5206349, p<0,05), experimento II (X²=98,07942388, p<0,05) - em todos os níveis de
73
proficiência, isto é, houve um percentual maior de frases produzidas com sujeito nulo em
primeira pessoa comparativamente a terceira e, ainda, um percentual maior de frases com
sujeito nulo no plural em comparação ao singular. Contudo, observando-se os percentuais de
produção de frases com sujeito pleno no experimento I é possível perceber que, exceto o nível
avançado e a primeira pessoa do nível básico, todas as produções de frases foram feitas, em
sua maioria, com a presença de sujeito pleno, o que, de acordo com Duarte (1993,1995) se
justifica se considerarmos a transferência da L1, que é de sujeito pleno para a L2 que é de
sujeito nulo. Todavia, ao observar os percentuais de produção de sujeito pleno no experimento
II verifica-se que apenas o nível básico apresenta um índice mais elevado, ainda que este
índice não ultrapasse o de sujeito nulo, o que possivelmente pode se dever ao fato de os
graduandos terem mais tempo de exposição à L2 mesmo estando nos períodos iniciais do
curso. Como esperado, não houve efeito significativo da variável tipo de narrativa relacionada
à pessoa gramatical (X²= 1,578947368, p>0,05), tampouco para a mesma variável relacionada
ao número (X²= 0,175438596, p>0,05) nos resultados do grupo controle, ou seja, o tipo de
narrativa de acordo com o paradigma número-pessoal não é um fator relevante para a
utilização do sujeito nulo em espanhol.
Sobre a produção de frases com sujeito nulo relacionada ao nível de proficiência, os
resultados do experimento I (X²= 129,3206349, p<0,05) e do experimento II
(X²=67,13253088, p<0,05) apontam na mesma direção indicando que há interferência da L1
sobre a L2, principalmente nos níveis iniciais de proficiência durante a aquisição da segunda
língua. No entanto, contrariamente ao esperado, os resultados do experimento I apresentaram
maior incidência de sujeito pleno na produção de frases do nível intermediário,
comparativamente ao nível básico e os resultados do experimento II apresentam maior índice
de produção de frases com sujeito nulo nos três níveis de proficiência. O resultado do
experimento I sugere que brasileiros aprendizes de espanhol como L2 produzem frases com
sujeito pleno tal qual acontece no PB até um determinado momento em que o parâmetro da
língua-alvo é ativado na mente destes aprendizes quando atingem o nível avançado de
proficiência na língua. Sendo assim, tal resultado contribui para os estudos sobre aquisição de
L2, pois permitem confirmar a Hipótese de Transferência e Acesso Total (SCHWARTZ E
SPROUSE, 1994, 1996 apud XAVIER, 2006), para a qual o estado inicial da L2 é a gramática
da L1 com suas propriedades abstratas que serão utilizadas para a construção da gramática da
IL, ou seja, ocorre a transferência do PSN da L1 para a L2 e, ainda esta transferência diminui
à medida que o aprendiz reestrutura a sua gramática da IL acessando à GU.
74
Então, os aprendizes do nível intermediário seriam menos suscetíveis às interferências
do valor da L1 para a L2, enquanto os aprendizes dos níveis básico e avançado não
perceberiam a diferença paramétrica entre as duas línguas. Isso não se verifica nos resultados
obtidos através do experimento II no qual o percentual de produção de frases com sujeito nulo
foi maior em todos os níveis de proficiência, porém, se observadas apenas as produções de
sujeito pleno isoladamente, percebe-se que estas diminuem gradativamente entre os três
níveis. Neste sentido, houve uma diferença considerável relacionada à variável grupal nível de
proficiência entre os resultados dos dois experimentos.
Comparando apenas os índices de produção de frases com sujeito nulo do nível
avançado do experimento I (85,41%) e do experimento II (94,16%) com o grupo controle
(95%), é possível perceber que os resultados são bastante similares e isto pode ser
significativo para supor que a interferência da L1 diminui em função do aumento da
proficiência em L2, já que, segundo a Hipótese de Transferência e Acesso Total (Schwartz e
Sprouse, 1994, 1996 apud XAVIER, 2006), o aprendiz reestrutura sucessivamente a sua
gramática da IL fixando novos parâmetros, através do acesso à GU, na medida em que não
encontra na L1 estruturas equivalentes a L2 e, ainda, que a gramática de um aprendiz no nível
avançado se aproxima a de um nativo.
No que se refere à interação entre o tipo de narrativa relacionada à pessoa e o tipo de
narrativa relacionada ao número, é possível observar que não houve efeito significativo para o
experimento I (X²= 3,719893232, p>0,05), nem para o experimento II (X²= 6,056675793,
p>0,05) em nenhum dos níveis de proficiência, tampouco no grupo controle, ou seja, não
houve interação entre essas duas variáveis.
Em síntese, os resultados obtidos nos dois experimentos indicaram diferenças
relacionadas à interferência do valor do parâmetro da L1 para a L2 durante os níveis iniciais
de proficiência, visto que no experimento I os níveis básico e intermediário tiveram maiores
percentuais de produção de frases com sujeito pleno comparativamente aos resultados obtidos
no experimento II cujo percentual de produção de frases com sujeito nulo foi mais elevado em
todos os níveis. Além disso, esta interferência não pareceu ser gradativa no experimento I,
diminuindo consideravelmente apenas no nível avançado, enquanto no experimento II a
gradação aparece claramente nos resultados evidenciando que a interferência diminui com o
aumento da proficiência na língua-alvo. Os resultados do experimento I mostraram, ainda, a
preferência dos aprendizes dos níveis básico e intermediário pela produção de frases com
sujeito pleno nas 1ª e 3ª pessoas gramaticas e curiosamente os índices de produção de sujeito
desse tipo de sujeito aparecem mais elevados na 3ª pessoa que é considerada a mais resistente
75
à mudança, segundo Duarte (1995). No experimento II, por sua vez, verifica-se que os
aprendizes de todos os níveis produziram sentenças com sujeito nulo, mas se voltarmos a
atenção apenas para os índices de produção de sujeito pleno, observa-se que a 3ª pessoa
gramatical apresenta um percentual maior de produção deste sujeito em relação a 1ª.
76
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Algumas mudanças relacionadas ao preenchimento do sujeito vêm afetando o PB, ao
contrário do que ocorre com o PE (cf. DUARTE, 1995, dentre outros), pois há indícios de que
o PB esteja passando por um processo de mudança, distanciando-se das outras línguas
românicas no que diz respeito à representação do sujeito pronominal. Assim, o PB tem
apresentado o status de LSN parcial (HOLMBERG, 2010; MODESTO, 2000), ao contrário
de línguas de sujeito preenchido, como é o caso do inglês, ou mesmo ao contrário de LSN
prototípicas, como é o caso do espanhol. Isto indica que esta diferença do PB relacionada ao
preenchimento da posição de sujeito pronominal pode ser indício de uma mudança em curso
na marcação do PSN nesta língua (DUARTE, 1993,1995). Desse modo, esse novo
comportamento do PB frente ao PSN pode refletir-se na aquisição de uma L2 com marcação
diferente como, por exemplo, o espanhol, ou seja, pode haver transferência de aspectos do PB
como L1 influenciando o processo de aquisição da L2.
Foi feita uma revisão de literatura para fundamentar as deduções feitas anteriormente,
no sentido de verificar quais são as particularidades relacionadas ao PSN e,
consequentemente, quais as características que permitem classificar as línguas marcadas
positiva ou negativamente em relação a este parâmetro. Além disso, verificou-se as
particularidades do PB e do espanhol relacionadas ao PSN a fim de comparar estas duas
línguas que possuem marcações diferentes e observar em que medida ocorre interferência do
PB como L1 sobre o espanhol como L2. Neste sentido, para a realização deste trabalho fez-se
uso do modelo formal de língua da linguística gerativa de acordo com o Programa
Minimalista (CHOMSKY, 1995 e posteriores) e dos pressupostos metodológicos da
psicolinguística experimental.
A partir da diferença entre a satisfação do traço EPP – “responsável pelo
preenchimento da posição de sujeito sintático nas línguas naturais” (VIEGAS, 2014) - no PB
e no espanhol, buscou-se verificar em que medida essa característica pode interferir na
aquisição do valor do parâmetro [+ pro drop] no curso do aprendizado do espanhol como L2.
O PB tem se aproximado de línguas como o inglês [- pro drop] no que diz respeito ao
preenchimento de sujeitos referenciais, no entanto, o espanhol peninsular permanece uma
LSN prototípica na qual o traço EPP é satisfeito por uma categoria vazia chamada pro.
Existe uma discussão complexa na literatura acerca de como acontece o processo de
aquisição/aprendizagem de L2, pois quando estamos diante de línguas com marcações
diferentes relacionadas ao PSN, verificamos diferentes comportamentos de satisfação do traço
EPP, fato que além de conferir um status diferente a estas línguas (XAVIER, 2007 apud
77
Viegas, 2014) pode tornar a aquisição de L2 por um adulto mais custosa e menos natural do
que ocorre com uma criança, interferindo na marcação do PSN da língua-alvo, isto é, o
estágio final do processo de aquisição pode diferir da gramática de um falante nativo. De
acordo com Selinker (1972) o fato de aprendiz de L2 desenvolver uma interlíngua de forma
sistemática e, não necessariamente, determinada pela L1 ou L2 ao longo do processo de
aquisição da segunda língua, parece demonstrar que a aquisição se dá a partir de um sistema
complexo tal qual acontece com a aquisição de L1 por um nativo. Por outro lado, se durante o
processo aquisição de L2, o estado inicial não acontece a partir do zero, visto que, o aprendiz
tem acesso ao conhecimento já adquirido da L1, muitas teorias defendem que a
aquisição/aprendizagem de L2 se dá da mesma forma que a aquisição da L1, para outras a
própria gramática da L1 seria o estágio inicial da L2 (cf. SCHWARTZ E SPROUSE, 1994,
1996; VAINIKKA E YOUNG-SCHOLTEN, 1994, 1996, EPSTEIN et. al., 1996, dentre
outros). Para White (2003) em alguns momentos a dissociação entre GU e L1 não acontecerá,
já que a GU estaria presente na própria L1.
Assim, o objetivo deste trabalho foi averiguar a transferência do parâmetro da L1
sobre a L2, à luz da teoria de Princípios e Parâmetros e contribuir para a discussão sobre as
hipóteses de acesso à GU durante o processo de aquisição/aprendizado de uma L2, por meio
de uma abordagem experimental. A hipótese que ora orientou este trabalho foi a de que há
interferência da L1 sobre a L2, e que esta interferência tende a diminuir com o aumento da
proficiência, assim como propõe a Hipótese de Transferência e Acesso Total de Schwartz e
Sprouse (1994, 1996, apud XAVIER, 2006). Para tanto, foi elaborado um experimento no
qual brasileiros aprendizes de espanhol como L2 divididos em três níveis de proficiência
(básico, intermediário e avançado) tinham, como tarefa off-line a continuação de narrativas
em espanhol. O experimento foi realizado em duas etapas, o experimento I foi realizado com
os alunos de curso um de idiomas localizado na Universidade Federal Fluminense e, o
experimento II foi realizado com os alunos do curso de graduação em Letras
português/espanhol localizado na mesma Universidade.
Os resultados do experimento I e II apresentaram diferenças significativas no que diz
respeito à interferência do PB como L1 sobre a aquisição do espanhol como L2. A previsão
(a) foi confirmada através dos resultados obtidos com o experimento I no qual os aprendizes
dos níveis básico e intermediário produziram um percentual elevado de frases com sujeito
pleno sugerindo que ocorre transferência na marcação do PSN da L1 para a L2. Por outro
lado, se observamos nos resultados do experimento II, o mesmo não acontece, já que o índice
de produção de frases com sujeito nulo se deu, majoritariamente, nos três níveis de
78
proficiência. Este resultado, no entanto, não foi interpretado como um indício contrário à
interferência do PSN da L1 para a L2 e, sim, um resultado relacionado ao tempo de exposição
à L2 durante a graduação, visto que, os aprendizes de L2 num ambiente universitário são
expostos à língua por mais tempo do que os aprendizes de L2 em um curso de idiomas.
Do mesmo modo, os resultados de ambos os experimentos mostraram resultados
distintos quando comparados os percentuais de preenchimento de sujeito pleno nos três
diferentes níveis de proficiência. Neste sentido, o experimento I, como dito anteriormente,
apresentou níveis elevados de preenchimento de sujeito nos níveis básico e avançado,
confirmando a previsão de que ocorre interferência da L1 sobre a L2, contudo, esta
interferência não pareceu ser gradativa, visto que o nível intermediário apresentou percentuais
mais elevados de produção de frases com sujeito pleno do que o nível básico. Embora o
experimento II tenha apresentado percentuais elevados de sujeito nulo, é possível verificar a
diminuição gradativa no preenchimento do sujeito se observamos isoladamente a produção de
sujeito pleno.
Todavia, se forem observados os resultados referentes ao nível avançado, o
experimento II reforça os resultados obtidos no experimento I, isto é, nos dois experimentos o
nível avançado apresentou percentuais elevados de produção de frases com sujeito nulo
sugerindo que aprendizes de L2 em estágio avançado atingiriam um nível de competência
linguística que permitiria a comparação ao nível de um nativo (BIRDSONG, 1992 apud
XAVIER, 2006) e, ainda, confirmando a previsão (b) a interferência diminui em função do
aumento da proficiência, o percentual com sujeito nulo no nível avançado aproximou-se
bastante dos resultados do grupo controle composto por nativos espanhóis.
Para Duarte (1995) e Ferreira (2000) a 3ª pessoa é considerada a mais resistente ao
processo de mudança pelo qual passa o PB, sendo assim, era esperado encontrar percentuais
mais elevados de produção de sujeito nulo em 3ª pessoa do que em 1ª. No entanto, os
resultados do experimento I mostraram percentuais mais elevados de produção de frases com
sujeito pleno na 3ª pessoa se comparados aos da 1ª e o mesmo se verifica no experimento II
quando observamos apenas os resultados relacionados ao sujeito pleno. Tais resultados, por
sua vez, permitem observar de acordo com Paredes Silva (1988) o comportamento atípico da
3ª pessoa no que tange o preenchimento do sujeito, visto que, há ainda ocorrência de sujeito
nulo relacionada a esta pessoa no PB, mas é possível verificar que os índices de
preenchimento de sujeito em 3ª pessoa são significantemente maiores do que no PE.
Este trabalho contribuiu para ampliar os estudos relacionados à aquisição de espanhol
como L2 por brasileiros e, ainda, expandir os estudos relacionados à transferência do PSN de
79
L1 para L2, bem como as discussões acerca do acesso à GU, tal qual propõem as teorias sobre
aquisição/aprendizagem de L2 (cf. WHITE, 2003, XAVIER, 2006, dentre outros). Além
disso, este trabalho contribuiu para ampliar as pesquisas de caráter experimental, visto que,
pesquisas sobre a aquisição de espanhol como L2 por aprendizes brasileiros sob a abordagem
metodológica da psicolinguística experimental são pouco numerosos.
Espera-se dar continuidade a esta pesquisa através da realização de outros
experimentos que permitam investigar, sob abordagem experimental, como se dá o
processamento em tempo real do PSN parcial do PB na mente dos aprendizes de espanhol,
como L2, durante a aquisição desta segunda língua. Além de investigar a própria definição do
PB como LSN parcial e, ainda, contribuir com os resultados para as questões referentes às
hipóteses de acesso à GU.
80
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85
ANEXOS
ANEXO 1: Experimento continuação de narrativas
Lee atentamente los siguientes fragmentos narrativos y complétalos con tus propias
palabras.
1) La presidenta de la empresa anunció que el cafecito y la leche de los intervalos serán
cobrados a los empleados porque subió el precio de la crema desnatada que los compone.
Algunos trabajadores hicieron saltar la alarma de incendio como…
2) Mido 1,70 m y peso 90 kilos. Me dicen que tengo que cambiar mis hábitos alimenticios si
quiero mejorar mi forma física y estar mejor dispuesto. No me muevo nada, no juego al
fútbol, no puedo correr más que…
3) Mi esposo y yo descubrimos que personas con altos niveles de colesterol tienen una
posibilidad significativamente mayor de desarrollar cáncer, por eso decidimos ir al spa para
reducir el antojo de comidas basura. Después de algunos días…
4) Actualmente, los mensajes electrónicos forman parte del día a día de millones de personas,
que los utilizan para tratar de asuntos personales, profesionales o comerciales con agilidad.
Sin embargo, todavía se escriben cartas de amor, comerciales…
5) José y Laura son dos hermanos y viven en el quinto piso. Tras la muerte de sus padres,
heredan una casa en el campo lejos de donde viven. Después de un tiempo pensando qué
hacer con la casa decidieron venderla; sin embargo…
6) Paco trabaja en una tienda de ropas ecológicas en el centro comercial. Todos los días se
levanta muy temprano y, a continuación, corre por la playa. Los días de semana son muy
especiales porque hay mucho trabajo hasta…
7) Conocí a unos muchachos en un sitio para jóvenes amigos, charlamos por lo menos unos
cinco meses hasta que decidí encontrarlos en un retiro espiritual. En el primer día, los
muchachos parecieron muy amables, pero después…
8) Desde hace pocos años son muchos los productos de usar y tirar que utilizamos. Si bien
este tipo de objetos han favorecido el crecimiento económico, su uso se ha extendido a
diferentes dominios de la vida, instaurándose una verdadera cultura de esta práctica que…
9) Hoy es lunes, mi primer día en México. Siempre he vivido en Argentina, pero con los
cambios en la empresa de mi padre, tuvimos que mudarnos a México. Anoche estábamos en
el aeropuerto esperando nuestro vuelo y…
86
10) Soy una persona muy atareada, casi no tengo tiempo para divertirme porque trabajo
demasiado, pero ayer decidí pasar todo el día sin trabajar. Ir al cine, a la primera sesión, y
luego comer una comida muy especial, es algo…
11) La policía le hizo un test de alcoholemia al conductor que estaba hablando por teléfono y
parecía tener un micrófono en las manos. Presentaba síntomas de ir alcoholizado y el test
pudo comprobar un alto nivel…
12) Hay momentos en los que necesito estar solo, en estos momentos no quiero estar con otras
personas, ni tampoco con mi familia o mismo con mi perro. Sin embargo, mis familiares no
están felices con ello y…
13) Madrid es una ciudad moderna, grande, de varios millones de habitantes, aunque para mí
no tiene comparación con la ciudad de México. Me falta más caos, más ruido, más
contaminación. La vida en Madrid y en España en general es muy…
14) A veces se consume muchísimo sin ningún tipo de preocupación por los problemas
medioambientales y sociales que ese tipo de práctica puede generar. Pero lo que pasa es que,
cuando uno va de compras, no se lleva solo…
15) Todos los días cuando veo a mi vecina salir de su casa con su coche rojo pienso en mi
vida y, aunque no lo quiera admitir, la verdad es que siento mucha envidia porque la
muchacha tiene mucho dinero. Otro día…
16) El tiempo camina deprisa, el futuro está ahí, nos acechándonos con sus prodigios. Cada
día se inventan máquinas nuevas que nos llevan a crear nuevos quehaceres, que acarrean
nuevas obligaciones. Todo cambia tan…
17) El oficial encargado de sellar mi pasaporte empezó a pasar las hojas del mismo hacia
delante y hacia atrás, entonces empecé a sospechar que las cosas no iban a salir bien. Tras
unos cinco minutos de tensión, el hombre dejó el…
18) Salí de vacaciones a conmemorar la defensa de mi tesis de postgrado en un lugar
diferente y el día fue muy provechoso en una playa paradisiaca de México. De los manjares
mexicanos nunca había probado, por eso…
19) Es muy importante saber que la contaminación ambiental es responsable por muchas
enfermedades. El 25% de la mortalidad y las hospitalizaciones en todo el mundo se relaciona
con factores ambientales que…
20) Tuve en la niñez una tía muy querida que me llevaba a su casa en las vacaciones, salía
conmigo y con mis hermanos en casi todos los fines de semana. Era una mujer espectacular,
trabajadora y muy feliz, pero un día…
87
21) En mis vacaciones fui al norte de España, concretamente a un pueblecito llamado
Galizano, donde hice muchos amigos; fui a Oporto, una ciudad maravillosa al norte de
Portugal, fui no solo para ver la ciudad sino también para visitar a…
22) El otro día fui a desayunar y, sin darme cuenta, estaba desayunando café con leche y
tostadas. Luego entró mi viejo padre en la cocina y lo abrace como si no lo hubiese visto
desde hace años. Luego me fui a la facultad pensando…
23) Se acerca la última semana de octubre y vestimos alegremente a nuestros hijos de zombis,
calaveras o monstruos; pero cuando ellos nos preguntan sobre la muerte preferimos dar
respuestas abstractas que tal vez…
24) Todos los días nos tocan muchos quehaceres: estudiamos, trabajamos, etc. Y siempre
estamos buscando una manera satisfactoria de dividir nuestro tiempo entre lo que queremos y
lo que debemos hacer. Todo el tiempo…
25) Hace un par de semanas un joven recién egresado, pero con un año de experiencia, fue a
una entrevista de trabajo. Cuando le preguntaron cuánto quería ganar, pidió tan poco que el
entrevistador se sorprendió con…
26) Tengo una vida tranquila, mi rutina es más o menos así: me despierto a las ocho,
desayuno, leo el periódico y camino un poco. Vuelvo a las doce, preparo la comida, almuerzo
y, enseguida, duermo la siesta. No tengo problemas y eso…
27) Las familias de hoy día son compuestas por padre, madre e hijos, pero en algunas no está
el padre o la madre. En otras no hay hijos y también hay aquellas en que se agregan otras
personas: abuelos, abuelas, primos, suegras…
28) Soy una persona muy tímida, pero me gusta muchísimo pasear en lugares donde haya
mucha gente, porque, aunque sea muy tímida, no me gusta la soledad. Necesito estar al lado
de personas hablando unas con las otras. Otros días…
29) En la ciudad donde vivo somos más de diez millones de habitantes distribuidos por
edificios, algunos muy altos, mansiones en condominios y también muchas chabolas. En la
zona central hay construcciones antiguas y modernas, calles, hoteles…
30) Soy joven y estudiante, tengo dieciséis años y, todavía, no me interesa conocer otras
culturas, otros lugares del mundo ni, tampoco, otro idioma que no sea el mío. Pero tengo una
madre muy atenta y eso no le gusta, por eso…
31) Viajar es experimentar otros sabores, respirar otros aires, conocer a otras personas, vivir
otras experiencias. En lo viajes conocemos lo diferente y nos reconocemos en ello, por eso
algunas personas suelen viajar todos…
88
32) Esta es una mañana muy ajetreada en la casa de Jimena. En la cocina la madre está
escribiendo un artículo y hablando por teléfono con su jefe, el padre está viendo el telediario y
preparando el desayuno, el abuelo está oyendo…
33) Mi familia es muy numerosa. En mi casa vivimos mi padre, mi madre, mis dos hermanas,
mi cuñado, mis tres sobrinos y yo. Nos gusta muchísimo ir de vacaciones todos los años y
siempre lo hacemos juntos. El año pasado…
34) La niñez es la época de la vida en que se aprenden muchas cosas: convivir con los amigos,
divertirse, leer, escribir, escuchar y contar historias. Todos tenemos derecho a una niñez sana,
pero infelizmente…
35) Un alumno de la academia de idiomas tenía alergia al polen y una vez le dijeron que
hiciera un tratamiento con un especialista gaucho que vivía en la periferia de la ciudad. Como
no sabía conducir hasta allí y tenía fobia a perderse, le pidió a su amigo que…
36) A lo largo de muchos siglos las fiestas expresan la cultura de un pueblo. Demuestran las
relaciones con las divinidades, con el medio social, con los valores y conocimientos de
nuestros ancestros; por eso las fiestas son…
89
ANEXO 2: Formulário de nivelamento.
INFORMAÇÕES GERAIS DO PARTICIPANTE
Idade: ________________ Sexo: masculino feminino País de Origem: _______________
Ocupação: ____________ Língua falada pela mãe: ________ Língua Falada pelo pai __________
Nível de Escolaridade: Ensino Fundamental Ensino Médio Graduação Pós-Graduação
Quanto tempo tem contato com espanhol? ____ Quantas horas semanais é exposto(a) ao espanhol__
Com quem e como começou a aprender? _________________________________________________
Curso de espanhol Faço Já concluí Interrompi meus estudos. Em que nível interrompeu? ____
Qual seu nível atual de espanhol(de acordo com seu curso ou avaliações) Básico Intermediário Avançado
Escolha a opção que melhor avalie sua relação com a língua espanhola (marque apenas UMA):
Leio, falo, escrevo e entendo em espanhol na mesma velocidade que o Português
Leio qualquer texto em espanhol, me considero fluente e, dificilmente, encontro problemas com alguma palavras
Entendo e me expresso bem, apesar de ter dificuldades pontuais em determinadas áreas
Consigo me expressar razoavelmente, apesar de não dominar alguns pontos da língua
Consigo me expressar razoavelmente, mas tenho problemas para entender algumas coisas e me fazer entendido
Consigo me comunicar em situações específicas com as poucas expressões que conheço e somente entendo a elas
Conheço apenas alguns poucos assuntos específicos e consigo entender e me comunicar com dificuldade
Ainda não sei muito. Estou começando, portanto, não consigo entender praticamente nada nem me comunicar
Sei muito pouco (aproximadamente 10 expressões) e não consigo compreender nem ser compreendido(a)
Conheço pouquíssimas palavras soltas, não consigo me comunicar e não entendo nada em espanhol
Desconheço o idioma Sou falante nativo de espanhol Sou falante nativo e entendo português
Conhece outra língua? Sim Não Qual (ou quais)? ____________________________________
Já morou em outro país? Sim Não Qual (ou quais)? ___________________________________
Dê mais informações (tempo, local, situação etc) __________________________________________
PARA PREENCHIMENTO DO PESQUISADOR
GRUPO Nativo Próximo a Nativo Avançado Intermediário Elementar / Iniciante
OBSERVAÇÕES __________________________________________________________________
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LOCAL E DATA
DO EXPERIMENTO
NÚMERO DO
PARTICIPANTE
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