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Universidade do PortoFaculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física
Porto, Dezembro 2005
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do Motocross
Autor: Victor Azevedo
Universidade do PortoFaculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física
Victor José da Silva Azevedo
Porto, Dezembro 2005
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do Motocross
Trabalho orientado pelo Prof. Dr. António Ascensão
Trabalho Monográfico realizado no âmbito da disciplina de Seminário, ministrada no
5º ano da licenciatura em Desporto e Educação Física da Faculdade de Ciências
do Desporto e de Educação Física da Universidade do Porto.
Agradecimentos
Apesar de se constituir como um trabalho individual, não seria possível a sua
concretização sem a ajuda de várias pessoas que nos acompanharam ao longo
do mesmo. Gostaria de expressar a minha gratidão e o meu profundo
agradecimento:
Ao Prof. Doutor António Ascensão por ter aceite orientar este trabalho, pela
forma empenhada, competente e rigorosa como o orientou, pelos
ensinamentos que nos transmitiu e pelo constante apoio e disponibilidade
prestada.
Ao Prof. Doutor José Magalhães pelos valiosos conselhos emitidos para
discussão dos resultados e pelo apoio prestado na realização da parte
experimental.
Ao Prof. Mestre Eduardo Oliveira pelos seus valiosos ensinamentos sobre o
manuseamento de alguns instrumentos de avaliação, bem como pela sua
colaboração na parte experimental do trabalho.
Ao Paulo Marques pelas excelentes condições de trabalho que nos
proporcionou na realização dos testes de terreno.
A todos os pilotos que participaram na realização deste trabalho.
À minha mãe, Maria Celeste, pelo amor e compreensão demonstrados ao
longo deste trabalho.
À Sónia Saldanha pelo amor, carinho incentivo e apoio prestado.
Em memória do meu Pai:
Albino da Silva Azevedo
Resumo A condição física dos pilotos de motocross tem sido frequentemente
referenciada de forma empírica como essencial para a obtenção de resultados
desportivos relevantes. Contudo, do nosso conhecimento não existem trabalhos
científicos elaborados sobre esta modalidade que caracterizem fisiologicamente
o esforço dos pilotos de motocross. Assim, o presente estudo pretende
caracterizar a intensidade de exercício dos pilotos durante a realização de uma
manga competitiva simulada de motocross.
A amostra foi constituída por nove (9) pilotos de motocross de elite (28,3 ± 7,9
anos; 71,1 ± 7 kg; 169 ± 4cm; 53,5 ± 3,7 ml.kg-1.min-1; 14,9 ± 3,3 % massa
gorda). Os pilotos realizaram, previamente um teste de corrida em tapete rolante
até à exaustão para determinar a frequência cardíaca máxima (FCmáx), o
consumo máximo de oxigénio (VO2max) e o limiar anaeróbio ventilatório (Lan
vent). Posteriormente, foi monitorizada e analisada a FC durante a realização de
uma manga de motocross.
Durante os 30 minutos da manga de motocross realizada, a FC média foi de
180,7±11,3 bpm e os pilotos despenderam: (i) 26 minutos (87%) do tempo da
manga acima de 90% FC máx; (ii) 27 minutos (89%) acima de 85% VO2máx e
(iii) 27 minutos com uma FC superior à correspondente ao Lan vent.
Em suma, as elevadas percentagens de tempo com FC bastante elevadas
observadas no presente estudo sugerem que o motocross é uma modalidade de
intensidade de exercício elevada.
Palavras-chave: motocross, manga, intensidade de exercício, frequência
cardíaca, consumo de oxigénio, limiar anaeróbio ventilatório
Abstract Physical conditioning of motocross riders has been considered as an important
component in this specific and complex sport performance. However, to our
present knowledge no studies regarding the exercise intensity of motocross
heats have been addressed so far. In this regard, the present study was
designed to quantify and describe the intensity profile of motocross riders during
a simulated competitive race.
To achieve this purpose, nine (9) elite motocross riders (28,3 ± 7,9 yrs; 71,1 ± 7
kg; 169 ± 4cm; 53,5 ± 3,7 ml.kg-1.min-1; 14,9 ± 3,3 % fat) performed one treadmill
running test to exhaustion in order to determine maximal heart rate (HRmax),
maximal oxygen consumption (VO2max) and ventilatory threshold (Lan vent).
Furthermore, one 30 min competitive off-road motocross heat was also
performed to measure exercise intensity through HR monitoring.
During the 30 min heat, mean HR was 180.7±11.3 bpm and riders spent: (i) 26
minutes (87%) of time above 90% of HRmax; (ii) 27 minutes (89%) between 95-
100% of VO2max and; (iii) 27 minutes with an HR higher than that corresponding
to Lan vent.
In conclusion, due to the elevated percentage of time spent at very high HR
observed in the present study, it can be suggested that competitive motocross
heats are performed at high exercise intensities.
Key words: motocross, heat, exercise intensity, heart rate, oxygen uptake,
lactate threshold.
Resumé La condition physique des pilotes de motocross a été souvent marquée de forme
empirique comme étant essentielle pour avoir des résultats sportifs importants.
Toutefois, à notre connaissance, il n´ ya pas des travaux scientifíques sur cette
modalité pour caractériser l´ effort des pilotes de motocross.
Le présent étude veut caractériser l´intensité de l´exercice d´une compétition de
motocross avec le recours de quelques indicateurs d´exigence cardio respiratoire
comme la fréquence cardiaque et la consommation de l´oxygène.
L´échantillon a été formé par neuf (9) pilotes de motocross d´ élite (28,3 ± 7,9
années; 71,1 ± 7 kg; 169 ± 4cm; 53,5 ± 3,7 ml.kg-1.min-1; 14,9 ± 3,3 % masse
gras). En laboratoire on a fait une course en tapis volant jusqu à l´ exhaustion, a
fin de déterminer la fréquence cardiaque maximale, la consommation maximale
d´ oxygène et le seuil anaérobie. Dans le terrain, la fréquence cardiaque a été
monitorizée pendant la réalisation d´une compétition de motocross.
Pendant les 30 minutes de la compétition de motocross, la fréquence cardiaque
moyenne a été 180.7±11.3 ppm et les pilotes ont passé : (i) 26 minutes (87%) du
temp au dessus 90%, FCmax; (ii) 27minutes (89%) au dessus 85 % VO2max;
(iii) 27 minutes au dessus Lan vent.
À la fin, les grands pourcentages de temp au dessus de 90% FCmax et VO2max
et aussi au dessus Lanvent, peut vent dire que le motocross est une modalité
avec une intensité d´exercice élevée.
Mots-clés: motocross, course, intensité d´ exercice, fréquence cardiaque,
consommation d´ oxygène, seuil anaérobie.
Índice
1 - Introdução 3 2 - Revisão da Literatura 4
2.1 - Breve perspectiva histórica da modalidade 4
2.2 - Importância da avaliação das capacidades físicas no rendimento desportivo 7
2.3 - Avaliação da intensidade de exercício 9
2.3.1 - Modalidades com perfil de actividade cíclica 9 2.3.2 - Modalidades tradicionais com perfil de actividade intermitente 11 2.3.3 - Modalidades off-road 14
2.4 - Vantagens e limitações da utilização da frequência cardíaca como indicador da
intensidade de exercício 16 3 – Material e Métodos 17 3.1 – Amostra 17
3.2 - Procedimentos de avaliação 17
3.2.1 -Testes de laboratório 18
3.2.2 -Testes de terreno 19
3.2.3 - Procedimentos estatísticos 20
4 - Resultados 21
5 - Discussão 25 5.1 - Discussão da metodologia 25
5.2 - Discussão dos resultados 27
6 - Conclusão 30 7- Bibliografia 31
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
3
1. Introdução O motociclismo é uma modalidade desportiva que engloba várias disciplinas
como a velocidade, o enduro, o todo – terreno, o trial, o motocross entre outras.
Estas disciplinas podem ser disputadas em asfalto ou em terra (off-road) e em
circuito fechado ou em terreno aberto de que é exemplo o classicamente
designado “Rally Paris Dakar”.
O motocross é uma modalidade disputada em duas mangas (1), num circuito
fechado constituído por vários saltos e obstáculos naturais. Cada piloto
tripulando o seu motociclo compete directamente com todos os seus
adversários, sendo consagrado vencedor aquele que cortar a meta em primeiro
lugar após ter cumprido o tempo de competição regulamentar (40 minutos + 2
voltas). (2)
Fig.1 – Circuito motocross de Ernée - França
Actualmente, a modalidade off-road mais profissional é o motocross. Nos
últimos anos tem-se assistido nesta disciplina do motociclismo a um incremento
do seu nível competitivo e por isso a um aumento do número de horas
dispendidos pelos pilotos para melhorar a sua condição física e técnica de
pilotagem.
(1) – Uma prova de motocross é constituída por duas corridas, denominadas de mangas.
(2) – Competição internacional; nacional 30 minutos mais duas voltas, denominadas de mangas.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
4
A condição física dos pilotos de motocross tem sido empiricamente
referenciada, como essencial para a obtenção de resultados desportivos
relevantes. Assim é do nosso entendimento que o conhecimento das
exigências do stress físico e fisiológico que a competição impõe aos pilotos
poderá contribuir para uma prescrição mais eficaz das cargas de treino e assim
melhorar a performance. Contudo, do nosso conhecimento não existem
trabalhos científicos elaborados sobre esta modalidade que caracterizem
fisiologicamente o esforço dos pilotos de motocross.
O presente estudo pretende caracterizar a intensidade de exercício de uma
manga de motocross recorrendo para isso a indicadores de exigência cardio-
respiratória como a frequência cardíaca (FC) e o consumo de oxigénio (VO2).
2. Revisão da Literatura
2.1- Breve perspectiva histórica da modalidade Segundo Bonini (1996) o motocross teve origem na Inglaterra no ano de 1920,
apesar do termo “motocross” só ter sido utilizado pela primeira vez alguns anos
mais tarde na Holanda e na Bélgica. Em 1947 realizou-se na Holanda a
primeira prova internacional denominada, motocross das nações.
Presentemente, este evento ainda se realiza uma vez por ano, tratando-se de
uma competição por selecções a nível mundial, onde os três melhores pilotos
em representação do seu país procuram obter as melhores classificações em
confronto com os pilotos das outras nacionalidades. De acordo com o autor
supra referido, o primeiro campeonato do mundo de motocross realizou-se no
ano de 1957.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
5
Em Portugal, o primeiro campeonato nacional disputou-se no ano de 1969.
Actualmente existem vários campeonatos nacionais distribuídos por 4 classes
elaboradas de acordo com o escalão etário; infantis, iniciados, sub–19 e sénior.
O escalão sénior é, ainda, dividido em duas categorias tendo em conta as
especificações técnicas do motociclo. O nível competitivo dos pilotos
portugueses tem evoluído de forma significativa, tendo recentemente a equipa
portuguesa alcançando um honroso 8º lugar na edição 2005 do motocross das
nações disputado em França, num total de 40 selecções participantes
(www.motox.com.br).
Fig.2 – Edição 2005 do motocross das nações
Após esta breve perspectiva histórica da modalidade, a questão que se coloca
é: o que é o motocross? O motocross segundo a definição da Federação
Internacional de Motociclismo (www.fim.ch) “é uma competição off-road
disputada num circuito com obstáculos naturais”. Na nossa opinião, esta
definição parece-nos desactualizada e insuficiente para descrever esta
modalidade. O motocross é efectivamente uma competição off-road, disputada
entre todos os pilotos em confronto directo com os demais, em duas mangas
realizadas, num circuito fechado constituído por obstáculos naturais e artificiais
como saltos, lombas e relevées (3).
(3) - Relevo do terreno que funciona como batente e carril nas curvas permitindo realizá-las com velocidade superior
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
6
Quanto à estrutura, uma prova de motocross é constituída pelos treinos livres e
treinos cronometrados disputados da parte da manhã e pela corrida
propriamente dita (duas mangas) da parte da tarde. A corrida inicia-se com os
pilotos perfilados atrás da grelha de partida e o vencedor, é o piloto que cortar
a meta em primeiro lugar após cumprir os 40 minutos mais duas voltas
constituintes da manga.
Fig.3 – Partida de uma manga de motocross
A partir de meados do século passado tem-se assistido a um incremento do
interesse pela modalidade como é possível observar pelo aumento do número
de participantes, competições e nível da mesma. Desta forma, o motocross é
actualmente uma modalidade com uma grande expansão, existindo
campeonatos em todo o mundo desde a Austrália e o Japão passando pela
Europa até ao Brasil e aos Estados Unidos. Actualmente, o campeonato mais
competitivo é o disputado nos Estados Unidos, rivalizando este, inclusive com o
campeonato mundial de motocross disputado maioritariamente na Europa.
O motocross das nações, competição acima referida, serve como palco para
confronto dos melhores pilotos de motocross de todo o mundo.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
7
2.2 – Importância da avaliação das capacidades físicas no rendimento desportivo
Segundo Wilmore e Costill (1994), o corpo humano é uma “máquina” complexa,
onde a actividade dos vários tipos de células e tecidos se conjugam de uma
forma precisa e coordenada. Assim, O rendimento desportivo de um atleta é o
produto do funcionamento do seu organismo.
De acordo com Green (1991), o rendimento final observado depende de uma
complexidade de factores, cada um dos quais, contribuindo de uma forma
váriavel na performance.
Para Banister (1991), a performance depende de uma complexa interacção de
factores (treino, fadiga, capacidades físicas, habilidades herdadas
genéticamente, factores psicológicos) e da forma como o organismo os integra.
Tendo em conta a orientação do presente estudo, focaremos a nossa atenção
nas capacidades do atleta, nomeadamente na importância da sua avaliação a
partir da aplicação de testes de avaliação funcional e fisiológica no rendimento
desportivo.
A capacidade física do atleta é determinada entre outras, pela capacidade de
produção máxima de energia (processos aeróbios e anaeróbios máximos), da
força muscular, da coordenação/economia do movimento e de factores
psicológicos (Powers e Howly, 1997). Segundo os mesmos autores, a
avaliação das capacidades físicas implica um conhecimento dos factores que
contribuem para o sucesso desportivo numa determinada modalidade
desportiva. Deste modo, defendem a utilização de testes fisiológicos que
avaliem os sistemas metabólicos preferencialmente utilizados para obtenção de
energia por forma a rentabilizar o treino e atingir níveis de performance mais
elevados.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
8
Para MacDougall e Wenger (1991), a avaliação das capacidades físicas do
atleta a partir de testes fisiológicos, poderão representar vantagens para o
atleta e para o seu treinador. Assim, (i) Uma bateria de testes indica os pontos
fortes e fracos do atleta na modalidade praticada e permite, face aos resultados
obtidos, prescrever um programa de treino que atenue os pontos fracos
identificados; (ii) Uma bateria de testes fornece ao atleta um feedback sobre o
efeito do programa de treino no seu rendimento, por comparação dos
resultados em dois momentos distintos; (iii) permite ao atleta sujeito a elevadas
cargas de treino, obter informações sobre o seu estado de saúde; (iv) Um atleta
sujeito a uma bateria de testes aprende o funcionamento do seu corpo em
termos fisiológicos e compreende as exigências do seu desporto.
Alguns autores reconhecem ainda a vantagem da aplicação dos testes na
predição da performance num determinado desporto, tendo em conta as
características antropométricas e as capacidades fisiológicas do indivíduo
(Pyke, 2000; Semenick, 1994). Tendo sempre em conta as características do
desporto, a selecção de testes deve preencher vários requisitos,
nomeadamente a relevância, a especificidade, a viabilidade, a validade e a
precisão.
Adicionalmente, a avaliação e controlo representam um contributo para a
redução dos factores de risco associados aos diferentes tipos de lesões, bem
como para a prevenção de situações potenciais de sobretreino.
Desta forma, a avaliação das capacidades físicas a partir de testes fisiológicos
permite conhecer e maximizar o potencial do atleta enquanto “máquina”
produtora de rendimento desportivo, constituindo-se assim como um requisito
importante no controlo e na maximização dos meios de treino utilizados.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
9
2.3 – Avaliação da intensidade de exercício
2.3.1- Modalidades com perfil de actividade cíclica As modalidades com perfil de actividade cíclica caracterizam-se pela execução
de gestos desportivos iguais, repetidos ritmicamente durante a duração da
performance (Dantas, 1995). O ciclismo de estrada e a corrida maratona do
atletismo são exemplos de modalidades que se enquadram nesta classificação.
De seguida apresentamos alguns dados obtidos a partir da literatura centrados
na avaliação da intensidade de exercício nestas modalidades.
Começando pelos estudos realizados sobre o ciclismo de estrada, segundo
Lucia et al (2001), esta modalidade é de resistência extrema. Um ciclista
profissional durante um ano percorre em treino e em competições entre 30.000
a 35.000km. Segundo os mesmos autores, a intensidade de exercício em
algumas etapas (contra relógio e subida de montanha) é elevada, próxima dos
90% da potência máxima aeróbia (VO2 máx.) e acima do limiar anaeróbio. O
VO2 máx. dos ciclistas profissionais ronda os 74 ml/kg/min (Hug et al, 2003; Lee
et al, 2002).
Padilla et al (2000) realizaram um estudo para avaliar a intensidade de
exercício durante as etapas contra – relógio em ciclistas profissionais utilizando
como indicador, a FC. Neste estudo, 80 ciclistas realizaram em laboratório, um
teste incremental no ciclo ergómetro, para avaliar a FCmáx, o início da
acumulação de lactato no sangue, o limiar anaeróbio e a relação da FC com
estes indicadores fisiológicos. A FC foi monitorizada nos cinco tipos de etapas
ao cronómetro constituintes de uma prova de ciclismo, nomeadamente o
prólogo (< 10km), o contra – relógio curto (<40km), o contra – relógio longo
(>40km), o contra – relógio de montanha (subida) e o contra – relógio de
equipa. Os autores mostraram que o valor percentual da FC utilizado pelos
ciclistas em relação à FCmáx., correspondente ao início da acumulação de
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
10
lactato no sangue e ao limiar anaeróbio, reflecte as exigências fisiológicas nos
variados tipos de etapas que compõe uma competição de ciclismo de estrada.
Contudo, Jones e Doust (1997) afirmam que o momento do desvio da
linearidade durante o aumento da FC, ocorre sistematicamente a uma
intensidade superior à FC correspondente ao limiar anaeróbio e
aproximadamente a 95% da FCmáx. Deste modo, a utilização da FC poderá
constituir-se um indicador muito lábil na determinação do limiar anaeróbio
apresentando assim, limitações na avaliação do esforço físico neste tipo de
modalidades.
Quanto à corrida da maratona, esta disciplina do atletismo é para os seus
praticantes, uma das mais exigentes do ponto de vista físico e psicológico. De
acordo com Hagerman (1992), a quantidade total de energia gasta por um
maratonista é a mais elevada no seio de todas as modalidades de resistência.
Segundo o mesmo autor, a intensidade de treino para a corrida de maratona
pode variar entre 60 e 125% do VO2 máx. e em competição os atletas de elite
correm acima de 80 – 90% do seu VO2máx. para alcançar bons resultados
desportivos. Segundo os estudos de Svedenhag e Sjodin (1984) e Peronnet e
Thibault (1987), os maratonistas de elite apresentam valores muito elevados de
VO2 máx. (aprox.76 ml//kg/min).
Vários autores têm estudado um conjunto de indicadores fisiológicos, incluindo
o VO2 máx, o limiar anaeróbio (Lan vent), FC, entre outros numa perspectiva
preditora da performance (Hagen et al,1981; Billat et al, 2001).
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
11
2.3.2 – Modalidades com perfil de actividade intermitente Modalidades como o futebol, judo, karaté, esgrima, golfe, basquetebol, voleibol,
ténis, andebol e o hóquei em patins constituem exemplos de modalidades
desportivas em que o exercício se desenvolve de um modo intermitente, isto é,
caracterizado por conter períodos de pausa frequentes, com níveis de
intensidade muito variáveis, seja nas fases de esforço ou nos momentos de
recuperação (Figueiredo, 1998; Zumerchik, 1997; Soares, 1988).
Dado o elevado número de desportos com este perfil, elegemos três
tradicionais como o futebol, o basquetebol e o ténis para apresentar alguns
dados da literatura sobre a caracterização da intensidade de exercício nestas
modalidades.
Em relação ao futebol, numerosos estudos têm sido realizados para avaliar a
intensidade de exercício nos seus intervenientes, desde os jogadores e
respectivas posições até aos árbitros (Hoff et al, 2002; D’ Ottavio e Castagna,
2001; Ali e Farrally, 1991; Rienzi et al, 2000; Krustrup e Bangsbo, 2001).
Segundo Stolen et al (2005), os jogadores de elite percorrem por jogo e em
média cerca de 10 km com uma intensidade perto do Lan vent e a 80 a 90% da
FCmáx.. Tendo em conta a duração do jogo, consideram o metabolismo
aeróbio como a principal fonte energética apesar de reconhecerem que a
maioria das acções decisivas de um jogo de futebol depender do metabolismo
anaeróbio.
A importância do metabolismo aeróbio referida anteriormente, está de acordo
com o estudo de Hoff et al (2002), segundo o qual 90% da energia produzida
num jogo de futebol provem desta via. Segundo os mesmos autores, a
utilização da FC durante um exercício específico de futebol é um indicador
válido para avaliar a sua intensidade de exercício.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
12
Contudo Stolen et al (2005), referem que o futebol se caracteriza por períodos
de alta e baixa intensidade de jogo, e deste modo advertem que a utilização da
FC média durante os 90 minutos de jogo se pode traduzir numa enorme perda
de informação específica. Os estudos de Bangsbo et al (1991), Rienzi et al
(2000), e Castagna et al (2003) fundamentam esta ideia, afirmando que
durante o jogo os jogadores despendem o tempo em diferentes acções
motoras de intensidade variável, como caminhar, em jogging, a passo largo,
em sprint e a caminhar/ correr de costas.
Ali e Farrally (1991) avaliaram a FC em jogadores de futebol no decorrer de um
jogo. A amostra, constituída por jogadores de nível semi–profissional,
universitários e recreação, foi ainda sub–dividida de acordo com as posições
ocupadas dentro do campo nomeadamente, avançados, médios e defesas. Os
resultados deste estudo sugerem que para todos os níveis, os jogadores
avançados e médios a intensidade de jogo é superior tendo em conta o registo
de FC médias mais elevadas. O mesmo estudo evidencia ainda nos níveis
semi-profissional e universitário, uma intensidade de exercício mais elevada
nos médios.
Esta ideia está de acordo com os resultados de outros estudos (Bangsbo et al,
1991; Rienzi et al, 2000; Ekblom, 1986), segundo os quais, os jogadores do
meio campo percorrem durante um jogo de futebol maiores distâncias em
relação aos jogadores avançados e defesas.
McInnes et al (1995) estudaram a intensidade de exercício em jogadores de
basquetebol de elite do sexo masculino durante a competição, utilizando
gravação vídeo e analisando a FC e as concentrações de lactato no sangue.
Os jogadores, no tempo efectivo de jogo, apresentaram uma FC média de 169
± 9 bpm e dispenderam 75% deste tempo com valores de FC correspondendo
a 85% da FCmáx. O nível médio de lactato encontrado no sangue foi de 6.8 ±
2.8 mM. Com base nestes resultados, os autores deste estudo concluíram que
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
13
as exigências do basquetebol masculino de elite são, quer do ponto de vista
metabólico quer cardiovascular, elevadas.
Todavia, a utilização do lactato como indicador de intensidade nestas
modalidades de perfil intermitente poderá constituir-se como um indicador
pouco preciso, uma vez que a intensidade das acções motoras desenvolvidas
pelos atletas nos momentos precedentes da recolha do sangue influencia
directamente a concentração deste metabolito.
Quanto ao ténis, trata-se de uma modalidade muito complexa que envolve
força, potência, velocidade, agilidade, explosividade e a intervenção de várias
componentes de resistência (Koniq et al, 2001). Segundo os mesmos autores,
a intensidade média de exercício no Ténis varia entre os 60 a 70% do VO2
máx. e a energia dispendida provêm principalmente do metabolismo aeróbio.
Esta ideia está de acordo com o estudo de Bergeron et al (1991), segundo o
qual, o ténis se caracteriza por períodos breves de alta intensidade de exercício
embora a exigência metabólica geral se assemelhe aos requisitos de exercício
prolongado de intensidade moderada. Neste estudo efectuado em 10 jogadores
do sexo masculino da 1ª divisão, a FC foi monitorizada durante 85 minutos de
jogo num campo indoor de superfície dura. Os resultados evidenciaram uma
FC média durante o jogo de 144.6 ±13.2 bpm com uma utilização média de
apenas 61,4% da FCmáx. de reserva.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
14
2.3.3- Modalidades off-road O motocross, o enduro e o todo-terreno constituem exemplos de disciplinas do
motociclismo com características off-road. Do nosso conhecimento, não
existem estudos de caracterização da intensidade de exercício nestas
modalidades motorizadas. Os estudos existentes na literatura sobre a
intensidade de exercício nas modalidades off-road tem-se centrado no ciclismo
fora de estrada (B.T.T.), nomeadamente numa das suas vertentes; o cross-
country (Impellizzeri et al, 2002; Creag et al, 1998; Wilber et al 1997).
O cross-country é uma das disciplinas mais populares do B.T.T., tendo sida
introduzida como modalidade Olímpica nos Jogos Olímpicos de Atlanta em
1996. Trata-se de uma modalidade de resistência, disputada num circuito off-
road, composto por várias subidas e descidas e variados tipos de piso.
Segundo o estudo de Lee et al (2003), o VO2máx dos atletas desta modalidade
(B.T.T.- cross-country), comparado aos valores apresentados pelos ciclistas
profissionais de estrada, são ligeiramente superiores, respectivamente, 78 ±
4,4 ml//kg/min e 73 ± 3,4 ml//kg/min.
Impellizzeri et al (2002), caracterizaram a intensidade de exercício do cross-
country em atletas de alto nível, monitorizando a FC em 4 competições
distintas. A amostra constituída por 9 atletas foi submetida em laboratório à
avaliação das suas características antropométricas e de alguns indicadores
fisiológicos como a FCmáx., VO2máx., o limiar de lactato (LT) e o início da
acumulação de lactato no sangue (OBLA). Tendo em conta estes indicadores,
os autores definiram 3 zonas distintas para caracterizar o perfil da intensidade
de exercício numa prova de cross-country; (i) “Easy zone“ para intensidades de
exercício abaixo da FC correspondente ao LT, (ii) “Moderate Zone“ para
intensidades de exercício entre a FC correspondente ao LT e OBLA, (iii) “Hard
Zone “para intensidades de exercício acima da FC correspondente ao OBLA. A
relação individual entre a VO2máx. e a FCmáx. foi igualmente determinada. Na
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
15
segunda fase do estudo desenvolvida no terreno, a FC foi monitorizada de 5
em 5” a todos os atletas nas 4 provas de cross-country constituintes do
protocolo. A FCmáx. média dos 5 atletas que completaram as 4 competições
não foi significativamente diferente da FCmáx. média atingida no laboratório;
191 ± 6 bpm e 192 ± 5 bpm, respectivamente. Tomando o exemplo de um perfil
individual da FC durante o desenrolar de uma das 4 competições, os autores
verificaram uma FC ligeiramente superior na parte inicial da prova o que pode
ser explicado segundo os mesmos, pela necessidade dos atletas atingirem
rapidamente os lugares da frente. Nas 4 competições constituintes dos testes
de terreno, a FC média dos atletas, 171 ± 6 bpm, correspondeu a 90 ± 3% da
FCmáx. Outra forma encontrada pelos autores deste estudo para descrever o
perfil da intensidade de exercício nesta modalidade, foi a percentagem do
tempo total despendido em cada uma das 3 zonas préviamente definidas,
“Easy zone“ 18 ± 10 %, “Moderate Zone” 51± 9 %, “Hard Zone“ 31 ± 16 %. Os
resultados obtidos neste estudo mostram que o cross-country é uma
modalidade desportiva de alta intensidade.
Esta ideia está de acordo com os resultados do estudo de Creag et al (1998)
realizado a atletas de elite do sexo feminino. As atletas durante a realização da
prova de cross-country passaram 43,4% do tempo com FC superiores a 180
bpm, 52,6% do tempo com FC entre 170 e 179 bpm e apenas 4% com FC
entre os 160 e 169 bpm, o que evidencia uma intensidade de exercício
igualmente elevada.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
16
2.4 – Vantagens e limitações da utilização da frequência cardíaca como indicador da intensidade de exercício. Para Powers e Howley (1997), durante o exercício, o débito cardíaco, ou seja,
a quantidade de sangue bombeado por batimento cardíaco aumenta em função
da exigência elevada de oxigénio e nutrientes da musculatura activa, havendo
uma relação essencialmente linear entre estes dois factores. A FC é em
repouso e em exercício máximo, inferior nos indivíduos treinados pelo facto
destes apresentarem superiores volumes de ejecção. Nos indivíduos pouco ou
moderadamente treinados, o volume de ejecção não aumenta além de uma
carga de VO2 máx. de 40%, sendo o débito cardíaco aumentado acima desta
intensidade de exercício, graças apenas a um aumento da FC.
A FC é o factor determinante do trabalho cardíaco em exercícios de
intensidade moderada a máxima desempenhando um papel importante no
aumento do consumo de oxigénio, incrementando o fluxo sanguíneo e
consequentemente o seu transporte para os músculos activos durante o
exercício (Brooks et al,1996).
Para Powers e Howley (1997), o VO2 máx. pode ser estimado a partir das
respostas da FC ao exercício sub máximo por meio da extrapolação da relação
com a FCmáx. ajustada à idade do indivíduo, garantindo uma avaliação mais
célere com menor stress cardiovascular.
A utilização FC tem ainda a vantagem de contornar as dificuldades inerentes a
uma avaliação fora do laboratório, dado tratar-se de um indicador fisiológico
facilmente mensurável. (Creagh et al, 1998; Impellizzeri et al, 2002).
Por outro lado, a determinação da intensidade de esforço recorrendo aos
valores da FC, levanta algumas preocupações, dado que este indicador se
assume como bastante lábil sendo influenciado por inúmeros factores como a
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
17
temperatura ambiente, a desidratação, a idade, o nível de condição física, as
massas musculares utilizadas, o tipo de exercício realizado e o estado
emocional (Powers e Howley, 1997; Soares, 1988).
A título de exemplo, vários estudos têm demonstrado alteração significativa no
padrão da FC em exercícios: (i) com uma percentagem elevada de contracções
isométricas (Lewis et al, 1985; Kilbom e Brundin, 1976); (ii) envolvendo um
stress emocional elevado com consequente elevação das concentrações de
catecolaminas circulantes (Stratton et al, 1985; Schwaberger, 1987; Baron et al,
1992) e (iii) prolongados realizados em ambientes quentes (Voltaire et al,
2003).
3. Material e Métodos
3.1. Amostra Participaram no presente estudo 9 pilotos do sexo masculino (idade = 28,3 ±
7,9 anos, peso = 71,1± 7 kg, altura = 169,8 ± 5 cm). Antes da sua participação
todos os sujeitos foram informados dos seus objectivos e procedimentos, tendo
fornecido consentimento escrito para a realização dos mesmos. As
características dos sujeitos da amostra (n=9) são apresentadas no quadro 1.
3.2. Procedimentos de avaliação O protocolo experimental foi subdividido em duas fases distintas: a primeira
realizada no laboratório e a segunda no terreno. O intervalo temporal entre as
fases foi de 5 dias para evitar possíveis alterações na condição física dos
pilotos da amostra entre os momentos.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
18
3.2.1 Testes de laboratório Nesta fase laboratorial, os pilotos foram sujeitos à avaliação dos seguintes
indicadores/parâmetros pela ordem apresentada de seguida:
(i) Dados antropométricos
Os sujeitos foram pesados em roupa interior numa balança digital (TANITA) e
medidos descalços utilizando um antropómetro (SECA). Foi também avaliada
por bioimpedância (BODYSTAT), a % de massa gorda dos sujeitos.
(ii) Teste força de preensão manual (Handgrip)
Os atletas realizaram o habitualmente designado teste de Handgrip com um
dinamómetro (Grip-D TKK5401) para avaliar a força máxima de preensão
manual e o índice de fadiga. A força máxima foi determinada foi determinada
através da realização de uma contracção isométrica voluntária máxima,
mantendo ambos os membros superiores simultaneamente em extensão e
paralelos ao solo. Foi adoptada esta posição por forma a aproximar o padrão
de avaliação com a posição de pilotagem utilizada no motocross. O teste teve a
duração de 30´´ após os quais foi novamente avaliada a força máxima de
preensão. O índice de fadiga, foi calculado pela diferença entre a força máxima
e a força mínima, a dividir pela força máxima e multiplicado por 100 e expresso
em percentagem.
(iii) Teste Wingate de braços
O teste Wingate foi realizado num ciclo ergómetro (MONARK 824
ERGOMEDIC) com controlo da carga por mecanismo de fricção. Para
uniformizar as condições da realização do teste, a altura e a distância do banco
foram ajustadas para cada atleta de forma a nivelar a altura do ombro com a
altura do centro de rotação da pedaleira e permitir uma extensão do membro
superior. Cinco segundos antes do início do teste, foi pedido aos atletas para
utilizarem uma cadência da pedalada máxima enquanto o avaliador fazia a
contagem decrescente de 5 até zero. Neste momento (zero), foi aplicada uma
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
19
carga equivalente a 5% do peso corporal. Nos 30 segundos subsequentes os
atletas foram instruídos para manter a cadência da pedalada máxima, tendo
sido verbalmente encorajados. Os parâmetros avaliados foram: (i) potência
máxima, calculada como a potência média mais elevada nos melhores 5
segundos do teste; (ii) potência média, definida como a potência média ao
longo dos 30 segundos; (ii) potência mínima, definida como a potência média
mais baixa registada no período correspondente aos piores 5 segundos do
teste; (iii) Índice de fadiga, definido como um valor percentual correspondente à
diferença entre a potência máxima e mínima multiplicado por 100 e depois
dividido pela potência máxima, Os valores da potência máxima, média e
mínima foram ainda relativizados ao peso corporal dos atletas
(iv) Avaliação cárdio-respiratória
A avaliação do consumo máximo oxigénio e de outros indicadores respiratórios
como a ventilação máxima, o limiar anaeróbio ventilatório e o quociente
respiratório máximo, efectuou-se por espirometria em circuito aberto com
oxímetro (CORTEX BREATH BY BREATH METALIZER 3B). Este teste foi
realizado em tapete rolante utilizando um protocolo máximal contínuo com
incrementos de velocidade de minuto a minuto de 0,2m/s até à exaustão. A FC
foi monitorizada durante a realização do teste utilizando um cárdio-
frequencímetro (POLAR VANTAGE NV), composto por um emissor colocado
num cinto ajustável ao tórax dos sujeitos, ao nível do apêndice xifoideo e por
um receptor (relógio) colocado no pulso do braço não dominante que registava
os valores dos batimentos cardíacos de 5 em 5 segundos. Foi ainda avaliada a
FCmáx. Durante a realização do teste os sujeitos foram verbalmente
encorajados pelos restantes pilotos e autores do presente trabalho.
3.2.2 Testes de terreno Esta fase realizou-se num circuito de motocross em condições ambientais
termo-naturais. Os sujeitos realizaram uma simulação da manga de motocross
com a duração de 30 minutos, numa pista com extensão de aproximadamente
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
20
1km, constituído por pequenos saltos e vários tipos de curva. Relativamente ao
estado físico, a pista encontrava-se deteriorada (ondulada) e com boa
aderência. Foram avaliados os seguintes indicadores/parâmetros:
(i) Dados antropométricos
Para avaliação do peso e da % de massa gorda dos sujeitos foram seguidos os
procedimentos metodológicos atrás referidos na avaliação laboratorial. Durante
esta 2ª fase experimental os pilotos não ingeriram qualquer alimento ou liquido
de forma a homogeneizar possíveis factores exógenos de interferência no
comportamento da FC.
(ii) Monitorização da FC A FC dos pilotos foi monitorizada durante a realização da manga de motocross
de acordo com o procedimento e material atrás referidos.
3.2.3 Procedimentos estatísticos Foram utilizadas medidas habituais de estatística descritiva média e desvio
padrão. Foi igualmente efectuada uma distribuição absoluta e relativa da FC e
da FC correspondente à % de VO2máx. durante a manga por intervalos de
intensidade.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
21
4. Resultados O quadro 1 mostra as principais características antropométricas e cárdio-
respiratórias dos sujeitos que participaram no presente estudo. São ainda
apresentados os valores relativos à performance dos sujeitos alcançadas no
teste de Wingate e de força de preensão manual (Handgrip).
Quadro 1 – Caracterização da amostra
Variáveis Média ± dp Idade (anos) 28,3 ± 7,9
Peso (kg) 71,1 ± 7
Altura (cm) 169,8 ± 4
% Massa gorda 14,9 ± 3,3 HG Pot.máx. esq.(kg) 40,1 ± 6,7
HG indice fadiga esq.(%) 16,6 ± 9
HG Pot.máx. dta.(kg) 47,7 ± 6,3
HG indice fadiga dta. (%) 21,6 ± 8,5 WB Pot. Máx. (w/kg) 7,2 ± 0,5
WB Pot. Méd. (w/kg) 5,2 ± 0,5
WB Pot. Min. (w/kg) 3,7 ± 0,8
WB Indíce fadiga (%) 48,7 ± 12,6 VO2 máx. (ml/min) 3,8 ± 0,4
VO2 máx. (ml/min/kg) 53,5 ± 3,7
Vemax (L/min) 131,9 ± 17,9
QR máx. 1,12 ± 0,1
LAN vent (bpm) 159,7 ± 24,1
LAN vent (ml/kg/min) 42 ± 5,6
LAN vent (%VO2max) 76,1± 8,9
FCmáx. (bpm . min -1) 198,3 ± 4,4
HG, Handgrip; WB, Wingate de braços; VO2 máx, consumo máximo de oxigénio;
Vemáx, ventilação máxima; QRmáx, quociente respiratório máximo; LAn vent, limiar
anaeróbio ventilatório; FCmáx, frequência cardíaca máxima;
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
22
O quadro 2 apresenta o comportamento da FC mínima, média e máxima
durante os 30 minutos da manga de motocross realizada. Expressa ainda a FC
média dos primeiros 15 minutos e dos 16 minutos até ao final da manga.
Quadro 2 – Frequência cardíaca durante a realização da
manga de motocross
Frequência cardíaca Média ± dp
Mínima (bpm) 137± 15,2
Média (bpm) 180,7 ± 11,3
Máxima (bpm) 191,7± 8
Média 0 – 15 min. (bpm) 179,6 ± 11,5
Média 16 – 30min. (bpm) 181,9 ± 11 bpm, batimentos por minuto
Tal como se pode observar pela análise da figura 4, durante os 30 minutos da
manga de motocross realizada, os pilotos encontram-se 87% do tempo acima
de 90% da sua FCmáx, especificamente 43 ± 25% do tempo com FC entre os
95 e 100 % da sua FCmáx. e 44 ± 22% do tempo com FC entre os 90 e 94
%da sua FCmáx. Para FC entre os 85 e 89 da FCmáx. os sujeitos passaram 8
± 7% do tempo. O tempo, despendido pelos pilotos a FC inferiores a 85% da
sua FCmáx, foi muito reduzido. Apenas 2 ± 3% entre os 85 e 80 % da sua
FCmáx. e 1 ± 1% do tempo com FC inferiores a 79 %.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
23
Fig. 4 – Percentagem do tempo total despendido nas diferentes percentagens da FC máxima (%FCmáx) durante os 30 minutos da manga de motocross realizada. Os valores representam média ± desvio padrão
A figura 5 mostra o tempo dispendido pelos pilotos nos intervalos percentuais
de FCmáx. considerados. Relativamente ao tempo total dispendido em cada
um dos diferentes intervalos, os pilotos encontraram-se 26 minutos acima de
90% da sua FCmáx, especificamente 13± 7,4 minutos entre os 95 e 100 % da
sua FCmáx. e 13 ± 6,2 minutos entre os 90 e 94 %da sua FCmáx. No intervalo
entre os 85 e 89 da FCmáx. os sujeitos passaram 2 ± 2minutos. Com FC
inferiores a 85% da FCmáx. encontraram-se apenas 1 ± 1 minuto num total de
30 minutos constituintes da manga de motocross realizada.
Fig. 5 – Tempo total despendido (s) nas diferentes percentagens da FC máxima (%FCmáx) durante os 30 minutos da manga de motocross realizada. Os valores representam média ± desvio padrão
1 0 0 02
4443
805
1015202530354045505560657075
100-95 94-90 89-85 84-80 79-75 74-70 69-65 64-60
% FCmáx
Tem
po (%
)
0 0 0 0
1313
21
0
5
10
15
20
25
100-95 94-90 89-85 84-80 79-75 74-70 69-65 64-60
%FCmáx
Tem
po (m
in)
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
24
A figura 6 mostra que durante os 30 minutos da manga de motocross
realizada, os pilotos encontraram-se na maioria do tempo (57 ± 33%) entre 100
e 95 % do seu VO2 máx. determinado laboratorialmente. No intervalo definido
entre os 94 e 90 % do VO2 máx, os pilotos passaram 14 ± 9 % do tempo. Entre
os 89 e 85 % de VO2 máx. dos pilotos, a percentagem de tempo dispendida foi
de 18 ± 19 %, enquanto que entre os valores correspondentes a 84 e 80% do
VO2 máx, a percentagem de tempo foi de 8 ± 11 %. Para percentagens
compreendidas entre 79 e 75 % do VO2 máx. os sujeitos passaram 2 ± 4% do
tempo. Com valores inferiores a 75 % do VO2 máx. encontraram-se apenas 1 ±
1% do tempo total da manga.
Fig. 6 - Percentagem do tempo total despendido nas diferentes percentagens do VO2máximo (%VO2máx) durante os 30 minutos da manga de motocross realizada. Os valores representam média ± desvio padrão
1 0 0 081814
57
2
0
1020
30
4050
60
70
8090
100
100-95 94-90 89-85 84-80 79-75 74-70 69-65 64-60 59-55
VO2máx (%)
Tem
po (%
)
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
25
Através da análise da figura 7 verificamos que durante os 30 minutos da manga
de motocross realizada, os pilotos passaram 27 ± 4 minutos a uma intensidade
de exercício superior à FC correspondente ao LANvent determinado
previamente em tapete rolante. Apenas 3 ± 5 minutos da manga foram
realizados a intensidades inferiores à FC correspondente ao LANvent.
3
27
0,0
5,0
10,0
15,0
20,0
25,0
30,0
35,0
Superior LANvent Inferior LANvent
Intensidade de exercício
Tem
po (m
in)
Fig. 7 – Tempo total dispendido (min) acima e abaixo da intensidade de exercício correspondente ao Lan vent durante os 30 minutos da manga de motocross realizada. Os valores representam média ± desvio padrão
5. Discussão 5.1. Discussão da metodologia Participaram inicialmente no presente estudo 12 pilotos. Contudo, devido à
verificação de inúmeros artefactos nos registos da FC de 3 pilotos obtidos
durante a realização da manga de motocross optamos por excluir a sua
análise. De entre os possíveis factores que poderiam ter estado na origem
desta morte amostral destacamos a dificuldade de captação e emissão
adequadas do sinal durante períodos extensos, as quais poderão estar
associadas à vasta quantidade de equipamento utilizada pelos pilotos que se
encontra sobre o emissor.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
26
Para garantir uma amostra representativa da população praticante e
adicionalmente, compreender as exigências funcionais e cardiovasculares
desta modalidade desportiva, seleccionamos uma amostra homogénea
constituída por pilotos motocross de elite.
Tendo em conta a especificidade do esforço físico dos atletas nas diversas
modalidades desportivas, bem como o stress emocional habitualmente
envolvido nas competições de motocross, procedemos no presente estudo à
recolha de dados a partir de uma manga de motocross com a duração de 30
minutos realizada sob condições regulamentares similares às de uma
competição oficial.
Durante a realização da manga de motocross, os pilotos não ingeriram líquidos
para evitar possíveis alterações na relação do volume plasmático. Os valores
médios do peso da amostra determinados antes e após a realização da manga
(71,05 ± 7,5 kg e 70,05 ± 7,6 kg), evidenciaram uma redução de
aproximadamente 1kg (1,4% do peso corporal) num período de apenas 30
minutos. Tem sido sugerido que estas reduções tenham origem em grande
parte na perda de água por sudação e evaporação (Broad et al, 1996; Speedy
et al, 2001). Esta perda, sugere uma redução do volume plasmático com
consequente incremento da viscosidade do sangue. Estas alterações obrigam
o sistema cardiovascular do organismo a uma série de adaptações como: (i)
aumento significativo da FC; (ii) diminuição da pressão sanguínea sistólica e
(iii) aumento da resistência periférica (Davis e Fortney, 1997). Contudo,
McConnell et al (1999), sugerem que a ingestão de água, nas condições
ambientais atrás referidas, durante a realização da manga (30 min.) não teria
um efeito significativo na FC, na temperatura corporal, no volume plasmático e
na performance. Deste modo, o valor médio de 1,4% de perda de peso corporal
por desidratação encontrado no presente estudo, parece não ter influenciado
de forma significativa a performance, dado que os sujeitos em esforços
inferiores a 90 minutos parecem tolerar perdas até 2% do seu peso corporal em
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
27
água sem alterações negativas no seu desempenho físico (Cheuvront et al,
2003; Naghii 2000).
Relativamente à idade, o valor médio dos pilotos constituintes da amostra (28,3
anos) e respectivo desvio padrão (7,9 anos) é relativamente elevado. Uma vez
que se verifica uma diminuição da FC com a idade (Gerstenblith et al, 1987), os
resultados do presente estudo são apresentados em percentagem do seu valor
máximo determinado no laboratório para cada sujeito da amostra. Para efeitos
de análise, este procedimento anula o efeito da idade na FC.
5.2. Discussão dos resultados Do nosso conhecimento, não se encontram disponíveis na literatura, trabalhos
científicos elaborados na área da fisiologia sobre a modalidade do motocross.
Deste modo, o presente estudo parece ser o primeiro que: (i) caracteriza do
ponto de vista morfológico, funcional e cárdio–respiratório, o piloto de
motocross; (ii) analisa a intensidade de exercício de uma manga de motocross.
No presente estudo, o valor da massa gorda estimada (aprox. 15%) parece, em
comparação com atletas de elite de outras modalidades como o futebol,
basquetebol e o kickboxing relativamente elevado (Wittich et al, 2001;
Apostolidis et al, 2004; Figueiredo, 1998). Todavia, este valor médio
encontrado na amostra poderá hipoteticamente resultar da equação de
estimativa escolhida da BODYSTAT que se referiu a indivíduos com um nível
de treino médio/alto. No que concerne ao VO2 máx., o valor médio dos pilotos
de motocross (53,0±7,7 ml/kg/min) é similar aos escaladores de elite (Watts,
2004) e inferior aos valores (aprox.75 ml/kg/min) apresentados pelos
maratonistas (Svedenhag e Sjodin, 1984; Peronnet e Thibault 1987) e ciclistas
profissionais (Hug et al, 2003; Lee et al, 2002).
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
28
A FC foi o indicador fisiológico de referência utilizado no nosso estudo para
caracterizar a intensidade de exercício da manga. O registo dos valores da FC
tem sido um método, igualmente, utilizado por vários autores para avaliar a
intensidade de exercício em diversas modalidades desportivas (Padilla et al,
2000; D’Ottavio e Castagna, 2001; Ali e Farraly, 1991; Bergeron et al, 1991;
Watts et al, 1998; Impellizzeri et al, 2002).
O padrão de FC obtido durante a realização da manga de motocross evidencia
elevadas percentagens da FCmáx (acima de 90%) durante 87% do tempo total
(fig. 4) e de valores percentuais entre 100 e 95 % do VO2 máx. durante 57% do
tempo da manga (fig. 6). Estes resultados parecem sugerir que o motocross é
um desporto caracterizado por uma intensidade de exercício elevada, similar a
desportos de resistência extrema como a corrida de maratona, em que atletas
de elite correm acima de 80 – 90% do seu VO2 máx. (Hagerman, 1992) e ao
ciclismo de estrada, em que a intensidade de exercício em algumas etapas
(contra relógio e subida de montanha) é elevada, próxima dos 90% da potência
máxima aeróbia (Lucia et al, 2001).
Os resultados obtidos no nosso estudo (FC média de 180,7 ± 9,5 bpm) em
comparação com o estudo de Impellizzeri et al (2002), efectuado a atletas
praticantes de B.T.T na vertente cross-country (FC média de 171 ± 6 bpm)
sugerem uma intensidade de esforço ligeiramente superior.
De facto, tal como referido no capítulo de resultados, os pilotos despendem
grande parte dos 30 minutos da manga com FC acima de 90% FCmáx.
Gostaríamos de ressalvar que, embora não tivéssemos determinado as
concentrações de catecolaminas circulantes após a manga competitiva bem
como após o teste máximo em laboratório para a determinação da FCmáx e
VO2máx, alguns trabalhos sugerem uma libertação de adrenalina e
noradrenalina bastante elevados em situação de competição (Schwaberger,
1987; Baron et al, 1992). Este aumento da actividade simpática poderá
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
29
contribuir, conjuntamente com o exercício per se, para uma elevação dos
valores da FC (Stratton et al, 1985; Schwaberger, 1987; Baron et al, 1992).
A caracterização da intensidade de exercício em diferentes modalidades tem
igualmente recorrido ao LANvent como indicador (Padilla et al, 2001; Bergeron et
al, 1991; Impellizzeri et al, 2002). No presente estudo, a FC correspondente ao
LANvent foi utilizada como referência para estimar do ponto de vista metabólico,
a intensidade de exercício do motocross. Deste modo, avaliamos o tempo que
cada piloto passou acima e abaixo do seu LANvent durante os 30 minutos
constituintes da manga de motocross. A análise da figura 7 mostra que os
pilotos passaram grande parte do tempo (27 min.) a uma intensidade de
exercício acima do LANvent e apenas 3minutos abaixo deste indicador
fisiológico. Este dado, reforça a ideia supra referida, que o motocross per se é
uma modalidade com uma intensidade de esforço elevada, ainda que
consideremos a possível influência da elevada contribuição simpática para as
FC observadas.
Embora não tenha sido avaliada a velocidade dos pilotos (tempo por volta ao
circuito de motocross), durante a realização da manga, parece que esta,
diminui com o decorrer da mesma. No entanto, este dado não justifica os
resultados obtidos, uma vez que, para além de ter sido muito tempo acima do
LANvent, os dados da figura 4 relativos à distribuição da FC mostram que a
intensidade de exercício se desenrolou muito acima da FC correspondente a
este indicador. O LANvent ocorreu a aproximadamente 81% da FCmáx. e a FC
da amostra esteve aproximadamente 26 minutos (87% do tempo da manga)
entre os 90 e 100% da FCmáx. De salientar, que o LANvent, FCmáx e o VO2
máx. foram determinados em laboratório num teste de corrida realizado em
tapete rolante, num esforço caracterizado por contracções musculares
dinâmicas enquanto que o esforço realizado pelos pilotos durante a realização
da manga de motocross (absorção das irregularidades do terreno, acelerações
da moto, travagens, mudanças bruscas de direcção, recepções nos saltos,
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
30
estabilização da moto), parece assumir um padrão de actividade com elevado
apelo a uma elevada percentagem de contracções isométricas. Esta diferença
no padrão de actividade, nomeadamente no que diz respeito ao tipo de
contracções musculares realizadas, poderá explicar a elevada FC dos pilotos
durante a realização da manga de motocross, dado que as contracções
isométricas induzem, em comparação com as dinâmicas, diminuição do retorno
venoso e do volume sistólico e consequentemente, aumentos superiores da
pressão arterial e da FC (Lewis et al, 1985; Kilbom et Brundin, 1976).
Os dados mostram que o motocross é uma modalidade que se caracteriza por
uma intensidade de exercício muito elevada. Apesar de se tratar de um
desporto com a duração de aproximadamente 30 minutos, parece fazer um
apelo relativamente elevado à via glicolítica de produção de energia.
6. Conclusão As principais conclusões a retirar deste estudo foram:
1. Os pilotos de motocross, durante a realização da manga utilizam elevadas
percentagens da FCmáx. e do VO2 máx durante grande parte do tempo,
sugerindo a elevada intensidade de exercício reportada pelos sujeitos
praticantes desta modalidade.
2. Apesar da forma cautelosa com que devemos encarar a informação
fornecida pela FC neste tipo de modalidades envolvendo um stress
emocional elevado e uma percentagem igualmente elevada de contracções
isométricas, os resultados mostram que o motocross é uma modalidade
com uma intensidade de exercício desenvolvida acima do LANvent e por isso
de intensidade elevada.
Caracterização da intensidade de exercício na modalidade do motocross
31
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