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A sombra do eclipse Quando tudo se esgotar E a vida for mais leve O vento norte irá soprar Lavando o espaço... De nosso tempo breve. Quando a terra explodir Em mil formas e cores E a morte nos reunir No suculento amargor De mil coroas de flores Mortas... Lembre-se da ampulheta quebrada Pelo olho do furacão Na velha casa, fria e despedaçada O avô lhe sorri na escuridão... Sombras sem fim. Lembre-se do sonho de sua vida Levado em terremoto e tufão Lembre-se das portas fechadas E das duras migalhas de pão Lembre-se do cheiro da chuva E das crianças frias no sertão E do sol por trás da lua Lembre-se da luz negra em curva E de mim... Lembre-se de mim Lembre-se de mim Lembre-se de mim Lembre-se de mim

Capitu Letras 2

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Capitu Letras 2

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Page 1: Capitu Letras 2

A sombra do eclipse

Quando tudo se esgotarE a vida for mais leveO vento norte irá soprarLavando o espaço...De nosso tempo breve.

Quando a terra explodirEm mil formas e coresE a morte nos reunirNo suculento amargor De mil coroas de flores

Mortas...

Lembre-se da ampulheta quebradaPelo olho do furacãoNa velha casa, fria e despedaçada O avô lhe sorri na escuridão...

Sombras sem fim.

Lembre-se do sonho de sua vidaLevado em terremoto e tufãoLembre-se das portas fechadasE das duras migalhas de pãoLembre-se do cheiro da chuvaE das crianças frias no sertãoE do sol por trás da luaLembre-se da luz negra em curva

E de mim...

Lembre-se de mim Lembre-se de mimLembre-se de mimLembre-se de mim

Page 2: Capitu Letras 2

Realidade

A estrada se perdeNas quatro paredes Do outro quartoPartimos sem ver,Que crer ou não crerÉ só mais um fardo.

E a chuva de ácidoBrilha no olhar; Sempre tão esgotadoE o olho caminhaNum céu de concreto Rabugento e rosado

Enquanto o brilho gira Em torno do chãoMonocromático é o tom

Tamanha é a profundeza... E o tom frio do fogoÉ sempre tão mornoÉ sempre tão morno

Mas pode ainda queimar...

A estrada se parteSe perde e se achaE a vista esgotadaPara e relaxaE crê no que vêNo que se encaixa

Estática na rotinaDo céu é a chuvaE a noite cega Nos cai como luvaE derrete o olharAntes da próxima curva

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Esquina de concreto

Sempre quisSoltar estes grilhõesPintar de cinzaOs foliões...Despedaçar o coraçãoCorrendo sempre...Na contra-mão....De Deus.

Agora...Tudo que queroÉ ficar...Longe do chãoSentir arrebentarDesfigurar...Esse meu Não....Coração.

Pois o nau...É naveganteDe mares...Tão arrediosE a brisa...Tão sufocante.Nesse calor...Sempre vazio.

VadioVazioDo ser...

VazioNavegoSem ver...O cais.

O cais...É angustianteE triste...É o navegante...Pois carrega...Verdades...Na mão...

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Ou não?

Sempre quis...Fui navegarNo sertão...E no luar...Ser tão....De Deus.

Mas a contra-mãoÉ na esquinaE haja aspirinaA me enlouquecer

A contra-mão É a verdadeQue cruzaA realidade...De sonhoNo ser....

Ideias: Música inspirada em poesia concretista. Versos soltos, mais recitados do que cantados. Instrumental dando a base para a poesia.

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Som torto

No crepúsculo, o silêncioSol, anelVermelho e densoNo céu rosado A sumir...

Eu me lanço em movimentoNo velho túnelA luz da lua É o firmamentoMe permita ir...

Refletida na represaAo som do nadaMatoA certezaMe fazendo rir..

E então eu me perguntoNo espaço estreitoMudoO que me faz sentir?

O universo é tão abertoNa finitude O incertoE o certoFaz mentir...___________________O certo cegoFaz mentirE a vontade De sumirNo universoMe faz rirPor favor Permita irEu não queroMais sentir...

Ideia: Última estrofe ser tocada no berimbau ao ritmo de capoeira (São Bento Grande).

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Ciclo

Luz…Pra do ventre nascerÁgua…E a raiz vai brotarTempo…Para o caule florescerE na flor do frutoSe esgotar.

Só então…O outono traráO vento…O sopro e o desfolharHá tempo…Pra então esperar.…E do limbo… No chão renascerAguardando o inverno passar

Oh sementeTão primaverilQue no cinza se refazNum feminino tão viril

E no véu…Desse imenso luarMomento…Pra se deixar descolarNo tempo…Quando o astro girar.…E no leste…Amarelado crescerAnunciando o lento despertar

Oh sementeTão primaverilQue no cinza se refazNum feminino tão viril

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Verso de mim

De musgo enrugada Ou: Que verde enrugado!Na mata; a minha cama De mata;/ a minha camaNa clareira da luaUm espírito-chamaClama por mim

É a negra corujaMãe do inversoNo anverso de mim...Em mim...No verde tão fundoO orvalho choraAntes da gélida auroraPintá-lo em amarelo-marfim...Antes da gélida aurora Pintá-lo em amarelo-marfim...________________________Eu sei o que devo fazer:Deixar o riacho correrPra na alma transbordar

Eu sei o que devo fazer:De pedra em pedra baterE me deixar respingar________________________Por fim...Em um grave piarMinh'alma arrefeceA floresta me aquecePara então revoar...

É a negra corujaMãe do universoVerso dentro de mim

Page 8: Capitu Letras 2

Hipnos e Morfeu (Sonho lúcido)

Ah se eu pudesseTer a luz a brilharUma última vez...

Seria como transbordar E de alegria prantearFeito um sonho na lucidez.

E... se eu pudesse Nesse sonho apanharUm pedaço do luar...Pra botar no meu céu.Colorindo o cinza véuDe esperança no ar

Santos...Seriam....Os infernos que cruzeiPara viver o que não viviE me tornar o que me tornei

Page 9: Capitu Letras 2

O nada e seus tons no eco

Mil tons no infinitoEspaço aberto e frioDentro do peito cerrado

Mil tons em uma notaEspaço nu e preguiçosoInsólito, insossoQue não vale nada. ...Nada

Mil tons nesta corPúrpura, corroída e secaQue finge ser dorE não vale nada....Nada

Mil tons na destruiçãoE um eco vazio na vastidãoDo infinito na nota na corDe cor não sei nada.…Nada

Ideia: os versos que contém “Nada” poderiam ser repetidos como um eco por backing vocal.

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O palhaço (Insanidade)

Oh insanidadeQue me aqueceTecendo com fioA nuvem que cresce

Oh insanidadeMe deixe em pazTão jovem é a nuvemQue na morteSe desfaz

Na meia luzQue pouco aqueceO que me adormeceNão me satisfaz

A paz da insanidadeTalvez na realidadeQue de um ecoSe refaz...

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Metal (A song for Ebenezer Scrooge)

Segure-se em mimE então... flutue!Segure-se novamentePois a vida bate forteE você quer sempre maisQuer sempre mais...Pra poder comprarA vida que não temA vida que não tem...Porém...Viver como convémDeveria ser o verdadeiro valorCapaz de aliviar toda sua dor...Tão suja!

Segure-se em mimE então... sintaSegure-se novamenteSinta o frio da MorteEm todos os natais passados...Um porquê em todos os “poréns”Repousa nesse rude clamorPor esse falso vintém Que compra a vida E retira seu calor

Levante-se e olheEstamos todos presosBanidos ao relentoMas talvez ainda há...Talvez ainda há tempoPra se desperdiçar...E comprar mais e maisE fingir ser o que nunca será!Rasgar-se a si mesmo Pra tentar prosperar!Morrer todos os diasE desdenhar da agonia...Que trabalhou para pagar...

Ideias: Introdução progressiva. 1ª estrofe começar recitada e ir ganhando ritmo. 2º estrofe com um instrumental de ambiência mais vazia, inteiramente recitada, com pouca musicalidade. 3ª estrofe parecida com o final da primeira(?). Entre a terceira e a quarta um intervalo instrumental mais longo. 4ª estrofe maior musicalidade no vocal, maior suavidade em alguns trechos.

Page 12: Capitu Letras 2

Ausência

Sem corDe cor (leia-se “de cór”)Em corSou vida...Sofrida...Querida

Na vastidãoDo mar Em mimNo caisA pazDo mar MarfimEnfim...Fui vida

Mas a cor É coração Demais Pra mim. Minha ferida...É vida

E a luz Se foi Pra me fazerSem corE acordarA escuridão Da dor Em mim

Ideias: Música experimental, puxada para um samba, talvez. Com versos curtos, a musicalidade criativa pode se desenvolver bem.

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Em um tom rosa blasé

No centro dessa cidadeNão há estrela que brilheSó a poeira da idadeNo ventre dos animais

Onde a realidade moraOnde o sujo dissolve a breve auroraEm um tom rosa blaséEm um tom rosa blasé

No centro dessa cidadeO enxofre é tão sufocanteE pra mim que nunca a amouA euforia é tão angustiante

Ah se um dia eu pudesseDissolver todo o esplendorE deixar a cidadeDemonstrar algum valor

Eu me apaixonei pela construçãoE não há mais nada em meu coraçãoA não ser fumaçaE cinzasA não ser fumaçaE cinzas

E eu que sempre fui tão bravoMe desmancho com seus cuidadosE quero toda a sua dorSó pra mim

Mas a cidade me diz nãoPorque sua dor é de todosE eu me sinto tão pequenoPerto de todosEu que sempre me senti tão pequenoPerto de todos...

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Som da montanha

Na ponta da montanha Eu me sinto tão sóToda a composiçãoÉ feita como que um dó

Na ponta da montanhaMe sinto perto de DeusUm deus tão distanteBalanço no meu lapso constante

E não há DeusSó a montanhaE não há DeusSó a montanha

Que se perdeu em mimE foi caminharEm um céu peito abertoNa verdade, nunca foi tão certo.

E o verde que era a cor mais belaSe mistura com meu azulTão grandeNesse inverno congelanteDe alma e coração.

Por fim, não há DeusSó a montanhaNão há DeusSó há montanha

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Reencontro

Eu me perdi na dorNa alegria do reencontroMe encontreiE se hoje eu choro é pelo espantoDe saber que nunca te deixarei

MasSe minha alegria pudesse se resumirSeria em Julho seu ápiceE minha tristeza iria se reduzirA lágrimas de pura bondade

Eu te amo como sempre ameiComo sempre ameiE a lua do inverno me faz relembrarA noite fria em que te reencontrei

Conduzido pelas lembranças do teu olharOblíquo mas nunca dissimuladoOblíquo mas nunca desperdiçado

E se os invernos fossem só nossosViveríamos longe da cancela da dorEm um tempo em que nem os nossos ossosSeparariam esse estranho amor.

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TOC

Quando meu olhar vagueiaNa luz de meu próprio olharÉ que a tristeza vem Para incomodar

Nada o desvirtuaNada o desanimaO pensamento vemNa nuvem escura e nua

Da minha mente vaziaQue fica tão cheiaA minha mente vaziaFica tão feia

Lá está ele a se contorcerNa floresta escura do meu próprio ser

Bate na porta do meu subconscienteToctocConfunde e distorce a minha menteToctocE me mata pelo seu/meu bel prazer

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Minha construção

Concreto do sofrimento, é o futuroEscarrado na vastidão do pensamento impuroA vida, a cor em pura decepçãoQue da máquina reconstrói a verdadeira solução

Quando o sofrimento se torna o futuroUm presente tão passadoO dia é reprogramadoQuando o sofrimento se torna o futuro...

Veja e ouça como eu queria serUm pedaço de ferroPra no fogo derreterE não aguardar esse duro despertar

Pois o despertar rebocaO triste de criançaQuebrando a confiançaE a vontade de viver

Minha alma se descolore Em pura decepçãoDesequilibrando o patamar de cordasDestruindo sanidade e coração.

Mas se eu pudesse fazer dessa a minha construçãoMe deixaria cairE desse pesadelo ressurgir Em um manso despertar.

Meu passo seria bêbadoMeu amor seria o últimoMeus filhos seriam pródigosEu seria a lembrança...

E construção.

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Vozes

No escuro em mim encontro vozesQue me dizem aonde quero estarMe lembrando o duro caminharMe relembrando seu duro caminhar...

Átomos a se debaterMe fazem contorcerE querer gritarE querer gritar

Me viro e vejo vultosOutrora homens astutosA se debruçar...Sobre mim

A fé se comoveE não há acordeQue a faça se recompor.E querer sair

E Deus que um dia foi bomMe abandonouMe abandonou

Mas os céus sabem que tenteiPrestar atenção nas vozesDos carrascos atrozesQue vinham me falar

Encaro o escuroE nada mais vejoDesde que o medoEm mim repousouDesde que o medo Em mim repousou...