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BIO-FLEX OBTIDO DA PIRÓLISE DE BIOMASSA COMO COMBUSTÍVEL Juan Miguel Mesa Pérez Roberto Alfonso Viltre Rodríguez Henry Ramón Marín Mesa Bioware Tecnologia, www.bioware.com.br, Campinas-SP, Brasil José Dilcio Rocha Núcleo interdisciplinar de Planejamento Energético – NIPE/UNICAMP e Bioware Tecnologia, www.bioware.com.br, Campinas-SP, Brasil Manuel Raul Peláez Samaniego Planejamento de Sistemas Energéticos, (UNICAMP) e Bioware Tecnologia, www.bioware.com.br , Campinas –SP, Brasil Luís Augusto Barbosa Cortez FEAGRI/UNICAMP, Universidade de Campinas-SP, Brasil Resumo Apresenta-se a experiência da Bioware na produção de bio-combustíveis a partir de resíduos de biomassa. Para isso foi feita a pirólise rápida de uma mistura de palha de cana-de-açúcar e capim elefante em reator de leito fluidizado com capacidade para processar 200 kg/h do material seco (12% umidade). Os produtos resultantes da pirólise desses materiais são: finos de carvão, água ácida e bio-óleo. A Planta de Pirólise Rápida –PPR-200 pertence à Unicamp – Universidade Estadual de Campinas, e é operada pela empresa Bioware. Este trabalho apresenta uma rota química para a obtenção de bio-flex (um tipo de biodiesel obtido por esterificação ácida) a partir dos ácidos carboxílicos gerados durante a pirólise rápida. Mostram-se ainda a composição química do bio-flex assim como o rendimento de produção. O processo de esterificação foi realizado usando etanol e metanol. Os resultados mostraram que quando é usado metanol os rendimentos de produção do bio-flex são maiores quando comparado com etanol. Palavras chave: bio-flex, bio-óleo, biomassa. Abstract This paper describes the BIOWARE experience in the biofuel production from biomass residues. Fast pyrolysis of a mixture of sugar cane trash and elephant grass carried out in a fluidized bed reactor with capacity of 200 kg/h dry feed (12% w/w). The co-products particulated charcoal, acid extract, and bio-oil were obtained. The fast pyrolysis pilot plant PPR-200 belonged to UNICAMP and is operated by BIOWARE personnel. This paper presents the chemical rote to bio-flex production (a kind of biodiesel from acid esterification) from pyrolytic carboxylic acids. Both ethanol and methanol were used as reactant but higher yields were found with methanol. 1. - Introdução Na atualidade, o mundo procura novas fontes de suprimento energético com o objetivo de diminuir a dependência em relação ao petróleo e de reduzir a crescente contaminação ambiental. A demanda mundial por petróleo está superando os 80 milhões de barris por dia (BP..., 2005), para um total de reservas provadas, em nível mundial, de 1.188.000 milhões de barris, segundo informaç ões do BP Global Statistics Review para o ano de 2004 (BP..., 2005). A preocupação aumenta quando analisados os consumos de economias emergentes e muito populosas, como as da China e da Índia, cujas demandas aumentam de maneira vertiginosa. As mudanças climáticas, caracterizadas pelo aquecimento da atmosfera — relatórios mostram o século XX como o mais

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BIO-FLEX OBTIDO DA PIRÓLISE DE BIOMASSA COMO COMBUSTÍVEL

Juan Miguel Mesa Pérez

Roberto Alfonso Viltre Rodríguez

Henry Ramón Marín Mesa Bioware Tecnologia, www.bioware.com.br, Campinas-SP, Brasil

José Dilcio Rocha

Núcleo interdisciplinar de Planejamento Energético – NIPE/UNICAMP e Bioware Tecnologia, www.bioware.com.br, Campinas-SP, Brasil

Manuel Raul Peláez Samaniego

Planejamento de Sistemas Energéticos, (UNICAMP) e Bioware Tecnologia, www.bioware.com.br, Campinas –SP, Brasil

Luís Augusto Barbosa Cortez

FEAGRI/UNICAMP, Universidade de Campinas-SP, Brasil Resumo Apresenta-se a experiência da Bioware na produção de bio-combustíveis a partir de resíduos de biomassa. Para isso foi feita a pirólise rápida de uma mistura de palha de cana-de-açúcar e capim elefante em reator de leito fluidizado com capacidade para processar 200 kg/h do material seco (12% umidade). Os produtos resultantes da pirólise desses materiais são: finos de carvão, água ácida e bio-óleo. A Planta de Pirólise Rápida –PPR-200 pertence à Unicamp – Universidade Estadual de Campinas, e é operada pela empresa Bioware. Este trabalho apresenta uma rota química para a obtenção de bio-flex (um tipo de biodiesel obtido por esterificação ácida) a partir dos ácidos carboxílicos gerados durante a pirólise rápida. Mostram-se ainda a composição química do bio-flex assim como o rendimento de produção. O processo de esterificação foi realizado usando etanol e metanol. Os resultados mostraram que quando é usado metanol os rendimentos de produção do bio-flex são maiores quando comparado com etanol. Palavras chave: bio-flex, bio-óleo, biomassa. Abstract This paper describes the BIOWARE experience in the biofuel production from biomass residues. Fast pyrolysis of a mixture of sugar cane trash and elephant grass carried out in a fluidized bed reactor with capacity of 200 kg/h dry feed (12% w/w). The co-products particulated charcoal, acid extract, and bio-oil were obtained. The fast pyrolysis pilot plant PPR-200 belonged to UNICAMP and is operated by BIOWARE personnel. This paper presents the chemical rote to bio-flex production (a kind of biodiesel from acid esterification) from pyrolytic carboxylic acids. Both ethanol and methanol were used as reactant but higher yields were found with methanol. 1. - Introdução Na atualidade, o mundo procura novas fontes de suprimento energético com o objetivo de diminuir a dependência em relação ao petróleo e de reduzir a crescente contaminação ambiental. A demanda mundial por petróleo está superando os 80 milhões de barris por dia (BP..., 2005), para um total de reservas provadas, em nível mundial, de 1.188.000 milhões de barris, segundo informaç ões do BP Global Statistics Review para o ano de 2004 (BP..., 2005). A preocupação aumenta quando analisados os consumos de economias emergentes e muito populosas, como as da China e da Índia, cujas demandas aumentam de maneira vertiginosa. As mudanças climáticas, caracterizadas pelo aquecimento da atmosfera — relatórios mostram o século XX como o mais

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quente do último milênio (NASA, 2006; FOLHAONLINE, 2006) —, provocado pelas emissões 1 de CO2, que aumentam de 1,5 a 2% por ano (BP..., 2005), são outro argumento que evidencia a necessidade de se mudarem os hábitos de consumo das populações grandemente dependentes do petróleo e/ou de se buscarem combustíveis substitutos do petróleo que derivem, em grande parte, de fontes renováveis. O interesse dos Estados no uso dessas “novas fontes de energia” é crescente. Assim, o investimento mundial em energia renovável alcançou um novo recorde de US$ 30 bilhões em 2004, de acordo com um informe apresentado pela Energy Policy Network referente ao século XXI (REN21..., 2006). Nesse informe, destacam se no mercado energético das fontes renováveis países como Brasil, China, Dinamarca. Alemanha, Índia, Japão, Espanha e Estados Unidos. Entre essas fontes de energia destaca-se a biomassa, a partir da qual é possível produzir combustíveis líquidos, sólidos e gasosos, além de insumos químicos de alto valor agregado, mediante processos termoquímicos como a gaseificação, a combustão, a pirólise, etc. Porém, o uso desses combustíveis precisa adequar-se para sua utilização nas máquinas e equipamentos térmicos que atualmente operam com combustíveis fósseis. Por outro lado, a otimização econômica dos processos e tecnologias de transformação da biomassa em combustíveis e insumos é um problema ainda não resolvido. Como uma alternativa ao anteriormente exposto, neste trabalho, apresenta se o processo de obtenção do bio-flex (Combustível similar ao biodiesel obtido através do processo de esterificação de Ficher), obtido a partir do bio-óleo e água acida produzido na planta de pirólise rápida PPR-200 de propriedade da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), operada pela Bioware. O bio-flex apresenta características físicas similares às do álcool, porém com maior poder calórico, podendo representar de 30 a 60 % em relação à biomassa seca alimentada ao reator. O método de produção de bio-flex foi desenvolvido nos laboratórios da Bioware. 2. - Produção de bio-óleo na planta de pirólise rápida PPR-200 O bio-óleo é obtido na planta de pirólise rápida da Unicamp. A instalação experimental em escala piloto está baseada na tecnologia de leito fluidizado e utiliza ar como agente de fluidização. Os principais componentes da planta são: sistema de alimentação de biomassa composto por esteira transportadora (1); silo (2); dosador de biomassa (3); rosca alimentadora (4); reator de leito fluidizado (5) com placa distribuidora de ar (6); dois ciclones em série para separar os finos de carvão (7); válvulas amostradoras de carvão (8) com tambores para armazenar o carvão (9); sistema de recuperação de finos de carvão via úmida (10); sistema de recuperação de bio-óleo (11) e chaminé (12) (Figura 1). O reator é cilíndrico, construído em aço carbono, possui diâmetro interno de 417 mm e é revestido internamente com isolamento térmico refratário. Sua capacidade nominal de alimentação é de 200 kg.h-1 de biomassa polidispersa seca e utiliza um leito de material inerte durante sua operação. O sistema de aquisição de dados registra e armazena a temperatura por meio de termopares (14 pontos) ao longo da altura do reator e na saída dos sistemas de recuperação. O monitoramento dos dados inclui a retirada de uma amostra de carvão vegetal na seção abaixo do ciclone, por meio de válvulas amostradoras; de bio-óleo no sistema centrífugo de recuperação e de água ácida no reservatório do sistema de recuperação de líquidos.

1 Aproximadamente 25% das emissões de CO2 para a atmosfera são provocados pelo setor de transportes.

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Figura 1. Esquema da planta de pirólise rápida PPR-200.

Nas Figuras 2a) e 2b) se mostra uma vista geral da planta PPR-200

Figura 2: a) Vista geral da planta PPR-200. b) Planta PPR-200 em operação.

O reator é inicialmente aquecido, utilizando-se finos de carvão vegetal provenientes do processo de carbonização da lenha de eucalipto, processo que continua até que o leito de areia sílica atinja uma temperatura média entre 550oC e 600oC. Nessas condições, e encontrando-se a vazão mássica de ar no valor estabelecido, alimenta-se a biomassa. Para realizar a coleta das amostras de carvão vegetal, bio-óleo e água ácida, espera-se que a distribuição de temperaturas ao longo da altura do reator seja aquela correspondente às condições de regime estacionário. O bio-óleo é o principal produto da pirólise rápida e pode atingir valores de até 75% em peso da biomassa inicial seca (BRIDGWATER; PEACOCKE, 2000; SZERNICK; BRIDGWATER, 2004), o que desperta interesse, em razão de seu potencial para substituir combustíveis derivados do petróleo e produtos químicos empregados na agroindústria e na indústria química.

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Na Tabela 1, expõem-se as principais características físicas e químicas do bio-óleo obtido da biomassa, do diesel e do óleo combustível pesado. Tabela 1. Comparação das propriedades do bio-óleo pirolítico com as propriedades do diesel e do

óleo pesado.

Propriedades Unidades Bio-óleo Diesel Óleo combustível pesado

Densidade kg/m3 a 150C 1220 854 963 % C 48.5 86.3 86.1 % H 6.4 12.8 11.8 % O 42.5 - -

Composição típica

% S - 0.9 2.1 Viscosidade cSt a 500C 13 2.5 3.51 Flash point 0C 66 70 100 Pour point 0C -27 -20 21 Cinza % peso 0.13 <0.01 0.03 Água % peso 20.5 0.1 0.1 PCI MJ/kg 17.5 42.9 40.7 Acidez pH 3 - -

Fonte: BRIDGWATER; CZERNICK; PIRKORZ, 2001. Pode-se constatar que o Poder Calorífico Inferior do bio-óleo é aproximadamente a metade quando comparado com o diesel e o óleo combustível pesado. Por outro lado o bio-óleo não apresenta enxofre, elemento responsável pelas chuvas ácidas. Outros produtos do processo de pirólise são: Carvão - Quando a pirólise é otimizada para a produção de carvão, é possível obter 30% ou mais desse produto, o que ocorre na pirólise lenta, na qual a reação pode levar horas ou mesmo dias. O carvão vegetal em pó tem uso na agricultura, na pelotização de minério de ferro e em processos de combustão (BRIDGWATER; CZERNICK; PIRKORZ, 2001). Gases - Os gases obtidos na pirólise são combustíveis com Valor Calorífico Inferior entre 4 e 8 MJ/Nm3, e que têm um alto nível de hidrocarbonetos, em particular o metano e outros hidrocarbonetos saturados e não-saturados. Esses gases podem ser usados para secagem, aquecimento ou geração de energia com o emprego de turbinas de gás (BRIDGWATER; CZERNICK; PIRKORZ, 2001). Na Tabela 2 observa-se a composição do bio-óleo em famílias químicas, onde até um 20% em massa do bio-óleo tem potencial para ser transformado em bio-flex (porcentagem dos ácidos carboxílicos), valor que se acrescenta com outros compostos diferentes aos ácidos que estão presentes no bio-óleo e vão formar parte do bio-flex.

Tabela 2. Composição do bio-óleo em termos de Famílias Químicas mais importantes. Família Química % em massa

Água 15-30 “Lignina pirolítica” Como insolúvel em água 15-30 Aldehidos (formaldeido, acetaldeido, hidroyacetaldeido, glioxal,

metilglioxal) 10-20

Ácidos carboxílicos Fórmico, acético, propionic, butiric, pentanoic, hexanoic, glicolic (hidroxy acetic)

10-20

Carbohidratos Cellobiosan, α-D-levoglucosan, oligosacarides, 1.6 anidroglucofuranose

5-10

Fenóis Fenol, cresol, guaiacol, syringol. 2-5 Furfurais 1-4 Álcoois Metanol, etanol. 2-5 Ketonas Acetol (1-hydroxy-2-propano), cyclo pentanone. 1-5

Fonte: BRIDGWATER; CZERNICK; PIRKORZ, 2001

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No contexto do uso do bio-óleo ou seus derivados, a tecnologia desenvolvida pela Bioware para a produção de bio-flex resulta uma novidade, pois permite a separação de frações úteis para a combustão. 3. - Obtenção do bio-flex mediante processo Bioware. Para que uma substância seja denominada “combustível”, precisa apresentar uma série de propriedades que permitam seu uso como tal. No caso do bio-óleo bruto obtido com a pirólise, valores de propriedades críticas como: Poder Calorífico, viscosidade, estabilidade no tempo, pH, etc., ainda são muito diferentes quando comparadas com as que apresentam os derivados de petróleo (GARCIA-PEREZ; LAPASS; ROY, 2004), segundo dados mostrados na Tabela 1. Por esse motivo, a grande quantidade de oxigênio e a presença de altas porcentagens de polímeros pesados, entre outros fatores, devem ser controladas com a finalidade de produzir um combustível compatível com os derivados de petróleo. Essa operação é conhecida como melhoramento do bio-óleo. Com relação aos processos aplicáveis ao melhoramento dos bio-óleos, têm sido elaboradas algumas propostas, associadas, em sua maioria, ao fracionamento com métodos similares aos usados para a destilação e o fracionamento do petróleo. Outra opção é o tratamento do bio-óleo nas chamadas bio-refinarias, algo similar a o que acontece com o processamento do bio-óleo obtido dos vegetais oleaginosos, exemplos de bio-refinarias para processar bio-óleos pirolíticos são a NREL e a Red Arrow, citadas por T. Bridgwater (2005). Existe também a possibilidade de uso direto do bio-óleo, opção que, entretanto, ainda oferece muitos desafios (GARCIA-PEREZ; LAPASS; ROY, 2004). A bio-refinaria integra os processos de conversão da biomassa com processos de melhoramento de seus derivados para a obtenção de combustíveis, potência e insumos químicos. O conceito de bio-refinaria não é novo, mas o reconhecimento de seu potencial estratégico e econômico é recente. Nesse aspecto, as bio-refinarias industriais têm sido consideradas o caminho mais promissor para a criação de novas indústrias baseadas na biomassa. As vantagens que apresentam essas novas tecnologias estão relacionadas com a menor dependência do petróleo, a possibilidade de instalação das indústrias em lugares diferentes, a criação de empregos nas áreas rurais, a preservação do meio ambiente, etc. Um exemplo de estudo das inovações no campo do melhoramento dos bio-óleos via bio-refinarias e outros processos é o de Mesa-Pérez (2004). A tecnologia desenvolvida pela Bioware para o melhoramento do bio-óleo consiste na separação dos ácidos carboxílicos de baixo peso molecular contidos no bio-óleo da pirólise para a obtenção de um combustível liquido similar ao etanol, mediante a esterificação de Ficher em meio ácido desses ácidos carboxílicos. O método de separação das frações dos ácidos carboxílicos, assim como o processo de esterificação para a obtenção de bio-flex é apresentado na Figura 3. Uma determinada massa de bio-óleo faz-se reagir em solução de bicarbonato de sódio num reator de aço inoxidável de 5 litros de capacidade com agitação constante. À medida que a reação transcorre, acontece a liberação de gases, fato que provoca aumento do volume total da mistura. Os critérios de dissolução total da fase solúvel do bio-óleo são o desaparecimento das bolhas de gás da fase líquida e a mudança de seu pH até um valor maior que 7. A fase líquida (fração ácida) se separa por decantação, mediante a adição de ácido clorídrico ou sulfúrico, até que se alcance pH = 2. Na neutralização, observam-se a liberação de gases e uma mudança na coloração da solução, de negra para amarela. A fração de elevada acidez do bio-óleo mistura-se com a mesma quantidade de álcool (etanol ou metanol), reflui por duas horas e, depois, é destilada, obtendo-se então três frações: biocombustíveis, mistura biocombustível—água, além de outros compostos e resíduos da destilação.

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Bio-óleo

NaHCO3 5%

Bio-óleo dezoito

Bio-óleo não

reagente

HCl (conc)

Fração de Acidez alta

Etanol

Refluxo, Destilação

Resíduo de Destilação

Outros Compostos

Mistura Bio-combustível-Água

Bio-combustível

Figura 3. Preparação de biocombustíveis mediante a esterificação da fração de alta acidez do bio-

óleo e da água ácida com etanol. Na Tabela 3 se apresenta a composição química dos ésteres componentes do bio-flex assim como a massa equivalente. O balance de massa apresentado foi realizado tomando como base a esterificação de 1 tonelada de bio-óleo. Pode-se verificar que a massa total de ésteres (298,65 kg) representa aproximadamente um 30% em massa de bio-óleo. Tabela 3. Balanço de massa dos ésteres componentes do bio-flex após a esterificação dos ácidos

carboxílicos de 1 tonelada de bio-óleo. No ÉSTERES RENDIMENTOA (kg)

1 4-Pentenoic acid, ethyl ester 4.86 2 2-Butenoic acid, 2-methyl- ethyl ester 8.86 3 2-Pentenoic acid, ethyl ester 21.15 4 Benzoic acid, ethyl ester 5.60 5 Octanoic acid, ethyl ester 9.30 6 Benzoic acid, 4-methyl- ethyl ester 8.52 7 Benzoic acid, 4-hidroxy- ethyl ester 6.27 8 Hydrocinnamic acid, 4-hidroxy- ethyl ester 19.80 9 Hexadecanioc acid, ethyl ester 23.66 10 Octadecanoic acid, ethyl ester 8.53 11 Butanoic acid, ethyl ester 1.02 12 Acetic acid, ethyl ester 97.85 13 Formic acid, ethyl ester 83.23 Total 298,65

A. Rendimento em uma tonelada de bio-óleo. Bio-combustíveis: Esterificação com etanol e metanol. Na Tabela 4 se mostra os produtos obtidos da reação de esterificação em meio ácido entre uma fração ácida do bio-óleo e etanol.

Tabela 4 Rendimento dos produtos depois da reação de esterificação com etanol. No PRODUCTOS TEMP. ( 0C ) % RENDIMENTO MASA BIO-OLEO (g) 1 Bio-combustível 77-85 25,32 16,96 2 Bio-combustível-água 90-100 3,44 2,29 3 Outros compostos 105-110 15,86 10,62 4 Resíduo de destilação - 55,38 37,13

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Da analise se obtêm informação da temperatura de cada destilado, rendimento dos produtos com respeito a mistura de reação e a massa de bio-óleo reativa correspondente a cada produto formado. O bio-combustível destila entre 77-85 0C, a mistura de água-combustível entre 90-100 0C e outros compostos de interesse entre 105-110 0C. Os rendimentos são de 25,32 % para o bio-combustível, 3.44 % para a mistura água-combustível, 15,86 % para outros compostos e 55,38 % para os resíduos. Por outra parte, a massa de bio-óleo reativo formadora do bio-combustível é de 16,96 g, para a mistura água-combustível é de 2,29 g, outros compostos são de 10.62 g e a massa no resíduo da destilação foi de 37,10 g. Um experimento similar se realizou com a mesma fração do bio-óleo, mas usando metanol na reação de esterificação. Os resultados se mostram na Tabela 5.

Tabela 5 Rendimento dos produtos depois da reação de esterificação com metanol. No PRODUCTOS TEMP. ( 0C ) % RENDIMENTO MASA BIO-OLEO (g) 1 Bio-combustível 58-90 32,06 21,48 2 Bio-combustível-água 90-100 4,72 3,17 3 Outros compostos 100-110 13,30 8,91 4 Resíduo de destilação - 49,92 33,44

Observando os resultados da Tabela 5 e comparando-os com os da Tabela 4, pode-se concluir que o uso do metanol na reação de esterificação incrementa ligeiramente os rendimentos dos produtos obtidos. Na Tabela 6 reportam-se algumas propriedades físicas do bio-óleo e das formulações dos bio-combustíveis obtidas com etanol e metanol.

Tabela 6 Propiedades físicas do bio-oleo e dos bio-combustibeis.

4. - Conclusões O uso do metanol na reação de esterificação incrementa ligeiramente os rendimentos dos produtos obtidos. Comparando algumas propriedades físicas do bio-óleo com os bio-combustíveis formulados, observa-se que sua massa específica é maior. Isso faz do bio-óleo um combustível mais pesado que o obtido dessa fração de alta acidez. A relação de viscosidades tem um efeito significativo, já que o bio-óleo é 2000 vezes mais viscoso que as formulações realizadas de sua fração de alta acidez. Comparando as propriedades físicas do bio-óleo e dos bio-combustiveis com as composições estruturais, pode se concluir que o bio-óleo BIOWARE (uma mistura complexa de compostos oxigenados de ácidos carboxílicos, fenóis, cetonas, aldeídos, derivados do furano e hidrocarbonetos alifáticos de baixa e alta massa molar) é um líquido muito instável com tendência a mudar suas propriedades físicas e com a possibilidade de experimentar reações de polimerização, eterificação e esterificação. No caso dos bio-combustíveis, termodinamicamente sua reação com álcool (etanol, metanol) é muito favorável, reduz a acidez, a corrosão, o flash point e aumentam o poder calórico. Isto faz que suas propriedades combustíveis sejam melhor que as do bio-óleo.

Amostra Massa especifica (g/mL) Viscosidade (cSt) Bio-oleo BIOWARE (A) 1.4100 ~ 2000 Bio-combustible com etanol (B) 0.8669 ± 0.0004 1.668 ± 0.0004 Bio-combustible com metanol (C) 0.8826 ± 0.0004 1.152 ± 0.0004

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