Antonio Carlos Croner de Abreu - A Redução Da Maioridade Penal

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  • INSTITUTO BRASILIENSE DE DIREITO PBLICO

    Curso de Ps-Graduao Lato Sensu em Direito Penal e Direito Processual Penal

    A REDUO DA MAIORIDADE PENAL

    ANTONIO CARLOS CRONER DE ABREU

    Braslia/DF 2011

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    ANTONIO CARLOS CRONER DE ABREU

    A REDUO DA MAIORIDADE PENAL Monografia apresentada como

    requisito parcial obteno do ttulo de

    Especialista em Direito Penal e Direito

    Processual Penal, no Curso de Ps-

    Graduao Lato Sensu (*) do Instituto

    Brasiliense de Direito Pblico IDP

    Orientador: Prof.

    Braslia/DF 2011

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    Para minha esposa Patrcia que tanto se sacrificou com minha ausncia, aos meus filhos Caio, Cau e Maria Eduarda para quem trabalho todos os dias e a todos aqueles que direta ou indiretamente contriburam para essa conquista.

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    ANTONIO CARLOS CRONER DE ABREU

    A REDUO DA MAIORIDADE PENAL Monografia apresentada como requisito

    parcial obteno do ttulo de

    Especialista em Direito Penal, e Direito

    Processual Penal, no Curso de Ps-

    Graduao Lato Sensu do Instituto

    Brasiliense de Direito Pblico IDP.

    Aprovado pelos membros da banca examinadora em __/__/__, com

    meno__(_________________________).

    Banca Examinadora:

    Presidente: Prof.

    Integrante: Prof.

    Integrante: Prof.

    ________________________________

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    RESUMO No presente trabalho o autor visa discutir a possibilidade ou no de reduo da maioridade penal, foco de grandes polmicas no mundo jurdico e social, posto que o nmero crescente de crimes que aterrorizam a sociedade so praticados por menores de 18 (dezoito) anos, considerados penalmente inimputveis. Primeiramente se faz um breve estudo acerca da evoluo histrica da legislao brasileira no tocante maioridade penal. Em seguida, analisa-se a imputabilidade e seus aspectos constitucionais e penais, bem como os obstculos inerentes a possibilidade de alterao do texto constitucional. Neste contexto, o tema estudado diante da lei especial de proteo ao menor, qual seja, o Estatuto da Criana e do Adolescente, principalmente as medidas scioeducativas. Posteriormente, so apresentados os argumentos favorveis e desfavorveis reduo da maioridade penal. PALAVRAS - CHAVE: imputabilidade, reduo da maioridade penal, princpios constitucionais, medidasscio-educativas.

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    ABSTRACT

    In the present work the author aims to argue the possibility or not of the reduction of the criminal majority, which is the focus of great controversies in the legal and social world, as the increasing number of crimes that frighten the society are practised by the minors of eighteen years, consedired criminally imputable. First, a briefing study concerning the historical evolution of the Brazilian legislation in regarding to the criminal majority is done. After that, the criminal imputability and its aspects constitutional and legal, as well as the inherent obstacles of the possibility of alteration of the constitutional text are analysed. In this context, the subject is studied a head of the special law of protection of the minor, which is, the Statute of the Child and the Adolescent, mainly the social and educative measures. Later, the favorable and unfavorable arguments to the reduction of the criminal majority and the international legislation are presented. KEY-WORDS: imputability, reduction of the criminal majority, principles constitutional, measured partner-educative.

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    SUMRIO

    1. EVOLUO HISTRICA DA LEGISLAO BRASILEIRA COM RELAO

    MAIORIDADE PENAL ............................................................................................................ 9

    2. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS E PENAIS SOBRE A IMPUTABILIDADE

    PENAL ..................................................................................................................................... 14

    2.1. Aspectos constitucionais ................................................................................................... 14

    2.2. Do artigo 27 do Cdigo Penal ........................................................................................... 17

    3. DO ESTATUTO DA CRIANA E DO ADOLESCENTE (LEI 8.069/1990) .................... 19

    3.1 Do ato infracional ............................................................................................................... 21

    3.2 Das medidas de proteo .................................................................................................... 22

    3.3 Das medidas scio-educativas ............................................................................................ 24

    3.3.1 Da advertncia ................................................................................................................. 25

    3.3.2 Da obrigao de reparar o dano ....................................................................................... 26

    3.3.3 Da prestao de servios comunidade .......................................................................... 27

    3.3.4 Da liberdade assistida ...................................................................................................... 28

    3.3.5 Do regime de semiliberdade ............................................................................................ 29

    3.3.6 Da internao ................................................................................................................... 30

    3.4 Da remisso ........................................................................................................................ 31

    4. POSICIONAMENTOS FAVORVEIS E DESFAVORVEIS REDUO DA

    MAIORIDADE PENAL .......................................................................................................... 35

    5 COMPARATIVO DA MAIORIDADE PENAL COM OUTROS PASES. ..................... 41

    CONCLUSO .......................................................................................................................... 43

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ..................................................................................... 47

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    INTRODUO

    O Dicionrio de lngua portuguesa Aurlio define a maioridade

    como a idade em que o indivduo entra no pleno gozo de seus direitos civis, e

    maioridade penal como condio de maioridade para efeitos criminais. A

    maioridade penal tambm significa imputabilidade penal, ou seja, idade a partir

    da qual uma pessoa j considerada imputavel pelos seus atos penais.

    Vrios so os critrios utilizados historicamente pelo Brasil e por

    outros pases para determinar a maoridade penal, biolgico, biopsicolgico,

    etrio simples, etc..

    A legislao ptria utilizou o critrio etrio ou sistema biolgico,

    em que considerado to-somente a idade do agente, independentemente da

    sua capacidade psquica, para determinar que a maioridade penal se d aos 18

    (dezoito) anos de idade. Essa norma encontra-se insculpida em trs Diplomas

    Legais do nosso ordenamento: artigo 27 do Cdigo Penal; artigo 104 do

    Estatuto da Criana e do Adolescente; e artigo 228 da Constituio Federal.

    Entretanto, o este critrio tem provocado diversas discusses sobre sua

    eficcia ou no.

    O fato que nos dias atuais, tem ocorrido aumento da

    criminalidade, com crescente participao de menores sendo que algumas

    infraes penais so gravssimas, at os crimes mais hediondos so praticados

    ultimamente por esses menores, o que voltou a agitar o mundo jurdico e

    social, trazendo tona a discusso acerca da questo da reduo da

    maioridade penal.

    No se pode considerar que o jovem deste novo milnio ainda

    aquele ingnuo de meados do sculo XX. A sociedade, como um todo se

    transformou em razo da ordem poltica, tecnocientfica, social e econmica.

    Com o advento, principalmente da internet, o acesso informao quase

    compulsivo. Novas tecnologias fazem parte do dia-a-dia das pessoas, inclusive

    dos jovens, como telefone celular, rdio, televiso, etc. Com tantos meios de

    comunicao se torna impossvel manter-se alheio aos acontecimentos. No

  • 8

    h espao para a ingenuidade, de forma geral, e com maior razo no que

    concerne aos adolescentes que so os que esto mais afetos a essas

    inovaes.

    No obstante, a Constituio Federal de 1988 expressamente em

    seu artigo 228, prev, entre os vrios direitos e garantias especficos das

    crianas e dos adolescentes, a regra de que so penalmente inimputveis os

    menores de dezoito anos, ficando sujeitos s normas da legislao especial.

    Igualmente estabelece o artigo 104 do Estatuto da Criana e do Adolescente,

    determinando que os menores de dezoito anos ficam sujeitos s medidas

    previstas nesta Lei.

    Focado nesta viso, o que se discute no presente trabalho, se

    seria conveniente a reduo da maioridade penal e se isso resolveria o

    problema da violncia. Ademais, o que causa grande divergncia tambm, se

    seria possvel eventual Emenda Constitucional ao artigo 228 da Constituio

    Federal, uma vez que de acordo com o artigo 5, 2, trata-se de direito

    individual que imune mudana por Emenda nos termos do artigo 60, 4,

    inciso IV.

    Assim, este estudo discutir a necessidade ou no de reduo da

    maioridade penal, bem como a imputabilidade comparada s garantias

    individuais previstas na Constituio Federal e ao Estatuto da Criana e do

    Adolescente.

    A opo para a realizao desta pesquisa foi pela pesquisa

    bibliogrfica em doutrinas e legislaes e na internet pertinentes temtica

    abordada.

  • 9

    1. EVOLUO HISTRICA DA LEGISLAO

    BRASILEIRA COM RELAO MAIORIDADE PENAL

    Historicamente, no que concerne a maioridade penal, nossa

    legislao no adotou o limite de 18 (dezoito) anos para a imputabilidade penal

    e nem o critrio puramente biolgico para determin-la.

    Quando a corte de Portugal aportou no Brasil, a primeira norma

    que tratava da imputabilidade penal determinou que a imputao iniciava-se

    aos sete anos, eximindo-se o menor da pena de morte e concedendo-lhe

    reduo da pena. Entre dezessete e vinte e um anos havia um sistema de

    jovem adulto, o qual poderia ser at mesmo condenado morte, ou,

    dependendo de certas circunstncias, ter sua pena diminuda. A imputabilidade

    penal plena ficava para os maiores de vinte e um anos, a quem se cominava,

    inclusive, a pena de morte em certos delitos.

    Em 1830 surgiu primeiro Cdigo Penal brasileiro, o chamado

    Cdigo Criminal do Imprio. Tal diploma adotou o sistema do discernimento,

    determinando a maioridade penal absoluta a partir dos 14 (quatorze) anos de

    idade, salvo se o menor tivesse atuado com discernimento, devendo, ento,

    ser recolhido s casas de correo, pelo tempo determinado pelo juiz, contanto

    que o recolhimento no excedesse a idade de dezessete anos. Por este

    critrio, o discernimento poderia ser aplicado at mesmo em uma criana de

    oito anos e um adolescente de quinze anos poderia ser condenado priso

    perptua.

    Com a proclamao da Repblica, em 1889, o Cdigo Penal do

    Imprio deu lugar ao Cdigo Penal dos Estados Unidos do Brasil, Decreto n.

    847, de 11 de outubro de 1890.

    A imputabilidade penal que no incio do sculo se dava aos sete

    anos, e pelo Cdigo Penal do Imprio de 1830 passou para um critrio

    biopsicolgico baseado no discernimento entre sete e quatorze anos, evoluiu

    no Cdigo Republicano de 1890: Irresponsvel penalmente seria o menor com

    idade at nove anos (art. 27, 1).

  • 10

    A imputabilidade plena, com carter objetivo, permanecia como

    no Cdigo do Imprio, fixada em quatorze anos (art. 30).

    O Cdigo Penal de 1890, adotou o critrio biopsicolgico fundado

    na idia do discernimento, o maior de nove anos e menor de quatorze anos

    seria submetido avaliao do magistrado (art. 27, 2) sobre a sua aptido

    para distinguir o bem do mal, o reconhecimento de possuir ele relativa lucidez

    para orientar-se em face das alternativas do justo e do injusto, da moralidade e

    da imoralidade, do lcito e do ilcito.

    Ao final do sculo XIX [...], a imputabilidade penal era alcanada

    aos quatorze anos, podendo retroagir aos nove anos, de acordo com o

    discernimento do infrator (SARAIVA, 2003, p.29).

    Paralelamente se construiu a Doutrina do Direito do Menor,

    fundada no binmio carncia/delinqncia. No mais se confundiam adultos

    com crianas, desta nova concepo resulta um outro mal: a conseqente

    criminalizao da pobreza, tratando de forma preconceituosa os mais pobres.

    Entre 1921 e 1927, importantes inovaes legislativas foram

    introduzidas na ordem jurdica brasileira.

    A Lei 4.242, de 5 de janeiro de 1921, abandona o sistema

    biopsicolgico vigente desde o Cdigo Penal da Repblica, em 1890, e afirma,

    em seu artigo 3, 16, a excluso de qualquer processo penal de menores

    que no tivessem completado quatorze anos de idade. Passava, ento a

    adotar um critrio objetivo de imputabilidade penal, fixando-a em quatorze

    anos.

    Contemporaneamente a isso, o Decreto n. 16.272, de 20 de

    dezembro de 1923, criava as primeiras normas de Assistncia Social visando a

    proteger os menores abandonados e delinqentes.

    Em seguida, com o Decreto 17.943-A, de 12 de outubro de 1927,

    estabelecia-se o Cdigo de Menores (Cdigo Mello Mattos), definindo que com

    idade maior de 14 anos e inferior a 18 anos, submeter-se-ia o menor

    abandonado ou delinqente ao regime estabelecido neste Cdigo, explicitando

    situaes de incidncia da norma, que cinqenta anos depois seriam

    praticamente reproduzidas no artigo 2 do Cdigo de Menores de 1979.

  • 11

    Trs projetos para um Novo Cdigo Penal Brasileiro se

    destacaram em substituio Consolidao das Leis Penais de 1922, que

    apenas reformara o Cdigo Penal de 1890.

    Pelo projeto de Galdino Siqueira, artigo 13, I, a imputabilidade

    penal era fixada aos 14 (quatorze) anos, retomando a idia do Cdigo Penal de

    1890. No projeto S Pereira, em seu artigo 20, a idade era fixada em 16 anos;

    enquanto a Proposta de Alcntara Machado, que acabou prevalecendo neste

    aspecto quando do advento do Cdigo Penal de 1940, a imputabilidade penal

    era fixada aos 18 (dezoito) anos (art. 16, n1).

    Na linha do direito de carter tutelar vigente, o tema da

    responsabilidade juvenil no Cdigo Penal de 1940 fundou-se na condio de

    imaturidade do menor.

    expressa a exposio de motivos do Cdigo Penal de 1940 ao

    afirmar que No cuida o projeto dos imaturos (menores de 18 anos) seno

    para declar-los inteira e irrestritamente fora do direito penal (art. 23), sujeitos

    apenas pedagogia corretiva da legislao especial.

    A legislao especial a que alude mantinha como objeto de sua

    atuao, sem distino, os delinqentes e os abandonados.

    No governo de Getlio Vargas, para atendimento desta clientela,

    em 1942, foi criado o SAM Servio de Assistncia aos Menores. Tratava-se o

    SAM, segundo Costa (1991) apud Saraiva (2003, p. 38), de um rgo de

    Ministrio da Justia que funcionava como um equivalente do Sistema

    Penitencirio para a populao menor de idade.

    A idia de irresponsabilidade absoluta do menor (que at hoje

    confunde a muitos, mesmo com a vigncia do ECA- Estatuto da Criana e do

    Adolescente- Lei 8069/90), resulta da cultura tutelar, fundamento da Doutrina

    da Situao Irregular.

    A Doutrina da Situao Irregular foi a ideologia inspiradora do

    Cdigo de Menores, Lei 6.697, de 10.10.1979.

    Esta Doutrina pode ser sucintamente definida como sendo aquela

    em que os menores passam a ser objeto da norma quando se encontrarem em

    estado de patologia social.

  • 12

    A declarao de situao irregular tanto poderia derivar de sua

    conduta pessoal (caso de infraes por ele praticadas ou de desvio de

    conduta), como da famlia (maus-tratos) ou da prpria sociedade (abandono).

    Haveria uma situao irregular, uma molstia social, sem

    distinguir, com clareza, situaes decorrentes da conduta do jovem ou

    daqueles que o cercam.

    Do ponto de vista do Direito Penal, at a efetivao da reforma de

    1984, que deu nova redao Parte Geral do Cdigo Penal, houve diversas

    tentativas de alterao da legislao penal brasileira.

    No chamado Projeto Hungria, de 1963, era mantida a idade de

    imputabilidade penal aos dezoito anos, facultando, porm, a possibilidade de

    submisso dos jovens a partir dos dezesseis anos legislao penal quando

    comprovada maturidade. Retomaria o pas, nesta proposta, o sistema

    biopsicolgico, abandonado em 1940.

    Em 1969, pelo Decreto-Lei 1.004, de 21.10.1969, foi proposto um

    Novo Cdigo Penal brasileiro. Esta Lei de 1969, que nunca vigorou, adotando a

    proposta de Hungria incorporava o sistema biopsicolgico, eis que o menor

    entre dezesseis e dezoito anos responderia criminalmente pelo fato praticado

    se apresentasse suficiente desenvolvimento psquico para entender o carter

    ilcito do fato e determinar-se de acordo com este entendimento. Neste caso, a

    pena aplicvel diminuda de um tero at a metade, consoante o disposto na

    exposio de motivos.

    A Exposio de Motivos da Lei 7.209/84 afirma que a

    imputabilidade penal aos dezoito anos fixada por um critrio de poltica

    criminal. Entretanto, durante o Regime Militar, por conta do Cdigo Penal

    Militar- Decreto-Lei n 1.001, de 21.10.1969, a imputabilidade penal, frente a

    crimes militares, foi fixada, excepcionalmente, em dezesseis anos (art. 50).

    Este dispositivo do texto somente veio a ser revogado, por inconstitucional,

    frente ao artigo 228, pela Constituio Federal de 1988.

    A reforma penal de 1984, atravs da Lei 7.209, de 11.07.1984,

    deu nova redao Parte Geral do Cdigo Penal, introduzindo importantes

    alteraes no direito penal brasileiro. Manteve, em seu artigo 27, a

    imputabilidade penal aos dezoito anos.

  • 13

    A Constituio Federal de 1988, antecipando-se Conveno das

    Naes Unidas do Direito da Criana, incorporou ao ordenamento jurdico

    nacional, em sede de norma constitucional, os princpios fundantes da Doutrina

    da Proteo Integral, expressos especialmente em seus artigos 227 e 228.

    Aps a promulgao da Constituio Federal de 1988 havia

    necessidade de uma nova lei para a infncia, sendo curta a vigncia do Cdigo

    de 79 em vista de sua ndole repressiva e contrria aos princpios da Magna

    Carta.

    Em 1990 foi promulgado o Estatuto da Criana e do Adolescente

    (Lei n. 8.069/90), que tem como pressuposto a concepo da criana e

    adolescente como sujeitos de direitos, dando garantia ampla aos seus direitos

    sociais e pessoais. Tal Estatuto, baseado na Conveno das Naes Unidas

    Sobre Direitos da Criana de 1989, est em vigor at a atualidade, sendo

    considerado a lei mais moderna no mundo e copiado por vrios pases da

    Amrica Latina.

    Hoje existe a garantia dos menores, efetuada pelo Conselho

    Tutelar (artigo 131 do ECA)1, que ir apurar, investigar e eventualmente punir o

    menor, desempenhando a mesma funo dos juzes, com a existncia do

    contraditrio, da possibilidade de remisso (instituto da lei 9.099/95) e de

    transao penal, negociando ou aplicando a medida scio-educativa.

    Aps este breve estudo acerca da evoluo da maioridade penal

    na legislao brasileira, passaremos a estudar no prximo captulo a

    imputabilidade face Constituio Federal, bem como seus aspectos no

    mbito do Cdigo Penal.

    1 Art. 131. O Conselho Tutelar rgo permanente e autnomo, no jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criana e do adolescente, definidos nesta Lei.

  • 14

    2. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS E PENAIS SOBRE A

    IMPUTABILIDADE PENAL

    2.1. Aspectos constitucionais

    A questo acerca da reduo da maioridade penal h de passar

    primeiramente, pelo nvel constitucional, uma vez que o artigo 228 da

    Constituio Federal elevou condio de princpio constitucional a

    inimputabilidade dos menores de 18 (dezoito) anos.

    Podemos definir princpios como o elemento central da ordem

    jurdica, por representarem aqueles valores supremos eleitos pela sociedade

    que a adota, sendo que a caracterstica mais marcante que hoje se lhes atribui

    o carter de normatividade, de modo que eles so tidos, pela teoria

    constitucional contempornea, como sendo uma espcie do gnero norma

    jurdica, ao lado das assim denominadas regras jurdicas.

    Pode-se afirmar, ento, que os princpios so os elementos que expressam os fins que devem ser perseguidos pelo Estado (em sua acepo mais ampla), vinculando a todos os entes e valendo como um impositivo para o presente e como um projeto para o futuro que se renova cotidianamente [...] (LEAL, 2003, p.50).

    De incio, se faz necessrio, definir que imputvel o agente

    mentalmente capaz de entender o carter ilcito do fato e possuidor de

    condies intelectuais para determinar sua conduta, ou seja, podemos

    conceituar a imputabilidade como sendo a capacidade de a pessoa entender

    que o fato ilcito e de agir de acordo com esse entendimento.

    Com o advento da Magna Carta, viabilizado pelo momento de

    abertura poltica que caracterizou o Estado Democrtico de Direito, foi instituda

    no ordenamento jurdico ptrio a Doutrina da Proteo Integral criada pela

    Conveno Internacional de Direitos da Criana. Apesar de ser,

    reconhecidamente, o Estatuto da Criana e do Adolescente uma das leis mais

  • 15

    avanadas do mundo na matria, visualiza-se vrias dificuldades prticas para

    a tutela dos direitos atinentes crianas e adolescentes em situao de risco.

    Nenhuma Constituio do Brasil, anteriormente, havia incorporado

    no seu texto o instituto de imputabilidade penal. Mas a Carta de 1988,

    promulgada pelo poder Constituinte Originrio, elevou categoria de

    constitucional a imputabilidade penal, materializada em seu artigo 228 em

    sintonia com o antigo Cdigo Penal.

    Com efeito, os menores de 18 (dezoito) anos esto sujeitos s

    normas de legislao especial, no caso, o ECA (Estatuto da Criana e do

    Adolescente).

    Os princpios fundantes da Doutrina da Proteo Integral esto

    expressos, especialmente, nos artigos 227 e 228 da Lei Maior.

    O Princpio da Prioridade Absoluta, erigido como preceito

    fundante da ordem jurdica, estabelece a primazia deste direito no artigo 227 da

    Constituio Federal. Tal princpio est reafirmado no artigo 4 do ECA2.

    Neste dispositivo esto lanados os fundamentos do chamado

    Sistema Primrio de Garantias, estabelecendo as diretrizes para uma Poltica

    Pblica que priorize crianas e adolescentes, reconhecidos em sua peculiar

    condio de pessoa em desenvolvimento.

    O artigo 228 reproduo do disposto no artigo 27 do Cdigo

    Penal3.

    A Constituio brasileira permite, em seu artigo 14, 1, II, c, que

    os menores de dezesseis anos votem. Ora, esse mesmo menor pode decidir

    uma eleio sobre quem deve conduzir os destinos de uma nao, mas

    inimputvel do ponto de vista criminal.

    2 Art.4- dever da famlia, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Pblico assegurar, com absoluta prioridade, a efetivao dos direitos referentes vida, sade, alimentao, educao, ao esporte, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria.

    Pargrafo nico- A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteo e socorro em quaisquer circunstncias; b) precedncia do atendimento nos servios pblicos ou de relevncia pblica; c) preferncia na formulao e na execuo das polticas sociais pblicas; d)destinao privilegiada de recursos pblicos nas reas relacionadas com a proteo infncia e juventude. 3 Art.27- Os menores de 18 (dezoito) anos so penalmente inimputveis, ficando sujeitos s normas

    estabelecidas na legislao especial.

  • 16

    O constituinte admitiu que a irresponsabilidade pode conformar o

    processo poltico-democrtico brasileiro, pois os inimputveis criminalmente

    tm o direito de decidir eleies sobre o futuro do Pas (BASTOS; MARTINS,

    2000, p. 1103).

    O conceito de inimputabilidade penal do adolescente, expresso na

    Constituio, faz-se fundamental na compreenso do ECA - Estatuto da

    Criana e do Adolescente (Lei 8.069/90).

    Todavia, h quem, desconhecendo o sistema de responsabilidade

    penal juvenil contemplado no ECA, corolrio da normativa internacional que

    regula a matria, insista em confundir inimputabilidade penal com impunidade,

    pleiteando a extenso do Sistema Penal Adulto ao adolescente em conflito com

    a Lei, buscando a reduo da idade de imputabilidade penal, fixada em dezoito

    anos.

    Na concepo de Saraiva (2003, p. 65), l-se que:

    Os preponentes desta idia, destituda de fundamentao apta a legitim-la e construda no desconhecimento do sistema tercerio de preveno insculpido no Estatuto, fundado no Direito Penal Juvenil, desprezam a natureza de clusula ptrea desta disposio constitucional.

    Os defensores da manuteno da idade penal alegam que o

    artigo 228 da Constituio Federal um direito e uma garantia fundamental

    uma vez que esses direitos no esto elencados de forma taxativa, no artigo 5

    do mesmo diploma legal, de modo que o prprio pargrafo 2, disciplina que os

    direitos e garantias expressos na Constituio no excluem outros.

    Assim, consoante o disposto no artigo 60, 4, IV, da Constituio

    Federal, no possvel abolir os direitos e garantias individuais entendidos

    como clusula ptrea, e portanto, o artigo 228 da Magna Carta no pode ser

    objeto de deliberao por emenda constitucional.

    De outro lado, aqueles que sustentam a reduo da maioridade

    penal alegam, dentre outros argumentos, que os menores so usados pelas

    quadrilhas para executarem os crimes, tendo em vista a impunidade

    estabelecida pela menoridade. Outra justificativa utilizada com bastante

    freqncia a de que o desenvolvimento mental de um jovem, atualmente,

    superior ao daquele que vivia em 1940, quando foi criado o Cdigo Penal

  • 17

    brasileiro. Assim atingem a maturidade mais cedo e, portanto, poderiam

    responder criminalmente pelos atos que cometem antes dos 18 anos.

    Tambm sustentam os adeptos da tese da reduo da idade

    penal o fato de que os adolescentes j tm direito de votar aos 16 anos e, por

    isso, podem responder criminalmente a partir dessa idade.

    Segundo entendimento do Deputado Pedro Corra:

    A certeza da sano branda tem contribudo para o aumento da criminalidade juvenil. Mais do que isso. A garantia da impunidade faz com que o crime organizado, principalmente o trfico de drogas, coopte uma legio de jovens absolutamente carentes e inimputveis.

    Feitas as consideraes constitucionais acerca do assunto,

    passaremos, a seguir, a estud-lo sob o aspecto da lei penal.

    2.2. Do artigo 27 do Cdigo Penal

    Como j foi dito anteriormente, adotou-se um critrio puramente

    biolgico, de idade do autor do fato, dispondo o Cdigo Penal em seu artigo 27

    que, so penalmente inimputveis, os menores de 18 (dezoito) anos. No se

    considera assim, o desenvolvimento mental do menor que, embora possa ser

    plenamente capaz de entender o carter ilcito do fato e de determinar-se de

    acordo com esse entendimento, no poder ser responsabilizado penalmente

    por suas aes.

    Dessa forma, como ensina o doutrinador Mirabete (2005, p. 272):

    Trata-se de um caso de presuno absoluta de inimputabilidade, e, embora no se possa negar que um jovem de menor idade tem hoje amplo conhecimento do mundo e condies de discernimento sobre a ilicitude de seus atos, no se admite a prova de que era ele, ao tempo da ao ou da omisso, capaz de entendimento e determinao.

    considerado imputvel aquele que comete o fato tpico nos

    primeiros momentos do dia em que completa 18 anos, pouco importando a

    hora de seu nascimento.

  • 18

    Imputabilidade a plena capacidade de culpabilidade, entendida

    como capacidade de entender e de querer, e, por conseguinte, de

    responsabilidade criminal, ou seja, conjunto das condies de maturidade e

    sanidade mental que permitem ao agente conhecer o carter ilcito de seu ato e

    determinar-se de acordo com esse entendimento.

    Conforme leciona o ilustre doutrinador Capez (2005, p.306), no

    tocante a imputabilidade:

    a capacidade de entender o carter ilcito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. O agente deve ter condies fsicas, psicolgicas, morais e mentais de saber que est realizando um ilcito penal. Mas no s. Alm dessa capacidade plena de entendimento, deve ter totais condies de controle sobre sua vontade. Em outras palavras, imputvel no apenas aquele que tem capacidade de inteleco sobre o significado de sua conduta, mas tambm de comando da prpria vontade, de acordo com esse entendimento.

    A prova da menoridade, a princpio, deve ser feita pela certido de

    nascimento, no se descartando a possibilidade de exame pericial

    especializado na inexistncia de prova documental. De acordo com a Smula

    74 do STJ, o reconhecimento da menoridade do ru requer prova por

    documento hbil. Havendo dvida quanto idade, o acusado deve ser

    absolvido face ao princpio do in dubio pro reo. Comprovada a sua menoridade

    penal, o processo deve ser anulado por falta de legitimidade passiva.

    O momento para se apreciar a imputabilidade, de acordo com a regra

    geral prevista no artigo 4 do Cdigo Penal, o da ao ou da omisso, no se

    podendo considerar imputvel aquele que praticou a conduta antes do 18

    aniversrio, ainda que a consumao ocorra nesse ou aps esse dia.

    Traadas as premissas constitucionais e penais, estudaremos no

    prximo captulo, o tema diante da lei especial de proteo ao menor, qual

    seja, o Estatuto da Criana e do Adolescente.

  • 19

    3. DO ESTATUTO DA CRIANA E DO ADOLESCENTE

    (LEI 8.069/1990)

    A Lei Federal n 8069 de 1990, que instituiu o Estatuto da Criana e

    do Adolescente, substituiu o Cdigo de Menores, Lei n 6697, que estava em

    vigor desde 10 de outubro de 1979. O Estatuto considerado uma das leis

    mais evoludas no mbito da menoridade e apresenta diferenas significativas

    em relao ao Cdigo de Menores.

    Diferentemente do Cdigo, que era dirigido a menores de 18

    (dezoito) anos em situaes especiais, o Estatuto destinado a todas as

    pessoas com menos de 18 anos de idade e est pautado nos princpios da

    Constituio Brasileira de 1988, expressos especialmente nos artigos 227 e

    228, fundantes da Doutrina da Proteo Integral e, na Conveno das Naes

    Unidas de Direito da Criana.

    Basicamente trs princpios norteiam o Estatuto, so eles: Princpio

    da Proteo Integral, pelo qual a criana e o adolescente tm direito proteo

    em todas as esferas de sua vida (art. 1); Garantia de Absoluta Prioridade que

    estabelece que a criana e o adolescente tm direito a ser protegidos e

    atendidos em suas necessidades, com prioridade no recebimento de socorro,

    na utilizao de servios pblicos e na destinao de verbas e polticas sociais

    pblicas (art. 4); e, por fim, a Condio de Pessoa em Desenvolvimento, no

    qual a criana e o adolescente so seres em formao que requerem cuidados

    especiais em cada fase da vida, para que tenham desenvolvimento sadio e

    harmonioso (art. 6).

    Assim com a promulgao do Estatuto, a criana e o adolescente

    passaram a ser sujeitos de Direito. Vale dizer que o atendimento e a proteo

    no so favores concedidos, mas direitos assegurados por lei.

    Um dos elementos fundamentais do Estatuto a participao popular

    direta na fiscalizao e cobrana poltica. A lei diz explicitamente que quem tem

    que atuar politicamente sobre a infncia no s o Estado, mas este em

    conjunto com a sociedade organizada. Os Conselhos de direito so o

    instrumento para isso.

  • 20

    Hoje h tambm os Conselhos Tutelares, sendo que no antigo

    Cdigo de Menores quem decidia, investigava, julgava, era o juiz, que tinha

    quase um poder absoluto, sem controle e nem participao da sociedade.

    Atualmente, o juiz e a promotoria da infncia so obrigados a

    compartilhar esse poder com os Conselhos Tutelares, compostos por pessoas

    escolhidas pela sociedade, que participam e zelam pelo direito da criana.

    O ECA se assenta no princpio de que todas as crianas e

    adolescentes, sem distino, desfrutam dos mesmos direitos e sujeitam-se a

    obrigaes compatveis com a peculiar condio de desenvolvimento que

    possuem, rompendo, definitivamente, com a idia at ento vigente de que os

    Juizados de Menores seriam uma justia para os pobres.

    Segundo Saraiva (2003, p.62), o ECA se estrutura a partir de trs

    grandes sistemas de garantia, harmnicos entre si, que so:

    a) o Sistema Primrio, que d conta das Polticas Pblicas de Atendimento a crianas e adolescentes (especialmente os arts. 4 e 85/87); b) o Sistema Secundrio que trata das Medidas de Proteo dirigidas a crianas e adolescentes em situao de risco pessoal ou social, no autores de atos infracionais, de natureza preventiva, ou seja, crianas e adolescentes enquanto vtimas, enquanto violados em seus direitos fundamentais (especialmente os arts. 98 e 101); c) o Sistema Tercirio, que trata das medidas scio-educativas, aplicveis a adolescentes em conflito com a Lei, autores de atos infracionais, ou seja, quando passam condio de vitimizadores (especialmente os arts. 103 e 112).

    Dessa forma, quando a criana ou o adolescente escapar ao sistema

    primrio de preveno, aciona-se o sistema secundrio, cujo agente operador

    ser o Conselho Tutelar e, estando o adolescente em conflito com a lei, ou

    seja, atribuindo-se a ele a prtica de algum ato infracional, ser acionado o

    terceiro sistema de preveno, operador das medidas scio-educativas, que

    pode ser chamado genericamente de sistema de Justia. Traadas as

    consideraes gerais, a seguir sero abordados, especificadamente, alguns

    aspectos inerentes ao Estatuto da Criana e do Adolescente.

  • 21

    3.1 Do ato infracional

    De acordo com o disposto no artigo 103 do Estatuto da Criana e do

    Adolescente, considera-se ato infracional, a conduta descrita como crime ou

    contraveno penal.

    A conduta da criana ou do adolescente, quando revestida de

    ilicitude, repercute, obrigatoriamente, no contexto social em que vive e, nos

    dias de hoje, a sua incidncia maior, sobretudo nos pases subdesenvolvidos

    ou em desenvolvimento. Entretanto tal fato no constitui ocorrncia apenas

    deste sculo, mas atualmente que o mesmo assume propores alarmantes,

    principalmente nos grandes centros urbanos, no s pelas dificuldades de

    sobrevivncia como, tambm, pela ausncia do Estado nas reas da

    educao, da sade, da habitao e, enfim, da assistncia social.

    Assim, a criminalidade crescente que a cada dia recruta maior

    nmero de jovens e o impacto de algumas infraes penais gravssimas, at os

    crimes mais hediondos, praticados ultimamente por esses menores, que volta

    a agitar o mundo jurdico e social acerca da possibilidade de reduo da

    maioridade penal.

    A infrao penal, como gnero das espcies crime ou delito e

    contraveno, s pode ser atribuda, para efeito de pena, s pessoas

    imputveis, que no Brasil so os maiores de 18 (dezoito) anos. Dessa forma,

    se estas pessoas incidirem em determinado preceito criminal ou

    contravencional, tem cabimento a respectiva sano. Contudo, se estiverem

    abaixo da idade acima referida, a conduta descrita como crime ou

    contraveno constitui ato infracional.

    Em outras palavras significa dizer que, o fato atribudo criana ou

    ao adolescente, embora possa ser enquadrado como crime ou contraveno,

    s pela circunstncia de sua idade, no constitui nenhum dos dois, mas, na

    linguagem do legislador, simples ato infracional.

    Quando se atribui um ato infracional a uma criana, considerada

    como tal aquela que possui idade entre 0 e 12 anos, aplicam-se mesma, as

    medidas de proteo previstas no artigo 101 do ECA, cuja competncia do

    GermanoSelecionar

    GermanoSelecionar

  • 22

    Conselho Tutelar, conforme o disposto no artigo 136 da mesma lei, juntamente

    com a interveno de outros rgos e a observncia de certas cautelas e

    formalidades, essenciais inclusive correta e completa apurao da respectiva

    infrao.

    Igualmente ao adolescente infrator, aquele com idade entre 12 e 18

    anos, no se confere pena, posto a sua peculiar situao de pessoa em

    desenvolvimento e, portanto, inimputvel, recebe como resposta sua conduta

    infracional medidas de carter scio-educativo, previstas no artigo 112 e

    incisos do Estatuto, que podem ser cumuladas com as medidas de proteo.

    Posto isto, sero estudadas, a seguir, as conseqncias da prtica

    de ato infracional pela criana ou adolescente, consoantes as disposies da

    Lei 8.069/90.

    3.2 Das medidas de proteo

    As medidas especficas de proteo estabelecidas no artigo 101 do

    Estatuto da Criana e do Adolescente so propostas, quando da ameaa ou da

    violao dos direitos reconhecidos nesta Lei, seja por ao ou omisso da

    sociedade ou do Estado; por falta, omisso ou abuso dos pais ou responsvel,

    assim como em razo de sua conduta, conforme o artigo 98 e incisos do ECA.

    Destinam-se, portanto, as medidas de proteo ao carente e ao infrator.

    Tais medidas escalonam os menores em trs categorias: os

    carentes, ou em situao irregular, os menores vtimas e os que praticaram

    atos infracionais (CHAVEZ, 1997, p. 455).

    Pode se dizer que , basicamente, nesse momento que o legislador

    rompe com a doutrina da situao irregular, que vigorava anteriormente, e

    adota a doutrina da proteo integral, preconizada pela Declarao e pela

    Conveno Internacional dos Direitos da Criana.

    Comporiam este conjunto de crianas e adolescente carentes ou em

    situao irregular, de um lado, aqueles vtimas histricas de polticas

  • 23

    econmicas concentradas de renda e de polticas sociais incompetentes em

    sua tarefa de assegurar a todos os cidados seus direitos bsicos.

    Crianas e jovens com a sade ou com a prpria vida ameaadas

    pelas condies de pobreza, desnutrio e insalubridade ambiental; sem

    acesso a uma assistncia mdica de qualidade; fora da escola ou submetidos a

    um processo educacional que os leva ao fracasso escolar.

    Estariam tambm neste grupo, por outro lado, crianas cujas famlias

    se omitem do dever de assisti-las e educ-las, praticam maus-tratos, opresso

    ou abuso sexual, ou simplesmente as abandonam.

    Nas palavras de Cury, Silva e Mendez (2002, p.304):

    Crianas e jovens sujeitos ao desuso, abuso ou violncia da sociedade, do Estado e da famlia ganham concretude nas figuras da criana abandonada, do jovem violentado, do pequeno bia-fria, do exrcito de evadidos da escola ainda analfabetos ou semi-alfabetizados, do menino de rua.

    H tambm, de acordo com a lei, entre os responsveis pela ameaa

    ou violao dos direitos da criana, um terceiro agente, ela mesma em funo

    de sua conduta. Entretanto, assegura-se criana de at 12 anos que comete

    ato infracional, a preservao de todos os direitos assegurados em lei,

    admitindo-se apenas para o adolescente infrator a restrio do seu direito

    liberdade, e assim mesmo somente em casos considerados de extrema

    gravidade e em condies especficas.

    As medidas de proteo no podero ser compreendidas como

    castigo ou pena, nem, tampouco, ter o carter de aliviar a responsabilidade

    jurdica daqueles que esto causando danos criana e ao adolescente e,

    podero ser aplicadas isolada ou cumulativamente de acordo com o caso

    concreto.

    Ainda, conforme o caso, algumas medidas podero ser substitudas

    a qualquer tempo, bem como cessar. A substituio poder ocorrer quando

    elas no atingirem o objetivo ou pelo agravamento do caso, e a suspenso, de

    acordo com o progresso realizado.

    As medidas vo desde o encaminhamento aos pais ou responsveis

    at o tratamento para alcolatras e toxicmanos, chegando, inclusive,

    colocao em famlia substituta. A aplicao das mesmas, como j dito

  • 24

    anteriormente, prevista atravs do Conselho Tutelar. Quando se constatar a

    incapacidade das polticas bsicas para atender as demandas apresentadas, o

    Conselho Tutelar estabelece contato com autoridades de setores

    correspondentes (educao, sade, segurana etc.) assim como orienta e

    incentiva a formulao e o desenvolvimento das polticas compensatrias

    consideradas pertinentes.

    Sempre que possvel o menor deve permanecer ou retornar junto

    sua famlia. Por isso, a primeira providncia, mesmo no caso de simples

    ameaa aos seus direitos, que o artigo 101 do Estatuto coloca, o referido

    encaminhamento, j cogitado no antigo Cdigo de Menores.

    Nos casos de menor gravidade a soluo ser convocar os pais ou

    responsveis presena do Juiz da Infncia e da Juventude, fazer-lhes as

    advertncias necessrias, inclusive da eventual perda do ptrio poder, tutela ou

    guarda, e possibilidade de processo criminal, que ser o argumento mais

    convincente, por infrao dos artigos 244, abandono material; 245, entrega de

    filho menor a pessoa inidnea; e 246, abandono intelectual, do Cdigo Penal.

    3.3 Das medidas scio-educativas

    No artigo 112 do Estatuto da Criana e do Adolescente esto

    elencadas as medidas de carter scio-educativo (e tambm protetivo)

    aplicveis aos adolescentes autores de atos infracionais.

    Por se tratar de rol taxativo, e no simplesmente exemplificativo,

    vedada a imposio de medidas diversas daquelas enunciadas no artigo em

    tela.

    So previstas no artigo 112 do ECA as seguintes medidas:

    Art. 112.[...]: I- advertncia; II- obrigao de reparar o dano; III- prestao de servios comunidade; IV- liberdade assistida; V- insero em regime de semiliberdade; VI- internao em estabelecimento educacional; VII- qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

  • 25

    criana que comete ato infracional aplica-se uma medida de

    proteo (art. 101). Porm, o inverso no verdadeiro. Ao adolescente infrator,

    possvel a aplicao da medida scio-educativa cumulada com as medidas

    protetivas, ou somente esta ltima, dado o contedo pedaggico das mesmas.

    A finalidade a de levar o adolescente a participar de programas educacionais,

    tratamento mdico, psiquitrico, entre outros.

    A seguir, sero analisadas, com detalhes, cada uma das espcies de

    medidas scio-educativas aplicadas aos adolescentes autores de atos

    infracionais.

    3.3.1 Da advertncia

    Consiste a advertncia, consoante o disposto no artigo 115 do ECA,

    em admoestao verbal, que deve ser reduzida a termo e assinada. O termo

    advertncia significa admoestao, observao, aviso, ato de advertir.

    a primeira das medidas, aplicveis ao menor, que revela

    comportamento anti-social, mas de menor gravidade como pequenos furtos,

    agresses leves, vadiagem. O menor ser, desde logo, entregue a seus

    responsveis, mediante admoestao verbal, reduzida a termo e assinada pela

    autoridade judicial. E, mesmo na reincidncia, ser reiterado o procedimento.

    De acordo com Nogueira apud Chaves (1997, p. 517), a advertncia

    deve ser a medida mais usada, uma vez que toda medida aplicada ao menor

    visa sua integrao sociofamiliar.

    Prev o Estatuto da Criana e do Adolescente, a aplicao desta

    medida s seguintes situaes: a) ao adolescente, no caso de prtica de ato

    infracional (art. 112, I, c/c o art. 103); b) aos pais ou responsveis, guardies de

    fato ou de direito, tutores, curadores etc. (art. 129, VII); c) s entidades

    governamentais ou no governamentais que atuam no planejamento e na

    execuo de programas de proteo e scio-educativos destinados a crianas

    e adolescentes (art. 97, I, a, e II, a). Na primeira hiptese trata-se de medida

    scio-educativa; nas demais, constitui medida de proteo.

  • 26

    Segundo a lei, artigo 114, pargrafo nico do Estatuto, a advertncia

    aplicada ao adolescente infrator exige a prova da materialidade do fato e

    indcios suficientes de autoria. Assim, esto excludas as situaes que

    acarretam mera suspeita, visto que a autoridade dever contar com elementos

    de convico, embora no plenamente concludentes, mas fortemente

    indicativos sobre a autoria do ato infracional.

    A advertncia a mais leve das medidas scio-educativas. A sua

    imposio dispensa perfeitamente a sindicncia ou o procedimento

    contraditrio, j que deve ser imposta mediante o boletim de ocorrncia

    elaborado pela autoridade policial ou informao do comissrio.

    Entretanto, Cury, Silva e Mendez (2002, p.376) entendem no

    seguinte sentido:

    [...] embora a advertncia possa vir a ser aplicada no primeiro contato com o sistema de Justia da Infncia e da Juventude, na audincia de apresentao ao rgo do Ministrio Pblico (art. 197 do ECA), nada impede que decorra do procedimento apuratrio do ato infracional, atravs do respectivo procedimento contraditrio.

    Dessa forma conclui-se que, a advertncia, na modalidade de

    medida scio-educativa, deve se destinar, via de regra, a adolescentes que no

    registrem antecedentes infracionais e para os casos de infraes leves. Poder

    ela ser aplicada pelo rgo do Ministrio Pblico, antes de instaurado o

    procedimento apuratrio, juntamente com o benefcio da remisso, e pela

    autoridade judiciria, no curso da instruo do procedimento apuratrio do ato

    infracional ou na sentena final.

    3.3.2 Da obrigao de reparar o dano

    O artigo 116 do Estatuto institui a possibilidade de impor ao

    adolescente autor de ato infracional com reflexos patrimoniais, como medida

    scio-educativa, a obrigao de reparar o dano causado vtima, seja pela

  • 27

    restituio da coisa subtrada, seja pelo respectivo ressarcimento, seja atravs

    de outra alternativa compensatria.

    A obrigao de reparar o dano prevista no ECA medida

    scioeducativa que pode ser aplicada ao adolescente autor de ato infracional e,

    por via de conseqncia, ao seu responsvel legal (culpa in vigilando). O que

    se visa orientar o adolescente a respeitar os bens e o patrimnio de seus

    semelhantes.

    H entendimentos, no tocante obrigao de reparar o dano, que a

    medida deve ser imposta em procedimento contraditrio, pois cabe ao

    adolescente fazer a sua defesa devidamente assistido por advogado.

    Entretanto isso no pacfico.

    Conforme dispe o pargrafo nico do artigo 116, a medida da

    obrigao de reparar o dano poder ser substituda por outra adequada caso

    se evidencie a manifesta impossibilidade de sua aplicao. Nesse sentido

    importante ressaltar o artigo 932, incisos I e II do Novo Cdigo Civil, que estatui

    a responsabilidade dos pais ou responsveis pelos filhos menores que

    estiverem sob sua autoridade e companhia.

    3.3.3 Da prestao de servios comunidade

    A prestao de servios comunidade consiste na realizao de

    tarefas gratuitas de interesse geral, por perodo no excedente a seis meses,

    junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos

    congneres, bem como em programas comunitrios ou governamentais (art.

    117).

    A submisso de um adolescente a este tipo de medida tem um

    sentido altamente educativo, particularmente orientado a obrigar o mesmo a

    tomar conscincia dos valores que supem a solidariedade social praticada em

    seus nveis mais expressivos.

  • 28

    Segundo Cury, Silva e Mendez (2002), uma das medidas

    scioeducativas que se reveste, hoje, de um grande e profundo significado

    pessoal e social para o adolescente infrator.

    De acordo com o que estabelece o pargrafo nico deste artigo que

    trata da prestao de servios comunidade, as tarefas sero atribudas

    conforme as aptides do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada

    mxima de oito horas semanais, aos sbados, domingos e feriados ou em dias

    teis, de modo a no prejudicar a freqncia escola ou jornada normal de

    trabalho.

    A medida ser cumprida pelo adolescente sob a superviso da

    autoridade judiciria, do Ministrio Pblico, de tcnicos sociais, que informaro

    suas atividades e comportamento atravs de relatrios, e da comunidade.

    3.3.4 Da liberdade assistida

    A aplicao da medida prevista no artigo 118 do ECA, qual seja, a

    liberdade assistida, tem lugar quando se mostrar a mais adequada ao caso

    concreto para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente. Consiste

    em submeter o menor, depois de entregue aos responsveis, ou aps liberao

    do internato, assistncia, com o fim de impedir a reincidncia e obter a

    certeza da reeducao.

    Ser esta espcie de medida scio-educativa fixada pelo prazo

    mnimo de 6 (seis) meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada,

    revogada ou substituda por outra sempre que necessrio, ouvindo o

    orientador, o Ministrio Pblico e o defensor. Em razo de sua finalidade

    (acompanhar, auxiliar e orientar), no h prazo mximo para cumprimento,

    sendo cabvel enquanto o Juiz entender necessrio ao adolescente.

    Normalmente se aplica a liberdade assistida a menores que so reincidentes

    em infraes mais leves, como pequenos furtos, agresses leves, porte de

    entorpecentes para uso prprio. Contudo, pode tambm ser aplicada queles

    que cometeram infraes mais graves, mas que, efetuado o estudo social,

  • 29

    verifica-se que melhor deix-los com sua famlia, para sua reintegrao

    sociedade. Outras vezes aplica-se queles que, anteriormente, estavam em

    regime de semiliberdade ou de internao, quando se verifica que os mesmos

    j se recuperaram em parte e no representam um perigo sociedade.

    O orientador, com apoio e superviso da autoridade competente, ter

    os seguintes encargos elencados no artigo 119 do Estatuto, quais sejam:

    orientar o adolescente, inserindo-o, se necessrio, em programas de auxlio e

    assistncia social; supervisionar sua freqncia e aproveitamento escolar e

    promover sua matrcula; diligenciar no sentido de profissionalizao e insero

    do adolescente no mercado de trabalho e, por fim, apresentar relatrios do

    caso.

    O ECA no define, especificamente, as condies que sero

    cumpridas pelo adolescente. Essa tarefa cabe autoridade judiciria, que

    individualizar o tratamento tutelar, aplicando no caso concreto as condies,

    que podero abranger as relaes de trabalho e escola, bem como as

    familiares; podendo haver proibio sobre conduo de veculos, bebidas

    alcolicas, freqncia a determinados ambientes, etc. E, considerando sempre

    a capacidade do adolescente de cumpri-las, as circunstncias e a gravidade da

    infrao, de acordo com o que dispe o artigo 112, 2.

    3.3.5 Do regime de semiliberdade

    O regime de semiliberdade a medida mais restritiva da liberdade

    pessoal depois da internao. Estas duas medidas so as nicas, entre

    aquelas previstas para o adolescente infrator no artigo 112, que implicam a

    institucionalizao. A semiliberdade faz parte das medidas scioeducativas

    para os quais o artigo 114 requer as plenas garantias formais em relao

    apurao da infrao e igualdade do adolescente na relao processual, ou

    seja, a existncia de provas suficientes da autoria e da materialidade da

    infrao.

  • 30

    Normalmente a semiliberdade usada quando o menor a que se

    aplicou medida de internao deixou de representar um perigo para a

    sociedade e, assim, passa para um regime mais ameno, em que pode visitar os

    familiares nos fins de semana e freqentar escolas externas e, tambm,

    quando o menor, embora tenha cometido uma infrao grave, no seja

    considerado perigoso, bastando a semiliberdade para a sua reintegrao

    sociedade e famlia, que o objetivo primordial de todas as medidas que se

    aplicam a menores que cometem infraes.

    Entende-se, por semiliberdade, como uma medida scio-educativa

    destinada a adolescentes infratores, que trabalham e estudam durante o dia, e

    noite recolhem-se a uma entidade especializada. So obrigatrias a

    escolarizao e a profissionalizao.

    A semiliberdade prevista no artigo 120 do Estatuto e, de acordo

    com o seu pargrafo 2, no comporta prazo determinado, aplicando-se, no

    que couberem, as disposies relativas internao, inclusive quanto aos

    direitos do adolescente privado de sua liberdade.

    3.3.6 Da internao

    Segundo dispe o artigo 121 do ECA, a internao uma medida

    privativa de liberdade que se sujeita aos princpios da brevidade,

    excepcionalidade e respeito condio peculiar de pessoa em

    desenvolvimento.

    O Estatuto regula minuciosamente a internao de menores, que

    tanto pode ser de alguns dias, como, no mximo, at trs anos, ao contrrio do

    que ocorria na vigncia do Cdigo de Menores.

    O 1 do artigo 121 permite a realizao de atividades externas,

    como uma maneira, na verdade, de converter a internao em uma medida o

    mais dependente possvel dos servios e atividades do mundo exterior.

    Como estabelece o 2 deste artigo, a medida no comporta prazo

    determinado. Entretanto, conforme o Estatuto, esse carter indeterminado

  • 31

    funciona a favor da proteo integral da pessoa humana em desenvolvimento,

    sendo que o limite mximo da privao de liberdade taxativamente fixado em

    trs anos pelo 3 deste mesmo artigo.

    Atingido o limite mximo, o adolescente dever ser liberado,

    colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida, sendo que a

    liberao ser compulsria aos 21 anos de idade. Assim, aps essa idade no

    ser possvel a aplicao de qualquer medida scio-educativa.

    As hipteses de cabimento da internao esto previstas no artigo

    122, que so: I) quando se tratar de ato infracional cometido com grave

    ameaa ou violncia a pessoa; II) reiterao no cometimento de outras

    infraes graves; III) descumprimento reiterado e injustificvel da medida

    anteriormente imposta.

    Ao delimitar as hipteses em que a medida de internao poder ser

    aplicada, o artigo 122 em seus incisos de I a III, est regulamentando o

    princpio da excepcionalidade. E, ainda, como menciona o 2, ela deve ser

    evitada se houver antes dela outras medidas de carter mais adequado.

    A internao somente poder ser aplicada pela autoridade judiciria

    competente em deciso fundamentada, devendo ser cumprida em entidade

    exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo,

    obedecida rigorosa separao por critrios de idade, compleio fsica e

    gravidade da infrao, sendo obrigatrio durante o seu perodo a realizao de

    atividades pedaggicas.

    Os direitos do adolescente privado de sua liberdade encontram-se

    previstos no artigo 124 do Estatuto.

    A desinternao, em qualquer hiptese, dever sempre ser

    precedida de autorizao judicial e ouvido o Ministrio Pblico.

    3.4 Da remisso

    Remisso significa clemncia, indulgncia, perdo, renncia. Prev o

    artigo 126 do Estatuto o instituto da remisso como forma de excluso,

    suspenso ou extino do processo para apurao do ato infracional.

  • 32

    Atravs de tal medida procura-se, em casos especiais, evitar ou

    atenuar os efeitos negativos da instaurao ou continuao do procedimento

    na administrao da Justia de Menores.

    A remisso por excluso do processo reserva-se s hipteses em

    que a infrao no tem carter grave, quando o menor no apresenta

    antecedentes e quando a famlia, a escola ou outras instituies de controle

    social no institucional j tiverem reagido de forma adequada e construtiva ou

    seja provvel que venham a reagir desse modo.

    Nos dizeres de Paula (1991) apud Chaves (1997, p. 558):

    Se do sistema processual penal deflui o princpio da obrigatoriedade de propositura da ao penal, o Estatuto da Criana e do Adolescente, ao instituir a remisso como forma de excluso do processo, expressamente adotou o princpio da oportunidade, conferindo ao titular da ao a deciso de invocar ou no a tutela jurisdicional. A deciso nasce do confronto dos interesses sociais e individuais tutelados unitariamente pelas normas insertas no ECA. [...]

    Dessa forma justifica-se a excluso da medida scio-educativa

    atravs da remisso, como perdo puro e simples, quando o interesse de

    defesa social assume valor inferior quele representado pelo custo, viabilidade

    e eficcia do processo. Assim, contravenes e infraes leves, atribudas a

    adolescentes primrios, marcadas pela previso de dificuldades na coleta da

    prova, cujo resultado, alm de incerto, constituir mera advertncia, podem ser

    remidas plenamente pelo representante da sociedade.

    medida exclusiva do representante do Ministrio Pblico por fora

    dos artigos 180, II e 201, I, que, em lugar de pedir a instaurao do

    procedimento, a concede, podendo incluir a aplicao de qualquer das medidas

    previstas na lei, exceto a colocao em regime de semiliberdade e a

    internao, como estabelece o artigo 127. A manifestao deve ser

    fundamentada e o pedido homologado pelo juiz, que, no concordando com

    sua aplicao, deve remeter os autos ao Procurador-Geral de Justia.

    H aqueles que criticam a manuteno do direito de o Ministrio

    Pblico conceder a remisso, em lugar de prop-lo ao Juiz, o qual poder

    discordar, como tambm da pretenso de arquivamento.

  • 33

    A remisso pode ser concedida como perdo puro e simples, sem a

    aplicao de qualquer medida, ou ainda, como uma espcie de transao, a

    critrio do representante do Ministrio Pblico ou da autoridade judiciria, como

    mitigao das conseqncias do ato infracional. Contudo, nesta ltima hiptese

    ocorre a aplicao de medida especfica de proteo ou scio-educativa,

    excludas as que implicam privao de liberdade. Essa transao sem a

    instaurao ou concluso do procedimento tem o mrito de antecipar a

    execuo da medida adequada, sem maiores formalidades, diminuindo

    tambm o constrangimento decorrente do prprio desenvolvimento do

    processo.

    De acordo com Cury, Silva e Mendez (2002, p. 413):

    Quando a remisso constituir perdo puro e simples ou vier acompanhada de medida que se esgote em si mesma, ocorrer a excluso do processo, se concedida pelo representante do Ministrio Pblico, ou a extino do processo, se concedida pelo juiz. No ocorrendo uma dessas hipteses, o processo ficar suspenso at que se cumpra a medida eventualmente aplicada pela remisso. As medidas aplicadas, ainda que pelo Ministrio Pblico, sero sempre executadas pela autoridade judiciria.

    Segundo Vilhena Jnior (1991) apud Chaves (1997, p. 566), a

    concesso da remisso como causa de suspenso ou extino do

    procedimento de apurao do ato infracional compete autoridade judiciria e,

    s sero admitidas no curso do processo, quando madura a deciso ou quando

    alcanado o objetivo a que se presta o procedimento, qual seja, a educao e a

    reintegrao do adolescente s normas sociais de conduta. J como forma de

    excluso do processo, atribuio do membro do Ministrio Pblico e, poder

    ser concedida quando ficar constatado que o incio do procedimento no trar

    benefcios ao adolescente.

    O artigo 128 do Estatuto dispe no sentido de que a medida aplicada

    por fora da remisso poder ser revista judicialmente, a qualquer tempo,

    mediante pedido expresso do adolescente ou de seu representante legal, ou do

    Ministrio Pblico.

    Ao decidir a reviso, a autoridade judiciria poder : a) cancelar a

    medida aplicada, retornando situao processual anterior; b) substitu-la por

  • 34

    outra, com excluso do regime de semiliberdade e da internao; c) convert-la

    em perdo puro e simples.

    Para ser aplicada medida de regime de semiliberdade ou internao

    dever ser instaurado o procedimento pertinente ao devido processo legal, ou

    ento, se estava suspenso ou extinto, a ele se dar prosseguimento na forma

    regular.

    Quanto constitucionalidade dos artigos 126 a 128 Cury, Silva e

    Mendez (2002, p. 414), entendem que a aplicao da remisso com medidas

    previstas na lei no implica, necessariamente, reconhecimento ou

    comprovao de responsabilidade, nem prevalece como antecedentes e,

    ainda, quando aplicada pelo Ministrio Pblico fica sujeita ao controle

    jurisdicional. Ademais, como estabelece o artigo 128 facultado o pedido de

    reviso a qualquer tempo. Portanto, esses mesmos artigos no podem ser

    reconhecidos como inconstitucionais.

  • 35

    4. POSICIONAMENTOS FAVORVEIS E

    DESFAVORVEIS REDUO DA MAIORIDADE

    PENAL

    De acordo com o sistema jurdico vigente no Brasil, a maioridade

    penal se d quando o indivduo completa dezoito anos. Essa norma encontra-

    se insculpida em trs Diplomas Legais: 1) artigo 27 do Cdigo Penal; 2) artigo

    104, caput do Estatuto da Criana e do Adolescente; 3) e artigo 228 da

    Constituio Federal.

    O legislador manteve-se fiel ao princpio de que a pessoa menor de

    18 (dezoito) anos no possui desenvolvimento mental completo para

    compreender o carter ilcito de seus atos, ou determinar-se de acordo com

    esse entendimento, resultando, inclusive, no dogma constitucional (CF, artigo

    228). Adotou-se o sistema biolgico, em que considerada to-somente a

    idade do agente, independentemente da sua capacidade psquica.

    No foi levada em considerao para a fixao deste critrio a

    evoluo da humanidade no ltimo sculo, provocando com isso que vrios

    doutrinadores entendam que o melhor sistema a ser utilizado seria o

    biopsicolgico, pois ntida a capacidade de discernimento de um jovem com

    pleno acesso a todas as informaes globalizadas e outro que vive no interior,

    em fazendas ou mesmo em pequenos municpios do norte e nordeste do pas.

    Ocorre que hoje se constata uma evoluo crescente do nmero de

    adolescentes na prtica de atitudes criminosas, os quais j no mais se limitam

    ao cometimento de pequenos delitos. A imprensa noticia com freqncia o

    envolvimento de menores em crimes hediondos, como homicdio qualificado,

    trfico de entorpecentes, estupro, extorso mediante seqestro, latrocnio, etc.

    Um exemplo claro que aparece constantemente na mdia o

    assassinato do casal de adolescentes Felipe Caff e Liana Friedenbach em

    novembro de 2003, que teve como principal autor um menor que na poca do

    crime tinha 16 anos de idade. Este no foi coadjuvante do crime, mas sim

    quem deu a idia de seqestrar o casal, estuprou a menina e desferiu as

    facadas que a mataram. Entretanto, ele jamais sentar no banco dos rus, foi

  • 36

    recolhido em uma unidade da FEBEM onde deveria passar apenas trs anos, o

    mximo admitido pelo ECA.

    Diante disso muito se tem discutido sobre a reduo da maioridade

    penal no Brasil, tendo em vista que, como j dito acima, a maioria dos crimes

    que aterrorizam nossa sociedade praticada por menores de 18 (dezoito)

    anos, considerados penalmente inimputveis. As opinies pblicas so

    divergentes quanto reduo ou no da idade penal, surgindo, assim,

    novamente o debate no tocante a essa questo.

    Entre os adeptos que so contrrios reduo da imputabilidade

    penal argumenta-se que, em primeiro lugar, com a reduo da maioridade

    penal haveria a conseqente incluso das crianas e adolescentes infratores

    na vala comum de nosso sistema presidirio. Contudo, tal medida no

    diminuiria a criminalidade por meio do medo, uma vez que estudos estatsticos

    j apontaram que tal previso abstrata no cumpre sua funo intimidadora,

    isso porque a cadeia no se mostra como punio suficiente para coibir os

    adultos. Ademais a incluso de crianas e adolescentes, que por ainda estarem

    em fase de formao de carter so mais facilmente influenciveis em um

    sistema penitencirio inadequado s suas necessidades e incapaz de se

    beneficiar dessa influenciabilidade para obter a ressocializao dificulta, se no

    impossibilita, que o infrator seja ressocializado, expondo-o pelo contrrio,

    essas causas que poderiam inclusive piorar a situao.

    Importante salientar que os presdios esto superlotados, alm de

    no terem, na quase totalidade, condies de recuperar algum. E, ainda,

    some-se o fato de o menor, ao conviver com criminosos adultos, receber forte

    carga negativa de influncia quando est em processo de formao.

    [...] Ento o Brasil deveria reduzir a idade penal para permitir que adolescentes possam ser presos como qualquer adulto criminoso? A resposta parece bvia, mas no . Ser que simplesmente despachar um jovem para os depsitos de lixo humano que so as prises brasileiras resolveria alguma coisa? Ou apenas saciaria o apetite da banda que rosna que o bandido no tem direitos humanos? ( PETRY, 2006, p. 66)

    Segundo Barros4:

    4 BARROS, Guilherme Simes de. Reduo da maioridade penal. Disponvel em: . Acesso: 15 out 2008.

  • 37

    Mandar jovens, menores de 18 anos para os precrios presdios e penitencirias que misturam presos reincidentes e primrios, perigosos ou no, o mesmo que graduar e ps-graduar estes jovens no mundo do crime. No podemos tratar o jovem delinqente como uma pessoa irrecupervel e somente querer afast-lo da sociedade, jogando-o dentro de um presdio com outros criminosos comuns. Os jovens merecem um tratamento diferenciado.

    Um outro fato que se argumenta que com a reduo da idade

    penal, os maiores que se valem de crianas e adolescentes na prtica de

    crimes, recrutariam crianas ou adolescentes com idade ainda mais precoce,

    conduzindo ao mundo do crime um grupo cada vez mais jovem, o que no

    resolve o problema da violncia, que tem como grandes causas a fome, a

    misria, falta de escolaridade, alm de outras.

    Ainda, como justificativa maior, no seria possvel a alterao da

    imputabilidade penal, posto que o artigo 27 do Cdigo Penal abarcado pela

    Constituio Federal em seu artigo 228, bem como o artigo 104 do Estatuto da

    Criana e do Adolescente, que tambm fixa a idade de dezoito anos como

    limite para a imputabilidade do menor. Isso porque o artigo 228 entendido

    como um direito e garantia fundamental, e sendo assim, considerado clusula

    ptrea, no se admitindo emendas que busquem abolir tais direitos e garantias

    individuais, segundo o que dispe o artigo 60, 4, IV da Constituio Federal.

    Para esta corrente, o Estado, Poder Pblico, Famlia e Sociedade,

    que tm por obrigao garantir os direitos fundamentais da criana e do

    adolescente (menores), e no podem, para cobrir suas falhas e faltas, que so

    gritantes, exigir que a maioridade penal seja reduzida. A questo, portanto, no

    reduzir a idade penal, mas discutir o processo de execuo das medidas

    aplicadas aos menores, que completamente falho, concluindo-se que quem

    est em situao irregular no a criana ou o adolescente, mas o Estado, que

    no cumpre suas polticas sociais bsicas. De outro lado, h opinies que

    defendem a reduo da maioridade penal pelos motivos a seguir expostos.

    Primeiramente, para esses defensores, h que se considerar que

    com a evoluo da sociedade, da educao, dos meios de comunicao e

    informao, o jovem deste novo milnio no mais aquele ingnuo de meados

    do Sculo XX. As transformaes foram de ordem poltica, tecnocientfica,

    social e econmica. Atualmente, o acesso informao quase compulsivo.

  • 38

    Novas tecnologias fazem parte do dia-a-dia das pessoas, inclusive dos jovens

    (telefone celular, internet, correio eletrnico, rdio, etc.). So tantos os canais

    de comunicao, que se torna impossvel manter-se ilhado, alheio aos

    acontecimentos. No h espao para a ingenuidade, e com maior razo no que

    concerne aos adolescentes. Alis, estes esto mais afetos a essas inovaes

    e, em algumas situaes, h inverso da ordem natural, como por exemplo, os

    filhos orientarem os pais sobre informtica.

    Nesse contexto, este jovem precisa ser encarado como pessoa

    capaz de entender as conseqncias de seus atos, vale dizer, deve se

    submeter s sanes de ordem penal, uma vez que possui plena capacidade

    de discernimento, sabe e consegue determinar-se de acordo com esse

    entendimento.

    Na concepo de Reale (1990) apud Jorge (2002)5, l-se que:

    Tendo o agente cincia de sua impunidade, est dando justo motivo imperiosa mudana na idade limite da imputabilidade penal, que deve efetivamente comear aos dezesseis anos, inclusive, devido precocidade da conscincia delitual resultante dos acelerados processos de comunicao que caracterizam nosso tempo.

    Assim, alm de possurem plena convico de que o ato que

    praticam criminoso, estes menores utilizam-se, conscientemente, dessa

    menoridade que os alberga em seu favor, na prtica de crimes, valendo-se,

    inclusive, da certeza dessa impunidade que a sua particular condio lhe

    proporciona.

    Neste sentido Arajo6:

    A insignificncia da punio, certamente, pode trazer consigo o sentimento de que o crime compensa, pois leva o indivduo a raciocinar da seguinte forma: mais vantajoso para mim praticar esta conduta criminosa lucrativa, pois, se eu for descoberto, se eu for preso, se eu for processado, se eu for condenado, ainda assim, o mximo que poderei sofrer uma medida scio-educativa. Logo, vale a pena correr o risco. Trata-se, claro, de criao hipottica, mas no se pode negar que perfeitamente plausvel.

    5 JORGE, der. Reduo da maioridade penal. Disponvel em:. Acesso: 15 out 2008. 6 ARAJO, Kleber Martins. Pela reduo da maioridade penal para os 16 anos. Disponvel em: . Acesso: 15 out 2008.

  • 39

    Outro forte argumento o de que o legislador-constituinte reconhece

    aos maiores de dezesseis e menores de dezoito anos lucidez e discernimento

    na tomada de decises ao lhes conferir capacidade eleitoral ativa, conforme

    previso expressa constante no artigo 14, 1, inciso II, aliena c, da Magna

    Carta. De acordo com a Constituio Federal, homens e mulheres entre 16 e

    18 anos esto aptos a votar em candidatos para qualquer cargo pblico eletivo

    (vereador, prefeito, deputado estadual, deputado federal, senador e Presidente

    da Repblica). Trata-se de uma responsabilidade atribuda somente a quem

    possui elevado grau de maturidade.

    A fim de fortalecer esse ponto de vista, novamente cito a notvel

    lio de Reale (1990) apud Jorge (2002):

    No Brasil, especialmente, h um outro motivo determinante, que a extenso do direito ao voto, embora facultativo aos menores entre dezesseis e dezoito anos, como decidiu a Assemblia Nacional Constituinte para gudio de ilustre senador que sempre cultiva o seu progressismo... Alis, no se compreende que possa exercer o direito de voto quem, nos termos da lei vigente, no seria imputvel pela prtica de delito eleitoral.

    Dessa forma, se de um lado a Constituio Federal considera o

    menor de dezoito e maior de dezesseis anos inimputvel conforme o artigo

    228, por outro, permite exercer o direito ao voto, distinguindo, portanto, a

    maioridade penal da maioridade eleitoral. Portanto, como um jovem pode ter

    discernimento para votar, como por exemplo, no Presidente da Repblica, mas

    no tem em relao prtica de crimes, ainda que hediondos? Vale dizer, o

    menor conhece toda importncia da escolha dos integrantes dos Poderes

    Legislativo e Executivo, mas no tem conscincia das condutas delituosas, por

    isso inimputvel, sendo que evidente que o processo eleitoral mais

    complexo.

    Impe-se sim uma reviso do preceito constitucional atinente

    maioridade penal, segundo esta corrente. O debate atual, pois a violncia e o

    envolvimento de menores de dezoito anos tm aumentado. Ademais, quem

    tem maturidade para votar, trabalhar, matar, roubar, traficar, estuprar, deveria

    ter, tambm, para responder por seus atos como qualquer adulto.

  • 40

    Existem mesmo algumas propostas que se no alteram o limite da

    imputabilidade do menor no Brasil, permitem que seja alterado o tempo de

    internao em casos especficos para alm dos trs anos.

    Os argumentos acima citados so os que aparecem com maior

    freqncia quando o tema em debate o da reduo da maioridade penal.

    Seja qual for o posicionamento, fato que, infelizmente, no Brasil, a cada dia

    que passa o problema da criminalidade e marginalizao do menor vem

    crescendo assustadoramente, destacando a questo da reduo da

    imputabilidade penal como um dos temas mais polmicos e discutidos em

    nossa sociedade, colocando, de um lado, em julgamento a eficcia e

    aplicabilidade das medidas scio-educativas contida na Lei 8.079/90, o

    Estatuto da Criana e do Adolescente e, de outro, a discusso das causas

    determinantes do aumento da violncia e da criminalidade dos menores, no

    entendimento de que o seu combate a nica maneira capaz de minimizar o

    problema.

    Existe uma corrente de doutrinadores contrria reduo da

    maioridade, que argumenta que se deve atacar as causas da criminalizao

    juvenil e no os seus efeitos, alegando que a diminuio da maioridade penal

    acarretaria danos irreversveis ao adolescente que retribuiria de forma violenta

    contra a sociedade que o atacou, alm do que ao ser remetido para o presdio

    retornaria sociedade ainda mais eficiente no crime e na violncia.

    Entretanto, a utilizao do direito penal como forma de conter a

    criminalidade, no se buscando sistemas e solues de preveno e insero

    social do jovem, no resolver o aumento da criminalidade praticada por jovens

    pois bem disse o Marqus de BECCARIA: o que intimida o criminoso no a

    dureza da pena prescrita, mas a certeza da punio.

    Em alguns pases onde se pratica a pena de morte no houve

    reduo significativa dos crimes.

    Na prpria sociedade brasileira existe um grande exemplo de

    ineficcia do agravamento de pena que a lei dos crimes hediondos que no

    fez baixar os ndices de criminalidade, muito pelo contrrio.

    H, no Brasil, uma inclinao para se tratar o resultado e no para

    prevenir que o fato no ocorra, esse pensamento totalmente ineficaz e a

    histria o tem mostrado seguidamente.

  • 41

    5 COMPARATIVO DA MAIORIDADE PENAL COM

    OUTROS PASES.

    O pensamento sobre a maioridade penal ideal varia muito de pas

    para pas, fato este que somente indica a total falta de consenso sobre o

    assunto, mesmo a nvel mundial.

    A Resoluo n 40/33 das Naes Unidas, de 29 de novembro de

    1985, estabeleceu as Regras Mnimas das Naes Unidas para a

    Administrao da Justia Juvenil, conhecidas como as Regras de Pequim, e

    recomenda que a idade da responsabilidade criminal seja baseada na

    maturidade emocional, mental e intelectual do jovem, e que esta idade no seja

    fixada baixa demais. Entretanto no explicta o que seria este baixo demais,

    deixando em aberto a interpretao sobre o tema7.

    Existem diversos pases que adotam maioridade inferior aos 18

    anos dando a estes um regime de tratamento especial. Por exemplo: na vizinha

    Argentina o adolescente pode ser julgado como adulto aos 16 anos, mas ir

    cumprir a pena em local especfico para sua idade, distinto dos detidos

    considerados adultos. Os EUA e a Inglaterra, adotam sistema nico, sem

    distino quanto idade, mas oferecem regime diferenciado de cumprimento

    das penas. A deve-se levar em conta o grande apoio social que o pas d ao

    jovem.

    J existem alguns pases que baixaram a maioridade penal mas

    acabaram retornando a sua idade inicial ou at aumentando. O Japo havia

    baixado para 14 anos, mas verificou aumento nos ndices de criminalidade e

    acabou aumentando para 21 anos a inimputabilidade penal.

    Alguns pases tem utilizado idades as mais variadas para a

    imputabilidade penal, entretanto, em razo da variao cultural, social e

    religioso de pas para pas no h como se comparar os ndices de

    participao em crimes pelos menores, entretanto alguns pases imputam

    penalmente at mesmo crianas de 06 anos, se falamos em reduo da

    maioridade penal, poderiamos chegar mesmo a seis anos de idade, idade esta

    7 http://pt.wikipedia.org/wiki/Maioridade_penal. Acesso em 26 jul 2011.

  • 42

    que culturalmente inaceitvel no Brasil, entretanto nos Estados Unidos,

    Inglaterra, Mxico e Groelndia esta a idade mnima penal; na ndia,

    Paquisto, Tanznia e Bangladesh a idade mnima de 07 anos.

    claramente visivel que, at mesmo em pases plenamente

    desenvolvidos, onde o Estado presente para o menor e sua famlia, a

    reduo da maioridade penal, ou mesmo a sua aplicao desde a mais tenra

    idade, no resolve o problema da criminalizao, havendo mesmo pases que

    reduziram a maioridade penal e no reduziram os ndices de criminalidade.

    Portanto, devemos nos basear em nossa prpria histria e

    verificar que culturalmente, reduzir a maioridade penal somente traria uma

    sobrepenalizao para a populao mais carente e desprovida da ateno do

    Estado omisso quanto as questes sociais e fiscalizao das leis postas.

  • 43

    CONCLUSO

    Conforme bosquejado sobejamente no presente trabalho, a

    maioridade penal hoje fixada em 18 (dezoito) anos de idade, sendo adotado

    pelo legislador o critrio biolgico ou etrio. Contudo, verificou-se que nem

    sempre foi assim, ou seja, no se adotou desde o princpio o limite de 18

    (dezoito) anos para a imputabilidade penal. Muitas legislaes foram criadas e

    aplicadas no Brasil ao longo de sua histria.

    Atualmente se encontra em vigor o Estatuto da Criana e do

    Adolescente, o qual foi promulgado em 1990 (Lei n 8.069/90) e que consiste

    em normas de legislao especial no qual esto sujeitos os menores de 18

    (dezoito) anos. O ECA tem como pressuposto a concepo da criana e

    adolescente como sujeitos de direitos, dando garantia ampla aos seus direitos

    sociais e pessoais.

    Entretanto, o aumento da criminalidade infanto-juvenil elevando-se

    at os dias de hoje e que cada vez mais recruta maior nmero de jovens, faz

    com que a maioridade penal seja o foco de grandes polmicas e discusses na

    sociedade, sobretudo no meio jurdico. Todavia, no nos cabe no presente

    trabalho exaurir o tema em questo.

    Em verdade, o Estatuto da Criana e do Adolescente no to

    eficiente o quanto deveria ser, existem falhas em seu cumprimento, razo pela

    qual no tem intimidado os menores infratores.

    Dessa forma, tal como foi explanado em captulo especfico, as

    opinies pblicas se divergem quanto reduo ou no da idade penal.

    Caso se entenda pela possibilidade de reduo da imputabilidade

    penal, at mesmo porque como foi dito alhures h um grande posicionamento

    no sentido de que seria inconstitucional eventual alterao do artigo 228 da

    Constituio Federal, o problema passaria a residir na idade certa para a

    reduo. E mais, qual seria o critrio ideal a ser adotado pelo legislador?

    Poderia se optar pelo sistema biopsicolgico (ou biopsicolgico

    normativo ou misto), onde as pessoas menores de 18 (dezoito) anos que

    praticassem crime ou contraveno penal seriam necessariamente submetidas

  • 44

    avaliao psiquitrica ou psicolgica para aferir o seu grau de

    amadurecimento. Como foi visto este critrio no uma novidade, posto que

    ao final do sculo XIX a imputabilidade penal era baseada no discernimento do

    infrator.

    O grande inconveniente dessa opo est na necessidade de percia

    psicolgica e psiquitrica em todo menor que venha a cometer infrao penal.

    E, como se sabe, inexiste em nosso pas estrutura organizacional para a

    realizao desses exames.

    Reduzir pura e simplesmente a idade penal no resolveria o

    problema em si, pois o adolescente uma pessoa em desenvolvimento, no

    podendo ser-lhe atribudo, indiscriminadamente, a responsabilidade pela

    prtica de um ato infracional.

    Ademais, ao contrrio do que erroneamente se propala, o sistema

    legal implantado pelo Estatuto da Criana e do Adolescente faz estes jovens,

    entre 12 e 18 anos, sujeitos de direitos e de responsabilidades e, em caso de

    infrao, prev medidas scio-educativas, inclusive com privao de liberdade.

    Por fim, impe-se sim uma reviso de todo o sistema que

    completamente falho. necessrio um ajustamento realidade social com a

    conseqente criao de meios para enfrentar a criminalidade com eficcia para

    que, assim, possamos ter uma sociedade mais justa e com menos violncia.

    No entanto, h de se ater que para que se resolva o problema dos crimes

    praticados por menores, no basta a imputabilidade, necessita-se de toda uma

    mudana social criando oportunidades de preparao para o ingresso do

    menor na sociedade e de ressocializao do menor infrator, alm de uma

    profunda mudana no sistema prisional brasileiro para oportunizar que o preso

    durante a sua internao, tenha tratamento digno, descrito no texto

    constitucional, propiciando ao mesmo oportunidades ao cumprir a sua pena,

    evitando que se eternize a universidade do crime.

    O Estatuto da Criana e do Adolescente, que tem como referncia

    Constituio Federal de 1988, tem como base a compreenso de que o menor

    um ser ainda incompleto, portanto naturalmente anti-social na medida em que

    no instrudo ou socializado, devendo assim a preocupao da sociedade em

    vez de querer reduzir a menoridade penal ou agravar as penalidades para

    estes, o procedimento deve estar focado no processo de formao do seu

  • 45

    carter, um trabalho a ser feito pelo sistema educacional e no atravs de

    penalidades criminais.8

    O criminoso o espelho do seu meio e resultado das omisses do

    Estado, se no investirmos na presena macia do Estado, em educao, e

    tratamento digno para os menores e para os presos, alm de mudanas do

    Cdigo Penal, atravs da minimizao do uso do direito penal, que no foi

    idealizado para resolver todos os problemas da sociedade, no teremos

    soluo de curto prazo.

    A simples reduo da idade de imputao ir, de imediato, aumentar

    o caos do sistema prisional, devolvendo para a sociedade, criminosos,

    menores ou no, ainda mais violentos e revoltados com a sociedade que os

    encarcerou, respondendo com a mesma violncia com que foram tratados.

    No existe formula mgica, entretanto, a maximizao das punies

    no o caminho e a historia tem mostrado isso.

    A soluo passa por uma ampla discusso sobre o tema para se

    aprimorar o ECA, bem como o sistema de educao, o sistema penal e o

    sistema prisional brasileiro.

    No se resolve o problema da criminalizao do menor apenas

    afastando-o da sociedade, pois o problema continua a existir oculto ou no,

    pesquisas apontam que a criminalidade no se resolve com penas posteriores,

    e sim com a preveno.

    O problema deve ser resolvido como um todo, no adiantaria, neste

    momento a reduo da maioridade penal. Outras medidas preparatrias devem

    ser tomadas inicialmente, como por exemplo: escola integral com cursos de

    formao tcnica visando insero no mercado de trabalho para o menor;

    acompanhamento scioeducativo por parte do Estado visando melhor preparar

    socialmente o menor, condies dignas de sobrevivncia do menor e da

    famlia; reformulao do sistema penitencirio brasileiro; etc.

    8 BRITTO, Jos Mrio de Oliveira. A Inimputabilidade Penal da Criana e do Adolescente e o

    ECA. Disponvel em

    Acesso em 26.07.2011.

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    No se pode criar a iluso de que apenas reduzindo-se a maioridade

    penal ir se resolver o problema da criminalidade de menores; a histria aponta

    que no.

    Para diminuir a criminalidade infantil e juvenil, h de se comear pelo

    incio, pela preveno, a preveno que diminui a criminalidade em qualquer

    faixa etria e no a punio, conforme cansativamente comprovado por

    diversos estudos tcnicos.

    O pensamento que deve permear a tentativa, talvez, a necessidade

    de mudana, no deve ser meramente jurdico, mas deve perpassar pelo

    pensamento psicolgico, social e at mesmo econmico.

    A presena do Estado como a presena da me para o seu filho,

    ausente o Estado (me) quem educar o menor? Quais os seus parmetros

    morais e sociais? Quais os seus limites?

    A discusso deve continuar e mudanas devero ocorrer, entretanto,

    busquemos uma mudana radical onde se modifique do incio ao fim da

    situao do menor e no apenas formas de aumentar a j gigantesca

    populao carcerria e a desigualdade social brasileira, o problema tem de ser

    enfrentado e no escondido nas celas dos presdios.

  • 47

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    ARAJO, Kleber Martins. Pela Reduo da Maioridade Penal para os 16 anos. Disponvel em: Acesso em: 05 jul 2011. BARROS, Guilherme Simes de. Reduo da Maioridade Penal. Disponvel em: Acesso em: 15 out 2010. BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentrios Constituio do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 2 ed. So Paulo: Saraiva, 2000. BRITTO, Jos Mrio de Oliveira. A Inimputabilidade Penal da Criana e do Adolescente e o ECA. Disponvel em < http://artigos.netsaber.com.br/resumo_artigo_18802/artigo_sobre_a_inimputabilidade_penal_da_crianca_e_do_adolescente_e_o_eca> Acesso em 26.07.2011. CAPEZ, Fernando. Curso de Direito