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1 VII Jornada VII Jornada VII Jornada VII Jornada VII Jornada Médico-literáriaPaulista Médico-literáriaPaulista Médico-literáriaPaulista Médico-literáriaPaulista Médico-literáriaPaulista Campos do Jordão - São Paulo - Brasil Campos do Jordão - São Paulo - Brasil Campos do Jordão - São Paulo - Brasil Campos do Jordão - São Paulo - Brasil Campos do Jordão - São Paulo - Brasil 25 a 28 de setembro de 2003 25 a 28 de setembro de 2003 25 a 28 de setembro de 2003 25 a 28 de setembro de 2003 25 a 28 de setembro de 2003 Anais Sociedade Brasileira de Médicos Escritores SOBRAMES - SP

Anais VII Jornada - 2005

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VII JornadaVII JornadaVII JornadaVII JornadaVII Jornada

Médico-literária PaulistaMédico-literária PaulistaMédico-literária PaulistaMédico-literária PaulistaMédico-literária Paulista

Campos do Jordão - São Paulo - BrasilCampos do Jordão - São Paulo - BrasilCampos do Jordão - São Paulo - BrasilCampos do Jordão - São Paulo - BrasilCampos do Jordão - São Paulo - Brasil

25 a 28 de setembro de 200325 a 28 de setembro de 200325 a 28 de setembro de 200325 a 28 de setembro de 200325 a 28 de setembro de 2003

Anais

Sociedade Brasileira de Médicos Escritores

SOBRAMES - SP

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SOCIEDADE BRASILEIRA DE MÉDICOS ESCRITORES

SOBRAMES - SP

Diretoria Gestão 2003/2004

Cargos Eletivos

Presidente: Luiz GiovaniVice-presidente: Milton Maretti

Primeiro secretário: Karin Schmidt Rodrigues MassaroSegundo secretário: Flerts Nebó

Primeiro tesoureiro: Arlete M. M. GiovaniSegundo tesoureiro: Marcos Gimenes Salun

Conselho Fiscal

Efetivos:Carlos Augusto Ferreira Galvão

Madalena J. G. M. NebóAldo Miletto

Suplentes:Sérgio PerazzoJosé Jucovsky

Manlio M. M. Napoli

AVII Jornada Médico-literária Paulista

é uma realização da

SOBRAMES - SP - Sociedade Brasileira de Médicos Escritores

Regional do Estado de São PauloSede: Rua Alves Guimarães, 251 - CEP 05410-000 - São Paulo - SP

Telefax: (0xx11) 3062.9887Todos os direitos desta edição reservados à SOBRAMES-SP

Copyright 2003 © dos Autores

A Comissão Organizadora da VII Jornada Médico-literária Paulista foicomposta por todos os integrantes da atual diretoria e por inúmeros colaboradores

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O homem a inventou faz muito tempo e ao usá-la para gravar seu pensamento,acrescenta nos caracteres que a compõe, sinais tão singulares quanto os da impressão

digital. Mesmo em caracteres primitivos como nos manuscritos do Mar Morto,se pode saber exatamente quantas pessoas os escreveram e o que escreveram

há milênios, isto porque têm “letras” diferentes e de características próprias,como explicam os técnicos tradutores.

A escrita é assim, soberba perante o tempo. O homem, esta carne que malresiste ao século em que nasce e passa rápido na história do cosmo, permanece

imortal, posto que grava o que pensa no que denominou de literatura, a arte das letras.

A SOBRAMES SP procura imortalizar nas páginas seguintes, os pensamentos emletras, com os quais seus associados edificaram a VII JORNADA MÉDICO-LITERÁRIA

PAULISTA. Aqui o leitor perceberá que as diferenças, longe de estarem nos formatos dasletras, estão nos estilos e sensibilidades, como matizes que cintilam

em um feixe de cristais.

Campos do Jordão, setembro de 2003

Luiz GiovaniPresidente da SOBRAMES-SP

Sociedade Brasileira de Médicos Escritores

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Sociedade Brasileira de Médicos Escritores

SOBRAMES-SP

A Sociedade Brasileira de Médicos Escritores, Regional do Estado de São Paulo, foi fundada em 16 desetembro de 1988 e congrega mais de cem membros titulares, acadêmicos, colaboradores, eméritos, honoráriose beneméritos.

Em 1989 surgiu a idéia de se reunir os colegas ao redor de uma mesa de pizza, como acontecera porocasião da fundação da entidade. A reunião mensal tornou-se uma tradição e foi intitulada “Pizza Literária”,e é realizada em uma pizzaria de São Paulo, com uma freqüência que costuma beirar quarenta pessoas. Nesta,além de se saborear uma deliciosa pizza e bater papo com os amigos, tem-se a oportunidade de ouvir ostrabalhos dos colegas e também apresentar os seus, se quiser. Tem-se, também, a possibilidade de encontrarcolegas de outras especialidades e formados nas mais diversas faculdades, além de sócios não médicos dasmais variadas profissões.

A cada dois anos a Regional de São Paulo promove uma Jornada Médico-literária. Estas se realizaram emcidades do interior paulista: Jundiaí, Bragança Paulista, Santos, Campos do Jordão, Águas de São Pedro eBotucatu. Em 2003, está realizando a VII Jornada, novamente na cidade de Campos do Jordão.

Como existem regionais da SOBRAMES em muitos estados brasileiros, nos anos pares é realizado umCongresso Nacional da SOBRAMES. Em 1994 e 1998, este ocorreu em São Paulo, organizado por nossaregional. O último Congresso Nacional se realizou em Belo Horizonte / MG, com expressiva participação dadelegação da SOBRAMES-SP.

Desde 1992 a SOBRAMES-SP publica um informativo mensal chamado “O Bandeirante” que é distribuídoaos membros. Por vários anos publicou o suplemento literário, as “Páginas Sobrâmicas”, trazendo trabalhosdos sócios da Regional de São Paulo. À partir de 2001 a publicação ganhou o título de “Suplemento Literário”,e continua sendo publicado mensalmente. Além disso, a Sociedade já editou sete coletâneas com trabalhosdos membros, a primeira publicada em 1990, com o título de “Por um Lugar ao Sol”. Seguiram-se “A PizzaLiterária” (1993), “A Pizza Literária - segunda fornada” (1995), “Criação” (1996), “A Pizza Literária - quintafornada” (1998), “A Pizza Literária - sexta fornada” (2000) e “A Pizza Literária – sétima fornada” (2002). Em1999, editou-se a “I Antologia Paulista”, contendo todos os trabalhos das “Páginas Sobrâmicas” nos seus doisprimeiros anos de publicação (abril 1997 a março de 1999). Em 2000 foi publicada a II Antologia Paulista,desta vez com trabalhos inéditos dos sócios. Em 2001 publicou-se a III Antologia Paulista, com trabalhosliterários publicados de abril de 1999 a março de 2001 no Suplemento Literário. Por ocasião desta JornadaLiterária de Campos do Jordão, a SOBRAMES-SP lança o quarto volume dessa série de antologias.

Em 1997, foi instituído o Concurso para A Melhor Poesia do Ano, Prêmio “Bernardo de Oliveira Martins”e, a partir de 1999, o Concurso para A Melhor Prosa do Ano, Prêmio “Flerts Nebó”, dos quais participam todosos membros da SOBRAMES-SP que apresentam seu trabalhos nas Pizzas Literárias.

A Sociedade Brasileira de Médicos Escritores, regional do Estado de São Paulo, orgulha-se de contar emsuas fileiras com escritores talentosos, muitos deles com livros individuais publicados, e a grande maioria comparticipações em coletâneas e antologias. Todos têm como maior ponto em comum o diletantismo e o amorpelas letras.

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INDICEINDICEINDICEINDICEINDICE

Alcione Alcântara Gonçalves 9Alcione Alcântara Gonçalves 9Alcione Alcântara Gonçalves 9Alcione Alcântara Gonçalves 9Alcione Alcântara Gonçalves 9

Lição de Amor / O homem imortal / Prelibar o amor / PercepçõesAldo Miletto 11Aldo Miletto 11Aldo Miletto 11Aldo Miletto 11Aldo Miletto 11

A chama / Semana SantaAline de Mello Brandão 12Aline de Mello Brandão 12Aline de Mello Brandão 12Aline de Mello Brandão 12Aline de Mello Brandão 12

AbaúnaAlitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da Silva 14Alitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da Silva 14Alitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da Silva 14Alitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da Silva 14Alitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da Silva 14

Sugurando Proteu: uma proposta educativa com superdotados / Faz-de-conta /Em casa / Do azul e dos sonhosAnita Aparecida de Souza 16Anita Aparecida de Souza 16Anita Aparecida de Souza 16Anita Aparecida de Souza 16Anita Aparecida de Souza 16A jardineira florida versus cerca elétrica / O boi Guindaste / Geometrizando / O poetaArlete Mazzini Miranda Giovani 19Arlete Mazzini Miranda Giovani 19Arlete Mazzini Miranda Giovani 19Arlete Mazzini Miranda Giovani 19Arlete Mazzini Miranda Giovani 19

A peste / O que é ser enfermeira?Carlos Augusto Ferreira Galvão 20Carlos Augusto Ferreira Galvão 20Carlos Augusto Ferreira Galvão 20Carlos Augusto Ferreira Galvão 20Carlos Augusto Ferreira Galvão 20A batalha do tremDagoberto de Oliveira Sant’Ana e Souza 21Dagoberto de Oliveira Sant’Ana e Souza 21Dagoberto de Oliveira Sant’Ana e Souza 21Dagoberto de Oliveira Sant’Ana e Souza 21Dagoberto de Oliveira Sant’Ana e Souza 21O astronauta / São Jorge do meu povo / Todos os negócios / EpitáfioEnrique Félix Visillac 23Enrique Félix Visillac 23Enrique Félix Visillac 23Enrique Félix Visillac 23Enrique Félix Visillac 23El valor del silencio / Las paredes testigosEvanil Pires de Campos 25Evanil Pires de Campos 25Evanil Pires de Campos 25Evanil Pires de Campos 25Evanil Pires de Campos 25Tio Jeca / O revólver / Recordar / Intuição e percepçãoFlerts Nebó 28Flerts Nebó 28Flerts Nebó 28Flerts Nebó 28Flerts Nebó 28

As classes dos judeus no tempo de Jesus / Algo novo, mas que é muito velhoHelio Begliomini 31Helio Begliomini 31Helio Begliomini 31Helio Begliomini 31Helio Begliomini 31Voluntariado / Origem da história da literatura / Aida Lúcia / Se eu não puderHélio José Déstro 34Hélio José Déstro 34Hélio José Déstro 34Hélio José Déstro 34Hélio José Déstro 34

Frases paranão esquecer jamais / O dom divino do sorriso / Lavanderia do futuro /São Paulo, coração- 450 anosJacyra da Costa Funfas 38Jacyra da Costa Funfas 38Jacyra da Costa Funfas 38Jacyra da Costa Funfas 38Jacyra da Costa Funfas 38O concurso / Um instante no passado / O campo e a cidade / SaudadeJosé de Souza Meirelles 40José de Souza Meirelles 40José de Souza Meirelles 40José de Souza Meirelles 40José de Souza Meirelles 40

O galãJosé Rodrigues Louzã 42José Rodrigues Louzã 42José Rodrigues Louzã 42José Rodrigues Louzã 42José Rodrigues Louzã 42Misha - a nossa gata / Uma visita de Papai-Noel / SuinãJosyanne Rita de Arruda Franco 45Josyanne Rita de Arruda Franco 45Josyanne Rita de Arruda Franco 45Josyanne Rita de Arruda Franco 45Josyanne Rita de Arruda Franco 45Fato / Regresso / EstrelittaKarin Schmidt Rodrigues Massaro 47Karin Schmidt Rodrigues Massaro 47Karin Schmidt Rodrigues Massaro 47Karin Schmidt Rodrigues Massaro 47Karin Schmidt Rodrigues Massaro 47Erosão do peito / Sangue quenteLuis Papagno 48Luis Papagno 48Luis Papagno 48Luis Papagno 48Luis Papagno 48Crisis / IroníaLuiz Giovani 51Luiz Giovani 51Luiz Giovani 51Luiz Giovani 51Luiz Giovani 51

Além da vidaLuiz Gondin de Araújo Lins 52Luiz Gondin de Araújo Lins 52Luiz Gondin de Araújo Lins 52Luiz Gondin de Araújo Lins 52Luiz Gondin de Araújo Lins 52Machista / Emoções / Resgates / Se alguém souber...

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Luiz Jorge Ferreira 54Luiz Jorge Ferreira 54Luiz Jorge Ferreira 54Luiz Jorge Ferreira 54Luiz Jorge Ferreira 54Ei, chefia! - Tim Lopes / Apelo IManlio Mario Marco Napoli 55Manlio Mario Marco Napoli 55Manlio Mario Marco Napoli 55Manlio Mario Marco Napoli 55Manlio Mario Marco Napoli 55O alfaiate / Meu pai e os jesuitasMarcos Gimenes Salun 57Marcos Gimenes Salun 57Marcos Gimenes Salun 57Marcos Gimenes Salun 57Marcos Gimenes Salun 57

Fiapos / Poema para qualquer absurdo / Tribunal / Um vôo a maisMarcos Roberto dos Santos Ramasco 59Marcos Roberto dos Santos Ramasco 59Marcos Roberto dos Santos Ramasco 59Marcos Roberto dos Santos Ramasco 59Marcos Roberto dos Santos Ramasco 59

Assunção / Bom dia, filho! / Primeira vez / Vida da FelicidadeMaria Julia Pereira de Moraes Prieto Peres 61Maria Julia Pereira de Moraes Prieto Peres 61Maria Julia Pereira de Moraes Prieto Peres 61Maria Julia Pereira de Moraes Prieto Peres 61Maria Julia Pereira de Moraes Prieto Peres 61

Vazio paradoxalMaria Virgínia Bosco 62Maria Virgínia Bosco 62Maria Virgínia Bosco 62Maria Virgínia Bosco 62Maria Virgínia Bosco 62Metáfora / Ossos do ofício / Cartas de amor / GrafiteMaria Zulcides Déstro 64Maria Zulcides Déstro 64Maria Zulcides Déstro 64Maria Zulcides Déstro 64Maria Zulcides Déstro 64

Uma menina diferente - Manuela / Convite irrecusável /Depoimento - na delegacia da mulher / A busca do tempo perdidoMario Edgar Hidalgo 67Mario Edgar Hidalgo 67Mario Edgar Hidalgo 67Mario Edgar Hidalgo 67Mario Edgar Hidalgo 67Sin darme cuenta / Viente variables / Labios mios / Sin palabrasMélida Velasco Cassanello 69Mélida Velasco Cassanello 69Mélida Velasco Cassanello 69Mélida Velasco Cassanello 69Mélida Velasco Cassanello 69

Querido pai / Feliz aniversário, Carlos Alberto / Beijos, só beijos / Amor sublimeMilton Maretti 71Milton Maretti 71Milton Maretti 71Milton Maretti 71Milton Maretti 71

Um caso tenebroso / O homem que ensinava a viverPaulo Expedito Rodarte de Abreu 73Paulo Expedito Rodarte de Abreu 73Paulo Expedito Rodarte de Abreu 73Paulo Expedito Rodarte de Abreu 73Paulo Expedito Rodarte de Abreu 73Mais fácil entender as vacas / O doteRenato Passos 75Renato Passos 75Renato Passos 75Renato Passos 75Renato Passos 75

Dona Jael / Acontecimento / A paz / A plumaRodolpho Civile 78Rodolpho Civile 78Rodolpho Civile 78Rodolpho Civile 78Rodolpho Civile 78Pavana para uma rolinha morta / Agonia e morte de um hotel três estrêlas - o DanúbioRonaldo Vieira de Aguiar 80Ronaldo Vieira de Aguiar 80Ronaldo Vieira de Aguiar 80Ronaldo Vieira de Aguiar 80Ronaldo Vieira de Aguiar 80O mais beloTomás Cavallero 81Tomás Cavallero 81Tomás Cavallero 81Tomás Cavallero 81Tomás Cavallero 81

Vidas paralelas / Ilusión / Soneto VII / Soneto XVIIIVictor José Fryc 82Victor José Fryc 82Victor José Fryc 82Victor José Fryc 82Victor José Fryc 82El vecino / El comprador del libro / Agonizan las hojas / Diario... diarioWalter Whitton Harris 88Walter Whitton Harris 88Walter Whitton Harris 88Walter Whitton Harris 88Walter Whitton Harris 88

Quem anda do lado errado? O sorriso / Se / LábiosWilliam Moffitt Harris 91William Moffitt Harris 91William Moffitt Harris 91William Moffitt Harris 91William Moffitt Harris 91

O antitabagista / Prescrição precisaWilma Lúcia da Silva Moraes 93Wilma Lúcia da Silva Moraes 93Wilma Lúcia da Silva Moraes 93Wilma Lúcia da Silva Moraes 93Wilma Lúcia da Silva Moraes 93

Caixa de Pandora / Nossos contrastesZilda Cormack 94Zilda Cormack 94Zilda Cormack 94Zilda Cormack 94Zilda Cormack 94

Sara... cura? Ou saracura? / O perfume / Em que? / Compu-mento

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VII JornadaVII JornadaVII JornadaVII JornadaVII Jornada

Médico-literária PaulistaMédico-literária PaulistaMédico-literária PaulistaMédico-literária PaulistaMédico-literária Paulista

Obras LiteráriasObras LiteráriasObras LiteráriasObras LiteráriasObras Literárias

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Lição de amor

“Não semeies vento para não colheres tempestade”! A máxima, agora relembrada, nos fazparar para meditarmos. A indulgência divina, é sempre benéfica para quem dela sabe aproveitar. Para isto, épreciso obedecer aos cânones das pregações cristãs onde deveremos beber a sabedoria e os ensinamentos doMESSIAS.

Procure, amigo, conhecer melhor a você próprio, retirando a venda que lhe cega, que lheincomoda e está lhe impedindo de sentir melhor os defeitos que são próprios do ser humano. Não fiquesjogando pedra no seu próximo, sem antes proteger a sua vidraça, pois, estas pedras voltarão contra ti, ferindo-o e ameaçando o seu bem estar. É mais fácil ver e constatar o defeito dos outros que reconhecer os nossos.Buscamos sempre justificar as nossas ações, gestos e atitudes por mais bizarras e agressivas que sejam. É adefesa do “EU”, mecanismo psicológico que usamos para evitarmos sofrimento. Acontece que, muitas vezes,precisamos sofrer um pouco, ao reconhecer o nosso erro, para não deixar as nossas imperfeições crescerem,agigantarem-se, evitando, deste modo, maiores dificuldades no futuro. Evitemos espalhar a discórdia, o malestar, a mentira, o opróbrio, a desconfiança, o adultério, as frustrações e o mal e estaremos preparando umambiente agradável e acolhedor onde reinará o AMOR, a compreensão e o bom relacionamento entre ospovos.

Preparemos a nossa morada com muito carinho, pois ela é e será o local onde descansaremos,onde encontraremos os nossos familiares, os nossos amigos e onde desfrutaremos de bem-aventurança. Então,prepare-a amigo! Não se esqueça: se queres confôrto e bem estar, contribua para isto já, não deixando paraamanhã o que podes fazer hoje. Se queres dormir num leito limpo e perfumado, não dissemine poeira no ar,nem odores desagradáveis, porque você também será uma das vítimas. Como vês, de nada adianta atirarmospedra no telhado dos outros, sem antes protegermos o nosso; e só o faremos, quando deixarmos de agredir aquem quer que seja, sem justificativa plausível.

Vamos doar AMOR sem esperar qualquer recompensa! E, se assim o fizeres, tendes a certezaque colherás mais AMOR!

Alcione Alcântara GonçalvesAlcione Alcântara GonçalvesAlcione Alcântara GonçalvesAlcione Alcântara GonçalvesAlcione Alcântara GonçalvesMédico psiquiatra - Tupã - São PauloMédico psiquiatra - Tupã - São PauloMédico psiquiatra - Tupã - São PauloMédico psiquiatra - Tupã - São PauloMédico psiquiatra - Tupã - São Paulo

O homem imortal

Certa vez, um JOVEM irrequieto, em plena adolescência, buscava encontrar respostas parasuas indagações, para suas dúvidas, para suas incertezas e passou horas a fio pensando e imaginando coisas,buscando respostas para os seus pensamentos que lhe angustiavam.

Como sempre, determinadas pessoas quando abordadas por esses jovens, não lhes dão a devidaatenção, o que lhes deixam mais ansiosos, aumentando cada vez mais as suas dúvidas e a desconfiança emtudo que lhes cerca. Assim, surge a revolta no seu interior, incapazes que são de entender todo o mecanismocósmico que procura desvendar. Não se contentam com respostas evasivas, porque buscam explicaçõesplausíveis e convincentes. Não aceitam explicações vãs e sem conteúdo científico, pois sabem que a Lei deNewton pode ser comprovada através da FÍSICA, assim como a força centrífuga explica e serve de parâmetropara os construtores de rodovias, ensinando-os através da FÍSICA, a impedir acidentes automobilísticos. Sabemque através da QUÍMICA podem explicar a existência da água, este líquido preciosíssimo para nossas vidas,formada pela junção de dois átomos de Hidrogênio com um átomo de Oxigênio; isto para não falarmos nadesintegração atômica, que nos deixou uma amarga lembrança, quando do seu “mau” uso em HIROSHIMAe NAGASAKI, produzindo centenas de milhares de vítimas em conseqüência dos efeitos danosos, deletérios emortais da fissão nuclear. Também sabem que a BIOLOGIA nos explica a Reprodução dos seres vivos, -através da FECUNDAÇÃO SEXUADA e ASSEXUADA - destacando-se entre eles o HOMEM, por ser dotadode inteligência; sem querermos entrar, aqui, na discussão da existência ou não de outros seres inteligentes.Também sabem, por outro lado, que LAVOISIER, através de sua “LEI”, explicou as transformações e mudançasnaturais, que encontram objetivos e utilidades em tudo que existe em nosso derredor, enunciando-a assim:“Em a Natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”. Mas, o jovem continua a pensar e a seindagar: A FÍSICA me explica as reações atômicas, entre outras; a QUÍMICA pode me explicar a ação dosFármacos e da Adrenalina modificando as minhas EMOÇÕES; a BIOLOGIA nos ensina desde o nascimento,o desenvolvimento, o crescimento até a morte dos seres vivos. Mas, o que me explica a “VIDA” em si?! e o quea ANIMA?

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Prelibar o amor

Num mundo sem graça,A desgraça que rola,A mola da vida,Na ida pra lida,Da vida diária.

No aro da roda,Que rola nas ruas,Na tua procura,Pelo afeto que cura,As agruras diárias.

Semeias sempre o bem!Mesmo que não tenha um vintém,Porque além de fazeres o bem,Não tem o sabor do desdém,Que da luta de classes provém.

Na busca da graça,Na roça da vida,Burilas o homem,Que não tem comida,À procura do amor pela vida!

A roda viva que rola,Os prazeres e anelos da vida,Nem sempre chega aos convivas,Para cada um prelibar,O gosto singelo e humano de AMAR!

Alcione Alcântara GonçalvesAlcione Alcântara GonçalvesAlcione Alcântara GonçalvesAlcione Alcântara GonçalvesAlcione Alcântara Gonçalves

Percepções

Das entranhas de onde viemos,Não podíamos visualizar,O ambiente morno e aquoso,Que se mantinha sem se alterar,Para assim nos proporcionar,Um grande sentimento de bem estar.

Com os sentidos da visão,Que não se podia acionar,Pois mantínhamos as pálpebras cerradas,Para proteger o globo ocularDiante do líquido amnióticoQue poderia lhe afetar.

Neste mar salgado e quenteEnvolvido por uma bolsa plangenteQue foi denominada placentaCom forma esféricaComo o globo terrestreA mãe terra da gente

Com os sentidos da audiçãoSabíamos que podíamos contarPois o som se propaga na águaQue penetrando no conduto auditivoAtinge o tímpano e o labirintoLevando ao córtex a comunicação.

Do olfato não tenho certezaSe poderia ser acionadoCom os pulmões colabadosA sábia natureza impediaA água que nos envolviaPelas narinas pudesse ter penetrado.

Com o sentido da gustação,Também fica uma interrogação;As papilas gustativas como pontos de captação,Contidas e distribuídas na línguaSó poderiam saborear água salgadaGerando assim: gosto ou desgosto?

Mas com o sentido do tatoConcentrados nas pontas dos dedosE também espalhados pela superfície corpóreaSão todos pontos de captaçãoDe frio, dor e calorQue o sistema nervoso central transforma em percepção.

Aqui entram os Psiquiatras, Psicólogos, Parapsicólogos e Neuro-fisiologistas, tentando explicar ofuncionamento cerebral como o centro das EMOÇÕES, do PRAZER, da DOR, da ANGÚSTIA, das FOBIAS,da ALEGRIA e DEPRESSÕES. Mas, não lhe satisfaz ainda, porque faltam explicações para o ”PRINCÍPIOVITAL”, que só se consegue explicar através da FÉ, naquilo que poderemos chamar de “ESPÍRITO”, de “ALMA”,que nos ANIMA, que nos VIVIFICA E NÃO MORRE JAMAIS! Esta chama de Luz que existe dentro de cadaum de nós é perpétua, não morre, não se estiola, não fenece e, por isso, devemos cuidar bem dela, pois asconseqüências dos nossos atos, recairão sobre ela, alegrando-a ou fazendo-a sofrer. O JOVEM, finalmente,imbuído desta FÉ, chegou a conclusão de que o HOMEM É IMORTAL!.

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A chamaUma chama pequenina, de uma vela a bruxulear,Reluzindo branda e fina, rompe as trevas e a alumiar,Nos desperta, na surdina, silenciosa, o meditar,Pois, com ela, se ilumina, na consciência, o meu pensar!...

Na verdade, ela é uma vida, na sua essência, elementarE, calada assim, convida, com prudência, a nos cuidar,Pra levarmos de vencida, com seguro bem estar,A batalha, em que aguerridas, nossas mãos hão de lutar!...

Como a chama, a própria vida, que sustenta o nosso ser,De repente, mal se inflama, queima em brasa um bem querer,Destroçando o que se emana, de um sadio e bom viver,E por terra se esparrama... Como a lama faz sofrer...

Ou qual brasa, que se inflama, que incendeia, que arruinaOs afetos, mais profundos, que em desgraça, já os deformaNo amor posse, que semeia ciumes, ódios e assassina,Bate, mata e, na cadeia, num inferno se transforma!...

Mas por outro lado a vida, com amor, bem clara e bela,Como o lume de uma vela, feita só pra iluminar,Também clama bons cuidados, pois que é chama, como aquela,E bem pode, descuidada, por um sopro se apagar!...

Aldo MilettoAldo MilettoAldo MilettoAldo MilettoAldo MilettoMédico psiquiatra - São Paulo - SPMédico psiquiatra - São Paulo - SPMédico psiquiatra - São Paulo - SPMédico psiquiatra - São Paulo - SPMédico psiquiatra - São Paulo - SP

Semana Santa(Meditação)

Bendita seja a terra umedecida,[ A VIDA ]Que distraído, andando ao léu, amasso,[ VIVENDO ]Sujando-me o sapato e, na medida,[ TROPEÇANDO ]Fixando a forma feita de meu passo![ SENDO ]

É nela que se esconde, recolhida,[ BUSCANDO ]Embora disfarçada, no pedaço,[ REVENDO ]A base elementar de minha vida,[ FIANDO ]Com que Deus Pai me fez e pôs no espaço!...[ CRENDO ]

Se, quando a piso, sujo o meu calçado,[ CONTRITO ]Com água e escova o mal fica sanado!...[ PENITENTE ]O que não devo me olvidar, sem dó,[ DE PÉ, PORÉM ]

È que sou feito por Divino intento[ FOI DITO ]E um dia me verei, no firmamento,[ HUMILDEMENTE ]Do Céu, se Deus quiser,...na terra,...em pó!...[ COM FÉ!...AMÉM.]

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doces resíduos de riopele macia de abiuonde deságuo meu ciotátil - senso que sentiu.Ei...ei - vêm abalroando, vigilenga da lembrançaEi...ei - vêm desatracando, Tupana na contradançaBraço - abraço - igarapésbeijo e boca: igaritéspercorrendo nossas almas:líquen, laca, a nossa fé.Vozes, cantos, nossas armascom perfume de Guinéde laranja-alaranjadoque nem cor de guaraná.Flanco do ser, minha estreladeste céu embandeiradoquero o momento precisono meu verso encadeado.Ei...ei – vêm, um deus e um rio navegando essa manhãEi... ei – vêm, yaúpá caboclo, cheiro de erva e tucumãNão seja o pé indeciso,seja no barro, fincadono amor feito de terra,barro escuro - esverdeado.Frutas, folhas, flores, sabemRios, canoas, índios, ouvemo cantar desafogadohumana - e - ardentemente:alfabeto alfazemadoybura nalma da genteremo e rumo, o conclamadode cantar independente.Ei...ei – vêm, nódoas de chuvas viajando pelos riosEi...ei – vêm colheitas fartas, aguadouros, pingos friosMente aberta, afeto humanotrazem o bem da pessoa.Arte, cultura e belezasão da vida o que é ameno,chuva, trovão ou garoasão forças da natureza.Nesta vida o que-fazerquando a estrada é longa retaa contar do seu viversua sina e sua meta:flechada no coração,maré de arrebentação.Ei...ei – vêm, passadas leves fluindo por sobre o verEi...ei – vêm, brisas tão breves, sonos-sonhos de aquecerSem pressa, feita a cantiga,alma na palma da mãoresguarda mirada antiga,olhar de contemplação.Muita luta e sofrimento,Muito, o visto, na labuta.Vale o ser ficar atento,aprimorar-se, de fato.

Aline de Mello BrandãoAline de Mello BrandãoAline de Mello BrandãoAline de Mello BrandãoAline de Mello BrandãoMédica neurologista - Belém - ParáMédica neurologista - Belém - ParáMédica neurologista - Belém - ParáMédica neurologista - Belém - ParáMédica neurologista - Belém - Pará

Abaúna*

Ei... ei - vêm, o rio - deus, yarií dentro de mim...Ei... ei - vêm, canto e anauês, plumagens de curumim.Cama e dobra desaguada,afolhada de capim.Orvalho de madrugada,borboletas de marfim.Casa-e-selva escancarada,sulamericanas vozesfeito êxtases, velozesna floresta encantadeira.Chão de gumes de tocheiros,chora o látex grisalho.Chão de chãos, a Brasileiraantiqüíssimo sudário.Ei...ei - vêm, um rio e um deus, cantando dentro de mim...Ei... ei - vêm, mato, ybatés, tambores, adofiês...Cinqüenta- e- cinco - abaúnas,mestres de mato e boiúnas,Água-Mãe de alimpaduras,viajante nas lonjuras.No lilás de teus altares,ondas, rios, marés, funduras,fêmeas - asas , trazem os maresnas retinas das graúnas.Selva e luas desatadas,galopando nos vermelhosdas clareiras indomadas,chão de farpas, teus artelhos.Ei...ei - vêm um rio e um deus, plantando dentro de mimEi...ei – vêm, vazando a voz, o grito do curumimDa mãe-dágua, a aijulataAmazônia - ama da mata.Abadia almejadaerguendo murutucúsPálpebra semi-queimadaArgüindo uirapurús:luz de luzes, penumbradas,convocando ybicatú.Mastigo o grão, arrebentoo azul – grávido, criança.Usado o mordido ungüento,andyroba da lembrança.

Ei... ei - vêm floresta e um deus, gritando através de mimEi...ei - vêm o aviso aceso, nesse cantar no sem-fimVolteando canto e dança:a estrada, o brejo, a mata,o suor, sorriso, a trança,o voar, a veia, a meta,onde a sílaba encalhaa paixão desatrapalha.Onde vem macio, desnudo:coito de mel e veludo

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Aline de Mello BrandãoAline de Mello BrandãoAline de Mello BrandãoAline de Mello BrandãoAline de Mello Brandão

O tempo-ser, mais – valia,faz-se escrita, filho e criao parto da viva letraé a vida que soletra.Ei...ei – vêm, sílabas soltas silvando o sonoro tomEi...ei – vêm, selva de selvas verdejando vento bomAlma larga, gratidãoboca aberta, voz lançada,que a vida não seja em vãono barro onde fui criada.Canto – norte, harmoniade remos, na travessiaágua escura e cintilante,pleno sol de meio – dia.Meia – noite, a lua acesaencanta e traz nostalgia.Vontade de amar é reza.Ventre em prece é maresia.Ei...ei, vêm, ergue teus braços, segura meu coraçãoEi...ei, vêm, negra na raça, sou índia nesta naçãoBelém do Pará, és vidada floresta, aldeamento,preservas tualma altiva,cabano, teu pensamento.És portal de minha pátriacantiga de encantamento.Teu cocar: acangatarfoi doado por Maíraaçoiaba, o teu mantotecido no parauaracolorido deste cantode ave marajoara.

Ei...ei – vêm, O Rio e Deus, colhendo dentro de mimEi...ei – vêm, canto yari, auroras e adofiêsNada, nada é para sempretudo, tudo é para brevenada levo do que tenhosou só mulher que se atreve,na lonjura donde eu venho,de tirar a vestimentaimposta por quem não tenta,andar nua na florestamergulhar num afluente,ser humana, sem arestariqueza do ser viventefortuna é lua nascente.Ei...ei, vêm, praia de rio banhando dentro do serEi...ei, vêm, proa e canoa, navegando o amanhecerCantoria feito a palmaseda fêmea, no lamento.Trago a rama engatilhadagasto a munição que tenhorama em poesia, armadanas barrancas donde eu venhosei dos bilros dos açoitesrefincados nestas terrassei do hálito das noitesíndia antiga – velhas guelras.Sei do rio em deus, nas águas ,abaúna, flecha e guerra.

Ei... ei - vêm, ybura índia, boiando dentro de mimEi...ei - vêm, nessas enchentes, meu rio, começo e fim*

••••• Abaúna: índios de raça pura, que não se miscigenaram biológica e culturalmente. No Brasil, atualmente são raros,embora algumas tribos remanescentes vivam totalmente isoladas.Anauê ou inauê: o mesmo a ti, resposta que se dá a qualquer saudação.Yarií: os antepassados.Ybaté: o alto, o cume.Adofiê: pequena flauta de taquara com bocal de madeira (do iorubá).Curumî ou curumim: menino.Aijulata: peça de pano em que os índios se enrolam,espécie de tanga, julata.Andyroba: fruto da andirobeira, planta medicinal de onde se extrai um sumo amargo.Abiu: fruto do abiueiro.Tupana: o mesmo que Tupã = aquele que faz o ser.Yaúpá: útero.Tucumã: fruto da tucumanzeira.Ybura: jorro dágua.Ybycatú: terra boa.

Fonte: Bueno, Silveira, Vocabulário Tupi – Guarani, 1998, Éfeta Ed. SP.

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Faz-de-contaEstaríamos em algum ponto entre os leves passos de equilibristas e a solidez das rochas,

cheios de arte e sabedoria.Ficaríamos lado a lado, talvez dizendo tolices, talvez não. No silêncio prenhe de verdades,

tocaríamos até nossas almas.Riríamos muito, muito mesmo, até que os olhos, brilhando, nos lembrassem estrelas.

Repentinamente sérios, talvez disséssemos, solenemente, o que já sabíamos.Transgressores, alheios a tudo, o tempo resvalaria manso por sobre nossos ombros,

desvelando mistérios.Haveria vertigem de abismos, leveza de vôo, prazer de mergulho. Seríamos mais sensuais

do que quaisquer outros no planeta, incandescentes, amando no sentido mais assustador do termo.Corpos-orquestra, afinadíssimos, verteriam sinfonias. Desejo maestro, inúmeras

possibilidades, nenhuma limitação, tudo devastando, mas construindo o inesperado.Vergados, gemendo como feras, explodiríamos como vulcões.Depois, ficaríamos em silêncio.Poderosos, serenos como deuses.

Em casa

Tomo a sopa de sobrascom vinho tinto.Tenho na mão uma flor,rosa vermelha.Faz frio. Está tudo quieto.O velho agasalho me conforta.O gato mia,querendo abrir a porta.O cachorro também reclamapor afeto.Foi um dia bom, doce e completo.

Alitta Guimarães da CostaAlitta Guimarães da CostaAlitta Guimarães da CostaAlitta Guimarães da CostaAlitta Guimarães da Costa

Reis Ribeiro da SilvaReis Ribeiro da SilvaReis Ribeiro da SilvaReis Ribeiro da SilvaReis Ribeiro da SilvaMédica psiquiatra - São Lourenço - Minas GeraisMédica psiquiatra - São Lourenço - Minas GeraisMédica psiquiatra - São Lourenço - Minas GeraisMédica psiquiatra - São Lourenço - Minas GeraisMédica psiquiatra - São Lourenço - Minas Gerais

Do azul e dos sonhos

Quando acordou, os seios cheios de sol,sonhava com aflições, perdas e dores.E devia ser assim, todas as noites,pois, pela manhã, o rosto já dizia.Sem queixas, sem remédio, sem compaixão,para onde correr, contra o que lutar?Para imaginar, tinha o resto do dia...sabia do risco de ir muito fundo.Fechou os olhos e se ajeitou na cama.De repente, entrou no azul profundo.Tudo ficou profundamente azul.E do azul teceu-se uma paz completa,inventando o amor em doce regaço,pura música, em ouro, em cristais...puro prazer de barco livre do cais,ocupando todo o tempo e todo o espaço.Por ironia, acordou. Sonhos malvados!Emergiu bruscamente do mundo azul,aterrissou em seus lençóis amassados,retornou de chofre àquela manhãabsurdamente real e luminosa.O sol já ardia um pouco em sua pele.O azul bonito, cheirando a infinito,se esvaíra. Por ter criado contraste,o sonho fora mais cruel que os outros.Teria todo dia para lembrarque havia perdido o que era seu,de direito: paz profunda e amor perfeito.

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Alitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da SilvaAlitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da SilvaAlitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da SilvaAlitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da SilvaAlitta Guimarães Costa Reis Ribeiro da Silva

Segurando Proteu:uma proposta educativa com superdotados

Eles sabem mais que nós. E esta é uma constatação que precisa ser feita, em nome da honestidade.Esses nossos alunos espontâneos, com alto nível de curiosidade e desempenho, cheios de energia e talento,expõem nossas falhas e fraquezas, mostram o quanto estão inseridos no mundo moderno e pós-moderno,como dominam a tecnologia da informação. Quanto a nós, professores, não bastam as conferências, os cursos, as reuniões, os grupos quecompartilham experiências: continuamos perplexos e maravilhados, porque eles são brilhantes. Nós, e outroseducadores, filósofos, cientistas, poetas... todos os que refletem sobre a questão da(s) inteligência(s). Oassunto “vende” bem. Há quem se proponha a desenvolver a inteligência alheia, há quem critique o excessivointeresse sobre o tema. O século XX foi pródigo em publicações deste tipo. Sabemos que “a escola há de mover-se por razões morais para não perder sua essência e espírito”(Escudero, 2000). Portanto, a educação dos superdotados reverte-se de grande importância. A informaçãotraz poder. Como será exercido esse poder ? Para que será exercido? Um distanciamento crítico faz-se necessário. O próprio nome (superdotado) não satisfaz. Pareceprivilegiar a pessoa, e daí à segregação e ao preconceito é um passo apenas. Por outro lado, a próprianatureza parece privilegiar a diversidade, em nome da sobrevivência. A única garantia parece repousar naconduta ética e moral, e aí está o desafio educacional mais importante para esses alunos, para quem tudoparece tão fácil. Muitos receberam em seus lares a base desta educação moral e a aceitaram. Outros não. Ea literatura é farta em apontar casos de superdotados que ficaram na marginalidade ou que simplesmentefracassaram na escola e no meio social. Muitos são bem educados e evidentemente talentosos, mas nãoescaparam da mediocridade e até mesmo da deriva social. Ensinar a esses alunos a persistirem, mesmo nasdificuldades, exercita sua auto-determinação e vontade, faz com que se importem com os outros, e podeajudá-los a se situarem no eixo moral que irá mudar positivamente suas vidas. E como podemos fazer isto? Mostrando-lhes o quanto nós somos determinados e persistentes. SegurandoProteu. Proteu, na mitologia grega era uma divindade marinha, guardião dos rebanhos de Posídon, que detinhao conhecimento do passado, do presente e do futuro (dom da profecia) e também o dom da metamorfose.Mas o único meio de se ter acesso à sua sabedoria era surpreendê-lo e segurá-lo fortemente. Proteumetamorfoseava-se sucessivamente em várias coisas, como: leão, javali, pantera, árvore, serpente, fogo,água corrente, mas, se continuava a ser contido, retornava à forma original e respondia a qualquer perguntaque lhe fosse feita. As pessoas cujo funcionamento intelectual está significativamente acima da média, parecem precisardesta contenção simbólica, para que possam mostrar todo seu potencial. Se pudermos suportar seus aspectosassustadores e imprevisíveis, suas mudanças de motivação e humor, podemos ensinar-lhes perseverança,tolerância, respeito, solidariedade, fazendo do aparente conflito uma ferramenta pedagógica. Essa diretrizatende ao atual posicionamento educativo intercultural, à educação personalizada e humanista, às exigênciasdo mundo agitado e complexo em que vivemos, com seu pluralismo étnico, lingüístico, religioso, econômicoe de gênero, em que a inteligência não é uma coisa única nem suficiente.

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Anita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaProfessora - Belo Horizonte - Minas GeraisProfessora - Belo Horizonte - Minas GeraisProfessora - Belo Horizonte - Minas GeraisProfessora - Belo Horizonte - Minas GeraisProfessora - Belo Horizonte - Minas Gerais

O boi Guindaste

João Paulo era um menino pobre, filho de Sr. João e de D. Paula. Era o mais velho de uma numerosaprole de oito. Com sete irmãos, precisava trabalhar para ajudar ao pai no sustento da casa. Moravam maisou menos próximos de uma grande fazenda - a fazenda do coronel Bento Lira.

Certa tarde de domingo, quando Coronel Bento Lira passeava com a família na sua D 20, encontrou-se,na estrada, com o pai de João Paulo, que vinha em sentido contrário, com uma enxada nas costas; apesar deser dia de descanso. Admirado com o esforço do homem, parou sua camionete para dar um dedinho deconversa com o pai do rapaz, que aproveitou para lhe perguntar se não estava precisando de um homem nafazenda, para qualquer mandado ou serviço. Coronel Bento Lira coçou o bigode, já pensando: “Se puxou aopai, deve ser trabalhador”. – Interrogou:

– Quantos anos ele tem?- Vai fazer dezessete. - Respondeu aliviado, sentindo que o coronel começara a se interessar em lhe

empregar o filho.– Mande ele lá falar comigo. – E despediram-se.Animado, o pai de João Paulo segui seu caminho.No dia seguinte, bem cedo, João Paulo foi ter-se com o coronel Bento Lira na expectativa de conseguir

o emprego. Depois de entrevistado pelo coronel, este decidiu que o rapaz começaria seu trabalho naquelamesma manhã. Limparia os estábulos, varreria o terreiro, cortaria capim para o gado que fica confinado - porrazões especiais e convenientes -, levaria recados aos vizinhos, quando necessário, pois não havia telefonenaquela região. Entusiasmado, o rapaz passou a desempenhar suas funções da melhor maneira que podia.

No confinamento havia um bezerro isolado, doente. De coração bondoso, o rapaz afeiçou-se a ele.Tratava-o com carinho, punha a comida e água perto dele, alisava-o, conversava com ele. Dizia: “Você vaificar bom! Vai sarar, crescer ficar bonito, vamos ser amigos”. Os dias foram passando e o pobre bezerro nãose levantava para nada. Continuava fraco, magro, triste. Até que numa manhã o coronel disse a João Paulo.Eu vou até à cidade. Quando eu sair, leve este bezerro até a beira do ribeirão, sacrifica-o e jogue-o no rio,antes que ele contamine o resto do gado. O rapaz sentiu uma dor no coração, pois já gostava muito daquelebezerro, mas ao mesmo tempo precisava cumprir as ordens do patrão. Ficou parado em silêncio, pensando noque fazer. O coronel montou seu cavalo e rumou para a cidade. João Paulo enrolou o bezerro num pedaço delona e o levou para a casa de seu pai. Chegando lá explicou o acontecido e pediu a seu pai que o deixassecuidar do bezerro escondido do patrão. O pai, que era um homem sensível, e conhecia os sentimentos do filhosabia que desde pequeno ele desejou ter um bezerrinho que este nunca lhe pôde dar. Coçou a cabeça dizendo:“Óia que ele pode adiscubri e manda ocê imbora... Nóis tem que escondê ele bem escundido lá nos fundo.Põe ele lá: vou cortar umas foia de bananeira e fazer uma cubertinha prele”. Feliz, o rapaz deixou o bezerrocom o pai e voltou para os seus afazeres. À tardinha, quando o coronel voltou, foi verificar se o bezerro nãoestava mais no estábulo. Mas felizmente não perguntou nada ao rapaz sobre o assunto. Todos os dias, o rapazganhava três litros de leite do coronel para levar para a família. Ia para casa correndo levar o leite para suamãe preparar um mingau para o seu bezerro e regressava à fazenda contente e aliviado por ter alimentado obezerrinho doente. Quando voltava do trabalho ficava brincando com o bezerrinho, conversando com ele,encorajando-o. Dizia sempre: “Você vai sarar, vai ficar bom. Vamos ser grandes amigos!”.

Quando João Paulo recebeu o seu primeiro ordenado, entregou-o a seu pai dizendo: “Compra umpacote de ração para o bezerro o resto sinhô pode ficar”. O Pai atendeu seu pedido.

Bem cuidado, recebendo alimentação balanceada, carinho e amor o bezerro foi ficando cada vezmais forte e bonito. Foi crescendo engordando e, para a alegria de todos, começou a andar pelo terreiro ecomer talos de couve, cascas de mandioca que encontrava caídos no quintal. Em poucos meses já estavapastando. Com o tempo, transformou-se num belo touro. Tudo aconteceu sem que o coronel descobrisse.

Numa tarde de sábado, estava o coronel sentado na varanda quando chegou um cavaleiro apressadolhe dizendo: “Coronel, a sua camionete está virada na estrada. Capotou e prendeu as pernas do seu filho nobarranco. Coronelsinho está com as duas pernas presas debaixo da camionete”. O coronel, mal acabou deouvir, saltou na garupa do cavaleiro e se dirigiram para o local do acidente.

João Paulo, que havia escutado a conversa, lembrou-se do seu touro orgulhosamente. Rápido, pegouumas cordas e laços na fazenda e correu para casa. Pegou o touro e levou até o lugar do acidente, onde todos

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O poeta

O poeta nunca está inteiro:desfaço-me aos pedaçosem cada verso que faço.E, se acabar a tinta do tinteiro,

escrevo a lápis num papel qualquer,porque o que o poeta queré deixar transbordar o que sentesangrando o peito e rasgando a mente.

O poeta fala do esplendorde um novo e belo amor,fala da tristeza e da nostalgia,do desabrochar de uma flor,

da alegria de um novo dia,e até da dor de sua alma vazia,do encanto de um novo encontro,da realidade e da fantasia,

da saudade, e da paixão.Na verdade, o poeta é um tonto,capaz de rasgar o coraçãopara criar sua poesia.

Anita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de Souza

estavam apavorados e sem saber o que fazer. Atrelou o touro à camionete e puxou-a no sentido contrárioconseguindo desvirá-la e libertar as pernas do filho do patrão. Feliz e, ao mesmo tempo, surpreso, o coronelperguntou: “Onde você arranjou este boi, João?”.

- Sinhô se alembra daquele bezerrinho doente que o sinhô mandou eu matar e jogar no rio? É ele. Esteboi que acaba de salvar seu fio é aquele que sinhô mandou eu matar.

O coronel franziu a testa, tomou o filho nos braços em silêncio, foi levá-lo ao hospital. João Paulopermaneceu no local por algum tempo alisando o seu valente touro que nesse dia recebeu o nome de BoiGuindaste.

Geometrizando

Pus meus sonhos num triângulo,um anjo em cada ângulo,um círculo em voltapara dar voltas,para girar, girar...

Fiz a esfera rolarno losango do teu olhar.No retângulo quatro paralelase, dentro delas,caminhei pra te encontrar.

Nos meus sonhos de triângulo isósceleseu fui a mesóclise, a perpendicular,a mediatriz que fiz rolar,num giro completo,buscando afeto.

E produzi um cone,escrevi, nele, o teu nome,ali guardei a espiral da ilusãoe, em círculos concêntricos,te dei meu coração.

Jardineira florida versus cerca elétrica

Foi-se o tempo em que as janelas das casas exibiam, orgulhosas, suas jardineiras floridas, alegres,onde as flores pareciam sorrir para os vizinhos e, balançadas pela brisa, faziam-lhe coloridos acenos ouconversavam com as irmãs-flores do jardim da casa da frente. E, com freqüência, as moradoras destas casasapareciam nas sacadas ou nos jardins se cumprimentando e se informando sobre as noticias do dia anterior.O noticiário verbal, de pequeno alcance, a quase total tranqüilidade. Nas cadeiras das varandas, o bate papode fins de tarde, na companhia de verdes samambaias. Lugar onde muitos negócios eram realizados pelossenhores, onde mãos de muitas donzelas eram pedidas. Como era bonito ver aqueles sorrisos róseos dealegria!

Mas, dessa beleza e tranqüilidade, hoje, só restam saudades. E que saudades!Os tempos são outros. As noticias são dadas agora por grandes emissoras de televisão, os negócios,

realizados pelos telefones celulares e Internet, e as moças, estas ficam noivas no Mac Donald. Adeus romantismode outrora! Hoje, quando passo de ônibus pelas ruas da Capital, escondendo a bolsa, com medo de assalto, vouolhando as poucas casas que ainda restam, sufocadas e assombreadas pelos edifícios, na vã esperança de veruma jardineira, uma sacada florida, um jardim. Deparo, constrangida, com grades, enormes cadeadossegurando (?) os portões.

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Anita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de SouzaAnita Aparecida de Souza

As flores das jardineiras foram substituídas por enormes cacos de vidro e, nas sacadas e muros,chuços de ferro! Os jardins, desolados, desnudos... As senhoras e os respeitáveis senhores já não podem maiscultivar suas flores. Não se vêem, não se falam quase. Saindo-se à sacada, pode-se receber bala perdida:podar as plantas do jardim é correr o risco de um seqüestro; bater papo na varanda é expor-se a assalto àmão armada.

As varandas pertencem, agora, a ferozes cães de guarda, muitos deles gerados e criados paraassassinarem – como temos sido informados pela mídia. Nas fachadas das casas e dos prédios, cercaselétricas e as placas de aviso das seguradoras: ‘Perigo! 1.500W’.

E nós da terceira idade, fragilizados por tantas razões que nos acompanham ao longo da vida, sem ahabilidade para dirigirmos o nosso carro – mesmo que blindado – ou ainda, sem recursos para manter ummotorista particular à nossa disposição para nos levar ao médico, ao dentista, ao advogado, ao banco – sobretudo – ou visitarmos nossos filhos, que já não têm mais tempo para nos visitar, ficamos, forçosamente,prisioneiros em nossas próprias casas, tendo por carcereiro permanente o medo. E o medo é um carcereiromuito dispendioso e perverso, pois ele traja a farda do pânico – doença dos dias modernos – criado pelaviolência. Este carcereiro usa, também, as armas da depressão, que nos faz sentir tristes, sem ânimo,desestimulados a executarmos nossas tarefas mais corriqueiras. E, na situação em que vive a maioria dosidosos na atualidade, morando sozinhos, sem o aconchego e a companhia dos filhos, a depressão torna avida insuportável, porque ela nos tira o ânimo para levantarmos da cama, tomar banho, preparar nossaalimentação e nos alimentar. Às vezes, quando podemos comprar o Prosak, que o gerontologista ou psiquiatranos receita, conseguimos dar uma prosa com Deus, pois, vitimados pela depressão, costumamos não quererconversa nem com Ele. Nestas amistosas conversas com Deus, ele, bondosamente, nos aconselha a entrarnum curso de línguas, de hidroginástica, a conviver com outras pessoas da nossa faixa etária, sair paradançar. Dançar! Sair à rua à noite? Só se for carregando um lampião para clarear mais e puxando um cão deguarda para fazer nossa segurança. Mas, aí, vai ficar ridículo. Vão dizer que estamos caducando.

Enquanto nossos governantes não pararem de improvisar tanto, com tão pouco acerto, enquantogrande parte deles, não se ocupar tanto com a corrupção e reconhecer que as drogas são o câncer moral queestá destruído a juventude brasileira e não providenciarem, urgentemente, campanhas maciças de educação,reeducação e combate às drogas, e também punições mais severas do que as atuais para os criminososreincidentes, com substituição das cadeias comuns por penitenciárias agrícolas; alfabetização, cursosprofissionalizantes gratuitos para detentos; enquanto pelo menos o curso fundamental não for gratuito eobrigatório – inclusive, dentro das penitenciárias – e não houver ensino médio profissionalizante que atendaa realidade do país; enquanto não se criarem cursos técnicos gratuitos e obrigatórios nas comunidadescarentes, em faixas etárias compatíveis, qualificando e reciclando a mão de obra, adaptando-a às novas emodernas tecnologias, não se conscientizar o povo da necessidade de se fazer controle de natalidade e melhorpreparação das mulheres para com o exercício da maternidade; não houver melhor aproveitamento dosalimentos, estendendo-se as informações às comunidades das periferias e dos morros – que vão fazendo ocerco das cidades; enquanto não tratarem da saúde, melhorando os postos de atendimento; enquanto nãonos fornecerem policiais mais bem preparados, melhor equipados, mais bem remunerados e em maior númeronas ruas, resta-nos unirmo-nos em orações permanentes, em nosso enclausuramento, para que Deus nosproteja a todos e para que nossos filhos e netos tenham um Brasil mais ameno.

QUEM SABE AÍ AS JARDINEIRAS FLORIDAS VOLTEM ÀS SACADAS DAS CASAS E NOSPOSSAM FALAR DA ALEGRIA?

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Arlete Miranda Mazzini GiovaniArlete Miranda Mazzini GiovaniArlete Miranda Mazzini GiovaniArlete Miranda Mazzini GiovaniArlete Miranda Mazzini GiovaniEnfermeira - São Paulo - SPEnfermeira - São Paulo - SPEnfermeira - São Paulo - SPEnfermeira - São Paulo - SPEnfermeira - São Paulo - SP

A PesteDesde a época da Universidade, o tema sobre doenças infecto-contagiosas me interessa muito. Antes

da escolha da profissão, raramente fazia uma visita a pacientes internados em Hospitais, pois esta era umadecisão da família. Meu pai dizia: “Hospital é lugar para doentes, visitas a gente faz em casa”. Ouvia palavrascomo contágio, contaminação, perigo, isolamento, quarentena...

Logo nos primeiros contatos com o Hospital, já como estudante, observava que havia maneiras delidar com os pacientes, equipamentos e utensílios e que ofereciam proteção.Gostava de ler sobre o assunto ealguns pontos que aconteceram há muitos anos vale a pena contar a vocês, vários deles até bizarros.

Os avanços sobre a compreensão das infecções começaram para valer em 1348, quando a chamadaPeste Negra, assolou a Europa. E era o que se podia chamar mesmo de peste, pois em apenas dois anos matou1/4 da população do continente. Pouco se sabia sobre o assunto e a peste era considerada um castigo divinoou do próprio diabo, quem sabe... Logo o Papa Clemente VI tentou ajudar. Convocou todos para pedir clemênciaem Roma. Acredita-se que dos muitos que atenderam ao seu pedido, a cada dez, nove morriam pelo caminho.Então, dos que conseguiram chegar, o Papa ninguém viu. Este preferiu ficar escondido, com medo do contágio.O medo era tanto que nem mesmo o “tchauzinho “de longe ele tentou.

A peste se espalhou pelo mundo inteiro e já desconfiavam do papel sinistro que os ratos desempenhavamna transmissão da doença. Assim, todo navio que chegava da Oriente, os passageiros ficavam retidos naembarcação durante 40 dias, por causa da possibilidade dos porões esconderem passageiros clandestinos: ostemíveis ratos. Passado o período, se ninguém tivesse a peste, o capitão hasteava a bandeira branca: pronto,estava instituída a paz, quer dizer, a Quarentena.

O bacilo da peste, ao infectar o organismo humano, se aloja nas células dos gânglios linfáticos que,com o avançar da doença, vão formando as ínguas ou bubões: daí o nome de peste bubônica. A contaminaçãose fazia através da bactéria presente nas secreções do nariz. Observando tudo isto, o médico francês CharlesDelorme sugeriu vestimentas especiais, para serem usadas durante a peste. Mas, não imaginem um belo aventalbranco, alvíssimo. Era de tecido escuro e o médico deveria usar uma máscara em forma de bico e que continhasubstâncias aromáticas na ponta.

Era costume da época, em torno do ano 1600, lancetar os bubões dos doentes. Na ocasião, os médicostinham muita habilidade com as lâminas e o medo da doença era tanto que eles utilizavam facas que podiamchegar a 1,80 metro. É brincadeira!!

O que é ser enfermeira?Freqüentemente pergunto a mim mesma o que é ser enfermeira e o que gostaria que fosse dito em alguma

comemoração em que fosse lembrada. Deixo aqui com vocês a resposta. Se vocês estiverem ao meu lado nestacomemoração, lembrem-se de que não quero uma longa comemoração e nem mesmo um longo discurso.

Digam-me para não falar muito, para não dizer que tenho trezentos certificados de cursos e congressosrealizados. Isso não é importante. Para não dizer que fiz curso universitário e tenho trabalhos publicados. Issotambém não é importante. Para não dizer o lugar onde estudei. Para não dizer o cargo que ocupo. O local ondetrabalho. Os anos trabalhados.

Eu gostaria, sim, que alguém mencionasse aquele dia em que tentei dar o melhor de mim a serviço dospacientes, razão maior de minha profissão; em que tentei desempenhar, da melhor maneira, tudo que aprendi e quecontinuamente aprendo; em que procurei amenizar a dor, colaborar para a recuperação da saúde, dar um novoajuste na condição de vida daqueles que, um dia, a sorte por um instante esqueceu; em que tentei ser honesta nasminhas atividades e caminhar na busca da assistência ideal, apesar dos tropeços; em que tentei aliviar a dor dainternação e do afastamento dos familiares daqueles para quem o mundo passou a ser um leito de hospital; em quetentei enxugar uma lágrima e arrancar um sorriso de rostos tão sofridos; em que tentei distribuir otimismo,descontração, sorrisos, esperança, carinho e sobretudo profissionalismo a seres tão humanos quanto eu.

Sim, se quiserem dizer algo, digam que fui implacável defensora da justiça, dos direitos e dos deveres detodos e, sobretudo, da paz. Da paz do espírito, do dever cumprido e da missão realizada. Todas as outras coisas,triviais, não têm importância.

Não quero deixar para trás nenhuma homenagem póstuma, nenhum busto, nenhuma placa e nenhumnome de rua. Só quero deixar uma vida profissional de dedicação e realizações, sempre caminhando adiante.Passar a imagem de que ser enfermeira é, sobretudo, ser gente, possuir alma, ter defeitos e virtudes. Será que algumdia todos olharão para a enfermeira e enxergarão que ela tem também uma alma, ama, sofre, respira, alimenta-se,é mãe, é esposa, namorada, filha... e não apenas o robô infalível que, se erra, não tem competência e, se acerta, nãofez nada mais do que a obrigação? Ela é responsável por tudo, está no hospital 24 horas, mas será sempre umasombra nos resultados. Portanto, ser enfermeira é, antes de tudo, ser gente.

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Carlos Augusto Ferreira GalvãoCarlos Augusto Ferreira GalvãoCarlos Augusto Ferreira GalvãoCarlos Augusto Ferreira GalvãoCarlos Augusto Ferreira GalvãoMédico psiquiatra - São Paulo - SPMédico psiquiatra - São Paulo - SPMédico psiquiatra - São Paulo - SPMédico psiquiatra - São Paulo - SPMédico psiquiatra - São Paulo - SP

A batalha do tremA mais sangrenta batalha da Cabanagem

O Cenário parecia saído do mais avernal dos pesadelos. Acima pairava uma estranha nuvemcircunvolucionando sem sair do lugar como se Boitatá, a cobra grande, tivesse acordado de seu sono nalgumcanto do inferno e, em estado gasoso com seus anéis transformados em nimbos plúmbeos, tivesse vindoobservar divertida, tantos filhos de Deus se matando. Vez em quando raios rasgavam os ares, sobressaindo dapenumbra do temporal que se aproximava, anunciado muito antes pelo calor forte. Embaixo daquela danaçãodos céus, a morte preparava suas cestas para uma grande colheita. Tomei posição no telhado do casarão deClaudete de onde tinha uma visão panorâmica do local, mas que ficava numa distância prudente. Com minhaluneta comecei a observar o desenrolar dos acontecimentos.

Os cabanos, numerosos como grãos de areia, já tinham dominado todos os pontos fortificados legalistasnas proximidades do Arsenal de Guerra e já possuíam muitos prisioneiros. Pelo menos um terço da troparebelde tomava posição em torno do fortim, ocupado por soldados de elite e de comando bastante experientenas artes bélicas. Num momento Angelim, em seu cavalo, baixou o mastro e deu o sinal. Seus soldados emurros que até chegaram a mim, arremessaram-se a correr como uma matilha ensandecida, subindo a suavecolina em cujo topo se situava a fortaleza. Atiradores de Angelim, postados em cima dos prédios vizinhos,procuravam acertar as janelas dos pavimentos superiores e a massa cabana, no pé da muralha, procuravachegar nas janelas escalando as paredes.

Trovões pareciam mostrar para todos que o Diabo estava gostando do espetáculo. Quase confundidascom estes trovões, formidáveis explosões aconteceram entre as forças cabanas que cercavam o prédio,distribuindo o pesadelo entre eles pois voava pedaços de gente para todos os lados. Os legalistas estavamjogando granadas de fragmentação das janelas superiores. Eu já tinha ouvido falar daquela moderna arma eagora, trêmulo e horrorizado em cima de um telhado, via o poder de destruição e morte que continha naquelasesferas negras. Sem se intimidar com os petardos, logo novas ondas de cabanos vinham substituir osdespedaçados para, pouco depois, seguirem o mesmo destino. Ao longe meu rapaz preparava seus homenspara entrar em ação.

Ele corria na frente empunhando sua espada e gritava animando seu pelotão que o acompanhavaberrando e exalando ferocidade. Com o coração disparado, a boca seca e o pensamento cheio de orações atodos os santos que lembrava, acompanhei meu filho em sua destemida carreira.

Vi nitidamente a mancha vermelha se espalhando em seu peito nos dois passos desgovernados queantecederam sua pesada queda, da forma que desmorona um gigante. Desesperado, por um momento esquecique estava em cima de um telhado e, apressado para chegar ao meu cavalo, quase caí de uma grande alturaprovocando um grito numa puta que tomava banho nua no alpendre abaixo, indiferente aos estrondos infernais.

O animal empinava nas patas traseiras em relinchantes e assustados protestos, querendo recusar aminha ordem para que fosse em frente, mas com vigorosas esporadas em suas ancas, o fazia avançarrapidamente em direção ao que o assustava: as explosões. Frenético e de braços dados com a angústia, gritavaseu nome e o procurava, pedindo ao Criador a dádiva de sua vida. Já estava em alcance de fogo e ainda nãoo tinha achado, pois a perder de vista não havia um único corpo inteiro, apenas pedaços de troncos, cabeças,e sangue, muito sangue que voava de junto da fortificação lá de cima, donde também vinham gritos e gemidosdos que estavam sendo dilacerados. Ao longe, vozes berravam animando todos a lutar em nome do Brasil e doPará, naquela atmosfera que cheirava a pólvora queimada e sangue.

(Trecho do romance “A Terra de Tupã” – Expressão e Arte Editora – 2003 - Carlos Augusto Ferreira Galvão)

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Dagoberto de OliveiraDagoberto de OliveiraDagoberto de OliveiraDagoberto de OliveiraDagoberto de Oliveira

Sant’Ana e SouzaSant’Ana e SouzaSant’Ana e SouzaSant’Ana e SouzaSant’Ana e SouzaMédico - Salvador - BahiaMédico - Salvador - BahiaMédico - Salvador - BahiaMédico - Salvador - BahiaMédico - Salvador - Bahia

O astronauta

João nasceu na Terra. A bem dizer, na lua. Cheia.Sua mãe sentiu as dores quando atravessava a praça. Nada a demoveu dali, até que berrasse o

rebento.A primeira luz foi um mosaico trêmulo, feito de luz pálida, de folhas e de vento. Depois vieram outras

e muitas outras.Mas, só uma realmente lhe iluminou: a luz da Lua. A clara luz da Lua. A enigmática luz da Lua.Começou insidiosa por lamber-lhe a pele, aos poucos invadiu-lhe os olhos e finalmente penetrou-lhe

os sonhos, bem fundos, bem fundos, até onde os sonhos por não ter mais o que sonhar, sonham loucuras.João menino cresceu tropeçando na Lua. Arrebatado no vai-vem do fole das suas fases, na ilusão dos

seus “mares”, nos cinzas das suas “montanhas”. Um pequeno lunático!Galileu caipira, adolesceu de olhos grudados no céu, alheado os 27 dias do mês lunar, a espreitar

eclipses e adivinhar elípticas.Com ajuda, aprendeu áreas e distancias, conheceu limites e velocidades e terminou por entrecruzar

todos os traços da bola. A lua.Tinha-a na palma da mão e então, certa noite, lhe deu ganas de ter a palma da mão nela. A lua.O fogo da idéia viajou a jato as suas veias, orbitou acima das suas dúvidas e gravitou em torno do seu

bom-senso, antes de aterrissar na idéia louca de construir um foguete.Foguetes, cálculos, projetos, querosenes e gasolinas, fuçou todas as tecnologias cósmicas. Escarafunchou

bibliotecas, esquadrinhou planetários, escaneou os céus noite e dia.Gerou uma idéia, pariu um projeto, criou um monstro de latas e tubos e apelidou-se astronauta.Sua equipe assentou a geringonça no cocuruto de um morrote, o mais alto, o mais perto do céu e

ultimou os procedimentos.Consultou meteorologias e horóscopos. Equacionou luas e marés. Definiu data, precisou hora.Despediu-

se das gentes.Era véspera.Estavam ali, numa cisma muda, os dois se encarando, como dois abismos, numa mão dupla de

dúvidas e questionamentos, João e a Lua, num doloroso plenilúnio.Era dia. Era hora.A pequena multidão viu entrar naquele estranho gafanhoto metálico um escafandrista do espaço, que

acenava convicto da sua pretensa proeza.No zero de uma contagem regressiva, zoou um apito fino que logo ficou rouco e ainda mais rouco e

finalmente todos puderam assistir, atônitos, a uma estrondosa explosão em meio a uma imensa bola de fogoe fumaça, que se viu e ouviu à distância.

Ninguém nunca encontrou a caixa preta da sua ilusão, nenhum jornal noticiou a sua esfumaçadaesperança ou nenhum amigo jamais lhe identificou um traço de loucura diferente do próprio.

Foi um verdadeiro astronauta ............

São Jorge do meu povoCírculo de luz alva furando a noite escura. Lua cheia.Cheia da desesperança deste povo mais que povo, sofrido, pisado, mirrado, violentado, moído, traído,

descompreendido.Lua cheia de ódio, de fome, de peste, de tudo o que é ruim.Gorda, pálida, flutuando à toa na louça do espaço, esta lua mais que lua, estampa na cara virada pro

Sol , um S. Jorge cavaleiro e sua lança e um vencido dragão.O lume que desce do céu clareia um país: imenso remanso de um futuro eternamente prometido e

nunca vindo. Sua cara, já feia, não olha mais para frente, faz careta no espelho do horizonte, convexo, e seassusta com sua própria metáfora distorcida.

Valei-me S. Jorge, valei-me!!Padroeiro, poderoso, herói do povo, último redentor, traz na face e no gesto a dignidade que seu povo

já esqueceu.

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Todos os negócios

Ócio.Nego o ócio

Quando me falam de negócio.Mas nêgo, o ócio

É negócio!Quando negocio, nêgo

Nego o cio:Antes, negocio

Com negociantes .E se negaceio, nêga,

Sei-o.Se nêgo nega cio,Nêga nega seio

E ceiaE outros negócios.

EpitáfioQuando a carne de vez descer à terra

E a ânima liberar-se para sempre nos éteres,Tudo e nada restará neste imenso intervalo,

Do que fui e do que não fui.Gravem indelevelmente na pesada pedraTudo o que de mim deveria ter sido dito

E ficou perdido,Nos tortuosos caminhos da garganta:

Para que se exprimam todos os amores,Para que sublimem todos os venenos,

Para que dispersem todas as angústias.Esculpam na realidade dura do granitoTudo o que pude sonhar e nunca fiz;Digam que da música fui amante,

E da palavra operário;Demonstrem que fui inconstante,

Na mera constância;Imprimam na plástica argila,

Meu absoluto entusiasmo,Quiçá pouco divino,

Pela leviandade das paixões;Exponham a todos minha pretensa calma,

Com latência vulcânica;Lembrem que por vezes fui

Ardoroso amante,Perdidamente enamorado;

Afirmem que às vezes fui duro,Mas também pude ser doce;

Recortem no branco mármoreQue se tanto não ousei,Tampouco fui covarde:

Nunca temi o novo;

Dagoberto de Oliveira Sant’Ana e SouzaDagoberto de Oliveira Sant’Ana e SouzaDagoberto de Oliveira Sant’Ana e SouzaDagoberto de Oliveira Sant’Ana e SouzaDagoberto de Oliveira Sant’Ana e Souza

Teimoso D. Quixote tupiniquim perdido do Sancho Pança, lança em riste, insiste todo santo dia, todasanta noite, toda santa lua, todo santo dragão, o que seu povo fatigado já não insiste.

Onde os profetas desta terra promitente? Onde os milagrosos desígnios? Onde o radiante futuro?Chuva de balas sobre suas cidades, chuva de desmandos sob os seus governos.Um mar de miséria afoga os seus povos, um mar de corrupção salva os seus algozes!?!Façam-se ofertas de livros à mancheia e mande o povo pensar..- Fale, meu santo, uma palavra mágica, uma simpatia!- Diga, meu rei, com sua palavra santa, um desafogo pra essa ziquizira!Aonde suas gentes precisam de santo canonizado? Santo cassado lhe é mais próprio, cassados que

são de sua cidadania.- Ogunhê meu Ogum, valente cavaleiro das planícies capadócias, protetor das virgens raparigas;- Oquê-arô meu Oxossi, salve nossas ariscas moçoilas, caças prenhes da miséria e da ignorância.Santo importado, com versão em inglês e português d’além mar. Meu S. Jorge de carteirinha universal!Onde houver exploração, opressão, submissão.Onde houver guerra, onde houver dragão. Lá estará,

guerreiro, justiceiro, um Jorge cavaleiro azul de ronda, um santo soldado, um menino destemido, armado atéos dentes da coragem dos heróis.

Redivivo Lampião de uma catinga injusta. Pródigo Beato de um já desperançoso sertão.Já dizia minha avó, mascando um pauzinho de fumo, de cima da sua sabedoria nativa:- Só acredito em S. Jorge sem o dragão e com o cavalo com as quatro patas no chão” !!- E tem mais, rebatia meu avô :- “Só acredito em santo de madeira”!!Perdoai, meu branco, eles não sabem o que dizem !!!?!!

Mas, não esqueçam de deixar bem claroE em destaque

Apenas uma verdade insofismável,E que sobre mim todos saibam:

“Aqui jaz um homemQue gostava de comer cebola”

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Enrique Felix VisillacEnrique Felix VisillacEnrique Felix VisillacEnrique Felix VisillacEnrique Felix VisillacMédico Pediatra - Buenos Aires - ArgentinaMédico Pediatra - Buenos Aires - ArgentinaMédico Pediatra - Buenos Aires - ArgentinaMédico Pediatra - Buenos Aires - ArgentinaMédico Pediatra - Buenos Aires - Argentina

El valor del silencio

He caminado largo rato por las arboladas calles de un barrio que parece no ser el mío. Como si fueseun extranjero, he mirado las casas y los hermosos frentes que las adornan. Las personas que pasan a mi ladome parecen diferentes a las que transitan por mi barrio. Como un extranjero las he mirado con sana curiosidady esto lo digo porque ninguna de ellas me ha despertado sentimientos de envidia, celos o una irracionalirritación. Era una contemplación “aséptica”, que me hacía feliz. A medida que avanzaba por esas callesarboladas, sentía una sensación de bienestar que crecía como si alguien insuflara serenidad a mi espírituatribulado. Al llegar a una esquina, que debería ser la más céntrica del barrio, divisé un edificio gris con dospuertas también grises. En su parte superior, como si estuviesen dibujadas, dos manchas blancas y simétricasrompían la monotonía de su color plomizo.

Mientras las miraba escuché un murmullo de voces lejanas que se fueron acercando y aumentando deintensidad hasta transformarse en una vocinglería intolerable, que rompió el hechizo de aquel barrio arbolado.Todo cambió ante mis ojos que se negaban a creer lo que veían. Los árboles me parecieron raquíticos, sufrondoso follaje casi había desaparecido, las escasas hojas que le quedaban, habían perdido su brillo, y sucolor ya no era verde. Un amarillo desteñido lo había reemplazado. Los frentes que orlaban las casas eransimples y estaban sucios y en nada se asemejaban a lujosas mansiones. La casa gris era sólo gris. Mientrasmiraba este fenómeno, las voces que de murmullo se habían convertido en gritos, algunos de un volumeninsufrible, estaban muy cerca de mí. De pronto me vi rodeado de un grupo de personas que se peleaban confruición, y se blasfemaban con una agresividad propia de los vecinos de mi barrio. Al verlos, me encolericé ala par de ellos, y sin meditarlo me mezclé entre los revoltosos y participe de la pelea. Algunos suspendían susgritos para mirarme como si fuese lo que era: un extraño. Sin darme cuenta me había involucrado en unalucha sin tener la menor idea de por qué se había originado. De pronto, entre las caras sudorosas que seinsultaban y denunciaban las intimidades más íntimas sin el menor pudor, me encontré con un par de carasconocidas, que por la furia estaban desfiguradas. ¡Sí! esa gorda no era otra que Rosa, nada más que enojada.A Rosa nadie la podía imaginar sin su sonrisa, que de tanto exhibirla parecía una idiota. Nadie puede ser tanfeliz como para tener una sonrisa perenne. Mi sorpresa fue mayor aún, cuando a un hombre de unos cincuentaaños que se insultaba con gran frenesí con una mujer mayor que él, lo reconocí: era el sodero. El sodero máspacífico que yo había conocido. Era tan caballero que cuando otro sodero le quitaba un cliente, lo felicitaba.Verlo furioso contra esa mujer, incluso con amenazas que excedían lo verbal, lo habían transformado en unhombre agresivo. Cuando me reconoció, aumentó su cólera y en algún momento, me pareció, que amagó conpegarme.

Así como me había metido a pelear sin motivos, me retiré del campo de batalla por un motivo esencial:mi rechazo a la insensatez. Me fui alejando con lentitud. A medida que tomaba distancia del campo de batalla,me daba vuelta para observar el triste espectáculo que daban esas figuras que formaban parte de una tragediainnecesaria, que se difuminaban por la distancia perdiendo fuerza y nitidez. Habría caminado unos doscientosmetros cuando el silencio regresó al barrio. Era un silencio que paradójicamente decía y cambiaba muchascosas. Protegido por él recomencé a mirar el barrio que me había deslumbrado. Para mi sorpresa el edificiogris y sus simétricas zonas blancas, habían recobrado su hermosura. Lo mismo me pasó con los árboles quelucían sus frondosos follajes verdes como si alguien los hubiese repintado, y para aumentar mi asombro, losfrentes habían recuperado su belleza.

Caminé hacia la calle y me senté en el cordón de la vereda. Extasiado miré el paisaje, ya no como unextranjero, sino como un hombre amante de la belleza que otorga a las cosas la paz y el silencio oportuno.Poco después me dispuse con gran expectativa regresar a mi barrio. Pero no pude, porque nunca me habíaalejado de él.

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Las paredes testigos

Las paredes que me rodean han sido testigo de momentos que quisiera revivir y momentos que desearíapero no puedo olvidar. Las paredes son silenciosas y en su acendrado mutismo transmiten un silenciomurmurante. Las he mirado cuando la nostalgia mellaba mis sentimientos y en su rugosa superficie heencontrado respuestas que tal vez las palabras no me podían dar.

Las paredes que me rodean no están desnudas, están orladas por cuadros y láminas. Una de ellas seoculta tras una biblioteca y otra se ha engalanado con las lujosas puertas de un placard.

No sé el motivo, pero cuando tengo que reflexionar sobre cosas importantes, miro las paredes delcuarto, en el que también sueño con cosas que quizás nunca alcanzaré. Pero imaginar cosas que parecenimposibles es el principio en el que han abrevado las conquistas importantes, aquellas que se dan de tanto entanto pero cuando se dan te demuestran que la realidad imaginada se ha transformado en una realidadtangible.

Las paredes que yo miraba mientras elucubraba y alimentaba mis fantasías me han ayudado con surespetuoso silencio en mis momentos de dudas y fatiga. De ahí que quedan grabadas en mi cerebro pequeñossignos y anfractuosidades que de ella se desprenden y que son la esencia de la pared testigo.

Cuando pasan los años y la vejez comienza a asomarse en el horizonte de tus días, no como el majestuososol del amanecer, sino como un signo inequívoco del ocaso, se presenta en toda su magnitud la nostalgia.Muchas de las cosas que nos provocan nostalgia, son irrepetibles. Tan irrepetibles como la vida misma, quetozudamente avanza hacia ese horizonte que ahora se antoja desconocido. Mis paredes son trasmisoras derecuerdos con cada uno sus signos o anfractuosidades me permiten revivir los acontecimientos pasados conmás realismo. Es así como rememoro aquel día que mirando esa pequeña figura formada por dos irregularidadesenfrentadas, me rendí ante la mirada de unos ojos negros o goce con la sonrisa de mi hijo, o disfrute con laalegría, para mi muchas veces inexplicable de mi perro.

Todo es parte de la vida que es generosa con algunos pocos y mezquina con la mayoría. Las paredesde mi cuarto, donde sueño y pienso y además escribo suelen trasmitirme con su silencio el valor de las cosascotidianas. Las que alimentan el destino.

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Evanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposMédico infectologista - Botucatu - SPMédico infectologista - Botucatu - SPMédico infectologista - Botucatu - SPMédico infectologista - Botucatu - SPMédico infectologista - Botucatu - SP

Tio Jeca

Ao citá-lo, percorreu meu pensamento as profundezas de minha reminescente memória atada à minhainfância.

José era tio de meu pai, irmão de meu avô, e havia nascido em Laranjal Paulista, a exemplo de grandeparte da família.

Lembro-me, ainda, a história do Jeca Tatu de Monteiro Lobato, pela mesma origem cabocla. Nascerame cresceram no sítio e desenvolveram-se na mais pura e amiga natureza. O Jeca tornou-se símbolo do matutoque, desenvolveu o amarelão ou opilação. Este subjugou-o, por longo período, e tornou-o indolente e debilitado.Curou-se e venceu, porém, essa é uma outra história.

Conhecia Tio Jeca desde menino e muitas lendas corriam sobre ele. Suas artes e artimanhas eramcantadas e divulgadas. Surpresas e inovações eram construídas e imaginadas. Portanto, surpreendia-noshabitualmente. Meu pai queria-lhe muito e recebia-o cordial em nossa casa. Tinha o respeito e a amizadecarinhosa do sobrinho.

Convivia em nosso lar e nele passava, ao dirigir-se, diariamente à Fazenda Boa Esperança que,carinhosamente, administrava. Desse modo, freqüentava nossa casa e subia a escada da entrada principal alargos passos, a fim de surpreender-nos e divertir-se com as brincadeiras que, diariamente, criava ou improvisava.

Assustava-nos, muitas vezes, e se divertia com a nossa susceptibilidade à pilhéria ou com nosso temorde sua mente provocativa e instigadora que afluía sobre nós.

Sua grande estatura, seu porte austero, seu sorriso franco e brincalhão em um olhar sério e acolhedorcativava-nos diante de um semblante amigo e sincero. Seus longos braços e suas pernas magras e compridas,hoje, lembram-me Dom Quixote em sua face afilada e desenvolta. Era homem honesto e trabalhador quedirigia, de maneira exemplar, a propriedade rural.

O trajeto da Fazenda era, obrigatoriamente, a passagem pela rua principal do Bairro onde vivia seusobrinho Pedrinho, farmacêutico, e sua família. Parava e descia, cumprimentavam-se, conversavam, trocavamidéias fraternas e amigáveis. Algumas vezes subia, tomava um café conosco e, a seguir, continuava sua jornadamatinal em direção à fazenda. As crianças admiravam-no e, ao mesmo tempo, o temiam pelas suas açõessurpreendentes e momentâneas deliberadas.

Certa vez, pegou-nos de surpresa e, sorrateiramente, colocou-nos em sua baratinha (Rocinante) dequatro portas e levou-nos para o ponto mais alto da vila em sentido da estrada que levava à fazenda. Nesseponto, estacionou e simulou prender-nos, porém, permitiu que assustados corrêssemos, apressadamente, devolta para casa.

Em outra ocasião, recolheu-nos carinhosamente em sua baratinha e levou-nos à fazenda. Dessa maneira,iríamos passear e conhecer melhor a propriedade . Pela manhã fomos ver, em detalhe, o extenso e belo pomarque lá existia. Árvores frutíferas abundantes e de aroma melífluo preenchiam o amplo quintal. Ainda, cedo foià cozinha a fim de recomendar e sugerir o tipo de almoço a ser oferecido, aos filhos do sobrinho. No entanto,houve por bem, dirigir-se à cozinha e preparou, de arte própria, alguns pratos típicos e preferidos de nossafamília.

Assim, torresmos fritos à pururuca, virado de feijão, couve picada e gostosamente temperada, bistecasde porco, tenras e frescas, saborosamente preparadas, laranjas picadas, além de outros deliciosos quitutesapetitosos, por nós, apreciados.

Após um descanso, para bem assentar essa fausta e gulosa refeição, fomos olhar e compreender omecanismo de tratamento, varredura, separação e de estoques das sacas de café. Assistimos, também, aseparação dos bezerros e das novilhas das mães leiteiras e a colocação das vacas em uma pastagem próximapara facilitar o seu recolhimento e a ordenha na madrugada do dia seguinte.

À tarde felizes e vislumbrados regressamos para o nosso querido lar, onde nossos pais, carinhosamente,nos aguardavam.

Portanto, Tio Jeca, sempre viveu e sobreviveu em minha inesquecível infância. Seu carinho e amizadedemonstrados ao seu sobrinho, soube atingir nossa alma e nosso ser infantil. Essa imagem sobrevive em meuíntimo e esse pequeno conto permitiu revelar a pureza de sentimento que aprendi a desenvolver no seio dessafamília cuja benção divina concedeu-me nascer e viver.

O trajeto da vida ensina desvendar e a florescer em nossa mente as percepções, que afloram, educame enobrecem nossa breve existência.

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O revólver

Éramos meninos quando meu pai houve por bem, fazer uma ampliação da Farmácia e,conseqüentemente, de nossa casa assobradada. Reuniu para esse serviço as pessoas de sua inteira confiança,posto que tal obra seria minuciosa e demorada.

Convocou alguns senhores, bons e eficientes pedreiros, a saber: Torelli, Antenor e outros. Iniciaram oserviço que seria longo e exaustivo, visto que levaria um extenso período de atividade.

A reforma e ampliação desejadas corriam tranqüilas e diárias. Nós habitualmente, ao ir e vir pela casa,curiosamente, observávamos o trabalho desses laboriosos contratados. Tudo transcorria em perfeita ordem. Anossa curiosidade dava asas à imaginação e as múltiplas aventuras ocorriam, pelo interior da casa, em plenareforma.

Algumas vezes os pedreiros nos advertiam e outras tantas pediam o auxilio de meus pais para acalmaro excesso de algazarra vivida pelos garotos durante suas horas de trabalho. Assunto resolvido, éramosordeiramente levados e orientados para permanecer em livre brincadeira no grande quintal. Dessa maneira,postos em liberdade em nosso território infantil criávamos outras brincadeiras e artimanhas que alimentavamnossa fértil imaginação.

Nossa irmã, Eni, freqüentemente, nos acompanhava e, também, sabia elaborar e aprontar as suassutis e engenhosas artes.

Porém, um certo dia vendo os trabalhadores entretidos e absorvidos em seu, cotidiano, afazeres, acabeidescobrindo em lugar oculto, muito apropriado, um revolver, Colt Cavalinho, calibre 38 cano curto, eautomaticamente peguei-o. No entanto, como garoto, pouco sabia manuseá-lo. Brinquei com o revólver,solitariamente, e, a seguir, empunhando-o saí a andar, dirigindo-me até a área da reforma do Sobrado. Apesarde conhecer a arma era uma criança e, como tal poderia cometer uma imprudência ou dispará-la numa açãobem infantil.

Os trabalhadores ao perceberem e vendo a presença de um revólver em minha mão, assustaram-se eisso permitiu, portanto, imaginar o que poderia ocorrer; imediatamente o desespero e a aflição os atingiu. Osque estavam em uma escada, dela, rapidamente, pularam e correram em fuga, certos de que, um ou outrofosse à procura de meu pai. Aqueles que se achavam nos andaimes, nada puderam fazer e neles permaneceramatentos e temerosos. Alguns tremiam, outros se escondiam dentro do possível ou imaginado. No entanto,mantiveram-se apreensivos quanto à minha possível atitude. Poderia atirar? Eis a questão! Afinal era umacriança de posse uma arma perigosa. Poderia a arma disparar? Acionar, tolamente, o gatilho? Eis o perigo, eisuma situação complicada! Estavam presos, acuados e aflitos. E, ainda, retidos pela própria posição queocupavam. Era esperar e apelar pela sorte.

Intuição e percepção

A intuição clara e nobre da percepçãoRevela-se casta e pura na imaginaçãoNo olhar desnudo desvenda pia visãoPlena no íntimo busca astuta sensação.

O pensamento clama n’ alma a levezaEspecula no âmago da sábia naturezaNa reflexão consulta asserção supostaA ideação no perceber fica algemada.

A hipótese se realiza na razão ativaNela nutre toda matéria pesquisadaAbre-se na indução senso aguerrido.

Primoroso sentido cogita todo nutridoO pensar se deita na visão intuitivaO saber nasce na sapiência perceptiva.

Recordar

Recordar é o pio e nobre ato de amorNele o pensamento pródigo e cienteAo fluir libera e irmana o inconscienteNo sonho nossa alma acende o fervor.

A idéia vaga solitária na intençãoO real devaneia solto na imaginaçãoO porvir se imbrica pleno no presenteE o devir se insere no fato eminente

O ideal sonha e descobre a ima dorO ser floresce e procria sua imagemA alma escuta e vive íntima visagem.

A suposição suplica e aguça a intuiçãoO agir concilia o supor na vera deduçãoO pensar no existir elogia a conclusão.

Evanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposEvanil Pires de Campos

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Evanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposEvanil Pires de CamposEvanil Pires de Campos

Nesse ínterim, algum desesperado e mais criterioso servidor já havia visto e alcançado meu pai, pedindo,à ele, socorro. Ele cauteloso e carinhoso, dirigiu-se a mim e, paternalmente, pediu-me que lhe entregasse orevólver. Obedeci-o e imediatamente, devolvi-lhe a arma, pois, não tinha intenção de usá-la, e sim, apenas,peguei-a pelo prazer de tê-la na mão.

Meu pai, soube entender meu gesto infantil mas, aproveitou a ocasião para ensinar-me sobre o usoadequado, preciso e, eventualmente, necessário dessa sedutora arma de fogo. Era e é uma arma cuja finalidadeprecípua é a proteção humana. Jamais deveria ser utilizada para matar ou lesar um animal ou um serhumano.

Essas pessoas citadas, algumas delas já faleceram, inclusive meu estimado pai, mas os, atualmentevivos procuram, ainda hoje, recordar esse incidente e, alegremente, brincam, apesar de revelar o temor e aapreensão sentida no passado frente ao episódio, duramente vivido.

Sorrimos ao lembrar esse fato e felizes ficamos por sobreviver a uma grande atribulação e a umaperigosa aventura.

Os homens, habitualmente, apreciaram as armas e, inicialmente utilizaram as pedras para o abate deanimais e nas brigas tribais; sendo, gradualmente, modificadas na disputa de bens, região, posse ou lutasbélicas pelo poder e pela soberania: Verbi gratia - As Guerras: a) Tróia - sedução, poder e misticismo seconfundem; b) Alexandre Magno- a hegemonia; c) As duas grandes Guerras Mundiais e os Estados Unidos,recentemente, revelaram que a religião, a força, o poder, o interesse, o racismo e o menosprezo à vida sãopredominantes. Portanto, a arma foi aprimorada e deixou de ser, apenas, um utensílio de caça e de sobrevivênciada espécie humana na natureza.

Os obstáculos, as lições, as tribulações e as dificuldades presentes na infância servem para nos mostrare nos ensinar o modo de enfrentar as diferentes situações adversas criadas pelo ser humano na senda danossa vida.

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Flerts NebóFlerts NebóFlerts NebóFlerts NebóFlerts NebóMédico reumatologista - São Paulo - SPMédico reumatologista - São Paulo - SPMédico reumatologista - São Paulo - SPMédico reumatologista - São Paulo - SPMédico reumatologista - São Paulo - SP

As Classes dos Judeus no tempo de Jesus

Por vezes ao lermos algum livro ou trabalho relacionado ao tempo de Cristo, principalmente entre osanos 30 e 33 do Reinado de Augusto, que foi quando Cristo fez suas pregações, nos deparamos com termosque nos levam a uma pequena confusão sobre a constituição dos que mandavam na Palestina, independentedo domínio romano que era a voz suprema na época.

Desse modo encontramos os Doutores, os Fariseus, os Escribas, os Saduceus, os Essênios e o Sinédrioe, naturalmente, podermos fazer uma pequena confusão. É por isso que escrevemos esta cônica.

Doutores da LeiFuncionavam em referência às Escrituras Sagradas. A PIEDADE judaica consistia, principalmente na

observância material dos preceitos da Lei e de suas múltiplas interpretações, pelas quais a vida ficavaminuciosamente regrada. A Lei era o grande dom de Deus dos israelitas, pois por meio dela podiam conhecersua Vontade e andar em seus caminhos, confiantes numa recompensa justa.

O AMOR a Lei eram a essência da Piedade. Isto requeria uma classe de homens especializados noestudo apurado da Lei, para interpretá-la para o povo. Temos notícias de eruditos que exerciam este oficio apartir do tempo de Esdras e Neemias.

No começo prestaram grandes serviços ao povo a quem falavam com elevação em várias ocasiões.Mas a partir da época dos MACABEUS caíram num formalismo estreito e aniquilaram o espírito da Lei, contrao que Jesus combateu energicamente, advertindo o povo claramente. São estes Doutores da Lei os ESCRIBAS,mencionados com tanta freqüência nos Evangelhos. Com eles entreteve-se Jesus em longas palestras, quandose deixou ficar em Jerusalém, aos 12 anos, segundo o que se encontra no evangelho de Lucas.

Durante a vida pública, repreendeu-os severamente e desmascarou-lhes a hipocrisia. Avisou-os Jesus,embora pudessem ser ouvidos, porque tinham a doutrina verdadeira, não deveriam, entretanto, serem imitadosporque suas vidas não estavam de acordo com a doutrina. Silenciou-os por ocasião das armadilhas que lhepregaram (as Moedas de César, p.ex.). Pelo seu cego apego à tradição e às falsas idéias sobre o seu reinomessiânico, quando J.C. procurou corrigí-los, recusaram-se a aceitar os sinais de sua missão, tais como osmilagres e profecias, que nele se cumpriram, etc. e iniciaram a luta para destruí-lo, conseguindo por fim prende-lo e entregá-lo a Poncius Pilatus .

FariseusMembros de uma seita ou escola religiosa entre os judeus, sendo em cerca de 6.000 no tempo de Jesus.

Nascida no tempo da conquista grega da Palestina, para imunizar os judeus das contaminações de religiõesestranhas, para o que insistiam na completa separação (fariseu – quer dizer “Aquele que está separado, dosgentios). Requeriam uma estreita observância das ESCRITURAS e das tradições rabínicas, dentre o emaranhadodas prescrições e interpretações farisaicas sobre a Lei, recebiam maior ênfase: a pureza das cerimônias e opagamento das taxas religiosas. Havia certo fatalismo na doutrina dos fariseus, conquanto sustentassem aRessurreição e a Vida futura.

No tempo de Cristo, seu zelo primitivo degenerara em fanatismo e hipocrisia. Encabeçaram a oposiçãoa Cristo que lhes condenava a hipocrisia. Seu orgulho e complacência em si mesmos, foram objeto da parábolado PUBLICANO e o FARISEU . Nem todos, eram maus; Nicodemus, Gamaliel eram fariseus. Inicialmentequiseram aceitar a J.C. como o Messias, mas quando viram que para isso tinham de corrigir umas tantasopiniões tradicionais, como a maneira de observar o sábado e outras mais, preferiram rejeitar a Jesus apesardas provas estupendas que o Mestre deu de sua missão divina.

EscribasIndivíduo pertencente à classe culta entre os judeus e que no tempo de JESUS era considerada autoridade

oficial de interpretação e tradição da Lei. Quem quer que fizesse os estudos com sucesso, tornava-se escribaaos 30 anos, recebendo então a imposição das mãos com a entrega de uma lâmina escrita e uma chave. Comtoda a probabilidade podemos distinguir várias classes de escribas.

1- Doutores ou Rabinos – que mantinham escolas e ensinavam no Templo2- Legisperitos ou Advogados – que nos tribunais, discutiam os pontos da Lei Judaica3- Juizes – que se sentavam no Sinédrio Nacional ou nos Tribunais locais, como membros da Corte

JudiciáriaEnquanto a função dos sacerdotes era ritual, a dos escribas era doutrinária. Eram interpretes das

ESCRITURAS mas J.C. os condenou pelos pesados acréscimos feitos à Lei Divina. Ensinavam citando aoscélebres escritores do passado. No tempo do Cristo as principais escolas entre os escribas eram as do liberalHillel e a do sério Shammai. Em geral os escribas se opunham aos Saduceus e apoiavam os fariseus. Como os

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fariseus, os escribas eram celebres pela hipocrisia, orgulho e oposição a Cristo. Havia, contudo caracteresnobres e sinceros entre eles, especialmente Nicodemus e Gamaliel.

SaduceusSeita religiosa dos judeus. Eram menos numerosos que seus rivais os Fariseus. Mas muito influentes em

razão dos muitos nobres ricos que pertenciam as suas fileiras. Mantinham-se fora das tradições e semprerejeitavam as verdades ensinadas nos Livros Sagrados. Insistiam no LIVRE ARBÍTRIO, mas negavam aImortalidade da Alma e a Ressurreição do Corpo, bem como a existência os Anjos.

Poderíamos chamá-los de MATERIALISTAS daqueles tempos e o que é mais incrível, é o fato de atésacerdotes terem pertencido a essa seita. Foram acusados por João Batista e pelo próprio Cristo. Emboramenos ferrenhos que os Fariseus, em sua oposição a Cristo também buscaram apanhá-lo em ciladas e porseus representantes tomaram parte na condenação de Jesus no Sinédrio. Também se opuseram fortemente àprimitiva igreja porque os Apóstolos pregavam a Ressurreição de Jesus Cristo.

Sinedrio ou SenedrinEra o CONSELHO NACIONAL ou local onde, entre os judeus dotados de autoridade, se reunia para

julgar casos eclesiásticos ou civis. O Sinédrio Nacional, ou Grande Conselho dos Judeus. Se encontravaestabelecido em Jerusalém, comumente no Templo, mas às vezes na casa do Sumo Sacerdote. Por regra Geralera presidido pelo próprio Sumo Sacerdote.

Compunha-se de 72 membros, representando, igualmente os três grupos: SACERDOTES, ESCRIBASE ANCIÕES. Os 24 Sacerdotes eram escolhidos de cada uma das 24 Classes Sacerdotais. Este Conselhotomava conhecimento dos casos graves da doutrina, de jurisprudência ou de caráter administrativo que afetavama religião e a Nação Judaica.

A Assembléia se colocava em semi-círculo com o Presidente no centro e todos voltados para o Santuário,como a lembrar que a Justiça deveria ser observada. Os romanos reconheciam os direitos do Sinédrio e osLitores, assistiam as reuniões para executar as ordens dos juizes. No entanto, a Pena de Morte, no tempo deJesus, estava reservada à autoridade romana. Os Tribunais locais subordinados ao Supremo Sinédrio seencontravam nas diferentes cidades da Palestina e seus membros variavam de 3 a 23, de acordo com otamanho ou a população masculina do lugar. O “juízo” provavelmente se refere a um destes tribunais inferiores.

EssêniosAssociação religiosa no judaísmo palestinense, no tempo de Cristo; era uma espécie de ordem monarcal

com tendências nitidamente ascéticas. Dados sobre eles se encontram principalmente em Filo e Flávio José;também em Plínio e alguns Santos Padres. Eles são mencionados, mas não na Bíblia, nem na tradição judaicaoficial; possivelmente uma vez na Mixná. Seu significado corresponde, provavelmente, ao plural aramaico: Ossantos piedosos, ou os calados. Ao que parece viviam apenas na Palestina, sobretudo nas proximidades doMar Morto. Flávio José menciona-os pela primeira vez sob Jônatan, o Macabeu, e parece que existiam aindaquando ele, escrevia sobre a “Guerra Judaica” depois da queda de Jerusalém.

Praticavam a pobreza pessoal e o celibato (mas havia também uma espécie de ordem terceira para oscasados) viviam em obediência a superiores, escolhidos por eles mesmos, não se dedicavam ao comércio nemàs armas, mas proviam seu próprio sustento pelo trabalho manual, sobretudo pela agricultura.

Características de suas práticas religiosas são: abluções rituais, veneração a Moisés e dos anjos, umaoração matinal ao sol, observância rigorosa do sábado, abstinham-se do culto no templo de Jerusalém e desacrifício de animais. Só depois de longo tempo de provação o candidato era admitido, por um juramento, noscírculos dos Essênios.

Sua doutrina concorda em geral com a dos fariseus, porém tinham noção fatalista da providência epregavam sobre a alma uma doutrina secreta reservada aos iniciados. Embora os elementos principais doinstituto possam, portanto, ser chamados judaicos, houve também, indubitavelmente, influências estranhasbastante fortes.

De fato as tendências espirituais dos Essênios sempre foram alheias à corrente principal do judaísmooficial. Sobre a questão se a comunidade, cujos manuscritos foram achados em Qumrân, era composta deEssênios, ainda não se chegou à certeza.

AnciõesNo Antigo Testamento, diz: – Enquanto os israelitas viviam organizados em tribos, a autoridade ficava

nas mãos dos chefes das tribo, clãs e famílias. Geralmente eram homens de certa idade, os anciões. Emboratodos os chefes de família tivessem, em principio, direitos iguais, na realidade os chefes das famílias maispoderosas exerciam a autoridade na tribo.

É por isso que desde cedo o nome de ancião se refere mais a dignidade do que à idade. Os anciões deIsrael ou de uma tribo, formavam sua nobreza. Em tempo de guerra eles chefiavam os seus súditos e em tempode paz exerciam a jurisdição; como, porém não tinham poder de impor as suas sentenças com força, a suaautoridade era mais moral do que efetiva.

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Algo novo, mas que é muito velhoO berço da civilização, fala ao mundo ainda hoje desde a profundeza dos milênios já transcorridos até

estes nossos dias e vemos que acaba de ser descoberto o elo perdido do chamado Homo Sapiens. Vemos queos atuais mísseis, gastos pelos americanos, apoiados em mentiras, bombardeando a terra onde foi inventadaa escrita e a Roda! É sobre esses chamados Pilares da Civilização que vou falar um pouco.

Essa terra, que a irrigação, tornou produtiva, permitiu que o homem, pela primeira vez superasse onível da mera subsistência, dando-lhe lazer para pensar e recursos para se desenvolver, de forma criteriosa.Foram os sumérios que idearam o primeiro veículo de rodas, o código de leis escritas, o legislativo e o governopor cidadãos eleitos. E um poema sumeriano fez a primeira alusão a uma idade de ouro, que ainda hojeinspira os sonho dos homens. Mais do que qualquer invenção humana, foi a escrita que tornou possível acivilização. Quando os simples desenhos ruprestes cederam lugar aos sinais cuneiformes dos sumerianos eestes, por sua vez foram substituídos pela escrita alfabética, o homem conquistou um poder crescente deacumular e transmitir o que aprendera. A sociedade recebeu a história e tornou-se viável a sistematização dosconhecimentos humanos.

Até o século XV a escrita permaneceu como uma arte de uma pequena minoria. Foi preservada durantea Idade Média, sobretudo pelos monges que floreavam seus escritos com iluminurias. É a partir de 1440, coma invenção da imprensa que foi possibilitada a divulgação de obras escritas e com um grande surto depublicações. Podemos dizer que já no inicio do século passado existiam jornais imprimindo um milhão deexemplares. Em 1960 surgiu uma nova modalidade de impressão com os computadores, que veio capacitar aohomem a registrar mais conhecimentos do que sequer poderiam sonhar os velhos escribas da Suméria. Vejam,na história que lhes vou contar de dois ancestrais mesopotâmicos de nossos velhos conhecidos de hoje, Noé eJô. O conto assim o narra:

“Houve um tempo em que Enlil, o mais poderoso dos deuses, se desgostou da humanidade e decidiumandar uma inundação da qual nenhum vivente pudesse escapar. Mas a sentença pareceu demasiadamenterigorosa a Ea, um outro deus, que num sonho avisou a Utnapishtim, o mortal de sua predileção, e ele construiuum barco para seu uso e dentro dele colocou sua família e as sementes de todas as criaturas vivas... a bicharadados campos e todos os artesãos.

O barco resistiu à tempestade, que se desencadeou por seis dias e seis noites. No sétimo dia, quando aságuas baixaram, ele desembarcou e fez saírem seus passageiros, homens e animais. Então grato por ter sidosalvo, apresentou uma oferenda aos deuses, que censuraram a Enlil pela sua decisão impiedosa. Enlil num atode expiação, conferiu o dom da imortalidade a Utnapishtim e a sua devotada esposa.”

Encontramos entre as histórias da Suméria a seguinte:“Na Suméria figura a história do homem de nome desconhecido, rico. Judicioso e afortunado com a

família e os amigos, que um dia se encontrou sozinho e enfermo por motivos que ele não era capaz de entender.Cercado de torturadores, fez uma súplica ao seu deus tutelar que o observava dede o alto. O homem lastimandosua sorte exclama:

–Minha palavra honrada tornou-se mentira... Uma doença maligna cobre meu corpo... Deus meu... porquanto tempo me abandonarás e me deixarás sem proteção?”

A história deste Jô sumeriano tem um desfecho feliz, porque o deus lhe ouviu as preces e fez que asprovações terminassem tão rapidamente como tinham começado. Porém as questões fundamentais do sofrimentohumano e da justiça divina – formuladas pelo sumeriano e ainda com maior pungência pelo seu descendentebíblico – ainda nos desafiam.

Vejam que o que encontramos na Bíblia nada mais é que duas velhas histórias: a do Noé e sua arca ede Jô e suas doenças. Nada de novo sobre a Terra, e sabemos disso graças a invenção da escrita originária dadesaparecida Suméria, que os americanos agora desejam, no maior roubo de toda a história da humanidade,ficar com seu petróleo e suas “armas de destruição total”...

Conversa nova sobre tema velho...

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A organização tribal, baseada sobretudo no parentesco prevaleceu até depois da conquista de Canaãe mesmo depois do cativeiro. Contudo a vida cotidiana era determinada pela organização local. Por issotornava-os cada vez mais importantes no papel dos anciões da cidade, isto é dos habitantes mais notáveis.

A aristocracia urbana foi tomando o lugar da tribal. Com a instituição da realeza e a tendência dos reispara um governo mais centralizado diminuiu a autoridade dos anciões, mas assim mesmo os reis semprelevavam em conta a sua opinião e não poucas vezes eram seus conselheiros. O seu direito principal consistiaem poder admitir novos membros na comunidade religiosa e em excomungar.

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Origem da história da literatura brasileira

Joaquim Norberto de Sousa e Silva, natural de Niterói não ficou imune ao costume pós-independênciado Brasil de negar a sua descendência sobrenomes oriundos de Portugal. Assim, substituiu em seus quatrofilhos, o “Sousa e Silva” por Artur Niteroíno, Oscar Guanabarino, Armando Fluviano e João Sapucaíno. Estaousada façanha é apenas uma das facetas deste autor que foi contemporâneo de outros renomados literatoscomo Gonçalves Dias e Joaquim Manuel de Macedo.

Joaquim Norberto teve uma trajetória quase que desconhecida. Entretanto, foi quem inaugurou oromantismo brasileiro, sendo o primeiro a publicar a partir de 1859, na “Revista Popular”, uma “História daLiteratura Brasileira”.

Era de família humilde e trabalhava como balconista, ao mesmo tempo em que estudava. Autodidata,com 21 anos, foi nomeado funcionário da Biblioteca Nacional, condição essa que lhe deu acesso à eliteintelectual coeva. Posteriormente, integrou-se a outras instituições de renome, como o Instituto Histórico eGeográfico Brasileiro.

Começou a escrever aos 20 anos e continuou ao longo de sua vida até a morte, ocorrida em 1891. Sãode sua lavra estudos históricos, críticas, peças teatrais, poemas e até folhetins bizarros, como o aterrorizanteJanuário Barbosa ou as sete orelhas, de 1852.

Colaborou com a “Revista Popular”, transformada em 1862 no “Jornal das Famílias Brasileiras”.Também organizou inúmeras edições, como por exemplo, as “Obras Poéticas de Silva Alvarenga”, “Poesias deGonçalves Dias” e outras produções, totalizando cerca de uma dezena de volumes e traduções.

Sua ficção foi considerada medíocre devido à influência do bovarysmo, mania célebre dos românticosde se introduzir figuras de ninfas banhando-se em águas ou poetizar sobre atlantes alados das montanhas.Entretanto, o contexto de suas obras impressiona aos críticos pela quantidade e variedade, além do espíritopesquisador escrupuloso de ir às fontes literárias da cultura brasileira. Assim, fazia referências a outros autorescomo que querendo alicerçar sua autonomia cultural.

Propôs, ainda que anacronicamente, o nome da poetisa Beatriz de Assis Brandão, para sócia honoráriado Instituto Histórico, o que foi evidentemente recusado em virtude da flagrante desconsideração que a mulhertinha naquela época. Em 1849 lançou o livro “Poesias Eróticas” que só não causou maior escândalo, visto quefora dedicado à sua esposa. Mais tarde, em 1873, escreveu o portentoso livro, “História da Conjuração Mineira”,obra onde expressou seus dotes de historiador romântico.

Joaquim Norberto de Sousa e Silva foi o primeiro a falar, ainda que ingenuamente, numa línguabrasileira. Sílvio Romero, alguns anos após a sua morte, o definiu como “homem de estudo e de trabalho, quenão se afatigava, fugia de aborrecer-se e irritar-se; era alegre, bem-humorado, palestrador e cheio de anedotase gaiatices”.

Joaquim Norberto, além de ter sido um dos esteios do romantismo brasileiro, influenciou intelectuais deentão a pensar na nacionalidade brasileira, diferenciando-a da européia e, sobremodo da de Portugal.

Voluntariado “Em lugar de ser um homem de êxito, procura ser um homem valioso: o restante chegará naturalmente”

(Albert Einstein)

Por mais evoluído que o mundo hodierno esteja, há inúmeros quesitos no planeta que estão muito longede serem superados pela moderna tecnologia aplicada e pela consciência social que o homem alcançou. Agrande distância entre países ricos e pobres, a dívida impagável que muitas nações possuem e que as tornam“neocolônias escravizadas à distância” de outras nações ou instituições financeiras; a fome, a miséria, oanalfabetismo, as doenças endêmicas tradicionais ou que aparecem em surtos; as más condições de higiene ede saneamento básico são, dentre outros, fatores que contribuem para uma precária, primitiva, ou subumanacondição de vida para uma grande parcela da humanidade.

Governos que não priorizam o setor social fomentam a continuidade da miséria que grassa aqui ealhures. Este cenário, verdadeiro teatro de operações bélicas, só não é pior porque existe uma miríade incalculávelde soldados anônimos que trabalha diuturnamente para dar um pouco de si mesma ao seu semelhante. São osvoluntários. Quaisquer que sejam os nomes a eles dados, constituem-se num verdadeiro exército cujas armassão abnegação, trabalho livre e gratuito, desprendimento e amor. Não importa seus credos, suas raças, suas

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Helio BegliominiHelio BegliominiHelio BegliominiHelio BegliominiHelio Begliomini

preferências políticas, as condições geográficas que vivem ou as intempéries que enfrentam, todos têm comodenominador comum a solidariedade ao próximo que é um outro sinônimo de fraternidade.

De acordo com matéria publicada por O Correio - da UNESCO, algumas das motivações queimpulsionam o voluntariado são: 1- A expressão dos próprios valores internos (se alguém se julga uma pessoahumanitária, sentir-se-á bem no agir de acordo com esse valor); 2- A busca do conhecimento (há quem saiada Europa para o 3º mundo para entender a realidade social); 3- Razões utilitaristas (usa-se o voluntariadocomo meio de se alcançar outros objetivos como relacionamento social, aprendizado de idiomas, etc); 4-Identificação com a comunidade: é o caso típico dos que atuam numa área específica (ajuda a doentesmentais, aidéticos...), mas não atuariam em outra. Pode-se chamar de voluntariado heterocentrado; 5- Adefesa do eu: é a mais difícil de explicar ou de entender. Consiste em superar as próprias angústias pelocompromisso com uma ação voluntária, como, por exemplo, lutar contra a Aids por ser homossexual. É umtipo de voluntariado autocentrado.

Os voluntários sempre existiram, porém sempre aquém da ciclópica demanda existente, sobremodonos países subdesenvolvidos. De acordo com suas aptidões, necessidades onde vivem e motivações próprias,tornam-se presentes num multifário segmento da sociedade. São encontrados com mendigos, sem-terra, sem-teto, sem-instrução, desempregados, presidiários, indígenas, migrantes, refugiados, prostitutas, doentes, drogados,alcoólatras, neuróticos, deprimidos...

No Brasil, um notável exemplo que desperta a admiração do mundo é a Pastoral da Criança, lideradapela médica catarinense Zilda Arns Neumann, indicada em 2002 pela segunda vez consecutiva para o prêmioNobel da Paz. Dados estatísticos do 3º trimestre de 2001 revelaram que um megaexército de 145.000 voluntáriostem transformado a vida e as condições de 1.575.000 crianças carentes menores de seis anos, que vivem emnada menos do que 3.277 municípios brasileiros, além de atenção a 77.802 gestantes que vivem em bolsões demiséria. Mais de 1 milhão e 100 mil famílias, recebem os cuidados da Pastoral da Criança. Do ponto de vistaprático, pôde-se constatar que a mortalidade infantil no Brasil em 1999 era de 34,6 mortes para cada milcrianças nascidas, no primeiro ano de vida. No âmbito da Pastoral da Criança, esta cifra caiu para 13 óbitospor mil! No dizer da Dra Zilda, “nosso Prêmio Nobel já veio pelo fato de salvarmos mais de cinco mil criançasa cada ano e de recuperarmos outros milhares de desnutrição.”

O ano de 2001 foi escolhido como Ano Internacional do Voluntariado. Esta campanha estimulou milharesde pessoas e associações do mundo todo a intercambiarem experiências e conhecimentos entre seus voluntários.Este tácito serviço ao próximo não pode parar, sequer arrefecer. Urge que se rume denodadamente contra acorrente iconoclasta e materialista vigente e que se valorize esses humildes heróis da humanidade.

Numa imprensa falada e escrita que costuma conquistar audiência através da propagação de tragédiase notícias negativas, faz-se mister divulgar instituições, pessoas e ações que construam algo de bom e de bema outrem. Colocar essas idéias em prática, é uma das formas mais eficientes e nobres de exercer a cidadaniae trabalhar por um mundo melhor. Por sua vez, não deixa de ser fomento para que novas pessoas de boavontade se engajem no voluntariado. Valem os inteligentes termos da campanha em favor do trabalho voluntário:“Você não precisa pôr a mão no bolso... Basta pôr a mão na massa!”.

Aida Lúcia

Mais do que um perfumeEla é um delicioso aroma na minha vida

Mais que um benévolo ungüentoEla é eficaz medicamento nas horas difíceis

Mais que uma companheiraEla é uma marcante presença na sua ausência

Mais que uma amigaEla é minha confidente, assessora, orientadora

Mais que uma mulherEla é a musa que orienta meu amor

Mais que uma lenteEla ajuda a enxergar mais claro no mais escuro

Mais do que uma geratrizEla é a mãe de nossos filhos – nossas vidas

Mais do que uma amanteEla é quem compartilha minhas lutas, vitórias e derrotas

Mais do que um raro brilhanteEla é uma preciosidade em minha existência

Mais do que uma vida a doisEla é o esteio do meu lar

Seu nome: meu amorSua condição: minha esposaSeu destino: meu destino

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Helio BegliominiHelio BegliominiHelio BegliominiHelio BegliominiHelio Begliomini

Se eu não puder

Se eu não puder...remover as montanhas da incompreensão

que eu construa túneis nos caminhos do relacionamento.

Se eu não puder...executar grandes obras sociais

que eu seja simplesmente útil ao próximo.

Se eu não puder...ser um mestre e atrair multidões

que eu não propague ensinamentos fúteis.

Se eu não puder...ter o dom da oratória para convencer e esclarecer

que eu explicite pela coerência de meus atos.

Se eu não puder...ser um taumaturgo e realizar grandes prodígios

que eu me esforce em fazer o essencial.

Se eu não puder...eliminar as guerras e trazer a paz

que eu saiba aplainar as veredas entre os homens.

Se eu não puder...ser um grande administrador

que eu não subestime a ordem e a disciplina no trabalho.

Se eu não puder...ser um famoso líder e comandar pessoas

que eu execute bem o meu papel.

Se eu não puder... ter a lucidez dos grandes santos e santas

que eu tenha humildade de pedir-lhes ajuda.

Se eu não puder...transformar o mundo

que eu melhore o nicho onde vivo.

Se eu não puder...subtrair a miséria existente

que eu possa multiplicar o bem ausente.

Se eu não puder...dividir a dor daqueles que padecem

que eu multiplique os sinais de esperança.

Se eu não puder...transpor o precipício do racismo

que eu seja uma ponte de fraternidade.

Se eu não puder...abolir ódio que destrói

que eu restaure tudo no amor.

Se eu não puder...atrair uma miríade para Deus

que eu jamais abjure a fé.

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Frases para não se esquecer jamais1Mulher nenhuma leva o homem a falência, pode levar a potência ou impotência.Há amigos de esquina, de partidas de futebol, de jantar ou de praia, o difícil é de coração.Horas perdidas em noites e madrugadas na juventude, terás que pagá-las na alta idade.Toda vez que tens pressa é ai que encontra tudo para te atrasar.Tem senhoras que tem cérebro de mocinhas: o tempo passou e nem perceberam.Após a euforia, vem o cansaço, desculpas, boca e língua com gosto de cabo de guarda-chuva, entras novazio e com o passar do tempo tens saudade.Na vida até os quarenta é possível acelerar na subida, após, nunca o faça mesmo na descida.Todos os poetas têm asas de anjo, asas de borboletas, o mergulho dos peixes, o vôo dos gaviões, a força dosrinocerontes, a beleza do pavão enfim é um ser completo, na sua cabeça, porém é um louco e fora de seu tempo.Poetas são os malditos que enxergam com os olhos da alma.Tem hora que o tempo é infinito... Eterno, porém não é sempre, é finitotem segundos, minutos ou horas pode até ser em centésimos.Há amigos que batem as costas na frente e nas costas riem como inimigo de frente.Com o passar do tempo continuas não sabendo nada, qualquer um tem o que te ensinar.O caminhar à frente, quando olhar para trás poderia ter buscado outro caminho.A arma branca na mão de um negro, na tarde cinza fez do amarelo... Vermelho sangue.O amor no jovem quando pega, deixa-o cego, surdo e mudo, casar restitui as perdas.No trânsito, numa fração de segundos é melhor tirar um fino, do que um grosso.Nada é tão cor-de-rosa como se pinta ou diz.O pingo d’água de uma torneira com saudades tira sons de cachoeira.Os sons em parafernália atuais são curados com músicas clássicas e silêncio bruto.Na solidão buscas gente, com gente buscas solidão.É bom estar só com os pensamentos depois que a poeira assentou.Ficar só... Além da eternidade é solução e não salvação.Sem crianças, poetas e loucos a vida não teria graça.O açúcar só chegou a este estágio depois de muito azedar.Cada cabeça uma sentença pra julgar; pobres, feios e desprotegidos, o julgar ricos muda de figura e importância.Há pessoas que no encontro se conhecem há séculos, isto é foram apresentadas há minutos.Há os imortais, que pensam que câncer só dá nos outros, assim como as doenças, os chifres, os desastres e as mortes.Há pessoas que lutam e vencem e milhares que lutam e cansam.O amor tem a fineza do cristal, é tão delicado, se riscar ou quebrar é impossível recuperar.Pedras atiradas são exemplos, são castigos, são inveja e podem ser só pedras.De passo a passo chega-se ao destino e de passo a passo cansa-se.Nada é tão duradouro com sonhos de criança em cabeça de ancião.

2Ele é um feio que se fez bonito.Eu não me lembro de nada do que esqueci.Pela última vez o meu segredo todos conhecem.Ah! Ah! Ah! Eu não estou indo... Eu estou voltando.O meu problema é a tua solução e sorte.Você é o que quiser ser, serás o que quiseres.Nada dura... Tudo tem começo, meio e fim. Fique frio.O absurdo, o improvável e o fictício podem existir.Quando você não tem nada especial, não tem nada especial pra perder.Sou eu sozinho, contra tudo, contra todos e contra o Mundo.A verdade verdadeira é que não sabemos o que somos e o que podemos.Aquele pai não conhece os filhos não os viu crescerem.Não se deixe perder pelos caminhos, talvez fique tarde pra se encontrar.Envelheci, começou ontem e eu simplesmente não vi.Engasguei-me do tudo por nada.Não sou espelho polarizado para ser visto pelo outro lado.Tudo é silêncio; as fotos, as lembranças e o som dos beijos.O quê eu usaria para não usar nada?Se enfrentares o problema de frente não necessitas ficar de costas.

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Hélio José DéstroHélio José DéstroHélio José DéstroHélio José DéstroHélio José Déstro

Procure na sua vida, há portas fechadas e janelas abertas.Amanhã o sol aparecerá e as nuvens escuras partirão.Você entra com a dúvida, eu entro com a solução.O petróleo é um óleo que se tira do sub-solo pra se infiltrar em poluição na atmosfera.Nunca sejas menos do que és, você é muito mais.Nesta altura de minha vida problemas não me preocupam.Quem quer algo deve fazer acontecer.Dei tantas cabeçadas até que achei a cabeça da cabeça.Nas fases: primeiro você odeia, depois aceita, e até ama.Eu sou como um livro virgem fechado sem abri-lo é difícil saber meus sentimentos.Na vida ocupe-se vivendo, porém se preferir vá morrendo lentamente.A pureza da Poesia e sua simplicidade é quando nasce do coração.Era algo tão belo que palavras não poderiam narrá-lo.Eu sonho azul, penso em azul, vejo em azul porque tudo é azul.O que faz a solidão suportável é o silêncio e a convivência.Junto a si a metamorfose... sua mãe.Procura-se um rapaz virgem para voar.Não sejas um pássaro sem asas tendo todo o céu para voar. Seja livre... Livre.Ver com medo é horrível, a esperança do bom é o ótimo.Asas de liberdade, sonhos de liberdade isto existe?

Lavanderia do futuroAnúncio de jornal

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Pra nós, és especial se não és o “Pai da Pátria”.É sim o “filho querido da mãe das mamatas”.

Cidadão com direitos fundamentais na Constituição.Um ser esperto, frio, calculista, vigarista, terás ótimas defesas jurídicas.

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São Paulo, coração – 450 anosA maior cidade da América do Sul, terceira do Mundo, A Capital Mundial da Paz.

Vou falar na voz do povo... Vou cantar na voz de DEUS.Saudar SÃO PAULO no seu aniversário.

No “Minhocão” que se estende ao longo da Av. São João.Na 23 de Maio entraremos nos túneis do Ibirapuera.

Na beleza que é o “Ayrton Senna” e no “Tribunal de Justiça”Casa de Portugal, Aeroporto, Centro Cultural, A Praça da Sé,

O Pátio do Colégio, A Bienal.No Domingo ir feliz ao Morumbi ver o “Timão”

No Pacaembu gritar e rir para o “Verdão”. Ver o “Tricolor” com suas glórias e amor.A Augusta, O Bexiga, A República, Aeroporto de Congonhas,

Interlagos, A Câmara Municipal.Fazer compras no “Brás”, no “Shopping Erundina”.

Nas ruelas, nas avenidas de bairros, nas marginais e Avenidas Monumentais.Na 25 de Março e no “Bom Retiro”, onde nordestinos, estrangeiros... Todos brasileiros.

Nos templos onde oram, aos Santos... A seu DEUS. Templos católicos, espíritas, maometanos, Budismo.Protestantes, cultos africanos e todos os “ismos”.

Assembléia Legislativa, as Escolas de Samba, O Largo São Francisco.Nas marginais, radiais, engarrafamentos em todos os locais, mesmo com todas as lindas rodovias pra serem admiradas.

Nas avenidas: Paulista, Faria Lima, dos Bandeirantes, Ipiranga, São Luís,onde rola o dinheiro naqueles prédios e suas fachadas monumentais.

Monumentos produtivos e bancários,Cidade onde existe a maior quantidade de malandros tapeando otários.

A Praça Júlio Prestes, O museu Ipiranga, O MAM, As Faculdades, O Masp, A Praça Princesa Izabel.

O mundo estudantil, o mundo infantil. O mundo produtivo. O mundo terceira idade...Impregnando de exemplos; do bem e fraternidade.

SÃO PAULO... Paulistanos, onde todas as raças são de Brasileiros.Capital, seu perfil, sua história, sua importância mundial...

Incrustada na Bandeira das Treze listrasE na amizade deste grande país... BRASIL.

As passeatas, as carreatas, as comemorações dos campeões na Paulista.SÃO PAULO é a alma e no seu coração profundo. Na sua grandiosidade.

É a capital de todos os povos. É a ONU da paz no Mundo.Hélio José Déstro... Um paulista, mineiro, paulistano, Brasileiro. 25-1-2003

Hélio José DéstroHélio José DéstroHélio José DéstroHélio José DéstroHélio José Déstro

Não havendo provas, não há condenação de pessoas tão ilibadas.Serviços essenciais, sigilo a-b-so-lu-to, garantias mundiais.

Seja um a mais dos que confiam em nós, não tenham prejuízos no serviço.Proteção garantida “THE BEST OF BEST” o Rei do Paraíso1000 x 1000 = milhões & Milhões $$$$$ ( dólares ou Euros)

O dom divino do sorriso

- Estudo completo de manifestações e maneiras -O riso puro - é aquele riso íntimo que se mostra na face... É beleza pura, beleza da alma.O riso de Amor - das crianças, dos alquimistas, podem estar inclusos... Os loucos varridos.O riso de breque – sintomaticamente é um riso onde há uma parada rápida e a continuidade é em tom variável.O riso debochado - um dos mais ruidosos, o som é estridente mostrando dentes, garganta e todo o palato.Procura chamar a atenção... É irritante.O riso de escárnio – um riso tétrico, maldoso, próprio de um ser medíocre e invejoso.O riso de choque – 100 motivos e 100 temas, uma emoção 100 nexo, um riso 100 sexo,O praticante quase 100pre é um neurótico.O riso de inveja – A pessoa sente a inveja, não pode suplantá-la e ri só pra se fazer feliz... É o riso da besta humana.O riso mudo – um derivado e um braço do riso; 100 som, 100 motivação, 100 sal... 100 açúcar - um riso nulo.O riso próprio-muito sutil vem embutido dentro da criança que existe nos risos.O riso só – é o sorriso invertido está na morfologia da palavra, vejam, na mutação ele se transforma em sorrisoperdendo o assento agudo e tendo de união o r( so+r+riso= sorriso).

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Hélio José DéstroHélio José DéstroHélio José DéstroHélio José DéstroHélio José Déstro

O sorriso - é o gênesis do riso, tem o nascedouro no silêncio, é mestre em benevolência pode se perder emdesdém ( o caso de Caim e Abel... ver a Bíblia).A risada - pode ser classificada de feminino, porém pode ser dado por ambos o sexo, está infiltrada emaglomerações de pessoas e por um motivo vulgar, piadas ou assemelhadas, dispara causando até lágrimas ehisterias – É um riso em disparada.A risada multi estilos – Na aglomeração, as vogais se misturam dando vários tons.A risada forçada é aquela induzida, feita na base de cócegas; na sola dos pés, na barriga,Ou debaixo dos braços e até pode se localizar no atrito de bigode na nuca.A risada coletiva – muito rara ultimamente, uma risada diferente, é de satisfação geral... Uma risada de naçãorica prospera, nação de bem com a vida (em extinção).A risada e soluços- Não sabe se ri ou se chora.As lágrimas de emoção ou tristeza inundam a face.A risada nada mais é do que uma corredeira onde se cruzam os amanhãs.Risada 100 motivos – caso comum de alunos relapsos, que nas aulas se põem a rir e são mandadas as favas,isto é, pra fora de aula.

EXEMPLOS CLÁSSICOS DE RISADASA risada do pato – Qua...Qua... Qua... Qua...A risada da pata - Qué... Qué... Qué... Qué... A risada do cão - Au... Au... Au... Au... Au...A risada do gato – Miau... Miau, Miau, Miau. A risada do chinês – Qui... Qui, Qui, Qui, Qui A risada do Papai Noel - Ro... Ro... Ro... Ro

ESTILOS DE RISADAS EM VOGAISRisadas em A – AAAAAAAAAAAARisadas em E - EEEEEEEEEEEEEERisadas em I – iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiRisadas em O – OOOOOOOOOOOORisadas em U - UUUUUUUUUUUURisadas em várias vogais - AEIOUA RISADA MUSICALRA... RE... RI RA... RA... RA

A risada e a gargalhada fazem bem ao fígado, ao coração, aos pulmões e para todos os comediantes e autoresde comédias e similares é alegria, pois os enriquecem.Na risada o homem se aproxima de DEUS. É o esplendor do arco-íris.Em estudos nas variadas pinturas de Jesus o filho de DEUS jamais um pintor o retratou dando sorrisos,risadas ou gargalhadas. Risão é o indivíduo que ri em gargalhadas, que ri 100 motivos, na atual conjunturanacional, um débil mental.Risadagem é uma sucessão de risadas, risadas coletivas, às vezes ouvidas em programas humorísticos, emreuniões, em velórios, casamentos e aniversários.É muito usual as piadas de portugueses, cornos e assemelhados causarem tipos de risadas.Nas comédias americanas vistas em TV paga ouvem-se risadas gravadas e nada há de engraçado nos assuntostratados, classificados de risadas pra enganar trouxas mostrando ser o que não é e obrigando as pessoas aestudarem a língua,Depois de conhecê-la não se ri é a sugestão da sugestão – uma caca.Há a risada dos puxa-sacos, empregados que riem 100 motivos pra agradar patrões.

A RISADA FINALVem da frase “- Quem ri por último ri melhor”.Não é nada disto, aquele que ri por último pode é surdo e só ri pra fazer acompanhamento.Não ficar com cara de bobo, de não entender ou estar por fora do assunto.RIR – é um santo remédio, anda de boca a boca porque rir é melhor que chorar.RIR – sentimento de alegria íntima; individual (rir de si) ou de outro (riu pra mim).Pode ser espontâneo, direcionado, pode até vir de um gracejo ou 100 motivos.O riso tem o nascedouro nos olhos e ouvidos, vem do coração, sai pela boca em sons da garganta, dá distorçõesfaciais, pode ser: alegria ou tristeza e é acompanhado por lágrimas.GARGALHADA é uma risada em disparada semelhante a um carro na descida:100 breques, 100 motorista, 100 nada – O causador de desastres.Quem não tem um sorriso, necessita ser presenteado com um.O SORRISO mais enigmático retratado no mundo é de Monna Lisa- Será doença??? - Será imbecilidade??? – Será tristeza??? - Enfim o que será???- Diga-nos LEONARDO DA VINCI -Hélio José Déstro – Rindo... Sorrindo... E Gargalhando em São Paulo em 18-08-1998

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Saudade

Quanto pó levantei com pés ligeiros,Caçando borboletas ou florzinhas!Quantos espinhos, farpas de pinheiros,Picaram-me, feriram-me as mãozinhas!

Quantos sóis vi caírem no poente,Atrás deles sumirem muitas luasE estrelas brincavam com a genteEntre as folhas das árvores nas ruas.

Quanto até breve! E quanta esperança!Quantas vozes! Choro e também riso!Parti... Trouxe a semente da lembrança

Que plantei pelos cantos da cidade:Uma casa, uma janela, um sorrisoE vi brotar no asfalto uma saudade!

Jacyra da Costa FunfasJacyra da Costa FunfasJacyra da Costa FunfasJacyra da Costa FunfasJacyra da Costa FunfasAdvogada - São Paulo - SPAdvogada - São Paulo - SPAdvogada - São Paulo - SPAdvogada - São Paulo - SPAdvogada - São Paulo - SP

Um instante no passado

O relógio despertou às sete horas. Ainda na cama, espreguicei-me e dirigi-me à janela para ver otempo. Empurrei a cortina para o lado: asfalto molhado, pessoas com guarda-chuvas abertos, apressadas,desviavam de outras que vinham em sua direção. De vez em quando, o vento sacudia os galhos das árvoresplantadas nas calçadas, dando a impressão de que a chuva aumentava. O céu cinzento não dava sinal de sol.Estava frio lá fora. Fiquei olhando a rua movimentada, com olhar parado, distante, com as saudosas lembrançasda minha infância: ao invés do asfalto, os paralelepípedos molhados pela garoa fina; pessoas caminhandocompassadamente, sem se trombarem na calçada. De vez em quando, passava um bonde nas ruas onde haviatrilhos.

Gostava de sair com minha mãe, quando ia pagar a conta de luz, no prédio da Light. O bonde era omeio de transporte mais usado na época e para mim era sempre um passeio feliz. Refestelada no seu colo, àsvezes, para não pagar passagem, soletrava as sílabas dos anúncios afixados no interior do coletivo. Com otempo, já dominava quase tudo, e assim reforcei minha alfabetização.

O cobrador uniformizado, usava quepe, andando de um lado para outro, no estribo, observava quemsubia nos pontos e logo ia em direção a eles, sacudindo moedas num tim-tim-tim, para receber. Em seguida,puxava uma alça de couro que ficava em cima de cada entrada, para registrar o número de passageiros, queaparecia num mostrador pendurado no interior do bonde à vista de todos e cada puxão da alça, mudava onúmero para mais um passageiro ao som de um “tim” – havia muito boato em torno disso.

Na Praça da Sé, o bonde contornava o “Relógio” e descíamos. Íamos em direção à rua Direita, ondehavia duas mãos para pedestres: numa calçada se ia e na outra se voltava. Se alguém estivesse na contramão,o guarda apitava chamando a atenção: “olha a mão, olha a mão!”- que disciplina para andar no centro!

Minha pressa era chegar no Viaduto do Chá, onde uma única ambulante, com pequeno tabuleiro,vendia as famosas balas de coco com ovos caramelados. Minha mãe sempre comprava algumas.

Ao chegar no prédio da Light, no dirigíamos ao guinche, onde o funcionário com sua impecável camisae gravata nos recebia: “pois não, minha senhora”. Feito o pagamento da conta, agradecia com um sorriso erespeito.

Ao voltar para casa era uma festa, comprando mais balas carameladas. Quando ia me deliciar comessa guloseima, o telefone tocou e a bala sumiu, misteriosamente, de minhas mãos. Assustei-me com acampainha e fui atender ao chamado.

Ao voltar para a janela, tentei desembaçar a vidraça para ver melhor a rua movimentada, mas percebique eram meus olhos que estavam marejados pela saudade do instante no passado.

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O campo e a cidade

Às vezes, quero viver diferente,Fugir do asfalto e mais sentir a terra,Viver no campo como tanta gente,Na sábia ignorância que ele encerra.

Sentir o cheiro da terra molhada,Colher, sem medo, a flor que nasce à toa,Ir de encontro ao sol da madrugada,Cantarolando o que o pardal entoa.

Ah!, se eu pudesse... se eu pudesse iria...E vou pensando enquanto ando a esmo,Na indiferença da cidade fria.

E nem percebo a noite que vai altaE que no campo este céu é o mesmo,A sábia ignorância é que faz falta.

Jacyra da Costa FunfasJacyra da Costa FunfasJacyra da Costa FunfasJacyra da Costa FunfasJacyra da Costa Funfas

O concurso

Agripina trabalhava no apartamento da Dra. Joana. Acostumada à rotina diária, já limpava tudo “deolhos fechados”, como dizia a patroa quando encontrava alguma coisa mal feita. Costumava cantarolar duranteo trabalho. Era alegre e sempre tinha um sorriso para mostrar seus lindos dentes, “presente de Deus”, comodizia a patroa. Morena, cabelos lisos e compridos, amarrados como rabo de cavalo, que ia de lá para cáconforme se virava. Sentia-se feliz. Vivia com um rapaz de sua idade, 28 anos, que fazia biscates para ajudarnas compras da casa, ou melhor, do quarto e cozinha onde viviam. Agripina tinha grandes sonhos, como o deganhar na loteria.

A patroa escrevia para um jornal e uma revista, e no seu escritório, parte do apartamento, muitos livrose papéis por todo lado. Estava preocupada porque tinha que apresentar um trabalho, no prazo estipulado, parao concurso e o tempo estava se exaurindo. Rascunhava um início, amassava a folha jogando-a no chão,rascunhava outra parte, amassava a folha e jogava, novamente. Assim por diante, durante todo o dia, aescritora tentou buscar inspiração, escrevia, não gostava, amassava a folha e jogava no chão.

De vez em quando Agripina levava um café e biscoitos, dizendo que era para vir a inspiração. A patroacontou-lhe os detalhes do concurso e o valor do prêmio para o vencedor. Ficou de olhos arregalados ouvindoa escritora. Foi para a cozinha e imaginou-se com o prêmio nas mãos.

No dia seguinte, ao fazer a faxina do escritório, Agripina recolheu as folhas amassadas e perguntou àpatroa o que fazer com elas. “Pode rasgar ou se quiser, fique com elas, quem sabe você ganhará o prêmio” –disse rindo. Agripina levou as folhas amassadas para casa e conversou com o companheiro sobre o prêmio.Puseram em ordem as folhas e foram procurar alguém que as imprimisse. Agora é só mandar no endereçocerto e pronto, esperar o prêmio.

Mas, uma semana depois, os dois pensaram bem e resolveram falar com a escritora sobre o trabalho.Quando Dra. Joana leu, achou maravilhoso e ficou admirada com a idéia que tiveram para ordenar osacontecimentos e seqüências. Os dois encabulados confessaram que, na realidade, quem escreveu o texto foia própria escritora, Dra.Joana.

Perplexa, não sabia o que dizer, pois, ela já havia mandado seu trabalho para concorrer, dias antes.Entendeu que se Agripina mandasse o seu, não teria chance de ganhar, porquanto, estando numa linguagemmuito simples, ainda, havia alguns erros de português.

Quinze dias após, chega um telegrama para Agripina da Silva comparecer no tal endereço: ganhara oprimeiro lugar no concurso com direito a receber um cheque de dez mil reais. Quase desmaiou de alegria.Nunca pusera as mãos num cheque de tanto valor.

Dra. Joana, além de pasma ficou feliz por ter dado à antiga e fiel empregada, oportunidade de participarde um concurso literário, embora, tivesse pouco estudo.

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José de Souza MeirellesJosé de Souza MeirellesJosé de Souza MeirellesJosé de Souza MeirellesJosé de Souza MeirellesMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SP

O galãItoró, uma pequena cidade situada numa extensa planície, circundada por infindáveis pastagens, sem

matas ou montanhas que quebrem a monotonia da paisagem. A pecuária se constitui da principal atividadedo pequeno município.

A rua principal., Av. Rui Barbosa, passa ao lado da Praça da Matriz, onde se concentra o comércio eo bar-sorveteria, ponto de encontro. No início da noite, os jovens para lá se dirigem para fazer o “footing” aoredor da praça. Rapazes caminhando n sentido horário e as jovens no anti-horário, lei não escrita masrigorosamente cumprida.

Os moços mais velhos não suportam esta regra e permanecem no bar ou na calçada em frente, trocandoolhares românticos com as moças que passam na esperança de um inocente flerte que, eventualmente, podeevoluir para namoro sério e até casamento.]

Alfredo era um dos que ficavam no bar, com permanente ar de tédio, cigarro colado aos lábios,bebericando displicentemente uma cerveja. Era o rapaz mais bonito, mais charmoso, possuidor de indescritívelmagnetismo sobre as jovens da cidade. Tinha absoluta consciência desta situação, motivo de inveja de seusamigos.

O pai de Alfredo, já falecido, fôra proprietário de uma pequena fazenda, próxima à cidade, com apreciávelplantel de gado leiteiro. Alfredo, filho único, não se dispusera a assumir a administração da fazenda, deixandotudo a cargo de um empregado de competência duvidosa. Com isto a renda da fazenda despencou. Entretanto,somada ao aluguel de três casinhas que o pai deixara na cidade, o dinheiro era suficiente para que ele e suamãe sobrevivessem, sobrando ainda um extra para que o filho pudesse continuar cultivando a fama de galã dacidade.

Aos 25 anos, bem apessoado, alto, moreno, porte elegante, cabelos negros e ondulados untados comgenerosas porções de brilhantina Royal Briar, bigode aparado, barba bem feita e face recendendo água decolônia, Alfredo sempre trajava jaquetão azul sarja, camisa impecavelmente engomada (tarefa de engomar àqual, não raro, ele mesmo se encarregava ) meias brancas, sapatos marrons, gravata vermelha. Enfim, umafigura que se destacava no meio daquela gente mal ajambrada da cidade.

Por outro lado, não descuidava do seu preparo intelectual que, também neste aspecto, destacava-seentre os seus conterrâneos. Todos os dias às 14 horas lá esta ele na Estação, aguardando o “rápido” que chegada Capital com o correio, os jornais e as revistas. Tinha especial interesse nas revistas sobre cinema. Devoravade ponta a ponta a “Cena Muda”.

Às terças e sábados havia sessão de cinema na cidade. Ele emocionava-se com as divas da época eprincipalmente com os galãs, os quais procurava imitar nos gestos e na maneira de se vestir. Seu ídolo eraTyrne Power, com quem muitas das jovens o comparava, o que o levou a levar esta semelhança ao extremo;cortanto o cabelo mais curto, raspando o bigode, fazendo penteado semelhando ao do Tyrone, passando,inclusive, a usar ternos de cor cinza e paletó de dois botões ao invés do jaquetão. Com o novo visual ficou maisirresistível e com mais confiança no seu charme e na sua indiscutível atração sobre as mulheres.

Nas “soirées” dançantes dos sábados, após o cinema, animadas com a orquestra dos irmãos Geraldini,Alfredo , impecavelmente vestido e absolutamente informado do que se passava fora daquele vilarejo,principalmente as novidades sobre Hollywood, continuava enchendo seus amigos de inveja e partindo o coraçãodas jovens.

Na época, como em qualquer outra pequena cidade, mandavam os costumes que as moçaspermanecessem sentadas numa fila de cadeiras encostadas à parede e na parede oposta, os jovens assumissema mesma posição. Assim que a orquestra “atacava”, os cavalheiros levantavam-se, dirigindo-se às eleitas jáselecionadas com furtivos olhares específicos. De um modo elegante e sobranceiro dirigia-se à fila de moçassentadas no lado oposto e com olhar vago e insinuante dava a entender a diferentes jovens que “ela” era aeleita, deixando frustradas as não escolhidas, sensação esta que ele procurava compensar com um olhar terno,dando a entender que... “sua vez chegará”...

Sua conversa, enquanto dançava, deixava as parceiras deslumbradas. Com seu permanente e envolventesorriso, voz suave e pausada, discorria sobre qualquer assunto. Estava perfeitamente a par do que ocorria naalta sociedade, leitor voraz que era da “Vida Doméstica”. Em “Paratodos” e no “Eu Sei Tudo” informava-sesobre as novidades em geral e, embora não estivesse interessado em política e nem sempre entendesse ascríticas mordazes da “Careta”, ele as repetia para sua parceira que, de resto, entendia muito menos. O quenão o impedia de ficar maravilhada com a cultura do seu par. Mesmo um consulta ao “Almanaque do Capivarol”era de extrema utilidade, pois permitia uma incursão sobre cultura geral, comentando, por exemplo, o númerode planetas que gravitavam ao redor do sol e a distância em quilômetros entre a terra e a lua. Mais encantamento!

Se o assunto resvalava para o cinema (o que ele sempre forçava) a moça ia ao delírio. Alfredo discorriasobre os astros e estrelas como se com eles convivesse. Sabia tudo sobre Humphrey Bogart, Lionel Barrymore,Hedy Lamarr, Gary Cooper, Shirley Temple e muitos outros.

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Entretanto, depois de algum tempo Alfredo começou a sentir-se entediado. O ambiente pacato,pachorrento e opressivo daquela cidade onde nada acontecia e onde seque havia alguém com moderadacultura com quem pudesse conversar, o estava deixando deprimido.

Colocou na cabeça que a solução seria mudar-se para a Capital, conhecer as pessoas cultas einteressantes que ele encontrava nas páginas da “Vida Doméstica”. Sabia que a cultura adquirida através daleitura de tantas revistas o capacitava plenamente a enfrentar de igual para igual a alta sociedade da Capital.Não tinha condições financeiras de viajar, fato que não chegou ao extremo de levá-lo a descuidar da suaimagem. Entretanto um certo desânimo começou a minar seu espírito.

Quando finalmente se conformara com a situação, já pensando em se casar com alguma moça dacidade, apareceu em sua casa um rico fazendeiro, proprietário de gado leiteiro, interessado na compra doexcelente touro, orgulho da fazenda. De início, a mãe se opôs à venda. Alfredo, após convincente conversação,com o argumento de que o rebanho da fazenda era pequeno e as poucas vacas restantes poderiam perfeitamentecruzar com o touro do Sr. Alcebíades, o bom vizinho, que não se oporia a este favor. Acrescentou que certamenteo touro também não se oporia. Conseguiu convencê-la, embora a mãe, religiosa e carola convicta, não tinhaachado graça na brincadeira. Finalmente o touro foi vendido... e por um bom dinheiro.

A venda significou dinheiro para refazer o guarda-roupa, compra de gravatas do tipo Tyrone, bomestoque de água de colônia, novo corte dos cabelos , enfim uma pequena reforma do visual que, segundo suasincontáveis fÀs, foi para melhor.

Bem vestido, bem penteado, bem perfumado e bem atualizado sobre tudo o que acontecia na Capital,partiu em busca de nova vida. Tratando-se de um rapaz bonito, elegante, bem apessoado, culto, simpático,insinuante, Alfredo, no fundo, não descartava a possibilidade de vir a se casar com uma das granfinas ricaçascujas todos via com freqüência na “Vida Doméstica”.

Chegou o dia. A espera do “rápido” que o levaria à capital e a chegada do mesmo à estação, prenunciandoo início de uma nova vida o deixou perturbado. Despediu-se da mãe procurando sustar as lágrimas queteimavam em brotar de seus olhos. Finalmente embarcou. Entrou no vagão de primeira classe pela porta dafrente de maneira a encarar os passageiros que aguardavam a partida do trem.

Ao entrar, foi como que fulminado por um raio! A alguns metros dele, sentada na poltrona do corredor,lendo despreocupadamente um livro, lá estava a mulher de seus sonhos. Loira, olhos verde-azulados e cintilantesds quais, ele jurava, saía uma luz radiante, cintura fina, tornozelos bem torneados, porte altivo, trajando elegantetaileu, revelando tratar-se de pessoa educada, rica, certamente pertencente à tão invejada alta sociedade.

Èle nem acreditou na sorte de, logo ao entrar, encontrar a mulher com que sempre sonhou, sorte estaque continuou a bafejá-lo pois sua deusa ao virar a página desviou os olhos do livro e demorou uma fração desegundo de encontro ao olhar siderado de Alfredo. Claro que ele notou a atenção da jovem e, habituado queestava ao grande fascínio que exercia sobre as mulheres, contou como certa uma aproximação cujoprolongamento, estava convicto, iria acontecer.

Nem tudo entretanto, estava acontecendo como ele desejava. Ao lado da sua diva permanecia sentadauma senhora de idade, faces enrugadas, lábios contraídos, olhar sem brilho e de poucos amigos. Certamentetratava-se de uma tia solteirona ou da dama de companhia, não saberia dizer, mas sem dúvida era o fiel cãode guarda de sua eleita. A bruxa logo percebeu o ar embevecido de Alfredo e dirigiu-lhe de encontro um olharque por pouco não o fulmina.

Sua jovem voltou a concentrar-se no livro e o nosso herói simplesmente não conseguia despregar osolhos daquela figura lindíssima, em que pesasse a presença desaprovadora e agressiva da bruxa. Num dadomomento Alfredo lembrou-se de leituras que falavam dos deuses do amor, Cupido, Vênus, Afrodite, não selembrava qual, mas o certo é que um deles, ou todos, o estavam atendendo, pois naquele exato momento, ajovem ao virar a página voltou novamente a dirigir o olhar para ele e novamente seus olhares encontraram-se.Alfredo percebeu claramente que ela o notara, o que aliás não se constituía em nenhuma surpresa.

Altamente emocionado e com o coração palpitando, tomou a decisão de abordar aquela que, commuita probabilidade, seria a mulher de sua vida. Restava entretanto a necessidade de desviar a atenção docão de guarda. Tinha que encontrar um jeito de dirigir a palavra à jovem pois era certeza que com seu sorrisoinsinuante, sua voz doce e macia, sua conversa alegre, culta, educada e descontraída, sua eleita não resistiriaaos seus encantos.

Novamente os deuses do amor, não sabe qual deles, o inspiraram. Decidiu a abordagem. Colocou umarevista debaixo do braço e despreocupadamente, mantendo o elegante porte, caminhou lentamente pelo corredor,ao atingir a altura em que estava sentada a jovem, deixou “acidentalmente” cair a revista ao lado do banco. Amoça, num reflexo, abaixou-se para entregá-la ao dono. Foi o momento certo. Alfredo, já cônscio de seufascínio, também abaixou-se e seus rostos quase se tocaram. Ele sentiu os macios cabelos loiros e o suaveperfume da jovem acariciarem sua face. Foi um delírio em que ele quase perdeu o controle da situação. Osdeuses novamente o ajudaram. Tinha que, com urgência, tomar uma atitude sem que a bruxa notasse.

A inspiração surgiu como uma benção. Próximo ao ouvido de sua amada, sussurrou com voz suave esorriso cativante:

- Finja que vai cagar e me encontre no fim do corredor...

José de Souza MeirellesJosé de Souza MeirellesJosé de Souza MeirellesJosé de Souza MeirellesJosé de Souza Meirelles

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José Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SP

Misha – a nossa gata

Depois do nosso casamento, fomos morar num sobrado, com um grande quintal e onde vivemos pormuito tempo. Tivemos duas vizinhas muito boas e ficamos muito amigos. Os muros que separavam as nossascasas eram relativamente baixos e convidavam à conversa constante por cima do muro, e também a passarpor cima dele objetos ou coisas que um de nós necessitava – um pouco de farinha, um prato para terminar deassar (faltava às vezes eletricidade, nos domingos e o fogão de uma das vizinhas era elétrico!), enfim, muitosproblemas se resolviam e muita conversa se gastava por cima do muro...

Certa vez, a filha da vizinha, ganhou de um namorado, descendente de russos, uma gata persa, cinza,muito bonita, de pelos muito longos, olhos verdes e também muito mansa. As nossas filhas gêmeas, com cincoou seis anos, ficaram encantadas com a gatinha que era posta sobre o muro para que elas pudessem brincar.Pouco a pouco elas pegavam-na no muro e traziam emprestada para o nosso quintal, brincavam bastante edevolviam-na. Depois de algum tempo, a gata passava sozinha o muro e, miando, vinha para a nossa casapara brincar com as crianças. O namorado da mocinha foi substituído por outro e o interesse pela gata diminuiu. Ela passou a morarem nossa casa – as crianças prepararam um local para ela dormir, mas fora de casa – não gostávamos muitode animais dentro de casa. Só que nós descobrimos – mas ficamos quietos - que as nossas filhas, com aconivência da pajem, que dormia com elas no mesmo quarto, imaginaram um elevador – uma cestinha presaa uma corda, para à noite trazê-la para o quarto, quando elas iam dormir. E a gata - Misha – nome de origemrussa – aprendeu logo a esperar a casa ficar sossegada, para aguardar a cestinha que era baixada do andar decima para acomodar-se e ser içada para ir dormir com elas. A Misha teve duas ninhadas de filhotes, mestiços, bem bonitinhos que conseguimos dar a pessoas amigas.Foi muito curioso observar como a gata ia educando e ensinando os seus filhotes a ficarem progressivamentemais independentes para todas as suas atividades, e a ir aprendendo os costumes e até os horários de nossacasa. Foi uma ótima educadora e uma boa mãe para seus gatinhos. Depois resolvemos mandar operá-la, para nosso sossego e pudemos fechar a “maternidade” que estavainstalada na garagem. Misha era extremamente mansa, meiga, um pouco diferente da maioria dos gatos, quesão tão independentes. Ela sempre atendia ao nosso chamado, vinha correndo, miando e abanando a sualinda cauda peluda. Estava sempre por perto da família, com pose majestosa e dela foram tiradas inúmerasfotografias. Paciente deixava-se escovar depois do banho e colocar fitas e laçarotes no pescoço. Curiosamente uns tempos depois ela, a Misha, apareceu em casa - como todo gato, ela saía para darsuas voltinhas pelo bairro - com um filhote, na boca, já grandinho, carregando-o pelo pescoço – provavelmenteela o tinha tirado, não na Febem, mas na “gatobem”. O resultado, é que também o adotamos. O gatinho era preto, batizamo-lo de Nero, ele aprendeu a atender por este nome e acabou ficando lá emcasa. Ele também foi criado pela Misha com toda atenção, com o mesmo carinho com que tinha cuidado dosseus próprios filhos. Ao mencionar o nome – Nero - é interessante explicar o porquê da escolha deste nomepara um gato. Ele é comum para um cachorro. Eu sempre me imaginei dono de um grande cachorro negro,talvez um policial (assim se chamavam no meu tempo de criança os “pastores”), e ao qual daria o nome deNero. Porém eu tive apenas dois cachorros em minha vida. Um foi um pastor – Rex - que foi morar na casaem que vovó residia, no interior e um outro, Lulu da Pomerânia – Toy, que, acreditem se quiserem, passeavacomigo, no túnel da Av. 9 de Julho... de bicicleta, no meu colo. Nero – nome dado não em homenagem aoimperador romano, mas à cor preta – era como eu costumava chamar os animais lá de casa - não os cachorros- mas o gato e também um canário – que não era preto, mas amarelo - e que aprendeu a responder-me piandoquando o chamava “ Nero”, de perto da gaiola. Assim este gato, por ser pretinho, foi oficialmente chamado, Nero. Ficou lá em casa também por muitosanos. Sua mãe adotiva – a Misha, viveu muito tempo conosco e foi uma ótima companheira para a infânciados nossos filhos.

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Uma Visita de Papai Noel

“Uma visita de Papai Noel” é o nome de um bonito poema de Clement Clark Moore - A visit from St.Nick - escrito em 1822 e que hoje resolvi traduzir e adaptar para o português.

Clement Clark Moore, poeta e educador norte-americano, nasceu na cidade de New York em 1779. Erafilho único de Benjamin Moore, bispo (Episcopal) de NewYork, professor e presidente da universidade deColumbia (1801-11). Clement Clark Moore, foi educado no Columbia College (hoje Universidade de Columbia).Em 1813 casou-se com Catherine Elizabeth Taylor e fixaram residência em Chelsea, que na época era nosarredores de New York. De 1821 a 1850 foi professor de literatura oriental e grega no Seminário EpiscopalTeológico de NewYork, seminário este construído em terras doadas por ele. De 1840 a 1850 foi membro doconselho administrativo do New York Institution for the Blind, hoje conhecido como The New York Institute forSpecial Education. Faleceu em 1863, com 84 anos. Ficou famoso, porém, pelo poema que escreveu para seusfilhos, em 1822, “A Visit from Saint Nick”, publicado anonimamente no Sentinel de Troy (N.Y.) em 1823. O seupoema, bem representa a véspera de Natal e a tradição dos presentes. A grande curiosidade é ele dar nomes àsrenas que puxam o trenó de Saint Nicholas - Papai Noel.

Recentemente, um escritor sugeriu que o verdadeiro autor do poema foi o Major Henry Livingstone Jr.(1748- 1828). Ficam aí, a lembrança dos dois nomes, e a discussão continua em aberto.

O importante é a originalidade da história e o nome das renas. Eu a traduzi em prosa:Uma vez... Num país muito longe de nós... À noite...Na véspera de Natal, quando casa já estava toda calma, ninguém, nem mesmo um gato ou rato se

movimentava, fazendo o menor ruído. As meias de cada uma das crianças estavam arrumadas com carinhona beirada da lareira para aguardarem a chegada de Papai Noel. A árvore de Natal estava toda enfeitada eiluminada, a esperar a vinda, naquela noite, de Papai Noel com os presentes.

As crianças, apesar da animação, já estavam aninhadas em suas camas, bem agasalhadas e quietas,sonhando com os brinquedos que elas tinham solicitado e que, certamente iriam receber. Mamãe com umlenço nas costas e eu com um pijama bem quente, também já estávamos acomodados, para um descansomerecido e um sono bem gostoso, numa noite de inverno.

Foi quando, repentinamente, no jardim da nossa casa ouviu-se um grande estrépito. Eu acordei assustadoe saltei da cama, dirigindo-me à janela, que abri correndo e puxando as cortinas encontrei a lua brilhante,refletindo-se na neve recém-caída e clareando tudo. Meus olhos espantados viram, em miniatura, como numpequeno palco de teatro de marionetes, um lindo trenó puxado por oito belas renas e um velhinho a dirigí-las.Era um velhinho tão esperto e ligeiro que logo compreendi só podia ser Papai Noel (St. Nicholas). Rapidamenteele se movimentou e assobiou chamando as renas pelos seus nomes: “ vamos Corredor, e você tambémDançarino, força Empinador e você também Raposa, muita coragem... vocês, Cometa e Cupido e tambémTrovão e Relâmpago.” E comandou firme : “Vamos já para o topo deste telhado, depressa... Vamos, eia!”.

Com a mesma velocidade com que as folhas secas se agitam e voam ao vento forte, suas renas seelevaram rapidamente levando consigo o trenó repleto de brinquedos e também Papai Noel. Num instante euouvi as leves pisadas das suas patas no telhado e olhei, instintivamente para cima. No mesmo momento, saíada lareira, Papai Noel, todo vestido de peles, as roupas sujas de cinzas e do saco que trazia às suas costas comuma coleção de presentes, escolheu alguns e os colocou nas meias que estavam penduradas na lareira. Seusolhos brilhavam de alegria, o nariz parecia uma cereja e as bochechas estavam avermelhadas pelo frio econtrastavam com suas longas barbas... brancas como a neve. Um cachimbo fumegava, firmemente preso aosseus dentes e cobria sua face com um halo de fumaça. Seu rosto muito gordo e sua barriga redonda balançavamquando caminhava saltitante. Ele parecia um duende traquinas e brincalhão e ao perceber que eu estavaassustado ao vê-lo – era uma visita muito estranha e inesperada - deu uma gargalhada e piscando os olhos fez-me ver que eu não tinha nada a temer e continuou sua tarefa, colocando as lembranças no lugar. Assim queacabou de encher as meias virou-se para mim com um aceno da cabeça, fez um sinal com o dedo e sumiu pelachaminé. Saltou no seu trenó e assobiou para os seus animais que saíram a galopar, desaparecendo no céu.

Ainda pude ouví-lo exclamar: “Feliz Natal para todos, e para todos uma boa noite”!!!

José Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãJosé Rodrigues Louzã

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Suinã

Suinã é o nome comum de uma árvore da família das leguminosas-papilionáceas, que pode atingir aaltura de 20 metros. Os troncos são retorcidos e cheios de espinhos. As folhas são compostas e as flores de corvermelho-coral, lembrando candelabros – é a Erythrina Verna. Muito cultivada como ornamental e adaptadaa todas as regiões do Brasil. É muito bonita e quando floresce perde todas as folhas.

Ao narrar a marcha pelo campo, Affonso de Carvalho descreve o encontro desta árvore da floresta:“Uma árvore, no entanto chama a atenção do observador. É efetivamente impressionante. Ressequida, mirrada,abre-se, lá em cima, em galhos contorcidos, como nervosas mãos crispadas e uma coloração estranha tinge asua copa desgrenhada, de um vermelhão, que grita berrantemente, no conjunto verde da paisagem.” Estetrecho é do seu livro “Capacete de Aço”, sobre a revolução paulista de 1932, e ele também lembra que a suinãfloresce em geral de julho a setembro – o período em que os nossos campos tingiram-se do sangue dos brasileirosde ambos os lados. E em outubro, veio o armistício, quando já alvejam os cafezais brancos em flor. A floraçãoda suinã acompanhou o nosso movimento de luta por uma constituição. Sua floração durou o que durou arevolução. Alguns dos meus ouvintes devem conhecer a lenda da suinã, uma lenda indígena, brasileira, quemodestamente versejei:

A lenda da suinã.

No Brasil as matas são muito bonitas,flores que parecem de ouro pepitas.Antigamente, já faz muito tempo,trabalhavam, sem nenhum contratempo,os índios, arcos e flechas fazendo,as mulheres das crianças cuidando.Era a vida da aldeia assim pacatano roçado. Ao redor, bem perto, a mataluxuriosa aformoseia a tapera.Suinã é filha do chefe Anhanguera,na agitação, na rotina da aldeia,vê um lindo rapaz...trança-se a teia...que firme irá prender seu coração.Afeiçoam-se com grande paixão.Tinha sido ao cacique prometidade tribo vizinha muito aguerrida,não podia pensar em se entregaraos braços daquele que estava a amar.Porém a tudo defronta o amor,foi encontrá-lo com grande fervor.Abraços e beijos, muito carinho,em seu ardente e recôndito ninho.O sonho passa, vem a realidade,as tribos os caçam com crueldade.Ao amanhecer Suinã é ferida,seu amante a carrega, na corrida...o sangue gotejando pelo chão,enquanto prossegue a perseguição.Mas pasmem, brotam árvores com floresvermelhas, caros amigos leitores,onde o seu sangue vai sendo vertidoaté dar seu derradeiro gemido.Esta foi a vida, o amor de Suinãque morreu jovem, e bela aldeã,nos braços de seu desmedido amor,transmitindo-nos de seu sangue a cor,na árvore tão bela, linda e florida,lembrança da eterna paixão sentida.

José Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãJosé Rodrigues LouzãJosé Rodrigues Louzã

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Josyanne Rita de Arruda FrancoJosyanne Rita de Arruda FrancoJosyanne Rita de Arruda FrancoJosyanne Rita de Arruda FrancoJosyanne Rita de Arruda FrancoMédica pediatra - Jundiaí - SPMédica pediatra - Jundiaí - SPMédica pediatra - Jundiaí - SPMédica pediatra - Jundiaí - SPMédica pediatra - Jundiaí - SP

Fato

É bem depois que te amoque percebo o que não sou:não sou parte tua, meus lábios me pertencem,são terras devolutas,às vezes descontentes, descrentes, dissolutas.

E é quando me deixasque louca razão me invade:na ânsia vã de ser deusa, mortal me faz o combate.Não sou caça, não sou presa,sou isca da tua vontade.

Ainda assim estou inteira:pernas, músculos e braços.O amor que ilude e tonteiae faz de mim companheirase esvai , cadente e tão lasso...

Depois que o prazer termina,acerca-me esta verdade:mesmo te sendo querida, de mim sou propriedade:caprichosa messalina que faz de ti meu confrade.

Ah... conclusão descabidanão sou contigo unidade.Somos partes bem distintasAlmas errantes, lascivase angustiadas metades...

Regresso

Boa noite, amiga Poesia,aqui estou eu de volta !Tentei ser mais realista,tentei ser mais egoísta,tentei amar sem propostas.

Ouvi música, dancei ritmos,até cantei tantas horas...Sorri das coisas difíceis,vivi sem nem ficar triste,tentei não mais ir embora.

Bem quis não ser tão volúvel...Esforço eu fiz em ser justa.Travei conflitos a esmo,errei...tentei assim mesmo,mas eu não sou dessa luta.

Meu universo é sublime...nas juras que tu defines encontro minha missão:eu quero a voz dos teus versossorrindo de amores que eu peço,regendo minha vocação!

Portanto, fica comigo...Eu sei que tu compreendes que vivo da emoção:em troca, como ofertóriote dou o brilho nos olhose as venturas da paixão.

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Josyanne Rita de Arruda FrancoJosyanne Rita de Arruda FrancoJosyanne Rita de Arruda FrancoJosyanne Rita de Arruda FrancoJosyanne Rita de Arruda Franco

Estrelitta *

Seu nome era uma inspiração poética.Beatriz era uma adolescente pouco comum na favela onde morava desde o primeiro raio de sol que lhe

banhou a vida. Nascera em casa, amparada pela velha tia da mãe, que partiu do mundo quando a meninacompletou cinco anos.

Os amigos de Beatriz viviam fazendo gracejos, mas ela não ligava: rap, pagode, drogas e noitadas nãofaziam parte de seu modo de viver.

Aproveitava o tempo livre estudando, lendo e ouvindo músicas clássicas. Seu compositor preferido eraChopin com a melodia “Noturno em Mi Bemol Maior”; ouvira bem criança em uma festa de bodas e ficarairremediavelmente apaixonada.

Escrevia poemas de amor, com espírito romântico e enlevado: parecia viver em êxtase permanente,mas nunca descuidou dos estudos que, conforme acreditava, seriam o passaporte para realizar o sonho de seruma grande escritora. Eu, seu professor de literatura e redação, apreciava o interesse daquela menina nasminhas aulas e era testemunha silenciosa de sua inspiração.

Beatriz cuidava com zelo da casa modesta em que vivia. Cantava e dançava sozinha, enquanto davaconta dos pequenos afazeres domésticos que a mãe lhe delegava. Às vezes achava que deveria sair um poucomais, o que era comum na sua idade, mas aceitava com resignação e sem apelo as ponderações dos paissobre a violência do mundo externo e a segurança do seu caloroso e humilde lar.

O universo de Beatriz ficou restrito aos cômodos do pequeno barraco, às poesias e músicas clássicasque preenchiam seus momentos de abstração romântica e apaixonada. Era o mais rico dos mundos, convencia-se ela. Sentia-se feliz com isso.

Num fim de tarde, segundo soube, Beatriz se preparava para ir à escola noturna; o inverno trazia anoite mais cedo e o vento gelado cortava as paredes da casa; não poderia esquecer seu melhor agasalhorecentemente saído do varal, perfumado e cuidado.

Ouviu dois tiros ecoarem lá fora - uma ou duas ruas para cima, pensou.Movimentação de todo lado e novamente silêncio. Rezou pela proteção dos pais, que em quarenta

minutos chegariam no lotação das sete.Continuou se vestindo e aumentou o volume da pequena vitrola para se manter calma e distrair o medo

que já sentia. Nunca se habituaria à rotina daquele lugar perigoso e teria que descer todo aquele barrancosozinha.

Pensou na classe barulhenta, nos colegas displicentes e nos mais interessados. Riu e se animou com opensamento, espantando o calafrio da espinha.

Pensou no Noturno de Chopin... queria ser talentosa como ele.Pensou em si mesma e correu até o quarto para pegar o caderno na mesinha de canto ou iria se atrasar,

coisa muito rara.Ao se aproximar da cama, foi surpreendida pela violência do homem que a atacou.Ela nem tentou se defender... não sabia; não tentou gritar... sua doce voz não conseguia.Beatriz se tornou uma lenda naquele bairro pobre.Seus colegas não fizeram mais baderna na sua classe de escola.Até eu deixei de lecionar com tanto entusiasmo: sentia um nó na garganta ao olhar para a carteira dela,

tão absolutamente vazia.As ruas miseráveis ganharam um pouco mais de iluminação à noite.Somente na casa de Beatriz tudo permaneceu noturno e... para que o brilho daquela pequena estrela

nunca apagasse... para que a voz da poesia jamais se calasse.

* Estrellita é uma composição do mexicano Manuel María Ponce (1882 - 1948 )

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Karin Schmidt Rodrigues MassaroKarin Schmidt Rodrigues MassaroKarin Schmidt Rodrigues MassaroKarin Schmidt Rodrigues MassaroKarin Schmidt Rodrigues MassaroMédica hematologista - São Paulo - SPMédica hematologista - São Paulo - SPMédica hematologista - São Paulo - SPMédica hematologista - São Paulo - SPMédica hematologista - São Paulo - SP

Sangue quente

Não minto:não sou inofensiva.Sou honesta,e um tanto persuasiva.Eu sou a reação,a idéia desatinada,a provocação,a doença incubada.Um homem hiperestrogênico,uma mulher contundente,seu mel, seu arsênico.Eu sou de sangue quente!

Erosão do peito

Acordo só, desencantadade mim mesma, abstraída.A uma só dor reduzida,do devaneio, subtraída.Meu peito rasga, a erosão!Sou caatinga sem água.Meu choro seca a razão,se é que há choro ou mágoa.Caminho em pura anestesia,sem entender o meu passo.Eu que em tudo sou demasia,se perco, caio, o que eu faço?A rua me subjugaa um ente tolo qualquer.Caminho, eu passo em fuga.Desencantada e mulher.

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Luis PapagnoLuis PapagnoLuis PapagnoLuis PapagnoLuis PapagnoMédico tocoginecólogo - Buenos Aires - ArgentinaMédico tocoginecólogo - Buenos Aires - ArgentinaMédico tocoginecólogo - Buenos Aires - ArgentinaMédico tocoginecólogo - Buenos Aires - ArgentinaMédico tocoginecólogo - Buenos Aires - Argentina

Crisis

Su vida nunca fue fácil. Siempre tuvo que luchar. No conocía otro modo de vivir. Pelearle y pelearle a lamuerte. Quizás alguna vez no saldría victorioso...

No habían desaparecido aun los efectos de aquellos dramáticos momentos, cuando las pérdidas de sangrefueron el primer síntoma de alarma. Un dolor de cabeza leve, pero pertinaz, le hacia recordar constantementelo vivido.

Ultimamente no se sentía bien. Su mundo había cambiado; los momentos pasados fueron muy intensosy dejaron huellas. Los mareos aun no lo habían abandonado y una rara sensación de extrañeza acompañabasus días. Se encontraba desorientado. Parecían haberle cambiado las reglas del juego. Nada era lo que entonces.Cielo y tierra habían trastrocado posiciones.

Presentía que algo inevitable e irreparable estaba por producirse. Los análisis últimos no habían dadoresultado alentador. Quizás no pudiera cumplirse el plan propuesto para su vida.

Sus sueños eran cada vez menos reparadores. Movimientos irregulares y agitados de su pecho, hacíanprever un futuro incierto. La sensación de falta de aire, aunque transitoria, no lo dejaba en paz. Se sentía cadavez más oprimido.

En principio, habían sido hechos aislados, que no llegaron a conmoverlo, pero en los últimos días loacompañaban día y noche. Opresión y falta de aire se alternaban. A pesar de que podía anticipar su aparición,siempre llegaban a conmoverlo. Sólo cuando ellas no lo acosaban, podía relajarse e intentar el sueño.

Tres de la madrugada...En la mas completa oscuridad, una extraña sensación lo invadió. Se sintió deslizar. Sus pies ya no le

servían de apoyo; parecía flotar en un líquido caliente. Ya no respiraba con la misma facilidad. El mundo queél conocía se estaba estrechando cada vez más. Los latidos de su corazón se aceleraron. No sabia que estabapasando, pero así tan veloz como se hizo presente, la sensación desapareció. Intentó moverse. Algo habíacambiado, imperceptible pero cierto. Intentó entregarse nuevamente al sueño, pero no pudo. Otra vez!

Un temor incipiente fue apoderándose de él. La misma sensación de opresión. Esta ves mas firme yduradera. Sus latidos se aceleraron nuevamente; otra vez la falta de aire... más intensa esta vez. Ya pasa, yapasa... Su corazón se niega a retomar su tranquilo andar. Ni siquiera puede moverse. Todo es un trabajosoesfuerzo. El nuevo intento de dormir termina bruscamente con una opresión, ahora más intensa, interminable.Su pecho parece estrujarse.

Otra vez la calma. Pero nada vuelve atrás; después de cada episodio se siente con menos fuerzas. Susmúsculos esbozan un ligero temblor. Imposible pensar. ¡Sólo queda sentir!

La opresión se apodera de todo su ser. Lo envuelve y lo transporta hacia un mundo desconocido. El dolorde cabeza aumenta su intensidad, llenándolo de angustia. El dolor pasa, la angustia, no. Intenta calmarse.Nunca antes pasó por algo semejante. Es una experiencia totalmente nueva, para la cual no estaba preparado.Está inquieto. Sus latidos recobran el ritmo mas lento, pero se hacen irregulares. Siente golpes en el pecho.Varios latidos muy rápidos seguidos, luego una pausa más larga... y otra vez los latidos irregulares, cada vezmas frecuentes. El caballo desbocado que habita en su pecho cada vez lucha con mas furia por su libertad.

La opresión vuelve a invadirlo. No puede moverse. Las paredes parecen querer triturarlo. Flexiona sumentón sobre su pecho, buscando un alivio que no llega. El dolor de cabeza se hace más intenso... siente caloren la cara, tiene ganas de gritar... la angustia es máxima. Alivio. Desaparece la presión; el dolor de cabeza loabandona un instante para dejar paso al ahogo, que lo obliga a abrir la boca, como queriendo tragar un aireque le permita aferrarse a la vida. Toda su piel se encuentra ahora impregnada de un liquido caliente. ¿Se hizopis?

Vano intento de calmarse. Otra vez la presión amenaza aniquilarlo. La cabeza le estalla! ¡Si pudiera pedirauxilio...! Ningún sonido sale de su garganta; nadie es espectador de sus gestos desesperados...

La presión es ahora una mano sobre su garganta, ahogándolo; el dolor de cabeza ya no calma. Se desespera.Se agita. Su corazón late locamente. Dolor... presión... ahogo... sucesión interminable de angustias... otra, otravez y... otra!... la angustia cede paso al miedo. Siente que se hace encima, arrastrado a la nada, empujado alabismo. Arriba y abajo ya no existen. Sólo confusión. Le faltan las fuerzas, no da más.

Súbitamente, el líquido caliente se enfría. Siente pinchazos en la piel. Imagina su piel cubierta de hielo.Tiene frío, mucho frío. Una luz dolorosa lo enceguece. Sus pulmones se llenan de un aire seco, quemante,paralizando su respiración. Respira entrecortadamente, cual lastimoso quejido. No puede soportar mas, nopuede mas... basta ya!

Se siente solo, muy solo. Desamparado. Sus brazos buscan una contención que no llega. La sensación depérdida ahora es real. Su mundo ya no existe. Un llanto agudo, entrecortado, tembloroso, anuncia el finalcercano. Un grito lo aturde, lastimando su oído...

- ¡Es un varón! ¡ Es un varón...!

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Ironía

- Ve esta imagen, en la ecografía? Es una zona de mayor densidad.. .de bordes irregulares... de untamaño apreciable...

-................... ?- Creo que justifica profundizar el estudio.- Y eso... que significa?- Una biopsia. La haremos bajo control ecográfico, para estar seguros de que lo que sacamos es lo

correcto. Se hará con anestesia general. Ud. no sentirá nada. Durante algunos días estará con algunas molestias...nada importante...

- Para Ud.- Lo entiendo, pero no puedo ofrecerle otra alternativa. Tiene una edad en que ya hay que pensar en

todas las posibilidades.- Un cáncer... por ejemplo. - Por ejemplo. Se hará estos estudios de laboratorio y un electrocardiograma; simple rutina. Cuando

los tenga, me llama por teléfono y combinamos fecha de la intervención. Buena suerte!Al despedirse, le pareció que la mano del medico estaba mas fría que otras veces...........................................................................................- ¡Perdone, Don!... Eh! señor... señor...!El chiquilín tomó la pelota y salió corriendo; había que vengar el gol que le habían hecho. Siguió con la mirada el ir y venir de la pelota. Pero sus pensamientos ya no le pertenecían, no los

controlaba. Le contaban al oído que en esa misma plaza se sentaba para repasar los textos para sus exámenes;también en ese mismo lugar había tomado la decisión de separarse y de formar una nueva pareja. Le encantabacaminar por ella pisando hojas secas, esquivando charcos. La paz del lugar le había permitido hacer proyectosa futuro, pero... ¿qué hacía ahora, ahí sentado? ¿Que futuro podía programar? Si sobre él pendía una hipote-ca, garabateada con tinta negra en unos papeles con pomposo membrete. Sintió bronca. ¿Porqué a él!!!

Ganas de orinar... otra vez! Tenía miedo de hacerlo. No quería ver el color remolacha de su orina; lasmanchas oscuras en su ropa interior lo humillaban.

También en esa misma plaza le prometió a su mujer que se irían juntos a vivir al sur, una vez que sejubilara. Cuantas cosas le parecían sin sentido ahora...!

.......................................................................................................................Señor, le tengo que dar la medicación preanestésica... es solamente esta pastillita azul; luego vendré a

buscarlo para llevarlo a quirófano.Intentó distraerse con algún programa de la tele, pero el medicamento que tomó sería un relajante,

pues le costaba mantener los ojos abiertos.Se despertó nuevamente en la habitación. Temblaba.. Pensó que alguna complicación tendría... no

cesaba de temblar. Se asustó mucho El alivio le llegó bajo la forma de una frazada. ¡Era el frío el causante desu temblor! Se sintió avergonzado por sus miedos.

.......................................................................................................................................- Bueno, acá esta resultado. Mire: Hipertrofia prostática .- Si, ya veo. Pero no entiendo...- -Significa que no tiene nada, amigo. Es todo benigno!- Benigno?- Sí. No me cree?- Perdón, Dr. No es eso...no era lo que yo esperaba...- Pero...¿ no está contento, acaso?- Si, Dr. ¡ cómo no voy a estar contento!- Y entonces... ¡hombre!. Alta. Vaya a su casa y haga su vida.- Gracias, Dr...¡gracias!El mundo volvió a existir.- Pucha que tuve suerte. Esta vez pegó en el palo... voy a tener que meter un cambio – pensó en

lenguaje futbolero – Voy a hablar mañana con los muchachos del negocio y chau pichí. Total, ellos se lasarreglan solos... parece pecado desperdiciar esta oportunidad de la vida... algunos ahorros tengo... vendo lacasa y nos vamos al sur, donde siempre quisimos vivir... si sale la jubilación, bien, sino, Dios dirá.

Se había hecho de noche. Pensó en tomar un taxi pero por la turbación del momento se olvidó labilletera en su casa, así que estaba sin dinero y sin documentos, pero, ése era su territorio. Nada podía pasar.Debía atravesar la plaza y pocas cuadras mas estaba su casa.

Luis PapagnoLuis PapagnoLuis PapagnoLuis PapagnoLuis Papagno

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Luis PapagnoLuis PapagnoLuis PapagnoLuis PapagnoLuis Papagno

¡Que sorpresa la daría a su mujer! El futuro era de ellos. No habían tenido hijos. Se tenían uno al otro.Era suficiente para ambos. Sabía que iban a discutir: Ómnibus o Avión; también sabía que ella siempre cedíaa sus temores y lo acompañaba en los viajes largos. El volar no es para humanos – por lo menos, no para él –era su teoría.

Ya falta poco... pucha cómo tiran estos puntos...!No podía apurarse porque aun le dolía la herida. Por la alegría del informe y las ganas de compartir su

decisión caminaba ligero, pero tuvo que aminorar la marcha................................................

- Así es oficial. Yo siempre cuido coches de esta vereda, así que n puedo ver que pasa del otro lado dela plaza... sólo escuché un ruido... un cuete, pensé. Que joder! Con lo que falta para las fiestas y ya empezaron...Me avivé cuando ví a dos tipos corriento, para allá, para el lado de la perito moreno...

- Agente chapa 16471, señor- Deme su QTH- Uspallata y Pepirí, señor.- Señor, acabo de encontra a un masculino, fallecido, señor, aparentemente por herida de bala en torso.- Identifíquelo, Agente. QSL?-Compreendido, señor.- C.I.?- No lleva documentos, mi Principal. Sólo tiene un análisis en la mano, parece un protocolo de laboratorio,

señor.

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Luiz GiovaniLuiz GiovaniLuiz GiovaniLuiz GiovaniLuiz GiovaniMédico pediatra - São Paulo - SPMédico pediatra - São Paulo - SPMédico pediatra - São Paulo - SPMédico pediatra - São Paulo - SPMédico pediatra - São Paulo - SP

Além da vida

Tudo aconteceu tão de repente como um raio que cai em estrondo sobre a cabeça. Pois é, lá estava ofarol verde que ficou amarelo que ficou vermelho. Depois, a freada brusca, daquelas que deixam escapar um“droga!” Pra variar, o tráfego pesado da tarde deixava ainda mais pesados os pés do freio e do acelerador. Detão cansado, o da embreagem repousava no pedal mesmo já sabendo que estragava a frição. Caramba, trêspés? Tudo bem, a gente não raciocina mais com tanto calor, a mente torporosa só pensando em chegar logoem casa e aquela beleza de trânsito insistindo em piorar as coisas. Todas as partes do corpo queriam algo, oestômago a comidinha quente, a pele um bom banho e o traseiro um sofá macio em frente da televisão. Nãoé pedir muito, é? Foi assim que aconteceu. Duas pancadas secas no vidro semi-aberto e alguém berrando comvoz autoritária: “Vai, passa pra lá, vai logo, vai!” E a gente obedece, não sabe o que se passa, que loucura.Nem deu pra perceber o outro que entrava pela porta de trás. Então sim, o coração mostrou a cara, começoua bater forte, cada vez mais forte até quase sair pela boca aberta. “Fica na sua, cara, quietinho aí se nãomorre!” O de trás toca o cano gelado no pescoço frio de adrenalina pura. Mal abriu o verde e lá se foi o carroroncando assustado. Dois, três, cinco e tantos semáforos que não deu mais pra contar. Mas o nível de adrenalinaacaba baixando e o cérebro volta meio bobo, tentando articular alguma coisa. “O que vocês querem?” “Calaa boca, meu, fica na sua!” Desta vez o cano bateu forte na cabeça, primeiro de um lado e depois do outro.Nem me lembro se doeu. Esquinas escuras, vielas estreitas e, enfim, estrada de terra. Era mato pra todo canto.A noite havia chegado, sombria desta vez, safada por acobertar ratos da escuridão. A carteira, coitada, tinhapouco dinheiro e tentou se desculpar. Que nada, outra pancada na cara com a coronha preta e o sangueescorreu quente. Sangue, aliás, que nunca foi de barata. Olhos nos olhos por um instante infinito. “Ta olhandoo quê, cara, ficou besta?” Nova coronhada. Essa agora doeu. “Escute bem, meu amigo, sabe quantos anosestudei? Pois foram a vida inteira... Sabe quantas noites acordado, cuidando de gente como vocês? Facadas,balas, ossos quebrados... Só pra levar dinheiro pra casa, ter minha casa, meu carrinho...” As palavras saíamfirmes e não admitiam interrupções. “Pois fique sabendo, companheiro, se você me matar, eu juro, se é queDeus existe, juro por tudo que é sagrado, que volto todas as noites e vou atrás de você, em cada canto, cadaquarto, cada sala desse maldito mundo nojento! E fantasma, meu amigo, não tem arma que mate...” A salivaespumava na beira da boca. “Só que eu não acredito em Deus e nem em fantasmas...” Foram dois tiros nopeito, bem no precórdio.

Demorou um pouco, creio eu, pra achar o caminho de volta. Mas achei.Hoje, lá está ele com aqueles mesmos olhos, agora assustados, no canto do quarto do manicômio

gritando que dedos gelados apertam seu pescoço todas as noites.E, amigos, com que prazer faço isso...

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Luiz Gondin de Araujo LinsLuiz Gondin de Araujo LinsLuiz Gondin de Araujo LinsLuiz Gondin de Araujo LinsLuiz Gondin de Araujo LinsMédico psiquiatra - Rio de Janeiro - RJMédico psiquiatra - Rio de Janeiro - RJMédico psiquiatra - Rio de Janeiro - RJMédico psiquiatra - Rio de Janeiro - RJMédico psiquiatra - Rio de Janeiro - RJ

Emoções

Os primeiros estudos foram levados adiante com enorme dificuldade, pois os pais eram judeus oriundosde famílias modestas, no entanto, todas as esperanças e sacrifícios se concentravam naquele filho único,franzino e tímido.

Os obstáculos se tornaram sensivelmente agravados com o eclodir da segunda guerra mundial, de trágicasconseqüências, principalmente para os judeus da Europa. O casal foi preso e enviado para um campo deconcentração em Auschwitz e lá executado.

Aos 15 anos o rapaz se viu sozinho no mundo e, durante sete anos, aperfeiçoou-se como violinista,pagando as aulas com todo tipo de trabalho. Aos 22 anos havia conseguido, pelos próprios méritos, um lugarefetivo na Orquestra Sinfônica de Viena. A cidade era ponto de referência e visita obrigatória para os cultoresda música.

Apaixonou-se pela filha de seu professor de violino, mas não se atrevia a revelar seu afeto, temendo serrejeitado; ainda não tinha muito a lhe oferecer.

A obstinação e o talento lhe propiciaram vitórias e colocações honrosas em alguns importantes concursosmusicais, culminando com o posto de primeiro violino da orquestra.

Conquistou seu mestre por inteiro e, com ele, a filha que passou a vê-lo com um brilho especial noolhar. Ele captou, era tão sensível, e se atreveu a falar com ela de todo o seu sentimento. Ela ouviu, baixou osolhos e o encontro aconteceu...

Namoraram durante alguns meses, mais alguns de noivado e chegaram ao casamento. Nunca tiveramfilhos e jamais buscaram saber de quem era o problema, não tinha importância, eles se bastavam. Foramintensamente felizes durante 40 anos até que ela sofreu um enfarte fulminante ao longo de uma fria madrugada.

Para ele a dor se fez insuportável, o mundo ficou vazio e ele resolveu sair da cidade e do país, viajandopara o Brasil, fixando residência no Rio de Janeiro, pelo qual se encantara, há anos passados, durante vitoriosatournée com a orquestra.

Tinha algumas economias e um currículo respeitável, mas aos poucos foi se conscientizando dasdificuldades de recomeçar a vida profissional em terra estranha. A música no Brasil não era muito valorizada,os músicos mal remunerados, suas economias foram minando, já havia atingido os 70 anos, mas não seseparava do belo violino, presente dado pelo sogro por ocasião de seu casamento.

Passou a morar em modesta pensão do centro da cidade e tocar em um restaurante próximo ao Largodo Machado, com parca remuneração. Além disso, sofria como artista, pois as pessoas raramente lhe davamatenção, voltadas para o bate-papo ou com pressa de retornar ao trabalho. Um ou outro aplaudia, um ou outrocolocava um ou dois reais na mesa do artista. Sentiu-se velho e triste.

Até que houve um fato singular: ele executava um pout-pourrie de árias ciganas quando notou queuma bela menina, de aproximadamente quatro anos, veio em sua direção como que hipnotizada pelas lindasmelodias, ficando à sua frente com os olhinhos brilhando de encantamento. O artista foi tocado em sua finasensibilidade, seu violino vibrou como nunca, a magia se alastrou, inundou o ambiente, cessaram as conversas,as atenções se voltaram para aquele belo quadro: o velho violinista e a linda criança.

Quando o violino se calou, a menina bateu palminhas, pegou sua bonequinha e a entregou ao artista,dizendo: “toma pra você de presente!”.

A platéia maravilhada presenciou a descida silenciosa de duas lágrimas vertidas pelo grande artista...Fora a maior emoção de toda a sua vida...

Machista

Filho de um rico fazendeiro do interior habituara-se, desde cedo, a presenciar a ascendência do pai ea submissão da mãe. Assim, possuía pela herança e também pela convivência social, a firme convicção dasuperioridade do homem sobre a mulher.

Além do mais, fora o único filho e suas três irmãs sempre exerceram papel secundário naquela família.Ele cresceu e se desenvolveu esnobando as mulheres, usando frases de efeito, que não eram suas, mas

que ele adotara e incorporara ao seu vocabulário, tais como: “uma mulher é como um charuto: é precisoacendê-lo várias vezes” ou então: “se você tem medo da solidão, não se case”.

Mas o fato é que ele se casou com uma jovem da cidade, muito bonita e também muito pobre. Elepossuía dinheiro a rodo, mas tinha um defeito: uma perna mais fina, seqüela de paralisia infantil, não tomaravacina, pois o pai não autorizara por achar uma bobagem. Coisas da vida, os contrastes se buscam: o rico ea pobre, a bela e o feio.

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Se alguém souber...

Hoje me envergonhei de estar felizantes de olhar a fotografia, num jornal,de um menino de quatro anosferido, mutilado pela guerra,após ter visto os pais morrerem.Semblante sofrido, tristeza profunda,perdeu seus dois bracinhos,em renúncia total à vida.Se alguém souber o que dizera essa criança estigmatizada,mal nasceu e já pensa em morrer,diga, diga para mim.Quero saber, tentar entenderem que planeta vivemos,entregues ao amargo saborde tão injusto sofrer.Quem é o responsável?E alguém irá nos socorrer?Se alguém souberdiga, diga para mim,que direi para esse menino,pois me envergonho de ter estado feliz...

Resgates

Vou partir o silêncio,fazê-lo em pedaços,deixando em cada umo sabor de meus cansaços.

Vou abrir o vazio,inocular o afeto,torná-lo humanodo chão ao teto.

Sorvendo a poesiado canto dos pássaros,levitarei em êxtasenos mais belos jardins.

Resgatando todo um passado,véus da saudade rasgando;chegando, enfim, ao teu ladodizendo que continuo te amando.

Luiz Gondin de Araujo LinsLuiz Gondin de Araujo LinsLuiz Gondin de Araujo LinsLuiz Gondin de Araujo LinsLuiz Gondin de Araujo Lins

Desde que se conheceram ele impôs e ela aceitou seu acendrado machismo, inclusive com doispensamentos emoldurados, um no quarto do casal e outro na sala de visitas, com os seguintes dizeres: ”asmulheres são como a sopa, não se deve deixá-las esfriar” e “o amor é um esforço que o homem faz para secontentar com apenas uma mulher!”.

Ele decidia sobre tudo dentro de casa, só ele falava alto, nem conta bancária a mulher possuía.Numa das reuniões que deu em sua bela mansão, para a qual só convidara amigos machistas, já

tocado pelo álcool, proferiu um pequeno discurso, arrematando com as seguintes palavras: “Não há nada nomundo pior que uma mulher, a não ser uma outra mulher”. Os aplausos foram delirantes em meio aos gritos eurros dos amigos; sua pobre esposa só fez baixar a cabeça.

Após mais algumas doses de whisky, deu a última mensagem daquela noite: “as mulheres são maiscastas nas orelhas do que no resto do corpo”. Sucesso retumbante! Foi carregado em triunfo e lhe foi concedidoo título, por unanimidade, de “O REI DOS MACHOS”.

A esposa passou a noite em claro, remoendo-se de ódio, seu limite fora atingido e ultrapassado, sentiu-se tomada por um novo, irresistível e temível sentimento: o ressentimento. Ele pulsou em suas veias, revolveu asentranhas, conturbou o cérebro. Amadureceu sua vingança e a pôs em prática: teve relações sexuais comdiversos homens que estiveram em sua casa naquela maldita noite. A cada um deles ela dizia e repetia: “certasmulheres amam tanto seus maridos que, para não os gastar, elas usam os de suas amigas”.

Certa noite, ao chegar em casa, o machista estranhou o silêncio reinante, chamou pela mulher, gritou,nenhuma resposta. Em cima da mesa da sala de jantar achou um bilhete com uma letra que logo reconheceu.Assim dizia:

“Você é uma droga como homem e o mesmo não pode dizer de mim, pergunte aos seus amigos. Vocêsnão são de nada, não passam de pobres objetos descartáveis.”

Assinado A VINGADORA.

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Luiz Jorge FerreiraLuiz Jorge FerreiraLuiz Jorge FerreiraLuiz Jorge FerreiraLuiz Jorge FerreiraMédico clínico - Osasco - SPMédico clínico - Osasco - SPMédico clínico - Osasco - SPMédico clínico - Osasco - SPMédico clínico - Osasco - SP

Apelo 1O charme de Zaide, era sair de baixo, sem haver terminado.Longe: - zumbando o Marabaixo.Sem perder a linha, sem zunir, sem zombar, sem dar um gemido.Isso ela fez com o primeiro – pai de Colo –Repetiu com o segundo – pai de Ângela –Bisou com o terceiro – pai de Bebeçudo. Com o pai de Álvaro, Angélica, Avulu, Fernando, Biló, Zé Maria,Paula Rodolfo, Cecílio, Quelé, Padoca, Lelé e os que mudaram com ela para a rua da Olaria.Ali colocou a lua em tigela de barro, e os gemidos e assovios, os pôs a secar.Os de ninar dependurou na crista do vento, os de beber retirou suas línguas,E as esticou entre o Equador e o Trópico de Câncer.Os de chorar, amarrou suas lágrimas com puraquês e os acendeu às vésperas de lua.Os de rir, para eles, varreu a porta da casa com sopros e sussurros,os por quês dos quereres e maldizeres, deixou no escuro da memória,os de escrever poemas e os de se apaixonar, nestes, ela fez sinais com a digitalsobre os olhos sempre ávidos e avulsos.Os de voltar, para eles, ela limpou um quarto escuro, sem limite entre o passado e o presenteespalhou... Duendes, encontros banais, espanto, canções, perfumes e lembrançassituações cotidianas, frases levianas, psius e silencio, botou de repente e alguns... te amo.Os de subir a Avenida Ernestino Borges, para eles, ela confundiu o norte magnético,Com telas de tv, teclas de computador e a cicatriz de várias pegadas sem rumo.Os que gastaram pouco tempo, os prematuros, os imaturos, os quase mudos,os que subiram a ladeira com as mãos nos bolsos, os de terno escuro, os amantes do muro,os que sentavam no tronco ao lado da Igreja, os de queixa, os de pranto, os de reza,os de pressa, os de bulir com pica-paus e percevejos, os dos retratos, os escoteiros,os de cervejas, os do Pacoval, os do Araxá, os do Curral das Éguas, as mulheres éguase os de eu e os que foram tu, e as que foram, e os que foram, e os que são...O charme de Zaide era sair do poema, antes do termino, como um invernolargando chuva na vidraça, barulho nas telhas e pausa para mexer no quarto escurocom os gatos de porcelana e as bailarinas de louça.Tudo isso, na primeira estrofe.- que é esta, na qual estou vivo.Para os vivos ela preparou. Um aviso.Para os vivos!

Ei chefia! Tim Lopes

Ei chefia, perdi. Pode guardar este cano virado em minha direção. Eu me entrego.Não sei porque estão atrás de mim como cachorros loucos. Sou sangue bom.Perguntem ao pároco da igreja da nossa comunidade.Fiz primeira comunhão, fui crismado, fui coroinha, ajudei missa, assisti reunião de escoteiros,

acompanhei procissão.Não esculacha não, chefia. Pode colocar as algemas. Mesmo que não ponha, eu não fujo não, eu vou

na moral. A verdade vai aparecer e eu vou sair numa boa. Sou sangue bom. O cara que dizem que matei,estou limpo. O negócio foi o seguinte. Eu estava queimando uns pneus, mas um camaradinha, pra quê? Praespantar este mosquito, da tal dengue. Quando este moço veio correndo e se escondeu dentro de um deles. Praque? Sei lá. Vai ver que tava zoando. Chapado. Sei que entrou e começou a gritar muito. O chefe já viu o calorque faz um pneu pegando fogo? É quente como o inferno. Pra ajudar o cara, apanhei uma espada e cortei ospneus em volta das pernas dele para que ele pudesse correr e sair de dentro dos pneus que era uma brasa só.

E se o atingi, não sei, só que em vez de sair correndo, ele ficou foi rolando e gritando, qualquer coisacomo: “– Cadê minhas pernas. Cadê minhas pernas”.

Meu camaradinha quase morreu de rir, de ver o cara querendo correr só de joelhos.A única coisa que eu fiz mais assim, assim, foi bater na cabeça dele com o cabo da espada e perguntar

já irritado, pois ele não respondia.“– Machuquei você, cara. Machuquei, você?”

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O alfaiate

Em 1978, participamos do Congresso Mundial da Sociedade Internacional de Ortopedia e Traumatologia(SICOT), realizado em Kyoto – Japão. Aproveitamos a oportunidade para conhecer o outro lado do mundo.

Partimos de São Paulo; através várias escalas na América Central e São Francisco, nos Estados Unidos,num grande salto sobre o Pacífico, chegamos ao Haway, ilha verdadeiro paraíso tropical, onde chove e faz solininterruptamente e a vegetação é luxuriante. Do Haway viajamos para Kyoto, sede do congresso.

Terminado este, partimos para a China, entrando por Hong Kong, cidade fundada em 1841 e que, apartir de 1860, passou a ser porto livre para facilitar o intercâmbio do comércio de importação e exportaçãoda China com o resto do mundo; até o fim do século passado, esse território era colônia da coroa britânica,posteriormente devolvido à China.

Hong Kong está situado na costa sul da China e compreende a ilha do mesmo nome e muitas ilhotasadjacentes, chamada Península, e os Novos Territórios, com mais de 230 ilhotas, arrendados do continentechinês. A área total é de 1.032 quilômetros quadrados, dos quais Hong Kong só ocupa 90; a cidade fica a 144quilômetros de Cantão e apenas 44 de Macau, última possessão de Portugal no Oriente. A população é 99% dechineses, com predominância absoluta de cantoneses, cuja língua difere do idioma chinês. O Alto Cossumarianoque governa Hong Kong permite que os cantoneses se tornem súditos britânicos, após alguns anos de residêncialocal, o que é uma das maiores aspirações desses imigrantes.

Hong Kong é a cidade com a maior densidade populacional do mundo. O centro de Hong Kong temapenas 9 quilômetros quadrados, chama-se Kowloon e abriga 80% dos habitantes da colônia. Durante aSegunda Guerra Mundial sua população baixou de 1.600.000 habitantes para 600.000; porém, após 1945,cresceu rapidamente: o censo de 1960 mostrou que havia 3.100.000 habitantes e cinco anos após, ultrapassava4.000.000, ou seja, havia 3.100 habitantes por quilômetro quadrado. A cidade tem atividade ininterruptadurante 24 horas, com setores especializados – material fotográfico, relógios, bijuterias, etc.

A poluição visual é espantosa, com verdadeiros enxames de placas, umas encobrindo as outras, emtodas as avenidas, praças, ruas e ruelas.

O estrangeiro que chega à cidade pela primeira vez é alertado e instruído para pechinchar, pois ésabido que qualquer compra que se faça, no comércio, sofre um aumento inicial de preço da ordem de até50%. Assim sendo, tratamos de aplicar essa tática a todas as nossas transações comerciais.

Certa noite, na hora do jantar, perambulando pela cidade à procura de um bom restaurante, alguém dogrupo nos informou ser possível, nesta incrível cidade, fazer um terno completo em no máximo vinte e quatrohoras.

Absolutamente ao acaso, entre muitas, escolhemos uma alfaiataria. Entramos e pudemos ver algunshomens sorridentes, atrás de um tosco balcão de madeira; no lado oposto havia uma prateleira simples comcortes de casimira todas ditas inglesas, pois nos encontrávamos em colônia britânica.

Cada qual escolheu o padrão e o tecido; nesse momento começou a batalha da pechincha. Sabíamosde antemão, que o preço corrente era 130 dólares para um terno completo – paletó, calça e colete. Comoesperado, o preço inicial foi bem maior – 180 dólares.

A conversa que se seguiu, com todas as dificuldades para se conversar inglês com um oriental, foiárdua e exaustiva, e após muita discussão, chegou-se aos 130 dólares previstos. Tiramos as medidas.

O relógio batia 22 horas. Pediram que voltássemos ainda naquela noite ou madrugada, pois as alfaiatariascomo o comércio, em geral, trabalham 24 horas seguidas. Também, pudera, além das medidas, já haviam feitoos cortes no tecido.

Fomos a um espetáculo noturno e como fora combinado, voltamos cerca das três horas da madrugada,para a primeira prova.

Os ternos, eram seis, estavam montados e chuleados; cerca de seis a oito ágeis homenzinhos amarelosestavam ao nosso derredor – um verdadeiros exército!

Porque íamos permanecer por mais dois dias na cidade, pensei fazer um outro terno; como haviaapreciado o padrão do tecido, apenas escolhi nova cor para o segundo. Solicitei, mais por curiosidade, opreço; a resposta veio imediata, clara e sonora – 180 dólares! Desta vez, a discussão foi ainda mais longa, oalfaiate chefe tinha justificativa para o novo preço, pois era mais um terno apenas! Chegamos, finalmente, aos130 dólares. Embora já fosse alta madrugada, nos solicitaram vir buscar os ternos pela hora do almoço.

De volta a São Paulo, comentando com amigos, sobre o fato inusitado, a suspeita de que a casimiranão fosse inglesa, voltou-me à mente. Como era verão, após alguns meses, ao abrir meu guarda-roupa, pudeconstatar que as traças tinham, literalmente, devorado ambos os ternos.

Só, então, tive certeza que os tecidos eram pura lã inglesa.

Manlio Mario Marco NapoliManlio Mario Marco NapoliManlio Mario Marco NapoliManlio Mario Marco NapoliManlio Mario Marco NapoliMédico ortopedista - São Paulo - SPMédico ortopedista - São Paulo - SPMédico ortopedista - São Paulo - SPMédico ortopedista - São Paulo - SPMédico ortopedista - São Paulo - SP

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Manlio Mario Marco NapoliManlio Mario Marco NapoliManlio Mario Marco NapoliManlio Mario Marco NapoliManlio Mario Marco Napoli

Meu pai e os jesuítas

Meu pai nasceu em Salerno, Itália, em 1890. Recebeu as primeiras letras em casa, pois seu pai eramestre-escola. Porém, meu avô, preocupado com a educação do filho primogênito, desejava que o mesmotivesse educação esmerada. Assim, o levou para matricular-se no Colégio dos Jesuítas, em Nápoles.

Era o início do século XX e com seus onze ou doze anos, lá foi o garoto levado àquele vetusto e famosocolégio. Já tarde alta, levado pela mão paterna, entrou no velho edifício. Recebido pelo padre superior, foimatriculado e conheceu o dormitório.

Pouco antes das seis horas, adentrou o imenso refeitório, onde havia muitas longas mesas e ao seuredor mais de trezentos alunos. Finalmente, chegou a hora do jantar, não sem que o Reitor aparecesse,comandasse as preces coletivas, desse alguma orientação sobre como deveria correr a vida dos internos daípara a frente, com normas rígidas de disciplina.

Para terminar, em tom elevado de voz, para que todos pudessem ouvi-lo, disse: Meus filhos, vocêspraticamente iniciam sua vida religiosa nesta casa; além da educação, nós cuidamos também de suas almas.Os sacrifícios, as penitências agradam a Deus e são vias da salvação. Assim, desde logo, vocês deverão fazerpenitências, renunciar a alguns hábitos. E como fazer isto? Muito simples; abdicando do pecado mortal dagula e trocando as refeições ou parte delas por dias de indulgência. Por isso, cada qual deveria escolher umprato ou a sobremesa.

No próprio refeitório havia uma escala de valores – tal prato, tantos dias de indulgência! O meninoFrancisco aceitou a ordem superior, como não poderia deixar de ser. Porém, por ser meridional e por isso umardoroso amante de números, se deu ao trabalho de anotar, diariamente, quantos dias de indulgência haviaconseguido e, portanto, quantos bons e suculentos pratos e sobremesas havia deixado de comer. Cerca de doismeses após, já havia somado centenas de dias de indulgência.

Tudo teria decorrido em santa paz no colégio, se o nosso caro Chico não tivesse segredado aos maispróximos amigos que tudo aquilo era arranjo, golpe dos padres, para simplesmente fazerem economia.

Numa certa noite, os trezentos internos, sentados em suas mesas no refeitório, com pratos e talheres,iniciaram verdadeira revolução, batendo os utensílios e gritando em coro: VOGLIAMO MANGIARE!VOGLIAMO MANGIARE! (queremos comer, queremos comer); diante do tumulto, o Reitor foi chamado àspressas.

Com olhos esbugalhados, cabelos eriçados, rosto rubro, espumando de raiva, ordenou que os meninosse calassem e vociferou: QUEM COMEÇOU A REVOLUÇÃO?

Todos apavorados com a aparição de tão sinistra figura, quase a uma só voz, responderam: FOINAPOLI FRANCISCO! Imediatamente Francisco foi retirado do refeitório e levado à diretoria.

Lá, o Reitor ainda furibundo, foi lacônico - Seu pai, o Mestre Emílio será imediatamente chamado; equanto a você, está desde já expulso! Francisco ajoelhou-se aos pés do padre, chorou convulsivamente, humilhou-se quanto pode, pediu ardentemente perdão; fez as mais sinceras promessas que não mais interferiria na vidadoméstica do colégio. Debalde, de nada valeram suas preces e promessas.

No dia seguinte, chega o Mestre Emílio Napoli e imediatamente é levado ao gabinete do reitor. Este,antes mesmo que o pai aflito pudesse dizer algo além da saudação inicial, sentenciou: Senhor Professor, seufilho é um agitador, um anarquista e está expulso. Não queremos desordeiros neste colégio.

No mesmo dia, meu pai voltou para Salerno, ficando sua educação sob os cuidados paternos, daí pordiante. O Mestre Emílio era extremamente exigente e severo, desejando que seu filho fosse exemplo para osdemais alunos. Em pouco tempo, literalmente, o filho começou a fenecer em suas mãos.

Um tio que vivia no Brasil, foi à Itália para submeter-se a tratamento cirúrgico; percebendo a tristesituação do então adolescente, levou-o de volta consigo, em caráter de punição, prometendo que após um anoo devolveria aos pais.

Francisco nunca mais voltou a sua terra natal. Adaptou-se maravilhosamente a esta terra e comomilhões de outros imigrantes, seus compatriotas, aqui casou-se, criou sua família e foi muito feliz.

Conseqüência – graças a Deus, sou brasileiro e nunca freqüentei qualquer colégio católico, em especial,da Companhia de Jesus.

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Marcos Gimenes SalunMarcos Gimenes SalunMarcos Gimenes SalunMarcos Gimenes SalunMarcos Gimenes SalunJornalista - São Paulo - SPJornalista - São Paulo - SPJornalista - São Paulo - SPJornalista - São Paulo - SPJornalista - São Paulo - SP

TribunalHoje estive mais uma vez no tribunal do júri. É um palco tenebroso e enfadonho, um cara-a-cara com

a morte, um verdadeiro mercado da justiça ou da falta dela. Ali tratam a vida e a morte como objeto de troca.Os que mataram, porque seu negócio talvez seja esse mesmo, o de matar, estão ali como quem não

quer nada. Devem acreditar que seja certo o que fizeram. Muitas vezes alegam inocência. Noutras, nem isso.Só tentam deixar a impressão de que o que foi feito, é porque era para ser feito mesmo e pronto.

Os que defendem esses réus, tratam a morte como a coisa mais natural do mundo, quase sempre. Umabanalidade, muitas vezes. Gesticulam e encenam. Gritam! A morte é periférica aos seus trejeitos e apenascoadjuvante nos seus objetivos de inocentar o réu. Não é ela, a morte, nem ele, o assassino, quem estão emjulgamento, mas sim aquele cara com um par de algemas nos pulsos, “uma pobre vítima desta sociedadeexclusiva”, como dizem na maioria das vezes. Chega a dar dó de caras, homens ou mulheres com algemas,mesmo sabendo que, segundo testemunhas, foram verdadeiros algozes e manifestaram toda sua bestialidadetirando a vida de algum semelhante.

Já os que acusam, estes sim... São os primeiros a falar e a tentar comover a platéia e principalmente osjurados, com a tenebrosa lança da justiça nas mãos. Tentam empurrar os réus para o mais profundo castigoque possa ter o terrível crime de terem tirado a vida de alguém. Pelo que fez, o réu merece o fogo do infernocomo castigo, arder na penitenciária, ao lado do demo, por 30 anos e quiçá, pela vida eterna. Precisamaprender a respeitar o dom maior, que é a vida.

O juiz é um caso a parte. Impassível, parece sempre o menos afetado por isso tudo. É quase como seestivesse num patamar distante da sociedade onde o crime foi cometido. Tanto é que, em pleno debate entreacusadores e defensores, com o júri tentando prestar a maior das atenções do mundo para não cometerinjustiça na hora do SIM ou NÃO na sala secreta, cadê o juiz? O plenário nem percebeu, mas não há juiznenhum assistindo aos debates que podem culpar ou inocentar um réu.

Mas os “sorteados” do júri permanecem lá o tempo todo, firmes e fortes, por mais que estejam sonolentose irritados com a teatralidade de promotores e defensores, por mais que estejam se sentindo ameaçados peloolhar cabisbaixo e de soslaio do réu, o tempo todo em sua frente, como a dizer: “Veja lá como você vai votar,heim?... Dependendo do que você disser, quando eu sair dessa a gente acerta, viu, ô cidadão de ilibadaconduta?”. Que situaçãozinha mais filha da puta esta, concorda?

Um vôo a maisNaquele tempo, muitas mulheres flutuaram... Boa parte fazendo algumas incursões pelos ares, o que

era uma novidade absoluta. A grande maioria delas, no entanto, era motivo de pilhéria entre os homens, poisestes julgavam tudo aquilo uma grande besteira. Elas simplesmente camboteavam e zuncavam suas asas paralá e para cá, davam algumas voltas sonsas, e depois se espatifavam no chão, de forma grotesca. Coisa típica!

Contudo, a maioria das mulheres não fazia apenas piruetas à toa, pois tinha um percurso a seguir. Asmulheres sabiam muito bem o que queriam e onde queriam chegar. Por isso ninguém quis interferir. Ou pelomenos ninguém pode interferir naquele momento. Afinal nenhum deles entendia nada de flutuação de mulheres.Era um segredo só delas. Só elas sabiam - e já sabiam há muito tempo - se já tinham ou não atingido um bomnível de flutuação.

O que se ouviu dizer é que ninguém quis interferir. Elas, e somente elas, sabiam do que precisavam eonde queriam chegar. E os homens estavam todos ali, boquiabertos, vendo suas mulheres atingirem o céu,alçando vôo para limites que eles nunca puderam imaginar. Elas estavam sobre suas cabeças. Todas elas! Deuma maneira que nunca estiveram antes. A hora havia chegado e os homens não poderiam fazer mais nada.Somente olhar suas mulheres flutuando, longe e alto, cada qual com sua potência de flutuar. Cada uma delascom um objetivo. Cada uma delas com seu desejo mais íntimo...

E então veio um momento importante para aquela casta de homens: precisavam esperar pela decisãodas mulheres que flutuavam. Lá do alto elas poderiam decidir o que fazer. E aos homens restava esperar... Sóesperar. Depois do vôo e da flutuação, quem sabe suas mulheres lhes dariam alguma oportunidade?

E essa coisa toda de vôos e flutuações já estava enchendo era o saco de todo mundo. Principalmentedaquele bando impotente de homens sem asa que já não sabia fazer outra coisa a não ser bisbilhotar o céu, àprocura de suas esvoaçantes mulheres. Quando não, se metiam em rodas de bebida e conversa fiada, um olhosempre vasculhando as alturas, de soslaio.

Vai daí, que elas que flutuavam, iam meio sem rumo, cada uma para um lado, ao sabor da brisa e dopróprio gosto de pairar sobre as cabeças deles, lá embaixo. Coisa oposta se dava com eles, que cada vez maispermaneciam ao redor de uma mesa de cachaça, conversa cada vez mais concentrada em suas mulheresvoadoras. Como resultado lógico da equação, muita cachaça e conversa deram a eles uma perspectiva dedecisão. Elas, no entanto, cada qual com seu vento, cada qual com sua brisa, se espalhando pelo ar...

E numa manhã de domingo aconteceu. Quando a mulherada toda já infestava o céu com seus bamboleiosflutuantes, cada qual mais estufada e leve que a outra, eles saíram sorrateiros de sua roda de cachaça. Foi aí

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que seus estilingues começaram a lançar pedrinhas miúdas. Logo uma dessas pedrinhas, pequena, maspontiaguda, atingiu a bunda de uma das mulheres flutuantes. Na mesma hora ela começou a murchar, empiruetas e reviravoltas tão rápidas, que quase não deu tempo de vê-la se espatifando na areia.

Isso bastou para encorajar todos eles a lançarem pedrinhas e mais pedrinhas em direção a suas mulheresvoadoras. E não dava outra. Era só atingir a bunda de uma delas para assistir aos desengonçados, indecisose rápidos vôos de volta ao chão. Em pouco tempo puseram todas em terra, completamente desnorteadas econfusas. Então elas batiam a mão nos traseiros murchos, sacudindo a poeira do tombo, e cambaleavam embusca de um refúgio para o susto momentâneo.

Naquela tarde eles vibraram muito. E eufóricos, foram noite adentro, cantando e cachaceando, numaalegria indescritível de quem tinha, afinal, vencido. Em dado momento, começaram a cair pelos cantos,embriagados de tanta glória e cachaça, até que o último que restou em pé foi-se embora, sem apagar a luz.

A manhã já pretendia terminar, sol alto e forte, quando o primeiro deles esfregou os olhos. Ardiam detanta luz e raspavam como se neles houvesse areia. Ficou prostrado nesse nada de seu acordar por um bomtempo, até que, aos poucos, os demais também foram se erguendo a custo e com vagar. Não diziam nada, poissequer se davam conta do que lhes acontecia.

Daí beberam muita água gelada, depois água de coco, depois sal de frutas. Alguns vomitaram.Então um deles, o primeiro que teve forças para erguer a cabeça rumo ao azul profundo do céu, firmou

a vista num pontinho. Depois noutro, e mais outro... De início achou que seus olhos ainda estivessem pontilhadosda ressaca. Mas depois conseguiu firmar a vista numa dessas minúsculas referências. Eram elas! Nítidas,claras como a manhã que já quase ia a termo. Flutuavam outra vez. E todos se abismaram, lá na ressaca decada um, com o que viram. Suas mulheres voavam outra vez, cada qual com um forte protetor de couro nabunda, só por precaução.

Poema para qualquer absurdoExiste um pequeno detalhe: a diferença.Qualquer um põe reticências a torto e a direito,onde quer e onde cisma que elas servem.Qualquer um usa aspas e citações,em abundância ou com parcimônia,quando quer e quando cisma.É tudo uma questão de gosto, eis aí a diferença.E para ser diferente é preciso uma relação,um ponto de referência.Nada é absurdo, sem ponto de referência.

Existe mais um pequeno detalhe: a indiferença.Qualquer um reclama atenção, qualquer um!Então tudo é absurdo, apesar de pontuações,de pontos de vista, de necessidades.Mas poucas coisas são absurdas, na verdade,já que uma flor não é absurdo,o amor não é absurdo,o carisma não é absurdo,a rima e o ritmo não são absurdos,gêneros e estilos não são absolutamente um absurdo.É quase tudo uma questão de referenciais.

Existem coisas absurdas, é claro!Mas são todas tão coerentes e simples,tão expontâneas e singelas,que não se parecem com qualquer absurdo.Um poema absurdo não existe,Um poeta absurdo não existe,Um verso absurdo não existe.O que existe, e isto sim é um absurdo,são palavras sem sentidoque se juntam só porque nunca souberam a diferençaentre a indiferença e o absurdo,entre o absurdo e a diferença.

FiaposCada palavra indigenteque sai de mim para o papelé um fiapo de alma,um descuido.

Quisera ter um dom,e um apenas me bastaria:o de saber dar rumoà indigência que se esvai de mim,tão esfarrapada,tão simplória,tão encardida das marcas de cada dia.

Quisera saber de rumos e rotas,de letras e feridas,todos num mesmo conteúdo.Quisera saber de minutos e sinaistodos num mesmo contextoque não se revela assim, tão simplesmente.

Contudo, meus fiapos de alma são assim,cheios de nada e ao mesmo tempotão plenos,e ainda assim tão pobres,e talvez por isso, só fiapos.

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Marcos Roberto dos Santos RamascoMarcos Roberto dos Santos RamascoMarcos Roberto dos Santos RamascoMarcos Roberto dos Santos RamascoMarcos Roberto dos Santos RamascoMédico oftalmologista - Campinas - SPMédico oftalmologista - Campinas - SPMédico oftalmologista - Campinas - SPMédico oftalmologista - Campinas - SPMédico oftalmologista - Campinas - SP

Vida da Felicidade

Felicidade nasceu...!Logo deu sinal de vida. Chorou.Pesava, mas pesava apenas aos olhos dos outros, pois para si própria, era leve.Chorava pra mostrar que nascera e nascera mulher, menos por isso e mais porque nascera e tinha que

ser criada.E bem criada. Felicidade sugou e sugou vida da natureza e assim desde o início tornou-se bela.Felicidade era única. Única e dupla. Era Felicidade a dois e Felicidade de dois. Dois que se uniam por

ela e para ela.Felicidade era criança. Esperta, um azougue, desbravava terrenos insondados, escalava encostas

íngremes, bailava sobre seixos rolados entendia tudo e aceitava tudo.Era Felicidade modelo. Amoldava-se a tudo e a todas as arestas da convivida vida, alegre e feliz.

Felicidade sorria e cantava, pulava, deitava e rolava; era saudável como um touro, saúde de platina e de ouro,que não perdem o brilho; tinha a tez macia como uma pétala de rosa branca. Felicidade era loura, ou melhor,era dourada e era de ouro. Era mesmo, modelo de Felicidade.

Felicidade era feliz...Bem criada no aspecto da vida, criada no sentido da vida e mal criada no espírito da vida. Felicidade

cresceu. No aspecto da vida era bem aparente; linda, unida e forte, tanto ao seu próprio juízo como ao dosoutros.

Felicidade aparentava ser eterna Felicidade. Única e dupla.No sentido da vida, Felicidade queria mais, sempre mais. Felicidade era ambiciosa, era gananciosa e

não se contentava mais em ser apenas feliz. Não queria Felicidade recebida, queria Felicidade tomada, roubada,comprada, queria Felicidade conquistada a todo e qualquer custo e então, tornou-se mesquinha. Felicidadeficou avarenta.

No espírito da vida, Felicidade não se encontrou; não encontrou o ESPÍRITO vivificante, o ESPÍRITOSANTO. Felicidade buscou durante sua vida, somente a si própria.

E não se achou. Sua beleza, autoconfiança, egocentrismo, ambição e avareza cegaram seus cristalinosolhos azuis, que assim não puderam ver a CRISTO, Nosso Senhor, que acenava chamando-a para ser e terfelicidade no ESPIRITO da vida.

Felicidade tornara-se infeliz.Felicidade era agora: enrugada, triste, desprezada, sisuda, rancorosa, descabelada e cega.Felicidade aí, nesse instante, curvou-se ao peso de sua escolha, desuniu e já não era mais dupla, nem

única. Era ela e só ela e chorou amargamente como sinal de fim e tombou.Deixou missão a cumprir. Deixou obra inacabada. Deixou órfão. Deixou o amor. Sem vencer nem

convencer. Morreu moça, mas corroída por seus ácidos desejos.Morreu...! Morreu a felicidade. Felicidade? MORREU!

Bom dia, filho!(Crônica de um pai separado)

- Bom dia, filho!- Bom dia, pai! Repetia-se quase toda manhã.- Oi, filho, tudo bem? Como foi o seu dia na escola?- Tudo bem! Repetia-se assim quase toda noite.Deste modo quebrava então o silêncio insólito do cansaço, que o trabalho causava no corpo, que

sufocava até as certezas absolutas contidas no coração e que explodia sempre em lágrimas extenuadas desaudade e paixão, irreversíveis, porém irretomáveis, molhando o rosto e o travesseiro e que o sono finalmenteaplacaria na esperança de um dia seguinte menos enfadonho.

- Bom dia, filho! Ele quase não falava, mas se fazia ouvir.- Bom dia, pai!

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Marcos Roberto dos Santos RamascoMarcos Roberto dos Santos RamascoMarcos Roberto dos Santos RamascoMarcos Roberto dos Santos RamascoMarcos Roberto dos Santos Ramasco

Assunção

Quisera a doçura da inocênciabrilhando simplesmente no destino,iluminando toda a existência,dando-me a pureza de um menino.

Desafortunado momento envolvente,desafiou a introversão à entrega,assim criando coesão aparentena razão ilusória que o amor prega.

Atraiçoado pela incoerência sumária,na culpa por sentimento inconsistente,desaconselhando pois a intenção primária.

Sou réu, confesso, condenado e penitentena desventura do amor, apesar da precedência,por TI, quero com ardor a reincidência.

Primeira vez

Como se fosse a primeira vez,para que a memória não ferisse a paixãoe o amor tivesse a insensatezde se tornar total e se tornar razão,

a sensação da imparidademe fez cúmplice do meu desejo,realçando com a clareza da realidade,a intenção pura que almejo.

Ter teu passo em meu compasso,dar minha mão à tua mão,converter nossos receios em nosso laço,

nossos anseios em nossa emoção,brilhar o amor que em teus olhos vejoe cobrir o teu sorriso com meu beijo.

Era um novo dia de novo e a plural simpatia de melhoranças acendia no peito um sorriso que eclodianos lábios espontaneamente. Mas aos poucos, o enredo cotidiano devolvia ao semblante o peso dasinconseqüências, munição interminável de insatisfações, sempre decorrentes da extrema intenção de atendernossas necessidades quer pessoais, quer espirituais, físicas, afetivas, amorosas e principalmente financeiras: otrabalho.

- Será que vai dar pra levar meu filho à escola, hoje?...- Oi, filho! Que alegria vê-lo agora no meio do dia, no meio da semana! Vamos pra escola, vamos!- Vamos, pai!- O papaizão não tem tido tempo pra levar você na escola, sabe? Mas, hoje deu. Só que não vou poder

ir buscá-lo, tá? Você vai voltar com a tia, certo?- Tá bom, pai, você vai trabalhar, né?- É filho, é, é isso mesmo!Mas não era assim todo dia, buscá-lo ou levá-lo à escola. Era raramente. Era distante, era quase

sempre impossível, era quase sempre mais distante. Era a angústia do inevitável, a impotência de qualqueratitude. Era o escapar por entre os dedos, de um clímax já atingido, o êxtase de um grande e perene amor, ofrenesi de uma grande derrota, a perda irreparável.

Um pai marcado para estar sempre longe.E assim a amizade sucumbia nessa distância proposital e inconveniente e o amor restava na saudade

e na esperança amarga do reconhecimento de um fato eterno, ser pai, que se fora nos desdenhos do destinoque então reservara para o dia a dia. Incessante e exaustivo, a imensa e dura alegria de olhar para o seu retratoe dizer:

- Bom dia, filho!

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Maria Julia Pereira de MoraesMaria Julia Pereira de MoraesMaria Julia Pereira de MoraesMaria Julia Pereira de MoraesMaria Julia Pereira de Moraes

Prieto PeresPrieto PeresPrieto PeresPrieto PeresPrieto PeresMédica psiquiatra - São Paulo - SPMédica psiquiatra - São Paulo - SPMédica psiquiatra - São Paulo - SPMédica psiquiatra - São Paulo - SPMédica psiquiatra - São Paulo - SP

Vazio paradoxal

Para conseguir a sua plenitude o homem precisa estar com a consciência em paz consigo mesmo ecom o mundo que o cerca. Entretanto, ele está repleto de necessidades importantes e vazio no que tange aoburilamento do seu caráter. Além de suas necessidades de sobrevivência, o ser humano tem múltiplas outras,como o ser complexo que é, ampliado sob as diversas vertentes dos aspectos biopsicossocial e espiritual.

Entre as suas necessidades mais importantes, estão aquelas de ser verdadeiro, sendo ele próprio,admitindo suas características positivas e também as negativas, que devem ser elaboradas em seus processosde mudanças, por meio de constantes redecisões amadurecidas, facilitadoras de seu progresso interior, emtodo o seu âmbito de atuação.

O homem precisa cada vez mais, aprimorar o seu caráter, adquirindo melhor compreensão dossignificados da vida, conhecendo mais os limites e as possibilidades da experiência humana.

A integração entre a fé e a razão, feita sem os dogmatismos místicos e entorpecedores, de ambos oslados, incentivam a compreensão do ser humano, quer sob o ponto de vista físico, quer na perspectiva espiritual,abrangendo as relações interpessoais em todas as suas nuances.

Assim, o homem pode preencher o “vazio paradoxal” que limita seus conhecimentos no âmbito de seucrescimento espiritual, independentemente de rótulos religiosos ou de quaisquer outros. Isso ele consegue,complementando-se em relações fraternas de amizade sincera; nutrindo-se emocionalmente ao doar e recebero que houver de melhor em seus anseios, que têm embasamento na paz, justiça, amor, solidariedade, parceria,confiabilidade, cultura, família, conhecimento e integridade moral. Desta forma ele interage consigo mesmo ecom o seu semelhante, de maneira adequada e saudável.

Este é o caminho! Entretanto, o homem é visto sob o aspecto socio-biológico, como um ser extremamentecompetitivo, como máquinas de genes egoísticos, cujos destino e comportamento são controlados pelas leisdeterministas da física clássica e da genética (Goswami, 1999).

Quanto mais o homem necessita vivenciar a fraternidade universal, a cooperação entre os povos, oaltruísmo de uns para com os outros, mais ele desencadeia a violência, mediada por sentimentos de ira, ódio,vingança, pseudoprotecionismo, gerados na luta pelo poder.

Assim, prosseguem, desde tempos remotos, os mais terríveis conflitos mundiais, em que os países sepreocupam mais com o controle de armas (nucleares, atômicas, biológicas e químicas), pretendendo umasuposta segurança nacional, com o suposto objetivo de preservar a paz... É um contra-senso. Estes métodostêm sempre falhado, pois as nações belicosas persistem, continuamente, em seus intuitos destruidores.

Os países ocidentais prosseguem cedendo armas aos países emergentes, isto é, em desenvolvimento; ospovos do Oriente Médio não conseguem viver em paz. Os hinduístas e muçulmanos, entre outros, seguemlutando para atingir uma posição de superioridade. Continuam as lutas fratricidas, cognominadas “guerrassantas”, e prosseguem as iniqüidades!

Realmente, o homem tem evoluído muito do ponto de vista tecnológico e cognitivo, mas está muitodistante em atingir o progresso espiritual e a maturidade emocional (Sanvito, 1995).

Atualmente, o cenário internacional encontra-se avassaladoramente açoitado pela crueldade da guerra,alimentando violências, lágrimas, derramamento de sangue, emoções de medo e desespero, embasados noódio e na incompreensão. Cumpre-nos relembrar, reconstruir e revivenciar o ensinamento de amor fraterno,com que exemplificaram alguns grandes líderes espirituais da humanidade.

Libertemo-nos dos desentendimentos nos nossos próprios lares e ambientes de trabalho, cultivando osmais dignos princípios morais e éticos.

Preservemos a dignidade, o amor, a sinceridade e a compreensão onde quer que estejamos, pois sóassim, estaremos executando concretamente a parte que nos compete, neste nosso mundo, ainda de barbáries,de expiações e provas.

O paradoxo do vazio, o homem só conseguirá entender e preencher, quando desenvolver a capacidadede amar com desprendimento e altruísmo, superando o egoísmo, a vaidade, a ganância pelo poder, preservandoos laços de família biológica ou social, onde ele aprende a se reestruturar e crescer em seu processo evolutivo.

Esta VII Jornada Médico-Literária promovida pela SOBRAMES é uma feliz oportunidade deconfraternização para preencher o nosso “vazio”, tornando-o menos paradoxal.

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Maria Virgínia BoscoMaria Virgínia BoscoMaria Virgínia BoscoMaria Virgínia BoscoMaria Virgínia BoscoMédica cardiologista - São Paulo - SPMédica cardiologista - São Paulo - SPMédica cardiologista - São Paulo - SPMédica cardiologista - São Paulo - SPMédica cardiologista - São Paulo - SP

Grafite

Grafo letras solitárias, sem destino, magoadasEm palavras as organizo por sensações tão abstratas...No alfabeto eu passeio, concretizo devaneiosGrafo letras em monossílabos se poucos são os meus anseios!

Grafo letras saltitantes, em palavras estonteantesNa grafia do alfabeto arquiteto mil projetos...Eu desenho a alegria com um toque de euforiaGrafo letras em polissílabos e as transformo em poesia!

Grafo letras esquecidas, escolhidas com cuidadoEu capricho em cada traço, em cada passo do compasso!E na dança das palavras, faço pares de fonemas...

Giro a valsa da saudade, marco o tango sincopadoNão tropeço no alfabeto, desde o ”a” ao “z” navego!E nas letras grafitadas...grafo a vida em poemas.

Metáfora

Destinava-se mais um dia de árduo trabalho na unidade de saúde. A manhã estava nublada,aonde miúdas gotas de chuva misturavam-se aos resquícios da conturbada madrugada que haviapassado por lá. Chovera torrencialmente.

Tão logo cheguei à porta da unidade, lá estava ele, úmido, magro, friorento, triste, faminto,assustado, com o olhar vagamente perdido, que logo cruzou o meu. Não consegui prontamente decifraro que exatamente me pedia, mas com certeza urgia por socorro.

Rapidamente percebi que estava machucado, pois reluzia no seu descoramento global, uma corvioleta no seu membro inferior. Alguém, dentro de precárias condições, já havia dele se compadecido.Pareceu-me dispneico, cansado... com certeza da vida que tem enfrentado.

Assim que entrei na unidade, brinquei com a recepção:- Bom dia!... viram só? Hoje temos um novo guarda!- Não doutora, - respondeu a recepcionista... ele aguarda por uma vaga... que nunca tem!Sorri, e comecei meu trabalho. Terminada minha jornada, ao sair da unidade, deparei-me

novamente com ele. Imóvel, no mesmo lugar, seu cenário em nada havia mudado, a não ser pela faltade ar, que me parecia ter aumentado. Novamente seu olhar cruzou o meu, e percebendo que eu já meia, sofregamente conseguiu se levantar, e cambaleando me acompanhou até o carro. Lancei-lhe umpensamento de desculpas.

Já em movimento, olhei para trás, e ele sumiu no meu retrovisor. Ainda pude ouví-lo latirdebilmente... um ato heróico, que delatava sua desnutrição e anunciava a sua tragédia.

- Meu Deus! pensei tristemente - ele é o retrato da condição que acredito que trato!Nada pude fazer por ele. Nunca mais o vi.

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Cartas de amor

Cartas de amor, emoções... são sincerasQuando escritas no afã das paixões... são eternas!Cartas de amor, são lembranças de outroraQue o tempo levou... mas deixou na memória.

Cartas de amor, intenções... são singelasSão espelhos da alma, são ingênuas... tão belas!São só lagrimas que rolam de um peito apertadoSão retratos perdidos de um tempo apressado.

Cartas de amor, ilusões... são quimerasSão fagulhas efêmeras... qual uma linda donzela!São palavras esculpidas feito obras de arte,São postadas ao destino chamado saudade!

Ossos do ofício

O telefone tocava insistentemente. Na agitação de mais um agendamento lotado, procurava dar respostas,através da secretária, às necessidades mais urgentes dos meus clientes.

- Doutora, dona fulana ligou, dizendo ser um caso de “vida ou morte”, sendo necessário que a senhora aveja hoje!

Quando soube de quem se tratava, senti um “frio na barriga”, mas em homenagem aos ”ossos doofício”, resolvi encaixá-la no agendamento, pois mesmo não sendo advogada, aprendi que... na dúvida... pró-réu!

Minutos após, lá estava dona fulana, aos prantos, cuja cacofonia inundava as instalações do meu pequenoconsultório, já angariando a piedade de todos que esperavam pacientemente.

- Posso entrar, doutora? - e, rapidamente instalada à minha frente, contou-me o caso de morte:- Ele morreu... eu sabia que não iria agüentar!- Ele... quem? - perguntei assustada...- Doutora, perdi meu Nicolau.- Seu marido?- Não doutora, antes fosse... perdi meu cachorro!- E...n o quê eu poderia ajudá-la?- Preciso de um anti-depressivo.- Outro?- Preciso de um mais forte para agüentar a cerimônia e, por favor, algo que seja mais barato, pois gastei

muito com a doença dele.- Cerimônia?- De cremação... a senhora acha que eu agüento?- Mas dona fulana, não seria melhor algo mais simples? - confesso que para mim é novidade este negócio

de cremação de cães.- Ele merece, doutora! Sofreu muito com a doença. Insuficiência renal. Será que não poderia ter feito

diálise? Será que houve erro médico? Qual a sua opinião?Engoli seco e retruquei:- Não posso lhe emitir minha opinião, porque não acompanhei o caso , e além do mais, não sou

nefrologista e muito menos veterinária! - e já prescrevendo-lhe uma medicação, ansiosa por me livrar dela e dasua depressão, ainda ouvi a sugestão:

- Faça uma receita de manipulação que fica mais em conta, pois a cerimônia e as cinzas embaladas comos dizeres “Aqui jaz Nicolau, meu único e fiel amigo”, me custarão 600 dólares!

Respirei fundo, e cheguei à conclusão de que, se não fossem os “rins”, com certeza o coração do pobrecãozinho não teria agüentado. Realmente, um grande herói... um indiscutível merecedor de tamanha homenagem!E, para salvaguardar o meu coração, nunca mais atendi encaixes de “vida ou morte”... pois são extremamenteonerosos e desgastantes para uma heróica consulta de “convênio”, e esta, a mais literal representante dosnossos “ossos do ofício”.

Maria Virgínia BoscoMaria Virgínia BoscoMaria Virgínia BoscoMaria Virgínia BoscoMaria Virgínia Bosco

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Maria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroAdministradora de empresas - São Paulo - SPAdministradora de empresas - São Paulo - SPAdministradora de empresas - São Paulo - SPAdministradora de empresas - São Paulo - SPAdministradora de empresas - São Paulo - SP

Uma menina diferente - Manuela

Introdução... Apresentação da personagem MANUELAQuando ela chegou... O sol sorriu e inundou os corações, todos da família sentiram um grande e

estranho desejo de gostar gostando... Gostosamente... Já de pequena mostrava uma personalidade forte,irresistível e o ser “diferente”; em tudo, por tudo e, sobretudo o ser diferente, pensar diferente, agir diferente,nos pequenos trejeitos e nas artes infantis.

Relatarei pequenos tópicos da vida de MANUELA.Tem a facilidade de fazer inúmeras atividades ao mesmo tempo, tais como assistir TV, ouvir discos,

beliscar a irmã ou estar brincando com os amigos, os dois cachorros (Max - o moleque e Bandid seuacompanhante... “Dom Quixote e Sancho Pança)”.

Beliscar a irmã sempre que necessário porque a dita cuja veio ocupar um lugar que era inteiramenteseu nos corações dos parentes veio se intrometer onde não foi por Manuela chamada, por tal motivo sempre etendo oportunidade dá-lhe empurrão, jogando seus brinquedos longe, só não a faz sumir porque não conheceesta mágica, porém quando distante sente enorme saudade da irmã. Quando Manuela cerra os dentes (aqueleslindos dentes de leite e alguns definitivos que estão nascendo e com tantas “janelas” na parte superior e inferiordas arcadas dentárias). Saia de perto porque vem chumbo grosso, a menina goteja raiva. A mãe de Manuelanão tem tempo para ver as pequenas e grandes diferenças e por motivos fúteis, pequenas estrepolias e molecagensa colocam...

“No quarto pra pensar”Lá está Manuela no seu quarto repleto com brinquedos e bonecas, seus apetrechos escolares, tudo que

lhe interessa e se põe a reunir os pequenos acidentes de percurso de molecagens que passa a relatar-lhes... “Não sei porque recebi aquele safanão na cabeça só porque estando na garagem do apartamento do

vovô minha mãe estando a retirar as malas diz”:- Manuela... Chame o elevador.Eu na maior distração e inocência, desligada atendendo a ordem de mamãe comecei a gritar em frente

ao elevador:- Elevador... ElevadorFui acompanhada pela minha irmã e nossas vozes e gritos infantis inundando e preenchendo toda a

garagem, só vi quando minha mãe chegou brava e dando tabefes e falando nervosa:- Não e assim que chama o elevador é apertando esta tecla aqui de garagem.- Agora digo pra vocês é motivo pra tanto drama, porque não falou certo, assim nada diferente

aconteceria, mas que foi gozado foi, sabem que acho e digo para vocês que o elevador é surdo e mudo... Comos gritos ele nada de aparecer.

2Na novela “O Clone” exibido em abril - julho de 2002,

Parte passa-se em Marrocos, onde as mulheres são trocadas por camelos.Conversam a avó materna e Manuela (9 anos)

O avô havia comprado uma televisão e foi necessário ser colocada no banco da frente, pois nãoentrava na porta mala ou no banco de trás, a avó teve que ir no banco de trás do carro.

- É Manuela, nesta compra o televisor ocupou meu lugar na frente, a vovó foi trocada.- Não se preocupe vovó a senhora vale mais.- Se fosse em Marrocos a vovó seria trocada por 50 camelos.- Não vovó a senhora vale muito mais... Vale 60 (sessenta camelos) Grande vantagem Manuela deu 10

camelos a mais (isto para nós que não sabemos o valor de cada camelo).

***** *****Na padaria onde se compra pães e outros alimentos há mesinhas, onde as pessoas fazem o café da

manhã e no dia todo há enorme movimento, existe em cada mesa um menu. Manuela lê o menu enquantomãe e avó compram os pães e guloseimas.

Manuela sabe ler e tudo que lhe cai nas mãos é lido, busca, rebusca, rele e faz o seu pedido.- Eu quero viski de oito anos.- O que Manuela? O que você quer?

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Maria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroMaria Zulcides Déstro

- Viski oito anos, quero experimentar isto. (Baseado em sua pronuncia de leitura é viski)A mãe apanha o menu e começa a ler para saber do pedido inusitado e lê Whisky – 8 anos- Não é possível Manuela você querer isto, é uma bebida, é bebida americana.- Eu quero, sabe é pra oito anos e eu tenho nove eu posso tomar.

(Caros leitores aprender a ler e fazer pedidos a diferença é muito grande)

***** *****Manuela nove anos seu sonho é ser manequim e quando a TV a cabo apresenta desfiles lá está Manuela

desfilando naquele gingado próprio de desfiles praticamente cruzando e dando gingados às pernas ao desfilar.Haja passarelas e corredores e assistentes que quase sempre são a mãe, a irmã o pai e dois enormes cães.

- Manuela vou fazer sua inscrição nos Pequenos Brilhantes quando for a S. Paulo (reside em Valinhoscidade próxima).

- Eu quero ser manequim, não quero ser atriz.Visitando S. Paulo, foram fazer a inscrição trazendo várias fotos de Manuela, mas é necessário pagar

uma foto e colocá-la na Internet por um ano foto 3 x 4 na qual estão centenas de fotos. São poluições visuais.Há um, porém tem que fazer o book à pagamento e o preço é caro e Manuela já tem centenas de fotos... émuito fotogênica.

- Não é caro, ela fica inscrita para desfiles em fotos de produtos.- Tudo isto, o contrato é muito vago. São gastos sem ter retorno e os tempos são bicudos. Não foi isto

que me informaram pelo telefone. Manuela ouvidos atentos e ouvindo os preços na sua importância e belezaresolve na hora.

- Não vou tirar fotos, não quero e não quero, mãe vamos. (Ninguém mudou sua opinião)

Depoimento nadelegacia da mulher

amor e ódio

MOÇA estou com vergonha de tudo e de todos...Estou com vergonha de mim mesma e do mundo...

Apanhar, levar tapas na cara, chutes, safanões.MOÇA dói o corpo e principalmente dói a alma.

É dor física... é dor moral sucumbir e ter calma...Deitar e chorar um choro sentido, choro sufocado.

MOÇA são manchas no corpo, no olho roxidão.Socos dados e o meu íntimo a rastejar no chão...

Ser seviciada pelo homem que amei.MOÇA traz um ódio mortal, ódio que nunca pensei ter.

E não foi uma vez... E por várias vezes apanhar nua.Não ter para onde ir. Depois ter vergonha de sair na rua.

MOÇA, saber de minha inocência e ter tanto medo.Ele a bater... E bater e ter o prazer.

De sentir e ver o meu sofrer...Eu a guardar este segredo.MOÇA quis sumir... Mas sumir pra onde?

Quis desaparecer... Quis morrer, desejar a morte pra gente.Quis... Quis... Quis e... Fiquei impotente.

MOÇA, antes que eu faça uma desgraça...Antes que eu mate... Ou que morra, arranco esta mordaça,

Vim dar este depoimento, saber os meus direitos.MOÇA, aqui na DELEGACIA DA MULHER...

Agora eu só quero a minha dignidade...A minha dignidade... Dignidade e juro

MOÇA...DEUS sabe... Que digo a verdade... DEUS sabe...

DEUS é minha testemunha...26-2-2002

O grito ao mundo mulher.

Busca dotempo perdido

Quando a amiga se vai.Chora-se, sente-se e não acredita.

Ela vai buscar o seu destino.Deixa um espaço vazio.

A amizade se vai.O canto é mudo.Olhos marejam.

Na nossa boca fica omundo sem som.

Porque a amiga se foi.Deixando um vazio.

Que não se pode preencher.Nem com toda a água do Oceano.

Nem com areia da praia.Nem com folhas da floresta...

Só se preenche com a saudade.

Se ela deixou saudade.Pode contar foi uma amiga de verdade.

Então o que se deve fazer é rezar.Olhar o relógio da vida.

Rezar, rezar e rezar.Pra preencher o lugar

Quando a amiga se vai

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O convite irrecusávelA viagem.Amigas de longa data, Maria e Beatriz, muitas festas, muitas viagens, segredos, enfim parecem irmãs

e confidentes, suas estórias a contar, passeios vários, diversões, descrições, tudo no Tim... Tim... Tim.Casadas e amizade de longa data... consolidada.

O telefone toca, atende Maria.- Alô Maria, como vai, tudo bem?- Sim Beatriz, esperei seu telefonema, havia deixado recado na secretária.- Recebi, estive ocupada, tenho uma grande novidade, se lembra daquele passeio de navio para as

Costas Brasileiras que comentamos, lemos os prospectos, itinerários, citys, 20 dias de excursão. Tenho umanotícia boa a te contar.

- Vocês vão ao passeio, agora no fim do verão? Será uma delícia.- Maria... Compramos 4 passagens, eu, o João, minha filha e o namorado, tudo resolvido, pagamos em

parcelas. Sabe estamos preparados para a viagem o João teve um problema na firma, não pode ir, entãotemos três passagens para três pessoas está sobrando uma. Acredite, na loja de turismo não querem devolvero dinheiro.

Do outro lado do telefone Maria pensa “vai me convidar”.- Nós já fomos juntas a vários lugares e sabes que gostamos muito de você, dinheiro não querem

devolver.“É agora vai me oferecer”. - Beatriz na hora de vender e receber são uma coisa, devolver criam tantos

empecilhos. Vá ao Procon, não perca este dinheiro.- O João até deu sugestão que se convidasse alguém.“Vai me convidar, faço um pouco de fita, dizendo que vou pensar, vou dourar a pílula”.- A saída será no porto de Santos, iremos de carro, que ficará na garagem do apartamento do Guarujá,

o passeio nas costas: jantares, shows, lojas, pensaste Maria que delícia?- Eu conheço algumas destas cidades em excursões, porém foram passeios de aviões, de navio será

melhor, de navio estive no sul nos paises vizinhos; Argentina e Uruguai.- Lembra-se da viagem a Europa, das excursões, pegamos uma excursão muito boa é pra nunca

esquecer o quanto nos divertimos.

A conversa demorada de Maria ao telefone, o marido ao passar pela sala ouve trechos de respostas epelo “andar do andor” sua mulher vai ganhar uma passagem pelas “costas brasileiras”. Pensa. “Outro passeiodas amigas”. Tendo o que fazer dirá “sim ou não?”.

Ao telefone a conversa toma ritmo e emoções, citações, informações sobre o atendimento ser fenomenal.Camarões, frutos do mar, sol, lagosta, festas, o ideal pra terminar março com diversões.

Maria começa a salivar quanto se falou em camarões... Pensa “Adoro”.- Como te disse temos quatro passagens e três pessoas para a viagem.“É agora, pago a minha parte ou ganho a excursão?”.- Sabe, eu e minha filha, pensamos... Pensamos e achamos a pessoa ideal.

“É agora, já estou com os dois pés no navio”. - Convidei o meu neto o Alan, ele pode perder algumas aulas em março. Recupera, os amigos anotam,

é começo de ano mesmo. Sabe que ele topou. “A passagem, a excursão criaram asas... voou... voou”. - Não me diga, que ótimo! A voz em tom de tristeza. - Irão: você, a filha, o namorado e o neto que idéia fenomenal. No cérebro a passagem ouvida, degustada, fugiu entre dedos. - Pra vocês então um bom passeio, muita diversão, um belo fim de verão, venha bronzeada.

Aproveitem.Tchau. - Tchau. O telefone no gancho, o queixo caído, a refletir na absoluta certeza de ser convidada, que usufruiria a 4ª

passagem. A amiga sendo econômica jamais iria perder o valor. O marido que retorna a sala vendo a mulher pensativa, taciturna, estranhou. - Vais viajar com a Beatriz? - Eu tinha a certeza absoluta do convite. Relata as conversas da amiga. Na bucha o marido retruca: - Maria, você seria a convidada, tinha o nome na quarta passagem, gozou todas as sensações de ser a

convidada, porém você se chama Maria, é viagem pelo mar, nas costas brasileiras, porém faltou o principal,que não aconteceu... O verbo ia (Mar + ia)

Caem os dois em gargalhada na maior alegria e não ir a um passeio. A vida continua.

Maria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroMaria Zulcides DéstroMaria Zulcides Déstro

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Mario Edgar HidalgoMario Edgar HidalgoMario Edgar HidalgoMario Edgar HidalgoMario Edgar HidalgoMaster em Saúde Pública - Buenos Aires - ArgentinaMaster em Saúde Pública - Buenos Aires - ArgentinaMaster em Saúde Pública - Buenos Aires - ArgentinaMaster em Saúde Pública - Buenos Aires - ArgentinaMaster em Saúde Pública - Buenos Aires - Argentina

Sin darme cuenta

Un nacer ha despertado en mi, una inquietud muy importanteque tiene con ver a que corresponde este nacer.Transformaré este nacer en un poema, en un poema que tenga que ver con ti, mente.Mente que uno niega la creación de algo bello, que contenga, el contenido tuyo,es decir todo lo que realmente sos, es decir un vegetal, un mineral, una luz,oscuridad que tiene el contenido mío es este interminable momento que no sale desu letargo y se estanca en eso, la desazón y la pena.Vuelvo, he de volver con todo lo otro; Es decir con sonrisa, ¡Alegría Mía!.De nacer se trataba mi relato, de hacer el nacer la iniciación de vida, de vida de un niño,que viene, que nos dice que él es él que ha nacido.Que viene a vivir y hacernos vivir, que tomará nuestra vida nuestros cariños,nuestra desdicha, pero sobre todo nuestra fuerza de vivir, que tienes tú mujer, ser de engendrar ese nacer, nose interpreta aquí ahora pero vemos que el nacer y hacer nacer supero hasta el propio poder de hacer nacer.Te tengo en todo tu tiempo de haber preparado nacer,no me expliques nada, veo tus pechos turgentes, veo tu vientre tenso de engendrar ese nacer, tal vez sea yo,tú, él, todos, todos, pero lo veo sobre todo a él, él el mejor, es decir el creador. Sí el creador, que no nos dicenada pero que sin darnos cuenta somos nacidos ycreadores de hacer nacer ¡tú hombre, tú mujer!. Sigue así mundo, porque la vida es nacer para crecer, nollores, a pesar de haber llorado pero ese llanto es el cristal de mirar tu viday la de él del nacer.Falta poco, unos días más. No puede ser, pero es, llega no sé si rápido o lento ese día.El día llegó con un grito, con un llanto, ahora veo, veo, ¡sí es él, es mi varón!¡Gracias Nacer! Ahora si que creo!.

Veinte variables

En veinte variables veo, presiento y me transporto a lo sublime.Al recibirme te he manifestado que yo llegaré,tú serás como cuando yo te vi por primera vez.De ahí he transitado para definirte en estasveinte realidades mías que son como tu eres para mi!.Fíjate que pienso en un futuro.Fíjate que como todo me equivoco, no veo lo escondido, la inseguridad de tiesa débil disputa por lo hallado, tenido, no tal vez sentido,me hace desconocedor de tu verdadera personalidadla cual se me escapa,se me escapa con la congoja de no cambiar esta veinte sinfoníaque me eleva y te reclama, reclama afecto y sin haber recibido.Busco tu cuerpo, en él me dejare llevar por todo lo bello,lo malo de tu tránsito, hasta el comienzo mismo de tu serser que quiero y deseo conocerTú extraña, tú sensible, tú triste, tú alejada, tú tierna, tú, tú.

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Labios míos

El verso mío es el cuento tuyo.El verso mío es el dibujo tuyo.

El verso mío es la mirada de tus ojos.El verso mío es la turgencia de tus pechos.

El verso mío es tu fresca boca.El verso mío es el camino imagen.

El verso mío es el cuento del pájaro.El verso mío es la ilusión de lo poseído.

Pero lo realmente mío es vivirPor eso mejor verso sos vos!Mi nombre nombra tu canto.Mi verso nombra tu figura.Mi verso nombra tus ojos.

Mi verso nombra tus pechos.Mi verso nombra tu boca.

Por eso busca tu imagen, vuelacomo el pájaro, la ilusión tellevará lejos y encontrarás

tu vivir el mío y así conjurasel verso, el verso mío en tu

labios, labios míos!

Sin palabras

Hoy he venido en este díapara recordar hechos importantes

en nuestras vidas. Hoy he despertado de improviso.Hoy he recordado un sin númerode palabras que bien ordenadas

nos dirán un poema queserá el comienzo de la vidade un pequeño niño, niño

mío, que llegó un díade anochecer en una programación

y hora y minutos de su nacer.Esto fue así y no a la expresión

natural de nacer, en horay tiempo en que el creador lo dispuso.

Ahí esta mi niña, me tomade la mano, se aferra a mi

me mira con sus ojos verdeshermosos, me pide que la acompañe y ayude¿Qué ayuda, yo estoy y ahí esta mi ayuda.

Me piden presencia en el actomismo. ¡No! Mejor, esperar!.Por suerte el llanto, por suerte

una hermosa criatura, por suerteva parece empezar a meterse

en nuestros corazonesva rumbo a su estar, ahí todos a mirar.

Yo sin palabras, pero quieroeso silencio y reflexiónporque de aquí en más

veremos su existir y nuestrasideas de verlo crecer,

querer, sentir y sentirlos!como tales: abuelos, tíos, padre y madre.

Ahí te veo hija mía, ahíte distes la gratificación de

madre por eso te digo¡Gracias hija, por tu varón

y que es nuestro nieto!

Mario Edgar HidalgoMario Edgar HidalgoMario Edgar HidalgoMario Edgar HidalgoMario Edgar Hidalgo

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Mélida Velasco CassanelloMélida Velasco CassanelloMélida Velasco CassanelloMélida Velasco CassanelloMélida Velasco CassanelloMédica - São Paulo - SPMédica - São Paulo - SPMédica - São Paulo - SPMédica - São Paulo - SPMédica - São Paulo - SP

Querido paiHoje, 29/01/2003 eu, sua filha Heloísa estou fazendo aniversário, e lembrei do meu aniversário

de 15 anos, e que minha mãe com minhas irmãs prepararam uma festa entre nossos amigos parafestejar e comemorar meus 15 anos de vida. Meu melhor presente pai, foi o telegrama que vocêenviou, pois estava viajando a trabalho. Quando você retornou da viagem me trouxe um outro presentemaravilhoso, o livro “Mulhercitas”. Li e reli várias vezes e ainda o conservo com muito carinho comolembrança do meu aniversário e do meu pai.

Pai quanto tempo passou, e como é triste lembrar a maneira como foste separado de nossas vidas, suafamília. Família que com tanto amor construíste, sua esposa Eliana, e tuas cinco filhas: Fátima, Heloísa,Lorena, Silvana, e Carolina.

Aquele fato aconteceu em 28/06/1980, “Desaparecido Político”, Crime Cruel, sem corpo, sem vestimenta,sem alma. Dois dias após seu desaparecimento, nasceu teu 1º neto, José Miguel, filho de Carolina e de JoséMiguel, o neto que todo avô queria conhecer. Crime Cruel que não permitiu que conheceste teu 1º neto.

Sofrimento maior, acredito foi o de tua filha, Carolina. Todos temos que nos preparar para a morte,mas da mesma maneira, temos o direito de nascer com dignidade.

Até uma morte violenta é menos cruel que o desaparecimento. Crime Cruel, sem corpo, sem vestimenta,isso ouvimos de todas as famílias dos desaparecidos políticos. Muito comum na América Latina, Brasil,Argentina, Uruguai, Chile, pouco comum ou divulgado no Equador, latitude 0, longitude 0, perto da linha doEquador. Por isso queremos toda a família unindo forças com as outras famílias que como nós levam osofrimento durante anos, esperando ter alguma notícia daquele ente querido, pai, mãe, filho, irmão, tio queum dia saiu de casa e nunca mais voltou, porque foi vítima do Crime Cruel, sem corpo, sem vestimenta, semalma.

Pai todos sabemos que teu espírito está no céu, porém durante anos, procuramos um lugar onde depositarflores, onde encontrar seus ossos, e eu encontrei um símbolo onde tu estás, “Praça de Maio”, em BuenosAires, Argentina, porque além de ser um dos lugares mais importante da América Latina para lembrar dos“Desaparecidos Políticos”, você meu pai também morou em Buenos Aires de 1946 a 1953; e foi lá queconsolidaste teus ideais políticos, teus valores.

Pai hoje eu quero falar de tua família. Tua esposa Eliana está bem, lutadora como sempre, ela acha quevai saber alguma coisa a teu respeito e sobre teu desaparecimento algum dia, pois as orações mesmo após 22anos não se esgotaram.

Tua filha Fátima abandonou a política e montou uma Imobiliária, é empresária. Lorena casou-se comMarcelo e mora nos Estados Unidos e tem duas filhas, Christina e Vanessa, de 14 e 13 anos. Carolina já eracasada com José Miguel, e tem dois filhos, José Miguel de 22 anos, está cursando o quarto ano de direito eCarlos Alberto de 17 anos, está terminando o Ensino Médio. Silvana se formou em Veterinária e se casou comAndré que é médico, tem dois filhos, André de 11 anos e Martin de 8 anos, estão estudando.

E eu tua filha Heloísa, que já estudava medicina, me formei em médica, vim para o Brasil e meespecializei em Cardiologia, moro na cidade de São Paulo.

Somos uma família feliz, porém seu desaparecimento marcou nossas vidas.Vou te contar o que o mais novo dos seus netos, Martin, pede todos os anos para o Papai Noel:Ele quer que seu avô Artur, lhe visite em seu aniversário, dia 31 de dezembro, pelo menos uma vez e

depois pode subir ao céu, que é o único lugar que seu avô pode estar.

Feliz aniversário, Carlos AlbertoEm 06/01/1986, nascia uma criança de sexo masculino, recebeu o nome de “Carlos Alberto”. Filho de

Carolina e José Miguel. Guilherme, o médico obstetra, tio de Carolina, deu atendimento ao parto, segundofilho de Carolina. A criança estava por nascer, e a médica pediatra não tinha chegado. As enfermeirasperguntaram quem seria a pediatra. O obstetra Guilherme respondeu com voz firme: “Heloisa, a irmã deCarolina”. – Eu não sou pediatra, respondeu Heloisa.

– Sim, mas é médica, respondeu Guilherme.Heloisa médica recém formada, encontrava-se no 1º ano da residência de Clínica Médica. Já tinha

atendido muitos partos e tinha sido pediatra de muitas crianças – porém esse dia a alegria, a responsabilidadee a emoção foram diferentes e maiores:

“Pediatra de seu sobrinho”.

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Beijos, só beijos

Beije-me esta noiteQue a noite é eternaBeije-me nos lábiosBeije-me na fronteQue as estrelas estão brilhandoE a Lua está cheia...Cheia de paixão e de alegria

Beije-me mais uma vezQue estou tremendo de emoçãoE teus lábios estão ardentesE agora, beije-me os seios...Arredondados..., sedentosSedentos de teus lábios...Sedentos de teu alento

Beije-me — beije-meNovamente...Que o universo é nossoMeus lábios estão dentro deTeus lábios...Parece que estou respirandoCom teus lábios...Com teu alentoE teu coração está batendoDentro de meus lábios...

Teus lábios me beijam com ternuraTeus lábios me beijam com paixãoTeus lábios me beijam com amor...

Após várias horas de beijosDe amor e de paixãoDormir ao lado da pessoa amadaE sonhei com teus beijos...E acordei com teus beijos...

E a vida continua seu caminhoE muitas horas, tardes... noites...Dormia com teus beijos...E acordava com teus beijos...

Quando as pessoas se beijam...Conhecem o infinitoO Céu ... A Terra... O Mar...Se conhecem a si mesmos,por isso meu amor, beije-me sempre...

Amor sublime

Quem pode definir o amor sublimeQuem pode definir o amor eternoQuem pode vivenciar o amor sublimeQuem pode vivenciar o amor eterno

Tuas palavras ofenderam meu egoEu amo de verdadeEu amo por inteiroEu amo de verdadeEu sou feliz até com o sofrimento

Tuas palavras apenas as levo ao ventoEm meu coração não fizeram ninhoSó tenho pequenas feridas por dentroQue só cicatrizaram com o tempo

Meu amor infinito, meu amor sublimeApenas precisavas respeitar meu sentimentoComo pode ser o e ser humano tão insensívelTeu orgulho de homem te fez insensato

Meu amor por ti, meu amor sublimeAmor infinito, amor eternoDe repente porque o amor nos escolheNasceu o amor por ti,e meu espírito só tenho sofrimento

Amor sublimePor um tempo vou continuar comTeu olhar profundoQue triste! Poderia ter sido diferenteVou fingir que nada sinto

Amor sublimeMeu coração está feridoNão sei se vou querer tua amizadeA cada encontro sofre meu espíritoPoderia ter sido diferente

Amanhã vou encontrar contigoTeu silêncio será melhorQuero expressar meu sentimentoQuero expressar minha dor

Amanhã, amanhã vou esperar por ti

Mélida Velasco CasanelloMélida Velasco CasanelloMélida Velasco CasanelloMélida Velasco CasanelloMélida Velasco Casanello

Carlos Alberto nasceu com 50cm, pesando 3,500 kg, APGAR 9.9 – Aquele dia ficou marcadona vida da jovem médica “Heloisa”.

Carlos Alberto hoje faz 17 anos. É um jovem como tantos outros, cheio de sonhos. Gosta de música,toca violão. Está terminando o Ensino Médio; gosta de estudar, e é muito esforçado. Quer ser engenheiro,ainda não resolveu se vai ser engenheiro civil, mecânico, aeronáutico, chegou até a pensar em ser engenheiroaero-espacial, mas vai ser engenheiro.....

Que seus sonhos se transformem em realizações...Feliz Aniversário, Carlos Alberto!!

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Milton MarettiMilton MarettiMilton MarettiMilton MarettiMilton MarettiMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SPMédico - São Paulo - SP

Um caso tenebroso

Era eu médico interno e diretor do Hospital do SESI de Jundiaí. Fazia plantões, dirigia o hospital e oambulatório e também residia no hospital, que por sinal era uma casa adaptada com leitos e sala cirúrgico eambulatório sendo este em outro bairro de Jundiaí. Havia a particularidade da sala cirúrgica que apresentavauma porta de vai-e-vem, comunicando com a cozinha.

Certa noite fui acordado com um chamado. Era uma “parteira” (curiosa) que me solicitava pararesolver um caso de Obstetrícia. Sonolento acompanhei o rapaz que provavelmente era o marido da clienteque estava sob os cuidados da parteira. Rodamos por algumas ruas até chegarmos à casa do rapaz. Pediu-mepara acompanhá-lo até os aposentos, isto é, o quarto deles.

Ao entrar no quarto deparei com a “parteira” que estava assustada e o marido com os olhos arregalados.Sob a luz de um candeeiro de querosene, com luz bruxuleante consegui vislumbrar a cama do casal e lá estavauma paciente deitada toda vestida e “limpa’ como se não tivesse dado a luz. Chegando mais perto notei queestava lívida, extremamente assustada e com a respiração ofegante e suores frios na fronte. Ao tocá-la realmenteestava fria e o pulso filiforme. Imediatamente me voltei para outra cama ao lado, com um recém-nascidovestido limpo, sem vestígio de ter nascido há pouco tempo e impressionante, porque estava morto”.

Nesse momento perguntei para a parteira o que havia acontecido e ela, na sua ingenuidade, gesticulandocom as mãos, em cujo dedo mínimo tinha uma unha muito comprida. Perguntado o porque da unha longa meinformou que era para romper as “bolsas das águas” na hora do parto.

Em seguida me fez o seguinte relato: “Doutor eu não sei o que aconteceu! Estava eu assistindo o parto,evoluindo bem, quando saiu uma perninha da criança pela vagina. Aí eu quis ajudar. Peguei no pé da criançae comecei a puxar, fiz força e a criança veio vindo até que nasceu. Foi difícil, doutor, precisei suar para tirar acriança. Afinal ela nasceu mas não chorou. Eu acho que ela já estava morta”. Perguntei então se estavaescutando o coraçãozinho. Disse-me que não era preciso porque quando fazia os partos não precisava escutaro coraçãozinho e tudo corria muito bem.

Imediatamente pedi para carregar a paciente e levá-la ao carro até o Hospital do SESI. Solicitei apresença de um colega de Jundiaí, que também fazia obstetrícia para me ajudar a examiná-la. Constatamosque a pobre moça havia perdido muito sangue no parto em conseqüência de várias rupturas de vagina, desdeo fundo de saco vaginal até o períneo. A reconstrução da vagina durou em torno de duas horas, naturalmentecom vários frascos de sangue. Evoluiu bem e teve alta.

Como explicar o ocorrido: A “parteira”, absolutamente ignorante, quis ultimar o parto tracionando aperna do feto. Esta claro que seu gesto foi desastroso. Sabe-se que a apresentação pélvica determina partosmais difíceis da obstetrícia. Ou o feto nasce sem o auxílio do obstetra espontaneamente ou freqüentemente énecessária a prática da extração pélvica por meio de complicadas manobras e que a mortalidade peri-natal defetos nascidos desta maneira é alta, mesmo em mãos experientes. Por esses motivos, jovens partejadorespreferem o parto cesário, modernamente.

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Milton MarettiMilton MarettiMilton MarettiMilton MarettiMilton Maretti

O homem que ensinava a viver

Lendo o “Estadão”, de 31 de janeiro de 2003, deparei na crônica de Ignácio de Loyola Brandão, quediscorria sobre o Homem que ensinava a viver.

Homem esse que, apesar de amputado de uma perna, conservava o sorriso e não se lamentava, dizendoque era apenas uma perna, mas estava vivo e que a amargura não deixa ver o outro lado da vida.

Essa crônica iluminou minha mente e me veio à memória um fato ocorrido há mais ou menos cinqüentaanos atrás.

No Largo de São Bento e recostado em uma parede numa pequena cadeira, estava um homem combilhetes de loteria presos na camisa. O incrível é que o homem não tinha pernas nem braços, portanto era um“Homem Tronco” e estava vivo; não se lamentava, porém, simplesmente expunha seu produto para quemquisesse comprar.

Imediatamente associei com o ocorrido há mais ou menos vinte anos.Era eu professor de obstetrícia, juntamente com o Professor Lacreta, no Curso Experimental de Medicina,

que funcionava no Hospital Municipal do Tatuapé em convênio com a Faculdade de Medicina da Universidadede São Paulo e a Prefeitura Municipal de São Paulo.

Nesse curso, os alunos faziam plantões, assistiam partos, praticando a obstetrícia.Repentinamente fomos chamados para uma emergência obstétrica.Era um trabalho de parto. Ao chegarmos notamos que estava sendo liberada a nádega de um feto.

Nada de mais a não ser a preocupação por ser um parto pélvico.Evoluindo causou espanto quando liberando a nádega o feto não apresentava pernas. Continuando o

parto, desprendeu-se o tronco e o feto não tinha os braços.Desprendido o pólo cefálico (cabeça) o recém nascido começou a chorar.Estava vivo!Levado ao berçário permaneceu bem por alguns dias. Apesar de tudo, girava no berço, mesmo sem os

membros. Lutou para permanecer vivo quando por complicações urológicas veio a falecer.“Vivem só os que lutam”, disse Victor Hugo.

“É tão bela a vida! Mesmo se fosse feita toda de dor, mesmo se fosse uma cadeia de angústias eprivações, ela seria sempre bela” segundo nos diz E. Sudermann.

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Paulo Expedito Rodarte de AbreuPaulo Expedito Rodarte de AbreuPaulo Expedito Rodarte de AbreuPaulo Expedito Rodarte de AbreuPaulo Expedito Rodarte de AbreuMédico urologista - Lavras - MGMédico urologista - Lavras - MGMédico urologista - Lavras - MGMédico urologista - Lavras - MGMédico urologista - Lavras - MG

Mais fácil entender as vacas...

Poucos finais de semana mantêm-me atrelado aos ares da cidade. Nestes dias dedicados ao lazer, oupara saldar o débito com Deus, abandono o estetoscópio, substituo as roupas brancas por uma calça surrada,nos pés um par de confortáveis botinas, e bem cedo ninguém mais me encontra. Celular, coitado, nunca vaiser convidado, e para onde vou a sua presença incômoda nem mesmo consegue ser notada. Em poucos minutos estou em contato direto com a natureza. Nos tempos de seca a poeira incomodamais que o barro. O pasto ressequido, o verde menos verde, não é o cenário preferido nos ares da roça.Melhor seria afrontar os atoleiros, a lama pegajosa, e de quando em quando contar com uma junta de boispara rebocar o carro que grudou na estrada, agora poeirenta e sem graça. Mas, mesmo esse ambiente semcores, onde o gado passa fome, ganha de goleada e com vantagens da falta de poesia do asfalto, dos programasde televisão repetitivos, que fazem das tardes de domingo uma chatice só. Não é sem propósito que é dito, com grande proficiência, que roça nunca há de dar lucro. E precisa?Não existe, ou pelo menos ainda não inventaram um local que fosse mais aprazível, com o ar mais puro, ondeos boatos ou as fofocas ficassem de fora. Pelo menos desconheço qualquer mau juízo que tivesse saído daboca de uma vaca. Dos cavalos, então, apenas os observo trabalhando, ainda de quebra nos levam no lomboem ecológicas cavalgadas. Não sei bem ao certo qual o momento mais bonito, se as madrugadas ou o entardecer. Esses instantessó serão em sua plenitude completos, longe da poluição e do burburinho das cidades. Recomendo, com aresde autoridade, por uma vez apenas contemplar o sol que se despede de um dia de trabalho, por entre o verdede um bosque, mergulhando suas cores na superfície de um lago. Não há como descrever esse instantesingelo, nem mesmo o mais sensível pintor conseguirá eternizá-lo em um quadro. Voltando às vacas frias, motivos do meu título, não me despeço da roça sem trocar confidências comelas. São seres notáveis, amigos, confiáveis. Se existe algum animal mais admirado neste mundo dos humanos,depois dos cães, hão de ser os bovinos. Apenas o verde das pastagens faz parte do seu cardápio. No máximouma silagem, temperada por um pouco de ração, ajuda a sustentar seu corpanzil pesado, sobretudo emtempos de inverno. Nestes dias em que a chuva faz greve, o trato tem de ser redobrado, sob pena do bezerromorrer e o leite secar. Até o produto dos seus intestinos tem a função de adubo, e não tem o cheiro pútrido doshumanos. Da vaca tudo se aproveita: o leite que vale tão pouco, a carne iguaria fundamental de um bomchurrasco, o couro que vale ouro, matéria prima de uma sela, incômodo adereço dos seus amigos, os cavalos.Hoje os chifres estão fora de moda, deixaram os mesmos para adornar as cabeças dos seus donos e senhores.As minhas amigas bovinas só têm qualidades, desconheço defeitos. Não conhecem até mesmo a palavraciúme, pois convivem na maior harmonia entre outras colegas, com um só touro. Os machos têm a vida quepediram a Deus, reinam soberanos entre fêmeas brejeiras, com a função principal da cobertura na época docio. E passam a maior parte do tempo a cheirar o traseiro das namoradas, como numa corte onde são os reisdo gado. O que é bom dura pouco. O sábado me reserva outras surpresas. Ao final da tarde o dever me chama,e chegou a hora de me despedir das vacas, e tourear outros personagens mais bravios, desta feita na cidade.E o pior de tudo é que, à noite, um compromisso social me obriga a aparecer contrafeito. Não poderia fazerdesfeita e deixar de comparecer à cerimônia de matrimônio, marcada para as oito horas do mesmo dia.Juntas comigo iriam à mesma festa duas mulheres maravilhosas, uma amostragem fidedigna da sua espécie.Cheguei em casa duas horas antes, e em pouco tempo estava pronto para o compromisso noturno. As duasmulheres já haviam saído para o salão de beleza, como se precisassem de mais um trato. Três horas sepassaram, e nada de elas chegarem. Imagino que o padre já estava a postos, e os noivos a beira de umataque de nervos. E as minhas admiráveis mulheres, bastante atrasadas para a cerimônia, nem haviam dadoas caras da oficina de beleza. Meia hora depois do início programado para o casamento, lá vinham elas depenteado novo, envergando um topete de dar gosto. Nem de roupa haviam trocado. Eu, na minha impaciênciade convidado, com jeito de mineiro que nunca perde o trem, quase havia saído só, cansado de esperar pelascompanheiras. Horas se passaram, e o relógio apontava uma hora de atraso, em função da cerimônia quenos aguardava na Igreja. As queridas mulheres mudaram o penteado conquistado depois de duas horas desacrifício, balançaram entre duas dezenas de pares de sapato, derrubaram o guarda roupa inteiro na indecisãode qual modelo escolher, e eu, no carro, como um motorista bem educado a esperar as madames. Por fimchegamos à igreja, cansada de esperar os convivas de última hora, e o casamento já havia terminado. Que saudade das minhas vacas! Mais ainda do touro, que calmamente aguarda o momento exatoda cobertura, sem o receio de usar chifres, pois reina soberano por entre o seu rebanho. No alvoroço da cidadea realidade é bem mais complicada ...

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O dote

Não é de hoje que uma idéia meio louca, que contraria o bom senso, tem me tirado o sono . Por quenão trocar o negro poluído do asfalto, pelo verde apetitoso do campo? Tão logo chego à cidade, no final dedomingo, as más notícias me esperam. Como faz bem fazer as pazes com o simples, o rústico, o bucólico esem afetações, por um final de semana inteiro, e dar férias à televisão! Sem querer procurar, as desgraçasfazem plantão, e é só conectar à Internet e as bombas ameaçam desabar. Os “Sem Teto” continuam a ocupação.No Iraque mais americanos são mortos, numa guerra que nunca tem fim. O desemprego bate recordes, e aqueda de juros é insuficiente para aquecer a economia, que se recusa a sair do inverno. Na quietude da roçanão há risco de se pisar numa granada, e apenas o estrume de vaca macula os pés do incauto.

A derradeira vez que me permiti sair em direção ao mato, me regalei com tanta liberdade. Desta feitafui em companhia de mim mesmo, para encontrar a gente simples do lugar. Não existe papo mais prazerosodo que aquele que rola após um serviço bem feito. Ainda mais tendo o sol por testemunha, e as águas comocompanheiras. Se o colóquio aconteceu do lado de dentro de um bosque, à margem de uma represa, melhorainda. Naquele dia fui apresentado à natureza quase intocada, numa virgindade que não mais se encontrana cidade. Fui, por mãos experientes, introduzido à família das árvores, que por sorte não foram abatidasquando do enchimento do grande reservatório. Quem conhece o Óleo Copaíba, O Cedro Vermelho, OJacarandá, e alguns parentes menos nobres como o Guatambu, a Amoreira, e o Eucalipto, com certeza estáem boa companhia. Pela boca do especialista em madeira descobri que dentro de uma árvore tombada temo cerne, também conhecido por ele como “âmago”. É pura poesia. Os casos enriquecem ainda mais a agradável estadia no ambiente rural. Contaram-me um desses fatos,e quem o relatou jura que não é invencionice, e faz parte do folclore do lugar (conheço até o santo). – Umvelho quase surdo foi pego arrancando mandioca para a patroa, já bem chegada em anos. O compadrefutriqueiro quis saber da qualidade da raiz, se ela estava realmente boa. Ao que o velho respondeu (referindo-se à mandioca, e não à patroa): - ela não está enxuta, mas “como” assim mesmo. Na noite da estada rural, lá pelas tantas, convidaram-me a participar de um “forró”. Quem o fez jurouque a festa era pra lá de bem freqüentada, com música da melhor qualidade. Sem nada para fazer, e o sonosem dar o ar da graça, fomos com alguns amigos para o local do festejo. De noite todos os gatos são pardos,e a estrada esburacada era um quebra cabeças para as rodas do carro. Não fosse pela experiente conduçãode um amigo da roça, jamais teria encontrado o rumo da danceteria improvisada, a alguns quilômetros domeu pouso de final de semana. Do lado de fora da pista, de cimento grosso, uma imponente fogueira clareavao pátio engalanado, preparado com todo carinho para o “arrasta- pé”. À entrada um cordão de isolamento,onde cobravam ingresso. Uma dúzia de cavaleiros impediam o acesso aos penetras; sem pagar ninguémlograva êxito para dançar forró. Chegamos antes das dez da noite, quase os primeiros. Na minha imaginaçãopouco experta, nem de longe imaginava a “roubada” em que estávamos nos metendo. O salão estava àsmoscas. A banda convidada não havia chegado. De cara a festa começou pior do que acabaria. Um conhecidodos velhos tempos, caindo de bêbado, grudou em mim que nem carrapato, com aquela velha prosa de sempre.Foi preciso bancar o fantasma para me ver livre dele, não sem antes aceitar uma dose generosa de whisky,daqueles responsáveis por um ressaca indigesta. Por fim a música começou a embalar o silêncio da madrugada, em boa hora. Baile na roça é bemdiferente do da cidade. Aqui, sobram donzelas, lá, elas estão em marcante minoria. Eram, se não me falha amemória, cinco machos para cada fêmea, isto sem contar os de bota e espora, que mais pareciam figurantes.E ainda por cima se usava mulher dançar com outra do mesmo sexo. Os homens, vestidos que nem caubóis,chapéu a esconder os chifres, ficavam em fila de espera a cobiçar as moçoilas desimpedidas. No meio dobaile, quando eu pensava que tudo estava perdido, entrou salão a dentro uma morena de fechar o comércio.Todos os olhos convergiram para aquela figura esguia, objeto de desejo de qualquer cristão, mesmo o maisdevoto. Conseguir tirá-la para dançar era um feito memorável, digno do pódio. Por detrás daqueles cabeloscacheados, da cintura de vespa, dos olhares de perdição, a fila dobrava esquina. No máximo a dançarinasensação se permitia uma única volta no salão, com o mesmo par. Caso contrário poderia sair duelo, comtantos caubóis em volta. Um dos amigos que me escoltou ao infausto forró, conhecia de perto a deusa brejeira. Segundo eleme confidenciou, na roça onde ela morava, a situação não era diferente. Todos os vizinhos de cerca lhefaziam a corte, e não havia meio de ela ceder aos pedidos. Não que ela tivesse outros dotes, que não a beleza.Mas a formosura era de dar água na boca no padre mais recatado. Contou-me ele, e não pediu segredo, queum vizinho de pasto ofereceu ao seu pai, como proposta de casamento, um filhote de maritaca ainda por secobrir de penas. Era um dote considerável, que na hora foi rejeitado... Tão logo a morena resolveu sair de cena a festa acabou, melancolicamente, como havia começado...

Paulo Expedito Rodarte de AbreuPaulo Expedito Rodarte de AbreuPaulo Expedito Rodarte de AbreuPaulo Expedito Rodarte de AbreuPaulo Expedito Rodarte de Abreu

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Renato PassosRenato PassosRenato PassosRenato PassosRenato PassosMédico - Belo Horizonte - MGMédico - Belo Horizonte - MGMédico - Belo Horizonte - MGMédico - Belo Horizonte - MGMédico - Belo Horizonte - MG

Dona JaelLá pelos idos dos anos de 47, havia na minha terra, uma veneranda professora, aposentada e famosa

pelos seus dotes profissionais e de bondade. Se na época ela era aposentada é por que carregava nas costasum bando de muitos anos. Por ser aposentada também dedicava-se mais à igreja do que as lidas domésticas.A dita senhora era magérrima e usava óculos de lentes calibrosas e que sem eles era inteiramente vesga e cega.De tão velha ela possuía uma enorme corcunda, que a obrigava a só olhar para o chão, que parecia estarsempre procurando alguma coisa perdida. Olhar para frente era por cima dos óculos, com esforço e só osolhos se elevavam.

Naquela época, onde o costume era pedir a benção aos mais velhos, isto lhe conferia o direito debeliscar e dar cocadas nas cabeças das crianças. Até o cocão, que é a cocada com muita força. Eu nãogostava de cocada na cabeça e portanto odiava os velhos.

Éramos obrigados a ter um corte de cabelo muito econômico ao bolso dos nossos pais, que viviam emtempo de guerra, de dinheiro curto e de tudo difícil. Quem cortava nosso cabelo era o finado barbeiro Sr Elias.Ele era assim: quase toda a cabeça raspada, deixando só um reles topetinho, que, a custa de muita banha deporco sossegava para trás. Uma cabeça pelada era convite as cocadas, de sair água nos olhos.

Dona Jael era a única que não fazia isto, mas eu tinha um tio que gostava de aplicá-las e com força.Um dia, chamei meu irmão Rinaldo, que hoje ocupa um lugar de destaque no céu pela alegria que

empresta às almas de lá. Isto eu tenho a certeza absoluta, porque em vida ele era o melhor contador de casosque conheci. Rolando Boldrim foi aluno dele, juro. Lá no céu, com mais paz e mais tempo, ele deve teraperfeiçoado mais os seus dons.

Voltando ao caso: Rinaldo, vamos, dar um susto no tio que vem aqui em casa toda a noite e dá cocãona gente?

— Vamos sim. Ele, bem merece e perguntou-me, o que deveríamos fazer.— Primeiro tenho que apanhar uma meia preta da mamãe que está no varal e você, pegue o carretel de

linha preta que sei estar na gavetinha da máquina de costura, aquela grande e rasa.— Porque você não vai?— Porque estou proibido de chegar perto da máquina. Esqueceu do couro que tomei por conta da

linha do papagaio! Ainda estou com raiva de você que ficou rindo de mim! Na hora não pude te xingar, masagora posso. Sem vergonha! Cachorro! Pardal seco (era seu apelido).

— Ele continuou rindo e gritou!.— Anda logo Biondini (era meu apelido).Da meia eu faço uma cobra. Com a linha do carretel eu a amarro. De tarde, nós a colocamos no

buraco do porão da casa do sr. Pinto, ai defronte e que dá para a rua. Quando ele passar, nós a puxamos e elevai levar um susto danado. Já ríamos por antecipação.

Dito e feito. Enchi a meia com panos velhos e papel. Ela ficou bem parecida com uma cobra preta etoda molenga. Agora era só esperar a tarde entrar.

Jantamos o que sobrou do almoço, agora em forma de sopa. Nosso jantar era com a família todareunida na mesa de pés e bancos fixos e sem encosto.

Após o jantar, partimos para a execução do programado.Sentados no meio fio do lado de nossa casa, colocamos a cobra amarrada na linha, no buraco do

porão do outro lado da rua, com a linha preta esticada no chão. Esperamos que o tio viesse. Quando passavauma pessoa, eu tinha que brigar com o Rinaldo, que queria puxar a linha, mas, medo de couro põe juízo nagente e eu não deixava. O tempo foi passando, e nada dele aparecer.

Já era noitinha e a minha mãe assentou-se no alpendre da nossa casa, sinal que já havia terminado ajornada do dia. Meu pai não estava lá, por aperto de serviço na oficina mecânica.

Ali, na espera do tio, vi dona Jael subindo lentamente para o santuário na esquina de cima. Nisto,mamãe me chamou, não sei para quê.

Aí aconteceu o que eu não queria. O Rinaldo puxou a cobra, que se embaraçou nos pés da velha, quegritava: Ai Jesus, a cobra!... Ai Jesus, a cobra!... Sapateou e deu uns pulinhos miúdos e feios. Caíram-lhe osóculos, o missal e cambaleando, acabou caindo também. Escorou na mão direita, deitou-se de lado todadescomposta, esperneando, querendo se levantar. Como a rua era uma descida suave, ela começou a rolar delado, por cima da corcunda, ladeira abaixo, devagarzinho. Dava uma rolada e quase parava. Esperneava ecomeçava a rolar. Corri para socorrê-la, o que não consegui. Eu não sabia como segurá-la, fiquei dando pulos, na suafrente, abaixado igual a um sapo. Não a peguei, tinha medo de por a mão na velha, por não saber o que iriapegar. Então fiquei de pé na sua frente até que ela encostando no meu pé, parou de rolar, naquela posição maisridícula de pernas para o ar.

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Renato PassosRenato PassosRenato PassosRenato PassosRenato Passos

Nisto, correu o povo da rua para socorrê-la. O Rinaldo tinha escondido a prova do crime. Todosprocuravam a cobra na rua, sem achá-la.

A minha mãe apanhou-a no colo, levou-a para nossa casa. Deu-lhe água com açúcar, acalmando-a.Mas ela gritava: — Ai!... Jesus, a cobra! Ainda nos perguntava: — Vocês viram? Era enorme! Será que

me picou? Não quero morrer, meu Deus! Enquanto minha mãe lavava-lhe as feridas e passava-lhe merúrio-cromo em todos os seus arranhões.

Minha irmã acompanhou-a até sua casa.Nesta hora, chegou o Rinaldo e entregou-lhe os óculos e o missal o que fê-la muito agradecida.Continuava a falar da cobra com toda a ênfase. Ela tinha a certeza de ter sido uma cobra viva e bem

grande em que ela tropeçou. Furiosa falava: tudo é descaso da prefeitura em deixar cobras na cidade. Olhaque porcaria de prefeito temos!

Quando tudo serenou, veio a famosa surra de chinelo, mas foi uma surra diferente. Minha mãe batia eria e acabou tudo em gargalhadas!...

A paz

A paz é sempre prêmio e resultadodo querer que o trabalho conquistou.

Velho tempo tirou deste passado,sobra em saudades... Só do que se amou!

Paz é a sombra do tempo bem usado,nos meandros que o destino desenhou.Foi lucro do presente bem guardado,

quando o sonho em matéria se tornou.

A paz não é sossego de verdadee sim, amor, paixão e ter saudade.Paz é chegar até no fim da estrada

e sentir que — o Mal — foi um quase nada.Paz... é não ter os choros insepultos,é sorrir sem segredos vis, ocultos!...

A pluma

Um algodão caía da paineiraSe tornava uma nuvem esvoaçantecomo uma bola de sabão voadeiraque a brisa fazia bêbada viajante.

Carros agitavam essa dançadeiraRodopiava, a pluma cintilante

Era o vôo de uma linda feiticeirana alegria pura de um infante.

Nesta mágica singela pus-me a imaginar:fragilidade da pluma e o poder do ar

nessa tão grande disparidade

era o viver sem sentir saudadeA pluma linda e frágil e um quase nada

breve será uma paineira encantada

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Acontecimento

Tarde de feriado, de uma quinta feira esperada, após uma viagem sobrâmica a Recife e Belém.Inusitado seria declamar em prosa e versos, o tamanho do Brasil, as belezas que ele possui, a gente boa

(filha dele) e que nós desconhecemos porque o chique mesmo é o estrangeiro.Voltando como diz o capiau mineiro, ao ”causo”, conto com três dedos de prosa, o acontecimento da

tarde morna na beirada da linda Lagoa Santa.Era doze horas e como estávamos movidos pela fome e pela preguiça de cozinhar, eu e minha mulher,

fomos em busca de um frango assado, destes que eu chamo de TV de cachorro, porque são vistos, mas,sempre fora de suas cogitações alimentares.

Comprei a guloseima e na volta, o trânsito estava emperrado na Vila Militar. Havia dos dois lados dapista, três carros à direita e dois à esquerda. Para espanto meu, todos eles vazios e de portas abertas. Ocorreu-me que deveria ter havido um desastre sério e naquele minuto, pois até o guarda da guarita estava fora do seuposto. Assustado, também desci do carro, mas o tranquei nos conformes da quase extinta segurança.

Foi ai então, que fiquei conhecendo a “sacanagem” animal.O passeio da orla da lagoa estava com os expectadores saídos dos carros e provavelmente outros

passantes e todos riam ou sorriam.Isto, se dava por uma peleja timorata entre um cão e um possível “capivaro”, nome que eu dou ao

“marido” da capivara. O cãozinho era negro, de mais ou menos dois palmos de comprimento, por um dealtura, mestiço de bassê com vira-latas, mas era lindo, muito saudável, buliçoso, protagonista de show deaudácia, conhecimento e “sacanagem”. Percebi quanto ele era inteligente ao ter a certeza que o grande roedornão o pegaria nunca. Latia irritando o oponente, que corria atrás dele. O cão, fugia dele e deitava mais à frentee ficavam neste entrevero, medindo forças contra a velocidade. O capivara macho, corria menos e se cansavamais depressa, sabendo disto a cão fazia a festa. Cumpre-se notar que o “capivaro” era um animal bonito dese ver, dentro da feiúra que eu acho ser próprio das capivaras. Forte musculoso, de cor vermelho-terra, que emtamanho e peso deveria ser dez vezes maior que o seu oponente. Não é exagero, mas é que sou amigo íntimodeste roedor, nadador e selvagem mas, ali era manso e pacato.

O ”capivaro” defendia seu harém de mais ou menos, dez capivaras fêmeas e uns três “capivarinhos”.Naquele momento estava toda a família arrepiada, parada, assistindo respeitosamente a batalha.

O safado do canídeo, corria em círculos e jogava cabriolas (pulos e corcovos serpenteantes) e sedeitava mais longe. O macho alfa das capivaras, todo ouriçado, mas sem ares de medo, mostrava muita ira,corria atrás do cão, tentando mordê-lo, mas, por não consegui-lo, estava cansado, babando, arfando e estafado.Sempre olhando para traz, retirava-se do campo da luta majestoso, enquanto o cão deitado, fingia que não seimportava. Quando o dito “marido” das capivaras estava quase chegando junto da sua família, o safadodisparava uma carreira e latia e voltava. O “capivaro”, rompia a barreira do cansaço, batia os dentes que nósouvíamos de longe e voltava enfezado, em nova tentativa para agredir e vencer o cão.

Todos da platéia rindo, aprovavam a brincadeira do cão.Ai, é que me caiu a ficha. Se o cão brincava, a capivara macho não o fazia. Estava muito sério,

cumprindo o seu dever, mas desmoralizado a cada investida do cachorrinho, que se sentia estrela e estavadelirando de felicidade.

Tive a certeza de que jogava para a platéia, enquanto o outro fazia o papel de pai e defensor da prole.Ali, no fato, estava esquecido por mim e provavelmente por todos da platéia que se havia alegria de um, haviaa responsabilidade do outro. Então concluí: o cão fazia tudo aquilo porque conhecia a impotência da capivaraem vencê-lo numa corrida e ele abusava deste conhecimento. Triste deixei o local e divaguei pelo mundo doconhecimento.

Conhecimento é a percepção das coisas reais e abstratas do mundo. É ter noção, é informação, é osaber de si e do outro.

Sabedoria é ter grande conhecimento, erudição, e ciência de tudo, ou melhor é possuir a qualidade desabido. Mas, que é isto? Sabido é quem usa bem a esperteza, a astúcia, a manha, a prudência, a moderação,a sensatez usando para tudo o conhecimento. Aqui o sábio se torna invencível.

Era o que cão fazia naquele momento. É o que acontece nos relacionamentos. O mais sabido ficaconhecendo a fraqueza do outro e passa a humilhá-lo.

Como existe nos humanos uma fera boa e uma má em eterna luta, vence a que for melhor alimentada,e para isto agimos conforme a nossa vontade. Quando a má está solta podemos até matar. Quando a boa estasolta, somos bons, compreensivos e ajudamos.

Por isto a partir de hoje passei a temer o meu conhecimento porque tem hora que sou o cãozinho vira-latas, tem hora que sou o “capivaro”, cumprindo um destes papéis na platéia social em que eu vivo.

Renato PassosRenato PassosRenato PassosRenato PassosRenato Passos

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Rodolpho CivileRodolpho CivileRodolpho CivileRodolpho CivileRodolpho CivileMédico - São José dos Campos - SPMédico - São José dos Campos - SPMédico - São José dos Campos - SPMédico - São José dos Campos - SPMédico - São José dos Campos - SP

Agonia e morte de umhotel três estrelas – o “Danúbio”

Localizado no centro – oeste do bairro do Bexiga em São Paulo, (estou sempre falando do Bexiga: éuma verdadeira obsessão ou vício, sei lá...), o Hotel Danúbio fechou as suas portas em agosto de 2002.Notícia muito triste para mim que agora sou um velhinho, mas, que em outras ocasiões, no passado, tive umrelacionamento profissional muito intenso com as pessoas que se hospedavam neste hotel. Devo uma explicação:o meu consultório médico era na rua Maria José junto à Major Diogo. As duas ruas desembocando na AvenidaBrigadeiro Luiz Antonio, defronte ao hotel. Dessa proximidade, a facilidade para chamados e consultas. Damesma maneira, para os teatros: Brasileiro de Comédias e Sérgio Cardoso (foram meus clientes, Sérgio Cardoso,Leila Abramo e outros artistas, que agora não me recordo). Voltando ao hotel Danúbio, ele teve o seu apogeunas décadas de 50, 60 e 70, dado a sua localização bem próxima ao centro da cidade, ao requinte dos seusmóveis, a um selecionado atendimento de seus funcionários, cozinha sofisticada, bonitas salas de convenções,um bom estacionamento e uma badalada sauna, que depois, na decadência, virou uma danceteria, em seguidaum mundo clandestino de drogas e encontro de homossexuais. A sauna acabou sendo fechada pela Prefeitura.

Lembro-me de ter atendido pacientes das mais diversas profissões e posições sociais: executivos,empresários, gerentes, jogadores de futebol, turistas, cantores, compositores, músicos, membros de partidospolíticos e o que eu mais gostava: a companhia americana Holiday on Ice de patinação no gelo, da qual eurecebia ingressos para assistir aos espetáculos, sempre por cortesia... As artistas freqüentavam o meu consultórioe para mim era um motivo de satisfação e alegria atende-las: magras, elegantes, exageradamente pintadas,sempre sorridentes, falando, ou melhor, tentando falar, um português espanholado e eu um inglês calabresado...No final elas não entendiam o que eu falava e nem eu a elas... Tudo se resumia em sinais e algumas palavrasao vento... Às vezes as palavras saíam daquelas boquinhas mimosas, lindas, que o compositor Tosti e o poetaGabrielle d’Anunzio, se estivessem vivos, fariam uma outra bela cançoneta italiana a“Vucchella-2” (a boquinha),com sucesso garantido pelo Mundo. No meu caso, em particular as palavras soavam meio estranhas e eucuidava de interpretá-las da melhor maneira possível... As queixas mais freqüentes eram dor de barriga, náuseas,vômitos e diarréias, conseqüentes à ingestão de saborosas e “ricas” feijoadas. Eu devo agradecer às abençoadasfeijoadas... Por intermédio delas eu consegui conhecer pessoas, desenvolver a minha profissão e ganhar dinheiro.Não sou um mercenário, mas, como dizia Giovanni Pappini, o grande escritor italiano, “o dinheiro é o estrumedo diabo, mas, ninguém vive sem ele”. Aquelas graciosas boquinhas eram “divinas” quando diziam: mijar ecagar. Eu achava graça, elas riam, eu também em solidariedade e nesta comunhão de “belas expressões”,todos saíam felizes... Como a felicidade é fácil de se adquirir...

Não sei porque estou recordando tudo isso. É coisa de velho que não tem nada o que fazer no presentee se diverte com o passado... Outro dia um amigo telefonou, também da velha guarda.

- Você sabe que o hotel Danúbio fechou?- Sei!- E a Confital também?- Sei!- Que pena! Cada doce! Cada panetone! Quando eu penso me vem água na boca! Aquilo que era uma

confeitaria!Por que será que velho só pensa em comer? Provavelmente seguem a filosofia de Epicuro: “deste

Mundo só se leva o que se come e o que se bebe”.- Dizem que o hotel que entrou para a história de São Paulo, a partir do segundo semestre de 2003 será

o Teatro UniFMU com uma sala de 1500 lugares e um palco exclusivo para espetáculos musicais. Uma novaBroadway, imitando a de Nova York. Que pena! Acabou!

- Meu amigo, não fique triste, as coisas não podem parar. É a evolução! Não se esqueça: nada acaba,tudo se transforma. Você e eu também não somos os mesmos... Não se aborreça com detalhes, é o conjunto oque vale...

- Mas, como posso esquecer o passado?!- Colocando o presente no seu lugar! É o que eu faço diariamente.- Você consegue?- Bem, às vezes eu me atrapalho... Em vez de pensar no presente, acabo trocando pelo passado. É a

maldita memória! Agora, por exemplo, estou “vendo” “Primo Carnera” o campeão mundial de Box saindo dohotel. Um homem enorme, acromegálico, que chamava a atenção de todos na rua. Atrás dele a pequena,

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Pavana para uma rolinha morta

Como preâmbulo para um melhor entendimento:Pavana, era no começo do século XVI, uma dança da corte, provavelmente de origem italiana, em

compasso binário ou quaternário, andamento lento e majestoso. Depois de 1600, peça instrumental, com ascaracterísticas dessa dança e geralmente seguida pela galharda.

Galharda: dança saltada, rápida, em compasso ternário, e em voga no século XVI. Peça instrumentalinspirada no ritmo desta dança, e que surge nas suítes do século XVII, contrastando com a pavana.

Numa linda manhã de Maio, no jardim de nossa casa, percebemos um alvoroçar de asas se debatendoentre a folhagem e as flores do hibisco. Uma ave de plumagem cinzenta tentava levantar vôo. Assustada pelanossa presença, querendo escapar, piava com insistência chamando o companheiro aboletado no alto dapalmeira. Por mais que tentasse não conseguia sair do lugar. Estava ferida a bela rolinha. Com cuidado nosaproximamos e carinhosamente tocamos o seu corpo. Ela não reagiu e agasalhou-se em nossas mãos comoque pedindo ajuda, socorro, pelos seus males... Notamos dilaceramento na asa esquerda e parte da cabecinha,provavelmente resultado da agressão e garras de um gato.

Imediatamente, demos de beber água e a colocamos numa caixa de papelão com migalhas de pão egrãos de arroz. Nos ferimentos, curativo com água oxigenada e mercurocromo. Ela acomodou-se no fundo dacaixa e a deixamos protegida na área de serviço para evitar uma nova agressão. As horas foram passando eela quieta, agasalhada na sua nova morada.

No dia seguinte, bem cedo fomos vê-la. Estava morta. Que tristeza... Foi tudo em vão... Que desilusãopara mim... E que pretensão a minha pensar que poderia dar vida àquela criatura. A vida pertence ao Divinoe não a nós. Somos simples receptadores da Vontade Celestial. Mas, por que este lindo pássaro que alegrementegorgeava toda manhã no meu jardim e me chamava para a labuta do dia agora jaz inerte no fundo de umacaixa de papelão? Nasceu para morrer? É o destino de todos nós. E o que será depois? Quantas perguntas semrespostas...

Emocionado, chorando, eu disse um adeus à querida rolinha. Depois, numa triste despedida fui ouvira música de Ravel: “ Pavana para uma princesa morta”. Aos poucos fui adormecendo...

Na manhã seguinte, nem o dia clareou ouvi o chilrear de pássaros. Corri para ver. O companheiro darolinha morta, cantava, cantava, trocando juras de amor com uma outra “donzela” da espécie, ensinando-meque a vida continua apesar das nossas lágrimas.

Recebi a mensagem e como por encanto retornou ao meu ser a alegria perdida... Joguei migalhas depão na relva. As rolinhas desceram, comeram e depois voaram em direção ao ninho.

Lembrei-me dos dizeres de um alfarrábio: “entre a criação e a destruição, o nascimento e a morteexiste o amor. Por intermédio dele a Natureza se utiliza para a continuação da espécie”. A todo instante Elanos dá uma lição de indestrutibilidade, de imortalidade, sempre sob a ação do Amor. “ Morre um pássaro, nãoo pássaro. Morre um cão, não o cão. Morre um homem, não o homem. É a vida na sua eterna pujança” – diziaSchopenhauer

Portanto: - Para todo o sempre... Viva o Amor!Saudosamente me conformei.

Rodolpho CivileRodolpho CivileRodolpho CivileRodolpho CivileRodolpho Civile

famosa e talentosa pianista Magdalena Tagliaferro, com seus cabelos pintados de cor cenoura. Que contraste!Difícil de se esquecer!

- Ué! Você falou que eu devo trocar?- É verdade! Entretanto, enquanto isso não acontecer, vá vivendo, não importa se é no passado ou no

presente. Vivendo... Vivendo...- Até quando?- Na eternidade! Lá você terá todas as explicações.- Conversa! Eu vou é dormir, o que dá mais certo...- Cuidado, meu amigo! Cuidado! Diz o ditado: velho quando pára dorme ou enferruja.- Então, só me resta pensar no hotel Danúbio e por associação de idéias nos panetones da Confital...- Outra vez! Velho não tem jeito! Só pensa em comer...

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Ronaldo Vieira de AguiarRonaldo Vieira de AguiarRonaldo Vieira de AguiarRonaldo Vieira de AguiarRonaldo Vieira de AguiarMédico - Belo Horizonte - MGMédico - Belo Horizonte - MGMédico - Belo Horizonte - MGMédico - Belo Horizonte - MGMédico - Belo Horizonte - MG

O mais belo

Belo, muito belo mesmo. Beleza nunca vista, formosura desconcertante. Assim se apresentava o jovemXisto. Sempre fora bonito, desde que nascera. Mas o embelezamento superava em muito o seu desenvolvimentofísico.

Vivia bastante assustado, perplexo. Quando aparecia logo as mulheres de qualquer idade - meninas,moças, jovens, coroas, maduras, velhas e velhíssimas - todas fugiam espavoridas à sua presença.

A beleza de Xisto, já com 16 anos, era ofuscante, cegava, entortava a língua, provocava baba e atédesidratação. Por isso, as mulheres fugiam mesmo. Não podiam suportar uma presença tão deslumbrante, tãoestonteante. Homens, de todas as idades, faziam cara de poucos amigos, franziam a testa, sorriam sem graça,emudeciam, corroídos pela inferioridade gritante.

Todo o mundo conhecia os seus esplêndidos predicados físicos, menos ele próprio. Por causa da situaçãodesconcertante que a sua presença provocava, julgava-se horrendo, um monstrengo. Só assim se explicaria afuga desordenada provocada pela sua aproximação.

Por isso, nunca teve coragem de mirar-se no espelho. Seria demais constatar sua fealdade, suamonstruosidade física, isso seria demais para seus nervos e seu espírito. Preferia ignorar-se, nunca se ver.Passava longe dos espelhos e de superfícies espelhadas, ou fechava os olhos quando isso era impossível.

O psiquismo do jovem estava visivelmente alterado. Agora, ele mesmo fugia de tudo e de todos. Serrepudiado daquela maneira, ser excluído como vinha sendo não dava para agüentar. Foi-se tornando cada vezmais solitário, mais triste. Mudou-se para longe, morava sozinho, longe de todo o mundo. Procurava semprever as pessoas de longe. Começou a transformar-se num verdadeiro eremita. Gostava de dar longos passeiospela floresta, por áreas desertas.

Um dia, descobriu magnífica região da floresta, mata exuberante, cachoeira, frescor ambienteincomparável. Pela primeira vez, sentiu-se verdadeiramente relaxado, descontraído. Uma profunda paz deespírito se apoderou do jovem. Displicentemente, ele se aproxima de um lago de águas cristalinas e, chegandobem perto, vê a imagem de belíssimo rapaz, coisa jamais imaginável.

Leva um tremendo susto. Alguém o estava seguindo! Alguém o estava perseguindo! Ele, que tinha seisolado de maneira tão perfeita! A única explicação seria a perseguição. Perseguição para quê? Para repudiá-lo, para eliminá-lo?

Sim, queriam matá-lo! Aquele belo jovem, com certeza, teria sido contratado para matá-lo, para varrê-lo da face da terra. Só assim sua presença desapareceria. Ninguém mais precisaria fugir, principalmente asjovens, de quem gostava, que apreciava, mas das quais não conseguia aproximar-se.

Xisto não teve dúvida. Apesar de tudo, queria permanecer vivo, mesmo tão horrível quanto julgava ser.Resolveu, então, defender-se: “Antes que este belo jovem me mate, eu o mato. Vou acabar com sua

vida!”Volta-se e, deixando o lago para trás, percebe um barulho na mata. Não tem dúvida, é o seu perseguidor

em fuga. “Mas ele não me escapa! Não vou permitir que, numa emboscada, perca minha vida!”Sai correndo como louco, na direção do ruído. Cai, machuca-se, fere-se. E sempre um novo ruído é

percebido.Continua na perseguição desenfreada, mas nada, o seu perseguidor não aparece. Já sem forças, cai no

meio da floresta, extenuado.Desiste de tudo: agora é presa fácil para seu perseguidor. Seu cérebro ainda funciona bem e tem certeza

de que, agora, se despediria do mundo.Passam-se horas, e nada acontece. Xisto adormece. Acorda. Está vivo!Conforma-se com sua situação: “Afinal, sou feio mesmo, que posso fazer? Vou, agora, habitar esta

floresta, junto com os animais e longe dos homens. Estarei protegido pelas folhas, pelas árvores, pela naturezaselvagem, e, assim, nada de mal me acontecerá. Apesar de feio, horroroso, horrendo, tenho o direito de viver!”

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Tomás CavalleroTomás CavalleroTomás CavalleroTomás CavalleroTomás CavalleroMédico pediatra - Formosa - ArgentinaMédico pediatra - Formosa - ArgentinaMédico pediatra - Formosa - ArgentinaMédico pediatra - Formosa - ArgentinaMédico pediatra - Formosa - Argentina

Ilusión

Quisiera contarte una pequeña historia, llena de vida, de fantasías, de sensaciones y de diálogos sinpalabras, pero por sobre todas estas cosas, de sentimientos unidos, es como haber hallado el refugio del amor.

El lugar es solitario, a pesar de estar habitado por un número importante de seres humanos sencillos,simples, toscos, esforzados trabajadores de la vida. Calles de tierra, donde la siesta con sus cuarenta grados ala sombra hace que te sientas obligado al reposo, a la búsqueda de un lugar sombreado para dar descanso a lapiel y el cuerpo entero. Es un lugar cubierto de árboles, de flores, donde la reina absoluta es el Silencio, quien talvez sienta a su competencia allí muy cerquita a la ILUSIÓN, la esperanza, el sueño eterno del ser humano parahallar la felicidad en plenitud ¿cómo será? ¿alguien la conoce? Si alguna vez existiera un ser que pueda hacermesaber como se logra esa felicidad completa, espero me lo haga saber.

Son las seis de la mañana, el lugar parece de leyenda, las primeras luces comienzan a encenderse,sombras en movimiento es lo único que se ve; pero sí se oyen y te lo aseguro, es una música para el alma. Si nola oíste nunca, tratá de hacerlo: sí, me refiero al alternativo, acompasado y ordenado canto de los gallos alamanecer en el campo. ¡Qué maravilla de la naturaleza! ¡Qué música! ¡Qué compás! ¡Qué ritmo! ¡Qué acor-des! un canto aquí, otro un poquito más lejos, y otro y otro y otros que tratan de hacerse oír, sin molestarse unocon otro, siempre respetando al que le toca cantar ¿te lo imaginas?: orgullosos, esbeltos, tensos, concentrados,vanidosos, todos hecho un tenor que quieren que los oigan y que los aplaudan: Es la vida.

En cada canto puedes hallar la letra de la canción que más te agrada, y los versos del poema que máste guste o la ILUSIÓN de encontrar a tu otro yo allí junto al canto de esas pacíficas aves que nos acompañansin pedirnos nada.

El lucero muestra todo su esplendor, brillando solitario en el límpido cielo de ese pueblo y... el silencio,siempre el silencio, luego del canto de los gallos. El clima menos agresivo y la sensación de respirar oxígenopuro, sin contaminante alguno, salvo la primavera donde el perfume de alguna flor silvestre acaricia nuestrasmucosas nasales para alegría del alma.

En uno de los tantos sencillos hogares de ese pueblo, también la vida comienza a moverse, debajo delmosquitero que protege de los insectos a los humanos, alguien gira sobre su cuerpo, extiende una mano y hallaotro cuerpo a su lado, tibio, silencioso y casi girando sobre su propio eje en posición fetal, descansa, parecedormida, pero en realidad solo sueña, y sí, sueña despierta ¿con qué soñará? Eso solo ella lo sabe. Sí te puedodecir que el hombre que está a su lado tiene, al igual que ella, la dichosa virtud de saber lo que piensa el otro ya veces hasta lo que sueña.

El no habla, ella tampoco, él la mira, ella siente que la miran pero no abre los ojos. El la observadetenidamente, la acaricia con su mirada, la ama profundamente y en silencio, ella siente todo eso y deja veruna tenue, casi imperceptible sonrisa y goza plenamente del momento, siente que es feliz, siente que la aman deverdad y experimenta el amor hacia el otro en plenitud, límpido, cristalino y puro como el perfume de una floro como la sonrisa de un niño. En realidad ambos se aman como solamente pueden sentir el amor dos seresmuy pero muy especiales que no necesitan del contacto físico sino que aprendieron a gozar del amor enplenitud, y tú me dirás: ¿eso no es la felicidad? Sí, claro que sí, lo es... pero... pero... siempre hay un pero. Lavida no todo es amor, ni todo sensación, también está la realidad, en este caso la realidad los obliga a salir deese estado de ensueño para disponerse a vivir la vida, tal como se presenta en ese instante.

El lucero ya se fue y apareció el astro rey implacable, ardiente, agresivo, pues desde muy tempranoaprieta como solo él sabe hacerlo. El mate compañero predispone a la acción, allí se programarán las actividadesdel día y... manos a la obra.

El ya está dispuesto para el rudo trabajo de campo, con su vestimenta acorde a la época, y a la actividada realizar; sin embargo ella se demora un poco más pues...pues...¡es mujer! y las mujeres, aún las que vivensencillamente, siempre tienen esa dosis de coquetería que no dejan jamás y que no deberían dejar estén dondeestén, vivan donde vivan, porque es signo de feminidad ¡es tan lindo! Tan encantador ver a una mujer arreglarse,perfumarse, vestirse, ponerse bien para sentirse bien.

El pueblo despertó y la reina, el Silencio, fue a descansar.La pareja ya dispuesta para la actividad del día, sale del hogar y debe recorrer una distancia prudencial

hasta llegar a su destino laboral. Diariamente se los ve atravesar el pueblo y perderse en el campo por variossenderos, pasando por zonas áridas, donde la nube de polvo y tierra hacen de las suyas en épocas de viento,cruzan por un bosque hasta llegar a su lugar de trabajo.

El bosque ¡cuántas cosas encierra! Siempre al ingresar al mismo, él y ella se toman de la mano ydisfrutan plenamente de esos veinte minutos que dura atravesar el mismo. El microclima del bosque es algo quecasi escapa a mi descripción, si se lo siente, se lo vive, se lo disfruta, tal vez se lo pueda pintar, pero describirlo

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Soneto VII

Cuando Dios decidió que yo nacierame ubicó en esta tierra generosa,a mi madre la hizo más hermosay su vida llenó de una quimera.

Inundó mi cuerpo de alabanzas,a mis ojos dio brillo con tristezas,a mi alma le infundió con gran presteza:amor, paz, sencillez y esperanzas.

Así armado permitió que arribaraa este mundo rodeado de belleza.Me hizo amante de la naturaleza,

modeló mi figura, tal me vierasy me ordenó que al hallarte alguna veztodo mi cuerpo y mi alma te lo diera.

Tomás CavalleroTomás CavalleroTomás CavalleroTomás CavalleroTomás Cavallero

¡qué difícil es! Sí te puedo decir que es un clima especial, único, fresco, tierno, con ese olor a mezcla de flores yhumedad y por sobre todas las cosas es el lugar donde la reina, el Silencio, luce en todo su esplendor.

Un colibrí que revolotea de flor en flor mostrando todos sus divinos colores recibe siempre a la pareja alingresar al bosque, una vez allí, el astro rey no reina, pues los árboles con sus tupidos ramajes no les permiteingresar.

Un trozo de árbol caído cruzando todo el camino obliga a agacharse y casi tocar el suelo y ayudarsemutuamente para no lastimarse; en ese preciso instante se cruzan y se encuentran sus miradas, sus invisiblesrayos hacen explotar imaginarias chispas de amor, aparece en el aire una corona de corazones ardientes.

Flores de mil especies, pájaros de variados colores, reptiles que huyen asustados, es parte del paisaje,del sendero por el bosque... ¡Cuánta sencillez! ¡Cuánta vida! ¡Cuánto amor! Y no es una utopía, existe deverdad, es cuestión de tratar de hallarlo.

El lugar de trabajo es otra cosa: él debe soportar estoico todas las inclemencias del clima y el duro oficiode trabajador rural, que al finalizar el día causa dolor hasta en los huesos. Ella no hace menos, está produciendoa la par de él, cuida sus plantas, sus animales, realiza toda la dura tarea del hogar soportando silenciosa losrigores del clima, haciendo caso omiso a todas sus necesidades porque vive la ILUSIÓN, sí, la ilusión de cruzarel bosque y de amanecer en el patio y experimentar la inigualable sensación de que la aman de verdad,fundamentalmente la ilusión de algún día poder entregar al mundo algún heredero que continúe su propioandar, pero especialmente que aprenda y sepa amar de verdad, que sepa intuir, encontrar, aprisionar y gozardel amor en plenitud, que por ahora solo es una ILUSIÓN.

Soneto XVIII

Esta noche más que otra quiero vertesilencioso adormilarme en tu pecho,sentir latir el corazón desecho,pernoctar a tu lado hasta mi muerte.

Empapado en tus humores descansar,embriagado de amor y felicidad,cobijarme con tu cuerpo, mi deidad,soñar de este sueño, nunca despertar.

Esta noche más que otra quiero amarte,en tu vientre muy agotado descansary poder aún dormido.... recorrerte.

Amanecer enroscado a tu cuerpo,beber gota a gota, el aire al respiraresta noche, más que otra..... te recuerdo.

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Vidas paralelasCuando era muy niño aún, debía recorrer grandes distancias para cumplir con mi obligación del momento,

cual era: asistir diariamente a clases para mi educación formal, académica y entonces descubrí algo sin alcanzara saber a ciencia cierta de qué se trataba, pero supe que existía. Mi recorrido lo hacía por las vías de un muytransitado ferrocarril y lo rieles ubicados uno al lado del otro producían en mí una sensación especial. A veceslo hacía con alguna técnica que me entretenía agradablemente, por ejemplo: guiaba mis pasos por la derecha,o por el medio de ambos rieles o por la izquierda y veía siempre algo diferente, pero un punto en común; otrasveces intentaba no con tanta facilidad desplazarme por sobre uno de los lustrosos y resbaladizos rieles y de allícon un pequeño brinco apoyarme en el otro riel sin que tocase el suelo, en varias ocasiones mis atormentadostobillos sufrían las consecuencias de mi impericia, pero todo se aprende y con perseverancia fui casi un perfectoequilibrista.

Eso era muy entretenido hasta que por obligación, dado que en ocasiones coincidía nuestro andar porel mismo camino, nos encontrábamos el tren y yo, por supuesto debía resguardarme en algún lugar y lo hacíaapretadito, abrazadito fuertemente a la base de uno de los postes del telégrafo que plantados de tanto en tantoeran como silenciosos, constantes y permanentes vigilantes en la costa de la línea férrea. Cerraba fuertementelos ojos y me tapaba los oídos hasta que el último vagón cruzaba frente a mí. Todo me entretenía y causabacierto placer pero siempre llamó mi atención y cubría de curiosidad mi mente cuando levantaba la vista ymiraba hacia delante y a una distancia considerable observaba que las vías se unían en alguna parte. “Ese erami descubrimiento”, buscaba esa unión, me intrigaba, caminaba y caminaba para encontrar ese lugar pero lasvías aquí estaban unas al lado de la otra y muy allá se unían. En algunos momentos pensé en ser conductor detrenes así podría encontrar ese punto que tanta incertidumbre creaba en mi ser.

Fui creciendo y la enseñanza formal cada vez era más compleja, hasta que un buen día en clase, ladocente sentada frente al aula incorpora a mi vocabulario la palabra PARALELAS, nos da la definición de lamisma, sus normas, sus características y un ejemplo: las vías del ferrocarril. Recuerdo como si fuese ayer queal terminar su exposición la docente, yo me sonreí y fui interpelado por tal hecho, al contestarle que las vías delferrocarril se unen, que no siempre van unas al lado de la otra, todos, absolutamente todos rompieron a reír.

Eso me molestó muchísimo y no respondí, especialmente por el inmenso respeto hacia mis docentes,pero yo sabía que no era así como me estaban enseñando, que eso que nos decía no era una máxima sí o sí,porque simplemente yo veía a diario que en algún lugar esas vías se unían y me prometí que algún día sabríaporqué yo las veía así. Eso era mi descubrimiento ¡qué constructivo sería que los docentes fuesen más claritosen sus enseñanzas! Que se limiten a proveer información y crear en el espíritu de sus alumnos el deseo deobservación, discusión y formación de su propia conclusión!

Por suerte en este caso particular yo continuaba en mis propios pensamientos, y el tema siempre fuesaber: ¿dónde se unían? ¿para qué se unían? ¿porqué se unían?

Y llegaron las flores, la primavera a mi vida, es decir la adolescencia y con ella, la angustia, laincertidumbre, la formación académica de la secundaria, la incertidumbre siempre presente de las paralelasque se unen. Cada vez que me paro frente a las vías del ferrocarril siento como una cosa extraña, como unasensación que me incomoda, pero que a su vez me hace feliz.

La lectura pasó a formar parte de mi vida, me permitió conocer muchas palabras nuevas, cosas ylugares diferentes, ocupó uno de los rieles de mi andar por la vida. También se hicieron presentes los primerossentimientos amorosos pero mis paralelas siempre se unían en algún punto y no gracias a la relatividad.

Y por fin, mis estudios superiores, siempre agregando a mis neuronas: reglas, normas, máximas,disciplinas, metodologías. Mis actividades diarias eran múltiples y me dedicaba a leer, estudiar, sentir, aprender,resolver, concentrarme, soñar, divagar, pensar, fantasear cosas y así fui creciendo, realizando actos con mayorresponsabilidad, respeto, empeño, amor y cariño pero siempre he notado que en algunas oportuniadades,mientras transitaba mi mente por una vía determinada debía responder a alguien algo que me preguntaba, odebía realizar algo que nada tenía que ver con el camino andado en ese instante por mi mente, era como saltarde un riel a otro sin pisar el suelo, tarea nada fácil por cierto, pero como desde niño lo hacía, podía lograrlo conéxito.

He notado que en alguna circunstancia en que estoy atareado en algo que requiere de toda mi habilidady concentración, de repente se cruza en mi mente algún recuerdo, algún hecho vivido o la imagen de alguien ymis poros con sus pelos se erizan hasta provocarme dolor. Ese preciso instante, ese sublime momento queacontece en mi cuerpo es sin duda alguna el punto en que se unen mis paralelas. Al fin sé con certeza que almenos mis paralelas, donde por un lado transcurren felices mis actos, mi trabajo, mis amigos, mi hermosafamilia y por otro lo que siento, lo que sueño, lo que contiene mis fantasías y deseos se unen en un puntodeterminado y llenan mi vida de felicidad.

VIDA PARALELA es la que tengo desde muy niño y que seguiré teniendo alimentándola permanentementecon fantasías, hechos y recuerdos. Espero continuar así y que en ella quepan todos y perduren en el tiempo.Tú ocupas prácticamente toda, uno de los rieles de mis paralelas.

Tomás CavalleroTomás CavalleroTomás CavalleroTomás CavalleroTomás Cavallero

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Victor José FrycVictor José FrycVictor José FrycVictor José FrycVictor José FrycMédico - Buenos Aires - ArgentinaMédico - Buenos Aires - ArgentinaMédico - Buenos Aires - ArgentinaMédico - Buenos Aires - ArgentinaMédico - Buenos Aires - Argentina

El vecino

Carmelo oprimió el timbre de la vivienda de Ruperto un tanto alterado. Hizo un esfuerzo para pareceramable.

- Señor vecino, una rama de su cedro ha seccionado mi cable telefónico.- ¿Pero cómo pudo producirse?- Es simple: al balancearse con el viento.- Bien, habrá que llamar a la empresa telefónica para su reparación.- Eso ya lo hice. Lo que me preocupa es la rama del cedro que volverá a herir el cable conductor.- No veo cual es el problema... Con desviarlo...- La rama del árbol se antepone a la entrada pues el cable viene de una distancia de un centenar de

metros en forma directa; no hay otra forma de acceso.- Caramba, qué contrariedad; no encuentro solución a su problema.- Si la hay; debe cortarse el cedro.- Es una solución unilateral. El único beneficiado es usted y el único perjudicado soy yo.- No pretenderá que me quede sin teléfono y me comunique por señales de humo.- Su ironía no aporta ideas; es demasiado superficial.- Ofrezca usted la solución.- Lo pensaré.- No hay mucho tiempo, la empresa llegará en un par de horas.- No me importa, no talaré el cedro... Ni loco.- Tendré que denunciarlo formalmente; no me deja alternativa.- El árbol está en mi territorio y sembrado reglamentariamente a distancia de su medianera.El cable fue reparado pero debió apoyarse en el cedro con el que quedó hermanado indefectiblemente.Desde ese momento, entre Ruperto y Carmelo se produjo un cisma de vecindad comparable al celo de

las fieras que esperan mutuamente el primer gesto del otro como excusa para atacar.Diariamente Carmelo vigilaba el cable telefónico y muy especialmente el tramo que pasaba por el

cedro. Lo obsesionaba corroborar la presencia del tono de la línea telefónica a tal extremo, que se acostumbróa vigilarlo en cuanta oportunidad tenía al pasar por su cercanía. Lo primero que hacía al partir y al regresar asu domicilio era verificar el correcto funcionamiento del equipo. El tono se convirtió en el “la” de la afinaciónde una orquesta o la idea obsesiva del delirio de Robert Schumann. No podía vivir sin escuchar el “tono”. Eltemor a la ruptura del cable lo desgastaba.

Además, el rencor, por la indiferencia de Ruperto crecía en forma paralela.Ruperto notó el cambio en la relación de su vecino pero no se inmutó. Al fin y al cabo, el cedro ya tenía

veinte años de existencia y el cable telefónico era un mero vehículo de la tecnología que se utilizaba, la mayoríade las veces, para hablar de cosas sin valor, nada comparable a la belleza del idioma de la naturaleza. Y porúltimo, a Ruperto le interesaba un bledo del teléfono de Carmelo.

Llegó la época de los vientos y las lluvias.La preocupación de Carmelo se incrementó hasta niveles de neurotismo. Cada vez que arreciaban los

vientos y las tormentas descargaban sus rayos, relámpagos y centellas, ascendía a los techos cubierto por unacapa para inspeccionar el cable telefónico que padecía, como la cuerda de un barrilete, los vaivenes del cedroal balancearse como un muñeco gigante y burlón que Carmelo desafiaba con insultos.

Durante una de aquellas tormentas donde el aire se cargaba de un aroma eléctrico y los relámpagosfotografiaban los perfiles de las casas, Carmelo quedó sorprendido al levantar el auricular y escuchar unamelodía en lugar de la voz humana. Como no era versado en temas musicales consultó con su hijo que,también sorprendido, opinó:

- Debe ser una broma de alguien que marcó este número. La obra que se escucha es la “Danza Macabra”de Camille Saint Säens.

- Nadie marcó el número porque no ha sonado...- No sé qué decir... Se habrá ligado con otro teléfono... ¿Qué se yo?Transcurrieron algunos días y al descargarse una nueva tormenta se repitió el fenómeno. Esta vez, la

música que se escuchó fue la “Sonata Patética” de Beethoven.Hasta ese momento no fue motivo de gran preocupación por parte de Carmelo pero decidió, con un

poco de timidez, consultar a la empresa telefónica.- Escucho música por la línea telefónica - dijo preocupado.- Y yo, el sorteo de la quiniela... Deje de molestar.

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Diario... Diario

Diario... Diario...Con las últimas noticias.Mariposas que la brisa de la tardeSopla en espirales.

Que han pasado los sueñosQue a nadie le interesa.Que te he besado las manos con las que me acaricias.Que me invade un tanto la cursileríade mirarme en tus pupilasy decirte tonterías.O en tus cabellos callarme poesíascomo si adolescente fuera.

Diario... Diario...Con las últimas noticias.Tratarán de palpitar tu nocheDetrás de las cortinasy escurrirse en tus puntillaso en el borde de tu manta.

Rápido... Rápido...Lee mis últimas noticiasantes que sean mariposasantes que amanezca el nuevo día.

Me deslizaré por la ventanapara esconderme en un lirioy si me descubren por la mañanadirán: No es nada másque una simple mariposa.Es una buena noticia... que se posa.

Victor José FrycVictor José FrycVictor José FrycVictor José FrycVictor José Fryc

Y de esta forma se repitió el fenómeno. Esta vez se escuchó por la línea “La Isla de los Muertos” deSergei Rachmáninoff. Un escalofrío corrió por sus espaldas. Luego siguió la “Marcha Fúnebre” de la TerceraSinfonía de Beethoven.

Su preocupación fue en aumento y así se sucedieron “La Muerte del Cisne” “Las canciones para losNiños Muertos” de Gustav Mhaler, “Muerte y Transfiguración” de Richard Strauss.

Carmelo entró en la desesperación. En la última tormenta tuvo terror de levantar el auricular pero laimpulsividad lo superó; se escuchó “El Requiem” de Wolfang Amadeus Mozart. La incertidumbre hacia lodesconocido; el influjo de la magia de la hechicería, hizo que en plena tormenta, cuando arreciaba el vendavaly la noche se exaltaba con los relámpagos y el cielo se quebraba en un cataclismo, saliera desesperado adevelar el misterio que lo tenía esclavizado al más allá y encadenado al influjo de la muerte. Subió a los techosy se arrastró por las cornisas mientras el huracán lo sacudía tratando de empujarlo hacia el abismo.

Trató de llegar al cedro maldito que una y otra vez cabeceaba como un muñeco gigante y grotescomientras hacía bambolear el cable telefónico. Allí debería llegar para descubrir el secreto.

La sombra de Carmelo se encaramó a las ramas.La mujer de Ruperto llamó a su esposo asustada y gritó:- Hay un ladrón bajando del muro...Ruperto tomó la escopeta de dos caños y desde el ventanal disparó los dos cartuchos.El cuerpo de Carmelo quedó colgado del ramal y su cabeza, destrozada, yacía al pie del cedro.

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Agonizan las hojas

Agonizan las hojasy en su último suspirocomo las páginas sepiasde un viejo librocomo las cartas que no llegan(porque no parten)como el afiche desgarrado por el vientose deslizan directas al olvidosin que nadie lo perciba.

Quién las ve caer...Caen las hojas y en el abrazoun crujido de dolor gime la hojarascay el oído imagina la caída.Más nadie las ve caer...Sólo es una máscara fugaztestigo de la muerte.

Agonizan las hojaso tal vez duermenocultas en los futuros brotesde la primavera.Misterio de la vida y la muerteque se traspone a cada instantepor un sendero secreto:del amor a la ausenciade la ausencia a la soledadde la vigilia a los sueñosde los sueños a la realidadde la risa al llantodel llanto a la resignaciónde las partidas sin retornosde los retornos sin esperas.

Mueren las hojasy morir nadie las ve.Igual como se van los añospoco a poco imperceptiblesy de pronto se sumantantas míseras muertestantas como las hojas muertasque no llenan ni una vidani el vacío de un trunco amorni el olvidoni el espejo de una lagunaque cegado por la nieblapresiente huir la lunay la sueña convencidoque volveráaunque la aurora desmayeentre las hojas muertas.

Victor José FrycVictor José FrycVictor José FrycVictor José FrycVictor José Fryc

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El comprador del libro

Después de muchos años de duda, Sacarías pudo vencer la timidez y publicar su primer libro decuentos. Después de corregir y corregir (que el gerundio, que el adverbio, que la adjetivación excesiva), sedecidió a recorrer las editoriales pero no tuvo gran éxito. Todas le exigían costearse la publicación.

Por fin, con la ayuda de un amigo que hizo las correcciones sintácticas; otro que volcó los escritos enla computadora y una imprenta del barrio (“Tinta Roja”), que hizo el resto, pudo lograrlo.

Sacarías, colmado su entusiasmo y exultante ante la tapa multicolor, no sabía qué hacer ante las pilasde libros que ocupaban toda la habitación.

“Relatos del Barrio”, lucía con letras en relieve; Sacarías era feliz.Presentó el libro en sociedad. Amigos y parientes recibieron unas docenas de ejemplares autografiados.

Especialmente su hijo, lo recibió con su correspondiente dedicatoria.Con los libros cargados en su pequeño coche, recorrió las librerías de libreros conocidos. Su orgullo se

colmó cuando los vio en las vidrieras.Transcurrió el tiempo y los libros, inquilinos perpetuos, no abandonaron su lugar en los escaparates.

Sólo dialogaban con los otros libros. Pero ese mundo de autor desconocido codeándose con las grandes obrasde la literatura no conformaba a Sacarías. Entre sus sueños figuraba, al menos, obtener los beneficioseconómicos que le hicieran recuperar los gastos y en gran parte, la satisfacción de que su libro fuera leído porel público. Su fantasía lo arrastraba hacia un caleidoscopio de imágenes al verse tal vez nombrado en la páginaliteraria de alguna revista, un diario o un programa de televisión. Tal vez la emoción más intensa sería experimentarla sensación de ser leído por un desconocido... Así es... Qué nuevo espacio, qué magia tan real plasmada en lacomunicación secreta vuelve a recrear otros escenarios; un nuevo libro.

Pasó un tiempo y Sacarías recorrió las librerías por donde había sembrado su libro. Nada; no se habíavendido ningún ejemplar. Se desilusionó.

Todos sus allegados lo consolaron aduciendo “que la crisis”... “que la lectura”... “que la globalización”...etc. A lo mejore, el título de la obra no era lo suficientemente atractivo. “¿Relatos del Barrio?”... Ya casi noquedaban barrios.”

En uno de tantos viajes de veraneo a Mar del Plata, donde habitaba un departamentito frente a laplaya, se le ocurrió dejar dos ejemplares en una librería de un conocido situada en pleno centro de la ciudad.

- Los colocaré en un lugar privilegiado - dijo el librero.Y los colocó en una bandeja en la entrada del local.Transcurrido un año, comprobó que no se había vendido ningún ejemplar y así transcurrieron otros

tres.Sacarías se había olvidado de su libro y dejó de visitar las librerías. Lo había abandonado como

venganza de su frustración. Se podría decir que hasta le guardaba rencor.Nuevamente el estío lo empujó hacia las playas de Mar del Plata y la rutina lo llevó por lugares y

paisajes habituales hasta que una noche, al pasar por la librería, se detuvo en la entrada con la intención depreguntar por sus libros pero después de unos titubeos prosiguió sus pasos.

Tras de su espalda, la voz del encargado gritó:- Sacarías... Señor Sacarías, por fin lo veo... Tengo que comunicarle que se vendió un libro suyo.La emoción experimentada por Sacarìas fue muy grande. Tuvo la sensación de que solitario en una

isla tenía un encuentro con otro ser; que iniciaba un diálogo con un nuevo amigo, mucho más, se creaba unnuevo mundo donde su libro volvía a nacer.

- ¿ Cuándo se vendió?- Hace quince días.- ¿Quién era?- Lo desconozco pues lo vendió el dependiente por la mañana.- ¿Quién sería ese lector?En la mañana siguiente entrevistó al empleado el que indiferente dijo que no podía recordar la cara de

todos los compradores, aunque le llamó la atención la venta después de tanto tiempo. Le pareció que era unhombre de mediana edad tirando a joven.

Inmediatamente lo invadió la obsesión de saber la identidad del comprador.Al día siguiente, al bajar a la playa habitual, fue a saludar a todos sus amigos y conocidos de todas las

temporadas parta detectar al presunto lector... pero nada.Visitó todos los lugares conocidos para el mismo fin pero no obtuvo ningún resultado y con este enigma

volvió a Buenos Aires con la esperanza que algún llamado telefónico develara su curiosidad persecutoria.Al pasar cierto tiempo, llegó a la conclusión de que el fantasma que perseguía era un desconocido.Cierta tarde debió visitar a su hijo.Después de los saludos y durante el diálogo, vio con sorpresa que sobre la mesa había un ejemplar del

libro “Recuerdos del Barrio”.Cuando Sacarías lo abrió, comprobó con sorpresa que en la primera página estaba ausente la dedicatoria

Victor José FrycVictor José FrycVictor José FrycVictor José FrycVictor José Fryc

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Walter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisMédico ortopedista - São Paulo - SPMédico ortopedista - São Paulo - SPMédico ortopedista - São Paulo - SPMédico ortopedista - São Paulo - SPMédico ortopedista - São Paulo - SP

Quem anda do lado errado?

ANTIGAMENTE, A LÓGICA MANDAVA QUE AS PESSOAS circulassem pelas estradas e nas ruas da melhor posiçãopossível para poderem usar uma espada para se proteger. Como a maioria é destra, tinha de se manter àesquerda. Por volta de 1300, esta prática foi oficializada através de uma bula papal, pelo Papa Bonifácio VIII,que recomendava a todos os peregrinos para que andassem à esquerda.

Nada mudou até 1773, quando o aumento de trânsito à cavalo fez com que o governo britânico exigisseque se circulasse do lado esquerdo das vias, e isto virou lei em 1835.

Está menos claro porque muitos adotaram o lado contrário para circular. A versão mais aceita é de que osfranceses, como católicos, seguiram a bula papal. Durante o período que antecedeu a Revolução Francesa, aaristocracia guiava suas carruagens em alta velocidade pelo lado esquerdo das ruas, forçando a plebe a pularpara o lado direito, para maior segurança. Com a Revolução, os instintos de auto-preservação levaram o quesobrou da aristocracia a se juntar à plebe do lado direito das ruas. O primeiro registro oficial de se manter acirculação do lado direito das vias públicas é de 1794, na cidade de Paris.

A expansão colonialista da Grã-Bretanha espalhou pelo mundo o conceito de se manter o lado esquerdo.Isto incluiu a Índia, Australásia e grande parte da África (embora muito países africanos mudaram para o ladodireito depois de sua independência).

A França também manteve muitas colônias após as guerras revolucionárias e conservou as regras de secircular pelo lado direito na maior parte da Europa, estendendo-se a colônias como o Egito. Parece que emrelação aos Estados Unidos, foi o General Lafayette que recomendou que se adotasse o lado direito comoparte do apoio dado aos americanos durante a preparação para a Guerra da Independência. A primeira leiamericana estabelecendo a obrigatoriedade de se ficar à direita data de 1792, em relação a uma estrada entreLancaster e Philadelphia.

Na época da Rainha Vitória, o Japão foi obrigado a abrir seus portos para os britânicos, por motivosdiplomáticos, e os japoneses foram convencidos a adotarem a circulação pelo lado esquerdo, o que permaneceaté hoje.

Os primeiros automóveis seguiram o princípio das carruagens a tração animal, com o chofer sentado nocentro. Quando os proprietários dos carros descobriram como era interessante dirigir, quiseram que as pessoasse sentassem a seu lado enquanto guiavam, e o volante foi definitivamente colocado em um dos lados dopainel.

O lado onde ficava o volante seguiu a tradição de cada país e, portanto, os primeiros carros (Benz naAlemanha), o tinham do lado esquerdo, pois se circulava pela direita. A principal exceção foi dos carros decorrida, cujos volantes eram construídos do lado direito, que ficava melhor para corridas em círculo. Por isso,na Europa, quase todos os carros esportivos italianos antes de 1950 tinham o volante do lado direito. Todos osBugatti também o têm do lado direito.

Apesar da insistência de outros países europeus, é bem provável que a Grã-Bretanha e outros países quecirculam do lado esquerdo nunca adotem uma mudança para o lado direito. É economicamente inviável, pelonúmero elevado de veículos existentes com volante à direita e, também, porque o Japão, o maior produtor deautomóveis do mundo, que precisa produzir veículos para seu próprio mercado e para exportação, já alegouque jamais mudará de lado, assim garantindo suprimento para o mundo inteiro.

Desde as primeiras locomotivas, nos primórdios do século XIX, os trens circulavam nas ferrovias pelo ladoesquerdo. Isto acontece até hoje, inclusive aqui no Brasil. No entanto, o trânsito por via fluvial se faz peladireita, mesmo na Inglaterra. Não há uma explicação plausível para isto, mas a teoria favorita é de que se nosbarcos impulsionados por vara (como as gôndolas) ou a um remo só, o remador destro fica à esquerda, otimoneiro tem de ficar do lado direito, e quando a embarcação chega à margem, a tendência é descer poraquele lado...

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Se...

Se puderes manter a tua calma quando todosA teu redor já a perderam e te culpam;

Se puderes crer em ti quando todos de ti duvidamE, para estes, magnanimamente, achar uma desculpa;

Se puderes esperar sem cansar-te com a espera,Ou, enganado, não te rebaixares a mentiras,

Ou, sendo odiado, não te sujeitares ao ódio,E ainda te comportares sem pretensão ou falsidade:

SE puderes sonhar - sem fazer dos sonhos teus senhores;Se puderes pensar - sem te dominar pelos pensamentos;

Se puderes enfrentar a Desgraça e o TriunfoE tratar aqueles dois impostores igualmente;

Se malvados falsearem as tuas verdades mais justasE sofreres essa carga com tranqüila humildade,

Ou vires as coisas pelas quais deste a vida, retalhadas,E com ferramentas gastas te ergueres novamente:

SE puderes juntar tudo o quanto ganhaste na vidaE arriscá-lo numa única jogada, sem temor,

E perder e, assim, retornar ao princípio,Sem jamais queixar-te de tua perda;

Se puderes forçar teu coração, nervos, músculos e empenhoA serviço do Supremo Ideal

E agüentares quando nada mais há em tiExceto a vontade que ordena ainda: “Persiste !”

SE puderes caminhar entre a plebe e manter tua virtude,E entre Reis, não perder a altivez;

Se nem amigos nem inimigos puderem te ferir,Se todos puderem contar contigo, sem exageros;

Se puderes preencher o implacável minutoCom o valor autêntico de sessenta segundos,

Tua é a Terra com tudo que nela existe,E - o que é mais - serás um Homem, meu filho!

Rudyard Kipling.Versão adaptada por Walter Whitton Harris

Walter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisWalter Whitton Harris

Lábios

Lábios carnudosLábios quentesLábios femininosLábios atraentes

Estes que murmuramMerecem beijos milExpressam o desejoDe uma forma sutil

Lábios pensativosLábios adormecidosLábios adoradosLábios enternecidos

No momento da paixãoSuave toque de amorHomem algum se esqueceDaquele distinto sabor

Lábios despertadosLábios encantadoresLábios rosadosLábios como flores

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O sorriso

SÃO NECESSÁRIOS 43 MÚSCULOS PARA FAZER CARA-FEIA, mas apenas dezessete para um sorriso. Portanto, é 2,5vezes mais fácil sorrir.

Essa expressão facial não é ensinada. Haja vista que uma criança nascida cega sorri da mesma maneiraque uma pessoa normal, mas jamais viu alguém sorrir. Um bebê, mesmo com dois dias de idade, reage comum sorriso ao interesse dos que o circundam.

Há muitos tipos de sorrisos, mas a maioria denota emoções positivas, como alegria, alívio, diversão,felicidade, prazer e orgulho. Há estudos que sugerem que, ao sorrir, o indivíduo está feliz, e isso o ajuda paraque se sinta melhor e a vislumbrar o lado mais leve e cômico da vida.

Fazer careta e ficar mal-humorado são emoções negativas. Essas também estão sendo estudadas. É certoque não dói sorrir, mesmo quando se tem aparelho nos dentes!

É quase certeza que o sorriso faz aproximar as pessoas. Sinaliza que você pode ser alguém interessante,agradável para conhecer, para fazer amizade.

Infelizmente, muitas vezes, a vida o joga em uma situação díficil, onde não há lugar para alegria. Pode-seficar triste por um motivo ou outro, mas isso, de vez em quando, é normal. Pode não haver nenhuma razão paraum sorriso, mas faça uma tentativa: olhe-se no espelho e dê um sorriso, mesmo forçado. Verá que as coisasirão melhorar. Ficando na companhia de alguém que esteja alegre poderá, também, ajudá-lo a voltar a sorrir.

Um sorriso é contagiante, portanto, espalhe-o. Andando pela rua, sorrindo, poderá deixar todos a seu redormais felizes. Uma pessoa sábia disse, certa vez: — Um sorriso não custa nada, mas dá um grande retorno.Enriquece quem o dá. Leva apenas um instante, mas dura uma eternidade na memória. Ninguém ésuficientemente rico, para que possa viver sem ele.

Talvez um dos sorrisos mais famosos ficou gravado para sempre na tela de Leonardo da Vinci, “MonaLisa”. Acha-se que foi um nobre de Firenze, Bartolommeo di Zanobi del Giocondo, que a encomendou deLeonardo, em 1503. Seria a pintura de sua terceira esposa, Lisa di Antonio Maria di Noldo Gherardini. Elateria, então, 24 anos de idade.

Quando Leonardo deixou Florença, em 1507, levou o quadro com ele, e o vendeu ao Rei Francisco I, daFrança, para o castelo de Ambroise. Ficou depois em Fontainebleau, Paris, Versailles e, posteriormente, nacoleção de Luiz XIV. Após a Revolução Francesa, ganhou um lugar no Louvre, mas Napoleão o levou de lá ependurou em seu quarto de dormir. Quando Napoleão foi preso, “Mona Lisa” voltou para o Louvre.

Em 1911, a pintura foi roubada por um italiano, que a levou para a Itália. Surgiu dois anos depois emFlorença. Após várias exposições, foi devolvida ao Louvre. Nas décadas de 1960 e 1970, foi exposta em NovaIorque, Tóquio e Moscou. Hoje se encontra no Louvre, em Paris, por trás de vidro à prova de bala, e háacordos internacionais que não permitem que saia mais dali.

Há também a história da diretoria de uma rede de supermercados, nos Estados Unidos, que orientouseus funcionários para receber os clientes com um sorriso e contato visual direto. Houve 12 funcionáriasque processaram a firma, depois de receberem propostas indecorosas de clientes!

É óbvio que não há necessidade de exageros, andando por aí com um sorriso congelado na cara. Mesmoquando está se divertindo, não precisa sorrir o tempo todo. Basta fazê-lo no auge. Mas...

Sorria!Nem que seja um sorriso triste.Por que mais triste que um sorriso triste,É a tristeza de não saber sorrir.

Walter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisWalter Whitton HarrisWalter Whitton Harris

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William Moffitt HarrisWilliam Moffitt HarrisWilliam Moffitt HarrisWilliam Moffitt HarrisWilliam Moffitt HarrisMédico sanitarista - Campinas - SPMédico sanitarista - Campinas - SPMédico sanitarista - Campinas - SPMédico sanitarista - Campinas - SPMédico sanitarista - Campinas - SP

O antitabagista

Em 1992, sob a égide da ABRASE - Associação Brasileira de Saúde Escolar, montamos o 9o CongressoBrasileiro de Saúde Escolar, que se fez realizar no segundo semestre no Rio de Janeiro no campus da UERJ. Eupresidia pela terceira vez a comissão organizadora que era composta de uma equipe multiprofissional oriunda deSão Paulo, Guarulhos, Ribeirão Preto, Indaiatuba, Campinas, Vitória, além do Rio. Sete das reuniões foram levadasa efeito numa sala do SESC-Botafogo arranjada pelo saudoso colega Geraldo de Souza Pereira Lima, vice-presidentedo evento. Quase sempre as reuniões se davam aos sábados ou aos domingos, porque quase todos os membros dacomissão estavam trabalhando nos outros dias da semana. Para estar no SESC no Rio às nove horas da manhã dosábado, eu saía de Campinas pelo noturno da Viação Cometa da meia-noite.

Já se tornara hábito meu, havia quase duas décadas, encrencar com os fumantes que acendiam seuscigarros nos ônibus. Viajei vinte e poucos anos entre Campinas e São Paulo indo e vindo entre minha residência eo trabalho. Vivia fazendo palestras, distribuindo material que recebia do Ministério da Saúde e armando cenas aochamar a atenção dos fumantes que não tinham a menor consideração com crianças de colo, por exemplo. Além detabagistas suicidas, acusava-os de assassinos em potencial, uma vez que estavam induzindo os demais passageirosa adoecerem de câncer pulmonar, assim como de outros tipos. Várias vezes, houve princípio de tumulto nos ônibuspor parte daqueles outros passageiros não fumantes e em três ocasiões quase fui morto. Um dia eu conto...

Nesta viagem noturna aconteceram alguns fatos interessantes. Dois casais começaram a fumar, e para piorara situação, o motorista também. Levantei-me, fiz meu discursinho e fui chamar a atenção do motorista. Ele engrossoucomigo e tentou me fazer descer. Mandei ele para aquele lugar e voltei para a minha poltrona. Um dos casaisgentilmente apagou seus cigarros, mas o outro acintosamente acendeu mais cigarros subseqüentemente. O motoristaficou resmungando em voz alta. Passado cerca de meia hora, me dei conta de que estávamos parados em algumponto da Rodovia D. Pedro e o motorista conversava na frente do ônibus com um oficial fardado da polícia. Acheique possivelmente o assunto fosse a história do fumo e fui lá fora. Eu não estava enganado: “É ele!” - Disse omotorista.

“O senhor é que está criando problema no ônibus? Vai ter de descer aqui.” - Disse o sargento. “Antes demais nada, senhor sargento, o senhor vai ter de me ouvir, porque senão estará sendo arbitrário e atrabiliário e istodará um belíssimo processo de abuso da autoridade. O senhor já está exorbitando de suas funções. Compreendeu?”

Nem o deixei retrucar. “Este motorista, além de permitir que os passageiros fumem no veículo que está sobsua responsabilidade, em flagrante desobediência à Lei Estadual no 110/76, está fumando enquanto ao volante, emdesrespeito ao Código Nacional de Trânsito.”

O policial virou-se para o motorista e aplicou-lhe aquela bronca, desconcertando o aparente vitoriosoinfeliz. “E agora o senhor suba no ônibus e avise os passageiros que não podem fumar durante a viagem.” -Completou o policial.

Antes de prosseguirmos, o motorista falou o seguinte aos passageiros, em alto e bom som, acordando inclusivedois lá no fundo que já queriam armar uma briga: “O guarda mandou avisar vocês que aqui no estado de SãoPaulo é proibido fumar no ônibus, mas quando chegarmos na divisa com o Rio, na Dutra, estarão liberados.”

Estacionamos no Posto Itatiaia, obrigatório para os ônibus do Cometa, e após a parada regulamentar seguimosem frente. O ônibus parou no acostamento e percebi que o motorista desceu novamente. Vi pela janela que ele foiconversar com um policial rodoviário.

Daí a pouco ouvi um berro lá da frente. Sempre ocupei assentos da metade para trás dos ônibus. Estavanovamente lendo meu livro, mas sabia que a coisa era comigo.

“O senhor aí, desça do ônibus!” Fiz que não o ouvia ou que não era comigo.“O senhor aí, de óculos e paletó azul. Vai descer ou não vai?”Falava da frente do ônibus, ao lado do motorista. Olhei para os lados, atrás de mim e indaguei: “O senhor

está falando comigo? O que é que está havendo?”“Desça já para falar conosco aqui fora.” Afirmei que não desceria. O guarda desceu e o vi confabulando com

outros dois rodoviários. Subiu outro, desta vez um tenente que em tom ameaçador disse: “O senhor vai descer ounão vai descer do ônibus?”

“Já disse que não e não vou repetir, senhor guarda. Conheço meus direitos constitucionais e os senhores sópodem me deter em duas circunstâncias, ou em flagrante delito ou com mandado judicial. Nem meu nome o senhorsabe e nem estou fazendo qualquer coisa de errado. Não descerei por espontânea vontade – só se vierem mebuscar. Aviso que resistirei até o fim e é melhor que venham os três. Se é a questão do cigarro, então prendam estesdois casais e o motorista, que são perigosos assassinos soltos por aí, matando os demais passageiros com seuscigarros.”

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William Moffitt HarrisWilliam Moffitt HarrisWilliam Moffitt HarrisWilliam Moffitt HarrisWilliam Moffitt Harris

A prescrição precisaCorria o ano de 1960. Eu estava fazendo o estágio obrigatório do 6o ano do curso médico nas Clínicas.

O sistema era de rodízio e, portanto, ficávamos ora num serviço, ora em outro. No ano anterior, eu havia adquiridoum gosto muito grande pela nefrologia. Havia um quê de mecânica, química, laboratório e dramaticidade naquilotudo. Com grande freqüência dava plantões voluntários de aprendizagem durante todo o 5o ano e, nos intervalos deoutros plantões obrigatórios do 6o, ia correndo junto ao grupo de rim ajudar um pouco.

Lembro-me da paciência que o Absalão e o Saldanha tinham comigo ao me ensinarem a fazer eletroforesede proteínas plasmáticas e a manusear o espectrofotômetro-de-chama para dosar o Na, K, Mg, Ca, P e outros quetais. A pesagem correta dos sais e a mistura que fazia no tambor de Merril eram cuidadosamente monitorizadaspelos dois residentes. O rim artificial, como era chamado, consistia de uma mangueira de material semipermeávelenrolada em torno de um tambor que girava no banho de sais que, pelo princípio de Donan, trocava íons com omeio interno. Este consistia dos oito litros de sangue que circulavam pela tubulação e o do paciente submetidos àdiálise.

Tenho saudades das explicações magistrais de corredor e de sala-de-aula do Israel Nussenzweig, EmilSabbaga e José Barros Magaldi, todos luminares do grupo de rim. Era um belo time, sempre bem humorado,prestativo e solícito às indagações dos alunos e coeso na orientação dada aos pacientes internados.

Eu ia ser um nefrologista, e dos bons, por tudo que eu soubesse na época. O destino no entanto me reservououtros caminhos sobre os quais versarei no futuro.

Eram três da manhã e estava tudo calmo na enfermaria. Fazia mais de hora que havíamos terminado adiálise daquela noite e desmontado todo o equipamento para as auxiliares de enfermagem providenciarem a lavageme esterilização do material. Resolvi puxar uma palha para poder estar em condições de participar de uma importantereunião às oito.

Fui subitamente acordado com berros vindo do corredor.“Alguém me acuda, alguém me acuda!”Corri para ver do que se tratava. Havia luzes acesas, outras piscando, dois sinaleiros buzinando e várias

pessoas correndo para cá e para lá. Uma enfermeira, ao me ver, gritou:“Seu Manoel está com parada cardíaca. Já mandei buscar correndo o defibrilador.”

Entrei na enfermaria, abri espaço para olhar o paciente, chequei o pulso e também não consegui ouvir osbatimentos cardíacos. Ele estava com os lábios e dedos da mão bem arroxeados. Era um enorme negro com umtórax que parecia um barril. Dei-lhe um soco com toda a força no gradeado costal na altura do 5o espaço intercostaldo lado esquerdo. Achei que parecia querer voltar. Apliquei-lhe um segundo golpe. Tossiu engasgado, roncou,tentou assentar-se, murmurou alguma coisa, virou-se na cama e dormiu. As pontas dos dedos e unhas já estavamrosadas e fiquei mais sossegado.

Chegou a equipe do defibrilador. Não havia serviço para eles. Pedi um eletro e chamei o residente paraverificá-lo. Parece que não acusou nada de anormal. Ao clarear o dia e antes de descer para o refeitório para tomaro café-da-manhã fui ver Seu Manoel. Vi que a notícia havia se espalhado. Um residente havia solicitado umaradiografia simples do paciente porque se queixava de muita dor no gradeado costal.

“Pecisava quebrá as costela, seu dotô?”Haviam contado para ele que eu tinha lhe partido duas costelas. É o que dizia a chapa. Sei lá se era

verdade. Ricardo Campedelli e João Paulo Rossi, meus colegas de turma, que encontrei no refeitório, já foram logome gozando:

“Ouvimos falar que você andou deixando por aí uma prescrição “um muro no peito de 8 em 8 horas”!”(com sotaque inglês)

O tenente desceu e foi conversar com seus dois companheiros. Acompanhei-os pela janela de forma ostensiva.Demoraram uns quatro ou cinco minutos e os vi sinalizando para que o motorista voltasse à estrada. Durante oresto da viagem, ninguém fumou.

À medida que nos aproximávamos do Rio fiquei temeroso de que talvez naquele meio de tempo já tivessesido expedido pela rádio alguma ordem para me prenderem na Rodoviária. Fui chegando perto da porta e, assimque o motorista abriu a porta, sumi lá para dentro.

Meu amigo e tesoureiro da comissão organizadora, Paulo César de Almeida Mattos aguardava-me no mezanino.Ele viu meu ônibus chegando e encostando na plataforma de desembarque. Foi lá embaixo e ficou na frente daporta vendo saírem os passageiros. Quando desceu o último, abordou o motorista:

“Por gentileza, vim encontrar aqui um passageiro que viria de Campinas neste ônibus; um senhor alto deóculos, cabelo branco...”

“Virge... deve ser aquele professor chato de Campinas! Foi o primeiro a descer do carro. Parece que não gostamuito do cheiro do cigarro.”

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Caixa de PandoraTenho-te ausente, ó amado,e amo tua ausência porque me traz tua lembrança..Não sei para onde fostes,mas me acalenta o eco da tua voz, que a mensagem da noite traz.Vem com a brisa em constante carícia, me saudar, beijar, consolar, amar,Essa brisa que parece vir de perto, ou do além mar,vem me acordar, falar de tua saudade.Tua ausência, já não é mais.Estás aqui tão perto, sinto teu calor suave a envolver meu corpo,e um gemido de prazer e agonia escapa do meu peito, caixa de pandora,a guardar meus segredos, dores, perdas, sofrimentos e alegrias.Estás em mim, ó amado, e mesmo distante, és minha realidade verde,esperança para meu espírito, orvalho para minha sede,alimento para minha fome.Amo tua lembrança, que significa presença em minha solidão,vida em meus dias, abraço em minha saudade.Tenho-te presente, ó amado.Nossos sentimentos entrelaçados, persistem no cosmos ,energia vital mais forte que a eternidade imensa e solitária.Se numa semente se esconde uma floresta, o que se pode dizer de uma célula de amor?

Wilma Lucia da Silva MoraesWilma Lucia da Silva MoraesWilma Lucia da Silva MoraesWilma Lucia da Silva MoraesWilma Lucia da Silva MoraesMédica anestesiologista - Americana - SPMédica anestesiologista - Americana - SPMédica anestesiologista - Americana - SPMédica anestesiologista - Americana - SPMédica anestesiologista - Americana - SP

Nossos contrastesNasci num tempo em que a vida não tinha pressa.Nasceste com pressa numa vida que não tinha tempo.Quis te alcançar, retroceder nos anos já vividos.Tu me alcançaste vivendo um passado já perdido.

Nossos contrastes se encontraram já sem tempo.Tiveram pressa de viverem uma verdade.Me amaste muito, em tua louca e nascente juventude.Te amei demais em minha louca e nascente maturidade

Amantes fomos em eflúvios rápidos e eternos.Fugia eu do tempo ao encontro do teu presente.Fugias tu do presente ao encontro do meu passado,e ambos num só paraíso, fugíamos dos infernos.

Embora verde nos anos, sabias insinuar-te a meia voz.Aviventavas minh’alma com palavras eloquentes,sabias dizer a cada minuto, frases que calavam fundo.Soubeste deixar em meu peito um coração gemente.

Quando a vida que não tinha tempo, arrebatou-te de mim,com tua vida que tanta pressa tinha de viver.Te levou tão cedo ao encontro da morte, que todo tempo temneste mundo , para levar toda a vida ,sem correr...

Eu que nasci num tempo em que a vida era o amor em prece,não sei mais o que fazer desta vida, que não me dá mais tempo,e neste tempo parado no tempo, sem presente e sem futuro,rouba-se do meu passado, o tempo em que vivi sem pressa.

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Zilda CormackZilda CormackZilda CormackZilda CormackZilda CormackMédica - Rio de Janeiro - RJMédica - Rio de Janeiro - RJMédica - Rio de Janeiro - RJMédica - Rio de Janeiro - RJMédica - Rio de Janeiro - RJ

Sara?... Cura? ou Saracura

Ela permanecia atenta em uma das salas do centro cirúrgico do Hospital da Beneficência Portuguesa,na cidade de Niterói. Acompanhava toda a movimentação da equipe no preparo da cirurgia, uma tireoidectomia,que dentro em pouco seria iniciada na sua sobrinha Lídia.

Quando entrou na sala, verificou que a moça já estava anestesiada. Jazia deitada na mesa operatória,semi-desnuda. Uma enfermeira lhe fazia assepsia em todo o tórax e pescoço. Ficou pensando: por que solicitarapermissão para assistir a operação da sobrinha? Por que se submetia mais a esse sofrimento? Estava velha,cansada, poderia estar se poupando disso. Formada há 50 anos, dez dos quais trabalhara auxiliando neuro-cirurgia. Desistira da especialização pelo cansaço físico. Não tinha estrutura para suportar, de pé, seis, oitohoras de trabalho. Como já lidava com doentes mentais, a eles se dedicou exclusivamente por trinta anos.Com o passar do tempo, as ilusões que alimentara na cura da doença mental foram se dissipando. Algumasaltas com acompanhamento familiar. Eram poucas, considerando-se a enorme população dos sanatóriosonde se abrigavam esse tipo de enfermos.

Os doentes muitas vezes lhe interrogavam: Vou sarar, doutora? Ela sempre respondia que sim. Outros,indecisos, fisionomia ansiosa, com uma triste esperança no olhar, perguntavam timidamente: Tenho cura,doutora? Essa doença tem cura? Ela sara mesmo? Aquilo ficava na sua cabeça. A doença sara mesmo? Temcura?

Ligava os dois termos. Resolvera investigar. Consultou o Aurélio. Lá estava: Saracura - Designaçãocomum de aves gruiformes, ralídeas, representadas no Brasil por 13 generos e várias espécies. São avesdesconfiadas, que passam o dia escondidas na vegetação, saindo em geral à tarde, para se alimentar deinsetos, crustáceos e peixes de pequeno porte. Lembrou-se da analogia que fizera há alguns anos atrás. Saracura.O portador de uma doença mental é sempre muito desconfiado. Achou engraçado o fato dessas lembrançasestarem florescendo em sua memória, na proporção em que a equipe médica se movimentava em todas asdireções na sala de cirurgia (que nada mais é do que um centro que sara e cura patologias bem definidas).

E eu? ela pensava. - Por que estava ali? Não seria mais simples ter ficado no quarto com a irmãaguardando o retorno da sobrinha após a operação? Não estaria se estressando, vendo-a inerte, submetida amanuseios técnicos dos médicos, nas perdas sanguíneas, no ar de segurança do anestesista andando pelasala, volta e meia dando uma espiada no campo operatório para ver o tempo cirúrgico que o especialista jáalcançara. Por vezes algum comentário extra, ligado a interesses particulares, quebrava o silêncio da sala. Oruido dos instrumentos manuseados com perfeita maestria pela instrumentadora, chamou-lhe a atenção. Elaera perfeita. Antes mesmo que o cirurgião solicitasse, ela ja lhe estendia as pinças, os afastadores, o bisturi, asagulhas, etc. Continuava a observar a delicadeza do cirurgião na retirada da tireoide. Vendo-o no seu mistér,fechou os olhos e agradeceu a Deus estar ali, a despeito do sofrimento a que se submetera. Não é nadaagradavel ver um familiar se submeter a qualquer tipo de cirurgia, seja ela qual for. Mas, eu estou aqui, pensava.Por que ?

Encontrou a resposta. Veio devagar, ressurgindo do seu inconsciente, fixando-se no consciente,mostrando-lhe a verdadeira razão de estar ali, assistindo a cirurgia da querida sobrinha. Entre outros, ela eramuito especial, amada por tantos motivos. Rememorava como um filme, na sua imaginação, todo o passadoda moça. Muitos sofrimentos e mágoas. Lágrimas lhe vêm aos olhos, fez força para contê-las.

Afinal era médica, tinha que se controlar, o que pensariam os seus jovens colegas? A resposta, noentanto, da sua presença na sala cirúrgica, estava no seu consciente, viva, palpitante, não podia mudá-la. Elaestava agindo simplesmente como uma “saracura”. Adotara um comportamento desconfiado de uma saracura.Quisera ver de perto se havia efetivamente indicação para uma tireoidectomia. O grande afeto que nutria pelasobrinha lhe levara a isso. A glândula foi extirpada, sem sinais aparentes de qualquer anormalidade. Seuinstinto “saracureiro” apaziguado. Lembrou-se das perguntas dos seus doentes e as fez para si própria: Hásara ou cura mesmo que justifique uma tireoidectomia como a que acabara de assistir? Trata-se de umaglândula endócrina. Só o futuro poderá responder a essa questão.

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Em que?

Em que distânciasse medem os mundosda reflexão constantenos caminhos da mente ?

Em que profundidadeou natureza viva se encontra,a sutileza das linhasnão medidas, das coisassem explicação?

Em que proporçãoa natureza desses mundostomou forma,ou ficaram retidasnas asas da imaginação?

Em que sentimentosa alma perdura... se os tem?

Em que idéiaestapafúrdia ou boa,bem generosa ou mábrotou, da natureza, o tempode um só espaço, ou elo,indefinível e casto,e ao mesmo tempobom... e... mau?

Em que raízes foramtão bem plantadas cores,se dissabores toldama marginal finezada mãe... da natureza,no ser, na prevalência,ferindo toda a essênciado homem... para ser bom?

Zilda CormackZilda CormackZilda CormackZilda CormackZilda Cormack

Compu-mento(computador - pensamento)

Vou remexer meu “ compumento “até descobrirse as minhas dúvidasficaram retidasno “arquivo “ da imaginação!

Vou desdobrar suas “janelas”e penetrar nos sonhos...Permitir que os “ícones”promovam uma dançana “tela” da mente!

Escolher as “opções”,clicá-las no momento certo!Estabelecer no “layout” da vidaas medidas de suas margens...

Observar o “cursor”,cujo caminho me apontao início de uma jornada...

E... finalmente,“salvar” as boas idéiasque a vida vai me dando,utilizando-asna hora e tempo certosem que Deus me vai permitindo...viver!...

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O perfumeQue sensações estranhas são as causadas à percepção olfativa imediata de um perfume, quando as

imagens ligadas a ele estavam amortecidas no inconsciente.Foi o que aconteceu naquela fatídica noite em que Maurício programara um cinema com a nova

namorada. Já tinham saído algumas vezes para jantar, bate-papo informal, levando-a para casa sem fazerqualquer comentário ou convite para passarem algumas horas juntos, ou curtirem esse novo amor que iadespontando nele. Maurício estava certo, pela experiência que tinha, que tão logo fizesse um convite a Marina,esta o acolheria de bom grado. Sentia até uma certa impaciência nela quando, nos arroubos audaciosos decarinho que trocavam, ele levava-a de carro até a porta do edifício onde ela residia com a mãe. Dava-lhe umbeijo rápido e partia célere no seu carro. Voltava para o seu apartamento ainda envolto numa névoa românticade desejo e medo. Ao entrar em casa, ligava o som em surdina, pegava um livro e, logo após, quedava-sesurpreso a pensar na moça que acabara de deixar. Era linda, bem dentro do seu tipo preferido de mulher.Conhecera-a numa lanchonete, começaram a conversar, saíram juntos, ofereceu-lhe carona nessa mesmatarde. Os telefonemas se sucederam e ei-lo novamente interessado numa figura feminina, após um afastamentode oito meses do seu último caso amoroso que tivera com Ana. Sua paixão por ela durara quase cinco anos,e o seu rompimento intempestivo lhe deixara profundas cicatrizes. Tinha medo de se machucar novamente,pois sofrera terrivelmente com a separação. Encontravam-se quase todos os dias após o trabalho de ambos,jantavam, iam a um cinema e em seguida para o seu apartamento ou o dela. Faziam sexo com toda a paixão,às vezes dormiam juntos ou então um dos dois voltava para o próprio apartamento. Eles já tinham conversadosobre a possibilidade de morarem juntos várias vezes. Ambos, entretanto, não queriam deixar os seus própriosespaços. Assim iam seguindo felizes, freqüentando as respectivas famílias. Ana era encantadora, inteligente,culta, vestia-se com elegância e discrição. Usava sempre o mesmo perfume. Maurício adorava cheirar as suasroupas impregnadas com o seu odor característico de mulher associado ao misterioso perfume que usava commoderação, sem nunca lhe revelar o nome. Quando ela se antecedia nos encontros na sua casa, ao abrir aporta do apartamento, já percebia a sua presença. Da mesma maneira quando ela o deixava, ficava aquelecheiro delicioso de mulher nos lençóis, no travesseiro, no seu corpo. Dormia tranqüilo como uma criança,sabendo que Ana era a mulher de sua via. O desfecho foi rápido, para não dizer trágico, para ele. Um noivo dopassado, que se casara com outra, ao enviuvar, procurou-a, reatando o relacionamento. Não contestou e nempoderia. Sabia desse passado de Ana. Ela nunca lhe ocultou. Sofreu muito e ei-lo, agora, já se interessando poressa bela mulher, Marina.

Quando ainda estava pensando nela, o telefone tocou . Era a própria, dando-lhe boa noite com todo ocarinho, sugerindo-lhe um cinema para a tarde seguinte.

Entraram de mãos dadas na casa de espetáculos, conversando descontraidamente, ele estava radiante.Tinha ao lado uma bela companheira. Todos a fitavam com olhar de admiração. Sentiu-se vaidoso e de certaforma foi prenunciando que essa noite se alongaria bem mais do que as anteriores, tal o entusiasmo que ja semanifestava nele.

Sentaram-se bem juntinhos, mãos entrelaçadas, uma auréola de desejo emanando dos seus corpos.Ao iniciar-se a projeção do filme, um casal entra tardiamente no escuro, ocupando a fila dianteira. Mauríciosentiu o cheiro do perfume usado por Ana. Começou a se sentir inquieto, uma sensação estranha, um caloresquisito. O entusiasmo erétil que estava sentindo ao lado de Marina começou a desvanecer-se. Quanto maisele tentava se reanimar com a presença dela, mais ele se arrefecia no seu entusiasmo másculo. O perfume lheavivara lembranças que acreditava estarem esquecidas para sempre. Sentiu que o amor por Ana aindaperdurava dentro dele, vivo, palpitante, como foi todo o tempo em que vivera com a moça. Não queria saberse a mulher que entrara tardiamente no cinema usando o misterioso perfume de Ana era ela própria, suapaixão antiga, ou uma outra qualquer. Recusava-se a ver o filme, pediu licença a Marina pretextando forte dorde cabeça e saiu sem outras explicações. A moça seguiu-o atônita, sem nada entender. Levou-a à casa,pedindo-lhe mil desculpas pelo ocorrido.

Maurício já em seu apartamento começou a refletir. Recusa-se a aceitar o seu próprio e absurdocomportamento. Saíra do cinema com o coração apertado de saudades e de desejo por Ana, mal sentiraaquele perfume que nunca mais lhe saíra das entranhas. Que estranho, pensava, um simples perfume veiodespertar lembranças que eu as considerava superadas. Que dizer agora a Marina? Talvez ela nem mais oquisesse ver. Paciência. Ia continuar a curtir as saudades de Ana, do seu cheiro, do seu perfume, do seu jeitopróprio de amar ao qual se acostumara. O seu orgulho de machão fez com que ele não mais a procurasse paralutar pelo seu amor. Tudo reacendeu ao sentir o perfume. Decidiu-se: iria procurar Ana. Tinha esse direito.Sabia que ela também o amara durante o tempo em que ficaram juntos. Detalhes os mais íntimos, aguçaram-lhe as saudades, despertando o desejo por Ana. Começou a chorar, dando vasão ao seu desespero. Quandofoi se deitar, por coincidência, ao mergulhar o rosto no travesseiro, lá estava, a mistura homônima do perfumesecreto e da mulher amada. Ficou relembrando-a, rolando na cama até a exaustão. Quando conseguiuadormecer, os primeiros albores da manhã já se prenunciavam no céu.

Zilda CormackZilda CormackZilda CormackZilda CormackZilda Cormack