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Amores da Guerra

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Em AMORES DA GUERRA o foco central é a história de um soldado brasileiro, combatente na Guerra do Paraguai, que após a Batalha de Avaí foi socorrido por uma índia guarani, paraguaia, Luisa Abela Delore que lhe salvou a vida. Ela acompanhou o soldado brasileiro e chegou com ele ao vale do rio Três Forquilhas. Casaram e tiveram muitos filhos. Quando o soldado faleceu, ela teve surtos de saudade de sua terra. Ela morreu de saudade...Em AMORES DA GUERRA nos é revelada também, a dor de tantas mães que viram seus filhos partindo para a guerra e que, com saudade, ficaram por eles esperando.Em AMORES DA GUERRA vemos os sobreviventes retornando, trazendo lições de vida extraídas do campo de guerra juncado de mortos. A guerra do Paraguai.Em AMORES DA GUERRA surgem jovens combatentes que, de retorno à Pátria, não mais conseguem se conformar com a realidade injusta da vida política existente em sua própria terra. Por terem amor por sua terra e pela Pátria estão dispostos a partir de novo para a luta que apenas muda de foco. Personagens que marcam esta obra: Pastor Carlos Leopoldo Voges, Major Adolfo Felipe Voges, os militares Brummer - prussianos. Surgem também Baiano Candinho. Michel Eberhardt - Miguel Barata, Johennes Menger - João Patrulha. A escola do Pastor Voges. Carl Daniel Gross - Paraguaio Gross. A assistência religiosa aos soldados. O coronel João Niederauer Sobrinho - filho do vale do rio Três Forquilhas. O busto para Coronel Niederauer em Itati. O prefeito Heneri Máximo Lipert de Terra de Areia. O capelão Elio Eugenio Müller, do Exército Brasileiro e que foi Chefe do SAREX, sediado no Quartel General do Exército Brasileiro - QGEx - o Forte Apache - em Brasília - DF.. Elio Eugenio Muller

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Editora – AVBL2010

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

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MÜLLER, Elio Eugenio

“Amores da Guerra – Coleção Memórias da Figueira – Volume: IV” – Elio Eugenio Müller -- Curitiba/PR. Editora AVBL, 2010. -- Bauru/SP 186p. il. 14,8 X 21 cm.

ISBN: 978-85-98219-52-3

1. Contos: Literatura Brasileira. I. Título.

08-11-10 CDD-869.93

Índice para catálogo sistemático:1. Contos: Literatura Brasileira - CDD-869.93

Copyright © - ELIO EUGENIO MÜ[email protected] - [email protected]

AMORES DA GUERRAColeção Memórias da Figueira - Volume: IV

ISBN: 978-85-98219-52-3

Direitos reservados segundo legislação em vigorProibida a reprodução total ou parcial

sem a autorização do autor.

EDITORA AVBLwww.editora.avbl.com.br

e-mail: [email protected]

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“AMORES DA GUERRA”Coleção Memórias da Figueira

Volume: IV

Histórias da Guerra do Paraguai

ÍNDICE

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Page 5: Amores da Guerra

- AGRADECIMENTOS 7- PALAVRAS AO LEITOR 8

- AMORES DA GUERRA 11- Os filhos que não voltarão... 15- Marcas e cicatrizes da guerra 18

- UM EMOTIVO CULTO DE LEMBRANÇA DOS MORTOS 23- A Bandeira da Colônia de Três Forquilhas 25- Um sermão que calou na alma 26

- A CHEGADA DOS CINCO BAHIANOS 30- Vida nova para os cinco baianos 32- Candinho e Tonho, hóspedes dos Becker 34- Emprego e casamento para Baiano Tonho 35- Pedro Baiano encontra um novo lar no Josaphat 37- Os baianos João e José também acolhidos no Josaphat.

39

- A fama de Baiano Candinho 41

- A VOLTA DE PETER FECK 44

- O RETORNO DE “PARAGUAIO GROSS” 47- Gross, ferido gravemente na batalha de Avaí 49- Abela Delore apreciava cavalos 53- Paraguaio Gross dá emprego para Baiano Candinho

56

- Um casamento diferente 59- “...eles vão pro mato e se escondem...” 65- Uma demonstração hípica 68- Somos dominados por uma cultura da guerra 70

TEXTOS DIVERSOS 75

- OS VOLUNTÁRIOS DA PÁTRIA, FILHOS DA COLONIA ALEMÃ DE TRÊS FORQUILHAS QUE

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FORAM PARA A GUERRA DO PARAGUAI- Os mortos em combate 77- Os que voltaram... 83- Filhos de Três Forquilhas na Artilharia de Mallet 92

- OS VOLUNTÁRIOS DA CISPLATINA 94

- OS SOLDADOS DA PATRULHA SERRANA 98

- MILITARES BRUMMER QUE ENTRARAM NA COLONIA DE TRÊS FORQUILHAS A PARTIR DE 1853

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- FRIEDRICH SCHÜTT – UM ARMEIRO MILITAR INGLÊS

109

- WILHELM SCHMITT – UM ARMEIRO E RELOJOEIRO 113- O Ofício de um Mestre Armeiro 114

- A ÍNDIA PARAGUAIA ABELA DELORE 116

- A INICIAÇÃO POLÍTICA DE CANDINHO 119

- AS MÃES E AS VIUVAS DOS COMBATENTES MORTOS

123

- A ESCOLA DO PASTOR VOGES 125

- ASSISTÊNCIA RELIGIOSA AOS COMBATENTES, MINISTRADA POR VOGES, ANTES E DEPOIS DA GUERRA

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- O que a Comunidade tem a ver com o fim da guerra?

133

- UM PREGADOR PARA OS REGIMENTOS 136

- O BRASÃO DA COLÔNIA DE TRÊS FORQUILHAS 142

- HOMENAGENS AO CORONEL NIEDERAUER EM 145

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ITATI-RS

- CORRESPONDÊNCIAS 147

- COLOCAÇÃO DO BUSTO DO CORONEL NIEDERAUER EM ITATI-RS

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- A PRAÇA CORONEL NIEDERAUER, EM ITATI – RS 165

- GRUPO DE AMIGOS DA PRAÇA CORONEL NIEDERAUER

168

- HOMENAGEM A ADÉLIO VOGES DO NASCIMENTO 170

- CONCLUSÃO 172

- NOTAS EXPLICATIVAS 175- FIGURAS em “Amores da Guerra” 181- FONTES DE CONSULTA 183- COLEÇÃO MEMÓRIAS DA FIGUEIRA 186

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus fonte da vida e de toda a boa inspiração, que me permitiu a realização desta obra. Que

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estas memórias sirvam como um instrumento para a edificação do Seu Reino sobre a terra.

À Doris, minha esposa, pelo permanente incentivo, como companheira valorosa, ao longo destes 40 anos de pesquisa e trabalho, que me ajudou a localizar e dar vida aos personagens, muitos dos quais parentes dela, que viveram esta saga contada em "Memórias da Figueira".

À Profª. Dra. Solange T. de Lima Guimarães (Sol Karmel), amiga e conselheira, pela avaliação da obra e orientação.

Ao publicitário Rodrigo Sounis Saporiti pela orientação, na fase inicial, para a escolha do formato literário da obra.

À escritora Maria Inês Simões, Presidente da Academia Virtual Brasileira de Letras - AVBL, pela orientação na fase de publicação do livro.

PALAVRAS AO LEITOR

Sentado outra vez sob a proteção da acolhedora figueira, em meu Sítio, me envolvi com os AMORES DA GUERRA.

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Desfilaram diante de mim inúmeros personagens, filhos do vale do rio Três Forquilhas que quiseram, como voluntários, seguir em defesa do solo pátrio.

Pensando nos voluntários da pátria, me vi de retorno aos tempos de minha mocidade, em minha terra natal. Um dia eu também me apresentei como voluntário para a prestação do serviço militar.

Ser voluntário foi apenas uma consequência da influência colhida na minha infância, tanto no lar, bem como na escola e na igreja. Minha mente ficara povoada de histórias dos épicos gloriosos.

Na escola me ensinaram sobre a grandeza do meu país construída através das suas lutas, seus cavaleiros, heróis, tudo marcado pela filosofia positivista então dominante.

Na igreja me ensinaram as histórias épicas das lutas dos heróis bíblicos, desde Moisés e Josué, na conquista da Terra Prometida, bem como da coragem de Davi que derrotou o gigante Golias.

Ensinaram-me que a fé em Deus é o escudo de um bom guerreiro.

Passei a acreditar que o meu país precisava de homens como eu, para manter a sua integridade física e espiritual. Por isso fui, sou e sempre serei um voluntário...

Na Junta do Serviço Militar, de Panambi – RS trabalhava o Sr.Waldemar Wentz, o “Neco”, um amigo dos jovens. Grande foi a minha decepção quando, em 1962 ele sentenciou: - “Você está longe do físico ideal para ser um soldado... Você é tão magro que qualquer vento te derruba...”.

Como eu era nascido em novembro, portanto no final

do ano, recebi a recomendação: - “Volte no ano que vem,

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mas, até lá, coma mais feijão. Então darei um jeito para te levar à inspeção e a aprovação para ser um soldado”.

E, assim ocorreu... Como voluntário, consegui, com

satisfação, vestir a farda do soldado...

Neste contexto considero interessantes as palavras de Jean Pouget - oficial do exército francês que em A Guerra Cruel, escreveu: - “Sim, um dia eu escolhi usar a farda do Exército. Sim, com orgulho vesti o uniforme... E, isso não me impediu de ser um homem tão sensível como qualquer outra pessoa. Donde é que tiraram a idéia de que ser do Exército é ser tratado como criminoso comum? Existem segmentos da opinião pública que desejam renegar totalmente a nossa vocação, para termos vergonha da farda que vestimos. O fato de que um homem escolheu ser um soldado, por acaso significa que ele encontrou em si mesmo um assassino sádico? Não, pois isto seria uma injustiça muito grande, se deixássemos de reagir, sem vomitar em cima de tal opinião. Iríamos admitir que todo soldado desempenha o papel do carrasco, que aí está apenas para matar... A verdade é que na guerra sempre há de se optar pela morte do inimigo, ou pelo sacrifício da própria vida. É preciso entrar numa guerra como um soldado voluntário, como um profissional, não como um mercenário. E, acima de tudo, é necessário escolher a disciplina, porque ela limita a violência. A profissão das armas é um sacerdócio. A vitória não pertence ao soldado, nem a derrota. Elas sempre pertencem à Nação que arregimentou as suas tropas... Ambas são o resultado da política de uma Nação. Humanizar a paz parece mais lógico do que tentar humanizar a guerra. A guerra sempre pode ser uma das soluções na busca pela paz.

Em AMORES DA GUERRA o foco central é a história de um soldado brasileiro que foi socorrido por uma índia guarani, paraguaia, que lhe salvou a vida.

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Em AMORES DA GUERRA nos é revelada também, a dor de tantas mães que viram seus filhos partindo para a guerra e que, com saudade, ficaram por eles esperando.

Em AMORES DA GUERRA vemos os sobreviventes retornando, trazendo lições de vida extraídas do campo de guerra juncado de mortos.

Em AMORES DA GUERRA surgem jovens combatentes que, de retorno à Pátria, não mais conseguem se conformar com a realidade injusta da vida política existente em sua própria terra. Por terem amor por sua terra e pela Pátria estão dispostos a partir de novo para a luta que apenas muda de foco.

Desejo a todos uma boa leitura, ou “leitorem salutem” conforme diziam os latinos.

ITATI – RS, 13 de novembro de 2010

Elio Eugenio MüllerMembro da Academia Virtual Brasileira de Letras – AVBL

AMORES DA GUERRA

- “Uma guerra sempre traz aflições”, disse o pastor Voges. Ele estava se referindo à Guerra do Paraguai, lembrando dos filhos de Três Forquilhas que haviam perecido nesse confronto bélico. Voges estava sentado à sombra do frondoso cedro, que podia ser visto, sempre altaneiro, nos fundos da casa, no pátio, onde Mãe Maria também costumava reunir seus irmãos africanos para as danças e os cânticos. Nessa hora estavam ali apenas as pessoas da casa pastoral, a esposa Dona Elisabetha, os

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filhos Adolfo Felipe e Jacob. Faltava a filha Catharina que já fazia anos morava em Campo Bom, onde casara com Jacob Sebastian Diehl e, às vezes apareciam por algumas semanas em Três Forquilhas, para dar contato dos netos com seus avós. Num outro ponto estava Mãe Maria, Pai Vicente e os filhos dos mesmos. Todos gostavam de ficar ali conversando e às vezes provando das guloseimas, que “Mãe Maria” se acostumara a preparar com todo o carinho e sorridente oferecia uma prova aos presentes.

Pastor Voges continuou: - “A guerra abre feridas inesperadas em muitos corações, que precisam chorar as suas perdas. Mas não podemos esquecer que além das feridas e da perda de vidas que são tão caras, a guerra também desperta e promove os amores da guerra”.

Esposa e filhos gostavam destas conversas ao pé do cedro, para escutar o pastor em suas reflexões. Como sempre, a curiosidade tomou conta de todos. Dona Elisabetha quis saber: - “Carlos, de que filósofo você pegou esse pensamento?”.

O pastor sorriu e falou: - “Porque dizes que peguei pensamentos de algum filósofo? Não podem ser os meus próprios pensamentos?”.

Dona Elisabetha encostou a cabeça no ombro do marido e com carinho lhe fez cafuné. O pastor continuou: - “Querida, confesso que me lembrei de uns escritos, não muito indicados para os meus paroquianos, que eu li em meus tempos de estudo, antes da vinda ao Brasil. Lembrei do cancioneiro amoroso conhecido como Os Amores de Ovídio”1.

- “Amores da Guerra”, continuou insistindo o pastor.

“Sim, tivemos aqui as nossas histórias de amores da guerra, no vale do rio Três Forquilhas. Podemos lembrar dos amores inesperados trazidos com a chegada dos soldados Brummer, depois de 1853. O primeiro que chegou aqui, foi o Christian Tietboehl que mexeu com tantos corações femininos... Sou

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de opinião que mestre de banda de música sempre se destaca e chama a atenção de todos... Quem poderia imaginar que o Professor Tietboehl seria tomado de amores pela recatada Catharina Eigenbrodt. Mas com certeza constituíram uma bonita família com nove filhos, sete homens e duas mulheres. Penso que eles fazem uma bela e exemplar família que muito poderão fazer pelo progresso desta Colônia”.

Elisabetha concordou e também passou a recordar dos militares prussianos que haviam chegado à Colônia. Ela falou: - “Lembro do Peter Mathias Erling, ele que casou com a Dorothea Henze. Essa família também colabora muito com a igreja e não perdem nenhum culto. Naquela casa são três filhos e três filhas que foram meus alunos aqui em nossa escola da Comunidade”.

Adolfo Felipe e Jacob também se envolveram na conversa e também foram enumerando nomes de militares prussianos que haviam chegado à Colônia. Foram mencionados Mathias Grassmann que em 1858 casou com Catharina Mittmann; José Etter que casou com Bárbara Justin; Augusto Rudolf que casou com Catarina dos Santos, filha do índio Manoel dos Santos; Franz Saul, professor trazido pelo pastor para lecionar na Escola da Comunidade que casou com Elisabeth Dorothea Mauer; Augusto Sonntag, outro professor trazido pelo pastor, que casou com Bárbara Triesch; João Pedro Baumann que casou com a Anna Maria Schneider, filha do cervejeiro Schneider; Martin Blehm que casou com Magdalena Gross; Maximiliano Krause que casou com Anna Elisabeth Gehrmann; Jacob Steinmetz que casou a Elisabeth Justin e se tornou o melhor alfaiate da Colônia, costurando para as famílias mais abastadas, criando trajes modernos; João Westphalen, assassinado na Colônia em 1870 e que deixou viúva a Maria Catharina Becker; Frederico Dicksen que casou com Maria Madalena Menger e foi morar no Três Pinheiros para servir aquele povo como sapateiro competente; Carlos Rickroth que casou com Catharina Gross e foram morar nas bandas do Morro do

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Chapéu; Luis Stahlbaum que casou Maria Dresbach e também foi morar nas proximidades do Rickroth; Jacob Hartmann que casou com Maria Eva Henze; Frederico Brookschmitt que casou com Sofia Henze.

Adolfo Felipe perguntou então ao pai: - “E quanto ao Wilhelm Schmitt que me contou ter trabalhado para o Exército como armeiro e até guarda um lindo capacete prussiano, na sala de visitas”.

Pastor Voges explicou: - “O Wilhelm é um grande artista que domina tanto o ouro bem como o couro... Ele trabalha com o ferro e com metais mais nobres, pois é um experiente mecânico2 e ourives que sabe fabricar as suas próprias peças de metal para consertar relógios e construir jóias finas, broches e anéis. Fabrica também fivelas, galões, botões e artefatos metálicos. Porém o que me chamou mais a atenção são as idéias que ele prega entre os colonos. Nesses dias, numa reunião aqui na Igreja ele comparou o Universo com um relógio e comparou Deus como sendo o Grande Relojoeiro...”.

- “Que bela comparação...” - disse Elisabetha.

O pastor discordou: - “Querida Elisabetha, esse pensamento até pode soar bem, mas a verdade é que ele me causa algumas dificuldades... Ele é um livre pensador e racionalista... Ele veio também fortemente influenciado pela maçonaria germânica, semelhante ao tio e sogro, o nosso saudoso Comandante Philipp Peter Schmitt... A diferença é que o nosso inesquecível comandante jamais me contestou e não interferia em minha atividade de pregação e ensino”.

- “Nada entendo disso”, disse Elisabetha Nunca ouvi você falar alguma coisa a respeito dos Livres Pensadores. Eles são procedentes de qual nação da Europa?”.

- “São pessoas das mais diferentes nações que assumiram idéias filosóficas e religiosas racionalistas e passaram a ser denominados de livres pensadores,

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exatamente por se dizerem livres do poder exercido pela religião. Eles são convictos de que a pregação religiosa não aguenta aos testes da razão. O Wilhelm, por exemplo, defende que nada há a se ganhar por acreditar no irreal, como também há tudo a perder quando se sacrifica a ferramenta da razão no altar da superstição. Ele criticou dizendo que a religião tem sido usada para justificar guerras, escravidão e, principalmente, a intolerância com as minorias, como é o caso da perseguição movida contra a maçonaria”.

- “Eu não sabia que o tio Wilhelm tem idéias tão interessantes...” - interveio o filho Jacob.

- “Estão ouvindo?” - disse pastor Voges. - “Até a minha família fica encantada com as idéias de um livre pensador. O Wilhelm vem recebendo uma publicação que apresenta as teorias de Darwin. Terei um trabalho cada vez mais árduo, para defender e explicar que as boas novas do Evangelho de Jesus não são nenhuma superstição...”.

Elisabetha insistiu com o marido: - “Carlos, você ainda não respondeu? De onde vem os Livres Pensadores?”.

O pastor explicou: - “Nos meus estudos básicos de teologia, entre 1820 a 1823, li alguma coisa sobre o Livre Pensar com base em Gottfried Von Leibniz que era natural de Leipzig, na Alemanha. Mas hoje estou diante de coisas mais complicadas e bem recentes, como as tais teorias do inglês Charles Darwin. O Wilhelm Schmitt me emprestou um folheto onde se explica algo a respeito dessas idéias, através da Teoria das Espécies. Esse assunto é novo para mim... Tenho passado dificuldade para rebater tais idéias que, creio, tem muitos aspectos de grande valor científico que merecem o nosso respeito... Confesso que gostei da leitura, mas não concordo com aqueles que a partir da Teoria das Espécies querem agora colocar a obra da criação conforme é descrita no Livro de Gênesis como uma pura lenda, sem valor científico e, em consequência, colocando a

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fé como sendo pura superstição de crédulos que estariam sendo enganados pela Igreja.

O pastor foi interrompido neste diáologo, pois uma mulher viera até o templo, em busca de orientação e consolo. Ele prontamente foi ver de quem e de que se tratava.

Os filhos que não voltarão...

- “O meu filho não voltou” - disse a mãe desconsolada que se dirigira até a igreja, para falar com o pastor. Ela estava de luto fechado... Tratava-se de Elisabeth Catharina Gross, a viúva do carpinteiro e imigrante Philipp Peter Gross. Muito magra e nervosa, ela retorcia as mãos enquanto falava.

O pastor procurou consolá-la, enfatizando o amor que uma mãe nutre por seus filhos, mesmo quando já são crescidos. Falou das feridas que a guerra causa nos corações, que choram. Mas finalmente ele falou de modo mais enérgico, dizendo: - “Estimada senhora, não chegou nenhum aviso do Exército, que informasse sobre a eventual morte do seu filho, Carl Daniel Gross. Por isso a senhora não deveria se apresentar aqui vestida de luto, só pelo fato de que ele ainda não retornou. Tenho que insistir que o seu filho não foi declarado como morto... Por este motivo peço que não insista tanto em sofrer, pois é certo que a senhora está procurando sofrer mais que o necessário”.

- “Pastor, não vim procurar este tipo de consolo, pois são só palavras... O senhor é mestre de belas palavras, mas é lerdo em ajudar as pessoas que sofrem! Exijo alguma coisa mais concreta... Exijo que o senhor coloque uma coroa de defunto na parede do templo, com o nome do meu filho. Quero que o senhor inclua todas as demais homenagens que o senhor tem feito para outros que também morreram...

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Eu noto que isso trouxe consolo para aquelas famílias que choram pelos filhos que não mais voltarão!”.

Desde a volta de diversos combatentes da Guerra do Paraguai, a mãe de Carl Daniel Gross, havia colocado luto pesado. Ela passou a chorar a morte do filho e insistia, constantemente, com o pastor Voges para que o filho fosse incluído nas preces de intercessão e homenagens póstumas, que eram feitas na igreja, cada vez que vinha a notícia da morte, de um soldado da Colônia. O pastor, no entanto, sempre insistiu no conselho de que se deveria aguardar por algum comunicado oficial do Exército e, por mais uma vez explicou: - “Tenho feito de tudo que me foi possível para procurar ajudar a senhora. Quando os primeiros sobreviventes retornaram, imediatamente fiz reuniões com eles. Dentre os diversos assuntos que discutíamos procurei colocar em primeiro lugar um pedido de informações sobre o eventual paradeiro do seu filho. Porém, ninguém soube dar qualquer informação a respeito dele...”.

- “Pastor, se ninguém soube dar alguma informação sobre o paradeiro de meu filho então é por que ele morreu nessa triste guerra. Por isto, diga-me se não estou certa em chegar até aqui para insistir com o senhor para que ele receba uma homenagem fúnebre”. A viúva pediu que se fizesse uma coroa de flores artificiais que Dona Elisabetha confeccionava e que a cada vez que chegava alguma notificação do Exército informando a morte de um combatente da Colônia, a mesma era colocada na parede interna do templo, durante uma cerimônia de consolo. Nessas ocasiões o pastor procurava reunir os familiares do morto, com o objetivo de proferir uma mensagem de conforto com base na Palavra de Deus e para fazer orações.

O pastor falou: - “No próximo domingo, na primeira semana da primavera, faremos aqui um culto especial, semelhante ao do ano passado quando iremos reunir na igreja todos os voluntários da Pátria de nossa Colônia que retornaram. Faremos também, outra vez, uma chamada

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nominal dos filhos que não mais voltarão... Peço que a senhora venha participar, juntamente com os seus familiares... Faremos preces pela senhora e pediremos que o seu filho possa voltar logo, se ainda estiver vivo...”.

- “Pastor, se já estamos chegando à primavera de 1871 e já faz quase um ano e meio que a guerra terminou, conceda que o meu Carl Daniel também receba a sua coroa fúnebre...”.

- “Não posso fazer isso, pois o Exército não enviou nenhum comunicado para informar a morte dele. Vá para casa e tire esse traje de luto... Não posso impedi-la de chorar de saudade pelo seu filho, mas, por favor, ainda não é hora de querer lamentar a morte dele... Tenho aqui a relação de todos os filhos de Três Forquilhas que não mais voltarão”. O pastor mostrou à viúva um papel contendo os nomes dos mortos.

A viúva saiu da igreja, insatisfeita e, onde podia, reclamava, dizendo: - “O nosso pastor está ficando insensível com a dor de uma pobre viúva...”.

Marcas e cicatrizes da guerra

O pastor Carlos Leopoldo Voges realizou um encontro no templo reunindo os voluntários que haviam voltado da guerra. O motivo principal era de organizar detalhes do culto especial em Ação de Graças pelo final da guerra e pela volta de diversos voluntários filhos desta Colônia.

Adolfo Felipe, o filho do pastor, estava postado junto à porta principal de entrada do templo. Tinha nas mãos uma folha com a relação dos voluntários. O primeiro a chegar foi Carl Daniel Helbig que morava a 200 metros da igreja. Ele fora o mais velho do grupo de voluntários e nascera na Alemanha em 1824. Portanto estava agora com 48 anos de

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idade. Ele havia sido o padrinho de batismo de dois dos jovens soldados que com ele haviam seguido ao Paraguai. Eram o Carl Daniel Gross e o Carl Daniel Dahl.

Helbig se mostrava desconsolado, pois o primeiro dos afilhados ainda não regressara da Guerra e, o segundo, o Dahl, regressara aleijado. Por isso demorou um instante ao lado de Adolfo Felipe para comentar de sua lembrança do dia em que havia partido para a guerra e como alguns amigos haviam feito brincadeira, dizendo: - “Você vai de ama seca dos teus afilhados... Vê se cuida bem deles e os traz de volta para nós...”.

Enquanto ele estava relembrando estes fatos foi interrompido por alguém chegando e que disse: - “A benção, padrinho!”. Era Carl Daniel Dahl que vinha amparado numa muleta. O rosto dele e os braços estavam marcados por muitas cicatrizes, de ferimentos recebidos em combate. Locomovia-se com grande dificuldade, pois um tiro o atingira na região inguinal, deixando-o sexualmente impotente. Era visível no seu rosto que grande era o seu trauma. Ele costumava dizer: - “Melhor teria sido que eu tivesse ficado estendido, sem vida, lá no campo de batalha”.

Da localidade de Três Pinheiros chegou, a cavalo, o voluntário da pátria Cristiano Daniel Becker. O seu pai já fora à Guerra Cisplatina e esse fato o motivara para também seguir ao Paraguai. Em companhia do Becker vinham também Carlos Frederico Kellermann e Carlos Frederico Strassburg, dois primos-irmãos.

Chegaram também voluntários residentes na Boa União, destacando-se o furriel Johann Heinrich Beck que atuara no Serviço de Intendência do Exército. Em sua companhia estavam Andreas Gehrmann, marcado por cicatrizes dos muitos ferimentos recebidos e os irmãos Sparremberger, O Johann Wilhelm, o Johann Carl, o Heinrich e o Philipp que haviam atuado como artilheiros do 12º

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Regimento de Artilharia, o Boi de Botas, sob o comando do General Emilio Luis Mallet, o Barão de Itapevi.

Finalmente foi chegando o veterano de guerra August Sonntag, um imigrante brummer – prussiano - agora já com 63 anos de idade. Ele não era das famílias desta Colônia, pois viera somente após o final da Guerra a convite do pastor Voges para servir como professor na escola da comunidade e em vias de ser efetivado como professor da escola pública local.

Faltavam Carl Daniel Gross e Peter Feck que constavam da relação dos sobreviventes, mas ainda não haviam regressado ao lar. A família Feck estava feliz, pois haviam sido notificados que Peter se encontrava em Porto Alegre convalescendo no Hospital Militar. A informação recebida dava conta que Peter Feck passara por sérios contratempos, pois, por engano, fora incluído numa relação de desertores quando na verdade passara por sérios problemas de saúde advindos de ferimentos em combate. Estivera entre a vida e a morte, numa enfermaria de campanha, no Paraguai. Por este motivo ele decidiu permanecer em Porto Alegre para colocar sua situação a limpo e para receber o pagamento de soldos atrasados.

Os convidados, à medida que chegavam eram conduzidos até os primeiros bancos, diante do altar. O pastor cumprimentava um por um, para depois explicar: - “Fiz este convite a vocês para juntos planejarmos um culto solene, que oficiarei no próximo domingo, não só na qualidade de pastor, mas um pastor que é cidadão brasileiro” 3.

Em seguida Voges voltou a falar e perguntou: - “Quem de vocês conseguiu trazer e tem uma farda militar?

Todos levantaram o braço confirmando que haviam trazido a farda de gala com a qual, haviam desfilado em Porto Alegre, para a festiva formatura pública, depois do

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retorno ao torrão pátrio. Esta farda eles desejavam guardar como lembrança da atuação como Voluntários da Pátria.

O pastor foi concedendo detalhes sobre a liturgia do culto de Ação de Graças, dos cânticos e do momento memorial para os que pereceram na guerra. Voges disse: - O meu filho Adolfo Felipe durante o nosso culto fará uma chamada simbólica dos filhos desta Colônia que morreram e, vocês, em conjunto, responderão < PRESENTE! >, pois presentes em nossa memória, eles estarão, para sempre.

Estavam também presentes diversos ex-militares prussianos, destacando-se Christian Tietboehl – regente do coral e da banda – Wilhem Schmitt, entre outros. Diversos ainda mantinham a farda de militar prussiano e combinaram que também viriam fardados, para prestigiarem este culto especial.

FIGURA 1: Os veteranos Brummer também decidiram vestir suas velhas fardas e o capacete de agulha prussiano.

Fonte: Gravura dos arquivos do autor, 2010

Finalizada a reunião o pastor convidou todos, em particular os 10 voluntários da pátria, para um café na casa pastoral. Dona Elisabetha e Mãe Maria com muito carinho

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haviam preparado a longa mesa que estava sempre ao dispor no templo velho, e, agora, ornamentado com flores.

A conversa se prolongou por horas e invariavelmente girava em torno dos companheiros que morreram na guerra, das marcas e das cicatrizes, dos traumas e das dores. Muitos rostos e braços estavam marcados pelas cicatrizes e tantas outras marcas escondidas sob a roupa. O mais tristonho de todos era Carl Daniel Dahl que ficara “aleijado das partes”, como ele costumava dizer.

Ao cair da tarde, um a um ou em grupo, todos foram se despedindo, para rumarem de volta aos seus lares.

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UM EMOTIVO CULTO DE LEMBRANÇA DOS MORTOS

Finalmente raiou o dia tão esperado, do primeiro domingo da primavera de 1871.

Famílias provenientes de todos os recantos da Colônia vinham chegando ao templo. O recinto mostrou ser pequeno para tanto povo. Além disso, os primeiros bancos diante do altar estavam reservados para os soldados que haviam retornado da guerra e que aguardavam na casa pastoral para fazer uma entrada conjunta em companhia do pastor, para o início do culto.

A Banda de Música regida pelo ex-militar prussiano Christian Tietboehl estava colocada no lado de fora, junto à porta de entrada do templo. O regente bem como diversos integrantes estavam fardados, com seus vistosos dólmãs, com botões dourados e reluzentes. Alguns estavam espremidos dentro da farda que mais pareciam Dicke Würste - lingüiças rechonchudas. Para estes a farda com certeza já ficara apertada, fazia muitos anos...

Ao toque de uma marcha militar executada pela banda, o pastor, o seu filho Adolfo Felipe fardado, e os voluntários sobreviventes fizeram uma entrada solene. Os veteranos estavam com o uniforme azul do Exército Imperial, com seus dólmãs ostentando reluzentes botões dourados.

Os acordes da banda cessaram quando o pastor assomou o altar e fez-se um profundo silêncio.

Tratava-se de um culto bilíngüe, pois nem todos os presentes entendiam a língua alemã. O pastor quebrou o silêncio, declamando o salmo 76: A Majestade e o Poder de

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Deus. Em seu sermão ele falou sobre o alívio que sobreveio a todos com o final da guerra, ocorrido em março de 1870. Falou sobre a volta dos 10 voluntários, ali sentados e de mais dois Peter Feck e Carl Daniel Gross que ainda estavam sendo aguardados ansiosamente, pelos familiares e pela comunidade.

Chegou o momento mais emotivo da celebração. O pastor disse: - “Vamos agora lembrar dos filhos que não voltarão. Vamos fazer a chamada deles e vocês ouvirão <PRESENTE!>, pois presentes estão e sempre estarão, em nosso meio, em nossos corações e nas nossas mentes”.

Adolfo Felipe trajando o seu uniforme da Guarda Nacional de São Leopoldo, agora já ostentando o posto de major, passou a fazer a chamada solene. Inicialmente, porém ele explicou: - “Quero aqui lembrar que eu mesmo fui o encarregado de convocar, reunir e conduzir os voluntários da pátria desta Colônia, para seguirem até Porto Alegre, onde eles foram preparados e distribuídos nos diferentes contingentes. Eu os entreguei ao Comandante Militar da nossa Província. Agora, aqui estou, tocado por uma forte emoção, para chamar em alta voz, o nome daqueles que não voltaram”. Adolfo Felipe fez uma pausa breve e continuou falando: - “Coronel João Niederauer Sobrinho. Este não saiu daqui conosco, mas trata-se do primeiro filho homem nascido nesta Colônia e que já estava no Paraguai em combates, quando os nossos voluntários daqui seguiram, para levar reforços. Niederauer tombou na Batalha de Avaí, em 1868, aos 41 anos de idade. Chamo, portanto o Coronel João Niederauer Sobrinho...”.

- “PRESENTE!”, ecoou a voz dos voluntários, em uníssono.

E, na sequência, o major Voges foi citando os demais mortos na guerra: - “Tenente Johann Heinrich Hoffmann, gravemente ferido em combate e que morreu também aos 41 anos de idade. Philipp Peter Klein, morto em combate

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aos 24 anos de idade. Carl Klein tombou na batalha de Tuiuti aos 22 anos de idade. Christian Klein morreu em combate aos 22 anos de idade. Philipp Maschmann morreu em combate aos 24 anos de idade. Johann Jacob Mauer, morto em combate aos 34 anos de idade. Philipp Jacob Menger morto em combate aos 20 anos de idade. Michel Menger morto em combate aos 24 anos de idade. Friedrich Henze tombou na batalha de Tuiuti aos 26 anos de idade.

Depois de cada nome citado os voluntários presentes, em uníssono, diziam < PRESENTE >.

A Bandeira da Colônia de Três Forquilhas

Houve um fato que chamou particular atenção de todos os presentes. Havia algo diferente, nunca antes visto. Atrás do altar viam-se três bandeiras, no lado direito a bandeira do Império, no lado esquerdo a bandeira da Província e no centro uma bandeira desconhecida, pois todos sabiam que não era a da Comarca de Conceição do Arroio.

A curiosidade foi finalmente satisfeita quando, na sequência do culto, o pastor chamou a sua esposa, professora Elisabetha e Mãe Maria para recolherem a bandeira da parede e trazê-la até mais perto, diante do altar.

Enquanto elas seguravam o pano, o pastor passou a explicar os motivos nela representados, dizendo: “Apresento-vos, hoje, com satisfação a nossa bandeira da Colônia de Três Forquilhas. Ela foi bordada nestes últimos meses com a dedicação de minha esposa e mais Mãe Maria. Ela é feita em pano de linho branco. O branco representa a fraternidade, o entendimento entre as pessoas e entre povos. Afinal, sabemos que o branco representa, acima de

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tudo, a paz na terra, que todos almejamos. Vocês podem também observar os símbolos constantes do brasão: - A cruz branca plena simboliza a fé em Cristo. A trempe lembra além da hospitalidade, o trabalho tropeiro e a presença das mulheres. A guampa comprida, semelhante a um berrante, simboliza o anúncio de um novo tempo para todos nós, que desejamos participar ativamente da vida política em nossa terra. A carreta lembra o trabalho árduo dos colonos, que desde 1826 vem lutando pelo progresso desta nossa Colônia de Três Forquilhas. E, finalmente, as três lágrimas vermelhas, que lembram o sangue derramado por filhos desta Colônia que participaram das três guerras, da Cisplatina, dos Farrapos e do Paraguai, em sacrifício na defesa do solo da nossa Pátria”.

Finalizada a apresentação da bandeira, a mesma foi recolocada na parede, atrás do altar.

O culto continuou, com a execução de um cântico da comunidade, sob a regência de Christian Mauer, com o objetivo de preparar o público presente, para o sermão do pastor que viria na sequência.

O sermão que calou na alma

Todos aguardavam ansiosos, pelo sermão do pastor. Ele iniciou lendo as Bem Aventuranças, conforme o texto do Evangelho de Mateus 5, 3 – 12 e, depois, repetiu o versículo 9, falando lentamente: - “Bem aventurados os pacificadores...”.

Para introduzir a reflexão ele procurou situar os seus ouvintes, no motivo do culto e falou: - “Estamos reunidos neste solene culto para lembrar, em particular, dos nossos filhos mortos ou desaparecidos, da Guerra do Paraguai. Decidi realizar uma cerimônia bem simples, conforme uma situação destas recomenda, para não parecer que

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alimentamos a vanglória. Uma guerra tem dois lados em combate e, nos dois lados existe o horror de destruição e de mutilações, de vidas humanas ceifadas e das relações entre povos que ficaram estremecidas. Não vou aqui falar sobre a necessidade ou validade das guerras. Um único motivo nos chamou para cá. Desejamos lembrar dos nossos filhos mortos e desaparecidos, colocando em destaque, em, nosso meio, os filhos que puderam retornar ao lar... Filhos estes que necessitam do nosso carinho, respeito e compreensão. E, não posso esquecer dos familiares enlutados, que aqui estão desconsolados, aguardando pelas nossas orações e por palavras de consolo, em meio a tanta dor.

Somos seguidores de Jesus, nosso Senhor. E, como tais, o nosso propósito é de vivermos confiantes no Seu amor, desejosos por receber a orientação do Seu Evangelho, para nos mantermos ao Seu Serviço. Esse é o santo legado, vermächtnis: - Que sobre todo esse terrível evento da guerra, sobre o sangue daqueles que foram abatidos, os povos que estiveram envolvidos no conflito possam voltar a se estender as mãos em gestos fraternos, como filhos que todos são, do mesmo e único Pai de todos. Sim, somente assim as bem-aventuranças que Jesus pronunciou se estenderão sobre as nossas cabeças, em especial o chamamento aos pacificadores, pois são eles, os pacificadores, que são chamados de filhos de Deus.

Permitam que eu finalize com uma prece pedindo que Jesus, nosso Senhor, queira colocar a Sua Paz em nossos corações, nos corações de todos, seja aqui conosco, ou seja, com o sofrido povo paraguaio. Somente assim o nosso culto memorial pelos que tombaram nesta guerra se transforma num Memorial das Consciências, “Mahnmal der Gewissen”, para reconhecer que os nossos inimigos neste confronto bélico, eram nossos irmãos... E, para que Deus não nos acuse, como naquela hora em que ele inquiriu a Caim, perguntando: < Caim, onde está o teu irmão Abel? O sangue do teu irmão trucidado está clamando aos céus... >.

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Um profundo silêncio se fez no recinto do templo. O próprio pastor olhou em torno, sentindo este silêncio, e prosseguiu: - “Os nossos irmãos paraguaios, nesta hora, também estão chorando, com certeza... Estão chorando os seus mortos e desaparecidos...

O luto paira, não somente sobre nós... O luto paira igualmente sobre aqueles que foram os nossos inimigos neste confronto bélico. Digo por isto: - < Que Deus tenha piedade de nós e tenha piedade deles, dos paraguaios. Que a aurora da paz de Deus volte a aparecer e venha a lançar os seus raios de luz para dissipar as trevas, nas quais como vulto nos movemos. Chocados por tanta morte e tanta dor, necessitamos de consolo e de orientação de nosso Senhor Jesus Cristo para prosseguir >.

Pastor Voges fez sinal para que todos levantassem para a oração memorial.

Citou novamente cada soldado morto e os incluiu nas preces de intercessão.

Muitos dos familiares enlutados foram tomados pelas mais diferentes expressões de dor e pranto, desde gritos histéricos de algumas mulheres, dentre as quais se destacava a viúva Gross que pronunciava insistentemente o nome do filho Carl Daniel Gross que ainda não retornara da guerra. Mas também havia aqueles que no pranto silencioso, choravam a sua dor...

Finalmente sobressaíram os acordes musicais da banda.

O pastor e seu filho Adolfo Felipe foram até a porta de saída, para se despedir das pessoas, à medida que saíam. Aos poucos todos foram deixando o local e o silêncio voltou a reinar no local.

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A CHEGADA DOS CINCO BAHIANOS

Justo no dia em que se realizara o culto solene em memória dos filhos de Três Forquilhas mortos na guerra, chegavam ao vale cinco desertores e que ficariam conhecidos pelo apelido de bahianos.

Foi por questão de poucas horas que eles perderam toda aquela movimentação do povo que estivera presente ao culto.

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Os baianos vieram devagar. Fazia horas que eles iam pedindo informações aqui e ali, ao longo da estrada, no rumo para a sede da Colônia de Três Forquilhas. Perguntavam pelo major Adolfo Felipe Voges, o líder político do lugar. Os cinco estavam além de sujos e empoeirados também famintos e sedentos.

Quando chegaram ao endereço procurado, o major Voges ainda se encontrava de farda, atrás do balcão, conversando animadamente com alguns fregueses. Foi fácil identificá-lo...

O líder do grupo conhecido por Bahiano Candinho aproximou-se e em sinal de apresentação falou: - “Major, quero apresentar-lhe o meu grupamento. Somos Voluntários da Pátria do Ceará4 que não aguentaram a guerra... Escapamos dos campos de guerra, do Paraguai... Se nos pegam vamos presos, pois foi declarado que somos desertores...”.

- “Quem vos indicou o meu nome?” - quis saber o major.

- “Foi o Miguel Patrulha que era filho desta terra. Nós, que fomos dos poucos cearenses que não morreram de diarréia, de doença ou de frio, nós que sobramos com vida, fomos incorporados à companhia do soldado Patrulha. Lutamos lado a lado, até o dia em que ele caiu varado por uma lança paraguaia...” Candinho indicando para outro baiano postado ao lado explicou: - “Este aí é o Pedro, meu irmão... Ele amparou o Miguel Patrulha na hora em que morria... O moribundo ainda conseguiu recomendar que procurássemos o Major Borges, da Colônia dos Alemães das Três Forquilhas de Torres. Seguindo esta informação chegamos até aqui...”.

Pedro Baiano deu um passo à frente e falou: - “O Miguel Patrulha pediu para avisarmos o pai dele, chamado João Patrulha... Senhor major, será que o senhor pode nos

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dizer onde podemos encontrar esse tal João Patrulha, pai do nosso companheiro morto?”.

Major Voges examinou detidamente os cinco baianos. Teve uma boa impressão dos mesmos. Não pareciam ser covardes e nem maus elementos. Por isso ordenou: - “Vocês estão famintos e sedentos. Venham até o galpão, aqui do lado de meu Armazém para lavarem o rosto. Os meus peões vão servir uma refeição reforçada para vocês. Depois veremos, com calma, o que vocês farão...

Voges os deixou e foi até a sua residência para trocar de roupa. Depois de passada meia hora voltou ao galpão para atender os baianos que agora estavam com um aspecto bem melhor, depois de alimentados e saciados. O major foi inquirindo Candinho: - “Você falou que não aguentaram a guerra e fugiram? Como foi isso?”.

Candinho explicou: - “Nós Voluntários da Pátria do Ceará sofremos muito no Paraguai5. Vimos muitos dos nossos morrendo de frio, de doença e de diarréia. Foi feio de ver os nossos se finando, sem forças para viver. Não aguentamos continuar vendo essa situação e decidimos cuidar da nossa sobrevivência, pois não havia nem comandante e nem médicos que nos pudessem ajudar ou socorrer nessa penúria. Um dia daqueles quase no final da guerra, fomos embora, por nossa conta... Chegamos aqui para pedir a vossa acolhida, para que aqui possamos viver, caso puderem nos aceitar... Apenas o Pedro tem um dever a cumprir... Ele precisa procurar o João Patrulha, para dar o recado do filho deste lugar, que morreu nos braços de meu irmão...”.

Major Voges ordenou que Pedro e mais outros que quisessem ir até a morada do João Patrulha, voltassem a selar os cavalos, pois que no armazém estavam alguns serranos que iriam seguir naquele rumo.

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Vida nova para os cinco baianos

"Bahiano Candinho", o mais jovem dos cinco, é quem mais falava. Ficou claro que ele exercia uma forte liderança sobre os demais.

Candinho confidenciou ao Major Voges sobre a situação deplorável em que se encontravam na condição de desertores. Haviam fugido do campo de guerra e vieram se escondendo nos matos, viajando mais à noite, com receio de serem identificados por alguém. Acreditavam que nunca mais poderiam retornar para a terra natal, onde agentes do Imperador poderiam estar à espreita para prendê-los e condená-los a 200 chibatadas ou até ao pelotão de fuzilamento.

Candinho fez uma apresentação detalhada das aptidões de cada um. Ele próprio era especialista em atafonas6. Havia construído diversas atafonas, em sua terra natal. O seu irmão era perito em fabricar farinha e sabia lidar com gado. Já os primos José e João conheciam a lida de engenho, no fabrico de açúcar mascavo, conforme a prática nordestina. E finalmente, o Tonho, sabia fazer de tudo um pouco, particularmente o fabrico de carne de sol, de boa qualidade.

Major Voges avaliou as possibilidades de integração dos baianos, na vida da Colônia. Diversas famílias haviam perdido filhos nesta guerra. Os baianos bem que poderiam preencher essa força de trabalho que os braços daqueles teriam representado. Finalmente tomou uma decisão. Ordenou que dois ou três deles fossem até o Josaphat, na área da Serra do Pinto, para uma visita ao João Patrulha. Este precisava saber detalhes sobre como o filho lutara e da forma como morrera na guerra. Quanto ao "Bahiano Candinho", para ele haveria um trabalho bem especial: aperfeiçoar a atafona do patriarca e chefe espiritual da Colônia, o pastor Voges - pai do Major.

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Tonho imediatamente se dispôs a permanecer ao lado de Candinho. Já Pedro, irmão de Candinho, prontificou-se para seguir com os primos José e João até a morada de João Patrulha, no Josaphat, pois havia presenciado a morte do "Miguel" que, mortalmente ferido, amparado em seu braço, pedira: - "Avise meu pai, nas Três Forquilhas de Torres, que os paraguaios me vararam com uma lança".

Quando os baianos já saíam, o Major em tom de pilhéria sugeriu: - "Temos diversas viúvas, na Colônia, procurando por uma nova oportunidade de casamento. Se os senhores tiverem mesmo o plano firme de aqui se estabelecer e de viver com toda a dignidade, então nada melhor do que servir de arrimo para alguma viúva, necessitada de braço forte para cuidar de filhos, lavouras e propriedade".

"Bahiano Candinho" deu uma forte gargalhada, piscou um olho e acrescentou: - "Uma recomendação do major é uma ordem para nós".

Os cinco saíram dali certos de que teriam oportunidade para uma nova vida. Passaram a sonhar com a vida de colono ou de dono de engenho, na Colônia Alemã de Três Forquilhas.

Candinho e Tonho, hóspedes dos Becker

Os cinco baianos, saindo do armazém de Major Voges, separaram-se em dois grupos. Pedro, João e José subiram nas montarias, tomando o rumo do Baixo Josaphat em companhia de alguns serranos, para uma visita particular ao João Patrulha.

Candinho e Tonho mostraram-se indecisos. Que rumo poderiam tomar? Saíram caminhando, puxando os cavalos

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pelas rédeas. Talvez tivessem percorrido 100 metros quando tiveram a atenção despertada por um colono que parecia estar enfrentando dificuldades. Tratava-se de Jacob Becker que, sozinho, tentava consertar uma porteira. Candinho ouvindo o colono, praguejando em língua alemã, foi se achegando e finalmente ofereceu ajuda. O colono ficou surpreso tanto com a gentileza bem como com o sotaque do nordestino, mas sorriu, aceitando a ajuda dos dois. Viu a porteira recolocada, rapidamente, no devido lugar, pronta para o uso.

Os três ficaram então "proseando". Candinho mesmo encontrando dificuldade para se fazer entender explicou que recém fora contratado pelo Major Voges para "dar uma melhorada na atafona de pastor Voges". Havia, porém um pequeno problema. Onde poderiam encontrar hospedagem? Jacob Becker esclareceu que, nas proximidades, não  encontrariam nenhuma hospedagem. Mas, já que os dois haveriam de fazer um trabalho para o pastor Voges, então todo e qualquer colono haveria de dar-lhes acolhida. Ofereceu a sua propriedade, caso os dois não considerassem por ofensa a oferta para dormir nos galpões.

Esse encontro marcou a vida de Candinho e Tonho nesse vínculo com a família Becker que se tornaria sólida. Os dois baianos conheceram as irmãs de Jacob Becker, filhas de Heinrich Becker e Maria Christina Gross. Uma era viúva e outras duas, solteiras e cheias de amor para oferecer, em busca do homem dos sonhos.

Emprego e casamento para Baiano Tonho

“Baiano Tonho” surpreendeu os quatro amigos baianos, pois seria o primeiro a contrair matrimonio. Ele fora apresentado por Jacob Becker a uma irmã, viúva, que necessitava de um bom capataz ou um empregado, para

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ajudá-la na administração e cuidados pelas lavouras e propriedade agrícola.

A história dessa viúva era muito triste. Ela perdera o marido de forma violenta, morto por um empregado. Um tal de João Beriva aparecera na Colônia por volta de 1865 e vivia de biscates, trabalhando ora aqui e ora ali. Tornara-se um indesejado com fama de brigão. Carl Westphal apesar dos conselhos de bons vizinhos decidira contratá-lo. Porém Beriva, já na primeira repreensão por causa de um serviço mal feito, pedira briga. Westphal levou a pior. Foi retalhado com golpes de facão. Isto ocorrera em 03.03.1870.

Maria Catharina Westphal, nascida Becker, já estava, portanto a mais de um ano lutando com grandes dificuldades, para cuidar das lavouras. Estava difícil encontrar um bom peão e mais difícil ainda, de encontrar um capataz competente para lidar com os peões. Quando lhe foi apresentado o jovem “Baiano Tonho”, forte e saudável, ela não teve dúvidas. O contratou de imediato, pois lhe parecera um homem amável e trabalhador.

Maria Catharina ficara com sete filhos para criar. Coragem não lhe faltava. Com a ajuda desse baiano, o ânimo crescera, para novamente passar a produzir de tudo, até moer cana no engenho. Em poucos dias “Baiano Tonho” passara a morar sob o mesmo teto e logo em seguida a dormir na mesma cama, com a viúva.

Quando ela constatou estar grávida, pediu o baiano em casamento. Ela desejava que pastor Voges, lhes concedesse uma benção, por mais simples que fosse realizada na própria casa deles. O baiano concordou, com a maior satisfação.

Pastor Voges atendeu a solicitação. Entretanto, nada consta em seus registros, a respeito dessa união. Possivelmente “Baiano Tonho” não tinha o menor interesse para fornecer o seu nome verdadeiro, pois imaginava que

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ainda estivesse sendo procurado pelo Exército Imperial do Brasil, por causa da deserção dos campos de guerra, no Paraguai.

Desta forma “Baiano Tonho” se tornara colono, na sede da Colônia de Três Forquilhas, a aproximadamente 800 metros do templo protestante. Ele tornou-se benquisto por todos. Elogiavam o homem por ele ter assumido uma viúva com sete filhos. Mas em breve ele teria seus próprios filhos com a mulher.

O conceito dos baianos era bom, sendo vistos como homens trabalhadores, honestos e cumpridores da palavra empenhada.

Pedro Bahiano encontra um novo lar no Josaphat

Os baianos, Pedro, João e José, cumprindo ordens do Major Adolfo Felipe Voges, foram à procura da morada de João Patrulha, no Josaphat. Grande foi o alvoroço quando da chegada dos mesmos àquele destino.

O Velho Patrulha um serrano rude e “durão”, parecia fraquejar diante da forte emoção, de que ficou acometido, ao escutar o motivo da visita.

Façamos um pequeno parêntesis, para apresentar o dono da casa: O seu nome verdadeiro era Johannes Menger. Viera para aquela área no princípio da Revolução Farroupilha, enviado pelo Tenente Coronel Francisco de Paula Soares, integrando um grupo de soldados do Presídio das Torres, para patrulhar os caminhos e as trilhas do Josaphat, com a missão bem específica de dar um pouco mais de segurança às eventuais caravanas de comerciantes que, naquele período difícil entre 1835 e 1845, ainda tiveram a coragem de viajar. João Patrulha ali conhecera

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Maria Catharina Gross, filha de Jacob Gross, primeiro morador de origem alemã do Baixo Josaphat.

João Patrulha e Maria Catharina tiveram apenas um filho varão, o Miguel, que depois se apresentara como voluntário, para ir combater na Guerra do Paraguai. O casal teve também cinco filhas. Haviam decidido fixar morada, para sempre, naquele espaço tão ermo da Serra. João Patrulha tornara-se líder político (maragato) da área, vinculado ao Partido Liberal, sob o comando do Major Adolfo Felipe Voges.

Vamos retomar novamente o relato sobre a chegada de Pedro Bahiano ao Josaphat. Ele teve que contar, repetidas vezes, a mesma história. Cada vez que ele chegava ao ponto onde o soldado moribundo dizia - “Avise o meu pai, nas Três Forquilhas de Torres, que os paraguaios me vararam com uma lança”, o choro das mulheres se intensificava. Eram os gritos de dor daquela mãe que perdera, no Paraguai, o seu único filho varão, fazendo eco com o forte choro das cinco filhas. E Pedro Bahiano mostrava então o braço esquerdo, dizendo: - “Aqui segurei o Miguel Patrulha, ferido de morte”.

Finalmente, João Patrulha bateu com o taco das botas sobre o soalho, pedindo silêncio. Falou com voz forte e firme: -“Bahiano, hoje você trouxe, de volta para nós, um pouquinho do nosso filho Miguel. Por isto peço que você fique em nossa casa. Quero que fique como se meu filho fosse, já que o único que eu tinha, ficou sepultado lá no Paraguai”.

Pedro Bahiano não tinha mesmo para onde ir. Compreendeu que naquela hora a sorte estava sorrindo para o seu lado, com uma oferta tão generosa de um novo lar. Ele aceitou integrar-se à família Menger. Logo ficou enamorado pela Margaretha Patrulha e casaram.

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“Pedro Bahiano” declarou diante do sogro chamar-se Pedro Jovêncio Maria. Entretanto, o seu nome verdadeiro fora Pedro Pereira dos Santos, nascido na Província do Ceará, por volta de 1844, filho de José Pereira dos Santos e Rosa Maria dos Santos.

Que rumo tomaram João Bahiano e José Bahiano? Eles estiveram presentes, durante a visita ao João Patrulha, em silêncio. O dono da casa, entretanto, em seguida os encaminhou para a morada de vizinhos, onde também pudessem receber um lar e trabalho

Os baianos João e José também acolhidos no Josaphat

“Pedro Bahiano” parecia ser o mais feliz dos baianos. Recebera o lugar de braço direito do “João Patrulha”, assumindo a lida com a criação de gado, na propriedade do sogro. Passou a sair na condução de tropas, para negociar no mercado de animais de Vacaria. Alguns fazendeiros aproveitavam esse serviço de tropeiro e incluíam cabeças de gado para serem incluídas nos lotes e conduzidas aos mercados mais próximos. A profissão de tropeiro, na época, era bastante valorizada, concedendo aos “chefes das tropeadas” um bom retorno financeiro.

Entretanto os primos de Pedro, o João e o José não ficaram para trás. Também foram encaminhados para as casas de vizinhos, de “Lipio Fatas” e de “Rico Treis”, respectivamente. Vamos identificar agora esses dois vizinhos:

“Lipio Fatas” era o Joachim Brusch, nascido em 1833, filho de Johann Phillip e Sofia Brusch, instalados com criação de gado. Joachim em português é Joaquim. Ele casara em 07.05.1853 com Sofia Gross, uma irmã da esposa de “João Patrulha”. Portanto era, também, cunhado de

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França e Jacob Gross. As filhas e filhos costumavam chamá-lo de “Lipio Fatas”. Os vizinhos e estranhos também adotaram esse apelido, para identificá-lo. As filhas se dirigiam ao pai, chamando-o de “Lieber Vater”, o que significa “querido pai”.

João Bahiano7. fez sociedade com “Felipe Fatas”, (o filho primogênito de Joaquim). Passaram a se dedicar à criação de gado, no Josaphat. “João Bahiano” se apresentava como sendo João Rosa dos Santos, um nome falso.

Quanto ao José Bahiano, ele foi encaminhado para a morada de “Rico Treis”. Tratava-se de Heinrich Louis Georg Triesch. Os nomes tão complicados é que levaram o povo serrano a dar apelido aos imigrantes alemães e seus descendentes. Simplesmente não conseguiam guardar na memória e muito menos ainda de pronunciar tais nomes ou sobrenomes.

“Rico Treis” era casado com Catharina Fuhr e tivera 7 filhas e 3 filhos. As filhas “Teia”, “Jacoba”, “Bina” e “Barba” ainda bem jovens foram autorizadas pelos pais a fazer companhia aos irmãos na lida com o gado e na condução de tropas, pelos caminhos da Serra, rumo ao mercado de Vacaria. Eram, portanto “tropeiras” que cuidavam do preparo da comida, durante as andanças. Por isto, sempre conduziam “cargueiros” (mulas) carregados com trempes, panelas, chaleiras, charque, farinha, cuias e erva-mate.

“José Bahiano” se apresentava como sendo José Rosa dos Santos, um irmão de “João Bahiano”. Ele se uniu com “Bina Treis” ou Maria Felisbina Triesch,8 nascida em 1848, filha do “Rico”).

Os dois baianos João e José eram peritos no trabalho

de castração de animais. Passaram a prestar seus serviços aos fazendeiros da Serra e até mesmo para os colonos de

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Três Forquilhas. Viajavam munidos de instrumentos como a marreta de madeira, creolina e um preparado especial, uma pomada, feito com ervas e unto de porco, para tratar de eventuais feridas que fossem causadas durante o processo da castração de um animal.

A fama de Baiano Candinho

Com grande rapidez espalhou-se, através de toda a Colônia de Três Forquilhas, a fama de valente, do recém chegado "Bahiano Candinho".

O seu companheiro Tonho é quem contava histórias sobre a bravura dos soldados nordestinos,9 nos combates no Paraguai. Invariavelmente destacava a força e a coragem do amigo. Nos combates corpo a corpo é que Candinho teria mostrado a maior bravura. Com grande agilidade soubera enfrentar até quatro ou cinco inimigos, de uma só vez. Usava de preferência sua arma predileta, trazida do sertão do Ceará: - "um facão que mais parecia um espadão". Ele ia logo "abrindo uma clareira ao seu derredor", fazendo o inimigo recuar, em busca de refúgio, para escapar do massacre. Destacou que Candinho parecia ter o corpo fechado a tudo, fossem lanças, tiros ou golpes de espada. Nada conseguira ferí-lo.

Além dessas histórias, espalhou-se também a

novidade que dava destaque para outra de suas qualidades. Passou a ser conhecido como sendo "mestre de atafonas". Poucos colonos possuíam uma atafona. Por isto, essa habilidade não significava um real potencial para prestar serviços a alguém e muito menos para garantir-lhe o sustento. Serviu, porém para conceder-lhe um particular prestígio diante do líder espiritual da Colônia, o pastor Carlos Leopoldo Voges. Durante diversas semanas Candinho esteve trabalhando na reforma daquela atafona. Não só aperfeiçoou o funcionamento da mesma como ainda

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ensinou aos peões atafoneiros, da casa do pastor, a maneira correta de fabricar uma farinha de mandioca da melhor qualidade.

 

FIGURA 2: A velha atafona

FIGURA 3: O cevador

O contato de Candinho com o dia-a-dia da casa pastoral trouxe um toque sensível para a sua alma de sertanejo, de grande religiosidade. Não só passou a admirar

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o pastor, mas também a alimentar uma verdadeira veneração pelo carismático patriarca e líder espiritual dos colonos.

Sempre que convidado para fazer alguma das refeições na casa pastoral, ele fazia  menção de beijar a mão do pastor. Voges, porém com rapidez elevava a mão até a cabeça de Candinho e dizia: - "Deus o abençoe!".

Candinho costumava confidenciar aos amigos: - “Nunca esquecerei que meu primeiro dinheiro ganho aqui, veio da algibeira10 deste padre dos lemôns11”.

Tonho e Baianho Candinho seguiram caminhos diferentes. O primeiro se unira apressadamente com a viúva Maria Catharina Becker, assumindo a vida pacata e recatada de colono dedicado à família e ao trabalho da lavoura. Já o Candinho não demonstrava nenhuma pressa para "enrabichar-se" de forma definitiva, com alguma mulher da Colônia.

Quando da chegada à Colônia, ele teve um breve romance com "Tedéia Beca" (Maria Dorothea Becker), uma das irmãs de Jacob Becker, mas não resultou em casamento. Ele voltava para encontrá-la vez ou outra, mas, teve, ao mesmo tempo, diversas outras mulheres.

Candinho preferiu manter-se livre e descomprometido, não perdendo festas e nem bailes das redondezas.

 Espalhou-se o comentário de que inúmeras viúvas e

também moças solteiras da Colônia Alemã de Três Forquilhas suspiravam ao ouvir o seu nome e, mais ainda ao conseguirem ver o próprio Candinho, muitas delas sonhando casar-se com ele.

A VOLTA DE PETER FECK

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Ninguém consegue imaginar tudo o que se passa no íntimo e na mente de quem sobrevive a graves ferimentos em combates numa guerra. O tempo de tratamento e convalescença é, sem dúvida, um valioso tempo de reflexão e de preparação para o dia do retorno ao lar.

Peter Feck depois de muitos meses baixado no hospital militar de Porto Alegre e depois mais outros tantos meses morando na vizinhança da Capital, em casa de amigos que também retornaram da guerra, não podia se afastar da região, pois precisava colocar em ordem a sua situação junto ao Exército. Por algum engano ocorrido no Paraguai, seu nome constava do rol de desertores. Essa situação precisava ser esclarecida para habilitá-lo a receber os soldos atrasados, para regularizar sua situação financeira. Peter foi por algumas semanas, visitar amigos, ex-combatentes residentes em Taquara, em Rolante e São Sebastião do Caí. No vale do Caí conheceu uma mulher, com a qual teve um breve romance. Mais tarde as más línguas diriam que ele deixara um filho para trás.

Peter Feck teve êxito e todas as pendências finalmente foram solucionadas. Seu nome voltara a constar do rol dos valorosos ex-combatentes. Peter Feck saiu de Porto Alegre montado num belo cavalo que ele adquirira, trajando a sua farda de gala, azul, e a calça branca, de soldado do Exército Imperial. Chegou ao vale do rio Três Forquilhas todo garboso, peito estufado, com os botões metálicos de seu dólmã jogando reflexos quando em contato com os raios de sol.

Peter estava muito feliz... Vez ou outra apalpava sua bolsa de dinheiro, recheada de moedas sonantes, provenientes de soldos atrasados.

Chegando perto de sua morada, na altura do Sítio da Figueira esporeou o animal e se pôs a galope, batendo com o quepe nas ancas do animal.

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O cavaleiro entrou pátio adentro e fez o cavalo estacar de repente, levantado torrões de terra e poeira. Os cachorros fugiram ganindo e as galinhas entraram pelo bananal próximo, cacarejando. A casa parecia deserta, mais se assemelhava a uma tapera. Chamou algumas vezes pelos familiares. Finalmente apareceu um menino, assustado, espiando pelo canto do galpão. Era o sobrinho Pedrinho filho de sua mana caçula, casada com o sapateiro Serafim Flor da Silva. O menino ficava mais tempo com os avós já idosos, que já passavam dos 60 anos de idade para dar-lhes companhia. O recém chegado perguntou: - “Onde estão meu pai e minha mãe?”.

O menino prontamente respondeu: - “Estão na lavoura. Me deixaram aqui para dar atenção aos porquinhos nascidos faz poucos dias. São onze porquinhos e como sabes a porca só tem dez tetas. Preciso cuidar para que todos eles encontrem o alimento que necessitam...”.

Peter deu uma sonora gargalhada e comentou: - “Vivendo e aprendendo. Esse assunto é bom: - a porca tem só dez tetas, mas é capaz de gerar mais de dez porquinhos. É uma bela história que haverei de aproveitar no futuro...”.

Peter esporeou o cavalo e seguiu pela trilha da roça à procura dos pais. Estava ansioso para abraçá-los. Grande foi a alegria dos velhos. Voltaram abraçados ao filho desejosos de escutar as histórias que ele teria para contar. E Peter era um bom contador de histórias. Ele costumava destacar que o fato mais marcante na guerra fora a fome. Certa vez chegara a roer couro e comer ervas, para aliviar a dor, causada pela fome. Dizia também que tantas vezes pensava ter que morrer de fome, tendo o alimento bem próximo. Eram reses paraguaias soltas no campo. Todavia, os combates impediam uma trégua adequada para o abate de um animal e consequente churrascada. Lembrava que passou a ter raiva dos paraguaios, pelas dezenas de vezes que investiam, exatamente na hora da refeição. Na hora de

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carneação ou na hora de descansar, vinha o toque de avançar ou atacar, para repelir o inimigo.

Pedro Feck tornou-se um personagem central das Três Forquilhas, visto como um homem corajoso. Era o convidado especial nas comemorações de datas / cívicas. Diziam que a campanha do Paraguai o transformara em um homem muito resoluto, capaz de defender os interesses da Colônia, diante das autoridades. Tinha que ir constantemente a Conceição do Arroio (Osório), fazendo a vez de advogado, para defender diante das autoridades os anseios de algum colono.

Contam que certa feita estava ele em Osório, por causa de uma questão de terras. Chegado a um restaurante, onde trataria do problema, encontrou os servidores da justiça, almoçando. Ele estava sem refeição desde o desjejum, que fora em plena madrugada. Ninguém, porém o convidara para reunir-se a mesa. Finalmente um dos chefes dirigiu-lhe a palavra, querendo saber: - "Quais são as novidades em Três Forquilhas?". Ele então respondeu: - "Uma porca deu cria, concebendo 11 filhotes". Alguém junto à mesa, que entendia de lavoura e de criação, concluiu: - "Mas isto é grave. Com certeza um vai morrer de fome?" E Pedro Feck teria então completado, dizendo: - Com certeza. “O coitado é como eu". Houve uma gostosa gargalhada. Foram dadas ordens: - "Tragam mais uma cadeira!

Foi servido então do bom e do melhor para o esperto veterano da Guerra do Paraguai.

O RETORNO DO “PARAGUAIO GROSS”

Muitas surpresas estiveram reservadas para o povo do vale do rio Três Forquilhas, com a chegada dos sobreviventes da guerra. O último a voltar, o veterano Carl Daniel Gross, foi, certamente, quem causou o maior impacto, pois já fora tido como morto até pela própria mãe.

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A Colônia viu-se surpreendida com a notícia que “Paraguaio Gross” voltara. O que mais chamara a atenção é que ele viera com uma índia paraguaia na garupa de Hidalgo, o seu belo cavalo paraguaio. Uma jovem mulher de cabelos negros e longos, trajando um vestido colorido e um lenço de seda esvoaçando ao vento.

FIGURA 4: O Paraguaio Gross com uma Índia ParaguaiaFonte: Gravura dos arquivos do autor, 2010

Nas casas comerciais era repetida a história: - “A mulher veio na garupa. Com uma mão ela se segurava na cintura do cavaleiro e com a outra segurava uma corda puxando uma égua chamada Milonga carregada com mochilas e pertences que a índia fizera questão de trazer consigo. Ao lado de Hidalgo e Milonga vinha Valente, um cachorro velho, marcado por muitas cicatrizes colhidas durante os combates. Vallente vinha com a língua pendente, estropiado, parecendo sentir o rigor da longa jornada. Mas era um cachorro fiel, que se dedicara ao dono, e não quisera ficar para trás”.

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Grande foi a confusão na propriedade dos Gross, quando este casal entrou porteira adentro. Foi muita correria, gente vindo de dentro da casa e dos galpões para ver o espetáculo. Crianças, mulheres, homens e peões falavam todos ao mesmo tempo, enquanto a cachorrada latia sem parar vendo aquele cão intruso e desconhecido se esgueirando e finalmente, Valente se larga exausto, sobre o gramado.

A mãe idosa e chorosa foi a primeira a reconhecer o filho e gritou: - “É ele!”. Em seguida ela colocou-se de joelhos, levantou os olhos aos céus e clamou: - “Obrigado, meu Pai do Céu, pois hoje me devolves com vida o filho que eu pensara que estava morto”.

O jovem fardado apeou do animal, ajudou a sua companheira a descer também, entregou as rédeas para um peão e aproximou-se de mão estendida para a mãe, fazendo-a levantar-se do solo. A velha chorava agora com lágrimas soltas. Abraçou longamente o filho até que, de repente, volveu os olhos para a índia paraguaia que com ele chegara.

- “Quem é essa! - quis ela saber.

E o filho tomado pela emoção falou: - “Esta é um anjo dos céus que me livrou da morte, quando eu estava estirado no campo de batalha de Avaí”.

A mãe foi até a índia, tomou-a carinhosamente pela mão e a beijou no rosto.

- “Venha, vamos entrar em casa” - disse a viúva, tentando estabelecer um diálogo. Mas a índia só dominava bem a língua guarani e um pouco do castelhano. A língua portuguesa lhe era ainda estranha e muito mais ainda a língua alemã, que a velha utilizava para falar.

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Carl Daniel pegou então a índia pelo braço e a conduziu delicadamente para dentro de casa. Antes de passar pelo umbral da porta ele gritou ainda para os familiares e peões reunidos no pátio: - “Parem com essa zoeira, que depois de um bom descanso, volto para contar sobre tudo o que vivi e sofri nestes tempos de guerra, no Paraguai”.

Gross, ferido gravemente na Batalha de Avaí

Carlos Daniel Gross, depois de descansar, contou e voltou a repetir inúmeras vezes à história de como fora ferido gravemente a batalha de Avaí. Relatou que, mesmo socorrido pela índia paraguaia, estivera por diversos dias entre a vida e a morte.

Carl Daniel teve que contar detalhes sobre a longa guerra. Falou dos combates dos quais participou, Atuara na Cavalaria comandada pelo General Osório e sob as ordens diretas do Coronel João Niederauer Sobrinho, e dizia: - “Acredito que o combate mais difícil foi o de Itororó, ocorrido no dia 6 de dezembro de 1868, quando o próprio Duque de Caxias, o chefe de todas as nossas forças estava ali conosco. Depois de investidas repetidas de nossos soldados, sem êxito, ele mesmo, o Duque em pessoa, o que ele fez? Ele tomou a frente e comandou a investida decisiva para nos dar a vitória...”.

Carlos Daniel Gross relatou detalhes sobre aquela que viria a ser a sua última batalha, em Avaí: - “Integrei um dos esquadrões, que recebeu a missão de flanquear a posição paraguaia. Foi uma investida frustrada, na qual muitos ficaram fora de combate, feridos ou mortos, atingidos por canhonaços ou subjugados a golpes de lança. O terreno ficou juncado de feridos e de cadáveres de soldados brasileiros...”.

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Gross continua o seu relato: “Fui abatido por lançaços e, fiquei estirado num ponto distante, numa curva da estrada, por onde havíamos tentado flanquear os paraguaios. Não conseguimos surpreendê-los. Quase todos os companheiros do meu pelotão estavam mortos. E eu, estava numa terrível agonia entre a vida e a morte... O ruído dos combates cessara, finalmente... O silêncio incomodava... Ouvi então o trotear de dois cavalos. Vislumbrei a figura do meu comandante, o Coronel João Niederauer, acompanhado por dois ajudantes de ordens, avançando e parando para escutar, examinando os corpos inertes, em busca de algum ferido e sobrevivente... Vi quando um soldado paraguaio ferido foi se arrastando por entre os arbustos, à espreita do meu coronel... Tentei me mexer e não consegui... Tentei gritar para alertar o comandante, mas a voz permaneceu presa em minha garganta... O coronel continuou avançando e quando estava a dez passos do paraguaio escondido, este saltou repentinamente por entre os arbustos e reunindo as forças arremessou uma lança contra o chefe... O coronel foi surpreendido... Não conseguiu nem esboçar um gesto sequer para se desviar da lança. A mesma o atingiu, um pouco abaixo da fivela perfurando-lhe o ventre. Em reação imediata um dos acompanhantes do nosso comandante, abateu o paraguaio com um tiro certeiro no coração. Somente meses mais tarde eu soube que a ferida no ventre de Niederauer foi muito grave e que ele veio há morrer três dias depois...”.

A curiosidade dos ouvintes era grande. Ninguém falava. Todos escutavam com muita atenção. E Gross continuou no relato a respeito da emboscada em que o seu chefe fora abatido: - “Em poucos minutos surgiram, à galope, diversos soldados brasileiros, alertados pelo tiro. Deviam estar preocupados em levar auxílio e proteção ao chefe e comandante. Vi toda a movimentação que se seguiu... Vi que transportaram o nosso comandante ferido, às pressas. em busca de socorro médico... Tentei novamente me mexer, tentei gritar para dizer que eu

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também necessitava de ajuda urgente, mas meu corpo não me obedeceu...”.

Gross contou que pareceu uma eternidade o tempo que em ele ficou ali entre momentos de lucidez, de torpor e de inconsciência. Em certo momento sentiu a língua quente de Valente, o seu cachorro, que em lambidas suaves nas faces tentava reanimá-lo... Afinal este fiel amigo também estava com feridas feias, na cabeça e na paleta, mas não morrera... Algum paraguaio com certeza acertara Valente com pontaços de lança ou com bordoadas, mas ele resistira aos ferimentos.

Gross contou que Valente ajudara para que se reanimasse um pouco, mas não conseguiu se mexer. Estava com muita sede e passou a sentir fortes dores, proveniente de alguns ferimentos mais profundos, em seu peito. Em determinado momento notou o vulto de uma pessoa se esgueirando por entre os arbustos... Imaginou que poderia ser um paraguaio ferido, sobrevivente do combate... Valente começou a rosnar. A pessoa ficou parada por um instante, mas logo passou a se aproximar novamente, para examinar o corpo ali estendido. Por algum motivo o cachorro foi se aquietando permitindo que a pessoa chegasse até o ferido.

Gross contou que viu então nitidamente o rosto de uma mulher, uma mulher bem jovem, cabelos longos e pretos e as feições de índia paraguaia. Ela estava ali percorrendo o campo de batalha à procura de seu pai e seus irmãos, que ela temia, podiam estar feridos ou até entre os mortos.

E Gross enfatizou: - “A índia colocou-se ao lado do meu corpo e me examinou atentamente. Ela notou que eu ainda respirava... Ela me contou mais tarde, que eu gemia... Ela não falava nossa língua, apenas um pouco do espanhol além da língua materna dela, a língua dos índios guaranis...”. Gross continuou falando: - “Ela afastou-se um pouco do local onde eu estava deitado e deu um assovio

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insistente e contínuo, como para dar um sinal para alguém. Não demorou muito apareceu ali um menino de uns 14 ou 15 anos de idade, segurando um cavalo pela rédea. A índia falou na língua guarani, dando ordens ao menino. Este olhou inicialmente assustado para mim, mas obedeceu. Pegou um facão que estava nas mãos de um paraguaio morto e veio caminhando... Passou perto de mim e seguiu até um arbusto mais alto... cortou dois fortes galhos, trazendo-os para a irmã. Esta depois de tirar dois casacos de paraguaios mortos improvisou uma padiola. Em seguida me colocou sobre a mesma, fixou uma ponta dessa maca improvisada, na sela do cavalo com o objetivo de me arrastar com cuidado... Ela tomou a direção da estância da família...”.

Gross contou que por diversos dias ele permaneceu entre a vida e a morte, delirando, com febre e convulsões. Nas horas de lucidez ele chamava pela mãe. Pedia que ela viesse para ajudar e aliviar as dores e tratar das feridas infeccionadas. Ele guardara na memória aquele vulto de mulher, que cuidava das feridas, e lhe dava xaropadas de ervas medicinais. Aos poucos o seu organismo reagiu e foi melhorando...

Contou que quando a jovem constatou que Gross já apresentava condições para montar ela decidira conduzi-lo até o acampamento brasileiro mais próximo.

Gross finalizou: - “Grande foi a surpresa de todos, no Hospital de Campanha do nosso Exército, vendo uma índia paraguaia trazendo um inimigo ferido, para ser socorrido por eles. Permitiram que ela continuasse ao meu lado, enquanto eu podia me restabelecer e convalescer das graves feridas...”.

Abela Delore apreciava cavalos

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Carl Daniel Gross, quando ainda no Paraguai, enquanto fazia planos sobre o seu retorno ao Brasil, ouviu que Abela e seu irmãozinho desejavam acompanhá-lo. Recebeu a notícia com satisfação, pois que ele se afeiçoara muito à paraguaia e dizia a si mesmo: - “Ela me salvou da morte e tem cuidado de mim com tanto desvelo, de modos que minha vida agora lhe pertence. Já nem sei mais o que seria viver sem ela... Será isso amor?”.

Quando começaram a fazer os preparativos para a viagem ao Brasil, Abela sugeriu que levassem alguns cavalos que seu pai e seus irmãos haviam escondido em lugar seguro.

Os antepassados de Abela haviam sido estancieiros prósperos, dedicado à criação de cavalos. A mãe de Abela morrera no princípio da guerra. Em seguida, o pai e os irmãos foram convocados para se apresentarem ao Exército de Solano Lopes. Antes de partir, o pai, comunicou que os cavalos da estância haviam sido requisitados pelo exército. Assim sendo ele teria que levá-los. Porém esconderia alguns animais. Ele escolheu o seu cavalo predileto, chamado por Hidalgo. E o filho primogênito do estancieiro, tinha uma égua muito linda, chamada Milonga; também desejava preservá-la para com ela iniciar uma nova manada, no futuro, quando terminada a guerra. Os demais irmãos apartaram mais quatro éguas, escondendo todos esses animais num refúgio de uma invernada de difícil acesso, em meio aos morros.

Quando Abela e o irmãozinho, apelidado de Pepito decidiram acompanhar Gross, foram buscar esses animais, para levá-los para iniciar uma manada na nova terra.

A viagem ao Brasil foi muito lenta... Gross precisava

fazer paradas demoradas para descansar, uma vez que o seu corpo ainda estava fraco, pois que se encontrava em estado de pós-convalescença.

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Chegando a Santa Maria, Pepito começou a ficar intranqüilo. Falou para a irmã de que não estava gostando das terras brasileiras e desejava retornar para a sua estância, no Paraguai.

Gross e Abela falaram e insistiram que ele os acompanhasse até o vale do rio Três Forquilhas, mas não havia argumento que o convencesse. Vendo que nada o fazia mudar de idéia, Gross então sugeriu que vendessem três das éguas para que o menino tivesse um mínimo de recursos para cuidar de sua sobrevivência. A irmã ensinou-o de como devia proceder para que ninguém desconfiasse que ele estivesse com tantas moedas. Devia portar um pouquinho de dinheiro, de modo visível, acondicionado num saquinho pendurado na cintura. As demais moedas deviam ser mantidas escondidas, dentro do alforje, preso debaixo do pelego.

Quando o menino se despediu, Abela caiu em prantos. Chorando sempre, abraçou Pepito, rogando a Deus para que o protegesse no retorno e no futuro. O último elo de sangue, da família Delore, estava se rompendo e Carlos Daniel Gross ficou parado, olhando compadecido, sem nada poder fazer ou dizer, para consolar Abela.

A viagem rumo à Colônia de Três Forquilhas foi retomada.

Gross vendo a tristeza de Abela, perguntava tentando falar em espanhol: - “¿Qué sucede en tu mente?”.

E ela sempre concedia uma e mesma resposta: - “Mis pensamientos están con Pepito, mi pequeño hermano”.

Gross aproximava-se de Abela em silêncio e a enlaçava com seus braços, demoradamente, pois não tinha outro remédio para oferecer.

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Finalmente chegaram a Três Forquilhas, conforme já tivemos a oportunidade de relatar.

Assim que Carlos Daniel se recompôs da longa jornada, passou a cuidar de detalhes para organizarem a vida e principalmente para logo iniciarem a criação de cavalos. Haveria de adquirir mais algumas éguas, para compensar a perda daquelas que ele vendera em Santa Maria no propósito de ajudar Pepito.

Abela gostava de cavalos e da lida diária para cuidar deles. O que mais satisfação lhe trazia era de ajudar uma égua prenha na hora do parto e depois, de cuidar daquela cria nova, para vê-la saltitar e se desenvolver.

Carl Daniel mandou construir um galpão novo com dois estábulos. Pediu a ajuda de todos os seus familiares da numerosa família Gross bem como o apoio dos cunhados. Era costume, na época, haver um mutirão12, cada vez que alguém construía uma casa ou galpões, fato que representava uma grande economia, sem a necessidade de pagar pela mão de obra. Assim não faltaram braços nas diferentes frentes de trabalho que foram organizadas.

Paraguaio Gross dá emprego ao Baiano Candinho

Os irmãos Johann Philipp Gross e Wilhelm Gross moravam nas mesmas terras que haviam pertencido ao pai deles, o imigrante e carpinteiro Philipp Peter Gross. Por este motivo os dois foram os primeiros voluntários e os mais dispostos para ajudar o irmão que ao retornar recebera o apelido de Paraguaio Gross.

Os cunhados também não queriam ficar para trás. O velho João Patrulha Menger, casado com a Maria Catharina Gross mandou seu genro Pedro Baiano para prestar ajuda. O

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cunhado Martin Brehm, um ex-militar prussiano, casado com a Anna Magdalena Gross veio pessoalmente da Boa União disposto a dedicar uma ou duas semanas de trabalho, caso fosse preciso. Da localidade conhecida por Bananeiras veio o cunhado Joachim Brusch que era casado com a Sofia Gross. Da localidade de Morro do Chapéu que ficava ali pertinho, veio Carl Rieckroth outro ex-militar prussiano, casado com a Catharina Elisabeth Gross. Da sede da Colônia veio o sobrinho Jacob Becker, filho da Maria Elisabetha Gross e Heinrich Becker. Este sobrinho trouxe diversas e boas ferramentas para ajudar no trabalho. No entanto, a ajuda mais preciosa certamente foi oferecida pelo cunhado e competente mestre pedreiro açoriano José Pereira de Souza, casado com Maria Cristina Gross.

Os vizinhos passaram a fazer comentários de humor e de brincadeira, dizendo: - “Homem que quer casar precisa ter casa. E você paraguaio, com tantos braços ajudando, logo poderá casar...”. Faziam então referência aos comentários que corriam através de toda a Colônia de que o Paraguaio Gross até já tinha a data de casamento marcada com o pastor Voges.

A verdade é que Gross realmente tinha pressa para casar com a índia paraguaia Abela Delore que lhe salvara a vida. Desejava deixar a propriedade bem organizada, até o dia do casamento. Um problema aparentemente simples estava lhe tirando o sono. Dizia que não encontrava um capataz competente em condições de comandar os peões que ele contratara. Conversando sobre a preocupação com o sobrinho Jacob Becker este tranqüilizou o tio Paraguaio e sugeriu: - “Por que o tio não contrata o Baiano Candinho? Esse homem é de bom caráter, muito trabalhador e sabe ser enérgico, quando necessário. Tenho certeza que esse Baiano tem tudo para ser um bom capataz...”.

Paraguaio Gross entendeu que valia a pena verificar essa possibilidade e cavalgou até a sede da Colônia para

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procurar pelo Candinho. Sabia que o mesmo ainda estava hospedado no galpão dos Becker.

Conversa vai e conversa vem, o Paraguaio lança uma proposta: - “Preciso de um bom capataz para comandar os peões que contratei. Estou disposto a pagar bem. Preciso com toda a urgência que seja feita uma cerca de taipa de pedra num trecho de minha propriedade, para demarcar o meu potreiro e pastagens. Abela e eu pretendemos nos dedicar à criação de cavalos. Trouxemos um bom reprodutor, do Paraguai, o Hidalgo que foi o garanhão predileto do pai de minha noiva. Trouxemos também uma bela égua, a Milonga. Preciso conseguir mais algumas éguas... Meu irmão França me prometeu uma, que ele tem nos pastos ali no Baixo Josaphat. Teu irmão o Pedro Baiano também ficou de conseguir um bom animal, em Vacaria, na próxima tropeada quando ele irá até Vacaria, do cima da Serra.

Baiano Candinho surpreendeu quando prontamente respondeu: - “Aceito o emprego de bom grado, pois, afinal, preciso com urgência ganhar dinheiro, para também organizar a minha vida. Além disso, gosto muito de cavalos e poderei dar-lhe apoio. Também sou um mestre para fazer cercas de taipa de pedra. Me comprometo a ser o seu capataz por 12 meses, pois não quero ficar amarrado num compromisso por muito tempo. Amo a liberdade, para me governar... E preciso de liberdade”.

Na mesma hora Candinho juntou seus poucos pertences, selou o cavalo e acompanhou Paraguaio Gross. Ele, no entanto, não disse, por mera discrição, que estava desejoso para distanciar-se um pouco mais da propriedade dos amigos Becker que tanto já o haviam ajudado. A Tedéia Becker, irmã de Jacob, estava dando em cima de Candinho desejosa para casar. E ele não queria ainda um relacionamento sério e muito menos um casamento.

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Quando Candinho se encontrava com o seu mano Pedro, ele costumava desabafar: - “Tenho dó do primo Tonho Baiano que casou com aquela viúva com a casa cheia de filhos, aquela irmã de Tedéia. Já descobri que essas mulheres Becker prendem demais os seus homens. Veja o coitado do Tonho que é obrigado a ficar na lavoura desde o amanhecer até a noite chegar. Isso não é uma escravidão? Eu quero mais é liberdade. Não quero mulher que queira me ditar ordens ou me impor algum tipo de trabalho”.

Pedro Baiano concordava e respondia: - “Eu é que sou um homem de sorte e feliz. Tenho toda a liberdade que poderia querer, pois sou um tropeiro igual ao meu sogro João Patrulha Menger. Quando canso de ficar em casa, surge uma tropeda até Vacaria e às vezes para Passo Fundo e Cruz Alta. Ficamos durante semanas nos campos e pelas estradas. Quando volto sei que a prisão de minha casa é bem vinda, e estou ansioso para deixar minha mulher dormir em meus braços”.

Candinho, ao escutar essas conversas do irmão, sonhava em também encontrar algum dia desses uma tropeira ou uma filha de algum tropeiro, para estabelecer uma feliz união e para colocar filhos no mundo.

Um casamento diferente

Grande foi a movimentação na casa de Carl Daniel Gross, nos preparativos para o casamento. Os irmãos ajudaram a preparar um altar improvisado junto às taquareiras. As mulheres trouxeram flores silvestres e enfeitaram o local. Parecia agora um recanto florido.

O pastor gastara muitas horas organizando a sua fala, nos dias que antecederam o especial momento. Sabendo que a índia não entendia a língua alemã e poucas

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palavras da nossa língua nacional, optou por utilizar, em alguns momentos, frases em espanhol.

Abela Delore escolheu para testemunhas o casal Manoel Santos e esposa. Carlos Daniel convidou o Major Adolfo Felipe Voges e esposa.

O noivo solicitou o comparecimento do maestro Christian Tietboehl que organizou um pequeno grupo de canto. Foram integrados Carl Mauer e filhas, Adam Martin Bobsin e esposa, Christian Eberhardt e esposa, Bárbara Schmitt, esposa de Wilhelm Schmitt e Pastor Voges e esposa. Tietboehl fazia, nessas ocasiões, um acompanhamento musical com a sua flauta.

A cerimônia foi breve e já todos se aproximaram do galpão novo e estábulo, bem limpos onde os convidados permaneceram conversando animadamente, esperando pelo churrasco. Formaram-se dois grupos distintos. No grupo menor destacava-se a presença de pastor Voges e esposa, além de Wilhelm Schmitt e esposa, Christian Tietboehl e esposa, Wilhelm Brehm e esposa e o meio irmão Friedrich Philipp Nicolaus Schütt, que era afilhado de Philipp Gross. Também estavam ali Christian Mauer e família, Peter Feck ainda solteiro e mais alguns curiosos. Em outro ponto encontrava-se o Major Adolfo Felipe Voges e o noivo Paraguaio Gross, tendo em volta o pedreiro José Pereira de Souza e filhos, Baiano Candinho, Pedro Baiano, João Patrulha, Carl Rietgeroth, Jacob Becker, França e Jacob Gross, o professor Serafim Agostinho do Nascimento e outros familiares do noivo, irmãos e sobrinhos. Também estava ali o velho Miguel Barata, de cabelos brancos, com seus mais de 70 anos de idade, adoentado e queixoso, sofrendo de reumatismo e de outras dores do corpo e da mente.

A noiva saíra discretamente com a sogra, dizendo que iriam ver os preparativos das mulheres, na cozinha.

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No primeiro grupo Wilhelm Schmitt liderava a conversa, sempre cheio de novas idéias para comentar e, logicamente, falando em língua alemã. Desta vez passou a comentar sobre sua insatisfação com a situação da comunidade protestante, dizendo: - “Não me agrado dessa mistura racial que prolifera a olhos vistos.

Pastor Voges logo notou que estava sendo pressionado, mas sorriu e manteve silêncio.

Wilhelm Schmitt continuou: - “A nossa igreja precisa de orientação mais firme, para incentivar as nossas famílias alemãs para que preservem nossa raça, língua, costumes e cultura”.

Pastor Voges, de modo benévolo, apenas sorriu em postura de quem escuta com atenção. No entanto, o professor Christiano Tietboehl reagiu, dizendo: - “Não consigo acompanhar o pensamento do nosso amigo Wilhelm Schmitt. Sou professor e lido com as crianças e com as famílias de alunos. Penso que precisamos inserir nossa gente na realidade nacional... As crianças precisam dominar a língua da nossa nova Pátria para que lhes sejam dadas as possibilidades de encontrarem um lugar na vida política e social brasileira”.

Wilhelm Schmitt olhou o interlocutor com espanto, pois esperara que viesse uma reação da parte do pastor Voges. Mas não imaginara que o maestro e professor Tietboehl viesse tomar a frente na discussão.

O maestro Tietboehl continuou: - “Sou de opinião que ninguém consegue segurar essa miscigenação em marcha e por isso dou os meus aplausos ao nosso pastor que, já deve fazer muitos anos, utiliza momentos de culto bilíngue em nossa igreja, principalmente em dias de festa. E outro procedimento importante de nosso pastor é o fato de ele ter trazido para esse nosso interior o professor Serafim Agostinho do Nascimento, um competente mestre formado

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na Capital do nosso Império, para garantir aos nossos filhos um bom ensino em nossa língua nacional, sem terem que sair daqui para isso”.

Pastor Voges fez discreto gesto de aprovação e, em dado momento, procurou desviar o assunto da discussão que Wilhelm Schmitt levantara. Apontando para o ferreiro Wilhelm Brehm, postado num canto, perguntou: - “Vejo que o nosso ferreiro Brehm está aqui... Parece-me que ambos Wilhelm, tanto o Wilhelm Schmitt bem como o Wilhelm Brehm, tem diversas aptidões em comum...”.

Wilhelm Brehm sorriu satisfeito com a menção do seu nome. Já Schmitt olhou surpreso para o pastor e reagiu, dizendo: - “Eu não sou ferreiro... Sou um artista em ouro e couro... Pelo que sei o Brehm só entende de malhar ferro em brasa sobre sua pesada bigorna...”.

Voges sugeriu: - “Quem sabe vamos uma vez escutar o Brehm. Ele tem histórias lindas e interessantes sobre a aprendizagem que ele teve junto ao padrasto, o armeiro militar Friedrich Schütt....”.

Brehm puxou uma banqueta e tomou lugar ao lado do pastor, disposto a entrar nessa conversa. Já Schmitt curioso disse: - “Olhem só, o ferreiro teve um mestre que era armeiro militar Parece que esse armeiro tinha algo em comum comigo...”.

Pastor Voges sorriu, satisfeito, ao notar que um novo rumo de discussão estava garantido.

Ferreiro Brehm, encarando Schmitt de frente, explicou: - “O meu padrasto aperfeiçoou os conhecimentos de armeiro na Inglaterra, ao servir no 15º Regimento de Cavalaria Leve. Até inglês ele sabia falar... Mas aqui na Colônia nunca encontrou alguém com quem pudesse manter uma conversação...”.

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Brehm fez uma pequena pausa para observar seus ouvintes, em particular, encarou mais uma vez Wilhelm Schmitt de frente e continuou: - “Meu padrasto sabia derreter metais, fazia moldes de argila e fabricava as suas peças de reposição para consertar pistolas e espingardas, dos colonos de Três Forquilhas. Traziam armas até do Baluarte Ipiranga, no começo de nossa Colônia, enquanto o Coronel Paula Soares lá mandava. Meu padrasto falava às vezes de assuntos bem complicados quando tentava nos contar de que ele era um iniciado em alquimia... Mas a cultura dos colonos não chegava até aí, para ele poder explicar melhor os conhecimentos que ele adquirira na Inglaterra. Acredito que todos aqui sabem muito bem, ele foi o primeiro ferreiro de Três Forquilhas, pois aqui chegou antes do Natal de 1826 atendendo o apelo do comandante Philipp Peter Schmitt. O meu “papai ferreiro” trouxe com ele a minha mãe e mais eu e meu irmãozinho. Eu disse papai ferreiro, pois ele foi um bom pai para mim, me criou e educou para fazer de mim o que hoje posso ser aqui na Colônia...”.

A curiosidade de Wilhelm Schmitt era visível. Com grande atenção acompanhava agora esse relato. E o ferreiro continuou: - “O meu padrasto nos ensinou que a água do tonel de ferreiro tem poderes curativos. Essa água onde o ferro em brasa é esfriado serve para tratar de certas doenças da pele e até para eliminar verrugas. Os mais velhos contam que papai Schütt eliminou verruga de muita gente...”.

Wilhelm Schmitt não se conteve e reclamou: - “Não quero acreditar que o ferreiro Schütt prestou-se a alimentar a superstição do povo. Ele devia saber que a simples água de um tonel de ferreiro não possui poderes para eliminar verrugas e menos ainda serve para tratar de doenças da pele. Isso que ele fez não tem aceitação científica e não resiste ao raciocínio normal de qualquer um, mesmo que não tenha os mínimos conhecimentos sobre a medicina...”.

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O professor Cristiano Tietboehl interveio e sugeriu: - “Será que não é interessante escutarmos a história do ferreiro Brehm? Outro dia ele me falou sobre o modo como o padrasto dele tratava de feridas abertas, que vertiam sangue, provenientes de corte de facão, foice ou machado...”.

- “É verdade”, disse Brehm. “Meu padrasto muitas vezes foi procurado por pessoas que traziam alguém gravemente ferido, para dar um jeito de estancar o sangue. Ele fazia uso de um ferro em brasa e dizia que isso logo ajudava também a evitar uma infecção...”.

Schmitt interrompeu o relato e comentou: - “Isso não é novidade. Trata-se de uma prática comum em campos de guerra. O Schütt deve ter aprendido essa prática no Regimento Inglês no qual atuou”.

O ferreiro continuou: - “O meu padrasto foi um homem com uma forte fé em Deus. Ele nos orientava com palavras das Escrituras Sagradas que ele lia todo o dia. Ele nos ensinou que o nosso Criador que fez os céus e a terra nos colocou no mundo para dominarmos a terra, com muito cuidado sobre todas as coisas”.

Os olhos de Schmitt se aguçaram, mas ele se manteve em silêncio.

Pastor Voges esfregou as mãos certamente como um sinal do quanto estava satisfeito com o rumo que a conversa havia tomado.

Enquanto isso, no outro grupo, reunido em outro ponto do galpão, também se desenvolvia uma animada conversa. O noivo Paraguaio Gross, estava sentado ao lado de Major Voges e fez questão que o velho Miguel Barata viesse sentar ao seu lado. Miguel Barata saíra de casa de madrugada, da área do Baixo Josaphat, onde residia junto ao Arroio Barata.

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Gross insistia com os convidados para que levantassem assuntos e perguntas a respeito da atividade política da Colônia Alemã de Três Forquilhas e região.

Miguel Barata teve que falar sobre sua participação nas guerras, da Cisplatina e dos Farrapos.

Major Voges falou sobre o trabalho de liderança no Partido Liberal. A conversa era bem descontraída, marcada pelo bom humor e, às vezes podiam ser ouvidas sonoras gargalhadas.

A língua usada neste grupo foi o português uma vez que muitos dos que ali se encontravam nada ou pouco entendiam da língua alemã.

“... eles vão pro mato e se escondem...”

O velho Miguel Eberhardt, o Barata, amparado em um bastão, utilizado como bengala, aproximou-se de Adam Martin Bobsin e colocando paternalmente a mão sobre seu ombro, perguntou: - “O que andam fazendo os descendentes do colono mais forte que um touro? As lavouras naquele cantão de vocês devem produzir muito bem?”.

Bobsin sorriu e respondeu: - “Fortes somos, mas nem tanto... Homem com força igual ao meu pai, dificilmente aparecerá outro por aqui... Meus irmãos trabalham muito, e tem lavouras muito bonitas. O único que teve interesse para continuar trabalhando com couro sou eu. Mas não vale mais a pena, pois nos últimos tempos apareceram tantos sapateiros e artistas de couro que não existe trabalho para todos. Diante disso a minha ocupação principal também passou a ser o cultivo da terra. Eu e meus irmãos acabamos de colher milho e feijão...”.

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Miguel Barata, agora falando mais baixo, quase a cochichar, segredou: - “Contam por aí que vocês Bobsin fugiram do chamado para a guerra... Uma família com tantos homens sadios e fortes e não houve um sequer para se apresentar como voluntário da Pátria?”.

Bobsin olhou em torno e também falando em voz baixa, para que ninguém escutasse a conversa, explicou: - “Você sempre foi o grande amigo de meu pai e por isso deve saber muito bem que por questões de consciência e de convicções de fé cristã, papai nunca foi de querer saber de guerra. Depois de 1839, quando aconteceu aquela desgraceira da Guerra dos Farrapos e que meu irmãozinho inocente foi apagado covardemente por um farrapo desgarrado, meu pai pirou... Você deve ter tomado conhecimento que reagiu à morte de Pedrinho e liquidou aquele sargento farrapo, com um tiro só... Mas não sei se soubeste que, meu pai que sempre foi um simpatizante dos ideais farroupilhas, depois daquela tragédia com Pedrinho e da morte do farrapo, ele entrou num período de grande desânimo... Certo dia pegou aquela arma com a qual ele liquidara o farrapo e a fez em cacos. Depois reuniu a família e ensinou que pela decisão que ele estava tomando naquela hora, nunca mais haveria uma arma de fogo na casa dele e de seus descendentes...”.

Miguel Barata colocou novamente a mão sobre o ombro de Bobsin e falou: - “Eu acompanhei de perto toda essa problemática de teu pai. Muito me esforcei para tirar as idéias erradas da cabeça dele, pois que era apenas um sofrimento desnecessário que ele estava carregando. Afinal, ele apenas reagiu para vingar, no ato, a morte de Pedrinho”.

Bobsin explicou: - “Agora você colocou o dedo na ferida que machucou a mente e o coração do meu pai, pois que ele insistia que o espírito de vingança fere o Evangelho de Jesus”.

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Barata elevou a voz, explicando: - “Quando falei em vingança, eu quis dizer que acredito no direito de defesa que pertence para uma comunidade...”.

Bobsin assustou-se e colocando os dedos sobre os lábios, implorou: - “Barata, fale mais baixo, pois que já vejo gente nos olhando com curiosidade... Não quero que ouçam o assunto da nossa conversa, pois senão as pilhérias contra a minha família vão ressurgir...”.

- “Que pilhérias?”, quis saber Barata.

Bobsin explicou: - “Tem gente que nos debocha dizendo que os Bobsin quando são chamados pra ir pra guerra, eles vão é pro mato, e só saem de lá depois de um ano...”.

Barata procurou segurar o riso, mas não conseguiu e uma sonora gargalhada pode ser ouvida, ecoando pelo galpão. Barata abraçou firmemente Bobsin e concluiu: - “Me perdoe, amigo, mas não aguentei a graça dessa pilhéria. Não leve a mal que o povo da Colônia anda falando isso, pois no fundo, bem no fundo, eles admiram e respeitam os Bobsin”.

Bobsin, um pouco intimidado, pediu licença, dirigindo-se até o gramado, diante do galpão, onde uma repentina agitação podia ser notada.

Uma demonstração hípica

O almoço da festa de casamento consistiu de um churrasco gaúcho, assado pelos competentes peões de Paraguaio Gross. As irmãs e sobrinhas do noivo passavam diante dos convidados oferecendo porções de aipim cozido ou de cuca, que elas conduziam em pequenas gamelas de madeira. Enquanto isso alguns rapazes estavam a postos

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para oferecer cerveja caseira e suco de framboesa, de acordo com o gosto de cada qual. Mas não existiam canecas suficientes à disposição dos convidados de modos que muitos homens pegavam a cerveja, para beber diretamente do gargalo13.

A noiva durante o tempo todo se manteve calada, pois não entendia o que era falado em torno dela. As animadas conversas dos convidados mais próximos era mantida em língua alemã.

O noivo tinha consciência da situação, pois constantemente murmurava algo nos ouvidos da noiva, talvez traduzindo um ou outro assunto, da conversa que corria solta.

Terminado o almoço, Paraguaio Gross pediu que todos que tivessem vontade de ver uma demonstração hípica viessem até o grande gramado, diante de sua casa. Baiano Candinho já recebera ordens de selar Hidalgo e Milonga. O próprio Candinho montou o garanhão e seu irmão Pedro montou a égua.

Paraguaio Gross explicou, em português e em alemão, que o seu cavalo Hidalgo havia sido o predileto do sogro, um homem que ele não chegara a conhecer, um estancieiro paraguaio, morto em combate pelos brasileiros. Em seguida apontou para a égua Milonga que pertencera ao seu cunhado, que também perecera em combate contra os brasileiros. Foi explicando cada atividade que era desenvolvida por Candinho e Pedro, enfatizando a beleza do trote e a desenvoltura do galope dos animais.

Candinho passou a fazer evoluções especiais com Hidalgo, muito mais para se mostrar como exímio cavaleiro que ele era. Candinho estava trajando uma bombacha, peça de farda militar também recebida por outros, os soldados nordestinos que em algum momento integraram a arma da Cavalaria, durante a Guerra do Paraguai. Certamente foi por causa desta guerra e durante a guerra que a bombacha

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transformou-se em símbolo não só dos gaúchos, mas também da cavalaria brasileira.

FIGURA 5: O velho João Patrulha Menger mostra sua destreza no tiro de laço. Fonte: Gravura dos arquivos do autor, 2010

Candinho e Pedro fizeram uma breve demonstração de paleteada14 e demonstrações de rédeas. Eles mostraram que controlar um cavalo não é só guiá-lo, mas dominar os seus movimentos, com firmeza e destreza.

Finalmente, quando todos pensavam que a demonstração estava encerrada, apresentou-se João Patrulha Menger, apesar de seus 61 anos de idade. Alguém trouxera novamente uma rês e Patrulha, montando em Hidalgo fez uma demonstração de tiro de laço. Ele recebeu muitos aplausos, diante de sua exímia destreza, revelando que fizera jus às tantas vezes que fora sagrado major do laço, como campeão em torneios de tiro de laço que se realizavam na Colônia.

Somos dominados por uma cultura da guerra

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Pastor Voges também observava as evoluções dos cavaleiros. Notou a presença de Adam Martin Bobsin, postado ao lado, de modo pensativo. O pastor aproximou-se e puxou conversa: - “Adam Bobsin, você me parece preocupado com alguma coisa...”.

Bobsin foi se achegando, enquanto olhava a proeza de João Patrulha que com um certeiro tiro de laço, pegara a rês com grande precisão. Aproveitou para aplaudir a façanha...

Voges continuou: - “Algum problema em casa? A família vai bem?”.

Bobsin chegou ainda mais perto e falou em voz baixa: - “Em casa tudo vai muito bem. Porém, se alguém não anda bem sou eu... Meu problema tem algo a ver com o meu falecido pai. Há pouco tive uma prosa particular com o amigo Miguel Barata e fiquei ainda mais confuso das idéias. Não é que ele me disse que o meu pai estava errado...”.

- “Não entendi ao certo, qual é mesmo problema...” - disse pastor Voges.

- “É a respeito da nossa ausência na Guerra do Paraguai e também a respeito da decisão de meu pai já no tempo da Guerra dos Farrapos, depois da morte de meu irmão Pedrinho, atingido por um tiro... O Miguel Barata falou que o meu pai estava errado, quando decidiu que em nossa casa não teria mais lugar para uma arma de fogo...”.

Pastor Voges puxou Bobsin pelo braço de modo delicado e pediu que o acompanhasse numa breve caminhada, para olhar as lavouras dos Gross. Enquanto seguiam em frente, Voges falou: - “Adam, preciso que você saiba que eu sempre considerei o teu pai como um homem de boa formação evangélica e muito coerente em tudo o que fazia e dizia. O mundo não entende um homem que vê as coisas a partir do Evangelho. O mundo está dominado por uma cultura da guerra. Preciso te dizer com clareza que

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a humanidade, ao longo dos milênios, sempre foi guiada pela cultura da guerra e por ela dominada...”.

Bobsin olhou com ares de ansiedade, como quem não consegue acompanhar o pensamento do interlocutor e falou: - “Pastor, para ser sincero com o senhor, preciso dizer que não estou entendendo o que o senhor quer me dizer. As suas palavras são muito complicadas. Será possível explicar isso com palavras que eu consiga entender?”.

O pastor sorriu de modo amigável e explicou: - “É verdade, eu compliquei mais do que expliquei, não é verdade? Vamos ver se consigo deixar isso em palavras bem mais simples... Quando falei em cultura da guerra eu estava me lembrando que os povos desde a antiguidade mais remota, sempre se basearam no princípio da força bélica, a força das armas, a força dos guerreiros, para impor-se sobre outros povos vizinhos. Basta olharmos para a história do tempo do Antigo Egito, o tempo da Babilônia, o tempo da Grécia com seus espartanos guerreiros e assim continuou século após século, até os nossos dias. A humanidade mostra não conhecer outro caminho possível que não seja o uso da força das armas para resolver as diferenças que aparecem. E você foi logo falar com o nosso amigo Miguel Barata que tem um espírito bélico e só não é capitão honorário hoje, porque o lado dele perdeu a guerra... Entendes? Ele esteve no lado perdedor, na Guerra dos Farrapos... Mas quero ainda aproveitar para falar mais um pouco sobre essa cultura da guerra e o resultado dela. Posso dizer que fazendo guerras, cultivam-se mais guerras. E qual é a utilidade de uma guerra? Nesta questão o teu pai viu um caminho novo melhor, que foi concedido para a humanidade. Em nossas reuniões na igreja ele comentava sobre isso e insistia que a confiança sempre é melhor que a suspeita... Ele insistia que é melhor diminuir a defesa e, que é melhor desarmar-se, pois os que estão armados, quando ameaçados se defendem com a utilização deste armamento...”.

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Bobsin estava em silêncio e era notório que tentava entender a explanação e mais uma vez interrompeu Voges e pediu: - “Pastor, não consegui acompanhar a sua explicação. Não será possível dizer isso em palavras ainda mais simples?”.

Voges ficou em silêncio por um momento e revelou estar pensando, procurando por um exemplo mais prático. Finalmente passou a dizer: - “Pois bem, vou ser franco e branco contigo. Imagine o teu pai diante da casa de vocês em 1839. Alguns Farrapos desgarrados vem chegando, à galope, perseguindo diversas vacas. Eles estão com fome. Querem pegar apenas uma e abatê-la. Eles vem a galope soltos, segurando numa das mãos, com firmeza, a arma de cano longo, para não perdê-la pelo caminho. Certamente nem pensam em fazer uso das armas. Agora olhe para o teu pai... Ele vê os desconhecidos se aproximando e grita ao Pedrinho pedindo que lhe traga a arma que está dentro de casa. Teu pai está lá no galpão, só observando... Teu irmãozinho rapidamente cumpre a ordem recebida e com a arma na mão corre na direção do galpão. O teu pai apesar de ser um simpatizante dos Farrapos, os vê chegando com a suspeita que possam estar se aproximando para causar-lhes algum mal. Os farroupilhas desgarrados, vendo alguém correndo de arma na mão, suspeitam que serão hostilizados. O primeiro a atirar é o Farrapo, que atinge mortalmente o inocente Pedrinho. O teu pai, com um pequeno esforço alcança a arma que o teu irmãozinho estava levando até ele, mira e elimina o Farrapo. Agora imagine o contrário, algo que teu pai insistia em nos contar... Imagine que o teu pai não chamasse pelo Pedrinho e não pedisse que lhe trouxesse aquela arma. O teu pai estaria desarmado diante do Farrapo... Estariam frente a frente, dois Farrapos, pois que teu pai sempre simpatizou com os ideais de justiça que os farroupilhas pregavam... E, tenho certeza que Johannes Bobsin jamais teria negado comida para aqueles soldados famintos... Entendes agora sobre que o teu pai procurava nos alertar? Sou testemunha que o meu inesquecível amigo Johannes Bobsin foi dos

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poucos colonos de Três Forquilhas com começou a entender o Evangelho de Jesus, para reconhecer o caminho novo que se abriu para toda a humanidade que se debate em meio aos conflitos de ódio e guerras... Tente imaginar como seria a atividade política dos homens e como seriam as relações na sociedade, se todos nós começássemos a colocar em prática o Evangelho que Jesus nos legou!”.

Adam Martin Bobsin olhou aliviado para o pastor e enfatizou: - “Agora entendi, sim... Ficou muito claro para mim que papai estava certo a respeito das lições que ele procurou nos transmitir. Agora entendo o motivo que levou o pai a quebrar a arma dele em muitos pedaços... Agora entendo o motivo porque ele não desejava mais ter uma arma de fogo dentro de casa.”.

Os dois foram retornando para o galpão onde naquele momento um grupo de músicos liderado pelo maestro Christian Tietboehl conduzia as danças, animando a festa do casório de Carl Daniel e Abela.

 

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TEXTOS DIVERSOS

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OS VOLUNTÁRIOS DA PÁTRIA, FILHOS DA COLONIA ALEMÃ DE TRÊS FORQUILHAS QUE FORAM PARA A GUERRA DO PARAGUAI

Em junho de 1865 o Paraguai, nosso vizinho pais, invadira o Brasil e tomou as cidades brasileiras de são Borja, Itaqui e Uruguaiana.

De imediato, o Ministro da Guerra Ângelo Muniz da Silva Ferraz (Barão de Uruguaiana) lançou um apelo nacional. Solicitava o empenho de padres e pastores, para que através de seus bons ofícios conclamassem a todos aqueles que, em condições de servir, cerrassem fileiras, apresentando-se o quanto antes, para partir em defesa da Pátria.

Pastor Carlos Leopoldo Voges, na Colônia Alemã de Três Forquilhas, conclamou a comunidade apelando que voluntários se apresentassem. O seu filho major Adolfo Felipe Voges que iniciara como oficial da Guarda Nacional de São Leopoldo e passara para a Guarda Nacional de Santo Antonio da Patrulha ficou encarregado de reunir o efetivo de voluntários. Algumas famílias, com mais posses, colocaram substituto para seu filho. Isto era permitido. Unicamente cumpria ao interessado assumir o compromisso financeiro com o voluntário substituto. Em geral era feito um simples

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contrato, com o pagamento de metade do valor na ora da partida e a outra metade por ocasião do final da guerra.

Os jovens da Colônia Alemã de Três Forquilhas foram conduzidos a Porto Alegre sob o comando do Major Voges e ali foram distribuídos entre as diferentes armas e efetivos, de acordo com suas aptidões. Todos prestaram o juramento à Bandeira do Brasil. Receberam um treinamento elementar para o combate para logo serem postos em marcha rumo aos campos de batalha, no Paraguai.

Descendentes dos veteranos contam que Carlos Daniel Gross, integrando a Arma da Cavalaria, foi dos primeiros a receber seu batismo de fogo e haveria de enfrentar por maior tempo o envolvimento nesta Guerra.

Até julho de 1866 praticamente todos os voluntários

da Colônia Alemã de Três Forquilhas, de alguma forma, tiveram contato com as frentes de combate. Tiveram o chamado “batismo de fogo”. Logo também começaram a aparecer as primeiras baixas.

Os mortos em combate

Dos filhos da já antiga Colônia Alemã de São Pedro de Alcântara das Três Forquilhas, que participaram da Guerra do Paraguai, alguns tombaram, derramando o seu sangue, em defesa das fronteiras da Pátria. São nomes que, em sua própria terra natal, caíram no esquecimento. Queremos lembrá-los, em homenagem, mesmo que tardia, para servir como reconhecimento, pelo sacrifício ao qual se dispuseram de modo voluntário e como preito de amor à Pátria.

JOÃO NIDERAUER SOBRINHO - Coronel. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Itati – RS), no dia 04 de abril de 1827, portanto no alvorecer desta colonização.

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Era filho do imigrante Felipe Leonardo Niederrauer, e

de Catarina Diehl Niederauer naturais de Kettenheim/Rheinhessen. Sua mãe era parente próxima de Elisabetha Diefenthaeler Voges, esposa de Carlos Leopoldo Voges, pároco da Colônia Alemã de Três Forquilhas.

João Niderauer Sobrinho foi batizado pelo pastor Voges em 14.04.1827, tendo por padrinho o seu tio homônimo João Niderauer, que atuara como comerciante próximo ao Baluarte Ipiranga, em Torres e depois, por breve tempo, na Colônia de Três Forquilhas.

Com o prenúncio da Revolução Farroupilha, todo o grupo familiar Niederauer mais chegado retornaram para São Leopoldo e Santa Maria, permitindo que João Niederauer Sobrinho recebesse uma ótima formação escolar.

Em 1849 encontrâmo-lo em Santa Maria-RS, como integrante da Guarda Nacional. Em 09.01.1850 foi nomeado Alferes do 12º Esquadrão do Corpo de Cavalaria, de Santa Maria. Fez, assim, em 1851, as campanhas contra Oribe e Rosas, recebendo a Medalha do Valor Militar.

Em 21.09.1852, casou-se com sua prima Maria Catarina Niederauer, sendo abençoados com o nascimento de 6 filhos: Delfina (1853), João, Gabriela, José Gabriel, Afonso e Adelaide.

Em 1854 foi promovido ao posto de Capitão e marchou para a campanha do Uruguai. De volta, continuou prestando serviços de observação, junto à fronteira. Em 30.05.1860 foi promovido a Tenente-Coronel. Recebeu, 4 anos depois, o Comando do 7º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional. Partiu, em 1864, para a campanha do Uruguai. Participou da tomada de Paisandu e do cerco de Montevidéu. Do Uruguai, teve que marchar diretamente ao Paraguai, esse país vizinho que em junho de 1865 tomara três de nossas cidades, junto à fronteira. Em 25.05.1866 foi

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promovido ao posto de Coronel, recebendo o Comando da 3ª Brigada de Cavalaria.

Tomou parte nos seguintes combates: Tuiucuê (03.07.1867), Arroio Hondo (03.08.1867), San Solano (06.09.1867), assalto à vila de Pilar (20. 09.1867), cercanias de San Solano (29.09.1867), Hermosa-cuê (03.10.1867), Tataibá (21.10.1867), Potrero Obela (29.10.1867), vizinhanças de Humaitá 31.01.1868), apoio a passagem de Humaitá - e assalto ao Forte del Estabelecimiento (19.02. 1868), Arroio Jacaré (26.08.1868), Passo de Tiibicuarl (28.08.1868), Arroio de Surubiu e Batalha de Itororó (06.12.1868), batalha de Avaí (12.12.1868).

Foi ferido gravemente nesta última batalha, atingido por uma lança paraguaia, quando percorria o campo de luta, após os combates, à procura de soldados brasileiros feridos. Foi levado ao Hospital de Vileta. Ali faleceu em 13.12.1868, sendo a morte causada por peritonite aguda, em consequência de ferimento recebido no ventre. Foi sepultado no Cemitério de Vileta.

Sobre a morte de Niederauer, temos um relato de Otto Stiehr, correspondente de guerra, que em 15.12.1868 escreveu: "Depois da tomada de Vileta, o Coronel João Niedrauer Sobrinho montou a cavalo para, acompanhado de duas ordenanças, percorrer uma picada e reconhecê-la. Ai, num estreito da picada, surge um soldado paraguaio que, com sua lança fere o Coronel na ilharga, quase lhe abrindo a barriga toda. Esse paraguaio, logo após, é morto. O Coronel é levado ao Hospital de Sangue. Dois dias depois morre, em consequência de gangrena".

"Os feitos de Niderauer foram dos mais notáveis e a sua morte, em plena vitória na batalha decisiva de Avaí, trouxe geral consternação entre os companheiros e comandados brasileiros" (Ten Cel Henrique O. Wiederspahn – pg. 245/248).

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FIGURA 6 : Coronel João Niederauer Sobrinho. Fonte: Arquivo fotográfico da 6ª Brigada de Infantaria Blindada, Santa Maria - RS.

Coronel João Niderauer Sobrinho já estava cogitado na relação de promoções ao generalato. Mereceu durante a campanha do Paraguai, reiterados elogios do Brigadeiro José Joaquim de Andrade Neves e do próprio comandante em Chefe do Exército Brasileiro, o Duque de Caxias.

Para conhecer um pouco melhor a personalidade de Coronel Niderauer, ouçamos de novo palavras de Otto Stiehr: "Foi um cidadão moderado com senso realista; um amigo abnegado sempre disposto a ajudar a todos que o procurassem; um companheiro afável e muito benquisto; e, original nos seus risos cordiais. Como Oficial e Chefe preferia falar seriamente e admoestar amigavelmente ao invés de punir disciplinarmente. Estimado e quase endeusado pelos seus comandados, gozava de muita estima bem como da amizade e da confiança particular do Marquez de Caxias. Foi um dos mais intrépidos Soldados e Comandantes que, sem expor-se atrevidamente ao perigo,

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sempre indicou, para a sua Brigada, o caminho para a vitória". (Klaus Becker - pg. /113).

JOÃO HENRIQUE HOFFMANN – Tenente. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas em 12 de maio de 1827 (hoje Três Forquilhas - RS), filho primogênito do imigrante Jacob Hoffmann (natural de Unterlais/Hessen) e de Cristina Maria Neiss. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 12.05.1827, tendo por padrinho Henrique Schwartzzhaupt. Seus pais saíram de Três Forquilhas juntamente com os Niederauer, por volta de 1834, radicando-se em São Leopoldo - RS.

João Henrique, semelhante a Adolfo Felipe Voges, ingressou na Guarda Nacional daquela cidade. Seguiu para a campanha do Paraguai, onde foi gravemente ferido em combate, vindo a falecer a seguir. Não temos outros detalhes sobre a vida militar do Tenente João Henrique Hoffmann.

FELIPE PEDRO KLEIN – Soldado - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Itati - RS) em 16 de agosto de 1842, filho do imigrante Carlos Klein e de Maria Margareta Jacoby. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 28.08.1842, tendo por padrinhos Felipe Jacó Menger, Carolina Menger, Pedro Jacoby e Dorotéia Helbig. Foi morto em combate aos 24 anos de idade.

CARLOS KLEIN - Soldado. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Itati - RS) em 06 de abril de 1844, filho do imigrante Carlos Klein e de Maria Margareta Jacoby. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 08.05.1844, tendo por padrinho Carlos Jacoby. Tombou na Batalha de Tuiuti.

CRISTIANO KLEIN - Soldado. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Itati - RS) em 16 de novembro de 1845, filho do imigrante Carlos Klein e de Maria Margareta Jacoby. Foi batizado pelo pastor Carlos

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Leopoldo Voges em 18.12.1845, tendo por padrinho Cristiano Jacoby. Morreu em combate.

FELIPE MASCHMANN - Soldado. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Três Forquilhas - RS) em 09 de outubro de 1842, filho do imigrante João Maschmann e de Gertrudes Klippel. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 04.11.1842, tendo por padrinhos Jacó Felipe Feck e Doroteia Niederauer Feck. Morreu em combate.

JOÃO JACÓ MAUER - Soldado. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas em 1834, filho do imigrante Cristiano Mauer e de Cristina Helbig. O nome de João Jacó Mauer não consta no registro de batismos do pastor Voges. A tradição oral porem transmitiu que o mesmo foi filho deste casal e que tombou na Paraguai, em defesa da Pátria. Dr. Klaus Becker, em "Alemães e seus Descendentes na Guerra do Paraguai" registra o nome de João Jacó Mauer, citando-o como filho da Colônia Alemã de Três Forquilhas e como tendo sido morto em combate.

FELIPE JACÓ MENGER - Soldado. - Nasceu Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Itati - RS) em 16 de agosto de 1846, filho do imigrante Jacob Menger Senior (natural de Bechtheim/Rheinhessen) e de Carolina Klein. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 28.09.1846, tendo por padrinhos Jacó Felipe Feck e Dorotéia Niederauer Feck. Morreu em combate.

MIGUEL MENGER - Soldado. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Itati - RS) em 12 de março de 1842, filho do imigrante João Menger (João Patrulha) e de Maria Catharina Gross. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 10.05.1842, tendo por padrinhos João Maschmann e Gertrudes Klippel. Morreu em combate.

FREDERICO HENZE - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Itati - RS) em 25 de dezembro de

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1840, filho do imigrante Loudwich Gottlieb Henze e de Dorotéia Cristina Doebelling. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 27.12.1840, tendo por padrinhos Frederico Strassburg e Catarina Kellermann. Dr. Klaus Becker menciona em sua obra (pag. 186) um Frederico Henes (e, entre parêntesis ele sugere Henz), como soldado do Corpo de Pioneiros, tombado na batalha de Tuiuti, em 1867. Caso levarmos em consideração essa referência então devemos também pesquisar o nome de Peter Henes (Henz) que igualmente tombou na batalha de Tuiuti, em 21.12.1987, com um tiro na cabeça. O Corpo de Pioneiros perdeu 50 homens na batalha. A família Henze saiu de Três Forquilhas após o final da Guerra da Paraguai, o que dificultou a verificação junto à tradição oral, para tirar estas dúvidas. Não incluímos o nome de Peter Henze em nossa relação.

Os que voltaram...

Os voluntários da Colônia Alemã de Três Forquilhas, sobreviventes da Guerra do Paraguai não voltaram ao mesmo tempo. Alguns foram dispensados mais cedo, tendo em vista ferimentos graves recebidos em combate. Outros voltaram em 1870, ao final da guerra Houve também um que já era chorado pela família, tido como desaparecido na guerra. Estes veteranos passaram a ser olhados com grande respeito e admiração, pois que invariavelmente carregavam marcas e cicatrizes, sinais incontestes da participação direta nos combates.

Com emoção falavam da barbárie da guerra, dos sofrimentos, das feridas, do sangue e de mortes, presenciados, em solo paraguaio. Junto ao nome daqueles que voltaram, procuramos também incluir as histórias e estórias que os seus descendentes souberam ainda nos transmitir.

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JOÃO HENRIQUE BECK - Furriel. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Três Forquilhas-RS) em 19 de novembro de 1839, filho do imigrante João Beck (natural de Gelnnhaar) e de Sofia Gebhardt (natural de Stuttgart). Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 22.01.1840, tendo por padrinho Henrique Beck. Era o único filho varão do casal, permitindo assim, caso quisesse, de contornar a convocação. Foi, porém, como voluntário. Recebeu funções na intendência. Ficou encarregado da distribuição de material de campanha e como auxiliar nos pagamentos do soldo à tropa. Isto indica de que João Henrique Beck não atuou na frente de combate. Ao regressar do Paraguai (com a idade de 31 anos), casou-se em 05.12.1870 com Juliana Beck (de 17 anos), filha de Guilherme Beck e Catarina Schwartzzhaupt. O casal teve oito filhos: João (05.08.1872), Guilherme (14.10.1873), Carlos (29.12.1874), Maria (27.05.1877), Maria Luisa Cristina (01.02. 1881), Felipe Pedro (12.10.1883), Carolina (03. 09.1887) e Frederico (20.06.1889).

CARLOS DANIEL GROSS - Nasceu na Colônia Alemã de Forquilhas (hoje Três Forquilhas-RS) em 12 de junho de 1842, filho do imigrante Felipe Pedro Gross (natural de Birkenfeld/Oldenburg) e de Elisabetha Catarina Hoffmann. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 22 de agosto de 1842, tendo por padrinhos Carlos Becker, Daniel Helbig e Dorotéia Becker Helbig. Era filho de família numerosa, tendo outros cinco irmãos e seis irmãs.

Carlos Daniel Gross foi integrado na Arma da

Cavalaria, sob o comando de General Osório e de Coronel Niederauer. Desde o inicio da guerra se fez acompanhar por um cachorro, que mais tarde lhe ajudaria a salvar a vida.

Chegando a Três Forquilhas, grande foi a confusão em seu lar e redobrada a alegria de sua mãe. Era choro e riso ao mesmo tempo.

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Carlos Daniel Gross casou-se com a paraguaia Luisa Abela Dellore, em 1873, sendo o casamento oficiado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges. O matrimônio foi abençoado com o nascimento de 5 filhos: Carlos Daniel (27.08.1874 - que tornou- se capitão, na revolução federalista de 1893), Evelina (09.12.1875), Rosalina (20.09,1879), Serafim José (07.07.1882), e Maria Paulina (06.06.1883). Esta última menina foi adotada por Carlos Strassburg, companheiro de Gross, na Guerra do Paraguai. Na época Gross estava muito adoentado. Sofria muito. Seus filhos diziam que, quando o veterano faleceu "mais parecia um couro estaqueado sobre os ossos, curtido ao sol". Ele fora secando lentamente, ficando apenas pele e ossos.

O corpo de Carlos Daniel Gross estava repleto de cicatrizes, provenientes dos pontaços das lanças paraguaias. Trouxera também sequelas físicas e psíquicas, que os combates, sangue e cadáveres, ferimentos e exaustão haviam produzido. Sofria de constantes problemas gástricos, tendo o organismo totalmente minado pela doença.

PEDRO FECK - Cabo - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Itati-RS) em 05 de junho de 1845, filho natural de Catarina Feck e neto de Felipe Jacó Feck e Dorotéia Niederauer Feck. Em suas veias corria o sangue dos destemidos Niederauer, pois era, por parte da avó materna, parente do Coronel de Cavalaria João Niederauer Sobrinho. Ele fora batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 16.09.1845, sendo padrinho Carlos Pedro Menger. O pai de Peter Feck, conforme seus netos fora Pedro Jacoby Júnior, filho de uma família muito rica de Três Forquilhas.

Pedro Feck voltou da guerra em 1871, mas levou

sete anos até encontrar com quem casar. No dia 05 de julho de 1878 casou com Elisabeta Schmitt, filha de Wilhelm Schmitt. Tiveram os seguintes filhos: Pedro Antonio (12. 02.1881), Idalina (06.04.1883), José Gustavo (05. 11.1884 - falecido em 1893, Alberto (03.08.1886 falecido em 1898),

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Artur (08.06.1888), Maria Sezilda (26.04.1890) e Balduino (1892 - falecido em 1893).

Pedro Feck recebeu soldo honorário conforme

decreto de 13.08.1907 passando a contar com bons recursos financeiros. Faleceu por volta de 1920.

Contam os seus descendentes de que Peter guardara seu uniforme de gala e o boné, para o dia do enterro. Sua vontade expressa fora de ser velado e sepultado como soldado, veterano da Guerra do Paraguai, o que de fato foi cumprido pelos seus filhos.

CRISTIANO DANIEL BECKER - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas, (hoje Itati – RS) a 16 de agosto 1844, filho de Carlos Becker (veterano da Campanha Cisplatina) e de Eva Helbig. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 04 de setembro de 1844, tendo como padrinhos: Cristiano Jacoby, Carlos Mauer e Jaco Daniel Helbig. Era de família numerosa, com mais quatro irmãos e quatro irmãs. Ao voltar do Paraguai, casou com Magdalena Eigenbrodt. Não consta, terem tido filhos.

CARLOS DANIEL DAHL - Soldado. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Itati-RS) em 07.04.1840, filho do imigrante João Dahl e de Catarina Hellbig. Tinha mais dois irmãos e cinco irmãs. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 24.06.1840, sendo padrinhos Carlos Becker e Daniel Helbig. Carlos Daniel Dahl voltou do Paraguai com o corpo marcado de cicatrizes, provindas da guerra. Sofrendo muito por causa de uma mutilação dos órgãos genitais, decidiu não contrair matrimônio.

JACÓ DANIEL HELBIG - Soldado. - Era imigrante, nascido na região de Rheinhessen, em 1824. Filho de Nicolau e Margarida Helbig. Era o único filho varão. Tinha mais seis irmãs.

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Jacó Daniel já casara em 1852 com Maria Margareta Hoffmann, sendo o matrimônio abençoado com o nascimento de uma filha: Elisabeta (20.05.1854). Perdeu a esposa por complicações pós-parto. Casou, em segundas núpcias, com Catarina Menger. Deste novo matrimônio nasceram os seguintes filhos: Carlos Pedro (17.01.1856), João (05.07.1857), Jacó (15.06. 1859), Felipe (12.07.1861) e Carolina Cristina (12. 07.1864). Seguiu ao Paraguai aos 41 anos de idade, deixando para trás a esposa e seis filhos.

Ele levou em sua companhia os afilhados de batismo

Carlos Daniel Gross, e Carlos Daniel Dahl. Foi incumbido pelos pais destes dois, para que olhasse por eles, dentro do possível. Para a sua felicidade, estes dois afilhados voltaram da guerra. Nada sabemos sobre a atuação de Helbig nos campos de guerra. Faleceu por volta de 1880.

CARLOS FREDERICO KELLERMANN - Soldado. - Nasceu na Colônia de Três Forquilhas (hoje Itati-RS) em 04.07.1841, filho do imigrante Carlos Kellermann e de Catarina Müller. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 06 de março de 1842 tendo por padrinho Carlos Frederico Strassburg. Era filho primogênito de família numerosa (5 irmãs e 4 irmãos) todos gente forte e de elevada estatura. Nada sabemos sobre a sua participação no Paraguai, pois que regressando da guerra, decidiu radicar-se em Três Coroas-RS, onde casou e deixou descendência. A maior parte de seus irmãos permaneceu em Três Forquilhas.

CARLOS FREDERICO STRASSBURG - Soldado. - Nasceu na Colônia de Três Forquilhas (hoje Itati-RS) em 06 de agosto de 1839), filho primogênito do imigrante Carlos Frederico Strassburg (natural de Hoyah/Hannover) e de Catarina Kellermann. Tinha mais 2 irmãos e 7 irmãs. Carlos Frederico foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 25.08.1839, sendo padrinho o seu tio Carlos Kellermann. Portanto Carlos Frederico Strassburg era primo em primeiro grau de Carlos Frederico Kellermann. Nada sabemos sobre a

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sua participação na guerra, pois ele só falava que apenas queria esquecer do horror vivido no Paraguai. Retornou com 31 anos de idade, casando em 13.09.1870 com Henrieta Jacoby. Tiveram 9 filhos: Maria Cristina (07.07.1872), Catarina Barbara (10.09. 1874), Catarina Elisabeta (12.03.1877) Frederico (12. 01. 1880 - falecido em 1894), Henrieta (30.03.1885), Carlos Ferdinando (13.10.1887), Matilde (04.11.1889) e Guilherme Ferdinando (1892 falecido em 1894). Além destes 8 filhos, ele adotou também a filha caçula de Carlos Daniel Gross, ao constatar que aquele camarada de combates estava finando lentamente, sem condições de atender a família.

ANDREAS GEHRMANN - Soldado - Nasceu na Colônia de Três Forquilhas (hoje Três Forquilhas-RS) em 18 de março de 1842, filho do imigrante João Jorge Cristiano Gehrrmann (natural do Mecklenburgo) e de Maria Catarina Dresbach. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopóldo Voges em 13.04.1844, sendo padrinhos Andreas Walter e Apolonia Justin Walter. Tinha 3 irmãos e 4 irmãs. Regressou mais cedo do Paraguai em virtude de graves ferimentos recebidos. Casou com Maria Elisabeta Mittmann em 1869, sendo abençoados com 8 filhos; Maria (09.04.1870), Maria Margareta (29.12.1871), Carlos Leopoldo (25. 03.1873), João Alberto (06.03.1876), Maria Luisa (03.05.1878), Nicolau (28.02.1880), Ernestina (09. 06.1882) e Avelina (04.04.1888). Andreas Gehrmann faleceu em 19.08.1911, aos 69 anos de idade.

JOÃO GUILHEME SPARREMBEREGER - Soldado. - Nasceu na Colônia de Três Forquilhas (hoje Três Forquilhas-RS) em 05.09.1837, filho do imigrante João Sparremberger (natural de Wendelsheim/Hessen) e de Anna Maria Beck. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 24.09.1837, tendo por padrinho João Guilherme Beck. Na Guerra do Paraguai, foi soldado do 12º Regimento de Artilharia, dando baixa em 27.02.1870. Casara antes de ir para a guerra, em 1862, com Luisa Eberhardt, tendo os seguintes filhos: João (03.06.1863) e Maria Madalena (03.09.1865). Depois da

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guerra tiveram mais uma filha: Luisa Carolina (01.04.1876). Faleceu em 14.09.1906, aos 69 anos de idade.

JOÃO CARLOS SPARREMBERGER - Soldado. - Nasceu na Colônia de Três Forquilhas (hoje Três Forquilhas-RS) 07.04.1839, filho do imigrante João Sparremberger (natural Wendelsheim/Hessen) e de Anna Maria Beck. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges 13.05:1839, sendo padrinho João Beck. Foi soldado do 8º Corpo de Cavalaria, na Guerra do Paraguai. De volta, casou aos 31 anos de idade, em 13.09.1870, com Juliana Beck (23 anos), irmã do veterano de guerra João Henrique Beck. O matrimonio foi abençoado com 7 filhos: Carolina Cristina (29.05.1872), Guilherme (30.06.1873), Henrique (01.06.1874), João Pedro (07.07.1875) Ana Maria (30.12.1876), Felipe (08.09.1880), e Catarina (03.05.1885). João Carlos faleceu em 11.11.1908 aos 69 anos idade.

HENRIQUE SPARREMBERGER - Soldado. - Nasceu na Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Três Forquilhas-RS) 18.04.1841, filho do imigrante João Sparremberger (natural Wendelsheim/Hessen) e de Anna Maria Beck. Foi batizado pelo pastor Carlos Leopoldo Voges em 27.04.1841, sendo padrinho Henrique Sparremberger. Integrou o 12º Regimento de Artilharia, na Guerra Paraguai. De volta, casou com Sofia Knewitz, em 18.07.1873. O matrimonio foi abençoado com o nascimento de 3 filhos: Carlos (27.06.1875), Catarina Margareta (19.01.1877) e João Gustavo (07.11.1883). Faleceu em 09.12.1908, aos 67 anos de idade.

FELIPE SPARREMBERGER - Soldado. - Nasceu Colônia Alemã de Três Forquilhas (hoje Três Forquilhas-RS) em 1843, filho de João Sparremberger (natural de Wendelsheim /Hessen) e de Anna Maria Beck. Pastor Voges não registrou o batismo. Porém consta do registro de casamentos, com a devida filiação e idade, permitindo sua identificação. Integrou o 12º Regimento de Artilharia, na Guerra do Paraguai. De regresso, casou-se em 11.02.1873

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com Margareta Beck: tiveram apenas um filho: João (08.02.1874).

AUGUSTO SONNTAG - O veterano da Guerra do Paraguai professor Augusto Sonntag veio a Três Forquilhas a convite de pastor Voges para atuar tanto na Escola Comunitária mantida pelo pastor, bem como para lecionar na Escola Pública. Augusto Sonntag era imigrante, nascido em 1809. Deu baixa mais cedo, no Paraguai, em virtude de ferimentos recebidos. Em Três Forquilhas ele encontrou uma efusiva acolhida. Casou em 1876 com Bárbara Triesch. O matrimonio foi abençoado com o nascimento de 2 filhos: João Carlos Augusto (22.10.1877) e Maria (26.09.1880). Professor Sonntag ficou conhecido em Três Forquilhas, como "O Xaropeiro". Ele atuava como farmacêutico. Além de vender medicamentos trazidos de Porto Alegre, fabricava ainda os seus próprios xaropes. Ele estabeleceu residência a 150 metros da casa pastoral, em um pequeno terreno cedido por um colono. Por volta de 1892 o vale do Rio Três Forquilhas passou a ser assolado por uma epidemia conhecida como "Rothe Ruhr" (diarréia de sangue) ou cólera. Professor Sonntag passou então a fabricar um medicamento com base em ervas, na tentativa de ajudar os enfermos. O esforço foi infrutífero, pois que somente os mais fortes resistiam. Morriam principalmente as crianças, os velhos e os negros. O próprio professor Sonntag, então com 83 anos de idade, não resistiu ao mal, falecendo em 25.04.1892.

EDUARDO SELISTRE - Trata-se de um descendente do imigrante João Jorge Schlitzer (natural de Hessen) que entrou na Colônia Alemã das Tôrres, integrando a caravana de 1826. Os Schlitzer eram inicialmente católicos, localizando-se na Colônia Alemã de São Pedro (Tôrres-RS). Depois alguns deles vieram na direção da Colônia Alemã de Três Forquilhas e Santo Antonio da Patrulha. Perderam a grafia original do nome, passando alguns a assinar Selistre e outros Silistrio. No registro do pastor Voges surge esta última grafia. Eduardo Selistre era integrante do 15º Corpo

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de Cavalaria de Santo Antonio da Patrulha e no retorno, radicou-se por algum tempo na área do Serra do Pinto.

RUDOLFO LIPPERT - Trata-se de um provável descendente do imigrante Francisco Lippert que entrou nessa região do Litoral Norte do Rio Grande do Sul nos primórdios da colonização. Rudolfo Lippert retornou do Paraguai, integrado ao 39º Batalhão de Voluntários da Pátria. Chegou a Porto Alegre em 28.04.1870. Encontramos ainda hoje descendentes dos imigrantes Lippertno Vale do rio das Três Forquilhas, pois no vale do rio Três Forquilhas reside atualmente o Prefeito de Terra de Areia-RS, Dr. Generi Máximo Lippert.

Filhos de Três Forquilhas na Artilharia de Mallet

Os três irmãos Sparremberger (João Guilherme, Henrique e Felipe) integraram o 1º Regimento de Artilharia, mais conhecido como o "Boi de Botas". Combateram sob o Comando do General Emlio Luis Mallet, o Barão de Itapevy.

Em 24 de maio de 1866 os irmãos Sparremberger tiveram sua primeira participação na guerra, ficando postados na vanguarda, na linha de fogo. Foi na primeira batalha de Tuiuti. . Em 16.07.1866 foram expectadores no assalto à linha fortificada de Sauce; em 18.07.1866 participaram da batalha de Boqueron. Tiveram que puxar peças de artilharia, por falta de mulas. Em 21.09.1866 auxiliaram a Cavalaria e Infantaria no assalto a Curupaiti, em 19.02.1868 na Batalha de Humaitá e tomada de Forte del Estabelecimiento. O Regimento cooperou ainda nas vitórias de Itororó (06.12.1868); Avaí (11.12.1868); Lomas Valentinas (27.12.1868); Ita-Ivaté; Passo do Espinilho; Pare-Cuê; Fortléza de Humaitá; Assunção (30.01.1869); Luque (06.04.1869); Areguá (22. 04.1869); Itaguá (23.04.1869); Piraju (25.04.1869); Ascurra; Sapucai; Penbebui (12.08.1869) e Campo Grande ou Nhu-Guassu (16.08.1869).

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Voltando aos combates do Passo da Pátria, naquela oportunidade Mallet tentou utilizar muares para fazer o desembarque das peças de artilharia. Os muares empacaram na prancha. Os soldados mais fortes foram chamados, inclusive os irmãos Sparremberger, para puxar as peças e colocá-las em posição, no braço.

Depois desta situação Mallet mudou a estratégia.

Para movimentar as peças de artilharia através dos campos paraguaios ele passou a fazer uso de tração bovina. Os bois eram mais resistentes e movimentavam as peças com maior eficiência.

Por este motivo a unidade de Mallet, o 1º Regimento

de Artilharia Montada passou a ser conhecido como “Regimento Boi de Botas”.

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OS VOLUNTÁRIOS DA CISPLATINA

O Imperador D. Pedro I, em dezembro de 1826, ao passar pela Vila de Torres requisitou voluntários, da imigração alemã para acompanhá-lo rumo à Campanha Cisplatina. Em nossas pesquisas foram localizados os seguintes nomes:

EBERHARDT, JOÃO MIGUEL Nasceu em Dorzbach/Württemberg, filho de João Eberhardt e Regina Ziegler. Veio para ser soldado integrado a Companhia dos Voluntários Alemães e foi lutar na Campanha Cisplatina. Não há certeza sobre a época em que esteve em Três Forquilhas, já que não poderia permanecer em dois lugares ao mesmo tempo. Consta ter entrado em Três Forquilhas em 1827. Neste caso ele foi conduzido às pressas a Porto Alegre, para ser movimentado à fronteira platina. Em 1836 ele se encontrava em São Leopoldo, onde se uniu com Maria Catarina Heller. Em 1837, entretanto, já aparece de novo em Três Forquilhas, onde se une com Magdalena Geb, filha de Heinrich Geb. Estabeleceu-se em seu antigo lote, a 300 metros da casa do pastor Voges. Por volta de 1839/40 ele aderiu às tropas farroupilhas, recebendo farda e soldo. Levou a família para a região de Campo Bom ou Lomba Grande. Não se sabe por onde ele possa ter andado, mas sabemos que ele participou de combates. Ele ficou comparado a uma pedra que muito rola e por isto não cria limo. Seus filhos e esposa sofreram privações e falta de escola. Eberhardt retomou a sua antiga propriedade de Três

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Forquilhas em 1850 bem como assumiu um lote na floresta da Boa União, onde existe o Arroio Barata. O seu filho Cristiano, mais conhecido como "Cristiano Barata", herdou mais tarde a propriedade paterna e vinculou-se firmemente à Comunidade. Foi presbítero muito dedicado por longos anos. Cristiano Eberhardt assumiu sob a sua guarda o netinho Eugenio Bobsin que ficara órfão da mãe. Desta forma Eugenio Bobsin viria a assumir a propriedade dos "Barata" e teve no avô um dedicado "professor", sendo despertando para o serviço voltado à Igreja e ao desenvolvimento da Colônia. Eugenio Bobsin foi sub-Prefeito de Itati e, presidente da Comunidade por um decênio.

João Miguel Eberhardt deixou numerosa descendência na Colônia, que depois se espalhou rumo a Sanga Funda, Cachoeira/Maquiné e Osório. Na sua descendência, através dos Bobsin, constam dois pastores da IECLB, citados nas referências de João Bobsin.

JORGE LORÉ ou Georg Lorey nasceu em Nack – Reinhessen. Perdera a esposa durante a viagem. Casou em São Leopoldo e deixou a nova esposa grávida e os filhos do primeiro matrimônio, em São Leopoldo com os sogros Cassel. Integrou a caravana para Torres em 1826. Foi com D. Pedro I como voluntário para a Guerra Cisplatina. Retornou mais cedo, doente. Recebeu terras em Três Forquilhas. Sua profissão foi de mestre pedreiro. Desistiu das terras, pois a esposa não mais desejava sair de perto dos pais dela. Durante a Guerra dos Farrapos acompanhou Michel Eberhardt e outros, recebendo farda e soldo, para lutar pela República do Piratini, integrado à Cavalaria de Bento Gonçalves.

BECKER, CARLOS Sobre sua origem consta ter sido um Mecklemburgues, trazido para ser soldado no confronto Cisplatino. Integrou efetivamente a Companhia dos Voluntários Alemães, sendo dispensado em 1827. Ele casou perante o pastor Voges, em 1829, com Eva Hellbig. Tiveram seis filhas e cinco filhos. O seu filho Cristiano Daniel Becker

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integrou mais tarde o Corpo de Voluntários da Pátria e seguiu à Guerra do Paraguai (retomou e constituiu família em Três Forquilhas). Carlos Becker não consta como parente de Henrique Becker. Sua descendência radicou-se na Costa do Morro, na área de Três Pinheiros, em direção às "terras de areia". Entre sua descendência constam presbíteros e, através de uma união com o Professor Serafim Agostinho do Nascimento, surgiu o descendente pastor Gilmar do Nascimento, da IECLB.

SCHMITT, JOÃO NICOLAUS Não há registro sobre sua origem na Alemanha. Casou em Três Forquilhas com Maria Catarina Jacoby (filha de João Pedro Jacoby Senior), após retomar da Campanha Cisplatina. Com a abertura da estrada da renascença ele subiu a Serra, não havendo referências sobre o seu destino.

SEIM, CONRADO Veio para ser soldado e lutou na Guerra Cisplatina. Recebeu designação de um lote de terra em Três Forquilhas. Quando retomou da Guerra, uniu-se com a mulher de Felipe Boehl. Tiveram dois filhos em Três Forquilhas, Jacob (1831) e Cristóvão (1836). A família saiu da Colônia, não havendo referência sobre o destino que tomaram.

BECK, JOÃO natural de Hessen, veio para ser soldado e integrou a Companhia dos Voluntários Alemães que seguiram à Guerra Cisplatina. Casou em 1837, em Três Forquilhas, com Sofia Gebhardt. O casal teve um filho e duas filhas. Esse único filho varão, João Henrique, integrou o Corpo de Voluntários da Pátria, foi Furriel durante a Guerra do Paraguai e depois do retorno casou com a sua prima-irmã Juliana em 1870, deixando numerosa descendência.

STOLLENBERG, HANS TRHON Era de origem norueguesa, apelidado de "Wicking". Sua predileção era a navegação, pois era barqueiro. Casara em São Leopoldo em 1826 com Maria Magdalena Beyer. Tiveram um filho em Três Forquilhas, João Cristovão Paulo (1827). Há dúvidas

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sobre o destino dos Stollenberg. Conforme a tradição oral, o Vicking faleceu logo após a Guerra dos Farrapos em conseqüência de ferimentos recebidos num confronto na Colônia de Três Forquilhas, contra os farroupilhas. A viúva deve ter seguido para São Leopoldo onde residiam os seus pais e parentes mais próximos.

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OS SOLDADOS DA PATRULHA SERRANA

Em 1835 o Coronel Francisco de Paula Soares destacara um grupamento de soldados de sua Milícia Sertaneja, para patrulhar a Serra do Pinto. Conforme a tradição oral eram homens fardados, alguns casados outros solteiros, que se fixaram em pontos estratégicos da área serrana da Colônia de Três Forquilhas. O comando ficou com Johann Schlitzer, o João Silistrio. É a seguinte a relação dos integrantes da Patrulha Serrana, conforme depoimentos da tradição oral:

JOÃO SILISTRIO, no alto da Serra. Seu nome correto era Johann Georg Schlitzer, nascido em Hessen em 1784. Perdeu a esposa e um filho, na viagem ao Brasil. Chegou a Torres viúvo, em companhia de quatro filhos e duas filhas. Em 1826 ingressou como soldado, no Baluarte Ipiranga, com o Coronel Paula Soares. Em 1835, no posto de Sargento, já contando com 71 anos de idade, foi destacado para ser o comandante da Patrulha Serrana, em Três Forquilhas. Foram com ele as duas filhas e o filho menor. Os dois filhos mais velhos seguiram até Porto Alegre e se apresentaram a Paula Soares, como voluntários, para servir ao Exército Imperial. O seu neto ANTONIO SILISTRIO, Anton Schlitzer casou com Maria Joaquina da Silva Becker, tornando-se protestante. Anton e Maria Joaquina tiveram o filho João Silistrio (04.06.1891), batizado pelo pastor Voges.

JOHANNES MENGER, o João Patrulha, ao pé da Serra, nasceu em Dittelsheim em 1811, filho da viúva Anna Catarina Menger. Casou em Três Forquilhas com Maria Catarina Gross. Fixou residência na região do Josaphat. Em virtude disto os seus filhos não tiveram escola, além de se criarem em um meio muito rude e hostil. Deixou numerosa descendência, destacando-se Lidurino "Barroso" Menger, com dedicada atuação na formação do núcleo comunitário de Três Pinheiros, doando terrenos para ampliação do

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cemitério e construção de um Centro Evangélico da IECLB bem como foi vereador do município de Osório – RS.

JOSÉ DA CUNHA, no alto da Serra, mais conhecido como José Cândido, da Patrulha Serrana. Após a Guerra dos Farrapos recebeu terras na Serra e ali se radicou. O seu filho MANOEL FRANCISCO DA CUNHA, conhecido como "Miguel Cândido", juntar-se-ia mais tarde, com Maria Menger, filha de João Patrulha. Tiveram os seguintes filhos: Jacob Menger (1856), Carlos Pedro Menger (1862), Miguel Cândido Menger (1866). O neto "Miguel Cândido Menger", nascido em 1866, foi assassinado em 11.11.1893, no princípio da agitação federalista. Jacob Menger casou em Três Forquilhas em 04.11.1880 com Maria Luisa Witt e integrou-se firmemente à Comunidade Evangélica de Três Forquilhas, deixando a sua descendência vinculada ao trabalho da Igreja.

ESTEBAN DOS SANTOS, índio guarani, nascido na região das Missões. Veio a Três Forquilhas integrando a Patrulha Serrana, durante a Guerra dos Farrapos. O seu filho Manoel casou com Magdalena Strach, meia irmã de João Patrulha. Manoel e Magdalena radicaram-se no núcleo da igreja, na sede da Colônia, nas terras da viúva Menger. O casal teve 4 filhas e 6 filhos que se vincularam com dedicação na vida da Comunidade. Entre seus descendentes destacaram-se Adair dos Santos e seu sobrinho Jaime dos Santos que foram presidente da Comunidade IECLB em Itati e o reverendo Roberto Etter dos Santos (ex-pastor da IECLB).

JOSÉ FLOR DA SILVA, residiu no alto da Serra, integrando a Patrulha Serrana. Após a Guerra dos Farrapos recebeu terras no Baixo Josaphat, próximo a João Patrulha Menger. Seu filho Serafim estudou em Torres, onde aprendeu a profissão de alfaiate e sapateiro. Serafim casou em 1859 perante pastor Voges com Carolina Feck. Este casal deu 8 netos para Zeca Flor, pois tiveram 3 filhas e 6 filhos. O filho Adriano Flor da Silva foi assassinado em 1892. O filho Carlos Pedro morreu envenenado em 1897.

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ANTONIO SABINO, o TONHO CABELEIRA, que residiu ao pé da Serra, ao servir na Patrulha Serrana. Finda a guerra recebeu terras no alto da Serra. Os “Sabino” tornaram-se conhecidos como sendo os “Cabeleiras” por usarem cabelo comprido, amarrado com um lenço. Até hoje existe a Trilha dos Cabeleiras, no fundo de Rio Carvalho. João Sabino, filho de Tonho, era cunhado de Rico Marques. Uniu-se com Bárbara Pereira de Souza. Tiveram os filhos: José (02.01.1880) e Maria (01.02.1878), batizados pelo Pastor Voges. Todos os descendentes da Família Sabino moravam na Serra dos Cabeleiras e tornaram-se maragatos, participando da Revolução Federalista.

FRANZ STRACH, veio fixar-se na Colônia de Três Forquilhas, ao pé da Serra, ao integrar a Patrulha Serrana. Ele teve seu sobrenome aportuguesado para Estraque e Straque. Recebeu terras no Baixo Josaphat, em forma de pagamento, Estava unido com a viúva Ana Catarina Menger que conseguira terras na sede da Colônia. Franz Strach foi, portanto padrasto de João Patrulha Menger.

TILO FABRÍCIO, integrou a Patrulha Serrana radicando-se no Baixo Josaphat, ao pé da Serra do Pinto. A sua filha Maria Fabrício, casou com Johannes Teisinger, casal que teve o filho Valentim, em 1849 (afilhado de Valentim Justin). O casal Teisinger saiu de Três Forquilhas, devido à má fama dos irmãos Fabrício, filhos de Tilo, Por volta de 1880 esses irmãos Fabrício passaram a promover atos de violência na Colônia e foram eliminados pela força policial.

MILITARES BRUMMER QUE ENTRARAM NA COLONIA DE TRÊS FORQUILHAS A PARTIR DE 1853

Para a Colônia de Três Forquilhas que por algum tempo sofreu sob um inclemente isolamento e estagnação, a vinda dos "Brummer", tornou-se fator valioso a contribuir na arrancada para o desenvolvimento no chamado período

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da "Renascença da Colônia". Eles representavam sangue novo como ótimos partidos para as moças casadoiras além de apresentarem todos eles boa formação intelectual e capacitação profissional. Alguns foram dispensados antes da guerra, por motivos de saúde, como foi o caso do professor Christian Tietboehl.

Ao chegarem, traziam seus vistosos uniformes, medalhas, armas e mochila militar. Na Colônia de Três Forquilhas passaram a ser conhecidos como "Mochileiros", pois que diversos passaram a circular pela Vila e circunvizinhanças com a mochila nas costas, para levar as ferramentas de trabalho.

Quem eram estes militares prussianos?

Em 1851 o Brasil decidira contratar tropas mercenárias para a luta contra Oribe e Rosas. Foram trazidos 1800 homens da Prússia (alemães) sendo muitos deles experientes por terem atuado em campos de guerra da Europa.

Vieram artilheiros, infantes, sapadores. Apresentaram-se completamente apetrechados com suas armas (fuzil Dreyse com agulha), fardamento, capacete, além da mochila de campanha, com todo o material para entrar em combate.

Fizeram um contrato para quatro anos de serviços ao Brasil, nas seguintes condições: 1 – No final dos quatro anos receberiam um prêmio em dinheiro e se quisessem poderiam voltar para a Alemanha. 2 – ou, receber o soldo durante quatro anos e mais uma área de terra e radicar-se no Brasil. A maioria aceitou a segunda opção.

Dois Brummer destacaram-se pelo seu valor militar sendo convidados, após a guerra, para servirem de instrutores na Escola Militar no Rio de Janeiro. O Major Maximiliano Emmerich. Ele transmitiu a tecnologia militar

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prussiana aos jovens oficiais brasileiros. Ele seguiu depois para a Guerra do Paraguai como militar do Exército Brasileiro.

O segundo instrutor foi o tenente Coronel Peter Meyer, um atirador de elite e serviu como instrutor de tiro para alunos da Escola Militar. Também depois partiu para a Guerra do Paraguai.

Findas as lutas contra Oribe e Rosas, os que não estavam enfermos, tiveram que terminar o contrato com o Império para serem liberados.

Pastor Voges, a partir de 1851, empenhara-se, insistentemente, com o auxílio do Comandante Schmitt e do Brummer Christian Tieboehl, para conseguir a vinda de pelo menos alguns militares, para a Colônia de Três Forquilhas.

Comandante Schmitt tinha um especial interesse, pois dentre esses imigrantes encontrava-se o seu sobrinho Wilhelm Schmitt, que viera por volta de 1852 ou 53, para prestar serviços de armeiro, aguardado, para o efetivo dos Brummer. Wilhelm era aguardado em Três Forquilhas com ansiedade, para o casamento com Bárbara Schmitt, (filha do comandante Schmitt e prima de Wilhelm15).

Porém Comandante Schmitt não pode presenciar a chegada do sobrinho e o casamento com Bárbara, pois faleceu semanas antes, em virtude de enfermidade crônica de hidropisia.

Christian Tietboehl também auxiliou bastante, pois tinha entre aqueles militares diversos de seus amigos e conhecidos.

Vieram em torno de 20 militares prussianos para Três

Forquilhas, com suas fardas, mochilas e armas (fuzil Dreyse).

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A inclusão deste militares na Colônia teve um efeito bem maior do que o esperado, nas mais diferentes áreas: social, econômica e cultural. Eles vinham com seus soldos de quatro anos quase intactos, para aplicar em atividades na Colônia. Foram logo vistos como ótimos partidos para um casamento. Além disso, diversos deles eram disputados como profissionais bem qualificados em diferentes áreas como alfaiates, sapateiros, carpinteiros, funileiros, entre outras profissões.

É a seguinte a relação dos "Brummer" da Colônia de Três Forquilhas, com base no Registro Eclesiástico do Pastor Voges e outras fontes da tradição oral:

CRISTIANO TIETBOEHL nasceu em Demin (Prussia). A tradição oral transmite que ele fora oficial do Exército Imperial da Prússia, com uma fina formação intelectual e artística. Era pedagogo e músico. Casou no vale do rio Três Forquilhas com Catarina Eigendrodt. Tiveram sete filhos e duas filhas. Em 1860 fundou/ juntamente com outros companheiros a Banda de Música de Três Forquilhas. Estabeleceu uma Escola Particular e assumiu o cargo de regente do Coral da Igreja. Seus filhos e netos dariam continuidade ao mesmo empenho, mantendo a Banda de Música e o Coral da Igreja em quase 100 anos de atividades ininterruptas, por três gerações da família Tietboehl.

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FIGURA 7: Christian Tietboehl - ex Oficial Brummer.Fonte: Arquivos da Família Voges, 1970.

PETER MATHIAS ERLING nasceu em Mannesheim/Holstein, filho de João Erling, casou no vale do rio Três Forquilhas, em primeiro matrimônio com Dorothea Henze, tendo duas filhas e um filho, e, em segundas núpcias com Susana Weckmann, com quem teve mais três filhas e três filhos. Adquiriu uma propriedade agrícola na sede da Colônia e assumiu forte presença na liderança comunitária na Igreja.

MATHIAS GRASSMANN nasceu em Mannbach bei Nieederheimbach, em 1826, filho de Jacob Grassmann e Anna Elisabetha Grassmann e casou na Colônia de Três Forquilhas em 1858, em primeiras núpcias com Catarina Mittmann, tendo quatro filhas e três filhos e, em segundas núpcias com Maria Klein com mais duas filhas e dois filhos. Estabeleceu-se como curtidor e agricultor, com forte presença na liderança comunitária.

JOSÉ ETTERER nasceu em Heithil am Rhein, em 1820, filho de Matheus Etterer e Maria Braunholz e casou no Vale de Três Forquilhas em 1853 com Bárbara Justin. Tiveram doze filhas e dois filhos. Modificou mais tarde o sobrenome, passando a assinar somente ETTER. Exerceu as

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profissões de alfaiate e sapateiro, estabelecido à margem das terras do Pastor Voges, na estrada que leva à localidade de Arroio do Padre.

AUGUST RUDOLF nasceu em Berlim em 1834, filho de João Daaniel Rudolf e Carolina Rudolf. Casou em 1861 com Catarina dos Santos, filha do indo missioneiro Manoel Santos, tendo uma filha e sete filhos. Modificou mais tarde o sobrenome, passando a assinar RODOLFO. Exerceu as profissões de alfaiate e sapateiro.

FRANZ SAUL, não encontramos nenhum registro sobre a sua procedência, na Prússia. Casou na Colônia de Três Forquilhas, em 1857 com Elisabeta Dorotea Mauer, tendo com ela cinco filhos. Exerceu o cargo de professor da Comunidade, mantida pelo Pastor Voges. Seus descendente não permaneceram na Colônia, mudando residência para a região do cima da Serra.

AUGUST SONNTAG não encontramos nenhum registro sobre suas origens, na Prússia. Foi ao campo de guerra no Paraguai, e no retorno a São Leopoldo, foi convidado pelo Pastor Voges para atuar como professor da Escola da Comunidade, como sucessor de Franz Saul. Foi a fase de especial progresso na área do ensino escolar. Sonntag casou com Bárbara Triesch, em 1876 e tiveram um filho e uma ·filha. Exerceu ainda a profissão de médico homeopata, recebendo o apelido de "Xaropeiro".

GUILHERME SCHMITT nasceu nas redondezas de Borrnheim/Hessen. Conforme a tradição oral ele teria servido como armeiro, no Exercito Imperial da Prússia. Na Alemanha, como artesão, estivera ligado à maçonaria germânica. Foi trazido pelo tio Felipe Pedro Schmitt para casar com a meia prima Bárbara Schmitt. Tiveram três filhas e dois filhos. Ele assumiu a casa comercial e o espaço de liderança ocupado pelo sogro, herdando também o apelido do mesmo: Comandante Schmitt.

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JOÃO PEDRO DIETERICO BAUMANN não encontramos registro sobre suas origens na Prússia. Lutou na Guerra do Paraguai. Casou na Colônia com Anna Maria Schneider (filha do cervejeiro Schneider). Tiveram três filhos. Não permaneceu no Vale do rio Três Forquilhas.

MARTIN BREHM (ou BLEHM), nasceu em Briedel/Koblenz, em 1841, filho de Franz Brehm e Elisabetha Schon. Casou, em 1866, com Magdalena Gross, que não era parente. Tiveram três filhas e quatro filhos. Estabeleceu-se na localidade da Boa União como agricultor e criador de gado.

MAXIMILIANO KRAUSE nasceu em Konigsberg, em 1832, filho de João Ferdinand Maximiliano Krause e Frederica Schellenberg. Casou em 1857 com Anna Elisabetha Gehrmann. Tiveram quatro filhas. Exerceu a profissão de marceneiro.

JACOB STEINMETZ não encontramos registro sobre suas origens na Prússia. Casou em 1856 com Elisabetha Justin. Tiveram três filhos e duas filhas. Exerceu a profissão de alfaiate e seus descendentes encontraram prosperidade, alguns buscando a atividade política e a administração pública em Conceição do Arroio – Osório – RS.

JOÃO F.C. WESTPHALEN nasceu em Lübeck bei Neumünsster/Holstein. Casou em 1858 com Maria Catarina Becker. Tiveram quatro filhos e três filhas. Dedicou-se à agricultura, na sede da Colônia. Foi assassinado em 1870, na Colônia de Três Forquilhas.

FREDERICO DICKSEN nasceu em Kiel/Holstein em 1826, filho de João e Helena Dicksen. Casou em 1863 com Maria Madalena Menger. Tiveram seis filhas e dois filhos. Exerceu a profissão de mestre sapateiro na localidade de Três Pinheiros.

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CARLOS RIETGEROTH. Não encontramos registro sobre suas origens na Prússia. Casou em 1857 com Catharina Gross. Tiveram cinco filhos e três filhas. Mudou o sobrenome para RICKROTH. Foi mestre sapateiro na localidade de Morro do Chapéu. Consta que trouxe para dentro de sua casa uma mulher índia, caingangue, e com ela gerou filhos que levaram o seu sobrenome e batizados como sendo filhos tidos com a esposa Catharina Gross.

LUIS STAHLBAUM. Não encontramos registro sobre suas origens na Prússia. Casou em 1860 com Maria Dresbach. Tiveram cinco filhos e duas filhas. Teve modificado o seu sobrenome pelo apelido de Gaspar, por causa do sogro Gaspar Dresbach. Ele passou a ser o Luiz do Gaspar e depois simplesmente Luis Gaspar. Foi marceneiro na localidade de Morro do Chapéu.

JACOB HARTMANN filho de Matheus Hartmann e Cristina Hummes, casou em 1853 com Maria Eva Henze. Tiveram uma filha. A família saiu da área da Colônia Alemã de Três Forquilhas.

JOÃO FINGER. Este nome não aparece no Registro Eclesiástico mantido pelo Pastor Voges. Consta apenas da relação transmitida pela tradição oral. Nos registros consta, porém ALBERT FINGER, radicado em Vacaria e que em 1867 batizou uma filha com o Pastor Voges. Este era casado com Maria Romilda Lemos.

JOÃO SCHWARZ. Não aparece no Livro de Registro Eclesiástico mantido pelo Pastor Voges. Consta que ele residiu no Vale do rio Três Forquilhas, como agricultor.

FREDERICO RODOLFO DIETERICO BROOKSCHMITT. Nasceu em Lushof, no Reinado de Hannover, em 1828, filho de Frederico Brooksschmitt e Cristina Schlüsselberg. Casou em 1855 com Sofia Henze. Estabeleceu-se como agricultor, porém não permaneceu na Colônia por muito tempo.

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Observação: É possível que mais outros Brummer tenham entrado no vale do rio Três Forquilhas, mas não identificados como militares prussianos, uma vez que o Pastor Voges não mencionava detalhes desta natureza em seu Registro Eclesiástico. Esperamos, no entanto, ter contribuído com o resultado das nossas pesquisas para que esta matéria possa ser aprofundada pelos interessados.

FRIEDRICH SCHÜTT – UM ARMEIRO MILITAR INGLÊS

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FIGURA 8: Armeiro e ferreiro.Fonte: Arquivo fotográfico do autor, 1974.

SCHÜTT, FREDERICO. Frederico Schütt que nasceu em Hannover, na Alemanha, serviu no 15º Regimento de Cavalaria Leve, no exército inglês. Veio ao Brasil com o objetivo de servir ao Exército Imperial para combater na Guerra Cisplatina.

Ele se uniu com Elisabetha Brehm, e com ela teve duas crianças. A Dorothea Schütt nascida em 08.07.1828 e a segunda criança foi Friedrich Philipp Nicolaus Schütt, nascido em 29.09.1831, batizado pelo pastor Voges no dia 08.10.1831 e teve como padrinhos Friedrich Wilhelm Eigenbrodt, Nicolaus Helbig e Philipp Gross.

    O filho Frederico Schütt casou em 14.07.1853 com Elisabetha Eigenbrodt e faleceu de ataque cardíaco em 15.05.1896 e tiveram 8 filhos. F1 - Catharina Maria nasceu em 06.08.1854 e que casou com Friedrich Wilhelm Brehm em 13.05.1876. F2 - Friedrich nasceu em 16.09.1858 e casou com Carolina Elisabeth Tietboehl em 27.02.1886. F3 - Catharina nasceu em 17.08.1860 e faleceu quando criança. F4 - Luiza Dorothea nasceu em 1862 e casou com o médico

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inglês William Williams no dia 28.10.1877. F5 - Anton Peter nasceu em 10.09.1864 e casou com Christina Gross 03.04.1890. F6 - Wilhelm nasceu em 26.07.1866 e casou com Rosalina Gross, filha de Paraguaio Gross e Abela Delore, em 07.09.1899. F7 - Leopoldo que nasceu em 23.06.1869 e faleceu solteiro. F8 - Mariana Wilhelmina nasceu em 16.09.1870 e casou com Wilhelm Tietböehl em 24.03.1887.

A profissão de armeiro era uma das mais valorizadas do Brasil, após a Independência (depois de 1822). Serviço não faltava - afinal, alguém tinha de cuidar do armamento dos Soldados, e das armas (espadas e lanças) das milícias.

Era preciso consertar armas avariadas e também alinhar as miras e deixar os canos em ordem. Pela intensidade do uso de armamento, e até com o romper da Guerra Cisplatina, faltavam armeiros no  mercado. Quem sabe, os melhores do ramo eram solicitados a prestar serviços ao Exército Imperial, na Capital - Rio de Janeiro. Porque Schütt não permaneceu no Rio de Janeiro, servindo ao Exército, se ele era um militar? Não sei dar a resposta...

Caso Schütt tivesse permanecido no Rio de Janeiro, certamente ele teria ganhado muito dinheiro, muito e muito mais do que ganhava em ser o ferreiro da Colônia de Três Forquilhas.

No entanto, creio que o amor pela Izabel Brehm, o fez seguir com ela para o Sul. Ou ficara enfermo e não podia mais ser um soldado e armeiro da tropa? Hipóteses para serem pesquisadas. Não tenho respostas para tais perguntas que surgiram...

Sei apenas que Schütt preferiu seguir com a sua amada Izabel Brehm tornando-se padrasto de Wilhelm e Martin Brehm. Ele ajudou na formação excelente dos meninos Brehm e fez deles homens de valor, os quais deixaram suas

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marcas na história local. (Darci Brehm foi o primeiro Prefeito do município de Três Forquilhas. Também Rubem Brehm Justo e Enildo Brehm foram Prefeitos de Três Forquilhas. Carlos Chaves, atual Prefeito de Itati – RS também é descendente de Wilhelm Brehm. Existem outros líderes, em cujas veias, correm o sangue de Brehm, por exemplo, o Jarbas Brehm e toda aquela numerosa turma. Inclusive nas veias de minha esposa e de meus filhos existe o sangue Brehm, pois a bisavó de Doris chamava-se Leopoldina Brehm e casou com José Justo. Todos eles devem ao Schütt que o antepassado Wilhelm Brehm recebeu esse bom encaminhamento para a vida.

   Dentre os descendentes do armeiro militar Frederico Schutt lembramos também o professor Pedro Osmar Schutt com destacada folha de serviços no magistério, em particular na Escola Rural Guilherme Schmitt, em Três Pinheiros e o Sr. Luis Cláudio Schutt que foi vereador em Itati - RS.

O ferreiro GUILHERME BREHM nasceu em 04.12.1825 no Rio de Janeiro, filho de Izabel ou "Elisabeta" Brehm, que voltara a casar em São Leopoldo com o viúvo Bentzen, que faleceu. A viúva integrou a caravana rumo a Três Forquilhas e em algum momento uniu-se com Frederiico Schütt. Desta forma Guilherme Brehm entrou no Vale de Três Forquilhas com apenas um ano de idade. Ele aprendeu a profissão de ferreiro, ofício que lhe foi transmitido pelo padrasto. Seus descendentes tiveram presença marcante na vida da Colônia de Três Forquilhas. Tornaram-se ativos na Comunidade e arrojados em seus empreendimentos. São responsáveis pela instalação da primeira indústria de conservas do Vale do Rio Três Forquilhas, em 1970. Darci Brehm exerceu a função de Prefeito de Torres e foi eleito primeiro Prefeito de Três Forquilhas em 1992. Na descendência de Guilherme Brehm constam mais dois Prefeitos do município de Três Forquilhas: Rubem Brehm Justo e Enildo Brehm, além de diversos vereadores e líderes políticos.

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WILHELM SCHMITT – UM ARMEIRO E RELOJOEIRO

Wilhelm Schmitt trouxe da Europa uma forja doméstica, pequena, mas na época bem moderna. Na profissão de relojoeiro ele não encontrou muito serviço, pois os relógios eram escassos na Colônia de Três Forquilhas.

Schmitt não fabricava relógios, apenas consertava. Ele fabricava as peças de reposição, fabricando mecanismos

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e engrenagens. Era, por isso, fundidor, dourador e cinzelador.

Os relógios quase todos eram de ferro, com corda para dois dias. Os relógios com pêndulo eram ainda mais raros, talvez meia dúzia deles na Colônia. Wilhelm possuía o relógio de pêndulo mais fino, era de pêndulo compensado com mercúrio com elevado grau de precisão, no modelo da marca George Graham.

Comparando os armeiros Schütt e Schmitt, ficava evidente que a forja do primeiro era rústica, de tamanho grande. A forja do segundo era pequena e delicada. O ferreiro Schütt e depois seu enteado Brehm usavam um grande martelo, batendo sobre o ferro em brasa na forte bigorna. Já o armeiro Wilhelm Schmitt usava no máximo um martelete. Com a forja delicada ele derretia metais e os moldava em moldes de gesso.

Ambos sabiam trabalhar com o ferro, com o aço e bronze.

Wilhelm Brehm, o ferreiro herdeiro de Schütt, continuou fabricando ferramentas grandes, duras e flexíveis.

Wilhelm Schmitt passou a fabricar pequenas peças, mecanismos e engrenagens.

As ferramentas de Wilhelm Brehm eram, portanto a bigorna, os martelos, a grande forja, o fole, os tornos de cilindrar, as serras de cortar, as cunhas e as alavancas.

Já para Wilhelm Schmitt era tudo em miniatura.

O Ofício de um Mestre Armeiro

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O armeiro tinha que entender do ofício de ferreiro, de funileiro e ferramenteiro.

O Armeiro, como ferreiro, fazia o serviço rústico de

transformar ferro em canos e nas demais peças de armamento. Na condição de Funileiro fazia moldes para fabricar armas e armaduras, espadas e lanças. Como ferramenteiro sabia fazer toda a espécie de ferramentas e engenhocas.

O principal personagem da SAGA DOS SCHÜTT NA COLÔNIA DE TRÊS FORQUILHAS foi o armeiro Friedrich Schütt. Ele foi ferreiro, funileiro e ferramenteiro. Ele sabia produzir de tudo que lhe fosse encomendado, desde espadas, lanças, bem como as ferramentas mais diversas como facões, foices, machados e enxadas.

Como armeiro Schütt sabia trabalhar com moldes de argila. Com esses moldes ele produzia, em uma fornalha própria, as suas espadas, lanças e canos de armas e de pistolas, com a qualidade que suas habilidades permitiam. Uma arma feita de bronze tinha qualidades totalmente diferentes das de uma de ferro. Por isso havia a necessidade de conseguir a matéria prima. Onde conseguir a matéria prima? Possivelmente, em Três Forquilhas, ele passou a trabalhar exclusivamente com ferro, a matéria prima mais fácil de ser encontrada e abandonou a fabricação de armamentos.

Em Três Forquilhas, em 1826, a maioria eram colonos que precisavam de algum tipo de ferramenta, de ferro. Enxadas, foices, machados, facões, etc.

Certamente ele apenas consertava armas... Armas avariadas que os colonos lhe traziam...

Quando Wilhelm Schmitt chegou ao vale do Três Forquilhas também notou que não teria clientela. Tentou desenvolver a sua exímia atividade artesanal para forjar as

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peças de reposição em armamentos, tanto de pistolas bem como de armamento de cano longo. Mas o serviço era tão escasso que passou a cuidar de suas lavouras, do engenho e de seu alambique, com o auxílio de peões.

A ÍNDIA PARAGUAIA ABELA DELORE

Abela Delore nasceu em 1851 nas proximidades de Luque, no Paraguai, nas planícies entre o rio Paraguai e o lago de Ypacaraí, a quase 20 quilômetros de Assunção.

A família de Abela mudou-se mais tarde, por volta de

1858 para as margens do rio Avaí, na direção da cidade de Vileta.

A família Delore era de origem indígena, do ramo dos guaranis, civilizados e entrosados na sociedade. O pai de Abela tornou-se um próspero estancieiro dedicado à criação de cavalos.

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FIGURA 9: Índia Guarani, do Paraguai.Fonte: Internet, 2010.

O estancieiro e seus filhos mais velhos foram convocados para a guerra e pereceram na batalha de Avaí, em 1868.

Restaram órfãos Abela e Pepito, pois a mãe já falecera no início da guerra.

Abela socorreu o soldado brasileiro Carl Daneil Gross, que jazia gravemente ferido no campo de batalha. Concedeu-lhe os primeiros cuidados e depois o conduziu até o Hospital de Campanha brasileiro, provavelmente em Vileta.

Luisa Abela Dellore depois veio na garupa de um cavalo, acompanhando o soldado brasileiro que ela socorrera até o Brasil e dele cuidou com integral dedicação, até o final. Seus filhos e netos e amigos a admiravam por este motivo.

Quando Carlos Daniel Gross partiu desta vida, Abela foi tomada pela solidão. Sobrevieram para ela horas de saudade do Paraguai. Ela se dirigia então ao descampado,

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ou subia algum morro mais próximo, preferindo estar longe de todos. Encontravam-na inúmeras vezes com o olhar perdido, olhando para o horizonte, na direção de sua terra natal. Sofria em silêncio, a sós.

Ainda que Abela falasse pouco, pois que só dominava bem a língua guarani, seus netos souberam que ela fora filha de um rico estancieiro paraguaio. O pai um próspero criador de cavalos e dono de 25 escravos. A mãe dela falecera antes do inicio da guerra. Por causa da guerra todos os cavalos haviam sido requisitados pelo Exército de Solano Lopes. Nada mais restou ao estancieiro senão de também partir para o campo de combate, juntamente com os seus filhos mais velhos. O pai cairia morto, diante das lanças da cavalaria brasileira, na Batalha do Avaí, em 1868.

Abela que fora rondar os campos de batalha, andando em companhia do irmãozinho, passou pelos campos de combate do Avaí, em busca de notícias do pai ou de seus irmãos. Encontrou ali o cavalariano brasileiro que talvez tivesse morto seus familiares.

Essa era a história da índia paraguaia Abela e do combatente brasileiro Carlos Daniel Gross. Uma legítima história de AMORES DA GUERRA.

O irmãozinho de Abela, que prometera acompanhá-la, só chegou até Santa Maria. Assustou-se com a vastidão da terra estrangeira em que pisava pela primeira vez e preferiu retornar ao Paraguai.

Quando Carlos Daniel Gross faleceu, Abela passou a pensar muito nesse seu irmão. Tinha uma enorme vontade para revê-lo, de saber se ele estava bem. Ela ficou tão envolvida neste sofrimento tão profundo que se arraigava em sua alma que, quando Paraguaio Gross faltou, ela não conseguiu nem mais cuidar de sua filhinha caçula, nascida em 1883, um pouco antes do falecimento de Paraguaio Gross. Carl Strassburg que também estivera na guerra, se

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apresentou na casa da viúva Abela Delore e prontificou-se a adotar e criar a pequenina Maria Paulina Gross.

Abela findou os dias na Colônia Alemã de Três Forquilhas, minada pela tristeza e melancolia. Ela também recebeu, em 1885, o repouso no Cemitério do Passo, ao lado da sepultura daquele que ela salvara e ao qual se ligara a tal ponto que deixara tudo, sua terra e sua gente.

A INICIAÇÃO POLÍTICA DE CANDINHO

Baiano Candinho teve um período muito feliz, na propriedade de Paraguaio Gross, como capataz para conduzir a atividade dos peões da propriedade.

As cercas de taipa de pedra, para demarcar a propriedade e as cercas do potreiro, foram construídas nesse período por orientação dele.

Os dias de chuva e dias de folga foram ocasiões de longas conversas mantidas por Paraguaio Gross e Candinho. Outras vezes foram as visitas demoradas que o velho Miguel Barata costumava fazer ao Paraguaio, para ficarem falando de política. E, conversa vem e conversa vai, Candinho vinha se juntar aos dois, interessado pelos ideais farroupilhas e das lutas do passado, em busca de mais justiça para os habitantes da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul.

Todos notavam que Paraguaio Gross ia perdendo a força muscular, a cada dia que passava. O homem parecia

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estar "secando", lentamente, por debaixo da pele. Aos amigos ele explicava que o problema resultara de água pestilenta16 que ele se vira obrigado a beber, em certa oportunidade, para não morrer de sede.

Os amigos, por sua vez, faziam "troça", sugerindo que ele, cada vez mais, se assemelhava ao couro estaqueado17.

No contato com o veterano Paraguaio Gross, a

influência que Candinho passara a receber dizia respeito à atividade política no vale do rio Três Forquilhas. Gross não escondia a sua grande insatisfação com a situação em que se encontravam os imigrantes alemães e seus filhos, de credo protestante que estavam impedidos, de votar e de serem votados. O veterano Gross costumava criticar tal situação, dizendo: "Para oferecermos as nossas vidas em defesa da Pátria, fomos aceitos. Mas para votar e sermos votados, não nos concedem tal direito".

Bahiano Candinho simpatizou com este discurso. Temos que lembrar que ele também se via alijado da vida política e pública por viver como um clandestino. Até um nome falso ele adotara.

Conforme já citamos anteriormente Paraguaio Gross pertencia ao grupo dos admiradores dos feitos e da coragem dos farrapos que enfrentaram o Governo Imperial em busca de mais atenção para esta terra do extremo sul.

No passado, após a Guerra dos Farrapos, de retorno ao vale, o Miguel Barata é quem mais influenciara os jovens da localidade, com seus discursos inflamados, dentre os quais Gross ocupava um lugar especial.

Além disso, a Colônia Alemã de Três Forquilhas via o fortalecimento, cada vez maior, do Partido Liberal, sob a liderança do Major Adolfo Felipe Voges.  Esse partido era reconhecido como continuador dos ideais farroupilhas, ao

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qual estava ligado até o insigne General Manoel Luis Osório, que todos admiravam.

Lembramos ainda que nos primórdios da Colônia, no tempo da Revolução Farroupilha (1835-45) poucos haviam sido os maragatos farroupilhas, na localidade. Apenas era citado o nome de Miguel Barata (Johann Michel Eberhardt) que se posicionara publicamente e por causa disto até tivera que se afastar de Três Forquilhas, por diversos anos, para fugir de perseguições.

Agora, porém, no Partido Liberal podiam ser encontrados representantes de inúmeras famílias influentes da Colônia, como por exemplo: dos Jacoby, dos Hoffmann, dos Eberhardt, dos Gross, dos Becker, dos Menger, dos Pereira de Souza, dos Triesch, dos Flor, dos Klein, dos Rudolf, dos Stahlbaum, dos Brusch, dos Schwartzhaupt, dos Rickroth, dos Steinmetz, dos Tietboehl, entre tantos outros. O próprio pastor Carlos Leopoldo Voges, depois de mais de 40 anos de dedicação à vida administrativa e espiritual da Colônia encorajava agora os paroquianos a uma vida bem mais ativa na esfera política local. O pastor se naturalizara, para ser um cidadão brasileiro, fazia muitos anos, com o objetivo de contornar as limitações que alguns setores políticos da Província tentavam lhe impor por considerá-lo como sendo um estrangeiro. Pastor Voges não tinha pretensões por cargos eletivos, mas incentivava os seus filhos e os filhos dos colonos para ocuparem todos os espaços possíveis e para o exercício de liderança em busca de uma participação ativa na política, ali onde se estabelecessem.

Bahiano Candinho inicialmente foi apenas observador e ouvinte. Mas quando aderiu passou também a pregar os ideais dos farroupilhas e maragatos, e o fez com convicção. Foi ocupando, passo a passo, o espaço que o seu amigo Paraguaio Gross ia deixando, em virtude da saúde precária que, a cada dia, piorava.

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A discriminação que no passado fora feita pela maioria dos moradores da Colônia de Três Forquilhas, aos seguidores do movimento farroupilha, foi desaparecendo por completo. Certamente a causa principal para isto foi à conscientização ampla, como esta em que Paraguaio Gross também se empenhou, após o seu retorno da guerra. Os colonos passaram a entender que a falta de perspectivas dos protestantes de participar da vida política do Brasil, era inaceitável.

Foi deste modo que os cinco baianos ingressaram neste círculo bem íntimo do "Paraguaio Gross", pelo simples fato de estarem unidos com sobrinhas dele. Todavia, tiveram que passar a viver à sombra da fama, ao lado de um combatente de valor reconhecido.

Afinal, Carlos Daniel Gross era filho do Carpinteiro Gross - Philipp Peter Gross - dos pioneiros imigrantes. Paraguaio Gross era cunhado de "João Patrulha" (Johannes Menger), de "Lipio Fatas" (Joachim Brusch) e de Heinrich Becker. Era tio das mulheres de "Pedro Bahiano", "João Bahiano" e "Bahiano Tonho" e tio da eterna namorada de "Bahiano Candinho", a "Tedéia Beca".

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AS MÃES E AS VIÚVAS DOS COMBATENTES MORTOS

Merece espaço em AMORES DA GUERRA um enfoque, por breve que seja e que permita uma visão da situação das mães e das viúvas dos ex-combatentes que tombaram na Guerra do Paraguai. As famílias souberam quando dos recrutamentos dos voluntários, que em caso de mortes dos mesmos, haveria uma pensão para a mãe, se solteiro, ou para a viúva, quando casado.

Podemos assim entender que uma das preocupações da viúva Gross, que surge em AMORES DA GUERRA, tinha algo a ver com o recebimento de uma pensão, caso o filho não retornasse. Felizmente ele retornou e com uma boa quantia em dinheiro na guaiaca, do soldo pelo cumprimento do serviço como combatente.

Conforme estimativas dos pesquisadores, o Brasil teve entre trinta a cinqüenta mil mortos na Guerra do Paraguai. Além disso, teve um número elevado de mutilados e gravemente feridos.

Sucedeu um grave problema social do pós-guerra que atingiu entre cinquenta a oitenta mil famílias brasileiras.

O Governo Imperial havia contabilizado um problema econômico de grandes proporções, advindo dos gastos com a Guerra do Paraguai. Ficou diante de uma desorganização

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político administrativa com dificuldades para ressarcir as mães e ou as viúvas e órfãos dos ex-combatentes tombados nos combates e os mutilados e incapazes para o trabalho. Inúmeras mães ou viúvas jamais foram indenizadas pela perda irreparável do filho ou do marido, fato que comprometeu a sobrevivência daquelas famílias.

Muitas mães e muitas viúvas e órfãos foram tomados por angústia e pelo medo. A angústia e o medo são pólos que merecem a nossa observação. O medo pode ser descrito como sendo uma situação bem determinada, com vistas claras sobre o futuro adverso que está pela frente. Já a angústia é marcada por total incerteza, motivada pela ausência de notícias e bem mais difícil de enfrentar, pois precisa lidar com uma ansiedade difícil de ser identificada. Tratam-se de sofrimentos profundos, que comprometem a saúde e a existência dessas mulheres.

Existiram muitas mães, muitas viúvas, e muitos órfãos tomados por ansiedade e melancolia por causa do desaparecimento do combatente, que não voltou, criando uma angústia profunda e dolorosa. Somado à angústia, está o medo, causado pela ausência do provedor, que cuida da sobrevivência da família.

Angústia e medo, sofrimento dobrado, para mães, viúvas e órfãos diante de um governo imperial ineficiente, que foi incapaz de providenciar uma pensão imediata para as famílias dos militares mortos ou mutilados, da Guerra do Paraguai.

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A ESCOLA DO PASTOR VOGES

A Escola da Comunidade, também conhecida como Escola do Pastor Voges iniciou em 1827, de modo precário e funcionou no templo de madeira, por mais de 20 anos.

Em 1850 ela foi transferida para o sobrado do pastor, com sala no piso superior. Além disso, o pastor oferecia acomodação ou quarto para hospedar o professor, enquanto que solteiro.

Em 1853 o pastor conseguiu a vinda do professor August Schröder, que chegou logo após a inauguração do templo de pedra. Schröder adoeceu em 1854 pedindo transferência a Porto Alegre, para melhor cuidar de seu tratamento. Em 05 de janeiro de 1855 o pastor enviou ofício ao Conde de Sinimbu, José Lins Vieira, então Presidente da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, e ainda dizia: “A aula em Três Forquilhas é freqüentada por 30 alunos, os quais fazem ligeiros progressos debaixo do magistério do professor Augusto Guilherme Schröder, de maneira que os meninos da Missão freqüentam a sua aula. Vão à Escola do Governo do dito professor, mui acertado, por ser pessoa de boa moral e zeloso no seu emprego”.

Na primavera de 1854 o pastor conseguiu trazer o professor Franz Saul, para integrar o corpo docente da Escola da Comunidade, uma vez que Schröder já comunicara sua situação precária de saúde e o desejo de seguir para Porto Alegre. Franz Saul era dos militares prussianos, Brummer, que lutaram na Guerra contra Oribe e Rosas, e vinha com uma esmerada formação recebida em escola européia. O professor Saul adaptou-se bem à Colônia e em 1858 casou com Elisabeth Dorotéia Mauer. Tratava-se de uma filha do moleiro Christian Mauer, regente do coral da igreja e braço direito de pastor Voges na liderança da

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Comunidade. O casamento do professor Saul com Elisabeth Doroteia foi abençoado com os seguintes filhos: Carlos Saul, em 03.03.1859, Adolfo Guilherme Saul em 03.04.1861, Leopoldo Saul em 21.08.1863, Carlos Frederico Saul em 03.07.1865 e Martin Saul em 18.05.1867.

Dez anos após o término da Guerra do Paraguai professor Saul decidiu transferir-se para a região do Cima da Serra. Novamente o pastor teve que se empenhar na busca de novo professor. Localizou o militar August Sonntag que combatera na Guerra do Paraguai e estava em busca de um campo de trabalho, como professor, em vista de sua formação em escolas européias, dando-lhe condições de exercer este mister. Augusto Sonntag assumiu a Escola de Voges após a saída do professor Saul e integrou-se na Comunidade. Casou em 1876 com Bárbara Triesch e tiveram os seguintes filhos: João Carlos Augusto Sonntag, nascido em 22.10.1877 e Maria Sonntag nascida em 26.09.1880.

FIGURA 10: Professor AUGUST SONNTAGFonte: Arquivo da Família Voges

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O professor Sonntag dedicou-se além do magistério também à prática da medicina, recebendo o apelido de Xaropeiro. Ele fabricava os seus próprios xaropes e, além disso, trazia remédios da Capital. Professor Sonntag permaneceu na Colônia de Três Forquilhas até a morte, vitimado pela epidemia de cólera que se abateu sobre a Colônia de Três Forquilhas.

Outra iniciativa de grande vulto encetada em prol da formação ministrada na Escola do Pastor Voges foi sem dúvida a vinda do professor Serafim Agostinho do Nascimento com o claro objetivo de oferecer o ensino da língua nacional aos alunos. O professor Nascimento se formara na Capital Federal, ou seja, no Rio de Janeiro. O trabalho trouxe uma total mudança no ensino ministrado na Escola do Pastor Voges.

O professor SERAFIM AGOSTINHO DO NASCIMENTO nasceu em 1835 na cidade de Rio Grande, na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, filho de Antonio Agostinho do Nascimento e Maria do Nascimento. Serafim teria sido primo-irmão do pai do Presidente Getúlio Dornelles Vargas. Conforme informação de Hernando Nascimento, o pai de Getúlio Vargas teria se chamado Manoel Vargas do Nascimento. Ainda não foi possível comprovar essa informação com outras fontes.

Serafim foi estudar na Capital do Império, Rio de Janeiro. Lá casou com a baiana Maria Carolina dos Santos, filha de Antonio José da Silva e Marcelina Joaquina do Espírito Santo. Retornando ao sul, Serafim foi morar inicialmente na cidade de Conceição do Arroio (Osório). Mais tarde seria enviado para a Colônia de Três Forquilhas. O Governo da Província atendia solicitação feita pelo pastor Voges que desejava receber um bom professor de língua nacional, para os jovens matriculados na escola por ele mantida. Como primeira atitude, ao chegar à Colônia, professor Serafim buscou receber, junto ao pastor Voges,

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algumas aulas de língua alemã, com o propósito de melhor conseguir se comunicar com pais e alunos.

Professor Serafim e Dona Maria Carolina tiveram os seguintes filhos: F1 – Serafim Agostinho do Nascimento, nascido no Rio de Janeiro em 1861. Sem outras informações. F2 – Antonio Agostinho do Nascimento, nascido no dia 13 de setembro de 1863 em Conceição do Arroio (hoje Osório – RS). Na Colônia de Três Forquilhas recebeu depois o apelido de “Nico Nascimento”. Casou com Catharina Schwartzhaupt. O casal deu os seguintes netos para o professor: N1 – João; N2 – Nenê; N3 – Marica; N4 – Brandina; N5 – Serafim; N6 – Antonio; N7 – Dolfa. “Nico” foi cabo da Escolta Policial, em 1897, destacado para a Guarnição de Arroio do Padre (Trilha das Mulas). F3 – João Agostinho do Nascimento nasceu no dia 23 de junho de 1865 na cidade de Conceição do Arroio (Osório – RS). Recebeu o apelido de “Joca Nascimento”. Casou com Generosa Feijó. Tiveram os filhos: N1 – João (02.11.1896), N2 – Alypio (11.12.1899). Joca e Generosa fixaram residência na localidade de Três Pinheiros. F4 – Luiza Serafina (Carolina) do Nascimento nasceu no dia 23 de agosto de 1867 na cidade de Conceição do Arroio (Osório – RS). F5 – Luiz Agostinho do Nascimento nasceu em 1868, na Colônia de Três Forquilhas. Recebeu o apelido de “Lula Agostinho”. Não há registro sobre nome da esposa. O casal deu os seguintes netos ao professor: N1 – Modesto; N2 – Leopoldo; N3 – Dedé; N4 – Vicentina; N5 – Maria; N6 – Palmira; N7 – Candoca. Lula e família fixaram residência em Três Pinheiros. F6 – Carlos Agostinho do Nascimento nasceu em 1869, na Colônia de Três Forquilhas. Casou com Maria Cardoso (viúva do falecido Frederico Bobsin). Não tiveram filhos.

O professor Serafim Agostinho do Nascimento recebera a alcunha de Doutor Nascimento, pois ele clinicava e tratava as doenças mais simples. Quando saía à cavalo, nas andanças pela Colônia, sempre levava uma maleta contendo homeopatias, xaropes e outros medicamentos.

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Serafim além de professor era homeopata, parteiro, doutor, também atuava como advogado de colonos analfabetos fazia inventários, redigia cartas, documentos e petições em nome de pessoas analfabetas, foi político atuante no Partido Liberal (Maragato). Participava do trabalho de alistamento eleitoral dos colonos. Por diversas vezes recebeu o cargo de subdelegado da Colônia de Três Forquilhas. Sua residência se situava a aproximadamente 200 metros do templo protestante, onde mais tarde o Sr. Otto Becker construiria um armazém.

Professor Nascimento lecionou na Escola mantida pelo Pastor Voges durante 30 anos. Aposentara-se em 1890, porém continuou ministrando aulas de português na referida Escola, por falta de um mestre que o pudesse substituir.

Em 1894 a Escola foi transferida para a nova casa pastoral e, transformada, pelo novo pastor, em Escola Alemã. A Escola deixou de ministrar um ensino completo. Passou a ser uma escola de catequese, visando alfabetizar as crianças na língua alemã e catequizá-las na doutrina protestante (hoje se falaria em ensino confirmatório).

Professor Serafim Agostinhho do Nascimento caiu em total ostracismo, por ter sido sempre um maragato convicto. Quando faleceu, em 22.05.1902, aos 67 anos de idade, deixou uma boa herança para os filhos: uma fazenda em Mostardas. Os filhos, porém jamais reivindicaram a propriedade, deixando-a abandonada até os dias atuais.

ASSISTÊNCIA RELIGIOSA AOS COMBATENTES, MINISTRADA POR VOGES, ANTES E DEPOIS DA GUERRA

A assistência aos voluntários do vale do rio Três Forquilhas e seus familiares foi ministrada pelo Pastor Voges

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com uma atenção especial. Todos eram da Igreja Protestante (hoje IECLB), ligados à Colônia Alemã de São Pedro de Alcântara das Três Forquilhas.

Por ocasião da convocação dos voluntários, era, pois pastor Voges quem os assistia. Assim que o efetivo apresentou-se pronto para partir, ele os reuniu na Igreja, juntamente com os respectivos familiares, para um culto solene. O pastor invocou a proteção e a ajuda de Deus, para que cumprissem fielmente todos os deveres, em defesa da Pátria.

Sabemos que outros pastores também assistiram os soldados de suas respectivas áreas. O pastor Otto H.T. Recke, pároco de Campo Bom-RS (no Vale do Rio dos Sinos) chegou a viajar a Porto Alegre para junto à Igreja Evangélica (Rua Senhor dos Passos) realizar cultos especiais, destinados aos voluntários alemães.

Em 20.08.1865 oficiou um culto para a "Bateria dos Voluntários Alemães", sendo que todos eles (aproximadamente 80) comungaram na Santa Ceia. Estes voluntários foram depois incorporados ao 12º Regimento de Artilharia Montada, comandada pelo Coronel Emilio Luiz Mallet. Diversos voluntários das Três Forquilhas também integraram este Regimento, como foi o caso dos irmãos Sparremberger e certamente participaram desse culto realizado em Porto Alegre.

Em Hamburgo Velho (Novo Hamburgo-RS) o pastor João Pedro Haesbert ofereceu assistência aos voluntários. O seu próprio filho Luiz Adolfo Haesbert, da Guarda Nacional, também seguiu ao Paraguai, morrendo em 1867, em Corrientes, vitimado pela cólera.

Os voluntários protestantes seguiram ao campo de batalha, sem a companhia de um pastor. O Império contratara somente padres católicos, para o serviço de

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assistência religiosa, aos efetivos brasileiros que seguiram até a frente de guerra.

Um dos motivos de não existir um Capelão Protestante vinha de uma circunstância, descrita pelo pastor Voges, já no ano de 1827: "Por falta de pregadores evangélicos não está contratado um pregador para os Regimentos Alemães". Essa situação da falta de pastores persistiu até a época do final da Guerra do Paraguai.

Antes da partida dos futuros combatentes da Colônia Alemã de Três Forquilhas, pastor Voges realizou um culto especial, para animar os voluntários que partiam em defesa das terras brasileiras.

Depois, cada vez que, do Paraguai, vinha a informação da morte de um filho da Colônia, Dona Elizabetha, esposa do pastor Voges, confeccionava uma coroa de flores. No culto seguinte, esta coroa era fixada na parede interior do templo, juntamente com uma faixa contendo o nome do soldado morto. Durante as orações, o pastor lembrava o nome do falecido. Após o culto reunia os familiares em torno da coroa, enfatizando o sangue derramado em defesa da Pátria, deste filho ora sepultado em terras estrangeiras.

O pastor enfatizava, dizendo: - “Eis aqui a coroa de ramos de cipreste, feita para nosso querido (nome). Olhem para esta coroa. Ela é circular, sem início e sem fim. Que ela sirva de comparação, para saber que em meio da desesperança surgiu uma nova esperança. Ali onde nós chegamos ao fim, apenas tem início um novo começo, pois Cristo Ressuscitou. Nele e através d’Ele a nossa vida não acaba com a morte. Por isto confiamos que a coroa incorruptível da vitória está guardada para...” (nome do soldado morto).

O pastor lia o texto da 2ª Carta do Apóstolo Paulo para Timoteo, Capítulo 4, versículos 7 e 8: - “Combati o bom

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combate, completei a carreira, guardei a fé. Já agora a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, reto juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas a todos os que amam a sua vinda”.

Em geral as cerimônias tornavam-se fator de fortes emoções, em particular das famílias atingidas.

Finda a guerra, o trabalho da assistência espiritual não diminuiu. Os combatentes que voltavam, muitos deles necessitaram de muita atenção. Alguns estavam mutilados, outros se apresentavam física e psiquicamente alquebrados e outros marcados por traumas e cicatrizes da guerra.

No ano de 1870 foi oficiado um culto solene, visando agradecer a Deus pelo fim da guerra e para confortar os soldados sobreviventes. Apenas um não estava ali. Era Carlos Daniel Gross, que só viria mais tarde, quando, pela família, já era dado como desaparecido. Uma jovem paraguaia, porém o socorreu em campo de batalha, onde ele jazia entre a vida e a morte, sem possibilidades de receber assistência médica. Abela Delore era uma órfã de guerra, filha de um estancieiro paraguaio, morto em combate contra os brasileiros. Ela socorreu o suposto inimigo e dele cuidou com grande desvelo, por meses a fio. Depois ela o acompanharia até o Brasil, para terminar seus dias ao lado daquele que ela salvara. Ela recebeu a admiração do povo do vale do rio Três Forquilhas que a acolheu com muito carinho.

O que a Comunidade tem a ver com o fim da guerra?

(Alocução do autor proferida em 1970, durante a comemoração do Centenário do término da Guerra do Paraguai, em Itati – RS).

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Dez filhos da Colônia Alemã de Três Forquilhas pereceram na Guerra do Paraguai. Os demais que retornaram, puderam transmitir à posteridade algo de suas vivências. Além desses vinte e dois soldados, nascidos no vale do rio Três Forquilhas, recolhemos ainda o nome de outros que, de alguma forma, também estiveram ligados com a antiga Colônia Alemã das Três Forquilhas também designada como Colônia de São Pedro de Alcântara das Três Forquilhas.

Pastor Carlos Leopoldo Voges revelou que a Comunidade tinha muito a ver com os seus filhos que partiam em defesa da Pátria.

Os jovens foram assistidos e encorajados antes da partida.

Foram acompanhados pelas orações da Comunidade, durante a ação em campanha. Aqueles que caíram no campo de guerra foram homenageados, em cultos especiais. Conta inclusive a tradição oral, de que as dez coroas, com o nome dos soldados mortos na Guerra do Paraguai, ficaram por dezenas de anos, fixadas na parede da Igreja Evangélica de Três Forquilhas. Naquele período do pastor Voges, até 1893, quando ele faleceu, os familiares e os membros da Comunidade mantinham vivamente na memória os nomes dos seus filhos, sacrificados em terra estranha, em defesa das fronteiras da Pátria.

Existia um forte espírito cívico entre o povo.

Olhando para os que voltaram, vemos que foram recebidos com júbilo, cercados pelo carinho da Comunidade. Alguns veteranos da guerra carregavam profundas sequelas físicas e psíquicas, produzidas pelas feridas, exaustão, doenças e combates.

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Vimos também que os veteranos que voltaram quase todos conseguiram constituir família, cercando-se do carinho de filhos e netos.

Em particular granjearam o respeito daqueles que não foram à guerra. Era a consideração daqueles que puderam permanecer à distância, na expectativa dos acontecimentos.

Os veteranos da guerra do Paraguai comemoraram a vitória com alívio e cheios de esperança por um mundo de paz, pois afinal, a ameaça estava afastada, as fronteiras asseguradas, a guerra finda. Havia agora silêncio nas antigas frentes de combate.

Em 1870, respirava-se alívio, até no país adversário. Era o fim das lutas, apesar da profunda dor pelos mortos.

Entretanto, constamos que o povo, depois da morte do pastor Voges, esqueceu, bem depressa, dos soldados que não se pouparam que foram para o sacrifício, aqueles que lutaram em favor dos seus. Pelo menos deveríamos dar a eles, hoje, a nossa respeitosa reverência, mesmo que anonimamente.

Queremos ir mais longe, trazendo novamente os seus nomes à memória. Uma homenagem singela pelo exemplo que nos concederam, pelo desprendimento que tiveram.

Que isto ajude para que todos, nós, nossos filhos e nossos netos saibamos compreender o quanto e absurda a ambição e ganância desenfreada do gênero humano, que provoca a violência, no desrespeito à liberdade e aos direitos dos semelhantes.

A Comunidade tem muito a ver com o fim da guerra. A Comunidade pode falar às novas gerações sobre os caminhos que levam à paz e que contribuem para o entendimento entre os povos.

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A Comunidade, particularmente com a sua ação pastoral (Atos 1,8) tem uma missão que precisa dirigir-se a todas as esferas da atividade e da vida dos homens. Os homens precisam ouvir o Evangelho de Cristo, para buscarem uma vida e ação cristã, no lugar onde estão colocados, enquanto ainda é tempo. (Elio E. Müller – 1970).

UM PREGADOR PARA OS REGIMENTOS

"Por falta de pregadores evangélicos não está contratado um pregador para os Regimentos Alemães". Conforme já registramos anteriormente, estas foram palavras escritas pelo pastor Carlos Leopoldo Voges, em fevereiro de 1827, em carta enviada, à British and Foreign Bible Soociety.

Naquela época havia somente quatro pastores protestantes em todo o território brasileiro. Vieram acompanhando os imigrantes alemães que chegavam dispostos a se integrar nesta nova pátria.

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1 - Pastor FRIEDRICH OSVALD SAUERBRON, entrou em Nova Friburgo (Rio de Janeiro) em 1824, acompanhando 300 alemães, que em sua maioria eram protestantes.

2 - Pastor JOHANN GEORGE EHLERS, entrou em São Leoopoldo (Rio Grande do Sul) em 06.11.1824, acompanhando os imigrantes alemães que ali se estabeleceram.

3 - Pastor CARLOS LEOPOLDO VOGES entrou também em São Leopoldo (Rio Grande do Sul) em fevereiro de 1825. Foi designado pelo Governo Imperial para acompanhar em novembro de 1826, a caravana de colonos protestantes incumbidos de iniciar a colonização em Torres.

4 - Pastor FREDERICO CRISTIANO KLINGELHÖFFER, entrou em São Leopoldo em 17.04.1826, radicando-se em Campo Bom (também no Vale do Rio dos Sinos). Pastor Klingelhöfer foi morto em 1838, quando integrava as forças farroupilhas, em confronto com uma tropa do Império.

Foi, portanto no alvorecer da colonização alemã, que pastor Voges, com perspicácia, já olhava para os diferentes setores que mereciam atenção pastoral. Os tempos eram propícios para alcançar os favores do soberano brasileiro. D. Pedro I prometera aos pastores protestantes as mesmas vantagens e emolumentos concedidos aos demais vigários (católicos), no Brasil. Prova disto é que pastor Voges chegou a receber ordenado pelos cofres do Governo Imperial até 1830.

Se na época tivesse havido pastor evangélico disponível, possivelmente, um teria sido contratado para servir nos Regimentos Alemães (na qualidade de vigário militar). A questão ficou, contudo só na idéia do pastor Voges.

Os tempos mudaram, já a partir de 1830. Os protestantes foram perdendo vantagens recebidas. Na verdade estavam estabelecidos em um país onde a Igreja

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Católica Romana era oficial, integrada com o Governo. A Igreja Católica passou a ver com preocupação o crescimento e progresso das populações protestantes, no Brasil.

De 1824 até o rompimento da Guerra do Paraguai, passou a persistir o problema descrito pelo pastor Voges: - era sentida a falta de pastores evangélicos. Diversas Colônias estavam sem pastor. Foi um período chamado, pelos historiadores modernos, de "estiagem pastoral". A Igreja Luterana da Alemanha não acordara para a necessidade de uma maior assistência teológica para as suas Comunidades no Brasil.

Em 1970 havíamos elaborado um ensaio literário sob o título de "UM PREGADOR PARA OS REGIMENTOS ALEMÃES" A partir desse enfoque, pretendíamos não só lançar um olhar sobre o passado. A intenção era também de observar o pregador evangélico em tempos atuais, que como desbravador e pioneiro sabe agir com o pensamento voltado ao futuro do rebanho, com a oferta de uma assistência ampla, nas mais diferentes esferas e campos da vida nas comunidades e em nossa sociedade.

“UM PREGADOR PARA OS REGIMENTOS ALEMÃES" foi originalmente redigido para dar uma visão da dura realidade vivida no passado. Da luta, do suor, do sangue e da morte, diante da barbárie da guerra. A história de jovens teuto-brasileiros que escutaram o apelo para sair em defesa da jovem Pátria, a Nação que os acolhera e que eles desejavam ajudar a forjar e construir em bases fortes.

Em cada personagem, em cada esboço biográfico registrado na época, desfilavam diante de nós, emoções vividas, de felicidade ou de tragédia, de sonhos realizados ou frustrados e de ideais e das perspectivas para promover a vida e no propósito de buscar a felicidade de todos.

"UM PREGADOR PARA OS REGIMENTOS ALEMÃES" foi, para nós, semelhante a uma ponte. Uma ponte em

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condições de nos vincular a um passado distante, e que muito teve para falar na hora presente. Uma ponte que indicava para um espaço que ainda estava no futuro, de uma tarefa que deveria ser ampliada e desenvolvida, para ser levada a bom termo.

Este ensaio foi resultado das nossas primeiras pesquisas que fizemos, sobre a presença de filhos da Colônia Alemã das Três Forquilhas nas guerras, a Guerra Cisplatina, a Guerra dos Farrapos, a Guerra contra Uribe e Rosas, a Guerra do Paraguai e a Revolução Federalista. Em particular procuramos identificar os mortos em combate. Este fato despertou em nós uma palpitante pergunta: - "Qual teria sido o papel do PREGADOR PARA OS REGIMENTOS junto aos soldados e suas famílias, no enfrentar das angústias da guerra e de morte?”.

Os REGIMENTOS ALEMÃES, das guerras de então, não puderam contar com uma cura adequada d'alma protestante. Ou, será que nessa situação o homem não necessita e não espera o consolo de Cristo?

Seja na guerra, ou seja, em tempos de paz, no nosso entender, o soldado deve receber a possibilidade de buscar sustento para sua vida espiritual e para uma ação cristã, no mundo em que ele vive.

Mais de 150 anos depois de pastor Carlos Leopoldo Voges escrever afirmando que “por falta de pregadores evangélicos não está contratado um pregador para os Regimentos Alemães”, o Exército Brasileiro incluiu, dentre os pastores de credo evangélico, também os primeiros pastores luteranos, para integrar o Quadro de Capelães do Serviço de Assistência Religiosa do Exército Brasileiro - SAREx.

O Pastor DARCI DREHMER, que já viera atuando, fazia muitos anos, como Capelão Civil, da IECLB, em

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quartéis, foi nomeado ao posto de 2º Tenente da Ativa, pela Portaria Ministerial nº 622, de 09 de julho de 1982.

No ano seguinte, o pastor ELIO EUGENIO MÜLLER também conseguiu o ingresso na Capelania Militar, integrando a primeira turma de Capelães Estagiários da Academia Militar das Agulhas Negras - AMAN, em Resende-RJ. Pastor MÜLLER foi nomeado, pelo Ministro de Estado do Exército, e também incluído como Capelão Militar no Quadro do SAREx, a contar de 03 de dezembro de 1983 (“Portaria Ministerial nº 311, de” 02 de maio de 1984 e Diário Oficial nº 86, de 04 de maio de 1984).

Capelão MÜLLER conseguiu fazer o seu sucessor em 1996, com o ingresso do pastor JOÃO LUIS BOLLA que iniciou seu estágio na Escola da Administração do Exército, em Salvador da Bahia.

Pastor Darci Drehmer atuou na área do Comando Militar do Sul, sediado em Porto Alegre – RS e sempre residiu em São Leopoldo-RS. Pastor Elio Eugenio Müller atuou por 11 anos na área do Comando da 5º Região Militar e 5º Divisão de Exército em Curitiba-PR; em 1994 foi transferido para Recife – PE junto ao Comando Militar do Nordeste e, em 1998 foi nomeado para o cargo de Capelão Chefe do SAREx, no QGEx em Brasília – DF. O pastor João Luis Bolla, atuou no Rio de Janeiro – RJ, depois no Recife – PE, em Brasília – DF e atualmente em Tabatinga – AM.

Iniciou-se assim uma nova situação na história do pastorado evangélico e luterano no Brasil, com a nomeação de Capelães Militares.

A frase que pastor Carlos Leopoldo Voges escreveu em 1827, entretanto perdeu a conotação étnica, que marcava os Luteranos no passado. Os pastores luteranos no Brasil já são hoje, em sua maioria, brasileiros e a própria Instituição Eclesiástica trazida pelos imigrantes, tornou-se a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil – IECLB.

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Não mais existem Regimentos Alemães e nem a contratação de mercenários estrangeiros para a tarefa de zelar pela defesa do Brasil.

A relação entre católicos e protestantes (luteranos) também está mudada. Particularmente no Brasil as duas confissões eclesiásticas (católicos e protestantes), encontraram uma dimensão ecumênica, possibilitando um intercâmbio teológico e uma aproximação em atividades práticas, no exercício do ministério eclesiástico.

"UM PREGADOR PARA OS REGIMENTOS” significa hoje, concretamente, a inclusão de pastores evangélicos no Serviço de Assistência Religiosa do Exército, o SAREX, para participar da assistência ao soldado brasileiro.

O desafio para os Capelães Militares está muito bem definido pelo apóstolo Paulo, em Filipenses 2, 7: "Vivei, acima de tudo, por modo digno do Evangelho de Cristo, estando firmes em um só espírito, como uma só alma, lutando juntos pela fé evangélica", (e pelo bem do Brasil).

Hoje, após quase 40 anos de pesquisa da história da Colônia Alemã de Três Forquilhas e com a jornada concluída, na qualidade de Capelão Militar, ou seja, de PREGADOR DOS REGIMENTOS, recebemos uma visão bem mais ampla, daquela que tínhamos em 1970. Hoje podemos avaliar os nossos escritos de então, com a experiência colhida na missão de Capelão Militar do Exército Brasileiro. Chegamos até o coração dos REGIMENTOS BRASILEIROS, em nossa função exercida na Chefia do SAREX, com atuação no Quartel General do Exército, em Brasília – DF, de 1998 a 99.

É isto nos ajudou, de maneira muito especial, para escrever este quarto volume das MEMÓRIAS DA FIGUEIRA sob o título de AMORES DA GUERRA.

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O BRASÃO DA COLÔNIA DE TRÊS FORQUILHAS

FIGURA 11: Brasão da Colônia de Três Forquilhas, 1870Fonte: Esboço feito pelo autor com base no brasão antigo

Arte final de Ernani C. Straube, Curitiba, 2000.

Descrição heráldica do Brasão da Colônia de Três Forquilhas:

Escudo peninsular, de gules, com cruz plena de argenta, esquartelado: o primeiro de uma trempe, o segundo de um berrante, o terceiro de uma carreta e o quarto de quatro gotas, todos de argenta. Em 1870 eram três as gotas de sangue, porém, após a Revolução

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Federalista, entendemos que cabem quatro gotas de sangue derramado.

Timbre: coroa mural de argenta com cinco torres visíveis.

Listel de gules, tendo inscrito, com letras de argenta, no centro, "Cidadania".

Significado das peças:

Escudo peninsular, primitivo ou clássico, usado largamente em Portugal, tem a ponta boleada e mede três módulos de largura e quatro de altura.

Gules ou vermelho, representado no desenho monocromático por linhas verticais, significa das virtudes a caridade, das qualidades, a nobreza, a magnanimidade, o valor, a generosidade, a honra. Os que trazem essa cor estão obrigados a socorrer os oprimidos pela injustiça.

Cruz plena, isto é, ligada aos bordos do escudo, simboliza a fé.

Argenta, prata ou branco, representada no desenho monocromático, deixando em branco o campo, significa, das virtudes, a humildade, a inocência, a pureza e a verdade e das qualidades a franqueza, a limpeza, a integridade.

Esquartelado, isto é dividido em quatro partes ou quartéis.

A trempe, o berrante e a carreta marcam a presença do tropeiro e a sua influência no desenvolvimento da região.

As quatro gotas de prata, que indicam lágrimas, correspondem à participação dos habitantes da região nos momentos históricos da terra, isto é, a Campanha

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Cisplatina, a Revolução Farroupilha, a Guerra do Paraguai e a Revolução Federalista.

O timbre representado por uma coroa mural com torres e ameias é de prata.

O listel ou legenda tem como dístico principal a palavra "Cidadania", como a qualidade do cidadão da Colônia de Três Forquilhas, que nós propusemos.

Significado das peças:

a) A trempe lembra a hospitalidade do povo e a presença da mulher;

b) O berrante é o arauto que anuncia os novos tempos;

c) O carroção ou carreta lembra o trabalho árduo do imigrante e dos seus descendentes alargando os horizontes e

d) As quatro lágrimas lembram a epopéia dos heróis do vale do rio Três Forquilhas nas campanhas gloriosas em defesa da terra e na construção da Nação.

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HOMENAGENS AO CORONEL NIEDERAUER, EM ITATI - RS

(Correspondência do autor mantida com autoridades municipais e militares).

No dia 03 de junho de 1992 o Noticiário do Exército, no Boletim nº 8.440 publicou em destaque que a 62ª Brigada de Infantaria Blindada de Santa Maria – RS recebera a designação de BRIGADA NIEDERAUER.

Neste mesmo noticiário, em um breve resumo biográfico eram concedidas informações sobre o Coronel Niederauer, dando conta ele teria nascido em Três Forquilhas, no município de Torres – RS.

Mostrei imediatamente esta publicação ao meu chefe direto, em Curitiba – PR, hoje o General de Divisão NELSON BORGES MOLINARI. Expliquei que a informação sobre o local de nascimento não condizia mais com a designação geográfica correta, pois se o homenageado nascera na Colônia Alemã de Três Forquilhas, então em 1827 ligada administrativamente à Vila de Torres, hoje está modificada. O local de nascimento, ou seja, a morada dos Niederauer se localiza em Itati, hoje no município de Terra de Areia – RS. (Isto enquanto Itati não conseguisse o seu intento de emancipação política).

O General Molinari orientou que fosse feito um contato direto com o Comandante da Brigada Niederauer, o amigo dele, General de Brigada CARLOS AUGUSTO FERNANDES DOS SANTOS.

O contato telefônico sugerido foi coroado de êxito, inclusive com a pronta resposta que a nossa idéia de se

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instalar uma praça e a colocação de um monumento ou busto do Coronel João Niederauer Sobrinho, primeiro filho varão nascido na Colônia Alemã na área que hoje pertence à Itati – RS era viável.

O General DOS SANTOS autorizou o encaminhamento de contatos, tratativas e entendimentos com as autoridades municipais, em particular para a mobilização da Prefeitura de Terra de Areia e do povo de Itati para uma forte adesão a esta iniciativa de se homenagear Coronel Niederauer em sua terra natal.

Segue correspondência mantida a respeito do assunto.

CORRESPONDÊNCIAS

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AO SR GENERI MÁXIMO LIPPERT - Prefeito de Terra de Areia – RS

Curitiba-PR, 22 de junho de 1992. Ilmo. Sr. GENERI M. LIPERT

Caro amigo. Remeto cópia do Informativo Militar

"NOTICIÁRIO DO EXÉRCITO” de 03.06.92 que divulga que a 62ª Bda Inf Bld de Santa Maria-RS passou a denominar-se BRIGADA NIEDERAUER.

Neste Informativo consta uma breve biografia do Cel JOÃO NIDERAUER SOBRINHO, registrando que o berço natal deste ilustre filho do hoje município de Terra de Areia - RS teria sido no lado de Torres. Creio que cabe ao ilustre amigo prefeito ajudar para que este dado seja corrigido. Sugiro uma correspondência sua dirigida ao Comandante dessa Brigada. O endereço dele é o seguinte:

Exmo Sr. Gen Bda CARLOS AUGUSTO FERNANDES DOS SANTOS

Avenida Borges de Medeiros 1515 - 97015 SANTA MARIA - RS

Aproveito para incluir outra sugestão ao amigo

Prefeito. Trata-se da possibilidade de organizarmos em Itati uma praça, que poderia receber o nome de "PRAÇA CORONEL NIEDERAUER". Um possível local seria em frente da "Casa da Dindinha" (hoje moradia da Professora Leci Pereira de Souza. Talvez a família Pereira de Souza vende à Prefeitura ou até faz uma doação, dessa área situada no outro lado da rua (lado do rio Três Forquilhas), podendo ser aberta uma rua até a ponte pênsil. A rua seria alargada neste ponto, para proporcionar um estacionamento de veículos. A praça poderia ser pequena (50 x 50) recebendo aterro, em virtude de eventuais enchentes. Porém o aterro

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não deveria ir até o rio, para não represar as águas, em caso de enchente. Nesta praça poderia ser futuramente colocado um busto do Coronel Niederauer com o auxílio de firmas de Santa Maria, Porto Alegre, Osório e Terra de Areia. Cada dois ou três anos, em combinação com a Brigada Niederauer (de Santa Maria) poderia ser feita uma solenidade cívico-militar com a presença ou mesmo totalmente organizada pelo Exército ou então pela Prefeitura de Terra de Areia. Seria um ponto de valor turístico, incluindo a ponte pênsil e a própria casa enxaimel da Dindinha. Caso quisermos que a praça seja mais próxima do ponto onde Niederauer nasceu, certamente deveria ser nas terras de Shimomura. Não sei se ele estaria disposto a doar um trecho, no outro lado da estrada, em direção ao Rio. Creio que Terra de Areia pode aproveitar positivamente esse momento e divulgar um pouco de sua história.

Incluo também alguns recortes de jornais referentes a publicação do meu livro que estão praticamente esgotados. Curitiba concedeu-me um extraordinário apoio, particularmente o Banco do Brasil que patrocinou uma tarde de autógrafos, incluindo um caríssimo coquetel de queijos e vinhos e uma exposição de materiais bélicos do Museu do expedicionário, de Curitiba. A minha Agência do Banco do Brasil bancou todas as despesas.

Sugiro que o amigo remeta um livro seu “TERRA DE AREIA, IDÉIA, SONHO, REALIDADE” como brinde para o Comando da 62ª Brigada de Infantaria Blindada, de Santa Maria, para que fique incluído na biblioteca deles.

Por hoje é isto, com saudações cordiais de ELIO EUGENIO MÜLLER Major Capelão do Exército Brasileiro

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FIGURA 12: Cartão enviado pelo Exmo. Senhor General Carlos Augusto dos Santos ao autor, confirmando o recebimento do

Atestado do registro do Batismo de Coronel Niederauer.

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AO SR GENERI MÁXIMO LIPPERT - Prefeito de Terra de Areia – RS

Curitiba-PR, 12 de julho de 1992. Caro amigo Prefeito GENERI MÁXIMO LIPERT:

Conforme o teu pedido feito por meio de telefonema, envio um breve resumo sobre a abordagem que pode ser feita a respeito do assunto:

ONDE NASCEU O CORONEL JOÃO NIEDERAUER SOBRINHO?

1 – O Coronel JOÃO NIEDERAUER SOBRINHO, herói da

Guerra da Paraguai, agora patrono da 6ª Brigada de Infantaria Blindada, sediada em Santa Maria – RS, conforme Portaria do MEx de 18 de março de 1992 filho de Philipp Leonhard Niederauer e de Catharina Diehl Niederauer, nasceu no dia 04 de abril de 1827. E a pergunta que lançamos é: - ONDE NASCEU ELE? Conforme nossas pesquisas, o imigrante Philipp Leonhard Niederauer e família entraram no vale do rio Três Forquilhas durante o mês de dezembro de 1826, integrando a primeira leva de colonizadores. Ele foi um dos três comerciantes que se radicaram na Colônia, tendo ele escolhido como local para o seu estabelecimento comercial, o núcleo da igreja, a talvez 200 metros do templo protestante. (Em anexo incluo outros dados biográficos sobre João Niederauer Sobrinho, a saída da área do vale do rio Três Forquilhas e sua trajetória de vida, até o dia em que tombou na batalha do Avaí, no Paraguai).

2 – Convém levar em conta as dúvidas existentes sobre o local de nascimento de João Niederauer Sobrinho. a) – Por exemplo, no livro “O Pote de Geléia” Hoffmeister afirma que Niederauer teria nascido em Três Forquilhas, Torres – RS. b) – No livro “Terra de Areia, Idéia, Sonho e Realidade, o autor Generi M. Lippert publica na página 54 o mapa esclarecedor, de autoria de Elio E. Müller, no qual constam os nomes dos pioneiros genearcas da Colônia de Três Forquilhas. Felipe Niederauer, pai de João Niederauer

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Sobrinho, aparece como morador no Núcleo da Igreja que hoje pertence à área geográfica de Itati. c) – As dúvidas de alguns autores certamente surgiram de uma confusão que se fez a respeito da localização da Colônia de Três Forquilhas que se tornara conhecida como sendo uma parcela da colonização alemã, administrada a partir do Presídio Militar de Torres. Falava-se nas Colônias Alemãs de Torres (São Pedro e Três Forquilhas) integrando a então Comarca de Santo Antonio da Patrulha. É recomendável explicar que foi somente em 1857 que surgiu a Comarca de Conceição do Arroio (Osório – RS) e que em 1878 surgiu a Comarca de Torres. Com a criação da Comarca de Torres a antiga Colônia de Três Forquilhas viu-se dividida, sendo o divisor o rio Três Forquilhas. No lado esquerdo ficou o distrito de Três Forquilhas pertencente a Torres e, no lado direito, o distrito de Três Forquilhas, pertencente à Conceição do Arroio. d) – Importa definir com clareza, num mapa, onde se situava e ainda se situa o Núcleo da Igreja, que depois passou a ser a sede de Itati, local onde nasceu João Niederauer Sobrinho.

3 – Cópias de documentos anexos: a) – Atestado do registro de nascimento de João Niederauer Sobrinho. b) Mapa dos moradores da Colônia de Três Forquilhas, dos pioneiros de 1826 e 27, que foi por mim organizado. d) – Mapa do Vale do rio Três Forquilhas, conforme publicado em meu livro TRES FORQUILHAS 1826 – 1899.

Caso ainda persistam dúvidas, conte com a minha

ajuda. Com saudações fraternas ELIO EUGENIO MÜLLERMajor Capelão da 5ª Região Militar.

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FIGURA 13: Atestado de Registro de Batismo de Coronel Niederauer. (Extraído do Livro do Registro Eclesiástico da Comunidade Evangélica de Três Forquilhas - IECLB, de ITATI – RS – Livro nº 01, página

22, Registro nº 05).

AO ILUSTRÍSSIMO SENHOR MAJOR ELIO E. MULLER - CURITIBA – PR

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Terra de Areia, 24 de agosto de 1992. Of. GB nº 262/92 - Gabinete do Prefeito

Prezado Major Elio: Conforme havíamos conversado quando de tua visita a Terra de Areia, estou enviando cópia do expediente remetido ao Gen. Bda. Carlos Augusto Fernandes dos Santos, comandante da 6ª Brigada de Infantaria Motorizada em 11 de agosto de 1992, sobre o local de nascimento do Cel. João Niederauer Sobrinho.

Gostaria de receber tua opinião acerca da

abordagem do assunto. Em anexo segue também reportagem do jornal "O

Informativo" registrando tua visita e doação de livros a Biblioteca Pública Municipal "ProL Leopoldo Tietboehl".

Atte GENERI MAX LIPERT - Prefeito Municipal Rua Tancredo Neves, 500- Fone (051) 666.1110 - Telex: 51.5056- CEP 95547 - Terra de Areia - RS

AO EXMO SENHOR GEN. BDA. CARLOS AUGUSTO FERNANDES DOS SANTOS

Terra de Areia, 11 de agosto de J992. Of. GB nº 250/92 - Gabinete do Prefeito

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Senhor Comandante: Ao ensejo de cumprimentar V. Sa. Tenho a honra de encaminhar-lhe assunto da mais alta relevância para o Município de Terra de Areia, o qual me orgulho de ser seu primeiro Prefeito. Trata-se do local de nascimento do herói da Guerra do Paraguai, Tenente-Coronel João Niederauer Sobrinho que por ato do Excelentíssimo Senhor Ministro do Exército General Carlos Tinoco Ribeiro Gomes, prestou-lhe justa e merecida homenagem ao conceder à 6ª Brigada de Infantaria Motorizada o nome daquele ilustre brasileiro.

Segundo conhecimentos adquiridos em pesquisa da micro história da Região do Vale do rio Três Forquilhas, João Niederauer Sobrinho nasceu em terras do atual Município de Terra de Areia, na sede do atual distrito de Itati, que foi sede da antiga. Colônia Alemã de Três Forquilhas, fundada em dezembro de 1826.

Para melhor expor a tese defendida pelo pesquisador Capelão Militar Elio Eugenio Muller, que foi Pastor em Itati de 1969 a 1975, a qual me filio, é necessário estabelecer os limites geográficos dos mais antigos municípios gaúchos, a começar por Santo Antonio da Patrulha, criado pela Provisão Real de 01/1O/1809 que abrangia toda a região nordeste do Rio Grande do Sul, do Litoral até os Campos do Cima da Serra. Portanto, as terras colonizadas pelos alemães a partir de 1826 que originaram a Colônia de São Pedro (católica) e a Colônia de Três Forquilhas (luterana), localizaram- se primeiramente em terras de Santo Antonio da Patrulha. Em 16 de dezembro de 1857, pela Lei nº 401, foi criado o Município de Conceição do Arroio, atual Osório, abrangendo a Freguesia de Torres. Em 2J/05/1878 pela Lei nº 1152, foi criado o Município de São Domingos das Torres, cuja divisa com Conceição do Arroio (Osório), ao Sul, ficou sendo o Rio Três Forquilhas, que as suas margens abrigavam a Colônia Alemã. À margem direita ficava o território de Conceição do Arroio e à esquerda o de Torres. Com a criação do Município de Terra de Areia, pela Lei 8.561 de 13/04/1988, a margem

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direita do Rio Três Forquilhas (Itati) passou a pertencer a este município, bem como, foi criado o Município de Três Forquilhas, abrangendo toda a região da margem esquerda, pela Lei nº 9.590 de 20 de março de 1992, cuja instalação se deu em 01/0J/1993.

Voltando a questão do local de nascimento do Ten.

Cel. João Niederauer Sobrinho, baseado no estudo do Major Elio Eugenio Müller que é o guardião dos arquivos do 1º Pastor de Três Forquilhas, Carlos Leopoldo Voges e com base na tradição oral, pode-se afirmar que o mesmo nasceu na casa de seus pais, cujo lote de terras situava-se próximo da atual vila de Itati, propriedade que hoje pertence ao colono de origem nipônica Riohey Shimomura. Em reforço ao aqui exposto, remeto a V. Sa., atestado firmado pelo Major Elio, bem como, um exemplar do livro "Terra de Areia - Idéia, Sonho e Realidade", de minha autoria, onde o assunto é abordado. A página 54 consta o mapa elaborado pelo Major Elio quando Pastor em Itati, onde aparece o nome do genearca Felipe Niederauer, localizado na margem direita do Rio Três Forquilhas.

Caso V. Sa. tenha outras provas documentais, capazes de derrogar nossa tese, gostaria de receber noticias, para que numa futura edição revisada da obra em apreço possa eu fazer as devidas correções.

Por outro lado, se nossos argumentos conseguirem

sensibilizar V. Sa. e o Alto Comando do Exército Brasileiro, então proponho que seja criada uma praça nas proximidades do local de nascimento do ilustre militar, onde ficasse um espaço para erguer um monumento ao nosso herói, com a possibilidade de periodicamente deslocar-se um grupamento da Brigada Niederauer e prestar-lhe uma justa homenagem na terra que o viu nascer. Penso que a idéia seria Interessante tanto para o Município de Terra de Areia, como para o próprio Exército Brasileiro.

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No aguardo de vossa manifestação, colho o ensejo para enviar-lhe Cordiais saudações

GENERI MÁXIMO LIPPERT – Prefeito Municipal.Rua Tancredo Neves, 500Fone (051) 666, 1110 - CEP 95547- Terra de Areia - RS

AO MAJOR CAPELÃO ELIO EUGENIO MULLER

Terra de Areia, 14 de setembro de 1992. Of. GB nº 278/92 - Gabinete do PrefeitoPrezado Major Capelão ELIO EUGENIO MÜLLER

Ao ensejo de cumprimentá-lo, tomo a liberdade de

enviar-lhe cópia do oficio Nr 185-E/l do Comandante da 6ª Brigada de Infantaria Blindada, Gen. Bda. CARLOS AUGUSTO

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FERNANDES DOS SANTOS acerca do local de nascimento do Cel. JOÃO NIEDERAUER SOBRINHO.

Como se verifica através da pesquisa histórica do

Coronel MÁRIO JOSÉ DE MENEZES está aceita a tese do local de nascimento do ilustre militar em território do Município, mais precisamente em Itati.

Quanto à solicitação do ilustre comandante para

enviar cópia autêntica da Certidão de Batismo do Cel. Niederauer, socorro-me do dileto amigo para atender aquele pedido.

Em anexo seguem também alguns trechos de obras

que versam sobre o assunto que acompanharam o oficio do comandante da 6ª Bd. de Inf. Bld.

Atenciosamente GENERI MÁXIMO LIPPERT – Prefeito Municipal de Terra de Areia.

AO MAJOR CAPELÃO ELIO EUGENIO MÜLLER

MINISTÉRIO DO EXÉRCITOCOMANDO MILITAR DO SUL3ª DIVISÃO DE EXÉRCITOCMDO DA 6ª BDA INF BLD"BRIGADA NIEDERAUER"

SANTA MARIA, RS, 09 Out 92.

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Caro Major Capelão MULLER: Acuso o recebimento de sua correspondência com data de 24 de setembro de 1992.

Vi, com interesse, a idéia da construção de uma

praça, em TERRA DE AREIA, em homenagem ao nosso patrono.

Tão logo estejam definidos a cessão da área e o

projeto, enviaremos ao Sr Cmt da 3ª Divisão de Exército expediente, solicitando autorização para iniciarmos as gestões' necessárias para colaborarmos com o referido projeto.

Atenciosamente, Gen Bda CARLOS AUGUSTO DOS SANTOS - Comandante da 6ª Bda Inf Bld -

AO SR GENERI MÁXIMO LIPPERT – Prefeito de Terra de Areia – RS

Terra de Areia, 26 de dezembro de 1992.

Senhor Prefeito: Ao ensejo de cumprimentá-lo, tomamos a liberdade de retomar o assunto referente à implantação da Praça Pública no distrito de Itati, em homenagem ao ilustre filho desta terra, Cel. João Niederauer Sobrinho, herói da Guerra do Paraguai.

Outrossim, ao tomar conhecimento da

indisponibilidade de cedência dos imóveis previstos, de propriedade dos senhores Ryohei Shimomura e Evaldo

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Ranft, queremos colocar a possibilidade de fazer a doação para aquela finalidade especifica, de uma fração de terra rural, de nossa propriedade, situada no Sitio da Figueira, próximo à ponte do rio Três Forquilhas.

Ao propor a presente doação, autorizamos esta

Municipalidade a proceder o levantamento topográfico da referida fração de terra condicionando tal doação a edificação do monumento ao Cel. Niederauer e uma placa em memória aos filhos de Três Forquilhas, tombados na Guerra do Paraguai, bem como, se a Prefeitura entender viável, implantar na parte mais baixa do terreno, (na margem entre a estrada e o rio) um balneário para o lazer do público em geral. Outrossim, comunicamos que o Sr. Podalírio Teixeira de Oliveira e sua esposa Gládis Bobsin de Oliveira também se dispõe a doar igual fração de terreno para a edificação da Praça Niederauer.

Queremos informar ainda da nossa intenção de ceder

para acampamento provisório, a infraestrutura do Sítio da Figueira, com o objetivo de acolher como hóspedes os integrantes do efetivo da 6ª Brigada de Infantaria Blindada, denominada Brigada Niederauer, cujo comandante demonstrou interesse de efetuar envio de uma representação para homenagear o Patrono da referida Brigada, periodicamente.

Na certeza de merecer toda a atenção que o assunto

merece, subscrevemo-nos, Atenciosamente ELIO EUGENIO MÜLLER e DORIS BOBSIN MÜLLER

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AO SR MAJOR CAPELÃO ELIO EUGENIO MÜLLER

MINISTÉRIO DO EXÉRCITOCOMANDO MILITAR DO SUL3ª DE - 6ª BDA INF BLD“BRIGADA NIEDERAUER”SANTA MARIA, RS, 24 Fev 93. Do Gen Bda CARLOS AUGUSTO FERNANDES Oficio Nr 20-E/3 - DOS SANTOS

Assunto: Homenagens ao Cel JOÃO NIEDERAUER SOBRINHO

Sr. Major Capelão ELIO EUGÊNIO MULLER: Prazerosamente acuso o recebimento de suas duas últimas correspondências e, desde já, gostaria de retribuir e agradecer, em nome dos integrantes da "Brigada NIEDERAUER", os votos de um abençoado 1993.

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Este Comando vê com bons olhos as tratativas para a

consecução do monumento em praça pública, em homenagem ao Patrono da 6ª Bda Inf Bld, a ser implantado no distrito de ITATI, no município de TERRA DE AREIA.

A doação de fração de terra onde será erguido o

referido monumento, bem como o empenho e interesse da Administração Municipal em ver realizado o empreendimento, em tela, são motivos fortes que se unem aos interesses da nossa Brigada e do Exército e que, sem dúvida, servirão como alavanca para a concretização do objetivo maior.

O novo prefeito de TERRA DE AREIA, Sr. NEDIO

PERUSSO, ainda não entrou em contato com a Brigada, conforme foi adiantado em seu cartão.

Finalmente, gostaria de lhe adiantar que, a 4 de abril próximo, dia do nascimento do Cel NIEDERAUER - será levado a efeito a transferência da herma do Patrono da Brigada, atualmente localizada no centro da cidade de SANTA MARIA, para a Praça Gen OSÓRIO, onde se juntará a outros bustos de figuras ilustres da história do Brasil. Para esse evento, V. Sa. receberá documentação especifica, oportunamente.

Sendo o que tinha no momento, subscrevo-me Atenciosamente, Gen Bda CARLOS AUGUSTO FERNANDES DOS

SANTOS

Comandante da 6ª Bda Inf Bld

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COLOCAÇÃO DO BUSTO DO CORONEL NIEDERAUER EM ITATI-RS

O General CARLOS AUGUSTO FERNANDES DOS SANTOS, conforme decisão tomada encaminhou a confecção de um busto de Coronel Niederauer conforme o propósito definido, de colocá-lo em praça a ser erigida em Itati. O assunto tramitou via comando e o Ministro do Exército autorizou que o Arsenal de Guerra, no Rio de Janeiro assumisse a confecção da peça, que foi forjada com o bronze de canhões antigos, que foram derretidos, para servirem na moldagem do busto do homenageado.

O Arsenal de Guerra concluiu o trabalho no princípio de 1995. O busto foi enviado de navio até Rio Grande onde foi recebido pelo Exército e transportado até Porto Alegre, para mais tarde ser enviado até Itati.

Nestas alturas dos acontecimentos o General DOS SANTOS já entregara o comando da Brigada Niederauer de Santa Maria ao General TREVISAN.

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E o autor deste livro, Capelão Müller, agora já no posto de Tenente Coronel fora transferido ao Recife – PE para a condução da Subchefia do SAREX, no Nordeste.

Aproximando-se a data prevista para a realização do ato festivo da colocação do busto de Coronel Niederauer, em Itati, General TREVISAN fez contato telefônico com o Capelão informando que a Prefeitura Municipal de Terra de Areia não conseguiria construir a praça pretendida para receber o monumento de Niederauer, em Itati. O General solicitou a autorização para que o busto fosse colocado no gramado, diante da casa secular do Sítio da Figueira.

Estabeleceu-se o seguinte diálogo:

- “Capelão Müller, dois de meus Oficiais de Estado Maior da Brigada Niederauer estiveram em Itati e estudaram as diferentes possibilidades para que se erga um monumento e se coloque o busto de Niederuaer, em Itati. O Prefeito Municipal Dr. Nédio Perusso já nos informou que não existe mais tempo hábil de se construir uma praça”.

- “Caro General Trevisan, fico feliz pelo seu empenho para que aconteça essa justa homenagem ao Coronel Niederauer em sua própria terra natal”. E continuei: “Estou ao seu dispor para fazer o que me for possível para que o evento possa ser realizado”.

General Trevisan agradeceu e falou: - “Meus oficiais fizeram um levantamento do local e concluíram que, em face da inexistência de uma praça, o busto poderia ser colocado diante da porta principal da sua casa, no Sítio da Figueira. O local apresenta um belo gramado, bem cuidado e que dispensaria qualquer outra obra, a não ser a colocação do busto...”.

Expliquei ao General que a propriedade do Sítio da Figueira pertencera aos antepassados de minha esposa e fora recebida por ela, como herança. Falei: - “General,

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aguarde um minuto, que vou consultar a minha esposa, que está aqui ao meu lado, para que ela autorize a utilização deste local.

O General agradeceu por mais esta nossa contribuição para que as justas homenagens ao Coronel João Niedrauer Sobrinho possam finalmente ser concretizadas em sua própria terra natal.

FIGURA 14: Busto de Coronel NIEDERAUER, Itati, 11.04.1995, pronto para inauguração, no Sítio da Figueira. Flagrante do

discurso do General Trevisan. Foto do acervo da Brigada Niederauer, de Santa Maria – RS.

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A PRAÇA CORONEL NIEDERAUER, EM ITATI-RS

Em 1999 através do interesse do Dr. Generi Máximo Lippert, Prefeito Municipal de Terra de Areia, foi construída a Praça Niederauer, distando a apenas 20 metros do local provisório, diante da secular figueira. O busto foi transferido para este novo local em momento festivo que contou com a presença de uma representação da Brigada Niederauer através do próprio Comandante, General JOSÉ CHUQUER RODRIGUES e de um grupamento militar trajando uniformes da época da Guerra do Paraguai.

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FIGURA 15: General CHUQUER (direita), Prefeito GENERI LIPERT (centro) e JOSÉ HOFFMANN, Prefeito de Três Forquilhas

(esquerda). Fonte: Foto do Arquivo da Brigada Niederauer, 1999.

FIGURA 16: Efetivo da BRIGADA NIEDERAUER, com uniforme da época do Paraguai, desfilando em Itati.

Fonte: Foto do Arquivo da Brigada Niederauer, 1999.

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GRUPO DE AMIGOS DA PRAÇA CORONEL NIEDERAUER

A Praça Coronel Niederauer não foi assumida devidamente pela Prefeitura de Itati, quando da emancipação do município. Em conseqüência a manutenção da mesma não foi satisfatória, uma vez que fora construída com pedras de taipa, com frestas, por onde sumia a areia que fora utilizada para preencher a base do piso, coberto com lajes de pedra. Em pouco tempo, a calçada deteriorara de modo a oferecer sérios riscos para os visitantes.

FIGURA 17: A - Praça Niederauer danificada pelas chuvas._________________________________________________________

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A praça foi recuperada pelo voluntário Adélio do Nascimento.Fonte: Acervo fotográfico do autor, 2003.

O autor e esposa professora Doris, proprietários do Sítio da Figueira, decidiram formar o Grupo de Amigos Coronel Niederauer, reunindo pessoas dispostas em assumir a tarefa de manutenção e zelo pela praça. Foi eleito para presidir o grupo o Sr. Osmarino Rickroth, mais conhecido por todos como Marinho Rickroth, um descendente do militar Brummer Carl Rickroth, e que passou a mostrar uma grande atenção pela manutenção da praça.

Adélio Voges do Nascimento foi convidado e aceitou a tarefa de mantenedor voluntário. Em poucos meses, com a colaboração de outros voluntários, a praça foi totalmente remodelada, concedendo-lhe uma bela aparência e mais segurança para os visitantes.

Nos últimos anos o próprio autor e esposa passaram a cuidar da conservação da praça. Pessoas que passam, brincam, dizendo: - “Um coronel cuidando da praça de outro coronel”.

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HOMENAGEM A ADÉLIO VOGES DO NASCIMENTO

FIGURA 18: Adélio do Nascimento restaurando a Praça Niederauer. Fonte: Acervo fotográfico do autor.

Adélio do Nascimento, filho de Laura Voges do Nascimento e de Edmundo do Nascimento. era um descendente de pastor Carlos L. Voges e de professor Serafim Agostinho do Nascimento.

Adélio apresentou-se como voluntário para auxiliar na recuperação da Praça Coronel Niederauer, que havia decaído.

Ele revelou prazer pelo trabalho, uma vez que a Prefeitura Municipal de Itati alegava falta de condições financeiras para cuidar dessa tarefa.

Adélio do Nascimento merece, pois um lugar na galeria dos mantenedores da Praça Coronel Niederauer, pois foi o que mais intensamente trabalhou, mas, lamentavelmente, bem cedo partiu desta vida, vitimado por um câncer em 2009.

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Deve-se a ele a maior parte do trabalho de restauração, desta Praça.

Adélio era um mutilado, não de guerra, mas de um acidente de trabalho, ocorrido em sua propriedade, tendo perdido três dedos da mão direita.

Adélio, sem três de seus dedos da mão, teve que ouvir inúmeras vezes, um veredito de funcionários e médicos de órgãos da nossa Previdência Social insensíveis: - “Você não é incapaz para o trabalho e poderá muito bem prover o seu sustento”.

Adélio foi um amigo leal, um verdadeiro irmão, e um batalhador pelas boas causas do nosso município.

Em sua simplicidade, conseguiu despertar o nosso respeito e a nossa admiração, por causa deste seu desprendimento como um legítimo voluntário.

CONCLUSÃO

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AMORES DA GUERRA mostra entre outros enfoques o lugar duplo que podem ter mutilações sofridas em virtude do confronto bélico.

De um lado está um soldado ferido, mutilado, que passou de defensor para indefeso, depois de ferimentos severos sofridos no campo de batalha.

Do outro lado está a viúva, com o coração vestido de luto, habitado pela dor, com o amor mutilado, mas ela precisa ser forte para cuidar dos filhos pequenos, que ficaram órfãos de pai.

O que dói mais?

A sociedade confrontada com a situação também é atingida. Ela pode sentir-se culpada por ser o objeto do sacrifício, seja daquele que deixou viúva e órfãos, ou seja, do mutilado que colocou sua integridade física em jogo, na defesa do solo pátrio. No primeiro momento a sociedade age e reage, muito mais em conseqüência do sentimento de culpa e depois esquece dos seus soldados.

O que atinge mais a fundo as nossas emoções e nos desperta para a compaixão?

Será a mulher que costura o seu luto, de um coração já costurado, pois que não poderá mais sangrar ou chorar uma vez que precisa ser forte para cuidar dos seus filhos...

Ou será a figura do soldado desfigurado, desuniformizado, que deixou parte de si mesmo no campo de batalha e que agora precisa aprender a viver sem a autonomia de outrora?

A verdade é que rapidamente, nós - a sociedade - esquecemos desta ou daquele. Esquecemos da viúva e do soldado ferido e mutilado. A sociedade esquece sua dívida e

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a necessidade de expressar gratidão, por aqueles que carregaram o peso do sacrifício pelos demais.

AMORES DA GUERRA não tem por objetivo comparar sofrimentos apesar, de que, na verdade a maioria das pessoas preferem passar de largo onde vêem o sofredor que jaz à margem da estrada (Lucas 10, 55 – 37 – A Parábola do Bom Samaritano). Outrossim, AMORES DA GUERRA não quer cobrar dívidas da sociedade, apenas ressalta: os que a integram tem um compromisso com aqueles que se dispões a colocar a vida em sacrifício em defesa da integridade da Pátria e para o bem estar de todos.

AMORES DA GUERRA pretende servir muito mais para partilhar as diferentes formas de sofrer, não somente as causadas pela guerra, mas, por que não servir também, para que olhemos todas as dores do cotidiano que surgem na vida de um povo, seja nas catástrofes (enchentes, pragas ou terremotos) ou em casos de epidemia (cólera, tifo, etc.) e nas mais diferentes situações onde pessoas são atingidas por males que as fazem penar.

A Comunidade precisa ser despertada, sempre de novo, para que todos aprendam a se apoiarem mutuamente em particular, nos momentos difíceis da caminhada, pois feita em conjunto, será menos penosa, menos longa e menos triste.

Seja como for, um dia o sofrimento também nos alcançará. A caminhada de sofrimento, todos temos que fazer, algum dia, mais cedo ou mais tarde, que a façamos acompanhados e não sozinhos, amparados e não no desamparo.

Se já é certo que temos que caminhar no trilho comum que é imposto a toda a humanidade, sem escolha, onde entre outras coisas, mesmo entre alegrias e diversões, o sofrimento também está apenas à espera... Então, por que não começar já a olhar em torno, para descobrir as

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fisionomias daqueles que já agora, sofrem e talvez se encontram bem próximos de nós.

O importante é aprendamos a respeitar a forma como cada um sente a dor. Os sentimentos da dor não são idênticos para todos. Para uns é permeado pela angústia, para outros desperta a revolta. Há aqueles que sentem raiva e se tornam agressivos e outras vezes, são pessoas que tem surtos fortes de choro e de saudade. Há até aqueles que na inércia não querem mais viver e, finalmente, não podemos esquecer aqueles que simplesmente negam a realidade do sofrimento e tentam tapar os olhos para não verem essa realidade.

Importa saber e ver com mais clareza que existem diferentes formas de vivenciar, de expressar e de interpretar o sofrimento.

Que aprendamos a lidar com o sofrimento dentro de um espírito de solidariedade, onde a ajuda mútua é praticada de modo espontâneo e consciente, como fruto da espiritualidade.

NOTAS EXPLICATIVAS

(1) Ovídio: nasceu em 43 a.C. em Sulmo (Sulmona), num vale nos Apeninos, a leste de Roma e faleceu em 18 d. C.. Sua poesia, muito imitada durante a Antiguidade tardia e a Idade Média, influenciou decisivamente a arte e a literatura europeias, particulamente Dante, Shakespeare e

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Milton, e permanece como uma das fontes mais importantes de mitologia clássica.

(2) Mecânico: termo usado na época para designar um artesão que tivesse a capacidade de fabricar as suas próprias peças para consertar relógios.

(3) Cidadão Brasileiro: a constatação é que pastor Voges, sempre que via uma oportunidade, fazia questão de se apresentar como sendo um cidadão brasileiro. Isto ele passara a fazer desde 1854 quando lhe fora concedida a naturalização. O historiador Rodrigo Trespach nos forneceu interessante documento que atesta a naturalização de Voges. Conforme uma Ata da Câmara Municipal de Vereadores da Comarca de Santo Antonio da Patrulha e conforme transcrição paleográfica de Teresinha de Jesus Benfica Fier, segue o texto: "4ª SESSÃO DE 7 DE JULHO DE 1852. Presidente o Sr. Antônio Xavier da Luz. Aos sete de Julho de mil oitocentos e cinqüenta e dois trigésimo primeiro da Independência do Império nos Paços da Câmara Municipal da Vila de Santo Antônio da Patrulha reunidos os Senhores Vereadores sob, digo, Vereadores Antônio Xavier da Luz, Marcelino Soares da Silva, Victorino Correa de Andrade, Lourenço Antônio da Rosa e Venâncio José Monteiro, o Sr. Antônio Xavier da Luz abriu a Sessão leu-se e aprovou-se a ata da antecedente. Ficou a Câmara inteirada do ofício do Cirurgião de Partido acompanhado do Mapa dos enfermos pobres que tratou durante o trimestre findo, deliberou-se que se remetesse ao Exmo. Vice- Presidente. Ficou a Câmara inteirada da Portaria Circular da Vice-Presidência de nº. 9 e deliberou que (Fl. 123) fosse respondido. Assinou termo de declaração de querer se naturalizar cidadão brasileiro Carlos Leopoldo Voges Vigário Apostólico do Santo Evangelho da Colônia de São Pedro de Alcântara por seu bastante Procurador Manoel Dias Ribeiro de Almeida, e ordenou-se que se lhe desse o competente documento para exigir sua carta de naturalização. Levantou-se a Sessão eu João Pereira de Souza Secretário

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lavrei a presente que lida foi aprovada. Xavier da Luz Monteiro Andrade".

(4) 26º Corpo de Voluntários da Pátria: a Província do Ceará enviara apenas o “26º Corpo de Voluntários da Pátria” (Marcos Antonio da Cunha, A Chama da Nacionalidade, p. 99), por isto, os cinco baianos (cearenses) liderados por Baiano Candinho e que entraram no vale do rio Três Forquilhas devem ter integrado o mesmo. Esse Corpo de Voluntários viera com um efetivo de 2.037 voluntários (Marcos Antonio da Cunha, A Chama da Nacionalidade, p. 72), dos quais, grande parte não mais retornaria ao Nordeste. Conforme relatos, a mortandade entre os mesmos fora muito acentuada: “... vítimas da influência da mudança brusca das condições climáticas a que estavam acostumados, contraíram inúmeras moléstias, o que resultou em expressivo número de óbitos” (Marcos Antonio da Cunha, A Chama da Nacionalidade, p. 80).

(5) “Nós Voluntários da Pátria do Ceará sofremos

muito no Paraguai”: essa informação está correta, pois o próprio Serviço de Saúde do Exército reconheceu que: “... não há medicamentos próprios para enfermidades que geralmente acometem aos homens do Norte neste clima frio, e que vem comer só carne verde”. (História do Serviço de Saúde do Exército – 1º volume – Gilberto de Medeiros Mitchel, RJ, 1963 – página 119).

(6) Atafona: palavra portuguesa derivada do árabe 'at-tahuna' que significa moinho. É um moinho movido à mão ou pela força de um animal (mula, burro, boi) ou pela força da água e destina-se ao fabrico de farinha de mandioca. A roda motora se encontra num plano horizontal, em geral, junto ao chão ou a uma altura de cerca de dois metros. A atafona situa-se dentro duma casa, a atafona, muitas vezes é também a morada do peão responsável, o atafoneiro.

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(7) João Bahiano: em 1874 João Bahiano entrou para a família Brusch ao se unir com “Rosinha Fatas” (Rosalina Christina Brusch, nascida em 1855). Ela faleceu cedo com problemas de parto. Mais tarde, por volta de 1884, João voltou a buscar uma nova companheira, unindo-se com “Teia Treis” (Maria Dorothea Triesch, nascida em 1858). Ela consta do Registro Eclesiástico do pastor Voges ao batizar dois filhos: Joseph (23.06.1885) e Carl Johann (01.09.1889).

(8) Maria Felisbina Triesch: aparece no Registro Eclesiástico do pastor Voges como mãe de três crianças: Bersalina (08.10.1884), Johannes (17.10.1885) e Idalina (12.02.1888).

(9) “A bravura dos soldados nordestinos”: Essa afirmação sobre a bravura dos soldados nordestinos é confirmada pela historiografia militar. O homem nordestino é valente. No seu meio, seja na caatinga ou no agreste, ele é resistente. Mas conduzi-lo para um terreno e clima para os quais ele não foi adaptado é destrutivo para a sua sobrevivência e para o moral do efetivo. Imagine o soldado nordestino, de uma hora para outra, jogado em meio às geladas noites paraguaias, em meio à geada e condenado a uma dieta não recomendada e para a qual o seu organismo não está afeito. Existem, porém relatos que atestam para o bom humor do soldado nordestino em meio àquelas dificuldades, não da guerra, mas do clima e alimentação. O bom humor foi algo que distinguiu o soldado nordestino. “Numa das arrancadas da cavalaria, composta por uma coluna de Infantaria, integrada por soldados do 26º Batalhão de Voluntários da Pátria, o famoso Batalhão do Ceará. Os exploradores atravessavam enorme laranjal, todo em floração, rescindindo um perfume inebriante. Em dado momento quando tudo era silêncio, quebrando a monotonia dos que marchavam, um soldado, genuíno caboclo do Norte (do ceará) pensando sem dúvida na aspereza da guerra, tão escassa de sorrisos e encantos femininos, grita a bom pulmão: - < Valha-me São Francisco das Chagas! Que cheiro bom de mulher >. E uma gargalhada sacudiu a tropa”.

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(Euzébio de Sousa – Anedotário da Guerra da Tríplice Aliança – R. J. – Biblioteca Militar, 1944 – páginas 103 e 104).

(10) Algibeira: A palavra vem do árabe al-jibairâ e significa um pequeno saco de couro com vários bolsos, usado pelos cavaleiros árabes. No Brasil o termo passou a designar um pequeno bolso integrado à roupa, geralmente costurado pelo lado de dentro do vestuário. Os homens, por exemplo, também usavam o relógio de algibeira (de bolso). Algibeira podia ser também uma pequena bolsa que as mulheres do povo prendiam á cintura.

(11) Padre dos Lemôns: Os baianos quando faziam humor, costumavam designar Voges de padre, para mexer com os colonos. Ao invés de alemães falavam nos lemôns, no sentido da fruta cítrica conhecida como limão.

(12) Mutirão: Termo de origem na língua tupi, designa a mobilização familiar ou da vizinhança para proporcionar ajuda mútua prestada gratuitamente. É uma expressão usada para o trabalho no meio rural em lavouras, ou em vilas, na construção de casas, galpões ou outras edificações, onde voluntários convidados prestam auxílio, num sistema de rodízio.

(13) Pegavam a cerveja, para beber diretamente do gargalo: a garrafa de cerveja caseira era a grande novidade na Colônia de Três Forquilhas. O vasilhame já podia ser adquirido no Armazém dos Jacoby. As garrafas eram adquiridas pelos Jacoby, na Cervejaria de Friedrich Christoffel, em Porto Alegre e passaram a ser revendidas na Colônia. A grande novidade tornou-se pois a cerveja caseira engarrafada mas que somente as famílias mais abastadas tinham condições de produzir, uma vez que garrafas eram caras.

(14) Paleteada: a paleteada revela a aptidão do cavaleiro com o gado e também a velocidade, a força, a rusticidade e a submissão do cavalo. Consiste na prensa e

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condução de um novilho, por uma raia. A demonstração, em geral, é realizada em duplas.

(15) Prima de Wilhelm: conforme pesquisas realizadas pelo amigo e historiador Rodrigo Trespach: “Philipp Peter Schmitt (1797 – 1853) o Comandante era filho de Christoph e sua segunda mulher Johanna Magdalena Barth. Philipp Peter era onze anos mais novo que o irmão Johann Konrad Schmitt (1786 – 1860) e que era filho de Christoph Schmitt e sua primeira esposa Maria Catharina Schmahl. Portanto, os irmãos Schmitt (Philipp Peter e Konrad) que teriam arranjado o casamento entre os filhos Wilhem e Bárbara, eram na verdade somente meio irmãos”. (Do Livro: “Borger, Justin, Schmitt e outras famílias de origem germânica” – Editora Secco – Florianópolis – SC, 2010 – Página 54).

(16) Água pestilenta: água contaminada por cadáveres de pessoas e de animais, fato comum em tempos de guerra.

(17) Couro estaqueado: referia-se ao couro de gado que, logo após o abate de uma rês, era cuidadosamente retirado e fixado contra uma parede de galpão, com estaquinhas de madeira. O couro permanecia desta forma, durante algumas semanas, até ficar bem seco e curtido. Daí veio a comparação, que faziam, da aparência de Paraguaio Gross).

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FIGURAS em “Amores da Guerra”

FIGURA 1: Página 21 - Os veteranos Brummer também decidiram vestir suas velhas fardas e o capacete de agulha prussiano. Fonte: Gravura dos arquivos do autor, 2010.

FIGURA 2: Página 42 – A velha Atafona.

FIGURA 3: Página 42 – O Cevador.

FIGURA 4: Página 47 – O Paraguaio Gross com uma Índia Paraguaia. Fonte: Gravura dos arquivos do autor, 2010.

FIGURA 5: Página 69 - O velho João Patrulha Menger mostra sua destreza no tiro de laço. Fonte: Gravura dos arquivos do autor, 2010.

FIGURA 6: Página 80 - Coronel João Niederauer Sobrinho. Fonte: Arquivo fotográfico da 6ª Brigada de Infantaria Blindada, Santa Maria - RS.

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FIGURA 7: Página 104 - Christian Tietboehl - ex Oficial Brummer. Fonte: Arquivos da Família Voges, 1970.

FIGURA 8: Página 109 - Armeiro e ferreiro. Fonte: Arquivo fotográfico do autor, 1974.

FIGURA 9: Página 116 - Índia Guarani, do Paraguai.Fonte: Internet, 2010.

FIGURA 10: Página 126 - Professor AUGUST SONNTAGFonte: Arquivo da Família Voges.

FIGURA 11: Página 142 - Brasão da Colônia de Três Forquilhas, 1870. Fonte: Esboço feito pelo autor com base no brasão antigo Arte final de Ernani C. Straube, Curitiba, 2000.

FIGURA 12: Página 149 - Cartão enviado pelo Exmo. Senhor General Carlos Augusto dos Santos ao autor, confirmando o recebimento do Atestado do registro do Batismo de Coronel Niederauer.

FIGURA 13: Página 152 - Atestado de Registro de Batismo de Coronel Niederauer. (Extraído do Livro do Registro Eclesiástico da Comunidade Evangélica de Três Forquilhas - IECLB, de ITATI – RS – Livro nº 01, página 22, Registro nº 05).

FIGURA 14: Página 165 - Busto de Coronel NIEDERAUER, Itati, 11.04.1995, pronto para inauguração, no Sítio da Figueira. Flagrante do discurso do General Trevisan. Foto do acervo da Brigada Niederauer, de Santa Maria – RS.

FIGURA 15: Página 166 - General CHUQUER (direita), Prefeito GENERI LIPERT (centro) e JOSÉ HOFFMANN, Prefeito de Três Forquilhas (esquerda). Fonte: Foto do Arquivo da Brigada Niederauer, 1999.

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FIGURA 16: Página 167 - Efetivo da BRIGADA NIEDERAUER, com uniforme da época do Paraguai, desfilando em Itati. Fonte: Foto do Arquivo da Brigada Niederauer, 1999.

FIGURA 17: página 168 - A - Praça Niederauer danificada pelas chuvas. A praça foi recuperada pelo voluntário Adélio do Nascimento. Fonte: Acervo fotográfico do autor, 2003.

FIGURA 18: Página170 - Adélio do Nascimento restaurando a praça Niederauer. Fonte: Acervo fotográfico do autor.

FONTES DE CONSULTA

Acervo documental do Pastor CARLOS LEOPOLDO VOGES. Pastas de documentos, livros, relatórios, fotografias e papéis avulsos.

Livros do Registro Eclesiástico da COMUNIDADE EVANGÉLICA DE TRÊS FORQUILHAS, em Itati – RS. (Registro de Batismos, Casamentos e Óbitos).

Arquivo pessoal do escrivão ALBERTO SCHMITT e de seu pai, o escrivão CHRISTOVAM SCHMITT. Depoimentos de Alberto Schmitt vindos da tradição oral.

Depoimentos de ARTUR DANIEL GROSS, um homem irrequieto, de espírito errante, conhecido como “Paraguaio Gross”, descendente do veterano da Guerra do Paraguai, Carl Daniel Gross. Nasceu em Três Forquilhas - RS em 28.07.1910, filho de Carlos Daniel Gross Júnior e de Carolina Bobsin Gross. Faleceu em Curitiba – PR, no Instituto de Medicina em 25.08.1986. Foi sepultado no dia 26 de agosto, no Cemitério de Santa Cândida. O falecido não tinha vínculo eclesiástico por isso a família solicitou a assistência do Capelão Militar Protestante. No entanto o mesmo estava ausente de Curitiba participando de manobras militares. Em conseqüência a esposa do Capelão, Doris Bobsin Müller oficiou a cerimônia fúnebre. Artur Daniel Gross ficara

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durante três meses em tratamento médico, na cidade de Curitiba. Isso permitiu que ele recebesse inúmeras visitas do capelão, que aproveitou para escutá-lo, já que o enfermo desejava contar a sua história, bem como dos antepassados. Foram tocantes histórias sobre o avô Carl Daniel Gross, veterano da Guerra do Paraguai, sobre o pai Carlos Daniel Gross Júnior, um revolucionário que aos 19 anos ingressou nas fileiras maragatas para lutar na Revolução Federalista, tendo acompanhado Gumercindo Saraiva no Cerco da Lapa e a tomada de Curitiba.

Depoimentos de EUGENIO BOBSIN, com memórias sobre os seus antepassados Eberhardt e Bobsin. Eugenio Bobsin foi criado pelo avô Cristiano Eberhardt, com o qual colheu memórias valiosas sobre a história da Colônia de Três Forquilhas.

Elio E. Müller, em “TRÊS FORQUILHAS 1826 – 1899”, Fonte Gráfica e Editora Ltda, Curitiba, 1992.

Gilberto de Medeiros Mitchel, em “História do Serviço de Saúde do Exército” – 1º volume –, Serviço de Saúde do exército, RJ, 1963 – página 119.

Maria Regina Santos de Souza, em “Entre Súplica e Luta – ações de viúvas e de outros parentes de militares da Guerra do Paraguai – 1865-1870”, Revista Outros Tempos – UFPE, Recife, PE, 2009.

Cláudio Moreira Bento, Major Eng QEMA, em “OS BRUMMER, OS PRIMEIROS PONTONEIROS DO EXÉRCITO BRASILEIRO”, do livro dos “Anais do 1º Simpósio de História da Imigração e Colonização Alemã no rio Grande do Sul” – São Leopoldo – RS – Rotermund S. A. – 1974.

Depoimentos de LIDURINO BARROSO MENGER, bisneto de João Patrulha Menger e que guardou a tradição oral da família. Ele enfatizava que a Família Menger, semelhante a muitas outras que participaram da Revolução

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Federalista, passaram a esconder o passado de revolucionários por temerem represálias que eram impostas aos maragatos derrotados que, apesar de anistiados, foram perseguidos e alguns eliminados sumariamente sem prisão, nem julgamento ou condenação. Lidurino Menger disputou eleições para o cargo de vereador do município de Osório e, mesmo apenas suplente, desempenhou o exercício do cargo por algum tempo, em substituição ao vereador titular.

Depoimentos de CLARESTINA JUSTIN BREHM, sobre a numerosa Família Justin e Brehm. "Dona Clara", como era chamada, guardou muitas histórias interessantes sobre os antepassados e sobre a vida na Colônia. Semelhante a outros entrevistados, ela solicitou para não ser mencionada diretamente em causos e fatos por ela relatados, deixando a responsabilidade pela divulgação para ser assumida pelo próprio autor.

Depoimentos de ADY BREHM, descendente do ferreiro Wilhelm Brehm, um conhecedor profundo do passado da família e das relações de famílias e grupos na vida da Colônia De Três Forquilhas. Ady Brehm bem como o seu irmão ADELINO foram líderes atuantes na política, chegando a ser eleitos para o cargo de vereador de Torres e o desempenho de outras atividades políticas, em diferentes momentos.

Depoimentos de IVO DE OLIVEIRA MELLO, o "IVO BAIANO", neto de Baiano Candinho, um bom conhecedor da história do legendário avô. Ivo mostrava orgulho que Baiano Candinho, fora um Voluntário da Pátria, do Estado do Ceará, que lutou na Guerra do Paraguai, que desertando juntamente com seu irmão Pedro e primos, veio buscar refúgio no vale do rio Três Forquilhas.

Depoimentos de HERNANDO DO NASCIMENTO, bisneto do professor Serafim Agostinho do Nascimento e bisneto de Wilhelm Schmitt, um pesquisador da história dos

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antepassados e guardião da memória da família Nascimento.

COLEÇÃO MEMÓRIAS DA FIGUEIRAAutor: Elio Eugenio Müller

Volume: I “De Pés e a Ferros” O nascer da Colônia de Três Forquilhas.

Volume: II “Sangue de Inocentes” Episódio da Revolução Farroupilha.

Volume: III “Dos bugres aos pretos” A tragédia de duas raças.

Volume: IV “Amores da Guerra” Histórias da Guerra do Paraguai.

Volume: V “Face Morena” A miscigenação na Colônia de Três Forquilhas.

Volume: VI “Os Peleadores” Um episódio da Revolução Federalista.

Volume: VII “E a vida continua...” O drama humano diante do flagelo da epidemia.

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A oratória do autor, diante do Monumento ao Coronel Niederauer.

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