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Universidade de São Paulo Instituto de Física Emaranhamento multicor para redes de informação quântica Antonio Sales Oliveira Coelho Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Física para a obtenção do título de Doutor em Ciências Orientador: Prof. Dr. Paulo Alberto Nussenzveig Banca Examinadora: Prof. Dr. Daniel Felinto Pires Barbosa (UFPE) Prof. Dr. Marcelo Paleologo Elefteriadis de França Santos (UFMG) Prof. Dr. Gustavo Garcia Rigolin (UFSCAR) Prof. Dr. Alexandre Levine (IFUSP) São Paulo 2013

Alguma Coisa no OPO

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  • Universidade de So PauloInstituto de Fsica

    Emaranhamento multicor pararedes de informao quntica

    Antonio Sales Oliveira Coelho

    Tese de doutorado apresentada aoInstituto de Fsica para a obteno

    do ttulo de Doutor em Cincias

    Orientador: Prof. Dr. Paulo Alberto Nussenzveig

    Banca Examinadora:

    Prof. Dr. Daniel Felinto Pires Barbosa (UFPE)

    Prof. Dr. Marcelo Paleologo Elefteriadis de Frana Santos (UFMG)

    Prof. Dr. Gustavo Garcia Rigolin (UFSCAR)

    Prof. Dr. Alexandre Levine (IFUSP)

    So Paulo2013

    http://www.usp.brhttp://www.if.usp.br

  • Resumo

    Apresentamos nesta tese a primeira gerao direta de emaranhamento tripartite entrefeixes intensos de luz. Medimos o emaranhamento entre os feixes sinal, complementare bombeio refletido, produzidos por um Oscilador Paramtrico tico (OPO) operandoacima do limiar de oscilao. A principal caracterstica do nosso sistema a diferenaentre os comprimentos de onda dos campos (0 = 532.251 nm, 1 = 1062.102 nm, e2 = 1066.915 nm). Esta a primeira medida de emaranhamento entre mais de dois sub-sistemas produzidos por uma nica fonte no mbito de variveis contnuas. Para investigara existncia emaranhamento, utilizamos o critrio de positividade sob transposio parcial(PPT). Este critrio, aplicado a sistemas compostos por estados gaussianos, dispostos embiparties do tipo 1 (N 1), torna-se necessrio e suficiente na demonstrao do ema-ranhamento. Realizamos tambm a caracterizao do emaranhamento produzido quandosubmetemos os campos a perdas, identificando regies de parmetros onde os estadosapresentam emaranhamento frgil ou robusto. A fim de garantir que estamos lidandocom estados gaussianos, investigamos a estatstica das flutuaes dos campos, mostrandoexcelente acordo entre os valores dos momentos de ordem mais alta da fotocorrente medidae os valores esperados para uma distribuio gaussiana. O estudo que apresentamos umpasso importante para a elaborao de uma rede de informao quntica que possibilitara comunicao entre diferentes sistemas fsicos.

  • Abstract

    We present in this thesis the first direct generation of tripartite entanglement amongbright beams of light. We measured the entanglement among signal, idler and reflectedpump beams, produced by an Optical Parametric Oscillator (OPO) operating above thethreshold. The main feature of our system is the difference between the wavelengthsof the fields (0 = 532.251 nm, 1 = 1062.102 nm, e 2 = 1066.915 nm). This isthe first measurement of entanglement among more than two subsystems produced by asingle source, in a continuous variable system. In order to investigate the existenceof entanglement, we applied the criterion of positivity under partial transposition(PPT). This criterion, applied to systems composed of Gaussian states, arranged in1(N1) bipartition, becomes necessary and sufficient to demonstrate entanglement. Wealso characterized the entanglement when the fields are submitted to losses, identifyingregions of parameters where the states have fragile or robust entanglement. To ensure thatwe are dealing with Gaussian states, we investigate the statistics of the fields, showingexcelent agreement among values of higher order moments of the photocurrent measuredand expected values for a Gaussian distribution. The present study is an important step inthe development of a quantum information network formed by different physical systems.

  • Publicaes

    X S. N. Filippov, V. I. Manko, A. S. Coelho, A. Zavatta and M. BelliniSingle photon-added coherent states: estimation of parameters and fidelity of the opticalhomodyne detectionAceito para publicao em Physica Scripta.

    X M. Bellini, A. S. Coelho, S. N. Filippov, V. I. Manko, and A. Zavatta.Towards higher precision and operational use of optical homodyne tomogramsPhys. Rev. A 85, 052129 (2012).

    X F. A. S. Barbosa, A. J. de Faria, A. S. Coelho, K. N. Cassemiro, A. S. Villar, P.Nussenzveig, and M. Martinelli.Disentanglement in bipartite continuous-variable systemsPhys. Rev. A 84, 052330 (2011).

    X F. A. S. Barbosa, A. S. Coelho, A. J. de Faria, K. N. Cassemiro, A. S. Villar, P.Nussenzveig, and M. Martinelli.Robustness of bipartite Gaussian entangled beams propagating in lossy channelsNature Photon. 4, 858 (2010).

    X A. S. Coelho, F. A. S. Barbosa, K. N. Cassemiro, A. S. Villar, M. Martinelli and P.Nussenzveig.Three-Color EntanglementScience 326, 823 (2009).

    X J. E. S. Csar, A. S. Coelho, K. N. Cassemiro, A. S. Villar, M. Lassen, P. Nussenzveig,and M. Martinelli.Extra phase noise from thermal fluctuations in nonlinear optical crystalsPhys. Rev. A 79, 063816 (2009).

    http://iopscience.iop.org/1402-4896/page/Forthcoming$%$20articleshttp://pra.aps.org/abstract/PRA/v85/i5/e052129http://pra.aps.org/abstract/PRA/v84/i5/e052330http://www.nature.com/nphoton/journal/v4/n12/full/nphoton.2010.222.htmlhttp://www.sciencemag.org/content/326/5954/823.abstracthttp://pra.aps.org/abstract/PRA/v79/i6/e063816

  • Agradecimentos

    Se eu tivesse que escolher uma palavra para resumir este perodo de seis anos 1 que passeina cidade de So Paulo, eu escolheria a palavra amadurecimento. Foi um processo rduo eintenso, mas que trouxe grandes benefcios para todos os aspectos da minha vida e, como tal, eujamais chegaria at aqui se no fosse a participao de pessoas com as quais eu tive a felicidadede encontrar.

    Em primeirssimo lugar, agradeo minha famlia. Meus pais, Maria Vilma e AntonioSales, meus maiores exemplos de perseverana, pacincia e dedicao. Muito obrigado pornunca permitirem que eu desistisse dos meus sonhos. Meus irmos, Vincius Sales e DulceSales, eu os agradeo pelo companheirismo e pela alegria contagiosa com que tratam a vida.Minha esposa, Lilian Rego, presente que meu pai me deu, talvez fossem necessrias mais140 pginas de tese para exprimir de forma justa meus agradecimentos a voc; obrigado pelocompanheirismo e ajuda constante, por ponderar minhas dificuldades e pelo exemplo de seriedadeprofissional. Tambm te agradeo pelas amizades que ganhei, dentre elas, as imunogenticas eseus respectivos.

    Com enorme entusiasmo, agradeo a meu orientador, Prof. Paulo Nussenzveig. Muitoobrigado pelos ensinamentos que transcenderam os muros do mundo acadmico (, infelizmenteestes muros existem). Algumas de suas caractersticas mais marcantes despertam emmim grandeadmirao, de modo especial, sua intuio cientfica e seu anseio por um ensino de qualidade.Pelas discusses e pacincia meu muito-obrigado. No menos importante na construo destetrabalho foi o Prof. Marcelo Martinelli. Sou muito grato pela pacincia com a qual meouviu em diversas situaes e pela dedicao constante nos ensinamentos sobre os detalhes doexperimento.

    Faltam-me palavras para agradecer a ajuda incomensurvel de duas pessoas pelas quais tenhogrande admirao, Alessandro Villar e Katiscia Cassemiro. A ele agradeo a forteatuao como orientador em minha formao; sou grato tambm pelos conselhos e cobranasmuitas vezes regadas ironia que lhe peculiar. A ela agradeo a correo sempre atenta dosmeus textos, opinies e discusses sinceras. No posso deixar de agradecer a acolhida e atenoque me deram em Erlangen e Recife.

    Alguns professores foram fundamentais para minha formao, tanto por meio de uma inte-rao direta quanto pela simples observao de seus atos e posturas dentro do ambiente acad-mico. So eles: Antonio Piza, Renata Funchal, Oscar boli, Josif Frenkel e JosPimentel. Agradeo a participao ativa dos membros da banca examinadora desta tese, poraceitarem ler, criticar e avaliar criteriosamente este trabalho.

    Agradeo aos colegas de trabalho por tornarem o ambiente no laboratrio mais ameno epor terem se segurado para no usar as armas brancas disponveis quando eu cismava em dis-tribuir apelidos. De modo especial, agradeo a Felippe Barbosa, com quem dividi o todisputado OPO. Pelas noites em claro realizando medidas e pelas discusses agradveis, meu

    1Dois anos de mestrado e quatro anos de doutorado.

  • 10

    muito-obrigado. Hans M. Florez (o Mafalda ), um grande amigo; cara, obrigado pelocompanheirismo e momentos de descontrao regados a samba (graas a Ana Luiza), cervejae pandeiro. Sou muito grato a Renn Arajo por ter trazido a msica para dentro do la-boratrio, pela simplicidade com que guia as discusses e por ter lido atenciosamente minhatese. Lus Xavier (o Chico Bento), muito obrigado pelas impagveis solues dos problemaseletrnicos recorrentes. Agradeo tambm aos demais colegas: Mrcio Miranda, LucianoCruz, Klara Thefilo, Carlos Gonzalez (o Colombaiano! Que orgulho deste apelido!),Paula Meirelles, Igor Konieczniak ( o Flipper), Flvio Moraes (o Ground State) ameiga Rayssa Bruzaca (a Supernanny) e Renato Domeneguetti (o Renacto)... relutei,mas no seria eu se no colocasse os parnteses.

    Este trabalho no teria acontecido se no fosse o apoio dos funcionrios do Instituto deFsica. s secretrias do departamento, Juliane Pagamice e Edi, obrigado pela eficincia eprestatividade. Ao pessoal da oficina mecnica, em especial o Sr. Wilson Aparecido, JosCarlos e Raimundo Moreira, obrigado pelos ensinamentos e agilidade. Agradeo ao pessoaldo Centro de Computao, Renata, Antonio, Leonel e Srgio. Agradeo tambm a D.Graa pelo animado Bom dia de todos os dias. Agradeo tambm aos funcionrios da CPG,ber, Cristiano e Izabel por me explicarem pacientemente todos os detalhes da infernalburocracia.

    Agradeo s pessoas que me receberam em locais distantes, onde fui buscar elementos es-senciais para a minha formao. Pela receptividade na cidade de Florena, agradeo ao amigoe supervisor Alessandro Zavatta pela forma metdica e dedicada que me apresentou o la-boratrio e pela confiana depositada. Ao professor Marco Bellini pelo bom humor semprepresente e por ter me dado total liberdade para trabalhar; pelo seu exemplo de simplicidadee competncia, meu muito-obrigado. Agradeo os momentos descontrados proporcionados porConstantina Polycarpou e pela companhia no laboratrio. Sou grato s pessoas que meajudaram em diversas questes cotidianas, so elas: Hamit Gurses, Lasti e Nalin. EmRecife, contei com a acolhida dos j citados Alessandro Villar e Katiscia Cassemiro, e com aajuda crucial dos prestativos Paulo Campos, Nara Cavalcanti, Daniel Felinto, Raquel,Anely Camarotti e Andr Camaroti, aos quais agradeo imensamente. Agradeo ao Prof.Rios Leite por me apresentar o So Joo recifense.

    Durante estes anos, compartilhei com MUITAS pessoas diversas experincias de vida, desdemomentos agradveis at situaes deveras complicadas. Pondo-me a citar nomes, inevitavel-mente esquecerei alguns, porm, pelos nomes que JAMAIS eu poderia esquecer, ponho-me.Pedro Accioly e Lilian Contin meus queridos cumpades, obrigado pelas pardias, cer-vejas, vinhos e reflexes. Juliane Cavalcante e Leonardo Vitoriano, meus primos, porsempre se colocarem presentes e pelas palavras motivadoras, meu muito-obrigado. Agradecer ogrande amigo Emdio Marques tarefa difcil dada a importncia que tem, por isso simples-mente digo: muito obrigado. Sou eternamente grato a Fbio Jorge, o fisioterapeuta que medevolveu a alegria de viver sem dor. Meus sinceros agradecimentos aos amigos Marina Wall(a Muretinha) e Jos Albuquerque (quase um Seu Lunga) que fizeram de So Paulo umacidade menos dura. Muito obrigado ao querido casal Mrio Vieira e Rosana, pelos ensina-mentos e carinho. Pelos momentos bem vividos agradeo s pessoas com quem dividi o mesmo

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    teto: Milessa Afonso, Jairo Savian, Viviane Anglica, Alan, Wanderson Bento,Paulo Takahashi e Marcelo Alves (o Tatoo). Agradeo os puxes de orelha de AlineMarques e Kitamura. Agradeo tambm (sem utilizar versalete por uma questo esttica)aos demais colegas e amigos que encontrei na USP: Nayara Fonseca, Igor Carboni, LeonardoLima, Tiago Adorno, Danilo Liarte, Thais, Jorgivan Dias, Thaiany Quevedo, Karine Piacentini,Leandro Bevilaqua, Juliano Neves, Claudio Cruz, Maria Bonacina, Francesca Dapr, EduardoDo Carmo, Hedhio Luz, Patriota, Jonatas Csar e os piauienses do CRUSP.

    Por fim, agradeo a Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo (FAPESP),por ter apostado em mim, financiado meu doutorado e proporcionado conhecer lugares inacre-ditveis.

    minha famlia

  • Sumrio

    1 Introduo 1

    2 Conceitos fundamentais 52.1 Quadraturas do campo: tratamento clssico . . . . . . . . . . . . . . . . . 62.2 Quadraturas do campo: tratamento quntico . . . . . . . . . . . . . . . . . 92.3 Estados gaussianos e matriz de covarincias . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

    2.3.1 Relao entre as mdias em e W . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152.4 Fotodeteco de quadraturas do campo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

    2.4.1 O operador de fotodeteco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 172.4.2 Quadraturas do campo e o processo de fotodeteco . . . . . . . . . 182.4.3 Quadraturas segundo anlise Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . 212.4.4 Espectro de rudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 232.4.5 O efeito da mistura de fase . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

    2.5 Referncia de rudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 262.6 O rudo quntico padro ou shot-noise . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

    2.6.1 Como medido o shot-noise? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 302.7 Medidas das flutuaes das quadraturas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

    2.7.1 Medidas das quadraturas: deteco homodina . . . . . . . . . . . . 342.7.2 Cavidade tica vazia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 352.7.3 Deteco Auto homodina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

    3 Emaranhamento 473.1 Primeiras reflexes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 483.2 Estados de Einstein, Podolsky e Rosen . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 513.3 Estados emaranhados segundo Schrdinger . . . . . . . . . . . . . . . . . . 523.4 O estado de Bohm-Aharonov . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 533.5 Definio formal de estados emaranhados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 563.6 Soma de varincias: caso bipartite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 603.7 Critrio de Positividade sob Transposio Parcial (PPT) . . . . . . . . . . 62

    3.7.1 Caracterstica geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 623.7.2 Variveis discretas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63

    i

  • ii SUMRIO

    3.7.3 Variveis contnuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64

    4 O Oscilador Paramtrico tico 714.1 Descrio qualitativa do OPO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 734.2 Descrio terica do OPO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 764.3 Solues Estacionrias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 794.4 Flutuaes Qunticas Linearizadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 814.5 Soluo Matricial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82

    4.5.1 Aplicao do critrio PPT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 854.6 Gaussianidade dos feixes produzidos pelo OPO acima do limiar . . . . . . 88

    5 Resultados Experimentais 915.1 Experimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93

    5.1.1 Calibrao do shot-noise: Configurao 1 . . . . . . . . . . . . . . . 1005.1.2 Calibrao do shot-noise: Configurao 2 . . . . . . . . . . . . . . . 105

    5.2 Medidas de emaranhamento tripartite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1065.3 Morte sbita de emaranhamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112

    5.3.1 Caso tripartite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1125.3.2 Morte sbita bipartite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116

    5.4 Teste de gaussianidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118

    6 Conclues e perspectivas 123

  • Captulo 1

    Introduo

    Pesquisas em tica quntica tm ganhado grande visibilidade devido ao interesse cres-cente por sistemas que, pelo menos em princpio, permitem processar, armazenar e realizartransferncia de informao com altas velocidade, eficincia e segurana [Zeilinger 2007].Dada a vasta utilizao de sinais luminosos como ferramenta de comunicao, parece evi-dente utilizar a luz em protocolos qunticos, dada sua alta velocidade e baixa interaocom o meio, sendo assim menos suscetvel a perdas [Kimble 2008]. Naturalmente, os avan-os tecnolgicos atuais j requerem o entendimento de propriedades da teoria quntica,uma vez que sistemas usados para realizar o processamento e transmisso de informaose aproximam cada vez mais de limites impostos por princpios fundamentais da natureza.

    Dentre as propriedades de sistemas qunticos o emaranhamento pode ser consideradocomo um dos principais focos de pesquisa dentro da fsica, principalmente por conta dasua importncia no processamento de informao quntica [Braunstein 2005]. Reconhe-cido primeiramente por Einstein, Podolsky e Rosen (EPR) em 1935 [Einstein 1935], oemaranhamento era visto como uma prova da falta de compreenso da teoria quntica,levando a situaes aparentemente absurdas como, por exemplo, a violao do princpiode localidade que deu origem expresso ao fantasmagrica distncia. Motivadopelo trabalho EPR, Schrdinger elaborou um trabalho independente [Schrdinger 1935]onde usou cunhou a expresso Verschrnkung, traduzida do alemo para o ingls comoentanglement, para enfatizar que as propriedades de duas partculas que formam um sis-tema composto no-fatorizvel esto ligadas de modo inextricvel. O emaranhamentosurge no mbito de sistemas compostos e fruto de estados globais que no possuemfatorabilidade ou separabilidade.

    O trabalho EPR teve como objetivo principal mostrar elementos que fariam da mec-nica quntica uma teoria incompleta. A descrio de EPR envolvia um sistema composto

    1

  • 2 CAPTULO 1. INTRODUO

    por duas partculas que interagiram por um curto intervalo de tempo e depois se afas-tavam atingindo distncias que cessavam qualquer tipo de interao. Aps a separao,medidas efetuadas em cada uma das partes apresentariam correlaes que aparentementeviolariam as relaes de incerteza de Heisenberg, tendo como consequncia situaes quepoderiam desafiar o senso comum, dado que no haveria mais comunicao entre elas.

    Bohr, no mesmo ano da publicao de EPR, argumentou que os estados propostospor Einstein estavam consistentes com a mecnica quntica e obedeciam o princpio daincerteza [Bohr 1935]. Para EPR, era estranho no poder atribuir valores para grandezasindependentemente do processo de medida, um pensamento determinista. Somente em1964 surgiu a possibilidade de colocar prova o raciocnio EPR. John Bell, fazendouso das asseres sobre realismo e localidade de EPR e assumindo que estes estavamcorretos, mostrou ser possvel colocar o problema do emaranhamento em um contextoexperimental [Bell 1964]. Por meio de uma teoria baseada em variveis ocultas locais,Bell mostrou que as probabilidades associadas aos resultados de medidas feitas em umsistema quntico emaranhado violavam desigualdades que deveriam ser obedecidas porum sistema que satisfizesse as hipteses de realismo e localidade. Desta maneira, secomprovado, o emaranhamento surgiria como uma caracterstica intrnseca da mecnicaquntica.

    Os primeiros experimentos que tentaram tirar o emaranhamento do campo das ideiassurgiram ainda na dcada de 60 [Kocher 1967, Freedman 1972], no entanto somente em1982 foi realizada a primeira comprovao experimental do fenmeno [Aspect 1982]. Po-rm, imperfeies experimentais tendem a mascarar as contradies existentes entre ateoria quntica e os conceitos de realidade e localidade propostos por EPR. Para isso,uma demonstrao experimental rigorosa da violao das desigualdades de Bell deve pre-encher dois requisitos: primeiro, dois observadores separados devem possuir sistemas dedeteco completamente independentes, de modo que possa ser descartada qualquer even-tual comunicao entre os dois; por exemplo, no caso onde a anlise feita por polarizao,as polarizadores de cada sistema devem ser alteradas de modo aleatrio com uma veloci-dade to rpida que nenhuma informao sobre o aparato de um observador possa viajar,durante o processo de medida, para o outro com velocidade inferior velocidade da luz e,segundo, deve-se ter uma alta eficincia de deteco tal que os resultados no possam serexplicados em termos realistas locais; isto significa que a eficincia total de deteco deveser maior que um determinado limiar, caso contrrio o subconjunto de eventos detectadospode concordar com as previses da mecnica quntica, embora o conjunto de todos oseventos satisfaa as desigualdades de Bell [Pearle 1970]. Experimentos que no cumpramessas exigncias so ditos abertos a loophole de localidade e deteco [Simon 2003].

    Aps sua comprovao experimental, logo foi vislumbrada a aplicao de emara-nhamento na troca de informao entre partes separadas por grandes distncias, vi-sando o aumento de velocidade e segurana no processo. Atualmente, o emaranha-

  • 3

    mento um ingrediente chave na implementao de protocolos de criptografia qun-tica [Ekert 1991, Silberhorn 2002], codificao densa [Bennett 1992, Li 2002] e teletrans-porte de estados qunticos [Bennett 1993, Furusawa 1998]. A comunidade cientfica, mo-tivada por essas ideias, logo pensou em um aumento na capacidade de processamentode dados e armazenamento dessa informao, o que deu origem Computao Quntica[Nielsen 2000]. Alm disso, fora toda a motivao econmica existente, o emaranhamentopor si s algo interessante de ser estudado, pois est inserido no contexto de pesquisabsica, envolvendo questionamentos sobre os fundamentos da mecnica quntica.

    No entanto, mesmo com todos os vislumbramentos, muito sobre emaranhamento con-tinua desconhecido. Em geral, o emaranhamento possui estrutura complexa, difcil de seridentificada na maioria dos casos e sua evoluo envolvendo processos de descoerncia algo no-trivial. Por estes motivos, so consideradas questes fundamentais no estudo doemaranhamento: (1) Como identificar de modo inequvoco um estado emaranhado, tericae experimentalmente? (2) Como evitar o processo de descoerncia e, caso seja inevitvel,como revert-lo? (3) Como caracterizar, controlar e quantificar o emaranhamento?. Aliteratura que tenta responder esses questionamentos extensa [Horodecki R. 2007].

    As respostas para esses questionamentos so importantes para desenvolver mtodosque possibilitem realizar o armazenamento de informao utilizando emaranhamento emmeios materiais, tais como tomos ou ons, alm de permitir desenvolver protocolos detransmisso de informao sendo necessrio, para este fim, o uso de meios pouco intera-gentes.

    O Laboratrio de Manipulao Coerente de tomos e Luz (LMCAL) tem desenvolvidoexperimentos que podem contribuir para a elucidao dessas respostas. Em especial, otrabalho que ser apresentado aqui se concentra na produo de estados emaranhadosentre feixes intensos de luz. Para isso, utilizado um Oscilador Paramtrico tico (OPO)triplamente ressonante acima do limiar de oscilao. Trata-se de uma fonte sintonizvelque permite gerar campos emaranhados com comprimentos de onda distintos. Com estafonte, realizamos a primeira medida de emaranhamento tripartite entre os feixes sinal,complementar e bombeio refletido produzidos pelo OPO. Esta a primeira gerao diretade emaranhamento entre mais de dois subsistemas em variveis contnuas [Coelho 2009b].

    Para verificar a existncia de emaranhamento utilizamos o critrio de Positividadesob Transposio Parcial (PPT) elaborado por Asher Peres [Peres 1996], demonstradopor Horodecki [Horodecki M. 1996] ser necessrio e suficiente para sistemas com baixadimenso, (2 2) e (2 3), descritos por variveis discretas. A verso estendida paravariveis contnuas, feita por Simon [Simon 2000], mostra-se necessria e suficiente paraestados gaussianos com parties do tipo (1 1). Em seguida, foi provado por Werner eWolf [Werner 2001] que estas mesmas propriedades so vlidas para sistemas analisadosem parties do tipo (1 (N 1), em que N o nmero total de subsistemas.

    Aps identificar o emaranhamento em nosso sistema, realizamos sua caracterizao

  • 4 CAPTULO 1. INTRODUO

    frente a perdas. Com este estudo, identificamos as regies de parmetros de funciona-mento do sistema que apresentam limitaes para eventuais aplicaes [Coelho 2009b,Barbosa 2010a]. Alm disto, encontramos fortes evidncias de caractersticas anlogass encontradas em estados GHZ e W , at o momento demonstradas experimentalmentesomente no mbito de variveis discretas[Dr 2000].

    ? ? ?

    Os principais resultados desta tese so: a medida do emaranhamento tripartite, carac-terizao experimental do emaranhamento bipartite e tripartite frente a perdas e estudoexperimental da estatstica gaussiana das flutuaes dos campos produzidos por um OPOtriplamente ressonante acima do limiar de oscilao.

    No Captulo 2, apresentaremos conceitos fundamentais para o entendimento dos re-sultados. Iniciaremos com uma descrio breve do campo no contexto clssico e quntico,introduzindo as quadraturas amplitude e fase, bem como as flutuaes a elas associadas,organizadas posteriormente em uma matriz de covarincias. Apresentaremos tambmdetalhes sobre o processo de fotodeteco das quadraturas dos campos, explicitando osmodos das frequncias efetivamente envolvidas no processo. Em seguida, falaremos sobreo shot-noise, a referncia para os rudos do campo. Por fim, discutiremos as tcnicasde deteco homodina e auto-homodina, empregadas para a medida das flutuaes dasquadraturas, indicando quais informaes podem ser extradas por cada tcnica.

    O emaranhamento ser discutido no Captulo 3. Iniciaremos apresentando as primeirasreflexes acerca do emaranhamento, deixando claro de antemo que no se trata de umadescrio completa. Daremos a definio formal de estados emaranhados e explicaremosdois critrios de separabilidade, o critrio de Duan [Duan 2000], ou critrio de somade varincias, e o critrio de Positividade sob Transposio Parcial (PPT) [Simon 2000,Peres 1996].

    A teoria do OPO ser apresentada no captulo 4, seguindo de perto a descrio expostanas referncias [Cassemiro 2008, Villar 2007b, Martinelli 2002]. Alm de identificar oemaranhamento produzido em nosso sistema, estamos interessados em estudar o efeitodas perdas sobre os campos, algo que deve ser feito com um critrio que seja necessrio esuficiente para a determinao do emaranhamento. O critrio PPT preenche este requisitopara estados gaussianos analisados em biparties do tipo 1 (N 1). Por conta disso,faz-se necessrio mostrar que a estatstica dos estados produzidos pelo OPO gaussiana.Os elementos necessrios para estudar a estatstica das flutuaes dos campos tambmso descritos neste captulo.

    Os resultados experimentais so expostos no captulo 5. Alm dos resultados prin-cipais, descrevemos o nosso aparato experimental, indicando quais os novos elementos

  • 5

    inseridos, e as melhorias implementadas nos j existentes desde a elaborao de outrostrabalhos de tese do grupo [Cassemiro 2008, Villar 2007b].

    Finalmente, no captulo 6, apresentamos nossas concluses e perspectivas.

  • 6 CAPTULO 1. INTRODUO

  • Captulo 2

    Conceitos fundamentais

    We all know what is light;but it is not easy tell what it is.

    Samuel Johnson (1709-1784)Queremos saber, Queremos saber,

    todos queremos saber.G. Gil (1976)

    O objetivo deste captulo deixar o leitor a par da notao usada ao longo trabalho,bem como introduzir alguns conceitos fundamentais. Definiremos as quadraturas am-plitude e fase do campo eletromagntico no contexto clssico e quntico e as flutuaesassociadas a elas. Todas as medidas de potncia de rudo so normalizadas pelo rudoquntico padro ou shot-noise1, que desempenha um papel fundamental na determinaode caractersticas intrinsecamente qunticas. Mostraremos como realizada a medida doshot-noise2 utilizando a tcnica de deteco homodina que consiste em misturar o campode interesse com um campo intenso onde sero projetadas as flutuaes que desejamosacessar.

    Com o uso desta mesma tcnica, faremos o tratamento do processo de fotodetecopartindo de primeiros princpios, deixando claro quais modos do campo so realmentemedidos, reinterpretando as quadraturas amplitude e fase usualmente utilizadas em todosos trabalhos do grupo at hoje. Dado que os estados produzidos em nosso sistema sogaussianos, definiremos a matriz de covarincias para as quadraturas e sua relao com ooperador densidade e funo de Wigner.

    Finalmente, descreveremos a tcnica auto-homodina que tira proveito da propriedadedispersiva de cavidades ticas vazias. Com a anlise da fotodeteco possvel ver que

    1Dado o uso recorrente do termo em ingls ao longo da tese, optamos por no utilizar o vocbulo emitlico.

    2Ao longo do texto usaremos de forma indiscriminada os termos shot-noise e rudo quntico padropara as flutuaes de estados coerentes.

    7

  • 8 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    a auto-homodinagem pode trazer mais informaes no domnio da frequncia em compa-rao com a tcnica de deteco homodina. O tratamento terico sobre estas questes,da forma como est apresentado aqui, foi elaborado pelo Prof. Alessandro Villar3 e estdescrito em sua srie de materiais elaborados para discusso interna do grupo.

    A principal razo para o uso das cavidades ticas a diferena entre os comprimentosde onda dos campos existentes em nosso experimento, pois no h disponibilidade de umoscilador local para cada feixe a fim de realizar a deteco homodina. A teoria completada deteco auto-homodina encontrada nas referncias [Villar 2008, Villar 2007b], sendoabordado aqui somente o fundamental para o entendimento da anlise de dados.

    O tratamento dado ao campo de radiao livre baseado na referncia [Piza 2010], deonde partimos para introduzir as quadraturas amplitude e fase, tanto no contexto clssicoquanto quntico. Para mais detalhes sobre conceitos fundamentais em tica quntica sorecomendadas as referncias [Leonhardt 2010, Fox 2000, Bachor 1998].

    2.1 Quadraturas do campo: tratamento clssico

    Consideremos uma regio do espao onde no h densidade de cargas e correntes,ou seja, uma regio livre de fontes. O eletromagnetismo clssico, dentro dessa regio, governado pelas equaes de Maxwell com as relaes constitutivas para o vcuo.

    Para os nossos propsitos, conveniente adotar a condio de calibre (ou gauge) deCoulomb, introduzindo o potencial vetor ~A(~r, t) com divergncia nula, ~A(~r, t) = 0.Nessa condio, assume-se, sem perder em generalidade, que o potencial escalar (~r, t) nulo. Assim, os campos eltrico e magntico passam a ser representados em termos deum potencial vetor atravs das relaes

    ~E(~r, t) = 1c

    ~A(~r, t)t

    e~B(~r, t) = ~A(~r, t), (2.1.1)

    onde c = 1/00 a velocidade da luz no vcuo, 0 a permeabilidade e 0 a permissivi-dade do espao livre.

    Verifica-se a partir das equaes de Maxwell que o potencial vetor satisfaz a equao[2 1

    c22

    t2

    ]~A(~r, t) = 0, (2.1.2)

    que tem como soluo geral

    ~A(~r, t) =~k`

    ~A~k`(~r, t), com ~A~k`(~r, t) =

    4c2L3

    ~~k,`~qk,`(t)ei~k~r. (2.1.3)

    3E-mail: [email protected] .

  • 2.1. QUADRATURAS DO CAMPO: TRATAMENTO CLSSICO 9

    Essa soluo obtida considerando condies peridicas de contorno num volume L3 doespao livre. Vemos ento que o potencial vetor ~A(~r, t) escrito como uma soma demodos ~q~k`(t), rotulados pelo vetor ~k e pelo ndice ` = 1, 2 que definem, respectivamente,a direo de propagao e a polarizao do campo, cuja orientao determinada pelovetor ~~k,` que descreve duas orientaes perpendiculares entre si e ao vetor ~k.

    Devido linearidade da equao de onda, ao substituir a equao (2.1.3) em (2.1.2),cada modo do campo deve satisfazer

    d2q~k`(t)dt2

    + 2kq~k`(t) = 0, (2.1.4)

    com a frequncia w~k = |~k|c. Essas funes so em geral complexas e fornecem uma formasimples para a condio de realidade que deve ser satisfeita pelo potencial vetor,

    ~k`

    ~A~k`(~r, t) =~k`

    ~A~k`(~r, t). (2.1.5)

    Desta equao decorre que~k`

    ~~k,`~qk,`(t)ei~k~r =

    ~k`

    ~~k,`~qk,`(t)ei

    ~k~r =~k`

    ~~k,`~qk,`(t)ei

    ~k~r. (2.1.6)

    Os vetores que definem a polarizao seguem a conveno ~~k,` = ~~k,` [Piza 2010], que,juntamente com a independncia linear das ondas planas, reduzem a condio de realidadea ~qk,`(t) = ~q k,`(t).

    Vemos pela equao (2.1.4) que o valor o campo eltrico monocromtico (de frequncia0) pode ser escrito como,

    q~k0,` E(t) = eiw0t + eiw0t. (2.1.7)

    Suprimimos as grandezas que definem a dimenso do campo e definimos a amplitudecomplexa = 0ei com uma fase arbitrria. Expandindo as exponenciais podemosescrever a amplitude do campo em funo de dois termos em quadratura,

    E(t) = X cos(0t) + Y sen (0t), com (2.1.8)X = 2Re() = + e Y = 2Im() = i( ). (2.1.9)

    Em uma situao fsica real, os campos eletromagnticos, e por consequncia suasquadraturas, esto sujeitos a flutuaes que podem ser originadas por efeitos clssicosou serem de natureza quntica. Para explicitar as grandezas importantes na descriodo campo, representamos o mesmo em um diagrama de fasores conforme ilustrado nafigura 2.1(a), cujos eixos so dados por X e Y . A amplitude || do campo dada pelomdulo do fasor e sua fase definida como = arctan(Y/X). Inclumos na representaoas quadraturas amplitude p e fase q da flutuao , comparadas s quadraturas X eY tomadas com uma referncia de fase arbitrria.

  • 10 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    (a) (b)

    Figura 2.1: (a) Representao do campo em um diagrama de fasores. O comprimentodo fasor partindo da origem representa o valor mdio do campo. (b) Aps a modulaode amplitude, trs frequncias, 0 e (0 ), passam a contribuir para a intensidadedo campo. A frequncia central chamada portadora e as demais denominadas bandaslaterais.

    Conforme ser tratado aqui, as informaes sobre tais flutuaes se fazem notar embandas laterais, frequncias especficas geradas no entorno da frequncia principal docampo, a portadora. Para ver como isso ocorre, vamos seguir a abordagem apresentadaem [Bachor 1998]. Considerando nula a fase arbitrria, = 0, verifiquemos o que ocorrequando inserimos no campo E(t) uma pequena modulao de amplitude com frequncia:

    E(t) = 0{1M [1 cos(t)]}(eiw0t + eiw0t),= 2(1M)0 cos(w0t) + 2M0{cos[(w0 + )t] + cos[(w0 )t]},(2.1.10)

    de onde se veem as contribuies das trs frequncias: portadora w0 e bandas lateraisw0 , ilustradas na figura 2.1(b). A constante M est associada amplitude do sinalde modulao. importante notar que, mesmo sendo a amplitude de modulao muitopequena (M 1), os efeitos das bandas laterais so perceptveis graas ao fato de suasamplitudes serem proporcionais amplitude da portadora. V-se isso mais claramentequando calculamos a intensidade do campo I(t) = |E(t)|2 para M 1,

    I(t) = {2(1M)0 cos(w0t) + 2M0[cos[(w0 + )t] + cos[(w0 )t]]}2, 420 cos2(w0t) 8M20 cos2(w0t)[1 2 cos(t)]= I0 2I0M [1 cos(t)], (2.1.11)

    em que I0 a intensidade do campo sem modulao. V-se, ento, que a intensidade dabanda lateral proporcional intensidade da portadora central.

  • 2.2. QUADRATURAS DO CAMPO: TRATAMENTO QUNTICO 11

    Em uma descrio geral, as flutuaes existentes nos campos se estendem por todoo espectro de rudo, e a escolha da componente de frequncia na qual desejamos estu-dar as flutuaes do campo se d pelo uso de dispositivos eletrnicos utilizados para ademodulao do rudo [Bachor 1998]. A frequncia escolhida para analisar as flutuaes denominada, por esta razo, frequncia de anlise, e podem ser interpretadas como asmodulaes que acabamos de descrever. tambm necessrio entender a relao existenteentre as quadraturas e as flutuaes medidas. Portanto, definimos X e Y de forma maisgeral,

    X = (t)ei + (t)ei e Y = i[(t)ei (t)ei], (2.1.12)

    onde a dependncia temporal surge por conta das modulaes existentes e includa comouma referncia de fase que pode ser manipulada experimentalmente, permitindo girar asquadraturas com relao ao referencial do campo. Desse modo, se = a quadratura Xest alinhada com o vetor do campo e qualquer flutuao nessa quadratura interpretadacomo flutuao de amplitude. Vemos este fato adicionando amplitude complexa (t)um termo de flutuao (t), de modo que se (t) (t), a intensidade do campo passaa ser escrita da seguinte maneira:

    I(t) = I+ I(t) = (t)(t)= [ + (t)][ + (t)]= 20 + 0[(t)ei + (t)e i] +O[(t)2], (2.1.13)

    o que fornece para a flutuao de intensidade

    I(t) = |0|[(t)ei + (t)ei] = |0|X(t). (2.1.14)

    Vemos ento que a flutuao da quadratura X(t) est diretamente relacionada com aflutuao de amplitude do campo, enquanto Y(t) se relaciona com as flutuaes de fase.Ao longo do trabalho usada a seguinte conveno: p(t) X(t) e q(t) Y(t) paradefinir as quadraturas amplitude e fase, respectivamente. Note que este tratamento feitoaqui no domnio temporal e tem como objetivo relacionar as flutuaes de intensidade docampo com suas quadraturas. Sendo assim, a sua relao com as bandas laterais se tornaexplcita quando o levamos para o domnio da frequncia, algo usualmente realizado coma aplicao de transformadas de Fourier nas expresses (2.1.12), assunto que ser tratadomais frente.

    Vejamos a seguir como essas grandezas so apresentadas no domnio quntico.

    2.2 Quadraturas do campo: tratamento quntico

    No tratamento clssico do campo eletromagntico em uma condio de calibre deCoulomb, o potencial vetor ~A(~r, t) obedece a equao de onda (2.1.2), de modo que sua

  • 12 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    soluo geral possibilita escrev-lo como uma soma infinita de modos espao-temporais.Em especial, os modos espaciais se comportam como um conjunto de osciladores harm-nicos, dada sua descrio pela equao (2.1.4). Portanto, a quantizao do campo deradiao livre se d por meio da quantizao desse conjunto de osciladores. Fazemos issoreinterpretando a amplitude q~k,` e o momento p~k,`

    ddtq~k,` como operadores hermitianos

    que satisfazem as relaes de comutao

    [q~k,`, p~k,` ] = i~~k,~k`,` , [q~k,`, q~k,` ] = 0 e [p~k,`, p~k,` ] = 0. (2.2.1)

    Seguindo o mesmo raciocnio utilizado na quantizao de um oscilador harmnico, conveniente definir os operadores adimensionais no-hermitianos de criao (a) e aniqui-lao (a) atravs das relaes

    q~k,` =

    ~2wk

    (a~k,`eiwkt + a~k,`e

    iwkt) e (2.2.2)

    p~k,` = i~wk

    2 (a~k,`eiwkt a ~k,`e

    iwkt), (2.2.3)

    com [a~k,`, a~k,`

    ] = ~k,~k`,` , dada as condies de realidade do potencial vetor, q~k,` = q~k,`

    e p~k,` = p~k,`. Note que isto garante ainda que p~k,` e q~k,` sejam operadores hermitianos.

    Estes objetos qunticos representam osciladores harmnicos com frequncia w~k = |~k|c,cuja analogia com o caso clssico pode ser feita pela associao da amplitude complexa com o operador de aniquilao, a, conforme discutido em [Cohen-Tannoudji 2004]na passagem da descrio clssica para a quntica.

    A fim de simplificar a notao so introduzidas as equivalncias

    {~k, `}, { ~k, `} e wk w = w, (2.2.4)

    de forma que passa a representar um modo do campo. Feito isso, o potencial vetor e ocampo eltrico quantizados tm suas expresses dadas por

    A(~r, t) =

    1L3

    2~ck

    ~[aei(~k~rwt) + aei(

    ~k~rwt)], (2.2.5)

    E(~r, t) = E(+)(~r, t) + E()(~r, t), (2.2.6)

    sendo

    E(+)(~r, t) = i

    2~wL3

    ~aei(~k~rwt) e E()(~r, t) = [E(+)(~r, t)]. (2.2.7)

    vlido lembrar que essas so expresses obtidas na representao de Heisenberg, sendoescritas na representao de Schrdinger para t = 0 [Piza 2010].

  • 2.2. QUADRATURAS DO CAMPO: TRATAMENTO QUNTICO 13

    Como a energia uma grandeza extensiva, a hamiltoniana do campo livre dada pelasoma das hamiltonianas dos osciladores que o compem,

    H =

    H =

    ~(aa +

    12

    ), (2.2.8)

    com autovetores e autovalores dados por

    |n |n1 |n2 ... |n ... e En =

    ~(n +

    12

    ), (2.2.9)

    onde o autoestado |n dado pelo produto dos autoestados individuais de cada modo.Nessa descrio, vemos que q~k,` assume o papel anlogo ao da posio do oscilador

    harmnico e sendo correspondente amplitude do modo {~k,`} do potencial vetor A(~r, t),enquanto p~k,` desempenha o papel de momento, proporcional amplitude do campo el-trico E(~r, t).

    De forma semelhante ao tratamento clssico de um campo monocromtico de frequn-cia 0 (equao 2.1.12), somos levados definio dos operadores de quadratura

    X(t) = a(t)ei + a(t)ei e Y(t) = i[a(t)ei a(t)ei], (2.2.10)

    onde usamos evoluo livre dos operadores de criao e aniquilao calculada pela equaode Heisenberg que implica a(t) = aei0t.

    Em condies reais, quando falamos de um campo monocromtico de frequncia 0estamos nos referindo a um laser cuja frequncia est definida dentro de uma faixa estreitaconhecida como largura de linha, onde a frequncia 0 que o caracteriza ocupa a posiocentral desta faixa. Assim, na expresso (2.2.7), a contribuio do fator quasecompletamente dada por 0. Dessa forma, conveniente considerar os operadores acimacomo sendo uma combinao de operadores no domnio da frequncia,

    a(t) =

    0da()eit e a(t) =

    0

    da()eit. (2.2.11)

    Visando tornar explcitas as frequncias no entorno da portadora de frequncia 0, po-demos reescrever as equaes acima em termos dos operadores lentamente variveis,a(t) = a(t)ei0t e a(t) = a(t)ei0t, o que fornece

    a(t) =

    0da()ei(0)t e a(t) =

    0

    da()ei(0)t. (2.2.12)

    Agora, realizamos a mudana de variveis w0 + de modo a obtermos 0

    dei(0)ta() 0

    deita(0 + )

    deita(), (2.2.13)

    onde foi usada uma notao mais compacta, a saber a( + 0) a(). A alterao dolimite de integrao 0 pode ser feita uma vez que 0 e principalmente pelofato do campo considerado monocromtico ter uma largura de linha estreita, de forma

  • 14 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    que as frequncias fora dessa largura tm contribuies nulas para o sinal de fotodeteco,como ser visto posteriormente. Tendo em mente as condies peridicas de contorno ea continuidade do espectro, sabemos que a relao de comutao entre os operadores decriao e aniquilao dada por [a(), a()] = ( ). Isso permite mostrar que arelao de comutao entre as quadraturas escrita como

    [X(t), Y(t)] = 2i(t t). (2.2.14)

    Resta-nos agora relacionar os operadores citados com grandezas medidas no laboratrio.Podemos definir o operador de aniquilao do campo como soma do seu valor mdio comum termo de flutuao, a(t) = + a(t), com a(t) = 0ei, de modo que parasituaes onde a flutuao do campo muito menor que seu valor mdio, I(t) I,obtemos

    I(t) = I+ I(t) = a(t)a(t)= [ + a(t)][ + a(t)]= |0|2 + |0|[a(t)ei + a(t)ei] I(t) = |0|X, (2.2.15)

    Mais uma vez, vemos que as flutuaes de intensidade do campo so proporcionais sflutuaes da quadratura X. Continuaremos usando a conveno anterior p(t) X(t)e q(t) Y(t), para especificar as quadraturas amplitude e fase do campo.

    Assim como na descrio clssica, as bandas laterais contm toda a informao sobreas flutuaes e estatstica dos campos. Isso posto, conveniente tratar os operadores nodomnio da frequncia, algo usualmente feito realizando a transformada de Fourier dasexpresses (2.2.10), obtendo

    X() = a()ei + a()ei e Y() = i[a()ei a()ei], (2.2.16)

    que obedecem s relaes

    [X()] = X() e [Y()] = Y(), (2.2.17)

    obtidas da condio de hermiticidade dos operadores no domnio temporal. Deduz-seainda que, dada a relao de comutao entre os operadores de criao e aniquilao,deve ser satisfeita a relao

    [X(), Y()] = 4i( ). (2.2.18)

    Contudo, neste ponto surge um problema conceitual importante: os operadores p() =X() e q() = Y() atuam em modos legtimos do campo? Dito de outra forma, quemodos do campo so descritos por estes operadores? Trata-se de uma pergunta pertinente,

  • 2.3. ESTADOS GAUSSIANOS E MATRIZ DE COVARINCIAS 15

    dado que nas expresses (2.2.16) esses operadores aparecem como uma combinao deoperadores de criao e aniquilao dependentes de frequncias distintas, a() e a().Alm disso, as relaes (2.2.17) mostram que p() e q() so operadores no hermitianos.

    Para dar respostas a essas perguntas, definiremos o estado de nosso interesse e suarepresentao em uma matriz de covarincias. Por fim, analisaremos a relao entremdias de grandezas tomadas no estado descrito pelo operador densidade e as mdiasobtidas no espao de fase da funo de Wigner.

    2.3 Estados gaussianos e matriz de covarincias

    Devido sua particular importncia em experimentos em tica e informao qun-tica, os estados gaussianos tm sido amplamente estudados, principalmente por permi-tirem um tratamento matemtico mais simples no domnio de variveis contnuas (CV)[Adesso 2006]. Estes estados so de interesse fundamental no desenvolvimento do traba-lho que ser apresentado. O estudo do nosso sistema realizado no espao de fase, sendoa funo de Wigner a representao escolhida.

    Dentre representaes bem conhecidas que descrevem completamente o sistema no es-pao de fase [Walls 1995, Scully 1997, Gardiner 1991], a funo de Wigner habitualmentechamada de distribuio de quasi-probabilidade, por conta de caractersticas que vo deencontro definio de distribuies clssicas, como a possibilidade de valores negativos,por exemplo. Assim como as demais distribuies, a funo de Wigner W (p, q) repre-senta completamente um sistema quntico descrito pelas variveis cannicas p e q, pormpossui um carter mais intuitivo, pois suas distribuies marginais correspondem exata-mente s probabilidades de quadraturas no espao de fase, por exemplo,

    W (p, q)dp e

    W (p, q)dq so as probabilidades associadas s grandezas q e p, respectivamente.Na referncia [Leonhardt 1997], pode ser encontrada uma abordagem bastante didtica

    sobre a funo de Wigner, bem como a demonstrao da sua forma mais conhecida:

    W (p, q) = 1

    dq exp(ipq)q q||q + q, (2.3.1)

    que aparece pela primeira vez no trabalho de Wigner sobre equilbrio termodinmico[Wigner 1932]. V-se ento que existe uma relao direta entre a funo W (q, p) e ooperador densidade do sistema [Cohen-Tannoudji 1977], justificando o fato de termostoda a informao sobre o sistema contida nesta funo.

    Para nossos propsitos, interessante notar que a funo de Wigner tambm estdiretamente relacionada com a matriz de covarincias. Esta contm todas as informaessobre os momentos de segunda ordem das variveis do sistema. Por exemplo, um campocom frequncia tica representado pelos operadores de quadratura amplitude p efase q. Estes operadores obedecem s relaes de comutao [p, q ] = 2i( )

  • 16 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    e se relacionam com os operadores de criao a e aniquilao a, os quais satisfazem[a, a ] = 2i( ), a = p + iq.

    A fim de descrever um sistema composto por N campos monocromticos, cada umrepresentado por um modo, ordenamos os operadores p e q a eles associados em um vetorcoluna Z = (p1 , q1 , p2 , q2 , . . . , pN , qN ), onde wi a frequncia do i-simo modo. Emseguida, definimos a matriz de covarincias

    V = 12{Z, ZT } = 12

    (Z ZT + ZT Z

    ), (2.3.2)

    onde a mdia tomada em um estado que descreve o sistema quntico total. A relaoentre a matriz de covarincias e a funo de Wigner se d por meio do clculo da mdiaem . Matematicamente [Leonhardt 1997],

    {Zi, Zj}/2 = Tr{(ZiZj + ZjZi)/2} (2.3.3)

    =dZ2NW (Z)ZiZj (2.3.4)

    ZiZjW = Vij. (2.3.5)

    Note que na equao (2.3.3), a mdia dos operadores tomada no estado do campodescrito em termos do operador densidade , enquanto que na equao (2.3.5) temos amdia de grandezas complexas associadas a estes mesmos operadores no espao de fase dafuno de Wigner. A substituio por nmeros complexos se deve troca dos operadoresa (a) por amplitudes complexas (). Isto ocorre ao passar da descrio do estado emtermos de seus operadores para a sua descrio no espao de fase da funo de Wigner[Mandel 1995]. importante observar que operadores envolvendo produtos de ordemmais alta qmpn devem ser colocados em uma forma simetrizada para que correspondam aoperadores hermitianos. Isso significa somar todos os produtos possveis de q e p. Comoexemplo, o operador (q2p+ qpq + pq2)/3 uma simetrizao possvel do operador q2p.

    Em relao matriz de covarincias, os elementos diagonais de V representam asvarincias das quadraturas dos modos representadas por 2p ppW , por exemplo.Os elementos fora da diagonal so correlaes entre diferentes operadores de quadratura,tal como C(pp) ppW . Aqui, deixamos explcito o fato de as mdias seremtomadas no espao de fase da funo de Wigner, algo observado na notao W , assuntoque ser tratado na subseo seguinte.

    Para um sistema composto por dois modos distintos do campo a matriz de covarinciastem sua forma explcita

    V =

    2p C(p q) C(pp) C(p q)

    2q C(pp) C(pp)2p C(pp)

    2q

    , (2.3.6)

  • 2.3. ESTADOS GAUSSIANOS E MATRIZ DE COVARINCIAS 17

    onde foram omitidos os termos que se repetem, facilmente identificados pela propriedadede simetria V = VT .

    Estados gaussianos so completamente descritos pelos momentos de primeira e segundaordem, sendo estes ltimos organizados em uma matriz de covarincias da forma descritaanteriormente. Conforme detalhado na referncia [Simon 2000], a funo de Wigner paraum estado gaussiano tem sua expresso dada por

    W (Z) = 1N

    det(V )exp

    (12ZV Z

    T), (2.3.7)

    escrita para um sistema mais geral constitudo por N subsistemas. Assim sendo, a ma-triz de covarincias carrega em si todas as informaes necessrias para descrever estadosgaussianos, dado que os momentos de primeira ordem, valores mdios dos estados, podemser facilmente ajustados por deslocamentos no espao de fase. Dizemos ento que paraum sistema de N modos, N(2N + 1) momentos de segunda ordem so requeridos paradescrever completamente um estado gaussiano. neste contexto que esto inseridos osestados produzidos e analisados experimentalmente nesta tese. Neste ponto, estamos emcondio de extrair informaes importantes da expresso (2.3.2). Essas informaes po-dem esclarecer o real significado dos operadores no-hermitianos p() e q() apresentadosna equao (2.2.16).

    2.3.1 Relao entre as mdias em e W

    Definida a matriz de covarincias, vemos que a descrio dos operadores no domnio dafrequncia levar a mdias do tipo p()p(), q()q() e p()q(), difceis de sereminterpretadas intuitivamente no espao de fase da funo de Wigner (W ). Contrariamente,no domnio temporal, as mdias de operadores tomadas no estado de um sistema descritopelo operador densidade levam relao

    Tr{p(t)} =d2[(t) + (t)]W ((t), (t)), (2.3.8)

    de onde se v claramente que a mdia tomada no operador densidade do operador dequadratura p(t) = a(t) + a(t), correspondente a um modo bem definido do campo, igual a mdia da funo p(t) = (t) + (t) no espao de fase W ((t), (t)). Destaforma, ficam claras as grandezas envolvidas nos clculos das mdias nos dois formalismos.

    De modo sucinto, a equao anterior se escreve

    p(t) = (t) + (t)W . (2.3.9)

    Em um contexto geral, a funo de Wigner definida tal que valha a relao

    FS(a, a) = F (, )W , (2.3.10)

  • 18 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    onde FS(a, a) uma funo dos operadores de criao e aniquilao em ordem simtricae F (, ) a mesma funo em termos dos argumentos complexos e da funo deWigner.

    Para descobrir o que de fato ocorre com as mdias de produtos dos operadores definidosem (2.2.16), consideremos a mdia p()p()W . Iniciamos escrevendo-a em termos deseus operadores no domnio temporal,

    p()p()W =dteit

    dteit

    p(t)p(t)W (2.3.11)

    =dteit

    dteit

    p(t)p(t), (2.3.12)

    em que foi utilizada a correspondncia formal (2.3.10), na troca da mdia das grandezascomplexas em W pela mdia dos operadores em . Neste ponto, devemos reescrever ooperador p(t) em termos dos modos do campo de frequncia . Seguindo os passos quelevaram da equao (2.2.11) para (2.2.13), o operador de quadratura se escreve

    p(t) = a(t) + a(t) deita +

    deita (2.3.13)

    deit(a + a), (2.3.14)

    onde a passagem da equao (2.3.13) para a equao (2.3.14) feita pela mudana devarivel na integral correspondente ao operador a(t).

    Utilizando a equao (2.3.14), escrevemos a mdia p(t)p(t) como

    p(t)p(t) =d

    deiteit(a + a)(a + a

    ). (2.3.15)

    Substituindo a equao (2.3.15) em (2.3.12), obtemos o resultado

    p()p()W = (a + a)(a + a). (2.3.16)

    Por fim, como sabemos que a quantidade p() definida a partir da transformada deFourier de p(t) = (t) + (t),

    p() =dteitp(t) =

    dteit[(t) + (t)] = () + (), (2.3.17)

    podemos reescrever a relao (2.3.16) como

    [() + ()][() + ()]W = (a + a)(a + a). (2.3.18)

    Esse desenvolvimento mostra que a relao (2.3.10) pode ser escrita diretamente em ter-mos das grandezas complexas () e similares, uma vez que estes aparecem de modonatural na funo de Wigner. Portanto, vemos que a correspondncia formal estabelecida

    F ((), (), (), ())W = FS(a, a, a, a), (2.3.19)

  • 2.4. FOTODETECO DE QUADRATURAS DO CAMPO 19

    em que dois modos legtimos do campo aparecem necessariamente. Isto posto, podemosdizer que os operadores p() e q(), so na verdade uma combinao dos modos dasbandas laterais .

    Resumimos estes resultados em uma tabela contendo as relaes de correspondnciasentre os operadores de criao e aniquilao de modos do campo e as grandezas complexasexistentes na representao de Wigner:

    Tabela de correspondncias

    Estado W ((t), (t))

    Modo temporala(t) (t)

    a(t) (t)

    Modo a ()

    a ()

    Modo a ()

    a ()

    Tabela 2.1: Correspondncias entre operadores do campo e nmeros complexos no espaoda funo de Wigner.

    Definimos nesta seo a notao para a matriz de covarincias e as relaes de cor-respondncias entre os formalismos nos clculos da mdia de operadores na descrio dooperador densidade e da funo de Wigner. A seguir, descreveremos o processo de foto-deteco do campo utilizando a tcnica de deteco homodina. Veremos que a descrioseguinte possibilitar chegar s mesmas concluses desta subseo.

    2.4 Fotodeteco de quadraturas do campo

    Nesta anlise de fotodeteco, lidaremos com campos escalares que possuem polariza-o e direo de propagao bem definidas, se propagando livremente at incidir em umaregio ativa do detector de rea A, situada em um plano fixo, perpendicular direo depropagao do campo. Primeiramente, iremos identificar as etapas envolvidas no processode medida e, em seguida, veremos como acessar as informaes sobre as quadraturas docampo atravs da deteco homodina. Finalmente, identificaremos o que de fato medidoe sua relao com operadores legtimos do campo.

  • 20 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    2.4.1 O operador de fotodeteco

    Com as suposies anteriores e tomando o limite contnuo para um volume de quan-tizao infinito, o campo eltrico dado na equao (2.2.7) tem sua expresso reescritacomo

    E(t)(+) =

    0deita, (2.4.1)

    em que foram omitidos os fatores multiplicativos.A relao de comutao entre os operadores de criao e aniquilao de modos do

    campo passa a ser [a, a ] = ( ). Vemos que o campo uma soma de modosrotulados pela frequncia , fixada pela dependncia espacial = c|~k|. Esta frequnciano possui qualquer relao com a decomposio de Fourier com a qual obtivemos asequaes (2.2.16), trata-se de uma frequncia de evoluo livre do campo.

    Como o processo de medio do campo se d por meio de efeito fotoeltrico, naturalque o operador associado medida de fotodeteco esteja diretamente relacionado como operador nmero de ftons aa. De fato, de acordo com [Glauber 1963b], o operadorhermitiano que representa a fotodeteco

    I(t) = E()(t)E(+)(t) (2.4.2)=

    ddei(

    )taa . (2.4.3)

    A mdia desse operador no estado que chega ao detector fornecer a fotocorrente medida.Para que ambas as quadraturas do campo sejam acessadas, necessrio utilizar tcni-

    cas interferomtricas, pois tudo que o fotodetector permite medir fluxo de ftons. Sendoassim, as informaes obtidas por medidas diretas esto imediatamente associadas coma quadratura amplitude, uma vez que esta proporcional intensidade do campo. Atcnica mais amplamente utilizada a deteco homodina.

    2.4.2 Quadraturas do campo e o processo de fotodeteco

    Para estudar o processo de medida vamos considerar dois campos: um intenso, deno-minado portadora, que se encontra em um estado coerente com frequncia 0 de amplitude = ||ei, denotado por |0 cujo espao de Hilbert Hp; e outro com estado multi-modo desconhecido onde esto as quantidades de interesse, | no espao de Hilbert Hbl,com nmero mdio de ftons muito menor. Nas tcnicas interferomtricas utilizadas noacesso s quadraturas, o campo coerente denominado oscilador local (LO), terminologiaque tambm utilizaremos aqui. A deteco homodina a tcnica mais difundida e serapresentada em detalhe na seo 2.6.1. Inicialmente, consideremos a medida do estadoque tem sua forma geral dada pelo produto direto dos estados citados,

    | = |0 |, (2.4.4)

    cujo espao de Hilbert no qual definido H=HpHbl.

  • 2.4. FOTODETECO DE QUADRATURAS DO CAMPO 21

    O valor mdio do operador que representa a fotodeteco (equao 2.4.2) fornece afotocorrente I(t),

    I(t) = |E()(t)E(+)(t)| (2.4.5)=

    ddei(

    )t0||aa |0|. (2.4.6)

    Por conta da intensidade do oscilador local, alguns termos dessa equao se destacam e soexplicitados pela aplicao dos operadores de criao e aniquilao referentes frequncia = 0, pois, para um estado coerente, a |0 = ( 0)|0. Por exemplo, aintegral envolvendo o operador a tem sua forma explcita,

    deita|0| =

    (ei0t +

    dei

    ta

    )|0|, (2.4.7)

    na qual vemos duas contribuies dentro dos parnteses: a primeira correspondente aooperador a0 que atua no espao de Hilbert Hp e a segunda, correspondente s demaisfrequncias descritas no espao Hbl. Note a presena do apstrofo na integral indicandoque a frequncia 0 no mais levada em conta neste ltimo termo.

    Realizando uma manipulao algbrica simples com a exponencial ei0t, obtemos

    dei

    ta |0| = ei0t

    + dei(

    0)ta a(t)

    |0|. (2.4.8)

    O termo entre parnteses indica que o tratamento heurstico adotado nas equaes (2.1.13)e (2.2.15) aparece naturalmente neste desenvolvimento formal, pois possvel reconhecera soma de um valor mdio com um termo que faz as vezes da flutuao, formado porcontribuies de frequncias diferentes da frequncia central 0, fato que indicamos comum apstrofo na integral.

    A expresso para I(t) pode ser obtida calculando de modo similar a outra integral daexpresso (2.4.5) que simplesmente o complexo conjugado da equao acima. Dito isto,podemos examinar as quantidades envolvidas em I(t) = E(+)(t)| 2, explicitamenteescrita como

    I(t) ||2 + dei(

    0)t|a|+ dei(

    0)t|a|

    ||2 + |||

    ei dei(

    0)ta a(t)

    +e i dei(

    0)ta a(t)

    |.(2.4.9)

    Os operadores de criao e aniquilao no domnio temporal definidos aqui so osoperadores lentamente variveis apresentados na equao (2.2.12), porm manteremos anotao acima. O primeiro termo, ||2, a intensidade mdia do campo, denotada nos

  • 22 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    experimentos como sendo a componente DC. As outras contribuies so frutos do pro-duto entre os modos 6= 0 e a frequncia central 0 do oscilador local. Note que, mesmosendo de intensidades muito pequenas, estes termos so amplificados pela amplitude dooscilador local. A exemplo do que foi feito nas expresses (2.1.13) e (2.2.15), os ter-mos de intensidade cruzada entre modos de poucos ftons foram desprezados por teremcontribuies muito menores para a fotocorrente quando comparados com os demais.

    Podemos reconhecer a grandeza entre os parnteses da equao anterior como sendouma quadratura generalizada temporal do campo, traduzida como amplitude ou fasedependendo da fase do oscilador local. Sendo assim, a equao pode ser escrita de umaforma mais compacta,

    I(t) = ||2 + ||I(t), (2.4.10)

    onde

    I(t) = a(t)ei + a(t)ei (2.4.11)

    representa a flutuao da fotocorrente no tempo4.Com o intuito de deixarmos explcita a dependncia dos operadores com as frequncias

    no entorno da frequncia central 0, utilizamos um tratamento similar ao realizado nasequaes (2.2.11)-(2.2.13) para obter

    a(t) =deita e a(t) =

    deita, (2.4.12)

    onde utilizamos novamente a forma compacta 0 e retiramos o apstrofo dasintegrais. Explicitando as frequncias positivas e negativas, a quadratura generalizadapassa a ser

    I(t) =d

    (eie ita + eie ita

    )(2.4.13)

    =

    0d

    (eie ita + eie ita + eie ita + eie ita

    ).(2.4.14)

    Fizemos isso com o intuito de escrever a equao anterior explicitando os operadoresp e q legtimos dos modos de frequncia ,

    p = a + a (2.4.15)q = i(a a), (2.4.16)

    4 Como veremos, na tcnica de deteco homodina, a equao (2.4.11) surge naturalmente como umoperador que representa a subtrao das fotocorrentes dos modos oriundos de uma deteco balanceada,onde a fase interpretada fisicamente, e de modo preciso, como uma fase relativa entre o feixe deinteresse e o oscilador local. Na descrio dada at aqui, esta fase aparece como uma propriedade queno podemos acessar diretamente sem o uso de tcnicas interferomtricas.

  • 2.4. FOTODETECO DE QUADRATURAS DO CAMPO 23

    com relaes de comutao [p, q ] = 2i( ), o que resulta em

    I(t) = cos

    0d[(p + p) cos(t) + (q q) sen (t)] +

    + sen

    0d[(p + p) sen (t) + (q + q) cos(t)]. (2.4.17)

    A flutuao da fotocorrente dada pela equao acima mostra que estamos lidando comum sistema composto pelos modos , dado que os operadores de quadratura p e qaparecem explicitamente. Declarando w e w na equao (2.3.6), podemosdescrever este sistema atravs de uma matriz de covarincias que carrega informaessobre as amplitudes de rudo de suas quadraturas (2p e 2q) e correlaes entre asmesmas (i.e., C(pp) e C(pq) ).

    Apresentamos aqui a estrutura da fotocorrente no processo de homodinagem. O passoseguinte ver como a decomposio em Fourier influencia essa estrutura e seus efeitossobre os modos das bandas laterais.

    2.4.3 Quadraturas segundo anlise Fourier

    As informaes sobre as flutuaes e sua natureza estatstica esto presentes nas ban-das laterais do campo e so fisicamente acessveis atravs da decomposio por anlisede Fourier da fotocorrente medida. O procedimento geral consiste em misturar a fo-tocorrente I(t) de entrada com um sinal peridico I0(t) conhecido como oscilador localeletrnico (eLO), de frequncia 0 fixada pelo observador. Em seguida, o sinal I(t)I0(t),proveniente do misturador, atravessa um filtro passa-banda que determina a resoluo emfrequncia que poder ser observada. O resultado deste processo integrado usando umfiltro passa-baixa que determina o intervalo de tempo no qual ser feita a mdia do sinalde entrada, geralmente muito maior que o perodo do eLO. Tipicamente, a variao daspropriedades do campo ocorre em intervalos de tempo muito curtos quando comparadosao tempo de integrao associado deteco, o que permite colocar limites infinitos nasintegrais. Queremos dizer que a eletrnica fornece o sinal

    dtI(t)I0(t) =dtI(t)ei0t (2.4.18)

    = I0 , (2.4.19)

    onde escrevemos o sinal do eLO como I0(t) = I0ei0t e omitimos o fator I0 na equaoacima.

    Desprezando o valor mdio, podemos usar a forma compacta (2.4.10) para a flutuaoda fotocorrente a fim de escrever

    I0 =dtI(t)ei0t. (2.4.20)

  • 24 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    Substituindo a expresso (2.4.13) obtida para I e invertendo a ordem das integraistemos

    I0 = d

    dtei0(eieita + eieita) (2.4.21)

    = eia0 + eia0. (2.4.22)

    Assim, no fim da anlise de Fourier mostramos que a componente espectral da fotocor-rente correspondente ao sinal efetivamente medido uma grandeza complexa associadaao operador no-hermitiano

    I = eia + eia, (2.4.23)

    com frequncia definida pelo eLO. V-se claramente que I = I. Podemos reescrevera equao precedente explicitando os operadores hermitianos das quadraturas dos camposnos modos e . Fazemos isso definindo os operadores das combinaes simtricas (s)e antissimtricas (a):

    ps(a) = (p p)/

    2 e qs(a) = (q q)/

    2, (2.4.24)

    em que s e a representam, respectivamente, a combinao dada pela soma e subtraodos operadores p e q.

    Definindo tambm as correspondentes quadraturas generalizadas Xs e X+2a , podemos

    verificar que os termos em quadratura da fotocorrente I =

    2(Icos + iI sen ), so dadospor

    Icos = cos ps + sen qs Xs , (2.4.25)I sen = cos qa sen pa X

    +2a . (2.4.26)

    Assim, em princpio, a medida das componentes Icos e I sen da fotocorrente obtidas peladecomposio de Fourier pode trazer de maneira direta informaes sobre as combinaessimtricas e antissimtricas dos modos das bandas. Podemos ento dizer que cada umdos sinais em quadratura uma medida de um modo nico do campo, ambos acessveisem virtude da relao de comutao [Icos, I sen ] = 0.

    Esses dois sinais podem ser medidos de forma independente atravs de um procedi-mento relativamente simples, misturando a fotocorrente com dois sinais em quadratura,conforme ilustrado na figura abaixo.

    A exemplo do que foi feito para os modos especficos das bandas laterais, podemosescrever a matriz de covarincias (2.3.6) na base {ps, qs, pa, qa}, declarando w s ew a, obtendo as amplitudes de rudo dessas novas quadraturas, 2ps(a) e 2qs(a), ecorrelaes entre as mesmas [i.e, C(pspa) e C(psqs(a))].

    Para determinar a contribuio desses modos para a potncia de rudo em uma de-terminada frequncia segundo a anlise Fourier, vejamos como calculado o espectro derudo.

  • 2.4. FOTODETECO DE QUADRATURAS DO CAMPO 25

    Figura 2.2: Esquema de medida das fotocorrentes em quadratura.

    2.4.4 Espectro de rudo

    Aps adquirir os sinais das fotocorrentes, utilizamos o Teorema de Wiener-Kintchinepara obter a potncia de rudo S() associado fotocorrente I(t) do campo. Faz-se isso,calculando a transformada de Fourier da funo de autocorrelao temporal [Mandel 1995]

    C(t, t) = I(t)I(t+ ), = t t, (2.4.27)

    que determina como o valor da flutuao da fotocorrente no tempo t se relaciona com ovalor no instante de tempo t. Para processos estacionrios, definidos aqui como aquelesonde C(t, t) depende somente da diferena de tempo = t t, o Teorema de Wiener-Kintchine [Mandel 1995] afirma que S() dado por

    S() =ei I(t)I(t+ )d, (2.4.28)

    ou, aps substituir os operadores dependentes do tempo pelas suas transformadas deFourier,

    2S()( ) = II, (2.4.29)

    reescrita como S() = II,II = 0, para 6= . (2.4.30)Nas linhas seguintes, quando nos referirmos a estados estacionrios, estamos nos re-

    portando a estados que geram fotocorrentes que satisfazem a equao acima. A funodelta surge por causa do limite de integrao infinito na equao (2.2.13). No entanto,essa divergncia contornada pelo fato de medidas serem realizadas em um tempo finito,alm de serem utilizados filtros de frequncia com uma dada largura de banda o que de-fine a frequncia dentro de um certo intervalo. Desse modo no medimos exatamenteo espectro de rudo e sim algo proporcional a ele.

    Utilizando as expresses das quadraturas da fotocorrente medida, dadas pelas equaes(2.4.25) e (2.4.26), vemos que o espectro de rudo dado pela equao (2.4.30) se escrevecomo

    S() = 12I2cos+

    12I

    2sen

    12

    2Xs +12

    2X+2a . (2.4.31)

  • 26 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    Esta expresso nos mostra que a amplitude do rudo medido tem contribuies de doisoperadores de quadratura de modos distintos, que correspondem respectivamente s com-binaes simtrica e antissimtrica de frequncias e . Logo, a amplitude de rudo notraz informaes sobre um modo legtimo do campo, mas sim de uma mistura estatsticade modos. No entanto, sob certas circunstncias, apresentadas nas sees seguintes sobreas tcnicas de deteco homodina e auto-homodina, as medidas de uma nica quadraturaeletrnica (Icos ou I sen ) podem representar de fato um modo nico do campo.

    Quando levamos em conta a estacionariedade das flutuaes da fotocorrente dada pelaequao (2.4.30), o clculo de II, utilizando a equao (2.4.23) e tendo em mente asrelaes (2.4.25) e (2.4.26), nos mostra que

    II = 0 =

    2Xs = 2X

    +2a ,

    2Xs2X+2a = 0.

    (2.4.32)

    Vemos ento que a estacionariedade implica perfeita simetria entre as estatsticas dascomponentes eletrnicas em quadratura e completa ausncia de correlaes entre elas.

    Neste caso, podemos afirmar que a amplitude do rudo medido corresponde de fato varincia de modos legtimos do campo, sendo uma medida da combinao simtricaou antissimtrica dos modos das bandas laterais, uma vez que so iguais. Em princpio,trata-se de um procedimento relativamente simples de ser testado, pois para isso bastarealizar a medida das fotocorrentes em quadratura, conforme ilustrado na figura 2.2,comparando as flutuaes de cada uma e as correlaes entre elas, a fim de confirmar seestamos lidando com fotocorrentes estacionrias e dessa forma reconhecer a medida deum modo bem definido do campo.

    Em uma perspectiva mais geral, podemos interpretar a potncia de rudo S(), deacordo com a equao (2.4.30), como um teste experimental direto do critrio de emara-nhamento de Duan et al. [Duan 2000] aplicado s bandas laterais. Caso seja verificadaa presena de compresso de rudo, temos, alm dessa caracterstica quntica, a presenade emaranhamento entre os modos e . Exporemos este critrio no prximo captulo.

    Estados com compresso de rudo so assim definidos por apresentarem em suas qua-draturas flutuaes abaixo de um nvel de rudo bem estabelecido conhecido como shot-noise ou rudo quntico padro. Este nvel de rudo uma das principais caractersticasde outra classe de estados de mnima incerteza, os estados coerentes. Nas prximas seesapresentaremos a definio do shot-noise e tentaremos mostrar em uma anlise simplessua relao com o carter corpuscular da luz.

    As relaes (2.4.30) podem no ser resultado somente da estacionariedade, sendo neces-srios outros ingredientes para ganhar mais informaes sobre o estado quntico estudado.Na anlise feita acima, no consideramos em nenhum momento o efeito da difuso da faserelativa entre o oscilador tico e eletrnico, algo que pode ter grande importncia para amedida das fotocorrentes em quadratura. Trataremos deste assunto a seguir.

  • 2.4. FOTODETECO DE QUADRATURAS DO CAMPO 27

    2.4.5 O efeito da mistura de fase

    Mesmo que as componentes da fotocorrente sejam em princpio mensurveis, ne-cessrio garantir que exista um travamento da fase relativa entre o eLO e o osciladorlocal tico (LO) de modo a tornar possvel a escolha de uma das quadraturas (Icos ouI sen ) [Collett 1987]. Contudo, na prtica, o oscilador local tico sofre difuso de faseem tempos relativamente curtos [Kawakubo 2010]. Caso estejamos considerando medidasem uma determinada janela de tempo suficiente para que o efeito da difuso de fase sejaconsidervel, haver uma variao do operador de medida entre medidas consecutivas.

    Podemos analisar o efeito da variao da fase relativa escrevendo o operador de medidada fotocorrente como uma combinao linear de suas quadraturas da seguinte maneira

    I = cosIcos + senI sen , (2.4.33)

    onde representa a fase relativa entre o LO e o eLO. Consideraremos que esta fasepermanece constante durante a tomada de uma nica medida mas varia entre medidasconsecutivas, sendo alterada por uma quantidade a cada medida. Sendo assim, aestatstica de uma sequncia de medidas deve levar em conta essa variao.

    Isso nos diz que os momentos de ordem superior da fotocorrente medida so na verdadeuma mdia dos momentos do operador I obtidos em um conjunto de medidas consecu-tivas. Portanto, a varincia de qualquer componente da fotocorrente uma mistura devarincias das componentes ideais,

    2I =1

    2

    dI+ I+ (2.4.34)

    = 122Icos +

    12

    2I sen , . (2.4.35)

    O mesmo raciocnio pode ser aplicado ao clculo das correlaes entre as componentesem quadratura da fotocorrente,

    CII+2= 12

    dI+ I+2 + (2.4.36)

    = IcosI sen I sen Icos = 0, , (2.4.37)

    pois [Icos, I sen ] = 0, independente do estado quntico. Os resultados acima podem serresumidos como

    2I = 2I+2 ,CII+2

    = 0

    2Xs = 2X+2a ,

    2Xs 2X+2a = 0.

    . (2.4.38)Vemos que, no havendo relao de fase bem definida entre o eOL e OL, as quadraturas

    da fotocorrente apresentam a mesma estatstica, o que torna arbitrria a escolha da fase .Alm disso, comparando as equaes (2.4.38) e (2.4.32), observamos que o efeito da difuso

  • 28 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    de fase nos leva s mesmas previses de uma fotocorrente estacionria, independente doestado quntico sobre o qual so calculadas as mdias.

    As consequncias das relaes (2.4.38) so evidentes quando olhamos os vnculos im-postos sobre as matrizes de covarincias V/ e Vs/a, escritas nas bases {p, q, p, q}e {ps, qs, pa, qa}, respectivamente. Para os modos simtricos e antissimtricos temos, amenos de rotaes das quadraturas, as igualdades entre varincias 2ps = 2qa ,2qs = 2pa e C(psqs) = C(paqa) para correlaes entre quadraturas deum mesmo modo, sendo ainda possvel verificar correlaes entre quadraturas de modosdistintos C(pspa) = C(qsqa) = . Dada a relao entre as bases segundo as definies dosmodos ps(a) e qs(a), verificamos tambm que 2p = 2q , 2p = 2q ,C(pp) = C(qq) = e C(pq) = C(qp) = . Obtemos, ento, asmatrizes de covarincias

    Vs/a =

    ps qs pa qa

    ps 0qs 0 pa 0 qa 0

    e V/ =

    p q p q

    p 0

    q 0

    p 0q 0

    . (2.4.39)

    Essa descrio geral considerando que exista a difuso de fase, independente doestado quntico. Portanto, para que o sistema seja completamente caracterizado, neces-srio obter informaes subjacentes a este efeito. Para uma descrio completa do estadoproduzido por nosso sistema, so necessrias as medidas de todos os elementos de umadas matrizes acima, uma vez que estas esto diretamente relacionadas por transformaesunitrias. Analisaremos brevemente a medida desses termos, sendo este assunto tratadode modo mais detalhado na tese de outro estudante do grupo, Felippe A. S. Barbosa.

    Os resultados apresentados no decorrer dessa tese so frutos de medidas realizadas comum nico oscilador local eletrnico e sem travamento de fase relativa entre ele e o osciladorlocal tico. Por conta disso, aps algumas consideraes, veremos em nosso tratamentoque o estado de um campo de luz ser examinado como um nico modo formado pelacombinao das bandas laterais, sem considerar os modos e como subsistemas.

    Na subseo anterior mencionamos que a existncia de emaranhamento entre bandaslaterais pode ser verificada se o rudo dado pela equao (2.4.30) apresentar compresso,valor abaixo do limite estabelecido pelo rudo existente em estados coerentes da luz, oshot-noise. Nas duas prximas sees trataremos deste assunto, mostrando como feitaa calibrao do rudo quntico padro e como so medidas as flutuaes das quadraturasdo campo relativas ao shot-noise.

    2.5 Referncia de rudo

    Existem estados qunticos para os quais a relao de incerteza de Heisenberg se limita

  • 2.5. REFERNCIA DE RUDO 29

    igualdade e que permitem explorar a analogia entre as variveis dinmicas do osciladorharmnico clssico e as quadraturas aqui definidas [Stephen 1987]. Introduzido na teoriaquntica por Roy J. Glauber [Glauber 1963a], estes so os chamados estados coerentes,autoestados do operador de aniquilao,

    a| = |, (2.5.1)

    onde o autovalor de a que pode ser interpretado como uma amplitude complexa,anloga amplitude de um oscilador harmnico. Escrito na base de Fock {|n}, onde nindica um nmero bem definido de ftons, | dado por

    | = e||2/2n=0

    nn!|n. (2.5.2)

    Com esta expresso, podemos calcular a probabilidade |n||2 de encontrar n ftons noestado |, obtendo como resultado uma distribuio poissoniana,

    P(n) = 1n!e||2||2n, (2.5.3)

    que descreve uma sucesso de eventos estatisticamente independentes, como o caso dachegada de ftons ao fotodetector. Uma caracterstica importante desse tipo de distribui-o a igualdade entre a varincia e nmero mdio de ftons,

    2N = N = ||2, (2.5.4)

    onde N = aa o operador nmero.Calculado para um estado coerente, o valor mdio do campo eltrico monocromtico

    dado pela equao (2.2.6)

    |E| =

    8~L3

    ~|| sen (~k ~r t+ ), (2.5.5)

    em que = ||ei. Vemos nessa expresso que as grandezas || e representam, defato, a amplitude e a fase do campo. A varincia de ~E mostra um resultado bastanteinteressante

    2E = |E E| |E| |E| = 2~kL3

    . (2.5.6)

    Em um estado coerente, a amplitude das flutuaes do campo eltrico calculadas per-manece constante e igual s flutuaes no vcuo |0, independente do estado |. A essasflutuaes dado o nome rudo quntico padro ou shot-noise. Para nosso tratamento, til normalizar as flutuaes do campo por este rudo de modo a obtermos sempre2 ~E = 1 para os estados coerentes. Isso porque existem estados para os quais as flu-tuaes do campo tm amplitudes menores que as obtidas em estados coerentes, o quedetermina o carter intrinsecamente quntico do sistema [Teich 1989]. Conhecidos como

  • 30 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    Figura 2.3: Representao do campo e suas flutuaes no diagrama de Fresnel. O vetorpartindo da origem representa o valor mdio do campo e o crculo pontilhado o rudo deum estado coerente, shot-noise. A elipse indica compresso de rudo em uma quadraturaem detrimento das flutuaes na quadratura conjugada para que no haja violao darelao de incerteza de Heisenberg.

    estados comprimidos, estes tambm pertencem classe de estados de mnima incerteza eso de fundamental importncia para tica quntica, constituindo ainda a base de crit-rios de emaranhamento de estados gaussianos em variveis contnuas. A figura mostra arepresentao do campo num diagrama de fasores incluindo esses novos elementos.

    A seguir falaremos mais sobre o rudo quntico padro e sua interpretao (talvez) umpouco mais intuitiva, alm de mostrar como feita sua calibrao.

    2.6 O rudo quntico padro ou shot-noise

    O rudo quntico padro (ou shot-noise) um dos principais conceitos deste traba-lho. Trata-se de uma caracterstica intrnseca natureza quntica da luz e serve comoreferncia para todos os rudos medidos no laboratrio.

    A fim de ganhar intuio sobre o shot noise, podemos imaginar um campo de luzmonocromtica que incide sobre um divisor de feixes com transmisso e reflexo iguais.Classicamente, somos levados a pensar que as flutuaes de intensidade do campo deentrada so igualmente transmitidas com metade de sua amplitude para cada campooriundo da diviso. Sendo assim, espera-se que a amplitude das flutuaes do sinal desubtrao desses dois campos apresente valor nulo.

    No entanto, no cenrio quntico a presena de flutuaes de intensidade no campoest associada s variaes no fluxo de ftons. Ao chegar no divisor de feixes, cadafton possui 50% de chance de ser transmitido ou refletido, o que torna as reflexese transmisses aleatrias. Cada campo passa a ter de modo independente a sua prpriaaleatoriedade no fluxo de ftons. Portanto, a subtrao das flutuaes ainda dar origem a

  • 2.6. O RUDO QUNTICO PADRO OU SHOT-NOISE 31

    uma flutuao mensurvel, inerente natureza da luz. Mostramos anteriormente que, paraum estado coerente, a estatstica de ftons poissoniana, um tipo de distribuio muitasvezes associada com eventos raros, com baixa probabilidade de ocorrncia [Salinas 1997].

    Tomando esta ideia como base, vamos considerar um problema simples apresentadona referncia [Fox 2000]. Consideremos um feixe laser estvel com intensidade constantede modo que no haja variao no fluxo de ftons com o tempo. Para um feixe de luz comuma potncia constante, o nmero mdio de ftons em um segmento de comprimento L dado por

    n = Lc, (2.6.1)

    onde o fluxo de ftons que passam por uma seo transversal do segmento por unidadede tempo. O comprimento L considerado suficientemente grande de tal modo que onmero mdio de ftons seja um nmero inteiro bem definido.

    Lana-se agora o seguinte problema: divida o segmento L em N partes, gerando L/Nsubsegmentos. Faa N ser muito grande, tal que a probabilidade p = n/N de encontrarum fton dentro de um subsegmento seja muito pequena, tornando a chance de encontrardois ou mais ftons em um dos segmentos L/N desprezvel. Qual a probabilidade P(n)de encontrar n ftons dentro do segmento L contendo N subsegmentos?

    Para encontrar a resposta, basta calcular a probabilidade de encontrar n subsegmentoscom 1 fton e os (N n) restantes vazios. O resultado uma distribuio binomial

    P(n) = N !(N n)!n! pn(1 p)Nn. (2.6.2)

    Substituindo p = n/N e fazendo um rearranjo simples obtemos

    P(n) = 1n!

    (N !

    (N n)!Nn

    )nn(

    1 nN

    )Nn. (2.6.3)

    Agora, vamos tomar o limite N . Calculando o logaritmo da equao acima eutilizando a aproximao de Stirling (lnN ! N lnNN), vlida para N suficientementegrande, possvel mostrar que o primeiro e o segundo termo entre parnteses na equao(2.6.3) so aproximadamente iguais a 1 e exp(n), respectivamente. Como resultadodessas aproximaes temos

    P(n) = nn

    n! e(n), n = 0, 1, 2, . . . (2.6.4)

    que descreve uma distribuio Poissoniana.Este tipo de estatstica encontrada em processos aleatrios discretos, que fornecem

    como resultado nmeros inteiros. Podemos, por exemplo, considerar o processo de conta-gem em um sistema que detecta ftons individuais de um feixe de luz coerente. Os valoresregistrados variam acima e abaixo da mdia e a probabilidade de registrar n ftons dadapela distribuio Poissoniana (2.6.4). No caso ideal, cada fton que incide na superfcie

  • 32 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    do detetor ir provocar a emisso de um eltron, dando origem a uma fotocorrente. Adistribuio P(n) diretamente representada pela variao dessa fotocorrente. No do-mnio temporal, isto significa que os ftons esto chegando ao fotodetector em temposdiferentes, de forma aleatria [Bachor 1998].

    Uma distribuio Poissoniana caracterizada unicamente pelo valor mdio n, umavez que as flutuaes estatsticas quantificadas pela varincia, 2n, so iguais ao prpriovalor mdio.

    Os estados coerentes descritos na seo anterior possuem essas caractersticas. Perten-cem classe de estados com mnima incerteza, distribuda igualmente entre as variveiscanonicamente conjugadas, obedecendo a igualdade da relao de incerteza de Heisen-berg. So eles que definem o shot-noise. A motivao para este nome parte da anlisede flutuaes de corrente em circuitos eltricos, por Schottky em 1918 [Schottky 1918],devido ao carter discreto dos portadores de carga. Schottky fez analogia entre a chegadade eltrons em nodos e o granizo que caa sobre uma superfcie gerando sons parecidoscom tiros, da o termo shot.

    A seguir apresentamos como medir o shot-noise para um feixe de luz intenso e, umavez medido, como utiliz-lo como referncia para os demais rudos medidos.

    2.6.1 Como medido o shot-noise?

    O limite clssico associado ao rudo das quadraturas do campo pode ser determinado apartir das flutuaes de intensidade de um feixe coerente. Sero descritas aqui as tcnicasempregadas em nosso experimento para a calibrao do shot-noise e os mtodos utilizadospara torn-lo uma referncia para os demais rudos.

    Considere dois campos ~E1 e ~E2 que incidem em um divisor de feixes (figura 2.4),gerando dois campos de sada ~E3 e ~E4, relacionados entre si atravs da equao matricial E3

    E4

    = r tt r

    E1E2

    , (2.6.5)em que r e t so os coeficientes complexos de reflexo e transmisso do divisor de feixesilustrado na figura 2.4.

    A conservao de energia impe | ~E1|2 + | ~E2|2 = | ~E3|2 + | ~E4|2, o que implica |r|2 + |t|2 = 1,

    rt+ rt = 0.. (2.6.6)

    Se escrevermos r = |r|eir e t = |t|eit , possvel mostrar que a diferena de fase entreos campos refletidos e transmitidos deve ser igual a . Utilizando esses resultados eintroduzindo os operadores de aniquilao atravs das correspondncias

    E1 a, E2 b, (2.6.7)E3 c, E4 d, (2.6.8)

  • 2.6. O RUDO QUNTICO PADRO OU SHOT-NOISE 33

    Figura 2.4: Esquema de um divisor de feixes.

    obtemos cd

    = |r| |t||t| |r|

    ab

    . (2.6.9)Para o caso de uma deteco balanceada (|r| = |t| = 1/

    2), obtemos os campos de sada

    c = 12

    (a+ b), d = 12

    (a b). (2.6.10)

    No processo de deteco so usados fotodetectores sensveis aos operadores nmero,uma vez que o efeito fotoeltrico o responsvel pela converso de intensidade dos camposem fotocorrente. Dessa forma, os operadores hermitianos que representam a fotodetecodos campos c e d so dados por

    Ic = kcc e Id = kdd, (2.6.11)

    onde k um fator constante (geralmente denominado ganho) introduzido pela eletrnicaenvolvida na deteco. Se o valor de k realmente no variar com a intensidade do campoincidente, dizemos que a eletrnica possui uma resposta linear, algo fcil de ser testadoexperimentalmente.

    Informaes importantes sobre os campos de entrada podem ser obtidas atravs dasoma e subtrao das fotocorrentes medidas, escritas em termos dos campos de entradacomo

    I+ = Ic + Id = k(aa+ bb) (2.6.12)I = Ic Id = k(ab+ ab). (2.6.13)

    Suponhamos um sistema formado por campos de entrada representados pelos estados|a e |, tal que o estado geral seja | = |a |. Para simplificar, sem perder em

  • 34 CAPTULO 2. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

    generalidade, vamos considerar o estado correspondente ao campo b como sendo coerente,b| = |. Com isso, podemos calcular as varincias dos sinais de soma e subtrao,

    2I() = I2 I2. (2.6.14)

    Aps algumas manipulaes algbricas, obtm-se

    2I = k2(aa+ ||2) + k2[(a + a)2 (a+ a)2],2I+ = k2[: 2na :+ aa+ ||2], (2.6.15)

    em que : 2na : a varincia do operador nmero do campo a em ordem normal5.Explicitando a amplitude complexa = ||ei, a varincia da subtrao das fotocor-

    rentes reescrita como

    2I = k2(aa+ ||2) + k2|nb|2[(aei + aei)2 X2

    aei + aei2 X2

    ], (2.6.16)

    onde notamos a presena da quadratura generalizada, X, do campo a. Podemos aindaescrever as varincias em termos do valor mdio das intensidades de cada campo, obtendo

    2I = k(Ia+ Ib) + kIb2X2I+ = k2: 2na :+ kIa+ kIb. (2.6.17)

    O resultado acima nos mostra que as flutuaes da subtrao das intensidades tmuma relao direta com as flutuaes da quadratura do campo a. Variando a fase docampo coerente (oscilador local), temos acesso a todas as quadraturas do campo. Umcaso particularmente interessante ocorre quando consideramos o modo do campo b comosendo o modo de vcuo, | = |0. As expresses (2.6.17) se tornam

    2I = kIa (2.6.18)2I+ = kIa+ k2: 2na : (2.6.19)

    Para um estado coerente, as flutuaes de intensidade so iguais ao valor mdio do campo,o que caracteriza uma distribuio Poissoniana no nmero de ftons. Sendo assim, re-conhecemos na expresso (2.6.18) o termo correspondente ao shot-noise. Na equao(2.6.19) notamos duas contribuies, uma devido ao shot-noise, primeiro termo do ladodireito, e outra devido a rudos caractersticos do estado analisado, segundo termo.

    A forma usual de calibrao do shot-noise se d pela equao (2.6.18) com a obtenodo coeficiente linear k. Feito isso, os rudos de uma dada medida so normalizados pelaconstante k multiplicada pelo valor mdio Ia do campo correspondente, o que equivale a

    5Ordem normal definida como aquela em que os operadores de criao so posicionados esquerdados operadores de aniquilao.

  • 2.6. O RUDO QUNTICO PADRO OU SHOT-NOISE 35

    normalizar 2I. Esse o mtodo mais utilizado para relativizar os rudos ao shot-noise.Alm disso, como a varincia da subtrao das fotocorrentes tem uma dependncia linearcom a intensidade do campo, a tcnica serve como um teste para a eletrnica de deteco.

    Outro mtodo baseado na ideia acima consiste em medir os rudos de interesse enormaliz-lo pelo shot-noise a cada medida. Faz-se isto calculando diretamente a razo2I+/2I:

    2I+2I

    = k: 2na :Ia

    + 1, (2.6.20)

    de onde se notam as contribuies do rudo do campo de interesse e do rudo qunticopadro, igual unidade, dado que foi divido por ele mesmo.

    Se reescrevermos : 2na : em termos de Ia, obtemos2I+2I

    = 2IakIa

    = 2p, (2.6.21)

    onde a segunda igualdade se refere equao (2.2.15). Este resultado nos mostra que arazo entre as varincias dos sinais de soma e subtrao das fotocorrentes nos fornece orudo de amplitude do campo j normalizado pelo shot-noise.

    Ao lidarmos com medidas de flutuaes do campo, devemos levar em consideraotodas as fontes de rudo que sero registrados no ato da medida. Basicamente, ao incidirum campo em um fotodetector, o rudo total ST medido tambm tem contribuies daeletrnica do aparato experimental. Explicitamente,

    ST = 2I(t) + 2I(t)esc + 2I(t)th + 2I(t)amp 2I(t)ele

    , (2.6.22)

    onde o primeiro termo o rudo intrnseco da luz e os demais so diferentes tipos derudo eletrnico, 2I(t)ele . O primeiro deles, 2I(t)esc [Spiegel 1980], refere-se a falsasdeteces, pois mesmo na ausncia de luz os fot