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FUNDA<;:AO EDITORA DA UNESP Presidente do Conselho Curador Jose Carlos Souza Trindade Diretor-Presiden te Jose Castilho Marques Neto Editor Executivo Jezio Hernani Bomfim Gutierre Conselho Editorial Ac ademico Alberto Ikeda Alfredo Pereira Junior Antonio Carlos Carrera de Souza Elizabeth Berwerth Stucchi Kester Carrara Lourdes A . M . dos Santos Pinto Maria Heloisa Martins Dias Paulo Jose Brando Santilli Ruben Aldrovandi Tania Regina de Luca Editora Assistente Joana Monteleone ;,, .. t·h ii .L . -.rc::·: '·. }' · . : , . :. r .. · . ·•. i Wladimir Pornar A REvoLu<;Ao CHINESA CoLE<;Ao .REvoLu<;OEs oo XX DIRE<;Ao DE EMILIA VIOTTI DA CosTA (;ASA · oo XEROX 3322-2328 .f .. , 1 a 1 or : .. ....... ,iP,.,_ ___ _ otrnall. .,m lfflESP r : \d]:;.!JIIIi»Wiiti.'l "@ ....

A Revolução Chinesa

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Page 1: A Revolução Chinesa

FUNDA<;:AO EDITORA DA UNESP

Presidente do Conselho Curador

Jose Carlos Souza Trindade

Diretor-Presiden te Jose Castilho Marques Neto

Editor Executivo Jezio Hernani Bomfim Gutierre

Conselho Editorial A cademico Alberto Ikeda

Alfredo Pereira Junior Antonio Carlos Carrera de Souza

Elizabeth Berwerth Stucchi Kester Carrara

Lourdes A . M . dos Santos Pinto Maria Heloisa Martins Dias Paulo Jose Brando Santilli

Ruben Aldrovandi Tania Regina de Luca

Editora Assistente Joana Monteleone

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Wladimir Pornar

A REvoLu<;Ao CHINESA

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© 2003 Editora UNESP

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Pomar, W1adirnir A Revoluc;:ao Chinesa I W1adimir Pomar. - Sao Paulo:

Editora UNESP, 2003. - (Colecyao Revolucy6es do seculo XX I

direcyao de Emilia Viotti da Costa)

Bibliografia.

ISBN 8?"7l39-~$)-4. :. '· :· .' · .. .:•

1. Revolu~6es ...:.. Clfuta · .. 2. Chin~- - Hist6ria I. Costa,

Emilia Viotti da. ll. Titulo. ill. serie

03 -5930 CDD- 321.0940951

f.n4i<;es para.catalogo sistem.litico:

1. China_: Revolu~oes:Ci~ncia politica 321.0940951

2. Revoh.lc;:oes: China: Ci~ncia polftica 321.0940951

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de Am&ic:a Latina y el Carlbe

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APRESENTA<;::AO DA COLE<;::AO

0 seculo XIX foi o seculo das revolw;:oes liberais; o XX, o das revoluyoes socialistas. Que nos reservan1 o seculo XXI? Ha quem diga que a era das revoluyoes esta encerrada, que o mito da Revoluyao que governou a vida dos homens desde o seculo XVIII ja nao serve como guia no presente. Ate mesmo entre pes­soas de esquerda, que tern sido atraves do tempo os defensores das ideias revolucionarias, ouve-se dizer que os movimentos sociais vieram substituir as revoluyoes. Diante do monop6lio da violencia pelos governos e do custo crescente dos armamen­tos belicos, parece a muitos ser quase impossfvel repetir os feitos da era das barricadas.

Por toda parte, no en tanto, de Seattle- a Porto Alegre ou Mumbai, ha sinais de que hoje, como no passado, ha jovens que nao estao dispostos a aceitar o mundo tal como se configura em nossos dias. Mas quaisquer que sejam as formas de lutas escolhidas e preciso conhecer as experiencias revolucionarias do passado. Como se tern dito e repetido, quem nao aprende dos erros do passado esta fadado a repeti-los. Existe, contudo, entre as gera~oes mais jovens, uma profunda ignorancia desses acontecimentos tao fundatnentais para a compreensao do passa­do e a construyao do futuro. Foi com essa ideia em mente que a Editora UNESP decidiu publicar esta coleyao. Esperamos que os livros venham a servir de leitura complementar aos estudan­tes da escola media, universitarios e ao publico em geral.

Os autores foratn recrutados entre historiadores, cientis­tas sociais e jornalistas, norte-atnericanos e brasileiros, de posi­yoes politicas diversas, cobrindo urn espectro que vai do centro ate a esquerda. Essa variedade de posiyoes foi conscientemente buscada. 0 que perdemos, talvez, em consist~ncia, esperamos

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3. FRENTE UNICA BEM CHINESA

Antes da chegada a Yenan, os comunistas haviam lan~do novo apelo para uma allan~ nacional. Assinado pela Sr• Soong Shinlin, viuva de Sun Yat-sen, e outras personalidades, o Programa de Seis Pontos para a Resistir ao /apiio e Salvar a Na¢o propunha a suspensao da guerra civil e a unidade com os nacionalistas.

A ocupa~o de Liaoning, Jilin e Heilongjiang (Mandchu­ria), em 1931, seguida da instala~o do govemo Manchuquo, dera inicio a coloniza~o japonesa da China. Posteriormente, o Japao avans;ara sobre Hebei, criando a Administra~o Aut6no­ma Anticomunista, e apresentara ao Guomindang seus Tres Prindpios de Relafoes com a China, em que exigia a supressao dos movimentos antinip6nicos, a cooperas:ao economica entre o Japao, a China e o Manchuquo, e urn acordo de luta conjunta contra o comunismo.

0 movimento patri6tico, no entanto, tambem crescera. Em 1935, os estudantes de Beijing ignoraram as proibis:oes e realizaram demonstras:oes, exigindo o fim da guerra civil e a resist~ncia a agressao estrangeira. Diferentes classes sociais to­mavam consci~ncia da ameas:a japonesa sobre a China e posi­cionavam-se ante as ops:<>es de resistir, render-se ou vacilar.

Os trabalhadores, camponeses e classes medias mostra­ram disposi~o de resistir. Os grandes latifundiarios e a burgue­sia burocratica, por seu lado, haviam perdido o senso de nacio­nalidade e achavam a revolu~o pior do que a rendi~o. Entre esses dois p6los, vacilavam a burguesia nacional e os setores dos pequenos e medios latifundiarios e compradores. Queriam opor-se aos nip6nicos, mas temiam a revolu~o.

Alem disso, as outras pot~ncias imperialistas- Fran~a,

Inglaterra e Estados Unidos - pretendiam manter o acordo de Washington, de 1922, que reservava a China como area de do-

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WLADIM!R POMAR

mfnio conjunto. A decisao japonesa de colonizar a China esse acordo. Agravou as disputas entre elas e o Japao, do a China unir-se a elas contra o Japao. Nesse contexto, frente Unica antiimperialista nao mais se dirigiria contra todos ; os imperialismos, mas unicamente contra o Japao. E os setores.j burgueses e latifundiarios ligados aquelas potencias poderiam incluir-se em tal £rente.

CoNSTRU<;:Ao

Em 1935, a iminencia da invasao niponica nao era evi-· dente para todos, mas os comunistas tinham certeza de ocorreria. Para eles, o avan~o sobre Hebei e os Tres Princtpios do ministro Hirota, a pretexto de combater o "banditismo co­munista~ eram parte dos preparatives para uma ofensiva geral Portanto, a resist~ncia a invasao japonesa deveria transformar­se em centro de todas as preocupa~6es.

Predispostos a isso, os comunistas reiteravam sempre sua proposta de cessa~o da guerra civil e unifica~o contra os japo­neses. Como condi~o, queriam a suspensao dos ataques as suas bases, liberdades e direitos para o povo e a ado~o, pelos nacio..: . nalistas, de medidas para armar a popula~o. Em maio de 1936, em telegrama ao Conselho Militar do Guomindang, o comando do Exercito Vennelho tomou publico que suas tropas haviam sido atacadas por mais de dez divis6es nacionalistas, o · que as · impedira de enfrentar as for~ nip6nicas em Hebei, e insistiu na suspensao da guerra civil e na realiza~o de negocia~oes.

Durante 1936, o movimento estudantil e dos drculos culturais e jornalfsticos estendeu~se a todo o pais. Grandes gre­ves antinip6nicas sacudiram Xangai e Qingdao. Os senhores de guerra Li Qunggen e Bai Shungsi, de Guanxi, e Chen Shidang, de Guangdong, declararam-se contra Chiang Kai-chek, por sua pouca disposi~o de resistir ao Japao, e o Exercito Vermelho penetrou no noroeste e assumiu a linha de frente da resistenda. ·

Em novembro de 1936, tropas nacionalistas do Exercito do Nordeste e do 17° Exercito, comandadas pelos generais Chang Xueliang e Yang Hucheng, enfrentaram os nip6nicos em ·

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A REvoLu<;:Ao C H ! NESA

suiyuan, articularam-se com o Exercito Vermelho e insistiram que Chiang Kai-chek aceitasse a unificacyao. No entanto, Chiang f(ai-chek estava mais interessado na guerra civil do que na de­fesa nadonal. Recusou tais sugestoes e tornou-se ainda mais ativo na «supressao" dos comunistas e da oposi~ao. Em dezem­bro, foi a Xian enquadrar aqueles generais e reprimir as manifes­ta~<>es antijaponesas dos jovens da cidade. Mas seus pr6prios generais o prenderam, criando uma crise.

Essa crise era perigosa. Interessava aos japoneses porque, pelo grupo de apoio que possuiam no Guomindang, dirigido por Wang .Xinguei, podiam advogar uma "expedicyao punitiva" contra os exercitos rebeldes, eliminar Chiang Kai-chek, justificar a continuidade da guerra civil e facilitar a invasao geral. Para os comunistas, a morte de Chiang a pen as aprofundaria as divi­s0es da nacyao e enfraqueceria sua capacidade de luta. Isso os levou a intervir nas negocia~oes, enviando Zhu Enlai a Xian, e obter urn acordo, mesmo verbal, entre Chiang Kai-chek e seus generais rebelados.

Chiang se comprometeu a atender "de forma resoluta" as condi~oes apresentadas: retirar de Shaanxi e Gansu as tropas envolvidas na guerra civil, expulsar do Guomindang e do go­verno nacional os grupos pr6-japoneses, anistiar os prisioneiros politicos, garantir liberdades para o povo, cessar a "supressao dos comunistas", aliar-se ao Exercito Vermelho, convocar wna confer~ncia nadonal das for~ dedicadas a salva~o nacional e cooperar com os pafses simpaticos a resistencia da China.

Apesar de os comunistas o haverem salvo da morte, Chiang Kai-chek, no entanto, protelou ao maximo o acordo entre os dois partidos. Ap6s ser libertado, admoestou os generais rebeldes e denunciou o Incidente de Xian como uma "pressao reacionaria': Em maio de 193 7, os comunistas reiteraram con­cordar como acordo de Xian. Cessariam qualquer movimento insurrecional, transformariam o Governo da Regiao Fronteiri~ Shaanxi-Gansu-Ninx:ia eQI Governo da Regiao Especial da Repu­blica da China, e transformariam o Exerdto Verrnelho em parte do Exercito Revolucionario Nacional.

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Nada fora sacramentado quando, em 7 de julho de 1937, as tropas japonesas atacaram Luquochiao e atravessaram a Grande Muralha no rurno sul. No dia seguinte, os cornunistas repetiram seus apelos. Mas Chiang estava sob uma triplice pres­sao: dos que queriam capitular, dos vacilantes representantes da Inglaterra, Estados Unidos e Fran~a, e das rnanifesta~oes populares, que defendiarn a guerra. E so anunciou a decisao de resistir no dia 17. Fez o que os cornunistas charnaram de "pri­meira declara~ao correta, em muitos anos, sabre as relac;:oes in­temacionais': Disse que, tendo a guerra sido iniciada, "cada pes­soa, jovem ou velho, no norte e no sul, deve assumir a respon­sabilidade de resistir ao Japao e defender a patria".

Mao Zedong afirrnou que a declara.yao de Chiang, do dia 17, e a do PC, do dia g, tinham em co mum a decisao de travar urna resoluta guerra de resistencia e opor-se a compromissos e concessoes. Isso, porem, nao impediu que o Guomindang con­tinuasse a negociar e aceitasse os acordos de paz dos gover­nos locais com os comandos niponicos. Somente ap6s o ata­que a Xangai, em 13 de agosto, que obrigou a rnudanya da sede do governo para Chongqing e diante do enfrentamento do Exercito Nacional contra a ofensiva niponica, Chiang em­barcou na guerra.

Manteve, no en tanto, suas protelac;:oes. Em julho de 1937, havia reconhecido o status legal do PC e a cooperacyao biparti­daria, mas apenas em setembro, quando a situac;:ao militar tor­nou-se critica, deixou que fossem publicados os acordos. Os cornunistas reconheciam o Governo Central e o Exercito Nacio­nal, dirigidos pelo Guomindang e por Chiang Kai-chek, enquan­to estes aceitavam a incorporacyao do Exercito Verrnelho, na condic;:ao de go Corpo de Exercitos ( ou go Exercito da Rota) e 4° Corpo de Exercitos (ou Novo 4° Exercito), permitindo que conservassem seus territ6rios e sua organizacyao pr6pria.

A partir dai, a Revolw;:ao Chinesa transformou-se em Guerra de Resistencia Antijaponesa. E o conflito armada entre o Guomintang e o PC transformou-se numa frente (mica armada contra o inimigo estrangeiro. Porem, as estrategias do

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Guomindang e do PC nao foram identicas. E as do Japao, em rela~o a ambos, tambem se distinguiram consideravelmente.

£sTRAT~GlAS JAPONESAS

0 objetivo do Japao consistia em subjugar a China e transforma-la numa colonia. lsso fazia parte do plano, mais vasto, de expulsar as potencias ocidentais da Asia e consolidar­se como Unico imperialismo na regiao. Contando com as mate­rias-primas e a mao-de-obra dos paises colonizados, o Japao poderia realizar seu desenvolvimento industrial e ombrear-se com as potencias europeias e os Estados Unidos.

Para concretizar seu plano expansionista, o Japao conta­va com Forc;:as Armadas modernas: marinha de guerra poderosa, aviacyao de combate eficiente e exercito terrestre altamente trei­nado. Seus oficiais e soldados tinham alto grau de organizac;:ao e autoconfianc;:a, e urn baixo conceito de seus adversarios. Tam­bern possuiam a crenc;:a supersticiosa no Micado e em seus seres sobrenaturais, tradic;:oes nacionais que servirarn de base a uma prolongada doutrinacyao militarista e racista, que os tornou arro­gantes e capazes de ac;:<>es audadosas.

Eram pdntos fortes que continham fraquezas de dificil superacyao. A populacyao do Japao era relativarnente pequena, o que obrigava o pais a subjugar outros povos com a utilizacyao de colaboracionistas nativos para o trabalho politico-governa­mental e para as atividades militares. 0 que contrariava o con­ceito que nutriam em rela~ao a tais povos, podendo resultar em impacto negativo no moral de suas tropas, se a resistencia fosse acima do esperado e impusesse-lhes derrotas em batalha.

Desdenhando essas fraquezas e a capacidade de resisten­cia dos chineses, o comando nip6nico planejou uma guerra de decisao nipida, com apenas dois grupos de exercitos ou doze divisoes. Ern 1937 e 193g, dirigiu seu ataque somente contra as tropas nadonalistas, desprezando as guerrilhas comunistas e suas bases de apoio. Tambem concentrou suas a~oes nos aspectos militares, deixando de lado os aspectos politicos. Desse modo, foi tornado de surpresa pela resistencia do go Exercito, sediado

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WLADIMIR POMAR

em Shaanxi Seu planejamento de rapida decisao desmoronou e, ap6s a tomada de Wuhan, em 193g, teve que mudar de estrategia_

Os japoneses deram-se conta de que os trinta mil homens do go Exercito, com seus ataques aos flancos e a retaguarda de suas tropas, causavam muito mais danos do que as defesas fron­tais dos numerosos exercitos do Guomindang. Elevaram, entao, de doze para trinta o mimero de suas divisoes, concentrararn seus ataques contra os comunistas e ded.icaram aten~ao as a~<>es polfticas que visavam a capitula~o do Guomindang.

Essa mudan~ de estrategia nao deteve, porem, o cresci­mento das for~s comunistas entre 193g e 1940. Isso obrigou os japoneses a adotarem, em 1941, a polftica de «queimar tudo, matar tudo, pilhar tudo': durante sua ofensiva contra as bases do go Exercito. Com isso, conseguiram reduzir a popula~o das areas sob influ~ncia das guerrilhas para cinqiienta milhoes e o go Exercito para trezentos mil homens. Tambem eliminaram urn ml.mero considen\vel de quadros do Partido Comunista e deterioram a economia e as finan~s daquelas areas. Apesar de tudo, nao obtiveram uma vit6ria decisiva.

Tambem nao tiveram sucesso em obter a rendi~ao pac­tuada. Cooptaram vinte membros do Comit~ Central Executivo do Guomindang, para organizar governos titeres a servi~o do Japao. Obtiveram a deser~ao de 58 generais do Exercito Nacio­nal, que transformaram suas tropas em for~as chinesas titeres. Jamais tiveram necessidade de fazer uma declara~ao formal de guerra a China. Porem, apesar de tudo isso, nao alcan~ram o objetivo de levar o Guomindang a capitula~ao e isolar os co­munistas.

As d.ificuldades do Japao cresceram a partir de 1943. As tropas comunistas tinham aprendido a derrotar a polftica de "queimar tudo, matar tudo, pilhar tudo': e os norte-america­nas haviam passado a contra-ofensiva no Padfico. Os niponicos tinham que abrir, a qualquer custo, o trafego ferroviario Beijing­Hangzhou e Hangzhou-Cantao, vias guardadas pelas tropas nadonalistas. Para tanto, reduziram seus contingentes concen­trados contra os vermelhos ( 60% do total) e deslocaram tropas

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para wna a~ao decisiva contra os nacionalistas. Com cerca de sessenta mil homens, aniquilaram metade dos quatrocentos mil homens dos exercitos do Guomindang.

Essa a~ao tornou. ainda mais dificil qualquer polftica capitulacionista ou pacifista e d.ificultou os esfon;:os do Japao, durante 1944 e 1945, para obter uma paz em separado. Esfor~os que se esboroaram totalmente quando as tropas sovieticas, ap6s a vit6ria contra o nazismo na Europa, cumpriram os acordos de Potsdam e lan~ram sua ofensiva na Mandchuria, em agos­to de 1945.

ESTRATEGIAS NACIONALISTAS

Na China, os 6nicos que pretend.iam capitular ao Japao eram os grandes latifund.iarios e os burgueses burocratas asso­ciados ao imperialismo niponico. Os grandes latifundiarios e compradores ligados aos franceses, ingleses e norte-americanos vacilavam entre a rendi~o e a resist~ncia. Isso explica, em parte, a dubiedade dos nacionalistas, mesmo ap6s o acordo para a Guerra de Resist~ncia Antijaponesa.

Os colaboracionistas not6rios haviam passado para o lado japon~s. Mas, no Guomindang, conviviam setores com d.iferen­tes atitudes ante o Japao. Os pr6-japoneses desejavam a guerra civil. Entre os antijaponeses, havia os que queriam combater os japoneses e os comunistas, os que pretendiam enfrentar os japoneses sem aliar-se aos comunistas e os que defend.iam uma guerra unificada contra o Japao. Diante d.isso, a transi~o de uma resist~ncia parcial, levada a cabo apenas pelos comunistas e pelos nacionalistas favoraveis a guerra, poderia desenvolver­se tanto na direlj3o de uma guerra total quanto na dire~ao da capitulalj3o, ou da coexist~ncia entre capitula~ao e resist~ncia.

Em 1938, quando o comando japon~s mudou sua estra­tegia, os nacionalistas tambem mudaram sua polftica de resis­tencia ativa para resist~ncia passiva. Chiang Kai-chek adotou a trfplice politica de negociar com os japoneses, criar fricfi5es com os comunistas e resi.stiJ: passivamente aos niponicos. Isso foi facilitado, em parte, pela vacila~o da Inglaterra e dos Estados

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Unidos diante dos japoneses, que se aproveitaram para espalhar rumores sobre urn acordo de paz.

Em 1939 os rumores transformaram-se em grande con­troversia. Os favoniveis a paz com o Japao diziam que "fazer a paz e sobreviver; lutar e correr perigo". Supunham os japone­ses dispostos a retirar-se dos territ6rios ocupados. Chiang Kai­chek declarou que "levar a Guerra de Resistencia ate o fun" sig­nificava "restaurar o status anterior ao Incidente de Luquochiao': Aceitaria urn acordo se o Japao se retirasse para o norte e man­tivesse ocupadas apenas as provincias do nordeste.

Com essa perspectiva, os nacionalistas espalharam noti­cias e documentos incriminadores contra o Partido Comunista e ampliaram o uso da fricfiiO, urn tipo de a~ao praticada du­rante a cessa<yao da guerra civil e transforma<yao das guerrilhas em unidades do Exercito Nacional. Naquela ocasiao, utilizando­se das negocia<y5es com as guerrilhas de ]iangx:i, Fujian, Guang­dong, Hunan, Hubei, Henan, Zhejiang e Anhui, que formariam o n ovo 4° Exercito, Chiang cercou mais de mil guerrilheiros de Ho Ming, desarmou-os e aprisionou-os.

Em junho de 1939, o 27° Exercito cercou o Escrit6rio de Liga<yao do 4° Exercito, em Pingqiang, matando varios oficiais e soldados. Fricfi5es desse tipo continuaram nos anos seguintes. No inicio de 1941, quando o Japao se lan<you contra os comu­nistas para "queimar tudo, matar tudo, pilhar tudo'~ Chiang ordenou a<y6es, nao contra os japoneses, mas contra os comunis­tas. Emitiu o rdens contradit6rias de desmobiliza~o e desloca­m entos do 4° Exercito, ao mesmo tempo que ordenou ataques contra os contingentes em marcha. Mais de nove mil soldados do 4° Exercito foram mortos e feridos, e seu pr6prio coman­dante foi aprisionado.

As fricfi5es tiveram, porem, que ser reduzidas em 1942 e boa parte de 1943. 0 ataque do Japao a Pearl Harbour mudou OS cenarios em que OS capitulacionistas se moviam. Nesse perio­do, as principais tropas nacionalistas retirar~-se para a Grande Area de Retaguarda, nas montanhas Omei, no Sichuan. Tendo "subido as montanhas para assistir a luta dos outros", Chiang

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pOde escrever seu 0 destino da China, no qual enfatizou sua oposi<yao ao comunismo e as ideias liberais, descarregou sobre

0 PC a culpa pelos dez anos de guerra civil, alcunhou os comu­nistaS e os 4° e 8° Exercitos de "militaristas" e "separatistas de novo tipo", e prometeu liquida-los em dois anos. Assim,.a estra­ttgia de fricfi5es com os comunistas foi reafirmada com vigor.

Do ponto de vista pratico, tres corpos de exercitos de Chiang- os 34°, 37° e 38°- guarnedam o noroeste. Dois deles cercavam a regiao fronteiri~ onde ficava a principal base comu­nista, enquanto apenas urn defendia a linha do Rio Amarelo contra os japoneses. Em jullio de 1943, Chiang deslocou mais dois dos exercitos desse grupamento para atacar aquela regiao e planejou uma serie de outras friCfi5es, frustradas pelo desastre nacionalista ante a ofensiva japonesa contra as ferrovias norte-sui.

Apesar disso, o empenho do Guo min dang em criar inci­dentes e romper a frente Unica nao diminuiu. Aproveitando-se da dissolu~o da Terceira Internacional Comunista, tambem em 1943, Chiang acusou o PC e os 4° e 8° Exercitos de "sabotarem a Guerra de Resistencia e amea<yarem o Estado" e exigiu a sua dissolu~o e a aboli~ao do regime "separatista" da regiao fron­teiri<ya. E, apesat da disposit;:ao dos EUA de impor uma "rendi­~o incondicional" ao Japao, Chiang manteve contatos secretos com representantes nip6nicos no final de 1944, ao mesmo tem­po que lan~ava mais de setecentos mil homens contra as bases comunistas.

Ate a expulsao final do Japao, o Guomindang teve como politica ser "ativo contra os comunistas" e "passivo contra os japoneses". Esperava que os comunistas saissem tao enfraque­cidos que fossem incapazes de suportar uma nova guerra civil. Alem disso, nao mudou suas politicas ante os camponeses, ope­rcirios e setores medios da popula<yao. Manteve o sistema lati­~diario e suas taxas de arrendamento e procurou ampliar os lucros das burguesias burocratica e estrangeira, mesmo que isso ~tum en ­tasse o descontentamento dos trabalhadores. E jamais reduziu sua repressao contra os estudantes e intelectuais, mesmo quando estes tentavam realizar mobiliza~5es estritamente patri6ticas.

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Finalmente, o Guomindang tambem nao modificou seus metodos de recrutamento para o Exercito Nacional. Detinha as pessoas indiscriminadamente e transformava os detidos em soldados, embora pennitisse a libera~ao daqueles que possuiam dinheiro para pagar substitutos ou subornar oficiais. Quando os exercitos nip6nicos entraram em retirada, Chiang ordenou a transforma~o das tropas titeres em contingentes do Exercito Nacional, para poder espalha-las por todo o territ6rio no mo­menta oportuno. Nessas condi~oes, seus tres milhoes de ho­mens, no imaginario popular chines, nao passavam de cestas frageis de ovos. Bastava urn baque para que se quebrassem.

ESTRAT£GIAS COMUNISTAS

Os comunistas tinham como estrategia evitar que o go­verna nacionalista aceitasse capitular, minasse a resistencia con­tra o Japao e rompesse a frente (mica. Em razao disso, concla­maram todas as For~ Armadas chinesas, inclusive o Exercito Vermelho, a apoiarem a declara~ao de Chiang Kai-chek, em julho de 193 7, de "assumir a responsabilidade de resistir ao Japao e defender a patria':

Em seu Programa de Dez Pontos, propuseram que os Tres Princtpios do Povo, de Sun Yat-sen, fossem a base da unidade nacional. · Propuseram, ainda, combinar a guerra regular com a guerra de guerrilhas, dar liberdade ao movimento patri6tico, fazer a reforma democratica do governo, expulsar os traidores e colaboradores, confiscar as propriedades japonesas, concluir alian~as com a Uniao Sovietica, Inglaterra, Estados Unidos e Fran~, realizar urn programa imediato para melhorar as condi­s;oes de vida do povo e instituir urna educa~o e urna propa­ganda voltadas para a defesa nacional.

Para os comunistas, nao havia incompatibilidade entre seus prindpios e os 'Ih~s Prindpios do Povo. Segundo eles, nao estavam maduras as condi~oes materiais para os prindpios co­munistas. Sua tarefa consistia em resgatar o espfrito revoluciona­rio de Sun Yat-sen, consolidar a frente Unica e realizar a revolu­~o nacional e democratica. Quanto a resistencia ao Japao, opi-

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na-vam que o Exercito Nacional era de velho tipo, incapaz de defender o pais. Mas o Exercito Vermelho, embora de novo tipo, oao seria capaz de fazer isso sozinho. Poderia apenas ser a van­guarda, a exemplo do que vinha fazendo o 8° Exercito, com sua combina~o de guerra de guerrilhas e guerra regular.

Consideravam estrategico armar e organizar todo o povo para desintegrar as for~ inimigas. Para tanto, seus pr6prios exercitos realizavam trabalho de educa~o polftica, pelo qual pretendiam obter urna disciplina consciente, fazer de cada sol­dado urn ativista politico e t ransformar as pessoas do povo em combatentes. Nas rela~6es entre oficiais e soldados, proibiam qualquer abuso contra os soldados e, nas rela~oes do exercito com o povo, proibiam qualquer viola~o dos interesses do povo e o mau tratamento aos prisioneiros.

Suas Tres Principais Regras de Disciplina ( obedecer as or­dens em todas as a~oes, nao tomar uma simples agulha ou linha de coser das massas e entregar tudo o que for capturado ) e seus Oito Pontos de Atenft1o (falar polidamente, pagar estritamente tudo que comprar, devolver tudo que tomar de emprestimo, pagar por tudo que danificar, nao agredir ou golpear as pessoas, nao danificar as planta~6es, nao tomar liberdades com as mu­lheres e nao tratar mal os prisioneiros) eram nao s6 orienta­~oes de comportamento, mas pontos vitais de educa~o polftica.

Ap6s a queda de Xangai e Taiwan, no final de 1937, os comunistas avaliaram que o tipo de guerra regular praticada pelo Guomindang fracassara. A partir de entao, as guerras de guerrilha e de movimento teriam que ser as principais. Wang Ming, representante na Internacional Comunista, contestou essa suposi~o. Considerou possfvel aos comunistas retornar as cida­des, de forma aberta e legal, para mobilizar as massas populares e resistir aos japoneses, juntamente com os exercitos regulares do Guomindang. Mas, em 1938, essa diverg~ncia foi resolvida pela batalha de Wuhan, quando o pr6prio Wang Ming tentou colocar em pratica tal proposta e sofreu urna derrota total.

Coube ao 8° Exercito demonstrar a viabilidade de com­binar guerra de guerrilhas e guerra de movimento e derrotar

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os japoneses no campo de batalha, quebrando sua autoconfian~ e arrogancia. Nesse sentido, o tratamento dos prisioneiros me~ recia aten~o especial. 0 orgulho dos soldados e oficiais aprisi~ nados nao era ferido. Em vez de serem maltratados, os prisio~ neiros eram tratados com leniencia, sendo mostrado a eles 0 carater crirninoso da guerra contra a China. Finalmente, ap6s lembrados que o povo chines era capaz de travar batalhas de aniquilamento com sucesso, eram libertados, criando uma situa­~o inusitada para o comando nip6nico.

Assirn, jogando com a for~ e as fraquezas do exercito japones, os comunistas o for~rani a aumentar seus efetivos na China. Colocaram em tensao sua escassez de recursos humanos e levaram o Japao a manter grandes contingentes no cerco estra­tegico aos 4° e so Exercitos. Com essa polftica, no final de 1940, os trinta mil combatentes iniciais do so Exercito haviam passa­do para quinhentos mil, os quarenta mil membros do PC subi­ram a oitocentos mil, e a popula~o das bases de apoio chegou a cern milhoes.

As estrategias comunistas tiveram irnpacto sobre os inte­lectuais e estudantes das cidades ocupadas pelos japoneses. Uma parte deles migrou para Kunming, no Yunan, onde a repressao do Guomindang nao chegava tao fortemente. Outra parte aten~ deu ao apelo comunista, venceu as d.ificuldades da travessia e dirigiu-se para Yenan, que se transformou numa das capitais da Guerra de Resist~ncia. Milhares de pessoas, das mais dife­rentes classes sociais, desejosas de incorporar-se ao movimento antijapon~s, atlufram para Ia. Ampliaram os recursos humanos dos comunistas, mas tambem criaram novos problemas de or­dem ideol6gica, polftica, militar e econ6mica.

A maioria delas nao havia passado pela experiencia da g\ierra civil, nem da Grande Marcha. Apresentava visOes diferen­tes a respeito da Guerra de Resist~ncia, muitos considerando desnecessarias polfticas diferentes, desde que se estabelecera a allan~ com o Guomindang. Diversificaram-se as opinioes a res­peito dos metodos de dire~o. democracia, assuntos militares, cultura, trabalho econ6mico e outros temas. Dentro do so Exer-

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cito, muitos queriam livra-lo da lideran~ do PC. Alguns de seus oficiais orgulhavarn-se de estar no Exercito Nacional e queriarn aplicar os metodos nacionalistas nas rela~oes oficiais-soldados e anilitares-povo. Outros nao viam mais necessidade dos meto­dos da guerrilha, desde que possuiam urn exercito regular. A teoria de que "as armas decidem tudo" espraiou-se.

Unificar as politicas da Guerra de Resist~ncia tornou-se vital por volta de 1942, ap6s as perdas com a ofensiva japonesa de "queimar tudo, matar tudo, pilhar tudo'~ Sem urna a~o po­lftica unificada, seria muito d.iftcil superar as d.ificuldades. Essa foi a razao da Campanha de Retifica~o. visando retificar o es­tilo de estudo, as rela~Oes internas e externas e o estilo de, escri­ta. Segundo as diretivas do PC, a questao central residia em aprender com os erros do passado para evita-los no futuro ou, metaforicamente falando, curar a doenfa para salvar o pa,:iente.

Desde 1936, Mao Zedong dedicava aten~o a tais. ques­toes. Seus trabalhos «Problemas de estrategia na guerra de Re­sistencia ao Japao", "Sobre a pnitica" e "Sobre a contradi~o", dirigiam-se contra o dogmatismo eo empirismo no tr11to da situa~ao criada pela expansao japonesa. Nos trabalhos d~ 193S a 1940, ele voltou a discutir a guerra de guerrilhas, a lideran~ do PC e a natureza da frente Unica, combatendo a esperan~ na guerra regular e, mais ainda, na for~ do Guomindang, ~ a su­bestima~o da guerra de guerrilhas. Esta demonstrara ser o Unico metodo de urn pais fraco enfrentar com sucesso urn pais forte. E, no caso da China, era o Unico metodo capaz de incorpo­rar as grandes massas do povo, o fator decisivo na guerra con­tra o Japao.

Mao argumentava que a Guerra de Resist~ncia seria pro­longada. Durante a Campanha de Retifica~o, ela encontrava­se em defensiva estrategica e possuia dois diferentes tipos de exercitos regulares, unidades de guerrilha, bases de apoio e areas libertadas, urn tipo sob a dire~o dos comunistas, outro sob o Guomindang. A questao-chave consistia em coordenar esses di­ferentes aspectos. Primeiro, travando batalhas de decisao rapi­da no contexto da guerra prolongada e a~oes ofensivas no con-

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texto da defensiva estrategica. Depois, coordenando a guerrilha com a guerra regular, estabelecendo novas bases de apoio, le­vando os exercitos regulares a aplicar metodos de guerrilha e desenvolvendo a guerra de guerrilha em guerra de movimento.

Alem disso, para ele a guerra contra o Japao nao era ape­nas militar, mas tambem e principalmente politica. Ela englo­bava a amplia~o da frente unica, que nao poderia ficar restrita aos dois principais partidos e deveria ter como centro a demo­cratiza~o do pais. Englobava ainda a mobiliza~o das grandes massas, a aboli~o dos impostos e taxas exorbitantes, o adia­mento da reforma agriria e a redu~o das taxas de arrendamento, a restri~o a usura, a eleva~ao dos salarios dos trabalhadores, a melhoria da situa~ao dos soldados, oficiais e suas familias, e assim por diante. Questoes que o exercito s6 poderia tratar ade­quadamente sob a dire~o de urn partido com uma linha polf­tica conveniente.

A allan~ com o Guomindang e as fricfiies provocadas por ele envolviam questoes militares e polfticas. A .. unifica~o do pais': para Mao, tinha como base a resist~ncia antijaponesa, a unidade entre as for~ patri6ticas e o progresso democrati­co. Os comunistas deviam se opor, en tao, as fricfoes. Porem, se atacados, deviam contra-atacar, conforme o tipo de ataque, politiCo ou militar, e agir nos limites da autodefesa, como fize­ram nas campanhas anticomunistas de 1939, 1940 e 1941. Frente unica nao era allan~ sem luta, nem luta sem alian~a. sendo necessario combinar alian~a e luta. Nessa polftica dual, era pos­sfvel unir-se aos anticomunistas para a resist~ncia antijaponesa, mas isola-los quando combatessem os patriotas. Mesmo em rela~ao aos pr6-japoneses e traidores, devia-se combate-los en­quanto mantivessem seu colaboracionismo, mas tra2e-los para perto e ganha-los quando vacilassem.

Mao aconselhava usar as contradi~oes para ganhar a maioria, opor-se a minoria e derrotar os inimigos urn a urn. Os comunistas distinguiam, entao, o imperialismo japones dos demais irnperialismos, e os aliados dos japoneses dos que se opunham ao Japao. Estabeleceram rela~oes com os militares

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norte-americanos do general Stilwell e esfor~ram-se em con­quistar os latifundiarios para a frente unica. Suspenderam as medidas de reforma agraria nas bases de apoio, mas negociaram a reducyao dos arrendamentos, do tamanho das propriedades e das cargas sobre os camponeses. 0 programa de reforma agraria ficou limitado as terras expropriadas dos que colaboravam com os japoneses. Ao mesmo tempo, os camponeses participaram nos governos locais, baseados no sistema dos tres terfOS, na reali­za~o de elei~oes e na constru~o de institui~oes democraticas.

No esfor~o para desenvolver a industria e a agricultura das areas libertadas e promover a circulacrao de mercadorias, os comunistas encorajaram os capitalistas a transferir suas empre­sas para la. Davam garantias as empresas privadas e evitavam que as empresas estatais fossem a unica economia daquelas areas. 0 slogan "Melhores tropas e administrac;:ao mais simples", proposto por Li Dingming, urn latifundiario, foi adotado como eixo para superar a crise causada pela ofensiva japonesa. As tro­pas passaram a realizar trabalho produtivo, em articula~ao com as tarefas militares. E as autoridades dedicaram-se a economia e aos suprimentos, considerando em pe de igualdade os inte­resses publicos e privados, assim como os militares e civis.

Paralelamente, ganhou amplitude o debate em torno do estilo de escrita e dos metodos de dire~o. Muitos intelectuais escreviam segundo o estilo dos ensaios de oito pernas, do perio­do imperial. Estes tinham, invariavelmente, uma estrutura de oito partes, com apresenta~o, amplificacyao, exposi~o prelimi­nar, argumento inicial, paragrafo introdut6rio, paragrafo inter­mediario, penwtirno paragrafo e paragrafo conclusivo. Alem disso, cada urn dos quatro Ultirnos paragrafos tinha duas pernas, ou duas antiteses, derivando daf o termo ensaio de oito pernas. 0 resultado era urna verborragia, incompreensivel para a maio­ria da popula~o, e urn formalismo estereotipado, que descon­siderava OS conhecimentOS das massas populares.

Mao defendia a necessidade de partir das ideias das mas­sas, dispersas e nao sistematizadas. Deviam-se, entao, analisar tais ideias, sintet:izci-las e sistematiza-las, fazendo-as retomar as

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massas. S6 dessa forma as massas as tomariam como suas e as transfonnariam em a~oes. Nessa pratica seria testada a corr~0 das ideias, investigadas as novas ideias surgidas e refeito todo

0 processo de analise, sintese, sistematiza~o. retorno as massas, propaga~o, a~o etc. Em outras palavras, .. das massas para as massas': esse o estilo e o metodo para relacionar-se com o povo, corrigir as ideias incorretas e transformar as ideias corretas em feitos materiais.

Assim, no final de 1943, apos superar as ofensivas japone­sas, os comunistas haviam recuperado suas for~. A popula~0 das areas libertadas chegara a oitenta milhoes, 0 numero de membros do PC a novecentos mil, os contingentes dos 4° e So Exercitos a 470 mil e os participantes das milicias populares a 2,27 milhoes. No infcio de 1944, os comunistas intensificaram seus preparativos para contra-atacar e empurrar as tropas ni­p6nicas no rurno do Rio Yalu. Aprendiam a trabalhar nas gran­des cidades e ao Iongo das linhas de comunica~o, realizando wna mudan~ em sua estrategia. Elevavam o trabalho nas cidades ao nivel do trabalho nas wnas rurais, com o objetivo de organizar insurreis;6es urbanas contra os japoneses e capacitar-se a admi­nistrar a indUstria, o comercio e as comunicas:6es urbanas.

Ao preparar essa virada estrategica, emancipando suas mentes para os novos desafios, os comunistas tambem exigiram do Guomindang urn ajuste nas rela~6es entre os dois partidos. Solicitaram a imediata instaura~o de urn governo constitucio­nal democratico e livre, a aboli~o da ditadura fascista de um partido, uma doutrina e um Uder, e a convocas:ao de uma assem­bleia nacional eleita pelo povo. Como resposta, o Guomindang intensi.ficou as fricfoes e ofereceu, quando a guerra terminou, em 1945, a participa~o num Comit~ Tnplice, integrado ainda por urn representante dos EUA, para convocar uma Assemblei.a Nacional e .. reorganizar" as Fors:as Armadas ... comunistas. 0 espectro de uma nova guerra civil voltou a pairar sobre a China.

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4. AINDA SOB FOGO

0 anode 1945 foi de grandes acontecimentos. Em mars:o,

0 Guomindang exigiu que os comunistas depusessem as armas para obter o status de partido legal. Em abril, o PC realiwu seu VII Congresso Nacional, reafirmou sua oposis:3o a nova guerra civil, mas declarou que manteria suas armas se seus inimigos continuassem com as suas engatilhadas. Em maio, terminou a guerra na Europa, com a derrota nazista. Em julho, os Aliados acertaram, na Conferencia de Potsdam, que a guerra na Asia continuaria ate a rendi~o incondicional do Japao, e a Uniao Sovietica declararia guerra aos japoneses e enviaria suas tropas a Mandch'llria, para cortar a retirada do Kwanton, o principal exercito e reserva estrategica do Japao.

Enquanto esses acertos eram feitos, o Guomindang lan­s;ou tres de seus exercitos contra a regiao de Yenan. Apesar disso, em agosto, diante do colapso japon~s, o comandante do so Exer­cito, Zhu De, determinou que suas unidades atacassem as linhas de comunicas:ao e compelissem as tropas nip6nicas e os exer­citos tlteres na Mong6lia Interior e no nordeste da China a ren­der-se mais rapidamente.

0 quartel-general do Guomindang tachou as ordens de Zhu De de "ilegais" e ordenou ao so Exercito "que permanecesse onde estava, aguar~do ordens posteriores". Ao mesmo tem­po, porem, instruiu "os oficiais e homens das varias zonas de guerra a elevar seus esfor~os e, de acordo com os pianos mill­tares e ordens existentes'~ avan~ ativamente, sem "o mais leve relaxamento':

Diante de ordens tao contraditorias, as tropas comunis­tas do so Exercito mantiveram sua ofensiva. Nas Ul.timas duas semanas de agosto, recuperaram 59 cidades, ocuparam grandes areas rurais do norte e. nordeste, cortaram as ferrovias que liga-

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vam essas regioes ao centro e ao sui da China, e aprisionararn razoavel numero de tropas nip6nicas e tfteres. Assim, quando o Japao se rendeu, em 26 de agosto, as rela~6es entre o Guo­mindang e o PC estavam em processo de deteriora~o e o peri­go de nova guerra civil tornara-se extremamente grave.

PAZ E GUERRA

0 Guomindang tinha pela frente urna situa~o bern dife­rente de 1927, quando rompeu a frente Unica com os comunistas por meio de urn golpe militar sangrento. No segundo semestre de 1945, estava com suas principais tropas, com cerca de dois milhoes de homens, na Grande Area de Retaguarda do sudoeste e noroeste, onde viviam duzentos milh<>es de pessoas. Manti­nha-as como reserva e praticamente nao possufa nenhurn traba­lho subt:er"rineo nas regi6es ate entao ocupadas pelos japoneses.

Os comunistas, por seu lado, possuiam dezenove Areas Libertadas, com urn milhao de quil6metros quadrados e cern milhoes de habitantes, em dezenove provincias do nordeste, leste, centro e sui da China. Alem disso, haviam organizado ex­tensas for~s subterrAneas entre os 160 milh6es de habitantes das zonas antes ocupadas pelos japoneses. E possuiam mais de urn milhao de homens organizados nos exercitos regulares e mais de dois milh6es em milicias armadas.

Eles tinham visto com desconfian~a a estrategia naciona­lista de olhar das montanhas, com as armas ensarilhadas, a luta deles contra os invasores japoneses. Em sua opiniao, Chiang Kai­chek preservara as pr6prias for~ para nova guerra civil. Quan­do a vit6ria contra o Japao se apresentasse, ele desceria do monte Omei e tentaria usurpar seus frutos. Nao esqueciam o golpe de 1927, os dez anos de guerra civil, nem as tres campanhas mili­tares desfechadas contra suas areas, entre 1939 e 1943. E avalia­vam que a paz interna e a constru~ao da nova democracia estavain em perigo.

Tinham consci~ncia, porem, de que grande parte da po­pula~ao, principalmente a que vivia nas regi<>es ocupadas pelo Japao e na Grande Area da Retaguarda, nutria ilus6es ilas inten-

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A REVOLUCAO CHINESA

~OeS do Guomindang, nao acreditando que este pretendesse dar continuidade a seu governo ditatorial. Ou que os Estados Uni­dos quisessem substituir o Japao na domina~o imperialista so­bre a China. Para p6r a prova as verdadeiras inten~oes de Chiang, o PC advogou urn governo de coalizao em bases demo­craticas.

Chiang respondeu com a proposta de negocia~oes de paz. Havia refor~do suas posicyoes e confiava dobrar os comunis­tas. Recuperara Xangai, Nanjing e outras grandes cidades. Rea­brira as comunica~Oes marftimas, tomara as armas das tropas japonesas rendidas e incorporara as tropas titeres a seu exercito. E contava com os Estados Unidos. Apesar disso, enfrentava difi­culdades. 0 povo chines opunha-se a guerra civil e dentro do Guomindang havia setores contrarios a uma nova guerra inter­na. A proposta de negocia~Oes visava superar tais dificuldades, fazendo cair sobre os comunistas a responsabilidade pelo novo conflito.

Chiang tinha que ganhar a guerra polftica para ter su­cesso na militar. Para evitar isso, os comunistas enviaram a Chongqing, para negociar a paz, Mao Zedong, Zhu Enlai e Wang Jofei. Sabiam que Chiang demandaria a redu~o drastica das Areas Libertadas e dos exercitos do PC, e a paralisacyao da im­pressao de dinheiro. E que, sem concess<>es nesses temas, nao colocariam a nu suas verdadeiras inten~<>es, nem o levariam a aceitar a paz. Assim subordinaram-se as negocia~oes na perspec­tiva de conquistar a opiniao publica chinesa e mundial, e recu­perar a iniciativa politica. Se o Guomindang, apesar das conces­s<>es, perseverasse nos pianos da guerra civil, ele pr6prio mos­traria sua falsidade aos olhos de todos.

Entre os comunistas, porem, havia resist~ncia as conces­s6es. Muitos nio entendiam por que teriam que ceder areas para cuja constru~o deram nao apenas seu suor, mas tambem seu sangue. Nem por que teriam que cortar suas For~ Armadas· para 48 divisOes, ou menos, se o Guomindang conservaria for~ varias vezes superiores.

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Foi preciso empenho dos dirigentes do PC para expUcar os motivos das concessoes. As areas seriam cedidas porque os nacionalistas nao se sentiam seguros tendo Nanjing cercada por elas. Nao conseguiriam donnir, sabendo que os vermelhos esta­vam sobre suas camas e em seus corredores. Alem disso, os meios de comunica~o do Guomindang batiam na teda de que os comunistas queriam mais territ6rios e nao se dispunham a fazer nenhuma concessao. Entao, seria inteligente ceder areas no sui em troca de paz e democracia. Isso desmoralizaria os boatos, frustraria os pianos de Chiang e conquistaria a opiniao publica.

Em rela~o as For~ Armadas ocorria algo identico. Os comunistas come~am propondo a redu~o de seus exercitos para 48 divisoes, correspondendo a 1/6 das 263 divisoes do Guomindang. Depois, propuseram reduzir suas for~ para 43 divisOes, ou 1/7 do total do Guomindang. Como este disse que poderia reduzir suas for~ para 120 d.ivisoes, os comunistas se comprometeram a reduzir as suas para 24 ou mesmo vinte. Como urn a divisao nacionalista possuia seis mil hom ens, I ,2 milhao de homens dos exercitos vermelhos corresponderiam a duzentas di­vis6es nacionalistas, mantendo urn razoavel equilibrio de for~.

Assiin, embora preparados para fazer concessoes, os co­munistas queriam que os princfpios de paz e unidade, direitos democraticos e coopera~o para construir uma nova China, fossem reconhecidos pelo Guomindang. 0 que foi estipulado no "Sumario de Conversa~<>es" ou "Acordo de Outubro'~ depois de 43 dias de negocia~oes. Mao Zedong p6de, entao, retornar a Yenan, enquanto Zhu Enlai e Wang Jofei permaneciam em Chongqing para negociar os pontos pendentes.

Enquanto negociava com os comunistas, o Guomindang jogou oitocentos mil homens contra as Areas Libertadas. Em setembro e outubro, treze de suas divis6es, com 38.mil homens, atacararn as bases comunistas em Shandong, sendo derrotadas. No noroeste, tr~ exercitos do Guomindang avan~am contra as are~ de Shaanxi, mas foram cercados e desbaratados quan­do, ap6s uma semana de combates, o comandante de wn dos

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exerdtos revoltou-se e, a frente de dez mil homens, passou para

0 }ado comunista. Alem de ocupar cinco Areas Libertadas em Zhejiang,

Anhui e Hunan, os naci~nalistas cercaram as areas de Henan, Hubei, Suiyuan, Chahar e Jehol. Ao serem derrotados, deixaram cair docwnentos, como o Manual sobre a supressiio de bandi­dos, que comprovavam seus pianos de fazer a guerra de fato e

0egociar a paz apenas para ganhar vantagem. Assiin, em novem­bro de 1945, quando o Guomindang denunciou que estava envolvido numa "gJ.Ierra defensiva': sua palavra ja nao valia tan­to. E suas dificuldades haviam aumentado.

Ja nao podia ignorar o PC como igual, cuja for~ subes­timara, nem desconhecer a oposi~ao popular a guerra civil. Tambem nao tinha raz6es para colocar-se contra a politica geral de paz e unidade. Se desencadeasse a guerra civil, isolar-se-ia e daria mais razao aos comunistas para suas a~oes de autodefesa. Mesmo assim, o Guomindang nao desistiu de seus pianos e intensificou sua mobiliza~ao. Com o auxilio logistico norte­americano, transportou para o nordeste grande quantidade de tropas, conseguindo estabelecer seu controle sobre essa regiao estrategica.

Seguindo sua tradi~o de preparar-se segundo o ritmo do inimigo, os comunistas tambem intensificaram sua mobili­zac;:ao. Nas areas em que governavam, cuidaram para que a pro­ducyao fosse elevada em larga escala, os latifundiarios pudessem manter sua vida e os industriais e comerciantes, seus lucros. Dedicaram aten~o ao abastecimento da popula~o;. ao supri­mento do exercito, ao alivio da situa~o dos famintos e refugia­dos e a melhoria das condi~oes de vida dos ~poneses e opera­rios, reduzindo as taxas de arrendamento e e1evando os salarios.

Alem disso, orientaram suas unidades politicas e militares, visando estimular generais, oficiais, soldados e unidades inteiras do Guomindang a trocar de lado. Na esteira do avan~o sovietico em agosto, haviam enviado mais de cern mil homens para cons­truir bases na regiao-nordeste, come~do pelas cidades .e zonas rurais distantes dos centros dominados pelo Guomindang. E

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haviam intensificado a educa~ao ideol6gica e politica de seus soldados, reafirmando a necessidade de observar estritamente as Tres Principais Regras de Disciplina ( obedecer as ordens em todas as a~oes, nao tomar wna simples agulha ou linha de coser das massas e entregar tudo o que for capturado) e os Oito Pontos de AtenfiiO (falar polidamente, pagar estritamente tudo que comprar, devolver tudo que tomar de emprestimo, pagar por tudo que danificar, nao agredir ou golpear as pessoas, nao dani­ficar as pl~ta~oes, nao tomar liberdades com as mulheres e nao tratar mal os prisioneiros).

Assim, em dezembro de 1945, as posi~<>es estrategicas es­tavam definidas. Mas Chiang nao conseguia Ian~ abertamen­te sua ofensiva. A pressao popular, estimulada pelo empenho comunista em exigir paz, unidade, democracia e melhoria das condic;:oes de vida, criava fricfoes entre os pr6prios nacionalistas. Em janeiro de 1946, o Guomindang viu-se na contingencia de convocar a Conferencia Consultiva Polftica, da qual participa­ram os comunistas e outros partidos democraticos, e ordenar wn cessar-fogo, embora suas tropas continuassem atacando as areas comunistas.

No final de junho, em contraste com as resolu~oes de paz e democracia daquela Conferencia, Chiang Kai-chek e seus as­sessores norte-americanos consideraram seus exercitos prepa­rados para esmagar os comunistas num prazo de tres a seis meses. Os EUA haviam equipado 45 divis<>es, treinado 350 mil homens de todas as armas e servic;:os, e seus navios e avioes haviarn transportado para as linhas de frente 41 divisoes regula­res e oito regimentos de comunicac;:ao, com mais de 540 mil homens. Alem disso, noventa mil fuzileiros navais norte-ame­ricanos· foram estacionados em Beijing, Xangai, Qingdao, Tien­tsin e Jinghuangdao, para proteger as vias de comunicac;:ao. Ao todo, os EUA investiram US$ 4,5 bilhoes, uma soma proporcio­nalmente maior do que qualquer outra destinada as na~oes da Europa ocidental desde o final da guerra.

No dia 26 de junho de 1946, os nacionalistas iniciaram urn ataque em larga escala contra a area comunista do Planalto

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A REvoLuc:;Ao CHJN ESA

eentral. Depois, entre julho e setembro, jogaram-se contra to­das as demais Areas Libertadas. Empregando 193 divisoes, num total de 1,6 milhao de homens, Chiang colocou em combate SO% de todas as suas tropas e confrontou-se, em seis teatros de guerra, com os generais comunistas que haviam despontado durante a Guerra de Resistencia ao Japao: Liu Bosheng e Deng J{iaoping, na ~;egiao de Shanxi; Chen Yi, Su Yu e Tan Shenlin, oa regiao de Shandong; Lin Biao e Lo Shunghuan, na Mand­chUria; Nie Shungchen, na regiao de Shaanxi; He Lung, na re­giio de Suiyaun; e Li Xiannian e Chen Weisan, no Planalto Central.

Supondo resolver suas contradic;:oes com os comunistas own curto espa~o de tempo, Chiang Kai-chek lan~ou-se na ter­ceira guerra civil de sua hist6ria, chamando-a de "guerra de su­pressao de bandidos". Os comunistas, por sua vez, transforma­ram os 4° e 8° Exercitos no Exercito Popular de Libertac;:ao, ou EPL, englobando I ,2 milhao de homens, e denominaram a nova guerra civil de "terceira guerra civil revoluciom1ria" ou Guerra de Libertac;:ao.

G u ERRA E PAZ

Desde maio de 1946, os comunistas adotavam medidas para garantir o apoio dos camponeses contra uma possivel ofen­siva dos exercitos nacionalistas. Sua Diretiva sobre a Questilo da Terra mudara a politica de reduc;:ao de arrendamentos para a de confisco das terras latifundiarias e sua distribuic;:io entre os camponeses. Em julho, diante da nova guerra civil, os comu­nistas intensificaram a reforma agraria, mas protegeram os cam­poneses medios e os camponeses ricos. Mesmo os latifundiarios que nao colaboraram com os japoneses, nem eram tiranos lo­cais crueis, foram tratados com leni~ncia e receberam parcelas de terras para trabalhar e sobreviver.

Os comunistas avaliaram favoravelmente a situa<yao. Chiang nao queria fazer a reforma agraria, nem atender as de­mandas de democracia e independ~ncia nacional. Alem disso, das 190 divisoes do Guomindang em campanha, 25 foram

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destro~das pelo EPL, entre julho e setembro, e metade estava presa a tarefas de aquartelamento. Com sua tatica de nao defen~ der terreno e destruir as for~s inimigas wna a uma, o EPL per~ dera wna dt!zia de pequenas e medias cidades e dois a tres mil homens que foram mortos, feridos e aprisionados, mas aniqui~ lara dez mil nacionalistas e retomara o territ6rio perdido.

Trabalhando na perspectiva de uma guerra prolongada, o PC ampliou suas for~s regulares, pela incorporac;:ao volunta~ ria, e intensificou a organizac;:ao de milicias, guerrilhas e grupos de trabalho armados, que controlavam vastas areas rurais, inclu~ sive no interior das linhas do Guomindang. Este, por sua vez, intensificou a conscric;:ao for~da de combatentes e retomou a polftica de confisco de graos, aumentando o descontentamen~ to popular.

Em sete meses, o EPL desmantelou 56 divis6es regulares nacionalistas, wna media de oito por m~s. alem de tropas auxi­liares. Agravou, com isso, o conflito entre a grande extensao das linhas de combate do Guomindang e sua escassez de tropas, fazendo ruir seu moral. Em fevereiro de 1947, 78 divisoes nacio­nalistas, com 1, 71 milhao de homens, 90% de todas as suas tro­pas, estavam engajadas contra as areas comunistas. Mas apenas quinze delas, com 213 mil homens, permaneciam como reserva estrategica.

Alem disso, o Guomindang enfrentava seria crise econo~ mica e financeira, com elevac;:ao da inflac;:ao, quebra de indUs­trias e empresas comerciais, e deteriorac;:ao do padrao de vida da populac;:ao. Chiang Kai-chek procurou, entao, manobrar no campo polftico. Por intermedio do embaixador norte-ameri­cana na China, Leighton Stuart, solicitou enviar uma delega~o a Yenan para "negociac;:<>es de paz'~ Esperava ganhar tempo para reorganizar suas forc;:as antes de lanc;:ar novas ofensivas. Em res~ posta, os comunistas impuseram duas condic;:oes: abolir a As­sembleia Nacional, que violava as resoluc;:oes da Conferencia Consultiva Polftica, e evacuar todos os territ6rios ocupados pelo Guornindang desde o acordo de paz de janeiro de 1946.

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......... ~.-..._ ............ - _ ............. . No final de fevereiro de 1947, Chiang, no entanto, noti­

ficou aos representantes do PC em Nanjing, Xangai e Cho;ngqing que deveriam retirar-se, e anunciou 0 rompimento das negocia~ ~OeS- Em 15 de marc;:o, proclamou sua deterrninac;:ao de conduzir a guerra civil ate o fun e lanc;:ou sua ofensiva contra Yenan. Com 230 mil homens, obrigou os vinte mil do EPL a retir~r-se e ocupou o quartel-general do PC e do EPL e diversas pequenas cidades da area. No entanto, o objetivo de destrui.r o QG cornu~ nista e empurra~lo para o leste do Rio Amarelo falhou comple­tamente.

0 comando comunista retirou-se de Yenan, mas perma­neceu na pr6pria regiao ate marc;:o de 1948, quando suas tropas iniciaram a contra-ofensiva. Utilizando seu velho metodo de manter o inimigo correndo ate cansar, reduzir drasticamente seus suprimentos e escolher a oportunidade de sua fadiga ex­trema para ataca-lo e destruf-lo, as tropas do EPL causaram mais de cern mil baixas nas tropas do Guomindang, enviadas para tomar e manter Yenan, e acabaram expulsando-as em de­bandada.

Alem disso, Chiang via-se diante de uma nova frente de luta. Em meados de 1947, emergiu nas grandes cidades e es­praiou-se por toda a China urn movimento estudantil, exigindo "Comida, Paz e Liberdade" e batendo-se "Contra a Fome, a Guerra Civil e a Repressao". Mais de quinhentos mil estudantes manifestaram-se nas ruas, em greves e demonstrac;:6es de pro­testa, depois que uma estudante da Universidade de Beijing foi seqtiestrada por soldados norte-americanos.

Esse foi o preludio de outra frente nao-militar, aberta em setembro. A Confer~ncia Nacional do PC sobre a Reforma Agra­ria elaborou o Projeto de Lei Agraria da China, mantendo os principais pontos da Diretiva de Maio de 1946. Com dezesseis artigos, o primeiro abolia o "sistema agrario de explorac;:ao feu­dal e semifeudal" e instituia o sistema de "terra para quem a trabalha': Os segundo e terceiro aboliam os direitos de proprie­dade territorial dos latifundiarios, santuarios, templos, monas­terios, escolas, instituic;:oes e organizac;:oes ancestrais, enquanto

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o quarto cancelava todos os debitos contraidos na zona rural antes da reforma agraria.

Os artigos quinto e sexto estipulavam que a execu~o da refotma ficaria a cargo das assembleias de camponeses de aldeia e comit~s eleitos por eles; das assembleias da Liga dos Carnpo­neses Pobres ou organiza~oes de camponeses sem-terra ou com pouca terra nas aldeias e comit~ eleitos por elas; dos congressos de camponeses de aldeia, distrito, provincia ou outro nivel e comit~s eleitos por eles. As terras publicas e latifundiarias passa­vam para a responsabilidade das associa~oes camponesas e demais habitantes das aldeias, que deveriam unifica-las e redis­tribuf-las igualitariamente.

Os outros dez artigos complementavam os seis primei­ros, um verdadeiro chamamento para os camponeses realiza­rem por sua pr6pria conta e por seus pr6prios esfor~os a refor­ma agraria. Contar com as pr6prias fors;as - fanshen, em chines - foi a palavra magica que levantou milhoes de camponeses contra os latifundiarios, em certa medida tambem contra os camponeses ricos e, principalmente, contra o Guomindang e seus exercitos, que procuravam impedir a implementa~ao do projeto.

A ofensiva polftica do fanshen acompanhou a contra­ofensiva geral do EPL. Em junho de 1947, sete colunas cornan­dadas por Liu Bosheng e Deng Xiaoping for~am as defesas do Rio Amarelo, marcharam para as montanhas Tapieh e, em oito meses de avan~o, eliminaram mais de cern mil homens do Guomindang. Em agosto, outras oito colunas, comandadas por Chen Yi e Su Yu, partiram de Shandong, marchararn para su­doeste e liquidararn outros cern mil nacionalistas, estabelecen­do-se na regiao fronteiri~ entre Henan, Anhui e Jiangsu e iso­lando as cidades de Kainfeng e Hangzhou. Nessa mesma oca­siao, tropas comandadas por Chen Keng e Xie Fushi atravessa­rarn o Rio Amarelo ao sui de Shaanxi, avan~am sobre Henan, desbaratararn quarenta mil soldados nacionalistas e isolaram o centro estrategico de Luoyang.

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Em dezembro de 1947, o Exercito do Nordeste do EPL, comandado por Lin Biao e Lo Junghuan, desencadeou uma ofensiva de inverno sem precedentes. Durante tr~s meses segui­dos, avan~ou ao Iongo das ferrovias que ligam Shanhaiquan a Sbenyang e Beijing a Liaoning, tirou de combate 156 mil ho­mens do Guomindang e ocupou dezenove cidades. Na prima­vera de 1948, o n\imero de combatentes nacionalistas estava em franco declinio. Dos 4,3 milhoes de homens que o Guomindang recrutara antes de julho de 1946, sobravam 3,6 milhoes. Nesse periodo, quase dois milhoes haviam sido postos fora de combate · pelo EPL, a maior parte aprisionada.

Em setembro de 1948, tiveram inicio as tr~s campanhas do EPL, que modificaram radicalmente o curso da guerra. Na primeira, os setecentos mil homens do Exercito de Campanha do Nordeste varreram o Guomindang da regiao, ao destruir catorze exercitos, com 470 mil homens. Na segunda, os seis­centos mil homens dos Exercitos de Campanha do Leste e do Planalto Central desbarataram cinco exercitos do Guomindang, com 550 mil homens, e passaram a amea~ar Nanjing, capital nacionalista. Na terceira, o Exercito de Campanha do Nordeste e parte do Exercito de Campanha do Norte atravessaram a Grande Muralha, cortaram a retirada dos seiscentos mil homens do general Fu Zoyi, colocaram 520 mil fora de combate e con­quistaram Beijing, Tianjin e Shijiazhuang. Ao todo, o Guomin­dang perdeu I ,54 milhao de homens.

0 Guornindang estava perdendo muitas tropas e generais nao apenas em combate, mas tambem por causa da evasao d e suas tropas, que trocavam de lado e iam sendo reorganizadas como tropas comunistas. Isso levou Chiang Kai-chek, em Jo de janeiro de 1949, a declarar seu desejo de reatar as negociayoes de paz. Os comunistas dispuseram-se a aceitar a proposta, des­de que o Guomindang punisse os criminosos de guerra, abo­lisse as falsas autoridades constitucionais "constitufdas", reor­ganizasse as tropas em bases democniticas, confiscasse o capital burocratico, reformasse o sistema agrario, revogasse os trata­dos desiguais, convocasse uma Confer~ncia Consultiva Polftica,

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sem a participayao dos elementos reacionarios, e formasse um governo democratico de coal.izao.

No final de janeiro, o PC admitiu que o governo de Nan­jing enviasse uma delegas:3o para as negocia~6es, mas s6 porque estava preocupado com as tropas remanescentes do Guomin­dang e queria encontrar uma forma de coloca-las sob controle. A rendi~ao pacifica do general Fu Zoyi, em Beijing, com os duzentos mil homens de sua guarni~ao, em 20 de janeiro, esta­beleceu na pratica a f6rmula da paz e intensificou a desagrega­yao nacionalista. Paradoxalmente, fora o pr6prio clamor por paz de Chiang, patrocinado pelos EUA, que acelerou o colapso de seu governo.

Em 26 de mar~o, o PC estipulou a data de 1 o de abril, em Beijing, para o inicio das negocia~oes de paz, nomeando Zhu Enlai, Liu Bozhun, Lin Biao, Ye Xienying eLi Weishan como seus representantes. As delega~oes chegaram a urn Acordo sobre a Paz Interna, no dia 15, rejeitado por Chiang no dia 20. No dia seguinte, Mao Zedong, como presidente da Comissao Militar Revolucionaria do Povo Chines, e Zhu De, como comandante­chefe do EPL, ernitiram uma ordem a todos os seus exercitos para a ofensiva final.

Os 1 o, 2° e 3° Exercitos de Campanha atravessaram o Rio Yang-tse-kiang numa frente de mais de 500 km, ocupando Nanjing e seguindo no rumo sui. 0 4° Exercito de Campanha for~ou o medio Yangtse numa frente de mais de 100 km, a leste de Wuhan, avan~do para sudoeste. Em 1° de outubro de 1949, na Pra~ da Paz Celestial (Tiananmen), em Beijing, Mao Zedong proclamou a Republica Popular da China.

REsCALDOS DO INC2.NDIO

Ao proclamarem a Republica Popular da China, o PCCh e seus oito partidos aliados na guerra civil ainda nao haviam conquistado toda a China. 0 restante dos exercitos do Guo­rnindang estava em retirada para Taiwan o~ assolando o sui da China em debandada. Mas, no infcio de 1950, toda a China continental, exceto o Tibete, parte de Hong Kong e Macau,

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estava sob controle do EPL. Das ilhas, apenas Taiwan e Hong l(ong encontravam-se fora da nova jurisdis:3o.

A paz come~va a tomar forma sobre a China, embora wna paz armada. 0 pais viu-se bloqueado pela 7• Esquadra dos EUA e pela maioria dos paises do mundo, que retiraram da Chi­na seus embaixadores e seus bens e empresas e posicionaram­nos em Taiwan. Os EUA se opuseram ao reconhecimento do go­vemo popular pela ONU e, logo depois, desencadearam a guerra da Coreia, na expectativa de sangrar as for~ chinesas e propiciar

0 desembarque do Guomintang de regresso ao continente. Em 1950, com cerca de quinhentos milh6es de habitan­

tes, a China estava destruida. Suas ferrovias e rodovias encontra­vam-se sem condi~oes de uso. As industrias, alem de poucas e atrasadas, encontravam-se inoperantes. Grande parte da colheita de outono havia se perdido e os estoques tinham sido trans­portados pelas tropas do Guomindang em fuga. Milhoes de pessoas encontravam-se desempregadas. 0 novo governo tinha diante de si uma China a beira da anarquia, isolada e amea~ada militarmente.

Afora as ferrovias instaladas por capitais estrangeiros para facilitar as exporta~oes de materias-primas agrfcolas e mine­rais, e algumas fabricas de tecidos e de outros produtos de con­sumo, a China desconhecia outros tipos de in:dtistria. Sua side­rurgia era insignificante e concen-trada na Mandchuria. Nao possuia nenhuma indUstria de produ¢o de hens de capital, qui­mica, de equipamentos de transportes e de geras:ao de energia, ou seja, do ponto de vista industrial, era extremamente atrasada.

Nessas condi~6es, a primeira preocupa~o do novo go­verno popular voltou-se para recuperar a economia .destrufda pela guerra, _liquidar a inflayao, reduzir o desemprego e criar as condi~oes para o desenvolvimento. No campo, ao ser promul­gada oficialmente a Lei de Reforma Agraria, em junho de 1950, o novo sistema agrario ja havia sido implantado em varias re­gioes pelo fanshen dos pr6prios camponeses.

Nos dois anos posteriores, foram distribufdos 47 ~oes de hectares, ou cerca de 50% das terras cultivadas, entre trezen-

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tos milhoes de lavradores, cabendo a cada familia cerca de 0,4 hectare. Enquanto os camponeses medios continuaram com as parcelas e instrumentos de trabalho que possuiam anteriormen­te, os camponeses ricos tiverarn reduzidas suas parcelas a um tamanho correspondente ao que poderiam efetivamente trabalhar com seu pr6prio esforc;:o. E os antigos latifundiarios, nao culpados de crimes, receberam parcelas de terra necessarias para trabalhar por sua conta.

Livres das dfvidas e do pagamento anual das taxas de arrendamento aos latifundiarios, que levavarn anualmente cerca de 35 milh6es de toneladas de sua produ~o de graos, os anti­gos camponeses pobres e medios tiveram sua situa~o melho­rada pelo novo sistema agrario, que llies propiciou cerca de 90% das terras agricultaveis. Apesar disso, sua capacidade produtiva continuava reduzida. As propriedades agricolas eram fragmen­tadas e diminuto o emprego de tecnicas agron6rnicas. A pre­dorninancia dos minifU.ndios impedia a utiliza~o de equipa­mentos de porte e era urn entrave ao aumento da produtivida­de rural. Criou-se uma situa~o em que esses camponeses (83% do total) nao conseguiam concorrer com os camponeses ricos.

Estes, aproveitando-se de seus antigos lac;:os mercantis, da experi~ncia acumulada na produ~o e no comercio rural e de uma serie de outros fatores pr6prios da econornia mercantil, passaiam a comprar, vender e arrendar terras, explorar mao­de-obra de terceiros, especular com os produtos agdcolas e em­prestar dinheiro a altos juros. Faziam renascer varias das for­mas passadas de ex:plora~o, gerando uma nova polariza~o no campo chin~s. Esta foi a origem das formas de ajuda mutua e cooperacyao que OS camponeses pobres e medios passaram a praticar para enfrentar os camponeses ricos no pr6prio terreno da economia mercantil.

Para o novo Estado, pressionado para aba:st:e~r as cidades e as industrias dependentes de materias-primas agrfcolas, as ati­vidades dos camponeses ricos tambem eram prejudiciais, par­ticularmente quando especulavam com os produtos e as terras. Em conson~cia com o movimento de ajuda mutua, o gover-

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no popular regulamentou, em 1953, o mercado de cereais, crian­do o Sistema Unificado de Compra e Venda. Por meio dele, es­tabeleceu cotas de vendas de cereais, algodao e outros produtos agricolas importantes para garantir o abastecimento dos ha­bitantes e industrias urbanos. Ao mesmo tempo, propiciou o abastecimento das equipes camponesas de ajuda mutua com pro­dutos industriais, como fertilizantes e equiparnentos agricolas.

Seguindo a linha da revolu~o nacional e democnitica, o novo governo s6 modificou a estrutura da econornia urbana chinesa na parte referente as propriedades estrangeiras e do capital burocratico chin~, que foram confiscadas e transforma­das em propriedade estatal. Ao lado desse setor estatal, conti­nuaram a existir os setores individual, capitalista, coletivo ou cooperativo, e misto estatal-privado. Na indl:tstria, o setor capita­lista era predominante com 63,3% do total, enquanto o setor estatal detinha o resto, ou 34,7%. No comercio atacadista, o setor capitalista detinha 85,1% do total das empresas, enquanto o setor estatal possuia apenas 14,9%. No artesanato e no pe­queno comercio, da mesma forma que no campo, o setor indi­vidual predominava com mais de 90% de todas as proprieda­des. Os setores coletivo ou cooperativo e rnisto estatal-privado eram embrionarios, com participa~o insignificante ate 1953-1954.

Essa situa~o, aliada a capacidade produtiva do pais, con­venceu os comunistas de que o novo Estado teria que aprovei­tar, numa certa escala e por urn tempo prolongado, as econo­mias capitalista e individual, ao mesmo tempo que desenvolvia as economias estatal e coletiva. Essa foi a razao econ6mica e social de sua decisao de aliar-se a burguesia nacional chinesa nao s6 para a revolu~o, mas tambem para a constru~o da nova China, apesar de compreenderem que isso representava tambem urna prolongada luta pela predomin~cia econ6rnica e politica na sodedade chinesa.

Ja no inicio da reconstru~o econ6mica, a burguesia, no entanto, tentou aproveitar-se da infla~o deixada pelo Goumin­dang. Entre 1937 e 1948, os pre~os haviam subido seis milh6es

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de vezes e o volume de moeda emitida 3,7 milhoes de vezes. Depois, entre agosto de 1948 e maio de 1949, com a ernissa

0 desenfreada do "yuan-ouro': os pre~os e a moeda entraram ern espirais inversas descontroladas, os pre~os subindo e a moeda desvalorizando-se, numa media de 40% ao mes. Aproveitan­do-se disso, os capitalistas procuraram obter lucros exorbitantes, a~mbarcando e especulando com as mercadorias e utilizan­do-se da agiotagem.

A estabiliza~ao dos pre~os tornou-se urn ponto critico na recupera~o da produ~o e na tranqililidade a popula~o. A a~o especulativa da burguesia transformou-se em ponto critico de suas rela~5es com os comunistas. Antes mesmo da cria~o do Sistema Unificado, o novo Estado popular vira-se na con­tingencia de comprar e armazenar grande quantidade de graos para enfrentar o auge de especula~o esperado para o Festival da Primavera de 1950, mas a burguesia nao acreditou na capaci­dade do novo Estado. Sem medir as conseqiiencias, jogou todos os seus capitais no as;ambarcamento dos cereais ofertados pelo governo. Sem conseguir esgotar as reservas deste, viu-se obri­gada a reembolsar os capitais emprestados. Os especuladores passaram de compradores a vendedores, ofertando cereais de forma mad~ e causando uma queda acentuada dos pre~os, e tambem falencias diversas.

A burguesia chinesa viu-se, assim, desprovida de capitais para comprar materias-primas, pagar salarios e impostos e con­tinuar suas atividades empresariais. Teve que recorrer, entao, a economia estatal, subordinando-se aos termos desta. Sob con­trato, o Estado passou a fomecer as materias-primas em troca de produtos acabados, ou estabeleceu algum tipo de associa~o na qual a empresa capitalista passava a produzir de acordo com as necessidades estipuladas pelo governo.

Por esse processo, entre 1952 e 1953 a infla~o foi colo­carla sob controle. A produ~o de graos subiu de 103 para 166 milhoes, a de algodao de 450 mil para 1,3 milhao de toneladas, e a de carvao de 3 2 milhoes para 66 milh<>es de toneladas. A media anual de crescimento econ6mico nesse perfodo foi de

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34,8%. A economia recuperou-se quase totalmente em compa­ra~o com o perfodo de pre-guerra.

Essa recuperas;ao econ6mica agricola e urbana, assim como os embates com a. burguesia, introduziu modificas;oes na participa~ao dos diversos capitais na economia chinesa. Em 1953, cerca de 56% do valor da produ~o industrial ja era estatal, enquanto 26,90A» provinham de empresas mistas estatais-priva­das ou de empresas capitalistas operando sob contrato do Es­tado. Desse modo, abriu-se o caminho da moderniza~o socia­}ista, mas criou-se tambem a suposi~o de que ela poderia li­vrar-se da necessidade de conviver com o capitalismo por urn tempo prolongado, como pensara o pr6prio Mao Zedong.

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T 5 . EM BUSCA DA MODERNIDADE I

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Com a economia no patamar de antes da guerra, a bur­guesia domesticada eo florescimento dos sistemas de ajuda mu­tua agricola e coopera~ao artesanal, os comunistas supuserarn possfvel avan~r a passos largos no processo de industrializacyao. A partir de 1953, com o primeiro Plano Qti.inquenal, teve inicio a instalacyao de grandes complexos industriais.

A realidade, porem, mostrou-se mais complexa. 0 blo­queio econ6mico das principais pot~ncias mundiais e a fraqueza relativa da Uniao Sovietica, que tambern curava suas feridas de guerra, impediarn a obtencyao de creditos externos. Nessas con­di~oes, a industrializacyao s6 poderia ocorrer sendo financiada pelo trabalho excedente dos camponeses e operarios. Isso apre­sentava limites sociais e politicos evidentes, que se fizerarn pre­sentes nas insatisfa~oes e criticas surgidas entre 1955 e 1957, relacionadas principalmente com a queda da reoda camponesa, a compressao salarial e a escassez de hens de consurno.

Surgiram discrep~cias sobre os caminhos para urn de­senvolvimento sustentado de largo prazo. Embora com o mes­mo objetivo de desenvolver a capacidade produtiva do pais e moderniza-lo, formaram-se pontos de vista diferenciados. As principais duvidas residiam no papel que as formas privadas e as formas publicas e estatais de propriedade poderiarn desem­penhar nesse desenvolvimento. Muitos atacavam as forrnas pri­vadas como entraves, enquanto outros as consideravarn uma necessidade hist6rica nao superada.

De 1956 a 1976, as tentativas de liquidar as formas pri­vadas de propriedade, implantar as formas sociais e, por meio destas, elevar a capacidade produtiva, chegararn a extremos. A China sofreu convulsoes econ6micas,. sociais, culturais, id~ol6-gicas e polfticas, cujos principais. eventos foram o Movimento

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das Cern Flores, em 1957, o Grande Salta Adiante, entre 1958 e 1960, e a Revolu~ao Cultural, entre 1966 e 1976. E surpreen­dente que, apesar dos disturbios, ela tenha conservado sua uni­dade nacional e sido capaz de ingressar num novo periodo de reformas, levando sua revolu~o por caminhos inusitados.

PRIMEIRAS DIFICULDADES

Durante o primeiro Plano Qiiinqtienal, a China realizou altos investimentos na constru~o de infra-estruturas e indw­trias. Em 1957, ela ja possuia industrias de produ~o de a~o, metal-ligas, avioes, autom6veis, equipamentos de geras;ao de eletricidade e de minas e maquinas pesadas e de precisao. Foram colocadas em opera~o cern grandes empresas industriais e tive­ram inkio outras seiscentas grandes obras.

Os recursos para esses investimentos - cerca de US$ 32 bilhoes - foram basicamente arrancados da agricultura, por meio de impostos, utiliza~ao dos fundos de acumula~ao das cooperativas e emprego de jornadas voluntarias de trabalho. Os camponeses chegaram a contribuir com cerca de 25% de sua produ~o para o aumento da capacidade produtiva do pais.

Como resultado, a renda familiar camponesa caiu mais de 20%, entre 1953 e 1957. A fome endemica fora eliminada e as massas de rniseriveis e maltrapilhos deixaram de ser presen~ no panorama chin~, mas o conjunto da popula~o permanecia po­bre eo padrao de·vida dos camponeses e operarios foi afetado. E, como a maior parte dos cereais era monopolizada para evitar a especula~o, os camponeses transformaram essa monopoliza~o no principal assunto de suas preocupas:<>es e de suas criticas.

Para minora-las, o Estado teve que revender aos lavrado­res uma parcela dos cereais que havia adquirido deles, prejudi­cando as exporta~oes agrfcolas, das quais dependia a importa~o de equipamentos industriais. Alem disso, ocorreram desequili­brios entre o alto crescimento industrial e baixo incremento da agricultura e do consumo, agravados pela disparidade entre o elevado desenvolvimento da indllstria pesada e o crescimento mediocre da industria leve.

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A escassez de produtos de consumo de massa pressionou

05 pres:os e obrigou o Estado a instituir o racionamento, para assegurar uma distribui~o eqtiitativa e manter os pres:os sob controle. 0 uso de tecnologias modernas chocou-se contra a necessidade de criar uma grande massa de novos empregos e manter os salarios em niveis que nao estourassem o ors:amento estatal. Tambem apresentaram-se disparidades entre as rendas camponesa e urbana, entre a oferta demasiada de alguns .produ­tos e a escassez de outros, entre a planifica~o centralizada e as demandas do mercado.

Quanto maiores as dificuldades, maiores os esfor~os co­munistas para supeni-las pela transforma~o socialista da agri­cultura, artesanato, indllstria e comercio. Acreditavam que elas residiam nas formas privadas de propriedade e das relac;:oes de trabalho e distribui~o. Por isso, ate 1957, haviam reduzido de 7% para zero a participa~o da economia capitalista e de 72% para 7o/o a da economia individual. Em contraste, elevaram a participa~o da economia estatal de 19% para 32%, da coletiva ou cooperativa de 1 ,5o/o para 53%, e da mista estatal-privada de 0,7% para 8o/o.

Na agricultura, ate 1955 cerca de 50% das familias rurais haviam se organizado nos grupos de ajuda mutua, e~ que as parcelas e os meios de produ~o permaneciam propriedade dos camponeses. Apenas 14% estavam nas cooperativas de tipo in­ferior, em que as parcelas eram unificadas para melhor apro­veitamento dos equipamentos. Em 1956, porem, ocor._-eu urn salto: 97% das familias haviam ingressado nas cooperativas de tipo superior, em que a propriedade da terra e dos meios de produs:3o era coletiva.

A rapida transfonna~o socialista da propriedade privada e das relas:<>es de trabalho e distribuicyao nao foi, porem, acom­panhada de urn ritmo elevado de crias:ao de novos trabalhos. Assim, para alcans:ar o pleno emprego, foi adotada a politica 1:3, na qual urn trabalho assegurava emprego para tr~s pessoas, com danos para a produtividade. Mesmo assim, a insa~isfa~o cresceu, sendo o estopim para Um.a ampla discussao sobre os

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rumos da construc;:ao socialista na China. Estava em pauta como elevar a capacidade produtiva do pais e, ao mesmo tem­po, garantir o bem-estar da populac;:ao. Ou, como industriali­zar a China e, ao mesmo tempo, atender as novas necessidades sociais que a superac;:ao inicial do atraso e da miseria haviam gerado.

Mao Zedong discutiu essas quest<>es em As 10 grandes re­lafoes e Tratamento correto das contradifoes no seio do povo. No primeiro, criticou o modelo sovietico, prop6s equilibrar a in­dustria pesada, a agricultura e a industria leve, sugeriu o desen­volvimento da rede de pequenas inddstrias rurais e sua moder­niza93o progressiva e defendeu maior descentralizac;:ao admi­nistrativa, para dedicar atenc;:ao aos servic;:os de bem-estar e aos salarios. Tambem sugeriu maior autonomia para as empresas e autoridades locais e aconselhou os chineses a aproveitar a ex­periencia dos outros pafses, inclusive capitalistas, nas areas de ciencias, tecnologia e administrac;:ao.

No Tratamento correto das contradifoes no seio do povo, Mao advogou urn tratamento cuidadoso das contradic;:oes exis­tentes, pela manifestac;:ao livre das correntes de pensamento. Considerava nao antag6nica a contradic;:iio com a burguesia chi­nesa, apesar de seus representantes ainda receberem dividen­dos das empresas mistas, e defendia a ideia de que a contradi~o basica da sociedade chinesa residia no fato de as relac;:oes de produc;:iio ou de propriedade nao estarem em correspondencia com as forc;:as produtivas.

Ao considerar as forc;:as produtivas do pais mais avanc;:a­das do que suas relac;:oes de propriedade, trabalho e distribui<;ao, o pr6prio Mao viu-se constrangido, porem, a atacar os que criti­cavant a pressa na coletivizac;:ao agricola e urbana, acusando-os de "tentar parar a revoluc;:ao•: Desse modo, para "nao parar a revoluc;:ao•: o VIII Congresso do PC, em 1956, escolheu o cami­nho de construir o socialismo estritamente pelas formas publi­cas de propriedade. Os comunistas concordaram com Mao que suas di.ficuldades advinham nao do estreitamento das formas de propriedade, mas de desvios no tratamento das contradic;:6es

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no seio do povo e da rna utilizac;:ao da capacidade tecnica e cien­tffica dos intelectuais.

Essa foi uma das razoes que os conduziram a deflagrar o Movirnento das Cern Flores. Queriam que "cern flores flores­cessem, cern escolas competissem", a exemplo do florescimento cultural do seculo V a. C., para levar os intelectuais a colocar toda sua capacidade a servic;:o da construc;:ao socialista. No en­tanto, a queda do padrao de vida das camadas populaces e o ferreo controle do Estado sobre as manifestac;:oes politicas e culturais, em contraste com o perlodo de reconstruc;:ao econ6-rnica e as expectativas criadas pela revoluc;:ao, parecem ter ultra­passado os limites suportaveis.

0 Movimento das Cern Flores escancarou as comportas para as quei.xas e insatisfac;:<>es desaguarem. As greves operarias e nas cooperativas, as manifestac;:6es estudantis, os protestos de intelectuais, o abandono das cooperativas, a matanc;:a de animais de cria e outras formas de protesto multiplicaram-se, superando os objetivos do movimento. Alem disso, as criticas aos defei­tos e erros da constru~ao socialista e os ataques ao pr6prio socialismo foram muito alem do previsivel, abriram espa~o para a ac;:ao de sabotadores e elementos anti-socialistas e obri­garaiD os comunistas a contra-atacar e sustar o tlorescimento das Cern Flores.

Substitufram-nas por urn amplo movimento de retifica­c;:ao intema de seu partido, dirigido contra o burocratismo, o sectarismo e o subjetivismo, ao mesmo tempo que atacavam com rigor os elementos anti-socialistas presentes na sociedade. Mais tarde, reconhecer~m que esse contra-ataque foi alem do previsto, atingindo como "direitistas e contra-revolucionarios" parte da int~lectualidade que era simplesmente critica.

TENTANDO UM GRANDE SALTO

0 moVimento de retifica~o, como sugerira Mao, levou a uma grande descentraliza~o. As empresas subordinadas ao govemo central foram reduzidas de 9.300 para 1.200, os itens econ6micos controlados cafram de 532 para 132, eo peso dos

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recursos ors;amentarios nacionais destinados a obras locais su­biu de 10% para 50%. A amplia<;ao dos poderes das localidades criou urn ambiente favonivel ao aumento da produs;ao, levan­do os· dirigentes a estabelecer metas ambiciosas, para demons­trar a superioridade das rela<;oes socialistas.

Em 1958, ja no curso do segundo Plano Quinquenal, a dires;ao do PC planejou, por meio de urna grande mobiliza~o social, duplicar a producrao de a<;o naquele ano (de 5,3 milh<>es de toneladas para 10,7 milh6es de toneladas) e unificar as coope­rativas agricolas em comunas populaces. Milhoes de campone­ses e trabalhadores urbanos transformaram-se em fabricantes de a<;o em altos-fornos de quintal. Nas comunas populares, ou­tros milhoes foram mobilizados para a construs;ao de obras hidraulicas, como barragens, diques contra inunda<;oes e canais de irrigacrao. Tudo indicava urn "grande salto adiante" no au­mento da capacidade produtiva da China.

Cada comuna agrupava cerca de 25 cooperativas, com cinco a dez mil moradias, e era organizada por brigadas e equi­pes de produs;ao, estas com vinte a cinquenta familias cada. Ao rebaixar os camponeses medios e ricos ao nivel dos camponeses pobres, estes viram nas comunas a materializacrao de sua tradi­s;ao igualitarista. Nas equipes de produs:ao, todos trabalhavam segundo as regras militares e ganhavam igUalmente, comendo "na mesma panela de arroz". Supostamente, as comunas nao davam pausa a revolus:ao e indicavam o caminho de passar do principio socialista de "a cada urn segundo seu trabalho" para o prindpio comunista de "a cada urn segundo sua necessidade".

Esses movimentos demonstraram a disp9si.yao popular de atender aos apelos de desenvolvimento economico, mas apre­sentavam dires:oes opostas. A medida que as autoridades locais podiam realizar obras de infra-estrutura, a escala destas exigia a coordenacrao de diversas localidades, apressando a unifica.yao das cooperativas em comunas. A descentralizas;ao transformou­se nurna nova centralizacrao. Alem disso, logo se descobriu que as estatisticas de grandiosas produ<;5es de as:o e cereais estavam infladas. Pior, o as:o produzido nos fomos de quintal era im-

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prest:avel, e as demandas dispersas de carvao e minerio haviam tevado o caos aos transportes.

Sem a existencia de uma base produtiva adequada, quanto [J13is acelerada a socializas:ao das rela~oes de trabalho e de dis­tribuis:iio, maior a centralizas:ao para compensar aquela ausen­cia. Mesmo assim, nao foi possfvel evitar uma ruptura no pro­cess<> de construs:ao economica. Houve desgaste e dispersao da for~ de trabalho e dos recursos materiais e serias despropor­s:aes na produs:ao, agravadas pelas calamidades naturais de 1959 e 1960. Neste Ultimo ano, a produ.yao agricola sofreu urn colap­so. Ao cair para ISO milhoes de toneladas, a fome voltou a algu­mas regioes.

Nessas condi.yoes, a discussao sobre a construs:ao socialis­ta na China retornou com for~. V arios responsabilizavam nao apenas as calamidades naturais, mas tambem as "for.yas espon­taneas capitalistas" pelo insucesso do "grande salto'~ Outros criti­cavam a socializas:ao rapida das rela.yoes de produs:ao, manifes­tada nas propriedades estatal e coletiva e nas rela.yoes de traba­lho e distribui.yao das comunas e empresas. Embora o pr6prio Mao aceitasse a responsabilidade pelo desastre e criticasse a ten­dencia a avan~r prematuramente na coletiviza~ao agricola, ele nao suportou a contundencia da crftica do general Peng Dehuai, ministro da Defesa, e fors:ou sua destitui~o.

0 contexto dessa polemica foi conturbado ainda pelas divergencias ideol6gicas e pollticas que separavam a China da Uniao Sovietica a respeito da coexistencia pacifica com o impe­rialismo e do apoio aos movimentos de liberta~o nacional que ocorriam no mundo. Em razao delas, a Uniao Sovietica retirou, em 1960, os tecnicos que orientavam a construs:ao de mais de 170 grandes projetos industriais chineses, obrigando a China a realizar reajustamentos ainda mais globais em sua econornia.

A atitude sovietica foi tida como uma medida deliberada de aproveitar-se das dificuldades internas chinesas para deses­tabilizar o regime dirigido pelo PC. 0 governo Chines teve que paralisar grandes obras, permitir a retomada da produ~o do­mestica camponesa e reduzir o nt1mero de trabalhadores nas

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cidades. E, embora o reajustamento econ6mico fosse acompa­nhado de wna intensa atividade ideol6gica e organizativa para conquistar o apoio dos camponeses, trabalhadores e intelectuais na supera~ao das dificuldades, a situa~o ainda continuava cri­tica no infcio de 1962.

A polftica das tr~s liberdades ( direito de os camponeses plantarem em seus lotes, desenvolverem atividades domesticas complementares e venderem parte da produ~o no mercado) e de uma garantia ( contratos de compra dos excedentes pelo Es­tado) permitiu superar a queda na produ~o agricola. No en tan­to, ela tambem se tornou alvo das crlticas dos que apelavam para "nao esquecer jamais· a luta de classes" e para concentrar a aten~ao no incremento das rela~oes socialistas e no combate aos "seguidores do caminho capitalista~

Em outras palavras, grande parte dos dirigentes comu­nistas considerava qu~ os problemas surgidos no pais eram de­correntes de wna estatiza~o e uma coletiviza~o da economia e das rela~<>es de trabalho e distribui~o que nao se completa­ram. Portanto, todos aqueles que defendiam o desenvolvimen­to prioritario das for~s produtivas ou da capacidade produtiva da China, pela a~o de diversas formas de propriedade, passa­ram a ser considerados "seguidores do caminho capitalista':

Nesse contexto, o movimento de educa~o socialista, de 1963, destinado a realizar "quatro limpezas" (nos campos poli­tico, econ6mico, organizativo e ideol6gico) em algumas areas rurais e num pequeno nUmero de fabricas, minas e escolas, para solucionar problemas de estilo de trabalho e gestao econ6mica, acabou sendo transformado numa manifesta~o da luta de clas­ses e de seu reflexo dentro do PC e do governo. A ideia de que o alvo principal do movimento de educa~o socialista deveriam ser as pessoas com poder no partido e no governo que estavam "seguindo o caminho capitalista" tomou corpo na dire~o do PC e colocou a luta de classes no centro da constru~o socialista.

A disputa entre dois caminhos era evidente, apesar de nem sempre explicitada claramente. Enquanto Mao Zedong afirmava que a maior parte das associa~oes de literatura e arte

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e suas publica(j:oes, nos quinze anos precedentes, havia abando­nado as politicas socialistas e deslizado no revisionismo, Zhu Enlai conclamava os intelectuais a "florir e revitalizar" e prepa­rava uma proposta de "quatro modernizac;:oes"- agricultura, industria, defesa nacional e ci~ncia e tecnologia - que, na pra­tica, assumia o desenvolvimento das fon;:as produtivas como eixo da transi~o socialista.

Em 1964, porem, ja era forte a suposi~o de que o poder na China estava em maos dos "seguidores do caminho capita­lista" e que o proletariado precisava retomar esse poder. Lin Biao, que substituira Peng Dehuai no Ministerio da Defesa, defendeu entao a tese de que "a tomada do poder depende de harris de p6lvora e tinteiro", isto e, de For~as Armadas e da propaganda.

Para conquistar os "harris", suprimiu os graus de oficia­lato no Exercito Popular, na suposi~o de aurnentar a participa­cyao dos soldados e contar com sua fidelidade, e substituiu os comandantes e comissarios politicos das regioes militares por homens de sua confian(j:a. E, para ter os "tinteiros", lan(j:OU as campanhas ideol6gicas de Imitar Lei Feng (urn jovem soldado her6i) e Seguir a Escola do EPL, tendo como cartilha o livro Ci­tafoes de Mao Zedong. Estendidas a todo o pais pelos grupos de trabalho do EPL, essas campanhas jogaram o exercito na disputa . ideol6gica e politica e deram infcio a urn culto sem precedentes da personalidade de Mao.

Tudo isso ocorria no contexto de urn mundo dividido pela guerra fria. Entre 1959 e 1964, a China teve que enfrentar a insurreis:ao dos feudais do Tibete, conflitos fronteiric;:os com a India relacionados com a Caxemira e o Paquistao, e as amea(j:a5 de guerra nuclear, em razao das diverg~ncias com os sovieticos e da crise dos misseis em Cuba. Como rea~o, os comunistas chineses lan~am seu programa de 25 pontos, em apoio aos movimentos revolucionarios, e conseguiram produzir seu pr6-prio artefato nuclear, fazendo com sucesso urn teste em 1964.

Os norte-americanos, por seu turno, nao s6 mantinham seu bloqueio e sua polftica de "duas Chinas" (China Naciona­lista, ou Taiwan, e China Popular ou Comunista), como intensi-

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ficaram a constru~o de urn cinturao antichines, promovendo golpes de Estado e ditaduras em varios paises da Asia, Africa e America Latina. Apesar dos .. Cinco Principios de Coexistencia Pacifica" que orientavam sua politica externa desde 1954, a China nao conseguira estender suas relac;:oes diplomaticas a mais do que trinta paises, a maioria africanos e asiaticos.

E nesse quadro de aguc;:amento interno e internacional que, em fevereiro de 1966, Lin Biao e Jiang Qing ( esposa de Mao), na linha deter os tinteiros, organizaram urn f6rum sobre literatura e arte no EPL. Suas conclusoes: desde a fundac;:ao da Republica Popular, a literatura e os cfrculos Iiterarios teriam estado .. sob a ditadura" dos proponentes de uma «linha sinis­tra" anti-socialista, diametralmente oposta ao pensamento de Mao.

A partir da1 as coisas se precipitaram. Os defensores da continuidade sem pausa da revoluc;:ao consideraram-se prepa­rados para lanc;:ar, como disse Kang Shen, membro do biro po­litico do PC, "uma revolu~o politica proletaria, continuac;:ao da guerra civil e continua~o da luta de classes entre o Guomindang e o PC''. Em consequ~ncia, os responsaveis do setor de propa­ganda do PC e os dirigentes da municipalidade de Beijing fo­ram destitWdos, e, em maio, foram publicados dezesseis pontos sobre a Grande Revolu~o Cultural. 0 conceito da revolu~o permanente passava, na pratica, a ser o conceito basico da cons­truc;:ao do socialismo na China.

REVOLU<;AO CULTURAL

Os dezesseis pontos apelaram as massas para .. fazer a re­volu~o': «transformar os pensamentos, a cultura, os habitos e costumes antigos': .. moldar a fisionomia moral de toda a socie­dade conforme os pensamentos, a cultura, os habitos e costumes do proletariado': "derrubar os que ocupavam postos de direc;:ao, mas seguiam o caminho capitalista': "tomar o poder': "opor-se aos ataques da burguesia no dominio ideol6gico", "criticar as autoridades acad~micas reacionarias': "atacar a ideologia bur­guesa e de todas as outras classes exploradoras" e «reformar a

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estrutura de ensino, a literatura, a arte e todos os demais ramos da superestrutura'~

Ao mesmo tempo, porem, proibiam "que os representan­tes da burguesia infiltrados no Partido fossem citados nominal­mente na imprensa sem a aprova~o do comit~ ao qual perten­ciam': .. que os quadros tecnicos e cientfficos dedicados a ativi­dades estrategicas fossem incomodados" e que a Revoluc;:ao Cul­tural "fosse levada as fileiras do Exercito Popular de Libertac;:ao':

Milh6es de chineses organizaram-se na "guarda vermelha" e nos diversos "comit~ de rebeldes revolucionarios" e passaram a aplicar a democracia direta, cada grupo interpretando a seu modo as citac;:6es e as instruc;:oes do presidente Mao, que defendia fume­mente a ideia de que as "massas nao deveriam ser tutelad~':

Em 1969, porem, a situac;:ao tomara-se extremamente pe­rigosa. Alem dos prejuizos a produc;:ao, em razao das constantes paralisac;:oes para as discuss<>es e disputas politicas, e das repe­tidas arbitrariedades, injustic;:as e ate crimes contra os que se opunham as ideias e praticas dos "guardas vermelhos" e "rebel­des revolucionarios': o perigo de uma guerra civil real materiali­zou-se ap6s choques envolvendo unidades do EPL na cidade de Wuhan.

A direc;:ao do PC e o governo ordenaram o desarmamen­to e a dissoluc;:ao da Guarda Vermelha, reorganizaram os orga­nismos estatais, com a participac;:ao de representantes dos co­mites do PC, dos comites revolucionarios e do EPL, e passaram a dar atenc;:ao redobrada a economia. "Fazer a revoluc;:ao e au­mentar a produ~o" tornou-se a ordem principal, sinalizando que os danos causados pela movimentac;:ao macic;:a poderiam levar o pais ao caos. A partir de entao, a Revoluc;:ao Cultural refluiu de suas grandes mobiliza~oes e entrou numa fase de disputa quase exclusivamente palaciana e partidaria.

Havia tr~s grupos principais: o de Jiang Qing e mais tres dirigentes que gimharam destaque a partir das discussoes litera­rias e ideol6gicas de 1963; ode Lin Biao, ministro da Defesa, cuja base principal eram oficiais do EPL; e o terceiro, informal, cuja refer~ncia era Zhu Enlai. Sobre eles pairava Mao Zedong ..

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Zhu era o alvo principal dos ataques de Jiang Qing e Lin Biao, porem Mao resistia a tais ataques e opunha-se a qualquer redu­~o dos poderes de Zhu. Isso levou Lin Biao a tentar por em pratica sua teoria sobre golpes de Estado no socialismo, embora s6 pudesse ter exito contra Zhu Enlai chocando-se contra Mao.

Urn dos fatores que empurraram Lin Biao a aventura gol­pista foi a tlexibiliza~ao da pol.itica exterior da China, incluin­do a regulariza~ao das rela~oes com a Uniao Sovietica, Estados Unidos e outros pafses, mesmo imperialistas, promovida por Mao e Zhu. Diante do agravamento da corrida armamentista entre as duas superpotencias e da situa~o de derrota dos Esta­dos Unidos no Vietna, aqueles dois dirigentes enxergaram uma oportunidade de reduzir suas tensoes com as superpotencias e sair do isolamento internacional.

Paradoxalmente, foi no pr6prio curso da Revolu~ao Cul­tural que a China retomou suas relac;:oes com os Estados Unidos, sob a condi~ao de a Republica Popular ser reconhecida como unico governo da China. Na pratica, isso implicava que, para reatar rela~oes com a China, os demais paises deveriam des­considerar Taiwan como «Republica': romper relac;:oes com ela e passar a ve-la como provincia chinesa. Em 1976, quando fin­dou a Revolu~o Cultural, a China ja havia estendido suas rela­c;:oes polfticas a mais de cern Estados em vez dos cinqtienta ante­riores a 1969.

0 plano sedicioso de Lin Biao, em 1971, falhou e isso desbaratou seu grupo e assestou urn golpe na corrente aliada de Jiang Qing e na Revoluc;:ao Cultural. Embora Mao reiterasse a necessidade de levar adiante tal Revoluc;:ao, a partir de 1972 ele comec;:ou a chamar para postos dirigentes no partido e no governo muitos dos veteranos que haviam sido afastados. E, mesmo sob urna renhida resistencia do grupo de Jiang Qing, em 1973 Mao indicou Deng Xiaoping para ocupar os postos de vice"7primeiro-ministro e chefe do Estado-maior do EPL.

Apesar dessas mudanc;:as, o X Congresso do PC, ern 1975, reafirmou as ideias centrais de Mao Zedong a respeito da con­tinuac;:ao da luta de classes sob o socialismo. Aprovou sua

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tese sobre a realizac;:ao de revoluc;:oes culturais ddicas e elegeu alguns dos membros do grupo de Jiang Qing para os 6rgaos maximos do Partido Comunista e do govemo. Assim, ao mesmo tempo que ele estimulava as retificac;:oes empreendidas por Zhu Enlai, Deng Xiaoping e outros nas polfticas partidarias, do go­verna e do EPL, permitia que o grupo de Jiang Qing atacasse essas retifica~oes e denunciasse a reabilita<yao dos veteranos, a pretexto de criticar Lin Biao e Conrucio, revigorar os temas da Revolucyao Cultural, incentivar o igualitarismo nas comunas e estimular a crftica aos seguidores do caminho capitalista.

A novidade e que essa campanha nao encontrava mais eco entre as grandes massas. Ao contrario, apareceram cartazes criticando Jiang Qing, Wang Howen, Zhang Chunqiao e Yao Wenyuan, que o pr6prio Mao designara como "bando dos qua­tro". Essa reversao polftica se acentuou em janeiro de 1976, com a como<yao nacional causada pela morte de Zhu Enlai. A oposi­c;:ao as ac;:oes de Jiang Qing e seu grupo aumentou e desembocou na data de celebra~o dos mortos, em abril, com as manifesta­c;:oes populares em homenagem a Zhu Enlai e os choques com os milicianos, em particular em Tiananmen.

Mao responsabilizou Deng Xiaoping pelos acontecimen­tos e o destituiu, ao mesmo tempo que impediu os membros do "bando dos quatro" de serem designados como primeiro­vice-presidente e primeiro-ministro. Colocou Hua Kuofeng, seu ministro de Segurancya, nesses postos, e praticamente definiu seu sucessor. Assim, quando Mao morreu, em setembro, a suces­sao do poder na China estava definida. S6 poderia ser desfeita por meio de urn amplo processo democratico dentro do PC ou por algum golpe palaciano. Foi por esse caminho que envere­daram Jiang Qing e seu grupo, levando os demais membros do bir6 politico a reagir e prende-los.

0 carnaval popular que se seguiu ao ant1ncio dessa prisao foi a demonstra~o eloquente de que a Revolu~o Cultural se esgotara. No entanto, como ficou evidente, dar fim a ela ainda demandava urn compl~xo processo de avalia~o hist6rica e de mudanc;:as nas diretivas pol.iticas herdadas de Mao Zedong.

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WLA D IMIR P O MAR

A VALIA<;:AO HISTORJCA

Hua Kuofeng, que substituiu Mao na presidencia do PC e como primeiro-ministro do Conselho de Estado, queria ater­se as "duas todas", isto e, pretendia seguir estritamente "todas as diretivas" e "todas as orienta~oes" de Mao. 0 que estava em contradi~ao com a situa~o da economia que necessitava de rea­justamentos urgentes. Chegara a urn ponto critico, com que­das em itens importantes da produ~ao, pequeno crescimento global e grandes perdas financeiras. Alem disso, as "duas todas" conflitavam com as pressoes pela reabilita~o dos veteranos des­tituidos e pela revoga.yao dos vereditos sobre eles.

Nas conversa.yoes da dire~o do PC com Deng Xiaoping, em maio de 1977, esse veterano considerou inaceitaveis as "duas todas': Se tal principio fosse correto, nao haveria motivo para reabilita-lo, nem razao para considerar justificados os aconteci­mentos na Pra~ Tiananmen (Paz Celestial), em abril de 1976, quando a popula~o foi homenagear Zhu Enlai e criticar o "ban­do dos quatro': entrando em cheque com os milicianos. Deng frisou que a constru~ao socialista, apesar dos avan.yos obtidos, falliara em progredir satisfatoriamente e envolvera o pais em graves insucessos politicos. A China nao superaria suas dificul­dades se o PC nao assumisse que cometera grandes erros, inclu­sive Mao, como seu principal dirigente. Se Mao reconhecera que algumas de suas decisoes foram erradas e que ninguem poderia evitar cometer erros no trabalho, a menos que nada fizesse, por que os comunistas deveriam continuar atados as "duas todas"?

Deng Xiaoping defendeu, nessa ocasiao, a necessidade de fazer uma aprecia.yao profunda da economia chinesa e passar por urn perfodo de reajustamento extenso e complexo, para trans­formar os vcirios graus de desequilibrio existentes nurn equilibrio relativo. lsso, segundo ele, seria urna retirada parcial, no estilo da Grande Marcha, para preparar as condi~6es de realizar as "qua­teo moderniza~Oe5" requeridas pela sociedade chinesa. A China nao se desenvolveria sem que tal reajustamento fosse realizado, o que incluia superar os elementos de instabilidade polttica e ideo-16gica e:xistentes na China, como o faccionismo e o anarquismo.

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A R EVOL U <;:AO CHI NESA

Havia problemas imediatos que afligiam o povo chines, como a eleva~o dos pre.yos, os privilegios dos quadros partida­rios e governamentais e a escassez de moradias. Tambem havia grande expectativa nacional e internacional sobre a avalia~o de Mao Zedong e da Revolu~o Cultural, e a democracia nao era difundida e promovida como urn objetivo permanente. Nes­sas condi~oes, Deng defendeu que se tomasse como prindpio a corre~o de tudo que estivesse errado e dos erros do passado. Seria essencial encaminhar a solu~o dos problemas mais a£li­tivos do povo e realizar uma avalia~o democratica e profunda da hist6ria da China, desde a funda.yao da Republica Popular, de modo a alcan~r nova estabilidade e nova unidade no pais.

Em julho de 1977, foi consumada a reabilita~o de Deng Xiaoping e de outros veteranos. Mas o XI Congresso do PC, rea­lizado em agosto, embora desse por encerrada a Revoluc;:ao Cultural, nao revogou as "duas todas~ Foi preciso urn persis­tente trabalho de jogar Mao contra Mao, reafirmando princi­palmente sua linha de massas (to mar as massas como o centro das preocupa~oes) e seu estilo de trabalho (procurar a verdade nos fatos ou tomar a pratica como criterio da verdade), para mudar o foco do trabalho partidario e governamental c;la luta de classes para as "quatro moderniza.y6es" (industria, agricul­tura, defesa nacional e ci~ncia e tecnologia) ~

Durante a confer~ncia preparat6ria da terceira sessao ple­naria do comit~ central do PC, que durou urn m~ inteiro, Deng Xiaoping, Chen Yun, Li Xiannian e outros quadros veteranos e novos defenderam aquela mudan.ya de foco, tendo por base a emancipa~o das mentes, a quebra dos tabus e a ultrapassagem dos limites das zonas proibidas por doze anos de dominio de Lin Biao e Jiang Qing. Para emancipar as mentes, era decisivo tomar a democracia como condi~o maior. As pessoas deveriam perder o medo de falar, abandonando as praticas de punir por qualquer falta, colocar r6tulos e usar a crftica como se fosse uma grande vara.

Seus argumentostinham como refer~ncia as teses de Mao. Primeiro, combinar em alto grau a democracia e o centralismo.

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Amanda
Highlight
Page 28: A Revolução Chinesa

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di<;ocs entre o povo co inimigo e mancjar cada uma dela:; com corre~o. Ainda depois, aplicar a f6rmula wtidade-critica-unida­de no tratamento das contradi~oes dentro do povo e aprender dos erros do passado para evitar erros no futuro, curando a doen~a para salvar o paciente. Tudo isso exigia descentralizar a gestiio e o poder de decisao e assegurar os direitos democraticos, consolidando os mecanismos de elei~o, gestao e supervisao. A democracia deveria tornar-se lei, ser institucionalizada, de modo que nao sofresse danos com o rodizio de lideran.yas, ou quando estas mudassem seus pontos de vista ou seu foco de aten~o.

A terceira sessao plemiria do comit~ central do PC, de dezembro de 1978, fez a crftica das "duas todas" e revogou-as. Em 1979, a nova dire~o do PC e a do governo formaram uma Comissao Econ6mica e Financeira, dirigida por Chen Yun e Li Xiannian, para organizar todo o processo de reajustamento e preparar o plano de reformas e moderniza~o. Sua aten~ao ini­cial deveria concentrar-se na efetiva~o do "sistema de responsa­bilidade" agricola e na implanta~o das quatro Zonas Econo­micas Especiais destinadas a atrair investimentos estrangeiros e acelerar a abertura ao exterior.

No final de 1980, Hua Kuofeng foi substituido por Hu Yaobang, como presidente do PC, e por Deng Xiaoping, como presidente da comissao militar. E, em junho de 1981, o comite central do PC aprovou uma resolu~o sobre questoes da hist6-ria do partido, relativizando os erros de Mao Zedong, respon- · sabilizando tambem outros dirigentes, inclusive Deng Xiaoping, por esses erros e considerando validas as linhas mestras do pen­samento de Mao Zedong, em especial as de integrar a teoria com a pratica, forjar fortes la~os com as grandes massas e prati­car a autocrftica.

Com isso, estavam colocadas as condi~<>es para a China ingressar em seu vasto programa de reformas.

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6 . N OVAS COMBINAC;OES ESTH.A' I'I'GI< A' ·

Ate meados dos anos 90, poucos acreditavam que as no­vas estrategias de desenvolvimento da China produzissem su ­cessos duradouros. Para alguns, o futuro da Asia ainda era asso­ciado apenas ao Japao. Para outro~, o crescimento da China nao compensaria o que chamavam de ressurgimento de velhos males das sociedades de classes, como a desigualdade social, desem­prego, infla~o e corru~o.

Alem disso, muitos consideravam o regime comunista chines baseado na repressao polftica. Advogavam, pois, que as "quatro modernizacy<>es" fossem acompanhadas de uma "quinta reforma': a reforma polftica, como tal entendendo a irnplanta­~o de uma democracia de tipo ocidental. Para eles, apenas com urn regime como o praticado nos pafses capitalistas do Ocidente seria possivel mobilizar a energia, a compet~ncia e o talento do povo chines. Fora disso, o que restaria para a China seria uma sociedade de tipo sovietico, com urn Estado forte e wn povo escravo e miseravel.

Outros generalizavam alguns comportamentos ressurgi­dos na mutante sociedade chinesa, a exemplo da a~o de gan­gues, como indica~o de que os ideais socialistas teriam sido abandonados. Para eles, falar em "socialismo de mercado" nao passaria, pois, de urn engodo. Alguns reconhecerarn que os chi­neses podiam visitar os demais pa.ises, mas lamentavam-se de que somente poderiam exercer es~ direito se tivessem dinhei­ro, como se no resto do mundo fosse diferente. Partiam do prin­dpio de que o socialismo deveria ser radicalmente diferente dos paises capitalistas, significando igualdade total, e nao wn proces­so que transita da desigualdade (no caso da China, inicialmente abissal) para uma crescente igualdade.

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