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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI JANINE SANTOS DA SILVA A IRREVERSIBILIDADE DO PROVIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA NO DIREITO À SAÚDE Biguaçu 2015

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

JANINE SANTOS DA SILVA

A IRREVERSIBILIDADE DO PROVIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA NO

DIREITO À SAÚDE

Biguaçu

2015

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JANINE SANTOS DA SILVA

A IRREVERSIBILIDADE DA TUTELA ANTECIPADA NO DIREITO À SAÚDE

Monografia apresentada como

requisito parcial para a obtenção do título

de Bacharel, na Universidade do Vale de

Itajaí, Centro de Ciências Sociais e

Jurídicas.

Prof. Msc. Carlos Alberto Luz Gonçalves

UNIVALI – Centro de Ciências Sociais e Jurídicas. Orientador Prof. ............................ UNIVALI – Centro de Ciências Sociais e Jurídicas. Membro

Prof. ............................ UNIVALI – Centro de Ciências Sociais e Jurídicas. Membro

Biguaçu

2015

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha família, por todo o amor e

apoio que sempre me deram.

Ao meu namorado, Ernesto, por todo o seu

incentivo e companheirismo.

Ao meu orientador, pela sugestão do tema e pela

experiência transmitida durante a elaboração

deste trabalho.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade

pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Biguaçu, 05 de junho de 2015.

Janine Santos da Silva

Bacharel(a)

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RESUMO

O direito à saúde está previsto na Constituição Federal de 1988 como um direito social fundamental de todos os indivíduos, devendo o Estado prestar assistência de forma igualitária e universal, promovendo sua proteção e recuperação. Acontece que nem sempre essa prestação ocorre de forma efetiva, pois o Poder Público não cumpre o seu dever de fornecer a assistência à saúde. Desse modo, poderão os indivíduos recorrer ao Poder Judiciário para que obtenham a tutela desse direito. Entretanto, sabe-se que um processo judicial poderá levar anos para que tenha um final, e isso no que diz respeito ao direito à saúde poderá ser fatal, fazendo com que o direito pereça. Por isso, foi instituído no ordenamento jurídico brasileiro, com a Lei n. 8.952/94, o instituto da tutela antecipada, que tem como objetivo proporcionar o acesso à justiça de forma efetiva e tempestiva. Tal instituto possui requisitos para a sua concessão, previstos no art. 273 do Código de Processo Civil. Dentre eles, o § 2º do referido artigo, que estabelece que não se concederá a tutela antecipada caso haja perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. No presente trabalho, estudou-se a possibilidade do magistrado conceder a antecipação de tutela diante de sua irreversibilidade, com o objetivo de proteger o direito à saúde, que é tão fundamental por estar diretamente ligado ao direito à vida.

Palavras-chave: Direito à saúde. Tutela Antecipada. Irreversibilidade.

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ABSTRACT

The right to health is established in the 1988 Federal Constitution as a fundamental social right of all individuals, and the state must assist this in an equal and universal way, promoting its protection and recovery. It turns out that this provision is not always effectively because the Government does not fulfill its duty to provide health care. Thus, individuals may resort to the courts to obtain the protection of that right. However, it is known that a lawsuit could take years for it to have an end, and that with regard to the right to health can be fatal, causing the right perish. So it was instituted in the Brazilian legal system, with Law n. 8952/94, the Institute of injunctive relief, which aims to provide access to justice in an effective and timely manner. This institute has requirements for granting provided for in art. 273 of the Civil Procedure Code. Among them, § 2 of that article, which states that do not grant injunctive relief if there is danger of irreversibility of advance provision. In this monograph, we studied the possibility of the magistrate to grant the preliminary injunction before its irreversibility, in order to protect the right to health, which is so important because it is directly linked to the right to life. Keywords: Right to health. Injuctive Relief. Irreversibility.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 8

1 DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E SOCIAIS ...................................................... 10

1.1 Conceito de Direitos Fundamentais ............................................................. 10

1.2 Características dos Direitos Fundamentais .................................................. 12

1.3 As Dimensões dos Direitos Fundamentais ................................................... 14

1.3.1 Os Direitos Fundamentais da Primeira Dimensão ................................. 15

1.3.2 Os Direitos Fundamentais da Segunda Dimensão ................................ 16

1.3.3 Os Direitos Fundamentais da Terceira Dimensão ................................. 17

1.3.4 Os Direitos Fundamentais da Quarta Dimensão ................................... 18

1.4 Conceito de Direitos Sociais ........................................................................ 19

1.5 Direito à Saúde ............................................................................................ 20

2 A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA ......................................................................... 24

2.1 A Tutela Antecipada no Ordenamento Jurídico Brasileiro ............................ 24

2.2 Conceito ....................................................................................................... 26

2.3 Requisitos para a Concessão da Tutela Antecipada .................................... 28

2.3.1 Requerimento da parte .......................................................................... 29

2.3.2 Prova Inequívoca ................................................................................... 30

2.3.3 Verossimilhança das alegações ............................................................ 31

2.3.4 Fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação .................. 33

2.3.5 Caracterização do Abuso do Direito de Defesa ou Manifesto Propósito

Protelatório do Réu ............................................................................................ 34

2.3.6 Reversibilidade da Medida .................................................................... 36

3 IRREVERSIBILIDADE DA TUTELA ANTECIPADA APLICADA NO DIREITO À

SAÚDE ...................................................................................................................... 39

3.1 O Dever do Estado em Fornecer Assistência à Saúde ................................ 39

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3.2 A Aplicabilidade da Tutela Antecipada nas Demandas de Tratamento de

Saúde .................................................................................................................... 43

3.3 A Irreversibilidade da Tutela Antecipada nas Demandas de Tratamento de

Saúde .................................................................................................................... 46

3.4 O Princípio da Proporcionalidade Aplicado à Irreversibilidade da Tutela

Antecipada nas Demandas de Tratamento de Saúde ........................................... 49

3.5 Posicionamento dos Tribunais ..................................................................... 52

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 56

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ................................................................... 58

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto o estudo da possibilidade da

concessão da antecipação de tutela diante da irreversibilidade do seu provimento

nas ações que visam o tratamento de saúde.

O direito à saúde está previsto na Constituição Federal como um direito

social fundamental, sendo um dever do Estado garanti-lo e prestá-lo a todos de

forma eficiente. Entretanto, sabe-se que tal prestação não ocorre de maneira efetiva,

o que leva os cidadãos a buscarem o Poder Judiciário para que tenham o seu direito

à saúde assegurado.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes hipóteses:

O direito à saúde está previsto constitucionalmente como um direito

fundamental?

Quais os requisitos necessários a serem cumpridos para que seja

deferido o pedido de antecipação de tutela?

Diante da inércia do Estado em prestar assistência à saúde, poderá ele

ser obrigado a fornecê-la judicialmente por meio da tutela antecipada, ainda que

exista o perigo da irreversibilidade do provimento?

Para tanto, inicia-se, no primeiro capítulo, o estudo dos direitos

fundamentais previstos na Constituição Federal, demonstrando seu conceito,

características e dimensões. Ainda, neste capítulo, será feita uma abordagem sobre

os direitos sociais, com ênfase no direito à saúde.

Já no segundo capítulo, será tratado sobre o instituto da tutela antecipada

no ordenamento jurídico brasileiro, o seu conceito e no que ela difere da tutela

cautelar, bem como os pressupostos necessários para a sua concessão.

Por fim, no terceiro capítulo, será demonstrado o dever do Estado em

fornecer assistência à saúde e a possibilidade da concessão da antecipação de

tutela nas ações de tratamento médico, ainda que exista o perigo de seu provimento

não ser reversível, diante da urgência e necessidade desses casos, fundamentado

com jurisprudências do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e

do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina.

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O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações

Finais, nas quais são sintetizadas as contribuições sobre a possibilidade da

concessão da antecipação de tutela no direito à saúde diante do perigo da

irreversibilidade do seu provimento.

Quanto à metodologia empregada, registra-se que foi utilizado o Método

Dedutivo.

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CAPÍTULO 1

1 DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E SOCIAIS

1.1 Conceito de Direitos Fundamentais

O surgimento dos direitos fundamentais, em sua concepção moderna, ocorreu

como consequência da fusão de várias fontes, desde tradições arraigadas nas

diversas civilizações humanas até a conjugação dos pensamentos filosóficos-

jurídicos, das ideias surgidas com o cristianismo e o direito natural1.

Por conseguinte, faz-se necessário explicar do que se tratam os direitos

fundamentais, conceituados por Alkmim da seguinte forma: “são todos aqueles

essenciais à pessoa humana, indispensáveis para assegurar a todos uma existência

digna, livre e igual2.”.

No mesmo sentido, Bulos diz que os direitos fundamentais:

São o conjunto de normas princípios, prerrogativas, deveres e institutos inerentes à soberania popular, que garantem a convivência pacífica, digna, livre e igualitária, independentemente de credo, raça, origem, cor, condição

econômica ou status social3.

Assim, infere-se que, os direitos fundamentais são aquelas posições jurídicas

que se conferem ao ser humano, ou seja, prerrogativas, faculdades e instituições

que nossa Constituição reconhece como indispensáveis para uma convivência

digna, livre e igual a todos as pessoas4.

São empregadas diversas expressões para designar os direitos fundamentais,

tais como: direitos naturais, direitos humanos, direitos do homem, direitos

individuais, direitos públicos subjetivos, liberdades fundamentais, liberdades públicas

e direitos fundamentais do homem5.

1 MORAES, Alexandre apud ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo:

Conceito Editorial, 2011, p. 334. 2 ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011, p.

333. 3 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 8. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2014, p. 525. 4 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e

atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 159. 5 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed., rev. e atual. São Paulo:

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Dentre todas estas expressões, a mais utilizada como sinônimo de direitos

fundamentais é “direitos humanos”, entretanto, Sarlet leciona que tais termos não

podem ser confundidos, ou seja:

Em que pese sejam ambos os termos (“direitos humanos” e “direitos fundamentais”) comumente utilizados como sinônimos, a explicação corriqueira e, diga-se de passagem, procedente para a distinção é de que o termo “direitos fundamentais” se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado, ao passo que a expressão “direitos humanos” guardaria relação com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional, e que, portanto, aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoco caráter supranacional (internacional)6.

Acerca da expressão “direitos humanos”, Silva faz a seguinte definição:

Direitos humanos é a expressão preferida nos documentos internacionais. Contra ela, assim, como contra a terminologia direitos do homem, objeta-se que não há direito que não seja humano ou do homem, afirmando-se que só

o ser humano pode ser titular de direitos7.

Leciona também que a expressão mais adequada para se tratar de direitos

fundamentais é a direitos fundamentais do homem, pois além de se referir a

princípios que resumem a concepção do mundo e informam a ideologia política de

cada ordenamento jurídico, é utilizada para designar as prerrogativas e instituições

que ele concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as

pessoas8.

Importa destacar que direitos e garantias fundamentais não se confundem.

Alkmim leciona que:

[...] os direitos fundamentais estão expressos em normas de natureza declaratória, que estabelecem materialmente estes direitos, ao passo que as garantias encontram-se consignadas em normas assecuratórias, as quais têm o condão de assegurar o pleno exercício dos direitos

fundamentais9.

Malheiros, 2014, p. 177.

6 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed., rev., atual., e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 35-36.

7 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 178.

8 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 180.

9 ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011, p. 339.

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Em síntese, pode-se dizer que os direitos fundamentais são bens e vantagens

prescritos na Constituição, sendo as garantias constitucionais os instrumentos

utilizados para assegurar o exercício de tais direitos10.

Infere-se que os direitos e garantias fundamentais expressos em quase todas

as constituições modernas representam o reconhecimento formal por parte dos

Estados dos direitos intocáveis do homem e a impossibilidade de interferência ou de

violação destes direitos pela vontade das autoridades, representando, desta forma,

uma limitação à atuação do Estado11.

1.2 Características dos Direitos Fundamentais

As principais características que os direitos fundamentais possuem são a

historicidade, inalienabilidade, imprescritibilidade, irrenunciabilidade, universalidade,

limitabilidade, concorrência e complementariedade12.

A historicidade demonstra que os direitos fundamentais não são resultado

apenas de um acontecimento histórico e sim de todo um processo de evolução13.

Alkmim explica que: “esses direitos nascem e modificam-se com o decorrer

do tempo e, por vezes, desaparecem na exata medida em que evolui a

sociedade14.”.

A inalienabilidade dos direitos fundamentais se dá pelo falo de que estes são

intransferíveis e inegociáveis, não possuindo conteúdo econômico-patrimonial. São

direitos que não se encontram à disposição de seu titular, sendo, portanto,

indisponíveis15.

10 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17. Ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 1031. 11 ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011,

p. 334. 12 ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011,

p. 341-342. 13 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e

atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 228. 14 ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011,

p. 341. 15 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed., rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2014, p. 183.

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Outrossim, tais direitos também são irrenunciáveis. O titular do direito não

poderá dispor sobre eles. Embora possa deixar de exercê-los, não poderá renunciá-

los16.

Complementando o acima disposto, ensina Lenza: “o que pode ocorrer é o

seu não exercício, mas nunca sua irrenunciabilidade17.”.

Apesar da possibilidade de não exercer um direito, este não prescreve. Os

direitos fundamentais constituem seguro constitucional do cidadão, que podem ser

exercidos a qualquer tempo, na medida de sua necessidade e não deixam de ser

exigíveis em razão da falta de seu exercício ou pelo decurso do prazo18.

Os direitos fundamentais possuem a característica da universalidade por

serem estendidos a todos os seres humanos, independente de raça, religião, origem

ou condição econômica. Contudo, apesar de abrangerem todos os seres humanos,

alguns direitos só dizem respeito a determinado grupo, como por exemplo, os

direitos dos trabalhadores19.

Igualmente, explica Sarlet acerca da universalidade dos direitos

fundamentais:

De acordo com o princípio da universalidade, todas as pessoas, pelo fato de serem pessoas são titulares de direitos e deveres fundamentais, o que, por sua vez, não significa que não possa haver diferenças a serem consideradas, inclusive, em alguns casos, por força do próprio princípio da igualdade, além de exceções expressamente estabelecidas pela Constituição, como dá conta a distinção entre brasileiro nato e naturalizado,

algumas distinções relativas aos estrangeiros, entre outras20.

Importa destacar que os direitos fundamentais não são absolutos, tendo em

vista que existem limites para o seu exercício quando há colisão entre direitos.

Sobre a limitabilidade dos direitos fundamentais, em sua obra Alkmim nos

ensina que: “na medida em que o exercício de um direito por alguém importar na

16 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e

atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 229. 17 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17. Ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 1032. 18 ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011,

p. 341. 19 MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO, Inocêncio Mártires. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso

de direito constitucional. 4. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 274. 20 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 9. ed. Porto Alegre: Livraria do

Advogado, 2007, p. 229.

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invasão da esfera de direitos de outrem, haverá de ter limitado o seu exercício, ou

seja, havendo colisão de direitos, poderá haver limitação21.”.

A característica da concorrência é explicada da seguinte forma por Cunha

Junior:

Os direitos fundamentais podem ser exercidos cumulativamente. Vale dizer, num mesmo titular podem acumular-se vários direitos, como, por exemplo, o direito de liberdade de manifestação do pensamento com o direito de

reunião ou associação22.

Lenza exemplifica a característica da concorrência da seguinte maneira:

“podem ser exercidos cumulativamente, quando, por exemplo, o jornalista transmite

uma notícia (direito de informação) e, juntamente, emite uma opinião (direito de

opinião)23.”.

Por fim, acerca da característica de complementariedade dos direitos

fundamentais, Moraes apud Alkimim leciona: “os direitos fundamentais não devem

ser interpretados isoladamente, mas sim de forma conjunta, com a finalidade de

alcance dos objetivos previstos pelo legislador constituinte24.”.

Desta feita, demonstradas as características dos direitos fundamentais,

passa-se agora a discorrer sobre as suas dimensões.

1.3 As Dimensões dos Direitos Fundamentais

Os direitos fundamentais são divididos em “dimensões” ou "gerações” de

direito, havendo divergência doutrinária acerca desta nomenclatura, conforme nos

demonstra Sarlet:

Com efeito, não há como negar que o reconhecimento progressivo de novos direitos fundamentais tem o caráter de um processo cumulativo, de complementaridade, e não de alternância, de tal sorte que o uso da expressão “gerações” pode ensejar a falsa impressão da substituição gradativa de uma geração por outra, razão pela qual há quem prefira o

termo “dimensões” dos direitos fundamentais25.

21 ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011,

p. 342. 22 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e

atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 230. 23 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17. Ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 1032. 24 MORAES, Alexandre apud ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São

Paulo: Conceito Editorial, 2011, p. 343. 25 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed., rev., atual., e ampl. Porto

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No mesmo sentido, Lenza explica que existe uma preferência da doutrina

mais atual sobre a expressão “dimensões” a medida de que uma nova “dimensão”

não abandona as conquistas da “dimensão” anterior, se mostrando, assim, a

expressão mais adequada26.

Além da divergência quanto à nomenclatura, a doutrina também diverge

quanto ao número de dimensões existentes dos direitos fundamentais. Alguns

autores tratam apenas da existência da primeira, segunda e terceira dimensões dos

direitos fundamentais, enquanto outras lecionam que tais direitos evoluíram até a

quarta dimensão.

Desse modo, sanadas as dúvidas quanto à nomenclatura utilizada,

prosseguir-se-á com a explicação das quatro dimensões dos direitos fundamentais.

1.3.1 Os Direitos Fundamentais da Primeira Dimensão

Preliminarmente, destaca-se que os direitos fundamentais da primeira

dimensão são os direitos da liberdade, os primeiros a constarem do instrumento

normativo constitucional, quais sejam, os direitos civis e políticos, que dizem

respeito, numa visão histórica, àquela fase inicial do constitucionalismo do

Ocidente27.

Assim, têm-se que os direitos fundamentais da primeira dimensão foram, de

fato, os primeiros direitos solenemente reconhecidos, os quais surgiram através das

declarações setecentistas e das primeiras constituições escritas que surgiram no

constitucionalismo ocidental, como resultado do pensamento liberal-burguês

existente na época28.

Complementando, explica Cunha Junior:

Os direitos da primeira dimensão correspondem às chamadas liberdades públicas dos franceses, compreendendo os direitos civis, entre os quais se destacam, sobretudo pela acentuada e profunda inspiração jusnaturalista, os direitos à vida, à liberdade, à propriedade, à segurança e à igualdade de

Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 54.

26 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17. Ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 1028.

27 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 27 ed. Malheiros Editores: São Paulo, 2012, p. 581

28 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 206.

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todos perante a lei, posteriormente complementados pelos direitos de expressão coletiva (tais como os direitos de reunião e associação) e os direitos políticos (como os direitos de voto, mas de modalidade ativa e

passiva) 29.

Nas palavras de Lenza: “os direitos humanos da 1ª dimensão marcam a

passagem de um Estado autoritário para um Estado de Direito e, nesse contexto, o

respeito às liberdades individuais, em uma verdadeira perspectiva de absenteísmo

estatal 30.”.

Nesse sentido, Bonavides leciona que:

Os direitos da primeira geração ou direitos da liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são direitos de resistência ou de oposição perante o

Estado31.

Sendo assim, em síntese, os direitos fundamentais da primeira dimensão

foram reconhecidos com o objetivo de proteger as pessoas do poder opressivo do

Estado, concebendo, desta forma, como visto acima, os direitos à vida, à liberdade,

à propriedade, à segurança, à igualdade, bem como, os direitos políticos e de

expressão coletiva32.

1.3.2 Os Direitos Fundamentais da Segunda Dimensão

Os direitos fundamentais da segunda dimensão abrangem os direitos sociais,

culturais e econômicos, bem como os direitos coletivos ou da coletividade33.

Assim, esclarece Sarlet:

caracterizam-se, ainda hoje, por outorgarem ao individuo direitos a prestações sociais estatais, como assistência social, saúde, educação, trabalho etc, revelando uma transição das liberdades formais abstratas para

29 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e

atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 206. 30 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17. Ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 1028. 31 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 27 ed. Malheiros Editores: São Paulo,

2012, p. 582. 32 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e

atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 207. 33 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 27 ed. Malheiros Editores: São Paulo,

2012, p. 582.

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as liberdades materiais concretas, utilizando-se a formulação preferida na

doutrina francesa34.

Desta forma, leciona Lenza que, motivado pelas péssimas situações e

condições de trabalho: “o momento histórico que os inspira e impulsiona os direitos

humanos de 2ª dimensão é a Revolução Industrial Europeia, a partir do século

XIX35.”.

Nesse sentido, Chimenti explica que:

Os direitos fundamentais de segunda geração – ou direitos sociais – impõem ao Estado o fornecimento de prestações destinadas ao cumprimento da igualdade e redução dos problemas sociais. Por muito tempo esses direitos tiveram previsão apenas em normas de caráter programático, em razão da necessidade de meios e recursos para a atuação do estado nesse campo. A aplicabilidade direta e imediata dos direitos sociais é recente, dando ao indivíduo direito subjetivo de exigir do Estado prestações positivas, como, por exemplo, o direito subjetivo de assistência à saúde (direito de todos e dever do Estado, conforme dispõe o art. 196 da CF), independentemente de regulamentação por norma

infraconstitucional36.

Cabe destacar que os direitos da segunda dimensão não englobam apenas

direitos de cunho positivo, mas também as denominadas “liberdades sociais”, como

por exemplo, a liberdade de sindicalização e direito de greve. Além disso, nessa

dimensão foram reconhecidos os direitos fundamentais dos trabalhadores, como as

férias e o repouso semanal remunerado, o salário mínimo, a limitação da jornada de

trabalho, entre outros37.

Pelo exposto, infere-se que os direitos fundamentais da segunda geração

surgiram com o intuito de proteger os direitos sociais, culturais e econômicos do

indivíduo, principalmente o direito à saúde, à educação e ao trabalho.

1.3.3 Os Direitos Fundamentais da Terceira Dimensão

34 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed., rev., atual., e ampl. Porto

Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 57. 35 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17. Ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 1029. 36 CHIMENTI, Ricardo Cunha; CAPEZ, Fernando; ROSA, Márcio Fernando Elias; SANTOS, Marisa

Ferreira dos. Curso de Direito Constitucional. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p.47-48. 37 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed., rev., atual., e ampl. Porto

Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 57.

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Os direitos fundamentais da terceira dimensão são considerados direitos

transindividuais, pois ultrapassam os interesses do indivíduo e passam a se

preocupar com a proteção do gênero humano, com grande teor de humanismo e

universalidade38.

Sobre o assunto, Cunha Junior destaca que:

[...] esses direitos caracterizam-se por destinarem-se à proteção, não do homem em sua individualidade, mas do homem em coletividade social, sendo, portanto, de titularidade coletiva ou difusa. Compreendem o direito ao meio-ambiente ecologicamente equilibrado, o direito à segurança, o direito à paz, o direito à solidariedade universal, ao reconhecimento mútuo de direitos entre vários países, à comunicação, à autodeterminação dos

povos e ao desenvolvimento39.

O que diferencia os direitos de terceira dimensão dos demais é a sua

titularidade coletiva, que é muitas vezes indefinida e indeterminável. Tais direitos

também são denominados como direitos de fraternidade ou de solidariedade, pois

não têm apenas a figura do homem-indivíduo como seu titular, e sim buscam a

proteção de grupos humanos, como a família, o povo e a nação40.

Denota-se, portanto, que os direitos fundamentais da terceira dimensão

buscam resguardar os direitos de toda uma coletividade e não apenas do ser

humano individualizado.

1.3.4 Os Direitos Fundamentais da Quarta Dimensão

Inicialmente, destaca-se que existe certa divergência doutrinária quanto aos

direitos fundamentais da quarta dimensão.

Para Bonavides “são direitos da quarta geração o direito à democracia, o

direito à informação e o direito ao pluralismo41.”.

38 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17. Ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 1030. 39 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e

atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 216. 40 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed., rev., atual., e ampl. Porto

Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 58. 41 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 27 ed. Malheiros Editores: São Paulo,

2012, p. 590.

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19

Já para Bobbio, tais direitos decorrem dos avanços no campo da engenharia

genética, que colocam em risco a própria existência humana, por meio da

manipulação do patrimônio genético42.

Afirma o referido autor que os direitos da quarta geração se referem “aos

efeitos cada vez mais traumáticos da pesquisa biológica, que permitirá

manipulações do patrimônio genético de cada indivíduo43.”.

Ainda mais, Cruz leciona que a quarta geração de direitos abrange as

descobertas feitas na área da ciência:

O constitucionalismo recente passou a levar em conta os avanços alcançados pela ciência nas áreas de informática – espaços virtuais, comunicação via internet etc – e da manipulação genética – clonagem, reprodução assistida, transgênicos, etc. – que devem estar regulados nas constituições como forma de proteção à essência do ser humano e como proteção a criança dos ditos “seres genéticos”, que podem ser utilizados para fins ignóbeis. Estas previsões são denominadas (ainda que de forma

incipiente) de “direitos de Quarta geração” 44.

Verifica-se, portanto, que diferentemente das três primeiras dimensões, esta

ainda é fonte de discussão, tanto pela sua existência, quanto pela sua abrangência.

1.4 Conceito de Direitos Sociais

Os direitos sociais, direitos de segunda dimensão, são prestações positivas

proporcionadas pelo Estado, enunciadas em normas constitucionais, que

possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, sendo direitos que buscam

igualar situações desiguais45.

Sob o mesmo ponto de vista, Alkmim esclarece que:

[...] por direitos sociais entende-se o conjunto de direitos de conteúdo econômico e social que visam à melhoria das condições de vida e de trabalho de todos. São prestações positivas do Estado em prol do cidadão, em especial dos menos favorecidos e dos setores economicamente mais fracos da sociedade. Exemplos de direitos sociais são o direito à saúde, à

educação, ao lazer etc46.

42 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17. Ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 1030. 43 BOBBIO, Noberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 6. 44 CRUZ, Paulo Márcio. Fundamentos do direito constitucional. Curitiba: Juruá, 2002, p. 138. 45 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed., rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2014, p. 288-289. 46 ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011,

p. 515.

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É importante destacar que tais prestações são consideradas positivas, pois

revelam um fazer por parte dos órgãos do Estado, que têm a incumbência de

realizar serviços para concretizar os direitos sociais, tais como serviços escolares,

médico-hospitalares, assistenciais previdenciários, entre outros47.

Tais direitos estão previstos no art. 6º, da Constituição Federal, que dispõe

que: “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia,

o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a

assistência aos desamparados, na forma desta Constituição48.”.

Os direitos relativos aos trabalhadores urbanos e rurais foram disciplinados

nos artigos 7º a 11, enquanto que os demais direitos se encontram disciplinados no

título VIII, “Da ordem social”, da Constituição Federal49.

Quanto à classificação, Silva a faz com base nos arts. 6º a 11, da Constituição

Federal, do seguinte modo:

a) direitos sociais relativos ao trabalhador; b) direitos sociais relativos à seguridade, compreendendo os direitos à saúde, à previdência e a assistência social; c) direitos sociais relativos à educação e à cultura; d) direitos sociais relativos à moradia; e) direitos sociais relativos à família, criança, adolescente e idoso; f) direitos sociais relativos ao meio

ambiente50.

Desta forma, após conceituar os direitos sociais, passa-se agora ao estudo de

um direito social específico, qual seja, o direito à saúde, que está compreendido nos

direitos sociais relativos à seguridade social.

1.5 Direito à Saúde

Preliminarmente, é necessário frisar que a busca pela saúde é uma realidade

presente desde os primórdios da humanidade. Em um primeiro momento, a

humanidade pensou a saúde como forma de eliminar os males que a afligiam. No

47 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 8. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2014, p. 809. 48 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br.

Acesso em 26 abr. 2015. 49 ALKMIM, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011,

p. 520. 50 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed., rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2014, p. 289.

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decorrer da história do mundo, os seres humanos foram acometidos por doenças

que ameaçaram sua sobrevivência e a única forma de conhecimento disponível para

rebater tais enfermidades era a magia. Denota-se a existência de curandeiros,

xamãs e feiticeiros nas sociedades mais primitivas, os quais eram responsáveis pela

cura dos males que afetavam os seres humanos 51.

No decorrer da história da humanidade, tinha-se a ideia de que saúde era

apenas a ausência de doenças. Entretanto, tal conceito foi alargado, tendo como

marco o preâmbulo da Constituição da Organização Mundial da Saúde, que se

referia a saúde como um completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a

ausência de doenças52.

Bulos corrobora com a ideia ao lecionar que: “saúde é o estado de completo

bem-estar físico, mental e espiritual do homem, e não apenas a ausência de

afecções e doenças53.”.

A Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na história do direito

brasileiro, elevou a saúde à condição de direito fundamental, relevando a

preocupação de constitucionalizar a saúde, vinculando-a à seguridade social, tendo

os constituintes compreendido que a vida humana é o bem supremo, que merece

amparo na Lei Maior54.

Rocha conceitua a saúde da seguinte forma:

A conceituação da saúde deve ser entendida como algo presente: a concretização da sadia qualidade de vida, uma vida com dignidade. Algo a ser continuadamente afirmado diante da profunda miséria porque atravessa a maioria da nossa população. Consequentemente, a discussão e a compreensão da saúde passa pela afirmação da cidadania plena e pela aplicabilidade dos dispositivos garantidores dos direitos sociais da

Constituição Federal55.

51 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 28-29. 52 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 35. 53 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 8. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2014, p. 1562. 54 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 8. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2014, p. 1562. 55 ROCHA, Júlio César de Sá da. Direito da Saúde: direito sanitário na perspectiva dos interesses

difusos e coletivos. São Paulo: LTr, 1999, p. 43.

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Cunha Junior entende que o direito social à saúde é tão fundamental por estar

mais diretamente ligado ao direito à vida, que nem precisava de reconhecimento

explícito56.

Desta forma, verifica-se que o direito à saúde é imprescindível, tanto que

recebeu artigo próprio na Constituição Federal, conforme se demonstra:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para

sua promoção, proteção e recuperação57.

Explicando o artigo acima, esclarece Silva:

A saúde é concebida como direito de todos e dever do Estado, que a deve garantir mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e outros agravos. O direito à saúde rege-se pelos princípios da universalidade e da igualdade de acesso às ações e serviços que a

promovem, protegem e recuperam58.

No mesmo sentido, acerca do art. 196, da Constituição Federal, Schwartz

ensina que:

Quando fala em "recuperação", a CF/88 está conectada ao que se convencionou chamar de saúde "curativa"; os termos "redução do risco de doença" e "proteção" estão claramente ligados à saúde "preventiva", e a

"promoção" é a qualidade de vida59.

Para a efetivação do direito à saúde, é necessário o cumprimento de

prestações positivas e negativas. Nas prestações positivas, deve o Poder Público

tomar medidas preventivas ou paliativas no combate e no tratamento de doenças. Já

na negativa, deve o Estado abster-se de praticar atos que criem obstáculos no

efetivo exercício desse direito fundamental60.

Confirma-se, então, que a saúde é, senão o primeiro, um dos principais

componentes da vida, seja como pressuposto indispensável para sua existência,

56 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e

atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 312. 57 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br.

Acesso em 26 abr. 2015. 58 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed., rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2014, p. 831. 59 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 27. 60 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 8. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,

2014, p. 1563.

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seja como elemento agregado à sua qualidade. Assim, a saúde se conecta

diretamente ao direito à vida61.

Os direitos sociais, principalmente o que diz respeito à saúde, representam

uma garantia constitucional das condições mínimas e indispensáveis para uma

existência digna, sendo o princípio da dignidade humana o seu melhor

fundamento62.

Igualmente, Sarlet se posiciona da seguinte forma:

[...] é no âmbito do direito à saúde, igualmente integrante do sistema de proteção da seguridade social (juntamente com a previdência e a assistência social), que se manifesta de forma mais contundente a vinculação do seu objeto (prestações materiais na esfera da assistência médica, hospitalar, etc), com o direito à vida e ao princípio da dignidade da

pessoa humana63.

Acerca do direito à saúde, assim assevera Silva:

É espantoso como um bem extraordinariamente relevante à vida só agora é elevado à condição de direito fundamental do homem. E há de informar-se pelo princípio de que o direito igual à vida de todos os seres humanos significa também que, nos casos de doença, cada um tem o direito a um tratamento condigno de acordo com o estado atual da ciência médica, independentemente de sua situação econômica, sob pena de não ter muito valor sua consignação em normas constitucionais64.

Infere-se, desse modo, que o direito à saúde é um direito social fundamental

que visa assegurar, indistintamente, uma existência digna para as pessoas, não

apenas no sentido de curar e prevenir doenças, mas sim de promover uma melhor

qualidade de vida para todos, cabendo ao Poder Público proporcioná-la.

Ademais, haja vista que o enfoque deste trabalho científico se trata da

irreversibilidade da tutela antecipada nas demandas de tratamento de saúde, será

tratado em capítulo próprio o dever do Estado em fornecer assistência à saúde.

Ainda, destaca-se que no próximo capítulo será estudado o instituto da tutela

antecipada no ordenamento jurídico brasileiro, demonstrando o seu conceito e

requisitos.

61 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 52. 62 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2. ed., rev. e

atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 314. 63 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed., rev., atual., e ampl. Porto

Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 340. 64 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27. ed., rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2006, p. 308.

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CAPÍTULO 2

2 A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

2.1 A Tutela Antecipada no Ordenamento Jurídico Brasileiro

Inicialmente, destaca-se que a antecipação de tutela já existe no

ordenamento processual brasileiro antes mesmo da sua introdução pela Lei n.

8.952/94, que deu nova redação ao art. 273, do Código de Processo Civil65, que

assim dispõe:

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. § 1o Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento. § 2o Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. § 3o A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A. § 4o A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. § 5o Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento. § 6o A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. § 7o Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo

ajuizado66.

Anterior à lei, existiam outras medidas judiciais que tinham essa natureza,

embora não tivessem o nome de tutela antecipada. O que a lei fez foi estender a

possibilidade de concedê-las em qualquer ação, desde que preenchidos os seus

requisitos67. Nesse sentido, Gonçalves leciona:

65 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev.

ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1535. 66 BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869compilada.htm>. Acesso em 18 mai. 2015. 67 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual. -

São Paulo: Saraiva, 2014, p. 691.

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Essas medidas, cuja natureza era de antecipação de tutela, só podiam ser concedidas em algumas ações de rito especial, como nas de alimentos ou possessórias— desde que preenchidos requisitos específicos previstos pelo legislador. Inexistia a antecipação em ações de procedimento comum, ou de

procedimento especial, para a qual não havia previsão de liminares68.

Além disso, o Código de Defesa do Consumidor, anterior a reforma do art.

273, já havia previsto a possibilidade dessa antecipação, especificamente nas

obrigações de fazer ou não fazer, no âmbito das relações de consumo. A nova

redação do art. 273, do Código de Processo Civil, trouxe a possibilidade da

concessão da antecipação de tutela em todos os processos de conhecimento, desde

que preenchidos os requisitos gerais69.

Dessa forma, infere-se que a Lei n. 8.952/94 não criou o instituto da tutela

antecipada, e sim converteu em regra geral o que já estava prescrito para aquelas

situações particulares70.

Essa ampliação teve como fundamento o princípio da inafastabilidade do

controle jurisdicional, previsto no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, que não

assegura apenas o acesso formal aos órgãos judiciários, mas sim o acesso à Justiça

de forma efetiva e tempestiva71.

Nessa direção, Wambier entende que:

Assim, a antecipação de tutela pretendida pela parte (que, em princípio somente ao final, com a sentença, é que seria deferida) consiste em fenômeno processual de raízes nitidamente constitucionais, já que, para que seja plenamente aplicado o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, previsto na Constituição, é necessário que a tutela prestada seja efetiva e eficaz. A função da antecipação da tutela é a de permitir que a

proteção jurisdicional seja oportuna, adequada e efetiva72.

68 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual. -

São Paulo: Saraiva, 2014, p. 691. 69 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume l: teoria

geral e processo de conhecimento (1a parte). 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 269. 70 LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 3. ed. São Paulo: RT, 2007,

p. 47. 71 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 684.

72 WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento, volume 1. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 413-414.

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Assim, depreende-se que o instituto da tutela antecipada foi instituído no

ordenamento processual brasileiro com o objetivo de prestar de forma mais célere e

eficaz o acesso à justiça.

2.2 Conceito

A tutela antecipada consiste na possibilidade do juiz antecipar, total ou

parcialmente, os efeitos que só seriam obtidos com a sentença73.

Em outras palavras, Theodoro Júnior ensina que: “o juiz, antes de completar a

instrução e o debate da causa, antecipa uma decisão de mérito, dando provisório

atendimento ao pedido, no todo ou em parte74.”.

Sendo assim, há antecipação de tutela quando o juiz concede à parte um

provimento que, de ordinário, somente ocorreria depois de exaurida a apreciação de

toda a controvérsia e prolatada a sentença definitiva75.

Acerca do assunto, Gonçalves explica:

Ao antecipar os efeitos da sentença, ela permite que o favorecido obtenha os mesmos benefícios que só adviriam com a sua prolação. Se o pedido era condenatório, a concessão de tutela antecipada permitirá ao autor dar início, desde logo, ao processo de execução, para exigir a quantia ou o bem que lhe foram provisoriamente atribuídos; se o pedido era declaratório ou constitutivo, ela permitirá ao autor beneficiar-se, desde logo, das consequências que da declaração, constituição ou desconstituição da relação jurídica resultariam. Por exemplo, se for ajuizada uma ação declaratória de inexigibilidade de um título de crédito, a antecipação trará ao autor os mesmos benefícios que só adviriam com a sentença definitiva,

inclusive o de sustar ou cancelar o protesto do título em cartório76.

O benefício obtido com a antecipação de tutela tem caráter provisório, pois

somente com a sentença de procedência, ou do acórdão, havendo recurso, é que

seus efeitos se tornarão definitivos77.

73 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual. -

São Paulo: Saraiva, 2014, p. 692. 74 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 686.

75 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 686.

76 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume l: teoria geral e processo de conhecimento (1a parte). 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 271.

77 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2014, p. 692.

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27

A tutela antecipada não se trata de uma faculdade ou uma discricionariedade

do juiz, mas sim de um direito que a parte pode exigir do judiciário, desde que

respeitadas as exigências da lei78.

Ainda, cabe destacar que a tutela antecipada não se confunde com a

cautelar. Na tutela antecipada, há o adiantamento total ou parcial da providência

final. Já na tutela cautelar, concede-se uma providência destinada a conservar uma

situação até que seja dado o provimento final, sendo que a providência conservativa

não é a mesma que se espera com o provimento final79.

Gonçalves ensina o seguinte quanto às diferenças da tutela antecipada e da

cautelar:

Todavia, elas diferem no modo pelo qual afastam a situação de perigo: a tutela cautelar não concede, antecipadamente, aquilo que foi pedido, mas busca resguardar e proteger a futura eficácia do provimento final. Ela não satisfaz a pretensão do autor, não é uma tutela de mérito. O que faz é

proteger, resguardar e assegurar o provimento final80.

A tutela antecipada tem natureza satisfativa, posto que o juiz concede os

efeitos que só poderiam ser concedidos ao final do processo. Já na cautelar, o juiz

não concede os efeitos pedidos, mas sim defere uma medida protetiva que assegura

o direito do autor81.

Ainda, há distinção entre as medidas no que diz respeito aos seus requisitos.

Na tutela antecipada estes são mais numerosos e rígidos do que nas medidas

cautelares82.

Para o deferimento da tutela cautelar, basta que estejam presentes os

requisitos do periculum in mora e do fumus boni iuris. Já na tutela antecipada, é

necessário que o juiz se convença da verossimilhança da alegação por meio de uma

prova inequívoca, além de ter que ser demonstrado que a situação traz um fundado

78 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 686. 79 WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: teoria geral

do processo e processo de conhecimento, volume 1. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 418.

80 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume l: teoria geral e processo de conhecimento (1a parte). 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 271.

81 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2014, p. 692.

82 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 697.

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receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou ainda que fique caracterizado o

abuso de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu83.

Infere-se, então, que a antecipação de tutela é a possibilidade da parte obter

uma providência que só seria possível ao final do processo, desde que respeitados

os seus requisitos, que por sua vez são mais rígidos que os da tutela cautelar.

Após verificar o conceito da tutela antecipada e suas diferenças para a tutela

cautelar, passa-se agora ao estudo dos citados requisitos para a sua concessão.

2.3 Requisitos para a Concessão da Tutela Antecipada

Os primeiros requisitos que deverão ser observados para a concessão da

antecipação da tutela estão dispostos no caput do art. 273, do Código de Processo

Civil, sendo eles o requerimento da parte, a prova inequívoca e a verossimilhança da

alegação.

Observados estes requisitos, o referido artigo ainda condiciona o deferimento

da tutela antecipada aos pressupostos previstos nos seus incisos I e II e no §6º84.

Importante esclarecer que estes últimos requisitos podem ser observados de

maneira alternativa, ou seja, não é necessário que sejam percebidos de maneira

conjunta, bastando apenas a constatação de um deles para que seja possível a

antecipação de tutela85.

Por fim, destaca-se ainda o requisito existente no § 2º do referido artigo, que

determina: “não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de

irreversibilidade do provimento antecipado86.”.

Esclarecidos quais são os pressupostos necessários para o deferimento da

tutela antecipada, far-se-á o estudo de cada um deles, de forma individual.

83 BENASSI, Marcos Antonio. Tutela antecipada em caso de irreversibilidade. Campinas:

Bookseller, 2001, p. 74-75. 84 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 692.

85 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1540.

86 BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869compilada.htm>. Acesso em 18 mai. 2015.

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2.3.1 Requerimento da parte

O caput do art. 273, do Código de Processo Civil, preceitua que para que

possam ser antecipados os efeitos da tutela, é imprescindível que haja pedido, ou

seja, sem provocação da parte não há como antecipar os efeitos da tutela87.

Entende-se por parte quem pleiteia o reconhecimento de algum direito

material, sendo assim, não somente o autor poderá requerê-la, mas também o réu,

nos casos das ações dúplices88.

Nesse sentido, assim leciona Wambier:

Em princípio, o pedido de antecipação de tutela é formulado pelo autor. Autor é quem formula a pretensão, quem traça os limites e determina os contornos da lide. Autor, no processo, é, além daquele que apresenta a petição inicial, o oponente, o denunciante, o reconvinte, o que apresenta declaratória incidental, o assistente litisconsorcial do autor etc. O assistente simples e o Ministério Público (na mera condição de fiscal da lei) podem também formular pedido de tutela antecipada, mas a antecipação dos efeitos da sentença beneficiará ou atingirá autor e réu, não a ele (assistente

e MP) que são terceiros89.

Acerca do assunto, esclarece Marinoni:

A tutela antecipada tem que ser requerida pela parte. Excepcionalmente, em casos graves e de evidente disparidade de armas entre as partes, contudo, à luz da razoabilidade, é possível antecipar a tutela de ofício no processo civil brasileiro. O assistente simples pode requerer a antecipação de tutela em favor da parte assistida, o réu pode pleitear a antecipação de tutela nos casos em que propõe reconvenção e quando em causa uma ação dúplice (por exemplo, ação de prestação de contas). Atuando como fiscal da lei, pode o Ministério Público requerer a antecipação de tutela a favor da

parte90.

Verifica-se que, em regra, é necessário o pedido expresso do autor para que

seja concedida a tutela. Quando o processo versar sobre interesses disponíveis, não

será possível sua concessão de ofício pelo juiz. Entretanto, se o processo versar

87 WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: teoria geral

do processo e processo de conhecimento, volume 1. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 421.

88 DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 18. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Atlas, 2014, p. 436.

89 WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento, volume 1. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 421.

90 MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil: comentado artigo por artigo. 5. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 268.

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sobre interesse indisponível, havendo risco de prejuízo irreparável ou de difícil

reparação, o juiz poderá, de forma excepcional, concedê-la91.

Infere-se, portanto, que de forma geral, como preceitua o caput do art. 273, do

Código de Processo Civil, é necessário que haja pedido expresso da parte para que

possível a antecipação de tutela, sendo vedado ao juiz concedê-la de ofício.

2.3.2 Prova Inequívoca

Outro requisito para que o juiz conceda a antecipação de tutela, previsto no

caput do art. 273, do Código de Processo Civil, é de que exista prova inequívoca

que o convença da verossimilhança da alegação.

Acerca do tema, Theodoro Júnior ensina:

Por se tratar de medida satisfativa tomada antes de completar-se o debate e instrução da causa, a lei a condiciona a certas precauções de ordem probatória. Mais do que a simples aparência de direito (fumus boni iuris) reclamada para as medidas cautelares, exige a lei que a antecipação de

tutela esteja sempre fundada em “prova inequívoca92.”.

É inequívoca, segundo o referido autor, “a prova capaz, no momento

processual, de autorizar uma sentença de mérito favorável à parte que invoca a

tutela antecipada, caso pudesse ser a coisa julgada desde logo93.”.

Na lição de Klippel, a prova inequívoca “nada mais é do que qualquer prova

lícita que sirva para demonstrar a verossimilhança das alegações fáticas do

requerente94.”.

Em outras palavras, entende-se por prova inequívoca aquela capaz de

convencer o juiz de que a parte é titular do direito material disputado95.

91 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual. -

São Paulo: Saraiva, 2014, p. 694. 92 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 691.

93 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 691.

94 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1548.

95 DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 18. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Atlas, 2014, p. 438.

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Ainda, Friede leciona que a prova inequívoca “é aquela que possibilita uma

fundamentação convincente do magistrado. Ela é convincente, inequívoca, isto é,

prova que não permite equívoco, engano, quando a fundamentação que nela

assenta é dessa natureza96.”.

A parte deverá fundamentar seu pedido em prova preexistente, que não

precisa ser necessariamente documental. Tal prova, no entanto, deverá ser clara,

evidente, portadora de grau de convencimento que não deixe dúvidas a seu

respeito97.

Ao requerer a tutela antecipada, a parte pode valer-se de provas

documentais, testemunhais ou periciais antecipadamente realizadas, e também de

laudos ou pareceres de especialistas, que poderão substituir a prova pericial, em

vista da urgência98.

Constata-se, portanto, que a prova inequívoca é requisito indispensável para

a concessão da tutela antecipada. A parte deverá demonstrá-la de forma que

possibilite o convencimento do juiz acerca do direito que postula.

2.3.3 Verossimilhança das alegações

Analisar-se-á, nesse momento, o pressuposto previsto no caput do art. 273,

do Código de Processo Civil, que diz respeito à verossimilhança das alegações.

Inicialmente, cabe demonstrar o significado de “verossimilhança” segundo o

dicionário:

De verossímil (plausível) entende-se a plausibilidade, a probabilidade de ser. A verossimilhança resulta das circunstâncias que apontam certo fato, ou certa coisa, como possível, ou como real, mesmo que não se tenham deles provas diretas99.

Dessa forma, pode-se entender o pressuposto da verossimilhança no

precitado artigo como um “juízo de probabilidade”, que significa que as alegações 96 FRIEDE, Reis. Tutela antecipada, tutela específica e tutela Cautelar. 4. ed. Belo Horizonte: Del

Rey, 1997, p. 75. 97 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 691.

98 MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil, volume 2: processo de conhecimento. 6.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 208.

99 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro, 2004, p. 1477.

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fáticas e jurídicas apresentadas, em um juízo sumário e prévio ao mérito, mostram-

se provavelmente verídicas100.

Nessa direção, assim afirma Theodoro Júnior:

Quanto à “verossimilhança da alegação”, refere-se ao juízo de convencimento a ser feito em torno de todo o quadro fático invocado pela parte que pretende a antecipação de tutela, não apenas quanto à existência de seu direito subjetivo material, mas também e, principalmente, no relativo ao perigo de dano e sua irreparabilidade, bem como ao abuso dos atos de

defesa e de procrastinação praticados pelo réu101.

Nos ensinamentos de Bueno, “é a prova inequívoca que conduz o magistrado

a um estado de verossimilhança da alegação. Verossimilhança no sentido de que o

que foi narrado e provado ao magistrado parece ser verdadeiro102.”.

A lei preceitua que o juiz, com base nos elementos que constam nos autos,

não deve analisar a certeza de um direito, mas sim a plausibilidade da sua

existência103.

Marinoni pondera que a verossimilhança a ser exigida pelo julgador deve

sempre considerar o valor do bem jurídico ameaçado, a dificuldade de se provar a

alegação, a credibilidade da alegação e a própria urgência104.

Donizetti ressalva que:

A verossimilhança guarda relação com a plausibilidade do direito invocado, com o fumus boni iuris. Entretanto, na antecipação da tutela, exatamente porque se antecipam os efeitos da decisão de mérito, exige-se mais do que

a fumaça: exige-se a verossimilhança, a aparência do direito105.

O requisito da verossimilhança se assemelha ao fumus boni iuris das

cautelares no sentido de que a cognição do juiz é feita com base em mera

probabilidade. Entretanto, é possível distingui-las já que a plausibilidade há de ser

100 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev.

ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1547. 101 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 692.

102 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 4: tutela antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 37.

103 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume l: teoria geral e processo de conhecimento (1a parte). 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 274.

104 MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil: comentado artigo por artigo. 5. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 269.

105 DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 18. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Atlas, 2014, p. 438.

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maior para a concessão da tutela antecipada do que para a cautelar, exigindo um

exame mais rigoroso por parte do juiz106.

Verifica-se, dessa forma, que demonstrar a verossimilhança das alegações é

pressuposto fundamental para que seja concedida a tutela antecipada, devendo a

parte fazê-la por meio de uma prova inequívoca.

2.3.4 Fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação

A lei exige que a parte demonstre o fundado receio de dano irreparável ou de

difícil reparação para que seja possível o deferimento do pedido de tutela

antecipada.

Dessa forma, o requerente deverá demonstrar que se encontra em uma

determinada situação em que não é possível aguardar o desfecho do processo, sem

que isso lhe traga graves consequências. A concessão da medida serve para evitar

que o dano ocorra, persista ou se agrave107.

Nas palavras de Bueno:

Esse “perigo de demora da prestação jurisdicional” deve ser entendido no sentido de que a tutela jurisdicional deve ser prestada (e, para os fins presentes, antecipada), como forma de evitar a perpetuação da lesão a

direito ou como forma de imunizar ameaça a direito do autor108.

Gonçalves assevera que: “não basta um temor subjetivo da parte. É preciso

que haja elementos objetivos que levem ao convencimento de que o dano ocorrerá

ou se agravará, se a tutela não for concedida109.”.

Nesse sentido, Theodoro Júnior afirma:

Receio fundado é o que não provém de simples temor subjetivo da parte, mas que nasce de dados concretos, seguros, objeto de prova suficiente para autorizar o juízo de verossimilhança, ou de grande probabilidade em

torno do risco de prejuízo grave110.

106 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume l: teoria

geral e processo de conhecimento (1a parte). 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 274. 107 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume l: teoria

geral e processo de conhecimento (1a parte). 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 275. 108 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 4: tutela

antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 40.

109 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2014, p. 696.

110 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e

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Marinoni ensina que: “o dano que enseja a tutela antecipatória é o dano

concreto (não eventual), atual (iminente ou consumado) e grave (capaz de lesar

significativamente a esfera jurídica da parte)111.”.

Faz-se necessário destacar que o dano irreparável é aquele que os seus

efeitos já não são mais reversíveis. Já o dano de difícil reparação é aquele que se

pressupõe que o dano não será reparado de maneira efetiva112.

Ressalta-se, ainda, que os simples inconvenientes causados pela demora

processual não justificam a antecipação de tutela113.

Em suma, tal pressuposto, previsto no inciso I, do art. 273, do Código de

Processo Civil, nada mais é do que o dever do autor de comprovar o periculum in

mora que suportará caso não obtenha a antecipação de tutela114.

2.3.5 Caracterização do Abuso do Direito de Defesa ou Manifesto Propósito

Protelatório do Réu

Além do pressuposto do periculum in mora estudado anteriormente, outras

duas situações autorizam a antecipação de tutela. Estas situações não encontram

respaldo na urgência, mas sim na efetiva e célere prestação da tutela jurisdicional115.

O inciso II, do art. 273, do Código de Processo Civil, preceitua que, ficando

caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do

réu, o juiz poderá antecipar os efeitos da tutela116.

Marinoni comenta o referido artigo da seguinte maneira:

Quando o legislador instituiu a tutela antecipatória baseada em abuso de direito de defesa ou contra manifesto propósito protelatório do réu, ele

atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 692.

111 MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil: comentado artigo por artigo. 5. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 267.

112 MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil: comentado artigo por artigo. 5. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 267.

113 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 693.

114 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1553.

115 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1554.

116 BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869compilada.htm>. Acesso em 18 mai. 2015.

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estava querendo evitar que o autor fosse prejudicado, e o réu consequentemente beneficiado, pelo tempo do processo. Assim, o legislador pensou no tempo do processo como um ônus, que deve ser

repartido igualmente entre o autor e o réu117.

Observa-se este requisito quando o réu suscita defesas ou argumentos

inconsistentes apenas para ganhar tempo, ou incidentes protelatórios, para retardar

o julgamento118.

Na lição de Theodoro Júnior: “o abuso do direito de defesa ocorre quando o

réu apresenta resistência à pretensão do autor, totalmente infundada ou contra

direito expresso, e, ainda, quando emprega meios ilícitos ou escusos para forjar sua

defesa119.”.

As seguintes condutas, não lição de Klippel, caracterizam o abuso de defesa,

dado o caráter protelatório do réu:

[...] durante a demanda, o requerido: (i) apresenta defesa flagrantemente contrária à prova dos autos; (ii) realiza a retirada dos autos de cartório, devolvendo-os somente após solicitação do magistrado; (iii) requer, a todo momento, a juntada e a manifestação do magistrado sobre documentos irrelevantes, bem como a produção de provas imprestáveis; sucessivamente realiza pedidos de reconsideração e a interposição de recursos incabíveis

ou manifestamente protelatórios etc120.

Outros exemplos que podem ser citados são os pedidos de provas

impertinentes, a demora em cumprir as determinações judiciais e a suscitação de

incidentes processuais descabidos121.

Defender-se é um direito do réu, mas deve ser exercido dentro dos padrões

da legalidade e da probidade122. Ainda que esteja previsto na Constituição Federal o

direito à ampla defesa, o réu não poderá valer-se desta garantia de forma

abusiva123.

117 MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil: comentado artigo

por artigo. 5. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 267. 118 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual.

- São Paulo: Saraiva, 2014, p. 696. 119 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 693.

120 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1555.

121 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume l: teoria geral e processo de conhecimento (1a parte). 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 276.

122 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1554.

123 TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. Cadernos de processo civil, 9: antecipação dos efeitos da

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Ainda, cabe ressaltar que é especialmente em torno dos atos praticados

extrajudicialmente que se pode caracterizar o propósito protelatório do réu124.

Nesse sentido, assim ensina Bueno:

Merece ser prestigiado o entendimento de que também os atos extraprocessuais praticados pelo réu com ânimo de postergar eventual solução jurisdicional do conflito podem sensibilizar o magistrado para o

deferimento da medida125.

E exemplifica:

Assim, por exemplo, quando o réu cria embaraços desnecessários (devidamente documentados por notificações, cartas com aviso de recebimento ou e-mails), em negociação que antecede – e que acabam por justificar – a necessidade da busca da tutela jurisdicional, ou quando se constata, antes do ingresso em juízo, dilapidação do patrimônio do réu ou a prática de atos voltados ao mesmo fim126.

Dessa forma, infere-se que tal dispositivo foi criado a fim de prestar

efetividade ao processo, punindo, de certa forma, o réu que abusa do seu direito de

defesa, com o claro objetivo de atrasar a prestação da tutela definitiva127.

2.3.6 Reversibilidade da Medida

O art. 273, § 2º, do Código de Processo Civil, dispõe que: “não se concederá

a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento

antecipado128.”.

Inicialmente, cabe esclarecer que a irreversibilidade de que trata o referido

artigo não é a do provimento em si, pois este, em princípio, poderá ser revertido,

mas sim dos efeitos que ele produz129.

tutela. São Paulo: LTr, 1999, p. 40.

124 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 693.

125 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 4: tutela antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 43.

126 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 4: tutela antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 44.

127 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1555.

128 BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869compilada.htm>. Acesso em 18 mai. 2015.

129 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual.

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Sobre essa questão, elucida Klippel:

Inicialmente, vale destacar que o presente dispositivo trata do perigo de irreversibilidade dos efeitos práticos do provimento antecipado, e não do que se poderia chamar de irreversibilidade jurídica do provimento, pois, como visto anteriormente, este é provisório e temporário, podendo ser revogado a qualquer momento pelo órgão julgador, como por exemplo, em

juízo de reconsideração ou por recurso de agravo de instrumento130.

Wambier entende que: “a tutela antecipada deve ser reversível, isto é, as

suas consequências de fato devem ser reversíveis, no plano empírico. Deve ser

possível o retorno ao status quo ante131.”.

Acerca do assunto, assim se posiciona Nery Júnior:

A norma fala na inadmissibilidade da concessão da tutela antecipada quando o provimento for irreversível. O provimento nunca é irreversível, porque provisório e revogável. O que podem ser irreversíveis são as consequências de fato ocorridas pela execução da medida, ou seja, os efeitos decorrentes de sua execução. De toda sorte, essa irreversibilidade não é óbice intransponível à concessão do adiantamento, pois, caso o autor seja vencido na demanda, deve indenizar a parte contrária pelos prejuízos

que ela sofreu com a execução da medida132.

Tal posicionamento é contrário ao de Theodoro Júnior, que ensina que a

medida só é realmente reversível quando aferida dentro dos limites do processo em

que a antecipação ocorre. Se para restaurar o status quo se torna necessário o

futuro ajuizamento de uma ação indenizatória, não será cabível a antecipação de

tutela, pois esta não poderá ser justificada na vaga possibilidade de a parte

prejudicada ser indenizada futuramente por aquele que se beneficiou da medida133.

No mesmo sentido, elucida Bermudes apud Friede:

Urge que a providência antecipada não produza resultados irreversíveis, isto é, resultados de tal ordem que tornem impossível a devolução da situação ao seu estado anterior. Assim, dispõe o § 2º, que restringiu o âmbito da tutela antecipada, só a admitindo sem risco de irreversibilidade. Diante desse dispositivo, assaz limitador, não se admite a antecipação

- São Paulo: Saraiva, 2014, p. 697.

130 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1550.

131 WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento, volume 1. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 423.

132 NERY JÚNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante.10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 529.

133 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 695

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quando a irreversibilidade só puder ser reparada em dinheiro. É preciso que o quadro fático, alterado pela tutela, possa ser recomposto134.

Dessa forma, o legislador restringiu a concessão da tutela antecipada à sua

reversibilidade como um meio de preservar o adversário contra os excessos

empregados na medida, o que ocorria com o uso das cautelares. Sendo assim, ao

mesmo tempo em que foi ampliada a possibilidade de se antecipar os efeitos da

tutela para qualquer procedimento, procurou-se delimitar com precisão a sua área

de incidência135.

Destarte, após o estudo do instituto da tutela antecipada e de seus requisitos,

verificar-se-á no próximo capítulo o dever do Estado em fornecer assistência à

saúde, bem como a possibilidade do magistrado conceder a antecipação de tutela

diante de sua irreversibilidade nas demandas que dizem respeito ao direito à saúde.

134 BERMUDES, Sérgio apud FRIEDE, Reis. Tutela antecipada, tutela específica e tutela Cautelar.

4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 96. 135 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório,

ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. v. 2. 8. ed. rev. e atual. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 554.

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CAPÍTULO 3

3 IRREVERSIBILIDADE DA TUTELA ANTECIPADA APLICADA NO DIREITO À

SAÚDE

3.1 O Dever do Estado em Fornecer Assistência à Saúde

Como estudado anteriormente, o direito à saúde está previsto na Constituição

Federal como um direito social fundamental, sendo um direito de todos e dever do

Estado, nos termos do art. 196.

Inicialmente, destaca-se a necessidade de estabelecer o vínculo existente

entre o direito à saúde e o Estado Democrático de Direito, pois, nas palavras de

Schwartz: “a questão do Estado Democrático de Direito x Direito à Saúde é,

portanto, um dos principais vetores da problemática sanitária brasileira136.”.

Conforme previsão expressa do artigo 1º da Constituição Federal vigente, o

Brasil é estabelecido como um Estado Democrático de Direito, conforme se expõe:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político137.

Sendo assim, a tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito consiste

em superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime democrático

que realize a justiça social138.

Nos ensinamentos de Schwartz: “O Estado Democrático de Direito é um compromisso

assumido pela sociedade brasileira no sentido da busca de uma justiça social efetiva, de uma

qualidade de vida que se faça presente; logo, da saúde também139.”.

136 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 48. 137 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br.

Acesso em 26 mai. 2015. 138 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27. ed., rev. e atual. São

Paulo: Malheiros, 2006, p. 122. 139 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

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Verifica-se que o Estado está, portanto, obrigado a realizar mudanças na

procura de que a saúde seja efetivamente aplicada e de que ela seja um real

instrumento de justiça social140.

Destarte, quanto à obrigação do Estado em promover a saúde, Gloeckner

assim leciona:

Se o direito à saúde é um dos mais completos, sua não efetividade implica forçosamente no esmorecimento de todos os direitos intercambiariamente enfeixados em sua imbricação axiológica e dogmática. Vale dizer, se o direito a saúde restar absorto, inanes estarão o direito a vida, a cidadania, a autonomia...141.

No mesmo sentido, Tojal apud Schwartz:

Está, pois, o Estado juridicamente obrigado a exercer as ações e serviços de saúde visando a construção de uma nova ordem social, cujos objetivos, repita-se, são o bem-estar e a justiça sociais, pois a Constituição lhe dirige

impositivamente essas tarefas142.

Deve ficar claro que o Estado não pode omitir-se de se encarregar das

prestações sanitárias que o indivíduo se encontrar necessitado. Tendo em vista que

o direito à saúde é um direito indisponível e está entrelaçado a tantos outros direitos

fundamentais, deverá o Estado prestá-lo com sua máxima eficiência143.

No mesmo sentido, explica Gloeckner: “o direito à saúde requer uma máxima

otimização, condizente com o grau de direitos a ele vinculados144.”.

Gloeckner explica que: “abstenção e prestação. Eis a mesma faceta do direito

a saúde entendido como direito subjetivo, um direito em que o cidadão pode exigir

do Estado a sua prestação145.”.

Ainda, cabe destacar que o art. 197 da Constituição Federal dispõe sobre o

dever do Estado em regulamentar, fiscalizar, controlar e executar os serviços de

saúde:

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 50.

140 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 50.

141 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 91.

142 TOJAL apud SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 51.

143 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 93.

144 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 91.

145 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 93.

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Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Sobre a obrigatoriedade do Estado em prestar assistência à saúde, assim

conclui Gloeckner: "desta forma, não pode o Estado eximir-se de cumprir sua

obrigação sanitária, pois assim agindo, infringe os ideias de justiça social e

distributiva pertencentes ao Estado Democrático de Direito146.".

Sobre este dever do Estado, colhe-se da jurisprudência do Tribunal de Justiça

do Estado de Santa Catarina:

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. AUTOR PORTADOR DE OSTEOMIELITE CRÔNICA. NECESSIDADE E HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA DEMONSTRADAS. DIREITO À SAÚDE. GARANTIA CONSTITUCIONALMENTE PREVISTA. ART. 196 DA CRFB/88. CONTRACAUTELA MENSAL DEVIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS EM R$ 1.000,00 (MIL REAIS). QUANTUM PROPORCIONAL AO TRABALHO DISPENDIDO PELO PATRONO DO AUTOR. APELO E REMESSA DESPROVIDOS. Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, caput), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez configurado esse dilema - que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: o respeito indeclinável à vida (Min. Celso de Melo) (Agravo de Instrumento n. 2010.062159-9, de Pinhalzinho, rel. Des. Jaime Ramos). Suficientemente demonstrada a moléstia e a impossibilidade de o enfermo arcar com o custo do medicamento necessário ao respectivo tratamento, surge para o Poder Público o inafastável dever de fornecê-lo gratuitamente, assegurando-lhe o direito fundamental à saúde (Apelação Cível n. 2012.018477-4, de Otacílio Costa, rel. Des. Sônia Maria Schmitz). (TJSC, Apelação Cível n. 2014.018547-3, de Taió, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. 10-02-2015)147.

Ainda, esse é o entendimento do Supremo Tribunal Federal:

PACIENTE COM HIV/AIDS - PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS - DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196) - PRECEDENTES (STF) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE

146 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à

saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 97. 147 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 2014.018547-3. Comarca de Taió. Des.

Rel. Sérgio Roberto Baasch Luz. Julgado em 10/02/2015. Disponível em: <http://app6.tjsc.jus.br/cposg/pcpoQuestConvPDFframeset.jsp?cdProcesso=01000R98H0000&nuSeqProcessoMv=24&tipoDocumento=D&nuDocumento=7720410>. Acesso em 26 mai. 2015.

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REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa consequência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ- LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. [...] Precedentes do STF. (RE 271286 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 12/09/2000, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJ 24-11-2000 PP-00101 EMENT VOL-02013-07 PP-01409)148.

No mesmo sentido:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO PELO PODER PÚBLICO DO TRATAMENTO ADEQUADO. SOLIDARIEDADE DOS ENTES FEDERATIVOS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. NÃO OCORRÊNCIA. COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. PREVALÊNCIA DO DIREITO À VIDA. PRECEDENTES. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, apesar do caráter meramente programático atribuído ao art. 196 da Constituição Federal, o Estado não pode se eximir do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde dos cidadãos. O Supremo Tribunal Federal assentou o entendimento de que o Poder Judiciário pode, sem que fique configurada violação ao princípio da separação dos Poderes, determinar a implementação de políticas públicas nas questões relativas ao direito constitucional à saúde. O Supremo Tribunal Federal entende que, na colisão entre o direito à vida e à saúde e interesses secundários do Estado, o juízo de ponderação impõe que a solução do conflito seja no sentido da preservação do direito à vida. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 801676 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 19/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-170 DIVULG 02-09-2014 PUBLIC 03-09-2014)149.

148 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 271286.

Min. Rel. Celso de Mello. Julgado em 12/09/2000. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=335538>. Acesso em 26 mai. 2015.

149 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 801676. Min. Rel. Roberto Barroso. Julgado em 19/08/2014. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=6639025>. Acesso em 26 mai. 2015.

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Igualmente, por ser o direito fundamental do homem à saúde um direito auto-

aplicável, nos termos do art. 5º, § 1º, da Constituição Federal, tal compreensão

passa a ser um dos pilares da efetivação do aludido direito, destacando que o Poder

Judiciário detém um papel decisivo nesse sentido150.

Caberá ao Poder Judiciário corrigir eventuais desigualdades na prestação do

direito à saúde, quando provocado. Tal atuação só ocorrerá de forma secundária em

relação ao dever do Poder Público, ou seja, quando ficar constatado que as ações

positivas estatais não garantiram o direito à saúde. O Judiciário só age depois da

omissão ou comissão do Estado, pois inexistiria a necessidade de uma decisão

judicial caso o Poder Público cumprisse com o seu papel151.

Neste diapasão, escreve Schwartz:

A saúde, como direito público subjetivo e fundamental do ser humano que é, quando lesionada, não pode ser excluída da apreciação do Poder Judiciário. Essa é, no constitucionalismo contemporâneo, a tarefa mais elevada do Poder Judiciário: garantir a observância e o cumprimento dos direitos fundamentais do homem152.

Dessa forma, compreende-se que o Judiciário assume um papel importante

na guarda do Estado Democrático de Direito, principalmente no que diz respeito à

problemática sanitária, já que não se pode falar em vida digna sem saúde153.

Infere-se, portanto, que por estar atrelada a tantos outros direitos

fundamentais, a prestação do direito à saúde é suma importância e deverá ser

realizada pelo Estado de forma eficiente, ainda que seja possível que os indivíduos

procurem meios privados para a sua realização. Caso o Poder Público permaneça

omisso na prestação do serviço, poderá a parte buscar no Poder Judiciário o meio

de garantir esse direito.

3.2 A Aplicabilidade da Tutela Antecipada nas Demandas de Tratamento de Saúde

150 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 51. 151 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 162. 152 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 163. 153 SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva

sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 165.

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Como visto anteriormente, quando o Estado não cumprir com os seus

deveres atinentes ao direito à saúde, poderá a parte interessada recorrer ao Poder

Judiciário para que tenha o seu direito garantido.

Inicialmente, quanto à prestação jurisdicional, cabe destacar os ensinamentos

de Marinoni:

O art. 5º, XXXV, da Constituição Federal da República, garante o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, o qual obriga o Estado a instituir técnicas processuais idôneas à tutela dos direitos. O cidadão que afirma ter um direito deve ter ao seu dispor as medidas e os instrumentos necessários à realização do seu eventual direito154.

Nesse sentido, leciona Theodoro Júnior: Quando a Constituição garante o acesso à Justiça, por meio do devido processo legal, não o faz com o propósito de criar regras apenas formais de procedimento de juízo. O que, na verdade, se está garantindo é a tutela jurídica do Estado a todos, de maneira a que nenhuma lesão ou ameaça a direito fique sem remédio155.

Entretanto, sabe-se que muitas vezes a demora na resposta jurisdicional

invalida toda a eficácia dessa tutela e representa uma grave injustiça para quem

depende da justiça estatal, motivo pelo qual existe a necessidade de mecanismos de

aceleração do procedimento em juízo156.

Sendo assim, visando atender ao princípio da efetividade, deve o legislador

infraconstitucional elaborar procedimentos que permitam que o autor não seja

prejudicado pela demora do processo. Dessa forma, constata-se que o cidadão tem

um direito constitucional à tutela antecipada, decorrente do princípio da

inafastabilidade157.

A tutela antecipada é caracterizada por uma celeridade incomum aos demais

processos que, geralmente, não necessitam um provimento jurisdicional veloz.

Dessa forma, tem-se agilidade e decisões antecipadas no processo158.

154 MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 12. ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011, p. 134. 155 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 688.

156 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 688.

157 MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 12. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 135.

158 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 128.

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Acerca do exposto, elucida Marinoni:

A legislação infraconstitucional, portanto, ainda que possa delimitar o direito de ação, estabelecendo condições para o seu exercício, bem como disciplinar os procedimentos, não pode, sob pena de lesão ao princípio constitucional, impedir o direito de ação, negar o direito de postulação de uma tutela urgente, ou ainda, porque resultaria no mesmo, estabelecer procedimento, cognição, provimento e meios executivos inadequados a uma determinada situação conflitiva concreta159.

Contudo, assevera Schwartz que a tutela antecipada se encontra no epicentro

do conflito entre segurança jurídica (“ninguém será privado da liberdade ou de seus

bens sem o devido processo legal”) e a efetividade do processo (direito de acesso à

justiça ou direito à ordem jurídica justa)160.

Sobre este conflito, pondera Feres: “[...] a Constituição garante também que

ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal,

fundado no princípio do contraditório e da ampla defesa. Isso caracteriza o princípio

da segurança jurídica161.”.

Em contrapartida, Theodoro Junior elucida o seguinte:

Assim, para evitar que o autor se veja completamente desassistido pelo devido processo legal, procede-se a medidas como as cautelares e as de antecipação de tutela. Isto se faz logo porque não há outro caminho para assegurar a tutela de mérito ao litigante que aparenta ser o merecer da garantia jurisdicional. No entanto, o adversário não fica privado do devido processo legal, porque depois da antecipação, que se da em moldes de provisoriedade, abre-se o pleno contraditório e a ampla defesa, para só no afinal dar-se uma solução definitiva à lide162.

E conclui com base nos ensinamentos de Calmon de Passos:

Aqui dois valores constitucionais conflitam. O da efetividade da tutela e o do contraditório e ampla defesa. Caso a ampla defesa ou até mesmo a citação do réu importe certeza da ineficácia da futura tutela, sacrifica-se, provisoriamente, o contraditório, porque recuperável depois, assegurando-se a tutela que, se não antecipada, se faria impossível no futuro163.

159 MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 12. ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011, p. 135. 160 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à

saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 132.

161 FERES, Carlos Roberto. Antecipação da tutela jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 5. 162 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 689.

163 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 689.

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No tocante ao direito à saúde, quando o processo estiver instruído com prova

pré-constituída e caracterizada a emergência do estado de saúde do requerente da

medida, a tutela antecipada deverá ser concedida164.

Verifica-se, portanto, que diante de situações que necessitam de uma

resposta jurisdicional mais célere e eficaz, principalmente no que diz respeito à

saúde, é perfeitamente cabível o instituto da tutela antecipada.

3.3 A Irreversibilidade da Tutela Antecipada nas Demandas de Tratamento de

Saúde

Conforme disposto no segundo capítulo deste trabalho, a reversibilidade da

medida é pressuposto fundamental para que seja concedida a tutela antecipada. O

art. 273, §2º, do Código de Processo Civil, preceitua que não será concedida a

antecipação quando houver perigo de irreversibilidade desse provimento.

Quanto à irreversibilidade, nas palavras de Bueno:

A irreversibilidade de que trata o dispositivo em comento diz respeito aos efeitos práticos que decorrem da decisão que antecipa a tutela, que lhe são consequentes, que são externos ao processo. Trata-se, propriamente, de irreversibilidade daquilo que a “tutela jurisdicional” tem de mais sensível e importante: seus efeitos práticos e concretos165.

Nas palavras de Feres, com o requisito da reversibilidade: “procura-se evitar

assim a criação de situações danosas para o réu, para a hipótese da improcedência

da ação, se não puder restabelecer a situação primitiva166.”.

Nesse sentido, Theodoro Júnior leciona:

O periculum in mora deve ser evitado para o autor, mas não à custa de transportá-lo para o réu (periculum in mora inversum). Em outros termos: o autor tem direito a obter o afastamento do perigo que ameaça o seu direito. Não tem, todavia, a faculdade de impor ao réu que suporte dito perigo167.

164 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à

saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 155.

165 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 4: tutela antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 45.

166 FERES, Carlos Roberto. Antecipação da tutela jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 57. 167 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e

cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência, volume II. 48. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 695.

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Entretanto, destaca-se que o perigo da irreversibilidade não pode ser visto em

termos absolutos, pois o objetivo da antecipação de tutela é evitar danos ao direito

subjetivo das partes. Dessa maneira, é imprescindível que o juiz sopese os valores

dos bens em conflito, decidindo com bom-senso168.

Assim, deve ser colocado em uma balança o periculum in mora do autor e o

periculum in mora inverso do réu, pois somente dessa maneira que o julgador

poderá analisar qual a medida mais justa a ser adotada, tendo em vista que em

alguns casos o dano do autor no caso de indeferimento da tutela antecipada

reveste-se em verdadeira irreversibilidade para este, sendo muito maior que o risco

de irreversibilidade para o réu169.

Marinoni leciona que: “há casos, conhecidos por todos, em que, se não for

concedida a tutela antecipatória para não se correr o risco de lesar o direito do réu,

certamente o direito do autor será lesado170.”.

Neste diapasão, Alvim assevera que:

No que toca ao perigo da irreversibilidade, porém, como circunstância impeditiva da tutela antecipada, a doutrina é majoritária no sentido de que essa impossibilidade não pode significar um obstáculo intransponível à outorga da tutela antecipada, pois, do contrário, deixaria desamparado inúmeras pretensões jurídicas, configuradoras de direitos subjetivos, que, se não forem desde logo amparados, terão desaparecido quando da prolação da sentença de mérito171.

Dessa forma, quando existir o perigo de irreversibilidade da tutela antecipada,

bem como o perigo de irreversibilidade diante da sua não antecipação, prejudicando

definitivamente o autor, deverá o julgador decidir quem possui efetivamente mais

direito, aplicando a justiça necessária172.

Acerca da irreversibilidade da tutela antecipada no direito à saúde, Didier

Junior leciona:

Isso porque, em muitos casos, mesmo sendo irreversível a medida antecipatória - ex.: cirurgia em paciente terminal, despoluição de águas

168 DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 18. ed. rev., ampl. e atual. São

Paulo: Atlas, 2014, p. 439. 169 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev.

ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1551. 170 MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil: comentado artigo

por artigo. 5. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 271. 171 ALVIM, Luciana Gontijo Carreira. Tutela antecipada na sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2003,

p. 70. 172 BENASSI, Marcos Antonio. Tutela antecipada em caso de irreversibilidade. Campinas:

Bookseller, 2001, p. 140.

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fluviais, dentre outros -, o seu deferimento é essencial, para que se evite um "mal maior" para parte/requerente. Se o seu deferimento é fadado à produção de efeitos irreversíveis para o requerido, o seu indeferimento também implica consequências irreversíveis para o requerente. Nesse contexto, existe, pois, o perigo da irreversibilidade decorrente da não-concessão da medida. Não conceder a tutela antecipada para a efetivação do direito à saúde pode, por exemplo, muitas vezes, implicar a consequência irreversível da morte do demandante173.

Sendo assim, pode-se citar o exemplo do autor que busca realizar uma

cirurgia urgente, que foi negada pelo plano de saúde. Há o perigo da

irreversibilidade, porém, se não for deferida a tutela antecipada, é possível que o

autor faleça, retirando toda a efetividade da prestação da tutela jurisdicional, bem

como ferindo o direito à vida, que supera a prescrição do §2º do art. 273174.

Na mesma direção, Gloeckner leciona:

Na grande maioria dos casos, mesmo que o provimento antecipatório revista-se de irreversibilidade, dos males o menor: consolida-se o direito à vida e à saúde, enaltece-se a função sanitária estatal e mais do que isso, cria-se na sociedade, no indivíduo e também, (por que não?), na própria consciência do julgador, uma mentalidade voltada à vida, sabendo-se que o dever foi cumprido e a justiça distribuída175.

E finaliza:

Na dúvida sobre a concessão ou não da tutela antecipada, à evidência, tendo em vista os interesses em jogo, deve ela ser concedida. Na apreciação dos requisitos para a consecução eficaz do modelo ponderativo construído (e isto é algo inarredável), entre causar um dano irreparável (saúde) e outro de menor gravidade (prejuízo ao Erário Público) sobrepõe-se a tutela antecipada. Até mesmo pelo fato de que a prova de necessidade (no sentido de falta de recursos econômicos) é um horizonte mediato, que serve de guia do julgador, nunca, ao revés, óbice à implementação do direito à saúde, que primeiramente, em um metanível, a todos se estende176.

Isto posto, verifica-se então que, havendo o conflito entre bens jurídicos de

valores diversos, o magistrado está autorizado a não aplicar o §2º do art. 273177.

173 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório,

ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. v. 2. 8. ed. rev. e atual. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 554.

174 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1553.

175 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 158

176 GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. SCHWARTZ, Germano A. A tutela antecipada no direito à saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 158.

177 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 4: tutela

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O juiz, ao analisar o pedido de antecipação de tutela, deverá valer-se do

princípio da proporcionalidade, determinando a proteção do interesse mais

relevante, e afastando o risco mais grave178.

Assim, toda vez que se verificar a presença da verossimilhança do direito e do

risco de danos irreparáveis ou de difícil reparação resultantes da não antecipação de

tutela, deve-se privilegiar esse direito provável, em detrimento do direito improvável

do réu. Deve-se dar preferência à efetividade da tutela em prejuízo da segurança

jurídica da parte adversária, que deverá suportar a irreversibilidade179.

Infere-se que, em regra, o juiz não deverá conceder a antecipação de tutela

caso ela traga o risco de irreversibilidade para o demandado. Entretanto, diante de

bens jurídicos como a saúde e a vida, que necessitam uma maior proteção, a sua

concessão será possível, tendo em vista que se o direito não for prestado no

momento oportuno, poderá acarretar danos irreversíveis ao autor.

3.4 O Princípio da Proporcionalidade Aplicado à Irreversibilidade da Tutela

Antecipada nas Demandas de Tratamento de Saúde

Conforme o exposto acima, quando em conflito dois bens jurídicos diversos, o

juiz deverá utilizar o princípio da proporcionalidade ao analisar a questão da

irreversibilidade da tutela antecipada.

O princípio da proporcionalidade é uma garantia constitucional que protege os

cidadãos contra os abusos do poder estatal, bem como serve de método

interpretativo de apoio para o juiz quando este precisa resolver problemas de

compatibilidade e de conformidade na tarefa da densificação ou concretização das

normas constitucionais180.

Nas palavras de Larenz apud Marinoni: “o princípio da proporcionalidade é

aplicado justamente quando o problema consiste em determinar onde se situa o

antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 49.

178 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 4. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2014, p. 697.

179 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. v. 2. 8. ed. rev. e atual. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 555.

180 CARVALHO, Márcia Haydée Porto de. Hermenêutica Constitucional. Florianópolis: Obra Jurídica, 1997, p. 120.

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limite da satisfação lícita de um interesse à custa de outro também digno de

tutela181.”.

Desta forma, tal princípio permite que exista o balanceamento entre um direito

fundamental e os demais direitos, valores, princípios ou bens jurídicos

contrapostos182.

No que diz respeito à aplicação do princípio da proporcionalidade no instituto

da tutela antecipada, assim leciona Marinoni:

[...] a regra da proporcionalidade constitui um método para a solução de conflitos entre direitos que contêm uma limitação imanente diante de direitos de igual porte e, dessa forma, também pode auxiliar na solução de conflito de bens diante da tutela antecipatória. Quando o juiz, mediante a aplicação de tal regra, decide antecipar a tutela, admite-se o risco de irreversibilidade, até porque a proibição da concessão da tutela obrigaria o juiz a expor a risco de irreversibilidade exatamente o direito que, à luz da ponderação, merece tutela183.

O princípio da proporcionalidade exige, portanto, que seja feita uma

ponderação dos direitos ou bens jurídicos em conflito, conforme o “peso” que é

atribuído ao bem na respectiva situação184.

Na mesma direção, ensina Bueno:

Pelo referido princípio, é dado ao magistrado ponderar as situações de cada um dos litigantes para verificar qual, diante de determinados pressupostos, deve proteger (antecipadamente, como interesse para cá), mesmo que isso signifique colocar em situação de irreversibilidade a outra. É por intermédio desse princípio que o magistrado consegue medir os valores diversos dos bens jurídicos postos em conflito e decidir, concretamente, qual deve proteger em detrimento do outro. Se o caso é mesmo de preponderância do princípio da efetividade do processo, porque a tutela antecipada é adequada e necessária para tutelar um direito mais evidente que o outro, que assim seja185.

E, ainda, salienta o aludido autor que tal princípio é:

[...] ferramenta que permite a flexibilização do rigor da letra do §2º do art. 273 (que consagra, em termos bem diretos, os princípios da isonomia e o da segurança jurídica) diante de outros valores dispersos no sistema; assim,

181 LARENZ, Karl apud MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 12. ed. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 201. 182 FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Direito fundamental à saúde: parâmetros para a sua eficácia e

efetividade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 121. 183 MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 12. ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011, p. 203. 184 LARENZ, Karl apud MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 12. ed. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 203. 185 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 4: tutela

antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 49.

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por exemplo, o direito à saúde, o direito à vida e, no plano processual, os princípios da economia e eficiência processuais e o da efetividade do processo186.

Ainda que esteja em questão um interesse que não seja possível indenizar,

devem ser ponderados os valores dos direitos em conflito, gerando a possibilidade

de que medidas concedidas com base na plausibilidade do direito não fiquem presas

à necessidade de reversibilidade187.

Sendo assim, diante de direitos conflitantes, deve o juiz proceder à avaliação

dos interesses em jogo e dar preferência àquele que tem maior relevo e expressão,

possibilitando que o princípio da proporcionalidade supere a questão da

irreversibilidade188.

Acerca do assunto, assim assevera Marinoni:

Por isso, não admitir a possibilidade de ponderação de direitos no juízo sumário é retirar da doutrina a possibilidade da construção de uma dogmática mais sensível à realidade social e, assim, impedir que as reformas processuais atendam às expectativas que foram geradas nos consumidores daquela tutela jurisdicional, transformando-as em um amontoado de leis sem qualquer função social189.

Isto posto, verifica-se que diante do impedimento gerado pela impossibilidade

de reversibilidade da medida e de sua irreparabilidade, o julgador deverá utilizar do

seu juízo de proporcionalidade para verificar o valor jurídico mais importante a ser

tutelado, ante a evidência de um direito em desfavor de outro190.

Em suma, mesmo havendo risco de irreversibilidade da medida, quando se

tratar do direito à saúde, o julgador, fazendo uso do princípio da proporcionalidade,

deverá conceder a antecipação da tutela, visando assegurar o um bem maior, que é

a vida.

186 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, 4: tutela

antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 49.

187 WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento, volume 1. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 423.

188 LOPES, João Batista. Tutela antecipada: reversibilidade dos efeitos do provimento e princípio da proporcionalidade. Revista dos Tribunais. v. 815. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 98-100.

189 MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 12. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 204.

190 KLIPPEL, Rodrigo. BASTOS, Antônio Adonias. Manual de Direito Processual Civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. Bahia: Editora Juspodivm, 2014, p. 1552.

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3.5 Posicionamento dos Tribunais

Após o estudo doutrinário acerca da irreversibilidade da tutela antecipada no

direito à saúde, entende-se necessário demonstrar o posicionamento adotado pelos

tribunais a respeito do tema.

Destaca-se, inicialmente, que é possível de concessão da tutela antecipada

quando o pedido versar sobre tratamento de saúde, conforme se depreende da

jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. AÇÃO JUDICIAL PARA O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. PRESSUPOSTOS DO ART. 273 DO CPC. SÚMULA 7/STJ. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS PELO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA UNIÃO. 1. É possível a concessão de antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública para obrigá-la a fornecer medicamento a cidadão que não consegue ter acesso, com dignidade, a tratamento que lhe assegure o direito à vida, podendo, inclusive, ser fixada multa cominatória para tal fim, ou até mesmo proceder-se a bloqueio de verbas públicas. Precedentes. 2. A apreciação dos requisitos de que trata o art. 273 do Código de Processo Civil para a concessão da tutela antecipada enseja o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula 7/STJ. 3. O funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, dos Estados e dos Municípios, de modo que qualquer um desses entes tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso a medicamentos para tratamento de problema de saúde. Precedentes. 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1291883/PI, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/06/2013, DJe 01/07/2013)191.

Extrai-se do julgado que, quando em risco o direito à vida por conta da não

efetiva prestação do direito a saúde por parte do Estado, é possível que seja

concedida a tutela antecipada para que esses direitos sejam protegidos.

191 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial n. 1291883/PI.

Min. Rel. Castro Meira. Julgado em 20/06/2013. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=29327644&num_registro=201101881151&data=20130701&tipo=91&formato=PDF>. Acesso em 24 mai. 2015.

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Quanto à irreversibilidade, colhe-se da jurisprudência do Egrégio Tribunal de

Justiça do Estado de Santa Catarina o seguinte:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANEJO CONTRA DECISÃO QUE ANTECIPA OS EFEITOS DA TUTELA EM AÇÃO COMINATÓRIA PARA FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO E VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES, PRESENTES NA INICIAL, ANTE A COMPROVAÇÃO DA GRAVE ENFERMIDADE E DA IMPOSSIBILIDADE DE CUSTEAR O TRATAMENTO E O MEDICAMENTO. DIREITO À SAÚDE. EXEGESE DOS ARTS. 6º E 196, DA CF/88, E 153, DA CE/89 E DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO. IRRELEVÂNCIA, IN CASU. RECURSO NÃO PROVIDO. "A CF/1988 erige a saúde como um direito de todos e dever do Estado (art. 196). Daí, a seguinte conclusão: é obrigação do Estado, no sentido genérico (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária para a cura de suas mazelas, em especial, as mais graves. Sendo o SUS composto pela União, Estados e Municípios, impõe-se a solidariedade dos três entes federativos no pólo passivo da demanda." (STJ, AgRg no REsp n. 690.483/SC, rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, j. 19.4.05). A lei processual vigente ressalva a concessão da tutela antecipada quando houver perigo de irreversibilidade da medida. Porém, esta condição não pode servir de impedimento à antecipação dos efeitos da tutela, especialmente quando pautada sobre o direito constitucional à vida. Assim, caracterizado o risco à integridade física da parte e a responsabilidade do Estado em prover os meios de acesso à saúde, inexiste óbice à antecipação dos efeitos da tutela, uma vez preenchidos os requisitos do art. 273 do Código de Processo Civil. "As alegações de que o medicamento é de alto custo, de que inexiste previsão orçamentária no órgão estatal para o fim pretendido, bem como de que inexiste norma que obrigue o seu fornecimento, conquanto argumentos ponderáveis, não tem o condão de sobrepujar o direito hierático à vida, bem jurídico de hierarquia máxima tutelado pela Constituição da República" (Apelação cível n. 2010044653-7, rel. Des. João Henrique Blasi, j em 9.8.2012). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2012.001065-1, de Balneário Camboriú, rel. Des. Gaspar Rubick, j. 09-10-2012).192.

No mesmo sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER PARA FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. DEVER DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE ASSEGURAR O DIREITO FUNDAMENTAL E INDISPONÍVEL À SAÚDE. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 196. ORDEM JUDICIAL PARA CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER QUE NÃO PODE SER OBSTADA POR RESTRIÇÕES ORÇAMENTÁRIAS E NÃO IMPLICA EM AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. HIPOSSUFICIÊNCIA DEMONSTRADA. OBRIGAÇÃO DO ESTADO DE ASSEGURAR O DIREITO À SAÚDE QUE NÃO ESTÁ ADSTRITA À COMPROVAÇÃO DE MISERABILIDADE. DECLARAÇÃO E REQUISIÇÃO DE MÉDICO CREDENCIADO PELO SUS E DIAGNÓSTICO

192 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n. 2012.001065-1. Comarca de

Balneário Camboriú. Des. Rel. Gaspar Rubick. Julgado em 09/10/2012. Disponível em: <http://app6.tjsc.jus.br/cposg/pcpoQuestConvPDFframeset.jsp?cdProcesso=01000KYHN0000&nuSeqProcessoMv=62&tipoDocumento=D&nuDocumento=4951844>. Acesso em 24 mai. 2015.

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DE ARTRITE REUMATÓIDE SOROPOSITIVA GRAVE A INDICAR A VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES E O PERIGO DE DANO IRREPARÁVEL NA DEMORA DO FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO ACTEMRA (TOCILIZUMAB). REQUISITOS DO ART. 273 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL PREENCHIDOS PARA A CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. RISCO DE IRREVERSIBILIDADE DO PROVIMENTO ANTECIPADO MITIGADO DIANTE DA PREVALÊNCIA DO DIREITO À SAÚDE E À VIDA SOBRE O INTERESSE ECONÔMICO DO ENTE PÚBLICO. PRAZO RAZOÁVEL DE 05 (CINCO) DIAS PARA CUMPRIMENTO DA ORDEM, POR TRATAR-SE DE MEDIDA ASSECURATÓRIA DE DIREITO FUNDAMENTAL DE PACIENTE COM DOENÇA GRAVE. EXCESSIVIDADE DA MEDIDA COERCITIVA DE BLOQUEIO DE VERBA PÚBLICA. POSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO SOMENTE QUANDO A ASTREINTE NÃO FOR SUFICIENTE PARA ASSEGURAR O CUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL. SUBSTITUIÇÃO DO SEQUESTRO PELA MULTA DIÁRIA DE R$ 250,00. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, ART. 461, §§ 4º E 5º. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2012.059313-1, de Rio do Sul, rel. Des. Nelson Schaefer Martins, j. 13-11-2012)193.

Ainda, em decisão mais recente:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - PACIENTE PORTADOR DE DOENÇAS GRAVES - ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL - REQUISITOS DO ART. 273, DO CPC DEMONSTRADOS - IRREVERSIBILIDADE DOS EFEITOS DA MEDIDA - DIREITO À SAÚDE - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE - PREVALÊNCIA SOBRE O DIREITO PATRIMONIAL DO ENTE PÚBLICO - AUSÊNCIA DE DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA - POSSIBILIDADE DE DISPENSA DE LICITAÇÃO DADA A URGÊNCIA (ART. 24 DA LEI N. 8.666/93) - SEQUESTRO DE VALORES DA CONTA BANCÁRIA DO ENTE PÚBLICO PARA CUSTEAR O TRATAMENTO SE ESTE NÃO FOR DISPONIBILIZADO NO PRAZO DADO - POSSIBILIDADE - CONTRACAUTELA - NECESSIDADE. É cabível a concessão liminar contra a Fazenda Pública para o fornecimento de medicamento necessário ao tratamento de saúde de paciente necessitado, não se podendo falar em ofensa ao disposto no art. 475, incisos I e II, do Código de Processo Civil, e na Lei n. 8.437/92, quando pende contra essas normas um direito fundamental de todo ser humano, como a vida. Havendo prova inequívoca capaz de convencer este Órgão julgador da verossimilhança das alegações e fundado o receio de dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, do CPC) decorrente da demora na entrega da prestação jurisdicional definitiva, há de se conceder antecipação de tutela obrigando o ente público a fornecer o tratamento de que necessita a agravante para manutenção de sua saúde. "Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, caput), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez configurado esse dilema - que razões de ordem ético - jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: o respeito indeclinável à vida"

193 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n. 2012.059313-1. Comarca de

Rio do Sul. Des. Rel. Nelson Schaefer Martins. Julgado em 13/11/2012. Disponível em: <http://app6.tjsc.jus.br/cposg/pcpoQuestConvPDFframeset.jsp?cdProcesso=01000MOJ60000&nuSeqProcessoMv=46&tipoDocumento=D&nuDocumento=5073722>. Acesso em 24 mai. 2015.

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(Min. Celso de Melo). A tutela pode ser antecipada antes da ouvida da parte contrária e da instrução probatória, quando se verificar a urgência da medida, já que no caso se trata de pleito para o fornecimento de medicamento pelo ente público ao paciente, sem o qual o beneficiário encontrará dificuldades de sobrevivência ou manutenção da saúde. Assim, não há ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa a que se refere o art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal de 1988, haja vista que eles continuam assegurados, mas postergados para momento oportuno, qual seja, a resposta do réu. A falta de dotação orçamentária específica não pode servir de obstáculo à aquisição e ao fornecimento de medicamento ao doente necessitado, sobretudo quando a vida é o bem maior a ser protegido pelo Estado, genericamente falando. Nos termos do artigo 24, da Lei Federal n. 8.666/93, em caso de comprovada urgência, é possível a dispensa de processo de licitação para a aquisição, pelo Poder Público, de medicamento necessário à manutenção da saúde de pessoa carente de recursos para adquiri-lo. A concessão de tutela antecipada para fornecimento de remédio deve ser condicionada à demonstração, pelo paciente, da permanência da necessidade e da adequação do medicamento, durante todo o curso da ação, podendo o Juiz determinar a realização de perícias ou exigir a apresentação periódica de atestados médicos circunstanciados e atualizados. Para assegurar o cumprimento da obrigação de fornecer o tratamento médico necessário para o enfermo, pode ser imposta astreinte em valor razoável e proporcional ou substituí-la pela ameaça de sequestro de quantia necessária para a realização do procedimento, que é garantia suficiente para forçar o Poder Público a cumprir o comando judicial. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2014.076339-4, de Laguna, rel. Des. Jaime Ramos, j. 26-02-2015)194.

Verifica-se, dessa forma, que o entendimento do Tribunal de Justiça do

Estado de Santa Catarina é de que é possível o deferimento do pedido da tutela

antecipada diante do cumprimento de seus requisitos nas demandas de tratamento

de saúde, mesmo que este provimento seja irreversível.

Infere-se então que diante da omissão do Poder Público em prestar

assistência à saúde, poderá a parte buscar a efetivação do seu direito no judiciário,

valendo-se da tutela antecipada, ainda que seu provimento seja irreversível.

194 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n. 2014.076339-4. Comarca de

Laguna. Des. Rel. Jaime Ramos. Julgado em 26/02/2015. Disponível em: <http://app6.tjsc.jus.br/cposg/pcpoQuestConvPDFframeset.jsp?cdProcesso=01000T2IL0000&nuSeqProcessoMv=51&tipoDocumento=D&nuDocumento=7773322>. Acesso em 24 mai. 2015.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve como objetivo analisar a possibilidade do magistrado

conceder a antecipação de tutela mesmo diante de sua irreversibilidade nas ações

que visam o tratamento de saúde.

Verificou-se que o direito à saúde é um direito social fundamental de todos,

sendo este de suma importância por estar diretamente ligado ao direito à vida.

Entende-se por saúde não apenas a ausência de doenças, mas sim o bem

estar físico, mental e social dos indivíduos, devendo o Estado fornecer sua

assistência de forma igualitária e universal, promovendo sua proteção e

recuperação.

Ocorre que, na prática, o Estado não cumpre o seu dever e se mantém

omisso, não promovendo a assistência à saúde de forma efetiva como prevê nossa

Carta Magna.

Diante dessas situações, poderão os indivíduos recorrer ao Poder Judiciário

para que tenham o seu direito efetivado. Entretanto, muitas vezes a prestação

jurisdicional não acontece de forma célere, fazendo com que o direito pereça.

Por esse motivo, foi instituída no ordenamento jurídico brasileiro a Lei n.

8.952/94, que alterou substancialmente o art. 273 do Código de Processo Civil,

estendendo a possibilidade de o magistrado conceder a tutela antecipada em

qualquer ação, visando uma prestação jurisdicional mais efetiva.

Embora possa ser concedida em qualquer ação, a tutela antecipada possui

requisitos, previstos no citado art. 273, que devem ser cumpridos à risca, sob pena

do julgador não conceder o provimento antecipado.

Dentre os requisitos, destacou-se no presente trabalho o previsto no § 2º do

art. 273, do Código de Processo Civil, que preceitua que não se concederá a tutela

antecipatória quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

Dessa forma, o magistrado não poderá conceder tal provimento quando este não

puder ser revertido nos próprios autos.

Das hipóteses levantadas na introdução, concluiu-se que mesmo diante da

irreversibilidade do provimento, o julgador poderá conceder a antecipação de tutela

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quando o pedido versar sobre tratamento de saúde. O perigo de irreversibilidade não

poderá ser um impedimento para tal concessão, pois o direito a saúde prevalece

sobre os outros por ser um direito fundamental de todo indivíduo, mormente por

estar ligado ao direito à vida.

Os tratamentos de saúde, como por exemplo, cirurgias e fornecimento de

medicamentos, necessitam muitas vezes a prestação com celeridade,

impossibilitando que o requerente aguarde o desenrolar de todo um processo judicial

para que obtenha o provimento do seu direito. Verifica-se, portanto, que o instituto

da tutela antecipada é imprescindível nessas demandas, pois possibilita a prestação

jurisdicional de forma efetiva, evitando que direitos tão importantes para uma vida

digna pereçam.

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