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2368 – 1908 GRAFIARTE - NA PERIFERIA DO GRAFITE AO ENSINO DE ARTE Evânio Bezerra da Costa (Jimmy Rus)
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Email: [email protected] Comunicação: (Relato de experiência)
“... uma vez que se aprende a ver com bom gosto os pequenos desenhos feitos com
caneta esferográfica em papel riscado, abre-se todo um mundo de excitação. (WILSON,
1974. P.02).
O projeto GrafiArte foi desenvolvido entre os anos de 2006 e 2007, dentro do
programa PEAS - Programa Educacional Afetivo Sexual - da Escola Estadual Neuza
Rezende, com alunos 6ª, 7ª e 8ª série do Ensino Fundamental e 1° Ano do Ensino
Médio.
De início, não havia a intenção em realizar um projeto. Trabalhando com a
disciplina Arte dentro da E. E. Neuza Resende, em especial com a 8ª série, encontrei
uma turma desestimulada e pouco participativa. Porém, entre os alunos havia alguns
interessados no desenho. Estes alunos, chegaram em mim, no começo do ano, com
desenho feito a caneta, e em folhas com pauta, trazendo desenhos de personagens vindo
de seu mundo imaginário- O objetivo: Ansiavam por técnicas de desenho que não eram
apresentadas nas salas de aula, nem nas aulas de arte, que pudessem melhorar seus
desenho.
Inicialmente esses alunos eram dois (Paulo Ricardo e Rangel) e como dentro da
escola eu tinha de cumprir horário de modulo junto aos alunos, estipulei esse horário
para que pudesse encontrá-los. Assim, institui um encontro semanal, de forma que toda
quarta-feira, nos encontrávamos na sala de aula, após as 17h30, para que eu pudesse
analisar seus desenhos e dar dicas.
Nesse processo, o número de alunos passou para quatro e posteriormente foi
crescendo. Nesse momento, me vi sem ter a mínima noção- algo que só agora ao
escrever esse relato percebo- utilizando-me da Transversalidade.
A Transversalidade segundo MATTOS “diz respeito à possibilidade de se
estabelecer na pratica educativa, uma relação entre aprender, na realidade e da
realidade, conhecimentos teoricamente sistematizados.”- p.15
Formado pela Universidade Federal de Uberlândia (Licenciatura Plena – 2006, Bacharelado-2007), e
cartunista free-lancer, pesquisador e professor de Arte na rede Estadual (Uberlândia/M.G) desde 2004 e
Particular (Prata/M.G) desde 2005.
Ou seja, a partir da vivência diária do aluno, buscar referência para trabalhar os
conteúdos específicos de uma determinada disciplina. No caso, a disciplina de Arte.
Ainda, vivenciando o interesse desses alunos decidi partir nessas aulas de modulo, para
o desenho técnico, onde ensinaria diferentes técnicas de representação.
Estas aulas teriam conteúdo paralelo ao das aulas normais, onde utilizo da
Abordagem Triangular para tratar os conteúdos específicos da disciplina. Esta é
sistematizada em três eixos: O Histórico- onde junto aos alunos se faz a
contextualização temporal e espacial do momento em que a obra ou assunto abordado
ocorreu.
O Pratico- onde trabalhamos o fazer – utilizando técnicas diferenciadas e conforme
o possível dentro do contexto de cada escola, bem como o suporte didático que estas
possam oferecer (material didático, tais como tinta, argila, sala, etc), visando estimular o
“fazer” do aluno, que neste primeiro momento ainda e um treino, para possíveis
atividades futuras.
E para fechar o trio temático da Abordagem Triangular, a leitura da obra de arte, por
meio do estimulo e treino do olhar, da observação e da comparação de formas e
imagens, com o objetivo de aguçar no aluno um olhar critico, reflexivo e indagador.
Embora não fosse a intenção, esse trabalho acabou por ter uma repercussão, vindo a
chamar a atenção da direção e da coordenação pedagógica da escola, que entre o
primeiro e segundo bimestre de 2006, nos convidou a integrar de forma voluntária o
PEAS- Programa Educacional Afetivo Sexual - desenvolvendo um projeto que
envolvesse Arte com os alunos. Nascia então o projeto GrafiArte.
Imagem 01:Rangel - 8ª série/2006 Imagem 02: Paulo Ricardo/2006 Imagem 03: Paulo Ricardo/2007
O projeto recebeu esse nome devido o interesse dos alunos por grafitti, desenhos
animados e produções de Histórias em Quadrinhos - elementos que estavam presente
em seus desenhos, porém outro motivo também veio justificar esse nome: o fato da E.E
Neuza Rezende encontrar-se numa área periférica e afastada do centro da cidade de
Uberlândia e possuir nas ruas do bairro algumas imagens realizadas com a técnica do
Graffiti, o que por sua vez encanta a imaginação dos alunos, além de influenciar suas
produções dentro e fora da sala de aula.
Trabalhando especificamente o desenho- que os alunos pediam- fomos pouco a
pouco mostrando algumas técnicas durante as aulas e deixando que esses alunos
realizassem exercícios em casa. Para surpresa minha, eles sempre voltavam com as
atividades prontas, mesmo sabendo que não seriam avaliadas e que aquelas aulas seriam
extras.
Os primeiros desenhos a aparecerem foram dos alunos Paulo e Rangel. Este ultimo
embora estivesse ali para aprender, já apresentava um elevado grau técnico dentro dos
seus desenhos. Exemplo disso esta no desenho que apresento abaixo (imagem 01) de
2006. Nele o aluno trabalhou utilizando apenas o grafite para sombrear a imagem.
Como um dos objetivos do Projeto era formar alunos multiplicadores, e devido ao
desenvolvimento deste, o coloquei como Monitor da turma.
Com o decorrer do tempo essas aulas de desenho tornaram-se um atrativo para os
alunos que desejavam melhorar seu traço, e foi utilizada também para estimular alunos
de baixo rendimento a se tornarem participativos dentro não apenas da disciplina Arte,
mas da vida escolar como um todo.
Imagem 04: Alunos terminando telas em 2006 Imagem 05: Algumas das telas expostas em 2006
Visando mostrar como se trabalhava o desenho, antes de chegar ao graffiti, nas aulas
que se seguiram abordei inicialmente a figura humana. Para esta, ensinei a técnica do
cânone, mostrando aos alunos o processo de criação dos elementos do corpo. Iniciando
pela cabeça, mostrei e fiz com que observassem as formas dos elementos do rosto, tais
como boca, nariz, olho, orelha.
Em seguida passei para a construção do corpo, utilizando também o cânones para
dar a proporção correta ao tamanho do corpo. Como os alunos, na maior parte meninos
gostavam de personagens de quadrinho, trabalhei com a turma a diferença entre pessoas
aparentemente normais e os super-heróis.
Nessa etapa, o aluno Paulo Ricardo- que acompanhou o projeto até o final em 2007-
mostrou efetivo progresso. Analisando seus desenhos do começo do projeto, como
presente nas imagens 02 e 03, vemos claramente essa distinção. Vale aqui deixar claro,
que fui estimulando os alunos a valorizarem seus trabalhos, inclusive não utilizando
folhas pautadas de caderno para realizá-los.
Depois de alguns meses treinando e trabalhando a figura humana o passo seguinte
foi a perspectiva - que paralelamente eu iria abordar dentro da sala de aula- com a qual
iria mostrar aos alunos como criar cenários, não deixando seus personagens soltos no
espaço.
Dentro da dinâmica das atividades realizadas, fui estimulando os alunos a
observarem as características e detalhes dos desenhos realizados por eles e pelos outros,
estimulando assim a capacidade de analise visual de cada aluno. Além disso, procurei
ensiná-los a respeitar e a lidar com as diferenças, começando pela diferença de seus
desenhos, traços e desenvolvimento gráfico ( até mesmo por ter faixas etárias diferentes
na turma), e a respeitarem uns aos outros como colegas.
Imagem 06: Parte da turma em novembro de 2006
Como o objetivo final era trabalhar o graffiti, abordei também com estes a teoria
das cores, realizando exercícios com as cores e os possíveis contrastes. Entre esses
exercícios inclui o desenho de observação, testando antes de partir para um muro para a
realização do graffiti a pintura em tela. Infelizmente na fase de exercícios, o ano letivo
de 2006 já estava ao final, de forma que foi proposto pela coordenação pedagógica que
realizássemos uma exposição com os trabalhos dos alunos. Para tal, os trabalhos em tela
foram úteis, e em novembro de 2006 realizamos a exposição dos trabalhos.
Imagem 07: Exercício com cores- 2007
Retornando em 2007, o projeto, foi expandido para os alunos da 6ª e 7ª série, e o
1° Colegial (ex - 8ª série do ano anterior). Por tal motivo tive de reiniciar o trabalho de
figura humana, teoria das cores e perspectiva, onde os alunos do ano anterior muito
contribuíram, mostrando o que tinha aprendido, além de ter se tornado multiplicadores
do saber construído nas aulas.
Imagem 08,09 e 10: Exercícios realizados em 2007 (Personagem: Bruno – 7ª Série; Garrafa: Henriques-7ª série,
Maça: Débora– 1° Col)
Desta forma retrabalhamos no decorrer de 2007 com todas as técnicas, na qual
outros alunos também vieram a se destacar, e os antigos mostraram espetaculares
melhorias. Exemplo e o aluno Paulo Ricardo. Comparando seu ultimo desenho de 2006
com um apresentado em 2007, vemos nitidamente essa melhoria.
Imagem 11: Paulo Ricardo- 2006 Imagem 12: Paulo Ricardo 2007
Outro também que mostrou melhorias foi o aluno Adriel, este em especial foi
reprovado em 2006 e acabou por repetir a 7ª série em 2007. No ano anterior esse aluno
apresentava expressiva dificuldade, porém, ao participar das aulas do Grafiarte, e ser
cobrado passou a ser mais participativo, inclusive em outras disciplina, como relatara a
professora de Educação Física, disciplina na qual o aluno não mostrava grande
desempenho. Segundo essa professora, desde que começara a participar das aulas, o
aluno mostrou-se mais participativo e sociável para com os colegas.
Além disso, em conversa informais com alguns alunos, estes mesmo chegam a
dizem ter mudado sua visão quanto as aulas de Arte e quanto aos próprios trabalhos e
aos dos colegas, os quais passaram a olhar já com uma visão critica e técnica. Esta
também passou a ser visível no próprio trabalho desses alunos como podemos ver nesse
relato de experiência.
As aulas ministradas, dentro do projeto, GrafiArte, além de buscarem a
socialização e a integração dos participantes, tiveram como base principal o respeito
pelas diferenças (gráficas, de estilo, de idade, de gênero, etc.), e a intervenção direta no
“fazer artístico” de cada aluno.
O projeto GrafiArte foi encerrado em novembro de 2007, sem que o graffiti em
uma das paredes da escola fosse realizado, devido ao fato de ter me tornado excedente e
ter sido efetivado em outra escola, porém não deixou a desejar, pois cumpriu mais do
que esperava ao fazer dos alunos que participaram seres pensantes e com visão critica,
capazes de distinguir e respeitar diferenças culturais, além de leitores de imagens, sejam
elas do repertorio artístico (história da Arte) ou de seu próprio dia-a-dia ( O grafite, a
mídia, a Historia em Quadrinho).
Imagem 13, 14 e 15: Desenhos de Adriel- ( Primeira imagem:2006, Segunda e Terceira:2007)
Além disso, serviu-me de experiência, quando pude perceber e deixar aqui como
relato, que não basta impor a nosso aluno uma tarefa, e esperar que ele simplesmente a
realize, mas que antes e necessário explicar como é por que se faz da forma X e não da
forma Y. Isso foi o que fiz junto aos meus alunos nos horário extras- dentro do projeto.
Essa foi a forma mais pratica que encontrei ao conciliar o interesse de alguns alunos
com as aulas da disciplina Arte.
Bibliografia
FERRAZ, Maria Heloísa C. de T & FUSARI, Maria F. de Rezende. Metodologia do
Ensino de Arte. São Paulo: Cortez, 1993.
FERREIRA, Sueli (Org). O Ensino das Artes: Construindo Caminhos. Campinas
(S.P): Papirus, 2001.
MATTOS, Paual Belfort- A Arte de Educar- Antonio Bellini editora e Cultura,
Uberlândia, 2003
WILSON, Brent. Os Super-heróis de J.C Holtz - Mais um esboço de uma teoria da
Arte Infantil. Revista Art Education, nov. 1974. [Texto em Xérox traduzido por Maria
Lúcia Batezat Duarte e Maria Nilda Macedo de Assunção].
RAMOS, Jose Ortiz. Televisão, Publicidade e Cultura de Massa. Petrópolis(S.P):
Vozes, 1995.
Lei:
PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS: ARTE/ Secretaria de Educação
Fundamental. 2ªed. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.