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Copyright 2016 by

Paulo da Silva Neto Sobrinho (Paulo Neto)

Belo Horizonte, MG.

Capa:

http://www.kornbluthphoto.com/images/DelgadoCrux4.jpg

Revisão:

João Frazão de Medeiros Lima

Hugo Alvarenga Novaes

Diagramação:

Paulo Neto

site: www.paulosnetos.net

e-mail: [email protected]

Belo Horizonte, abril/2010.

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EL, o verdadeiro

deus dos hebreus

“Para cada indivíduo que acredita em algumacoisa, sempre há alguém que acredita nooposto ou que tem mais informações.”(CHURTON, 2009)

“[…] os teólogos são bem preparados para sereconômicos com a verdade […].” (ELLIS, 2004)

“Não é porque uma coisa está escrita que ela éverdadeira.” (RENAN, 2004)

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ÍNDICE

Introdução.......................................................................5

Análise das passagens base do questionamento...................91ª) Deus ordena a Abraão a sacrificar o seu filho Isaac...............12

2ª) Deus se identifica a Jacó como “Eu sou El”..........................30

3ª) O bezerro de ouro é identificado como o Deus de Israel........45

As pistas encontradas ao longo dos textos bíblicos..............49

Épocas em que os hebreus praticavam rituais pagãos..........91a) Os patriarcas....................................................................91

b) Moisés a Josué................................................................157

c) Dos Juízes a Salomão.......................................................188

d) Judá e Israel...................................................................209

e) Fim do reino de Judá.......................................................225

f) A restauração durante o período persa................................239

g) Época helenística............................................................245

Ou crê ou morre!..........................................................251

Absurdos atribuídos à divindade dos hebreus....................285

O que de interessante os estudiosos nos informam...........302

Conclusão....................................................................384

Referências bibliográficas...............................................388

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Introdução

Certamente que um título desses é algo bem

estranho mesmo; mas, ao se analisar as informações que

vários autores passam, ver-se-á que se aplica muito bem

ao caso.

Foi-nos afirmado, pelos líderes religiosos de

antanho, que os hebreus eram um povo monoteísta, ou

seja, que defendiam a existência de uma única divindade,

ideia essa que, no decorrer do tempo, por mais absurda

que seja, os teólogos não tiveram a coragem de

demonstrar o contrário, apenas aceitando-a

comodamente.

Entretanto, as informações que coletamos, da

Bíblia e de exegetas, nos apontam para uma outra

realidade que é bem diferente dessa, uma vez que os

hebreus, como veremos, admitiam e, até mesmo,

cultuaram vários deuses, o que, por conseguinte, nos

remete, na pior das hipóteses, ao henoteísmo, ou quiçá

ao politeísmo.

Disso nos ocorreu este pensamento: “Uma

mentira contada mil vezes, torna-se verdade,

embora, na realidade, não passe de uma mentira”,

que percebemos ter sido quase o que Joseph Goebbels

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(1897-1945), ministro da propaganda de Adolf Hitler

(1889-1945), disse, no século passado, para implantação

do nazismo.

Vejamos em Russel Norman Champlin (1933-2018)

e J. M. Bentes as definições dos termos que designam

essas crenças mencionadas:

O Henoteísmo (enoteísmo) deriva seu nomedos termos gregos henós, “um”, e théos,“deus”. A ideia é que só existe um único Deus.Porém, no uso comum que se faz da palavra aideia transmitida é que existe uma divindadesuprema, que tem contato com um certo mundoou com certo grupo de seres, ao mesmo tempoem que podem existir outros deuses com outroscampos de atividade. Pelo menos em algumasculturas, como na dos hebreus, ohenoteísmo pode ser um passo intermediárioentre o politeísmo e o monoteísmo. (1) (Sóúltima frase grifo nosso)

Monoteísmo. Essa palavra vem do gregomónos, “único”, e théos, “Deus”. Portanto, elaindica aquele ensino de que só existe um Deus.Isso pode ser contrastado com o henoteísmo,que admite uma pluralidade de deuses, emboraafirme ter relações somente com um deles, quemerece a nossa adoração e obediência. (2)

1 CHAMPLIN e BENTES, 1995c, p. 82.2 CHAMPLIN e BENTES, 1995d, p. 346.

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Politeísmo. Essa palavra vem do grego,poli, “muitos”, e théos, “deus”, ou seja, a crençade que existem muitos deuses. Isso contrastacom o monoteísmo, a crença na existência deum único Deus, e com o henoteísmo, a crençade que apesar de existirem muitos deuses,somos responsáveis diante de um só Deus. (3)

Traremos a esse estudo o resultado de nossa

pesquisa para que possibilite a você, caro leitor,

participar da surpresa que tivemos sobre esse assunto e,

logo de início, nós lhe pedimos uma pequena dose de

confiança, por já afirmar no título a realidade que, nem

em sonho, esperávamos ver.

Essa ideia não nos surgiu como uma espécie de fiat

lux e nem por acaso; tivemos, na verdade, como base

três passagens bíblicas, que sempre nos deixavam com

uma certa desconfiança – ou como se diria popularmente:

“com uma pulga atrás da orelha” –, quanto à questão do

povo hebreu ter sido realmente monoteísta, como sempre

nos ensinaram os líderes religiosos. São elas:

1ª) Deus ordena a Abraão a oferecer em sacrifício o

seu filho Isaac (Gênesis 22,1-9);

2ª) Deus se identifica a Jacó como “Eu sou El”

(Gênesis 46,3);

3 CHAMPLIN e BENTES, 1995e, p. 321.

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3ª) Com a demora de Moisés no topo do Sinai, o

povo fabrica uma estátua de um bezerro de ouro

apresentando-o como: “Este é teu Deus, ó Israel”

(Êxodo 32,1-6).

Vamos analisar cada uma dessas passagens, para

ver o que delas podemos tirar de útil ao nosso estudo.

Teremos como ponto norteador o fato de que “A

crítica não conhece textos infalíveis; seu primeiro

princípio é admitir a possibilidade de um erro no texto

que estuda.” (4)

Todos os textos bíblicos que utilizamos, no presente

estudo, têm como fonte a Bíblia de Jerusalém.

4 RENAN, 2004, p. 19.

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Análise das passagens base do questionamento

Primeiramente, para bem nos situarmos, devemos

explicar quem foi Abraão, o primeiro personagem bíblico,

do qual falaremos no decorrer da análise:

Abraão. É o mais antigo dos patriarcas eantepassado do povo de Israel (Gn 11-25).Atendendo à ordem de Deus, deixou Ur doscaldeus e, na primeira metade do segundomilênio a. C., emigrou para Canaã. Ali Deus fezcom ele uma aliança, prometendo uma terra euma grande descendência. […]. (5) (grifo nosso)

O fato importante aqui é que, ao final, ele se

estabeleceu em Canaã, região situada entre o vale do rio

Jordão e a costa do Mediterrâneo, que, segundo

apuramos, “é a antiga denominação da região

correspondente à área do atual Estado de Israel, da

Cisjordânia, da Jordânia ocidental, sul da Síria e sul do

Líbano.” (6)

Em A história de Israel no Antigo Testamento, o

autor Samuel J. Schultz (1914-2005), explica:

5 Bíblia Sagrada Vozes, p. 1513.6 Link: http://pt.wikipedia.org/wiki/Cana%C3%A3.

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A Mesopotâmia, a terra entre os dois rios,era a terra natal de Abraão (veja Gn 12:6;24:10 e At 7:2). Localizada às margens doBalique, um tributário do rio Eufrates, Harãconstituía o centro da cultura onde ele vivia comseus parentes. Nomes da gente de Abraão –Terá, Naor, Pelegue, Serugue, além de outros –são confirmados nos documentos de Mari e dosassírios como nomes de cidades daquela área.(7) Em obediência à ordem divina de deixarsua terra natal e sua parentela, Abraãodeixou Harã a fim de fixar nova residência naTerra de Canaã.

Abraão vivera em Ur dos caldeus antes de tervindo para Harã (ver Gn 11:28-31). Aidentificação mais geralmente aceita de Ur é amoderna Tell el-Mugayyar, que está localizada acatorze quilômetros e meio a oeste de Nasiryeh,no rio Eufrates, no sul do Iraque. […] O deus-lua Nanar, que era adorado em Ur, tambémera a principal divindade em Harã. (8) (9) (grifonosso)

A respeito de Canaã informa Schultz, ainda sem

mencionar as práticas religiosas da região, o que mais à

7 Nota da Transcrição (N.T.): Essas terras também eram conhecidas comoPadã-Arã, motivo pelo qual foi aplicado o nome de “arameus” a Abraão eseus parentes. Cf. Gn 25:20; 28:5; 31:20,24 e Dt 26:5. Além disso, Labrãofalava o aramaico. Cf. Gn 31:47.

8 N. T.: G. E. Wright, Biblical Archaeology (Filadelfia: Westminster Press,1957), pág. 41, observa: “Seja como for, podemos dizer com segurançaque Harã era o lar com o qual os patriarcas estiveram mais intimamenteligados, havendo pouca evidência de qualquer influência sobre suastradições da parte do sul da Mesopotâmia”.

9 SCHULTZ, 1995, p. 31.

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frente veremos:

O nome “Canaã” se aplica às terras quejazem entre Gaza, no sul, e Hamate, no norte,ao longo das costas orientais do marMediterrâneo (ver Gn 10:15-19). Os gregos, emseu intercâmbio com Canaã, durante o primeiromilênio a.C., chamavam seus habitantes defenícios, nome esse que provavelmente teveorigem no termo grego que significa “púrpura”,que designava a cor carmesim de um corantede têxteis criado em Canaã. Desde o século XVa.C. o nome “Canaã” vinha sendo aplicado, demodo geral, à província egípcia da Síria, ou,pelo menos às costas fenícias, o centro daindústria da púrpura. (10) Consequentemente, aspalavras “cananeu” e “fenício” têm a mesmaorigem cultural, geográfica e histórica. Maistarde essa área veio a ser conhecida como Síriae Palestina. A designação de “Palestina” tevesua origem no nome “Filístia”. (11)

Essa informação de Schultz é importante para

situarmos geograficamente Canaã e considerarmos a

designação moderna da região como sendo a Palestina,

região berço daquele que é nosso modelo e guia: Jesus.

Para que essa visão seja mais clara ainda,

10 N.T.: Cf. Merrill F. Unger, Israel and the Aramaeans of Damascus(Londres: James Clarke & Co., 1957), pág. 19) (grifo do original)

11 SCHULTZ, 1995, p. 25-26

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tomamos esta imagem (12) intitulada “O Mundo Patriarcal”

equivalente à que consta nessa obra:

1ª) Deus ordena a Abraão a sacrificar o seu filho

Isaac

Gênesis 22,1-9: “Depois desses acontecimentos,sucedeu que Deus pôs Abraão à prova e lhe disse:'Abraão! Abraão!' Ele respondeu: 'Eis-me aqui!'Deus disse: 'Toma teu filho, teu único, queamas, Isaac, e vai à terra de Moriá, e lá ooferecerás em holocausto sobre uma montanhaque eu te indicarei.' Abraão se levantou cedo, selou

12 Link: https://3.bp.blogspot.com/-d3tbXWluiJY/Wvrqfmd-4RI/AAAAAAAAA1s/gQaBU5ArFQUEs2sFCA3bdGPl-p5fDVWRQCLcBGAs/s400/Mapa%2B01%2B-%2BO%2BMundo%2BPatriarcal.jpg.

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seu jumento e tomou consigo dois de seus servos eseu filho Isaac. Ele rachou a lenha do holocausto ese pôs a caminho para o lugar que Deus haviaindicado. No terceiro dia, Abraão, levantando osolhos, viu de longe o lugar. Abraão disse a seusservos: 'Permanecei aqui com o jumento. Eu e omenino iremos até lá, adoraremos e voltaremos avós.' Abraão tomou a lenha do holocausto e acolocou sobre seu filho Isaac, tendo ele mesmotomado nas mãos o fogo e o cutelo, e foram-se osdois juntos. Isaac dirigiu-se a seu pai Abraão edisse: 'Meu pai!' Ele respondeu: 'Sim, meu filho!' –'Eis o fogo e a lenha,' retomou ele, 'mas onde estáo cordeiro para o holocausto?' Abraão respondeu:'É Deus quem proverá o cordeiro para oholocausto, meu filho', e foram-se os dois juntos.9Quando chegaram ao lugar que Deus lhe indicara,Abraão construiu o altar, dispôs a lenha, depoisamarrou seu filho e o colocou sobre o altar, emcima da lenha.” (grifo nosso)

Sempre achamos completamente fora de propósito

essa atitude de Abraão de atender a ordem para sacrificar

seu único filho, pelo motivo de que o sacrifício de seres

humanos era algo comum somente entre os povos que

adoravam deuses pagãos.

Para nós o Criador do Universo, jamais

compactuaria com uma atrocidade desse gênero, mesmo

que, no último minuto, tenha voltado atrás, pois alguma

espécie de mal já havia sido feito.

Imagine, leitor, se você estivesse no lugar de

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Abraão, o que teria passado de sofrimento moral para

“provar” sua fidelidade a esse deus (letra minúscula

mesmo). Avalie o que seu filho passou, ao saber ser ele

próprio a vítima do holocausto? Aliás, muito nos

surpreende ver como as pessoas aceitam piamente isso,

sem o menor constrangimento.

A prontidão com que Abraão agiu só pode significar

que ele já vivia num meio em que era prática comum o

sacrifício de seres humanos. Assim, não é difícil concluir

que ele, na verdade, seguia a um deus pagão. Moloque

(Moloc ou Moloch), por exemplo, é citado vezes na Bíblia.

Eis uma imagem que o representa. (13)

13 https://blogdoseualipio.com.br/wp-content/uploads/2016/12/Acaz-oferece-filhos-em-sacrif%C3%ADcio-696x779.jpg

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Na obra Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia,

os autores R. N. Champlin e J. M. Bentes, explicam-nos

que:

A adoração a esse deus estava associada aosacrifício de crianças ou infantes, na fogueira(Lev, 18:21; 20:2-5; II Reis 23:10; Jer, 32:35; II Reis20:3-5; 17:31). Essa prática é confirmada nosantigos cultos mesopotâmicos e filisteus. Aarqueologia tem demonstrado abundantemente essa prática. As referências bíblicas sãoperfeitamente claras. As leis de Moisés proibiamessa prática, sob pena de morte (Lev, 18:21; 20:2-5). No entanto, em cerca de 1000 A. C., Salomãoedificou um lugar alto em honra a essadivindade (naquele lugar que, mais tarde, veio aser chamado de monte das Oliveiras) (I Reis 11:7).O rei Acaz, em cerca de 730 A.C., queimou seusfilhos na fogueira (II Crô. 28:3), tal como veio afazê-lo Manassés (II Reis 21:6). Em Samariatambém chegou-se a praticar esse incrívelpecado, e a cidade foi julgada por esse motivo (IIReis 17:17). Josias destruiu os lugares altos deMoloque (II Reis 23:10,13). E foi necessário queEzequiel condenasse essa prática, já tão tardequando o começo do século VI A.C. Somente ocativeiro babilônico parece ter posto fim,definitivamente, a esse horrendo culto, embora,fora da Palestina, ainda tivesse permanecido nonorte da África, entre os fenícios cartagineses, atédentro da própria era cristã. (14) (grifo nosso)

14 CHAMPLIN e BENTES, 1995d, p. 342.

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Um ponto importante que se deve ressaltar é o fato

do envolvimento dos hebreus no culto a Moloque,

conforme mencionado na transcrição.

De tudo que foi dito, podemos concluir que, na pior

das hipóteses, Abraão vivia numa região em que o

sacrifício de crianças era praticado sem qualquer

constrangimento. Porém, temos confirmação de que Taré

(ou Terá, em algumas traduções), o pai de Abraão, servia

a outros deuses:

Josué 24,1-3: “Josué reuniu todas as tribos de Israelem Siquém; convocou todos os anciãos de Israel,seus chefes, seus juízes e seus escribas, que secolocaram ordenadamente na presença de Deus.Disse então Josué a todo o povo: 'Assim diz Iahweh,o Deus de Israel: Além do Rio (15) habitavamoutrora os vossos pais, Taré, pai de Abraão ede Nacor, serviam a outros deuses. Eu, porém,tomei vosso pai Abraão do outro lado do Rio e o fizpercorrer toda a terra de Canaã, multipliquei a suadescendência e lhe dei Isaac.'” (grifo nosso)

E para provar que não estamos vendo o que não

existe, apresentamos essas explicações dos tradutores

bíblicos:

24.2 Vossos pais… serviram… deuses. Terá,o Pai de Abraão, habitava na cidade de Ur

15 O Rio mencionado em outras traduções é o Eufrates.

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dos Caldeus, onde o povo servia a váriosdeuses. O monumento principal da cidade eradedicado ao deus da lua, o padroeiro da cidade.Também foi reconhecido Sumas, o deus-Sol eNana (ou Astarte), a filha do deus da lua, eoutros deuses. (16) (grifo nosso)

24.2. Deuses estrangeiros: Os pais deAbraão teriam sido, pois, pagãos. (17) (grifonosso)

24,2-4 Etapa patriarcal. Começa a históriaem tempos imemoriais na Mesopotâmia, ondese encontram as raízes étnicas do povo. Naperspectiva do capítulo, os antepassadosserviam ou prestavam culto a “outrosdeuses”. (18) (grifo nosso)

Samuel J. Schultz, em A História de Israel no Antigo

Testamento, afirma categórico:

A religião de Abraão forma um tema vitalnas narrativas sobre os patriarcas. Vindo de umambiente politeísta, onde o deus-lua Nanar erareconhecido como principal divindade da culturababilônica, Abraão chegou em Canaã. Que suafamília servia a outros deuses é claramenteafirmado em Js 24:2. […]. (19) (grifo nosso)

16 Bíblia Shedd, p. 339.17 Bíblia Ave-Maria, p. 275.18 Bíblia do Peregrino, p. 415.19 SCHULTZ, 1995, p. 33.

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Em Champlin, encontramos:

Serviram a outros deuses. Abraão, seuirmão, Naor, e o pai deles, Terá era todosidólatras. Isso posto, em certo sentido, achamada do povo de Israel foi a chamada deum pequeno clã da idolatria para o monoteísmoyahwista. Isso foi um autêntico avançoespiritual; e Josué anelava por preservar essepasso para frente. […].

Que Abraão anteriormente tinha sido idólatranão é dito especificamente no livro de Gênesis.Entretanto, certos trechos do livro de Gêneses(ver 31.19,29,30,53; 35,2-4) dão a entender quehouve um passado idólatra em sua família.(20) (grifo nosso)

Em a Enciclopédia de Bíblia, teologia e filosofia,

(vol. 4), Champlin e Bentes afirmam que: “[…] É inegável

que os antepassados de Abraão eram politeístas (ver

Gên. 35:2; Jos. 24:2)”. (21)

Em outro volume dessa coleção (vol. 6), Champlin e

Bentes explicam:

Na Bíblia. Ficamos desolados diante dovigésimo segundo capítulo de Gênesis.Nenhuma explicação pode aliviá-lo de suademonstração de uma religião primitivista.

20 CHAMPLIN, 2001, p. 983.21 CHAMPLIN e BENTES, 1995d, p. 347.

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Mesmo que Abraão tenha crido, sinceramente,que Deus requerera dele um sacrifício humano,e isso de seu próprio filho, é impossível crerque Deus lhe tenha dado, realmente, talmensagem. Abraão teria agido em boa fé; maso Senhor não estaria vinculado à questão, sobhipótese alguma. É óbvio, pois, que Abraãoainda retinha traços de selvageria epaganismo em sua fé, apesar do seu grandeavanço espiritual. Podemos extrair do relatomuitas boas lições morais; mas é catastróficopara a fé religiosa sã, a suposição de queDeus, sob qualquer circunstância ou razão,tenha ordenado que se fizesse um sacrifíciohumano. Mais tarde, na legislação de Israel, ossacrifícios humanos foram estrita eenfaticamente proibidos. Ver Lev. 18:21. E apena de morte era imposta aos desobedientes(Lev. 20:2,3). (22) (grifo nosso)

Além desse, há um outro comportamento de

Abraão, que também nos remete à ideia de que ele

praticava rituais muito semelhantes aos dos pagãos,

quando, por exemplo, ele ia a um monte alto (ou

montanha) a fim de realizar seus cultos de adoração.

Inclusive, o caso que estamos citando, sobre o seu filho

Isaac, ele, por ordem divina, subiu a uma montanha

(Gênesis 22,2.9), cujo nome, segundo Josefo, é Moriá. (23)

Em Gênesis 31,54, narra-se, também, que Jacó – o

22 CHAMPLIN e BENTES, 1995f, p. 38.23 JOSEFO, 2003, p. 59.

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terceiro patriarca da Bíblia, filho de Isaac e Rebeca e neto

de Abraão – ofereceu um sacrifício sobre a montanha.

Jacó teve seu nome mudado para Israel (Gênesis 32,29);

são os seus descendentes que passaram a ser chamados

de israelitas (Gênesis 32,33).

Muito curioso é o fato de que o “nome Isaac, é

forma abreviada de Yçhq-El, que significa: ‘Que Deus

sorria, seja favorável’ ou ‘sorriu, mostrou-se favorável’.”

(24) Entre os hebreus, essa terminação de nomes em “El”

era fato comum, conforme veremos um pouco mais à

frente.

Na sequência da narrativa, quando Abraão pega

uma faca para imolar seu filho, aparece-lhe um anjo e o

impede de concretizar tal ato bárbaro, dizendo: Gênesis

22,10: “Não estendas a mão contra o menino! Não lhe

faças nenhum mal! Agora sei que temes a Deus: tu não

me recusaste teu filho, teu único.” (grifo nosso)

Ora, como Deus é onisciente, certamente sabia o

que se passava no íntimo de Abraão; portanto, não

precisava submetê-lo a nenhum teste; nós, seres

humanos, sim, podemos fazer testes, pois nunca sabemos

o que vai no âmago das outras pessoas.

Se prestarmos bem atenção ao teor do passo

24 Bíblia de Jerusalém, p. 55.

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bíblico acima, veremos que estranhamente está dito que

Abraão não recusou oferecer o seu filho único ao anjo e

não exatamente a Deus, porquanto o pronome “me”

refere a ele próprio, ou seja, ao anjo, que era o

personagem que dialogava com o patriarca.

Caso não atentemos para isso seremos induzidos a

acreditar que o anjo, que apareceu a Abraão, seria o

próprio Deus, o que seria incoerente diante da afirmativa

do que ele disse: “Agora sei que temes a Deus”.

Não deixamos também de estranhar essa relação

de Abraão com os anjos, em busca da origem nós a

encontramos nesta explicação em Champlin e Bentes:

II. Angelologia e origens. Os anjos sãoreferidos na Bíblia de Gên. Ao Apocalipse,desde “os carvalhais de Manre” (Gên. 13:18) atéa “ilha chamada Patmos” (Apo. 1:9). As maisantigas evidências arqueológicas em favor dacrença na existência dos anjos vêm de Ur-Namus, de cerca de 2250 A.C., onde anjos sãovistos a adejar por sobre a cabeça do rei,enquanto este orava. Visto que Abraãochegou àquela região pouco depois disso, épossível que ele estivesse familiarizado coma angelologia desde a juventude. Como éóbvio, a angelologia estava misturada a todasas formas mitológicas possíveis, religiões esuperstições primitivas, sendo crençageneralizada entre todas as religiões da

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antiguidade. Que nem todos os conceitosacerca dos anjos correspondem à realidade éalgo óbvio, mas isso não significa que tais seres(dotados de impressionantes atributos) nãoexistam. Durante o cativeiro babilônico, aangelologia recebeu maior atenção da partedos judeus. O zoroastrismo (cerca de 1000A.C.) sem dúvida muito contribuiu para aangelologia dos hebreus, mas a sua crença naexistência desses seres antecede por muitosséculos ao zoroastrismo. Parece que quasetodos os povos têm acreditado em seresespirituais que poderíamos chamar de “anjos”,embora seus idiomas não tenham algumvocábulo que possamos traduzir em portuguêsdessa maneira (“mensageiro”, ou algo similar).O Novo Testamento se inicia com anjosocupados em serviço ativo e jamais põe emdúvida a sua existência. (25) (grifo nosso)

Podemos, portanto, relacionar essa crença em

anjos como sendo um produto da cultura na qual Abraão

estava inserido; não como uma revelação particular a ele

ou dele.

A primeira vez que um ser espiritual dessa espécie

aparece na Bíblia é quando, supostamente, Deus coloca

os querubins para guardar a “porta” do Paraíso, para que

o casal Adão e Eva não comesse do fruto da árvore da

vida (Gênesis 3,24).

25 CHAMPLIN e BENTES, 1995a, p. 171.

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Eis uma imagem do que, provavelmente, seriam os

querubins:

Esfinges aladas (querubins) guardando aArca da Aliança no Templo de Salomão26

Querubins, segundo o “Aurélio”, que reflete o

conceito moderno, é uma classe de anjos; entretanto,

parece-nos que àquela época não eram considerados

bem isso:

Querubins são seres da mitologiababilônica, metade homens e metadeanimais, guardas dos portais de templos epalácios. Aqui significam ministros de Deus. O“cintilar da espada” são os raios, símbolo da

26 Link: http://www.revista-temas.com/contacto/Images/10salomao1.jpg.

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ira de Deus. (27) (grifo nosso)

Os querubins eram seres mistos,representados com rosto humano e corpo deleão ou touro ou outros quadrúpedes comasas, vindo portanto a ser uma espécie deesfinge. […]. (28) (grifo nosso)

Figuras mitológicas, representadas comasas, que ornamentavam a entrada dostemplos babilônicos. Eram os “anjos daguarda” dos referidos templos. Por isso, o textoinspirado os utiliza como guardas do Éden.Estas estátuas ornamentais aparecem ainda naArca da Aliança (Êx 37,7ss); no pórtico doTemplo (1Rs 6,23-28); e na visão de Ezequiel(Ez 1 e 10). (29) (grifo nosso)

O nome corresponde ao dos karibubabilônicos; gênios, metade homens, metadeanimais, que vigiavam a porta dos templos edos palácios. Segundo as descrições bíblicas ea iconografia oriental, os querubins são esfingesaladas. […]. (30) (grifo nosso)

Realmente, podemos confirmar que “anjo” se trata

mesmo de um ser mitológico, pois existem duas

passagens nas quais se narra Deus literalmente montado

num deles: Salmo 18,10-11: “Ele inclinou o céu e desceu,

27 Bíblia Sagrada Vozes, p. 31.28 Bíblia Sagrada Vozes, p. 376.29 Bíblia Sagrada Santuário, p. 8.30 Bíblia de Jerusalém, p. 138.

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tendo aos pés uma nuvem escura, cavalgou um

querubim e voou, planando sobre as asas do vento”.

(grifo nosso) (ver tb 2 Samuel 22,10-11). Supor que Deus

tenha usado um anjo como montaria é fora de propósito;

não é mesmo?

Muito curiosa é a definição apresentada por

Ambrogio Donini (1903-1991), em Breve História das

Religiões, sobre esses seres alados:

[…] Os querubins, touros alados que erguemna entrada dos templos babilônicos para afastaros maus espíritos, aparecem como anjos tambémna mitologia hebraica e cristã: os serafins era, emsua origem, serpentes. […]. (31) (grifo nosso)

Destacamos o termo touro, que mais à frente será

esclarecido do que representava para os hebreus.

E ao falar de Adão e Eva acabamos por nos lembrar

da serpente que os tentou; porém, Joseph Campbell

(1904-1987) nos conta uma lenda dos bassari, povo da

África Central, bem interessante:

Um dia a Serpente disse: 'Nós tambémdeveríamos comer desses frutos. Por que ficarcom fome?' O Antílope disse: 'Mas não sabemosnada deste fruto'. Então o Homem e sua

31 DONINI, 1965, p. 106.

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mulher colheram alguns frutos e comeram-nos. Unumbotte desceu do céu e perguntou:'Quem comeu o fruto?' Eles responderam:'Nós comemos'. Unumbotte perguntou: 'Quemlhes disse que podiam comer desse fruto?' Elesresponderam; 'A Serpente'. (32) (grifo nosso)

Aí Campbell arremata, comparando-a com a

história da queda de Adão e Eva: “É praticamente a

mesma história”.

Apenas para que se possa ter um mesmo

entendimento do que significa o termo holocausto, citado

em Gênesis 22,1-9, relativamente ao “sacrifício” de Isaac,

vamos recorrer ao “Aurélio”, que assim o define:

Holocausto: [Do gr. Holókauston, ‘sacrifícioem que a vítima era queimada inteira’, pelo lat.Tard. Holocausto.] S. m. 1. Entre os antigoshebreus, sacrifício em que se queimavaminteiramente as vítimas; imolação; 2. A vítimaassim sacrificada. 3. P. ext. Sacrifício, expiação.(33)

O detalhe desse ritual dos hebreus é que nele se

queimava totalmente a vítima, o que, necessariamente,

não ocorria em todos os rituais pagãos semelhantes ao

que praticavam.

32 CAMPBELL, 1997, p. 47.33 Dicionário Eletrônico Aurélio XXI.

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Entretanto, não vemos nisso um ponto para se

estabelecer uma grande diferença entre um e outro, já

que em ambos havia sacrifício de seres humanos, pouco

importa a forma com a qual praticavam esse ignóbil

ritual.

Encontramos uma informação sobre uma prática

religiosa que, não se fazia na época, caso do barbarismo

dela, hoje chocaria a maioria de nós, os pais:

Visto que as divindades dos cananeus nãoteriam caráter moral, não é de surpreender quea moralidade daquele povo fosse extremamentebaixa. A brutalidade e imoralidade que sedestacam nas narrativas sobre esses deuses éalgo muito pior que qualquer outra coisa vista noOriente Próximo. E, posto que isso se refletia nasociedade cananeia, os cananeus, nos dias deJosué, praticavam sacrifícios de crianças, aprostituição sagrada e adoração à serpente comseus ritos e cerimônias religiosos. Naturalmente,a civilização deles se degenerou debaixo dessainfluência desmoralizadora. (34) (grifo nosso)

Fora a questão da proposta de sacrificar um ser

humano, mais uma coisa nos chamou a atenção, que foi o

fato de Deus ter indicado uma montanha para que Abraão

realizasse o ritual de holocausto de seu filho; mais à

frente voltaremos a esse curioso detalhe visando

34 SCHULTZ, 1995, p. 90.

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comentá-lo.

Vejamos, por oportuno, informações sobre a

religião dos cananeus, porquanto, terá ligação com o item

que, imediatamente, se segue a esse. Tomamos esta

explicação de Champlin e Bentes, que dizem:

6. A Religião dos Cananeus. O AntigoTestamento informa-nos muita coisa a respeitodo Panteão dos cananeus. A divindadeprincipal era El, a quem os outros deusesprecisavam consultar sobre questõesimportantes. Porém, Baal, filho de El, tornou-semais significativo. Ver o artigo sobre BAAL.Essa palavra significa “senhor”. Havia muitasmanifestações locais de Baal, como deus dafertilidade, deus da tempestade, etc. Tanto Baalquanto Dagom tinham um templo em, Ugarite.Atar era a divindade que substituía a Baal,quando este último supostamente excursionavapelo submundo dos espíritos. Atar era filho deAterate, consorte de El. Havia muitas deusas,como Anate, Aserá e Astarte (ou Astarote),deusas do sexo, da fertilidade e da guerra. -Anate era uma importante deusa para aagricultura. Os deuses Shahru (estrela matutina)e Yarbu (deus-lua), bem como Resebe, deus dapestilência e da morte, também eram adoradosem Canaã. Não há certeza se o deus Yahwehera conhecido ou não pelos cananeus.Milhares de tabletes de argila, guardados emuma biblioteca existente entre dois templos,datados de cerca dos séculos XV e XIV A. C.,

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descobertos em Ras Shamra, nos fornecemabundantes informações sobre a religião doscananeus. Havia grosseira imoralidade demistura com a adoração prestada a váriasdivindades da fertilidade, e os cananeusestavam maduros para o julgamento divino. Ésignificativo que alguns dos nomes de Deus,no hebraico, têm paralelo nos nomes dosdeuses cananeus, o que mostra que haviacerto contacto e troca de ideias ali, embora areligião cananeia e a religião hebreia tantodiferissem, mormente no tocante aomonoteísmo. Os deuses cananeus não sedestacavam quanto à santidade.

Templos cananeus têm sido escavados naSíria e na Palestina, e significativos modelostêm sido encontrados em Laquis (que vide),Megido, Jericó, Bete-Seãe e Hazor,pertencentes a um tempo tão remoto quanto3000 A.C., e daí até 1900 A.C. Muitos objetosrelacionados à adoração pagã têm sidodesenterrados, como objetos de culto, facas,tenazes, vasos de libação e ossos de animais, oque mostra que ali se praticava o sacrifíciode animais.

Em Ugarite, havia um sistema complexo dereligião, talvez típico também de outraslocalidades. Havia um sumo sacerdote e nadamenos de doze famílias de sacerdotes. O reiexercia funções sacerdotais. Havia cantores,costureiros de vestimentas, escultores e outrosespecialistas. Novamente, vemosconsiderável correspondência entre isso e areligião de Israel. Pelo menos é verdade que,

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quanto às questões culturais, os cananeus eramsuperiores aos israelitas, que muito seaproveitaram da cultura cananeia. Já vimoscomo Salomão dependeu desse povo quantoaos planos e à construção do templo deJerusalém. Era tarefa dos profetas impedirpesados empréstimos e corrupçõesprovenientes dos pagãos, mas os profetas nemsempre mostraram-se bem-sucedidos em seusesforços. A confusão entre Baal e Yahwehdestruiu a distintiva fé dos hebreus.Lembremo-nos do desafio lançado por Elias:“Se o Senhor é Deus, segui-o; se é Baal, segui-o”. (I Reis 18:21). (ALB ALBR AM LAM) (35) (grifonosso)

Os vários trechos que grifamos no texto tem

objetivo de ressaltar as coisas ditas neles, uma vez que

elas irão ser mencionadas, ao longo de nosso estudo.

2ª) Deus se identifica a Jacó como “Eu sou El”

O teor do passo, cujo texto nós transcrevemos da

Bíblia de Jerusalém (= Bíblia Sagrada Edição Pastoral), é:

Gênesis 46,3: “Deus retomou: ‘Eu sou El, o Deusde teu Pai. Não tenhas medo de descer ao Egito,porque lá eu farei de ti uma grande nação’”. (grifonosso)

Em outra passagem, na qual se fala da chegada de

35 CHAMPLIN e BENTES, 1995a, p. 621.

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Jacó a Siquém, na terra de Canaã, a identificação de “El”

como sendo o Deus dos hebreus também é direta:

Gênesis 33,20: “E lá erigiu um altar, que chamou‘El, o Deus de Israel’”. (grifo nosso)

Epa!!!: “Eu sou El” e “El, o Deus de Israel”? Que

“El” é esse?! Desconhecíamos de quem se tratava; por

isso fomos pesquisar e encontramos, no Dicionário Bíblico

Universal, a seguinte explicação para a palavra “El”:

É o nome do deus venerado pelos semitasdo Oeste. Esse deus pessoal é chamado “paidos deuses e dos homens”, o “criador dascoisas criadas”, o “pai dos anos”; é imaginadocomo um ancião de barba branca. É “sábio,benevolente e misericordioso”. Habita num lugarmisterioso, no extremo do mundo, “na fonte dosrios, na profundidade dos abismos”. Équalificado de El-Touro, muito mais por seupoder do que por sua fecundidade. Entre osarameus, os nomes compostos de El sãomuito frequentes: Batuel (Gn 22,22), Tabeel (Is7,6). Nomes semelhantes encontram-se entreos israelitas, desde os tempos mais remotos:Ismael, Jerael, Elias, Eliseu, Emanuel…

É que, vindo da Mesopotâmia, ospatriarcas encontraram em Canaã o culto dodeus El, celebrado sob diversos nomes: El-Roi(Gn 22,14), El-Olam (Gn 21,33), El-Berit (Jz8,33). Facilmente identificaram seu deusShaddai com a divindade adorada pelos

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cananeus e louvada em termos que convinhamà sua fé.

É a forma Elohim que mais comumentedesigna Deus. Esse plural, constantementeacompanhado de um verbo no singular (Gn 1,1),deve significar a majestade ou a plenitude. (36)(grifo nosso)

Damos apenas uma rápida pincelada, pois, mais à

frente, voltaremos a esse ponto; trazemos, também, em

Mircea Eliade (1907-1986), na obra Tratado de História

das religiões e em Werner Keller (1909-1980), no livro e a

Bíblia tinha razão…, o seguinte:

[…] Os textos de Ras Shamra, que sãopreciosos documentos sobre a vida religiosa dossemitas pré-mosaicos, mostram que El e Bethelsão os nomes intermutáveis de uma mesmadivindade. (37) (grifo nosso)

O deus El ocupava o primeiro lugar sobreos baalim de Canaã. Sua esposa era Achira,deusa também citada na Bíblia. Ele casou comsuas três irmãs, uma das quais era Astarteia.Como Astarot (Juízes 2.13, 10.6, e outros), émencionada repetidamente no VelhoTestamento. El não só matou seu irmão, mastambém o próprio filho; cortou a cabeça da suafilha, castrou seu pai e a si próprio e obrigou

36 MONLOUBOU, e DU BUIT, 1997, p. 218.37 ELIADE, 1998, p. 186.

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seus companheiros a fazerem o mesmo. (38)(grifo nosso)

A História Pagã do termo El não é muitoagradável. Dentro da religião dos cananeus,conforme é referido pelo historiador fenício, Filode Biblos (cerca de 100 d.C.), bem como naliteratura religiosa desenterrada em Ras Shamra(a antiga Ugarite, no sul da Síria, 1929-1937), Elera a divindade principal de um elaboradopanteão cananeu. De acordo com essas fontesinformativas. El teria três esposas, todas elassuas irmãs. Aparece ali como um tiranosanguinário, de destronou o seu próprio pai,Urano, assassinou o seu filho favorito edecapitou uma de suas filhas. Também era umacriatura sensual e mórbida. Contudo, pelo ladobom, ele era intitulado de “Pai dos Anos”, “Paido Homem”, e “Touro Pai”. À semelhança deZeus, deus grego, ele era imaginado como oprogenitor de todos os deuses. Baal, quefinalmente chegou a ser o principal objeto deadoração, era considerado filho de El. Sejacomo for, El foi tão importante, em certa época,que a literatura de Ras Shamra refere-se à terrade Canaã como “terra de El”.

Todas as religiões, antigas ou modernas,quando descrevem Deus (ou algum deus), sãoforçadas a lançar mão de termosantropomórficos, quando então são atribuídasqualidades humanas, visto que a linguagem é oprincipal meio de expressão e comunicação e

38 KELLER, 2000, p. 285.

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que a mesma reveste-se de tão grandeimportância para nós, seres humanos. Asreligiões pagãs constantemente atribuíam aosseus deuses todas as más qualidades humanas,excetuando que os homens vão se tornandocada vez piores, multiplicando a destruição e aselvageria que caracterizam as pessoas.Encontramos algo dessa atividade nas páginasdo Antigo Testamento, onde Deus é retratadocomo cabeça de exércitos destruidores, queexige toda a forma de matanças. As tentativasde muitos evangélicos para justificar essequadro sobre Deus são comuns e insistentes,mas não me convencem. É ridículo supor queuma revelação mais avançada não melhora onosso conceito de Deus, conforme melhora tudoo mais que conhecemos a respeito daespiritualidade. Deus atua através do processohistórico e sua autorrevelação ocorre apenasem estágios e mui gradualmente. Ainda estamosa longa distância da verdadeira compreensãosobre Deus, embora saibamos muitas coisassobre as suas obras, especialmente o que foifeito por meio de Cristo, que é o Irmão maisvelho dos homens e que veio redimir e restaurarà humanidade. (39) (grito nosso)

Informações muito interessantes encontramos aqui:

título de “Pai dos deuses”, qualificação “El-Touro”, que

falaremos na sequência, e os nomes de pessoas

terminados em “El”. Inclusive, o próprio nome Jacó é: “na

39 CHAMPLIN e BENTES, 1995b, p. 312.

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realidade, o nome abreviado de Ya’aqob-El, significa

provavelmente: ‘Que Deus proteja’.” (40)

As considerações finais de Champlin e Bentes são

desconcertantes para os fundamentalistas, que nunca

enxergam coisas óbvias nos textos bíblicos, dado ao

literalismo e ao dogmatismo de que são portadores.

Para o primeiro título, ou seja, “Pai dos deuses”,

temos a correspondente expressão bíblica “Deus dos

deuses” (Deuteronômio 10,17; Josué 22,22; Salmo 50,1;

136,2; Daniel 11,36) com a qual os israelitas, algumas

vezes, designavam a sua divindade; iremos citá-las mais

à frente.

Em relação ao segundo, no caso, “El-Touro”,

percebemos uma estreita relação com os touros e

bezerros oferecidos em sacrifício; na imagem do bezerro

de ouro, que os hebreus fabricaram para representar sua

divindade e nos doze touros de bronze que sustentavam o

Mar (bacia), feitos por ordem de Salomão como utensílio

do Templo, que, sob suas ordens, foi edificado em

Jerusalém. Mais à frente traremos uma imagem

representativa deles.

E, por fim, os nomes de pessoas com terminação

em “El”, cuja origem nós encontramos esta explicação no

40 Bíblia de Jerusalém, p. 66.

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Dicionário Bíblico Universal:

[…] Entre os arameus, os nomescompostos de El são muito frequentes:Batuel (Gn 22,22), Tabeel (Is 7,6). Nomessemelhantes encontram-se entre osisraelitas, desde os tempos mais remotos:Ismael, Jerael, Elias, Eliseu, Emanuel… (41)(grifo nosso)

Então, vemos uma grande possibilidade de os

hebreus terem adotado o costume dos arameus,

colocando a terminação El para os nomes de seus

cidadãos; termo, cujo significado é Deus, isto é, El =

Deus, conforme poder-se-á ver, por exemplo, no sentido

dado a cada um destes nomes listados:

Abdeel: servo de Deus.Abiel: Deus é meu pai.Abnel: rebanho de Deus.Babel: porta de Deus.Betel: casa de Deus.Daniel: Deus é meu juiz.Elcana: possessão de

Deus.Eleazar: Deus ajudou.Eli: meu Deus.Elias: Deus é meu pai.Elifaz: Deus é sua força.Eliseu: Deus é salvação.

Israel: que luta com Deus.Jabneel: Deus edifica.Jadiel: Deus alegra.Jediael: conhecido de

Deus.Jeiél: Deus consola.Jesreel: Deus semeia.Lael: consagrado a Deus.Lemuel: dedicado a Deus.Malquiel: Deus é rei.Matusael: homem de

Deus.Micael: quem é como

41 MONLOUBOU, e DU BUIT, 1997, p. 218.

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Emanuel: Deus conosco.Ezequiel: Deus fortalece.Gamaliel: recompensa de

Deus.Haniel: graça de Deus.Isabel: Deus, que faz

pacto.Ismael: Quem Deus ouve.

nosso Deus?Misael: quem é igual a

Deus?Natanael: dom de Deus.Netanel: Deus deu.Samuel: ouvir de Deus ou

nome de Deus.Uriel: Deus é luz.Uziel: Deus é a minha

força.

Vê-se, portanto, quão forte era, entre eles, a

influência do deus dos cananeus denominado El. E como

viveram nas suas terras (ou vieram de lá?) não é muito

difícil fazer uma relação e concluir que essa divindade

cananeia era, de fato, adorada pelos hebreus, embora

isso não signifique que não adorassem outros deuses; o

que nos levaria, portanto, a um politeísmo.

Além desses, é oportuno ainda acrescentar aqueles

com os quais designavam alguns seres espirituais, no

caso os anjos:

Gabriel: varão ou soldado de Deus.

Miguel: quem como Deus?

Rafael: medicina de Deus.

É até curioso que anjos, sempre considerados como

seres especiais, bem acima da humanidade, tenham

nomes comuns a seres humanos.

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E, por fim, encontramos até um nome terminado

em El designando um demônio:

Azazel: a força de Deus (42).

Esse nome aparece em Levítico 16,8s; entretanto,

temos várias traduções para ele, como “bode emissário”,

por exemplo; porém, quase ninguém dá o seu real

significado. Claro! Como relacionar o nome de um

demônio a Deus? Dele, temos estas explicações:

Azazel, como bem parece ter compreendidoa versão siríaca, é o nome de um demônioque os antigos hebreus e cananeusacreditavam que habitasse o deserto, terraárida onde Deus não exercia a sua açãofecundante (cf. Lv 16,22 e ref. 17,7+) (43) (grifonosso)

[…] O misterioso Azazel, que aparece sóneste capítulo da Bíblia (Lv 16), seria, conformeuma opinião corrente, um chefe de demônios(sátiros) que habita no deserto. Ver Is 13,21;34,14; Mt 12,43; Lc 11,23, e a descriçãofantástica de Zc 5,5-11. Parece tratar-se decrença antiga, tomada de outra cultura e nãobem integrada na fé javista. Precisamente porsua estranheza, a cerimônia podia ser maisimpressionante. (Bíblia do Peregrino, p. 205,grifo nosso)

42 Bíblia Shedd, p. 163.43 Bíblia de Jerusalém, p. 183-184.

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Oriundas desse fundo comummesopotâmico são as lendas do demônio dodeserto – Azazel (aziz = “força” e El =“Deus”, ao qual se ofereciam sacrifícios aomesmo tempo que a Deus (Levítico 16,8-10) – eas de Lilith – a primeira e insubmissa mulher deAdão e, posteriormente, demônio da luxúria –,bem como as lendas que povoam de espíritosos espaços em torno do rei Salomão, […]. (44)(grifo nosso)

A esse demônio, os hebreus ofereciam um bode

vivo, enviando-o para o deserto, cuja função era a de

expiar os pecados do povo; daí vem a conhecida

expressão “bode expiatório”.

Ao que tudo indica, embora poucos tenham a

coragem de admitir, sua origem é pagã, provavelmente

dos cananeus, povo que os hebreus lhe tomaram as

terras, a fio de espada.

Cabe uma pergunta: demônios ou espírito maus?

Ora, a crença dos hebreus era em espíritos maus, não em

demônios, como querem fazer entender alguns tradutores

e exegetas; tanto é que essa palavra não aparece no

Antigo Testamento, para designar um ser opositor a Deus,

de maneira a se formar a dualidade: deus do bem, deus

do mal.

44 NOGUEIRA, 2002, p. 17.

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Em nenhuma passagem do VelhoTestamento, o Diabo é citado. Satanás émostrado no livro de Jó mais como um anjooficial a serviço de Deus do que como uminimigo. E as poucas referências a demônioscontidas no antigo livro, sempre no plural egenéricas, tratam de divindades pagãs dospovos antigos. (45) (grifo nosso)

Demônios. Ao lado dos anjos bons, ojudaísmo reconhece a existência de espíritosmaus, ou anjos-maus, que causavam mal aoshomens. […]. (46) (grifo nosso)

Em Deuteronômio 32,17, consta a palavra

“demônios”; vejamos como tradutores bíblicos a

explicam:

“A demônios (ídolos).” Hebr.: lash-she-dhim; gr.; daí-mo-ní-os; lat.: dae-mó-ni-bus.(47) (grifo do original)

Demônios. Heb shēdhim, uma palavraderivada do assírio, que empregavam nosentido de “espírito protetor”, que significa, paraos hebreus, “um demônio dos pagãos”. Tudoaquilo que não é de Deus, mesmo sendosobrenatural, ou usado como objeto dedevoção, pertence ao Maligno; cf. v.21 com 1Co

45 GIASSETTI e CORCI, s/d, p. 12.46 Bíblia Sagrada Vozes, p. 1520.47 Tradução do Novo Mundo, p. 271.

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10.14-22. Confiar num “espírito protetor” dospagãos e abandonar a adoração a Deus, e cairem idolatria, em uma adoração falsa, inspiradapor poderes do inferno. (48) (grifo nosso)

A prova de que nesse passo o termo não

corresponde ao que hoje entendemos por demônio está

em que os tradutores da Bíblia Sagrada Vozes usaram o

termo “gênios”. Citam, no Índice Temático, as seguintes

ocorrências para a palavra demônio: “existe: Is 14,12-15;

tentador: Gn 3,1-15; Sb 2,24.” (49)

Porém, citar Isaías é pura apelação, pois nesse

livro, no capítulo 14, fala-se do rei da Babilônia e não de

demônio; em Gênesis cita-se uma serpente e no de

Sabedoria encontramos a palavra diabo, cujo “texto grego

usa a palavra diabo (diábolos), que significa caluniador,

acusador e que corresponde exatamente à palavra

hebraica satã” (50), portanto, em nenhuma delas o termo

usado corresponde a um ser do mal em oposição a Deus.

O significado da palavra demônio como espírito

mau (impuro), pode ser corroborado no Novo Testamento,

quando as passagens, que narram o caso do possesso de

Gerasa (Mateus 8,28-34; Marcos 5,1-13; Lucas 8,26-39), o

do possesso de Cafarnaum (Marcos 1,2128; Lucas 4,31-

48 Bíblia Shedd, p. 299.49 Bíblia Sagrada Vozes, p. 1497.50 Bíblia Sagrada Ave-Maria, p. 837.

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37), o da filha da mulher cananeia (Mateus 15,21-28;

Marcos 7,24-30) e o do menino mudo e epilético (Marcos

9,14;29; Mateus 17,14-21; Lucas 9,37-43), os autores

bíblicos usam indistintamente os dois termos para

designar a mesma ocorrência, tornando-os, portanto,

sinônimos.

Interessante informação nós encontramos em

Champlin e Bentes:

Era ponto teológico comum, entre osjudeus (sendo ensinado nas escolas teológicasjudaicas dos fariseus e de outros), que osdemônios, capazes de possuir e de controlarum corpo vivo, são espíritos de mortospartidos deste mundo, especialmente, aquelesde caráter vil e de natureza perversa. (verJosefo, de Bello Jud. VII. 6:3). Os gregos, osromanos e outros povos antigoscompartilhavam dessa crença. Alguns dospais da Igreja também aceitavam essa ideia, taiscomo Justino Mártir (150 D.C.) e Atenágoras. (51)(grifo nosso)

Assim, fica claro que foi somente com o tempo que

o vocábulo “demônio” tomou o significado de uma

potência do mal, cuja existência consiste em rivalizar-se

com Deus.

51 CHAMPLIN e BENTES, 1995b, p. 47.

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Há outra designação utilizada para o Deus dos

hebreus, tomemos este passo:

Gênesis 17,1: “Quando Abraão completou noventae nove anos, Iahweh lhe apareceu e lhe disse: ‘Eusou El Shaddai, anda na minha presença e sêperfeito.’” (grifo nosso)

A designação de “El Shaddai”, é utilizada em outras

sete passagens (52), porém, a sua tradução foi usada a

expressão “Deus Todo-poderoso”, fato que levou os

tradutores da Bíblia de Jerusalém a colocar uma nota de

rodapé, esclarecendo:

Antigo nome divino da época patriarcal (28,3;35,11; 43,14; 48,3; 49,25), mantidoespecialmente pela tradição sacerdotal (cf. Ex6,3), raro fora do Pentateuco, salvo em Jó. (53) Atradução comum “Deus Todo-poderoso” éinexata. O sentido é incerto; propôs-se “Deus damontanha”, segundo o acádico shadû; seriapreferível entender “Deus da Estepe”, segundoo hebraico sadeh é outro sentido do termoacádio. É uma apelação divina que correspondeao modo de vida. (54)

52 Gênesis 28,3; 35,11; 43,14; 48,3; 49,25; Êxodo 6,3 e Ezequiel 10,5.53 Em Jó 5,17: “Ditoso o homem a quem Deus corrige: não desprezes a lição

de Shaddai.” Em nota de rodapé, lemos: Este nome divino da épocapatriarcal (cf. Gn 17,1+) é empregado por Jó com intenção de arcaísmo.(Bíblia de Jerusalém, p. 808) Isoladamente o termo Shaddai é tambémusado: Jó 6,4.13; 8,3.5; 11,7; 13,3; 15.25; 21,15.20; 22,3.17.23.25.26;23,16; 24,1; 27,2.10.11.13; 29,5; 31,2.35; 32,8; 33,4; 34,10.12; 35,13;37,28; 40,2; Salmo 68,15; 91,1; Isaías 13,6; Ezequiel 1,24 e Joel 1,15.

54 Bíblia de Jerusalém, p. 54.

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Se é “Deus Todo-poderoso” ou “Deus da

montanha”, isso pouco nos importa, uma que, no

momento, o que mais nos interessa é o uso do termo “El”,

para designar Deus.

Em Tradução do Novo Mundo das Escrituras

Sagradas, temos um Apêndice, do qual destacamos o

tópico 1 G - “O [verdadeiro] Deus”, Hebr. ha.’Él,

onde lemos:

O título ‘El, quando precedido pelo artigodefinido ha, forma a expressão ha.’Él. Estaexpressão ocorre 32 vezes no M, no singular, esempre se refere ao verdadeiro Deus, Jeová.Gesenius’ Hebrew Grammar (GK), sec. 125 e,verte ha.’Elo-hím e ha.”Él por “o únicoverdadeiro Deus”.

A Tradução do Novo Mundo verte ha.’Él por“o [verdadeiro] Deus” no texto principal ou nasnotas em todos os 32 lugares onde ocorre no M,no singular, a saber, em Gên 31:13; 35:1, 3;46,3; De 7:9; 10:17; 33,26: 2Sa 22:31; 33, 48;Ne 1:5; 9:32; Jó 13,8; 21:14; 22:17; 31:28; 33:6;34:10; 37; 40:9; Sal 18:30, 32, 47: 57:2; 68:19,20; 77:14; 85:8; Is 5:16; 42:5; Je 32:18; Da 9:4.

O plural de ‘el é ‘e-lím. No M, ‘e-lím ocorreuma vez precedido pelo artigo definido, a saber,em Êx 15:11, onde se refere a outros deuses.(55) (grifo do original)

55 Tradução do Novo Mundo, p. 1507.

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A grande maioria dos tradutores fazem de tudo

para esconder ao leitor que El é, na verdade, o nome do

deus cananeu, porém, tratam-no como um título ao

traduzi-lo como Deus, portanto, passam longe ao

significado original do termo.

3ª) O bezerro de ouro é identificado como o Deus

de Israel

Com a demora de seu líder Moisés no topo do Sinai,

o povo fabrica uma estátua de um bezerro de ouro

tomando-o como sendo o seu deus.

Êxodo 32,1-6: “Quando o povo viu que Moiséstardava em descer da montanha, congregou-se emtorno de Aarão e lhe disse: ‘Vamos, faze-nos umdeus que vá à nossa frente, porque a esse Moisés,a esse homem que nos fez subir da terra do Egito,não sabemos o que lhe aconteceu’. Aarãorespondeu-lhes: ‘Tirai os brincos de ouro dasorelhas de vossas mulheres, de vossos filhos efilhas, e trazei-mos’. Então todo o povo tirou dasorelhas os brincos e os trouxeram a Arão. Esterecebeu o ouro das suas mãos, o fez fundir emum molde e fabricou com ele uma estátua debezerro. Então exclamaram: ‘Este é teu Deus, óIsrael, o que te fez subir da terra do Egito’. QuandoAarão viu isso, edificou um altar diante da estátuae fez esta proclamação: ’Amanhã será festa paraIahweh’. No dia seguinte, levantaram-se cedo,ofereceram holocaustos e trouxeram

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sacrifícios de comunhão. O povo assentou-separa comer e para beber, depois se levantou parase divertir”. (grifo nosso)

Moisés permaneceu, no alto do Sinai, por um

período de “quarenta dias e quarenta noites” (Êxodo

24,18), entende-se “muitos dias” (56); nesse texto bíblico,

isso nos chamou a atenção, pois julgamos muito pouco

tempo para que os hebreus fossem logo fabricando a

imagem do bezerro de ouro como uma representação de

seu deus, para adorá-la.

Isso nos parece muito estranho para um povo que

dizem ter sido monoteísta desde um tempo mais remoto;

julgamos que num período de tempo significativamente

maior de vários anos, até que poderia ser mais razoável.

Vejamos a explicação:

O “bezerro” de ouro, assim chamado porironia, é de fato imagem de novilho, um dossímbolos divinos do antigo Oriente. Umgrupo concorrente com o grupo de Moisés, oufracção dissidente desse grupo, quis oupretendeu ter como símbolo da presença doseu Deus uma figura de touro em vez da arcada Aliança. […]. (57) (grifo nosso)

Juntamos a ela essa informação:

56 PASTORINO, 1964a, p. 9.57 Bíblia de Jerusalém, p. 148.

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[…] O deus El, que ocupava um lugarproeminente no panteão paleofenício, édesignado por “touro” (shor) e também porEl “touro poderoso”. (58) (grifo nosso)

Assim, a relação do bezerro de ouro com o deus

cananeu “El” fica, por demais, evidente, sem campo para

alguma contestação.

Também não nos passou despercebido que, na

festa de Iahweh, representado pelo bezerro de ouro,

ocorreram as oferendas de holocaustos e sacrifícios de

comunhão, rituais comuns aos povos pagãos, assunto que

mais à frente retornaremos.

Uma última curiosidade foi o que vimos na atitude

de Moisés que está narrada na seguinte passagem:

Êxodo 32,19-20: “Quando se aproximou doacampamento e viu o bezerro e as danças, Moisésacendeu-se em ira; lançou das mãos as tábuas equebrou-as no sopé da montanha. Pegou obezerro que haviam feito, queimou-o e otriturou-o até reduzi-lo a pó miúdo, queespalhou na água e fez os israelitasbeberem”. (grifo nosso)

Tal expediente utilizado por Moisés já deixa bem

claro, pelo menos para nós, que sua intenção era, sem a

menor dúvida, impor sua crença aos hebreus.

58 ELIADE, 1998, p. 82.

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Tempos depois Jeroboão, primeiro rei de Israel (931-

910 a.C.), após a divisão em dois reinos – Israel e Judá –

também teve a brilhante ideia de fazer dois bezerros de

ouro, colocando um em Betel e o outro em Dã59, dizendo

ao povo: 1 Reis 12,28: “Deixai de subir a Jerusalém!

Israel, eis teus deuses que te fizeram sair da terra

do Egito” (grifo nosso), isso significa que é retomada a

crença de origem.

59 Dã, perto de uma fonte do Jordão, e Betel, no caminho de Jerusalém,delimitam o novo reino. Eram já santuários venerados (Gn 12,8 etc; Jz 17-18). (Bíblia de Jerusalém, p. 489)

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As pistas encontradas ao longo dos textos bíblicos

A crença em outros deuses sobressai do teor de

inúmeras passagens bíblicas, como, por exemplo, estas a

seguir, que só fazem sentido diante de quem tinha crença

em vários deuses. Aliás, é bom informar que:

[…] Os gregos, os romanos e os judeus daAntiguidade acreditaram sempre que seusdeuses apenas protegiam sua nação, e que opoder de cada um deles não se estendia paraalém do seu território. […]. (60) (grifo nosso)

Se Iakov Abramovitch Lentsman (1908-1967)

estiver correto, então arriscaremos dizer que os hebreus

possivelmente passaram do politeísmo para o

henoteísmo. Com isso em mente, vejamos agora algumas

passagens bíblicas.

Êxodo 12,12: “E naquela noite eu passarei pelaterra do Egito e ferirei na terra do Egito todos osprimogênitos, desde os homens até os animais; eeu, Iahweh, farei justiça sobre todos os deusesdo Egito”. (grifo nosso)

Êxodo 18,11: “Agora sei que Iahweh é o maior detodos os deuses…” (grifo nosso)

60 LENTSMAN, 1963, p. 81.

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Êxodo 20,3: “Não terás outros deuses diante demim”. (grifo nosso)

Êxodo 22,19: “Quem sacrificar a outros deuses,fora Iahweh, será entregue ao anátema”. (grifonosso)

Êxodo 23,13: “Prestai atenção a tudo o que vostenho dito, e não fareis menção do nome deoutros deuses: nem se ouça da vossa boca”.(grifo nosso)

Êxodo 23,23-24.32: “O meu anjo irá adiante de ti, ete levará aos amorreus, aos heteus, aos ferezeus,aos cananeus, aos heveus e aos jebuseus, e eu osexterminarei. Não adorarás os seus deuses,nem os servirás; não farás o que eles fazem, masdestruirás os seus deuses e quebrarás a suascolunas. Não faça aliança nenhuma com eles,nem com os seus deuses”. (grifo nosso)

Êxodo 34,14-16: “Não adorarás outro deus. PoisIahweh, tem por nome Zeloso: é um Deus Zeloso(61). Não faça aliança com os moradores da terra.Não suceda que, em se prostituindo com osdeuses deles e lhes sacrificando, alguém teconvide e comas dos seus sacrifícios e tomesmulheres das suas filhas para os teus filhos, e suasfilhas, prostituindo-se com seus deuses, façamcom que também os teus filhos se prostituam comos seus deuses”. (grifo nosso)

Deuteronômio 3,24: “Iahweh, meu Senhor!Começastes a mostrar ao teu servo tua grandeza e

61 Em outras traduções: ciumento.

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a força da tua mão. Qual é o deus no céu e naterra que pode realizar obras e feitospoderosos como os teus?” (grifo nosso)

Deuteronômio 6,13-14: “É a Iahweh teu Deus quetemerás. A ele servirás e pelo seu nome jurarás.Não seguireis outros deuses, qualquer umdos deuses dos povos que estão ao vossoredor, pois Iahweh é um Deus ciumento, quehabita em teu meio […].” (grifo nosso)

Deuteronômio 8,19: “Contudo, se te esquecerescompletamente de Iahweh teu Deus, seguindooutros deuses, servindo-os e adorando-os, euhoje testemunho contra vós: é certo queperecereis”. (grifo nosso)

Deuteronômio 10,16-17: “Circuncidai, pois, o vossocoração e nunca mais reteseis a vossa nuca! PoisIahweh vosso Deus é o Deus dos deuses e oSenhor dos Senhores, o Deus grande, o valente,o terrível, que não faz acepção de pessoas e nãoaceita suborno”. (grifo nosso)

Deuteronômio 18,20: “Todavia, se o profeta tiver aousadia de falar em meu nome uma palavra que eunão lhe tiver ordenado, ou se falar em nome deoutros deuses, tal profeta deverá ser morto.”(grifo nosso)

Josué 22,22: “O Deus dos deuses, Iahweh, oDeus dos deuses, Iahweh, bem o sabe, e Israeldeve sabê-lo: se houve de nossa parte rebelião ouinfidelidade para com Iahweh, que ele deixe de nossalvar neste dia.” (grifo nosso)

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2 Crônicas 2,4: “A Casa que vou construir serágrande, porque nosso Deus é maior que todosos deuses”. (grifo nosso) (fala de Salomão)

Salmo 82,1: “Deus preside, na assembleia divina,em meio aos deuses ele julga:” (grifo nosso)

Salmo 86,8: “Entre os deuses não há outrocomo tu, nada que se iguale às tuas obras!” (grifonosso)

Salmo 95,3: “Porque Iahweh é Deus grande, ogrande rei sobre todos os deuses.” (grifonosso)

Salmo 135,5: “Sim, eu sei que Iahweh é grande,que nosso Deus excede os deuses todos”.(grifo nosso)

Salmo 136,2: “Celebrai o Deus dos deuses,porque o seu amor é para sempre!” (grifo nosso)

Isaías 19,1: “Oráculo a respeito do Egito. Iahweh,montado em nuvem veloz, vai ao Egito. Os deusesdo Egito tremem diante dele e o coração dosegípcios se derrete no peito”. (grifo nosso)

Daniel 11,36: “O rei agirá a seu bel-prazer,exaltando-se e engrandecendo-se acima de todosos deuses. Proferirá coisas inauditas contra o Deusdos Deuses e, no entanto, prosperará, até que acólera chegue a seu cúmulo – porque o que estádecretado se cumprirá”. (grifo nosso)

Oséias 13,4: “Mas eu sou Iahweh teu Deus, desde aterra do Egito. Não deves reconhecer outroDeus além de mim, não há salvador que não seja

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eu”.

Jeoel 2,27: “E sabereis que eu estou no meio deIsrael, eu, Iahweh, vosso Deus, e não outro!Meu povo não se envergonhará nunca mais!” (grifonosso)

Apesar do que Isaías disse (Is 19,1), muito

estranhamente, em algumas passagens mais à frente, ele

aqui aparece advogando uma divindade única. Entre elas

podemos citar estas três, para exemplo:

Isaías 44,8: “Não vos apavoreis, não temais; nãovo-lo dei a conhecer há muito tempo e não oanunciei? Vós sois minhas testemunhas.Porventura existe um Deus fora de mim? Nãoexiste outra Rocha; eu não conheçonenhuma!” (grifo nosso)

Isaías 45,14: “Assim diz Iahweh: Os produtos doEgito e a riqueza de Cuch, bem como os sabeus,homens de grande estatura, passarão para o teudomínio e te pertencerão. Caminharão atrás de ti,seguindo-te em cadeias, prostrar-se-ão diante de tie com voz súplice dirão: ‘Só contigo Deus está!Fora dele não há nenhum Deus’”. (grifo nosso)

Isaías 46,9: “Lembrai-vos das coisas passadas hámuito tempo, porque eu sou Deus e não háoutro!” (grifo nosso)

Essas duas afirmativas de que “Fora dele não há

nenhum Deus” e “eu sou Deus e não há outro”, embora

com características do monoteísmo, só cabem em meio à

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crença da existência de vários deuses. Pareceu-nos que

houve uma mudança na maneira de Isaías pensar, fato

esse que merece ser explicado: Isaías nascido por volta

de 765 a.C., exerceu suas atividades proféticas de 740 a

700.

O livro que tem o seu nome é dividido, pelos

estudiosos e exegetas, em três partes:

1ª) Proto-Isaías – cap. 1 a 39;

2ª) Dêutero-Isaías, cap. 40-55; e,

3ª) Trito-Isaías, cap. 56-66.

Vejamos as seguintes informações dos tradutores

da Bíblia de Jerusalém:

[…] Suas palavras sofreram acréscimos. Olivro que traz seu nome é o resultado de umlongo processo de composição, impossível dereconstituir em todas as etapas. […].

O livro recebeu acréscimos maisconsideráveis ainda. Os caps. 40-55 nãopodem ser obra do profeta do século VII. Nãosó nunca é mencionado aí o seu nome, mastambém o contexto histórico é posterior cerca dedois séculos: Jerusalém foi tomada, o povo seachava cativo em Babilônia, Ciro já está emcena e será o instrumento da libertação. […]Esses capítulos contêm a pregação dumanônimo, continuador de Isaías e grandeprofeta, como ele, o qual, na falta de um nome

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melhor, chamamos de Dêutero-Isaías ou deSegundo Isaías. Pregou em Babilônia entre asprimeiras vitórias de Ciro, em 550 a.C. – quelevam a adivinhar a ruína do império babilônico– e o edito libertador de 538, que permitiu osprimeiros retornos. […]. (62) (grifo nosso)

Corroborando com Champlin e Bentes, que, em

outro volume, falando sobre o henoteísmo, dizem:

Enoteísmo. Essa palavra se deriva de umapalavra grega, hen, que é um adjetivo numeral,“um”. Trata-se da crença em um deus que ageem nosso favor, mas que não nega que talvezexistam outros deuses, cuja ação e autoridadesão exercidas em outras esferas. Assim sendo,havia um deus que exerce controle sobre oshomens, interessando-se por alguma pessoa,alguma cultura ou alguma nação. Por essarazão alguns interpretes acreditam que esseconceito de divindade, na cultura doshebreus, precedeu ao puro monoteísmo. Emoutras palavras, supõem que os israelitasoriginalmente criam que Yahweh era deusdeles, – e não Deus criador de todos. Osisraelitas também pensariam que nãoeliminava a possibilidade da existência deoutros deuses, que de Yahweh receberiam asua autoridade. Isso seria apenas acombinação de ideias monoteístas e politeístas.Praticamente seria monoteísmo, mas

62 Bíblia de Jerusalém, p. 1238.

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teoricamente seria politeísmo. Também seriauma forma de teísmo, porquanto ensina que odeus supremo ou mesmo vários deuses mantêmcontato com os homens, estando interessadospor eles, guiando-os, punindo-os por suas másações e galardoando-os por suas boas ações.(63) (grifo nosso)

Diante disso a suspeita que levantamos sobre as

características de monoteísmo, torna-se convicção de que

os hebreus, na realidade, praticavam o henoteísmo, pelo

menos até um certo momento histórico.

Assim, diante dessas passagens, somente por

fanatismo não se enxerga que, na verdade, acreditavam

em vários deuses e até, pelo menos, nesse momento

histórico ainda não se vê que alimentassem a crença num

Deus único.

Aliás, são poucos os versículos bíblicos nos quais

poder-se-á ter, de fato, a ideia de um Deus único; porém,

o seu número é extremamente insignificante diante dos

quase 23.000 (64) versículos que compõem o Antigo

Testamento:

Deuteronômio 4,35: “Foi a ti que ele mostrou tudoisso, para que soubesse que Iahweh é o únicoDeus. Além dele não existe outro.” (grifo nosso)

63 CHAMPLIN e BENTES, 1995b, p. 98.64 Exatos 23.146 em: http://www.cadecristo.com.br/curiosidades_biblicas.htm.

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Deuteronômio 4,39: “Portanto, reconhece hoje emedita em teu coração: Iahweh é o único Deus,tanto no alto do céu, como cá embaixo, na terra.Não existe outro!” (grifo nosso)

1 Reis 8,60: “Assim, todos os povos da terrasaberão que somente Iahweh é Deus e que nãohá outro além dele.” (grifo nosso) (prece deSalomão)

Em quantidade um pouco maior que essa, ainda

temos outras passagens bem interessantes, que nos

permitem suspeitar da crença em vários deuses:

Levítico 11,45: “Sou eu, Iahweh, que vos fiz subirda terra do Egito para ser o vosso Deus: sereissantos, porque eu sou santo”. (grifo nosso)

Levítico 22,33: “Eu vos fiz sair da terra do Egito, afim de ser o vosso Deus, eu sou Iahweh”. (grifonosso)

Levítico 25,38: “Eu sou Iahweh vosso Deus, quevos tirei da terra do Egito para vos dar a terra deCanaã e para ser o vosso Deus”. (grifo nosso)

Levítico 26,45: “Lembrar-me-ei, em favor deles, daaliança feita com os seus antepassados, que fiz sairda terra do Egito, à visita das nações, a fim de sero seu Deus, eu mesmo Iahweh”. (grifo nosso)

Números 15,41: “Eu sou Iahweh vosso Deus, quevos tirei da terra do Egito, a fim de ser vossoDeus, eu, Iahweh vosso Deus”. (grifo nosso)

A expressão “para/a fim de ser o vosso Deus” nos

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remete à conclusão de que Deus Se sentindo isolado,

resolveu escolher o povo judeu para adorá-Lo e que,

também, de fato, havia outros deuses.

E se foi neste momento que Deus o escolheu,

então, não há que se falar que, antes disso, ele era o

Deus de Israel ou de algum seu antepassado.

Provavelmente, podemos até aceitar que é aqui, nesse

momento histórico, que do politeísmo passam para

henoteísmo.

E não podemos deixar de citar aqui a conclusão de

Sigmund Freud (1856-1939), médico neurologista judeu-

austríaco, fundador da psicanálise:

[…] Ainda mais enigmática é a noção deum deus que repentinamente “escolhe” umpovo, que o declara como seu e a ele própriocomo seu deus. Acredito que este é o únicoexemplo desse tipo na história das religiõeshumanas. Comumente, deus e povo estãoindissoluvelmente vinculados, são um só desdeo próprio início das coisas. Sem dúvida, àsvezes ouvimos falar de um povo que adquire umdeus diferente, mas nunca de um deus quebusca um povo diferente. Poderemos talvezentender esse acontecimento único serelembrarmos as relações existentes entreMoisés e o povo judeu. Moisés abaixara-se atéos judeus, fizera-os o seu povo: eles eram o seu

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“povo escolhido” (65). (66) (grifo nosso)

Vimos também, nos textos bíblicos, várias

referências a “chifres” e “boi selvagem”, como as

seguintes, em que algumas delas faremos acompanhar

das notas dos tradutores:

Êxodo 27,1-2: “Farás o altar de madeira de acácia;com cinco côvados de comprimento e cincocôvados de largura, o altar será quadrado; a suaaltura será de três côvados. Dos quatro lados faráslevantar chifres, que formarão uma só peça com o

65 N.T.: 1 Javé era indubitavelmente um deus vulcânico. Não haviamotivo para que os habitantes do Egito o adorassem. De certo não sou aprimeira pessoa a se impressionar com a semelhança do som no nome“Javé” com a raiz de outro nome divino “Júpiter (Jove)”. O nome“Jochanan” é composto por uma abreviação do hebraico Javé, da mesmamaneira que [o alemão] “Gotthold” [“Deus é gracioso”] é o equivalentecartaginês “Aníbal”. Esse nome (Jochanan), sob as formas “Johann”, “John”,“Jean”, "Juan", tornou-se o nome de batismo favorito da cristandadeeuropeia. Os italianos, traduzindo-o por “Giovanni” e, além disso,chamando a um dia da semana “Giovedí [quinta-feira]”, trazem à luz umasemelhança que talvez não signifique nada ou, talvez, muito. Nesse ponto,perspectivas amplas, mas muito incertas, se nos abrem. Parece que,naqueles séculos obscuros, que mal são acessíveis à pesquisa histórica, ospaíses situados em torno da bacia oriental do Mediterrâneo eram cena defrequentes e violentas erupções vulcânicas, que devem ter causado aintensa impressão em seus habitantes. Evans presume que também adestruição final do palácio de Minos, em Cnossos, foi consequência de umterremoto. Em Creta, nesse período (como, provavelmente, no mundo egeuem geral), adorava-se a grande deusa-mãe. A compreensão de que ela nãofora capaz de proteger sua casa contra os ataques de um poder mais fortepode ter contribuído para que ela tenha cedido o lugar a uma divindademasculina, e, se assim foi, o deus vulcânico tinha o primeiro direito aocupar seu lugar. Afinal de contas, Zeus nunca deixou de ser o “abaladorda terra”. Há pouca dúvida de que foi durante essas épocas obscuras queas deusas-mães foram substituídas por deuses masculinos (que,originalmente, talvez tenham sido filhos delas). O destino de Palas Atena,que, sem dúvida, constituía a forma local da deusa-mãe, é particularmenteimpressionante. Ela foi conduzida à condição de filha pela revoluçãoreligiosa, despojada de sua própria mãe e, por ter a virgindade imposta asi, permanentemente excluída da maternidade. (grifo nosso)

66 FREUD, 1997, p. 42.

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altar; e o cobrirás de bronze”. (grifo nosso)

Nota: Os “chifres” são protuberâncias nos quatrocantos do altar. Esses chifres possuíamsantidade particular. O sangue do sacrifício eraaí aplicado (29,12), assim como sobre os chifresdo altar dos perfumes (30,10). O criminosopodia agarrar-se a eles para se proteger docastigo (1Rs 1,50; 2,28). (67)

Números 23,22: “Deus o fez sair do Egito, e é paraele como os chifres do búfalo”. (grifo nosso)

Nota: 1) Deus: Em lugar de Elohim, o heb. Tem“El”, que significa “Deus”, mas que é também onome próprio do grande deus cananeu El. Estejá fora identificado como o deus dos pais, e o foicom Iahweh. Dá-se o mesmo em 24,4.8.16. (68)

2) chifres de búfalo: Texto difícil. Outrastraduções: “Ele (Jacó) tem como que o vigor dobúfalo”, ou: “Ele (El) tem como chifres debúfalo”. (69)

Números 24,8: “Deus o tirou do Egito, e é para elecomo os chifres do búfalo”. (grifo nosso)

Deuteronômio 33,17: “Ele [José] é seu touroprimogênito, a glória lhe pertence. Seus chifressão chifres de búfalo: com eles investe contra os

67 Bíblia de Jerusalém, p. 141.68 Bíblia de Jerusalém, p. 238.69 Bíblia de Jerusalém, p. 238.

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povos até as extremidades de terra”. (grifo nosso)

1 Reis 1,50: “Adonias, temendo Salomão, levantou-se e foi se agarrar aos chifres do altar”. (grifonosso)

1 Reis 22,11: “Sedecias, filho de Canaana, fez parasi chifres de ferro e disse: 'Assim fala Iahweh: comisto ferirás os arameus até exterminá-los'” (grifonosso)

Salmo, 18,3: “Iahweh é minha rocha e minhafortaleza, meu libertador, é meu Deus. Nele meabrigo, meu rochedo, meu escudo e minha força(h) salvadora, minha cidade forte”. (grifo nosso)

(h) Lit.: “meu chifre”, símbolo de poder e vigor(Sl 75,5; 89,18, 92,11 etc., Dt 33,17; 1Rs 22,11;Zc 2,4), às vezes com tom messiânico (Sl132,17; Ez 29,11) (70)

Salmo 29,5-6: “A voz de Iahweh despedaça oscedros, Iahweh despedaça os cedros do Líbano, fazo Líbano pular qual bezerro e o Sarion (71) comocria de búfalo”. (grifo nosso)

Salmo 92,10-11: “Eis que teus inimigos perecem, eos malfeitores todos se dispersam; tu me dás ovigor de um touro e espalhas óleo novo sobremim”. (grifo nosso)

Salmo 132,17: “Ali farei brotar uma linhagem(a) a Davi, e prepararei uma lâmpada (b) ao meu

70 Bíblia de Jerusalém, p. 877.71 N.T.: Nome sidônio do Líbano (Dt 3,9). (Bíblia de Jerusalém, p. 890)

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Messias:” (grifo nosso)

(a) Lit. “farei brotar um chifre” (cf. Sl 18,3+) (72)

Ezequiel 29,21: “Naquele dia suscitarei um novorebento (b) para a casa de Israel e permitirei quese abra a boca no meio dela (e) e saberão que eusou Iahweh”. (grifo nosso)

(d) Lit.: “farei germinar um chifre”; este símboloda força tem, às vezes, alcance messiânico (cf.Sl 132,17). (Bíblia de Jerusalém, p. 1523)

Ezequiel 43,15: “A lareira tinha quatro côvados eacima da lareira havia quatro chifres”. (grifonosso)(Templo erguido por Salomão)

Oseias 10,11: “Efraim é novilha adestrada, quegosta de pisar a eira, mas eu passei o jugo em seupescoço soberbo! Eu atrelarei Efraim, Judá lavraráe Jacó gradeará”. (grifo nosso)

Miqueias 4,13: “Levanta-te e pisa o chão, filha deSião, porque farei de ferro os teus chifres e teuscascos de bronze, para que esmagues numerosospovos.” (grifo nosso)

Em diversas traduções em lugar de chifres de

búfalo, a comparação é com “boi selvagem”. Todas as

comparações acima só nos remetem a ideia de que

davam valor ao touro, às vezes visto com búfalo ou boi

72 Bíblia de Jerusalém, p. 1004.

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selvagem, que era, como vimos, a imagem representativa

do deus cananeu El.

Várias outras situações nos remetem a concluir

sobre a forte influência cultural de outros povos; vejamos,

por exemplo:

Êxodo 28,31-33: “Farás o manto do efod todo depúrpura violeta. No meio dele haverá uma aberturapara a cabeça; essa abertura será debruada comoa abertura de um colete, para que não se rompa.Ao redor de sua orla inferior porás romãs depúrpura violeta, púrpura escarlate e carmesim, eentre elas, em todo o redor, campainhas deouro”. (grifo nosso)

Explicam-nos os tradutores da Bíblia de Jerusalém

que o uso das campainhas de ouro é um “Vestígio de

concepção primitiva amplamente espalhada, segundo a

qual o tilintar das campainhas afastava os demônios”.

(73); portanto, mais uma crença pagã que os hebreus

adotaram.

Levítico 23,23-25: “Iahweh falou a Moisés e disse:‘Fala aos israelitas e dize-lhes: No sétimo mês, oprimeiro dia do mês será para vós o dia derepouso, comemoração com som de trombeta,santa assembleia. Não fareis nenhuma obra servile apresentareis oferenda queimada a Iahweh’.”(grifo nosso)

73 Bíblia de Jerusalém, p. 143.

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Os tradutores da Bíblia de Jerusalém dão-nos a

seguinte explicação para esse passo:

O primeiro dia do mês (lunar), a “luanova” ou “neomênia”, era uma festacelebrada tanto entre os israelitas comoentre os cananeus. (1Sm 20,5.24; Is 1,13; Am8,5), e o foi até a época do NT (cf. Nm 28,11-15;Ez 46,6-7; Ne 10,34; Cl 2,16). Os rituais de Lv23 e Nm 29,1-6 contêm só a neomênia dosétimo mês (do ano que começa na primavera),que foi durante muito tempo o primeiro mês (doano que começa no outono). (74) (grifo nosso)

Era a festa da lua nova, que, conforme afirmado, os

cananeus também a praticavam.

Embora os antepassados dos hebreus tenham

origem neles, o que se confirma em Ezequiel 16,3: “Por

tua origem e por teu nascimento, tu procedeste da terra

de Canaã”, nessa época, os consideravam como um povo

pagão; portanto, esse ritual, dentro dessa perspectiva, é

um ritual pagão.

1 Samuel 16,14-16: “O espírito de Iahweh tinha seretirado de Saul, e um mau espírito, procedente deIahweh, o atormentava. Então os servos de Saullhe disseram: ‘Eis que um mau espírito vindo deDeus te atormenta. Mande nosso senhor, e os

74 Bíblia de Jerusalém, p. 193.

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servos que te assistem irem buscar um homemque saiba dedilhar a lira e, quando o mauespírito da parte de Deus te atormentar, eletocará e tu te sentirás melhor.” (grifo nosso)

Confirma-se, novamente, tratar-se de um ritual

pagão: “A música foi empregada em toda a antiguidade

quer para estimular o bom espírito (cf. 10,5), quer para

expulsar o mau espírito”. (75)

Para dar a você, caro leitor, um melhor

esclarecimento, voltamos a algo que já falamos, porém,

rapidamente:

1 Reis 7,13-14.23-29: “Salomão mandou chamarHiram de Tiro, filho de uma viúva da tribo deNeftali e cujo pai era natural de Tiro e trabalhavaem bronze. Era dotado de grande habilidade,talento e inteligência para executar qualquertrabalho em bronze. Apresentou-se ao rei Salomãoe executou todos os seus trabalhos. Fez o Mar demetal fundido, com dez côvados de diâmetro. Eraredondo, tinha cinco côvados de altura; suacircunferência media-se com um fio de trintacôvados. Havia por baixo da borda coloquíntidasem todo o redor: rodeavam o Mar pelo espaço dedez por côvado, dispostas em duas fileiras efundidas numa só peça com o Mar. Esterepousava sobre doze touros, dos quais trêsolhavam para o norte, três para o oeste, trêspara o sul e três para o leste; o Mar se elevada

75 Bíblia de Jerusalém, p. 412.

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sobre eles e a parte posterior de seus corposestava voltada para o interior. Sua espessura erade um palmo e sua borda tinha a mesma formaque a borda de uma taça, como uma flor de lótus.Sua capacidade era de dois mil batos. Fez as dezbases de bronze, tendo cada uma quatro côvadosde comprimento, quatro côvados de largura e trêscôvados de altura. Eis como foram feitas: tinhammolduras que estavam entre as travessas. Sobreas molduras que estavam entre as travessashavia leões, touros e querubins, e sobre astravessas havia um suporte; abaixo dos leões e dostouros havia volutas em pingentes.” (grifo nosso)

Esse Mar de bronze ou mar de fundição é assim

explicado:

O Mar de Fundição

Esse pesado item do templo de Salomãosubstituiu a bacia de bronze do tabernáculo.Mas outros lavatórios foram adicionados, emface do aumento do número de sacerdotes queserviam no templo. A palavra hebraicacorrespondente ao mar de fundição é yam,“mar”. Era uma gigantesca bacia redonda,com cerca de 2,22 m de altura e o dobrodisso em diâmetro, e que ficava cheia deágua até a borda. Era feita de bronze fundido ebatido, com a espessura de uma mão (cerca de7,5 cm). Ficava apoiada sobre doze bois debronze, divididos em quatro grupos de trêsbois, cada grupo voltado na direção dealgum ponto cardeal. Esses doze bois ficavam

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todos sobre uma mesma plataforma. O originalmar de fundição foi feito com metal que Davihavia tomado de Zobá (ver I Crô. 18:8).Finalmente, porém, foi despedaçado e levadoaos pedaços para a Babilônia, quando do exíliobabilônico (ver II Reis 25:13). Esse item dotemplo era altamente decorativo, e não somenteútil. Para exemplificar, a beirada da bacia erarecurvada, a fim de dar a aparência de umafolha de lírio. Alguns estudiosos têm opinadoque os doze bois representavam os dozesinais do zodíaco, ou que eram símbolos dafertilidade, ou remanescentes da adoraçãoegípcia ao boi. De fato, havia o boi Apsu, cujotemplo na Babilônia dispunha de uma bacia debronze similar. Porém, é impossível dizermos sehavia qualquer conexão entre essa bacia e omar de fundição dos hebreus. Sabe-se, todavia,que Apsu estava vinculado às ideias de vida efertilidade. O mar de fundição dos hebreussimbolizava a purificação que é necessária paraa participação no culto a Deus. (76) (grifo nosso)

Muito provavelmente ela seria algo como o que se

vê nesta imagem (77):

76 CHAMPLIN e BENTES, 1995d, p. 110-111.77 Link:

https://thereasonerscorner.files.wordpress.com/2016/08/d7e15fe175914d2a8fa8ceea58129a80.jpg.

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Observe os bois, menciona-se doze, sustentando a

bacia de bronze.

Muitas vezes, nas suas explicações, os teólogos

fogem da realidade, pretendendo justificar dogmas ou

interpretações do passado; porém, não há como esconder

a verdade, pois, mais dia menos dia, ela aparecerá

triunfante.

Assim, podemos concluir que os doze bois que

sustentavam o Mar de bronze correspondiam a algo

aprendido na Babilônia, ou talvez no Egito, por serem

povos de culturas anteriores à dos hebreus.

Por outro lado, é bem interessante a determinação

de “não vos pervertais, fazendo para vós uma

imagem esculpida em forma de ídolo: uma figura de

homem ou de mulher, figura de algum animal terrestre,

de algum pássaro que voa no céu, de algum réptil que

rasteja sobre o solo, ou figura de algum peixe que há nas

águas que estão sob a terra” (Deuteronômio 4,16-17; ver

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tb Deuteronômio 6,4) (grifo nosso), que parece não terem

seguido.

Outro ponto, que podemos listar em reforço ao fato

de que os hebreus, por muito tempo, não adoravam um

Deus único, é o que se relaciona às suas práticas

ritualísticas. Pelo menos, três delas merecem ser

destacadas: 1ª) as que dizem respeito aos rituais de

sacrifícios; 2ª) quanto aos locais de adoração; e, 3ª)

relacionadas aos rituais de purificação.

1ª) rituais de sacrifícios

Os hebreus tinham suas práticas ritualísticas

descritas e regulamentadas no livro Levítico, do qual

extraímos as seguintes:

a) os holocaustos

Sobre eles, explicam-nos os tradutores da Bíblia de

Jerusalém:

Sacrifícios nos quais a vítima é inteiramenteconsumida. A imposição das mãos peloofertante (v. 4) é testemunho solene de que estavítima, apresentada em seguida pelo sacerdote,é realmente seu próprio sacrifício. As narrativas,como os textos rituais do Pentateuco, fazemeste tipo de sacrifício remontar à época dodeserto (Ex 18,12; Nm 7,12) e até mesmo aosPatriarcas (Gn 8,20; 22,9-10). Na realidade, ostestemunhos históricos mais antigos datam da

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época dos Juízes (cf. Jz 6,26; 11,31; 13,15-20).Parece que esta forma de sacrifício foiinfluenciada pelo ritual cananeu (cf. 1Rs 18: oholocausto dos profetas de Baal ésemelhante ao de Elias) e que não é anterior àinstalação das tribos. Em Lv 1, dá-se valorexpiatório ao holocausto; na época antiga, émais sacrifício de ação de graças (cf. 1Sm 6,14;10,8; 2Sm 6,17) ou sacrifício para obter umfavor de Iahweh (1Sm 7,9; 13,9; 1Rs 3,4). (78)(grifo nosso)

Tentando amenizar a situação dizem “parece”,

quando, pelas evidências, deveriam, humildemente, ter

assumido que essa forma de sacrifício é, na verdade, pura

influência do ritual cananeu, por mais que isso lhes

doesse.

Por outro lado, temos flagrante contradição nesses

tipos de rituais, porquanto, em outras passagens, se

afirma sobre Iahweh:

Salmo 51, 17-18 “Ó Senhor, abre os meus lábios, eminha língua anunciará o teu louvor. Pois tu nãoqueres sacrifício e um holocausto não teagrada”. (grifo nosso)

Isaías 1,11: “Que me importam os vossos inúmerossacrifícios?, diz Iahweh. Estou farto deholocaustos de carneiros e da gordura debezerros cevados; no sangue de touros, de

78 Bíblia de Jerusalém, p. 162.

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cordeiros e de bodes não tenho prazer”. (grifonosso)

Jeremias 6,20: “Que me importa o incenso que vemde Seba, e a cana aromática de países longínquos?Vossos holocaustos não me agradam e vossossacrifícios não me comprazem”. (grifo nosso)

Oseias 6,6: “Porque é amor que eu quero e nãosacrifício, conhecimento de Deus mais do queholocaustos”. (grifo nosso)

E aqui fica claro que, além de criticar e condenar os

atos praticados pelo povo, com relação aos holocaustos

(Jeremias 7,16-20), Iahweh declara que não prescreveu

qualquer atitude relacionada a sacrifícios:

Jeremias 7,21-23: “Assim disse Iahweh dosExércitos, Deus de Israel: Acrescentai os vossosholocaustos aos vossos sacrifícios e comei a carne!Porque eu não disse e nem prescrevi nada avossos pais, no dia em que vos fiz sair daTerra do Egito, em relação ao holocausto e aosacrifício. Mas eu lhes ordenei isto: Escutai aminha voz, e eu serei o vosso Deus e vós sereis omeu povo. Andai em todo caminho que eu vosordeno para que vos suceda o bem”. (grifo nosso)

Então, por conclusão lógica, cai por terra o livro

Levítico como de origem divina.

E, seguindo as notas, vejamos agora o que dizem

sobre expiação, para esclarecer o “valor expiatório” do

ritual:

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A Expiação é o sacrifício pelo qual o homemque ofendeu a Deus, transgredindo a aliança,pode voltar à graça. O animal oferecido emsacrifício (kipper) foi interpretado como resgate(koper; cf. Ex 30,12). Nos sacrifícios deexpiação, os ritos do sangue desempenhampapel primordial (17,11; cf. 4,1+; 4,12+).Conhecida pelos assírio-babilônios e peloscananeus, a expiação ligou-se aosfundamentos da Lei israelita. No NT,aparecerá, não como pagamento ousubstituição, mas como o dom da vida de Deuspara vivificar os homens (Rm 3,25-26). (79) (grifonosso)

Se na explicação anterior poder-se-ia dizer

“parecia”, nessa de agora devemos concluir que tal

prática foi mesmo tomada da cultura de outros povos, o

que foi assumido quando explicam que a expiação era

conhecida pelos assírio-babilônicos e pelos cananeus,

pois sabe-se que a existência desses povos é anterior à

dos hebreus.

Segundo o estudioso Bart D. Ehrman: “A religião

de Israel, em particular, era uma religião de

sacrifício.” (80) (grifo nosso)

b) a oblação

Vejamos a explicação:

79 Bíblia de Jerusalém, p. 162.80 EHRMAN, 2008, p. 79.

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A oblação, com as primícias, que aqui sãosemelhantes a ela (vv. 14-15), é oferenda deprodutos do solo; é, portanto, desde a origemrito de sedentários, que deve remontar aosprimórdios da instalação em Canaã. Aoferenda de incenso que acompanha,conhecida entre os povos vizinhos,especialmente no Egito, pode ter origemmais antiga. A oblação assemelha-se aholocausto em que se queima um punhado defarinha umedecida com azeite, como “odoragradável” a Iahweh (cf. Ex 29.18; Lv 1.9+).Este sacrifício é oferecido, em geral, comocomplemento de sacrifício sangrento, e é entãoacompanhado de libação de vinho (cf. 23.13; Ex29,40; Nm 15.5.7). (81) (grifo nosso)

É…, pelo que estamos vendo, os seus rituais quase

nada possuíam de original, praticamente tudo quanto

faziam tinha origem em outras culturas – nas pagãs.

c) o sacrifício de comunhão

Leiamos do que se trata:

O sacrifício chamado “de comunhão”, noqual a vítima é repartida entre Deus e oofertante, encontra-se em Canaã, mas osacrifício israelita distingue-se pelo antigo ritualdo sangue (cf. 1,5+). É banquete sagrado; aspartes mais vitais da vítima são oferecidas aDeus: a melhor parte é atribuída aos sacerdotes

81 Bíblia de Jerusalém, p. 163.

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(cf. 7,28s) e a parte restante é consumida pelosfiéis. Na época antiga, este tipo de sacrifícioera o mais frequente e formava o rito centraldas festas, exprimindo de modo eminente acomunidade de vida e a relação de aliança e deamizade entre o fiel e o seu Deus. (82) (grifonosso)

Vê-se, portanto, que esses rituais não primavam

pela originalidade; como já dito, todos eles foram

tomados de outras culturas, as quais passaram a tratá-las

como pagãs. Pura ironia do destino, pois faziam o mesmo

que elas!

Transcrevemos o que Champlin e Bentes, em

Enciclopédia de Bíblia, teologia e filosofia, dizem sobre

tais rituais:

Os Sacrifícios. A descrição dos vários tiposde ofertas, segundo sua sequência, mostra asignificação dos mesmos.

1. Ofertas expiatórias. Estas dividiam-se em:a. Ofertas pelo pecado; e b. Ofertas pela culpa.As ofertas pelo pecado tinham em vista avindicação da lei, mediante um sacrifício vicário(ver Lev. 4:1-35; 6:24-30). As ofertas pela culpaeram um tipo de oferta pelo pecado, tendo emvista a reparação de alguma injustiça (verespecialmente Lev. 7:1-10). […].

2. Ofertas consagratórias. Essas subdividem-

82 Bíblia de Jerusalém, p. 164.

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se em: a. Ofertas queimadas; b. Ofertas decereais; e c. Libações. As ofertas queimadas ou“holocaustos” indicavam a ideia de totalrendição a Deus. No hebraico, o nome significa“aquilo que sobe” (ver Lev. 1:3-17; 6:8-13). Asofertas de cereais acompanhavam quase todasas outras ofertas e nunca faltavam no caso dasofertas queimadas. Acompanhavam, porexemplo, na purificação de um leproso, no fimdo voto dos nazireus e na consagração dossacerdotes (ver Lev. 2 e 6:14-23). Nossa versãoportuguesa prefere chamá-las de “ofertas demanjares”. As libações, por sua vez,normalmente, acompanhavam as ofertasqueimadas e pacíficas. Interessante é observarque as libações não são mencionadas entre asofertas (ver Lev. 1-7), embora sejam incluídasnas instruções dos sacrifícios que seriamoferecidos quando os israelitas se instalassemna Terra Santa (ver Núm. 15:5-7). As libaçõeseram sempre “derramadas”, nunca sorvidas. Aprimeira menção a uma libação aparece emGênesis 35:14. Nunca acompanhavam umaoferta pelo pecado, ou uma oferta pela culpa,quando oferecidas isoladamente.

3. Ofertas de comunhão. Estas subdividem-se em várias categorias: a. Ofertas pacíficas; b.Ofertas movidas; c. Ofertas de agradecimento;d. Ofertas votivas; e. Ofertas voluntárias; e, f.ofertas de consagração sacerdotal. As ofertaspacíficas falam da comunhão restaurada, após aexpiação de pecados e o perdão recebido.Todas as outras ofertas de comunhão sãovariantes das ofertas pacíficas (ver Lev. 3 e

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7:11-36). As ofertas movidas eram a porção,dentre as ofertas pacíficas, que pertencia aosacerdote oficiante. As ofertas deagradecimento podem ser entendidas até porcausa de seu sugestivo nome, o que também sedá no caso das ofertas votivas. Estas últimaspodiam consistir em ofertas queimadas ou emofertas pacíficas. As ofertas voluntárias, comoseu nome indica, eram de natureza espontânea.E as ofertas de ordenação, que a LXX chama de“ofertas de aperfeiçoamento”, são chamadas nohebraico por “ofertas de instalação”. Essasofertas estavam intimamente vinculadas aoconceito de “encher a mão”, expressão usadapara indicar a consagração de alguém aoserviço do Senhor (ver Êxo, 28:41; 29; cf. Êxo.32:29), exigindo um estado de pureza ritual e dedevoção espiritual (ver II Crô. 29:31). (83)

E do Dicionário Bíblico Universal, retiramos:

Sacrifício no Velho Testamento. O sacrifício(q.v.) era a parte mais importante do cultojudaico. De acordo com o objeto sensíveloferecido a Deus, os sacrifícios eramclassificados em: cruentos (em que haviaderramamento de sangue: bois, carneiros,cabras, pombas) e incruentos (semderramamento de sangue: grãos ou produtosagrícolas). Nos sacrifícios cruentos só podiamser oferecidos animais que fossem propriedadedo oferente (2Sam 24,24); os animais imundos,

83 CHAMPLIN e BENTES, 1995f, p. 41.

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defeituosos ou roubados eram consideradosindignos (Mal 1,13). A cerimônia do sacrifício,em geral, consistia nos seguintes elementos: 1)a condução do animal até a porta doTabernáculo; 2) a imposição das mãos sobre avítima, o que provavelmente simbolizava atransmissão dos pecados do oferente para oanimal: 3) a morte da vítima e o derramamentode seu sangue; 4) a aspersão com o sangue davítima; 5) a cremação de toda a carne da vítimaou de apenas uma parte da vítima, seguia-se arefeição sacrifical, na qual o ofertante, pelamanducação da carne da vítima oferecida aDeus, patenteava sua amizade com Ele.

Os sacrifícios cruentos eram de trêsespécies: Sacrifícios em holocausto: os maisantigos e mais importantes sacrifícios, em quetoda a vítima era queimada. Somente osanimais machos podiam ser oferecidos emholocausto. Os sacrifícios pelo pecado: a vítimanão era completamente consumida pelo fogo;algumas partes eram conservadas para uso dosacerdote. Estes eram oferecidos em remissãodos pecados. Nesta classe, só no sacrifício davaca vermelha é que se queimava tudo (Num19,2-10). Os sacrifícios pacíficos: em quetambém só se queimava uma parte da vítima.Eram oferecidos para agradecer a Deus ou paralhe suplicar uma graça. Exemplos típicos desacrifícios cruentos foram os holocaustos e asofertas pacíficas oferecidas por Moisés, aotempo da promulgação da Lei (Ex 24,4-8; Hebr9,19-21) e o sacrifício da vaca vermelha, cujascinzas serviam para fazer a água da aspersão

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(Num 19,2-10).

Os sacrifícios incruentos eram ofertas degrãos e vinho, farinha pura, espigas de trigo,pão sem fermento ou bolos. Eram oferecidosfrequentemente com holocaustos e ofertaspacíficas; algumas vezes, porém eram ofertadasseparadamente. (84)

Em sua maioria, as ofertas eram de animais

sacrificados e queimados, uma ritualística totalmente

tétrica e mórbida, que hoje nos choca diante de tanta

crueldade para com os pobres dos animais e, mais ainda,

vendo o sangue deles espargido por sobre o altar, num

estilo bem próximo de filmes vampirescos.

Esses sacrifícios deviam ser feitos todos os dias,

tornando-se, novamente, nesse ponto, de algo ligado às

ritualísticas pagãs:

Nos templos de todas as cidades principaisda Mesopotâmia havia sacrifícios diariamentepropiciados aos deuses. Eram oferecidosvegetais e carnes, libações de água, cerveja evinho; queimavam-se especiarias aromáticas eincenso perfumado. Tais cerimônias eramrealizadas por sacerdotes e, de um modo geral,delas bem pouco ou nada participavam oscidadãos comuns. […]. (85) (grifo nosso)

84 Dicionário Prático Barsa, p. 241.85 KRAMER, 1983, p. 112.

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Se esses sacrifícios eram, também, uma prática

diária dos hebreus, não há como não aceitar, mais uma

vez, que tomaram isso da cultura pagã.

Uma curiosidade entre os gêneros que se ofereciam

como oblação é o sal, porquanto “atribuía-se ao sal valor

purificador”. (86)

Ora, ainda hoje encontramos isso em alguns

segmentos espiritualistas, quando se recomenda o

famoso “banho de sal grosso”.

Acrescentam os tradutores que o sal:

Entre os assírios, era utilizado no culto, eentre os nômades, na refeição de amizade oualiança, de onde a expressão ‘aliança de sal’ (Nm18,19) para exprimir a estabilidade da aliança entreDeus e o seu povo. (87) (grifo nosso)

Portanto, mais uma coisa tomada de outros povos.

2ª) locais de adoração

Não nos passaram despercebidas as citações nas

quais se vincula uma montanha a Deus como, por

exemplo:

Êxodo 3,1: “Apascentava Moisés o rebanho de

86 Bíblia de Jerusalém, p. 163.87 Bíblia de Jerusalém, p. 164.

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Jetro, seu sogro, sacerdote de Madiã. Conduziu asovelhas para além do deserto e chegou ao Horeb,a montanha de Deus”. (grifo nosso)

Êxodo 19,3: “Então Moisés subiu a montanha deDeus. E da montanha Iahweh o chamou, […].”(grifo nosso)

Êxodo 24,12: “Iahweh disse a Moisés: 'Sobe a mimna montanha, e fica lá; dar-te-ei tábuas de pedra– a lei e o mandamento – que escrevi para eles'”.(grifo nosso)

As montanhas eram, muitas vezes, os locais nos

quais adoravam aos deuses. A determinação divina dada

aos hebreus, para quando chegassem na terra de Canaã,

onde habitava um povo pagão, foi taxativa: Números

33,51: “Expulsareis diante de vós todos os habitantes da

terra. Destruireis as suas imagens esculpidas, todas as

suas estátuas de metal fundido, e demolireis todos os

seus lugares altos”. (grifo nosso) Assim, temos que os

rituais pagãos eram, via de regra, realizados em lugares

altos, que não são outra coisa senão as montanhas ou os

montes na visão dos hebreus.

É claro que das altas montanhas vêm asrevelações, daquela atmosfera misteriosa eencoberta. É uma antiquíssima e muitodifundida concepção a de que os deuses e opoder divino estão escondidos entre asnuvens, no alto das grandes montanhas. Isto

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se acredita no Japão, no Fuji; isto se acreditana Grécia, no Olimpo; isto se acredita e serelata no Sinai, revelação também vinda decima de uma alta montanha. […]. (88) (grifonosso)

A montanha está “mais próxima” do Céu,o que a investe de uma dupla sacralidade: porum lado, participa do simbolismo espacial datranscendência (“alto”, “vertical”, “supremo”,etc.) e, por outro, é o domínio por excelênciadas hierofanias atmosféricas e, como tal, amorada dos deuses. Todas as mitologias têmuma montanha sagrada, variante mais oumenos ilustre do Olimpo grego. Todos osdeuses possuem lugares reservados ao seuculto nos pontos altos. Os valores simbólicose religiosos das montanhas são inúmeros. Amontanha é frequentemente consideradacomo o ponto de reencontro entre o Céu e aTerra, portanto um “centro”, o ponto pelo qualpassa o eixo do mundo, região saturada desagrado, local onde podem realizar-se aspassagens entre as diferentes zonas cósmicas.Assim, segundo as crenças mesopotâmicas, “oMonte dos Países” une o Céu e a Terra (89) e omonte Meru da mitologia indiana eleva-se nomeio do mundo; acima dele brilha a estrela polar(90). Também os povos uralo-altaicos conhecemum monte central, o Sumbur, Sumur ou Sumeru,em cujo cimo está suspensa a estrela polar

88 REHFELD, 1986, p. 24.89 N.T.: JEREMINAS, Handbuch, p. 130.90 N.T.: KIRFEL, Kosmographie, p. 15.

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(crenças buriatas) (91). Segundo as crençasiranianas, o monte sagrado Haraberezaiti(Harburz) encontra-se no meio da Terra e estáligado ao Céu (92). Na Edda, Himingbjörg é,como seu nome indica, um “monte celeste”; aí oarco-íris (Bifröst) atinge a abóbada do Céu.Crenças parecidas encontram-se entre osfinlandeses, os japoneses, etc.

Devido ao fato de ser o ponto de encontroentre o Céu e a Terra, o “monte” acha-se no“centro do mundo” e é certamente o ponto maiselevado da Terra. Por isso as regiõesconsagradas – “lugares santos”, templos,palácios, cidades santas – são assimiladas a“montanhas” e elas mesmas tornam-se“centros”, isto é, são integradas de maneiramágica no cume do monte cósmico (cf. § 145).[…]. (93) (grifo nosso)

Interessante, também, foi esta outra explicação

que encontramos:

No livro do Êxodo, Moisés e os israelitasestão no monte Horebe, tendo viajado desde oEgito através do Mar Vermelho. Moisés escalaa rocha para falar com El Shaddai, o Senhorda Montanha (mais tarde chamado Jeová),que ensina que, a partir de então, ele será seuDeus e que eles não mais devem usar seu ouro

91 N.T.: HOLMBERG, Der Daum des Lebens, p. 41.92 N.T.: Textos em Christensen, Le premier homme, II, p. 42.93 ELIADE, 1998, p. 90-91.

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para fazer ídolos e imagens deiformes (94). (95)(grifo nosso)

Vê-se a relação da expressão El Shaddai com o

Senhor da Montanha; aliás, era no que acreditavam

naquela época:

1 Reis 20,22-28: “O profeta aproximou-se do rei deIsrael e lhe disse: ‘Vamos! Coragem! Pondera comcuidado o que deves fazer, pois na passagem doano o rei de Aram te atacará’. Os servos do rei deAram disseram-lhe: ‘O Deus dessa gente é umDeus de montanha, é por isso que nos venceram.Mas lutamos contra eles na planície e certamenteos venceremos”… O homem de Deus aproximou-sedo rei de Israel e disse-lhe: ‘Assim, fala Iahweh: Jáque Aram disse que Iahweh é um Deus demontanhas e não um Deus de planície, entregoem tuas mãos toda essa multidão e reconhecerásque sou Iahweh’”. (grifo nosso)

Certamente que esse fato será bem

desconcertante para quem possui e sustenta argumentos

dogmáticos.

Nova surpresa nos estava reservada; coube ao

jornalista do G1 (Globo) Reinaldo José Lopes, que, no

artigo “Conheça a verdadeira 'cara' da Arca da Aliança,

objeto mais sagrado da Bíblia”, nos apresenta esta

94 N.T.: Êxodo 20:23. Da mesma maneira, Êxodo 20:4 traz uma injunçãoanterior contra a confecção de imagens gravadas.

95 GARDNER, 2004, p. 24.

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afirmação de Cristine Hayes, professora de Bíblia

Hebraica da Universidade de Yale (EUA): “O principal

deus cananeu, El, era retratado como morando

numa tenda, no alto de uma montanha”. (96) (grifo

nosso)

Diante disso, podemos ainda acrescentar como

sendo de origem cananeia a Tenda da Reunião, na qual

Moisés falava com Deus “face a face” (Êxodo 33,7-11).

3ª) ritual de purificação

O Dicionário Prático Barsa, explica:

Cerimônia religiosa de acordo com a LeiMosaica, pela qual um israelita ficava livre dedeterminada mancha legal. Podia-se contrairimpureza legal (e por conseguinte necessitar depurificação) de vários modos: tocando numcadáver (Num 19,11-22; 31,19; Lev 11,24-40);pelo contacto com um leproso (Lev 14,4-32);pelas várias atividades referentes ao sexo (Lev15; Dt 23,10-11); pelo parto. (97)

O ritual de purificação para quem havia tocado

num cadáver humano é o que nos interessa. Usava-se

nele a água da purificação ou água lustral, conforme os

96 LOPES, 2008, disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL465154-5603,00-CONHECA+A+VERDADEIRA+CARA+DA+ARCA+DA+ALIANCA+OBJETO+MAIS+SAGRADO+DA+BIBLIA.html.

97 Dicionário Barsa, p. 225.

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procedimentos listados em Números, que transcrevemos:

Números 19,1-9: “Iahweh falou a Moisés e a Aarão.Disse-lhes: ‘Eis um estatuto da Lei que Iahwehprescreve. Fala aos israelitas. Que tragam a ti umanovilha vermelha sem defeito e perfeita e quenão tenha ainda sido submetida ao jugo. Entregá-la-eis a Eleazar, o sacerdote. Será levada para forado acampamento e será imolada diante dele.Depois o sacerdote Eleazar tomará com o seu dedoum pouco do sangue da vítima e com esse sanguefará sete aspersões na direção da entrada daTenda da Reunião. Queimar-se-á, então, anovilha na sua presença; o couro, a carne, osangue e os excrementos serão queimados. Osacerdote tomará em seguida madeira decedro, hissopo e escarlate de cochonila e oslançará no fogo onde arde a novilha. … Umhomem em estado de pureza recolherá as cinzasda novilha e as depositará, fora do acampamento,em lugar puro. Ali permanecerão para uso ritual dacomunidade dos israelitas, para fazerem a águalustral; é um sacrifício pelo pecado”. (grifo nosso)

Os tradutores da Bíblia de Jerusalém explicam-nos

que:

[…] Este ritual, ao qual somente outro textofaz referência (Nm 31,23, além de Hb 9,13),legitima antiga prática colorida de magia,assimilando-a a sacrifício de expiação pelopecado (v. 17 e comp. vv. 4-5 com Lev 16,27; v.8 com Lv 16,28). Outros costumes análogos

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foram assim admitidos pela Lei mosaica (Lv14,2-7; 16,5-10; Nm 5,17-28; Dt 21,1-9). Anovilha devia ser avermelhada, porque, noantigo Oriente, tudo aquilo que se aproximado vermelho tem valor profilático: esta corevoca o sangue, princípio da vida, e protegecontra a morte. (98) (grifo nosso)

Quanto a alguns dos materiais usados:

Madeira de cedro: simbolizava a longevidadee a incorruptibilidade. – Um fio de escarlate:usado provavelmente para atar o feixe dehissopo à haste do cedro. – Hissopo: eraconsiderado como um purificador porexcelência (Sl 51,9). Segundo os rabinos, apurificação feita com a madeira de cedro e como hissopo significa que, tanto os grandes comoos pequenos, devem inclinar as suas cabeçasdiante de Deus quando estão em pecado. (99)(grifo nosso)

Seria oportuno ver esses outros costumes

análogos, citados na explicação anterior; inclusive um

deles já o mencionamos:

Levítico 14,1-7: “Iahweh falou a Moisés e disse:‘Esta é a lei a ser aplicada ao leproso no dia da suapurificação. Será conduzido ao sacerdote, e osacerdote sairá para fora do acampamento. Se

98 Bíblia de Jerusalém, p. 230-231.99 Bíblia Sagrada Santuário, p. 152.

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verificar, após exame, que o leproso está curado dasua lepra, determinará que se tomem para ohomem a ser purificado, duas aves vivas epuras, madeira de cedro, lã escarlate ehissopo. E ordenará, em seguida, que se imoleuma ave em um vaso de argila, sobre águascorrentes. Tomará a ave viva, a madeira de cedro,a lã escarlate, o hissopo e mergulhará tudo(inclusive a ave viva) no sangue da aveimolada sobre a água corrente. Fará entãosete aspersões sobre o homem a ser purificadoda lepra e, tendo-o declarado puro, deixará quevoe para o campo a ave viva’. (grifo nosso)

Levítico 16,5-10: “Receberá a comunidade dosisraelitas dois bodes destinados ao sacrifício dopecado, e um carneiro para o holocausto. Depoisde haver oferecido o novilho do sacrifício pelo seupróprio pecado e de ter feito o rito de expiação porsi mesmo e pela sua casa. Aarão tomará os doisbodes e os colocará diante de Iahweh na entradada Tenda da Reunião. Lançará a sorte sobre osdois bodes, atribuindo uma sorte a Iahweh eoutra a Azazel. Aarão oferecerá o bode sobre oqual caiu a sorte ‘De Iahweh’ e fará com ele umsacrifício pelo pecado. Quanto ao bode sobre oqual caiu a sorte ‘De Azazel’, será colocado vivodiante de Iahweh, para se fazer com ele o rito deexpiação, a fim de ser enviado a Azazel, nodeserto”. (grifo nosso)

Números 5,16-28: “O sacerdote fará aproximar amulher e a colocará diante de Iahweh. Em seguidatomará água santa em um vaso de barro e,tendo tomado do pó do chão da Habitação, o

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espargirá sobre a água. E apresentará a mulherdiante de Iahweh, soltará a sua cabeleira ecolocará nas suas mãos a oblação comemorativa(isto é, a oblação de ciúme). E nas mãos dosacerdote estarão as águas amargas e demaldição. A seguir o sacerdote fará a mulher jurare lhe dirá: ‘Se não é verdade que algum homem sedeitou contigo e que te desviaste e que te tornasteimpura, enquanto sob o domínio de teu marido,que estas águas amargas e de maldição te sejaminofensivas! Porém, se é verdade que te desviasteenquanto sob o poder de teu marido e que tetornaste impura e que outro homem, que não o teumarido, participou do teu leito…' O sacerdote fará,aqui, a mulher prestar um juramento imprecatórioe lhe dirá: ‘…Que Iahweh te faça, no teu povo,objeto de imprecação e maldição, fazendo murcharo teu sexo e inchar o teu ventre! Que estas águasde maldição penetrem nas tuas entranhas, a fim deque o teu ventre se inche e o teu sexo murche!’ Amulher responderá: ‘Amém! Amém!’ Em seguida osacerdote escreverá essas imprecações e asapagará com as águas amargas. E fará a mulherbeber essas águas amargas e de maldição, eserão para ela amargas. O sacerdote, então,tomará das mãos da mulher a oblação de ciúme ea erguerá, apresentando-a diante de Iahweh, e acolocará sobre o altar. E tomará um punhado daoblação de ciúme e o queimará sobre o altar, paramemorial. O sacerdote fará a mulher beber dessaságuas. E ao fazê-la beber as águas, se realmenteela se tornou impura enganando a seu marido,então as águas de maldição, penetrando nela, ser-lhe-ão amargas: seu ventre inchará, seu sexo

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murchará e ela servirá para o seu povo de exemplonas maldições. Se, ao contrário, ela não se tornouimpura, mas está pura, sairá ilesa e será fecunda”.(grifo nosso)

Deuteronômio 21,1-9: “Quando for encontrado umhomem morto estendido no campo, na terra cujaposse Iahweh teu Deus te dará, e ninguém souberquem o matou, teus anciãos e teus escribas” sairãoe medirão as distâncias até às cidades queestiverem ao redor do morto, determinando acidade mais próxima do morto. A seguir, osanciãos daquela cidade tomarão uma novilhado gado, com a qual não se tenha trabalhado eainda não tenha sido atrelada ao jugo. Os anciãosdaquela cidade farão com que a novilhadesça até uma torrente de água permanente,onde ninguém trabalha nem semeia. E ali,sobre a torrente, desnucarão a novilha.Depois aproximar-se-ão os sacerdotes levitas, poisforam eles que Iahweh teu Deus escolheu para oseu serviço e para que abençoem em nome deIahweh, cabendo-lhes também resolver qualquerlitígio ou crime. E todos os anciãos da cidade maispróxima ao morto lavarão as mãos sobre a novilhadesnucada na torrente, fazendo a seguintedeclaração: ‘Nossas mãos não derramaram estesangue, e nossos olhos nada viram. Perdoa ao teupovo Israel, que resgataste, Ó Iahweh; nãopermitas que um sangue inocente recaia sobre oteu povo Israel e este sangue lhe será perdoado’.Tu porém, farás com que desapareça do teu meio oderramamento de sangue Inocente, porque farás oque é reto aos olhos de Iahweh”. (grifo nosso)

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Dessa última passagem, destacamos o trecho “a

novilha desnucada na torrente”, em relação ao qual nos

explicam:

O animal é desnucado num lugar deserto, enão se faz menção do sangue: não se trata deum sacrifício mas sim de um velho ritomágico como os de Lv 14,2-9; 16,5-16.21-22;Nm 19,2-10, que foi assimilado pelo javismo(cf. v. 8). (100) (grifo nosso)

Dessa forma, temos um ritual mágico, e puramente

pagão, incorporado à tradição religiosa dos hebreus. É

Fantáaaaastico!

De tudo o que até agora vimos, seguramente,

podemos concluir que o povo hebreu aceitou a mudança

de nome de sua divindade maior, mas não abandonou a

ritualística pagã.

100 Bíblia de Jerusalém, p. 283.

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Épocas em que os hebreus praticavam rituais

pagãos

Seguindo o que consta na Bíblia de Jerusalém (p.

2.170-2.188), vamos dividir a história dos hebreus nos

seguintes períodos: a) Patriarcas; b) Moisés e Josué, c)

Dos Juízes a Salomão (1.200-931 a.C.); d) Judá e Israel

(931-721 a.C.), e) Fim do reino de Judá (721-587 a.C.); f) A

restauração durante o período persa (538-333 a.C.) e g)

Época helenística (333-63 a.C.).

a) Os patriarcas

Na época do Bronze antigo – 3.100 a 2.100 –,

viviam na Palestina os cananeus, ancestrais de Abraão,

que eram nômades na Mesopotâmia. Na época do Bronze

médio – 2.100 a 1.550 aprox. –, foi que Abraão chegou em

Canaã (cerca de 1.850). De 1.700 a 1.250 é o período dos

patriarcas no Egito. (101)

Gênesis 17,1: “Quando Abrão completou noventae nove anos, Iahweh lhe apareceu e lhe disse: ‘Eusou El Shaddai, anda na minha presença e sêperfeito’”. (grifo nosso)

Explicam-nos o “El Shaddai”, desse passo, da

101 Bíblia de Jerusalém, p. 2170.

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seguinte forma:

Antigo nome divino da época patriarcal(28,3; 35,11; 43,14; 48,3; 49,25), mantidoespecialmente pela tradição sacerdotal (v. Ex.6,3), raro fora do Pentateuco, salvo em Jó. Atradução comum “Deus Todo-Poderoso” éinexata. O sentido é incerto; propôs-se “Deusda montanha”, segundo o acádico shadû; seriapreferível entender “Deus da Estepe”, segundoo hebraico sadeh é outro sentido do termoacádico. É uma apelação divina quecorresponde ao modo de vida. (102) (grifo nosso)

É bem verdade que em muitas traduções bíblicas

aparece mesmo a expressão “Deus Todo-Poderoso”,

como, por exemplo, na Bíblia Sagrada Vozes, na qual

explicitam: “Deus Poderoso (em hebr. El-Shaddai) é

nome do verdadeiro Deus adorado pelos patriarcas

(Gn 28,3; Ex 6,3)”. (103) (grifo nosso)

Vê-se o “El Shaddai” também ser usado em

Gênesis 28,3 e 35,11, quando Deus muda o nome de Jacó

para Israel e lhe revela este seu nome.

Mais à frente veremos uma correlação direta entre

as práticas religiosas dos hebreus com proposta de se

entender “El Shaddai” como o “deus da montanha”. (104)

102 Bíblia de Jerusalém, p. 54.103 Bíblia Sagrada Vozes, p. 43.104 Bíblia de Jerusalém, p. 54.

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Corroborando, a evolução do processo de crença:

Naquela época, Abraão acabara decompletar sua campanha militar em Canaã,tendo conduzido sua armada com sucessocontra as tropas de alguns reis incômodos. ODeus a que se refere é nomeado maisespecificamente, em antigos textos, como osenhor da montanha El Shaddai (105); omesmo título ao qual novamente aludiu oSenhor que falou com Moisés no Monte Horebe,no Sinai. Foi apenas durante a narrativa dosacontecimentos feita pelos escribas que o títuloJavé foi introduzido, baseado na raiz hebreiaYHVH: “Eu sou o que sou”, semelhante a: “Meunome é irrelevante”. Mais importante, porém, foia afirmação que esse Senhor fez a Moisés(Êxodo 6:3) de que era o Deus de Abraão.Textos primitivos dizem que o Deus deAbraão era El Shaddai (Gênesis 17:1), mas emBíblias modernas traduziu-se erroneamenteesse nome como Deus Todo-Poderoso.Usado em textos hebraicos e mantido naVulgata latina (106), El Shaddai era um termosemítico, sinônimo do deus mesopotâmicoEnlil, chamado Ilu Kurgal: grande Senhor daMontanha (muito mais tarde, em 1518, Javéfoi convertido no híbrido moderno, Jeová)

105 N.T.: Armstrong, Karen. A History of God, Ballantine. New York, NY, 1994,cap. 1, p. 14,20-21.

106 N.T.: Ver capítulo 1, nota 2.

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(107). (108) (grifo nosso)

Embora já tenhamos citado El, o deus cananeu,

deixamos para este momento desenvolver mais essa

questão, conforme, anteriormente, havíamos prometido.

Leiamos:

El

O povo de Canaã (ou filisteu) consideravaesta divindade o deus superior do seu panteão.Ele tinha criado a Terra e os Céus e delegou atarefa de gerir as vidas dos homens em Baal.Tinha um trono na “nascente das nascentes dosrios”, de onde via tudo o que passava noUniverso e o governava, à semelhança de Odine Zeus.

Como deus da água fertilizava os campos.

Foi venerado também nas tribos israelitascom o nome de Javé, aparecendo na Bíbliacomo El ou Elohim. Passou o nome de El asignificar deus para os hebreus, sendo o pluralelim (tal como o plural de Baal é baalim). Assimse presencia o Elohim cananita a dar origem aoDeus cristão. (109) (grifo itálico do original, negritonosso)

Parece que o mito de Marduc e Tiamatinfluenciou o povo de Canaã, que contava uma

107 N.T.: Hastings, James. Dictionary of the Bible. T & T. Clark, Edinburgh, 1909,em “God”.

108 GARDNER, 2004, p. 31.109 Site Infopédia – Enciclopédia e Dicionários Porto Editora, disponível em:

https://www.infopedia.pt/$el?uri=lingua-portuguesa/EL.

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história semelhante sobre Baal-Habab, o deusda tempestade e da fertilidade, muitas vezescitado em termos extremamente descorteses naBíblia. A história da batalha de Baal com Yam-Nahar, o deus dos mares e dos rios, é contadaem tabuinhas que datam do século XIV AEC.Baal e Yam viviam com El, o Deus Altocananeu. No Conselho de El, Yam exige queBaal lhe seja entregue. Com duas armasmágicas, Baal derrota Yam e está para matá-loquando Asera (esposa de El e mãe dos deuses)diz que é desonroso matar um prisioneiro. Baalenvergonha-se e poupa Yam, representante doaspecto hostil dos mares e dos rios queconstantemente ameaçam inundar a terra,enquanto Baal, o deus da tempestade, fertiliza aterra. Em outra versão do mito, Baal mata odragão de sete cabeças Lotan, chamado emhebraico de Leviatã. Em quase todas asculturas, o dragão simboliza o latente, o informee o indiferenciado. Assim, Baal interrompe oretorno à informidade primordial com um atoverdadeiramente criativo e é recompensadocom um belo palácio construído pelos deusesem sua honra. Portanto, já no início da religião,a capacidade criadora era vista como divina:ainda usamos a linguagem da religião para falarda “inspiração” criadora, que refaz a realidade econfere novo sentido ao mundo.

Mas Baal sofre um revés: morre e tem dedescer ao mundo de Mot, o deus da morte e daesterilidade. Ao tomar conhecimento desse fato,o Deus Alto El deixa seu trono, veste umatanga e retalha as faces, porém não consegue

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resgatar o filho. É Anat, amante e irmã de Baal,quem parte do reino divino à procura de suaalma gêmea, “desejando-o como uma vaca aseu bezerro ou uma ovelha a seu cordeiro”.Quando encontra seu corpo, realiza umbanquete fúnebre em sua homenagem. Depois,corta Mot ao meio com sua espada, queima-o,tritura-o como milho e o espalha pelo chão. Háhistórias semelhantes sobre as outras grandesdeusas – Inana, Ishtar e Ísis – que buscam odeus morto e dão vida nova ao solo. A vitória deAnat, no entanto, deve ser perpetuada ano apósano em celebração ritual. Mais tarde – nãosabemos ao certo como, pois nossas fontes sãoincompletas – Baal é revivificado e devolvido aAnat. Na antiga Canaã, festejava-se com sexoritual essa apoteose da inteireza e da harmonia,simbolizada pela união dos sexos. Assim, aoimitar os deuses, homens e mulheresparticipavam de sua luta contra a esterilidade easseguravam a capacidade criadora e afertilidade do mundo. A morte de um deus, abusca empreendida pela deusa e o retornotriunfante à esfera divina eram temasreligiosos presentes em muitas culturas ereaparecem na religião, muito diferente, doDeus Único adorado por judeus, cristãos emuçulmanos.

A Bíblia atribui essa religião a Abraão, que,em algum momento entre os séculos XX e XIXAEC, saiu de Ur e se instalou em Canaã. Nãotemos informações contemporâneas sobre ele,mas os estudiosos acham que talvez tenha sidoum dos chefes tribais errantes que conduziram

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seu povo da Mesopotâmia para o Mediterrâneono fim do terceiro milênio AEC. Esses errantes,alguns dos quais são chamados abiru, apiru ouhabiru em fontes mesopotâmicas e egípcias,falavam idiomas semitas ocidentais, um dosquais é o hebraico. Não eram nômades dodeserto como os beduínos, que migravam comseus rebanhos segundo o ciclo das estações;eram mais difíceis de classificar e comfrequência entravam em choque com asautoridades conservadoras. Tinham um nívelcultural geralmente superior ao do povo dodeserto. Alguns atuavam como mercenários;outros eram funcionários do governo; outrosainda trabalhavam como mercadores, criadosou funileiros. Alguns enriqueciam e tratavam deadquirir terra e assentar-se. O livro do Gênesismostra Abraão servindo ao rei de Sodoma comomercenário e descreve seus frequentes conflitoscom as autoridades de Canaã e arredores. Porfim, quando sua esposa Sara morreu, elecomprou terra em Hebron, na atual Cisjordânia.

Tal como é relatada no Gênesis, a história deAbraão e seus descendentes imediatos sugereque a instalação dos hebreus em Canaã, omoderno Israel, ocorreu em três etapas. Aprimeira, associada a Abraão e Hebron, tevelugar por volta de 1850 AEC. A segundarelaciona-se com o neto de Abraão, Jacó, querecebeu o nome de Israel (“Que Deus mostresua força!”); ele se estabeleceu em Siquém,hoje a cidade árabe de Nablus, na Cisjordânia. ABíblia nos informa que os filhos de Jacó, que setornaram os ancestrais das doze tribos de Israel,

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emigraram para o Egito durante uma grandefome em Canaã. A terceira etapa remonta aaproximadamente 1200 AEC, quando tribos quese diziam descendentes de Abraão partiram doEgito para Canaã. Contavam que os egípciosas escravizaram e uma divindade chamadaJavé, deus de seu chefe, Moisés, as libertara.Depois de entrar à força em Canaã, aliaram-seaos hebreus locais e passaram a ser chamadasde o povo de Israel. A Bíblia deixa claro que opovo que conhecemos como os antigosisraelitas era uma confederação de váriosgrupos étnicos, ligados sobretudo por sualealdade a Javé, o Deus de Moisés. Mas ahistória bíblica foi escrita séculos depois, porvolta do século VIII AEC, embora, sem dúvida,usasse fontes narrativas anteriores. No séculoXIX, estudiosos bíblicos alemães conceberamum método crítico que discerne quatro fontesdiferentes nos cinco primeiros livros da Bíblia –Gênesis, Êxodo, Levítico, Números eDeuteronômio –, que, reunidos no século VAEC, formam o Pentateuco. […].

[…] Passa rapidamente dos acontecimentosda pré-história ao final do período mítico – queinclui episódios como o Dilúvio e a Torre deBabel – e à história do povo de Israel. Elacomeça de forma abrupta no capítulo 12,quando o homem Abrão, que mais tarde seráchamado de Abraão (“Pai de uma multidão”),recebe ordem de Javé para deixar sua famíliaem Haran, onde hoje é a Turquia oriental, emigrar para Canaã, à margem do marMediterrâneo. Sabemos que seu pai, o pagão

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Taré, já havia migrado de Ur para o oeste, coma família. Agora Javé diz a Abraão que ele temum destino especial: tornar-se pai de umagrande nação, que um dia será mais numerosaque as estrelas do céu, e um dia seusdescendentes possuirão a terra de Canaã. […]Sua primeira revelação de si mesmo consistenuma ordem: que Abraão deixe seu povo e vápara a terra de Canaã.

Mas quem é Javé? Abraão adorava omesmo Deus que Moisés, ou o conhecia porum nome diferente? Essa seria uma questãode extrema importância para nós hoje, porém aBíblia é curiosamente vaga sobre o assunto enos fornece respostas conflitantes. J diz que oshomens adoravam Javé desde a época doneto de Adão, mas no século VI P sugere queos israelitas só ouviram falar de Javé quandoele apareceu a Moisés na sarça ardente. P fazJavé explicar que era de fato o mesmo Deus deAbraão, como se essa fosse uma ideia meiocontrovertida: ele diz a Moisés que Abraão ochamara de “El Shaddai” e não conhecia onome divino Javé. A discrepância não parecepreocupar muito os autores bíblicos ou seuseditores. J chama seu deus de “Javé” doprincípio ao fim: em sua época, Javé era o Deusde Israel, e só isso importava. A religião israelitaera pragmática e não tinha maior interesse notipo de detalhe que nos preocuparia. Contudo,não devemos imaginar que Abraão ou Moisésacreditavam em seu Deus como nósacreditamos. Estamos tão familiarizados com anarrativa bíblica e a história subsequente de

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Israel que tendemos a projetar nossoconhecimento da religião judaica posteriornessas primeiras personagens históricas.

Por conseguinte, supomos que os trêspatriarcas de Israel – Abraão. Seu filho Isaace seu neto Jacó – eram monoteístas,acreditavam num único Deus. Não pareceque assim fosse. Na verdade, provavelmente émais correto definir esses primeiros hebreuscomo pagãos que partilhavam muitas dascrenças religiosas de seus vizinhos. Decertoacreditavam na existência de divindades comoMarduc, Baal e Anat. Talvez não adorassem amesma divindade: é possível que o Deus deAbraão, o “Temor” ou “Parente” de Isaac e o“Poderoso” de Jacó fossem três deusesdistintos.

Podemos ir mais longe. É muitíssimoprovável que o Deus de Abraão fosse El, oDeus Alto de Canaã. Ele se apresenta aAbraão como El Shaddai (El da Montanha),que era um dos títulos tradicionais de El. Emoutras passagens, é chamado de El Elyon (ODeus Altíssimo) e El de Betel. O nome do DeusAlto cananeu se preserva em nomeshebraicos como Isra-El e Isma-El. Osisraelitas o vivenciaram de modos que nãoseriam estranhos para os pagãos do OrienteMédio. Veremos que, séculos depois, acharamaterrorizante o mana ou “santidade” de Javé. Nomonte Sinai, por exemplo, ele se manifestoua Moisés no meio de uma apavoranteerupção vulcânica, e o povo teve de manterdistância. Em comparação, o deus El de

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Abraão é uma divindade bem gentil. Aparece-lhe como um amigo e às vezes até assumeforma humana. Esse tipo de aparição divina,conhecida como epifania, era bastantecomum no mundo pagão da Antiguidade.Embora em geral não se esperasse que osdeuses interviessem diretamente na vida dosmortais, nos tempos míticos alguns indivíduosprivilegiados se viram face a face com seusdeuses. A Ilíada está repleta dessas epifanias.Os deuses e as deusas aparecem a gregos etroianos em sonhos, quando se acreditavaque caía a barreira entre os mundos humanoe divino. No final da Ilíada, Príamo é conduzidoaté os navios gregos por um jovem encantadorque acaba se revelando como Hermes. Quandoos gregos lembravam a Idade do Ouro de seusheróis, acreditavam que eles tiveram estreitocontato com os deuses, que eram, afinal, damesma natureza dos seres humanos. Essashistórias de epifanias expressam a visãoholística pagã: não sendo o divinoessencialmente distinto da natureza ou dahumanidade, podia-se experimentá-la semalarde. O mundo vivia cheio de deuses, que sepodia ver inesperadamente a qualquermomento, numa esquina ou na pessoa de umtranseunte desconhecido. Ao que parece, agente simples acreditava que esses encontroscom o divino podiam ocorrer em sua vida: issoexplicaria a estranha passagem dos Atos dosApóstolos em que, já no século I EC. O apóstoloPaulo e seu discípulo Barnabé são identificadoscomo Zeus e Hermes pelo povo de Listra, na

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atual Turquia.

Assim também, ao lembrar sua Idade doOuro, os israelitas viam Abraão, Isaac e Jacóconvivendo familiarmente com seu deus. El lhesdá conselhos amistosos, como qualquerxeque ou chefe tribal: orienta suas andanças,diz-lhes com quem se casar e fala-lhes emsonhos. De vez em quando, eles o veem emforma humana – uma ideia que mais tarde osisraelitas abominariam. No capítulo 18 doGênesis, J nos conta que Deus apareceu aAbraão junto ao carvalho de Mambré, perto deHebron. Abraão ergueu os olhos e avistou trêsestranhos aproximando-se de sua tenda, nahora mais quente do dia. Com a cortesia típicado Oriente Médio, insistiu que se sentassem edescansassem, enquanto corria a preparar-lhesuma refeição. Durante a conversa subsequente,descobriu, com toda a naturalidade, que umdaqueles homens era ninguém menos que seuDeus, a quem J sempre chama de “Javé”.Quanto aos outros dois, eram anjos. A revelaçãonão provocou grande surpresa. Quando Jescrevia, no século VIII AEC, nenhum israelitaesperaria “ver” Deus dessa forma: a maioriaacharia a ideia chocante. E, o contemporâneode J, considera indecorosas as velhas históriassobre a intimidade do patriarca com Deus: aorelatar os tratos de Abraão ou Jacó com Deus,prefere distanciar o fato e tornar as velhaslendas menos antropomórficas. Assim, diz queDeus fala a Abraão por intermédio de um anjo.J, no entanto, não é tão escrupuloso e preservao antigo sabor dessas primitivas epifanias.

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Jacó também presenciou várias epifanias.Numa ocasião, decidiu retornar a Haran paratomar esposa entre a parentela local. Naprimeira etapa da viagem, dormiu em Luza,perto do vale do Jordão, usando uma pedracomo travesseiro. Nessa noite, sonhou comuma escada que se erguia até o céu: anjossubiam e desciam entre os reinos de Deus edo homem. Não podemos deixar de lembraro zigurate de Marduc: no topo, como quesuspenso entre o céu e a terra, o homempodia encontrar seus deuses. No alto de suaescada, Jacó viu El, que o abençoou erepetiu as promessas feitas a Abraão: osdescendentes de Jacó se tornariam umapoderosa nação e possuiriam a terra de Canaã.Também fez uma promessa que, comoveremos, causou profunda impressão em Jacó.A religião pagã comumente era territorial: umdeus tinha jurisdição sobre determinada área, esempre era sensato adorar as divindades locais,quando se ia ao exterior. Mas El prometeu aJacó que o protegeria quando deixasseCanaã e vagasse numa terra estranha: “E eisque estou contigo, e te guardarei por onde querque fores”. A história dessa primeira epifaniamostra que o Deus Alto de Canaã começavaa adquirir uma implicação mais universal.

Quando acordou, Jacó compreendeu quepassara a noite num lugar santo, onde oshomens podiam conversar com seus deuses.“Na verdade, Javé está neste lugar, e eu nãosabia!”, J o faz dizer. Estava tomado deassombro, como geralmente ocorria com os

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pagãos, quando se deparavam com o podersagrado do divino: “que temível é este lugar! Eoutra coisa não é senão a casa de Deus (beth-El) e a porta do céu!” Expressou-seinstintivamente na linguagem religiosa de seutempo e de sua cultura: a Babilônia, moradados deuses, chamava-se “Porta dos deuses”(Bab-ili). Jacó resolveu consagrar aquele solosanto à maneira pagã tradicional da região.Colocou de pé a pedra que usara comotravesseiro e santificou-a com uma libação deóleo. Dali em diante, o nome do lugar seriaBeth-El [Betel], a Casa de El. Pedras eretaseram uma característica comum dos cultoscananeus da fertilidade, que, como veremos,floresceram em Betel até o século VIII AEC.Embora israelitas posteriores condenassemvigorosamente esse tipo de religião, osantuário pagão de Betel estava associado,na lenda antiga, a Jacó e seu Deus.

Antes de deixar Betel, Jacó resolveu: o deusque encontrara ali seria seu elohim (o termoabrangia tudo que os deuses podiam significarpara os mortais). Se cuidasse dele em Haran, El(ou Javé) devia ser muito eficiente. Jacó fezuma barganha: em troca da proteçãoespecial de El, o tornaria seu elohim, o únicodeus que importava. A crença israelita emDeus era profundamente pragmática. Abraão eJacó depositaram sua fé em El porquefuncionava para eles: não se preocuparam emprovar sua existência; El não era uma abstraçãofilosófica. No mundo antigo, o mana era um fatoconsumado, e um deus provava seu valor se

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conseguia transmiti-lo com eficiência. Essepragmatismo seria um fator constante nahistória de Deus. As pessoas continuariamadotando determinada concepção do divinoporque funcionava para elas, não porque eracientífica ou filosoficamente correta.

Anos mais tarde, Jacó deixou Haran comesposas e família e, ao entrar na terra deCanaã, presenciou mais uma estranha epifania.No vau do Jaboc, na Cisjordânia, lutou a noiteinteira com um desconhecido. Como a maioriados seres espirituais, pela manhã o adversáriodisse que tinha de partir, mas Jacó o segurou:não o soltaria enquanto não revelasse seunome. No mundo antigo, saber o nome dealguém equivalia a ter certo poder sobre ele, e odesconhecido se mostrou relutante em forneceressa informação. No decorrer do estranhoencontro, Jacó percebeu que o adversárioera o próprio El:

E Jacó lhe pediu: “Diz-me, teu nome”. Masele respondeu: “Por que perguntas meu nome?”.E ali o abençoou. E Jacó chamou esse lugar deFanu-El [Rosto de El], dizendo: “Porque vi Elface a face e sobrevivi”.

O espírito dessa epifania está mais próximoda Ilíada que do monoteísmo judaico posterior,que consideraria blasfemo um contato tão íntimocom o divino.

Contudo, embora mostrem os patriarcasencontrando seu deus quase do mesmomodo que seus contemporâneos pagãos,essas primeiras narrativas introduzem uma nova

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categoria de experiência religiosa. Em toda aBíblia, Abraão é chamado de homem de “fé”.Hoje tendemos a definir fé como a aceitaçãointelectual de um credo, mas, conforme vimos,para os autores bíblicos a fé em Deus não éuma crença abstrata ou metafísica. Quandolouvam a “fé” de Abraão, o que enaltecem não ésua ortodoxia (a aceitação de uma opiniãoteológica correta sobre Deus), porém suaconfiança, mais ou menos como quandodizemos que temos fé numa pessoa ou numideal. Na Bíblia, Abraão é um homem de féporque confia que Deus cumprirá suaspromessas, mesmo que pareçam absurdas.Como Abraão poderia ser o pai de uma grandenação se sua esposa, Sara, era estéril?Imaginar que ela poderia ter um filho é tãoridículo – Sara já passara da menopausa – queo casal ri da promessa. Quando, apesar detudo, finalmente o filho nasce, eles o chamamde Isaac, um nome que pode significar “risada”.Mas a alegria acaba quando Deus faz umaexigência horripilante: Abraão devesacrificar-lhe seu único filho.

O sacrifício humano era comum no mundopagão. Era cruel, mas tinha uma lógica e umaexplicação. Com frequência, acreditava-se queo primogênito era filho de um deus queengravidara a mãe num ato de droit deseigneur. Ao gerar a criança, a energia do deusse esgotava, e, para restaurá-la e assegurar acirculação de todo o mana existente, devolvia-seo primogênito ao pai divino. O caso de Isaac,porém, era muito diferente. Ele era uma dádiva

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de Deus, e não seu filho natural. Não haviamotivo para sacrifício nem necessidade derestaurar a energia divina. Na verdade, osacrifício tornaria sem sentido a vida de Abraão,baseada na promessa de que ele seria o pai deuma grande nação. Esse deus já começava aser concebido de um modo diferente de quasetodas as divindades do mundo antigo. Nãopartilhava da condição humana; não precisavade um influxo de energia de homens emulheres. Pertencia a outra categoria e podiafazer as exigências que quisesse. Abraãodecidiu confiar em seu deus. Junto com Isaac,empreendeu uma viagem de três dias ao monteMoriá, onde mais tarde se ergueria o Templo deJerusalém. Isaac, que ignorava a ordem divina,carregou a lenha para o próprio holocausto. Sóno último instante, quando Abraão jáempunhava a faca, Deus recuou e disse quetudo não passara de um teste. Abraão serevelara digno de tornar-se pai de umapoderosa nação, que seria tão numerosa quantoas estrelas do céu ou os grãos de areia dapraia.

Aos ouvidos modernos, a história é horrível:mostra Deus como um sádico despótico ecaprichoso, e não surpreende que, hoje emdia, muita gente que soube desse episódiona infância rejeite tal divindade. […].

Esse é um Deus brutal, sanguinário,guerreiro – seria conhecido como Javé Sabaot,o Deus dos Exércitos. Passionalmente parcial,propenso a compadecer-se apenas de seusfavoritos, não passa de uma divindade tribal.

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Quanto antes desaparecesse, melhor para todomundo. […].

Os hebreus chamavam Javé de “o Deusde nossos pais”, mas parece que ele era umadivindade bem diferente de El, o Deus Altocananeu adorado pelos patriarcas. Talveztenha sido o Deus de outro povo, antes de ser ode Israel. Em suas aparições a Moisés, Javérepete que é o Deus de Abraão, apesar deoriginalmente ser chamado de El Shaddai.Essa insistência talvez preserve os ecosdistantes de um antigo debate sobre aidentidade do Deus de Moisés. Sugeriu-se que,em sua origem, Javé teria sido um deusguerreiro, um deus dos vulcões, um deusadorado em Madian, onde hoje é a Jordânia.Nunca saberemos onde os israelitas odescobriram, se ele era de fato uma divindadecompletamente nova. Essa questão tambémseria muito importante para nós, mas não foi tãocrucial para os autores bíblicos. Na Antiguidadepagã, muitas vezes se amalgamavam diferentesdeuses ou uma localidade identificava com seusdeuses divindades de outro povo. A única coisade que podemos ter certeza é que, fosse qualfosse sua proveniência, os acontecimentos doÊxodo fizeram de Javé o definitivo Deus deIsrael e que Moisés conseguiu convencer osisraelitas de que ele era o mesmo El, o Deusamado por Abraão, Isaac e Jacó. (110) (grifonosso)

110 ARMSTRONG, 2008, p. 23-36.

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Confirma-se El como o Deus cananeu, estabelece a

hipótese de que os primeiros hebreus eram pagãos e,

sem meias palavras, Karen Armstrong afirma: “É

muitíssimo provável que o Deus de Abraão fosse El, o

Deus Alto de Canaã. Ele se apresenta a Abraão como El

Shaddai (El da Montanha), que era um dos títulos

tradicionais de El”, corroborando tudo quanto já foi dito

desde o início, e também a informação da Bíblia de

Jerusalém a respeito da possibilidade de significar “deus

da montanha”. (111) Uma outra tradução, que não ficaria

fora do que vimos, seria entender El Shaddai como “touro

poderoso”.

Vamos acrescentar essas duas últimas definições

do termo “El”:

El em nossa versão portuguesa “Deus” ou“deus”, tem formas cognatas em outras línguassemíticas, e significa um Deus no sentidomais lato, verdadeiro ou falso, ou mesmo umaimagem que é tratada como deus (Gn 35:2). Porcausa desse caráter geral, a palavra éfrequentemente associada com um adjetivo oupredicado definidor. Por exemplo, em Dt 5:9,lemos: ‘porque eu, o Senhor (Yahweh), teu Deus(elohim), sou Deus (el) zeloso’, ou, em Gn31:13: ‘Eu sou o Deus (el) de Betel’ Nos tabletesde Ras Shamra, entretanto, El aparece como

111 Ver Bíblia de Jerusalém, p. 54.

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substantivo próprio, o nome do “alto Deus”cananeu, cujo filho era Baal. O plural de El éElohim e quando é usada como plural étraduzido por “deuses”. Esses “deuses”podiam ser meras imagens, “madeira e pedra”(Dt 4:28), ou os seres imaginários que asmesmas representam (Dt 12:2). (112) (grifonosso)

No hebraico, “força”, “poder”. Essa palavra écognata do termo assírio ilu, bem como dovocábulo ugarítico il. Essa palavra significa“deus” (em contextos não-hebraicos), ou então“Deus” (no Antigo Testamento). Esse nome paraDeus (ou para deus), não foi inventado peloshebreus religiosos, mas foi adotado porempréstimo do uso semita pagão. O termolatino deus, que chegou ao português semqualquer modificação, era o nome pagão deuma divindade similar a Zeus, o principal dosdeuses dos gregos. Significava apenas deus oudivindade, tendo perdurado mais que os nomesespecíficos dos deuses, e assim tornou-se umtermo genérico para indicar a natureza divina.Por essa razão, podemos dizer que a origemdo termo Deus, em português, é pagã. Apalavra correspondente em inglês, God, é deorigem anglo-saxônica, referindo-se a qualquerobjeto de respeito e adoração religiosa e,naturalmente, também estava relacionada aopaganismo. Isso ocorre no caso de qualqueroutro idioma, visto que os vocábulos antecedem

112 DOUGLAS, 1984, p. 409.

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às revelações dadas aos hebreus e aosapóstolos de Jesus. Portanto, o mero fato deque o termo El é empregado como nomecomum para indicar deuses, divindades,poderes divinos, etc., nas religiõessemíticas, em nada detrata do valor dessevocábulo, usado no Antigo Testamento, paraindicar o Deus da Força. Ver o artigo geralsobre Deus, porção VI, onde são alistados ediscutidos os muitos nomes dados a Deus noAntigo Testamento, incluindo nome El, sozinhoou em suas muitas combinações.

Essa palavra, como um substantivo, é umdos nomes de Deus, embora também possa serusada como um adjetivo, com o sentido de‘forte’, em alusão a qualquer coisa, inclusiveseres humanos (Eze. 31:11) ou anjos (Sal.29:1). Essa palavra também pode indicardeuses pagãos, incluindo os seus ídolosrepresentativos, conforme se vê em Êxo. 15:11;34:14; Isa. 43:10, um fato que demonstra a largaaplicação dessa palavra, não se limitando aindicar o único verdadeiro Deus forte, conformeé usada, na maioria de suas ocorrências noAntigo Testamento.

A palavra El aparece isolada, algumas vezes;mais frequentemente, porém, em combinações,como El Elyon (o Deus Altíssimo, Gên. 14:18),El Shaddai (o Deus Todo Poderoso, Gên. 17:1),e El Hai (o Deus Vivo, Jos. 3:10). A forma pluraldessa palavra é Elohim, embora esse plural sejaa forma intensiva e não um verdadeiro plural. Atradução de Elohim poderia ser algo comoGrande Deus. Além disso, encontramos El Olam

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(o Deus da Eternidade, Gên. 21:33), El Roi (oDeus que vê, Gên. 16:13), El Rehum (o Deus daCompaixão, Deu. 4:31), El Nose (o Deus doPerdão, Sal. 99:8), El Hannun (o Deus Gracioso,Nee. 9:31), e El Kanna (o Deus Zeloso, Êxo.20:5), etc. (113) (grifo nosso)

Apenas destacaremos da última explicação: “Esse

nome para Deus (ou para deus), não foi inventado pelos

hebreus religiosos, mas foi adotado por empréstimo do

uso semita pagão.” e “Por essa razão, podemos dizer que

a origem do termo Deus, em português, é pagã”; tais

afirmações selam essa questão.

Importante, ainda, colocar as considerações de

Pepe Rodrígues, em Mentiras fundamentais da Igreja

Católica:

As compilações mais antigas de tradiçõesque aparecem no Génesis, no Exodo, noLevitico e nos Números foram escritas numadata difícil de precisar, mas foram-no, algures,durante a denominada época dos reis –provavelmente, no reinado de Salomão (± 970-930 a. C.) –, momento em que se desenvolveu ahistoriografia israelita na sequência doesplendor político dessa época. Nesses livrosaparecem claramente identificáveis os textospertencentes a duas fontes tradicionais muitodistintas – a iaveísta e a eloísta. Essa

113 CHAMPLIN e BENTES, 1995b, p. 311-312.

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identificação foi feita, pela primeira vez, em1711, num livro de Henning Bernhard Witter, quepassou despercebido; voltou a ser feita, em1753, por Jean Astruc, médico de Luís XIV, mas,desta vez, foi silenciada; finalmente, em 1780,as duas fontes foram postas em evidência peloerudito alemão Johann Gottfried Eichhorn.

Estes três analistas repararam em algo demuito simples: nos livros do Pentateuco – ouseja, nos primeiros cinco livros da Bíblia, de queMoisés é o suposto autor –, há muitas históriasque se duplicam, que contam os mesmos actos,só que entre esses relatos há notáveiscontradições, são diferentes as estruturas dalinguagem e, em especial, o nome dado a Deusvaria de uns para os outros; nuns, aparececomo Iavé e, noutros, como El ou Elohim, daío nome por que passaram a chamar-se essasfontes. Dado que ambas as fontes foramescritas por autores que viveram em contextossociopolíticos marcados por diferentesnecessidades legislativas, a análise do conteúdodos textos revela claramente que o autoriaveísta viveu em Judá, enquanto o eloísta viveuem Israel. Nalguns relatos, ambas as tradiçõesse juntaram e fundiram numa única. A esterespeito, a descrição que dá Richard ElliotFriedman, teólogo e professor de Hebreu daUniversidade da Califórnia, sobre todo esteprocesso parece bastante consistente:

“No decorrer das investigações sobre aantiga história israelita, alguns investigadoreschegaram à conclusão de que, historicamente,apenas uma pequena parte do antigo povo

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israelita partiu para o Egipto e se tornouescrava. É possível que esse grupo fosseexclusivamente composto por levitas. Feitas ascontas, é justamente entre eles queencontramos pessoas com nomes egípcios. Osnomes levitas de Moisés, Hofni e Pineas sãotodos egípcios, e não hebreus. Por outro lado,contrariamente às outras tribos, os levitas nãoocuparam nenhum território no país. Estesinvestigadores sugerem que o grupo que esteveno Egipto e, depois, no Sinai adorava o deusIavé. Só mais tarde chegaram a Israel, ondese encontraram com as tribos israelitas queadoravam o deus El. Em vez de lutarem paradecidir qual deus era verdadeiro, os doisgrupos aceitaram a crença de que Iavé e Eleram um único e mesmo Deus. Os levitastransformaram-se nos sacerdotes oficiais dareligião unificada, empregando possivelmente aforça, ou apenas a influência. Ou talvez tivessesido unicamente um modo de seremcompensados pelo facto de não possuíremnenhum território. Em vez de um território,passaram a receber, como sacerdotes, dez porcento dos animais sacrificados e das oferendas.

Esta hipótese concorda igualmente com aideia de que o autor da fonte E [eloísta] foi umlevita israelita. A sua versão sobre a revelaçãodo nome de Iavé a Moisés seria, no fundo, umreflexo desta história: o deus que as tribosadoravam no país era El. Possuíam tradiçõessobre o deus El e sobre os seus antepassadosAbraão, Isaac e Jacob. Entretanto, chegaram oslevitas, com as suas tradições sobre Moisés, o

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êxodo do Egipto e o deus Iavé. O tratamentoque se dá na fonte E aos nomes divinos explicapor que motivo o nome de Iavé não formavaparte das mais antigas tradições da nação”. (114).(115) (grifo nosso)

Se a informação de J. J. Hurtak estiver correta, o

nome El aparece 250 vezes no Antigo Testamento116.

Aceitar isso que estamos comprovando é

complicado para muitos seguidores de igrejas

evangélicas, pois, segundo nos informou uma amiga, ex-

evangélica, a explicação (ipsis litteris) que lhe deram é a

seguinte:

Na Igreja Batista diziam que “El” significava“Dele” ou “Ele” porque o judeu não pronunciavao nome de Deus em vão, pois este é um dos 10Mandamentos, veja:

Êxodo 20:7 Não tomará o nome do SENHORteu Deus em vão; porque o SENHOR não terápor inocente o que tomar o seu nome em vão.

Então, todos os nomes que terminam em “El”como Samuel, Rafael, Daniel, etc, sãotraduzidos assim:

114 N.T.: Cf. Friedman, R. E. (1989), ¿Quién escribió la Bíblia?, Martinez Roca,Barcelona, pp. 76-77. Livro muito bem documentado e escrito numalinguagem acessível aos leigos na matéria. Recomendamo-lo a todos osleitores que desejem aprofundar o estudo dos autores bíblicos (doPentateuco, no caso vertente) e das muitas contradições que se detectamnos seus textos.

115 RODRÍGUES, 2007, p. 30-31.116 Link: http://www.chavesdeenoch.org/html/hebraico.html.

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Samuel: Nome “Dele”.

Rafael: “Ele” é quem me cura ou “Ele” é aminha cura.

Daniel: “Ele” é meu juiz ou “Ele” é quem mejulga.

Que os judeus evitavam pronunciar o nome de

Deus isso é lá uma verdade; porém, não quanto ao que

usavam para substitui-lo, uma vez que o termo El

significa Deus, e não “Ele” ou “Dele”. Vejamos as

explicações na Tradução Novo Mundo citando Theological

Wordbook of the Old Testament, Vol. 1, Chicago (1980), p.

13:

Para evitar o risco de tomar o nome de Deus(YHWH) em vão, os judeus devotoscomeçaram a substituir o nome próprio deDeus pela palavra ‘ădōnā(y). Embora osmassoretas deixassem as quatro consoantesoriginais no texto, acrescentaram as vogais ē(em lugar de ă, por outros motivos) e ă paralembrar o leitor de pronunciar ‘ădōnā(y), semconsideração das consoantes. Estaparticularidade ocorre mais de seis mil vezes naBíblia hebraica. […]. (117) (grifo nosso)

O que não fazem para fugir daquilo que pode

colocar seus dogmas em contradição?… Quanto aos

significados dos nomes já listados anteriormente, e,

117 Tradução Novo Mundo, p. 1501.

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conforme se poderá perceber, nada tem a ver com a

explicação dada por muitos líderes a seus fiéis.

Vejamos, ainda sobre esse assunto, o que disse o

professor Ambrogio Donini (1903-1991), italiano,

catedrático de história das religiões na Universidade de

Bari e livre docente da mesma cadeira na Universidade

de Roma, embaixador italiano na Polônia em 1947 e

senador da República de 1953 a 1963 (118):

Cada vez que encontrava nas sagradasescrituras as quatro consoantes (ou“tetragrama”) do nome divino JHVH – sem asvogais, que só foram acrescentadas muitosséculos depois do início da era cristã – osacerdote hebreu ou o pio leitor comum eramlevados desde tempos imemoráveis, em virtudeda regra do tabu, que proíbe pronunciar onome do deus do clã, a substituí-lo, quandodeclamado em voz alta, pelo termo Adonai,“o meu senhor”. Muito mais tarde, no início daIdade Média, as vogais desta palavra foraminseridas entre as quatro consoantes do nomeJHVH para facilitar a leitura obrigatória eimpedir que se violasse de qualquer modo aantiga proibição, transformada em rígidanorma de fé: daí Jahovah ou Jehovah. (119)(grifo nosso)

118 Link: http://it.wikipedia.org/wiki/Ambrogio_Donini.119 DONINI, 1965, p. 158.

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Foi, portanto, confirmada a informação anterior

quanto à questão da pronúncia. E, conforme dito, se

acreditavam num “deus do clã”, é porque admitiram

outros deuses.

Essa questão de não se falar nome nos fez recordar

a informação de que, na Bíblia, especificamente no Antigo

Testamento, a palavra Egito aparece 529 vezes e Faraó

234 vezes (120); entretanto, não há uma só menção ao

nome próprio de qualquer Faraó egípcio, ponto esse muito

interessante, levantado por Carlos Boaretto, em Brasília

Egípcia.

Assim, a bem da verdade, se há um nome que não

se falava ou não se escrevia, era o do Faraó do Egito. E,

segundo este autor, “os egípcios acreditavam que existia

um nome divino que não poderia ser revelado nem

pronunciado” (121); portanto, se tal costume era praticado

pelos egípcios, é sinal que os hebreus tomaram

emprestado deles.

Gênesis 28,16-18: “Jacó acordou do seu sonho edisse: ‘Na verdade Iahweh está neste lugar e eunão o sabia!’ Teve medo e disse: ‘Este lugar éterrível! Não é nada menos que uma casa de Deuse a porta do céu’. Levantando-se de madrugada,tomou a pedra que lhe servira de travesseiro,

120 Bíblia Eletrônica – 3.0.7.121 BOARETTO, 2009, p. 315.

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ergueu-a como uma estela e derramou óleosobre o seu topo. A este lugar deu o nome deBetel, mas anteriormente a cidade se chamavaLuza”. (grifo nosso)

Explicando esse passo, dizem os tradutores da

Bíblia de Jerusalém:

Neste relato parece haver elementos detradição eloísta e javista, mas sua separaçãonem sempre é fácil. À primeira pertencem osonho da escada (mais que uma escadaria)que conduz ao céu, uma ideia mesopotâmicaque eram simbolizadas pelas torres emestágios, os zigurates (vv. 12,17), o voto deJacó e a fundação do santuário de Betel (vv.18,20.21a.22); conforme a segunda, Iahwehaparece e renova a Jacó as promessas feitas aAbraão e a Isaac, e Jacó o reconhece como seuDeus (vv. 13-16.19.21b). Ambas realçam oprestígio do santuário de Betel (1Rs 12.19-30+)[…]. (122) (grifo nosso)

A pedra localiza a presença divina. Ela setorna uma bêt El, uma “casa de Deus”, o queexplica o nome Betel, e recebe a unção de óleo,como ato cultual. Mas tais práticas, difundidasna religião cananeia e em todo o meiosemítico, mais tarde foram condenadas pelaLei e pelos Profetas (ver Ex. 23,24). Aquimesmo, à ideia de morada divina sobre a terrase justapõe a noção mais espiritual: Betel é a

122 Bíblia de Jerusalém, p. 70-71.

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“porta do céu”, onde Deus reside (cf. 1Rs 8,27).(123) (grifo nosso)

Quanto o termo estela, eis o que encontramos,

como explicação:

Gn 28,18: Estela ou coluna sagrada, deorigem cananeia, era uma pedra colocada depé com finalidade religiosa; aqui serve paralocalizar a presença divina. Mais tarde, paracombater os costumes pagãos, o seu uso foicondenado (Ex 23,34; Lv 26,1; Dt 7,5; 12,3;16,22). (124) (grifo nosso)

Continua o uso do nome El e também as práticas

difundidas na religião cananeia, sendo feitas pelos

hebreus. Certamente, que isso se justifica por estarem

ligados às práticas pagãs e ainda não acreditarem num

Deus único, embora sempre nos tenham dito o contrário.

Gênesis 35,2: “Jacó disse à sua família e atodos os que estavam com ele: 'Lançai foraos deuses estrangeiros que estão no meio devós, purificai-vos e mudai vossas roupas. Partamose subamos a Betel! Aí farei um altar ao Deus queme ouviu quando eu estava na angústia e meassistiu na viagem que fiz'”. (grifo nosso)

Sendo sua ordem generalizada aos que estavam

123 Bíblia de Jerusalém, p. 71.124 Bíblia Sagrada Vozes, p. 57.

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com ele, concluímos que tinham ídolos; portanto,

adoravam a deuses pagãos. Isso pode ser confirmado

com essa nota: “A família de Jacó não era ainda

monoteísta, mas a ordem do pai constitui já um ato de

fé no Deus único que lhe aparecera em Betel”. (125) (grifo

nosso)

É bom aqui relembrar que Jacó foi o terceiro

patriarca, era filho de Isaac e Rebeca, portanto, neto de

Abraão. Ele, conforme em breve veremos, oferece um

sacrifício sobre a montanha (Gênesis 31,54), que, como

sobejamente sabemos, era algo característico dos povos

pagãos.

Um pouco atrás citamos essa fala de Champlin e

Bentes: “[…] É inegável que os antepassados de Abraão

eram politeístas (ver Gên. 35:2; Jos. 24:2)”. (126) Resta-nos

agora ver o que podemos encontrar em Josué:

Josué 24,2: “Assim diz Iahweh, o Deus de Israel:Além do Rio habitavam outrora os vossos pais,Taré, pai de Abraão e de Nacor, e serviam aoutros deuses”. (grifo nosso)

A afirmação de que a família de Abraão servia a

outros deuses é tão desconcertante que em apenas duas

traduções bíblicas isso é mencionado, uma delas é a da

125 Bíblia Sagrada – Edição Pastoral, p. 60.126 CHAMPLIN e BENTES, 1995d, p. 347.

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editora Ave-Maria: “Deuses estrangeiros: Os pais de

Abraão teriam sido, pois, pagãos”. (127)

Vejamos a passagem na qual Moisés, conversando

com Deus, obteve d’Ele a revelação do nome pelo qual

Ele se revelou aos patriarcas:

Êxodo 6,2: “Deus falou a Moisés e lhe disse: ‘Eusou Iahweh. Apareci a Abraão, a Isaac e a Jacócomo El Shaddai; mas meu nome Iahweh, nãolhes fiz conhecer”. (grifo nosso)

Aparece-lhes como o Senhor da Montanha (El

Shaddai); entretanto a afirmação de que não teria dado a

conhecer a Abraão, a Isaac e a Jacó o nome Iahweh não

procede, pois em Gênesis 15,7 Ele revela seu nome a

Abraão, em Gênesis 26,25 Isaac invoca o seu nome e em

Gênesis 28,13 é a vez de Jacó.

Veremos agora mais alguns detalhes que ligam os

hebreus às crenças ou costumes pagãos.

Gênesis 12,10-14: “Houve uma fome na terra eAbrão desceu ao Egito, para aí ficar, pois a fomeassolava a terra. Quando estava chegando aoEgito, disse à sua mulher Sarai: ‘Vê, eu sei que ésuma mulher muito bela. Quando os egípcios tevierem, dirão: ‘É sua mulher’, e me matarão,deixando-te com vida. Dize, eu te peço, que ésminha irmã, para que me tratem bem por causa

127 Bíblia Sagrada – Ave-Maria, p. 275.

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de ti e, por tua causa, me conservem a vida’. Defato, quando Abrão chegou ao Egito, os egípciosviram que a mulher era muito bela”. (grifo nosso)

O trecho negritado é assim explicado pelos

tradutores da Bíblia de Jerusalém:

A aproximação com um costume da AltaMesopotâmia: na aristocracia hurrita, omarido podia ficticiamente adotar sua mulhercomo “irmã”, e esta passava a gozar então demaior consideração e de privilégios especiais.Esta teria sido a condição de Sarai, e Abrão ter-se-ia prevalecido disso diante dos egípcios, que,por sua vez, ter-se-iam equivocado (v. 19),como também o autor bíblico, que não maisconhecia o costume. A explicação é incerta.(128) (grifo nosso)

Considerando que os habitantes da Mesopotâmia

são de uma civilização anterior à dos hebreus, não temos

alternativa senão considerar que estes copiaram

daqueles.

Ora, a afirmação de que “ter-se-iam equivocado (v.

19), como também o autor bíblico, que não mais conhecia

o costume” prova que a Bíblia não é a palavra de Deus

como estabeleceram nos dogmas teológicos.

É muito curiosa a preocupação de Abraão,

128 Bíblia de Jerusalém, p. 50.

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porquanto, a essa época, Sara, sua mulher, era uma

velha com 65 anos (comparando-se Gênesis 12,4 com

Gênesis 17,17); portanto, não dá para acreditar que, a

essa altura do campeonato, ela ainda despertava

“desejo” nos homens.

Além disso, temos que, de fato, Sara era mesmo

irmã de Abraão, segundo sua própria afirmação: “ela é

realmente minha irmã, filha de meu pai, mas não filha de

minha mãe, e tornou-se minha mulher” (Gênesis 20,12);

portanto, a única conclusão a se tirar é que ele falou

exatamente a verdade.

Gênesis 16,1-2: “A mulher de Abrão, Sarai, não lhedera filho. Mas tinha uma serva egípcia, chamadaAgar, e Sarai disse a Abrão: ‘Vê, eu te peço: Iahwehnão permitiu que eu desse à luz. Toma, pois, aminha serva. Talvez, por ela, eu venha a terfilhos’. E Abrão ouviu a voz de Sarai”. (grifo nosso)

Explicam-nos: “Segundo o direito mesopotâmico,

uma esposa estéril podia dar a seu marido uma serva

como mulher e reconhecer como seus os filhos nascidos

dessa união. O caso se repetirá com Raquel (30,1-6) e Lia

(30,9-13)”. (129) Mais uma vez, relaciona-se algo praticado

pelos hebreus ao costume mesopotâmico, entenda-se:

pagão.

129 Bíblia de Jerusalém, p. 54.

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Gênesis 17,9-14: “Deus disse a Abraão: ‘Quanto ati, observarás a minha aliança, tu e tua raça depoisde ti, de geração em geração. E eis a minhaaliança, que será observada entre mim e vós, istoé, tua raça depois de ti: todos os vossos machossejam circuncidados. Fareis circuncidar a carnede vosso prepúcio, e este será o sinal da aliançaentre mim e vós. Quando completarem oito dias,todos os vossos machos serão circuncidados, degeração em geração. […] O incircunciso, o machocuja carne do prepúcio não tiver sido cortada, estavida será eliminada de sua parentela: eleviolou minha aliança’”. (grifo nosso)

Destaca-se aqui o rito da circuncisão:

A circuncisão é a amputação do prepúciomasculino, sendo um dos mais antigoscostumes da antiguidade, praticado pordiversos povos. É, ou era, prática a circuncisão(embora com muitas variações quando aométodo, a idade e a realização do rito etc.),entre os judeus, islamitas, egípcios, polinésiose indígenas do Novo Mundo, bem como pormuitas tribos primitivas da África e da Austrália.De fato, calcula-se que um sétimo da populaçãomasculina do mundo é circuncidada. (130) (grifonosso)

Na lista dos povos que praticavam a circuncisão,

podemos incluir também os cananeus e os egípcios. (131)

130 CHAMPLIN e BENTES, 1995a, p. 746.131 MONLOUBOU e DU BUIT, 1997, p. 131.

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Lentsman também nos informa:

Este rito era próprio não apenas aoshebreus, mas, também, aos egípcios, aosárabes e a muitos outros povos daAntiguidade e é praticado ainda hoje porcrentes de várias nações. Ora, nessa fonte,ele é apresentado como o símbolo da aliançaentre Jeová e o povo eleito. Semelhanteinterpretação não seria possível, a não ser emum país em que não se conhecesse acircuncisão, na Mesopotâmia neste caso. (132)(grifo nosso)

Especificamente quanto ao Egito, ele se encontra

bem retratado nesta cena de circuncisão gravada na

tumba de Ankn-mahor VI dinastia (2323-2150 a.C.) (133),

que coloca os dados históricos, provenientes das

pesquisas arqueológicas, em supremacia aos que,

posteriormente, e por interesses, que não nos cabe aqui

discutir, se atribuíram ao fato:

132 LENTSMAN, 1963, p. 94.133 Link: http://www.coladaweb.com/historia/hebreus,-gregos-e-fenicios-

primordios.

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Em relação aos hebreus, essa prática, transformada

em ritual de iniciação religiosa, coloca a religião deles

como altamente machista, pois, obviamente, cortar a

pele que cobre a cabeça do pênis, é coisa exclusiva para

homens.

Além disso, ainda temos “não cobiçarás a mulher

do teu próximo” (Deuteronômio 5,21), mandamento,

obviamente, para homens.

A recomendação de “esta vida será eliminada”, se

a entendermos como pena de morte, evidencia-se a

gravidade de não se praticar a circuncisão.

Para Freud, quem, na verdade, introduziu esse

costume aos hebreus foi outro personagem senão o

próprio Moisés:

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Moisés não apenas forneceu aos judeusuma nova religião; pode-se afirmar com igualcerteza que ele introduziu para eles ocostume da circuncisão. Esse fato é deimportância decisiva para nosso problema enem sequer foi levado em consideração. Éverdade que o relato bíblico o contradiz maisde uma vez. Por um lado, faz a circuncisãoremontar à era patriarcal, como sinal de umpacto entre Deus e Abraão; por outro,descreve, em passagem particularmenteobscura, como Deus ficou irado com Moisés porter negligenciado um costume que se tornarasagrado (134), e procurou matá-lo: a esposa dele,porém, uma madianita, salvou-o da ira de Deusrealizando rapidamente a operação. Estas,contudo, são deformações que não nos devemdesencaminhar; posteriormente, descobriremosa razão para elas. Permanece o fato de haverapenas uma só resposta para a questão desaber de onde os judeus derivaram ocostume da circuncisão – a saber, do Egito.Heródoto, o “pai da História”, conta-nos queo costume da circuncisão por muito tempofora indígena no Egito, e suas afirmaçõessão confirmadas pelas descobertas emmúmias e, na verdade, por pinturas nasparedes dos túmulos. Nenhum outro povo doMediterrâneo oriental, até onde sabemos,praticava esse costume, e pode-se comsegurança supor que os semitas, os babilôniose os sumérios não eram circuncidados. A

134 N.T.: "Heilig”.

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própria história da Bíblia diz que isso é típicodos habitantes de Canaã: constitui umapremissa necessária para a aventura da filha deJacó e o príncipe de Siquém. (135) Apossibilidade de que os judeus tenhamadquirido o costume da circuncisão durantesua estada no Egito por outra maneira quenão a vinculação com o ensinamentoreligioso de Moisés pode ser rejeitada comocompletamente despida de fundamento. Ora,tomando como certo que a circuncisão eracostume popular e universal no Egito,adotemos por um momento a hipótese de queMoisés era judeu, de que buscou libertar daservidão seus compatriotas no Egito e de que osconduziu a desenvolver uma existência nacionalindependente e autoconsciente em outro país –que foi realmente o que aconteceu. Que sentidopoderia ter, nesse caso, o fato de que, aomesmo tempo, ele lhes tenha imposto umcostume incômodo que inclusive, até certoponto, os transformava em egípcios e deviamanter permanentemente viva a lembrançadeles em relação ao Egito, ao passo que osesforços de Moisés só podiam visar a direção

135 N.T.: [Gênesis, XXXIV.] Dou-me muito bem conta de que. Ao lidar tãoautocrática e arbitrariamente com a tradição bíblica – trazendo-a paraconfirmar minhas opiniões quando ela me serve e rejeitando-a semhesitações quando me contradiz –, estou expondo-me a uma seria criticametodológica e debilitando a força convincente de meus argumentos. Masessa é a única maneira pela qual se pode tratar um material de que sesabe definitivamente que sua fidedignidade foi gravemente prejudicadapela influência deformante de intuitos tendenciosos. É de esperar que euencontre certo grau de justificação mais adiante, quando me deparar com orastro desses motivos secretos. A certeza é, de qualquer modo, inatingível,e, além disso, pode-se dizer que todos os outros que escreveram sobre oassunto adotaram o mesmo procedimento.

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oposta, isto é, a tornar alheio o povo à terra desua servidão e a superar o anseio pelas“panelas de carne” do Egito? Não, o fato do quepartimos e a hipótese que lhe acrescentamossão tão incompatíveis entre si, que podemosatrever-nos a chegar a esta conclusão: seMoisés deu aos judeus não apenas uma novareligião, como também o mandamento dacircuncisão, ele não foi um judeu, mas umegípcio, e, nesse caso, a religião mosaica foiprovavelmente uma religião egípcia, que, emvista de seu contraste com a religião popular,era a religião de Aten, com a qual a religiãojudaica posterior concorda em alguns aspectosmarcantes. (136) (grifo nosso)

O fato de encontrarmos sinais de esforçosfeitos para negar explicitamente que Javé eraum novo deus, estrangeiro aos judeus, malpode ser descrito como sendo o aparecimentode novo intuito tendencioso; trata-se, antes, deuma continuação do anterior. Com esseobjetivo em vista, as lendas dos patriarcasdo povo – Abraão, Isaac e Jacó – foramintroduzidas. Javé asseverou que ele já era odeus desses antepassados, embora sejaverdade que ele próprio teve de admitir queeles não o tinham adorado sob esse nome(137). Não acrescenta, contudo, qual era o outronome.

E aqui estava a oportunidade para um golpe

136 FREUD, 1997, p. 26-27.137 N.T.: Isso não torna as restrições ao uso desse novo nome mais inteligíveis,

embora as torne mais suspeitas.

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decisivo contra a origem egípcia do costumeda circuncisão: Javé, foi dito, já insistira nelacom Abraão e a introduzira como penhor dopacto celebrado entre ele e este último. Mas foiuma invenção particularmente inábil. Comomarca destinada a distinguir determinadapessoa das outras e preferir aquela a estas,escolher-se-ia algo que não pudesse serencontrado em outro povo, e não uma coisaque podia ser exibida, da mesma maneira,por milhões de outras pessoas. Um israelitaque se tivesse transplantado para o Egito teriasido obrigado a reconhecer todo egípcio comoirmão no pacto, como irmão em Javé. Éimpossível que os israelitas que criaram o textoda Bíblia pudessem ignorar o fato de acircuncisão ser indígena ao Egito. A passagemem Josué citada por Eduard Meyer admite issosem discussão, mas, por esse próprio motivo,tinha de ser renegada a qualquer preço. (138)(grifo nosso)

Seja lá qual tenha sido a origem desse ritual, o

certo é que ele provém de povos ditos pagãos; não há

como fugir dessa irrefutável realidade: “Os israelitas

nascidos homens eram circuncidados, mas o mesmo

ocorria com outros povos vizinhos (inclusive os egípcios)”.

(139)

Gênesis 31,54: “Jacó ofereceu um sacrifício sobre

138 FREUD, 1997, p. 41-42.139 FOX, 1993, p. 51.

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a montanha e convidou seus irmãos para arefeição. Eles comeram e passaram a noite sobre amontanha”. (grifo nosso)

Sacrifícios sobre uma montanha reporta ao

costume dos cananeus que os praticavam nos lugares

altos, fato que se entende com estas explicações:

Os lugares altos eram santuáriosestabelecidos sobre uma colina nasvizinhanças das cidades. Existiam natradição cananeia; neles Iahweh substituiBaal (Jz 6,25s) e o culto legítimo os tolerou pormuito tempo (1Rs 3,4s), até que foram proibidospela lei da unidade do santuário (Dt 12,2s). (140)(grifo nosso)

Os lugares altos eram lugares tradicionaispara culto entre os cananeus. Na Bíblia, esteculto é muitas vezes reprovado, por causa daidolatria a que, frequentemente, dava lugar. Noentanto, antes da centralização do culto a Javé,no Templo de Jerusalém, vários profetas esacerdotes prestaram ao Senhor um cultoperfeitamente ortodoxo nessas elevações. É oque aqui faz Samuel. (141) (grifo nosso)

Nos lugares altos eram adorados tambémídolos, mas os que eram consagrados a Deusforam tolerados até que o tabernáculorecebesse sede estável no templo. Adorava-se o

140 Bíblia de Jerusalém, p. 401.141 Bíblia Sagrada Santuário, p. 365.

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verdadeiro Deus ali onde se manifestara emcertas ocasiões. (142) (grifo nosso)

Os altos: ou “alturas” eram os lugares (depreferência sobre colinas) em que o povooferecia sacrifícios a Deus, emboracontrariando a lei que prescrevia só fossemoferecidos no tabernáculo. (143) (grifo nosso)

Nos altos. Não somente trata-se de lugaresaltos (como colinas, etc.), mas também deplataformas construídas para as cerimôniasreligiosas. Estes lugares, e inclusive osbosques, eram os pontos prediletos doscananitas praticarem sua religião pagã, razãopor que surgiu o desejo de se realizar o cultoverdadeiro tão somente no Templo. (144) (grifonosso)

Lugares Altos. Nome dado a altares esantuários erigidos a Deus ou a ídolos fora doTemplo, geralmente nos topos das colinas oumontes. Até o estabelecimento definitivo doTemplo de Jerusalém, estes lugares altos (assimchamados algumas vezes, mesmo quando nãoconstruídos em elevação) eram perfeitamentelegítimos se dedicados ao verdadeiro Deus (Ex20,24; Jz 6,26; 2Sam 25,18; 1Par 21,15).Mesmo depois da construção do Templo nãoforam completamente abandonados, eJoroboão, o primeiro rei do reino separado de

142 Bíblia Sagrada Paulinas, 1980, p. 338.143 Bíblia Sagrada – Barsa, p. 249.144 Bíblia Sagrada Shedd, p. 483.

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Israel (930-909 a.C.), favoreceu-os em seuterritório (3Rs 12,31-32; 13,33). Também noreino de Judá os “lugares altos” continuaram aser frequentados (3Rs 3,3; 15,14; 22,44; 4Rs12,3; 14,4; 15,4.35; 16,4; etc.), até o tempo deEzequias (721-693 a.C.), que destruiu quantospode (4Rs 18,4.22) por serem contrários à Lei(Dt 12,13-14), quer principalmente porque eramem regra geral o cenário de ritos pagãosrevoltantes (Is 57,5-7; 65,7; Jer 2,20; 3,6; 7,31;17,2-3; 19,5; Ez 6,13; 16,6.31; Os 10,8; Miq1,5).

O culto dos lugares altos foi restabelecidopelo sucessor de Ezequias, Manassés, 693-639 a.C. (4Rs 21,3), mas de novo destruído porJosias, 638-609 a.C. (4Rs 23,5). (145) (grifonosso)

Pelos registros bíblicos, esses rituais passaram a

fazer parte da cultura dos hebreus, o que veremos, mais

adiante, pois, em quase todo o período de administração

política – de Moisés aos reis de Israel e Judá –, o povo

insistia em realizar rituais nesses locais.

Gênesis 32,23-30: “Naquela mesma noite, ele selevantou, tomou suas duas mulheres, suas duasservas, seus onze filhos e passou o vau do Jaboc.Ele os tomou e os fez passar a torrente e fez passartambém tudo o que possuía. E Jacó ficou só. Ealguém lutou com ele até surgir a aurora.Vendo que não o dominava, tocou-lhe na

145 Dicionário Prático Barsa, p. 163.

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articulação da coxa, e a coxa de Jacó se deslocouenquanto lutava com ele. Ele disse: ‘Deixa-me ir,pois já rompeu o dia’. Mas Jacó respondeu: ‘Eu nãote deixarei se não me abençoares’. Ele lheperguntou: ‘Qual é o teu nome?’ - ‘Jacó’, respondeuele. Ele retomou: ‘Não te chamarás mais Jacó, masIsrael, porque foste forte contra Deus e contraos homens, e tu prevaleceste’. Jacó fez estapergunta: ‘Revela-me teu nome, por favor’. Mas elerespondeu: ‘Por que perguntas pelo meu nome?’ Eali mesmo o abençoou”. (grifo nosso)

Têm razão os tradutores bíblicos de afirmarem que

se trata de uma “narrativa misteriosa” (146), pois, pelo

relato, temos Jacó travando uma luta física, um autêntico

corpo a corpo, com Deus. Haja fanatismo para acreditar

nisso!

O costume de um deus vir à terra e se relacionar

com homens, certamente, que é pagão. O trecho “deixa-

me ir, pois já rompeu o dia”, nos fez lembrar os vampiros

que só “trabalham” de noite, e aí fica a pergunta: por

qual motivo, esse ser, que lutou com Jacó, teve que pedir

para ir, porque havia rompido o dia?

Gênesis 37,35: “Todos os seus filhos e filhas vierampara consolá-lo, mas ele recusou toda consolação edisse: ‘Não, é em luto que descerei ao Xeol parajunto de meu filho’. E seu pai o chorou”. (grifonosso)

146 Bíblia de Jerusalém, p. 77.

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Algumas traduções trazem “sheol”, em vez de xeol;

vejamos como o explicam:

O sheol dos israelitas, no tempo dadecadência religiosa, é praticamente idênticoao hades do povo helênico e ao infernus(lugar inferior) dos romanos – isto é, umaregião sombria onde os fantasmas humanosvegetam numa semi-vida sonâmbula e triste.Compreende-se, assim, porque a literaturaantiga desses povos permeada de prece esúplicas para que a divindade preserve ouliberte o humano viajor dessa deplorávelexistência após-morte. Só mais tarde, o sheol-hades-infernus veio a ser mais nitidamentediscriminado de uma vida da almadesencarnada menos vaga, culminando, por fim,na ideia do olympos (céu) como oposto àquele.Era proverbial entre os gregos que a vida maishumilde aqui na terra era preferível à existênciada alma do famoso herói Aquiles, no além. (147)(grifo nosso)

Não temos dúvida que tal crença foi absorvida dos

outros povos aqui mencionados; mas, além deles,

podemos citar também os gregos, que tinham, de igual

modo, o tártaro.

Gênesis 40,5-23: “Ora, numa mesma noite, os dois,o copeiro e o padeiro do rei do Egito, que estavam

147 ROHDEN, s/d, p. 131-132.

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detidos na prisão, tiveram um sonho, cada qualcom a sua significação. De manhã, vindo encontrá-los, José percebeu que estavam acabrunhados eperguntou aos eunucos do Faraó que estavam comele detidos na casa de seu senhor: ‘Por que tendeshoje o rosto triste?’ Eles lhe responderam:‘Tivemos um sonho e não há ninguém parainterpretá-lo’. José lhes disse: É Deus quem dá ainterpretação; mas contai-mo!’ O copeiro-mornarrou a José o sonho que tivera: ‘Sonhei’,disse ele, ‘que havia diante de mim uma videira, ena videira três ramos: deram brotos, floresceram eas uvas amadureceram em cachos. Eu tinha namão a taça do Faraó: peguei os cachos de uva,espremi-os na taça do Faraó e coloquei a taça namão do Faraó’. José lhe disse: ‘Eis o que istosignifica: os três ramos representam três dias.Mais três dias e o Faraó te erguerá a cabeça e terestituirá o emprego: colocarás a taça do Faraó emsua mão, como outrora tinhas o costume de fazer,quando eras seu copeiro. Lembra-te de mim,quando te suceder o bem, e sê bondoso parafalares de mim ao Faraó, a fim de que me faça sairdesta prisão. Com efeito, fui arrebatado da terrados hebreus e aqui mesmo nada fiz para que mepudessem prender’. O padeiro-mor viu que erauma interpretação favorável e disse a José: ‘Eutambém tive um sonho: havia três cestas debolos sobre a minha cabeça. Na cesta mais altahavia todos os tipos de doces que o Faraó come,mas as aves os comiam na cesta, sobre a minhacabeça”. José respondeu assim: ‘Eis o que istosignifica: as três cestas representam três dias.Mais três dias ainda e o Faraó te erguerá a cabeça,

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enforcar-te-á e as aves comerão a carne acima deti”. Efetivamente, no terceiro dia, que era oaniversário do Faraó, este deu um banquete atodos os seus oficiais e soltou o copeiro-mor e opadeiro-mor no meio de seus oficiais. Elereabilitou o copeiro-mor na copa real e estecolocou a taça na mão do Faraó; quanto aopadeiro-mor, enforcou-o, como José lhe haviaexplicado. Mas o copeiro-mor não se lembrou deJosé; ele o esqueceu”. (grifo nosso)

Entre os vários tipos de adivinhação havia a

interpretação dos sonhos. Entretanto, os israelitas não

consideravam as “revelações” de Iahweh, por esse meio,

como adivinhações, embora o processo seja o mesmo

para as revelações dadas por outros deuses. Vejamos o

que dizem sobre os sonhos:

Os egípcios, como tantos outros povosantigos, davam aos sonhos o valor depresságios. (148) (grifo nosso)

Gn 40,8. Tanto no Egito, como naBabilônia, atribuía-se aos sonhos grandeimportância e eram muitos os adivinhos queos interpretavam. Ao contrário do que faziamos outros adivinhos, José não atribui à Ciênciaou à arte humana o poder de interpretar ossonhos, mas à assistência e inspiração especialde Deus. (149) (grifo nosso)

148 Bíblia de Jerusalém, p. 86.149 Bíblia Sagrada Santuário, p. 59.

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1. Os antigos povos orientais, incluindoos judeus, davam grande valor aos sonhos,supondo que eles tinham o intuito de fazer-nos comunicações divinas. O AntigoTestamento exprime essa ideia, mas tambémoutras, as quais descrevo na secção III. OsSonhos na Bíblia. Os intérpretes de sonhoseram altamente estimados no Egito, conformea narrativa de José nos assegura (Gên. 40:41).Outro tanto sucedia na Pérsia, na época deDaniel (ver Daniel 7). Três ideias principaispodem ser extraídas dos sonhos entre os povosorientais: a. Os sonhos como revelaçõesdivinas; b. Os sonhos como reflexos da vidanormal do indivíduo, incluindo problemas desaúde física ou mental, presumivelmente com ointuito de dar-nos um meio de melhorá-la; c. Ossonhos de conhecimento prévio, como avisos ouencorajamentos acerca de certos atos.

2. Na cultura grega. Hipócrates pensava queos sonhos são úteis para diagnosticar os malesfísicos. Sócrates tinha um sonho que se repetia;dizendo-lhe para “fazer música”, que eleinterpretava como “sê um filósofo”, visto que,para ele, a filosofia era a mais linda música.Platão antecipou alguns elementos da teoriafreudiana, supondo que os sonhos refletem todaa espécie de répteis horrendos que se ocultamna mente humana, e que são combatidosmediante o processo da santificação moral.Aristóteles mencionou a ideia comum de que ossonhos são comunicações divinas; masterminou supondo que os sonhos, até mesmo osde conhecimento prévio, usualmente (se não

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mesmo sempre) são acidentais, ou seja, sãocoincidentes. Entretanto, ele reconheciatambém o valor da teoria futuramente chamadaAdleriana (ver 1.11), que diz que um sonho podecriar estados emocionais que afetam nossa vidadesperta, condicionando nossos atos.

3. Na cultura romana. Como era usual, osromanos também tomaram por empréstimo oque a cultura grega dizia sobre os sonhos, semgrandes modificações. Eles praticavam aincubação a fim de provocar sonhossupostamente espirituais e significativos. Issoera feito permanecendo a pessoa em algumlugar sagrado, como um templo ou umsantuário, na esperança de ter um sonhodurante a noite, estando naquele lugar. Ossonhos assim obtidos eram consideradosespiritualmente significativos, podendo serinterpretados pelo próprio indivíduo ou poralgum sacerdote. A incubação era praticada emnada menos de trezentos templos do mundogreco-romano. Cícero, porém, mostrava-secético quanto ao método, preferindo o ponto devista aristotélico dos sonhos. No entanto, elenão se mostrou coerente sobre a questão,porque uma das razões pelas quais ele se alioua Otávio, quando houve a luta pelo poder, emRoma, foi que um sonho lhe dissera que Otávioseria vitorioso nesse conflito. O sonho realizou-se, mas não na época certa. Marco Antônioobteve sucesso em um apelo que fez, e Cíceroe seus irmãos foram executados.

4. No islamismo. Tanto os antigos quanto osmodernos adeptos do islamismo dão muito valor

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aos sonhos. Maomé afirmou que os sonhos sãoum dos quarenta e seis aspectos da missãoprofética. O Alcorão tem muitas alusões aossonhos divinos, proféticos. A interpretação dossonhos é um exercício religioso dentro dessesistema. Entretanto, julga-se que diferentesclasses de pessoas teriam diferentes níveis desonhos, alguns mais valiosos do que outros.Portanto, os governantes e os santos seriamaqueles que têm os sonhos mais profundos,enquanto que as pessoas comuns teriamsonhos mais corriqueiros. Entre as mulheres, asmães seriam as que têm sonhos maissignificativos.

III. Os sonhos na Bíblia

1. No Antigo Testamento. Os sonhos alirelatados envolvem instruções e revelaçõesespirituais. Ver os sonhos de Jacó (Gên. 28:12ss; 31:11 ss), de José (Gên. 37:5; 41:1 ss), osde Daniel (Dan. 1:7; 2:1 ss, cap. 7). Ver tambémo princípio ensinado em Joel 2:28. Há trechos,como Núm. 12:6 e J6 33:15, que ensinam que avontade de Deus é revelada por meio desonhos. Os falsos profetas julgavam-se dotadosde sonhos significativos, ou então contavamsonhos que nunca tiveram (Deu. 13:1-3; Jer.23:25-28; 29:8). Contudo, os sonhos, de acordocom Eclesiastes 5:7, podem ser vazios e semsentido.

2. No Novo Testamento. Podemos evocar ossonhos de advertência dados a José, quesalvaram a vida de Jesus (Mat. 1:20); os sonhosdos magos, com o mesmo propósito (Mat.2:12,13); as instruções dadas a José, para

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retornarem a Nazaré, o que propiciou aformação de Jesus, em seus primeiros anos devida terrena, naquela cidade (Mat. 2:18); osonho da esposa de Pilatos, que pode ter sidoorientado por Deus ou não, mas que, semdúvida, foi muito significativo (Mat. 27:10); e adeclaração sobre a utilidade espiritual eprofética dos sonhos, em Atos 2:17. Com basenessas referências, chegamos a entender queos sonhos são tidos, no Novo Testamento, comorevestidos de uma importante função, mascertamente sujeitos a outras funções espirituais,como a função profética. (150) (grifo nosso)

E aqui uma explicação do ponto de vista

totalmente dogmático:

Uma das fontes e um dos métodos deadivinhação ilícita. As escrituras advertem queos sonhos não devem ser tomados comocomunicações sobrenaturais, a não seraqueles que tenham origem e interpretaçãodo mesmo Deus (Gn 40,8). Tal advertênciaentende sustar a prática dos falsos profetas queacreditavam serem os sonhos sinais de favordivino, pelo que proclamavam e interpretavamseus sonhos como sobrenaturais. Osverdadeiros profetas, ao contrário, davam aentender que as comunicações divinas sãoespontâneas e só Deus era seu intérprete (Jer23,16). Ordinariamente e assim os devemos

150 CHAMPLIN e BENTES, 1995f, p. 336-337.

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considerar. Isto não impede que Deus possaenviar sonhos, como de fato enviou e os lemosna Bíblia. Pode-se preliminarmente negar aorigem divina de um sonho, se este nos induzirao pecado, a alguma tolice ou mesmo a diminuiro amor de Deus. Seria pecado mortal orientar avida de quem quer que seja através de sonhosque, certamente, não são de origem divina. (151)(grifo nosso)

Como sempre acontece, o que “nós” fazemos é

lícito, o que os “outros” fazem é ilícito, provando que

somos totalmente incoerentes, por permitir que nosso

egoísmo e orgulho sempre falem mais alto. Aqui,

deixamos essas perguntas: quem está com a verdade –

aqueles que já praticavam a interpretação dos sonhos ou

os que passaram a praticar depois, só que com uma

justificativa de um deus único? E mais: será que os

deuses dos outros povos não eram iguais aos anjos do

cristianismo, agindo sob a inspiração do Deus “único” dos

judeus? Ou só porque, por ignorância desses povos, eram

chamados de deuses?…

Gênesis 44,1-5: “Depois José disse a seuintendente: ‘Enche de mantimentos as sacasdesses homens, quanto puder levar, e põe odinheiro de cada um na boca de sua saca. Minhataça, a de prata, tu a porás na boca da saca do

151 Dicionário Barsa, p. 258.

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mais novo, junto com o dinheiro de seumantimento’. E assim ele fez. Quando amanheceu,foram despedidos os homens com seus jumentos.Eles tinham apenas saído da cidade não iam longe,quando José disse a seu intendente: ‘Levanta!Corre atrás desses homens, alcança-os e dize-lhes:‘Por que pagastes o bem com o mal? Não é o queserve a meu senhor para beber e também leros presságios? Procedestes mal no que fizestes’”.(grifo nosso)

Aqui, fica claro que José realizava adivinhações, o

que é afirmado por ele mesmo em Gênesis 44,15, usando

a sua taça de prata, uma prática totalmente

“abominável” a Iahweh (Deuteronômio 18,9-12).

Não conseguimos levantar nada da cultura religiosa

dos hebreus no período em que eles ficaram subjugados

aos egípcios, que, conforme relatado na Bíblia, teria sido

de 430 anos (Êxodo 12,40).

Somente temos registro a partir do nascimento de

Moisés, que se tornou o líder desse povo; inclusive, foi ele

quem, segundo se acredita, conduziu os hebreus para

fora do Egito. Entretanto, nós não conseguimos definir por

qual motivo isso se deu: se foram expulsos (Êxodo 12,39);

se o Faraó os deixou partir (Êxodo 13,17) ou, finalmente,

se eles fugiram (Êxdodo 14,5).

Como os hebreus viveram mais de quatro séculos

entre os egípcios (que ao longo de sua história também

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adoravam vários deuses), é bom lembrar que isso nos

sugere uma boa chance de que tenham absorvido a

cultura deles. Informam-nos que o Faraó Akhenaton teria

defendido a ideia de um Deus único; portanto, podemos

dizer que ele possuía uma crença monoteísta:

Outra possibilidade nos é aberta por umacontecimento marcante na história da religiãoegípcia, um acontecimento que só ultimamentefoi reconhecido e apreciado. Continua sendopossível que a religião que Moisés deu a seupovo judeu era, mesmo assim, a sua própria,que era uma religião egípcia, embora não areligião egípcia.

Na gloriosa XVIII Dinastia, sob a qual o Egitose tornou uma potência mundial, um jovemfaraó subiu ao trono, por volta de 1375 a.C.Inicialmente ele foi chamado, tal como seu pai,Amenófis (IV); mais tarde, porém, mudou seunome, e não apenas seu nome. Esse reidispôs-se a impor uma religião a seussúditos egípcios, uma religião que ia deencontro às suas tradições de milênios e atodos os hábitos familiares de suas vidas.Ela era um monoteísmo estrito, a primeiratentativa dessa espécie, até onde sabemos.Na história do mundo, e, juntamente com acrença num deus único, nasceuinevitavelmente a intolerância, queanteriormente fora alheia ao mundo antigo eque por tão longo tempo permaneceu depoisdele. O reino de Amenófis, contudo, durou

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apenas 17 anos. Logo após sua morte, em1358 a.C. a nova religião foi varrida eproscrita a memória do rei herético. O poucoque sabemos dele deriva-se das ruínas da novacapital real que construiu e dedicou a seu deus,e das inscrições nas tumbas de pedrasadjacentes a ela. Tudo o que pudemos aprendersobre essa personalidade marcante e, naverdade, única, será merecedor do maiselevado interesse. (152) (grifo nosso)

[…] Sob a influência dos sacerdotes do deussolar em On (Heliópolis), fortalecida talvez porimpulsos provindos da Ásia, surgiu a ideia deum deus universal Aten, a quem a restrição aum único país e a um único povo não mais seaplicava. No jovem Amenófis IV, chegou aotrono um faraó que não tinha interesse maisalto do que o desenvolvimento dessa ideiade um deus. Ele promoveu a religião de Aten areligião estatal e, através dele, o deusuniversal tornou-se o único deus: tudo o quese contava dos outros deuses era engano ementira. Com magnífica inflexibilidade, eleresistiu a toda tentação ao pensamento mágico,e rejeitou a ilusão, tão cara aos egípcios,especificamente, de uma vida após a morte.Num espantoso pressentimento de descobertascientíficas posteriores, identificou na energia daradiação solar a fonte de toda a vida sobre aTerra e adorou-a como símbolo do poder de seudeus. Gabava-se de sua alegria na criação e de

152 FREUD, 1997, p. 20-21.

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sua vida em Ma’at (Verdade e Justiça).

Esse é o primeiro e talvez o mais clarocaso de uma religião monoteísta na históriahumana; uma compreensão mais profunda dosdeterminantes históricos e psicológicos de suaorigem seria de valor incomensurável.Entretanto, cuidou-se de que informaçõesdemasiadas sobre a religião de Aten nãochegassem até nós. Já sob os débeissucessores de Akhenaten tudo o que ele haviacriado entrou em colapso. A vingança da classesacerdotal que ele havia suprimido grassoucontra sua memória; a religião de Aten foiabolida, e a cidade capital do faraó,estigmatizado como um criminoso, foi destruídae saqueada. Por volta de 1350 a.C., a XVIIIDinastia terminou; após um período deanarquia, a ordem foi restaurada pelo generalHaremhab, que reinou até 1315 a.C. A reformade Akhenaten parecia ser um episódio fadadoao esquecimento. (153) (grifo nosso)

[…] No Egito, até onde podemoscompreender, o monoteísmo cresceu como umsubproduto do imperialismo. Deus era umreflexo do faraó que era soberano absoluto deum grande império mundial. Com os judeus, ascondições políticas eram altamentedesfavoráveis ao desenvolvimento da ideia deum deus nacional exclusivo para a de umsoberano universal do mundo. E onde foi queessa minúscula e impotente nação achou a

153 FREUD, 1997, p. 52-53.

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arrogância de declarar-se a si própria filhafavorita do grande Senhor? O problema daorigem do monoteísmo entre os judeuspermanecera assim irresolvido, ou teríamos denos contentar com a resposta comum segundoa qual o monoteísmo era expressão do gênioreligioso peculiar desse povo. É bem-sabido queo gênio é incompreensível e irresponsável:portanto, não devemos trazê-lo à baila comoexplicação até que toda outra solução nos tenhafalhado (154).

Além disso. Deparamo-nos com o fato deque os próprios registros e escritoshistóricos judaicos nos apontam o caminho.Asseverando bastante definidamente –dessa vez, sem contradizer-se – que a ideiade um deus único foi trazida ao povo porMoisés. Se há uma objeção à fidedignidadedessa afirmação, é a de que a revisãosacerdotal do texto que temos diante de nós faz,obviamente, demasiadas coisas remontarem aMoisés. Instituições tais como as ordenaçõesrituais, que datam inequivocamente deépocas posteriores, são dadas comomandamentos mosaicos, com a claraintenção de lhes emprestar autoridade. Issocertamente nos fornece fundamentos parasuspeita, mas não o suficiente para umarejeição, pois o motivo mais profundo para umexagero desse tipo é óbvio. A narrativasacerdotal busca estabelecer uma continuidadeentre seu período contemporâneo e o remoto

154 N.T.: Essa mesma consideração aplica-se também ao caso notável deWilliam Shakespeare, de Strattord.

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passado mosaico: busca repudiar exatamente oque descrevemos como sendo o fato maisnotável da história religiosa judaica, a saber, aexistência de uma lacuna hiante entre alegislação de Moisés e a religião judaicaposterior – lacuna que foi, a princípio,preenchida pela adoração de Javé, e sólentamente remendada depois. Ela discute essecurso de eventos por todos os modos possíveis.Embora sua correção histórica estejaestabelecida para além de qualquer dúvida,desde que, no tratamento específico dado aotexto bíblico, provas superabundantes foramdeixadas para prová-lo. Aqui, a revisãosacerdotal tentou algo semelhante àdeformação tendenciosa que transformou onovo deus Javé no deus dos Patriarcas. Selevarmos em consideração esse motivo doCódigo Sacerdotal, acharemos difícil reter nossacrença a partir da asserção de que foi realmenteo próprio Moisés que forneceu a ideiamonoteísta aos judeus. Estaremos ainda maisprontos a dar assentimento, já que podemosdizer de onde Moisés derivou essa ideia. A qual,certamente, os sacerdotes judeus nãoconheciam mais. (155) (grifo nosso)

Corroborando essa informação sobre Akhenaton,

temos: “[…] Aquenáton, o faraó herético que tentou

substituir os numerosos deuses do país por uma única

deidade universal”. (156)

155 FREUD, 1997, p. 58-59.156 KRAMER, 1983, p. 57.

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Uma outra versão:

Por causa de sua criação parcialmenteisraelita, Amenhotep IV (algumas vezeschamado Amenófis IV) (157) não podia aceitar asdivindades egípcias e sua miríade de ídolos.Assim, ele desenvolveu a noção de Aten, umdeus onipotente sem imagem, representadopor um disco solar com raios voltados parabaixo (distinguindo-se do deus-sol egípcio Rá)(158). O nome Aten era equivalente à palavrahebraica Adon, um título emprestado do fenício,que significa “Senhor”, como a palavraigualmente familiar Adonai, que significa “MeuSenhor” (159). Ao mesmo tempo, Amenhotep(Amen está contente) mudou seu próprionome para Akhenaton (Glorioso espírito deAten) (160). Fechou todos os Templos dosdeuses egípcios, tornando-se muito impopular,particularmente entre os sacerdotes de Rá e osda divindade nacional anterior, Amen.

Com sua esposa Nefertite, Akhenaton teveseis filhas e mantinha uma vida doméstica

157 N.T.: Gardiner; Alan. Egyptian Grammar, excursion A, p. 75; e Clayton,Peter A. Chronicle of lhe Pharaohs, p. 78. Amenhotep IV também erachamado Amenemhet IV e Amenemes IV.

158 N.T.: O conceito israelita de um Deus sem imagem já estava estabelecidono Egito antes que Akhenaton chegasse ao trono. O que ele fez,exclusivamente, foi instalar Aten como único deus do Egito. Foi o primeiroexemplo no mundo de intolerância religiosa em nível de Estado; ummonoteísmo estrito impingido ao povo. Esse conceito, algo discordante doDeus Uno no Egito, inspirou originalmente a pesquisa, nos anos de 1930,de Sigmund Freud, que o levou a associar Moisés com o reino do faraóAkhenaton.

159 N.T.: Osman, Ahmed. Moses, Pharaoh of Egypt, cap.17 p. 167.160 N.T.: Rohl, David M. A Test of Time, p. 197.

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extraordinariamente bem disciplinada. Mashavia complôs contra sua vida e ameaças deinsurreição armada se ele não permitisse que osdeuses tradicionais fossem adorados junto como Aten sem rosto. Ele recusou e acabou sendoforçado a abdicar em favor de seu primo,Smenkhkare, que foi sucedido por Tutancaten(filho de Akhenaton com sua segunda rainha,Kiya).

Ao chegar ao trono, com cerca de 11 anos,Tutancaten foi obrigado a mudar seu nome paraTutankhamon – denotando assim uma fidelidaderenovada a Amen, no lugar de Aten, mas eleviveria apenas mais nove ou dez anos (161).Akhenaton, nesse tempo, foi banido do Egito emaproximadamente 1361 a.C. (162), embora seuspartidários ainda o considerassem monarca dedireito. Para eles, era o herdeiro vivo do tronode seu pai; eles ainda o viam como o Mose real(em grego: Mosis) (163).

161 N.T.: lb., p. 199. Embora Aten fosse relegado a uma posição mais geraldentro do Panteão egípcio durante o reinado de Tutankhamon, a adoraçãode Aten não foi banida pelo jovem faraó. Confirma-o o colorido painel detrás de seu trono, dourado e marchetado, que o retrata com sua esposa,Ankhesenpaaten, e o disco de Aten. Porém, Tutankhamon moveu a capitalreal de Akhenaton para Mênfis.

162 N.T.: Osman, Ahmed. Moses, Pharaoh of Egypt, p. 105.163 N.T.: Anteriormente à sua partida inicial, Akhenaton (Moisés) fora

persuadido por sua mãe, Tiye, a mudar-se de Tebas, e ele o fez,estabelecendo seu centro recém-construído de Akhenaton (Horizonte doAten), o sítio da moderna Tell el-Amarna. Ver Clayton, Peter A. Chronicle ofthe Pharaohs, p. 122. Porém, um fato que os livros de referênciageralmente deixam de explicar é que Akhenaton não inventou o deus Aten.Mesmo antes do nascimento de Akhenaton, o barco usado por seu pai,Amenhotep III, no lago de Zaru, era chamado Tehen Aten (Fulgores deAten). Ver Baikie, James. The Amarna Age. A. &c. Black, London, 1926, p.91. Havia também um Templo de Aten em Zaru antes que Akhenatonconstruísse seus próprios Templos de Aten em Carnac e Luxor. Ver Osman,Ahmed. Moses, Pharaoh of Egypt, capo 12, p. 121.

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Desde o momento de seu exílio,Akhenaton (dali em diante igualado aMoisés) fez duas viagens ao Sinai, tendoretornado brevemente ao Egito entre elas,como explicado no livro do Êxodo. O êxodoisraelita geral, que ele liderou, ocorreu nasegunda ocasião, por volta de 1330 a.C. O cultoa Aten continuou por algum tempo depois damorte de Tutankhamon, época em que a coroafoi transferida para seu tio-avô, Aye, marido deTey, que criara Akhenaton e sua meia-irmã,Nefertite. Tey era a Gloriosa – a Yokâbar, que aBíblia chama Jochebede. Aye foi sucedido porseu genro, o general Horemheb, que anulouAten, proibiu a menção do nome de Akhenatone amputou os reis de Amama da lista oficial deReis. Destruiu também diversos monumentos daépoca (164); foi por essa razão que a descobertado túmulo de Tutankhamon em novembro de1922 foi recebida como uma grata surpresa,pois pouquíssimo se sabia a respeito deleanteriormente (165). (166) (grifo nosso)

Encontramos uma surpreendente informação de

quem era Akhenaton:

Recentemente, no livro The Head of God, deKeith Laidler, foi sugerido que o pai de Scota eraAkhenaton, o faraó que tentou estabelecer omonoteísmo no Egito usando o Sol para

164 N.T.: Osman, Ahmed. Moses, Pharaoh of Egypt, cap.6, pp. 63-4.165 N.T.: Clayton, Peter A. Chronicle of the Pharaohs, pp. 128-34.166 GARDNER, 2004, p. 56-57.

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representar o único deus verdadeiro, que nãodeveria ter outra imagem além dessa. Maissurpreendente ainda, Laurence Gardner, autorde Bloodline of the Holy Grail, afirmourecentemente que Akhenaton seria narealidade Moisés, o homem que conduziu osisraelitas para fora do Egito. (167) (grifo nosso)

Acreditamos que, no período em que se tornaram

escravos no Egito, é pouco provável que os hebreus,

subjugados fisicamente, também não o fosse em suas

práticas religiosas, até por uma questão de sobrevivência,

embora pelos registros bíblicos, isso não fique bem claro.

Um exemplo recente desse tipo de adaptação é o

sincretismo das religiões afro no Brasil, adaptadas às

imagens do catolicismo. Essa hipótese também a

encontramos em Russell P. Shedd, que, ao se referir ao

bezerro de ouro, citado em Êxodo. 32,1, disse:

O hábito de idolatria aprendido no Egitoera tão forte, que poucos dias sem ouvir a vozdo profeta e líder dinâmico, eram suficientespara o povo voltar à lama idolátrica (2Pe 2.20-22), uma descrição dos que voltam à vidamundana, após terem conhecido a Jesus Cristo.(168) (grifo nosso)

A confirmação da prática da idolatria é confirmada

167 NISBET, 2008, p. 100.168 Bíblia Shedd, p. 121.

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por Mons. José Alberto L. de Castro Pinto, em nota na

Bíblia Sagrada – Barsa, quando explica o passo

Deuteronômio 34,9: “E o sepultou: i.e., pelo ministério de

anjos e deixou que o lugar ficasse desconhecido para que

os israelitas, tão propensos à idolatria, não viessem

prestar culto a seu cadáver” (169), para justificar que, pelo

texto, se subentende que o Senhor sepultou o corpo de

Moisés num lugar desconhecido. Mais à frente, vários

estudiosos irão também confirmar essa prática, que,

certamente, não é compatível para um povo que dizem

ser monoteísta.

Considerando, conforme se crê, que todo profeta

falou em nome de Deus, temos algo para apresentar com

esta fala de Oseias, profeta em Israel no século VIII a.C.,

filho de Beeri, que “começou a pregar no tempo de

Jeroboão II; seu ministério se prolongou pelos reinados

dos sucessores deste rei, mas não parece ter ele

presenciado a ruína de Samaria em 721”. (170), que disse:

Oseias 12,10: “Eu sou Iahweh teu Deus, desde aterra do Egito […].” (grifo nosso)

Se Iahweh é Deus dos hebreus “desde a terra do

Egito”, não seria ilógico afirmar que, antes disso, Ele não

era o deus desse povo; certo? Então, a conclusão que

169 Bíblia Barsa, p. 157.170 Bíblia de Jerusalém, p. 1247.

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tiramos vai justamente ao encontro da informação de que

Moisés foi quem apresentou aos hebreus a ideia de um

Deus único.

Particularmente nós restringiríamos esse “único”

para o âmbito local dos hebreus (que de vários deuses

passaram a adorar somente um) e não como “único” no

sentido de um Deus Universal, como hoje se entende, ou

seja, eram adeptos do henoteísmo.

Corroborando:

No livro do Êxodo, Moisés e os israelitasestão no monte Horebe, tendo viajado desde oEgito através do Mar Vermelho. Moisés escalaa rocha para falar com El Shaddai, o Senhorda Montanha (mais tarde chamado Jeová), queensina que, a partir de então, ele será seuDeus e que eles não mais devem usar seuouro para fazer ídolos e imagens deiformes.(171) (grifo nosso)

Gardner, também, chegou à mesma conclusão,

quanto ao fato de Deus ter se tornado a divindade dos

hebreus a partir de Moisés, especificamente, quando este

recebe, no monte Horeb (Sinai), os Seus mandamentos.

Pepe Rodrígues, por sua vez, apresenta-nos outra

hipótese:

171 GARDNER, 2004, p. 24.

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Na realidade, Moisés nunca pode ter sido ofundador do monoteísmo judeu, como seafirma, porque Moisés, fiel à religião semíticados patriarcas, praticou o henoteísmo, a“monolatria”, ou seja, não acreditava queexistisse um deus único, mas vários, tendo-se limitado, no entanto, a adorar aquele quejulgava ser o maior de todos eles. Só assimsendo se podem interpretar frases como a doseu cântico triunfal: “Quem entre os deuses écomo tu, ó Iavé?” (Ex 15,11), ou como as docântico de Jetro, sogro de Moisés: “Agora seicomo Iavé é maior que todos os deuses” (Ex18,11). Crença que, aliás, está patente naspalavras do próprio Iavé, quando ordena: “Nãotereis outro Deus senão eu […] porque eu souIavé, teu Deus, um Deus ciumento” (Ex 20,2-5)(172) (grifo nosso)

Realmente, os argumentos são bem coerentes; dão

o que pensar.

Em Thomas de Wesselow, historiador de arte, foi

onde encontramos a informação sobre as possíveis

épocas nas quais os hebreus tornaram-se monoteístas:

15. Os especialistas ainda não sabem comprecisão quando os israelitas se tornarammonoteístas, mas, ao que tudo indica, apartir do fim do século VII a.C., no mais tardar,um partido que promoveu o culto apenas de

172 RODRÍGUES, 2007, p. 26.

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Iavé (Ver Finkelstein e Silberman 2001, p. 247-249). É provável que o monoteísmo tenha seimposto como o paradigma hebreu dominantenos séculos VI e V a.C. (ver Kninght 2008, pp.28-29). Também não se sabe com certeza se oprimeiro mandamento prescrevia, na origem,que Iavé fosse o único ou apenas o principaldeus de Israel (ver Lane Fox 199, pp. 54-5). (173)(grifo nosso)

Embora não se tenha precisado a época, ela gira

em torno do VII a V a.C. Levando-se em conta a data mais

antiga, estaremos bem próximos de quando o povo

hebreu se tornou cativo na Babilônia.

b) Moisés a Josué

Embora, a um pouco da história de Moisés seja de

conhecimento de todos nós, vamos transcrevê-la, para

que não sejamos traídos pela memória:

Êxodo 2,1-10: “Certo homem da casa de Levi foitomar por esposa uma descendente de Levi, a qualconcebeu e deu à luz um filho. Vendo que era belo,escondeu-o por três meses. E como não pudessemais escondê-lo, tomou um cesto de papiro,calafetou-o com betume e pez, colocou dentro acriança e a depôs nos juncos, à beira do Rio. Delonge, uma irmã do menino observava o que lheiria acontecer. Eis que a filha de Faraó desceu para

173 WESSELOW, 2012, p. 370.

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se lavar no Rio, enquanto as suas criadas andavamà beira do Rio. Ela viu o cesto entre os juncos emandou uma de suas servas apanhá-lo. Abrindo-o,viu a criança: era um menino que chorava.Compadecida, disse: ‘É uma criança doshebreus!’ Então a sua irmã disse à filha do Faraó:‘Queres que eu vá e te chame uma mulher doshebreus que possa criar esta criança?’ A filha doFaraó disse: ‘Vai!’ Partiu, pois, a moça e chamou amãe da criança. A filha de Faraó lhe disse: ‘Levaesta criança e cria-a e eu te darei a tua paga’. Amulher recebeu a criança e a criou. Quando omenino cresceu, ela o entregou à filha de Faraó, aqual o adotou e lhe pôs o nome de Moisés,dizendo: ‘Eu o tirei das águas’”. (grifo nosso)

O que é interessante nessa história, contada pelo

próprio Moisés, uma vez que a autoria desse livro é

atribuída a ele, é que sempre acreditamos nela como algo

real, quando, na verdade, ela foi tomada de uma lenda;

vejamos:

Etimologia popular do nome de Moisés (hebr.Moshê) a partir do verbo masha, “tiras”. Mas afilha do Faraó não falava hebraico. De fato,esse nome é egípcio. É conhecido na formaabreviada, mosés, ou na forma completa, p. ex.,Thutmosés ‘o deus Tot nasceu’. – A história deMoisés tirado das águas foi comparada comas lendas sobre a infância de algumaspersonagens célebres, de modo especialSargon de Agadê, rei da Mesopotâmia no III

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milênio: sua mãe o havia depositado no rio emum cesto de junco. (174) (grifo nosso)

O relato do nascimento e salvamento deMoisés se assemelha à lenda contada arespeito de Sargão, o conquistador daMesopotâmia (3º milênio AC). Nascido de paidesconhecido e de uma mãe que o abandonounas águas do Eufrates numa cesta de vimecalafetada com betume, foi salvo e criado porum jardineiro real. Depois, amado pela deusaIstar, se tornou rei durante 56 anos. Lendassemelhantes contam-se sobre a origem deCiro, rei da Pérsia, e de Rômulo e Remo,fundadores de Roma. Com recurso a um talclichê literário Moisés é colocado entre osgrandes personagens da história. (175) (grifonosso)

Ambas as explicações nos dão conta de que o

nome Moisés é egípcio, e não hebreu como habitualmente

querem nos fazer crer. Além de que, essa história a seu

respeito, se assemelha à lenda sobre Sargão, rei da

Mesopotâmia.

Freud, em Moisés e o Monoteísmo, desenvolve seus

argumentos, concluindo que, de fato, isso é verdadeiro,

pois dedica um capítulo específico intitulado “Moisés é

Egípcio”, do qual transcrevemos:

174 Bíblia de Jerusalém, p. 104.175 Bíblia Sagrada Vozes, p. 83.

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A primeira coisa que atrai nossa atenção arespeito da figura de Moisés é seu nome, queem hebraico é “Mosheh”, “Qual é a sua origem”,podemos perguntar, “e o que significa?” Comosabemos, a descrição contida no segundocapítulo do Êxodo já fornece uma resposta. É-nos dito aí que a princesa egípcia que salvou omenininho abandonado no Nilo deu-lhe essenome, fornecendo-se uma razão etimológica:“porque das águas o tirei”. Essa explicação,contudo, é claramente inadequada. “Ainterpretação bíblica do nome como ‘o que foitirado das águas’”, argumenta um autor noJüdisches Lexikon (176), “constitui etimologiapopular, com a qual, de início, é impossívelharmonizar a forma ativa da palavra hebraica,pois ‘Mosheh’ pode significar, no máximo,apenas ‘o que tira fora’”. Podemos apoiar essarejeição por dois outros argumentos: emprimeiro lugar, é absurdo atribuir a umaprincesa egípcia uma derivação do nome apartir do hebraico, e, em segundo, as águasde onde a criança foi tirada muitoprovavelmente não foram as do Nilo.

Por outro lado, há muito tempo foi expressauma suspeita, em muitas direções diferentes, deque o nome “Moisés” deriva-se dovocabulário egípcio. Em vez de enumerartodas as autoridades que argumentaram nessesentido, citarei a pertinente passagem de umlivro comparativamente recente, The Dawn ofConscience, da autoria de J.H. Breasted, autor

176 N. T.: G. Herlitz e B. Kirschner (org.). Jüdisches Lexikon. Berlim, 4(1). 303.1930. [O colaborador citado foi M. Soloweítschík.]

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cuja History of Egypt é considerada obrapadrão: “É importante notar que seu nome,Moisés, era egípcio. Ele é simplesmente apalavra egípcia ‘mose’, que significa‘criança’, e constitui uma abreviação daforma mais completa de nomes tais como‘Amon-mose’, significando ‘Amon-uma-criança’, ou ‘Ptah-mose’, significando ‘Ptah-uma-criança’, sendo essas próprias formas,semelhantemente, abreviações da formacompleta ‘Amon-(deu)-uma-criança’ ou ‘Ptah-(deu)-uma-criança’. A abreviação ‘criança’ cedotornou-se uma forma breve e conveniente paradesignar o complicado nome completo, e onome Mós ou Més (Mose), ‘criança’, não éincomum nos monumentos egípcios. O pai deMoisés indubitavelmente prefixou ao nome dofilho o de um deus egípcio como Amon ou Ptah,e esse nome divino perdeu-se gradativamenteno uso corrente, até que o menino foi chamado‘Mose’. (O s final constitui um acréscimo tiradoda tradução grega do Antigo Testamento. Elenão se acha no hebraico, que tem ‘Mosheh’)”(177) Repeti essa passagem palavra por palavrae de maneira alguma estou disposto a partilharda responsabilidade por seus pormenores. Ficotambém bastante surpreso que Breasted tenhadeixado de mencionar precisamente os nomesteóforos que figuram na relação dos reisegípcios, tais como Ahmose, Toth-mose e Ra-mose.

177 N.T.: J. H. Breasted. The Dawn of Conscience. Londres: 1934. p. 350. [Emgrego. Mosés ali Mousés. Deste último. Originou-se a forma portuguesa donome. – N. do T. Brasileiro].

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Ora, deveríamos esperar que uma dasmuitas pessoas que reconheceram ser “Moisés”um nome egípcio, houvesse também tirado aconclusão, ou, pelo menos, considerado apossibilidade, de que a pessoa que portavaesse nome egípcio fosse ela própria egípcia.[…]. (178) (grifo nosso)

Portanto, é confirmado o que foi dito pelos

tradutores bíblicos a respeito da origem do nome Moisés;

porém, acreditamos que, com bastante lógica, Freud vai

mais longe, dando ao próprio legislador hebreu uma

origem egípcia, fato que dá suporte à hipótese de que

Moisés queria implantar a ideia de um Deus único.

Além desse livro – Êxodo –, os outros que fazem

parte do chamado Pentateuco – Gênesis, Levítico,

Números e Deuteronômio – têm, segundo tradição, a

Moisés como autor; isso é curioso, pois algumas coisas

neles nos chamam a atenção por ter origem na mitologia

antiga e muitas de suas leis na legislação babilônica:

[…] O Deuteronômio, como está dito nosegundo livro dos Reis (Cap. XXII), surgiu emfins do século VII antes da nossa era, tendo sidodescoberto “por acaso” em um templo deJerusalém, simples subterfúgio da parte dossacerdotes desse templo, desejosos de revestira nova legislação com a autoridade do Moisés.

178 FREUD, 1997, p. 9-10.

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O Deuteronômio, tal como as leis expostasno Êxodo não pode de modo algum datar daépoca em que os hebreus vagavam pelodeserto, uma vez que todas elas seendereçam não a nômades mas aagricultores estabelecidos definitivamente.Notemos, por outro lado, que grande númerode leis do Pentateuco foram tomadas àlegislação do rei babilônico Hamurabi, que éum milênio mais antiga. (179) (grifo nosso)

E aqui entra um ponto importante: se até para

escrevê-lo Moisés usou da mitologia, por que razão,

somente as coisas relacionadas à própria divindade, que

seguia, não o seria? Hoje em dia, essa suposta autoria de

Moisés é bastante questionada, mas não é o caso de

tratarmos disso aqui. Vejamos alguns exemplos:

Gênesis 6,17: “Quanto a mim, vou enviar odilúvio, as águas, sobre a terra, para exterminarde debaixo do céu toda carne que tiver sopro devida: tudo o que há na terra deve perecer”. (grifonosso)

Parece que não é nada original essa ideia de

dilúvio:

O tema de um dilúvio está presente em todasas culturas, mas os relatos da antigaMesopotâmia têm um interesse particular por

179 LENTSMAN, 1963, p. 93-94.

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causa das semelhanças com o relato bíblico.(180) (grifo nosso)

Vejamos então, para confirmar, esse relato

originado da Mesopotâmia, que transcrevemos do livro A

história de Gilgamesh, rei de Uruk, de Rosana Rios:

E Ut-Napistim lhe contou que, havia muito,muito tempo, tinha morado em Shuruppak, umacidade às margens do rio Eufrates. Naquelaépoca, os deuses se sentiram perturbadoscom o barulho dos mortais, tão alto que nãoos deixava dormir. Enlil, o deus dos ventos,propôs:

– Vamos soltar as águas do mundo eafogar esse povo barulhento, que perturbanossa paz.

Todos concordaram: Anu, o deus dos céus;Shamash, o deus-sol: Sin, o deus-lua: Ishtar, adeusa do amor. E fizeram o juramento de nãorevelar a nenhum mortal o que aconteceria.

Mas Enki, o deus das águas doces, eraamigo dos humanos. Ele foi a Shuruppak pararevelar a vinda do dilúvio a Ut-Napistim, umhomem bom e fiel aos deuses. Como nãopodia quebrar seu juramento e contar a verdadea ele, usou um estratagema: não se dirigiu aohomem, mas a sua casa feita de juncos.

– Casa de juncos – disse Enki –, escute oque vou dizer. Diga ao homem de Shuruppak

180 Bíblia de Jerusalém, p. 42.

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que o Cavaleiro da Tempestade (181) trará aschuvas, e as águas afogarão todas as pessoase todos os animais. A única forma de sobreviverserá construir um grande barco e colocar nele asemente de todas as coisas vivas.

E, sempre falando para a cabana de juncos,Enki explicou o formato e o tamanho que deviater a embarcação.

Ut-Napistim entendeu a mensagem eobedeceu ao deus. Derrubou sua casa e emsete dias construiu um enorme barco. Nele,acomodou toda a sua família, ostrabalhadores da região e tudo o quepossuía, além dos animais de criação e dosanimais selvagens da floresta e dos campos.

Afinal, o Cavaleiro da Tempestade veiotrazendo a chuva destruidora. O barco foicarregado pela água e pelo vento. Mortal comouma batalha, o temporal se abateu sobre aspessoas e as cidades. Vendavais varreram asflorestas e a água furiosa a tudo cobriu. Aviolência era tanta que os próprios deuses seencolheram nos céus, com medo da fúria dodilúvio.

Depois de uma semana o temporal seacalmou; Ut-Napistim olhou para fora do barcoe, com o coração dolorido, viu que toda ahumanidade tinha voltado ao barro primitivo.

O barco encalhou no topo do monte Nisin,e dali o homem de Shuruppak soltou umapomba. Mas ela não encontrou onde pousar e

181 N.T.: Ser enviado pelos deuses para desencadear o dilúvio. (N. da A.)

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voltou; então, soltou uma andorinha, quetambém voltou. Por fim, soltou um corvo, queencontrou terra e não voltou. Ele e sua famíliadesceram o monte e acenderam uma fogueiraem homenagem aos deuses. No alto do céu, osdeuses estavam arrependidos por teremenviado o dilúvio e destruído os humanos e sereuniram como moscas em torno da fumaça dafogueira. Apenas Enlil se enfureceu por Ut-Napistirn ter escapado e acusou Enki de tê-loavisado. Mas Enki respondeu:

– Não revelei o segredo dos deuses aohomem de Shuruppak. Você é um dos deusesmais sábios e não percebe o erro do dilúvio? Sehá maldade entre os homens, que eles sejampunidos. Que sejam atacados pelas feras oupelas doenças, mas não destruídos. (182) (grifonosso)

Caro leitor, você não está com a impressão que já

ouviu essa história em algum lugar, apenas com outros

nomes? Pois é, tal e qual a do nosso Noé bíblico; só que o

detalhe é que essa é bem anterior à que consta na Bíblia,

o que nos leva, por força da lógica, a concluir que

tomaram essa lenda emprestada dos que habitavam na

Mesopotâmia, fato que, por consequência, faz cair por

terra a crença na inspiração divina dos textos sagrados.

E ainda temos, nessa lenda da mesopotâmia, que a

humanidade havia voltado ao barro primitivo, ou seja,

182 RIOS, 2007, p. 30-32.

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acreditavam também que o homem veio do barro, tal e

qual dizem do lendário Adão bíblico.

E para reforçar mais ainda essa origem,

transcrevemos:

No Gênesis, a história do dilúvio é uma daspoucas que ainda alimenta o interesse doscientistas, depois que os físicos substituíram acriação do mundo pelo Big Bang e Darwinsubstituiu Adão pelos macacos. O que intrigouos pesquisadores foi o fato de uma históriaparecida existir no texto épico babilônico deGilgamesh – o que sugere que uma enchentede enormes proporções poderia ter acontecidono Oriente Médio e na Ásia Menor. Parte domistério foi solucionado quando os filósofosconseguiram demonstrar que a narrativa doGênesis é uma apropriação do mitomesopotâmico. “Não há dúvida de que oshebreus se inspiraram no mito de Gilgameshpara contar a história do dilúvio”, afirmaRafael Rodrigues da Silva, professor doDepartamento de Teologia da PUC de SãoPaulo, especialista em exegese do AntigoTestamento. (183) (grifo nosso)

Não há como contestar esse fato.

Êxodo 19,10-11: “Iahweh disse a Moisés: ‘Vai aopovo, e faze-o santificar-se hoje e amanhã; lavem

183 ROMANINI, 2002p. 43.

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as suas vestes, estejam prontos depois de amanhã,porque depois de amanhã Iahweh descerá aosolhos de todo o povo sobre a montanha doSinai”. (grifo nosso)

Duas coisas nos remetem a esse passo: a primeira,

é a montanha do Sinai, na qual pensavam morar a

divindade (184), lembra-nos a designação de El Shaddai,

como o Senhor da Montanha (185); a segunda, é a crença

de que os deuses se manifestavam nos montes, pela

ligação bem próxima que faziam entre o céu e a terra.

Essa manifestação divina vem reforçar tudo que já foi dito

a respeito disso sobre ambas.

Êxodo 19,16: “Ao amanhecer, desde cedo, houvetrovões, relâmpagos e uma espessa nuvemsobre a montanha, e um clamor muito forte detrombeta: e o povo estava no acampamento pôs-se a tremer. Moisés fez o povo sair doacampamento ao encontro de Deus, e puseram-seao pé da montanha. Toda a montanha do Sinaifumegava, porque Iahweh descera sobre ela nofogo; a sua fumaça subiu como a fumaça de umafornalha, e toda a montanha tremiaviolentamente. O som da trombeta iaaumentando pouco a pouco; Moisés falava e Deuslhe respondia no trovão. Iahweh desceu sobre amontanha do Sinai, no cimo da montanha”. (grifonosso)

184 JOSEFO, 2003, p. 92.185 GARDNER, 2004, p. 24.

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As explicações, a seguir, sobre o Sinai são bem

interessantes:

A localização do Sinai é difícil. Desde oséculo IV de nossa era, a tradição cristã ocoloca ao sul da península da qual leva o nome,no djebel Musa (2.245m). Mas uma opiniãoatualmente difundida evoca os traçoscaracterísticos de um vulcão na descrição dateofania (19,6+) e o itinerário de Nm 33 (cf.33,1+), para situar o Sinai na Arábia, onde osvulcões estavam ainda em atividade naquelaépoca histórica. Estes argumentos não sãodecisivos (cf. As notas indicadas), e outrostextos supõem uma localização mais próxima doEgito e do Sul da Palestina. Por isso, outrateoria situa o Sinai, perto de Cades, apoiando-se nos textos que põe Seir, Edon e o monteFarã em relação com a manifestação divina (Jz5,4; Dt 33,2; Hab 3,3). Todavia, Cades nuncaestá associado com o deserto do Sinai, e algunstextos localizam claramente este último longe deCades (Nm 11-13; 33; Dt 1,2.19). A localizaçãoao sul da península permanece a maisverossímil. Apesar da importância constante dosacontecimentos e da legislação ligada ao Sinai(Ex 3,1-4-4,17; 18;19-40; Nm 1-10), os israelitasparecem ter-se logo esquecido de sualocalização exata. […]. (186) (grifo nosso)

[…] O monte Sinai é normalmente

186 Bíblia de Jerusalém, p. 128.

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identificado com Jebel Musa, um pico de 2.500metros de altura ao sul do “V” formado pelosgolfos de Suez e Aqaba. Ao pé deste monte háuma planície de 4.000 metros de cumprimentopor 800 metros de largura na qual o povopoderia facilmente ter acampado durante osmais de 11 meses em que ali ficou. (187) (grifonosso)

O monte Sinai, que supera em altura a todosos das províncias vizinhas, está tão cheio derochedos escarpados, de todos os lados, quenão somente com muita dificuldade lá se podesubir, mas não se poderia contemplá-lo, semtemor, pois é crença comum que Deus moralá e esse lugar parece temível e inacessível.[…]. (188) (grifo nosso)

Ora, as descrições “fumaça na montanha”, “clamor

muito forte de trombeta” e “toda a montanha tremia

violentamente”, nos faz lembrar uma ocorrência

vulcânica; e com a explicação de que, naquela época, os

vulcões próximos da região estavam em atividade (189),

não temos como pensar em algo diferente disso.

Curioso é como acreditavam na presença da

divindade no Monte Sinai:

187 Bíblia Anotada, p. 106.188 JOSEFO, 2003, p. 92.189 Bíblia de Jerusalém, p. 128.

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[…] O céu estava tão claro e tão sereno, quenão existia a menor nuvem; mas surgiu umanuvem quase de repente, que cobriu todo oacampamento dos israelitas; um ventoimpetuoso, acompanhado de grande chuva,levantou um furacão violento; os relâmpagosseguiam-se, um tão perto do outro, quedeslumbravam os olhos, não somente, maslançavam o terror nos espíritos; o raio que caíacom um ruído estranho, indicava a presençade Deus. […]. (190) (grifo nosso)

A ignorância das causas dos fenômenos naturais

fazia-os ver tais ocorrências como sendo a presença ou

manifestação da divindade. Algumas vezes tinham-nos

como resultado de sua ira, castigando os homens, como,

por exemplo, nesta explicação de Josefo para o Mar

Vermelho se fechar:

O vento juntou-se às vagas para aumentar atempestade: grande chuva caiu dos céus. Osrelâmpagos misturaram-se com o ribombo dotrovão, os raios seguiam-se aos trovões e,para que não faltasse nenhum sinal dos maisseveros castigos de Deus, na sua justacólera para punir os homens, uma noitesombria e tenebrosa cobriu a superfície do mar,de modo que de todo esse exército tão temívelnão restou um único homem que pudesse levar

190 JOSEFO, 2003, p. 92.

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ao Egito a notícia da horrível catástrofe. (191)(grifo nosso)

Por outro lado, sendo isso verdade, então, as

observações de Sigmund Freud, já mencionadas, e as que

seguem, a respeito de Jeová, como um deus vulcânico,

fazem sentido:

Esses historiadores modernos, dos quaispodemos tomar Eduard Meyer comorepresentante, concordam com a história bíblicanum ponto decisivo. Também eles acham queas tribos judaicas, que mais tarde sedesenvolveram no povo de Israel, adquiriramuma nova religião num determinado pontodo tempo. Contudo, segundo eles isso não serealizou no Egito ou ao sopé de umamontanha na Península de Sinai, mas numacerta localidade conhecida como Meribá-Cades,um oásis distinguido por sua riqueza em fontese poços, na extensão de terra ao sul daPalestina; entre a saída oriental da Península deSinai e a fronteira ocidental da Arábia. Aí elesassumiram a adoração de um deus Iavé ouJavé, provavelmente da tribo árabe vizinhados madianitas. Parece provável que outrastribos da vizinhança também fossem seguidorasdesse deus.

Javé era, indiscutivelmente, um deusvulcânico. Ora, como é bem-sabido, o Egitonão possui vulcões e as montanhas da

191 JOSEFO, 2003, p. 87.

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Península de Sinai nunca foram vulcânicas; poroutro lado, existem vulcões que podem ter sidoativos, até tempos recentes, ao longo dafronteira ocidental da Arábia. Assim, uma dessasmontanhas deve ter sido Sinai-Horeb,considerado a morada de Javé. (192) Apesar detodas as revisões a que a história bíblica foisubmetida, o retrato original do caráter do deuspode ser reconstruído, segundo Eduard Meyer:era um demônio sinistro e sedento de sangue,que vagueava pela noite e evitava a luz do dia.(193)

O mediador entre Deus e o povo, nafundação dessa religião, chamava-se Moisés.Era o genro do sacerdote madianita Jetro ecuidava de seus rebanhos quando recebeu aconvocação de Deus. Foi também visitado porJetro em Cades e recebeu alguns conselhosdele. (194) (grifo nosso)

Confirma-se, também, a questão de que somente

ao pé do Sinai é que os hebreus tiveram contato com o

Deus que Moisés queria lhes impor; não sem atritos,

conforme veremos com os fatos registrados na Bíblia.

Números 14,1-4: “Então toda a comunidade elevoua voz; puseram-se a clamar, e o povo chorouaquela noite. Todos os filhos de Israelmurmuraram contra Moisés e Aarão, e toda a

192 N.T.: Em alguns lugares do texto bíblico ainda se afirma que Javé desceu doSinal para Meribá-Cades.

193 N.T.: Meyer.194 FREUD, 1997, p. 32.

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comunidade lhes disse: ‘Antes tivéssemos morridona terra do Egito! Estamos morrendo nestedeserto! E por que Iahweh nos traz a esta terrapara nos fazer perecer à espada para entregarcomo presa as nossas mulheres e as nossascrianças? Não nos seria melhor voltar para oEgito?’ E diziam uns aos outros: ‘Escolhamos umchefe e voltemos para o Egito’”. (grifo nosso)

Números 14,11-12: “E Iahweh disse a Moisés: ‘Atéquando este povo me desprezará? Atéquando recusará crer em mim, apesar dossinais que fiz no meio deles? Vou feri-lo compestilência e o deserdarei. De ti, contudo, fareiuma nação maior e mais poderosa do que estepovo”. (grifo nosso)

Realmente é de se questionar: se Deus havia feito

tantos sinais a favor dos hebreus por que motivo não O

seguiam incondicionalmente? Certamente é pelo motivo

de estarem ligados a uma outra crença, que não a que

Moisés queria implantar.

Moisés faz Deus refletir sobre a ameaça de ferir o

povo com pestilência, conseguindo que Ele voltasse atrás:

Números 14,13-19: “Moisés respondeu a Iahweh:‘Os egípcios ouviram que pela tua própria forçafizeste sair este povo do meio deles’. Disseram-notambém aos habitantes desta terra. Souberam quetu, Iahweh, estás no meio deste povo, a quem tefazes ver face a face; que és tu, Iahweh, cujanuvem paira sobre eles; que tu marchas diante

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deles, de dia numa coluna de nuvem e de noitenuma coluna de fogo. Se fazes perecer estepovo como um só homem, as nações queouviram falar de ti vão dizer: ‘Iahweh nãoconseguiu fazer este povo entrar na terra quelhe havia prometido com juramento e, porisso, o destruiu no deserto’. Não! Mas queagora a tua força, meu Senhor, seengrandeça! Segundo a tua palavra: ‘Iahweh élento para a cólera e cheio de amor, tolera a falta ea transgressão, mas não deixa ninguém impune,ele que castiga a falta dos pais nos filhos até aterceira e quarta geração.’ 'Perdoa, pois, a faltadeste povo segundo a grandeza da tua bondade,tudo conforme o tens tratado desde o Egito atéaqui’”. (grifo nosso)

Números 14,20-23: “Disse Iahweh: ‘Eu o perdoo,conforme a tua súplica. Mas – eis que eu vivo! Ea glória de Iahweh enche toda a terra! – todosestes homens que viram minha glória e os sinaisque fiz no Egito e no deserto, estes homens que jáme puseram à prova dez vezes, sem obedecerà minha voz, não verão a terra que prometi comjuramento a seus pais. Nenhum daqueles que medesprezam a verá’”. (grifo nosso)

E aqui vemos o próprio Deus reclamando que os

hebreus não o obedeciam. Estranha essa mudança de

atitude, pois pensávamos que em suas decisões Deus não

mudava de opinião, voltando atrás em alguma coisa, uma

vez que isso é próprio de seres imperfeitos. E, a bem da

verdade, não houve um perdão incondicional, porque

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apenas Ele mudou a ameaça:

Números 14,26-35: “Iahweh falou a Moisés e aAarão. Disse-lhes: ‘Até quando estacomunidade perversa há de murmurar contramim? Ouvi as queixas que os israelitas murmuramcontra mim. Dize-lhes: Por minha vida – oráculo deIahweh – eu vos tratarei segundo as própriaspalavras que pronunciastes aos meus ouvidos. Osvossos cadáveres cairão neste deserto, todosvós os recenseados, todos vós osenumerados desde a idade de vinte anospara cima, vós que tendes murmurado contramim. Juro que não entrareis neste país, a respeitodo qual eu, levantando a mão, fiz juramento denele vos estabelecer. Apenas Caleb, filho de Jefoné,e Josué, filho de Nun, e os vossos filhos, dos quaisdizíeis que seriam levados como presa, serão elesque farei entrar e que conhecerão a terra quedesprezastes. Quanto a vós, os vossoscadáveres cairão neste deserto, e vossosfilhos andarão errantes neste desertodurante quarenta anos, carregando o peso davossa infidelidade, até que os vossos cadáveres seconsumam no deserto. Explorastes a terra durantequarenta dias. A cada dia corresponde um ano: porquarenta anos levareis o peso de vossas faltas esabereis o que é o fato de me abandonar.’ Eu falei,eu mesmo, Iahweh; é assim que tratarei toda estacomunidade perversa amotinada contra mim.Neste mesmo deserto não restará um deles e é alique morrerão.” (grifo nosso)

Apesar dos israelitas estarem às “portas” da terra

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prometida, foram mandados de volta para o deserto, local

em que vagaram por quarenta anos e onde todas as

pessoas de mais de 20 anos morreram. Então, percebe-se

que Iahweh queria Se impor aos hebreus à força; usava

Moisés como seu intermediário, conforme se apreende

das narrativas bíblicas. Porém, nós acreditamos que isso

era do próprio Moisés, que, querendo se impor, usou

fartamente do nome de Deus para conseguir seu intento.

Agora veremos uma rebelião na qual questionavam

a liderança religiosa de Aarão e a política de Moisés.

Números 16,1-3: “Coré, filho de Isaar, filho deCaat, filho de Levi, Datã e Abiram, filhos de Eliab,e On, filho de Felet (Eliab e Felet eram filhos deRúben), encheram-se de orgulho; levantaram-secontra Moisés, juntamente com duzentos ecinquenta israelitas, príncipes dacomunidade, respeitados nas solenidades,homens de renome. Ajuntaram-se, pois,contra Moisés e Aarão, dizendo-lhes: 'Basta!Toda a comunidade e todos os seus membros sãoconsagrados, e Iahweh está no meio deles. Porque, então, vos exaltais acima da assembleia deIahweh?” (grifo nosso)

Números 16,12-14: “Moisés mandou chamar a Datãe Abiram, filhos de Eliab. Responderam eles: ‘Nãoiremos. Não é por acaso bastante que nos fizestedeixar uma terra que mana leite e mel, para nosfazer morrer neste deserto, e queres ainda fazer-te príncipe sobre nós? Na verdade não é uma

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terra que mana leite e mel a terra para a qual nosconduziste e não nos deste por herança campos evergéis! Pensas em tornar cego a este povo? Demodo algum iremos”. (grifo nosso)

O questionamento dos revoltosos “queres ainda

fazer-te príncipe sobre nós”, fez-nos lembrar de algo que

nós vimos alhures sobre a possibilidade de Moisés ter

retirado os hebreus do Egito para se tornar rei deles.

Acreditamos que essa afirmativa cabe bem em quem

lidera e quer impor alguma coisa, um novo deus, por

exemplo, como, ao que tudo se parece, foi o caso de

Moisés.

Curioso é o desenrolar dessa história:

Números 16,28-35: “Disse Moisés: ‘Nistoconhecereis que foi Iahweh que me enviou pararealizar todos estes feitos e que não fiz por mimmesmo: se estas pessoas morrerem de mortenatural, atingidas pela sentença comum a todos oshomens, então não foi Iahweh que me enviou. Masse Iahweh fizer alguma coisa estranha, se a terraabrir a sua boca e os engolir, a eles e tudo aquiloque lhes pertence, e se descerem vivos ao Xeol,sabereis que estas pessoas desprezaram aIahweh’. E aconteceu que, acabando de pronunciartodas essas palavras, o solo se fendeu sob osseus pés, a terra abriu a sua boca e osengoliu, a eles e suas famílias bem como todos oshomens de Coré e todos os seus bens. Desceramvivos ao Xeol, eles e tudo aquilo que lhes

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pertencia. A terra os recobriu e desapareceram aomeio da assembleia. A seus gritos, fugiram todosos israelitas que se encontravam ao redor deles. Ediziam: ‘Que a terra não engula a nós também!’Saiu fogo da parte de Iahweh e consumiu osduzentos e cinquenta homens que ofereciamsacrifício”. (grifo nosso)

Provavelmente um fenômeno natural foi levado à

conta da intervenção de Iahweh; aliás, sempre faziam

isso. Tudo leva a crer tratar-se de alguma movimentação

de placas tectônicas que produziram simultaneamente,

abertura de uma fenda no solo com uma lufada

incandescente de alguma matéria de dentro da terra.

É certo que Moisés se esforçou para instituir a ideia

de um Deus único; para isso tomou a providência de

proibir que o povo adorasse a outros deuses e que

também não tomasse para si as práticas dos cananeus ao

chegar à terra prometida. E, para nós, o fato dele ter-se

esforçado tanto para instituir a adoração a um Deus

único, torna-se óbvio que o povo era politeísta, ou, na

melhor das hipóteses, adeptos do henoteísmo.

Êxodo 34,12-14: “Abstém-se de fazer aliançacom os moradores da terra para onde vais, paraque não te sejam uma cilada. Ao contrário,derrubareis os seus altares, quebrareis assuas colunas e os seus postes sagrados. Nãoadorarás outro Deus. Pois Iahweh tem por nomeZeloso: é um Deus zeloso”. (grifo nosso)

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Moisés, como se vê, queria eliminar tudo o que se

referia à crença dos povos da região, entre eles, os

cananeus. Robin Lane Fox, explicando o último versículo,

diz:

Esta parte do relato já foi definitivamentedatada, e sabe-se que foi escrita no século VIa.C.: o monoteísmo não era uma tradição tãoprimitiva em Israel, e nem a ideia de umaaliança com Deus. (195) (grifo nosso)

Isso só vem reforçar tudo quanto já se disse sobre o

assunto.

A partir daí, Moisés estabelece estatutos e normas,

entre os quais encontramos esta recomendação:

Deuteronômio 5,7-9: “Não terás outros deusesdiante de mim. Não farás para ti imagemesculpida de nada que se assemelhe ao queexiste lá em cima, no céu, ou cá embaixo naterra, ou nas águas que estão debaixo da terra.Não te prostrarás diante desses deuses nemos servirá, porque eu, Iahweh teu Deus, sou umDeus ciumento, […].” (grifo nosso)

Certamente, uma determinação desse tipo, que,

inclusive, consta dos Dez Mandamentos, só faz sentido

para quem ainda não tinha um Deus único, ou seja, a

195 FOX, 1993, p. 51.

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crença monoteísta, que era justamente o que se queria

implantar ao impedi-los de adorar, servir e fazer imagens

de outros deuses. Fato que podemos confirmar com a

explicação do passo Êxodo 20,3-5, cujo teor é igual ao

deste que estamos comentando:

Aqui é rigidamente inculcado omonoteísmo, ou seja, o culto do único everdadeiro Deus e detesta-se a idolatria, à qualo povo era tão exposto e inclinado. É a razãopor que é proibida a produção de imagens.Hoje, inexistindo esse perigo, são permitidas,pois são um auxílio válido para o culto exterior.(196) (grifo nosso)

Obviamente que era de se esperar o “salvamento”

para o culto das imagens, porquanto, ela é de cunho

católico, que admite imagens para identificar os seus

denominados santos.

E quanto a isso, ou seja, a adorar outros deuses, os

hebreus foram severamente advertidos, caso fizessem

imagens: Deuteronômio: “sereis depressa e

completamente exterminados da face da terra da qual

ides tomar posse ao atravessardes o Jordão.”; porém,

nem com essa ameaça eles O seguiram

incondicionalmente. Insiste na questão de ser um Deus

196 Bíblia Sagrada – Edição Popular, p. 96.

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Zeloso (ciumento).

Aliás, essas ameaças eram uma constante entre os

“homens de Deus”, num autêntico terrorismo religioso,

visando implantar Iahweh como o Deus único dos

hebreus; mais à frente, daremos alguns exemplos.

E especificamente sobre os Dez Mandamentos,

Champlin e Bentes, explicam-nos:

[…] Muitos teólogos têm HUMAN-izado aideia veterotestamentária da lei, pois dizem quea reivindicação de origem divina, da leimosaica, não passa um uma invençãohumana. Historicamente, isso exprime umaverdade – pode-se mostrar que os babilôniose outros povos antigos contavam comcódigos legais bastante similares aos dosjudeus, e expressos com bastante elaboração.É nossa tendência subestimar a sensibilidademoral dos povos antigos. […]. (197) (grifo nosso)

Portanto, nem neste ponto podemos dizer que os

hebreus foram originais.

E não sabemos as razões pelas quais não foram

exterminados, pois, de fato, eles adoraram a outros

deuses. Até vemos nisso uma certa incoerência, pois a

vingança que havia prometido contra Amalec, por ele não

ter permitido o povo hebreu passar por suas terras, deu

197 CHAMPLIN e BENTES, 1995c, p. 123.

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ordens expressas a Saul para executá-la:

1 Samuel 15,3: “Vai, pois, agora, e investe contraAmalec, condena-o ao anátema com tudo o que lhepertence, não tenhas piedade dele, mata homense mulheres, crianças e recém-nascidos, bois eovelhas, camelos e jumentos”. (grifo nosso)

Se nos horrorizamos diante das barbaridades

cometidas nas guerras contra civis, por qual motivo não

deveríamos ter o mesmo procedimento em relação ao

narrado nesse passo? Nos dias atuais alguém com um

comportamento semelhante seria julgado e certamente

condenado por crime contra a humanidade.

É por passagens como essas que não dá para se

aceitar que o Deus do Antigo Testamento, fosse o Criador

do Universo, que, sem a menor dúvida, nunca mandaria

matar seus filhos e muito menos vingaria a atitude de um

rei em mulheres, crianças e recém-nascidos, sem falar

nos pobres animais que nada tinham a ver com a história

e mesmo assim sofreram-lhes as consequências;

acreditar nisso só para os fanáticos, que parecem deletar

de sua mente qualquer possibilidade de raciocínio lógico.

Além disso, esse Deus é adepto do “faça o que eu

digo, mas não faça o que faço”, pois, em seus

mandamentos, encontramos: “Não matarás” (Êxodo

20,13) e “não matarás o inocente e o justo” (Êxodo 23,7).

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Outras recomendações lhes foram transmitidas

para quando tomassem posse da Terra Prometida:

Deuteronômio 18,9-14: “Quando entrares naterra que Iahweh teu Deus te dará, nãoaprendas a imitar as abominações daquelasnações. Que em teu meio não se encontre alguémque queime seu filho ou sua filha, nem que façapresságio, oráculo, adivinhação ou magia, ou quepratique encantamentos, que interrogue espíritosou adivinhos, ou ainda que invoque os mortos; poisquem pratica essas coisas é abominável a Iahweh,e é por causa dessas abominações que Iahweh teuDeus as desalojará em teu favor. Tu serás íntegropara com Iahweh teu Deus. Eis que as nações quevais conquistar ouvem oráculos e adivinhos.Quanto a ti, isso não te é permitido por Iahweh teuDeus”. (grifo nosso)

A terra que “mana leite e mel”, que estavam por

conquistar, era justamente a terra dos cananeus, o povo

que adorava o deus El, que, pelo visto acima, também era

dado a prognósticos e adivinhações, muitas vezes obtidos

por meio de suas relações com os seres espirituais, tidos

à época como sendo deuses.

Números 21,7-9: “[…] Moisés intercedeu pelo povoe Iahweh respondeu-lhe: ‘Faze uma serpenteabrasadora e coloca-a em uma haste. Todo aqueleque for mordido e a contemplar viverá’. Moisés,portanto, fez uma serpente de bronze e acolocou em uma haste; se alguém era mordido

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por uma serpente, contemplava a serpente debronze e vivia”. (grifo nosso)

Aqui temos mais uma confirmação de uma

incongruência de Deus, pelo uso do “faça o que digo, mas

não faça o que eu faço”, porquanto, Ele proíbe fazer

ídolos (Levítico 26:1) e, nesta passagem manda fazer

uma serpente, que se tornou objeto de culto:

A serpente na antiguidade era o símbolo dadivindade que cura. Trata-se de um cultoestranho que se introduziu até no templo deJerusalém, e foi abolido só no tempo deEzequias. Para afastar a impressão de magia,já no livro da Sabedoria se afirma que a curanão provinha da serpente mas da misericórdiadivina. (198) (grifo nosso)

Essa estátua só foi destruída por Ezequias; e neste

período todo – sete séculos –, ela foi objeto de adoração,

conforme corrobora a seguinte explicação:

A serpente de bronze. O que fora,setecentos anos antes, um meio de cura (Nm21:8-9) tornara-se um ídolo adorado pelopovo. Neustã significa “um mero pedaço debronze” – um desmascaramento desdenhoso doque aquela venerada relíquia realmente era.Destruí-la era a única alternativa certa para

198 Bíblia Sagrada Vozes, p. 181.

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Ezequias. (199) (grifo nosso)

A serpente de bronze foi conservada emJerusalém até ao tempo de Ezequias (725-697 a.C.), o qual a destruiu por se ter tornadoobjeto de culto idolátrico (2Rs 18,4). O próprioCristo explica o significado simbólico de todo ofato (Jo 3,14-15). (200) (grifo nosso)

Embora alguns tradutores e exegetas tentem

amenizar ou disfarçar o fato, não há como negar que os

hebreus praticavam rituais cananeus; portanto, cultos

pagãos aos quais tiveram ordem expressa de os eliminar

destruindo todos os apetrechos e locais, conforme se vê

nessa ordem divina a Moisés:

Números 33,51-52: “Fala aos israelitas: tu lhesdirás: Quando tiverdes atravessado o Jordão, emdireção à terra de Canaã, expulsareis de diante devós todos os habitantes da terra. Destruireis assuas imagens esculpidas, todas as suas estátuasde metal fundido, e demolireis todos os seuslugares altos”. (grifo nosso)

Vemos aqui que houve ordem expressa aos

hebreus para que destruíssem os lugares altos, onde os

cananeus praticavam seus rituais; porém, conforme

vimos, eles, os próprios hebreus, também se utilizavam

desses locais para praticar os seus rituais.

199 Bíblia Anotada, p. 512.200 Bíblia Sagrada – Edição Popular, p. 168.

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Josué 8,30-31: “Josué então edificou um altar aIahweh, Deus de Israel, sobre o monte Ebal,como Moisés, servo de Iahweh, havia ordenado aosisraelitas, segundo o que está escrito no livro daLei de Moisés: um altar de pedras brutas nãotrabalhadas com ferro. E nele ofereceramholocaustos a Iahweh e imolaram sacrifícios decomunhão”. (grifo nosso)

Exatamente o que acabamos de falar sobre os

lugares altos, utilizados pelos cananeus, que os hebreus

também usavam, ou mais provavelmente, continuaram

usando-os.

Números 25,1-3: “Israel estabeleceu-se em Setim.O povo se entregou à prostituição com as filhas deMoab. Estas convidaram o povo para sacrifício dosseus deuses; o povo comeu e prostrou-sediante de seus deuses. Estando Israel assimligado com o Baal de Fegor, a ira de Iahweh seinflamou contra Israel”. (grifo nosso)

Encontramos que o “prado das acácias, muitas

vezes somente chamado de Setim, local a leste da

Jordânia, na planície de Moab, quase em frente a Jericó.

Foi o quadragésimo segundo acampamento dos israelitas,

sendo seu último local de descanso antes de cruzar o rio

Jordão” (201), para conquistar Canaã.

Assim, temos que, já bem às “portas” da terra

201 LinK: http://pt.wikisource.org/wiki/Dicion%C3%A1rio_B%C3%ADblico_Easton_%281897%29/Abel-Sitim.

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prometida, os israelitas se envolveram com o culto pagão,

prostrando-se diante do deus dos moabitas, o que se

pode comprovar com esta explicação:

Beelfegor [Baal-Fegor], ou Senhor de Fegor,era uma divindade dos moabitas, que habitavama leste do mar Morto. Seu culto comportavapráticas obscenas. Israel consagrou-se aBeelfegor. Trata-se da primeira apostasia doculto do verdadeiro Deus. Não souberamresistir aos convites das mulheres moabitas,participaram dos ritos em honra do seu deusnacional, comeram as carnes das vítimasimoladas nos sacrifícios de comunhão,estabelecendo assim um vínculo sagradocom a divindade pagã e praticaram em largaescala a prostituição sagrada. Donde ocastigo terrível de Deus. (Nm 21,8-9: A serpentede bronze foi conservada em Jerusalém até aotempo de Ezequias (725-697 a.C.), o qual adestruiu por se ter tornado objeto de cultoidolátrico (2Rs 18,4). O próprio Cristo explica osignificado simbólico de todo o fato (Jo 3,14-15).(202) (grifo nosso)

Como se vê, não estavam tão convictos assim da

exclusividade da divindade à qual dizem que adoravam.

c) Dos Juízes a Salomão

Vejamos o que podemos encontrar no período em

202 Bíblia Sagrada – Edição Popular, p. 172.

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que os hebreus viveram sob administração dos juízes.

Juízes 2,6-19: “Então Josué despediu o povo e osisraelitas partiram cada qual para a sua herança, afim de tomar posse da terra. O povo serviu aIahweh durante toda a vida de Josué e toda a vidados anciãos que sobreviveram a Josué e queconheceram toda a grande obra que Iahweh fizeraa favor de Israel… E quando toda aquela geração,por seu turno, se reuniu a seus pais, sucedeu-lheuma outra geração que não conhecia a Iahwehnem a obra que ele tinha feito por Israel. Então osisraelitas fizeram o que era mau aos olhos deIahweh, e serviram aos baais. Deixaram aIahweh, o Deus de seus pais, que os tinha feito sairda terra do Egito, e seguiram a outros deusesdentre os dos povos ao seu redor. Prostraram-seante eles, e irritaram a Iahweh, e deixaram aIahweh para servir a Baal e às Astartes. Entãoa ira de Iahweh se acendeu contra Israel. […] EntãoIahweh lhes suscitou juízes que os livrassem dasmãos dos que os pilhavam. Mas não escutavamnem mesmo aos seus juízes, e seprostituíram a outros deuses, e seprostraram diante deles. Depressa se afastaramdo caminho que seus pais haviam seguido,obedientes aos mandamentos de Iahweh, e nãoagiram assim. Quando Iahweh lhes suscitavajuízes, Iahweh estava com o juiz e os salvava dasmãos dos seus inimigos enquanto vivia o juiz,porquanto Iahweh se comovia por causa dos seusgemidos perante os seus perseguidores eopressores. Mas logo que morria o juiz,reincidiam e se tornavam piores do que os

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seus pais. Seguiam a outros deuses, serviam-nos e se prostravam diante deles, e em nadarenunciavam às obras e à conduta endurecidade seus pais”. (grifo nosso)

Essa é a visão geral do período dos juízes, no qual

os hebreus “prostituíram-se” com outros deuses. É muito

sintomática a informação de que a Josué “sucedeu uma

outra geração que não conhecia Iahweh nem a obra que

ele tinha feito por Israel”; sinal que, ou foram

incompetentes em passar suas crenças à nova geração,

ou, então, que Iahweh não era tão bem conhecido por ser

mais um entre os vários deuses a que seguiam.

Imagine, caro leitor, depois de tantos “milagres”

feitos – as pragas no Egito, abrir o Mar Vermelho em dois,

as codornizes, o maná, água saindo de pedra, etc. – ainda

assim, diante de tantas coisas extraordinárias feitas a

favor deles, os hebreus não seguiram incondicionalmente

a Iahweh. Não vemos outra razão senão a de que viviam

em meio a crenças politeístas, cada uma tendo o seu

deus maior, por mais que isso possa doer a algumas

pessoas.

Explicam-nos os tradutores da Bíblia de Jerusalém,

que:

A dupla “Baal e Astarte”, ou, no plural, “osbaais e astartes”, é, na Bíblia, a designação

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corrente das divindades cananeias. Baal, “osenhor”, é o princípio divino masculino,comumente considerado como o proprietário dosolo. Astarte, que corresponde à Ishtar assíria, éa deusa do amor e da fecundidade. O seu nomeé por vezes (3,7; 2Rs 23,4) substituído pelo deAserá, outra divindade feminina do mesmocaráter (cf. Ex 34,13+) (203) (grifo nosso)

Assim, fica claro, com as provas se acumulando

cada vez mais, que os hebreus serviram, também a essas

duas divindades cananeias.

E, especificamente, sobre Baal trazemos estas

explicações de Champlin e Bentes:

BAAL (BAALISMO)

A palavra e seu uso. Essa é a palavrahebraica que significa “proprietário”,“senhor” ou “marido”. É usada em I Crô. 5:5;8:30 e 9:36 como um nome pessoal; e, de modogeral, designa a divindade cananeia dessenome. As identificações incluem aquelas comrestrições a algum mero lugar de adoração,como Baal-Peor (Núm. 25:3), Baal-Gade (Jos.11:17), Baal-Hermom (Juí. 3:3), etc. Algumasvezes, tais combinações indicam umacaracterística da divindade, e não algum lugarcom o qual estaria associada, como Baal-Berite(Baal do pacto, em Juí. 8:33); Baal-Zebube,talvez uma corruptela de Baal-Zebul (que

203 Bíblia de Jerusalém, p. 351.

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significa “príncipe”, em II Reis 1:2). O própriotermo sugere que a divindade era consideradaproprietária de um determinado lugar, pelo queexerceria controle ali, no tocante a certosaspectos da vida humana, mas, sobretudo, notocante à fertilidade.

Baalismo. A adoração a Baal era,essencialmente, uma religião da natureza, cujaênfase principal era a fertilidade. O OrientePróximo exibiu várias formas de religião dafertilidade, e essa religião dos cananeus era amais desenvolvida entre elas, quanto a esseaspecto. Israel deixou-se arrastar pelainfluência do baalismo por meio desincretismo (os hebreus incorporaram-no, ouao menos aspectos seus, à sua fé), tendohavido uma reação profética (os profetas quereagiram contra esses elementoscorruptores).

Fontes informativas. O A.T., os tabletes deRas Shamra (ver o artigo) e Filo Bíblio.

Ideias. El seria o pai dos deuses, mas nãoteria muito contato com os homens. Aserá era adeusa-mãe. Um filho (ou neto) de destaquedeles seria Baal. Sua consorte, Astarte (que noA.T. aparece como Astarote ou Astorete), era adeusa da fertilidade (ver o artigo sobre ela). Nostabletes de Ras Shamra, Anate aparece como aconsorte de Baal. Seu maior inimigo era Mote (amorte). O clima da Síria e da Palestinacontribuía para a elaboração dessa religião. Aschuvas cessam em março-abril. Só começa achover novamente em outubro-novembro; e,durante o intervalo, pouca vegetação pode

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crescer. A menos que as chuvas voltem, a fomeé inevitável. Assim, os cananeus personificaramas forças que fazem a vegetação voltar à vida. Arazão pela qual as chuvas cessariam é que Baalseria morto em uma luta feroz contra Mote. E aschuvas retornariam porque os amigos de Baal(como o Sol – Shapsh ou Shemesh) e Astarte(fertilidade), devolveriam-lhe a vida (princípio daressurreição). A terra floresceria novamenteporque Baal e Astarte copulavam. Assim, temosnisso uma forma de religião que é,essencialmente, a adoração à natureza. Quandoos homens perturbam os deuses ou deixam deagradá-los, há perturbações nas condiçõesatmosféricas, ou nas vidas das famílias e dastribos.

Festividades, A fim de promover o sentimentoreligioso do povo e honrar os deuses, foraminstituídas festas que apelavam ao impulsoprocriador e a licenciosidade, incluindo aprostituição masculina e feminina, que se tornouum acompanhamento indispensável nessescultos de fertilidade. Isso prosseguia durante osperíodos de festividade e fora dos mesmos.

Influência sobre Israel. Essa religião exerceugrande influência sobre Israel, especialmenteno norte (Israel, em contraste com Judá),onde as ideias e as culturas pagãs tomaram-se parte, mais rapidamente, da perspectivareligiosa dos israelitas. Isso provocou osprotestos dos profetas. Sob tais circunstânciasfoi que Elias e seus sucessores postularam apergunta se o Deus de Israel era Yahweh ouBaal (ver I Reis 18). Os símbolos dessa

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adoração foram condenados pelos profetas,incluindo a árvore ou bosque sagrado, a colunae os terafins (imagens, que incluíam figurinhasda deusa da fertilidade, que se tomarampopulares e numerosas entre os israelitas). Oprotesto levantado pelos profetas contra essetipo de religião pode ter sido um dos fatores queraramente permitia que Deus fosse chamado dePai; e o A.T. não tem palavra que corresponda adeusa. Além disso, a expressão filho de Deus,aplicada ao homem, é rara no A.T. Tais termospoderiam ser erroneamente entendidos, emtermos pagãos. No judaísmo havia o cuidado dese evitar a terminologia sexual no seio dafamília, porquanto isso era por demais comumnas religiões politeístas e de fertilidade, entre osvizinhos de Israel.

Fatores do vigor da religião de fertilidade. 1.Israel não expulsou os cananeus de suas terras,mas antes, misturou-se com eles emcasamento. 2. Aqueles que tinham acabado deentrar na Terra Prometida tinham acabado desair das experiências no deserto. Formasreligiosas que fomentavam festividades e osprazeres sensuais eram alternativas tentadoras.Ou, pelo menos, elementos tomados porempréstimo dessas atividades que, sem dúvida,eram muito atrativos. 3. A lei de Israel eraaustera. Sempre será mais fácil seguir o cursode menor resistência. Assim, persistia por umlado a fé em Yahweh, e esta ia-se misturandocom elementos cananeus. Esse processosincretista é ilustrado em passagens como Juí.2:1-5; 2:11-13,17, Is. 3:5-7; 6:25. A mesma coisa

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se dava com combinações de palavras, comoJerubaal (ver Juí. 7:1), Beeliada (ver I Crô.14:7), És-Baal e Meribe-Baal (ver I Crô.8:33,34), que surgiram de outros nomespróprios. As ostraca de Samaria (cerca de 780A.C.) demonstram que para cada dois nomesque envolviam o nome de Yahweh, um erauma forma qualquer composta de Baal. Otrecho de I Reis 18 mostra-nos que o baalismotornou-se tão forte em Israel que somente setemil deles permaneceram fiéis à antiga fé. Eliasconseguiu evitar o colapso total da fé judaica.Embora continuassem havendo reformas e oprotesto dos profetas (ver Osé. 2:16,17), pareceque foi necessário o cativeiro para impor apurificação necessária.

Dois grandes mitos de Baal. Os textos deRas Shamra contêm esses mitos, a saber: 1. Oconflito com o Príncipe do Mar e Juiz do Rio (odeus das águas obtém a ascendência e,arrogantemente, intimida os outros deuses).Baal, com a ajuda de alguns outros deuses, écapaz de derrotá-lo, confiando-o à sua devidaesfera de atividade. Talvez essa luta sejasimbolizada pelo leviatã da Bíblia, que poderiaser o mesmo lotan, a serpente enroscada. e quepossivelmente seja idêntica ao Príncipe do Mar.– Alguns supõem que o Dia do Senhor (segundooriginalmente concebido no judaísmo) poderiareferir-se à vitória de Yahweh sobre as forças docaos. E esse conceito poderia depender do mitocananeu, acima descrito. 2. Outrossim, havia odeus que morria e ressuscitava; Baal, morto porMote, era então ressuscitado pelo deus Sol e

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por Astarte. Tal suposta ressurreição eraacompanhada por grandes festividades desensualismo. Apesar de que o judaísmo, como éóbvio, nunca desenvolvesse qualquer coisasimilar, excetuando casos de empréstimosdiretos extraídos das religiões de seus vizinhospagãos, alguns estudiosos supõem que opróprio conceito de ressurreição pode tersido provocado, pelo menos em parte, poressa antiga crença. Não há como determinaraté que ponto isso pode ter sido verdade. Mas averdade do conceito da ressurreição em nada éprejudicada ainda que os povos pagãos, demaneira crua, tivessem antecipado eexpressado essa ideia à sua maneira ímpia. (EID SMIT Z). (204) (grifo nosso)

Ao referenciarem Baal e Astera, na verdade,

estavam retomando às divindades cananeias, ou quem

sabe poderíamos dizer: estavam voltando às raízes.

Juízes 3,5-6: “E os israelitas habitaram no meio doscananeus, dos heteus, dos amorreus, dos ferezeus,dos heveus e dos jebuseus; desposaram asfilhas deles, deram seus filhos às filhas delese serviram aos seus deuses”. (grifo nosso)

Eis mais uma prova bíblica irrefutável de que os

hebreus adotaram as práticas dos povos, no meio dos

quais viviam. Esse tipo de comportamento é algo

totalmente previsível a qualquer grupamento humano, e,

204 CHAMPLIN e BENTES, 1995a, p. 416-417.

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certamente, com os hebreus não seria diferente.

É interessante ressaltar a coincidência dealguns pontos entre as crenças dos povosmesopotâmicos e as dos hebreus, que,sendo seus vizinhos, naturalmente foraminfluenciados pela tradição regional.Destacamos, entre outros pontos de contato, aanalogia de Utnapishtim e Noé, do pobreinominado e Jó, a gula de Enil e o episódio daserpente, e entre o Éden e o Dilum. Também namitologia grega encontramos a réplica deGilgamesh em Héracles. (205) (grifo nosso)

A questão do casamento dos hebreus com pessoas

desses povos citados era algo terminantemente proibido:

Deuteronômio 7,3-4: “Não contrairásmatrimônio com elas, não darás tua filha a umde seus filhos, nem tomarás uma de suas filhaspara teu filho; pois deste modo o teu filho seafastaria de mim para servir a outros deuses,e a cólera de Iahweh se inflamaria contra vós,exterminando-te rapidamente”. (grifo nosso)

Fica claro que o objetivo da proibição era evitar que

os hebreus se “contaminassem” com as divindades

desses povos aos quais conquistariam a fio de espada.

Vejamos alguns juízes, citados em “História dos

Juízes”, pela Bíblia de Jerusalém, em cujo período os

205 KRAMER, 1983, p. 114.

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hebreus abandonaram a Iahweh, para adorar a outros

deuses:

1. Otoniel

Juízes 3,7: “Os israelitas fizeram o que é mauaos olhos de Iahweh. Esqueceram Iahweh seuDeus para servir aos baais e às aserás”. (grifonosso)

2. Aod

Juízes 3,12: “Os israelitas recomeçaram a fazero que era mau aos olhos de Iahweh, e Iahwehfortaleceu Eglon, rei de Moab, contra Israel, porquefaziam o que era mau aos olhos de Iahweh”. (grifonosso)

3. Débora e Barac

Juízes 4,1: “Depois da morte de Aod, os israelitasrecomeçaram a fazer o que era mau aos olhosde Iahweh”.(grifo nosso)

4. Gedeão e Abimelec

Juízes 6,1: “Os israelitas fizeram o que era mau aosolhos de Iahweh, […].”(grifo nosso)

Juízes 8,33: “Depois da morte de Gedeão, osisraelitas voltaram a se prostituir aos baais etomaram por Deus a Baal-Bertic”.(grifo nosso)

5. Jefté

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Juízes 10,6: “Recomeçaram os israelitas a fazero que era mau aos olhos de Iahweh. Serviramaos baais e às astartes, e também aos deusesde Aram e de Sidônia, aos deuses de Moab eaos dos amonitas e dos filisteus. Abandonarama Iahweh e não mais o serviram”.(grifo nosso)

Inclusive esse juiz fez uma promessa a Iahweh que,

se vitorioso sobre os amonitas, ele, Jefté, quando voltasse

da guerra, ofereceria em holocausto a primeira pessoa

que saísse da porta de sua casa para recebê-lo. Quem lhe

apareceu foi sua filha, única, pois não tinha mais filhos,

que foi a vítima oferecida a Iahweh, por tê-lo feito ganhar

a guerra. Esse triste episódio se encontra narrado em

Juízes 11,29-40.

Presumimos que, para tomar tal atitude de oferecer

em sacrifício um ser humano, é porque isso fazia parte de

uma prática à qual estava acostumado. E não se diga que

essa foi uma atitude de obediência, semelhante à de

Abraão em relação ao quase sacrifício de Isaac…

6. Sansão

Juízes 13,1: “Os israelitas recomeçaram apraticar o que era mau aos olhos de Iahweh,[…].” (grifo nosso)

7. Samuel

1 Samuel 7,3-4: “Desde o dia em que a Arca foiinstalada em Cariat-Iarim, um longo tempo

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ocorreu, cerca de vinte anos, toda a casa de Israelsuspirou por Iahweh. Então, Samuel falou a toda acasa de Israel, dizendo: ‘Se é de todo o vossocoração que voltais a Iahweh, tirai do meio devós os deuses estrangeiros e as astartes,fixai o vosso coração em Iahweh, e a ninguémmais sirvais a não ser a ele; então ele voslivrará da mão dos filisteus’”. (grifo nosso)

Pela advertência de Samuel, o último dos juízes de

Israel (1 Samuel 7,15), fica óbvio que, no período,

serviam “aos deuses estrangeiros e as astartes” e, como

estamos vendo, isso é algo recorrente entre os hebreus.

Além disso, ainda podemos encontrar entre eles o uso de

práticas pagãs, como a que já mencionamos, sobre as

montanhas ou lugares altos; este passo é mais um

exemplo:

1 Samuel 9,12: “Elas lhes responderam com estaspalavras: ‘Está sim. Acaba de chegar, um poucoantes de ti. Apressa-te: ele veio hoje à cidadeporque será oferecido um sacrifício pelo povono lugar alto”. (grifo nosso)

No passo narra-se a resposta de duas jovens a

Saul, quando ele estava procurando Samuel. Conforme já

vimos, os rituais praticados em lugares altos era uma

prática pagã que os hebreus absorveram dos cananeus,

incluindo-os no rol dos seus atos cultuais.

1 Samuel 12,19-21: “Todo o povo disse a Samuel:

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‘Intercede por nós, teus servos, a Iahweh teuDeus, para que não morramos, pois a todos osnossos pecados acrescentamos a desgraça depedir um rei para nós’. Mas Samuel disse ao povo:‘Não temais! Cometestes todo esse mal. Somentenão vos afasteis de Iahweh, mas servi-o com todo ovosso coração. Não vos afasteis dele, pois issoseria seguir o vazio, que não serve para nadae não pode libertar, pois os ídolos sãovazios’”. (grifo nosso)

Foi Samuel quem sagrou Saul como o primeiro dos

reis de Israel, que reinou apenas dois anos. Nada de

muito anormal em seu reinado, quanto ao aspecto de

fazer as coisas agradáveis a Iahweh; entretanto, um

acontecimento simples põe em evidência uma das

formas, entre outras, com a qual consultavam a Deus;

vejamos:

1 Samuel 14,41-42: “Saul disse a Iahweh: ‘Iahweh,Deus de Israel, por que não respondeste hoje aoteu servo? Se o pecado recai sobre mim ou sobre omeu filho Jônatas, ó Iahweh, Deus de Israel, dáUrim; se a falta foi cometida pelo teu povo deIsrael, dá Tummim’. Saul e Jônatas foramapontados, e o povo ficou livre. Saul disse: ‘Lançaia sorte entre mim e o meu filho Jônatas’, e Jônatasfoi apontado”. (grifo nosso)

Sobre essas duas pedras em forma de dados,

explicam-nos os tradutores da Bíblia de Jerusalém:

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202

O texto mostra como se consultava aDeus a partir de dois dados contidos numacaixa ou efod; chamavam-se Urim e Tummim(o valor das palavras é incerto) e davam-lhesuma significação convencional. Era, pois, umaresposta por sim ou não (cf. 23,10-12), e aconsulta era às vezes longa. O manejo dassortes estava reservado aos sacerdotes levitas(Nm 27,21; Dt 33,8). O costume caiu em desusodepois do reinado de Davi e não foirestabelecido (cf. Esd 2,63=Ne 7,65). (206) (grifonosso)

O urim e tummim eram considerados como sortes

sagradas, e por meio deles se faziam as consultas a Deus.

Conforme a maneira com que caíam, eram vistos como

um “sim” ou como um “não”, numa versão bem antiga de

um autêntico “cara ou coroa”. Essa foi de morte!

Vejamos, agora, uma outra história bem

interessante:

1 Samuel 19,10-17: “[…] Naquela mesma noite,Saul despachou emissários para vigiar a casa deDavi para que o matassem pela manhã. Mas Micol,mulher de Davi, lhe deu este conselho: ‘Se nãoescapares esta noite, amanhã serás um homemmorto!’ Micol fez Davi descer pela janela e ele saiucorrendo e escapou naquela noite. Micol apanhouo terafim, deitou-o na cama, pôs-lhe na cabeçauma pele de cabra e estendeu sobre ele um manto.

206 Bíblia de Jerusalém, p. 408-409.

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203

Aos mensageiros que Saul mandara trazer Davi, eladisse: ‘Está doente’. Mas Saul mandou outra vez osmensageiros, para que vissem Davi, e disse-lhes:‘Trazei-mo na sua cama, para que eu o mate!’ Osmensageiros entraram e deram com o terafim nacama, e a pele de cabra na cabeceira. Saul disse aMicol: ‘Por que me traíste e deixaste fugir o meuinimigo?’ Micol respondeu a Saul: ‘Foi ele quem medisse; Deixa-me partir ou te mato!’”. (grifo nosso)

Micol foi a filha que Saul, quando rei de Israel, deu

a Davi por mulher (1 Samuel 18,27); ela trai o pai para

salvar seu marido, colocando em seu lugar, na cama, um

terafim. Vejamos do que isso se trata:

Terafim. Palavra hebraica que significa“ídolos”. Quando Jacó se afastou de seu sogroLabão, sua esposa Raquel ocultou os terafim dacasa sob as roupas (Gen 31,19.34s). Por ondese vê que eram pequenas estátuas veneradassupersticiosamente como as representaçõesdos espíritos tutelares do lar dos antigosromanos. No tempo dos Juízes, um israelita denome Micas fez uns terafim (Jz 17,5ss) quetanto podiam ser ídolos como outros objetosempregados como meio de adivinhação.Micol, filha de Saul e esposa de Davi, salvou aseu esposo colocando na cama um terafim(estátua) coberto com uma pele para fazer creraos guardas que Davi estivesse ali, doente(1Sam 19,13). O bom rei Josias destruiu osterafim aos quais se prestava culto no reino de

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204

Judá (4Rs 23,24). (207) (grifo nosso)

TERAFINS

Há várias opiniões quanto ao significadodessa palavra, desde “nutridores” até “coisasvis”. Por esse motivo, alguns estudiosospreferem pensar que o termo é de sentidoincerto. O que é certo é que os “terafins”eram ídolos domésticos, que iam desdeaqueles de pequenas dimensões (Gên.31:34,35), até aqueles de tamanho quasenatural (I Sam. 19:13,16).

Recentes descobertas arqueológicas, feitasem Nuzi, no Iraque, têm iluminado a função e asignificação desses ídolos. A posse de umterafim indicava quem era o líder da família,com todos os direitos daí provenientes.Quando Raquel furtou os terafins de seu pai (verGên. 31:19), isso foi uma tentativa que ela fezde conseguir tal liderança, para seu marido,Jacó, embora tal direito pertencesse por direito,aos irmãos dela. A irritação de Labão, pois, ficaesclarecida por meio desse detalhe.

Ao que parece, durante grande parte de suahistória os israelitas não pensavam que apossessão de tais ídolos era incoerente com aadoração a Yahweh, cf. Juí. 17,18, mas,especialmente, o trecho de I Sam. 19:13,16,onde se aprende que havia terafins atémesmo na casa de Davi. Foi a partir da épocade Samuel (ver I Sam. 15:23), e daí até os diasde Zacarias (ver Zac. 10:2), que os terafins

207 Dicionário Barsa, p. 266.

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começaram a ser desaprovados.

A função dos terafins que os profetasmais combatiam era a função daadivinhação. Nessa qualidade de objetos deadivinhação, os terafins são, frequentementemencionados juntamente com estolassacerdotais, também usadas nas adivinhações(Juí, 17 e 18; onde parecem ser objetosseparados dos ídolos; e também Osé. 3:4).Entre as coisas e as atividades que foramexpurgadas durante a reforma instituída porJosias, parece que os terafins foram reunidosjuntamente com os médiuns e os bruxos.Lemos que o rei da Babilônia costumavaconsultá-los (Eze. 21:21), mas o profetaZacarias declarou que eles eram faladores de“cousas vãs”. Nessa passagem do livro deEzequiel, novamente vemos a designação“ídolos do lar”. Oseias referiu-se, esperançoso,ao tempo futuro quando Israel, dependendototalmente de Deus, será capaz de viver semapelar para os terafins (Osé. 3:4).

Alguns estudiosos têm sugerido que a funçãode adivinhação dos ídolos do lar talvez expliqueo uso obscuro da palavra hebraica elohim, quepode ser compreendida como “deus” ou como“deuses”, em Êxodo 21:6 e 22:7-10. (208) (grifonosso)

Então, fica claro que na casa de Davi havia um

terafim, que, conforme explicado, era usado para se fazer

208 CHAMPLIN e BENTES, 2995b, p. 497.

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adivinhações; consequentemente, algo relacionado a

ritual pagão para se consultar os deuses. Inclusive, foi

dito que o rei da Babilônia costumava consultá-los.

A dúvida que nos surgiu foi: se o terafim usado por

Micol, fazia parte dos ídolos que Davi e seus homens

teriam levado pertenciam aos filisteus (2 Samuel 5,21) ou

seria algum outro que, porventura, já possuía? Além

disso, ficamos ainda sem entender essa atitude de Davi,

pois o que, geralmente, os hebreus faziam era destruir os

ídolos dos povos pagãos vencidos nas batalhas.

Temos conhecimento de que “Isbaal, filho de Saul,

tinha quarenta anos quando se tornou rei de Israel, e

reinou por dois anos. Somente a casa de Judá seguia

Davi. E Davi reinou sobre a casa de Judá, em Hebron,

durante sete anos e meio”. (2 Samuel 2,10-11). Davi, à

frente do governo de Judá, segue fielmente a Iahweh;

contudo, ao lhe construir um altar, comprando o terreno

de Areúna, adota o costume pagão dos lugares altos:

A eira de Areúna encontrava-se fora dacidade, sobre a colina que dominava a primitivaJerusalém ao norte; foi aí que mais tarde seconstruiu o Templo de Salomão (cf. 5,9+). (209)(grifo nosso)

209 Bíblia de Jerusalém, p. 467.

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207

Ao ficar com idade avançada, Davi resolve

transferir o trono a seu filho Salomão. O interessante é

que de Salomão (970 a.C. aprox.) a Sedecias (587 a.C.),

ou seja, durante quase 400 anos, época da deportação

para a Babilônia, veremos que, na maior parte desse

período de tempo, eles adoravam a outros deuses, o que

reforça, acreditamos, até sem ter como se contestar, que

não eram mesmo monoteístas, mas sim, politeístas.

Salomão foi o terceiro rei de Israel, cujo reinado,

sabemos, se deu de 970 aproximadamente a 931 a.C.:

1 Reis 3,1-3: “Salomão tornou-se genro do Faraó,rei do Egito; tomou por sua esposa a filha de Faraóe introduziu-a na Cidade de Davi, até que acabassede construir o seu palácio, o Templo de Iahweh e asmuralhas em torno de Jerusalém. O povo ofereciasacrifícios nos lugares altos, pois até entãoainda não tinha sido construída uma casa para oNome de Iahweh. Salomão amou a Iahweh:comportava-se segundo os preceitos de seu paiDavi: mas oferecia sacrifícios e incenso noslugares altos”. (grifo nosso)

Aqui, parece-nos que quem tentou amenizar o fato

de estarem oferecendo sacrifícios em lugares altos foi o

próprio autor bíblico:

O autor pretende talvez desculpar osacrifício de Salomão num desses lugaresaltos. Trata-se de santuários locais, com uma

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árvore frondosa, um altar, uma estela sagrada.[…] geralmente herdados dos cananeus ededicados aos baais. Os israelitas os dedicama Yhwh, não sem expor-se ao sincretismoreligioso. Josias pretende suprimi-lostotalmente. (210) (grifo nosso)

Agora, sim, temos afirmações mais coerentes com

a realidade do povo hebreu, pois, certamente, viviam

num sincretismo religioso: “fusão de diferentes cultos ou

doutrinas religiosas, com reinterpretação de seus

elementos”. (211)

1 Reis 11,4-8: “Quando ficou velho, suas mulheresdesviaram seu coração para outros deuses e seucoração não foi mais todo de Iahweh seu Deus,como o fora o de Davi, seu pai. Salomão prestouculto a Astarte, deusa dos sidônios e a Melcom, aabominação dos amonitas. Fez mal aos olhos deIahweh e não lhe foi fiel plenamente, como seupai Davi. Foi então que Salomão construiu umsantuário para Camos, a abominação de Moab,na montanha a leste de Jerusalém, e para Moloc,a abominação dos amonitas. Fez o mesmo paratodas as suas mulheres estrangeiras, queofereciam incenso e sacrifícios aos seus deuses”.(grifo nosso)

Interessante que Salomão era considerado um

sábio, cuja sabedoria lhe foi dada pelo próprio Deus. Aí

210 Bíblia do Peregrino, p. 617.211 HOUAISS 3.0, 2009.

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cabe a pergunta: Se o rei, pessoalmente, teve seu

coração desviado para outros deuses, que dirá o resto dos

súditos? Após sua morte, seu filho Roboão lhe sucederia

no trono; entretanto, houve um cisma em Israel, cujo

resultado foi a sua divisão em dois reinos: o de Israel e o

de Judá. Listaremos seus reis separadamente, objetivando

mostrar uma visão mais pormenorizada de cada um

deles.

d) Judá e Israel

1) Reis de Israel

Jeroboão I (931-910):

1 Reis 12,28-33: “Depois de ter pedido conselho,fez dois bezerros de ouro e disse ao povo:'Deixai de subir a Jerusalém! Israel, eis teusdeuses que te fizeram sair da terra do Egito”.Erigiu um em Betel e pôs o outro em Dã. Esseprocedimento levou ao pecado, o povo foi emprocissão diante do outro até Dã. Estabeleceu otemplo dos lugares altos, e designou comosacerdotes homens tirados do povo, que não eramfilhos de Levi. Jeroboão celebrou uma festa nooitavo mês, no décimo quinto dia do mês, àsemelhança da que se celebrava em Judá, e subiuao altar. Assim, fez ele em Betel, sacrificandoaos bezerros que fizera e estabeleceu emBetel os sacerdotes dos lugares altos queinstituíra. Subiu ao altar que tinha feito em Betel,no décimo quinto dia do oitavo mês, isto é, no mês

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que ele escolhera arbitrariamente; instituiu umafesta para os israelitas e subiu ao altar paraqueimar incenso”. (grifo nosso)

Nadab (910-909):

1 Reis 15,26: “Fez mal aos olhos de Iahweh;imitou o comportamento de seu pai e opecado ao qual tinha arrastado Israel”. (grifonosso)

Baasa (909-886):

1 Reis 15,34: “Fez mal aos olhos de Iahweh eimitou a conduta de Jeroboão e o pecado aoqual ele tinha arrastado Israel”. (grifo nosso)

Ela (886-885):

1 Reis 16,12-13: “Zambri exterminou toda a casade Baasa, segundo a predição que Iahweh fizeracontra Baasa, por intermédio do profeta Jeú, porcausa de todos os pecados que cometeramBaasa e Ela, seu filho, e fizeram Israelcometer, irritando Iahweh, Deus de Israel,com seus ídolos vãos”. (grifo nosso)

Zambri (885):

1 Reis 16,18-19: “Quando Zambri viu que a cidadeia ser tomada, entrou na cidadela do palácio real,pôs fogo no palácio, estando lá dentro, e morreu.Tudo por causa do pecado que cometera,fazendo mal aos olhos de Iahweh, imitando aconduta de Jeroboão e o pecado que fizera,

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levando Israel a pecar”. (grifo nosso)

Amri (885-874):

1 Reis 16,25-26: “Amri fez o mal aos olhos deIahweh, superando nisso todos os seusantecessores. Imitou em tudo a conduta deJeroboão, filho de Nabat, e os pecados que a estelevara Israel, irritando Iahweh, Deus de Israel, comseus ídolos vãos”. (grifo nosso)

Acab (874-853):

1 Reis 16,30-33: “Acab, filho de Amri, fez o malaos olhos de Iahweh, mais do que todos os seusantecessores. Como se não lhe bastasse imitar ospecados de Jeroboão, filho de Nabat, desposouainda Jesabel, filha de Etbaal, rei dos idônios epassou a servir a Baal e a adorá-lo, erigiu-lheum altar no templo de Baal, que construiu emSamaria. Acab também erigiu um poste sagradoe cometeu ainda outros pecados, irritandoIahweh, Deus de Israel, mais que todos os reis deIsrael que o precederam”. (grifo nosso)

Ocozias (853-852):

1 Reis 22,53-54: “Fez mal aos olhos de Iahweh eimitou o comportamento de seu pai e de sua mãe,e o de Jeroboão, filho de Nabat, que levara Israel apecar. Prestou culto a Baal e prostrou-sediante dele provocando a ira de Iahweh, Deus deIsrael, como o fizera seu pai”. (grifo nosso)

Jorão (852-841):

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2 Reis 3,2-3: “Fez mal aos olhos de Iahweh; não,porém, como seu pai e sua mãe, pois derrubou aestela de Baal que seu pai tinha feito. Mascontinuou apegado aos pecados de Jeroboão, filhode Nabat, fez Israel cometer e deles não seapartou”. (grifo nosso)

Jeú (841-814):

2 Reis 10,28-31: “Assim, Jeú fez Baal desaparecerde Israel. Entretanto, Jeú não se desviou dospecados que Jeroboão, filho de Nabat, fizeraIsrael cometer, os bezerros de ouro de Betel e Dã.[…] Mas Jeú não seguiu fielmente e de todo oseu coração a lei de Iahweh, Deus de Israel; nãose afastou dos pecados que Jeroboão fizera Israelcometer”. (grifo nosso)

Joacaz (814-798):

2 Reis 13,2: “Fez o mal aos olhos de Iahweh eimitou o pecado ao qual Jeroboão, filho de Nabat,arrastou Israel e não se afastou dele”. (grifo nosso)

Joás (798-783):

2 Reis 13,11: “Fez o mal aos olhos de Iahweh enão se afastou do pecado ao qual Jeroboão, filho deNabat, havia arrastado Israel, mas obstinou-senele”. (grifo nosso)

Jeroboão II (783-743):

2 Reis 14,24: “Fez mal aos olhos de Iahweh enão se afastou de todos os pecados aos quais

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Jeroboão, filho de Nabat, havia arrastado Israel”.(grifo nosso)

Zacarias (743):

2 Reis 15,9: “Fez o mal aos olhos de Iahweh,como fizeram seus pais, e não se afastou dospecados aos quais Jeroboão, filho de Nabat, haviaarrastado Israel”. (grifo nosso)

Selum (743):

2 Reis 15,13: “Selum, filho de Jabes, tornou-se reino trigésimo nono ano de Ozias, rei de Judá, ereinou um mês em Samaria’. (grifo nosso)

Nada foi informado sobre o período de um mês de

seu reinado, porém, é provável que tenha agido como o

seu antecessor e o seu sucessor, que fizeram mal aos

olhos de Iahweh.

Manaém (743-738):

2 Reis 15,18: “Fez mal aos olhos de Iahweh, nãose afastando, durante sua vida, dos pecados aosquais Jeroboão, filho de Nabat, havia arrastadoIsrael”. (grifo nosso)

Faceias (738-737):

2 Reis 15,24: “Fez o mal aos olhos de Iahweh,não se afastando dos pecados aos quais Jeroboão,filho de Nabat, havia arrastado Israel”. (grifo nosso)

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Faceia (737-732):

2 Reis 15,28: “Fez o mal aos olhos de Iahweh,não se afastando dos pecados aos quais Jeroboão,filho de Nabat, havia arrastado Israel”. (grifo nosso)

Oseias (732-724):

2 Reis 17,2: “Fez o mal aos olhos de Iahweh,mas não como os reis de Israel seuspredecessores”. (grifo nosso)

O rei da Assíria conquistou toda essa região, tendo

como justificativa, pelo autor de 2 Reis:

2 Reis 17,7-23: “Isso aconteceu porque os israelitaspecaram contra Iahweh seu Deus, que os fizerasubir da terra do Egito, libertando-os da opressãodo Faraó, rei do Egito. Adoraram outros deuses eseguiram os costumes das nações que Iahwehhavia expulsado de diante deles, e os costumesestabelecidos pelos reis de Israel. Os israelitasproferiram palavras inconvenientes contra Iahwehseu Deus, construíram lugares altos em toda parteem que habitavam, deste as torres de vigia até ascidades fortificadas. Erigiram para si estelas epostes sagrados sobre toda colina elevada edebaixo de toda árvore verdejante. Sacrificaramem todos os lugares altos, imitando as nações queIahweh havia expulsado de diante deles, ecometeram ações más, provocando a ira deIahweh. Prestaram culto aos ídolos, embora Iahwehlhes houvesse dito: ‘Vós não fareis tal coisa’. Noentanto, Iahweh tinha feito esta advertência a

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Israel e a Judá, por meio de todos os profetas evidentes: ‘Convertei-vos de vossa má conduta eobservai meus mandamentos e meus estatutos,conforme toda a Lei que prescrevi a vossos pais eque lhes comuniquei por intermédio de meusservos, os profetas’. Mas eles não obedeceram eendureceram a sua cerviz como o haviam feitoseus pais, que não tinham acreditado em Iahwehseu Deus. Desprezaram seus estatutos, bem comoa aliança que ele havia concluído com seus pais, eas ordens que lhes havia dado. Correndo atrás daVaidade eles próprios se tornaram vaidade, comoas nações ao redor, apesar de Iahweh lhes terordenado que não agissem como elas. Rejeitaramtodos os mandamentos de Iahweh seu Deus,fabricaram para si estátuas de metal fundido,os dois bezerros de ouro, fizeram um postesagrado. Adoraram todo o exército do céu eprestaram culto a Baal. Fizeram passar pelofogo seus filhos e filhas, praticaram aadivinhação e a feitiçaria, e venderam-separa fazer o mal na presença de Iahweh,provocando sua ira. Então Iahweh irritou-sesobremaneira contra Israel e arrojou-o para longede sua face. Restou apenas a tribo de Judá. Judátampouco guardou os mandamentos deIahweh seu Deus; seguiu os estatutos que Israelpraticava. Por isso, Iahweh, rejeitou toda a raça deIsrael, humilhou-a e entregou-a aos saqueadores, eenfim baniu-a para longe de Sua face. Ele, comefeito, havia separado Israel da casa de Davi eIsrael tinha proclamado como rei Jeroboão, filho deNabat; Jeroboão afastou Israel de Iahweh elevou-o a cometer um grande pecado. Os

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israelitas imitaram todos os pecados queJeroboão cometera e dele não se afastaram,até que finalmente Iahweh baniu Israel de suapresença, como o havia anunciado por Intermédiode seus servos, os profetas; deportou Israel paralonge de sua terra, para a Assíria, onde estáaté hoje”. (grifo nosso)

Confirma-se, portanto, que os hebreus não faziam

questão de adorar e servir a Iahweh, pois, ao longo de

toda a sua história, sempre estiveram envolvidos com o

culto a outros deuses, com maior ênfase aos deuses dos

cananeus.

E aqui temos o relato sobre o repovoamento do

reino do Norte, Israel:

2 Reis 17,24-41: “O rei da Assíria mandou vir gentede Babilônia, de Cuta, de Ava, de Emat e deSefarvaim, e estabeleceu-os nas cidades daSamaria, em lugar dos israelitas; tomaram posseda Samaria e fixaram-se em suas cidades. Quandocomeçaram a se instalar na terra, não veneravamIahweh e este mandou contra eles leões, que osmatavam. Disseram, pois, ao rei da Assíria: ‘Aspopulações que deportaste para fixá-las nascidades da Samaria não conhecem o ritual do deusda terra, e ele mandou leões contra elas. Os leõesas matam porque elas não conhecem o ritual dodeus da terra”. Então o rei da Assíria ordenou:‘Mandai para lá um dos sacerdotes quedeportastes,” que ele se estabeleça lá e lhesensine o ritual do deus da terra’. Então veio um dos

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sacerdotes que haviam deportado de Samaria e sefixou em Betel; este ensinava-lhes como deviamvenerar Iahweh. Mas cada nação fabricou parasi seus próprios deuses e os colocou nostemplos dos lugares altos, que os samaritanoshaviam feito; assim fez cada povo nas cidades emque habitou. Os babilônios fizeram uma estátua deSucot-Benot, os de Cuta, uma de Nergel, os deEmat, uma de Asima, os de Ava, uma de Nebaaz euma de Tartac, e os de Sefarvaim queimavam seusfilhos em honra de Adramelec e de Anamelec,deuses de Sefarvaim. Prestavam culto também aIahweh e dentre seus homens elegeramsacerdotes, que oficiavam para eles nos templosdos lugares altos. Veneravam Iahweh e serviama seus deuses, segundo o costume dasnações de onde tinham sido deportados.Seguem ainda hoje seus ritos antigos. Nãohonravam Iahweh, nem observavam suas regras eseus ritos, nem a lei e os mandamentos queIahweh havia determinado aos filhos de Jacó, aquem dera o nome de Israel. Iahweh concluíra comeles uma aliança e lhes havia dado esta ordem:‘Não adorareis deuses estrangeiros, nem vosprostrareis diante deles, não lhes prestareis culto enão lhes oferecereis sacrifícios. Mas somente aIahweh, que vos fez subir da terra do Egito pelogrande poder de seu braço estendido, é que deveistributar vosso culto, adoração e sacrifícios.Observareis os estatutos e as normas, a lei e osmandamentos que ele vos deu por escrito, a fim deque os guardeis para sempre, e não prestareisculto a outros deuses. Não esqueçais a aliança queconcluí convosco e não presteis culto a deuses

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estrangeiros; adorai somente a Iahweh, vossoDeus, e ele vos libertará da mão de todos osvossos inimigos’. Eles, porém, não obedeceram econtinuam a seguir seu antigo rito. Assim, essasnações adoravam a Iahweh e prestavam cultoa seus ídolos; seus filhos e seus netoscontinuam até hoje fazendo o que fizeramseus pais”. (grifo nosso)

Antes de avançar para os reis de Judá, vamos dar

algumas informações do profeta Elias, que exerceu

atividades durante o reinado de Acab (874-853),

porquanto, elas reforçarão mais ainda o que estamos

descobrindo sobre a prática religiosa dos hebreus.

Elias, o mais célebre dos profetas, foienviado por Deus para se opor à idolatria quegrassava. Cumpriu a missão com a virtude ecom milagres. Tesbita, isto é, de Tisbe, cidade aoriente do Jordão. Estes poucos traços de umabiografia certamente mais ampla do profeta,foram provavelmente inseridos no livro não sópara lembrar a obra, mas também paradespertar a fé lânguida dos israelitas,chamando-lhes a atenção para a atitude firmede Elias. A missão do profeta começavaticinando a seca, como castigo de idolatria,enquanto ruptura da Aliança. Interessante notara particularidade do castigo: os israelitashaviam abandonado o seu Deus para adorarBaal, considerado precisamente o deus dachuva; ora, a seca devia fazer constatar aincapacidade daquela divindade em dar a

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chuva. (212) (grifo nosso)

Elias: Profeta dos israelitas. Os judeusacreditavam num Deus único. Mas essa crençasofreu mudanças. Na Bíblia hebraica se lê queos israelitas sempre se voltaram para os deusesBaal, adorados pelos povos vizinhos. Eliasanunciou-lhes um só e único Deus de Israel,Javé. Ele propunha o monoteísmo. – Dohebraico = meu Deus é Javé. (213) (grifo nosso)

Se Elias teve a missão de “anunciar-lhes um só e

único Deus”, então, fica provado que não é tão pacífica

assim a ideia de que já acreditavam nisso. Ambas as

explicações confirmam que os hebreus adoravam outros

deuses.

O deus aqui citado é Baal, do qual já falamos

alguma coisa, mas para clarear mais o assunto traremos

as seguintes informações.

Baal: No mundo bíblico, designação paradivindades cultuadas em determinados lugares.A divindade era considerada proprietária dafonte, árvore ou cidade, onde era invocada.Havia numerosos Baais, tidos como deuses dafertilidade. Os profetas de Israel combateramo culto a Baal como um desvio do Deus

212 Bíblia Sagrada Ed. Popular, p. 357.213 SCHUWIKART, 2001, p. 39.

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único. – Do hebraico = senhor, proprietário. (214)(grifo nosso)

Baal. Palavra hebraica que significa senhor,marido, dono. Nos primeiros tempos, osisraelitas usavam o termo Baal para overdadeiro Deus, como se pode concluir douso de certos nomes de pessoas e lugares,tais como Baal-Farasim (2 Sam 5,20), Esbaal,filho de Saul (I Par 8,33), Meribaal, filho deJônatan (I Par 8,34), Baaliada, filho de Davi (IPar 14,7), etc. Mais tarde entretanto, por causadas recordações idólatras que sugeria o termo,a palavra Baal não foi mais aplicada aoverdadeiro Deus e tornou-se comum usá-lapara designar qualquer uma das váriasdivindades pagãs, especialmente o Deus Soldos fenícios (Os 2,16). Os judeusfrequentemente caiam no pecado de adorar aBaal, oferecendo-lhe sacrifícios humanos,erigindo-lhe altares e templos econsagrando-lhe sacerdotes para seu culto(3 Rs 16,31-33; 18,22; 4 Rs 17,16; 2 Par 33,3-6;Jer 19,5; 32,35). O culto de Baal erafrequentemente caracterizado pelos ritos maisrevoltantes e impuros (3 Rs 14,24; 15,12; 22,47;4 Rs 23,7; Os 4,14). Gedeão destruiu ossacerdotes de Baal (3 Rs 18). Frequentementeo nome Baal é encontrado em sua forma plural:Baalim (Jz 3,7; etc.). Depois que a palavrapassou a designar deuses pagãos, conceberamos israelitas bons tal horror ao termo que

214 SCHUWIKART, 2001, p. 14.

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chegaram a mudar os nomes de antigospersonagens em cuja composição estivesseessa palavra, assim Isbaal (homem de Deus)recebeu nova forma: lsboset (homem daignomínia). (215) (grifo nosso)

Fulminante: “a palavra Baal não foi mais aplicada

ao verdadeiro Deus”, ou seja, se “não foi” é porque ela

era usada, provando que o tinha o deus pagão Baal como

sua divindade.

Voltando ao curso, com a lista dos reis, vejamos

agora os de Judá.

2) Reis de Judá

Roboão (931-913):

1 Reis 14,21-24: “Roboão, filho de Salomão,tornou-se rei de Judá; tinha quarenta e um anosquando subiu ao trono. […] Judá fez mal aosolhos de Iahweh; irritaram seu ciúme mais doque tinham feito seus pais, com todos os pecadosque cometeram, construindo lugares altos,erguendo estelas e postes sagrados sobretoda colina elevada e debaixo de toda árvorefrondosa. Houve até prostitutos sagrados naterra. Ele imitou todas as abominações das naçõesque Iahweh havia expulsado de diante dosisraelitas.” (grifo nosso)

Abiam (913-911):

215 Dicionário Prático Barsa, p. 29.

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1 Reis 15,1-3: “No décimo oitavo ano do reiJeroboão, filho de Nabat, Abiam tornou-se rei deJudá e reinou três anos em Jerusalém; […] Imitouos pecados que seu pai cometera antes dele eseu coração não foi plenamente fiel a Iahweh seuDeus como o coração de Davi, seu antepassado”.(grifo nosso)

Asa (911-870):

1 Reis 15,11-14: “Asa fez o que é reto aos olhosde Iahweh, como Davi seu pai. Expulsou da terratodos os prostitutos sagrados e aboliu os ídolos queseus pais haviam feito. […] Os lugares altos nãodesapareceram; mas o coração de Asa foiplenamente fiel a Iahweh, por toda a sua vida”.(grifo nosso)

Josafá (870-848):

1 Reis 22,43-44: “Seguiu em tudo o procedimentode seu pai Asa, sem dele se apartar, fazendo o queé reto aos olhos de Iahweh. Entretanto, oslugares altos não desapareceram; o povocontinuou a oferecer sacrifícios e incenso noslugares altos”. (grifo nosso)

Jorão (848-841):

2 Reis 8,18: “Imitou o comportamento dos reis deIsrael, como fizera a casa de Acab, pois foi umafilha de Acab que ele tomou como esposa, e fez omal aos olhos de Iahweh”. (grifo nosso)

Ocozias (841):

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2 Reis 8,27: “Ele imitou a conduta da família deAcab e fez o mal aos olhos de Iahweh, como afamília de Acab, pois era ligada a esta porafinidade”. (grifo nosso)

Atalaia (841-835):

2 Reis 11,17: “Joiada concluiu entre Iahweh, o rei eo povo uma aliança pela qual o povo secomprometia a ser o povo de Iahweh; e a aliançaentre o rei e o povo. Todo o povo da terradirigiu-se depois ao templo de Baal edemoliu; quebraram totalmente os altares e asimagens e mataram Matã, sacerdote de Baal,diante dos altares”. (grifo nosso)

Joiada era chefe do sacerdócio de Jerusalém, e

tramou contra Atalaia, fazendo o povo eleger Joás, como

rei. Assim, na verdade, no seu reinado, existiam os cultos

que foram eliminados por ele. O resultado disso será visto

no reinado de Joás, que se tornou rei quando contava com

apenas sete anos de idade.

Joás (835-796):

2 Reis 12,3-4: “Joás fez o que é agradável aosolhos de Iahweh, durante toda a sua vida, pois osacerdote Joiada o havia educado. Contudo, oslugares altos não desapareceram e o povocontinuava a oferecer sacrifícios e incensosobre os lugares altos”. (grifo nosso)

Amasias (796-781):

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2 Reis 14,3-4: “Fez o que é agradável a Iahweh,mas não como seu pai Davi; em tudo imitou Joás,seu pai. No entanto, os lugares altos nãodesapareceram e o povo continuava aoferecer sacrifícios e incenso sobre oslugares altos”. (grifo nosso)

Ozias (781-740):

2 Reis 15,3-4: “Fez o que é agradável a Iahweh,como tudo o que fizera seu pai Amasias.Entretanto, os lugares altos nãodesapareceram e o povo continuava aoferecer sacrifícios e incenso nos lugaresaltos”. (grifo nosso)

Joatão (740-736):

2 Reis 15,34-35: “Fez o que é agradável aosolhos de Iahweh, imitando em tudo a conduta deseu pai Ozias. Entretanto, os lugares altos nãodesapareceram e o povo continuava aoferecer sacrifícios e incenso nos lugaresaltos”. (grifo nosso)

Acaz (736-716):

2 Reis 16,2-4: “Acaz tinha vinte anos quandocomeçou a reinar e reinou dezesseis anos emJerusalém. Não fez o que é agradável aos olhosde Iahweh, seu Deus, como havia feito Davi, seuantepassado. Imitou a conduta dos reis de Israel, echegou a fazer passar seu filho pelo fogo,segundo os costumes abomináveis das nações queIahweh havia expulsado de diante dos israelitas.

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Ofereceu sacrifícios e incensos nos lugaresaltos, nas colinas e debaixo de toda árvoreverdejante”. (grifo nosso)

e) Fim do reino de Judá

Ezequias (716-687):

2 Reis 18,3-6: “Fez o que agrada aos olhos deIahweh, imitando tudo o que fizera Davi, seuantepassado. Foi ele que aboliu os lugaresaltos, quebrou as estelas, cortou o postesagrado e reduziu a pedaços a serpente debronze que Moisés havia feito, pois os israelitasaté então ofereciam-lhe incenso: chamavam-naNoestã”. (grifo nosso)

Manassés (687-642):

2 Reis 21,2-9: “Ele fez o mal aos olhos deIahweh, imitando as abominações das nações queIahweh havia expulsado de diante dos israelitas.Reconstruiu os lugares altos que Ezequias,seu pai, havia destruído, ergueu altares aBaal, fabricou um poste sagrado, como haviafeito Acab, rei de Israel, e prostrou-se diantede todo o exército do céu e lhe prestou culto.Construiu altares no Templo de Iahweh, do qualIahweh dissera: ‘É em Jerusalém que colocarei meuNome’. Edificou altares para todo o exército do céunos dois pátios do Tempo de Iahweh. Fez passarseu filho pelo fogo. Praticou encantamentos eadivinhação, estabeleceu necromantes e adivinhose multiplicou as ações que Iahweh considera más,

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provocando assim sua ira. Colocou o ídolo deAserá, que mandara esculpir, no Templo, doqual Iahweh dissera a Davi e a seu filho Salomão:‘Neste Templo em Jerusalém, cidade que escolhientre todas as tribos de Israel, colocarei meu Nomepara sempre’”. (grifo nosso)

Amon (642-640):

2 Reis 21,20-22: “Fez o mal aos olhos deIahweh, como havia feito seu pai Manassés.Seguiu em tudo a conduta de seu pai, prestouculto aos ídolos que ele havia servido eprostrou-se diante deles. Abandonou Iahweh,Deus de seus pais, e não seguiu o caminho deIahweh”. (grifo nosso)

Josias (640-609):

2 Reis 22,2: “Fez o que é agradável aos olhosde Iahweh e imitou em tudo a conduta do seuantepassado Davi, sem se desviar para a direitanem para esquerda”. (grifo nosso)

Josias fez uma reforma total; vejamos:

Reforma religiosa em Judá: 2 Reis 23,4-14: “Orei ordenou a Helcias, o sumo sacerdote, aossacerdotes que ocupavam o segundo lugar e aosguardas das portas que retirassem do santuário deIahweh todos os objetos de culto que tinham sidofeitos para Baal, para Aserá e para todo o exércitodo céu; queimou-os fora de Jerusalém, nos camposdo Cedron e levou suas cinzas para Betel. Destituiu

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os falsos sacerdotes que os reis de Judá haviamestabelecido e que ofereciam sacrifícios noslugares altos, nas cidades de Judá e nos arredoresde Jerusalém, e os que ofereciam sacrifícios a Baal,ao sol, à lua, às constelações e a todo o exército docéu. Transportou do Templo de Iahweh para fora deJerusalém para o vale do Cedron, o poste sagrado equeimou-o no vale do Cedron; reduziu-o a Cinzas elançou suas cinzas na vala comum. Demoliu ascasas dos prostitutos sagrados, que estavam noTemplo de Iahweh, onde as mulheres teciam véuspara Aserá. Mandou vir das cidades de Judá todosos sacerdotes e profanou os lugares altos ondeesses sacerdotes haviam oferecido sacrifíciosdesde Gaba até Bersabeia. Demoliu os lugaresaltos das portas, que se achavam à entrada daporta de Josué, governador da cidade, à esquerdade quem entra na porta da cidade. Mas ossacerdotes dos lugares altos não podiam subir aoaltar de Iahweh em Jerusalém; comiam, porém,pães sem fermento no meio de seus irmãos. O reiprofanou o Tofet do vale de bem-Enom, para queninguém mais pudesse passar pelo fogo seu filhoou sua filha em honra de Moloc. Fez desapareceros cavalos que os reis de Judá tinham dedicado aosol na entrada do Templo de Iahweh, perto doaposento do eunuco Natã-Melec, nasdependências, e queimou os carros do sol. Osaltares que estavam no terraço do quarto superiorde Acaz, e edificados pelos reis de Judá, e os queManassés tinha construído nos dois pátios doTemplo de Iahweh, o rei os demoliu, quebrou-os láe lançou suas cinzas no vale do Cedron. O reiprofanou os lugares altos situados diante de

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Jerusalém, ao sul do monte das Oliveiras e queSalomão, rei de Israel, tinha construído paraAstarte, abominação dos sidônios, e para Camosabominação dos moabitas, e para Melcom,abominação dos amonitas. Quebrou as estelas,cortou os postes sagrados e encheu de ossoshumanos o seu local”.

A reforma se estende ao antigo reino donorte: 2 Reis 23,15-20: “Demoliu também o altarque estava em Betel, o lugar alto edificado porJeroboão, filho de Nabat, que havia arrastado Israelao pecado; demoliu também esse altar e esse lugaralto, queimou o lugar alto e o reduziu a pó;queimou o poste sagrado. Josias voltou-se e viu ostúmulos que estavam na montanha; mandoubuscar os ossos daqueles túmulos e queimou-ossobre o altar. Profanou-o assim, cumprindo apalavra de Iahweh que havia anunciado o homemde Deus que havia anunciado essas coisas,perguntou: ‘Que sepulcro é esse que estou vendo?’Os homens da cidade responderam: ‘É o túmulo dohomem de Deus que veio de Judá e anunciou essascoisas que acabas de realizar contra o altar deBetel’ – Disse o rei: ‘Deixai-o em paz e queninguém toque em seus ossos’. Deixaram, pois,seus ossos intactos, bem como os do profeta quetinha vindo da Samaria de Betel. Josias fezdesaparecer também todos os templos dos lugaresaltos que estavam nas cidades da Samaria, e queos reis de Israel haviam construído, irritando comisso a Iahweh, e procedeu com eles exatamentecomo tinha agido em Betel. Todos os sacerdotesdos lugares altos que ali se achavam foram por eleimolados sobre os altares e queimou sobre esses

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altares ossos humanos. Depois regressou aJerusalém”.

Conclusão da reforma. 2 Reis 23,24-27: “Josiaseliminou também os necromantes, os adivinhos, osdeuses domésticos, os ídolos e todas asabominações que se viam na terra de Judá e emJerusalém, a fim de executar as palavras da Leiinscritas no livro que o sacerdote Helcias haviaencontrado no Templo de Iahweh. Não houve antesdele rei algum que se tivesse voltado, como ele,para Iahweh, de todo o seu coração, de toda a suaalma e com toda a sua força, em toda a fidelidadeà Lei de Moisés; nem depois dele houve algum selhe pudesse comprar”.

Se foi nesse tempo que encontraram o livro da Lei,

é sinal que antes não o tinham; portanto, não havia como

segui-lo; daí, talvez, justifica-se o motivo pelo qual tantos

reis praticaram rituais pagãos.

Joacaz (609):

2 Reis 23,32: “Ele fez o mal aos olhos deIahweh, como o haviam feito seus pais”. (grifonosso)

Joacaz governou só por três meses e mesmo depois

da grande reforma realizada por Josias, ainda assim,

voltaram-se aos cultos pagãos, o que demonstra como

arraigadas estavam tais práticas.

Joaquim (609-597):

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2 Reis 23,37: “Ele fez o mal aos olhos deIahweh, como haviam feito seus pais”. (grifonosso)

Jeconias (598):

2 Reis 24,9: “Ele fez o mal aos olhos deIahweh, como o havia feito seu pai”. (grifo nosso)

Sedecias (598-587) (586):

2 Reis 24,19: “Ele fez o mal aos olhos deIahweh, como o havia feito Joaquim”. (grifo nosso)

A partir daqui os hebreus tiveram o seu Templo

incendiado e, além disso, foram levados cativos para a

Babilônia, sob o governo de Nabucodonosor. Lá

permaneceram exilados de 586 a 539 a.C. Será oportuno

explicar:

O Cativeiro da Babilônia acabou em 539 a.C.,quando Ciro, imperador persa conquistou aBabilônia libertou os judeus, que retornaram aPalestina e reconstruíram o templo deJerusalém, que havia sido destruído porNabucodonosor. Em 332 a.C. os persas foramderrotados por Alexandre, o Grande, e osmacedônios e gregos passaram a dominar aPalestina, seguido pelo domínio romano, a partirde 63 a.C. Após a contenção da revolta judaicainiciada em meados da década de 60 d.C., e adestruição de Jerusalém em 70 d.C., os judeusse dispersaram pelo mundo – foi o início da

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Diáspora Judaica. (216)

Voltando ao ponto da divisão, vejamos o que

Ambrogio Donini, em Breve História das religiões, nos

informa:

Os dois reinos nos quais se dividiramimediatamente depois as tribos hebraicas, o deIsrael no norte, tendo Samaria como centro, e ode Judá no sul, tendo Jerusalém como capital,tiveram vida efêmera. Com a deportação demilhares de famílias para a Babilônia, no ano586 a.C., a história dos hebreus, comoEstado nacional independente, praticamentetermina: à opressão social característica daépoca da escravidão, contra a qual já tinhamreagido os primeiros “profetas” (Amos,Jeremias, o primeiro Isaías, etc.), acrescenta-sea dominação estrangeira nas suas formas maisbrutais.

Além das massas reduzidas à escravidãopelos invasores, dezenas de milhares dehebreus emigraram mais ou menosvoluntariamente e estabeleceram-se em quasetodos os centros habitados do mundo oriental,na bacia do Mediterrâneo e até na Índia e naChina. (217) Fruto da derrocada da liberdade,surgiu e foi elaborada a ideia de um “salvador”,

216 Link: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hebreus.

217 N.T.: Segundo alguns cálculos recolhidos por Baron, em sua história social ereligiosa de Israel, nos limites do Império Romano, no século I d.C., sobreuma população de 60-70 milhões de habitantes, pouco menos de 7 milhõeseram hebreus, dos quais mais de 6 milhões fora da Palestina.

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político e social, que só podia ser concebidocom o aspecto de um novo “rei” (o messias),comandante de exércitos e libertador nacional.

Esta concepção, que sofreu uma evoluçãocujas fases são de fácil reconstrução,identificou-se com a reforma monoteísta,contribuindo para dar à religião dos hebreusaquele aspecto típico que séculos e séculos dehistória não conseguiram apagar. (218) (grifonosso)

Encontramos informações, na Bíblia de Jerusalém,

de que o “Segundo Isaías” foi profeta anônimo e

continuador de Isaías, pregou em Babilônia, entre as

primeiras vitórias de Ciro, em 550 a.C., e o édito

libertador de 538 a.C. (219)

Ao que nos parece, foi nesse período que a

pregação de um Deus único foi implementada de forma

mais evidente.

Isaías 44,6-8: “Assim diz Iahweh, o rei de Israel,Iahweh dos Exércitos, o seu redentor: Eu sou oprimeiro e o último, fora de mim não há Deus.Quem é como eu? Que clame, que anuncie, que odeclare na minha presença; desde que estabelecium povo eterno, diga ele o que se passa, e anuncieo que deve acontecer. Não vos apavoreis, nãotemais; não vo-lo dei a conhecer há muito tempo e

218 DONINI, 1965, p. 159;219 Bíblia de Jerusalém, p. 1238.

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não o anunciei? Vós sois minhas testemunhas.Porventura existe um Deus fora de mim? Nãoexiste outra Rocha: eu não conheço nenhuma!”.(grifo nosso)

Isaías 44,24: “Assim diz Iahweh, o teu redentor,aquele que te modelou desde o ventre materno:eu, Iahweh, é que tudo fiz, e sozinho estendi oscéus e firmei a terra (com efeito, quem estavacomigo?)”. (grifo nosso)

Isaís 45,5-6: “Eu sou Iahweh, e não há nenhumoutro, fora de mim não há Deus. Embora não meconheças, eu te cinjo, a fim de que saiba desde onascente do sol até o poente que, fora de mim,não há ninguém: eu sou Iahweh e não hánenhum outro!”. (grifo nosso)

Isaías 45,18: “Com efeito, assim diz Iahweh, ocriador dos céus, - ele é Deus, o que modelou aterra e a fez, ele a estabeleceu; não a criou comodeserto, antes modelou-a para ser habitada. Eu souIahweh; não há nenhum outro”. (grifo nosso)

Isaías 45,21: “Anunciai, trazei vossas provas, - sim,tomem conselho entre si! Quem proclamou istodesde os tempos antigos? Quem o anunciou destehá muito tempo? Não fui eu, Iahweh? Não háoutro Deus fora de mim, Deus justo e salvadornão existe, a não ser eu”. (grifo nosso)

Isaías 46,3-9: “Ouvi-me, vós, da casa de Jacó, tudoo que resta da casa de Israel, vós, a quemcarreguei desde o seio materno, a quem leveidesde o berço. Até a vossa velhice continuo omesmo, até vos cobrirdes de cãs continuo a

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carregar-vos: eu vos criei e eu vos conduzirei, euvos carregarei e vos salvarei. A quem haveis deassemelhar-me? Quem igualareis a mim? A quemhaveis de comparar-me, como se fôssemossemelhantes? Há os que tiram ouro da bolsa epesam prata na balança, contratam umourives para lhes fazer um deus, prostram-sediante dele e o adoram. Em seguida, põem-nosobre os ombros e carregam-no, colocam-no noseu lugar para que aí fique, sem afastar-se da suaposição. Por mais que alguém o chame, nãoresponde, da sua tribulação não salva. Lembrai-vosdisto e sede homens; caí em vós mesmos, vós,infiéis. Lembrai-vos das coisas passadas há muitotempo, porque eu sou Deus e não há outro!”.(grifo nosso)

A referência aos que faziam deuses com ouro e

prata, em se referindo às casas de Jacó e de Israel, leva-

nos a concluir, que, ainda no exílio na Babilônia,

continuaram adorando outros deuses. É bom ter em

mente que “Os babilônios e os assírios, que sucederam

aos sumérios, adotaram a maioria dos deuses e das suas

práticas religiosas. […].” (220); portanto, campo fértil para

se prostituírem com outros deuses.

Samoel Noah Kramer (1897-1990) vai ainda mais

longe:

Da mesma forma, um opulento conjunto de

220 KRAMER, 1983, p. 105.

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rituais e de mitos mesopotâmicos, instituídos porum notável grupo de teólogos que viveram3.000 anos antes do nascimento de Cristo,influenciou profundamente as religiõesocidentais, sobretudo o judaísmo e ocristianismo. A ideia mesopotâmica de que daágua nasceram todas as coisas, porexemplo, infiltrou-se na narrativa do Gênesissobre a criação do mundo, e a noção bíblicade que o homem foi feito de barro e recebeuo “sopro de vida” brotou de raízesmesopotâmicas. Assim também o conceitobíblico de que o homem foi criadoprimordialmente para servir a Deus e o deque o poder criador da divindade está noSeu Verbo. A ideia de que as catástrofes sãocastigos celestes por más ações, como a de quea dor e a adversidade devem ser suportadascom paciência, também encontram analogia naMesopotâmia. Até mesmo a região dosmortos, imaginada pelos mesopotâmios, asua escura e lúgubre “terra de onde não sevolta”, tem a sua contrapartida no Sheol doshebreus e no Hades dos gregos.

Até na atualidade a liturgia judaica estárepleta de contribuições babilônicas. O KolNidre, o canto judaico recitado nas vésperas doDia da Inspiração, em penitência pela quebrados votos, é semelhante às preces quefiguravam nas cerimônias mesopotâmicas doAno Novo. O mesmo quanto à solene descriçãodo destino humano que é declamada no próprioDia da Inspiração. Durante o seu exílio emBabilônia os hebreus também adquiriram a

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crença nos demônios e sua exorcização, oque, sem dúvida, explica diversas passagensdo Novo Testamento concernentes àexpulsão dos espíritos malignos.

Desde os dias do cativeiro em Babilônia, edaí em diante, o judaísmo apresenta umenxame de místicos religiosos com visõesapocalípticas sobre o futuro do homem. Pormeio desses visionários, diz o eminenteorientalista W. F. Albright, “elementosinumeráveis da fantasia pagã e até mitosinteiros entraram na literatura do judaísmo e docristianismo”. Por exemplo, o rito do batismo– diz ele – remonta às religiões daMesopotâmia, como também muitos doselementos na história da vida de Cristo.Entre estes o Dr. Albright inclui a suaconcepção por uma virgem, o seunascimento relacionado com os astros, e ostemas da prisão, da morte, descida aosinfernos, o desaparecimento por três dias eposterior ascensão aos céus.

A religião mesopotâmica era, sem dúvida,pagã e politeísta, e portanto um profundoabismo espiritual a separa do monoteísmojudaico e cristão. Além disso, tanto o Velhocomo o Novo Testamento se impregnam de umasensibilidade ética e de um fervor moral que nãoencontram correspondência nos textosmesopotâmicos. Nem a Suméria, nemBabilônia, nem a Assíria jamais chegaram àelevada crença de que o “coração puro” e “mãoslimpas” tinham mais valor espiritual do quesacrifícios e rituais esmerados. O vínculo de

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amor entre Deus e o homem, embora não detodo alheio ao pensamento religioso daMesopotâmia, decerto é nele de significaçãomuito menor do que no judaísmo e nocristianismo. Todavia, os primitivosmesopotâmios cultivaram o conceito de umdeus pessoal e familiar que teve o seu econa Bíblia com o “deus de Abraão, Isaac eJacó” - e entre essa divindade protetora e oseu devoto adorador há uma relação íntima,de ternura e confiança, em alguns aspectos,comparável, com a que existiu entre Jeová eos patriarcas.

A literatura da Mesopotâmia, assim como asua religião e o seu direito, contaminaramtambém todo o mundo ocidental. Temas quefiguram nos capítulos iniciais do Gênesis – aCriação, o Paraíso, o Dilúvio, a rivalidade deCaim e Abel, e a Torre de Babel – todos têmantecedentes literários na Mesopotâmia. NoLivro dos Salmos, muitos dentre eles lembramhinos do culto mesopotâmico, e o Livro dasLamentações copia um dos motes literáriosmais cultivados pelos escritores mesopotâmicos– na Suméria era comum se comporemlamentações formais sobre a destruição de umacidade. Nas coleções sumerianas de brocardos,máximas e adágios, há também antecedentesestilísticos para o Livro dos Provérbios. Mesmoao Cântico dos Cânticos, de Salomão, o livrodiferente de quaisquer outros do VelhoTestamento pode ser atribuído um precedenteda Mesopotâmia, com os cantos de amor doculto sumeriano.

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A literatura grega mostra igualmenteinumeráveis indícios da influênciamesopotâmica. A história mesopotâmica dodilúvio, por exemplo, corresponde namitologia grega à história de Deucalião, queconstrói um barco e nele sobrevive a umainundação que destrói o resto dahumanidade. O tema do combate ao dragãonos mitos mesopotâmicos encontra equivalênciaem algumas ficções, como as de Jasão eHéracles, os quais mataram diversos monstros.Pragas lançadas como punição pelos deusestambém figuram na mitologia da Grécia e na daMesopotâmia. E há acentuada semelhançaentre o inferno grego e o mesopotâmico,sendo ambos lugares tenebrosos, separadosdo reino dos vivos por um rio sinistro que osmortos atravessavam de barca. Da mesmaforma, a nênia grega, ou elegia para o morto,parece ter o seu prenúncio em duascomposições sumerianas, recentementetraduzidas de uma inscrição no Museu Pushkin,de Moscou; nelas, um poeta mesopotâmicopranteia em linguagem hiperbólica a morte dopai e da esposa. Até a forma da epopeia grega,que conduziu à criação da Ilíada e da Odisseia,tem analogia com o estilo dos poemas épicos daMesopotâmia. (221) (grifo nosso)

Confirma-se que a influência mesopotâmica sobre a

cultura religiosa dos hebreus é um fato incontestável,

tendo em vista os vários relatos bíblicos que têm nítida

221 KRAMER, 1983, p. 168-170.

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origem nas crenças dos que viviam naquela região;

somente por fanatismo cego é que não se vê isso.

Antes de irmos para o período seguinte, vamos ver

algo que na própria Bíblia corrobora a apostasia de quase

todos os reis dos hebreus, salvando-se apenas três deles:

“Exceto Davi, Ezequias e Josias, todos os reis

cometeram pecados. Os reis de Judá desapareceram

porque abandonaram a Lei do Altíssimo”. (Eclesiástico

49,4). Apenas para lembrar: este livro Eclesiástico só faz

parte do cânon católico.

f) A restauração durante o período persa

Este era o quadro da época:

No ano de 538 a.C., quando os judeusvoltaram do exílio da Babilônia, a situação deJudá e Jerusalém era deplorável: cada umprocurando se defender sozinho, sem nenhuminteresse em formar a unidade que lhes desse acaracterística de povo. Mesmo aqueles quevoltaram do exílio estavam preocupados emconstruir a própria casa, plantar a sua roça,vender as suas mercadorias, mais do querestabelecer a dignidade nacional. […]. (222)

Destaca-se, nesse período, o profeta Ageu, que

incentivava o povo a reconstruir o templo de Jerusalém,

222 Bíblia Sagrada Pastoral, p. 1213.

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seguindo uma revelação que teve sobre isso.

Com Ageu começa o último período profético,o posterior ao Exílio. A mudança éimpressionante. Antes do Exílio, a palavra deordem dos profetas fora Castigo. Durante oExílio, passou a ser Consolação. Agora éRestauração. Ageu chega num momentodecisivo para a formação do judaísmo: onascimento da nova comunidade da Palestina.Suas breves exortações datam exatamente dofinal de agosto a meados de dezembro do anode 520. Os primeiros judeus que regressaramda Babilônia para reconstruir o Templo logoperderam a coragem. Mas os profetas Ageu eZacarias reavivaram as energias e induziram ogovernador Zorobabel e o sumo sacerdoteJosué a recomeçarem os trabalhos no Templo, oque foi feito em setembro de 520 (1,15/ cf. Esd5,1). (223) (grifo nosso)

Nesse período vemos que os hebreus, apesar de

estarem fiéis a Iahweh, não deixaram de absorver a

cultura persa.

Hendrik Willem Van Loon (1882-1944), em A

História da Bíblia, informa-nos que:

Sob a influência das doutrinas de Zaratustra,os judeus começaram a crer na existência dum

223 Bíblia de Jerusalém, p. 1250.

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espírito que procurava desfazer a obra deJeová. E a esse adversário deram o nome deSatã. (224)

O que é confirmado por Julio Trebolle Barrera, em A

Bíblia judaica e a Bíblia cristã: introdução à história da

Bíblia:

[…] A invasão de Alexandre Magno e oconseguinte desaparecimento do império persanão supõe uma virada total da situação. Ocentro da cultura não se deslocou de um polo aoutro, do Oriente ao Ocidente, da Pérsia eMesopotâmia à Macedônia e Grécia. Asmudanças surgiram dos então diversos centrosculturais e políticos espalhados de um canto aoutro do mundo helenístico. A incorporação daPalestina ao império persa já supôs suaintegração dentro de uma unidade política ecultural, que incluía amplos territórios gregos naÁsia Menor. Por isto mesmo a conquista deAlexandre não marcou um começo absoluto nasrelações entre as culturas judaica, semítica eirânica por um lado, e a cultura helênica poroutro, mas simplesmente houve umaintensificação das relações já existentes.

A conquista de Alexandre tampouco marcouo fim da irradiação da cultura persa, queseguirá influindo na literatura bíblica eapócrifa, em particular pelo que se refere àvisão dualista do cosmo e da história e ao

224 VAN LOON, 1981, p. 122.

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desenvolvimento da angeologia edemonologia. (225) (grifo nosso)

Realmente, conforme já dissemos, é muito difícil

um povo se isolar culturalmente para não receber

influência de um outro, seja pela proximidade geográfica,

seja por submissão política.

Zacarias 1,1-4: “No oitavo mês, no segundo ano deDario, a palavra de Iahweh foi dirigida ao profetaZacarias (filho de Baraquias), filho de Ado, nestestermos: Iahweh esteve profundamente irritadocontra vossos pais. Tu lhes dirás: Assim disseIahweh dos Exércitos: Retornai a mim – oráculode Iahweh dos Exércitos – e eu retornarei a vós,disse Iahweh dos Exércitos. Não sejais comovossos pais, a quem os antigos profetasanunciaram: Assim disse Iahweh dos Exércitos:Convertei-vos de vossos caminhos perversos e devossas ações perversas. Mas eles não ouviram enão me deram atenção – oráculo de Iahweh”. (grifonosso)

Essas admoestações do profeta Zacarias podem

significar que estavam se desviando dos caminhos de

Iahweh; entretanto, não logramos descobrir em qual

sentido, se estavam ou não adorando a outros deuses,

pois casamento de hebreus com indivíduos de outras

crenças, já era considerado não seguir os caminhos de

225 BARRERA, 1999, p. 44.

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Iahweh.

Zacarias 3,6-7: “Então o anjo de Iahweh fez a Josuéesta declaração: ‘Assim disse Iahweh dos Exércitos:Se andares pelos meus caminhos e guardaresos meus preceitos, então tu governarás a minhacasa e administrarás os meus pátios e eu te dareiacesso entre os que estão aqui de pé’”. (grifonosso)

Valem as mesmas considerações da passagem

anterior.

Esdras 9,1-2: “Feito isso, os chefes vieramprocurar-me, dizendo: ‘O povo de Israel, ossacerdotes e os levitas não se separaram dospovos das terras mergulhados em suasabominações – cananeus, heteus, ferezeus,jebuseus, amonitas, moabitas, egípcios eamorreus! – porque, para si e para seus filhos,tomaram esposas entre as filhas deles: alinhagem santa misturou-se com os povos dasterras: os chefes e os magistrados foram osprimeiros a participar dessa infidelidade!’”. (grifonosso)

Está aí a prova do que acabamos de falar a respeito

do casamento de hebreus com gente de outros povos.

Destacamos nesse período o personagem Esdras,

que liderou, em 457 a.C., o segundo grupo de retorno dos

israelitas do exílio da Babilônia. Ele era um escriba

entendido na lei de Moisés. Ele chega a Jerusalém em 458

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a.C. e, segundo narrativa, “vem munido de um decreto

que lhe dá autoridade para impor à comunidade a Lei de

Moisés, reconhecida pelo rei”. (226) Em vista disso se

conclui que:

[…] Esdras é de fato o pai do judaísmo,com suas três ideias essenciais: a Raça eleita, oTemplo e a Lei. Sua fé ardente e a necessidadede salvaguardar a comunidade renascenteexplicam a intransigência de suas reformas e oparticularismo que ele impôs aos seus. É opatrono dos escribas e sua figura foi semprecrescendo na tradição judaica. […]. (227) (grifonosso)

Na Bíblia Sagrada Pastoral encontramos a seguinte

explicação para as passagens Esdras 9,1-10,17 e

Neemias 7,72b-8,12, respectivamente:

Temos aqui o início do movimento queculminará com a estruturação dacomunidade judaica e, portanto, do que secostuma chamar de judaísmo. Esdras usa omatrimônio como critério para separardefinitivamente a comunidade dos repatriadosda população local. Esta era formada de judeusque não estiveram no exílio e que se misturaramcom elementos de povos vizinhos (samaritanos,moabitas, edomitas e outros). Desse modo, o

226 Bíblia de Jerusalém, p. 548.227 Bíblia de Jerusalém, p. 549.

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conflito latente desde a chegada dos repatriados(cf. 3,3; e,4s) se manifestou de maneirapermanente. Não faltaram vozes de protesto(10,15), mas a maioria dos repatriadosconcordou com Esdras. (228) (grifo nosso)

No primeiro dia do sétimo mês de um anosituado na segunda metade do séc. V a.C.,nasce o fenômeno político-religiosochamado judaísmo. O acontecimento marcanteé o livro da Lei, certamente o núcleo do atualPentateuco. Tal livro é promulgado publicamentecomo a lei que regerá a vida política, social ereligiosa da comunidade. Daí por diante e aténossos dias, o judaísmo foi pouco a pouco setornando a religião do livro, que acabou porsubstituir completamente o Templo e ossacrifícios. (229) (grifo nosso)

Se, por volta do ano 458 a.C., é que o judaísmo

nasceu, então, antes disso, o que temos? “Mosaísmo”

(para manter-se o sufixo “ismo” atribuída às correntes

religiosas)?

g) Época helenística

Uma visão do período:

O macedônio Alexandre Magno formou umgrande império, que foi disputado e dividido

228 Bíblia Sagrada Pastoral, p. 508.229 Bíblia Sagrada Pastoral, p. 518.

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entre seus oficiais após sua morte prematura. APalestina ficou disputada entre Ptolomeu, rei doEgito, e Selêuco, rei da Síria. Após certo tempode relativa tranquilidade, os judeus se veempressionados pelos selêucidas, sucessores deSelêuco, especialmente por Antíoco IVEpífanes, que assumiu o poder em 175 a.C.

Para assegurar seu domínio Antíoco IVimpunha costumes gregos aos povosdominados. Entre os judeus, um grupo lideradopelo sumo sacerdote Jasão (“geração deímpios”), tornou-se favorável às medidas deAntíoco e facilitou a entrada de usosestrangeiros até em Jerusalém.

Toda a dominação político-econômicalança mão da dominação cultural, paraveicular sua ideologia, descaracterizando aidentidade nacional. Para isso conta semprecom grupos nativos que se tornam porta-vozesdo dominador, em troca de privilégios.

Antíoco IV conquista o Egito para formar umgrande império junto com a Síria. Situada ameio caminho, de Jerusalém era importanteponto estratégico. Por isso, Antíoco a toma e atransforma em fortaleza.

É grande ingenuidade pensar que odominador possa ir contra seus própriosinteresses, para beneficiar os dominados. Maisuma vez se justifica a crítica que os profetasfaziam contra as alianças com os grandes.

Para assegurar a unidade do império, AntíocoIV ameaça a identidade de cada povo. Suasmedidas compreendem a imposição de leis,

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costumes e religião gregos. A resistência dosjudeus provoca medidas drásticas: ou aceitar odecreto, ou morrer. A Abominação da Desolação(v. 54) é o altar dedicado ao deus grego Júpiter,construído dentro do Templo de Jerusalém (cf.Nota em Dn 9,1-27) (230) (grifo nosso)

Essas notas constam do primeiro livro de Macabeus

(1 Macabeus 1,1-64) na Bíblia citada.

Temos alguns registros no período, embora não

possamos estendê-los para abranger a todo ele.

1 Macabeus 1,11-15: “Por esses dias apareceu emIsrael uma geração de perversos, que seduziram amuitos com estas palavras: ‘Vamos, façamosaliança com as nações circunvizinhas, pois muitosmales caíram sobre nós desde que delas nosseparamos’. Agradou-lhes tal modo de falar. Ealguns dentre o povo apressaram-se em ir tercom o rei, o qual lhes deu autorização paraobservarem os costumes pagãos. Construíram,então, em Jerusalém, uma praça de esportes,segundo os costumes das nações, restabeleceramseus prepúcios e renegaram a aliança sagrada.Assim associaram-se aos pagãos e sevenderam para fazer o mal”. (grifo nosso)

Uma debandada para o lado dos pagãos, cujos ritos

passaram a praticar. Ao que parece, isso aconteceu antes

até de Antíoco impor o costume grego a todos os povos

230 Bíblia Sagrada Pastoral, p. 576-577.

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conquistados.

1 Macabeus 1,41-53: “O rei prescreveu, emseguida, a todo o seu reino, que todos formassemum só povo, renunciando cada qual a seuscostumes particulares. E todos os pagãosconformaram-se ao decreto do rei. Tambémmuitos de Israel comprazeram-se no cultodele, sacrificando aos ídolos e profanando osábado. Além disso, o rei enviou, por emissários, aJerusalém e às cidades de Judá, ordens escritaspara que todos adotassem os costumesestranhos a seu país e impedissem osholocaustos, o sacrifício e as libações noSantuário, profanassem sábados e festas,contaminassem o Santuário e tudo o que ésanto, construíssem altares, recintos eoratórios para os ídolos e imolassem porcos eanimais impuros. Que deixassem, também,incircuncisos seus filhos e se tornassemabomináveis por toda sorte de impurezas eprofanações, de tal modo que olvidassem a Lei esubvertessem todas as observâncias. Quanto aquem não agisse conforme a ordem do rei,esse incorreria em pena de morte. Nessestermos, ele escreveu a todo o seu reino, nomeouinspetores para todo o povo e ordenou às cidadesde Judá que oferecessem sacrifícios em cadacidade. Muitos dentre o povo aderiram a eles,todos os que eram desertores da Lei. E praticaramo mal no país, reduzindo Israel a ter de se ocultaronde quer que encontrasse refúgio”. (grifo nosso)

Explicam-nos esse passo:

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Visando à unidade de seu império AntíocoEpífanes impôs aos judeus práticas pagãs,abolindo assim a concordata que em 198Antíoco III lhes havia concedido, ao reconhecer-lhes a lei de Moisés como o seu estatuto legal(como o haviam feito os reis da Pérsia após oExílio). A fidelidade à Lei tornava-se, depoisdessa revogação, ato de rebeldia política, quemotivaria a perseguição. A liberdade religiosaestá restabelecida pelo rescrito de Antíoco V(6,57-61; 2Mc 11,22-26). (231)

Se antes alguns o fizeram espontaneamente, agora

se impõe a todos o costume dos gregos. A pena de morte

aos infratores, certamente, fez ir para o lado dos pagãos

quase todos os hebreus; a resistência coube a poucos,

que, inicialmente, foram liderados por Judas Macabeu

(166-160 a.C.), sendo seu sucessor Jônatas (160-143

a.C.), que, por sua vez, foi sucedido por Simão (143-134

a.C.).

Apenas para dar uma sequência histórica,

transcrevemos do graduado em História Rainer Souza, da

Equipe Brasil Escola, o seguinte:

No século I a.C., os romanos conquistaramos judeus depois de subjugar os territóriosanteriormente controlados pelos macedônicos. Adominação romana contou com grande agitação

231 Bíblia de Jerusalém, p. 721.

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política entre os grupos judeus que não seconformavam com a falta de autonomia políticade seu povo. Os intensos conflitos resultaram naviolenta destruição da cidade de Jerusalém noano de 70 d.C. Depois de destruírem a capitaljudaica, o povo judeu foi proibido de retornar àPalestina. (232)

Eis o trágico fim dos hebreus, agora vistos como

judeus, que até nos dias de hoje não conseguiram mais

se restabelecerem como uma nação, separados como se

encontram pelo mundo afora. O Estado de Israel existe

desde maio de 1948, poderá, futuramente, juntá-los, caso

os povos da região da Palestina deixem de lado suas

divergências religiosas.

232 Link: http://www.brasilescola.com/historiag/hebreus3.htm.

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Ou crê ou morre!

Não podemos deixar de destacar que, ao longo da

história religiosa dos hebreus, a atitude da divindade, a

qual seguiam, para com eles era na base de um autêntico

terrorismo religioso, tipo “ou crê ou morre!”, uma

verdadeira tática de “guerra”; foram inúmeras vezes

ameaçados, caso buscassem outros deuses. Muitas

dessas ameaças se concretizaram, pois se tornaram uma

realidade, as quais só podemos classificar como

autênticas barbaridades praticadas contra eles.

Aliás, elas, em si, já provam que pacificamente eles

não seguiam a Iahweh como sua divindade. Vamos

demonstrar isso, para que se veja que os hebreus sempre

estiveram debaixo de pressão para ter Iahweh como seu

único Deus; infelizmente, ao que nos parece, não tiveram

a oportunidade de exercerem o seu livre-arbítrio, algo

fundamental para o progresso espiritual de cada um de

nós.

Antes de listar as passagens, destacaremos duas

delas, por serem mais importantes, onde veremos Moisés,

suposto representante de Iahweh, já aplicando a lei

máxima, a dar exemplo aos hebreus de que a sua

divindade não estava mesmo para brincadeiras, caso

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desrespeitassem suas leis.

Êxodo 32,25-28: “Moisés viu que o povo estavadesenfreado, porque Aarão os havia abandonado àvergonha no meio dos seus inimigos. Moisés ficoude pé no meio do acampamento e exclamou:'Quem for de Iahweh venha até mim'. Todos osfilhos de Levi reuniram-se em torno dele. Ele lhesdisse: 'Assim fala Iahweh, o Deus de Israel: Cingi,cada um de vós, a espada sobre o lado, passai etornai a passar pelo acampamento, de porta emporta, e matai, cada qual, a seu irmão, a seuamigo, a seu parente. Os filhos de Lei fizeramsegundo a palavra de Moisés, e naquele diamorreram do povo uns três mil homens”. (grifonosso)

Além de terem sido obrigados a tomar água com

ouro em pó, outra consequência da adoração do bezerro

de ouro, registrada nessa passagem, foi a morte de uns

três mil homens. O curioso é que Moisés mal acabara de

descer do Sinai e, certamente, ainda tinha debaixo dos

braços as tábuas de pedra com os Dez Mandamentos,

entre os quais havia o “Não matarás” (Êxodo 20,13),

manda, a pedido de Iahweh, matar seus compatriotas. O

fato é que ele já queria se impor, logo de início.

Números 15,32-36: “Enquanto os israelitasestavam no deserto, um homem foisurpreendido apanhando lenha no dia desábado. Aqueles que o surpreenderam recolhendo

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lenha trouxeram-no a Moisés, a Arão e a toda acomunidade. Puseram-no sob guarda, pois nãoestava ainda determinado o que se devia fazercom ele. Iahweh disse a Moisés: 'Tal homemdeve ser morto. Toda a comunidade o apedrejaráfora do acampamento'. Toda a comunidade o levoupara fora do acampamento e o apedrejou até quemorreu, como Iahweh ordenara a Moisés”. (grifonosso)

Meu Deus!!!… como um ato tão banal desse –

apanhar lenha –, poderia ter como resultado a pena de

morte ao pobre homem que o praticava? Somente por

que ele “violara” o “santificar o dia de sábado” (Ex 20,8),

cujo motivo de sua instituição sequer é bem definido? É

só ler as passagens abaixo:

Êxodo 20,11: “Porque em seis dias Iahweh fez océu, a terra, o mar e tudo o que eles contêm, masrepousou no sétimo dia; por isso Iahwehabençoou o dia de sábado e o consagrou”. (grifonosso)

Deuteronômio 5,15: “Recorda que foste escravo doEgito, e que Iahweh teu Deus te fez sair de lácom mão forte e braço estendido. É por isso queIahweh teu Deus te ordenou guardar o dia desábado”. (grifo nosso)

Enfim, deve-se guardar o sábado porque a

divindade descansou no sétimo dia da criação ou para

que os hebreus recordassem o dia em que eles foram

libertados da escravidão no Egito?

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O apedrejamento até a morte nada mais foi que a

aplicação da tática terrorista que visava impor aos

hebreus a ideia do deus único: Iahweh.

Ocorreu-nos uma dúvida: será que apedrejavam os

infratores no sábado, considerado que era proibido fazer

qualquer coisa nesse dia? Mas se o fizessem para

obedecer à Iahweh, também o desobedeceriam na

questão de não se fazer nada aos sábados, ou seja, uma

determinação estaria em conflito com a outra.

Agora sim, veremos as outras passagens nas quais

essa tática terrorista de Iahweh é, sobejamente,

incontestável:

Êxodo 20,3-6: “Não terás outros deuses diante demim. Não farás para ti imagem esculpida de nadaque se assemelhe ao que existe lá em cima noscéus, ou embaixo na terra, ou nas águas que estãodebaixo da terra. Não te prostrarás diante dessesdeuses e não os sirvais, porque eu, Iahweh teudeus sou um Deus ciumento, que puno ainiquidade dos pais sobre os filhos até aterceira e quarta geração dos que meodeiam, mas que também ajo com amor até amilésima geração para com aqueles que me amame guardam os meus mandamentos”. (grifo nosso)

Números 14,26-35: “Iahweh falou a Moisés e aAarão. Disse-lhe: ‘Até quando esta comunidadeperversa há de murmurar contra mim? Ouvi asqueixas que os israelitas murmuram contra mim.

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Dize-lhes: Por minha vida – oráculo de Iahweh – euvos tratarei segundo as próprias palavras quepronunciastes aos meus ouvidos. Os vossoscadáveres cairão neste deserto, todos vós osrecenseados, todos vós os enumerados desde aidade de vinte anos para cima, vos que tendesmurmurado contra mim. […] Quanto a vós, osvossos cadáveres cairão neste deserto, evossos filhos andarão errantes neste desertopor quarenta anos, carregando o peso davossa infidelidade, até que os vossos cadáveresse consumam no deserto. Explorastes a terradurante quarenta dias. A cada dia corresponde umano: por quarenta anos levareis o peso de vossasfaltas e sabereis o que é de fato de me abandonar.Eu falei, eu mesmo, Iahweh; é assim que tratareitoda esta comunidade perversa amotinada contramim. Neste mesmo deserto não restará um deles eé ali que morrerão’”. (grifo nosso)

Números 17,11-14: “Em seguida Moisés disse aAarão: ‘Toma o incensório, põe nele fogo do altar eem cima o incenso, e vai depressa à comunidade, afim de fazer o rito da expiação por ela. Eis que aira já saiu de diante de Iahweh: já começou apraga. Aarão o tomou, conforme ordenou Moisés, ecorreu para o meio da assembleia; mas a Praga jáhavia começado entre o povo. Colocou o incenso efez o rito de expiação pelo povo. E, permaneceuentre os mortos e vivos; e cessou a Praga. Foramcatorze mil e setecentas as vítimas da Praga,sem contar aqueles que foram mortos por causa deCoré”. (grifo nosso)

Números 21,4-6: “[…] No caminho o povo perdeu a

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paciência. Falou contra Deus e contra Moisés: ‘Porque nos fizestes subir do Egito para morrer nestedeserto? Pois não há nem pão, nem água; estamosenfastiados desse alimento de penúria’. EntãoIahweh enviou contra o povo serpentesabrasadoras, cuja mordedura fez perecermuita gente em Israel”. (grifo nosso)

Números 25,4-5.9: “Iahweh disse a Moisés: ‘Tomatodos os chefes do povo. Empala-os em face do sol,para Iahweh: então a ira ardente de Iahweh seafastará de Israel’. Moisés disse aos juízes deIsrael: ‘Mate cada um aquele dos seus homens quese ligaram a Baal de Fegor’. E morreram dentreeles vinte e quatro mil, devido à praga”. (grifonosso)

Deuteronômio 4,3-4: “Vossos olhos foramtestemunhas do que Iahweh fez em Baal-Fegor:Iahweh teu Deus exterminou do teu meiotodos os que seguiram o Baal de Fegor;quanto a vós, porém, permanecestes apegados aIahweh vosso Deus, e hoje estais vivos”. (grifonosso)

Deuteronômio 4,23-28: “Ficai atentos a vósmesmos, para não vos esquecerdes da Aliança queIahweh vosso Deus concluiu convosco, e nãofazerdes uma imagem esculpida de qualquer coisaque Iahweh teu Deus te proibiu, pois teu DeusIahweh é fogo devorador. Ele é um Deusciumento. Quando tiverdes gerado filhos e netos,e fordes velhos na terra, e vos corromperdes,fazendo uma imagem esculpida qualquer,praticando o que é mau aos olhos de Iahweh teu

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Deus, de modo a irritá-lo, eu tomo hoje o céu e aterra como testemunhas contra vós: sereisdepressa e completamente exterminados daface da terra da qual ides tomar posse aoatravessardes o Jordão. Não prolongareis vossosdias sobre ela, pois sereis completamenteaniquilados. Iahweh vos dispersará entre ospovos e restará de vós apenas um pequenonúmero, no meio das nações para onde Iahweh vostiver conduzido. Lá servireis a deuses feitos pormãos humanas, de madeira e de pedra, que nãopodem ver ou ouvir, comer ou cheirar”. (grifonosso)

Deuteronômio 6,13-15: “É a Iahweh teu Deus quetemerás. A ele servirás e pelo seu nome jurarás.Não seguireis outros deuses, qualquer um dosdeuses dos povos que estão ao vosso redor, poisIahweh teu Deus é um Deus ciumento, quehabita em teu meio. A cólera de Iahweh teuDeus se inflamaria contra ti, e ele teexterminaria da face da terra”. (grifo nosso)

Deuteronômio 7,1-4: “Quando Iahweh teu Deus tehouver introduzido na terra que está entrando parapossuí-la, e expulsando nações mais numerosasque tu – os heteus, os gergeseus, os amorreus, oscananeus, os ferezeus, os heveus e os jebuseus –,sete nações mais numerosas e poderosas do quetu; quando Iahweh teu Deus entregá-las a ti, tu asderrotarás e as sacrificarás como anátema. Nãofarás aliança com elas e não as tratarás compiedade. Não contrairás matrimônio com elas, nãodarás tua filha a um de seus filhos, nem tomarásuma de suas filhas para teu filho; pois deste modo

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o teu filho se afastaria de mim para servir aoutros deuses, e a cólera de Iahweh seinflamaria contra vós, exterminando-terapidamente”. (grifo nosso)

Deuteronômio 8,18-20: “Lembra-te de Iahweh teuDeus, pois é ele quem te concede força para teenriqueceres, mantendo a Aliança que jurou aosteus pais, como hoje se vê. Contudo, se teesquecerdes completamente de Iahweh teu Deus,seguindo outros deuses, servindo-os e adorando-os, eu hoje testemunho contra vós: é certo queperecereis! Perecereis do mesmo modo queas nações que Iahweh vai exterminar à vossafrente, por não terdes obedecido à voz deIahweh vosso Deus”. (grifo nosso)

Deuteronômio 11,16-17: “Contudo, ficai atento avós mesmos, para que o vosso coração não sedeixe seduzir e não vos desvieis para servir aoutros deuses, prostrando-se diante deles. Acólera de Iahweh se inflamaria contra vós ebloquearia o céu: não haveria mais chuva e aterra não daria o seu produto; deste mododesaparecereis rapidamente da boa terra queIahweh vos dá!”. (grifo nosso)

Deuteronômio 11,26-28: “Vede: hoje proponho abenção e a maldição diante de vós: A benção, seobedecerdes aos mandamentos de Iahweh vossoDeus que hoje vos ordeno; a maldição, se nãoobedecerdes aos mandamentos de Iahwehvosso Deus, desviando-vos do caminho que vosordeno, para seguirdes outros deuses, quenão conhecestes”. (grifo nosso)

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Deuteronômio 13,7-12: “Se teu irmão – filho deteu pai ou de tua mãe –, teu filho, tua filha,ou a mulher que repousa em teu seio, ou oamigo que é como tu mesmo, quiser teseduzir secretamente, dizendo: ‘Vamos servira outros deuses’, deuses que nem tu nem teuspais conheceram, – deuses de povos vizinhos,próximos ou distantes de ti, de uma extremidade àoutra –, não lhe darás consentimento, não oouvirás, e que teu olho não tenha piedade dele;não uses de misericórdia e não escondas o seuerro. Pelo contrário: deve matá-lo! Tua mãoserá a primeira a matá-lo e, a seguir, a mãode todo o povo. Apedreja-o até que morra,pois tentou afastar-te de Iahweh teu Deus, que tefez sair da terra do Egito, da casa da escravidão. Etodo Israel ouvirá, ficará com medo e nunca maisse fará uma ação má como esta em teu meio”.(grifo nosso)

Deuteronômio 13,13-16: “Caso ouças dizer que,numa das cidades que Iahweh teu Deus te darápara aí morar, homens vagabundos,procedentes do teu meio, seduziram oshabitantes da sua cidade, dizendo: ‘Vamosservir a outros deuses’, que não conhecestes,deverás investigar, fazendo uma pesquisa einterrogando cuidadosamente. Caso seja verdade,se o fato for constatado, se esta abominação foipraticada em teu meio, deverás então passar afio de espada os habitantes daquela cidade.Tu a sacrificarás como anátema, juntamentecom tudo o que nela existe”. (grifo nosso)

Deuteronômio 17,2-7: “Se em teu meio, numa

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das cidades que Iahweh teu Deus te dará, houveralgum homem ou mulher que faça o que émau aos olhos de Iahweh teu Deus,transgredindo sua Aliança para servir aoutros deuses e prostrar-se diante deles –diante do sol, da lua ou de todo o exército do céu –,o que eu não ordenei; se isto for denunciado a ti,ou se o ouvires, primeiros farás uma acuradainvestigação. Se for verdade, se for constatado quetal abominação foi cometida em Israel, entãofarás sair para as portas da cidade o homemou a mulher que cometeu esta má ação, eapedrejarás o homem ou a mulher até quemorra. Somente pela disposição de duas ou trêstestemunhas, poder-se-á condenar alguém àmorte; ninguém será morto pela deposição de umasó testemunha. A mão das testemunhas será aprimeira a fazê-lo morrer, e, depois a mão de todoo povo. Deste modo extirparás o mal do teu meio”.(grifo nosso)

Deuteronômio 28,58-63: “Se não cuidares de pôrem prática todas as palavras desta Lei escritasneste livro, temendo este nome glorioso e terrível –‘Iahweh teu Deus' –, Iahweh ferirá a ti e à tuadescendência com pragas espantosas, pragastremendas e persistentes, doenças graves eincuráveis. Voltará contra ti as pragas do Egitoque te horrorizavam, e elas se apegarão a ti. Eainda mais: Iahweh lançará contra ti todas asdoenças e pragas que estão escritas neste livro daLei, até que seja exterminado. Restarão de vóspoucos homens, vós que éreis tão numerososquanto as estrelas do céu! Uma vez que não

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obedecestes à voz de Iahweh teu Deus, do mesmomodo que Iahweh se comprazia em vos fazer obem e vos multiplicar, assim também ele teráprazer em vos destruir e vos exterminar:sereis arrancados do solo em que estáentrando a fim de tomardes posse dele”. (grifonosso)

Deuteronômio 29,17-20: “Que não exista entrevós homem ou mulher, clã ou tribo cujocoração se desvie hoje de Iahweh nossoDeus, indo servir a outros deuses daquelasnações! Que entre vós não exista uma raiz queproduza planta venenosa ou amarga! Portanto,ouvindo as palavras deste pacto com imprecação,se alguém abençoar a si próprio no coração,dizendo: ‘Vou ter paz, mesmo que ande conforme aobstinação do meu coração, pois a abundância daágua fará a sede desaparecer’, Iahweh jamaisconsentirá em perdoá-lo. Pelo contrário, sua ira eciúme se inflamarão contra tal homem,sobrevindo-lhe toda a imprecação escritaneste livro, e Iahweh lhe apagará o nome desob o céu. E, para seu infortúnio, Iahweh oseparará de todas as tribos de Israel, conforme asimprecações da Aliança escrita neste livro da Lei”.(grifo nosso)

Deuteronômio 30,17-18: “Contudo, se o teucoração se desviar e não ouvires, e tedeixares seduzir e te prostrares diante deoutros deuses, e os servirdes, eu hoje vosdeclaro: é certo que perecereis! Nãoprolongareis vossos dias sobre o solo em que, aoatravessar o Jordão, estás entrando para dele

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tomar posse”. (grifo nosso)

Josué 7,15: “Enfim, aquele que for designado pelasorte naquilo a que se refere o anátema seráqueimado, ele e tudo o que lhe pertence, porhaver transgredido a Aliança com Iahweh e havercometido uma infâmia em Israel”. (grifo nosso)

Josué 23,16: “Se transgredirdes a Aliança queIahweh vosso Deus vos impôs, e se servirdes aoutros deuses e vos prostrardes diante deles,então a ira de Iahweh se inflamará contra vóse bem depressa desaparecereis da boa terraque ele vos deu”. (grifo nosso)

Josué 24,20: “Se abandonardes Iahweh para serviros deuses do estrangeiro, ele novamente vosfará mal e vos consumirá depois de vos haverfeito o bem”. (grifo nosso)

Juízes 3,7-8: “Os israelitas fizeram o que é mau aosolhos de Iahweh. Esqueceram Iahweh seu Deuspara servir aos baais e às aserás. Então a ira deIahweh se acendeu contra Israel, e osentregou nas mãos de Cusã-Rasataim, rei deAram Naariam, e os israelitas serviram a Cusã-Rasataim durante oito anos”. (grifo nosso)

Juízes 3,12-14: “Os israelitas recomeçaram a fazero que era mau aos olhos de Iahweh, e Iahwehfortaleceu Eglon, o rei de Moab, contra Israel,porque faziam o que era mau aos olhos de Iahweh.Eglon uniu a si os filhos de Amom e Amalec,marchou contra Israel, venceu-o e tomou posse dacidade das Palmeiras. Os israelitas serviram aEglon, rei de Moab, dezoito anos”. (grifo nosso)

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Juízes 4,1-2: “Depois da morte de Aod, os israelitasrecomeçaram a fazer o que era mau aos olhos deIahweh, e Iahweh os entregou a Jabin, rei deCanaã, que reinava em Hasor. […].” (grifo nosso)

Juízes 6,1-2: “Os israelitas fizeram o que era mauaos olhos de Iahweh, e Iahweh os entregou porsete anos às mãos dos madianitas, e a mão deMadiã se tornou pesada sobre Israel. […].” (grifonosso)

Juízes 10,6-8: “Recomeçaram os israelitas a fazer oque era mau aos olhos de Iahweh. Serviram aosbaais e às astartes, e também aos deuses de Arame de Sidônia, aos deuses de Moab e aos dosamonitas e dos filisteus. Abandonaram a Iahwehe não mais o serviram. Então a ira de Iahwehse acendeu contra Israel, e ele os entregouàs mãos dos filisteus e às dos amonitas.Estes humilharam e oprimiram os israelitasdesde esse ano, durante dezoito anos, todosos israelitas que habitavam além do Jordão, naterra dos amorreus em Galaad”. (grifo nosso)

Juízes 13,1: “Os israelitas recomeçaram a praticaro que era mau aos olhos de Iahweh, e Iahweh osentregou nas mãos dos filisteus durantequarenta anos”. (grifo nosso)

1 Samuel 12,15: “Mas se não obedecerdes aIahweh, se vos revoltardes contra as ordens deIahweh, então a mão de Iahweh pesará sobrevós e sobre vossos pais”. (grifo nosso)

1 Reis 14,7-11.15-16: “Vai dizer a Jeroboão: ‘Assimfala Iahweh, Deus de Israel: […] fizeste mais mal

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que todos os teus antecessores, e chegaste a fazerpara ti outros deuses, imagens fundidas para meirritares; lançaste-me para trás das costas. Por isso,farei vir a desgraça sobre a casa de Jeroboão,ligados ou livres em Israel; varrerei a casa deJeroboão como se varre completamente olixo. Os membros da família de Jeroboão quemorrerem na cidade serão devorados pelos cães; eos que morrerem no campo serão comidos pelasaves do céu. É Iahweh quem o diz. Iahweh feriráIsrael, como o caniço que vacila na água; arrancaráIsrael desta boa terra que deu a seus pais e odispersará do outro lado do rio, porque fizeramseus postes sagrados, provocando a ira de Iahweh.Ele abandonará Israel por causa dos pecados queJeroboão cometeu e levou Israel a cometer”. (grifonosso)

1 Reis 16,1-4.11: “A palavra de Deus foi dirigida aJeú, filho de Hanani, contra Baasa, nestes termos:‘Eu te tirei do pó e te estabeleci chefe sobre o meupovo Israel, mas tu imitastes o comportamento deJeroboão e levaste Israel, meu povo, a cometerpecados que me irritam. Por isso, varrerei Baasa esua casa; tratarei a sua casa como a de Jeroboão,filho de Nabat. Todo membro da família de Baasaque morrer na cidade será devorado pelos cães; eo que morrer no campo será comido pelas aves docéu. Logo que se tornou rei e sentou-se no trono[Zambri], massacrou toda a família de Baasa, semlhe deixar um só varão, e matou também seusparentes e seu amigo. Zambri exterminou todaa casa de Baasa, segundo a predição queIahweh fizera contra Baasa, por intermédio

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do profeta Jeú, por causa de todos ospecados que cometeram Baasa e Ela, seufilho, e fizeram Israel cometer, irritandoIahweh, Deus de Israel, com seus ídolosvãos”. (grifo nosso)

2 Reis 1,15-17: “Anjo de Iahweh disse a Elias:‘Desce com ele, não o temas’. Ele se levantou,desceu com ele e foi ter com o rei [Ocozias], aquem disse: ‘Assim fala Iahweh. Por teres enviadomensageiros para consultar Baal Zebub, deus deAcaron – porventura não há Deus em Israel, cujapalavra possa ser consultada –, não descerás doleito ao qual subiste, mas, com certeza,morrerás. E ele morreu, conforme a palavra deIahweh, pronunciada por Elias. […].” (grifo nosso)

2 Reis 17,5-8: “Depois, o rei da Assíria invadiu todaa terra e pôs cerco a Samaria durante três anos. Nonono ano de Oseias, o rei da Assíria tomouSamaria e deportou Israel para a Assíria,estabelecendo-o em Hala e às margens do Habor,rio de Gozã, e nas cidades dos medos. Issoaconteceu porque os israelitas pecaramcontra Iahweh seu Deus, que os fizera subir daterra do Egito, libertando-os da opressão do Faraó,rei do Egito. Adoraram outros deuses e seguiramos costumes das nações que Iahweh haviaexpulsado de diante deles, e os costumesestabelecidos pelos reis de Israel”. (grifo nosso)

2 Reis 17,19-20: “Judá tampouco guardou osmandamentos de Iahweh seu Deus; seguiu osestatutos que Israel praticava. Por isso, Iahwehrejeitou toda a raça de Israel, humilhou-a e

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entregou-a aos saqueadores, e enfim baniu-apara longe de sua face”. (grifo nosso)

2 Reis 18,11-12: “O rei da Assíria deportouIsrael para a Assíria e conduziu-o a Hala e àsmargens de Habor, rio de Gozã, e nas cidades dosmedos. Isso aconteceu porque eles nãoobedeceram a tudo o que prescreveraMoisés, servo de Iahweh. Não o ouviram e nempuseram em prática”. (grifo nosso)

2 Reis 21,11-15: “Já que Manassés, rei de Judá,cometeu essas abominações, procedendo aindapior que tudo o que tinham feito antes dele osamorreus, e fez pecar também Judá com seusídolos, assim fala Iahweh, Deus de Israel: Eis quefaço cair sobre Jerusalém e sobre Judá umadesgraça tal, que fará retinir os dois ouvidos detodos que o ouvirem falar. Passarei sobre Jerusalémo mesmo cordel que passei sobre Samaria, omesmo nível que usei para a casa de Acab;limparei Jerusalém como se limpa um prato, que sevira para baixo depois de haver limpado.Abandonarei os restos de minha herança,entregá-los-ei nas mãos de seus inimigos, eeles servirão de presa e de espólio a todos osseus inimigos, porque fizeram o mal aosmeus olhos e provocaram minha ira, desde odia em que seus pais saíram do Egito até hoje”.(grifo nosso)

2 Reis 24,1-4: “No seu tempo, Nabucodonosor, reide Babilônia, marchou contra ele, e Joaquim lheesteve sujeito durante três anos e depois serevoltou de novo contra ele. Iahweh mandou

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contra ele bandos de caldeus, arameus,moabitas e amonitas; incitou-os contra Judápara destruí-lo, conforme a palavra que Iahwehhavia pronunciado por intermédio de seus servos,os profetas. Isso aconteceu a Judá unicamentepor ordem de Iahweh, que queria rejeitá-lo desua presença, por causa dos pecados de Manassés,por tudo o que ele fizera, e também por causa dosangue inocente que ele havia derramado,inundando Jerusalém de sangue inocente. Iahwehnão quis perdoar”. (grifo nosso)

Daqui para frente vamos citar algumas coisas ditas

por alguns dos profetas que servem ao assunto desse

tópico.

Joel 2,1-14: “Tocai a trombeta em Sião. Dai alarmeem minha montanha santa! Tremam todos oshabitantes da terra porque está chegando odia de Iahweh! Sim, está próximo um dia detrevas e de escuridão um dia de nuvens e deobscuridade! Como a aurora espalha-se sobre asmontanhas um povo numeroso e poderoso, nãoexistiu jamais outro como ele, e nem tornará aexistir, depois dele, de geração em geração. Diantedele o fogo devora, atrás dele a chama consome.Antes dele, a terra era como um jardim de Édendepois dele será um deserto desolado! Nada lheescapa! Seu aspecto é como o de cavalos, galopamcomo ginetes. E como o ruído de carros de guerra,que saltam sobre os cumes das montanhas como ocrepitar do fogo, que devora o restolho, como umpovo poderoso, preparado para a batalha. Diante

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dele os povos tremem de medo, todas as facesperdem sua cor. Como heróis eles avançam, comoguerreiros escalam a muralha. Cada qual segue oseu caminho, sem se afastar de sua rota. Ninguémempurra o seu vizinho, cada qual segue a sua via;por entre os dardos eles se lançam, sem romper afila. Assaltam a cidade, correm sobre a muralha,escalam as casas e entram como ladrões, pelasjanelas. Diante dele a terra se comove, os céustremem, o sol e a lua escurecem e as estrelasperdem o seu brilho! Iahweh levanta a sua vozdiante do seu exército! Sim, seu acampamento émuito grande, o executor de sua palavra époderoso. Sim, o dia de Iahweh é grande,extremamente terrível! Quem poderá suportá-lo?'Agora, portanto – oráculo de Iahweh – retornai amim de todo vosso coração, com jejum, comlágrimas e gritos de luto. Rasgai os vossoscorações, e não as vossas roupas, retornai aIahweh, vosso Deus, porque ele é bondoso emisericordioso, lento para a ira e cheio de amor, ese compadece da desgraça. Quem sabe? Talvezele volte atrás, se arrependa e deixe atrás desi uma bênção, oblação e libação paraIahweh, vosso Deus'”. (grifo nosso)

Oseias 4,8: “Eles [os sacerdotes] se alimentam dospecados do meu povo e anseiam por sua falta.Como ao povo, assim acontecerá aosacerdote: eu o castigarei por seuprocedimento e farei recair sobre ele as suasobras. Comerão, mas não ficarão saciados,prostituir-se-ão, mas não se multiplicarão,porque abandonaram a Iahweh pra se

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entregarem à prostituição”. (grifo nosso)

Oseias 14,1: “Samaria deverá expiar, porque serevoltou contra o seu Deus. Cairão pela espada,seus filhos serão esmagados, às suasmulheres grávidas serão abertos os ventres”.(grifo nosso)

Amós 2,4-5: “Assim falou Iahweh: Por três crimesJudá, e por quatro, não o revogarei! Porquedesprezaram a lei de Iahweh e não guardaram osseus decretos, suas mentiras os seduziram,aquelas atrás das quais os seus pais correram,enviarei fogo contra Judá, e ele devorará ospalácios de Jerusalém”. (grifo nosso)

Miqueias 1,2-7: “Ouvi, povos todos, presta atenção,terra, e o que habita! Que Iahweh seja testemunhacontra vós, o Senhor saiu de seu santo Templo!Porque eis que Iahweh sai de seu lugar santo, eledesce e pisa sobre os altos da terra. Debaixo deleos montes se derretem e os vales se desfazemcomo a cera junto do fogo, como a águaderramada em uma encosta. Tudo isso por causado crime de Jacó, por causa dos pecados da casade Israel. Qual é o crime de Jacó? Não é Samaria?Qual é o pecado de casa de Judá? Não é Jerusalém?Farei da Samaria um campo de ruínas, umaplantação de vinhas. Lançarei as suas pedraspara o vale e desnudarei os seusfundamentos. Todas as suas estátuas serãoquebradas, todos os seus salários serão queimadospelo fogo, e arruinarei todas as suas imagens, jáque elas foram ajuntadas com o salário daprostituição”. (grifo nosso)

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Isaías 1,27-28: “Sião será redimida pelo direito, eos seus retornantes, pela justiça. Será adestruição dos ímpios e dos pecadores, todosjuntos! Os que abandonaram Iahwehperecerão”. (grifo nosso)

Isaías 5,24-25: “Por isso, como a chama devora apalha, como o feno se incendeia e se consome,assim sua raiz se reduzirá a mofo, sua flor serálevada como o pó. Com efeito, eles rejeitaram a leide Iahweh dos Exércitos, desprezaram a palavra doSanto de Israel. Por esta razão inflamou-se aira de Iahweh contra o seu povo; eleestendeu sua mão e feriu, os montestremeram e seus cadáveres jazem no meiodas ruas como lixo. Com tudo isso não seamainou a sua ira, a sua mão continua estendida.Ele deu sinal a um povo distante, assobiou-lhedesde os confins da terra; ei-lo que vem chegandoapressado e ligeiro;” (233) (grifo nosso)

Isaías 9,18: “Em virtude do furor de Iahweh dosExércitos a terra foi queimada e o povo setornou presa do fogo”. (grifo nosso)

Isaías 10,5-6: “Ai da Assíria, vara da minha ira;ela é o bastão do meu furor posto nas suas mãos.Contra uma nação ímpia a enviei; a respeito deum povo contra o qual eu estava enfurecido lhedei ordens, para que o saqueasse e odespojasse, para que o pisasse como a lama dasruas”. (grifo nosso)

233 “O ato com que Javé vai julgar a corrupção será a invasão do país pelaAssíria, cujo emblema era o leão e cujo exército era um dos mais poderosose famosos da época”. (Bíblia Sagrada Pastoral, p. 954)

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Isaías 24,1-6: “Eis que Iahweh vai assolar aterra e devastá-la, porá em confusão a suasuperfície e dispersará os seus habitantes. […]Certamente a terra será devastada, certamente elaserá despojada, pois foi Iahweh quem pronunciouesta sentença. A terra cobre-se de luto, ela perece;o mundo definha, ele perece; a nata do povo daterra definha. A terra está profanada sob os pésdos seus habitantes; com efeito, elestransgrediram as leis, mudaram o decreto eromperam a aliança eterna. Por este motivo amaldição devorou a terra e os seushabitantes da terra foram consumidos:poucos são os que restam”. (grifo nosso)

Isaías 65,11-12: “Mas, quanto a vós queabandonais a Iahweh, que vos esqueceis do meumonte santo, que preparais uma mesa para Gad,que ofereceis misturas em taças cheias de Meni(234), vos destinarei à espada; todos dobrareisas costas para a matança, visto que chamei enão respondestes, falei e não ouvistes; antes,fizestes o que é mau aos meus olhos e escolhesteso que é mau aos meus olhos e escolhestes aquiloque não é do meu agrado”. (grifo nosso)

Isaías 66,14-16: “Vós o vereis e vosso coração seregozijará: vossos membros serão viçosos como aerva; a mão de Iahweh se revelará aos seus servos,mas a sua cólera, aos seus inimigos. Comefeito, Iahweh virá no fogo, com seus carrosde guerra, como um furacão, para acalmar

234 “Gad, deus arameu da fortuna. Meni, deus desconhecido, talvez umadivindade do destino”. (Bíblia de Jerusalém, p. 1358)

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com ardor sua ira e sua ameaça com chamasde fogo. Sim, por meio do fogo Iahweh executa ojulgamento, com sua espada, sobre toda acarne; muitas serão as vítimas de Iahweh”.(grifo nosso)

Sofonias 1,2-6: “Na verdade suprimirei tudo daface da terra, oráculo de Iahweh. Suprimireihomens e gado, suprimirei os pássaros docéu e os peixes do mar, farei tropeçar osperversos e aniquilarei os homens da face daterra, oráculo de Iahweh. Estenderei minha mãocontra Judá e contra todos os habitantes deJerusalém, aniquilarei deste lugar e resto de Baal,o nome dos sacerdotes dos ídolos, os que seprostram nos telhados diante do exército dos céus,os que se prostram diante de Iahweh, mas jurampor Melcom, os que se afastam de Iahweh, que nãoprocuram a Iahweh nem consultam”. (grifo nosso)

Jeremias 4,3-4: “Porque assim disse Iahweh aohomem de Judá e a Jerusalém: Arroteai para vósum campo novo e não semeeis entre espinhos.Circuncidai-vos para Iahweh e tirai o prepúcio devosso coração, homens de Judá e Jerusalém, paraque a minha cólera não irrompa como fogo,queime e não haja ninguém para apagar, porcausa da maldade de vossas obras”. (grifo nosso)

Jeremias 5,11-18: “Sim, realmente me traíram, acasa de Israel e a casa de Judá, – oráculo deIahweh. Eles renegaram a Iahweh e disseram: 'Elenão existe! Nenhum mal nos atingirá, não veremosnem espada nem fome! Seus profetas não sãosenão vento, a palavra não está neles; assim lhes

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aconteça!' Por isso, assim disse Iahweh, o Deus dosExércitos: Porque falastes esta palavra, eis quefarei de minhas palavras fogo em tua boca, e,desse povo, lenha que o fogo devorará. Eisque trago contra vós uma nação de longe, ócasa de Israel, oráculo de Iahweh. É naçãoduradoura, é nação antiga, nação cuja línguanão conheces e não compreendes o que elafala. Sua aljava é como sepulcro aberto,todos os seus homens são heróis. Devorarátua messe e teu pão, devorará teus filhos efilhas, devorará tuas ovelhas e tuas vacas,devorará tua vinha e tua figueira; destruirápela espada tuas cidades fortificadas em quedepositas a tua confiança'. Contudo, mesmonaqueles dias – oráculo de Iahweh – não vosaniquilarei completamente”. (grifo nosso)

Jeremias 7,20: “Por isso, assim disse o SenhorIahweh: Eis que minha ira ardente sederramará sobre este lugar, sobre os homens,sobre os animais, sobre as árvores do campo esobre os frutos da terra. Ela arderá e não seextinguirá”. (grifo nosso)

Jeremias 9,12-15: “E Iahweh disse: Porque elesabandonaram a minha Lei, que eu lhes dera, e nãoobedeceram a minha voz, não a seguiram, masseguiram a obstinação de seu coração e os baaisque os seus pais lhes fizeram conhecer. Por isso,assim disse Iahweh dos Exércitos, o Deus de Israel:Eis que farei esse povo comer absinto, e lhesdarei a beber água envenenada. Eu osdispersarei entre as nações que nãoconhecem, nem eles nem seus pais, e

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enviarei atrás deles a espada, até que ostenha exterminado”. (grifo nosso)

Jeremias 13,13-14: “Tu lhes dirás: 'Assim disseIahweh. Eis que encherei de embriaguez todos oshabitantes desta terra, os reis que estão sentadosno trono de Davi, os sacerdotes, os profetas etodos os habitantes de Jerusalém. Então eu osquebrarei, cada um contra o seu irmão, paiscontra filhos, oráculo de Iahweh. Sempiedade, sem pena, sem misericórdia osdestruirei”. (grifo nosso)

Jeremias 15,3-4: “Eu os visitarei com quatrocoisas – oráculo de Iahweh –: a espada paramatar; os cães para dilacerar; as aves do céue os animais selvagens para devorar edestruir. Eu os porei como objeto de horror paratodos os reinos da terra, por causa de Manassés,filho de Ezequias e rei de Judá, pelo que fez emJerusalém”. (grifo nosso)

Jeremias 16,1-4.12-13: “A palavra de Iahweh me foidirigida nestes termos: Não tomes para ti mulher enão tenhas filhos e filhas neste lugar. Porque assimdisse Iahweh a respeito dos filhos e das filhas quenascerão neste lugar, e a respeito de suas mãesque os conceberão e a respeito de seus pais que osgerarão nesta terra. Eles morrerão de doençasmortais, não serão lamentados nementerrados; servirão de esterco sobre o solo.Perecerão pela espada e pela fome, e seuscadáveres serão alimento para os pássarosdo céu e para os animais selvagens. Mas vósfizestes pior que vossos pais. Eis que cada um de

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vós seguiu a obstinação de seu coração perverso,sem me ouvir. Eu vos lançarei para fora destaterra, numa terra que vós e vossos pais nãoconhecestes; servireis lá a outros deuses, de dia ede noite, pois não usarei de misericórdiaconvosco'”. (grifo nosso)

Jeremias 19,3-9: “E dirás: Escutai a palavra deIahweh, reis de Judá e habitantes de Jerusalém.Assim disse Iahweh dos Exércitos, Deus de Israel:eis que trarei uma desgraça sobre este lugar,que fará zunir os ouvidos de quem ouvir. Porqueeles me abandonaram, desvirtuaram este lugar,ofereceram nele incenso a deuses estrangeiros,que nem ele, nem seus pais nem os reis de Judátinham conhecido, e encheram este lugar com osangue dos inocentes. Eles construíram lugaresaltos a Baal, para queimarem os seus filhos emholocausto a Baal, o que eu não tinha ordenadonem falado e nem jamais pensado. Por isso, eisque dias virão – oráculo de Iahweh – em que não sechamará mais este lugar Tofet ou vale de Ben-Enom, mas sim vale da Matança. Esvaziarei osplanos de Judá e de Jerusalém neste lugar e osfarei cair pela espada diante dos seusinimigos, pela mão daqueles que atentam contraa sua vida, e darei os seus cadáveres comoalimento dos pássaros do céu e aos animaisselvagens. Eu farei desta cidade um objeto depavor e de burla; cada um que passar por ela ficaráestupefato e assobiará, por causa de todos os seusferimentos. Farei que eles devorem a carne deseus filhos e a carne de suas filhas: eles sedevorarão mutuamente na angústia e na

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necessidade com que os oprimem os seus inimigose aqueles que atentam contra a sua vida”. (grifonosso)

Jeremias 21,4-7: “Assim disse Iahweh, o Deus deIsrael. Eis que farei voltar as armas que estãoem vossas mãos, com as quais combateis o reida Babilônia e os caldeus, que vos cercam: de forados muros os reunirei dentro desta cidade. E eumesmo combaterei contra vós com mãoestendida e com braço forte, com ira, comfuror e com grande indignação. Ferirei oshabitantes desta cidade, homens e animais,com uma grande peste, e eles morrerão.Depois disto – oráculo de Iahweh – entregareiSedecias, rei de Judá, seus servos, o povo eaqueles, nesta cidade, que escaparem dapeste, da espada e da fome, nas mãos deNabucodonosor, rei da Babilônia, nas mãos deseus inimigos e nas mãos daqueles que procuram asua vida; ele os passará ao fio da espada, nãoos poupará, não terá pena, não terá compaixão”.(grifo nosso)

Jeremias 25,8-11: “Por isso, assim disse Iahweh dosExércitos: Porque não ouvistes as minhas palavras,eis que mandarei buscar todas as tribos doNorte (– oráculo de Iahweh! ao redor deNabucodonosor, rei da Babilônia, meu servo) etrazê-las contra esta terra e seus habitantes(e contra todas as nações em redor); eu os ferireicom anátema e farei deles objeto de horror,de escárnio, e uma ruína perpétua. Fareicessar entre eles a voz de júbilo e de alegria, a vozdo noivo e da noiva, o ruído da mó e a luz da

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lâmpada. Toda esta terra será reduzida a ruína edesolação e estas nações servirão ao rei daBabilônia durante setenta anos”. (grifo nosso)

Jeremias 26,4-6: “Tu lhes dirás: Assim disseIahweh. Se não me escutardes para seguirdes aminha Lei, que vos dei, para atenderdes aspalavras de meus servos, os profetas, que vosenvio sem cessar, mas vós não escutais, tratareieste Templo como Silo (235) e farei destacidade maldição para todas as nações daterra”. (grifo nosso)

Jeremias 29,17-19: “Assim disse Iahweh dosExércitos: Eis que lhes enviarei a espada, afome e a peste; e os farei semelhantes a figospodres que não podem ser comidos, de tão ruinsque são. Persegui-lo-ei pela espada, pela fome epela peste. Farei deles um objeto de horrorpara todos os reinos da terra, uma maldição,um objeto de espanto, de escárnio e devergonha, em todas as nações, onde osdispersei. Porque não escutaram as minhaspalavras – oráculo de Iahweh –, embora lhes tenhaenviado sem cessar meus servos, os profetas, maseles não os escutaram, oráculo de Iahweh”. (grifonosso)

Jeremias 44,1-14: “Palavra que foi dirigida aJeremias para todos os judeus instalados na terrado Egito, residentes em Magdol, Táfnis, Nof e naterra de Patros. Assim disse Iahweh dos Exércitos,

235 O santuário de Silo, residência da Araca, fora destruído pelos filisteus (1Sm4)… Silo encontra-se cerca de 40 km ao norte de Jerusalém. (Bíblia deJerusalém, p. 1378)

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Deus de Israel: Vós vistes toda a desgraça quefiz vir sobre Jerusalém e sobre todas ascidades de Judá: ei-las hoje em ruínas e semhabitantes! Foi por causa das maldades quecometeram para me irritar, indo incensar e servirdeuses estrangeiros, que nem eles, nem vós, nemvossos pais conheciam. E eu vos enviei,constantemente, todos os meus servos, osprofetas, para dizer: 'Não façais essa coisaabominável que detesto!' Mas não escutaram nemderam ouvidos para se converterem de suamaldade e não mais incensarem deusesestrangeiros. Então minha fúria e minha cóleratransbordaram e abrasaram as cidades de Judá eas ruas de Jerusalém, que se tornaram ruínas esolidão, como hoje. Agora, assim disse Iahweh,Deus dos Exércitos, Deus de Israel: Por que causaisa vós mesmos um mal tão grande? Iríeisexterminar do meio de Judá homens e mulheres,crianças e lactantes, sem que vos subsista umresto, visto que teríeis irritado com as obras devossas mãos, incensando deuses estrangeiros naterra do Egito, onde entrastes para nela morardes,trabalhando assim para o vosso extermínio etornando-vos um objeto de maldição e zombariaentre todas as nações da terra? Vós vosesquecestes das maldades de vossos pais, dasmaldades dos reis de Judá e da maldade de vossospríncipes, de vossas maldades e das maldades devossas mulheres, cometidas na terra de Judá e nasruas de Jerusalém? Eles não se deixaram abateraté o dia de hoje, não temeram e não caminharamconforme a minha Lei e conforme as prescriçõesque apresentei diante de vós e diante de vossos

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pais. Por isso, assim disse Iahweh dos Exércitos,Deus de Israel: Eis que volto minha face contra vóspara vossa desgraça, para exterminar todo Judá.Tomarei o resto de Judá que decidiu entrar naterra do Egito para ali morar: eles perecerãotodos, na terra do Egito cairão, perecerãopela espada e pela fome, do menor ao maiormorrerão pela espada e pela fome, e serãoobjeto de escárnio, estupefação, desprezo eopróbrio. Castigarei aqueles que seinstalaram na terra do Egito, como castigueiJerusalém: pela espada, pela fome e pelapeste. Não haverá quem escape ou fuja, doresto de Judá, daqueles que entraram na terra doEgito para lá morarem. Quanto a voltar para a terrade Judá, para onde desejam voltar, a fim de láhabitarem, certamente não voltarão, a não seralguns fugitivos”. (grifo nosso)

Ezequiel 5,11-17: “Eis porque – por minha vida,oráculo do Senhor Iahweh – visto que profanaste omeu santuário com todos os ritos detestáveis ecom todas as abominações, também eu terejeitarei; também eu não lhe pouparei. A terçaparte dos teus habitantes morrerá pela pestee perecerá de fome no meio de ti; outra terçaparte cairá à espada em torno de ti;finalmente, a outra terça parte a espalharei atodos os ventos e desembainharei a espadaatrás deles. Assim se cumprirá a minha ira,saciarei a minha cólera neles e ficarei satisfeito.Então saberão que eu, Iahweh, falei no meu zelo,cumprindo a minha ira contra eles. Reduzir-te-eia ruína, a objeto de ludíbrio entre as nações

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que te cercam, aos olhos de todos os quepassam. Sim, serás objeto de ludíbrio e deinsultos, advertência e motivo de horror para asnações que te cercam, ao cumprir eu em ti osmeus julgamentos, com cólera e com ira, ecom castigos terríveis. Eu, Iahweh, o disse.Atirando contra eles as flechas malignas da fome –com efeito, atirá-las-ei para a vossa destruição eacrescentarei ainda a fome –, reduzirei a vossareserva de pão. Sim, atirarei a fome e animaisferozes que vos desfilharão; a peste e o sanguepassarão pelo meio de ti; trarei a espada contra ti.Eu, Iahweh, o disse”. (grifo nosso)

Ezequiel 6,1-10: “A palavra de Iahweh me foidirigida nestes termos: Filho do homem, volta a tuaface para os montes de Israel e profetiza contraeles. Dir-lhes-ás: Montes de Israel, ouvi a palavrado Senhor Iahweh. Eis o que diz o Senhor Iahwehaos montes, às colinas, às ravinas e aos vales: Euestou para trazer contra vós a espada para destruiros vossos lugares altos. Os vossos altares ficarãodevastados, os vossos altares de incenso serãodespedaçados: farei cair os vossos trespassadosperante os vossos ídolos imundos, porei oscadáveres dos israelitas diante dos seus ídolosimundos e espalharei os seus ossos ao redor devossos altares. Em todos os lugares ondehabitais, as cidades serão arrasadas e oslugares altos ficarão desertos, a fim de queos vossos altares sejam destruídos e fiquemdesertos, e os vossos ídolos imundos sejamdespedaçados e desapareçam, e os vossosaltares de incenso sejam reduzidos a pedaços

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e as vossas ações aniquiladas. Muitos dentrevós cairão trespassados e sabereis que eusou Iahweh. Mas para que entre vós hajasobreviventes da espada no meio das nações,espalhados em meio às nações, deixar-vos-ei umresto. Então os vossos sobreviventes no meio dasnações por onde tiverem sido levados cativos –quando eu tiver quebrado o seu coração prostituídoque me abandonara, e os seus olhos prostituídoscom ídolos imundos – se lembrarão de mim.Sentirão asco de si mesmos pelo mal que fizeram,por todas as suas abominações. Saberão então queeu sou Iahweh e que não foi em vão que lhes faleique havia de infligir-lhes todo este mal”. (grifonosso)

Ezequiel 14,6-11: “Portanto, dize à casa de Israel:Assim diz o Senhor Iahweh: Voltai, desviai-vos dosvossos ídolos imundos, desviai os vossos rostos detodas as vossas abominações, porque a todohomem da casa de Israel ou dentre os estrangeirosque vivem em Israel, que se afastar de mim, dandolugar de honra no seu coração aos seus ídolosimundos, e pondo diante da sua face o tropeço dasua iniquidade, e que vier ao profeta para meconsultar, serei eu, Iahweh, que lhe responderei.Porei o meu rosto contra esse homem, fareidele sinal e provérbio, riscando-o do seio domeu povo, e sabereis que eu sou Iahweh. E seo profeta se deixar seduzir e pronunciar umapalavra, eu, Iahweh, seduzirei esse profeta eestenderei a minha mão contra ele, exterminando-o do seio do meu povo, Israel. Ambos levarão sobresi a sua iniquidade. Como será a iniquidade do

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consultante, tal será a iniquidade do profeta. Destemodo a casa de Israel não tornará a desviar-se demim, nem se contaminará mais com todas as suastransgressões. Serão então o meu povo e eu sereio seu Deus, oráculo do Senhor Iahweh”. (grifonosso)

Ezequiel 33,23-29: “Então a palavra de Iahweh mefoi dirigida nestes termos: Filho do homem, oshabitantes daquelas ruínas do solo de Israel dizem:'Abraão era um só quando tomou posse da terra.Ora, a nós que somos muitos, a terra foi dadacomo patrimônio'. Dize-lhes, pois: Assim diz oSenhor Iahweh: Vós devorais sobre o sangue eelevais os olhos para os vossos ídolos imundos,derramais sangue e tereis a posse da terra? Vósvos apoiais em vossas espadas, cometeisabominação, cada um profana a mulher do seupróximo e tereis a posse da terra? Assim lhes dirás:Eis o que diz o Senhor Iahweh: Por minha vida,certamente uns cairão à espada no meio dasruínas, enquanto outros em pleno campo,serão dados a comer às feras, enquantooutros ainda, refugiados nas montanhas enas cavernas, morrerão de peste. Farei daterra uma solidão e um deserto, e assim cessará oorgulho da sua força e os montes de Israel ficarãoabandonados por falta de quem passe por eles.Desse modo saberão que eu sou Iahweh, quandoreduzir a terra a uma desolação e a um deserto,por causa de todas as abominações quepraticaram”. (grifo nosso)

Zacarias 14,1-5: “Eis que vem o dia de Iahweh,quando em teu seio serão repartidos os teus

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despojos. Reunirei todas as nações contraJerusalém para o combate; a cidade serátomada, as casas serão saqueadas, asmulheres violentadas; a metade da cidadesairá para o exílio, mas o resto do povo nãoserá eliminado da cidade. Então Iahweh sairá ecombaterá essas nações, como quando combateno dia da batalha. Naquele dia, estarão os seus péssobre o monte das Oliveiras, que está diante deJerusalém, na parte oriental. O monte das Oliveirasse rachará pela metade, e surgirá do oriente para oocidente um enorme vale. Metade do monte sedesviará para o norte, e a outra para o sul. Fugireisdo vale de minhas montanhas, pois o vale dasmontanhas atingirá Jasol; fugireis como fugistespor causa do terremoto nos dias de Ozias, rei deJudá. E Iahweh, meu Deus, virá, todos os santoscom ele”. (grifo nosso)

Aqui, damos por terminados os relatos nos quais a

divindade dos hebreus ameaça-os com castigos,

destruição, peste, etc., caso não se voltassem a servi-lo e

adorá-lo, provando, portanto, a imposição do culto a

Iahweh, de forma irrefutável.

Diante disso é fácil entender porque vários

pensadores têm ojeriza à Bíblia, inclusive alguns com

uma visão da divindade bem próxima à de Georg Wilhelm

Friedrich Hegel (1770-1831): “O Deus judaico era um

tirano, que exigia submissão incondicional às suas leis

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intoleráveis.” (236)

Porém, não nos iludiremos pensando que os

ortodoxos aceitarão essa verdade tão facilmente assim,

uma vez que só enxergam o que querem: aquilo que não

contraria seus dogmas. Bem disse Kardec: “O fanatismo é

cego; não raciocina.” (237)

236 ARMSTRONG, 2007, p. 198.237 KARDEC, Revista Espírita 1862, p. 263.

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Absurdos atribuídos à divindade dos hebreus

Quando estávamos pesquisando o livro de Josué,

que narra as guerras de conquista de Canaã, levada a

efeito pelos hebreus, não deixamos de lembrar de um

pequeno texto que havíamos feito tempos atrás (abril de

2007), que serve ao propósito do assunto desse tópico.

Leiamos:

Uma história de estarrecer e a Bíblia

Uma certa pessoa, a qual chamaremos de José, ohomem mais rico e poderoso do país do “Faz deContas”, promete a seu amigo João, a quem muitoestimava, que lhe daria um relógio de ouro. Algumtempo depois, José diz a João que estava chegandoa hora de cumprir com o prometido. Que ele, João,deveria ir à loja do Júlio, o mais hábil joalheiro dacapital, que trabalhava juntamente com a suamulher e dois filhos, pois não tinha nenhumaconfiança em pessoas de fora, não sem razão, dadaa peculiaridade de seu negócio.

José recomenda a João exatamente isso: vá àloja do Júlio, mate a ele, mulher e filhos, depoispegue o relógio de ouro da melhor marca quehouver por lá, e pode ir tranquilo para sua casa eassim considere cumprido o que lhe prometi.

Já estou imaginando o que você deve estarpensando, e que obviamente me dirá:

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– Que cara maluco, meu! Que história é essa,sem sentido algum? Só um “doido de pedra”poderia vir com algo assim.

– Sinceramente? Você está coberto de razão.Não há sentido algum numa coisa absurda dessa,mas…

– Eita! Lá vem você com o “mas”.

– Isso aconteceu de verdade.

– Como, aconteceu de verdade? Xiii, você é maismaluco do que pensei de início.

– Então vou provar-lhe que isso realmenteaconteceu, mas sei que é bem provável que nãogostará do que vai ouvir, dado o seutradicionalismo religioso. A única diferença emrelação ao que vou lhe contar é que o prometidonão foi um simples relógio, mas uma vastidão deterra pertencente a outros povos.

– Tá certo, essa quero pagar para ver.

– Bom, não vá dizer que não avisei, certo?Vamos lá, ouça:

Conta-nos, os escritores bíblicos, que Deus haviaprometido a Abraão, patriarca do povo hebreu, umaterra, na qual correria leite e mel, que, segundo seentende, seria onde viviam os cananeus (Gn 12,6-7; 15,8).

Tempos mais tarde, resolve dizer a este povoque já estava pronto para cumprir o prometido aAbraão, era o momento de dar-lhe essa terra. Paraisso retira-o do Egito, onde vivia na condição deescravidão, mandando-o seguir rumo a essa terra,

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por um caminho orientado por Ele. Chegando lá,com o seu exército promove uma carnificina geral,passando a fio de espada todos os habitantes –homens, mulheres e crianças –, das cidades: Jericó(Js 6,21), Hai (Js 8,24), Maceda (Js 8,28), Lebna,Laquis, Gazer, Eglon, Hebron e Dabir (Js 10,28-39).Tudo isso por determinação de “Javé” (Dt 20,16-17), que, ainda lhes envia “o chefe de seu exército”(Js 5,14) para, dessa forma, dar-lhes apoioincondicional a esse ato ignominioso que oshebreus levaram a efeito. Os únicos daquela regiãoque não sucumbiram, foram os gabaonitas, porém,impuseram-lhes a escravidão (Js 9,23).

E para se vangloriarem do feito, são listados ostrinta e um reis que pereceram nessa chacina,executada naquela vasta região (Js 12).

Narra-se que “desse modo, Javé deu a Israeltoda a terra que jurara dar a seus antepassados.Eles tomaram posse e nela se estabeleceram” (Js21,43). O próprio “Javé”, disse aos hebreus: “Eu deia vocês uma terra que não lhes custou nada, …” (Js24,13). Para dizer isso, certamente, só poderiaestar pensando que a vida das pessoas não valianada.

E, ao que tudo indica dos acontecimentos, deviaestar querendo implantar a raça do “povo eleito”aqui na terra, mesmo que a custa de milhares devidas humanas. Não muito diferente do que ahistória registra em relação a uma determinadapersonagem que queria que só existisse a “raçapura”. Comparação dura poderá achar, mas são osfatos que levam a ela. Nos tempos atuais, taisatrocidades seriam enquadradas como crime

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contra humanidade, seus responsáveis seriampunidos, sem sombra de dúvida.

Não posso fechar essa história senão afirmandoque isso obviamente não pode ter vindo daDivindade. Acredito que Moisés, na condição dechefe guerreiro, usou desse artifício para levar oshebreus a uma guerra de conquista, pensava,talvez, em tornar-se o rei deles. É por esse e outrosmuitos absurdos que não posso, em sã consciência,aceitar a Bíblia como sendo mesmo a palavra deDeus. Os que assim acreditam, de duas uma: lerame não entenderam nada ou estão evolutivamentepróximos desse deus tribal.

Paulo Neto

O que nos deixa completamente perplexos é ver

como as pessoas acreditam nesse absurdo, como se o

Criador fosse capaz de tais atitudes. Nos dias atuais,

procedimentos como esses seriam enquadrados como

crimes contra a humanidade e seu idealizador julgado por

um tribunal internacional, que, certamente, o condenaria,

no mínimo, à prisão perpétua.

Vejamos alguns outros absurdos, dentre vários

atribuídos à divindade dos hebreus, que nos leva à

conclusão ser ela apenas mais um deus pagão do que,

propriamente, o Criador do Universo, de tão ridículos e

impróprios que são.

Êxodo 25,10-22: “Farás uma arca de madeira de

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acácia com dois côvados e meio de cumprimento,um côvado e meio de largura e um côvado emeio de altura. Tu a cobrirás de ouro puro pordentro e por fora, e farás sobre ela umamoldura de ouro ao redor. Fundirás para elaquatro argolas de ouro: que porás nos quatrocantos inferiores da arca: duas argolas de um ladoe duas argolas de outro. E enfiarás os varais nasargolas aos lados da arca, para ser carregada pormeio deles. Os varais ficarão nas argolas da arca,não serão tirados dela. E colocarás na arca oTestemunho que te darei. Farás tambémpropiciatório de ouro puro, com dois côvados emeio de comprimento e um côvado e meio delargura. Farás dois querubins de ouro, de ourobatido os farás, nas duas extremidades dopropiciatório; faze-me um dos querubins numaextremidade e o outro na outra: farás os querubinsformando um só corpo com o propiciatório, nasduas extremidades. Os querubins terão as asasestendidas para cima e protegerão o propiciatóriocom suas asas, um voltado para o outro. As facesdos querubins estão voltadas para o propiciatório.Porás o propiciatório em cima da arca; e dentrodela porás o Testemunho que te darei. Ali virei a ti,e, de cima do propiciatório, do meio dos querubinsque estão sobre a arca do Testemunho, falareicontigo acerca de tudo o que eu te ordenar para osisraelitas”. (grifo nosso)

A arca de madeira aqui mencionada nada mais é

que a Arca da Aliança, também denominada de Arca do

Testamento; para sua confecção foi utilizado o côvado

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como medida, que sabemos ser de origem egípcia. Após

pronta ela seria algo próximo disto (238):

Arca da Aliança ou Arca do Testemunho

Reinaldo José Lopes, no artigo já anteriormente

citado, coloca:

Os historiadores e arqueólogos modernosainda não conseguiram determinar o paradeiroda Arca, se é que o objeto ainda existe, mas agrande ironia é que, ao que tudo indica, oartefato incorporava característicasoriginalmente pagãs, da época em que osisraelitas não adoravam um deus único. “AArca parece ter tido sua origem nos amuletosprotetores parecidos com caixas usados atéhoje por algumas tribos de beduínos. Colocadasem cima de camelos, essas caixas são a

238 Link: https://3d.leoaragao.com.br/wp-content/uploads/2013/10/intro_arca2.jpg.

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vanguarda das migrações deles, da mesmamaneira como se descreve a Arca liderando osisraelitas no deserto”, escreve Stephen A.Geller, professor de estudos bíblicos doSeminário Teológico Judaico de Nova York. (239)(grifo nosso)

Apesar da relação da arca com o paganismo, o fato

mais importante que aqui, neste item, queremos realçar é

que a divindade dos hebreus comporta-se em total

contradição com o que ela mesma havia determinado – o

que para nós é um grande absurdo –, pois havia proibido

a confecção de qualquer tipo de imagem (Deuteronômio

4,16-17), enquanto aqui ela mesma orienta para se fazer

a de dois querubins, que, para piorar ainda mais o fato,

foi tomada dos cultos pagãos, conforme já explicado

anteriormente.

Levítico 25,44-46: “Os servos e as servas quetiveres deverão vir das nações que vos circundam:delas podereis adquirir servos e servas… Tê-los-eiscomo escravos, mas sobre os vossos irmãos, osisraelitas, pessoa alguma exercerá poder dedomínio”.

Dos outros povos se permite fazer escravos,

designados como servos e servas, algo contrário a um

239 LOPES, 2008, disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL465154-5603,00-CONHECA+A+VERDADEIRA+CARA+DA+ARCA+DA+ALIANCA+OBJETO+MAIS+SAGRADO+DA+BIBLIA.html.

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lúcido sentimento humanitário.

Deuteronômio 15,12: “Quando um dos teus irmãos,hebreu ou hebreia, for vendido a ti, ele te servirápor seis anos. No sétimo ano tu o deixarás ir emliberdade”.

Se acima se proibia ter um irmão israelita como

escravo, aqui se permite.

Deuteronômio 5,21: “Não cobiçarás a mulher doteu próximo; nem desejarás para ti a casa do teupróximo, nem o seu campo, nem o seu escravo,nem a sua escrava, nem o seu boi, nem o seujumento, nem coisa alguma que pertença a seupróximo”.

Todo o versículo poderia ser resumido nisto: “não

desejar o que pertence a seu próximo”. Então, devemos

concluir que, entre os bens do seu próximo, está incluída

a mulher dele, ou seja, a sua esposa. Não soa muito mal

para uma divindade dizer isso?

E, aqui, novamente a questão do escravo é aceita

como coisa mais normal do mundo. Então, por que, nos

dias atuais, toda a humanidade se horroriza quando fica

sabendo de casos de escravidão? Somos melhores do que

essa divindade dos hebreus; é o que se pode concluir.

Deuteronômio 21,15-16: “Se alguém tiver duasmulheres, amando a uma e não gostando de outra,

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e ambas lhe tiverem dado filhos, se o primogênitofor da mulher da qual não gosta, este homem,quando for repartir a herança entre seus filhos, nãopoderá tratar o filho da mulher que ama como sefosse o mais velho, em detrimento do filho damulher da qual ele não gosta, mas que é overdadeiro primogênito”.

Embora a intenção seja preservar o direito do filho

da mulher que o homem não goste, está se admitindo a

poligamia. Será que não prevalece “o homem se une à

sua mulher, e eles se tornam uma só carne” (Gn 2,24)?

Por outro lado, se ter duas mulheres era algo de bom

naquela época, por que não o será mais?

Deuteronômio 21,18-21: “Se alguém tiver um filhorebelde e indócil, que não obedece ao pai e à mãee não os ouve mesmo quando o corrigem, o pai e amãe o pegarão e levarão aos anciãos da cidade, àporta do lugar, e dirão aos anciãos da cidade: ‘Estenosso filho é rebelde e indócil, não nos obedece, édevasso e beberrão. E todos os homens da cidadeo apedrejarão até que morra. Deste modoextirparás o mal do teu meio, e todo o Israel ouviráe ficará com medo”.

Que pedagogia!… Como têm coragem de admitir

tal barbaridade como emanada do Criador do Cosmo?!

Deuteronômio 23,2: “O homem com testículosesmagados ou com o membro viril cortado nãopoderá entrar na assembleia de Iahweh”.

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Será que a assembleia de Iahweh era somente para

homens com capacidade de reproduzir?! Não seria uma

discriminação, tal atitude?

Deuteronômio 23,14: “Junto com teu equipamentotenhas também uma pá. Quando saíres para fazeras tuas necessidades, cava com ela, e ao terminarcobre as fezes”.

Sim, deveriam fazer igual aos gatos, que, por

instinto, cobrem suas fezes. É certo que, como medida de

higiene e prevenção de doenças, foi uma medida útil;

entretanto, a vemos como atitude completamente

humana e não uma preocupação que deveria emanar da

divindade.

Deuteronômio 23,16: “Quando um escravo fugir doseu amo e se refugiar em tua casa, não oentregues ao seu amo; ele permanecerá contigo,entre os teus, no lugar que escolher, numa dastuas cidades, onde lhe pareça melhor. Não omaltrates!”.

Se foi permitido ter escravo, aqui não estaria se

aceitando a usurpação de propriedade alheia? Será que o

“não o maltrates” incluiria não o usar em trabalhos

forçados?

Deuteronômio 24,1-2: “Quando um homem tivertomado uma mulher e consumado o matrimônio,mas esta, logo depois, não encontra mais graça a

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seus olhos, porque viu nela algo de inconveniente,ele lhe escreverá então uma ata de divórcio e aentregará, deixando-a sair de sua casa emliberdade”.

O poder do divórcio estava nas mãos dos homens,

que, pelo que consta nesse versículo, poderiam dispensar

sua mulher pelos motivos mais irrisórios. E a igualdade

entre os direitos do homem e da mulher não existe

perante a divindade?

Josué 10,12-14: “Foi então que Josué falou aIahweh, no dia em que Iahweh entregou osamorreus aos israelitas. Disse Josué na presençade Israel: ‘Sol, detém-te em Gabaon, e tu, lua, novale de Aialon!’ E o sol se deteve a lua ficou imóvelaté que o povo se vingou dos seus inimigos. Nãoestá escrito no livro do Justo? O sol ficou imóvel nomeio do céu e atrasou o seu ocaso de quase umdia inteiro. Nunca houve dia semelhante, nemantes, nem depois, quando Iahweh obedeceu à vozde um homem. É que Iahweh combatia por Israel”.

A divindade obedecendo a um homem? Eita! Como

acreditam num absurdo desse? E o pior é que ainda

temos mais um outro: o sol e a lua pararem. Isto só

poderia acontecer para quem não sabe o que criou, pois,

para que o dia aumentasse suas horas de claridade

recebida do Sol, quem deveria parar era a Terra e não o

Sol, porquanto, é a rotação dela, sobre seu próprio eixo,

que produz o ciclo dia e noite. Ou, quem sabe, o escritor

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desse livro não sabia disso?…

Juízes 14,19: “Então o espírito de Iahweh caiusobre ele e se apossou dele, e ele desceu aAscalon, matou trinta homens, tirou-lhes as roupasde festa e entregou-as aos que lhe tinhamapresentado a solução do enigma, e depois,enfurecido, voltou para a casa de seu pai”.

A pessoa de quem se fala aqui é Sansão. Pensar

que a divindade Cósmica possa apoderar-se de um

homem levando-o a matar outros homens, é,

simplesmente, ridícula. E ainda têm a coragem de afirmar

que a possessão só existe por parte do demo…

1 Samuel 11,6-7: “E, quando Saul ouviu taispalavras, o espírito de Deus caiu sobre ele, e ele seencheu de cólera. Tomou uma junta de bois e osfez em pedaços, os mandou por mensageiros atodo o território de Israel, com este recado: ‘A todoaquele que não sair para o combate de Saul eSamuel, assim se fará a todos os seus bois. Umterror de Iahweh se abateu sobre o povo e elesmarcharam como se fossem um só homem”.

E o ridículo continua…

1 Sameul 15,2-3: “Samuel disse a Saul; ‘Foi a mimque Iahweh enviou para te ungir rei sobre o seupovo Israel. Portanto, escuta agora, as palavras deIahweh. Assim diz Iahweh dos Exércitos: Resolvipunir Amalec o que fez a Israel cortando-lhe ocaminho quando subia do Egito. Vai, pois agora, e

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investe contra Amalec, condena-o ao anátema comtudo o que lhe pertence, não tenhas piedade dele,mata homens e mulheres, crianças e recém-nascidos, bois e ovelhas, camelos e jumentos’”.

Cumprindo a promessa de vingança contra Amalec:

“eu vou apagar a memória de Amalec debaixo do céu”

(Êxodo 17,14; Deuteronômio 25,19), pelo motivo acima

exposto, esse “Deus dos Exércitos” manda os israelitas

matar tudo que encontrasse pela frente que fosse do

povo amalecita: homens, mulheres, crianças, recém-

nascidos e até os seus animais, algo compatível a um

nefando criminoso de guerra que também ataca a

população civil, sem poupar ninguém. Isso é crime de

guerra!!! E, mais à frente, sem se preocupar com nada do

que faz, justifica-se dizendo que “nem se arrepende,

porque não é homem para se arrepender” (1 Samuel

15,29), igualando-se ao mais vil criminoso de guerra que

já passou aqui pela humanidade, cujo nome nem é

preciso citar.

2 Reis 2,23-24: “De lá subiu a Betel; ao subir pelocaminho, uns rapazinhos que saíram da cidadezombaram dele, dizendo: ‘Sobe, careca! Sobe,careca!’ Eliseu virou-se, olhou para eles e osamaldiçoou em nome de Iahweh. Então saíram dobosque duas ursas e despedaçaram quarenta edois deles”.

Por uma simples brincadeira os rapazinhos, ou seja,

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jovens de 12 a 16 anos (240) a divindade castiga-os,

mandando-lhes duas ursas para despedaçá-los. Tão

absurdo tal ato que chocou até alguns tradutores bíblicos:

O episódio dos meninos mostra que Deusprotege o seu profeta contra os que os insultam(cf. 1,9-12), mas nos deixa bastante vexados.Jesus, ao contrário, abençoou as crianças (Mc10,14-16). (241) (grifo nosso)

Há que ser uma pessoa muito tacanha para admitir

essa barbaridade como proveniente de Deus.

2 Reis 20,8-11: “Ezequias disse a Isaías: ‘Qual é osinal de que Iahweh vai me curar e de que, dentrode três dias subirei ao Templo de Iahweh?’ Isaíasrespondeu: ‘Eis, da parte de Iahweh, o sinal de queele realizará o que disse: Queres que a sombraavance dez degraus ou que retroceda dezdegraus?’ Ezequias disse: ‘Avançar dez degraus éfácil para sombra! Não! Prefiro que ela recue dezdegraus!’ O profeta Isaías invocou Iahweh e estefez a sombra recuar os degraus que tinha descidonos degraus de Acaz – dez degraus para trás”.

Segundo os tradutores da Bíblia de Jerusalém,

trata-se de degraus de uma escada para o quarto

superior de Acaz e não de quadrante solar; ainda segundo

eles, foram tomados como base os manuscritos de

240 Bíblia Shedd, p. 528.241 Bíblia Sagrada Vozes, p. 407.

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Qumrã. (242) Isso pouco importa para o nosso caso, pois,

qualquer que seja a opção, na qual a sombra pudesse

voltar atrás se presume que o Sol teria recuado, fato

impossível de acontecer perante as leis que regem os

astros, as quais sabemos serem divinas, portanto,

imutáveis.

Isaías 20,2-4: “Falou Iahweh por intermédio deIsaías, filho de Amós, e disse: 'Eia, tira o pano desaco de sobre os teus ombros e descalça assandálias dos teus pés'. Ele assim fez, andando nue descalço. Então disse Iahweh: 'Da mesmamaneira que o meu servo Isaías andou nu edescalço durante três anos – sinal e presságioque diz respeito ao Egito e a Cuch –, dessa maneirao rei da Assíria levará os cativos do Egito e Cuch –jovens e velhos – nus e descalços, com as nádegasdescobertas – vergonha do Egito!”. (grifo nosso)

Fantástico: Isaías, a mando de Iahweh, anda nu e

descalço por três anos apenas para servir de exemplo do

que Ele fará ao Egito e Cuch. Quem acredita nisso,

merece toda a nossa compaixão.

Isaías 27,1: “Naquele dia, punirá Iahweh com a suaespada dura, grande e forte, Leviatã, serpenteescorregadia, Leviatã, serpente tortuosa,matará o monstro que habita o mar”. (grifonosso)

242 Bíblia de Jerusalém, p. 537.

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Iahweh chega ao cúmulo do absurdo, quando

promete matar até um ser totalmente mitológico.

Vejamos as informações que nos dão conta disso:

Leviatã (ou também o Dragão, a SerpenteFugitiva – cf. 26,13; 40,25+; Is 27,1; 51,9; Am9,3; Sl 74,14; 104,26) era, na mitologia fenícia,monstro do caos primitivo (cf. 7,12+); aimaginação popular podia sempre recear quedespertasse, atraído por uma eficaz maldiçãocontra a ordem existente… (243) (grifo nosso)

[…] E depois os autores atribuem aosdeuses motivações corriqueiras que chegamaté a ser mesquinhas: os homens sãoescravos de quem os deuses precisam paranutrir-se (Poema babilônico, 30-40); a desgraçado homem se explica pela inveja dos deusespreocupados em não perder seus privilégios.Esses mesmos antropomorfismos aparecem notexto bíblico. Deus forma montanhas (Am 4,13),animais e o homem, como o oleiro modela aargila (Gn 2,7.8.19). O tema do combatecósmico travado por Javé contra o Mar,Raab, Leviatã e o Dragão é atestado por Jó3,8; 7,12; 9,13; 26,12 etc.; pelos SI 74, 13-14;77,17; Is 27,1; 51,9 etc. Os motivos de Javécontinuam ambíguos segundo Gn 3,22.

Mas a tendência é utilizar imagensdespojadas de seu mofo mítico e verbos quemelhor se adaptem ao caráter único do ato

243 Bíblia de Jerusalém, p. 805.

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criador. (244) (grifo nosso)

O Dragão. A imaginação popular pensavaque os mares ou abismos eram habitados pormonstros, cujo chefe era Leviatã (Jó 3,8ss;7,12ss). (245) (grifo nosso)

Leviatã, muitas vezes representado pelocrocodilo, é propriamente um dragão mítico,que simboliza o poder do mal que ameaça acriação. Deus o teria derrotado, confinando-o naágua. […]. (246) (grifo nosso)

Fica aí configurada a mitologia, que os autores

bíblicos tomaram de outros povos para atribuí-la a

Iahweh, fato que os dogmáticos não fazem a mínima

questão de apontar.

Isaías 40,22: “Ele está entronizado sobre o círculoda terra, cujos habitantes são como gafanhotos;ele estende os céus como uma tela, abre-os comouma tenda que sirva de habitação”. (grifo nosso)

Um círculo, até onde sabemos, é “uma superfície

plana limitada por uma circunferência (linha curva)” (247),

o que não cabe se aplicar à Terra, porquanto ela é

esférica, com sua superfície curvada e não plana como

parecia aos povos da antiguidade.

244 MONLOUBOU, e DU BUIT, 1997, p. 161.245 Bíblia Sagrada Santuário, p. 1374.246 Bíblia Sagrada Pastoral, p. 669.247 HOUAISS 3.0, 2009.

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O que de interessante os estudiosos nos informam

Trazemos, para este tópico, tudo que achamos de

estudiosos e de outros autores sobre os vários assuntos

aqui relacionados, e que ainda não transcrevemos.

Preferimos fazer isso a colocá-los nos tópicos anteriores,

por acharmos mais importante a realçar que foram os

próprios textos bíblicos a nos dar base para os

argumentos colocados até então.

1 – Samuel J. Schultz:

A religião de Canaã era politeísta. El erareputado como principal divindade cananeia.Simbolizado como um touro entre um rebanhode vacas, e o povo se referia a ele como “paitouro”, considerando-o criador. Asera era aesposa de El. Nos dias de Elias, Jezabelpatrocinava a quatrocentos profetas de Asera(veja 1Rs 18:19). O rei Manassés erigiu aimagem dela no templo de Jerusalém (veja2Rs 21:7). O primeiro dentre os setenta deusese deusas que eram tidos como prole de El eAsera era Hadade, mais comumenteconhecido pelo nome de Baal, que quer dizer“Senhor”. Como monarca reinante dos deuses,ele controlaria os céus e a terra. Por ser deus dachuva e da tempestade, ele era o responsávelpela vegetação e pela fertilidade. Anate, a deusaamante da guerra, era sua irmã e consorte. No

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século IX a. C., Astarte, deusa da estrelavespertina, era adorada como sua esposa.Mote, deus da morte, era o principal adversáriode Baal. Iom, deus do mar, foi derrotado porBaal. Esses e muitos outros deuses são osprimeiros a figurar no catálogo do panteãocananeu. (248) (grifo nosso)

Mais dados que provam que a região era

“infestada” de deuses.

2 – Iakov Abramovitch Lentsman:

Os teólogos judeus e cristãos declaramque, se o judaísmo desempenhou tal papelna formação do cristianismo, foi graças aofato de os judeus, contrariamente aos outrospovos da Antiguidade, terem sido sempremonoteístas, não admitirem senão um únicodeus. Segundo a sua opinião essa foi a causadecisiva da difusão e da vitória da religião cristãsobre as outras religiões pagãs. Mas isso não éjusto, não corresponde à realidade. Se ocristianismo nasceu do judaísmo, não foi porcausa do caráter monoteísta deste último, mascomo consequência da situação política e socialgeral da metade oriental do Império Romano emmeados do século I. No que respeita aomonoteísmo, enquanto traço específico dojudaísmo, é preciso dizer, primo que todas asoutras religiões da época manifestavam amesma tendência para o monoteísmo, e,

248 SCHULTZ, 1995, p. 90.

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segundo, que o judaísmo não foi sempremonoteísta.

O sistema filosófico e religioso de Sênecanão era menos monoteísta do que o judaísmo. Aampliação das funções de Ísis, deusa egípcia,de Mitra, deus mazdeano, e até mesmo de umadivindade romana como Telus mostra que atendência ao monoteísmo era comum a todasas religiões da época. Uma religião monoteístaera, no fim das contas, a que melhor convinha auma potência mundial como o Império Romano.

O monoteísmo só predominou nojudaísmo depois de demorada luta. A Bíbliaestá repleta de relatos em que se apresentamos judeus adorando todas as espécies dedivindades além de Jeová, o Eterno. Esteteve durante muito tempo, como concorrentes, aSerpente de Bronze, o Bezerro de Ouro etc. Asdesgraças sofridas pelos antigos hebreus sãoexplicadas na Bíblia pela desobediência do povoeleito, que criava ídolos, apesar dosmandamentos de Jeová. O monoteísmo só seimpôs definitivamente aos judeus a partir doséculo V antes de nossa era. (249) (grifo nosso)

Confirma-se o politeísmo dos hebreus pelo menos

até o Século V AEC, quando, a partir daí, passaram ao

monoteísmo.

3 – Ambrogio Donini:

249 LENTSMAN, 1963, p. 91-92.

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Continua-se a discutir, entre os estudiosos dehistória das religiões, a origem do hábito denão comer carne de porco, existente entre osárabes e hebreus. Pretendeu-se ver nestainterdição de caráter religioso uma espécie deespontânea e compreendida medida de caráterhigiênico: o consumo da carne de porco teriasido vetado porque este animal, especialmentenos países quentes, é portador de germes dedoenças infecciosas e apodrece facilmente logodepois de morto. A paternidade desta tese éassumida inclusive por críticos como Renan,além dos habituais historiadores teologizantes,para os quais todo fenômeno histórico deve terforçosamente uma origem providencial.

Mas o homem primitivo não tem a mínimaideia do que seja a higiene, entendida comocorrelação de causa e efeito. Ele crê, porexemplo, que a doença seja a consequência dedeterminadas transgressões de caráter moral esocial, e não o produto de um contágio físicoqualquer. A proibição de comer carne de porcoderiva simplesmente do fato de que, numdeterminado momento de sua evolução, ospovos semitas atravessaram como todos osoutros, a fase o totemismo, e que porcos ejavalis tinham sido originariamenteconsiderados animais-parentes, animaissagrados, e, por conseguinte, tabu paraaqueles que os caçavam. Quando se perdeu anoção dessa prática antiquíssima, codificadanas leis religiosas, inventaram-se explicaçõesmais fantásticas para justificar a sua existência.

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(250) (grifo nosso)

Interessante essa informação sobre a origem do

hábito de não comer carne de porco que os hebreus

tinham.

Além disso, não se deve ignorar que jamaisexistiu um verdadeiro monoteísmo no seuestado puro. Os hebreus, consideradoserradamente como um povo monoteísta porexcelência, chegaram, é verdade, à concepçãode um só deus nacional, Jeová; masacreditavam igualmente na existência real dasdivindades dos outros povos, como Marduk dosbabilônios e Baal dos fenícios. (251) (grifo nosso)

O monoteísmo hebraico

É opinião corrente, e não apenas entre aspessoas menos cultas, que o povo hebreu, nassuas condições religiosas, tenha-setransformado desde o início em propagandistada crença num só deus (monoteísmo), diantede um mundo caracterizado pela aceitação deuma variada série de divindades (politeísmo).Esta interpretação não tem nenhum valorhistórico.

Ressalte-se mais uma vez que o estudo daevolução religiosa da humanidade não conhecenem um período primitivo, caracterizado pela fénum “ser supremo”, nem um desvio posterior no

250 DONINI, 1965, p. 46.251 DONINI, 1965, p. 84.

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sentido de formas grosseiras de animismo efetichismo, ou “idolatria”. O recente e amploestudo de Raffaele Pettazzoni sobreL’onniscienza di Dio (252) fez justiçadefinitivamente a esta artificiosa construção,ditada por preocupações confessionais e nãocientíficas. Jamais existiu um “monoteísmoprimordial”, degenerado posteriormente noculto dos espíritos, da natureza e dosanimais e triunfalmente reafirmado, pormérito da tradição judaica, por volta do fimda era antiga. Estamos em pleno reino da“ficção científica”, e já é hora, na Itália, de trataro assunto em termos de maior seriedade.

[…].

A história da religião hebraica permite-nosver claramente como a ideia de um só deus,superior aos outros, surge no momento emque das várias tribos e gentes em que erasubdividido o povo de Israel se originam asprimeiras instituições monárquicas. Demuitos chefes para um só chefe; da fé emmuitas divindades, surge lentamente a ideia deum só ser supremo, que inicialmente seapresenta como “mais forte” do que todos(enoteísmo, ou melhor monolatria, culto de umdeus hierarquicamente superior) e depois como“único”, excluindo-se qualquer outro(monoteísmo no sentido mais exato).

[…].

A concepção monoteísta não podia

252 N.T.: Turim, Einaudi, 1955 (“Coleção de estudos religiosos etnológicos 6psicológicos”, n.° 24). Veja-se acima, pág. 16, nota 6.

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predominar na mente dos israelitas antes deterem experimentado na prática aquele tipo deorganização econômica e social que é própriado regime monárquico; mas a crença num sóDeus, defendida tão ardorosamente pelos“profetas” do século VII-VI, desenvolveu-sedepois independentemente das causas queexplicam a sua origem, adquiriu força autônomae terminou por sua vez reagindo profundamentesobre a história e sobre a própria estrutura domundo hebraico.

O processo de desenvolvimento do judaísmo,da constituição da monarquia no ano 935 a. C.até o período das origens do cristianismo,oferece-nos uma prova bastante eficaz desta leiobjetiva da sociedade.

Inicialmente, o povo hebreu conheceu asdiversas formas de vida religiosa queacompanham o surgimento da comunidadeprimitiva e a sua passagem gradual àeconomia escravista. O culto dos animais, dasplantas, dos fenômenos naturais, das águase das nascentes, característico da fasetotêmica da vida tribal, domina a parte maisantiga da Bíblia, tenuemente mascaradapelas preocupações polêmicas e pelaincompreensão dos seus últimos redatores.São dessa mesma época as prescrições rituaistípicas de uma sociedade nômade, dedicadaessencialmente à caça e à pecuária, tais comoos tabus alimentares e a prática da“circuncisão”, a qual, embora sejaencontrada frequentemente entre os árabese numerosos grupos da África tropical e

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equatorial, transformou-se depois, naimaginação popular, numa dascaracterísticas fundamentais do judaísmo.(253)

A serpente e o touro são os dois animaisque deixaram as marcas mais profundas naprática religiosa de Israel.

Como totem e como deus da fertilidade, aserpente surge no primeiro plano em toda aPalestina; da narrativa da tentação de Adão à“serpente de bronze” de Moisés, destruída pelorei Ezequias no século VIII a. C., a tradiçãobíblica oferece-nos testemunhos frequentes epitorescos. O nome da serpente, seraph, estána raiz de Serafins, os anjos alados quemontam guarda no trono de Deus; é muitoprovável que na arca santa – um cofrezinhovermelho do tipo daquele mais tarde usadopelos árabes – inicialmente estivesse guardadauma serpente viva, símbolo do deus Jeová,nascido no deserto e às vezes identificadotambém com o touro, o vento, o fogo, a pedra,o monte, a nascente. Aquilo que é certo é que onome dos primeiros sacerdotes de Jeová, os“levitas”, está ligado ao culto das serpentes;o termo árabe lawah, que significa desenroscar-se, torcer-se, arrastar-se, e a etimologia dofamosíssimo Levi-athan, o deus dragão dosprimeiríssimos mitos hebraicos, levam-nos aomesmo conceito.

Quanto ao touro, as coisas se mostram

253 N.T.: No que se refere a toda esta parte, recomendamos uma obra de altovalor científico: La religion d’Israel, de R. KREGLINGER, 2.a ed., Bruxelas,1926 (Études sur l’origine et le développement de la vie religieuse, III).

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ainda mais claras. O grande sacerdote desteculto professado no norte da penínsulasinaíta, era Arão, o lendário irmão de Moisés.Mais tarde, em sinal de desprezo, a Bíbliafalará do touro apenas como de um bezerro;mas permanece o fato de que, ainda na épocados reis, o culto de Jeová, no santo dossantos, era caracterizado por estatuetasdouradas de dois touros, que desfilavam nasprocissões e eram expostas à veneração dosfiéis (I Reis, XII, 28; II Reis, X, 29; XVII, 16). Oculto de um deus tauriforme da fertilidade,difundido em toda a bacia do Mediterrâneo,deve ter alcançado um tal grau dedesenvolvimento entre os hebreus, que nanarrativa do Deuteronômio, XXXIII, 17, opróprio Moisés agonizante, ao abençoar asdoze tribos de Israel, atribui o sobrenome de“touro majestoso” à descendência doprimogênito de José, Efraim, que tem“chifres de boi selvagem”.

[…].

Ao lado das divindades típicas dos povosprimitivos, a gente hebraica, nas suasmigrações repletas de riscos e contrastes,quando ainda não havia saído do desertoarábico, elaborara uma das muitas crenças dosnômades: a ideia de fôrças misteriosas,mencionadas ora no singular e ora no plural,que acompanham a tribo na sua marcha,numa caixa levada às costas, na qualrepousam durante as longas paradas (el,elohim). A crítica bíblica pôde separar os doisdocumentos fundamentais da velha tradição

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religiosa hebraica, os quais frequentementereferem-se aos mesmos mitos: aquele quechama a divindade pelo nome de Elohim eaquele que usa o nome Javé. Mas não é fácilestabelecer qual dos dois é mais antigo, emvirtude do processo de reelaboração a queestes textos foram submetidos durante e depoisdo período do exílio, sob a influência dosprofetas e das castas sacerdotais do século V-IV.

O termo El é encontrado entre os outrosnomes de divindades nas tábuas de argilaem língua ugárica, descobertas porSchaeffer entre 1929 e 1933 em Ras Shamra,nome árabe da antiga Ugarit, nas regiões maissetentrionais da Palestina, e atribuídas aoséculo XIV a.C.; algumas vezes é acompanhadopor uma palavra feminina, resíduo talvez deuma longínqua idade matriarcal. (254) Aocontrário, a forma exata do outro termo, Javé,não pode ser fixada com segurança porque atéuma época muito avançada, contemporânea àsorigens do cristianismo, este nome continuava aser reproduzido nos textos hebraicos com asletras do alfabeto fenício, há muito temposubstituídas na prática corrente pela escrita“quadrada” usada até hoje, e a sua pronúnciaera mantida em segredo por motivos deconcorrência mágica. Talvez fosse Jahu, ouJeho, que se incorpora em algumas formas

254 N.T.: Veja-se o recente estudo de J. GRAY, The legacy of Canaan (a herançade Canaan). The Ras Shamra texts and their relevance to the OldTestament (suplemento de Vetus Testamentum, V, 1957, com índice dospassos ugáricos e escriturais.

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rituais como hallelu-já (“deus seja glorificado”) eem muitos nomes próprios da história hebraica,entre os quais Jeho-shua (“socorro de deus”)que estranhamente nós confundimos hoje oracom Josué e ora com Jesus.

Uma outra forma do nome de deus era Jao,que com etimologia imaginária os círculos anti-hebraicos de Alexandria procuravam ligar aoegípcio Eio (asno). Daí a lenda popular de queos hebreus adoravam uma divindade comcabeça de asno; no século II d.C. Estaacusação será retomada contra os cristãos.Quando Pompeu, no ano 63 a.C., invadiu oTemplo de Jerusalém, espantou-se por nãoencontrar na arca a imagem do deus asno quelhe fora indicada como característica do cultojudaico.

Pode ser que se tenha chegado à forma Javésob a influência de uma etimologia teológica quepretendia aproximar o nome divino de umaforma do verbo ser: “aquele que é”. De resto,também esta divindade tinha uma consorteceleste; e a sua história não se diferencia muito,até a reforma profética, da história de todos osoutros deuses posteriores ao período pastoral,ou melhor, que se transformaram de época emépoca de acordo com as vicissitudes dodesenvolvimento da sociedade. Recorde-se queno Velho Testamento a vida do pastor é tida namáxima consideração, tanto que uma metáforaquase estereotipada, que se desenvolveráenormemente no cristianismo, assemelhavaDeus ao “bom pastor”; só no século III d.C.,quando a atividade pastoril se rebaixara

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profundamente, um rabino mostrará acontradição entre o apelativo de “pastor” que aBíblia dá à divindade e a pouca consideraçãoem que era tida então aquela atividade. (255)

Quanto à forma Jehovah, ela tem umaorigem perfeitamente clara e é devida a umapura e simples transliteração litúrgica.

[…].

Ao contrário, as divindades dos povos quehabitavam a Palestina antes dos hebreus erampredominantemente de tipo agrícola esedentário: as pedras sagradas, as plantassagradas, as fôrças da natureza (Sol, chuva,vento, insetos) e os Baal ou “senhores”, oequivalente celeste dos “senhores” da terra, doslugares altos e dos campos cultivados.Diferentemente do ser supremo e das vagasfôrças misteriosas veneradas pelos nômades,os deuses cananeus e filisteus tinham templos ecultos fixos. A vitória das tribos hebraicassobre estas populações, no período daconquista da Palestina, é apresentada pelaBíblia como uma vitória dos poderes divinosde Israel sobre os Baal inimigos, que foramgradualmente reduzidos à função de seresdemoníacos (Astarte-Astarote; Baal Peor-Belgafor; Baal Zebu-Belzebu; Bel-Belial ouBeliar, etc.).

Mas a verdadeira religião hebraica, talcomo era praticada no momento em quenasceu o cristianismo, formou-se num

255 N.T.: Hama bem-Hamina, Omelia sul salmo 23 (v. BARON, Histoire d’Israel,vol. I, cit., pág. 341).

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período ainda mais recente, quando as tribosque conseguiram ocupar a Palestinamodificaram radicalmente o seu modo de vida epassaram a uma organização econômico-socialbaseada na predominância, embora sob formasmais atenuadas do que nos outros países doOriente Próximo e da bacia do Mediterrâneo,das relações de escravidão.

Os dois reinos nos quais se dividiramimediatamente depois as tribos hebraicas, o deIsrael no norte, tendo Samaria como centro, e ode Judá no sul, tendo Jerusalém como capital,tiveram vida efêmera. Com a deportação demilhares de famílias para a Babilônia, no ano586 a.C., a história dos hebreus, comoEstado nacional independente, praticamentetermina: à opressão social característica daépoca da escravidão, contra a qual já tinhamreagido os primeiros “profetas” (Amos,Jeremias, o primeiro Isaías, etc.), acrescenta-sea dominação estrangeira nas suas formas maisbrutais.

Além das massas reduzidas à escravidãopelos invasores, dezenas de milhares dehebreus emigraram mais ou menosvoluntariamente e estabeleceram-se em quasetodos os centros habitados do mundo oriental,na bacia do Mediterrâneo e até na Índia e naChina. (256) Fruto da derrocada da liberdade,surgiu e foi elaborada a ideia de um

256 N.T.: Segundo alguns cálculos recolhidos por Baron, em sua história social ereligiosa de Israel, nos limites do Império Romano, no século I d.C., sobreuma população de 60-70 milhões de habitantes, pouco menos de 7 milhõeseram hebreus, dos quais mais de 6 milhões fora da Palestina.

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“salvador”, político e social, que só podiaser concebido com o aspecto de um novo“rei” (o messias), comandante de exércitos elibertador nacional.

Esta concepção, que sofreu uma evoluçãocujas fases são de fácil reconstrução,identificou-se com a reforma monoteísta,contribuindo para dar à religião dos hebreusaquele aspecto típico que séculos e séculosde história não conseguiram apagar. (257)(grifo nosso)

4 – Werner Keller:

Aliás, a própria Bíblia sugere quepresumivelmente houve muita coisa bemdiferente daquilo que parecia ser à primeiravista. Por exemplo, a religião, como eraefetivamente praticada em vastas regiões, e oculto genuinamente popular dos “filhos deIsrael”, assumiram aspectos bem diversosdaqueles que os autores da Bíblia teriamgostado que assumissem. Sempre houve motivopara os profetas ficarem irados, sempre osautores bíblicos clamaram contra a “idolatria”, os“bezerros de ouro”, e, a julgar por taispronunciamentos, obviamente, pelo menosparte do povo deveria ter continuado apraticar cultos, considerados pelos autoresbíblicos como fora das normas estabelecidas eportanto altamente condenáveis.

257 DONINI, 1965, p. 152-159.

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Quanto à realidade daqueles dias, é só citaralguns poucos exemplos tirados da Bíblia. Já foimencionado em outra parte que Raquel, mulherde Jacó, “patriarca” bíblico, furtou os ídolos(terafim) de seu pai, Labão (Gênese 31.19), eque uma serpente de bronze, em efígie, datandodos tempos da marcha pelo deserto (Números21.9), continuou a ser venerada no templo deJerusalém, até o reinado de Ezequias, rei deJudá (Reis II 18.4), por volta de 700 a.C. Damesma forma, o próprio Salomão, o construtordo templo, permitiu – muito contra a vontadedos autores bíblicos – que as damas do seuserralho venerassem deidades e prestassemcultos a deuses alheios (I Reis 11.1 a 8);ademais ele mesmo mandou edificar “umtemplo a Camos, ídolo dos moabitas”, e maisoutro “a Moloc, ídolo dos filhos de Amon”, eparticipou, pessoalmente, de cultos (II Reis23.13). Aliás, quase todos os soberanosisraelitas, sucessores de Salomão, agiramdessa maneira. Até um fanático como Jeú, reide Israel (842-815 a.C.), que afogou em rios desangue os adeptos de Baal, deu motivo decensura com a prática de cultos nada ortodoxos(II Reis 10.18 a 29). Da mesma forma, em todaparte entre os “filhos de Israel” eramencontradas figurinhas nuas de Astarteia eainda à sombra do templo, do templo deSalomão, em Jerusalém, a arqueóloga britânicaKathleen M. Kenyon desenterrou um recinto,caracterizado como de culto pagão pelos pilareslá encontrados. De fato, na realidade, areligião popular, efetivamente praticada

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pelos “filhos de Israel”, era bem diversadaquela que a Bíblia nos mostra e faz crerque tivesse sido praticada. Para tanto, eis osindícios dados pela própria Bíblia, em númerobastante grande.

Ao passo que na Terra Santa a moral nemsempre era tal como a anuncia a Bíblia, poroutro lado os povos vizinhos de Israel, por elafrequente e veementemente censurados,também conheceram personificações divinas deprincípios éticos e morais. Assim, entre oscananeus era difundida a ideia “bíblica” doreinado de Deus, que não ficou, portanto,limitada à Bíblia. Aliás, ao conhecermos ostextos de Ugarit, que falam das divindades daantiga terra de Canaã, como El e Baal,verificamos com surpresa a que ponto essaspersonagens encarnaram conceitos religiososposteriormente surgidos na Bíblia. Isso vai tãolonge que o salmista decanta o deus real daBíblia como “rei de todos os deuses”, o quesomente tem sentido quando, ao seu lado,ainda se admite a presença de outros deuses(veja Salmos 95.3, 96.4, 97.7 e 9). A exemplode Baal de Ugarit, também o deus-rei bíblicotem o seu “santo monte” (Salmos 3.5), situadoao norte. Por intermédio de Otto Eissfeldt,pesquisador da Bíblia, natural de Halle,Alemanha Federal, sabemos a que se refere tal“santo monte”; é o Zaphon, também chamadoMons Casius, o atual Djebel al-Agra, de milsetecentos e setenta metros de altitude, trintaquilômetros ao norte de Ras Shamra, na costamediterrânea da Síria setentrional. E, a exemplo

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de Baal, que, como o deus das tempestades,monta nas nuvens, também o Deus da Bíblia édecantado nos Salmos como vindocarregado por nuvens e ventos (Salmos104.9).

Todavia, não obstante todo o palavreadoirado dos profetas, também El e Baalpersonificavam valores éticos; assim, El era“sagrado”, e Baal, na qualidade de “juiz” e aexemplo do Deus da aliança bíblica,encarregou-se de fazer justiça. Desse modo, aBíblia foi confirmada e elucidada a partir de umdado do qual ninguém teria esperado queviessem tais confirmações e elucidações. E foijustamente a religião tão difamada esupostamente diabólica da antiga Canaã afornecer elementos para uma novacompreensão dos pronunciamentos bíblicosa respeito da “religião dos patriarcas”. Hámuitos cientistas que não têm a menordúvida de que, quando os “patriarcas”bíblicos invocavam El-Eljon (o “Altíssimo”),El-Olam (o “Velho”, o “Eterno”), El-Roj(aquele “que aparece” ou “que me vê”) e El-Shadday (o “Supremo”, ou “Todo-Poderoso”), suas invocações eram dirigidasa El, o principal deus cananeu, em uma dassuas respectivas versões regionais.

El e Baal eram os deuses reais do panteãocananeu. Posteriormente, seu lugar foitomado por Jeová, o Deus do “povo eleito”da Bíblia. Contudo, houve certasdiferenciações. El era estático, absorto em sipróprio, distante, inacessível, ao passo que Baal

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era mais dinâmico, ativo, presente. Segundo omito cananeu, El criou o mundo, ao passo queBaal deu àquele mundo fecundidade e vidasempre novas, renovadas. El era o deusdistante; Baal, o deus próximo. Jeová, o Deusdos “eleitos” da Bíblia, reuniu os traços típicosde ambos; seu domínio sobre as demaisdeidades era imaginado como tendo sido maisradical, a ponto de negar, por completo, acoexistência de todas elas.

Aliás, é ponto pacífico, claro e patente, queum deus real dessa natureza, a cujo lado nãohavia mais lugar para as outras divindades, nemna qualidade de súditos, tampouco tolerava ummito divino, cuja exuberância – a nosso ver –conferia algo de bizarro aos antigos deusescananeus, pois aquele mito teria porpressuposto a crença na existência de deusesalheios… (258) (grifo nosso)

5 – Philotheus Boehner (1901-1955) e Etienne

Gilson (1884-1978):

É verdade que a aceitação incontroversado monoteísmo só se impôs ao fim de longoprocesso educativo, embora já viesseproposto com toda a clareza desejável noDeuteronômio (6,4). A luta incansável dosprofetas contra as várias formas dopoliteísmo nos dá uma ideia da estranhezacom que o homem antigo acolhia a doutrina

258 KELLER, 2000, p. 288-290.

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monoteísta. O cristianismo recebe-a comoherança preciosa, e os filósofos cristãos farãogrande empenho em penetrá-la racionalmentedos argumentos da existência de Deus. (259)(grifo nosso)

6 – Will Durant (1885-1981):

Quando penetraram no palco da história,os judeus não passavam de beduínosnômades, medrosos dos demônios do ar,adoradores das pedras, dos carneiros, dosbois, dos espíritos das cavernas emontanhas. O culto do boi e do carneiro eramuito vivo; Moisés nunca pôde extirpar dasua gente a fé no Bezerro de Ouro, porque aadoração egípcia do touro ainda estavafresca em sua memória; por longo tempoJeová foi simbolizado por esse herbívoro.Vemos no Êxodo como os judeus se regalavamem danças diante do Bezerro e como Moisés eos levitas – ou a classe sacerdotal – mataramtrezentos deles, como punição à idolatria. Daadoração da serpente existem inúmeros traçosno começo da história hebraica, desde asimagens de serpentes que encontramos nasruínas mais recuadas, até a serpente de bronzefeita por Moisés e adorada no Templo até aépoca de Ezequiel (720 a.C.). Como entretantos outros povos, a serpente se lhesafigurava sagrada, parte como símbolo fálicoda virilidade, parte como símbolo da

259 BOEHNER e GILSON, 2003, p. 16.

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sabedoria, da subtileza e da eternidade – ou,literalmente, pela faculdade de juntar a caudacom a cabeça. Baal, simbolizado em pedras deforma cônica muito semelhante ao linga doshindus era venerado por muitos judeus como oprincípio masculino da reprodução, o esposo daterra que ele fecundava. Assim como o primitivopoliteísmo sobreviveu na adoração dos anjos esantos e no teraphim, ou ídolos portáteis queserviam de deuses caseiros, assim tambémas nações mágicas, abundantes nos cultosprimitivos, permaneceram até os últimostempos, a despeito dos protestos dossacerdotes. O povo parece ter olhado paraMoisés e Aarão como mágicos, e ter fomentadoa profissão de mágicos e feiticeiros. Aadivinhação do futuro era obtida por meio dedados (Urim e Thummim) sacudidos numacaixa (ephod) – ritual também usado paraconhecer a vontade dos deuses. Ossacerdotes opuseram-se a esta prática epregaram a confiança exclusiva na mágica dosacrifício, da oração e das oferendas.

Lentamente a concepção de Jeová como odeus nacional tomou forma e deu à fé judaica aunidade e simplicidade que a elevou acima docaótico mosaico dos panteons mesopotâmicos.Aparentemente os judeus, depois da conquista,tomaram um dos deuses de Canaã, Iahu, (260) eo recriaram à sua própria imagem, severo,belicoso, rígido, com quase louváveis limitações.

260 N.T.: Entre ruínas da Idade do Bronze (3000 a.C.) foram encontradas emCanaã, em 1931, peças de cerâmica com o nome duma deidade canaanita,Yah ou Yahu.

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[…].

Originariamente Jeová parece ter sido o deusdo trovão, morando nas montanhas e adoradopelas mesmas razões que levavam o jovemGorki à crença quando trovejava. […]. (261) (grifonosso)

Jeová não era a única deidade cujaexistência foi reconhecida pelos judeus, ou porele mesmo; tudo quanto exigia no PrimeiroMandamento era que fosse colocado acima dosoutros. “Eu sou um deus ciumento”, confessaJeová, e induz os fiéis a “derribar” seus rivais e“quebrar suas imagens”. Antes de Isaíasraramente os judeus pensavam de Jeovácomo o deus de todas as tribos [fosse o]mesmo de todos os hebreus. Os moabitastinham o deus Chemosh, a quem, a conselho deNoémi, Rute devia permanecer leal; Belzebu erao deus de Ekron, e Milcon era o deus de Amon;o separatismo político e econômico daquelespovos muito naturalmente resultou no quepodemos chamar independência teológica. Emseu famoso cântico, Moisés canta: “Quementre os deuses é semelhante a ti, Jeová?”, eSalomão diz: “Grande é o nosso deus acimade todos os deuses.” Não somente eraTammuz aceito por todos os judeus menoscultos como um deus real, como o seu cultose tornara popular na Judeia; Ezequiellamentava-se de que o clamor feito lá fora, norito da morte de Tammuz fosse ouvido no

261 DURANT, 1957, p. 13-14.

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interior do Templo. O separatismo das tribosjudaicas levava-as a terem suas própriasdivindades; “os teus deuses são em númeroigual ao número das tuas cidades, ó Judá”; eo sombrio profeta revolta-se contra a adoração eBaal e Moloch pelos judeus. Com odesenvolvimento da unidade política nosreinados de Davi e Salomão e com acentralização do ritual no Templo deJerusalém, a teologia refletiu a história e apolítica, e Jeová se tornou o único deus dosjudeus. Além deste “henoteísmo” (262) nãoderam eles mais nenhum passo rumo aomonoteísmo, até ao advento dos Profetas. (263)Mesmo no princípio a religião hebraicaaproximou-se mais do monoteísmo do quequalquer outra fé pré-profética, com exceção doefêmero culto do sol do faraó Ikhnaton. Ojudaísmo mostrou-se igual em sentimento epoesia ao politeísmo da Babilônia e Grécia e eraimensamente superior a outras religiões de seutempo em majestade e poder, em unidadefilosófica, em fervor moral e influência. (264) (grifonosso)

262 N.T.: Palavra inventada por Max Müller para designar a adoração dum deuscomo supremo, combinada com a explícita (Índia) ou tácita (Judeia)admissão de outros deuses.

263 Eliseu, entretanto, já no século 9º a.C., anunciava um deus único: “Eu seique não há nenhum deus em toda terra, salvo em Israel” (2 Reis V, 15).Devemos ter em mente que mesmo o atual monoteísmo é muito relativo.Como os judeus adoravam uma divindade tribal, assim nós adoramos umdeus europeu, um deus francês, inglês, alemão; e os milhões de habitantesda Índia, China e Japão não reconhecem o deus dos nossos pais. Só quandoa terra se unificar num governo só poderá haver um deus único para toda aterra.

264 DURANT, 1957, p. 16-17.

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Mas os hebreus, apesar de tudo, jamaisfugiram à superstição e à idolatria. Os altosdas montanhas e os bosques continuavam aabrigar deuses de fora e a testemunharestranhos ritos; uma boa minoria do povoainda se prostrava diante de pedras divinasou adorava Baal e Astarte, ou praticava a artedivinatória à maneira da Babilônia, ou queimavaincenso diante de imagens, ou ajoelhava-sediante da Serpente de Bronze ou do Bezerro deOuro, ou enchia o Templo com o barulho defestins pagãos, ou fazia suas crianças“passarem pelo fogo” em sacrifício; mesmoalguns dos reis, como Salomão e Acab,“prostituíam-se” diante de deuses estrangeiros.Homens santos, como Elias e Eliseu, ergueram-se contra essas práticas e sem ser sacerdotesprocuraram com o exemplo de suas vidas levaro povo ao caminho da retidão. […]. (265) (grifonosso)

7 – Júlio Trebolle Barrera:

Entre as descobertas epigráficas maisrecentes sobressaem as de Tell Deir ‘Alla, demeados do século VIII a.C., em escrituraaramaica cursiva, com a menção de “Balaão,filho de Beor”, célebre personagem aludido nosrelatos de Nm 22-24 (Van der Kooij); KuntilletAjrud, com a representação de três figuras,duas das quais podem corresponder a Javée sua consorte, se esta for efetivamente a

265 DURANT, 1957, p. 19.

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interpretação correta da inscrição que aacompanha: “Javé de Samaria e sua ‘Ašerah”(lyhwh šmrn wl”šrth) (Meshel); Khirbet el-Kom, de meados do século VIII, com o texto deuma benção: “Bendito é Javé e sua ‘Ašerah”(Dever, Lemaire). Estes dois textos nãodeixam de ser enormemente perturbadorespara a história do javismo monoteísta. (266)(grifo nosso)

8 – Karen Armstrong:

[…] Originalmente Jeová fora membro daAssembleia Divina dos “santos”, que El, opoderoso deus de Canaã, havia presididocom sua consorte Aserá. Cada nação daregião tinha sua própria divindade padroeira, eJeová era “o santo de Israel”. (267) No séculoVIII, Jeová havia expulsado El da AssembleiaDivina (268) e reinava sozinho sobre umamultidão de “santos”, guerreiros do exércitoceleste. (269) Nenhum dos outros deuses podiase igualar a Jeová na fidelidade a seu povo.Nisso ele não tinha pares, não tinha rivais. (270)Mas a Bíblia mostra que até a destruição dotemplo por Nabucodonosor, em 586, osisraelitas também adoraram grande número

266 BARRERA, 1999, p. 105.267 N.T.: Deuteronômio 32:8-9.268 N.T.: Salmo 82.269 N.T.: Salmo 47-8, 96,148-51.270 N.T.: Salmo 89:5-8; Mark S. Smith, Origins of Biblical Monotheism, p. 9.

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de outras divindades. (271)

[…].

No século VIII, um pequeno número deprofetas quis levar o povo a adorarexclusivamente Jeová. Mas esse não foi ummovimento popular. Como guerreiro, Jeováera insuperável, mas não tinha conhecimentoespecializado em agricultura, de modo que,quando queria uma boa colheita, era natural queo povo de Israel e Judá recorresse ao cultodo deus local da fertilidade, Baal, e sua irmã-esposa Anat, praticando o rito sexual comumpara tornar os campos férteis. No início doséculo VIII, Oseias, um profeta do reino donorte, invectivou contra essa prática. Suamulher Gomer servira como prostituta sagrada aBaal, e a dor que a infidelidade lhe causava era,imaginava ele, semelhante à que Jeováexperimentava quando seu povo se prostituíacom outros deuses. Os israelitas deviamretornar a Jeová, que podia suprir todas as suasnecessidades. Era inútil tentar aplacar Jeovácom o ritual do templo: este queria lealdade deculto (hesed), não sacrifício animal. (272) Se elescontinuassem a ser infiéis a Jeová, o reinode Israel seria destruído pelo poderosoImpério Assírio, suas cidades, arrasadas, eseus filhos, exterminados. (273)

A Assíria havia estabelecido um poder semprecedentes no Oriente Médio; ela devastava

271 N.T.: Mark S. Smith, The Early History of God: Yahweh and the Other Deitiesin Ancient Israel, Nova York / Londres, 1990, p. 44-9.

272 N.T.: Oseias 6:6.273 N.T.: Oseias 11:5-6.

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regularmente os territórios de vassalosrecalcitrantes e deportava a população. Oprofeta Amós, que pregava em Israel emmeados do século VIII, afirmou que Jeovámovia uma guerra contra Israel para punirsua injustiça sistêmica. (274) Enquanto Oseiascondenava o amplamente respeitado culto deBaal, Amós transformou por completo o culto deJeová: ele não mais adotava o lado de Israel demaneira automática. Amós cobriu também dedesprezo os rituais do templo no reino do norte.Jeová estava enojado de cantorias ruidosas edo arranhar devoto das harpas. Em vez disso,Ele queria que a justiça “fluísse como água, e aintegridade como uma torrente inexaurível”. (275)Desde essa data remota, os Escritos bíblicosforam subversivos e iconoclásticos, desafiandoa ortodoxia dominante.

[…].

Embora os historiadores bíblicos reverenciemEzequias como um rei devoto, que tentouproscrever a adoração de deuses estrangeiros,sua política exterior foi um desastre. Após umaimprudente rebelião contra a Assíria em 701,Jerusalém foi quase destruída, a zona ruralbrutalmente devastada e Judá reduzido a umpequenino Estado residual. Judá melhorou.Numa tentativa de se integrar ao império, elerevogou a jurisdição religiosa do pai,erguendo altares para Baal, erigindo umaefígie de Aserá e estátuas dos cavalos

274 N.T.: Amós 1: 3-5; 6:13; 2:4-16.275 N.T.: Amós 5:24.

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divinos do sol no templo de Jerusalém, einstituindo o sacrifício de crianças fora dacidade. (276) O historiador bíblico ficouhorrorizado com esses desdobramentos, maspoucos dos súditos de Manassés teriam ficadosurpresos, já que em sua maioria eles tinhamícones semelhantes em suas próprias casas.(277) Apesar da prosperidade de Judá, eles foramamplamente espalhados pelos inquietos distritosrurais que haviam suportado o impacto brutal dainvasão assíria; e, depois da morte deManassés, o descontentamento latenteirrompeu num golpe palaciano, que depôsAmon, filho de Manassés, e pôs no trono seufilho de oito anos, Josias. (278) (grifo nosso)

No texto final do Êxodo, editado no século VAEC, Deus faz uma aliança com Moisés nomonte Sinai (o que teria ocorrido por volta de1200). Travou-se um debate erudito sobre isso:alguns críticos acreditam que a aliança só setornou importante em Israel no século VII AEC.Qualquer que seja a data, a ideia da aliançaindica que os israelitas ainda não erammonoteístas, pois ela só faria sentido numcenário politeísta. Eles não acreditavam queJavé, o Deus do Sinai, era o único Deus, masprometeram, em sua aliança, ignorar todas asoutras divindades e dedicar-lhe adoraçãoexclusiva. É muito difícil encontrar uma única

276 N.T.: 2 Reis 21:2-7; 23:11; 23:10; Ezequiel 2025-26; 22:30.277 N.T.: Cf. Salmos 68;18; 84;12. Gosta W. Ahlstrom, The History of Ancient

Palestine, Menneapolis, 1993, p. 734.278 ARMSTRONG, 2007, p. 22-26.

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declaração monoteísta em todo oPentateuco. Até os Dez Mandamentosentregues no monte Sinai reconhecem aexistência de outros deuses: “Não terásoutros deuses diante de mim” (279). Aadoração de uma única divindade era um passopraticamente inédito: o faraó Akhenatontentara adorar o Deus Sol e rejeitar as outrasdivindades do Egito, porém seu sucessorreverteu essa política. Desprezar uma fontepotencial de mana parecia uma grandeimprudência, e a história posterior dosisraelitas mostra que eles relutaram muitoem abandonar o culto de outros deuses. Javéprovara sua habilidade na guerra, mas não eraum deus da fertilidade. Quando se instalaramem Canaã, os hebreus instintivamenteabraçaram o culto de Baal, o Senhor deCanaã, que fazia as plantações cresceremdesde tempos imemoriais. Os profetas osexortavam a se manter fiéis à aliança, mas amaioria continuava adorando Baal, Asera eAnat à maneira tradicional. A Bíblia nos dizque, enquanto Moisés estava no monte Sinai,os israelitas retomaram o velho paganismocananeu. Fizeram um bezerro de ouro, efígietradicional de El, e diante dele executaram osantigos ritos. Ao contrapor esse incidente àapavorante revelação no monte Sinai, oseditores finais do Pentateuco talvez estivessemtentando mostrar a gravidade da divisão emIsrael. Profetas como Moisés pregavam a

279 N.T.: Êxodo 20,2.

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elevada religião de Javé, mas o povo em geralpreferia os rituais antigos, com sua visãoholística de unidade entre deuses, natureza ehumanidade.

Contudo, os israelitas prometeram fazer deJavé seu único Deus após o Êxodo, e osprofetas os lembravam desse acordo.Prometeram adorar apenas Javé como seuelohim e, em troca, receberam a promessade que seriam seu povo especial edesfrutariam de sua proteção,esplendidamente eficaz. Javé lhes advertiraque os destruiria sem piedade se quebrassemesse acordo. Mesmo assim, fizeram o pacto.[…].

[…].

Era possível optar entre Javé e os deusestradicionais de Canaã. Os israelitas nãohesitaram. Não havia outro deus como Javé;nenhuma divindade ajudara seus adoradorescom tamanha eficiência. Sua poderosaintervenção nos assuntos de seus devotosdemonstrara, sem sombra de dúvida, que Javétinha os requisitos necessários para ser seuelohim: adorariam apenas a ele e abandonariamos outros deuses. Josué advertiu-os de queJavé era extremamente ciumento. Sedescumprissem os termos da aliança, ele osdestruiria. O povo se manteve firme: Javé eraseu único elohim. “Então, expulsai os deusesestranhos do meio de vós”, exclamou Josué,“e entregai vosso coração a Javé, o Deus de

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Israel”. (280)

A Bíblia mostra que os israelitas nãoforam fiéis à aliança. Lembravam-na emtempos de guerra, quando precisavam daespecializada proteção militar de Javé, mas emtempos de bonança adoravam Baal, Anat eAsera. Embora fosse fundamentalmentediferente em sua tendência histórica, o culto deJavé muitas vezes se expressava nos termos dovelho paganismo. O templo que o rei Salomãoconstruiu para Javé, em Jerusalém – a cidadeque seu pai, Davi, tomara dos jebuseus –, erasemelhante aos templos dos deusescananeus. Compunha-se de três áreasquadrangulares, que culminavam no Santo dosSantos, pequena sala onde ficava a Arca daAliança, o altar portátil que os israelitascarregaram consigo durante seus anos nodeserto. Dentro do Templo havia um enormetanque de bronze, representando Yam, o marprimordial do mito cananeu, e duas colunasde doze metros, indicando o culto dafertilidade de Asera. Os israelitas continuavamadorando Javé nos antigos santuários quehaviam herdado dos cananeus em Betel, Silo,Hebron, Belém e Dan, onde frequentemente serealizavam cerimônias pagãs. Mas o Templologo se tornou especial, embora, como veremos,também ali houvesse algumas atividades bempouco ortodoxas. Os israelitas começavam a vero Templo como a réplica da corte celeste deJavé. Festejavam o Ano-Novo no outono,

280 N.T.: Josué 24,24.

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começando com a cerimônia do bode expiatóriono Dia do Perdão e prosseguindo, cinco diasdepois, com a festa dos Tabernáculos, quecelebrava a colheita e o início do ano agrícola.Estima-se que alguns Salmos comemoram aentronização de Javé em seu Templo na festados Tabernáculos, que, como a entronização deMarduc, relembrava sua vitória sobre o caosprimordial. (281) O próprio rei Salomão foi umgrande sincretista: teve muitas esposaspagãs, que adoravam seus próprios deuses,e relações amistosas com os vizinhospagãos.

O perigo de o culto de Javé acabar submersopelo paganismo popular era constante e seagravou na segunda metade do século IX AEC.Em 869, o rei Acab ascendeu ao trono do reinosetentrional de Israel. Sua esposa, Jezabel,filha do rei de Tiro e Sidônia, no Líbano atual,era uma pagã fervorosa, decidida a convertero país à religião de Baal e Asera. Importousacerdotes de Baal, que imediatamenteconquistaram seguidores entre os setentrionais,que haviam sido submetidos pelo rei Davi eeram javistas tíbios. Acab permaneceu fiel aJavé, mas não tentou conter o proselitismode Jezabel. Contudo, quando uma grave secaatingiu o país, no final de seu reinado, umprofeta chamado Elias (“Javé é meu Deus!”)passou a vagar por lá, com sua capa de pelos esua tanga de couro, fulminando a deslealdadede Acab. Convocou o rei e o povo para uma

281 N.T.: James, The ancient gods, p. 152; Salmos 29,89 e 93. Mas essesSalmos são posteriores ao Exílio.

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disputa no monte Carmelo entre Javé e Baal.Ali, na presença de 450 profetas de Baal,perguntou à multidão: até quando hesitarãoentre as duas divindades? Depois, ordenouque dois bois, um para si e outro para osprofetas de Baal, fossem colocados em doisaltares. Ambos os lados pediriam a seus deusesque mandassem fogo do céu para consumar oholocausto. “De acordo!”, gritou o povo. Osprofetas de Baal invocaram seu nome a manhãinteira, saltitando ao redor do altar, gritando ecortando-se com espadas e lanças. Mas “nãohouve voz nem resposta”. Elias zombou: “Gritaimais alto! Porque ele é um deus: estarápreocupado, atarefado ou viajando; talvez estejadormindo e venha a despertar”. Nadaaconteceu: “Não houve voz nem resposta, enenhuma atenção lhes foi dada”.

Então foi a vez de Elias. A multidão seapinhou em torno do altar de Javé. Elias cavouum fosso em volta do altar e encheu-o de água,para dificultar ainda mais a combustão. Depois,chamou Javé. Imediatamente, o fogo baixou docéu e consumiu o altar, o boi e toda a água dofosso. A multidão se prostrou com o rosto porterra, exclamando: “Javé é Deus! Javé é Deus!”.Elias não foi um vencedor generoso. “Pegai osprofetas de Baal!”, ordenou. E não poupounenhum deles: levou-os para um vale dasproximidades e os matou. (282) O paganismo nãotentava se impor – Jezabel é uma exceçãointeressante –. pois sempre havia lugar para

282 N.T.: 1 Reis 19,20-40.

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mais um deus no panteão. Essesacontecimentos míticos mostram que, desde oinício, o javismo exigia repressão violenta enegação de outros credos, um fenômeno queexaminaremos mais detalhadamente no próximocapítulo. […]. (283) (grifo nosso)

Não surpreende que a maioria dos israelitasrecusasse o convite do profeta para dialogarcom Javé. Preferiam uma religião deobservância ritual menos exigente, no Templode Jerusalém ou nos velhos cultos da fertilidadede Canaã. Continua sendo assim: apenas umaminoria segue a religião da compaixão; amaioria das pessoas religiosas contenta-se coma adoração na sinagoga, na igreja, no templo,na mesquita. As antigas religiões cananeiasainda floresciam em Israel. No século X, o reiJeroboão I estabelecera o culto de doistouros nos santuários de Dan e Betel.Duzentos anos depois, os israelitas aindaparticipavam de ritos da fertilidade e sexosagrado, como vemos nos oráculos doprofeta Oseias, contemporâneo e Amós. (284)Alguns achavam que Javé tinha esposa, comoos outros deuses: recentemente, arqueólogosencontraram inscrições dedicadas “A Javé esua Asera”. Oseias irritava-se particularmentecom o fato de Israel violar os termos daaliança ao adorar outros deuses, como Baal.Preocupava-se com o sentido intrínseco dareligião, como todos os novos profetas. “Porque

283 ARMSTRONG, 2008, p. 38-42.284 N.T.: Oseias 8,5.

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o que eu quero é amor [hesed], e não sacrifício”,faz Javé dizer; “e o conhecimento de Deus[daath Elohim], não holocaustos” (285). Não sereferia a um conhecimento teológico: a palavradaath deriva do verbo hebraico yada: conhecer,que tem conotações sexuais. Assim, J diz queAdão “conheceu” sua esposa, Eva (286). Navelha religião cananeia, Baal se casava com aterra e sua união era celebrada com orgiasrituais, mas Oseias insistia que, desde a aliança,Javé substituíra Baal e se casara com o povode Israel. Eles tinham de compreender que eraJavé, e não Baal, quem fertilizaria o solo (287).Ele ainda cortejava a nação israelita como umamante decidido a reconquistá-la dos Baals quea seduziram:

E nesse dia, diz Javé,ela me chamará: “Meu marido”;e não me chamará mais: “Meu Baal”.E de sua boca tirarei os nomes de Baal,e eles nunca mais serão pronunciados. (288)

Enquanto Amós atacava a maldade social,Oseias repisava a falta de interioridade nareligião israelita: o “conhecimento” de Deus serelacionava com “hesed”, implicando umaapropriação e um vínculo interiores com Javéque deviam se sobrepor à observância exterior.

[…].

Como todos os outros profetas, Oseias tinha

285 N.T.: Oseias 6,6.286 N.T.: Gênesis 4,1.287 N.T.: Oseias 2,23-4.288 N.T.: Oseias 2,18-9.

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horror à idolatria. Previu que as tribossetentrionais suscitariam a vingança divina,adorando deuses que elas mesmas haviamcriado:

E agora acumulam pecados e mais pecados,e com sua prata fundiram imagens,ídolos de sua própria fabricação, todos obrasde artífices.‘’A eles sacrificai”, dizem, “homens quelançais beijos aos bezerros.” (289)

[…].

[…] depois que Javé venceu as outrasdivindades de Canaã e do Oriente Médio e setornou o único Deus, os homens prevaleceramem sua religião. O culto das deusasdesapareceu, sinalizando uma transformaçãocultural característica do mundo recém-civilizado.

Veremos que a vitória de Javé foi difícil.Envolveu tensão, violência e confronto, e sugereque a nova religião do Deus Único não seconsolidou com tanta facilidade entre osisraelitas quanto o budismo e o hinduísmoentre os povos do subcontinente. Javé nãoparecia capaz de transcender as velhasdivindades de maneira natural e pacífica. Tevede expulsá-las à força. Assim, no Salmo 82, nóso vemos pleiteando a liderança da AssembleiaDivina, que desempenhara um papel tãoimportante no mito babilônico e cananeu:

289 N.T.: Oseias 13,2.

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Javé toma seu lugar no Conselho de Elpara proferir julgamentos entre osdeuses. (290)

“Não mais arremedeis a justiça.Não mais favoreçais os maus!Fazei justiça ao fraco e ao órfão,sede justos com o aflito e o desvalido,salvai o fraco e o necessitado,tirai-os das garras dos maus!”

Ignorantes e insensíveis, eles prosseguemcegamente, solapando os fundamentos dasociedade humana.Eu disse: “Vós também sois deuses, filhos deEl Elyon, todos vós; no entanto, morrereiscomo homens; como homem, deuses,caireis”.

Em seu confronto com o Conselhopresidido por El desde tempos imemoriais,Javé acusa os outros deuses de nãocorresponderem ao desafio social da época.Ele representa o moderno ethos compassivodos profetas, mas seus colegas divinos nuncafizeram nada para promover a justiça e aequidade. Nos velhos tempos, Javé estevedisposto a aceitá-los como elohim, filhos de ElElyon (“Deus Altíssimo”) (291), porém agora osdeuses se revelaram obsoletos.Desapareceriam como os mortais. O salmistadescreve Javé não só condenando à morteseus semelhantes divinos como usurpando a

290 N.T.: A tradução inglesa deste versículo é de John Bowker Tbe religiousimagination and tbe sense of God (Oxford, 1978), p. 73.

291 N.T.: Ver Gênesis 14,30.

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prerrogativa tradicional de El, que,aparentemente, ainda tinha defensores emIsrael.

Apesar de malvista na Bíblia, a idolatria perse nada tem de errado: só se torna condenávelou ingênua se a imagem de Deus, construídacom tanto amor e carinho, é confundida com ainefável realidade a que se refere. Veremos quealguns judeus, cristãos e muçulmanostrabalharam essa imagem primitiva da realidadeabsoluta e chegaram a uma concepção maispróxima das visões hinduístas ou budistas.Outros, porém, nunca conseguiram dar essepasso e concluíram que sua concepção de Deusera idêntica ao mistério último. Os perigos deuma religiosidade “idólatra” se evidenciaram porvolta de 622 AEC. Josias, rei de Judá, queriamuito revogar as políticas sincretistas deseus antecessores Manassés (687-42) eArnon (642-40), que haviam estimulado opovo a adorar os deuses de Canaãjuntamente com Javé. Manassés chegou acolocar uma estátua de Asera no Templo,onde florescia um culto da fertilidade. Comomuitos israelitas eram devotos de Asera ealguns achavam que ela era esposa de Javé,só os javistas mais severos consideravam issouma blasfêmia. Todavia, decidido a promover oculto de Javé, Josias tratou de restaurar oTemplo. Durante as obras, o sumo sacerdoteHelcias encontrou um antigo manuscrito quesupostamente continha o último sermão deMoisés aos filhos de Israel. Helcias o entregouao secretário de Josias, Safan, que o leu em voz

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alta na presença do rei. O jovem monarcarasgou as vestes, horrorizado: compreendeu porque Javé se enfurecera tanto com seusancestrais! Eles não seguiram suas instruções,confiadas a Moisés. (292)

[…] Em seu último sermão, Moisés confereuma nova centralidade à aliança e à ideia daeleição especial de Israel. Javé distinguiraseu povo de todas as outras nações, não poralgum mérito próprio, mas por seu grande amor.Em troca, exigia lealdade absoluta e umaferrenha rejeição de todos os outros deuses. Onúcleo do Deuteronômio inclui a declaração quemais tarde se tornaria a profissão de fé judaica:

Ouve [shema], Israel! Javé é nosso Elohim,Javé somente [ehad]! Amarás, pois, Javécom todo o teu coração, com toda a tua alma,com toda a tua força. E estas palavras, quehoje te ordeno, estarão escritas em teucoração. (293)

Ao ser eleito por Deus, Israel se diferencioudos goyim e, portanto, quando chegasse à TerraPrometida, não teria nenhum relacionamentocom as populações nativas: “Não farás aliançacom elas nem lhes demonstrarás piedade”. (294)Não deveria haver casamentos mistos nemintercâmbio social. E, principalmente, a religiãocananeia deveria ser banida: “Derrubai seusaltares, despedaçai suas pedras eretas, cortaisuas estacas sagradas e queimai seus ídolos”,

292 N.T.: II Reis 22,3-10; II Crônicas 34,14.293 N.T.: Deuteronômio 6,4-6.294 N.T.: Deuteronômio 7, 3.

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Moisés ordena aos israelitas. “Porque és umpovo consagrado a Javé, teu Elohim; foi a tique Javé, nosso Elohim, escolheu para quefosses seu povo, dentre todos os povos daterra.” (295)

Hoje em dia, quando recitam o Shema, osjudeus lhe dão uma interpretaçãomonoteísta: Javé, nosso Deus, é único. Odeuteronomista ainda não atingira essaperspectiva. “Javé ehad” não queria dizer queDeus é Único, mas que Javé era a únicadivindade a quem era permitido adorar. Osoutros deuses ainda constituíam uma ameaça:seus cultos sedutores podiam afastar osisraelitas de Javé, que era um Deus ciumento.Se obedecessem às leis de Javé, ele osabençoaria e lhes daria prosperidade; se oabandonassem, as consequências seriamdevastadoras:

Serás arrancado da terra que passas apossuir. Javé te espalhará entre todos ospovos, de uma extremidade da terra até aoutra; e lá servirás a outros deuses demadeira e de pedra, que não conheceste,nem tu nem teus pais […] E tua vida será umfardo para ti […] Dirás, pela manhã, “Ah,quem me dera fosse noite!” e, à noite, “Ah,quem me dera fosse manhã!”, por causa doterror de teu coração, por causa do que veráscom teus olhos. (296)

295 N.T.: Deuteronômio 7, 5-6.296 N.T.: Deuteronômio 28, 64-8.

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Quando ouviram essas palavras, no final doséculo VII, o rei Josias e seus súditos estavamprestes a enfrentar uma nova ameaça política.Tinham conseguido manter os assírios àdistância, escapando, assim, ao destino das deztribos setentrionais, que sofreram os castigosdescritos por Moisés. Porém, em 600 AEC, o reiNabucodonosor, da Babilônia, esmagaria osassírios e começaria a erguer seu próprioimpério.

Nessa atmosfera de extrema insegurança, aspolíticas do deuteronomista causaram grandeimpacto. Longe de obedecer às ordens de Javé,os dois últimos reis de Israel haviam sidodeliberadamente imprudentes. Josias inicioude imediato uma reforma, agindo com zeloexemplar. Retirou do Templo e queimou todasas imagens, ídolos e símbolos de fertilidade.Derrubou a grande efígie de Asera e destruiuos aposentos das prostitutas sagradas doTemplo, que ali teciam vestes para a deusa.Destruiu todos os antigos santuários do país,que haviam sido enclaves do paganismo, eestabeleceu que, dali em diante, os sacerdotessó poderiam oferecer sacrifícios a Javé nopurificado Templo de Jerusalém. O cronista, queregistrou suas reformas quase trezentos anosdepois, descreve com eloquência essa piedadede negação e supressão:

Josias viu os altares de Baal seremdemolidos; derrubou os altares de incensoexistentes sobre eles, despedaçou asestacas sagradas e os ídolos esculpidos e

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fundidos; reduziu-os a pó e os espargiu sobreas sepulturas dos que lhes ofereceramsacrifícios. Queimou sobre seus altares osossos dos sacerdotes e purificou Judá eJerusalém. Assim fez também nas cidades deManassés, de Efraim, de Simeão e até deNeftali, e nos lugares devastados a seu redor.Ele derrubou os altares e as estacassagradas, despedaçou os ídolos e os reduziua pó e deitou abaixo todos os altares deincenso em toda a terra de Israel. (297)

Estamos longe da serena tolerância de Budapara com as divindades que acreditava terdeixado para trás. Essa destruição em massanasce de um ódio enraizado em ansiedade emedo.

Os reformadores reescreveram a históriade Israel. Os livros históricos de Josias,Samuel e Reis foram revisados segundo anova ideologia, e depois os editores doPentateuco acrescentaram trechos queconferiam às narrativas mais antigas de J e Euma interpretação deuteronomista do mitodo Êxodo. Javé era agora o autor de umaguerra santa de extermínio em Canaã. Aosisraelitas foi dito que os cananeus nativos nãodeveriam viver em seu país, (298) uma políticaque Josué implementou com terrívelmeticulosidade:

Naquele tempo, veio Josué e extirpou os

297 N.T.: II Crônicas 34,5-7.298 N.T.: Êxodo 23,33.

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enacins das montanhas de Hebron, de Dabir,de Anab, de todas as montanhas de Judá ede Israel; destruiu a todos, juntamente comsuas cidades. Não sobraram enacins noterritório israelita, exceto em Gaza, Gat eAzoto. (299)

Na verdade, nada sabemos da conquista deCanaã por Josué e pelos Juízes, embora nãohaja dúvida de que muito sangue foi derramado.Agora o banho de sangue recebia umajustificação religiosa. Os perigos de taisteologias de eleição, não atenuadas pelaperspectiva transcendente de um Isaías, sãoevidentes nas guerras santas que têm marcadoa história do monoteísmo. Em taiscircunstâncias, em vez de funcionar como umsímbolo que conteste nosso preconceito e nosobrigue a contemplar nossas própriasdeficiências, Deus é usado para endossar nossoódio egotista e torná-lo absoluto; ageexatamente como nós, como se fosse mais umser humano. Provavelmente é mais atraente epopular que o Deus de Amós e Isaías, que exigeimplacável autocrítica.

[…].

Devemos observar que nem todos osisraelitas endossavam o deuteronomismo nosanos que precederam a destruição deJerusalém por Nabucodonosor, em 587 AEC, ea deportação dos judeus para a Babilônia. Em604, ano da ascensão de Nabucodonosor, oprofeta Jeremias retomou a perspectiva

299 N.T.: Josué 11,21-2.

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iconoclasta de Isaías, invertendo a doutrinatriunfalista do Povo Eleito: Deus usava aBabilônia para punir Israel, e agora era a vez deIsrael ser “entregue à destruição”. (300) Cumpririasetenta anos de exílio. Quando ouviu esseoráculo, o rei Joaquim arrancou o pergaminhoda mão do escriba, rasgou-o e jogou-o no fogo.Temendo por sua vida, Jeremias foi obrigado ase esconder.

[…].

Enquanto o inimigo esteve às portas,Jeremias esbravejou com seus compatriotas emnome de Deus (embora, diante de Deus,implorasse por eles). Assim que os babilôniosconquistaram Jerusalém, em 587, os oráculosde Javé se tornaram mais confortadores: agoraque seu povo aprendera a lição, ele prometiasalvá-lo e levá-lo de volta para casa. Com apermissão das autoridades babilônicas,Jeremias permaneceu em Judá e, paramanifestar sua confiança no futuro, comproualgumas propriedades: “Porque assim diz JavéSabaot: ‘Ainda se comprarão casas, campos evinhas nesta terra”’. (301) Não surpreende queuns e outros culpassem Javé pela catástrofe.Durante uma visita ao Egito, Jeremiasencontrou um grupo de judeus que fugirapara a região do delta e não queria saber deJavé. As mulheres contaram que estavam muitobem enquanto realizavam os ritos tradicionaisem honra a Ishtar, Rainha do Céu, mas, assim

300 N.T.: Jeremias 25, 8,9.301 N.T.: Jeremias 32, 15.

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que os abandonaram, estimulados por tiposcomo Jeremias, sobrevieram o desastre, aderrota, a miséria. Parece, porém, que atragédia aguçou o entendimento de Jeremias.(302) Após a queda de Jerusalém e a destruiçãodo Templo, ele passou a compreender que taisaspectos externos da religião não passavam desímbolos de um estado interior, subjetivo. Nofuturo, a aliança com Israel seria muito diferente:“Porei minha lei em seu íntimo, e a escrevereiem seu coração”. (303)

[…].

Como estavam junto aos rios da Babilônia,alguns exilados inevitavelmente achavam quenão podiam praticar sua religião fora da TerraPrometida. Os deuses pagãos eram territoriais,e os que julgavam impossível entoar os cânticosde Javé num país estrangeiro saboreavam aperspectiva de arremessar bebês babilônioscontra as pedras. (304) Um novo profeta, porém,pregava calma. Nada sabemos sobre ele, e issopode ser significativo, porque seus oráculos esalmos não sugerem uma luta pessoal, como asde seus antecessores. Mais tarde, suas obrasforam acrescentadas aos oráculos de Isaías, epor esse motivo ele geralmente é chamado deSegundo Isaías. No exílio, alguns judeuspassaram a adorar os antigos deuses daBabilônia, mas outros adquiriram uma novaconsciência religiosa. O Templo de Javé

302 N.T.: Jeremias 44,15-9.303 N.T.: Jeremias 31, 33.304 N.T.: Salmo 137.

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estava em ruínas; haviam sido destruídos osvelhos santuários de Betel e Hebron. NaBabilônia, não podiam participar de liturgias quehaviam sido fundamentais para sua vidareligiosa na pátria. Só tinha, Javé. O SegundoIsaías deu mais esse passo e declarou queJavé era o único deus. Em seu remanejamentoda história israelita, o mito do Êxodo se revestede imagens que nos lembram a vitória deMarduc sobre Tiamat, o mar primordial:

E Javé secará o braço de mar do Egitocom o calor de seu sopro,e estenderá a mão sobre o rio [Eufrates],e o dividirá em sete canais, para que sepasse por ele a pé enxuto.E haverá caminho para o resto de seu povo[…].como houve para Israelquando saiu da terra do Egito. (305)

O Primeiro Isaías fizera da história um avisodivino; após a catástrofe, em seu livro daConsolação, o Segundo Isaías fez a históriagerar nova esperança para o futuro. Se Javéresgatara Israel uma vez, podia fazê-lo de novo.Ele planejava as questões da história; a seusolhos, todos os goyim juntos não passavam deuma gota no oceano. Ele era o único Deus quecontava. O Segundo Isaías imagina as velhasdivindades da Babilônia amontoadas emcarroças, transportadas aos solavancos. (306)

305 N.T.: Isaías 11, 15, 16.306 N.T.: Isaías 51, 9,10. Este seria um tema constante. Ver Salmos 65 7; 74,13-

4; 77,16; Jó 3,8; 7,12.

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Seu tempo acabara: “Não sou Javé?”, elepergunta repetidas vezes. “Não há outro Deusalém de mim”. (307)

Nenhum deus foi formado antes de mim,nem o será depois de mim.Eu, eu sou Javé,e fora de mim não há salvador. (308)

O Segundo Isaías não perdeu tempodenunciando os deuses dos goyim, que, desdea catástrofe, podiam ser vistos como vitoriosos.Calmamente assumiu que Javé – não Marducnem Baal – realizara os grandes feitos míticosque resultaram na criação do mundo. Pelaprimeira vez, os israelitas se interessavam defato pelo papel de Javé na criação, talvez porcausa do renovado contato com os mitoscosmológicos da Babilônia. Obviamente, nãotentavam formular uma explicação científica dasorigens físicas do universo, mas buscavamencontrar conforto no duro mundo do presente.Se Javé derrotara os monstros do caos nostempos primordiais, seria muito simples para eleredimir os israelitas exilados. Percebendo asemelhança entre o mito do Êxodo e asnarrativas pagãs da vitória sobre o caosaquático no começo dos tempos, o SegundoIsaías exortou seu povo a esperar comconfiança uma nova demonstração da forçadivina. Aqui, por exemplo, ele se refere àvitória de Baal sobre Lotan, o monstro

307 N.T.: Isaías 46, 1.308 N.T.: Isaías 43, 10, 12.

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marinho da mitologia da criação cananeia,que também se chamava Raab, o Crocodilo(tannim) e o Abismo (tehõm):

Desperta, desperta! Veste-te de força,braço de Javé,Desperta, como antes,em tempos de gerações há muito passadas.Não cortaste Raab ao meio,e transpassaste o Dragão [tannim]?Não secaste o mar,as águas do grande Abismo [terom],para fazer do leito do mar uma estradapor onde passassem os remidos? (309)

Finalmente Javé absorvera seus rivais naimaginação religiosa de Israel; no exílio, aatração do paganismo perdera força e nascera ojudaísmo. Numa época em que seu cultopoderia desaparecer com facilidade, Javéinfundia esperança em seus devotos, apesardas circunstâncias adversas.

Tornara-se, portanto, o único Deus. Nãohouve nenhuma tentativa de justificaçãofilosófica. Como sempre, a nova teologia venceunão por ser racionalmente demonstrável, maspor conseguir evitar o desespero e incutiresperança. Os judeus deslocados já nãoachavam estranha e perturbadora adescontinuidade do culto de Javé: ela secoadunava com sua condição.

No entanto, o Deus do Segundo Isaías nãotinha nada de acolhedor. Continuava inacessível

309 N.T.: Isaías 51, 9,10.

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à mente humana:

Porque meus pensamentos não sãovossos pensamentos. Nem vossos caminhosmeus caminhos, diz Javé. Porque, assimcomo os céus são mais altos que a terra,assim são meus caminhos mais altos quevossos caminhos, e meus pensamentos maisaltos que vossos pensamentos. (310)

A realidade de Deus ultrapassa o alcance depalavras e conceitos. Tampouco Javé fariasempre o que seu povo esperava. Num trechobastante ousado, particularmente pungente hojeem dia, o profeta anseia por uma época em queo Egito e a Assíria também se tornariam o povode Javé: “Bendito seja meu povo do Egito, eda Assíria, obra de minhas mãos, e de Israel,minha herança”, Javé diria. (311) Ele se tornarao símbolo de uma realidade transcendente quefazia as tacanhas interpretações de eleiçãoparecerem mesquinhas e inadequadas.

A conquista do Império Babilônio por Ciro, reida Pérsia, em 539 AEC, aparentementedemonstrou que os profetas estavam certos.Ciro não impôs os deuses persas aos novossúditos, mas adorou no templo de Marduc,quando entrou, triunfante, na Babilônia. Tambémdevolveu aos países de origem as efígies dasdivindades pertencentes aos povosconquistados pelos babilônios. Agora que omundo se acostumara a viver em gigantescos

310 N.T.: Isaías 55, 8, 9.311 N.T.: Isaías 19,24,25

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impérios internacionais, Ciro provavelmente nãoprecisou recorrer aos velhos métodos dedeportação. O fardo de governar seria mais levese os povos submetidos adorassem seuspróprios deuses em seus próprios territórios. Portodo o Império, Ciro estimulou a restauração detemplos antigos, alegando, repetidas vezes, queas divindades das populações locais oencarregaram dessa tarefa. Foi um exemplo datolerância e largueza de visão de algumasformas de religião pagã. Em 538, promulgou umédito que permitia aos judeus retomarem a Judáe reconstruírem seu templo. A maioria deles,porém, preferiu ficar: dali em diante, só umaminoria viveria na Terra Prometida. A Bíblia nosdiz que 42.360 judeus deixaram a Babilônia eTel Aviv e voltaram para Israel, onde impuseramseu novo judaísmo aos perplexos irmãos que láhaviam permanecido. (312) (grifo nosso)

9 – Tobias Churton:

[…] Para começar, você teria de saber o queé “Barbelo”. Tal conhecimento não écompartilhado por todos. Na verdade, ele não écompartilhado comigo. Se “Barbelo” chegou asignificar alguma coisa específica, no que serefere à sua etimologia precisa, o segredo foimuito bem mantido.

A palavra soa como se significasse algo.“Bar” pode significar parentesco em hebraico;“arba” sugere a palavra hebraica para o número

312 ARMSTRONG, 2008, p. 66-85.

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4; “El” é a palavra semita para “Deus”: onome do deus supremo da religião doscananeus em Ras Shamra. “Bel” (ou Baal) erao nome de um deus pai algumas vezesapresentado como inferior a “El”, mas adoradodo mesmo modo pelos cananeus e israelitas noAntigo Testamento. (313) (grifo nosso)

Dois Deuses?

O artigo sobre Judas na revista New Dawn(“Judas: The Greatest Disciple?”) foi escrito peloespecialista em assuntos esotéricos, RichardSmoley. Ele faz considerações interessantesacerca das possíveis origens judaicas da ideiado “Deus superior” e do “Deus inferior”, que éuma característica marcante do Evangelho deJudas. Smoley examina a obra da estudiosado Antigo Testamento Margaret Barker. Elaapresenta a hipótese de que, durante operíodo do “Primeiro Templo” (por volta de940-586 a.C.) da história judaica antiga, osjudeus adoravam um tipo de trio divino: El, oDeus supremo; Yahweh, o Deus nacional; eAsherah, uma consorte.

Segundo essa hipótese, Asherah foidescartada durante as reformas sacerdotaispromovidas pelo rei Josias (por volta de 640-609a.C.), e ordenou-se que El e Yahweh fossemvistos não como uma entidade separada,mas como um Deus único. Barker acreditaque esse período marcou a mudança dohenoteísmo (um deus supremo entre um círculo

313 CHURTON, 2009, p. 85.

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de deuses) para o monoteísmo (só existe umDeus; não há nenhum outro além dele). Deacordo com a hipótese de Barker, essa estruturareformada de adoração dupla dominaria asEscrituras hebraicas depois do século VII a.C.

Segundo essa ideia, Yahweh poderia servisto como um usurpador, que “ficou acimade seu nível” e se igualou a “El” (o termogenérico para Deus e o Deus supremo dealguns cananitas). Originalmente um “deusnacional” (toda nação teve um), Yahweh tornou-se a divindade absoluta nos interesses daunidade divina, contra o politeísmo dos vizinhosdos judeus, os cananitas (e outros). Ou seja,“El” estava muito perto para dar conforto eteve de ser “transformado em Yahweh”. Issoé uma teoria.

No que se refere à origem das divindadessuperiores e inferiores do “gnosticismo”, umateoria sugere que houve um tipo de “movimentode continuidade” das ideias judaicas maisantigas, apoiada por aqueles que se apegaramà estrutura dualista de uma divindade supremae uma divindade secundária, nacional. Eleschegaram a considerar a lei judaica inferior aomodo gnóstico como um meio de alcançar oDeus supremo. Assim, a crítica posterior dePaulo à lei judaica reflete o contato com essatradição de continuidade, ou o conhecimentodela. Como os assim chamados gnósticosseguiram Paulo em seu conceito das limitaçõesda lei judaica, a distinção gnóstica dasdivindades superior e inferior também refleteuma evolução dos conflitos sacerdotais e

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proféticos do antigo reino judaico.

A hipótese é plausível, mas será difícilconvencer àqueles que recordam as narrativaspatriarcais concernentes a Abraão e sua crençaquintessencial em um Deus (mas qual?).Contudo, a questão sobre o quãoverdadeiramente monoteístas eram osancestrais dos judeus é assunto de um debateconsiderável entre os acadêmicos – em especialporque a questão se aproxima muito dascrenças e dos desejos sinceros de muitaspessoas religiosas.

Sem uma máquina do tempo – e mesmo comtodo o progresso feito pela Arqueologia – nãotemos conhecimento absoluto dascomplexidades das crenças experienciadas noOriente Médio 1.500 anos, ou mais, antes deCristo. Sabemos no que as pessoas passaram aacreditar, mas temos pouco conhecimento sobrecomo elas passaram a acreditar nisso. Todos osrelatos favorecem os interesses dominantesdaqueles cujas versões dos acontecimentos ecrenças foram escritas. Isso vale tanto para oAntigo Testamento quanto para o Novo. (314)(grifo nosso)

10 – C. W. Ceram (1915-1972):

A língua sumeriana é semelhante à dosantigos turcos (turanianos). Pelo tipo elespertencem ao ramo indo-europeu. Isto é tudo o

314 CHURTON, 2009, p. 167-168.

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que se sabe a seu respeito – tudo o mais é purahipótese. Um povo que habitualmenterepresentava seus deuses no alto damontanha, que os adorava em lugareselevados e que, para esse fim, construíamontanhas artificiais em terras estranhas eplanas, não podia provir das grandes planícies.Teria vindo, talvez, das terras altas do Irã, ou demais longe ainda, das montanhas asiáticas? Talconclusão é apoiada pelo fato de a arquiteturasumeriana mais primitiva encontrada até opresente na Mesopotâmia basear-se numatradição de construções de madeira, quenormalmente só poderiam ocorrer em terrasaltas cobertas de espessa mata. (315) (grifonosso)

11 – Maria Fernanda Vomero:

A religião de Abraão

São 14 capítulos do Gênesis dedicados aAbraão. Ao contrário de outros profetas epersonagens do Antigo Testamento, cuja sagacomeça a ser narrada a partir do nascimento,Abraão estreia já adulto. No início do relato, elevive com seu pai, Terá, seus irmãos e suaesposa, Sara, em Ur, uma das cidades maisimportantes do mundo antigo, localizada ao suldo rio Eufrates (veja mapa na página 44). Nãotem filhos, porque Sara era estéril. Certo dia,Terá reúne Abraão, Sara e Ló, sobrinho dopatriarca, e resolve seguir com a família para

315 CERAM, s/d, p. 275.

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as terras de Canaã, que se estendiam dosudoeste da Síria até o Egito. Ao chegarem àcidade de Harã, depois de uma viagem longa eexaustiva, decidem ficar por lá mesmo. Terámorre. Abraão ouve pela primeira vez ochamado de Deus, que lhe promete terra edescendência. Sem pestanejar, ele deixa Harãe parte rumo à terra dos cananeus.

O relato bíblico narra o episódio como seAbraão fosse monoteísta desde sempre,segundo a concepção que temos hoje. Noentanto, o Alcorão, livro sagrado dosmuçulmanos, evoca passagens da vida dopatriarca que não constam da Bíblia e queexplicitam como se deu a adesão ao Deusúnico e o rompimento com a crença dosantepassados. Abraão (ou Ibrahim, como échamado no Islã), ainda jovem, inicia seuitinerário religioso recusando a adoração dosastros. Nega os deuses petrificados comoestátuas e parte para uma verdadeira batalhade fé contra a idolatria dos seusantepassados, destruindo os ídolos locais epregando a existência de um único Deus –como fez o profeta Maomé mais de 20 séculosdepois, quando o Estado Árabe estava seconstituindo. O povo condenou Abraão àfogueira e, milagrosamente, ele se salvou. “Porrevelação divina, Abraão sabia que deveriadivulgar o Deus único, o monoteísmo”, diz oxeque Ali Abdune, da Associação Mundial daJuventude Islâmica, em São Paulo. “A aceitaçãodele ao chamado de Deus significou submissãototal e voluntária à vontade divina. Abraão

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deixou tudo – por isso, se tornou o patriarca, oamigo de Deus.”

[…].

[…] Achados arqueológicos mostram queos povos da região do Crescente Fértil –como ficaram conhecidas as terrasprodutivas que se estendiam da antigaMesopotâmia ao Egito – não acreditavam emum Deus único e soberano. No períodopatriarcal, que vai de 2000 a.C. a 1500 a.C.,vigorava o politeísmo. Os seminômades,porém, eram henoteístas, ou seja, adoravamapenas uma divindade, mas admitiam aexistência de outras. “Cada clã cultuava o seupróprio deus”, diz o pastor luterano MiltonSchwantes, cientista da religião da UniversidadeMetodista de São Paulo. “A cultura seminômadenão permitia uma diversidade grande deconcepções de mundo.”

Segundo Milton, o politeísmo surge porquevários subgrupos, dentro de uma grandepopulação, requisitam funções diferentes dadivindade – deus da guerra, deus da colheita,deus do poço… Como a população do clã épequena e homogênea, uma diferenciaçãocomo essa poderia pôr em risco o grupo social.“Daí a tendência a um só caminho religioso”,afirma Milton. “Mas isso não significa que existaum pensamento teórico monoteísta no mundoantigo. Existe, sim, um monoteísmo de adesão,em que cada grupo adere a um único deus.”

Mulheres de Abraão

[…].

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[…] Num dos mais belos trechos do Gênesis,Deus surge a Agar próximo a um poço, no meiodo deserto, e pede que ela volte para casa. (O“Deus do poço” é uma imagem bastanterecorrente na religiosidade do período patriarcal)Também a ela Deus promete: “Multiplicarei tuadescendência de tal forma e será tão numerosaque não se poderá contar”. Isso acontecerá pormeio de Ismael, filho que ela carrega no ventre.Agradecida, Agar nomeia o Deus queconversou com ela de El-roí o “Deus que mevê”. (ver em Gn 16,15).

Abraão interpretado

Segundo o narrador do Gênesis, o Deus deAbraão é Javé (Iahweh, em hebraico). Noentanto, os exegetas, como são chamados osestudiosos dos textos sagrados, reconhecemque se trata de um anacronismo, um acréscimoposterior feito ao relato. No período patriarcal,a denominação mais comum de Deus seriaEl, como comprovam achados arqueológicosda época. Para entender por que El (o Deus davida) se tornou Javé (o Deus libertador), vocêprecisa voltar no tempo e mais precisamente aoinício da formação do povo de Israel, entre 1250a.C. e 1000 a.C., quando os primeiros cincolivros da Bíblia, que também formam a Torájudaica, começaram a ser redigidos.

Até aquela época, as narrativas erambasicamente orais. Circulavam várias históriassobre Abraão e os demais patriarcas. Aospoucos, esses relatos começaram a serescritos, obviamente sofrendo influênciasliterárias e ideológicas de acordo com o

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momento histórico que o povo vivia. Aversão final do Gênesis e dos demais livrosdata de 400 a.C., mais de mil anos depois daépoca em que Abraão teria vivido. “Nesseperíodo, houve um grande movimento paraconsiderar o povo de Israel uma raça única eJavé, o Deus único. Era preciso consolidar ateocracia, e esse tipo de instituição exigia aexistência de um Deus absoluto para justificar opoder do rei”, afirma o padre Shige Nakanose,biblista do Centro Bíblico Verbo, em São Paulo.

Até então, havia vários nomes para Deus eJavé era um deles. Referia-se a umadivindade masculina cultuada ao lado dadeusa Aserá em um período posterior aopatriarcal. Javé era o Deus adorado pelosgrupos que escaparam da escravidão e do exílioe que se juntaram ao incipiente povo de Israel.Assim, quando as últimas versões do Gênesisforam escritas, os redatores tentaramsubstituir referências às divindades daregião de Canaã – como o nome El – porinvocações a Iahweh. (316) (grifo nosso)

12 – Sigmund Freud:

[…] Não devemos esquecer que Moisés foinão apenas o líder político dos judeusestabelecidos no Egito, mas também seulegislador e educador, forçando-os a pôr-se aserviço de uma nova religião, que até o dia dehoje é conhecida, por sua causa, como a

316 VOMERO, 2003, p. 40-48 passim.

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religião mosaica. Mas, é tão fácil a um homemisolado criar uma nova religião? E se alguémquisesse influenciar a religião de outra pessoa,mais naturalmente não a converteria ele à suaprópria? Decerto. De uma forma ou de outra,não faltava ao povo judeu no Egito uma religião.E se Moisés, que lhes forneceu uma nova, eraegípcio, não se pode colocar de lado asuposição de que essa outra nova religiãoera a egípcia. (317) (grifo nosso)

Era nossa esperança que a possibilidade deMoisés ser egípcio se mostrasse frutífera eesclarecedora em diversas direções, mas aprimeira conclusão que tiramos dessahipótese – que a nova religião que ele deuaos judeus era a sua, egípcia – foi invalidadapor nossa compreensão do caráter diferentee, em verdade, contraditório das duasreligiões. (318) (grifo nosso)

[…] Em 1922, Emest Sellin fez umadescoberta que influenciou decisivamente nossoproblema. Descobriu no profeta Oseias(segunda metade do século VIII a.C.) sinaisinequívocos de uma tradição segundo a qualMoisés, o fundador da religião dos judeus,encontrou um final violento num levante deseu povo refratário e obstinado, ao mesmotempo que a religião por ele introduzida erarepudiada. Essa tradição, contudo, não serestringe a Oseias; reaparece na maioria dos

317 FREUD, 1997, p. 19.318 FREUD, 1997, p. 20.

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profetas posteriores, e, na verdade, segundoSellin, tornou-se a base de todas asexpectativas messiânicas mais tardias. Ao fimdo cativeiro babilônico, surgiu entre o povojudeu a esperança de que o homem que fora tãovergonhosamente assassinado retornassedentre os mortos e conduzisse seu povo cheiode remorso, e talvez não apenas esse povo.Para o reino da felicidade duradoura. Avinculação óbvia disso com o destino dofundador de uma religião mais tardia não nosinteressa aqui. (319) (grifo nosso)

De todos os acontecimentos de temposprimitivos que posteriormente poetas,sacerdotes e historiadores empreenderamelaborar, um se salienta, cuja supressão foiimposta pelos mais imediatos e melhoresmotivos humanos. Trata-se do assassinato deMoisés. O grande líder e libertador,descoberto·por Sellin a partir de alusões nosescritos dos profetas. A hipótese de Sellinnão pode ser chamada de fantástica; ébastante provável. Moisés. Derivando-se daescola de Akhenaten, não empregou métodosdiferentes dos que o rei usara; ele ordenou,forçou sua fé ao povo (320). A doutrina de Moiséspode ter sido inclusive mais dura do que a deseu mestre. Ele não tinha necessidade demanter o deus solar como apoio: a escola de Onnão possuía significação para seu povo

319 FREUD, 1997, p. 34.320 N.T.: Nesse período, mal era possível qualquer outro método de influenciá-

lo.

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estrangeiro. Moisés, como Akhenaten,defrontou-se com o mesmo destino que esperatodos os déspotas esclarecidos. O povo judeu.Sob Moisés, era tão capaz de tolerar umareligião tão altamente espiritualizada e encontrarsatisfação de suas necessidades no que elatinha a oferecer quanto os egípcios da XVIIIDinastia. Em ambos os casos. Aconteceu omesmo: aqueles que tinham sido dominados emantidos em falta levantaram-se e lançaramfora o fardo da religião que lhes fora imposta.Mas, ao passo que os dóceis egípciosesperaram até que o destino removesse a figurasagrada de seu faraó, os selvagens semitastomaram o destino nas mãos e livraram-se deseu tirano (321).

Tampouco se pode sustentar que o textoremanescente da Bíblia não nos dá ciência deum fim desse tipo para Moisés. A descrição do“pastoreio no deserto”, que pode representar operíodo durante o qual Moisés governou,descreve uma sucessão de sérias revoltascontra sua autoridade. As quais tambémforam, por ordem de Javé, suprimidasmediante sangrentos castigos. É fácilimaginar que uma dessas rebeliões terminou demaneira diferente daquela que o texto sugere. Adefecção do povo quanto à nova religiãotambém é descrita no texto. Na história dobezerro de ouro. Nesse episódio. Através de

321 N.T.: É realmente notável quão pouco ouvimos, nos milhares de anos dehistória egípcia, sobre o afastamento violento ou o assassinato de umfaraó. Uma comparação com a história assíria, por exemplo, só aumentanossa surpresa quanto a isso, o que, naturalmente, pode ser explicado pelofato de a história ter sido inteiramente escrita para servir a fins oficiais.

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uma mudança engenhosa. O rompimento dastábuas da lei (que deve ser entendidosimbolicamente: “ele rompeu a lei”) é transpostopara o próprio Moisés, e sua indignação furiosaé atribuída como motivo desse rompimento. (322)(grifo nosso)

13 – Liliane Crétè (?):

[…] Seu rei, Acaz, tinha na verdade securvado de tal forma diante dos temidos assíriosque chegou até a construir um espaço paraseus deuses no Templo. Os judeus serenderam à idolatria e à injustiça, insensíveisà voz exaltada do profeta Isaías, que osestimulava a se reformarem. (323) (grifo nosso)

Seguindo a obra de Amós, de Oseias, deIsaías e de Miqueias, Jeremias levou mais longesuas doutrinas, afirmando que Jeová não erasomente Deus de Israel, mas o do Universo,responsável pelo destino de todos os povos.[…]. (324) (grifo nosso)

[…] A guerra triunfara e Jerusalém caiu emjulho de 586 a.C. O Templo foi devastado,depois queimado e as muralhas destruídas. […]O tempo do exílio propriamente dito foi de meioséculo. Em 539 a.C., a Babilônia sucumbiu aopoder do rei Ciro, fundador do império persa. No

322 FREUD, 1997, p. 43-44.323 CRÉTÉ, s/d, p. 88.324 CRÉTÉ, s/d, p. 89.

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ano seguinte Ciro publicou um édito autorizandoos exilados a voltarem para suas terras. Masnem todos aproveitaram a oferta, algunspreferiram permanecer. Os que voltaramlevaram uma nova concepção de suasrelações com Jeová, o que resultou noestabelecimento do judaísmo. (325) (grifonosso)

Apesar de que os relatos se referiam ao“cativeiro em Babilônia, o exílio foi suave. Osjudeus não foram jogados em prisões nemforçados à escravidão. Graças à liberdade quelhes foi concedida, construíram casas,plantaram jardins e se corresponderam comseus compatriotas que ficaram na Palestina.Alguns até ficaram ricos. Eles conservaram suaorganização em famílias e em clãs; tiveramchefes religiosos e mantiveram vivos seuscostumes e ritos. Com o pão de cada diagarantido pelo trabalho, os exilados nãoparavam de pensar em seu Deus e em suapátria, indissociáveis em sua alma. (326) (grifonosso)

Apesar de hostil às “nações” das quais eleanunciava a exterminação final e aos“incircuncidados de coração e incircuncidadosda carne”, que ele excluiu do futuro templo, oprofeta Ezequiel utilizou, como diz Alfred Lods,“grande quantidade de mitos estrangeiros ede figuras emprestadas da arte babilônica”,

325 CRÉTÉ, s/d, p. 90.326 CRÉTÉ, s/d, p. 90.

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entre eles a crença na montanha de Deus e nojardim do Éden (Ezequiel 28,13; 16). Também omito dos setes deuses planetários,transformados em instrumentos de vingança deJeová, que eram figuras de anjos semi-animaisque levavam o trono divino (Ezequiel 10,9-22).Essas figuras foram encontradas mais tarde,nos autores do Apocalipse. (327) (grifo nosso)

[…] O Segundo Isaías também foiconsolador: anunciou ao povo no exílio o perdãode Jeová e a renovação da história primordial.Disse que os hebreus atravessariam um novodeserto, mas um deserto ao longo do qual oDeus único do Universo faria fontes brotarem eárvores crescerem. Esse profeta ressaltou atranscendência do universalismo e fez doconceito monoteísta uma doutrina. Talvez porestar sob a influência babilônica, colocouconstantemente esse Deus único e universal emrelação com o Cosmos, de que era, ao mesmotempo, Criador, Conservador e Governador. (328)(grifo nosso)

14 – Bertrand Russell (1872-1970):

No período de cativeiro e, durante algumtempo, antes e depois desse período, a religiãojudaica passou por desenvolvimento bastanteimportante. Parece não ter havido, em suaorigem, grande diferença, do ponto de vista

327 CRÉTÉ, s/d, p. 91.328 CRÉTÉ, s/d, p. 91.

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religioso, entre os israelitas e as tribosadjacentes. Jeová era, a princípio, apenas umdeus tribal que favorecia os filhos de Israel masnão se negava que havia outros deuses eque seu culto era habitual. Quando o primeiromandamento diz: “Não terás outro Deus senãoeu”, está dizendo algo que era uma inovação notempo imediatamente anterior ao cativeiro. Istoé evidente através de diversos textos dosprimeiros profetas. Foram os profetas dessaépoca que ensinaram, pela primeira vez, quea adoração dos deuses pagãos era pecado.Para se conseguir a vitória nas constantesguerras daquele tempo, proclamavam essencialo favor de Jeová; e Jeová retiraria seu favor,se outros deuses fossem tambémvenerados. Jeremias e Ezequiel,principalmente, parecem ter inventado a ideiade que todas as religiões, exceto uma, eramfalsas, e que o Senhor castiga a idolatria.

Algumas citações ilustrarão essesensinamentos e a preponderância daspráticas pagãs contra as quais protestavam.“Acaso não vês tu o que estes fazem nascidades de Judá, e nas praças de Jerusalém?Os filhos ajuntam a lenha, e os pais acendem ofogo, e as mulheres misturam a manteiga comoos mais adjuntos necessários para fazeremtortas à rainha do céu (Ester), e parasacrificarem a deuses estranhos, e para meprovocarem a ira” (329). O Senhor está irritadocom isso. “E edificaram os altos de Tofeth, que

329 N.T.: Jeremias VII, 17-18.

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está no vale do filho de Ennom, para queimaremno fogo os seus filhos e as suas filhas; o que eunão mandei, nem pensei no meu coração”. (330)

Há uma passagem muito interessante emJeremias, na qual denuncia os judeus noEgito pela sua idolatria. Ele próprio viveu entreeles durante algum tempo. O profeta diz aosrefugiados judeus no Egito que Jeová osdestruirá a todos, porque suas mulheresqueimaram incenso a outros deuses. Mas elesse negam a escutá-lo, dizendo: “Maspontualmente cumpriremos toda a palavra quesair da nossa boca, de sacrificarmos à rainha docéu, e de lhe oferecermos libações, como nós otemos feito, e nossos pais, nossos reis, enossos príncipes, nas cidades de Judá e naspraças de Jerusalém; e tivemos fartura de pão,e nos ia bem, e não vimos mal algum.” MasJeremias lhes assegura que Jeová notou essaspráticas idólatras, e que o infortúnio haviachegado por causa delas. “Eis aqui estou euque jurei pelo meu grande nome, diz o Senhor,que de nenhum modo será pronunciado mais omeu nome por boca de nenhum homem judeuem toda a terra do Egito… Eis aqui estou eu,que vigiarei sobre vós para mal, e não parabem; e todos os varões de Judá, que há na terrado Egito, perecerão à espada, e de fome, atéque todos sejam consumidos”. (331)

Ezequiel mostra-se igualmente chocadocom as práticas idólatras dos judeus. O

330 N.T. ibid; VII, 31.331 N.T.: Jeremias, XLIV, II-fim.

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Senhor, numa visão, mostra-lhe mulheres, àporta norte do Templo, chorando por Tammuz(uma deidade babilônica); depois, mostra-lhe“maiores abominações”, vinte e cinco homens àporta do templo adorando o Sol. O Senhordeclara: “Desafogarei, pois, o meu furor contrati: e não te poupará o meu olho, nem meapiedarei de ti: e embora gritem em meusouvidos com altas vozes, não os ouvirei”. (332)

A ideia de que todas as religiões, excetouma, são perversas, e que o Senhor castigaa idolatria, foi, ao que parece, inventada poresses profetas. Os profetas, de modo geral,eram nacionalistas ferrenhos, e aguardavam odia em que o Senhor destruiria inteiramente osgentios.

O cativeiro prestou-se para justificar asdenúncias dos profetas. Se Jeová era todo-poderoso e os judeus o seu Povo Escolhido,seus sofrimentos só podiam ser explicados pelasua maldade. A psicologia é a da correçãopaterna: os judeus tinham de purificar-se pelocastigo. Sob a influência dessa crença,desenvolveram no desterro uma ortodoxia muitomais rígida e muito mais nacionalmenteexclusiva do que a que havia predominadoenquanto eram independentes. Os judeus queficaram para trás e não foram transplantados aBabilônia não experimentaram essa modificaçãono mesmo grau. Quando Esdras e Nehemiasvoltaram para Jerusalém depois do cativeiro,ficaram escandalizados ao verificar que

332 N.T.: Ezequiel, VII, III-fim.

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haviam sido comuns os matrimônios mistos,e dissolveram todos esses casamentos. (333)

Os judeus distinguiam-se de todas as outrasnações da antiguidade pelo seu inflexívelorgulho nacional. Todas as outras, quandoconquistadas, aquiesciam. Tanto em seu íntimocomo exteriormente; somente os Judeusconservavam a crença em sua própriapreeminência e a convicção de que seusinfortúnios eram devidos à ira de Deus, porquehaviam deixado de conservar a pureza de sua fée de seu ritual. Os livros históricos do AntigoTestamento, que foram, em sua maioria,compilados depois do cativeiro dão umaimpressão errônea, já que sugerem que aspráticas idólatras contra as quais os profetasprotestaram eram uma decadência da primitivaseveridade, quando, na verdade, a primitivaseveridade jamais existiu. Os profetas eraminovadores, num grau muito maior do que o queaparece na Bíblia quando não é lida de maneirahistórica.

[…].

O que temos como Livro de Isaías é obra dedois profetas diferentes, um anterior ao desterroe outro posterior. O segundo destes, que échamado, pelos estudantes bíblicos, DêuteroIsaías, é o mais notável dos profetas. É oprimeiro que se refere ao Senhor como tendodito: “Não há outro Deus senão eu”. Acredita naressurreição do corpo, talvez como resultadoda influência persa. Suas profecias relativas ao

333 N.T.: Esdras, IX-X, 5.

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Messias foram, mais tarde, os principais textosdo Antigo Testamento utilizados para mostrarque os profetas previram a vinda de Cristo.

[…].

Depois de Esdras e Nehemias, os judeusdesapareceram por um momento da história.O Estado judeu sobreviveu como teocracia, masseu território era muito diminuto, somente umaregião de dez ou quinze milhas em torno deJerusalém, segundo E. Bevan. (334) Depois deAlexandre, tornou-se um território disputadoentre os ptolomeus e os selêucidas. Isso, noentanto, raramente provocou lutas no verdadeiroterritório judeu, deixando os judeus livres, pormuito tempo, para exercer a sua religião.

[…].

Essa tranquila existência de cômoda virtudefoi interrompida bruscamente pelo rei selêucidaAntíoco IV, que estava resolvido a helenizartodos os seus domínios. Em 175 A.C.,estabeleceu um ginásio em Jerusalém eensinou os jovens a usar gorros gregos e apraticar o atletismo. Foi ajudado nisso porum judeu helenizado chamado Jasão, aoqual fez alto sacerdote. A aristocraciasacerdotal tornara-se frouxa, sentindo-se atraídapela civilização grega; mas havia um partido quese lhe opunha com veemência, chamado“Hasidim” (que significa “Santo”), e que era forteentre a população rural. Quando, em 170 A.C.,Antíoco se envolveu em guerra com o Egito, osjudeus se rebelaram. Diante disso, Antíoco

334 N.T.: Jerusalém under the High Priests p. 12.

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retirou os vasos santos do Templo e colocounele a imagem de Deus. Identificava Jeovácom Zeus, seguindo uma prática que forabem-sucedida em todos os outros lugares.(335) Resolveu extirpar a religião judaica,acabando com a circuncisão e com aobservância das leis relativas aos alimentos.A tudo isso Jerusalém se submeteu, mas, forade Jerusalém, os judeus resistiram com amáxima obstinação.

[…].

Foi a esse tempo que, entre os judeus,muitos passaram a crer na doutrina daimortalidade. Pensava-se que a virtude seriarecompensada aqui na Terra; mas aperseguição, que recaiu sobre os maisvirtuosos, tornou evidente que esse não era ocaso. A fim de salvaguardar a justiça divina,portanto, era necessário crer-se nasrecompensas e castigos na vida futura. Estadoutrina não era adotada por todos os judeus;no tempo de Cristo, os saduceus ainda arejeitavam. Mas, nessa altura, constituíam umpequeno partido e, em tempos posteriores,todos os judeus acreditavam na imortalidade.

A revolta contra Antíoco foi chefiada porJudas Macabeu, um hábil comandante militarque recapturou primeiro Jerusalém (164 A.C.),lançando-se depois à agressão. Às vezes,matava todos os varões; outras vezes,circuncidava-os à fôrça. Seu irmão Jônatas, que

335 N.T.: Alguns judeus alexandrinos não fizeram objeção a essa identificação.Vide Carta de Aristeas, 15, 16.

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foi feito alto sacerdote, teve permissão paraocupar Jerusalém com uma guarnição, econquistou parte da Samaria, adquirindo Joppae Acra. Realizou negociações bem-sucedidascom Roma, assegurando completa autonomia.Sua família era de altos sacerdotes atéHerodes, sendo conhecida como a dinastiaharmônia.

Ao suportar e resistir à perseguição, osjudeus de então revelaram imenso heroísmo,embora em defesa de coisas que não nosparecem importantes, tais como a circuncisão ea proibição de se comer carne de porco.

O tempo da perseguição por Antíoco IV foicrucial na história judaica. Os judeus daDispersão estavam, nesse tempo, setornando cada vez mais helenizados; osjudeus da Judeia eram poucos; e mesmo entreeles os ricos e poderosos se achavaminclinados a aquiescer às inovações gregas.Não fosse a heroica resistência do Hasidim, e areligião judaica poderia haver facilmenteperecido. […].

Os próprios macabeus, todavia, não eramadmirados pelos últimos judeus, porque suafamília, constituída de altos sacerdotes, adotou,depois de seus êxitos, uma conduta mundana econtemporizadora. A admiração era pelosmártires. O Quarto Livro dos Macabeus, escrito,provavelmente, em Alexandria, mais ou menosao tempo de Cristo, ilustra tanto este comooutros pontos interessantes. Apesar de seutítulo, não se refere, em parte alguma, aosmacabeus, mas relata a surpreendente

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fortaleza, primeiro de um velho e, depois, desete irmãos jovens, que foram todos torturadose depois queimados por Antíoco, enquanto amãe, que se achava presente, os exortava aque se mantivessem firmes. O rei, a princípio,procurou conquistá-los pela benevolência,dizendo-lhes que, se apenas consentissem emcomer porco ele os tomaria sob sua proteção,fazendo com que tivessem êxito em suascarreiras. Quando recusaram mostrou-lhes osinstrumentos de tortura. Mas elespermaneceram inabaláveis, dizendo-lhe queele sofreria tormentos eternos depois damorte, ao passo que eles herdariam parasempre a bem-aventurança. Um a um, napresença uns dos outros e na de sua mãe,foram primeiro exortados a comer porco e,quando se negaram, torturados e mortos. Nofim, o rei voltou-se para os soldados e disse-lhes que esperava que eles aproveitassemaquele exemplo de coragem. O relato é,certamente, embelezado pela lenda, mas éhistoricamente verdadeiro que a perseguição foisevera e suportada com heroísmo – comotambém que os seus pontos principais eram acircuncisão e o comer carne de porco.

Esse livro também é interessante sob outroaspecto. Embora o autor seja, evidentemente,um judeu ortodoxo, emprega a linguagem dafilosofia estoica e procura provar que osjudeus vivem completamente de acordo comos seus preceitos. O livro começa com aseguinte sentença:

“Filosófica no mais alto grau é a questão que

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me proponho discutir, isto é, se a RazãoInspirada tem domínio supremo sobre aspaixões e, para a filosofia disso, suplicariaseriamente a vossa mais viva atenção”.

Os judeus alexandrinos estavam dispostos,na filosofia, a aprender dos gregos, masaderiam com extraordinária tenacidade à Lei,principalmente a circuncisão, a observância doSabá e a abstinência de carne de porco e outrosalimentos impuros. Desde o tempo de Nehemiasaté depois da queda de Jerusalém, no ano 70da nossa era, a importância que atribuíam à Leiaumentou constantemente. Já não toleravam osprofetas que tinham algo de novo a dizer.Aqueles dentre eles que se sentiam impelidos aescrever no estilo dos profetas pretendiamhaver descoberto um velho livro de Daniel,Salomão ou algum outro antigo de impecávelrespeitabilidade. Suas peculiaridades rituais osmantinham unidos como nação, mas a ênfasequanto à Lei lhes destruiu, gradualmente, aoriginalidade, tornando-os extremamenteconservadores. Essa rigidez torna sumamentedigna de nota a revolta de São Paulo contra odomínio da Lei. (336) (grifo nosso)

15 – Israel Finkelstein e Niel Asher Silbermar:

Religião tradicional de Judá

Os livros dos Reis são explícitos na suadescrição de apostasia, que provocou tanto

336 RUSSELL, 1968, p. 7-15.

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infortúnio no reino de Judá. Essa apostasia éregistrada em detalhes típicos no relato sobre oreinado de Roboão:

E Judá fez o mal diante dos olhos doSENHOR, e o povo provocou o seu ciúme e asua ira com os pecados que cometeram, muitomais do que seus pais os fizeram. Porque elestambém construíram lugares elevados, pilares epostes sagrados [Asherim] em cada colina e sobcada árvore dos bosques verdes; e houvetambém prostitutos masculinos do culto em suaterra. Eles se comportaram de acordo comtodas as abominações das nações que oSENHOR destruiu diante dos filhos de Israel. (1Reis 14,22-24)

Como na época do rei Acaz, cerca deduzentos anos mais tarde, a natureza dospecados parecia ser substancialmente amesma. Acaz foi apóstata notório, que seguiuos passos ímpios dos reis de Israel einclusive queimou seu filho como oferenda(2 Reis 16,2-4).

Estudiosos bíblicos demonstraram queessas não eram práticas pagãs, isoladas earbitrárias, mas parte de um complexo derituais que apelavam para os poderescelestiais, para a fertilidade e o bem-estar dopovo e da terra. Em sua representaçãoexterna, eles se parecem com as práticasusadas pelos povos vizinhos para honrar ereceber as bênçãos de outros deuses. Defato, os achados arqueológicos de figuras debarro, de altares de incenso, de vasos de

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libação e de plataformas de oferendas, em todoo território de Judá, sugerem que a prática dareligião era bem variada, geograficamentedescentralizada e, com certeza, não restrita àadoração apenas de YHWH no Templo deJerusalém.

De fato, para Judá, com sua burocracia esuas instituições nacionais relativamentesubdesenvolvidas, os rituais religiosos eramrealizados em duas arenas distintas, algumasvezes trabalhando em conjunto, outras emconflito aberto. A primeira arena era o Templo deJerusalém, sobre o qual existe abundantedescrição bíblica de vários períodos mas (comoo sítio foi obliterado mais tarde por construçõesposteriores) quase nenhuma evidênciaarqueológica. O segundo foco da práticareligiosa era dividido entre os clãs espalhadospor toda a área rural. Ali, redes complexas derelações de parentesco dominavam todas asfases da vida, incluindo a religião. Rituais paraa fertilidade da terra e as bênçãos dosantepassados davam esperança ao povo,para o bem-estar de suas famílias, esantificavam a posse do campo e das terrasde pastos de suas aldeias.

O historiador bíblico Baruch Halpem e oarqueólogo Lawrence Stager compararam asdescrições bíblicas da estrutura dos clãs com osremanescentes de assentamentos nas áreasmontanhosas da Idade do Ferro e identificarampadrão arquitetônico distinto em extensivosconjuntos familiares, cujos habitantes talvezrealizassem rituais que algumas vezes eram

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bem diferentes daqueles do Templo deJerusalém. Costumes e tradições locaissustentam que os habitantes de Judá herdaramsuas casas, sua terra e mesmo seus túmulos doseu Deus e dos seus antepassados. Ossacrifícios eram oferecidos em santuários,dentro das propriedades familiares, em túmulosdas famílias e em altares abertos em toda aárea rural. Esses lugares de adoraçãoraramente eram perturbados ou destruídos,mesmo pelos reis mais “piedosos” e maisagressivos. Assim, não é de admirar que aBíblia observe repetidas vezes que “os lugaresaltos não foram destruídos”.

A existência de lugares elevados – ou altaresem campo aberto – e outras formas deveneração ancestral ou familiar a deuses nãoeram, como os livros dos Reis afirmam, aapostasia de uma fé antiga e mais pura. Eraparte de uma tradição intemporal dos colonosassentados na zona rural montanhosa de Judá,que veneravam YHWH junto com umavariedade de deusas e deuses, conhecidos eadaptados de cultos de povos vizinhos. Emresumo, YHWH era venerado de uma amplavariedade de modos e, algumas vezes,retratado como possuindo grande séquitocelestial. Da evidência indireta e definitivamentenegativa dos livros dos Reis, aprendemos queos sacerdotes na área rural tambémqueimavam incenso, com regularidade, nosaltares ao ar livre, para o sol, a lua e asestrelas.

Como os lugares elevados eram

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presumivelmente áreas abertas ou cumesnaturais de colinas, não foram identificadostraços de sua existência. Assim, a evidênciaarqueológica mais clara e definitiva dapopularidade desse tipo de prática religiosa, emtodo o reino, é a descoberta de centenas defiguras de barro de deusas da fertilidade nuasem todos os sítios da antiga monarquia emJudá. Ainda mais sugestivas são as inscriçõesencontradas no antigo sítio do século VIII deKuntillet Ajrud, no nordeste do Sinai, sítio quemostra laços culturais com o reino do norte.Essas inscrições parecem se referir à deusaAsherat como sendo a esposa de YHWH. E,antes que se diga que a condição matrimonialde YHWH era simplesmente uma alucinaçãopecaminosa do norte, uma fórmula de certomodo similar falando de YHWH e da suaAsherat aparece numa inscrição monárquicaposterior, da região do Shephelah, de Judá.

Esse culto bem enraizado não era restritoàs áreas rurais. Existe ampla informaçãobíblica e arqueológica de que o cultosincrético de YHWH floresceu em Jerusalém,mesmo nos tempos monárquicos tardios. Ascondenações de vários profetas de Judá deixammuito claro que YHWH era venerado emJerusalém junto com outras deidades, comoBaal, Asherat, o sol, a lua, as estrelas e osanjos do céu, e mesmo as deidadesnacionais das terras e nações vizinhas. Dacrítica bíblica a Salomão (refletindo talvezrealidades posteriores da monarquia)conhecemos a veneração a Melcom, Amon,

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Camos, Moab e a Ashtoret de Sidon, em Judá (1Reis 11,5; 2 Reis 23,13). Jeremias (11,13) nosfala que o número de deidades veneradas emJudá era igual ao número de suas cidades, eque o número dos altares em Jerusalém eraigual ao número de tendas nos bazares dacapital. Além disso, objetos do culto dedicadoa Baal, a Asherat, ao sol, à lua, às estrelas eaos anjos do céu estavam instalados noTemplo de YHWH, em Jerusalém. O livro deEzequiel descreve com detalhes todas asabominações praticadas no Templo emJerusalém, incluindo a veneração ao deusTammuz, da Mesopotâmia.

Assim, os grandes pecados de Acaz e deoutros reis ímpios de Judá não deveriam serconsiderados excepcionais, de nenhumamaneira. Esses governantes apenas permitiramque as tradições rurais continuasseminalteradas. Eles e muitos de seus súditosexpressavam sua devoção a YHWH em ritosrealizados em incontáveis túmulos,santuários e lugares elevados em todo oterritório do reino, com a ocasional esubsidiária veneração a outros deuses. (337)(grifo nosso)

16 – Daniel Lazare (jornalista):

Sobre um seu artigo publicado em março de 2002

na revista americana Harper's, Tom Harpur assim

comenta:

337 FINKELSTEIN e SILBERMAN, 2003, p. 325-328.

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De acordo com as descobertas de Lazare, omonoteísmo judaico – isto é, a adoraçãoexclusiva de uma divindade semítica chamadaYHWA, ou Iavé (Jeová), não “coalesceu”completamente até um ponto entre umaconquista assíria do reino do norte de Israel,em 722 a.C. e a conquista babilônica do reinodo sul de Judá, em 586”. (338) (grifo nosso)

17 – Eliane Pagels (professora de história da

religião):

O partido que exigia que Israel fosse leal“apenas ao Senhor”, incluindo profetas comoAmós (c. 750 a.C.), Isaías (c. 730 a.C.) eJeremias (c. 600 a.C.), denunciava acima detudo os israelitas que adotavam costumesestrangeiros, em especial a adoração deoutros deuses. (339) (340) (grifo nosso)

18 – Reinaldo José Lopes (jornalista de Ciência

da Folha de S. Paulo):

Do seu interessante artigo “Deus bíblico pode ser

fusão de vários deuses pagãos, dizem especialistas”,

publicado no site G1 (Globo.com) (341), transcrevemos:

338 HARPUR, 2008, p. 125.339 N.T.: Ver Morton Smith, Palestinian Parties and Politics That Shaped the Old

Testament (Nova York: Columbia University Press, 1971), em especial as pp.62-146; ver também Paul Hanson, The Dawn of Apocalyptic (Filadélfia:Fortress Press, 1975).

340 PAGELS, 1996, p. 6.341 LinK: http://g1.globo.com/Noticias/0,,MUL652419-9982,00-

DEUS+BIBLICO+PODE+SER+FUSAO+DE+VARIOS+DEUSES+PAGAOS+DIZEM+ESPECIALISTAS.html.

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Memórias de Ugarit

Os cananeus não deixaram para trás umaherança literária tão rica quanto a Bíblia. Noentanto, poucos quilômetros ao norte de Canaã,na atual Síria, ficava a cidade-Estado de Ugarit,cuja língua e cultura eram praticamenteidênticas às de seus primos do sul. Ugarit foidestruída por invasores bárbaros em 1200 a.C.,mas os arqueólogos recuperaram numerosasinscrições da cidade, nas quais dá para entreveruma mitologia que apresenta semelhanças (ediferenças) impressionantes com as narrativasda Bíblia. “Por isso, Ugarit é uma parteimportante do fundo cultural que, mais tarde,daria origem às tribos de Israel”, resumeChristine Hayes, professora de estudosclássicos judaicos da Universidade Yale (EUA).

Uma das figuras mais proeminentesnesses textos é El – nome que quer dizersimplesmente “deus” nas antigas línguas daregião, mas que também se refere a umadivindade específica, o patriarca, ou chefe defamília, dos deuses. “Patriarca” é a palavra-chave: o El de Ugarit tem paralelos muitoespecíficos com a figura de Deus durante operíodo patriarcal, retratado no livro do Gênesise personificado pelos ancestrais dos israelitas:Abraão, Isaac e Jacó.

Nesses textos da Bíblia há, por exemplo,referências a El Shadday (literalmente “El daMontanha”, embora a expressão normalmenteseja traduzida como “Deus Todo-Poderoso”), ElElyon (“Deus Altíssimo”) e El Olam (“Deus

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Eterno”). O curioso é que, na mitologia ugarítica,El também é imaginado vivendo no alto de umamontanha e visto como um ancião sábio, devida eterna.

Tal como os patriarcas bíblicos, El é umaespécie de nômade, vivendo numa versãodivina da tenda dos beduínos; e, maisimportante ainda, El tem uma relação especialcom os chefes dos clãs, tal como Abraão, Isaace Jacó: eles os protege e lhes promete umadescendência numerosa. Ora, a maior parte dolivro do Gênesis é o relato da amizade de Deuscom os patriarcas israelitas, guiando suasmigrações e fazendo a promessa solene detransformar a descendência deles num povo“mais numeroso que as estrelas do céu”.

Israel ou “Israías”?

Outros dados, mais circunstanciais, traçamoutros elos entre o Deus do Gênesis e El: numdos trechos aparentemente mais antigos dolivro bíblico, Deus é chamado pelo epítetopoético de “Touro de Jacó” (frase às vezestraduzida como “Poderoso de Jacó”),enquanto a mitologia ugarítica compara Elfrequentemente a um touro. Finalmente, opróprio nome do povo escolhido – Israel,originalmente dado como alcunha ao patriarcaJacó – carrega o elemento “-el”, lembra AirtonJosé da Silva, professor de Antigo Testamentodo Centro de Estudos da Arquidiocese deRibeirão Preto (SP).

“É o nome do deus cananeu, mais um indíciode que Israel surge dentro de Canaã, por um

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processo gradual”, diz Silva. Ele argumenta que,se Javé fosse desde sempre a divindade dosisraelitas, o nome desse povo seria “Israías”.Isso porque o elemento adaptado como “-ías”em português (algo como -yahu) era, emhebraico, uma forma contrata do nome “Javé”.Curiosamente, o elemento se torna dominantenos chamados nomes teofóricos (ligados a umadivindade) dados a israelitas no período damonarquia, a partir dos séculos 10 a.C. e 9 a.C.

E esse nome (provavelmente Yahweh emhebraico; a sonoridade original foi obscurecidapelo costume de não pronunciar a palavra porrespeito) é um enigma e tanto. As tradiçõesbíblicas são um tanto contraditórias, mas, pelomenos, uma fonte das Escrituras afirma queJavé só deu a conhecer seu verdadeiro nomeaos israelitas quando convocou Moisés para serseu profeta e arrancar os descendentes de Jacóda escravidão no Egito. (A Moisés, Deus diz queapareceu a Abraão, Isaac e Jacó como “ElShadday”.) O problema é que ninguém sabequal a origem de Javé, o qual nunca parece tersido uma divindade cananeia, exatamente comodiz o autor bíblico. (342) (grifo nosso)

Como se pode observar, muito do que foi dito

anteriormente, está comprovado no que estes autores

falam, demonstrando que a nossa ideia não é tão louca

342 LOPES, 2008, disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/0,,MUL652419-9982,00-DEUS+BIBLICO+PODE+SER+FUSAO+DE+VARIOS+DEUSES+PAGAOS+DIZEM+ESPECIALISTAS.html.

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assim.

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Conclusão

Diante de tudo o que aqui colocamos não nos resta

senão a única alternativa em afirmar que os hebreus,

partindo-se dos patriarcas, praticavam o politeísmo, daí

evoluindo para o henoteísmo, para, finalmente, numa

época mais recente, adotarem o monoteísmo. Sabemos

que isso contrariará alguns mitos estabelecidos e,

fatalmente, irritará os dogmáticos que não admitem

pensamentos contrários aos seus.

O que nos deixa bem tranquilo é que a

comprovação de tudo quanto foi falado, está bem

argumentado no Dicionário Bíblico Universal, na

explicação do termo politeísmo, do qual transcrevemos:

Enquanto Deus exclui todo rival (Ex 20,5),Israel é constantemente levado a reconhecerque cada povo (Jz 11,24) tem seu deus (o quese chama henoteísmo), ou a oferecer um culto adiversas divindades. Segundo Js 24, atendência politeísta caracterizava já a atitudereligiosa dos antepassados. Ez (20,7-9) pensaque, durante sua estadia no Egito, os hebreusse entregaram ao culto de diversas divindades.O tempo do deserto foi o tempo da corrupçãopagã (Nm 25) e quando o povo se instalou emCanaã, a fé javista foi constantemente

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misturada com características politeístas (Jz6,25-32). Os profetas fizeram tudo para arrancarpela raiz essa tendência permanente que semanifestava até no templo (2Rs 23,4-11; Ez 8):mas foi em vão. A população que se instala naPalestina, na volta do exílio, ainda é politeísta(Is 65-66). Finalmente, a perseguição de AntíocoEpífanes provoca a rejeição definitiva de todopoliteísmo. (343)

Então, fica claro que só a partir da perseguição de

Antíoco Epífanes é que o povo hebreu largou de vez do

politeísmo.

Por outro lado, concordamos com a opinião de que

“as religiões são seletivas em suas memórias e procuram

conduzir as pessoas a crerem naquilo que consideram o

mais importante para o seu proveito, obviamente. […].”

(344), por isso, os seus líderes, utilizando-as como forma

de impor suas concepções teológicas, não se preocupam

com a verdade.

Entretanto, a verdade deve ser restabelecida, doa a

quem doer – somente pessoas de mente fechadas sofrem

os seus efeitos –, até mesmo porque continua valendo

esta recomendação de Jesus: “Conhecereis a verdade, e a

verdade vos libertará” (Jo 8,33).

Estamos plenamente de acordo com Ernest Renan

343 MONLOUBOU e DU BUIT, 1997, p. 633.344 BOARETTO, 2009.

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(1823-1892), escritor, filósofo e historiador francês:

Eu escrevo para propor minhas ideias aosque buscam a verdade. Quanto às pessoas quenecessitam, no interesse de sua crença, que euseja um ignorante, um espírito falso ou umhomem de má-fé, não tenho a pretensão demodificar seus julgamentos. Se essa opinião énecessária ao sossego de algumas pessoaspiedosas, terei o maior escrúpulo em desiludi-las. (345)

E por falar em pessoas piedosas, lembramos do

renomado filósofo do século XVII, Baruch de Espinosa

(1632-1677), que, sabiamente, disse:

Julgam que é piedoso não se fiar na razão eno próprio juízo e que é ímpio duvidar daquelesque nos transmitiram os livros sagrados: masisso não é piedade, é pura demência! Afinal,pergunto eu, o que é que os preocupa? O que éque receiam? Porventura a religião e a fé sópodem ser mantidas se os homens foremtotalmente ignorantes e despediremdefinitivamente a razão? Se é isso o quepensam, então é porque a Escritura lhes inspiramais medo que confiança. (346)

Pensamento de sábio é o que não nos falta; eis

345 RENAN, 2004, p. 18.346 ESPINOSA, 2003, p. 225-226.

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mais um que vale a pena reproduzir:

Não creiais em coisa alguma pelo fato de vosmostrarem o testemunho escrito de algum sábioantigo. Não creiais em coisa alguma com basena autoridade de mestres e sacerdotes. Aquilo,porém, que se enquadrar na vossa razão e,depois de minucioso estudo, for confirmado pelavossa experiência, conduzindo ao vosso própriobem e ao de todas as outras coisas vivas: A issoaceitai como Verdade. Por isso, pautai a vossaconduta. (Gautama Buda, c. 500 a.C.) (347)

Apenas queremos reforçar que só temos interesse

em demonstrar a verdade, embora, para fazer isso, nós

tenhamos que pôr em dúvida a descrição de alguns fatos

constantes da Bíblia; em função disso, fiquem tranquilos

os bibliólatras, pois não somos contra os princípios morais

nela contidos, ainda que essa dúvida possa ser

considerada como uma contestação àquilo que alguns

consideram como sendo o seu livro sagrado. Não é contra

o seu significado de símbolo de um seguimento religioso,

mas contra fatos contraditórios existentes em seu texto,

que não concordamos.

Paulo da Silva Neto SobrinhoJun/2010.(Versão 14 – set/2019)

347 Link: http://www.geae.inf.br/pt/boletins/geae398.html.

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Paulo da Silva Neto Sobrinho, é natural de Guanhães,MG. Formado em Ciências Contábeis e Administração deEmpresas pela Universidade Católica (PUC-MG). Aposentou-secomo Fiscal de Tributos pela Secretaria de Estado da Fazendade Minas Gerais.

Ingressou no movimento Espírita em Julho/87. Escreveuvários artigos que foram publicados em alguns sites Espíritasna Internet, entre eles:

O Portal do Espírito: www.portalespirito.com/

Grupo de Apologética Espírita: www.apologiaespirita.org

Panorama Espírita: www.panoramaespirita.com.br

Autor dos livros: a) impressos: A Bíblia à Moda da Casa,Alma dos animais: estágio anterior da alma humana?,Espiritismo, princípios, práticas e provas, Os Espíritoscomunicam-se na Igreja Católica, As colônias espirituais e aCodificação e Kardec & Chico: 2 missionários; b) Ebook:Racismo em Kardec?, Reencarnação tá na Bíblia eManifestações de Espírito Pessoa viva (em que condições elasocorrem)

Belo Horizonte, MG

www.paulosnetos.net

e-mail: [email protected]