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LFG – PROCESSO PENAL – Aula 11 – Prof. Renato Brasileiro – Intensivo I – 13/05/2009 TEORIA DA PROVA 1. TERMINOLOGIA DA PROVA 1.1. Conceito de prova A palavra prova é usada em diversos sentidos, daí o ideal ser conceituar prova em vários sentidos: Conceito de prova como atividade probatória : “É o ato ou complexo de atos que tendem a formar a convicção da entidade decidente sobre a existência ou não de uma situação fática.” Vocês tem que raciocinar que a partir do momento em que a CF assegura o direito de ação, você entende que o direito à prova e um desdobramento do direito de ação. É um raciocínio que pode parecer bobo, mas é muito importante. De que haveria poder ingressar em juízo sem produzir provas? Meu direito e ação estaria prejudicado. O direito à prova é um desdobramento, seja do direito de ação, seja do direito de defesa. Conceito de prova como resultado: “Consiste na convicção da entidade decidente quanto à existência ou não de uma situação fática, formada no processo.” Conceito de prova como meio : “São os instrumentos aptos a formar a convicção do juiz quanto à existência ou não de uma situação fática.” 1.2. Destinatário da prova No processo penal, o destinatário da prova é o órgão jurisdicional (pode ser juiz, desembargador, ministro). Eu poso dizer que o ministério público é destinatário da prova? Há doutrina que diz que o MP seria destinatário da prova: 160

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TEORIA DA PROVA

1. TERMINOLOGIA DA PROVA

1.1. Conceito de prova

A palavra prova é usada em diversos sentidos, daí o ideal ser conceituar prova em vários sentidos:

Conceito de prova como atividade probatória: “É o ato ou complexo de atos que tendem a formar a convicção da entidade decidente sobre a existência ou não de uma situação fática.”

Vocês tem que raciocinar que a partir do momento em que a CF assegura o direito de ação, você entende que o direito à prova e um desdobramento do direito de ação. É um raciocínio que pode parecer bobo, mas é muito importante. De que haveria poder ingressar em juízo sem produzir provas? Meu direito e ação estaria prejudicado. O direito à prova é um desdobramento, seja do direito de ação, seja do direito de defesa.

Conceito de prova como resultado: “Consiste na convicção da entidade decidente quanto à existência ou não de uma situação fática, formada no processo.”

Conceito de prova como meio: “São os instrumentos aptos a formar a convicção do juiz quanto à existência ou não de uma situação fática.”

1.2. Destinatário da prova

No processo penal, o destinatário da prova é o órgão jurisdicional (pode ser juiz, desembargador, ministro).

Eu poso dizer que o ministério público é destinatário da prova? Há doutrina que diz que o MP seria destinatário da prova:

“Se o MP tem a atribuição de propor a ação penal, na fase pré-processual a prova também tem finalidade de formar a convicção do MP.”

Esse doutrinador diz que o MP é destinatário porque ele recebe o IPL< forma o seu convencimento e, se for o caso, propor a ação penal. Isso está correto? Não está! Até mesmo porque no IPL, onde não há contraditório e ampla defesa, eu não produzo prova. Eu produzo elementos de informação. Talvez não seja melhor dizer que o MP é destinatário da prova porque o MP, na verdade é o destinatário dos elementos de informação. Apesar de alguns doutrinadores, dizerem que o MP seria destinatário da prova, o ideal é dizer que o MP seria destinatário dos elementos de informação.

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1.3. Sujeitos da prova

São as pessoas responsáveis pela produção da prova: Vítimas, testemunhas, peritos, assistentes.

1.4. Fonte de prova

A doutrina se divide:

1º Sentido de fonte de prova: “Fonte de prova é tudo aquilo que indica algum fato ou afirmação que necessita de prova.”

LFG usa fonte de prova nesse sentido. O melhor exemplo desse tipo de prova é a denúncia. Indica os fatos que deverão ser provados.

2º Sentido de fonte de prova: “São as pessoas ou coisas das quais pode ser conseguir a prova.”

Cuidado com isso. O acusado pode ser fonte de prova. Todos sabemos, e isso está reforçado, que interrogatório é meio de defesa. Tanto que hoje, com o novo procedimento, é o último ato da instrução. Mas, se por acaso o acusado resolve confessar, ele se torna fonte de prova porque vai fornecer elementos.

1.5. Meios de Prova

“São os instrumentos aptos a formar a convicção do juiz quanto à existência ou não de uma situação fática.”

Os meios de prova no processo penal são apenas os que estão previstos na lei? Será que eu só posso me valer dos meios previstos na lei ou aqui eu tenho maior liberdade? Qual dos dois princípios vige no processo penal?

Princípio da taxatividade das provas – Só posso me valer das provas descritas pelo legislador? Não.

Princípio da liberdade das provas – É este o princípio que vige no processo penal.

Será que essa liberdade é ampla completa e absoluta? Ou tem limites? A Suzanne Rischtofen foi dar entrevista e o jornalista disse que não estava gravando e capta a conversa dela com o advogado que a estava orientando para chorar. Essa gravação constitui prova ilícita? Você tem liberdade na produção de provas, mas tem limites imposto pela própria CF. Essa captação, além de ser imoral e anti-ética, ela viola o direito ao sigilo porque não há nada mais sagrado do que a conversa entre o advogado e seu cliente.

“No processo penal podem ser utilizados quaisquer meios de prova, ainda que não especificados na lei, desde que não sejam inconstitucionais, ilegais ou imorais.”

Tem liberdade, mas é óbvio que é liberdade com certos limites. Surge aqui um tema, bem interessante:

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Há provas nominadas e provas inominadas

Provas NOMINADAS – São aquelas provas previstas no CPP. Se você pegar a partir do art. 158, vai ver as provas nominadas: exame de corpo de delito, depoimento de testemunhas, etc.

Provas INOMINADAS – São aquelas que não estão previstasno CPP. Como existe o princípio da liberdade de provas, eu posso usá-las.

E o que é uma prova típica e uma prova atípica e o que é uma prova anômala? E não tem nada a ver com prova inominada. As pessoas acham que anômala, atípica e inominada são sinônimos e não são.

Prova TÍPICA – É aquela prova que possui um procedimento probatório específico.

Alguns doutrinadores usam prova nominada como sinônimo de prova típica, mas há diferença. Outros vão dizer que prova nominada é aquela que está prevista no Código (exame de corpo de delito, confissão...). Algumas provas nominadas não tem previsão no CPP. A reconstituição não está prevista no Código. A reconstituição está prevista no CPP, no art. 7º:

Art. 7º - Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública.

Essa reconstituição é prova prevista no código, é nominada. Mas, por acaso, o legislador falou sobre o procedimento probatório da reconstituição? Não. Então, a reconstituição é uma prova nominada, porém atípica. E atípica porque o legislador não regulamentou seu procedimento probatório. Isso diferente do depoimento de testemunha, que é prova nominada e típica.

Prova ATÍPICA – “É aquela que não possui um procedimento probatório específico.”

Prova ANÔMALA – É cada vez mais utilizada. “Prova anômala é aquela utilizada para fins diversos daqueles que lhe são próprios, com características de outra prova típica.”

Vou dar um exemplo: uma pessoa tem conhecimento acerca de fato que interessa a decisão no processo. Bruno presenciou o motorista dirigindo seu carro em alta velocidade, causando a morte de duas pessoas. Se eu quiser que esse conhecimento do Bruno venha ao processo, eu vou ouvir o Bruno como testemunha. Hoje em dia tem acontecido muito: você pega o Bruno, vai até o MP, onde ele é ouvido. Eu uso esse depoimento do Bruno lá na minha sala do MP como se fosse uma prova testemunhal. Isso é absurdo. Se você é testemunha você tem que ser ouvido no processo como testemunha.

Tem juiz que ao invés de ouvir a testemunha, ele pede para ela assinar declarações, notadamente quando se trata de testemunhas abonatórias (para dizer que o réu é freqüentador de igreja, trabalhador, etc). Há juízes que pedem ao oficial de justiça para ligar para a testemunha e

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o oficial lavra uma certidão usada pelo juiz que alega que o oficial tem fé pública. Isso é absurdo.

Exemplo de prova anômala: “Testemunha cujo depoimento é colhido perante o MP e juntada aos autos pela forma documental.”

Qual a razão da importância da distinção entre prova atípica e prova anômala?

“Em virtude do princípio da liberdade probatória, a prova atípica é admitida no processo penal, já a prova anômala não pode ser aceita”. A prova anômala deforma o sistema. Quem atua no dia a dia sabe que é cada vez mais usada porque o juiz não quer perder tempo ouvindo testemunha.

Vimos que vige o princípio da liberdade probatória, agora, você consegue apontar algumas exceções ao princípio da liberdade probatória? Você pode se valer de todos os meios, desde que não sejam ilegais ou imorais.

EXCEÇÕES AO PRINCÍPIO DA LIBERDADE DE PROVAS

1ª Exceção : “Em relação ao estado das pessoas, a prova deve observar as restrições estabelecidas na lei civil.”

Art. 155, CPP: Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.

Essa é uma resposta mais técnica, por isso a morte deve ser comprovada pelo atestado de óbito.

Uma menina menor de 14 anos é vítima de crime sexual. O que eu tenho que juntar aos autos? Certidão de nascimento. Eu já vi processo tramitando sem certidão de nascimento. Todo mundo vê que é uma criança, mas é preciso provar que é menor via certidão de nascimento. Casamento de igual forma: você não prova juntando a aliança aos autos. Vai provar com a certidão. Súmula do STJ:

STJ Súmula nº 74 - DJ 20.04.1993 - Efeitos Penais - Reconhecimento da Menoridade - Prova Documental: Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil.

2ª Exceção : “Certas pessoas são proibidas de depor – art. 207, do CPP.”

Art. 207 - São proibidas de depor as pessoas que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho.

O melhor exemplo, aí, é o do advogado que, mesmo desobrigado, não pode depor. Eu era defensor e fui até a delegacia conversar com o assistido, preso em flagrante por descaminho. Ele

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arrumou um advogado e abriu mão de ser defendido pela Defensoria. Eu, Renato, poderia ser chamado para depor futurametne como testemunha? Não. Se tomei conhecimento do fato em razão da função, tenho que guardar segredo sobre isso.

3ª Exceção : “Exibição e leituras de documentos no plenário do júri que não tenham sido juntados com três dias úteis de antecedência – art. 479, CPP.”

Eu posso mostrar para os jurados o programa Linha Direta? O cara nem tinha sido condenado e o suposto crime já estava sendo contracenado por autores. Eu posso mostrar? Posso. Tranqulamente que posso, desde que seja juntado com três dias de antecedência. Com três dias úteis e asseguro a ampla defesa. Vai que o cara contrata a record e faz um filme contrário.

Art. 479. Durante o julgamento não será permitida a leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de 3 (três) dias úteis, dando-se ciência à outra parte. (Alterado pela L-011.689-2008)

Antes a lei só falava em três dias. Hoje fala em três dias úteis.

Parágrafo único. Compreende-se na proibição deste artigo a leitura de jornais ou qualquer outro escrito, bem como a exibição de vídeos, gravações, fotografias, laudos, quadros, croqui ou qualquer outro meio assemelhado, cujo conteúdo versar sobre a matéria de fato submetida à apreciação e julgamento dos jurados.

Posso, então, mostrar o vídeo, desde que tenha sido juntado três dias úteis.

4ª Exceção : “Exame de corpo de delito nos crimes materiais cujos vestígios não tenham desaparecido.”

Cuidado porque em relação ao exame de corpo de delito, o CPP é peremptório. Olha o que diz o art. 158:

Art. 158 - Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

Então, se a infração deixou vestígios, não adianta você querer provar a materialidade com o depoimento de uma testemunha. O Código, neste ponto, é taxativo. Exige a realização do exame pericial. Se o vestígio desaparecer aí você pode usar a prova testemunhal (exame pericial indireto que veremos na aula de provas em espécie).

5ª Exceção : “Questões prejudiciais heterogêneas (arts. 92 e 93, do CPP).” – É matéria do intensivo II.

Só tem um exemplo (nunca vi outro no dia a dia): O cidadão está sendo processado por bigamia e diz que não pode responder por bigamia porque o primeiro casamento é nulo. Aqui é uma questão prejudicial heterogênea relacionando estado civil. O juiz penal tem que parar o

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processo e aguardar a decisão no cível. Não deixa de ser uma limitação à essa liberdade das provas.

Meio de prova então, era só isso? Não. Ainda tem mais. Em relação ao meio de prova, tem outra discussão bastante interessante que é a seguinte:

QUAL A DIFERENÇA ENTRE MEIO DE PROVA E MEIO DE OBTENÇÃO DE PROVA?

Alguns doutrinadores chamam de meio de pesquisa e outros chamam de meio de investigação.

“Os meios de prova referem-se a uma atividade endoprocessual que se desenvolve perante o juiz com a participação das partes.”

“Meios de investigação são certos procedimentos regulados pela lei, em regra, extraprocessuais, com o objetivo de conseguir provas materiais, e que podem ser realizados por outros funcionários que não o juiz.”

Isso é muito interessante porque às vezes você se depara com erros. É comum se dizer que a busca e apreensão é meio de prova. Mas é meio de prova ou meio de obtenção de prova? Se amanhã sumir uma arma dentro do quartel, você pedir busca e apreensão se tiver indício, mas você pode entrar lá e não achar nada.

Outro exemplo: Interceptação é meio de obtenção de prova (você vai tentar colher algum elemento), e não meio de prova. O STJ tem entendimento dizendo que a interceptação só pode ser provocada uma vez, prorrogada por uma vez (15 + 15), mas isso não vinga. Quem diz isso é quem nunca nem pensou em investigação. No caso Abadia, a interceptação durou mais de 4 anos. Em 30 dias você não acha nada. Você consegue imaginar a quantidade de conversas que foram gravadas sem qualquer conteúdo que interesse ao processo. Em um dia, nesses quatro anos, você vai conseguir algo.

1.6. Objeto de prova ou Tema probando

“O objeto de prova são os fatos que interessam à decisão da causa.”

O juiz, no começo da audiência, às vezes nem sabe do que se trata. E acaba que pergunta de cara: “Qual é o objeto da prova?” Essa pergunta é campeã porque quando pergunta isso, está dizendo: O que esta testemunha está fazendo aqui, o que queremos obter dela? E aí você delimita, para não fazer perguntas inúteis.

O que precisa ser provado e o que não precisa ser provado no processo penal?

O QUE PRECISA SER PROVADO:

“Deve ser provado o fato narrado, seja pela acusação, seja pela defesa.”

Se o MP está imputando a alguém a prática de um furto, o MP vai ter que provar que você é o autor do delito. Se o acusado diz que ele não matou porque estava em outro local, cabe a ele a prova de que estava nesse outro local.

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“Direito consuetudinário. Costumes devem ser provados.”

Os costumes são importantes, para a interpretaçaod e alguns tipos penais. Por exemplo: furto durante o repouso noturno. Pensa, por exemplo, em Salvador carnaval às 2 horas da manhã. Neste caso, tem tudo menos repouso noturno.

“Regulamentos e portarias devem ser provados.”

Como se sabe que o estrito cumprimento do dever legal abrange, não só leis, mas também portarias, você tem que provar. Eu tenho que provar a Portaria da ANVISA sobre drogas? Negativo”

“Se a portaria é complemento de norma penal em branco, presume-se que o juiz a conheça.”

A Portaria 344, da ANVISA é o melhor exemplo.

“Direito estrangeiro, estadual e municipal.”

O art. 337, do CPC, diz o seguinte:

Art. 337 - A parte, que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário, provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o determinar o juiz.

“A jurisprudência diz o seguinte: que o juiz é obrigado a conhecer o direito municipal e estadual da localidade onde exerce sua função.” Em SP eu teria que provar o direito municipal de Manaus, de Belém.

No processo penal existe a CONFISSÃO FICTA ?

Se o acusado confessa, mesmo assim, o MP precisa provar? Cuidado com isso. Já me deparei com um caso em que um irmão confessou para inocentar o outro que era policial. O caso John Kennedy várias pessoas confessaram o crime para ganhar notoriedade.

“Fatos não contestados, incontroversos, devem ser provados no processo penal.”

Existe revelia no processo penal, mas não traz aquele efeito do processo civil de presunção da veracidade. Aqui, não mesmo, diante da revelia, o MP tem que provar.

O QUE NÃO PRECISA SER PROVADO:

“Fatos notórios, que são fatos de conhecimento público geral não precisam ser provados.”

“Fatos axiomáticos, que são fatos intuitivos, evidentes, não precisam ser provados.” É preciso provar que cocaína causa dependência? Não.

“Fatos inúteis não precisam ser provados.”

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“Presunções legais não precisam ser provadas. Presunção é a afirmação da lei de que um fato é existente ou verdadeiro, independentemente de prova.” Isso facilita o trabalho. Essas presunções subdividem-se em presunção absoluta (iuris et de iuris) e em presunção relativa (iuris tantum).

Presunção ABSOLUTA – É aquela presunção que não admite prova em sentido contrário. Diante dela, não perca seu tempo. Exemplo de presunção absoluta, o melhor deles, é um só: inimputabilidade do menor de 18 anos. O menor de 18 anos é presumido pela própria Constituição como inimputável. O cara dá aula sobre o assunto, mas pela lei ele é tido como inimputável. Não adianta você querer provar que ele tinha total entendimento do que fazia.

Presunção RELATIVA – Admite prova em sentido contrário. O que acontece aqui é uma inversão do ônus da prova. Como o fato é presumido, cabe a inversão do ônus para aquele a quem cabe provar que o fato não teria ocorrido.

Presunção de violência nos crimes sexuais – Qual é a sua natureza? Presume-se a violência se a vítima não é maior de 14 anos, se é débil mental e o agente conhece isso e não pode, por qualquer razão, oferecer resistência. Essa é a presunção de violência nos crimes sexuais.

“É possível a caracterização de erro de tipo.” O agente não sabe o que faz. Rafael conheceu uma moça de 13 anos com aparência de maior de idade e com ela manteve relação sexual, desconhecendo a idade. Ele manteve relação sexual, mas não sabia da idade. Se o elemento subjetivo não está presente, ele não responde pelo delito. No caso do estupro, que não pune a modalidade culposa, a conduta dele é atípica. Você começa a namorar a menina de 12 anos. Depois de um ano, se mantém relação, sabendo que ela é menor, responde pelo estupro? Se você diz que a presunção é absoluta, responde! Mas como admite prova em contrário, você, durante o processo, pode provar que ela já tinha experiência, já tinha capacidade e que aquela hipótese prevista pelo legislador não

“Para a doutrina, trata-se de presunção relativa.” E a doutrina gosta muito de citar o julgado do Supremo, relatado pelo Ministro Marco Aurélio: HC 73672. Apesar de a doutrina falar nisso quase que de forma unânime, esse é um julgado isolado no supremo. “Apesar desse julgado, prevalece no Supremo de que se trata de uma presunção de natureza absoluta (STF HC 81268 e 93263).” Você então não pode achar que o simples consentimento afasta a presunção. Para a prova de concurso eu acho que é melhor dizer que é presunção relativa. A não ser que seja prova do CESPE.

(Fim da 1ª parte da aula)

1.7. Prova DIRETA e Prova INDIRETA

“Prova DIRETA é aquela que recai diretamente sobre o fato probando.”

Esta prova direta se você parar para pensar em exemplo, seria o seguinte: Soldado pegou uma pistola 9 mm no meio do quartel e matou um cara, com testemunhas visualizando tudo. Isso é prova direta.

“Prova INDIRETA – Provada a existência de um fato, chega-se à conclusão acerca da existência de outro por meio de indução ou raciocínio lógico.”

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Exemplo difícil que às vezes acontece: Uma moça apareceu morta no apartamento. Qeum matou? Tem prova direta? Alguém viu o autor esfaqueando a vítima? Não. Então, vamos investigar. Uma hora antes um cidadão foi visto subindo no elevador com a vítima. Quando sai da casa, meia hora depois, é visto no elevador usando outra camiseta. Uma busca e apreensão é feita na casa dele e a farda usada no delito foi usada. Não há prova direta, mas há prova indireta. O cara foi pego com a arma do crime na mão e com a camisa cheia de sangue, você conclui que ele foi o autor do homicídio.

Eu pergunto: a prova indireta autoriza a condenação de alguém? Claro!

Seu marido chegou tarde da noite em casa. Ao se aproximar dele, você percebe uma mancha de batom no colarinho. Você pode chegar á conclusão que ele teria cometido adultério? Não. Para condenar seu marido, é preciso mais provas concatenadas.

“Prova indireta, desde que formada por um conjunto coeso e coerente, autoriza um decreto condenatório.”

Esse é o detalhe. Uma única prova indireta, talvez não seja suficiente para quebrar o princípio da presunção de inocência, mas quando junta vários elementos, autorizaria a condenação do agente.

1.8. Indícios

A palavra indício, geralmente, é usada pela doutrina como sinônimo de prova indireta. Mas aí é que está o detalhe. A palavra indício pode ser usada em dois sentidos absolutamente distintos:

Você pode usar a palavra indício como prova indireta – sinônimo de prova indireta, conceito do art. 239, do CPP (traz conceito de indício como prova indireta).

Art. 239 - Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.

Exemplo muito trabalhado: Um gato e um rato são trancados numa caixa lacrada. Meia hora depois só sai o gato, com um fiapo de pelo na boca. Pergunta-se: Quem teria sido o autor do raticídio? Tem prova direta? Não. Mas a prova indireta é clara.

Indício também pode ser usada como prova semiplena (e isso falta nos manuais) – Prova semi-plena é aquela prova de menor valor persuasivo.

É interessante ficar atento a essa distinção porque, em alguns momentos, o Código, a exemplo do art. 312, do CPP:

Art. 312 - A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

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Eu pergunto: Dá para perceber a diferença? Quando o legislador usa a palavra prova, está querendo dizer que em relação à materialidade é preciso ter certeza, mas se para a autoria eu preciso desta mesma certeza? Não. Para prender alguém preventivamente, eu não preciso ter a mesma certeza necessária para condenar. Basta ter indício. Aqui não é indício no sentido do gato que comeu o rato na caixa, mas no sentido de prova de menor poder persuasivo, ou seja, se uma testemunha disser, que era alguém muito parecido com ele a ameaçar as vítimas, é o que basta para determinar a prisão.

Esses conceitos são muito importantes e são cobrados. E algo que tem caído muito em prova é em relação à prova emprestada.

1.9. Prova Emprestada

“É a utilização da prova em um processo que foi produzida em outro processo.”

Esse é o processo A. Você tem um processo A e eu tenho outro processo B. No processo A, eu ouvi uma testemunha. Foi colhido seu depoimento. Na prova emprestada, eu tiro cópia desse depoimento e trago para o processo B esse depoimento. Essa prova pode ser utilizada? O grande problema da prova emprestada é o seguinte: No processo B é o acusado X. Será que o acusado X também participou do processo A. Neste caso, a prova seria possível. Seria diferente se o acusado fosse outro porque como trazer uma prova de um processo de X e usar no processo de Y. Anotar o seguinte:

“É possível a utilização da prova emprestada, desde que aquele contra quem ela será utilizada tenha participado do processo onde a prova foi produzida, com o respeito ao contraditório.”

Acusado B de acusado X. Aí não dá. Mas se for o mesmo acusado, houve respeito ao contraditório. Aqui foi ouvida a testemunha. Obviamente eu tiro cópia e junto no outro processo. E ela entra como documento ou como prova testemunhal? Se você disser que entra como documento, não serve para nada. Se o contraditório foi observado, ela entra nesse novo processo com o mesmo valor que tinha no outro.

“O valor da prova emprestada é o mesmo da prova originariamente produzida, apesar de ingressar no processo pela forma documental.”

Posição minoritária (Ada, Scaranzi) – sou obrigado a citar porque ganhou um grande reforço. A majoritária é que você já adotou (no caso de mesmas pessoas, pode usar). Mas olha o que uma corrente minoritária vai dizer:

São dois requisitos para a utilização da prova emprestada:

a) “Ser produzida em processo formado entre as mesmas partes” (até aqui é o mesmo que a outra corrente já dizia).

b) Ser colhida perante o juiz natural da causa – Isso para quem vai fazer prova para a defensoria está maravilhoso para cair em prova

Para essa corrente, além de observar o contraditório, você também deve se preocupar com o juiz natural porque esse processo estava tramitando na 3ª Vara Criminal de SP e o outro estava tramitando na 1ª Vara Federal de Campinas. Você usa no segundo processo uma prova que não foi produzida perante o juiz natural. Cuidado como princípio da identidade física do juiz. Olha

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que questão maravilhosa para ser cobrada de vocês. Isso agora vai ter uma grande relevância. Esse princípio agora figura no CPP, no art. 399, § 2º:

§ 2º O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença.

O problema: como é que o juiz da 3ª Vara vai ser valer de prova testemunhal que foi colhida em outro processo? Além de violar o princípio do juiz natural, viola a identidade física. Daí a questão. Essa corrente minoritária é para fazer prova para Defensoria.

POSSO USAR UMA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NUM PROCEDIMENTO DISCIPLINAR?

Sou funcionário público e estou pedindo dinheiro dos acusados para arquivar o IPL. Os elementos serão usados no processo criminal (corrupção passiva, concussão, o que for), mas poderão ser usados no processo disciplinar? Olha o detalhe: eu não posso pedir a interceptação no processo disciplinar, mas nada impede que seja levada para o processo disciplinar.

“Desde que a interceptação tenha sido autorizada para apurar crime punido com reclusão (a lei exige que a receptação seja utilizada para o crime seja punido, ao menos, com reclusão), nada impede que os elementos aí produzidos sejam utilizados em um processo disciplinar, desde que respeitado o contraditório em relação ao mesmo acusado.”

STJ – Tem um julgado, que é o RMS 16429.

É isso o que há de mais importante sobre a terminologia da prova.

2. PRINCÍPIOS RELACIONADOS À PROVA

Aqui, mais uma vez, aproveitando as auals de processo civil, minha preocupação não é com todos os princípios, mas aqueles relacionados ao processo penal.

2.1. Princípio da Busca da Verdade pelo Juiz

Não tem um juiz que não goste desse princípio e nenhum promotor que não o odeie. Uma doutrina mais tradicional trabalha com ele como se fosse o princípio da verdade material, ou da verdade real. E esse princípio da verdade material teria como oposto o chamado princípio da verdade formal. E essa doutrina mais antiga e bem conservadora faz essa distinção em relação ao processo penal e ao processo civil, afirmando que a verdade material informa o processo penal e a verdade formal o processo civil. O processo civil, sobretudo porque trata de direitos disponíveis, o comportamento do juiz é passivo. O juiz assiste ao que é produzido pelas partes.

“No processo penal, em virtude do direito individual indisponível em disputa (que é exatamente a liberdade de locomoção), cabe ao juiz a busca da verdade durante o curso do processo.”

Você permitir que o juiz saia por aí investigando é absurdo gigante. Se o Brasil adota o sistema acusatório, não cabe ao juiz fazer isso, mas ao MP. Só que isso vem sendo cada vez mais questionado pela doutrina. Em prol da busca pela verdade, várias heresias foram produzidas,

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como a tortura. O juiz saía por aí produzindo provas porque estava procurando a verdade. Prova disso é a nova redação do art. 212, que reforça isso:

Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida. (Alterado pela L-011.690-2008)

A própria lei, agora, reserva ao juiz um papel subsidiário. O juiz, quanto menos agir de ofício, melhor, porque preserva o que há de mais sagrado, que é a imparcialidade. Quando ele começa a procurar prova, a imparcialidade vai para o espaço.

2.2. Princípio do nemo tenetur se detegere

“De acordo com esse princípio, o acusado não é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Esse princípio surge a partir do momento em que se torna obrigatória a defesa do advogado.”

Se eu ficar só calado, a coisa complica, por isso a presença do advogado é importante. Eu calo, mas meu advogado vai me defender. Esse princípio está muito ligado à defesa técnica.

Esse princípio está previsto na Constituição? As pessoas entendem que isso é sinônimo de direito ao silêncio, que é apenas uma das manifestações desse princípio, que é muito mais amplo do que o direito ao silêncio. Esse princípio está previsto onde?

Convenção Americana dos Direitos Humanos, Pacto San José (que é mais ampla que a própria Constituição), que deve ser lida e citada:

Artigo 8º - Garantias judiciais2. Toda pessoa acusada de um delito tem

direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada;

ABRANGÊNCIA DO PRINCÍPIO NEMO TENETUR

O que esse princípio engloba ou ampara?

a) “Direito ao silêncio ou direito de ficar calado” – Este sim, previsto na CF, art. 5º, LXIII:

LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

Esse é o direito ao silêncio, que é apenas um dos desdobramentos do princípio do nemo tenetur. A Constituição fala em PRESO. Será que esse direito ao silêncio só se refere ao preso?

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“Por preso, leia-se, não somente quem está preso, mas também qualquer pessoa a quem seja imputada a prática de um ilícito criminal, aí abrangendo suspeitos, indiciados, acusados ou mesmo condenados.”

E a testemunha, tem direito ao silêncio? O que as CPI’s vinham fazendo? Vinham arrolando suspeitos como testemunhas para que tenham a obrigação de dizer a verdade. Será que pelo fato de ser chamado de testemunha eu não tenho direito ao silêncio? Testemunha, enquanto testemunha, tem obrigação de dizer a verdade, sob pena de responder por falso testemunho. Só que se a testemunha é submetida a um testemunho que pode incriminá-la, terá direito ao silêncio.

“A testemunha, enquanto testemunha, tem obrigação de dizer a verdade. Porém, se de suas respostas puder resultar uma auto-incriminação, também estará protegida pelo direito ao silêncio.”

Exemplo: Sou preso. Mandado de prisão, crime hediondo. Na hora que estou saindo de casa para ser preso com o mandado de prisão. No caminho para o xadrez, o delegado vira para mim e pergunta: “Você, por acaso trouxe muda de roupa para usar no xadrez? Não? Então vamos passar no shopping para comprar e fazer um almoço de despedida no rodízio. Não vou algemá-lo e nem vou colocá-lo no chiqueirinho do camburão.” Delegado gente-fina, eu acabei confessando: matei mesmo e enterrei o cadáver ali. O delegado pega essa gravação e usa isso. Essa gravação feita pelo delegado é lícita? Lembrem do que diz a Constituição de que o preso será informado dos seus direitos, dentre os quais, o de permanecer calado. Eu pergunto: Será que essa gravação feita pelo delegado é lícita? A Constituição é muito categórica nesse ponto. Eventual confissão, sem advertência quanto ao direito ao silêncio é prova ilícita porque viola esse direito. E não adianta falar que é coisa da minha cabeça. Eu vou citar o julgado.

Esse mesmo raciocínio pode ser usado para outra situação muito comum: Entrevista do preso à imprensa, que sai atropelando as garantias. O delegado acha o máximo. Essa gravação é usada, mas é prova ilícita.

“Gravações feitas pela imprensa ou de conversa informal do preso com policiais, sem a advertência formal quanto ao direito ao silêncio, torna ilícita a prova que contra si produza o acusado. Isso é violação à regra do art. 5º, LXIII.”

Princípio da máxima efetividade das garantias o acusado tem que ser informado. Um julgado do STF exatamente nesse tema: HC 80949. Vale a pena ver. Um julgado maravilhoso relatado por Sepúlveda Pertence.

Último exemplo: O que acontece durante o interrogatório judicial? Vamos supor que o Bruno esteja sendo ouvido pelo juiz. Antes do interrogatório, o juiz faz a advertência. O Bruno diz que se reserva o direito ao silêncio. Você, amanhã, como acusado, faria isso? O juiz jamais poderá fundamentar a sentença condenatória com base no seu silêncio porque se a Constituição garante o silêncio, eu não vou fundamentar. Mas é preciso lembrar que o juiz é um ser humano como outro qualquer. Se você opta pelo silêncio, o que o juiz pensa? “Vagabundo!”. Melhor, então contar uma história.

Silveirinha era um acusado da máfia dos fiscais do Rio. Durante a audiência, o juiz pergunta se o Silveirinha forneceria material para exame grafotécnico. O advogado falou no ouvido dele: fornece, mas escreve diferente. Isso foi captado pela imprensa. O advogado foi execrado pela mídia, mas tem algum problema com a conduta do advogado? Nenhum. Ele está fazendo valer o direito do seu cliente.

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DIREITO AO SILÊNCIO E TRIBUNAL DO JÚRI

“Direito ao silêncio não pode ser usado como argumento para convencer os jurados.”

Isso foi trazido pela nova lei, 11.689 e é um aspecto muito interessante. Isso era muito explorado pelo promotor. O acusado ficava calado e o que o promotor fazia? “Quem cala, consente.” Como o jurado não é obrigado a fundamental seu voto, ao fazer isso, você jogava no lixo o direito ao silêncio.

Com a Lei 11.689, a presença do acusado não é mais obrigatória no dia do julgamento, mesmo em se tratando de infração inafiançável. Antigamente, se o crime fosse infiançável, você tinha que estar presente e, como iria fazer uso do direito ao silêncio? Impossível. Hoje, para que o réu possa usar o direito ao silêncio, é melhor nem comparecer no dia do julgamento.

b) “Direito de não praticar qualquer comportamento ativo que possa incriminá-lo.”

Este direito também está abrangido pelo nemo tenetur. O acusado não é obrigado a praticar nenhum comportamento ativo. Eu não posso obriga-lo a fazer alguma coisa. Ele é obrigado a participar da reconstituição do crime? Pode ser conduzido para o seu reconhecimento? A reconstituição envolve um comportamento ativo (o acusado vai ter que fazer algo), por isso não pode ser obrigado a participar. Mas e o reconhecimento? Posso fazer a condução coercitiva do reconhecimento? Claro. Como o reconhecimento não envolve nenhum comportamento ativo, ele pode ser conduzido coercitivamente, por envolver comportamento passivo. O reconhecimento não está protegido pelo direito ao silêncio.

c) “Direito de não produzir nenhuma prova incriminadora que envolva o seu corpo humano.”

E aí vem um detalhe importante. O acusado não é obrigado a praticar nenhum comportamento desse tipo. E aí surge a diferença entre as chamadas provas invasivas e provas não invasivas. Atente para essa diferença.

Prova invasiva – “É uma prova que envolve o corpo humano e implica na utilização ou extração de alguma parte dele.”

Eu não posso obrigar o acusado a soprar o bafômetro. Detalhe interessante, bastante atual dessa discussão é o do art. 306, da Lei 9.503. Olha o que dizia a redação antiga:

Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem:

Por essa redação, se o acusado soprasse, tudo bem, mas não é obrigado a fazer isso. Na redação antiga, se ele não soprasse, como eu fazia a prova? Exame clínico. Levava até o IML. O médico, olhando para ele, ia constatar que ele estava sob a influência do álcool. Dá uma olhada comigo na nova redação do art. 306, que foi alterado ano passado:

Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: (Alterado pela L-011.705-2008) (Regulamentado pelo D-006.488-2008)

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Se sopra o bafômetro, tudo bem. O problema é que agora está dentro do tipo penal a concentração de álcool por litro de sangue. Aquele exame clínico da antiga redação ainda pode ser feito? Não, porque como é que o médico, olhando para você, vai poder aferir a concentração de álcool no seu organismo? Isso é impossível. O legislador acabou com o art. 306 porque a prova disso é absolutamente impossível de ser feita.

Um fio de cabelo caído no chão? Uma guimba de cigarro caída no chão? Eu posso utilizar? Eu não posso puxar o seu fio de cabelo porque seria uma prova invasiva. Mas será que eu posso pedir ao juiz um mandado de busca e apreensão e apreender a sua escova de cabelo?

“Uma coisa é a produção forçada de prova invasiva, o que não é admitido, outra coisa bem diferente, é a prova produzida voluntária ou involuntariamente com outra finalidade, a qual pode ser utilizada.”

Muita atenção, porque eu não posso arrancar um fio de cabelo seu, não posso raspar a sua mão, mas posso fazer uma busca e apreensão para pegar a sua escova de cabelo ou pegar uma guimba de cigarro que você jogou no chão. Exemplo da Gloria Trevi. Apareceu grávida dentro da carceragem da PF e alegou ter sido violentada. Ela não queria fazer o DNA, mas o Supremo acabou consentindo na realização do exame com um objeto que foi descartado, qual seja, a placenta. Reclamação 2040 – Nessa Reclamação, o STF autorizou a coleta na placenta.

Prova invasiva – “Consiste numa inspeção ou verificação corporal, não implicando na extração de nenhuma parte do corpo humano.”

Exemplo disso é o exame clínico feito pelo médico. Essa é uma prova que pode ser feita, mesmo sem o consentimento.

MULA TRANSPORTANDO COCAÍNA DENTRO DO ESTÔMAGO

O que eu faço com esse cidadão? Na prática, coloca-se um copo d’água para ele. A pessoa que ingeriu isso, não pode beber nada de jeito nenhum. Se ela beber, está tudo bem (a água dissolveria as cápsulas se desintegrariam, matando a mula); se não beber, é porque está com culpa no cartório. Mas pode ser feito exame de raio-x?

Nesse ponto, LFG entende que seria uma prova invasiva, já que invadiria o corpo da pessoa. Nesse caso, é preciso fazer um juízo de ponderação entre os interesses em conflito. O que está do outro lado? Se é o direito à vida, já que as cápsulas se estouram no estômago, matam imediatamente. Mesmo contra a sua vontade, você pode realizar o exame de raio-x. O que não dá é para deixá-la correndo risco.

Vamos entrar num ponto muito importante, que é a análise da Lei 11.690, que entra em vigor no ano passado e traz profundas alterações.

3. ANÁLISE DA LEI 11.690/08

3.1. Art. 155, do CPP, alterado pela Lei 11.690/08

Art.   155.   O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não

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podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. 

Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.” (NR)

O primeiro ponto importante sobre esse artigo é o seguinte:

a) Sistemas de Valoração da Prova

São três os sistemas e é um tema extremamente complexo

1º Sistema – SISTEMA DA ÍNTIMA CONVICÇÃO DO JUIZ

“Permite que o magistrado avalie a prova com ampla liberdade, porém, sem a obrigação de fundamentar sua convicção.”

Esse sistema possui uma vantagem, que é a liberdade. O juiz pode emprestar o valor que entender devido a qualquer prova. O problema é a desnecessidade de fundamentação. Esse sistema não é adotado no Brasil, mas é o sistema em vigor no tribunal do júri, onde os jurados não são obrigados a fundamentar seu voto.

2º Sistema – SISTEMA DA PROVA TARIFADA OU SISTEMA DA CERTEZA MORAL DO LEGISLADOR

“A lei atribui o valor a cada prova, cabendo ao juiz simplesmente obedecer o mandamento legal.”

Nesse tema, o juiz é como se fosse uma calculadora. O legislador diz: confissão, 10 pontos; depoimento de testemunha, 01 ponto. Aqui o juiz não tem liberdade e teria que condenar. Isso é adotado no Brasil? Em alguns casos, é. Prova pericial de crime material que deixa vestígio. Esse sistema não é adotado, mas dá para visualizar algumas exceções.

3º Sistema – SISTEMA DA PERSUASÃO RACIONAL DO JUIZ OU SISTEMA DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO

É o sistema adotado pelo constituinte originário, conforme se depreedende do art. 93, IX. O juiz pode usar qualquer prova, mas tem que fundamentar o seu convencimento.

“São efeitos da adoção desse sistema:”

a) “Não existe prova com valor absoluto.” Toda prova tem valor relativo, mesmo a confissão.

b) “O juiz deve valorar todas as provas produzidas no processo, mesmo que para rechaçá-las. O juiz é obrigado a valorar a prova.” Um álibi inconsistente tem que ser afastado, sob argumento fundamentado.

c) “Somente são válidas as provas constantes do processo, ou seja, conhecimentos privados do juiz não podem ser usados como prova.” O juiz não pode se valer daquilo que ele sabe para condenar alguém. Se ele presenciou um crime, será usado como testemunha.

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