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MESTRADO EM ESTUDOS SOBRE A EUROPA TRABALHO FINAL DA DISCIPLINA DE DIREITO E POLÍTICA INTERNACIONAL A INVESTIGAÇAO CRIMINAL NA UNIÃO EUROPEIA AS ESTRUTURAS EUROPEIAS Gilberto Gaspar - 801608 2014

MESTRADO EM ESTUDOS SOBRE A EUROPA TRABALHO FINAL DA DISCIPLINA DE DIREITO E POLÍTICA INTERNACIONAL A INVESTIGAÇAO CRIMINAL NA UNIÃO EUROPEIA AS ESTRUTURAS EUROPEIAS

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MESTRADO EM ESTUDOS SOBRE A EUROPA TRABALHO FINAL DA DISCIPLINA DE DIREITO E POLÍTICA INTERNACIONAL

A INVESTIGAÇAO CRIMINAL NA UNIÃO

EUROPEIA AS ESTRUTURAS EUROPEIAS

Gilberto Gaspar - 801608

2014

1

ÍNDICE

1 - A Investigação Criminal na União Europeia: Enquadramento ...................................... 3

2 - As Estruturas Europeias ............................................................................................... 7

2.1 - A Origem ............................................................................................................... 8

2.2 - O Grupo TREVI ................................................................................................... 9

2.3 - A Europol ............................................................................................................ 13

2.3.1 - Estrutura ....................................................................................................... 15

2.4 - A Eurojust ........................................................................................................... 17

2.4.1 - Estrutura e responsabilidades ........................................................................ 18

2.5 - A CEPOL ............................................................................................................ 20

2.5.1 - Estrutura ....................................................................................................... 21

2.6 - Outros ................................................................................................................. 22

2.6.1 - Organismo Europeu de Luta Antifraude ....................................................... 22

2.6.2 - Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras

Externas dos Estados-Membros da UE ................................................................... 23

2.6.3 - Centro de Situação Conjunto ........................................................................ 24

2.6.4 - Rede Judiciária Europeia ............................................................................... 24

3 - Síntese Conclusiva ...................................................................................................... 25

Bibliografia: ..................................................................................................................... 28

2

A INVESTIGAÇAO CRIMINAL NA UNIÃO EUROPEIA - As Estruturas

Europeias

Gilberto Gaspar - 801608

Universidade Aberta

Resumo: O presente paper pretende fazer um itinerário pelas estruturas europeias de apoio

à investigação criminal, as suas origens, os seus avanços, verificando se estas são suficientes

e se respondem correctamente às necessidades dos Estados-Membros no combate às

organizações criminosas transnacionais. Procedeu-se a uma análise sucinta dessas estruturas

apurando a sua importância e o seu enquadramento no contexto europeu e nacional, bem

como o seu contributo para a investigação da criminalidade organizada transnacional e para

a cooperação policial e judicial na União Europeia.

Palavras-chave: Investigação criminal, União Europeia, cooperação, criminalidade

organizada, transnacional.

Abstract: This paper intends to be a journey through the European structures who back-

up criminal investigation, starting in their origin and evolution and ending in trying to

establish whether they are enough and respond effectively to the needs of the Member

States in the fight against transnational criminal organizations.

A succinct analysis of those structures was conducted, intending to verify their importance

and framework in the national and European context, and also their contribution to the

investigation of transnational organized crime and police and judicial cooperation in the

European Union.

Keywords: Criminal investigation, European Union, cooperation, organized criminality,

transnational.

3

1 - A Investigação Criminal na União Europeia: Enquadramento

A União Europeia (UE) é um grande desafio para todos os Estados que a compõem pelas

suas características únicas e pela vontade destes em criarem um espaço de liberdade,

segurança e justiça. A UE actua através de um sistema de instituições, algumas delas com

características supranacionais, mas no que se refere ao nosso tema, a investigação criminal,

ainda são quase integralmente respeitadas as soberanias nacionais.

Esta situação torna a investigação da criminalidade organizada e transnacional bastante

difícil, demorada e muitas vezes burocratizada. As fronteiras estão abertas às organizações

criminosas, mas fechadas aos poderes judiciais e às polícias que as investigam.

Atendendo a que cada vez mais as organizações criminosas se aproveitam deste facto,

principalmente depois do Acordo de Schengen1, nomeadamente o terrorismo e todas as

estruturas criminosas a ele associadas, tais como: as organizações económico-financeiras, os

tráficos de estupefacientes, pessoas ou armas, branqueamento de capitais, o cibercrime e

tudo o que gravita à sua volta. Assim, para um combate eficaz a esta criminalidade

organizada e transnacional é necessário existirem “ (…) estruturas europeias fortes e

centralizadas que pratiquem uma cooperação internacional consistente”2. Há, portanto, a

necessidade de se desenvolver a cooperação policial e judicial de forma efectiva através da

criação de equipas de investigação conjuntas, troca rápida e eficaz de informação policial e

judiciária, ou seja, a palavra de ordem é cooperação. Sem a sua existência é difícil lutar

contra as poderosas organizações criminosas, principalmente as vindas do Leste europeu,

que se encontram instaladas na UE e apresentam meios técnicos e organizacionais muito

superiores aos das polícias que as investigam.

Estas organizações criminosas têm uma característica que lhes permitiu sobreviver e crescer

ao longo dos anos, a adaptabilidade, ou seja, elas ajustam-se consoante as barreiras que lhes

1 Foi assinado em 1985, pela Alemanha, Bélgica, França, Luxemburgo e Países Baixos visava suprimir

gradualmente os controlos nas fronteiras comuns e instaurar um regime de livre circulação para todos os nacionais dos Estados signatários, dos outros Estados da Comunidade ou de países terceiros. Ao longo do tempo, o Acordo de Schengen foi alargado: a Itália assinou o acordo em 1990, a Espanha e Portugal em 1991, a Grécia em 1992, a Áustria em 1995, a Finlândia e a Suécia em 1996, a Dinamarca também em 1996, mas com um estatuto especial, e a República Checa, Estónia, Letónia, Lituânia, Hungria, Malta, Polónia, Eslovénia e Eslováquia em 2007. A Irlanda e o Reino Unido apenas participam parcialmente no acervo de Schengen, tendo mantido, nomeadamente, os controlos nas suas fronteiras. 2 MOURA, José Souto de – prefácio em DAVIN, João (2007). A criminalidade Organizada Transnacional – A cooperação judicial e policial na UE, Almedina, Coimbra

4

são impostas pelos Estados através da legislação, mas, ao mesmo tempo e quando essa

legislação lhes é favorável, adaptam-se a ela e crescem desmesuradamente, utilizando para

tal as lacunas e disparidades existentes nos diversos ordenamentos jurídicos para melhor se

movimentarem, expandirem as suas actividades e, consequentemente, dilatarem a sua esfera

de influência (Simões, 2001). Foi o que aconteceu na Europa com a abertura das fronteiras,

depois do já referido Acordo de Schengen, permitindo uma mais fácil movimentação por

parte daquelas organizações e dos seus elementos, na circulação de mercadorias, serviços e

pessoas. Têm sido desenvolvidos esforços no sentido de controlar essas mesmas fronteiras,

daí termos Estados-Membros que ameaçam fechá-las e renunciar ao Acordo de Schengen

(Nahoi, 2013).

Tornava-se imprescindível à UE gerar uma força policial que lutasse contra o crime

organizado e transnacional, se ajustasse a esta nova realidade -uma Europa sem fronteiras

internas onde pessoas, bens, serviços e capitais se deslocam sem controlo interno- e,

particularmente, onde existisse aproximação entre polícia e entidades judiciais

supranacionais.

Esta Europa onde se movem milhões de pessoas quase sem controlo é atractiva para as

organizações criminosas transnacionais, obrigando as autoridades a um controlo mais

próximo e apertado, a uma adaptação à nova realidade de uma Europa sem fronteiras

internas onde a imigração e a criminalidade organizada tem crescido de forma

desmesurada, sendo difícil aos cidadãos europeus compreender essa realidade tal como

refere Simões (2001:99):

“ Os cidadãos dos Estados da União que generalizadamente se regozijam com a liberdade

proporcionada pela abertura de fronteiras terão contudo dificuldade em compreender que

não tenham ainda sido satisfatoriamente desenvolvidos mecanismos que obstem a que

aquelas vantagens acabem também por reverter a favor de delinquentes e de organizações

criminosas e lhes forneçam campo fértil para o desenvolvimento das suas actividades

ilícitas, traduzidas na obtenção de lucros e vantagens ilegais e na ocultação da sua origem.

Porque, nunca é demais repeti-lo, a dinâmica das organizações criminosas é sempre

superior à das forças da lei.”

Na década de 90 e no início do século XXI assistiu-se à criação de estruturas europeias que

fomentaram a cooperação entre os Estados-Membros para combater mais eficazmente o

5

crime organizado e transnacional numa tentativa de homogeneizar procedimentos de

investigação, de formação e fundamentalmente criar estruturas como a Europol, a Eurojust

ou a CEPOL. Estes exórdios permitiram uma maior colaboração e cooperação interna e

externa e, quem sabe, promoverão a criação de futuras instituições supranacionais de

polícia e justiça.

As instituições existentes até então, como é o caso da Interpol, mostraram-se

manifestamente insuficientes no combate ao crime organizado e principalmente ao

terrorismo como se verificou durante os anos 60 e 703. Com o crescimento do espaço

europeu foi necessário criar novas estruturas de combate ao crime. A abertura das

fronteiras internas europeias mudou substancialmente o panorama criminal europeu,

nomeadamente, com a adesão de muitos países do Leste europeu à UE. Estes Estados

trouxeram com eles o crime organizado, até então clandestino, mas que se adaptou

perfeitamente ao interior da Europa, incorporando-lhe novas actividades ilegais.

Até aos anos 90 as políticas da UE foram lentas na resposta ao combate ao crime

organizado, embora tenha sido na década de 70 que se iniciaram os primeiros trabalhos do

Grupo TREVI, que iremos abordar mais adiante. Esses trabalhos deram origem ao Tratado

de Amsterdão, em 1997, onde se declarou que a Europa era uma área de liberdade,

segurança e justiça. Previa-se já, nessa altura, que o panorama europeu no combate a este

tipo de criminalidade tivesse que mudar… e estava a mudar.

No seguimento do Tratado de Amsterdão, o Conselho Europeu reuniu em Tampere, na

Finlândia, no ano de 1999, onde foram dados importantes passos para a criação da

defendida área de liberdade, segurança e justiça no interior da UE, estabelecendo para tal

uma agenda de forma a torná-la real.

Os acontecimentos ocorriam em catadupa. Com os ataques de 11 de Setembro de 2001,

nos Estados Unidos da América (EUA) e a crise dos imigrantes ilegais na Europa, em

2002, as diligências começaram a ser mais rápidas, o interesse dos Estados passou a ser

outro e as instituições iniciaram uma procedimento mais supranacional ou a caminhar

nesse sentido. Adivinhava-se a ameaça e os governos dos Estados, conscientes, progrediam

nessa direcção.

3 Do século XX.

6

Encetava-se a criação de mecanismos importantes a nível europeu, por exemplo, a entrada

em vigor do Mandado de Detenção Europeu (MDE), em 2004, e a tentativa de uniformizar

alguma legislação criminal, permitiu a existência de definições comuns entre Estados-

Membros nas várias formas de crimes graves, nomeadamente: terrorismo e contrafacção do

euro, entre outros. A necessidade, o contexto interno e externo foram contribuindo para o

desenvolvimento da cooperação policial e judicial que, actualmente, abarca outro tipo de

crimes designadamente: o roubo de automóveis, o tráfico de seres humanos, a contrafacção

do euro, o branqueamento de capitais, o cibercrime, a exploração sexual de crianças, a

corrupção pública e privada.

Infelizmente, os problemas não se esgotam. Apesar de todos os esforços, continua a existir

uma grande diferença na legislação dos Estados-Membros. Torna-se necessária uma maior

homogeneização em termos de legislação criminal, o que constitui, sem dúvida, um dos

grandes problemas relativamente à luta contra o crime transnacional. Por outro lado esse

problema não existe nas organizações criminosas, nomeadamente: nos grupos terroristas

internos ou externos, nas máfias, italiana e de leste que se deslocam com facilidade pelas

fronteiras dos Estados-Membros, desde a criação e implementação do espaço Schengen

que teve início em Março de 19954. Esta zona facilitou o deslocamento dos cidadãos

europeus ou daqueles com visto Schengen, mas também simplificou a deslocação e as

actividades das organizações criminosas transnacionais no interior da EU. Com a adesão ao

Acordo de Schengen de mais Estados, principalmente do Leste europeu, tornou-se mais

fácil a movimentação desses grupos que encontraram na Europa o campo ideal para a

expansão das suas actividades, obrigando a uma cooperação internacional efectiva, uma

maior troca de informação e uma aplicação das melhores práticas na investigação a este

tipo de criminalidade, bem como uma formação adequada e homogénea em toda a Europa.

Vários factores contribuíram para esta mudança e para uma maior preocupação dos

Estados-Membros em aperfeiçoar o combate à criminalidade organizada transnacional. É

possível apresentar esses factores como externos, ou seja, vindos do exterior da EU, e

como internos, alguns deles citados anteriormente, como é o caso da livre circulação de

pessoas, bens, serviços e capitais. Quanto aos factores externos podemos falar da

4 Criando um espaço de circulação livre na Alemanha, Bélgica, Espanha, França, Holanda, Luxemburgo e

Portugal.

7

criminalidade internacional tal como: o terrorismo, o flagelo que é o tráfico de

estupefacientes, a imigração ilegal, o final da Guerra Fria com o consequente

desmembramento da União Soviética e o saltar para a ribalta do mercado negro ali

existente que passou a crime organizado entrando directamente para o interior da UE

através das novas adesões. Os ataques terroristas nos Estados Unidos em 2001 e de seguida

os ataques em solo europeu quer em Espanha quer no Reino Unido em 2005 foram

factores que contribuíram para uma maior preocupação dos Estados e proporcionou-lhes

uma visão diferente do espaço de liberdade, segurança e justiça que desejam para a UE.

Estes acontecimentos consciencializaram-nos que urge repensar estas entidades policiais e

judiciais supranacionais como forma de luta contra a criminalidade organizada

transnacional.

2 - As Estruturas Europeias

A preocupação com a criminalidade organizada surgiu com o aparecimento de grupos

terroristas na Europa e fora dela nos anos 60 e 70 do século passado, e contribuiu para que

os Estados despertassem não só para esse tipo de marginalidade mas também para a

cooperação existente entre eles, procurando, desta forma, uma actuação que permitisse

combatê-lo.

Em resposta a este fenómeno nasceu o Grupo TREVI, o alicerce das estruturas europeias

que despontaram nos anos 90 e no início do século XXI, também elas nascidas da

necessidade e do aumento da criminalidade organizada transnacional, depois do final da

Guerra Fria e da abertura das fronteiras com o Acordo de Schengen.

Estas estruturas, que vamos tratar individualmente de seguida, foram criadas no intuito de

apoiar os Estados-Membros na luta contra aqueles crimes, fomentando a cooperação, a

troca eficaz de informação e, de alguma forma, desburocratizar a cooperação internacional

no interior da UE. Outra das suas funções é a coadjuvação com outras agências

internacionais, nomeadamente a Interpol, as Nações Unidas e ao nível dos Estados, os

Estados Unidos da América, Canadá, Austrália, entre outros Estados considerados

parceiros na luta contra o terrorismo e toda a criminalidade organizada associada.

8

A concepção destas estruturas europeias é considerada, por alguns, o alicerce que dará

origem à criação de uma polícia europeia com contornos de um FBI5 europeu, tal como é

abordado por Occhipinti6 (2003:2):

“(…) the individual member states of the EU no longer have total sovereignty over

decision making and implementation of policies in matter of internal security. In fact, at

least in some regards, the EU seems to be on a path toward establishing its own federal

police agency, much like the Federal Bureau of Investigation (FBI) in the United States”.

2.1 - A Origem

Apesar de tratarmos das estruturas europeias não podemos olvidar de como tudo começou,

dos primórdios deste tipo de cooperação policial entre Estados. Esta relação remonta aos

finais do século XIX7, início do século XX, aquando dos primeiros contactos entre Estados

para uma efectiva colaboração e cooperação entre os países europeus e ocidentais no que

concerne ao combate ao crime.

Diversas reuniões foram realizadas no sentido de aproximar os Estados e as autoridades

policiais dos mesmos. A maioria foi patrocinada pelo Governo francês numa tentativa de

abolir a prostituição e o tráfico de escravas brancas e, ainda, no sentido de estabelecer

acordos de extradição. Foram estabelecidos protocolos internacionais na luta contra a

anarquia, contra o ópio e, no ano em que principiou a guerra8, houve um grande congresso

de Policia Judiciária Internacional, no Mónaco, onde estiveram presentes 300 delegados de

34 países (Deflem, 2002).

O movimento internacional tanto na Europa como nas Américas era já significativo, mas

esses esforços foram interrompidos com o início do conflito. Durante a guerra não houve

5 Federal Bureau of Investigation, uma das polícias de investigação criminal a actuar nos Estados Unidos da

América de âmbito federal, pois podem actuar em todos os Estados. 6 Occhipinti, John D. (2003). The politics of EU Police Cooperation. Towards a European FBI? Lynne Rienner Publishers: London – United Kingdom. 7 Em 1898, em Roma, onde se realizou secretamente a Conferencia Internacional de Polícia. Mas já em 1851

se tinha formado a União de Polícia dos Estados Germânicos, tendo efectuado reuniões frequentes até ao rebentamento da Guerra Austro-Prussiana, em 1866. Ainda em 1851 aquando da Exibição Industrial Internacional de Londres, Reino Unido várias dezenas de polícias vindos de vários países inclusive dos Estados Unidos, vieram investigar as actividades dos comunistas e liberais. 8 I Guerra Mundial 1914-1918.

9

actividades de relevo, porém, com o final da mesma, elas recomeçaram e, em 1919, um

chefe de Polícia holandesa enviou cartas aos seus homólogos propondo a criação de uma

organização internacional de polícia ao abrigo da Liga das Nações9.

Em 1923, seguindo a boa vontade surgida no final da guerra e da instabilidade causada pela

revolução bolchevique na Rússia, foi formada em Viena, na Áustria a International

Criminal Police Commission (ICPC). Com o início de uma nova guerra10 os trabalhos

foram interrompidos, a Áustria foi anexada pela Alemanha Nazi e de 1938 a 1944, com o

afastamento dos membros, deixa de ser uma organização internacional. A sua sede passa

em 1942 para Berlim, Alemanha, sendo os seus presidentes, durante esse período, algumas

das figuras mais destacadas do regime nazi.

Em 1946, terminada a guerra deu-se uma refundação da organização numa reunião

ocorrida em Paris, França11, com a participação de alguns membros fundadores, liderados

pela Bélgica, passando a chamar-se International Criminal Police Organization (ICPO)12,

estabelecendo a sua sede em Paris, França (Deflem, 2002; Occhipinti, 2003).

Em 1956, com a adopção de uma nova constituição é criado o acrónimo Interpol, a

organização passou a ser autónoma devido às contribuições dos seus membros. Em 1971, a

Interpol é reconhecida pelas Nações Unidas como organização intergovernamental.

Desde 1989 que a sua sede é em Lyon, França, contando actualmente com 190 membros,

mantendo cada um desses membros um Gabinete Nacional no seu território. O número de

membros cresceu grandemente depois do fim da Guerra Fria devido ao interesse e

importância da organização como apoio à investigação criminal a nível global.

2.2 - O Grupo TREVI

O términus da IIª. Guerra Mundial e a criação das primeiras estruturas europeias na década

de 50, nomeadamente, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço13, a Comunidade

9 Liga das Nações ou Sociedade das Nações era o nome de uma organização internacional criada em 1919 e

autodissolvida em 1946, e que tinha como objectivo reunir todas as nações da Terra e, através da mediação e arbitragem entre as mesmas em uma organização, manter a paz e a ordem no mundo inteiro, evitando assim conflitos desastrosos como o da guerra que recentemente devastara a Europa. 10 II Guerra Mundial. 1939-1945. 11

Occhipinti refere a refundação da ICPC em Paris, França enquanto Deflem a refere em Bruxelas, Bélgica. 12 Que tem como acrónimo Interpol. 13 CECA - Tratado de Paris, em 18 de Abril de 1951.

10

Económica Europeia14 e a Comunidade Europeia da Energia Atómica15, contribuíram para

o despoletar de uma maior integração europeia, com o crescente número de países

interessados em aderir.

Nunca houve uma grande preocupação por parte dos Estados-membros no que diz

respeito à cooperação policial porque a maioria tinha fronteiras comuns e alguns

protocolos bilaterais ou multilaterais já existiam entre esses Estados, ou seja, havia uma

razoável cooperação policial, apesar dos emergentes grupos terroristas, principalmente de

cariz político, no interior da Europa e fora dela.

Existia também alguma oposição principalmente por parte da França, liderada pelo general

Charles de Gaulle que sempre quis fechar a França a um maior federalismo ou influência

exterior. Em 1969, o seu sucessor George Pompidou16 trouxe novas ideias e mudou o

panorama da cooperação em França. Pompidou criou um grupo de combate ao tráfico e

abuso de drogas ilícitas, chamado Grupo Pompidou, que visava uma maior cooperação com

os seus vizinhos apenas no tráfico de estupefacientes, proporcionando um passo decisivo

na cooperação europeia (Occhipinti, 2003).

A Pompidou sucedeu Valery Giscard d’Estaing17, com ideias europeístas, que permitiu uma

célere integração, porque a sua visão era de cooperação em outras áreas da segurança

interna europeia, além das drogas ilícitas. Foi ele que liderou o Conselho Europeu de

Roma, em 1975, onde se criou uma base de cooperação policial e de justiça, dando origem

à criação do chamado Grupo TREVI 18 que mais tarde veio servir de base ao nascimento

da Europol.

O Grupo TREVI procurava colmatar alguns defeitos existentes na Europa no que

concerne ao combate ao terrorismo, à ineficácia da Interpol e das Nações Unidas em lidar

com este tipo de criminalidade internacional, resultante dos diversos ataques terroristas

ocorridos em diversos países europeus e fora da Europa, durante os anos 60 e 70,

14 CEE - Tratado de Roma, entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1958. 15 EURATOM – Tratado de Roma, entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1958. 16

Presidente francês de 1969-1974. 17

Presidente francês de 1974-1981. 18

O Grupo Trevi foi criado em 1976 pelos 12 Estados membros para a luta contraterrorista e para coordenar o policiamento na CE.

11

nomeadamente nos jogos olímpicos de Munique19. Este grupo possibilitou uma maior

cooperação informal fora das instituições europeias, sentando os diversos parceiros à

mesma mesa com vista a resolver um problema comum que era o terrorismo.

Esta agremiação funcionava em três níveis distintos, sendo o primeiro nível ministerial,

com reuniões bianuais (Junho e Dezembro) dos Ministros do Interior ou da Justiça dos

Estados-Membros; o grupo de oficiais superiores que também se reuniam duas vezes por

ano (Maio e Novembro) e os grupos de trabalho que eram compostos por oficiais dos

Ministérios do Interior, polícias, magistrados e especialistas em diversas áreas, que

elaboravam relatórios para serem discutidos nos vários níveis. Este grupo foi uma lufada de

ar fresco à cooperação internacional e proporcionou um avanço significativo relativamente

à Interpol no que diz respeito à cooperação europeia. Existiam ainda países observadores20,

que não participavam nas reuniões, mas eram informados do seu desenrolar no final das

mesmas.

Estabeleceram-se diversos grupos de trabalho depois da sua criação, em 1976, que foram

conhecidos por TREVI 1, responsável por medidas de combate ao terrorismo, quer no

âmbito da criação de acções de formação quer na elaboração de manuais de boas práticas;

TREVI 2, responsável pela área científica, conhecimento tecnológico e formação policial,

tendo posteriormente seguido para a área do hooliganismo e ordem pública21; TREVI 3,

medidas de segurança para viagens aéreas civis, que passou posteriormente para o grupo

TREVI 1, este grupo passou para o crime organizado e tráfico de estupefacientes,

permitindo a preparação do Grupo de Drogas Europeu, estabelecendo a necessidade da

colocação de oficiais de ligação para uma melhor e mais eficaz troca de informação e

cooperação. Dedicava-se também aos assaltos à mão armada, roubo de veículos, protecção

de testemunhas, protecção de bens culturais, formação e treino no combate à criminalidade

violenta. Até à criação do grupo TREVI 92, dedicava-se também à imigração e controlo de

fronteiras; TREVI 4, medidas de segurança em instalações nucleares e no transporte de

19

Em 1972, nos jogos Olímpicos de Munique, Alemanha Federal o grupo terrorista Setembro Negro atacou atletas israelitas provocando a morte a 11 deles. 20

Eram chamados os Amigos de Trevi e era composto por Suécia, Áustria, Marrocos, Noruega, Suíça, Finlândia, Canada e EUA. 21

Em 1985, depois dos incidentes no Estádio de Heysel, em Bruxelas, onde morreram 39 pessoas depois do ataque de adeptos ingleses.

12

material nuclear; e, por fim, o TREVI 5, medidas de contingência para lidar com

emergências, nomeadamente desastres, combate e prevenção a incêndios (Bunyan, 1993).

Um conjunto de factores fez do Grupo TREVI um sucesso e a trave mestra de uma

estrutura mais complexa que interessava aos Estados-Membros. Entre esses factores

destacam-se os externos: a experiência positiva com o terrorismo, o tráfico de

estupefacientes e toda a criminalidade organizada associada; e os internos que partem do

crescente federalismo europeu e de alguns acordos entre Estados-membros nomeadamente

o Acordo de Saarbrucken, em 1984, onde foram abolidos os controlos fronteiriços entre a

Alemanha e a França e que antecipou o Acordo de Schengen22, em 1985, assinado por estes

dois países e pelos representantes do Benelux23. Este acordo permitiu a livre circulação a

pessoas, bens, serviços e capitais, mas também abriu as fronteiras ao crime organizado e às

organizações criminosas que facilmente se adaptaram à nova realidade e aos novos

desafios.

Em 1989, apareceu um novo grupo de trabalho, conhecido por TREVI 92’, para debater os

problemas referentes à abertura das fronteiras. Foram, então, apresentadas iniciativas no

sentido de melhorar a cooperação entre os Estados-Membros e adaptá-las a essa nova

realidade.

Assim, foram abordados diversos assuntos em reuniões com oficiais de fronteira,

elaborados planos para, em caso de perseguição policial, estes poderem seguir através das

fronteiras; forma de criar um sistema integrado de informação -uma rede de informação

nacional no que diz respeito às drogas- e ainda a criação de um controlo conjunto para as

fronteiras externas. Foram também colocadas as primeiras pedras para o lançamento e

implementação do Sistema de Informação Schengen24 (Occhipinti, 2003).

22

Acordo de Schengen assinado em 1985 e em que as fronteiras entre a Alemanha, Bélgica, França, Holanda e Luxemburgo eram abolidas. 23

Organização económica entre a Bélgica, Holanda e Luxemburgo, desde 1950, em que já tinham abolido as fronteiras entre os três Estados durante os anos 50. 24

SIS, este sistema de informação tem duas categorias de informações, uma relativa a viaturas e bens roubados, e outra relativa a pessoas.

13

2.3 - A Europol

“A Europol tem por objectivo melhorar por meio das medidas previstas na presente

Convenção, no âmbito da cooperação entre os Estados-Membros em conformidade com o

ponto 9 do artigo K.1 do Tratado da União Europeia, a eficácia dos serviços competentes

dos Estados-membros e a sua cooperação no que diz respeito à prevenção e combate ao

terrorismo, ao tráfico de estupefacientes e a outras formas graves de criminalidade

internacional, quando haja indícios concretos da existência de uma estrutura ou de uma

organização criminosa e quando dois ou mais Estados-membros sejam afectados por essas

formas de criminalidade de modo tal que, pela amplitude, gravidade e consequências dos

actos criminosos, seja necessária uma acção comum por parte dos Estados-membros.”25

Já vimos anteriormente as origens da cooperação entre os Estados-Membros e os esforços

efectuados nesse sentido até chegarmos à Europol. Foi com o Tratado de Maastricht que

surgiu a segurança e os assuntos internos como o terceiro pilar do Tratado, onde é feita

referência explícita à cooperação entre os Estados-Membros no combate ao terrorismo,

tráfico de estupefacientes e crime organizado internacional, fazendo ainda referência ao

Gabinete de Polícia Europeia.

Nesse seguimento foi criado, em 1993, a Unidade de Droga da Europol, com mandado

para cooperar e assistir as instituições nacionais nas investigações criminais. Estava dado o

primeiro passo. Esta unidade era apoiada por um número limitado de funcionários e com a

colocação de oficiais de ligação dos Estados-Membros que faziam a ligação com as

unidades nacionais. Estendeu-se depois a outras áreas de actividade da criminalidade

organizada transnacional, nomeadamente ao terrorismo, tráfico de material nuclear, redes

de tráfico de seres humanos, roubo e tráfico de veículos automóveis e ainda a outro tipo de

redes, de organizações criminosas, nomeadamente ataques de skinheads contra

“estrangeiros”, racismo e xenofobia.

Atendendo aos resultados e ao elevado número de pedidos esta unidade viria a ser

transformada na Unidade Europeia de Polícia - Europol, este processo teve início no

25

Convenção Europol, artigo 2º., nº.1 – Objectivos.

14

Tratado de Maastricht26, a sua estrutura, procedimentos, responsabilidades e poderes foram

estabelecidos pela Convenção Europol27 e os seus protocolos, depois de serem ratificados

pelos Estados-membros entraram em vigor plenamente em 1 de Julho de 1999 (Occhipinti,

2003).

No Tratado de Amsterdão28, de 1997, foram-lhes reforçadas as suas competências, dando-

lhe mais importância e poderes quando ainda não se encontrava em pleno funcionamento.

Com o Plano de Acção para o Combate ao Crime Organizado onde se incluíam 15 guidelines

e 30 recomendações sobre a acusação e prevenção no que concerne a este tipo de

criminalidade. Mais uma vez, a cooperação era enfatizada e trazia a cooperação judicial para

o mesmo nível da cooperação policial, procurando desenvolver pontos de contacto entre

os Estados-Membros e os Estados-candidatos bem como com organizações internacionais

e procurando implementar programas de prevenção. Procurava-se, ainda, que os agentes da

Europol pudessem participar de uma forma mais activa em operações conjuntas. Grande

parte das guidelines e das recomendações fizeram parte do Tratado de Amsterdão ou foram

implementadas depois do Conselho Europeu de Tampere, na Finlândia, em 1999.

Neste Conselho Europeu de Tampere, já depois da entrada em pleno funcionamento da

Europol, o seu poder de actuação aumentou consideravelmente no que respeita ao

combate ao crime organizado transnacional, à criação de formas de agilizar uma maior

participação desta organização no trabalho operacional de polícia e reforçar a sua

importância a nível europeu, na cooperação, no planeamento de operações policiais, na

criação de equipas de investigação conjuntas envolvendo vários Estados-Membros. No

entanto, os seus agentes não podem ser considerados polícias porque não possuem poderes

de interpelação ou de detenção. É-lhes permitido prestar apoio às autoridades dos Estados-

Membros na recolha, coordenação e análise de informação, apoio na detecção, prevenção e

investigação de infracções. Podem integrar equipas de investigação conjuntas29, elaborar

relatórios estratégicos e análises sobre a criminalidade europeia, com base em informações

provenientes dos Estados-Membros, da Interpol e ainda de Estados terceiros.

26

No seu artigo K.3. 27 Assinada em 26 de Julho de 1995. 28 O Tratado de Amsterdão reforçou os poderes atribuídos à Europol através da Convenção que a criou nos seus artigos k2 e k4. 29

Decisão-quadro 2002/465/JAI relativa às equipas de investigação conjuntas

15

No seguimento dos atentados nos EUA, em Outubro de 2001 houve um reforço ainda

maior das competências, estendendo-se a sua actuação a todas as formas de criminalidade

organizada e terrorismo internacional, procurando aumentar a cooperação com Estados

terceiros, o que extrapolava os objectivos iniciais que apenas pressuponham o apoio aos

serviços policiais dos Estados-membros bem como a cooperação em determinadas áreas de

actividade.

A Europol dispõe de um sistema informatizado de dados que é alimentado pelos Estados-

Membros e podem ser consultados por estes, mas limitado às unidades nacionais, aos

oficiais de ligação30 e aos diversos agentes da Europol devidamente credenciados para tais

consultas.

A Europol promove programas de troca de agentes, formação e cooperação entre os

Estados-membros nomeadamente com os Programas Odysseus31 e Falcone32, entre outros

programas de apoio e de fomento à cooperação.

A partir de 2010, a Convenção Europol foi substituída pela Decisão do Conselho de 6 de

Abril de 2009, que criou o Serviço Europeu de Polícia - Europol, com uma maior

dependência e controlo por parte do Parlamento Europeu, passando assim a existir um

efectivo controlo democrático e jurisdicional da agência a nível comunitário.

2.3.1 - Estrutura

As alterações que entraram em vigor em 2010, relativamente à Europol delimitam-na e

estruturam-na, tal como aconteceu com a Convenção Europol, pelo que vamos referir os

órgãos que a compõem de forma a melhorar a percepção da mesma e uma pequena

referência ao pessoal da Europol, agentes de ligação e unidades nacionais.

Assim, existem dois órgãos33 na estrutura da Europol que são:

30 Todos os Estados-membros possuem oficiais de ligação na sede da Europol, em Haia – Holanda. 31

Programa relativo ao asilo político, imigração e passagem de fronteiras exteriores. 32 Programa relativo ao crime organizado. 33

Artigo 36º da Decisão do Conselho que criou a Europol.

16

O Conselho de administração34 composto por um representante de cada Estado-Membro e

de um membro da Comissão. Cada delegado do Estado-Membro dispõe de um voto,

podendo fazer-se substituir por um suplente em caso de ausência. Podem ainda fazer-se

acompanhar por peritos que os ajudem na tomada de decisões. Têm bastantes tarefas,

nomeadamente as elencadas no nº.9 do artigo 37º, da Decisão do Conselho de 6 de Abril

de 2009. O Presidente e o Vice-Presidente do Conselho de administração são seleccionados

pelo grupo de três Estados-Membros que elaboraram conjuntamente o programa de

dezoito meses do Conselho e são oriundos desses Estados-Membros, exercendo funções

por um período de dezoito meses. O presidente é coadjuvado por um secretariado. De

quatro em quatro anos o conselho de administração tem que solicitar uma avaliação externa

independente sobre a execução das actividades da Europol, cujo relatório tem que ser

enviado ao Parlamento Europeu, ao Conselho e à Comissão.

Relativamente ao segundo órgão que é o Director35, este é nomeado pelo Conselho sob

proposta do conselho de administração, por um período de quatro anos renovável por uma

vez, coadjuvado por três directores-adjuntos. As competências do director estão elencadas

no nº.4. do artigo 38º, da Decisão do Conselho de 6 de Abril de 2009. O Director é

responsável pela sua gestão perante o conselho de administração e participa nas suas

reuniões, não tem direito de voto, mas é o responsável legal da Europol.

Relativamente ao pessoal36 onde se incluem o Director e os Directores-adjuntos, estes

devem nortear-se pelos objectivos e funções atribuídas à Europol. São regulados pelo

Estatuto de Pessoal das Comunidades Europeias.

Relativamente aos oficiais de ligação, estes não fazem parte do pessoal da Europol, mas,

sim, dos Estados-Membros e regem-se pela sua legislação tal como é referido no artigo 9º.

Decisão do Conselho de 6 de Abril de 2009. Cada Estado-Membro deve destacar pelo

menos um oficial de ligação. Os oficiais de ligação são encarregados pelas respectivas

unidades nacionais de representar os seus interesses na Europol e devem fornecer

informações dos seus Estados-Membros para a Europol e vice-versa, podendo ainda fazer

o aconselhamento relativamente a assuntos referentes ao Estado que representam.

34 Artigo 37º da Decisão do Conselho que criou a Europol. 35 Artigo 38º da Decisão do Conselho que criou a Europol. 36 Artigo 39º da Decisão do Conselho que criou a Europol.

17

Cada Estado-Membro tem uma unidade nacional Europol, esta é o elo de ligação exclusivo

entre os serviços nacionais competentes e a Europol e as suas funções são elencadas no

nº.4, do artigo 7º, da Decisão do Conselho de 6 de Abril de 2009. As unidades nacionais

regem-se pelas leis nacionais e as despesas inerentes ao seu funcionamento são da

responsabilidade do Estado-Membro.

2.4 - A Eurojust

“A fim de reforçar a luta contra as formas graves de crime organizado, o Conselho

Europeu aprovou a criação de uma unidade (EUROJUST) composta por procuradores,

magistrados ou agentes da polícia nacionais com competências equivalentes, destacados por

cada Estado-Membro de acordo com o respectivo sistema jurídico. A EUROJUST deverá

ter por missão facilitar a coordenação adequada entre as autoridades repressivas nacionais e

dar apoio às investigações criminais em processos de crime organizado, designadamente

com base nas análises da Europol, bem como cooperar de forma estreita com a Rede

Judiciária Europeia, em especial a fim de simplificar a execução das cartas rogatórias. O

Conselho Europeu solicita ao Conselho que, até ao fim de 2001, adopte o instrumento

jurídico necessário”.37

A Eurojust foi instituída em 2002 por decisão do Conselho38 e posteriormente alterada em

16 de Dezembro de 200839 e o seu principal objectivo é o combate à criminalidade

transnacional organizada tal como é referido no seu site:

“ (…) é reforçar a eficácia das autoridades nacionais responsáveis pela investigação

e pelo exercício da acção penal na luta contra as formas graves de criminalidade

transfronteiriça e a criminalidade organizada, bem como submeter os criminosos a

julgamento de forma célere e eficaz.”40

No fundo a Eurojust funciona como um complemento à acção da Europol que se iniciou

alguns anos antes e que necessitava de apoio judiciário para a concretização das suas

funções. Mais uma vez o objectivo é a criminalidade transfronteiriça organizada,

fomentando a cooperação entre os Estados-Membros e, ao mesmo tempo, ter um papel

37

Conselho Europeu de Tampere – Conclusões da Presidência, ponto 46, [Consultado em 5 de Julho de 2014]. Disponível em: www.europarl.europa.eu/summits/tam_pt.htm 38 Decisão do Conselho 2002/187/JAI. 39 Decisão do Conselho 2009/426/JAI. 40 http://www.eurojust.europa.eu/Pages/languages/pt.aspx

18

central com o apoio de peritos judiciários para uma acção concreta e efectiva contra os

vários tipos de criminalidade organizada transfronteiriça, coordenando as autoridades

nacionais em todas as fases da investigação e no exercício da acção penal, tendo ainda em

conta os diversos ordenamentos jurídicos dos Estados-Membros.

Todos os 28 Estados-Membros têm o seu representante na Eurojust, são magistrados ou

investigadores com larga experiência nos diversos ordenamentos jurídicos dos Estados-

Membros e são coadjuvados por várias pessoas, nomeadamente adjuntos, assistentes e

peritos. Podem ainda trabalhar com outros magistrados de ligação de países terceiros com

quem foram celebrados protocolos e que são destacados para trabalhar junto da Eurojust.

De igual forma, os magistrados da Eurojust podem ser destacados para trabalhar em

Estados terceiros.

A Eurojust acolhe ainda os secretariados da rede Judiciária Europeia, da Rede de Pontos de

Contacto no que concerne a pessoas acusadas de genocídio ou crimes contra a humanidade

e ainda a Rede de Equipas de Investigação Conjunta que cada vez têm mais aceitação por

parte dos Estados-Membros, principalmente do centro da Europa, pois existe uma

proximidade física e histórica bastante relevante.

Os elementos da Eurojust são apoiados por um exército de funcionários que procuram dar

resposta célere aos pedidos de assistência efectuados pelas várias autoridades dos Estados-

Membros.

2.4.1 - Estrutura e responsabilidades

A Eurojust é composta por um magistrado, juiz ou oficial de polícia tendo em conta os

respectivos ordenamentos jurídicos, ou seja, existe um representante por cada Estado-

Membro, com a possibilidade de ser assistido por diversas pessoas e uma delas substitui-lo-

á em caso de ausência. Este representante pode também ser o ponto de contacto na Rede

Judicial Europeia.

Os membros dos diversos Estados formam um Colégio e elegem um Presidente que o

representa. O Presidente do Colégio submete anualmente um relatório ao Conselho com as

suas actividades e gestão incluindo os aspectos financeiros.

19

A Eurojust pode ser considerada o corpo da coordenação judicial porque atua através de

um ou mais membros nacionais ou através do Colégio.

Anualmente, a Eurojust trata de, aproximadamente, 1400 casos e realiza cerca de 140

reuniões de coordenação, que contam com a participação de autoridades judiciárias e

órgãos de polícia criminal dos Estados-Membros e, eventualmente, de Estados terceiros.

Nestas reuniões são discutidas questões relacionadas com os casos e desenvolvidos planos

de acções operacionais como detenções e buscas simultâneas.

Nas reuniões de coordenação são abordadas questões específicas relacionadas com os

crimes identificados como prioritários pelo Conselho da União Europeia: terrorismo,

tráfico de estupefacientes, tráfico de seres humanos, fraude, corrupção, cibercriminalidade,

branqueamento de capitais e outras actividades ilícitas relacionadas com a presença de

grupos criminosos organizados na economia.

A Decisão Eurojust enuncia uma lista de obrigações fundamentais e competências

atribuídas à instituição. A título exemplificativo, a Eurojust responde a pedidos de auxílio

apresentados pelas autoridades nacionais competentes dos Estados-Membros. Em

contrapartida, pode solicitar aos Estados-Membros que investiguem ou exerçam acção

penal relativamente a factos específicos.

A Eurojust presta, igualmente, assistência na resolução de conflitos de jurisdição nos casos

em que mais do que uma autoridade nacional se encontra em posição de investigar ou

exercer acção penal num determinado caso. Facilita a execução de instrumentos judiciários

internacionais, tal como, o Mandado de Detenção Europeu, e presta auxílio financeiro e

logístico às Equipas de Investigação Conjuntas.

Esta instituição trabalha no sentido de garantir que as parcerias estabelecidas com vista à

luta contra a criminalidade transnacional (de que o intercâmbio de informação entre as

autoridades competentes é parte fundamental) sejam desenvolvidas no sentido de alcançar

a melhor coordenação e cooperação possíveis, para garantir uma área de liberdade,

segurança e justiça para todos os cidadãos da UE.

20

2.5 - A CEPOL

A agência europeia CEPOL41 pretende encontrar soluções para o problema europeu da

segurança comum e regional através da formação profissional. Procura uma

homogeneização de soluções a aplicar no combate à criminalidade organizada e

transfronteiriça e estende-se naturalmente aos Estados adjacentes porque o combate àquele

tipo de criminalidade tem de começar antes das fronteiras exteriores europeias.

Para que esse combate seja efectivo, é necessário uma uniformização de procedimentos. É

importantíssimo lutar contra o eurocepticismo de muitos dos agentes de aplicação da lei,

através de uma agilização de contactos interpessoais, da experiência dos participantes a fim

de implementar e promover partilha entre eles como forma de incentivá-los na luta contra

o crime organizado e transfronteiriço.

Este tipo de cooperação no que diz respeito à formação policial começou a ser pensado

desde a década de 70, aquando do grupo TREVI, mas foi após 1992, com o Tratado de

Maastricht42 que esta se começou a desenhar. Tornou-se uma realidade quando foi

convertida em agência da UE em 2005 por decisão do Conselho43, tem sede em Bramshill,

no Reino Unido e reúne altos funcionários dos diversos serviços de polícia dos Estados-

Membros. Anseia ser reconhecida pelas agências e autoridades dos Estados-Membros

como a principal fonte de aprendizagem e formação de polícia para uma melhoria da

cooperação entre as diversas forças de segurança na Europa.

A formação cujas actividades passam por cursos, seminários, conferências e reuniões são

organizadas nas academias ou escolas de polícia dos diversos Estados-Membros, com a

participação de funcionários oriundos de outros Estados-Membros. São organizadas

anualmente 60 a 100 actividades que procuram abarcar os temas mais relevantes da

actividade policial europeia para que os agentes da autoridade possam estar actualizados

para melhor cooperarem e desempenharem o seu papel no combate à criminalidade.

41

O acrónimo CEPOL corresponde à designação francesa Collège Européen de Police - European Police

College (em inglês) – Academia Europeia de Polícia (em português).

42 O Tratado sobre a União Europeia (TUE), assinado em Maastricht em 7 de Fevereiro de 1992, entrou em

vigor em 1 de Novembro de 1993. 43

Decisão do Conselho 2005/681/JAI, de 20 de Setembro de 2005.

21

O Secretariado da CEPOL é gerido por um Director, que presta contas ao Conselho de

Administração, constituído por representantes dos Estados-Membros da UE, que

normalmente são os directores dos institutos nacionais de formação de altos funcionários

dos serviços de polícia. A Presidência do Conselho de Administração é ocupada por um

representante do Estado Membro que exercer a Presidência do Conselho da União

Europeia. O Conselho de Administração reúne normalmente duas vezes por ano.

A CEPOL foi criada através do Conselho de Tampere, um dos mais importantes para a

cooperação policial na Europa. Neste Conselho ficou decidido que iria ser criada a

CEPOL, inicialmente, como uma rede das já existentes escolas ou academias de polícia

nacionais não excluindo a hipótese de criação de um instituto permanente de formação.

2.5.1 - Estrutura

A CEPOL é constituída por um grupo de Directores das escolas ou academias de

formação nacionais. Existe a possibilidade de ser nomeado mais do que um elemento pelo

facto de existirem várias academias nacionais. Esta delegação assim constituída tem direito

a um voto. O grupo de directores é presidido por um Director do Estado que exercer a

Presidência do Conselho da União Europeia.

O Grupo de Directores reúne-se pelo menos uma vez por Presidência e são convidados

para as reuniões: um representante do Secretário-geral do Conselho da União Europeia, um

representante da Comissão e um representante da Europol.

O grupo de Directores decide sobre as actividades de formação que vão decorrer no ano

seguinte, bem como os seus conteúdos e respectiva duração. Estas decisões são

transmitidas ao Conselho da União Europeia que os ratifica.

A CEPOL elabora anualmente um relatório de actividades que é transmitido ao Parlamento

da União Europeia e à Comissão para conhecimento.

É escolhido um secretariado permanente que cuida de todas as actividades administrativas,

é chefiado por um Director Administrativo que é o legal representante da CEPOL.

22

Actualmente, o Secretariado da CEPOL encontra-se instalado no Police Staff College, em

Bramshill, no Reino Unido44.

2.6 - Outros

Não podemos deixar de fazer uma pequena análise a outras estruturas europeias que têm

sido criadas consoante as necessidades e o desenvolvimento da integração europeia. Nessas

estruturas encontram-se o Organismo Europeu de Luta contra a Fraude45, a Agência

Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos Estados-

Membros da UE, o Centro de Situação Conjunto46 e a Rede Judiciária Europeia.

2.6.1 - Organismo Europeu de Luta Antifraude

A OLAF foi uma estrutura criada em 199947, para o combate à fraude, corrupção e outro

tipo de actividades ilegais que afectem os interesses financeiros da UE. Deve ao mesmo

tempo providenciar assistência aos Estados-Membros, bem como cooperação entre as

autoridades desses Estados de forma a coordenar actividades no sentido de proteger os já

referidos interesses. Deve ainda contribuir para desenvolver métodos de combate à fraude

e outras actividades que possam afectar os interesses financeiros europeus, conduzir

investigações administrativas contra funcionários que possam estar a ser corrompidos ou

que, de alguma forma, tenham incorrido em faltas disciplinares ou criminais graves no

decorrer das suas funções.

A OLAF pode efectuar investigações externas e internas, através de protocolos celebrados,

de forma a poder proceder a inspecções ao desempenho de funcionários e de instituições

dos Estados-Membros, independentemente de possíveis investigações criminais ou outras

que possam estar a decorrer nesses mesmos Estados.

44

Por decisão 2005/681/JHA, no seu artigo 3º. 45 OLAF – relativamente a crimes que afectam os interesses financeiros da UE. 46

Sitcen 47

Decisão 1999/352/CE, CECA, Euratom da Comissão, de 28 de Abril de 1999, que institui o Organismo

Europeu de Luta Antifraude (OLAF).

23

Dado que a UE apoia financeiramente uma grande variedade de programas e projectos que

se destinam à formação e proporcionam uma melhor qualidade de vida aos seus cidadãos e

aos de outros países, a utilização abusiva dessas verbas do orçamento da UE ou a evasão ao

pagamento de impostos, direitos e quotizações, que são a base desse mesmo orçamento,

vão lesar directamente os cidadãos europeus e o projecto europeu, pelo que é necessário

implementar boas práticas e ajudar a Comissão Europeia a legislar no sentido de evitar a

fraude.

2.6.2 - Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras

Externas dos Estados-Membros da UE

O Frontex48 coordena a cooperação operacional entre os Estados-Membros no domínio da

gestão das fronteiras externas e apoia-os na formação dos guardas das fronteiras nacionais,

nomeadamente no que concerne às normas de formação comuns, às análises de risco.

Acompanha a evolução da investigação relevante em matéria de controlo e vigilância das

fronteiras externas e apoia os Estados-Membros em circunstâncias que exijam assistência

operacional e técnica reforçada nas fronteiras externas e o apoio necessário no âmbito da

organização de operações conjuntas de regresso.

Existe uma ligação estreita entre esta agência e outros parceiros comunitários e da UE

responsáveis pela segurança das fronteiras externas, designadamente a Europol, a

CEPOL e a OLAF, bem como na cooperação no domínio aduaneiro e dos controlos

fitossanitários e veterinários a fim de promover a coerência global nesta matéria, reforça

ainda a segurança nas fronteiras, através da coordenação das acções dos Estados-Membros

na aplicação de medidas comunitárias relacionadas com a gestão das fronteiras externas.

48 Criada pelo Regulamento (CE) n.°2007/2004 do Conselho (26.10.2004, JO L 349 de 25.11.2004).

24

2.6.3 - Centro de Situação Conjunto

Apesar de não existir muita informação sobre o Centro de Situação da UE (SITCEN), este

funciona essencialmente com informações confidenciais prestadas pelos Estados-

Membros. Recebe informações de outras fontes, nomeadamente instituições da UE,

organizações internacionais, entidades públicas e operadores comerciais.

Atendendo a que as suas atribuições incluem a avaliação dos riscos das missões da UE na

gestão de crises naturalmente que também recebe informações provenientes dessas

incumbências.

Encontra-se dividida em duas missões distintas: uma voltada essencialmente para uma

análise estratégica com informação que recebe dos serviços de segurança e de inteligência

dos Estados-Membros, composta por diversas secções que se encontram distribuídas desde

a geografia até diversos tópicos de análise; a outra encontra-se direccionada para as

questões legais e administrativas, comunicações e análise de fontes abertas. No fundo tem

uma estrutura idêntica aos serviços de informação nacionais e é gerido por Ilkka Salmi, que

já foi o Director dos Serviços de Informação da Finlândia.

2.6.4 - Rede Judiciária Europeia

Esta rede é uma rede de pontos de contacto nacionais que tem como objectivo facilitar a

cooperação judiciária em matéria penal49 e foi inaugurada oficialmente em 25 de Setembro

de 1998, tendo sido o primeiro mecanismo estruturado e prático de cooperação judiciária a

ficar completamente operacional. No entanto o seu estatuto jurídico foi reforçado em

200850, mas mantém o espirito original.

É constituída por pontos de contacto dos Estados-Membros, da Comissão Europeia e de

um Secretariado, com sede em Haia. Estes pontos de contacto são nomeados pelos

Estados-Membros entre as autoridades centrais responsáveis pela cooperação judiciária

internacional, as autoridades judiciárias e outras autoridades competentes com

49

Acção Comum 98/428 JAI, de 29 de Junho de 1998, para cumprir a recomendação n.º 21 do Plano de Acção para Combater o Crime Organizado adoptado pelo Conselho em 28 de Abril de 1997. 50 Decisão 2008/976/JAI do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008.

25

responsabilidades específicas no âmbito da cooperação judiciária internacional, tanto em

geral como para determinadas formas de criminalidade grave, como: crime organizado,

corrupção, tráfico de droga e terrorismo51.

Actualmente e de entre os 28 Estados-Membros existem mais de 300 pontos de contacto

nacionais que são nomeados de acordo com a legislação e tradições jurídicas de cada

Estado, tendo cada um deles um Correspondente Nacional nomeado e um correspondente

de Rede para tratar dos aspectos técnicos relacionados com a Rede Judiciária Europeia.

Os pontos de contacto dispõem de uma lista com informações sobre os seus parceiros

europeus, as línguas utilizadas e os horários contactáveis, de forma a agilizar todos as

comunicações que possam ser necessárias.

São ainda promovidas frequentes comunicações nacionais entre os pontos de contacto52no

sentido de haver trocas de experiência e conhecimento que podem ser importantes para o

futuro.

3 - Síntese Conclusiva

Sem dúvida que a cooperação entre Estados-Membros é a chave para uma maior

aproximação, integração e para a resolução do problema que é a criminalidade organizada

transnacional.

A UE nasceu com o objectivo de evitar conflitos num continente que foi sendo devastado

por sucessivas guerras, nunca totalmente resolvidas, citaremos como exemplo o caso do

traçado das fronteiras, resultantes da Iª. Guerra Mundial que ainda hoje causam problemas.

Depois da IIª. Guerra Mundial, paulatinamente, foi-se construindo a UE, sonho de muitos

pensadores europeístas. Esta UE foi crescendo, outros Estados foram integrados e hoje

são já 28 Estados-Membros e não terminará aqui, pois são grandes as perspectivas de

crescimento.

Com o alargamento abriram-se as fronteiras internas à livre circulação de pessoas, bens,

serviços, capitais e com esta abertura vieram as oportunidades para o crime organizado se

51 No caso português existem seis pontos de contacto que são a Procuradoria-Geral da República (Autoridade Central), a Directora do DCIAP e os Directores dos DIAP’s Distritais (Lisboa, Porto, Coimbra e Évora). 52 Pelo menos três por ano.

26

expandir, para cimentar posições nas mais variadas formas, através das máfias europeias,

nomeadamente as italianas e as novas máfias vindas de Leste porque depois da queda do

Muro de Berlim, a expansão da UE deu-se principalmente a Leste. Esta unificação originou

a entrada de novas formas de criminalidade, vindas da clandestinidade desses novos

Estados, que se expandiram por toda a Europa e que trouxeram com elas: tráfico de seres

humanos em grande escala, novas formas e rotas de tráfico de estupefacientes, alguma

criminalidade de extrema violência, cibercrime, corrupção pública e privada, ligações ao

terrorismo ao mais alto nível, lavagem de dinheiro proveniente destas actividades, para citar

apenas algumas actividades criminosas inerentes a este alargamento territorial.

Os Estados-Membros por si só não se encontram preparados para lidar com esta

criminalidade, na sua grande maioria transnacional o que limita desde logo a acção policial e

judicial, deixando o campo aberto aos grupos organizados conhecedores das fragilidades

legais e da forma de actuação das polícias e dos tribunais.

Perante este cenário foi necessário estimular a cooperação policial e judicial na UE, com

vista a combater o crime organizado transnacional e a reforçar a segurança e a justiça no

interior das fronteiras da UE. Começou-se, principalmente, desde os anos 70 a fomentar

essa cooperação, apesar de muito embrionária, deixou as suas sementes. Com a abertura

das fronteiras e a queda do Muro de Berlim, foi necessário promover, acelerar a cooperação

policial e judicial na UE. A acensão da criminalidade organizada nos Estados-Membros

despoletou uma realidade que estes Estados por si só não podiam combater. Embora

muito apegados às suas soberanias e às suas fronteiras tiveram de se adaptar, unir e traçar

uma actuação conjunta.

A necessidade de criar soluções deu origem ao Tratado de Amsterdão e, posteriormente, ao

Conselho Europeu de Tampere que trouxeram novas esperanças no combate ao crime

organizado transnacional. Foram criadas estruturas europeias de combate a estas formas de

criminalidade, talvez numa tentativa de vir a gerar uma polícia e tribunais supranacionais,

mas quiçá seja muito cedo para se falar desses desenvolvimentos, apesar dos primeiros

passos estarem dados e, de alguma forma, consolidados.

É certo que os Estados-Membros têm seguido o caminho que se afigura mais fácil no

combate à criminalidade organizada transnacional usando os mecanismos jurídico-legais,

27

como, por exemplo, o aumento das penas de prisão que, segundo Davin (2007:155) “não é

um simples aumento da moldura penal abstractamente aplicável a certos tipos legais de

crimes que constitui elemento (suficientemente) dissuasor para este tipo de criminalidade”.

Outro tipo de meios deve ser intentado. Os resultados podem não ser imediatos, mas

funcionariam como um investimento a médio/longo prazo no combate a este tipo de

criminalidade. A implementação de métodos de trabalho eficazes que devem pautar a

transparência, especialmente, na administração pública e, porque não, nas polícias e

tribunais de forma a evitar uma corrupção in situ.

Em suma, a cooperação deve ser estimulada entre e no interior dos Estados-Membros para

que a luta contra este tipo de criminalidade, sobejamente desenvolvida e apetrechada, possa

ser combatida através da realização de investigações e operações conjuntas. A

implementação de uma formação rigorosa, o incentivo à formação, a aplicação de técnicas

humanas e tecnológicas adequadas, o intercâmbio entre magistrados, agentes de polícia

como forma de aprendizagem e transmissão de conhecimento e, evidentemente, uma maior

aproximação entre polícias dos Estados-Membros é fundamental para que exista uma

verdadeira cooperação. Não obstante, a implementação de equipas de investigação

conjunta - por vezes, mal interpretadas por alguns agentes policiais ou judiciais,

nomeadamente as chefias- bem formadas e com fortes conhecimentos para que todos os

agentes envolvidos neste tipo de investigação possam falar a mesma “língua”

independentemente do ordenamento jurídico do Estado onde se encontram.

“A liberdade apenas pode ser disfrutada num verdadeiro espaço de justiça, onde as pessoas

possam recorrer aos tribunais e às autoridades de qualquer Estado-Membro tão facilmente

como o fariam no seu próprio país. Os criminosos não devem ter a possibilidade de tirar

partido das diferenças entre os sistemas judiciários dos Estados-Membros. As sentenças e

decisões devem ser respeitadas e aplicadas em toda a União, salvaguardando

simultaneamente a segurança jurídica de base tanto dos indivíduos como dos operadores

económicos. É necessário alcançar um grau mais elevado de compatibilidade e de

convergência entre os sistemas jurídicos dos Estados-Membros.”53

53

Conclusão 5 do Conselho Europeu de Tampere na Finlândia, em 1999.

28

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