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COMPORTAMENTO SOCIAL E SÍNDROME DE ASPERGER A sociedade tende a avaliar as pessoas pela sua aparência, pelo modo de se portarem e falarem. O portador de SA, não possui nenhuma característica física indicativa de sua condição, mas é normalmente visto pela sociedade como sendo diferente, pelo seu comportamento e conversação atípicos. Por exemplo, uma jovem Asperger uma vez descreveu como ela, quando ainda criança, viu pessoas se mudando para a casa em frente a sua, correu até lá, e cumprimentou os novos vizinhos da seguinte maneira: “ 9 vezes 9 é 81” (Schopler & Mesibov 1992). Esse comportamento social atípico pode ser extremamente revelador. Critérios Diagnósticos Relevantes ao Comportamento Social Os critérios diagnósticos procuram definir o perfil incomum de habilidades e comportamento característicos da SA, e todos os critérios referem-se ao comportamento social inadequado. Em 1989 Carina e Christopher Gillberg esboçaram 6 critérios , baseados em seus estudos na Suécia, e dois desses critérios descrevem aspectos do comportamento social. O 1º critério é a Deficiência ou incapacidade social, e a criança apresenta pelo menos dois destes: (a) incapacidade de interagir com crianças da mesma idade (b) falta de interesse em interagir com crianças da mesma idade (c) falta de reconhecimento de códigos sociais (d) comportamento social e emocional impróprio O outro critério explora a comunicação não-verbal, mas também reflete uma deficiência no comportamento social, e a criança apresenta pelo menos um destes: (a) uso limitado de gestos (b) linguagem corporal desajeitada (c) expressões faciais limitadas (d) olhar peculiar, perdido Szatmari, Brenne & Nagy (1989) enfatizaram outros critérios diagnósticos do comportamento social diferente dos portadores de SA, como sendo: aparente indiferença aos sentimentos alheios, não fixar o olhar em outras pessoas, a incapacidade de transmitir sentimentos através do olhar e ficar muito próximo das pessoas. A criança pequena não tem muita noção de espaço pessoal, e quando este é invadido, ocorre o desconforto. A Organização Mundial de Saúde publicou seu critério diagnóstico para Asperger em 1990. Lá eles afirmam que no brincar ‘social’ da criança Asperger, falta interesse em compartilhar atividades, emoções e não há uma modulação do comportamento de acordo com o contexto

COMPORTAMENTO SOCIAL E SINDROME DE ASPERGER

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COMPORTAMENTO SOCIAL E SÍNDROME DE ASPERGER

A sociedade tende a avaliar as pessoas pela sua aparência, pelo modo de seportarem e falarem. O portador de SA, não possui nenhuma característica físicaindicativa de sua condição, mas é normalmente visto pela sociedade como sendodiferente, pelo seu comportamento e conversação atípicos. Por exemplo, umajovem Asperger uma vez descreveu como ela, quando ainda criança, viu pessoas semudando para a casa em frente a sua, correu até lá, e cumprimentou os novosvizinhos da seguinte maneira: “ 9 vezes 9 é 81” (Schopler & Mesibov 1992). Essecomportamento social atípico pode ser extremamente revelador.

Critérios Diagnósticos Relevantes ao Comportamento Social

Os critérios diagnósticos procuram definir o perfil incomum de habilidades ecomportamento característicos da SA, e todos os critérios referem-se aocomportamento social inadequado. Em 1989 Carina e Christopher Gillbergesboçaram 6 critérios , baseados em seus estudos na Suécia, e dois dessescritérios descrevem aspectos do comportamento social. O 1º critério é aDeficiência ou incapacidade social, e a criança apresenta pelo menos doisdestes:

(a) incapacidade de interagir com crianças da mesma idade

(b) falta de interesse em interagir com crianças da mesma idade

(c) falta de reconhecimento de códigos sociais

(d) comportamento social e emocional impróprio

O outro critério explora a comunicação não-verbal, mas também reflete uma deficiência no comportamento social, e a criança apresenta pelo menos um destes:

(a) uso limitado de gestos

(b) linguagem corporal desajeitada

(c) expressões faciais limitadas

(d) olhar peculiar, perdido

Szatmari, Brenne & Nagy (1989) enfatizaram outros critérios diagnósticos docomportamento social diferente dos portadores de SA, como sendo: aparenteindiferença aos sentimentos alheios, não fixar o olhar em outras pessoas, aincapacidade de transmitir sentimentos através do olhar e ficar muito próximodas pessoas. A criança pequena não tem muita noção de espaço pessoal, e quandoeste é invadido, ocorre o desconforto. A Organização Mundial de Saúde publicouseu critério diagnóstico para Asperger em 1990. Lá eles afirmam que no brincar‘social’ da criança Asperger, falta interesse em compartilhar atividades,emoções e não há uma modulação do comportamento de acordo com o contexto

social. O critério mais recente foi publicado em 1994 pela Associação Americanade Psiquiatria, na quarta edição do Diagnostic and Statistical Manual of MentalDisordes. O 1º critério citado é a deficiência qualitativa na interação social,que inclui aspectos descritos em critérios anteriores, mas adiciona que, faltaà criança a reciprocidade social e emocional. Em outras palavras, a criançapode dominar a interação. A medida em que desenvolvemos nosso conhecimento arespeito das características incomuns do comportamento social associado com aSA, o critério diagnóstico se torna mais preciso. A essa altura, esseconhecimento é baseado mais em impressões clínicas, do que em estudoscientíficos rigorosos. A seguir, forneceremos mais detalhes de como a criança édiferente no contexto social, e o que pode ser feito para reduzir essasdiferenças.

Brincando com outras crianças

Nos estudos originais de Hans Asperger, ele descreve como a criança não sejunta ao grupo, podendo até entrar em pânico se forçada a isso (Asperger 1991).A criança com SA parece não saber ou não ter motivação para brincar com outrasde sua idade, não estando ‘sintonizada’ à atividade social. Elas parecemcontentes com sua própria companhia. Sula Wolff (1995) cita uma criança quedisse:

Eu não consigo fazer amigos...Eu gostaria de ficar sozinho e admirar minhacoleção de moedas...Eu tenho um hamster em casa. Isso é companhia suficientepara mim...Eu posso brincar sozinho. Eu não preciso de outras pessoas.(p.7)Elas são mais centradas do que egoístas. Algumas preferem observar asbrincadeiras, ficando na periferia, ou brincar com crianças bem mais novas oubem mais velhas. Quando envolvidas no grupo tendem a impor ou a ditar asatividades. O contato social é tolerado, contanto que as outras criançasbrinquem de acordo com as suas regras. As vezes, o contato social é evitado ,não somente devido a falta de habilidade social, mas também devido ao desejo deter o controle absoluto da situação. Isso pode ser ilustrado pela descrição deDonna Williams (1992) da sua infância:

Kay era do meu bairro. Ela era provavelmente a garota mais popular da nossasérie. Ela pedia para a gente fazer fila e dizia: ‘Você é a minha 1ª melhoramiga; você é minha 2ª ...’ Eu era a 22ª . Uma garota Yoguslava caladinha era aúltima. Eu era bonita, alegre e às vezes divertida, mas eu não sabia comobrincar com as crianças. O máximo que conseguia era criar jogos bem simples ouaventuras e as vezes permitir que outras crianças participassem, contanto quefosse seguindo as minhas regras.

Incluir outras crianças é ter que arriscar um script, uma interpretação ouconclusão alternativos – ou seja, é preciso compartilhar e aceitar idéiasdiferentes. A criança não está interessada em participar de atividades que asoutras querem e não está inclinada a dar explicações sobre os seus atos. Pareceque estão brincando numa ‘bolha’ e podem se sentir ofendidas quando outrascrianças invadem seu espaço. Quando a criança quer brincar sozinha e outrasfazem perguntas ou querem socializar, elas podem reagir abruptamente ou comagressividade para assegurarem a solitude. Geralmente, elas preferem continuarsuas atividades, sem a interrupção de outras pessoas.

Normalmente, na hora do recreio, a criança fica só, em algum local do‘playground’, às vezes conversando sozinhas, ou na biblioteca, lendo a respeitodo seu tópico de interesse. Certa vez quando perguntaram uma criança por queele não conversava com nenhuma outra no ‘playground’ , ele respondeu: ‘Nãoobrigado. Eu não preciso.’ Há uma preferência em interagir com adultos, poisestes são mais interessantes e possuem uma maior tolerância com relação a faltade habilidades sociais.

A criança não se vê como membro de um determinado grupo, e segue seus própriosinteresses, ao invés de seguir o das outras crianças no ‘playground’ ou na salade aula. Geralmente elas não têm interesse em esportes competitivos ou jogos emequipe. Por exemplo, durante um jogo de ‘rounders’ (uma mistura de criquete ebasquete) a criança com SA era capaz de bater na bola e jogar para cesta tãobem quanto os outros membros da equipe. Quando um membro estava correndo paramarcar ponto, todos gritavam e pulavam encorajando. A criança Aspergerpermaneceu quieta sem demonstrar emoção, e mostrou-se distraída por umaborboleta. Não havia nenhum interesse no sucesso de seu time. Um adolescenteAsperger descreveu como ele era incapaz de apreciar o sentimento de triunfo emcompetições esportivas, ele não conseguia entender como alguém podia sentirsatisfação quando seu oponente era inferiorizado.

A criança pode mostrar-se indiferente aos modismos de seus colegas com relaçãoaos últimos lançamentos em roupas e brinquedos, raramente é convidada a ir àfestas e possui poucos amigos verdadeiros. As crianças mais novas podemmostrar-se indiferentes ao isolamento, ficando contentes em brincarem sozinhasou com os irmãos. As crianças mais velhas tornam-se conscientes de seuisolamento, e em tempo, são genuinamente motivadas a socializarem com criançasde sua idade. No entanto, sua imaturidade no brincar e sua rigidez ficaaparente, e elas são então rejeitadas pelas outras crianças. Talvez este sejaum dos momentos mais tristes para os pais.

Códigos de Conduta

A criança SA parece não ter noção das regras sociais, e fará ou falará coisasque podem ofender ou magoar outras pessoas. O comentário, ainda que verdadeiro,pode ser potencialmente embaraçoso. Por exemplo, um adolescente SA parou no

meio de uma conversa para comentar que os dentes da pessoa com a qualconversava eram tortos. Comentário bastante preciso, é verdade, mas isto nãoirá facilitar em nada a conversação. Uma outra criança, que era fascinada porcomputadores, ouviu os pais comentarem que os vizinhos haviam adquirido umcomputador novo. Então ela entrou na casa dos vizinhos e começou a usar ocomputador. O problema é que já se passavam das 11h da noite e todos estavamdormindo. A criança jamais imaginou que as pessoas ficariam assustadas de terum intruso na casa e depois com raiva, por não terem sido consultadas arespeito do uso do computador.

Explicando os códigos de conduta uma vez, a criança tende a segui-losrigorosamente, tornando-se o ‘policial’ da classe, sendo tão rígido, que istotambém será considerado uma quebra do código de conduta. Por exemplo, na salade aula a professora se distrai e uma criança faz uma molecagem, que todosadoram. A professora então se dá conta de que alguém fez algo de errado epergunta : “Quem é que fez isso?” Há um longo silêncio, que é quebrado pelacriança Asperger, que fala o nome do trapalhão, em meio a olhares dedesaprovação dos demais colegas por ela ter quebrado o código de silêncio. Asoutras crianças quebram ou ‘entortam’ as regras, mas a criança com SA ficaatenta em cumpri-las.

Em algumas ocasiões pode parecer que a pessoa não tem educação; por exemplo, umrapaz Asperger queria chamar a atenção de sua mãe enquanto ela conversava numgrupo de pessoas, ele então gritou, ‘Ei você!’ , desconhecendo que há maneirasmais apropriadas de chamar sua mãe em público. A criança, por ser impulsiva,fala a primeira coisa que vem em sua mente, não tendo noção das conseqüências.As pessoas podem achar que a criança é mal educada, grosseira ou mimada, e dãoaos pais olhares de desaprovação achando que o comportamento da criança é frutode uma má criação. Podem até comentar, ‘Se essa criança ficasse comigo por duassemanas eu daria um jeito nela’. Os pais até que poderiam deixar a criançaficar com o estranho, para poderem descansar um pouco, e para provarem comoessas pessoas estão enganadas a respeito de seu filho. É fundamental que aspessoas entendam que a criança não esta sendo grosseira de propósito, e sim queela não conhece uma maneira mais apropriada e não percebe os efeitos de seuscomentários nos outros.

Carol Grey (no prelo) desenvolveu uma técnica chamada de Estórias Sociais, quevem se mostrando bastante eficaz, possibilitando o entendimento e reaçãoapropriada da criança, frente às situações sociais. Também ajuda outras pessoasa entenderem a perspectiva da criança, e por que podem parecer inocentes,excêntricas ou desobedientes. Se ocorreu algo, onde o comportamento da criançanão foi adequado, a técnica consiste em criar uma estória simples que descrevea situação, incluindo ações e expressões mais condizentes. Por exemplo, naescola a criança ficou agitada na hora de entrar na fila para o lanche. Aexplicação inicial seria de que essa criança é mal educada, grosseira ouagressiva. Esta pode ser uma explicação própria para as outras crianças, mas a

primeira fase na implantação da técnica, consiste em ver a situação daperspectiva da criança com SA. Conversando com a criança sobre o ocorrido,pode-se descobrir que a criança mostra-se confusa em relação ao por quê deformar a fila, onde entrar na fila e como se portar na fila enquanto espera.Com as outras crianças, não levamos estes aspectos em consideração, mas com acriança Asperger, é necessário. Normalmente eles não possuem o que podemoschamar de bom senso social. No entanto, eles podem aprender o que fazer se issofor ensinado.

Quando se cria uma estória social, a situação é descrita em termos de dicassociais relevantes, ações antecipatórias, e informações a respeito do que estáocorrendo e por que está ocorrendo. As estórias são escritas de acordo comnormas, baseadas na vasta experiência de Carol no uso dessa técnica. Há umaproporção matemática nos quatro tipos de frases utilizadas:

Descritiva: define de modo objetivo onde a situação ocorre, as pessoasenvolvidas, o que estão fazendo e por quê o fazem.

Perspectiva: descreve, e explica, se necessário, as reações e os sentimentosdas pessoas em uma determinada situação.

Diretiva: diz o que se espera que a criança fale e faça.

Controle: elabora estratégias que ajudarão a criança a lembrar o que fazer, oucomo compreender a situação. Geralmente essas estratégias são sugeridas ouescritas pela própria criança, e podem incluir seu tópico de interesse.

É preciso haver um equilíbrio entre esses quatro tipos de frases, evitando-seutilizar muitas diretivas o poucas descritivas e perspectivas. Carol recomendaa razão de 0:1 diretiva e/ou controle para cada 2:5 descritiva e/ouperspectiva. Caso contrário, a estória se torna uma lista de ‘o que fazer’ semexplicar ‘quando’ e ‘por que’ fazê-lo O vocabulário utilizado deve estar deacordo com a idade da criança, seu tipo de leitura (compreensão) e seu grau deatenção. Normalmente as estórias são escritas na primeira pessoa e no presente,como se estivessem descrevendo os eventos à medida em que eles ocorrem. Dessemodo, personaliza-se o conteúdo e evitam-se problemas com relação a percepçãode tempo e sintaxe. Uma estória pode descrever uma situação em que a criança játenha o domínio, assim ela pode, inicialmente, se concentrar em aprender asregras do jogo. Para a criança em idade pré-escolar, a estória deve conterpoucas palavras (em letras grandes) por página, e possuir fotos ou ilustrações.Para aquelas que não lêem, pode-se usar uma fita cassete. Para crianças maisvelhas, pais e professores podem preparar uma estória, como se fossemjornalistas, utilizando linguagem e gráficos de artigos publicados em jornaisou revistas. Por exemplo, pode-se escrever um artigo a respeito dos códigos deconduta existente entre amigos, ou a respeito de como se portar e o que falar,quando encontrar um amigo da escola no shopping.

Eis um exemplo de uma Estória Social de uma situação descrita anteriormente,uma criança pequena, que não está se comportando adequadamente enquanto esperana fila do lanche, na hora do recreio.

Minha escola tem muitas salas (descritiva). Uma sala é chamada de cantina(descritiva). Normalmente as crianças comem na cantina (descritiva). Ascrianças escutam o sino (perspectiva). As crianças sabem que quando o sino tocaé hora de entrar na fila (perspectiva). Nós fazemos fila para sermos justos comaquelas pessoas que esperam a mais tempo(perspectiva). A medida que as pessoaschegam elas entram no final da fila (diretiva). Quando eu chegar vou tentarentrar no final da fila (diretiva). As crianças estão com fome. Elas queremcomer (perspectiva). Eu vou tentar me manter quieto na fila até chegar minhavez de comprar meu lanche (diretiva). As filas para o lanche e as tartarugassão ambas muito lentas (controle). Às vezes elas param, às vezes elas andam(controle). Minha professora vai ficar contente por eu ter esperado quieto nafila (perspectiva).

Esta estória foi feita sob medida. A criança em questão tinha muito interessepor répteis, por isso a tartaruga foi incluída na estória. A palavra‘normalmente’ foi utilizada propositadamente, para deixar claro que o local dolanche pode variar. A palavra ‘tentar’ foi usada para que a criança saiba quenão estamos exigindo perfeição sempre. Palavras como ‘provavelmente’ e ‘`asvezes’ também podem ser usadas para evitar a interpretação literal, assim, acriança será capaz de aceitar mudanças na rotina. A utilização das EstóriasSociais é uma técnica engenhosa, para assegurar que a criança compreenda arazão de ser dos códigos de conduta, e por que estes são tão importantes emnossas vidas.

Aos poucos, a criança com SA assimila os códigos de conduta social, mais por umprocesso de análise intelectual do que por intuição. Eles precisam pensar muitoantes de agir. De fato, pode-se observar a criança parando para pensar no queela deve fazer ou falar, enquanto que outras crianças responderiamautomaticamente; para uma criança com SA, pensar é extremamente necessário.

Na próxima seção falaremos a respeito de algumas estratégias que ajudam naaquisição de outras condutas sociais deficientes.

Programas para Comportamentos Sociais Adequados

O que o pais podem fazer?

A primeira coisa a fazer é observar a atividade social e as brincadeiraspraticadas por crianças da idade de seu filho, e procurar brincar da mesmamaneira com ele. Se entre os meninos da escola de seu filho, a última novidade

em termos de brincadeira, for jogos de bola e com carrinhos, jogue bola com elee brinque de faz-de-conta usando os carrinhos dele. A idéia aqui não é só fazercom que seu filho se aperfeiçoe em uma determinada atividade, é importantemodelar o que deve ser dito e feito, e como incluir a outra pessoa no brincar.Às vezes, até as regras mais básicas precisam ser explicadas, por exemplo, sóse deve passar a bola para um membro da sua equipe, ainda que pessoas do timeadversário a solicitem. Portanto, regras básicas e específicas de jogos ebrincadeiras precisarão serem ensinadas. No entanto, outras crianças podem nãoquerer brincar com a criança Asperger, por isso é importante que os pais setornem os melhores amigos de seu filho, e brinquem com ele como se fossem damesma idade. Esta é uma oportunidade legítima para que um adulto volte a sercriança. Vá em frente, brinque no parque , construa estradas de mentirinha,faça bolinhos de areia , brinque de pega-pega - lembre-se, você tem a paciênciae a compreensão das necessidades de seu filho e você pode encorajá-lo aaprender o que deve ser feito.

O próximo passo, é observar quando seu filho estiver brincando com outrascrianças, e tomar nota das habilidades que precisam ser ensinadas. As maiscomuns são:

· Como começar, manter e terminar a brincadeira

Talvez precise se ensinar à criança a dizer coisas do tipo ‘Posso brincar?’ ‘Oque você quer fazer agora?’ ‘Você pode me ajudar?’ ou ‘Eu quero brincar sozinhaagora.’ Caso contrário, a criança pode falar o que está sentindo de formaintempestiva, ‘Você não faz o que eu quero – Não quero mais brincar com você’,sem se dar conta de que comentários desse tipo não ajudam a estabeleceramizades.

· Flexibilidade, cooperação e saber compartilhar

A criança Asperger pode querer controlar uma atividade e não tolerar nenhumasugestão, ou que outras crianças participem. É importante explicar que não éerrado se a atividade for conduzida de uma maneira diferente da original, e queás vezes, essa atividade pode ser completada de maneira mais rápida se astarefas e idéias forem compartilhadas.

· Como pedir para ficar sozinha

Quando a criança quiser brincar só, pode ser necessário ensinar maneiras ecomentários socialmente aceitáveis para isso. A criança pode possuir o rótulode agressiva, mas observando melhor, isso pode ter sido a maneira encontradapor ela de ficar sozinha. A sua agressividade não é para dominar ou obtercoisas. Uma vez ensinada uma frase mais apropriada para que ela fique só, asoutras crianças devem ser encorajadas a respeitá-la.

· Explique o que ela deveria ter feito

Erros no comportamento social ocorrem devido à vários fatores, especialmente,quando não há uma compreensão das conseqüências de atos, no sentimento dasoutras pessoas, e o que pode ser feito ou dito de maneira a não magoar osoutros. Quando a criança faz algo que magoa o sentimento de alguém (raramenteisto ocorre com intenção maliciosa), é preciso explicar-lhe o que ela deveriater feito e perguntar-lhe como ela acha que a outra pessoa se sentiu emconseqüência de seus atos.

· Convide um amigo para passar o dia

Convide um amigo (em potencial) e planeje para que a visita seja um sucesso .Pode ser feito um passeio, mas certifique-se que um adulto acompanhe asbrincadeiras para minimizar a deficiência social da criança. Se o dia foragradável, será quase certo que futuros convites serão aceitos.

· Inscreva a criança em clubes

A escola pode ser a única oportunidade para uma interação social, mas isto podeser estendido, se a criança for inscrita em clubes, como o dos Escoteiros. Avantagem desse tipo de clube é que as atividades são normalmentesupervisionadas e estruturadas. Os pais devem explicar ao encarregado, anatureza do problema de seu filho, bem como, citar estratégias que podem serutilizadas com sucesso.

O que o(a) professor(a) pode fazer?

A sala de aula fornece a oportunidade para o aprendizado de uma gama decomportamentos sociais para a criança com SA. Eis algumas estratégias:

· Utilize outras crianças como modelo

A criança pode não ter um comportamento adequado em sala de aula, desviando aatenção das outras. Quando isto ocorre, primeiro peça para a criança observar oque os outros alunos estão fazendo – por exemplo, se estão sentadas,trabalhando em silêncio ou se estão esperando numa fila. Diga a criança que oque ela deve fazer é observar as outras e fazer o mesmo, logicamente, se o queas outras estiverem fazendo for o correto.

· Promova jogos em equipe

Há uma variedade de atividades em sala de aula que envolvem trabalho em equipe.A criança pode necessitar de acompanhamento e orientação com relação a saberesperar sua vez, dar aos outros a oportunidade de falar e aceitar a sugestãodos outros membros da equipe. Jogos competitivos podem ser um problema para acriança com SA, que quer ser sempre a primeira a jogar. Isto talvez ocorra nãoporque a criança se sinta superior, mas para haver consistência na ordem dosparticipantes, para saber qual a sua posição e pela satisfação com seu sucessopessoal.

· Sirva de modelo no relacionamento com a criança

As demais crianças geralmente não sabem como reagir ante o comportamentoincomum da criança Asperger. Portanto, é essencial que o professor demonstretolerância, tutela nas habilidades sociais e encorajamento, pois a abordagemdelas será amplificada na sala. É igualmente importante reconhecer e elogiar asocasiões em que os colegas se apresentam particularmente cooperativos.

· Mostre meios alternativos de a criança pedir ajuda

A criança pequena pode considerar a professora como única fonte de conhecimentoe auxílio. É importante explicar que, quando surge um problema, a criança podetambém obter ajuda de seus colegas.

· Encoraje amizades em potencial

Cada criança em sala de aula tem uma personalidade própria, e pode demorar umpouco para que a criança com SA aprenda a interagir com cada uma delas. Podeser de grande ajuda, identificar e encorajar a interação com um número pequenode crianças, que possuem maior tolerância e se mostram inclinadas a ensinar acriança com SA como brincar. Nesta fase inicial não importa se é menino oumenina. Se amigos em potencial são identificados, procure motivar o contatotanto na sala de aula como no playground. Esses amigos podem se tornar osguardiões da criança, protegendo-a das gozações dos outros. Eles a incluirão emseus jogos, agirão como defensores do seus interesses, e instruirão a criançano que falar ou fazer quando o professor estiver fora da sala de aula. Éimpressionante como algumas crianças podem ser tolerantes e compreensivas.

· Providencie supervisão na hora do recreio

Para a maioria das crianças, a melhor hora no colégio é a hora do recreio.Devido a falta de supervisão e de um ambiente estruturado, bem como o clima deintensa socialização que ocorre, provavelmente esta não será a melhor hora dodia para a criança com SA. Neste momento ela estará no seu período de maiorvulnerabilidade. A pessoa que supervisiona o recreio deve ter conhecimento dasdificuldades da criança e deve incentivar sua inclusão ou respeitar seu desejode ficar a sós. O portador de SA, também pode necessitar de supervisão duranteo trajeto casa – escola, escola – casa.

· Atenção para comportamentos extremos

Na sala de aula a criança pode ter total consciência de que é diferente,fazendo um esforço tremendo para agir de acordo com os códigos de conduta. Essapressão, em agir de acordo com o esperado, pode gerar uma grande tensãoemocional , que, acumulada, age como se fosse uma mola, que se solta, assim quea criança chega em casa. Lá a criança pode apresentar uma personalidadecompletamente diferente da apresentada no colégio, como o personagem do médicoe o monstro. Isto é característico de algumas crianças com Asperger, e não um

indicador de que os pais não estão sabendo educá-la. Pode ser de alguma ajudase o professor preparar atividades relaxantes para a criança, pouco antes delair para casa. Os pais também podem preparar atividades relaxantes oubrincadeiras, onde ela possa extravasar as tensões de um longo dia na escola.

· Reforço Escolar

Muitas das habilidades citadas nesse livro não fazem parte do currículoescolar, por isso, é necessário que a criança com SA tenha acesso a umprofessor ou auxiliar que irá ajudá-la na aquisição dessas habilidades. A cargahorária vai depender de cada criança, e é fundamental que o auxiliar tenhaconhecimento a respeito da Síndrome de Asperger e de programas terapêuticos.Maiores detalhes a respeito da importância de uma auxiliar serão discutidos napágina 171. Se não há recursos financeiros suficientes para a contratação de umauxiliar, pode-se utilizar uma criança de uma séria mais adiantada, quefuncionará como um acompanhante, cumprindo parte de seu currículo no curso dehumanidades ou cidadania.

Grupos de Apoio

Há relatórios de sucesso na literatura de referência de grupos de apoio paraadolescentes com SA (Marriage, Gordon & Brand 1995; Mesibov 1984; Ozonoff &Miller 1995; Williams 1989). Esses grupos de apoio possibilitam o aprendizado ea prática de habilidades sociais mais avançadas. Podem fazer parte das aulas deteatro do colégio ou um programa em separado feito por especialistas em SA. Ogrupo pode ser composto por adolescentes Aspergers de diferentes escolas ecrianças ‘normais’ . O número de participantes do grupo deve ser pequeno, parapossibilitar atenção individual e evitar interrupções. Antes de iniciar assessões, membros do grupo, seus pais e professores podem sugerir um tema ousituação que vai exigir uma gama de habilidades sociais. Faz-se então um perfildos pontos fracos e dos fortes de cada participante. É importante estar atentoe observar essas seções em detalhe. Isto, para determinar a percepção e ainterpretação que a pessoa tem dos fatos, seus sinais, motivos e opções. Nóssabemos que os portadores de SA podem não ter um entendimento do que pensamosou sentimos no contexto social, porém, nós também podemos não estar a par doque eles pensam e sentem.

A seguir algumas sugestões de atividades em grupo:

q Recrie situações onde a pessoa não teve certeza de ações alternativas oucomentários, ou fez uma interpretação equivocada; ensaie novamente as opçõesmais apropriadas sugeridas pelos participantes.

q Faça uma demonstração de situações socialmente impróprias e peça paraidentificarem os erros. O líder do grupo faz de conta que é uma pessoasocialmente incapaz e os membros do grupo identificam os erros. Gradualmente os

erros tornam-se mais sutis. Pode-se utilizar vídeos (como Mr. Bean e TheBrittas Empire). Ensaiar o que não deve ser feito, também pode ser divertido.

q Um teste informal de raciocínio social foi desenvolvido por Margaret Dewey(1991), e por Hadyn Ellis & colaboradores (1994). Veja dois exemplos abaixo quepodem ajudar os portadores de SA:

Charlie, 23 anos, está desempregado há vários meses. Nesse dia ele estavaesperançoso, pois iria fazer uma entrevista para um emprego que ele achavafosse o ideal para ele. No elevador, a caminho de sua entrevista, um estranhofalou: “Bonito dia hoje, não?” Nesse instante Charlie se viu no espelho doelevador. Seu cabelo estava espetado e ele não possuía pente. Então ele virou-se para o estranho e perguntou: “Por favor, você tem um pente para meemprestar?”.

Você acha que este seria um comentário apropriado? Como você acha que oestranho se sentiria?

Keith, 25 anos, era vendedor. Na hora do lanche ele ia até o parque, próximo aoseu local de trabalho, e sentava num banco para comer seu sanduíche. Muitasvezes ele retirava um pedaço do sanduíche para dar aos pombos. Certo dia,quando ele se aproximava de seu banco favorito viu um carrinho de bebêestacionado vizinho ao banco. Keith notou uma mulher empurrando uma criançamais velha no balanço. O bebê no carrinho começou a chorar, mas sua mãe não oescutou porque o balanço fazia barulho. Keith aprendeu que, quando seu sobrinhobebê chorava, às vezes, era porque um alfinete da fralda soltava e o espetava.Não querendo incomodar a mãe do bebê Keith decidiu checar a roupa do bebê quechorava para se certificar de que era algum alfinete solto.

Você acha que Keith deveria ter checado a roupa do bebê? E o que você acha quea mãe do bebê pensaria respeito disso? Cite outra coisa que o Keith poderia terfeito.

q Utilizando cenas do seriado americano Third Rock from the Sun, pode ajudar naaquisição do raciocínio social. Nesta comédia, um grupo de ETs toma formahumana e tenta socializar como pessoas comuns, assim eles cometem erros e ficamconfusos. Estes sentimentos também fazem parte da vida de um adolescenteAsperger.

q As poesias e autobiografias de outros Aspergers descrevem situações e emoçõesvividas. Com este material o sentimento de empatia pode ser explorado. Há umagama de autobiografias disponíveis no mercado, algumas foram recentementepublicadas por Francesca Happé (1991). O Grupo de Apoio pode compor suaspróprias poesias ou biografias.

Um pé para dentro um pé para fora

Isto é o significado de ser Asperger

Às vezes eu penso, por quê eu;

Outras vezes eu penso que é o melhor jeito de ser.

Um pouco diferente dos demais

Faz de você o segundo melhor

Ninguém me entendendo muito bem

Uma vida dura que exige muito

Eu me pareço com qualquer criança

Mas pequenas coisas me enlouquecem

(Vanessa Royal)

Os líderes do grupo podem colecionar exemplos de outras pessoas com SA, como nopoema abaixo:

Pessoas em toda parte,

Falando, usando cores berrantes

O som da conversa é como patas de cavalos.

As cores berrantes cegam,

A conversa fere meus ouvidos,

As cores berrantes ferem meus olhos.

Oh, por que as pessoas não podem ficar caladas e usar cores discretas.

(Dianne Mear 1994)

Os humanos são a raça mais ilógica que existe.

Nada que eles falam,

Nada que eles fazem,

Faz sentido.

Oh, porque os humanos não são lógicos?

(Dianne Mear 1994)

Um tema bastante comum é o que fala a respeito de construção de pontes, comonesse poema escrito por Jim.

Eu construí uma ponte

do nada, sobre o nada

e me perguntei se existiria algo

do outro lado

Eu construí uma ponte

Da névoa, sobre a escuridão

E esperei encontrar luz

Do outro lado.

Eu construí uma ponte

Feita de desespero, sobre o esquecimento

E sabia que haveria esperança do outro lado.

Eu construí uma ponte

Do inferno, sobre o caos

E confiei que existiria força do outro lado.

Eu construí uma ponte

Do inferno, sobre o terror

E era uma ponte boa, uma ponte forte,

Uma linda ponte.

Foi a ponte que construí para mim mesmo,

Minhas mãos como ferramentas,

minha obstinação como sustentação,

minha fé como coluna, e meu sangue como rebite.

Eu construí uma ponte, e a atravessei,

Mas não havia ninguém para me receber

do outro lado.

(Cesaroni & Garber 1991, p.311)

q É preciso explicar ao portador de SA , que às vezes, quando ele não temcerteza de como agir numa determinada situação, pode não ser culpa dele. Veja oque foi escrito no diário de uma das participantes de um Grupo de Apoio:

Hoje é noite de habilidades sociais. Tivemos uma conversa a respeito de comoconseguir ler a linguagem corporal das pessoas. Não é fácil enxergar o que elaspensam, se não sabemos o que pensam, é como você saber que a pessoa estáestressada, mas não saber o por quê. Eu acho que sou eu a culpada.

q Forneça orientação no que diz respeito à linguagem corporal, traduzindo osignificado de cada postura. Isto pode se tornar um jogo de ‘adivinhe amensagem’.

q Ensaie o que fazer em situações que podem vir a acontecer. Por exemplo, o quefazer em caso de ser molestado ou gozado, como pedir alguém para namorar oudançar.

q O uso de uma filmadora possibilitará que os participantes assistam àperformance deles. É importante que a maioria dos comentários sejam positivos.A apresentação do vídeo e os comentários podem ser feitos no formato de umprograma de TV, mas cuidado para que os participantes não se distraiam com ouso da tecnologia.

q Uma vez que todos tenham adquirido segurança nas habilidades sociais dentrodo grupo, pode ainda existir um problema de iniciativa e generalização. Ouseja, a pessoa sabe o que fazer mas não consegue tomar iniciativa ou ela podenão perceber que certas habilidades adquiridas podem ser utilizadas emdiferentes situações.

Devem haver exercícios práticos e monitoramento entre uma sessão e outra dogrupo. Os pais e professores devem ser informados de novas habilidadesadquiridas, para que elas possam ser praticadas em circunstâncias variadas. Umadas vantagens de se ter crianças ‘normais’ no grupo, é que elas podem ajudar osamigos Aspergers na vida real, quando não há pais nem professores por perto.

q Prepare uma estória, onde as qualidades de uma pessoa com SA são umavantagem. Ele é o herói. Essas qualidades podem ser: percepção para detalhes,memória para fatos ocorridos, honestidade e conhecimento enciclopédico arespeito de seu tópico de interesse.

q Examine biografias de cientistas famosos e artistas, para verificar se estesapresentaram características ou experiências pessoais semelhantes aos membrosdo grupo. Isto pode ser feito como dever de casa ou na biblioteca. Asbiografias de Einstein ou de Mozart seriam boas escolhas para iniciar esse tipode trabalho.

q M. Ann Marquis fez uma adaptação de um jogo de perguntas e respostas paraensinar habilidades sociais. Veja exemplos de perguntas:

1. Palavra que começa com a letra “i” , significando que foi feito umcomentário que magoou alguém?

2. O que você faria se ganhasse um presente que você não gostou?

3. Seus amigos estão planejando fazer algo que você sente ser errado. O quevocê faria?

As respostas são dadas, mas essas perguntas também podem ser utilizadas emdiscussões em grupo, devendo-se enfatizar que para algumas situações pode havermais de uma opção. Veja como adquirir este jogo, bem como, outros similares, noApêndice.

q Ensaie situações onde a pessoa tem que aprender a não dizer o óbvio ou falaro que estão pensando, por ser embaraçoso ou ofensivo para outras pessoas. Hámomentos em que o melhor é ficar calado.

q Inclua atividades onde os membros do grupo têm que descrever pessoasimportantes em sua vida. Essa descrição não deve ser somente dascaracterísticas físicas, mas também da personalidade. Também deve ser dito doque se gosta ou não se gosta a respeito dessas pessoas.

q Nos Grupos de Apoio também podem ser incluídas atividades para melhorar aarte de conversar, entender e expressar emoções. Estas atividades serãodescritas em maiores detalhes em outro capítulo.

Os Grupos de Apoio podem ser educativos e divertidos. A duração de cada sessãoirá variar de acordo com o nível de habilidades e o progresso adquirido pelosparticipantes. Com o tempo, iremos desenvolver atividades mais eficazes. Atélá, pais, professores e terapeutas podem juntar forças, e utilizar seuconhecimento e imaginação, para elaborar um currículo individual para cadacriança, respeitando seu perfil de habilidades sociais.

Amizade

Pesquisas já identificaram uma seqüência de estágios evolutivos no conceito eexpressão da amizade. A medida que a criança amadurece, o conceito que ela temde comportamentos amigáveis, vai mudando. Sue Roffey & Colaboradoresdescreveram a complexa interação entre o desenvolvimento intelectual e moral eas experiências sociais, e destacaram 4 fases (Roffey, Tarrant & Majors 1994).

Durante o período pré-escolar a criança muda, gradualmente, e, deixa de brincarperto de alguém para brincar com alguém. A criança aprende que alguns jogo eatividades só podem acontecer se houver elementos como compartilhar e esperar avez. Ela também adquire métodos alternativos de lidar com conflitos, tornando-se assim, menos egoísta e possessiva. As crianças mais populares são aquelasque tomam atitudes positivas, como: ‘vamos brincar de ...’ , aceitam e gostamda companhia de outras pessoas nas brincadeiras. A idéia que fazem de amizade ébaseado em conceitos simples, como a proximidade. Sue Roffey mostra o que foidito por um garoto de 3 anos para ilustrar esse estágio do desenvolvimento:

‘Por que o Julio é seu amigo?’

‘Porque eu gosto dele.’

‘E por que você gosta dele?’

‘Porque ele é meu amigo.’

‘E por que mais?’

‘Porque ele mora vizinho a mim.’(p.1)

Por isto é importante que uma criança Asperger seja incentivada a compartilhar,a convidar alguém para se juntar a ela nas atividades, e a tomar a iniciativado que fazer.

O próximo estágio ocorre entre 5 e 8 anos de idade. A criança começa a entenderque existe um elemento de reciprocidade, necessário para manter a amizade. Osamigos também suprem necessidades práticas, são prestativos e simples aspectosda personalidade da outra pessoa tornam-se importantes. O amigo é alguém comquem você pode contar, ou que lhe empresta coisas. Crianças que são admiradaspelos colegas, são aquelas que agem com companheirismo. Para ilustrar esseestágio, Sue Roffey mostra o que disse uma garota de 6 anos:

‘Por que a Martina é sua amiga?’

‘Porque ela senta do meu lado e me empresta o lápis dela’.

‘Por que outra razão ela é sua amiga?’

‘Porque ela vem no meu aniversário e eu vou no dela.’(p1)

Outros dizeres:

‘Um amigo é alguém que lhe faz feliz.’

‘Um amigo compartilha coisas com você.’

Crianças com Síndrome de Asperger que estão nesse estágio do desenvolvimento,no que diz respeito à amizade, precisam aprender a elogiar seus amigos,demonstrar que se importam e a ajudar os outros, tanto em coisas práticas comonas atividades escolares.

O terceiro estágio ocorre na fase da pré-adolescência , dos 9 aos 13 anos deidade. Por volta dessa idade há uma separação bem definida dos sexos, e aamizade é baseada em semelhanças, descobrimentos compartilhados, apoioemocional e um entendimento crescente de como são vistos pelos outros. Osamigos podem se tornar inseparáveis, compartilhando segredos. Por exemplo,perguntamos a um garoto de 9 anos:

‘Por que Peter é seu amigo?’

‘Porque nos divertimos juntos.’

‘Existe mais alguma razão?’

‘Ele me ajuda quando eu não consigo escrever uma palavra.’

Um amigo é ‘alguém com quem você pode desabafar e que vai te escutar’.

Um amigo ‘deve ser bom com você e não te aperrear’.(p.1)

Nesse estágio a amizade é baseada em interesses compartilhados, por isso éimportante que a criança ou adolescente Asperger conheça pessoas que tenham osmesmos interesses que ela. Também é importante saber se expor e escutar, bemcomo reconhecer os pensamentos e sentimentos dos outros. Infelizmente, para umindivíduo Asperger, é difícil conseguir entrar num círculo de amizades jáestabelecidas, e pode ser devastador para ele quando uma amizade verdadeirachega ao final.

O quarto estágio ocorre na adolescência, onde a amizade é baseada em confiança,extroversão, e grande ênfase é dada nos aspectos da personalidade. Também háuma mudança, da amizade entre duas pessoas para um grupo mais amplo com valoresem comum. Foi perguntado a uma adolescente de 13 anos:

‘Por que Amber é sua amiga?’

‘Porque eu confidencio com ela meus segredos’.

‘Que outra razão existe?’

‘Porque nós pensamos de maneira igual.’(p.1)

Para o adolescente Asperger, é muito difícil expor aos outros seus sentimentos,eles preferem amizades platônicas. Normalmente eles precisam de orientação comrelação as mudanças e as necessidades que surgem para manter as amizades, eprecisam se identificar com seus heróis e com seu pequeno grupo de amigos. Elespodem se manter bem mais relaxados e fluentes socialmente se estiverem comapenas um amigo, mas tornam-se retraídos se estão num grupo. Seu sistema devalores assemelha-se a de um adulto, o que os afasta dos outros adolescentes.No entanto, não é impossível para um adolescente com SA encontrar e manteramizades que podem durar por toda vida. Eles precisam somente de apoio eoportunidades.

As crianças com SA, parecem não se preocupar com a falta de amigos, e quandopedimos a elas uma definição de amizade, as descrições são imaturas (Botroff etal. 1995). Os jovens também parecem não ter certeza do que constitui um bomamigo. Uma pessoa uma vez respondeu que o amigo ‘é alguém que carrega coisaspara você ou que te empresta dinheiro’, e não conseguia pensar em valoresabstratos. Podemos perguntar a uma criança Asperger se ela possui amigos em

casa e no colégio, e ela dirá que sim. No entanto, conversando com pais eprofessores e observando a criança, vê-se logo que ela possui apenas conhecidose não amigos de verdade. Ela pode ter dito que sim, ou porque desconhece oconceito de amizade, ou porque é um desejo íntimo seu de ter amigos.

Existe uma variedade de projetos escolares, livros e atividades que incentivamcrianças a explorarem o conceito do que faz um bom amigo, e esta é uma parteessencial de um currículo de uma criança Asperger.

Também é muito importante identificar e encorajar momentos espontâneos deamizade, falando coisas do tipo ‘isso que você fez foi amigável’ – ou ,pergunte à criança, ‘o que um amigo deve fazer numa circunstância como essa’.Os professores podem realizar atividades contendo as qualidades de uma amizade.Existe um livro da Rozanne Lanczak (1987) que contem várias atividades paracrianças que estão na escola primária. Por exemplo, pode-se utilizar exercíciosescritos contendo espaços em branco para o preenchimento:

Ø Todo mundo gosta da ............, e quer ser sua amiga porque elaé ..........

Ø Fale como ............ ajuda seus amigos:

Ø Faça um desenho onde você aparece sendo amigável. Escreva sobre ele.

Ø Seu melhor amigo está no hospital. O que você pode fazer ou dizer para queseu amigo sinta-se melhor?

Ø O que você gosta de fazer pelos seus amigos?

Pode-se fazer atividades em grupo, onde as crianças sentam em círculo,discutindo as seguintes questões: como você consegue identificar se alguémgosta de você? O que fazem os amigos? O que você pode fazer por um amigo?

Às vezes, a criança Asperger se sente atraída, e quer se aproximar do colegamais ‘danado’ da sala de aula. Certas amizades não são apropriadas. A atraçãopode até ser mútua, mas a criança com SA pode ser criticada ao imitar ocomportamento do colega. É preciso incentivar certas amizades e desencorajaroutras.

Existe também o problema das outras crianças quererem se aproveitar daingenuidade do colega Asperger. Elas podem armar confusões para que a criançaseja culpada. Num severo colégio católico, as ‘colegas’ de uma adolescentepediram para ela fazer uma pergunta a professora, uma freira. A garota fez apergunta sem saber de sua conotação obscena. Ela foi expulsa. É importante queprofessores tenham pleno conhecimento que a criança pode não ter malícia, edevem perguntar ‘Alguém pediu para você falar isso?’, antes de aplicarem ocastigo.

Na adolescência, a pessoa pode se tornar consciente de que não tem amigos deverdade e se sentir excluída das atividades sociais das pessoas de sua idade.Também pode desenvolver depressão ou negar que haja algo de errado com ela,tornando-se bastante sensíveis a qualquer menção de que é diferente. Pode sesentir confusa e entrar em desespero pelo fato das outras pessoas serem ocentro das atenções e possuírem muitos amigos. Quando ela tenta as mesmasatividades ou conta as mesmas piadas, ela é ridicularizada. Em taiscircunstâncias, antes de procurar aconselhamento ou um grupo de apoio, que podeauxiliá-la a fazer e manter a amizades, a pessoa tem que aceitar, ainda querelutantemente, que é diferente e que precisa de ajuda.

A preferência pela solidão ou tentativas pouco usuais de socializar faz com queo portador de SA seja mal interpretado por outros adolescentes. Quando a pessoanão tem interesse em relacionamentos românticos, pode ser marginalizada etaxada de ser gay. Tais comentários podem ser extremamente dolorosos para umadolescente Asperger. Um adolescente qualquer seria capaz de discutir arespeito das críticas recebidas, de sua personalidade e sexualidade com seumelhor amigo. Mas infelizmente, o adolescente SA, pode não ter um melhor amigo.No entanto, pais ou irmãos podem substituir a figura do ‘melhor amigo’, eincentivar o adolescente a desabafar sobre suas dificuldades emocionais etribulações do seu dia a dia. Provavelmente, o melhor momento para isso nãoseja logo que a pessoa tenha voltado do colégio, mas depois que ela tenha tidotempo de relaxar e esteja então apta a falar e escutar. O papel a serdesempenhado aqui, é o do melhor amigo, que está oferecendo apoio e consolo,encorajando a auto estima.

Há livros, bastante populares, que falam sobre como fazer amigos, escritos paraadolescentes comuns, que podem ser de grande ajuda para o adolescente Asperger.Um destes, escrito por Andrew Matthews (1990), é indicado para adolescentesmais capazes. O texto e as gravuras enfocam aspectos importantes da amizade,como saber escutar, fazer elogios, como admitir quando se está errado ou comodizer à outra pessoa quando ela está errada. A experiência tem mostrado queestas duas últimas questões são especialmente difíceis para os jovensportadores de SA.

Pode haver maneiras bastante incomuns de se escolher um amigo. Por exemplo, umrapaz fazia essa escolha, perguntando logo no início da conversa, se a pessoadirigia com o pára-sol levantado ou abaixado. Se a pessoa dirigisse com elelevantado, a conversa era finalizada abruptamente. Pode haver uma abordagemmuito exclusiva na escolha de um amigo. A pessoa pode querer entender oconceito de amizade, assistindo avidamente novelas, na tentativa de modelarfrases e ações. Esse tipo de programa tende a dramatizar em excesso osrelacionamentos, e não deve ser a principal fonte de informação a respeito deamizade. Às vezes, o portador de SA pode não saber dosar o nível deextroversão, e envergonhar um amigo em potencial ou um grupo de pessoas sendoextremamente aberto. Outro aspecto preocupante que ocorre, é quando um Asperger

gosta de uma pessoa e pressupõe que a recíproca é a mesma. Ele pode nãoreconhecer os sinais que a pessoa dá, que a amizade é casual ou platônica.

Eventualmente, pode haver um interesse romântico numa determinada pessoa, que écorrespondido, e então um relacionamento se desenvolve. Um jovem rapaz estavabastante chateado quando um típico namoro de adolescência chegou ao fim,dizendo que ‘a vida era mais fácil quando eu não me importava’ – uma lamentaçãode muitos adolescentes. No entanto, ele ficou radiante quando conseguiu umanova namorada, mas ficou também bastante confuso, quando descobriu que esta,não gostava das mesmas coisas que a namorada anterior. Ele presumiu que, tendoaprendido o que fazer e o que falar, poderia duplicar o comportamento paratodas as namoradas subsequentes. Esta característica pode não ser exclusiva daSíndrome de Asperger.

Elizabeth Newsom (1985) & colaboradores exploraram o desenvolvimento a longoprazo de crianças com SA , entrevistando pais e indivíduos. O desejo doadolescente de fazer amigos pode ser angustiante, como descrito por essa mãe:

Ele ia ao nosso clube local – a princípio todos ficavam empolgados, porque oDonald é alto, dá um ótimo goleiro, todos aqueles meninos o idolatravam. Maslogo, logo – não demorava a tarde toda, sabe, eles descobriam que havia algumacoisa errada. E ele voltava do clube, – ele deve ter tentado uns dez aqui porperto – ele voltava machucado, cuspido, as roupas rasgadas....Eu disse a ele umdia, ‘Donald, por que você permite isso? Você é mais forte que aqueles meninos,por que você deixa eles fazerem isso?’ E ele respondeu, ‘Bom, é melhor do quenada, eu não me importo’. E eu acho que ele estava tão desesperado por algumaforma de contato, que, era melhor ser machucado do que ficar sozinho. Isso eraum pesadelo, e aconteceu ano após ano, clube após clube. (p.9)

Outro jovem, na casa dos 20, ia à boates com seus amigos e observava como elesfalavam com as garotas. Ele percebia seus gestos e como eles olhavam, demaneira a paquerar as garotas. Mas, apesar disso, ele não conseguia imitá-los,e disse ‘As garotas só me lançam olhares gélidos, como que dizendo: “Não é paravocê, não é para você”. Apesar de ser um rapaz inteligente academicamente, eleapresentou problemas de depressão e começou a se auto detestar por suaincapacidade de conseguir uma namorada.

Na busca por popularidade, o Asperger começa a observar pessoas consideradassocialmente competentes, e tenta imitar sua personalidade, roupas e até suavoz. É como se estivesse representando o papel de alguém mais bem sucedido(Williams 1992,1994) . Essa habilidade pode ser direcionada para uma carreirade ator. Pode também não seguir os códigos tradicionais na busca por amigos damesma faixa etária ou do mesmo grupo social ou cultural. Infelizmente, istopode ser mal interpretado pelos outros.

Estratégias específicas podem ser aprendidas para manter amizades. A pessoaAsperger pode precisar memorizar ou escrever fatos importantes sobre cada um deseus amigos, para que, quando encontrar ou falar ao telefone com qualquer umdeles, tenha um script de tópicos para conversação, contendo perguntas do tipo‘Como está ...?’. Uma jovem, sempre tentava lembrar que, quando havia umsilêncio prolongado durante uma conversa com certa amiga, ela deveria perguntá-la a respeito de sua casa em Londres. No entanto, essa pergunta tornou-se tãoautomática, que ela freqüentemente esquecia que sua amiga mudou-se de Londreshá vários anos.

Algumas pessoas apresentam dificuldades no que diz respeito às questõescomplexas da moralidade, e buscam na religião e nos ideais políticos parâmetrospara conduzirem suas atitudes sociais. Esta pode ser uma oportunidade deconhecer pessoas que possuem as mesmas características, e pode-se ter asegurança que está se agindo moral e socialmente de acordo com o esperado. Noentanto, eles podem ter problemas com o contexto. Um rapaz, pelo que lia nosjornais, considerava o grupo local do Hells Angels (que eram todos membros deuma minoria étnica) como sendo composto de ladrões e traficantes, e dizia issocada vez que os encontrava. Felizmente, ele viveu uma vida abençoada.

Uma maneira de fazer amigos, é freqüentando clubes e associações baseados notópico de interesse da pessoa. Clubes de computação, sociedades históricas,astrônomos amadores, encontro dos aficionados por trens , podem fornecer umfórum para o aprendizado de seu tópico de interesse, bem como uma oportunidadede fazer amizades genuínas. A Internet, correspondentes, e jornais, paraportadores de SA, também permite que eles possam se corresponder, receberempatia e conselhos, e fazer amigos. Endereços para contato podem ser obtidosda associação local para crianças autistas ou SA, jornais de organizaçõesnacionais.

As dúvidas e o isolamento da adolescência normalmente diminuem à medida que apessoa amadurece. Na escola secundária a pessoa é forçada à proximidade comoutros adolescentes, que realmente não são as pessoas mais tolerantes. Comoadulto, o portador de SA tem uma gama maior para escolha de atividades,companhias e o ritmo de vida. O tempo é um excelente professor, e eventualmentehabilidades que pareciam tão distantes e impossíveis, são adquiridas. Éimportante explicar ao adolescente que, haverá luz no fim do túnel,esclarecendo que isso é uma figura de linguagem, e não um trem se aproximandodele! Eventualmente, eles poderão encontrar alguém que os entendam e queiram,genuinamente, ser seus amigos. Foi isto que aconteceu ao Jim:

Eu tinha um amigo – não um pai ou mãe movido por amor e obrigação de quererchegar até a mim, não um profissional que fez uma carreira estudando minhacondição, mas apenas alguém que me achava interessante o suficiente para quererme conhecer melhor – uma amiga que, sem nenhum conhecimento de psicologia oueducação especial, descobriu por si só, maneiras de se relacionar comigo. Ela

me contou quais eram: nunca tirar conclusões sobre coisa alguma sem meperguntar o que eu achava, sentia ou compreendia, simplesmente se baseando noque ela pensaria, sentiria ou entenderia segundo às circunstâncias e meucomportamento; e nunca pensar, sem perguntar antes, que eu não tivesse achado,sentido ou entendido coisa alguma simplesmente porque eu não estava agindo damesma forma que ela agiria diante daqueles pensamentos, sentimentos oucompreensão. Em outras palavras, ela aprendeu a perguntar ao invés de tentaradivinhar. (Sinclair 1992,p.296).

Como explicado anteriormente, pesquisas na área da psicologia estabeleceram quea semelhança é um dos principais critérios para a seleção das amizades. Istotem levado muitos Aspergers a estabelecerem amizades com outros portadores deSA. De fato, algumas dessas amizades têm se transformado em casamentos bemsucedidos.

Contato Visual (olho no olho)

A observação clínica tem indicado que a criança Asperger normalmente nãoutiliza o contato visual com seu interlocutor durante partes importantes daconversação, por exemplo, quando começam a falar, quando recebem um elogio ouquando têm interesse em algo, para pedir explicações, para ler a linguagemcorporal ou para terminar a conversação. Trabalhos de pesquisa recente (Baron-Cohen et al.1995; Tantam, Holmes & Cordess 1993) também indicam que há umafalta de ‘olhar atento’ quando seu interlocutor está falando. Vários adultosAspergers, relataram que acham muito mais fácil estabelecer o contato visualquando não precisam escutar. O contato visual quebra sua concentração. Elestambém não compreendem que o olhar transmite informações, expressa o estado deespírito ou os sentimentos de uma pessoa. Durante a avaliação diagnóstica, umadolescente Asperger tornou-se ansioso enquanto falava a respeito de seu tópicode interesse, porque seus pais haviam pedido para ele não falar sobre isso;eles achavam que o fazia parecer estranho. No entanto, do ponto de vistadiagnóstico, há aspectos qualitativos dos seus tópicos de interesse, que sãorelevantes. A maneira que esse adolescente encontrou de lidar com a ansiedadefoi de fechar os olhos. Quando foi dito a ele que era difícil manter umaconversa com alguém que permanecia de olhos fechados, ele respondeu ‘Por que euvou olhar para você, se eu sei onde você está?’ Obviamente, a criança com SAprecisa aprender a importância de olhar para o rosto e para os olhos da outrapessoa, não apenas para localizá-la, mas para reconhecer e responder àsmudanças sutis da expressão facial de seu interlocutor.

Lorna Wing (1992) fez referência a uma pessoa Asperger que disse ‘as pessoastransmitem entre si mensagens com seus olhos, mas eu não sei o que elas estãofalando’. Olhar para o rosto das pessoas e fixar um olhar atento, pode serextremamente difícil para o portador de SA, como descrito abaixo:

Olhar para o rosto das pessoas, particularmente para seus olhos, é uma dascoisas que considero mais difícil de fazer. Quando eu olho para as pessoas, eupreciso me esforçar para fazê-lo, e geralmente não agüento mais do que umsegundo. Se eu olho por um período de tempo maior, elas dizem que eu pareçoolhar através delas, e não para elas, como se eu não tivesse consciência de queelas estão ali. As pessoas não têm noção do quão difícil é para mim olhar paraalguém. Perturba minha tranqüilidade e é terrivelmente assustador – embora omedo diminua a medida que me distancio da pessoa. Tenho tentado manter ocontato visual, quando estou hospitalizada ou quando estou com meu psiquiatra,mas já faz mais de dois anos e meio, e ainda não obtive sucesso. O meupsiquiatra não me força a olhar para ele, mas insiste em olhar para mim. Eleexplicou que as pessoas podem interpretar o fato de eu não olhar para elas comosendo falta de interesse nelas, falta de sinceridade minha ou falta deeducação. Estou me esforçando muito, porque eu não quero que as pessoas tenhamuma idéia errada como essa, mas o máximo que consigo, é olhar por algunssegundos. Ter as pessoas me olhando, é tão ruim como ter que olhar para elas.Apenas recentemente é que eu descobri, que quando olho para pessoas ou figuras,eu não estou vendo o todo, mas apenas um esboço de uma parte. Eu consigo olharuma figura, mas apenas uma parte de cada vez. Acontece o mesmo com rostos. Eunão consigo olhar para o rosto todo, de uma só vez. (Jolliffe et al. 1992,p.15). 1

1. A pessoa que fez essa descrição foi diagnosticada como tendo autismo quandocriança, e de acordo com o DSM IV, ela não é portadora da Síndrome de Asperger.No entanto, ambas as condições são consideradas como áreas específicas do mesmocontinuum. Suas descrições de sua experiência com o autismo são de um valorinestimável para a nossa compreensão da Síndrome de Asperger. Isto pode serilustrado pelas citações de sua experiência com o autismo, utilizadas em váriospontos deste livro.

Com o tempo, a pessoa com SA aprende quando e como fazer contato visual, masalguns apenas aprendem a tornar esse atributo menos obvio. Por exemplo, Candy,uma senhora Asperger, descreve que ‘o contato visual agora é mais fácil demanter, mas ainda assim eu olho e não enxergo.’

Emoções

Na lista original das características da Síndrome de Asperger, está escrito quea criança não possui empatia. Isto não deve ser interpretado de forma errônea,de que a criança é incapaz de se importar com os outros. O que ocorre naverdade, é que a criança fica confusa em relação às emoções de outras pessoas,ou tem dificuldade em expressar seus próprios sentimentos. Apesar de a criançaAsperger apresentar as feições normais, durante a conversação, ou quando estábrincando, se a observarmos, parecerá que possui um rosto de madeira. A criança

não demonstra a variedade e a profundidade das expressões faciais. Isto tambémpode ocorrer com relação a sua linguagem corporal. As mãos podem movimentar-sea fim de descrever graficamente o que fazer com um objeto ou para expressarraiva ou frustração, mas os gestos ou a linguagem corporal baseados naconsideração dos pensamentos e sentimentos das outras pessoas – e.g. vergonha,consolo ou orgulho – é diminuída ou praticamente inexistente (Attwood et al.1988; Capps et al.1992). A medida que a interação continua, torna-se evidenteque a criança não está reconhecendo ou respondendo às mudanças das expressõesfaciais ou da linguagem corporal da outra pessoa. Outras crianças sabem quequando alguém cruza os braços é porque está chegando no seu limite, ou que umbrilho no olhar e um certo tom de voz significa ‘Estou te gozando’.Infelizmente, coisas sutis como essas, podem não ser reconhecidas pela criançaAsperger. Por exemplo, uma jovem mãe estava bastante chateada com seu filho, eisso podia ser atestado pelas rugas em sua testa. A criança então apontou paraa testa da mãe e disse ‘Onze’. Ele estava intrigado pelo novo padrão daexpressão de sua mãe, mas totalmente sem noção de que significava que elaestava com raiva. A criança pode então se sentir confusa e ofendida quando écriticada por não agir de acordo com o esperado, em reação aos sinais ouintenções subliminares. Os pais dizem que precisam ser bastante dramáticos nouso da linguagem corporal, tom de voz e expressão facial, para que a criançapossa entender o que os outros estão sentindo.

O problema não se apresenta somente na compreensão das emoções dos outros, mastambém em como a criança Asperger expressa suas emoções. Ela tende a fazer issode forma incomum, faltando sutileza e precisão. Um estranho pode receber umbeijo nos lábios, ou a frustração pode ser expressa de maneira desproporcional.A conversação pode apresentar termos técnicos bem avançados, mas os eventos sãodescritos em termos de ação, e não sentimentos. Uma das atividades usadas peloautor durante a avaliação diagnóstica da criança, é pedir que ela identifique aemoção em fotografias de crianças ou pedir que ela faça expressão de alegria,tristeza, raiva, susto ou surpresa. Algumas crianças utilizam as mãos paramanipular os lábios e produzir um sorriso ou contorcem a face em expressões queem quase nada se assemelham a expressão pedida. Esta atividade é muito fácilpara a criança comum, mas a criança SA tem muita dificuldade, e tende aracionalizar ou intelectualizar sua dificuldade. Uma criança uma vez respondeu,‘Como é que eu posso fazer uma cara triste se eu estou feliz?’ Crianças SA maisvelhas conseguem expressar emoções simples, mas têm muita dificuldade emexpressar emoções mais complexas como vergonha e orgulho (Capp et al. 1992).

Estratégias para Ajudar a Entender as Emoções

Os portadores de SA consideram o ‘mundo das emoções’ um territóriodesconhecido. Nos últimos anos tem havido um interesse crescente num doscomponentes mais importantes do comportamento social, ou seja, a expressão dasemoções ou sentimentos. A seguinte citação ilustra essa confusão:

Por outro lado eu costumo não gostar muito de beijos, abraços e carinhos. Se euabraçar ou fizer carinho em alguém tem que ser por vontade minha, e não dapessoa. A única pessoa que é abraçada atualmente é o meu psiquiatra. Ele dizque é um homem de muita sorte, mas eu não entendo o que a sorte tem haver comum abraço. (Joliffe et al, 1992, p.15)

Como as estratégias envolvem ensinar habilidades que outras crianças aprendemnaturalmente, há pouco material disponível para fazer isso. O Apêndice incluiuma lista de livros e jogos que o autor recomenda para ser usado com criançasSA, no entanto pais e professores terão, inevitavelmente, que fazer ou escolheralguns materiais próprios. O princípio básico, é de explorar uma emoção de cadavez, como tema de um projeto . Por exemplo, primeiro explore o sentimento de‘felicidade’, e forneça o maior número de ilustrações possíveis. Existe a sériede livros do Mr. Men que contém o Mr. Happy, canções como ‘Se você está felizbata palmas...’ Pode-se elaborar um projeto, onde é preciso encontrar figuraspara completar um álbum ou fazer colagens que ilustram rostos felizes, bem comoeventos ou ocasiões onde as pessoas ou a criança se sentiriam felizes. Acriança ou a classe podem listar e dar nota para todas as palavras quedescrevem diferentes níveis de felicidade. Crianças mais velhas podem perguntaraos colegas de classe ou aos adultos, o que os fazem felizes, demonstrandopreferências e diferenças individuais. A atividade também pode ser feitautilizando desenhos, escolha de cores, músicas, etc, para ilustrar cada emoção.Algumas perguntas chaves do projeto seriam: ‘O que você pode fazer para deixaralguém feliz?’ e ‘O que você pode dizer para deixar alguém feliz?’

Uma estratégia bastante útil, desenvolvida pelo autor, é de pegar uma folha docaderno de atividades que a criança usa para fazer as colagens de pessoasfelizes, por exemplo, e colar ao lado da figura uma foto ampliada de alguémfeliz. Isto é utilizado para explicar quando alguém está feliz. O próximo passoé colocar um espelho adjacente à foto e pedir para a criança olhar para ailustração, o rosto feliz, e olhar para o espelho para que a criança faça acara dela de felicidade. Assim a criança tem a oportunidade de pensar em coisasque a deixam feliz, observar um modelo e de praticar sua própria expressãofacial. Essa estratégia utilizando o caderno, a foto, e o espelho pode serusada para demonstrar várias emoções.

Existe também um jogo muito bom , que se chama Mr. Face (Sr. Rosto), compostode um rosto em branco e uma variedade de olhos, sobrancelhas e bocas que podemser coladas ao rosto através de velcro. A criança precisa escolher oscomponentes corretos para expressar determinada emoção – por exemplo, achar a‘boca feliz’ ou os ‘olhos felizes’. Existe ainda um jogo de computador (vejaApêndice) que permite que a criança selecione componentes de expressões faciaispara completar um rosto desenhado.

Baseado no livro de Rozanne Lanczak (1987) pode-se fazer a seguinte atividadeutilizando um caderno e colando fotos ou figuras de alguém abrindo seu presentede Natal:

· Perguntar a criança como ela se sente quando ganha muitos presentes?

· Pedir que a criança desenhe sua família, onde todos estão felizes.

Outra atividade pode ser feita por pais ou professores. Estes fazem trejeitos,tom de voz, expressões faciais de uma pessoa que está feliz e perguntam acriança, ‘Como é que eu me sinto?’ e ‘Estou um pouco feliz ou muito feliz?’Essa atividade explora os diferentes níveis de expressão.

Quando uma emoção em particular, e seus níveis de expressão, forem entendidos,o próximo passo será usar os mesmos procedimentos para ensinar uma emoçãocontrária a que foi ensinada anteriormente, por exemplo ‘tristeza’. Pode-seelaborar um jogo usando figuras, estórias ou imitação onde a criança precisaescolher qual a emoção que está sendo apresentada, ‘felicidade’ ou ‘tristeza’.Esse jogo começa nos extremos do continuum das duas emoções, por exemplo, afelicidade da Vovó quando ela chega e a tristeza dela quando vai embora. Comrelação a ‘tristeza’ pode-se perguntar também ‘Como você saberia se alguémestivesse triste?’ seguido de ‘O que você poderia fazer ou falar para a pessoase sentir melhor?’ Assim a criança aprende a interpretar os sinais e o quefazer ao reconhecê-los. O caderno de atividade da ‘tristeza’, também pode serusado para determinar por quê a criança pode estar se sentindo triste, quandoela não possui a fluência verbal para explicar seus sentimentos.

Uma vez que este formato tenha sido entendido, outras emoções podem serintroduzidas, particularmente, raiva, ansiedade e frustração bem como emoçõespositivas, particularmente, amor e afeição, satisfação, surpresa, ou emoçõescomplexas como orgulho, inveja ou vergonha. Um caderno de atividades pode serusado para explorar eventos e sentimentos que fazem aflorar uma determinadaemoção na criança e respostas alternativas a essa emoção. Por exemplo:

O que faz você se sentir ________?

O que você pode fazer quando se sente ______?

Eu estou com raiva porque ________.

Um jogo de Chapéu dos Sentimentos pode ser usado como atividade em grupo. Emcada cartão, que será colado nos chapéus, escreve-se o nome de cada emoção queserá usada no jogo. Cada criança escolhe um chapéu e faz de conta que estásentindo a emoção escrita no chapéu , depois trocam os chapéus até que todostenham feito cada uma das emoções. Outro jogo utiliza máscaras de sentimentos,com cada criança representando a emoção da máscara, ou o jogo “Simon Says”,adaptado ao uso das emoções. Existe uma variedade de livros de estória queilustram emoções específicas (veja Apêndice 1).

Para adolescentes, o Grupo de Apoio pode incluir um jogo de cartões,utilizando-se duas pilhas separadas. Em cada cartão de uma das pilhas estaráescrito uma emoção e.g, felicidade, orgulho, inveja Na outra pilha de cartões,em cada um, estará escrito, uma ação. Por exemplo, lavar a louça, tomar café damanhã, etc. O jogo consiste em pegar um cartão de cada pilha e representar aação e a emoção, para que o grupo tente adivinhar, a atividade, a emoção e ograu de expressão. Atividades tradicionais de aulas de teatro também podem seradaptadas para que o adolescente Asperger aprender a identificar o sentimentodas outras pessoas, utilizando a mímica, ouvindo fitas e lendo poesias.

As circunstâncias naturais também podem ser usadas para que o indivíduo SAaprenda a identificar sentimentos. Os pais ou professores podem tirar vantagemde uma situação para apontar os sinais – por exemplo, a testa enrugada e o dedoem riste ou o olhar penetrante e o silêncio têm um significado bem específico erequerem um tipo de resposta bem particular. Isto é importante na sala de aula,onde a criança pode não estar atenta aos sinais sutis dados pela professora,que são perfeitamente compreendidos pelos outros alunos. Quando a criança estáconfusa ou reconhece que cometeu algum erro, uma frase ‘de segurança’ pode serensinada, como ‘Desculpe, eu não tenho certeza do que você quer que eu faça’,‘Eu não tinha a intenção de chateá-lo’, ou simplesmente, ‘Me desculpe’. Istoajudará a remover as tensões e irá transmitir a idéia correta de que a criançapossui educação ou ingenuidade e não, agressividade ou indiferença. Os sinaisque indicam certos tipos de sentimentos, também precisam ser aprendidos poradultos Aspergers. Por exemplo, quando a Temple Grandin tornou-se bem sucedidaem sua área de atuação, ela escreveu: ‘Eu precisei aprender a ser desconfiada.Precisei aprender isso de modo cognitivo, pois não conseguia ver o olharinvejoso no rosto dele’(1995,p.14).

Um componente essencial de programas desse tipo, é descrever e explorar oseventos e comentários que produzem certo tipo de sentimento, tanto na criançacomo nas outras pessoas. Pode-se lembrar de um fato que levou a criança asentir determinado tipo de emoção, e então explicar que outras pessoas tambémtêm esse tipo de sentimento. Isto é o começo para que seja adquirido osentimento de empatia.

Uma das conseqüências desagradáveis de ser menos capaz de compreender osentimento alheio, é de agir como um ‘cientista’, e conduzir experiênciaspsicológicas para explorar a reação extrema das pessoas à certos tipos decomentários. Uma minoria de adolescentes Aspergers farão comentáriosprovocativos, que podem ser bem macabros, e mal interpretados comopotencialmente criminosos afim de explorar a reação das pessoas. Podem sentirgrande prazer em observar a reação dramática dos outros e perceber que possuema habilidade de controlar e manipular a emoção alheia. Pode parecer que oportador de SA é calculista, mas ele está somente tentando entender comoinfluenciar e prever os sentimentos das outras pessoas. Certamente que tais‘experiências’ devem ser desencorajadas e substituídas pelo ensinamento da

compreensão e expressão das emoções. Esta não é uma tarefa fácil, e pode serpreciso fazê-la ao longo da vida. Um rapaz Asperger, que possui um PhD emfísica, está participando de uma equipe de pesquisas em uma prestigiadauniversidade. Em casa, seu divertimento predileto, é desenvolver uma fórmulamatemática que prevê o comportamento emocional humano. Se conseguir, ele poderáconquistar o Prêmio Nobel e provocar o desemprego de milhares de psicólogos.

Estratégias que Ajudam a Expressar as Emoções

A dificuldade aqui parece ser em atingir um modo correto e preciso de expressardeterminado sentimento. Isto pode ser ilustrado por uma criança Asperger queestava em pé ao lado de sua mãe. Ambos estavam observando a irmã mais nova nobalaço. Ela caiu e correu para mãe pedindo consolo. Quando ela se aproximava, oirmão virou-se para a mãe e perguntou: ‘Eu faço cara de que?’ Certamente queele reconhecia os sinais, mas não sabia como expressar sua preocupação. Háocasiões onde a pessoa com SA simplesmente não possui o vocabulário precisopara expressar as nuances da emoção sentida. Uma chateação simples pode serexpressado com o uso de palavrões e linguagem corporal bombástica, talvezaprendida observando outras crianças ou atores em programas de televisão. Aexpressão é excessivamente dramática, mas a mensagem é bem clara. Aqui, apessoa deve aprender os graus de expressão mais precisos e apropriados,incluindo palavras e ações. Uma atividade visual útil, consiste em desenhar umaescala ou barômetro que ‘mede’ o grau de uma emoção específica. Cada ponto naescala tem um número com ações e palavras apropriadas. Veja um exemplo de umaescala para a raiva:

J----------------------------------L

1 2 3 4

Chateado Zangado Furioso Colérico

Irritado Aborrecido Muito zangado Raivoso

Para cada ponto na escala, palavras, tom de voz e linguagem corporalapropriados podem ser explicados através de estórias, programas de TV eencenações. Um jogo pode ser criado, onde o professor, os pais ou outracriança, demonstram um determinado tipo de sentimento, usando ação e palavrasapropriadas, e a criança Asperger aponta para o grau de expressão correto naescala. Depois a criança ou adolescente Asperger pode ser encorajado a usar aescala para expressar palavras mais sutis e precisas e linguagem corporal. Atécnica da escala pode ser utilizada para expressar uma gama de emoções, mastambém tem-se mostrado bastante útil para que a criança expresse o grau de dore desconforto. Crianças SA normalmente mostram-se estóicas, aturam a dor semdeixar evidente, nem por palavras, nem pela expressão corporal, que podem estarem estado de agonia.

Outra atividade é fazer um caderno de exercícios para explorar respostasemocionais e lingüísticas apropriadas à situações específicas. Por exemplo,como você se sentiria e o que você pode dizer ou fazer se:

· Alguém manga das suas roupas.

· Alguém critica sua caligrafia.

· Você estuda muito para uma prova e tira uma nota baixa.

· Você sorri, e diz ‘olá’ e a outra pessoa não responde.

· Você esquece seu lanche, mas um amigo oferece compartilhar o dele.

· Um amigo diz que você sabe muito sobre computadores.

A criança pode desenhar rostos ou cenários, bem como escrever uma pequenaestória para cada uma dessas situações.

Uma característica um pouco confusa da Síndrome de Asperger, é que, às vezes,um nível de estresse moderado causa como resposta o riso, como no ditado ‘é rirpara não chorar’. Isso não significa que a criança Asperger possui um senso dehumor negro, e sim que falta a ela sutileza e precisão na expressão de suasemoções. É muito importante explicar a criança qual o efeito dessa reação nasoutra pessoas, especialmente pais ou professores que podem criticá-la ou puni-la pois ficam aborrecidos com tal reação. Ocasionalmente, o riso impróprioparece um tanto bizarro, provavelmente após escutar uma palavra ou frase queproduz um riso descontrolado, histérico. O riso pode ocorrer sem razãoaparente, e a pessoa pode parecer que está tendo alucinações auditivas. Noentanto, e razão pode ser bem simples e lógica quando se tem uma compreensãomaior a respeito da Síndrome de Asperger. Normalmente a criança tem fascinaçãocom o significado ou som das palavras, e uma frase ambígua é intrigante,causando assim humor, como ocorre com os trocadilhos. Um adolescente Aspergerera considerado bem estranho porque ele costumava rir sozinho durante orecreio. A explicação foi encontrada quando foi perguntado a uma outra criança,por quê ela não se aproximava do adolescente, ‘por que ele ri das vespas’.Realmente, numa observação mais cuidadosa, pôde-se constatar que a reação delea este inseto venenoso era o riso, a maneira encontrada por ele de expressarsua inquietação. No entanto, ele nem imaginou que este tipo de comportamentoseria preocupante para as outras pessoas nem que o achariam estranho.

A linguagem corporal expressiva do Asperger pode ser mal interpretada. Podemachar seu maneirismo agressivo, indiferente ou desligado, isto pode geraransiedade, especialmente para os adultos com SA. Vendedores de lojas podemachar que eles estão sendo autoritários ou briguentos, apesar desta não ser aintenção deles. Em situações como esta, a encenação e o uso do vídeo pode

esclarecer quais os sinais que estão sendo mal interpretados, e possibilitar aprática de linguagem mais sutil e precisa, como também, o melhor uso daexpressão corporal .

Uma característica comum da Síndrome de Asperger é a dificuldade que a pessoatem de expressar seus sentimentos mais profundos. A criança pode estarvisivelmente aborrecida, mas não possui a habilidade ou as palavras paraexplicar seus sentimentos. Os pais ficam frustrados por não compreenderem o queaflige seu filho(a), e ficam impossibilitados de prestarem simpatia ouorientação adequados. Se os pais modelarem o ato de “desabafar”, ou seja, dizerao filho como foi o dia deles e qual foi a reação e emoções deles, pode ajudarbastante. Por exemplo, contar ao filho como foi o dia deles e depois perguntar,‘Você se sentiu chateado no colégio hoje?’, ou ‘Você ficou chateado?’ . Istoirá permitir um contexto e vocabulário apropriados para a prática de‘desabafar’.

Apesar de haver uma certa dificuldade em falar a respeito dos sentimentos,geralmente há uma eloqüência surpreendente, quando isto é feito através daescrita, como num diário, carta, poema ou autobiografia. Candy, uma senhoraAsperger, descreve como ‘a linguagem escrita flui com uma facilidade que não épossível de ser expressa de nenhuma outra forma’.

Procure incentivar o uso de um diário, não somente para eventos, mas tambémpara anotar impressões pessoais, pensamentos e sentimentos. Um dicionárioilustrado para os sentimentos pode ser utilizado com crianças mais capazes, e oApêndice inclui um exemplo de uma série de rostos que mostram emoções, e podeser usado para que a pessoa encontre a palavra apropriada. Este dicionário ,juntamente com o diário, foram muito úteis para Fiona, uma adolescenteAsperger. Certa vez, em sala de aula, sua professora solicitou que ela fizessealgo bem simples. Ela não conseguiu completar a tarefa, e ficou bastanteagitada, derrubando cadeiras e empurrando carteiras, até que precisou serexpulsa da sala. Ela não deu nenhuma explicação para este comportamento, e suamãe e professora ficaram muito preocupadas. Naquele mesmo dia, em seu diário,Fiona escreveu o que aconteceu, e desenhou rostos que expressavam o que elasentiu no momento. Na hora do recreio, duas garotas mais velhas pegaram alancheira dela, e ficaram jogando de uma para outra impedindo que Fiona apegasse de volta. Provavelmente esta ‘brincadeira’ foi bastante divertida paraas duas garotas, mas foi extremamente esgotante para Fiona, especialmenteporque ela ficou sem comer seu lanche. Quando ela retornou a sala de aula, suaexpressão corporal e facial não mostravam como ela estava aborrecida, e aprofessora a abordou da maneira usual, e não conseguiu compreender quando elaagiu de maneira agressiva.

Após tomar conhecimento dos eventos que provocaram o comportamento agressivo deFiona, o ‘gatilho’, que deu vazão ao comportamento explosivo, foi identificadocomo sendo o fato de não conseguir completar a tarefa. Duas coisas ocorreram –as duas garotas tiveram que pedir desculpas a Fiona, e ela foi entãoincentivada a falar para a professora, sempre que se sentisse frustrada ou comraiva. A frase ‘um problema compartilhado é meio problema’ é bastanteapropriado neste caso, mas talvez seja preciso explicar ao Asperger que isto seaplica tanto ao trabalho escolar, quanto a questões emocionais.

Apesar do aprendizado de habilidades sociais e emocionais parecer tarefabastante árdua, as crianças SA respondem surpreendentemente bem aos programasespeciais elaborados para elas. Quanto mais inteligente e motivada for acriança, e quanto maior o acesso ao conhecimento e suas fontes, mais rápidoserá seu progresso. Com o passar do tempo, nós iremos aprender por que os errosocorrem, bem como, estratégias específicas para superá-los. Apesar de estarmosapenas iniciando nossa jornada por essa estrada, sabemos que ela nos levará aosucesso.

Breve Sumário de Estratégias para a melhoria do Comportamento Social

q Aprenda a:

§ começar, manter e terminar a brincadeira

§ ser flexível, cooperar e compartilhar

§ manter-se sozinho sem ofender os outros

q Explique a criança o que ela deveria ter feito

q Incentive um amigo a ir brincar com a criança em casa

q Inscreva a criança em clubes ou associações

q Ensine a criança a observar outras crianças para aprender o que fazer

q Promova e incentive jogos cooperativos e competitivos

q Modele como se relacionar com a criança

q Explique modos alternativos para a criança pedir ajuda

q Incentive amizades em potencial

q Providencie para que o horário do recreio seja agradável

q Fique atento a possibilidade de comportamentos extremos

q Providencie um Reforço Escolar

q Utilize Estórias Sociais para que, em situações específicas, a criançaentenda os sinais e aja de acordo.

q Promova Grupos de Apoio para adolescentes:

§ ensaie ações mais apropriadas

§ demonstre comportamentos sociais impróprios

§ utilize poesias e autobiografias para encorajar empatia e extroversão

§ forneça orientação e pratique expressões corporais

q Faça projetos e atividades mostrando as qualidades de um bom amigo

q Para ajudar na compreensão das emoções:

§ num projeto, explore uma emoção de cada vez

§ ensine como ler e responder aos sinais que indicam diferentes níveis deemoção

§ ensine frases ‘seguras’ para quando o adolescente se sentir inseguro

q Para ajudar a expressar emoções:

§ utilize uma escala como um guia visual

§ utilize um vídeo e interpretação para fornecer expressões mais sutis ouprecisas

§ use perguntas chaves ou um diário para encorajar a extroversão e o ato dedesabafar

Fonte: www.autismo.com

Postado por Marina S. Rodrigues Almeida