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"Na casa de meu Pai há muitas moradas", diz Jesus no texto do Evangelho desta manhã. Santo Agostinho chamou este conjunto invisível de moradas espirituais "A Cidade de Deus", onde todos os cidadãos espontaneamente submetem sua vontade à Vontade Divina. Ele a contrastou com outra região invisívelà qual chamou "Cidade dos Homens". "A Cidade dos Homens", onde os habitantes imaginam que são livres, mas, na verdade, são escravos de sua própria vontade. De acordo com Agostinho, podemos ocupar apenas um ou outro desses mundos invisíveis ao mesmo tempo. Esta é nossa opção fundamental. A cidade que escolhermos para morar vai determinar a nossa vida exterior e a forma das culturas que criarmos na terra. Agostinho sugeriu que a diferença crucial entre a a autoridade terrena justa e injusta está enraizada nesses espaços espirituais, onde as almas humanas habitam invisivelmente A autoridade injusta na terra estaria enraizada na cidade invisível dos Homens, e seria meramente o tipo de poder destrutivo pelos qual os ladrões e criminosos se apoderam de suas vítimas. Uma vez que essas duas cidades pertencem a um Mundo Invisível, nunca seremos capazes de saber pela aparência externa em qual tipo de "vizinhança espiritual" nos encontramos. As favelas não são necessariamente mais cheias de criminosos do que os edifícios das igrejas de santos. Pode muito bem ser o contrário. No entanto, é mais provável que tanto o exteriormente "sagrado" quanto os lugares exteriormente "profanos" contenham algumas almas inclinadas à santidade e outras não tanto pró santidade. Separar nitidamente o bem do mal não é tão simples neste nosso mundo confuso. Isto é particularmente verdadeiro quando se trata dos pobres e vulneráveis que os chamados "bons" membros da sociedade muitas vezes procuram empurrar para fora do que eles imaginam ser a sua própria e particular cidade de Deus. Vão morar em áreas menos hospitaleiras, às quais pertencem "esse tipo de gente". Todavia, os pobres não podem ser deslocados da verdadeira Cidade de Deus tão facilmente, mesmo quando são forçados a viver com opções que parecem deixar que "se danem pelo que fizerem e pelo que não fizerem". Esta situação dos pobres foi destaque em dois filmes brasileiros premiados: a Cidade de Deus (Cidade de Deus) e a Cidade dos Homens (Cidade dos Homens). Estes filmes populares revelam uma cultura de extrema violência na favela do Rio de Janeiro chamada "Cidade de Deus" 1 devida à permissividade do governo para com traficantes que dominam a população. O que estes filmes não mostram, no entanto, é que essa comunidade superlotada com mais de 65.000 pessoas, consiste principalmente de famílias que lutam desesperadamente, em um 1 A área habitacional da zona leste do Rio de Janeiro, chamada "Cidade de Deus" foi criada em 1960 pelo governo do estado, como parte de uma política de erradicação para remoção das favelas da zona central do Rio e reassentá-las em regiões predeterminadas. A Cidade de Deus tem sido rotulada como uma das favelas urbanas mais perigosas. Em anos mais recentes, foram instaladas unidades de pacificação - UPPs - com o propósito de combater o tráfico de drogas e oferecer maior segurança aos moradores. Esse procedimento ainda se encontra em fase de implantação. Quando os filmes foram feitos, não havia ainda interferência organizada pelo estado e nem todas as favelas contam com esse serviço até o momento. Capital Espiritual & A Liturgia da Vida Cotidiana Capital Espiritual & A Liturgia da Vida Cotidiana Páscoa V, 18 de maio 2014 (Atos 7:55-60, Salmo 31:1-5, 15-16, 1 Pedro 2:2-10; João 14:1-14)

Capital Espiritual & A Liturgia Da Vida Cotidiana (versão em Portugues)

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"Na casa de meu Pai há muitas moradas", diz Jesus no texto do Evangelho desta manhã. Santo Agostinho chamou este conjunto invisível de moradas espirituais "A Cidade de Deus", onde todos os cidadãos espontaneamente submetem sua vontade à Vontade Divina. Ele a contrastou com outra região invisívelà qual chamou "Cidade dos Homens". "A Cidade dos Homens", onde os habitantes imaginam que são livres, mas, na verdade, são escravos de sua própria vontade. De acordo com Agostinho, podemos ocupar apenas um ou outro desses mundos invisíveis ao mesmo tempo. Esta é nossa opção fundamental. A cidade que escolhermos para morar vai determinar a nossa vida exterior e a forma das culturas que criarmos na terra. Agostinho sugeriu que a diferença crucial entre a a autoridade terrena justa e injusta está enraizada nesses espaços espirituais, onde as almas humanas habitam invisivelmente A autoridade injusta na terra estaria enraizada na cidade invisível dos Homens, e seria meramente o tipo de poder destrutivo pelos qual os ladrões e criminosos se apoderam de suas vítimas.

Uma vez que essas duas cidades pertencem a um Mundo Invisível, nunca seremos capazes de saber pela aparência externa em qual tipo de "vizinhança espiritual" nos encontramos. As favelas não são necessariamente mais cheias de criminosos do que os edifícios das igrejas de santos. Pode muito bem ser o contrário. No entanto, é mais provável que tanto o exteriormente "sagrado" quanto os lugares exteriormente "profanos" contenham algumas almas inclinadas à santidade e outras não tanto pró santidade. Separar nitidamente o bem do mal não é tão simples neste nosso mundo confuso. Isto é particularmente verdadeiro quando se trata dos pobres e vulneráveis que os chamados "bons" membros da sociedade muitas vezes procuram empurrar para fora do que eles imaginam ser a sua própria e particular cidade de Deus. Vão morar em áreas menos hospitaleiras, às quais pertencem "esse tipo de gente".

Todavia, os pobres não podem ser deslocados da verdadeira Cidade de Deus tão facilmente, mesmo quando são forçados a viver com opções que parecem deixar que "se danem pelo que fizerem e pelo que não fizerem". Esta situação dos pobres foi destaque em dois filmes brasileiros premiados: a Cidade de Deus (Cidade de Deus) e a Cidade dos Homens (Cidade dos Homens). Estes filmes populares revelam uma cultura de extrema violência na favela do Rio de Janeiro chamada "Cidade de Deus"1 devida à permissividade do governo para com traficantes que dominam a população. O que estes filmes não mostram, no entanto, é que essa comunidade superlotada com mais de 65.000 pessoas, consiste principalmente de famílias que lutam desesperadamente, em um

1 A área habitacional da zona leste do Rio de Janeiro, chamada "Cidade de Deus" foi criada em 1960 pelo governo do estado, como parte de uma política de erradicação para remoção das favelas da zona central do Rio e reassentá-las em regiões predeterminadas. A Cidade de Deus tem sido rotulada como uma das favelas urbanas mais perigosas. Em anos mais recentes, foram instaladas unidades de pacificação - UPPs - com o propósito de combater o tráfico de drogas e oferecer maior segurança aos moradores. Esse procedimento ainda se encontra em fase de implantação. Quando os filmes foram feitos, não havia ainda interferência organizada pelo estado e nem todas as favelas contam com esse serviço até o momento.

Capital Espiritual & A Liturgia da Vida CotidianaCapital Espiritual & A Liturgia da Vida CotidianaPáscoa V, 18 de maio 2014 (Atos 7:55-60, Salmo 31:1-5, 15-16, 1 Pedro 2:2-10; João 14:1-14)

ambiente caótico, para alimentar miseravelmente seus filhos e oferecer-lhes um futuro melhor. E, curiosamente, muitas dessas famílias não experimentam em suas vidas algo além da esperança.

Nossa sociedade não consegue entender como pessoas que nada têm materialmente e que enfrentam todas as adversidades sociais possam ter outros tesouros espirituais que a sociedade dominante, mesmo que deseje, não os tem.É um mistério do Evangelho que podemos ter força interior para viver em um mundo assim, e mesmo assim,não pertencer a ele em nossos mais profundos valores e modos de vida (por exemplo: João 15:12-19; 17:1416; Romanos 12:1-2; I Pedro 1:13-16). A Igreja brasileira parece ter desenvolvido um grande "know-how" nesta prática misteriosa de permanecer em Cristo em meio a condições extremamente adversas. Enquanto o nosso novo relacionamento com as pessoas da Diocese da Amazônia se desenvolver, enquanto pudermos por todos os meios ajudar, quem sabe elas nos ajudarão a desenvolver essa mesma espécie de "know-how" espiritual no nosso contexto.

Às vezes ouço coisas que os paroquianos dizem quando não sabem que estou ouvindo. Não é que esteja espionando. Acontece que só raramente me encontro no lugar certo, na hora certa, e ouço algo que está sendo dito. Foi o que aconteceu no último domingo durante o nosso momento social. Ouvi alguém dizer: "Este é um bom lugar" Isso me comoveu, porque eu sabia que era sincero, sabia que era verdade.

Não senti qualquer compulsão para atropelar e dizer:"Bem, se você gosta...espere até começar a perceber o nosso plano estratégico... ee tivermos camadas de tinta fresca... espaços para ministrar a pessoas de todas as idades...uma cozinha digna... e muito mais!" Se eu tivesse dito algo assim, eu estaria completamente fora de sintonia, porque essa pessoa não estava falando sobre o espaço físico ou do programas, ou até mesmo da b ela música com que fomos abençoados no domingo passado. Ficou muito claro, no contexto, que ela estava falando do espaço espiritual, como se sentia ao se relacionar conosco.

Não me interpretem mal, não estou de modo algum dizendo que devemos desistir de reformar nosso espaço físico. Estou muito ansioso por isto. Mas o que essa pessoa vivenciou na semana passada me ajudou a colocar todos as realizações materiais que estamos planejando juntos... no contexto certo... sobre a realidade do nosso relacionamento uns com os outros. A melhor coisa que temos a nosso favor é cada um de nós e como nos tratamos uns aos outros. Porque isto tem muito mais poder de influência sobre o modo como as pessoas se sentem dentro deste espaço do que a cor das paredes ou os ângulos da arquitetura, por mais importantes que possam ser as coisas. O que mais importa é a qualidade do amor que as pessoas encontram aqui. Isto é basicamente o faz de uma casa um lar. Não é que sejamos especialistas em relacionamentos, ou que coisas desagradáveis jamais aconteçam entre nós. Elas acontecem. Mas o que nos torna

diferentes é que, quando nossas falhas tiram de nós o melhor e prejudicamos os que somos chamados a amar, admitimos nossas falhas, fazemos as pazes de modo que possamos voltar ao caminho do crescimento unidos pelo amor... ao invés de deixarmos a culpa e o ressentimento cresçam dentro de nós e dentro dessas moradas. Trabalhamos para sermos transparentes e livres em nossos relacionamentos uns para com os outros. Este é o nosso verdadeiro pão com manteiga, nosso verdadeiro capital espiritual. Isto é o que faz a Igreja crescer de forma sustentável, mesmo que o seu altar seja construido à base de velhas caixas de madeira.

Nunca preguei sermão com o objetivo de levar as pessoas a dar mais dinheiro para a igreja. Não que me oponha. Mas acredito que as pessoas naturalmente colocam seu tempo, talentos e tesouros onde estão os corações. Estou mais preocupado em reforças os corações de modo que realmente cresçamos em nossa capacidade de amar, porque acredito que o capital espiritual é imensamente mais poderoso do que o dinheiro . Lembrei-me disto recentemente através do Bispo Bob, de volta de sua recente viagem à Amazônia, onde foi conhecer novos amigos na Diocese da Amazônia. Ele não conseguia parar de dizer:" as pessoas na igreja de lá não têm nada em bens materiais. Mas espiritualmente elas têm tudo. E, em comparação a elas, temos tudo materialmente falando, mas espiritualmente, nada temos. Palavras muito fortes. Foram ditas no contexto de nossa intenção no sentido de que esse relacionamento que estamos iniciando com a igreja do Brasil seja mutuamente benéfico. Que sejam beneficiados com tudo que pudermos dar-lhes, mas que também nós sejamos beneficiados do que eles têm com tamanha abundância. Em termos de capital espiritual , eles são extrema e belissimamente ricos (Mateus 5:1-16).

Todos vocês sabem que estou muito focado na liturgia, no poder da Palavra e do Sacramento para nos transformar de dentro para fora. Quando uma pessoa experimenta o poder da liturgia...há um brilho espiritual em torno dela que vem das profundezas do seu interior ao ser tocada - abordada pessoalmente - por alguma verdade divina que precisa experimentar. Esse poder é ampliado ainda mais quando a liturgia conta com outras artes , como a música e a dança, bem integradas nela. Entretanto, mesmo que nossas liturgias da Palavra e do Sacramento sejam as melhores da terra, não serão suficientes. Esse brilho maravilhoso que experimentamos através da liturgia é realmente um tipo de acontecimento espiritual , realmente transformador, realmente pode encher uma morada com o poder do Amor Divino. Mas, não é sustentável. Inevitavelmente se desvanece e foge. Não vivemos a maior parte das nossas vidas em uma rica cultura espiritual. É verdade que a nossa cultura canadense contém muitos tesouros espirituais edificantes, mas também contém uma grande quantidade de doença espiritual. E isto nos afeta, principalmente através dos nossos relacionamentos com as outras pessoas. Mas também nas relações virtuais que vivenciamos através dos meios de comunicação, por meio de ações prejudiciais dos nossos políticos e nossos poderes constituídos. Não são apenas as Liturgias da Palavra e da Eucaristia que alimentam nossas vidas. Nós acabamos por ingerir outros alimentos, não nutritivos, ou coisas do gênero.

E isto nos traz uma dificuldade na situação presente em toda comunidade paroquial. O brilho espiritual que vem com a participação na Liturgia não é suficiente para nos

Behold I Make All Things New Behold I Make All Things New Revelation 21:5Revelation 21:5

sustentar em meio a essa condições As verdades divinas que tocam nossas vidas através da Palavra e dos Sacramentos precisam ser mais firmemente plantadas em nossos pensamentos, em nossas emoções, em nosso trabalho, nos nossos passatempos. E o único lugar onde todas estas facetas de nossas vidas entram em jogo é em nossos relacionamentos com os outros. A construção de relacionamentos amorosos honestos que dão vida aos outros é lugar onde a Liturgia formal se torna encarnada na liturgia da vida cotidiana.

Quando é assim que nós praticamos essa coisa chamada cristianismo, algo sustentável acontece dentro dessas moradas. O amor que as pessoas vivenciam aqui, então, não é só porque fomos apanhados em um bom dia, depois de um culto edificante, ou porque ninguém que já nos machucou se encontra no mesmo recinto. Então, o amor que compartilhamos cresce realmente confiável, e mostra que discípulos realmente somos.

"Na casa de meu Pai há muitas moradas", diz Jesus. Muitas moradas cheias de amor que perdoa e cura e que encontramos em Cristo. Costumamos falar dessa moradas sagradas como se pertencessem ao mundo invisível que chamamos "céu" ou "Reino de Deus", e imaginamos realmente essas moradas sagradas, em sua totalidade, como se estivessem muito longe de nós no aqui e agora. Mas Jesus também nos ensina que o Reino de Deus está realmente no meio de nós e dentro de nós (Lucas 17:20-23). Ele diz que quando as pessoas chegam a nós e dizem: "é por aqui", "é ali", não se deve acreditar. Não é para irmos procurá-lo porque não vamos encontrá-lo. Ele não pode ser percebido com os cinco sentidos. Ele está bem aqui no meio de nós e em nossas almas, mas não tem propriedades físicas. É uma morada espiritual onde somos chamados a habitar (João 15:4-5).

Quando estamos abertos a isso, o drama sagrado da liturgia nos introduz a uma das moradas sagradas, feitas à mão pelo Espírito para nós. E é essa a intenção desse fazer. Mas isso não é toda a história. Facilmente somos tirados ou arrancados daquele lugar sagrado em nossas almas e nosso meio... se não estivermos ativamente fazendo o trabalho de construção honesta, amorosa, no perdão e nos relacionamentos que se baseiam no amor que experimentamos em Cristo.2 Relações com outros seres humanos imperfeitos, frustrantes (que, infelizmente, parecem nunca estar em falta). Esse é o lugar onde nos tornamos praticantes da Palavra Divina (Mateus 5:23-24; 7:24-29; João 13: 34-25; Gálatas 5: 6; 6:15; I João 2:1-12). Pode ser um cadinho, permanecer com Cristo no interior, enquanto somos lançados nos relacionamentos do lado de fora, mas o único lugar onde o crescimento espiritual sustentável realmente acontece, É o único lugar onde podemos praticar o tipo de amor confiável, que atrai as pessoas para essas moradas e

2 Tradicionalmente essa qualidade de amor é chamada "caritas pastoralis". O termo inglês "pastoral care" surge dái. É o Amor Divinoque é medido pelo Viver em Cristo através da vida humana comum. É também chamado "agape" no grego. Quando dizemos "amor de Cristo", nos referimos a uma declaração da nossa visão, por exemplo, sempre se referindo a esta qualidade de amor. Pastoral care significa, em português, cuidado pastoral.

trazem-nas de volta, porque elas querem saber como amar do jeito que nós amamos. Esse é o nosso mais precioso capital onde começa a boa mordomia.

Minha oração é que cada um de nós, inclusive eu, se comprometa de todo coração, para nos tornamos extraordinariamente ricos dessa forma, na maneira como nos tratamos uns aos outros. Se achar que não está funcionando com você, por favor venha me ver. Um pastor nos EE.UU. (H.E. Fosdick) costumava dizer que pode-se dizer o quanto um sermão foi bem, de verdade, pelo número de pessoas que vêm para aconselhamento pastoral na semana seguinte. (Não sei se isto é verdade, mas a minha porta está aberta de qualquer maneira). Tenho certeza, porém, que se aceito esse desafio para construir o nosso maior tesouro, o nosso capital espiritual, a última coisa que vamos ter de nos preocupar é o dinheiro. Nunca poderemos ser capazes de manter os Kadarshians deste mundo, mas vamos continuar a crescer em Cristo, Graças a Deus.

Bem-vindo novos amigos da Amazônia!Bem-vindo novos amigos da Amazônia!

Fr. Rishi Sativihari Fr. Rishi Sativihari The Parish of St. James Anglican Church,The Parish of St. James Anglican Church, 65 Church Street S. St. Marys, Ontario. Canada65 Church Street S. St. Marys, Ontario. CanadaOffice: 519-284-1147 Office: 519-284-1147 [email protected]@quadro.net www.sjsmac.ca https://www.facebook.com/StJamesSt.Marys