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Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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A outra face do janus cabo-verdiano: uma análise crítica da violência juvenil em Cabo Verde*
Nardi Sousa**
Resumo: A sociedade cabo-verdiana tem enfrentado, nos últimos tempos, uma crescente onda de criminalidade e violência urbana juvenil nos principais centros urbanos do país. A situação é muito confusa, dado que às vezes condena-se os jovens dos bairros periféricos, outras vezes os agentes ligados ao narcotráfico. Isso tem provocado um pânico geral e alerta para que se tomem medidas preventivas e punitivas. Tem-se verificado também uma certa desilusão dos jovens das comunidades pobres, que apresentam características de pessoas disempowered: desiludidas, desconfiadas com comportamentos passivos e agressivos como raiva e pessimismo. O artigo pretende fazer uma reflexão crítica sobre a problemática da delinquência juvenil em Cabo Verde, partindo de alguns estudos e contribuições teóricas disponíveis sobre o fenómeno, assim como ‘desmontar’ o PESI-20091, no que concerne ao espaço reservado à questão da delinquência/criminalidade juvenil. A revisitação de alguns estudos sobre a violência juvenil dá-se num diálogo entre Sociologia, Antropologia (simétrica) e Etnografia, da necessidade de se conhecer a questão da violência em Cabo Verde, assim como novos paradigmas que ajudem a compreender fenómenos tais como exclusão social e violência juvenil. Palavras-chave: Jovens, Violência, Delinquência Juvenil, Thug, PESI-2009, Segurança Interna, Cabo Verde. Abstract: The cape-verdean society has faced in recent times, a growing wave of juvenile crime and urban violence in major urban centers of the country. The situation is very confusing, because sometimes it condemns youth of the suburbs, sometimes agents linked to drug trafficking. This has caused widespread panic and alert to take preventive and punitive measures. There has been also a certain disillusionment of young people in poor communities, which have characteristics of disempowered people: disillusioned, distrustful with passive and aggressive behaviors such as anger and pessimism. The article aims to make a critical reflection on the problem of juvenile delinquency in Cape Verde, departing from some studies and theoretical contributions available on the phenomenon and ' dismantle ' the PESI-2009, regarding the priority that has been given to the issue of delinquency/juvenile crime . A revision of some studies on youth violence occurs on a dialogue between sociology, (symmetric) anthropology and Ethnography, the need to know the issue of violence in Cape Verde, as well as new paradigms that help to understand the phenomena such as social exclusion and youth violence. Key-words: Youth, Violence, Juvenile Delinquency, Thug, PESI-2009, Internal Security, Cape Verde.
Introdução
Cabo Verde é um país que soube adaptar-se, ao longo dos anos, a um mundo dinâmico
e assimétrico. Aproveitou bem os parcos recursos naturais, os da diáspora e da comunidade
internacional, o que tem permitido um crescimento razoável, reconhecido nacional e
internacionalmente, anestesiando a estrutura geradora do subdesenvolvimento2 herdado com
a independência (Renato Cardoso, 1987:45).
* Artigo recebido em Dezembro de 2012 e aceite em Janeiro de 2013. ** Sociólogo, professor na Universidade de Santiago – Cabo Verde. Mestre em Estudos Africanos. Doutorando em Ciências Sociais. Chefe do Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais na Universidade de Santiago. Email: [email protected] 1 PESI-2009 (Plano Estratégico de Segurança Interna) do Ministério da Administração Interna (MAI). 2 Cabo Verde teve que enfrentar e gerir, após a sua independência, um sistema político e económico que configurava uma verdadeira estrutura geradora do subdesenvolvimento (crise política, social, económica e ecológica) dinâmica, que engendra, cria e reproduz o subdesenvolvimento. A sociedade que se herdou, a estrutura política e administrativa que, inclusivamente, os africanos ajudaram a erguer, o sistema social e económico em que os mesmos se encontravam enredados e não destruíram com a conquista da independência, constituem elementos geradores do subdesenvolvimento e partes de um sistema vocacionado à partida para fracassar na luta pelo desenvolvimento. A estrutura contém valores, normas, factos e criaturas que só se justificam se compreendidos como continuidade, decorrência e corolário do passado. Em termos políticos, muitos dos regimes saídos do processo colonial surgem como cópia e continuidade desse mesmo processo.
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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Apesar das vulnerabilidades, pobreza estrutural, problemas ambientais, recursos
escassos, excessiva dependência da comunidade internacional, o país soube investir na
educação e saúde, atraindo poupanças da diáspora e IDE (Investimento Direto Estrangeiro).
Porém, o problema é que este avanço parece ser um falso desenvolvimento, i.e., Cabo Verde
está longe de ganhar a sua sustentabilidade económica, continua vulnerável e dependente da
comunidade internacional. Mesmo assim, nos últimos anos, tem atraído milhares de cidadãos
dos países da África Ocidental, sendo que a grande maioria se encontra numa situação ilegal.
Muitos entram no país com base nos Protocolos da Livre Circulação entre os países da
CEDEAO.3
A procura de Cabo Verde deve-se ao facto de o país granjear de liberdade, paz social,
estabilidade política e um certo crescimento económico.4
Cabo Verde, um pequeno Estado insular, é, de acordo com a política de crédito do
Banco Africano de Desenvolvimento (BAfD), um país de rendimento médio baixo (PRMB).
O Produto Nacional Bruto (PNB) per capita cabo-verdiano, em 2010, rondou os 3.270 USD,
bem acima do patamar de 1.175 USD de PNB per capita dos PRMB. Apesar dos progressos
significativos alcançados nas últimas duas décadas, o país continua a enfrentar alguns
constrangimentos e desafios significativos ao seu desenvolvimento.
Para responder ao declínio da atividade económica, fruto da crise económica
internacional (dívida pública da zona euro), o Governo adotou um programa de investimento
público (PIP) contra-cíclico para o período 2010-2011. Como resultado, o crescimento do
Produto Interno Bruto (PIB) acelerou para os 5.4%, em 2010, abrandando posteriormente para
os 5%, em 2011. Os especialistas consideram que os estímulos fiscais compensaram a
contração do investimento privado e mantiveram um nível adequado de desenvolvimento
infraestrutural. O turismo manteve a trajetória de recuperação em 2011, mas a balança de
transações correntes continuou a deteriorar-se, sobretudo devido à subida das importações de
bens de investimento, reflexo dos estímulos fiscais governamentais. Para 2012-2013, o
cenário de base das autoridades assume uma contração da política fiscal e políticas monetárias
prudentes. O crescimento real do PIB deverá rondar os 5%, permitindo que as reservas
externas garantam acima de três meses de cobertura das importações de bens e serviços, para
salvaguardar a taxa de câmbio fixa com o euro. Neste período, a inflação deverá situar-se nos
3% abaixo dos valores registados em 2011 (4.5%).5
3 CEDEAO – Comunidade dos Países da África Ocidental (16 países). 4 PESI-2009, p. 29 5 Economic Outlook Cabo Verde 2012, p. 2.
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Este período de alguma efervescência económico-cultural e de patologias sociais, tem
criado um senso comum, partilhado por muita gente de que os jovens de bairros pobres e
problemáticos, da capital, suscitam desconfiança, preocupações, medos. Há o temor de que
podem criar pânico social, pôr em causa a tal paz social cabo-verdiana e aumentar a
criminalidade. Esses jovens correm o risco de se transformar numa figura a quem é dada a
responsabilidade da delinquência difundida, e se esquece que a violência/delinquência juvenil
“tem um fenómeno espelho interessante, porque faz transparecer os problemas internos da
sociedade” (Nardi Sousa, 2003:23).
Sendo assim, não podia deixar de trazer para a discussão uma série de questões sobre a
problemática da delinquência/criminalidade juvenil. Muita gente, inclusive os investigadores
têm apontado fatores que se relacionam com a problemática da delinquência/criminalidade
juvenil: pobreza, desemprego, exclusão social, clivagens e desigualdades sociais, ausência de
medidas de prevenção, falhanço das políticas públicas, o fenómeno dos bairros pobres e
periféricos, acesso a armas e consumo de estupefacientes, uma certa propensão e influência
para a cultura de gangue, influência dos deportados, fragilidade do sistema jurídico, etc.
1. Pensar a juventude como construção social
Autores como Pierre Bourdieu (1983) não veem os jovens como uma unidade social,
um grupo constituído, dotado de interesses comuns, e nem relacionam esses interesses a uma
faixa etária. Não existe uma juventude, mas uma multiplicidade delas.
Entretanto, se o conceito é de difícil apreensão, não quer dizer que a juventude não
exista, de facto a categoria “juventude” enquanto objeto específico da pesquisa social decorre
da própria transformação da sociedade e dos problemas daí decorrentes. Aspectos
sociológicos, psicológicos, estatísticos, jurídicos, filosóficos e antropológicos devem ser
levados em consideração para uma melhor compreensão dessa categoria tão rica quanto
heterogénea”. A ambiguidade e a indefinição sobre o conceito de jovem seriam algumas das
características dessa situação de complexidade.
A juventude é também um estilo de vida que vai para além da definição da idade,
evocando a transgressão, o anticonformismo a procura do risco e do prazer, a omnipotência, a
irreverência, a contestação, a solidariedade e os esforços para mudar os padrões estabelecidos.
Muitas vezes, os jovens é que apresentam as novas propostas.
Muitos investigadores têm privilegiado a abordagem do conceito da juventude numa
perspectiva de comportamentos desviantes, analisando as sociabilidades e os comportamentos
dos jovens como consequência de uma fraca integração num contexto visto como
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desorganizado. Os media tendem a passar uma imagem estigmatizada dos jovens de bairros
periféricos (guetto, gangues, droga e marginalização) que os ‘molda’ como responsáveis pelos
males sociais (insegurança, violência).
Como diz António Sérgio Spagnol (2005:277), As notícias que geram maiores polêmicas são as de crime praticados por adolescentes oriundos da periferia, principalmente se forem cometidos contra a classe média. Quanto mais violento, sangrento e espetacular o crime, melhor para a mídia, pois ele funciona como um forte atrativo. A violência, apresentada sobretudo como algo perturbador e descontrolado, pode detonar uma crise em relação ao Estado (…), que se apressa a presentar inúmeros projetos visando á reintrodução do jovem infrator à sociedade. (…) o papel da mídia, segundo Thompson (1999), é provocar o medo, principalmente na classe média, insistindo que a violência é oriunda das classes baixas. A intenção é aleardar constantemente que a violência está em todas as partes, a todos os momentos (…)”.
É uma visão redutora da realidade que acaba por corresponder a vida e trajetórias de
vida dos jovens a patologias, transformando-os em “bodes expiatórios” e culpados pela
situação de miséria e oportunidades mal aproveitadas. Essa visão não enxerga a complexidade
e heterogeneidade da realidade juvenil, assim como da riqueza de estilos, de sociabilidades e
das manifestações culturais que os jovens criam entre si. (Raposo, 2007:7-8).
É importante compreender as dinâmicas de interação e de sociabilidade das camadas
juvenis, sobretudo no plano das representações, de forma a podermos interpretar os processos
de construção de identidades culturais e territoriais.
Outras visões limitadas consideram a juventude uma etapa obrigatória e inevitável da
vida humana, uma transição entre a infância e a vida adulta, que pode ser atribulada devido a
situações de crise e conflitos. É uma visão muito influenciada pelo darwinismo social (do
início do século XX).
Após a Segunda Guerra mundial, o jovem deixa de ser um sujeito passivo para se
tornar num sujeito ativo, um protagonista do espaço público. O Estado de Bem-Estar (Welfare
State) cria condições e possibilidades educativas e de ócio para o jovem. A liberdade juvenil
coincidiu e contribuiu para a crise da autoridade patriarcal. As indústrias culturais criaram um
mercado de consumo para os jovens, devido à sua nova liberdade económica e poder
aquisitivo. Da mesma forma, os media impulsionaram o aparecimento daquilo que muitos
autores designam de culturas e estilos juvenis transnacionais. Vários estilos surgiram após os
30 gloriosos anos de crescimento económico, no pós-Segunda Guerra: beatnicks, teddy boys,
rockers, punks e hippies. O que veio criar mais interesse na juventude como objeto de estudo.6
6 Esses estilos foram estudados em Birmingham na Inglaterra, nos anos de 1960. A Inglaterra conservadora teve de enfrentar o novo ‘pesadelo’ criado por estas ‘contraculturas’ que indicavam uma mudança estrutural na sociedade, que punham em causa os valores puritanos das elites burguesas. Aqui também toda esta mudança era canalizada para os jovens, considerados ‘bodes expiatórios’ (Raposo, Idem p. 28).
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É lógico que devemos falar de juventudes e de culturas juvenis no plural, dado que
vários fatores indicam essa diversidade: a classe social, o espaço de residência, formas de
sociabilidade, etc.
Segundo Raposo, sociabilidade, como conceito, faz referência a relações sociais que se
formam independentemente de outras necessidades, orientações ou interesses (sexuais ou
culturais, residenciais ou alimentares, religiosos ou militares, económicos ou políticos), é
mais numa perspetiva relacional em se que pode verificar, em simultâneo, conteúdos
substantivos diversificados.
Quer isto dizer que nas suas interações as juventudes colocam ‘à disposição’ vários
símbolos e elementos materiais e imateriais típicas dessas culturas juvenis, onde se podem
visualizar fronteiras e espaços comuns de interação. Vários estilos se combinam: a linguagem,
as preferências musicais, a estética, a ornamentação corporal.
Com a Escola de Chicago, houve a desmistificação do desvio juvenil, através do
método de pesquisa empírica (observação participante e entrevistas qualitativas), o que levou
à transformação do espaço urbano em “laboratório de experiências”. É que Chicago recebia
anualmente centenas de milhares de imigrantes e os investigadores consideraram normal
certos comportamentos numa amálgama de culturas, com muita pobreza e marginalidade,
típicas incubadoras para a violência juvenil.
Autores como Machado Pais (1990:151), enfatizam o facto de nas Ciências Sociais
haver duas correntes principais na abordagem da juventude: i) a geracional e ii) a classista. A
diferença entre elas tem a ver com o facto de uma ser homogeneizante e outra
heterogeneizante. A corrente geracional analisa a juventude como uma fase de vida, realçando
os aspetos culturas juvenis homogéneas e valores comuns. As diferenças entre as gerações
dariam o suporte teórico para definir as culturas juvenis em termos etários. Aqui os jovens são
uma geração social em interação com o mundo. Esta conceção articula-se bem com as teorias
de socialização e das gerações.
Já a teoria classista pensa a reprodução social sob a perspetiva das classes sociais. A
juventude é vista como um conjunto social diversificado. As diferenças de classe originam
habitus7 juvenis diferentes. As relações antagónicas de classes produziriam culturas juvenis
diferentes.
7 Habitus é um sistema de disposições, modos de perceber, sentir, fazer, pensar, que nos levam a agir de determinada forma em uma circunstância dada. As disposições não são nem mecânicas, nem determinísticas. São plásticas, flexíveis. Podem ser fortes ou fracas. Refletem o exercício da faculdade de ser condicionável, como capacidade natural de adquirir capacidades não-naturais, arbitrárias. São adquiridas pela interiorização das estruturas sociais. Portadoras da história individual e coletiva, são de tal forma internalizadas que chegamos a ignorar que existem. São as rotinas corporais e mentais inconscientes, que nos permitem agir sem pensar (Bourdieu, 2005:186-188).
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Entre as várias terminologias para designar o estudo sobre a juventude, subcultura,
tribos urbanas e culturas juvenis, Raposo afirma que há uma certa preferência pelo termo
“culturas juvenis” por ser uma perspetiva pluralista de ver a juventude, que não menospreza
um conjunto de valores e representações atribuídos aos jovens enquanto conjunto social
etário. Ligado às culturas juvenis estão os modos de vida específicos, que expressam certas
práticas do quotidiano. 8
Por isso, vendo a juventude como algo em movimento, e para se compreender as
culturas juvenis é preciso conhecer o quotidiano dos jovens, assim como os significados,
valores e representações que dão aos vários espaços, instituições e simbologias. Não há
espaços para apriorismos.
2. População e juventude cabo-verdiana
A população de Cabo Verde tem sofrido um aumento significativo nas últimas
décadas, mantendo no entanto a sua estrutura essencialmente jovem. Os dados do Censo 2010
situam a população residente em 491.875 habitantes, sendo 49,5% do sexo masculino e 50,5
% do sexo feminino, concentrando-se a maioria no meio urbano (61,8%) contra 38,2% no
meio rural. A taxa média de crescimento anual 2000-2010 foi de 1,2%, contra 2,1% no
período anterior. A idade média dos cabo-verdianos é de 26,8 anos e a mediana, de 22 anos. A
esperança de vida é 72,7 anos (76,4 para as mulheres e 68,7 para os homens).9 A taxa bruta de
natalidade tem vindo a diminuir ao logo dos anos, passando de 29,2 por cem mil em 2000
para 25,7 em 2009, um valor ainda considerado alto (Conceição Fortes, 2011:13).
Os jovens representam uma franja significativa da população, sendo que o grupo de
idade na faixa etária entre os 0 e os 24 anos é de 267.639, ou seja, 54,4% da população do
país e 63,4% tem menos de 30 anos. Os dados mostram que a faixa etária da população entre
15-19 anos constitui a principal componente no universo da população cabo-verdiana
(59.079), sendo que os rapazes constituem a maioria (29.679) contra 29.400 raparigas. No
intervalo dos 25-29 anos, os resultados indicam a existência de 23.357 homens contra 21.002
mulheres.
O conjunto da população dos 15-29 anos é de 156.363 habitantes, o que representa
31,7% do total da população do país, sendo que destes 51,5% são do sexo masculino e 48,6%
do sexo feminino, residindo a maioria no meio urbano, com maior peso nas cidades da Praia,
Mindelo e Assomada e Sal. 8 Culturas juvenis podem ser definidas como um sistema de valores socialmente atribuídos à juventude (fase de vida) que orientam as práticas quotidianas que exteriorizam valores institucionais e do dia-a-dia. 9 INE – Censo 2010
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Em termos de distribuição de jovens por ilha, Santiago concentra a maioria dos jovens
de Cabo Verde (58%), seguida de São Vicente (15%) e Santo Antão com 8%.
Segundo Conceição Fortes (2011), o peso da população jovem acaba por exercer uma
forte pressão sobre os recursos e estruturas sociais do país, o que exige uma nova abordagem,
bem como novas políticas sociais focalizadas sobretudo nos campos da educação, emprego,
formação profissional e saúde. Existe ainda a população cabo-verdiana emigrada, mormente a
população juvenil residente na diáspora, que constitui uma parte integrante da nação cabo-
verdiana. Embora não se disponha de dados sobre a juventude cabo-verdiana nos países de
acolhimento, o Censo de 2010 mostra que de um total de 18.522 que emigraram nesse ano,
19,5% situava-se na faixa etária entre os 0-16 anos, 46,9 % entre 17-24 anos e 14,9 entre 25 e
34 anos.10 Por outro lado, sendo Cabo Verde um país também de imigração, muitos são os
estrangeiros residentes (2,9%) correspondentes a 14.373 pessoas, a maioria do continente
africano, incluindo os PALOP (71,7%).
A característica jovem da população alerta para a criação de novas políticas sociais
que devem visar a educação, o emprego e a formação profissional, a saúde, e inserção
socioeconómica deste grupo.
3. Revisitando o PESI-2009
Mottos como terrorismo, tráfico de droga/seres humanos/armas ligeiras, criminalidade
organizada e transnacional e ainda a questão da imigração ilegal já fazem parte do léxico (e da
consciência colectiva) dos cabo-verdianos. A questão da segurança interna parece estar
conectada com a da segurança internacional.
Em Cabo Verde é a Polícia Nacional, conforme o artigo 240º da Constituição da
República, quem tem por missão defender a legalidade democrática, prevenir a criminalidade,
garantir a segurança interna, tranquilidade pública e o exercício dos direitos civis dos
cidadãos. A noção que se tem da segurança nacional, baseia-se no artigo 242º da Constituição
da República, que estabelece o conceito da defesa nacional, como: A disposição, integração e acção coordenadas de todas as energias e forças morais e materiais da Nação, face a qualquer forma de ameaça ou agressão, tendo por finalidade garantir, de modo permanente a unidade, a soberania, a integridade territorial e a independência de Cabo Verde, a liberdade e a segurança da sua população bem como o ordenamento constitucional democraticamente estabelecido.
A elaboração do PESI-2009 visou dotar o país de um instrumento que vai apoiasse o
Governo na implementação de um modelo misto, entre aquilo que Loic Wacquant (2000:22) 10 INE: Censo 2010 citado por C. Fortes, 2001.
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designa de (mundialização da) tolerância zero11 e medidas de prevenção e integração. Nesta
perspetiva, o PESI-2009 definiu alguns Eixos Estratégicos de Acção, visando criar um
sistema nacional de segurança que garantisse a tranquilidade e ordem pública, destacando três
pilares fundamentais: i) Forças Policiais (Polícia Nacional e Polícia Judiciária); ii) SIR
(Sistema de Informação da República), e iii) Forças Armadas, que deverão funcionar de forma
articulada e coordenada, e poder desmantelar as redes do crime organizado.
Os eixos principais procuram destacar: a) o desenvolvimento e implementação de um
Sistema Integrado de Segurança Interna e Nacional; b) Revisão e modernização de
instrumentos legislativos e orgânicos estruturantes e participação no reforço da capacidade
institucional de segurança do país; c) Modernização ou reforma das estruturas e serviços sob
tutela do MAI (Ministério de Administração Interna); d) Reafirmação da autoridade do
Estado e reforço da segurança, em torno do princípio de que a liberdade é indissociável da
segurança dos cidadãos12; e) Combate à criminalidade violenta e luta contra ameaças
emergentes (com base em estudos, intervenção precoce, discussão das causas, e redução da
reincidência); f) Redução da sinistralidade rodoviária; g) Dinamização e fortalecimento da
segurança cooperativa e parcerias, com particular incidência na Parceria Especial com a U.E;
h) Promoção de uma política de imigração integradora.
De todos os eixos, interessa-nos destacar o da delinquência juvenil e a sua redução.
Neste eixo (D) pode-se também realçar algumas estratégias definidas: (E.D.1.) “promover
uma abordagem multi-sectorial do fenómeno de segurança, e (E.D.2.) “colocação em prática
do modelo de policiamento pró-activo, privilegiando a prevenção e aumentando a confiança
na PN”.
Falta ainda um longo caminho a percorrer de modo que alguns objetivos imediatos e
produtos/resultados sejam alcançados. São os casos da coordenação efetiva entre as forças
policiais e o sistema judicial, no sentido de melhorar as respostas sobre questões criminais;
aumentar e melhorar as parcerias entre câmaras municipais, associações comunitárias,
associações juvenis, associações de imigrantes, instituições de solidariedade social; reduzir
práticas de comportamentos antissociais através de sensibilização dos agentes,
responsabilidade social das empresas, campanhas educativas, realização de estudos
aprofundados; prevenção e combate à delinquência juvenil; reduzir a delinquência juvenil
revendo a legislação pra o efeito, envolvendo cada vez mais as entidades públicas no combate
a realidades potenciadoras da delinquência juvenil, mormente o abandono escolar, atos de 11 Gestão policial e judicial da pobreza incómoda, a causa de incidentes e perturbações no espaço público, e portanto alimenta um sentimento difuso de insegurança, ou simplesmente de mal-estar tenaz e de incongruência. 12 Itálico nosso.
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vandalismo, presença de menores desacompanhados de adulto na via pública ou em locais de
diversão a horas noturnas, assim como normas que visem a implementação de mecanismos de
justiça restaurativa; levar a polícia a mudar de postura e práticas, reforçando o diálogo e ações
preventivas com as comunidades e suas organizações, envolvendo a comunidade na luta
contra a criminalidade.
Parece haver uma intenção de superar a ‘tolerância zero’, trabalhando,
preventivamente, mais perto das comunidades, Escola, Igrejas, etc., numa visão mais holista
do problema, de forma a não pôr em causa a visão do PESI-2009 que é «Instituir um sistema
de segurança interna integrado, articulado e cooperativo para manter Cabo Verde como um
dos países mais seguros do mundo com base em padrões mais elevados de segurança
interna».
Caso os implementadores do PESI-2009 não levarem em conta todo o trabalho que
está a ser feito nos bairros/comunidades, aquilo que designo de agendas periféricas de
intervenção, reconhecendo os curricula social dos jovens, todo esse esforço poderá ter um
efeito limitado. Nota-se que a partir de 2012 essas agendas começaram a ter um um impacto
positivo na diminuição da violência e na restauração de um clima de paz e confiança.13
4. Sobre a evolução do quadro de segurança interna em Cabo Verde
O PESI-2009 foi confrontado com uma realidade nova, que se traduz no surgimento e
intensificação de novos tipos criminais, no envolvimento de muitos jovens em actividades
ilícitas e no incremento de um clima de insegurança. A articulação entre as forças policiais
(PN e PJ, o SIR – Sistema de Informações da República) e as Forças Armadas visa melhorar o
sistema de coordenação e articulação dessas forças, de forma a desmantelar redes de crime
organizado e reforço da segurança nacional. Isto tem levado o Governo a modernizar as forças
e serviços de segurança, adaptar os instrumentos legais aplicáveis, capacitar os recursos
humanos, combater a criminalidade organizada e transnacional, investir na segurança
aeroportuária, portuária, marítima, prisional, prevenção do terrorismo, gestão da imigração
ilegal. Parece-nos que a modernização dos serviços de segurança tem consumido mais
recursos que a prevenção da criminalidade; recursos que poderiam ser utilizados para
investigação nos bairros desfavorecidos, no reforço da participação e da democracia
comunitária. 13 Defino Curriculum Social como intervenção comunitária dos jovens dos bairros periféricos com base numa agenda própria (formação, cultura, apoio escolar, atividades tempos livres, artesanato, desporto, etc), com ou sem diplomas, sendo que a maioria não os têm, estando, muitas vezes longe das agendas públicas e dos media. Essas agendas periféricas têm dado uma grande contribuição na resolução dos problemas, mormente da violência juvenil, devido a um trabalho positivo de consciencialização e pacificação dos jovens de bairros pobres.
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Quadro 1 - Evolução do conceito e práticas de segurança interna em Cabo Verde
Ano Iniciativa
Início anos de 1980
Coexistência da POP (Polícia de Ordem Pública) e Segurança do Estado (protecção dos dirigentes), a Direcção Nacional de Segurança e Ordem Pública (DNSOP) que dependia do Ministério da Defesa e Segurança Nacional.
Pós-Independência
A Guarda Fiscal foi integrada no Ministério das Finanças e a PMar (Polícia Marítima) no Ministério de Agricultura e Pescas
1981 Após o golpe de Estado na Guiné-Bissau, surge o Ministério do Interior, departamento governamental que passou a controlar a POP e a Segurança do Estado, denominando-se Forças de Segurança e Ordem Pública (FSOP).
Meados anos 1980
Passou a Ministério das Forças Armadas e Segurança. Em 1991 passou a ser Ministério da Administração Interna (regime democrático multipartidário).
Segunda República
A POP foi tutelada pela Secretaria do Estado, e foi criado o Sistema de Informações da República (Lei nº 70/VI/05).
1993 Foi criada a Polícia Judiciária (PJ), dependente do Ministério da Justiça.
1996 O Decreto-Lei nº15/96, de 20 de Maio, cria o Conselho Nacional de Segurança (CONSEG), órgão consultivo de coordenação e articulação na organização do sistema nacional de segurança.
2005 Cria-se a Polícia Nacional (PN)14, o Serviço Nacional de Protecção Civil e a Direcção-Geral dos Transportes rodoviários, sob a dependência do MAI.
27 Junho 2005 Aprovada a Lei nº70/VI/2005 que cria o Sistema de Informações da República (não confundir com Serviços de Informação da República –SIR).
2008 Criação do BIC (Brigada de Investigação Criminal) e o BAC (Brigada Anti-Crime), no sentido de combater os grupos considerados thugs.
2012 Criação de um Corpo Especial da Polícia (em motorizada) com apoio de Angola. Fonte: PESI-2009, p.15.
O país, com todo este aparato, parece não dispor ainda de um verdadeiro sistema de
segurança. Observa-se mais tecnologias e força, como diria Foucault em Vigiar e Punir
(1999:5) «O castigo passou de uma arte das sensações insuportáveis a uma economia dos
direitos suspensos».15
Segundo Michel Foucault: Prisão e polícia formam um dispositivo geminado; sozinhas elas realizam em todo o campo das ilegalidades a diferenciação, o isolamento e a utilização de uma delinquência. Nas ilegalidades, o sistema polícia-prisão corresponde a uma delinquência manejável. Esta, com sua especificidade, é um efeito do sistema; mas torna-se também uma engrenagem e um instrumento daquele. De maneira que se deveria falar de um conjunto cujos três termos (polícia-prisão-delinquência) se apoiam uns sobre os outros e formam um circuito que nunca é interrompido. A vigilância policial fornece à prisão os infratores que esta transforma em delinquentes, alvo e auxiliares dos controles policiais que regularmente mandam alguns deles de volta à prisão.
5. Contribuições socio-antropológicas para o debate
Até que ponto a abordagem que se tem utilizado em Cabo Verde na prevenção e
combate à criminalidade, sobretudo, a juvenil, é conservadora/funcionalista? Se assim for, faz
sentido então recorrer a Roy Wagner (1974:96) que defende, assim como uma boa parte de
14 A criação da PN visou reforçar a capacidade operacional e racionalizar os recursos materiais e humanos, com mais coordenação e articulação entre as partes. 15 Idem p. 301.
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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cientistas sociais, que Durkheim influenciou em muitos aspectos o legado da antropologia
social, quando procurou compreender a moral social/colectiva, aquilo que une as pessoas e faz
uma sociedade sentir-se ‘coesa’. Durkheim fundou a ciência da integração, o que leva as
pessoas a se associarem. Esta questão de integração foi a base natural em que se fundou a
Antropologia. Durkheim é considerado o pai do funcionalismo clássico (perspetiva que
influenciou autores como Radcliffe-Brown). Ele está mais preocupado em conhecer ou
explicar como funciona as instituições e como conseguem manter uma sociedade unida.
Em Cabo Verde, os políticos e alguns investigadores, assim como os media têm
seguido esta linha de análise que tende a ver os conflitos sociais (criminalidade incluída)
como patologia, anomia e não como necessidade de renegociação permanente do poder entre
grupos, ou seja, não se dá importância às funções sociais do conflito numa perspectiva que
Lewis Coser nos habituou, como evolução da mudança social. A perspectiva conservadora
tem pautado por revelar os músculos e aparato policiais (tolerância zero).
Lewis Coser (1956:151) reconhece que o objeto principal do seu estudo se prende
mais com as funções do que com as disfunções do conflito social. O autor sente que o
conflito, longe de ser um fator meramente negativo, pode cumprir uma série de funções
sociais determinantes. É uma forma de socialização”, nenhum grupo pode ser completamente
harmonioso, o que equivaleria a ser destituído de dinâmica e de estrutura. Os grupos requerem
tanto a harmonia como a desarmonia, a associação quanto a dissociação. Nestas condições, o
conflito dentro dum grupo pode ajudar a estabelecer ou restabelecer a unidade e coesão onde e
quando tenham sido ameaçadas por sentimentos hostis ou antagonistas entre os seus
membros. É evidente que nem todos os tipos de conflito beneficiam a estrutura do grupo, o
que depende das razões que os determinam bem como do tipo de sociedade em que ocorrem.16
Coser considera ainda os conflitos classificáveis em dois grandes grupos quanto aos
seus objectivos: realistas e não realistas. São realistas aqueles que pretendem atingir
resultados concretos, não tendo os contendores qualquer interesse em prossegui-los uma vez
que os mesmos tenham sido alcançados. Os não realistas, por outro lado, decorrem da
existência de tensões que têm que ser libertadas, são um fim em si mesmos e assim apenas
dispõem de alternativas funcionais quanto à escolha dos antagonistas.17
De notar, entretanto, que as referidas associações de indivíduos ou coligações de
grupos resistem normalmente a outras formas de unificação, prolongando desse modo a sua
16 O conflito social será provisoriamente tomado como significando uma luta por valores e reclamação por “status”, poder ou recursos escassos, em que os objetivos dos oponentes são neutralizar, ferir ou eliminar os seus rivais. As atitudes hostis são apenas uma predisposição para entrar em conflito enquanto este, ao contrário, é sempre uma transação. 17 Coser op cit, p. 156.
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vigência como mecanismo dinâmico de regulação social. Pode ainda acrescentar-se que a
multiplicidade dos conflitos está na razão inversa da sua intensidade. A frequência com que os
mais diversos líderes fomentam conflitos artificiais com grupos exteriores corresponde
exactamente a uma procura de unidade no seio do próprio grupo. As inimizades e
antagonismos recíprocos padronizados conservam, por outro lado, as divisões sociais e os
sistemas de estratificação, evitando o gradual desaparecimento das fronteiras entre os
subgrupos do sistema social e atribuindo-lhes dentro de tal sistema a posição que lhes
compete. Coser considera também que a frequência de ocasiões para o conflito varia no
mesmo sentido do grau de estreitamento de relações.
Mas, quaisquer que sejam os objectivos das partes em conflito, o poder, que Coser
define como a oportunidade de influenciar o comportamento dos outros de acordo com o
nosso próprio desejo, são necessários para a sua concretização. Como o conflito consiste num
teste de poder entre as partes antagónicas, a acomodação entre elas apenas é possível se cada
uma estiver ciente da sua força relativa, mas tal conhecimento, na maior parte das vezes,
apenas pode ocorrer através do próprio conflito (idem p.121).
Coser sublinha que o próprio acto de entrar em conflito, significa que tenha sido
estabelecida uma relação com a outra parte. O conflito para Coser traz consigo a necessidade
de aplicação de regras que, na sua ausência, poderiam ficar adormecidas.
6. Contribuições teóricas recentes sobre violência juvenil em Cabo Verde
Kátia Cardoso e Sílvia Roque (2008:5), relacionam a violência dos jovens na Cidade
da Praia, numa fase inicial, ao repatriamento dos jovens emigrantes cabo-verdianos expulsos,
que cometeram crimes nos Estados Unidos de América.
Vão mais longe ainda, procurando também relacionar a questão da violência com as
identidades construídas e estimuladas, assim como compreender os mecanismos de controlo
social. Neste sentido, procuram perceber se existem oportunidades de superação da condição
de marginalização: estratégias individuais (emigração, economia informal, prostituição) ou
colectivas (remessas de familiares no estrangeiro ou apoio de familiares alargados).
Para elas, é evidente que uma urbanização descontrolada pode levar à anomia social, o
que permite o surgimento de gangues. Neste processo, a própria estigmatização dos jovens faz
com que assumem estereótipos e rótulos e agir de acordo com eles. Realçam três aspectos que
têm a ver com a formação de gangues como modelos de inserção e coesão comunitária: (i) a
questão da masculinidade como forma de obter bens, dinheiro, respeito e mulheres (que pode
ser violento ou não); (ii) a questão da globalização como (mecanismo) e mercado de obtenção
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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de armas ligeiras e drogas (via marítima e aérea); (iii) e uma pobre abordagem da violência
em Cabo Verde, feita pelos media de forma superficial e enviesada.
Lorenzo Bordonaro (2010:170), tem tido uma postura mais crítica em relação à forma
como o Governo de Cabo Verde vem lidando com a questão da violência juvenil. Defende
que as medidas repressivas têm sido a via que Cabo Verde tem usado para enfrentar o
fenómeno da delinquência juvenil. A ideia subjacente do autor é que os jovens envolvidos na
criminalidade não aceitam passivamente a sua vitimização estrutural. Estes envolvem-se,
orgulhosamente18 na economia subterrânea e na cultura de rua.
O autor defende ainda que «esses jovens e crianças desses bairros são alvo de
agências sociais do governo, e da repressão violenta das forças policiais e repressivas do
Estado». Recorrendo aos dados do INE, o autor, identifica e bem o desemprego como um
problema muito sério em Cabo Verde: A situação da população juvenil nas áreas urbanas é, de facto, particularmente crítica. As taxas de desemprego nas áreas urbanas são assustadoras, chegando a um valor de 57% entre os indivíduos do sexo masculino com 15 a 24 anos (Bordonaro, 2010:171).
Em Cabo Verde, a questão dos dados estatísticos parecem ter criado certas confusões
na produção/interpretação dos mesmos. Quando confrontamos os dados do INE (2007)
utilizados por Bordonaro e os usados pelo PESI (2009), que diz que «Em 2008, a taxa de
desemprego era considerada de 17,8%, sendo que 31% dos desempregados são jovens (15-24
anos)»19 fica-se com algum ‘receio’ na utilização dos dados estatísticos. Os dados recentes do
INE (2013) apontam para 27% a taxa de desemprego jovem.
Fonte: INE (2012).
18 Itálico nosso. O autor quase que entra em contradição quando afirma que os jovens abraçam ‘orgulhosamente’ esse modus vivendi marginal, porque procuram fugir à sua marginalização. Na nossa perspetiva, esse ‘orgulho’, por falta de alternativas, com o tempo pode se transformar em habitus criminal, que será difícil fazer desaparecer. 19 Ver PESI-2009, p. 21.
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Outra questão que o autor deve estar atento tem a ver com uma certa ‘generalização’,
quando lê o continente africano numa perspectiva horizontal com base em estudos vários:
Nas áreas urbanas em todo o continente, os jovens parecem constrangidos a permanecer jovens (dependentes, carentes, celibatários) com dificuldades no acesso a salários, ao casamento ou a uma residência autónoma, numa situação (…) de moratória social (idem p172).20
O autor, com base em dados recolhidos na Cadeia Central da Praia, diz-nos por
exemplo, que muitos jovens aprendem mais sobre o crime quando entram na prisão. Para
além disso, os jovens têm uma perceção de que em Cabo Verde, o modus operandi para
combater/resolver o problema da criminalidade é mete-los na prisão. As prisões para além de
não servir para melhorar pedagogicamente’ o delituoso, acaba por dar azo à aquisição de
novos vícios e acesso à droga, mantendo a toxicodependência. Como diz, existe uma ligação
entre pequenos crimes e consumo de drogas: «Na verdade, os jovens criminosos são, na sua
maioria, toxicodependentes».21
Para o autor, o acesso a símbolos materiais definidores de status e o anseio por uma
certa mobilidade social ascendente, e a percepção que possuem de que é difícil ter acesso ao
poder e privilégio, assim como a pobreza e miséria, são os motores para o consumo de droga e
aumento da criminalidade em Cabo Verde: O crime, a violência, os flashes da cocaína são, (mais do que satisfação das necessidades básicas), instrumentos para aumentar o seu poder, a sua presença social, para ampliar o seu self e proclamar a sua identidade (…) são instrumentos daquele empoderamento (social, pessoal, económico) que ambicionam e que teriam dificuldades em alcançar de outra forma (Bordonaro, 2010:177).
Discordo em parte do autor, apesar de reconhecer que muitos jovens têm dificuldades
em ter acesso a tudo o que desejam e que são penalizados pela sua origem social. Porém, o
autor continua a generalizar e não se apercebe que grande parte dos cabo-verdianos sempre
teve grandes dificuldades na vida. Se essa visão fosse a norma, a maioria dos jovens cabo-
verdianos enveredaria para o consumo de droga e criminalidade, e deixaria de ver a escola
como um dos pilares para uma certa mobilidade social ascendente. O problema transcende
esta visão meio redutora do fenómeno. Seria interessante que o autor abordasse a questão da
responsabilidade pessoal e social. É que os jovens como seres reflexivos têm a capacidade de
fazer opções. E cada opção acarreta consequências. 20 Convém salientar que a situação de Cabo Verde, apesar de problemática, não é comparável à da Guiné-Bissau. Também é bom lembrar que na Europa, países como Itália, Espanha, Portugal, o desemprego tem estado acima dos 17%. No caso da Itália, nos últimos 4 anos, emigraram cerca de 1 milhão de jovens e quadros (Brain Drain). E desse um milhão de novos emigrantes, 1,3% está em África (Vide artigo de Vladmiro Polchi, “Gli italiani continuano a emigrare un milione in fuga negli ultimi 4 anni” no Jornal La Repubblica de 2 de Dezembro de 2010). 21 Bordonaro, op cit, p. 175.
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Contudo, o autor parece querer resolver esse problema, dizendo que esses actos
etiquetados como violentos e realizados pelos jovens em Cabo Verde, são actos produtores de
significados, que reconstroem e reordenam o mundo social e a posição do actor nele,
procurando articular-se com a estrutura.
Bordonaro considera que a polícia ainda não aprendeu a lidar com o fenómeno da
delinquência juvenil, o que traz uma tripla pressão: i) da parte dos jovens, combater o crime e
fazer a prevenção; ii) do lado da sociedade (ineficácia e morosidade e insatisfação pelos
serviços prestados); iii) e da parte do governo, dar resposta e serenidade à sociedade. Esta
incapacidade e pressão têm levado a polícia a cometer actos de violação dos direitos humanos
desses jovens (feridas, cicatrizes, espancamento, etc.). Diz e bem que a atitude do sistema
prisional em Cabo Verde é punitiva (pouca reabilitação, formação profissional e educação). A
prisão é punição pelo crime que cometeu. São espaços sem condições, sobrelotados (idem
p184).
Outro trabalho recente sobre este fenómeno em análise é o de Redy Lima (2010:194).
O autor refuta com convicção a ideia de que a escola e a família não têm peso nessa ‘crise’
actual da juventude cabo-verdiana. É pouco claro quando considera os anos de 1990 como a
década de libertação juvenil e da consolidação da visão da camada juvenil, como sendo uma
categoria social mais problemática, e ainda o ano das políticas públicas para esse segmento.
Não diz que tipo de liberdades e políticas públicas foram ‘inventadas’. Considera os jovens de
bairros periféricos: (…) desafiliados ou em processo de desafiliação, expostos a uma série de situações discriminatórias, em parte, por habitarem esses bairros – bairros estigmatizados e criminalizados (…) o conceito casteliano de desafiliação para designar um conjunto de indivíduos entregues a si próprios (…) em situação de pobreza, falta de emprego, sociabilidade restrita, riscos (…) em condição de vulnerabilidade.
Consideramos que esses jovens não são discriminados por pertencerem/viverem
nesses bairros, mas pelo facto de terem começado a praticar um tipo de violência que vai
crescendo e tomando proporções preocupantes, mesmo para os habitantes desses bairros
miseráveis. É um tipo de violência quase sádica que prejudica os próprios moradores e não é
praticada somente contra os centros. Quem mais sofre violência são os grupos de pares e
moradores dos bairros.
Ao tentar condenar o papel da escola em Cabo Verde, o autor, talvez sem querer, vê a
escola cabo-verdiana como um instrumento e representação das classes dominantes. Na nossa
perspetiva, durante muito tempo a escola tem sido mais democrática que o sistema político
implementado em 1991. A escola em Cabo Verde, bem ou mal, tem sido um dos principais
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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agentes que tem permitido a mobilidade social ascendente de uma boa parte da juventude
cabo-verdiana, dotando-lhes de competências e ferramentas necessárias.22 A escola não é vista
como prisão, muito pelo contrário, tem servido como libertação da prisão, uma janela para o
mundo, e não um espaço de violência simbólica e física tout court. Este cenário aplica-se mais
nos casos da diáspora cabo-verdiana na Europa e nos Estados Unidos. O abandono escolar
não se deve à fuga por causa da violência simbólica e física, mas a vários factores (pobreza,
vulnerabilidades, desemprego, trabalho infantil, desresponsabilização familiar/paterna. etc).
Os jovens não são discriminados somente pelo facto de pertencerem aos bairros
miseráveis, aquilo que denomino de societas miserabilis23, mas sim pelo facto de praticarem
atividades delituosas, que têm deixado marcas profundas nas comunidades e nos corpos dos
seus habitantes (feridas por bala, faca, pancadas, etc).
Consideramos que a violência tem vindo a assumir algumas características para certos
jovens que vivem este fenómeno de mal-estar juvenil: i) Violência (gratuita) como
afirmação de identidade e legitimação do poder (Existir como indivíduo/grupo e pôr em
prática o estilo de vida. Neste sentido, tudo o que põe em causa este desiderato e status pode
levar à violência com grupos/bairros rivais, polícia, símbolos do Estado, etc.); ii) Violência
como afirmação da Masculinidade (Ethos guerreiro, ser duro, macho, impressionar as
raparigas pela coragem, bravura e disposições corporais - tatuagens, músculos); iii) Violência
como moda e virada para o Consumo (Cultura do imediato, dinheiro, festa, hedonismo,
consumismo, prazer através dos produtos da indústria cultural).
Outra reflexão interessante sobre a violência juvenil em Cabo Verde é a do sociólogo
João José Tavares Monteiro (2010). O autor, um pouco à Foucault24, procura fazer uma
genealogia desse processo. Esta investigação para além de inovadora, interactiva e intensa,
usa a metodologia de análise de conteúdo para estudar as representações negativas nos jornais
Voz Di Povo (de 1986-1990), A Semana e Expresso das Ilhas (de 1999 a 2006). Para além dos
jornais, o autor analisou também as letras musicais (rap), estudou/conviveu (com) dois grupos
rivais dos bairros de Achada Grande Frente e Lém-Ferreira, com idade compreendida entre os
16 e 24 anos, durante mais de 12 meses.
22 Não podemos esquecer a merenda escolar que permitiu que a maioria dos jovens tivesse uma refeição quente; do ICASE (FICASE), etc. Como país de fracos recursos, a educação tem sido, a par com a saúde, duas grandes apostas ganhas por Cabo Verde. 23 Societas misarabilis «(…) as pessoas vivem de uma forma desumana, (…) barracas construídas à pressa, sem acabamento, fedores, ruas sujas, animais com mau aspecto, crianças ‘mal educadas’, ‘violentas’, brincando constantemente em porcarias; uma degradação humana, onde o ambiente envolvente tenta erradicar a própria dignidade humana. (Nardi Sousa, 2003:23). 24 No papel de um arqueólogo do saber com maior interesse nas práticas/camadas discursivas que dão origem a um tipo de saber numa determinada época (Ver Arqueologia do Saber, pp 158-159).
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Tavares Monteiro considera que o fenómeno thug se enquadra num conjunto de
processos sociais que se desenvolveram na sociedade praiense e que se estruturaram, com
forte influência mediática, a partir do ano de 2004, criando pânico social, e transformando-se
num problema social, político e sociológico (com representações positivas e negativas). Se
por um lado, procura compreender se as representações sociais positivas do fenómeno thug,
mediadas pelas influências da cultura hip hop, e pela valorização da mesma por uma parte da
camada juvenil feminina, reforçaram a adesão de muitos jovens a este movimento; por outro
lado, foca no papel dos media (sobretudo a imprensa escrita), que, juntamente com a Escola,
criou representações sociais negativas com base na estigmatização, marginalização e
condenação desses jovens, ‘contribuindo’, com essa exclusão, para a coesão de muitos jovens
de bairros desfavorecidos a este movimento
Esta imagem negativa criada pelos media, para além de ter provocado coesão (dos
jovens) e pânico social, deu azo à (re) pressão policial sobre os jovens, criada e forjada
‘negativamente’, recalcada através da música beef, pode ter reforçado a falsa identidade thug.
Isto tem vindo a reforçar a coesão do grupo, que se verifica através do grau de lealdade,
competição e rivalidade, ‘espírito’ de vingança e tentativa de protecção dos grupos (João
Monteiro, 2010:28).
7. Sobre a problemática juvenil
Não há dúvidas que se está a dar uma certa propensão de crianças e
adolescentes/jovens à criminalidade e violência. Alguns autores consideram que as situações
de maiores riscos estão estritamente associados à precariedade socioeconómica. Tanto nos
problemas da pequena infância, das crianças em risco no mundo do trabalho, das crianças em
situação de risco na rua, como na exploração sexual e maus tratos. Verificam-se dificuldades
tanto da família, da comunidade, assim como do sistema escolar em reter de forma protectora
as crianças oriundas de famílias seriamente atingidas pela pobreza. (J. C. Anjos e F.
Rodrigues, 2009:7).
Nesse estudo, a principal preocupação das crianças e adolescentes reunidos é com
recrudescimento da violência juvenil: A emergência de um ethos que associa violência, honra e identidades territoriais, transforma os bairros da capital em fortificações visíveis e intransponíveis apenas para os jovens que mergulham nessa cultura de rua. Num espaço geográfico relativamente pequeno a livre circulação dos adolescentes que vivem em situação de rua se vê hoje seriamente prejudicada. Um regime de codificação de acessos bloqueia passagens e torna perigosa a circulação pelos bairros periféricos da capital. A formação de gangues e o uso de armas de fogo (geralmente de
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fabricação artesanal) transformou a capital do país no palco de uma cultura juvenil da violência em meio a uma expansão das redes do narcotráfico.25
Segundo os autores, entre os adolescentes existe um certo pessimismo generalizado
em relação às possibilidades de controlo da violência crescente. Entre as crianças em situação
de rua é percetível uma auto-culpabilização e uma projeção pessimista em relação ao futuro
de modo geral. A violência policial, a falta de equipamentos que ofereçam alternativas aos
atrativos das ruas e a inconsistência ou ausência de propostas de formação profissional podem
ser percebidos como factores subjacentes a essas perspectivas negativas. Na rua, essas
crianças e adolescentes deparam-se com um quotidiano que associa exposição ao abuso e
exploração sexual e violência.
A nossa reflexão sobre o mal-estar da juventude começou a partir de 1997 nos bairros
de Lisboa e Amadora, sobretudo Venda Nova, Fontaínhas, Estrela de África, Buraca,
mormente em 2002, ao trabalhar no Programa Escolhas, do Governo português, programa de
Prevenção da Criminalidade e Inserção dos Jovens dos Bairros Vulneráveis dos Distritos de
Lisboa, Porto e Setúbal.26
Nessa altura, já chamava atenção que cidades com forte segregação urbana e
residencial e as más políticas de realojamento poderiam aumentar os problemas de
marginalização e criminalidade (Nardi Sousa, 2002:163-164): Esses lugares onde só existem pobreza funcional, casas degradadas, equipamentos insuficientes, delinquência, crime, desemprego, fraca mobilidade, pouca informação, insucesso escolar, não convém menosprezar o desenvolvimento do partenariado e da solidariedade que conduzem à integração e congregação. A participação de todos é uma força determinante não só na preservação da herança como na rejeição de projectos que não respeitam essa lógica.
O estudo dos jovens nos bairros degradados ou periféricos, ou em locais que os
próprios jovens chamam de gueto, é de extrema importância. Loic Wacquant (2002), já dizia
que as ciências sociais falharam por não terem desenvolvido um conceito analítico e robusto
de gueto, e que em vez disso contentaram-se em emprestar um conceito folclórico aos
discursos político e popular de cada época. Isso gerou confusão e o gueto passou a ser visto
como um espaço segregado, uma comunidade etnicamente homogénea, um território de
grande pobreza ou de casas abarracadas, onde existe o mito/crescimento de uma ‘underclass’,
uma mera acumulação de patologias urbanas e comportamentos antissociais.
O gueto, na perspetiva do autor, é uma invenção socio-espacial que permite que um
grupo dominante da área urbana oprima e explore simultaneamente um grupo subordinado
25 Anjos et all op cit, p. 35. 26 Resolução do Conselho de Ministros nº 4/2001 – Governo Português.
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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caracterizado por um capital simbólico negativo. Neste sentido, verifica-se uma relação de
controlo etno-racial e de fechamento construído por quatro elementos: (i) estigma; ii)
constrangimento; (iii) fronteiras territoriais; (iv) fechamento institucional. Surge um espaço
distinto, com uma população banida, com estilos de vida e estratégias específicas. O gueto
torna-se numa prisão que alberga uma categoria desonrada com oportunidades limitadas para
os seus membros. Muitas vezes, as populações dos bairros fingem que ignoram o que lhes tenta camuflar. Bloqueados, paralisados por este décalage entre o ressentido e o que projectam para o exterior, não tardam em desenvolver uma raiva surda, sufocada (…) até uma certa agressividade. Uma frustração que os conduz inexoravelmente em direcção a um estado de insatisfação permanente, tornando-os vulneráveis. (…) é assim que se instala o mal-estar. As pessoas chegam à conclusão que de que se vive em duas velocidades, dado que o todo o pensamento de outros lhes escapam e que os delas são estranhos aos outros. Nesta caça, onde a classe dominante é sempre o caçador, os oprimidos contentem-se com o papel de presas. (…) desenvolvem, muitas vezes, uma contracultura oposta à erudita e passam da lógica académica à comercial em que o lazer se torna num produto a consumir(…)».27
Os jovens que habitam os bairros degradados, ou guetos, podem se transformar em
presas fáceis da delinquência juvenil, do tráfico de droga e do consumismo desenfreado.
Nesses bairros existem poucas ofertas de participação, de formação profissional adequada que
colmate o défice crónico de cidadania, de socialização académica e problemas familiares.
À semelhança do que aconteceu com os bairros de imigrantes cabo-verdianos no início
do ano 2000, os bairros desfavorecidos poderão se transformar em ‘corredores’ ou a ponte
com a prisão. Esses jovens correm o risco de deixarem a escola e ir parar à prisão.
Muitos desses jovens, pertencentes a estas famílias, encontram-se numa trama de
relações que fazem brotar um húmus propício para a aventura da delinquência juvenil,
decorrente de uma certa fragilização da autoridade e de ambivalência dos referenciais de
conduta e identidade, conforme um estudo sobre Jovens em Conflito com a Lei, que inquiriu
cerca de 101 jovens na tentativa de elucidar a problemática da conflitualidade dos jovens com
a lei e na adopção de medidas e estratégias apropriadas e aptas a possibilitar uma intervenção
articulada (Gabriel Fernandes e José P. Delgado, 2008:81): Quando questionados sobre a razão da infracção, 40% dos inquiridos responderam “influência”, 5,7% alegaram “efeito da droga” e 11,4%, “brio de corpo”. Da mesma forma, quanto aos motivos de agressão, 30,8% responderam “a mando de amigos”, 7,7%, a mando de alguém, 7,7%, para exibir perante os outros e 15,4%, por prazer/diversão. Dados enfatizam o facto de que a vivência social dos jovens em conflito com a lei tende a decorrer na rua, um espaço alternativo ao lar, e que garante pão, aprendizado e castigo. A droga desponta como o principal factor de encaminhamento dos jovens para o delito, tendo sido apontado como móbil por 87,3% dos jovens do grupo dos 16 aos 21 anos. Os delitos de maior ocorrência são: roubo, furto e assalto, cerca de 80%, homicídio, cerca de 14%, e tráfico de drogas, cerca de 6,5%.
27 Nardi Sousa, 2003, p. 160.
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Caso os jovens assumirem um ethos/praxis e criminalidade e atos delituosos como
forma de interação com a sociedade podem cair no aforismo de William Thomas da Escola de
Chicago (década de 20 do século passado) «Se as pessoas definem a situação como real, ela
será real nas suas consequências».
Alguns autores são de opinião que nos bairros periféricos da Praia, grupos “semi-
organizados” de jovens proliferaram-se, os denominados “thugs”, “grupos” rivais que se
confrontam, resultando, algumas vezes, em morte prematura (Tavares Monteiro, 20010:39): São jovens desempregados, que usam drogas leves, de famílias monoparentais, ‘enclausurados’, expulsos da escola, sem projecto de vida. Esses jovens têm uma opinião muito negativa sobre a polícia (considerada como ladrões, bandidos, torturadores, mentirosos, corruptos, etc). A partir do ano de 2008, começam a denunciar os abusos e maus-tratos sofridos nas mãos dos polícias. Já não são vistos somente como delinquentes, são também vítimas. Muitos são reincidentes.
8. Revisão do conceito/Genealogia Thug
Parece que em Setembro de 2009, segundo um inquérito do Ministério de Justiça,
havia na Cadeia Central da Praia cerca de 127 jovens dos 16 a 21 anos de vários bairros da
cidade. Consta que nos anos de 2005 e 2006, os jovens nessa faixa etária foram parar em
massa à prisão, tentando reorganizar-se no interior da mesma.
Tavares Monteiro ao querer ‘desenhar’ a génese e trajetória thug, acabou por cair um
pouco na armadilha da concetualização inglesa da palavra thug, assumida pela Standard
Dictionary of the English Language de 1962, como uma forma de organização religiosa,
assassinos profissionais do norte da Índia. Porém, consegue fugir dessa definição, dado que
também vê o fenómeno como moda (forma de ser e estar na sociedade, valorizada por jovens
que adoptaram a subcultura hip hop), e ainda “como comportamentos antissociais
(delinquência juvenil). Vê os thugs como um movimento que congrega expressões de novas
identidades juvenis que acompanham as dinâmicas sociais globais e locais: Aos poucos foi associado às representações sociais dos crimes kasubodi aos repatriados dos EUA, até tomar a dimensão dum fenómeno propriamente sociológico. (…) Com efeito, através de uma imagem estereotipada, estes ‘grupos juvenis» emergentes ficaram a ser conhecidos nos meios jornalísticos como jovens delinquentes em conflito com a lei, entre outras expressões até a designação do termo “thug”. (João Monteiro, 2010: 11-12).
O termo thug passou a ser visto não como símbolo de delinquência juvenil, mas
também como um estilo de vida com características específicas. Receberam o rótulo de
delinquentes, antissociais e incapazes, vêm violados os seus direitos de cidadania (falta de
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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oportunidades e barreiras para o desenvolvimento pessoal e humano), reagem negativamente,
ocultando as suas competências (positivas) que poderiam disponibilizar à sociedade.
Pode-se considerar que os media, a partir de 2004, ajudaram na adesão e coesão de
jovens masculinos, da maioria dos bairros degradados da Praia, a grupos rebeldes e
‘americanizados’ (que se encontravam na fronteira entre a permanência e o abandono
escolar). É a partir dos anos 2006 e 2007, que este fenómeno sociológico ganhou contornos
preocupantes, transformando-se numa questão social e política.
Tavares Monteiro considera ainda que os deportados encabeçaram os primeiros grupos
thugs, verificando-se paulatinamente a adesão dos jovens dos bairros pobres. No início, esses
jovens faziam assaltos (kasu bodi) fora dos seus bairros, em todas as zonas da cidade da Praia,
para obter algum dinheiro para casa e para diversões noturnas. Com o tempo, esta praxis
propagou-se, levando a maior adesão e coesão para uma melhor proteção e controlo do
território de pertença (autodefesa) contra grupos rivais. O que provocou “enclausuramento”
dos jovens nos bairros (limitação de circulação), daí o aumento de conflitos entre bairros, com
as suas regras próprias de grupos (defesa/proteção/controlo do território/impedimento de
assaltos/invasão de grupos rivais na área de residência), o que aumentou a proliferação de
armas de fogo e intensificação dos conflitos. O enclausuramento e rivalidades, assim como os
assaltos, criaram ambiente para o surgimento de primeiros homicídios entre grupos rivais.
E é nesse período que os novos-entrantes, jovens com idade compreendida entre os 16
e 24 anos de idade (que frequentavam entre a 6ª classe e o 12º ano), procuram criar novas
formas de sociabilidade. Os conflitos rivais obrigam muitos a abandonar as escolas,
bloqueando a trajetória académica, adiando perspetivas profissionais, fazendo com que os
jovens vagueiam pelos bairros que não oferecem nenhuma alternativa para a ocupação dos
tempos livres. Dessa forma, esses jovens criam e recriam (des) ordem social periférica com
base nas suas próprias leis e valores simbólicos, onde as instituições como a família ou o
Estado, entre outras, tendem a perder significado. É assim que o hedonismo, o imediatismo
tout court, assim como o sexo, o álcool e as drogas se tornaram comum entre os grupos,
provocando depressão, processos judiciais, inimigos, tristeza às famílias das vítimas, pressão
social, estigma, assim como o consumo de droga, tiroteios nos bairros, kasu bodi, ajustes de
conta, extorsão, vingança, torturas de grupos sobre indivíduos:
O trabalho de pesquisa de João Tavares Monteiro, de que fui orientador da
monografia, trouxe informações interessantes, como por exemplo, nos finais da década de
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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1980, o grupo mais conhecido era, segundo o Jornal Voz di Povo os “netinho de vovó”28,
composto por adolescentes que cedo começaram a “vida na rua”. Nos finais dos anos de 1990
e inícios do ano 2000 surge o fenómeno dos deportados no jornal A Semana, e nos finais de
2004 a questão dos grupos de adolescentes designados “thug” no Jornal Expresso das Ilhas.
Outro momento interessante dessa pesquisa é quando o autor pede os jovens para
autodefinirem thug: Thug são pessoas normais, que gostam de vestir roupas largas, que adoptaram uma nova forma de andar, gesticular e falar. Andam em grupos de amigos e são unidos. Organizam festas e gostam de estar bem vestidos (moda hip hop). O thug está inserido no grupo que o defende e ao qual deve fidelidade. São pessoas com vida difícil e convivem muito com amigos. (…) Thug é diferente de gangs (considerados mais violentos). É um revoltado com a sociedade e não aceita abusos. Os que não podem comprar roupas e acessórios (brinco, chapéu, ténis, botas, calças, t-shirt), dão kasu bodi. Thug gosta de festas, bebidas, mulheres e discotecas. Adoram a cultura hip hop. Usam o rap para criticar a sociedade e reenviar mensagens de revolta para outros grupos rivais (beef) e chamar atenção das raparigas (”rap romântico”) (João Monteiro, 2010:105).
Nessa perspetiva, podemos ver que os thugs estão entre a revolta e a criminalidade,
adoram o rap e hip hop. São jovens que tinham por hábito agrupar-se para festas, jogos ou
danças, e que são amigos desde infância. No início era mais a influência do hip hop, sem
brigas, roupas largas, etc. Os conflitos vieram reforçar o enclausuramento e complicar a vida
deles. É interessante notar que esses jovens vêm no rap um estilo, forma de expressão e
manifestação que critica os alicerces do poder, as desigualdades social, a política, económica. É o estilo musical mais apreciado por esses jovens. Serve tanto de combustível para revoltas juvenis, como para
criar momentos positivos.
Numa perspetiva mais crítica, podemos ver que a categoria thug surge, como já foi
enfatizado, juntamente com o aumento considerável da violência juvenil urbana, sobretudo
nalgumas zonas das cidades da Praia e do Mindelo que se transformaram em arenas de mal-
estar e confrontação juvenil. Os media enfatizam imagens e notícias sobre esse mal-estar:
violência gratuita, confrontação e homicídios perpetrados por jovens de bairros ‘a evitar’,
usando uma expressão cara a Loic Wacquant (2008:1) que nos leva a recorrer, por sua vez, a
léxicos topográficos como bairros periféricos, ghetto, periferia para designar bairros e
comunidades estigmatizados, residências dos párias, daqueles que começam a ser indesejados,
desprezados pela sociedade (Nardi Sousa, Jornal Asemana nº1055, p6, 27 de Julho de 2012) 28 Expressões usadas nos Jornais - Jornal Voz di Povo (1986-1990): Assaltos, Ladrão, Roubos, Mascarados, Intrusos, Furtos, Larápios, Bandos, Meliantes, Quadrilha, Pequenos Ladrões, Grupos de Gatunos, Assaltantes, Grupos de Assaltantes./Jornal A semana (1999-2003): Repatriados Americanos, Terror, Deportado, Marginais, Vândalos, Gangs, Homicidas, Assassinos, Matadores./Expresso das Ilhas (2004-2007): “Caço-Body”, Assaltos, “Thugs”, Esfaqueamento, Grupos Rivais, Marginais, Grupos delinquentes, “Ataques”, Agressões, Venda de drogas, Assassinos, Espancamentos, Bandos de thug, Grupos organizados./A Semana (2005-2006): Gangs, Assaltantes, Incapuçados, Grupos de thugs, Bando rivais, Facadas, Grupos de kasu bodi, Grupos de jovens marginais, Jovens delinquentes, “Grupo X”, “Grupo y”. (João Monteiro, 2010:98).
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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A grande limitação desta rotulagem thug tem a ver com o facto de este termo atribuir
per se todos os mal-estares aos jovens de comunidades pobres e marginalizadas, que
começam a ser transformados em novos bodes expiatórios dos problemas sociais. O termo
não serve para explicar a amálgama de problemas que esses jovens enfrentam como vítimas e
agentes (abandono escolar, pobreza urbana, consumo de álcool e estupefaciente, assaltos,
crimes, confrontos, desemprego, acesso a armas de fogo, desigualdades sociais, perseguição
policial, etc.).
Se os investigadores e a sociedade focarem neste rótulo, para além de reforçar a
identidade desses mal-amados, incompreendidos e indesejados, provocam a sua coesão
grupal, propositadamente vai-se apostando paulatinamente na tríade:
Polícia/Repressão/Prisão. Mas, se a sociedade começa a enxergar o efeito espelho que esse
mal-estar juvenil provoca, pode-se chegar à conclusão, sem dizer que o fenómeno não existe,
que são categorias sociais inventadas e forjadas, fruto da inexistência de políticas públicas e
estratégias sérias que procuram diminuir os problemas sociais e juvenis. Esses jovens
precisam ser mais envolvidos na procura de soluções e responsabilizados pelos problemas
criados, conscientemente.
Por isso, a rejeição desta categoria social inventada, thug ou thug life, em Cabo Verde,
e inclusivamente a rejeição desses grupos como associações juvenis comunitárias. Para já
cria-se um falso problema sociológico, dado que designar os jovens de bairros pobres de thug,
sobretudo quando assumido como bandidos (ou vida bandida), é desconhecer a realidade da
juventude cabo-verdiana e o peso ou a percentagem daqueles que de facto cometem delitos
graves, inclusive assassinatos. É um erro rotular todos os jovens que vivem este mal-estar
num único conceito que foi compreendido e utilizado erroneamente para designar assassinos
ou vida bandida. É preciso contextualizar os conceitos: Thug é uma palavra tornada popular pelo rapper 2Pac (Tupac Shakur), que rapidamente foi confundida com criminoso. Thug Life é o oposto de alguém que teve tudo o que precisava para suceder na vida, é a situação daqueles que não têm nada, e vence na vida, quando ultrapassa todos os obstáculos para alcançar os seus objetivos. Thug life continha muitos códigos, de forma a pôr ordem no aumento de gangues e tráfico de droga. Thug é um acrónimo para "The Hate U Give Little Infants Fucks Everyone".29 Thug Life foi um grupo de rap formado por 2Pac com mais 4 outros membros: Mopreme, Macadoshis, Big Syke, and The Rated R. Após a prisão de 2Pac por alegada violação, o grupo desfez-se. (…) Thug life tem cerca de 21 códigos, sendo que o primeiro diz que todos os novatos no jogo devem saber que podem ficar rico, ir para a cadeia ou morrer (Bruce Poinsette, 2011).
Para Poinsette, poucos sabem de facto o que 2Pac quis dizer com a expressão Thug
life. Thug life foi um movimento criado por Tupac, o padrasto dele Mutulu Shakur e o 29 «O ódio que crias nas crianças, lixa todo o mundo» (tradução nossa).
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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padrinho Geronimo Pratt para politizar os gangues. Todos tinham ligação com o Partido Black
Panther e viram que a energia revolucionária dos jovens estava a ser desperdiçada na
opressão da comunidade negra em vez de a defender. Este autor diz ainda que o conceito de
gangue não é completamente negativo. É um grupo de pessoas que estão juntos, com
interesses comuns de proteção e ganho económico, o que não quer dizer que tem de ser com
base no crime e na violência. Porém, quando se vive na pobreza, no desemprego e uma certa
dependência do mercado da droga, que não tem regras para prevenir o uso de violência para
resolver problemas, existe aí uma receita para o desastre.
De facto, inicialmente, os gangues não aterrorizavam as comunidades, mas protegiam-
nas. É o caso do The Crips, que no início protegia a comunidade do abuso policial. Para Bruce
Poinsette, os Crips e outros gangues foram introduzidos na droga pela CIA (Central
Intelligence Agency – EUA) e produtores de drogas parceiros da CIA. É assim que os
membros dos gangues se transformaram de soldados em terroristas das comunidades.
O autor considera que sem atacar o problema, que é económico, não se vai resolver
este ciclo de desemprego e desunião. Basta lembrar que Tupac, Mutulu e Pratt eram
estudiosos de Malcolm X, que pregava o Nacionalismo Negro, que incitava a comunidade a
tomar conta da sua economia. Atualmente, os homens e mulheres de negócios que dominam a
economia não vivem nas comunidades e reinvestem o seu dinheiro noutro sítio, sem se
importar com a pobreza e o desemprego. Não investem em escolas, infraestruturas, etc. É o
caso dos armazéns dos chineses, libaneses, portugueses e cabo-verdianos em Achada Grande
Frente e Trás, que não se preocupa com essas comunidades, só se preocupam com lucros.
A proposta do autor é trazer os gangues para o campo político, de proteção dos seus
interesses económicos e comunitários. Uma espécie de máfia, mas mais positiva, dado que a
italiana conseguiu fazer isso. A violência poderá ser travada com alternativas económicas. O
aprisionamento dos jovens pobres (e negros) não irá resolver o problema. Poderá haver muita
reincidência. A proposta é transformar os jovens presos em empreendedores.30
9. Sobre a situação criminal em Cabo Verde: espaço urbano/criminalidade urbana
Em Cabo Verde, tem-se verificado mais criminalidade nas zonas urbanas com mais
peso populacional, S. Tiago representa 56% dos crimes nacionais. Quanto à criminalidade per
capita, as ilhas do Sal, Boa Vista e Brava apresentam um maior número de ocorrência. A
30 O termo “Thug Life”, segundo Poinsette, é uma referência subtil à Revolução americana e táticas que puseram fim à colonização britânica, “liberdade ou a morte” como diria Patrick Henry. Hoje, quem é revolucionário é visto como extremista. Revolução não tem de ser necessariamente violento, mas deve haver determinação e união, começando por combater a pobreza económica, controlar os meios da produção da economia.
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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partir do ano 2000, o número de crimes registados tem vindo a aumentar de ano para ano, com
exceção de 2004 e 2007 em que se verificou uma ligeira descida. Em 2008, a criminalidade
aumentou 11%.31
A Polícia Nacional disponibiliza mais dados que a Polícia Judiciária. O PESI-2009 só
contém dados, da PJ, relativo aos anos de 2004, 2005 e 2006, Santiago, Sal e S. Vicente.
Nesse estudo, os problemas que mais preocupam os cabo-verdianos são os de
segurança e da criminalidade. Esta preocupação é ascendente desde 2002, o seu grau
aumentou de 4 para 11.32
Quadro 2 - Dados sobre a Criminalidade Registada (Polícia Nacional) Ano Crime
contra pessoa
Crime contra
propriedade
Total Variação em relação ao
ano anterior
% Variação
% Crimes contra
pessoas/Total
% Crime contra propriedade/Total
1996 6.385 4.492 10.877 58,70% 41,30% 1997 7.411 5.338 12.749 1.872 17,20% 58,13% 41,87% 1998 8.892 5.633 14.525 1.776 13,90% 61,22% 38,78% 1999 8.181 4.954 13.135 -1.390 -9,60% 62,28% 37,72% 2000 9.219 4.936 14.155 1.020 7,80% 65,13% 34,87% 2001 9.420 5.451 14.871 716 5,10% 63,34% 36,66% 2002 9.549 6.427 15.976 1.105 7,40% 59,77% 40,23% 2003 10.003 7.487 17.490 1.514 9,50% 51,19% 42,81% 2004 9.478 7.291 16.769 -721 -4,10% 56,52% 43,48% 2005 9.550 7.861 17.411 642 3,80% 54,85% 45,15% 2006 10.624 8.630 19.254 1.843 10,60% 55,18% 44,82% 2007 9.854 8.942 18.796 461 -3% 52,43% 47,57% 2008 10.537 10.270 20.807 2.011 11% 50,64% 49,36%
Fonte: PESI-2009, p. 27. Em 2007, o número de crimes por 1.000 habitantes foi de 38,2% e em 2008 de 41,5%.
Em 2008, o número de crimes contra as pessoas e contra propriedades correspondeu a valores
quase idênticos (50,64% e 49,36%). De facto, 42% dos cabo-verdianos, inquiridos no Estudo
sobre a Criminalidade em Cabo Verde da ONUDC/CCCD, consideram que a perceção de
insegurança aumentou.33
É interessante também notar que em 2007 a criminalidade surgia em 7º lugar como o
maior problema em Cabo Verde. Em 2008 passou a ocupar a 3ª posição.34 Segundo dados
nacionais, metade dos crimes praticados em Cabo Verde não é participada (devido à falta de
provas, incapacidade e negligência da polícia). A polícia é mal vista no que concerne à
eficácia. O seu trabalho, na capital, é vista de forma negativa por cerca de 56% dos inquiridos
(ONUDOC 2007).
31 Dados do PESI-2009 informam que em 1996 registou-se 10.877 crimes; em 2006, 19.254. 32 PESI-2009, p. 3. 33 PESI-2009 (p29), dos crimes mais temidos Homicídio (40%); Roubos/furtos em residências (33%); Ofensas corporais (29%); Tráfico de droga (28%); Roubo/furto (16%). 34 ver Resultados Afrobarómetro, 2008, sobre a Qualidade da Democracia.
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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Neste cenário criminal, as desigualdades sociais fizeram surgir novos fenómenos
criminais, mormente a juvenil. Dados do Estudo Socioeconómico sobre as Armas Ligeiras e
de Pequeno Calibre em Cabo Verde (Novembro de 2008), informam que, dos crimes contra as
pessoas e contra o património, 80% são praticados por jovens com idade compreendida entre
os 16 e os 21 anos e cerca de 19% com idade entre os 12 e os 16 anos.35 Crimes de rua,
praticados por crianças e adolescentes, normalmente, são vistos como pequena criminalidade.
Mas, só nos últimos tempos, a circulação de armas de fogo, e a sua utilização pelos jovens
designados thugs (para ajustes de conta: homicídios, ferimentos, inclusivamente dentro de
escolas), começa a preocupar a população, que tende a ser cada vez menos tolerantes com este
modus vivendi dos jovens. Essas armas advêm do tráfico internacional, enviadas por
emigrantes (em bidões), do continente africano (Guiné-Bissau), do período da guerra de
libertação e ainda de fabricação artesanal local (boca bedju).36
Os dados recolhidos nos últimos dois anos indicam que a cidade da Praia tem mais de
80% dos bairros com origem espontânea e/ou clandestina. São cometidos, em média, em
Cabo Verde 76 crimes por dia e desses 43 são crimes contra o património. Dos 76 crimes
diários, 24,5 foram cometidos na Praia, 7,5 em S. Vicente, 4,6 no Sal, 3,3 em São Filipe e 2,7
em Santa Catarina, ou seja 42,6 crimes (ONUHABITAT, 2011:90).
A violência urbana constitui um problema social. Com efeito, cerca de 73% dos
inquiridos se mostram sempre preocupados com a violência e 12,8% estão muitas vezes
preocupados, perfazendo um total de 85,8% dos residentes dos centros urbanos.37
Com efeito, para 49,2% dos inquiridos existem grupos/bandos de jovens nos seus
bairros de residência que provocam conflito, sendo 79% na Praia, 39,7% em Mindelo e 40%
em Sal Rei. Os jovens reclusos entrevistados imputam a entrada na violência como resultado
de clivagens sociais e económicas, espacialmente, traduzidas numa ocupação diferenciada de
indivíduos, grupos, classes e categoriais sociais. O facto de querer ter o mesmo padrão de
consumo, constituiu para alguns a razão de assaltos, roubos e furtos. De igual modo, a falta de
emprego e rendimentos, a inexistência de infraestruturas nos bairros para ocupação dos
tempos livres ou, quando existem, são de difícil acesso aos jovens, a luta por demarcação de
territórios constituem outros factores aduzidos.
35 PESI-2009, p. 26. 36 A PN, até o ano de 2008, apreendeu e armazenou cerca de 1.961 armas, sendo 1.283 pistolas, 488 revólveres e 190 espingardas, dos quais 8% são boca bedju. 37 ONUHABITAT, p. 62.
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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A nível nacional, cerca de 73% dos inquiridos se mostram sempre preocupados com a
violência nos centros urbanos e 12,8% estão muitas vezes preocupados. 21,4% dos inquiridos
foram, em 2010, vítimas de crimes violentos.
Na verdade, 71,7% dos inquiridos apontam os jovens como os responsáveis pela
violência. Resulta também do estudo que as ações de violência tendem a acontecer em grupo
e no período da noite. Da mesma forma, 74,6% dos inquiridos consideram que o tráfico de
drogas nos seus respetivos bairros tem tido uma influência no aumento e no cometimento de
atos de violência. Para os inquiridos da Praia (50%), de S. Filipe (33,3%) e do Mindelo
(30%), a inexistência de proteção policial também deve ser considerada como um fator
importante de facilitação da violência (ONUHABITAT, 2011).
Estudos ainda mais recentes têm tratado, mesmo que superficialmente, o tema da
violência e criminalidade, perceção de insegurança, mal-estar social. É o caso do estudo
encomendado pelo Ministério da Administração Interna, que procura conhecer a perceção das
populações quanto ao fenómeno da violência e criminalidade, sua dinâmica e impactos na
vida quotidiana dos cidadãos, suas manifestações, perceções, tipologia, distribuição espacial e
seus principais determinantes sociais e económicos.38
Os bairros em que as famílias residentes (mais de 1/3) mais sofreram assaltos no
último ano são os de Fazenda/Sucupira (37,3%), do Castelão/Coqueiro (34,9%) e da Achada
Grande Frente (33,3%). A situação ainda é complicada, acima da média do concelho, nos
bairros de Achada Mato/Covão Mendes/Achadinha Pires (30,5%), da Calabaceira (30%) de
Achada Santo António (29,3%) de Lém Cachorro (27,6%) da Achada Grande Trás (27,2%) e
da Vila Nova (26,4%). Ainda no Bairro de Eugénio Lima e do Plateau, 1 em cada 4 agregado
familiar, experimentou algum tipo de violência/criminalidade no mesmo período.39
O tipo de violência/criminalidade mais sofrida segundo as vítimas é o assalto (51,3%).
Os resultados indicam que 1 em cada 5 agregado no Concelho foi vítima de algum tipo de
assalto. A violência interpessoal surge em terceiro plano, com 1 em cada 4 agregado.
Os assaltos acontecem em todos os bairros, com exceção do Bairro de S. Martinho
Pequeno onde os roubos (62,5%) são mais frequentes que os assaltos (12,5%). Os bairros que
38 Este estudo da Afrosondagem (Relatório sobre a Violência e Criminalidade na Cidade da Praia, 2012), teve por base um inquérito de auscultação das populações quanto aos fenómenos da violência, grau de vitimização e sua distribuição por bairros da capital, tipologia dos crimes e frequência da sua ocorrência, pontos de maior incidência da criminalidade e insegurança, etc. 39 Afrosondagem, 2012, p. 13.
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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mais assaltos sofrem são Fazenda, Plateau e Várzea, sendo que mais de 2/3 dos agregados
familiares sofreram assaltos.40
Os bairros onde os agregados mais sofrem a violência interpessoal são os de Safendi
(39,7%), S. Felipe (38,9%) e Achada Grande Frente (37,8%). No que concerne a distribuição
espacial da violência/criminalidade, ela teve lugar na rua (47,2%) ou em casa (45,1%).
Convém realçar que a grande maioria (82,5%) dos casos de violência e criminalidade tiveram
lugar no bairro de residência da vítima.41
Este estudo conclui que a maioria dos atos de violência e criminalidade sofrida pelos
agregados tem como perpetrador um indivíduo armado sem arma de fogo (23,3%), assim
como uma figura como perpetrador da violência/criminalidade, também um indivíduo isolado,
porém armado com arma de fogo (18,8%). Os grupos de indivíduos armados com armas de
fogo constituem 13,8% do universo dos agressores.42
Cerca de 2/4 das vítimas da violência e criminalidade que reportaram a ocorrência às
forças policiais têm a perceção que não resultou em nada, mormente os residentes dos bairros
de Tira Chapéu (71,4%), Terra Branca/Belavista (64,7%) e do Palmarejo (58,3%).
Provavelmente, isto tem aumentado o sentimento ou propensão de resistir ou ripostar com
violência (1.1%). Em caso de repetição cerca de 12% das vítimas mostra-se predisposta a
resistir/enfrentar o criminoso. Para além desses 12% que querem fazer justiça com as próprias mãos, 2,7%
dos agregados demonstraram propensão à vingança.43
Quanto à perceção sobre o aumento da violência/criminalidade, cerca de 54,2% da
população concorda que a violência e a criminalidade têm aumentado no seu bairro, nos
últimos 5 anos. Sendo que essa perceção sobre a diminuição da criminalidade é mais
favorável nos bairros de Lém-Ferreira (54,4%), Achada Grande Trás (36,6%) e Achada
Grande Frente (32,6%).
O estudo conclui ainda que a maioria das populações dos bairros da capital (70%)
partilha a opinião que os principais responsáveis pela onda de violência e criminalidade têm
como responsáveis os jovens de idade superior a 16 anos. Quanto ao conhecimento de grupos
de delinquentes nos bairros, 8 em cada 10 entrevistados dizem conhece-los, sobretudo nos 40 Roubo foi definido pelos autores como situações em que não há uma interação entre o criminoso e a vítima. Os bairros de Achada Grande Trás (38,8%), do Palmarejo (32,7%) e da Achada Grande Frente (32,7%) têm sofrido de forma preocupante com os roubos. Mesmo assim, a situação é melhor que os bairros do interior do Concelho, S.Tomé/Portete (41,7%) e de S. Martinho (62,5%). 41 Grande parte dos crimes acontece no horário e período pós-laboral, quando a maioria das populações estão em casa ou nas imediações. Grande parte das vítimas não conhece os criminosos, o que quer dizer estes não pertencem às comunidades onde atua. O conhecimento entre a vítima e o agressor é mais acentuado nos residentes dos bairros de Palmarejo (87,8%), de S. Tomé (83,3%), da Fazenda (82,9%) e da Prainha (81,3%). No bairro de Achada Grande 30% das vítimas identificam os seus agressores como sendo vizinho. (p. 20). 42 Idem p. 23. 43 Idem p. 34.
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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bairros de Achada Mato, Achada Grande Frente e Ponta de Água, todos a ultrapassar os 96%.
E cerca de 55% das populações dos bairros da Praia já presenciaram briga de grupos
delinquentes no seu bairro, sobretudo os dos bairros de Castelão/Coqueiro, Achada Grande
Frente e Achada Grande Trás.
Uma boa parte da população da Praia (73%) mudou alguns hábitos de rotina, como
sair à noite (60,6%), por exemplo, sendo os bairros de Achada Santo António, Tira Chapéu e
Terra Branca. Cerca de 88% dos entrevistados manifestaram vontade de colaborar
voluntariamente com a polícia e as autoridades no combate ao fenómeno da violência e
criminalidade. Para além do assalto às pessoas na rua, a briga entre grupos delinquentes,
assim como assaltos a casas e residências são os crimes mais comuns e identificados pelos
inquiridos. As causas identificadas têm a ver com o uso e tráfico de drogas, o desemprego,
falta de oportunidade para ocupação dos tempos livres, alcoolismo, pobreza e falta de
policiamento
Dados recentes da Direcção Geral dos Serviços Penitenciários e de Reinserção Social
(Julho 2012), apontam que existem na Cadeia central da Praia cerca de 810 presos e na
Cadeia Central de S. Vicente cerca de 323 presos.
Na CCP, destacam-se, quanto à natureza do delito, o crime contra pessoas (40,1%), o
que corresponde a 325 pessoas, sendo 318 homens; Crime contra propriedades (26,7%), que
corresponde a 216 pessoas, sendo 215 homens; e Crimes Sexuais (13,1%), o que corresponde
a 106 homens.
Quanto à situação do recluso, dos 810 presos, 278 (34%) são preventivos, sendo 265
homens, e 532 (66%) são condenados, o que corresponde a 503 homens. Quadro 3 - Balanço estatístico referente à Faixa etária dos reclusos no mês de Julho de 2012, na cadeia Central da Praia
Idade Homem Mulher Total % (16 a 21) anos 203 3 206 25% (22 a 30) anos 288 25 313 39% (31 a 40) anos 189 9 198 24% (41 a 50) anos 69 6 75 9% (51 a 60) anos 19 1 20 2% (60 e +) anos NR -2 -2 -0,2%
Total 768 42 810 100% Fonte: Direcção dos Serviços da Reinserção Social - 2012
Na CCSV, destacam-se, quanto à natureza do delito, o crime contra pessoas (30%), o
que corresponde a 96 pessoas, sendo 90 homens; Crime contra propriedades (42%), que
corresponde a 137 pessoas, sendo 136 homens; e Crimes Sexuais (11,1%), o que corresponde
a 36 homens.
Revista Cabo-verdiana de Ciências Sociais, ano 1, n. 1. jan-dez, 2013.
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Quanto à situação do recluso, dos 323 presos, 40 (12,4%) são preventivos, sendo 39
homens, e 283 (87,6%) são condenados, sendo 273 homens. Quadro 4 - Balanço estatístico referente à Faixa etária dos reclusos no mês de Julho de 2012, na Cadeia Central de S. Vicente
Idade Homem Mulher Total % (16 a 21) anos 39 2 40 12% (22 a 30) anos 144 2 147 46% (31 a 40) anos 77 5 85 26% (41 a 50) anos 48 2 50 15% (51 a 60) anos 1 NR 1 0,3% (60 e +) anos 3 NR 3 1%
Total 312 11 323 100% Fonte: Direcção dos Serviços da Reinserção Social
Quanto à faixa etária, o que mais nos interessa, tal como os quadros acima indicam
verifica-se uma crescente tendência para o encarceramento dos jovens (16-21 anos) e (22-30
anos), o que corresponde a 64% do total dos presos na cadeia Central da Praia e 57% na
cadeia Central de S. Vicente44. Este encarceramento maciço da população jovem e pobre
inquieta os investigadores.
10. Considerações Finais
De facto, o desvio dos jovens é um tema delicado, difícil e embaraçante. Os dados
confirmam um ligeiro aumento dos jovens na área da criminalidade, e fraca ligação familiares
e académicas. Apesar de ter surgido nos últimos tempos um interesse em conhecer o
fenómeno, existe ainda um conhecimento escasso nesta área. Tem-se verificado, através dos
media, uma cada vez maior presença de jovens em conflito com a lei. Este aumento de jovens
na criminalidade requer uma reflexão séria sobre a situação socioeconómica dos pobres e
excluídos, e ainda sobre as alternativas para a juventude em Cabo Verde. É que o fenómeno
das crianças na rua explodiu nos últimos anos na forma da cultura de gangs, um tipo de
violência juvenil fortemente enraizada nas estruturas de desigualdades sociais, que só poderá
ser minimizada com reforço de intervenção comunitária, luta contra a pobreza e através da
construção de um tecido menos esgarçado de organizações da sociedade civil.
Pode-se facilmente dizer que as medidas coercitivas/repressivas aplicadas pela polícia
não têm melhorado o fenómeno, apesar desta aparente anestesia ou estancamento; isso tem 44 Dados do mês de março de 2013, dizem que «o índice de criminalidade aumentou 10,35% em 2012, comparado com o período homólogo de 2011 onde se registaram 22 mil 152 casos reportados, contra 24 mil do ano passado. (…) Quanto a homicídios, Praia continua no topo com 29 crimes cometidos, menos 4 que em 2011 (33 casos). Ainda na praia houve 4.652 crimes contra a propriedade, contra 4.370 em 2011. (…) em 2101, a nível nacional foram cometidos 11.228 crimes contra propriedade, mas apenas 6.682 foram esclarecidos.. os dados da evolução da criminalidade de 1996 a 2012 apontam para um aumento na ordem dos 86% a uma média anual de 5,4%.» Vide Jornal A Nação, nº289, de 14 a 20 de março de 2013 folha policial A6).
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contribuído para aumentar a revolta juvenil, ‘obrigando’ os jovens a reagirem e
reorganizarem. É que o fenómeno parece mais um movimento que vai-se metamorfoseando,
do que existência de ‘grupos thug’ totalmente organizados, estáticos e homogéneos. É claro
que isto não quer dizer que estejam completamente desorganizados, ou que no passado não
houve grupos organizados. É importante notar que os grupos são abertos, sujeitos a mudanças.
Os media só tem abordado uma parte do problema (a desordem provocada pelos jovens), não
têm mostrado interesse pela vida dos jovens (dimensão do colectivo, emoções, amizade, hip
hop, desporto, entreajuda) e nem pelos problemas sociais por que passam (desemprego,
pobreza, abandono escolar, exclusão social).
No último ano, 2012, houve a nosso ver, uma forte intervenção comunitária de jovens
com curriculum social, intensificando a intervenção para reduzir os males da juventude;
verificou-se também uma tendência dos jovens de procurarem a paz, como moda. Denota-se
uma ligeira diminuição da violência. Por outro lado, a polícia tem aumentado a sua ação nos
bairros, dando caça aos criminosos e procurando implementar o Policiamento de
Proximidade. Porém, é preciso mais recursos e investimentos nos bairros, assim como mais
trabalho, compreensão e responsabilização dos jovens.
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