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Monografia PUC-GO
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
ESCOLA DE DIREITO E RELAÇÕES INTERNACIONAIS
CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS
PEDRO PAULO COSTA DE OLIVEIRA
O PODER DO DRAGÃO ASIATICO NO SISTEMA INTERNACIONAL: COMO A CHINA VEM USANDO DA ÁFRICA PARA AFIRMAR-SE
PERANTE O MUNDO
GOIÂNIA
2014
PEDRO PAULO COSTA DE OLIVEIRA
O PODER DO DRAGÃO ASIATICO NO SISTEMA INTERNACIONAL: COMO A CHINA VEM USANDO DA ÁFRICA PARA AFIRMAR-SE
PERANTE O MUNDO
Trabalho apresentado como parte dos requisitos para obtenção do título de bacharel em Relações Internacionais na Pontifícia Universidade Católica de Goiás,
Orientadora: Profa.Ms.Danyelle Wood.
GOIÂNIA
2014
PEDRO PAULO COSTA DE OLIVEIRA
O PODER DO DRAGÃO ASIATICO NO SISTEMA INTERNACIONAL: COMO A CHINA VEM USANDO DA ÁFRICA PARA AFIRMAR-SE PERANTE O MUNDO
BANCA EXAMINADORA:
_________________________________________________Profa. Ms. Danyelle Wood
_________________________________________________Prof. Hugo Tomazeti
_________________________________________________Prof. Rafael Manzi
Para minha família e amigos.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a minha família que me deu suporte durante todo meu tempo de
faculdade. Agradeço a todos meus amigos, os brothers de Trindade city e a
Bancada dos Humanos.
Também agradeço a minha orientadora Danyelle Wood, que me aguentou
nesse semestre, e a todos os professores que conseguiram minha atenção, que é
muito difícil de conseguir.
“Reality is wrong. Dreams are for real”
Tupac Shakur
RESUMO
O objetivo central deste trabalho de monografia é identificar as intenções do governo da China em sua crescente relação de cooperação internacional com países da África. O governo chinês vem aumentando suas negociações com países africanos, e somando a seu índice de crescimento econômico acelerado, outras potências tentam entender sua real posição na região africana. A diplomacia chinesa justifica suas relações por apontar semelhanças entre o tratamento dos países africanos e da China pelo mundo ocidental. A relação sino-africana se baseia em vendas chinesas de produtos industrializados, tecnologia, técnicas de agricultura e obras de engenharia civil; em troca de materiais brutos e recursos naturais de países africanos, principalmente petróleo. O Ocidente acusa a China de ser uma nova força colonizadora na África, se aproveitando de economias fracas e políticas problemáticas para explorar a região de seus recursos naturais. A África passa por um processo de desenvolvimento acelerado depois que as relações sino-africanas se fortaleceram e, apesar de alguns problemas causados por ela, a relação trás bastante benefício para os dois lados da negociação.
Palavras-chave: Cooperação; cooperação Sul-Sul; colonização; desenvolvimento; China; África.
ABSTRACT
The main objective of this work of monograph is to identify the intentions of the Chinese government on your growing international cooperation relations with African countries. The Chinese government has increased its negotiations with African countries, and adding its accelerating economic growth rate, other great powers try to understand your real position on the African region. The Chinese diplomacy justifiesthese relations pointing similarities between the western world. The sino-african relation is based on Chinese sales of industrial products, technology, farming techniques and construction works; in exchange for African raw materials and natural resources, mainly oil. The West accuses China of being a new colonizing force on Africa, taking advantage of weak economies and problematic politics. Africa goes through a development process after the sino-african relations strengthen and, despite some problems caused by it, the relation brings enough benefits for both sides of the negotiation.
Keywords: Cooperation; South-South cooperation; colonization; development; China; Africa.
SUMÁRIO
1. HISTÓRICO DAS ASCENSÕES E QUEDAS DO PODERIO CHINÊS.............................11
1.1. AS ANTIGAS DINASTIAS....................................................................................................11
1.2. O FIM DO GRANDE IMPÉRIO DA CHINA........................................................................16
1.3. O DESPREPARO CHINÊS..................................................................................................18
1.4. O GOVERNO COMUNISTA.................................................................................................20
2. O PODER E A CHINA........................................................................................................24
2.1. CONCEITUANDO PODER...................................................................................................25
2.2. CHINA E O FUTURO DO PODER......................................................................................30
3. RELAÇÕES SINO-AFRICANAS: HISTÓRICO E CRÍTICAS À PROCURA DO PODER PELA CHINA..........................................................................................................................36
3.1. HISTÓRICO DAS RELAÇÕES SINO-AFRICANAS..........................................................37
3.1.1. RELAÇÕES SINO-AFRICANAS PRÉ-1990...............................................................37
3.1.2. HISTÓRICO APÓS A DÉCADA DE 1990...................................................................42
3.2. UMA RELAÇÃO DE BENEFÍCIOS MÚTUOS?.................................................................46
3.3 A CHINA A PROCURA DESENVOLVIMENTO AFRICANO: HEGEMONIA OU COOPERAÇÃO?...........................................................................................................................53
CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................................57
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................................59
INTRODUÇÃO
A China é um dos atores internacionais mais ricos e com uma economia muito
ativa. Por sua política se diferenciar de outras potências do Ocidente, suas ações
são analisadas com cuidado. Qualquer movimento pode ser considerado “ameaça”
para essas potências e dentro desses movimentos temos as relações da China com
a África, que movimentam muito dinheiro e mercadorias nas duas partes.
O processo de cooperação entre a China e países da África é o maior
exemplo de cooperação Sul-Sul que temos hoje. Em 2000, o comércio entre o
continente e os chineses era de aproximadamente US$ 10 bilhões, e esse valor
subiu para US$ 114,81 bilhões em 2010 (AARSÆTHER, 2011), com mais de duas
mil empresas chinesas atuando em território africano (KOBZEV, 2013). Além desses
investimentos comerciais, a China concede empréstimos a Estados sem se importar
com sua política, financiando até governantes tiranos de países em guerra civil
(ALDEN, 2007).
Em 2006 aconteceu em Pequim o chamado Beijing Summit, a terceira
conferência ministerial do FOCAC, Fórum da Cooperação China-África. Essa
reunião de cúpula foi importantíssima para o relacionamento entre as duas partes, e
celebrou o 50º aniversário de inauguração das relações diplomáticas entre a
Republica da China e os estados africanos. Participaram dessa cúpula o ex-
presidente chinês Hu Jintao e governantes de 48 países africanos. Na declaração do
evento consta que o propósito da reunião foia promoção da “amizade, paz,
cooperação e desenvolvimento”, onde eles revisaram o meio século de cooperação
e discutiram os objetivos compartilhados para uma “nova era” de cooperação.
Os dados históricos mostram que o interesse chinês na África é grande e data
de muitos anos. Será visto que é comum as estratégias chinesas serem elaboradas
para muitas décadas, e o devagar aumento da influencia que a China mostra na
África confirma esse pensamento.
Portanto, o problema central deste trabalho é se a China procura poder
hegemônico, dentro de uma perspectiva realista, no sistema internacional através da
sua relação com o continente africano. Assim, é necessário ao estudo analisar a
cooperação sino-africana e até que ponto ela se mostra um projeto de
10
desenvolvimento cooperativo, uma relação pacifica em que ambos saem ganhando,
ou se acaba em mais um projeto realista de uma grande potência explorando povos
mais pobres.
Se for o caso de exploração da África pelos chineses, essa cooperação Sul-
Sul perderia suas vantagens, em que é favorecida uma negociação entre países em
desenvolvimento, principalmente para que uma exploração por parte do mais
poderoso não aconteça. A hipótese do trabalho vai procurar confirmação da
exploração da África de seus recursos naturais pela China, como uma forma do
governo chinês de se confirmar no sistema internacional como uma potência
hegemônica.
Será realizado para esse fim uma pesquisa bibliográfica e qualitativa com
base no método dialético, ou seja, um diálogo entre autores para se confirmar ou
não a hipótese. Assim, na parte onde será analisado o conceito de poder, serão
utilizados trabalhos de Joseph Nye e John Mearsheimer. Já na análise sobre as
relações sino-africanas, os trabalhos de Chris Alden e Gustavo Menezes vão ser
usados.
Portanto, o primeiro capítulo irá tratar de forma sucinta da história chinesa,
para melhor entender a formação da potência que existe na atualidade, mostrando
as ascendências e decadências do dragão chinês ao longo da sua história.
Já o segundo capítulo objetiva analisar as intenções da China quanto ao
tabuleiro de poder nas relações internacionais. Para isso é necessário conceituar o
poder, dando prioridade a discussão entre o poder bruto e poder brando. Assim
sendo, o capítulo concluirá verificando as possíveis intenções da China no sistema
internacional, focando da ascensão recente do poderio chinês.
O ultimo capítulo terá um histórico recente das relações sino-africanas, da
metade do século passado até a atualidade. Após isso, uma análise das críticas que
a China recebe pela sua presença na África, e quais dessas críticas mostram
problemas reais para os estados africanos. Por fim, será analisado se as estratégias
chinesas de relação com a África mostram interesse em aumentar seu poder para
um status de hegemonia regional, ou se a relação se trata apenas em um
desenvolvimento conjunto entre as duas partes, sem nenhuma intenção por trás da
cooperação.
11
1. HISTÓRICO DAS ASCENSÕES E QUEDAS DO PODERIO CHINÊS
A China tem uma história muito vasta, com mais de quatro milênios de história
registrada, e um dos poucos países que prosperaram no início da civilização. Sua
cultura não foi muito influenciada por fatores externos, com poucas exceções, e por
isso o povo chinês evoluiu em seus próprios e únicos costumes. Essa cultura
singular absorveu até povos estrangeiros que dominaram a China em tempos
separados.
Seu histórico de quedas e ascensões mostram incontáveis batalhas, em
guerras que duraram décadas. Os imperadores tinham riquezas tão vastas que se
consideravam deuses, e eles reinavam até algum imperador mais poderoso o
derrubar. A China dominou e foi dominada, e a partir dessa experiência em guerras
e destruição, períodos de paz e prosperidade foram muito valiosos, e toda a cultura
e costumes chineses são resultado de tudo o que passaram.
O Ocidente com frequência olha com estranheza para os chineses, não
entendendo como eles pensam e porque agem como agem. Para melhor entender a
China é preciso voltar no tempo e saber de sua história. Assim a compreensão sobre
eles pode ser alcançada.
1.1. AS ANTIGAS DINASTIAS
Antes da unificação da China, o território chinês era separado por vários
estados, que batalhavam entre si com muita frequência. Estes estados eram
comandados por dinastias diferentes, e o estado mais poderoso dominava seus
vizinhos. Então os períodos são separados pelo tempo de domínio da dinastia mais
forte.
Os territórios considerados chineses passaram por muitas mudanças com o
passar do tempo, e o mapa que conhecemos hoje só se formou recentemente, então
um povo era considerado chinês se sua cultura e seus costumes se condissessem
com a cultura da China, que por ser diferenciada de culturas vizinhas, era de fácil
identificação, até para estudos arqueológicos de hoje.
12
Segundo Kenneth Pletcher (2011, p. 21), essa separação da cultura chinesa
com o resto do mundo fez com que ela ficasse despreparada com o crescimento
tecnológico de outros países no século XIX, onde houve um grande declínio das
forças chinesas e ela foi explorada de vários lados, levando a China a um conjunto
de revoluções internas no começo do século XX. Mas depois de várias tentativas
fracassadas de reforma e adaptação para o sistema mundial moderno, a China vem
se levantando entre as potências novamente.
A primeira dinastia a deixar registros históricos foi a dinastia Shang, que
dominou de 1600 a 1046 AC. Os registros de dinastias anteriores são escritos raros
que confundem mitologia com realidade, que torna a veracidade desses registros
improváveis.
Segundo Kenneth Pletcher (2011), historiador e estudioso sobre a história da
China, dados arqueológicos mostram que as primeiras carruagens foram usadas
nesse período de 1046 AC na China, por comandantes militares importantes ou para
uso na caça. Esse dado é importante, pois mostra evidências de contatos com a
região ocidental europeia, onde as carruagens se originaram. O caminho pode ter
sido percorrido pela Ásia central ou por estepes do norte asiático.
No final da dinastia, no “século XI AC, o território dos Shang foi conquistado
pelos Zhou, um povo que vivia na fronteira nordeste.” (ATLAS DE HISTÓRIA
MUNDIAL, 2011, p. 62) A dinastia Zhou reinou por oito séculos, de 1046 até 256 AC.
Foi a dinastia que ficou mais tempo no poder, e neste período a China passou por
várias batalhas sangrentas que depois influenciariam na unificação da China. O
território de Zhou era repartido entre vários reis ou pessoas da elite, em um sistema
semelhante ao futuro sistema feudal europeu.
Também importante, deste período datam as técnicas de agriculturas
avançadas, como a rotação de culturas com grãos de soja, e a irrigação de solos
secos do norte para plantação de arroz. Essa evolução nas técnicas de plantio de
deviam ao crescimento da população nas cidades, que eram usadas
estrategicamente como defesa em territórios de conflitos com estados menores, e
pequenos agricultores abasteciam essas cidades com suas produções.
Essas técnicas de agricultura aumentaram a movimentação comercial, e
novos centros de mercado foram criados, tendo assim mais cidades e mais riqueza.
As pessoas abastadas passaram a usar acessórios feitos de metais e pedras
preciosas. Também eram usados produtos feitos de seda e cerâmica. Na dinastia
13
Zhou os trabalhos com metais melhoraram com o uso do aço, armas e ferramentas
fabricadas com incrível habilidade datam deste período. (PLETCHER, 2011, p. 50-
52)
A queda do reinado Zhou se deu em um período de mudança na ordem
social:
“O crescimento dos rendimentos e os importantes progressos registrados pela agricultura mudaram radicalmente a sociedade tradicional – as terras boas eram muito cobiçadas. Os Estados mais poderosos empregavam como funcionários nobres decaídos, soldados e artesãos e não mais a nobreza hereditária de antes.” (ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 62)
A dinastia Qin dominou por pouco tempo, de 221 a 207 AC, mas foi tão
importante que o nome China é derivado de Qin. Para alcançar o poder, seu príncipe
Zheng dominou e unificou todos os estados maiores da China, em uma campanha
de batalhas sangrentas e com exércitos gigantescos, no final do período dos Reinos
Combatentes. Alcançando seu objetivo, o Zheng se proclamou imperador com o
nome de QinShihuangdi.
Pletcher (2011) diz que o imperador Shihuangdi é retratado nos registros
como um tirano que proibiu livros considerados por ele perigosos para a população,
e enterrou (vivos) intelectuais e pensadores da época que se proclamavam opostos
ao seu governo. Mas o território de Qin é até hoje o território tradicional chinês, e
durante o reinado de Shihuangdi foram criadas estradas por toda a China e ele que
uniu a várias fortificações no norte, que hoje é a Grande Muralha da China, uma das
maravilhas do mundo. O imperador aboliu o sistema feudal e instalou um comando
burocrático centralizado. Esse sistema administrativo criado por ele foi utilizado até a
queda da ultima das dinastias da China, e em sua tumba foram encontradas as
6,000 estátuas de terracota, todas de guerreiros em tamanho real, uma famosa
atração turística na China nos dias de hoje.
“Mas sua dinastia, enfraquecida pelos sacrifícios que impôs às populações em suas campanhas militares e em seus vastos canteiros de obras públicas, sucumbe pouco depois de sua morte, em 206 AC, quando acontece uma rebelião nacional.” (ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 80)
Após a queda do imperador de Qin, a dinastia Han (202 AC – 220 DC)
dominou no período mais próspero que a China experimentou até os dias de hoje.
Foi inspirado pelo método governamental dos Qin, continuando o sistema
burocrático e imperial, mas de modo mais suave que seu antecessor. Na dinastia
14
Han “[...] se estabeleceu muito da cultura chinesa, tanto que Han se tornou a palavra
chinesa que denomina alguém que é chinês”. (PLETCHER, 2011, p. 15. Tradução
própria)
Durante o período Han, todos os territórios conquistados pelos Qin foram
colocados sob seu comando, e territórios no norte do Vietnam e partes da Coréia do
Norte também foram conquistadas. O império passou por um longo período de
riqueza, onde se dominava parte da rota da seda, e os produtos chineses,
principalmente sedas, chegam ao Império Romano. A riqueza do Império Han cresce
rapidamente, e a “população chinesa atinge cerca de 57 milhões de indivíduos. [...]
No início da era cristã, o Império Han rivaliza com Roma em extensão e riqueza”.
(ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 81)
A dinastia Han começa sua decadência com conflitos contra tribos não
chinesas em três lados diferentes, e facções da corte imperial lutavam pelo poder.
Juntamente com os conflitos, uma série de desastres naturais atrapalhou a produção
agrícola e a maioria da população passa fome, enfraquecendo muito o poder Han.
Depois da era Han, a china foi novamente fragmentada em várias partes, no período
chamado de tempo das Seis Dinastias. Nesse período houve um importante avanço
no desenvolvimento do taoismo e do budismo.
No ano 581, a nova dinastia Sui unificou novamente a China e construiu o
Canal Bian, canal de água que liga o norte e sul da China. Pouco tempo depois, os
Sui deram lugar a dinastia Tang (618 – 907), uma era de ouro das artes, com
grandes poetas da época. Também nessa época o exército chinês interviu em
conflitos na Índia, Ásia Central e Afeganistão. Foi o período de maior influência
militar chinesa, e seu poderio durou até a expansão do islamismo depois do século
VIII. (ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 126) Após essa dinastia, a China
passou por um período de invasão estrangeira, quando três povos do norte
dominavam parte do território chinês.
Depois desse período, a dinastia Song reinou de 960 até 1279. Foi uma era
de crescente educação da população, onde a literatura se tornou popular, e o
comércio entre a China e reinos vizinhos cresceu consideravelmente. A agricultura
alimentava uma população de 100 milhões de pessoas, que segundo Pletcher
(2011, p. 16), era a maior população do mundo naquele tempo. Foi um período forte
economicamente, mas a força militar chinesa dos Song era fraca, comparando com
as dinastias guerreiras anteriores. Seus exércitos foram derrotados nos territórios do
15
norte, e a dinastia Song ficou confinada ao sul da China. Isso não diminuiu a sua
força econômica, pois uma grande frota marítima “manteve trocas regulares com o
sudeste e o sul da Ásia e o golfo Pérsico [...]”. (ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL,
2011, p. 127)
A China foi um dos primeiros territórios anexados ao Império Mongol, com o
norte chinês dominado em 1211, fundando a dinastia Yuan (ou Mongol), que existiu
até 1368. Apesar de ter sido um período de sofrimento para a nobreza, que não
mais governava, os mongóis não influenciavam na cultura ou nas religiões chinesas,
e a vastidão do Império Mongol trouxe oportunidades de negociação dos produtos
chineses com partes longínquas do mundo. Na dinastia Yuan que o explorador
Marco Polo visitou a China e levou para a Europa várias invenções orientais.
(PLETCHER, 2011, p. 16-17; ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 128-129)
O enfraquecimento do Império Mongol se deu por lutas entre seus líderes
pelo trono imperial, em conjunto de uma série de inundações, secas e epidemias
nas décadas de 1340 e 1350. Durante esse tempo a China passou por várias
rebeliões contra o domínio mongol, e finalmente em 1368 o chefe rebelde Zhu
Yuanzhang proclamou uma nova dinastia, chamada de Ming, que dominou até 1644.
Pletcher (2011, p.17) continua quando o reinado Ming a China negociou com
diversas partes do mundo, vendendo sua famosa porcelana para países Europeus, e
nessa época as plantações chinesas passaram a produzir alimentos trazidos pelos
portugueses e espanhóis, como batata, milho e amendoim. Essa relação sino-
européia trouxe muitos recursos para o crescimento da economia chinesa, e muita
prata vinda do Novo Mundo fluiu para pagar chá, seda e cerâmicas. A China
também se tornou uma potência marítima como estes países europeus, e entre 1405
e 1433 seus navios atravessam o oceano Índico, chegando até a África Austral. As
frotas cancelaram suas viagens até a África por serem consideradas muito caras e
inúteis. (ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 167)
A partir do século XVI, o território chinês dos Ming era atacado no norte por
exércitos mongóis, e na costa sul por piratas japoneses, que por volta de 1550
infestavam os mares ocidentais, saqueando vilas costeiras. No final do século a
China mandou um grande exército de apoio à Coréia, seu país vassalo, depois de
saques advindos do Japão. Essas ameaças externas e a corrupção do governo
foram responsáveis pelo declínio da dinastia Ming, que teve seu fim depois de
grandes rebeliões.
16
1.2. O FIM DO GRANDE IMPÉRIO DA CHINA
A dinastia Qing dominou de 1644 a 1911, e foi a última grande dinastia a
dominar a China. Os Qing eram originalmente chamados de manchu, um povo do
norte que quase dobrou o tamanho do território chinês em seu domínio. A cultura
chinesa absorveu os manchu e depois de dois séculos eles não eram mais
considerados estrangeiros.
O período Qing teve um começo rico, com plantações que cobriam toda
porção de terra que possibilitava plantio, e grande entrada de prata vinda de
potências estrangeiras. No século XVIII a dinastia Qing teve seu apogeu, sendo o
governo mais rico e populoso da época, chegando a recusar propostas de contato
diplomático com a Inglaterra, ação que anos depois traria grande arrependimento.
(ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p 232)
O império passou a sentir perdas econômicas vindas do grande crescimento
demográfico chinês, que chegou a ter 450 milhões de habitantes em 1850. As
plantações não conseguiam alimentar todas as pessoas, pois mesmo abrangendo
grande parte do território, não era ilimitada. O povo passou fome e grandes levantes
e rebeliões aconteceram durante o século XIX. (ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL,
2011, p. 172)
Também no século XIX, a China sofreu muito com as Guerras do Ópio,
causadas pela venda ilegal de ópio, narcótico que trazia dependência aos usuários
muito rápido, trazida pelos ingleses para cidades chinesas. A dependência do ópio
chegava a números alarmantes, onde 90% dos funcionários se drogavam,
atrapalhando a produtividade, e em 1839 o império proibiu a entrada da droga e
queimou grandes quantidades dela. Seguindo a mesma fonte, a Grã-Bretanha
passou a ser a maior potência, econômica e militar, e sua Revolução Industrial
necessitava de muitos recursos econômicos para avançar. A China negociava muito
com os ingleses, vendendo chá, seda e porcelana, mas não comprava nada deles,
exceto o ópio.
O governo inglês tentou influenciar os Qing a legalizar a droga, sem sucesso,
então em 1840 navios de guerra zarparam para Hong Kong, para pressionar os
chineses a aceitar seus pedidos, e, como não chegaram a nenhum resultado
aceitável pelas duas partes, o porto de Cantão, o único porto chinês aberto a
estrangeiros, foi atacado em 1841 e pediram um resgate de $6 milhões, provocando
17
um contra ataque dos cantoneses e começando o conflito sino-inglês. (PLETCHER,
2011, p. 232, 233)
Segundo Pletcher (2011, p. 233), a força militar chinesa, antes muito
poderosa, agora não se comparava a o moderno exército inglês. Muitas batalhas
foram perdidas pelos chineses, e em 1842, foram obrigados a ceder Hong Kong,
abrir cinco portos de comércio estrangeiro e pagar $21 milhões aos ingleses. Essa
humilhação acabou completamente com a ideia de um império sustentado pelos
deuses que os chineses tinham, e a necessidade de renovação do governo fez a
população levantar várias rebeliões que abalaram todo o país, onde morreram mais
de 25 milhões nas revoltas de Taiping e Niam, por volta da década de 1850. (ATLAS
DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 232)
A partir das perdas da Guerra do Ópio, o império chinês foi mais enfraquecido
por ocupações estrangeiras. A China era explorada por russos, ingleses, japoneses,
franceses e alemães, um grande exemplo de como as potências da época utilizava
seu poder bruto sem restrições. A exploração provocou uma onda de xenofobia
entre os chineses, alimentando os levantes populares. O povo chinês sempre teve
orgulho de seu país e sua cultura, sendo uma das razões de terem aquela cultura
tão singular. Mas ironicamente a sua cultura exclusiva que fez o império Qing ser tão
despreparado para a guerra moderna, pois eles não esperavam que houvesse uma
potência bélica poderosa o bastante para causar algum dano em seu exército,
considerando sua experiência milenar da guerra. Os sinais deste despreparo só
caíram por terra no final do século passado.
Em 1898, o imperador tentou modernizar o seu governo de forma rápida, e
lançou a chamada Reforma dos 100 Dias, que não produziu nenhum resultado.
Depois de 1901 o império Qing admitiu necessidade de reforma governamental, e
alguns reformadores chegaram a conclusão que era preciso instaurar uma república,
necessitando de uma intervenção militar. Em 1911 houve um pequeno motim militar
onde se derrubou o império, que já datava de mais de dois mil anos. O médico Sun
Yat-Sen, chefe dos revolucionários, foi eleito presidente provisório no começo do
ano seguinte. (PLETCHER, 201, p. 250; ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p.
232)
18
1.3. O DESPREPARO CHINÊS
A situação da China não melhorou com a instauração da democracia. Sun
Yat-Sem renunciou para que o general Yuan Shikai ficasse no poder de forma
provisória. Segundo Pletcher (2011, p. 259), Yuan era um general poderoso do
antigo império, e tinha uma personalidade autocrata por treinamento. Isso fez com
que os revolucionários tivessem pouco espaço no novo governo, e não eram
apoiados pelo novo presidente.
Em 1913 foi eleito a Assembleia Nacional, com a maioria dos assentos
ocupados por antigos revolucionários, criando assim o Partido Nacionalista, ou
Kuomintang (KMT). A Assembleia foi reunida para a criação de uma constituição
permanente.
O general Yuan e o KMT nunca entravam em um consenso, atrasando o
progresso e criando uma rixa entre as duas partes, culminando no assassinato do
chefe do KMT, posteriormente provado que o assassino foi mandado pelo
presidente. Yuan fez empréstimos gigantes de bancos estrangeiros, contra a
vontade do KMT, e demitiu três governadores nacionalistas. Alguns líderes
revolucionários organizaram uma revolta contra o general, mas foram rapidamente
derrotados pelos militares. O general coagiu o parlamento a formalizar sua
presidência, e depois culpou os membros do KMT pela recente revolta, retirando-os
do poder. Em 1914, o presidente ditador dissolveu o parlamento e criou outro, com
especificações suas para uma nova constituição. (PLETCHER, 2011, p. 260)
Enquanto o governo interno passava por esses problemas, a China perdia
mais de sua soberania:
[...] os Estados satélite do Tibet e da Mongólia caíram nas mãos da Grã-Bretanha e da Rússia, respectivamente, e os japoneses continuaram sua política expansionista. Quando estourou a Primeira Guerra Mundial, o Japão se apossou da concessão alemã do Shandong e apresentou “21 exigências” que ameaçavam colocar a China sob sua dependência. Yuan Shikai resistiu, mas foi obrigado a reconhecer a dominação do Japão no Shandong, na Manchúria (regiões do norte da China) e na Mongólia Interior. (ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 260)
Yuan Shikai morreu em 1916, e o governo chinês passou por uma espécie de
anarquismo, onde vários generais governavam cada província. Algumas províncias
chegaram a prosperar, mas a maioria passava por combates entre esses senhores
de guerra, e na década de 1920 a população sofria com fome e a destruição
19
causada por seus próprios governantes. Nessa época, professores e estudantes
passaram a se espelhar na Rússia Soviética, e os russos mandaram um militante
comunista para recrutar intelectuais e formar um partido comunista. Alguns chineses
foram mandados para um treinamento na Rússia, e em 1923 o partido tinha em volta
de 300 membros, alguns já dentro do Partido Nacionalista. (PLETCHER, 2011, p.
266-268)
O KMT passou, em 1928, a tentar recuperar as terras dos senhores de guerra
e unificar a China, rompendo com os comunistas em 1927 e lutando em duas
frentes,de um lado contra o domínio japonês no norte, e de outro contra a influência
comunista nas regiões rurais, que aumentaram sua força de 1929 a 1934. Os
nacionalistas os expulsaramdo sul, e eles fizeram a Longa Marcha para o norte, em
Yan’an, onde ganhariam reconhecimento nacional e Mao Tse-Tung se tornaria o
líder do partido. (ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 260)
Em 1937, os dois partidos chineses se uniram contra a invasão japonesa,
este que em 1938 dominava todo o centro e norte da China, abrangendo todos os
polos industriais chineses. O exército chinês perdia batalha após batalha, e o povo
sofria massacres terríveis por parte dos japoneses. O Partido Comunista tinha
vantagem com seus programas de reforma, que atraíam os camponeses dominados
pelo Japão, assim formando uma guerrilha contra a ocupação japonesa. Os
nacionalistas perdiam terreno para os comunistas e passava por uma onda de
corrupção interna, facilitando para os comunistas na recuperação das terras antes
dominadas pelos japoneses. No final da Segunda Guerra Mundial o Partido
Comunista já tinha liberado grande parte do domínio japonês, e os ataques
americanos ao Japão os levou a rendição no território da China. (PLETCHER, 2011,
p. 18; ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p. 261)
Após a retirada do exército japonês, os dois partidos passaram a competir
pelos territórios antes dominados, levando por fim a guerra civil em 1946. Os
comunistas ganharam a guerra, e em 1949 foi fundada a República Popular da
China, comandada por Mao Tse-Tung. O KMT existe até hoje, mas domina apenas a
ilha de Taiwan, que até hoje tem uma relação conflituosa com a China comunista.
(PLETCHER, 2011, p. 18)
20
1.4. O GOVERNO COMUNISTA
Mao subiu ao poder em um país dilacerado por meio século de destruição
pela guerra e má administração. As vias ferroviárias estavam em ruínas e o sistema
financeiro afundado por dívidas. Várias tentativas de reforma tiveram resultados
catastróficos, com a população passando fome e levantes populares sendo
violentamente reprimidos pelo exército. (ATLAS DE HISTÓRIA MUNDIAL, 2011, p.
280)
O PCC (Partido Comunista da China) já tinha experiência com os
camponeses na guerra civil, quebrando as velhas classes dominantes na região
rural, mas o partido admitia ter pouca experiência na transição para o socialismo nos
grandes centros urbanos. Para corrigir isso, eles se espelhavam na União Soviética
que era o único que tinha tal experiência. As potências ocidentais tinham uma
aproximação hostil para o novo PCC, pelo fato de serem comunistas, e as
hostilidades aumentaram na Guerra da Coreia, no começo da década de 1950.
Todos esses acontecimentos estreitaram a relação da China com os Soviéticos, que
foram grandes parceiros internacionais. (PLETCHER, 2011, p. 300)
Quando a República Popular da China foi proclamada em 1949, suas ações
eram vigorosamente contra potências ocidentais, apoiando a União Soviética e
formando a ideia do mundo separado por dois blocos de poder. Stalin convidou as
lideranças chinesas a apoiarem revoluções em países asiáticos, e a China ajudou
Kim Il Sung chegar ao poder na Coreia do Norte, e a vitória do Vietnã sobre os
franceses, bem como a resistência deles aos americanos se deve muito a ajuda
chinesa. Alem disso, entre as décadas de 50 a 70, a China vinha contribuindo com
armamento e outras formas de apoio em conflitos que aconteciam em países pobres
e com governos comunistas (FOOT, 2010)
Estes exemplos citados são apenas uma demonstração de estratégias que
desafiaram as grandes potências, mas o governo chinês também promovia uma
imagem da China como potência, procurando reconhecimento nos países
ocidentais.
[...] no Conselho de Segurança da ONU, a República Popular da China desejava o assento ocupado pelo Kuomintang; da mesma forma, o seu governo participou das deliberações entre as grandes potências em Genebra em 1954, e procurou desenvolver e promover normas de conduta internacional, como os cinco princípios de coexistência pacífica, dando
21
ênfase própria ao valor da soberania estatal, aos interesses mútuos entre as grandes potências e ao princípio da não interferência. [...] a RPC [República Popular da China] também começou a financiar programas de ajuda internacional, mesmo havendo casos nos quais a sua própria população era ainda mais pobre do que as populações beneficiadas por essa ajuda. (FOOT, 2010, p. 16)
Então a China também procurava mostrar o status de uma grande potência
mesmo discordando com vários aspectos da política característica ocidental, e a
busca por esta fez o governo chinês se preocupar mais com a população de outros
países do que com seus próprios cidadãos, que passavam por um grande nível de
desemprego e fome. Segundo Pletcher (2011, p. 310, 311), a experiência chinesa
ganha na Guerra da Coreia mostraram os perigos de uma relação internacional
isolada. O governo chinês descobriu que países neutros menores na Ásia e África
não eram somente fantoches ocidentais, sendo bem rentável manter boas relações
com eles. As relações sino-africanas foram primeiro discutidas na Conferência de
Bandung, em 1955 na Indonésia, onde a China ganhou a atenção internacional com
seu slogan “União com Todos”.
A China mudou sua posição internacional quando teve auxílio soviético para
construir sua primeira bomba nuclear em 1957 (PLETCHER, 2011, p. 311, 340),
formando oficialmente as duas extremidades de poder, com os comunistas de um
lado e os Estados Unidos liberais no outro. As relações exteriores da China com o
ocidente foram diminuindo sua força até cessar completamente, e o conflito
ideológico ficou cada vez mais visível quando o governo americano constrói um
regime anticomunista que separa o mundo em dois, causando assim a Guerra Fria.
Após a morte de Mao Tsé-Tung, em setembro de 1976, a China passa por
mudanças muito significantes para seu grande crescimento econômico. O próximo
líder do PCC e de toda China foi Deng Xiaoping, que reintegrou o governo chinês
nas relações internacionais e aplicou um plano de crescimento econômico em 1978
que usava os recursos do governo para investir em um rápido crescimento
econômico, e incluiu a China no mercado internacional, ação que teve resposta
imediata por bancos e empresários estrangeiros. (PLETCHER, 2011, p. 336)
Depois que a China entrou na ONU em 1971, na posição que antes era
ocupada pelo Kuomintang de Taiwan, suas ações políticas foram mais bem vistas
pela diplomacia ocidental. Suas relações com os Estados Unidos, apesar de
continuar tento suspeitas e rivalidade, foram normalizadas e o papel da China no
palco internacional cresceu rapidamente, mas estes movimentos custaram à aliança
22
chinesa com o Vietnã e Coreia do Norte. Depois que o governo chinês descobriu
como usar seu assento no Conselho de Segurança da ONU, antes apenas um ator
passivo, o seu crescimento como ator central no sistema realmente acelerou.
(FOOT, 2010, p. 17)
A mudança mais concreta no relacionamento chinês com o resto do mundo é
observada no próprio Leste Asiático, onde a diferença no contato entre os países
mudou radicalmente.
[...] Até a década de 1990 o país lidava com a região com suspeita e desconfiança, considerando a maior parte das nações asiáticas como agentes da política externa americana, cujo objetivo seria o de impedir a ascensão chinesa. Hoje, tomadores de decisão chineses veem um potencial considerável de avanço dos seus objetivos na região, e que os interesses econômicos e de segurança da China são mais favorecidos pelo engajamento e cooperação – tanto por relações bilaterais com vizinhos quanto por processos multilaterais, incluindo a promoção ativa de instituições regionais formais. Atualmente, as elites da região (particularmente no Sudeste Asiático) parecem ter mais em comum com Pequim, estando em maior sintonia com os interesses da China e mais dispostas a tolerar ou aceitar uma crescente atuação regional chinesa do que em qualquer outra época desde 1949. (BRESLIN, 2010, p. 33, 34)
Essa nova relação mantida entre os países asiáticos com a China se deve
muito a força gigantesca da economia chinesa e, claro, ao seu exército, que é o
maior exército do mundo em número de militares, e em 2012 os gastos oficiais
militares foram de 670,3 bilhões de iuans, ou 110 bilhões de dólares (ULTIMO
SEGUNDO, 2012).
Os crescentes gastos militares da China fazem os países vizinhos ficarem
nervosos, principalmente Taiwan, que é um território independente, mas o governo
chinês considera parte do país; e Japão, pela rivalidade histórica e tensão recente
causada pelos protestos anti-Japão pela população chinesa, frutos de um
nacionalismo na China que vem crescendo a décadas alimentado por intelectuais
chineses (GREENFELD, 2012). Toda essa tensão entre os países pode ser um
modo de controle que a China impõe aos vizinhos, demonstrando a força militar a
eles e diminuindo muito as chances de um país asiático desafiar a China em
qualquer questão ou assunto. É um exemplo da influência por poder bruto no
sistema internacional, causado pelo medo do que a China pode fazer no futuro.
A China passou por uma transformação muito difícil para o mundo moderno,
explicado por Pletcher (2011) como um resultado negativo de sua cultura singular e
exclusiva, que apesar de ser uma das razões do sucesso e riqueza da China por
23
milênios, acarretou um despreparo para acompanhas as rápidas mudanças no
mundo nos últimos dois séculos. Todas as guerras e revoluções populares pelas
quais a China passou é uma prova de que os chineses querem voltar aos seus dias
de glória, e se essa glória ainda não voltou, está muito próxima.
24
2. O PODER E A CHINA
A China vem passando por um processo de crescimento nas ultimas duas
décadas que chama a atenção de qualquer observador, e essa ascensão
provavelmente será um dos assuntos principais em grande parte do século XXI.
Antes de analisar as estratégias de cooperação mantidas pela China em
países menores da África, é preciso saber quais são os objetivos chineses para o
futuro. É de conhecimento geral que o crescimento chinês no palco internacional tem
quebrado recordes, e hoje a maioria dos observadores concordam que a China está
entre as grandes potências mundiais. Isso faz com que as outras potências vigiem
todo e qualquer movimento chinês procurando algum tipo de ameaça ou
oportunidade para seu desenvolvimento próprio, o que é comum na manutenção de
poder de qualquer governo.
Atualmente a China é o país mais populoso do mundo, com algo em torno de
22% da população mundial. É o segundo lugar no ranking econômico, perdendo
apenas para os Estados Unidos, e a Organização Mundial do Comércio revelou
dados em 2009 onde a China ultrapassou a Alemanha como maior exportador
mundial de mercadorias. Em dados mais recentes, de 2012, a China exportou um
total de 2,05 trilhões de dólares, e importou 1,81 trilhões (ATLAS NATIONAL
GEOGRAPHIC). Esses números combinados com uma diplomacia extremamente
ativa transformam o país em um gigante entre as potências mundiais.
Com valores que crescem tão rápido todo ano, cada vez mais estudiosos já
pensam um cenário internacional hipotético onde a China é a maior potência no
lugar dos Estados Unidos, assim tentando prever como isso mudaria o sistema
internacional. Claro, deve-se levar em conta que essas previsões podem ser
completamente errôneas, considerando o histórico de imprevisibilidade nas
estratégias políticas chinesas e a própria instabilidade dos acontecimentos no
sistema internacional como um todo, entretanto quanto mais cenários forem
abrangidos, as prováveis mudanças no sistema serão mais bem compreendidas.
Então este segundo capítulo será um estudo das prováveis intenções
chinesas. A China continuará crescendo e consolidando seu poder no sistema
internacional? Se sim, quais poderiam ser suas estratégias dentro do contexto
internacional atual, seja de confrontação ou de cooperação?
25
Para responder essas questões, primeiramente o poder será conceituado de
forma sucinta e resumida, para um melhor entendimento das intenções da China
como uma potência. Depois será analisado o futuro do poder na China no século
XXI, concluindo com como o governo chinês se comportará no sistema internacional
com seu poder crescente.
2.1. CONCEITUANDO PODER
Antes de tentar discutir as intenções de uma potência no sistema
internacional temos que entender o conceito do poder neste. Mesmo sendo um
termo muito comum e usado com frequência, na hora de conceituá-lo a maioria dos
especialistas tem dificuldade em manter uma linha de similaridade na resposta do
problema.
Nas várias explicações sobre o conceito do poder, elas podem ser
organizadas se separarmos as linhas de pensamento do autor, pela teoria das
relações internacionais que esse autor se enquadra.
Um autor famoso que trabalhou o conceito foi Martin Wight, autor da Escola
Inglesa de relações internacionais, que escreveu:
O poder que faz uma “potência” é composto de muitos elementos. Seus componentes básicos são o tamanho da população, posição estratégica e extensão geográfica, recursos econômicos e produção industrial. Temos de acrescentar, a esses últimos, elementos menos tangíveis, tais como a eficiência administrativa e financeira, o aprimoramento educacional e tecnológico e, acima de tudo, a coesão moral. (WIGHT, 2002, p. 5).
Wight mostra primeiramente que o poder é ligado à força bruta de uma
potência, e que a sua população e extensão geográfica são forças medidas no caso
de conflitos, onde a população é treinada por militares e sua extensão geográfica e
posição estratégica serão usadas ao seu favor.
Os recursos econômicos e produção industrial influenciam muito no poder de
barganha e negociação com outros países, então quanto mais desses recursos,
melhor para o país. Em caso de conflito os dois elementos também são importantes,
como um tipo de combustível para a guerra. O autor dá mais importância aos
elementos de uso de força concreta e real no sistema internacional.
Depois de citar estes elementos ele acrescenta “elementos menos tangíveis”,
ou seja, que não tem uma força concreta no sistema. Wight usa como exemplo a
26
administração do país, ou a política interna; o “aprimoramento educacional e
tecnológico” são o nível da educação nacional e os frutos desta. Por último ele
escreve “coesão moral”, que ele mesmo explica como sendo o nacionalismo, ou
uma ideia de união social pela nacionalidade. Este conjunto de recursos é
considerado poder para Martin Wight.
Outro autor, Joseph Nye é um cientista político americano e autor de vários
livros e termos importantes para um melhor entendimento do sistema internacional.
Ele é um dos proeminentes do neoliberalismo, uma importante teoria das relações
internacionais.
Nye (2011, p. 23, 25) caracteriza o poder como “impreciso e difícil de medir”,
e também que “[q]ualquer tentativa de desenvolver um único índice de poder está
condenada a fracassar porque o poder depende de relacionamentos humanos que
variam nos diferentes contextos.” Isso significa que o poder já foi conceituado por
diferentes intelectuais, de diferentes áreas de estudo, e o resultado é diferente
segundo linhas de pensamento diferentes. Mas mesmo com essa conceituação
sendo dificultada pelo autor, os trabalhos dele são frequentemente usados em
estudos sobre o assunto, e também serão usados neste trabalho.
Nye separa o poder no sistema internacional em duas partes: hard powere
soft power (poder bruto e poder brando). O poder bruto é a força visível dos Estados,
que vem por meios militares e econômicos. Com a força bruta o Estado pode
comandar outro a fazer algo pelo simples medo de ser atacado ou por recompensas
econômicas, como dinheiro mercadorias de interesse do Estado coagido. Esse tipo
de poder é fácil de perceber na relação das potências, como é uma forma de
influência mais visível.
Como o poder bruto depende muito da força militar de um país, é uma forma
perigosa de uso do poder no sistema internacional. O uso do poder bruto em um
país trará um sentimento de revanchismo, uma necessidade de vingança sobre o
país que usou do poder bruto sobre ele. A ameaça do uso da força pode ser um
pretexto para alcançar um objetivo de outro país, mas a probabilidade de um ataque
militar recorrente dessa ameaça é muito grande, como forma de proteção contra o
país que ameaça o outro. Então o simples uso do poder bruto trás uma sombra de
conflito sobre o país que a utiliza.
Exemplos do perigo do uso desnecessário do poder bruto podem ser vistos
nas guerras dos Estados Unidos contra Afeganistão e Iraque, que trouxe prejuízos
27
gigantes para os dois lados, mesmo que sejam perdas muito maiores nos países do
Oriente Médio em comparação aos Estados Unidos. A luta contra os extremistas
islâmicos mostram poucos resultados, como vemos na ameaça que o recém-
formado Estado Islâmico tem imposto sobre os governos do Oriente Médio. Segundo
Max Boot (2014, p. 5), o exército americano contou 2,344 mortes na guerra, e 4,486
soldados iraquianos, mas o problema com as organizações extremistas parece ter
apenas piorado.
Já o poder brando seria uma forma de cooptar o Estado alvo, de um modo
indireto, mudando o comportamento dele por meios ideológicos ou culturais. Isto
acontece quando se cria ou molda as crenças, percepções e preferências básicas
do alvo, fazendo com que ele faça tudo o que o influenciador quer sem que isto seja
percebido por ele.
O poder brando é uma forma invisível e mais oculta de poder, então um país
que recebe influências do poder brando de outro país não percebe o que está
acontecendo, até que a própria cultura e pensamento geral da sociedade deste país
influenciado se torne a mesma do país que o influenciou. Essa estratégia é uma
forma muito eficiente de ganhar aliados entre os países que sofreram mudanças
pelo poder brando.
A influência do poder brando poder ser vista bem claramente na cultura
ocidental, que é baseada também nos Estados Unidos. Outros países recebem
influência pelos filmes, músicas e outras formas de entretenimento, e essa influência
aumentou muito com a globalização, que deixa as pessoas conectadas com tudo o
que acontece no país e em tempo real.
O poder bruto é o que Martin Wight tem como mais importante para o poder
de uma potência, como vimos acima, mas para Nye (2011, p. 29), esses recursos
(ele cita “população relativamente grande, território, recursos naturais, solidez
econômica, força militar e estabilidade social.”) não são definidos como poder.
Quando as pessoas definem poder como sinônimo de recursos que produzem (podem produzir) resultados, em geral se deparam com o paradoxo de que aqueles mais bem dotados de poder nem sempre conseguem os resultados que querem. (NYE, 2011, p. 29)
Com isso o autor mostra que os recursos são sim muito importantes, mas
apenas por ter estes recursos não significa que a potência terá mais poder que
outros países. Claro, um país com muitos recursos não vai ser desafiado
28
abertamente por outro país pobre de recursos, mas é preciso saber como usar os
recursos de poder para obter resultados desejados. Chegar a estes resultados “[...]
requer estratégias bem planejadas e uma liderança hábil” (NYE, 2011, p. 29), que é
chamado por ele de poder inteligente, outro termo cunhado pelo autor que é o
resultado do uso dos poderes bruto e brando de forma eficiente.
Se olharmos para acontecimentos na história internacional, vemos que
potências com grande quantidade de recursos não foram capazes de administrá-los
para alcançar objetivos relevantes. Se um país rico em recursos tiver uma estratégia
pobre, poucos resultados vão ser alcançados.
O autor comenta sobre a China em um exemplo:
[...] quando as pessoas falam do poder crescente da China ou da Índia, elas tendem a apontar para as populações maiores e para os recursos econômicos ou militares aumentados desses países. Mas se a capacidade que esses recursos implicam pode realmente ser convertida em resultados preferidos vai depender dos contextos e da habilidade do país em converter os recursos em estratégias que produzam esses resultados. (NYE, 2011).
Portanto, é preciso focar a atenção para os contextos e estratégia de um país
para medir seu poder. “As estratégias relacionam os meios aos fins, e aquelas que
combinam com sucesso os recursos de poder duro e brando em diferentes
contextos são a chave para o poder inteligente.” (NYE, 2011, p. 32). O conceito de
poder então deixa de ser uma simples constatação de quantos recursos um país
tem, e passa a ser um conjunto de recursos e estratégias usadas para se alcançar
objetivos preferidos.
Os estados do mundo estão em constante procura de mais poder. O autor de
base teórica realista estrutural, John J. Mearsheimer (2006), explica que a procura
do poder pelos estados se dá por cinco suposições: primeiramente os estados são
os principais atores no sistema internacional e este sistema é anárquico, ou seja,
não há nenhum poder controlador acima dos estados. Segundo, todo estado possui
alguma capacidade ofensiva, não importando o tamanho dessa capacidade. Se
existe alguma possibilidade de dano vindo de fontes externas, por menor que seja, o
estado vai procurar mais poder para sua segurança.
Mearsheimer continua com a terceira suposição, que diz que um estado não
pode prever as intenções de outro estado. A força militar pode ser medida e
verificada, mas as intenções estão apenas na mente dos governantes, dificultando o
discernimento de movimentos futuros dos estados.
29
Em quarto lugar, todo estado procura manter sua sobrevivência. O autor diz
que um estado pode ter vários objetivos, e dá exemplos como a proteção dos
direitos humanos, mas nenhum desses objetivos será completado se o estado não
se manter, então a principal preocupação dele é a própria sobrevivência no sistema.
A última suposição é que os estados são atores racionais, ou seja, eles são
capazes de manter uma estratégia para aumentar suas perspectivas de
sobrevivência. Mas pelo mesmo motivo de ser racional, são significa que o estado
não vai cometer erros, pois os tomadores de decisão de um estado trabalham com
“informações incertas em um mundo complicado, e às vezes cometem erros sérios”
(MEARSHEIMER, 2006, p. 74).
Conforme essa série de suposições que o autor explica por que os estados
procuram poder, ele também explica que estes estados não podem depender de
nenhum outro para ganhar mais poder. Mearsheimer escreve:
Grandes poderes também entendem que eles operam em um mundo de autoajuda. Eles têm que depender em si próprios para garantir sua sobrevivência, porque outros estados são ameaças em potencial e porque não existe maior autoridade na qual se voltar se eles forem atacados. Isso não nega que estados podem formar alianças, que são frequentemente uteis para lidar com adversários perigosos. Na analise final, contudo, estados não tem escolha a não ser por colocar seus próprios interesses na frente dos interesses de outros estados como também da chamada comunidade internacional (MEARSHEIMER, 2006, p. 74, tradução própria)1.
Assim vemos que a busca pelo poder faz com que os estados levem seus
próprios interesses mais em conta que a dos outros, e que a corrida pelo poder pode
levar a conflitos entre eles. Se todo estado age de forma egoísta, o meio mais
seguro de um estado sobreviver neste sistema é ter uma quantidade de poder maior
que a dos outros estados, e que estes não ganhem poder à custa do primeiro.
Segundo Mearsheimer, e outros autores da corrente do realismo ofensivo, um
estado vai sempre procurar ganhar mais poder enquanto houver a possibilidade de o
fazerem. “Estados devem maximizar o poder, e seu objetivo final deve ser a
hegemonia, pois este é o melhor meio de garantir sua sobrevivência”.
(MEARSHEIMER, 2006, p. 75).
1 No original eminglês: “Great powers also understand that they operate in a self-help world. They have to rely on themselves to ensure their survival, because other states are potential threats and because there is no higher authority they can turn to if they are attacked. This is not to deny that states can form alliances, which are often useful for dealing with dangerous adversaries. In the final analysis, however, states have no choice but to put their own interests ahead of the interests of other states as well as the so-called international community”.
30
2.2. CHINA E O FUTURO DO PODER
Como já foi visto, a China tem um histórico de potencia internacional, com as
dinastias chinesas do passado que dominaram várias regiões da Ásia, com um
exército poderoso e sua grande economia ativa. Depois de um grande período de
recessão, tentando se adaptar a um novo ambiente, a China está de volta no
sistema internacional crescendo e voltando a ser um gigante econômico e militar.
Nessa incrível fase de crescimento recente que a China tem passado, vários
estudiosos já pensam o mundo onde a China seria o ator mais importante. Mesmo
que o governo chinês negue que procuram por hegemonia, nem mesmo na
região asiática, uma declaração de conteúdo contrário traria um receio na relação de
países com a China. Então eles são obrigados a declarar que não procuram
hegemonia para manter boas relações com a maior quantidade de países possível.
(BRESLIN, 2010, p. 36).
A ascensão da China trás duas previsões para o futuro: ela tenta mudar ou
reformular as regras do sistema internacional conforme sua própria vontade,
causando conflitos com outros países por ser uma ameaça à segurança deles e por
ser uma característica de qualquer transição de poder; ou o governo chinês continua
seguindo as normas vigentes do sistema internacional, jogando sem mudar as
regras do jogo por ser maior e mais forte (FOOT, 2010, p. 10, 11; LEGRO, 2010, p.
63, 64).
A primeira previsão tem um lado mais realista, onde qualquer transição de
poder é um caminho certo para o conflito bélico. Já a segunda mostra a
interdependência entre os Estados agindo, pois a China não estaria lutando contra
apenas uma potência em decadência, mas contra todo o sistema de governânca
ocidental.
A influência crescente da China no estudo do futuro internacional mostra a
decadência dos Estados Unidos como potência hegemônica. O sistema criado
pelos americanos depois da Segunda Guerra Mundial abrange outros países de
governo democrático e capitalista, excluindo governos considerados como
comunistas (IKENBERRY, 2010, p. 65), e isso fez com que a China se tornasse uma
alternativa aos modelos vigentes no sistema internacional (BRESLIN, 2010, p. 42).
Os Estados Unidos tentam aumentar a força de influencia na Ásia para
competir com os chineses, mas eles usam métodos característicos de poder brando.
31
A cultura americana foi tão bem aceita pelo resto do mundo que já pode ser
considerada uma cultura mundial (ORTIZ, 1993). A China vem tentando mudar essa
realidade, e desde 2007 vem criando estratégias de compartilhar sua ideologia e
cultura no mundo.
A China sempre teve uma atrativa cultura tradicional, e agora vem criando algumas centenas de Institutos Confucianos em todo o mundo para ensinar sua língua e cultura. A inscrição de estudantes estrangeiros na China vem crescendo de 36,000 à uma década atrás para pelo menos 240,000 em 2010, e enquanto a Voz da América (serviço de radiodifusão americano transmitido apenas para não americanos) cortava sua transmissão chinesa, a Radio Internacional da China estava aumentando sua transmissão em inglês para 24 horas por dia. (NYE, 2012, tradução própria)2.
O governo chinês já gastou bilhões de dólares procurando um maior poder
brando, mas a ideia da cultura chinesa se sobressair como outra cultura mundial é
um objetivo difícil de alcançar. A cultura ocidental já engloba várias outras, com
restaurantes, esportes e outros meios de recreação, que podem ter origens na China
do passado, mas que já foram usurpadas pelo Ocidente do presente. O meio mais
eficiente de influência por poder brando seria nos projetos de cooperação, que será
comentado mais a frente.
Os Institutos Confucianos são promovidos pelo Conselho de Língua Chinesa
Internacional, conhecido em sua abreviação chinesa como Hanban, e trabalham
para que a cultura e língua chinesa se espalhem pelo globo. A cultura tradicional da
China tem milhares de anos como já foi visto, e ela é respeitada por estrangeiros,
principalmente se vindos de países asiáticos, onde o governo chinês aplica mais
força de influência, e essa sabedoria milenar atrai estudantes com facilidade, sendo
uma fonte de forte poder brando. O discurso chinês de paz e harmonia mundial
também remete a suas filosofias milenares, vindas de Confúcio e Sun Tsu, entre
muitos outros filósofos clássicos da China (BRESLIN, 2010, p. 43; NYE, 2012). É um
meio indireto de mostrar o valor de sua cultura para o mundo, e uma ótima
estratégia de influência com poder brando.
Por outro lado, esse discurso harmonioso se contrapõe ao histórico chinês de
guerras e opressões:
2 No original em ingles: “China has always had an attractive traditional culture, and now it has created several hundred Confucius Institutes around the world to teach its language and culture. The enrollment of foreign students in China has increased from 36,000 a decade ago to at least 240,000 in 2010, and while the Voice of America was cutting its Chinese broadcasts, China Radio International was increasing its broadcasts in English to 24 hours a day”.
32
Por exemplo, Dirlik (1995, p. 263-264) questiona a natureza pacífica da sociedade doméstica no passado da China: “Historicamente falando, clichês sobre harmonia e complementaridade apagam todos os conflitos trabalhistas, lutas femininas e opressão étnica na sociedade chinesa, que passou por uma das maiores e mais dolorosas revoluções da história moderna.” Cohen (2007, p. 683-704), por sua vez, enfatiza que, nas relações exteriores do país, o uso do poder chinês na região foi menos que “brando”, argumentando que “historicamente, uma China forte brutalizou os fracos”. (BRESLIN, 2010, p. 43).
Juntamente com seu histórico expansionista, a China tem passado por
mudanças recentes em sua política, interna e externa. O presidente chinês Xi
Jinping, que assumiu seu cargo em março de 2013, tem aplicado uma reforma com
o objetivo de rejuvenescer a nação. O objetivo principal de Xi é o extermínio da
corrupção no Partido Comunista da China, que ele vem fazendo com sucesso (ele
triplicou o numero de punidos por corrupção no seu primeiro ano de governo), mas
seus métodos recebem críticas por serem mais conservadores e realistas. O
presidente chinês tenta mudar a cara do governo sobre o PCC, que já tem sua fama
corrupta, e dar ao partido um lado mais jovem e com ideias contemporâneas.
(ECONOMY, 2014, p. 80, 84).
Mesmo tendo esse discurso de China rejuvenescida, suas ações lembram
muito mais de uma época antiga da China, quando as dinastias ainda governavam.
Ele centralizou o poder sobre si mesmo, retirando alguns dos deveres do primeiro
ministro, como a economia chinesa, e criou novas instituições governamentais com
seu nome no comando. Silencia a oposição com uma repressão de informação para
alienar cidadãos mais ricos e talentosos e melhorar sua imagem própria. Xi também
tem um grande comando no exército chinês, que ganhou maiores investimentos
financeiros no novo governo. O presidente mostra um medo de característica realista
de ter o poder do estado chinês minado se as portas forem abertas para a ideia
política e econômica do ocidente. (ECONOMY, 2014, p. 80-81).
Os prejudicados mais visíveis dessa política mais dura são os internautas
chineses, que são considerados voz política alternativa. Blogueiros chineses com
grande número de seguidores não tocam mais em assuntos sensíveis sobre a
política no seu país. Uma nova regulação da Internet foi feita, e usuários podem
receber penas a partir de três anos por posts com grande numero de leitores e que
as autoridades considerarem “rumor”. Vários sites tem seus conteúdos apagados
pelo governo, e programas de mensagem instantânea obrigam seus usuários a usar
33
seus nomes reais e restringem assuntos sobre política. (ECONOMY, 2014, p. 82-
83).
O presidente Xi também planeja um novo tipo de Rota da Seda, onde um
conjunto de linhas férreas, estradas e oleodutos ligariam a China com toda a Ásia,
Oriente Médio e até Europa. O governo vem estatizando várias empresas e propõe
que os bancos chineses financiem a construção deste gigantesco projeto. Neste
também há esperança da construção de um trem-bala que conecte a China à
América do Norte pelo Estreito de Bering. (ECONOMY, 2014, p. 88)
Todos esses projetos, junto com a recente reafirmação de poder na Ásia e
uma maior atividade militar mostram uma atitude imperial no governo chinês, que
remete às antigas e ricas dinastias, e o presidente Xi(apud ECONOMY, 2014, p. 90)
afirma que quer reposicionar a China como um dos grandes no sistema
internacional. Essa movimentação e reforma pode trazer desconfiança, medo e até
ações restritivas de outras potências e de seus vizinhos. A atitude antiamericana do
presidente também leva os EUA a pisar leve nos assuntos do oriente asiático. Mas
uma China poderosa, sem corrupção e com a economia mais centralizada também
trazem expectativas para um futuro em que negociações no sistema internacional
sejam mais fáceis.
O governo chinês ainda enfrenta sérios desafios para se adequar no sistema
internacional como uma potência confiável (para o Ocidente), o país tem sérios
problemas quando o assunto é direitos humanos. Segundo Kleine-Ahlbrandt (2008,
p. 38), a política internacional da China tem um sério compromisso em não
interferência de soberanias estrangeiras e isso se aplica a países com regimes
autoritários. A aliança do governo chinês com a Coreia do Norte trouxe vários
problemas e preocupações para as potencias ocidentais e para a própria China na
década passada.
A posição da China com países considerados “párias” tem mudado conforme
seu crescimento acelerado na economia provoca mudanças na aproximação com
outras potências. Antes dos anos 2000 a diplomacia chinesa era completamente
protetora dos países aliados, não importando se seu governo era autoritário, tirano e
provocasse massacres contra seus cidadãos. A China não chegava a defender seus
aliados párias na ONU, preferindo manter uma posição mais segura e fora dos
holofotes, seguindo a estratégia do ex-secretário do PCC, Deng Xiaoping (apud
KLEINE-AHLBRANDT, 2008, p. 39), que diz “observe calmamente; garanta a nossa
34
posição; lide com assuntos com calma; esconda nossas capacidades e espere
nossa vez; seja bom em manter a discrição; e nunca clame liderança.”
À medida que a China se tornou um dos gigantes econômicos, suas ações se
tornaram mais radicais na proteção de seus aliados na margem da sociedade
internacional. Em 2004 a China prometeu vetar as sanções contra o Sudão no
Conselho de Segurança, e sugeriu que seria inapropriado para os outros
participantes do conselho tratarem da crise nuclear no Irã quando ela começou.
(KLEINE-AHLBRANDT, 2008, p. 39-42).
O autor continua comentando que essa posição protecionista começou a
mudar com a troca de presidentes em 2005, com Hu Jintao no lugar de Jiang Zemin.
O governo da Coreia do Nortenão partilhava mais a aliança aberta de antes, e os
Estados Unidos passaram a mandar avisos velados de alerta para o bom
relacionamento da China com párias. Para não perder com ambos os lados, a o
governo chinês tomou uma posição mais neutra, apoiando sanções contra a Coreia
do Norte por parte dos EUA, e simultaneamente defendendo Pyongyang mesmo
depois de testes balísticos em 2006. Essa posição “em cima do muro” por parte da
China serviu de lição para o futuro, pois teve maus resultados perante a Coreia, que
perdeu sua confiança na China; e falhou em provar para os diplomatas americanos
que estavam sérios em restringir os testes nucleares norte-coreanos
Depois desse episódio, a China passou a tomar uma posição mais
controladora com seus aliados mais polêmicos, restringindo suas relações com
estados párias quando necessário. A importância crescente da China no sistema
internacional faz com que suas ações sejam mais visíveis no mundo, e isso impede
o governo chinês de agir livremente segundo sua ideologia própria.
Mesmo que suas ações sobre estados párias tomem uma nova estratégia, o
protecionismo que a China tem sobre eles não acabou completamente. Se países
vizinhos da China passarem por uma mudança de regime, para uma democracia, é
muito provável que os governantes chineses interfiram com toda sua força, para
evitar que a influência americana aumente em sua região. (KLEINE-AHLBRANDT,
2008, p. 51).
Então a mudança de posição da China com estados ditatoriais pode ser vista
como uma simples mudança de estratégia para maximizar seu poder entre as
grandes potências. A China vai continuar a proteger seus aliados, mesmo que a
força dessa proteção esteja decrescendo com o tempo, e sua relação com potências
35
ocidentais não parece ter uma relação de amizade futura, mas isso não impede a
China de negociar e manter a relação livre de conflitos, para seu próprio crescimento
econômico.
A análise final sobre o futuro da China pode se dar pela semelhança das suas
ações com as dos Estados Unidos. Segundo Mearsheimer (2010, p. 389), A China
vai agir segundo as ações dos Estados Unidos para se assegurar como grande
potência no sistema internacional. Como já vimos, o autor defende que um estadovai
sempre buscar mais poder, e que o objetivo final de todos os estados é a
hegemonia, pois a maior segurança que um estado pode ter é se nenhum outro país
tem a mesma quantidade de poder que ele.
Mearsheimer (2010) defende que os EUA não são uma hegemonia no mundo
inteiro, mas apenas em sua região. Ele escreve que a China vai tentar dominar a
Ásia e o Pacífico como os Estados Unidos já dominam o hemisfério ocidental. Para
isso, a China vai aumentar seu poder para que nenhum de seus vizinhos mais
poderosos, como a Rússia, Índia e Japão, cheguem a ameaçar seu governo.
O poder chinês, deste modo e segundo o autor, ganharia um status de
hegemonia na região asiática e a China teria que afastar a influência dos Estados
Unidos o máximo possível. Qualquer influência americana seria negativa para o
avanço do poder chinês, assim como qualquer estado vizinho com forte poderio
militar. Conforme o autor, o crescimento chinês no sistema internacional trará
apenas conflito com a potência americana, e que é muito provável que os Estados
Unidos se movam contra a China como se moveu antes contra a União Soviética.
Mesmo que muitos autores tentem prever as ações da China e quais seriam
as mudanças que uma China hegemônica traria para o sistema internacional,
sempre haverá a chance de que nenhuma dessas previsões chegue à realidade, e
que o governo chinês se mova de modo inesperado. A certeza sobre as ações da
China no mundo somente virá com o tempo, e assim temos que esperar por ela.
36
3. RELAÇÕES SINO-AFRICANAS: HISTÓRICO E CRÍTICAS À PROCURA DO PODER PELA CHINA
Já vimos que a China é o alvo dos olhares de todo o mundo com seu
crescimento acelerado e por formar tantas dúvidas sobre o futuro do mundo. A forma
de governo chinês é muito diferente das potências dominantes internacionais, e
todas as outras diferenças do Ocidente faz a China ser olhada com estranheza pelo
mundo.
Nesse contexto de emergência e consolidação do poderio chinês encontra-se
a África, terceiro maior continente do mundo, segundo mais populoso e o mais
pobre. O continente tem problemas com a falta de comida, com milhões de pessoas
que sofrem de fome; vários governos ditatoriais de violência brutal, com presidentes
que chegam muito perto dos piores vilões fictícios, exércitos infantis treinados para a
guerra e batalhas armadas por facões e outras armas rústicas, entre outros. O
histórico africano é obscuro, cheio de rebeliões, guerras civis, doenças, dominação e
escravidão.
O mundo prefere fechar os olhos aos horrores que tantas pessoas passaram
ou ainda passam na África, e seus países são em sua maioria ignorados pelas
grandes potências. Esses estados tem pequena importância econômica e não
trazem o lucro que os países ricos procuram, e as vezes podem se passar
despercebidos no sistema internacional pela sua pobreza. Claro que existem vários
programas e projetos de ajuda internacional para países africanos, mas eles tem se
mostrado de pouca ajuda em um continente tão grande.
O governo da China, ao contrário de várias potências do Ocidente, viu nos
países africanos uma oportunidade, oferecendo ajuda financeira ou simplesmente
ampliando os negócios comerciais. A África pode ser pobre quando se trata de
dinheiro, mas o continente é cheio de riquezas quando se trata de recursos naturais,
com minas ricas em metais, florestas com grande biodiversidade e muitos campos
para plantio.
A China tem uma indústria gigantesca, e precisa continuar crescendo para
continuar com seus altos índices de desenvolvimento. Assim sua economia precisa
ser alimentada com grandiosas quantidades de recurso e os preços baixos dos
37
produtos chineses necessitam de custos de produção ainda menor. Os estados
africanos tem tudo isso, formando assim uma aliança com grandes ganhos pelas
duas partes.
As relações sino-africanas, como serão chamadas neste trabalho, foram
crescendo e hoje a África como um todo é o maior parceiro comercial da China (THE
PEOPLES REPUBLIC OF CHINA, 2013). Neste capítulo será realizado um histórico
breve sobre as relações sino-africanas e, também, as críticas de várias partes sobre
a presença da China na África, analisando a possível busca por poder hegemônico
por parte do dragão asiático em seus posicionamentos no continente africano.
3.1. HISTÓRICO DAS RELAÇÕES SINO-AFRICANAS
O histórico de relações da China com a África pode parecer um assunto
recente, mas os extensos escritos da história chinesa mostram que suas relações
datam do século XV. As negociações China-África foram percebidas pelo mundo
depois da realização da Cúpula China África em 2006. Este evento, realizado na
capital da China, reuniu quarenta e oito chefes de estado africanos. Estudiosos do
mundo inteiro tiveram sua atenção voltada para esta relação pela primeira vez,
mesmo depois de muitos anos de desenvolvimento entre as duas regiões.
A relação entre a China e o continente africano pode ser dividida em dois
períodos de tempo: antes de 1990 e depois. As estratégias de envolvimento e
cooperação tem uma mudança distinta nos dois períodos, e essa diferença se
relaciona diretamente com os planos de desenvolvimento e objetivos do governo
chinês.
3.1.1. RELAÇÕES SINO-AFRICANAS PRÉ-1990
A dinastia Ming, que reinou após a queda do império mongol, teve um
imperador tão poderoso que demandou tributos para governantes de vários reinos
na Ásia, Oceania e até a África. Grandes viagens eram empreendidas por
navegadores subordinados ao imperador, para coletar tributos e explorar mares
desconhecidos, chegando assim à costa oeste africana. Um navegador chinês
chamado Zheng He, muçulmano, é citado na história como o “Grande Eunuco dos
Três Tesouros” e visitou a costa africana duas vezes, entre 1403 e 1433 para coletar
38
tributos para seu imperador. Os escritos mostram que os exploradores chineses não
continuavam sua expedição depois de chegar a terra, como os europeus faziam,
mas apenas coletavam o que era previsto e voltavam para o mar.(PLETCHER,
2011, p. 92-93; MENEZES, 2013, 68)
Menezes (2013) mostra que essa primeira relação de chineses com africanos
foi um ato isolado na história, mas é utilizada pelos líderes chineses como um marco
mostrando o quão antigo é a relação de amizade da China com os africanos. Os
líderes chineses também lembram que a viagem de seus exploradores não foram
seguidas por uma invasão colonialista, como os europeus empreenderam sobre a
África algumas décadas depois do primeiro contato China-África.
Há um grande hiato nos registros históricos relacionando as duas regiões.
Segundo Pletcher (2011), depois da fundação da República Popular da China, na
década de 1950, os governantes sofreram várias retaliações por parte dos Estados
Unidos, devido a ajuda que os chineses ofereceram aos norte coreanos para se
defender dos americanos. Depois destes acontecimentos, os tomadores de decisão
da China viram que se manter distante e isolado da política internacional traria várias
complicações para seu crescimento. O primeiro ministro ZhouEnlai entrou para a
história como o principal arquiteto da política externa chinesa, pela criação dos cinco
princípios da coexistência pacífica, em 1950. (MENEZES, 2013, p. 41-42)
Segundo Menezes (2013), estes cinco princípios são: a) respeito mútuo à
integridade territorial e soberania; b) não agressão; c) não interferência em negócios
internos; d) benefícios mútuos e igualdade; e) coexistência pacífica. A linha de
discurso de ZhouEnlai continua a ser utilizada ainda hoje em toda relação bilateral
da China, e seus cinco princípios de coexistência pacífica foram incluídos à
Constituição da República Popular, em 1982.
Foram primeiramente aplicados em 1954, no Acordo sobre Comércio e
Intercâmbio entre a Região do Tibete da China e da Índia, e logo depois em 1955,
na Conferência Ásia-África em Bandung, na Indonésia, que contou com a
participação de apenas cinco países africanos. (MENEZES, 2013)
Pletcher (2011, p. 310) afirma que a China nesse tempo começou a levar em
consideração que pequenos países asiáticos e africanos eram neutros, então não
eram considerados fantoches do ocidente. Como visto no capítulo 1, a China pós-
revolução comunista via os países ocidentais como antagônicos à sua ideologia. Na
conferência de Bandung, a China tratou de várias questões com países africanos, e
39
o primeiro ministro Zhou simbolizou a participação diplomática mais ativa da China,
com seu slogan “União com todos” e discurso de coexistência pacífica. Zhou
também chamou atenção do mundo quando falou que seu governo estava
completamente preparado para manter boas relações com todos os países.
Segundo Menezes (2013), após a conferência de Bandung, a China
estabeleceu relações diplomáticas com o Egito, em 1956, este que foi o primeiro
estado africano a se relacionar diplomaticamente com o governo chinês, seguido por
vários outros países da África.
O autor ainda afirma que a China teve grande importância para os países
africanos em seus processos de independência, com um discurso anti-imperialista e
anti-colonialista Ela ofereceu ajuda governamental neste processo de
independência, atraindo assim os países recém-fundados para sua esfera de
influência, em uma relação com base na lista dos “cinco princípios de coexistência
pacífica”.
Na época, o PCC travava uma guerra contra seus antagonistas políticos em
Taiwan, lutando por reconhecimento na comunidade internacional. O KMT, antigo
partido chinês, era reconhecido pelos Estados Unidos e detinha uma posição nas
Nações Unidas como o governo legítimo da China, e o PCC procurava substituir
Taiwan nas organizações internacionais. As relações com países africanos se
revelaram muito importantes nessa época, onde a maioria das potências ocidentais
ignoravam a República Popular da China.
A relação da China com a África cresceu na década de 1960 até meados da
década de 70. O governo chinês apoiou muitas das revoluções e movimentos de
independência nos países africanos. A China era vista como líder pelos países mais
pobres, atraindo os novos países para sua ideologia e propagando o comunismo
neles, e ao mesmo tempo rejeitando os ideais capitalistas e imperialistas das
potências ocidentais, culpando-os pelo sofrimento dos países africanos por serem
colônias do Ocidente. Em 1978 a China já mantinha relações com 43 países
africanos. Na década de 70 as relações passaram por uma fase não muito
movimentada, principalmente pelos acontecimentos da Guerra Fria e as várias
revoluções que o povo chinês levantou, deixando pouco espaço para relações
externas com os países africanos. (ALDEN, 2007, p. 10; MENEZES, 2013, p. 70-71)
A política externa chinesa mostrou-se suscetível às mudanças impulsionadas
internamente pela Revolução Cultural da década de 1960. Menezes (2013) mostra
40
que a diplomacia chinesa tinha alguns defensores de uma “exportação da revolução”
como um objetivo central nas relações sino-africanas. Entretanto, essa estratégia
faltava com um dos cinco princípios da coexistência pacífica, que é a não
interferência em assuntos internos, levando a ideia de exportação da evolução a
passar despercebido por seus parceiros na África, e essa tendência chinesa acabou
no final dos anos 60, e o governo chinês impulsionou programas de assistência
governamental em países africanos, sem condicioná-los a sua própria ideologia
política.
Menezes (2013) descreve como exemplo significativo da amizade entre a
África e a China, a Grande Ferrovia Tazara, mais conhecida como Tam-Zam. Era
um projeto grandioso nos anos 1960 que ligaria mais tarde a Tanzânia a Zâmbia, e
teve vários pedidos de empréstimo dos dois países africanos negados pelo Banco
Mundial, Estados Unidos, Reino Unido, Japão e URSS. Em 1967 a China aceita
emprestar os recursos necessários e executar o projeto, que foi o maior financiado e
executado pela China no exterior. A maior ferrovia da África foi construída em cinco
anos, e empregou vinte mil trabalhadores, e todos eles chineses. O modelo usado
para a execução da obra é utilizado até hoje em projetos chineses na África.
Menezes explica que com a entrada de Deng Xiaoping na liderança do PCC,
em 1982, houve uma pausa no avanço das relações diplomáticas, refletindo na
negligência dos países africanos na política externa do dragão asiático na década de
1980. Apesar disso, Deng modificou a política da China, trazendo algumas
características capitalistas e assim aumentando o nível do desenvolvimento
econômico do país. Já no começo da década de 80 ele previu que o impasse da
Guerra Fria poderia trazer algumas décadas de paz ao mundo, e assim levantou
uma ideia de desenvolvimento e modernização econômica na China. Menezes
(2013, P. 43) transcreve uma afirmação do presidente Deng em 1985, no Comitê
Militar:
[...] nosso ponto de vista foi sempre que a guerra é inevitável e iminente. Depois de cuidadosa observação da situação nos anos recentes, nós acreditamos agora que há uma possibilidade de uma guerra mundial em grande escala não acontecerá em umperíodo de tempo relativamente longo. A manutenção da paz mundial é promissora (Tradução própria)3.
3No original em inglês: “[…] our viewpoint has always been that war is unavoidable and imminent. After careful observation of the situation in recent years, we now believe that it is a possibility that world war on a large scale will not break out for a relatively long period of time. The maintenance of
41
Esse discurso se difere de outros anteriores, pois o governo de Mao Tse-Tung
estava preparado para a eclosão de uma terceira guerra mundial acontecer a
qualquer momento. A ideia de paz mundial trazida por Deng Xiaoping fez a China
entrar em um processo de desenvolvimento econômico muito forte, com as grande
porcentagem de crescimento anual que o sistema internacional está habituado a ver
do gigante hoje. A pobreza da população da China teve uma queda significativa,
descendo de 280 milhões de pessoas em estado de pobreza em 1978 para 140
milhões em 2004. (ALDEN, 2007, p. 10)
O distanciamento do governo chinês com a África foi justificado pelas
lideranças chinesas como um momento onde o governo da China tinha como
prioridade o seu próprio desenvolvimento, podendo assim se tornar uma potência
moderna e facilitando as cooperações futuras com países mais pobres. A década de
80 é considerada como um tempo de pouca atenção para países menores, mas o
primeiro ministro chinês ZhaoZiyang fez um tour de dezembro de 1982 a janeiro de
83, passando por onze países africanos. Deste tour a China obteve melhores
resultados nas relações com os países africanos, então a África não foi
completamente ignorada neste período. (MENEZES, 2013, p. 77)
Nessa primeira fase de cooperação entre a China e o continente africano,
vemos que o princípio usado para a prática de cooperação entre eles é
principalmente ideológico. A disseminação do comunismo nos países africanos era
como um requisito para a cooperação com a China, e as negociações bilaterais
entre as duas regiões cresceu conforme a influência ideológica chinesa crescia
também. Na segunda fase do histórico da cooperação sino-africana as razões
mudaram.
Alden (2007) explica que a estratégia de desenvolvimento feita pelo governo
chinês incluía em seus planos que a China deveria crescer independentemente de
ajuda externa, com seus próprios recursos naturais. Naturalmente, depois da
explosão econômica, estes recursos foram se esgotando em suas fontes na China, e
as indústrias chinesas precisavam de uma nova fonte de recursos naturais e
energia, e a procura os levou aos recursos inexplorados da África, que já mantinha
relações de amizade.
3.1.2. HISTÓRICO APÓS A DÉCADA DE 1990
world peace is promising”.
42
A partir da década de 1990, a China abre novamente suas relações externas,
e dá prioridade aos estados africanos, procurando parceiros comerciais para a
continuidade do desenvolvimento da máquina econômica chinesa. Nesse período,
os líderes chineses aumentam o numero de cúpulas internacionais e cooperações
econômicas, e a China demonstra uma nova confiança em sua diplomacia, que
demorou a se adaptar no sistema internacional.
Os estados africanos também tinham mais confiança nas negociações com a
China do que com potências ocidentais, pois eles se identificavam com a procura
pelo desenvolvimento dos chineses, e pelo fato da China promover cooperações
Sul-Sul. A diplomacia chinesa defendia a soberania e independência dos países
africanos, se opondo a intervenções estrangeiras e respeitando os sistemas políticos
escolhidos pelos africanos. (MENEZES, 2013, p. 81)
Nessa década, o plano concebido por Deng Xiaoping para desenvolver a
economia chinesa já estava em prática, e a rápida entrada da China no sistema
internacional como um ator ativo atraiu o olhar do Ocidente. Segundo Alden (2007),
a tática que o governo chinês usou no investimento na indústria petrolífera do
Sudão, em 1996, foi uma importante plataforma para que países ricos em petróleo
se interessarem pela África e Oriente Médio. O Sudão partilha 40% da sua
companhia de petróleo com a China, e é responsável por 10% de todo petróleo
usado pelos chineses.
Menezes escreve:
Em 1991, por iniciativa do Chanceler QianQichen, inicia-se a prática de o Ministro dos Negócios Estrangeiros da RPC inaugurar seu calendário anual de visitas ao exterior com uma viagem a países africanos.103 O próprio Qian, entre 1991 e 1995, realizou visitas a 36 países africanos. Essa prática, que já completou vinte anos, foi qualificada pelo Chanceler Yang Jiechi como uma “tradição não escrita da diplomacia chinesa”, em seu périplo africano de janeiro de 2009, e, sem dúvida, é bem recebida pelos países africanos, por sinalizar a importância que Pequim atribui ao continente. (MENEZES, 2013, p. 82)
Essa estratégia mostra uma mudança na relação sino-africana, agora
tomando a forma de uma amizade e não mais como uma cooperação baseada na
partilha de ideologias políticas semelhantes. Menezes (2013) também aponta
quando, em 1996, essa mudança se tornou mais visível quando o presidente da
China, Jiang Zemin, realizou uma visita oficial a sede da Organização da Unidade
43
Africana (OUA), atual União Africana. Essa visita mostrou que o governo chinês não
se preocupava apenas com a relação bilateral entre seu estado e países africanos,
mas que a África era importante para a China como um todo. Segundo Menezes
(2013, p. 83), Jiang discursou na OUA apresentando a “Proposta de Cinco Pontos”,
um planejamento para a melhoria das relações sino-africanas em longo prazo. São
elas:
I. promover sincera amizade entre os dois lados e fazer um do outro “o
amigo de todas as horas” (all-weather-friends);
II. tratar um ao outro como igual e respeitar a soberania do outro e abster-
se de interferir em assuntos internos da outra parte;
III. buscar o desenvolvimento conjunto com base no benefício mútuo;
IV. aprofundar consultas e cooperação em assuntos internacionais;
V. olhar o futuro e criar um mundo esplêndido.
Novamente um governante da China cria um guia de cinco pontos com
objetivos simples, para servir de manual no relacionamento entre a China e a África,
mas diferentemente dos cinco princípios da coexistência pacífica de ZhouEnlai, os
novos apresentam um conteúdo mais pragmático que ideológico. O presidente Jiang
também sugeriu a criação de uma cúpula China-África nessa visita a OUA, que viria
a acontecer quatro anos depois. (MENEZES, 2013, p. 83)
Outro fator importante para o crescimento das relações sino-africanas seria o
desinteresse dos Estados Unidos e outras potências do Ocidente com a África nos
anos pós guerra fria. Na década de 90, o estado chinês tinha novas oportunidades
de cooperação no sistema internacional, principalmente pelo seu crescente
desenvolvimento. Isso somando com o desinteresse dos EUA sobre países
africanos, as relações China-África cresceram com facilidade e rapidez. (MENEZES,
2013, p. 84)
A partir do ano 2000, o relacionamento da China com a África alcança outro
nível. Em outubro desse ano foi criado o Foro de Cooperação China-África, mais
conhecido como FOCAC4. Segundo Menezes (2013), sua criação reformulou essa
relação e essa estrutura institucional foi a primeira do tipo no governo chinês, pois
ela nunca havia aplicado uma instituição especializada nas relações com países
estrangeiros.
4 No original eminglês: Forum on China-Africa Cooperation.
44
Segundo o site oficial do foro (2013), o FOCAC foi criado em “[...] iniciativa
conjunta da China e África, e tem como propósito o fortalecimento da cooperação
amigável entre a China e estados africanos, enfrentando juntos os desafios da
globalização econômica e buscar o desenvolvimento comum”.
O governo chinês mantém o site do FOCAC, onde é encontrado várias
informações sobre o foro, seus encontros ministeriais e notícias sobre ações
conjuntas feitas pelas duas partes. O site pode ser lido em três línguas, sendo elas
inglês, francês e mandarim.
Com a criação do FOCAC, as atividades conjuntas da relação sino-africanas
se tornaram mais frequentes e fáceis de ser realizadas. Fazem parte do FOCAC a
China e 50 países africanos5, e o governo chinês aponta como objetivos do foro a
“consulta igualitária, reforço da compreensão, expansão do consenso, fortalecimento
da amizade e promoção da cooperação” (FOCAC, 2013). Esses objetivos são como
palavras-chave se um guia de bom relacionamento entre as duas partes, e mostram
uma iniciativa chinesa de melhorar ainda mais suas relações com países africanos.
Essa iniciativa foi muito bem aceita entre os governantes da África, e já aconteceram
cinco conferências ministeriais, sendo a primeira em Pequim, no ano 2000, que foi a
conferência inaugural do FOCAC; a segunda em Adis Abeba, na Etiópia, em 2003; a
terceira novamente em Pequim, em 2006; a quarta conferência em Sharm el-Sheikh,
no Egito, em 2009; e a última em Pequim, em 2012.
Todas essas conferências ministeriais trouxeram grandes aumentos nas
relações comerciais e políticas entre as duas regiões. A primeira conferência foi
chave para a criação de diversas instituições e órgãos chineses especializados para
facilitar e impulsionar as relações econômico-comerciais. Na segunda Conferência
Ministerial do FOCAC, realizada em Adis Abeba em 2003, e segundo Alden (2007,
p. 31), a China cancelou as dívidas de trinta e um estados africanos, totalizando
incríveis 1.27 bilhões de dólares, e reduziu tarifaz de exportação para vinte e oito
dos países mais pobres da África. Também foi decidido aumentar a comercialização
5Os 50 Estados africanos participantes do FOCAC são: Argélia, Angola, Benin, Botswana, Burundi, Camarões, Cabo Verde, República da África Central, Chade, República do Congo, União das Comores, Cote d 'Ivoire, República Democrática do Congo, Djibuti, Egito, Guiné Equatorial, Eritoria, Etiópia, Gabão, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Quênia, Lesoto, Libéria, Líbia, Madagascar, Malawi, Mali, Mauritânia, Maurícias, Marrocos, Moçambique, Namíbia, Níger, Nigéria, Ruanda, Senegal, Seychelles, Serra Leoa, Somália, África do Sul, Sudão, Sudão do Sul, Tanzânia, Togo, Tunísia, Uganda, Zâmbia e Zimbabwe.
45
sino-africana para 28 bilhões de dólares até 2006, valor que foi excedido no tempo
objetivo.
Segundo Menezes (2013, p. 90), em 2006 o FOCAC ganharia um grande
impulso. A China declarou 2006, ano em que seria celebrado o aniversário de 50
anos das relações sino-africanas, como o “Ano da África”. O continente africano foi
visitado pelo presidente Hu Jintao e pelo primeiro ministro Wen Jiabao no começo
do ano, e em novembro aconteceu a 3ª Conferência Ministerial e Primeira Cúpula do
FOCAC, em Pequim. Na ocasião, como descrito por Alden (2007), toda a cidade foi
enfeitada com referências às culturas de países africanos, com pessoas vestindo
roupas tribais e animais típicos da savana africana em pôsteres enormes cobrindo
os prédios de Pequim.
Nessa Cúpula, a China se comprometeu a liberar cinco bilhões de dólares em
empréstimos e crédito aos países africanos, e em dobrar sua assistência ao
desenvolvimento de estados africanos até 2009, além de alcançar uma meta de 100
bilhões de dólares nas negociações até 2010, assim tornando a África o maior
parceiro comercial da China. Menezes diz que a meta dos 100 bilhões foi alcançada
dois anos antes, em 2008, mas teve um decréscimo de 10 bilhões em 2009,
causado pela crise econômica internacional. Em 2010 o intercâmbio voltou a soma
de 100 bilhões.
A Cúpula de 2006 também foi um ponto importante para toda cooperação Sul-
Sul, onde o presidente Hu Jintao (apud MENEZES, 2013) aponta a importância das
relações sino-africanas como um exemplo para todos os países em
desenvolvimento, defendendo uma maior relação Sul-Sul e aumentando a influência
de países em desenvolvimento em instituições internacionais, como a ONU, OMC,
Banco Mundial e FMI, com um discurso que defende a igualdade entre os países,
não importando se ele for grande ou pequeno, forte ou fraco.
Essa Cúpula foi importante para a relação sino-africana, onde atraiu os
olhares da comunidade internacional, pois a reunião de tantos chefes de estado
africanos na China chamou a atenção da mídia internacional sobre o FOCAC. Essa
súbita mudança de interesse sobre as relações da China com a África resultou em
vários estudos e análises de estudiosos da política internacional, e mostrou o
resultado de um plano de melhoria das relações sino-africanas que foi conduzido por
vários anos. (MENEZES, 2013)
46
A 4ª Conferência do FOCAC, em Sharm el-Sheikh, se deu em 2009, e tinha
como discurso principal o compromisso de “aprofundar o novo tipo de parceria
estratégica sino-africana para o desenvolvimento sustentável”. (FOCAC, 2009) A
conferência, segundo Menezes (2013), foi em sua maioria sobre a continuidade das
cooperações já em andamento depois de 2006, que se mostraram tão assertivas e
com bons resultados. Dois problemas particulares foram citados, sendo eles a crise
financeira internacional e a mudança do clima.
O discurso dos líderes chineses continua seguindo a mesma linha na 5ª
Conferência Ministerial do FOCAC, que aconteceu na China em 2012. Segundo a
Embaixada da China no Brasil (2012), foi falado no FOCAC V que a relação sino-
africana é de grande importância para a paz, estabilidade e desenvolvimento do
mundo. Também se pede mudanças no tratamento de países menores pelas
instituições internacionais, e que a crise internacional ainda é uma ameaça, sendo
que os estados devem trabalhar em conjunto por meio de cooperação e promoção
da paz, para assim recuperar a economia mundial. Também foi tratado sobre
mudanças climáticas, catástrofes naturais e propagação de doenças.
Fica claro que o FOCAC se tornou a instituição com maior importância
quando se trata de relações sino-africanas. Desde a sua criação as relações entre
as duas partes cresceram com rapidez impressionante, relevando a importância
dessa relação para o mundo. Essa crescente relevância do relacionamento China-
África trouxe vários tipos de reação em potências ocidentais, umas criticando e
outras elogiando. A reação positiva e rápida aceitação dos negócios de base
chinesa pelos governos africanos mostram que a aproximação chinesa foi muito
efetiva. Alden (2007) escreve que os governantes e líderes empresariais africanos
expressam uma admiração pela política de aproximação chinesa, que causou uma
euforia no público raramente identificada na política mundial.
3.2. UMA RELAÇÃO DE BENEFÍCIOS MÚTUOS?
Já foi visto que a diplomacia chinesa mostrou grande poder estratégico na
política de aproximação no continente africano. Em questão de poucas décadas, a
China ultrapassou a presença das potências ocidentais, que já participavam de
negociações com a África a mais tempo, e fez do continente africano o maior
parceiro comercial da China, enquanto relações com o Ocidente ainda trazem
47
memórias por ter colonizado e explorado a África em tempos passados, estratégia
também utilizada com sucesso pelos governantes chineses.
Claro que o maior desenvolvimento que a África tem passado por conta da
política chinesa contrasta com uma austeridade econômica geral que os países
africanos apresentam, causado pela pobreza que assola grande parte do continente.
Isso faz com que as políticas de desenvolvimento sino-africanas tenham uma
aceitação ainda maior pela parte africana.
A China aumenta as capacidades técnicas dos africanos com bolsas de
estudo e cursos técnicos, liberam recursos financeiros para empréstimo por
governos, perdoam dívidas de grande valor em estados mais pobres, empresas
chinesas tem uma presença cada vez mais visível em terras africanas. Além disso,
toda sua política diplomática defende a soberania dos estados que se relacionam
com ela, e não tenta controlar os governos internos africanos por conta de sua
cooperação com eles. Esses meios de cooperação se diferem das políticas
Ocidentais, apresentando uma assistência ao desenvolvimento de melhor qualidade.
Alden declara que o monopólio sobre o desenvolvimento mantido pelo Ocidente foi
quebrado, em certo sentido.
No lado chinês, suas relações com a África foram ideais, onde a abundância
de recursos oferecidos pela contraparte africana é de grande importância para a
produção em indústrias da China. A resposta positiva dos governos africanos aos
investimentos chineses, além de surpreender os chineses, trouxeram maior apoio
para o governo chinês em cenários multilaterais.
Outro fator importante na relação e que a África se mostra um bom cliente de
produtos industrializados chineses, que tem preços acessíveis e elevam a qualidade
de vida dos africanos. Os produtos chineses exportados para a África não tem
tecnologia de ponta e não tem uma boa qualidade, mas o mercado africano compra
pelo preço acessível e pela simples falta de outros produtos. (ALDEN, 2007)
A presença chinesa na África traz muitas críticas no sistema internacional,
principalmente pelo lado do Ocidente, que pode considerar a presença da China do
continente como uma ameaça. Uma das acusações que mais aparecem na mídia
ocidental é a de uma nova colonização da África por parte do governo chinês, ou
neo-colonialismo.
Nesse caso, a China estaria desenvolvendo melhores relações com estados
africanos para proteger fontes de petróleo, que é o principal produto comprado pela
48
China, e de outros recursos naturais e energéticos (como pode ser visto na Tabela
3.1). É verdade que a China usa de recursos naturais e petróleo africano para
sustentar sua população, mas um novo colonialismo ou uma estratégia imperialista
de dominância do continente africano vai completamente contra sua política
diplomática de não interferência. (ASHAN, 2008)
TABELA 3.1.PAUTA DA IMPORTAÇÃO DA CHINA ORIUNDA DA ÁFRICA (EM %) – 1995-2009
1995-1997 1998- 2000 2001-2003 2004-2006 2000-2009
Commodities e petróleo 76.4 84.7 87.1 91.6 93.3
Intensivo em trabalho e recursos
naturais
7.6 5.4 4.0 3.6 2.5
Baixa intensidade tecnológica 4.6 2.9 3.9 2.0 2.1
Média intensidade tecnológica 7.9 4.5 2.5 1.3 0.8
Alta intensidade tecnológica 3.3 2.4 2.4 1.5 1.2
Não classificados 0.2 0.1 0.1 0.0 0.0
Fonte: HANDBOOK OF STATISTICS/UNCTAD apud IPEA, 2011
O autor Li Ashan continua dizendo que o comércio de recursos naturais,
incluindo o petróleo, fez com que os estados africanos que participam dela
ganhassem uma nova força econômica. O que antes era um potencial e riqueza
inexplorada, agora se tornou produto de comercialização real, e o recente
crescimento econômico do continente africano se deve em grande parte as
negociações sino-africanas (veja figura 3.1). Como já foi mencionado, antigos
importadores de petróleo se tornaram exportadores com a assistência técnica da
China, como é o caso do Sudão. Além disso, as estratégias de crescimento na
relação sino-africanas se deram antes da necessidade chinesa de mais recursos
naturais para sua indústria, que aconteceu por volta da década de 1990. Esse é o
discurso de defesa da parte chinesa das críticas de um novo colonialismo da África,
mas elas se mostram mesmo inconsistentes com a realidade.
Já uma crítica consistente é a de uma negociação desleal, de produtos
importados da China com produtos locais dos africanos. As empresas sul-africanas
divulgam que 55 mil trabalhadores perderam seus empregos de 2003 a 2005, por
49
culpa de mercadorias baratas chinesas, nos setores de calçados, vestuários e
têxteis. (COSATU apud Menezes, 2013)
O governo chinês também é criticado por não compartilhar tecnologias em
obras públicas como a já citada ferrovia Tam-Zam. Após o término da sua
construção, os governos locais não tinham tecnologia nem o conhecimento de como
manter as ferrovias em bom estado, levando assim a uma má manutenção e vários
problemas técnicos. Para as manutenções de obras públicas construídas pelos
chineses os governos precisam contratar serviços chineses.
50
FIGURA 3.1. OFERTAS DE INVESTIMENTO CHINÊS NA ÁFRICA – 2010-2012
Fonte: CHINA BUSINESS REVIEW, 2014
Outro problema muito importante nas críticas à relação sino-africana é a não
contratação de trabalhadores locais. Alden (2007) mostra que essa é a principal
preocupação por parte da população civil africana. As empresas chinesas que
chegam aos países africanos já trazem todos os seus trabalhadores da China,
51
treinados e prontos para o trabalho. Treinar os africanos para trabalhar nas
empresas chinesas traria maiores custos e até mesmo o pagamento feito para os
trabalhadores chineses é mais barato que o que os africanos pedem.
O autor se baseia em estatísticas chinesas e,segundo elas, o número de
trabalhadores chineses na África era de 82,000 em 2005, contrastando com os
42,000 de 2004. Não existem estatísticas corretas sobre a quantidade de
trabalhadores chineses nos tempos atuais, mas esses números devem ter crescido
exponencialmente, principalmente depois das negociações da Cúpula de 2006.
Segundo Alden, apenas na Angola, o número esperado de trabalhadores chineses
para 2008 era de 200,000, mas alguns rumores sugeriam um real número maior que
três milhões. Ademais, em cada obra chinesa na África, mais e mais trabalhadores
chegam às terras africanas. No continente com números altos de desemprego, esse
é um problema muito sério.
Alden (2007) justifica essa estratégia da China de trazer seus trabalhadores
como uma forma de completar o trabalho o mais rápido possível e com o mínimo de
problemas. O trabalho chinês é reconhecido como um dos mais rápidos e eficazes
do mundo. O treinamento de trabalhadores africanos para seus projetos não
possibilitaria o tempo curto do planejamento chinês. Lusaka (apud ALDEN, 2007, p.
83, tradução própria), um gerente de uma corporação governamental na capital de
Zâmbia, explica:
O povo chinês pode aguentar trabalho muito difícil. Isso é uma diferença cultural. Povo chinês trabalha até terminar e então descansam. Aqui eles são como os Britânicos, eles trabalham de acordo com um plano. Eles têm várias pausas para o chá e muitos dias de folga. Para nossa companhia de construção isso significa que custa muito mais.6
O governo chinês pode não fazer de propósito, mas existe um tipo de política
de emigração para a China. Os trabalhadores são informados por propagandas
governamentais de grandes oportunidades de negócio na África, e assim cada vez
mais cidadãos chineses vão para países africanos em busca de uma melhoria
financeira. Os dados estatísticos não podem mostrar números reais de emigração
por parte dos chineses por uma simples falta de interesse do PCC em contá-los. O
6 No original eminglês: “Chinese people can stand very hard work. This is a cultural difference. Chinese people work until they finish and then rest. Here [in Zambia] they are like the British, they work according to a plan. They have tea breaks and a lot of days off. For our construction company that means it costs a lot more.”
52
grande número de emigrantes ilegais também dificulta qualquer cálculo no assunto.
(ALDEN, 2007)
O problema do grande número de chineses nos países africanos leva a vários
casos de xenofobia e racismo. Pequenos donos de negócios, como lojas de
conveniência, são com frequência, em propriedades de chineses, e sofrem muito
preconceito por parte dos locais, culpa conjunta da política de empresas chinesas de
não contratar locais e pelo crescente número de chineses da África. Menezes (2013,
p. 174) descreve uma eleição presidencial recente na Zâmbia, onde o partido que
venceu utilizou um discurso anti-China para alcançar seus eleitores, com a utilização
de materiais eleitorais onde o povo chinês é retratado como ladrão e não confiável.
Outra grande crítica sobre as relações sino-africanas é a cooperação com
estados párias, como já foi mencionado neste trabalho. Seus planos de cooperação
com países que sofrem sanções por quebra de direitos humanos são alvo de críticas
de países europeus e dos Estados Unidos.
Um dos casos principais é o de Zimbábue, que sofre sanções por fortes ações
políticas contra partidos da oposição (ASHAM, 2008) e uma reforma de
propriedades, desapropriando as terras de negros e passando-as para os negras.
Zimbábue sofre sanções internacionais desde 2002, mas a China vem sendo uma
ótima alternativa como parceiro comercial, que segue a sua política de não
intervenção política. (MENEZES, 2013)
Outro caso é o do conflito em Darfur, região do Sudão que passa por um
conjunto de problemas, que, segundo Asham (2008),envolve desde suas origens
históricas, conflito religioso, migração de refugiados, pobreza, até a degradação
ambiental. Segundo Menezes (2013), a China é acusada de apoiar o regime
ditatorial que causou milhares de mortes entre 2003 e 2009, mas o governo chinês
seguiu sua política de não interferência, além de proteger o Sudão em reuniões do
Conselho de Segurança da ONU.
Mesmo com essa lista de críticas a presença da China em países africanos, a
cooperação entre as duas regiões é muito importante para o crescimento econômico
deles. A China já pode ser considerada uma potência, mas precisa da África para
continuar crescendo. A África, por sua vez, tem se desenvolvendo muito mais rápido
pela sua relação com a China, e essa cooperação mostra ganhos claros para ambos
os lados.
53
3.3 A CHINA A PROCURA DESENVOLVIMENTO AFRICANO: HEGEMONIA OU COOPERAÇÃO?
A China é vista de várias formas diferentes em suas relações com o
continente africano. Nessas relações sino-africanas, ela pode ser considerada como
um parceiro desenvolvimentista, competidor econômico ou colonizador. Como foi
visto no capítulo 2, vários autores discutem se a China procura um poder
hegemônico no sistema internacional. Esse objetivo faria com que nenhum outro
estado tivesse força e poder semelhante ao da China, assim ela teria mais
segurança no palco internacional para agir confirme seus desejos.
Então qual é o papel da China na África em relação a essa procura por
hegemonia? Cabe indagar se o governo chinês procura apenas o desenvolvimento
de países pobres africanos, como bons parceiros e com laços de amizade
diplomática; ou se toda a relação sino-africana é apenas parte de uma estratégia
maior de ganho de poder pela parte chinesa, onde o único objetivo seria a
hegemonia internacional.
Alden (2007) tenta caracterizar o papel da China nas relações sino-africanas
das seguintes formas: parceiro de desenvolvimento, competidor econômico ou
simples colonizador. Neste capítulo foi visto que a China não se enquadra em
apenas um desses papéis, pois a relação tem muitas críticas importantes e traz
vários pontos positivos para ambos os lados.
A crescente presença da China em regiões africanas não podem ser
analisadas com base em circunstâncias particulares. Se apenas os erros e
consequências negativas observáveis forem levadas em consideração, as análises
da relação sino-africanas trarão resultados que não se aplicam à realidade.
Segundo Alden (2007, p. 126), a China pode se encaixar nos três papéis
antes citados. Ela é um parceiro de desenvolvimento da África e o maior entre todos
os parceiros. No histórico das relações sino-africanas, o governo chinês procurou
formar uma política externa que se adaptou aos interesses e necessidades da África
como nenhuma potência fez. A aproximação diplomática da China no continente
compartilha valores anti-colonialistas e procura por desenvolvimento. Além disso, os
investimentos chineses são essenciais para o crescimento de países da África.
O papel de competidor econômico se baseia no fato de que se a África deseja
um desenvolvimento acelerado, como o índice de crescimento da China, ela precisa
54
se industrializar. A relação sino-africana mostra uma boa complementação da
economia dos dois lados, onde um lado vende produtos naturais brutos e o outro
produz mercadoria industrializada. Porém, essa complementação reduz as chances
da África se industrializar e, assim, de aumentar seu índice de desenvolvimento, pois
os produtos industrializados chineses são uma barreira para o desenvolvimento da
economia africana. (ALDEN, 2007, p. 127)
Já a imagem da China como colonizadora da África é, segundo Alden (2007,
p. 127), falsa e pode ser explicada como uma reação exagerada do Ocidente.
Aldenexplica que a base do colonialismo seria uma ideologia de “missão
civilizadora”, onde o território seria controlado de forma imperialista e as relações
comerciais se dariam exclusivamente entre o colonizador e colonizado. A política
diplomática sino-africana não mostra nenhum desses alicerces, pois, como já foi
visto, as relações se dão com base no lucro e desenvolvimento entre as duas partes.
A China não usa de coerção para com países africanos, procurando maiores
ganhospor meio do seu maior poder, levando a crer que a China não é uma nova
“colonizadora” da África.
Já o relacionamento da China com estados párias serão sempre pontos
influenciadores na atitude do Ocidente e da própria África com a China. As potências
ocidentais defendem a democracia em todos os estados, pois se um país não
mostrar atitudes democráticas, será tratado com métodos coercitivos. A posição
diplomática de não interferência da China parte para uma ação contrária à do
Ocidente, pois não é importante a base política de um estado e sim quais são suas
oportunidades de negócio. Essa diferença poderá continuar a causar problemas
para o governo chinês no futuro.
A forte migração chinesa para o continente africano também trarão suspeita
por parte de africanos e estudiosos estrangeiros, podendo se tornar um problema
nas futuras relações. A grande quantidade de moradores chineses não é explicada
pelo governo chinês em nenhum documento ou discurso internacional, e a falta de
interesse do governo nesses moradores imigrantes ainda será ponto de discussão
no futuro.
Autores realistas, como Mearsheimer (2010), defendem que a China procura
poder como todos os outros estados do sistema internacional e um futuro conflito
com as potências dominantes atuais é necessário para o governo chinês se tornar
uma hegemonia. Todos os discursos de política externa do governo da China
55
proclamam uma aproximação com outros estados para um desenvolvimento de
forma pacífica. O termo “desenvolvimento da paz” é lido frequentemente em
documentos diplomáticos chineses. Apesar disso, foi visto no capítulo 2 que a
premissa realista diz que um estado não pode ter certeza sobre as intenções de
outros estados, e que todo estado busca hegemonia de poder. Assim, não se pode
confiar absolutamente no discurso de “desenvolvimento pela paz” do governo
chinês, ainda mais devido à notoriedade de sigilo da política interna e externa desse
estado.
A China mostra em sua política externa que seu desejo é ser uma potência
responsável, onde o governo chinês não busca mudar o sistema internacional como
potência em ascensão. Sua posição com estados párias podem ser criticadas por
governos do Ocidente, mas elas seguem sua política de não interferência,
mostrando uma diferença dos meios diplomáticos ocidentais, mas não uma ameaça
contra o sistema atual.
Na relação sino-africana, a China pode ser vista como exploradora dos
recursos naturais africanos para seu próprio crescimento como potência no sistema
internacional. Claro que os recursos naturais são o principal interesse na economia
chinesa, mas declarar que essa é a única causa da presença chinesa na África
incorre ao erro.
Segundo a autora Deborah Brautigam (2010, p. 277), a China concede
subsídios a todos os estados africanos que participam do FOCAC, sejam eles ricos
em recursos ou não. Os créditos e empréstimos que a China libera não dão mais
importância a países ricos em recursos naturais, e nos países onde o governo
chinês investe na extração desses recursos, o estado africano pode vendê-los para
qualquer país, e não apenas para a China. Então, considerar a África como território
de extração de materiais para alimentar a indústria chinesa não se mostra
verdadeira.
Uma possibilidade que não é analisada seria uma procura por hegemonia
pelo governo chinês com ações de uma potência responsável. As ações da China na
sua relação com a África possuem retornos positivos para os dois lados e seguem
uma linha de pensamento que é legítima nos termos estabelecidos pelas próprias
potências Ocidentais que tanto a criticam.
O governo chinês poderia realmente explorar as fontes de poder da África,
devido ao seu poder consideravelmente maior. Entretanto, ela prefere manter
56
relações de amizade e um desenvolvimento saudável, que, mesmo tendo alguns
pontos negativos e várias críticas, são responsáveis pelo crescimento de países
africanos, tão negligenciados por outras grandes potências do mundo.
Nye (2012) mostra que a China tem investido em métodos de poder brando
em sua política internacional, por conta de um ataque pelo poder brando do
Ocidente. Ele transcreve as palavras do ex-presidente chinês Hu Jintao (apud NYE,
2014), de 2010, que afirmou que “[...] a cultura internacional do Ocidente é forte
enquanto a nossa é fraca”. As críticas sobre a relação sino-africana que são
espalhadas pela mídia são exemplo disso. Mas a cooperação que a China mantém
na África é um ótimo recurso de poder brando no Oriente e aumenta o poder de
influência chinês em toda a Ásia e, claro, no próprio continente africano.
Essa região de influência chinesa é importante em sua segurança nas
relações multilaterais, e aumenta o poder chinês no sistema internacional. No final, a
China melhora suas chances de se tornar uma potência hegemônica regional,
mesmo não utilizando de recursos que causariam conflitos em sua relação com a
África.
As relações sino-africanas continuam a se desenvolver na atualidade,
continuando a receber críticas do Ocidente. No entanto, apesar das críticas, o
governo chinês acertou em investir nos estados africanos, como é visto no resultado
lucrativo da estratégia. Se a China passar a usar de uma política com base no poder
bruto com a África, ela incorrerá ao confronto com o Ocidente, e isso não lhe
interessa atualmente devido aos seus ganhos atuais.
Os governantes dos estados africanos que precisam, em contrapartida, ficar
atentos a que direção tomar em futuras negociações. Eles precisam melhorar as
condições dos seus estados, e, para isso, precisam aprender a usar de forma
pragmática todas as relações que possuem com estados do sistema internacional, e
isso inclui a China, um importantíssimo parceiro econômico e estratégico para o
continente.
57
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho teve como problema a relação da China com a África, e se essa
relação é uma busca honesta por desenvolvimento ou uma forma de dominação do
mais fraco pelo mais forte.
Foi visto que a história chinesa passou por várias quedas e crescimentos. A
China já foi dominada por estrangeiros e já dominou. Seus governantes poderiam
aprender nesses milênios de história chinesa com inúmeras guerras de derrotas e
conquistas.
Em algumas décadas a China mostrou um crescimento exponencial e o
mundo inteiro procurou e vem procurando respostas sobre o papel futuro do estado
chinês no sistema internacional. Sua diferença política com o Ocidente é tratado
com estranheza e cautela, mas os governantes chineses continuam desenvolvendo
sua economia e mantendo boas relações com qualquer país que aceite negociar
com eles.
As relações sino-africanas passaram por mudanças concretas ao longo da
história. Antes movida por ideais políticos e uma confirmação do comunismo no
mundo, hoje o desenvolvimento de cooperações entre ambas as partes mostra uma
simples busca por ganhos, sem ligações ideológicas.
Alden (2007) mostra que o governo chinês frequentemente retrata sua relação
com o continente africano como longo e com muita história. Mas o que faz essa
relação tão ativa não é a longa história de desenvolvimento, mas sim um amplo
espaço para relações e negociações futuras.
Brautigam (2010, p. 310) mostra que a África se encaixa na política de
globalização de sua economia hoje não somente por seus recursos naturais, mas
por oportunidades no mercado, construção e indústria. Isso se deve muito a relação
do continente com a China, trazendo novas aberturas para a agricultura, centros de
desenvolvimento e a cooperação econômica.
Foi visto que grande parte das críticas à presença chinesa na África pode ser
interpretada como uma reação exagerada do Ocidente, que temem perder grandes
oportunidades de negócios que o governo chinês não falhou em ver e investir.
Existem vários problemas reais trazidos pela relação entre as duas partes, como,
por exemplo, a grande migração de chineses e a competição desleal que as grandes
58
indústrias chinesas oferece às pequenas produções locais, diminuindo assim o
desenvolvimento de produtos industriais africanos.
A relação sino-africana mostra um grande futuro à frente, e Brautigam (2010)
lembra que o governo chinês tentou com sucesso desenvolver sua própria economia
e tirar milhões de pessoas da pobreza, sem muita ajuda externa. A China pode usar
a mesma estratégia de desenvolvimento próprio nos países africanos, e fica para os
governantes da África conduzir essa relação para um desenvolvimento rápido e
lucrativo.
A hipótese inicial deste trabalho era confirmar que a China procura fontes de
poder, para assim se tornar uma hegemonia e se manter no sistema internacional.
Para isso, ela estaria explorando os estados africanos de seus recursos naturais
para alavancar seu poder no palco internacional. No entanto, essa hipótese é
refutada, pois a China não procura explorar a África de seus recursos, e não impõe
vontades sobre ela com base em seu poder maior.
As relações sino-africanas são baseadas em desenvolvimento conjunto, um
objetivo legítimo e lucrativo para as duas partes. Entretanto, a China pode ganhar
força hegemônica nessa relação, mesmo sem usar de ações coercitivas e da
imposição de poder. A boa relação entre as duas regiões mostra um ganho de poder
significativo para a China, e esse poder poderá ser usado no sistema internacional
em qualquerobjetivo que o governo chinês possa vir a ter.
59
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