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Jornal ISPA
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Passos em Volta | 4ª Edição
Passos em Volta
Alexandre Magalhães Vaz
Rafael Martinez Cláudio
Raquel Matos
José Candeias
Margarida Bessa Monteiro
Tereza Bínová
Diogo Vilaça Santos
Alexandre Magalhães Vaz
Rafael Martinez Cláudio
José Candeias
Tiago A. G. Fonseca
Ana Carla Nunes
Rita Alves
Jornal Académico do ISPA
Fundado por alunos da faculdade em colaboraçãocom a Associação de Estudantes (AEISPA)
Direcção e Edição
Co-Direcção
Revisão e Edição
Logótipo
Escritores Residentes
Presidente AEISPA
jornalpassosemvolta@gmail.com | +351 91 406 53 40
Imagem de Capa: Francis Bacon, "Tríptico - 3" (1944)
facebook.com/jornalispa
C O N T A C T O S
ÍNDICE
EDITORIAL
PSICOLOGIA PARAPSICÓLOGOS
facebook.com/jornal ispa
// p1
O GÉNIO (ESQUECIDO) DE ALFRED ADLER
Por Alexandre Vaz
A vida e as palavras de um dos psicoterapeutas maisinfluentes do Século XX // p3
UMA LINHA QUE(SUPOSTAMENTE) SEPARA // p2
Por José Candeias
A CESARE O QUEÉ DE CESARE // p6
Por Rafael Martinez Cláudio
// p8
Por Tiago A. G. Fonseca e Ana CarlaNunes
RELAXA QUE ENCAIXA// p7
Por Alexandre Vaz e Tiago A. G. Fonseca
PASSOS EM VOLTA | 1
Escrever com clareza é tramado.Cortar o excesso, realçar o essencial, manter o interesse ao longo docaminho. Regras que, na escrita como na vida, não envelhecem. Na minhainfância, pensar e sentir eram um excesso mal contido. Pior, havia orgulhonisso. O texto era para afundar, para mergulhar e não voltar mais. Algumasconversas também. A clareza era secundária e, por isso, faltou uma peçafundamental: saber partilhar. Ideias, impressões, sensações - tudo vivia numlugar nenhum, tinta mal mastigada.Anos depois, em terapia, aprendi a falar. E, como consequência (espero), aescrever. Aprendi a ser claro quanto ao que sei e ao que não sei. Ao que nãoé para saber e ao que, afinal, não é preciso saber.
A boa gente que escreve nesta nova edição do jornal fá-lo, à sua maneira,com a clareza de quem tem algo para dizer. José, Rafael, Tiago (e tambémAdler e Ellis) - à vossa.
Editorial
ALEXANDRE VAZ
36
48
Reality was far too scary forme to be casual about my beliefs.
- Emmy Van Deurzen
© H
elena Almeida
PASSOS EM VOLTA | 2
Cumprimento-vos terráqueos.Vamos supor que Jesus Cristo falacomigo telepaticamente porque eutambém sou um profeta. E que,numa das nossas conversas, este meinformou que esteve de novo noplaneta Terra há 20 anos, tendonessa vinda iniciado o processobíblico do apocalipse. Em Setúbal.
De uma perspectiva clínica este tipode convicções religiosas devemlevantar preocupações para opsicólogo? São potenciais sintomas? Se sim, porquê? Aparentemente, nãosão levantadas questões em relaçãoà sanidade mental de alguém queacredite que Jesus ressuscitou há 2mil anos em Israel. Porque é que acrença que ele regressou há 20 anosem Setúbal deve ser sinal depreocupação? Qual é a linha quesepara o são do insano nasconvicções metafisicas?
De facto não existe uma linhauniforme e clara. Por norma, énecessário dar maisimportância ao impacto dasconvicções na qualidade de vidado paciente do que propriamenteno seu conteúdo.
No entanto, existe uma linhabastante clara que separa asconvicções científicas dasconvicções religiosas.Designadamente, o confrontocom a realidade empírica. No casoda adopção de crianças por casaishomossexuais a literaturacientífica é absolutamenteavassaladora a demonstrar quenão existem motivos para proibira adopção em função daorientação sexual. Prova disso é ofacto das associações americanasde profissionais de áreas tãodistintas quanto as de psicologia,
Uma Linha que(Supostamente)Separa
psicanálise, sociologia ou medicinapsiquiátrica se assumirem publicamentea favor da adopção por casaishomossexuais. E olhem que para estamalta toda concordar em algumacoisa...
Apesar deste claro consenso ciêntificocontinuam a existir restrições naadopção em função da orientaçãosexual na maioria dos países ocidentais.E essas restrições são ostensivamentesustentadas em pseudociência onde atal linha que separa a ciência da religiãoé completamente ignorada. Em Portugala “Associação de Psicólogos Católicos”tem sido bastante agressiva na sua lutacontra a adopção por casais do mesmosexo.
Sobre esse facto, quero dizer duascoisas: Em primeiro lugar, não éestranho existir uma associação depsicólogos católicos? Não meinterpretem mal, não considero de todoque as convicções religiosas ditem dealguma forma a qualidade de umpsicólogo enquanto profissional. Masexistir uma associação que misturaciência de religião dessa forma é paramim tão estranho quanto a potencialexistência de uma associação debiólogos budistas. Ou de ginecologistasrastafáris.
Em segundo lugar não é no mínimorevoltante que após séculos deseparação do corpo de conhecimentocientífico das mãos da religiãocontinuem a existir grupos de pessoasque misturem descaradamente as duasquestões visando atropelar direitos quedevem ser fundamentais - neste caso, osimples direito à não discriminação emfunção da orientação sexual?
Para quem tem dúvidas de como isto daciência funciona, e de porque é que nãose deve misturar desta forma comreligião, sugiro uma leitura rápida deKarl Popper. Agora deixem-me ir até aoestuário do Sado esperar por Cthulhuem paz por favor.
Por José Candeias
O P I N I Ã O
© Tom
Gauld
O G É N I O
( E S Q U E C I D O ) D E
A L F R E D A D L E R
PASSOS EM VOLTA | 3
Muito mais do que um mero discípulo de
Freud, Adler (1970 - 1937) refutou a teoria e
prática psicanalítica do seu tempo. Nascido
em Viena, rapidamente se demonstrou
crítico da teoria sexual de Freud e do que
considerava ser um enfoque excessivo no
passado do paciente.
Popularizou o conceito de "complexo de
inferioridade", e a ideia de que o indivíduo -
principalmente aquele com problemas
psicológicos e emocionais -, vive numa
constante tentativa de demonstrar
superioridade sobre os outros.
Assim, Adler postula que por saúde mental
se entende o interesse genuíno pelos outros
e a capacidade de colaboração social.
Adler continuou a escrever e ensinar até ao
final da sua vida, influenciando (discreta
mas seguramente) futuros pioneiros da
psicoterapia como Carl Rogers, Abraham
Maslow, Aaron Beck ou Albert Ellis.
1
Experienciamos sempre a realidade através do
significado que lhe atribuímos; não “por si só”,
mas como algo interpretado. É por isso natural
supor que este significado seja sempre mais ou
menos inacabado, incompleto e nunca
completamente certo.
Quando perguntamos a alguém “qual o sentido
da vida?”, é possível que ele se veja incapaz de nos
responder. (…) É nas suas acções que todo o
Homem coloca esta questão e a responde. Ao
taparmos os ouvidos às suas palavras e ao
observar as suas acções, descobriremos que esta
pessoa possui o seu próprio “sentido da vida” – e
que todas as suas posturas, atitudes, movimentos,
expressões, maneirismos, ambições, hábitos e
características de personalidade existem de
acordo com este sentido. Ela age como se
pudesse contar com uma certa interpretação da
vida. Em todas as suas acções há uma avaliação
implícita do mundo e de si; um veredito: “eu sou
deste modo e o universo daquele”.
Somos auto-determinados pelos significados
que atribuímos às nossas experiências. Os
significados não são determinados pelas
situações, mas nós determinamo-nos através dos
significados que atribuímos às situações.
Alfred Adler (1870 – 1937)
Texto original em: What Life Could Mean to You
Tradução: Alexandre Vaz
Irvin D. Y
DIA 9 DE OUTUBRO, 18H
alom
ENTRADA LIVRE
PASSOS EM VOLTA | 6
Seguindo a moda tão em voga nasredes sociais, podemos sugerir umdivertido jogo.
Ou pelo menos poderíamos, seexistissem redes sociais em 1876,ano em que Cesare Lombroso(1835-1909) lançou um livro queinaugurou o estudo daAntropologia Forense. Na teoriadesse autor, que estudou 383prisioneiros italianos, existiam 18características corporais quecaracterizavam criminosos inatos,ou seja, alguém que nasceucriminoso (ou pelo menos comuma forte propensão a sê-lo).
O que diria Lombroso se tivesseconhecido Karla Homolka, umasimpática senhora que osconhecidos definiam como umaloira lindíssima? Ou o seu marido,Paul Bernardo, um homem que secomentava à boca pequena tertanta beleza quanta riqueza? Ao
A CESARE O QUEÉ DE CESARE
que parece, ambos tinham a simetriatípica das pessoas que se dizembonitas, queixos comuns, orelhas detamanho médio, apenas 20 dedos enão tinham braços de basquetebolista.O que diria Lombroso se soubesse queesta simpática e bela parelha foiresponsável pelo homicídio e violaçãode várias menores (uma delas a própriairmã de Karla)?
Mas longe de mim menosprezar otrabalho do Cesare: importa lembrarque foi ele o propulsor de um estudoda criminalidade como fenómenopróprio, e o primeiro a tentarpadronizar o comportamento criminal –e por essa herança a psicocriminologianão poderá ter menos que umagratidão tremenda.
Apesar disso, neste âmbito específico,felizmente, já não encontramosvalidade nesta tipologia física deLombroso. Ainda assim, a sua teoriaantropológica ganha um novo fôlego eo próprio Cesare ergue-se do seudescanso em êxtase, de cada vez queum homem de meia-idade (com queixolargo, orelhas grandes e talvez 21dedos) ajeita os óculos perante umafotografia do Correio da Manhã eafirma: “Epá, este tipo é culpado decerteza, tem mesmo carinha depedófilo”, haja Cesare!
Por Rafael Martinez Cláudio
R U B R I C A : O C R I M E D E S C O M P E N S A
© Salvador D
alí
Responde às seguintes questões:
- São as tuas faces assimétricas?- Tens um queixo maior do que ocomum?- Tens uns lábios carnudos?- Tens orelhas muito pequenas ou muitograndes?- Tens sardas?- Tens braços excessivamente longos?- Tens mais dedos do que o suposto?
Caso tenhas respondidoafirmativamente a mais do que 2
questões, PARABÉNS, és umcriminoso inato!
Sai e vive alegremente a tuacarreira de homicídio, violação,
abuso e violência!
Cesare Lombroso1835 - 1909
RELAXA QUEENCAIXA
R U B R I C A
I n tegração e I nves t igação em Ps ico te rap ia
Propomos a seguinte experiência:imaginem o vosso psicoterapeuta ideal.Imaginem as características essenciaisdeste terapeuta: o seu tom de voz, a suapostura física e relacional, o modo comoeste dirige ou "se deixa dirigir" durantea sessão.
Feito? Pensem agora nisto: secompararem o vosso "terapeuta desonho" com o da pessoa ao vosso lado,serão estes iguais?Provavelmente existirá um conjunto dediferenças que reflectem asnecessidades e preconceitos de cadaum. Para a Pessoa 1, o terapeuta idealpoderá ser algo calado, simpático ecaloroso, maioritariamenteempatizando com as experiênciasdifíceis apresentadas em terapia; para aPessoa 2 poderá ser um terapeuta"objectivo", focado no presente e emsoluções, "sem tempo a perder" demodo a resolver as problemáticas emcausa.
Ora, como temos vindo a escrever nestarubrica, as investigações parecemapontar consistentemente para umfacto importante(íssimo íssimo): omelhor preditor de resultados empsicoterapia diz respeito à qualidadeda relação terapêutica. Assim, torna-seessencial o psicoterapeuta ser flexivel
o suficiente para corresponder àsexpectativas e necessidadesespecíficas do cliente. Nas palavrasdo psicoterapeuta Arnold Lazarus,todo o terapeuta eficaz tem de serum "camaleão autêntico".
É também verdade que, em terapia,o cliente precisa de diferentescoisas em diferentes fases daterapia. Neste sentido, a posturarelacional e abordagem geral doterapeuta poderão ter de variar -por vezes drasticamente - com omesmo cliente.
Chegamos, por isso mesmo, a umconceito absolutamente essencialpara a integração em psicoterapia:o de responsividade.
O terapeuta responsivo é aqueleque se esforça por dar resposta àsnecessidades do cliente. Tentaconstantemente adaptar-se àsituação clínica como ela é, e nãocomo "devia ser". É por isso que aterapia não pode ser feita com base(exclusiva) em manuais. É umencontro entre duas pessoas, umencontro potencialmentereparador. E esse potencial é tantomaior, quanto mais flexível opsicoterapeuta for.
Por Alexandre Vaz e T iago A . G. Fonseca
PASSOS EM VOLTA | 7
PASSOS EM VOLTA | 8
Aproveitando um texto escrito,queremos começar por escreversobre textos escritos. Vamos iniciaros temas a que nos proposemos, ecomeçamos por falar, precisamente,da escrita em psicologia.
Em declaração de interesses,dizemos que escrever para o grandepúblico é das maiores e melhoresferramentas de que a psicologiadispõe. Pode equilibrar a balançaentre o conhecimento e aresponsabilidade, pode prestarinformação sobre as questõesligadas à psicologia de cada um,pode ajudar a promover umsentimento de presença nisto davida psicológica. É essencial. Nóstambém o fazemos, sempre quepodemos, com a maior qualidadeque nos for possível!
E não substitui o emprego de
ninguém, nem deve ser encaradodessa forma. Escrever comclareza, simplicidade e de formainformativa é a melhor forma depromover a psicologia, as suaspráticas e os seus técnicos.
Mas nisto da escrita, tal como emtudo na vida, existe um outrolado.
O lado da venda barata, das frasespara o ouvido, da meiainformação para vender a outrametade em consultório e, quandodamos por nós, temos todos deser felizes ao mesmo tempo!
Não me entendam mal. É legítimoque o façam. Tempo de antenanunca fez mal a ninguém. Mas oque se escreveu, era para quem?Para o público? Ou era o alimentodo ego próprio? Houve intenção
Escrever paraquem?
de dar conhecimento? Ou apenas deperder tempo a dizer umas coisas?
A psicologia é aquela ciência que unsdefendem como exacta, outros comociência das ciências sociais e humanas,outros ainda na saúde. Apesar de esteser o tema da próxima edição destarevista, deixem-nos dizer que é estamistura e as tantas possibilidades deencarar a psicologia que tem de nosfazer escrever pela sua evolução. Apsicologia apenas avança o que asociedade permitir, pois é para ela queexiste.
A intenção principal de escrever empsicologia deve ser a de permitir, aquem lê, perceber o que a psicologiapode fazer por si, o que precisa napsicologia e o que pode mudarpsicologicamente, com ou sem ajuda.
Parece-me que ninguém fica a perder,certo?
Por Tiago A. G. Fonseca e Ana Carla Nunes
R U B R I C A : P S I C O L O G I A P A R A P S I C Ó L O G O S
© Tom
Gauld
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trabalho e opinião de profissionais da classe.
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Passos em Volta
Jornal de Psicologia
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