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Fabiano J. Santos 30 6.1. Funções Contínuas por Partes Neste capítulo faremos algumas pequenas observações sobre a teoria das Séries de Fourier. Uma função periódica R R f : pode ser representada por uma Série de Fourier desde que satisfaça as condições de Dirichlet: i) f deve possuir um número finito de descontinuidades num período; ii) f deve possuir um número finito de máximos e mínimos num período; iii) f deve ser absolutamente integrável num período, ou seja, finita dt t f L L | ) ( | . Uma função que satisfaz as condições (i) e (ii) acima é dita contínua por partes. Tal tipo de função ocorre com bastante freqüência em problemas de Engenharia, e sendo assim investigaremos agora com mais detalhes suas características. Definição: uma função f se diz contínua por partes em um intervalo b t a se este intervalo pode ser particionado por um número finito de pontos b t t t t t a n i i ... ... 1 1 0 de modo que: i) f seja contínua em cada subintervalo aberto 1 i i t t t ( 1 ... 0 n i ); ii) em cada subintervalo, quando t tender à qualquer dos dois extremos, f tende a um limite finito. Em outras palavras, f será contínua por partes em um intervalo b x a se for contínua em todo este intervalo, com exceção em um número finito de pontos, onde apresenta descontinuidades de salto (também chamados descontinuidades de primeira espécie). O gráfico a seguir ilustra uma função contínua por partes no intervalo b t a

Séries fourier cap_6 Funções Contínuas por Partes

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Fabiano J. Santos

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6.1. Funções Contínuas por Partes

Neste capítulo faremos algumas pequenas observações sobre a teoria das Séries de Fourier.

Uma função periódica RRf : pode ser representada por uma Série de Fourier desde que

satisfaça as condições de Dirichlet:

i) f deve possuir um número finito de descontinuidades num período;

ii) f deve possuir um número finito de máximos e mínimos num período;

iii) f deve ser absolutamente integrável num período, ou seja,

finitadttf

L

L

|)(| .

Uma função que satisfaz as condições (i) e (ii) acima é dita contínua por partes. Tal tipo de

função ocorre com bastante freqüência em problemas de Engenharia, e sendo assim investigaremos

agora com mais detalhes suas características.

Definição: uma função f se diz contínua por partes em um intervalo bta se este intervalo

pode ser particionado por um número finito de pontos bttttta nii ...... 110 de modo

que:

i) f seja contínua em cada subintervalo aberto 1 ii ttt ( 1...0 ni );

ii) em cada subintervalo, quando t tender à qualquer dos dois extremos, f tende a um

limite finito.

Em outras palavras, f será contínua por partes em um intervalo bxa se for contínua

em todo este intervalo, com exceção em um número finito de pontos, onde apresenta

descontinuidades de salto (também chamados descontinuidades de primeira espécie). O gráfico a

seguir ilustra uma função contínua por partes no intervalo bta

Capítulo 06

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Observe que f atende aos dois requisitos estabelecidos na definição, uma vez que:

i) f é contínua em cada subintervalo aberto: f , 21 ttt e 32 ttt e que o

número de subintervalos é finito;

ii) em cada subintervalo quando t tende à qualquer um dos extremos, f tende a um valor

finito.

Observação importante: a definição anterior não faz nenhuma referência ao valor da função

nos pontos de descontinuidade, podendo a função nem mesmo ser definida em tais pontos (veja o

ponto 2t no gráfico anterior).

6.2. O Teorema de Fourier

Enunciaremos agora o Teorema de Fourier, que enuncia as hipóteses necessárias para que

uma dada função tenha uma representação em Série de Fourier. Para simplificar a notação do

Teorema, denotaremos os limites laterais à direita e à esquerda da seguinte forma

limite de f quando t tende a c pela direita: )()(lim

cfct

tf

e

limite de )()(l im

cfct

tf quando t tende a c pela esquerda )()(lim

cfct

tf.

Teorema: se f e 'f são contínuas por partes no intervalo LxL e )2()( Ltftf

(periódica com período LT 2 ), então f possui uma representação em Série de Fourier da forma

1

0 sencos)(

n

nnL

tnb

L

tnaatf

,

(1)

cujos coeficientes são dados por

L

L

dttfL

a )(2

10 ,

L

L

n dtL

tntf

La

cos)(

1 ,

L

L

n dtL

tntf

Lb

sen)(

1

(2)

e converge para 2

)()( tftf para todo t .

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Pelo Teorema, nos pontos de descontinuidade (salto), f converge para a média aritmética

dos limites laterais à esquerda e à direita (motivo pelo qual os limites laterais não podem ser

infinitos). Por outro lado, nos pontos onde f é contínua temos que )()()( tftftf , logo a

série converge para o próprio valor da função.

A demonstração deste Teorema está além dos objetivos deste texto1. Para uma melhor

compreensão de seu significado consideramos aqui algumas classes de funções que não satisfazem

as condições impostas

i) funções tais como t1 e )(ttg , que apresentam descontinuidades infinitas (de segunda

espécies) quando 0t e 2

)12(

nt respectivamente;

ii) funções que apresentam um número infinito de descontinuidades de salto, como por

exemplo a função

irracionalétse

racionalétsetf

,1

,0)( . Tais funções são raras e bizarras e quase

impossíveis de serem encontradas em situações práticas.

6.3. Fenômeno de Gibbs

Para finalizar o assunto consideremos um último exemplo, no qual ressaltaremos o

Fenômeno de Gibbs, que ocorrem nas representações em Séries de Fourier.

Exemplo 01: encontre a representação em Série de Fourier para a função

t

ttf

0,1

0,3)( e

)2()( tftf .

Solução: inicialmente observamos que a função é periódica de período 2 . Note que não foi feita

qualquer referência sobre o valor da função nos pontos de salto nt ( Zn ). Deixaremos esta

questão em aberto por um momento. Graficamente temos

1 Para uma demonstração veja "Análise de Fourier e Equações Diferenciais Parciais" – Djairo Guedes de Figueiredo –

Editora IMPA (Instituto de Matemática Pura e Aplicada) – Capítulo 03. Trata-se de uma demonstração longa, com

vários lemas e teoremas preliminares.

Capítulo 06

33

Procedendo naturalmente, observamos que o intervalo de definição da função pode ser

subdivido em dois subintervalos:

i) em 0 t temos que 3)( tf e 0)(' tf , logo f e 'f são contínuas neste

subintervalo. Além disto os limites laterais neste intervalo são finitos pois quando t temos

que 3f e quando 0t temos que 3f ;

ii) em t0 , onde 1)( tf e 0)(' tf , logo f e 'f são contínuas neste

subintervalo. Além disto os limites laterais neste intervalo são finitos pois quando 0t temos

que 1f e quando t temos que 1f .

Desta forma, f satisfaz as hipóteses do Teorema e possui uma representação em Série de

Fourier. Passemos ao cálculo dos coeficientes.

2132

1)(

2

1)(

2

1

0

0

0

dtdtdttfdttfL

a

L

L

;

0cos1cos31

cos)(1

cos)(1

0

0

dtntdtntdtnttfdt

L

tntf

La

L

L

n ;

)cos(12

sen1sen31

sen)(1

0

0

nn

dtntdtntdtL

tntf

Lb

L

L

n

.

Assim, temos que

ímparénn

parén

bn ,4

,0

e a Série de Fourier para a função fica

...7sen7

45sen

5

43sen

3

4sen

42)( tttttf

,

(5a)

ou

112

)12(sen42...7sen

7

15sen

5

13sen

3

1sen

42)(

kk

xktttttf

.

(5b)

O gráfico a seguir ilustra as somas parciais 0S (com apenas 1 termo constante), 1S (com

2 termos) e 4S (com 5 termos):

Fabiano J. Santos

34

.

Podemos agora analisar o que acontece nos pontos de salto nt ( Zn ). Inicialmente

observemos que para estes valores a Série obtida em (5) nos dá 2)( tf (os senos de múltiplos

inteiros de se anulam), que é exatamente a média aritmética dos limites laterais. Assim, se

defirmos o valor da função como sendo 2 nestes pontos, a série de Fourier converge para f para

todo t . Por outro lado, se 2)( tf para tais pontos, a Série de Fourier converge para f para todo

t , exceto nestes pontos de salto.

De qualquer forma, independentemente dos valores de f nos pontos de salto, a Série de

Fourier é exatamente a dada em (5), uma vez que os cálculos dos coeficientes nn baa ,,0 não se

modificam. O gráfico a seguir ilustra a soma parcial 19S (com 20 termos)

.

Capítulo 06

35

Observamos que nos pontos de salto a Série não converge regularmente para o valor médio,

que vale 2. Ao invés disto, surgem oscilações em torno de cada extremo, como se a Série tentasse se

adaptar ao salto abrupto de f nestes pontos. Este fenômeno é típico de Séries de Fourier nos

pontos de descontinuidade da função e é conhecido como fenômeno de Gibbs2.

Problemas

1. Nos exemplos 01, 02 e 03 do Capítulo 03 as séries de Fourier encontradas convergem para as

funções dadas em todos os pontos? Explique. Quais as modificações necessárias nas definições

destas funções para que isto ocorra?

2. Dada a função

tt

ttf

0,

0,0)( ,

a) verifique cuidadosamente que ela é contínua por partes;

b) determine sua representação em Série de Fourier;

c) qual deve ser o valor da função nos pontos de salto para que a Série encontrada convirja em todos

os pontos.

3. Esboce o gráfico e determine se as funções a seguir são ou não contínuas por partes. Caso não

sejam explique o motivo.

a)

)()4(,

21,1

12,1)( tftf

t

ttf ; b)

)()2(,

10,1

1

01,1

1

)( tftf

tt

tttf ;

c)

)()4(,

21,1

11,0

12,1

)( tftf

t

t

t

tf ;

2 Josiah Willird Gibbs (1839-1903). Para uma discussão mais detalhada do Fenômeno de Gibbs (e também sobre

convergência da Série de Fourier) veja "Análise de Fourier" – Hwei P. Hsu – Livros Técnicos e Científicos Editora

Ltda – Apêndice A.

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d) )()1(,

...,3,2,1,12

1

2

1,0

...,3,2,1,2

1

12

1,1

)( tftf

nn

tn

nn

tntf

.