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Ana Margarida Pintonº2 11ºA
Em Petiz
IDE TARDE
Mais morta do que viva, a minha companheiraNem força teve em si para soltar um grito;E eu, nesse tempo, um destro1 e bravo rapazito,Como um homenzarrão, servi-lhe de barreira!
Em meio de arvoredo, azenhas e ruínas,Pulavam para a fonte as bezerrinhas brancas;E, tetas a abanar, as mães, de largas ancas,Desciam mais atrás malhadas e turinas2.
Do seio do lugar – casitas com postigos –Vem-nos o leite. Mas baptizam-no3 primeiro.Leva-o de madrugada, em bilhas, o leiteiro,Cujo pregão4 vos tira ao vosso sono, amigos!
1 destro: ágil; hábil.
2turinas: diz-se deuma raça de gadobovino.
3baptizam-no:adicionam-lhe água.
4pregão:anúnciopúblico feito em vozalta.
Petiz: pequeno, menino.
Nós dávamos, os dois, um giro pelo vale:Várzeas5, povoações, pegos6, silêncios vastos!E os fartos animais, ao recolher dos pastos,Roçavam pelo teu «costume de percale7».
Já não receias tu essa vaquita preta,Que eu segurei, prendi por um chavelho8? JuroQue estavas a tremer, cosida com o muro,Ombros em pé, medrosa, e fina, de luneta!
5várzeas:planície extensae cultivada .
6pegos: os sítios maisfundos dos rios.
7«costume de percale»:(expressão francesa) fatode percal (tecido dealgodão fino e liso).
8chavelho: chifre.
O poema tem 20 versos.
Sendo composto por:
cinco quadras.
Mais morta do que viva, a minha companheiraNem força teve em si para soltar um grito; E eu, nesse tempo, um destro e bravo rapazito, Como um homenzarrão, servi-lhe de barreira!
Em meio de arvoredo, azenhas e ruínas, Pulavam para a fonte as bezerrinhas brancas; E, tetas a abanar, as mães, de largas ancas, Desciam mais atrás malhadas e turinas.
Do seio do lugar – casitas com postigos –Vem-nos o leite. Mas baptizam-no primeiro. Leva-o de madrugada, em bilhas, o leiteiro, Cujo pregão vos tira ao vosso sono, amigos!
Nós dávamos, os dois, um giro pelo vale: Várzeas, povoações, pegos, silêncios vastos! E os fartos animais, ao recolher dos pastos, Roçavam pelo teu «costume de percale».
Já não receias tu essa vaquita preta, Que eu segurei, prendi por um chavelho? Juro Que estavas a tremer, cosida com o muro, Ombros em pé, medrosa, e fina, de luneta!
Mais morta do que viva, a minha companheira A Nem força teve em si para soltar um grito; B E eu, nesse tempo, um destro e bravo rapazito, BComo um homenzarrão, servi-lhe de barreira! A
Em meio de arvoredo, azenhas e ruínas, CPulavam para a fonte as bezerrinhas brancas; DE, tetas a abanar, as mães, de largas ancas, DDesciam mais atrás malhadas e turinas. C
Do seio do lugar – casitas com postigos – EVem-nos o leite. Mas baptizam-no primeiro. FLeva-o de madrugada, em bilhas, o leiteiro, FCujo pregão vos tira ao vosso sono, amigos! E
Nós dávamos, os dois, um giro pelo vale: GVárzeas, povoações, pegos, silêncios vastos! HE os fartos animais, ao recolher dos pastos, HRoçavam pelo teu «costume de percale». G
Já não receias tu essa vaquita preta, IQue eu segurei, prendi por um chavelho? Juro JQue estavas a tremer, cosida com o muro, JOmbros em pé, medrosa, e fina, de luneta! I
interpolada
emparelhada
Mais morta do que viva, a minha companheiraNem força teve em si para soltar um grito; E eu, nesse tempo, um destro e bravo rapazito, Como um homenzarrão, servi-lhe de barreira!
Em meio de arvoredo, azenhas e ruínas, Pulavam para a fonte as bezerrinhas brancas; E, tetas a abanar, as mães, de largas ancas, Desciam mais atrás malhadas e turinas.
Do seio do lugar – casitas com postigos –Vem-nos o leite. Mas baptizam-no primeiro. Leva-o de madrugada, em bilhas, o leiteiro, Cujo pregão vos tira ao vosso sono, amigos!
Nós dávamos, os dois, um giro pelo vale: Várzeas, povoações, pegos, silêncios vastos! E os fartos animais, ao recolher dos pastos, Roçavam pelo teu «costume de percale».
Já não receias tu essa vaquita preta, Que eu segurei, prendi por um chavelho? JuroQue estavas a tremer, cosida com o muro, Ombros em pé, medrosa, e fina, de luneta!
A rima é sempre consoante.
Predominância da rima rica,
havendo rima pobre apenas em
6 versos (1 e 4; 2 e 3; 9e 12).
Métrica regular com versos
dodecassílabos.
Tema: recordação de um passeio pelo campo quando era mais
pequeno, “em petiz”.
Assunto: descrição de uma tarde passada no campo (vista na
perspectiva do presente), onde a presença de vacas a pastar foi o
pretexto para mostrar a valentia e o medo, respectivamente, do
sujeito poético e da sua acompanhante.
Divisão
1ª - estrofes 1, 4 e 5
Recordação do carácter destemido do sujeito poético,
contrastando com o da sua companheira; discurso centrado
predominantemente no eu, tu e nós.
2ª - estrofes 2 e 3
Descrição/ parêntesis para falar dos animais que se
observam (vacas) durante o passeio e do alimento de
primeira necessidade que fornecem (leite); discurso
centrado principalmente no ele e elas.
O poema está construído em dois tempos diferentes, o da escrita poética
e o da história. O presente é o da escrita, o momento em que o “eu” recorda
um episódio situado “nesse tempo”, aquele em que ele, ainda “rapazito”,
protege a “companheira” do seu próprio susto.
São duas as imagens principais que recorda e que sintetizam o episódio: a
dela, “cosida com o muro”, “a tremer” de susto; e a dele, a segurar “por um
chavelho” uma “vaquita preta”.
No presente da rememoração, o sujeito poético pergunta à
“companheira” se ainda receia uma “vaquita preta” como aquela, o que
parece indicar que o tempo em que a história se passou é o da infância,
sendo ambos muito novos, “em petiz”.
Presente vs Passado
Presente vs Passado
Posicionamento actual do eu perante o episódio recordado:
•Interpelação, hesitação, cepticismo quanto às consequências do incidente
na personalidade da figura feminina, “companheira”:
• interrogação retórica “Já não receias tu essa vaquita preta,/Que eu segurei, prendi por um chavelho? Juro “ (vv. 17-18);• anátrofe “Já não receias tu (…)” (v. 17);• expressividade do diminutivo “vaquita” (v. 17);• metáfora “cosida com o muro” (v. 19);• adjectivação “medrosa”, “fina” (v. 20);• exclamação final “Ombros em pé, medrosa, e fina, de luneta!” (v. 20).
Na 3ª estrofe, o “eu”, ao fazer a invocação aos “amigos”, está a ligar esse
passado da sua memória com o presente da sua experiência.
Neste contexto, “os amigos”, podem ser os que na cidade recebem o leite
que é no campo produzido e a partir do campo distribuído. É de madrugada
que os leiteiros fazem o transporte do leite, chegando ainda cedo aos locais
onde o vão vender, lançando pregões que acordam os citadinos.
A invocação aos “amigos” (que também podem ser uma imagem do
público do poeta, ou dos leitores do poema) coloca em contraposição aqueles
que produzem e os que consumem.
Presente vs Passado
Caracterização da figura feminina - “companheira”
Magra, elegante, burguesa, usa óculos – “o teu costume de percale”; “E fina,
de luneta!” – é um retrato que compõe um tipo de personagem urbana.
Medrosa, insegura – vv. 1, 2, 17, 19, 20 – a situação em que se encontra
provoca nela uma reacção de pessoa com medo, traço que é reiterado no
poema e acentuado pelo facto de se encontrar fora do seu meio, num
ambiente que não domina.
• hipérbole “Mais morta do que viva” (v. 1);• metáfora “cosida com o muro” (v. 19);• expressividade do diminutivo “vaquita preta” (v. 17).
Caracterização do eu
Ágil e valente – o “eu” auto-retrata-se como um “rapazito” “destro” e “bravo”
(com alguma ironia, pois, naquele caso, o perigo era mais imaginário do que
real), parece conhecer melhor o meio em que se encontra, a real mansidão
da “vaquita preta” e dos restantes “fartos animais”, revelando uma maior
sintonia com o ambiente campestre e uma maior capacidade de adaptação a
esse mesmo meio. Assim, ele age naquela circunstância “como um
homenzarrão” (de novo a ser irónico).
• adjectivação “um destro e bravo rapazito” (v. 3);• comparação “como um homenzarrão” (v. 4);• antítese “rapazito” vs “homenzarrão” (vv. 3-4).• expressividade do diminutivo e aumentativo (vv. 3-4);
convencido e orgulhoso “E eu, nesse tempo, um destro e bravo rapazito, Como um homenzarrão, servi-lhe de barreira!”
protector “servi-lhe de barreira”• reiteração, gradação “segurei, prendi” (v. 18).
Caracterização/ localização dos elementos observados:
• Localização da acção no espaço e no tempo:
O cenário evocado é o espaço aberto do campo, um “vale”, com referência a
elementos da paisagem vistos de perto – “arvoredos”, uma “fonte”, “pastos”,
“azenhas e ruínas” -, alguns dos quais marcam a presença do homem. Vêem-se
também, ao longe, “Várzeas, povoações, pegos”. Há, ainda, a referência a uma
povoação, “casitas com postigos”, onde vivem os camponeses.
Os “silêncios vastos” da paisagem indicam a largueza das vistas e a paz que a
inunda, ajudando a descrever o passeio no campo tal como dois citadinos,
habituados ao ruído, o sentem.
• enumeração “Nós dávamos, os dois, um giro pelo vale:/ Várzeas, povoações, pegos, silêncios vastos!” (vv. 13-14);• substantivo do verbo “ao recolher dos pastos” (v. 15).
Caracterização/ localização dos elementos observados:
• animais (vacas) – jovialidade, despreocupação, irrequietude, agilidade das
crias vs dolência, lentidão das vacas adultas:
• expressividade do diminutivo “bezerrinhas” (v. 6);• expressividade do verbo de acção “pulavam” (v. 6);• enumeração – obstáculos que compunham o cenário “Em meio de arvoredo,azenhas e ruínas” (v. 5);• descrição física das vacas adultas – adjectivação “E, tetas a abanar, as mães, de largas ancas,/ Desciam mais atrás malhadas e turinas.” (vv. 7-8).
Caracterização/ localização dos elementos observados:
• inflexão sobre o percurso efectuado pelo leite recorrendo ao presente da
escrita:
•local da ordenha, “casitas com postigos”, e sua importância para o eu:
•metáfora “do seio do lugar” (v. 9);
• o transporte feito pelo leiteiro:
• expressividade dos complementos circunstanciais de tempo – “de
madrugada”, de modo – “em bilhas”;
• dificuldade, sacrifício, esforço – contraste com o “sono” dos clientes
(v. 12);
• o pregão – invasão do “sono” dos clientes.
Conclusão:
Temática: campo; poema narrativo/ descritivo:
• variedade de substantivos, adjectivos, verbos de acção (“pulavam”,
”desciam”, ”Leva-o”, “Roçavam”, “segurei”, “prendi”);
• importância do pretérito perfeito do indicativo (vv. 2, 4, 18);
• importância do pretérito imperfeito do indicativo (vv. 6, 8, 13, 16, 19);
• presente histórico (vv. 10-12);
• visualização do cenário, dos acontecimentos (enumerações,
pormenorizações, tom dialogado).
(Paralelismo/ oposição com o poema “De Verão”)