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Contando Saberes:
HISTORIAS DA DONA FIOTA
FAMILIAS AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA
VOL. 5I
Fundação Guimarães Rosa apresenta:
Contando Saberes:Historias da dona Fiota
Famílias Africana e Afro-Brasileira - Vol. 5
Kelly Cardozo e Rosângela Gontijo
Ilustração
Guilherme Rocha - “FUDI”
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Volume 5 . Famil ias aFricana e aFro-Bras ileira
O conceito de Família é antigo, mas ao mesmo tempo atual, pois vem sendo discutido com a mesma veemência e responsabilidade. Por isso, apresentamos aos nossos alunos o conceito tradicional do termo, a concepção africana, bem como suas variáveis no mundo dito “moderno”.
O universo da família tradicional africana mostra importantes valores, pois ela preserva características milenares como respeito aos mais velhos e preservação da ancestralidade, na maioria das vezes desconhecidas da sociedade brasileira.
Neste volume 5, citamos a influência das etnias envolvidas na formação social do Brasil, além da construção da família afro-brasileira, suas particularidades e os valores absorvidos das matrizes culturais africanas. Aproveitem!
Equipe Fundação Guimarães Rosa
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Conceito de Família: é um grupo de pessoas ou um número de grupos domésticos ligados por descendência (demonstrada ou estipulada) a partir de um ancestral comum, matrimônio ou adoção. A família é unida por múltiplos laços capazes de manter os membros moralmente, materialmente e reciprocamente durante uma vida e durante gerações. Assim, no interior da família, os indivíduos podem constituir subsistemas, podendo estes ser formados pela geração, sexo, interesse e/ou função, havendo diferentes níveis de poder, e onde os comportamentos de um membro afetam e influenciam os outros membros. A família, como unidade social, enfrenta uma série de tarefas de desenvolvimento, diferindo a nível dos parâmetros culturais, mas possuindo as mesmas raízes universais (MINUCHIN,1990). Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Família. Conceito de família. Acesso 10/03/08.
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A África também possui seu conceito próprio de família, a Família Tradicional Africana.
Ela preserva características milenares, como respeito aos anciãos, as festas para reunir todos os parentes, o nascimento de uma criança ou um casamento.
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Bom dia, Dona Rosângela! Oba!!! Que bom, vamos conhecer mais sobre a África e sobre a família dos nossos ancestrais.
Bom dia, crianças! Hoje, vamos aprender sobre a família tradicional africana.
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Sim, crianças, continuaremos a desvendar o continente africano. Por isso, escolhi a família como nosso tema de aula.
Então, Dona Rosângela, ensine para nós. Estou curiosíssimo para aprender.
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Ah, entendi professora. Meu avô e meu pai vivem me contando histórias sobre a nossa antiga Bom Despacho e, quando faço algo errado, os dois sempre conversam comigo, mostrando o outro lado, que é fazer o certo.
Bom, pessoal, toda família, independente da etnia, credo ou condição social, é responsável por repassar, de avô para pai, de pai para filho e assim por diante, alguns valores importantes como: passado/presente, certo/errado, justiça/liberdade, ética/cidadania.
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Isso mesmo, Virgínia! Já a família tradicional africana tem tudo isso que eu disse e também as particularidades de cada região.
Muitas famílias africanas têm a característica matrilinear.
Matri o que, Dona Rosângela?
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Matrilinear, Bruno! Esse sistema determina que a herança venha do lado da mãe e não do pai. Logo, a criança é orientada e bem-educada pela sua família do lado da mãe.
E a criança não tem contato com família do pai?
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Tem sim, Bruno. Mas, com os parentes do lado da mãe, ele aprende tudo, essa é uma questão cultural na África. Como diz o provérbio africano: “Quem educa uma mulher (menina), educa um povo.”
A sociedade africana, apesar de machista (esta é outra herança cultural), delega a responsabilidade da educação dos filhos à mulher. Isso porque a mulher (mãe) convive com as crianças por mais tempo que os homens.
Entendi, professora!
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Continuemos. Na sociedade africana, a criança é verdadeiramente a glória da mãe. A mulher será estimada por seu marido e familiares pelo número de filhos que colocar no mundo. Por esse motivo, a mulher sempre deseja ter muitos filhos.
Dona Rosângela, é assim em todo continente africano?
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Em grande parte sim, Virgínia. Lá, a cultura familiar é um pouco diferente da nossa, mas não podemos esquecer que também temos grande influência dos africanos, que explicarei depois.
Pessoal, na África, o conceito de família é bem diferente do nosso mundo porque, para o africano, a família tem uma conotação ampla. Os laços de sangue ou de etnia são mais abrangentes que a própria filiação de pai ou mãe. Com isso, a responsabilidade pela educação das crianças ou dos adolescentes é de todos os parentes da família.
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Por isso, turminha, é comum ouvir uma criança ou adolescente chamar a tia de mãe, ou o tio de pai. Em relação aos adultos, existe sempre o respeito pelos mais velhos e, também, eles aceitam a correção na educação.
Que diferente, Dona Rosângela, aqui em Bom Despacho não vejo muito esse tipo de família!
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É verdade, Dani, enfrentamos grande crise na família brasileira. Mas, antes falar dela, encontrei esse exemplo para vocês:
A família é o elemento base da estabilidade na sociedade africana, porque tudo o que diz respeito a uma pessoa envolve toda a família. Um rapaz não se casa com uma moça (ou vice-versa), mas ele (ela) se casa com toda a família.
Se, no futuro, houver um problema entre o casal, será também problema de toda família, que intervirá de todos os lados para ajudá-lo a superar a desavença. Nesse caso, ninguém dirá que é intromissão ou invasão de privacidade. É justamente o contrário: na hora do julgamento popular, o casal não falará nada e serão os outros membros da família que falarão em seu nome.
Os filhos, educados nesse ambiente, saberão como orientar as suas vidas no futuro, porque terão como ponto de referência a tradição familiar herdada de seus pais, avós e antepassados.Fonte: http://www.pime.org.br/missaojovem/mjevangincultafricana.htm
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Que bom, Virgínia, que você pensa assim: precisamos valorizar sempre o nosso aprendizado.
Que bacana, Dona Rosângela, nunca imaginei que nos países africanos eles fossem tão unidos!
Por isso, é muito bom aprender e estudar!
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Crianças, já a família afro-brasileira teve influência de três etnias, como vocês já estudaram: a africana, a indígena e a portuguesa. Isso significa que nós temos como referência um pouquinho de cada.
Mas, como nosso tema de hoje é a África, vamos falar agora sobre a família afro-brasileira, combinado?
Tem muita diferença, Dona Rosângela?
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No Brasil, os africanos escravizados tiveram seus laços de família quebrados e, por isso, foram obrigados a criar uma nova relação familiar. Aqui, geralmente, nas famílias moram o pai, a mãe e os filhos. Às vezes, coincide de todos morarem próximos uns dos outros, mas a grande parte fica distante dos demais parentes.
Essa mistura, influência da África e da Europa, fez com que a família afro-brasileira construísse um novo conceito de família.
É verdade, Dona Rosângela, depois da sua explicação, ficou mais claro. Existem coisas na família africana que aqui no Brasil não vejo. Por exemplo: lá, a tia, o tio ou os primos mais velhos podem corrigir a criança. Aqui, vejo sempre o pai ou a mãe e, de vez em quando, os avós! No Brasil, a maioria das pessoas pensa que isso é uma intromissão.
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Sim, Virgínia, que ótimo que você percebeu essa diferença. Mas, é bom lembrar que temos muita influência da família africana, nas reuniões de família, para realizar festas ou discutir problemas, a preocupação com o bem-estar de todos, entre outras.
Ah! Não podemos esquecer também as famílias quilombolas, que formaram outro tipo de família afro-brasileira preservada. Aqui em Bom Despacho, a Tabatinga é considerada um quilombo urbano.
É mesmo, Dona Rosângela, a Dona Fiota, avó do Bruno, contou que os bairros da Tabatinga e Monte Azul foram e ainda são redutos de negros e da Língua da Tabatinga.
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Viu, Virgínia, temos exemplos importantes em Bom Despacho. Já que aprendemos mais sobre as famílias e, principalmente, sobre as famílias africana e afro-brasileira, proponho para a turma e para a escola fazer a Festa da Família, o que vocês acham?
Excelente idéia, Dona Rosângela, podemos dividir a escola e cada turno ficaria com um tipo de família! O que a senhora acha?
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Acho ótima a idéia, Matheus, vamos conversar com a Diretora Dinha sobre a festa.
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Com licença, Dinha, os alunos e eu viemos fazer uma proposta para você.
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Sabe, Dinha, hoje estudei com os alunos sobre a família e, principalmente, sobre as famílias africana e afro-brasileira. Por isso, tivemos a idéia de organizar a Festa da Família aqui na escola, o que você acha?Oi, Rô, oi, crianças, entrem!
Sim, podem falar.
Acho excelente idéia. Como vamos realizá-la, vocês pensaram nisso?
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Sim, sim, diretora. Pensamos em dividir a escola e cada turno falará sobre um tipo de família. O nosso turno ficará com as famílias africana e afro-brasileira! O turno da tarde, com a família européia, e turno da noite, com a família indígena.
Aprovado, a secretaria da escola será encarregada de distribuir os convites para os pais e também providenciar o lanche. Combinado?
Combinadíssimo!
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Xi, vó, lá na escola vamos comemorar o Dia da Família. A senhora vai comigo?
Sim, Bruno! É claro que vou!
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Quero levar a minha mãe também. Só não entendo o porquê dessa comemoração. A escola também tem cada uma...
Ih, mas que exagero!
Ah, meu neto, a família é um grande tesouro. Não tem preço. Ela é muito importante para cada um de nós, para a sociedade, para o País.
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Com licença, Dona Fiota?
Entre! É você, Carol?
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Eu mesma! Minha avó mandou essas broas de fubá pra senhora!
Oba! Vamos comê-las e continuar a nossa conversa. A maior é minha, hein vó!
Obrigada, Carol! Que beleza! Parecem estar deliciosas!
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Carol, a vovó vê a família como a coisa mais importante do mundo. Eu achei exagero, você não acha?
Não acho, Bruno! A família não pode ficar desprotegida. Se isso acontecer, o cidadão perde toda sua referência de certo ou errado.
Guloso!
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Que cidadão, Carol?
Eu, você, o Clayton e o Matheus, que estão chegando. Todos somos cidadãos!
Pense comigo, garoto. Na família recebemos proteção, carinho, educação e os cuidados que precisamos para nos transformar em cidadãos dignos e éticos, como disse a Dona Rosângela.
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Bom dia para todos! Mas você, hein Carol, tão novinha e com idéias tão bacanas, parabéns! Oi, Dona Fiota, passei aqui na sua porta e senti um cheirinho de cajuvira e não resisti. Entrei para tomar um pouquinho de café quentinho.
Salve, salve, o barbeiro mais famoso do nosso bairro, grande Tchê. Entre e tome o seu cajuvira (café).
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Mas, a Carol está certa, Bruno. A família é uma instituição sagrada.
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Deve ser mesmo, Tchê! Para você ficar falando assim tão difícil.
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Difícil nada! Acompanhar a mudança radical que ocorre na sociedade, na vida das pessoas, coloca a gente de olhos bem abertos com relação à família.
A realidade exige posturas e adaptações que acabam por gerar conflitos. Mas a família deve ser preservada sempre.
Sabe, Tchê, meu colega Jaime não conhece o pai. Ele mora com os avós e a mãe.
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Viu, Bruno, atualmente esses ajustes são comuns. A família tradicional é aquela composta por pai, mãe e filhos: ela existe e é muito importante. Mas, a família do seu colega também é, mesmo que ele não saiba quem seja o pai. Na sociedade brasileira, assim como em outros lugares, existem vários tipos de família, como: netos e avós, mães e filhos, pais e filhos, entre outros, entendeu?
A professora nos explicou que a família acumula valores fundamentais para uma sociedade justa e, se possível, igualitária.
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Igualitária? O que significa isso? Lá vem você outra vez...
Tchê, parece que estão te chamando na barbearia...
Não, Seu Bruno! É muita falta de atenção sua! Você se lembra que ela explicou sobre valores repassados pelos mais velhos, falou sobre a justiça e a igualdade que deveria existir para todos, independente da etnia, credo ou condição social?
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Vou atender este cliente que nunca chega atrasado. Obrigado pelo cajuvira, Dona Fiota. Até logo, crianças!!!
Depois você volta para mais uma cajuvira e um dedo de prosa.
Tchau, Tchê!
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Vó, você disse que a família está se modificando. Como?
Está sim, Bruno. Antigamente, as famílias eram mais numerosas aqui em Bom Despacho, penso que em outros lugares também. Mas, muitos fatores contribuíram para que a família ficasse cada vez menor.
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Quais, por exemplo?
A educação está cada vez mais difícil, mais cara. As mulheres não são mais exclusivamente donas de casa, precisam trabalhar fora. A violência crescente, a dificuldade para o tratamento de saúde, o alto preço dos alimentos e da moradia e o avanço dessa tal tecnologia, que nem conheço direito, são alguns pontos que contribuem para que as famílias sejam cada vez menores.
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É, Bruno, sua memória está fraca mesmo. Você se lembra que a Dona Rosângela explicou para nós sobre tipos de família e, principalmente, sobre as famílias africana e afro-brasileira?
É mesmo, Carol, você tem razão, às vezes esqueço das coisas!!!
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Ô Fiota! Ô Fiota! A Carol está aí? Ela veio trazer as broas de fubá e não voltou!
Está sim! Entre, Ângela. Nossa conversa é sobre a família, e está tão boa que nem vimos o tempo passar. O Bruno quer saber mais por que as famílias estão menores.
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Eh! São tantos os motivos... Eu tive seis filhos e eles têm no máximo dois cada um. Educar um filho atualmente não é muito fácil. As coisas estão difíceis e complicadas, pois as drogas chegam cada vez mais depressa, prega-se uma liberdade irresponsável e irreal que engana os jovens. A sexualidade é muito explorada e aflora cada dia mais cedo, deixando a afetividade em segundo plano.
Assim, os problemas se acumulam e muitas adolescentes tornam-se mães muito cedo. Estes são alguns problemas sérios que precisam ser pensados, revistos, discutidos e enfrentados pelas famílias.
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Puxa, Dona Ângela! É tão sério assim? E como podemos resolver esses problemas?
Na verdade, não existe uma receita pronta. Mas, acredito, Bruno, que se as pessoas parassem para discutir o assunto em família, nas associações de bairro, nas escolas, nas igrejas, nas fraternidades e em outros lugares, seria mais fácil buscar formas para se resolver este e outros problemas que também afligem as famílias.
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Carol, sua mãe está te chamando. Vá depressa e direto para casa, ouviu?
Já vou! O que será que ela quer com tanta urgência?
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Com certeza, saber onde você está e com quem. Não dá para deixar uma mocinha linda como você solta por aí! Vá para casa, pois ela se preocupa com a sua segurança.
A segurança dos filhos é uma das grandes preocupações de todas as famílias: brancas, negras, indígenas.
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É, vó, vocês me convenceram. É mesmo importante valorizar a família. A Carol me lembrou o que a Dona Rosângela ensinou sobre as famílias africana e afro-brasileira e ficou decidido que o nosso turno irá falar sobre esse tema. Vou aproveitar o estudo e a pesquisa que fizemos sobre elas e criar um cartaz para homenageá-las e também enfeitar a escola no dia da festa.
É bom fazer vários e posso ajudar vocês! Tenho certeza que a Carol, o Clayton, o Matheus, a Virgínia e o Jaime também ajudarão. E vocês, queridos leitores, também podem colaborar desenhando esses painéis.
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Complete os quadros abaixo com desenhos:
atiVidades
Família Tradicional Africana
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Família Tradicional Afro-Brasileira
50
Os vários tipos de famílias existentes na África
51
Os vários tipos de família existentes no Brasil
52
Os vários tipos de famílias existentes no Mundo
HERNANDEZ, Leila Leite. A África na sala de aula – Visita à História Contemporânea. São Paulo: Selo Negro, 2005.
LOPES, Nei. Bantos, malês e identidade negra. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.
SOUZA, Maria de Melo e. África e Brasil Africano. São Paulo: Ática, 2006.
Site:
http://pt.wikipedia.org/wiki/familia
http://www.pime.org.br/missaojovem/mjevangincultafricana.html (Acesso 21/04/08)
reFerencias BiBlioGraFicasii i
Fundação Guimarães Rosa
Superintendente-Geral
Álvaro Antônio Nicolau
Superintendente Operacional
Pedro Seixas da Silva
Superintende de Administração e Finanças
José Antônio Gonçalves
Departamento Social
Helvécio Gomes
Setor de Comunicação, Cultura e Lazer
Juliana Leonel Peixoto
Equipe Responsável pela Pesquisa
Kelly Alcilene Cardozo: Historiadora e Especialista em Estudos Africanos e Afro-Brasileiros Rosângela Melo Gontijo: Assistente de Pesquisa
Apoio
Escola Estadual Martinho Fidélis
Ilustração
Guilherme Rocha - “FUDI”
Edição, diagramação e revisão
Jota Campelo Comunicação
Fundação Guimarães Rosa – FGRCARDOZO, Kelly A.; GONTIJO, Rosângela M. Contando Saberes: Histórias da Dona Fiota - Famílias Africana e Afro-Brasileira. Vol. 5.
Belo Horizonte: Gráfica e Editora 101, 2008. 56p.
Rua Paraíba, 1441 - Conj. 801/806 - FuncionáriosBelo Horizonte - MG - www.fgr.org.br
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