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Leitura na escola e na comunidade
Introdução
De livros, leituras e leitores
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Agradecemos à Biblioteca Nacional do Rio de
Janeiro por ter gentilmente cedido o direito de uso
de imagens do seu acervo neste módulo. E também
a todos os educadores que nos cederam suas
“histórias de leitura”.
Fundação Volkswagen Via Anchieta, km 23,5 – CPI 1394 – Bairro Demarchi 09823-901 – São Bernardo do Campo – SP http://www.vw.com.br/fundacaovw
Presidente do Conselho de CuradoresHolger Rust
Diretor SuperintendenteEduardo de A. Barros
Diretora de Administração e Relações InstitucionaisConceição Mirandolae-mail: [email protected]
CENPEC – Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária Rua Minas Gerais, 228 – Consolação01244-010 – São Paulo – SPhttp://www.cenpec.org.br
Presidente do Conselho de Administração Maria Alice Setubal
SuperintendenteAnna Helena Altenfelder
Coordenadora TécnicaMaria Amábile Mansutti
Gerente de Projetos Locais Claudia Petri
Líder do ProjetoMaria Alice Mendes de Oliveira Armelin
Autoria do MóduloAmérica dos Anjos Costa Marinho Maria Alice Mendes de Oliveira Armelin
RevisãoSandra Miguel
Projeto gráfi coRabiscos & Grafi smos
Editoração eletrônicaAlba Amaral Gurgel Cerdeira Rodrigues
Fotografi asAcervo da Biblioteca Nacionalwww.dominiopublico.gov.br
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São Paulo, fevereiro de 2011Tiragem: 500
Sumário
O PROJETO ENTRE NA RODA E O PROGRAMA TERRITÓRIO ESCOLA 4
DE LIVROS, LEITURAS E LEITORES 7
O Livro e a leitura no Brasil 15
LEITURA, UMA PRÁTICA SOCIAL 27
Concepção de leitura 27
A formação do leitor 33
O texto literário como isca de leitura 35
HISTÓRIAS DE LEITORES 41
REFERÊNCIAS E SUGESTÕES DE LEITURA 49
CRÉDITOS DAS FIGURAS 51
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O Projeto Entre na Roda e o Programa Território Escola
(. . .) Ingressar, estar, permanecer, por um tempo, nas escolas - em qualquer
tipo de instituição escolar - é uma experiência tão natural e cotidiana
que nem sequer tomamos consciência da razão de ser de sua existência,
da sua contingência, de sua possível provisoriedade no tempo, das
funções que cumpriu, cumpre ou poderia cumprir, dos signifi cados que
tem nas vidas das pessoas, nas sociedades e nas culturas(...)É como o ar,
de cuja importância e presença só nos damos conta quando ele nos falta
para respirar.
GIMENO SACRISTÁN.
4 Entre na roda - Introdução
Esta coleção é um material
de apoio do Projeto Entre na
Roda, destinado à formação
de leitores. Entre na Roda faz parte do
Programa Território Escola, fruto da par-
ceria entre a Fundação Volkswagen e o
Cenpec.
Em 2002, a Fundação Volkswagen e
o Cenpec iniciaram um trabalho conjunto
para oferecer apoio pedagógico às esco-
las públicas de municípios que sediam
unidades fabris e de serviços da marca
Volkswagen, implementando, em um pri-
meiro momento, os projetos Estudar pra
Valer! Língua Portuguesa e Entre na Roda,
que têm o letramento como ponto comum
do trabalho de formação de educadores.
Posteriormente, outros projetos fo-
ram implementados: Brincar, Estudar
pra Valer! Matemática e Leitura e Escrita:
desafio de todos, este último destinado
às séries finais do ensino fundamental.
Além disso, introduziu-se o projeto Ações
em Rede visando alargar e potencializar
os espaços de aprendizagem na comu-
nidade para crianças e adolescentes. Em
2005 esses projetos foram reunidos no
Programa Território Escola.
O Programa Território Escola é mais
que um conjunto de projetos; é uma con-
cepção de educação, de escola e de pro-
cesso de ensino e de aprendizagem. Parte
do princípio de que todos são capazes de
aprender e considera que o acesso aos
bens culturais é mediação necessária para
a apropriação do conhecimento universal.
A denominação Território Escola foi
intencionalmente escolhida por sugerir
uma reflexão sobre as concepções que
consideram escola e comunidade como
um território onde pulsam relações hu-
manas e onde podem-se estabelecer vín-
culos de pertinência entre instituições e
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Os projetos que integram o Programa
seguem os mesmos princípios e têm a
mesma intenção educacional, articulando
teoria e prática no processo de formação
dos educadores. Todos preveem forma-
ção continuada com momentos presen-
ciais e a distância, bem como acompa-
nhamento e avaliação, ambos pautados
por um processo de gestão compartilha-
da entre os envolvidos. Ao mesmo tempo,
destinam-se a públicos específicos e uti-
lizam estratégias diferenciadas que lhes
conferem um caráter próprio, único.
Valoriza-se, em cada um deles, o regis-
tro das ações desenvolvidas como instru-
mento de produção de conhecimentos e de
divulgação de resultados, dando-lhes visibi-
lidade e contribuindo para sua irradiação.
Território Escola é a concepção de esco-
la que defendemos: uma escola viva, enrai-
zada e crítica que se relaciona com o mun-
do e na qual o conhecimento faz sentido.
serviços públicos de atendimento a crian-
ças e adolescentes.
Assim, é muito importante o prota-
gonismo dos agentes da escola e da co-
munidade, pois a escola só potencializa
o seu fazer articulando-se e complemen-
tando-se com outros recursos, espaços e
sujeitos presentes no território.
O Programa Território Escola tem três
propostas-chave:
● articular a atuação da escola às
práticas culturais do território em que
está inserida, buscando dar sentido
às aprendizagens dos alunos;
● ampliar o letramento como
ferramenta de base para o acesso ao
conhecimento e à cidadania.
● somar esforços com outros espaços
educativos da comunidade na
perspectiva da educação e da
proteção integral de crianças e de
adolescentes.
5Entre na roda - Introdução
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BÍBLIA. Latim. Mogúncia. 1462. Trata-se da primeira obra impressa na qual aparecem data, lugar e nomes dos impressores, Fust e Schoeffer (ex-sócios de Gutenberg), no colofão. É o incunábulo mais antigo da Biblioteca Nacional. Impressa sobre pergaminho, sendo as iniciais dos capítulos feitas à mão com tinta azul e vermelha.
Figura 1 - Encadernação da Bíblia da Mogúncia
Figura 2 - Bíblia da Mogúncia - página em pergaminho com a marca do impressor
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7Entre na roda - Introdução
A té o século XVIII, o livro era feito
artesanalmente – por isso cada
exemplar tinha características próprias,
que manifestavam a criatividade e o es-
mero do artista que o produzia, sendo
apreciado não só pelo conteúdo, mas
também por seus aspectos estéticos.
Enquanto obra de arte, seu preço era ele-
vado e sua circulação, restrita.
Nas sociedades modernas, a função da
escrita se modificou devido ao progresso
tecnológico, ao acúmulo de conhecimen-
tos e à necessidade de circulação de in-
formações. O livro então passou de objeto
de arte a produto de consumo e deixou de
ser o principal suporte da escrita, pois esta
passou a se valer de cartazes, jornais, fo-
lhetins, revistas, meio eletrônico e outros.
Da mesma forma, o leitor deixou de ser
aquele que usufruía esteticamente do texto
e do aspecto gráfico de uma obra, lendo-
-a integralmente da primeira à última linha,
para tornar-se um leitor mais rápido e flexí-
vel, em face da diversidade de situações de
leitura ao mesmo tempo impostas e propor-
cionadas a ele pela vida moderna.
Dada a transformação profunda ocor-
rida ao longo dos séculos, é quase impos-
De livros, leituras e leitores
sível imaginar como seria a leitura – e o
leitor – nas épocas precedentes, embora
estudos feitos a partir de suportes, regis-
tros e obras que sobreviveram ao tempo
nos permitam visualizar um pouco a tra-
jetória dessa relação sempre algo impre-
visível entre o homem e o texto escrito.
Ainda que os sumérios, há 4 mil anos
a.C., já utilizassem a escrita e, nas anti-
gas Grécia e Roma, parte da população
tivesse acesso a ela, todo o conhecimento
acumulado até a Idade Média era basica-
mente transmitido de forma oral. Apesar
de pensadores como Sócrates, Platão e
Pitágoras valorizarem mais o pensamento
vivo e o diálogo com os pares e com os
discípulos como forma de transmissão e
de construção do saber, parte desse co-
nhecimento só chegou até nós porque foi
registrado por escrito.
Pode-se dizer que, na Antiguidade, o
leitor, antes de tudo, era um ouvinte, já que
a prática habitual eram as leituras públicas
– realizadas ou pelo próprio autor, ou por
um profissional da leitura. Essa era a forma
pela qual leitores e não leitores entravam
em contato com as diferentes obras produ-
zidas, em função das dificuldades e da pre-
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8 Entre na roda - Introdução
cariedade das técnicas de registro manual.
O escrito era visto como mero substituto do
oral e, por isso, pouco valorizado.
No entanto, descontadas as dificulda-
des de registro, a reprodução de obras co-
piadas dos originais fez aumentar o número
de bibliotecas, fossem elas particulares ou
públicas. O exemplo mais significativo des-
se processo foi a criação da Biblioteca de
Alexandria, no século III a.C., com um acer-
vo de 500 mil obras da Antiguidade e a ins-
crição na entrada: “Lugar de cura da alma”.
Inicialmente as obras eram registradas
sobre papiro (folha feita com fibras de uma
planta originária do Egito) nos volumina
– rolos sobre os quais o texto era escrito em
estreitas colunas, sem espaço em branco
entre as palavras. A leitura era dificultada
pelo fato de que o leitor deveria segurar o vo-
lumen com as duas mãos, desenrolando-o
com uma delas e enrolando-o com a outra.
Esse processo não permitia que ele anteci-
passe o que vinha pela frente ou retornasse
a trechos anteriores do texto como é possível
fazer hoje. A leitura completa de uma obra
era traduzida pela expressão latina “ad um-
bilicum adducere”, que significa “ir de fora
até o ‘umbigo’ (eixo/centro)” do volumen.
Posteriormente, passou-se a utilizar
o pergaminho (pele de animal, macera-
da em cal, raspada e polida com pedra -
-pomes), material mais flexível, menos raro
e, portanto, mais barato. Além disso, per-
mitia a escrita nos dois lados das folhas,
que depois podiam ser dobradas e unidas
em cadernos, constituindo um códice, o
primeiro livro portátil.
As invasões bárbaras, nos séculos V e
VI d.C., acabaram por destruir o Império
Romano e, com ele, os grandes centros de
formação e concentração da cultura antiga.
O mundo ocidental mergulhou num período
em que a cultura letrada praticamente desa-
pareceu, restringindo-se aos monastérios.
A censura exercida pela Igreja Católica
ao longo da Idade Média, aliada ao mono-
pólio que detinha sobre a escrita, fez com
que o livro se sacralizasse.
Também a instrução passou para a tu-
tela da Igreja. Dessa forma, o aprendizado
da leitura, em latim, acabou se restringin-
do aos jovens destinados à vida religiosa.
Aos sete anos, esses meninos iam para a
escola e recebiam ensinamentos, sobretu-
do orais. Cabia à criança ouvir o mestre e
memorizar o que a ela era ensinado, pois
saber era “saber de cor”.
Nos mosteiros, as obras aprovadas pela
Igreja para reprodução eram manuscritas,
num trabalho longo e paciente, por monges
instalados no scriptorium, sala ampla e ilu-
minada, com mesas sobre as quais ficavam
todos os instrumentos necessários para có-
pia e ilustração (iluminuras) dos textos.
Nesse ambiente, pairava o murmúrio
constante dos monges que necessitavam
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Figura 3 - Livro de Horas em latim, 1588.
Em pergaminho, um valioso livro medieval iluminado. Cena bíblica
Figura 4 - Bíblia em latim, Veneza, 1480 - Capitular iluminada a ouro
9Entre na roda - Introdução
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10 Entre na roda - Introdução
ler em voz alta os textos que copiavam, já
que neles a escrita dirigia-se mais aos ou-
vidos que aos olhos: não havia separação
entre as palavras, e a pontuação e a or-
tografia ainda não estavam normatizadas.
Portanto, só pela oralização o leitor podia
chegar ao significado do texto.
Era raro encontrar um leitor silencioso e,
em função disso, nos mosteiros havia ainda
um aposento especial, destinado à leitura,
para que o texto lido em voz alta não prejudi-
casse a paz e o recolhimento dos religiosos.
Somente no século X, a leitura silen-
ciosa passou a ser usual no Ocidente.
Santo Agostinho relata, espantado,
a maneira extraordinária como San-
to Ambrósio lia: “Quando ele lia, seus
olhos perscrutavam a página e seu co-
ração buscava o sentido, mas sua voz
fi cava em silêncio e sua língua quieta”
(MANGUEL, 1997).
Todavia, aos poucos, alterações técni-
cas na diagramação do texto manuscrito
foram sendo conquistadas. A adoção de
um novo tipo de letra (carolina), mais le-
gível que a gótica, a separação entre as
palavras, a pontuação e a normatização
da ortografia latina permitiram a criação
de estratégias de leitura mais eficazes.
A leitura visual, silenciosa, primeiro difun-
dida nos mosteiros, foi ganhando as universi-
dades e finalmente alcançou a aristocracia.
Essa irradiação de uma nova forma de ler
demorou séculos para se efetivar e resultou
de um grande processo de transformações
econômicas e sociais, que conduziram a
Europa de um sistema feudal para outro,
mercantilista. A Igreja foi perdendo sua su-
premacia espiritual e temporal; a educação
ganhou um caráter laico; o ensino deixou
de ser exclusivamente oral para contar com
o apoio do livro como instrumento didático;
e os intelectuais tornaram-se mais críticos e
contestadores, à medida que foram tendo
acesso a autores gregos e árabes.
Cresceu a demanda por livros e, pa-
ralelamente, aumentou a produção edi-
torial, os livros ficaram mais acessíveis,
passaram a ter uma nova configuração,
apresentando paginação, sumário e lista-
gem de abreviaturas, que facilitavam seu
manuseio e compreensão.
Esse cenário favoreceu o surgimento da
imprensa na Europa. Na década de 1440,
Gutenberg inventou uma técnica de impres-
são com tipos móveis, utilizando-se de outras
recentes conquistas – a fundição do chum-
bo, a criação de tintas mais aderentes, a xilo-
gravura, a impressão em tecido e o papel de
origem chinesa.
Na verdade, Gutenberg não foi o pri-
meiro a utilizar o tipo móvel para im-
pressão. Esse processo já era conhecido
na Ásia bem antes de sua descoberta
no Ocidente. Desde o século XI, a China
utilizava o tipo móvel em terracota. A
partir do século XIII, passou a utilizar
caracteres de madeira, enquanto na
Coreia os textos eram impressos com
caracteres de metal.
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11Entre na roda - Introdução
A partir da Bíblia de Gutenberg, a
Igreja perdeu a função de intermediá-
ria da palavra sagrada, já que se tornou
possível ter acesso diretamente à palavra
de Deus por meio da página impressa.
Lutero e a Reforma Protestante surgiram
no bojo dessa situação e apontaram para
a necessidade de escolarização, que per-
mitisse a todos ler a Bíblia.
Mesmo depois da invenção de Guten-
berg, as cópias manuscritas continua-
ram tendo importância na circulação
de vários gêneros, como panfl etos po-
líticos e informativos, trabalhos proibi-
dos, composições poéticas e trabalhos
eruditos, cujo acesso deveria fi car res-
trito a um número limitado de leitores.
Figura 5 - Mesa de trabalho do gravador – Ofi cina da Casa Literária do Arco do Cego, depois denominada Tipografi a Calcográfi ca e Literária do Arco do Cego, criada em 1799 por D. Rodrigo Souza Coutinho com o objetivo de difundir as Luzes da Ciência e da Ilustração portuguesas. A tipografi a publicou 83 títulos. A Ofi cina aglutinava várias funções ligadas a artes gráfi cas, tipografi a, calcografi a, com corpo próprio de gravadores.
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12 Entre na roda - Introdução
Cresceu então o entusiasmo pela
aprendizagem da leitura e, em alguns
países, para superar a falta de escolas,
aqueles que sabiam ler ensinavam aos
que não sabiam.
A partir do século XVII, a relação
do leitor com o livro, antes centrada na
Bíblia e em outras obras sacras, alterou-
-se profundamente com a publicação de
grande quantidade de obras profanas.
Almanaques, calendários e contos popu-
lares e amorosos faziam grande sucesso
entre os mais pobres.
Segundo José Juvêncio Barbosa (1990),
nessa sociedade em mudança coexistiam
dois tipos de leitores, que representavam
duas concepções de leitura. Havia o leitor
ainda preso à tradição oral, para quem o li-
vro e a leitura eram instrumentos para man-
ter unida a família em torno de mensagens
religiosas e moralizantes. A essa leitura oral
e coletiva contrapunha-se a do leitor solitário
e silencioso, que lia todo e qualquer texto, e
tratava a escrita como uma linguagem para
os olhos, apreendendo de forma mais efi-
ciente porções maiores de texto.
O século XVIII representou um salto na di-
reção da formação de um público leitor. A re-
volução econômica, política e cultural da épo-
ca, promovida pelo avanço tecnológico e pelo
pensamento crítico e racional de filósofos do
Iluminismo, resultou numa crescente amplia-
ção das oportunidades de acesso ao saber. A
partir da invenção da imprensa, as técnicas
de reprodução gráfica se desenvolveram ra-
pidamente, tornando possível publicar obras
dos mais diferentes gêneros, escritas por au-
tores de todos os segmentos sociais. Houve,
também, uma disseminação da habilidade
de ler, graças à ampliação da escolaridade
para uma faixa maior da população.
Até a metade do século XVIII, as publi-
cações de caráter romanesco, que mais
circulavam socialmente, não costumavam
trazer o nome dos autores estampado na
página de rosto. Isso se devia em parte
à má fama dos romances – vistos como
uma forma inferior de literatura e como
capazes de corromper moralmente, so-
bretudo as leitoras –, em parte ao caráter
passageiro da maioria dessas obras.
Os escritores viviam sob a proteção de
um aristocrata ou acabavam se envolven-
do em atividades ilegais, como o contra-
bando de livros. Não existia, portanto, a
“profissão” de escritor. Esses costumavam
vender seus originais a um editor, que
muitas vezes lhes pagava parte em dinhei-
ro, parte em livros, que os autores podiam
comercializar por conta própria. Não havia
“direitos autorais” – os lucros ficavam com
o editor. Só mais tarde, em 21 de julho de
1793, a França revolucionária promulgaria
uma lei que reconhecia a noção de pro-
priedade literária, conferindo certidão de
batismo ao autor moderno.
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13Entre na roda - Introdução
Outro tipo de obra que também fez su-
cesso nesse período foi a literatura peda-
gógica e infantil, voltada para a formação
moral e a educação das crianças. Essas
obras, carregadas das ideias de Rousseau
– de que o homem é naturalmente bom e
a sociedade é que o corrompe –, preocu-
pavam-se em orientar os pais para educar
a mente e o coração dos pequenos, tendo
em vista torná-los cidadãos úteis e felizes.
Ainda no século XVIII, consolidou-se em
alguns países da Europa uma nova forma de
circulação de textos, que atendia a duas ne-
cessidades básicas: oferecer conteúdos mais
leves, menos eruditos, e propiciar informações
sobre os acontecimentos cotidianos. Os jornais
ganharam espaço enquanto suporte de dife-
rentes gêneros discursivos: notícias, anúncios
publicitários, curiosidades, fofocas etc.
O primeiro “jornal” de que se tem no-
tícia – a Acta diurna – surgiu em Roma,
em 59 a.C., por inspiração de Júlio Cé-
sar. Desejando tornar públicos os mais
importantes eventos e acontecimen-
tos sociais e políticos, César ordenou
que esses fatos fossem divulgados nas
principais cidades por meio das Acta.
Escritas sobre placas brancas coloca-
das em lugares públicos, como as ter-
mas, as Acta informavam os cidadãos
sobre campanhas militares, escândalos
no governo, julgamentos e execuções,
casamentos, óbitos e nascimentos. As
informações que constavam das Acta
eram colhidas por “repórteres” nomea-
dos pelo Estado, chamados de “actuarii”.
Em 1761, Rousseau lançava Julie ou
La nouvelle Héloïse, o grande best-seller
do século. Pelo sucesso alcançado pelo
romance, pode-se atribuir a seu autor o
surgimento do culto ao escritor.
Esse romance, que já antecipava o
Romantismo, foi responsável por uma
enxurrada de lágrimas, desmaios e sui-
cídios entre os(as) leitores(as) da época.
Nele, Rousseau retoma a situação vi-
vida por Abelardo e Heloísa, um casal
de amantes da Idade Média que teve
seu amor violentamente combatido
pelo tio da moça e pelos preconceitos
da época, para construir personagens
porta-vozes de suas ideias.
Escrito na forma de cartas – 163 ao
todo –, o romance conta a história de
uma jovem nobre, Julie d’Étanges, que
se enamora de seu preceptor, o jovem
e pobre Saint-Preux. A diferença social
é o grande obstáculo ao amor dos dois,
mas, mesmo separados, o sentimento
entre eles se mantém.
O sucesso de La nouvelle Héloïse foi
tão grande que a quantidade de livros
impressos não foi sufi ciente para aten-
der à demanda de tantos leitores inte-
ressados. Isso fez com que os livreiros
passassem a alugar os livros por dia e
até por hora.
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Figura 6 - Tradução guarani, feita no século XVIII, da 1ª catequese dos índios selvagens pelos padres da Companhia de Jesus, 1733
14 Entre na roda - Introdução
Do século XVIII, palco de tantas trans-
formações, até nossos dias, a função da
escrita na sociedade se alterou profunda-
mente e, em consequência disso, o ato
de ler assumiu novas dimensões. O novo
leitor lê apenas pequenas porções de tex-
tos que lhe são ofertados. Como aponta
BARBOSA (1990, p. 109), “grande parte
da leitura diária das pessoas é constituída
de atos exploratórios onde o leitor desta-
ca os segmentos relevantes para obter a
informação que deseja”. Trata-se, nesse
caso, de uma leitura seletiva.
A palavra escrita se popularizou cada
vez mais e acabou se tornando um meio co-
mum de comunicação a distância entre as
pessoas. O modo como se lia também mu-
dou. Se até a metade do século XVIII a lei-
tura era mais intensiva – poucos textos lidos
repetidas vezes, com profundidade, e parti-
lhados em família e em reuniões sociais –, a
partir de 1750 ela se tornou mais extensiva,
resultando no ato de ler voltado para grande
quantidade de matéria impressa – fato que
elegeu os romances e jornais como mate-
riais privilegiados e mais consumidos. Dessa
forma, os textos passaram a ser lidos uma
única vez, com o objetivo
de obter entretenimento e
informação.
O Romantismo, movi-
mento literário do século
XIX, ao afirmar o texto li-
terário como algo original,
resultado da criatividade
e da expressão íntima de
um indivíduo, difundiu
definitivamente a ideia de
autoria. Assim, rompeu-
-se com a visão da tradi-
ção medieval e clássica,
que via os atos de escrita
– literários ou não – como
reescrita pela retomada
ou imitação de textos já
consagrados.
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15Entre na roda - Introdução
O Livro e a leitura no BrasilA descoberta do Brasil pelos portu-
gueses e sua consequente colonização
transportaram para nosso país a língua e a
cultura de um povo que, bem ou mal, já se
inseria em todo um processo que impul-
sionava a Europa na direção de uma nova
ordem social e econômica.
Dada a extensão da nova terra, a coloni-
zação se fez de forma lenta, restringindo-se,
sobretudo, a pontos do litoral, onde se forma-
ram, durante o século XVI, algumas poucas
vilas destinadas a receber os governantes
que Portugal enviava para garantir a posse
da terra. Com eles, aqui aportaram os que
vinham povoar a colônia; cuidar da conver-
são do gentio; cumprir pena de desterro, por
crimes cometidos na metrópole; ou simples-
mente se aventurar em busca de riquezas.
As condições que cercaram os primeiros
séculos de nossa vida colonial foram respon-
sáveis pela fragilidade na constituição de prá-
ticas culturais que levassem à formação de
leitores. Os poucos escritos que circularam
aqui – vindos de Portugal – vinculavam-se, so-
bretudo, a questões práticas: a administração
da nova terra e a catequização dos nativos. E
o que aqui foi produzido não teve impacto na
formação de uma cultura letrada, pois ficou
restrito a pequenos grupos e só alguns desses
textos foram publicados na Europa. Esse é o
caso dos relatos de viajantes, dos poemas de
elogio à terra recém-descoberta e das crôni-
cas de acontecimentos memoráveis e de de-
fesa da terra contra as invasões estrangeiras.
Como marco dessa época, pode-se citar
José de Anchieta, um dos poucos a criar uma
obra de real valor literário, como só acontece-
ria mais tarde, já no século XVII, com autores
como o padre Antônio Vieira e Gregório de
Matos. Este último, apesar da qualidade de
sua obra poética, só teve seus poemas im-
pressos em meados do século XIX. Até então,
eles circularam em manuscritos feitos pelo
autor ou em cópias transcritas por terceiros.
Gregório de Matos, poeta baiano nas-
cido em 1636, viveu muitos anos em
Portugal, onde se formou em Leis. Vol-
tando à Bahia, levou uma vida irregu-
lar, pontuada por escândalos, prisão e
até exílio na África. Escreveu poemas
líricos, religiosos e satíricos, mas nun-
ca conseguiu imprimi-los; tornou-os
públicos declamando-os ou oferecendo
seus manuscritos a amigos e admirado-
res. Os ataques impiedosos à sociedade
baiana, ao clero e às altas autoridades
da época – tratados com ironia e debo-
che em seus versos satíricos – rende-
ram-lhe o apelido de “Boca do Inferno”.
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Figura 7 - Carimbo da Biblioteca Nacional
16 Entre na roda - Introdução
No século XVIII, a descoberta de ouro
e diamantes, principalmente na região de
Minas Gerais, provocou o deslocamento
do eixo político-econômico para o sul. A
capital do Brasil foi transferida para o Rio
de Janeiro e o governador-geral tornou-se
vice-rei.
Com isso, tanto a vida urbana teve
grande impulso, como se criaram condi-
ções para que florescessem, sobretudo
na capitania de Minas Gerais, importan-
tes manifestações culturais na arquite-
tura, pintura, escultura, música e litera-
tura. Foi nesse contexto que um grupo
de intelectuais ligados ao movimento da
Conjuração Mineira veio a produzir um
conjunto de obras reveladoras de uma
maturidade que caminhava para a afir-
mação de nossa autonomia literária e
para a crescente conquista de um público
leitor ainda bastante incipiente. Basílio da
Gama, Silva Alvarenga, Alvarenga Peixoto,
Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio
Gonzaga são alguns dos poetas que mar-
caram esse momento.
Tomás Antônio Gonzaga, autor de li-
ras dedicadas a sua amada Marília, foi
o primeiro a representar em seus poe-
mas a relação entre a mulher e o livro,
entre a leitora e a literatura.
LIRA III(...)
Enquanto revolver os meus consultos,
Tu me farás gostosa companhia,
Lendo os fatos da sábia mestra História
E os cantos da poesia.
Lerás em alta voz a imagem bela,
Eu, vendo que lhe dás o justo apreço,
Gostoso tornarei a ler de novo
O cansado processo.
(...)
A Lira III (trecho acima) insere-se na
terceira parte da obra Marília de Dirceu,
escrita quando Gonzaga já se achava
preso e aguardava a sentença pela par-
ticipação na Conjuração Mineira. Nela,
o poeta inclui a leitura no cotidiano do-
méstico, numa cena – nunca realizada
– em que projeta a futura vida ao lado
da amada.
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Figura 8 - Ex-libris da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro
17Entre na roda - Introdução
Em 1747, contrariando as autoridades
portuguesas, Isidoro da Fonseca, um dos
principais tipógrafos de Lisboa, veio para
o Brasil, a convite do governador do Rio
de Janeiro e de Minas Gerais – Gomes
Freire de Andrade –, para instalar uma
ofi cina de impressão no Rio. A experi-
ência durou pouco. Assim que as auto-
ridades portuguesas souberam do fato,
Fonseca foi obrigado a fechá-la.
Rompendo com essa tradição, o ano
de 1808 teve fundamental importância
para a história da leitura no Brasil. Com
a chegada da família real portuguesa, a
então colônia começou a conquistar gra-
dativamente condições para sua inserção
no mundo das letras.
Logo que chegou ao Rio de Janeiro, o
príncipe regente D. João VI tomou uma sé-
rie de medidas visando aparelhar a cidade
para torná-la compatível com a nova função
de sede da corte portuguesa.
Entre essas medidas, aquelas que mais
diretamente afetaram o processo de for-
mação de leitores no Brasil foram: a cria-
ção de escolas superiores, a fundação da
Biblioteca Real e a autorização para o fun-
cionamento da imprensa no Brasil.
Antes da chegada de D. João VI, os
jovens das famílias ricas, após os estudos
iniciais aqui realizados, costumavam ir a
Portugal para frequentar a universidade
e, de lá, retornavam formados principal-
É certo que, nos três primeiros sécu-
los de colonização, a imprensa inexistiu no
Brasil, fato que acabou dificultando bastante
a difusão de práticas de leitura mais intensas
e consistentes entre nós. Qualquer escrito
produzido na colônia deveria obter autoriza-
ção real para ser publicado na metrópole ou
permanecer sob a forma de manuscrito.
A restrição à impressão de obras na co-
lônia deveu-se ao conservadorismo adminis-
trativo, que julgava perigosa a circulação de
textos que pudessem despertar ideias contrá-
rias aos interesses da metrópole. Condicionar
a publicação de uma obra à aprovação da
censura eclesiástica e régia era uma forma
de conter qualquer ímpeto libertário.
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18 Entre na roda - Introdução
blioteca foi aberta ao público em 1814, com
50 mil livros impressos em línguas antigas
e modernas, preciosos manuscritos, cópias
de estampas, mapas e curiosidades biblio-
gráficas. Todavia, cronistas estrangeiros da
época relatam que o acervo, composto por
obras predominantemente clássicas, era de-
satualizado e, embora o atendimento fosse
primoroso, o público frequentador era ainda
muito reduzido. Com o passar do tempo, o
acervo foi se atualizando e ampliando, mas
nunca chegou a contar com uma frequência
expressiva, o que denotava pouca intimida-
de dos brasileiros com os livros.
A terceira medida tomada por D. João
VI talvez tenha sido a mais importante para
a nossa história de leitura: a carta régia que
autorizava a impressão no Brasil e a con-
sequente criação da Imprensa Real rom-
peram com três séculos de proibição e de
controle autoritário sobre a publicação dos
escritos aqui produzidos.
O primeiro prelo foi trazido ao Brasil
por acaso. Tudo se deveu à fuga precipi-
tada da corte portuguesa para o Rio de
Janeiro, em função do avanço das tropas
de Napoleão. Pouco antes, Portugal en-
comendara à Inglaterra uma tipografi a
completa, que seria instalada na Secreta-
ria de Estado dos Negócios Estrangeiros e
da Guerra. Esta se achava ainda encaixo-
tada na Alfândega de Lisboa. Quando se
deu o embarque da família real, o prelo
foi colocado nos porões da fragata Medu-
sa, um dos navios da esquadra régia.
mente em Leis ou em Medicina. Com as
invasões napoleônicas e a fuga da família
real, essa possibilidade estava descartada.
Havia, portanto, necessidade de es-
colas aqui que pudessem formar esses
jovens. Assim, D. João VI criou duas es-
colas de Medicina (uma no Rio e outra
na Bahia); a Real Academia Militar para o
ensino de Ciências Matemáticas, Militares
e Naturais; e transferiu para a corte a
Real Academia Naval, onde se estudavam
Ciências Matemáticas e Físico-Matemáticas,
Artilharia, Navegação e Desenho. Dessa
forma, D. João VI procurava evitar o êxodo
de futuros intelectuais, médicos e cientistas
e garantir também quadros que pudessem
compor o exército e a armada, forças que
deveriam manter a segurança do território
brasileiro e da família real.
Além dessa medida, o príncipe regente
tratou de oferecer à cidade uma biblioteca
comparável às europeias. Nas 55 embarca-
ções da esquadra portuguesa que trouxe a
família real ao Brasil, acomodaram-se, sem
nenhum conforto, as figuras mais ilustres
da corte portuguesa com seus respectivos
bens. Entre os pertences da família real vie-
ram livros do vasto e raro acervo de D. João
VI, que aqui foram instalados no Hospital da
Ordem Terceira do Carmo, onde passou a
funcionar a Biblioteca Real.
Organizada por dois intelectuais da épo-
ca, Joaquim Damaso e José Viegas, a bi-
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19Entre na roda - Introdução
Mesmo assim, a imprensa continuou a
ser monopólio da coroa; somente a Bahia
teve licença para instalar outro prelo; os de-
mais, surgidos no Rio de Janeiro, foram con-
siderados ilegais e apreendidos pela polícia.
Além da publicação de atos e procla-
mações do Estado, a Imprensa Régia pa-
trocinou jornais como a Gazeta do Rio de
Janeiro, criada em 1808, espécie de diário
oficial da época, e O patriota, jornal literário
que contou com a colaboração dos intelec-
tuais mais ilustres de então. Publicou tam-
bém sermões, folhetos contra a França, que
invadira Portugal, e obras literárias.
Com a criação da Real Academia Militar
e a fundação das escolas de Medicina, além
da transferência para o Rio de Janeiro da Real
Academia Naval, surgiu a demanda por livros
didáticos, que, quantitativamente, passaram
a constituir a parte mais importante do catálo-
go de publicações da Imprensa Régia.
Apesar do número crescente de pu-
blicações, a Imprensa Régia vivia em di-
fi culdades fi nanceiras. Para superá-las,
D. João VI autorizou que a ela se ane-
xasse, em 1811, uma fábrica de bara-
lhos e procurou criar mecanismos para
impedir a concorrência de material es-
trangeiro contrabandeado.
Como a cidade crescia, graças à pre-
sença da corte e à intensificação de negó-
cios com outros países, especialmente a
Inglaterra, aumentou a procura por livros.
Como a Imprensa Régia, sozinha, não dava
conta de produzi-los, houve necessidade de
se recorrer à importação, o que fez surgirem
novas livrarias, que, de duas (1808), passa-
ram a doze (1816).
O Brasil e mais especificamente o Rio
de Janeiro, sede da monarquia, lentamen-
te começavam a apresentar as condições
mínimas necessárias para a formação e o
fortalecimento de uma sociedade leitora.
De 1808 a 1840, em que pese a todas
as dificuldades, percebiam-se avanços:
já se contava com tipografias, livrarias e
bibliotecas, ainda que poucas; a escola-
rização, embora precária, expandia-se; a
cafeicultura começava a despontar como
uma fonte segura de riqueza econômica;
e o Brasil, estimulado pelos investimentos
britânicos, inseria-se lentamente no pro-
cesso capitalista.
Paralelamente a esse desenvolvimen-
to, ocorria a afirmação progressiva da
literatura brasileira, por meio de movi-
mentos como o Romantismo, o Realismo,
o Naturalismo, o Parnasianismo e o
Simbolismo, que reuniram um conjunto
expressivo de poetas e escritores. Porém,
o surgimento de condições estruturais
para que as obras desses autores fossem
editadas de forma a atingir um público
significativo foi um processo longo e len-
to. Poucos eram os editores e, muitas ve-
zes, a edição de uma obra dependia das
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20 Entre na roda - Introdução
benesses do Estado e de apadrinhamen-
tos. Além disso, o número de leitores era
muito pequeno – o censo de 1890 apon-
tava mais de 70% de analfabetos. Parte
dos que sabiam ler preferia romances de
caráter folhetinesco traduzidos principal-
mente do francês e que circulavam em
jornais e revistas ou em edições baratas.
Na falta de livrarias onde pudessem
expor suas obras para a venda, muitos
autores as anunciavam pelos jornais,
ou as colocavam para vender em lojas
e boticas.
Segundo depoimentos, Joaquim Ma-
nuel de Macedo e José de Alencar man-
davam vender suas obras, de porta em
porta, por um escravo que as transporta-
va num balaio, como se fossem frutas.
Para garantir a sobrevivência, restava aos
escritores da época empregarem-se como
funcionários públicos, jornalistas, tradutores
ou professores. Publicar suas obras em jor-
nais era outra forma de se tornar conhecido e
de atingir um número maior de leitores. Aliás,
muitos autores de renome, como Manuel
Antônio de Almeida, Machado de Assis e
Lima Barreto, antes de verem suas obras edi-
tadas em livros, tiveram de publicar muitas
delas, capítulo a capítulo, em folhetins.
Não raro os escritores apelavam também
para a produção de livros didáticos, que, ten-
do destino certo, eram economicamente mui-
to mais rentáveis, já que, entre os problemas
estruturais que exigiam solução urgente, esta-
va a escolarização de crianças e jovens.
Apesar da preocupação de D. João VI em
criar escolas de ensino superior, o sistema
educacional no Brasil estava desmantelado
desde 1759, quando, por ordem do mar-
quês de Pombal, os jesuítas foram expulsos
do Brasil, ficando a educação ao deus-dará.
As aulas eram frequentemente parti-
culares e avulsas, abordando, sobretudo,
Latim e Português; o ensino era esparso
e sem direção. Em 1821, um decreto real
permitiu a qualquer cidadão, mesmo sem
se licenciar, ministrar ensino e abrir escolas
primárias. Tal medida, se por um lado pos-
sibilitou o aumento do número de escolas,
por outro trouxe para a educação uma sé-
rie de pessoas despreparadas, alheias aos
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21Entre na roda - Introdução
A realidade da escola brasileira da
época é descrita com tintas carregadas
por muitos escritores nacionais, como
Manuel Antônio de Almeida, em Me-
mórias de um sargento de milícias:
“Foi o barbeiro recebido na sala que era
mobiliada por quatro ou cinco longos
bancos de pinho sujos já pelo uso,
uma mesa pequena que pertencia ao
mestre, e outra maior onde escreviam
os discípulos, toda cheia de pequenos
buracos para os tinteiros; nas paredes e
no teto havia penduradas uma porção
enorme de gaiolas de todos os tamanhos
e feitios, dentro das quais pulavam
e cantavam passarinhos de diversas
qualidades: era a paixão predileta do
pedagogo.
Era este um homem todo em proporções
infi nitesimais, baixinho, magrinho, de
carinha estreita e chupada, excessivamente
calvo; usava de óculos, tinha pretensões de
latinista, e dava bolos nos discípulos por dá
cá aquela palha. Por isso era um dos mais
acreditados da cidade.
(...) chegaram os dois exatamente na hora
da tabuada cantada. Era uma espécie de
ladainha de números que se usava então
nos colégios, cantada todos os sábados
em uma espécie de cantochão monótono
e insuportável, mas de que os meninos
gostavam muito. (...) o mestre, acostumado
àquilo, escutava impassível, com uma
enorme palmatória na mão, e o menor erro
que algum dos discípulos cometia não lhe
escapava no meio de todo o barulho; fazia
parar o canto, chamava o infeliz, emendava
cantando o erro cometido, e cascava-lhe pelo
menos seis puxados bolos.”
avanços pedagógicos e novos métodos, já
utilizados com sucesso em outros países,
e sem recursos materiais que lhes permi-
tissem adquirir livros, em função de sua
raridade e preço elevado.
Como consequência disso, o projeto bur-
guês de tornar a leitura universal foi, mais
uma vez, adiado entre nós. Isso foi tão mais
grave quando se pensa que a escola, nesse
projeto, era o espaço de iniciação à leitura e
de seu desenvolvimento.
Embora a Constituição de 1824, outor-
gada por D. Pedro I, anunciasse instrução
primária gratuita a todos os cidadãos, na
prática pouco se realizou no sentido de al-
cançar esse objetivo. O próprio imperador,
pouco depois, passou às províncias a res-
ponsabilidade pelo ensino primário e se-
cundário, ficando a coroa responsável pelo
ensino superior em todo o território e pelo
ensino inicial e secundário na capital. Como
as províncias não dispunham de orçamento
que garantisse o cumprimento da lei, a edu-
cação acabou atravessando o império na
mesma situação de precariedade que havia
na época colonial.
Poucos foram os avanços no sentido de
garantir educação básica às camadas popu-
lares. E durante muito tempo a escola conti-
nuaria a ser um lugar desagradável, em que
a aprendizagem, fundamentada na memori-
zação e permeada por castigos, era uma ver-
dadeira tortura.
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22 Entre na roda - Introdução
Na segunda metade do século XIX, para
fazer frente ao despreparo dos que se dis-
punham a dar aulas e à falta de material
didático que os subsidiasse nessa tarefa,
a educação de crianças e jovens teve de
se valer de livros e métodos importados
de Portugal, como os dos poetas Antônio
Feliciano de Castilho e João de Deus. Em
ambos, a proposta pedagógica procurava
valorizar o envolvimento do educando, a
afetividade e a empatia como estratégias
para alfabetizar, de forma lúdica e eficien-
te. Tanto um como outro fizeram grande
sucesso, em parte graças ao próprio valor
pedagógico da obra – por ser inovadora e
atender às necessidades de um mercado
carente –, em parte devido à utilização de
influências políticas que lhes renderam
grande publicidade.
Castilho preconizava que o mestre
tivesse uma postura gentil e toleran-
te, permitindo aos educandos partici-
parem das aulas de forma prazerosa,
rindo, comentando e até mesmo gra-
cejando (sem excessos), pois isso lhes
garantiria tomar gosto pelo estudo e os
predisporia a produzir mais.
Já João de Deus, com sua Cartilha ma-
ternal, defendia o ensino de palavras
contextualizadas – em oposição ao en-
sino do abecedário –, alertando os mes-
tres e as famílias, sobretudo as mães,
de que o ensino tradicional constituía
uma violência contra os cérebros infan-
tis, podendo prejudicá-los para o resto
da vida.
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Figura 9 - Província do Brasil - mapa manuscrito e aquarelado por João Teixeira Albernaz, 1666 (fi nalidade estratégica das cartas geográfi cas)
23Entre na roda - Introdução
ses por outros, de autores nacionais, como
modelos de boa escrita. Mas, sem dúvida,
a grande revolução no mercado editorial foi
provocada por Monteiro Lobato, já no início
do século XX, ao perceber precocemente de
que maneira se daria a profissionalização do
escritor no mundo moderno.
Monteiro Lobato, em 1918, imprimiu
na gráfica do Estado seu primeiro volume
de contos – Urupês –, que foi um sucesso
comercial, vendendo mil exemplares em
um mês e atingindo, até 1923, 30 mil vo-
lumes vendidos. Essa obra se contrapunha
à literatura parnasiana, em voga na época,
apresentando a vida interiorana de forma
crítica e sem idealismos, chamando o País
a despertar para a própria realidade.
Urupês representou para Lobato a desco-
berta da publicidade como valor que impul-
sionava o mercado editorial. Seu Jeca Tatu,
citado por Rui Barbosa em um discurso na
campanha presidencial, tornou-se nacional-
mente conhecido. Mais tarde, reconhecendo
que a preguiça de Jeca se devia aos parasitas
que o infestavam, lançou, em parceria com a
empresa Fontoura & Serpe, um livrinho que
orientava sobre a prevenção de doenças pa-
rasitológicas. A tiragem desse livreto, distribu-
ído gratuitamente pelo laboratório, alcançou
mais de 6 milhões de exemplares, um núme-
ro astronômico para a época.
Além de criar editoras e valorizar novos
autores, Lobato tinha percepção de mer-
O êxito de Castilho e de João de Deus
acendeu ainda mais o ânimo dos nossos
escritores que reivindicavam havia muito
tempo livros didáticos nacionais, compos-
tos com textos de autores brasileiros. Por
um lado, essa defesa era justa, se vista
pelo prisma de uma nação que, acaban-
do de se tornar independente, desejava
afirmar seus valores e criticava nos livros
escolares importados a distância entre
seu conteúdo e a realidade vivida pelas
crianças e jovens brasileiros que os uti-
lizavam. Por outro lado, o mercado edi-
torial voltado para a escola era um filão
importante e poderia garantir a muitos de
nossos autores, além da sobrevivência, a
fama e o reconhecimento.
Nesse sentido, Abílio César Borges, o
barão de Macaúbas, inaugurou, já no final
do século XIX, a presença do autor brasilei-
ro no mercado do livro didático, ao compor
obras destinadas a todas as séries do ensi-
no primário e secundário. Grandes escrito-
res brasileiros estudaram nesses compên-
dios e lembram-se deles de forma negativa,
como Graciliano Ramos. Outros tomaram
o autor como referência obrigatória em ter-
mos de educação: Raul Pompeia inspirou-
se no pedagogo Macaúbas para criar o per-
sonagem Aristarco, diretor do Ateneu.
A partir de então, o livro didático brasilei-
ro foi gradativamente substituindo, em anto-
logias e seletas, os textos clássicos portugue-
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24 Entre na roda - Introdução
Emília comunista!Em plena ditadura do Estado Novo,
e aos 59 anos, Lobato foi preso. Não só
pela campanha em defesa do petró-
leo, como também por ter despertado
a simpatia das crianças por uma per-
sonagem irreverente e “subversiva”: a
boneca Emília.
O padre Sales Brasil lançou alguns
anos depois um livro chamado A litera-
tura infantil de Monteiro Lobato ou co-
munismo para crianças. Segundo o au-
tor, Lobato negava a hierarquia social, a
independência da pátria, o respeito aos
pais e o direito à propriedade, além de
contestar a existência e as leis de Deus,
por meio dos personagens do Sítio do
Picapau Amarelo. Mas o maior de todos
os pecados era Emília ser apresentada
às crianças como uma “divorciada”, e
isso de forma muito natural!
Apesar de toda a repercussão das
obras de Monteiro Lobato e da relativa
disseminação da leitura enquanto práti-
ca social, a escola não acompanhou esse
movimento, já que se perdeu na cons-
tante discussão de métodos de ensino e
planos nacionais de educação que, des-
de sempre, estiveram voltados mais para
o ensino da elite, ignorando a educação
das classes populares. Basta lembrar
que, chegando ao Brasil, D. João VI in-
vestiu em cursos superiores quando a
educação básica estava totalmente des-
mantelada e assim permaneceu ao longo
de todo o império e de boa parte do pe-
ríodo republicano. Apesar de os grandes
debates em torno da democratização da
cado e inovou superando o problema da
distribuição – em 1918, havia apenas 30
livrarias concentradas nas capitais –, ao
colocar seus livros em consignação em
bancas de jornal, papelarias, farmácias e
armazéns em todo o País, conseguindo
assim estabelecer 2 mil pontos de venda.
Segundo ele, editar era fazer “psico-
logia comercial”. Por isso, preocupava-se
com a aparência do livro (a diagramação,
a cor da capa, ilustrações de boa qualida-
de, tipos de letra mais legíveis etc.), com
títulos mais instigantes e com a divulga-
ção, chegando a publicar anúncios de
página inteira em jornais da época.
Em 1920, Lobato conquistou outra vi-
tória, quando se lançou na literatura infan-
til com A menina do narizinho arrebitado,
numa tiragem de mais de 50 mil exem-
plares. Distribuiu 500 exemplares pelas
escolas públicas de São Paulo e o livro fez
tanto sucesso entre as crianças que logo
o presidente do estado, Washington Luís,
encomendou mais 30 mil exemplares.
Com Monteiro Lobato, a literatura infan-
til ganhou a marca da brasilidade e passou
a ser considerada no País. Abriu caminho
para se firmar enquanto gênero comercial-
mente viável, capaz de seduzir e encantar
um público até então relegado a segundo
plano: em fins de 1925, já circulavam 250
mil exemplares da obra infantil de Lobato.
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25Entre na roda - Introdução
escola resultarem em projetos e leis, na
prática eles não se efetivaram.
Na sociedade burguesa, a escola é
um dos pilares de sustentação para a
universalização da leitura. No caso do
Brasil, a democratização do acesso à
escola é bastante recente. A partir da
década de 1980, as discussões e ações
no sentido de estender a escolarização
a todos ganham maior impulso. Mas se
por um lado a escola se abre como pos-
sibilidade de elevação sociocultural para
muitos, por outro ela continua ainda a ex-
cluir parcelas significativas de seus usu-
ários, seja pela evasão, seja pela reten-
ção. Qualitativamente, a escola até hoje
não conseguiu se organizar para oferecer
uma educação cidadã, atendendo a toda
a população em igualdade de condições.
Do ponto de vista do acesso à leitura
e da formação de leitores, é inegável que
houve progressos nesses cinco séculos de
Brasil. Contudo, o espessamento das prá-
ticas de leitura tem ocorrido num processo
sinuoso de avanços e recuos constantes, o
que nos coloca sempre em defasagem em
relação a países que, desde o século XVIII,
assumiram a escolarização como condição
de progresso material, social e humano.
Falta-nos a formulação de políticas
educacionais que efetivamente promo-
vam o ensino da leitura e da escrita, o
que passa pela existência e expansão de
uma rede escolar eficiente, pela criação e
apoio a instituições que democratizem o
acesso aos livros, bem como pela funda-
ção e fortalecimento de organismos que
disseminem e defendam essa política.
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N
Figura 10 - Sobre alfabetos e a escrita - Pierre Vander Aa, 1659-1733
27Entre na roda - Introdução
as sociedades letradas, qual-
quer que seja o campo de atua-
ção do indivíduo, a necessidade
da leitura e da escrita é cada vez maior.
Essa exigência é ainda mais contundente
no que diz respeito à leitura, já que estamos
imersos num universo de mensagens escri-
tas: os letreiros de ônibus, as placas de rua,
os folhetos de propaganda, os cartazes, os
impostos e demais contas – com que nos
defrontamos a todo o momento –, os jor-
nais, os manuais de instrução, a internet,
os textos dos livros didáticos etc. Saber ler,
portanto, é indispensável para a efetiva in-
serção do indivíduo na sociedade.
Mas não se trata de qualquer leitura,
nem de qualquer leitor. De que leitura es-
tamos falando?
Concepção de leituraConsideramos que ler não se refere ao
simples ato de decifrar o código escrito,
nem de apenas saber localizar e repetir
conteúdos específicos de um texto, numa
leitura linear e literal. É importante desta-
car essa ideia, pois durante muito tempo
se acreditou que bastava estar alfabetiza-
do ou ser capaz de repetir o que estava
escrito para se compreender qualquer
texto. Hoje sabemos que um bom leitor
é aquele que sabe utilizar procedimentos
de leitura, de modo a reconstruir os senti-
dos do texto, dialogar com ele, concordar,
discordar etc.
Um texto é sempre o resultado das
experiências do autor à época de sua
Leitura, uma prática social
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produção, isto é, de sua maneira de ver
o mundo, de suas expectativas, crenças,
valores, dos conhecimentos de que dis-
punha naquele momento, das influências
que recebeu.
A leitura desse texto também é fruto das
experiências e conhecimentos de que dispõe
o leitor e do momento histórico em que ocor-
re a leitura. Portanto, nem sempre ao sentido
pretendido pelo autor correspondem os senti-
dos atribuídos por seus possíveis leitores, ain-
da que autor e leitores dominem uma mesma
língua e vivam num mesmo tempo.
Ler não é um processo linear; e um
mesmo texto possibilita diferentes leituras,
ainda que lido por pessoas que comparti-
lhem um mesmo momento histórico. Por
mais modeladas que sejam as várias for-
mas de discurso, a história de leitura de
cada um está presente na sua manifesta-
ção individual, fazendo parte da história de
leitura do mundo.
Quando um sujeito interage verbal-
mente com outro, o discurso se organiza
a partir das finalidades e intenções desse
locutor, das apreciações que faz de seu
interlocutor e de seu tema, por exemplo,
dos conhecimentos ou crenças/valo-
res que acredita que o interlocutor pos-
sua, do que supõe serem suas opiniões
e convicções, simpatias e antipatias, da
relação de afinidade e do grau de familia-
ridade que ambos têm, da posição social
e hierárquica que ocupam. Vale assinalar
aqui que o discurso, quando produzido,
manifesta-se lingüisticamente por meio
de gêneros orais ou escritos, motivados
justamente por esses condicionantes.
Segundo BAKHTIN1 (1929/1990), os
textos que produzimos, orais ou escritos,
são formas de dizer que se originam das
necessidades criadas em diferentes esfe-
ras da comunicação humana. Essas for-
mas de dizer (oralmente ou por escrito)
não são inventadas a cada vez que nos
comunicamos, mas estão à nossa dis-
posição, circulam nos diferentes meios
sociais, tenhamos ou não consciência
delas. Quando nos comunicamos, nas
mais diversas situações, utilizamos essas
formas, que possuem características pró-
prias e relativamente estáveis. Essas ca-
racterísticas configuram diferentes gêne-
ros discursivos que podem ser definidos
por três aspectos básicos coexistentes:
seus temas (o que é dizível ou pode se
tornar dizível, por meio do gênero), sua
construção composicional (forma parti-
cular dos textos pertencentes ao gênero)
e seu estilo (seleção feita pelo autor de
recursos da língua – de vocabulário e gra-
maticais –, tendo em vista o gênero). 1Mikhail Mikhailovitch Bakhtin (1895-1975), teórico russo, desen-volveu, entre outras, pesquisas na área de Língua. Construiu uma nova concepção de linguagem, rompendo com as correntes que tratavam a língua como um fenômeno separado do universo social e histórico. Considerava que a linguagem resulta de um esforço histórico coletivo de caráter dialógico e interacional.
28 Entre na roda - Introdução
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Gêneros são formas de enunciados
produzidos historicamente, que se
encontram disponíveis na cultura. Fa-
zemos uso de gêneros discursivos que
nos foram transmitidos histórica e so-
cialmente, o que não quer dizer que
não seja possível transformar esses gê-
neros, ou que outros não sejam criados,
de acordo com as novas necessidades
culturais de interação verbal que sur-
gem historicamente.
O estudo dos diversos gêneros discur-
sivos que circulam socialmente entre
nós não somente amplia as capacida-
des linguísticas e discursivas dos leito-
res, mas também aponta-lhes inúme-
ras formas de participação social que
eles podem ter como cidadãos, usando
a linguagem.
O gênero discursivo é um instrumen-
to com o qual é possível exercer uma
ação linguística sobre a realidade, am-
pliando as capacidades do usuário e o
próprio conhecimento sobre o gênero –
carta de reclamação, carta familiar, ar-
tigo de opinião, conto da tradição oral,
notícia etc.
Figura 11 - Folhinha do Povo - capa
29Entre na roda - Introdução
Entre_na_roda_módulo Introdutorio_revisado.indd 29 29/01/2010 17:28:33
e começa a ler. Trata-se de um instigante
romance policial, sua leitura favorita. Ela
envolve-se de tal forma na leitura que qua-
se perde a estação onde deveria descer.
Na sala de aula, várias crianças, reu-
nidas em pequenos grupos, conversam
sobre um conto de fadas que a professo-
ra acabou de ler. Em suas mãos, outras
versões da mesma história que elas vão
comparar com o original.
Um empresário chega ao escritório,
senta-se ao computador e lê o relatório
preparado por seus auxiliares. Faz algu-
mas correções e dirige-se à sala de reuni-
ões, onde o lê em voz alta para o grupo de
acionistas; depois discute as planilhas de
custo apresentadas pelo setor financeiro.
Numa feira, no Nordeste, uma senhora
ouve atentamente os versos cantados por um
cordelista; a história a emociona e ela adquire
um folheto de cordel, para retomar a história
que tanto a encantou.
Uma mãe recorre ao livro de receitas,
pois quer preparar um prato saboroso e
rápido para o almoço dos filhos que logo
vão chegar da escola.
Um grupo de amigos dirige-se a um
restaurante; lá consultam o cardápio para
decidir que pratos serão pedidos. De vol-
ta ao trabalho, um deles passa pelo ban-
co para retirar um extrato – constata que
o saldo está baixíssimo e isso o deixa mal-
-humorado.
Assim, a leitura como prática social é pro-
fundamente marcada pelo ambiente em que
circula o texto, pela época em que foi produ-
zido, pelos objetivos do autor, pela finalidade
da leitura. Veja os exemplos a seguir:
Ao acordar, um indivíduo folheia o jor-
nal, atendo-se inicialmente à primeira pá-
gina, para ter uma visão geral dos acon-
tecimentos do dia. Se algo lhe chama a
atenção, localiza a notícia no interior de
um caderno e obtém maiores informa-
ções sobre o fato que lhe interessa. Lê a
previsão do tempo e descobre que deve-
rá levar consigo um agasalho, pois uma
frente fria se aproxima.
À mesa do café, uma garota saboreia
uma bebida láctea, cuja embalagem indi-
ca tratar-se de um produto “light”: ime-
diatamente, ela confere o número de ca-
lorias, pois não quer engordar.
No supermercado, uma dona de casa
observa atenta as embalagens dos pro-
dutos que deseja comprar, verificando os
prazos de validade.
Um homem sai para o trabalho e, ao
observar o letreiro e a placa com o itinerá-
rio do ônibus que se aproxima, apressa o
passo para tomá-lo. Durante o percurso,
observa placas com os nomes das lojas,
faixas com ofertas do dia, outdoors e pla-
cas de rua.
No metrô, como vários outros passa-
geiros, uma jovem pega um livro de bolso
30 Entre na roda - Introdução
Entre_na_roda_módulo Introdutorio_revisado.indd 30 29/01/2010 17:28:34
Numa igreja, os fiéis participam do
culto religioso, acompanhando num fo-
lheto os vários momentos em que respon-
derão às palavras do padre.
Em sua sala, uma advogada consulta a
agenda para verificar os compromissos da
tarde e descobre que, infelizmente, terá de
desmarcar um encontro com amigos, pois
deverá atender um cliente às 19 horas.
Ao chegar em casa, um menino lê o
bilhete deixado pela mãe:
“Filho, tem comida na geladeira. É só
esquentar! À noite a gente se vê. Chego
mais tarde, porque vou passar as roupas
da Dona Celita.
Beijos”.
O carteiro deixa a correspondência numa
casa. A dona da casa abre a correspondência
e separa as contas a pagar.
Com o apoio de um manual de instru-
ções, um senhor tenta instalar o aparelho
telefônico que acabou de comprar.
Um casal de namorados consulta um
guia de entretenimento encartado no jornal
para descobrir um filme interessante a que
possam assistir após o jantar.
Ao longo do dia, essas pessoas entraram
em contato com vários gêneros discursivos
e sua leitura obedeceu a diferentes finalida-
des. Leram: silenciosamente, para informar-
-se, orientar-se, distrair-se, entreter-se e, em
voz alta, para partilhar informações com ou-
tros ou participar de um ritual.
Todos esses atos de leitura constituem
práticas sociais porque estão presentes no
cotidiano de boa parte das pessoas que vi-
vem atualmente em sociedades letradas.
Certamente, 50 ou 100 anos atrás havia
outras práticas de leitura vinculadas ao
modo de vida e de organização das socie-
dades de então.
A literatura brasileira é pródiga em
exemplos que ilustram como se davam
entre nós as práticas de leitura nos sécu-
los anteriores.
Em Quincas Borba, Machado de Assis
retrata uma situação em que a leitura de
uma revista da moda é vista como status,
capaz de aproximar a personagem Sofia do
círculo social ao qual quer pertencer.
“Afi nal, deixou a vista da chuva e do
nevoeiro; estava cansada, e para
repousar, foi abrir as folhas do último
número da Revista dos Dois Mundos.
Um dia, no melhor dos trabalhos da
comissão das Alagoas, perguntara-lhe
uma das elegantes do tempo, casada com
um senador:
– Está lendo o romance de Feuillet, na
Revista dos Dois Mundos?
– Estou, acudiu Sofi a; é muito interessante.
Não estava lendo, nem conhecia a Revista;
mas, no dia seguinte, pediu ao marido
que a assinasse; leu o romance, leu os
que saíram depois e falava de todos os
que lera ou ia lendo.”(ASSIS, Machado de. Obras completas de Machado
de Assis – Quincas Borba. Rio de Janeiro: W.M.
Jackson Inc., 1970.)
31Entre na roda - Introdução
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Nesse instante assomava
à porta um parente nosso, o
Reverendo Padre Carlos Peixoto de
Alencar, já assustado com o choro que
ouvira ao entrar.
(...)
– Que aconteceu? Alguma desgraça?
Perguntou arrebatadamente.
(...)
– Foi o pai de Amanda que morreu! Disse,
mostrando-lhe o livro aberto.”(ALENCAR, José de. Como e por que sou romancista.
Campinas: Pontes, 1990.)
José de Alencar, por sua vez, relata uma
situação em que a leitura de um romance
envolve toda a família, uma prática social co-
mum, não só no Brasil, mas em vários países,
quando a leitura começou a se popularizar:
“Era eu quem lia para minha boa mãe não
somente as cartas e os jornais, como
os volumes de uma diminuta livraria
romântica formada ao gosto do tempo.
(...)
Não havendo visitas de cerimônia, sentava-
-se minha boa mãe e sua irmã d. Florinda
com os amigos que apareciam, ao redor
de uma mesa redonda de jacarandá, no
centro da qual havia um candeeiro.
Minha mãe e minha tia ocupavam-se com
trabalhos de costura, e as amigas para
não fi carem ociosas as ajudavam. Dados
os primeiros momentos à conversação,
passava-se à leitura e eu era chamado
ao lugar de honra.
(...)
Lia-se até a hora do chá, e tópicos
havia tão interessantes que eu era
obrigado à repetição. Compensavam
esse excesso as pausas para dar lugar às
expansões do auditório, o qual desfazia-
-se em recriminações contra algum mau
personagem, ou acompanhava de seus
votos e simpatias o herói perseguido.
Uma noite, daquelas em que eu estava mais
possuído do livro, lia com expressão
uma das páginas mais comoventes da
nossa biblioteca. As senhoras, de cabeça
baixa, levavam o lenço ao rosto, e poucos
momentos depois não puderam conter os
soluços que rompiam-lhes o seio.
(...)
32 Entre na roda - Introdução
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A formação do leitorO processo de formação do leitor é longo,
ocorrendo pela mediação de leitores mais ex-
perientes e pela interação com diferentes su-
portes e gêneros discursivos. Hoje sabemos
que, muito antes de ser capaz de compreen-
der o funcionamento do sistema alfabético, o
sujeito imerso numa sociedade letrada busca
entender o que significam os escritos presen-
tes no mundo em que vive e pode entrar no
mundo da escrita pela mão, pelo olhar e pela
voz de outras pessoas, evidentemente valori-
zando e elegendo a sua. Todas as tentativas
que ele faz para atribuir sentido a um texto
são leituras. Nesse sentido, mesmo os não al-
fabetizados são capazes de ler, apoiados em
ilustrações e em outras marcas do texto, bem
como em sua memória.
Para alguns, essa experiência começa
muito antes de entrar na escola, quando
presenciam atos de leitura praticados pe-
las pessoas que os rodeiam ou participam
deles. Entretanto, muitos dependem exclu-
sivamente da escola para se tornar leitores.
Assim, na escola e na comunidade, é pre-
ciso criar momentos ou situações para que
os leitores iniciantes construam e ampliem
experiências de leitura, oferecendo-lhes
diferentes suportes e gêneros discursivos,
lendo para eles com frequência, colocan-
do-os no papel de leitores.
O contato com diferentes suportes e tex-
tos e com leitores mais experientes é funda-
mental para desenvolver o gosto pela leitura
e formar leitores competentes. Essa compe-
tência – que se forma com o manuseio e a
leitura de muitos suportes e textos – inclui
saberes diversos.
No que se refere ao livro, por exem-
plo, saber segurá-lo e manuseá-lo corre-
tamente; saber que a capa apresenta em
geral o nome do autor, o título do livro e
a editora; perceber que livros com muitas
histórias ou poemas comumente trazem
um índice; descobrir que no verso da fo-
lha de rosto há uma ficha catalográfica
com informações sobre a edição da obra;
e, principalmente, reconhecer obras de
boa qualidade, apontar autores e ilustra-
dores que admira e comentar um texto
lido, justificando suas opiniões, sem con-
tar os modos de “sentir” a realidade física
do material escrito, que vão do olhar ao
toque, do olfato ao próprio poder gustati-
vo imaginário ou não, tornando o livro um
particular fetiche.
Se o suporte de leitura for um jornal,
saber como se organiza a primeira página,
como se localizam as notícias dentro do jor-
nal, qual é a diferença entre um editorial, um
artigo de opinião assinado e uma reporta-
gem; descobrir a função das manchetes; ser
capaz de comparar diferentes jornais etc.
Figura 12 - Almanak Laemmert - Folha de rosto
33Entre na roda - Introdução
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Já a leitura de uma propaganda re-
quer outras capacidades, como relacio-
nar a mensagem escrita com a imagem,
compreender a linguagem figurada etc.
Embora o foco do Projeto Entre na
Roda seja a fruição e o prazer da leitura,
acreditamos que para o leitor desfrutar
desse prazer é necessário que desenvol-
va algumas competências leitoras, tais
como:
● Definir as finalidades da leitura:
saber com que objetivo se vai
ler – por prazer, para conhecer
determinado assunto, para atualizar-
-se, para comunicar algo, para
executar uma ação, para viver ou
reviver uma experiência pouco ou
bem conhecida etc.
● Recuperar o contexto de produção:
quem é o autor, que posição social
ocupa(ou), em que época vive(eu),
em que situação escreveu, com que
finalidade, onde seu texto circula,
a quem se destina, de onde foi
retirado etc.
● Relacionar temas e conteúdos
abordados em diferentes textos,
mesmo porque cada texto sempre
dialoga com um outro de um
modo sutil ou consideravelmente
aproximado. (Intertextualidade)
● Relacionar diferentes versões
de um mesmo tema ou assunto.
(Interdiscursividade)
● Fazer apreciações estética, afetiva
e ética: gostar ou não, concordar,
discordar, criticar, levando em conta
que a leitura atenta, prazerosa ou
não, é sempre motivação e ponto de
partida de um outro texto.
● Localizar informações importantes
para a compreensão do texto ou para
fins de estudo ou trabalho.
● Antecipar ou predizer conteúdos a
partir do título, do tema abordado,
dos conhecimentos prévios sobre o
tema ou sobre o autor.
● Inferir, isto é, tirar conclusões que
não estão explicitadas, com base em
outras leituras, experiências de vida,
crenças, valores.
● Extrapolar: projetar o sentido do
texto para outras vivências e outras
realidades; ir além do texto.
● Perceber outras linguagens:
relacionar texto escrito com imagens,
imagens em movimento, diagramas,
gráficos, mapas, sons, números etc.
34 Entre na roda - Introdução
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Ao longo das oficinas, propomos ativida-
des em que são explorados diferentes su-
portes e gêneros discursivos – na Oficina 2,
histórias da tradição oral (“causos”, contos
de encantamento, fábulas), apólogo e crôni-
cas; na 3 e na 4, contos,
romance, novela e texto
teatral; na 5, poemas; na
6, textos jornalísticos; e
na 7, textos de divulga-
ção científica.
Em cada uma de-
las, analisamos e dis-
cutimos aspectos dis-
cursivos (condições de
produção) e formais (es-
trutura textual, recursos
linguísticos e expressi-
vos), bem como procu-
ramos orientar para que
se identifiquem dificul-
dades de leitura que o
texto possa acarretar, se-
jam relativas ao contex-
to de produção, sejam
referentes a conteúdos
semânticos e sintáticos.
O texto literário como isca de leituraA literatura é matéria privilegiada para
motivar e formar leitores, por ser lingua-
gem que se oferece a múltiplas inter-
pretações. Ela funde harmoniosamente
realidade e fantasia – sendo um material
inestimável na formação do indivíduo em
sociedade –, toca primeiro a emoção e
depois leva à reflexão, à análise, à inter-
pretação e até mesmo à produção de ou-
tros textos. Por essa especificidade da lin-
guagem literária, as oficinas deste projeto
dão especial destaque aos gêneros da
literatura na formação do leitor, tentando
aproximar conhecimento e prazer, casa-
mento esse que nem sempre faz parte do
cotidiano das escolas e de outros espaços
de aprendizagem. Comumente a leitura-
-prazer é proposta como uma atividade
menor, para ocupar o tempo – depois que
os alunos acabaram de fazer atividades
“sérias”, podem pegar livros para ler, até
que todos terminem as tarefas.
O texto literário é matéria criativa e
“reveladora”, capaz de inquietar prazero-
samente os educadores para o gosto da
leitura, experiência essa que naturalmen-
te eles podem promover junto aos alunos
e à comunidade, acentuando que a lei-
tura de textos literários permeia todas as
formas de conhecimento: a literatura está
Figura 13 - Homem escrevendo a bico de pena, cercado de livros e outros instrumentos, c. 1550
35Entre na roda - Introdução
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sempre voltada para a condição humana
e a serviço da vida.
Por isso, o primeiro passo para desen-
volver o gosto dos leitores iniciantes é co-
locá-los em contato com muitos textos de
boa qualidade. Isso significa oferecer-lhes
um acervo contendo diversidade de gêne-
ros, temas, autores, ilustradores, estilos,
tratamento gráfico, para atender às expec-
tativas mais variadas, revelando a eles a
maravilhosa e inestimável aventura de ler.
Identificar uma obra como sendo de
boa qualidade significa também levar
em conta: os valores estéticos da obra
(linguagem criativa, sugestiva, fluente,
temas interessantes ou intrigantes, inven-
tividade no jogo das palavras, potencial
lúdico e outros), o respaldo da crítica e,
sobretudo, a receptividade dos leitores a
quem a obra se destina.
Livros bons são aqueles de que os leito-
res gostam e que têm prazer de ler – e não
aqueles considerados capazes de ensinar
lições de moral ou de alfabetizar (como
os de cunho cartilhesco) ou ainda aque-
les em que a voz do narrador macaqueia
uma fala infantil ou débil, desqualificando
a capacidade de compreensão do leitor.
Bons livros atravessam gerações, manten-
do-se sempre novos. Tornam-se inesque-
cíveis, porque a cada releitura têm sempre
algo a nos dizer. Permitem a quem os lê
viver simbolicamente outras vidas, com
experiências diferentes do seu cotidiano.
Despertam nele o gosto pela exploração
da diversidade e pelo conhecimento do
outro; possibilitam ao leitor reconhecer-se
nos personagens e, pelo distanciamento
da ficção, compreender melhor as pró-
prias experiências.
Como afirma Ana Maria Machado
(MACHADO, 2002): “O que interessa
mesmo a esses jovens leitores que se
aproximam da grande tradição literária é
ficar conhecendo as histórias empolgan-
tes de que somos feitos”.
Quando o(a) orientador(a) oferece
bons livros aos participantes das rodas,
seu papel de formador(a) de leitores já
está parcialmente cumprido, porque as
múltiplas experiências de leitura, sobre-
tudo aquelas que são críticas e prazero-
sas, depuram o gosto. Além disso, um(a)
leitor(a) mais experiente pode ajudar os
demais a apreciar melhor as obras, au-
xiliando-os a desenvolver suas capacida-
des leitoras.
Cabe ao(à) orientador(a) das rodas
de leitura estar atento(a) a aspectos rele-
vantes que garantam o envolvimento dos
participantes e a plena compreensão do
texto. Por isso, sugerimos que:
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Antes da leitura● Escolha textos de boa qualidade.
● Prepare-se para esse momento,
estudando o texto antes.
● Procure criar um clima de magia
e envolvimento. Se possível, peça
aos participantes que se sentem em
círculo, próximos de você.
● Diga o nome do(a) autor(a) e
pergunte se já o(a) conhecem, se já
leram algum livro ou texto dele(a).
● Fale sobre a época e o lugar em que
o texto foi escrito, caso tenha essa
informação.
● Mostre-lhes a capa e pergunte sobre
o que seria o texto.
● Aponte o nome do(a) autor(a), o título
do livro, leia a orelha e o texto da quarta
capa ou contracapa (se houver). Se o
livro contiver muitos textos, mostre a eles
como localizar o que vão ler pelo índice,
ou simplesmente deixe o livro sobre a
mesa para aguçar a curiosidade.
Durante a leitura● Se os ouvintes se dispersarem,
utilize alguns recursos para resgatar
a atenção, fazendo algum tipo de
suspense e perguntando, por exemplo:
O que será que vai acontecer agora?
Será que os heróis da história vão
conseguir superar o problema? E o par
amoroso, vai conseguir ficar junto?
Como o personagem X vai se livrar da
enrascada em que se meteu?
● Faça algumas interrupções também se
notar que a compreensão está difícil,
dando algumas pistas para ajudar, mas
sem se alongar em explicações, evitando
fragmentar a narrativa e propiciando a
expressão individual ou do grupo.
● Se os participantes interromperem com
perguntas, responda o estritamente
necessário e retome o texto rapidamente,
para não perder o encanto.
37Entre na roda - Introdução
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Após a leitura● Caso perceba que não
compreenderam o texto apresentado,
ajude-os dando pistas, fazendo
perguntas e respondendo às deles.
● Oralmente, recupere com eles belas
passagens ou aquelas que causaram
entraves à compreensão.
● Proponha eventualmente que
representem o que leram por meio
de dramatizações ou desenhos, já
que essas estratégias permitem um
mergulho no texto e, portanto, uma
compreensão maior.
● Inverta alguns papéis ou dê algumas
sugestões e motive a recriação do texto.
● Estimule comentários e discussões a
respeito de usos e costumes de outras
épocas e povos, bem como sobre as
características dos personagens.
● Desafie-os a ir além do texto,
relacionando-o com as próprias
experiências.
● Incentive os participantes a exercitar
a imaginação, o raciocínio lógico e a
coerência, questionando sobre o que
aconteceria se determinado fato fosse
alterado:
● E se Fulano tivesse agido assim?
● O que mudaria na história se Beltrano
tivesse respondido...?
● O que havia por trás da atitude do
personagem Y?
● Chame a atenção para: o estilo do(a)
autor(a), os recursos que ele(a) utiliza
para prender a atenção do leitor, a
riqueza de expressões, as frases bem
construídas, as expressões regionais,
gírias, linguagem figurada etc.
● Abra espaço para que manifestem
seus sentimentos e opiniões e
ajude-os a ir além do “é legal” ou do
“gostei”, pedindo que justifiquem
suas opiniões sobre: a história, as
ilustrações, o estilo do(a) autor(a) – o
jeito de contar/escrever – etc.
● Crie também situações em que os
próprios participantes escolham livros
para ler, sejam alfabetizados ou não.
Organize uma rotina para que a leitura
livre se torne uma prática no grupo.
● Todos podem e devem ler, ainda que
não o façam convencionalmente.
Portanto, organize estratégias para
que leitores mais experientes possam
auxiliar os menos experientes.
● Estimule a reflexão, a partir do(s)
ponto(s) de vista do(a) autor(a) do
texto, abrindo perspectivas para a
busca de soluções para problemas
individuais ou coletivos.
38 Entre na roda - Introdução
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jornalísticos, nos quais o leitor pode encontrar,
sobretudo, informação e reflexão sobre os
acontecimentos que interferem diretamente
em sua vida. Da mesma forma, propomos o
trabalho com textos de divulgação científica,
que aproximam o leitor do conhecimento pro-
duzido em várias áreas do saber.
Contudo, qualquer que seja o gênero en-
focado nas oficinas, tivemos sempre o cui-
dado de oferecer atividades que têm como
principal finalidade a fruição e a reflexão.
Apesar de o projeto dar maior destaque
aos textos literários, acreditamos que a fami-
liaridade com outros gêneros discursivos que
circulam numa sociedade letrada também é
fundamental para a formação do leitor, tendo
em vista que a todo o momento ele é solicita-
do a ler com diferentes finalidades, para fazer
frente a todos os desafios que a vida moderna
lhe impõe. Isso nos levou a propor oficinas em
que sugerimos que o(a) orientador(a) das ro-
das de leitura aborde, por exemplo, os textos Figura 14 - Encadernações preciosas - artesanais
39Entre na roda - Introdução 39Entre na roda - Introdução
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Figura 15 - Gramática João de Barros
Figura 16 - Conhecendo a língua pátria. Luiz Figueira. Arte da Gramática da Língua do Brasil, 1795
40 Entre na roda - Introdução
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Rodeado de tantos livros, dos mais variados
gêneros, lendo e incentivando a ler, como
profi ssão, hoje estou num lugar escolhido. Não
sei se por mim ou para mim.
Não me imaginava nessa situação quando
tudo me parecia maior, com cheiro de terra
molhada, galinhas empoleiradas nos galhos
da mangueira e, no fi nal da tarde, realmente
o Boitatá corria pelo fundo do quintal, à beira
do taquaral.
Não imaginava que aprendia a ler.
Subia pelas árvores, goiabeiras, abacateiros,
ameixeiras, e a preferida amoreira, com
braços acolhedores, dos quais muitas
vezes saíamos manchados de sumo
avermelhado.
Fugia do Brasinha, o irritado cachorro de
minha avó, driblando os arbustos de
buchinha.
Fazia bois de chuchu e naves espaciais de
caroço de abacate e brincava com o que,
parece hoje, era meu único brinquedo
formal: o cavalinho de plástico. O meu era
o preto.
Passava horas acompanhando carreiras de
formigas saúvas. A paciência já era uma
característica. Talvez fruto da relativa
liberdade e quase anonimato em meio a
tantos irmãos, numa casa que não era
nossa.
Às vezes ajudava minha mãe a rachar lenha,
tirar água do poço ou capinar o canteiro
de batata-doce. A roça na periferia, tão
perto da cidade. O cheiro de pão assando,
envolto em folha de bananeira, no forno
de barro, ainda traz saudade. Até mesmo
o coqueiro que tanto dava coquinhos
amarelos como lagartas. O canudinho
das bolinhas de sabão eram folhas de
cebolinha. A lata cheia de bolinhas
de gude tinha os mais variados tipos.
Algumas revelavam universos inteiros
quando olhadas à luz do Sol. E a coleção
de tampinhas de garrafa me fazia olhar
para o chão sempre que saía de casa.
Demorei a aprender a rodar pião direito e
aprendi a andar de bicicleta numa enorme
Peugeot cinza, de adulto. A tampa de
manteiga pregada num cabo era mais
fácil de manobrar.
Os quadrados cortados com faca de cozinha
nem sempre saíam bem, mas nem por
isso deixava de tentar fazê-los. Às vezes
me rendia às capuchetas de papel de pão
que, apesar da barriga na linha, sempre
eram mais fáceis de empinar em dia de
vento forte.
Toda semana a família se reunia e quase
sempre resultava em brincadeiras de
roda, com adultos e crianças. O grande
butiá era presença constante. Uma
palmeira de tronco bastante largo para
meu tamanho, que dava para se esconder
atrás, correr em volta, contar pique de
lberto Manguel, em seu livro Uma história da leitura, diz que “uma história
da leitura é a história de leitura de cada um dos leitores”. O Projeto Entre na
Roda compartilha dessa ideia; por isso, apresenta agora histórias de leitura
de alguns de seus participantes.
Histórias de leitores
A
41Entre na roda - Introdução
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esconde-esconde – “bater cara” como se
dizia – e imaginar a possibilidade de
escavar uma casa.
E eu que pensava que só estava aprendendo
a ler quando ia ao grupo escolar,
caminhando uma longa distância, às
vezes atirando folhas de certo capim
para o ar, como se fossem foguetes.
Já havia muitos livros de autores
consagrados em casa, em edições
populares, que minhas irmãs liam
para a escola. Uma riqueza em meio à
nossa pobreza material. O folclore de
que minha mãe havia enterrado livros
“perigosos” de meu pai, naqueles tempos
difíceis da política, não sei se é verdade.
Se bem que só encontrei, mais tarde, um
único livro remanescente, de fi losofi a,
que estudei na faculdade.
De qualquer forma, não os lia. A leitura mais
misteriosa que me atraía estava num livro
didático, em formato pequeno, que falava
algo sobre “subir a bainha”. A ilustração
da menina na ladeira não deixava dúvidas
de que era ela quem tinha que subir a
bainha. Ficava imaginando como seria
essa bainha. Talvez uma encosta ou uma
ladeira estreita por entre árvores. Era
fascinante. Perdeu-se no tempo o conteúdo
do texto. Não tinha ainda habilidade
sufi ciente para decifrá-lo.
Quando me encontrei com o desenho
animado e os quadrinhos, estava selado
meu futuro. Meu “carma” a pagar
seria entre livros. Conheci Tintin e
Asterix na adolescência, em exemplares
encadernados da biblioteca, já na
“civilização”, num bairro mais central de
São Paulo.
Compartilhava com meu irmão mais novo o
hábito de trocar gibis numa banca, dois por
um. Fiz pilhas de desenhos e criei inúmeros
personagens de quadrinhos, que fi caram
restritos ao conhecimento da família.
Nunca fui um grande leitor, sempre muito
lento, precisando forçar a concentração.
Mas me emocionei quando voltei à escola
em que iniciei minha vida escolar, para
contar histórias de livros que ilustrei às
crianças atentas e curiosas das turmas
superlotadas.
Engraçado como tudo pareceu bem menor.
Fiz questão de descer pelas escadas por
onde andava naquele tempo e imaginar
os fantasmas de minhas lembranças
correndo ao redor.
Por isso sinto pena que a atividade que
exerço esteja subordinada ao bel-prazer
das políticas governamentais.
Marcelino Tristan Vargas
●
A primeira parte de minha infância foi numa
fazenda, rodeada de árvores frutíferas e
bichos. Livros não havia por lá. Passava os
dias em cima de mangueiras e goiabeiras
ou desenhando na terra do porão de casa
com palitos de fósforo usados. Histórias,
só os causos de caipira ou de assombração
contados pelo meu pai ou as lembranças
de minha mãe sobre a Itália. Uma vez por
ano vinha um tio de São Paulo e trazia a
revista “O Cruzeiro”. Eu me deleitava com as
fotos, principalmente com as das “misses”, e
tentava copiá-las com todos os detalhes, até
um aviãozinho (eu acho) que havia no maiô.
Certa vez chegou um tio com uns livros
estranhos. Um deles tinha o seguinte título:
“Eles possuirão a terra”. Não tinha fi guras,
só escrita. E eu fi cava imaginando o que
podia estar escrito ali. Mais tarde soube que
o tal tio andava metido em política e que até
já fora preso.
Do primeiro ano da escola, lembro-me
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apenas dos belos desenhos, copiados
da cartilha, que a professora fazia
na lousa com giz colorido. Não me
lembro do momento em que aprendi a
ler. Mas me lembro de que aguardava
ansiosamente o dia do exame de leitura.
O diretor do grupo escolar chamava
um de cada vez à sua sala para ler,
primeiro silenciosamente e depois em
voz alta. Nem o medo do exame tirava
de mim o prazer de ter nas mãos um
livro diferente da cartilha! Aos dez anos
minha família mudou-se para a cidade
de São Paulo. No Instituto de Educação
onde fui fazer o ginásio havia uma
grande biblioteca com livros variados.
Os meus preferidos eram os de Monteiro
Lobato. Passei, então, a devorar livros e
torcia para que os professores faltassem,
pois quando isso acontecia eu corria para
a biblioteca. Às vezes até “cabulava”
aula e dizia para a bibliotecária que o
professor havia faltado. Alguns livros
eram proibidos, o que aguçava ainda
mais o meu desejo de lê-los. Nessa
época, para minha alegria, minha mãe
comprou, de um vendedor de livros, a
prestação, uma coleção do Malba Tahan,
toda encadernada de vermelho. Mas a
infl uência de um professor de Português
foi decisiva para fortalecer em mim o
gosto pela leitura. Suas aulas consistiam
tão somente em recitar poemas de
Paulo Bonfi m, Guilherme de Almeida e
outros e em comentar livros que havia
lido. Até hoje sua voz ecoa nos meus
ouvidos: “Iracema, a virgem dos lábios
de mel”; “Rosinha, minha canoa”... Por
sua infl uência, convenci minha mãe a
fi car sócia do Clube do Livro. Pagávamos
uma pequena mensalidade e recebíamos
um livro mensalmente. O jornal entrou
mais tarde, também por infl uência de
professores, então do magistério. Nessa
época eu já trabalhava, mas como o
dinheiro era curto, fi z um acordo com o
dono de uma banca de jornal para pagar
por mês e assim mesmo só o jornal
de domingo. A parte preferida era o
suplemento literário, que li, reli e guardei
durante vários anos, como um tesouro.
Zoraide Inês Faustinoni da Silva
●
Minha família sempre leu muito, meu pai
sempre trazia livros para casa e minha
mãe sempre gostou de ler para nós.
Comecei a ler aos cinco anos em casa e
sozinha e minha mãe foi a primeira a
perceber que estava lendo e fi cou muito
emocionada. A partir daquela data
comecei a ganhar livros de presente e a
ler em voz alta para todas as visitas.
Regina Helena Botteon de Souza
●
De uma família muito grande – dez irmãos
– fui a caçula e desde muito cedo convivi
com livros e gibis de meus irmãos mais
velhos.
Inicialmente via as fi guras, mas as letras
me encantavam, parecia que existia
um outro mundo e a vontade, junto
com a curiosidade, me incentivaram
a fazer perguntas aos meus irmãos e,
com isso, aos 5 anos e meio já conseguia
decifrar algumas palavras dos gibis
que folheava. A leitura para mim era
essencial. Sempre que podia já estava
com gibis na mão. Mas minha grande
alegria foi quando li meu primeiro livro,
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que foi “Meu Pé de Laranja Lima”. Acho
que fi quei tão feliz que reli diversas
vezes. Depois deste foi “Pollyana”, “O
Menino do Dedo Verde” e outros.
Carmita de Freitas Dino
●
Nasci em uma família pobre. Meu pai e
minha mãe eram analfabetos. Quando
falo de meu pai, me emociono ao lembrar
que tinha discernimento para resolver
tudo e ajudar todos que o procuravam.
Não tínhamos livros, nem mesmo televisão.
Nosso jantar geralmente era por volta das
18h. Logo estávamos todos deitados e meu
pai contava-nos histórias maravilhosas. Era
um momento mágico; eu e meus irmãos
ouvíamos a história “Fogo no céu” onde ele
imitava as vozes dos animais. A rotina era
variada, pois quando meu pai não queria
contar histórias de animais, ele nos contava
causos ocorridos no Nordeste, envolvendo
caçadores e pescarias. Mas o que eu mais
gostava era da história “Fogo no céu” e
sempre solicitava que a recontasse.
Eram momentos que me permitiam viajar
no mundo da fantasia, deparando-me
com desafi os constantes. Hoje avalio que
não tive livros como suporte, mas esses
momentos contribuíram muito para
minha formação de leitora, levando-me a
descobrir o fantástico mundo dos livros.
Por volta dos 6 anos, mudou-se para perto
de minha casa um casal que morava
em São Paulo e só vinha aos fi nais de
semana. Eu auxiliava a mulher nas
tarefas da casa. E qual não foi minha
surpresa no dia em que ela me presenteou
com um livro de histórias intitulado “Os
fi lhotes”. Recordo como se fosse hoje a
história dos seis cachorrinhos brancos e
um preto que faziam arruaças pela casa.
Aquele livro para mim era uma relíquia,
da qual eu cuidava com muito carinho.
Reli várias vezes e guardei como um
tesouro raríssimo. Mantive bons laços
de amizade com essa família. Quando
eles chegavam no fi nal de semana, já
passavam buzinando, me alertando que
tinham chegado.
Durante minha vida na escola primária
não consigo me lembrar de momentos
prazerosos de leitura. Recordo de um texto
que citava cometas no universo, mas não
conseguia fazer analogias, pois o único
cometa que conhecia era o ônibus que
passava na Via Anhanguera.
O único momento que me recordo da leitura
com prazer na escola foi quando a
professora contou uma história do coelho
da Páscoa, utilizando fantoches.
(...)
Hoje, meu momento de contato com os livros
é quando me deito e aos fi nais de semana.
Vou lendo os capítulos, sempre fi cando com
o gostinho de quero mais. Refl ito muito
sobre meu contato com a leitura e, após
10 anos sem meu pai, sinto saudades do
meu tempo de criança. Na realidade ele
era um ótimo contador de histórias. Em
minhas memórias, verifi co o quanto ele
contribuiu para minha formação de leitora.
Até hoje me recordo com muita saudade
da entonação de sua voz narrando as
histórias, que jamais esquecerei.
Maria de Lourdes de Moura Santos
●
44 Entre na roda - Introdução
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Com seis anos de idade costumava fi car
no bar de meu pai em Caçapava. No
bar havia revistinhas e eu adorava
ver os gibis do Tio Patinhas e do Pato
Donald, principalmente as histórias
que envolviam as peripécias dos três
sobrinhos de Donald: Huguinho, Zezinho
e Luizinho. Devido a suas travessuras,
fi cava doida para saber o que estava
escrito nos balõezinhos, sendo este o
motivo pelo qual me interessei em ler
com autonomia. Lembro-me também
de um dos primeiros livros que li: “Os
sobrinhos do capitão”, que eram danados
e só aprontavam confusão.
Mercedes Pons Garcia
●
(...) quem me fez ter o gosto pela leitura,
pelos livros, foi minha primeira
professora. No fi nal do meu 1º ano
de escola, quando comecei a ler, essa
professora presenteou-me com dois
livros: “Chapeuzinho Vermelho” e “Ali
Babá e os Quarenta Ladrões”. Lembro-
-me de que passei as férias lendo e
relendo esses dois livros. Depois vieram
“Soldadinho de Chumbo” e muitos gibis.
Helena A.Y. Yamane
●
O primeiro livro que li foi “Caminho Suave”,
após ter passado por experiências
constrangedoras com a professora da
primeira série porque não soube ler a lição
da jarra. O castigo? Ah!... esse castigo era
45Entre na roda - IntroduçãoEntre na roda -
Desde muito pequenina lembro-me de meu avô
ouvindo em sua vitrola Chopin, Vivaldi,
Strauss comigo em seu colo. Adorava ouvir
suas histórias de palácio, de viagens e
principalmente histórias de nossa árvore
genealógica. Uma das lembranças que
trago (nasce meu interesse por ler) é a
leitura de poesias e cartas escritas pelo
vovô, que reunia todos os familiares: vovó,
fi lhos, netos e primos em volta da mesa do
almoço para lê-las e recitá-las. Às vezes,
aliás quase sempre, tio Meco, seu fi lho, se
emocionava e deixava ver que chorava.
Caso raro entre homens. Passar os fi ns de
semana na casa de meus avós era como
entrar nos livros de contos onde tudo era
possível e as tristezas deixadas de lado.
Antes de dormir, era a vez de vovó Alba,
que me deixava deitar a seu lado para ouvir
histórias de princesas, príncipes e plebeus.
Eu também amava ouvir suas histórias
com as irmãs, quando tiveram que morar
na fazenda e perderam todas as riquezas
por causa da crise de 29. Eram histórias
tristes, mas percebia em vovó o orgulho
de contá-las, pois com sua perseverança
conseguiu vencer, casar, ter fi lhos e naquele
momento ter seus netinhos para curtir e
contar histórias de sua tradição.
Meus pais também foram muito infl uentes
na minha formação cultural. Motivaram
a mim e meus irmãos a participarmos de
eventos organizados na escola. Faziam
parte ativamente da Associação de Pais
e Mestres. Além disso, também nos
levavam ao teatro e cinema quando
podiam. Quanto à leitura, papai nunca
teve costume, sempre preferiu os
esportes. De mamãe lembro dela lendo
em sua cama e sofá. Ela participava
do Clube do Livro com as amigas que
compravam livros para trocar entre elas.
Stella Campos Mendes
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vergonhoso! Pelo menos para mim que
era muito tímida e não conversava com
meninos porque “menina não conversa
com menino”. Então, como não soube ler,
fi quei sem recreio. Eu e o Jeremias, o fi lho do
sapateiro, o menino mais danado da turma.
A partir daí, outras experiências de leitura
soaram como negativas e positivas. A do
primeiro livro foi inesquecível. Acariciava-o
como algo muito precioso, me deleitava em
ver o Fábio, tão bonito e limpo, estudioso...
Enfi m um “primor”, que nada tinha a ver
com o danado do Jeremias. Dona Cecília, a
mãe de Fábio, então... Era uma maravilha
vê-la dando sinal para o táxi... Achava-a
linda, e até hoje conservo na memória sua
saia branca evasê, sua blusa azul-claro,
uns sapatos de salto lindíssimos (Penso que
o meu interesse compulsivo por sapatos
tenha partido dessa fi gura, talvez...!).
Cheirava o primeiro livro, só meu, de
preferência sozinha, quando todos iam
dormir, para conservar e respeitar a nossa
intimidade. Até hoje, gosto de ler num
ambiente tranquilo e sozinha, de preferência
à noite, quando todos estão dormindo, onde
só ouço o barulho da própria noite e dos
personagens do livro.
Só que rapidamente me desinteressei por ele.
Então fi cava mais feliz por ouvir histórias
da minha mãe, e vê-la lendo jornais que
embrulhavam as carnes do açougue. Isso
foi o porto seguro para que eu não fugisse
da importância de ler.
Então, apareceu em casa, por indicação da
professora da quinta série do meu irmão
mais velho, o maravilhoso e inesquecível “A
ilha perdida”. Esperei, ansiosamente, que
meu irmão o lesse para fazer prova, para
que posteriormente eu o lesse por prazer.
Ah! Como fui mais feliz que ele! Ainda
conservo na memória cenas do livro, como
por exemplo Simão com a Jaguatirica, a
cobra... Imagino, ainda, Maria José Dupré, a
autora, com a mesma feição que a conheci
quando li, pela primeira vez, uma obra sua,
embora nunca tenha visto uma foto dela
sequer. O Ilha Perdida foi a minha porta
para o mundo fantástico da Leitura.
Infelizmente não me recordo de ter ouvido sequer
um conto de fadas – não pelo menos na
época certa! Descobri, embora soubesse de
sua existência, ao ser convidada a fazer um
curso de histórias relacionadas aos Contos
de Fadas, quando fui professora de Educação
Infantil. Me apaixonei pelas histórias de
Mamãe Ganso, senti a pobreza do Andersen,
viajei com os Grimm, sofri na neve com a
Pequena vendedora de fósforos, mas a minha
grande paixão, ainda, é “A bela e a fera”.
Essa história mexe profundamente com o
meu lado emocional, me fazendo encontrar,
apaixonadamente, algo que acredito nunca
ter perdido, embora não tenha lido esses
contos quando criança. Ao contrário, descobri
sua existência e importância. Assim, os
encontrei e desavergonhadamente leio e os
saboreio, dando-lhes um delicioso gostinho
de chocolate!!
Osana B. A. P. Oliveira
●
Mesmo estudando na capital nas primeiras
séries do antigo primário e parte do
ginásio, passei a ter contato com a
leitura de forma signifi cativa apenas
na 6a série, quando uma professora
de Língua Portuguesa leu pra toda a
sala uma história. Não me recordo do
título, porém sou capaz de lembrar
com bastante clareza que o texto fazia
parte da coleção Para Gostar de Ler.
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Identifi quei mais tarde que se tratava de
uma crônica e aquela história, da forma
como a professora leu, não poderia ter
provocado nada menos que um grande
início na minha jornada no mundo dos
livros. Procurei primeiramente histórias
dentro da mesma coleção...
Com certeza o prazer de ler veio anos mais
tarde devido à profi ssão de professor,
que exige muita leitura da nossa parte.
O bom é que a leitura não veio na forma
de obrigação, mas sim por prazer e hoje
afi rmo com todas as letras que sou um
fanático pela leitura.
José Paulo da Silva
●
Lembro dos meus primeiros contatos com
os livros, quando ainda era pequena e
não sabia ler. Em minha casa havia um
armário com muitos livros da Coleção
Saraiva, que me fascinava. Achava o
máximo o fato de meu pai ter lido muitos
daqueles livros. Para mim parecia algo
inatingível, sagrado até.
Quando ainda não sabia ler, ganhei de meu
pai uma revista em quadrinhos da
Branca de Neve. Cada vez que a folheava,
inventava a história de um jeito diferente.
Amava as gravuras e a própria história
(que meu pai havia contado), fi cava
imaginando o que ao certo aquelas letras
queriam dizer. Quando aprendi a ler, foi
minha primeira leitura.
Depois disso, uma série de outros textos
permitiu-me viajar pelo mundo da
imaginação, rir, chorar, aprender... Houve
um período de férias em que li muitos
livros, entre eles “Éramos Seis” – acabei por
me apaixonar pelo fi lho mais velho. Após o
almoço, sentava-me no quintal e ia lendo,
não querendo que as páginas acabassem
(sensação que ainda sinto quando estou
lendo um livro que me encanta). Foi
com esse texto que descobri a magia
maravilhosa que a leitura nos proporciona,
o transporte a um mundo de sonhos; o
prazer que tenho de entrar nesse mundo e
de não querer sair mais, de protelar o fi nal
para que a mágica não acabe.
Selene Coletti
●
Minha lembrança mais antiga de leitura
remonta à coleção de Monteiro Lobato,
que minha mãe ganhou quando ainda era
menina.
Eu sou uma daquelas pessoas que seguem
o dito popular, que diz que o exemplo é o
melhor meio de se ensinar algo.
Meus pais estavam sempre com um livro ou
dois na cabeceira da cama e eu achava
isso o máximo, muito adulto e, portanto,
eu deveria ser igual (afi nal eu era muito
amadurecida, há!, há!, há!).
De qualquer forma, gostei muito de ler as
histórias do Sítio do Picapau Amarelo, e
segui lendo tudo o que me caía nas mãos, o
que nem sempre signifi cou alta literatura.
Márcia Cintra Camargo Rodrigues
●
Nasci no interior de Minas Gerais, em uma
fazenda dessas bem distantes da cidade, e
fi quei por lá até meus seis anos de idade.
Lembro-me como se fosse hoje: papai
chegava da lida e à noitinha reunia a
47Entre na roda - Introdução
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família ao pé do fogão de lenha e começava
seu ritual. Esperava todos se acomodarem
e então começava a contar e ler estórias de
aventuras, amor, vingança, lealdade, honra,
mistério, encantamento e assombrações.
Contava essas histórias com ajuda de
uma velha candeia a querosene. Enquanto
contava eu me encantava...
Sempre trazia consigo uns livrinhos bem
fi ninhos, mas que continham grandes
estórias – mais tarde soube que esses
livrinhos se chamavam Literatura de
Cordel. Quando ele lia essas histórias, fazia
as devidas entonações e isso as embelezava
ainda mais.
Não sabia ler, mas fi cava imaginando as
estórias e muitas vezes me imaginava
dentro delas; então conhecia lugares sem
sair da fazenda. Vivia cercada de contadores
de “causos”, o que é bastante comum no
interior das Minas Gerais. Esses contadores
eram pessoas simples e sem nenhuma
instrução escolar, mas que carregavam
dentro de si riquezas, “experiências de
vida”. Nessa época, só tinha contato físico
com o livro através da literatura de cordel,
não possuíamos nenhum outro tipo de livro
na fazenda. Mas, quando ia à cidade – isso
acontecia duas vezes por ano –, fi cava
namorando de longe as revistas nas bancas
e fi cava imaginando o que estaria escrito
nelas. Às vezes pedia para mamãe comprar
algumas delas pra mim, mas era inútil,
ela sempre dizia: “Quando você crescer
mais eu compro, além disso, você precisa
aprender a ler pois só olhar fi guras não dá”.
Então crescia em mim um desespero, uma
vontade de decifrar aqueles códigos que os
adultos chamavam “ler”.
Fui para a escola com seis anos, deixei o
campo e fui morar com minha família
na cidade. Foi lá que conheci a fi gura
que me alfabetizou, tia Ana Lúcia, uma
criatura mágica, cheia de histórias de
bichos, castelos, princesas... A cada estória
contada por ela, crescia em mim uma
grande admiração, eu acreditava que
todas as estórias do mundo moravam
dentro dela. Hoje sei que tia Ana Lúcia foi
imprescindível para minha formação de
leitora e trago dentro de mim um pouco de
sua mágica.
O primeiro livro que eu li, lembro até hoje, se
chamava As aventuras do bode Fifi , um
livrinho de dez folhas e cheio de gravuras
coloridas. Me encantava passando o dedo
pelas letrinhas. Depois desse vieram muitos
e muitos outros, pois tinha conseguido abrir
a porta encantada do conhecimento.
Quando ainda não sabia ler e tentava de
todas as formas decifrar aqueles símbolos,
minha mãe sempre falava: “Filha, ler é
como montar burro bravo; no começo dá
um medo danado de enfrentar o bicho, mas
quando dá a coragem, a gente ganha o
lombo do matuto e vai acostumando com
o passo e se sentindo parte da estrada,
sentindo que a viagem é mesmo sem fi m”.
Concordo com mamãe; depois que me senti
parte da estrada, não parei mais, fui lendo
tudo que caía em minhas mãos.
Josefa Salgado
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Créditos das fi gurasFigura 1 – Bible. Latin. Mainz, 1462 2v. Diora: Cofre 4, 4, ex. 1. 42 x 30 cm.
Figura 2 – Colophon. Op. Cit. 41,2 x 19,5 cm.
Figura 3 – Book of Hours, 1588. Latin. 17 x 13 cm. Mss I, 15, 02, 11.
Figura 4 – Bíblia. Latin. Veneza, Otavianus Scotus, 31 de maio de 1480. 21,5 x 16 cm. Diora: Z 2, 3, 11.
Figura 5 – Metal plate for print nc.21, part 4. 1799 – 1801.Oficina do Arco do Cego. 14,5 x 11,7 cm. Dilco: ARM. 24.40.4.
Figura 6 – Tradução guarani realizada pelos padres da Companhia de Jesus, 1733. pp.209-10. 19,5 x 14 cm. Mss: I, 15, 02, 11.
Figura 7 – Carimbo da Biblioteca Nacional.
Figura 8 – Foto Cláudio Xavier. Ex-libris da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.
Figura 9 – Mapas manuscritos e aquarelados de várias regiões do Brasil, por João Teixeira Albernaz. Data c. 1666. ARC. 16-8-6/21. 60,5 x 41 cm. ARC.16.8.6.
Figura 10 – Pierre Vander Aa (1659–1733). Volumes 49/50 BN/Icon 67.3.6.28 x 18 cm. Dilco: 67.3.6.
Figura 11 – Foto Cláudio Xavier. Acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro
Figura 12 – Foto Cláudio Xavier. Acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro
Figura 13 – Jean-Jacques Boissard. Bibliotheca Chalcographica. 1669. Parte 2, p. 290. 17,8 x 13 cm. Dilco: ARM.11.1.24.
Figura 14 – Acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.
Figura 15 – Acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.
Figura 16 – Luiz Figueira. Arte da Grammatica da Língua do Brasil, composta pelo Dr. Luiz Figueira, natural de Almodóvar. Lisboa, Oficina Patriarcal, 1795. Folha de rosto. 20,5 x 13,5 cm. Diora: 97, 01, 17.
Créditos : Fotos em marca-d’água
pp. 28, 29 e 51 – Vista de Ouro Preto/ Minas Gerais – Espartaco Madureira Coelho, s/d.
pp. 34 e 35 – Igreja de Nossa Senhora do Rosário – Ouro Preto/ Minas Gerais – Espartaco Madureira Coelho, s/d.
pp. 40 e 41 – Acervo digital: Fundação Joaquim Nabuco – Monumento Marechal Deodoro, s/d.
pp. 42 e 43 – Estação Central da antiga estrada de ferro D. Pedro II – Rio de Janeiro – Marc Férrez, 1899.
pp. 44 e 45 – Aqueduto da Carioca – Rio de Janeiro/ Brasil – Marc Férrez, 1896.
pp. 46 e 47 – Acervo digital: Fundação Joaquim Nabuco – Teatro Municipal, s/d.
Disponíveis em www.dominiopublico.org.br
51Entre na roda - Introdução
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Iniciativa CoordenaçãoTécnica
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