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PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA – PRPGP
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO
A SUBSTITUIÇÃO DOS TÍTULOS DE PAGAMENTO PELO
CARTÃO DE CRÉDITO COMO INSTRUMENTO DE GLOBALIZAÇÃO
Brasília - DF
2012
Autor: Gustavo Lopes de Souza
Orientador: Dr. Wilson Almeida
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA – PRPGP
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO
A SUBSTITUIÇÃO DOS TÍTULOS DE PAGAMENTO PELO
CARTÃO DE CRÉDITO COMO INSTRUMENTO DE GLOBALIZAÇÃO
Autor: Gustavo Lopes de Souza
Orientador: Dr. Wilson Almeida
Brasília - DF
2012
GUSTAVO LOPES DE SOUZA
A SUBSTITUIÇÃO DOS TÍTULOS DE PAGAMENTO PELO
CARTÃO DE CRÉDITO COMO INSTRUMENTO DE GLOBALIZAÇÃO
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito
da Universidade Católica de Brasília,
como requisito parcial para obtenção do
Título de Mestre em Direito.
Orientador: Dr. Wilson Almeida
Brasília
2012
12,5 cm 7,5 cm 7,5cm
Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB 17/12/2012
S729s Souza, Gustavo Lopes de.
A substituição dos títulos de pagamento pelo cartão de crédito como instrumento de globalização. / Gustavo Lopes de Souza – 2012.
101f. ; il.: 30 cm Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2012. Orientação: Prof. Dr. Wilson Almeida 1. Títulos (Finanças). 2. Cartões de crédito. 3. Globalização. 4. Direito
comercial. I. Almeida, Wilson, orient. II. Título.
CDU 347.7:336.77
À minha esposa, Kamile, pelo seu amor.
Aos meus filhos, Maria Luíza e João Lu-
cas pelo carinho.
À minha mãe Lola, pela lição de vida.
Às minhas irmãs e cunhados, pelo apoio.
Aos meus sogros, Agenor e Edite, pela
nova família que ganhei.
À Equipe de Nossa Senhora, Sede San-
tos, Ejoc e amigos, pelas orações.
À memória de meu pai, Lívio Mário,
meu grande mestre e herói.
AGRADECIMENTOS
Ao eminente professor orientador Doutor Wilson Almeida, sempre atencioso,
educado e muito solícito.
À professora Doutora Leila Bijus, à professora Doutora Arinda Fernandes e ao
professor Doutor Antônio Paulo Cachapuz, pela amizade e incentivo.
Ao professor Doutor Arnaldo Godoy, por sua inegável contribuição na presente
obra.
À Universidade Católica de Brasília e à FACITEC, pelo apoio à minha partici-
pação no curso.
“Tudo posso naquele que me fortalece.”
Filipenses: 4. 13
RESUMO
Referência: SOUZA, Gustavo Lopes. A substituição dos títulos de pagamento pelo car-
tão de crédito como instrumento de globalização. 2012. 101 folhas. Dissertação (Mes-
trado em Direito). Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2012.
Este trabalho é divido em quatro capítulos. No primeiro foi feito um levantamento his-
tórico e evolutivo da modalidade de pagamento: cartão de crédito. Também foi analisa-
do neste capítulo, a natureza jurídica do cartão de crédito, destacando as espécies desta
modalidade de pagamento. Além de abordagem panorâmica das relações jurídicas con-
tratuais dos cartões de crédito, com incursões sobre as diversas classificações doutriná-
rias. Foi apresentado estudo estatístico do crescimento do uso do cartão de crédito como opção de pagamento. No segundo capítulo, foi abordado o instituto dos títulos de crédi-
to e análise da origem do crédito. Destacou-se especificamente as espécies de títulos de
crédito como o cheque, duplicata, nota promissória e a letra de câmbio. Foram aborda-
das as características, os princípios da literalidade, da cartularidade e da autonomia. O
sistema legislativo dos títulos de crédito foi analisado no cenário nacional e internacio-
nal. Ainda no terceiro capítulo foram analisados títulos de crédito dentro do Código
Civil e a sua padronização internacional pela Lei Uniforme de Genebra. No terceiro
capítulo é apresentada a evolução na forma de pagamento no Brasil e no mundo, desta-
cando a substituição da nota promissória, letra de câmbio, duplicata mercantil e do che-
que pelo cartão de crédito. Também foi investigada a ausência de previsão legislativa
sobre o instituto do cartão de crédito. No quarto capítulo foi abordado o comércio ele-
trônico, descrição da importância do cartão de crédito nesta nova modalidade de compra
e venda virtual, analisando as preocupações com a segurança jurídica neste tipo de tran-
sação. Por fim, tudo isso foi posto e debatido para a defesa da viabilidade de se justifi-
car a substituição dos títulos de pagamento pelo cartão de crédito como instrumento de
globalização.
Palavras-chave: Cartão de Crédito – substituição dos títulos de crédito – a moeda de
plástico como instrumento de globalização – a evolução nas formas de pagamento.
ABSTRACT
Reference: Souza, Gustavo Lopes. Replacement of securities of payment Credit card as
instrument of globalization. 2012. 101 pages. Dissertation (Master of Law). Catholic
University of Brasilia, Brazil, 2012.
This study is divided into four chapters. The first chapter was a survey of the historical
and evolutionary mode of payment: the credit card. Was also analyzed in this chapter,
the legal nature of the credit card, highlighting the species of this type of payment. Be-
sides panoramic approach of contractual legal relationships of credit cards, with raids on
several doctrinal ratings. Statistical analysis was made of the growing use of credit
cards as a payment option. In the second chapter, was approached the institute of securi-
ties credit and analysis of the origin of the credit. Specifically species of credit bonds
like the check, duplicate, promissory note and bill of exchange. We approached the
characteristics, principles of literalness, of cartularidade and autonomy. The legislative
system of securities was analyzed in the national and international scene. Also in the
third chapter were analyzed securities within the Civil Code and its international stand-
ardization by the Uniform Law of Geneva. The third chapter presents the evolution in
the form of payment in Brazil and worldwide, highlighting the replacement of the prom-
issory note, bill of exchange, duplicate and check by credit card. We also investigated
the absence of legislative prediction about the institute's credit card. In the fourth chap-
ter was approached electronic commerce, demonstrating the importance of credit cards
in this new mode of virtual buying and selling, analyzing concerns about legal certainty
in this type of transaction. All this is debated to defend the viability to justify the substi-
tution of securities for payment by credit card as an instrument of globalization.
Keywords: Credit card – replacement of securities – the plastic currency as an instru-
ment of globalization – the evolution of payment ways.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 11
2 CARTÃO DE CRÉDITO .......................................................................................... 13
2.1 HISTÓRICO DO CARTÃO DE CRÉDITO ............................................................. 13
2.2 SISTEMA CONTRATUAL DOS CARTÕES DE CRÉDITO ................................. 15
2.3 AS RELAÇÕES JURÍDICAS EM ESPÉCIE DO CARTÃO DE CRÉDITO ........... 17
2.3.1 Contrato da entidade emissora com titular do cartão de crédito ............ 19
2.3.2 Contrato entre a entidade emissora e o estabelecimento filiado .............. 21
2.3.3 Contrato entre o titular do cartão de crédito e o estabelecimento filiado 21
2.3.4 Contrato entre a entidade emissora e a instituição financeira ................. 22
2.4 NATUREZA JURÍDICA DO CARTÃO DE CRÉDITO .......................................... 23
2.5 MODALIDADES DO CARTÃO DE CRÉDITO ..................................................... 25
2.6 AS PARTES NO CARTÃO DE CRÉDITO.............................................................. 28
2.7 O AVANÇO NO USO DOS CARTÕES DE CRÉDITO .......................................... 29
3 TÍTULOS DE CRÉDITO ......................................................................................... 32
3.1 A ORIGEM DO CRÉDITO ...................................................................................... 32
3.2 - INTRODUÇÕES AOS TÍTULOS DE CRÉDITO.................................................. 33
3.3. CARACTERÍSTICAS DOS TÍTULOS DE CRÉDITO .......................................... 35
3.4. OS PRINCÍPIOS DOS TÍTULOS DE CRÉDITO ................................................... 36
3.5 A LEGISLAÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO ................................................... 40
3.6 CONVENÇÕES INTERNACIONAIS ..................................................................... 41
3.7 A POLÊMICA SOBRE A VIGÊNCIA DA LUG COMO INTEGRANTE DO
DIREITO INTERNO BRASILEIRO.............................................................................. 43
3.8. A CODIFICAÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL.......................................... 44
3.9 - O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO E OS TÍTULOS DE CRÉDITO ...................... 46
3.10. A RELAÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO COM O AVANÇO DA
TECNOLOGIA .............................................................................................................. 53
4. O CARTÃO DE CRÉDITO COMO SUBSTITUTO DOS CLÁSSICOS
DOCUMENTOS DE CRÉDITO ................................................................................. 60
4.1 DA REGULAÇÃO DOS CARTÕES DE CRÉDITO ............................................... 62
4.2. NECESSIDADE DE NOVA REGULAMENTAÇÃO DOS TÍTULOS DE
PAGAMENTO ............................................................................................................... 64
4.3 O DIREITO COMPARADO .................................................................................... 66
5. O COMÉRCIO ELETRÔNICO ............................................................................. 70
5.1 O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO ................................. 71
5.2. O COMÉRCIO ELETRÔNICO VIA INTERNET .................................................. 75
5.3. TEMORES QUANTO ÀS TRANSAÇÕES ELETRÔNICAS ADVINDAS DA
INTERNET ..................................................................................................................... 78
5.4. O VILÃO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO .......................................................... 80
5.5. A RESPONSABILIDADE DAS ADMINISTRADORAS DE CARTÃO DE
CRÉDITO NO COMÉRCIO ELETRÔNICO................................................................. 84
6 CONCLUSÃO ............................................................................................................ 88
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 91
11
1 INTRODUÇÃO
O mundo está mudando a sua forma de pagamento e a cultura de dinheiro no
bolso não está sendo substituído somente no Brasil, todo o mercado consumidor está
sendo afetado significativamente pelas transformações das formas de pagamento, que
não se diferem nacional nem internacionalmente. As facilidades trazidas pelos cartões
de crédito estão em preferência no mercado internacional, em razão de possibilitar a
entrada de pequenas empresas no comércio virtual com as mesmas chances e possibili-
dades de acesso ao comércio exterior.
A sociedade está em constante transformação e as relações de comércio e, con-
sequentemente, as formas de pagamento também estão sofrendo mutações. Dessa for-
ma, os pagamentos através de títulos, como o uso dos cheques, duplicatas, notas pro-
missórias e letras de câmbio estão sendo substituídas cada vez mais pelo chamado di-
nheiro de plástico. O uso da moeda está se transformando com o passar do tempo e com
o avanço das tecnologias, sendo empurrada pelos fortes efeitos e consequências da glo-
balização.
Entretanto, a falta de padronização e harmonização de uma legislação internaci-
onal, baseada em acordos, para regulamentar as operações com o cartão de crédito é um
grande problema que será discutido nesta pesquisa. Os títulos de crédito diferentemente,
além de gozarem da proteção das legislações nacionais, foram padronizados pela Lei
Uniforme de Genebra - LUG, com o objetivo de uniformizar o mercado internacional
nas modalidades de pagamento. Por conseguinte, os títulos de crédito nasceram no Di-
reito interno e consequentemente foram regulamentados no Direito Internacional. Por
outro lado, os cartões de crédito, em tese, surgiram no comércio internacional e foram
agregados nos comércios locais.
Todavia, a grande preocupação é em relação à ausência de legislação nacional e
internacional para regulamentar a matéria referente aos cartões de crédito, que acaba
gerando uma insegurança jurídica na principal forma de pagamento existente nos países
ocidentais.
A evolução dos títulos de pagamento para o cartão de crédito é uma matéria dig-
na de um tratado internacional. O Direito material que regula as formas de pagamento
necessita de uma legislação uniforme para padronizar a principal forma de pagamento
12
utilizada atualmente no mundo. O avanço do uso dos cartões de crédito como instru-
mento de integração econômica e a diminuição na utilização dos títulos de crédito é um
tema relevante para o Direito Internacional Econômico, entretanto carente de legislação.
Esta pesquisa tem o objetivo de investigar o avanço da utilização dos cartões de
crédito pelo mundo como uma verdadeira expansão do crédito como elemento novo a
facilitar a vida dos indivíduos e, consequentemente, o progresso da economia. Com o
estudo do tema, pretende-se abordar as principais posições acerca da diminuição do uso
dos títulos de crédito que perderam espaço no mundo globalizado com o avanço do di-
nheiro de plástico.
Este estudo pretende analisar as relações jurídicas em espécie dos cartões de
crédito, bem como discutir sobre a ausência de legislação em relação aos cartões de
crédito no nosso ordenamento jurídico e pelo mundo. Diferentemente do que aconteceu
com os títulos de crédito, em que o legislador brasileiro cuidou bem da matéria no âm-
bito interno e ainda tomou o cuidado de padronizar os títulos de maneira internacional
ao ser signatário da Lei Uniforme de Genebra - LUG.
A pesquisa também tem o propósito de melhor esclarecer a evolução do comér-
cio eletrônico à luz do direito pátrio e internacional e ausência de harmonia no uso do
cheque, da nota promissória, da letra de câmbio e da duplicata mercantil nas relações
comerciais.
Com um simples passeio em qualquer shopping o consumidor estará propício a
receber uma série de propostas para adquirir vários cartões de crédito diferentes. As
empresas não estão aceitando os cheques nas operações comerciais, tampouco as notas
promissórias. Atualmente quase não existe relação comercial feita com o uso de uma
letra de câmbio, e poucos os comércios ainda estão trabalhando com as duplicatas mer-
cantis.
No âmbito interno, o uso do dinheiro de plástico está diminuindo de forma exa-
gerada a aceitação dos títulos de crédito. No âmbito internacional, o uso do cartão de
crédito é quase absoluto, tanto pela facilidade na conversão das moedas como pela har-
monia do comércio na aceitação do crédito no cenário mundial.
A Globalização é um fenômeno com amplos benefícios para a sociedade em ge-
ral, seja pela facilidade do acesso às inovações tecnológicas ou, até, estreitando as rela-
ções e a integração entre países. Destarte, o uso do cartão de crédito como instrumento
de globalização se enquadra perfeitamente na Linha de Pesquisa escolhida do Direito
Internacional Econômico.
13
2 CARTÃO DE CRÉDITO
2.1 HISTÓRICO DO CARTÃO DE CRÉDITO
O cartão de crédito é uma criação relativamente recente, em comparação a exis-
tência do crédito. Embora exista uma divergência doutrinária sobre a sua origem e evo-
lução histórica, adotou-se, nesse estudo, como a primeira ideia a se assemelhar aos atu-
ais cartões de crédito, os cartões de credenciamento emitidos por alguns hotéis euro-
peus, a partir de 1914, para identificar seus bons clientes. Os fregueses habituais recebi-
am um cartão, que servia como identificação nas futuras hospedagens, e garantia vanta-
gens como deixar débitos pendentes para pagamento na próxima estada no hotel.
Redes de postos de gasolina nos Estados Unidos, como a Texaco e a Exxon, a
partir de 1920, passaram a emitir cartões semelhantes. Porém, somente depois da Se-
gunda Guerra Mundial que surgiram os primeiros cartões de crédito propriamente ditos,
como os que se conhecem hoje: emitidos por uma empresa especialmente criada para
este fim. Os bens não são adquiridos junto à empresa emissora do cartão, mas em uma
rede de empresas afiliadas a ela. A emissora do cartão é mera intermediária, financiando
as vendas feitas junto às afiliadas.
O primeiro cartão de crédito igual ao que existe hoje foi o Diners Club1, surgido
em 1950. Inicialmente, funcionava restrito a uma rede de hotéis e restaurantes afiliados.
Logo, o leque de opções se estendeu a diversos tipos de empresas. Em 1958, a Ameri-
can Express, originalmente uma agência de viagens, também criou um cartão semelhan-
te. A partir daí, começou a surgir várias outras empresas com a mesma finalidade.
Ricaurte2, com aguda precisão, recupera os primeiros momentos da breve histó-
ria dos cartões, ao narrar que:
La evolución de las tarjetas de crédito se dio propriamente en la década de
los años 60 donde se evidencio un dessarrollo extraordinario a consecuencia
de la general aceptación del sistema por parte de los distintos sujetos de las
operaciones comerciales, observándose además cambios radicales em la for-
1 A primeira emissão do Cartão Diners Club Card foi feita em 8 de fevereiro de 1950, por Frank McNa-
mara, Ralph Schneider e Matty Simmons, no restaurante Major´s Cabin Grill, situado no Empirre State
Bulilding, New York, onde mantinham escritórios de advocacia. 2 RICAURTE, Hernando Sarmiento. La trajeta de credito: su aspecto jurídico e econômico. Bogotá:
Temis, 1973, p. 3-5.
14
ma de vida de los usuários como consecuencia de la implementación de esta
nueva modalidad crediticia que modificó radicalmente el concepto de las
ventas a plazos al incorporarse em este tipo de negócios contractuales las ins-
tituciones de crédito.
É importante destacar um período estratégico para a evolução da moeda de plás-
tico, no qual, na década de 1960 seguindo o espírito da evolução do capitalismo, o car-
tão de crédito passou a ser considerado um cartão de visita da globalização. Nelson Ei-
zirik3 resume bem a evolução dos cartões, ao constatar que:
Surgiram, em suas diversas modalidades, como uma notável evolução na prá-
tica das relações de troca e de consumo. Com efeito, se a passagem da eco-
nomia de escambo para a economia monetária constitui uma verdadeira revo-
lução nas relações comerciais, não mesmo revolucionária é a tendência, hoje
verificada, da substituição gradativa da moeda, ou mesmo do cheque, pelo
cartão de crédito, como autêntico meio de pagamento. Se com a introdução
do cheque passamos à economia da sociedade sem papel-moeda, com os car-
tões de crédito ingressamos na chamada era da checkless society.
No Brasil, o cartão de crédito foi adotado em 1956, pelo empresário tcheco
Hanus Tauber que comprou, nos Estados Unidos, a franquia do Diners Club, sendo ini-
cialmente um cartão de compra, o qual requeria o pagamento total da fatura, e não um
cartão de crédito.4
Conforme o autor Fausto Pereira de Lacerda5, o Brasil foi o primeiro a adotar o
sistema de cartão de crédito na América do Sul.
Quando o Diner‟s club se associou à família Klabin para implantar o seu sis-
tema. Durante muito tempo, o cartão Diner‟s reinou absoluto no mercado
brasileiro. Com a saída da família Klabin da sociedade formada com Diner‟s,
o cartão Diner‟s perdeu a aura de cartão de elite. Posteriormente, formou-se
uma nova sociedade com a entrada do Banco Sul Brasileiro S/A. Mais tarde,
o cartão Diner‟s teve seu título negociado com a Credicard, associada ao gi-
gante Mastercard, que já explorava um cartão com seu nome.
As empresas voltadas para esse ramo comercial se uniram, e em 1971 e funda-
ram, no Rio de Janeiro, a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e
Serviços, a ABECS. O cartão de crédito adquiriu grande relevância no panorama jurídi-
co-econômico pelas intrincadas relações jurídicas e pela sua grande frequência de utili-
zação, o que demonstra a necessidade de seu estudo e regulamentação.
3 EIZIRIK, Nelson. Administração de cartão de crédito constitui atividade privativa de instituição
financeira? Revista de Direito Mercantil. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 88, 1990. 4ABECS – Associação Brasileira de Cartões de Crédito e Serviços. Disponível em:
<http://www.abecs.org.br/site2012/abecs.asp.>. Acesso em: 3 maio, 2012. 5 FILHO, Fausto Pereira Lacerda. Cartão de Crédito. 1990, p. 40.
15
Foram realizadas no Brasil, apenas no primeiro trimestre de 2012, mais de
2.192.592 (em milhões) de transações com cartão de crédito, movimentando um fatura-
mento total neste semestre de 178.476 (em milhões), conforme dados extraídos em con-
sulta a ABECS – Associação Brasileira de Cartões de Crédito e Serviços.6
O cartão de crédito representa uma verdadeira revolução no comércio, pela
enorme expansão do crédito que possibilita. Dessa forma, incentiva a circulação da mo-
eda e impulsiona o comércio e o desenvolvimento econômico. Diferentemente do che-
que, o cartão não exige provisão de fundos. O financiamento é facilitado, e dispensa a
necessidade de prévia habilitação do cliente perante uma instituição financeira antes de
cada compra.
2.2 SISTEMA CONTRATUAL DOS CARTÕES DE CRÉDITO
Trata-se de um negócio jurídico complexo, plurilateral, administrado por insti-
tuições financeiras autorizadas a prestar serviços de emissões de cartões e administração
de sua utilização, com o objetivo de lucro e com o propósito de implementar a comerci-
alização de bens ou serviços.
Neste contexto, visando uma evolução das formas de pagamento no mundo e
adequando a primazia da funcionalidade da moeda de plástico, Bretón7 alude ao sistema
negocial dos cartões de crédito:
Una entidad, que puede ser especializada o bancaria, emite un documento
denominado tarjeta de crédito a favor de determinadas personas las que ex-
chibiéndola em los comércios o prestatarios de servicios que se encuentran
adheridos, pueden adquirir mercaderías o servicios firmando em formulários
especiales, sin pagar em efectivo, el import de la operación. Posteriormente,
com dicho documento firmado, el establecimiento adherido gestiona ante
aquella entidad su pago em dinero, previo descuento de la comisión conveni-
da, y por último, la entidad cobra el importe al possedor de la tarjeta.
A funcionalidade dos cartões de crédito é uma das suas principais características,
no sentido de trazer uma maior dinâmica no mercado de créditos com celeridade e segu-
rança. A entidade especializada tem a prerrogativa de emitir um documento, o cartão de
6 ABECS – Associação Brasileira de Cartões de Crédito e Serviços. Disponível em:
<http://www.abecs.org.br/site2012/abecs.asp>. Acesso em: 3 maio. 2012. 7 BRETÓN, Samuel Linares. La tarjeta de crédito: su calificación jurídica como médio de pago. Buenos
Aires: La ley, 2000, p.144.
16
crédito, em favor de seus clientes que irá utilizá-lo como forma de pagamento nos co-
mércios. Dessa forma, os consumidores possuem a possibilidade de aderirem bens e
serviços com as operações da moeda de plástico.
Posteriormente, com o contrato firmado, as entidades especializadas, efetuam os
pagamentos para as empresas, para depois sub-rogarem no direito de cobrança de seus
clientes beneficiados pelo cartão de crédito.
É importante destacar também a natureza jurídica dos cartões de crédito, para a
corrente de juristas que optaram por uma complexa coordenação de contratos. Muguil-
lo8 qualifica os cartões de crédito da seguinte forma:
Como um negocio jurídico de coordinación, plural o masivo, y complejo,
conformado en una unidad de relaciones jurídicas diversas, donde cada rela-
ción entre los intervenientes tiene uma regulación y uma naturaleza jurídica
própria y autónoma, que sólo adquiere sentido para conformar este sistema
por via de coordinación y complentación (necessaria para ser operativo), de-
monstrando la ineficacia de cada una de ellas de no integrarse recíprocamen-
te.
A complexa relação jurídica contratual dos cartões de crédito dificulta até mes-
mo o entendimento de sua natureza jurídica, haja vista que se trata de uma relação pró-
pria e autônoma em relação a cada uma das partes envolvidas. Não é, na realidade, um
título de crédito que está desprovido das características de abstração e livre circulação,
em que não tem, igualmente, valor por si mesmo.
O cartão credencia o portador na aquisição de bens ou prestação de serviços me-
diante sua simples apresentação, com a singularidade de que o pagamento das despesas
será realizado em uma época posterior e a uma pessoa diversa do vendedor.
Ao pagar o preço de um bem ou serviço, o usuário pode fazê-lo mediante a assi-
natura de uma nota de consumo, e a apresentação de um cartão de crédito. Em determi-
nado prazo contratual, deverá pagar o valor à empresa que lhe emitiu o cartão, que, por
sua vez, pagará ao fornecedor.
Dornelles da Luz9 desenha o cartão de crédito sob a perspectiva do emissor co-
mo:
Um sistema operacional de credenciamento dirigido ao consumo, que reúne
clientes do emitente, constituídos por comerciantes e consumidores. Visa
8 MUGUILLO, Roberto Alfredo. Tarjeta de crédito. 2. Ed. Buenos Aires: Astrea, 1994, p 79.
9 LUZ, Aramy Dornelles da. Negócios jurídicos bancários: o banco múltiplo e seus contratos.2. Ed. São
Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p. 241.
17
manter uma clientela cativa, fortalecendo o conglomerado financeiro ao qual
é filiado, oferecendo em troca qualificado serviço de segurança e desregula-
mentação do crédito.
A clientela cativa e fiel é um dos principais objetivos do mercado comercial,
pois nas atividades comerciais é muito mais benéfico vender sempre, do que vender
muito sem fidelizar seus clientes. O dinheiro de plástico trouxe um fortalecimento fi-
nanceiro ao mercado oferecendo um serviço de segurança e uma maior qualidade nas
operações.
Landáez10
define a natureza do instrumento de identificação do suporte contratu-
al como a:
Tarjeta de crédito es el signo (bien llámese carnet, cedula, instrumento, lami-
nilla, plástico) que identifica al legítimo tenedor del mismo, sea el titular ori-
ginal o las personas por él autorizadas, como partes intervenientes en un con-
trato, mediante la cual uma entidad crediticia ( banco, institución financeira,
pública, privada o establecimiento comercial) concede un crédito, que puede
ser rotatorio, de cuantía y plazo determinado a dichos titulares, com el fin de
que estos lo utilicen em los estabelecimientos afiliados, para recibir de los
mismos bienes, mercancías, servicios y aun dinero, a la presentación de dicho
signo y previa la firma de los documentos probatórios de la transacción efec-
tuada o a la mención del número del signo y datos identificatorios cuando no
se requiera la presentación.
A segurança trazida pelos cartões de crédito com os sinais de identificação do
legítimo credor trouxe uma segurança jamais vista nas formas de pagamento. Pois as
administradoras de cartões concedem créditos rotatórios aos seus beneficiados com um
determinado prazo para fazerem o pagamento.
O cartão, em si, é apenas uma pequena peça de plástico, de tamanho uniforme,
impresso e, em relevo, com certos dizeres, como nome do organismo emissor, número
em código do portador, data da emissão, período de validade, nome e assinatura do por-
tador, que tem a natureza de um documento de identificação.
2.3 AS RELAÇÕES JURÍDICAS EM ESPÉCIE DO CARTÃO DE CRÉDITO
Embora formalmente separados, o funcionamento do cartão de crédito pode ser
explicado por meio de uma série de contratos interligados materialmente entre si. As-
10
LANDÁEZ, Otazo. La tarjeta de crédito. Editorial Sentido. Caracas, 1998, p. 32.
18
sim, com a proposta de ilustrar as relações jurídicas em espécie, é importante observar a
seguinte figura 1.
Figura 1 – Relações Jurídicas.
A administradora emite, em favor de uma pessoa (titular), um cartão de crédito,
pessoal e intransferível, que lhe permite pagar suas contas numa rede de estabelecimen-
tos afiliados, e estes são reembolsados posteriormente pela administradora, descontada
uma porcentagem de remuneração, e a administradora cobra, em relação jurídica autô-
noma, as dívidas ao titular, além de uma taxa anual.
Como se vê, a empresa administradora ocupa a posição central, como verdadeira
intermediária nas relações jurídicas oriundas do cartão de crédito.
Em suma, são quatro contratos: o primeiro, entre o titular do cartão e a adminis-
tradora; o segundo, entre a administradora e cada empresa afiliada; o terceiro, entre a
administradora e a instituição bancária que financia as vendas realizadas por meio do
cartão; e, um quarto contrato: entre o titular do cartão e cada afiliada de que se compra
ou locam-se serviços.
Este último contrato tem os caracteres de compra e venda ou de locação de ser-
viços, se for o caso, porém com uma particularidade, se para a afiliada existe a obriga-
ção de entregar a coisa para o comprador, em contrapartida, para o titular do cartão de
crédito não existe a obrigação de entregar o preço, mas tão somente de emissão de um
título contra a administradora. O titular não paga diretamente à afiliada; quem a paga é a
administradora.
19
A afiliada, normalmente, não tem qualquer ação contra o titular. O titular se
obriga a pagar perante a administradora. Só a esta cabe cobrá-lo em caso de inadimple-
mento. Neste contexto, com a proposta de ilustrar o tema com maior profundidade, pas-
saremos a analisar cada uma das espécies de relações jurídicas entre as partes.
2.3.1 Contrato da Entidade Emissora com Titular do Cartão de Crédito
O contrato firmado entre o titular do cartão e a entidade emissora é o contrato
por adesão feito pela empresa emissora do cartão, no qual o titular transcreve uma série
de informações de caráter pessoal e patrimonial, no verso da impressão. As cláusulas
contratuais, que deverão vigorar entre as partes, sua aceitação é obtida por meio do con-
trato de adesão, da entrega do cartão e do desbloqueio ou uso deste cartão.
Picazo11
define os contratos de adesão como:
Aquellos supuestos en los cuales una de las partes, que generalmente es unu
empresario mercantil o industrial que realiza una contratación en masa, esta-
belece un contenido prefijado para todos los contratos de un determinado tipo
que en el ejercicio de la empresa se realicen.
A entidade emissora garante ao titular a aquisição de bens e serviços junto aos
estabelecimentos credenciados para pagamento posterior, pré-estabelecidos e no limite
concedido. Utilizar-se um crédito bancário quando não quitar a dívida integral no prazo
definido na assinatura do contrato de adesão, de forma que, este último direito, o titular
adquire no cartão de crédito bancário.
As administradoras de cartão de crédito costumam exigir dos clientes, a títulos
de manutenção do sistema, uma taxa anual, que geralmente poderá ser parcelada. Mas
na análise do código do consumidor dispõe que, a despesa decorrente do uso somente
pode ser cobrada em dois momentos distintos: na feitura do contrato de adesão e conse-
quente emissão do cartão, ou no respectivo vencimento de sua validade, caso contrário,
há ônus sem contraprestação correlata.
Além disso, tem a taxa de administração ou equivalente, referente à remuneração
da administradora pelos serviços de intermediação e garantidor do financiamento con-
seguido junto às instituições financeiras em nome do titular.
11
PICAZO, Luis Díez. Fundamentos de derecho civil patrimonial. Madri: Civitas. 1986, T1. p. 323.
20
As vantagens para o estipulante dos contratos de adesão são definidas em um
perfil definido por Chinchilla:12
En los que se emplean condiciones generales. Pridispuestas por el banco o
entidad financeira y ello porque además de otras ventajas conllevan para es-
tas entidades un efecto racionalizador, que podemos resumir en:
1.Una reducción de los costes de contratación: El empleo de las condiciones
generales permite simplificar y acelerar la celebratión: El empleo de las con-
diciones generales permite simplificar y acelerar la celebración de los contra-
tos, reduciendo los costes de negociación convirtiendo ésta en un processo
prácticamente automático una vez que hay acuerdo em la prestación y el pre-
cio.
2. Facilitación de la división de tarefas: al uniformar las condiciones de con-
tratación para todas las sucursales y agencias de una entidad, al conseguir re-
ducir las necessidades de personal jurídico especializado, y permitir dedicar
más recursos humanos en el personal comercial.
3. Facilita la coordinación en el seno de la propria empresa.
4. Possibilita el cálculo anticipado de los costes. Todo ello sin olvidar la se-
guridad jurídica que las condiciones proporcionan a las partes, pues a través
de ellas, se obtiene una reglamentación analítica, exhaustiva y clara que eli-
mina los motivos de incertidumbre, y con ellos las possibles controvérsias
que no harían sino aumentar la litigiosidad, aumentándose así, los costes a el-
la associados.
Todas as facilidades que dispõe no contrato de adesão são estabelecidas em re-
gras básicas para a utilização do cartão, dentre elas destacam-se: a utilização pessoal e
intransferível, dentro do limite de crédito concedido do cartão pelo seu titular; a forma
de utilização do cartão; o território de utilização do cartão; as consequências do inadim-
plemento da obrigação por parte do titular; os valores cobrados pelos serviços presta-
dos; a obrigação de informar sobre mudanças de dados pessoais; as causas de rescisão
de contrato, inclusive por denúncia unilateral por parte da emissora, no caso de inadim-
plemento; a autorização concedida à entidade emissora para representar o titular junto às
instituições financeiras, para financiar os valores de fatura não pagas em data aprazada;
a obrigação de comunicar à entidade emissora sobre a perda, furto ou roubo do cartão; e
a remuneração, caso seja feita cobrança extrajudicial do valor inadimplido.
A entidade emissora não se responsabiliza perante o titular em relação à quali-
dade e quantidade dos produtos ou serviços prestados por ele adquiridos através do uso
do cartão de crédito como forma de pagamento. Qualquer que seja o prejuízo do produ-
to ou serviço adquirido poderá ser reclamado diretamente junto ao fornecedor que res-
ponderá que será o único responsável.
12
CHINCHILLA, José Justo Navarro. Condiciones generales y cláusulas abusivas em La contratación
bancaria. In: Carol, Ubaldo Nieto ET al. Condiciones generales de La contratación y cláusulas abusivas.
Valladolid: Lex Nova, 2001, p. 535-536.
21
2.3.2 Contrato entre a entidade emissora e o estabelecimento filiado
Trata-se de contrato atípico em que o estabelecimento filiado se obriga a aceitar
o cartão de crédito como forma de pagamento, solicita a autorização da entidade emis-
sora, a realização de cada operação, e a conferir a assinatura postada no comprovante da
operação com a assinatura postada no cartão de crédito ou, na sua falta, em outro docu-
mento de identificação do titular.
A entidade emissora terá o dever de efetuar o pagamento das vendas ou do ser-
viço tomado pelo titular do cartão junto ao estabelecimento filiado no prazo determina-
do, salvo quando ocorrer vício na operação, como, por exemplo, operações realizadas
com cartão vencido, sem a autorização da entidade emissora, ou, por pessoa estranha à
pessoa do titular. Em contrapartida, a entidade emissora cobrará dos estabelecimentos
credenciados uma taxa, percentual sobre as vendas, como forma de remuneração dos
serviços por ela prestados.
A entidade emissora não assume perante o titular do cartão a responsabilidade de
garantir a quantidade e qualidade dos produtos por ele adquiridos junto aos estabeleci-
mentos credenciados. Dessa forma, também não poderá recusar-se a pagar aos estabele-
cimentos credenciados devidos a vícios nos produtos ou serviços por eles prestados,
salvo em previsão contratual nesse sentido.
A recusa quanto ao pagamento, normalmente, somente será feita quando houver
vício na transação realizada com o cartão de crédito.
2.3.3 Contrato entre o titular do cartão de crédito e o estabelecimento filiado
O contrato firmado entre o titular do cartão e os estabelecimentos credenciados é
um contrato de compra e venda ou de prestação de serviços. Conforme a peculiaridade
de pagamento de mercadorias adquiridas ou pelos serviços tomados pelo estabelecimen-
to filiado pela administradora de cartão e pelo titular à administradora de cartão.
As obrigações inerentes às relações de consumo persistem, mas o titular do car-
tão não estará obrigado ao pagamento para o fornecedor ou ao prestador de serviços.
Pode-se afirmar que o pagamento pelas mercadorias adquiridas ou pelos serviços toma-
dos pelo titular do cartão é um pagamento a prazo, posto que o estabelecimento filiado
22
irá receber seu crédito posteriormente à realização do negócio, em prazo pré-fixado en-
tre este e a administradora do cartão.
Para Simón13
o sistema contratual dos cartões é tratado com o enfoque em:
Una relación jurídica triangular por intermedio de la cual se legitima activa y
pasivamente al tenedor de la tarjeta para que el mismo pueda, sin abonar em
forma inmediata al ente emisor, adquirir bienes y/o servicios, em los comer-
cios adheridos al sistema , los cuales se benefician com el aumento de sus
ventas y los entes emisores perciben um porcentaje variable como utilidad
quedando a priori estos últimos obligados al pago respecto de los comércios.
A relação jurídica triangular abordada por Simón (1990) visa um benefício para
ambas as partes, tendo em vista que as empresas que aderem o sistema de pagamento se
beneficiam com o aumento de suas vendas, por outro lado, as administradoras de car-
tões recebem uma porcentagem pelas operações e o consumidor consegue ter um crédito
de forma rápida e imediata com a prerrogativa de fazer o pagamento no futuro.
Entretanto, devido à relação triangular firmada entre administradora de cartão,
titular e estabelecimento filiado, os efeitos do pagamento serão os mesmos do pagamen-
to à vista ao titular do cartão, posto que a ele seja dada quitação da obrigação de pagar
no momento em que assina o comprovante da efetivação da operação realizada com o
cartão de crédito.
2.3.4 Contrato entre a entidade emissora e a instituição financeira
O contrato firmado entre a entidade emissora e a instituição financeira ocorrerá
quando se tratar de cartão de crédito não bancário, em que a administradora de cartões é
uma sociedade não financeira e, ainda, quando o titular do cartão desejar financiar suas
compras ou sacar dinheiro com o cartão, ou quando o estabelecimento filiado resolver
receber os valores provenientes das vendas realizadas ou dos serviços prestados ao titu-
lar do cartão antes do prazo fixado entre este e a entidade emissora.
A administradora de cartão irá firmar com a instituição financeira um contrato
de abertura de crédito em nome do titular do cartão, em que o crédito será concedido de
forma rotativa, ou seja, à medida que for utilizado, será constituído o crédito em favor
da instituição financeira, que, consequentemente dará quitação à obrigação assumida
13
SIMÓN, Júlio. Tarjetas de crédito. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1990, p.64.
23
pelo titular e pela administradora de cartão na medida em que houver o pagamento total
ou parcial, reconstituindo o crédito em favor do titular.
De igual forma, se darão os contratos firmados entre a administradora de cartão
e a instituição financeira, na medida em que o estabelecimento filiado solicitar o paga-
mento do seu crédito antes do prazo fixado em contrato celebrado com a administradora
de cartão. O financiamento do estabelecimento filiado será necessário para antecipar o
valor do seu crédito e será remunerado pelo período compreendido entre a data da ante-
cipação e a data fixada para o pagamento do crédito pela administradora de cartão no
contrato firmado entre estes.
Os custos do financiamento obtido pela administradora de cartão em nome do ti-
tular ou do estabelecimento filiado serão repassados integralmente aos beneficiários.
Todavia, esses custos serão pagos pelos beneficiários (titulares ou estabelecimentos
credenciados) à administradora de cartão que os repassarão integralmente à instituição
financeira concedente.
Esse contrato não existirá no caso da administradora de cartão ser uma institui-
ção financeira, posto que a própria administradora financiará a dívida diretamente ao
titular do cartão ou ao estabelecimento filiado.
2.4 NATUREZA JURÍDICA DO CARTÃO DE CRÉDITO
Por total ausência no sistema tradicional de um instituto que se enquadre perfei-
tamente na complexidade do cartão de crédito, considera-se a sua natureza jurídica co-
mo sendo um sistema contratual sui generis.14
A natureza jurídica deste instituto é mista, assim como o contrato de cartão de
crédito é um contrato misto. É uma congregação de relações jurídicas complexas e con-
vergentes, integradas para a realização de um fim comum. A falta de qualquer uma des-
tas relações se torna, sem efeito, a existência das demais relações do instituto.
Destarte, o sistema de cartão de crédito pode ser considerado uma combinação
de contratos que tem como objetivo facilitar a aquisição de bens ou serviços. Sobre isso,
Filho15, expõe:
14
SILVA, Plácido. Vocabulário jurídico. 1998. Sistema. “Do grego traz o sentido de reunião, método,
juntura, exprime o conjunto de regras e princípios sobre uma matéria, tendo relações entre si, formando
um corpo de doutrinas e contribuindo para a realização de um fim.” p. 761.
24
Entendemos que o cartão de crédito configura em si mesmo um sistema ope-
rativo, constituído por diversas relações jurídicas cuja unidade se alcança e se
consuma na finalidade comum do instituto, muito difícil de enquadrar-se em
uma única natureza ou identidade jurídica.
No mesmo sentindo, para Fran Martins16, abordando o tema da natureza jurídica
dos cartões de crédito e em conclusão a suas explicações sobre os cartões de crédito
bancários é verificada a consonância à estrutura de um sistema:
Estudando-se, em conjunto, um sistema de cartões de crédito bancários, veri-
fica-se que há uma certa harmonia no mecanismo de funcionamento sem que
deixem de vigorar os contratos que estruturam o sistema. O elemento centra-
lizador dele é, como também já foi dito repetidamente, o organismo emissor
do sistema. Nos cartões de crédito bancários esse organismo pode ser um
banco, um grupo de bancos reunidos em associação, uma sociedade subsidiá-
ria de um banco ou uma sociedade autônoma a que estejam agregados vários
bancos.
Completando, Fausto Pereira de Lacerda Filho17, quanto ao cartão de crédito de
acordo com a concepção da natureza jurídica do cartão de crédito:
Sustentamos que o instituto do cartão de crédito deverá ser entendido como
um negócio jurídico complexo, conformado em uma unidade de relações ju-
rídicas originalmente diversas entre os seus intervenientes, onde cada qual
possui uma regulamentação e uma natureza jurídica própria, independente e
autônoma, mas que, por via de complementação que é própria e característica
do sistema, demonstram a ineficácia de cada uma delas se não forem integra-
das reciprocamente.
Portanto, o sistema contratual do cartão de crédito alude a um negócio jurídico
complexo, plurilateral, haja vista que é integrado por partes distintas possuidoras de
obrigações também distintas. É um contrato atípico, por não haver legislação que esta-
beleça as diretrizes para sua concretização. E é, ainda, um contrato de crédito, de ade-
são, e de consumo. Por ser de crédito em função de a administradora disponibilizar ao
titular, quantia possível de utilização; de adesão, de forma que tanto o titular quanto o
fornecedor aderem a um contrato pré-definido, unilateralmente, pela emissora; e de con-
sumo, considerando ser a administradora fornecedora e prestadora de serviços e os titu-
lares dos cartões destinatários finais.18
15
FILHO, Fausto Pereira Lacerda. Cartão de crédito. 1990, p. 99. 16
MARTINS, Fran. Op. cit. p. 197. 17
FILHO, Fausto Pereira Lacerda. Cartão de crédito. 1990, Op. Cit. p. 100. 18
MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, Op. cit. p.
512.
25
É certo que, no mercado globalizado, não se pode desprezar o elenco de caracte-
rísticas positivas dessa modalidade de formação contratual, consistentes na simplifica-
ção, celeridade e redução de custos nos negócios em massa.
Giordano19
sublinha a atividade econômica organizada do predisponente nessa
modalidade contratual, uma vez que:
La organización determina una limitación de la libertad contractual, en cuan-
to los contratantes individuales (adherentes) se encuetram frente a esquemas,
a formulários preestablecidos en los cuales está presente la organización
misma. La relación que suscita mediante el contrato de adhesión – si este es
encuadrado em su ambiente natural que es la empresa – aparece dirigida a un
objeto que colerea la causa del contrato: el ejercicio de uma actividad eco-
nómica organizada. Este objeto unitário ao cual son destinadas cada uma de
las relaciones individuales, no es un objeto común a ambas partes de la rela-
ción, porque una de ellas, el adherente no tiene como finalidad la explotación
de la empresa [...]. La actividad de la empresa es para el adherente el médio
para el logro del bien o del servicio que necesita.
Assim, acompanhando a corrente majoritária da doutrina do ramo de Direito
Empresarial sobre a natureza jurídica dos cartões de crédito, conclui-se que é um negó-
cio jurídico complexo que envolve vários contratos e partes diferentes, tornando-se um
sistema contratual único e sui generis, de forma que se torna um negócio jurídico que se
divide em três modalidades que serão abordadas no próximo tópico.
2.5 MODALIDADES DO CARTÃO DE CRÉDITO
Atualmente, existem três espécies de cartão de crédito: os cartões de credencia-
mento; os cartões de crédito bancários; e os cartões de crédito não bancários - definidos
de acordo com as relações jurídicas firmadas e com os direitos atribuídos aos titulares
dos cartões e estabelecimentos prestadores de serviços credenciados. A participação das
instituições financeiras também se faz presente nas relações firmadas com o uso do car-
tão de crédito, quando este se tratar da última espécie aqui mencionada, apesar da admi-
nistradora de cartão de crédito não se confundir necessariamente com a primeira.
É importante destacar que os cartões de débito, apesar de serem estudados e
acompanhados pela Associação Brasileira de Empresas de Cartão de Crédito e Serviços
– ABECS, não podem ser classificados como cartão de crédito, pois representa uma
19
GIORDANO, Alessandro. I contratti per adesione. Milano: Giuffrè, 1951, p. 31.
26
forma de pagamento à vista, em que a instituição financeira se compromete a pagar o
estabelecimento filiado, mediante a apresentação dos comprovantes da transação co-
mercial, cobrando, em contrapartida uma taxa de desconto sobre o valor da venda, re-
muneratória dos serviços prestados, debitando o valor gasto pelo titular diretamente da
conta corrente que este possuiu junto à instituição financeira emissora em tempo real -
no momento em que a transação comercial é efetuada, não havendo, portanto, concessão
de crédito aos seus titulares.
Podem-se classificar os cartões de crédito em cartões de crédito propriamente di-
tos e cartões de credenciamento. O cartão de credenciamento nada mais é do que uma
venda a prazo realizada pelo estabelecimento comercial emissor do cartão.
Esse estabelecimento comercial emite aos seus melhores clientes um cartão de
credenciamento, através do qual concede determinado crédito aos titulares desse cartão
para realizarem compras utilizando, como forma de pagamento, o indigitado cartão para
pagamento posterior de fatura emitida pelo estabelecimento com vencimento, normal-
mente, em 30 ou 40 dias contados da data de realização da compra de mercadorias ou da
utilização dos serviços por ele prestados.
Os cartões de credenciamento não são considerados verdadeiros cartões de cré-
dito, tais como utilizados hoje em larga escala no comércio. No mecanismo de utiliza-
ção existem apenas dois elementos, o emissor - que é também o vendedor e o beneficiá-
rio. As operações que se realizam com as interferências desses cartões são simples ven-
das a prazo ou a crédito, sendo o emissor o credor do comprador em virtude dessa ven-
da. O cartão só pode ser utilizado nos estabelecimentos do vendedor e as relações jurí-
dicas entre as partes se reduzem a uma venda a termo. A operação realizada entre o
emissor e o titular é uma simples operação de crédito pessoal, como, aliás, em todos os
contratos a prazo.20
Os cartões de crédito propriamente ditos podem ser classificados em cartões de
crédito bancários e não bancários.21
Os cartões de crédito não bancários são emitidos por instituições não finan-
ceiras, que buscam, pela administração de seu próprio sistema de cartões de
crédito, oferecer ao público em geral um instrumento para aquisição de bens
ou serviços, perante uma rede credenciada, com a possibilidade de pagamen-
to em prazo dilatado. Esses cartões, pois, não admitem que o seu emissor rea-
lize empréstimo bancário aos titulares de cartões de crédito.
20
MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 513. 21
RONGAGLIA, Marcelo Marques. Tributação no sistema de cartões de crédito. São Paulo: Quartier
Latin, 2004, p. 121.
27
Verifica-se nessa modalidade de cartão de crédito que uma sociedade não finan-
ceira utiliza de recursos próprios para conceder crédito aos seus titulares, comprometen-
do-se a pagar o valor das compras realizadas por estes aos estabelecimentos credencia-
dos, independente do adimplemento da obrigação assumida junto à administradora de
cartão pelos titulares.
O mecanismo utilizado nas transações comerciais realizadas com os cartões de
crédito bancários como forma de pagamento, não se difere do mecanismo utilizado com
os cartões de crédito não bancários. Entretanto, além dos benefícios concedidos aos titu-
lares do cartão de crédito não bancário, os portadores do cartão de crédito bancário terão
ainda a prerrogativa de financiar o valor por eles despendido com compras e serviços no
vencimento da fatura, caso não disponham ou não desejem dispor de recursos para qui-
tá-la integralmente.
Neste caso, os titulares poderão optar pelo pagamento mínimo descrito na fatura
e financiarão o restante. Sobre o financiamento, os titulares do cartão de crédito bancá-
rio pagarão uma taxa de juros definida pela instituição financeira contratada, além de
uma taxa de administração ou taxa de garantia cobrada pela administradora do cartão de
crédito bancário, quando a pessoa desta não se confundir com a pessoa da instituição
financeira.
Os cartões de crédito bancário poderão ainda conceder aos seus titulares a prer-
rogativa de sacar dinheiro, utilizando-se do cartão em agências ou máquinas próprias da
instituição financeira emissora ou parceira da administradora de cartão. Em alguns ca-
sos, dependendo do contrato firmado entre entidade emissora e titular do cartão, poderá,
este, parcelar suas compras, mediante pagamento de taxa de juros remuneratória à insti-
tuição financeira que lhe concede o crédito.
Cumpre esclarecer que o que caracteriza o cartão de crédito como sendo um car-
tão de crédito bancário não é o fato da sociedade emissora ser ou não uma instituição
financeira, mas a possibilidade de saque de dinheiro e de financiamento do crédito.
Uma sociedade não financeira pode ser a emissora e administradora do cartão de
crédito bancário. Todavia, os recursos utilizados para financiar o crédito dos titulares do
cartão por ela ofertados serão captados junto a instituições financeiras parceiras. Neste
caso, a administradora de cartão firma contrato com o titular em que este a autoriza ex-
pressamente a captar recursos junto à instituição financeira em seu nome, repassando ao
28
mesmo tempo a taxa de juros cobrada pela instituição financeira que concede o financi-
amento.
2.6 AS PARTES NO CARTÃO DE CRÉDITO
A indústria de cartões de pagamento se organiza de maneira complexa, sendo
que os agentes que atuam neste setor podem ser assim elencados: os proprietários das
plataformas (popularmente conhecido como "bandeiras"); os emissores ou administra-
dores (bancos); os usuários do cartão ou portadores; os credenciadores; e os estabeleci-
mentos comerciais (vendedores).22
A empresa detentora da plataforma de pagamento, mais conhecida como bandei-
ra, é aquela que detém a marca do cartão e a tecnologia, plataforma para que as transa-
ções sejam operadas pelos emissores e credenciadores. Considerando que esta empresa
somente fornece a plataforma para que o pagamento possa ser efetuado por meio de um
cartão, ela não mantém qualquer relação jurídica com o usuário do cartão, nem com o
estabelecimento comercial.
É bastante comum a confusão causada pelo logotipo da bandeira estampado nos
cartões de pagamento. Muitos acabam entendendo que, por esta razão, a bandeira tam-
bém deve ser responsabilizada pelos eventuais problemas sofridos pelo consumidor. No
entanto, vale observar que a marca da bandeira aparece no cartão somente como forma
de indicar ao estabelecimento comercial credenciado que ele deve aceitar aquele cartão
como forma de pagamento. Ou seja, a medida serve justamente para evitar constrangi-
mentos ao portador do cartão.
O banco emissor é o administrador do cartão de pagamento que irá contratar
com o consumidor o produto cartão de pagamento. O emissor é responsável pela habili-
tação, identificação e autorização, liberação de limite de crédito ou saldo em conta cor-
rente, fixação de encargos financeiros, cobrança de fatura e definição de programas de
benefícios.
O usuário do cartão de crédito ou portador é aquele que utiliza o serviço de pa-
gamento por meio de cartão oferecido pelo emissor. Ao efetuar o pagamento de produ-
tos e serviços adquiridos junto aos estabelecimentos comerciais credenciados, ele rece-
22
Secretaria de Direito Econômico, Banco Central do Brasil e Secretaria de Acompanhamento Econô-
mico. Relatório sobre a Indústria de Cartões de Pagamentos.
29
berá, na data estipulada, uma fatura no valor correspondente ao total de produtos e ser-
viços adquiridos naquele período. Logo, estabelece relação jurídica somente com o ban-
co emissor e com os estabelecimentos comerciais nos quais realiza suas compras.
O credenciador é o responsável pela afiliação dos estabelecimentos. Isto signifi-
ca que é com os credenciadores, e não com a bandeira ou com o banco emissor, que os
estabelecimentos comerciais firmarão contrato. Ademais, é ele o responsável por pagar
ao estabelecimento comercial os valores dos produtos e serviços adquiridos pelo usuário
do cartão. Ou seja, problemas na "maquininha" do cartão podem ser resolvidos pelo
credenciador.
Por conseguinte, existem os estabelecimentos comerciais, que são aqueles que
oferecem seus produtos e serviços aceitando o cartão como forma de pagamento. Para
isso, eles devem ser afiliados, pelas credenciadoras, a uma ou mais bandeiras. Como
mencionado acima, para eles, são muitas as vantagens em aceitar os cartões de paga-
mento: menor risco de inadimplência, facilidade para o cliente no pagamento, o que
proporciona maior competitividade.
A parte mais forte nas relações dos cartões de crédito são as plataformas, popu-
larmente conhecidas como as bandeiras, pelo fato de elas acabarem monopolizando o
mercado dos cartões por serem as grandes legisladoras dessas relações comerciais, ten-
do em vista que estas bandeiras são as responsáveis por ditar as regras dos mercados de
cartões de crédito que carecem de legislação.
2.7 O AVANÇO NO USO DOS CARTÕES DE CRÉDITO
O avanço no uso do cartão de crédito, que segundo a Associação Brasileira das
Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (ABECS) passou de 48% em 2008 para 53%
em 2011, está diretamente ligado ao aumento da inadimplência das outras formas de
pagamento.23
Até pouco tempo, ao parcelar uma compra, o consumidor constantemente recor-
ria aos cheques e boletos bancários, modalidades de pagamento que não dão garantias
ao empresário. Com isso, um número cada vez maior de estabelecimentos comerciais
23
ABECS – Associação Brasileira de Cartões de Crédito e Serviços. Disponível em: <
http://www.abecs.org.br/site2012/abecs.asp>. Acesso em: 3 set. 2012.
30
opta por arcar com a porcentagem cobrada pelas administradoras, que varia de 2,5% a
5%. Para evitar prejuízos, os cheques são cada vez menos aceitos. A ABECS apresenta
que as transações efetuadas com esta forma de pagamento recuaram de 7%, em 2008,
para 3%, em 2011.
A ABECS projeta que, até o final deste ano de 2012, 193,2 milhões de cartões
de crédito devem estar no mercado, o que supera a população brasileira estimada em
190.732.694, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).24
A expansão da ferramenta desencadeia naturalmente um aumento da inadim-
plência. Mas a tendência é que, com o passar do tempo, o crescimento seja menos ex-
pressivo, pois tanto administradoras quanto consumidores devem controlar melhor as
emissões e o uso, respectivamente.
É importante destacar que a alta da inadimplência, sobretudo via "dinheiro de
plástico", não significa necessariamente o início de uma crise. Além disso, ressalta-se
que o crédito facilitado ainda é algo recente para a classe média em ascensão. Assim, a
partir do momento que sua utilização passa a fazer parte do cotidiano, a população deve
aprender a empregá-lo de maneira mais consciente.
Além disso, dois fatores estreitam a relação entre inadimplência e "dinheiro de
plástico": acessível e conveniente, ele chega à casa do consumidor muitas vezes sem
sequer ser solicitado, embora tal prática seja proibida por lei. Existe, por parte dos ban-
cos, uma ampla oferta de cartões e não acredito que a inadimplência em alta tenha como
consequência direta a redução imediata do número de emissões.
As contas em atraso, muitas vezes, não são suficientes para inibir as instituições
financeiras, devido aos encargos que recaem sobre aqueles que atrasam o pagamento ou
optam pelo pagamento mínimo - de 15%. Pesquisa da Associação Nacional dos Execu-
tivos de Finanças, Administração e Contabilidade (ANEFAC)25
revela que a taxa média
de juros do cartão se manteve em 10,69% entre fevereiro de 2010 e junho de 2012, a
mais alta dentre as linhas de financiamento. Em seguida, aparece outra bastante requisi-
tada, o cheque especial, 8,22% ao mês.
As duas linhas de crédito mais fáceis, cartão de crédito e cheque especial, são
também as que têm as maiores taxas. Com isso, o consumidor, principalmente aquele
24
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/estimativa2012/default.shtm>. Acesso em: 4 set.
2012. 25
ANEFAC - Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade.
Disponível em: <http://www.anefac.com.br/Pages/Default.aspx>. Acesso em: 4 set. 2012.
31
que nunca teve acesso ao crédito e tem mais necessidades de consumo, passa a comprar
por impulso e se embola em uma quantidade de prestações que não consegue quitar.
O avanço no uso dos cartões de crédito é um elemento de integração econômica,
no qual possibilita ao consumidor a obtenção de crédito gerando movimentação na eco-
nomia e consequentemente um desenvolvimento para a sociedade.
32
3 TÍTULOS DE CRÉDITO
3.1 A ORIGEM DO CRÉDITO
O uso do crédito, em sentido amplo, é tão antigo quanto à sociedade organizada,
mas, na acepção comercial, pecuniária, pressupõe-se a existência de uma economia pre-
dominantemente monetária.
A expansão do crédito pelo mundo merece cuidados por parte dos legisladores,
nesse complexo cenário internacional, dominado pelo contexto da globalização e pela
desfronteirização do crédito. Essa expansão se cosntitui em uma temática de grande
relevância para a economia mundial. Na visão de Fran Martins:26
Surgiu assim, o crédito como elemento novo a facilitar a vida dos indivíduos
e, consequentemente, o progresso dos povos.
A utilização do crédito somente se tornou universal após a Revolução Industrial,
quando a tecnologia da produção, distribuição e consumo adquiriram grande complexi-
dade. O desenvolvimento da indústria e do comércio depende de financiamentos que,
muitas vezes, não podem ser prontamente atendidos. O crédito desempenha importante
missão no sentido de proporcionar as condições necessárias para que se efetive essa
evolução.
O dinheiro é um instrumento de troca por excelência, e o que caracteriza a ope-
ração creditória é a troca de um valor presente por um valor futuro. O traço característi-
co do crédito está na espera do produto novo, que irá substituir o produto vendido ou
emprestado. Temos, então, dois elementos fundamentais que decorrem da troca de um
valor presente e atual por um valor futuro: a confiança e o tempo.
A confiança conquistada por uma pessoa no ânimo daquela de quem se vai tor-
nar devedor, em virtude da entrega atual da coisa, se transformará em prestação futura,
portanto a confiança fundamenta o próprio conceito de crédito, em seu aspecto econô-
mico.
26
MARTINS, Fran. Títulos de crédito, atualizada por Joaquim Penalva Santos. Ed. Forense. 2009, p. 3.
33
O tempo constitui o prazo, o intervalo, o período que medeia entre a prestação
presente e atual, e a prestação futura. O crédito é o meio pelo qual aqueles que não dis-
põem de dinheiro conseguem obter produtos e serviços.
A utilização do crédito evidenciou o problema da circulação dos direitos creditó-
rios. A união patrimônio e pessoa, em que o patrimônio é um acessório da pessoa - caso
esta contraia dívidas - a obrigação pecuniária assumida em tempos passados fica sem
solução, uma vez que a própria pessoa deve cumpri-la.
A origem etimológica da palavra crédito é derivada do latim Creditum, Credere
(confiar, emprestar dinheiro); daí o crédito importa um ato de fé e de confiança do cre-
dor. Em sua acepção econômica, significa a confiança que uma pessoa deposita em ou-
tra, a quem entrega coisa sua para que, em futuro, receba coisa equivalente. Túllio Asca-
relli27
marca um importante início de fase da circulação do crédito:
A faculdade que tem o titular de um direito de crédito de transferir esse direi-
to a outra pessoa, juntamente com o documento que a incorpora, marcou re-
almente o início de uma fase importantíssima para a economia dos povos que
é a de circulação do crédito.
Na obra “Teoria geral dos títulos de crédito”, Ascarelli (1969) entende que a
contribuição do Direito Comercial na formação da economia moderna visa mobilizar o
mundo nas próprias riquezas através dos títulos de crédito; graças a eles, o Direito con-
segue vencer o tempo, transportando, com maior facilidade, representadas nesses títulos,
as possíveis riquezas futuras.
3.2 INTRODUÇÕES AOS TÍTULOS DE CRÉDITO
Foi na Idade Média que surgiu os títulos de crédito, com o surgimento da letra
de câmbio como o estágio inicial dos títulos. Foi, portanto, com a finalidade de permitir
a circulação de riquezas que surgiram os títulos de crédito28
.
A definição de títulos de crédito comporta pouquíssima discussão entre os dou-
trinadores, uma vez que em esmagadora maioria, adotam-se os mestres a célebre formu-
lação de Vivante29
- considerada perfeita - que definiu o título de crédito como:
27
ASCARELLI, Tullio. Teoria geral dos títulos de crédito. 2ª edição. Ed. Saraiva, 1969, p.221. 28
MARTINS, Fran. op. cit. Ed. Forense. 2009, p. 4.
34
Um documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele
mencionado.
Pela definição do mestre italiano, o título de crédito é um documento, material,
corpóreo, donde concluir-se pela clássica definição, que na inexistência de documento,
igualmente inexistirá título de crédito.
Ainda pela definição de Vivante (1937), o direito incorporado no documento é
literal, portanto, predomina-se o fato de só valer o que está escrito. A autonomia apre-
goada na mesma definição, diz respeito à independência das obrigações, no sentido de
que ulteriores partícipes do título de crédito, mediante o endosso, não têm vínculo com
as obrigações já estabelecidas. Dessa forma, ainda hoje prevalece no cenário acadêmico
a quase intocável definição do Professor Italiano, tanto que em alguns países passou a
constituir como princípio legal.
É o que ocorre, por exemplo, com o Código Civil Brasileiro, que se pronuncia
no art. 88730
como, in verbis:
O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e au-
tônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da
lei.
Sem ousar desqualificar a definição de títulos de crédito dada por Vivante
(1937), a questão que se apresenta é de avaliar a atualidade da definição. De concreto,
registra-se que a doutrina aplaude de forma majoritária o conceito apresentado, e, em
alguns países, acolhe-se o conceito do mestre italiano como princípio legal.
Os títulos de crédito, conforme definição de Cesare Vivante, incorporado em vá-
rias legislações, inclusive no Código Civil Brasileiro, permite o exercício do direito lite-
ral e autônomo nele contido, significa-se dizer que o título incorpora uma obrigação. É
certo que as obrigações podem ser representadas por instrumentos jurídicos diferentes.
Para bem contextualizar a assertiva anterior, vale-se do exemplo apresentado pelo pro-
fessor Fábio Ulhoa Coelho31
.
29
VIVANTE, Cesare. Trattato di diritto commerciale, vol. III, p.63. Julga-se conveniente transcrever o
original: “Il títolo di credito è um documento necessário per esercitare il diritto letterale ed autonomo che
vi è mencionato”. 30
Art. 887 do Código Civil - Lei 10.406, promulgada em 10 de janeiro de 2002, em vigor desde 11 de
Janeiro de 2003. 31
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 4ª edição. São Paulo: Ed. Saraiva, 2009, p.
205-206.
35
No seu exemplo, o professor paulista utiliza a hipótese de um ato ilícito, origina-
do de um dano à propriedade alheia provocado por alguém com seu automóvel, obri-
gando-o a indenizar os prejuízos decorrentes. Neste contexto, os envolvidos ao estarem
de acordo quanto à existência e a extensão do dano, poderão representar a obrigação por
um título de crédito, seja cheque, nota promissória ou letra de câmbio.
Por outro lado, se não estiverem concordes quanto à existência da obrigação e
mesmo, com a sua extensão, a obrigação de indenizar estará condicionada a uma sen-
tença judicial que imponha este ônus àquele que causou o dano. Quis o professor, com
este exemplo, assentar que uma mesma obrigação pode ser representada por instrumen-
tos jurídicos diferentes, cuja solução, acrescenta-se, dependerá de circunstâncias deter-
minadas, inclusive em nível de discernimento das partes envolvidas.
No exemplo acima, caso a solução fosse a emissão de um título de crédito (nota
promissória, cheque, letra de câmbio) teria um documento cambial, cuja legislação pro-
cessual confere a natureza de título executivo extrajudicial, o que vale dizer que inde-
penderia de prévia constituição judicial do título. A segunda hipótese demandaria a pro-
positura de uma ação judicial, que prevê primeiro, obter a constituição de um título exe-
cutivo, a sentença, para então, permitir a ação de execução.
Como preleciona Carvalho de Mendonça32
, os traços predominantes dos títulos
de crédito são:
A negociabilidade e força que adquirem com a boa fé do possuidor.
Entre as duas categorias de documentos, o credor de um título de crédito, em que
é considerado a natureza executiva extrajudicial que a lei lhe confere e a facilidade de
circulação, através do endosso e da simples entrega do documento representativo do
crédito, está dispensado da burocracia típica dos atos civis.
3.3 CARACTERÍSTICAS DOS TÍTULOS DE CRÉDITO
A formalização dos títulos de crédito, assim como nos demais atos de declaração
de vontade, conforme recomenda a cautela jurídica, ocorre pela via documental. A fina-
lidade de tal postura é, em essência, a formação da prova. Neste sentido, de acordo com
32
MENDONÇA, J. X. Carvalho de. Tratado de Direito Comercial Brasileiro, 6.ed. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1963. p. 55.
36
a concepção clássica dos títulos de crédito, o formalismo, ou o rigor cambiário, como se
convencionou chamar, constitui fator preponderante para a existência do título.
Destarte, cada espécie de título (letra de câmbio, nota promissória, cheque, du-
plicata), para que tenha validade jurídica, deverá conter determinados requisitos expres-
samente enumerados em lei.
O apego ao formalismo está diretamente relacionado à segurança que se quer
transmitir, por exemplo, na circulação do título de crédito através da via cambiária pró-
pria, que é o endosso.
O formalismo transforma a natureza do título de um simples escrito, em um do-
cumento válido, abstraindo-se de sua causa. Portanto, as características formais dos títu-
los de crédito se encontram estabelecidas nos respectivos textos legislativos disciplina-
dores de cada espécie, sendo, ainda, importante aspecto a ser observado na materializa-
ção jurídica do instrumento, não obstante as mudanças tecnológicas verificadas nos úl-
timos anos. Daí porque a premissa estampada nos textos legais de que os documentos
que não revestirem a forma exigida, não têm o valor de título de crédito.
3.4 OS PRINCÍPIOS DOS TÍTULOS DE CRÉDITO
São três os princípios que informam o regime jurídico cambial responsável pela
dinâmica e celeridade do crédito: cartularidade, literalidade e autonomia. Valem-se dos
ensinamentos do mestre Rubens Requião33
, que bem acentuou a definição dos referidos
princípios, in verbis:
a) Literalidade. O título é literal porque sua existência se regula pelo teor de
seu conteúdo. O título de crédito se enuncia em um escrito, e somente o que
está nele inserido se leva em consideração; uma obrigação que dele não cons-
te, embora sendo expressa em documento separado, nele não se integra.
b) Autonomia. Diz-se que o título de crédito é autônomo (não em relação à
sua causa como às vezes se tem explicado), mas, segundo Vivante, porque o
possuidor de boa fé exercita um direito próprio, que não pode ser restringido
ou destruído em virtude das relações existentes entre os anteriores possuido-
res e o devedor. Cada obrigação que deriva do título é autônoma em relação
às demais.
c) Cartularidade (documento necessário). O título de crédito se assenta, se
materializa, numa cártula, ou seja, num papel ou documento. Para o exercício
do direito resultante do crédito concedido torna-se essencial a exibição do
documento. O documento é necessário para o exercício do direito de crédito.
33
REQUIÃO, Rubens, Curso de Direito Comercial. 19ª ed. São Paulo, Editora Saraiva, v. 1, 1989, p.
291 -292.
37
Sem a sua exibição material não pode o credor exigir ou exercitar qualquer
direito fundado no título de crédito. Vivante, com esse conceito, substitui o
vulgar, que combate, pelo qual se afirma que o direito está incorporado ao tí-
tulo.
Destaca-se que o princípio da cartularidade se concentra na figura do documen-
to, ou seja, o papel (cártula) que irá representar a obrigação relacionada ao título de cré-
dito. O princípio da autonomia se concentra na figura da transferência e circularidade do
título de pagamento, enquanto que o princípio da literalidade consiste em representar o
que está expresso na cártula. Neste contexto, Waldirio Bulgarelli34
, assim se manifesta,
in verbis:
A cartularidade, também chamada de incorporação, notadamente pelos auto-
res espanhóis modernos, como Broseta Pont e Rodrigo Uria, e pelo nosso
Eunápio Borges, e que consiste, em última análise, na materialização do di-
reito, no documento. Daí se dizer que o direito se incorpora ao documento,
expressão empregada até mesmo por Cesare Vivante. A expressão cartulari-
dade ou direito cartular (de chartula, do baixo latim) é empregada para signi-
ficar tanto a incorporação do direito ao documento, como o direito decorrente
do título em relação ao negócio fundamental, chamado por isso mesmo, o ne-
gócio subjacente, de relação extracartular (na Espanha, extracartacea). Assim,
deve-se ter presente que um negócio qualquer, quando gera a emissão de títu-
lo de crédito, passa a ser, perante o título, negócio ou relação extracartular,
enquanto o título se apresenta como cártula. Pelo direito cartular, o documen-
to torna-se essencial à existência do direito nele mencionado, e necessário pa-
ra a sua exigência, tornando-se legítima a cobrança pelo titular que o adquiriu
regularmente (função de legitimação). Portanto, em decorrência da incorpo-
ração do direito no título:
a) quem detenha o título, legitimamente, pode exigir a prestação;
b) sem o documento, o devedor não está obrigado, em princípio, a cumprir a
obrigação.
A literalidade é a medida do direito contido no título. Vale, assim, o docu-
mento pelo que nele se contém, exprimindo, portanto, a sua existência, o seu
conteúdo, a sua extensão, e a modalidade do direito nele mencionado.
A autonomia é requisito fundamental para a circulação dos títulos de crédito.
Por ela, o seu adquirente passa a ser titular de direito autônomo, independente
da relação anterior entre os possuidores. Em conseqüência, não podem ser
oponíveis ao cessionário de boa fé as exceções decorrentes da relação extra-
cartular, que eventualmente possam ser opostas ao credor originário.
Como se vê, pela compreensão dos mestres citados, para que o credor possa
exercitar os direitos representados por um título de crédito, é indispensável que se en-
contre na posse do documento. Esta é a razão pela qual Vivante (1937) adotou no seu
conceito a expressão documento necessário para o exercício do direito nele contido.
A cartularidade, ou documento necessário, foi à alternativa encontrada pelos
comerciantes da Idade Média para conferir segurança às relações mercantis. A cártula,
34
BULGARELLI, Waldirio. Títulos de Crédito. 11ª edição. São Paulo: Atlas, 1995, p. 58-59.
38
em verdade, passou a substituir os acordos verbais, fazendo com que os comerciantes
passassem a dispor de um meio material para provar a existência do crédito.
O princípio da literalidade tem o condão de manifestar que o conteúdo do título
encontra-se nele expresso, valendo dizer que não está no mundo o que nele não está
escrito. Sendo assim, incorpora-se ao documento (cártula) o próprio direito de crédito,
dando-lhe um caráter constitutivo.
Waldemar Ferreira35
atribui à literalidade a responsabilidade por conferir liqui-
dez, certeza e segurança aos títulos de crédito. Pela liquidez que a literalidade confere
ao título, em observação ao valor nele expresso, em que pode ser transformado em di-
nheiro, com certeza e segurança.
Tullio Ascarelli36
diz que:
É essa exigência de certeza e de segurança que o título de crédito satisfaz,
certeza na existência do direito, segurança na sua realização.
Já o princípio da autonomia manifesta a independência das relações cambiárias,
ou seja, o direito do proprietário de um título de crédito, desde que tenha circulado, não
tem qualquer vínculo com a relação antecessora. Neste ponto, embora mereça entendi-
mentos ou classificações diversas por parte da doutrina, podemos atribuir ao princípio
da autonomia, as consequências próprias da abstração e da inoponibilidade das exce-
ções.
No primeiro caso, a consequência jurídica da abstração, refere-se à causa que
deu origem à obrigação representada pelo título, na medida em que este se desprende
dessa causa, pode circular sem necessidade de investigações a seu respeito, satisfazendo
a segurança e a certeza do negócio.
A consequência jurídica da autonomia quanto à inoponibilidade das exceções
pessoais a terceiros de boa-fé, delimita, processualmente, as matérias passíveis de serem
opostas pelo devedor de um título de crédito executado. Ou seja, não é lícito ao devedor
opor exceções de natureza pessoal àquele contra quem não estabeleceu relação direta.
Falando sobre a inoponibilidade das exceções, sustenta o professor Fran Mar-
tins37
, verbis:
35
FERREIRA, Waldemar. Tratado de direito comercial. São Paulo: Editora Saraiva. v. 8/9, 1963. p. 90. 36
ASCARELLI, Tullio. op. cit. p. 5 37
MARTINS, Fran. Títulos de crédito. São Paulo: Editora Forense. Vol. 1, 3ª edição, p. 17-18.
39
Decorrência do princípio da autonomia das obrigações cambiárias (cada
obrigação é autônoma e independente, não ficando sua validade subordinada
a uma outra obrigação – donde se concluir que cada obrigado se obriga não
apenas com a pessoa a quem transfere o título mas com o portador do mes-
mo, seja ele quem for), surgiu a regra chamada da inoponibilidade das exce-
ções. Por essa regra, consagrada no art. 17 da Lei Uniforme, o obrigado em
uma letra não pode recusar o pagamento ao portador alegando suas relações
pessoais com o sacador ou outros obrigados anteriores do título (por exem-
plo, não pode o obrigado recusar o pagamento alegando que é credor do sa-
cador). Tais exceções ou defesas são inoponíveis ao portador, que fica, sem-
pre, assegurado quanto ao cumprimento da obrigação pelo obrigado.
Vivante (1937) explicou que a autonomia de um título está no fato de que o pos-
suidor pode exercê-la como se fosse decorrência de um direito originário, em razão da
inoponibilidade de exceções que garante.
Para Carvalho de Mendonça:38
O direito próprio conferido ao legítimo possuidor, não lhe podendo, portanto,
ser oposta pelo devedor excepções deduzidas das suas relações com os pos-
suidores precedentes.
Os princípios cambiários, conquanto possam merecer classificações outras pelos
tratadistas, constituem importantes balizadores do direito cambiário, pois se conside-
rarmos que a função econômica dos títulos de crédito é exercitada, fundamentalmente,
através da circulação, uma vez dotados destas garantias, assegura-se a circulação pronta
e segura, contribuindo não só para o desenvolvimento e celeridade da atividade comer-
cial, mas, sobretudo, preservando ou buscando preservar a ética nos negócios. Na visão
de Nelson Abrão:39
A circulação, no consenso unânime dos doutrinadores, tem sido apontada
como característica essencial dos títulos de crédito.
Novamente Tullio Ascarelli40
, sobre circulação dos créditos, leciona que:
O máximo de rapidez e de simplicidade no transmiti-lo a vários adquirentes
sucessivos, com o mínimo de insegurança para cada adquirente que deve ser
posto, não só em condições de conhecer pronta e eficazmente aquilo que ad-
38
MENDONÇA, J. X. Carvalho de. op. cit., p. 50-1. 39
ABRÃO, Nelson. Cibernética e títulos de crédito Revista de Direito Mercantil, Industrial, Eco-
nômico e Financeiro. São Paulo, v. 19, 95-97, 1975,, p. 95. 40
ASCARELLI, Tullio. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. 2ª edição. São Paulo Ed. Saraiva, 1969.
p.7.
40
quire, mas, também, a salvo das exceções cuja existência não lhe fosse dada
notar, facilmente, no ato de aquisição.
Os princípios da cartularidade, da literalidade e da autonomia são fundamentais
para a segurança relacionada aos títulos de crédito, no qual eles são estudados de forma
aprofundada pela doutrina e previsto na legislação dos títulos de crédito, tema que será
abordado no próximo tópico.
3.5 A LEGISLAÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO
O estudo e a prática dos títulos de crédito dependem sobremaneira dos textos le-
gais que tratam da Letra de Câmbio41
, mesmo considerando que as várias espécies de
títulos sejam detentores de legislação própria. É que naqueles textos42
se encontram os
princípios norteadores do direito cambiário, e, por isso, aplicáveis aos demais títulos,
sempre que os respectivos textos apontarem lacunas ou deficiências.
Tal dependência pode ser explicada pelo fato de ter sido a Letra de Câmbio o
mais importante dos títulos de crédito, mormente com a finalidade de mobilização do
crédito. Diz-se ter sido, porquanto, nos dias atuais, notadamente no Brasil, esta espécie
de cambial ter perdido o seu espaço, pelo menos nos negócios mais populares.
De qualquer modo, inegável que, nos primeiros tempos, desde o surgimento dos
títulos de crédito, o uso em larga escala da Letra de Câmbio fez com que sobre ela fos-
sem concentradas as atenções legislativas. É por esta razão que qualquer manual que
explore o estudo dos títulos de crédito recomenda o conhecimento aprofundado da Lei
Cambiária, ou da Letra de Câmbio.
As quatro espécies de títulos de crédito a seguir elencados constituem o que de
mais importante se tem nesta área do Direito Brasileiro. Apontamos, igualmente, os
respectivos textos legais:
Letra de câmbio e nota promissória – Decreto 2.044, de 31/12/1908, alte-
rado pelo Decreto 57.663, de 24/01/1966 – Lei Uniforme de Genebra;
41
Consiste a Letra de Câmbio em uma ordem dada, por escrito, a uma pessoa, para que pague a um bene-
ficiário indicado, ou à ordem deste, uma determinada importância em dinheiro. 42
Decreto 2.044, de 31 de dezembro de 1908, alterado pelo Decreto 57.663, de 24 de janeiro de 1966, que
introduziu a Lei Uniforme de Genebra no sistema jurídico brasileiro.
41
Cheque – Decreto 57.595, de 07/01/1966 – Lei Uniforme de Genebra – e
Lei 7.357, de 02/09/1985;
Duplicata comercial e de serviço – Lei 5.474, de 18/07/1968;
É importante destacar que além da legislação interna para regular a matéria rela-
cionada aos títulos de crédito, o tema em estudo também foi objeto de legislação inter-
nacional para sua padronização e uniformização por meio de convenções internacionais.
3.6 CONVENÇÕES INTERNACIONAIS
O Brasil aos sete dias do mês de junho do ano de 1930, juntamente com mais
vinte e três países, firmou um pacto, a qual veio a consagrar-se mundialmente, sendo
vigente até hoje, destinado a regular as relações creditícias.
Essa convenção recebeu o nome da cidade aonde foi celebrada, no caso, Gene-
bra, ensejando a criação de uma lei uniforme com vista à regulação de emissão, da for-
ma, do endosso, do aceite, do aval, do vencimento, do pagamento, da cobrança, por par-
te de terceiros, das alterações e da prescrição concernente à letra de câmbio e a nota
promissória.
No ano seguinte, em 19 de Março de 1931, firmaram-se mais três Convenções,
igualmente em Genebra, sobre lei uniforme, e conflitos de leis em matéria de cheques.
O Governo Brasileiro se fez representar na conferência diplomática de 1930, tendo sido
parte signatária das Convenções então elaboradas. Quanto às Convenções de 1931, ape-
nas manifestou a sua adesão.
Em 8 de setembro de 1964, o Congresso Nacional aprovou, com o decreto legis-
lativo n. 54, as seis Convenções Genebrinas, que vieram a ser promulgadas pelos decre-
tos executivos n. 57.595, de 7 de Janeiro de 1966 (Lei Uniforme em matéria de Che-
ques); e 57.663, de 24 de Janeiro de 1966 (Lei Uniforme em matéria de Letras de Câm-
bio e Notas Promissórias).
A necessidade de uniformização das regras referentes aos títulos de crédito, par-
ticularmente da letra de câmbio, decorre do fato de que a cambial:43
43
STRENGER, Irineu. Direito Internacional Privado, 4ª edição. São Paulo: LTr, 2000.p. 847.
42
Sendo um instrumento de crédito destinado à circulação, atravessa durante
sua existência muitos países, nos quais origina diversos atos, como endosso,
aceitação, aval, que por sua vez são fontes de múltiplas relações entre as pes-
soas que concorrem para a sua realização.
A legislação atinente a letra de câmbio e nota promissória é fonte de solução pa-
ra as lacunas ou deficiências apresentadas por outros textos legais que regulam títulos
de crédito no Brasil, de forma que a mesma contempla os princípios norteadores do di-
reito cambial. Segundo o professor Irineu Strenger:44
O regulamento internacional da cambial é movido por três critérios funda-
mentais que, pode-se dizer, são universalmente reconhecidos, seja no campo
doutrinário, seja naquele da codificação positiva. As divergências se referem
geralmente, a questões especiais:
a) A obrigação cambiária não é senão uma categoria da obrigação comercial
e, portanto, os lineamentos principais de sua construção devem ingressar no
quadro geral dos princípios fixados nos ordenamentos internos.
b) A relação cambiária, considerada seja na origem, seja nos vários momen-
tos de seu desenvolvimento, resolve-se em uma cadeia de obrigações (emis-
são, endosso, aval) vinculadas uma à outra, mas, tendo cada qual natureza e
fisionomia própria. Convém, pois, decompô-la em seus vários momentos, nas
simples obrigações que essa dá origem sucessivamente, aplicando à discipli-
na de cada uma os princípios do direito internacional privado, que a lei do fo-
ro fixou para as obrigações comerciais.
c) O princípio ora indicado, da independência das simples obrigações cambi-
árias, vai subordinado à condição de que elas correspondam a uma obrigação
válida. A independência subsiste em uma cambial válida, mas não em um tí-
tulo originariamente nulo. Convirá, pois, ainda, respeitando suas sucessivas
operações cambiárias a qualidade de negócio futuro autônomo, relacioná-lo à
lei originária do título, com o propósito de avaliar se possui os requisitos ne-
cessários para desenvolver validamente sua vida futura.
Com a promulgação das Leis Uniformes, Decretos 57.595 e 57.663, criou-se
uma polêmica entre os comercialistas brasileiros, destacando que o Brasil já dispunha
de legislação sobre letra de câmbio, nota promissória e cheque, os Decretos 2.044 (letra
de câmbio e nota promissória) e 2.591 (cheque). A polêmica residia exatamente no fato
de que:45
Entendiam alguns que a Lei Uniforme prevalecia como direito interno, sobre
as regras cambiais existentes em nosso ordenamento; outros sustentavam que,
sendo a Lei Uniforme relativa ao comércio internacional, somente com ele se
relacionavam.
44
STRENGER, Irineu. op. cit., p. 848-849. 45
STRENGER, Irineu. op. cit., p. 850.
43
Todavia, com a promulgação das Leis Uniformes, indene de dúvidas que estas
ingressaram em nosso ordenamento jurídico, e suas normas passaram a ter aplicação
imediata. Além do que, como registra o professor Strenger:46
O Supremo Tribunal Federal em sequentes julgamentos tem confirmado sua
orientação no sentido de que as leis uniformes genebrinas estão introduzidas
em nosso direito interno e revogam as disposições do Decreto n. 2.044, de 31
de dezembro de 1908 e do Decreto n. 2.591, de 7 de junho de 1912, que esti-
verem em desacordo com suas normas.
Destaca-se que o Brasil assinalou determinadas reservas quanto à adesão às
Convenções Genebrinas, em que se denota que, em relação àquelas matérias reservadas,
permitia-se o signatário introduzir parcialmente no ordenamento interno o texto da Lei
Uniforme.
Considerando que a matéria objeto das reservas não foi disciplinada por outro
texto legislativo, comunga-se da parcela doutrinária que entende vigorante, nestes casos,
os dispositivos do Decreto 2.044, de 1908, relativamente à Letra de Câmbio e Nota
Promissória, mesmo porque, relativamente ao cheque, o novo texto legal (Lei n. 7.357,
de 02/09/85) é harmônico com a Lei Uniforme (Decreto 57.595).
3.7 A POLÊMICA SOBRE A VIGÊNCIA DA LUG COMO INTEGRANTE DO DI-
REITO INTERNO BRASILEIRO
A internalização da LUG - Lei Uniforme de Genebra - no ordenamento jurídico
brasileiro foi tema de várias discussões no cenário do Direito Internacional e principal-
mente do Direito Comercial no que concerne ao poder legítimo para determinar o início
da vigência da LUG no Brasil. Embora não seja objeto desta dissertação a discussão da
incorporação dos tratados no ordenamento pátrio brasileiro, é importante destacar que a
competência para reconhecer a validade das convenções e tratados internacionais é do
Congresso Nacional. Fábio Ulhoa Coelho47
, por sua vez, complementa essas ideias,
afirmando que:
46
Idem. 47
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. São Paulo. Ed. Saraiva. 2009. p 125.
44
A via escolhida, em 1966, para fazer valer a Convenção de Genebra no direi-
to brasileiro, não era a tecnicamente a correta. O Decreto nº 2.044/08 possui
status de lei ordinária, e sua revogação não pode ocorrer por meio de simples
Decreto do Poder Executivo, mas apenas por outra lei.
Desse modo, o meio adequado seria o envio de um projeto de lei ao Poder Legis-
lativo. O grande conflito da questão estava relacionado à vigência da LUG enquanto
integrante do direito interno pátrio, visto que após a promulgação do Decreto Executivo
nº 57.663, surgiram, em relação à doutrina e a jurisprudência, uma série de dúvidas
acerca da afirmativa de que a LUG estaria ou não em vigor, e se estaria o Decreto 2.044
de 1908 revogado ou não.
No tocante a esse impasse e em face a tamanha controvérsia, achou-se necessá-
rio que o próprio Poder Executivo fosse acionado, de modo que emitisse um parecer
definitivo sobre a aplicação ou não da lei uniforme. Essa consulta foi dirigida à consul-
toria Geral da República, o qual se posicionou pela adoção da lei uniforme, revogando-
se, consequentemente, o Decreto 2.044.
Malgrado todos os esforços realizados para se chegar a um denominador co-
mum, a oitiva do Poder Executivo não foi suficiente, já que alguns consideravam o pa-
recer como meramente opinativo, e não vinculativo. Desse modo, continuaram a existir
flagrantes desrespeitos a lei uniforme como, por exemplo, as letras de câmbio ao porta-
dor.
Finalmente, passados quarenta e um anos desde a adesão a Convenção de Gene-
bra, o Supremo Tribunal Federal tomou uma decisão, ficando esclarecido, definitiva-
mente, que as disposições presentes na legislação ordinária, antagônicas ao disposto da
LUG estariam revogadas. Portanto, a partir desse momento, não havia mais motivos
para a não aplicação da Lei Uniforme, cuja titularidade no tocante à regulação dos títu-
los de crédito no Brasil era indubitável, sendo aceita a aplicação do Decreto 2.044/08
em casos de lacunas.
3.8 A CODIFICAÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL
A busca da codificação do Direito Internacional, tarefa desenvolvida especial-
mente pela ONU – Organização das Nações Unidas -, é consequência da transformação
verificada pelos Estados em suas relações, antes marcada pelos costumes, hoje, diante
45
da complexidade e intensidade com que se desenvolve o intercâmbio entre os países,
marcada pelo formalismo e, no mais das vezes, pela minuciosa descrição dos direitos e
deveres inerentes a cada integrante do cenário mundial organizado.
A codificação consistiria, em palavras muito objetivas, na transformação de
normas costumeiras em normas escritas, com as modificações e aperfeiçoamentos que
estas últimas reclamam, sobretudo, valendo-nos da observação do professor Jacob Do-
linger48
na afirmação em que:
[...] daquelas instituições jurídicas que atuam, total ou parcialmente, no plano
internacional, como a compra-e-venda, os títulos de crédito, os transportes, as
comunicações, a propriedade industrial e intelectual e todas as atividades
humanas naturalmente extraterritoriais.
Dentre os propósitos e atribuições da ONU, estabelecidos no Estatuto da Orga-
nização, um deles consiste exatamente em promover estudos e recomendações visando a
codificação do Direito Internacional, cujo objetivo, evidentemente, é tornar as relações
mais equânimes e uniformes, alcançando-se, com essa postura, menos conflitos e, por
conseguinte, a manutenção da paz e a observância aos princípios da convivência pacífi-
ca. Nesse sentido, a organização mantém sua estrutura em órgãos específicos para essa
finalidade, sem olvidarmos de outros organismos citados pelo internacionalista Dolin-
ger49
, in verbis:
Na elaboração do Direito Internacional Privado Uniformizado recorrem ao
comparativismo jurídico todos os órgãos internacionais que trabalham em
prol desta uniformização, como a Conferência de Direito Internacional Priva-
do da Haia, o UNIDROT50
e os órgãos especializados das Nações Unidas,
principalmente a UNCITRAL – Comissão das Nações Unidas para o Direito
do Comércio Internacional51
. Estas entidades preparam minuciosos questio-
nários dirigidos aos países membros sobre a matéria que se objetiva regular
por meio de uma convenção internacional. As respostas indicam as possibili-
dades de se conseguir concessões suficientes para formular um projeto de
convenção aceitável a todos ou a parte considerável dos países participantes.
Neste particular, não se discute que a legislação cambiária é fruto de uma Con-
venção para Adoção de uma Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Promissó-
48
DOLINGER, Jacob. Direito Internacional Privado. 6ª edição, p. 37. 49
DOLINGER, Jacob, op. cit., p. 47. 50
UNIDROT- International institute for the unification of private law institut international pour l'unifica-
tion du droit prive. É o Instituto Internacional para a Unificação do Direito Privado. Disponível em:
<http://www.unidroit.org/dynasite.cfm>. Acesso em: 25 set. 2012. 51
UNCITRAL (United Nations Commission on International Trade Law – Comissão das Nações Unidas
sobre Direito do Comércio Internacional) é o órgão das nações unidas encarregado da padronização
mundial do Direito do Comércio Internacional. Disponível em:
<http://www.uncitral.org/english/text/eletcom/ml-ec.htm>. Acesso em: 25 set. 2012.
46
rias, convenção esta que prevê, inclusive, a possibilidade de revisão de suas disposições,
in verbis:52
Decorrido um prazo de 4 (quatro) anos da entrada em vigor da presente Con-
venção, qualquer membro da Sociedade das Nações ou Estado não-membro
ligado à Convenção poderá formular ao secretário-geral da Sociedade das
Nações um pedido de revisão de algumas ou de todas as suas disposições. Se
este pedido, comunicado aos outros membros ou Estados não-membros para
os quais a Convenção estiver em vigor, for apoiado dentro do prazo de 1
(um) ano por seis, pelo menos, dentre eles, o Conselho da Sociedade das Na-
ções decidirá se deve ser convocada uma conferência para aquele fim.
Porque pertinente com o tema proposto, a influência da informática nos princí-
pios cambiários, registra-se a existência de movimentos visando a regulamentação do
comércio eletrônico, cujo exemplo concreto é a Lei Modelo da UNCITRAL - Comissão
das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional, que será abordada com mai-
ores cuidados no capítulo do comércio eletrônico.
3.9 O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO E OS TÍTULOS DE CRÉDITO
O Código Civil Brasileiro - a Lei nº 10.406, promulgada em 10 de janeiro de
2002 - que entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003, apresenta mudanças em vários
pontos do ordenamento jurídico relativo aos atos civis. O diploma tem por característica
a unificação do Direito Privado Brasileiro, uma vez que abrange, além de matéria civil,
matéria de Direito Comercial, pois revoga a Parte Primeira da Lei nº 556, de 1850, o
nosso Código Comercial.
A unificação do Direito Privado ocorre nos moldes em que foi efetuado no Có-
digo Civil Italiano, de 1942. Com a nova lei, volta-se a discutir o secular tema da auto-
nomia do Direito Comercial, que atormenta os estudiosos do Direito Privado, não obs-
tante há várias tentativas com a finalidade de unificar as regras desses dois campos do
Direito.
Muitos tratadistas consideram o Direito Comercial subordinado ao Direito Civil.
Outros estudiosos sobre o assunto e que são maioria no desate desta controvérsia, con-
52
Art. 9 da Convenção para Adoção de uma Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias
– Dec. 57.663, de 24 de janeiro de 1966.
47
sideram o Direito Comercial autônomo em relação ao Direito Civil, além dos pontos de
contato já que ambos pertencem ao ramo do Direito Privado.
Considerando que não existe o propósito de se aprofundar no tema objeto de dis-
cussão entre comercialistas e civilistas, qual seja, a unificação do Direito Privado, mas
apenas registrar o fato por razões didáticas, permite-se nessa análise colher a sempre
serena opinião de Requião53
sobre a questão, na certeza de que ela reflete o pensamento
majoritário da doutrina, in verbis:
A controvérsia doutrinária sobre a unificação do direito privado deixou de ser
simples tema de debate acadêmico, para se tornar o mais atual e sério pro-
blema do direito brasileiro. Aceleraram-se, nos últimos tempos, as tendências
da unificação, sobretudo após a Revolução de 1964, com o envio, pelo Go-
verno ao Congresso Nacional, do Projeto de Código de Obrigações (Projeto
n. 3.264/65), posteriormente retirado para melhores estudos. A reforma dos
Códigos brasileiros não objetivava, na verdade, a unificação do direito priva-
do, como se procedeu na Itália, sob a codificação única. Propendíamos, com
os duplos projetos, para o sistema suíço, com um Código Civil e um Código
de Obrigações autônomos. Agora, na fase atual da reforma, pretende o Go-
verno a unificação formal do direito civil e do direito comercial, enfeixando-
os num código único, sob o título de Código Civil.
[...]
É preciso não esquecer, porém, que a doutrina unificadora não foi determina-
da pelo direito civil. Foi, assim, conseqüência da crescente influência do di-
reito comercial, provocada pela sua decidida invasão e domínio sobre o direi-
to civil. Atuais, por isso, as agudas observações do Prof. Inglez de Souza, que
acompanharam o Projeto de 1912: „O direito mercantil, progressista e huma-
no, destacando-se do antigo direito comum para atender às necessidades
crescentes do desenvolvimento do tráfico entre os homens, moldando as no-
vas instituições pelo espírito igualitário e democrático dos comerciantes, não
pode retrogradar por amor à unidade; é o direito civil que se funde, por assim
dizer, no comercial, influenciando por sua vez pelo interesse social que prima
ao individual. É irrelevante, afinal, para o direito comercial, que a matéria
seja tratada num código autônomo ou em um só código, formalmente unifi-
cado. Isso já o dissera luminosamente o Prof. Alfredo Rocco: „Ora, que as
normas concernentes ao comércio e as concernentes à vida civil estejam con-
tidas em um ou em dois códigos não é coisa que tenha grande importância
sob o ponto de vista científico. O direito comercial poderia permanecer um
direito autônomo e, portanto, a ciência comercial uma ciência jurídica autô-
noma, ainda que as normas do direito comercial estivessem contidas em um
código único, conjuntamente com as do direito civil das obrigações‟.
Na mesma linha de reflexão de Requião (1989), entende-se como irrelevante que
a matéria atinente ao Direito Privado seja tratada em um único código. Mesmo porque,
matérias como o direito cambial, falimentar, societário, pertencentes à área do Direito
Comercial, continuarão a ser regidas por leis especiais. Ademais, a revogação da pri-
meira parte do Código Comercial de 1850 pelo novo Código Civil não significa, neces-
53
REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 19ª ed. São Paulo, Editora Saraiva, v. 1, 1989. p.
19, 20-21.
48
sariamente, o fim da autonomia didática do Direito Comercial. A unificação legislativa,
por si só, como diz o Prof. Alfredo Rocco, não tornaria o Direito Comercial menos au-
tônomo ou independente.
De qualquer modo, não se pode perder de vista que uma das tarefas da ciência
do Direito é dar regulamentação jurídica aos fatos sociais e econômicos, missão esta que
não tem sido desempenhada a contento, ou seja, os acontecimentos sociais estão sempre
muito avançados, vindo o Direito objetivo à reboque das inovações, muito tardiamente.
É necessário considerar que em pouco tempo a legislação unificada possa estar
obsoleta, necessitando de constantes atualizações, especialmente no Direito Comercial,
em que os fatos econômicos sofrem modificações de maneira muito rápida.
O diploma traz profundas modificações com a unificação das obrigações civis e
mercantis. Em substituição ao Código Comercial de 1850, um novo capítulo é introdu-
zido na codificação, disciplinando a vida do empresário e das empresas. Trata-se do
“Direito de Empresa”, cuja definição de empresário se encontra assim ditada pelo art.
96654
: “Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade
econômica organizada para a produção ou a circulação de bens e serviços”.
Concomitantemente, temos a nova disciplina geral dos títulos de crédito, dispos-
ta no título VIII, abrangendo os arts. 887 a 926, divididos em 4 capítulos, que são:
“Disposições gerais” (art. 887-903); “Do título ao portador” (art. 904-909); “Do título à
ordem” (art. 910-920); e “Do título nominativo” (art. 921-926). No art. 887, o legislador
do Código Civil de 2002 assume a definição de Cesare Vivante55
, segundo o qual o títu-
lo de crédito é o “documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele
contido”.
Em linhas gerais, os artigos 887 a 896 tratam da emissão, transferência e circula-
ção dos títulos; os artigos 897 a 900 tratam do aval; os artigos 901 e 902 tratam do pa-
gamento dos títulos; o art. 903 estipula que “salvo disposição diversa em lei especial,
regem-se os títulos de crédito pelo disposto neste Código”; os artigos 904 a 909 cuidam
do título ao portador; os artigos 910 a 920 cuidam do título à ordem e; os artigos 921 a
926 tratam do título nominativo.
A doutrina nacional começa a se manifestar em relação ao Título VIII do novo
Código Civil, especialmente em relação ao disposto no artigo 903, já que este estabelece
54
Artigo 966 do Código Civil - Lei 10.406, promulgada em 10 de janeiro de 2002, em vigor desde 11 de
Janeiro de 2003. 55
VIVANTE, Cesare. Trattato di diritto commerciale, op. cit., p. 63.
49
que as regras do novo Código somente serão aplicadas quando não houver lei especial,
e, como já anotado em linhas passadas, os títulos de crédito são regulados por leis espe-
ciais.
Em relação a este ponto especificamente, vejamos a observação do professor
Manoel Justino Bezerra Filho:56
A primeira crítica que se poderia fazer ao novo Código diz respeito ao fato de
se ter perdido a oportunidade para unificar a legislação cambial, o que pode-
ria ter sido tentado pela inserção no Código de toda a legislação internalizada
pela Convenção de Genebra, resolvendo-se de uma vez por todas as terríveis
dificuldades, quase intransponíveis, que se apresentam ao estudioso dos títu-
los de crédito. Com efeito, já que o novo Código Civil mantém em vigor toda
a legislação especial, poder-se-ia perguntar qual foi então a utilidade de suas
normas que só se aplicarão de forma subsidiária, parcamente subsidiária.
Waldírio Bulgarelli ressalta a extrema dificuldade que se apresenta ao estudi-
oso quando se depara com esta confusão legislativa já existente, lembrando a
vigência simultânea das leis próprias a cada título cambial, da lei geral das
cambiais (Dec. 2.044/1908), de ambas as Leis Uniformes (Convenção de Ge-
nebra), além de resoluções, circulares, portarias etc. Pois bem, a tais dificul-
dades acresce-se agora mais uma, com a promulgação do novo Código Civil,
outro texto legal sobre a mesma matéria, já tão farta e confusamente legisla-
da.
Conclui o professor:57
Enfim, melhor teria sido que relativamente aos títulos de crédito se procedes-
se como foi feito com relação à sociedade anônima, a qual, segundo o art.
1.089 do novo Código Civil, continua regida por lei especial, aplicando-se,
nos casos omissos, as disposições do Código; ou ainda o que ocorreu com a
legislação falimentar, sobre a qual não há menção no Código; ou também
com relação à segunda parte do Código Comercial, mantida em vigor pelo
art. 2.045 do texto de 2002. Talvez, melhor ainda teria sido que o novo Códi-
go Civil não entrasse em vigor.
Com o devido respeito a opinião do professor Manoel Justino, nesta análise, há
uma discordância quanto a suas ideias em relação ao novo Código Civil, ao regular de
forma geral sobre os títulos de crédito, causará a confusão por ele apregoada, a ponto de
sugerir a não vigência do novo diploma. Ora, os títulos regidos por leis especiais conti-
nuarão a ser regidos por elas, nada mais, mesmo porque, não se vislumbra, em exame
preliminar, profundas incompatibilidades entre as disposições do Código Civil e a legis-
lação cambiária em vigor.
E quando houver incompatibilidade, haverá de prevalecer a lei especial, pois, a
nossa legislação cambiária é fundada em convenções internacionais e, nestes casos, a lei 56
FILHO, Manoel Justino Bezerra. Dos títulos de Crédito – Exame crítico do título VII do Livro I da
Parte Especial do novo Código Civil. Revista dos Tribunais, nº 798; 103-109, 2002. 57
FILHO, Manoel Justino Bezerra op. cit., p. 109.
50
posterior não pode revogar ou alterar lei anterior oriunda de ato internacional, sem a
prévia denúncia feita pelo Poder Executivo58
, observando-se que no Brasil, garante-se
tratamento paritário entre os tratados e as leis nacionais e diplomas de grau equivalen-
te.59
Propõe-se com o novo Código, nesta análise, positivar uma Teoria Geral dos Tí-
tulos de Crédito, de modo a acolher as constantes transformações a que essa área do
Direito está sujeita, quer em face do número variável de títulos que a compõe, quer em
face às influências do comércio nacional e internacional. Neste contexto, divergem os
doutrinadores, em que alguns defendem a construção de uma teoria geral e de uma dis-
ciplina uniforme interna; outros a consideram desnecessária e de difícil elaboração.
O que resta claro no contexto, é a deficiência legislativa dos inúmeros diplomas
legais que cuidam dos títulos de crédito, ante a prática exagerada da técnica remissiva à
legislação cambial, dificultando a atuação do intérprete.
Exemplo manifesto desta situação é o da duplicata mercantil – título de crédito
mais utilizado na atividade empresarial –, que não obstante ter merecido um tratamento
mais aprimorado pela Lei 5.474. Ainda assim é insatisfatória legislativamente no tocan-
te às remissões. Vejamos o teor da Lei: “Art. 25. Aplicam-se à duplicata e à triplicata,
no que couber, os dispositivos sobre emissão, circulação e pagamento das letras de
câmbio.”
O exemplo apresentado é suficiente a recomendar uma disciplina geral para os
títulos de crédito, justamente para suprimir as confusões de interpretação. É a proposi-
ção, salvo melhor juízo, do Título VIII do novo Código Civil, um conjunto de regras, de
caráter geral, aplicável a todos os títulos de crédito que não sejam regulados por lei es-
pecial, ou quando esta contiver lacunas.
Com esta sistemática, a disciplina dos títulos de crédito passa a ter um conjunto
homogêneo de preceitos gerais, que conferirão organicidade ao sistema, nada obstante
às opiniões científicas em sentido contrário.
Importante observar, ademais, que o novo Código Civil adota o princípio da li-
berdade de criação e emissão de títulos de crédito, abandonando o sistema de numerus
clausus, ou seja, admitindo a figura dos títulos atípicos ou inominados. É o que resulta
das normas do Título VIII, do Livro I, da Parte Especial.
58
ROSA JÚNIOR, Luís Emídio F. da. Direito cambiário. 2. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1984. p.
30. 59
REZEK, J.F. Direito Internacional Público, 8 ed. São Paulo : Saraiva, 2000.p. 97.
51
Inicialmente, convém esclarecer que títulos atípicos ou inominados seriam aque-
les documentos não previstos objetivamente na legislação, mas compreendidos nos
princípios reguladores dos títulos típicos ou nominados.
Exemplos de títulos nominados seriam aqueles popularmente conhecidos, como
a letra de câmbio, nota promissória, duplicata, cheque, dentre outros, porque regulados
por textos específicos. Os dispositivos do Código Civil que contemplam, de forma mais
contundente, o princípio da liberdade de criação dos títulos atípicos são:60
Deve o título de crédito conter a data da emissão, a indicação precisa dos di-
reitos que confere, e a assinatura do emitente. § 1º É à vista o título de crédito
que não contenha indicação do vencimento. § 2º Considera-se lugar de emis-
são e de pagamento, quando não indicado no título, o domicílio do emitente.
§ 3º O título poderá ser emitido a partir dos caracteres criados em computa-
dor ou meio técnico equivalente e que constem da escrituração do emitente,
observados os requisitos mínimos previstos neste artigo.
Ora, não fosse a intenção do legislador permitir o uso de títulos atípicos, razão
inexistiria para estabelecer, conforme o fez no artigo 889, os requisitos que o título de
crédito deve conter. Isto porque, os textos legais que cuidam dos títulos nominados,
letra de câmbio, nota promissória, cheque, duplicata, estabelecem os requisitos que refe-
ridos títulos devem apresentar para serem considerados títulos de crédito. Neste ponto,
de bom alvitre marcar uma vez mais a disposição61
contida no artigo 903: “Salvo dispo-
sição diversa em lei especial, regem-se os títulos de crédito pelo disposto neste Código”.
O que haverá de regular-se pelo disposto no Código? Exatamente os títulos atípicos e,
de forma supletiva, as eventuais lacunas que os textos especiais – aqueles que regulam
os títulos nominados – apresentarem.
A liberdade de criação de títulos de crédito atípicos é princípio presente em di-
versos ordenamentos, quer no sistema romano-germânico, como da common law, em
que é verificado uma tendência à negação do sistema de numerus clausus.
É o que sustentava, por exemplo, o Professor Mauro Rodrigues Penteado62
,
quando analisava o então projeto do Código Civil, in verbis:
[...] Atentou-se, assim, para a tendência atual e irreversível, verificada sobre-
tudo no campo empresarial, de tornar mais célere e fácil a assunção e a circu-
60
Art. 889 do Código Civil – Lei 10.406, promulgada em 10 de janeiro de 2002, em vigor desde 11 de
Janeiro de 2003. 61
Art. 903 do Código Civil - Lei 10.406, promulgada em 10 de janeiro de 2002, em vigor desde 11 de
Janeiro de 2003. 62
PENTEADO, Mauro Rodrigues Títulos de Crédito no Projeto de Código Civil, Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, v. 100/24-ss, 1995.
52
lação de direitos e obrigações, o que será propiciado, como se viu, por essa
categoria intermédia de documentos. Que terão, no Projeto, apoio e corretivo,
como esclarece a sua exposição justificativa: „apoio, porque terão maior força
jurídica do que os créditos de direito não-cambiário, embora menor força do
que os títulos regulados em leis especiais, como a letra de câmbio e a nota
promissória; corretivo, porque se evitarão títulos sem requisitos mínimos de
segurança, os quais ficarão desautorizados pelo Código Civil‟. O intento de-
clarado foi, portanto, o de (1º), fixar os requisitos mínimos dos títulos de cré-
dito – art. 891 do Projeto e (2º), permitir a criação de títulos de crédito atípi-
cos ou inominados, com menos vantagens em relação aos títulos de crédito
típicos, reconhecidos em leis especiais. Com base no princípio da livre inicia-
tiva, pedra angular da ordem econômica (Constituição de 1988, arts. 1º e
170), visou-se desembaraçar a atuação e criatividade do meio empresarial
(„deixando assim aberta a porta às necessidades econômicas e jurídicas do fu-
turo‟, como diz o projetista), que está nas raízes do próprio instituto, originá-
rio, como sabido, da praxe mercantil, consolidada num primeiro momento
nos estatutos corporativos, para, ao depois, receber a sanção do direito esta-
tal. A criação de títulos inominados ou atípicos, que, entre nós, conta com a
opinião favorável de juristas do porte de Carvalho de Mendonça e Pontes de
Miranda, é largamente admitida no Direito italiano.
Para concluir estas considerações acerca do Título VIII do Código Civil, que,
obviamente não se teve o condão de promover uma análise crítica, senão fazer o registro
da nova disciplina legal, faz-se uma pequena observação em relação ao § 3º, do art.
88963
leciona que: “... § 3º O título poderá ser emitido a partir dos caracteres criados em
computador ou meio técnico equivalente e que constem da escrituração do emitente,
observados os requisitos mínimos previstos neste artigo”.
Há quem sustente, com suporte naquele parágrafo, que o novo diploma discipli-
nou o título escritural ou digital. É o que diz, por exemplo, Rodney de Castro Peixoto:64
Embora o disposto no art. 889 do Novo Código Civil se refira a títulos de
crédito, de maneira genérica, é na duplicata que presenciamos sua aplicabili-
dade mais importante e efetiva. Pela primeira vez, „caracteres criados em
computador‟, vale dizer, bits e bytes, constam em um codex de tamanha im-
portância e abrangência, o que caracteriza os novos rumos tomados pela soci-
edade com a utilização da tecnologia da informação. A duplicata digital rece-
be previsão legal. Nada muda no processamento da duplicata nas transações
cotidianas. Todos os dias milhares de títulos são gerados em sistemas infor-
máticos e cobrados da mesma maneira. Entretanto, merece destaque o fato da
letra da lei abrigar, de maneira inédita e contundente, o título de crédito gera-
do digitalmente, pacificando a matéria entre os doutrinadores e cercando de
eficácia o conjunto probatório nascente da utilização de dados unicamente
lógicos para a formalização de título de crédito.
Ainda, Maria Bernadete Miranda65
, acrescenta ao registrar que:
63
Art. 889 -§ 3º do Código Civil – Lei 10.406, promulgada em 10 de janeiro de 2002, em vigor desde 11
de Janeiro de 2003. 64
PEIXOTO, Rodney de Castro. O Novo Código Civil e a Duplicata Digital. Disponível em:
<http://conjur.uol.com.br/view.cfm?id=12683&print=yes>. Acesso em: 6 de jul. 2012.
53
No § 3º do art. 889 do novo Código, encontramos os títulos eletrônicos ou
escriturais, que são aqueles criados a partir dos caracteres em computador ou
outro meio técnico equivalente e que constem de escrituração do emitente.
É prematuro afirmar que a letra fria daquele dispositivo possa resultar na pacifi-
cação da discussão em torno do título de crédito eletrônico entre os doutrinadores.
Acredita-se que o legislador pretendeu, objetivamente, admitir a emissão do título inde-
pendente de padronização, desde que observados os demais requisitos do artigo 889.
Observamos que títulos de crédito como o cheque e a duplicata são padronizados pelo
Poder Público.66
Mesmo porque, caso tivesse tratado efetivamente do título digital ou escritural,
deveria, igualmente, ter disciplinado a assinatura digital, coisa que não fez, pois como
se observa do caput do art. 88967
, “Deve o título de crédito conter a data da emissão, a
indicação precisa dos direitos que confere, e a assinatura do emitente”. Claro que se
poderia cogitar de que a assinatura ali prevista poderá ser inclusive a digital.
3.10 A RELAÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO COM O AVANÇO DA TECNO-
LOGIA
No discorrer do desenvolvimento desta dissertação verificou-se a importância do
crédito na história econômica da humanidade, e que, desde os primórdios, teve como
objetivo ampliar e acelerar as transações comerciais entre as pessoas. Os títulos de pa-
gamento surgiram como forma de superar inconvenientes do comércio de outrora, espe-
cialmente o relativo à segurança; à grande distância entre os pontos de produção e de
comercialização dos produtos e; ainda, a diversidade de moedas que circulavam.
A aceitação deste tipo de documento levou os juristas a conceberem princípios
que os caracterizam até os dias atuais. Nesta perspectiva, é importante destacar a refe-
rência ao conceito clássico e ainda vigente do comercialista italiano Cesare Vivante68
,
65
MIRANDA, Maria Bernadete O Título de Crédito Eletrônico no novo Código Civil. Disponível em:
<http://www.saraivajur.com.br/printa>. Acesso em: 18 jul. 2012. 66
REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, vol. 2, 18ª edição, p. 458. 67
Art. 889 do Código Civil – Lei 10.406, promulgada em 10 de janeiro de 2002, em vigor desde 11 de
Janeiro de 2003. 68
VIVANTE, Cesare. Trattato di diritto commerciale, op. cit., p.63.
54
de que o título de crédito é um “documento necessário para o exercício do direito literal
e autônomo nele mencionado”.
Deste conceito foram extraídos clássicos princípios embasadores da teoria geral
dos títulos de crédito, como a: cartularidade, autonomia e literalidade. Destaca-se que a
legislação cambiária é fruto de convenções internacionais, pela razão lógica de que o
comércio, sobretudo nos dias atuais, constitui-se na essência deste processo convencio-
nalmente chamado de “globalização”. Na verdade, desde sempre o comércio fora glo-
balizante, influenciado e intensificado na atualidade pelos sofisticados mecanismos de
intermediação, dentre eles, os da informática.
De qualquer sorte, o objetivo de se considerar a legislação internacional, deve-se
ao fato de que eventual necessidade de mudanças legislativas, por conta da informatiza-
ção dos negócios, haverá de se dá, também, no plano internacional, ante a necessidade
de uniformização das regras referentes aos títulos de crédito, pois, conforme registrado,
ao fazermos especial referência à letra de câmbio, dada a sua importância histórica:69
Sendo um instrumento de crédito destinado à circulação, atravessa durante
sua existência muitos países, nos quais origina diversos atos, como endosso,
aceitação, aval, que por sua vez são fontes de múltiplas relações entre as pes-
soas que concorrem para a sua realização.
O Código Civil Brasileiro no capítulo específico dispensado por aquele diploma
aos títulos de crédito, ressaltando a pretensa unificação das obrigações civis e mercantis.
Diz-se pretensa porque o código não tratou de toda a matéria comercial, pois muitos
institutos continuarão a ser regidos por legislações próprias, dentre eles, os títulos de
crédito.
Na verdade, o Código Civil, a Lei 10.406, consolidou uma disciplina geral para
os títulos de crédito, concebendo a liberdade de criação de títulos de créditos, abando-
nando o sistema de numerus clausus, ou seja, admitindo a figura dos títulos atípicos ou
inominados.
A teoria cambiária em face da evolução tecnológica aborda o Direito Cambiário
dentro de uma nova fase, marcados pela decisiva influência dos modernos e sofisticados
meios de informática nos negócios, inclusive, é certo, por aqueles realizados através de
títulos de crédito.
69
STRENGER, Irineu. Direito Internacional Privado. 4ª edição. São Paulo: LTr, 2000. p. 847.
55
Os títulos representativos de crédito, que surgiram como documentos físicos ne-
cessários, atualmente, no auge da era da informática, encontram-se em declínio. O do-
cumento materializado em papel, além de circular de uma forma menos ágil, indubita-
velmente é um meio extremamente dispendioso, se considerarmos o atual modelo eco-
nômico reinante no globo, marcado pela intensificação das movimentações financeiras,
indiferente, no mais das vezes, as fronteiras e, sobretudo, buscando incessantemente o
aumento de lucros e a diminuição de despesas.
A tecnologia invadiu o cotidiano das pessoas, alterando e reduzindo significati-
vamente o uso de documentos físicos e substituindo pelos documentos virtuais. Até
mesmo o uso do papel-moeda, instrumento indispensável nos negócios, vem sofrendo
de algum tempo a substituição por mecanismos informatizados, a exemplo do cheque e
a moeda eletrônica.
Como instrumentos de mobilização do crédito, surgidos na Idade Média, primei-
ramente através da Letra de Câmbio – é o que sustenta a doutrina –, apontasse como
característica principal dos títulos de crédito o seu efeito circulatório, no sentido de faci-
litar e permitir o envolvimento de maior número de empreendedores.
É o que deixa assentado, por exemplo, Nelson Abrão70
, citando Vivante, Asca-
relli e Eunápio Borges. Em vista do conteúdo trazido por aqueles tratadistas nas citações
do Professor Abrão, vale a transcrição:
Circulação dos créditos, vale dizer – o máximo de rapidez e de simplicidade
no transmiti-los a vários adquirentes sucessivos, com o mínimo de inseguran-
ça para cada adquirente que deve ser posto, não só em condições de conhecer
pronta e eficazmente aquilo que adquire, mas, também, a salvo das exceções
cuja existência não lhe fosse dado notar, facilmente, no ato da aquisição (As-
carelli, Teoria Geral dos Títulos de Crédito, 1969, pág. 7). Materializando-se
em um pedaço de papel, estruturando o título de crédito, o direito dotou a
economia dos meios necessários à circulação fácil e segura do crédito (Euná-
pio Borges, Títulos de Crédito, 1971, pág. 9).
Não obstante a importância do fenômeno da circulação na vida dos títulos de
crédito ver-se-á que a mesma vem perdendo espaço na atividade econômica, constata-
ção que se dá, sobremaneira, com a intermediação cada vez mais sofisticada das insti-
tuições financeiras no processo negocial, cuja prática, no mais das vezes, consiste em
encerrar o processo circulatório do título, ou seja, raramente as instituições financeiras
negociam os títulos de crédito que chegam às suas carteiras.
70
ABRÃO, Nelson. Cibernética e Títulos de Crédito. Revista de Direito Mercantil nº 19, p. 95-97.
56
Assim, sem desconsiderar a importância que os títulos de crédito desempenha-
ram ao longo dos séculos e que, indubitavelmente, continua a desempenhar, o fato é que
este instrumento, tal como tradicionalmente concebido, encontra-se em processo de de-
cadência, motivado fundamentalmente por processos tecnológicos inovadores, que pro-
curam prescindir dos princípios cambiários, considerados incompatíveis com a prática
comercial informatizada.
O professor Fábio Ulhoa Coelho71
, já no ano de 1996, fazia observações acerca
da matéria, in verbis:
Não é novidade para ninguém, neste final de século, que o meio magnético
vem substituindo paulatina e decisivamente o maio papel, como suporte de
informações. O registro da concessão, cobrança e cumprimento do crédito
comercial não fica, por evidente, à margem desse processo. Quer dizer, os
empresários, ao venderem seus produtos ou serviços a prazo, cada vez mais
não têm se valido do documento escrito para registro da operação. Procedem,
na verdade, à apropriação das informações acerca do crédito concedido ex-
clusivamente em meio magnético, e apenas por este meio as mesmas infor-
mações são transmitidas ao banco para fins de desconto, caução de emprés-
timos ou controle e cobrança do cumprimento da obrigação pelo devedor.
Apenas uma pequena margem de empresários ainda se vale do cheque pós-
datado, da duplicata efetivamente emitida ou da nota promissória como meio
de documentação da operação creditícia.
Esse avanço da tecnologia da informática nos documentos representativos de
crédito, como registrava o professor Fábio Ulhoa, não vem sendo acompanhado pela
disciplina jurídica, indispensável à segurança que as relações comerciais demandam.
Tem-se a impressão que as pessoas, de modo geral, porque formadas sobre a segurança
do papel, e a comunidade jurídica, em particular, por desvairada paixão a certos dog-
mas, não se encontram seguras acerca da conveniência da substituição do papel pelo
registro eletrônico de dados.
É preciso enfatizar, desde logo, que não se vislumbra a substituição absoluta do
papel como expressão documental, tal cenário somente seria possível numa hipótese
pouco provável, pelo menos para as próximas décadas, qual seja: de que todas as pesso-
as, todos os lares, todas as empresas dispusessem de instrumental técnico para reger
suas vidas, seus negócios. Por ora, isto é um privilégio para poucos.
Ademais, aquilo que na linguagem informática convencionou-se chamar de vir-
tual, como diz o filósofo Pierre Lévy72
, não se opõe ao real, mas ao atual:
71
COELHO, Fabio Ulhoa. O Desenvolvimento da Informática e o Desatualizado Direito Cambiário.
Boletim Informativo Saraiva, nº 1, 1996. 72
PIERRE, Lévy. O que é o virtual? São Paulo: Editora 34, 1996, p. 15.
57
Virtualidade e atualidade são apenas duas maneiras de ser diferentes.
Ao cogitar a prática comercial informatizada, enfatiza-se que a grande maioria
dos empresários, nos dias de hoje, ao realizar negócios já não se utilizam do tradicional
meio papel de escrituração, senão fazendo-os em meio magnético. Não só impostam os
dados magneticamente, mas também os negociam pela mesma via. Exemplo claro desta
prática envolve as instituições financeiras. Ou seja, negócios como desconto bancário e
mesmo os serviços de cobrança, já são materializados sem que necessariamente a cártu-
la – o documento de papel – integre o negócio.
Diante desta realidade fica em crise o princípio da cartularidade, que pressupõe a
existência do documento físico, do papel, quando as transações são realizadas por via
magnética, através da simples troca de informações, especialmente nos casos que en-
volvem instituições financeiras.
Quer parecer que a ausência do documento não teria o condão, isoladamente, de
desnaturar o negócio cambial. Basta ver que a Lei de Duplicatas (nº 5.474, de 1968) já
admitia o protesto por indicação, ou seja, sem a cártula, assim como a execução do títu-
lo retido pelo sacado.
A duplicata mercantil é exemplo singular para a presente análise, na medida que
a Letra de Câmbio jamais exerceu papel preponderante no comércio brasileiro. E é a
duplicata, seja mercantil ou de prestação de serviços, que tem sofrido a efetiva desmate-
rialização em face do desenvolvimento tecnológico.
Nos negócios realizados com duplicatas através de bancos, que em verdade,
concentram hoje este tipo de negócio, a cobrança do título é realizada mediante a con-
fecção e expedição de instrumento conhecido por “boletos”, de tal maneira que o título,
a cártula como tradicionalmente é conhecida, muito raramente chega às mãos do deve-
dor.
Mesmo nestas condições, não se questiona a quitação ofertada em documento
apartado do título, em que pesa a insistência da doutrina em afirmar que a quitação dada
fora do documento não pode ser oposta ao portador de boa-fé do título de crédito. Ora,
há muito tempo, o sistema financeiro usa deste expediente, não sendo razoável insistir
na premissa de que a quitação deva ser necessariamente conferida no título. Mesmo
porque, a própria Lei das Duplicatas (5.474, de 18.07.68), no parágrafo primeiro, do seu
58
artigo 9º, leciona que73
“a prova do pagamento é o recibo, passado pelo legítimo porta-
dor ou por seu representante com poderes especiais, no verso do próprio título ou em
documento, em separado, com referência expressa à duplicata”.
Não se justifica, a nosso juízo, a resistência e indiferença do mundo jurídico a
estas relevantes alterações verificadas na praxis negocial, mormente porque não têm se
transformado em prejuízo aos negociantes. Ademais, não se pode perder de vista que o
Direito Comercial tem, nos usos comerciais, uma de suas principais fontes.
É verdade que o procedimento sob cogitação perderá um pouco de sua eficácia,
pelo menos, até o momento em que o Judiciário enfrente a questão com maior profundi-
dade, quando se verificar a inadimplência. Nestes casos, salvo algumas decisões a que
nos reportaremos mais adiante, imprescindível será a exibição material do título, visto
que o registro magnético não suprirá os requisitos processuais para efeito de execução.
Mas, mesmo contra estes inconvenientes, alternativas são buscadas pelos nego-
ciantes. Exemplo concreto é o acentuado uso do cheque pré-datado, em substituição à
duplicata nas operações feitas a prazo. É certo que também o cheque, na sua forma co-
mum, vem sofrendo o impacto da informatização, com o uso cada vez mais acentuado
dos cartões, que permitem não só a realização de compra e venda, mas também saques
bancários, pagamento de faturas e até a concretização de empréstimos em terminais
específicos, sem falar nos cartões que não só substituirão o cheque, mas o próprio uso
da moeda, considerando que já virão carregados de um valor financeiro.
Aliás, em versão ainda mais sofisticada e bastante recente da família dos cartões,
já é possível transferir dinheiro da conta corrente para o cartão de crédito ou débito, via
Internet, sem precisar ir à agência bancária ou pedir qualquer tipo de autorização.
Da mesma maneira que o princípio da cartularidade é afetado profundamente pe-
las inovações sob consideração, assim também ocorre com os princípios da literalidade
e da autonomia. Quanto à literalidade pela razão óbvia de sua expressão, qual seja, de só
expressarem validade jurídica os atos lançados na cártula. Em não havendo cártula, pre-
judicada estará, sob a ótica convencional, a literalidade.
O princípio da autonomia, por sua vez, parece-nos ser pouco afetado pelas ino-
vações aqui consideradas, tendo em vista as restrições circulatórias dos títulos, especi-
almente em face da concentração dos negócios da espécie pelas instituições financeiras,
73
Art. 9º da Lei da Duplicata Mercantil, promulgada em 18 de julho de 1968.
59
que, como frisados raramente criam novas relações a partir dos títulos que ingressam em
suas carteiras.
Observa-se, assim, que os princípios cambiários, tão preservados pela tradicional
doutrina, o que se justifica pela sua importância na construção e manutenção das regras
atinentes ao direito cambial, encontram-se objetivamente afetados pelas inovações pro-
piciadas pela moderna tecnologia, impondo-se, como é de se esperar da ciência do direi-
to, o repensar destes princípios, de molde a torná-los compatíveis com a nova prática
comercial. É o que sustenta o professor Fábio Ulhoa Coelho74
, ao assentar que:
[...] deste ramo do direito privado resta nos dias de hoje muito pouco de atual.
Revela-se, portanto, um desafio para os comercialistas e para o legislador, a
construção de novas doutrinas e novas regras, compatíveis com a realidade
econômica e tecnológica, em que se insere a concessão e administração do
crédito.
Não restam dúvidas que hoje o Direito Comercial atravessa uma fase de desatua-
lização, no qual é extremamente importante que os estudiosos deste ramo do Direito
Privado se preocupem com a construção de novas ideias compatíveis com a nossa atua-
lidade no que tange a tecnologia nas formas de pagamento.
74
COELHO, Fabio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. São Paulo. Ed. Saraiva. 2009. p 244.
60
4. O CARTÃO DE CRÉDITO COMO SUBSTITUTO DOS CLÁSSICOS DOCU-
MENTOS DE CRÉDITO
Os títulos de crédito são documentos representativos de obrigações pecuniárias e
são considerados meio de antecipação da circulação de riquezas, tendo em vista que eles
se apoiam nos princípios da boa-fé e da confiança, na maioria das vezes, atrelados a
concessão de um lapso temporal para que haja o adimplemento da obrigação nele conti-
da.
Os mais importantes princípios que mereceram destaques foram: a cartularidade,
a literalidade e a autonomia. Assim como os próprios títulos de crédito evoluíram com o
passar dos anos, as relações jurídicas existentes na sociedade também mudaram e, com
isso, o conceito de crédito passou a se distanciar um pouco dos clássicos conceitos en-
contrados no Direito Comercial.
A cartularidade do título passa a ser relativa a partir da possibilidade de criação
de títulos por meio eletrônico ou magnético. Novas operações, como a utilização de
cartões de crédito, ganham espaço fazendo com que se comece a pensar nessas novas
formas de circulação de crédito como substitutos dos clássicos documentos crédito. Se-
gundo Fábio Ulhoa Coelho75
, os títulos de crédito são:
Documentos representativos de obrigações pecuniárias que podem ter sua
origem tanto extracambial como exclusivamente cambial.
O Código Civil Brasileiro76
preceitua-os como documentos necessários “ao
exercício do direito literal e autônomo nele contido” que apenas produzirão efeitos ao
preencher os requisitos da lei. Baseiam-se no princípio da confiança e, em geral, acarre-
tam na concessão de um prazo para que o direito nele representado possa se tornar exi-
gível. Porém, durante esse lapso temporal, podem circular sendo por isso considerado o
meio mais antigo de se estabelecer relações de crédito e, consequentemente de antecipa-
ção da circulação de riquezas.
75
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. Ed. Saraiva. 2009, p. 229. 76
Artigo 887 do Código Civil - Lei 10.406, promulgada em 10 de janeiro de 2002, em vigor desde de 11
de Janeiro de 2003.
61
Da sua definição legal e doutrinária, extraem-se seus princípios essenciais, sendo
a cartularidade, a literalidade e a autonomia. A cartularidade está ligada ao documento
em que o direito é consubstanciado à cártula, geralmente um papel. Segundo Pimentel:77
Para o exercício do direito de crédito, é necessária a apresentação do docu-
mento, também chamado de cártula.
A cártula deve conter expressamente o direito que representa, dá-se a isto o no-
me de literalidade. Não terão eficácia para as relações jurídico-cambiais aqueles atos
jurídicos não instrumentalizados pela própria cártula a que se referem. O que não se
encontra expressamente consignado no título de crédito não produz consequências na
disciplina das relações jurídico-cambiais.
E, por direito autônomo, deve-se entender que a invalidação de alguma obriga-
ção constante no título não invalida as demais. As obrigações representadas por um
mesmo título de crédito são independentes entre si. Se uma dessas obrigações for nula
ou anulável, eivada de vício jurídico, tal fato não comprometerá a validade e eficácia
das demais obrigações constantes do mesmo título de crédito.
A sociedade está em constante evolução. No mundo moderno, os relacionamen-
tos vão tomando as mais variadas formas e a necessidade de informação cada vez mais
rápida é uma constante. Os meios eletrônicos e de comunicação ganham espaço e se
tornam cada vez mais indispensáveis para a concretização das relações jurídicas.
O Direito, por ser a forma de regulação desta sociedade, não pode, por conse-
guinte, estagnar, sendo necessária sua modernização a fim de acompanhar os ditames da
sociedade da informação e atingir seu fim, abrangendo também as novas formas de rela-
cionamentos. Nesse sentido, o conceito de crédito, antes intrinsecamente ligado a uma
cártula, também evolui, dando espaço a novas operações que se ultimam sem a necessi-
dade de tal meio como, por exemplo, os pagamentos feitos através de cartões de crédito.
Se o cotidiano demonstra o abandono do pagamento por papel-moeda, a insegu-
rança e o desvirtuamento do cheque determinam a preferência atual por outros instru-
mentos de pagamento, como os cartões. Certamente, a segurança e a certeza da liquida-
ção são os fatores que determinam esse fenômeno.
77
PIMENTEL, Carlos Barbosa. Direito Comercial: teoria e questões comentadas. 5ª ed. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2006, p. 206.
62
4.1 DA REGULAÇÃO DOS CARTÕES DE CRÉDITO
Não há nenhum órgão que, pelo menos explicitamente, seja responsável pela re-
gulamentação da indústria de cartões de crédito no País. Indiretamente, contudo, o Ban-
co Central tem o mandato para fiscalizar e emitir normas para os emissores de cartão,
não pelo fato de serem emissores, mas por serem bancos. Dessa forma, o principal inte-
resse do Banco Central seria analisar como a carteira de crédito associada à emissão de
cartões repercute no risco da instituição financeira.
O Banco Central também é responsável pelo bom funcionamento do sistema de
pagamentos brasileiro. Nesse sentido, pode fiscalizar e estabelecer normas sobre as em-
presas credenciadoras. Novamente, o principal objetivo do Banco Central é fazer com
que essas empresas façam o processamento de dados e a liquidação de pagamentos da
forma mais segura e eficiente possível. Pode-se questionar se é necessário haver um
órgão regulador da indústria de pagamentos. Afinal, não existe, por exemplo, uma
“Agência Nacional de Supermercados”, encarregada de regular o setor.
Ocorre que, diferentemente do setor de supermercados, o mercado de cartões de
crédito tende a ser concentrado, e, diferentemente de outros setores, a concentração de
mercado, em termos de número de bandeiras, pode ser um arranjo economicamente efi-
ciente, em virtude dos potenciais ganhos de escala.
Mesmo que a concentração no número de bandeiras seja desejável, o mesmo não
é necessariamente verdadeiro para as atividades de emissão e credenciamento. Ainda
assim, isso não justificaria a existência de um órgão regulador específico para a indús-
tria de cartões, uma vez que, o Sistema Brasileiro de Concorrência poderia determinar,
se for vantajoso para a economia, uma reorganização da indústria de forma a garantir
maior competição. Em primeiro lugar porque, para algumas das atividades da indústria,
uma estrutura pouco competitiva pode ser mais eficiente.
Além das bandeiras, em alguns países o processamento e a captura de informa-
ções são feitos por uma única empresa. Nesse caso, é necessário um monitoramento
constante das tarifas cobradas, com o objetivo de evitar abuso de poder econômico.78
78
Não se trata aqui de advogar a regulação via imposição de preços. O órgão regulador deve, em primeiro
lugar, monitorar o regulado de forma a assegurar a competição no mercado. Somente em situações em
que há evidências suficientemente fortes de abuso de poder econômico – e que, portanto, geram ineficiên-
cia econômica – é que os preços deveriam ser diretamente controlados. Afinal, nessas situações, mesmo
que o órgão regulador fixe um preço ineficiente, as distorções causadas serão, provavelmente, menores do
que as observadas na ausência de intervenção. Paulo Springer de Freitas. Consultoria Legislativa do
63
Um órgão regulador específico para a indústria tem também maior facilidade de
detectar eventuais práticas anticompetitivas, podendo saná-las com maior rapidez, se for
conveniente e sem prejuízo de ações por parte dos órgãos integrantes do Sistema Brasi-
leiro de Concorrência. É importante chamar a atenção para uma tendência, mais acentu-
ada para a Mastercard e Visa, que acabam ditando as regras para o mercado nacional e
internacional no que tange o mercado de cartões de créditos.
A se confirmar este cenário, a indústria como um todo apresentará um alto grau
de concentração, ao contrário do que ocorre hoje, em que para algumas atividades da
indústria de cartões de pagamento, como a emissão, o grau de concentração é baixo.
Existe a necessidade de haver um órgão regulador, o candidato natural seria o Banco
Central.
Algumas das atividades da indústria de cartões já são objeto de regulação por
parte do Banco Central, como a concessão de crédito e o processamento, compensação e
liquidação de pagamentos. Talvez a falta de vontade de se criar um órgão regulador
estaria justificada pelo alto custo, no qual seria muito dispendioso, e, provavelmente,
sem ganhos de qualidade, montar uma nova estrutura administrativa para regular o se-
tor.
Por fim, é possível, com base na legislação atual, dizer que o Banco Central pos-
sui a atribuição de fiscalizar e regular pelo menos parte da indústria de cartões. De acor-
do com a Lei do Sistema Financeiro Nacional:79
Consideram-se instituições financeiras, [...], as pessoas jurídicas públicas ou
privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, inter-
mediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros,[...].
Essa definição é ampla o suficiente para incluir alguns dos participantes da in-
dústria de cartões. Os emissores, por concederem crédito aos consumidores, poderiam,
com mais facilidade, ser considerados instituições financeiras. A Súmula nº 28380
, do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), corroborou essa interpretação, estabelecendo que as
administradoras de cartões de crédito são instituições financeiras, e estão, portanto, su-
jeitas ao controle do Banco Central.
senado Federal: Coordenação de Estudos. Mercado de Cartões de Crédito no Brasil: problemas de
regulação e oportunidades de aperfeiçoamento da legislação. Brasília, dezembro de 2007. 79
Art. 17 da Lei nº 4.595, de 1964. 80
STJ. Súmula 283 - As empresas administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras e, por
isso, os juros remuneratórios por elas cobrados não sofrem as limitações da Lei de Usura.
64
Uma vez aceito que determinada instituição é financeira, a subordinação ao con-
trole do Banco Central é garantida pelo art. 18, que prevê, no caput, que as instituições
financeiras somente poderão funcionar no País mediante prévia autorização do Banco
Central. Adicionalmente, o §2º dá ao Banco Central competência para regular as condi-
ções de concorrência e coibir abusos.
Se, para os emissores, é fácil caracterizá-los como instituições financeiras, o
mesmo não se pode dizer das bandeiras e credenciadoras. A solução para preencher essa
lacuna legal seria alterar a Lei no 4.595, de 1964, conhecida como Lei do Sistema Fi-
nanceiro Nacional, determinando que o Banco Central seja o órgão responsável pela
regulamentação da indústria de cartões. Ocorre que este tipo de matéria, por dispor so-
bre a organização do Poder Executivo, é de competência privativa do Presidente da Re-
pública.
Na ausência de lei de iniciativa do Poder Executivo, é viável a apresentação de
projeto que altere a mesma Lei 4.595/64, de forma a estabelecer que os participantes da
indústria de cartões, exceto os usuários finais, sejam considerados como instituições
financeiras.
Poderiam ser incluídas até mesmo as empresas que fornecem infraestrutura para
a indústria. Na qualidade de instituições financeiras, o Banco Central, com base no §2º
do art. 18, poderia fiscalizá-las e regular as condições de concorrência entre elas, coi-
bindo abusos.
Deve-se observar, entretanto, que, como o objetivo de alterar a Lei do Sistema
Financeiro Nacional seria somente preencher o vácuo legislatório relativo à regulamen-
tação do setor, não haveria necessidade de as empresas da indústria de cartões cumpri-
rem todos os requisitos previstos para empresas financeiras, como os relativos a parâ-
metros de liquidez, padrões de governança e forma de organização societária.
4.2 NECESSIDADE DE NOVA REGULAMENTAÇÃO DOS TÍTULOS DE PAGA-
MENTO
A necessidade ou não de uma legislação específica para as operações eletrôni-
cas, dentre as quais aquelas formalizadas por títulos de crédito, ainda é um assunto po-
65
lêmico no meio jurídico. Há os que defendem a tese de que a Internet é um meio de co-
municação como outro qualquer e que, portanto, não requer leis próprias, na maioria dos
casos.
Para o Professor Newton de Lucca81
, a legislação atual não é suficiente para en-
globar os novos casos que surgem com a internet. A questão realmente é polêmica, e
qualquer posição é defensável, pois é possível sustentar a sua validade jurídica através
da interpretação da legislação atualmente existente, utilizando-se os princípios gerais de
direito, a equidade, a analogia. De qualquer forma, são muitos os projetos de lei que
tramitam no congresso brasileiro tratando do tema internet, entretanto, nada especifica-
mente tratando de títulos de crédito, mas não nos esqueçamos que as cambiais são partí-
cipes indispensáveis do comércio, inclusive do comércio eletrônico.
Ademais, os países de maneira geral, estão preocupados com a questão e, inclu-
sive, legislando sobre a matéria. A UNCITRAL também demonstra preocupação, atra-
vés da sua proposta de Lei Modelo para o comércio eletrônico. Ou seja, parece-nos que
estes movimentos legislativos no globo, per si, demonstram que já há um direcionamen-
to diante desta discussão, e a conclusão seria pela necessidade de uma nova legislação
ou alterações na existente, de modo a propiciar ao comércio eletrônico a necessária se-
gurança jurídica.
No caso dos títulos de crédito, em que existe uma resistência muito grande por
parte da doutrina, muito influenciada pela concepção de Vivante (1937), faz-se com que
a necessidade de legislação se mostre ainda mais relevante, apesar da possibilidade de
se dá uma nova interpretação ao conceito de títulos de crédito formulada pelo mestre
italiano.
É importante destacar a tese dos que entendem necessária a interferência legisla-
tiva em que se objetiva a regular o novo rumo ditado pela tecnologia da informática ao
mundo comercial, levando em consideração, dentre outra razões, a nossa história jurídi-
ca, marcada pelo conservadorismo e pela dependência extrema do direito positivo.
Ademais, a interpretação da legislação existente, com o uso dos princípios gerais de
direito, a analogia e a equidade possam, em prazo razoável, dispensar ao comércio ele-
trônico a segurança que este reclama.
81
LUCCA, Newton de; FILHO, Simão. Adaberto (coordenadores). Direito & Internet-Aspectos Jurídi-
cos Relevantes. Edipro, 2000. p 39.
66
4.3 O DIREITO COMPARADO
O direito material relacionado a títulos de crédito, em grande número de países,
signatários de convenções internacionais, é uniforme, mormente em relação aos títulos
que integram o chamado mercado popular, como o cheque, a nota promissória e, em
menor escala de importância, principalmente no Brasil, a letra de câmbio.
Assim, não haveria razão para serem abordados aspectos relacionados à materia-
lidade destes títulos. Daí porque pretendemos, rapidamente, promover algumas conside-
rações acerca da evolução verificada no campo da automação bancária, na medida em
que, os avanços verificados nesta área, refletem diretamente no manuseio tecnológico
dos títulos de crédito.
Antes, porém, será analisado um retrospecto no direito comparado referente a
duplicata, tendo em vista que a doutrina, de maneira geral, considera este título uma
autêntica criação brasileira e, portanto, não integra as já conhecidas Leis Uniformes,
tendo sido chamada por Fran Martins82
como “título príncipe do direito brasileiro”.
A Argentina, com o advento da Lei nº 24.760, de 13 de Janeiro de 1997, instituiu
um título de crédito similar à duplicata brasileira, denominado Factura de Crédito. Na
França, a mobilização do crédito se opera a partir da difusão de um bordereau, que
constitui um regime especial de cessão de créditos, aplicável somente às empresas.
A Itália estimula o financiamento dos empresários através da agilização do re-
gime da cessão de crédito. Através desta sistemática, permitiu-se a difusão do factoring,
a tal ponto que a Itália é o país europeu onde essa modalidade de financiamento tem tido
maior difusão. No Uruguai, o Código de Processo estabelece o caráter de título executi-
vo às “facturas de vendas de mercadorias”, subscritas pelo obrigado ou seu representan-
te.
Nos Estados Unidos, temos o Trade Acceptance que não está disciplinado em lei
escrita, e sim, incorporado pelos usos e costumes do comércio. É um particular tipo de
letra de câmbio emitido pelo vendedor contra o seu comprador e aceito por este median-
te sua assinatura. Este tipo de documento não é muito utilizado neste país, porque os
bancos preferem comerciar mais com letras de câmbio e notas promissórias. Portugal
82
MARTINS, Fran. Títulos de Crédito, Vol. II, 4ª ed., p.176.
67
criou o extrato fatura que visa facilitar as transações comerciais, oferecendo às ativida-
des bancárias maior número de garantias, no intuito de facilitar a sua aceitação e circu-
lação.
Feita esta rápida incursão no âmbito material dos títulos de crédito de alguns pa-
íses, mesmo porque, com exceção da duplicata, os títulos mais populares são objeto de
convenções internacionais. Importante registrar que a expansão dos bancos, através dos
caixas eletrônicos, terminais em postos de venda e a sua colocação em residências por
meio da internet, promove o fenômeno da massificação contratual, caracterizada pela
despersonalização e a essência das convenções escritas.
A Internet engloba situações dos mais diversos ramos do Direito, como relações
de consumo, assim como a prestação de serviços, sem excluir os aspectos relacionados a
violação de privacidade, com repercussão no Direito Penal. É certo que a inexistência
de normas que regulamentem este tipo de relação é um dificultador na busca de solu-
ções para os conflitos daí originados.
O desenvolvimento da Internet é o principal responsável pelo surgimento de
muitas questões. Na nova era da informação, o comércio, uma das mais antigas ativida-
des da humanidade surge agora na rede e o comércio eletrônico tem um papel importan-
te na Internet.
Com o crescimento do comércio eletrônico, novos tipos de contratos estão sur-
gindo e, neste cenário de economia globalizada, embora os títulos de crédito já viessem
sendo tratados de forma globalizada, haja vista as convenções internacionais inúmeras
vezes citadas neste trabalho, muitos governos tentaram estudar legislações para regular
esse comércio, em conformidade com um novo direito e com base em novos princípios.
A regulamentação das assinaturas digitais, por exemplo, representa um passo
importante na legislação do comércio eletrônico, especialmente no direito cambiário,
pois determinarão a criação ou emissão de um título de crédito, possibilitando, ademais,
o uso de outros institutos próprios daquele direito, como o endosso.
Na criação do direito do fato social e da evolução dos usos e costumes, aguarda-
se normas que venham regulamentar as relações negociais informatizadas, sendo que a
ausência das normas não deve ser empecilho à evolução desse novo direito.
Registra-se que coube ao jurista Newton de Lucca (2000), a formulação das pri-
meiras considerações teóricas a respeito da utilização da informática em substituição ao
papel, e o trabalho do Professor foi baseado na experiência francesa, que utilizava a
Lettre de Change-Relevé, traduzida pelo mestre ao nosso jargão bancário como a Cam-
68
bial-Extrato. Vejamos o que diz o mestre sobre a experiência francesa, mais especifi-
camente sobre a Lettre de Change-Relevé:83
Podia a Letrre de Change-Relevé, assumir duas diferentes formas: LCRpape-
le LCR-fita magnética. No caso da LCR-papel, a inovação básica consistia no
fato de que o título de crédito não mais iria circular materialmente: após a
remessa da LCR-papel ao banco do sacador, todos os dados eram transporta-
dos para uma fita magnética. O título era conservado em poder do banco do
sacador. Passava a circular somente a fita magnética: do banco do sacador ao
„computador da compensação‟ do Banco da frança e, deste, para o banco do
sacado. Somente no banco do sacado era que o papel reaparecia: o extrato da
LCR (relevé). Já no caso da LCR-fita magnética, a significação era, eviden-
temente, mais profunda. Sobre ela, assim se manifestava Michel Vasseur, es-
pecialmente ao referir-se à diferença entre a LCR-papel e LCR-fita magnéti-
ca: „Um verdadeiro abismo‟ – tal era a expressão por ele utilizada posto que a
primeira seria uma verdadeira letra de câmbio que, após a sua criação, era
transportada para a fita magnética. A segunda não era nem jamais poderia ser
considerada uma verdadeira letra de câmbio. Arrematava esse jurista: „A
afirmação é evidente. Inexiste letra de câmbio sem a cártula, isto é, sem pa-
pel. Ora, a fita magnética exclui todo papel inicialmente redigido.
Percebe-se que o Professor Newton de Lucca (2000), ao citar a legislação fran-
cesa sobre a matéria, manifesta o seu entendimento quanto à necessidade de legislação
específica para regular o trânsito de negócios firmados pela via eletrônica. O Professor
da Faculdade de Direito Milton Campos relata a situação também em outros países.84
Europa, Japão e América do Sul. A maioria dos países europeus e sul-
americanos adota o sistema do Direito Civil. Alguns desses países vêm traba-
lhando em leis destinadas a oferecer base legal às gravações eletrônicas que
substituem os documentos em papel. Enquanto que, nos Estados Unidos, a
maior barreira à nota promissória eletrônica é representada pelo „Statute of
Frauds‟, na maioria dos países que adotam o Direito Civil essa barreira é a
L.U.G. Todavia, o primeiro passo para a implementação da promissória ele-
trônica nos países que adotam o Direito Civil é uma efetiva legislação das as-
sinaturas digitais. Este trabalho procura demonstrar que o uso de assinaturas
digitais não é uma solução doméstica estrita a um ponto de vista paroquial
dentro dos Estados Unidos, mas, sim uma solução que poderá ser empregada
no mundo inteiro para as leis do comércio eletrônico e para os títulos de cré-
dito eletrônicos. A Comunidade Européia vem trabalhando na regulamenta-
ção das assinaturas digitais e criptografia. Apesar de o Parlamento europeu
não haver traçado diretrizes específicas sobre essa questão, muitos países
desse continente já implementaram suas leis para regular as assinaturas digi-
tais. O exemplo mais marcante é o da Alemanha, que já tem a sua lei sobre
assinaturas digitais. Fora da Comunidade Européia, mas ainda dentro do es-
copo da L.U.G., a Rússia se destaca como um país que já possui uma legisla-
ção sobre PKI que reconhece a validade legal das assinaturas digitais. Aquele
país também já dispõe de uma legislação sobre o uso de documentos eletrôni-
cos emitidos por sua Comissão Federal de Mercados Mobiliários. A América
Latina não dispõe de leis para as assinaturas digitais, as quais vêm sendo usa-
das em alguns países como uma „prática do ciberespaço‟. A Argentina tomou
83
NEWTON DE LUCCA e ADALBERTO SIMÃO FILHO (Coordenadores), op. cit., p. 40. 84
ROHRMANN, Carlos Alberto. op. cit., p. 44-47.
69
uma iniciativa. Há, também, projetos de leis similares na Colômbia e no
Congresso Brasileiro. O Japão, outro país que também adota o sistema Lei
Uniforme de Genebra para Notas Promissórias, adotou o Certificate Autho-
rity Guidelines. Trata-se de um importante projeto para o comércio eletrônico
de autoria do Electronic Commerce Promotion Council of Japan.
É importante destacar a preocupação reinante na grande maioria dos países em
buscar soluções legislativas para tratar desse novo Direito Comercial, em especial no
que tange ao marco legislativo nas novas modalidades de formas de pagamento que
estão em evolução no mundo globalizado.
70
5 O COMÉRCIO ELETRÔNICO
O consumidor vive em uma era de transição das tradicionais lojas físicas para se
aventurar no universo das compras virtuais. O que mais atrai inúmeros curiosos e mui-
tos já veteranos nas compras pela internet é a praticidade deste meio. Em regra, quase
ninguém possui mais tempo para sair de casa, ir até inúmeras lojas, esperar ser atendido,
esperar para pagar em grandes filas.
O tempo parece passar cada vez mais rápido. Não que as compras tradicionais,
mesmo com todos esses contratempos, não tenham seu charme e tradição, como é o
caso da relação vendedor-cliente e a sensação de sentir o produto em mãos. Porém, dei-
xa-se essa forma de compra para situações em que a correria diária não seja um empeci-
lho.
Nas compras pela internet não se enfrentam filas; visita-se um número ilimitado
de lojas em pouquíssimos minutos; preços são comparados instantaneamente; conse-
guem-se menores preços em comparação aos estabelecimentos físicos; não existe a dis-
tância geográfica, enfim, se ganha o precioso tempo.
Importante salientar a divisão do comércio eletrônico em duas categorias com
fulcro na natureza dos bens e serviços ofertados, melhor dizendo, materiais ou imateri-
ais, ou melhor, corpóreos ou incorpóreos. O grupo dos bens corpóreos se trata da com-
pra e venda de produtos físicos, que já vinha sendo realizada através de centrais de te-
lemarketing e reembolso postal, atualmente e massivamente por meio de web sites.85
A este grupo, aplicam-se os dispositivos legais das normas do Código Civil,
Comercial, caracterizada a relação de consumo - as normas do Código de Defesa do
Consumidor. Quanto ao segundo, os imateriais, de natureza incorpórea, compreendido
entre as informações de sons e imagens, como, por exemplo, a compra de um software,
cria-se um novo cenário, em que o objeto transacionado não será os átomos, mas apenas
os bytes. O problema a ser resolvido pelo direito nesse novo campo de atuação é saber,
sobretudo nas relações consumeristas, quais leis serão aplicadas, devido às inúmeras
85
ATHENIENSE, Alexandre. Auto-aplicação do código do consumidor nas transações de bens cor-
póreos pelo comércio eletrônico na internet. Trabalho apresentado no congresso Brasileiro de Direito
do Consumidor do Brasilcon, Belo Horizonte, março de 2000. Disponível em:
<http://www.dnt.adv.br/noticias/auto-aplicacao-do-codigo-do-consumidor-nas-transacoes-de-
benscorporeos- pelo-comercio-eletronico-na-internet-2/>. Acesso em: 21 out. 2012.
71
dificuldades de limites geográficos e de tempo trazidos por essa nova forma de comér-
cio.
5.1 O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO
Em cada espécie de relações comerciais eletrônicas aplica-se uma determinada
norma legal, assim, nas relações de empresa versus empresa, aplicam-se as normas con-
tidas no Código Comercial e Código Civil. Nas relações consumidor versus consumidor
aplicam-se o Código Civil, já nas relações entre empresas versus consumidor, aplicam-
se as normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor.
Coaduna com este entendimento o prodigioso Ricardo L. Lorenzetti:86
[...] a maioria das leis e das propostas de legislação separam o comércio ele-
trônico entre empresas e comerciantes das relações entre governo e particula-
res e daquelas realizadas entre consumidores, aplicando-se as normas proteti-
vas apenas no campo específico das relações entre consumidores e fornece-
dores.
Apesar de ter como alvo as relações entre empresas e consumidores, julga-se ne-
cessário um aparte, por entender também, em certos casos, haver a possibilidade de
aplicação do Código de Defesa do Consumidor nas relações de empresa versus empresa.
Via de regra, o comércio eletrônico entre empresários não está abrigado pelo Código de
Defesa do Consumidor, salvo na hipótese latente de vulnerabilidade do empresário ad-
quirente do produto como destinatário final, caso que poderá ser aplicada às normas
protetivas consumeristas. Fundamenta-se tal posicionamento no próprio conceito de
consumidor disposto no artigo 2º do supracitado ordenamento, que assim preceitua:
“Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço
como destinatário final.”
Tal importância tem esse conceito que o faz ser um dos requisitos, ou melhor,
condição necessária para a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor
nas relações negociais concretizadas no âmbito da internet, ou seja, enquadrar um dos
pólos como consumidor.
86
LORENZETTI, Ricardo L. Comércio Eletrônico. Tradução de Fabiano Menke. 2004. Revista dos
Tribunais, p. 378.
72
No outro pólo, figura o outro requisito, enquadra-se na relação de consumo o
fornecedor, cuja definição se encontra no artigo 3º do CDC. Não obstante, a grande am-
plitude do conceito de fornecedor, merece maior importância em seu enquadramento
para não ocorrer situações em que figure, em ambos os pólos, pessoas ou empresas com
objetivos outros que não uma relação de consumo, mas apenas uma relação de contrato
civil. Fato esse anulador da hipossuficiência, da vulnerabilidade do consumidor no mer-
cado de consumo.
Para a aplicação das leis no comércio eletrônico, em primeiro lugar, deve-se co-
nhecer a sede física do ofertante, pois não importa onde os dados estejam armazenados.
O que deve prevalecer é a sede física e não onde se armazena o estabelecimento virtual
para a fixação da competência de foro. Isso também é o que sanciona as diretrizes da
Lei Uniforme da UNCITRAL (United Nations Commission on International Trade
Law) para o comércio eletrônico elaborada pelas Nações Unidas, apresentado na 29ª
Assembleia Geral, realizada entre 28 de maio a 14 de junho de 1996, 51ª Sessão, Su-
plemento nº. 17 (A/51/17).87
, lei que norteou os projetos de leis de comércio eletrônico
em diversos países do mundo, inclusive o do Brasil. Por isso, é importante mencionar
claramente em sua página da internet onde está localizada sua sede física.
Comprovado que a sede se encontra dentro de território nacional, não haverá dú-
vidas quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor, invertendo o foro da
demanda para o local do domicílio do consumidor. A posição majoritária é que deve ser
aplicada a lei do domicílio do consumidor, pois se entende como oferta feita a domicí-
lio, no computador do usuário, sendo celebrado o contrato no domicílio do consumidor.
Sendo assim, o local de formação dos contratos eletrônicos, quando ambas as partes
residirem no País, deve ser aplicado o direito interno, nos termos do art. 435 do Código
Civil Brasileiro.88
Todavia, quando ambas as partes estiverem fora do território nacional, aplicar-
se-á, o art. 9º, § 2º da Lei de Introdução ao Código Civil.89
No caso de contratos cele-
brados em locais distintos, basta a identificação de onde se encontra o proponente no
87
Lei Modelo Sobre Comércio Eletrônico – UNCITRAL. Disponível em:
<http://www.uncitral.org/english/text/eletcom/ml-ec.htm; bem como em www.direitodarede.com.br>.
Acesso em: 25 nov. 2012. 88
“Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto”. Código Civil – Artigo 966 - Lei
10.406, promulgada em 10 de janeiro de 2002, em vigor desde 11 de Janeiro de 2003. 89
Art. 9º, § 2º da LICC, Lei de Introdução ao Código Civil – “A obrigação resultante do contrato repu-
ta-se constituída no lugar em que residir o proponente”.
73
momento em que se expressa a declaração de vontade, caracterizada como proposta ou
oferta para se estabelecer o lugar de formação dos contratos.
Face às condições de fixação de foro estabelecidas nesse novo meio virtual, en-
tende-se que, para uma maior segurança da relação jurídica resultante de um contrato
eletrônico, o ideal é que as partes contratantes estabeleçam o lugar de formação do con-
trato, ou, na impossibilidade dessa estipulação, é viável indicar onde a proposta é ex-
pressamente manifestada.
Com efeito, é evidente a plena aplicabilidade do Código de Defesa do Consumi-
dor (Lei nº 8.078/90) às operações realizadas no Brasil através da Internet, desde que
envolva uma relação de consumo entre Web sites brasileiros e, se for estrangeiro, é pre-
ciso averiguar se a legislação estrangeira afronta dispositivos do CDC, caso isto aconte-
ça, deverá ter incidência às normas do CDC, invertendo o foro da demanda para o local
do domicílio do consumidor.
Daí a importância de se saber o endereço físico da empresa que mantém o web
site com ofertas de produtos e serviços pela internet, pois ao aceitar tal endereço como o
lugar onde foi proposto o contrato, resolve-se uma série de controvérsias como qual o
país do nome do domínio do web site, onde estariam hospedados os dados do web site,
em que país e cidade90
, por exemplo.
Tanto no Brasil, quanto na Europa, vislumbra-se uma tendência de proteger o
consumidor por considerá-lo a extremidade mais desamparada na relação de consumo.
Levando à possibilidade da aplicação do Código de Defesa do Consumidor mesmo nas
relações entre consumidor brasileiro e fornecedor estrangeiro.
Em uma decisão muito discutida, o STJ decidiu pela aplicabilidade do CDC ine-
rente às normas de garantia de um produto comprado no exterior cuja empresa multina-
cional. O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 1º, estabelece que as normas de
proteção e defesa do consumidor são de “ordem pública e de interesse social”. Dessa
forma, as regras nele contidas possuem natureza cogente, ou seja, não podem ser derro-
gadas pela vontade das partes.
Neste sentido, o art. 17 da LICC, dispõe: “As leis, atos e sentenças de outro país,
bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofen-
derem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.” Portanto, a ordem
pública é o princípio que restringe a aplicação de lei estrangeira.
90
ROHRMANN, Carlos Alberto. Curso de Direito Virtual. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p. 94
74
É importante destacar que o STJ entendeu que a economia globalizada não mais
possui fronteiras rígidas à propaganda de fornecedores estrangeiros, sendo imprescindí-
vel que as leis de proteção ao consumidor ganhem maior expressão em sua exegese, na
busca do equilíbrio que deve reger as relações jurídicas.91
O autor ao ajuizar a ação,
baseou-se no Código de Defesa do Consumidor, afirmando que a garantia contra defei-
tos de fabricação é garantia do produto e não do território onde ele tenha sido fabricado
ou vendido.
O voto dominante foi no sentido de que as grandes corporações perderam a mar-
ca da nacionalidade para se tornarem empresas mundiais e, ainda, se a multinacional
está em todos os lugares, ela pode prestar serviços em todos os lugares.92
Em matéria de política legislativa, a posição majoritária afirma que a proteção
do consumidor constitui um piso mínimo que não pode ser derrogado por outras leis. O
artigo 1° da Lei 8078/90, Código de Defesa do Consumidor93
, institui que as normas de
proteção e defesa do consumidor nele dispostas são de “ordem social e interesse públi-
co”. Sendo assim, essas normas possuem caráter imperioso, ou seja, incidem indepen-
dentemente do desejo das partes, proibido o banimento de sua aplicação.94
Na mesma linha segue o entendimento do professor Fábio Ulhoa:95
O direito positivo brasileiro não contém nenhuma norma específica sobre o
comércio eletrônico, nem mesmo na legislação consumerista de 1990 (a lei
argentina de defesa dos consumidores, de 1994, já se refere ao tema, ao con-
ceituar as vendas por correspondências: art. 32).
Assim, o empresário brasileiro dedicado ao comércio eletrônico tem, em relação
ao consumidor, exatamente as mesmas obrigações que a lei atribui aos fornecedores em
geral. A circunstância de a venda ter-se realizado num estabelecimento físico ou virtual
em nada altera os direitos dos consumidores e os correlatos deveres dos empresários. O
contrato eletrônico de consumo entre brasileiros está, então, sujeito aos mesmos princí-
91
ROHRMANN, Carlos Alberto. Op. cit .p. 96 - 97. 92
STJ, REsp 63.981/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO. JUNIOR, Rel. p/ Acórdão Ministro
SÁLVIO DE FIGUEIREDO. TEIXEIRA, Quarta Turma, julgado em 7 de outubro de 2008.Disponível
em: <www.stj.jus.br>. Acesso em: 25 set. 2012. 93
Lei n. 8078/90, Código de Defesa do Consumidor, institui que as normas de proteção e defesa do
consumidor. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4595.htm>. Acesso em: 28
nov. 2012. 94
CASTRO, Luiz Fernando Martins. Comércio Eletrônico e a Defesa do Consumidor no Direito Bra-
sileiro e no Mercosul. In Internet e Direito. Reflexões Doutrinárias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. 95
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 6 ed. São Paulo: Saraiva. 2006, V. 3.p. 42.
75
pios e regras aplicáveis aos demais contratos disciplinados pelo Código de Defesa do
Consumidor.
5.2 O COMÉRCIO ELETRÔNICO VIA INTERNET
O comércio eletrônico via internet, mesmo ainda sem a criação do Código de
Defesa do Consumidor, especificamente para o comércio eletrônico, é plenamente justi-
ficável a adequada aplicação de suas normas às relações de consumo feitas pela internet.
As normas do CDC são aplicáveis aos contratos eletrônicos em que constitua re-
lação de consumo, com sua adequada subsunção. O artigo 6º do Código de Defesa do
Consumidor é talvez o basilar de toda estrutura baseada na vulnerabilidade do consumi-
dor em relação ao fornecedor. No seu inciso I, busca-se a proteção da vida, da saúde e
segurança do consumidor em relação a produtos que possam causar-lhe algum tipo de
dano. Combina-se a este o inciso III, que ratifica a necessidade de se apresentar todas as
informações sobre os produtos e serviços, mormente sobre os riscos inerentes a eles.
Igualmente, o artigo mencionado traz em seu inciso IV o direito à proteção con-
tra a publicidade enganosa ou abusiva, práticas comercias coercitivas ou desleais. No
inciso VI concede o direito a prevenção e a reparação de danos sofridos pelo consumi-
dor. Além da possibilidade da inversão do ônus da prova, inciso VIII, em face da posi-
ção de hipossuficiência administrada ao consumidor.
As diretrizes da Lei Modelo da UNCITRAL preconiza ser desnecessária uma
prévia autorização para se ofertar produtos na internet. Contudo, este mesmo ofertante
virtual não estará imune de cumprir as normas impostas àqueles que praticam atos, ten-
do em vista a relação jurídico-empresarial como, por exemplo, a constituição de um
negócio regular, registro no ente competente, CNPJ e endereço físico do estabelecimen-
to.
Sendo assim, é inteiramente aplicável o conteúdo dos artigos 30 e 31 do Código
de Defesa do Consumidor. No qual, o primeiro estipula obrigação do fornecedor que
veiculou a oferta e a publicidade, fazendo com que as mesmas passem a integrar o con-
trato que vier a ser celebrado. E o segundo ratifica o dever de a oferta e apresentação
dos produtos ou serviços apresentarem informações corretas, claras, precisas, ostensivas
em língua portuguesa.
76
No mesmo sentido, Alexandre Atheniense96
posiciona-se ao entender que todo
conteúdo apresentado por uma loja integra o contrato a ser celebrado. Em consonância,
estão esses artigos supracitados com recomendação da Lei Modelo da UNCITRAL e o
adotado pelo Projeto de Lei do Comércio Eletrônico Brasileiro, que se dispõe respalda-
do no artigo 33 do CDC.
A oferta de contratação eletrônica deve conter claras e inequívocas informações
sobre o nome do ofertante, e o número de sua inscrição no cadastro geral do Ministério
da Fazenda, e ainda, em se tratando de serviço sujeito a regime de profissão regulamen-
tada, o número de inscrição no órgão fiscalizador ou regulamentador. Também o ende-
reço físico do estabelecimento; a identificação e endereço físico do armazenador; o
meio pelo qual é possível contatar o ofertante, inclusive correio eletrônico; o arquiva-
mento do contrato eletrônico, pelo ofertante; as instruções para arquivamento do contra-
to eletrônico, pelo aceitante, bem como para sua recuperação, em caso de necessidade; e
os sistemas de segurança empregados na operação.
Busca-se com esses procedimentos proporcionar maior conforto e segurança ao
consumidor em compras pela internet, por ser um ambiente de manuseio técnico ainda
não totalmente dominado pela grande maioria dos que se dispõe a utilizá-la.
Registra-se que a oferta é feita no momento em que os dados são disponibiliza-
dos no web site e ingressam no computador do usuário. A aceitação, por sua vez, con-
cretiza-se com o ingresso dos dados transmitidos por este nas máquinas do empresário.
Especificamente sobre a publicidade, a ela é vedado ter natureza enganosa ou
abusiva. Essa norma geral contida no artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor
justifica-se, também, na seara virtual.
No comércio virtual, assim como no comércio em geral, vale tudo para atrair cli-
entes, dentro dos limites da aceitabilidade legal. Ocorre é que muitos empresários bus-
cam essa captação de clientes por meio de publicidades falsas ou mesmo omitindo in-
formações capazes de levar os consumidores a erro quanto à natureza, qualidade, carac-
terísticas, origem e preço dos produtos e serviços ofertados. Ora, se ocorre esse tipo de
ação dentro de estabelecimentos físicos, com a presença do consumidor, podendo ele
ver e tocar os produtos, maior é a possibilidade de insatisfação nas compras em um web
96
ATHENIENSE, Alexandre. Auto-aplicação do código do consumidor nas transações de bens cor-
póreos pelo comércio eletrônico na internet. Trabalho apresentado no congresso Brasileiro de Direito
do Consumidor do Brasilcon, Belo Horizonte, março de 2000. Disponível em:
<http://www.dnt.adv.br/noticias/auto-aplicacao-do-codigo-do-consumidor-nas-transacoes-de-
benscorporeos- pelo-comercio-eletronico-na-internet-2/>. Acesso em: 21 out. 2012
77
site, onde o consumidor tem que se ater apenas a informações escritas em uma tela e no
máximo fotos dos produtos.
Nada mais justo, caso ocorra a recusa do fornecedor a cumprir a oferta, apresen-
tação ou publicidade, a imposição das alternativas, à escolha do consumidor, das nor-
mas do artigo 35 do CDC. Dentre as normas, destacam-se a de coagir ao cumprimento
forçado da obrigação - aceitar outro produto ou serviço equivalente, ou ainda, rescindir
o contrato e ter a quantia paga devolvida com os devidos reajustes, perdas e danos.
A mídia criada pela internet não possui impedimentos e controle como é o caso
das mídias tradicionais (televisão, jornais e revistas), portanto a forma de controle e
fiscalização não pode funcionar da mesma maneira. Trata-se de um mundo atípico, em
que a adequação de analogias pode variar até mesmo dentro de um assunto específico,
devido a suas sutilezas em constante evolução.
Direito de arrependimento está contido no artigo 49 do Código de Defesa do
Consumidor, que permite a desistência do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua
assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço. Nos contratos em homepa-
ges (web sites), os que o consumidor concretiza a compra com um click do mouse em
um ícone desejado, a doutrina vem se posicionando pela aplicação do direito de arre-
pendimento. Um dos fundamentos dessa aceitação é interpretar a compra pela internet
como vendas fora do estabelecimento empresarial.
Outro é de se aceitar o direito de arrependimento nas compras por meio de tele-
fone, mesmo sendo este considerado pelo Código Civil contrato “entre presentes”. Ain-
da há um terceiro alicerce à proteção do CDC em se evitar o abuso decorrente da deno-
minada “compra por impulso”.97
Essa compra, mais do que a simples facilidade de se comprar com um click, liga-
se às práticas do chamado marketing agressivo, que utiliza de técnicas de venda que
restringem a capacidade de reflexão sobre a decisão livre a ser tomada pelo consumidor
no ato de comprar.98
A presunção genérica é de que diante da impossibilidade do contato do consu-
midor com o vendedor e com o produto, poderá haver insatisfação quanto ao recebimen-
to do bem. Destoa da maior parte da doutrina, o Douto professor Fábio Ulhoa Coelho,
compreendendo não ser aplicado o artigo 49 do CDC ao comércio eletrônico. Na inter-
pretação do distinto doutrinador, não se trata de negócio concretizado fora do estabele-
97
ROHRMANN, Carlos Alberto. Op. cit., p.102. 98
COELHO, Fábio Ulhoa. Op. cit., p.47.
78
cimento empresarial. Baseia-se, o eminente, pelo reconhecimento da existência de um
novo tipo de estabelecimento, ou seja, o estabelecimento virtual.
Admite apenas o direito de arrependimento nas hipóteses específicas em que o
comércio eletrônico emprega marketing agressivo. Apesar de maciça a posição na dou-
trina pela aplicação do direito de arrependimento no comércio eletrônico, uma difícil
solução é quando os bens transacionados virtualmente são da categoria dos imateriais,
intangíveis e que não requerem entrega fora da rede.
5.3 TEMORES QUANTO ÀS TRANSAÇÕES ELETRÔNICAS ADVINDAS DA IN-
TERNET
Inicialmente, deve-se colocar em prática um dos conceitos básicos do direito do
consumidor, que é a premissa de ser o consumidor a parte mais vulnerável da relação de
consumo e por isso deve ser protegido, dado a sua hipossuficiência.
O empresário, como é de todos sabido, obriga-se aos riscos do negócio. Ou no
famoso brocardo: “quem aufere o bônus; arca com o ônus”. Cabe assim ao fornecedor
buscar meios de proteção sobre os seus produtos para impossibilitar ou minimizar frau-
des por parte da má-fé de alguns consumidores não tão hipossuficientes como a maioria.
De forma alguma se toma posição absolutamente retilínea à aceitação indiscri-
minada do direito de arrependimento, sobretudo em casos que envolvam bens imateri-
ais. Nas incertezas jurídicas, deve o julgador tender pela proteção da parte mais fragili-
zada na relação de consumo, ou seja, o consumidor.
O consumidor, ao abrir um site de compras pela primeira vez, deslumbra-se e ao
mesmo tempo, aterroriza-se. O temor vem por diversas razões dentre as quais estão as
fraudes virtuais, campo novo no ordenamento jurídico brasileiro.99
Existe o receio de
comprar um produto e quando o tiver nas mãos não agradar. Fato este resolvido pelo
acima debatido direito de arrependimento.
No momento de fornecer os dados pessoais, há também o receio que dados pos-
sam ser desviados ou fornecidos a terceiros sem prévio conhecimento ou autorização do
consumidor. Se for o caso de constituição de bancos de dados, consequentemente forne-
99
ROHRMANN, Carlos Alberto. Op. cit.p.106 - 108.
79
cidos a terceiros, sem ciência do consumidor, caso em que poderão ser impostas as san-
ções do CDC inerentes ao artigo 43 §2º.
Os crimes digitais dependem na maioria das vezes de coleta de informações ar-
quivadas ou em trânsito pela internet. A sociedade dependente de informação acaba
virando vítima de ameaças simples e até de “terrorismo e de vandalismo eletrônico”.100
Na forma mais popular de pagamento de compras via internet, encontra-se o
maior temor e um campo vasto para fraudes virtuais. Está se falando do pagamento com
cartão de crédito. O próprio administrador do provedor, ao qual o usuário está conecta-
do, tem acesso ao conteúdo dessas páginas, podendo, caso por algum motivo queira, até
mesmo modificá-lo e utilizá-lo pra fins ilícitos. Não só o administrador tem acesso, pois
pessoas com ferramentas apropriadas e conhecimento suficiente (hackers) também po-
dem se apoderar de tais informações. De posse destas, pode ocorrer clonagem de car-
tões, débitos superiores aos devidos, fraudes em futuras compras e muitas outras formas
de ilícitos imaginados nas mentes criminosas.
O comportamento do consumidor é afetado pela complexidade que a compra
eletrônica representa para algumas pessoas, pela desconfiança sobre a segurança nas
compras on line, quando exigem o envio do número do cartão de crédito e a invasão de
sua privacidade com consequente alteração de dados ou envio a terceiros.
Quanto à complexidade, os sites devem apresentar formas de facilitar o acesso e
entendimento por parte dos consumidores. As informações devem ser corretas, claras,
precisas, ostensivas, em língua portuguesa, demonstrando todas as especificidades dos
produtos, preço e forma de pagamento, acatando assim as normas do artigo 31 do Códi-
go de Defesa do Consumidor. O website deve ter layout que não dificulte o acesso das
informações pelo usuário. O site que não se apresentar inteligível terá como consequên-
cia real o abandono por parte do consumidor.
A despeito dos dados dos cartões de crédito, estão sendo desenvolvidos atual-
mente diversos mecanismos, na busca de constituição e consolidação do “dinheiro ele-
trônico”, tais como os bancos via internet, ampliando a capacidade da utilização de
moeda pela rede.101
Devido ao aumento da concorrência, empresas estão sendo levadas
a conferir garantias especiais e algumas delas têm oferecido responsabilizarem-se pelas
cobranças não autorizadas oriundas da Web, até certo limite.
100
CORRÊA, Gustavo Testa. Aspectos jurídicos da internet. 2 ed.rev, São Paulo: Saraiva, 2002, p. 43. 101
CORRÊA, Gustavo Testa. Op. cit. p.50.
80
O aparecimento de um mercado competitivo, mesmo não eliminando a necessi-
dade de regulamentação das condições gerais e aplicação do regime de proteção do con-
sumidor, faz com que as empresas busquem fornecer aos seus clientes mecanismos para
que estes se sintam mais seguros e confiantes nas suas contratações e aquisição de pro-
dutos.
Os comerciantes virtuais devem propiciar um ambiente sadio, inteligível, seguro,
expor seu endereço físico, apresentar autenticações que identificam sua condição de
idoneidade e lisura nas relações de comércio eletrônico; cumprir de forma eficaz e efici-
ente as entregas dos produtos ou serviços, meio pelo qual possa ser contatado; arquiva-
mento do contrato eletrônico por parte do ofertante e do consumidor e todos os meios de
segurança eletrônicos possíveis e atualizados para a proteção durante e posterior à reali-
zação da transação.
5.4 O VILÃO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO
O chargeback é o cancelamento de uma venda feita com cartão de crédito, pelo
não reconhecimento da compra pelo titular do cartão ou pela desobediência ao contrato,
e é tido por muitos empresários como um dos atuais vilões do comércio eletrônico.
Se é correto afirmar que o comércio virtual trouxe conforto e comodidade a em-
presários e, principalmente, aos consumidores, também é correta a afirmação no sentido
de que severas mazelas vêm ocorrendo em razão dessa prática, ante as sucessivas notí-
cias de fraudes perpetradas por ocasião das fragilidades que caracterizam a contratação
à distância, notadamente no ambiente da internet.
O chargeback é um dos grandes fantasmas para os proprietários de lojas virtuais
e responsável pelo fechamento de várias destas lojas. O problema é muito maior do que
as pessoas imaginam e não ganha a devida publicidade porque não interessa às adminis-
tradoras de cartões de crédito fazer qualquer tipo de divulgação sobre o volume de frau-
des que ocorrem na utilização de seus cartões porque isso afugentaria clientes e exporia
a fragilidade destes sistemas de cobrança.
A verdade é que nenhuma administradora de cartão de crédito garante transação
alguma nas vendas efetuadas pela Internet, ficando a cargo do lojista todos os riscos
inerentes à operação e também, é claro, o risco do chargeback.
81
Este posicionamento expõe o vendedor a todo tipo de golpes que vão desde a
fraude com cartões de crédito roubados e clonados, até a má fé de alguns usuários que
simplesmente alegam não reconhecer compras legítimas. É uma verdadeira Roleta Rus-
sa que pode levar a empresa à falência.
Quem lê e entende o contrato de credenciamento de uma administradora de car-
tão de crédito, em sã consciência, não assina. As cláusulas são leoninas e em muitos
casos totalmente subjetivas. Resumindo as relações de responsabilidades descritas na
maioria dos contratos, as administradoras têm todos os direitos e os lojistas arcam com
todas as obrigações. Além do famoso contrato, são criados aditivos e novas regras que
beneficiam exclusivamente as administradoras deixando em situação cada vez mais fra-
gilizada o lojista. Se não bastasse o prejuízo pelo não recebimento pelas vendas efetua-
das, o lojista ainda pode ser surpreendido pela bizarra situação de passar da posição de
lesado para a de devedor da administradora.
Suponha-se a situação em que o lojista efetua várias vendas e muitas delas são
recusadas pela administradora. Independentemente das outras transações serem legíti-
mas ou não, elas respondem pelo valor das transações fraudadas e, portanto, devem ser
usadas para reposição de valores que tenham sido sacados pelo lojista antes da negati-
vação da compra.
É justamente nessa situação que muitas lojas virtuais encerram suas atividades.
Como o fluxo de vendas é interrompido, mas não o fluxo de negativação de compras já
efetuadas, o resultado é um saldo devedor na conta do lojista afiliado.
Há quem confunda o chargeback com o direito de arrependimento previsto no
art. 49 do CDC102
, isto é, aquele em que o consumidor desiste de uma contratação, ob-
tendo a devolução do valor efetivamente pago ao fornecedor, monetariamente corrigido.
Entretanto, essas situações não se confundem, e guardam diferenças sensíveis.
De comum, o chargeback e o direito de arrependimento só possuem uma carac-
terística: a devolução, ao consumidor, de valores por ele despendidos.
Percebe-se, então, que o chargeback não se confunde com o direito de arrepen-
dimento previsto no art. 49 do Código de Defesa do Consumidor, pois, nesse caso, não
está o consumidor obrigado a declinar o motivo do cancelamento do negócio, ao passo
que, no chargeback, existe uma causa específica que o legitima.
102
Artigo 49 da Lei n. 8078/90, Código de Defesa do Consumidor, institui que as normas de proteção
e defesa do consumidor. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4595.htm>. Aces-
so em: 28 nov. 2012.
82
Em outras palavras, para que haja o chargeback, é necessária a ocorrência de
uma das causas mencionadas, a saber: o não reconhecimento, por parte do titular do
cartão, da compra que gerou o débito lançado na respectiva fatura; ou o descumprimen-
to de normas afetas ao contrato firmado entre o fornecedor de produtos ou serviços e a
administradora de cartões, fato que autoriza esta a não creditar valores na conta daquele.
Resumindo, pode-se dizer que o chargeback exige relevante motivo de direito
para que seja legítimo, pois, do contrário, poderá resultar em abuso de direito por parte
do consumidor ou da própria administradora de cartões de crédito. Em suma, é pressu-
posto para o chargeback a ocorrência de alguma ou ambas as situações acima descritas.
Por sua vez, o direito de arrependimento conferido ao consumidor pela regra do
art. 49 do CDC é um direito potestativo, isto é, exercido livremente pelo consumidor,
dentro de um prazo que, no caso, é o chamado prazo de reflexão. São sete dias conferi-
dos ao consumidor, contados da assinatura do contrato ou do ato de recebimento do
produto ou serviço, e ao qual o fornecedor estará obrigatoriamente sujeito, independen-
temente da ocorrência de alguma causa.
Para que o consumidor exercite o seu direito de arrependimento não há a neces-
sidade da ocorrência de qualquer evento, bastando a sua vontade de não mais contratar,
isto é, de prosseguir com o negócio. Não há necessidade, por exemplo, da ocorrência de
vícios do produto ou do serviço para que o consumidor desista de contratar. O direito de
desistir do negócio celebrado carece de motivação, devendo o consumidor receber, ime-
diatamente, a quantia eventualmente paga, monetariamente corrigida.
Sendo assim, a razão de existência das normas são diversas. No chargeback, o
cancelamento da venda, com o consequente estorno de valores, seja ao consumidor ou à
administradora de cartões (a depender da causa que motiva o ato) ocorre mediante rele-
vante razão de direito. Por parte do consumidor, pode ocorrer quando terceiros se apo-
derarem do número e da senha de seu cartão (fraude, furto ou roubo do cartão), e então
passar a realizar compras em nome daquele. Como não foi o consumidor quem realizou
a transação, poderá, legitimamente, contestá-la, devendo obter o ressarcimento do que
lhe for eventualmente cobrado, inclusive valendo-se da regra do parágrafo único do art.
42 do CDC103
, que lhe confere o direito à repetição do indébito, "por valor igual ao do-
103
Artigo 42 da Lei n. 8078/90, Código de Defesa do Consumidor, institui que as normas de proteção
e defesa do consumidor. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4595.htm>. Aces-
so em: 28 nov. 2012.
83
bro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hi-
pótese de engano justificável".
Uma observação se faz necessária a de atentar-se para a parte final do precepti-
vo, pois, o fornecedor desavisado poderá alegar que houve engano justificável na venda
ou até mesmo que agiu com boa-fé, uma vez que confiou que o portador do cartão era
de fato seu titular.
Tendo o CDC desenvolvido o sistema de responsabilidade civil com base na teo-
ria do risco do empreendimento, o fornecedor deverá arcar com eventuais prejuízos cau-
sados ao consumidor, na medida em que, aventurando-se a adotar um sistema de vendas
mais informal, estará sujeito ao risco de estar negociando com uma pessoa que não é
efetivamente a titular do cartão de crédito. Em uma analogia a expressão “cara-crachá”,
nas vendas à distância é praticamente impossível ter o contato face a face, fazendo com
que o fornecedor de produtos e serviços deva suportar os riscos nessa modalidade de
negócio e, portanto, o dever de indenizar.
De seu turno, a razão do direito de arrependimento, ou seja, da norma etiquetada
no art. 49 do CDC, é a vulnerabilidade do consumidor, evidenciada pela ausência de
contato direto com o produto ou serviço que irá adquirir ou contratar. Quando contrata
fora do estabelecimento comercial, o consumidor não exerce contato físico com o pro-
duto; não tem condições de verificar se a cor corresponde à desejada, se o tamanho do
produto é de fato o esperado.
Por outro lado, examinando pessoalmente o produto, o consumidor reúne condi-
ções de verificar se este realmente corresponde à suas expectativas, pode testá-lo no
local da aquisição para conferir seu funcionamento, consultar outros consumidores que,
porventura, adquiriram o mesmo produto, ouvindo as respectivas opiniões. Da mesma
forma, quando tem acesso direto ao conteúdo de um contrato, é possível ao consumidor
verificar, via de regra, se as cláusulas não são abusivas, se as condições do negócio não
lhe são desfavoráveis.
Em resumo, a negociação em contato com o objeto do negócio, o consumidor
tem mais chances de consumir refletidamente, conscientemente, firme na ideia de que
está contratando o que quer e como quer.
Lado outro, se contrata à distância, correrá o risco de o objeto do negócio não
corresponder ao que espera, tendo em vista as diversas técnicas de "maquiagem" do
produto para torná-lo mais atraente, publicidades com apelo emocional, mostrando fa-
84
mílias sorridentes, felizes, de vida aparentemente perfeita, como ocorre com publicidade
de planos de saúde e seguros.
Esta é, portanto, a razão de ser do direito de arrependimento, a ser exercido no
prazo de reflexão: leva-se em conta o aumento da vulnerabilidade do consumidor, em
razão da ausência de contato direto com o objeto do negócio.
Sintetizando, no chargeback inexiste arrependimento do consumidor em relação
ao negócio sacramentado, pois sequer há tratativas entre este e o fornecedor. Há, sim, a
ocorrência de uma fraude por parte de terceiros, ou até mesmo por má-fé do consumi-
dor, ou por parte de próprio fornecedor, ao descumprir as regras que regulamentam o
contrato entre este e a administradora do cartão.
De seu turno, no direito de arrependimento inexiste fraude ou descumprimento
de qualquer regra contratual a ensejar a desistência do consumidor em prosseguir com o
negócio. Como dito, é um direito potestativo, despido de qualquer justificativa por parte
do consumidor para que ocorra. O consumidor, após refletir sobre a conveniência ou
oportunidade da contratação, simplesmente desiste de prosseguir com o negócio, se ar-
repende, e ao fornecedor resta apenas o dever de acatar a decisão do consumidor.
5.5 A RESPONSABILIDADE DAS ADMINISTRADORAS DE CARTÃO DE CRÉ-
DITO NO COMÉRCIO ELETRÔNICO
No contexto da responsabilidade por chargeback, verificada a ocorrência de
fraude, o consumidor, tendo sido cobrado ou tendo quitado o que não devia, terá direito
à repetição do indébito, nos exatos termos do parágrafo único do art. 42 do CDC. A
natureza jurídica dessa medida, como aponta a melhor doutrina, é de caráter sancionató-
rio, isto é, é uma sanção aplicada ao fornecedor que age canhestramente, cobrando o
consumidor pelo que ele não deve, ou, que lhe foi cobrando em excesso, isto é, mais do
que ele efetivamente deve. Portanto, é medida de caráter pedagógico, imposta ao forne-
cedor com o escopo de educá-lo para que não volte a atuar da mesma forma.
No caso de má-fé do próprio consumidor, isto é, os casos em que cliente comu-
nica falsamente uma fraude, diz não reconhecer uma compra que ele mesmo efetuou, e
em decorrência disso, tem os valores indevidamente estornados para o seu cartão, cer-
tamente poderá ser punido, inclusive criminalmente, a depender do caso.
85
Na órbita civil, deverá ser condenado a ressarcir o fornecedor lesado por sua prá-
tica, sendo que, nesse caso, a medida tem caráter indenizatório, e não sancionatório, já
que visa restituir ao lesado o status quo ante, indenizando-o verdadeiramente.
Em caso de cancelamento da compra, pelo não reconhecimento do consumidor,
seria juridicamente possível a repartição dos riscos e dos prejuízos entre o lojista e ad-
ministradora de cartões de crédito, em virtude da própria atividade lucrativa que exer-
cem no mercado de venda de produtos a distância? Afigurar-se-ia, em tese, viável que o
lojista não arcasse sozinho com o risco e o ônus do chargeback? A administradora de
cartões poderia ser considerada co-responsável pela venda frustrada?
Para responder a estas indagações, antes é necessário identificar as relações en-
volvidas em um contrato de cartão de crédito, que já foram exaustivamente analisadas
no primeiro capítulo desta dissertação.
André Luiz Santa Cruz Ramos104
nos explica o que é um contrato de cartão de
crédito, bem como as relações que o cercam. Trata-se de contrato por meio do qual uma
instituição financeira, a operadora do cartão, permite aos seus clientes a compra de bens
e serviços em estabelecimentos comerciais cadastrados, que receberão os valores das
compras diretamente da operadora. Esta por sua vez, cobra dos clientes, mensalmente,
o valor de todas as suas compras realizadas num determinado período. Chama-se cartão
de crédito, então, o documento por meio do qual o cliente realiza a compra, apresentan-
do-o ao estabelecimento comercial cadastrado.
Do que foi exposto, pode-se então distinguir três relações jurídicas distintas nu-
ma operação com cartão de crédito, relembrando que estas foram devidamente explora-
das no primeiro capítulo desta dissertação, que em suma são a da operadora com o seu
cliente; a do cliente com o estabelecimento comercial; e a do estabelecimento comercial
com a operadora.
De modo a responder às indagações, é possível afirmar que as duas primeiras re-
lações, isto é, a da operadora com o seu cliente, e a do cliente com o estabelecimento
comercial, são relações de consumo, portanto sujeitas às regras do CDC.
Nas relações de consumo, submetem-se à regra de responsabilidade civil objeti-
va, agasalhada pelo sistema consumerista. Isto significa que, perante o consumidor, tan-
to o comerciante quanto a administradora do cartão, responderão independentemente da
existência de culpa por eventuais danos causados ao consumidor em razão de charge-
104
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. 1ª Ed. São Paulo: Método,
2011, p. 485.
86
back, pois ambos se enquadram no conceito de fornecedor, insculpido no art. 3º do
CDC.
Assim, respondendo à primeira indagação, é, sim, juridicamente possível a re-
partição dos riscos e dos prejuízos entre o lojista e administradora de cartões de crédito
ou débito, em virtude da própria atividade lucrativa que exercem no mercado de venda
de produtos à distância, uma vez que estará com vício na prestação de serviço, sujeito à
regra do art. 19 do CDC (salvo comprovada má-fé do próprio consumidor, obviamente,
o que caracteriza sua culpa exclusiva), "embora seja mais comum a verificação de um
único fornecedor na cadeia de consumo, no caso o que prestou o serviço", como nos
informa Leonardo de Medeiros Garcia.105
Destarte, a responsabilidade por vício de serviço é solidária e objetiva. Além
disso, como foi dito, o sistema de responsabilidade civil objetiva, agasalhado pelo CDC,
a fundar-se na teoria do risco do empreendimento. Dessa forma, se o comerciante adere
às vendas por meio de cartão de crédito, se ele já sabe de antemão que atualmente o
volume de fraudes na utilização de cartões de crédito é grande, sujeitar-se-á aos riscos
inerentes, pois, como se sabe, não deverá o consumidor suportar os prejuízos daí advin-
dos. Isto posto, perante o consumidor, haverá repartição dos riscos, devendo tanto a
operadora de cartões quanto o comerciante responderem.
Para responder ao segundo questionamento, deve-se frisar que a relação entre o
comerciante e a operadora de cartões, por sua vez, é eminentemente empresarial. Ou
seja, o contrato firmado entre esses dois sujeitos é de natureza empresarial; é um contra-
to entre iguais.
Num primeiro momento, é possível afirmar que, por estarem em pé de igualda-
de, o comerciante e a operadora de cartão de crédito gozam de plena liberdade de con-
tratar e de liberdade contratual, em homenagem ao princípio da autonomia da vontade.
Assim, por serem, em tese, iguais, e embora o contrato firmado entre comercian-
te e operadora de cartão de crédito seja de adesão, não se vislumbra a vulnerabilidade
que caracteriza o consumidor. Como informa André Luiz Santa Cruz Ramos:106
No âmbito do direito empresarial, o norte interpretativo deve ser sempre, na
nossa modesta opinião, a autonomia da vontade das partes. Caso contrário, o
105
GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor: código comentado e jurisprudência. 7ª
ed. rev. amp. e atual. Niterói: Impetus, 2011, p. 179. 106
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. 1ª Ed. São Paulo: Método,
2011, p. 435.
87
que se instaura é a insegurança jurídica, que se manifesta especificamente nas
atividades econômicas como um obstáculo ao desenvolvimento.
Destarte, nesse primeiro momento, entende-se que no contrato empresarial de
adesão, embora presente, em tese, a autonomia da vontade, dificilmente o comerciante
conseguirá discutir os termos afetos aos riscos envolvendo o chargeback. Pode até ser
que contratos dessa natureza sejam leoninos, praticamente prevendo somente vantagens
para a operadora de cartões de crédito e riscos para o comerciante e, por isso, o correto,
nesta compreensão, seria o compartilhamento de riscos entre esses dois sujeitos. Contu-
do, dificilmente isso ocorrerá.
Dificilmente as operadoras de cartão de crédito passarão a assumir um risco que
as tirará da zona de conforto em que se encontram, a não ser que haja uma debandada
por parte dos comerciantes, deixando de adotar essa modalidade de pagamento, o que,
talvez, faria com que as operadoras de cartão repensassem seu modelo de compartilha-
mento de riscos.
Contudo, tal atitude por parte dos comerciantes pode significar o insucesso do
empreendimento, já que o volume de contratações por meio de cartão de crédito é em
grande quantidade. O mais interessante é que, da mesma forma, igual insucesso poderá
experimentar, já que o volume de fraudes também é considerável, podendo levar ao
fechamento do negócio.
88
6 CONCLUSÃO
O mundo está mudando a sua forma de pagamento, no qual, apesar de não haver
regulamentação específica sobre o tema, é importante observar o instituto do cartão de
crédito, para melhor compreender o sistema complexo que está por trás de tal mecanis-
mo.
É justamente pelo fato de não ter sido regulamentada a matéria, que ainda exis-
tem tantas discussões doutrinárias e judiciais sobre o tema. Entretanto, tem-se verificado
que, na medida em que há crescimento da utilização do cartão, como forma de paga-
mento aceito pelo comércio, em especial pelo comércio eletrônico, o entendimento dos
tribunais acaba sendo pacificado e uniformizado em relação a algumas questões primei-
ramente tão polêmicas.
Não se pode negar, todavia, a importância do cartão de crédito na economia bra-
sileira e internacional, principalmente no que tange ao comércio eletrônico. Afinal, por
meio da utilização do cartão de crédito se têm movimentado bilhões de reais no merca-
do.
Uma regulamentação, talvez, trouxesse maior segurança às operações realizadas
com os cartões, principalmente no que tange ao comércio eletrônico, mas o que se vê
atualmente é um assentamento e aprimoramento das operações e das relações jurídicas
firmadas em sua decorrência, mediante a prática do uso, costume e do posicionamento
do judiciário acerca do tema.
Por outro lado, os títulos de crédito foram protagonistas de situações especiais,
as quais, a doutrina costuma denominar de atributos dos títulos de crédito, chamados,
respectivamente, de negociabilidade, que consiste na facilidade de circulação do crédito
e a executividade, que consiste na maior eficiência na cobrança. Todavia, no cenário
atual, os títulos de crédito não preenchem as necessidades do comércio, principalmente
no mercado virtual.
Os contratos de cartão de crédito possibilitam, assim como os títulos de crédito
convencionais, a circulação de riquezas que ainda serão adquiridas, ou seja, a mobiliza-
ção de riquezas através do princípio da confiança.
Além disso, constituem-se numa certeza de pagamento ao fornecedor, visto que
este irá receber diretamente do emissor do cartão de crédito. Portanto, é indiscutível a
89
utilidade de tal meio de pagamento, bem como sua crescente aceitação entre os brasilei-
ros e fora do País.
Porém, ainda não é possível sua equiparação a um título de crédito, principal-
mente em razão da ausência de uma legislação ou um tratado específico para determinar
a sua natureza jurídica. Apesar de dotados de negociabilidade, visto que o fornecedor
pode solicitar a antecipação do crédito a ser recebido mediante o desconto de um per-
centual previamente estabelecido e possuidor de características basilares dos títulos de
crédito como a literalidade e a autonomia, o cartão de crédito não possui o atributo da
executividade.
No caso do inadimplemento de uma dívida proveniente de um contrato de cartão
de crédito, não é possível ao seu titular buscar a execução imediata da obrigação, inde-
pendentemente de um processo de conhecimento, já que não se encontram no rol que
elenca os títulos executivos extrajudiciais.
É importante destacar que hoje seria possível viajar pelo mundo inteiro sem ne-
nhuma nota ou moeda no bolso. Entretanto, seria difícil viajar sem um cartão de crédito,
no qual os obstáculos já irão surgir desde a reserva da passagem área até a sua estadia
no hotel de destino.
Os conflitos relacionados à tecnologia no que tange a matéria comercial têm
exigido um esforço especial por parte dos estudiosos do Direito Comercial para respon-
der o fenômeno do avanço do dinheiro de plástico com a consequente desvalorização
dos títulos de crédito.
O cartão de crédito representa uma verdadeira revolução no comércio, pela
enorme expansão do crédito que possibilita, no qual incentiva a circulação da moeda e
impulsiona o comércio e o desenvolvimento econômico. Diferentemente do cheque, o
cartão não exige provisão de fundos. O financiamento é facilitado, e dispensa a necessi-
dade de prévia habilitação do cliente perante uma instituição financeira antes de cada
compra.
O cartão de crédito é instrumento que simboliza com propriedade a dinâmica da
vida econômica do sistema capitalista, o qual gerou as relações de consumo numa soci-
edade de massa. Revela-se meio ágil e prático, porquanto evita o risco do transporte de
dinheiro e do cheque e proporciona concessão automática de crédito. Não é sem razão,
pois, que experimenta prodigioso crescimento no Brasil e no mundo, sobretudo após a
estabilização monetária de nossa economia.
90
Tal sistema evidentemente proporciona benefícios as outras partes envolvidas: a
administradora como intermediária aufere lucros com sua comissão pactuada; e o forne-
cedor obtém aumento das vendas com novos clientes atraídos pela facilidade do paga-
mento e, desta forma, não necessita desembolsar o dinheiro no ato da compra.
A chamada “moeda de plástico”, ante a presença marcante deste instrumento na
vida dos consumidores brasileiros e na economia do país, com efeitos jurídicos e conse-
quências judiciais inevitáveis, o sistema contratual do cartão de crédito reclama uma
normatização por meio de legislação específica.
Apesar disso, os cartões de crédito continuam sendo, mediante o exposto, fortes
concorrentes na substituição dos documentos clássicos de crédito, como a letra de câm-
bio, nota promissória, duplicata e o cheque servindo assim para a sociedade como um
instrumento de globalização.
91
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<www.direitodarede.com.br.> Acesso em: 15 set. 2012.
UNIDROIT. Disponível em: <http://www.unidroit.org/dynasite.cfm>. Acesso em: 25
set. 2012.
VIVANTE, Cesare. Trattato di Diritto Commerciale. 3ª ed. Milão, Casa Editrice Dot-
torFrancesco Vallardi, v. 3, 1937.
97
VOLPI, Marlon Marcelo. Assinatura digital. Aspectos técnicos, práticos e legais. Rio
de Janeiro: Axcel Books, 2004.
98
8 ANEXOS
ANEXO A - % de Faturamento de Cartões (Total e Crédito) Consumo Privado -
Evolução
Fonte: http://www.abecs.org.br/ site 2012/Abecs.asp. Acesso em: 3 set, 2012.
ANEXO B - Participação regional no faturamento
Fonte: http://www.abecs.org.br/ site 2012/Abecs.asp. Acesso em: 3 set, 2012.
99
ANEXO C - Participação por ramo de atividade
Fonte: http://www.abecs.org.br/ site 2012/Abecs.asp. Acesso em: 3 set, 2012.
ANEXO D - Quantidade de transações, por função dos cartões (em milhões)
Fonte: http://www.abecs.org.br/ site 2012/Abecs.asp. Acesso em: 3 set, 2012.
100
ANEXO E - Faturamento, por função dos cartões (em R$ bilhões)
Fonte: http://www.abecs.org.br/ site 2012/Abecs.asp. Acesso em: 3 set, 2012.
ANEXO F - Os precursores do cartão de crédito
Fonte: http://www.abecs.org.br/ site 2012/Abecs.asp. Acesso em: 3 set, 2012.
101
ANEXO G - Executivo Frank McNamara, o inventor do cartão de crédito.
Fonte: http://www.abecs.org.br/ site 2012/Abecs.asp. Acesso em: 3 set, 2012.