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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
JOIRA APARECIDA LEITE DE OLIVEIRA AMORIM MARTINS
PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS NO CONTEXTO
DA POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA
EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA
Cuiabá – MT
2015
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
JOIRA APARECIDA LEITE DE OLIVEIRA AMORIM MARTINS
PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS NO CONTEXTO
DA POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA
EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA
Cuiabá – MT
2015
3
JOIRA APARECIDA LEITE DE OLIVEIRA AMORIM MARTINS
PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS NO CONTEXTO DA
POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO
SUPERIOR BRASILEIRA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação no Instituto de Pós
Graduação em Educação da Universidade Federal de
Mato Grosso, como requisito para obtenção de título
de Mestre em Educação. Área de concentração:
Educação. Linha de Pesquisa: Movimentos Sociais,
Política e Educação Popular.
Orientadora: Profª. Drª. Maria das Graças Martins
da Silva
Cuiabá – MT
2015
Dados Internacionais de Catalogação na Fonte.
Ficha catalográfica elaborada automaticamente de acordo com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).
Permitida a reprodução parcial ou total, desde que citada a fonte.
L533p Leite de Oliveira Amorim Martins, Joira Aparecida.Programa Ciência sem Fronteiras no contexto da política de
internacionalização da educação superior brasileira / JoiraAparecida Leite de Oliveira Amorim Martins. -- 2015
174 f. : il. color. ; 30 cm.
Orientador: Maria das Graças Martins da Silva.Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Mato Grosso,
Instituto de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação,Cuiabá, 2015.
Inclui bibliografia.
1. Internacionalização. 2. Ciência sem Fronteiras. 3. Políticaseducacionais. I. Título.
5
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE PÓ-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Avenida Fernando Corrêa da Costa, 2367 - Boa Esperança - Cep: 78060900 - CUIABÁ/MT
Tel: 3615-8431/3615-8429 – Email: [email protected]
FOLHA DE APROVAÇÃO
TÍTULO: “Programa Ciência Sem Fronteiras no contexto da política de
internacionalização da educação superior brasileira”
AUTORA: Mestranda Joira Aparecida Leite de Oliveira Amorim Martins
Dissertação defendida e aprovada em 27 de março de 2015.
Composição da Banca Examinadora:
Presidente Banca/Orientadora Doutora Maria das Graças Martins da Silva
Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Examinadora Interna Doutora Tereza Christina Mertens Aguiar Veloso
Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Examinador Externo Doutor Marío Luiz Neves de Azevedo
Instituição: UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ/UEM
Examinadora Suplente Doutora Rose Cléia Ramos da Silva
Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
CUIABÁ, 27/03/2015.
6
AGRADECIMENTOS
Você não sabe o quanto eu caminhei
Pra chegar até aqui
Percorri milhas e milhas antes de dormir
Eu nem cochilei
Os mais belos montes escalei
Nas noites escuras de frio chorei, ei, ei, ei
Together, Together[...]
(A Estrada – Cidade Negra)
“Caminhei milhões de milhas”, mas nunca sozinha. Eis-me aqui, para agradecer a
todos que caminharam comigo em mais essa jornada em minha vida.
Em primeiro lugar, agradeço a Deus, pela capacidade física e mental e resiliência nos
momentos extremos.
Agradeço pelo amor, incentivo e compreensão de minha família, em especial a
minha mãe Inês, meu esposo Cristiano e minha filha Aline, pois eles “sonharam o meu
sonho” e por isso virou realidade.
Sou imensamente grata a minha orientadora, Profa. Dra. Maria das Graças, que
vivenciou cada segundo comigo a experiência de desvendar um tema contemporâneo, e por
ter sido incansável em suas correções detalhadas objetivando a lapidação do saber.
Igualmente agradeço a Profa. Tereza, o Prof. Mário e a Profa. Rose Cléia por
terem aceitado participar da minha banca, contribuindo com avaliações generosas e objetivas
para o aperfeiçoamento deste trabalho.
Também demonstro minha gratidão á todos docentes e os colegas discentes do
Programa de Pós-Graduação em Educação/UFMT e todos os membros do Grupo de
Estudos e Pesquisa em Políticas Educacionais (GEPDES) pelos vários momentos de
compartilhamento de conhecimento, alegrias e angústias vivenciados através do estudo.
Agradeço à UFMT, especialmente as pessoas vinculadas a Secretaria de Relações
Internacionais e a Reitoria, pela permissão para meu afastamento, pelo esforço dobrado dos
meus colegas às atividades profissionais durante minha ausência e pela a disponibilização de
informações sempre de forma solícitas.
Registro também a honra de partilhar esta experiência com pessoas que se tornaram
cada vez mais próxima, e me auxiliaram com suas sugestões, orientações, revisões e
conversas de “pé de orelha”: Prof. Paulo Teixeira, Prof. Vinícius Pereira, Profa. Irene
Cajal, e Brunna Carvalho (representando também todos estagiários da SECRI). Deixo aqui
meus sinceros agradecimentos a todos, que direta ou indiretamente, percorreram comigo essa
estrada.
7
[...] quem define a coerência
macroeconômica de uma época é a
correlação de forças do período – e
hoje essa matemática foi
globalizada pela livre mobilidade
dos capitais, que potencializou seu
desafio.
Saul Leblon
8
RESUMO
MARTINS, Joira Aparecida Leite de Oliveira Amorim. Programa Ciência sem Fronteiras no
contexto da politica de internacionalização da educação superior brasileira. 174 f. Dissertação
(Mestrado em Educação). Universidade Federal de Mato Grosso, 2015.
A dissertação discorre sobre o Programa Ciência sem Fronteiras (CsF), um programa do
Governo Federal Brasileiro que busca “[...] promover a consolidação, expansão e
internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por
meio do intercâmbio e da mobilidade internacional.” (BRASIL, 2014). O objetivo da pesquisa
é analisar a concepção e a implementação do Programa CsF, no contexto da política de
internacionalização da educação superior no Brasil. Trata-se de um estudo exploratório e de
caráter qualitativo, que utiliza entrevista semiestruturada com três representantes das
instituições idealizadoras e gestoras do CsF. A análise de dados, focalizando a idealização,
criação, objetivos, fomentos e adaptações do CsF, tendo em perspectiva a política de
internacionalização da educação superior, teve por base as seguintes categorias, a luz do
método dialético: concepção, contemplando formulação e criação, e a implementação,
abrangendo características e perspectivas. A pesquisa mostra que a política de
internacionalização da educação superior no Brasil, conforme o que se apresenta no Programa
CsF, tende a negligenciar a solidariedade mútua para se constituir em estratégia para o
fortalecimento do modelo político-econômico vigente.
Palavras-chave: Internacionalização; Ciência sem Fronteira; Políticas educacionais.
9
ABSTRACT
MARTINS, Joira Aparecida Leite de Oliveira Amorim. The Science without Borders Program
within the internationalization of Brazilian higher education. 174 p. Thesis (Master´s
Education).Federal University of Mato Grosso, 2015.
This Master’s thesis is about the Science without Borders Program (CsF), a program created
by the Brazilian Federal Government to “consolidate, expand and internationalize Brazilian
science, technology, innovation and competitiveness by means of interchange and
international mobility” (BRAZIL, 2014). The objective of this research is to analyze the
conception and implementation of CsF within the internationalizing policies of Brazilian
higher education. This is an exploratory qualitative study, using semi-structured interviews of
3 representatives of the institutions that created and now manage CsF. Data analysis focuses
on CsF idealization, creation, objectives, foments and adaptations, according to the
perspective of internationalizing policies of higher education. The following categories were
analyzed, through the lens of the dialectical method: conception, encompassing idealization
and creation; and implementation, encompassing characteristics and perspectives. The
research shows that the internationalizing policies of higher education in Brazil, according to
data from CsF, tend to neglect mutual solidarity so as to reinforce the current political and
economical model.
Keywords: Internationalization; Science without Borders; Educational Policies.
10
LISTA DE SIGLAS
ACCC Associação das Faculdades Comunitárias Canadenses.
ACE American CouncilEducation
AEU Associação Europeia de Universidades
AGCS Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços
ANDIFES
Associação Nacional Dirigentes de Instituições Federais de Ensino
Superior
ARI Assessoria de Relações Internacionais
AUCC Associação das Universidades e Colégios do Canadá
BIRD Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento
BM Banco Mundial
CALDO Consórcio das Universidades de Alberta, Laval, Dalhousie e Ottawa
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CBIE Canadian Bureau for International Education
CDES Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
CF Constituição Federal
CGRIFES
Conselho de Gestores de Relações Internacionais das Instituições
Federais de Ensino Superior
CHEA Council for Higher Education Accreditation
CIC CollegesAndInstitutes Canada
CMES Conferência Mundial sobre Ensino Superior
CNE Conselho Nacional de Educação
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CONSEPE Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão
CP Chamadas públicas/editais
CRASP Conferência de Reitores de Escolas Acadêmicas da Polônia.
CsF Ciência sem Fronteiras
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio
ENLACES
Espaço de Encontro Latino-Americano e Caribenho de Educação
Superior
EUA Estados Unidos da América
FATEC Faculdades de Tecnologia
FAUBAI Associação Brasileira de Educação Internacional,
FMI Fundo Monetário Internacional
GEPDES Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais
ICSID Centro Internacional para Resolução de Disputas sobre Investimentos
IDA Associação Internacional de Desenvolvimento
IES Instituição de Educação Superior
IF Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica
IFC Corporação Financeira Internacional
11
IFES Instituição Federal de Educação Superior
IIE InstituteofInternationalEducation
IPI Imposto sobre produtos industrializados
IsF Inglês sem Fronteiras
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MCTi Ministro da Ciência e Tecnologia e Inovação
MEC Ministério de Educação
MEO MyEnglishOnLine
MIGA Agência de Garantia de Investimento Multilaterais
NOVA Instituição Comunitária de Ensino Superior da Virginia do Norte
OMC Organização Mundial do Comércio
ONU Organização das Nações Unidas
PIBIC Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica
PIBIT
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento
Tecnológico e Inovação
PEC-PG Programa de Estudantes-Convênio de Pós- Graduação
PET Programa de Educação Tutorial
PNE Plano Nacional de Educação
PPGAS Pós-Graduação em Antropologia Social
PPGE Programa de Pós-Graduação em Educação
PROUNI Programa Universidade para Todos
RI Relações Internacionais
SECRI Secretaria de Relações Internacionais
SFM Sistema Financeiro Mundial
SISU Sistema de Seleção Unificada
UDF Universidade Distrito Federal
UDUAL União das Universidades da América Latina
UFMT Universidade Federal do Mato Grosso
UNAMAZ
Universidades dos Países Membros do Tratado de Cooperação
Amazônica
UNITWIN University Twinning and Networking Programme
UNESCO Organização das Nações Unidas para Educação, Ciências e Cultura
URJ Universidade do Rio de Janeiro
USP Universidade de São Paulo
VIC Voluntariado de Iniciação Científica
12
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Chamadas Públicas do Programa CsF – Modalidade graduação- sanduíche .......... 97
Tabela 2 - Vagas da 9ª Convocação – CAPES. ...................................................................... 108
Tabela 3 - IES destino classificadas no QS World University Rankings ................................ 132
13
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Síntese de Apresentação CNPq/MCTi ................................................................... 111
Figura 2 - Apresentação The Brazilian Scientific Mobility Program - Slide 7 ...................... 112
Figura 3 - Apresentação Ciência sem Fronteiras: Programa Brasileiro de Mobilidade
Científica - Slide 10 ................................................................................................................ 113
Figura 4 - Síntese de Apresentação Capes.............................................................................. 114
14
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Setor de Convênios/UFMT – 2008 a 2012 .......................................................... 119
Gráfico 2 - Convênios Ativos/UFMT – 2009 a 2013 ............................................................. 120
Gráfico 3 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2008 a 2012 ....................................................... 120
Gráfico 4 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2012 a 2013 ....................................................... 122
Gráfico 5 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2012 a 2013 ....................................................... 122
Gráfico 6 - Estudantes da UFMT participantes da seleção para Programa CsF..................... 126
Gráfico 7 - Estatísticas do Programa CsF – UFMT – Perfil socioeconômico. ....................... 128
Gráfico 8 - Estatísticas do Programa CsF – UFMT – Perfil acadêmico. ............................... 129
Gráfico 9 - Estatísticas gerais do Programa CsF-I ................................................................. 130
Gráfico 10 - Estatísticas gerais do Programa CsF-II .............................................................. 131
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Revisão de literatura no Banco de Teses e Dissertações da CAPES, delimitação da
palavra-chave: internacionalização........................................................................................... 43
Quadro 2 - Delimitação das concepções sobre a internacionalização da educação superior ... 46
Quadro 3 - Documentos UNESCO acerca das diretrizes educacionais.................................... 63
Quadro 4 - Documentos BM acerca das diretrizes educacionais. ............................................ 74
Quadro 5 - Programa Ciência sem Fronteiras. Eventos marcantes – agosto de 2011 a outubro
de 2013 ..................................................................................................................................... 96
Quadro 6 - Destaques das Convocações do Programa CsF de 2011 a 2014 ............................ 99
Quadro 7 - Análise do Programa CsF pelos membros da CGRIFES/ANDIFES. .................. 105
Quadro 8 - Destaques dos Editais SECRI/UFMT para o Programa CsF de 2011 a 2013 ...... 124
Quadro 9 - Custo por bolsista/ano do Programa CsF ............................................................. 157
16
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 17
1. A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO
CONTEXTO DAS MUDANÇAS SOCIAIS ........................................................................ 23
1.1 INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: ESBOÇO PARA UMA CONSTRUÇÃO
TEÓRICA ......................................................................................................................................................... 23
1.1.1 Geopolítica Mundial: breve delineamento do pós 2ª Guerra Mundial ................................................ 23
1.1.2 A particularidade brasileira ................................................................................................................ 30
1.1.3 Reflexos das políticas globais nas políticas de educação superior, com foco na internacionalização
33
1.2 A INTERNACIONALIZAÇÃO NAS PESQUISAS ACADÊMICAS ................................................ 41
1.3 CONCEITO DA INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ................................. 46
2. A INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL ........... 50
2.1 A INTERNACIONALIZAÇÃO NAS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA ........... 50
2.2 INTERFACES ENTRE A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR
MUNDIAL E BRASILEIRA ............................................................................................................................ 62
2.2.1 A UNESCO: perspectivas sobre a internacionalização da educação superior. .................................. 62
2.2.2 Banco Mundial: orientações educacionais .......................................................................................... 72
2.2.3 Interfaces dos organismos internacionais à política de internacionalização da educação superior
brasileira ...................................................................................................................................................... 78
3. O PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS .......................................................... 81
3.1. CONTEXTO SÓCIO-POLÍTICO-ECONÔMICO NO PERÍODO DE CRIAÇÃO DO PROGRAMA
CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS ........................................................................................................................ 81
3.2. FISIONOMIA E FUNCIONAMENTO DO PROGRAMA CSF ................................................................ 90
3.2.1 Sobre a Graduação – Sanduíche ......................................................................................................... 96
3.2.2 Avaliação do Programa CsF por parte das agências executoras ..................................................... 110
3.3. UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO: A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO
COMO FOCO ................................................................................................................................................. 115
3.3.1 Os editais SECRI/UFMT para seleção dos bolsistas CsF ................................................................. 124
3.3.2 Perfil dos bolsistas CsF na UFMT e no CsF ..................................................................................... 127
4. BUSCANDO ELEMENTOS PARA RESPOSTAS ...................................................... 135
4.1. METODOLOGIA .................................................................................................................................... 136
4.1.1 Metodologia das entrevistas .............................................................................................................. 137
4.2 ANÁLISE DOS DADOS .......................................................................................................................... 140
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 154
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 159
APÊNDICE A ....................................................................................................................... 172
APÊNDICE B ........................................................................................................................ 173
APÊNDICE C ....................................................................................................................... 174
17
INTRODUÇÃO
O presente estudo compõe a dissertação desenvolvida no Programa de Pós-
Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), junto ao
Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais (GEPDES).
A pesquisa apresenta como tema central o Programa Ciência sem Fronteiras (CsF),
delimitando-se no contexto da política de internacionalização da educação superior no Brasil.
Nessa direção, estabelece o seguinte problema de pesquisa: Como se caracteriza, em termos
de concepção e implementação, o Programa Ciência sem Fronteiras, no âmbito da
política de internacionalização da educação superior no Brasil?
Acreditamos ser um estudo relevante pela perspectiva de desvelar as ações e
intenções desse programa governamental. Os estudos mostram que, desde a antiguidade, a
troca de informação entre povos era recorrente, principalmente no meio universitário, pois,
conforme Charle e Verger (1996, p.27), “As populações universitárias medievais eram
bastante móveis, uma vez que, em tese, nenhuma fronteira se opunha à circulação dos homens
nem à validade dos diplomas.”
Os autores também esclarecem que na Idade Média a mobilidade internacional já
se apresentava com as características de busca pelo estudo e a viagem em si, ou seja, “a
experiência existencial, a ocasião de visita a lugares célebres e de iniciação da sociabilidade –
estava investida de um valor educativo próprio” (CHARLE; VERGER, 1996, p.49). Porém, o
que parece diferenciar-se, atualmente, é a centralidade da questão e o aumento de interesse do
Estado sobre ela.
Essa tendência se intensifica largamente após a 3ª Revolução Industrial, também
conhecida como Revolução Digital ou Revolução Técnico-Científica Informacional1.
Conforme destaca Dias Sobrinho (2005, p.139):
A modernização dos meios de transporte e diversos programas de financiamento e
estratégias de organização de eventos e variados trabalhos de cooperação facilitam
muito a circulação de professores e estudantes. A cooperação acadêmica pode ser
altamente potencializada hoje em dia pela interconexão das instituições e de grupos
de pesquisadores, ou seja, pela constituição de redes mundiais permitindo o acesso
1 Iniciou-se em meados do século XX e correspondeu ao processo de inovações no campo da informática e suas
aplicações nos campos da produção e do consumo. As grandes realizações desse período são o desenvolvimento
da chamada química fina, a biotecnologia, a escalada espacial, a robótica, a genética, entre outros importantes
avanços (PENA, 2014).
18
imediato a informações longínquas, unindo o local ao global. Atualmente, a
cooperação em rede pode prescindir da presença física (DIAS SOBRINHO, 2005,
p.139).
Temos vivido intensamente a interação entre países, sobretudo levando em conta
os aspectos econômicos, sociais, culturais, tecnológicos e políticos, ponto de vista que a
presente pesquisa propõe-se a explorar mais amiúde.
A Universidade, como instituição educadora, participa diretamente do cenário da
internacionalização, valendo-se de meios tecnológicos para desenvolver atividades de ensino
e pesquisa conjuntas à distância, bem como pelo intercâmbio acadêmico via mobilidade
recíproca de membros ou por participação em missões científicas e congressos internacionais.
Stallivieri (s.d., p.23) define a internacionalização universitária a seguir:
Como espaço gerador de conhecimento, a universidade tem contribuído para as
rápidas transformações tecnológicas, para a evolução dos meios de comunicação e
para a velocidade com que circulam as informações, que têm aproximado os povos e
têm feito com que as populações tenham acesso muito rápido e direto ao que está
ocorrendo nos lugares mais longínquos do globo, gerando um acelerado processo de
internacionalização. [...] Preparar cidadãos do futuro para um mundo interligado e
interdependente requer um sistema de educação superior cujo processo de
internacionalização permita o conhecimento direto e o respeito pela diversidade
cultural, promovendo, acima de todos os conceitos, o entendimento e o respeito pela
multiplicidade de valores e a tolerância entre os povos (STALLIVIERI, s.d., p.23).
Essa prática, tradicionalmente, teve como princípio a solidariedade e a
reciprocidade, tendo como objetivo o diálogo entre povos, fundado no respeito ao diferente e
na cooperação mundial.
Porém, nos últimos tempos, novos modos de conceber e operar os intercâmbios
internacionais da educação superior vem sendo desenvolvidos, ao que parece, podendo ser
exemplificado o próprio Programa Ciência sem Fronteiras, que utiliza como estratégia o
incentivo financeiro (montante inicial de R$3,1 bilhões)2, mediante pagamento de bolsas e de
taxas acadêmicas, para aumentar a presença de pesquisadores e estudantes brasileiros em
instituições “de excelência” no exterior e para atrair jovens talentos científicos e
investigadores para atuar no Brasil.
A partir dessas considerações, o nosso objetivo principal é analisar a concepção e a
implementação do Programa Ciência sem Fronteiras, no contexto da política de
2 Informação fornecida no pronunciamento da presidente Dilma Rousseff, na reunião do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social realizada em julho de 2011 (Jornal Valor Econômico, 2011).
19
internacionalização da educação superior no Brasil. Os objetivos específicos assim se
delineiam:
Contextualizar e caracterizar a política de internacionalização da educação
superior brasileira;
Identificar as interfaces entre a política de internacionalização da educação
superior mundial e brasileira;
Contextualizar e explicitar o funcionamento do Programa Ciência sem
Fronteiras no Brasil, no período de 2011 a 2014;
Caracterizar o processo de implementação do Programa Ciência sem
Fronteiras, segundo a delimitação do público alvo estudantes de graduação na
modalidade graduação – sanduíche, no período de 2011 a 2014, no enfoque da
Universidade Federal do Mato Grosso.
Ressaltamos que o estudo privilegia a análise dos processos de concepção e
implementação da política pública da internacionalização da educação superior, o que
significa que não vamos nos deter centralmente nos impactos e resultados do Programa.
A propósito, Gomes e Oliveira (2012, p. 23/27) destacam que estudos em políticas
públicas e, particularmente, de políticas de educação superior, podem ser agrupados em
quatro linhas a partir do foco de pesquisa que privilegiam: a) análises dos processos de
concepção e formulação das políticas públicas de educação superior; b) análises dos processos
e estratégias de implementação; c) análises e avaliações de impactos e resultados; d) e estudos
dedicados à descrição, análise e interpretação dos processos de concepção, formulação e
implementação, assim como analisam os impactos e resultados das políticas de educação
superior. Assim sendo, pelas limitações do tempo de estudo, nos ateremos aos itens “a” e “b”,
conforme apresentado pelos autores.
A opção em estudar essa temática deve-se a minha experiência profissional, pela
atuação desde 2008 na Secretaria de Relações Internacionais (SECRI) da UFMT, sendo uma
das responsáveis pela gestão do referido programa nas ações de internacionalização dessa
Instituição Federal de Educação Superior (IFES). Nesse espaço profissional, ricas vivências,
desafios e conflitos se apresentaram desde a implementação do programa, motivando o
desenvolvimento deste estudo.
20
Esta pesquisa configura-se um estudo exploratório, de caráter qualitativo, seguindo o
entendimento de que no universo das Ciências Sociais a produção humana dificilmente pode
ser traduzida em indicadores quantitativos (MINAYO, 2011).
Consideramos neste estudo também o pensamento de Chizzotti (2000, p.80) quanto
à relação entre a orientação filosófica e pesquisas qualitativas: “[...] Valoriza a contradição
dinâmica do fato observado e a atividade criadora do sujeito que observa, as oposições
contraditórias entre o todo e a parte e os vínculos do saber e do agir com a vida social dos
homens.”
Para compor a coleta de dados, utilizamos entrevista semiestruturada, com um roteiro
orientativo de perguntas que o entrevistado tinha liberdade para falar sobre o tema da questão,
e, se preferisse, aprofundar algum aspecto relacionado ao mesmo, que julgasse pertinente.
Para o desenvolvimento da pesquisa sobre o Programa Ciência sem Fronteiras, os
locais de estudo foram as instituições idealizadoras e gestoras do referido Programa:
Ministério da Educação (MEC), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) e Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Ressaltamos que foi
feito convite para a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
participar do presente estudo, porém, sem sucesso pela falta de resposta do referido órgão.
Os sujeitos entrevistados delimitam-se aos gestores dessas instituições, vinculados ao
segmento da internacionalização da educação superior. Optamos por resguardar sua
identidade. A presente pesquisa obteve parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa
com Seres Humanos, conforme n.º 801.651.
Enfatizamos que esta pesquisa é do tipo qualitativa, ou seja, não se configura um
estudo de caso, ainda que tenha como um dos entrevistados um representante de Instituição de
Educação Superior (IES) pública. O intuito desta pesquisa é utilizar o depoimento como
exemplo da implementação prática do CsF.
Para garantir melhor resultado do trabalho, consultamos a legislação, documentos
intitucionais, artigos, livros, sites, entre outros, mediante a coleta de documentação indireta,
constituindo a pesquisa documental e bibliográfica.
Esta pesquisa segue os preceitos do método dialético de investigação, que pretende
descobrir como se produz concretamente o fênomeno estudado por meio da busca da sua
essência, utilizando-se da crítica como princípio. Trata-se de buscar suas origens, causas,
21
orientações, transformações, desenvolvimento e conexões, tendo como base o real, a prática e
o concreto em movimento. Esse método, segundo Frigotto (2010), procura explicações
coerentes e racionais para os fenômenos, apoiando-se numa visão da realidade como
totalidade, movimento e história, situando-os nas relações sociais e entendendo-os na trama
das contradições.
Na realização da pesquisa, consideramos, principalmente, as categorias filosóficas da
contradição e da totalidade, num processo de conhecer o fenômeno estudado pelos seus polos
contrários que, em movimento e tensão, se autoafirmam, seguindo o entendimento de Cury
(1987, p.30): “A contradição é destruidora e ao mesmo tempo criadora, já que se obriga
constantemente a superação.”
Vale ponderar que o método dialético de investigação é complexo, tornando-nos
estudantes da sua apropriação, sendo esta pesquisa o primeiro desafio de sua apreensão.
A dissertação organiza-se em quatro capítulos, na sequência: A política de
internacionalização da educação superior no contexto das mudanças sociais; A
internacionalização da educação superior no Brasil; O Programa CsF; e Buscando elementos
para as respostas.
O primeiro capítulo contextualiza brevemente o sistema capitalista a partir da 2ª
Guerra Mundial, percorrendo a organização político-econômica do estado de bem-estar social
(na ideologia keynesiana) do regime de acumulação fordista e a organização político-
econômica do neoliberalismo, que se articula com o regime de acumulação flexível
(toyotismo). O texto também adentra na realidade brasileira, evidenciando o novo-
desenvolvimentismo, que se estabelece em meados da década de 2000 no país. Tais estudos
têm a perspectiva de entender os reflexos das políticas globais nas políticas de educação
superior, em especial sobre a internacionalização nesse nível de ensino. Além disso, procura
estabelecer um marco conceitual sobre a internacionalização da educação superior a fim de
nortear as reflexões sobre o tema.
No capítulo seguinte, tratamos de aspectos relacionados aos processos de
internacionalização da educação superior brasileira. Primeiramente, discorremos numa
perspectiva histórica como se caracterizou pela implementação da internacionalização da
educação superior, desde o período colonial até a nova república, fazendo a correlação com os
principais dispositivos legais da educação, com foco na educação superior. Esse trajeto é
importante, na medida em que evidencia como se desenvolveu a internacionalização da
22
educação superior no Brasil. Posteriormente, realizamos uma breve interface com as
influências de organismos internacionais3 na consolidação das políticas educacionais
brasileiras. Trata-se da necessidade de compreender as medidas impostas pelo Estado que
afetam a realidade concreta, evidenciando, sobretudo, como o sistema capitalista atua sobre a
questão, segundo seus interesses, considerando certo período histórico.
No terceiro capítulo, abordamos o contexto sócio-político-econômico referente ao
período de implementação do Programa CsF, para facilitar a compreensão da fisionomia e
funcionamento do programa. Além disso, apresentamos como exemplo o processo de
internacionalização na UFMT, ressaltando a inserção do Programa CsF em tal processo.
Finalmente, no último capítulo, apresentamos a análise dos dados obtidos nas
entrevistas feitas com os representantes de instituições ligados à concepção e à
implementação do Programa CsF, em interlocução com as informações já obtidas nos
capítulos anteriores, com o objetivo de buscar elementos para responder ao questionamento
norteador desta dissertação e suas questões secundárias.
Conclusivamente, analisamos que a internacionalização da educação superior no
Brasil, na perspectiva do que se apresenta no Programa CsF, tende a negligenciar a
solidariedade mútua para se constituir em estratégia para o fortalecimento do modelo político-
econômico vigente, posicionando-se em termos de relações internacionais com a essência da
transnacionalização da educação superior.
3 Seguiremos o entendimento de Bruno (2013, p.18): “O termo internacional, por sua vez, era e continua a ser
empregado para designar o inter-relacionamento entre várias nações. Uma organização internacional busca
produzir acordos entre grupos de várias nacionalidades, constituindo-se no palco em que atos nacionais são
realizados.” (BRUNO, 2013, p.18).
23
1. A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO
CONTEXTO DAS MUDANÇAS SOCIAIS
O presente capítulo contextualiza brevemente o sistema capitalista a partir da 2ª
Guerra Mundial, percorrendo a organização político-econômica do estado de bem-estar social
(na ideologia keynesiana) do regime de acumulação fordista e a organização político-
econômica do neoliberalismo, que se articula com o regime de acumulação flexível
(toyotismo). O texto também adentra na realidade brasileira, evidenciando o novo-
desenvolvimentismo, que se estabelece em meados da década de 2000 no país. Tais estudos
têm a perspectiva de entender os reflexos das políticas globais nas políticas de educação
superior, em especial sobre a internacionalização nesse nível de ensino. Além disso, procura
estabelecer um marco conceitual sobre a internacionalização da educação superior a fim de
nortear as reflexões sobre o tema.
1.1 INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: ESBOÇO PARA UMA
CONSTRUÇÃO TEÓRICA
1.1.1 Geopolítica Mundial: breve delineamento do pós 2ª Guerra Mundial
Como consequência da 2ª Guerra Mundial (1939 – 1945), no conflito dos países
aliados (Inglaterra, França, União Soviética, Estados Unidos da América, Brasil, entre outros)
contra os países do eixo (Alemanha, Itália e Japão), muitos ficaram destruídos, principalmente
os do eixo, que perderam o combate, apresentando-se a necessidade de investimento
financeiro externo para sua reconstrução.
Os Estados Unidos da América (EUA), do lado vencedor da guerra e com potencial
financeiro advindo da liderança da 3ª Revolução Industrial (início em 1940), cuja principal
característica é o uso de tecnologias avançadas no sistema de produção industrial com vista a
alavancar lucros expressivos, desenvolveram um plano de auxílio econômico denominado
Plano Marshall (1947).
O Plano, resumidamente, possuía como objetivos a reconstrução material, recuperação
e reorganização da economia dos países capitalistas, condicionados ao aumento das relações
24
comerciais com o EUA, além de fazer frente aos avanços do socialismo nos países do leste
europeu.
Esse Plano foi propício para o EUA, pois, ao oferecer o auxílio condicionado,
conseguiu aumentar suas exportações e, principalmente, sua influência política sobre os países
auxiliados.
É importante citar que o período pós-guerra, conforme Harvey (1989, p.131), foi
marcado pela expansão do modo de produção baseado no fordismo (implementado,
primeiramente, nos EUA).
Foi consolidado e expandido no período de pós-guerra, seja diretamente, através de
políticas impostas na ocupação [...], ou indiretamente, por meio do Plano Marshall e
do investimento direto americano subsequente. Este último, que começou aos
poucos nos anos entre - guerras, quando as corporações americanas procuravam
mercados externo para superar os limites da demanda efetiva interna, tomou impulso
depois de 1945. Essa abertura do investimento estrangeiro (especialmente na
Europa) e do comércio permitiu que a capacidade produtiva excedente dos Estados
Unidos fosse absorvida alhures, enquanto o progresso internacional do fordismo
significou a formação de mercados de massa globais e a absorção da massa da
população mundial fora do mundo comunista na dinâmica global de um novo tipo de
capitalismo (HARVEY, 1989, p.131).
O autor ainda explicita o diferencial desse modelo econômico:
O que havia de especial em Ford (e que, em última análise, distingue o fordismo do
taylorismo) era a sua visão, seu reconhecimento explícito de que produção de massa
significa consumo de massa, um novo sistema de reprodução da força de trabalho,
uma nova política de controle e gerência do trabalho, uma nova estética e uma nova
psicologia, em suma, um novo tipo de sociedade democrática, racionalizada,
modernista e populista (HARVEY, 1989, p.121).
Com base nessa visão, o fordismo proporcionava trabalho disciplinado com renda e
tempo de lazer para consumir os produtos produzidos em massa, aliando-se à ideologia
keynisiana de promoção do estado de bem-estar social, ou seja, o Estado como agente
regulamentador da vida social, política e econômica do país em parceria com sindicados e
empresas privadas.
A influência política dos EUA foi fundante no Acordo de Bretton Woods, que tinha
como principal objetivo estabelecer disposições para 45 países aliados a fim de definir os
parâmetros que iriam reger a economia mundial após a 2ª Guerra, gerando um sistema
financeiro amplamente favorável aos EUA, que, a partir de então, passou a controlar de fato a
25
economia mundial e o sistema de distribuição de capitais, transformando o dólar na moeda
forte do sistema financeiro mundial e fator de referência para as moedas dos outros
signatários do referido Acordo, como bem demonstra Harvey (1989, p. 131):
Tudo isso se abrigava [características do fordismo] sob o guarda-chuva hegemônico
do poder econômico e financeiro dos Estados Unidos, baseado no domínio militar. O
acordo de Bretton Woods, de 1944, transformou o dólar na moeda-reserva mundial e
vinculou com firmeza o desenvolvimento econômico do mundo à política fiscal e
monetária norte-americana (HARVEY, 1989, p. 131).
Reafirmando o posicionamento imperioso do EUA, Sampaio Jr (2010, p.45) relembra
citação de John K. Galbraith, escritor norte-americano conhecido por suas posições
keynesianas (apud BORON, 2004, p.138): “A globalização não é um conceito sério. Nós, os
norte-americanos, a inventamos para ocultar nossa política de penetração econômica – e,
poderíamos acrescentar, cultural e militar – no exterior.”
O Acordo de Bretton Woods previa a criação de instituições financeiras mundiais para
dar suporte às políticas e projetos de desenvolvimento do mundo todo, como o Banco
Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento sendo depois renomeado para Banco
Mundial (BM) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), ambos com intuito de promover
injeção de capital na economia do país solicitante, no mesmo sistema de condicionamento de
preceitos de disciplina fiscal e jurídica ditados pelos dirigentes das instituições financeiras
mundiais.
Igualmente, com o final da 2ª guerra mundial, em 1945, foi criada a Organização das
Nações Unidas (ONU), com aspiração de manutenção da paz entre as nações mediante
mecanismos de segurança internacional, desenvolvimento econômico, definição de leis
internacionais e respeito aos direitos humanos e progresso social.
No âmbito da ONU, foi estabelecida a UNESCO, sigla para Organização das Nações
Unidas para Educação, Ciências e Cultura, que também promove direcionamentos os quais os
países participantes devem seguir, mediante documentos internacionais.
Em meados de 1960, o fordismo apresenta indícios de problemas na medida em que a
Europa Ocidental e Japão iniciam seus processos de expansão por meio do mercado de
exportação, tendo em vista seus mercados internos estarem saturados, criando, assim, um
cenário de competição, sob a dominação norte-americana. Os EUA, por sua vez, passam por
momentos de instabilidade econômica devido à queda de produtividade e da lucratividade
26
corporativas, fato que gerou problema fiscal, que só seria sanado à custa de uma aceleração da
inflação, o que poderia tornar o dólar uma moeda-reserva internacional instável.
Harvey (1989, p.135) esclarece: “De modo mais geral, de 1965 a 1973 tornou cada vez
mais evidente a incapacidade do fordismo e do keynesianismo de conter as contradições
inerentes ao capitalismo.”
E acrescenta: “No espaço social criado por todas essas oscilações e incertezas, uma
série de novas experiências nos domínios da organização industrial e da vida social e política
começou a tomar forma.” (HARVEY, 1989, p.140). O autor se refere ao modelo de
organização industrial do toyotismo, conhecido como “modelo japonês”, pois foi
desenvolvido por Taiichi Ohno na fábrica da Toyota. Ou, como Harvey define:
A acumulação flexível, como vou chamá-la, é marcada por um confronto direto com
a rigidez do fordismo. Ela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos
mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo
surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de
fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente
intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação
flexível envolve rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual, tanto
entre setores como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto
movimento no emprego no chamado “setor de serviços”, bem como conjuntos
industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas [...]. Ela
também envolve um novo movimento que chamarei de “compreensão do espaço–
tempo” [...] no mundo capitalista – os horizontes temporais da tomada de decisões
privada e pública se estreitaram, enquanto a comunicação via satélite e a queda dos
custos de transporte possibilitaram cada vez mais a difusão imediata dessas decisões
num espaço cada vez mais amplo e variegado (HARVEY, 1989, p.140).
Antunes (1999, p.48) explica a contradição de interpretações sobre a definição da
relação capital e trabalho no toyotismo. Com base em Sabel e Piore (1984), interpreta-o como
sendo uma nova forma de organização industrial, instaurando a especialização flexível e
defende a ideia que esse modelo é:
[...] mais favorável quando comparada ao taylorismo/fordismo, uma vez que
possibilitaram o advento de um trabalhador mais qualificado, participativo,
multifuncional, polivalente, dotado de “maior realização no espaço do trabalho”
(ANTUNES, 1999, p.48).
Em contrapartida, outros autores, como Tomaney (1996, p.157/158), não interpretam
como um novo modelo de organização do trabalho, mas sim como “[...] reconfiguração do
poder no local de trabalho e no próprio mercado de trabalho, muito mais em favor dos
empregadores do que dos trabalhadores.” Antunes (1999, p.48/49) complementa que
27
Tomaney fez uma análise crítica sobre o assunto e concluiu que “[...] a tese da “nova
organização do trabalho” dotada de um “novo otimismo”, vem sido desmentida.”
Antunes (1999, p.50) assume a posição defendida por Tomaney e afirma que “[...] as
mutações em curso [toyotismo] são expressão da reorganização do capital com vistas à
retomada do seu patamar de acumulação e ao seu projeto global de dominação.”
Dentre as mutações desse novo modo organizacional, o toyotismo, podemos destacar a
notável implementação de emprego no setor de serviços a partir do início dos anos 1970, nos
ramos das consultorias, da assistência, das finanças, dos seguros, da saúde e da educação,
promovendo a valorização do empreendimento inovador e com ênfase na informação rápida,
precisa e eficiente colocando o acesso ao conhecimento científico e técnico como vantagem
competitiva tornando o saber, o conhecimento como mercadoria. Dessa forma, Harvey (1989,
p.151) expõe:
O próprio saber se torna uma mercadoria-chave, a ser produzida e vendida a quem
pagar mais, sob condições que são elas mesmas cada vez mais organizadas em base
competitivas. Universidades e institutos de pesquisa competem ferozmente por
pessoal, bem como pela honra de patentear primeiro novas descobertas científicas
[...] A produção organizada de conhecimento passou por notável expansão nas
últimas décadas, ao mesmo tempo que assumiu cada vez mais um cunho comercial
(como provam as incômodas transições de muitos sistemas universitários do mundo
capitalista avançado de guardiões do conhecimento e da sabedoria para produtores
subordinados de conhecimento a soldo do capital corporativo) (HARVEY, 1989,
p.151).
Vemos aqui os primeiros sinais assumidos pela educação no contexto do toyotismo e
neoliberalismo, os quais aprofundaremos adiante.
Ao retomarmos o contexto econômico-político, observamos que o toyotismo, aliado ao
esforço de superação dos países arrasados na 2ª Guerra Mundial, principalmente no Japão,
promoveu rápida recuperação do comércio externo dos países aliados e à medida que iam se
fortalecendo começaram os questionamentos sobre a liderança do EUA no Acordo de Bretton
Woods.
Aos poucos, o superávit na conta de transações correntes dos EUA foi diminuindo, até
que, em 1971, apresentou seu primeiro déficit. Para tentar recuperar a competitividade de sua
economia, esse país buscou convencer os aliados ao Acordo a valorizarem suas moedas de
forma coordenada para que o dólar desvalorizasse, sem que o preço do ouro em dólar
28
variasse, mas não conseguiu, então, não viu outra forma a não ser romper com o Acordo de
Bretton Woods.
Fernandes (2009, s.p.) esclarece esse fim:
A justificativa imediata para romper com o acordo baseou-se no argumento de que o
desequilíbrio externo dos EUA era determinado por práticas comerciais desleais dos
países europeus e do Japão (14). Mas hoje está claro que o alcance desta decisão
crucial do Estado norteamericano foi muito maior do que se poderia imaginar na
época. O desenrolar das décadas seguintes demonstrou que o fim do padrão dólar-
ouro não foi uma derrota do capitalismo norte-americano, nem se tratou de uma
imposição natural dos mercados, mas sim de uma política estratégica bem
articulada. Daí surgiu um novo padrão monetário, o chamado dólar flexível, inédito
na história das relações internacionais, e ainda mais vantajoso para os EUA. Este
acontecimento também marca a volta da grande finança ao centro do poder, numa
espécie de revanche contra aqueles que lutaram contra a liberdade dos capitais no
período de Bretton Woods. Isso ficou evidente nos anos 1990 quando a vitória do
neoliberalismo parecia incontestável e o dólar se configurou como a moeda da
globalização financeira (FERNANDES, 2009, s. p.).
Após a ruptura do Acordo de Bretton Woods, em 1971, concomitante com a
fragilidade demonstrada pela crise do estado de bem-estar na ideologia do keynesianismo,
expressa por problemas reais, como superinflação, instabilidade econômica e estagnação nos
países capitalistas desenvolvidos, o neoliberalismo surgiu como uma reação política, uma
contraproposta ao Estado assistencialista, considerado excessivamente oneroso aos cofres
públicos. Iniciou-se então, um novo modelo de organização político-econômica, baseado na
concepção do neoliberalismo.
Moraes (2001, p. 32) lembra um evento importante antes do renascer neoliberal: os
documentos da chamada Comissão Trilateral, que alertavam que a sobrecarga do Estado
gerada pelos compromissos do bem-estar social do modelo keynesianismo levaria à
ingovernabilidade das democracias:
[...] autores como Samuel Huntington, Daniel Bell, Irving Kristol e Zbignew
Brzezinski enunciam um receituário inflexível: era preciso limitar a participação
política, distanciar a sociedade e o sistema político, subtrair as decisões
administrativas ao controle político (MORAES, 2001, p.32).
A citação apresenta princípios basilares do neoliberalismo: o Estado retraído da função
social e não regulamentadora da economia, ideologia que conquistou governos de países
desenvolvidos, como Inglaterra e EUA.
O neoliberalismo, tendo como patrono Friedrich von Hayek, em sua obra “O caminho
da Servidão”, lançada em 1944, entendia que o igualitarismo propagado pelo estado de bem-
29
estar destruía a liberdade dos cidadãos e a vitalidade da concorrência, da qual dependia a
prosperidade de todos (HAYEK, 2010). Hayek defende com uma nova roupagem o
liberalismo clássico, construindo um paralelo contra o Estado mercantilista e as corporações,
que, conforme explica Moraes (2001, p.28):
Segundo eles, os inimigos vestiam agora outros trajes, mas revelavam as mesmas
taras e perversões. Um desses inimigos era o conjunto institucional composto pelo
Estado de bem-estar social, pela planificação e pela intervenção estatal na economia,
tudo isso identificado com a doutrina keynesiana. O outro inimigo era localizado nas
modernas corporações – os sindicatos e centrais sindicais, que, nas democracias de
massas do século XX, também foram paulatinamente integrados nesse conjunto
institucional. Além de sabotar as bases da acumulação privada por meio de
reivindicações salarias, os sindicatos teriam empurrado o Estado a um crescimento
parasitário, impondo despesas sociais e investimentos que não tinham perspectiva de
retorno (MORAES, 2001, p.28).
Em suma, o pensamento neoliberal apresentava como solução para crise do capital da
doutrina keynesiana a diminuição dos gastos públicos com políticas sociais e a adesão às
privatizações, como forma de beneficiar o mercado, o interesse individual.
Fiori (1997, p. 218) entende que o neoliberalismo foi concebido como um “casamento
virtuoso, ou pelo menos vitorioso, entre as ideias e o movimento real do capital.”
Especificando o movimento do setor de educação, principalmente da educação
superior, no mundo perante o contexto do neoliberalismo, temos a seguir citação
esclarecedora de Dias (2002, p.33):
No campo do ensino superior, a grande tendência dos últimos anos é a
comercialização favorecida pelo desenvolvimento das novas tecnologias e
estimulada pela OMC. O desenvolvimento da sociedade do conhecimento, que
representaria, se bem administrado, um grande instrumento para dividir as riquezas
no mundo, corre o risco de se tornar um fator adicional de dominação por parte de
poucos e de exclusão da maioria (DIAS, 2002, p.33).
Tal citação expõe que no contexto neoliberal a educação é tratada como mercadoria,
colocando-a como ferramenta para “dominação de poucos” e “exclusão da maioria”.
A seguir, adentramos com mais detalhe como se desenhou o contexto sócio-político-
econômico brasileiro a partir do período ditatorial (1964) até os dias atuais.
30
1.1.2 A particularidade brasileira
Os chamados países subdesenvolvidos, destacando-se os países latino-americanos,
atravessaram momentos diversos nas décadas de 1950, 1960 e 1970 em relação aos países
desenvolvidos e não vivenciaram em essência o estado do bem-estar social do keysianismo,
tendo em vista as ditaduras militares impostas em países como Brasil, Argentina, Uruguai e
Chile.
No Brasil, a ditadura militar perdurou de 1964 a 1985, mesclando o caráter
autoritário com o desenvolvimentista, “[...] apoiado, articulado desde seu início pelos Estados
Unidos em conjunto com as forças de direita, extrema direita, civil e militar do Brasil.”
(ZENHA, 2014, s. p).
A ditadura se estabeleceu com o golpe militar que derrubou o governo do presidente
democraticamente eleito João Goulart, como uma reação à possibilidade de uma inclinação do
Brasil ao socialismo (ou a um modelo mais progressista). Entrou em decadência na medida
em que o governo não conseguiu mais estimular a economia, controlar a inflação crônica e os
níveis crescentes de concentração de renda e pobreza, impulsionando ao movimento pró-
democracia. Disso resultou a eleição de José Sarney, em 1984, que assumiu o cargo de
presidente de 1985 a 1990, iniciando o período conhecido como Nova República.
Vale ressaltar a interpretação de que no período ditatorial o pensamento
predominante era o nacional-desenvolvimentismo (1940-1970), conforme Castelo (2010,
p.192/193), que explica:
Nessa época, trabalhos seminais, gestados na Comissão Econômica para América
Latina e Caribe (Cepal) e no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (Iseb),
começaram um processo de formulação de teorias explicativas das condições
estruturais do subdesenvolvimento da periferia do sistema mundial, com ênfase nas
especificidades da América Latina. Nascia o chamado nacional-
desenvolvimentismo, termo consagrado nos trabalhos de autores como Celso
Furtado, Hélio Jaguaribe, Candido Mendes, entre outros. [...] pois era possível
identificar características similares a todos os seus autores, entre as quais (i) a defesa
da autonomia e da soberania nacionais; (ii) a industrialização como meio mais
eficiente para a superação dos entraves ao desenvolvimento da periferia; (iii) o
Estado entendido como um agente estratégico promotor de políticas de planejamento
e bem-estar social; e, (iv) a participação ativa de uma intelligentsia culta e bem
formada na gerência de postos-chave do Estado (CASTELO, 2010, p.192/193, grifo
autor).
31
Porém, as características citadas, principalmente no que tange ao investimento da
industrialização como meio de desenvolvimento do país, não alcançaram o esperado e o
subdesenvolvimento não foi superado, enfraquecendo tal pensamento. Fontes (2010, p.15)
considera que, para evitar retrocessos, visto que a sociedade estivera marcada por torturas,
massacres, censura e alísios forçados, além de uma economia esmorecida pelas dívidas do
período militar, o Estado faz alianças que configuram a reprodução do capital, via
neoliberalismo:
O estado de direito, logo que reconquistado, foi submetido às esdrúxulas alianças
entre a grande propriedade, amalgamando oligarquias, terratenentes, burguesias
industriais, agrárias, comerciais, bancárias, financeiras, compradoras e outras que,
novamente contra suas populações, convocaram capitais e poderes transnacionais
para tentar alcançar a última novidade de então, o neoliberalismo. Pela virulência
econômica das reestruturações e expropriações, pelas forças policiais, pela mídia
latifundiária, e também pela sedução das “parcerias” e de vultosos recursos
destinados a desviar para rumos adaptativos ( e não mais reivindicativos) a atuação
de setores das organizações de trabalhadores, conformou-se um capitalismo cujas
feições democráticas se enrijeciam, similares a um doloroso ricto (FONTES, 2010,
p.15).
A ideologia neoliberal foi imposta aos países da América Latina como condição para
renegociação de dívidas externas, que passaram a ter vigilância mais acirrada e gerenciamento
das economias pelo BM e FMI, fomentadores de tais recursos.
De acordo com Sader (2003, p.137), José Sarney teve um governo moderado que:
[...] teve como lema o que até recentemente seria considerado um grave pecado pelo
receituário vigente do Fundo Monetário Internacional – “Tudo pelo social” -, mesmo
que concebesse de forma assistencialista. Essas tendências brasileiras atrasaram a
aplicação no Brasil das políticas de ajuste fiscal (SADER, 2003, p.137).
A partir 1990, o modelo do neoliberalismo é inserido no Brasil, expressando-se nos
governos dos presidentes Fernando Collor/Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. Esse
modelo político teve como base o Consenso de Washington, documento formulado pelo BM,
FMI e Tesouro dos EUA, que continha um conjunto de medidas destinadas aos países em
desenvolvimento para promover o ajuste macroeconômico, a exemplo de privatizações de
empresas estatais e serviços públicos e desregulamentação do Estado para diminuir a
interferência nos poderes privados.
Moraes (2001, p.39) destaca a ironia do fato de que após o povo conseguir o direito
ao voto, as decisões político-econômicas passaram a outro patamar, o das diretrizes mundiais.
32
Durante os séculos XIX e XX, os movimentos trabalhistas haviam lutado para
conquistar o voto, o direito de organização e, assim, influir sobre a elaboração
politicas, definição de leis e normas. Agora que conquistaram esse voto, o espaço
em que se exerce é esvaziado em proveito de um espaço maior, mundializado, onde
eles não votam nem opinião (MORAES, 2001, p.39).
Porém, no final do século XX e início do século XXI, no contexto sul-americano, o
modelo neoliberal mostra sinais de crise e as reações populares emergem, como destaca
Castelo (2010, p.193):
[...] mostra sinais claro de esgotamento no plano econômico, com a persistência dos
desequilíbrios macroeconômicos, a redução dos direitos sociais e o aumento do
desemprego estrutural e do pauperismo relativo. A crise argentina de 2001 seria o
mais claro exemplo do fracasso neoliberal. As reações populares não tardam a
acontecer e a América do Sul vivencia um novo contexto histórico, indo em direção
contrária do resto do mundo. Um a um, os projetos neoliberais dão uma guinada à
esquerda; antigos dirigentes dos projetos neoliberais locais são defenestrados do
poder e novos governantes são eleitos com maciço apoio popular. Temos, assim,
uma janela histórica que abre possibilidades de movimentos políticos e ideológicos
contestatórios ao neoliberalismo (CASTELO, 2010, p.193, grifo nosso).
Nessa conjuntura, a ideologia do desenvolvimentismo ganha força no Brasil e
reaparece com novo termo: novo-desenvolvimentismo, sintetizado pelo projeto político
conduzido por Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010). Tal modelo representa o ressurgimento
das características do nacional-desenvolvimento, todavia, em uma realidade político-
econômica diferente, como ilustra Castelo (2010, p.194):
O termo “desenvolvimentismo” foi uma expressão marcante de um passado não tão
remoto, mas que com as transformações sociais ocorridas nestas últimas três
décadas, tornou-se antiquado, anacrônico. Logo, é preciso abandoná-lo, não somente
no sentido terminológico, mas dar-lhe um sentido conceitual inovador, adequado às
configurações do capitalismo contemporâneo. Para novos tempos, uma nova teoria;
para novos desafios, um novo projeto nacional. Daí o termo “novo-
desenvolvimentismo” (CASTELO, 2010, p.194).
O novo-desenvolvimentismo tem como principal objetivo aliar crescimento
econômico do país com distribuição de renda. Segundo Castelo (2010, p.196), “O Estado
seria uma espécie de ente político promotor de condições propicias para o capital investir seus
recursos financeiros e gerar emprego e renda para população em geral.” Então, o Brasil se
comprometeu a buscar o desenvolvimento aliado à parceria com os países desenvolvidos
mantendo os contratos vigentes e respeitando as diretrizes dos organismos internacionais.
33
Certos intelectuais (CARCANHOLO, 2010; CASTELO, 2010; MARINI, 2010)
criticam esse modelo, pincipalmente, levando em conta a manutenção do Estado burguês
como complementar ao mercado, na tentativa de conciliar capital e trabalho.
Mesmo assim, Bastos (2012, p.799, grifo nosso) afirma que: “No Brasil, a conjuntura
foi oportuna para que os grupos desenvolvimentistas do governo Lula avançassem sobre o
domínio conservador das políticas macroeconômicas, processo que parece aprofundar-se no
governo Dilma.”
Dilma Rousseff, como Presidente da República (2011-2014), parece desenvolver seu
mandato na mesma diretriz: crescimento econômico com distribuição de renda aliado à
parceria com os países desenvolvidos e em desenvolvimento.
1.1.3 Reflexos das políticas globais nas políticas de educação superior, com foco na
internacionalização
Conforme já citado, Harvey (1989, p.151) explica que no sistema capitalista, sob o
neoliberalismo e o enfoque econômico na acumulação flexível e toyotismo, o saber, o
conhecimento científico e técnico ganham maior ênfase no processo de vantagem
competitiva, tornando-se uma mercadoria-chave, intrinsecamente ligada aos interesses
ideológicos e pragmáticos da reprodução e expansão do sistema. Como explica Harvey (1989,
p.151), “O próprio saber se torna uma mercadoria-chave, a ser produzida e vendida a quem
pagar mais, sob condições que são elas mesmas cada vez mais organizadas em base
competitivas.”
Isso posto, a aplicação dos princípios neoliberais na política educacional não foi
diferente dos princípios aplicados nas políticas globais, como ilustra Santos (2011, p. 32):
A inculcação ideológica serve-se de análises sistematicamente enviesadas contra a
educação pública para demonstrar que a educação é potencialmente uma mercadoria
como qualquer outra e que a sua conversão em mercadoria decorre da dupla
constatação da superioridade do capitalismo, enquanto organizador de relações
sociais, e da superioridade dos princípios da economia neoliberal, para potencializar
as potencialidades do capitalismo através da privatização, desregulação,
mercadorização e globalização (SANTOS, 2011, p. 32).
É importante ressaltar que o Estado é o protagonista para implementar e gerenciar as
políticas públicas, contudo, essas resultam de contradições e embates de interesses entre os
34
envolvidos (organismos internacionais, movimentos sociais, Estado, partidos políticos),
conforme expressa Silva (2008, p.36):
O Estado resulta de certa construção histórica, de um campo de contradições e de
luta por interesses e projetos, que, por sua vez, emanam das forças diversas que
interagem na sociedade. Isso significa entende-lo como reflexo das relações sociais,
detentor de um poder que é, ao mesmo tempo, delimitado e relativo. Delimitado,
porque se caracteriza por uma hegemonia de classe; relativo, porque é também
penetrado pelos diversos estratos da sociedade, em ocasiões de maior ou menor
proporção. Por consequências, as políticas geridas pelo Estado são produtoras de
consensos e, ao mesmo tempo, portadoras de contradições (SILVA, 2008, p.36).
Nessa perspectiva dialética, salientando as contradições do processo, serão descritos
os posicionamentos de sujeitos sociais que interagem e contrapõem os interesses na
formulação da política de educação superior, assumindo enfoque no sentido da
internacionalização desse nível de ensino.
Um dos disseminadores do ideário neoliberal são os organismos internacionais,
sendo eles Organização Mundial do Comércio (OMC), BM, UNESCO, entre outros.
Evidenciamos dois posicionamentos confluentes na política de educação superior,
um por parte da OMC e outro pelo BM, apontados por Lima (2005, p.159) e Santos (2011,
p.24):
Justificando que a educação é um importante “capital humano”, para promoção do
crescimento econômico e do desenvolvimento individual e social, garantindo a
integração de cada país no comércio mundial, a OMC reivindica a necessidade do
estabelecimento de parcerias público-privadas para o financiamento da educação
superior, sinalizando, inclusive, a diluição das fronteiras entre público e privado
(LIMA, 2005, p. 159).
Basta referir o relatório do Banco Mundial de 2002 onde se assume que não vão
(isto é, que não devem) aumentar os recursos públicos na universidade e que, por
isso, a solução está na ampliação do mercado universitário, combinada com a
redução dos custos por estudantes [...]e com a eliminação da gratuidade do ensino
público (SANTOS, 2011, p.24).
Nos documentos dos referidos organismos, podemos identificar o princípio
neoliberal da privatização do ensino público, em consonância com o exposto por Santos
(2011, p.22-39), ao destacar dois “pilares” do projeto político-educacional do neoliberalismo:
a descapitalização da universidade pública e a transnacionalização do mercado universitário,
que significa respectivamente, diminuição de recursos para as universidades públicas e
abertura do mercado educacional transnacional. O autor esclarece que essas ações constituem
35
um fenômeno global, ainda que tenham consequências diferentes no centro, na periferia e na
semiperiferia do sistema mundial (SANTOS, 2011, p.22-39).
O movimento de transformar a universidade de bem público em mercadoria ganha
impulso no fim da década de 1990. Dias (2002, p. p. 33) mostra as duas forças representativas
de interesses distintos expressas na Conferência Mundial sobre Educação Superior (1998),
cuja influência nos rumos da educação superior não pode ser subestimada, tendo em vista a
repercussão desse evento sobre vários países:
Em 1998, em Paris, durante a Conferência Mundial sobre Educação Superior
(CMES) na UNESCO, a comunidade acadêmica internacional e governos de mais de
180 países manifestaram, de maneira clara e insofismável, sua decisão de manter o
ensino superior como um direito e um bem público. No entanto, ao mesmo tempo e
sem fazer alarde, o secretariado da OMC, com o apoio de representantes de alguns
governos que contraditoriamente aprovaram a Declaração de Paris, manobrava para
criar normas que tratassem o ensino superior como uma mercadoria a ser
comercializada e liberalizada, retirando dos Estados nacionais, em termos práticos, o
direito de decidir com soberania sobre ações que visem formar cidadãos conscientes
e responsáveis (DIAS, 2002, p.33, grifo nosso).
Por sua vez, a OMC possui como regras gerais para todo serviço comercial o Acordo
Geral sobre o Comércio de Serviços (AGCS), de modo que: “O objetivo do AGCS, aprovado
em abril de 1994, é o de provocar uma liberalização progressiva dos serviços, inclusive os
educacionais.” (DIAS, 2002, p.48). É a partir de 1999, que em um documento relativo à área
de cobertura do AGCS, a educação passa a ser regulamentada na OMC como serviços de
educação, sendo aceito por todos os países membros, incluindo o Brasil. Porém, é necessário
que os membros estabeleçam acordos bi ou multilaterais entre si.
Em pesquisa, feita em janeiro de 2015 aos arquivos da OMC, identificamos que já
foram estabelecidos 683 acordos bi ou multilaterais, envolvendo 35 membros, sendo eles:
Austrália, Burundi, Cambodia, Canadá, Chile, China, Colômbia, Costa Rica, El Salvador,
EUA, Guatemala, Honduras, Índia, Islândia, Japão, Quênia, Malásia, Marrocos, México,
Niquaragua, Noruega, Nova Zelândia, Panamá, Paquistão, Peru, Reino de Bahraim, República
da Coréia, República Dominicana, Ruanda, Singapura, Suécia, Tailândia, Tanzânia, Uganda,
Vietnam (World Trade Organization, 2015).
Como podemos notar, o Brasil, apesar de ter aceitado a inclusão da educação como
serviços pela AGCS, ainda não formalizou qualquer acordo específico sobre o assunto, porém
muitas medidas vão nessa direção.
36
Como exemplo da transnacionalização do mercado universitário no Brasil, podemos
citar a autorização dada, em 14 de maio de 2014, pelo Conselho Administrativo de Defesa
Econômica/Ministério da Justiça acerca da fusão das empresas de ensino superior Anhanguera
e Kroton tornando-a “[...] a maior companhia de ensino superior do mundo com mais de um
milhão de alunos.” (Jornal Folha de São de Paulo, 2015).
Tal fusão transnacional tem como características predominantes: que as empresas
atuem no mercado financeiro, possuam participação de originárias estrangeiras e aspirem por
recursos públicos, itens constantes na reportagem de capa “Os bilionários da Educação”,
escrito por Luciele Velluto, na revista Isto é Dinheiro, de 01/05/2013:
A união dos dois grupos educacionais foi bem recebida pelo mercado financeiro. No
acumulado da semana até quinta-feira 25, os papéis da Kroton e da Anhanguera
subiram 9,64% e 7,14%, respectivamente na Bovespa. Essa parceria também é
apontada como um possível catalisador para o ingresso de novos fundos de
investimentos no segmento. Anhanguera e Kroton cresceram, em boa medida,
graças ao suporte de gestão e aos recursos injetados pelos fundos. A primeira
com o brasileiro Pátria, a segunda com o Advent, dos EUA. A nova Kroton é um
colosso por qualquer ângulo que se analise (VELLUTO, 2013, p.43/44, grifo autor).
Apesar dessa permissão pelo Governo Federal, vale ressaltar a garantia
constitucional brasileira da existência de um sistema público de educação superior totalmente
gratuito oferecido pelas universidades e institutos federais. Assim, percebe-se o aspecto
contraditório do sistema, que assegura modelos opostos e que de algum modo se articulam.
Voltando ao AGCS, Dias (2002, p.49) cita, ainda, as modalidades incluídas no
mesmo:
[...] o fornecimento de serviços através das fronteiras, o consumo dos serviços no
estrangeiro, a presença comercial (quando, por exemplo, um estrangeiro torna-se
proprietário no território de outro país, como fazem as cadeias de hotéis) e a
presença de pessoas físicas (DIAS, 2002, p.49).
Santos (2011, p.34/35) especifica cada uma das modalidades, conforme:
A oferta transfronteiriça consiste na provisão transnacional do serviço sem que
haja movimento físico do consumidor. [...] O consumo no estrangeiro consiste na
provisão do serviço através do movimento transnacional do consumidor. [...] a
presença comercial e consiste em produtor privado de educação superior
estabelecer sucursais no estrangeiro a fim de aí vender os seus serviços. [...] a
presença de pessoas consiste na deslocação temporária ao estrangeiro de
fornecedores de serviços sediados num dado país, sejam eles professores ou
pesquisadores (SANTOS, 2011, p.34/35).
37
Contudo, certas associações universitárias esboçam reações contra a inclusão
da educação como setor de serviços no AGCS/OMC:
No dia 28 de setembro de 2001, quatro grandes organizações universitárias da
Europa, Canadá e Estados Unidos enviaram ao governo do Canadá, ao representante
dos Estados Unidos na área de comércio junto à Comissão Europeia e aos governos
dos Estados europeus uma nota contrária à proposta da OMC de incluir o ensino
superior como um dos doze setores de serviço incluídos no AGCS (DIAS, 2002,
p.51).
As referidas organizações universitárias “ricas e de países ricos” (DIAS, 2002, p.52)
baseiam-se nos princípios da Conferência Mundial sobre o Ensino Superior (1998) na
UNESCO, que orienta manter o ensino superior como bem público:
Como enfatizaram as ONG´s “a razão de ser do ensino superior é a de servir o
interesse público e não de constituir uma ‘mercadoria’, fato que os Estados-
Membros da OMC reconhecem através de convenções e declarações da UNESCO e
de outras instâncias internacionais ou multilaterais” (DIAS, 2002 p.52).
O autor ainda afirma que:
As ONGs reclamam do fato de que, em muitos países, não se desenvolveu um
procedimento eficaz de consulta entre altos funcionários e representantes dos
estabelecimentos de ensino superior e indicam, com precisão, que os tribunais
comerciais interpretam de maneira restrita os acordos internacionais no que dizem
respeito à educação e, em particular, ao ensino superior (DIAS, 2002, p.53).
Contudo, a nota assinada pelas referidas organizações universitárias: Associação das
Universidades e Colégios do Canadá (AUCC), Associação Europeia de Universidades (AEU);
American Council Educaton (ACE); Council for Higher Education Accreditation (CHEA), é
ambígua, a julgar pela afirmação de que: “O ensino superior representa um serviço
completamente diferente da maior parte dos outros setores de serviço em função de seu
mandato público, que pode ser delegado, mas que é essencialmente público” (DIAS, 2002,
p.55, grifo nosso). Tal posicionamento pode, talvez, ser assim explicado “[...] pelo fato de
representarem entidades que, embora pública, passaram a adotar, em grande número, no
campo internacional e em suas relações com universidades dos países em desenvolvimento,
uma atitude igualmente comercial.” (DIAS, 2002, p.56).
Outra manifestação contrária à inclusão da educação como serviço regulamentado
pela AGCS aconteceu no Brasil em 2002:
Na oficina sobre Ciência e Tecnologia (“Ciência e Tecnologia, um instrumento para
a paz no Século XX, organizada durante Fórum Social de Porto Alegre, por
38
iniciativa da Secretaria de Ciência e Tecnologia do Governo do Rio Grande do Sul),
seus participantes adotaram uma decisão, propondo um pacto global que, entre
outros, assegure os seguintes objetivos gerais: 1. A consolidação dos princípios de
ação aprovados na I Conferência Internacional sobre Ensino Superior [...],
promovida, pela UNESCO [...] 2. A exclusão do ensino superior do Acordo Geral de
Serviços da OMC [...] (DIAS, 2002, p.55).
Apesar das reações contrárias à mercadorização da educação, Dias (2002, p.35)
afirma que prevalece a tendência mercantil, conforme estimulada pela OMC:
No campo do ensino superior, a grande tendência dos últimos anos é a
comercialização favorecida pelo desenvolvimento das novas tecnologias e
estimulada pela OMC. O desenvolvimento da sociedade do conhecimento, que
representaria, se bem administrado, um grande instrumento para dividir as riquezas
no mundo, corre o risco de se tornar um fator adicional de dominação por parte de
poucos e de exclusão da maioria (DIAS, 2002, p.35).
O autor, ao retomar sobre o documento aprovado pela OMC para tratar o ensino
superior de forma mercantil, afirma que a justificativa é pautada num sofisma “[...] que, a
partir do momento em que se admitem instituições particulares como provedoras de ensino,
este torna-se comercial, aplicando-se, pois, a ele, as regras da OMC.” (DIAS, 2002, p.41).
Reitera, ainda, que no documento da OMC são demonstradas as suas verdadeiras intenções:
[...] desde o inicio dos anos 90, cerca de 1,5 milhão de estudantes universitários
estavam matriculados no Exterior, o que, sem dúvida, poderia representar um
mercado muito importante. Nos Estados Unidos, o número de estudantes
estrangeiros no período de 1989-1993 cresceu numa proporção de 3 a 6% ao ano.
Entre 1996 e 1997, o número de estudantes estrangeiros era quase meio milhão. Em
1995, o mercado global para o ensino superior era estimado em 27 bilhões de
dólares (DIAS, 2002, p. 43).
Uma das questões preocupantes envolvida no processo de comercialização da
educação superior refere-se à especialização, padronização e homogeneização do saber, isto é,
à recusa ao diferente, ao plural e ao controle ao acesso, pois saber é poder, conforme defende
Oliveira (2001, p.127):
Nesse processo, vê-se ocorrer uma nova síntese, na qual caminham as
especializações. Desse desencantamento, dessa constituição de práticas que são
saberes e são também poderes, o conhecimento transforma-se em algo que passa a
ser capaz de moldar a própria reprodução da sociedade, que passa a ser moldada
cada vez mais pelo acúmulo e pela radicalização das especializações. É nesse
momento, fatal na aventura do conhecimento, que o conhecimento vai se tornar uma
mercadoria. Este é o seu “calcanhar de Aquiles”. No momento em que as
especializações passam a ser um diálogo circunscrito aos especialistas, no momento
em que elas começam a moldar o próprio comportamento da Humanidade, o
conhecimento deu um passo decisivo e transformou-se em mercadoria. E uma
mercadoria só se reproduz pela sua mimese, pela sua homogeneidade; a mercadoria
recusa a diferença, recusa o diverso, recusa o plural; a mercadoria é univocidade.
39
Nesse caminho, o capital apossou-se do conhecimento. Não do conhecimento para a
liberdade, mas do conhecimento como mercadoria, do conhecimento como molde de
produção da sociedade, do conhecimento como controle do acesso aos saberes e
poderes (OLIVEIRA, 2001, p.127).
Dias Sobrinho (2005, p.153) completa acerca do mercado atraente da educação
superior:
Em alguns países, os serviços de educação superior estão entre os cinco principais
itens de exportação e representam no mínimo 3% do total de serviços. Segundo
estudos da OCDE, os Estados Unidos faturam, por ano, somente em matrículas de
estudantes estrangeiros em cursos superiores, algo como 14 bilhões de dólares,
quantia que alcança algo como uma vez e meia a soma dos orçamentos públicos para
a educação superior do conjunto dos países latino-americanos. Calcula-se que o
comércio internacional de educação movimenta cerca de 30 milhões de dólares
anuais somente nos países da ODCE (DIAS SOBRINHO, 2005, p.153).
De fato, o mercado educacional internacional possui cifras expressivas4. Sob o eixo
da transnacionalização do mercado universitário, influencia a condução da política de
educação superior, principalmente, no seu processo de internacionalização.
Ao focar a internacionalização na educação superior, interesse primordial a este
trabalho, é importante esclarecer que a mesma articula-se à tradição da universidade como
contributo acadêmico mútuo. Nessa perspectiva, Dias Sobrinho (2005, p.139) explica:
Por vocação e tradição, a universidade tem sido uma instituição que preserva e
alimenta a dimensão internacional, seja pelo sentido da ciência e pelos critérios de
qualidade e cientificidade, isto é, pelos valores autenticamente acadêmicos, seja
pelas iniciativas práticas de intercâmbio institucionais e mobilidade de estudantes e
professores. [...] Fazem parte da tradição universitária as parcerias e vários tipos de
cooperação que objetivam aumentar a qualidade acadêmica, e a relevância social da
educação superior. O sentido predominante da internacionalização universitária tem
sido ao longo dos tempos o de colaboração acadêmica buscando o avanço da ciência
e da educação (DIAS SOBRINHO, 2005, p.139).
De acordo com Morosini (2006, p.97), o campo de estudos da internacionalização da
educação superior compreende a noção de relações entre nações, políticas, programas de
governo, sistemas e instituições de ensino superior, ressaltando a forma como lidam com o
sistema internacionalizado (MOROSINI, 2006).
A internacionalização da educação superior pode contribuir para desenvolver
habilidades interculturais, ampliação das vertentes do conhecimento acadêmico, visão
4 Como exemplo, podemos citar o próprio Programa Ciência sem Fronteiras, objeto de estudo dessa dissertação,
que teve como orçamento inicial o valor de R$3,1 bilhões, conforme pronunciamento da presidente Dilma
Rousseff, na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social realizada em julho de 2011 (Jornal
Valor Econômico, 2011).
40
holística do saber e larga vivência pessoal com objetivo de solidariedade mútua, de maior
tolerância entre povos e cooperação mundial.
Por quê? Azevedo e Catani (2012, p.274) esclarecem:
Isso porque a circulação de ideias e a educação, inclusive a superior,
necessariamente, implicam em compartilhamento de cultura e de conhecimento. Isso
pode ocorrer tanto em nível restrito, para as elites, quanto de maneira ampla, sem
discriminação de classes; tanto em plano nacional, com vista à unificação, como
internacional, para a promoção da solidariedade entre os povos. Assim, conceber
“cultura como civilidade” e “cultura como solidariedade”, de acordo com Eagleton
(2000, p.112), pode significar somente a reunião de “inimigos jurados”; porém,
também pode, de forma inversa, transformar essas junções (cultura/civilidade e
cultura/solidariedade) em potentes “aliados” (AZEVEDO; CATANI, 2012, p.274).
A categoria contradição contribui para analisar o fenômeno da
internacionalização de educação superior, mostrando os sentidos opostos presentes: “[...] o
sentido humanista da solidariedade e da civilidade, ou sentido coisificante da expansão
capitalista e da mercadorização (commodification).” (AZEVEDO; CATANI 2012, p.274).
Conforme já analisado, as políticas globais afetam as políticas de educação superior,
tendendo a tratar a educação como mercadoria, o que gera pressão para que as exigências do
mercado se sobreponham aos ideais da cooperação internacional solidária. Sendo assim, as
instituições de educação superior sofrem os efeitos de tais forças, inclinando-se a uma visão
mais pragmática, competitiva, de utilidade e de produção de inovações.
Santos (2011) designa o referido quadro por “transnacionalização do mercado
universitário”, dadas as suas características.
Dias Sobrinho (2005, p.141) explica a distinção entre ambos os conceitos de
internacionalização e de transnacionalização da educação superior:
Uma coisa é a internacionalização da educação superior, fundada na idéia do valor
universal do conhecimento e da formação e expressa pelas diversas formas de
cooperação entre instituições, pesquisadores, professores e estudantes. Isso incide
sobre organizações intergovernamentais, agências de cooperação e programas
institucionais. Coisa diferente é a transnacionalização. Diferentemente da
cooperação internacional, a transnacionalização tem como principais motivações a
competitividade e o lucro (DIAS SOBRINHO, 2005, p.141).
Nesse contexto, sobressai a premissa de que a universidade deve formar um
profissional para atender aos interesses imediatos do mercado de trabalho, do tipo descrito por
Antunes (1999, p.48), com base em Saber e Piore (1984): “um trabalhador mais qualificado,
41
participativo, multifuncional, polivalente, dotado de “maior realização no espaço do
trabalho.”
O ponto propulsor que levou a universidade “produtora de conhecimento” para a
“universidade formadora de profissional para o mercado de trabalho” parece ter sido o
estabelecimento do Processo de Bolonha, na década de 1990. O referido processo criou um
Espaço Europeu de Ensino Superior, onde os membros se comprometeram a reformar seus
sistemas de ensino em busca de homogeneização, flexibilidade e competitividade
internacional, visando atender ao objetivo revelado por Dias Sobrinho (2009, p.134):
No fundo, a “Declaração de Bolonha” é o registro formal de um importante processo
que visa criar uma sólida convergência na educação superior europeia, a fim de que
esta responda adequada e eficientemente aos problemas, oportunidades e desafios
gestados pela globalização da economia. Daí a necessidade de adaptar os currículos
às demandas e às características do mercado de trabalho, impulsionar a mobilidade
de estudantes, professores e funcionários e, não menos importante, tornar a educação
superior atraente no mercado global (DIAS SOBRINHO, 2009, p.139).
Na América Latina e Caribe, parece não haver consenso nos entendimentos sobre a
educação superior, conforme o que professa Bolonha. Algumas iniciativas já foram tomadas
no sentido de fortalecimento sul-sul, a exemplo das redes universitárias: Espaço de Encontro
Latino-Americano e Caribenho de Educação Superior (ENLACES), União das Universidades
dos Países Membros do Tratado de Cooperação Amazônica (UNAMAZ) e União das
Universidades da América Latina (UDUAL), dentre outros. Porém, seu desenvolvimento
ainda é incipiente. Consequentemente, as universidades tendem a agir sozinhas e/ou em redes
nacionais para atuar na internacionalização da educação superior.
Devemos entender, enfim, que se trata de um processo permeado por contradições e
embates; portanto, complexo.
A seguir estabeleceremos um marco conceitual sobre a internacionalização da
educação superior a fim de nortear as reflexões sobre o tema.
1.2 A INTERNACIONALIZAÇÃO NAS PESQUISAS ACADÊMICAS
Por conceber o estado da arte5 como um procedimento metodológico fundamental
para apreensão da temática da internacionalização da educação superior, visando identificar o
5 Corroboramos com o conceito de estado da arte definido por Ferreira (2002, p.258) como sendo uma
ferramenta metodológica “[...] de caráter inventariante e descritivo da produção acadêmica e científica sobre o
42
que estudiosos da área debatem acerca do assunto, identificamos as dissertações e teses do
banco de dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e
do banco de dados Domínio Público, biblioteca digital do Ministério de Educação (MEC).
Em ambos os bancos de dados, a pesquisa foi delimitada pela palavra-chave
“internacionalização”, correlacionada com a área de conhecimento educação e/ou educação
superior, sendo desprezadas outras relações existentes, como a da área de conhecimento
administração de empresas internacionais.
É pertinente informar que a pesquisa foi realizada em agosto de 2014, assim,
pesquisas que foram lançadas porventura nos portais eletrônicos posteriores a esse período
não serão encontradas no levantamento.
A pesquisa das dissertações e teses foi realizada apenas em meio eletrônico, sem
delimitar ano de publicação e/ou disponibilização nos portais. Metodologicamente, o
levantamento foi feito em três etapas: 1ª) Identificação das pesquisas; 2ª) Leitura dos
Resumos e download dos arquivos completos; 3ª) Leitura completa das pesquisas.
Na 1ª etapa, buscamos identificar a palavra-chave “internacionalização”, em nível de
Mestrado e Doutorado, por meio da leitura de seus títulos para verificar se pertenciam à área
de educação e/ou educação superior.
Na etapa seguinte, foi feita a leitura dos resumos buscando identificar o foco de
interesse da presente pesquisa, fazendo o download dos arquivos completos daquelas que se
aproximavam do nosso interesse.
Por fim, na 3ª etapa, realizamos uma leitura completa das pesquisas para apreensão
geral do que cada trabalho trazia, principalmente a respeito da internacionalização da
educação superior.
Nesse levantamento, foram identificadas quatro pesquisas no portal da CAPES e
nenhuma no portal Domínio Público- MEC, sendo todas dissertações de mestrados que
traziam algum debate sobre a internacionalização da educação superior.
No Quadro 1, expomos a referência e o objetivo de cada pesquisa.
tema que busca investigar, à luz de categorias e facetas que se caracterizam enquanto tais em cada trabalho e no
conjunto deles, sob os quais o fenômeno passa a ser analisado.”
43
Quadro 1 - Revisão de literatura no Banco de Teses e Dissertações da CAPES, delimitação da palavra-
chave: internacionalização.
Ano Autor Título Objetivo Geral
2009 Batista, Janaina
Siegler Marques
O processo
de internacionalização das
instituições de ensino
superior: um estudo de caso na
Universidade Federal de
Uberlândia
A realização de um estudo de caso
sobre a dimensão institucional
da internacionalização na
Universidade Federal de Uberlândia
2013 Silva, Stella Maris
Wolff Da
Cooperação acadêmica
internacional da Capes na
perspectiva do Programa
Ciência sem Fronteiras
Nesta pesquisa foi feita uma revisão
dos Programas de Cooperação
Acadêmica Internacional
promovidos pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (Capes) e na
exploração sobre o potencial desses
programas para contribuir com a
gestão do Programa Ciência sem
Fronteiras.
2013 Feijó, Rosemeri
Nunes
A internacionalização da
educação superior no Brasil:
um estudo de caso de alunos
estrangeiros do Programa de
Pós-Graduação em
Antropologia Social/UFRGS
A presente dissertação analisa o
Programa de Estudantes-Convênio
de Pós-Graduação (PEC-PG),
promovido pela CAPES e CNPq, por
meio do estudo de alunos
estrangeiros contemplados com esta
modalidade de bolsa, tomando o
Programa de Pós-Graduação em
Antropologia Social (PPGAS) da
Universidade Federal do Rio Grande
do Sul como estudo de caso.
2013 Mueller, Cristiana
Verônica
O processo
de internacionalização do
ensino superior: um estudo de
caso da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul
A realização de um estudo de caso
sobre a dimensão institucional
da internacionalização na
Universidade Federal do Rio Grande
do Sul.
Fonte: Organizado pela autora, agosto de 2014.
Batista (2009) evidencia que a internacionalização da educação superior está
intrinsecamente ligada à tradição das universidades de promover parcerias e diversas
cooperações, visando aumentar a qualidade acadêmica e a relevância social da educação
superior.
A internacionalização universitária tem sido ao longo dos tempos resultado de
colaboração acadêmica buscando o avanço da ciência e da educação. Por razões
históricas e culturais, os mercados e projetos políticos diferem muito um dos outros,
resultando com isso, diferentes sistemas e instituições de educação superior,
facilitando assim, as estratégias de cooperação universitária, cativando a
internacionalização para objetivos de benefícios econômicos (BATISTA, 2009, p.
48).
Porém, afirma que: “As instituições de educação superior não existem para preparar os
novos conquistadores do mundo, mas fundamentalmente para formar cidadãos.” (BATISTA,
2009, p. 48).
44
Ao final, a autora conclui que o conceito da internacionalização da educação superior
assumido pela Universidade Federal de Uberlândia se difere do enfoque que liga esse tema ao
setor mercadológico.
[...] a crença que a internacionalização pode ser uma alternativa para intolerância
política e social, além de atuar no auxilio da resolução de grandes problemas globais
(como violência, fome, miséria, uso inadequado de recursos naturais, desastres
ecológicos, etc.) contrariando assim o discurso mundial sobre a internacionalização
como fator preponderante de diferencial curricular e, por consequência profissional
e financeiro (BATISTA, 2009, p. 207).
Silva (2013, p.12), na introdução de seu trabalho, assim se posiciona:
[...] internacionalização é compreendida como inserção e visibilidade da ciência
brasileira apreciada por meio de publicações e revistas e eventos internacionais,
intercâmbio de estudantes e pesquisadores e realização de projetos conjuntos de
pesquisa, bem como a intensidade de programas de cooperação acadêmica (SILVA,
2013, p.12).
A autora, ao correlacionar a internacionalização da educação superior com o
Programa CsF, afirma:
Pode se depreender que a proposta do Programa Ciência sem Fronteiras, combina o
desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação em temas de interesse nacional,
como o processo de internacionalização, inclusive para atender a demanda reprimida
de qualificação de pessoal nessas áreas (SILVA, 2013, p.62).
Nesse sentido, demonstra sua compreensão de que o motivo de criação do Programa
CsF é “atender a demanda reprimida de qualificação de pessoal”, utilizando-se do processo de
internacionalização para esse fim.
Feijó (2013, p.36), por sua vez, faz relação entre os conceitos de globalização e de
internacionalização do ensino superior. A autora se baseia em Altbach e Knight (2007) para
expor que, apesar dos conceitos se inter-relacionarem, há distinções:
[...] podemos entender a globalização como um fenômeno mais abrangente, não se
referindo apenas a educação, mas também à economia e à cultura, envolvendo
acordo comerciais; enquanto a internacionalização relaciona-se com as práticas
exercidas no âmbito da educação por governos e instituições. Mas, se por um lado, a
internacionalização aparece como um fenômeno altamente valorizado no universo
acadêmico, alguns autores sugerem que não se pode perder de vista que tal
fenômeno se expandiu de forma vinculada ao processo de globalização; assim, a
lógica capitalista – que em certo sentido o orienta – também se faz presente no
processo de internacionalização (FEIJÓ,2013, p.36).
45
A autora ainda cita que Knigth tem refletido acerca das possíveis consequências da
internacionalização como fuga de cérebros e mercantilização da educação, mas afirma que
essa preocupação “[...] está além dos limites e objetivos da discussão desta dissertação.”
(FEIJÓ, 2013, p.36). Porém, prevalece em seu texto a aceitação da internacionalização da
educação superior como processo de atendimento “[...] as exigências de suas comunidades, do
mercado de trabalho e das ações decorrentes do processo de integração” (FEIJÓ, 2013, p.38).
Por fim, Mueller (2013, p.26) adota o enfoque teórico de Knigth e privilegia a
dimensão institucional. Nesse ponto, esclarece:
A dimensão institucional é um elemento que compõe as novas interpretações
conceituais do processo de internacionalização do ensino superior. A gestão das
universidades se depara com um novo paradigma de criar uma cultura voltada à
cooperação internacional e de desenvolver ações voltadas ao desenvolvimento deste
processo de amplitude internacional assim como consolidar o espaço universitário
como local de difusão de saber global (MUELLER, 2013, p.26).
A autora ainda afirma:
Assim, a internacionalização surge em decorrência da globalização e se dá por
meio da criação de políticas e estratégias institucionais que possibilitam a
interação internacional de novos atores sociais baseados no domínio do
conhecimento (MULLER, 2013, p. 24).
Desta feita, podemos inferir que Mueller adota uma definição híbrida ou
contraditória para internacionalização, visando à solidariedade, e, no oposto, a
mercantilização da educação superior.
A partir do que foi exposto, podemos destacar sinteticamente as seguintes
predominâncias nos estudos:
- Evidência da inter-relação entre os conceitos globalização e internacionalização da
educação superior, por meio da afirmação de que esses conceitos são distintos, mas se
retroalimentam, pois a globalização vê na internacionalização um meio para atender sua
demanda por quadros profissionais com elevados níveis de qualificação e especialização; e a
internacionalização da educação superior vê a globalização como uma fonte de fomento para
sua expansão, mesmo que mercantilista; consequentemente, ambos atendem ao sistema
reprodutivo do capital.
- O conceito da internacionalização da educação superior possui distintas perspectivas
teóricas, prevalecendo a de que se trata de um processo complexo, dinâmico, trazendo as
46
instituições de educação superior a responsabilidade de promover ações pragmáticas de
resposta às demandas do sistema global baseados no domínio do conhecimento.
- O conceito de internacionalização da educação superior sofreu alterações
convenientes para o sistema capitalista, não esse sendo motivo de questionamento por parte
das dissertações levantadas.
A partir disso, considerando a limitação de enfoques conceituais nas teses e
dissertações, direcionamo-nos para buscar as referências autorais dos referidos trabalhos na
perspectiva do tema “internacionalização da educação superior”.
1.3 CONCEITO DA INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR
Tendo realizado no item 1.2 um levantamento sobre as pesquisas que tratam do tema
“internacionalização” correlacionado com a área de conhecimento educação e/ou educação
superior no banco de dados da CAPES e no banco de dados Domínio Público, destacamos a
seguir as principais concepções sobre a internacionalização da educação superior, que se
apresentaram como referência para os autores das quatro pesquisas selecionadas no Banco de
Dissertações da CAPES.
Esquematicamente, o Quadro 2 apresenta o referido levantamento, sendo
considerado o ano de publicação da obra referenciada, o autor referenciado, a definição de
internacionalização apresentada e a fonte da citação, ou seja, da dissertação extraída do banco
de dados da CAPES.
Quadro 2 - Delimitação das concepções sobre a internacionalização da educação superior
Ano
Autor da
ideia A definição Fonte da citação
1994 Knight
[...] a internacionalização nas IES é ampla e constitui-se
num processo no qual se integra uma dimensão
internacional/intercultural ao ensino, pesquisa e aos
serviços de uma instituição. De acordo com a
perspectiva desta autora, a internacionalização é um
processo dinâmico que ultrapassa a simples realização
de atividades no âmbito internacional, até então
consideradas indicadores da internacionalização das
universidades. Muller, 2013, p. 25
1994
Brasil, Lei
de
Diretrizes
e Bases da
Educação.
A Lei de Diretrizes e Bases – LDB (art. 43) conceitua a
internacionalização como uma estratégia para
“promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem como patrimônio
da humanidade e comunicar o saber por meio do ensino, Silva, 2013, p. 11
47
de publicações ou de outras formas de comunicação”.
1998 De Witt
De Witt (1998) destaca que a internacionalização é um
processo e ao mesmo tempo uma resposta à
globalização, mas não deve ser confundida com a
globalização por ela mesma. Internacionalização inclui
tanto aspectos locais como internacionais, bem como
elementos interculturais. Feijó, 2013, p. 35
2001
Van Der
Wende
Na perspectiva de Van der Wende (2001) é importante
que a internacionalização não seja caracterizada como
um fim em si, mas, um meio de atingir outros objetivos
específicos do ensino superior. Muller 2013, p. 25
2002
Marginson
e Rhoades
Para os autores Marginson e Rhoades (2002), a
internacionalização é definida como a globalização do
ensino superior, uma vez que as relações universitárias
e a criação de sistemas integrados são realizados além
do espaço nacional. Muller 2013, p. 25
2003
Gacel-
Ávila
Conforme Gacel-Ávila (2003), a internacionalização da
educação passou a ganhar espaço no século XX e
esteve originalmente vinculada ao movimento de
paz e relação de entendimento entre as pessoas. Muller 2013, p.24
2003 Qiang
Para Qiang (2003), é certo que o elemento chave do
termo internacionalização é a noção existente entre
nações e identidades culturais e por isso a
internacionalização do ensino superior é vista como uma
forma de um país responder ao impacto da
globalização. Muller 2013, p. 24
2003 Bartell
Segundo Bartell (2003), a internacionalização é um
processo avançado de trocas internacionais
decorrentes da realidade global. Muller 2013,p. 25
2004 Sebastián
Segundo Sebastián (2004, p. 16) , este é “um processo
de introdução da dimensão internacional na cultura e
estratégia institucional, em suas funções de
formação, pesquisa e extensão e também na projeção
de sua oferta e capacidade instalada.” Muller 2013, p.26/27
2004 Laus
Em um sistema fortemente regulamentado e
centralizado, o processo de internacionalização se inicia
de maneira induzida e em atenção às prioridades do
Estado se concretiza com uma ação concertada entre o
governo e as instituições em busca da criação de massa
crítica para impulsionar o desenvolvimento nacional
(LAUS, 2004). Batista 2013, p. 39
2004 Knight
[...] “the process of integrating an international,
intercultural or global dimension into the purpose,
functions or delivery of post-secondary education.”
Knight (2004, p. 11). Muller 2013, p.18
2005 Knight
Segundo esta perspectiva, a internacionalização é um
processo que leva as universidades a alterações em
toda sua estrutura organizacional e curricular, seus
regimes acadêmicos e suas relações com o exterior,
sendo que é no nível institucional o espaço onde
acontece o verdadeiro processo de
internacionalização (Knight, 2005). Muller 2013,p.18
2009 Altbach
Segundo a definição de Altbach (2009), existe
proximidade desses processos ao afirmar que a
globalização é uma realidade do século XXI
moldada pela economia mundial integrada pelas
novas tecnologias de comunicação e informação e
pelo surgimento de uma rede internacional do
conhecimento; já a internacionalização é definida Muller 2013, p.23
48
como a variedade de políticas e programas que as
universidades e os governos implementam para
responder à globalização.
2010 De Witt,
Para De Wit (2010), esta mudança de compreensão do
papel estratégico da internacionalização nas IES
ocorrida ao longo dos últimos 25 anos, demonstra a
alteração deste enquanto processo meramente reativo
a um formato planejado na dimensão institucional,
nacional e internacional. Muller 2013, p. 27
Fonte: Organizado pela autora com base no Banco de Teses e Dissertações da CAPES, grifo nosso.
Fica evidenciado que as definições correspondem, em sua maioria, à ideia de que a
internacionalização da educação superior é um processo complexo, dinâmico, imputando às
instituições de educação superior a responsabilidade de promover ações pragmáticas, como
resposta às chamadas demandas da globalização.
De Wit (2002) adverte sobre o cuidado que se deve ter no uso do conceito da
internacionalização da educação superior:
[...] à medida que a dimensão internacional da educação superior ganha mais atenção
e reconhecimento, as pessoas tendem a usar o termo da forma que melhor satisfaça
aos seus propósitos. Uma definição mais focada é necessária para ser entendida com
a importância que ela merece. Mesmo se não houver concordância sobre a
definição, a internacionalização precisa ter parâmetros para ser avaliada e, portanto,
contribuir com a educação superior. Este é o motivo pelo qual o uso de uma
definição em construção com uma estrutura conceitual é relevante para
internacionalização do ensino superior. (DE WIT 2002, p.114).
Nesse sentido, acatamos o entendimento de Knigth (2010, s.p):
Internacionalização é um termo que significa diferentes coisas para diferentes
pessoas. Para alguns, significa uma série de atividades como a mobilidade
acadêmica para estudantes e professores; redes internacionais, associações e
projetos; novos programas acadêmicos e iniciativas de pesquisa. Para outros,
significa a transmissão de educação a outros países, através de novas disposições,
como as sucursais de universidades ou franquias, usando uma variedade de técnicas
presenciais e à distância. Para muitos, significa a inclusão de uma dimensão
internacional, intercultural e/ou global dentro do currículo e o processo de ensino-
aprendizado. Ainda outros veem a internacionalização como centros regionais de
educação, hot spots, aldeias de conhecimento. Os projetos de desenvolvimento
internacionais foram percebidos tradicionalmente como parte da internacionalização
e, mais recentemente, o aumento da ênfase no comércio da educação superior
também está sendo visto como internacionalização. Logo, a internacionalização é
interpretada e utilizada de maneira diferente nos países ao redor do mundo
(KNIGTH, 2010, s.p).
Portanto, este trabalho tratará a ideia de internacionalização da educação superior
como um processo. Isso se traduz em que “O sufixo "-ização" significa que a
internacionalização é um processo ou um meio de aprimorar ou atingir metas.” (KNIGTH,
2010, s. p), sendo assim, depende de qual meta se quer atingir. No caso da internacionalização
49
da educação superior, ao referir à categoria contradição, pode assumir sentidos opostos: “[...] o
sentido humanista da solidariedade e da civilidade, ou sentido coisificante da expansão
capitalista e da mercadorização (commodification).” (AZEVEDO; CATANI, 2012, p.274).
Por entender que a internacionalização é um processo vocacional das instituições da
educação superior, retomamos Dias Sobrinho (2005, p.141), com o qual concordamos que a
internacionalização da educação superior se difere da transnacionalização da educação
superior.
Neste sentido, ao nos referir ao termo internacionalização da educação superior,
evocamos o sentido do “valor universal do conhecimento” pela solidariedade e, ao nos referir
à transnacionalização da educação superior, aludimos ao sentido mercantil.
É importante ressaltar, mais uma vez, a categoria contradição, pois muitos discursos
dos sujeitos sociais envolvidos se utilizam do termo internacionalização da educação superior
para ocultar sua essência de transnacionalização.
Isso considerando, o segundo capítulo aprofunda acerca da internacionalização da
educação superior no contexto das políticas brasileiras.
50
2. A INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL
Neste capítulo, tratamos de aspectos relacionados aos processos de
internacionalização da educação superior brasileira. Primeiramente, discorremos, numa
perspectiva histórica, como se caracterizou a implementação da internacionalização da
educação superior desde o período colonial até a nova república, fazendo a correlação com os
principais dispositivos legais da educação, com foco na educação superior. Esse trajeto é
importante, na medida em que evidencia como se desenvolveu a internacionalização da
educação superior no Brasil. Posteriormente, será realizada uma breve interface com as
influências de organismos internacionais na consolidação das políticas educacionais
brasileiras. Trata-se da necessidade de compreender as medidas impostas pelo Estado que
afetam a realidade concreta, evidenciando, sobretudo, como o sistema capitalista atua sobre a
questão, segundo seus interesses, considerando certo período histórico.
2.1 A INTERNACIONALIZAÇÃO NAS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO SUPERIOR
BRASILEIRA
É possível observar, de certo modo, os primeiros indícios da internacionalização nas
políticas de educação superior brasileira desde o período colônia, quando cabia a Portugal ou
outros centros europeus a formação da elite brasileira no ensino superior. Marquês de Pombal,
ministro da Fazenda do rei D. José I, promoveu as Reformas Pombalinas6 com vista a
transferir a responsabilidade do ensino dos jesuítas para a Coroa Portuguesa. Nesse sentido,
conforme Amaral e Seco (s.d., p.9):
Quem tinha condições de cursar o ensino superior enfrentava os perigos das viagens,
para frequentar a Universidade de Coimbra ou outros centros europeus. Como as
"Reformas Pombalinas" visavam transformar Portugal numa metrópole como a
Inglaterra, a elite masculina deveria buscar respaldo fora, para poder servir melhor
na sua função de articuladora dos interesses da camada dominante (AMARAL;
SECO, s.d., p.9).
Fávero (2006, p.20) complementa:
6 Texto sobre Reformas Pombalinas (MACIEL; SHIGUNOV NETO, 2006).
51
Portanto, não seria exagero inferir que Portugal exerceu, até o final do Primeiro
Reinado, grande influência na formação de nossas elites. Todos os esforços de
criação de universidades, nos períodos colonial e monárquico, foram malogrados, o
que denota uma política de controle por parte da Metrópole de qualquer iniciativa
que vislumbrasse sinais de independência cultural e política da Colônia (FÁVERO,
2006, p. 20).
Fávero (2006), em “A universidade no Brasil: das origens à reforma universitária de
1968”, discorre sobre as muitas tentativas de criação de universidades brasileiras desde o
Brasil Colônia (1530-1815), o Brasil Império (1822-1889) ao Brasil da Primeira República
(1890-1930). A autora informa que a Universidade do Rio de Janeiro (URJ) foi a primeira
universidade oficialmente criada pelo Governo Federal, em 1920. Ainda discorre sobre a
criação do Ministério de Educação e Saúde Pública, em 1930, bem como a criação da
Universidade de São Paulo (USP), em 1934, e da Universidade Distrito Federal (UDF), em
1935, a qual é importante destacar, tendo em vista um sinal da internacionalização nas
políticas de educação superior brasileira. Fávero (2006) informa que a formação do corpo
docente desta instituição se dá pela busca “[...] na Europa [de] professores para aquelas áreas
em que se considerava não haver, no Brasil, profissionais suficientemente preparados.”
(FÁVERO, 2006, p.26).
A autora ainda esclarece que “[...] de 1935 a 1945, a criação da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da USP e da Escola de Ciências da UDF [...] tiveram o mérito de
integrar, desde o início, estudiosos e cultores da ciência [...].” Destaca o pensamento de Paim
(1982, p.80-81), ao vincular pesquisa e intercâmbio internacional:
Como bem assinala Paim, a Escola de Ciências da UDF e a Faculdade Nacional de
Filosofia não apenas formaram os docentes das ciências exatas, mas prepararam
diversos pesquisadores que passaram a integrar os quadros do Instituto Oswaldo
Cruz, do Museu Nacional, do Departamento Nacional de Produção Mineral e do
Instituto de Tecnologia. O intercâmbio com instituições estrangeiras, a
participação em seminários e simpósios começam a fazer parte do trabalho dos
cientistas e pesquisadores, já agora de forma institucional (PAIM, 1982, p. 80-
81 apud FÁVERO, 2006, p. 28/29, grifo nosso).
A internacionalização da educação superior de forma institucional se configura com
a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da
Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (atual Capes –
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) em 1951.
Antes de tratarmos da criação desses dois órgãos, é importante contextualizar o
aspecto sociopolítico da época. A propósito, ao evocarmos o pensamento sobre a universidade
52
e suas ações, funções e organização, é imperativo apropriar-nos da categoria totalidade, que
contribui no sentido de considerar o contexto de inserção e as relações que se estabelecem.
Nesse sentido, Fávero (2006, p.18/19) expressa:
Para tanto, faz-se necessário ter conhecimento de sua realidade, criação e
organização, como funciona e se desenvolve, quais as forças que podem ser
mobilizadas a fim de empreender as mudanças almejadas. Todavia, tal
empreendimento não se faz sem relacionar essa instituição [universidade] com o
conjunto da sociedade, na ótica de sua dimensão política. O ponto de partida para
qualquer discussão sobre universidade não poderá ser, portanto, “o fenômeno
universitário” analisado fora de uma realidade concreta, mas como parte de uma
totalidade, de um processo social amplo, de uma problemática mais geral do país
(FÁVERO, 2006, p. 18/19).
Nessa perspectiva, a década de 1950 assim pode ser caracterizada:
[...] o início do segundo governo Vargas, e a retomada do projeto de construção de
uma nação desenvolvida e independente era palavra de ordem. A industrialização
pesada e a complexidade da administração pública trouxeram à tona a necessidade
urgente de formação de especialistas e pesquisadores nos mais diversos ramos de
atividade: de cientistas qualificados em física, matemática e química a técnicos em
finanças e pesquisadores sociais (CAPES, 2014).
Por conseguinte, o CNPq e a Capes foram criados com o objetivo de atender a
necessidade de formação de especialistas e pesquisadores para o então projeto de
desenvolvimento do país.
Os dois principais órgãos de fomento nacionais possibilitaram financiamento para
práticas de relações internacionais na pós-graduação, de acordo com o exposto por Morosini
(2008, p.293):
No Brasil a internacionalização da educação superior sempre veio acoplada ao
desenvolvimento dos programas de pós-graduação. Esses são fomentados pela
cooperação internacional apoiada pelas duas principais agências governamentais – o
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
(MOROSINI, 2008, p.293).
A referida autora ainda esclarece que “O CNPq [...] vem apoiando a formação de
recursos humanos [...] e a pesquisa científica [...]. E a Capes volta-se, prioritariamente, à
capacitação de recursos humanos, via programas de pós-graduação.” (MOROSINI, 2008,
p.294).
53
De acordo com a Lei 1.310, de 15 de janeiro de 1951, que criou o CNPq, as
competências desse Conselho são:
a) promover investigações científicas e tecnológicas por iniciativa própria, ou em
colaboração com outras instituições do país ou do exterior;
b) estimular a realização de pesquisas científicas ou tecnológicas em outras
instituições oficiais ou particulares, concedendo-lhes os recursos necessários, sob a
forma de auxílios especiais, para aquisição de material, contrato e remuneração de
pessoal e para quaisquer outras providências condizentes com os objetivos visados;
c) auxiliar a formação e o aperfeiçoamento de pesquisadores e técnicos, organizando
ou cooperando na organização de cursos especializados, sob a orientação de
professores nacionais ou estrangeiros, concedendo bolsas de estudo ou de pesquisa e
promovendo estágios em instituições técnico-científicas e em estabelecimentos
industriais no país ou no exterior;
d) cooperar com as universidades e os institutos de ensino superior no
desenvolvimento da pesquisa científica e na formação de pesquisadores;
e) entrar em entendimento com as instituições, que desenvolvem pesquisas, a fim de
articular-lhes as atividades para melhor aproveitamento de esforços e recursos;
f) manter-se em relação com instituições nacionais e estrangeiras para
intercâmbio de documentação técnico-científica e participação nas reuniões e
congressos, promovidos no país e no exterior, para estudo de temas de interesse
comum;
g) emitir pareceres e prestar informações sobre assuntos pertinentes às suas
atividades e que sejam solicitados por órgão oficial;
h) sugerir aos poderes competentes quaisquer providências, que considere
necessárias à realização de seus objetivos (BRASIL, 1951, grifo nosso).
Por sua vez, o Decreto nº 29.741, de 11 de Julho de 1951, que institui a CAPES,
determina que a comissão deva:
a) promover o estudo das necessidades do país em matéria de pessoal
especializado, particularmente nos setores onde se verifica escassez de pessoal em
número e qualidade;
b) mobilizar, em cooperação com as instituições públicas e privadas, competentes,
os recursos existentes no país para oferecer oportunidades de treinamento, de modo
a suprir as deficiências identificadas nas diferentes profissões e grupos profissionais;
c) promover em coordenação com os órgãos existentes o aproveitamento das
oportunidades de aperfeiçoamento oferecidas pelos programas de assistência
técnica da Organização das Nações Unidas, de seus organismos especializados e
resultantes de acordos bilaterais firmados pelo Governo brasileiro;
d) promover, direta ou indiretamente, a realização dos programas que se
mostrarem indispensáveis para satisfazer às necessidades de treinamento que não
puderem ser atendidas na forma das alíneas precedentes;
e) coordenar e auxiliar os programas correlatos levados a efeito por ógãos da
administração federal, governos locais e entidades privadas;
f) promover a instalação e expansão de centros de aperfeiçoamentos e estudos
pós-graduados (BRASIL, 1951, grifo nosso).
Evidencia-se assim, o trato da internacionalização da educação superior de forma
institucional, vinculado à pesquisa e à pós-graduação.
54
Podemos citar, ainda, a título de exemplo, o que é divulgado sobre a história da
Capes:
Em 1953, é implantado o Programa Universitário, principal linha da Capes junto às
universidades e institutos de ensino superior. Teixeira7 contrata professores
visitantes estrangeiros, estimula atividades de intercâmbio e cooperação entre
instituições, concede bolsas de estudos e apoia eventos de natureza científica
(CAPES, 2014).
Continuando a síntese histórica dos fatos relacionados ao tema da
internacionalização da educação superior, retomamos o período ditatorial imposto pelo golpe
militar (1964-1985), o que já foi introduzido no capítulo anterior, para esclarecer sobre as
medidas adotadas com relação à universidade brasileira nessa época.
Fávero (2006, p. 30) destaca a três medidas nesse sentido:
[...] o plano de assistência técnica estrangeira, consubstanciado pelos acordos
MEC/USAID [Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional]; o Plano Atcon (1966) e o Relatório Meira Mattos (1968). Concebida como estratégia
de hegemonia, a intervenção da USAID na América Latina se processa de modo
integrado, nos anos 60, em várias áreas e sob três linhas de atuação: assistência
técnica; assistência financeira, traduzida em recursos para financiamento de projetos
e compra de equipamentos nos EUA, além da assistência militar, concretizada pela
vinda de consultores militares norte- americanos ao Brasil e do treinamento de
militares brasileiros nos Estados Unidos, assim como do fornecimento de
equipamentos militares [...] (FÁVERO 2006, p.30).
Dias (2012, p.58 apud UNESCO, 2012) assevera:
Quanto ao modelo dos Estados Unidos, realmente, não há mais o que se aprender
com ele. O que o modelo tinha de bom (a dinâmica e a flexibilidade do sistema de
créditos, por exemplo) e de ruim (sobretudo o conteúdo padronizado) foi aplicado
no Brasil com as leis de 1968. (DIAS, 2012, p.58 apud UNESCO, 2012).
Fica evidente a profunda participação dos Estados Unidos durante a ditadura militar,
em várias áreas. Na educação superior isso se evidenciou por meio da Lei Nº 5.540, de 28 de
novembro de 1968, conhecida como Reforma Universitária de 1968.
Martins (s.d. p.16) caracteriza a Reforma Universitária de 1968 como produtora de
efeitos paradoxais no ensino superior brasileiro:
Por um lado, modernizou uma parte significativa das universidades federais e
determinadas instituições estaduais e confessionais, que incorporaram gradualmente
7 Anísio Teixeira foi o primeiro secretário-geral da Capes, de 1951 a 1964. (BRASIL/Capes, disponível em: <
http://www.capes.gov.br/historia-e-missao>. Acesso em: 09 set.2014.).
55
as modificações acadêmicas propostas pela Reforma. Criaram-se condições
propícias para que determinadas instituições passassem a articular as atividades de
ensino e de pesquisa, que ate então – salvo raras exceções – estavam relativamente
desconectadas. Aboliram-se as cátedras vitalícias, introduziu-se o regime
departamental, institucionalizou-se a carreira acadêmica, a legislação pertinente
acoplou o ingresso e a progressão docente à titulação acadêmica. [...] por outro lado,
abriu condições para o surgimento de um ensino privado que reproduziu o que
Florestan Fernandes denominou o antigo padrão brasileiro de escola superior, ou
seja, instituições organizadas a partir de estabelecimentos isolados, voltados para a
mera transmissão de conhecimentos de cunho marcadamente profissionalizante e
distanciados da atividade de pesquisa, que pouco contribuem com a formação de um
horizonte intelectual crítico para a análise da sociedade brasileira e das
transformações de nossa época [...] (MARTINS, s.d., p.16).
No documento da Reforma Universitária de 1968, não se localiza menção à acerca da
internacionalização da educação superior, mas vale destacar por Martins (s.d., p.26/27) o
pensamento de Currie e Newson (1998, s. p.) sobre os sinais da transnacionalização nesse
nível de ensino:
No processo de escalada da privatização, algumas instituições particulares de perfil
comercial romperam as fronteiras regionais, associaram-se comercialmente com
estabelecimentos estrangeiros, colocaram ações na bolsa de valores e, mais
recentemente, passaram a atuar em outros países (CURRIE; NEWSON, 1998, s. p.
apud MARTINS, s.n., p.26/27).
Após a Reforma Universitária de 1968, outro importante documento a ser citado é a
Constituição Brasileira de 1988, já na Nova República (1985 até dias de hoje), que Castro
(2008, p.1) resumidamente, assim explicita:
Os anos que se seguiram ao fim do regime militar foram marcados por grande
entusiasmo democrático. Após longo período de restrições às liberdades civis e
políticas, iniciava-se uma nova fase histórica no Brasil, cujo traço essencial seria,
conforme sentimento bastante difundido entre as elites intelectuais e políticas, a de
uma participação mais ativa dos cidadãos e da sociedade na condução dos rumos do
País. Desse modo, o atraso e as contradições nacionais poderiam, finalmente, ser
enfrentados e superados, ainda que à custa de muita determinação e esforço.
Embora a realidade dos fatos acabasse por revelar a ingenuidade dessa visão, a
convocação e os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte (ANC) abriram
espaço para novo otimismo em relação ao futuro imediato da nação. Naturalmente,
logo os embates no seio da ANC evidenciaram, mais uma vez, a verdadeira natureza
do jogo político e dos diferentes interesses que o anima. No entanto, o ambiente era
fortemente favorável a que os direitos civis, políticos e sociais fossem os mais
amplos possíveis. Nasceu, desse modo, o vigor com o qual o texto constitucional de
1988 estipulou os direitos à educação (CASTRO, 2008, p.1, grifo nosso).
56
Na Constituição de 1988, podemos cogitar em seu preâmbulo o sentido humanista e
de civilidade nas relações internacionais, visto pautar-se na ordem internacional como solução
pacífica das controvérsias:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional
Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício
dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade
fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e
comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das
controvérsias [...] (BRASIL, 1988).
Outro destaque refere-se à Emenda Constitucional de 30/04/1996, que oficializa a
possibilidade de admissão de estrangeiros pelas universidades: “Permite a admissão de
professores, técnicos e cientistas estrangeiros pelas universidades brasileiras e concede
autonomia às instituições de pesquisa científica e tecnológica.” (BRASIL, 1996).
Igualmente, um documento a ser destacado é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), nº 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996, que, da mesma forma, não registra
explicitamente sobre a política de internacionalização da educação brasileira. Porém,
podemos frisar o Art.48, como segue:
Art. 48. [...] § 2o Os diplomas de graduação expedidos por universidades
estrangeiras serão revalidados por universidades públicas que tenham curso do
mesmo nível e área ou equivalente, respeitando-se os acordos internacionais de
reciprocidade ou equiparação. § 3o Os diplomas de mestrado e de doutorado
expedidos por universidades estrangeiras só poderão ser reconhecidos por
universidades que possuam cursos de pós- graduação reconhecidos e avaliados, na
mesma área de conhecimento e em nível equivalente ou superior (BRASIL, 1996).
Conforme o referido artigo, fica estipulado que apenas as universidades públicas
podem revalidar diplomas obtidos no exterior, notificando mais uma vez que a
operacionalização das ações da internacionalização da educação superior é na esfera
institucional das universidades públicas.
Há de referenciar que a LDB consolidou a reforma da educação brasileira, conforme
afirma Aguiar (2010, p.721):
Essa reforma altera a estrutura legal, as diretrizes e bases do modelo instaurado com
a reforma universitária de 1968. Neste contexto, a LDB favorece as mudanças na
organização acadêmica, no padrão de avaliação, de financiamento, de gestão, de
currículo e de produção do trabalho acadêmico, com amplas repercussões, no campo
universitário e na identidade das IES. (AGUIAR, 2010, p.721).
57
Morosini (2008, p. 287), igualmente, expõe que a LDB foi um marco no sistema
educacional brasileiro:
A LDB nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), de 20 de
dezembro de 1996, foi um dos marcos normativos dessa mudança. Hoje, estamos
diante de um sistema complexo e diversificado pendendo para um modelo híbrido,
heterônimo e neoprofissional (Sguissardi, 2003), em um sistema de educação
superior caracterizado pela: concentração em regiões desenvolvidas do país;
expansão; privatização; centralização da avaliação de IES e/ou de cursos; e, mais
recentemente, pela internacionalização da educação superior (MOROSINI, 2008,
p.287).
Ao suscitar sobre a Constituição Federal (CF) de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB) de 1996, é preciso analisar o Plano Nacional de Educação
(PNE), que é ancorado nessas duas legislações. O art.214 da CF promulga que é a lei que
estabelecerá o Plano Nacional de Educação, e a LDB determina que no prazo de um ano, após
sua publicação, a União deverá encaminhar o referido Plano ao Congresso Nacional.
De acordo com a Emenda Constitucional n.º59, de 2009, o Plano Nacional de
Educação deve ser:
[...] de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação
em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de
implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus
diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes
públicos das diferentes esferas federativas (BRASIL, 2009).
Na Lei no 10.172, de 9 de janeiro de 2001, é aprovado o PNE 2001 – 2010, o qual no
item sobre Educação Superior indica as seguintes diretrizes:
Nenhum país pode aspirar a ser desenvolvido e independente sem um forte sistema
de educação superior. Num mundo em que o conhecimento sobrepuja os recursos
materiais como fator de desenvolvimento humano, a importância da educação
superior e de suas instituições é cada vez maior. [...] A importância que neste plano
se deve dar às Instituições de Ensino Superior (IES), mormente à universidade e aos
centros de pesquisa, erige-se sobre a constatação de que a produção de
conhecimento, hoje mais do que nunca e assim tende a ser cada vez mais é a base
do desenvolvimento científico e tecnológico e que este é que está criando o
dinamismo das sociedades atuais. As IES têm muito a fazer, no conjunto dos
esforços nacionais, para colocar o País à altura das exigências e desafios do Séc.
XXI, encontrando a solução para os problemas atuais, em todos os campos da vida e
da atividade humana e abrindo um horizonte para um futuro melhor para a sociedade
brasileira, reduzindo as desigualdades. [...] Esse núcleo estratégico [as
universidades] tem como missão contribuir para o desenvolvimento do País e a
redução dos desequilíbrios regionais, nos marcos de um projeto nacional. Por esse
motivo, estas instituições devem ter estreita articulação com as instituições de
ciência e tecnologia – como aliás está indicado na LDB (art. 86). No mundo
58
contemporâneo, as rápidas transformações destinam às universidades o desafio de
reunir em suas atividades de ensino, pesquisa e extensão, os requisitos
de relevância, incluindo a superação das desigualdades sociais e
regionais, qualidade e cooperação internacional. [...] Finalmente, é necessário rever
e ampliar, em colaboração com o Ministério da Ciência e Tecnologia e com as
Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa, a política de incentivo à pós-graduação
e à investigação científica, tecnológica e humanística nas universidades (BRASIL,
2001, grifo nosso).
Dessas diretrizes, é possível interpretar que a cooperação internacional é considerada
como requisito de relevância, como um “algo a mais” a ser alcançado pelas universidades,
associando-a às atividades de ensino, pesquisa e extensão, visando contribuir para o
desenvolvimento do País e a redução dos desequilíbrios regionais. Ou seja, utilização da
educação com meio para aspiração do país desenvolvido, justificando que a produção do
conhecimento é hoje a base do desenvolvimento científico e tecnológico, propulsor para uma
sociedade desenvolvida.
Vale recordar (conforme tratado no capítulo 1) que o neoliberalismo insere-se no
Brasil a partir de 1990, por meio dos projetos políticos presididos por Fernando Collor (1990-
1992), Itamar Franco (1992-1994) e Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), promovendo
alterações no modelo econômico, sobretudo com privatizações e diminuição de participação
do Estado na prestação de serviços públicos. Apesar da primeira proposta do PNE ter sido
apresentada pelas representações de associação civil organizada da sociedade brasileira, ela
não foi aprovada, como cita Bonamigo et al. (2012, p.2):
Esta proposta apresentada à Câmara, entretanto, não foi encaminhada, tampouco
aprovada. De 1998 a 2000, o governo de Fernando Henrique Cardoso alterou e
adequou o Plano ao ideário partidário hegemônico daquele período. Somente no
início de 2001 foi aprovado o Plano Nacional da Educação - PNE pela Lei n° 10.172
de 10/01/2001, com vários vetos, em especial, a emenda que propunha o
investimento de 10% do Produto Interno Bruto em educação (BONAMIGO et al.,
2012, p.2).
Justifica-se, assim, nas diretrizes do PNE aprovado em 2001 que as universidades
“[...] tem como missão contribuir para o desenvolvimento do País e a redução dos
desequilíbrios regionais, nos marcos de um projeto nacional.” (BRASIL, 2001), sendo a
cooperação internacional uma das alternativas para esse fim.
Ainda sobre o contexto sociopolítico, evocamos a afirmação de Aguiar (2010,
p.712): “Aliás, vale ressaltar que, dois anos após a aprovação do PNE, houve mudança do
59
governo no Brasil e a agenda das políticas educacionais, a partir de 2003, foi reorientada, com
ênfase, sobretudo, na expansão da educação pública de qualidade.”
Decorrida a década do primeiro PNE aprovado (2001-2010), iniciou-se a formulação
do próximo PNE, somente aprovado em 2014, pela Lei n.º13005, de 25 de junho de 2014,
passando a ter vigência de 2014 a 2024.
Antes de nos deter no PNE 2014-2024, é preciso enfatizar a oficialização da criação
do Programa CsF, em 2011, por se tratar do tema principal deste estudo.
O CsF foi criado, oficialmente, pelo Decreto n.º 7.642, de 13 de dezembro de 2011,
com objetivo principal de:
[...] propiciar a formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação em
universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros de
pesquisa estrangeiros de excelência, além de atrair para o Brasil jovens talentos e
pesquisadores estrangeiros de elevada qualificação, em áreas de conhecimento
definidas como prioritárias (BRASIL, 2011).
Esse é o primeiro programa que trata com exclusividade das ações da
internacionalização brasileira vinculadas à educação superior no sentido de enviar estudantes
brasileiros de nível de graduação ao exterior. Foi criado pelo Governo Federal, sendo
financiado pelas agências de fomento CAPES e CNPq, incluindo com maior ênfase o envio
de estudantes de graduação ao exterior.
Por ser o destaque da presente pesquisa, discorremos detalhadamente acerca dele no
próximo capítulo.
Retomando sobre o PNE aprovado em 2014, temos que a internacionalização da
educação superior transfere-se do âmbito das “diretrizes” para o âmbito das “estratégias”, as
quais relacionamos a seguir, considerando primordialmente as Metas 12,13 e 14 do referido
PNE.
A Meta 12 trata da educação superior, tendo o objetivo de:
[...] elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% (cinquenta por
cento) e a taxa líquida para 33% (trinta e três por cento) da população de 18
(dezoito) a 24 (vinte e quatro) anos, assegurada a qualidade da oferta e expansão
60
para, pelo menos, 40% (quarenta por cento) das novas matrículas, no segmento
público (BRASIL, 2014).
A estratégia destacada é a 12.12, que visa “consolidar e ampliar programas e ações
de incentivo à mobilidade estudantil e docente em cursos de graduação e pós-graduação, em
âmbito nacional e internacional, tendo em vista o enriquecimento da formação de nível
superior;” (BRASIL, 2014, grifo nosso). Fica representado aqui que a ação de mobilidade
nacional e/ou internacional é vista como enriquecimento da formação tanto do estudante
como do docente.
A Meta 13 visa:
elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores
do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior
para 75% (setenta e cinco por cento), sendo, do total, no mínimo, 35% (trinta e cinco
por cento) doutores (BRASIL, 2014).
De algum modo aproximando do tema central dessa pesquisa, focamos na estratégia
13.7, que trata da busca por maior visibilidade nacional e internacional das atividades da
educação superior:
13.7) fomentar a formação de consórcios entre instituições públicas de educação
superior, com vistas a potencializar a atuação regional, inclusive por meio de plano
de desenvolvimento institucional integrado, assegurando maior visibilidade
nacional e internacional às atividades de ensino, pesquisa e extensão [...].
(BRASIL, 2014, grifo nosso).
Já na Meta 14, é tratada especificamente a pós-graduação stricto sensu,
estabelecendo que se deva “elevar gradualmente o número de matrículas na pós-
graduação stricto sensu, de modo a atingir a titulação anual de 60.000 (sessenta mil) mestres e
25.000 (vinte e cinco mil) doutores.” (BRASIL, 2014).
Nas estratégias 14.1 e 14.2, evidencia-se o financiamento via agências oficiais de
fomento (como principais, a CAPES e o CNPq), que possuem também a competência de
financiar as ações da internacionalização da educação superior, vinculadas à pesquisa e à pós-
graduação.
14.1) expandir o financiamento da pós-graduação stricto sensu por meio das
agências oficiais de fomento;14.2) estimular a integração e a atuação articulada entre
a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES e as
agências estaduais de fomento à pesquisa; (BRASIL, 2014).
61
Nas estratégias a seguir relacionadas, é notória a referência à participação das ações
de internacionalização da educação superior na pesquisa e na pós-graduação, com o objetivo
de aumentar qualitativa e quantitativamente o desempenho científico e tecnológico do País.
14.9) consolidar programas, projetos e ações que objetivem a internacionalização
da pesquisa e da pós-graduação brasileiras, incentivando a atuação em rede e o
fortalecimento de grupos de pesquisa;14.10) promover o intercâmbio científico e
tecnológico, nacional e internacional, entre as instituições de ensino, pesquisa e
extensão;14.13) aumentar qualitativa e quantitativamente o desempenho científico e
tecnológico do País e a competitividade internacional da pesquisa brasileira,
ampliando a cooperação científica com empresas, Instituições de Educação Superior
- IES e demais Instituições Científicas e Tecnológicas – ICTs [...] (BRASIL, 2014,
grifo nosso).
Todas as metas e estratégias do PNE 2014-2024, incluindo bolsa de estudos no Brasil e
no exterior, deverão ser financiadas por recursos públicos, conforme previsto no artigo 5º, §
4o:
§ 4o O investimento público em educação a que se referem o inciso VI do art. 214
da Constituição Federal e a meta 20 do Anexo desta Lei engloba os recursos
aplicados na forma do art. 212 da Constituição Federal e do art. 60 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, bem como os recursos aplicados nos
programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive na forma de
incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos concedidas no Brasil e no exterior,
os subsídios concedidos em programas de financiamento estudantil e o
financiamento de creches, pré-escolas e de educação especial na forma do art. 213
da Constituição Federal (BRASIL, 2014, grifo nosso).
Até então podemos perceber que não há documentos oficiais que tratem da política
de internacionalização da educação superior de forma específica, e, sim, ações institucionais
que possibilitam as relações internacionais da educação superior aliada prioritariamente à
pesquisa e pós-graduação, além, é claro, da criação do Programa CsF, com ênfase no âmbito
da graduação.
Há, portanto, de mencionar a alteração ocorrida em relação à internacionalização da
educação superior quanto ao uso da expressão “diretrizes” para “estratégias”, no Plano
Nacional de Educação 2014-2024. Isso evoca ações práticas imediatas e em curto prazo para
implementação do processo de internacionalização da educação superior. Nesse bojo, tem-se a
própria criação do Programa CsF.
Cabe entender o que motivou tais ações do Governo; para tanto, será preciso buscar
relações entre a política mundial e o Brasil acerca do tema estudado, o que é tratado no item
seguinte.
62
2.2 INTERFACES ENTRE A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA
EDUCAÇÃO SUPERIOR MUNDIAL E BRASILEIRA
O tema internacionalização da educação superior vem assumindo destaque nas
políticas de educação superior contemporâneas, conforme esclarece Morosini (s.d., p.1): “É a
partir da década 90 e neste novo milênio que ela vem se fortificando no panorama mundial”.
Assim sendo, nosso objetivo é analisar os documentos de diretrizes dos organismos
internacionais a partir de 1990, mais propriamente da UNESCO e do Banco Mundial, para
buscar as interfaces entre a política de internacionalização da educação superior mundial e a
brasileira.
A escolha da UNESCO e do Banco Mundial deu-se porque ambos apresentam como
missão o apontamento de diretrizes que influenciem as políticas dos países membro,
especialmente na área de educação, sendo o Brasil partícipe dos dois organismos.
2.2.1 A UNESCO: perspectivas sobre a internacionalização da educação superior.
A UNESCO, parte integrante da ONU, trata especificamente dos assuntos sobre
educação, ciência e cultura. Conforme Cunha (apud WERTHEIN, 2002, p. 9):
A UNESCO, em cumprimento ao seu mandato de subsidiar a construção de uma
cultura de paz, mediante o intercâmbio educacional, científico e cultural entre os
povos, reuniu, ao longo de sua existência de mais de meio século, um acervo de
conhecimentos, de experiências e de compromissos fundados na ética e na equidade,
que a credenciou como uma das organizações mais bem preparadas para enfrentar as
incertezas e as desigualdades do nosso tempo (CUNHA, grifo nosso, apud
WERTHEIN, 2002, p.9).
Justifica-se, assim, a necessidade de abordar suas orientações acerca da
internacionalização da educação superior, para depois correlacionar com as políticas
educacionais adotadas no Brasil.
Analisaremos os documentos destaque da UNESCO com relação às diretrizes
norteadoras sobre a educação, prioritariamente a educação superior, buscando evidenciar o
tema principal deste estudo: internacionalização da educação superior.
Temos como destaque os seguintes documentos da UNESCO:
63
Quadro 3 - Documentos UNESCO acerca das diretrizes educacionais
Ano Documento
1990 Declaração Mundial sobre Educação para Todos: satisfação das necessidades básicas de
aprendizagem.
1995 Política de Mudança e Desenvolvimento no Ensino Superior;
1998 Tendências da Educação Superior para o Século XXI;
2008 Conferência Regional de Educação Superior na América Latina e no Caribe;
2009 Conferência Mundial sobre Ensino Superior
2010 Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI,
intitulado “Educação: um tesouro a descobrir”.
2012 Desafios e perspectivas da Educação Superior Brasileira para a próxima década 2011-2021.
Fonte: Organizado pela autora, com base nos documentos da UNESCO.
Em 1990, a UNESCO, financiada pelo BM, realizou a Conferência Mundial de
Educação para Todos, em Jomtien, na Tailândia, adotando a premissa fundamental da
Declaração Mundial sobre Educação para Todos: satisfação das necessidades básicas de
aprendizagem, tendo como objetivo central a educação básica.
Nessa conferência, mesmo tendo como foco a educação básica, podemos
correlacionar ao tema da internacionalização da educação o artigo 10, intitulado “Fortalecer a
solidariedade internacional”, que indica que as ações de internacionalização devem seguir o
princípio da solidariedade internacional:
1. Satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem constitui-se uma
responsabilidade comum e universal a todos os povos, e implica solidariedade
internacional e relações económicas honestas e equitativas, a fim de corrigir as
atuais disparidades económicas (UNESCO, 1990, s.p.)
A referida conferência derivou em maior consolidação entre Brasil e UNESCO, já
que após esse momento (mais precisamente em 1992) o Ministério da Educação e a UNESCO
assinaram um acordo de cooperação amplo, que resultou, já em 1993, no primeiro plano de
trabalho com o MEC, como mecanismo auxiliar à decisão do Governo de elaborar o Plano
Decenal de Educação para Todos (UNESCO, 2014).
No final deste ano (1993), o Brasil apresentou o “Plano Decenal Brasileiro”, focado
no objetivo central da reunião, ou seja, na priorização da educação básica, cumprindo, assim,
o compromisso feito de levar à UNESCO um plano de educação para o Brasil, tendo em vista
ainda não ter assumido os acordos estabelecidos em 1990, em Jomtien.
Em 1995, foi publicado o documento “Política de Mudança e Desenvolvimento no
Ensino Superior” que atende o pleiteado na 27ª sessão da Conferência Geral da UNESCO, em
1993, com o objetivo de promover uma síntese “[...] daquilo que a UNESCO vê como
tendências maiores em ensino superior, e também tenta formular uma perspectiva para a
64
Organização referente às políticas-chaves neste campo.” (MAYOR, 1995, p. 8, apud
UNESCO, 1995, p.8).
O Diretor-Geral da UNESCO, Federico Mayor, responsável pela elaboração de tal
documento, adverte:
Este documento deve ser considerado como uma parte importante da contribuição da
UNESCO para o debate em todos os aspectos da educação nesta virada de século,
inclusive o ensino superior. Deve ser considerado como um ponto de partida para
iniciativas e atividades que promovam o ensino superior e a pesquisa e como um
passo importante para a revitalização do suporte para o ensino superior no mundo
(MAYOR, 1995, p.8 apud UNESCO, 1995).
Na introdução desse documento a internacionalização é citada como um dos maiores
desafios enfrentados pelo ensino superior num mundo de rápida mudança, destacada pelo
autor como um dos três tópicos principais: relevância, qualidade e internacionalização. Para
ele, essa última é “[...] a característica inerente ao ensino superior que tem crescido
consideravelmente na última parte desde século.” (MAYOR, 1995, p.27, apud UNESCO,
1995).
No item “Tendências do Ensino Superior” é interessante destacar a menção sobre
“Aumento de internacionalização”:
[...] o número de pessoas que buscam ensino superior fora de seus países de origem
aumentou em quase 30% durante a última década: de cerca de 920.000 em 1980 para
mais de 1,2 milhões em 1990. A maioria (mais de 750.000 em 1990) veio de países
em desenvolvimento (MAYOR, 1995, p.40 apud UNESCO, 1995).
Mayor (1995, p.39) adverte que o aumento da mobilidade “[...] ganha um significado
adicional à luz das tendências atuais do comércio global, da economia e integração política e
da necessidade crescente de entendimento intercultural.” O autor assim resume sua
preocupação: “Em outras palavras, enquanto os benefícios do estudo no exterior são cada vez
mais reconhecidos, os custos envolvidos fazem com que ele se torne privilégio dos países (ou
estudantes) que podem pagá-lo.” (MAYOR, 1995, p.41 apud UNESCO, 1995).
No item “Respostas do Ensino Superior – Uma nova visão”, a internacionalização é
posta como um dos lemas norteadores que determinam a posição estratégica do ensino
superior na sociedade, sendo que “[...] deve basear-se em parceria genuína, mútuo respeito e
solidariedade.” (UNESCO, 1995, p.75, apud UNESCO, 1995).
65
Ao finalizar o documento “Política de Mudança e Desenvolvimento no Ensino
Superior”, Mayor (1995, p.89, apud UNESCO, 1995) resgata a missão institucional da
UNESCO “[...] de manter, aumentar e difundir o conhecimento [...] através do encorajamento
(...) do intercâmbio de pessoas ativas no campo da educação, ciência e cultura.”
O autor, igualmente, cita o programa das cátedras University Twinning and
Networking Programme (UNITWIN) da UNESCO, lançado em 1991, como uma ação prática
da UNESCO em relação a esse tema.
O programa foi planejado para desenvolver elos em redes nas instituições de ensino
superior, em níveis inter-regionais, regionais e sub-regionais, a fim de promover o
desenvolvimento institucional, a divisão de fundos e facilitar o intercâmbio de
conhecimento e experiência, assim como o intercâmbio de funcionários e
estudantes. O programa está baseado no espírito de solidariedade acadêmica,
necessária para colocar em movimento um processo que estabeleça ligações fortes e
duráveis entre o ensino superior e as instituições científicas do mundo (MAYOR,
1995, p. 91, grifo autor, apud UNESCO, 1995).
Em 1998, realizou-se a Conferência Mundial sobre Ensino Superior (CMES),
convocada pela UNESCO, em Paris, que teve aprovação de dois documentos: “Declaração
Mundial sobre a Educação Superior no Século XXI: Visão e Ação” e “Marco de ação
prioritária para a mudança e o desenvolvimento da educação superior”, sendo ambos
estruturais para a publicação dos anais “Tendências da Educação Superior para o Século
XXI”.
A CMES foi convocada com o objetivo de propor soluções para os desafios da
educação superior mundial, considerando que:
A educação superior tem dado ampla prova de sua viabilidade no decorrer dos
séculos e de sua habilidade para se transformar e induzir mudanças e progressos na
sociedade. Devido ao escopo e ritmo destas transformações, a sociedade tende
paulatinamente a transformar-se em uma sociedade do conhecimento, de modo que
a educação superior e a pesquisa atuam agora como componentes essenciais do
desenvolvimento cultural e socioeconômico de indivíduos, comunidades e nações
(UNESCO, 1998, p.20, grifo autor).
No documento “Declaração Mundial sobre a Educação Superior no Século XXI: Visão
e Ação”, destacamos a internacionalização da educação superior em três momentos:
1º Nas considerações iniciais do documento: “Considerando ainda que a cooperação e o
intercâmbio internacionais são os caminhos principais para promover o avanço da educação
superior em todo o mundo.” (UNESCO, 1998, p.22, grifo da entidade).
66
2º No item “Da visão à ação, Artigo 11. Avaliação da qualidade”:
b) a qualidade requer também que a educação superior seja caracterizada por sua
dimensão internacional: intercâmbio de conhecimentos, criação de redes interativas,
mobilidade de professores e estudantes, e projetos de pesquisa internacionais,
levando-se sempre em conta os valores culturais e as situações nacionais
(UNESCO, 1998, p.29).
3º No item “Da visão à ação, Artigo 15. Compartilhar conhecimentos teóricos e práticos
entre países e continentes”:
a) O princípio de solidariedade e de uma autêntica parceria entre instituições de
educação superior em todo o mundo é crucial para que a educação e a formação em
todos os âmbitos motivem uma compreensão melhor de questões globais e do papel
de uma direção democrática e de recursos humanos qualificados para a solução de
tais questões, além da necessidade de conviver com culturas e valores diferentes. O
domínio de múltiplos idiomas, os programas de intercâmbio de docentes e
estudantes, e o estabelecimento de vínculos institucionais para promover a
cooperação intelectual e científica devem ser parte integrante de todos os sistemas
de educação superior.
b) Os princípios de cooperação internacional com base na solidariedade, no
reconhecimento e apoio mútuo, na autêntica parceria que resulte, de modo
equitativo, em benefício mútuo, e a importância de compartilhar conhecimentos
teóricos e práticos em nível internacional devem guiar as relações entre instituições
de educação superior em países desenvolvidos, em países em desenvolvimento, e
devem beneficiar particularmente os países menos desenvolvidos. Deve-se ter em
conta a necessidade de salvaguardar as capacidades institucionais em matéria de
educação superior nas regiões em situações de conflito ou submetidas a desastres
naturais. Por conseguinte, a dimensão internacional deve estar presente nos planos
curriculares e nos processos de ensino e aprendizagem.
c) Deve-se ratificar e implementar os instrumentos normativos regionais e
internacionais relativos ao reconhecimento de estudos, incluindo os que se referem à
homologação de conhecimentos, competências e aptidões dos formandos,
permitindo que estudantes mudem de curso com maior facilidade e tenham mais
mobilidade dentro dos sistemas nacionais e na sua movimentação entre eles
(UNESCO, 1998, p.31/32).
No documento “Marco de ação prioritária para a mudança e o desenvolvimento da
educação superior”, a internacionalização da educação superior é citada como parte do item:
“1. Ações prioritárias na esfera nacional”, subitem: “m) promover e facilitar a mobilidade
nacional e internacional do pessoal docente e de estudantes, como parte essencial da
qualidade e relevância da educação superior.” (UNESCO, 1998, p.38).
Por sua vez, em “3. Ações prioritárias no plano internacional”, em particular as
futuras iniciativas da UNESCO podem assim ser destacadas:
10. A cooperação deve ser concebida como parte integrante das missões
institucionais de entidades e sistemas de ensino superior. [...] [11.] todos os
setores da sociedade envolvidos com a educação superior devem promover a
mobilidade acadêmica internacional [...] 13. A UNESCO [...] deve promover uma
67
ação com o objetivo de aliviar os efeitos negativos da “perda de quadros” e levar
a um processo dinâmico de “ganho de talentos”. [...] 14. Dentro deste marco, a
UNESCO deve: a) promover uma melhor coordenação entre organizações
intergovernamentais, supranacionais e não governamentais, agências e
fundações financiadoras de programas já existentes e projetos visando a
cooperação internacionais em educação superior (UNESCO, 1998, p.42/43,
grifos da entidade).
O próximo documento a ser destacado sobre a política da Educação Superior da
UNESCO é a Declaração da Conferência Regional de Educação Superior na América Latina e
Caribe8, em 2008. O mesmo serviu como base de análise para identificar as principais
demandas da América Latina e Caribe com vistas à preparação da Conferência Mundial de
Educação Superior, que aconteceria no ano seguinte, em 2009.
Acerca do assunto internacionalização da educação superior, temos a registrar o item
“H-Integração regional e internacionalização”, no que tange ao dever de construir um Espaço
de Encontro Latino-Americano e Caribenho de Educação Superior (ENLACES) por tratar-se:
[...] de uma iniciativa básica para alcançar a integração regional em aspectos
fundamentais, a saber: o aprofundamento de sua dimensão cultural; o
desenvolvimento das potencialidades acadêmicas que consolidem as perspectivas
regionais em face aos mais prementes problemas mundiais; o aproveitamento dos
recursos humanos para criar sinergias em escala regional; a superação de
discrepâncias na disponibilidade de conhecimentos e capacidades profissionais e
técnicas; a construção do saber sob a perspectiva do bem-estar coletivo e a criação
de competências para a conexão orgânica entre o conhecimento acadêmico, o mundo
da produção, o trabalho e a vida social, com atitude humanista e responsabilidade
intelectual (UNESCO, 2008, s.p., apud Revista da Avaliação da Educação Superior,
2009, p.245).
Nesse âmbito, é mencionada a necessidade de consolidar a cooperação Sul-Sul
conforme também exposto no item H: “3. No plano internacional é preciso fortalecer a
cooperação da América Latina e do Caribe com as outras regiões do Mundo, particularmente
a cooperação Sul-Sul e, dentro desta, com os países africanos.” (UNESCO, 2008, s.p., apud
Revista da Avaliação da Educação Superior, 2009, p.246).
Em 2009, na Conferência Mundial de Ensino Superior (CMES), realizada na sede da
UNESCO, em Paris, correlacionando com o tema internacionalização da educação superior,
temos:
8 Esta conferência realizou-se com o apoio do Instituto Internacional da UNESCO para a Educação Superior na
América Latina e no Caribe (IESALC-UNESCO) e o Ministério de Educação Nacional da Colômbia, com a
colaboração dos governos do Brasil, Espanha, México e da República Bolivariana da Venezuela. Os
participantes destacaram a tarefa substancial realizada pelo IESALC-UNESCO na preparação e realização do
referido evento (UNESCO, 2008, s.p. apud Revista da Avaliação da Educação Superior, 2009).
68
24. Cooperação internacional na educação superior deve ser baseada na
solidariedade e no respeito mútuo, além de na promoção de valores humanísticos e
diálogo intercultural. Como tal, pode ser estimulada apesar da crise econômica.
25. Instituições de educação superior ao redor do mundo têm uma responsabilidade
social de ajudar no desenvolvimento, por meio da crescente transferência de
conhecimentos cruzando fronteiras, especialmente nos países subdesenvolvidos, e
trabalhando para encontrar soluções comuns para promover a circulação do saber e
aliviar o impacto negativo da fuga de cérebros.
26. Redes de universidades internacionais e parcerias são uma parte dessa solução e
auxiliam no crescimento do entendimento mútuo e da cultura de paz.
27. Parcerias para pesquisa e equipe e intercâmbio de estudantes promovem a
cooperação internacional. O encorajamento de uma mobilidade acadêmica mais
amplamente equilibrada deveria ser integrada em mecanismos que garantam
colaboração genuína, multicultural e multilateral.
28. Parcerias devem promover a criação de capacidades de conhecimento nacional
em todos os países envolvidos e, desse modo, garantir fontes mais diversificadas de
pesquisa coletiva de alta qualidade e produção de conhecimento, em escala global e
regional (UNESCO, 2009, p.3).
Nos documentos da UNESCO, analisados de 1990 a 2008, o princípio fortemente
destacado acerca das ações de internacionalização da educação superior é o da solidariedade,
além da menção recorrente de que a educação superior trata-se de um bem público.
Porém, no evento realizado em 2009, ao mesmo tempo em que constam esses
princípios, abre-se oportunidade para ações da transnacionalização da educação superior,
conforme podemos observar:
29. Para que a globalização da educação superior beneficie a todos, é essencial
que ela proporcione a igualdade de acesso e de sucesso a fim de promover a
qualidade e respeitar a diversidade cultural, bem como a soberania nacional.
30. A globalização enfatizou a necessidade do estabelecimento de um sistema de
reconhecimento e de garantia de qualidade juntamente com a promoção de uma rede
ao redor desses Sistemas.
31. A disposição transfronteiriça de educação superior pode fazer uma
contribuição significativa para a educação superior fornecida, oferecendo educação
de qualidade, promovendo valores acadêmicos, mantendo a relevância e respeitando
os princípios básicos de diálogo e cooperação, reconhecimento mútuo pelos direitos
humanos, diversidade e soberania nacional.
32. Educação Superior transfronteiriça pode também criar oportunidades para
que aqueles que fornecem educação superior de baixa-qualidade ou fraudulenta
sejam contestados. As fornecedoras de diplomas falsos (‘falsificadoras de diploma’)
são um problema sério. Combater as ‘falsificadoras de diploma’ requer esforços em
múltiplas frentes em nível nacional e internacional (UNESCO, 2009, p.3).
Há de se questionar o porquê de tal abertura. Para responder, é preciso analisar
novamente o contexto sócio-político-econômico mundial vivenciado no presente século XXI.
Nessa linha, recordamos o já exposto sobre o predomínio político-econômico
neoliberal aliado ao regime de acumulação flexível (toyotismo). Essa combinação resulta na
tendência mundial de tratar a educação de forma comercial. Ao que parece, há nisso
69
subjacente a cessão por parte da UNESCO à pressão da OMC (citada no capítulo 1) de
considerar a educação superior como parte integrante do Acordo Geral sobre o Comércio de
Serviços (AGCS), ou seja, como uma mercadoria.
Em 2010, foi publicado um relatório, a pedido da UNESCO, pela Comissão
Internacional sobre Educação para o século XXI, denominado “Educação: um tesouro a
descobrir”.
Nesse documento, primeiramente, é exposto como parte dos horizontes, no capítulo
1. Da comunidade de base à sociedade mundial, a saber:
A interdependência planetária e a globalização são os principais fenômenos de nosso
tempo; eles já estão em marcha e vão deixar sua marca profunda no século XXI.
Desde já, eles exigem uma reflexão abrangente – para além das áreas da educação e
da cultura – sobre o papel e as estruturas das organizações internacionais (UNESCO,
2010, p.27).
O tema internacionalização da educação superior, de forma mais específica, é citado
em dois capítulos: no sexto, intitulado “Da educação básica à universidade”, e no nono, “A
cooperação internacional: educar a aldeia global”.
No sexto, destacamos a orientação de que “A universidade deve ocupar o centro do
sistema educacional [...]” (UNESCO, 2010, p.34) e de que a universidade deveria
desempenhar quatro funções essenciais:
1. preparação para a pesquisa e para o ensino; 2. oferta de uma formação, em
diferentes áreas, bastante especializada e adaptada às necessidades da vida
econômica e social; 3. abertura a todos para responder aos múltiplos aspectos do que
se designa por educação permanente, em sentido lato; 4. cooperação internacional
(UNESCO, 2010, p. 34).
No capítulo nono, destacamos as seguintes orientações:
•A necessidade de uma cooperação internacional – que deve ser repensada
radicalmente – é válida também para a área da educação; tratase de uma questão
que implica não só os responsáveis pelas políticas educativas e os professores, mas
também todos os atores da vida coletiva. [...]
•Modificar a orientação da política de assistência para uma perspectiva de parceria,
ao favorecer, especialmente, a cooperação e o intercâmbio no âmago de grupos
regionais. [...]
• Incentivar a conversão de dívidas, a fim de compensar os efeitos negativos – sobre
as despesas com a educação – das políticas de ajuste e de redução de déficits interno
e externo.
70
• Ajudar no fortalecimento dos sistemas educacionais nacionais ao encorajar as
alianças e a cooperação entre os ministérios em nível regional, e entre países que
enfrentam problemas semelhantes.
• Ajudar os países a enfatizar a dimensão internacional do ensino ministrado
(programas de estudo, recurso às tecnologias da informação, cooperação
internacional).
• Incrementar novas parcerias entre as instituições internacionais que se dedicam à
educação, lançando, por exemplo, um projeto internacional que tenha o objetivo de
divulgar e implementar o conceito de educação ao longo da vida, a partir do modelo
de iniciativa interinstitucional que culminou na Conferência de Jomtien.
• Constituir um conjunto de indicadores destinados a detectar as disfunções mais
graves dos sistemas educacionais, relacionando, por exemplo, diversos dados
quantitativos e qualitativos: nível de despesas com a educação, taxa de desperdício,
desigualdades de acesso, falta de eficácia dos diferentes setores do sistema,
deficiente qualidade de ensino, condição dos docentes etc. [...]
• Incentivar, por intermédio da UNESCO, a cooperação intelectual na área da
educação: Cátedras UNESCO, Escolas Associadas, partilha equitativa do saber entre
países, divulgação das tecnologias da informação, intercâmbio de estudantes e de
pesquisadores.
• Fortalecer a ação normativa da UNESCO a serviço de seus Estados Membros, por
exemplo, no que diz respeito à harmonização das legislações nacionais com os
instrumentos internacionais (UNESCO, 2010, p. 37/38).
Os citados documentos mostram ênfase na cooperação internacional como função
das universidades, além de que ela é necessária no processo educacional. Igualmente, indicam
que se deve atuar com parceria e não com assistencialismo, buscar aliança com países que
enfrentam problemas semelhantes, constituir indicadores avaliativos dos sistemas
educacionais, e, finalmente, promover intercâmbios e buscar a flexibilização/harmonização
com as legislações internacionais.
Para encerrar a abordagem sobre os direcionamentos da UNESCO, destacamos o
documento “Desafios e perspectivas da Educação Superior Brasileira para a próxima década
2011-2021.”, justamente por se tratar das influências mundiais nas políticas brasileiras na
presente década.
A publicação é fruto da parceria UNESCO e o Conselho Nacional de Educação
(CNE) do Ministério da Educação (MEC), que, por meio de oficina de trabalho, promoveu
reflexões sobre as principais demandas e desafios da política de ES para a próxima década,
especialmente à luz da elaboração do novo PNE 2011-2020.
Incluímos esse documento nas considerações sobre a UNESCO porque apresenta
como um dos eixos temáticos “Experiências recentes de inovação na educação superior: o
contexto internacional”. Nesse âmbito, promoveram-se palestras para discorrer sobre os
aspectos da internacionalização, regionalização e mundialização da educação superior, por
meio de mesa de debates mediada por conselheiros do CNE.
71
Como estamos examinando os documentos da UNESCO, não discorremos sobre as
opiniões dos palestrantes acerca do assunto, visto que pretendemos averiguar a posição
assumida pelos parceiros institucionais: UNESCO e CNE, o que se expressa no capítulo final
do referido documento, intitulado “4. Documento final: Desafios e perspectivas da educação
superior brasileira para a próxima década”.
No subitem “II - Educação superior no Brasil: perspectivas para 2011-2020”
destacamos a afirmação:
Os novos desafios gerados pelo avanço da globalização tecnológica, econômica e
cultural começam a exigir dos atores envolvidos com a ES a responsabilidade de
viabilizar as reformas necessárias para sua consolidação no cenário nacional e
ampliar sua presença internacional, na perspectiva de um desenvolvimento
socialmente justo e sustentável (UNESCO; CNE, 2012, p.162).
Os autores do documento (representantes da UNESCO e do CNE) consideram
fundamental para responder aos desafios e perspectivas da educação superior implementar
políticas e ações estratégicas que promovam e estimulem:
i. fortalecimento do regime de colaboração entre os entes federados; ii. uma
articulação que englobe as quatro áreas: educação, ciência, tecnologia e inovação;
iii. estímulo aos programas de intercâmbio e à integração internacional da
educação no país (UNESCO; CNE, 2012, p.162, grifo nosso).
Para concluir, no documento, os autores asseveram que:
Em síntese, um dos maiores desafios da ES brasileira é a implementação de uma
política que tenha como foco o conjunto do sistema, e não apenas uma parte dele.
Tal política deverá atentar para as características desse sistema, composto por
instituições públicas e privadas, com diferentes formatos organizacionais, múltiplos
papéis e funções locais, regionais, nacionais e internacionais. Ao mesmo tempo,
essa política deve respeitar as premissas de expansão com garantia de padrões de
qualidade, gratuidade nos estabelecimentos públicos, gestão democrática e
autonomia, respeito à diversidade e sustentabilidade financeira. Por fim,
consideramos que é preciso pensar os desafios da ES para os próximos dez anos,
tendo em vista que a principal característica do mundo atual é a mudança constante e
ininterrupta, acelerada pelas novas tecnologias, e cujos efeitos afetam todo o planeta
e praticamente todas as áreas e condições da atividade e da vida do homem e da
sociedade. Assim, é preciso pensar o futuro do ES, assumindo valores e princípios e
articulando ações e estratégias que permitam cumprir sua missão num mundo em
constante mudança (UNESCO; CNE, 2012, p.162).
Como se nota, as ações da internacionalização da educação superior são concebidas
como estratégicas para os desafios do porvir.
Num exame sobre o conjunto dos documentos estudados da UNESCO, observamos
que predomina o tratamento da internacionalização da educação superior como cooperação
72
solidária. Mas ressaltamos que toda construção política possui o movimento dialético de
posições congêneres e opostas, conforme evidenciado por Dias (2012, p.55, apud UNESCO;
CNE):
Apesar da restrição de certos funcionários internacionais, os princípios de 1998
[cooperação solidária] foram ratificados no comunicado final expedido pelos
participantes da Segunda Conferência Mundial sobre Educação Superior, organizada
pela UNESCO, em julho de 2009 (DIAS, 2012, p.55, apud UNESCO; CNE).
Frisamos que mesmo mantendo o princípio de cooperação solidária da primeira
CMES, de 1998, a segunda CMES, de 2009, cedeu espaço para ações afetas à
transnacionalização da educação superior, ou seja, ações de “cooperação comercial”.
Há de se destacar que a UNESCO é financiada por patrocinadores, dentre eles o
Banco Mundial:
Portanto, seu sucesso depende dos recursos investidos e do suporte oferecido por
diferentes fontes: Instituições de Educação Superior dos países desenvolvidos,
associados aos projetos de Cátedras; Instituições dos países em desenvolvimento,
envolvidos no Programa; Organizações governamentais e não governamentais;
Organizações não governamentais de Educação Superior; Possíveis patrocinadores
(UNESCO, 2014).
Esse registro incita-nos a examinar as orientações do Banco Mundial acerca da
internacionalização da educação superior, para identificar congruências e divergências
existentes entre tais organismos.
2.2.2 Banco Mundial: orientações educacionais
O Banco Mundial (BM) é composto pelas instituições: Banco Internacional para
Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), Associação Internacional de Desenvolvimento
(IDA), Corporação Financeira Internacional (IFC), Centro Internacional para Resolução de
Disputas sobre Investimentos (ICSID) e a Agência de Garantia de Investimento Multilaterais
(MIGA). Trata-se de uma instituição financeira internacional que fornece empréstimos para
países em desenvolvimento, consoante com o exposto por Soares (2009, p. 18): “[...] pode-se
dizer que foi apenas ao longo dos anos 50 que o Banco Mundial foi adquirindo o perfil de um
banco voltado para financiamento dos países em desenvolvimento, tal como é hoje.”
(SOARES, 2009, p.18).
73
O BM é presidido pelos Estados Unidos desde sua fundação, detém 17,1% do poder de
voto, cabendo ao Brasil apenas 1,7% desse poder. (SOARES, 2009, p.16) esclarece:
Os estatutos do Banco Mundial estabelecem que a influência nas decisões e votações
é proporcional à participação no aporte de capital, o que tem assegurado aos EUA a
presidência do Banco desde a sua fundação, e hegemonia absoluta entre as cinco
nações líderes [1º EUA, 2º Japão, 3º Alemanha, 4º França e 5º Reino Unido] na
definição de suas políticas e prioridades (SOARES, 2009, p.16).
Os empréstimos são feitos mediante condicionalidades:
O Banco Mundial passou a impor uma série de condicionalidades para concessão de
novos empréstimos. Mediante essas condicionalidades, o Banco Mundial (tal como
o FMI) passou a intervir diretamente na formulação da política interna e a
influenciar a própria legislação dos países (SOARES, 2009, p.21).
Importa destacar que o BM é “[...] o maior captador mundial não soberano de
recursos financeiros, exercendo profunda influência no mercado internacional.” (SOARES,
2009, p.15). Ademais, ressaltamos que sua influência sobre as políticas de educação e saúde a
partir da década de 1970 foi significativa:
Assim, até a década de 1960, a educação e a saúde eram secundárias para este
Organismo. A situação começou a mudar a partir da década de 1970 com George D.
Woods (1963-1968) e definitivamente, na gestão de Robert S. McNamara (1968-
1981) (LEHER, 1998, p. 202). O Banco Mundial passou a ampliar os investimentos
em projetos para o setor social, destacando-se o setor educacional, a saúde e o
desenvolvimento agrícola, considerados de suma importância (BUENO;
FIGUEIREDO, 2012, p.2).
O BM passou a priorizar a educação em seus documentos com “[...] vista não apenas
como instrumento de redução da pobreza, mas principalmente como fator essencial para a
formação de “capital humano” adequado aos requisitos do novo padrão de acumulação.”
(SOARES, 2009, p.30).
A exemplificar, temos o documento “Relatório No. 20475-BR - O Combate à
Pobreza no Brasil”, que faz constatações, traça tendências e perfis da pobreza no Brasil, além
de promover direcionamentos na política para promover a redução da pobreza. Sobre a
educação, destaca: “Se houver um grande empenho no sentido de melhorar a educação,
haverá também uma redução significativa da pobreza [...] especialmente se for possível
melhorar a focalização dos recursos.” (BANCO MUNDIAL, 2001, p. 11).
Conforme Bueno e Figueiredo (2012, p.5):
74
Nesta direção, para o Banco Mundial direcionar esforços para o atendimento do
grupo socialmente vulnerável, poderia ser traduzido pelo investimento em políticas
focalizadas que atendessem às necessidades mínimas dos sujeitos em situação de
pobreza. Incentivos sociais como a educação e a saúde básicas, segundo o Banco
Mundial, são suficientes para aliviar a pobreza, já que “[...] ajudam a fortalecer o
capital humano dos pobres e aumenta sua renda” (BANCO MUNDIAL, 2001, p. 7-
16). A defesa em valorizar o capital humano, por parte do Banco Mundial, teve
como objetivo aumentar a produtividade dos mais pobres, visando incluí-los no
sistema econômico, no mercado de consumo e influir sobre sua conduta política
(BUENO; FIGUEIREDO, 2012, p.5).
Resumidamente, podemos interpretar que o BM passou a ver na educação uma forma
de alívio da pobreza e impulso ao desenvolvimento do sistema capitalista, colocando o capital
humano dos pobres como fundamental para elevar a economia do país.
Soares (2009, p.15) destaca a importância do BM nos dias de hoje:
O Banco Mundial exerce profunda influência nos rumos do desenvolvimento
mundial. Sua importância hoje deve-se não apenas ao volume de seus empréstimos e
à abrangências de suas áreas de atuação, mas também ao caráter estratégico que vem
desempenhando no processo de reestruturação neoliberal dos países em
desenvolvimento, por meio de políticas de ajuste estrutural (SOARES, 2009, p.15).
Fundamenta-se dessa forma a necessidade de analisar as orientações do BM acerca
da internacionalização da educação superior.
A seguir, no Quadro 4, relacionamos os documentos do Banco Mundial que
apontaram diretrizes norteadoras para a educação, prioritariamente, a educação superior.
Quadro 4 - Documentos BM acerca das diretrizes educacionais.
Ano Documento
1994 Higher Education: The Lessons of Experience
2002 Higher Education in Brazil: Challenges and Options
2011 Learning for All - Investing in People’s Knowledge and Skills
to Promote Development: World Bank Group Education Strategy 2020
Fonte: Organizado pela autora, com base em documentos do Banco Mundial.
Em 1994, o BM publicou o documento “Higher Education: The lessons of
experience” com objetivo de obter lições da experiência recente, informar e aguçar a
discussão de políticas tanto no BM quanto aos “países clientes”, com vista a melhorar as
formas de suporte em educação pela instituição financeira.
Esse documento não trata especificamente da internacionalização da educação
superior, mas se torna importante por expor os quatro pilares considerados primordiais para a
eficiência das universidades: incentivo ao desenvolvimento das universidades privadas, fontes
75
de recurso público e privado, aumento da autonomia e responsabilidade institucional,
consequentemente, sendo menos dependente da participação estatal, ou seja, possível redução
da injeção de recursos públicos.
Valdemar Sguissardi, no artigo “Rumo à Universidade Mundial – e a Universidade
será feita à sua Imagem e Semelhança” (que conforme o autor também poderia ser escrito em
forma de questões) faz alusão desse título ao documento do BM ora citado e assevera:
Este texto visa responder, ainda que parcialmente, a essas questões e mostrar como
na última década se foi estruturando, em especial a partir dos países do primeiro
mundo (particularmente, anglo-saxônicos) e das recomendações e ações de
organismos multilaterais (financeiros) um novo modelo de universidade mundial –
neoprofissional, heterônoma, operacional, empresarial e competitiva – que está
sendo feito à imagem e semelhança dos interesses do atual estágio de acumulação do
capital (SGUISSARDI, 2005, p.7/8).
Em 2002, o BM produziu o documento “Higher Education in Brazil: Challenges and
Options”, a pedido do governo brasileiro:
O Governo do Brasil está analisando opções para melhorar e reestruturar o ensino
superior ao longo das próximas duas a três décadas. A pedido do Ministro da
Educação, Sr. Paulo Renato, o Banco realizou uma avaliação do estado do ensino
superior e fez recomendações sobre como a sua finalidade, estrutura, escopo,
recursos e governança poderia evoluir para melhor atender as necessidades do país
(BANCO MUNDIAL, 2002, p.vi, tradução nossa).
Nesse documento, em sua primeira fase, o trabalho analítico feito entre o ministro
Paulo Renato, os membros do Conselho Nacional de Educação, reitores, autoridades federais
de ensino superior e técnicos do BM levaram à identificação dos cinco problemas principais
acerca da educação superior brasileira:
i. aumento da cobertura; ii. reforçar a autonomia gerencial e incentivar a eficiência a
nível institucional; iii. a mudança do papel do Governo Federal; iv. a melhoria da
qualidade de ensino, e v. identificar e reunir apoio de parceiros (BANCO
MUNDIAL, 2002, p.vi, tradução nossa).
Após oficinas de debate, o documento final elaborou recomendações com relação ao
acesso equitativo, qualidade, relevância e eficiência. Também não vimos no referido
documento nenhum direcionamento acerca da internacionalização da educação superior, mas
merece registro a recomendação de privatização das universidades públicas, além do
76
investimento público nas universidades privadas, demonstrando, assim, o trato da educação
como mercadoria.
Finalmente, o documento “Learning for All - Investing in People’s Knowledge and
Skills to Promote Development: World Bank Group Education Strategy 2020”, publicado em
2011 pelo BM, teve como objetivo auxiliar os países no direcionamento de suas políticas, o
que foi assim justificado:
Estamos vivendo um período de mudanças extraordinárias. O impressionante
crescimento dos países de renda média, liderada por China, Índia e Brasil,
intensificou o desejo de muitas nações para aumentar a sua competitividade através
da construção de mais força de trabalho altamente qualificados. Os avanços
tecnológicos estão mudando perfis profissionais e habilidades, além de oferecer
possibilidades de aprendizagem acelerada. Persistentemente elevados níveis de
desemprego, especialmente entre os jovens, têm destacado o fracasso dos sistemas
de ensino para preparar os jovens com as competências adequadas para o mercado
de trabalho e têm alimentado apelo a uma maior oportunidade e responsabilidade.
Expandir e melhorar a educação são fundamentais para a adaptação à mudança para
enfrentar esses desafios. Simplificando, os investimentos em educação de
qualidade levam a um crescimento e desenvolvimento econômico mais rápido e
sustentável (BANCO MUNDIAL, 2011, p.v, tradução e grifo nossa).
Fica evidenciado, mais uma vez, que para o BM a educação está intrinsecamente
ligada ao crescimento e desenvolvimento econômico do país, ou seja, como um fator
econômico.
Nesse documento, constam duas prioridades do Banco com relação à educação ao
longo da próxima década: 1. fortalecer a capacidade dos sistemas de ensino para atingir as
metas de aprendizagem; 2. contribuir para a construção de uma base de conhecimento global
de alta qualidade nos sistemas de ensino.
Na prioridade 1, o Banco afirma: “A nova estratégia reconhece explicitamente que as
oportunidades de aprendizagem vão além daqueles oferecidos pelo setor público, bem como
para além dos programas tradicionais formais.” (BANCO MUNDIAL, 2011, p. 34, tradução
nossa), deixando explícita a necessidade de parceria entre o Governo e as instituições de
educação do setor privado.
Outro ponto a destacar nessa prioridade refere-se a: “Um foco especial de política de
ensino superior é promover a ciência, tecnologia e inovação através da utilização mais eficaz
das parcerias entre universidades.” (BANCO MUNDIAL, 2011, p. 36, tradução nossa).
77
Talvez esteja aqui a priorização de áreas do Programa CsF, objeto principal deste estudo, o
qual examinaremos no próximo capítulo.
Na prioridade 2, “contribuir para a construção de uma base de conhecimento global de
alta qualidade nos sistemas de ensino”, destacamos:
Durante a próxima década, o Banco continuará a apoiar o desenvolvimento e
utilização de dados de educação regular. Ele irá apoiar os esforços dos países
parceiros para medir tanto o desempenho do aluno (ou seja, os resultados da
aprendizagem) e o desempenho global dos sistemas de ensino em uma base
regular e sistemática, e utilizar esses dados para informar políticas e investimentos
na educação (BANCO MUNDIAL, 2011, p. 39, tradução e grifo nosso).
Vemos aqui indícios de padronização da avaliação das universidades na citação antes
grifada (“o desempenho global dos sistemas de ensino uma [única] base regular e
sistemática”).
Além das prioridades, vale destacar na Parte 4. “Alavancas de Implementação da
Nova Estratégia”, o subitem “Geração de Conhecimento e Intercâmbio”, pois se abre aqui
investimentos na cópia das boas práticas (benchmarking9) da educação de outros países via
cooperação internacional:
Na área de geração de conhecimento e intercâmbio, o Banco irá concentrar os seus
esforços no desenvolvimento e utilização de uma abordagem de sistema, apoiar a
avaliação de aprendizagem dos alunos, a ampliação da base de conhecimento
utilizando avaliações de impacto e outras pesquisas, e promovendo a troca de
conhecimento entre os países. [...] Por fim, além de ajudar a preencher lacunas
importantes no conhecimento, o Banco tem o compromisso de intermediar trocas de
conhecimento. Melhor compreensão dos pontos fortes dos vários sistemas, os
resultados de aprendizagem, e as possíveis soluções para os problemas
permitirão aos países para aprender com as experiências uns dos outros. Grande parte desse aprendizado será Sul-Sul, que os países procuram exemplos de
abordagens bem sucedidas em outros países em situações similares. Pesquisa em
educação nos países mais ricos também produz lições para os países em
desenvolvimento, permitindo a aprendizagem Norte-Sul, e porque os países ricos
não têm o monopólio sobre as boas práticas de ensino, aprendizagem Sul-Norte tem
um grande potencial também (BANCO MUNDIAL, 2011, 60 e 64, tradução e grifo
nosso).
9 Este termo “benchmarking” é utilizado pelo Banco Mundial ao informar que está sendo construído um
programa denominado “System Assessment and Benchmarking for Education Results (SABER)”, que possui a
função de abordar programas de educação nacionais, bem- sucedidos ou fracassados, em países ao redor do
mundo com objetivo de disseminação de boas práticas. De acordo com palestrante Carlos Hilsdorf (2010, s.p.)
“Benchmarking é uma ferramenta de gestão que consiste na mensuração da performance de uma organização,
permitindo que ela compare sua eficiência com a de outras organizações, frequentemente com a empresa líder do
segmento ou outro concorrente muito relevante.”. HILSDORF, Carlos. O que é benchmarking? Disponível em: < http://www.administradores.com.br/artigos/negocios/o-que-e-benchmarking/48104/> Acesso em: 29 set. 2014.
78
De acordo com o observado nos documentos, não aparecem explicitamente menções
diretas sobre a internacionalização da educação superior, mas há orientações para área de
educação superior com medidas que podem influenciar, diretamente ou não, tais como:
incentivo à privatização, incentivo ao investimento dos recursos públicos no setor privado,
criação de um sistema único de avaliação global da educação e a utilização da ferramenta
empresarial denominada benchmarking.
2.2.3 Interfaces dos organismos internacionais à política de internacionalização da educação
superior brasileira
Primeiramente, ressaltamos que os organismos internacionais promovem diretrizes,
direcionamentos, sugestões, mas cabe aos governos nacionais adotarem ou não tais
orientações. No âmbito dos governos nacionais, toda construção de política possui o embate
de forças, seja dos favoráveis, seja dos contrários, implicando forças a atuarem sob interesses
diversos. Essa complexa seara requer abranger os prós, os contras, os condicionantes e as
consequências envolvidas, sob o contexto sócio-político-econômico do país.
Por isso, ao dimensionar os documentos da UNESCO e do BM e suas influências na
construção da política de internacionalização da educação superior brasileira, vimos certo
envolvimento do país, com ajustes, adaptações, reações. Não há apenas consentimento, há
negação também. Por exemplo, na análise do documento publicado em 2002, o Banco
Mundial orienta que, para expansão do acesso, uma das soluções é “iii) cobrando taxa de
matrícula em universidades públicas.” (BANCO MUNDIAL, 2002, p. xiii), mas o movimento
docente, estudantil, movimentos sociais, certas forças políticas, etc. resistiram e foram
vitoriosos nessa questão, até então.
Nessa perspectiva, retomamos o pensamento de Silva (2008), que aborda o Estado
como reflexo das relações sociais, campo de disputa, de consensos e de contradições.
De forma resumida, a partir da análise feita nesta dissertação acerca dos documentos
da UNESCO e do BM, podemos destacar as seguintes orientações acerca da área de educação:
UNESCO:
1. Promove orientações sobre as ações de internacionalização da educação superior;
79
2. Entende que ações de internacionalização da educação superior podem ser utilizadas
como ações meio para obtenção da cultura de paz entre povos;
3. Refere-se, predominantemente, ao princípio da solidariedade internacional, porém a
partir de 2009, abre-se oportunidade para ações da transnacionalização da educação
superior;
4. Entende a internacionalização como um dos maiores desafios institucionais
(universidades e sistemas de educação superior) a operar num mundo em rápidas
mudanças;
5. Menciona a preocupação com a elitização das ações de internacionalização da
educação superior;
6. Considera que as ações da internacionalização da educação são os caminhos
principais para promover o avanço da educação superior em todo o mundo, como
parte essencial da qualidade e relevância da educação superior;
7. Traz à responsabilidade da UNESCO, promover uma ação com o objetivo de aliviar
os efeitos negativos da “perda de quadros” e levar a um processo dinâmico de
“ganho de talentos”. Além de promover uma melhor coordenação entre organizações
envolvidas em programas já existentes e projetos visando à cooperação internacional
em educação superior;
8. Orienta sobre a necessidade de criação do Espaço do Encontro Latino-Americano e
Caribenho de Educação Superior (ENLACES), como forma de consolidar a
cooperação Sul-Sul;
9. E, identificada que a cooperação internacional, recomenda que se deve atuar com
parceria e não com assistencialismo, constituindo indicadores avaliativos dos
sistemas educacionais, promovendo intercâmbios e buscando a
flexibilização/harmonização com as legislações internacionais.
BM:
1. Promove orientações acerca da área de educação superior, sem especificar a
internacionalização da educação superior;
2. Considera primordial para eficiência das universidades: incentivo ao
desenvolvimento das universidades privadas, fontes de recurso público e privado,
aumento da autonomia e responsabilidade institucional, consequentemente, sendo
menos dependente da participação estatal, ou seja, possível redução da injeção de
recursos públicos;
3. Acredita que educação está intrinsecamente ligada ao crescimento e desenvolvimento
econômico do país, ou seja, como um fator financeiro;
4. Traz como foco especial de política de ensino superior a promoção da ciência,
tecnologia e inovação através da utilização mais eficaz das parcerias entre
universidades;
5. Orienta para criação de um sistema único de avaliação global da educação;
6. E, instrui investimentos na cópia das boas práticas (benchmarking) da educação de
outros países via a cooperação internacional.
Para entender as correlações entre o conjunto de orientações citadas e as políticas
educacionais adotadas no Brasil, resgatamos a seguir o exposto no item 2.1 deste capítulo. Ou
80
seja: de forma também sintética, elencamos os posicionamentos assumidos pelo Brasil acerca
do tema da internacionalização da educação superior:
1. Desde a criação das universidades federais as ações da internacionalização de
educação superior vincularam-se à prática da pesquisa e à pós-graduação;
2. O processo de internacionalização da educação superior é visto como
responsabilidade institucional das universidades com possibilidade de fomento
público pelos órgãos: CAPES e CNPq;
3. Institucionalmente, entende-se como primordial o princípio da solidariedade
internacional no sentido humanista da civilidade, porém, evidenciaram-se algumas
ações da transnacionalização da educação superior;
4. Internacionalização é visto como relevante pelas universidades por contribuir para o
desenvolvimento do País e a redução dos desequilíbrios regionais;
5. Criou-se o primeiro programa que trata com exclusividade das ações de
internacionalização brasileira vinculadas à educação superior, financiado pelas
agências de fomento CAPES e CNPq, que inclui com maior ênfase o envio de
estudantes de graduação ao exterior;
6. Nas diretrizes da presente década, entende-se a internacionalização no campo das
“estratégias”, ou seja, envolvendo práticas para promoção da qualidade e relevância
da educação superior, e para o aumento qualitativo e quantitativo do desempenho
científico e tecnológico do País.
Diante do conjunto de elementos apurados, percebemos uma adesão híbrida às
orientações dos organismos internacionais ora estudados, estando presentes adaptações,
ajustes e embates entre os sujeitos envolvidos.
Considerando que o único documento formal que trata da internacionalização da
educação superior, delimitando-se ao envio de estudantes brasileiros em nível de graduação
ao exterior, é o da criação do Programa CsF, evidencia-se a necessidade de analisar
detalhadamente tal programa para entender o posicionamento brasileiro frente à tendência de
adesão mundial ao citado processo, o que realizamos no próximo capítulo.
81
3. O PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS
Neste capítulo, abordamos o contexto sócio-político-econômico referente ao período
de implementação do Programa CsF, para facilitar a compreensão do funcionamento do
programa. Além disso, apresentamos como exemplo o processo de internacionalização na
UFMT, ressaltando a inserção do CsF em tal processo.
3.1. CONTEXTO SÓCIO-POLÍTICO-ECONÔMICO NO PERÍODO DE CRIAÇÃO DO
PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS
Conforme já abordado, no final do século XX até os presentes dias, há um
predomínio mundial político-econômico do neoliberalismo. Na América Latina, mais
especificamente no Brasil, apresenta-se uma configuração político-econômica que muitos
autores interpretam como novo desenvolvimento.
Com relação ao regime de produção, esse é prioritariamente pautado no modelo da
acumulação flexível (toyotismo), que, de acordo com Harvey, fundamenta-se na informação e
na internacionalização do mercado financeiro.
A respeito da informação, Harvey (1989, p. 150) esclarece:
Com efeito, na medida em que a informação e a capacidade de tomar decisões
rápidas num ambiente deveras incerto, efêmero e competitivo se tornaram cruciais
para os lucros, a corporação bem organizada tem evidentes vantagens competitivas
sobre os pequenos negócios. A “desregulamentação” [...] significou muitas vezes um
aumento da monopolização [...] em setores como empresas de avião, energia e
serviços financeiros. Num dos extremos da escala de negócios, a acumulação
flexível levou a maciças fusões e diversificações corporativas (HARVEY, 1989,
p.150).
Sobre a internacionalização do mercado financeiro, Harvey (1989, p.152) assevera:
O segundo desenvolvimento, que foi muito mais importante do que o primeiro, foi a
completa reorganização do sistema financeiro global e a emergência de poderes
imensamente ampliados de coordenação financeira. Mais uma vez, houve um
movimento dual; de um lado, para a formação de conglomerados e corretores
financeiros de extraordinário poder global; e, do outro, uma rápida proliferação e
descentralização de atividades e fluxos financeiros por meio da criação de
instrumentos e mercados financeiros totalmente inéditos. [...] A formação de um
mercado de ações global, de mercados futuros de mercadoria (e até de dívidas)
globais, de acordos de compensação recíproca de taxas de juros e moedas, ao lado
da acelerada mobilidade geográfica de fundos, significou, pela primeira vez, a
82
criação de um único mercado mundial de dinheiro e de crédito[...] (HARVEY, 1989,
p.152).
Considerando a afirmação de que “o sistema do capital é orientado para expansão e
movido pela acumulação” (MÉSZÁROS, 2002, p.100, grifo autor), o mesmo não medirá
esforços no sentido da sua reprodução, independentemente dos desafios que encontrar pela
frente e das consequências globais que possam acarretar.
Mesmo sob “normalidade” de perturbações e bloqueios cíclicos relativamente
limitados, a destruição que acompanha as consequentes crises socioeconômicas e
políticas pode ser enorme, como revelam os anais do século XX [...]. Portanto, não é
muito difícil imaginar as implicações de uma crise sistêmica, verdadeiramente
estrutural; ou seja, uma crise que afete o sistema do capital global não apenas em
um de seus aspectos – o financeiro/monetário, por exemplo – mas em todas as suas
dimensões fundamentais, ao colocar em questão a sua viabilidade como sistema
reprodutivo social (MESZÁROS, 2002, p.100, grifo autor).
Neste sentido é que não poderíamos deixar de evidenciar a crise de 2008, citada por
autores (BASÍLIO; OREIRO, 2009; BRESSER-PEREIRA, 2009; FERGUSON, 2013;
KRUGMAN, 2009; SICSÚ, 2009; entre outros) como a maior do sistema capitalista desde a
crise de 1929, tendo suas consequências ainda presentes na economia mundial, sobretudo,
sobre a internacionalização do mercado financeiro.
Sicsú (2009, p.144/145) esclarece o que foi a crise de 2008 e como ela desdobrou-se
em três crises: crise de crédito, crise de liquidez e crise patrimonial. Conforme o autor:
O sistema financeiro ofereceu aos americanos de renda mais baixa e instável o sonho
da casa própria. Ao mesmo tempo, ofereceu aos de cima outro sonho, o da alta
rentabilidade financeira – já que as operações tradicionais, como a concessão de
crédito, estavam remunerando muito aquém dos seus sonhos financistas. O sonho
dos de baixo era compatível com o sonho dos de cima. Diferentemente das empresas
e outros entes, os americanos de baixo (os indivíduos do grupo subprime)
supostamente poderiam pagar aos de cima juros mais altos. O sistema pactuou os
sonhos dos “subcidadãos” com os sonhos das superinstituições financeiras. As
operações de financiamento imobiliário ao grupo de “subcidadãos” eram de alto
risco por estarem garantidas pelo trabalho, por vezes, informal e por rendas,
potencialmente, variáveis. E, finalmente, chegou o dia em que as garantias
evaporaram. Chegou o dia em que as prestações da casa própria não puderam mais
ser pagas. Uma das formas de pactuação dos sonhos foi estabelecer contratos de
financiamento imobiliário com juros altos, mas com percentuais diferenciados ao
longo do tempo. No começo do contrato, as taxas de juros eram baixas, depois eram
muito altas para compensar a redução da primeira fase. Até o final de 2006, a maior
parte dos contratos ainda estava na fase de juros mais baixos (e, portanto, a
inadimplência era reduzida). Posteriormente, na fase de juros mais altos, a prestação
elevada não cabia no rendimento dos “subcidadãos” e os empréstimos deixaram de
ser validados. Esse é o desenho da crise de crédito que atingiu a economia norte-
americana. O sistema financeiro vendeu a dívida que carregava dos “subcidadãos”
para as super-instituições, remunerando-as com elevadas taxas de juros,
83
proporcionais ao risco da operação. Quando foi percebido que a dívida dos de baixo
não estava sendo validada, decidiu-se vender o papel lastreado na capacidade de
pagamento dos “subcidadãos”. Quase que simultaneamente, todos tomaram a
mesma decisão. Por razões óbvias, os papéis passaram a valer quase nada. Quando
os preços de ativos entram em deflação aguda, diz-se, então, que o mercado entrou
em crise de liquidez. Esses papéis de alto risco e remuneração compunham o ativo
de muitas instituições financeiras nos Estados Unidos. Os valores de passivos são
mais rígidos do que de ativos. Se por um lado, a maior parte dos ativos das
instituições financeiras é cotada pelo mercado, por outro, os seus passivos estão
registrados em contratos. Assim, passivos e ativos se desequilibraram. Foi isto que
tornou o capital de diversas instituições insuficiente para garantir a continuidade de
suas operações. A terceira crise, então, adentrou a economia: a crise patrimonial.
Primeiro foi a crise de crédito, que se transformou em crise de liquidez que, por sua
vez, se transformou em crise patrimonial (SICSÚ, 2009, p.144/145).
Oreiro (2011, s.p.), ao abordar as origens da crise de 2008, afirma que ela se espalhou
pelo mundo em poucos meses:
Começou nos Estados Unidos após o colapso da bolha especulativa no mercado
imobiliário, alimentada pela enorme expansão de crédito bancário e potencializada
pelo uso de novos instrumentos financeiros, a crise financeira se espalhou pelo
mundo todo em poucos meses. O evento detonador da crise foi à falência do banco
de investimento Lehman Brothers no dia 15 de setembro de 2008, após a recusa do
Federal Reserve (Fed, banco central americano) em socorrer a instituição. Essa
atitude do Fed teve um impacto tremendo sobre o estado de confiança dos mercados
financeiros, rompendo a convenção dominante de que a autoridade monetária norte-
americana iria socorrer todas as instituições financeiras afetadas pelo estouro da
bolha especulativa no mercado imobiliário (OREIRO, 2011, s. p., grifo nosso).
Ferguson (2014, s.p.), em entrevista à Revista Época, pelo jornalista Rodrigo Turrer,
declara que as causas da crise de 2008 assim se apresentam:
O excesso de poder político do mercado financeiro. Nos últimos 30 anos, houve uma
enorme concentração do poder econômico de vários tipos de indústrias nas mãos de
poucas pessoas. Isso fez com que esses grupos tivessem capacidade de influenciar a
política americana. No caso do mercado financeiro, isso foi ainda mais acentuado
por causa do contínuo enfraquecimento das regras para o setor, desde o governo
Ronald Reagan (1981-1989) até hoje. Ao mesmo tempo, os serviços financeiros se
globalizaram. O mercado financeiro ganhou um poder de barganha e controle
inigualável. Nesse mesmo período, o poder do dinheiro tornou-se mais presente na
política americana. A partir do governo Reagan, o financiamento de campanhas saiu
de uma faixa de US$ 20 milhões a US$ 30 milhões, em 1970, para US$ 900
milhões, em 2012. A importância do dinheiro na política americana aumentou.
Então, as grandes fortunas do mercado financeiro conseguiram exercer cada vez
mais influência política, e o setor financeiro tornou-se sem princípios. O resultado
foi à crise de 2008 (FERGUSON, 2014, s. p.).
O mesmo autor, ao responder ao questionamento “Por que o senhor acha que o setor
financeiro é mais danoso que outros setores da economia?”, afirma:
84
Porque ele é totalmente diferente das outras indústrias do capitalismo. Qualquer
crise ou instabilidade do setor financeiro pode causar a derrocada de toda a
economia, de uma forma que os outros setores não podem. Desregulamentado, o
mercado financeiro é mais perigoso que qualquer outro. Se uma empresa aeronáutica
constrói aviões que caem o tempo inteiro, todos percebem. Há um clamor popular,
governos investigam para descobrir o que houve de errado e tentam regular. O
mesmo vale para outras indústrias. Quando falamos do setor financeiro, isso não se
aplica. O mercado financeiro pode fazer estragos enormes antes que percebam que
há algo errado ali. Por isso, a regulação é necessária, mais que em outros setores
(FERGUSON, 2014, s. p.).
Já De Paula e Ferrari Filho (2009, p.142/143), no artigo intitulado “A crise das
finanças desregulamentadas: o que fazer?”, constatam que não existem regras na globalização
financeira:
A internacionalização do sistema financeiro tem alterado substancialmente a
natureza e os determinantes da dinâmica econômica mundial: a conjugação entre a
desregulamentação dos mercados financeiros e inovações financeiras – tais como
securitizações e derivativos – a livre mobilidade de capitais e a flexibilidade e a
volatilidade das taxas de câmbio e de juros têm, por um lado, limitado a ação das
políticas macroeconômicas domésticas e, por outro, sido responsáveis tanto pelas
frequentes crises de balanço de pagamentos das economias emergentes, quanto pelas
crises de liquidez e solvência, como a recente crise financeira internacional. Este
processo de globalização financeira, em que os mercados financeiros são integrados
de tal forma a criar um “único” mercado mundial de dinheiro e crédito, acaba, por
sua vez, diante de um quadro em que inexistem regras monetário-financeiras e
cambiais estabilizantes e os instrumentos tradicionais de política macroeconômica
tornam-se crescentemente insuficientes para conter os colapsos financeiros (e
cambiais) em nível mundial, resultando em crises de demanda efetiva (DE PAULA;
FERREIRA FILHO, 2009, p.142/143).
Também ao analisarem a crise de 2008 fazem as seguintes reflexões:
Em primeiro lugar, ela põe em xeque os benefícios concretos da globalização
financeira, com mercados financeiros desregulados, inclusive nos países
desenvolvidos. Em segundo lugar, ela nos remete, a partir das medidas de natureza
fiscal e monetária implementadas pelos EUA e países da Zona do Euro e do Japão –
tais como injeção de liquidez e de capital nos sistemas financeiros por parte das
autoridades econômicas destes países e a redução sincronizada da taxa básica de
juros dos principais bancos centrais mundiais – para se evitar uma recessão
econômica aguda, tanto a repensar o próprio papel do Estado na economia quanto à
necessidade de re-regulamentar os sistemas financeiros domésticos e reestruturar o
sistema financeiro mundial (SFM). (DE PAULA; FERREIRA FILHO, 2009, p.143).
A partir do exposto, podemos interpretar que a inexistência ou a limitação de regras
ampliam as atividades especulativas de risco e que a ação estatal é necessária para restaurar a
estabilidade do sistema financeiro mundial, evitando um efeito dominó devastador.
85
E foram as ações estatais dos países, por meio de injeção de recursos financeiros no
mercado, que desacelerou o furor da crise, tanto nos EUA quanto em outros países do mundo.
De acordo com D´Almeida (2011, p. 9):
Em 20 de setembro de 2008, o Governo Bush anunciou um pacote de salvamento do
sistema financeiro americano, que envolvia a criação de um fundo de US$ 700
bilhões a ser administrado pelo Tesouro Americano [...]. O objetivo era a compra de
títulos hipotecários de posse das instituições, visando à restauração da confiança no
sistema financeiro americano e o “desempoçamento” do crédito, que se encontrava
literalmente paralisado. Portanto, dentro da perspectiva de que o problema era
somente de liquidez, a estratégia passava por injetar reservas nos bancos, via compra
de ativos problemáticos, ou seja, uma solução pelo lado do ativo (D´ALMEIDA,
2011, p.9).
Em 2009, com a mudança de governo nos EUA com a eleição de Barack Obama, as
consequências sociais da crise continuavam dramáticas “[...] uma vez que os índices de
desemprego permaneciam em torno de 10% e cerca de 860 mil mutuários tiveram suas casas
retomadas no ano anterior.” (D´ALMEIDA, 2011, p. 11). Então, o novo presidente precisou
fazer outra intervenção estatal visando aumentar o poder de consumo da população e evitar o
aprofundamento da recessão: “em 17 de fevereiro de 2009, o novo presidente assinou um
novo plano, que visava ampliar as medidas fiscais que foram estimadas em 5,6% do PIB.”
(D´ALMEIDA, 2011, p.11).
No Brasil, o governo atuou de forma direta, conforme exposto por Rêbelo (2011, p.
74):
O Banco Central, por seu turno, injetou mais de 2 bilhões de dólares no mercado,
com o escopo de se preservar instituições financeiras e manter o crédito para o
consumo. Baixaram-se os juros da taxa Selic e reforçou-se a liquidez do BNDES,
almejando-se o financiamento da economia. Somando-se a isso, os empréstimos em
bancos públicos cresceram no mesmo período pós- inauguração da “crise” no Brasil,
chegando ao índice de 29,7% entre agosto de 2008 e junho de 2009, em comparação
com o crescimento de 7,51% dos bancos privados, no mesmo período (RÊBELO,
2011, p.74).
De igual forma, o governo precisou intervir na economia de forma indireta, por meio
de fornecimento de benefícios fiscais às empresas para manter a economia aquecida e os
postos de trabalho. De acordo com Rêbelo (2010), o fomento pode ser ilustrado pelo incentivo
financeiro por parte da Caixa Econômica Federal às construtoras de imóveis, corte do imposto
sobre produtos industrializados (IPI) para material de construção, automóveis e
eletrodomésticos (chamados de linha branca).
86
A intervenção direta e indireta na economia pelos governos mundiais se deu pelo fato
de que a crise de 2008 atingiu tanto o mercado financeiro mundial quanto as questões sociais,
conforme afirma Castelo Branco (2008, s. p.), que cita três efeitos nessa direção:
Os efeitos da crise financeira já se fazem presentes no mundo do trabalho. A falência
de diversas empresas, bem como a diminuição do crédito em circulação, reduzem os
níveis de consumo e investimento, o que gera, consequentemente, a queda no nível
das atividades econômicas. O resultado mais imediato deste ciclo econômico
descendente é o aumento do desemprego dos trabalhadores. [...] Um segundo
efeito da crise financeira sobre a classe trabalhadora, e que merece a nossa atenção,
é o aumento do pauperismo. A tendência – a curto, médio e longo prazos – é a
deterioração do bem-estar social dos trabalhadores. [...] Por fim iremos abordar um
terceiro efeito socioeconômico da crise sobre a “questão social”. O aumento dos
preços dos alimentos, estimulado pelo aumento dos preços dos combustíveis e dos
insumos agrícolas, tem crescido muito ultimamente (CASTELO BRANCO, 2008,
s.p., grifo nosso).
Nas questões sociais, podemos ilustrar como a crise de 2008 atingiu a educação
nos EUA. O jornalista Rodolfo Stancki, no Jornal eletrônico Gazeta do Povo, publicou em
agosto de 2012, reportagem intitulada “Crise econômica afeta a educação superior nos EUA”.
Nessa reportagem, o jornalista cita o relatório da empresa de consultoria Bain & Company,
publicado em julho de 2012, em que consta a informação de que um terço das instituições de
educação superior, públicas e privadas está passando por dificuldades financeiras.
Stancki (2012, s. p.) assevera que “O levantamento afirma que a dívida das
faculdades cresce até 12% ao ano. O débito dos empréstimos feitos por estudantes para pagar
a universidade ultrapassa US$ 1 trilhão [...].” Ressalta ainda que as instituições de ensino
superior nos Estados Unidos são pagas, tanto as públicas quanto as privadas, sendo que as
públicas são menos onerosas por serem subsidiadas por impostos do governo norte-
americano (STANCKI, 2012, s. p.).
O jornalista completa a informação com uma fala da professora Areta Galat, do
Núcleo de Relações Internacionais do Centro Universitário FAE: “Como todas essas
instituições têm um valor, a crise de 2008 afetou muito a vida dos estudantes e, por
consequência, de várias escolas.” Segundo ela, quem fez empréstimos para pagar a faculdade
antes da explosão da “bolha imobiliária”, agora precisa lidar com a dívida (STANCKI, 2012,
s. p.).
Como exemplo, podemos ainda citar os efeitos da crise de 2008 no estado da
Califórnia – EUA baseado na interpretação da publicação da Chronicle of Higher Education,
feita pelo jornalista Carlos Orsi, na Revista de Ensino Superior em agosto de 2012, por meio
87
da reportagem “Crise econômica e demanda crescente pressionam universidades públicas na
Califórnia”:
Os cortes de verba afetam todo o sistema: a Universidade da Califórnia perdeu US$
1 bilhão de financiamento estadual desde 2008, uma queda de 25%. As faculdades
comunitárias perderam US$ 668 milhões no mesmo período, uma queda de 24%. E
a Universidade Estadual viu sua dotação cair 30%, perdendo US$ 900 milhões
(ORSI, 2012, s. p.).
Além da intervenção econômica, os EUA, epicentro da crise de 2008, ao que parece,
iniciaram logo em 2009, na administração do presidente Barack Obama, uma nova forma de
diplomacia em suas relações internacionais.
No evento da 5ª Cúpula das Américas, realizado em 2009, na República de Trinidad
e Tobago, o referido presidente busca aproximação com os países da América Latina,
conforme cita Auken (2009, s. p.) na reportagem “Cúpula das Américas termina sem acordo
sobre crise econômica”:
O principal papel efetuado pelo presidente americano foi tentar refazer a política dos
EUA na região, apresentando seu governo como uma radical ruptura com a postura
confrontante da administração Bush. Ele enfatizou que os Estados Unidos estavam
na cúpula “para escutar e não somente para falar” e para avançar em uma nova
relação entre os EUA e os países ao sul, baseada no “respeito mútuo e igualdade”
(AUKEN, 2009, s. p.).
Em 2011, Barack Obama visitou a América Latina, incluindo o Brasil, com intuito de
aproximação iniciada na 5ª Cúpula das Américas, conforme exposto pelos jornalistas
Anselmo Massad e João Peres na reportagem “Visita de Obama indica atenção maior dos EUA à
América Latina e ao Brasil”, na Rede Brasil Atual, em março de 2011:
Segundo analistas, a visita iniciada pelo Brasil neste sábado (19), incluindo também
Chile e El Salvador, é uma tentativa de aprofundar laços e de convencer os países da
região de que as intenções de Obama são, de fato, de promover uma "parceria entre
iguais", como ele próprio sugeriu na Cúpula das Américas de 2009 (MASSAD;
PERES, 2011, s. p. ).
Nessa mesma reportagem, os jornalistas trazem ainda a situação do Brasil ao citar o
posicionamento do governo Lula e do governo Dilma:
Além disso, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva promoveu uma expansão nas
relações Sul-Sul, o que quer dizer priorizar nações como China, Venezuela e Irã. A
diversificação de parcerias comerciais é defendida como forma de evitar uma
dependência excessiva de uma única potência e foi parte da resposta mais rápida do
país à crise financeira internacional de 2008 e 2009, que teve nos Estados Unidos
sua origem e epicentro.[...]Apesar de não haver indicações de mudanças na política
88
externa, Dilma Rousseff ofereceu sinais de que quer trabalhar com Obama para
reverter o declínio relativo no comércio bilateral durante os últimos anos e explorar
outras iniciativas que, segundo ela, podem ajudar o Brasil a se tornar um país de
classe média até o fim desta década (MASSAD; PERES, 2011, s. p. ).
Os jornalistas concluem qual é o interesse de tal visita:
A visita deste fim de semana pode ser vista como um sinal do interesse do
mandatário da Casa Branca de aproveitar o momento favorável nas relações,
especialmente em um contexto em que o Brasil é a oitava economia do mundo, com
perspectiva de crescimento sustentável pelos próximos anos (MASSAD; PERES,
2011, s. p. ).
Marco Aurélio Garcia, assessor-chefe da Assessoria Especial da Presidenta da
República, em entrevista concedida à imprensa do Itamaraty, às vésperas da vinda do
presidente do EUA ao Brasil, afirma:
É bom lembrar que nós tivemos uma reunião muito importante entre o presidente
Obama e os presidentes sul-americanos em Trinidad e Tobago durante uma reunião
das Américas e que, lamentavelmente, a partir daquele momento não houve o
desenvolvimento que nós esperávamos que pudesse haver. Mas eu acho que agora
está se retomando essa possibilidade de aprofundar a relação com os Estados Unidos
e nós vemos isso com muita alegria, com muita expectativa (BRASIL, 2011).
No Brasil, a primeira visita de Barack Obama, realizada nos dias 19 e 20 de março de
2011, estabeleceu dez acordos de relação bilateral entre Brasil e EUA em áreas relacionadas
ao comércio exterior, eventos esportivos, energia e educação.
Ao especificar a área de educação, objeto do estudo em tela, o principal documento
assinado pelo EUA e Brasil, na visita em 2011, foi o “Memorando de Entendimento para o
estabelecimento do Programa Diálogos Estratégicos Brasil- EUA a ser celebrado entre a
Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior ( CAPES/MEC) e a
Comissão para o intercâmbio educacional entre os Estados Unidos da América e o Brasil (
Comissão Fulbright)”.
Nesse documento é mencionado como objeto:
1. Estabelecer o Programa Diálogos Estratégicos Brasil-EUA (CAPES/Fulbright)
buscando aprofundar a cooperação entre acadêmicos de instituições brasileiras e
estadunidenses em áreas que sejam mutuamente benéficas para as comunidades
acadêmicas de ambos os países.
2. Fomentar a cooperação acadêmica e o intercâmbio entre pesquisadores de
alto nível brasileiros e estadunidenses em programas de pós-graduação stricto
sensu, mediante a visita de docentes e pesquisadores de alto nível a programas de
89
pós-graduação stricto sensu ministrados no Brasil e nos EUA (BRASIL, 2011, grifo
nosso).
Fica evidenciado que esse documento “abre portas” para a criação de programas de
cooperação acadêmica internacional, ou seja, trata-se da gestação do Programa Ciência sem
Fronteiras.
Essa afirmação se confirma, considerando o citado pelo Diretor de Relações
Internacionais da CAPES, Márcio de Castro Silva Filho, em entrevista cedida para Jornal da
Ciência, em 03/11/2011: “Obama perguntou à presidente brasileira por que não há muitos
brasileiros estudando nos EUA, se atualmente existem 130 mil chineses e 120 mil indianos
nas universidades americanas.”
Viana (2014, p. 10), no artigo “A reação Norte-Americana ao programa Ciência sem
Fronteiras”, ao refletir sobre as relações bilaterais de educação entre os EUA e o Brasil,
conclui que:
Pode-se entender o programa do governo brasileiro como uma resposta ao
andamento e o contexto das relações internacionais bilaterais entre Brasil e Estados
Unidos. Ainda, responde à intensificação para o desenvolvimento das Ciências e
Tecnologias, dentro do âmbito mais amplo dos GPDs [U.S -Brazil Global
Partnership Dialogue ] e da parceria Brasil-Estados Unidos para o século 21,
ocorridos em 2012. Como foi verificado, tais parcerias ditaram a reação norte-
americana ao que se refere à operacionalização do programa naquele país, reação
positiva e alinhada à visão estratégica dada ao assunto (VIANA, 2014, p.10).
Resumidamente, ousamos fazer a seguinte análise conjuntural:
EUA – Epicentro da crise de 2008; consequências também na área de educação;
promotor de alta tecnologia; busca por nova diplomacia e aproximação com a América Latina
com vista a expandir sua econômica e ideologia.
BRASIL – Crise de 2008 com menor ênfase; situado entre as oito maiores economias
mundiais; deficitário em alta tecnologia; princípios do novo-desenvolvimentismo
(crescimento econômico com distribuição de renda aliado à parceria com os países
desenvolvidos, respeitando certas diretrizes dos organismos internacionais); do ponto de vista
da aproximação com o EUA, há o interesse em apropriar-se de conhecimento tecnológico e
inovador.
90
Temos, então, um encontro de interesses: aquele que possui alta tecnologia e precisa
de recursos financeiros e o que possui recurso financeiro e precisa de alta tecnologia.
Podemos apontar como um dos resultados o Programa Ciência sem Fronteiras.
3.2. FISIONOMIA E FUNCIONAMENTO DO PROGRAMA CSF
O CsF foi idealizado pelo governo da Presidente Dilma após a visita do Presidente
dos Estados Unidos da América, Barack Obama, em março de 2011.
O surgimento do CsF é tratado por Catani e Silva Júnior ( 2013, p.171):
Em 25 de janeiro de 2011, o presidente Barack Obama anunciou, em discurso do
Estado, a importância da relação bilateral Brasil- Estados Unidos. Visitou Brasília e
Rio de Janeiro (março de 2011), quando se encontrou com a presidente Dilma
Rouseff. Foi nessa visita que o Programa CsF foi comentado como uma área
estratégica de desenvolvimento (Entrevista concedida pelo professor William L.
Gertz, do American Institute For Foreing Study, ao professor João dos Reis Silva
Júnior na cidade de Nova York em 12 de julho de 2012) (CATANI; SILVA
JÚNIOR, 2013, p.171).
O primeiro anúncio sobre o Programa foi feito pelo Ministro da Ciência e Tecnologia
e Inovação (MCTi), Aloisio Mercadante, na 38ª reunião do Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social (CDES), em julho de 2011, em Brasília. Na ocasião, Mercadante
destacou que hoje o Brasil é o 13º no ranking de produção científica mundial, média cinco
vezes maior que a do restante das outras nações, mas que o país precisa produzir mais
patentes e que o Programa Ciência sem Fronteiras surge com este intuito, destacando que se
trata de “[...] os melhores estudantes do Brasil, nas melhores universidades do mundo. Assim
poderemos superar o maior desafio do país e dar um salto quântico na formação para áreas
estratégicas de forma sustentável, ampliando os setores de média e alta tecnologia.” (CsF,
2011).
Como se percebe, o Programa CsF nasce para estimular o avanço da ciência nacional
em tecnologia, inovação e competitividade, por meio da expansão da mobilidade
internacional, utilizando-se como estratégia o incentivo financeiro para aumentar a presença
de pesquisadores e estudantes brasileiros em instituições de excelência no exterior e para
atrair jovens talentos científicos e investigadores para trabalhar no Brasil. Tem-se como
objetivo principal:
91
[...] propiciar a formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação
em universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros
de pesquisa estrangeiros de excelência, além de atrair para o Brasil jovens
talentos e pesquisadores estrangeiros de elevada qualificação, em áreas de
conhecimento definidas como prioritárias (BRASIL, 2011).
Para entendermos a construção desse Programa, precisamos contextualizá-lo
cronologicamente. Logo após o anúncio em agosto de 2011, iniciou-se a primeira convocação
para o Programa CsF, por meio da Chamada Pública CAPES n.º 01/2011 (Diário Oficial da
União n.°166, 29/08/11), que tornou pública a seleção por IES brasileiras de estudantes de
graduação em áreas e temas de estudo de interesse para o Brasil, para realização de disciplinas
e estágios em Universidades dos Estados Unidos da América no âmbito do Programa CsF,
sendo contemplado com bolsa de intercâmbio CAPES, custeios de viagem e o pagamento das
taxas acadêmicas na instituição estrangeira. Porém, cabia à CAPES escolher a Universidade
destino, com apoio da agência educacional Institute of International Educacion – IIE.
Em setembro de 2011, o CNPq entrou em contato com os Coordenadores do
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) e Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (Pibit) das Universidades
brasileiras com intuito de apresentar o Programa CsF e explicar que cada Universidade
receberia uma quota de vagas para contemplar estudantes bolsistas e ex-bolsistas dos PIBIC,
PIBIT, Programa Voluntariado de Iniciação Científica (VIC) e Programa de Educação
Tutorial (PET) que estivessem matriculados e cursando a graduação para participarem do
referido Programa (CsF, 2011).
A ideia presente era aperfeiçoar sua formação no exterior e estimular suas
competências e habilidades para o desenvolvimento científico e tecnológico, o
empreendedorismo e a inovação. O CNPq disponibilizou um documento com mais de 330
instituições que os candidatos poderiam escolher e determinou que a negociação da
vaga/estada deveria ser feita pelos pesquisadores e Universidades brasileiras, cabendo à
instituição estrangeira a palavra final sobre receber ou não o estudante contemplado.
No decorrer de agosto a dezembro de 2011, houve muitos desencontros de
informações entre os órgãos fomentadores, as Universidades brasileiras e os candidatos10
.
10
Fatos vivenciados pela autora a partir da experiência profissional para implementar o Programa CsF numa IES
brasileira.
92
A principal dificuldade da chamada pública-CAPES foi encontrar locais disponíveis,
no âmbito do calendário do Edital, para efetuar a prova de proficiência em inglês exigida,
tendo em vista que somente as grandes cidades do Brasil possuem instituições habilitadas
para aplicarem tal prova, com calendário pré-definido e para um número reduzido de
estudantes, gerando assim um grande impasse aos candidatos. Na época, a CAPES teve que
repensar esse requisito e articular com a empresa administradora da prova e as Universidades
brasileiras uma parceria para atender a demanda do CsF.
Na forma de execução do programa pelo CNPq a maior dificuldade foi justamente a
responsabilidade imposta aos pesquisadores e às Universidades brasileiras de negociar as
vagas/estada do estudante nas instituições estrangeiras. Primeiro, porque poucos
pesquisadores já mantinham relações institucionais com os pesquisadores do exterior e
segundo porque quando havia o contato para estabelecer as negociações os parceiros
estrangeiros não sabiam do que se tratava, não conheciam o Programa CsF. Para tentar
amenizar a situação, o próprio CNPq emitiu uma carta de apresentação do Programa,
multilíngue, para que os candidatos pudessem enviá-las ao exterior apresentando o programa
e pleiteando vaga, mesmo assim poucas quotas foram contempladas nas universidades
brasileiras.
Era latente, nos dois órgãos, um desentendimento sobre quais cursos de nível
superior pertenciam às áreas elegíveis do Programa CsF, causando confusão entre os
estudantes, as universidades brasileiras e os órgãos executores.
Tendo em vista a forma atribulada e desarmônica da gestão desse programa pelos
órgãos executores, CAPES e CNPq, a Presidência da República tomou para a si a
responsabilidade de instituir oficialmente o programa e suas diretrizes.
Assim sendo, o Programa CsF foi oficialmente instituído em 13/12/2011, pelo
Decreto n.º 7.642 da Presidência da República, como um programa do Governo Federal
Brasileiro que “ [...]busca promover a consolidação, expansão e internacionalização da ciência
e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por meio do intercâmbio e da
mobilidade internacional.” (BRASIL/CsF, 2014).
O programa tem como objetivos definidos no artigo 2, do Decreto de criação:
93
I - promover, por meio da concessão de bolsas de estudos, a formação de estudantes
brasileiros, conferindo-lhes a oportunidade de novas experiências educacionais e
profissionais voltadas para a qualidade, o empreendedorismo, a competitividade e a
inovação em áreas prioritárias e estratégicas para o Brasil; II - ampliar a participação e a mobilidade internacional de estudantes de cursos
técnicos, graduação e pós-graduação, docentes, pesquisadores, especialistas,
técnicos, tecnólogos e engenheiros, pessoal técnico-científico de empresas e centros
de pesquisa e de inovação tecnológica brasileiros, para o desenvolvimento de
projetos de pesquisa, estudos, treinamentos e capacitação em instituições de
excelência no exterior; III - criar oportunidade de cooperação entre grupos de pesquisa brasileiros e
estrangeiros de Universidades, instituições de educação profissional e tecnológica e
centros de pesquisa de reconhecido padrão internacional; IV - promover a cooperação técnico-científica entre pesquisadores brasileiros e
pesquisadores de reconhecida liderança científica residentes no exterior por meio de
projetos de cooperação bilateral e Programas para fixação no País, na condição de
pesquisadores visitantes ou em caráter permanente; V - promover a cooperação internacional na área de ciência, tecnologia e inovação; VI - contribuir para o processo de internacionalização das instituições de ensino
superior e dos centros de pesquisa brasileiros; VII - propiciar maior visibilidade internacional à pesquisa acadêmica e científica
realizada no Brasil; VIII - contribuir para o aumento da competitividade das empresas brasileiras; e IX - estimular e aperfeiçoar as pesquisas aplicadas no País, visando ao
desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação ( BRASIL, 2011).
Ficou estabelecido desde então que o programa se desenvolveria de acordo com duas
modalidades principais: 1) formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação em
universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros de pesquisa
estrangeiros de excelência; 2) atração de jovens talentos, principalmente brasileiros, e
pesquisadores renomados estrangeiros para vir ao Brasil desenvolver projetos de pesquisa por
cooperação científica e tecnológica. Os dois pontos seriam submetidos a financiamento de
bolsas e fomento à pesquisa.
A primeira modalidade possui como público alvo: 1) estudantes de graduação na
modalidade graduação – sanduíche, 2) estudantes de doutorado na modalidade doutorado-
sanduíche, 3) candidatos graduados ou mestres à formação plena de doutoramento na
modalidade doutorado pleno, 4) candidatos doutores na modalidade pós-doutorado e
docentes, pesquisadores e estudantes de cursos técnicos e superiores oferecidos por institutos
de formação profissional e tecnológica na modalidade educação profissional e tecnológica.
A segunda modalidade possui como público alvo: 1) jovens cientistas de talento,
principalmente brasileiros, com destacada produção científica ou tecnológica na modalidade
jovens talentos e 2) lideranças internacionais, estrangeiros ou brasileiros, com expressiva
atuação no exterior na modalidade pesquisadores visitantes estrangeiros.
94
Nesse mesmo documento, foi detalhada a forma de gestão, divulgação e fomento. Para
gerir o referido programa foram criados dois Comitês, um de Acompanhamento e
Assessoramento e outro Executivo.
O Comitê de Acompanhamento e Assessoramento tem como membros representantes:
1 da Casa Civil da Presidência da República, 1 do Ministério da Educação, 1 do Ministério da
Ciência, Tecnologia e Inovação, 1 do Ministério das Relações Exteriores, além do Presidente
do CNPq e do Presidente da CAPES . Assumirá a presidência deste Comitê o representante do
Ministério da Educação e o Ministério da Ciência e Tecnologia, alternadamente a cada 12
meses.
Esse Comitê possui como principais atribuições propor ações, metas, indicadores,
áreas prioritárias, bem como acompanhamento, divulgação e avaliação do referido programa
visando seu bom desenvolvimento, numa postura estrategista.
No Comitê Executivo, também há mais um membro representante de cada órgão
descrito no outro Comitê acima, além da presença dos presidentes do CNPq e CAPES. Porém,
sendo presidido primeiramente pelo representante do Ministério da Ciência e Tecnologia e
Inovação para depois de 12 meses alternar com o representante do Ministério da Educação, e
assim sucessivamente pelo tempo de existência do referido programa.
O Comitê possui uma característica administrativa, tendo com principais atribuições
estabelecer cronograma, critérios de seleção dos bolsistas e das instituições participantes e
valores e períodos de bolsas, além de identificar centros e lideranças no exterior de interesse
para o Brasil.
No âmbito da gestão, ficou estabelecido que o modo de divulgação do processo de
concessão das bolsas é por chamadas públicas promovidas pela CAPES e CNPq,
conjuntamente, levando-se em conta o mérito dos candidatos e dos projetos, respeitadas as
especificidades de cada entidade executora.
O fomento do programa ocorre pelas dotações orçamentárias da União, por meio dos
Ministérios de Educação e de Ciência e Tecnologia e Inovação consignadas, que, anualmente,
complementam os orçamentos da CAPES e CNPq, respectivamente, os quais já desenvolviam
e desenvolvem cooperação internacional e concessão de bolsas no exterior, independente do
95
Programa CsF. Além disso, há possibilidade de participação de outras fontes de recursos,
provenientes de entidades públicas e privadas.
Na ocasião do primeiro anúncio do referido programa (julho/2011), foi publicado em
meios de comunicação que o CNPq concederia o montante de 35 mil bolsas e a CAPES o
montante de 40 mil bolsas, totalizando 75 mil bolsas, com investimento governamental inicial
de 3 bilhões de reais e 160 milhões de reais, respectivamente. Porém, o Governo esperava que
o investimento crescesse com a iniciativa privada arcando com mais 25 mil bolsas, para
garantir 100 mil bolsas até 2014/2015.
Até o momento (abril de 2015) temos a informação de que a iniciativa privada
assumiu o financiamento de 26 mil bolsas (CsF, 2015) o que faz supor que ao longo de 2015 a
meta pretendida de oferta de bolsas pelo governo seja cumprida.
É importante ressaltar que ficou instituído em 09/01/2013, pela Portaria
Interministerial n.1, do Ministério da Educação, que as áreas e temas prioritários de atuação
do programa são:
I - engenharias e demais áreas tecnológicas;
II - ciências exatas e da terra;
III - biologia, ciências biomédicas e da saúde;
IV - computação e tecnologias da informação;
V - tecnologia aeroespacial;
VI - fármacos;
VII - produção agrícola sustentável;
VIII - petróleo, gás e carvão mineral;
IX - energias renováveis;
X - tecnologia mineral;
XI - biotecnologia;
XII - nanotecnologia e novos materiais;
XIII - tecnologias de prevenção e mitigação de desastres
naturais;
XIV - biodiversidade e bioprospecção;
XV - ciências do mar;
XVI - indústria criativa;
XVII - novas tecnologias de engenharia construtiva; e
XVIII - formação de tecnólogos.
(BRASIL, 2013)
Isso sinaliza que as áreas são limitadas, focadas em ciência, tecnologia e inovação
(conforme indica o Banco Mundial em seu documento publicado em 2011), definidas
exclusivamente pelo interesse do governo federal e sem perspectiva de alteração.
96
3.2.1 Sobre a Graduação – Sanduíche
Neste trabalho, delimitaremos as análises apenas na primeira modalidade do
Programa CsF- a formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação em
universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros de pesquisa
estrangeiros de excelência, no recorte do público alvo estudantes de graduação – sanduíche,
no período de exercício de 2011 a 2014.
O Quadro 5, a seguir apresentado, sistematiza, cronologicamente, eventos marcantes
que se sucederam, considerando o período de abrangência do CsF. Tem-se expectativa, com
isso, de mostrar a fisionomia geral do programa e sua evolução, por meio das sucessivas
normatizações estabelecidas.
Quadro 5 - Programa Ciência sem Fronteiras. Eventos marcantes – agosto de 2011 a outubro de 2013
Data Descrição Agosto de 2011 1ª convocação para o Programa CsF, através da Chamada Pública CAPES n.º 01/2011,
com destino para as Universidade dos EUA. Setembro de
2011 CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico entrou em
contato com os Coordenadores do Programa de Iniciação Científica e Tecnológica
(PIBIC/PIBIT) das Universidades brasileiras para apresentar o Programa CsF e explicar
que cada Universidade receberia uma quota de vagas para contemplar estudantes
bolsistas e ex-bolsistas dos Programa de Iniciação Científica. Agosto a
Dezembro de
2011
Período marcado por recorrentes desencontros de informações entre os órgãos
fomentadores, as Universidades brasileiras e os candidatos, principalmente a respeito da
definição dos cursos elegíveis. 13/12/2011 Publicação do Decreto n.º 7.642 da Presidência da República, que instituiu oficialmente
o Programa CsF. Nesse mesmo documento foi detalhada a forma de gestão, divulgação
e fomento. Dezembro de
2011 2ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas 102 até 106.
Março de 2012 3ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas de 108 até 116. Agosto de 2012 4ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas de 117 até 124. Novembro de
2012 5ª convocação para o Programa CsF, das Chamadas Públicas de 126 até 134.
18/12/2012 Publicação da Portaria Interministerial n.1466, do Ministério da Educação, que intuiu
oficialmente o Programa Inglês sem Fronteiras (IsF). 09/01/2013 Publicação da Portaria Interministerial n.1, do Ministério da Educação, que definiu
definitivamente as áreas e temas prioritários de atuação do Programa CsF. Fevereiro de
2013 6ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas 136 até 142.
24/04/2013 Veto do Ministério de Educação brasileiro da Chamada Pública n.º 127 com destino às
Universidades de Portugal, justificado pelo fato da elevada procura por Portugal, em
detrimento dos países de outra língua, considerando que o Programa possui como um
dos objetivos principais incentivar a proficiência em uma segunda língua. Maio de 2013 7ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas de 143 até 155. Outubro de 2013 8ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas de 156 até 174. Agosto de 2014 9ª convocação para Programa CsF através das Chamadas Públicas de 179 até 204.
Fonte: Organizado pela autora, segundo documentos do Programa CsF.
97
Ao longo do período examinado, parece ser possível afirmar que o programa constrói-
se apressadamente, sem o necessário planejamento e discussão entre os envolvidos,
acarretando desencontros de informações e, inclusive, divulgação de atos oficias posteriores à
implementação de ações a eles relacionadas.
No que tange à modalidade delimitada nesta pesquisa (graduação-sanduíche), até o
presente momento (outubro de 2014) foram lançadas 101 chamadas públicas, as quais são
agrupadas em nove convocações, que se referem a um conjunto de chamadas públicas
lançadas num dado período.
A Tabela 1, na sequência, apresenta os países que sediam as instituições onde se
destinam os estudantes de graduação brasileiros, bem como o mês de lançamento das
convocações, as chamadas públicas as quais pertencem às convocações (mantendo a
numeração utilizada pelo programa) e o total de vezes em que o país participou das chamadas
públicas divulgadas.
Tabela 1 - Chamadas Públicas do Programa CsF – Modalidade graduação- sanduíche
Lançamento Convocações/N.ºs das Chamadas por País
Ano 2011 2011
2012 2012 2012
20122
013 2013 2013 2013 2014
Mês Ago Dez Mar Ago Nov Fev Mai Out Ago
Convocações 1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª 9ª Total
Canadá* 108/
109 120/
124
147/149
/152 168/171 188/189/204 12
EUA* 01
CAPES 102 117
131/13
2 143 156 180/196 9
Bélgica* 110/
111
140/
141 175/176 186/187 8
Austrália* 112 119 148/153 167/172 184/185 8
Alemanha 103 118 144 157 181 5
Reino Unido 106 123 151 170 195 5
Coreia do Sul 114 121 150 169 190 5
França 104 128 158 182 4
Itália 105 130 159 183 4
Espanha 115 126 178 191 4
Holanda 116 122 177 193 4
Hungria 129 146 164 201 4
Japão 135 145 165 202 4
Finlândia 142 154 173 192 4
Suécia 133 160 197 3
Noruega 134 161 198 3
China 136 163 200 3
Irlanda 138 162 199 3
98
Fonte: Dados organizados pela autora, com base nas chamadas públicas divulgadas.
*Países com mais de uma agência de cooperação;
** Chamada pública cancelada; estudantes selecionados redirecionados para outro país.
É possível notar, como destaque, que o Canadá totalizou sua participação em doze
chamadas públicas ao longo do período estudado (2011-2014). Além desse país, com maior
incidência nas chamadas públicas divulgadas, constam os Estados Unidos da América com
nove. Não por acaso, são países onde se localizam instituições de ensino superior que
aparecem com frequência em posições de frente em rankings11
internacionais, o que,
inclusive, pode sinalizar uma intencionalidade da política educacional brasileira em aliar-se à
lógica competitiva inerente a esse processo.
Cabe ressaltar, ao considerar as IES receptoras dos estudantes, que algumas não
figuram positivamente em institutos de classificação, o que parece contradizer a intenção de
“formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação em universidades, instituições
de educação profissional e tecnológica, e centros de pesquisa estrangeiros de excelência.”
(BRASIL, 2011). Nesse sentido, a título de exemplo: a Chamada Pública n.º 132 anunciou a
destinação dos bolsistas para as Universidades e Instituições Comunitárias Historicamente
Negras dos EUA, bem como uma lista das 31 instituições contempladas pela referida
chamada. Porém, segundo levantamento realizado em março de 2014, no site dos rankings:
The World Reputations Rankings e QS World University Rankings, nenhuma se classifica
nesses rankings como as “melhores do mundo”. Percebe-se um afrouxamento com relação à
posição das IES de destino, senão veja-se o divulgado no site oficial do Programa CsF,
subitem Instituições de Destino, acessado em 29/09/14:
Os estudantes e pesquisadores do Ciência sem Fronteiras terão o seu treinamento nas
melhores instituições e grupos de pesquisa disponíveis, prioritariamente entre os
mais bem conceituados para cada grande área do conhecimento de acordo com os
principais rankings internacionais (CsF, 2014, grifo nosso).
11
A título de exemplo, tem-se: The World Reputations Rankings
(<http://www.timeshighereducation.co.uk/world-university-rankings/2014/reputation-ranking> e QS World
University Rankings (<http://www.topuniversities.com/university-rankings/world-university-
rankings/2013#sorting=rank+region=+country=+faculty=+stars=false+search= >).
Áustria 139 166 203 3
Nova
Zelândia 155 174 194 3
Portugal 113 127** 2
Polônia 179 1
TOTAL GERAL CsF 101
99
A lógica de rankiamento de instituições de ensino superior suscita questionamentos,
por exemplo, os critérios utilizados na escolha das melhores, e apenas a evidenciamos neste
texto porque os gestores do Programa CsF valorizam a questão, conforme a citação anterior.
No que segue, o Quadro 6 destaca as principais alterações ocorridas ao longo das
convocações públicas do CsF, na modalidade de bolsas de graduação-sanduíche divulgadas
no período de 2011 a 2014. Ressaltamos novamente que convocações é um grupo de
chamadas públicas/editais (CP) lançadas na mesma época, sendo cada número correspondente
a um país de destino.
Quadro 6 - Destaques das Convocações do Programa CsF de 2011 a 2014
Convocação Descrição
1ª Convocação
CP CAPES n.º
01/2011
Data: Ago/2011
- CsF foi executado por dois órgãos separadamente, Capes e CNPq.
- Cabe a IES a responsabilidade pela organização e acompanhamento do processo de
apresentação das candidaturas e pela respectiva homologação junto a CAPES.
2ª Convocação
CP n.º 102 a 106
Data: Dez/2011
-A execução do CsF passou a ser conjunta, Capes e CNPq, através de representações
nos comitês: 1.Acompanhamento e Assessoramento e 2. Executivo. As IES
assumiram apenas o papel de homologadoras de elegibilidade dos candidatos.
-Ampliaram as modalidades de proficiência linguística e oportunizaram curso de
idioma intensivo no exterior, antes da mobilidade acadêmica.
3ª Convocação
CP n.º 108 a 116
Data: Mar/2012
-Alteraram o período de integralização do curso de 40%-80% para 20%-90% no
requisito de elegibilidade do candidato.
-Excluíram o requisito de apresentação de comprovantes da nota do Programa
Universidade para Todos (Prouni) ou do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) com
nota no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) igual ou superior a 600 pontos
para as candidaturas individuais.
4ª Convocação
CP n.º117 a 124
Data: Ago/2012
-Redefiniram a responsabilidade das IES, ficando apenas como homologadoras das
inscrições e validação da documentação comprobatória dos prémios e participação de
programas científicos.
-Extinguiram a modalidade de candidatura individual, porém, a apresentação dos
comprovantes dos Prêmios Jovem Cientista, Iniciação Científica e Olimpíadas da
Matemática e/ou de Ciências foram incorporadas na única modalidade vigente da
referida convocação, por adesão das IES brasileiras.
- Incluíram o dispositivo “Etapas de análise das candidaturas” para facilitar a
compreensão por parte dos candidatos e IES Brasileiras.
5ª Convocação
CP n.º 126 a 134
Data: Nov/2012
-Obrigaram o teste de proficiência linguístico para Espanha, até então não
requisitado.
-Incluíram dois subitens que limitavam a participação dos estudantes das áreas de
ciências biológicas e saúde no ciclo clínico, ou seja, nas atividades práticas de cursos
como Medicina, Enfermagem, Farmácia etc. Além de limitar a participação dos
estudantes das áreas de comunicação social que eram alocados na área “Indústria
Criativa”.
-Criaram dispositivos de proteção de possíveis ações judiciais: Recursos Financeiros,
Recursos Administrativos e Impugnação da Chamada.
- Delimitaram vagas específicas para estudantes matriculados em curso de graduação
tecnológica ou engenharias das Instituições da Rede Federal de Educação
Profissional e Tecnológica (IF) ou de Universidades ou Faculdades de Tecnologia
(FATEC).
-Aparece pela primeira vez a destinação dos bolsistas para as Universidades e
Instituições Comunitárias Historicamente Negras dos EUA.
-Vetaram a chamada pública n.º127, destinada a Portugal.
6ª Convocação -Incluíram a informação que caberá à CAPES e ao CNPq definirem a pertinência das
100
CP n.º136 a 142
Data: Fev/2013
candidaturas às diversas áreas e temas, conforme o curso de origem dos candidatos.
- Incluíram os dispositivos “Atribuição das IES Brasileiras” e “Atribuição do
Programa CsF”, determinando a atuação de cada um dentro das etapas do referido
programa.
- Incluíram a solicitação de informações socioeconômicas e de origem racial do
candidato no Formulário de Inscrições.
7ª Convocação
CP n.º143 a 155
Data: Mai/2013
-Incluíram “Ter obtido nota no ENEM igual ou superior a 600 pontos, em exames
realizados a partir de 2009.”.
-Distribuíram os selecionados por nível de conhecimento linguístico, proporcionando
curso de língua de 2 a 6 meses e calendário adaptado.
-Implementaram a prova de proficiência em inglês gratuitamente para os países
EUA, Canadá, Hungria e Japão.
-É lançada chamada pública para Canadá ACCC – Associação das Faculdades
Comunitárias Canadenses.
8ª Convocação
CP n.º156 a 174
Data: Out/2013
-Incluíram: “Ter se inscrito no processo seletivo interno da sua IES. É dever do
candidato buscar informação junto à sua universidade a respeito da existência deste
processo seletivo interno.”
-Países com integralização diferenciada: Noruega de 40% a 90%, Suécia de 60% a
90%.
-Mantiveram a distribuição dos selecionados por nível de conhecimento linguístico.
-Implementaram a prova de proficiência em inglês gratuitamente para os países
(EUA, Noruega, China, Hungria e Japão).
9ª Convocação CP
n.°179 a 204
Data: Ago/2014
- É lançada primeira chamada pública para Polônia CRASP- Conferência de Reitores
de Escolas Acadêmicas da Polônia.
- É informada a quantidade de vagas gerida por cada órgão de fomento, sendo 5.500
vagas geridas pelo CNPq para as chamadas dos países: Polônia, Austrália, Bélgica,
Canadá (CALDO e CBIE), Coreia do Sul, Espanha, Finlândia, Holanda, Nova
Zelândia e Reino Unido. E 8.550 vagas geridas pela Capes para as chamadas dos
países: Alemanha, Áustria, Canadá (CIC), China, EUA (IIE e Nova), França,
Hungria, Irlanda, Itália, Japão, Noruega e Suécia.
- Alegando incompatibilidade curricular, incluíram limitação para alocação de
disciplinas de ciclo clínico para os candidatos matriculados em cursos das áreas da
Saúde, Ciências Biológicas ou Indústria Criativa, por exemplo os cursos de:
medicina, enfermagem, nutrição, farmácia, fisioterapia, terapia ocupacional,
odontologia, veterinária e design, nas chamadas dos países: Polônia, Bélgica e
Canadá – CBIE.
- E por exigência da agência internacional de cooperação, alegando também
incompatibilidade curricular, excluíram cursos das áreas da Saúde, Ciências
Biológicas ou Indústria Criativa, por exemplo: medicina, medicina veterinária,
enfermagem, odontologia, terapia ocupacional, farmácia, fonoaudiologia, cinema,
design, nutrição entre outras, nas chamadas dos países: EUA, Alemanha, França,
Austrália, Coreia do Sul, Irlanda, China, Hungria, Japão, Áustria, Canadá (CIC e
CALDO).
- Acrescentaram que todas as comunicações no âmbito das chamadas serão
realizadas por intermédio do endereço de e-mail ou endereço de correspondência
cadastrados no Currículo Lattes do candidato.
- Na etapa de homologação das candidaturas, acrescentaram a avaliação por parte da
IES Brasileira, da elegibilidade de área e temas do candidato dependendo das
restrições de cada chamada.
- Efetuaram alteração no critério de desempate, colocando como ordem: 1° Maior
nota do ENEM, 2° Prêmio acadêmico ou mérito, 3º Maior nota de proficiência, 4°
Maio período de integralização e 5° Participação de programa de iniciação científica.
Sendo que na 8° convocação a ordem era: 1º Maior nota de proficiência, 2º Maio
período de integralização, 3º Participação de programa de iniciação científica e 4°
Prêmio acadêmico ou mérito.
Fonte: Dados organizados pela autora, com base nas chamadas públicas divulgadas pelo CsF.
101
A primeira grande alteração ocorrida nas chamadas públicas foi justamente no âmbito
da execução, sendo caracterizada por dois momentos: antes da instituição oficial do Programa
CsF e após sua instituição oficial.
Antes da instituição oficial, ou seja, de agosto a dezembro de 2011, o programa foi
executado por dois órgãos separadamente, cada um com sua forma de gestão já explicitada
anteriormente. Após sua instituição oficial, ou seja, a partir de 13/12/2011, a execução passou
a ser conjunta por meio de representações nos comitês criados.
É importante ressaltar que a forma assumida antes da instituição oficial do referido
programa pelo CNPq foi extinta, de modo que as quotas não usadas até a criação oficial do
programa foram devolvidas aos Comitês. Por sua vez, a Chamada Pública-CAPES n.º
01/2011 foi usada como base nas convocações seguintes para criação das chamadas públicas.
Ao analisarmos a 2ª convocação, percebemos que a administração federal do CsF,
após oficialmente criado, assumiu completamente a gestão do programa, deixando as IES
brasileiras apenas como homologadoras de elegibilidade dos candidatos. Nesse escopo,
ampliou o público alvo através da alteração de matriculados em curso de bacharelado para
curso de nível superior e também pela aceitação de outras modalidades de proficiência
linguísticas, além de esclarecer dúvidas acerca das áreas contempladas e de oportunizar cursos
intensivos de idioma no exterior.
Da 1ª convocação para 2ª, destacamos a redução da participação das IES no processo
de escolha do bolsista. No primeiro momento, a IES tinha a responsabilidade pela organização
e acompanhamento do processo de apresentação das candidaturas e pela respectiva
homologação junto a CAPES, porém, alterou-se a responsabilidade da seleção para o
Programa CsF. Ao que parece o programa preserva a gestão estatal, provavelmente, para não
sofrer interferências na sua matriz estrutural.
Identificamos na 3ª convocação que o CsF, buscando ampliar o público alvo, alterou
consideravelmente o requisito do período de integralização do curso, pois, ao transferir de
40%-80% para 20%-90%, passam a serem elegíveis estudantes que cursam o seu primeiro
semestre de estudos, mas que, dependendo do seu tempo total de curso, terão integralizado até
o início da viagem, setembro/2012, o mínimo exigido. Ao mesmo tempo, os estudantes que
estão próximos à finalização do curso também poderão concluir seus estudos no exterior,
102
retornando ao Brasil apenas para colação de grau. Outra estratégia adotada foi excluir o
requisito de apresentação de comprovantes da nota do Programa Universidade para Todos
(Prouni) ou do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) com nota no Exame Nacional do Ensino
Médio (Enem) igual ou superior a 600 pontos para as candidaturas individuais.
Sobre a proficiência, foi alterado principalmente o momento em que será ofertado o
curso de idiomas, ou seja, na 2ª convocação se previa para antes do início das atividades
acadêmicas e na 3ª convocação para concomitante às atividades acadêmicas.
Além disso, persistiam os desencontros acerca dos cursos de nível superior que
pertencem às áreas e temas do programa. Tal fato levou o Ministério da Educação a publicar
em 09/01/2013 a Portaria Interministerial n.1, que estabelece as áreas e temas prioritários de
atuação do programa.
Até então, ou mais exatamente, nas 1ª, 2ª e 3ª convocações, a forma de participação
no Programa CsF previa duas modalidades, uma pela IES brasileira aderindo ao programa e
outra mediante candidatura individual destinada a estudantes das IES brasileiras que não
aderiram ao programa. Porém, nessa 4ª convocação, a modalidade de candidatura individual
foi extinta. Salientamos que nessa convocação incluiu-se o dispositivo sobre as “Etapas de
análise das candidaturas” com o objetivo de facilitar o entendimento a respeito do processo de
seleção por parte dos candidatos e das IES brasileiras.
Podemos observar que a obrigatoriedade da candidatura individual de apresentar
comprovantes dos Prêmios Jovem Cientista, Iniciação Científica e Olimpíadas da Matemática
e/ou de Ciências foi incorporada na única modalidade vigente da referida convocação, por
adesão das IES brasileiras.
Depois da primeira experiência do programa em enviar estudantes para Espanha sem
exigir o teste de proficiência linguístico, foi necessário estabelecer o referido teste visando
melhor desempenho acadêmico e convivência social dos bolsistas, obrigatoriedade incluída na
5ª convocação.
Ainda com problemas de interpretação dos cursos elegíveis das áreas e temas, foi
anexada a todas chamadas desta 5ª convocação uma listagem contendo todos os cursos
elegíveis e acrescentados dois subitens que limitavam a participação dos estudantes das áreas
de ciências biológicas e saúde no ciclo clínico, ou seja, nas atividades práticas de cursos como
103
Medicina, Enfermagem, Farmácia etc. Além disso, foi limitada a participação dos estudantes
das áreas de comunicação social que eram alocados na área “Indústria Criativa”.
Fica notório que, mesmo depois da portaria do Ministério da Educação que instituiu
as áreas e cursos de atuação do programa, as dúvidas acerca de área elegível persistiam.
Registramos também a criação dos dispositivos Recursos Financeiros, Recursos
Administrativos e Impugnação da Chamada, visando proteger o programa de possíveis ações
judiciais.
É importante evidenciar que somente a chamada pública 128 – França ofereceu curso
intensivo de idioma aos candidatos escolhidos pelo programa.
Na 5ª convocação, houve três fatos inéditos. Primeiro, a Chamada Pública n.º 131
apresentou-se com o objetivo de destinar 200 estudantes regularmente matriculados em curso
de graduação tecnológica ou engenharias das Instituições da Rede Federal de Educação
Profissional e Tecnológica (IF) ou de Universidades ou Faculdades de Tecnologia (FATEC)
relacionadas às áreas prioritárias do programa para Instituições Comunitárias de Ensino
Superior dos EUA.
Segundo, a Chamada Pública n.º 132 anunciava a destinação dos bolsistas para as
Universidades e Instituições Comunitárias Historicamente Negras dos EUA, inclusive, com
uma pequena descrição sobre o histórico e desempenho das mesmas, bem como uma lista das
31 instituições contempladas pela referida chamada.
Finalmente, o terceiro fato inédito refere-se ao anúncio na mídia do veto do
Ministério de Educação brasileiro da Chamada Pública n.º 127 com destino às Universidades
de Portugal, em 24 de abril de 2013, logo após o término do prazo para comunicação da
aprovação ou indeferimento das candidaturas estipulado do cronograma (17 de abril de 2013).
Tal veto foi justificado pelo fato da elevada procura por Portugal em detrimento dos países de
outra língua, sendo que o programa possui como um dos objetivos principais incentivar a
proficiência em uma segunda língua.
Na 6ª convocação, tem-se a definição final de que quem estabelece a elegibilidade da
candidatura com relação às diversas áreas e temas são a CAPES e o CNPq, bem como a
definição sobre as atribuições das IES e do Programa CsF acerca da sua operacionalização.
104
Ambas, somente após um ano e meio de execução do Programa CsF, demonstrando, mais
uma vez, a forma aligeirada e imprecisa de sua construção.
Resumidamente, da 1ª à 6ª convocação, é possível observar que o programa foi sendo
alterado no sentido de ir se adaptando às dificuldades encontradas, seja no período de
integralização do curso que o candidato deve estar situado para poder participar, seja no curso
de idiomas ou mesmo na definição dos cursos elegíveis. Ao que se sinaliza, são alterações
processadas com o objetivo de obter sucesso na meta estabelecida: “O projeto prevê a
utilização de até 101 mil bolsas em quatro anos para promover intercâmbio, de forma que
estudantes de graduação e pós-graduação façam estágio no exterior com a finalidade de
manter contato com sistemas educacionais competitivos em relação à tecnologia e inovação.”
(CsF, 2011).
Já na 7ª convocação, destaca-se a relação com outra política de acesso por meio do
requisito de nota do ENEM – Exame Nacional Ensino Médio, utilizado como prova para
ingresso em diversas instituições de ensino superior no Brasil.
Na definição da 8ª convocação, chama atenção a ênfase de que os candidatos devam
se inscrever no processo seletivo interno das IES de origem. Provavelmente, isso se deva à
manifestação das IES nas reuniões de Coordenadores Institucionais do Programa CsF,
requerendo autonomia institucional. Em outras palavras, significa o pleito de atendimento
prioritário às regras próprias das IES, que são deliberadas por seus órgãos colegiados.
Um exame comparativo das informações constantes na 6ª, 7ª e 8ª convocações
permite inferir que o Programa CsF continua reagindo às demandas da sociedade,
reconhecendo a necessidade de adaptações por meio de ações que vão desde centralizar a
gestão nos órgãos CAPES/CNPq até a parceria com o curso de inglês online My English On
Line (MEO) para ensino do idioma inglês. No mesmo sentido, posteriormente, a adaptação
veio pela criação de um “co-programa”, denominado Inglês sem Fronteiras. Observa-se,
ainda, adequações como a publicação oficial sobre quem define áreas prioritárias, a
implementação de dispositivos de segurança jurídica, o veto a Portugal, a ênfase na última
convocatória sobre a obrigatoriedade do estudante se inscrever no processo seletivo interno
das IES, entre outras.
Um dos exemplos que podemos citar como reação da sociedade refere-se ao Oficio
CGRIFES n.01/2013, de 21/06/2013, documento emitido pelo Conselho de Gestores de
105
Relações Internacionais das Instituições Federais de Ensino Superior/CGRIFES, da
ANDIFES – Associação Nacional Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior.
Com base no citado documento, o Quadro 7 sintetiza os pontos considerados
negativos do Programa CsF e as sugestões de melhoria apresentadas pela ANDIFES:
Quadro 7 - Análise do Programa CsF pelos membros da CGRIFES/ANDIFES. 1. Exclusão das Humanidades e das Artes,
injustificável para um programa com tal envergadura
e com este nome;
1. Abertura de editais de mobilidade de alunos de
graduação para as áreas excluídas do Programa
Ciência sem Fronteiras, ou lançamento de novo
programa com outro nome, mas capaz de atender os
estudantes de graduação das áreas excluídas pelo
CsF; 2. Exclusão de continentes inteiros como destino de
estudantes de graduação;
2. Abertura de editais de mobilidade de alunos e
professores para a América Latina e a África, ainda
que prevendo mobilidades mais curtas e mais
vinculadas à pesquisa ou à iniciação científica
internacional; 3. Mobilidade basicamente unidirecional na
graduação, desconsiderando possibilidades de
internacionalização em casa;
3. Atribuição de um caráter bidirecional à
mobilidade prevista pelo CsF e, consequentemente,
apoio à oferta de disciplinas em inglês e espanhol
em cursos de graduação e pós-graduação das IFES,
incremento da oferta de disciplinas de português
como língua estrangeira pelas IFES e criação das
condições mínimas necessárias para a recepção de
estrangeiros, sobretudo no quesito moradia, tudo
isso mediante o lançamento de editais de estímulo; 4. Inúmeras dificuldades operacionais na gestão do
programa devido à falta de pessoal qualificado e à
divisão do trabalho entre duas agências com
histórias e práticas distintas;
4. Aproveitamento das competências instaladas nas
RIs das IFES na gestão do programa e
estabelecimento de fóruns constantes de
monitoramento e avaliação do programa envolvendo
seus representantes institucionais e os responsáveis
pelas RIs nas IFES, sobretudo os colegiados de seus
representantes institucionais, notadamente
CGRIFES e FAUBAI; 5. Dificuldades na obtenção de informações a
respeito dos processos em curso;
5. Maior transparência, agilidade e precisão na
divulgação das informações a respeito dos processos
em curso; 6. Falta de diálogo sistemático das agências com as
RIs das IFES, o que desperdiça competências
instaladas e provoca erros;
6. Abertura de fóruns de diálogo constante com as
RIs das IFES, sobretudo com os colegiados de seus
representantes institucionais, notadamente
CGRIFES e FAUBAI;
7. Privilégio das relações de balcão em detrimento
da mediação das RIs, com consequente prejuízo do
estabelecimento de vínculos institucionais entre as
IFES e as instituições estrangeiras, em favor de
relações individualizadas centradas nos bolsistas, o
que contribui para enfraquecer o processo de
internacionalização nas IFES, colocando em risco os
objetivos propalados pelo programa;
7. Envolvimento das RIs das IFES como parceiras
institucionais da gestão do programa, e não como
meras executoras do mesmo, além do
estabelecimento de fóruns constantes de
monitoramento e avaliação do programa envolvendo
seus representantes institucionais e os responsáveis
pelas RIs nas IFES, sobretudo os colegiados de seus
representantes institucionais, notadamente
CGRIFES e FAUBAI; 8. Aparente privilégio de critérios políticos em
detrimento de critérios técnico-acadêmicos na
seleção das universidades de destino;
8. Envolvimento das RIs das IFES na definição de
ao menos uma parte das universidades de destino
dos intercambistas, com privilégio dos acordos de
cooperação já celebrados por cada IFES;
9. Falta de controle por parte das universidades de 9. Envolvimento das RIs das IFES na definição de
106
origem sobre a escolha das universidades de destino;
ao menos uma parte das universidades de destino
dos intercambistas, com privilégio dos acordos de
cooperação já celebrados por cada IFES; 10. Mudança de atitude dos parceiros tradicionais
das IFES no exterior, que passaram a cobrar por
vagas que anteriormente eram gratuitas, por vezes
desrespeitando os acordos que previam
reciprocidade;
10. Envolvimento das RIs das IFES na definição de
ao menos uma parte das universidades de destino
dos intercambistas, com privilégio dos acordos de
cooperação já celebrados por cada IFES;
11. Tratamento padronizado das universidades
brasileiras que estão em diferentes estágios no
processo de internacionalização, como, por exemplo,
a desconsideração dos acordos de cooperação
existentes entre as IFES e instituições estrangeiras;
11. Estabelecimento de um percentual do total de
bolsas do programa (uma cota) a ser destinado às
IFES, que as administrariam destinando-as às
universidades parceiras, observadas as
condicionantes impostas pelas agências de fomento
gestoras do CsF, com o intuito de respeitar a
autonomia das IFES e as características regionais de
cada uma e de otimizar as parcerias já estabelecidas; 12. Soluções imediatistas, paliativas e onerosas para
a questão da proficiência linguística.
12. Abertura de editais que estimulem o incremento
da proficiência linguística dos estudantes das IFES
valendo-se dos quadros locais das universidades,
que devem ser ampliados, investimento na criação
de centros de idiomas nas universidades e no ensino
de idiomas nos níveis fundamental e médio de
ensino. Fonte: Dados organizados pela autora com base no OF. CGRIFES n. 01/2013 - Conselho de Gestores de
Relações Internacionais das Instituições Federais de Ensino Superior – CGRIFES/ANDIFES.
Dessa lista extensa de críticas e sugestões, chama atenção a falta de diálogo entre os
idealizadores do CsF com os executores, ou seja, as IES. É notório que o programa preserva a
gestão estatal, com reduzida participação das IES brasileiras, provavelmente para não sofrer
interferências na sua matriz estrutural. Porém, a centralização dá sinais de contrariar um dos
objetivos divulgados em seu documento de criação: “[...] IV. Estimular iniciativas de
internacionalização das universidades brasileiras [...].” (Decreto n. 7.642, de 13/12/2011).
Essa pode ser vista como uma das contradições identificadas no Programa CsF. Além
do exposto, é possível afirmar como marcante o discurso ufanista a ele associado em
discursos oficiais, suscitando variados questionamentos. Como exemplo, podemos citar o
pronunciamento da Presidente Dilma Rousseff na cerimônia de regulamentação do Programa
CsF, em 13/12/2011:
Nós somos, de fato, um país muito rico. Nós temos petróleo, nós temos minério,
nós... aí, eu quero agradecer, mais uma vez, à Vale, à Petrobras pela sua
participação. Nós temos também uma agricultura bastante competitiva e produtiva,
nós temos uma indústria. Mas, o que nós temos certeza que vamos precisar, nos
próximos anos, é de homens e mulheres muito bem preparados, muito bem
capacitados e que tenham condições de permitir que o nosso país adentre à
economia do conhecimento, sendo capaz de produzir ciência, de inovar e de
absorver tecnologia e transformar (BRASIL, 2011).
107
Com base no modelo de produção e veiculação do conhecimento científico de países
desenvolvidos que nos serve de referência (cujos países também são submetidos a
desigualdades sociais), questionamos se o Brasil poderá alcançar a almejada posição de
partícipe do primeiro mundo, via desenvolvimento tecnológico.
Dando continuidade à análise das convocações, em agosto de 2014 foi lançada a 9ª
convocação, após 10 meses da 8ª convocação, ou seja, com o dobro de tempo médio de
lançamento entre uma convocação e outra. Ressaltamos que essa convocação está em plena
fase de execução, significando ainda não ter bolsistas contemplados.
Acerca da 9ª convocação, temos que destacar a limitação ou exclusão total de alguns
cursos das áreas da Saúde, Ciências Biológicas e Indústria Criativa, destacadamente
Medicina, por alegação de incompatibilidade curricular. Isso parece ser resultado de uma
reação negativa por parte dos cursos de origem do estudante. Ou seja: os estudantes não
conseguem compatibilizar ao seu currículo na IES de origem o novo conteúdo recebido no
exterior, o que os obriga a retornar os estudos de onde pararam ao sair para o intercâmbio,
com grandes possibilidades de atraso na integralização curricular.
Como exemplo, podemos citar a fala da estudante Maria Clara Pestana, bolsista do
CsF no Canadá de 2012 a 2013, ao Jornal Último Segundo, em 06/06/2014, na reportagem
intitulada “Ciência sem Fronteiras: aluno é pouco orientado e não tem disciplinas validadas”:
Todas as cinco matérias que eu fiz eram da minha área de formação. Mas até agora
apenas duas foram aceitas como créditos na minha universidade. Outra eu consegui,
ao menos, transformá-la em atividade complementar, porque ela não foi validada. É
uma pena, queria ter aproveitado as cinco (PESTANA, 2014 apud BALMANT et
al., 2014).
Nessa reportagem, são descritas como responsáveis pela falta ou limitação de
reconhecimento: falta de chancela de coordenadores de cursos antes da viagem, livre escolha
de matérias por parte do bolsista e resistência de universidades do País na validação de
disciplinas cursadas no exterior.
Outro destaque nessa convocação é a citação, pela primeira vez, das vagas por
países, porém, somente das geridas pela CAPES, conforme Tabela 2, que demonstra
claramente o país de destino com maior número de vagas: EUA.
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Tabela 2 - Vagas da 9ª Convocação – CAPES.
País Vagas
EUA (IIE e
NOVA) 5600
Alemanha 500
França 500
Itália 500
Suécia 100
Noruega 100
China 100
Hungria 300
Japão 100
Áustria 50
Canadá 200
Irlanda 500
Total 8550 Fonte: Dados organizados pela autora, com base nas chamadas públicas divulgadas pela CAPES.
Há de se ressaltar, igualmente, que todo o contato do Programa CsF é direto com o
estudante, isto é, a IES brasileira parece ser preterida na relação com o programa. Por sua
vez, sobre as IES brasileiras, retorna a responsabilidade quanto à análise da elegibilidade dos
estudantes nas áreas e temas do referido programa.
Ao identificarmos o percurso transcorrido pelo Programa CsF, podemos observar
que:
1) O programa possui gestão estatal centralizadora, com reduzida participação das IES
brasileira, para não sofrer interferências na sua matriz estrutural;
2) O programa vai se adaptando às dificuldades encontradas na sua implementação,
imputando ajustes, seja no período de integralização, no curso de idiomas ou na
definição dos cursos elegíveis, com a finalidade de obter sucesso na meta estabelecida;
e, principalmente,
3) O programa prima por garantir o foco principal em consonância ao projeto
econômico-social vigente, no que tange a:
Meritocracia – É evidenciado com sistema de classificação, tendo pontuação acrescida
para candidatos que tenham sido contemplados com prêmios acadêmicos e de mérito,
sendo eles: Prêmios Jovem Cientista, Iniciação Científica e Olimpíadas de Matemática
109
e/ou de Ciências e ainda demais premiações de mérito acadêmico. E também
acrescidos para candidatos que tenham participação em programas de iniciação
científica, tecnológica ou docência e para candidatos que já possuam domínio
linguístico em outro idioma. Além, é claro, do corte de elegibilidade pela nota no
ENEM igual ou superior a 600 pontos, incluído a partir da 7ª convocação.
Vertente científica e tecnicista – As áreas e temas, apesar das constantes alterações,
mantiveram seu foco em cursos científico-tecnicistas com intuito de suprir a
necessidade de mão de obra técnica qualificada para as indústrias e empresas de
tecnologia que se despontam no país como Vale, Petrobras, Eletrobras etc;12
Parceria com países 1º Mundo – As chamadas públicas visavam maciçamente países
da América do Norte e Europa, com destaque para Canadá e Estados Unidos da
América, que juntos somam 21% do total de chamadas ofertadas. Ressaltamos que
houve um afrouxamento com relação às IES de Acolhimento, no que diz ao termo
“para as melhores universidades do mundo”, que passou a ser “para as melhores
universidades do mundo disponíveis”, enfatizando a inclusão de chamadas específicas
para IES Comunitárias e Historicamente Negras dos Estados Unidos da América, que
não estão no ranking das melhores universidades do mundo.
Parceria público - privada – Tanto IES públicas quanto IES privadas nacionais podem
enviar bolsistas para IES públicas ou privadas no exterior, e vice-versa, garantindo-se
o repasse público para pagamento das taxas acadêmicas privadas. No outro sentido,
por acolher doações privadas a fim de fomentar bolsas para futuros trabalhadores do
mercado produtivo.
Os itens aqui referidos são basilares para o projeto econômico-social pautado no
novo-desenvolvimentismo, que, de acordo com Fontes (2010, p.13):
[...] promete recuperar os desafios perdidos da América Latina e propulsar, enfim, a
recuperação do “atraso” do continente. Essa modernização asseguraria a expansão
do consumo, num mercado interno ampliado e plenamente integrado ao mercado
mundial (FONTES, 2010, p.13).
O principal objetivo desse projeto político- social – econômico é delineado por
Castelo (2010, p.194) como “de crescimento econômico combinado com uma melhora
12
Essas são empresas que já possuem acordo firmado com o Programa CsF, tratam-se de “ empresas
financiadoras atuam em conjunto com o CNPq e a CAPES, com a finalidade de apoiar e complementar o
Programa Ciência sem Fronteiras [...]” (BRASIL/CsF,2014).
110
substancial nos padrões distributivos do país.” A ligação entre tal modelo social e o CsF
parece estar em que o crescimento econômico do país e a equidade social se dão pela
formação de profissionais altamente qualificados, técnico-cientistas, que seriam capazes de
promover a competitividade empresarial brasileira aliada às grandes potências internacionais.
Ao mesmo tempo, a formação no exterior contribuiria para que os estudantes se tornassem
profissionais flexíveis, adaptáveis, dinâmicos, que possuiriam competência para aprender a
aprender e submeter-se ao novo.
Adicionalmente, a seguir, abordamos a avaliação do CsF por parte da CAPES e CNPq.
3.2.2 Avaliação do Programa CsF por parte das agências executoras
Em 07 de outubro de 2014, após o período de inscrição dos candidatos da 9ª CP, os
coordenadores institucionais CsF das IFES foram convocados para uma reunião em Brasília
com a finalidade de apresentar avaliação geral do programa por parte das agências executoras
Capes e CNPq e demais assuntos burocráticos da 9ª convocação vigente.
Estiveram presentes como representantes das agências executoras para proferir as
apresentações: Sr. Glaucius Oliva, Presidente do CNPq; Sr. Paulo Beirão, Diretor de
Cooperação Institucional do CNPq; Sr. Jorge de Almeida Guimarães, Presidente da CAPES,
Sra. Denise de Menezes Neddermeyer, Diretora de Relações Internacionais da CAPES; e, Sr.
Adi Balbinot Junior, Coordenador-Geral de Acompanhamento e Monitoramento de
Resultados da CAPES.
A seguir, evocaremos os destaques de cada apresentação proferida. Iniciamos com o
Sr. Glaucius Oliva, Presidente do CNPq, com a apresentação intitulada “The Brazilian
Scientific Mobility Program”.
Na Figura 1, é exposta a distribuição das bolsas por país destino e área prioritária,
bem como ensinamentos e avaliação do Programa CsF pelo CNPq/MCTI.
111
Figura 1 - Síntese de Apresentação CNPq/MCTi
Fonte: Dados organizados pela autora, com base na apresentação The Brazilian Scientific Mobility Program,
proferida pelo Sr. Glaucius Oliva acerca da avaliação do Programa CsF.
Nessa apresentação, ficam demonstradas as informações expostas ao longo deste
estudo: que os EUA são o país que mais recebe os bolsistas CsF, com cerca de 30% do total
de enviados, e a área de estudo predominante é engenharia e demais áreas tecnológicas.
Também informam os “ensinamentos do programa”, demonstrando que as ações ali citadas
foram criadas apenas após a implementação do programa, parecendo tratar-se de ações
corretivas motivadas pela falta de planejamento devido a sua precipitada execução.
112
Destacamos, na Figura 4, primordialmente, a avaliação do Programa CsF pelo
CNPq/MCTi, por meio da resposta de 8900 relatórios finais dos bolsistas CsF/CNPq acerca
da participação no referido programa, que demonstra avaliação positiva quanto à excelência
das universidades no exterior e ao desempenho dos bolsistas. Porém, atesta que cerca de 3.200
bolsistas que responderam ao presente relatório tiveram menos que a metade das disciplinas
reconhecidas no Brasil, significando, automaticamente, atraso na conclusão do curso.
Acentuamos que atraso na conclusão de curso representa mais recursos públicos ou pessoais
para o egresso CsF conquistar o diploma.
A Figura 2 expõe o slide 7 da apresentação Sr. Oliva, informando como será a
participação dos Coordenadores Institucionais do Programa CsF, na versão 2.0, com previsão
de início em 2015.
Figura 2 - Apresentação The Brazilian Scientific Mobility Program - Slide 7
Fonte: Apresentação The Brazilian Scientific Mobility Program, proferida pelo Sr. Glaucius Oliva acerca da
avaliação do Programa CsF.
Acreditamos que essas informações vêm ao encontro do reivindicado pelas IES
brasileiras aos órgãos executores acerca da relação preterida institucionalmente, tendo em
vista o contato de o referido programa ser direto com o bolsista.
A seguir, na Figura 3, evidenciamos o slide 10: Avaliação Ciência sem Fronteira 1,
exibida pelo Sr. Paulo Beirão, Diretor de Cooperação Institucional do CNPq em sua
113
apresentação intitulada “Ciência sem Fronteiras: Programa Brasileiro de Mobilidade
Científica”.
Figura 3 - Apresentação Ciência sem Fronteiras: Programa Brasileiro de Mobilidade Científica - Slide 10
Fonte: Apresentação Ciência sem Fronteiras: Programa Brasileiro de Mobilidade Científica, proferida pelo Sr.
Paulo Beirão acerca da avaliação do Programa CsF.
Temos a destacar no presente slide que o orçamento global do Programa CsF atingiu
5,2 bilhões de reais, cerca de 68% a mais que o inicialmente divulgado de 3,1 bilhões de reais
(conforme informado na página 12), e a predominância de participação das IES brasileiras
privadas (72%), constatando a característica da parceria público-privada, uma faceta do
projeto do novo-desenvolvimento do país.
Vale ressaltar, igualmente, a diferença entre as informações dos egressos da Figura 1
e 3, pois que a Figura 1 é baseada nas respostas dos bolsitas CsF/CNPq que responderam ao
relatório final e a Figura 3 é baseada em uma análise geral, intercâmbios geridos tanto pelo
CNPq quanto pela CAPES, o que demonstra dissonância quanto à percentagem de créditos
integralmente aceitos pela IES brasileiras. Podemos ver que a Figura 1 informa que seria
64,29% quem conseguiu reconhecer mais da metade (+50%) das disciplinas cursadas, ao
passo que a Figura 3 cita que 70% dos bolsistas conseguiram reconhecer todas (100%) as
disciplinas.
114
Dando continuidade à síntese das apresentações, evidenciamos as informações
fornecidas pela CAPES, por meio do Sr. Adi Balbinot Junior, Coordenador-Geral de
Acompanhamento e Monitoramento de Resultados da CAPES.
A Figura 4 expressa sobre o relatório final de atividades respondido pelos bolsistas
CsF/CAPES.
Figura 4 - Síntese de Apresentação Capes
Fonte: Apresentação Reunião de Coordenadores Institucionais do Programa Ciência sem Fronteiras, proferida
pelo Sr. Adi Balbinot Junior, Coordenador-Geral de Acompanhamento e Monitoramento de Resultados da
CAPES.
115
Na Figura 4, há a divulgação da avaliação dos bolsistas acerca das IES destino sobre
duas vertentes: 1. qualidade de ensino e competência; e 2. infraestrutura. Além disso, trata da
comparação da IES brasileira de origem com a IES de destino no exterior em três quesitos: 1.
infraestrutura; 2. método de avaliação; e 3. ensino.
Podemos notar pela avaliação dos bolsistas que, quanto ao método de avaliação e
ensino, as IES brasileiras estão equiparadas às IES estrangeiras, ficando aquém apenas no
quesito infraestrutura, o que pode ser justificado pelo contexto histórico sócio-político
vivenciado pelo Brasil, como ditadura militar e cortes do neoliberalismo, em comparação com
os países da América do Norte e Europa, que vivenciaram o “bem – estar social”, permitindo-
lhes, portanto, construir ao longo da história uma base de desenvolvimento.
Adicionalmente, consta na Figura 4 a avaliação geral da experiência no exterior pelo
bolsista CsF, mostrando que mais de 90% dos consultados consideram como bom ou ótimo, o
que indica o êxito no referido programa, porém não são expostos os referenciais para tal
decisão, isto é, se foram vivências pessoais ou acadêmicas.
De modo geral, as agências executoras consideram o programa CsF um sucesso e de
grande relevância, conforme destacou Sr. Jorge de Almeida Guimarães, Presidente da
CAPES na referida reunião: “O programa despertou nos jovens e, sobretudo na graduação,
enormes oportunidades e levou milhares deles a conquistar novas possibilidades e
perspectivas. Isso nos anima cada vez mais.” (CAPES, 2014). Entretanto, reconhecem alguns
“contratempos” no caminho de sua execução, e que estarão aprimorando procedimentos
burocráticos para a versão 2.0, prevista para 2015.
A seguir, exemplificamos como ocorreu na prática a criação e a implementação do
Programa CsF em uma IES brasileira: a Universidade Federal de Mato Grosso. Tal ilustração
se apresenta como uma forma de melhor compreender a materialização desse programa.
3.3. UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO: A POLÍTICA DE
INTERNACIONALIZAÇÃO COMO FOCO
A UFMT foi criada em 1970, porém o primeiro ato institucional acerca do interesse
de seu processo de internacionalização se deu apenas em 01/08/1989, pela Portaria do
116
Gabinete da Reitoria nº328/89 que designou o Prof. Paulo Speller como Assessor do Reitor,
ficando ao seu encargo assuntos inerentes às Relações Internacionais. O Reitor a época era o
Prof. Augusto Frederico Muller Junior, que dirigiu a instituição de 1988 a 1992.
É importante esclarecer que, de acordo com a estrutura organizacional da instituição
à época, trata-se apenas de um cargo de Assessor indicado pelo Reitor, o que implica a sua
ligação direta à Reitoria, sem necessariamente que as Relações Internacionais constituíssem
uma unidade institucional.
Porém, para fins de diferenciação com os demais cargos de assessores da Reitoria,
utilizou-se a denominação “Assessoria de Relações Internacionais”, conforme demonstra o
Relatório de Gestão de 1988-1992:
Durante os últimos anos, as possibilidades de intercâmbio entre a UFMT e
universidades e organismos internacionais ampliaram-se consideravelmente,
levando a reitoria a criar uma Assessoria de Relações Internacionais para coordenar
e acompanhar todos esses contatos e ações conjuntas.” (UFMT, RELATÒRIO DE
GESTÃO DO PERÍODO DE 1989 a 1992, p.37).
O cargo de assessor possuía como missão assessorar o reitor na elaboração e na
execução de políticas que propiciassem uma maior inserção da instituição no contexto
mundial.
O processo de internacionalização da UFMT começou incipiente, com poucos
contatos internacionais, sendo, inclusive, viabilizados “seja da decisão política dos dirigentes
[...] seja do corpo científico das várias áreas da UFMT [...]” (UFMT, Relatório de Gestão
1992-1996, p.141), manifestando ações tanto institucionais como individuais, ou seja, de
pesquisador para pesquisador.
A trajetória revela a influência da conjuntura sócio-política vivenciada no Brasil. Na
década de 1990, com forte corte de recursos financeiros, as universidades federais motivadas
pela ideologia do neoliberalismo, vivenciaram um processo lento de ações para a
interncionalização. Nesse contexto, a UFMT tinha como foco a América Latina e Caribe e
Europa.
Na década seguinte, na gestão do Reitor Prof. Paulo Speller, nos períodos de 2000-
2004 e 2004-2008, foi indicada como Assessora de Relações Internacionais a Profa. Maria
117
Inês Portugal. Temos a destacar a informação: “A partir de 2000, a UFMT ampliou
consideravelmente suas atividades de intercâmbio e cooperação com o exterior [...]”. “Esses
protocolos”, informa a Assessora de Relações Internacionais, Maria Inês Guimarães Portugal,
“permitem, no mínimo, que nossos estudantes possam estagiar em qualquer parte do mundo
sem pagar as taxas cobradas por universidades estrangeiras.” (UFMT, RELATÓRIO DE
GESTÃO 2000-2008, p.108).
Ainda no âmbito da Gestão do Prof. Speller e da Profa. Maria Inês, foi publicado o
Balanço Social – Gestão 2000-2003. Acerca das relações internacionais, traz: “A UFMT, nos
últimos três anos, buscou expandir sua interlocução também para o exterior, com instituições
de pesquisas e universitárias de todos os continentes, mas especialmente com aquelas que
estão próximas, na América do Sul.” (UFMT, BALANÇO SOCIAL 2000-2003, p.49). Mas
há de se considerar também, seguindo informações dos relatórios de gestão da época, o
aumento de parcerias com instituições da América do Norte, que, em 1992-1996 computavam
9%, depois de 1996-2000 aumentou para 21% e, no período de 2000-2008, atingiu 38%,
demonstrando abertura cada vez mais para os países norte-americanos.
Acerca de mobilidades internacionais, “A Assessoria de Relações Internacionais
buscou favorecer o intercâmbio dos estudantes da UFMT com universidades estrangeiras,
atuando nos programas de mobilidade acadêmica, tais como o Bolsas Luso-Brasileiras,
Erasmus Mundus e outros individuais. Quanto aos estudantes estrangeiros, recebe anualmente
[período de 2000-2008] uma média de dez alunos de diferentes países.” (UFMT,
RELATÒRIO DE GESTÃO 2000-2008, p.108), explicando assim que já havia mobilidades
internacionais, porém sem registro quantitativo exato.
Antes de adentrar no próximo período de gestão da UFMT (2008-2012), há
necessidade de relembrar a conjuntura sócio-política do final do século XX e início do século
XXI, em que o modelo neoliberal mostrava sinais de crise e a ideologia do novo-
desenvolvimentismo foi impulsionada pelo projeto político conduzido por Luiz Inácio Lula da
Silva (2003-2010). Em suma, o Estado, mesmo que numa marcha lenta, a princípio, passou a
investir mais recursos públicos em ações e programas sociais, contemplando a educação e
também a internacionalização da educação superior.
118
Do ponto de vista da UFMT, as iniciativas empreendidas acerca da
internacionalização no período de 1989 a 2008: “[...] resultaram em projetos e programas de
considerável sucesso, propiciando oportunidades de cooperação com instituições de ensino e
pesquisa de diversos países.” (UFMT/SECRI, 2014).
Nesta dissertação, daremos ênfase ao período de 2008 a 2012 e de 2012 aos dias
atuais, por ser o período da passagem da fase embrionária da internacionalização da UFMT
para uma ação institucionalizada nesse campo.
Em 2008, ao iniciar uma nova gestão na reitoria, a ARI promoveu a cooperação
internacional da UFMT via Planejamento Estratégico Participativo. Tal planejamento foi
traçado no “Relatório de Oficina de Planejamento Estratégico 2008-2018”, o qual definiu
metas para dez anos e, mais propositivamente, a missão de: “Prospectar oportunidades,
induzir, propor e executar políticas para a inserção internacional visando à promoção e o
desenvolvimento da UFMT.”
Conforme informa o Relatório de Gestão do período de 2008 a 2012:
[...] a ARI elaborou projetos para a captação de recursos, participou de editais
(Erasmus Mundus; Programa de Mobilidade Mercosul etc.), propôs e mediou a
filiação da UFMT a redes e consórcios universitários, elaborou normas, criou
programas de apoio à mobilidade e apoio iniciativas das unidades acadêmicas [...].
(UFMT, RELATÓRIO DE GESTÃO DO PERÍODO DE 2008 A 2012, p.36).
Para a SECRI/UFMT, há duas instâncias principais de atuação: o Setor de Convênio
e o Setor de Mobilidades. Conforme o Relatório de Gestão de 2012/2013:
[...] O setor de convênio destina-se a prospectar, articular, facilitar e
instrumentalizar as parcerias a serem formalizadas com instituições internacionais,
além de gerenciar e garantir a execução de parcerias vigentes. Propicia também o
apoio a iniciativas de pesquisadores da UFMT no âmbito internacional e a
participação da UFMT em redes de cooperação internacional, além de elaborar,
acompanhar e divulgar editais de estímulos a parcerias internacionais. [...] O setor
de mobilidade tem a finalidade de propor, executar ou acompanhar programas de
intercâmbios internacionais, fomentando e apoiando a mobilidade recíproca de
estudantes, docentes e técnicos administrativos. Este setor subdivide-se em
Mobilidades Outgoing e Mobilidades Incoming. Mobilidade outgoing, ou
mobilidade out, viabiliza o envio ao exterior, orienta e auxilia a todos os membros
da comunidade acadêmica da UFMT interessados em estudar ou pesquisar em
instituições de outros países (UFMT, RELATÓRIO DE GESTÃO DE 2012/2013,
grifos nossos).
119
No que segue, apresentamos a evolução da cooperação internacional da UFMT,
evidenciando os setores de Convênios e de Mobilidades no período de 2008 a 2012.
Inicialmente, o Gráfico 1 mostra os dados do Setor de Convênios.
Gráfico 1 - Setor de Convênios/UFMT – 2008 a 2012
Fonte: Relatório de Gestão/UFMT 2008/2012. Evolução anual de convênios internacionais na UFMT (2008-
2012)
É perceptível o aumento de convênios ativos (convênios vigentes), passando de 25,
em 2009, para 57, em 2012. Já os convênios em andamento (em fase de assinatura, ainda não
vigentes) evoluíram de 29, em 2009, para 81, em 2012.
Porém, ao compararmos apenas os números de convênios ativos fornecidos pelo
Gráfico 1 com o número do Relatório de Gestão/UFMT 2012 – 2013, que totaliza 32
convênios ativos, observamos uma redução considerável de convênios a partir de 2011,
coincidentemente, a partir do ano de lançamento do Programa CsF (agosto de 2011),
conforme segue:
Ativos Inativos EmFirmamento
25 14
4
56
9 15
61
6 7
57
17 24
2009 2010 2011 2012
Em Andamento
120
Gráfico 2 - Convênios Ativos/UFMT – 2009 a 2013
Fonte: Dados organizados pelas autoras, com base nos Relatório de Gestão/UFMT
No âmbito de parcerias internacionais, de 2000 a 2008, destaca-se a priorização dos
países da América do Norte (38%) e o equilíbrio dos países da América Latina e Caribe
(31%) e Europa (31%). Porém, de 2008 em diante, ampliam-se parcerias com a Europa
(46%), diminuem com a América Latina e Caribe (22%) e América do Norte (24%) e abrem-
se novas frentes de ação, como Ásia e África (UFMT, RELATÓRIO DE GESTÃO 2000-
2008; 2008-2012; 2012-2013).
Em relação ao Setor de Mobilidades, o Relatório de Gestão de 2008-2012 informa:
Gráfico 3 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2008 a 2012
Fonte: Relatório de Gestão/UFMT 2008/2012. Mobilidade estudantil na UFMT
É notório o desenvolvimento do setor de mobilidades, principalmente, com relação
ao envio de estudantes brasileiros ao exterior. Notamos que, em 2008, foram enviados 2
estudantes e recebidos 27, ao passo que, em 2012, foram enviados 110 e o número dos
recebidos decresce para 7 estudantes.
25
56 61 57
32
2009 2010 2011 2012 2013
Convênios Ativos
Convênios Ativos
121
É importante esclarecer que a entrada e saída quantitativa de estudantes é instável e
não cumulativa. A exemplificar, temos a mobilidade de estrangeiros na UFMT, que inicia
com 27 em 2008, 3 em 2009, 21 em 2010, 3 em 2011, terminando com 7 em 2012 (UFMT,
RELATÓRIO DE GESTÃO DO PERÍODO DE 2008 a 2012). Na realidade, os primeiros 27
estudantes estrangeiros, ora citados, foram herdados das gestões anteriores, sendo vinculados
ao Programa de Estudantes Convênios de Graduação (PEC-G), programa do governo federal
brasileiro com objetivo de “oferecer oportunidades de formação superior a cidadãos de países
em desenvolvimento com os quais o Brasil mantém acordos educacionais e culturais.”
(BRASIL/MEC, 2014) e que completa 50 anos neste ano de 2015. Por sua vez, os demais
estudantes contabilizados são novos, inseridos no ano referido.
Vale ressaltar que o CsF foi lançado em agosto de 2011 e a UFMT a ele aderiu, de
início informalmente, tão logo foi lançado, e depois via Termo de Adesão, em dezembro de
2011. A iniciativa proporcionou reflexos no que tange ao envio de estudantes ao exterior em
2012, tendo em vista que o programa prevê apenas o envio de estudantes de graduação na
modalidade graduação – sanduíche.
Em 2012, com a reeleição da administração superior da UFMT, a ARI foi
reestruturada para Secretaria de Relações Internacionais (SECRI), passando a ter autonomia
na diretriz do processo de internacionalização da UFMT. Essa alteração foi marcante, tanto
que, com relação ao Setor de Mobilidades, as legendas dos gráficos descritos no Relatório de
Gestão 2012-2013 indicam: “[...] ao período de gestão pela ARI, de 2008 a 2011, período de
transição ARI para SECRI, em 2012, e o início do período de gestão da SECRI, em 2013.”
No Gráfico 4, é possível identificar informações relativas ao Setor de Mobilidade,
inicialmente de 2008 a 2011, e, após, nos anos de 2012 e de 2013, sendo que o retratado
refere-se à ida de estudantes às instituições de outros países.
122
Gráfico 4 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2012 a 2013
Fonte: Relatório de Gestão/UFMT 2012/2013. Mobilidades Out.
Podemos observar que, no período em foco (2008-2013), considerando a graduação,
os anos de 2012 e 2013 se destacam acentuadamente, o que se deve à vigência do CsF na
UFMT.
Por sua vez, o Gráfico 5 mostra dados das Mobilidades In, que se refere à entrada de
estudantes estrangeiros na UFMT, compreendendo o período de 2009 a 2011 e os anos de
2012 e 2013.
Gráfico 5 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2012 a 2013
Fonte: Relatório de Gestão/UFMT 2012/2013. Mobilidades In.
Nessa modalidade, considerando a graduação, percebe-se um declínio em 2012 e
2013, o que é assim justificado pela instituição:
2008 a2011
2012 2013
73
106
149
3 2 2
Mobilidades Out
Graduação
Pós-Graduação
2009 a 2011 2012 2013
Graduação
Pós-Graduação
123
[...] os números são bem menos expressivos que na modalidade out pelo fato de a
língua portuguesa ser pouco atrativa para estrangeiros, por não oferecermos cursos
em língua inglesa, por não oferecermos cursos de português para estrangeiros, pela
localização e o pouco conhecimento sobre a UFMT e pela carência de recursos
que financiem a vinda de estudantes para o Brasil (UFMT, RELATÓRIO DE
GESTÃO DE 2012/2013, grifos nossos).
Reparamos que o fluxo basicamente se constitui na direção da saída de estudantes do
Brasil. Já o inverso apresenta fluxo menor, o que é atribuído, inclusive, à falta de
financiamento que estimule o processo. Diante disso, podemos indagar se o órgão nacional
deveria respaldar a vinda de estudantes, e, se fosse o caso, sob que argumentos e condições.
Contudo, é preciso reconhecer que a SECRI/UFMT busca mediante outros
programas a possibilidade de enviar estudantes ao exterior, bem como programas para receber
estrangeiros, além de aumentar convênios e apoiar projetos de pesquisas conjuntos. O
Relatório de Gestão 2012/2013 reitera esse movimento:
Buscando atrair um maior número de estrangeiros para a UFMT, a Secri está
desenvolvendo diversos tipos de mídia (eletrônica e impressa) para a divulgação
multilíngue da Instituição, dando maior visibilidade e apoiando, desta forma, a
participação em missões, eventos e reuniões internacionais. Ainda visando criar um
ambiente mais propício à atração de estudantes estrangeiros para a UFMT,
propusemos e tivemos a aprovação pelo Consuni do Programa de Bolsas
Expandindo Fronteiras (BEF), destinado aos estrangeiros pertencentes a instituições
conveniadas com a UFMT [...] (UFMT, RELATÓRIO DE GESTÃO DE
2012/2013).
O conjunto de iniciativas, no entanto, não possui a expressividade do CsF, um
programa com financiamento e apelo midiático que se destacam, dando sinais, na instituição
estudada, de monopolizar as ações de internacionalização.
É importante ressaltar que a UFMT aprovou em seu Conselho de Ensino, Pesquisa e
Extensão (CONSEPE), em 28/07/2014, a Resolução n.º74/2014, que dispõe sobre intercâmbio
internacional para a comunidade acadêmica da UFMT. Essa resolução justifica tais ações a
partir das seguintes considerações:
CONSIDERANDO o caráter fundamental do intercâmbio de ideias para a própria
constituição das universidades, desde o seu surgimento; a possibilidade de se
concretizar esse intercâmbio através do envio de membros da comunidade universitária
da UFMT a outras instituições de educação superior (IES) no exterior, assim como a
recepção de acadêmicos estrangeiros na UFMT;
CONSIDERANDO o investimento realizado pelo Governo Federal nos processos de
intercâmbio acadêmico, através de seus diferentes organismos de fomento ao ensino,
pesquisa e extensão;
124
CONSIDERANDO a necessidade de promover a participação da UFMT em
associações, consórcios, redes e acordos de cooperação com outras IES, de forma a
propiciar condições para o intercâmbio internacional da comunidade acadêmica;
CONSIDERANDO a melhoria da qualidade na pesquisa, no ensino e na extensão e a
consequente visibilidade que a universidade pode alcançar diante da comunidade
acadêmico-científica através da promoção do intercâmbio internacional;
CONSIDERANDO a ineficácia da Resolução CONSEPE n.º 118/2002 frente ao novo
cenário da internacionalização da educação superior
CONSIDERANDO que no Plano de Desenvolvimento Institucional da UFMT consta
em sua visão “Tornar-se referência nacional e internacional como instituição multicampi
de qualidade acadêmica, consolidando-se como marco de referência para o
desenvolvimento sustentável da região central da América do Sul, na confluência da
Amazônia, do Cerrado e do Pantanal.” (BRASIL/UFMT, 2014).
Do exposto, fica evidenciada uma síntese da institucionalização da política de
internacionalização da educação superior na UFMT.
3.3.1 Os editais SECRI/UFMT para seleção dos bolsistas CsF
Abaixo, no Quadro 8, são enfatizados os editais lançados pela UFMT, destacando as
principais alterações ocorridas ao longo da implementação do CsF nesta IFES em seus
requisitos específicos que determinam a excelência da candidatura, na modalidade de bolsas
de graduação-sanduíche divulgadas no período de 2011 a 2014. Assim sendo, ao explanar o
processo de implementação do CsF, pretendemos esboçar sua fisionomia no âmbito dessa
instituição.
Relembramos que se entende por convocações um grupo de chamadas
públicas/editais (CP) lançadas na mesma época, sendo cada número correspondente a um país
de destino.
Quadro 8 - Destaques dos Editais SECRI/UFMT para o Programa CsF de 2011 a 2013
Convocação Descrição
1ª Convocação
CP CAPES n.º
01/2011
Data: Ago/2011
Edital ARI 002/2011
- UFMT
Requisitos específicos da UFMT:
-Estar matriculado em curso de bacharelado ou licenciatura presencial nas áreas e
temas indicados no item 1. Os estudantes de cursos de licenciatura ou outras áreas
de bacharelado, somente poderão se inscrever se comprovarem o envolvimento
em projetos de pesquisa em um dos temas descritos no item 1 deste edital, através
de declaração emitida pela Pró-Reitoria de Pesquisa - PROPEq.
-Possuir coeficiente geral igual ou superior a 6,5.
- Apresentar declaração emitida pelo colegiado de curso do compromisso de
reconhecimento dos créditos obtidos pelos estudantes de graduação nas
instituições americanas, com pleno aproveitamento dos estudos e do respectivo
estágio, entendido tal reconhecimento como sendo parte das exigências e do
currículo disciplinar de formação do estudante.
- As inscrições de estudantes que já participaram de mobilidade internacional
poderão ser aceitas, em baixa prioridade, após analise caso a caso pela ARI.
125
- Apresentar documentação exigida pelo presente Edital.
Processo de candidatura interna deve ser feito via processo.
2ª Convocação
CP n.º 102 a 106
Data: Dez/2011
Edital ARI 004/2011
- UFMT
Requisitos alterados na UFMT: - Estar matriculado em curso de bacharelado ou licenciatura presencial nas áreas e
temas indicados no item 1.
Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF.
3ª Convocação
CP n.º 108 a 116
Data: Mar/2012
Edital ARI 002/2012-
UFMT
Requisitos alterados na UFMT:
- Possuir, no máximo, duas (02) reprovações e que já tenham sido cursadas e com
aprovação; ou possuir coeficiente geral igual ou superior a 6,0.
-Apresentar toda documentação exigida e no prazo estipulado conforme
cronograma do programa, ou seja, até 30/04/2012.
Se selecionado, apresentar Declaração de Pleno reconhecimento de estudos no
Exterior.
Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF.
4ª Convocação
CP n.º117 a 124
Data: Ago/2012
Edital ARI 007/2012
- UFMT
Mantiveram-se os requisitos anteriores na UFMT e acrescentaram
apresentação dos documentos: -Comprovante de participação em programas de iniciação científica ou
tecnológica, quando houver. A comprovação se dará através de Declaração da
Pró-Reitoria de Pesquisa (PROPEq), que deverá ser requerida pelo e.mail:
[email protected] , com cópia para [email protected] , informando o
nome do estudante e do orientador.
-Comprovante de participação em programa de docência, quando houver, através
de Declaração do Coordenador de Área/PIBID.
- Declaração de Integralização Curricular, conforme Anexo deste Edital. Este
documento deverá ser enviado, devidamente assinado e carimbado pelo
Coordenador de Curso, para e-mail: [email protected] , até último dia da
inscrição conforme calendário do programa.
Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF.
5ª Convocação
CP n.º 126 a 134
Data: Nov/2012
Edital ARI 009/2012
- UFMT
Sem alterações.
6ª Convocação
CP n.º136 a 142
Data: Fev/2013
EDITAL SECRI
001/2013 - UFMT
Mantiveram-se os requisitos anteriores na UFMT e acrescentaram:
O estudante selecionado deverá acatar todos os princípios estabelecidos no
Código de Conduta, divulgado no site: www.ufmt.br/secri , assim como
apresentar Termo de Responsabilidade de Manutenção Financeira que porventura
ultrapassarem os benefícios recebidos pelo referido Programa, devidamente
assinado pelos pais ou responsáveis legais com reconhecimento de firma em
cartório.
Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF e no site da
SECRI.
7ª Convocação
CP n.º143 a 155
Data: Mai/2013
EDITAL SECRI
005/2013 - UFMT
Requisitos alterados na UFMT: - Possuir, no máximo, 2 (duas) reprovações e que elas já tenham sido cursadas
com aprovação conforme determina a Resolução CONSEPE n.º 118/2002;
Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF e no site da
SECRI, acrescentou-se:
- O discente que for contemplado, após todas as fases, pelo Programa CsF deverá
entrar com um processo de afastamento via Secretária de Relações Internacionais,
devendo também participar de reuniões convocadas por esta Secretaria com a
finalidade de orientar os futuros bolsistas na fase de pré-mobilidade.
8ª Convocação
CP n.º156 a 174
Data: Out/2013
EDITAL SECRI
Requisitos alterados na UFMT: - Ter integralizado o número mínimo e não ter atingido o número máximo de
créditos conforme especificado no texto da Chamada Pública do país de interesse,
no momento do início previsto da viagem de estudos, comprovado pela
“Declaração de Integralização Curricular” (anexo I);
126
009/2013 - UFMT - Ter sua candidatura aprovada pelo Colegiado de Curso, comprovado pela
“Solicitação de Candidatura CsF” (anexo II);
Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF e no site da
SECRI. Destaque-se o lançamento na UFMT do Manual CsF e o Folder CsF.
9ª Convocação CP
n.º179 a 204
Data: Ago/2014
EDITAL SECRI
004/2014 - UFMT
Mantiveram-se os requisitos anteriores na UFMT e acrescentaram:
IV. Ser considerado um estudante de excelência de acordo com critérios
estabelecidos pelo colegiado de curso na UFMT, conforme determina a Resolução
CONSEPE n.º 74/2014.
Fonte: Dados organizados pela autora, com base nos editais divulgados.
Em face do apresentado, observamos que os ajustes promovidos priorizam atender às
necessidades do CsF, sobretudo no que se refere ao maior número de candidatos elegíveis e
agilidade no processo de homologação das candidaturas pela IES.
É importante ressaltar a Resolução CONSEPE n.º 74/2014, artigo 10, inciso IV, que
estabelece:
IV. Ser considerado aluno de excelência de acordo com critérios estabelecidos
por decisão do colegiado de curso de origem, homologado pela respectiva
Congregação e PROEG, que deverá dar ciência à SECRI (BRASIL/UFMT,
2014).
Isso significa que é delegado (a partir da 9ª Convocação) aos cursos de origem
estabelecer os critérios de excelência para seleção dos estudantes ao intercâmbio internacional,
ou seja, a elegibilidade dos candidatos a participar do CsF.
No Gráfico 6, demonstramos dados da 1ª à 8ª convocação (2011 a 2013) do CsF, na
UFMT, quanto à participação dos estudantes. Além disso, registramos que não é possível
aferir a 9ª convocação por estar ainda em execução:
Gráfico 6 - Estudantes da UFMT participantes da seleção para Programa CsF
Fonte: Secretaria de Relações Internacionais. Jul/2014.
946
621
329
32
Inscritos Pré-Sel. UFMT Contemplados Desistência
CsF UFMT - Geral
127
É possível verificar pelo número de inscritos uma acentuada procura, o que vai
afunilando diante da pré-seleção e dos efetivamente contemplados.
Além de examinar as chamadas públicas/editais do Programa CsF e da UFMT para
entender seu funcionamento, consideramos pertinente abordar o perfil dos bolsistas
contemplados, o que a seguir se apresenta.
3.3.2 Perfil dos bolsistas CsF na UFMT e no CsF
A SECRI, com o objetivo de caracterizar o perfil socioeconômico dos contemplados
pelo Programa CsF na UFMT, enviou questionário para aproximadamente 190 estudantes
atendidos na modalidade graduação-sanduíche, no período de agosto/2011 a maio/2013, tendo
recebido 109 respostas. Evidenciamos alguns desses dados, socioeconômicos e acadêmicos,
retratados nos gráficos 7 e 8 a seguir.
128
Gráfico 7 - Estatísticas do Programa CsF – UFMT – Perfil socioeconômico. Fonte: Secretaria de Relações Internacionais. Março/2014.
Dessa síntese, verificamos que os estudantes contemplados apresentam proporção
equivalente quanto ao gênero, são massivamente solteiros e realizarão sua primeira viagem
internacional. Os dados da renda familiar indicam que aproximadamente 38% dos
entrevistados estão enquadrados no item de 05 a 10 salários mínimos, o que correspondia, em
129
2014, à escala de R$ 3.620,00 a R$ 7.240,00. Segundo a renda média bruta familiar no mês em
reais, pelo enquadramento do Critério Brasil (ABEP referenciando o LSE 2012 Ibope Media,
2012), notamos que os entrevistados pertencem majoritariamente às classes A e B. Finalmente,
79% dos estudantes não trabalham, possuindo gastos custeados, o que sugere uma
participação predominantemente elitizada no CsF.
Gráfico 8 - Estatísticas do Programa CsF – UFMT – Perfil acadêmico. Fonte: Secretaria de Relações Internacionais. Março/2014.
130
Já com relação ao perfil acadêmico, são, majoritariamente, estudantes que farão seu
primeiro intercâmbio, estão alocados na capital do estado de Mato Grosso, encontram-se no
meio do período de integralização do curso de origem, pertencem às áreas de conhecimento
priorizadas pelo CsF, representada, sobretudo, por engenharias, saúde e biológicas. Quase a
metade dos entrevistados não participa de Programa de iniciação científica, contradizendo um
dos interesses primordiais citados nas convocações do Programa CsF. Além disso, os
estudantes estão pontuados com maior ênfase no início da escala do ENEM elegível para o
referido programa, ou seja, entre 600 a 700 pontos. Há de ressaltar o elevado nível de
desconhecimento de idioma estrangeiro, justificando, assim, a necessidade do Programa
Inglês sem Fronteiras para conseguir atenuar essa deficiência.
Com a finalidade de comparar os dados da UFMT com os dados gerais do programa,
buscamos junto à home page oficial os dados publicados no “Painel Eletrônico”, que contém
informações atualizadas até agosto/2014, isto é, considerando os números apenas do período
da 1ª à 8ª convocação (2011 a 2013). Destacamos os principais dados por meio do Gráfico 9 e
10:
Gráfico 9 - Estatísticas gerais do Programa CsF-I Fonte: Programa Ciência sem Fronteiras/Painel de Controle. Acesso em outubro/2014.
131
Resumidamente, podemos destacar no Gráfico 9 que o programa registra 70.188
bolsas implementadas, ou seja, já atingiu cerca de 70% de sua meta final que é 101.000 bolsas
implementadas até 2015. Porém, ao considerar o anteriormente exposto (ou seja, que na 9ª
convocação há disponíveis 8.550 vagas geridas pela CAPES e 5.500 pelo CNPq), a
possibilidade é que se possa atingir 84.238 bolsas implementadas, significando não atingir a
meta tão aspirada. A menos que haja maior número de chamadas públicas de graduação e pós-
graduação, ou até programas aderentes, que venham somar no cálculo final pretendido.
Ademais, evidenciamos no Gráfico 9 que 82% das bolsas implementadas foram para
a modalidade de graduação-sanduíche, predominantemente da região sudeste com 50% das
bolsas implementadas, com certa equidade de gêneros masculino e feminino (considerando
sua magnitude nacional).
O Gráfico 10 informa sobre a distribuição de bolsas CsF implementadas por área
prioritária de conhecimento e por país de destino.
Gráfico 10 - Estatísticas gerais do Programa CsF-II
Fonte: Programa Ciência sem Fronteiras/Painel de Controle. Acesso em outubro/2014.
Observamos que, de acordo com o Gráfico 10, o foco é sobre a área de engenharia e
demais áreas tecnológicas, que contemplam 45% do total de bolsas implementadas e com
132
destino prioritário para os Estados Unidos da América, com aproximadamente 30% do total
de envio de estudantes.
Essa última informação faz refletir acerca da Tabela 1, que trata sobre as chamadas
públicas divulgadas. Nessa tabela, o Canadá tem 12 chamadas e os EUA têm 9, porém, ao
comparar com o número de bolsistas contemplados, temos 6.325 para o Canadá e 20.358 para
EUA, representando que os números de chamadas abertas para um país pode não
corresponder ao país de destino preeminente.
Independente do país de destino, aguçamos o interesse em saber acerca dos bolsistas
CsF oriundos da UFMT, se os mesmos foram alocados em instituições consideradas de
excelência pelo programa CsF, ou seja, entre as 100 melhores dos rankings mundiais.
Consultamos os Anuários UFMT/SECRI do ano de 2012, divulgado em 2013, e o de
2013, divulgado em 2014, no site do QS World University Rankings divulgados em 2012,
2013 e 2014, e chegamos aos seguintes números:
Tabela 3 - IES destino classificadas no QS World University Rankings
Registros Não classificadas Classificadas de
0-100 Classificadas de
101-700 Total
2013/2014
IES 42 11 31 84
Estudantes 52 17 37 106
2012/2013 IES 19 3 8 30
Estudantes 22 3 13 38 Fonte: Dados organizados pela autora, com base no QS World University Rankings.
Concluímos que foram enviados 7% dos bolsistas CsF UFMT de 2012 e 16 % dos
bolsistas CsF UFMT de 2013 para IES classificadas pelo ranking entre as 100 melhores
universidades do mundo, ou seja, mais de 80% dos bolsistas CsF UFMT foram enviados para
as IES pior classificadas pelo QS World University Ranking.
Esta análise vem ao encontro da notícia “Ciência sem Fronteiras tem 13,8% de bolsistas em
universidades 'top' 100”, divulgada em 13/11/2014, pelo site G1:
Entre as 100 melhores universidades do mundo, de acordo com o ranking Times Higher
Education, divulgado no início de outubro, há 5.425 estudantes brasileiros que
obtiveram bolsa pelo programa Ciência sem Fronteiras. O número representa 13,8% dos
39.091 brasileiros, de graduandos a pesquisadores realizando pós-doutorado, que estão
atualmente em universidades do exterior por meio do programa do governo (FABIANO,
2014, grifo autor).
133
Ainda na mesma notícia, consta a avaliação por parte do secretário executivo do MEC,
Luiz Claudio Costa: "Desde o início do programa, foi uma determinação que nós trabalhássemos
alocando os estudantes nas melhores universidades do mundo, então esse número que nós temos de
13,8% dos alunos entre as 100 melhores é extremamente importante." (FABIANO, 2014).
O depoimento da autoridade do MEC leva a crer que contemplar menos de 20% dos
bolsistas CsF em IES bem rankiadas seja suficiente para um programa que teve como primeiro
anúncio “[...] os melhores estudantes do Brasil, nas melhores universidades do mundo. [...]”
(CsF, 2011). Há de se recordar que todas as IES destino receberam taxas acadêmicas para
receber os bolsistas brasileiros CsF, com recursos públicos.
Em suma, de modo geral, ao comparar os dados estatísticos da UFMT/SECRI com
os dados gerais do Programa CsF, identificamos congruência de informações.
Igualmente percebemos que o processo de internacionalização na UFMT iniciou bem
antes do lançamento do CsF, embora o mesmo tenha se tornado o “carro chefe” a partir da
adesão institucional. Mesmo promovendo iniciativas diversificadas para trazer estudantes
estrangeiros, verificamos que a UFMT ajustou sua política de internacionalização às
proposições do CsF e sobre ele concentra as ações de internacionalização.
O exame de documentos da UFMT demonstrou que o CsF sintoniza com uma
diretriz considerada importante pela instituição, a mobilidade outgoing, que se expandiu a
partir do referido programa. A esse propósito, avaliamos que priorizar o movimento de envio
de estudantes para fora do país expressa alguns significados. Sugere um reconhecimento de
que o conhecimento científico “de excelência” deve ser buscado prioritariamente no exterior,
o que suscita questionamentos, seja sobre o modelo de produção do conhecimento, seja sobre
o modelo de desenvolvimento dos países de destino.
É importante destacar que a SECRI/UFMT considera que o movimento das
mobilidades deve ocorrer em mão dupla, porém, a falta de investimentos no incoming
prejudica a vinda de estrangeiros. São barreiras a serem enfrentadas, visto que a vinda de
acadêmicos estrangeiros poderia valorizar e alavancar o conhecimento local.
Esse aspecto, agregado ao que explicita as características do CsF, suscita
questionamentos, entre os quais a função social do conhecimento produzido na universidade
(a quem se destina? em que se referencia?) e os benefícios que a internacionalização então
priorizada pode resultar às instituições de ensino e ao país.
134
Em busca de resposta a esses e outros questionamentos, no próximo capítulo
entrevistamos representantes de instituições ligados à criação e implementação do Programa
CsF.
135
4. BUSCANDO ELEMENTOS PARA RESPOSTAS
Neste capítulo, apresentamos a análise dos dados obtidos nas entrevistas feitas com
os representantes de instituições ligados à concepção e à implementação do Programa Ciência
sem Fronteiras, em interlocução com as informações já obtidas nos capítulos anteriores, com
o objetivo de buscar elementos para responder ao questionamento norteador desta dissertação:
Como se caracteriza, em termos de concepção e implementação, o Programa Ciência
Sem Fronteiras, no âmbito da política de internacionalização da educação superior no
Brasil? Nessa direção, as questões norteadoras secundárias foram: Qual a função social do
conhecimento produzido na universidade? A quem se destina? Em que se referencia? E os
benefícios que a internacionalização então priorizada pode resultar às instituições de ensino e
ao país?
A propósito, conforme Gomes e Oliveira (2012, p.22/23), a análise dos processos de
concepção e formulação das políticas públicas de educação superior:
[...] trata-se de estudos que focalizam o contexto de concepção e formulação das
políticas públicas, nos quais em geral se destacam que o texto da política não pode
ser lido e entendido sem a compreensão do contexto. O contexto significa o espaço
social no qual se movimenta os diferentes sujeitos individuais e coletivos que se
envolvem no debate, que influenciam as decisões, que orientam a elaboração e que
decidem os termos, categorias e conceitos que se incorporam ao texto-documento
(GOMES; OLIVEIRA, 2012, p. 22/23).
Acerca de análise dos processos e estratégias de implementação, asseveram que:
[...] trata-se de estudos que procuram desvelar os processos e estratégias
relacionadas com as práticas sociais e institucionais em torno da materialização de
uma determinada política pública. Esse tipo de análise não reduz tais processos e
estratégias apenas ao terreno institucional e as ações dos sujeitos nele envolvidos,
mas procuram mapear as etapas ou fases do processo de implementação, destacando
muitas vezes que o contexto de formulação realizou-se a definição geral ou
específica de como a implementação deveria ocorrer. No entanto, observa-se que a
grande preocupação dessas análises é entender como se coloca em prática a política
pública a partir das ações de sujeitos que geralmente não participaram de sua
elaboração. [...] Em geral, pode-se dizer que tais estudos são capazes de trazer, à
superfície, a recepção, reação e resistência que a comunidade acadêmica, ou
segmentos desta constrói em relação à determinada política pública (GOMES;
OLIVEIRA, 2012, p. 26/27).
136
4.1. METODOLOGIA
Esta pesquisa configura um estudo exploratório, de caráter qualitativo, assim
definido por Minayo (2011, p.21):
[...] ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das
crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é
entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se distingue não só
por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir
da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes (MINAYO, 2011, p.21).
Para compor a coleta de dados, utilizamos entrevista semiestruturada, “[...] que
combina perguntas fechadas e abertas, em que o entrevistado tem a possibilidade de discorrer
sobre o tema em questão sem se prender à indagação formulada” (MINAYO, 2011, p.64).
Evocamos, ainda, o pensamento Triviños (2013, p. 146):
Podemos entender por entrevista semiestruturada, em geral, aquela que parte de
certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à
pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de
novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do
informante. Desta maneira, o informante seguindo espontaneamente a linha de seu
pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado pelo
investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da pesquisa
(TRIVINOS, 2013, p.146, grifo do autor).
Cabe esclarecer que a pesquisa procurou orientar-se pelo método dialético de
investigação, que tem a crítica como princípio. Para Frigotto (2010, p.84), essa referência
teórica: “tem de dar conta da totalidade, do específico, do singular e do particular. Isto implica
dizer que as categorias totalidade, contradição, mediação, alienação não são apriorísticas, mas
construídas historicamente”, pois as mesmas se modificam historicamente e precisam ser
sempre “revisitadas” e “reconstruídas” (FRIGOTTO, 2010).
Nessa perspectiva, utilizamos como fonte de inspiração e como suporte à dissertação,
principalmente, as categorias filosóficas da contradição e da totalidade por entender que
ambas possibilitam conhecer o fenômeno estudado das partes para o todo e do todo para as
partes, num movimento de ir e vir, como a práxis humana. Tais categorias se integram a
outras categorias filosóficas ao longo da análise, como a aparência e a essência.
Cury (1989, p.27) define tais categorias da seguinte forma:
A categoria contradição (poder-se-ia denomina-la de lei, dado seu alcance
globalizante) é à base de uma metodologia dialética. Ela é o momento conceitual
137
explicativo mais amplo, uma vez que reflete o movimento mais originário do real. A
contradição é o próprio motor interno do desenvolvimento. Conceber uma tal
metodologia sem a contradição é praticamente incidir num modo metafísico de
compreender a própria realidade. A racionalidade do real se acha no movimento
contraditório dos fenômenos pelo qual esses são provisórios e superáveis. A
contradição é sinal de que a teoria que a assume leva em conta que ela é o elemento-
chave das sociedades. [...] A categoria da totalidade justifica-se enquanto o homem
não busca apenas uma compreensão particular do real, mas pretende uma visão que
seja capaz de conectar dialeticamente um processo particular com outros processos
e, enfim, coordená-lo como uma síntese explicativa cada vez mais ampla (CURY,
1989, p.27, grifo autor).
Nessa trilha, as categorias contradição e totalidade contribuem para retratar o
fenômeno de estudo, possibilitando decifrar seus movimentos contrários. O estudo promove a
revelação do fenômeno por meio, inicialmente, da sua decomposição em partes, processo que
é seguido pela junção das partes e, por fim, produzindo-se a sua síntese complexa.
A esse respeito, Kosik (1976) afirma:
O conceito da coisa é compreensão da coisa, e compreender a coisa significa
conhecer-lhe a estrutura. A característica precípua do conhecimento consiste na
decomposição do todo. A dialética não atinge o pensamento de fora pra dentro, nem
de imediato, nem tampouco constitui uma de suas qualidades; o conhecimento é que é
a própria dialética em uma das suas formas; o conhecimento é a decomposição do
todo. O ‘conceito’ e a ‘abstração’, em uma concepção dialética, tem significado de
método que decompõe o todo para poder reproduzir espiritualmente a estrutura da
coisa, e, portanto, compreender a coisa (KOSIK, 1976, p. 14).
Ressaltamos que as categorias foram definidas no percurso desta dissertação, sendo o
momento da análise de dados o ápice desta definição. Igualmente, é importante ponderar que
a orientação pelo método dialético de investigação é um grande desafio, tendo em vista sua
complexidade, o que nos faz estudante contínuo da sua apreensão. Assim sendo, o presente
estudo constitui uma primeira aproximação ao método.
4.1.1 Metodologia das entrevistas
Para o desenvolvimento da pesquisa sobre o Programa Ciência sem Fronteiras, os
locais de estudo foram as instituições idealizadoras e gestoras do referido programa,
delimitando-nos aos líderes dessas instituições, vinculados ao segmento da
internacionalização da educação superior. Optamos por resguardar o seu anonimato. Os 03
(três) sujeitos entrevistados foram:
138
Representante da Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação,
com o objetivo de captar a idealização do Programa CsF e sua relação com a
política de internacionalização da educação superior no Brasil;
Representante da Secretaria de Relações Internacionais da Universidade
Federal de Mato Grosso, com o objetivo de ilustrar a implementação do
Programa CsF em uma universidade brasileira;
Representante do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico, com o objetivo de captar a operacionalização do Programa CsF e
sua relação com a política de internacionalização da educação superior no
Brasil, pelo olhar de uma das agência de fomento.
Elaboramos um roteiro com dez questões que pretendiam tratar fundamentalmente
dos eixos: internacionalização da educação superior, política de internacionalização da
educação superior e do Programa CsF, bem como a inter-relação entre os mesmos.
As entrevistas, que se realizaram em setembro de 2014, foram gravadas, mediante
consentimento dos participantes e, posteriormente, transcritas para análise. O tempo médio de
cada uma foi aproximadamente 30 minutos. Quanto ao local, as entrevistas foram realizadas
no escritório de cada representante, ou seja, na sede da SESU e na sede do CNPq, ambos em
Brasília-DF e, na sede da SECRI/UFMT em Cuiabá-MT.
Ressaltamos que os entrevistados são gestores das instituições que representam,
possuem mais de 30 anos de atuação na área de educação superior e políticas públicas.
A escolha, portanto, deu-se por considerar que, dada a posição de dirigentes, são os
responsáveis pela definição da política pública de internacionalização da educação superior
brasileira, tornando a discussão mais rica, possibilitando a problematização do tema, o
desvendar da concepção e implementação de tal política, além de trazer elementos da prática
vivenciada.
Para estruturar o conteúdo das entrevistas, selecionamos o material a ser trabalhado
na descrição e utilizamos os procedimentos apresentados por Biklen e Bogdan (1994):
- rever as páginas das transcrições das entrevistas, numerando-as sequencialmente,
agrupando-as por tipo de material semelhante;
- proceder à leitura do material, assinalando palavras, frases ou parágrafos que se
julga necessário selecionar por conterem elementos importantes ao trabalho de pesquisa.
139
Devem abranger conteúdos em que haja variedade, repetição ou que se deseja explorar por
sua pertinência e relevância em relação aos objetivos da pesquisa;
- a partir dessa seleção, iniciar a determinação preliminar de categorias de
codificação, desenvolvendo para cada uma destes códigos de identificação e anotando em
separado. Voltar ao texto, atribuindo os códigos às unidades de análise correspondentes. Por
unidades de análise entendem-se as “partes das suas notas de campo, transcrições ou
documentos que caem dentro de um tópico particular representado pela categoria de
codificação.” (BIKLEN; BOGDAN, 1994, p. 233);
- observar, então, a viabilidade das categorias que se criou, realizando alterações, se
for o caso, e criando subcategorias.
As categorias empíricas norteadoras da análise são: concepção e implementação,
justamente por serem elementos fundamentais do objetivo geral a qual se quer obter, sendo
que as mesmas seguem o entendimento de Gomes e Oliveira (2012) conforme referenciado na
página 124.
As categorias de codificação empregadas foram extraídas do conteúdo das
entrevistas após realizar as sínteses necessárias do conjunto dos depoimentos, sendo assim
definidas: A. formulação – no sentido da idealização; B. criação – no sentido da obra em si;
C. características – no sentido de descrição; D. perspectivas – no sentido de
desdobramentos futuros.
Ainda sim, houve a necessidade da criação de subcategorias, sendo elas: a.
definição; b. política; c. agenda; d. motivação; e. ponto de vista; f. fragilidades; e, g.
pontos positivos.
Essas mesmas categorias são apresentadas no esquema a seguir:
Concepção: categoria empírica
A. Formulação: categoria de codificação
Subcategorias:
a. Definição;
b. Política;
c. Agenda;
d. Motivação.
140
B. Criação: categoria de codificação
Subcategoria:
e. Ponto de vista.
Implementação: categoria empírica
C. Características: categoria de codificação
Subcategorias:
f. Fragilidades;
g. Pontos positivos.
D. Perspectivas: categoria de codificação
Esclarecemos que os participantes da pesquisa também receberam codificação de
acordo com o segmento a que pertencem: MEC, CNPq e UFMT, de forma a resguardar o
anonimato pactuado.
4.2 ANÁLISE DOS DADOS
Conforme já explicado, as questões das entrevistas foram abertas, o que propiciou
um número expressivo e diversificado de respostas.
Procuramos apresentar uma síntese do que foi exposto pelos entrevistados,
destacando as citações que tiveram maior incidência ou as que julgamos mais interessantes
trazer à tona por proporcionarem elementos importantes para análise.
Os depoimentos que transcrevemos conforme expressa o entrevistado são
registrados entre aspas e em negrito. Já alguns, por serem muito longos ou repetitivos, são
sintetizados, procurando ser fiel à ideia principal ali contida, sendo, então, registrados em
negrito, sem aspas.
Sendo assim, ao analisar as categorias concepção/ formulação/definição em busca
de apreender o que o entrevistado entende por internacionalização da educação superior,
tivemos os seguintes depoimentos:
[...] é a introdução da dimensão intercultural na educação superior, em função principalmente do
crescente processo de globalização. Então, essa aceleração do processo de globalização, lançou um desafio,
vamos dizer assim, para as universidades. Hoje você tem que falar a língua e ter essa vivência intercultural
141
também. E é nesse aspecto da interculturalização do estudante, oportunizar o estudante a trabalhar,
conhecer, a lidar com o diferente (UFMT).
[...] é, sobretudo, o movimento de troca que se faz e que desemboca na realização de trabalhos
conjuntos, a partir de um intercâmbio, que inicialmente serve para nós nos conhecermos e que resulte nesse
trabalho de parceria conjunta etc (SESU).
“É que muitas pessoas tendem a confundir o CsF como “A” internacionalização, e o programa é
na verdade um elemento importante para a efetiva internacionalização, mas que não se limita ao programa.”
(SESU).
[...] no Brasil, nós só teremos o processo de internacionalização da educação superior quando a
gente tiver estes dois, essa ação passiva no sentido de mandar [para o exterior] equilibrada com a ativa no
sentido de receber [no Brasil], ou seja, um processo de que contempla essa mobilidade de estudante,
pesquisadores nos dois sentidos (CNPq).
Pelos depoimentos, podemos inferir que a internacionalização da educação superior é
entendida pelo representante da UFMT como algo amplo, ou seja, como dimensão
intercultural na educação superior, sendo um desafio da globalização às universidades. Por
sua vez, é entendida pelos representantes da SESU e CNPq, principalmente, como um
processo de mobilidade internacional. Porém, a mobilidade nada mais é que um elemento do
processo de internacionalização da educação superior.
Evocamos novamente o pensamento de Knigth (2010, s.p), ao afirmar que
“Internacionalização é um termo que significa diferentes coisas para diferentes pessoas.”. E
também a advertência de De Wit (2002), ao asseverar:
[...] à medida que a dimensão internacional da educação superior ganha mais
atenção e reconhecimento, as pessoas tendem a usar o termo da forma que
melhor satisfaça aos seus propósitos. Uma definição mais focada é necessária para
ser entendida com a importância que ela merece. Mesmo se não houver
concordância sobre a definição, a internacionalização precisa ter parâmetros para ser
avaliada e, portanto, contribuir com a educação superior. Este é o motivo pelo
qual o uso de uma definição em construção com uma estrutura conceitual é relevante
para internacionalização do ensino superior (DE WIT 2002, p.114, grifo nosso).
Nesse sentido, fica evidenciado que o conceito ainda está em construção, não há
concordância sobre a definição e esta precisa ser definida para que haja harmonia no
entendimento do que é e para que se propõe, de forma a trazer contributos à educação
superior.
Ainda sobre o tópico da definição, o representante do SESU, ao ser questionado
sobre a definição do Programa CsF, se é internacionalização da educação ou da ciência,
expôs:
142
“É a internacionalização da educação com ênfase nas ciências duras, nas tecnologias, então ai as
coisas se confundem, mas eu diria que o impacto é na educação, sobretudo na volta do estudante.” (SESU,
grifo nosso).
Esse questionamento surgiu porque, no site institucional do Programa CsF, consta a
definição “Ciência sem Fronteiras é um programa que busca promover a consolidação,
expansão e internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade
brasileira por meio do intercâmbio e da mobilidade internacional.” (BRASIL, 2014, grifo
nosso). Porém, o programa é citado nos meios de comunicação como sendo um programa de
internacionalização da educação superior, causando paradoxos, que o próprio representante da
SESU reconhece.
A disparidade de entendimentos sobre o que seja a internacionalização da educação
superior parece dificultar o país a definir ações que a ela se referem. É como se cada sujeito
desse cenário (governo, instituição de ensino, estudantes, pesquisadores) buscasse foco
diferenciado, deixando evidências de que ainda não há uma política pública brasileira definida
acerca do tema.
Nesse sentido, ao analisar as categorias concepção/formulação/política, nosso
intuito era identificar se o Brasil, na visão dos entrevistados, possui uma política de
internacionalização da educação superior definida. Em caso positivo, pautada em que aspectos
e sob qual inspiração de modelo ou, em caso negativo, se é importante criá-la. Assim, temos:
“Eu acho que ela está em construção porque você dizer que um programa como o CsF, por
exemplo, é uma política, é muito pretencioso. [...] Dá para chamar isso de política de internacionalização do
ensino superior se você não está internacionalizando as universidades?!Não dá. Isso é política de
internacionalização do aluno de educação superior.”(UFMT).
“Nós temos uma política, ela está claramente delineada [...] E tanto é assim, que agora no Plano de
Desenvolvimento Universitário que está sendo pactuado entre o MEC e as Universidades federais, já levado
pela ANDIFES nas audiências que as universidades tiveram com a presidenta Dilma. [...]Então quer dizer,
você veja, é uma política que se explicita, é uma política que tem uma instrumentalização clara, tem um
planejamento e tem os recursos necessários, entretanto, nós vamos respeitar a autonomia das universidades,
então cada universidade vai formular seu PDU, isso a partir do Plano de Desenvolvimento Institucional da
universidade, que será atualizado, e é atualizado, quer dizer é a universidade que vai definir isso, a partir de
suas prioridades regionais, da sua inserção nacional e da sua internacionalização.” (SESU).
Quanto à inspiração, o Brasil não se inspirou em nenhum modelo de outro país. Não, está
acontecendo ao contrário. Outros países é que estão se espelhando no Brasil (SESU).
“Não, não tem. Tem um programa forte mis uma política não tem, arquitetada no sentido de
montar estratégias... não tem, precisaria ter.[...]Bom, como eu disse eu não vejo uma política de
internacionalização. Eu vejo um programa, uma ação forte que poderá vir a, digamos assim, depois,
englobado dentro de uma política.[...] Porque a gente não tem uma política, a gente precisa de uma política,
que a gente pode se apropriar dos erros que cometemos, dos muitos acertos que a gente teve no programa
para melhorar e aprofundar esse processo de internacionalização. ”(CNPq).
143
Olha, o seguinte, os casos clássicos em internacionalização baseados em mobilidade de
pesquisadores e estudantes são os casos de países asiáticos, como China e Coréia, que mandam massivamente
estudantes e pesquisadores para o exterior. [...] o procedimento agressivo com relação a isso, mas se difere
por causa do financiamento, que no Brasil é majoritariamente por recursos públicos (CNPq).
Por meio desses depoimentos, identificamos divergências. Primeiramente, o
representante da SESU afirma com firmeza que há uma política de internacionalização de
educação superior definida e que está sendo materializada em forma do Plano de
Desenvolvimento Universitário, ao passo que os representantes da UFMT e do CNPq
afirmam que não há tal política.
Ao buscar o documento citado pelo Representante da SESU, identificamos que, em
maio de 2014, a ANDIFES entregou a presidente Dilma Rousseff uma proposta de
desenvolvimento para as Universidades Federais, para os próximos dez anos, intitulada “Uma
agenda de desenvolvimento para as Universidades Federais”, que contém a
internacionalização como uma das dimensões prioritárias do documento, porém trata-se
apenas de uma proposta. Tanto é que na reportagem “Andifes debate CT&I, autonomia e
delibera sobre entrega de proposta para presidenciáveis”, publicada em setembro de 2014, no
site da ANDIFES, consta a seguinte informação:
Durante a reunião do Conselho Pleno, foi deliberado que a proposta para o
desenvolvimento das universidades, elaborada pela Andifes, será entregue a todos os
presidenciáveis, como já feito à presidente Dilma Rousseff em maio. A iniciativa da
Andifes visa apresentar aos candidatos à Presidência da República a posição e
importância das Universidades Federais, ao relatar no documento os avanços
alcançados com a expansão dos últimos anos e propor diretrizes para uma nova
etapa de crescimento destas instituições. O documento é baseado em seis eixos
principais; desenvolvimento regional, desenvolvimento nacional, inovação
tecnológica, internacionalização, formação de professores e educação a
distância. Agenda de Desenvolvimento Para as Universidades Federias,
também reafirma o compromisso das instituições com o desenvolvimento
econômico e social do país e com as políticas educacionais ao propor um projeto
articulado com o Plano Nacional de Educação (PNE) (ANDIFES, 2014, grifo autor).
Desta forma, apesar do representante do SESU afirmar que existe tal política, ela não
é reconhecida pelos sujeitos e o documento de referência trata-se ainda de uma proposta.
A segunda divergência é acerca da inspiração, pois para o representante da SESU o
Brasil está sendo modelo para outros países, mas para o representante do CNPq o Brasil se
inspira na magnitude dos números de países asiáticos, como China e Coreia do Sul.
144
Ao questionar se a internacionalização da educação superior é agenda prioritária para
o Brasil, pela categoria concepção/formulação/agenda, temos :
“Eu acredito que nos últimos anos sim. O Programa CsF é um demonstrativo disso.[...] Mas essa
prioridade, essa horizontalização da internacionalização é mais recente e eu acho que a vitrine dela é o CsF.
[...] A gente pode colocar o Programa CsF como marco divisor de águas, antes dele e depois dele.”(UFMT).
Em termos de política institucional essa é uma política prioritária da nossa administração da
reitora Maria Lucia, resultando inclusive na criação da SECRI. Mas não foi por causa do Programa CsF que
foi criada a SECRI (UFMT).
“Sim, cada vez mais, você tem na verdade um crescendo ai de priorização da internacionalização.
[...] A internacionalização é uma prioridade, está inserida na política do MEC em relação às universidades
federais e tem um substrato material que é o PNE, inclusive, para planejamento e financiamento.” (SESU).
“Bom, eu entendo que [o Brasil] colocou [a internacionalização na agenda] e atrasado! [...] o
Programa CsF eu acho que ele deu um passo decisivo, um programa governamental, deu um passo decisivo
no sentido de ter como prioridade isso.”(CNPq).
Aqui identificamos um consenso: todos os entrevistados acreditam que o Brasil tem
colocado a internacionalização da educação superior como prioridade em sua agenda, e o fez
principalmente pelo Programa CsF. Mas qual a motivação para tal? Temos como respostas
dos entrevistados para a categoria concepção/formulação/motivação:
“[...] na realidade essa é uma imposição de uma realidade que é maior do que nós. Uma realidade
internacional e isto está posto dentro da agenda internacional hoje, e o país que ficar a margem disso vai
acabar ficando prejudicado.” (UFMT).
“[...] o mundo está globalizado, e a educação superior tem que acompanhar este processo, então por
isso é uma prioridade.” (SESU).
“[...] o principal motor, eu acho, foi essa questão relacionada com a baixa produtividade da
economia brasileira.” (CNPq).
Identificamos que os entrevistados explicam a priorização na agenda sobre o tema
internacionalização da educação superior pelo contexto político-econômico que estamos
vivenciando. Conforme demonstrado no capítulo 2, há um direcionamento dos organismos
internacionais para que os países elejam esse tema como prioridade, o que, inclusive,
oportuniza ações da transnacionalização da educação superior, ao tratar como resposta à
globalização ou devido à baixa produtividade da economia brasileira.
Além da formulação, suscitou-nos saber acerca da criação do Programa CsF, ou seja,
qual é o ponto de vista dos representantes entrevistados. Primeiramente, separamos os
depoimentos em: O que? Para quem? Por quê? Após, agrupamos a síntese dos depoimentos
na categoria concepção/criação/ponto de vista.
145
Vale explicar que foi solicitado que cada entrevistado fizesse uma escala de
prioridades que caracterizasse os sujeitos envolvidos (instituições parceiras internacionais;
instituição brasileira, bolsista e a política de internacionalização da educação superior
brasileira), entre o mais beneficiado e o menos, beneficiando com a criação e a
implementação do Programa CsF, conforme o quadro abaixo.
1 – Prioritário 2- Mediano 3 – Menos que a média 4- Menos prioritário
Desta feita, demonstramos a seguir o depoimento do representante da UFMT:
O que?
“Primeira coisa, esse numero 100 mil ninguém sabe até hoje de onde veio, então isso já mostra
uma falta de planejamento do programa. [...] O Programa CsF não passa de um programa exportador de
alunos[...]Olha, a priorização das áreas segue a lógica do mercado. E dentro desta lógica que o país tem que
competir, a escolha foi correta.” (UFMT).
Para quem?
“Você tem universidade[no exterior] que não tem aluno, porque a população está envelhecendo,
então para eles é um grande negócio receber os nossos alunos CsF por que eles conseguem manter a
população estudantil, pagando taxa, e todo mundo consegue manter os seus empregos, então é um bom
negócio para eles.”(UFMT).
“Para a instituição é 2, porque foi um divisor de aguas mas poderia ser melhor. Para o bolsista é 2
também, porque se ele fosse mais bem elaborado, se desse para bolsista fazer um plano de estudos melhor, ele
aproveitaria melhor a experiência internacional sem perder muito tempo para colação de grau dele. Para o
parceiro internacional é excelente, está ganhando taxa acadêmica, fazendo internacionalização em casa e
não esta assumindo compromisso nenhum conosco, com o Brasil, com a instituição. É a melhor coisa do
mundo. Para a política da internacionalização da educação superior, ele é abaixo da média porque se fosse
mais bem pensado, elaborado, planejado e executado, ele traria resultados muito melhores, seria um
programa, que traria sob o ponto de vista economicidade para o contribuinte, seria muito melhor, nós
poderíamos tirar muito mais proveito para o contribuinte, para as instituições.” (UFMT).
Por quê?
“A crise de 2008 foi uma crise crônica porque está aqui até hoje, [...] isso é claro, teve rebatimento
das instituições externas, e isso é claro, fez com que o Obama saísse como garoto propaganda e viesse aqui ao
Brasil, fazer o desafio para a Dilma, e ela como é uma pessoa que não é de fugir de desafios, ela aceitou o
desafio do Obama.” (UFMT).
“[...] a globalização da economia é isso, um engolindo o outro, um competindo com o outro, e isso
acaba refletindo na mão de obra, o país que tiver a mão-de-obra mais barata e produzir mais, é isso que vai
ganhando.” (UFMT).
O Brasil é muito isolado. O Brasil era e ainda é um país extremamente fechado sob o ponto de vista
da internacionalização. Isso vem também do fato de nossas universidades serem muito fechadas a essa
interação com o exterior (UFMT).
De forma sucinta, o ponto de vista defendido pela UFMT parece ser que o Programa
CsF possui uma magnitude em termos numéricos de bolsas, trata-se de um programa
146
exportador de alunos, que prioriza áreas segundo a lógica do mercado e tem como escala de
beneficiados: 1. instituições parceiras internacionais; 2. instituição brasileira e bolsista; e 3. a
política de internacionalização da educação superior brasileira. Finalmente, que foi criado por
uma demanda dos EUA, devido à crise de 2008 e à globalização, considerando o fato de o
Brasil precisar romper o isolamento em suas relações internacionais.
Adiante, o depoimento do representante da SESU:
O que?
“[...] é um número cabalístico. Cem mil é muita coisa [...] para um país da dimensão do Brasil
ainda que a gente tenha um numero pequeno de estudantes nas nossas universidades, vem crescendo, cem mil
é um número bastante razoável. [...] Mas foi um primeiro momento e nós vimos que estávamos corretos. [...]
Mas o dados estão mostrando que vamos atingir as 101 mil bolsas no final deste ano e já estamos quase
chegando lá.” (SESU).
“Eu diria que é “um” programa e não “o” programa. [...] O Programa CsF, obviamente, tem uma
dimensão tal, que não tem como dizer que ele é apenas um elemento, é um elemento fundamental e ele está
servindo de base para toda repercussão em outras ações, outros editais.[...] CsF, de grande sucesso o
programa [...] ” (SESU).
Para quem?
“Olha, é difícil fazer uma escala porque na verdade todos são prioritariamente beneficiados. Todos
são 1.” (SESU).
Por quê?
“Porque o Brasil sempre esteve de costas para o exterior.” (SESU).
Ao resumir o ponto de vista da SESU acerca da criação do Programa CsF, temos que
o entrevistado entende que o programa possui uma magnitude em termos numéricos de
bolsas, porém acredita ser um número razoável, levando em conta a dimensão do país.
Considera um elemento fundamental para as ações de internacionalização da educação
superior do país, mas afirma não ser o único. Acredita que todos os sujeitos (instituições
parceiras internacionais; instituição brasileira, bolsista e a política de internacionalização da
educação superior brasileira) são beneficiados da mesma forma. E acredita, igualmente, que o
programa foi criado pelo fato de o Brasil ser muito isolado em suas relações internacionais.
Por fim, temos o ponto de vista do CNPq:
O que?
Essa pergunta é um verdadeiro mistério. Então, teria sido uma sugestão do presidente Barack
Obama de mandar 100 mil para EUA porque os chineses têm mais de 250 mil. Então, ele queria que
mandasse 100 mil para EUA. Acerca da priorização de áreas, eu vejo o seguinte, muito coragem da
147
presidenta fazer isso, porque no Brasil trabalhar com prioridade é uma coisa muito complicada, sempre dá
muita reclamação[...]Mas eu acho que esse é um ponto positivo do programa, pois se abrissem para todas as
áreas, a gente ia fazer um bando de coisa e nada (CNPq).
“[...] foi um programa que veio de cima para baixo, em cima das duas agências, e que pelo respeito
que as agências tem com as instituições, as instituições aderiram e também a maioria delas viu que era bom
[...]” (CNPq).
“Acho ele fundamental, ele veio para mexer com uma situação que estava confortável para todo
mundo.” (CNPq).
Para quem?
“A prioridade aqui é no estudante, para que ele vivencie uma experiência diferente que ele tem
aqui, tenha oportunidade de aprofundar seus conhecimentos linguísticos, ter uma outra cultura, contato com
outra cultura acadêmica, de pesquisa, cultura de maneira geral com outra sociedade.[...]Em segundo lugar,
as instituições no Brasil, porque se elas – elas são inteligentes, mas se elas forem muito inteligentes elas
podem aproveitar esse, todo esse material que está voltando do exterior, para rediscutir seus processos e
procedimentos internos, que eu considero atrasado.[...] O parceiro internacional é importante como
instrumento, não é um ator assim[..] Porque nós contratamos, são pessoas, então eles tem interesse, então
colocaria como 4 ou 5 na escala. Para construção de uma política o programa é 3 lugar.” (CNPq).
Acerca da participação das instituições brasileiras na criação do programa, a participação foi
pequena, o programa foi de “cima para baixo”, uma decisão. [...] Isso é o egoísmo das instituições [...] Você
vê como eles estão olhando para o próprio umbigo, isso é uma atitude típica da universidade brasileira hoje,
de algumas, olhar para o umbigo dela, não olha para o Brasil como um todo. E o programa vem olhar para o
Brasil como um todo [...] (CNPq).
Por quê?
“Eu ouvi falar que teria sido uma provocação do presidente americano à presidenta Dilma numa
reunião que ele teve aqui no Brasil, ele fez uma visita no Brasil.[...] a criação do programa já estava sendo de
certa forma gestada quando o presidente visitou, estava em discussão essa questão de abrir mais [...]Então, já
estava sendo discutido isso, com a vinda do presidente Obama houve uma provocação extra que redundou
nestas 100 mil bolsas.”(CNPq).
Em síntese, o relato do ponto de vista do CNPq sobre a criação do Programa CsF
evidenciou que o mesmo possui uma magnitude em termos numéricos de bolsas; que o
destino prioritário são os EUA; que a priorização de áreas foi uma atitude corajosa da
presidente e uma decisão governamental imposta aos sujeitos executores; e que o programa é
fundamental. Considera, ainda, que tem como escala de beneficiados: 1.bolsista; 2. instituição
brasileira; 3. a política de internacionalização da educação superior brasileira; e 4 ou 5 as
instituições parceiras internacionais. O representante faz um adendo no sentido de que as
instituições brasileiras tiveram pouca participação na criação do programa e as classifica
como “egoístas” por não olharem o Brasil como um todo. E, por fim, acerca do por quê o
programa foi criado, assevera que teria sido por uma provação do presidente Barack Obama à
Dilma Rousseff.
148
Ao focalizar a categoria concepção/criação/ponto de vista, assinalamos a
convergência dos entrevistados em considerar a magnitude do programa, a necessidade de
priorização de áreas para atender a demanda reprimida de formação de quadros das “ciências
duras” e tecnológicas, considerando a lógica do sistema capitalista. Igualmente, os
entrevistados corroboram que a criação do programa foi motivada pela provocação dos EUA,
e também pelo isolamento do Brasil em suas relações internacionais. Porém, identificamos
divergência na escala de prioridade dos beneficiados do Programa CsF, sendo possível assim
sintetizar:
UFMT: 1. instituições parceiras internacionais; 2. instituição brasileira e bolsista e 3.
a política de internacionalização da educação superior brasileira.
SESU: 1. instituições parceiras internacionais; 1. instituição brasileira; 1. bolsista e 1.
a política de internacionalização da educação superior brasileira.
CNPq: 1.bolsista; 2. instituição brasileira; 3. a política de internacionalização da
educação superior brasileira; e 4 ou 5 as instituições parceiras internacionais.
Evidenciamos que cada representante, ao indicar os beneficiados, possui um olhar
institucional diferente, que, inclusive, pode decorrer da falta de uma política pública definida
acerca do tema em questão.
Continuamos nossa exposição, desta vez, na categoria implementação/fragilidades.
Inicialmente, buscamos unir os depoimentos por temática afim, estabelecendo: 1.
planejamento e gestão; 2. vínculo institucional; 3. priorização de áreas; 4 . avaliação
institucional; 5. conhecimento de língua estrangeira; e, 6. adaptação psicológica.
1. Planejamento e gestão
Então, é um programa que foi mal planejado, eu diria também que ele foi mal concebido, que os
operadores que somos nós, não fomos ouvidos. Ele tem uma série de erros na implementação, a gente vê que
há uma concentração de poder na CAPES e no CNPq e não precisava ser assim. [...] O programa se deu de
uma forma bastante atribulada, não só na UFMT, mas no Brasil todo [...] As agências se comunicavam
diretamente com os estudantes e não conosco, então foi uma série de atropelos por causa da meta ambiciosa e
do prazo curto imposto pelo governo. Nós éramos chamados a Brasília [...] onde eles se limitavam a ler edital
para nós [...] Você imagina algumas universidades (que não foram poucas) que não tinham experiência
nenhuma com isso. Isso caiu com todo atropelo que foi o início do CsF,[...] nós tivemos muita dor de cabeça
pela forma como o programa foi implementado, imagina as outras universidades.[...] Ele apesar de dar
visibilidade a nossas IES, atropela muito o nosso trabalho, passou por cima, patrolou o que a gente já fazia. A
minha avaliação negativa é no aspecto da gestão. (UFMT).
“[...] porque ele é centralizado nas duas agências” (SESU).
149
“Na verdade, o que nós encontramos aqui, um programa dessa dimensão, que não existia, e você
colocar 100 mil pessoas, 100 mil bolsas, os problemas que nós tivemos foi praticamente nada.” (SESU)
“Nós estamos atrasados com relação a internacionalização.” (CNPq).
“A participação foi pequena, o programa foi de “cima para baixo”, uma decisão.[...] Eu diria que
para um segundo momento, a gente tem que melhorar muito a participação das instituições, estar mais junto
do programa, discutindo mais com elas as formas[...]” (CNPq).
2. Vínculo institucional
[...] eu acho que ele não cria vínculos entre as instituições [...] vínculo institucional que é aquilo
que realmente traria, sob o ponto de visto de uma política de internacionalização universitária. [...] O CsF
não está nos trazendo isso, pelo contrário, o CsF evita isso, na medida em que aquelas universidades, que
alguns anos atrás estariam dispostas a firmar convênio conosco, hoje não querem mais, porque preferem
receber um aluno CsF que paga taxa administrativa [...]E o que nós vemos hoje é que as universidades não
querem mais esse tipo de convênio porque elas querem a taxa. [...] Vou começar pelo “ não ganhos”, esses
são os convênios e as parceria que nós poderíamos estabelecer. O governo fala que o estudante vai para fora,
criar vínculos, cria laços, que bom! Mas que bom se a instituição que ele estuda também pudesse criar esses
laços, que seriam mais duradouros, para que a instituição também se internacionalizasse (UFMT).
3. Priorização de áreas
“[...] humanidades prestam um serviço à sociedade, no sentido de que a universidade é a única
instituição que a sociedade paga para criticar ela própria, e quem faz isso, são as humanidades, o programa
peca desse lado.” (UFMT).
“É priorizou-se onde nós tínhamos fragilidades, nas ciências ditas duras, tecnologias, saúde,
ciências da informação, engenharias, porque nós não temos programas em número suficiente, abrangência
suficiente, com padrão internacional que permitissem receber todos esses estudantes e pesquisadores”.
(SESU).
4. Avaliação institucional
Prejuízo? teve sim. Vamos ver como é que o MEC vai avaliar as universidades. Um [dos critérios de
avaliação] é o tempo de permanência dos alunos [para integralização curricular]. Eu espero que o atraso na
colação de grau dos alunos CsF[não seja considerado] para não prejudicar os indicadores da universidade
junto ao MEC. (UFMT).
“Para a instituição que representa, obviamente que ela é beneficiada, e aqui cabe um parêntese (
nós estamos enfrentando bons problemas)[...]Então, quer dizer, o que inicialmente, parece um problema é um
bom problema no sentido de que cabe a nós, nossas universidades, conhecerem, fazerem uma avaliação do
que nós fazemos aqui, e nós nos ajustarmos a essa maneira mais independente, mais ativa do estudante, do
que o que nos temos hoje e em muitos casos que o estudante é um participante, se pode dizer assim,
passivo.”(SESU).
“Eu fui professor universitário, e sei que a universidade não diferencia muito do tempo que eu
deixei a universidade não, está do mesmo jeito, parecendo a mesma coisa. Tem algumas ilhas de excelência
etc, mas na média quadro e giz, aluno sentado, tendo centenas de aulas durante uma semana, sem
oportunidade de ser criativo[...]” (CNPq).
5. Conhecimento de língua estrangeira
“Primeira delas, nós brasileiros não falamos uma segunda língua” (SESU).
“[...] com todas as dificuldades de língua, de logística, duas agencias CAPES e CNPq assumindo o
compromisso, que significou para as duas um trabalho imenso e ainda significa, tiveram que receber um
reforço na sua estrutura, então foi um desafio grande” (SESU).
6. Adaptação psicológica
150
“[...] é evidente que algum problema você vai ter,...sempre tem um problema de adaptação
psicológica, o impacto da língua que você não domina, algum problema de saúde.” (SESU).
De forma geral, podemos notar que as fragilidades do Programa CsF surgem com
falhas em seu planejamento e gestão, consequentemente, em sua implementação, fato
comprovado também pelas análises documentais já exploradas.
A questão da falta de vínculo institucional entre as instituições de ensino brasileiras e
estrangeiras é ressaltada apenas pelo representante da UFMT, não sendo objeto de análise por
parte dos representantes de instituições idealizadoras e gestoras, SESU e CNPq. Aliás, pelo
CNPq, isso é uma reivindicação “egoísta” por parte das instituições brasileiras.
A priorização de área é considerada fragilidade por não incluir as humanidades e
pelo Brasil não ter programa suficiente para atender a demanda de todas as áreas.
A avaliação institucional é cogitada como fragilidade no sentido de que as
instituições brasileiras precisam repensar seus processos para se aproximarem do que os
entrevistados da SESU e CNPq consideram de “excelência”, ou seja, a forma como são
geridas as instituições estrangeiras. Com relação ao representante da UFMT, é no sentido de
como a instituição brasileira será avaliada pelo MEC no quesito permanência do estudante, já
que o bolsista CsF tem grandes chances de atrasar a integralização curricular, segundo o
entrevistado.
Também é suscitada a fragilidade do conhecimento de línguas estrangeiras por parte
dos bolsistas, bem como a falta de estrutura e logística por parte das agências executoras do
programa, além da citação de possíveis problemas de adaptação psicológicas por parte dos
bolsistas no exterior.
Todas essas fragilidades estão presentes na descrição da fisionomia e funcionamento
do Programa CsF, retratando a forma abrupta da sua criação, sem planejamento, imposta às
agências CAPES e CNPq, com desencontros de informações entre as agências, as
universidades e os bolsistas, sendo necessário que a Presidência da República tomasse para si
a responsabilidade de definir papéis e funções instituindo, oficialmente, o Programa CsF
somente seis meses após seu lançamento. Além disso, foram destacados os problemas de
conhecimento de língua estrangeira que provocaram a criação do subprograma Inglês sem
Fronteiras e, ainda, a falta de diálogo dos órgãos do MEC com as instituições de educação
151
brasileira, conforme também constatado no OF. CGRIFES n. 01/2013 - Conselho de Gestores
de Relações Internacionais das Instituições Federais de Ensino Superior –
CGRIFES/ANDIFES.
Contudo, o Programa CsF também possui pontos fortes, sendo evidenciadas na
categoria implementação/pontos positivos. Também buscamos unir os depoimentos por
temática afim, estabelecendo: 1. expertise da instituição de educação brasileira; 2.
visibilidade; 3. agências: Capes e CNPq; 4. embaixadas e consulados brasileiros; 5.
priorização de área; e, 6. repercussão internacional.
1. Expertise da Instituição de educação superior brasileira
“[...] apoio da administração superior [...] Isso é claro, beneficiou também o CsF, nós tivemos
aumento de equipe, de infraestrutura, enfim, se você comparar hoje com 2008 a situação é totalmente
diferente, mas não só por conta do CsF.” (UFMT).
“Resumindo, a experiência da UFMT com outros programas, com outras parcerias foi uma
facilidade para UFMT implementar o Programa CsF.” (UFMT).
2. Visibilidade
“O Programa CsF tem e teve o grande mérito de nos dar visibilidade, às instituições superior
brasileira, passamos a ter visibilidade internacional, o que nos não tínhamos antes, isso é inegável. [...] O
Brasil entrou no mapa mundi da internacionalização. [...] Olha, eu analiso de forma positiva na UFMT
devido a visibilidade que esse programa deu as ações da SECRI e, por conseguinte, ao processo de
internacionalização da universidade.” (UFMT).
3. Agências: CAPES e CNPq
“Realmente a CAPES e o CNPq têm uma equipe de funcionários empenhados, trabalham bastante,
mas eles não têm culpa se a chefia não planejou o programa, isso veio de cima com planejamento a desejar.”
(UFMT).
Olha, eu avalio de uma forma, talvez seja um dos programas mais exitosos do atual governo porque
as duas agências são muito competentes no que fazem, tem experiência consolidada de mandar gente para o
exterior, bons contatos no exterior. Uma das coisas essenciais é a credibilidade das agências, de quem está
mandando, e também a possibilidade de contato que essas duas agências, através dos dois presidentes, tiveram
um êxito muito grande.” (CNPq).
4. Embaixadas e consulados brasileiros
“[...] embaixadas e consulados brasileiros foram espetaculares[...]” (SESU).
5. Priorização de áreas
“Então eu acho que foi um dos pontos fortes do programa: a coragem de determinar prioridades.”
(CNPq).
6. Repercussão internacional
“Nós tivemos oportunidade de receber vários Ministros da Educação aqui, da Ciência e Tecnologia,
eu fui testemunha de vários encontros, todos eles elogiam intensamente. Países que não recebem,
152
reivindicando receber, para serem incluídos no programa. Países querendo conhecer o programa para
replicar na realidade de seu país.” (SESU).
Sintetizando os pontos positivos, fica evidenciado que, apesar da pouca participação
das instituições brasileiras na criação do Programa CsF, sua expertise em atuar com outros
programas de internacionalização facilitou a implementação do CsF. Além, é claro, da
atuação empenhada por parte das agências CAPES e CNPq e das embaixadas e dos
consulados brasileiros. Porém, reiteramos que o ponto forte de destaque foi a visibilidade
conquistada pelo Brasil que “entrou no mapa mundi da internacionalização” (UFMT),
reproduzindo, assim, uma repercussão internacional positiva.
Tais pontos positivos também estão referendados nos efeitos pós-CsF na
exemplificação dada por meio da análise do processo de internacionalização na UFMT
principalmente acerca do seu aumento agressivo nas estatísticas pela mobilidade outgoing.
Finalmente, como última categoria temos a implementação/ perspectivas, com o
objetivo de detectar os desdobramentos futuros de tal programa:
“Vamos ver agora. Eu não posso te falar ainda, como é que isso está e se isso vai impactar porque
eu não duvido muito, conhecendo, infelizmente um pouco a máquina pública brasileira como funciona, que
amanhã a gente sofra algum prejuízo.” (UFMT).
“Aquele estudante que vai fazer mobilidade para fora ele mantem contatos, ele vai ativar este
contatos, vai talvez, fazer uma pós-graduação, vai fazer um mestrado, sobretudo um doutorado.” (SESU).
“[...] a reivindicação para que as humanidades também integrem.” (SESU).
“[...] estamos agora [com] iniciativas outras, idiomas sem fronteiras, a internacionalização da pós-
graduação, o uso de uma segunda disciplina sobretudo o inglês, eventualmente outras, na pós-graduação.”
(SESU).
“[...] claro que com diretrizes claras, dar um pouco mais de autonomia às universidades, para ela
tomar decisões, tipo em que áreas ela acha importante, o que o PDU [Plano de Desenvolvimento
Universitário] daquela universidade está priorizando para o desenvolvimento regional, e mesmo nacional, e
que vai ter um impacto na instituição, na região, esse é um elemento que talvez seja agregado no ano que
vem.” (SESU).
“Sim, nós queremos que vocês recebam nossos estudantes/pesquisadores, mas nós queremos a
contrapartida, que vocês venham e vamos colocar no ar um programa para vocês aprenderem o português,
como nós estamos aprendendo a sua língua.” (SESU).
“O CsF 2.0 inicia no próximo ano[...] Eu diria que para um segundo momento, a gente tem que
melhorar muito a participação das instituições, estar mais junto do programa, discutindo mais com elas as
formas[...]” (CNPq).
Acerca do futuro, temos a confirmação por meio do relato do entrevistado do CNPq
de que o Programa CsF 2.0, lançado em julho de 2014, inicia em 2015. Os relatos mostram
153
que, nesse segundo momento, poderá ser pensada uma forma de melhorar a participação das
instituições brasileiras na implementação do programa, dando-se um pouco mais de
autonomia às universidades. Talvez as humanidades integrem o programa, e, quiçá, haja
requisição de contrapartida aos parceiros internacionais, conforme expõe o representante da
SESU.
Há também, nos relatos feitos, perspectivas acerca do fortalecimento de outras
iniciativas de internacionalização da educação superior, como o Programa Idiomas sem
Fronteiras, a internacionalização na pós-graduação incluindo o retorno dos ex-bolsistas CsF
para fazer a pós-graduação no exterior. Ademais, permanece o receio do representante da
UFMT sobre a forma como as instituições brasileiras serão avaliadas no quesito permanência
de estudantes devido ao possível atraso de integralização curricular dos bolsistas CsF.
Ao longo da análise em busca de elementos para as respostas às questões suscitadas
no início deste capítulo, conseguimos promover aproximações relativas. Em outras palavras,
“um processo de trabalho de aproximações sucessivas da verdade que, por ser histórica,
sempre é relativa.” (FRIGOTTO, 1997, p. 87).
Segundo Silva (2008), a realidade, por ser histórica, está sempre em construção. A
autora ainda cita Frigotto: “ao iniciarmos uma pesquisa dificilmente temos um problema, mas
uma problemática.” (1997, p. 87).
Nesse sentido, os depoimentos coletados parecem atestar, em grande parte, o
apresentando ao longo dos capítulos anteriores, destacando-se, principalmente, o contexto
sócio-político-econômico vigente no Brasil para a criação e a implementação do Programa
CsF.
154
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente dissertação teve como objetivo principal analisar a concepção e a
implementação do Programa Ciência sem Fronteiras, no contexto da política de
internacionalização da educação superior no Brasil.
A partir do estudado, parece-nos que a principal constatação é que não existe uma
política de internacionalização da educação superior plenamente definida no Brasil. Há uma
política em construção, em que os sujeitos envolvidos ainda discutem sobre o assunto,
tentando estabelecer sua posição no embate de forças, no qual o Estado, em última instância,
tem a responsabilidade de estabelecer e manter a política pública, o que o configura como
“[...] um meta-ator das políticas públicas [...]” (HARVEY, 1989, p.174).
Essa constatação parece desestruturar a questão principal norteadora de toda essa
dissertação: Como se caracteriza, em termos de concepção e implementação, o Programa
Ciência Sem Fronteiras, no âmbito da política de internacionalização da educação superior no
Brasil? Assim sendo, se não há política instituída, a reflexão fundamental poderia ser: Qual a
representatividade do Programa CsF na definição da política de internacionalização da
educação superior no Brasil?
O nosso entendimento sobre política pública refere-se a um conjunto intencionado de
ações ou diretrizes sobre determinado tema social com vista a cumprir um objetivo, o que,
geralmente, é realizado pelo Estado.
Vimos que a concepção e a implementação do Programa CsF, mesmo sem expressar
exatamente a política de internacionalização como um todo, traduz posicionamentos e
características as quais esboçam uma ideia consistente de internacionalização. Isso pode ser
demonstrada ao longo da pesquisa documental e também pelos depoimentos dos sujeitos
entrevistados.
Sendo assim, para entender o posicionamento assumido pelo Brasil acerca da
internacionalização da educação superior, é preciso adentrar aos pormenores do Programa
CsF.
A julgar pelo que podemos analisar até então, o Programa CsF atende à lógica do
sistema capitalista, em consonância com os princípios do novo-desenvolvimentismo:
155
crescimento econômico do país e equidade social. Além disso, caracteriza-se como um
elemento fundamental na política de internacionalização da educação superior no Brasil, que,
salientamos novamente, ainda está em construção.
O referido programa fortalece a perspectiva mundial de induzir as instituições de
ensino a priorizar a produção de conhecimento para atendimento à demanda de formação de
quadros de pessoal, principalmente técnicos-cientistas, tendo em vista a demanda de
profissionais altamente qualificados, principalmente nas áreas de ciência, tecnologia e
inovação, com intuito de promover a competividade empresarial brasileira no mundo
globalizado, e, consequentemente, promover o crescimento econômico do país.
Há de se ressaltar que havia instituições de educação brasileiras que já desenvolviam
atividades da internacionalização da educação superior antes do Programa CsF, tendo como
princípios básicos a isenção de taxas acadêmicas e a aproximação com países do mesmo
continente sul-americano ( conforme demonstrado sobre o processo de internacionalização da
UFMT), entretanto, sem o mesmo destaque midiático e de investimentos governamentais
dados ao CsF.
Em relação ao princípio da equidade social, no que concerne ao CsF, a intenção é
elevar o número nacional de profissionais altamente qualificados para que tenham melhores
condições financeiras, ou seja, alto valor no mercado. “Quem sabe aplicar os conhecimentos e
gerenciar os processos que os transformam em riquezas tem grande prestígio social e alto
valor no mercado. Daí decorre o prestígio de áreas tecnológicas [...].” (DIAS SOBRINHO,
2005, p.76/77).
Esse pensamento do governo brasileiro parece estar pautado na explicação de Dias
Sobrinho (2005, p.75):
A divisão internacional entre os ricos e pobres tem agora uma conotação muito
fortemente ligada à globalização capitalista. Não basta aos países ter grandes
riquezas naturais. Não atingirão estágios elevados de desenvolvimento, não terão
futuro, se não investirem consistentemente em formação humana. É a educação que
acrescenta valor à vida humana. Pobreza e exclusão relacionam-se com as
carências de conhecimento e desprovimento dos meios de aquisição de
aprendizagens e informações. Conhecimento e informação atualizados são
instrumentos poderosos de desenvolvimento e de inclusão social (DIAS
SOBRINHO, 2005, p.75, grifo nosso).
Contudo, há de se afirmar que elevar o padrão financeiro de quem detém o
conhecimento implica em excluir aqueles que não se enquadram em tal perfil profissional,
156
característica da sociedade do conhecimento, também explicada por Dias Sobrinho (2005,
p.75): “Entretanto, também não há como omitir os efeitos deletérios da má distribuição das
benesses da globalização, especialmente no que diz respeito ao conhecimento. A sociedade e
a economia do conhecimento incluem e excluem [...].”
Numa leitura questionadora da realidade em foco, podemos interpretar que o discurso
de redenção social via conhecimento e promessa de conduzir a sociedade a um tempo de
prosperidade pode não se sustentar, caso não envolva reformas sociais de caráter abrangente,
a exemplo de uma profunda distribuição de renda e de superação das relações sociais pautadas
na desigualdade social. No que tange à educação, reformas abrangentes implicariam, dentre
outras questões, o pleno acesso à educação superior em instituições formadoras reconhecidas
como referências sociais.
A propósito, Silva (2008, p. 3) resgata análises de Barros (2002) sobre a questão da
produção do conhecimento na atualidade, permitindo-lhe concluir que o mundo está dividido
em blocos que interagem: dos países desenvolvidos ou altamente industrializados, que se
baseiam no crescimento da ciência como principal atividade geradora de conhecimento e na
aplicação da tecnologia ao progresso produtivo e social; a outra, como maioria, dos países
dependentes, onde faltam recursos, instituições, capital humano, legado cultural, provocando
uma incapacidade de gerar conhecimento científico em larga escala. De forma ilustrativa, é
informado que, segundo Barros (2002), em 1995, Estados Unidos, Japão e Europa detinham
74,8% da produção científica mundial, evidenciando a correlação entre a capacidade de
pesquisa e o poder econômico.
Essa análise traz à tona outra característica do Programa CsF que é a sua parceria
com países desenvolvidos, principalmente os EUA, que receberam aproximadamente 30%
dos bolsistas CsF, atendendo o asseverado por Altbach (2001, p.71, apud DIAS SOBRINHO,
2005, p.84): “As nações do Terceiro Mundo são basicamente ‘consumidoras’ de
conhecimento dependentes das nações industrializadas no que respeita à investigação, às
interpretações dos avanços científicos e, em geral, à informação.”
Podemos afirmar que o Brasil está na condição de consumidor de conhecimento
tendo em vista a forma como o CsF foi concebido (ou seja, buscar e referenciar-se no
conhecimento produzido fora do país), e, principalmente, a característica de pagamentos de
taxas acadêmicas internacionais. Para exemplificar, temos o quadro abaixo que demonstra os
157
valores iniciais negociados entre o Programa CsF e os parceiros internacionais, em novembro
de 2011, às vésperas do lançamento das chamadas da 2ª convocação do referido programa.
Quadro 9 - Custo por bolsista/ano do Programa CsF
País Valor/ Ano/ por
Bolsista CsF
Referência
EUA US$35.950 Taxas escolares + Acomodação
Reino Unido £15.000 Taxas escolares + Acomodação + Curso de
Idioma
Alemanha € 2.500 Taxas administrativas + Curso de Idioma
Itália € 2.500 Taxas administrativas + Curso de Idioma
Fonte: Dados organizados pela autora, com base na apresentação “CsF: Um programa especial de
mobilidade internacional em ciência, tecnologia e inovação”, CNPq, novembro de 2011.
Independentemente do valor gasto pelo recurso público nacional, a contradição
básica parece ser a utilização, por parte do programa analisado, do termo internacionalização
da educação superior, que expressa, na verdade, a comercialização da educação. Em outras
palavras, a transnacionalização da educação superior.
Interpretamos, portanto, que a internacionalização da educação superior oculta uma
essência: a transnacionalização. Isso vem no sentido advertido por De Wit (2002, p.114 apud
MUELLER, 2013, p.25) sobre o cuidado que se deve ter no uso do conceito da
internacionalização da educação superior:
[...] à medida que a dimensão internacional da educação superior ganha mais atenção
e reconhecimento, as pessoas tendem a usar o termo da forma que melhor satisfaça
aos seus propósitos. Uma definição mais focada é necessária para ser entendida com
a importância que ela merece. Mesmo se não houver concordância sobre a
definição, a internacionalização precisa ter parâmetros para ser avaliada e, portanto,
contribuir com a educação superior. Este é o motivo pelo qual o uso de uma
definição em construção com uma estrutura conceitual é relevante para
internacionalização do ensino superior (DE WIT 2002, p.114, apud MUELLER,
2013, p.25).
Entendemos que a internacionalização da educação superior deve ter como norteador
o “valor universal do conhecimento”, num processo de troca mútua e solidária, ou seja, de
‘mão dupla’, em busca de soluções para questões globais como fome, doenças,
sustentabilidade etc. Ou até em busca de soluções locais/regionais, que venham a ser
compartilhadas para melhoria da qualidade de vida da sociedade como um todo.
158
Acreditamos que a experiência da cooperação internacional pode desenvolver
habilidades interculturais, ampliação das vertentes do conhecimento acadêmico, visão
holística do saber, larga vivência pessoal e vínculos pessoais e institucionais, podendo
promover maior tolerância entre povos, tanto para o indivíduo participante de uma
modalidade da internacionalização (intercâmbio, pesquisas conjuntas etc.) quanto para as
instituições de educação superior envolvidas no cenário.
Mas a transnacionalização da educação superior pouco traz de resultado aos
partícipes do processo. Trata-se de uma relação comercial de venda de conhecimento e que
depende da habilidade do comprador para ter a certeza que está comprando o produto ideal
para suas necessidades.
Esse fato pode ser demonstrado pela característica do Programa CsF, que, pela
avaliação do representante da instituição de educação superior entrevistado, pouco trouxe de
resultado institucional por tratar sobremaneira da mobilidade outgoing, em detrimento de
outras tantas modalidades possíveis do processo de internacionalização da educação superior.
Segundo o entrevistado: “O governo fala que o estudante vai para fora, criar vínculos, cria laços, que
bom! Mas que bom se a instituição que ele estuda também pudesse criar esses laços, que seriam mais
duradouros, para que a instituição também se internacionalizasse.” (UFMT).
A partir desse conjunto, analisamos que a internacionalização da educação superior
no Brasil, na perspectiva do que se apresenta no Programa CsF, tende a negligenciar a
solidariedade mútua para se constituir em estratégia para o fortalecimento do modelo político-
econômico vigente, posicionando-se em termos de relações internacionais com a essência da
transnacionalização da educação superior.
Em tal perspectiva, resta-nos questionar: será que, assumindo essa posição, o Brasil
poderá efetivamente vencer as barreiras das desigualdades que o caracterizam socialmente,
além de potencializar o crescimento do país e da ciência, avançando na direção dos interesses
societários e da sua autonomia?
159
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172
APÊNDICE A
Roteiro para entrevista com Representante da SECRI- UFMT
1) O que entende por internacionalização da educação superior?
2) O Brasil tem colocado a internacionalização da educação superior como prioridade em
sua agenda? Por quê?
3) O Brasil possui uma política de internacionalização da educação superior?
3.1 Caso sim, pautada em que aspectos fundamentais?
3.2 Caso responda que não, considera importante criá-la? Por quê?
4) Como se caracteriza, em termos de concepção, o Programa Ciências Sem Fronteiras
(CsF), no âmbito da política de internacionalização da educação superior no Brasil?
Considera que o CsF é o programa fundamental desta política?
5) Como avalia a implementação do Programa CsF para cumprimento da meta
estabelecida de fornecimento de mais de 100 mil bolsas em 4 anos (2011 a 2015)?
6) Como vê a priorização de áreas do conhecimento por parte do Programa CsF?
7) Enumere conforme escala prioridade abaixo, como caracteriza o mais beneficiado e o
menos beneficiado com a criação e implementação do Programa CsF e justifique sua
escolha:
1 – Prioritário 2- Mediano 3 – Menos que a média 4- Menos prioritário
______ para a instituição que representa;
______ para o bolsista do programa;
______ para o parceiro internacional:
______ para a política de internacionalização da educação superior no Brasil:
Justifique sua escolha:
8) Como se deu o processo de adesão e implementação do Programa CsF pela UFMT?
Quais foram os gargalos e as facilidades?
9) Quais são os benefícios, prejuízos ou não ganho por parte da UFMT na implementação
do Programa CsF considerando o processo de internacionalização desta IFES?
10) Como avalia de modo geral, em termos de concepção e implementação, o Programa
CsF, no âmbito da política de internacionalização da UFMT?
173
APÊNDICE B
Roteiro para entrevista com Representante do SESU-MEC
1) O que entende por internacionalização da educação superior?
2) O Brasil tem colocado a internacionalização da educação superior como prioridade em
sua agenda? Por quê?
3) O Brasil possui uma política de internacionalização da educação superior?
2.1 Caso sim, pautada em que aspectos fundamentais?
2.2 Caso responda que não, considera importante criá-la? Por quê?
4) O Brasil se inspira ou se inspirou em modelos de outros países para conceber a sua
política ou as suas ações de internacionalização da ES?
5) Em setembro de 2013, enquanto representante da UFMT, participei da Oficina sobre a
Internacionalização da Educação Superior, convocada pela SESU/MEC,o qual teve
como resultado um material de diagnóstico da atual situação da internacionalização da
educação superior nas universidades públicas do Brasil, objetivando auxiliar as decisões
futuras do MEC. Quais foram os desdobramentos após esta oficina?
6) Como se caracteriza, em termos de concepção, o Programa Ciências Sem Fronteiras
(CsF), no âmbito da política de internacionalização da educação superior no Brasil?
7) Como se chegou ao número de mais de 100 mil bolsas, em 4 anos, para áreas
tecnológicas? Houve algum estudo prévio para exiguidade desta meta?
8) Como avalia a implementação do Programa CsF para cumprimento da meta
estabelecida de mais de 100 mil bolsas em 4 anos (2011 a 2015)?
9) Como vê a priorização de áreas do conhecimento por parte do Programa CsF?
10) Enumere a escala de prioridade conforme o quadro abaixo, como caracteriza o mais
beneficiado e o menos beneficiado com a criação e implementação do Programa
Ciências sem Fronteiras e justifique sua escolha:
1 – Prioritário 2- Mediano 3 – Menos que a média 4- Menos prioritário
______ para a instituição que representa;
______ para o bolsista do programa;
______ para o parceiro internacional:
______ para a política de internacionalização da educação superior no Brasil
Justifique sua escolha:
11) Considera que o CsF é o programa fundamental da política de internacionalização do
pais?
174
APÊNDICE C
Roteiro para entrevista com Representante do CNPq
1) O que entende por internacionalização da educação superior?
2) O Brasil tem colocado a internacionalização da educação superior como prioridade em
sua agenda? Por quê?
3) O Brasil possui uma política de internacionalização da educação superior?
2.3 Caso sim, pautada em que aspectos fundamentais?
2.4 Caso responda que não, considera importante criá-la? Por quê?
4) O Brasil se inspira ou se inspirou em modelos de outros países para conceber a sua
política ou as suas ações de internacionalização da ES?
5) Como se caracteriza, em termos de concepção, o Programa Ciências Sem Fronteiras
(CsF), no âmbito da política de internacionalização da educação superior no Brasil?
6) Como se chegou ao número de mais de 100 mil bolsas, em 4 anos, para áreas
tecnológicas? Houve algum estudo prévio para exiguidade desta meta?
7) Como avalia a implementação do Programa CsF para cumprimento da meta
estabelecida de mais de 100 mil bolsas em 4 anos (2011 a 2015)?
8) Como vê a priorização de áreas do conhecimento por parte do Programa CsF?
9) Enumere a escala de prioridade conforme o quadro abaixo, como caracteriza o mais
beneficiado e o menos beneficiado com a criação e implementação do Programa
Ciências sem Fronteiras e justifique sua escolha:
1 – Prioritário 2- Mediano 3 – Menos que a média 4- Menos prioritário
______ para a instituição que representa;
______ para o bolsista do programa;
______ para o parceiro internacional:
______ para a política de internacionalização da educação superior no Brasil
Justifique sua escolha:
10) Considera que o CsF é o programa fundamental da política de internacionalização do
pais?