UNIVERSIDADE DE RIBEIRÃO PRETO
INQUÉRITO CIVIL E A DEFESA DOS INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
LEONARDO MIALICHI
Ribeirão Preto
2009
LEONARDO MIALICHI
INQUÉRITO CIVIL E A DEFESA DOS INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
Dissertação apresentada à banca examinadora da Universidade de Ribeirão Preto, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito.
Orientador: Prof. Dr. Sebastião Sergio da Silveira.
RIBEIRÃO PRETO
2009
Ficha catalográfica preparada pelo Centro de Processamento Técnico da Biblioteca Central da UNAERP
- Universidade de Ribeirão Preto -
Mialichi, Leonardo, 1978 -
M618i Inquérito civil e a defesa dos interesses individuais homogêneos /
Leonardo Mialichi. - - Ribeirão Preto, 2010.
101 f. Orientador: Prof. Dr. Sebastião Sergio da Silveira.
Monografia (graduação) - Universidade de Ribeirão Preto, UNAERP, Direito. Ribeirão Preto, 2010.
1. Direito. 2. Ministério Público. 3. Direito coletivo. 4.
Direito
LEONARDO MIALICHI
INQUÉRITO CIVIL E A DEFESA DOS DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
Dissertação apresentada à banca examinadora da Universidade de Ribeirão Preto, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito, sob a orientação do Prof. Dr. Sebastião Sergio da Silveira.
Nota:______
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________ Orientador: professor Dr. Sebastião Sergio da Silveira.
Universidade de Ribeirão Preto
____________________________________________
Professor Dr. Universidade de Ribeirão Preto
____________________________________________ Professor Dr. Universidade de Ribeirão Preto
Ribeirão Preto, 2009
AGRADECIMENTOS
Ao professor Mestre Doutor. Sebastião
Sergio da Silveira, pela orientação e
importante contribuição no presente
trabalho.
A minha família pelo constante apoio.
Ao professor Doutor Luiz Manoel Gomes
Junior, meu amigo, jurista que sem sombra
de dúvidas contribui e sempre contribuirá
de modo ímpar e excepcional para a ciência
jurídica.
Aos meus sócios do escritório Mascaro,
Rossi e Berto, Alysson Leandro Mascaro,
Luis Antonio Rossi, Alexandre Fontana
Berto, Fabio Rossi e Alex Antonio
Mascaro, meu muito obrigado.
A advogada Ketri Daniela Damianci,
mulher especial, pelo constante apoio e
pela imensurável ajuda.
A todos aqueles que de certa forma
fizeram torcida pelo êxito desse trabalho.
Aos meus alunos, do Instituto Municipal
de Ensino Superior de Catanduva.
Abrir uma clareira no Direito, desocultar caminhos, descobrir as sendas encobertas... É este o desafio! Numa palavra, é na abertura da clareira, no aberto para tudo que se apresenta e ausenta, é que se possibilitará que a Constituição se mostre como ela mesma, que se revele e se mostre em si mesma, enquanto fenômeno, enfim, como algo que constituí, deixando vir à presença o ente (constitucional/ constitucionalizado) no seu ser (isto é, em seu estado descoberto), conduzindo o discurso jurídico ao próprio Direito, desocultando-o, deixando-o visível.
Lenio Luis Streck
RESUMO
A Constituição Federal de 1988 reservou um capítulo próprio ao Ministério
Público, dispondo sobre as atribuições que lhe são próprias, entre as quais a legitimidade
para a propositura do inquérito civil. O inquérito civil é um instrumento constitucional,
colocado a disposição do Ministério Público para a proteção dos direitos difusos, coletivos
e em alguns casos os individuais homogêneos. Com ele o órgão do Ministério Público, de
forma responsável, exerce uma de suas principais atribuições previsto na Constituição,
como instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado, e, em defesa da
ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
A legislação que a disciplina, confere ao Ministério Público, a possibilidade de efetuar
recomendações, celebrar compromissos de ajustamento de conduta, realizar perícias,
expedir notificações, produzir toda e qualquer prova licita, apta a desvendar a verdade dos
fatos levados ao órgão, como fato lesionador de interesse social, difuso, coletivo e
individual homogêneo. Poderá ainda ao seu término, dar substrato ao mesmo para que
possa promover a Ação Civil Pública, instrumento destinado a coibir abusos e obrigar
aqueles que feriram direitos amparados pelo regime jurídico brasileiro. Assim, insta
observar que o inquérito civil adquire grande importância e eficácia na proteção dos
direitos supra-individuais, uma vez que por seu intermédio se solucione conflitos de massa,
o amparo dos direitos da coletividade, e a proteção ao patrimônio público, sendo
atualmente principal objetivo do Ministério Público, razão maior para ter ao alcance o
procedimento do inquérito civil.
Palavras chave: Direitos homogêneos, inquérito civil, Ministério Publico, interesse social, direito difuso, coletivo e individual homogêneo.
ABSTRACT
The civil inquiry is, without shade of doubts, one of the best and more efficient
instruments constitutional, placed the disposal of the Public prosecution service for the
protection of the diffuse, collective rights and in some individual cases the homogeneous
ones. With it the agency of the Public prosecution service, responsible form, exerts one of
its main attributions constitutional as permanent, essential institution to the jurisdictional
function of the State, in defense of the jurisprudence, the democratic system and
unavailable the social and individual interests. The legislation confers to the Public
prosecution service, the possibility to effect recommendations, to celebrate commitments of
behavior adjustment, to carry through perícias, to forward notifications, to produce all and
any test bids, apt to unmask the truth of the facts taken to the agency, as lesionador fact of
social, diffuse and collective interest. It will still be able to its ending, to give to substratum
to the Public prosecution service, so that it can promote the Civil action Public, destined
instrument to restrain abuses and to compel those that of certain form, had wounded rights
supported for the Brazilian legal regimen.
Key Words: Rights homogeneous, civil investigation, prosecution, social interest, right diffuse, collective and individual homogeneous
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................................07 1- ORIGEM, CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA............... ...........................................09 1.1 Conceito e Natureza Jurídica .................................................................................................11 2. DOS PRINCÍPIOS INFORMATIVOS DO INQUÉRITO CIVIL ..... ................................15 2.1 – Princípio Do Devido Processo Legal ..................................................................................16 2.2 – Do Princípio da Legalidade..................................................................................................17 2.3 – Princípio da Impessoalidade ................................................................................................19 2.4 – Princípio da Publicidade ......................................................................................................21 2.5 – Princípio da Moralidade.......................................................................................................24 2.6 – Princípio da Eficiência .........................................................................................................26 2.7 – Princípio da Motivação ........................................................................................................27 2.8 – Princípio da Razoabilidade .................................................................................................28 2.9 – Princípios informativos do processo Coletivo ....................................................................30 2.9.1 - Princípio do interesse jurisdicional no conhecimento do mérito do processo coletivo.....30 2.9.2 - Princípio da Máxima Prioridade Jurisdicional da Tutela Jurisdicional Coletiva...............31 2.9.3 - Princípio da Disponibilidade Motivada da Ação Coletiva ................................................31 2.9.4 - Principio da Legitimidade Ativa Concorrente ou Pluralista.............................................32 3. DA INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO CIVIL ............. ...................................................34 3.1- Instrução.................................................................................................................................40 3.2 -Poder de Requisição ..............................................................................................................41 3-Das provas ilícitas e a atuação do Ministério Público ...............................................................50 3.4 - O Contraditório .....................................................................................................................55 3.5 - A Condenação do Ministério Público nas Penas de Litigância de Má-Fé e sua responsabilidade............................................................................................................................59 3.6 – Recursos no Inquérito Civil ................................................................................................62 3.7 - Arquivamento e seus efeitos.................................................................................................64 3.8- Compromisso de Ajustamento de Conduta ...........................................................................69 3.9- Projeto de Lei que altera a Lei n.º 7.347/1985 em relação ao Inquérito Civil.......................80 4. – O INQUÉRITO CIVIL E A DEFESA DOS DIREITOS INDIVIDUA IS HOMOGÊNEOS ........................................................................................................................83 Conclusão.....................................................................................................................................98
Bibliografia ..................................................................................................................................101
INTRODUÇÃO
Incluído no ordenamento jurídico brasileiro com o advento da Lei Federal n.º
7.347/1985, o inquérito civil é autêntico instrumento de defesa da cidadania e dos direitos
de massa, cuja disposição se encontra na Constituição Federal de 1988, no artigo 129,
inciso III.
A utilidade do instituto é inegável e decorre da sua finalidade, que é a de
possibilitar ao Ministério Público o suficiente domínio dos fatos que impliquem no seu
dever de cumprir as missões que lhe foram atribuídas pela Constituição Federal em nome
da coletividade, viabilizando não só a segurança da formação ou da expressão da sua
vontade enquanto órgão público, e assim o exercício responsável da ação civil pública,
como também, e, principalmente, a correta defesa dos interesses sociais, individuais
indisponíveis e individuais homogêneos com o máximo cuidado pelo efetivo respeito aos
Poderes Públicos e aos serviços de relevância pública, direitos esses, assegurados na
Constituição.
Rompendo com a tradição de separação das funções investigatória e acusatória,
o instituto, que impulsionou a alteração do perfil institucional do Ministério Público,
presente no ambiente jurídico nacional, merece um cuidadoso estudo para aquilatar não
somente sua importância, mas para dimensionar seu alcance, seus requisitos e
características, bem como, sua função e seu futuro à luz do cotejo com os princípios
jurídico-constitucionais.
Vários estudos e obras têm sido apresentados sobre o instituto no seio de
respeitáveis análises sobre a tutela dos interesses difusos, coletivos e individuais
homogêneos, mas o exercício cada vez mais intenso da ação civil pública tem suscitado
novas questões que merecem apreciação, notadamente as que se referem à extensão e os
limites dos poderes instrutórios do Ministério Público, e o valor que os elementos de
convicção obtidos por estes meios terão no processo.
Levando em conta que o inquérito civil é um instrumento de atuação do
Ministério Público e suas diversas atribuições, a dissertação se aterá mais aos aspectos
estruturais do instituto e sua aplicabilidade com relação à defesa dos interesses individuais
homogêneos quando lesados ou ameaçados de lesão, cingindo-se ao estabelecimento de
critérios que legitimem sua instauração e instrução, fazendo-se ao final uma analise sobre o
compromisso de ajustamento de conduta, que por sua importância pode ser objeto de
trabalho especifico.
Com a finalidade de conferir uma maior dinâmica as posturas teóricas-
doutrinárias sobre o tema, procurou-se dirigir uma importante atenção aos pronunciamentos
jurisprudenciais com relação à natureza do inquérito civil, os poderes investigatórios do
Ministério Público e seu campo de atuação. Levando-se em consideração, assim, a
efetividade dos conceitos teóricos à aplicação prática do Direito. O presente trabalho
principia com a exposição da origem, do conceito, da evolução e da natureza jurídica do
inquérito civil e, em seguida, a identificação de seu regime jurídico pela evocação dos
princípios jurídicos que o informa como procedimento administrativo. Nesse percurso será
abordada a projeção dos princípios constitucionais da atividade administrativa, não obstante
a natureza inquisitiva do instituto, assim como a compreensão de princípios particulares do
instituto.
Fixadas estas premissas, a matéria será destacada para análise da instauração do
inquérito civil envolvendo entre outros assuntos a exclusividade do Ministério Público, os
requisitos e condições da instauração, seus efeitos e necessidade de controle. Após terá hora
vez a instrução do inquérito civil dimensionando poderes e seus limites e a valia das provas
coligidas.
O instituto do inquérito civil pode gerar a imposição de conseqüências de
interesses alheios diretamente pelo Ministério Público mediante recomendações e
compromissos de ajustamento de conduta ou dar a ignição ao controle judiciário pela ação
civil pública. Não obstante, nem sempre o inquérito civil motivara qualquer dessas
medidas, razão pela qual merecem abordagem sua conclusão. Ou seja, será abordado o
arquivamento do inquérito civil buscando identificar-se a natureza deste ato sujeito ao
reexame obrigatório e seus efeitos e limites. Por fim, cuidar-se-á de dissertar sobre o
instituto incidental do compromisso de ajustamento de conduta como formula de solução
extrajudicial de conflitos de interesses e sua utilização para a defesa dos interesses
individuais homogêneos.
Não se pode olvidar nestas linhas introdutórias que inquérito civil também é
meio de participação popular na Administração Pública, já que o administrado pode
provocar, através de denúncia, que se investiguem lesões, ameaça de lesão e outras
arbitrariedade praticadas contras interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.
É nesse exato contexto que o inquérito civil, meio hábil á proteção de interesses
difusos, coletivos e individuais homogêneos, se apresenta como indispensável fator de
sublimação da cidadania, qualidade que o articula como direito e garantia fundamental.
1- ORIGEM, CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA
O inquérito civil foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro por meio da
Lei da Ação Civil Pública – Lei n. 7.347/1985, legislação essa que legitimou o Ministério
Público para a propositura de ação civil pública, e, em caráter privativo, para “instaurar, sob
sua presidência, inquérito civil” (artigo 8º, parágrafo 1º)1.
Posteriormente veio a ter previsão na Constituição Federal de 1988, no artigo
129, inciso III2. Posteriormente outras normas trataram igualmente do instituto, dentre elas
a Lei dos Portadores de Deficiência, o Estatuto da Criança e do Adolescente, Estatuto das
Cidades, Estatuto do Idoso, dentre outros.
Por sua vez, a Lei 8.625/1993 que regula a Lei Orgânica do Ministério Público,
acompanhando o texto constitucional, especifica como função institucional do Ministério
Público a “instauração de inquérito civil público para a proteção, prevenção e reparação de
danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico,
estético, histórico, turístico, paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e
individuais indisponíveis e homogêneos”.
Todavia, antes da criação do instituto pela Lei da Ação Civil Pública, mesmo
não existindo um instrumento investigativo como é o inquérito civil, o órgão do Ministério
Público já tinha titularidade para a instauração de procedimentos administrativos
inominados para o exercício de suas funções institucionais.
A Lei Complementar n. 40/1981, que estabelecia normas gerais para a
organização do Ministério Público nos Estados, autorizava em seu artigo 15 e incisos, a
realização de diligências para a defesa da ordem pública e dos interesses indisponíveis da
sociedade.
O termo inquérito civil, segundo a literatura jurídica, surgiu no ano de 1980, em
um grupo de estudos criados por Promotores de Justiça do Estado de São Paulo, e liderados
por José Fernando da Silva Lopes que afirma:
O inquérito civil se justificava porque, como órgão do Estado, o Ministério Público, a exemplo do que ocorre com o trabalho da polícia judiciária através do inquérito policial, poderá valer se dos organismos da administração para realizar
1 Artigo 8º § 1º: O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis 2 Artigo 129, inciso III da Constituição Federal: promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.
atividades investigativas preparatórias – inquérito civil – muitas vezes indispensável para colher suficientes elementos de provas.3
Sua criação inspirou-se, no inquérito policial, todavia, não com a finalidade de
angariar elementos para prova de autoria de materialidade delitiva das infrações penais,
mais sim, para colher elementos e investigar fatos que dão relevo à atuação do Ministério
Público, servindo de base à propositura da ação civil pública.
Embora guarde significativas semelhanças com o inquérito policial, com esse
não pode ser confundido. O inquérito policial é presidido por um Delegado de Policia, ao
passo que o inquérito civil, como expressamente afirma o texto legal, é presidido por um
Promotor de Justiça ou um Procurador da República. No inquérito policial, o Ministério
Público investiga indiretamente, no inquérito civil, a investigação é feita diretamente e sob
o comando do Ministério Público. No inquérito policial há interferência judicial e,
inclusive, participação do Ministério Público, enquanto no inquérito civil não há
interferência judicial, que eventualmente só realizará controle de legalidade. Desta forma,
no caso de arquivamento do inquérito civil, o arquivamento é promovido e homologado
pelo próprio Ministério Público, diferentemente do inquérito policial, que passa pelo
requerimento do Ministério Público e homologação do juiz, não podendo o delegado
arquivá-lo ex officio.
Destarte, a finalidade precípua do inquérito policial é apurar infrações
penais, sua respectiva autoria e colher elementos para propositura da ação penal, já o
inquérito civil visa buscar elementos de convicção sobre infrações civis, provas que
embasem a propositura da ação civil pública. A disciplina legal do inquérito encontra-se no
artigo 4º e seguintes do Código de Processo Penal, já a do inquérito civil está nos artigos 8º
e 9º da Lei de Ação Civil Publica.
Assim, como já pronunciou o Superior Tribunal de Justiça:
O inquérito civil é um instrumento de coleta de informações de forma a aclarar, determinar e precisar os fatos denunciados, para que se possa verificar a necessidade ou não de ajuizamento de ação civil pública.4
Com relação a legitimação do Ministério Público após a Constituição Federal
foram editadas também: a Constituição do Estado de São Paulo (artigo 97, parágrafo
único); Lei Complementar Estadual n.º 734/1993, que instituiu a Lei Orgânica Nacional do
Ministério Público do Estado de São Paulo; Lei Federal n.º 8.625/1993, que instituiu a Lei
3 FERRAZ, Antônio Augusto Mello de Camargo. Inquérito Civil : dez anos de um instrumento de cidadania.In: Milaré, Edis (Coord.). Ação Civil Pública, Lei 7.347/85: reminiscências e reflexões após dez anos de aplicação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 62 4 REsp nº 262.186 –MT – relator Ministro Castro Meira, Julg 23/05/2006.
Orgânica Nacional do Ministério Público; e a Lei Complementar n.º 75/1993 que dispõe
sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União.
É certo que todas essas inovações repercutiram no inquérito civil, pois
ampliaram seu objeto não só em relação á proteção dos interesses difusos e coletivos, como
também incluiu o dever de zelar pelo efetivo respeito aos Poderes Públicos e aos serviços
de relevância pública bem como, aos direitos assegurados no ordenamento jurídico vigente,
como meio de possibilitar a defesa dos interesses individuais homogêneos, objeto maior da
presente pesquisa, em perfeita consonância com as atribuições do Ministério Público
estabelecidas pelo artigo 127 da Constituição Federal.
1.1. Conceito e Natureza Jurídica.
Trata- se de procedimento administrativo, de caráter inquisitorial, unilateral e
facultativo, instaurado pelo órgão do Ministério Público para coligir provas e outros
elementos de convicção para propositura da ação civil pública, ou para agilizar celebração
de compromisso de ajustamento de conduta.
Assim na concepção de Motauri Ciocchetti de Souza:
O inquérito civil é um procedimento administrativo de natureza inquisitiva, presidido pelo Ministério Público – MP e que tem por finalidade a coleta de subsídios para eventual propositura de ação civil pública pela instituição5.
Na mesma trilha ensina Hugo Nigro Mazzilli:
O inquérito civil é uma investigação administrativa prévia, presidida pelo Ministério Público, que se destina basicamente a colher elementos de convicção para que o próprio órgão ministerial possa identificar se ocorre circunstância que enseje eventual propositura de ação civil pública6.
Antonio Augusto Mello de Camargo Ferraz7 discorre que o inquérito civil é um
procedimento administrativo de natureza inquisitiva, tendente a recolher elementos de
prova que ensejam o ajuizamento da ação civil pública.
No mesmo diapasão seguem José Rogério Cruz e Tucci8, Rodolfo de Camargo
Mancuso9, José Marcelo Menezes Vigliar10, acordando ter o inquérito civil natureza
5. Ação Civil Pública e Inquérito Civil. São Paulo: Saraiva, 2º.ed, 2005, p.103/104. 6.O Inquérito Civil. São Paulo: Saraiva, 2ª ed, 2000, p. 53. 7 FERRAZ. Antonio Augusto Mello de Camargo. Inquérito Civil: dez anos de um instrumento de cidadania. In Ação Civil Pública. coord. MILARÉ, Edis. São Paulo: RT, 1995. p. 63.
investigatória, cuja função se faz em colheita de provas para assim dar ensejo à ação civil
pública.
Desta feita ressalta-se que o inquérito civil não pode ser instaurado, instruído e
presidido por outras entidades, como as associações e os demais co-legitimados que podem
propor a ação civil pública, a teor do que dispõe o artigo 5º da Lei 7.347/1985, mas
somente pelo órgão do Ministério Público, sendo procedimento administrativo onde não há
acusação, e por isso não possuindo natureza jurisdicional.11
E se assim não fosse, como bem apontado por Luiz Manoel Gomes Junior12, o
inquérito civil sem tais prerrogativas, seria um instituto jurídico totalmente inútil.
O inquérito civil, não é, pressuposto processual para a propositura das ações de
titularidade do Ministério Público, muito menos para a adoção de outras medidas de sua
competência, sua finalidade é apurar os fatos á respeito dos quais, a lei impõe ao Ministério
Público o dever de agir, que, por sua vez permitirá o esclarecimento da situação jurídica
dos responsáveis, para que posteriormente se promova as medidas necessárias à tutela de
interesses difusos e coletivos.
Sua instauração está relacionada ao exercício das funções estatais, entre as quais
as do Ministério Público, que segundo a Constituição Federal, é a defesa da ordem pública,
do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
A função de zelar pela satisfação das necessidades coletivas, dadas como
essenciais á justiça, não direciona que o Ministério Público deva agir somente perante o
Poder Judiciário, mas também fora de seu alcance, como atividade extrajudicial,
administrativa, onde, na grande maioria das vezes obtêm excelentes resultados.
O inquérito civil, como instrumento de colheita de elementos probatórios, não é
requisito essencial e obrigatório para a propositura de ação civil pública. A legislação
vigente não condiciona a propositura de tal ação à realização de mencionado procedimento
investigatório o que, enterra o entendimento de pequena parcela da doutrina que considera
“a instauração como condição de procedibilidade” 13.
8 Código do Consumidor e processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991 p. 32. 9. Ação civil pública em defesa do meio ambiente, do patrimônio cultural e dos consumidores. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 111. 10. Ação Civil Pública. São Paulo: Atlas, 1997. p.82 11 Artigo 5º: Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: I - o Ministério Público; II - a Defensoria Pública; III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; V - a associação que, concomitantemente: a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. 12. Curso de Direito Processual Coletivo. São Paulo: SRS Editora, 2ª edição, 2008, p.252. 13 SMANIO, Gianpaolo Poggio, Interesses Difusos e Coletivos. São Paulo: Atlas. 1999, p. 115.
Aliás, no sentido da indispensabilidade de instauração de inquérito civil para
a propositura de ação civil pública, cabe mencionar a jurisprudência do Tribunal de Justiça
do Estado de São Paulo:
Agravo de Instrumento - Decisão proferida em demanda movida pelo Ministério Público, fundamentada em ato tido como de improbidade administrativa, previsto pela Lei Federal 8.429/92 - Decisão sobre a indisponibilidade dos bens dos réus a respeito da qual já ocorreu preclusão - Litispendência com ação popular inocorrente, pois diversas a causa de pedir e o pedido - Inquérito civil busca apenas informações a respeito da necessidade de ajuizamento do processo, em que será observado o contraditório, motivo porque desnecessário o contraditório na fase inquisitiva, que caracterizaria uma mera contradição - Prescrição inocorrente, no que tange ao ressarcimento dos danos, em vista do disposto no artigo 37, § 5o da Constituição Federal - Legitimidade ativa do Ministério Público, conferida pelo artigo 17 da Lei Federal 8.429/92 - Apesar de incabível a ação civil pública, tal como prevista na Lei Federal 7.347/85, o pedido deve ser deduzido em processo de conhecimento, pelo rito ordinário, em que possível o decreto liminar de indisponibilidade dos bens dos réus, o que foi observado - Recurso não provido. (Al 132.193-5, Avaré, 3a Câmara de Direito Público, rei. Des. Hermes Pinotti, j . 20/6/2000, v.u). “Ação Civil Pública - Propositura sem prévia instauração de inquérito civil - Admissibilidade - Mera faculdade outorgada ao Ministério Público - Instituto que não figura como pressuposto processual - Preliminar rejeitada - Recursos não providos. O inquérito, quer no âmbito civil quer no criminal, embora seja considerado praxe neste último, constitui faculdade para colher as provas necessárias ao ingresso das ações civil ou penal públicas. (Apel. Cível 211.502-1, Sertãozinho, rei. Des. Cambrea Filho, j . 8/3/1995, v.u.).
Como bem apontado por Luiz Roberto Proença, o inquérito civil das definições
acima apontadas, pode se extrair o seguinte: “exclusividade de sua titularidade,
facultatividade de sua instauração, formalidade restrita, e auto executoriedade” 14.
No tocante a titularidade exclusiva, embora os demais co-legitimados terem
recebido da lei a legitimação para propor ação civil pública, somente ao Ministério Público
caberá a instauração e condução do procedimento, isso porque, em razão poder
investigativo que o Ministério Público tem, em virtude de suas funções institucionais, o que
falta aos demais legitimados.
A facultatividade é característica do inquérito civil, pois, não se faz
necessária a sua prévia instauração para a tomada de medidas colocadas a disposição do
Ministério Público para a defesa dos interesses sociais, notadamente a propositura da ação
civil pública.
O Ministério Público possui competência discricionária para a instauração
do inquérito civil, no intuito de colher elementos para a sua convicção. A avaliação das
circunstancias e critérios determinantes para a instauração do inquérito civil, incumbe ao
mesmo, que para tanto deverá considerar as circunstâncias concretas com que se deparar.
É importante salientar que a colheita de elementos para a propositura da ação
civil pública não é a única finalidade do inquérito civil, que também serve como adiante
14. Inquérito Civil . São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001, p.34.
veremos, para aperfeiçoar a celebração de termos de ajustamento de conduta ou a
expedição de recomendação.
Já a formalidade restrita é característica marcante do conceito do inquérito
civil porque não se coaduna com a agilidade e efetividade do instituto. Seria um risco à
efetiva defesa dos interesses sociais impor regras formalistas ao inquérito que impedissem a
rápida propositura de ação civil pública ou a rápida formalização de termo de ajustamento
de conduta caso necessário.
Por fim, importante dizer que é auto-executável porque não depende o
Ministério Público de ajuda de outros órgãos para promover o andamento das investigações
cujo poder investigativo autônomo se representa no poder de requisitar documentos
certidões e informações, realizar perícias e colher depoimentos dentre outras atribuições.
É bem verdade que nem sempre essa regra se aplica. Em alguns casos faz- se
necessária a intervenção do Poder Judiciário, como veremos quando da análise da fase
instrutória do inquérito civil, notadamente quando da obtenção de dados ou documentos
considerados sigilosos.
2- DOS PRINCÍPIOS INFORMATIVOS DO INQUÉRITO CIVIL
Antes de adentrar nos princípios específicos e informativos concernentes ao
inquérito civil, mister trazer o entendimento dos autores sobre a importância dos princípios
para a ordem jurídica.
Para Luis Roberto Barroso “os princípios são normas que espelham a ideologia
contida na norma jurídica como fonte essencial”. Para J.J.Gomes Canotilho 15 os princípios
juntamente com as regras permitem a abertura do direito, constituindo a razão das normas
jurídicas, assim ressaltando:
É a existência de princípios e regras que permitem o direito Constitucional ser um sistema aberto, consagrando valores que fundamentam e justificam a ordem jurídica (...) os princípios tem caráter fundamental no sistema de fontes, pois, são normas que tem papel essencial no ordenamento.16
Miguel Reale 17afirma que “os princípios são verdades fundantes de um sistema
de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas
(...)”
Para Celso Bandeira de Mello 18os princípios “são mandamentos nucleares de
um sistema, sendo alicerce e disposição fundamental que irradia em diferentes normas,
servindo para a sua exata compreensão e inteligência.”
A esse propósito, salutar as lições de Ruy Samuel Espíndola que desta forma
afirma:
Existe unanimidade em se reconhecer aos princípios jurídicos o status conceitual e positivo de norma de direito, de norma jurídica. Os princípios têm positividade, vinculatividade, são normas que obrigam, que tem eficácia positiva sobre comportamentos públicos ou privados, bem como, sobre a aplicação e a interpretação de outras normas. 19
Assim, os princípios são capazes de obter uma estrutura dialógica,
acompanhando as vicissitudes da sociedade e as mudanças da realidade, são os princípios
que balizam toda a estrutura normativa estabelecida no ordenamento jurídico.
15 Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4 ed. ed. Coimbra: Almedina,2000.p.62 16 Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. São Paulo Saraiva, 1999, pág. 147. 17 Lições Preliminares de Direito. São Paulo: Saraiva 1980, p.103. 18 Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000. p.47 19 Conceito de Princípios Constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1999, p. 55
Dessa forma, os princípios são de suma importância na aplicação dos institutos
jurídicos, sobre tudo, quando vem com o escopo fundante de informar e integrar a
interpretação da norma referente a um instituto processual, uma vez, que são dotados de
expressiva carga valorativa, e, por isso, têm o condão de se irradiar sobre todas as normas
jurídicas, funcionando como forma de interpretação das normas existentes.
Não se pode olvidar que os princípios Constitucionais processuais têm papel
efetivo no processo coletivo, e, se tratando de inquérito civil a aplicação dos princípios
constitucionais específicos da atividade administrativa se torna essencial para a propositura
da ação civil pública pelo órgão do Ministério Público, sobretudo na defesa dos direitos
coletivos.
Portanto, ao se buscar uma conceituação para o que sejam os princípios,
acabamos por chegar a uma definição simples, mas abrangente - princípios são proposições
que contém as diretrizes estruturais de determinada ciência, pelos quais seu
desenvolvimento deverá pautar-se.
Os princípios são adstritos a todas as formas de conhecimento filosófico e
científico, influenciando cada ramo do direito, como fonte basilar da norma, não sendo
diferente quanto às normas e procedimentos concernentes ao Inquérito Civil.
Assim, como já ressaltado o inquérito civil é informado por diversos princípios,
cuja observância deverá ser feita pelo órgão do Ministério Público, sob pena de ineficácia
do procedimento, sendo eles: o princípio do devido processo legal, da legalidade, da
impessoalidade, da publicidade, da moralidade, eficiência, motivação e razoabilidade, não
se olvidando também dos princípios informativos do direito coletivo os quais passamos a
expor.
2.1 – Princípio do Devido Processo Legal
Em razão da natureza administrativa do procedimento do Inquérito Civil, o
mesmo está sujeito à obediência aos princípios de direito público dispostos na Constituição
Federal.
Portanto, inicia-se o estudo a partir dos princípios processuais civis inseridos
na Constituição Federal, partindo do princípio do devido processo legal, que representa o
assento ou o núcleo do qual decorrem todos os demais princípios do processo civil.
A recepção positivada e formal do princípio do devido processo legal, pelo
nosso ordenamento jurídico somente ocorreu com o advento da Constituição Federal de
1988. As constituições anteriores nada dispuseram com relação à tal princípio consagrado
na Constituição Federal de 1988, no artigo 5º inciso LV20.
O devido processo legal é considerado um dos mais antigos princípios da
ciência jurídica e não se limita apenas à garantia à ampla defesa do litigante no processo
administrativo ou judicial, mas também na garantia do cidadão de que o Poder Público
agirá observando os preceitos de imparcialidade, moralidade, legalidade e publicidade de
seus atos.
Aponta Nelson Nery Junior21 que, “o princípio fundamental do processo civil,
que entendemos como a base sobre o qual os outros se sustentam, é o devido processo
legal, expressão oriunda da inglesa due process of law”.
O princípio do devido processo legal se encontra albergado sobre outros
princípios como o princípio do processo justo, ou ainda o princípio da inviolabilidade da
defesa em juízo, sendo uma garantia do cidadão, constitucionalmente prevista em beneficio
da coletividade, assegurando tanto o acesso de todos ao poder judiciário como o justo
desenvolvimento processual.
Destarte, importante salientar que o inquérito civil apenas não obedece ao
princípio do contraditório, uma vez, que não possui natureza de processo judicial e nem
administrativo, mas, sim de procedimento com caráter inquisitorial, e, assim como o
inquérito policial, não tem a marca do contraditório, pois, dele não se aplica sanções e nem
se aufere convencimento, mas apenas elementos probatórios.
Todavia, mesmo com tais características, no que tange as outras atribuições do
Ministério Público, por se tratar de órgão público deve observar o princípio do due
processo of law, que está intrinsecamente ligado ao princípio da equidade, uma vez, que o
devido processo legal alude aos imperativos de ordem pública em consonância com a
Constituição, como as garantias da isonomia processual, da bilateralidade dos atos
processuais, da ampla defesa e do contraditório.
2.2 – Do Princípio da Legalidade
O principio da Legalidade está relacionado à idéia de Estado Democrático,
representando o império da lei sobre o Estado encontrando-se expresso no artigo 5º, inciso
20 Artigo 5, LV, CF: “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. 21 Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais. 6 ed. 2001, p. 31.
II, onde garante a liberdade dos cidadãos, quando prevê que ninguém será obrigado a fazer
ou deixar de fazer algo que não seja previsto em lei.22
Igualmente, encontramos o princípio em tela, no artigo 3723, também da Carta
Magna, informador de toda a Administração Pública, assim, o princípio in tela deve ser
interpretado no sentido de que toda e qualquer atividade administrativa é limitada, para que
não atue livremente, para fazer ou deixar de fazer algo de acordo que não esteja vedado em
lei, mas só o que esta autorizar.
O princípio ora objeto de estudo é um princípio jurídico fundamental, originado
de fundamentos políticos, mas, que possui o escopo de dar certeza jurídica, garantindo a
segurança político-legal ao cidadão.
É na legalidade que todo indivíduo encontra o fundamento de todos os seus
direitos e prerrogativas, assim, como todas as suas fontes de deveres, não se confundindo
com legitimidade que diz respeito ao poder de estar em juízo.
Para Alexandre de Moraes “o princípio da legalidade está ligado a certo
comando jurídico”, assim discorrendo:
O princípio da legalidade é comando jurídico que impõe comportamentos forçados provendo uma espécie normativa devidamente elaborada conforme as regras do processo legislativo Constitucional, possuindo uma abrangência ampla, tão mais ampla que o próprio princípio da reserva legal.24
O princípio da legalidade representa integral subordinação do poder publico a
previsão legal, desse modo, na administração esse princípio está vinculado à lei, e na falta
de previsão legal, nenhum ato pode ser realizado, ou seja, só pode ser feito o que a lei
autoriza, portanto, pauta-se pela legislação.
Trata-se, pois, de um verdadeiro limitador da atividade pública administrativa e
judicial, de modo que toda e qualquer decisão emanada deverá ser sempre fundada na lei e
poderão ser sempre revistas, não existindo decisões imunes.
Contudo, cabe ressaltar que em algumas hipóteses há o reconhecimento à
administração o poder de apreciar subjetivamente certos aspectos comportamentais na
realização do ato, uma vez, que a própria lei confere uma margem de atuação
22 Artigo 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I –(...) II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;" 23 Artigo 37. A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de Legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte 24 Direito Constitucional São Paulo: Atlas, 16 ed. 2004, p.71.
discricionária, e essa margem diz respeito a uma liberdade limitada para que o princípio da
legalidade seja respeitado.
Já no inquérito civil a plena validade do procedimento depende da submissão ao
princípio da legalidade, de modo que o Ministério Público só está autorizado a instaurar o
inquérito civil no exercício de sua competência e de suas atribuições conferidos pela
Constituição Federal, bem como, pela legislação infraconstitucional, valendo-se para tanto
dos meios igualmente legais.
Mister, salientar que embora o inquérito civil tenha sido criado como
instrumento funcional de atuação exclusivo do Ministério Público, outros legitimados
podem investigar, sem contudo instaurar ou presidir o inquérito civil , desse modo, mesmo
que a instauração seja dependente de portaria ou despacho ministerial, o promotor de
justiça pode instaurar o inquérito mediante provocação de alguém que o represente.
Outro fator importante é que embora o inquérito civil deva ser precedido de
justa causa e relevância em decorrência da submissão ao princípio da legalidade, não
poderá retroagir para abranger fatos ilícitos no período que já se operou a prescrição, regra
esta contida no art. 23 inc. I e II da Lei 8429/92, assim, passado esse decurso temporal a
competência do Ministério Publico que era extraordinária, passa a ser do ente lesado
através de via própria.
2.3 – Princípio da Impessoalidade
Previsto no art. 37, caput e § 1º, da Constituição Federal, o princípio da
impessoalidade deve ser concebido em uma dupla perspectiva. Em um primeiro sentido,
estatui que o autor dos atos estatais seja o órgão ou a entidade, e não a pessoa do agente.
Já sob outra perspectiva impõe que a administração dispense a todos que estiver
em posição similar igualdade de tratamento pressupondo que os atos praticados gerem os
mesmos efeitos e atinjam a todos os administrados que estejam em idêntica situação fática
ou jurídica, caracterizando a imparcialidade do agente público.
Com isto, busca-se preservar o princípio da isonomia entre os administrados e o
princípio da finalidade, segundo o qual a atividade estatal deve ter sempre por objetivo a
satisfação do interesse público, sendo vedada qualquer prática que busque unicamente a
implementar o interesse particular.
Com este entendimento Hely Lopes Meirelles 25salienta que o princípio da
impessoalidade é aquele que está relacionado ao princípio da finalidade que se divide em
primário e secundário, desta forma dispondo:
O princípio da finalidade se traduz na busca da satisfação do interesse público
que se subdivide em interesse primário e secundário, o primeiro definido como bem geral, o
segundo como o modo pelo qual os órgãos públicos vêem o interesse público.
Seguindo esse entendimento o princípio, ora objeto de estudo é o clássico
princípio da finalidade que impõe ao administrador público o dever de atender o fim legal
do ato, impedindo a promoção pessoal sobre as realizações enquanto administrador.
Desta feita, o princípio da impessoalidade visa à neutralidade, tendo como
objetivo primordial o interesse público, trazendo consigo como elemento principal a
ausência de promoções pessoais e de interesses particulares do administrador que esteja no
exercício de sua atividade.
Celso Bandeira Mello ao discorrer em sua obra sobre o princípio da
impessoalidade assim dispõe:
Que o alcance dos princípios não se restringe a nivelar os cidadãos diante da norma legal posta, mas que a própria lei não pode ser editada em desconformidade com a isonomia. [...] O preceito magno da igualdade, como já tem sido assinalado, é norma voltada quer para o aplicador da lei quer para o próprio legislador.26
Destarte, sendo o Estado uma organização política, não resta duvida de que
todos os atos praticados pela administração ou pelos seus órgãos manter-se-ão fieis ao
ordenamento jurídico, cuja ocorrência contrária fragilizará não só os princípios basilares
dos fundamentos e ideais de uma democracia igualitária, como também a confiança na
realização da justiça.
A impessoalidade ainda pode ser observada sob o prisma de um conteúdo
positivo e negativo, a primeira assegura a neutralidade e a objetividade, elementos que
devem prevalecer em todos os atos da administração, já o segundo indica os limites da
atuação administrativa.
É de suma importância assegurar que o princípio da impessoalidade seja
observado, pois, dele decorre a segurança de tratamento igualitário e não particularizado em
razão de alguma condição específica, vedando à adoção de qualquer tipo de comportamento
administrativo tendente a pessoalidade.
25 Curso de Direito Administrativo, brasileiro, 32ª Ed.Malheiros: 2006 , p.91. 26 Conteúdo Jurídico do princípio da igualdade, 3ª edição, 17ª, tiragem Malheiros: 2007 p. 09.
Para Carmen Lucia Rocha, em seu estudo sobre os princípios administrativos,
chegou à conclusão que:
[...] a impessoalidade tem como conteúdo jurídico o despojamento da pessoa
pública de vontade que lhe seja enxertada pelo agente público, que, se agisse
segundo os seus interesses, subjetivamente definidos, jamais alcançaria aquela
finalidade, que se põe, objetiva, genérica e publicamente. 27
Portanto, pode-se dizer que a neutralidade das atividades administrativas está
representada e inserida no princípio da impessoalidade, cujo objetivo, não se faz outro,
senão, o interesse público, não podendo o administrador proceder de outra forma, criando
ou praticando atos no interesse próprio ou ainda de terceiros.
Ademais, a Constituição elencou ao órgão do Ministério Público o dever de
defender a ordem jurídica e os interesses concernentes ao regime democrático de direito o
que abrange os direitos sociais, bem como, os individuais indisponíveis, e, por força deste
preceito, e, nos princípios elencados como parte integrante da ordem jurídica, destaca-se o
princípio da impessoalidade este de suma importância para o fundamento de validade dos
atos e consecuções dos órgãos, assim como o Ministério Público, que tem o dever de
ajuizar medidas necessárias a realização de suas finalidades, observando a absoluta
neutralidade, se pautando no interesse público sobre as particularidades pessoais sobre tudo
no que tange as investigações, como é o caso do inquérito civil.
2.4 – Princípio da Publicidade
O principio da publicidade é a possibilidade e o direito que qualquer cidadão
tem de se dirigir a qualquer órgão público e requerer cópias e certidões de atos e contratos,
tomando conhecimento dos atos eivados da administração.
O poder Público, como já explanado anteriormente, não pode ter outro
comportamento senão, o de agir com transparência a fim de que todos os que por ele
administrados tenham conhecimentos de seus atos, o que torna proibido o segredo, ou o
sigilo injustificado.
Para melhor elucidar o que seja tornar público é providenciar que o ato venha a
conhecimento público, e de acesso a todos, cumprindo assim seu papel essencial.
27 Princípios Constitucionais da Administração Pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994,p.150.
A Carta Magna é clara ao expressar a publicidade como principio e bem
jurídico no artigo 5º, inciso LX,28 quando preconiza pela regra da publicidade, restringindo
o sigilo somente quanto a defesa da intimidade ou interesse social.
Portanto, vários são os meios assecuratórios previstos pela Constituição para
tutelar e realizar o princípio da publicidade, podendo ser citado como exemplo o Habeas
data, cuja finalidade é a promoção da publicidade dos atos administrativos que geram
armazenamentos de informações privadas do cidadão, que apesar de resguardar interesse do
próprio interessado, não pode ser dele privado.
Portanto, a transparência das atividades públicas visa resguardar a realização do
princípio da publicidade, desta forma, o inquérito Civil como ato administrativo deve
obediência ao princípio constitucional previsto no artigo 37 da CF, qual seja, da
publicidade de seus atos, sobre tudo no que tange ao modo, as audiências designadas para
oitiva de testemunhas, declarações, vistorias e outras diligências, contudo, com a
publicidade efetivada com a publicação no Diário Oficial, com a identificação do
procedimento, do objeto e do órgão investigador.
O respeito ao princípio da publicidade vem ao encontro do objeto de
investigação do inquérito civil que estará voltado para o interesse da sociedade evitando
assim, abusos ou excessos praticados pelos agentes públicos, no caso, o próprio
representante do Ministério Público que oficia no inquérito civil, além de possibilitar um
maior e efetivo controle dos atos administrativos.
Para Diógenes Gasparini “o princípio da Publicidade é um dos fundamentos da
Administração Pública, porque expõe para a fiscalização todo e qualquer ato administrativo
emanado pelo poder público” 29.
Entretanto, em alguns casos essa publicidade acaba sendo mitigada, não
restando absoluta, uma vez, que o Ministério Público no exercício de suas atribuições,
como condutor do inquérito civil, pode dispor sobre o sigilo quando imprescindível a
segurança da sociedade e do Estado, bem como, para impedir a violação da intimidade da
vida privada, da honra e da imagem das pessoas envolvidas. Aplicando -se analogicamente
a disposição prevista no artigo 20 do Código de Processo Penal30 no que se refere ao sigilo
das investigações em sede de inquérito policial.
28 a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem.
29 Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva. 2001, p. 140. 30 Art. 20 - A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.
Para tanto, bastará que o presidente do inquérito civil, de modo fundamentado
exponha as razões que o levaram a impedir que aos atos praticados no inquérito não seja
dada efetiva publicidade.
É notório, aliás, que em alguns casos o sigilo nas investigações é fator que
propicia melhor êxito nos resultados das diligencias, razão pela qual se entende que é de
rigor que o membro do Ministério Público que o preside o imponha em todos os atos nele
inseridos.
Ademais, o fato das investigações caminharem em sigilo, não ofende o
princípio da ampla defesa, posto que, na fase inquisitorial não se aplique o referido
princípio e nem do contraditório, já que não se veicula acusação a quem quer que seja, nem
aplicação de qualquer penalidade.
Vale ressaltar que a submissão do inquérito civil a todos os requisitos exigíveis
aos processos o inviabilizaria como alternativa eficaz de apuração dos desatinos praticados
contra o interesse coletivo, sendo essencial ao Ministério Público a faculdade de apurar,
com desenvoltura e amplitude e quando necessário em segredo os fatos que acharem
merecedores de investigação.
Assim, no caso de possuir elementos ensejadores da propositura de uma ação
civil pública a circunstância de não ter tido acesso pleno a essa fase preparatória não afetará
o que predispõe a exercer em plenitude quando da ação civil pública, momento este
oportuno em que o contraditório e seus consectários se mostrarão imprescindível e
incontornável.
Contudo, há discordâncias entre os autores sobre o sigilo imposto pelo
Ministério Público, como Luiz Manoel Gomes Junior31 entende que às partes envolvidas e
seus advogados regularmente constituídos deve haver amplo acesso, desta forma, mitigando
a faculdade do sigilo prerrogativa do Ministério Público.
Já Hugo Nigro Mazzilli, afirma que:
O presidente do inquérito civil desde que fundamentadamente tenha imposto sigilo as investigações, poderá impedir seja estas acompanhadas por terceiros, inclusive advogados e estagiários, ou limitar acesso destes os determinados atos ou a determinadas peças dos autos.32
Entretanto, o princípio da publicidade preza pela amplitude da publicidade
somente justificando o sigilo como a exceção se o inquérito civil contiver informações
sigilosas que possam ser prejudicadas com a prévia publicidade.
31 Curso de Direito Processual Coletivo. São Paulo: SRS Editora, 2008, p.256. 32 Op. cit. p.230.
O fato de o representante do Ministério Público depois de decretado o sigilo das
investigações impedirem que advogados e terceiros tenham acesso ao conteúdo dos autos,
não fere princípios, tampouco os direitos dos advogados, posto que o Estatuto da Ordem
dos Advogados do Brasil é claro nesse particular33.
Cabe invocar a orientação do Superior Tribunal de Justiça em hipótese de certa
analogia a questão da publicidade aqui debatida:
Se, nos processos judiciais ou administrativos sob o regime de segredo de justiça, o próprio Estatuto da Ordem estabelece restrições ao princípio da publicidade (artigo T, § 1°) com muito mais razão elas devem ocorrer na fase apuratória - momento em que se colhem os primeiros elementos a respeito da infração penal. Esse raciocínio é aplicável mormente nos tempos atuais, em que se expande a macrocriminalidade (tráfico ilícito de entorpecentes, delitos contra o Sistema Financeiro Nacional, praticados por organizações criminosas, lavagem de ativos provenientes de ilícitos, etc). Para combatê-la, o sigilo nas investigações mostra-se vital (Recurso Ordinário em Habeas Corpus 13.360-PR, Rel. Min. GILSON DÍPP, j . 27.5.2003, in RSTJ 184/455).
Pode-se concluir que o principio da publicidade visa a transparência das
atividades públicas, admitindo o sigilo como exceção, contudo a garantia do acesso ao
inquérito, pelo advogado constituído pelo averiguado, estará conferindo segurança jurídica
aos direitos individuais, além da transparência na atuação do representante do Ministério
Público com o controle da legalidade de sua atuação.
2.5 – Princípio da Moralidade
O princípio da moralidade está expresso no direito pátrio com menções no
art.5º, LXXIII e no caput do art. 37, dispondo sobre o dever do administrador além de
seguir o princípio da legalidade, pautar sua conduta pela moral, na busca pela defesa do
interesse público.
Assim, fica evidente a importância do princípio da moralidade no
ordenamento jurídico, pois, uma vez observado que qualquer ação praticada pela
administração não respeitou a moralidade administrativa, fica passiva de anulação,
tratando-se de um requisito de validade dos atos da administração.
Todavia, o princípio da moralidade não deve ser confundido com a moralidade
comum, sendo apenas complementos, já que a moralidade administrativa é composta de
33 Dispõe o artigo 7 inciso XIII da Lei n. 8.906/1994, ser direito do advogado “examinar, em qualquer orgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos.”
regras pautadas na boa administração, não só suscitadas pela distinção entre o bem e o mal,
o legal e o ilegal, o justo e o injusto, mas sim, pela idéia geral de caráter de finalidade do
bem comum.
Deste modo, o princípio da moralidade está intimamente ligado ao princípio da
legalidade, pois, é preciso que o administrador além de obedecer à lei aja em conformidade
com a moralidade administrativa, o que em última análise não basta, o que vale dizer que o
agente administrativo obedeça apenas o que diz a lei, não basta a conformação do ato
administrativo com a lei, é preciso que o agente, além da legalidade, proceda suas
atividades observando a moralidade administrativa, que seria, em última análise, um
controle moral e de suma relevância ao sistema jurídico.
Assim, conclui-se que o princípio da moralidade trata dos padrões éticos, mas
objetivos, que são assimilados e difundidos entre todos, e não apenas uma noção puramente
pessoal, do agente administrativo, cumprindo destacar que o agente público deve sempre
observar o fim do ato, e os valores legais- morais na prática de sua função.
Destarte, toda e qualquer atividade administrativa deve ser desenvolvida
através de uma ordem ética, com o dever de observância aos valores morais, uma vez que a
moralidade, nada mais é do que a correta observância às regras de boa administração, sob
pena de qualificar como improbidade administrativa.
Neste diapasão José Afonso da Silva leciona:
A improbidade administrativa é uma forma de imoralidade administrativa qualificada. Consiste no dever do funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício de suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira fornecer.34
Juarez Freitas em sua obra discorre sobre o princípio da moralidade
asseverando:
No tangente ao princípio da moralidade, por mais que tentem assimilá-lo a outras diretrizes e conquanto experimentando pronunciada afinidade com todos os demais princípios, certo é, que o constituinte brasileiro, com todas as imensas e profundíssimas conseqüências técnicas e hermenêuticas que daí advêm, pretendeu conferir autonomia jurídica ao princípio da moralidade, o qual veda condutas eticamente inaceitáveis e transgressoras do senso moral da sociedade, a ponto de não comportarem condescendência.35
34 Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros. 1998, p. 280. 35 O Controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª Ed.São Paulo: Malheiros Editores, 2009 p.412.
Tal princípio se identifica com a idéia de justiça, ao determinar que se trate a
outrem do mesmo modo que se apreciaria ser tratado, ou seja, a sociedade merece ter
respeitado o direito a ver fundamentado os atos, contratos e procedimentos administrativos
que prescrevem o dever de a Administração Pública observar com pronunciado rigor e
maior objetividade possível cumprindo, de maneira precípua a lealdade e a boa-fé para com
a sociedade, bem como, o combate contra toda e qualquer lesão moral provocada por ações
públicas destituídas de honra probidade.
Mister também salientar a importância do princípio da moralidade como
reforço dos demais na superação da dicotomia entre o direito e a ética, assim, como não há
possibilidade de separar o direito da sociedade, esses elementos devem caminhar juntos.
A construção da teoria do princípio da moralidade está diretamente vinculada
aos freios a serem impostos aos agentes públicos na execução dos poderes discricionários,
surgida e desenvolvida junto à idéia de desvio de poder.
O Ministério Público já que também é órgão administrativo deve em obediência
ao princípio em comento, na condução da investigação pautar-se, pela lealdade,
honestidade e, sobretudo, a moralidade, sem a intenção de perseguir quem quer que seja.
Afrontará o representante do Ministério Público, o princípio da moralidade
todas as vezes que agir visando interesses pessoais, com o fito de tirar proveito para si ou
terceiros ou quando editar atos maliciosos ou desleais, ou exarados com o intuito de
perseguir inimigos ou desafetos políticos quando afrontar a probidade administrativa
agindo com má-fé ou de maneira desleal.
Na condução do inquérito civil, deverá o representante do Ministério Público
que o preside, agir segundo os preceitos da ética, da boa-fé e acima de tudo da
imparcialidade, impedindo e evitando atuações pautadas pela falta de decoro.
Agir com moralidade significa agir dentro de princípios éticos em relação aos
cidadãos e ao patrimônio público que está confiado as mãos do administrador público, em
especial ao órgão do Ministério Público.
2.6 – Princípio da Eficiência
O princípio da eficiência administrativa tem o cunho de estabelecer que toda
ação administrativa tem o dever de se orientar para a finalidade de concretizar
materialmente os cânones da lei conforme os ditames administrativos.
Já Alexandre de Moraes, ressalta que o principio da eficiência tem o escopo de
perseguir o bem comum:
Assim, princípio da eficiência é o que impõe à administração pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, rimando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitarem-se desperdícios e garantir-se maior rentabilidade social.36
Todavia, o que se observa no texto constitucional é que o conceito de eficiência
pressupõe uma interpretação sistemática com outros princípios constitucionais o que enseja
na prestatibilidade e economicidade, ligada a idéia de bom administrador, aquele que age
de forma proba, voltado a uma nova gerencia administrativa.
Hely Lopes Meirelles assevera que:
O dever de eficiência é o mais moderno principio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.37
E Celso Antonio Bandeira de Mello38 ensina que o “princípio de eficiência é o
dever de atuação ótima ou excelente do administrador nas hipóteses de discricionariedade.”
Assim o princípio em comento, é certo, estar intima e diretamente ligado com a
otimização no uso dos meios e com a satisfação dos resultados da administração pública.
Se tratando do órgão do Ministério Público no que tange a observação do
princípio da eficiência, pode-se explicar pela discrionariedade conferida ao mesmo na
condução do inquérito civil obrigando-o a procurar seu convencimento através da escolha
do meio mais eficiente existente à sua disposição no caso concreto.
Portanto, deve o representante do Ministério Público que preside o inquérito
civil, zelar pelo eficaz e rápido andamento das investigações, não deixando que medidas
procrastinatórias sejam adotadas.
2.7 – Princípio da Motivação
36 Reforma Administrativa: Emenda Constitucional nº 19/98. 3. Ed., São Paulo : Atlas, 1999. p.30 37 Direito Administrativo Brasileiro . 20 edição, São Paulo: Malheiros, 1995, p. 90. 38 Op. cit.p.36
O principio da motivação é o dever que tem todo administrador de fundamentar,
motivar seus atos, sendo considerado como um dos mais importantes princípios pelo fato de
que sem motivação não há o devido processo legal, uma vez que a motivação serve como
meio de interpretação do ato.
Portanto, todos os atos advindos da administração devem ser motivados para
que o judiciário possa exercer seu controle quando necessário, no que tange a legalidade do
ato, sendo a motivação de todo e qualquer ato ou decisão administrativa inerente às funções
estatais, já que o que se visa é o interesse público de toda a coletividade.
Desta feita, a motivação decorre do princípio da legalidade, onde todo e
qualquer ato emanado dos agentes públicos e políticos deve trazer consigo a especificação
de sua base legal e de seu motivo.
Walace Paiva Martins Junior ao discorrer sobre o principio da motivação o faz
nos seguintes termos:
A obrigatoriedade da motivação suficiente (ou adequada) que deve expressar a exposição das razões de fato e de direito, a justificativa do juízo valorativo, a exposição das finalidades perseguidas para a solução tomada, mediante uma ponderação reflexiva, correlacional, imparcial, objetiva e racional das situações constatadas, dos preceitos normativos aplicáveis, dos resultados e dos interesses em jogo captados na fase do respectivo processo administrativo, conducentes a aferição da decisão à luz da legalidade em sentido amplo (eficiência, moralidade, razoabilidade e proporcionalidade, publicidade, e etc).39
O princípio da motivação alcança sua importância singular quando em
previsões constitucionais, como em constituições estaduais como a do Estado de São Paulo,
que em seu artigo 111 elenca os princípios do artigo 37 da Constituição Federal ainda o
princípio da motivação , da razoabilidade, finalidade e do interesse público.
Mister enfatizar que em relação às decisões do Poder Judiciário, tanto em
decisões judiciais como nas administrativas e ainda nas disciplinares, a garantia da ampla
defesa é prevista a necessidade de motivação conforme impera o art. 93, incisos IX e X da
Constituição Federal.
Por tudo isso, conclui-se e não poderia ser diferente quanto ao Ministério
Público que fica vinculado aos motivos apresentados no decorrer do inquérito, de modo a
serem controláveis até mesmo pela atuação do Poder Judiciário, devendo todo e qualquer
ato ser fundamentado, salvo por óbvio, os chamados de mero expediente.
39 Transparência Administrativa . São Paulo: Saraiva, 2004, p. 272.
Devendo ainda a todo o momento, especificar quais dispositivos e quais bases
legais se ampararam para instaurar, instruir e concluir o procedimento do inquérito civil,
sob pena de todo trabalho realizado se tornar nulo.
2.8 - Princípio da Razoabilidade.
O princípio da razoabilidade, também chamado de proporcionalidade ou
princípio da adequação ou da adequação dos meios aos fins, é um método usado para
resolver os conflitos quando na ocorrência de colisão entre princípios, oriunda do princípio
do devido processo legal.
O princípio da razoabilidade tem também o escopo de regular a própria norma,
uma vez que o ordenamento jurídico está eivado de normas que organizam seu
processamento e o seu devido regulamento, sendo nas palavras de Hans Kelsen:
O Direito possui a particularidade de regular a sua própria criação. Isso pode operar-se por forma a que uma norma apenas determine o processo por que outra norma é produzida. Mas também é possível que seja determinado ainda -- em certa medida -- o conteúdo da norma a produzir. Como, dado o caráter dinâmico do Direito, uma norma somente é válida porque e na medida em que foi produzida por uma determinada maneira, isto é, pela maneira determinada por uma outra norma, esta outra norma representa o fundamento imediato de validade daquela. A relação entre a norma que regula a produção de uma outra e a norma assim regularmente produzida pode ser figurada pela imagem espacial da supra-infra-ordenação. A norma que regula a produção é a norma superior; a norma produzida segundo as determinações daquela é a norma inferior.40
Todavia, tal princípio não se encontra expressamente previsto sob esta epígrafe
na Constituição de 1988. Isto, contudo, não permite se infira estar este princípio afastado do
sistema constitucional pátrio, posto se pode auferi-lo implicitamente de alguns dispositivos,
bem como, em outras legislações infraconstitucionais
A Constituição do Estado de São Paulo, em seu artigo 111 41e a Lei n.
4.717/1965 em seu artigo 2º42, parágrafo único o explicitam.
40 Teoria pura do direito. Coimbra: Ed. Armênio Amado, 4ª ed., trad. de João Baptista Machado, 1979 41 Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência 42 Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência;) vício de forma; c) ilegalidade do objeto;d) inexistência dos motivos; e) desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas: a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido;e) o desvio de finalidade se verifica quando o
Os direitos individuais e coletivos albergados na Constituição e cerne do Estado
Social e Democrático de Direito não podem ser postergados pelo legislador
infraconstitucional, nem pode este desnaturá-los editando leis que com eles conflitem quer
frontalmente quer por via oblíqua, sob pena de afronta ao princípio da razoabilidade e,
conseqüentemente ao princípio da legalidade.
Na organização do Estado, a proporcionalidade está presente dentre os
requisitos à decretação da intervenção, que em análise ao §3º do artigo 36, atem-se ao fato
da possibilidade da exclusão da intervenção quando observada desarrazoada conforme
explicitado no citado parágrafo.
Na esfera administrativa, o principio da proporcionalidade rege por exemplo a
contratação temporária de funcionários , a qual rege-se pela avaliação de necessidade
conforme o art. 37,IX e XXI,
Já na atuação do Ministério Público o art. 129 assegura que o mesmo tome
medidas necessárias e proporcionais com o cunho de assegurar o respeito aos direitos
constitucionais pelos poderes públicos e seus serviços, e, no inquérito civil, embora não
deva obedecer ao princípio da razoabilidade quando não existirem os fatos em que se
embasou, ou quando os fatos mesmo existentes não guardem nexo lógico com a medida
tomada pelo presidente do inquérito, deve quando da instauração do inquérito obedecer a
racionalidade, coerência, sob pena de ferir o principio da legalidade.
2.9. Princípios informativos do processo coletivo
Além dos princípios constitucionais acima comentados, é importante destacar
ainda, sem esgotar o assunto, alguns dos princípios que norteiam o processo coletivo, estes
de suma importância no que se refere à defesa dos direitos coletivos (lato sensu) nas ações
propostas pelo Ministério Público, sobretudo na atribuição de propositura do inquérito civil.
Para o direito processual, o princípio é toda margem de orientação para o
cumprimento da atividade jurisdicional, cumprindo salientar que os princípios informativos
do processo coletivo são fundamentais para todo o sistema concernente a defesa e
efetividade desses direitos.
Não se podendo olvidar que os princípios são fundamentos lógicos na busca de
meios e medidas eficientes com o escopo de evitar os erros, garantindo a igualdade no
agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.
processo de busca pela justiça, a não violação das liberdades, inspirando o aperfeiçoamento
do sistema como meio de tornar a justiça acessível á todos.
Merece destaque antes de adentrar nos princípios que tangem o processo
coletivo, salientar que estes se regem pelo princípio do devido processo legal, haja vista que
o processo coletivo tem como uma das finalidades servir como instrumento de garantia dos
direitos do cidadão.
2.9.1 – Princípio do interesse jurisdicional no conhecimento do
mérito do processo coletivo
Cabe ao Poder Judiciário fazer valer todos os direitos e garantias fundamentais
previstas no Estado Democrático de Direito com as mudanças sociais, políticas e
econômicas existentes, e, dada as mudanças na sociedade e a globalização, os conflitos
ultrapassaram a barreira da individualidade para então passar a transindividualidade.
Assim, deixou de ser órgão de resolução tão só de conflitos interindividuais e
passou a assumir uma nova e legitima função: a de Poder transformador da realidade do
social43.
Com base nisso é que se criou o principio em tela, onde deverão ser esgotadas
todas as possibilidades para se enfrentar o mérito de toda e qualquer situação que enseje
violação, transgressão a interesse difuso e coletivo.
2.9.2 - Princípio da máxima prioridade jurisdicional da tutela
jurisdicional coletiva
É escopo da tutela coletiva a validação e efetivação dos interesses sociais, da
sociedade como um todo.
Assim, extrai-se que cabe ao Estado, através de instrumentos práticos deve
priorizar o trâmite, para a solução dos processos envolvendo conflitos coletivos que sempre
deverão se sobrepor ao interesse individual, evitando decisões conflitantes, e garantido
celeridade na entrega da tutela jurisdicional.
43 ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito Processual Coletivo Brasileiro. Um novo ramo do direito processual. São Paulo: Saraiva. 2003, p. 571.
Interligados a esse princípio estão os princípios da máxima efetividade do
processo coletivo, onde se deve utilizar de todos os mecanismos necessários e eficazes para
que se alcance a verdade real, propiciando a tutela adequada e efetiva dos direitos coletivos.
Ademais, o princípio do máximo benefício da tutela jurisdicional coletiva que
prima pelo aproveitamento máximo “da prestação jurisdicional coletiva, tem o objetivo de
resolver em um só processo um conflito social de grande proporção ou ainda vários
conflitos individuais, unidos pelo vínculo da homogeneidade”44.
Portanto, este princípio está ligado ao interesse social da tutela jurisdicional,
razão pela qual, valendo-se da regra interpretativa do sopesamento, conclui-se que os
processos coletivos devem ser analisados com a máxima prioridade, considerando que o
interesse social prevalece sobre o individual o individual.
2.9.3 – Princípio da disponibilidade motivada da ação coletiva
O abandono ou a desistência imotivada, injustificada de uma ação coletiva por
seu autor levará o órgão do Ministério Público a assumir seu comando, dando a ela
prosseguimento.
Ao contrário, sendo o abandono e a desistência levada a cabo pelo órgão do
Ministério Público poderá o Juiz da causa, em entendendo a incoerência da atitude remeter
os autos ao Procurador Geral, para que tome as providências cabíveis, aplicando-se aqui
aquelas previstas no artigo 28 do Código de Processo Penal45.
A hipótese aqui aventada se assemelha a situação de não concordância com a
promoção de inquérito policial requerida pelo Ministério Público, oportunidade em que o
Juiz encaminhará à apreciação do Procurador Geral.
Válido mencionar, por oportuno, que o Ministério Público, por força legal, tem
obrigatoriedade de assumir em caso de desistência dos demais legitimados, o processo de
execução do julgado coletivo.
44 Princípios informativos das ações coletivas. Trabalho escrito por Eneida Luzia de Souza Pinto e publicado na Revista de Processo n.º 151, São Paulo: Revista dos Tribunais. 2007. p. 321. 45 Artigo 28 - Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento de inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.
O Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos andou bem nesse
sentido, ao dispor em seu artigo 15 o princípio segundo o qual em havendo desinteresse dos
demais legitimados, deverá o órgão do Ministério Público iniciar ou caso já iniciada
prosseguir na liquidação e ou na execução da sentença coletiva46.
2.9.4 - Princípio da legitimidade ativa concorrente ou pluralista
O processo coletivo por se apresentar como diferenciado, traz consigo outra
característica marcante, notadamente com relação à legitimidade para a propositura de
demandas coletivas.
Será a legitimidade “ad causam”, em se tratando de defesa de interesse difuso e
coletivo concorrente, admitindo-se a possibilidade de propositura de ação tanto pelo
Ministério Público, que pela Constituição Federal recebeu legitimidade institucional,
quanto pelos demais co-legitimados conforme permissão legal contida no art. 5º da Lei
7.347, de 24 de julho de 1985 como também pelo Código de Defesa do Consumidor Lei
8.078, de 11 de setembro de 1990.
O ordenamento jurídico brasileiro atual conferiu legitimidade para propor a
ação civil pública e para instaurar procedimentos investigatórios, ainda que com outra
nomenclatura, a entes que, em virtude de sua posição na sociedade e de suas atribuições
constitucionais, revelam-se, a princípio, capazes de superar todos os entraves à defesa dos
direitos consolidados pelo Estado Democrático de Direito.
Os princípios inseridos no texto da Constituição Federal vigente, é certo,
constituem os pilares de sustentação em que se fundam as regras reguladoras da
legitimidade coletiva, assegurando que a legitimidade seja exercitada com plenitude
garantindo o acesso efetivo a ordem jurídica justa.
Tal princípio refere-se tanto no caso do Ministério Público quanto no de outros
legitimados, bastando como requisito a presença do direito tido como social, para que o
órgão do Ministério Público tenha legitimidade, buscando o máximo da prestação
jurisdicional coletiva, assim evitando demandas que tenham o mesmo fundamento e
idêntica causa de pedir.
46 Art.15. Decorridos sessenta dias da publicação da sentença condenatória, sem que a associação autora promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos demais legitimados.
3- DA INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO CIVIL
A atribuição para a instauração do inquérito civil está prevista nas leis de
organização do Ministério Público, na Lei de Ação Civil Pública, e no Código de Defesa do
Consumidor, sendo regra a instauração no local onde ocorreu ou deva ocorrer o dano. Em
outra dicção, a instauração do procedimento investigatório, compete ao mesmo órgão do
Ministério Público que teria atribuição para propor a ação civil pública, nele baseada.
Como apontado por Luis Roberto Proença:
O inquérito civil nasce com o ato de sua instauração, ganha substância com os
elementos obtidos através dos atos de investigação, para atingir o seu momento
final que é o da apreciação do conjunto de elementos coligidos, ensejando o
arquivamento ou, a pactuação de acordo extrajudicial, ou, finalmente, a
propositura da ação judicial indicada ao caso concreto.47
A instauração é atribuição privativa do órgão do Ministério Público, consoante
disciplinado no artigo 129 da Constituição Federal, bem como pela própria Lei da Ação
Civil Pública nº. 7.347/85.
Tal fato decorre, em razão de ser o Ministério Público o possuidor de uma
vocação natural para fiscalizar e apurar irregularidades administrativas que chegam à esfera
de seu conhecimento, bem como, por ter como função institucional, a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
A competência é condição de validade de todo ato administrativo e sempre será
elemento vinculado, destacando que em havendo conflito de competência quanto a
instauração, tal será dirimido pelo Procurador Geral que por sua vez possui competência
para instaurar, em alguns casos, o inquérito civil.
Havendo eventuais incompatibilidades relacionadas aos membros do Ministério
Público que presidem os inquéritos civis, é valido notar que, no que couber aplicam se as
normas processuais de impedimento e suspeição48, que ofendidas deverão ser comunicadas
ao Procurador Geral, mediante requerimento escrito e devidamente instruído.
Fechado o parêntese com relação às rápidas observações de regra de
competência, passamos a fase de instauração propriamente dita, que pode se dar por
diversas formas. De ofício, mediante representação, através do recebimento de denúncia
anônima, ou através do recebimento de peças de informação.
47 Inquérito Civil . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p.44. 48 Artigos 134 a 138 do Código de Processo Civil.
A instauração de ofício ocorre quando o Ministério Público, através de seu
representante toma conhecimento pessoal da ocorrência de ameaça ou lesão a interesses
transindividuais, ou seja, interesses que ultrapassam o campo do individual.
O Ministério Público também pode de ofício instaurar inquérito civil a outras
ocorrências que estejam vinculados ao seu âmbito de atuação em atendimento a
requerimento de qualquer pessoa física ou jurídica, o que se faz, através de portaria,
contendo o objeto de investigação e uma breve sinopse da motivação para a instauração do
inquérito civil.
Vale ressaltar, que caso o fato não esteja inserido dentre as atribuições do
representante do Ministério Público que tomou conhecimento do mesmo, nos parece
razoável que deverá tomar as providências para quem real e legalmente competente faça o
que de direito.
Importante salientar que a permissão que o Ministério Público possui de
instaurar inquérito civil de ofício não deve ser usado como instrumento de perseguição de
pessoas e autoridades, utilizando o inquérito civil como instrumento de devassa.
Deverá, portanto, agir de ofício quando se tratar de fato determinado ou
determinável, claro e preciso, não obstante decisão em sentido contrário, onde muitas vezes
o fato investigado somente se reveste de precisão e objetividade no decurso do
procedimento investigatório, submetendo-se a sua atividade, como a de qualquer agente
público, ao controle da legalidade, inclusive para evitar eventuais abusos49.
Nesse particular, importante transcrever as lições de Paulo Marcio da Silva,
para quem:
Não obstante a titularidade para a instauração ter sido com exclusividade
outorgada ao Ministério Público, não quer dizer que o exercício de tal faculdade
não esteja sujeito a critérios ainda que mínimos para evitar abusos, devendo estar
presente para a instauração de ofício uma espécie de justa causa, como forma de
se evitar eventuais abusos. Essa justa causa seria caracterizada pela ocorrência de
um fato jurídico certo e determinado, capaz de ofender ou ameaçar de ofensa
bens, direitos e interesses coletivos ou difusos, e que desafie a apuração mediante
inquérito civil. É dizer que não se verificando tal pressuposto, se afiguraria
ilegítima a instauração do procedimento de investigação pretendido pelo
inquérito.50
49 Recurso Especial n. 262.186- MT, relatado pelo Ministro Castro Meira, publicado no Diário da Justiça de DJ 23.05.2005 p.188. 50 Inquérito Civil e Ação Civil Pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 102.
Outro meio de instauração é por representação, que reflete o direito atribuído a
qualquer pessoa, de apontar a existência de situações irregulares ao Poder Público. Cuida-se
do verdadeiro exercício da cidadania, da atuação do cidadão para fazer que sejam
respeitados os princípios norteadores atribuídos ao Poder Público (moralidade, legalidade,
impessoalidade, dentre outros).
Assim, quando qualquer agente público, qualquer cidadão, pessoa jurídica,
enfim qualquer órgão público noticie a existência de lesão ou ameaça de lesão a interesses
transindividuais ou dentre aqueles acoplados dentro da área de atuação do órgão
ministerial, deverá o órgão do Ministério Público, instaurar inquérito civil cuja
representação poder ser feita por escrito, de modo fundamentado ou verbalmente ocasião
em que será reduzida a termo.
Dessa forma o Ministério Público realiza na verdade a manifestação expressa
do direito constitucional de petição51, garantindo a todos o exercício do direito contra os
abusos de poder.
Não impera necessidade de maiores formalismos quanto ao conteúdo da
representação, como relatado por Hugo Nigro Mazzilli52.“bastando que alguém nela se
identifique, qualificando-se, e leve ao conhecimento do Ministério Público noticia do fato
que deva ensejar sua atuação”
A representação pode ser indeferida de plano, desde que motivadamente,
bastando para tanto falta de atribuição do órgão do Ministério Público para a apuração do
fato, ou sendo esse considerado superado em razão de já estar sendo objeto de ação civil
pública, termo de ajustamento de conduta, dentre outras situações.
Como veremos adiante, em tópico específico, do indeferimento da
representação cabe recurso, tanto que da decisão que indefere, deverá o representante
cientificado.
O inquérito civil também por ser instaurado por determinação do chefe do
Ministério Público, o Procurador Geral de Justiça, conforme previsão no artigo 106 da Lei
Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo que descreve que:
O inquérito civil será instaurado por portaria, de ofício, ou por representação do
Procurador Geral de Justiça ou do Conselho Superior do Ministério Público e em
face de representação ou em decorrência de peças de informação.
51 Artigo 5º, inciso XXXIV : “São assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder. 52 O inquérito Civil , Op. Cit. p. 122.
Recebendo o órgão do Ministério Público peças de informação o inquérito civil
também poderá ser instaurado. As peças de informação, via de regra, se originam em ou e
outros processados, como sindicâncias, processos judiciais, de natureza criminal, cível,
fiscal e etc.
Sobre o tema Hugo Nigro Mazzilli, em sua obra O Inquérito Civil diz:
“Não é novidade na Lei da Ação Civil Pública; já era conhecido na área
processual penal para referir-se a representações, documentos, certidões, cópias
de peças processuais, declarações ou quaisquer outras informações que, ‘mesmo
sem o inquérito policial’ permitissem caracterizar a materialidade e a autoria do
crime, assim servindo de base à propositura da ação penal. Mutatis Mutandis, na
área civil, ‘peças de informação são os elementos de convicção em que se possa
basear o membro do Ministério Público para propor eventual ação civil pública,
nela imputando a alguém a responsabilidade pelo risco de lesão ou a própria
pratica de lesão a interesses cuja tutela a lei lhe tenha cometido, como a defesa do
patrimônio público ou o zelo de interesses transindividuais”.53
Assim, dispondo o Ministério Público de qualquer documento ou elemento
avulso considerado peça de informação, poderá instaurar inquérito civil, ou até mesmo
propor diretamente ação civil pública, tanto que conforme narrado linhas atrás, o inquérito
civil não é requisito de procedibilidade da ação civil pública ou coletiva.
O artigo 6º da Lei Federal 7.347/1995, a propósito, menciona que:
Qualquer pessoa poderá e o servidor deverá provocar a iniciativa do Ministério
Público, ministrando-lhe informações sobre fatos que constituem objeto da ação civil
pública e indicando-lhes os elementos de convicção.
Ainda, estabelece também o artigo 7º da Lei da Ação Civil Pública, que:
Se no exercício de suas funções, os juízes ou tribunais tiverem conhecimento de
fatos que possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão peças ao Ministério Público
para as providências cabíveis.
A natureza do dispositivo é sem discussão, cogente, representando aos seus
destinatários, juízes ou tribunais, a obrigatoriedade em remeterem ao Ministério Público,
assim que tomem conhecimento do fato ofensivo a interesse coletivo transindividual, as
peças necessárias a tomada de providencias que o caso requer.
53 O inquérito Civil , Op. Cit. p. 169.
Recebendo tais peças, o Ministério Público de imediato, irá formalizar o devido
processo administrativo, comunicando a autoridade responsável pela comunicação e as
providências que até então foram adotadas.
A instauração pode ainda, se dar através de denúncia anônima que equivale à
instauração de ofício54. Nesses casos, os representantes do Ministério Público devem ter
cautela maior antes de darem inicio a instauração, sendo de bom alvitre e que angariem
outros elementos complementares.
A propósito do tema, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o Ministério
Público pode atuar ex officio ao tomar conhecimento de fatos suscetíveis de apuração ainda
que o faça impelido por informação contida em denuncia anônima55.
A instauração do inquérito civil, é certo, produz alguns efeitos. O efeito
imediato consiste na legitimação dos atos administrativos praticados pelo órgão do
Ministério Público com base no regime jurídico administrativo, fundamentado na
supremacia do interesse público sobre o particular e na indisponibilidade do interesse
público.
Questão interessante lembrada por Luiz Roberto Proença56 é a questão da
instauração do inquérito civil quando no fato não haja elementos seguros para a imediata
instauração do procedimento de inquérito civil, para o autor:
Quando não há segurança para que seja imediatamente instaurado o inquérito
civil, faculta se ao órgão de execução do Ministério Público a instauração de procedimento
preparatório, destinado a realização de uma investigação preliminar, com a finalidade de
decidir ou não pelo cabimento da instauração do inquérito civil.
Verifica-se aqui que os órgãos do Ministério Público encontraram na prática um
caminho para escapar dos prazos e de todos os regramentos impostos ao inquérito civil,
quer pela própria Lei, incluindo-se aqui as leis complementares de cada Estado, bem como
as determinações do Conselho Superior.
A justificativa segundo Eurico Ferraresi é que ocorre uma questão de ordem
prática: como existem algumas investigações de menor vulto, ou que precisam de um
esclarecimento mais demorado criou-se a figura do “procedimento preparatório ou
protocolado”.57
54 Artigo 47 § único do projeto de que altera a Lei de Ação Civil Pública assim dispõe: É autorizada a instauração de inquérito civil fundamentado em denúncia anônima, somente se instruída com elementos mínimos de convicção. 55 MS n. 7.069, 3 Seção, Relator Ministro Félix Fischer, DJ de 12/02/2001. 56 Op. cit., p. 45. 57 COSTA, Susana Henriques da. Coord. Comentários à Lei de Ação Civil Pública e Lei de Ação Popular. São Paulo: Quartier Latin. 2006. p. 446
Essa postura vem de encontro com a própria finalidade do procedimento, dando
margem a abusos e até mesmo gerando instabilidade e efetiva aplicação das normas do
Estado Democrático de Direito.
Não se podem modificar as formas de controle de instauração e arquivamento
do inquérito civil, diferentemente do disposto na legislação federal.
Os atos praticados no inquérito civil gozam de legitimidade e de veracidade,
além da imperatividade de determinados atos, que a lei autoriza ao órgão ministerial a
executar sem a necessária intervenção do Poder Judiciário.
3.1 - Instrução
A instrução do inquérito civil é um tema um tanto quanto tormentoso para os
estudiosos do assunto, bem como para o próprio Poder Judiciário que na grande maioria das
vezes é instado a se manifestar sobre.
Embora a legislação atinente ao procedimento do inquérito civil seja bem
suscinta com relação à instrução, a Constituição Federal concebe ao órgão do Ministério
Público poderes instrutórios para expedir notificações, requisitar informações e documentos
e requisitar diligências investigatórias.
A par disso, a Lei da Ação Civil Pública em breves linhas dispõe acerca do
poder de requisição conferido ao órgão do Ministério Público, dentre eles o de obter
certidões, informações, perícias ou exames, regulando que nos casos de omissão aplica-se
subsidiariamente do Código de Processo Civil.
Assim, para cumprir as funções do regime democrático dos interesses sociais e
individuais, a proteção do meio ambiente e do patrimônio público, a Constituição atribuiu
ao Ministério Público o inquérito civil dotando-os de poderes de instrução concernentes a
expedir notificações, requisitar informações, documentos e diligências investigatórias, bem
como, a instauração de inquérito policial conforme previsto no art. 129, inc.III, VI e VIII da
Constituição Federal.
Vale ressaltar que no âmbito das diligencias investigatórias que podem ser
requisitadas por autorização constitucional, são inseridas diversas medidas como inspeções,
vistorias, informações, perícias, certidões, assim como,
Todavia, a timidez da legislação trouxe a baila inúmeras discussões,
notadamente quanto a amplitude desse poder requisitório, que abaixo trataremos, sem a
ânsia de esgotar o tema.
3.2- Poder de Requisição
No âmbito do inquérito civil e do procedimento administrativo sob sua
presidência, o Ministério Público possui poderes instrutórios que são concernentes ao poder
de requisição, possuindo assim o poder de requisitar certidões, informações, documentos,
exames periciais, de qualquer organismo público ou particular conforme o artigo 129,
inciso VI da Constituição Federal, art.8º §1º, Lei Federal 7347/85, arts. 8º e 12 Lei
Complementar Federal 75/93; artigos 26 I b, II e 27 parágrafo único I, Lei Federal
8.625/93, artigo 104, I b, III e 27 parágrafo único I, Lei Federal 8.625/93.
A Constituição do Estado de São Paulo no parágrafo único do art. 97 também
prevê a requisição aos órgãos da administração pública direta ou indireta dos meios
necessários à conclusão do inquérito civil dos procedimentos administrativos que lhe são
atribuídos.
Dessa feita, para a instrução do inquérito civil, poderá o representante do
Ministério Público que preside o inquérito civil requisitar a qualquer autoridade federal,
estadual, municipal, da administração pública direta ou indireta, bem como toda e qualquer
pessoa física e jurídica de direito privado, documentos, certidões, exames, perícias e
informações que entender necessárias.
Tal autorização decorre de previsão legal, o artigo 8º da Lei da Ação Civil
Pública é claro em chancelar a requisição direta pelo órgão do Ministério Público de
algumas informações, de alguns documentos.
Não houvesse poderes para instruir poucos elementos de convicção teria o
órgão do Ministério Público para a propositura segura da ação civil pública, sendo então o
inquérito, frágil, ineficiente e insólita seria a investigação.
A atribuição do Ministério Público, relativa à requisição de informações e
documentos de qualquer natureza surge do próprio ordenamento constitucional vigente,
posto resguardar o interesse público.
A requisição nada mais é do que ordem de apresentação, sendo mecanismo
indispensável para que o Ministério Público desempenhe suas funções atribuídas pela
Constituição Federal.
Seu fundamento encontra guarida no regime jurídico do direito público baseado
nos princípios da supremacia do interesse público sobre o privado e na indisponibilidade do
interesse público pela Administração, dos quais se extrai o atributo da imperatividade.
As requisições, segundo preceito legal, deverão ser atendidas gratuitamente e
dentro de um prazo mínimo não inferior a dez dias, nada impedindo que tal prazo possa ser
ampliado, dependendo da complexidade do cumprimento da requisição58.
A falta injustificada quanto ao atendimento, pode implicar em infração penal, e
sendo o destinatário agente público, esse responderá por desobediência e prevaricação e até
mesmo por ato de improbidade administrativa, nos termos do artigo 11 caput, e inciso II da
Lei n.º 8.429/1992, onde diz que: retardar ou deixar de praticar indevidamente ato de ofício.
Dispõe também a Lei Federal nº 7.347/1985 em seu artigo 10 que:
Constitui crime punível com pena de reclusão de um 1 (um) a 3 (três) anos, mais
multa de 10 (dez) a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesoura Nacional –
ORTN, a recusa o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à
propositura de ação civil, quando requisitados pelos Ministério Público.
No mesmo sentido o projeto de Lei em andamento, que altera a Lei da Ação
Civil Pública também dispõe em seu artigo 13 § 2º figura típica para aquele que retarda ou
omite dados ou documentos indispensáveis a propositura da ação civil pública.
Seu destinatário poderá ser qualquer agente público da Administração Pública
direta ou indireta, constituindo seu cumprimento dever de ofício sendo destinatários
igualmente, os agentes políticos, de qualquer esfera de governo, além das entidades
privadas.
As requisições, consoante já mencionado, não possuem amplitude absoluta, isso
porque a grande corrente doutrinária e jurisprudencial exige que, para o acesso as
determinadas bases de dados aqui se incluem, dentre outras, não menos importantes,
cadastros bancários, informações fiscais e eleitorais, não bastando à requisição direta pelo
órgão de execução do Ministério Público, mas necessário se faz a intervenção judicial, tudo
em razão do sigilo que acoberta tais dados.
58 Artigo 26 da Lei Federal n. 8.625/1993: Serão cumpridas gratuitamente as requisições feitas pelo Ministério Público às autoridades, órgãos e entidades da Administração Pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Importante aqui mencionar que a Constituição Federal de 1988, em seu artigo
5º, mais de uma vez dispõe sobre proteção a intimidade da pessoa humana, a vida privada,
bem como informações de interesse particular, ou de interesse coletivo.
É inegável que em se tratando de investigação que demande quebra de sigilo
bancário, telefônico, fiscal e de correspondência diretamente pelo Ministério Público, ao
argumento de que possui amplos poderes instrutórios, discussões surgem sobre o tema, uma
vez, que tais questões estão ligadas a intimidade da pessoa humana, a sua honra e a sua
imagem.
A defesa da privacidade está ligada a proteção do homem contra a interferência
em sua vida privada, a ingerência em sua integridade física ou mental e em sua liberdade
moral e intectual, a comunicação de fatos relevantes que causem embaraços a sua vida e
intimidade, intervenção em suas correspondências e até mesmo informações de cunho
profissional, cuja ética obriga a guardar.
Para Alexandre de Moraes59 a necessidade de proteção à privacidade humana,
visa também considerar que as informações fiscais e bancárias “sejam as constantes nas
próprias instituições financeiras, sejam na Receita Federal, constituem parte da vida privada
da pessoa”.
Contudo, vale ressaltar que as requisições do Ministério Público, como já
citado, têm fulcro constitucional, e como afirma Nelson Nery e Rosa Nery60: “em nenhuma
hipótese a requisição pode ser negada, sendo que o desatendimento pode caracterizar crime
de prevaricação ou desobediência, conforme o caso”.
Atualmente a questão já está mais sedimentada, ou seja, o poder requisitório do
representante do Ministério Público não é tão amplo como já se foi, pois, nas hipóteses de
sigilo, hipóteses essas definidas por Lei, ou previstas na Constituição Federal, deverá o
promotor de justiça oficiante requerer ao Poder Judiciário que intervenha na obtenção dos
dados que pretende para a investigação.
Embora a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público61 e a Lei Orgânica do
Ministério Público da União62 autorizam o amplo acesso a informações sigilosas sem a
intervenção do Poder Judiciário, a Lei da Ação Civil Pública63 enuncia que nas hipóteses de
sigilo legal podem ser negadas certidões ou informações, autorizando assim, que a ação
possa ser proposta desacompanhas daqueles documentos, cabendo o Juiz requisitá-los.
59 Direito Constitucional, 16 ed.São Paulo: Atlas,2004 op cit, p.93. 60 Código de Processo Civil e legislação processual civil extravagante em vigor. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2000, p.1032. 61 Artigo 26, inciso I, letra “b”, e inciso II. 62 Artigo 8, inciso VIII, parágrafo 1 e 2. 63 Artigo 8 parágrafo 2.
No que relaciona ao sigilo bancário, a Lei Complementar n. 105/2001, em seu
artigo 3º impõe que todas as informações bancária serão mantidas em sigilo, salvo se os
dados forem utilizados em processos judiciais ou outros procedimentos e desde que ocorra
intervenção judicial.
A jurisprudência também tem se firmado no sentido de que havendo interesse
do Ministério Público quanto a dados bancários considerados sigilosos porem
imprescindíveis às investigações no âmbito do inquérito civil, imperiosa se faz autorização
judicial64.
Nos casos em que nas investigações no âmbito do inquérito civil esteja
envolvido o patrimônio público, no entanto, o entendimento tem sido outro, o que
demonstra não ser absoluto o direito a intimidade. O Supremo Tribunal Federal em sede de
mandado de segurança determinou que o Banco do Brasil fornecesse ao Ministério Público
relatório de nome de beneficiários de empréstimos concedidos pela instituição, com
recursos custeados pelo governo federal65.
Restritas são as decisões no sentido de o Ministério Público acessar dados
bancários considerados sigilosos sem que haja intervenção judicial. É de frisar que não é
necessária a existência do processo judicial em si, podendo a autorização judicial ser
concedida em procedimento investigativo.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim decidiu:
QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO - Para apuração de atos de improbidade
administrativa mesmo que noticiados por delação anônima e não por
representação, que atenda os requisitos dos a r t 14, da LF 8.429/92, admissível a
instauração de inquérito civil e a realização de atividades investigatórias pelo
Ministério Público, destarte, as quais a quebra de sigilo bancário, mediante
autorização judicial, desde que presentes indícios- da prática de ato de
improbidade administrativa e a medida extrema se fizer necessária - Liminar
concedida - Deferimento por decisão judicial devidamente limitada, acolhendo
pedido do Ministério Público devidamente justificado, com base em indícios da
prática de ato de improbidade administrativa e em situação em que configurada
sua necessidade para esclarecimento, ante a recusa de fornecimento pelo
agravante dos extratos bancários solicitados - Recurso improvido. VOTO n°
2.146 Agravo de Instrumento n° 383.098.5/9-00 66
64 A norma inscrita no inciso VIII do artigo 129, da CF, não autoriza o Ministério Público, sem a interferência da autoridade judiciária, quebrar o sigilo bancário de alguém. Se se tem presente que o sigilo bancário é espécie de direito a privacidade, que a CF consagra, art 5, X,somente autorização expressa da Constituição legitimaria o Ministério Público a promover, diretamente e sem a intervenção da autoridade judiciária, a quebra do sigilo bancário de qualquer pessoa” – RE n.215.301 – Relator Ministro Carlos Mario Velloso. 65 STF – MS n 21.799/DF, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, informativo STF n. 246. 66 HC n.96.02.984.60-9 –RJ, 1Turma, Relator Juiz Chalu Barbosa, in DJ 19/6/1997, . <www.tjsp.gov.com.br>, Acessado dia 25 de agosto de 2009.
Já o Superior Tribunal de Justiça não decidiu diferente:
Ministério Público Estadual – Poderes – Lei 8.625/93 – Sigilo Bancário – Quebra
por requisição direta do promotor público – Impossibilidade. A criação de novas
hipóteses de quebra de sigilo bancário, não previstas na Lei 4.595/64, ou a forma
de acesso a informações bancárias sigilosas só pode ser fruto de lei
complementar, não de lei ordinária, de que é espécie a Lei 8.625, de 12.02.1993,
instituidora da Lei Orgânica do Ministério Público. Além disso, o artigo 26, II, da
referida Lei 8.625 contem autorização genérica que não afasta a exceção de
proibição de violação de sigilo. O parágrafo 2 desse mesmo artigo define uma
hipótese de responsabilidade de membro do Ministério Público, não de
autorização de quebra de sigilo. O acesso a informações bancárias, cobertas, pode
e deve ser obtido pelo Ministério Público através do Poder Judiciário. Habeas
Corpus deferido” (STJ – 5ª Turma, HC 2352-8- RJ- Relator Ministro Assis
Toledo).67
Aplicam-se igualmente ao sigilo fiscal, telefônico, de correspondência68 as
mesmas regras impostas ao sigilo bancário, pois, a Lei complementar nº105/01, que
revogou o art. 38 da Lei Federal nº 4.595/64, impõe que o sigilo bancário deve ser aberto
por decisão judicial, mas a Lei complementar Federal nº. 75/9369 permite então o acesso
direto do Ministério Público ás informações bancárias.
Ainda, com relação à instrução do inquérito civil, poderá seu presidente realizar
vistorias70 ou inspeções para a constatação de situações supostamente danosas aos
interesses que deve zelar, elaborando relatório circunstanciado.
Os membros do Ministério Público podem realizá-las pessoalmente ou
determinar que seus órgãos auxiliares realizem. Ninguém poderá proibir que o
representante do Ministério Público assim haja quando necessário as investigações,
podendo este se valer de auxílio de força policial se o caso.
Vale destacar que o presidente do inquérito, embora possa adentrar em qualquer
recinto para a realização de vistorias, deverá em sendo residência de particular atentar para
67 STJ-Agravo de Instrumento n° 383.098.5/9-00. A JURIS 1ª STJ-Agravo de Instrumento n° 383.098.5/9-00. <www.tjsp.gov.com.br>, Acesso dia 25 de agosto de 2009. 68 Artigo 5º inciso XII: Ser inviolável o sigilo de correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e da comunicação telefônica, salvo, no ultimo caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. 69 Nenhuma autoridade poderá opor ao Ministério Público, sob qualquer pretexto, a exceção de sigilo, sem prejuízo da subsistência do caráter sigiloso da informação, do registro, do dado ou do documento que lhe seja fornecido. 70 Estatuto do Idoso – artigo 74 inciso VIII -. São atribuições do Ministério Público: inspecionar as entidades públicas e particulares de atendimento e os programas de que trata esta Lei, adotando de pronto as medidas administrativas ou judiciais necessárias à remoção de irregularidades, porventura verificadas.
o que dispõe a Constituição Federal em seu artigo 5º inciso XI71, já que a casa é consagrada
como asilo inviolável do cidadão e goza de imunidade.
Poderá ainda requisitar a qualquer órgão público de todas as esferas, a
realização de exames periciais, existindo algumas circunstâncias investigativas cuja
conclusão dependa exclusivamente de prova pericial, de conhecimento técnico específico,
como por exemplo temos os danos ambientais cuja mensuração de extensão do dano
dependerá de perícia por engenheiros florestais ou técnicos que cuidem do assunto.
Algumas promotorias especializadas possuem aparato técnico próprio, todavia,
na maioria dos casos, o Ministério Público depende de auxilio de repartições públicas
outras.
Os peritos, sejam eles próprios da instituição, sejam eles servidores públicos de
outros órgãos da Administração Pública, ou particulares convidados, estão sujeitos a
normas previstas na legislação processual civil e penal, especialmente no que tange as
regras de suspeição e impedimento e naqueles de como proceder ao trabalho pericial
adequado.
O Ministério Público poderá ainda, gozando de poder probatório a si conferido,
expedir notificações, para fim de colher depoimento dos investigados e ouvir testemunhas
acerca dos fatos que investiga.
A notificação, em seu conteúdo devera conter o objeto da investigação a
finalidade do convite, local, hora e data para comparecimento, além das advertências de
praxe para o caso de não atendimento ao chamado ministerial.
Caso haja o descumprimento da notificação, poderá o representante do
Ministério Público determinar a condução coercitiva da testemunha faltante, todavia, ao ser
ouvida e, caso faça afirmação falsa ou negar a verdade será responsabilizada
criminalmente, nos termos do disposto no art. 342 do Código Penal.
Com relação a eventuais incompatibilidades, o Presidente do inquérito civil,
havendo causa suficiente, tomando-se como parâmetro no que couberem os motivos de
suspeição e impedimento prescritos pela lei processual, em qualquer momento da
tramitação das investigações, deverá comunicar o fato ao Procurador Geral, encaminhando-
lhes os autos, para que o procedimento investigatório não tenha solução de continuidade.
71 Artigo 5º inciso XI: a casa é asilo inviolável do individuo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.
Tanto o interessado, quanto qualquer outra pessoa poderá intervir no
procedimento para argüição de impedimento ou suspeição do representante do Ministério
Público que preside o inquérito civil, através de requerimento motivado e instruído com
elementos a provar a hipótese aventada.
Os artigos 25 e 30 do Ato Normativo nº 484-do Conselho de Procuradores
de Justiça, de 5 de outubro de 2006, que regula a tramitação de investigações civis, assenta
a possibilidade de declaração de impedimento ou suspeição por parte do presidente do
procedimento investigatório e disciplina outras providências quando da ocorrência de
alegação de impedimento e suspeição.
Como o representante do Ministério Público tem o dever e não a faculdade, de
se abster ante os motivos de impedimento e suspeição, poderá rejeitá-la motivadamente e
prosseguir na condução da investigação, ou acatá-la tomando as providências que acima se
elencou.
Por fim, é valido mencionar que além dos poderes investigatórios conferidos ao
Ministério Público, a legislação também confere outro valioso instrumento para a formação
responsável de sua convicção para a posterior tomada de medidas concretas. Pode o órgão
ministerial requisitar da Administração Pública e seus órgãos que se instaure procedimentos
administrativos com a finalidade de apuração de fatos de sua competência o que por certo,
garantirá agilidade à investigação que pretende o Ministério Público.
Encerrada pela Administração Pública e seus órgãos o levantamento, a
investigação desencadeada por requisição ministerial, deverá remeter o quanto alcançado
ao órgão do Ministério Público requisitante para que as analisando tome a providência que
julgar pertinentes.
Mister salientar que o representante do Ministério Público que ao ter acesso a
informações sigilosas e destas não guardar o devido segredo ou dessas fazer uso ilegal,
responderá civil e criminalmente.
3.3 - Das provas ilícitas e a atuação do Ministério Público
Importante discussão se faz em relação às provas obtidas ilicitamente e a
atuação do Ministério Público, uma vez que a prova, sem sombra de dúvidas, é o âmago do
processo ou de qualquer procedimento investigativo.
No direito, como é sabido, as ações, tanto pode versar sobre o direito, como
também sobre o fato, ou ainda sobre ambos, geralmente no litígio, o mais comum da lide é
versar sobre o fato, daí a grande decorrência do uso das provas como meio de provar esses
fatos.
Assim, as provas constituem o meio mais importante para assinalarmos a
verdade formal nos autos, cuja origem etimológica vem do latim probatio que por
conseqüência provém do verbo probare que significa examinar, persuadir, demonstrar.
Assim, podemos concluir que provar significa demonstrar de modo que não seja suscetível
de contrariar, a verdade de fatos argüidos.
Desta forma, podemos sintetizar o conceito de prova em fazer conhecidos ao
juiz os fatos controvertidos e duvidosos, e dar-lhes a certeza de seu modo de ser.
O Código de Processo Civil refere-se, em seu artigo 332, sobre os meios legais
e moralmente legítimos de provas usadas em juízo, dispondo o presente artigo que não
somente os especificados no código, mas também todos aqueles moralmente legítimos, são
idôneos para demonstrar a verdade dos fatos em que se funda a lide.
Assim, temos que todos os meios, mesmo que não estejam elencados no Código
de Processo Civil, desde que moralmente legítimos, poderão ser usados para se provar em
juízo, deste ponto inicial podemos elencar alguns problemas para os meios de defesa no
processo, principalmente devido à falta de um dispositivo que regulem quais são os meios
de prova, o que vai gerar na maioria das vezes, dúvidas quanto a licitude das provas que são
apresentadas.
Esta questão está atada ao processo de forma que qualquer deslize das partes em
não analisar se as provas são legais ou não, pode se findar o processo sem que seu objetivo
principal, seja alcançado.
As provas usadas como meio de convencimento do juiz devem obedecer a uma
formalidade técnica e jurídica, além do seu conteúdo lícito e moral. Por isso tanto o CPC no
artigo 332 quanto a Constituição Federal em seu artigo 5.º, inciso LVI, especificam quanto
à licitude da prova.
Ademais, a Constituição Federal, como garantia de forma de defesa, traz em seu
artigo 5.°, LVI, que as provas obtidas devem seguir os preceitos da moralidade e legalidade
para serem aceitas no processo, com o objetivo de conseguir uma plenitude de defesa para
as partes.
Mister diferenciar a prova ilícita da ilegítima, de modo que a prova ilícita é a
que viola regra de direito material, constitucional ou legal, no momento de sua obtenção se
dando fora do processo (é, portanto, sempre extraprocessual).
Já a prova ilegítima é a que viola regra de direito processual no momento de sua
obtenção em juízo (ou seja: no momento em que é produzida no processo). Exemplo: oitiva
de pessoas que não podem depor como é o caso do advogado que não pode nada informar
sobre o que soube no exercício da sua profissão (art. 207, do CPP).
Outro exemplo seria o interrogatório sem a presença de advogado ou a colheita
de um depoimento sem o mesmo, sendo, portanto, a prova ilegítima sempre intraprocessual.
Desse modo, a prova obtida fora do processo cuida-se de prova ilícita, ainda
que viole concomitantemente duas regras: uma material, (constitucional) e outra processual,
cujo meio decisivo para se descobrir se uma prova é ilícita ou ilegítima é o locus da sua
obtenção: dentro ou fora do processo.
De qualquer maneira, combinando-se o que diz a CF, art. 5.º, inc. LVI com o
que ficou assentado no novo art. 157 do CPP vê-se que umas e outras (ilícitas ou ilegítimas)
passaram a ter um mesmo e único regramento jurídico: são inadmissíveis acima de tudo é
uma afronta à garantia ao contraditório, por isso está elencado em nossa Carta
Constitucional como um preceito indispensável para a solução da lide. Assim devem ser
concedidas para ambas as partes garantias iguais e oportunidades de para mostrarem e
apresentarem provas, não podendo haver qualquer disparidade no critério para aceitação de
tais provas.
Aparece neste caso a figura do Estado como forma de assegurar as partes uma
isonomia entre os meios de defesas, inquirindo desta forma sobre a validade e aceitação de
provas, principalmente quanto a sua autenticidade e forma de obtenção, impossibilitando
desta forma qualquer aniquilamento de direito na fase probatória do processo.
Desta maneira assumem papel de grande importância na Carta Federal as
provas obtidas ilicitamente, pois, sem uma definição positivada de quais meios são os
éticos para a obtenção de provas, torna-se uma questão muito relativa do que é moral e
legal para o uso do fim probatório.
Com esse dispositivo composto na Constituição, podemos ver sua valoração e
seus riscos, se não fosse regulamentado, pois, tem para ser prova válida, como demonstra a
Carta, ser obtida por meio legal e ético.
Assim, temos já um leque de opções, somente por esses conceitos de que meios
de provas são admitidos em juízo ou não, pois legal, segundo o Código de Processo Civil
em seu artigo 332, é aquele que tem fundamento na lei, e ético pode ser enquadrado em
tudo aquilo de relevante valor moral para a sociedade, que não lesam nem ofendem o
direito alheio.
Portanto, a Constituição repudia quaisquer meios de prova obtidos ilicitamente,
visto que estes amputam todos os direitos que nela figuram, exceto em casos excepcionais
que tenham dispositivos que permitam, em último caso, o seu uso, como por exemplo o art.
5.°, XII, que diz: “É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas,
de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas
hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução
processual penal.”
Por fim, a Constituição de 1988 traz juntamente ao processo uma disposição
dando maior segurança quanto ao uso das provas, regulamentando-as e as colocando como
forma de garantias do cidadão, não podendo desta forma ser usado qualquer meio para a
obtenção de prova.
É grande o número de formas e meios de se obter uma prova, mas nem todos
são aceitos com força probatória em um processo, pois também são grandes os meios de
formas inidôneas de se obtê-las. Abaixo temos os tipos mais comuns e praticados de provas
ilícitas que se obtêm e tentam inseri-las no processo, por conseguintes não aceitas por
constituírem em meio ilegítimo de provar.
No processo penal, segue geralmente os mesmos preceitos do processo civil em
se tratando de prova ilícita, mas o principal problema se consiste na preservação do bem
maior que é a vida.
A cláusula do art. 332 do Código de Processo Civil indica, na verdade, uma
limitação ao direito de prova. A idéia do devido processo legal, não é só definida como a
oportunidade de direito de defesa, mas a oportunidade de demonstrar ao juiz que aquilo que
foi alegado tanto em favor do autor como do réu corresponde à verdade. Mas há limites a
estes direitos que compõem a noção de devido processo legal.
Tais limites estão ligados a questões adversas ao processo, opções do legislador
por determinados valores em sacrifício de outros. Correto seria ao Estado fornecer, em
primeiro lugar, o devido processo legal antes que se restrinja a liberdade de alguém ou seu
patrimônio, dentro daquela perspectiva do juiz natural, do esquema de defesa, do
contraditório, etc. Mas, na verdade, faz-se um balanço e o fato não pode estar a exercer
ilimitadamente a sua prerrogativa de fazer a prova dentro de um processo.
O Estado, ao estabelecer limites, optou por sacrificar a busca da verdade
material em favor de direitos como os direitos da personalidade, o direito à intimidade, por
exemplo, conforme exposto na própria Constituição Federal. Tanto o processo civil como o
penal estão estruturados para busca da verdade, mas não a qualquer custo (neste caso o
processo penal tem mais interesse na verdade real do que o civil, por estar em jogo o direito
a vida ou a liberdade).
Se o custo for a intimidade das pessoas, por exemplo, então as regras sobre
meios de prova estabelecem quais as circunstâncias possíveis, mas se a prova for uma
interceptação telefônica na forma vedada em lei, gravação clandestina, etc., será revelada
uma verdade, mas ela não poderá prevalecer como verdade.
A Lei complementar 75/93 assegura aos membros do Ministério Público a
prerrogativa de requisitar informações e documentos, ter acesso a qualquer banco de dados
de caráter público ou a serviço de relevância pública, todavia, em relação a prova colhida
diretamente pelo ministério em desconformidade com o Direito seria considerada ilícita?
Eugênio Pacelli de Oliveira ao discorrer sobre o assunto 72defende que “mesmo
que seja irregular a diligência não se poderá falar em provas ilícitas ou na conseqüência
ilicitude da prova (cujo objetivo é a tutela dos direitos fundamentais) (...).
E ainda argumenta fazendo uso do julgamento do HC nº 83.463-9/RS, onde o
Ministro Nelson Jobin em seu voto fundamenta entre outros pontos que: (...) uma coisa
seria examinar o problema durante as tentativas investigatórias do Ministério Público, outra
coisa a existência de indícios de ilicitude, porque aí estaríamos colocando a forma como
mais importante do que a prática do ilícito.
3.4 - O Contraditório
Uma das grandes características do inquérito civil é a sua inquisitividade, ou
seja, não se lhe aplica a o princípio do contraditório e por indução lógica, a ampla defesa.
De efeito, segundo a Constituição Federal, em seu artigo 5º inciso LV, “aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral são assegurados
o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Há muito tempo tem se discutido acerca da necessidade ou não de formação do
contraditório no âmbito do inquérito civil, entretanto, por não se enquadrar o inquérito civil
dentro do conceito de processo judicial ou administrativo, já que pela sua natureza trata-se
de procedimento, tem se que não é obrigatório o atendimento ao principio constitucional
supra mencionado.
Seria obrigatório, como é, quando no procedimento investigatório instaurado se
objetive ao final das averiguações, a imposição de punição por parte da Administração, sem
a prévia intervenção do Poder Judiciário.
72 Curso de Processo Penal - 11a. edição - Revista e Atualizada. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris Ltda, 2009. p.308
Maria Sylvia Zanella de Di Pietro73 expõe que: “o principio da ampla defesa é
aplicável em qualquer tipo de processo que envolva poder sancionatório do Estado sobre as
pessoas físicas ou jurídicas”.
Em um comparativo, temos as sindicâncias que apuram faltas praticadas por
funcionários públicos quando do desempenho de suas funções, onde há por imperativo
legal que se aplicar o contraditório, posto no final a possibilidade de se aplicar ao
funcionário uma pena que pode ir desde uma advertência até uma demissão do serviço
público.
No inquérito policial, procedimento investigativo para apurar a autoria e a
materialidade do delito, posto não haver ao final imposição de sanção, não há que se
observar o princípio constitucional do contraditório.
Amparando-se nas razões acima, não se fala em obrigatoriedade de observância,
como já frisado é procedimento investigativo e no final não irá se impor penalidade a quem
quer que seja porquanto servirá exclusivamente para angariar elementos para eventual
propositura de ação civil pública, ou celebração de termo de ajustamento de conduta.
Nele não se decidem controvérsias, não há acusação alguma e, por isso mesmo,
não há contraditório ou defesa, daí, ser um mero procedimento e não um processo, tendo
também como característica a facultatividade, porque não se constitui um pressuposto
processual para que o Ministério Público inicie a ação civil pública.
Ademais, do mesmo modo como ocorre no inquérito policial o Ministério
Público pode dispensá-lo para oferecer a denúncia, sendo a utilização do inquérito civil
aconselhável como forma de controle do Ministério Público, evitando, com a investigação
prévia, que se dê à demanda civil um cunho individual do representante ministerial que nela
atua.
Pela natureza jurídica do inquérito civil, pode concluir-se que inexiste nulidade
quando da colheita de provas sem que tenha observado o contraditório, pois, em Juízo irão
servir como prova indiciária, elemento de convicção por ser uma investigação pública e
oficial.
Assim, o que se apura no inquérito civil público tem validade e eficácia para o
Judiciário, concorrendo para reforçar o entendimento do julgador, quando em confronto
com as provas produzidas pela parte contrária em Juízo.
73 Direito Administrativo . São Paulo: Atlas. 9º ed. 1998, p. 410.
Rogério Lauria Tucci é favorável a tese da “nulidade do inquérito quando nele
não se propiciar ao investigado uma “participação efetiva e contraditória” e acrescenta:
[...] até por necessária coerência, tal nulidade, a ser declarada de plano, implica,
com a nulidade também de todos os atos que do inquérito civil derivem, a
inviabilidade da ação neste fundamentada; acarretando, como conseqüência
lógica e curial, a extinção do processo sem julgamento do mérito, por falta de
pressuposto inarredável de sua constituição e desenvolvimento válido. 74
Na mesma trilha se posiciona Eduardo Walmory Sanches, que assim afirma:
O operador do direito deve ter bom senso e exigir a aplicação do contraditório
durante o inquérito civil. O princípio do contraditório implica proporcionar as
partes o direito de se manifestarem sobre todos os fatos e meios de prova que
entendam indispensáveis para o convencimento do juiz. No atual modelo,
somente o promotor de justiça possui o direito de produzir provas
antecipadamente sem respeitar o principio do contraditório. Destarte é
indispensável a aplicação do contraditório durante o inquérito civil para garantir
uma reação adequada ao réu na fase judicial.75
Já Marcelo Abelha desenvolve sólido raciocínio na defesa de ampla
“participatividade” no inquérito civil, ponderando:
Se o inquérito civil redunda em sérias conseqüências sobre a esfera pessoal dos
inquiridos “[...], e paralelamente a participação é meio de se obter a verdade, ora,
não há justificativa lógica, legal e legítima para que a mesma seja impedida ou
mutilada. Nesses casos, v.g., a só notícia de um inquérito que apura contaminação
deste ou daquele alimento, deste ou daquele derramamento, desta ou daquela
lesão aos cofres públicos mexe com o que há de mais importante para esses
sujeitos: a imagem, a moral, a reputação, que, em virtude da ausência do
contraditório, ficam impossibilitados de fornecer seus elementos de convicção,
enfim, suas razões. Sob esse aspecto é que deve ser repensado o princípio do
contraditório. Se informação necessária deve existir, em razão da publicidade e
pelo fato de que as ditas informações ali contidas referem-se à pessoa, é de se
pensar que a reação possível deve ser levada em consideração. O que se quer
dizer é que deve prevalecer o bom senso e, diríamos, o princípio da participação.
Ora, se o contraditório pressupõe informação necessária somada a reação
possível, e, no caso do IC, não há contra o que reagir para justificar o
descabimento do contraditório, é certo que há um direito essencial de qualquer
pessoa, e, portanto, em contraface de um dever da administração de permitir a
participação pública no IC. Essa participação não será com contraditório de todos
os atos do procedimento, mas permitirá que a pessoa inquirida tenha acesso a
todas as informações e tenha o direito de fomentar a investigação com seus
74 Ação civil pública: falta de legitimidade e de interesse do Ministério Público, Revista dos Tribunais, v. 745, p. 84. 75 SANCHES, Eduardo Walmory. A ilegalidade da prova obtida no inquérito civil. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 26.
argumentos, afinal de contas, o MP é órgão público, cuja função administrativa é
regida pelos princípios insculpidos no art. 37 da CF, devendo atuar com
moralidade, impessoalidade, eficiência, legalidade e publicidade 76
Luiz Manoel Gomes Júnior77 posiciona-se assim: “[...] como regra geral, a
prova colhida no Inquérito Civil, que não for repetida em sede judicial é imprestável, salvo
se atendidos os postulados constitucionais do contraditório e da ampla defesa”.
O entendimento esposado pelo citado autor preza pelo requisito de se utilizar
em juízo os elementos colhidos no inquérito civil repousando na observância do princípio
do contraditório.
Essa posição, aliás, parece estar em consonância com o que prevê o anteprojeto
do Código Brasileiro de Processos Coletivos, conforme se constata no disposto no § 1º do
seu art. 23: “Para aproveitamento em juízo das peças informativas colhidas no inquérito
civil, este deverá observar o contraditório”.
Se a prova for repetida no plano judicial, sob a observação do contraditório,
será válida, mas a falta de apresentação de contraprova durante o processo judicial não
autoriza, por si só, a receptividade e validade de tais “provas” (elementos) em juízo.
Destaca-se que mesmo não sendo observado o contraditório no âmbito do
inquérito civil, eventuais provas indeferidas pelo promotor de justiça oficiante, tais não
estão preclusas, podendo oportunamente, sem redundando ação civil pública, serem
produzidas novamente.
Até porque, toda e qualquer prova colhida e produzida quando da tramitação do
inquérito civil, deve obrigatoriamente ser ratificadas judicialmente para atender a garantia,
consagrada no art. 5º, inc. LV da Constituição Federal de 1988.
A propósito, o Superior Tribunal de Justiça78, em decisão de lavra da Ministra
Eliana Calmon decidiu que “as provas colhidas no inquérito civil, tem valor probante
relativo, porque colhidas sem a observância do contraditório, mas só devem ser afastadas
quando há contraprova de hierarquia superior, ou seja, produzida sob a vigilância do
contraditório”.
Não obstante a vedação ainda que por interpretação doutrinária e
jurisprudencial quanto a observância ou não do contraditório no âmbito do inquérito civil,
nada impede que o promotor de justiça que o preside a fim de garantir a lisura do
76 Ação civil pública e meio ambiente, p. 99-100. 77 Curso de direito processual civil coletivo, p. 158. 78 Recurso Especial n. 476.660 – MG, D.J de 04.08.2003.
procedimento, conceda ao investigado o direito de ciência de todos os elementos
angariados, e via de conseqüência o direito de manifestar-se acerca de tais.
O contraditório então sob este prisma traria ao órgão do Ministério Público
alguns benefícios, dentre eles, maior credibilidade a toda prova produzida, com todas as
oportunidades ao investigado em contestá-las.
3.5 – A condenação do Ministério Público nas penas de litigância
de má-fé e sua responsabilidade
Os agentes públicos têm plena liberdade funcional, equiparável à independência
dos juízes nos seus julgamentos e, para tanto, ficam a salvo de responsabilização civil por
seus eventuais erros de atuação, a menos que tenham agido com culpa grosseira, má-fé ou
abuso de poder.
No tocante à responsabilização civil especial dos membros do Ministério
Público, estabeleceu o legislador pátrio, no artigo 85 do Código de Processo Civil, que “O
órgão do Ministério Público será civilmente responsável quando, no exercício de suas
funções, proceder com dolo e fraude.”
Nélson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery interpretando o artigo supra
mencionado asseveram que:
Os membros do MP são agentes políticos e, assim como ocorre com os juízes,
somente respondem por responsabilidade, quando agem com dolo ou fraude no
exercício de sua função. Não estão sujeitos a responsabilidade quando agem com
culpa. As hipóteses de responsabilidade dos juizes e do MP são arroladas em
numerus clausus, taxativamente, não comportando ampliação.” Acrescentam
ainda que “o prejudicado por ato doloso ou fraudulento praticado pelo MP tem
direito de ressarcir-se por meio de ação dirigida contra o poder público” que, por
sua vez, deverá acionar regressivamente o membro do Ministério Público que
tiver agido dolosa ou fraudulentamente no processo 79
É certo que eventual responsabilidade civil do promotor será sempre subjetiva,
em outras palavras, dependerá da demonstração efetiva de conduta ilícita, dano e nexo
causal entre a conduta e o dano, portanto, não podemos falar em responsabilidade objetiva,
que decorre sempre de lei ou de contrato.
79 Código de Processo Civil Comentado, RT, ano 2006, p.277
É certo que, as situações ensejadoras de responsabilidade civil são restritas, não
possuindo rol amplo, neste diapasão Sergio Roxo da Fonseca. ao escrever sobre Promotoria
e Imprensa assim se manifestou sobre o tema:
Quanto à responsabilidade civil dos Promotores de Justiça abrem-se duas
hipóteses: a) se o Promotor agiu com dolo ou fraude; b) o Promotor não agiu com
dolo ou fraude.
Na primeira hipótese, a parte atingida tem o dever processual de descrever em
que consistiu a conduta dolosa ou fraudulenta lastimada para invocar em seu
favor o preceptivo do art. 85 do Código de Processo Civil. A norma não autoriza
a responsabilidade civil do representante do Ministério Público que agiu apenas
com culpa “stricto sensu". Na segunda hipótese, ou seja, na ausência de dolo ou
fraude, a parte não pode acionar o Promotor de Justiça, mas, sim, o Estado,
cabendo-lhe ação regressiva, se for o caso.80
Nesse ponto, interessante trazer a baila o entendimento de Fabio Medina Osório
quando afirma que:
Até mesmo os atos tipicamente jurisdicionais, legislativos e ministeriais não
dispensam os seus autores da responsabilização por improbidade administrativa,
desde que contaminados pela má-fé que gera o enriquecimento ilícito, o prejuízo
ao erário e a violação aos princípios que regem a administração pública, como no
exemplo dado do magistrado que vende sentenças e do parlamentar que negocia
os seus votos. 81
O promotor de justiça que no desempenho de suas funções cometer abusos,
praticar atos incompatíveis com a função, praticar atos de improbidade, ainda que cercado
de inúmeras garantias constitucionais relativas a função, merecerá reprimenda, após
procedimento próprio, garantida a ampla defesa e o contraditório.
Quanto a vítima da atuação ministerial abusiva esta poderá pleitear indenização
por danos materiais e morais contra o próprio promotor, mesmo dispondo o artigo 85 do
Código de Processo Civil que o órgão é que será civilmente responsável.
Não obstante a possibilidade de responsabilização pessoal do membro do
Ministério Público que age no inquérito com abuso, dolo ou fraude, está ainda sujeito as
sanções pela litigância de má-fé quando da condução processual, em sendo culposa sua
atuação, nesse caso o Estado arcará com a responsabilidade e será o responsável por
eventuais indenizações.
80 MEDINA OSÓRIO, disponível em www.jusvox.com.br/mostraartigos, acessado em 19 de agosto de 2009. 81 OSÓRIO, Fábio Medina - Improbidade Administrativa (Observações sobre a Lei 8.429/92), 2ª Edição Ampliada e Atualizada, Porto Alegre: Editora Síntese, 1998. p.104. 36 STF-AgRg 102.251, relator Ministro Sydney Sanches.
Qualquer tentativa de exclusão do representante do Ministério Público dos
deveres de lealdade e boa-fé quer dentro do inquérito quer dentro do processo, é afrontar o
bom senso e atacar com chicote a ética, jogando pelo ralo o principio da igualdade de
tratamento.
A Lei que rege a Ação Civil Pública é clara ao dispor que se aplicam a todas as
normas contidas no Código de Processo Civil nos procedimentos que regula, assim, é
notório que nas ações civis públicas e nos inquérito civis, agindo o parquet com má-fé
processual, a ele deverá ser imposto as penas pela litigância, ficando os promotores de
justiça afora a responsabilidade no campo civil sujeitos também as expressas disposições da
Lei de Improbidade Administrativa.
Pedro da Silva Dinamarco comentando os artigos 1º e 2º da Lei de Improbidade
Administrativa discorre:
Está bastante clara a intenção da lei de abranger toda e qualquer pessoa que
exerça função pública, a qualquer título. Portanto, não há como excluir
promotores, nem juízes, da sujeição às penas e à indenização previstas no artigo
12 da lei de Improbidade. 82
Finalmente, ainda no campo das responsabilidades, não se pode esquecer que
está o representante do Ministério Público sujeito a responsabilização penal, cujo Código
Penal vigente prevê algumas condutas do sujeito ativo que inclusive pode ser o promotor de
justiça, ressalvando-se a necessidade de presença de dolo especifico.
3.6 - Recursos no Inquérito Civil
Embora silencie à respeito a Lei da Ação Civil Pública, sobre a possibilidade de
interposição de recursos quando da instauração ou não do inquérito civil, a Lei Orgânica do
Ministério Público do Estado de São Paulo,o faz de forma inovadora, disciplinando nos
artigos 107 e 108, dois recursos oponíveis em ambas as situações.
Assim, da decisão proferida pelo representante do Ministério Público que
preside o inquérito civil consistente em rejeitar a representação para a instauração do
procedimento de inquérito, o interessado poderá no prazo de dez dias, contados da data em
que tenha tomado ciência da decisão, apresentar recurso junto ao Conselho Superior do
Ministério Público, o que entendem-se como mecanismos de controle interno, destacando
que pode ocorrer controle judicial sobre o inquérito civil.
82 Ação civil pública. SP: Saraiva 2001, Op. Cit. p. 257.
Edis Milaré ao tratar sobre o assunto diz que:
Trata-se, cabe notar, de recurso em princípio inócuo, porque, com ou sem ele e
suas razões, o indeferimento da representação deve ser sempre revisto pelo
Conselho Superior do Ministério Público, porque equivale ao arquivamento das
peças de informação.83
Igualmente caberá recurso, também dirigido ao Conselho Superior da
instituição, da decisão que determina a instauração do inquérito civil, desta feita, pelo prazo
de cinco dias, computados a partir da data de ciência, pelo investigado, da instauração.
Esse segundo recurso, segundo disciplina a lei orgânica estadual, tem efeito
suspensivo, impedindo o início das investigações até o final julgamento do mesmo.
Entretanto, há quem argumente nesse segundo caso que a Lei Complementar é
inconstitucional, sob o argumento de que não pode o Estado legislar sobre recursos ou até
mesmo sobre o inquérito civil, por se tratar de norma processual.84
Para Hugo Mazzilli
É írrito o sistema de recursos no inquérito civil, criado pela lei estadual. Ainda
que em tese pudesse o legislador estadual dispor sobre procedimento, não está a
disciplina do inquérito civil contida no objeto da Lei Orgânica Estadual do
Ministério Público. O objeto a esta reservado consiste apenas em dispor sobre a
organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público, e não dar
disciplina normativa ao inquérito civil.85
Por ser o inquérito civil um procedimento e não um processo conforme alhures
exposto pode o Estado legislar, pois, não se trata, portanto, de norma processual, nem
mesmo de direito material, onde somente a União tem competência exclusiva, nos termos
do disposto no artigo 22, inciso I da Magna Carta86.
A Lei Complementar não pode inviabilizar direta ou indiretamente o alcance de
um instituto já regulado por norma geral. A legislação Estadual, qualquer que seja, deve
estabelecer normas relativas ao domínio da competência estadual.
83 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. A gestão ambiental em foco. São Paulo: Revista dos Tribunais. 5ª ed., 2008, p. 970. 84 Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 10ª ed., 2005, p. 1332, nota 6 85 Op. cit. p. 340. 86 Artigo 22, inciso I, Constituição Federal: Compete privativamente a União legislar sobre: direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho
Inobstante tais discussões, é certo, como bem apontado por Luiz Manoel Gomes
Junior que “de qualquer modo, perfeitamente admissível à impetração de Mandado de
Segurança ou mesmo habeas corpus, desde atendidos os requisitos legais87.
Assim, qualquer medida adotada pelo presidente do inquérito civil no sentido de
impedir o direito de locomoção do investigado, é possível a impetração de habeas corpus e,
qualquer medida que viole o direito liquido e certo do investigado, desde que não amparado
por habeas corpus, é cabível a impetração de mandado de segurança.
3.7- Arquivamento e seus efeitos
Entendendo o representante do Ministério Público que as investigações
desencadeadas e a prova coligida no transcorrer do inquérito civil não são suficientes para a
propositura da ação civil pública ou até mesmo para a celebração de termo de ajustamento
de conduta, determinará que se proceda a seu arquivamento.
Segundo Luiz Guilherme da Costa Wagner Junior:
O inquérito civil poderá ser arquivado: a) porque a investigação dos fatos
demonstrou inexistirem os pressupostos fáticos ou jurídicos que sirvam de base
ou a justa causa para a propositura da ação civil pública, b) porque a investigação
demonstrou que, embora, tivessem existido tais pressupostos, ficou prejudicado o
ajuizamento da ação.88
José dos Santos Carvalho Filho, ao tratar do assunto, elenca duas espécies de
arquivamento:
O arquivamento institucional e o arquivamento administrativo e traz suas
distinções: a) enquanto o arquivamento de natureza institucional se origina pela
falta de eleentos para a propositura da ação civil pública, o arquivamento
administrativo é provocado por fato impeditivo do ajuizamento da ação (como
p.ex, o compromisso de ajustamento de conduta,; ou o desaparecimento da
violação legal; ou o desaparecimento do sujeito ou do objeto da violação, etc); b)
o arquivamento de natureza institucional, por ser relativo ao exercício de uma das
funções institucionais, vale dizer, o ajuizamento da ação civil pública, deve ser
objeto de reapreciação pelo Conselho Superior do Ministério Público; o
arquivamento administrativo, ao contrário, significa o desfecho de mero
procedimento administrativo, razão pela qual deve ser definido pelo próprio
87 Curso de Direito Processual. Op. cit. p. 261. 88 Ação Civil Pública como instrumento de defesa da ordem urbanística. Belo Horizonte: Del Rey. 2003, p. 166.
órgão Ministerial que o preside, sem qualquer necessidade de sofrer reexame por
órgão institucional diverso .89
O arquivamento dos autos do inquérito civil não está adstrito a intervenção do
Poder Judiciário como nos casos de arquivamento de inquérito policial, quando optar o
representante do Ministério Público pela promoção de arquivamento, esse deverá de modo
fundamentado fazê-la e posteriormente, sob pena de falta funcional remeter os autos ao
Conselho Superior do Ministério Público, no prazo de três dias, prazo esse improrrogável.
O Conselho Superior do Ministério órgão de execução do Ministério Público,
composto por procuradores de justiça, presidido pelo Procurador Geral de Justiça, analisara
as razões de convencimento do membro oficiante que optou pelo arquivamento.
O Conselho Superior poderá chancelar a opinião manifestada pelo membro do
Ministério Público que requereu o arquivamento, ou discordando determinará o
prosseguimento das investigações se o caso, ou ainda, havendo elementos suficientes para a
tomada de providencias cabível a espécie determinará a propositura de ação civil pública,
designando para tanto nesses dois casos, outro promotor de justiça que se consubstanciará
por ato do Procurador Geral de Justiça.
Como bem observado por Paulo Marcio da Silva:
O promotor de justiça designado não poderá realizar qualquer avaliação de ordem
subjetiva (analise de mérito) quanto ao aforamento ou não da ação civil pública,
posto que, na condição de órgão de execução especialmente designado apenas
exterioriza um convencimento, uma manifestação que é originária do Conselho
Superior.90
Hugo Nigro Mazzilli faz interessante comentário acerca de conseqüências que
surgem com relação ao membro do Ministério Público que promoveu o arquivamento:
Aquele membro do Ministério Público que tinha promovido o arquivamento do
inquérito civil estará logicamente impedido de oficiar: a) na ação civil pública
que venha ser ajuizada por um colega seu, em decorrência da não homologação
do arquivamento pelo Conselho Superior da instituição; b) na ação civil pública
ou na ação coletiva ajuizada por qualquer co-legitimado de que cuidam o artigo 5,
inciso II da Lei da Ação Civil Pública e o artigo 82 do Código de Defesa do
Consumidor.91
89 Ação Civil Pública Comentários por Artigos. Rio de Janeiro: Lúmen Júris Editora, 2009, p. 298. 90 O Inquérito Civil e a ação civil pública. Op. cit. 138. 91 O inquérito civil . São Paulo. Saraiva. p. 323.
É importante frisar nesse particular que, embora seja de competência exclusiva
do Ministério Público a instauração e presidência do inquérito civil, seu arquivamento não
impede que os demais co-legitimados à propositura da ação civil pública proponham tal,
caso entendam cabível e caso disponham de outros elementos.
Os efeitos do arquivamento como trazido pela própria legislação, mais
precisamente no artigo 9 da Lei da Ação Civil Pública não impede que outros co-
legitimados ingressem em Juízo com a ação civil pública. Luis Roberto Proença92 escreve
que “o arquivamento do inquérito civil não é obstáculo do exercício da ação por outro ente
oficial ou particular não constituindo coisa julgada formal”.
Aliás, qualquer dos entes co-legitimados que porventura discordem do
arquivamento promovido pelo órgão de execução do Ministério Público, podem levar ao
Conselho Superior, as razões, desde que fundamentadas, que entender importantes e
necessárias para justificar a intervenção ministerial.
As razões por razões legais, devem ser escritas e não oral e apresentadas dentro
do prazo legal, qual seja, antes da homologação ou da rejeição do arquivamento.
Após homologada pelo Conselho Superior a promoção do arquivamento, o
inquérito civil somente poderá desarquivado, se surgirem novas provas, aplicando-se aqui,
analogicamente o disposto no artigo 18 do Código de Processo Penal, quando trata do
desarquivamento do inquérito policial.
A questão afeta ao desarquivamento não foi tratada pela Lei da Ação Civil
Pública, mas sim pela Resolução 23 do Conselho Nacional do Ministério Público, desse
modo, o desarquivamento deverá se dar mediante decisão fundamentada, com a exposição
dos novos fatos ou provas suficientes a permitir novo desencadear das investigações.
A reabertura das investigações não deve ser submetida ao crivo do Conselho
Superior do Ministério Público, salvo se desse resultar em novo pedido de arquivamento.
O prazo máximo para o desarquivamento do inquérito civil, em qualquer
hipótese, é de seis meses a partir do arquivamento. Transcorrido esse prazo, instaura-se
novo inquérito civil, muito embora possam ser utilizadas as provas já colhidas.
Destaca-se ainda, ser vedado o arquivamento implícito do inquérito civil, isso
porque, quando proposta a ação civil pública ou celebrado termo de ajustamento de que não
tenha como objeto todos os fatos referidos na portaria de instauração de inquérito civil, o
representante do Ministério Público deverá submeter à apreciação também do Conselho
Superior o que não fora versado no bojo da ação desencadeada ou do termo celebrado.
92 Inquérito Civil . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, op cit p.45.
Acerca do tema, Mazzill diz que:
Trata-se de grave irregularidade que deve ser coibida, ainda quando praticada de
forma involuntária, seja por desatenção, seja até por negligência. Por falhas e
descuido, isso pode se dar quando: a) haja vários atos ilícitos, em tese, e o
promotor de Justiça só enfrente expressamente a falta de base para ajuizamento
de ação civil pública apenas quanto a alguns desses atos na promoção de
arquivamento; b) haja vários possíveis autores ou responsáveis pelas ilegalidades
e, na promoção de arquivamento, o promotor de Justiça não enfrente
expressamente a ausência de responsabilidade de alguns deles; c) o promotor de
Justiça proponha ação civil pública, mas esta que não cobre todos os atos ilícitos
ou todos os possíveis responsáveis pelas ilegalidades. 93
Em todos esses casos, se o promotor não fundamenta o arquivamento nem
destina suas ponderações ao órgão legalmente encarregado de rever o motivo pelo qual não
agiu em relação a alguns dos fatos ou algumas das pessoas investigadas, ai estará havendo o
chamado arquivamento implícito.
O inquérito civil, uma vez arquivado, nada impede que o mesmo seja reaberto,
bastando para tanto, o surgimento de novas provas que possam mudar o panorama anterior
que levou o membro do Ministério Público a determinar o arquivamento.
Quanto à possibilidade de desarquivamento, do inquérito civil, este poderá
ocorrer diante de novas provas ou para investigar fato novo relevante, podendo ocorrer no
prazo máximo de seis meses após o arquivamento.
Assim, após a homologação da promoção do arquivamento do Inquérito Civil
pelo Conselho Superior do Ministério Público, o órgão do Ministério Público só poderá
então proceder a novas investigações se de outras provas ou fatos conexos tiver notícia, ou
no surgimento de novos dados técnicos ou jurídicos.
O desarquivamento de inquérito civil deverá ser feito por decisão fundamentada
com a indicação de motivos de fato e de direito suficientes a permitir o restabelecimento
das investigações.
Tais exigências são decorrências do principio da segurança jurídica que nada
mais é do que um dos fundamentos basilares do Estado de Direito, informando não só os
princípios da irretroatividade da lei, da coisa julgada, bem como o respeito aos direitos
adquiridos e ao ato jurídico perfeito.
93 O inquérito Civil op. cit p. 261.
Importante salientar que o Ministério Público não se subsume as ordens
superiores de caráter normativo ou não, em decorrência da independência funcional, mas a
decisão anterior que é eficaz devido ao pronunciamento do órgão incumbido do reexame, o
que não pode ficar sujeito a novo julgamento, tampouco ao influxo de novas orientações
sumuladas pelo Conselho Superior do Ministério Público ou a membros que assuma as
funções daquele.
A Lei Federal 7.347/85 conclui pelo arquivamento possível a partir de novas
provas ,ou seja pela superveniência de fatos novos, quando devidamente comprovados,
pertinentes e suficientes para justificá-lo.
Desse modo, caso a reabertura ocorra com base em novos elementos de
convicção condizente a decisão de propositura da ação civil pública ou de reabertura das
investigações o órgão do Ministério Público não terá que subordinar a decisão do Conselho
Superior do Ministério Público, que só deverá se manifestar no caso de um eventual novo
arquivamento, de modo, que uma nova investigação não afeta a competência do promotor
natural.
3.8- Compromisso de Ajustamento de Conduta
O Compromisso de Ajustamento de Conduta é uma das alternativas previstas
pela Lei da Ação Civil Pública para a defesa dos bens difusos e coletivos tendo sido
introduzido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90).
O termo ou compromisso de ajustamento, dotado de eficácia de título executivo
extrajudicial, foi posteriormente inserido no § 6º do art. 5º da Lei da Ação Civil Pública,
por força do art. 113 do CDC, que dispõe que “os órgãos públicos legitimados podem,
mediante cominações, tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta
às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de titulo executivo
extrajudicial 94.
Desta feita é um procedimento que vem sendo tratado atualmente em diversas
legislações, como a Lei dos Portadores de Deficiência Física, Lei Ambiental, o Estatuto do
Idoso, Lei Antitruste dentre outras, tendo como finalidade precípua buscar saídas, com a
imposição de medidas negociadas para a reparação dos danos a interesses difusos e
coletivos.
94 A alteração trazida pelo Código de Defesa do Consumidor, no tocante a introdução do parágrafo 6º ao artigo 5.º da Lei da Ação Civil Pública para que o termo de ajustamento de conduta, até então previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, fosse aplicado a defesa de qualquer interesse difuso e coletivo foi alvo de discussões quanto a possibilidade de sua vigência. De modo profundo, escreveu sobre o assunto Hugo Mazzilli , in o Inquérito Civil, Saraiva: São Paulo. 2º ed. 2000, p. 363.
Hodiernamente tem sido a solução de conflitos de interesses mediante a
autocomposição, onde há renúncia por parte do compromissário da resistência oferecida a
pretensão e em razão do fato do Estado ser onipresente e não ter aparato suficiente para a
solução de todos os conflitos existentes na sociedade, o compromisso de ajustamento de
conduta abre uma nova perspectiva de composição de conflitos entre Administração e os
administrados, reduzindo em especial a demanda ao Poder Judiciário.
Cuida-se de importante instrumento para a solução dos conflitos
transindividuais, posto que nem sempre a tutela estatal garante que os direitos e interesses
coletivos sejam respeitados na sua integralidade.
Os princípios reitores do termo de ajustamento de conduta são: o de acesso à
justiça, o da prevenção, o da tutela especifica, o da aplicação negociada da norma jurídica e
o democrático. Esses princípios informam a interpretação do ajustamento de conduta e seus
desdobramentos práticos.
De efeito, essa alternativa de resolução de controvérsia de direitos
transindividuais é uma importante decorrência do Estado Democrático de Direito, pois
amplia o acesso à Justiça desse tipo de demanda, ao ensejar uma tutela mais breve,
econômica, em muitos casos, mais adequada do que a proporcionada pela via judicial.
Pode o compromisso de ajustamento de conduta ser celebrado em qualquer fase
do inquérito civil, desde que o fato esteja devidamente solucionado, bem como no decorrer
da ação civil pública, caso já proposta. Daí dizer ser o compromisso extrajudicial ou
judicial, respectivamente.
Sobrevindo o ajuste no curso do inquérito, o mesmo será arquivado, ressaltando
que somente assim se procederá em havendo abrangência total do que se investiga, posto
que, sendo parcial as investigações quanto aos demais fatos poderá prosseguir
normalmente.
Portanto, uma vez celebrado, não mais se encontrará patente o interesse de agir
necessário a propositura da ação civil pública.
Quanto a sua natureza jurídica o compromisso de ajustamento de conduta teria
natureza jurídica de transação, ou ainda teria ele situação jurídica própria que não se
confunde com o instituto civil da transação.
Por transação, ensina Carlos Roberto Gonçalves:
No sentido técnico-jurídico do termo, contudo, constituí negócio jurídico
bilateral, pelo qual as partes previnem ou terminam relações jurídicas
controvertidas, por meio de concessões mútuas. Resulta de um acordo de
vontades, para evitar os riscos de futura demanda, ou para extinguir litígios
judiciais já instaurados, em cada uma das partes abre mão de uma parcela de seus
direitos.95
Assim, por ser o objeto do ajuste interesses difusos e coletivos indisponíveis
que por sua vez são irrenunciáveis e inegociáveis e por ser o Ministério Público substituto
processual para agir na defesa desses interesses, conforme se depreende do disposto na
legislação coletiva, não podendo deles dispor a seu bel prazer, inviabilizado está à
aplicação do instituto da transação.
Embora tenha o compromisso de ajustamento natureza consensual, não tem ele
natureza contratual, típica do direito privado, uma vez que o órgão público que firmou o
acordo não pode realizar concessões mútuas de direito indisponível, circunstância que
desfigura um dos elementos constitutivos da transação, segundo dispõe o artigo 840 do
Código Civil, tem se que trata o compromisso de ajustamento instituto específico com
características próprias.
Fernando Grella Vieira ao analisar o conteúdo da norma prevista no artigo 5º
parágrafo 6º da Lei da Ação Civil Pública leciona que:
Tal norma, sem duvida, consagra hipótese de transação, pois destina se a prevenir
litígio (propositura da ação civil pública) ou a pôr-lhe fim (ação em andamento),
e ainda dotar os legitimados ativos de titulo executivo extrajudicial ou judicial,
respectivamente, tornando liquida e certa a obrigação.96
Hugo Nigro Mazzilli aponta suas principais características:
Trata-se de título executivo extrajudicial, passando a ser judicial, se homologado
pelo Juiz; dispensar testemunhas instrumentárias; permitir a execução das
obrigações de fazer independentemente de prévia ação de conhecimento; permitir
ação de execução por quantia certa, no tocante as sanções pecuniárias, se
descumpridas as obrigações de fazer.97
95. Direito Civil Brasileiro . 5ª ed. São Paulo: Saraiva, Vol. III, 2008, p. 541. 96 A transação na esfera da tutela dos interesses difusos e coletivos: compromisso de ajustamento de conduta. In: Milaré, Edis (coord). Ação Civil Pública: Lei 7.3471985 – 15 anos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 20012 ed.p.289. 97 A defesa dos interesses difusos em juízo. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2003 p.213
Luis Roberto Proença98 relata que “o compromisso de ajustamento de conduta,
efetivamente, demonstra diferenças tão substanciais em relação ao instituto civil, que
apenas um grande esforço de abstração conceitual poderia fazer uma espécie daquele”
Geisa de Assis Rodrigues em estudo profundo sobre o tema relata que:
O fato de compor um litígio não determina necessariamente que tenhamos que
qualificar o ajustamento de conduta como transação. Repise-se que não há no
ajustamento de conduta, e isso que é fundamental, a existência de concessões
recíprocas. O obrigado se compromete a cumprir uma conduta, que pode ter um
conteúdo variado, consubstanciando uma obrigação de fazer, não fazer, de
entregar coisa, de reparar, ou evitar um dano. Esse é o reconhecimento
fundamental do compromisso de ajustamento de conduta, ou seja, a aceitação que
deve adotar um determinado comportamento para que seu agir atenda as
exigências legais.99
Trata-se de um instituto com características próprias, e que, como visto, não
pode ser comparada ao instituto civil da transação, notadamente porque tem como efeito
principal o de acertar a conduta do obrigado às exigências legais, não sendo possível a
disposição do interesse metaindividual tratado.
Para o projeto de Lei que altera fortemente a Lei da Ação Civil Púbica, essa
discussão se encerra, pois de forma explicita passa a ter reconhecida sua natureza jurídica
como transação100.
Curioso aspecto do compromisso de ajustamento de conduta é o fato de que o
mesmo pode ser integral ou parcial. Luiz Roberto Proença escreve que:
Pode ser ele integral, esgotando todas as conseqüências jurídicas de um conjunto
de fatos ou pode se ele parcial, referindo-se apenas a alguns dos fatos ou das
conseqüências acarretadas por estes fatos, relegando-se o restante para o
prosseguimento das investigações ou para o deslinde judicial. 101
Nada impede a celebração de compromisso de ajustamento de conduta
envolvendo parte do que se esta investigando. É plenamente possível, sendo certo que a
outra parte do dano que não se quer reparar, seja objeto de futura ação civil pública102.
98 Inquérito Civil, atuação investigativa do Ministério Público a serviço do acesso à justiça, Op. cit. p.125 99 Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta, 1 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 147. 100 Art. 46. O termo de ajustamento de conduta terá natureza jurídica de transação, com eficácia de título executivo extrajudicial, sem prejuízo da possibilidade da sua homologação judicial, hipótese em que sua eficácia será de título executivo judicial. 101 Op. cit. p.127.
102 Autorizando tal proceder foi editada a Súmula 20 C.C.S.M.P.S.P.:Quando o compromisso tiver a característica de ajuste preliminar, que não dispense o prosseguimento de diligências
Entretanto para que tenha eficácia plena deverá ser revestido de liquidez,
devendo estipular obrigação certa quanto à sua existência e determinada quanto ao seu
objeto, devendo ser estabelecido multa cominatória para o caso de descumprimento.
Terá por objeto, a prevenção de dano, ou a reparação caso o dano já tenha se
efetivado, visando sempre, que o responsável pela obrigação assuma seu cumprimento em
instrumento formal e solene, salvo nos casos de improbidade administrativa onde torna-se
impossível a celebração de ajustamento de conduta.
José Marcelo Menezes Vigliar103 aduz que “os atos de improbidade
administrativa são de natureza tal que, uma vez realizados, advém o dever de ajuizamento
da ação civil pública para reconhecimento do mesmo e conseqüente imposição de pena”.
Luiz Manoel Gomes Junior tratando do assunto ensina que:
A intenção do legislador, bem como sua própria finalidade da norma proibitiva é
bem clara: vedada qualquer espécie de acordo quando a hipótese sub judice
estiver abarcada pela Lei de Improbidade Administrativa.104
Hugo de Nigro Mazzilli105, comungando quanto a impossibilidade de
celebração do termo de ajustamento de conduta nos casos de improbidade administrativa
admite ser possível “o parcelamento de obrigações, sem a dispensa dos juros legais e feita a
correção monetária pelos índices oficiais”.
No mesmo sentido Eurico Ferraresi106, para quem;
A expressa vedação de transação, acordo ou conciliação nas ações de
improbidade, nos termos do parágrafo 1 do artigo 17 da Lei 8.429/1992, merece
nova interpretação. O artigo 12 da citada lei afirma que o responsável pelo ato de
improbidade fica sujeito a inúmeras sanções, como a perda dos bens ou valores
acrescidos ilicitamente ao patrimônio, o ressarcimento integral do dano, a perda
da função pública, a suspensão dos direitos politicos, o pagamento de multa, a
proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos
fiscais ou crediticios, todavia, nada impede que o ressarcimento do dano e a perda
da vantagem indevida sejam objeto do ajuste de conduta. Se o responsável pelo
para uma solução definitiva, salientado pelo órgão do Ministério Público que o celebrou, o Conselho Superior homologará somente o compromisso, autorizando o prosseguimento das investigações. 103 VIGLIAR. José Marcelo Menezes. Ação Civil Pública. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1998, p. 90. 104 Ibd. p. 269. 105 Ibd. cit. p.394. 106Ação popular, ação civil pública e mandado de Segurança Coletivo, Op. cit. p 230.
ato ímprobo, de espontânea vontade, concorda em reparar o dano que haja
causado não se pode negar o ajustamento de conduta a respeito.
O Ministério Público do Estado de São Paulo através do Ato 168/98 que
aprovou o Manual de Atuação funcional dos Promotores de Justiça do Estado de São Paulo
permitindo expressamente o ajuste de conduta objetivando a reparação do dano decorrente
de ato de improbidade administrativa.
Assim, em virtude da indisponibilidade do bem protegido, ou seja, o patrimônio
público se torna inadmissível a pactuação de termo de ajustamento de conduta em inquérito
civil, cujo objeto de investigação, seja atos de improbidade administrativa.
Inaceitável também que no ajuste se discuta a questão da perda dos direitos
políticos do agente ímprobo, que como cediço, somente por decisão judicial é que pode ser
ou não imposta.
A idéia do legislador ao vedar a celebração de ajuste de condutas em
procedimentos que investiguem a prática de atos de improbidade levou em consideração, a
gravidade de tais atos, o desencorajamento de novas práticas, e, o fato de que não se pode
deixar nesses casos de se propor ação civil pública, para subseqüente imposição das penas
previstas na Lei de Improbidade.
Para José dos Santos Carvalho Filho, como todo ato jurídico:
A validade do compromisso de ajustamento de conduta deve sujeitar-se à
observância de certos requisitos. Sem eles, o ato será inválido e inidôneo a
produzir os efeitos que dele se espera. Os requisitos se agrupam em quatro
categorias, sendo eles, objetivo, subjetivos, formais e temporais.107
Os requisitos enumerados pelo autor tratam inicialmente dos sujeitos que
participam do ato, desse modo, para ser válido primordial que aquele que violou a norma
manifeste vontade em submeter se as condições do ajustamento e de outro lado, a presença
do órgão público compromissário, responsável legalmente pela elaboração do termo
(requisito subjetivo).
Quanto ao objeto e conteúdo, com exceção dos atos de improbidade
administrativa, conterão o termo de ajustamento, a descrição detalhada da conduta
violadora dos interesses difusos e coletivos, as providências a serem adotadas pelo violador
da conduta, atendidas as exigências legais e finalmente, deve a obrigação ser juridicamente
107 Ação Civil Pública Comentários por Artigo. Rio de Janeiro: Lúmen Júris Editora, 2009. p.
223.
possível (requisitos objetivos). Quanto à forma, indiscutivelmente será o ajuste firmado por
escrito, através de instrumento público ou privado (requisito formal). Por fim, quanto ao
tempo, todo e qualquer contrato, estipula-se um prazo para a execução do objeto,
notadamente nos contratos de obrigação de fazer e não fazer, com o compromisso de
ajustamento de conduta não é diferente. Devera constar o prazo para que o agente violador
repare sua conduta lesionadora, pois, se assim não fosse, o instrumento seria inócuo,
restando desnaturado (requisito temporal).
Uma vez firmado o ajuste no âmbito do inquérito civil ou em procedimento
preparatório, surge como conseqüência jurídica o arquivamento dos instrumentos
investigativos, razão pela qual deve o ajuste submeter-se à apreciação do Conselho
Superior do Ministério Público, para que seja homologada ou rejeitada a promoção de
arquivamento. Formalizado o ajuste o juiz da causa, os pressupostos legais de
admissibilidade serão por ele avaliadas.
Nesse sentido a Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo é
clara em dispor em seu artigo 112 que: “A eficácia do compromisso ficará condicionada a
homologação da promoção de arquivamento do inquérito civil pelo Conselho Superior do
Ministério Público”.
Sobre a questão, assevera Mancuso:
Com efeito, se a promoção de arquivamento do inquérito civil deve ser submetida
a exame e deliberação do Conselho Superior do Ministério Público (Lei 7.347/85,
art. 9º, § 3º), parece-nos que, com maior razão – e, quanto mais não fosse, por
justificada cautela, deve o promotor de justiça oficiante colher a prévia oitiva do
Conselho quando se desenhe a virtualidade da transação nos autos da ação em
curso; até porque, uma vez homologado, o acordo receberá a imutabilidade da
coisa julgada.108
Em sentido diverso aponta a Súmula de Entendimento n. 25 do Conselho
Superior do MP paulista, que dispõe não haver intervenção do CSMP quando a transação
for promovida por promotor de justiça no curso de ação civil pública ou coletiva.
Quanto à legitimação ativa para a formalização do ajuste de conduta, este pode
ser firmado perante o Ministério Público ou os órgãos públicos legitimados. Em regra,
seriam legitimados todos aqueles que são dotados de autorização legal para proporem a
ação civil pública.
Sobre a questão, Hugo Nigro Mazzilli aponta três categorias legitimadas:
108 Inquérito Civil. p. 319.
a) dos legitimados incontroversos: Ministério Público, União, Estados,
Municípios, Distrito Federal e órgãos públicos, ainda que sem personalidade
jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses metaindividuais; b) a
dos legitimados que não podem, de forma alguma, firmar o ajuste: associações
civis, sindicatos e fundações privadas; e c) a dos legitimados controversos, como
as fundações públicas, autarquias, empresas públicas e sociedades de economia
mista. Quanto ao último grupo, entende o autor serem legitimados: [...] os órgãos
pelos quais o Estado administra o interesse público, ainda que integrem a
chamada administração indireta” (autarquias, fundações públicas e empresas
públicas); acrescentando que o mesmo não se aplica quanto às empresas estatais
que “ajam na qualidade de exploradoras da atividade econômica [...] como é o
caso das sociedades de economia mista e empresa públicas quando ajam em
condições de empresas de mercado.109
Há que se notar que as associações, embora legitimadas a propositura da ação
civil pública, não encontram no rol de legitimados para a celebração de compromisso de
ajustamento de conduta, o que é um contra sendo em sua extensa maioria possuindo
finalidade exclusiva a defesa dos interesses coletivos e muito mais capacidade do que
alguns entes públicos.
Para Edis Milaré 110, não basta somente a presença desses requisitos se fazendo
necessário para que tenha o compromisso de ajustamento firmado, validade e eficácia a
intervenção do Ministério Público.
Já Luis Roberto Proença, indica que:
Por uma razão de ordem prática não se recomenda a participação do Ministério
Público nos compromissos firmados por outros órgãos.É simplesmente irrealista
imaginar que todos os eventuais compromissos de ajustamentos firmados pelos
outros órgãos públicos, relativos a sua parcela do poder policia, devam em
antecipação ser referendados pelo Ministério Público. 111
Ao Ministério Público devem ser submetidos os compromissos de ajustamento
de conduta celebrados por outros órgãos, tendo em vista a posição de protagonista da tutela
dos interesses transindividuais conferida, pelo ordenamento jurídico a instituição.
A celebração de compromisso de ajustamento pelo órgão do Ministério Público
sonega dos co-legitimados a interesse processual para demandar em Juízo com relação ao
objeto do mesmo, autorizando, em conseqüência, a propositura de ação visando a defesa
dos interesses não abrangidos pelo termo celebrado.
109 Id p.329. 110 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 5. ed. p. 978 111 Op. cit.129.
Conforme visto, dentre as características do compromisso de ajustamento de
conduta está a de que, uma vez firmado, e, observadas todas as formalidades para tanto, se
transforma em titulo executivo extrajudicial, o que implica dizer que, não sendo o mesmo
cumprido em seus exatos termos, autorizado esta, a instauração de processo de execução,
cujo rito, dependerá da natureza das obrigações constantes no compromisso (obrigação de
fazer, não fazer, de entregar coisa ou de pagar quantia).
A hipótese mais comum de execução por quantia certa nesses casos se dá
quando o compromisso tiver como único objeto obrigação de indenizar.
Uma vez não cumprido o ajuste celebrado, tem o órgão do Ministério Público, o
dever de executá-lo, por aplicação analógica do disposto no artigo 15 da Lei da Ação Civil
Pública112.
O compromisso pode ser rescindido, nos termos do artigo 486 do CPC,
mediante ajuizamento de ação anulatória, bastando a ocorrência de quaisquer das hipóteses
desenhadas pela legislação processual.
Pode ainda, em sendo seu objeto lesivo ao patrimônio público, a moralidade
administrativa, ao meio ambiente, ao patrimônio histórico e cultural, ser ajuizada por
qualquer cidadão ação popular, com a finalidade de anulação do objeto ilícito.
É possível ainda, havendo abusos ou a adoção de medidas que extrapolem os
limites da legalidade, a propositura de Mandado de Segurança, habeas corpus, dentre
outros remédios constitucionais, disponíveis para assegurar a ordem jurídica efetiva e
plena.
O Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos traz em seu artigo
12 e parágrafo único que:
O Ministério Público e os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos
interessados compromisso de ajustamento de conduta às exigências legais, mediante as
cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial, sem prejuízo da
possibilidade de homologação judicial do compromisso, se as partes assim requererem
quando o compromisso de ajustamento for tomado por legitimado que não seja o Ministério
Público, este deverá ser cientificado para que funcione como fiscal.
Ora, em se concretizando a existência do Código, o compromisso de
ajustamento de condutas formalizado pelo Ministério Público e demais co-legitimados, será
112 Artigo 15: Decorridos sessenta dias do trânsito em julgado da sentença condenatória, sem que a associação autora lhe promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos demais co-legitimados.
resolvidos sem maiores discussões, especialmente quanto a necessidade do Ministério
Público intervir, nos termos de que não participa o que atualmente não ocorre como vimos.
Por fim, é importante destacar a inovação que pretende a nova Lei da Ação
Civil Pública ao dispor que o Conselho Nacional do Ministério Público irá manter um
cadastro nacional, uma espécie de banco de dados, onde estarão arquivados todos os
ajustamentos de conduta celebrados a permitir que todos tenham acesso, sejam membros do
Poder Judiciário, sejam co-legitimados, sejam pessoas da sociedade civil113.
Com isso, sem sombra de dúvidas haverá um controle e uma fiscalização muito
maior do cumprimento de tais ajustes, dentre outros benefícios que a medida traz.
3.9 – Projeto de Lei que altera a Lei n.º 7.347/1985 em relação ao
Inquérito Civil
Tramita no Congresso Nacional, o Projeto de Lei nº.5.139/09, em virtude do
anseio do Ministério da Justiça desejar adequar a legislação pátria "às significativas e
profundas transformações econômicas, políticas, tecnológicas e culturais em âmbito global,
significativamente aceleradas nesta virada do século XX, para o fim de prever a proteção de
direitos que dizem respeito à cidadania".
Nada obstante a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) e o Código de Defesa do
Consumidor (Lei 8.072/90), além de outros diplomas normativos federais, disporem sobre
as ações coletivas, o que criou o que se chama hoje de "sistema único coletivo brasileiro",
considerou-se que há uma necessidade de aperfeiçoamento e modernização deste, "com
vistas a adequá-lo às novas concepções teóricas, nacionais e internacionais, e à nova ordem
constitucional".
Diante disto, "o Ministério da Justiça instituiu, por meio da Portaria nº 2.481, de
09 de dezembro de 2008, Comissão Especial composta por renomados juristas e operadores
do Direito, com representação de todas as carreiras jurídicas", a qual formulou o
anteprojeto em questão.
Dentre os renomados especialistas que fizeram parte da referida comissão,
pode-se mencionar, sem prejuízo da notabilidade dos demais integrantes: Ada Pellegrini
Grinover, Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, Antônio Carlos de Oliveira Gidi, Elton
113 Artigo 50: O Conselho Nacional do Ministério Público organizará e manterá o Cadastro Nacional de Inquéritos Civis e de Termos de Ajustamento de Conduta, com a finalidade de permitir que os órgãos do Poder Judiciário, os co-legitimados e os interessados tenham amplo acesso às informações relevantes relacionadas com a abertura do inquérito e a existência do Termo.
Venturi, Gregório Assagra de Almeida, Luiz Manoel Gomes Júnior, Luiz Rodrigues
Wambier e Sérgio Cruz Arenhart.
Recentemente, em 13.04.09, os chefes dos três poderes a nível federal
firmaram o "II Pacto Republicano de Estado por um Sistema de Justiça mais acessível", que
tem entre seus objetivos (item 3.2) a "revisão da Lei da Ação Civil Pública, de forma a
instituir um Sistema Único Coletivo que priorize e discipline a ação coletiva para tutela de
interesses e direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, objetivando a
racionalização do processo e julgamento dos conflitos de massa".
Assim sendo, pode-se reputar iminente a aprovação do projeto de lei em
questão, de modo que sua análise preliminar torna-se de suma importância, até como forma
de estimular o debate que permeará seu trâmite procedimental junto ao Congresso
Nacional.
O projeto, mais precisamente em seu Capitulo X, traz alterações inovadoras no
que pertine ao inquérito civil e ao termo de ajustamento de conduta, porém ainda não é o
suficiente para encerrar as diversas discussões que pairam sobre os institutos, o que com
certeza ainda fará com que Poder Judiciário intervenha e os órgãos de cúpula do Ministério
Público regulem a matéria administrativamente.
Fora isso, a primeira vista já se percebe que foi muito mais além do que as
previsões anteriores.
A primeira grande inovação é o fato de que será possível o representante do
Ministério Público instaurar inquérito civil embasado por denúncia anônima, não que antes
não se podia, todavia, não havia previsão legal.
É certo entretanto, que ainda assim, deve se cercar o promotor receptor da
denúncia anônima de todas as cautelas necessárias, para ao depois tomar as providências
que a espécie reclama.
Outro ponto objeto do projeto que esta a merecer aplausos é a criação pelo
Conselho Nacional do Ministério Público de um cadastro nacional quanto a existência dos
inquéritos civis instaurados e dos ajustes de conduta celebrados, para que todos da
sociedade civil, do Poder Judiciários, e demais órgãos co-legitimados tenha amplo acesso a
esse banco de dados.
Inova ainda, com muito êxito, o projeto de lei em comento quanto à estipulação
de prazos para o cumprimento por aquele que conduz o inquérito civil, o que evitará que
tais procedimentos se eternizem e se percam no tempo.
Ainda haverá muitas interpretações acerca do projeto apresentado, o que irá
contribuir muito para seu aperfeiçoamento nos ponto que necessita, afinal trata-se apenas
de projeto.
4- O INQUÉRITO CIVIL E A DEFESA DOS DIREITOS
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
Antes de adentrar especificamente sobre os interesses individuais homogêneos,
mister discorrer sobre o direito coletivo, para que então os interesses individuais
homogêneos sejam tratados na esfera do inquérito civil
Segundo Rodolfo de Camargo Mancuso o direito pode ser sempre conceituado
como coletivo se presentes os seguintes requisitos:
Um mínimo de organização a fim de que se tenha a coesão necessária à formação
e identificação do interesse da causa, a afetação desse interesse a grupos
determinados ou determináveis, um vínculo jurídico básico comum a todos os
aderentes, conferindo-lhes unidade de atuação e situação diferenciada. 114
Assim, direito coletivo, é a designação genérica para as modalidades de direitos
transindividuais, quais sejam o difuso e o coletivo strictu sensu, direitos esses pertencentes
a um grupo de pessoas, a uma classe, categoria, ou seja, a própria sociedade.
Os direitos difusos e coletivos estão na Constituição Federal de forma
garantida, sendo diferenciados de acordo com vários elementos ou ainda espécies.
Hermes Zanetti jr: ao tratar sobre direitos difusos em sua obra o faz da seguinte
maneira:
São direitos difusos os direitos transindividuais , ou seja, aqueles pertencentes a
vários indivíduos cuja natureza seja indivisível e cujos titulares sejam pessoas
114 O município enquanto Co-legitimado para a tutela dos interesses Difusos, Revista de processo, São Paulo, Revista de processo, São Paulo, Revistas dos Tribunais, 1987, nº 48, PP.47.
indeterminadas (ou seja, indeterminabilidade dos sujeitos, não há individuação)
ligadas por circunstâncias de fato, não existe um vínculo comum de natureza
jurídica, v.g., a publicidade enganosa ou abusiva, veiculada através de imprensa
falada, escrita ou televisionada, a afetar uma multidão incalculável de pessoas,
sem que entre elas exista uma relação jurídica-base.115
São direitos coletivos stricto sensu , segundo definição encontrada no Código
de Defesa do Consumidor precisamente no art. 81, parágrafo único, II :
Os transindividuais de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria
ou classe de pessoas (indeterminadas, mas determináveis, enquanto grupo categoria ou
classe) ligadas entre si, ou com a parte contrária, por uma relação jurídica base.
Essa relação jurídica base pode se dar por exemplo entre os membros do grupo
affectio societatis ou pela sua ligação com a parte contrária, o que teremos caso como
qualquer associação de profissionais e com contribuintes de determinado imposto.
A relação-base necessita ser anterior à lesão, ou seja, ter caráter de
anterioridade, podendo acrescentar o caso da publicidade enganosa, a "ligação" com a parte
contrária também ocorre, só que em razão da lesão e não de vínculo precedente, o que a
configura como direito difuso e não coletivo stricto sensu.
Outro elemento diferenciador entre o direito difuso e o direito coletivo é a
determinabilidade e a decorrente coesão como grupo, categoria ou classe anterior à lesão,
fenômeno que se verifica nos direitos coletivos stricto sensu e não ocorre nos direitos
difusos.
Contudo, o que importa é a possibilidade de identificar um grupo, categoria ou
classe, vez que a tutela revela-se indivisível, e a ação coletiva não está disponível aos
indivíduos que serão beneficiados.
Para Kazuo Watanabe, o que diferencia os direitos coletivos dos direitos difusos
é A determinabilidade das pessoas titulares:
Seja através da relação jurídica-base que as une entre si (membros de uma
associação de classe ou ainda acionistas de uma mesma sociedade), seja por meio
do vínculo jurídico que as liga à parte contrária (contribuintes de um mesmo
tributo, contratantes de um segurador com um mesmo tipo de seguro, estudantes
de uma mesma escola etc.).116
115 ZANETTI JÚNIOR, Hermes. Direitos coletivos lato sensu: a definição conceitual dos direitos difusos, dos direitos coletivos stricto sensu e dos direitos individuais homogêneos. In: AMARAL, Guilherme & CARPENA, Márcia Louzada Carpena (Coord.). Visões críticas do Processo Civil. Porto Alegre, Livraria do Advogado. 2005 116 GRINOVER, Ada Pellegrini ; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos e ; FINK, Daniel Roberto ; FILOMENO, José Geraldo Brito ; NERY JÚNIOR, Nelson ; DENARI, Zelmo . Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. 1062 p.98.
Para Zanetti117, é preciso determinar o grupo, categoria ou classe beneficiado
em sua amplitude e dimensão não-individual, sendo indiferente a identificação da “pessoa
titular”, pois, a prestação será indivisível, “beneficia um, beneficia a todos”.
Já os direitos individuais homogêneos, são tidos como direitos subjetivos
individuais, direito esse ligado entre si por uma relação de afinidade, de semelhança, de
homogeneidade, permitindo assim a defesa coletiva de todos eles.
Segundo Teori Albino Zavaschi
Os interesses ou direitos individuais homogêneos são aqueles decorrentes de
origem comum. A origem comum pode ser de fato ou de direito, não implicando
necessariamente, que haja unidade factual e temporal. Os direitos individuais
homogêneos têm caráter predominantemente individualizado, são perfeitamente
divisíveis entre os titulares, há ordenamento de relação de titularidade com o bem
da vida violado ou disputado, e este, também por sua vez, é perfeitamente
distribuído e individualizado entre os titulares, no entanto pode postular a
proteção jurisdicional coletivamente, em face da origem comum do direito
afirmado. 118
Afirma ainda tratar-se de direitos originados da incidência de um mesmo
conjunto normativo sobre uma situação fática idêntica ou assemelhada, produzindo um
conjunto de direitos subjetivos com os seguintes aspectos fundamentais de identidade: a) o
relacionado à própria existência da obrigação; b) o que diz respeito a natureza da prestação
devida e; c) o concernente ao sujeito passivo (ou aos sujeitos passivos), comuns a todos
eles”.
Segundo Mazzilli119, os interesses individuais homogêneos “compreendem os integrantes
determinados ou determináveis de grupo, categoria ou classe de pessoas que compartilham
prejuízos divisíveis, oriundos das mesmas circunstâncias de fato”.
Os direitos individuais homogêneos se destacam dos direitos difusos porque estes têm
indeterminação quanto aos titulares e são indivisíveis e dos direitos coletivos se destacam
porque estes também não têm titular individualizado, mas sim o grupo identificado, e
também tem natureza indivisível.
117 Didier Junior, et al , Curso de Direito Processual Civil – vol. 4,São Paulo: editora Quartier latim, 2005,p.103 118 Processo Coletivo, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 157 119 A Defesa dos Interesses Difusos e Coletivos em Juízo, 23º ed., São Paulo: Saraiva 2003, p. 10.
Assim, vê se que a falta de indivisibilidade é a principal característica dos
interesses individuais homogêneos. Sendo possível o fracionamento, não haverá, a
princípio, tratamento unitário obrigatório, sendo factível a adoção de solução diferenciada
para os interessados.
Esses interesses individuais homogêneos, pode se dizer, são essencialmente
individuais e acidentalmente coletivos. É preciso para alcançar a qualificação de
homogêneos, o envolvimento de uma pluralidade de pessoas e decorrer de uma origem
comum.
Em suma, Inicialmente, os direitos difusos, são os direitos transindividuais, de
natureza indivisível, em que os titulares são pessoas indeterminadas e ligadas por uma
circunstância de fato.
A título ilustrativo, podemos citar a publicidade enganosa ou abusiva, veiculada
através de imprensa falada, escrita ou televisionada, a afetar uma multidão incalculável de
pessoas, sem que entre elas exista relação base; assim como a colocação no mercado, de
produto de alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança dos
consumidores. (art. 10 do Código de Defesa do Consumidor - Lei Federal n.º 8078/90).
Em ambos os casos o bem jurídico tutelado é indivisível, pois uma única ofensa foi
suficiente para a lesão de todos os consumidores, igualmente a satisfação de um deles, pela
retirada do produto do mercado, beneficia todos eles ao mesmo tempo. O ato atingiu todos
os consumidores em número incalculável, sem estarem ligados por uma relação jurídica
base ao fabricante do produto.
Os interesses ou direitos coletivos em sentido estrito são os direitos transindividuais
de natureza indivisível de que sejam titulares grupos, categorias ou classes de pessoas
ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base (preexistente à
lesão).
A tutela do Estado para estes direitos visa tratá-los de uma forma molecular ,assim
como nos direitos difusos, tendo, porém uma clara distinção conceitual entre eles.
O traço mais marcante de tal distinção é a capacidade que aqui temos de
determinar (não individualizar) as pessoas titulares destes direitos, seja através da relação
jurídica base (por exemplo, membros de uma associação de classe), seja por meio do
vínculo jurídico (contribuintes de um mesmo tributo) que as liga à parte contrária.
Uma das conseqüências de sua natureza indivisível, é que não raro, após o
ganho de causa, a proteção alcançada pela tutela jurisdicional se estenderá inclusive às
pessoas não pertencentes às associações autoras das ações coletivas, e foi por essa razão
que o art. 103, II do Código de defesa do Consumidor, estabeleceu que as sentenças
proferidas nessas ações se limitariam aos grupos, categorias ou classes que a pleitearam.
Vale dizer, porém, que se um indivíduo propõe ação coletiva e ela é julgada procedente, seu
efeito alcançará não somente seus filiados, como também toda a categoria.
No caso, por exemplo, de uma ação coletiva de associação de pais e alunos,
pleiteando redução das mensalidades, for julgada procedente, todos os pais não associados
também receberão tal benefício, porém, se o que se pretende for a devolução das quantias
pagas a mais pelos alunos, a demanda coletiva só será para tutela de interesses ou direitos
individuais homogêneos, e não de interesses coletivos, pois a origem de causa dos danos
era comum a todos e “penetrou” na esfera jurídica de cada um de forma diferente.
Já os direitos homogêneos embora,possa existir ou nao uma relação jurídica
base anterior (ele pode derivar do difuso ou do coletivo), o que importa é que sejam todos
os interesses individuais derivados de origem comum.
O vínculo com parte contrária em determinados casos é conseqüência da
própria lesão. Essa relação jurídica que nasce na lesão pode ser, ao contrário dos direitos
difusos e coletivos, individualizada na pessoa de cada um dos prejudicados, pois foram
atingidos de modos diferentes na sua esfera jurídica, permitindo aí a determinação, ou ao
menos, a determinalidade das pessoas atingidas cuja determinação acontece quando cada
um exercita seu direito, surgindo uma demanda que visa uma tutela coletiva de interesses
individuais e homogêneos.
O modelo processual coletivo por apresentar peculiaridades que o diferenciam
do modelo processual individual traz ao cuidar do tema, alguns posicionamentos que
merecem ser analisados.
O primeiro posicionamento, que com certeza é mais restritivo, acena pela
impossibilidade de defesa dos interesses individuais homogêneos, em sede de inquérito
civil, alegando-se que a Magna Carta teria aludido à defesa do Ministério Público apenas de
interesses difusos e coletivos e, deste rol, teriam sido excluídos os interesses individuais
homogêneos.
Carlos Mario da Silva Velloso sustentando esse posicionamento relata que:
Ao que tenho sustentado a legitimidade do Ministério Público, diante da
Constituição, restringe-se a promover o inquérito civil e a ação civil pública, para
a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros
interesses difusos e coletivos (C.F., art. 129, III). Não há menção, no inciso III do
art. 129 da Constituição, a direitos individuais homogêneos. 120
A despeito dessa afirmação, continua o autor:
É certo que direitos individuais homogêneos, que se identificam com interesses
sociais e individuais indisponíveis, podem ser defendidos, na ação civil pública,
pelo Ministério Público, tendo em vista a previsão expressa inscrita na
Constituição, art. 127, caput: “O Ministério Público é instituição permanente,
essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.121
Assim, pode se verificar que, apesar de defender que a legitimidade do
Ministério Público restringe-se para defesa dos interesses difusos e coletivos, vez que não
há menção expressa no inciso III do artigo 129 da Constituição Federal a direitos
individuais homogêneos, ressaltou ele que se estes se identificarem com interesses sociais e
individuais indisponíveis, podem ser defendidos e investigadas as lesões a eles lançadas.
E continua na mesma esteira de posicionamento vai mais além, pugnando pela
inconstitucionalidade dos artigos 117 e 81, ambos do Código de Defesa do Consumidor
asseverando que:
[...] ao ser elaborado o Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078, de 11 de
setembro de 1990) entendeu o legislador ordinário de inovar na Constituição, ao
estender, ex vi de seu art. 117, a ação civil pública. “à defesa dos direitos e
interesses difusos, coletivos e individuais, desde que se trata de “direitos de
interesses individuais homogêneos”. “assim entendidos os decorrentes de origem
comum”, conforme específica o art. 81 do mesmo Código. A enumeração de três
espécies de interesses protegidos por ação civil publica – os difusos, os coletivos
e os individuais homogêneos, afigura-se- me manifestamente inconstitucional.
Concluindo que: A meu ver, o art. 81 do Código de Defesa do Consumidor, em
correlação com o seu art. 127, não pode servir de supedâneo legitimador desse
desideratum, não somente porque os direitos postulados não são indisponíveis,
mas também porque não encontram guarida no inciso III do art. 129, da
Constituição, por ser evidente que uma competência de ordem constitucional não
pode ser ampliada por lei ordinária, a pretexto de esclarecê-la.122
120 Temas de Direito Público, Belo Horizonte: editora Del Rey, 2003, p. 302-304
121 Temas de Direito Público, op cit. p. 303. 122 id. p. 111.
O Superior Tribunal de Justiça123 entendeu em julgado que enfrentou a
discussão relativa ao tema, pela impossibilidade atuação do Ministério Público na defesa
dos interesses individuais homogêneos.
Respeitado o entendimento esposado por Miguel Reale, tenho que, nada
impede que a lei infraconstitucional venha conferir novas funções ao órgão, se compatíveis
as finalidades institucionais, especificamente para defesa do interesse social e ou de
interesses indisponíveis.
Não prospera, porém, a alegada inconstitucionalidade, uma vez que a própria
Carta Magna prevê que é função institucional do Ministério Público “promover o inquérito
civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio
ambiente e de outros interesses difusos e coletivos” (art. 129, inc. III), com a ressalva do
exercício de “outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com a sua
finalidade” (art. 129, inc. IX), tornando implícita a legitimidade para a defesa de interesses
individuais homogêneos, desde que observado o “princípio da compatibilidade da defesa do
interesse com o perfil institucional”.
Um segundo posicionamento, por sinal ampliativo, preconiza que a resposta,
sobre a legitimidade do Ministério Público e a defesa de interesses individuais
homogêneos, seria sempre positiva, pois o legislador conferiu, em tese, legitimidade ao
Ministério Público para a defesa de quaisquer interesses transindividuais, conforme se vê
do disposto no artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor. Trata-se de uma presunção
legal e, nestes termos, não cabe ao intérprete questionar a presença ou não do interesse
social legitimador de sua atuação.
Ada Pellegrinne Grinover ensina que:
Não bastasse a legitimação a toda e qualquer ação coletiva, conferida ao
Ministério Público pelo art. 82, ao qual o art. 91 faz remissão, o próprio art. 92
reforça a idéia da titularidade do Ministério Público para o processo tratado no
capitulo ora em exame.124
E mais, segundo a autora:
Assim, foi exatamente a relevância social da tutela coletiva dos interesses ou
direitos individuais homogêneos que levou o legislador ordinário a conferir ao
123 Ação Civil Pública. Mensalidades Escolares. Repasse do Aumento dos Professores. Ministério Público. Parte Ilegitima. Não se cuidando de interesses difusos ou coletivos, mas de interesses individuais de um grupo de alunos de um determinado colégio, afasta-se a legitimidade do Ministério Público. Recurso provido (STJ, 1ª T., Resp 65836/MG, Rel. Min. Garcia Vieira, j. 14.06.1995, v. 1, publ. DJ 14.08.1995, p. 24002). 124 Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.op cit.145
MP e a outros entes públicos a legitimação para agir nessa modalidade de
demanda, mesmo em se tratando de interesses ou direitos disponíveis, em
conformidade, aliás, com a própria Constituição, que permite a atribuição de
outras funções ao MP, desde que compatíveis com sua finalidade (art. 129, IX); e
a dimensão comunitária das demandas coletivas, qualquer que seja seu objeto,
insere-as sem dúvida na tutela dos interesses sociais referidos no art. 127 da
Constituição.125
Noutras palavras, se o Código de Defesa do Consumidor autoriza o
Ministério Público ajuizar ação coletiva para defesa de todas as espécies de interesses
transindividuais, inclusive individuais homogêneos, não só em matéria atinente às relações
de consumo, mas também em qualquer outra área que envolva interesses transindividuais,
não haveria razão para restringir a iniciativa da instituição e excluir de sua investigação
danos a interesse coletivos e individuais homogêneos.
Além disso, reforça-se essa linha de pensamento com o previsto no artigo 6º,
inciso VII, alínea “d”, da Lei Complementar n.º 75/93, Lei Orgânica do Ministério Público
da União, e o artigo 25, inciso IV, alínea “a”, da Lei n.º 8.625/93, Lei Orgânica Nacional do
Ministério Público, invocando que também permitem o Ministério Público instaurar
inquérito civil para defesa de interesses individuais homogêneos.
Todavia, esse posicionamento generaliza por demais as hipóteses de atuação do
Ministério Público e inibe, a princípio, por ser uma presunção legal de interesse de agir,
amoldar a atuação do órgão de acordo com suas finalidades constitucionais. Ou seja, não
recordam que as funções atribuídas ao órgão devem ser compatíveis com sua finalidade,
consoante previsto no artigo 129, inciso IX, da Constituição Federal.
Aliás, Ada Pellegrinne Grinover ressalta que:
Quando muito, poder-se-ia exigir, caso a caso, que se aferisse a relevância
social do objeto da demanda coletiva em defesa de interesses individuais
homogêneos, para o reconhecimento da legitimação do MP,e, isso poderia ser
feito na esteira do disposto no art. 82, § 1º, CDC, para a dispensa do requisito da
pré-constituição para as associações, não tendo sentido a afirmação da
inconstitucionalidade do dispositivo do CDC que confere ao MP a titularidade
dessas ações.126
Outra, e, predominante afirma que o Ministério Público possui sim
legitimidade para agir em defesa de interesses individuais homogêneos, todavia, não é
125 Id. p.149 126 Op cit.p.152
sempre que estará ele legitimado, apenas poderá atuar se houver compatibilidade entre a
defesa do interesse e o seu perfil e destinação constitucionais.
Ou seja, pode sim o Ministério Público agir na defesa dos interesses
individuais homogêneos e coletivos (em sentido estrito), mas só pode atuar ou intervir
processualmente quando haja efetiva compatibilidade com as finalidades institucionais,
principalmente para a defesa do interesse social.
Com este entendimento Hugo Nigro Mazzilli afirma:
O interesse e conveniência social hão de ser apurados em concreto, a partir, por
exemplo, dos seguintes critérios: natureza do dano (saúde, segurança e educação
pública) dispersão dos lesados abrangência social do dano); interesse social no
funcionamento de um sistema econômico, social e jurídico 127
Esse é o posicionamento, aliás, adotado pelo Conselho Superior do
Ministério Público Paulista, que, na Súmula n.º 7, ao estabelecer
O Ministério Público está legitimado à defesa de interesses individuais
homogêneos que tenham expressão para a coletividade, como: a) os que digam
respeito à saúde ou à segurança das pessoas, ou ao acesso das crianças e
adolescentes à educação; b) aqueles em que haja extraordinária dispersão dos
lesados; c) quando convenha à coletividade o zelo pelo funcionamento de um
sistema econômico, social ou jurídico.
Nestes termos, o Ministério Público está legitimado sempre que houver
relevância social na discussão dos interesses transindividuais em jogo, principalmente
quanto aos individuais homogêneos. Aliás, mesmo que se trate de interesses individuais
homogêneos disponíveis, é possível a intervenção do Ministério Público se envolverem
larga abrangência social, pois cabe ao órgão a defesa dos interesses sociais, e não só
indisponíveis.
Hugo Nigro Mazzilli, comentando a Sumula n.º 7 do CSMP diz que:
A legitimação que o Código do Consumidor confere ao Ministério Público para a
defesa de interesses individuais homogêneos há de ser vista dentro da destinação
institucional do Ministério Público, que sempre deve agir em defesa de interesses
indisponíveis ou de interesses que, pela sua natureza ou abrangência, atinjam a
sociedade como um todo.
127 O Inquérito Civil. Op cit, p. 98.
O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, por unanimidade, manifestou-se
sobre o assunto:
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL.
LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO
CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E
HOMOGÊNEOS. MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE
POSTULARÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO. 1. A
Constituição Federal confere relevo ao Ministério Público como instituição
permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa
da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis (CF, artigo 127). 2. Por isso mesmo detém o Ministério Público
capacidade postulatória, não só para a abertura do inquérito civil, da ação penal
pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do
meio ambiente, mas também de outros interesses difusos e coletivos (CF, artigo
129, I e III). 3. Interesses difusos são aqueles que abrangem um número
indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos
aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis,
ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. 3.1. A
indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a
determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos. 4. Direitos ou
interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (artigo 81, III, da
Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de
direitos coletivos. 4.1. Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente
interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base
jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos,
categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas
isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser
vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística
destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas. 5. As
chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser
impugnadas por via de ação civil pública, a requerimento do Órgão do Ministério
Público, pois ainda que sejam interesses homogêneos de interesse comum, são
subespécies de interesses coletivos, tutelados pelo Estado por esse meio
processual como dispõe o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal. 5.1.
Cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como
dever do Estado e obrigação de todos (CF, artigo 205), está o Ministério Público
investido da capacidade postulatória, patente a legitimidade ad causam, quando o
bem que se busca resguardar se insere na órbita de interesses coletivos, em
segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo,
recomenda-se o abrigo estatal. Recurso extraordinário conhecido e provido para,
afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos
interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de
origem, para prosseguir no julgamento da ação. RE n. 163.231-SP, j. em
26.02.97128
128 STF RE n. 163.231-SP, em 26.02.97
A resposta acerca da possibilidade ou não do Ministério Público instaurar o
inquérito civil com a finalidade de apurar eventuais danos a interesses individuais
homogêneos está obrigatoriamente relacionada com a própria legitimação do Ministério
Público para propor ações em defesa desses interesses.
Os direitos individuais homogêneos alem de estarem previstos no artigo 129, III
da Constituição Federal, ainda vem disposto no Código de Defesa do Consumidor que
estabelece no artigo 90 que:
Aplicam-se às ações previstas neste Titulo as normas do Código de Processo
Civil e da Lei n.º 7.347/1985, no que respeita ao inquérito civil, naquilo que não
contrariar suas disposições”, titulo este que contém a definição dos interesses
individuais homogêneos no artigo 81, inc III, e que confere legitimidade ao
Ministério Público para sua defesa no artigo 82 inciso I.
Extrai-se desse sistema que não há como restringir a legitimação do Ministério
Público para a propositura da ação civil pública em defesa de quaisquer interesses
individual homogêneos, o que seria se assim fosse negar vigência a Constituição Federal.
Numa interpretação sistemática dos artigos 129 III e 127, ambos da
Constituição Federal, é possível concluir que o Ministério Público possa defender não só os
interesses sociais, mas também os interesses individuais indisponíveis que tenham
características metaindividuais.
De efeito. O artigo 129 III da Constituição Federal reafirma que uma das
instituições do Ministério Público é a defesa do patrimônio social, o que por outro lado, o
inciso IX do artigo 129 também da Constituição Federal diz que o Ministério Público
poderá exercer outras funções que lhe forem conferidas desde que compatíveis com sua
finalidade.
Além dessa legitimação de ordem geral, o artigo 6º VII do Estatuto do
Ministério Público da União estabelece que “Compete ao Ministério Público da União (...)
promover o inquérito civil e ação civil pública (...) outros interesses individuais
indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos”, lembrando que está norma aplica-
se subsidiariamente ao Ministério Público dos Estados.
Embora haja a autorização legal, é válido destacar que somente deverá o
Ministério Público atuar na defesa dos interesses individuais homogêneos, instaurando
inquérito civil ou propondo ação civil pública quando houver a presença marcante de
interesse social.
A Constituição Federal embora não tenha contemplado entre as funções
institucionais do Ministério Público sua legitimação para a defesa dos interesses individuais
homogêneos, é possível aferir que se trata rol meramente exemplificativo posto prever a
possibilidade de “exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis
com sua finalidade- artigo 129 inciso IX.
Entre outras funções que lhe forem conferidas está a defesa dos interesses
individuais homogêneos nos quais identifique relevância social, exatamente pela
compatibilidade com sua finalidade de defender a ordem jurídica, do regime democrático e
dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Letícia Rezende Castelo Branco estudando sobre o tema conclui:
Para aferir a legitimidade do parquet no caso concreto para a propositura de ações
que versem sobre direitos individuais homogêneos, deve se ter sempre em foco a
existência da relevância social, independentemente de previsão legal expressa.
Relevância social é expressão sinônima de interesse social e pode ser definida
como o interesse concernente à maioria da sociedade civil, que reflete o que esta
sociedade entende por bem comum.129
O Supremo Tribunal Federal130 em um passado não muito distante entendeu ser
possível a instauração de inquérito civil, bem como o aforamento de ação civil pública em
se tratando de interesses individuais homogêneos.
Na mesma trilha o Superior Tribunal de Justiça131 também já decidiu favorável
a atuação como autor, do Ministério Público em casos de interesse individual homogêneo.
A legitimidade do Ministério Público tanto para a instauração de inquérito civil,
quanto para propor a competente ação civil pública, só se discute nos casos em que se trate
de direitos disponíveis, devendo nesses casos, ser comprovada a relevancia social.
129Letícia Rezende Castelo Branco, Legitimidade Ativa do Ministério Público nas Ações Coletivas para a Defesa dos Interesses Individuais Homogêneos. Unaerp, 2008. 130 Recurso Extraordinário n.º 163.231 –SP – Relator Ministro Mauricio Correia: “(...) detém o Ministério Público capacidade postulatória, não só para a abertura do inquérito civil, da ação penal pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, mas também de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, I eIII). (...) 4. Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei n.º 8.078/1990), constituindo-se em subespécie de direitos coletivos. 4.1 Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalistica destina-se á proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas”. RE 424048 AgR- SC, relator Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 25.11.2005; AI 438703 AgR, relatora Ministra Ellen Gracie, DJ 05.05.2006 131 Resp. 633470 – CE, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ 19.12.2005 e Resp 396081-RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Kazuo Watanabe tratando do tema faz importante observação, para ele:
O órgão do Ministério Público deve permanecer atento para não promover ações
coletivas que tutelem interesses genuinamente privados sem qualquer relevância
social, sob pena de amesquinhamento da relevância institucional do parquet.132
Luiz Manoel Gomes Junior entende que:
Inexiste incompatibilidade entre as funções institucionais previstas na
Constituição Federal para o Ministério Público e a defesa dos direitos individuais
homogêneos, pois houve uma clara opção não só em ampliar as áreas de atuação
pelo Ministério Público, como ainda, para proteger os denominados direitos
coletivos.133
Ao que parece, deve prevalecer o entendimento, posto não haver nem
legislação, nem posição doutrinária e jurisprudencial concreta a respeito, o fato de que
somente haverá atuação do Ministério Público em inquérito civil e ação civil pública
atinente a interesses individuais homogêneos quando houver relevância, interesse social do
bem jurídico tutelado.
A tutela destes direitos pelo Ministério Público, não colide com as funções
institucionais do órgão, pelo contrário, vem de encontro com suas atribuições
constitucionais.
Observada a relevância social do objeto, a atuação do órgão do Ministério
Público na defesa dos interesses individuais homogêneos é primordial para uma sociedade
justa e democrática.
132 Resp. 633470 – CE, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ 19.12.2005 e Resp 396081-RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura. 133 Op. Cit. p. 38.
CONCLUSÃO
O progresso tecnológico e científico, assim como as transformações sociais,
políticas econômicas ocorridas ao longo do século XX proporcionaram a massificação da
atual sociedade. Concomitantemente, fez-se necessário um processo de evolução e
conscientização da coletividade no tocante aos novos interesses ou direitos que passaram a
existir, sendo inerentes a todos e devendo ser respeitados e preservados.
O presente trabalho teve por objetivo demonstrar o instituto do inquérito civil
como instrumento de cidadania para a proteção dos direitos difusos, coletivos e
especialmente os individuais homogêneos, destacando a importância de sua sistematização
como meio de alcance da efetividade deste.
Para que houvesse a efetiva proteção dos interesses transindividuais, aliada
com a economia processual, foi criado um novo sistema, o da tutela coletiva de direitos,
materializada nos processos coletivos, mecanismo que possibilitou a adequada tutela
jurídica dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.
Contudo, como grande parte da população ainda desconhece a existência da
tutela coletiva,os meios de defesa dos seus direitos ou até a eventual repercussão coletiva
que possa advir de uma pequena lesão individual, o ordenamento jurídico criou, em sede
processual, a legitimação extraordinária de determinados órgãos e entidades, habilitando-os
a defender em seu nome direitos alheios.
O Ministério Público é órgão legitimado a defender os interesses difusos,
coletivos e individuais homogêneos, conforme o art. 5.º, “caput”, da Lei n.º 7.347/85 e art.
82, I da Lei n.º 8.078/90, sendo que sua atuação, além de adequada, parece ser essencial,
pois corresponde às suas atribuições previstas no art. 129 da Constituição Federal.
O encampamento dos direitos coletivos na ordem jurídica brasileira traz como
conseqüência a necessidade de adaptação do inquérito civil a essa realidade substancial,
isto é, a existência de direitos de natureza coletiva requer um procedimento também desta
natureza para tutelá-los.
Assim, se por um lado o legislador constituinte deixou de inserir expressamente
os interesses individuais homogêneos dentre aqueles que são objeto da intervenção
ministerial, por outro lado permite a Constituição ser interpretada de modo a considerar o
art. 129, inciso IX, como conclusivo à legitimidade ao MP nesse sentido, ao dispor que,
dentre seu imperativo institucional, encontra-se o exercício de outras funções que lhe forem
conferidas, desde que compatíveis a sua finalidade.
Já no âmbito das normas programáticas do Código de Defesa do Consumidor o
art. 5º, II atribuiu ao Ministério Público a defesa do Consumidor, para que assim garantisse
a efetividade desses direitos.
Desse modo, quando se trata de direito do consumidor o dispositivo deve ser
observado pelos juízes, reconhecendo o Ministério Público como instituição que possui
legitimidade para defender os interesses dos consumidores.
Ademais, a intervenção do Ministério Público é medida importante para evitar
que decisões conflitantes ou contraditórias referentes ao mesmo fato possam fragilizar a
celeridade processual ou que seja dispensado tratamento individual a situações geradas por
uma sociedade de consumo de massas.
Em relação à legitimidade do Ministério Público para as tutelas dos interesses
individuais homogêneos, embora, como narrado no trabalho alguns autores defendam que o
Ministério Público só possuiria legitimidade para defender os interesses difusos e coletivos,
como disposto no inc. III, art. 129 da Constituição, o que excluiria os individuais
homogêneos.
A conclusão exposta pelo trabalho revela que a análise do art. 81 e 82 do
Código de Defesa do Consumidor revela o contrário, deixando claro que o Ministério
Público tutela qualquer interesse , portanto, os interesses individuais homogêneos.
Outro forte argumento é a invocação do artigo 127 “caput” da Carta Magna,
bem como, os artigos 6º, VII alínea “d” da Lei complementar 75/93, Lei Orgânica do
Ministério Público da União LOMPU, 25, IV, alínea a da Lei 8625/93 Lei orgânica
Nacional do Ministério Público que trazem em seu bojo a possibilidade de legitimidade do
Ministério Público de defesa dos interesses individuais homogêneos.
Dessa forma, uma vez que a defesa de interesse coletivo ou individual
homogêneo convier à coletividade como um todo, o Ministério Público tem legitimidade
para tutelá-los.
A possibilidade do Ministério Público instaurar o inquérito civil com a
finalidade de apurar eventuais danos a interesses individuais homogêneos está
obrigatoriamente relacionada com a própria legitimação do Ministério Público para propor
ações em defesa desses interesses.
Além dessa legitimação de ordem geral, o artigo 6º VII do Estatuto do
Ministério Público da União estabelece que “Compete ao Ministério Público da União (...)
promover o inquérito civil e ação civil pública (...) outros interesses individuais
indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos”, lembrando que está norma aplica-
se subsidiariamente ao Ministério Público dos Estados.
Assim, a tutela dos direitos individuais homogêneos pelo Ministério Público,
não colide com as funções institucionais vindo ao encontro às suas atribuições
constitucionais, observado a relevância social do objeto, sendo primordial na defesa dos
interesses individuais homogêneos através do instrumento do inquérito civil para uma
sociedade justa e democrática.
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