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Curso: MBA em Administração Pública e Gerência de Cidades
Disciplina: Direito Administrativo
Tema: Licitações Públicas
Professor: Silvano Alves Alcântara
Introdução Neste tema, entenderemos o que é a licitação, analisando seu conceito
e seus objetivos. Veremos também seus nove princípios informadores e suas
nove modalidades. Aproveite esse momento de atualização e tenha bons
estudos!
Objetivo da licitação O Estado, por não ser autossuficiente, necessita buscar bens e serviços
de terceiros. Por esta razão, firma contratos administrativos com outras
pessoas, sempre com a finalidade de atender o interesse público.
Mas você sabe o que é interesse público? Veja, a seguir, a definição de
Lúcia Valle Figueiredo, professora universitária e advogada brasileira:
Interesse público pode ser definido como o bem jurídico de interesse coletivo que, por lei, deve ser perseguido pela Administração. De seu turno, conveniência e oportunidade estão atrelados a este conceito. É dizer: conveniente para a Administração será sempre o implemento do bem público a tempo e hora. A oportunidade de concretizar a finalidade pública terá exatamente de ocorrer em momento propício, em momento adequado à sua implementação. Pode acontecer, por exemplo, que haja um interesse público, porém que o momento azado para sua consecução não seja contemporâneo a seu aparecimento, por existirem prioridades outras para a Administração Pública (FIGUEIREDO, 2002, p. 17).
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Entretanto, ao contrário dos particulares, os quais podem livremente
buscar os contratantes ao seu livre arbítrio, a Administração Pública — por
estar submetida ao regime jurídico-administrativo — tem que efetuar um
procedimento administrativo concorrencial denominado licitação. Nela, a
Administração Pública deverá selecionar a proposta que melhor satisfizer o
interesse público, ante uma gama de regras definidas, num ato convocatório,
para que todos possam saber qual será o tratamento despendido.
Compete destacar que a busca pela melhor contratação não pode
importar ofensa ao regime jurídico-administrativo e seus princípios,
principalmente o da isonomia1.
Previsão constitucional
O dever de licitar está expressamente prescrito pela Constituição
Federal, em seu artigo 37, inciso XXI, nos seguintes termos: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.
1 O princípio da isonomia é um dos pilares de sustento para a licitação pública, pois, a
partir dele, todo processo licitatório deverá conceder a um universo geral de participantes ou
interessados todas as oportunidades para que os particulares estejam numa igualdade de
condições. Isso porque conviver num Estado Democrático de Direito implica respeito ao
princípio da legalidade em sentido amplo.
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Esse preceito constitucional é o alicerce constitucional para o dever de
licitar, por parte da Administração Pública, quando esta pretende contratar
obras, serviços, compras e alienações.
O texto constitucional garante que o processo licitatório tenha igualdade
de condições entre os participantes, bem como, desde o ato convocatório,
disposição das cláusulas acerca da forma do pagamento. Além disso, aponta
que somente poderão ser exigidas condições de qualificação econômica e
técnica que sejam indispensáveis para o cumprimento do contrato entre o
interessado e a Administração Pública.
No entanto, a própria constituição determinou que há hipóteses
excepcionais, nas quais estará afastado o dever de licitar. Tais situações são
chamadas contratação direta, como adiante trataremos.
Portanto, a rigor, os contratos administrativos devem ser precedidos de
licitações, porém existem hipóteses que este dever poderá ser afastado para a
realização de uma contratação direta.
Um forma de contratação de serviços públicos que se diferencia da
licitação é o regime diferenciado de contratação (RDC), que busca diminuir a
burocracia e agilizar os processos. Ela rege de forma paralela a lei de
licitações, e foi criada em 2011 para atender à demanda da copa e das
olimpíadas. Para entender seu funcionamento e seus objetivos, acesse o site:
http://www.youtube.com/watch?v=tU4xnpl_zhE.
Competência legislativa
O artigo 22, parágrafo XXVII da Constituição da República, dispõe que
compete à União editar “normas gerais de licitação e contratação, em todas as
modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e
fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios”.
Como se vê, a competência para legislar sobre licitações e contratos
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pertence à União. Contudo, trata-se de uma competência legislativa limitada.
Isso porque se restringe tão somente à edição de normas gerais. Aos demais
entes políticos (Estados, Distrito Federal e Municípios) compete editar as
normas específicas, a fim de atender às suas peculiaridades.
O conceito de normas gerais é extremamente difícil de ser obtido. Dessa
forma, para demonstrá-lo, é importante usar a definição de alguns
doutrinadores pátrios. Adilson Abreu Dallari (1997, p. 20-1) leciona que, para se
chegar a um conceito de norma geral, deve-se fazer o caminho inverso, ou
seja, dizer o que não é norma geral. E completa:
Não é norma geral aquela que corresponde a uma especificação, a um detalhamento. Portanto, norma geral é aquela que cuida de determinada matéria de maneira ampla. Norma geral é aquela que comporta uma aplicação uniforme pela União, Estado e Município; norma geral é aquela que não é completa em si mesma, mas exige uma complementação (DALLARI, 1997, p. 20-1).
O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto afirma
que as normas gerais são aquelas que têm por objetivo “desatar” os princípios
e regras constantes na constituição, que têm na licitação o seu âmbito material
de incidência e em todas as demais ordens jurídicas federadas, o âmbito
espacial de aplicabilidade:
Com a palavra “desatar”, o que trazemos à berlinda é a função lógica de desdobrar ou fazer render o que, na Lei Maior, se encontre de alguma forma contracto. Não contracto por já significar uma formulação normativo-constitucional que é ponto de partida e de chegada, a um só tempo, sem a menor abertura de espaço para ulterior normação. Mas por decorrer do deliberado propósito de apenas iniciar a regulação de uma dada matéria, deixando para outra fonte normativa de menor escalão (no caso, o Poder Legislativo Ordinário da União) o aporte complementar de prescritibilidade (BRITTO,1997, p. 27).
Nesse ponto, as normas gerais funcionam apenas como limitador
negativo das normas específicas e estão subordinadas às prescrições
constitucionais. Por outro lado, quanto às normas específicas, há uma relação
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de mera compatibilidade. Ainda segundo Carlos Ayres Britto:
Em resumo, todas as relações objeto de norma geral da União deverão comportar reenvio material à Magna Carta, ou válidas não serão (...). Mas não é esta a natureza do vínculo que prende as normas específicas ao diploma constitucional e às próprias normas gerais da União, naquele plano da materialidade licitatória, pois a tal categoria de normas é suficiente a disciplina de relações de simples não contradição. O remonte das normas específicas à materialidade da Constituição e das normas gerais de timbre federal há de ser feito, sim, mas não num sentido confirmatório ou de prolongamento eficacial, por não ser por meio da especificidade legislativa que ricocheteiam sobre novas relações jurídicas os conteúdos empíricos das regras e princípios (um mínimo de empirismo há de se conter em cada princípio jurídico) da Constituição e das próprias normas gerais.
Desse modo, seja qual for o conceito que se dê às normas gerais, o que
se tem como certo é que sua edição compete à União, bem como sua
aplicabilidade atinge todo território nacional. Os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios poderão editar normas específicas. Note-se que a União também
poderá produzir esse último tipo de norma. Entretanto, as normas específicas
expedidas pela União obrigarão somente a Administração Pública Federal.
Normas gerais e normas especiais Na tabela a seguir, estão as normas gerais de licitações públicas, no
ordenamento jurídico, e alguns exemplos de normas especiais de licitações
públicas editadas por Estados, que merecem destaque.
Normas Gerais Normas Especiais
Lei n. 8.666/1993, de 21 de setembro de
1993;
Lei n. 10.520/2002, de 17 de julho de
2002;
Lei Complementar n. 123/2006, de 14 de
dezembro de 2006.
Lei Estadual da Bahia n. 9.433/2005;
Lei Estadual do Paraná n. 15.608/2007;
Lei Estadual de Pernambuco n. 12.340/03;
Lei Estadual de São Paulo n. 13.121/2008.
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Conceito de licitação
A licitação pública é um procedimento administrativo pré-contratual, o
qual se constitui numa sucessão de atos destinados a selecionar o particular
que estará autorizado e apto a celebrar um contrato com a Administração
Pública. Para ilustrar, Edgar Guimarães conceitua licitação do seguinte modo:
Sinteticamente, é possível afirmar que licitação é um procedimento administrativo consubstanciado num conjunto de atos praticados de forma ordenada e sucessiva pelo Poder Público, visando à seleção da melhor oferta, em razão de um negócio jurídico que pretende celebrar por meio de um contrato. Cada ato deste conjunto cumpre uma função específica no contexto geral (GUIMARÃES, 2002, p. 38).
Já segundo José dos Santos Carvalho Filho, licitação é
o procedimento administrativo vinculado por meio do qual os entes da Administração Pública e aqueles por ela controlados selecionam a melhor proposta entre as oferecidas pelos vários interessados, com dois objetivos – a celebração de contrato, ou a obtenção do melhor trabalho técnico, artístico ou científico (2007, p. 209-10).
Princípios informadores
Para o entendimento do instituto “licitações e contratos administrativos”,
de início precisa haver o conhecimento dos princípios que os regem. Os
princípios enquadram-se como as normas que irão nortear a aplicação do
instituto. Atinente acerca dos princípios, Carlos Ari Sundfeld discorre que:
Os princípios são as ideias centrais de um sistema, ao qual dão sentido lógico, harmonioso, racional, permitindo a compreensão de seu modo de organizar-se. Sua enunciação tem, portanto, uma primeira utilidade evidente: ajudar no ato de conhecimento. Mas, para o profissional do Direito, sua importância não é só esta. Os princípios são verdadeiras normas, que devem ser tomadas em consideração para a solução de problemas jurídicos concretos.
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O princípio jurídico é norma de hierarquia superior à das meras regras, pois determina o sentido e o alcance destas, que não podem contrariá-lo, sob pena de pôr em risco a globalidade do ordenamento jurídico. Deve haver coerência entre princípios e regras, no sentido que vai daqueles para estas. Por isso, conhecer os princípios do Direito é condição essencial para aplicá-lo corretamente (SUNDFELD, 1995).
Especificamente, atinente a licitações e contratos administrativos, vale
também transcrever o caput do artigo 3º da Lei n. 8.666/93:
Art. 3º. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.
Da leitura do dispositivo acima, percebe-se que a Lei de Licitações
consagra uma série de princípios que são gerais do Direito Administrativo,
como o da legalidade, publicidade etc., e outros que decorrem especificamente
do instituto da licitação, como o princípio do julgamento objetivo e o da
vinculação ao instrumento convocatório, por exemplo. Adiante será explicado o
significado e o alcance, em síntese, de cada princípio informador das licitações
públicas.
Princípio da legalidade
Pelo princípio da legalidade, pode-se dizer que todos os atos da
Administração Pública deverão estar calcados na lei (em sentido lato) e
consubstanciados numa autorização normativa (permissividade). Este
raciocínio difere do princípio da legalidade para o Direito Privado.
Sobre o tema, vale recorrer a Hely Lopes Meirelles:
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Na Administração Pública, não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A Lei para o particular significa ‘pode fazer assim’; para o administrador público significa ‘deve fazer assim (MEIRELLES, 2001, p. 82).
Princípio da isonomia
O princípio da isonomia concede a prerrogativa e o direito às pessoas de
serem tratadas com uniformidade por parte da Administração Pública, não
havendo qualquer preferência. Porém, destaca-se que o princípio da isonomia
não proíbe as discriminações entre as pessoas. O que não se admite é a
discriminação injustificada.
Celso Antônio Bandeira de Mello (1999, p. 10) diz que o tratamento
diferenciado somente é possível quando concorrerem três elementos:
Existência de diferenças nas próprias situações de fato, que serão 1.reguladas pelo direito;
Correspondência (adequação) entre tratamento discriminatório e as 2.diferenças existentes entre as situações de fato;
Correspondência (adequação) entre os fins visados pelo tratamento 3.discriminatório e os valores jurídicos consagrados pelo ordenamento
jurídico.
Somente quando tais elementos estiverem presentes na situação
concreta é que poderá o Poder Público estabelecer diferenças, tanto no ato
convocatório, como entre os licitantes durante o procedimento licitatório.
Portanto, pode-se dizer que o princípio da igualdade ou da isonomia não
consiste senão em tratar os iguais de maneira igual, e aquinhoar
desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades.
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Princípio da competitividade
O princípio da competitividade deve nortear e marcar todo o processo
licitatório. Isto porque, a partir da extrema competitividade entre os
participantes, a Administração Pública selecionará a melhor proposta para o
interesse público.
Inclusive, o artigo 3º, parágrafo 1º, inciso I da Lei de Licitações,
estabelece que a Administração não poderá “admitir, prever, incluir ou tolerar,
nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam
ou frustrem o seu caráter competitivo”.
Carlos Ari Sundfeld (1995, p. 22) comenta sobre o princípio em estudo:
A competitividade real, concreta, efetiva, é condição essencial
do sucesso da licitação. Quando a competição entre diversos sujeitos for impossível, não se fará licitação (art. 25), pois ela não existe sem confronto, sem disputa, sem oposição, sem conflito de interesses entre pessoas. Daí a lei vedar as restrições editalícias tão intensas que acabem por frustrá-la ou dificultá-la (art. 3º-§ 1º-I), exigir o parcelamento das contratações de modo a ampliar o acesso das pequenas empresas aos certames (arts. 23-§ 1º e 15-IV), favorecer o consórcio, que cumpre o mesmo objetivo (art. 33) e autorizar a contratação sem licitação quando a falta de competição acabe por gerar ofertas de valor excessivo (art. 24-VII).
Portanto, a administração licitadora deverá sempre elaborar o
instrumento convocatório, bem como interpretar os problemas que surgirem
(quando, por exemplo, houver dúvida se o licitante deve ou não ser habilitado),
de forma a ampliar a competitividade ao máximo (desde que isso não signifique
ofensa ao ordenamento jurídico).
Além disso, nesta linha, pode-se advogar que a competitividade, no
certame, acarretará vantagem para a Administração, com base no raciocínio de
que quanto maior a concorrência, maior será a disputa entre os participantes e,
consequentemente, maior será a possibilidade de a Administração obter uma
melhor proposta, seja no aspecto financeiro ou técnico.
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Acesse o material on-line para assistir à videoaula do professor Silvano!
Princípio da moralidade administrativa
Como a Administração Pública é mera gestora dos interesses alheios,
ou seja, o interesse público, pressupõe-se que ela deve agir com ética,
lealdade e boa-fé. O princípio da moralidade, para a Administração Pública,
está explicitamente encartado no caput do artigo 37 da Constituição Federal. E,
nas licitações, por sua vez, está estampado no caput do artigo 3º da Lei de
Licitações.
Porém, no campo das licitações públicas, a moralidade não fica atrelada
somente à Administração, mas também aos particulares que desejam contratar
com ela. Tanto que tal princípio reflete-se no dever de conduta dos licitantes e
dos agentes públicos, o qual tem que ser compatível com a moral, a ética, os
bons costumes e as regras da boa administração.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, p. 93) anota que o comportamento
moral deverá ser observado tanto pela Administração, como pelo particular que
com ela se relaciona. Em resumo, sempre que em matéria administrativa se verificar que o comportamento da Administração ou do administrado, que com ela se relaciona juridicamente, embora em consonância com a lei, ofende a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de equidade, a ideia de bem comum de honestidade, estará havendo ofensa ao princípio da moralidade (DI PIETRO, 2006, p. 93).
A autora cita, ainda, como exemplo, os frequentes conluios entre
licitantes, como caracterizadores de ofensa ao princípio da moralidade. Isso
pode ensejar, inclusive, a aplicação de sanção administrativa. Por outro lado,
quando a ofensa ao princípio da moralidade decorre de ato praticado pelo
agente público, além da sua responsabilização, caberá a anulação do ato
imoral.
É importante mencionar que o referido princípio não possui uma
definição, visto que depende de acordo com os parâmetros da sociedade.
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Dessa forma, é um conceito abstrato e que se fixa com base nos valores éticos
e morais, os quais não possuem uma fixação.
Sob este pensamento, Egon Bockmann Moreira (2003, p. 96-7)
corrobora, relatando que: Sob o aspecto subjetivo, o princípio da moralidade pública atinge não só a Administração (direta e indireta), mas também as pessoas privadas, quando em relação com os entes públicos. Ainda que se possa sustentar validade a atos avessos à Moral praticados entre particulares, a Administração jamais poderia prestigiar condutas de particulares contrárias a preceito constitucional. As pessoas privadas não se encontram imunes à moralidade em seu relacionamento com a Administração – mesmo porque na hipótese de um agente público prestigiar um ato imoral/ amoral de um particular estará, ao seu tempo, praticando um ato violador do princípio constitucional. (...) A moralidade proíbe condutas praticadas de forma imoral (conscientemente oposta à Moral em vigor) e amoral (indiferente às valorizações da Ética, caracterizada pela ausência de senso moral). Ainda que o agente esteja absolutamente convencido de que atendeu ao interesse público, sem qualquer benefício pessoal, pode haver violação ao princípio. Trata-se de vício submetido a um controle objetivo.
Princípio da probidade administrativa
Muito se fala acerca da existência ou não de distinção com relação ao
princípio da moralidade administrativa. Para a nossa segmentação, será
adotada a linha preconizada por Edgar Guimarães (2002, p. 51), que defende a
existência de diferença entre o princípio da moralidade administrativa e o da
probidade administrativa, no sentido de que este atinge, além dos atos
desonestos e/ou imorais, os atos ilegais.
Princípio da impessoalidade
O princípio da impessoalidade encontra-se constitucionalmente previsto
no caput do artigo 37 da Constituição da República. Três são as interpretações
dadas a esse princípio. Para Hely Lopes Meirelles (2001, p. 85-6), o princípio
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da impessoalidade identifica-se com o princípio da finalidade, o qual significa o
atendimento ao interesse público previsto na norma.
José Afonso da Silva (1999, p. 646) entende que o princípio da
impessoalidade “significa que os atos e provimentos administrativos são
imputáveis não ao funcionário que os pratica, mas ao órgão ou entidade
administrativa em nome do qual age o funcionário”.
Já Celso Antônio Bandeira de Mello (2008, p. 114) vê no princípio da
impessoalidade o mesmo conteúdo do princípio da isonomia. Ou seja: os
administradores públicos não poderão discriminar licitantes, ou conceder
benefícios a quaisquer deles.
Odete Medaur, depois de mencionar os três posicionamentos, conclui:
Os aspectos apontados acima representam ângulos diversos do intuito essencial de impedir que fatores pessoais, subjetivos, sejam os verdadeiros móveis e fins das atividades administrativas. Com o princípio da impessoalidade a Constituição visa a obstaculizar atuações geradas por antipatias, simpatias, objetivos de vingança, represálias, nepotismo, favorecimentos diversos, muito comuns em licitações, concursos públicos, exercício do poder de polícia. Busca, desse modo, que predomine o sentido de função, isto é, a ideia de que os poderes atribuídos finalizam-se ao interesse de toda a coletividade, portanto a resultados desconectados de razões pessoais (MEDAUR, 2006, p. 126).
O tratamento dispensado aos administrados deverá ser feito de maneira
equânime, não se podendo efetuar quaisquer direcionamento ou favoritismo.
Independente de quem esteja participando da licitação, a Administração deverá
tratar todos com as mesmas atitudes e proposições.
Por conseguinte, este princípio significa que as entidades administrativas
deverão observar, em suas decisões, critérios objetivos previamente
estabelecidos, afastando a discricionariedade e o subjetivismo na condução
dos procedimentos da licitação.
Princípio da publicidade
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Pelo princípio da publicidade, toda atividade administrativa deverá ser
transparente. Em sede licitacional, além do caput do artigo 3º, verifica-se sua
influência no parágrafo 3º do mesmo dispositivo, que estabelece o seguinte: “A
licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de
seu procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva
abertura”.
Trata-se de um requisito de eficácia dos atos jurídicos realizados pela
Administração Pública. Vale citar aqui o parágrafo único do artigo 61 da Lei n.
8.666/93, o qual afirma que a publicação do instrumento contratual e de seus
aditamentos, na imprensa oficial, é uma condição indispensável de sua
eficácia.
Adilson Abreu Dallari considera, inclusive, a publicidade como um dos
princípios fundamentais da licitação: Acreditamos que os elementos verdadeiramente essenciais a qualquer modalidade de licitação e que, por isso mesmo, devem ser considerados como princípios fundamentais desse procedimento são três: igualdade, publicidade e estrita observância das condições estabelecidas no instrumento de abertura (DALLARI, 1997, p. 37).
Conforme observa Marçal Justen Filho (2005, p. 54), o princípio da
publicidade possui, no procedimento licitatório, duas funções. A primeira é
propiciar o amplo acesso a todos os interessados ao certame. Já a segunda
função é permitir que os particulares possam fiscalizar os atos praticados no
procedimento. Parte-se do pressuposto de que as pessoas tanto mais se preocuparão em seguir a lei e a moral quanto maior for a possibilidade de fiscalização de sua conduta. Sendo ilimitadas as condições de fiscalização, haverá maior garantia de que os atos serão corretos (JUSTEN FILHO, 2005, p. 54).
Princípio da vinculação ao instrumento convocatório
O princípio da vinculação ao instrumento convocatório pode ser
encarado como o dever da Administração e dos terceiros respeitarem “as
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regras do jogo”, as quais estão, anteriormente à efetivação da licitação pública,
estipuladas no ato convocatório. O caput do artigo 41 da Lei n. 8.666/93
estabelece que a Administração Pública não poderá “descumprir as normas e
condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada”.
No dizer de Carlos Ari Sundfeld, são três os objetivos almejados por
esse princípio: a) Vinculação da Administração ao Direito, “na medida em que a sujeita ao respeito de seus próprios atos”; b) Vedação de criação de etapas ad hoc ou a eleição de critérios destinados a favorecer certos licitantes; c) Segurança para os licitantes, porquanto evita surpresas. “Após o início da licitação, a única surpresa para os licitantes deve ser quanto ao conteúdo das propostas de seus concorrentes” (SUNDFELD, 1995, p. 21).
De certo modo, o ato convocatório é o fundamento de validade dos atos
praticados no certame licitatório. Isto porque deverão ser considerados
inválidos os atos que forem realizados em desconformidade com os termos do
instrumento convocatório. Daí o porquê de se falar que, uma vez publicado, o
ato convocatório é lei interna da licitação.
Todas as regras para o julgamento do objeto licitado e os procedimentos
operacionais deverão estar elencados no predito documento. Neste ideário, a
jurisprudência pátria decide: Apelação cível em mandado de segurança. Administrativo. Licitação pública destinada à prestação de serviços de gerenciamento de trânsito com controle eletrônico de velocidade. Concorrência. Melhor técnica e preço. Alegação de ilegalidade nos itens "e" e "f" do anexo iii, do edital n. 001/06. Não ocorrência. requisitos de habilitação exigidos em conformidade com o instrumento convocatório. Exegese do art. 41 da lei n. 8.666/93. Princípio da igualdade entre os licitantes observado. Caráter competitivo do procedimento licitatório próprio certame e, por isso, deve ser cumprido em sua totalidade. É através dele que ficam estabelecidas as regras para o posterior cumprimento do contrato. Faltante um item exigido pelo edital, inabilita-se o proponente. [...] o princípio da isonomia deve ser interpretado de forma sistêmica ao princípio da vinculação do edital, pois este estabelece as regras do certame e aquele garante, dentro da própria licitação, a justa competição entre os concorrentes. A isonomia não deve ser tratada única e exclusivamente como direito dos licitantes, mas também como um conjunto de deveres e limitações impostas pelo próprio edital (MS n. 98.008136-0, Rel. Des. Volnei Carlin, j. 14/8/02). (TJSC; AC-MS 2006.047913-1; Tubarão; Quarta Câmara de
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Direito Público; Rel. Des. José Volpato de Souza; DJSC 30/04/2008; Pág. 181) (Publicado no DVD Magister nº 20 - Repositório Autorizado do STJ nº 60/2006 e do TST nº 31/2007) Apelação cível. Ação ordinária. Aproveitamento de crédito por precatório para oferecimento de garantia e demais exigências de ordem financeira constantes do edital de concorrência modalidade maior oferta pela outorga. Pedido indeferido administrativamente. Impossibilidade de apresentação de proposta. Reabertura do prazo. Descabimento. Aplicação do princípio da vinculação ao instrumento convocatório. O processo licitatório rende homenagem ao princípio da vinculação ao instrumento convocatório, previsto no artigo 3º da Lei nº 8.666/93, que submete tanto a Administração como os interessados na licitação. Esse princípio vem reafirmado no art. 41 do mesmo diploma legal. Afinal, o edital é a lei interna da licitação, e uma vez estabelecidas suas regras, tornam-se inalteradas durante todo o procedimento. Não poderia, pois, a Administração reabrir o prazo para admitir proposta; tampouco o Poder Judiciário, pena de subverter todo o processo, a afrontar os princípios que norteiam a aplicação da Lei de Licitações, e, porque não, desafiar a própria lei. Apelo desprovido. Unânime. (TJRS; AC 70024865719; Bagé; Vigésima Primeira Câmara Cível; Rel. Des. Genaro José Baroni Borges; Julg. 06/08/2008; DOERS 25/08/2008; Pág. 76). Licitação. Qualificação técnica. O edital, lei interna das licitações, não pode exigir especificidade tal que descaracterize o objeto licitado, direcionando o procedimento a um número limitado de ofertantes. Segurança concedida. Recurso necessário improvido. (TJSP; AC 39.631-5; Jundiaí; Sétima Câmara de Férias de Direito Público; Rel. Des. Guerrieri Rezende; Julg. 27/07/1998) (Publicado no DVD Magister nº 17 - Repositório Autorizado do STJ nº 60/2006 e do TST nº 31/2007).
Princípio do julgamento objetivo
Pelo princípio do julgamento objetivo, consagrado nos artigos 3º, 44º e
45º da Lei de Licitações, a Administração não poderá se basear em critérios
subjetivos para a escolha do futuro contratante.
Marçal Justen Filho (2005, p. 431) diz que objetividade é junção de
imparcialidade e finalidade. Além de se excluir a parcialidade, é necessário que
o julgamento a ser realizado esteja voltado ao atendimento do interesse
público. Tal interesse, por seu turno, não autoriza que a Administração se
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afaste do estabelecido na lei e no ato convocatório.
Edgar Guimarães (2002, p. 54), ao falar do princípio do julgamento
objetivo, afirma que o legislador não poderia ter agido de outro modo ao
consagrá-lo na Lei de Licitações. Isso porque, Se assim não fosse, nenhum sentido haveria para estabelecer-se a instauração de um procedimento com uma série de atos prévios à contratação, bastaria a lei eleger a tese da liberdade de contratação no setor público, deixando a escolha da proposta mais vantajosa ao alvedrio do agente público, sem o confronto entre proponentes.
O descumprimento do julgamento objetivo acarreta privilégios e um
possível direcionamento do certame, o que ocasionaria ao final o
descumprimento dos princípios da isonomia e da impessoalidade.
Frisa-se que a apreciação das propostas será realizada com esteio em
critérios objetivos, devidamente descritos no ato convocatório, sempre
priorizando pela disputa isonômica entre os participantes. Neste sentido,
Marcos Jurena Villela Souto aduz: Tal princípio decorre da impessoalidade e da vinculação ao edital, por força do qual são vedados aspectos de apreciação subjetiva, que dão margem à discricionariedade, ou de integração de conceitos jurídicos indeterminados pela comissão julgadora. É comum – porém ilegal – a presença de expressões como “adequado”, “suficiente”, “completo”, “primeira linha”, “imediatamente” etc., sem um parâmetro objeto de aferição e atribuição de pontos (especialmente quando há licitações de técnica ou exame de metodologia de execução, para fins de habilitação) (SOUTO, 2004, p. 20).
Consubstanciando o desiderato deste princípio, o Poder Judiciário tem
julgado nesta diretriz: Mandado de segurança. Licitação. Desclassificação por desconformidade da proposta à condição fixada no edital. Ausência de direito líquido e certo. Segurança denegada. Não é nulo o ato desclassificatório de proposta fundado na desobediência de critério objetivo pertinente ao limite expresso no edital como contraprestação máxima que a Administração se dispôs a pagar pelos serviços licitados. Segurança denegada (Superior Tribunal de Justiça, Mandado de Segurança nº 7.256/DF, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ 12.08/2003).
Dessa forma, o princípio do julgamento objetivo estabelece que o
administrador deve observar critérios objetivos, definidos no ato convocatório,
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para o julgamento das propostas. Afasta-se a possibilidade de o julgador
utilizar-se de fatores subjetivos, ou de exigências não previstas no ato
convocatório, mesmo que em benesse da própria Administração.
Modalidades de licitação
As modalidades são as espécies existentes, na legislação pátria, para
procedimentalizar as licitações, de acordo com a estrutura do certame e os fins
colimados pela Administração de acordo com o objeto. As modalidades estão
correlacionadas à estrutura procedimental a ser adotada durante o processo
licitatório. Atualmente, são seis modalidades existentes. Vamos conhecer um
pouco sobre cada uma delas?
Concorrência
Concorrência é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados
que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos
mínimos de qualificação exigidos, no edital, para execução de seu objeto,
conforme preconiza o artigo 22, parágrafo 1º da Lei n. 8.666/93.
Tomada de preços
Tomada de preços é a modalidade de licitação entre interessados
devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas
para cadastramento, até o terceiro dia anterior à data do recebimento das
propostas, observada a necessária qualificação, conforme preceitua o artigo
22, parágrafo 2º da Lei n. 8.666/93.
Convite
Convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo
pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em
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número mínimo de três pela unidade administrativa. Esta afixará, em local
apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais
cadastrados na correspondente especialidade, que manifestarem seu interesse
com antecedência de até vinte e quatro horas da apresentação das propostas,
conforme estabelece o artigo 22, parágrafo 3º, da Lei n. 8.666/93.
Concurso
Concurso é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para
escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de
prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de
edital publicado, na imprensa oficial, com antecedência mínima de 45 (quarenta
e cinco) dias, conforme preconiza o artigo 22, parágrafo 4º da Lei n. 8.666/93.
Leilão
Leilão é a modalidade de licitação, entre quaisquer interessados para a
venda de bens móveis inservíveis para a administração ou de produtos
legalmente apreendidos ou penhorados ou, ainda, para a alienação de bens
imóveis, prevista no artigo 19, da Lei de Licitações, a quem oferecer o maior
lance, igual ou superior ao valor da avaliação, conforme prescreve o artigo 22,
parágrafo 5º, da Lei n. 8.666/93.
Pregão
Pregão é a modalidade de licitação em que a disputa pelo fornecimento
de bens ou serviços comuns é feita em sessão pública, por meio de propostas
de preços escritas e lances verbais ou por via eletrônica, conforme estabelece
a Lei n. 10.520/02.
Escolha da modalidade A escolha da modalidade deve recair de acordo com o objeto ou em
conformidade com o valor total da contratação. Fala-se em “de acordo com o
objeto”, pois as modalidades concurso, leilão e pregão não estão
condicionadas ao seu uso, por intermédio da interpretação do objeto e a
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quantificação de seus valores, mas sim de acordo com a natureza do foco da
licitação.
O concurso busca a escolha de trabalho técnico, científico ou artístico,
mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores. O leilão
almeja a venda de bens móveis inservíveis para a Administração, produtos
legalmente apreendidos ou penhorados ou ainda a alienação de bens imóveis,
preconizados no artigo 19, da Lei de Licitações. O pregão, por sua vez, visa ao
bem e serviço comum, independentemente do valor.
É importante lembrar que a Lei n. 10.520/2002 definiu bem e serviço
comum como “aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser
objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no
mercado”.
Ou seja, é aquele bem ou serviço disponível no mercado, de
configuração padronizada de acordo com o mercado, o qual pode
minimamente ser delineado de modo objetivo, no edital, sem qualquer prejuízo,
ou possível prejuízo para a Administração, sobre a idoneidade ou análise de
características técnicas.
Já o uso das modalidades de concorrência, tomada de preços e convite
têm a sua utilização condicionada ao valor total pretendido para a contratação,
sendo que deverá ser levado em consideração possíveis prorrogações
contratuais.
Obras e serviços de engenharia Compras e serviços
Convite Até R$ 150.000,00 Até R$ 80.000,00
Tomada de preços De R$ 150.000,00 a
R$ 1.500.000,00
De R$ 80.000,00 a
R$ 650.000,00
Concorrência Acima de R$ 1.500.000,00 Acima de R$ 650.000,00
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Fracionamento de despesas
O fracionamento se caracteriza quando se segmenta a despesa a ser
objetivada, na licitação, para utilizar a modalidade de licitação inferior àquela
estipulada pela legislação para o total. Não se deve confundir fracionamento de
despesas com fracionamento de obra, compra ou serviço.
Imagine, por exemplo, que a Administração pretenda contratar a quantia
de 100.000 resmas de papel para todo o ano, e o montante orçado para tal
compra é de R$ 120 mil. Ao invés de instaurar e realizar uma licitação na
modalidade tomada de preços, concorrência ou pregão, a Administração
resolve fazer a sua compra por intermédio de dois convites. Este é um clássico
exemplo de fracionamento de despesas.
O fracionamento afronta, principalmente, os princípios da legalidade, da
anualidade orçamentária e do dever de planejamento ínsito ao administrador
público. O artigo 23, parágrafo 5º da Lei de Licitações inclusive prescreve sobre
isso: § 5º É vedada a utilização da modalidade "convite" ou "tomada de preços", conforme o caso, para parcelas de uma mesma obra ou serviço, ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente, sempre que o somatório de seus valores caracterizar o caso de "tomada de preços" ou "concorrência", respectivamente, nos termos deste artigo, exceto para as parcelas de natureza específica que possam ser executadas por pessoas ou empresas de especialidade diversa daquela do executor da obra ou serviço.
Além disso, o fracionamento de despesas é uma prática altamente
recriminada pelos Tribunais de Contas, conforme se pode vislumbrar pelas
decisões abaixo: Evite a fragmentação de despesas, caracterizada por aquisições frequentes dos mesmos produtos ou realização sistemática de serviços da mesma natureza em processos distintos, cujos valores globais excedam o limite para dispensa de licitação a que se referem os incisos I e II do art. 24 da Lei n. 8.666/1993 (Acórdão n. 1386/2005 – Segunda Câmara – Tribunal de Contas da União). Evite o fracionamento de despesas como mecanismo de fuga à
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modalidade de licitação adequada (art. 23, § 5º)” (Acórdão n. 2528/2003 – Primeira Câmara – Tribunal de Contas da União). Planeje adequadamente as aquisições e/ou contratações a fim de evitar o fracionamento de despesas, em observância ao art. 23, § 5º, da Lei n. 8.666/1993” (Acórdão n. 740/2004 – Plenário – Tribunal de Contas da União)
Contratação direta
De acordo com o próprio artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal,
há situações em que o dever de licitar poderá ser afastado ao mencionar que
“ressalvados os casos especificados na legislação”. Com isso, se deduz que a
regra é licitar, sendo exceção a fuga da licitação.
Mas por que a legislação preconiza hipóteses de fuga à regra geral do
dever de licitar?
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes explana sobre o assunto da seguinte
maneira: Assim, em alguns casos previamente estabelecidos pelo legislador, o princípio da licitação cede espaço ao princípio da economicidade ou ao primado da segurança nacional, ou ainda para garantir o interesse público maior, concernente à necessidade de o Estado intervir na economia. Em todos os casos delineados pela Lei n. 8.666/1993, em que a licitação foi dispensada ou considerada inexigível, pelo menos no plano teórico, entendeu o legislador estar em confronto o princípio jurídico da licitação e outros valores igualmente tutelados pela ordem jurídica, tendo sido aquele subjugado por um destes (FERNANDES, 2007, p. 195).
Cumpre destacar que não é pelo fato de a contratação direta afastar o
dever de licitar que a Administração Pública pode ajustar sem a confecção de
qualquer procedimento. É impreterível que a contratação direta, dispensa ou
inexigível, seja respaldada por intermédio de um processo administrativo, a que
deverá obedecer no que couber ao artigo 38 da Lei de Licitações.
Por ser exceção a uma regra constitucional, destaca-se ainda que o
princípio da motivação deve ser amplamente respeitado por parte do
administrador, ou seja, deve haver a descrição dos motivos de fato e de direito,
que desencadearam a possibilidade e o uso, em si, de uma contratação direta.
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Espécies de contratação direta
A contratação direta possui três tipos, que são: dispensa de licitação,
inexigibilidade de licitação e licitação dispensável.
Diferença entre licitação dispensável (dispensa de licitação) e licitação
dispensada
Salvo a expressão vernacular disposta no caput dos artigos 17 e 24 da
Lei de Licitações, não existe diferença entre licitação dispensada e dispensa de
licitação.
Dispensa de Licitação
A dispensa de licitação ocorre em determinadas situações em que,
embora até seja possível e viável a competição entre particulares, a realização
de um processo licitatório afronta ao interesse público. Esta afronta ao
interesse público pode ser caracterizada pelo tempo a ser despendido por um
processo licitatório, em um dado caso, pelos custos econômicos usados, para
fomentar uma atividade da própria Administração ou ainda por questão
estratégica do ponto de vista informativo.
Neste diapasão, o legislador previu taxativamente as hipóteses
concretas passíveis de dispensa de licitação, ou seja, as hipóteses são
exaustivas e não exemplificativas. Os casos de dispensa estão estipulados
nos artigos 17 e 24 da Lei de Licitações.
Para fins didáticos, pode-se segmentar os casos de dispensa em quatro
ângulos pelo critério adotado por Marçal Justen Filho (2005): a) custo econômico da licitação: quando o custo econômico da licitação for superior ao benefícios dela extraível. Exemplos: art. 24, incisos I e II; b) custo temporal da licitação: quando a demora na realização da licitação puder acarretar a ineficácia da contratação. Exemplo: art. 24,
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incisos III e IV; c) ausência de potencialidade de benefício: quando inexistir potencialidade de benefício, em decorrência da licitação. Exemplos: art. 24, incisos V, VII, VIII, XI, XIV e XXIII; d) destinação da contratação: quando a contratação não for norteada pelo critério de vantagem econômica, porque o Estado busca realizar outros fins. Exemplos: art. 24, incisos VI, IX, XIII, XVI, XX, XXI e XXIV.
Inexigibilidade de licitação
A inexigibilidade de licitação tem respaldo legal no artigo 25 da Lei de
Licitações, a qual prescreve da seguinte forma: Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou ainda, pelas entidades equivalentes; II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.
Conforme se desprende da referida norma legal, a inexigibilidade de
licitação é cabível quando for impossível a realização de licitação, por
inviabilidade absoluta de competição, ou, como apontam alguns doutrinadores,
pela impossibilidade de serem comparados bens heterogêneos.
Neste diapasão, acerca do tema, Marçal Justen Filho (2005, p. 274)
assevera que
as causas de inviabilidade de competição podem ser agrupadas em dois grandes grupos, tendo por critério a sua natureza. Há uma primeira espécie que envolve inviabilidade de competição derivada de circunstâncias atinentes ao sujeito a ser contratado. A segunda espécie abrange os casos de inviabilidade de competição relacionada com a natureza do objeto a ser contratado.
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Seguindo esta linha, Celso Antônio Bandeira de Mello (2008, p. 530)
aduz que:
São licitáveis unicamente objetos que possam ser fornecidos por mais de uma pessoa, uma vez que a licitação supõe disputa, concorrência, ao menos potencial, entre ofertantes (...). Só se licitam bens homogêneos, intercambiáveis, equivalentes. Não se licitam coisas desiguais. Cumpre que sejam confrontáveis as características do que se pretende e que quaisquer dos objetos em certame possam atender ao que a Administração almeja.
Assim, é requisito básico à autorização de uma contratação direta por
inexigibilidade, a ausência de competição relativamente ao objeto pretendido
pela Administração.
Ademais, como os casos de inviabilidade de licitação não podem ser
previamente prescritos pelo legislador, em razão da impossibilidade de
descrição de todas as situações fáticas que possam gerá-la, o rol estabelecido
no artigo 25 é meramente exemplificativo, não havendo a necessidade de o
caso enquadrar-se plenamente em um dos incisos.
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