Emprego Mão de obra feminina está a ser substituída por mecanização do trabalho
Agriculturaperdeu 100 milmulheres
Teresa Costatcosta (adinheirovivo.pt
? A crise deu à agricultura um refor-ço do estatuto de boa alternativa devida e de eterna almofada para des-empregados? A realidade não foibem assim, e as mulheres foram asmais afetadas. Apesar de o empregoagrícola ter sofrido altos e baixos des-de 2011, ano da chegada da troika, amão de obra feminina nesta ativida-de sofreu uma razia desde aqueleano, tendo perdido 101,4 mil mulhe-res (-51%). Aliás, são agora 96 800, deacordo com o Instituto Nacional deEstatística (INE), nas contas de 2017.
E a primeira vez que fica abaixo dafasquia dos 100 mil.
O declínio laborai na agriculturaocorre quando o emprego geral nopaís tem vindo a acelerar, em espe-cial desde 2013, mas graças ao núme-ro crescente de contratações nos ser-viços, comércio, alojamento e restau-ração. Por outro lado, a redução damão de obra agrícola em nada temcomprometido a produção nacional,
que tem aumentado, bem como as
exportações de bens alimentares,que estão a subir acima dos dois dí-gitos (11,7% em 2017 face a 2016).
Então, porque abandonam as mu-lheres a agricultura?
A presidente do Instituto Superiorde Agronomia (ISA), Amarilis de Va-rennes, até considera positiva a evo-lução: "Com o desenvolvimento in-dustrial e depois dos serviços, amaior parte da população não se en-contra já no setor primário. A popu-lação diretamente empregada naagricultura está felizmente a dimi-nuir no nosso país e tal é um sinal de
progresso".Igual opinião tem Luís Mira, secre-
tário-geral da Confederação dosAgricultores de Portugal; "Apesar deatravessarmos um período de recu-peração do setor, considerando quenos anos mais recentes se tem veri-
ficado um particular desenvolvi-mento da maquinaria dedicada às
colheitas (olival, vinha, pomares, etc.)e que é precisamente esta a área deatividade agrícola que emprega maismulheres, é possível que as estatísti-cas reflitam esse facto".
loão Dinis, dirigente da Confede-ração Nacional de Agricultura, assi-nala ter sido determinante "o desapa-recimento de milhares de pequenasexplorações agrícolas no país, de
agricultura familiar, que se repercu-tiu em quem nelas trabalha, que são
as mulheres"."Não querem ser cavadoras"Para futuro, não há uma tendênciadefinida. No ISA, 60% dos alunos sãodo sexo feminino. Amarilis de Varen-nes observa: "Não há desinteressedas mulheres pela área, mas não que-rem ser cavadoras... e não precisamde o ser". Ana Paula Vale, diretora daEscola Superior Agrária de Ponte de
Lima, enfrenta uma situação diferen-te; "Aqui na escola, predominam oshomens e estão a surgir muitas em-presas geridas por homens".
Mas o declínio da população agrí-cola não se traduz necessariamenteno abandono de terras. Será verdadenas zonas rurais afastadas, mas nãonas periurbanas, onde faltam terras,nomeadamente para os jovens agri-cultores, contrapõe Ana Paula Vale. •
Testemunhos Do sonho à realidade
TeresaGonçalves"O preçoda carnenãocompensa"
Abdicou da sua
"paixão" paraseguir outro
caminho
? Licenciada em Engenharia Agrí-cola e com mestrado em Engenha-ria Agronómica, Teresa Gonçalvestornou-se empresária agrícola em2001, em Vila Pouca de Aguiar, comprodução de leite de vaca, que de-pois evoluiu para a criação de vacasda raça maronesa. Este ano, passou--a. Apesar da sua "paixão" pela agri-cultura, sempre teve necessidade
de ter outra atividade: "Não consigoviver como gostaria". O que a levoua afastar-se? "Foram as dificuldadespor nunca poder ter férias nem finsde semana, o clima terrível e esseefeito reflete-se em maiores gastos,a burocracia com a sanidade animale o custo das rações e combustíveis- o preço da carne não compensa -tudo isso pesou na decisão". •
SílviaMartins"Não dápara viverapenas daagricultura 99
Mirtilos só dãorendimento quatromeses por ano,se correr bem
? Aos 31 anos, Silvia Martins é pro-dutora de mirtilos, na aldeia de S.
Cristóvão, perto de Viseu, mas comoa plantação só dá rendimento duran-te quatro meses por ano, e "quandocorre bem", tem outras ocupações.Mudou-se para Coimbra, onde estu-da e trabalha, e reserva os fins de se-mana para a agricultura. É técnica de
segurança no trabalho, coordena a
formação da Confederação AgrícolaNacional, em Coimbra, e está a con-cluir a licenciatura em AgriculturaBiológica. "Não há condições para vi-ver só da agricultura, mesmo traba-lhando com mão de obra familiar,como é o meu caso. Não conseguiemprego em Viseu. Tenho de sermultifunções, mas ainda acredito naagricultura", confessa. •
MariaMilheiro"Atívidadesó é rentávelse houverapoios 99
"É possível viverda agricultura,mas é ingrato"
? Dez anos de farmacêutica, em Lis-boa, não a convenceram. Um mestra-do em Empreendedorismo mudou--lhe a vida. Maria Milheiro regressouao Fundão e integrou uma empresado pai, dedicada maioritariamente à
produção de milho. Agora, está no iní-cio de um projeto de um cerejal. Emnome individual tem uma exploraçãobiológica de oliveiras. Vive da agricul-
tura. "Sim, é possível, mas é ingrato e
só é rentável com apoios, sobretudo,os cereais."lngrato, "porque há coisas
que não dependem de nós, como o
tempo". E deu o exemplo do cerejalonde, "numa das quintas, 90% daplantação não vingou, atrasando a
produção num ano, com todos os cus-tos inerentes, lá no milho, o preço de-pende da Bolsa de Salamanca". •
Evolução Setor agrícola empregavaquase meio milhão de pessoas em 2011Os números não deixam margem para dúvidas: a populaçãoque trabalha na agricultura está a diminuir consideravelmentenesta década. Em 2011, quase meio milhão de portuguesestrabalhavam no setor. No ano passado, a mão de obra agríco-la era constituída por pouco mais de 300 mil efetivos. 0 nú-mero de mulheres baixou para menos de metade ao longodesse período de tempo. São atualmente menos de um terçodo total de trabalhadores do setor.
«M»SOOmulherestrabalhavam, no ano passado, na agricul-tura, de acordo com o Instituto Nacional de
Estatística. Pela primeira vez, a mão de
obra feminina baixou a fasquia dos 100mil. Desde 2011, o setor perdeu 101,4 mil
mulheres (-51%).