UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
PAULO INACIO JUNIOR
CONFLITOS PELA ÁGUA NA BACIA DO PRATA:
O CASO ITAIPU
São Paulo
2015
PAULO INACIO JUNIOR
CONFLITOS PELA ÁGUA NA BACIA DO PRATA:
O CASO ITAIPU Trabalho de Graduação Individual apresentado
ao Departamento de Geografia, da Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo; para conclusão do
curso de bacharelado.
Orientador: Prof. Dr. Wagner Costa Ribeiro
São Paulo
2015
PAULO INACIO JUNIOR
CONFLITOS PELA ÁGUA NA BACIA DO PRATA: O CASO ITAIPU
Trabalho de Graduação Individual apresentado
ao Departamento de Geografia, da Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo; para conclusão do
curso de bacharelado.
Orientador: Prof. Dr. Wagner Costa Ribeiro
Data: ___/___/___
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________
Prof. Dr. Wagner Costa Ribeiro
_____________________________________________
Prof(a). Dr. (a)
_____________________________________________
Prof(a). Dr. (a)
São Paulo
2015
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Professor Dr. Wagner Costa Ribeiro, meu orientador, pelo apoio,
paciência, confiança, pelos ensinamentos, instruções e dedicação durante a pesquisa.
Agradeço ao CNPq, FFLCH e USP que viabilizaram a pesquisa e a graduação.
Agradeço aos demais professores que nas aulas, palestras e conversas contribuíram à
minha formação de geógrafo e, ainda mais, minha formação enquanto cidadão consciente do
mundo em que vive.
Aos amigos que fiz durante a graduação e aos que juntos vivemos grandes histórias e
lições que levarei, nem que seja na memória e nas fotografias, por toda a vida.
RESUMO
A Entidade Itaipu Binacional é uma empresa criada pelo Tratado de Itaipu em 1973 em
regime de cooperação pelo Brasil e por Paraguai para aproveitamento hidroelétrico das águas
transfronteiriças do rio Paraná, sua concepção foi um empreendimento diplomático,
geopolítico e energético em meio a uma equilibrada balança de poder na América do Sul ao
qual as teorias geopolíticas indicavam ao Brasil a necessidade de estender sua influência aos
países que compunham o heartland sul-americano através de políticas territoriais em direção
ao oeste do continente. A assinatura da Ata de Iguaçu que, viabilizou cooperação para estudos
técnicos do potencial hidrelétrico, suscitou preocupação da Argentina e reações adversas à
exploração das águas transfronteiriças, culminando em conflitos internacionais entre Brasil e
Argentina. O embate no nível internacional pelo uso da água também criou, em regime de
cooperação, o CIC como instituição internacional para gestão da água da A Bacia do Prata é
compartilhada por cinco países (Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai) que integram
uma relação de interdependência porque as águas transfronteiriças são indicadas pela
literatura como os motivadores de conflitos mais intensivos devido seus fluxos transnacionais,
assim, as práticas sobre as águas em seu território podem ter efeitos na qualidade e
disponibilidade da água a outro país ribeirinho. O conceito clássico de soberania permitiria a
um Estado e sua população os usos dos recursos hídricos em seu território sem considerar o
país vizinho potencializando conflitos. Conflito e cooperação pela água podem ocorrer
simultaneamente nos níveis internacionais ou subnacionais. Na Bacia do Prata, o último
quarto do século XX foi permeado por conflitos enquanto que na última década as relações
foram voltadas mais à integração regional. Ambos os cenários pode-se dizer, perpassam o
empreendimento da Entidade Binacional Itaipu em referência ao seu caráter, no primeiro
momento, de projeção da influência brasileira na Bacia do Prata e pelas instituições e
cooperações criadas a partir de sua criação. Este trabalho pretendeu percorrer a complexidade
da análise multiescalar dos conflitos e da cooperação pela água transfronteiriça pela
perspectiva da Geografia Política e das teorias das Relações Internacionais com o enfoque nos
desdobramentos da Entidade Binacional Itaipu.
Palavras-chave: Itaipu, Água transfronteiriça, Conflito e cooperação.
ABSTRACT
The Entity Itaipu Binacional is a company created by Itaipu Treaty in 1973 in cooperation
regime by Brazil and Paraguay for hydroelectric development of transboundary waters of the
Parana River, its design was a diplomatic, geopolitical and energy development in the midst
of a balanced scale power in South America to which the geopolitical theories to Brazil
indicated the need to extend its influence to countries that made up the South American
heartland through territorial policies towards the west of the continent. The signing of the
Iguaçu Act that enabled cooperation technical studies of the hydroelectric potential, has raised
concerns in Argentina and adverse reactions to the exploitation of transboundary waters,
culminating in international conflicts between Brazil and Argentina. The clash at the
international level for water use also created, in cooperation arrangements, the CIC as an
international institution for water management of the River Plate Basin is shared by five
countries (Argentina, Bolivia, Brazil, Paraguay and Uruguay) that integrate a interdependent
relationship because transboundary waters are indicated in the literature as the motivating
more intensive conflicts because of its transnational flows thus practices on water in its
territory may have effects on the quality and availability of water to another country riverside.
The classical concept of sovereignty would allow a state and its population uses of water
resources in its territory without considering its neighbor leveraging conflicts. Conflict and
cooperation through the water can simultaneously occur in international or subnational levels.
In the River Plate Basin, the last quarter of the twentieth century was permeated by conflicts
while in the last decade relations were geared more to regional integration. Both scenarios can
be said to permeate the enterprise of Itaipu Binacional entity in reference to his character, at
first, projection of Brazilian influence in the River Plate Basin and institutions and
cooperation created from its inception. This work intended to go through the complexity of
multi-scale analysis of conflict and cooperation through cross-border water from the
perspective of Political Geography and theories of International Relations with a focus on
developments in the Itaipu Binacional Entity.
Keywords: Itaipu, Transboundery water, Conflicts and cooperation.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Demonstração da localização de Itaipu, Corpus e Yaciretá e ilustração do conflito
entre os projetos das hidroelétricas ................................................................................... 34
Figura 2 Estrutura do corpo administrativo da Entidade Itaipu Binacional e a influencia dos
governos federais .............................................................................................................. 36
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Evolução da produção (ton) e da área (ha) do cultivo de soja no distrito de
Canindeyu - Paraguai........................................................................................................ 60
Gráfico 2 Evolução da produção (ton) e da área (ha) do cultivo de milho no distrito de
Canindeyu - Paraguai........................................................................................................ 61
Gráfico 3 Evolução da produção (ton) e da área (ha) do cultivo de soja no distrito de Parana
Alto - Paraguai .................................................................................................................. 62
Gráfico 4 Evolução da produção (ton) e da área (ha) do cultivo de milho no distrito de Parana
Alto - Paraguai .................................................................................................................. 63
LISTA DE SIGLAS
ANDE Administracion Nacional de Electricidad
BP3 Bacia Hidrográfica do Paraná Três
CBH Comitê de Bacia Hidrográfica
CERH Conselho Estadual de Recursos Hídricos
CIC Comitê Intergovernamental Coordenador dos Países da
Bacia do Prata
CNRH Conselho Nacional de Recursos Hídricos
CTPLAN Câmara Técnica de Acompanhamento de Elaboração
do Plano
DGEEC Dirección General de Estadística, Encustas y Censos
ELETROBRAS Centrais Elétricas Brasileiras S.A.
EMATER Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão
Rural
FAO Food and Agriculture Organization of the United Nations
FONPLATA Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia
do Prata
GEF Global Environmental Facility
IMEA Instituto Mercosul de Estudos Avançados
IPA Instituto das Águas do Paraná
IPARDES Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e
Social
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
MERCOSUL Mercado Comum do Sul
OEA Organização dos Estados Americanos
ONU Organização das Nações Unidas
PCA Plano de Controle Ambiental
PLBH Plano de Recursos Hídricos da Bacia
PMAE Programa Marco para Gestão Sustentável dos Recursos
Hídricos da Bacia do Prata
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PTI Parque Tecnológico Itaipu
SANEPAR Companhia de Saneamento do Paraná
SNGRH Sitema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos
UFTPR Universidade Federal Tecnológica do Paraná
UNILA Universidade Federal da Integração Latino-Americana
UNIOESTE Universidade Estadual do Oeste do Paraná
WWF World Wide Fund for Nature
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 10
1. TEORIAS DA GEOGRAFIA POLÍTICA, TEORIAS DAS RELAÇÕES
INTERNACIONAIS E OS RECURSOS NATURAIS COMPARTILHADOS:
ARTICULAÇÕES INDISPENSÁVEIS À COMPREENSÃO DA QUESTÃO ..................... 13
1.1 Fronteira, soberania e rios transfronteiriços .................................................................. 14
1.2 As teorias das Relações Internacionais sobre cooperação interestatal .......................... 22
2. O BRASIL E A FRONTEIRA .......................................................................................... 25
2.1 As teorias geopolíticas brasileiras para a tríplice fronteiras antes da assinatura da Ata de
Itaipu ......................................................................................................................................... 26
2.2 A POTENCIALIDADE DE INTEGRAÇÃO REGIONAL NA FRONTEIRA ................ 28
3. A ENTIDADE ITAIPU BINACIONAL ........................................................................... 31
3.1 O conflito entre os projetos de Itaipu (Brasil-Paraguai) e de Corpus (Argentina-Paraguai)
.................................................................................................................................................. 32
3.2 O conflito pela revisão do acordo em 2009 ........................................................................ 34
3. 3 Pareceres sobre a natureza jurídica da Itaipu..................................................................... 37
3.4 ITAIPU E A APROXIMAÇÃO COM VETORES ALÉM DA PRODUÇÃO DE
ENERGIA ................................................................................................................................. 41
3.4.1 O Programa Cultivando Água Boa .................................................................................. 42
4. O PAR CONFLITO E COOPERAÇÃO E SUAS NUANÇAS NO PLANO TEÓRICO:
DIÁLOGO ENTRE GEOGRAFIA POLÍTICA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS SOBRE
A ÁGUA COMPARTILHADA ............................................................................................... 45
4.2 Instituição de Governança da Água Internacional: O Comitê Intergovernamental
Coordenador dos Países da Bacia do Prata, FONPLATA e o Programa Marco ...................... 53
4.3 Comitê Bacia Hidrográfica no Brasil e o CBH da BP-3 .................................................... 57
4.4 Características do uso da água nas bacias na margem paraguaia e na bacia na margem
brasileira: Indicadores socioeconômicos. ................................................................................. 59
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 68
ANEXOS .................................................................................................................................. 73
10
INTRODUÇÃO
O desenvolvimento deste Trabalho de Graduação Individual é produto de duas
Iniciações Científicas sobre os conflitos pela água na Bacia do Prata com enfoque no estudo
de caso da Entidade Itaipu Binacional e do acúmulo teórico que a graduação em Geografia
proporciona e viabiliza em relação a percepção do espaço a partir de categorias de análise que
abrangem os planos do meio físico e natural em conjunto com a formação econômica e social
dos espaços.
Dando lugar à subjetividade, o interesse pelo tema ao longo da produção deste
trabalho crescia a medida que me deparava com os desafios de compreensão da complexidade
em uma análise multiescalar do tema.
O desenvolvimento da pesquisa e o amadurecimento do projeto com a melhoria de
compreensão da complexidade do tema tornou o estudo de caso de Itaipu vinculado a uma
rede mais ampla dos fenômenos de conflito e cooperação na Bacia do Prata, desta forma, faz-
se referências ao longo deste TGI sobre processos além da Entidade Binacional, mas que se
realizaram apenas pela sua existência, como é o caso da participação da Argentina e a
elaboração de movimentos diplomáticos logo em seguida à assinatura da Ata de Iguaçu e o
projeto de Corpus como resposta à assinatura do Tratado de Itaipu entre Brasil e Paraguai.
A história das relações interestatais na Bacia do Prata é uma história repleta de
conflitos em vários níveis, de guerras à declarações ríspidas. A literatura sobre conflitos em
bacias hidrográficas compartilhadas assume a potencialidade dos conflitos interestatais, ao
passo que também propõe a bacia hidrográfica como meio de potencialidade integradora
através da cooperação sobre bacia compartilhada.
A Entidade Itaipu Binacional e seus instrumentos diplomáticos de instituição da
cooperação tem imensa relevância na história das relações entre os países da Bacia do Prata.
Se no último quarto do século XX foi motivo de conflitos diplomáticos entre os maiores
Estados da região, na primeira década do século XXI mostrou-se como uma ferramenta de
integração regional, sobretudo pela sua função e localização na tríplice fronteira.
Mesmo com essa afirmação o par conflito-cooperação foi entendido como um par em
choque dialético, isto é, as relações de cooperação internacionais não desvencilham o caráter
conflitivo dos interesses, simultaneamente, a existência de conflito não anula a existência de
cooperação. Além disso, se se pretende uma análise multiescalar do par conflito-cooperação,
11
que insiram as disputas no nível sub e transnacional, como é o caso deste trabalho, conflito e
cooperação tornam-se ainda mais complexos porque aumentam-se os agentes e seus
respectivos interesses sobre a água transfronteiriça.
O presente TGI está dividido em 5 capítulos mais anexos. No primeiro capítulo faz-se
uma revisão bibliográfica dos conceitos, categorias da Geografia Política incorporado por
teorias das Relações Internacionais sobre comportamento dos Estados e cooperação.
As categorias que, neste momento, identifico como basilares para o estudo dos
conflitos e da cooperação na Bacia do Prata são, sobretudo, território, soberania e a água
transfronteiriça, a saber importantes temas da Geografia Política. Ao passo que o conceito de
água transfronteiriça incorpora a relação de interdependência entre todos os agentes, estatais
ou civis na bacia.
O pensamento dualista não tem espaço na abordagem relacional da política, a
complexidade das relações em seus custos e benefícios, simetrias e assimetrias no espaço-
tempo impedem que a compreensão de um todo nas relações Estatais contemporâneas sejam
todas classificadas em apenas uma teoria das relações internacionais, Mais precisamente, há
manifestações neoinstitucionalistas que deflagram relações de interdependência mas que
podem ser ocasionadas por intencionalidades mas próximas às neorrealistas. Neste contexto,
surgem, como já apontado por Le Prestre, situações de cooperação, mas que são
demonstradoras da subordinação das políticas sobre o meio ambiente à defesa dos interesses
nacionais econômicos e políticos. Paquerot constata que em águas compartilhadas a existência
de acordo de cooperação entre países com forças diferentes não garante uso igualitário e pode
ainda provocar a imposição de interesses do mais forte podendo ocasionar conflitos como se
não houvesse acordo algum, para isso ela demonstra a partir do estudo de Wolf e Hamner que
pós-1870 86% dos acordos foram bilaterais e aponta que acordos bilaterais são preferidos
pelos países mais poderosos para manter supremacia na bacia.
No segundo capítulo aponto as teorias geopolíticas brasileiras da metade do século XX
para a região da bacia, com enfoque na tríplice fronteira pretéritas ao Tratado de Itaipu e
outras da primeira década do século XXI que aludem à integração regional a partir da
relevância do eixo de metrópoles do Cone Sul: Rio de Janeiro, São Paulo e Buenos Aires e
sua centralidade nas tomadas de decisão para toda a América do Sul.
12
No terceiro capítulo me debruço em apresentar a Entidade Itaipu Binacional, os
aspectos da natureza jurídica de seu Estatuto, e os conflitos eclodidos no seu projeto entre
Argentina e Brasil e em 2009 entre Paraguai e Brasil pela revisão dos valores da dívida
paraguaia, do preço da energia vendida ao Brasil, da estrutura administrativa da empresa e por
obras de infraestrutura no Paraguai.
O quarto capítulo apresenta primeiro os instrumentos de cooperação pela água e suas
fragilidades para em seguida propor instrumentos de governança hídrica participativa que
envolva igualitariamente os agentes sobre a bacia. Buscando compreender a densidade de
relações sobre as águas transfronteiriças, são apresentados instrumentos de gestão de bacias
hidrográficas no Brasil, o CBH da Bacia do Paraná-III, em Itaipu, o Programa Cultivando
Água Boa, e na Bacia do Prata, os marcos institucionais do Programa Marco para Gestão
Sustentável dos Recursos Hídricos da Bacia do Prata.
As considerações finais compõe o quinto e último capítulo em que se procurou
relacionar os paradigmas da gestão da água compartilhada, o par conflito e cooperação, com a
relevância geopolítica da Bacia do Prata e a relevância do empreendimento da Itaipu
Binacional neste cenário,
13
1. TEORIAS DA GEOGRAFIA POLÍTICA, TEORIAS DAS RELAÇÕES
INTERNACIONAIS E OS RECURSOS NATURAIS COMPARTILHADOS:
ARTICULAÇÕES INDISPENSÁVEIS À COMPREENSÃO DA QUESTÃO
Os fatores da relação interestatal no regime jurídico de Itaipu a, desenvolvidos no
capítulo 3, seriam por si o suficiente para expor o nível de complexidade da cooperação na
Entidade Binacional, entretanto o cenário é ainda mais desafiador quando se insere um
elemento que não deve ser ignorado, a água em sua relevância ao meio ambiente, ao homem
pela dessedentarização e pela relevância como recurso natural no campo e na cidade para
ambos os Estados.
Usaremos a definição de recurso natural trabalhada pelo geógrafo Claude Raffestin e
muito constante na literatura de geografia sobre o tema. Segundo o autor a matéria natural
preexiste a toda e qualquer influência humana, enquanto que recurso é a matéria em sua forma
transformada pelo trabalho intencional com o emprego de técnicas podendo alterar a estrutura
molecular da matéria tal qual encontrada na natureza com a finalidade de criar outras
substâncias, transformando a mateira natural em recurso que por sua utilização pode se tornar
comercializável na forma de mercadoria (RAFFESTIN, 1993).
Para que se avance na compreensão da relevância dos recursos naturais na diversidade
de seus usos, o geógrafo Raffestin propôs que a Geografia Política se aproximasse da política
além do Estado, desenvolvendo em um sentido amplo “uma geografia do poder” que
reestruturou a disciplina por não considerar somente o Estado na forma de ator único das
relações entre poder e espaço (COSTA, 1992), mas que consideram também a população e as
diversas organizações na sociedade – empresas, organizações não governamentais, partidos,
etc. – como formas de poder relacional, como agentes do jogo político na tomada de decisão
e/ou na forma de resistência às decisões tomadas por terceiros, são estes agentes
paradigmátcos e aqueles sintagmáticos (RAFFESTIN, 1993). Dentre os novos agentes de
poder que se relacionam espacialmente no território propostos por Raffestin em “Por uma
Geografia do Poder”, interessa-nos especialmente as organizações que cujas atividades
ultrapassam o território de um único Estado, influenciando e, ultrapassando fronteiras,
exercendo poder em territórios de outros Estados.
Trata-se, portanto, da constatação de que novos agentes se manifestam no complexo
cenário político em diversas escalas. De maneira que a geógrafa Iná de Castro considera que
14
estes novos agentes atuam em distintas escalas, e que para a geografia política, priorizar
alguma das escalas em detrimento de outras torna esta ciência necessariamente incompleta,
porque embora a renovação pós-1970 tenha impulsionado estudos sobre outros agentes e
outras escalas além dos Estados, “a escala do Estado nacional é ainda importante para a
identificação, análise e explicação de alguns fenômenos característicos do recorte territorial
definido por suas fronteiras” (CASTRO, 2005. p. 40), mas ainda enfatiza “a geografia política
não pode prescindir de nenhuma dessas escalas [...], a consideração de cada uma e a
articulação entre elas é necessária” (CASTRO, 2005. p. 54).
1.1 Fronteira, soberania e rios transfronteiriços
Os rios transfonteiriços são, além dos fluxos de águas superficiais, fronteiras entre
Estados que podem ter políticas divergentes para o uso destas águas. Ribeiro concebe que a
questão da água tem que ser necessariamente compreendida a partir do território e da
soberania (RIBEIRO, 2008) porque o controle e o aproveitamento das águas são de
pertinência política devido aos diversos interesses coletivos no uso do recurso (RAFFESTIN,
1993). A distribuição espacial da água, tornada em recurso pela técnica, não corresponde a
todas as demandas locais, o caráter finito da água deflagra em uma distribuição desigual para
uso referente ao poder econômico ou político dos usuários, entre eles os Estados.
(RAFFESTIN, 1993; RIBEIRO 2003).
Ao adicionar o prefixo “trans” ao fronteiriço, observa-se que detém no conceito a
noção de fluxo entre os lados da fronteira, fluxo tal que atinge a dimensão daquilo que escapa
ao controle dos Estados, que se manifesta pela permeabilidade e porosidade das fronteiras em
contextos de movimentos de produtos sociais ou de recursos naturais compartilhados.
As águas transfronteiriças são “as águas superficiais e subterrâneas que marcam as
fronteiras entre dois ou mais Estados, que as atravessam, ou que estão situadas nessas mesmas
fronteiras.” (CANOTILHO, 2006, p. 291). Deste modo, as águas transfronteiriças são
recursos naturais compartilhados e estão, ao menos, sob duas esferas legais de ação, a cada
jurisdição nacional regulada conforme a soberania interna do Estado, mas que encontra
limitações impostas pelo direito internacional. A delimitação política dos Estados, portanto,
nem sempre corresponde com a delimitação das áreas das bacias hidrográficas (RIBEIRO,
2008; PAQUEROT, 2005)
15
Portanto, os cursos de água que delimitam territórios estão sujeitos a diversos agentes
que estão inseridos em contextos culturais, sociais e políticos distintos, mas se relacionam
com um mesmo e único sistema hídrico comum à região e, por essa característica
transfronteiriça, há a necessidade de existir políticas de cooperação internacional que atendam
aos interesses dos atores em suas particularidades.
Os limites dos territórios tem relevante potencialidade para situações de tensão. Nas
últimas décadas, o emprego de políticas de integração internacional inseriram as fronteiras em
um paradigma contemporâneo, pois além dos aspectos de delimitação política e de
preocupação com segurança nacional passaram a ser também potenciais lugares para
cooperação interestatal estratégica. (SANT’ANNA, 2009).
As regiões fronteiriças tem potencial para integração e desintegração, nelas coexistem
momentos sociais, políticos e econômicos distintos, referentes a cada Estado-nação vizinho
(MACHADO e STEIMAN, 2002).
O direito de utilização das águas está baseado na soberania de um Estado, ao poder
valer dos recursos dispostos no território. Ratzel traz a categoria de território definida como o
espaço apropriado pelo homem e assume implicitamente a noção de limite a este espaço.
Raffestin influenciado pelas ideias de Lefebvre e Foucault compreende o território pelo
espaço produzido pela energia e informação empregadas intencionalmente pelos grupos
sociais revelando relações de poder com o espaço desde um indivíduo que organiza os objetos
em seu apartamento ao Poder do Estado que ordena seu território.
Raffestin sintetiza a relação do território com o limite
...à noção de limite que, mesmo não sendo traçado, como em
geral ocorre, exprime a relação que um grupo mantém com uma
porção do espaço. A ação desse grupo gera de imediato a
delimitação. [...] Sendo a ação sempre comandada por um
objetivo, este é também uma delimitação em relação a outros
objetivos possíveis. [...] Delimitar é, pois, isolar ou subtrair
momentaneamente, ou, ainda, manifestar um poder numa área
precisa. (RAFFESTIN, 1993, p. 153).
A fronteira na geografia política clássica é, sobretudo, um espaço de tensão, das
“fronteiras vivas” e da “tensão vital” (VALLAUX apud COSTA, 1992), para a análise da
16
geografia política contemporânea existem zonas fronteiriças que são integradoras e
unificantes e as fronteiras que são disjuntoras de tempos sociais desiguais. A soberania nesta
contextualização analítica, passaria a perder seu sentido militar, pois as fronteiras são mais
facilmente permeáveis. A soberania continuaria com sua significação no conjunto das leis de
um país, no controle fiscal e no controle de fluxos migratórios. (RAFFESTIN &
GUICHONNET apud COSTA, 1992).
Para Raffestin, população, território e soberania são as categorias que definem o
Estado (RAFFESTIN, 1993). O exercício de soberania pela população em um território expõe
a questão das fronteiras territoriais. Nesta categorização, passa a ser imprescindível que os
Estados cooperem entre si, uma vez que o globo terrestre tornou-se seccionado em territórios
de diversos Estados soberanos.
Os geógrafos A. C. R. Moraes e W. M. Costa consideraram territórios que detém
“valor estratégico”, onde não são apenas as variáveis econômicas que os valorizam, mas,
sobretudo, o seu domínio devido a sua localização privilegiada. (MORAES & COSTA, 1984).
Para o Brigadeiro Lysias Rodrigues e para o General Golbery, cânones da geopolítica
brasileira, a tríplice fronteira consiste em um ponto de tensão pelo jogo de forças entre os três
Estados que confluem àquele ponto.
A estratégia principal do Brasil para a região desde o início do século XX, vem se
apoiando na demonstração elaborada por Vallaux, em um claro movimento de contenção da
Argentina enquanto potência vizinha e de expansão de suas zonas de influências, sem se
interessar precisamente pela expansão de território e sim por sua manutenção. Vallaux
demonstrou que existe uma relação histórica entre a estrutura geral de circulação interna de
um país e o que a circulação projeta em termos de fluxo para fora do território, a qual
apresenta três significados:
Primeiro: ela (a estrutura geral de circulação interna) é
reveladora de uma estratégia nacional de construção da coesão
interna e de defesa da integridade territorial, isto é, de
articulação e proteção dos seus elementos vitais, tais como
fronteiras, sua capital, a infraestrutura fundamental, etc.
Segundo: ela revela também a natureza da projeção externa de
um Estado, sempre carregada de significados diversos, ora
sinalizando enlaces voltados para a cooperação, ora envolvida
com políticas de poder e de hegemonia em contextos de
rivalidades regionais. Finalmente, em seu significado trivial, a
17
circulação geral é realmente aquilo que mais aparenta, isto é,
infraestrutura econômica ou meios de transporte de bens,
pessoas e informação. (VALLAUX apud COSTA, 1999, p.30)
O debate sobre soberania se fará mais adiante, mas cabe sinalizar que se expressa
nessa análise de Vallaux, um movimento que transfere os efeitos da política territorial de um
Estado da escala interna para a escala externa através da projeção de fluxos, o que significa
dizer que o exercício de soberania interna, na efetivação de estruturas de circulação, implica
em desdobramentos externos afetando de forma relacional o território vizinho e tornando
efeitos que podem influir nas políticas internas de outro Estado soberano.
Na compreensão das políticas territoriais os fluxos variados e as concentrações de
equipamentos fixos no espaço – formando centros urbanos e metrópoles que se articulam com
outros centros e metrópoles que também concentram fixos, compõem o pano de fundo com
importante vertente de caráter econômico. Evidencia-se assim a participação de outros
agentes além dos Estados na efetivação destas políticas, observa-se intensa atividade de
diversos atores, entre eles, as cidades fronteiriças que se mobilizam antecipadamente à
implementação com fins de atraírem em seus domínios os fixos, e empresas e investidores
com interesses na superação dos obstáculos à circulação (COSTA, 1999).
No âmbito daquilo que se constitui uma escala de disputas articuladas entre os lugares
e o poder econômico de concentração e acumulação, a manutenção do status quo das
desigualdades socioespaciais revela-se no âmbito do Estado que se realiza inserido na lógica
de economia neoliberal. Enfrenta-se assim o Poder com o poder, de modo que a
multidimensionalidade das políticas territoriais compreende a dinâmica dos diversos agentes
que produzem o espaço.
Uma perspectiva de análise contemporânea que inclui a Bacia do Prata na política
regional é a abordagem do geógrafo Wanderley Messias da Costa, que propõe à América do
Sul quatro arranjos territoriais principais, que se pretende não se basear nas características das
condições naturais e “identificar arranjos específicos e de importância regional” (COSTA,
1999, p.36) onde todos se estabelecem por articulações com o território brasileiro.
Nesta proposta, Costa considera a formação econômico-social das articulações
meridionais e as orientais, a primeira funciona como área de atração para toda a América do
Sul através das políticas territoriais que interligam o Mercosul e a segunda funciona como
18
subsistema da primeira interligando as principais e mais modernas metrópoles do continente
exercendo poder de atração das forças centrípetas para os centros do Cone Sul. (ROSEIRA,
2006; RUCKERT, 2010).
A relação que o Estado brasileiro demonstra ter na região da tríplice fronteira é mais
próxima da concepção de território trabalhada pela geografia política clássica, à qual constitui
ao território um potencial para o desenvolvimento e expansão da influência do Estado. E
simultaneamente o território integrado pelas organizações supranacionais e
intergovernamentais (Itaipu e CIC) são organismos que se relacionam na perspectiva dos
territórios-rede, uma vez que são integrados pela cooperação interestatal, mas não estão sobre
apenas um território, havendo então diversas intersecções territoriais que por sua vez também
estão sob intersecções de soberanias e interesses que podem coincidir ou serem divergentes.
Para pensar no espaço subordinado à ação política, a geografia política tanto a clássica
quanto a contemporânea se estabelecem sobre o conceito de território como base
materializada da ação social. Ainda que durante a sua historicidade tenha-se discutido muito
sobre a relação de causalidade imposta ao meio social pelas características físicas do território
e também sobre o inverso disto, o meio social dimensionando o território e configurando o
meio físico através da técnica de cada sociedade no tempo alcançando seu ápice no debate da
superação do território. Alternativamente a esta dicotomia, o geógrafo Rogerio Haesbart,
afirma que o território seja relacional no sentido de mesclar ambas compreensões de território,
ao passo que, para o autor, os discursos da desterritorialização baseados, por exemplo, nos
fluxos entre territórios mais ou menos próximos possibilitados pelo desenvolvimento das
técnicas científico informacionais formando redes, são incapazes de demonstrar a
complexidade das relações de poder com os espaços. Haesbart busca na obra de Raffestin a
definição das redes como uma das três características básicas do território. Haesbart avança ao
trabalhar o que chama de “territórios-rede”, que é um conceito no eixo da coexistência das
escalas do espaço, dos tempos e das concepções dicotômicas entre fim do território e de sua
manutenção.
Ainda que em Raffestin o território seja compreendido em sua forma relacional,
conforme a própria historicidade do autor o debate sobre a desterritorialização não tem lugar
em sua obra, entretanto na sua própria conceitualização de Poder e poder1, ao assumir a
1 “Poder, com letra maiúscula, postula como dados iniciais, a soberania do Estado, a forma da lei ou da unidade
global de uma dominação.”; e poder, com letra minúscula, “está presente em cada relação, na curva de cada
19
perspectiva foucaultiana de relações de poder, implica em diversas escalas de espaço
temporais de maneira que leva a conceber a sobreposição de territórios no espaço, uma vez
que acrescentar mais agentes no território de outro agente pretérito se torna imprescindível.
Neste ponto o que poderia confluir para uma leitura do fim do território, é inibida pelos
axiomas que o autor expõe sobre espaço que algum agente age, ou seja, sobre o território. São
as bases do território as malhas, os nós e as redes que formam um “sistema territorial” e
“constituem o invólucro no qual se originam as relações de poder.” (RAFFESTIN, 1993. p,
151), buscando em Gottmann, o autor justifica a existência destas características básicas do
território, pela disposição dos grupos ou indivíduos no espaço, isto é, às distâncias
geográficas, sociais e econômicas com outros grupos e a problemática da acessibilidade lato
sensu. Isto ocorre tanto na escala estatal quando na escala individual, pois
Do Estado ao indivíduo, passando por todas as organizações
pequenas ou grandes, encontram-se atores sintagmáticos que
‘produzem’ o território” uma vez que “todos nós combinamos
energia e informação, que estruturamos com códigos em função
de certos objetivos (RAFFESTIN, 1993. p. 152-153).
Voltando a Haesbart, o cenário que involucra diversos agentes de “produção” de
território constitui uma pluralidade de territórios, uma espécie de soma de territórios e de
territorialidades que podem se justapor ou sobrepor hierarquicamente, em ambas situações os
conflitos se realizam em maior ou menor grau. Por isso, o autor afirma que os “territórios
devem ser trabalhados na multiplicidade de poderes neles incorporados através de múltiplos
agentes envolvidos” e que devemos considerar os territórios de acordo com os agentes que o
constroem (HAESBART, 2004, p. 52).
Conforme já demonstrado, a integração continental nas perspectivas das teorias
brasileiras se estabeleceria no espraiamento das zonas de influências através de relações
logísticas, técnicas e informacionais no espaço. Assim sendo, as fronteiras territoriais tornam-
se, enquanto categorias de análise, conceitos centrais para os estudos de Geografia Política
devido ao seu duplo caráter que simultaneamente e em última instância teriam as funções em
que: “a fronteira marca o limite territorial onde o Estado-nação exerce sua soberania”
(MARTIN, 1992, p.38) e “um limite que ao mesmo tempo é suficiente para distinguir as
ação: insidioso, ele se aproveita de todas as fissuras sociais para infiltrar-se até o coração do homem”
(RAFFESTIN, 1993, p. 51-52)
20
responsabilidades jurídicas e político-administrativas, mas não impede a livre circulação de
pessoas, mercadorias, capitais e informações.” (MARTIN, 1992, p. 45).
Para compreensão destes fenômenos sintetizados pelo geógrafo André Martin, faz-se
necessário caminhar em direção a outro conceito essencial à análise que se propõe à política
dos Estados e das fronteiras: soberania. Em síntese, o modelo clássico do conceito se
estabeleceu ao fim da Guerra dos Trinta Anos, em 1648, no Congresso de Westfália, que
resultou na formação de uma consciência que se pretendia internacional e cabível a todos
Estados baseada nos princípios de autonomia, de território, reconhecimento mútuo e controle
(KRASNER, 2001). Isto implicaria dizer que a soberania estatal no modelo de Westfália
compreende, nos termos de Ribeiro “que o mundo é dividido em Estados soberanos, sobre os
quais não há autoridade superior que não a do soberano. Garante-se o território dos países dos
países e a exclusão de atores internacionais nas decisões fundamentais internas a um Estado”
(RIBEIRO, 2012, p.4). Em que pese as premissas elencadas, não se manteve um sistema onde
os comportamentos dos Estados no plano internacional deixasse de denotar de algum modo o
comprometimento da soberania nos moldes da Paz de Westfália, constituindo e reforçando
desigualdades entre Estados através de uma dicotomia entre o discurso e a prática a ponto de
se caracterizar criticamente uma “organized hypocrisy” (KRASNER, 1999;2001) que é
decorrência das assimetrias de Poder.
Os grandes teóricos da política clássica, como Maquiavel, Bodin, Hobbes e Rousseau,
de alguma forma contribuem para uma política internacional de defesa dos interesses
próprios, pois segundo esses autores a soberania é sempre referente aos interesses de um
Estado, ainda que, no caso dos dois últimos autores, a soberania esteja mais próxima dos
desejos da população de um Estado legitimando atitudes assimétricas nas relações
internacionais.
A compreensão clássica de soberania considerada a “ferro e fogo” na prática
contemporânea impossibilitaria relações interestatais que compartilham o controle político
sobre uma determinada área de um território, e consequentemente, dos recursos que ali
existem.
A cooperação interestatal sobre águas compartilhadas entre os territórios dos Estados
e as manifestações com fins em assegurar os interesses políticos de cada parte nos impõe a
necessidade do debate da soberania em sua compreensão mais clássica e também a
contemporânea frente aos novos paradigmas das relações entre os Estados. A ascensão de
21
organizações supranacionais no período posterior à Segunda Guerra Mundial e ainda a
consolidação de empresas transnacionais sugerem o declínio da soberania, porém de acordo
com o geografo Wagner Ribeiro, “é preciso rever a definição de soberania sem precisar
abandoná-la [...] para reafirmar seu papel relevante nas relações entre países no mundo
contemporâneo” (RIBEIRO, 2012. p. 1).
Ainda segundo Ribeiro
Caso um rio transfronteiriço seja compartilhado por dois ou
mais países, o uso do conceito clássico de soberania como
instrumento para garantir o acesso à água implicaria em não
abandonar o domínio e o uso sobre recursos territoriais. Dois
países que tenham objetivos distintos e antagônicos podem
chegar ao conflito se estiverem apoiados na soberania clássica.
(RIBEIRO, 2012. p. 4)
Na contingência dos paradigmas dos fluxos transfronteiriços que, de certa maneira,
permitem os fluxos de mercadorias, de pessoas, capitais, informações, doenças, efeitos de
degradação ambiental entre outros fluxos que fogem da regulação dos Estados, se
estabeleceram as percepções de uma outra conceituação de soberania, a qual denominou-se
“soberania interdependente”.
A soberania interdependente apontada por Stephen Krasner permitiria abordar a
problemática dos cursos d’água transfronteiriços em sua amplitude de territórios que
possibilitaria uma relação conjunta somente entre os Estados ribeirinhos no desenvolvimento
de políticas em direção à contingência de conflitos.
Esta compreensão de soberania não anula completamente as outras, uma vez que o
comportamento dos Estados, mesmo em regime de cooperação sobre recursos naturais
compartilhados, tem explícitas ligações com a soberania clássica porque mesmo na
interdependência há muitas relações assimétricas como demonstram diversos autores
(PAQUEROT, 2005; NYE & KEOHANE, 1997; STRANGE, 1996), o que significa dizer que
se denotam “novas formas de coexistência interestatal” (RIBEIRO, 2012, p.10).
A temática dos conflitos distributivos na geografia política aparecer em Harvey
(1973), mas também em outros autores, como Raffestin (1993) e Ribeiro (2001). Na nova
agenda da Geografia Política, os conflitos distributivos emergem como uma questão
geográfica e definem um campo temático (CASTRO, 2004).
22
1.2 As teorias das Relações Internacionais sobre cooperação interestatal
Os conflitos distributivos na dimensão interestatal são baseados no principio de
soberania sobre os recursos especializados em seus territórios. O geografo Wolf coordenou
pesquisa que identificou e classificou a partir da intensidade as situações de conflito e
cooperação em bacias transfronteiriças, no extremo do conflito estaria a declaração de guerra
formal enquanto que no outro extremo está a unificação em uma nação, não foi identificada
nenhuma situação que fosse classificada em algum destes extremos, ainda que existissem
situações que compunham um nível abaixo das extremidades (Ações militares de grande
escala, 21 eventos, e Tratado internacional de águas, 157 eventos). Em termos absolutos
concluiu-se que há mais eventos de cooperação. (WOLF, 2002)
Le Prestre, cientista político, analisou as situações de cooperação internacional sobre o
meio ambiente identificando as motivações dos Estados. Assim, constatou quatro atitudes
possíveis: 1. Os Estados buscam adaptar a comunidade internacional aos seus modelos e
valores, num comportamento imperialista; 2. Os Estados tomam postura defensiva no sentido
de limitação de sua autonomia motivados pelos objetivos políticos e econômicos; 3. O
comportamento instrumental dos Estados consideram, mas não compreendem a relevância da
questão ambiental, o interesse é obter concessões ou vantagens em outro domínio; 4. Os
Estados adotam comportamento internacionalista concluindo que a comunidade internacional
deve definir e buscar interesse comum, com a motivação de encontrar solução otimizada (LE
PRESTRE, 2000).
Mesmo que em algumas situações não se resolvam efetivamente os conflitos, é na via
contrária a eles que surge a cooperação internacional. Keohane indica que cooperação ocorre
quando os atores ajustam seus comportamentos aos comportamentos de outros atores
buscando objetivos comuns (KEOHANE, 1984). As teorias contemporâneas sobre cooperação
descrevem-na como: “um processo aberto, descentralizado, não-linear e repetitivo, que pode
ter um impacto de transformação nos atores e no funcionamento do sistema internacional.”
(BALSIGER apud SANT’ANNA, 2009, p. 190).
Por isso, os ganhos e as perdas são relativos e podem ocorrer situações de cooperação
institucionalizada em que o Estado menos poderoso sofra consequências como se não
existisse regime de cooperação. (PAQUEROT, 2005). Ao passo que se compreende por
cooperação neste trabalho uma relação não linear, não detentora da característica idealista de
estabilidade e paz constante no tempo, assume-se assim a perspectiva de que o regime de
23
cooperação gera custos e ganhos relativos, e sujeita a conflitos nas diversas escalas a que
envolvem o tema
Nas relações internacionais há teorias que visam compreender as motivações dos
Estados para assinarem acordos de cooperação. Para os autores da corrente do neorrealismo,
pautada principalmente no poder militar, a cooperação entre os Estados seria meio de
preservação da ordem internacional em um sistema anárquico e intensamente competitivo em
que os Estados seriam racionais e igualmente soberanos. (DONELLY, 2005). A constante
competição entre Estados e o sistema anárquico, sem regulação das relações, seriam
empecilhos à cooperação, pois nas relações com Estados mais poderosos, a cooperação
geraria apenas ganhos relativos (SANT’ANNA, 2009).
Em oposição ao neorrealismo, o neoliberalismo insere as instituições internacionais no
sistema internacional buscando as necessidades humanas em detrimento da soberania absoluta
dos Estados. Os autores neoliberais concordam com os neorrealistas pois supõem o
racionalismo, a busca pelos interesses próprios e os Estados como principais agentes do
sistema internacional (WENDT, 1992), muito embora compreenda-se que a cooperação gere
ganhos absolutos.
A teoria da interdependência também procura compreender os movimentos da
cooperação internacional, mas pressupõe que em casos de relação de interdependência entre
países as ações de determinado agente tem implicações recíprocas entre as parte (NYE e
KEOHANE, 1997).
Apesar da teoria da interdependência entender que os efeitos são recíprocos ela não
desfaz do caráter das diferenças entre as partes sobre os custos da cooperação, assume-se
assim, que em regimes de cooperação há uma relativa diminuição da autonomia dos Estados,
além disso, em casos de significativas diferenças de poder político e/ou econômico os custos
da cooperação podem ser significantes conforme nos indica Guedes, 2003: “A condição de
assimetria pode levar determinado ator a práticas de manipulação nas relações com um ator
ou grupo de atores e se aproveite daqueles mais dependentes” (p. 566). A mesma autora
indica ainda que “quanto maior a assimetria maior a possibilidade de conflito e instabilidade”
(p. 567).
A cooperação pode, portanto, compreender que apesar dos efeitos serem recíprocos a
cooperação interdependente não se limita a ideia de benefício mútuo. Ao contrário de um
24
sistema de igualdade, segundo Lima (2009), na gênese da teoria estão as perspectivas da
teoria da dependência levadas a cabo, sobretudo, por sociólogos, economistas e historiadores
latino-americanos que buscaram explicar o atraso econômico de suas nações a partir da
economia política internacional, em que os Estados não são os únicos agentes. Quanto a
perspectiva economicista do desenvolvimento desigual, o ilustre geógrafo Yves Lacoste diz:
Essa crise dialética se acelera, não somente no tempo, como também
no espaço. Ela não se manifesta uniformemente na superfície do globo
mas, bem ao contrário, ela aí toma formas cada vez mais diferenciadas,
embora cada vez mais ligadas umas as outras. [...] Essa diferenciação
não se marca somente por indicadores econômicos, os quais, após os
economistas, adquirimos o costume de refletir. Ela se manifesta
também no plano de cada um dos diferentes grandes tipos de
contradições que parece útil distinguir (por exemplo, as contradições
demográficas, as contradições ecológicas, as contradições políticas)
(LACOSTE, 1988 ,p. 168-169).
As assimetrias nas relações de interdependência podem engendrar relações de
sensibilidade e de vulnerabilidade. A primeira faz referência a “diferentes graus de resposta
dentro de uma estrutura política [...] ou com que rapidez e em que intensidade os abalos –
econômicos, financeiros, políticos, sociais, ecológicos – vividos por um país atingem a
outro.”, e a segunda a surge quando “a sensibilidade de um Estado, ou outros atores, ficam
expostas e não tem onde se socorrer [...] é como se os atores ficassem sem alternativas diante
dos fatores que causam sensibilidade” (LIMA, 2009, p. 279-280).
Este cenário de complexa disputa em meio a cooperação evidencia algumas
das formas em que os Estados se relacionaram no pós-segunda guerra. O caso de
Itaipu pode ser compreendido como relação de interdependência de vulnerabilidade
se se considerar a posição do Paraguai em sua dependência econômica e
energética no empreendimento binacional, que culminaram nos esforços de uma
revisão dos preços pagos pelo Brasil ao Paraguai pelo excedente energético e pelos esforços
em busca da abertura à venda da energia a terceiros que não ao Estado Brasileiro.
No campo das relações de cooperação sobre o meio ambiente, a conscientização da
necessidade de interdependência existe pela conjugação de características que compõem o
próprio ambiente físico-biológico, ao contrário do que é a fragmentação político-
administrativa das relações sociais que pretende regulamentar e fazer uso dos recursos
25
naturais disponíveis no espaço e distribuídos de forma desigual. (GUIDO, 2003; RIBEIRO,
2001, 2008).
Ainda que as dinâmicas de assimetrias sejam presentes, para os autores, as formações
de cooperação interdependente através de instituições internacionais são ainda mais
importantes como estruturas para formação de coalizões de regime de regulação do
comportamento dos Estados mais poderosos (KEOHANE e NYE, 2001).
2. O BRASIL E A FRONTEIRA
O Estado brasileiro desenvolveu o projeto de Itaipu no âmbito das políticas territoriais,
mas que na sua própria condição enquanto Entidade Binacional com fins de produção de
energia elétrica pelo aproveitamento das águas compartilhadas depende de outros agentes
políticos além dos que são internos aos interesses do Estado brasileiro. Configura-se uma
multidimensionalidade do poder no âmbito da gestão do território.
O aproveitamento hidrelétrico nas águas transfronteiriças entre Brasil e Paraguai no
Rio Paraná, se realiza pela Itaipu Binacional, inicialmente concebida pelo Brasil por motivos
políticos no movimento de conflitos pela supremacia na porção sul da América do Sul, mas
com espraiamentos para todo o subcontinente.
A materialização no espaço das políticas brasileiras para a região abrem caminho para
o conceito de spill overs, que decorre da ideia de que a integração regional é o horizonte de
um processo gradativo que pode ser estimulado através da integração setorial, como a
integração elétrica, através do desenvolvimento das estruturas necessárias para a execução das
funções do setor. Em que pese os sabidos problemas das teorias de desenvolvimento que não
consideram as singularidades do espaço, ele auxilia a compreensão dos processos de
integração setorial e mais amplamente os processos de integração regional.
26
2.1 As teorias geopolíticas brasileiras para a tríplice fronteiras antes da assinatura da
Ata de Itaipu
O Brasil teve ao longo do século XX, em especial após a Segunda Guerra, militares
geopolíticos com relevante influencia nas análises brasileiras da geografia política e no
planejamento da política externa. Capitão Travassos na década de 30, Brigadeiro Lysias
Rodrigues em 1947 e o General Golbery de Couto e Silva nas décadas de 50 e 60 foram
evidentemente influenciados pela escola alemã. A partir das ideias de Friedrich Ratzel e de
Kjéllen, observaram a América do Sul através de uma perspectiva expansionista com base nas
relações entre espaço e poder (COSTA. 1992). Portanto, a política externa do Estado
brasileiro se direcionaria em direção de estabelecer o Brasil como a maior potência
continental e que exercesse sobre os Estados vizinhos uma zona de influência que os
colocassem em uma posição que propiciasse relações comerciais e políticas em prol dos
interesses brasileiros. Além dos autores da escola alemã, para Travassos e Golbery o conceito
de “heartland”2 do britânico Mackinder é central para a estratégia brasileira de expansão de
sua zona de influência na América do Sul (MELLO, 1997).
Na elaboração de estratégias para expansão do poder brasileiro, o capitão Mário
Tavassos considerou as cidades de Cochabamba, Santa Cruz e Sucre, na Bolívia como o
“heartland” da América do Sul. Estas três cidades denominou “Triângulo Estratégico
Boliviano” apontando a relevância por ser o ponto de contato, mobilidade e comunicação e
interligação no continente sul-americano. Travassos entende que é crucial para os interesses
brasileiros que a projeção continental da Argentina através da Bacia do Prata, seja mitigada
numa política de ações neutralizantes. Neste sentido, o foco de ação da política externa do
Estado brasileiro deveria concentrar-se, então, na extensão da rede de comunicação entre o
Brasil e os Estados mediterrâneos – Paraguai e Bolívia – através da construção de vias de
comunicação como rodovias, ferrovias, vias fluviais e aéreas que viabilizassem o desvio no
transporte de carga que seria destinada aos portos do Pacífico ou aos portos argentinos para os
portos brasileiros no Atlântico.
2
O conceito de “heartland” foi constituído após a análise da possibilidade de mobilidade
econômica e militar em porções de terras emersas, na Europa Oriental e parte da Ásia. O
Coração Continental seria, portanto, o território a ser dominado pelos estrategistas.
27
Para o brigadeiro Lysias Rodrigues, assim como para Travassos, a estratégia territorial
do Brasil na América Latina também compreende a necessidade de neutralizar a influência
argentina no sistema platino, de modo que a projeção brasileira se expanda ao integrar a rede
de portos nacionais aos demais países que não tem saída ao mar, a integração valeria como
alternativa ao porto de Buenos Aires, na Argentina. A análise de Rodrigues compreende que
devido ao jogo de forças das estratégias geopolíticas entre dois Estados na busca histórica
pela supremacia política e econômica no continente, a região de Iguaçu seria “punctum
dolens”, ou seja, uma “fronteira viva”, que sofre um choque “de forças antagônicas e que, por
sua localização geopolítica estratégica, constituía um estopim capaz de detonar um confronto
bélico entre dois ou mais países.” (MELLO, 1997, p. 89), revelando o caráter de tensão
política naquele ponto de fronteira.
O general Golbery propõe estratégias geopolíticas claramente influenciadas pelas
ideias de Travassos, por exemplo, Golbery adota, além da Bolívia como “heartland sul-
americano”, a concepção de expansão continental do Brasil e, no que diz respeito à Bacia do
Prata, as “ações neutralizantes” também estão presentes. Além da marcante influencia de
Travassos nos estudos de Golbery, as áreas fronteiriças e suas tensões inerentes
(BACKHEUSER, 1952) estão na análise do potencial aproveitamento geopolítico do
território brasileiro. Interessa-nos destacar as percepções de Golbery à fronteira sudoeste, na
região do “punctum dolens”, para o general Golbery esta fronteira seria “a linha de tensão
máxima do campo sul-americano”3 neste ponto o embate político e econômico entre Brasil e
Argentina se canaliza e se acirra com a política de “ações neutralizantes” que buscavam
satelitizar e colocar na orbita de influência brasileira os Estados mediterrâneos da América do
Sul e dependentes do sistema fluvial do Prata.
O Paraguai é identificado como uma via de acesso ao coração continental e essencial
para a estratégia brasileira de mitigação da extensão argentina. Para consolidar o plano de
ação concebido pelos generais brasileiros, o governo brasileiro passou efetivamente a realizar
obras de expansão “rumo ao oeste”4 baseado numa política, em um primeiro momento, em
3 COUTO e SILVA, G. Conjuntura Política Nacional, e o Poder Executivo & Geopolítica
do Brasil. 3. Ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. 1981.
4 No final de seu livro “Projeção Continental do Brasil”, Travassos faz um apelo entusiasta à
expansão do espaço de influência do Brasil na América do Sul com a frase “Para Oeste!”, em
uma revisitação ao espírito bandeirante (MELLO, 1997).
28
construção de vias de transporte e posteriormente com o uso do recurso da água
transfronteiriça para concepção e construção da Entidade Binacional Itaipu em uma
perspectiva de extensão da zona de influência através da aproximação do Paraguai.
Em 26 de abril de 1973, foi assinado na cidade de Brasília o Tratado de Itaipu que
definiu o regulamento da produção energética conjunta entre Brasil e Paraguai. Tendo sucesso
nas negociações com o Paraguai, o governo brasileiro realizou, do ponto de vista geopolítico,
o que ambicionavam os militares: a amortização da influência da Argentina na bacia do Prata
e a satelitização de um dos países que adotava política de pendulo (ora, em consonância com a
Argentina, ora em consonância com os interesses do Brasil), o Paraguai (MELLO, 1997).
Essa dinâmica da política externa brasileira gerou diversos incômodos com teóricos da
geopolítica latino-americana, especialmente com argentinos, de modo que o general
Gugliamelli fez críticas ao general Golbery dizendo que sua geopolítica era “arbitrária” e que
“alguns chauvinistas sonham ainda noites inteiras com imperialismos ou novas formas de
colonialismo”5.
2.2 A POTENCIALIDADE DE INTEGRAÇÃO REGIONAL NA FRONTEIRA
Uma perspectiva de análise contemporânea que inclui a Bacia do Prata na política
regional é a abordagem do geógrafo Wanderley Messias da Costa, que propõe à América do
Sul quatro arranjos territoriais principais, que se pretende não se basear nas características das
condições naturais e “identificar arranjos específicos e de importância regional” (COSTA,
1999, p.36) onde todos se estabelecem por articulações com o território brasileiro.
Nesta proposta, Costa considera a formação econômico-social das articulações
meridionais e as orientais, a primeira funciona como área de atração para toda a América do
Sul através das políticas territoriais que interligam o Mercosul e a segunda funciona como
subsistema da primeira interligando as principais e mais modernas metrópoles do continente
5 Gugliamelli (1979 apud MELLO, 1997, p. 127)
29
exercendo poder de atração das forças centrípetas para os centros do Cone Sul. (ROSEIRA,
2006; RUCKERT, 2010).
A relação que o Estado brasileiro demonstra ter na região da tríplice fronteira é mais
próxima da concepção de território trabalhada pela geografia política clássica, à qual constitui
ao território um potencial para o desenvolvimento e expansão da influência do Estado. E
simultaneamente o território integrado pelas organizações supranacionais e
intergovernamentais (Itaipu e CIC) são organismos que se relacionam na perspectiva dos
territórios-rede, uma vez que são integrados pela cooperação interestatal, mas não estão sobre
apenas um território, havendo então diversas intersecções territoriais que por sua vez também
estão sob intersecções de soberanias e interesses que podem coincidir ou serem divergentes.
Na compreensão das políticas territoriais os fluxos variados e as concentrações de
equipamentos fixos no espaço – formando centros urbanos e metrópoles que se articulam com
outros centros e metrópoles que também concentram fixos, compõem o pano de fundo com
importante vertente de caráter econômico. Evidencia-se assim a participação de outros
agentes além dos Estados na efetivação destas políticas, observa-se intensa atividade de
diversos atores, entre eles, as cidades fronteiriças que se mobilizam antecipadamente à
implementação com fins de atraírem em seus domínios os fixos, e empresas e investidores
com interesses na superação dos obstáculos à circulação (COSTA, 1999).
No âmbito das escala de disputas articuladas entre os lugares e o poder econômico de
concentração e acumulação, a manutenção do status quo das desigualdades sócio-espaciais
revela-se no âmbito do Estado que se realiza inserido na lógica de economia neoliberal.
Enfrenta-se assim o Poder com o poder, de modo que a multidimensionalidade das políticas
territoriais compreende a dinâmica dos diversos agentes que produzem o espaço.
A institucionalização dos interesses subnacionais brasileiros e de integração regional
no Cone Sul, permitiram a realização de projetos de grande porte na margem direita do rio
Paraná. A construção do Parque Tecnológico Itaipu (PTI), o desenvolvimento do Programa
Cultivando Água Boa e a implantação da Universidade Federal da Integração Latino-
Americana (UNILA), são projetos que foram inicialmente desenvolvidos pela parte brasileira.
O Parque Tecnológico Itaipu, foi criado em 2003 e inaugurado em Outubro de 2004
com o propósito de “atender às necessidades de modernização das instalações da hidrelétrica e
30
estimular o progresso da região do entorno da usina”6. O PTI foi criado em parceria com a
Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), com as prefeituras e outras
instituições que assinaram a carta de intenções que previa a criação do Parque Tecnológico
que se pretendia ser
Espaço inovador que congrega projetos e programas voltados para a
inserção social, a geração de emprego e renda, a geração e distribuição
do conhecimento, em todos os seus níveis, assim como o
desenvolvimento e transferência de tecnologias, propiciando trocas de
experiências e integração entre pessoas para uma melhor compreensão e
mudança da realidade. (Item 1 da Carta de Intenções firmada na Central
Hidrelétrica de Itaipu, em 23/05/2003, por 36 autoridades brasileiras e
paraguaias).7
O Paraguai tem participação no PTI, mas iniciou as atividades somente 5 anos depois
do Brasil, em 2009 e utiliza o mesmo espaço, na margem direita do Rio Paraná, em território
brasileiro.
Finalmente, a UNILA é uma universidade federal brasileira, foi criada em 2010, mas
iniciou sua estruturação em 2007 com a proposta de criação do Instituto Mercosul de Estudos
Avançados (IMEA). No artigo Iº da lei nº 12.189/20108, que cria a UNILA, é explícita
localidade onde deve ser implementada a universidade
Fica criada a Universidade Federal da Integração Latino-Americana -
UNILA, de natureza jurídica autárquica, vinculada ao Ministério da
Educação, com sede e foro na cidade de Foz do Iguaçu, Estado do
Paraná.
E no artigo IIº parágrafo 2º o objetivo de formação de “recursos humanos” com a finalidade
de integração científica entre a América Latina, especialmente ao MERCOSUL.
Os cursos ministrados na Unila serão, preferencialmente, em áreas de
interesse mútuo dos países da América Latina, sobretudo dos membros
do Mercosul, com ênfase em temas envolvendo exploração de recursos
naturais e biodiversidades transfronteiriças, estudos sociais e
6 Disponível em: https://www.itaipu.gov.br/tecnologia/parque-tecnologico-itaipu-pti Acesso em 02/03/2015.
7 Disponível em http://www.pti.org.br/pti/sobre-nos/historico Acesso em 02/03/2015.
8 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/L12189.htm
Acesso em 04/03/2015
31
linguísticos regionais, relações internacionais e demais áreas
consideradas estratégicas para o desenvolvimento e a integração
regionais.
As técnicas, a tecnologia e a informação como formas de poder somados à
caracterização da política de integração na tríplice fronteira aqui esboçada, podem contribuir
para compreensão do interesse brasileiro na região. Se assim considerado a concentração de
instituições voltadas à produção tecnológica e científica propicia o desenvolvimento de uma
relação ainda mais centrada no poder brasileiro e distanciamento com os países vizinhos que
não detém estruturas semelhantes, como é o caso do Paraguai.
Em que pese as mudanças políticas ocorridas na América do Sul pós 1980, todos estes
esforços empregados pelo Brasil na tríplice fronteira indicam que assim como na época das
estratégias geopolíticas esboçadas pelos militares antes do Tratado de Itaipu, a região ainda
manifesta sua potencialidade tanto para a cooperação como para manutenção do poder de
influência do Brasil na Bacia do Prata e na América Latina.
3. A ENTIDADE ITAIPU BINACIONAL
O rio Paraná delimita a fronteira entre Paraguai e Brasil por 190 quilômetros.
Historicamente as relações brasileiras com o Estado paraguaio foram permeadas por diversos
conflitos que atingiram diferentes graus de tensão (POMER, 1979). A assinatura conciliatória
da Ata de Iguaçu9 foi além de uma resolução de conflito territorial
10, o documento estabeleceu
as diretrizes gerais dos estudos do potencial hidroelétrico e da divisão em partes iguais da
possível produção de energia elétrica, viabilizando legalmente a consolidação do projeto de
9
Disponível na íntegra em: http://www.info.lncc.br/pata1966.html > acessado em 02 de
Março de 2015.
10 O impasse interestatal se manifestou quando o governo de Jânio Quadros em 1962 iniciou estudos
sobre o potencial aproveitamento hidroelétrico em Sete Quedas e iniciou-se uma extensa troca de
correspondências oficiais. Em 1964, no Brasil, os militares tomam o poder e os avanços do governo de
João Goulart são desfeitos, porém foi naquele mandato que se propõe a divisão igualitária da produção
de usina hidrelétrica que, mais tarde, foi também proposto pelo governo militar brasileiro. Segundo a
tradição do Direito Internacional, a fronteira – em seu sentido métrico – é definida nos pontos mais
profundos do canal dos rios, entretanto na região conhecida por Salto Grande de Sete Quedas (que foi
alagado após a construção da barragem) o rio Paraná tornava-se de múltiplos canais.
32
aproveitamento do potencial hidroelétrico no curso de águas fronteiriças entre Paraguai e
Brasil, no Rio Paraná. Paraguai e Brasil passaram a elaborar em regime de cooperação
estudos sobre o potencial energético do Rio Paraná através de uma comissão mista,
culminando com o a assinatura e ratificação do Tratado de Itaipu em 1973 que permitia a
construção da usina hidrelétrica Entidade Binacional Itaipu cujo lago criado pela edificação
da barragem alagaria a área em disputa.
Assinado em Brasília, o Tratado de Itaipu, define o regulamento de produção energia
elétrica e da construção de Itaipu de maneira conjunta entre Brasil e Paraguai. No mesmo ano,
o então Ministro das Minas e Energia brasileiro, Antônio Dias Leite, deixou claro diante da
Comissão das Relações Exteriores da Câmara dos Deputados o caráter estratégico do Estado
brasileiro: “O projeto de Itaipu é essencialmente político” (Mello, 1997, p. 173-174).
O projeto político a que se refere o então ministro é de caráter geopolítico, e deixa
transparecer o cenário político de disputas na América do Sul, sobretudo entre Brasil e
Argentina naquele período.
3.1 O conflito entre os projetos de Itaipu (Brasil-Paraguai) e de Corpus (Argentina-
Paraguai)
A reação do governo argentino à aproximação institucionalizada através da assinatura
da Ata de Iguaçu e do Tratado de Itaipu acirrou ainda mais as relações entre os Estados que
disputavam a maior influência no subcontinente. No ano da assinatura da Ata de Iguaçu, a
Argentina esforçou-se em dar respostas ao projeto de aproveitamento do potencial
hidroelétrico da Bacia do Prata, assim, entre a assinatura da Ata e a oficialização do Tratado
de Itaipu, a Argentina propôs a criação do Comitê Intergovernamental Coordenador dos
Países da Bacia do Prata (CIC). Oficialmente o governo argentino propunha “vincular os
países da região em um esforço conjunto com o intuito principal de integrar fisicamente a
região através da grande quantidade de recursos naturais” (LOPES, 2013, p. 43). . A
instituição foi oficializada com o Tratado da Bacia do Prata assinado em 1969. A composição
do CIC é formado por representantes somente pelos países condôminos da Bacia do Prata,
Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai.
Segundo LOPES (2013) com a assinatura do Tratado da Bacia do Prata, a Argentina
procurou inviabilizar a continuidade da execução do projeto binacional ou deter informações
33
privilegiadas,, segundo o governo argentino, os termos do Tratado de Itaipu os quais definiam
a utilização da energia produzida somente entre as Partes, configuraria um embate ao Artigo I
do Tratado da Bacia do Prata “conjugar esforços [...] para promover o desenvolvimento
harmônico e a integração física da Bacia do Prata e de suas áreas de influência direta e
ponderável”.
O uso da água compartilhada estatais continuou suscitando conflitos com a Argentina
tendo de pano de fundo de disputas interestatais pela proeminência política na Bacia. O
governo com sede em Buenos Aires relutou em ceder ao projeto da Itaipu Binacional, incitou
a circulação no nível internacional de seus argumentos, dentre eles que Buenos Aires
submergiria, e de que parte do seu território a nordeste e parte do sudoeste do território
uruguaio tornariam as regiões em desertos completos. A oposição argentina tentou
interromper o financiamento da execução do projeto de Itaipu, mas por fim, o Banco Mundial
não deixou de conceder crédito para sua realização.
Outro movimento argentino que visava conter a proeminência brasileira na região da
Bacia foi o projeto de hidrelétrica binacional em cooperação com o Paraguai. A Corpus se
localizaria a 250 quilômetros à jusante de Itaipu e, portanto, relativamente próxima da tríplice
fronteira.
O projeto de Corpus, que não foi executado, instaurou uma grande disputa entre os
dois Países, a saber, a Argentina alegava que a altura da barragem necessária à viabilidade
econômica do empreendimento era de 120 metros acima do nível do mar, enquanto que a
barragem de Itaipu estava planejada a 105 metros acima do nível do mar, esses valores
causariam impactos na produção energética de Itaipu de 1/6 do total previsto. Além disso,
Corpus acarretaria na perda de metade da potencia de usina paraguaia de Icaraí e alagaria
cerca de 20 quilômetros no oeste de Santa Catarina (QUEIROZ, 2012)
34
Figura 1 Demonstração da localização de Itaipu, Corpus e Yaciretá e ilustração do conflito
entre os projetos das hidroelétricas
Fonte: VEJA; n464, 27 de julho de 1977; VEJA, n240, 11 de abril de 1973. apud VIllar, 2012, p. 50.
Os conflitos se acirraram em 1977 quando a Argentina fechou túnel que ligava o
Brasil ao Chile, ou seja, ao Pacífico, forçando a desvios de cerca de 2000 quilômetros. A
posição brasileira manteve-se irredutível diante dos foros internacionais e a Argentina recuou
com a estratégia mais agressiva e passou a defender o direito de consulta prévia como
princípio que permite maior equilíbrio regional. Ainda sob conflitos nos projetos e as obras da
Itaipu Binacional avançando, em 1979 os governos de Brasil, Paraguai e Argentina assinaram
o Acordo Tripartite Itaipu-Corpus, que estabelecia instrumentos de cooperação técnica e de
garantia de navegação. O conflito Itaipu-Corpus exemplifica a relevância política do uso da
água na escala internacional e da bacia hidrográfica. Segundo análise de Queiroz (2012), o
projeto de Corpus foi uma ferramenta de disputa que possibilitaria à Argentina a influência e
obrigar revisão do projeto de Itaipu. Outros autores conferem a estes conflitos o termo de
Complexo Hidropolítico de Segurança, que em síntese, é surge quando a competição entre
Estados pela água se acirra e constitui ameaças à segurança hídrica, ambiental e humana.
(SHULZ, 1995).
3.2 O conflito pela revisão do acordo em 2009
A cooperação entre Paraguai e Brasil pelo aproveitamento da energia gerada por Itaipu
se dá a partir de cláusulas do Tratado de Itaipu que delimitam importantes fatores dessa
35
relação. Destacam-se, as porcentagens igualitárias de 50% dos custos de construção da
hidrelétrica e da repartição em 50% da energia produzida para cada país.
Esta equidade jurídica do Tratado de Itaipu é, na prática, motivo para litígios entre
Paraguai e Brasil. Primeiro porque para a construção da hidrelétrica foi realizado um
financiamento pelo Brasil ao Paraguai que não possuía meios de custeio da obra que
inicialmente custaria US$ 2.033 mi, mas ao seu término custou mais de US$ 20 mi
(CANESE, 2009) E segundo, porque o Paraguai não utiliza os 50% de energia que o Tratado
define na divisão equitativa, porém há uma clausula que restringe a venda desta energia
excedente apenas entre os Estados que assinaram o Tratado, ou seja, pelos termos legais do
Tratado, o Paraguai é obrigado a vender ao Brasil, a preço de custo esta energia. O Anexo C,
item VI estipula que os acordos financeiros do Tratado vigorariam por 50 anos e, apenas com
um novo acordo poderiam ser editados.
O ponto mais crítico para as relações de cooperação interestatal se dava em relação à
energia excedente do Paraguai que, de acordo com o Anexo A do Tratado de Itaipu, é
permitida a venda apenas ao Brasil, por um valor “casi gratuita” (CANESE, 2009, p. 2). O
Brasil pagava ao Paraguai US$ 2,8 acrescido aos US$ 39,00 MWh devido a compensação
pela cessão de energia, entretanto, a amortização da dívida paraguaia retomava para o Brasil
os US$ 39 pagos por Megawatt-hora, ficando para o Paraguai apenas os US$ 2,8 por MWh,
esse valor somado no período de um ano equivale a aproximadamente US$ 120 mi, variando
conforme a produção anual de energia de Itaipu.
Em 2008, em pouco mais de um mês corrido após a posse da presidência paraguaia,
Fernando Lugo e assessores engajados no caso Itaipu se reuniram com o então presidente
brasileiro, Luis Inácio Lula, para iniciar as negociações de um acordo que revisasse o valor da
dívida com o Brasil e o valor pago por MWh produzido pela Entidade Binacional e
concedesse mais algumas obras de infraestrutura ao Paraguai.
.
36
Figura 2 Estrutura do corpo administrativo da Entidade Itaipu Binacional e a influencia dos governos
federais
Figura 3: Fonte: Relatório Anual 2014. Elaboração: Paulo Inacio Junior
A divisão das atividades de Diretoria Executiva em Itaipu é duramente contestada pelo
Paraguai. Ao longo das negociações entre Paraguai e Brasil em 2009 o engenheiro Ricardo
Canese assumiu as negociações e apresentou os principais pontos da insatisfação no livro “La
Recuperación de la Soberanía Hidroeléctrica del Paraguay en el Marco de Políticas de Estado
de Energía”, além da revisão do valor pago pela energia excedente, da dívida na construção da
hidrelétrica e das obras de infraestrutura o artigo aponta que as diretorias executivas
financeira e técnica desde a criação da Itaipu são nomeadas pelo governo brasileiro e que isto
constituiria uma violação do caráter binacional da empresa: “El ejercicio ininterrompido de la
Dirección Financiera em manos del Brasil (ELETROBRAS) explica porqué ELETROBRAS
hoy com capital privado y cotizando em diversas bolsas del mundo tenga um excelente
negocio financieiro em Itaipú, desvirtuándose el objetivo de brindas uma energia barata a los
37
pueblos del Brasil y del Paraguay.” (CANESE, 2009)11
. Embora quantitativamente mais
funções de Diretor Executivo sejam definidas pelo Paraguai, o que se alega é que as funções
mais relevantes estejam concentradas pelos interesses do governo brasileiro.
As primeiras negociações não chegaram a revisões e as respostas do governo brasileiro
eram negativas, entretanto, depois de mais de um ano de negociações e imediatamente após
um encontro dos países membros do Mercosul, foi realizada a assinatura e divulgação do
acordo em Assunção em julho de 2009. No novo acordo, o Brasil aceitou “estudar a liberação
gradual da venda da energia excedente do Paraguai no mercado brasileiro diretamente pela
ANDE, a estatal paraguaia...” (OLIVEIRA, 2012). Além disso, concordou em triplicar o valor
pago pela cessão de energia excedente, ou seja, de, aproximadamente, US$ 120 mi passou a
pagar, aproximadamente, US$ 360 mi por ano diretamente ao Paraguai12
.
O Brasil também concordou em construir uma linha de transmissão de energia até
Assunção além de outras obras na margem direita do Rio Paraná como a construção de uma
torre turística e seccionamento de linhas de transmissão. Pelo novo acordo, essas obras não
teriam custos ao Paraguai e totalizariam cerca de US$ 540 mi.13
.
3. 3 Pareceres sobre a natureza jurídica da Itaipu
O Tratado de Itaipu, em seu artigo III, criou a Entidade Itaipu Binacional, que se
tornou responsável pelo aproveitamento hidrelétrico no rio Paraná e construção da estrutura
física para tal. Compõem a Itaipu, além dos dois Estados, mais dois órgãos: a
ELETROBRÁS, empresa brasileira e de sociedade mista e capital aberto, e a ANDE, empresa
paraguaia e autárquica. Estes dois organismos tiveram iguais responsabilidades para o capital
inicial da Itaipu.
O Tratado foi baseado no Direito Internacional Público, e, devido a isso, estabeleceu-
se em consonância às suas diretrizes de igualdade das soberanias, desta forma, não só o
capital inicial empregado na construção da hidrelétrica foi igualitário como também as
porcentagens de 50% na repartição da energia produzida para cada parte. De modo que
11
Disponível em:
http://www.portalguarani.com/957_ricardo_canese/8757_por_los_derechos_del_pueblo_paraguayo_en_itaipu.ht
ml 12
Jornal FOLHA DE S. PAULO. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1012200819.htm 13
Disponível em: http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/2009/07/25/visita-do-
presidente-luiz-inacio-lula-da-silva-ao/?searchterm=itaipu
38
respeitada a igualdade de soberanias na divisão de deveres no Tratado, as fronteiras políticas
permaneceram sem alteração de limites, mas sem prejuízo das finalidades de funcionamento e
produção da Entidade Binacional:
...durante a sua operação, constituirá um “território comum”, dotado de
livre trânsito e circulação para pessoas e bens (Tratado, Art. XVII, §
2.º), independentemente da nacionalidade de seus dirigentes e
empregados. Isto não obstante, não houve qualquer alteração na linha
de fronteira entre as duas Nações, estabelecendo-se, expressamente, que
“as instalações destinadas à produção de energia elétrica e as obras
auxiliares não produzirão variação alguma nos limites” (Tratado, Art.
VII).
Surge, digamos assim, uma “entidade internacional de natureza
empresária”, tanto ou mais que uma “empresa de natureza
internacional”, visto como é em função do aproveitamento dos recursos
hídricos comuns que se resolvem as situações jurídicas e se define o
quadro de direitos e deveres, respeitado sempre o princípio de igualdade
das soberanias.14
.
A igualdade pressuposta no Tratado estende-se também ao plano da administração da
empresa. Que é composto pelo Conselho Administrativo, pela Diretoria Executiva, pelos
representantes dos Ministérios de Relações Exteriores e por representantes da ELETROBRAS
e da ANDE. A disposição dos membros e participantes na Diretoria Executiva somam 12
integrantes sendo 6 representantes de cada Estado, no Conselho Administrativo são mais 12
participantes também 6 a cada parte do acordo, dentre estes um é indicado pela
ELETROBRAS e outro pela ANDE, somam-se os representantes dos Ministérios de Relações
Exteriores, também um de cada Estado, totalizando em 26 o número de participantes.
Em que, conforme o jurista Miguel Reale cabe as seguintes tarefas ao Conselho e à
Diretoria:
De acordo com as cláusulas estatutárias, enquanto a Diretoria Executiva
pratica os “atos de administração necessários à condução dos assuntos
da entidade”, elaborando a proposta orçamentária, balanços e
demonstração da conta de resultados, bem como executando as normas
e bases para prestação dos serviços de eletricidade e, de modo geral, as
decisões do Conselho de Administração (XIII), a este incumbe o
14
Idem.
39
exercício de amplas funções, a nível normativo, deliberativo e de
controle. Vale transcrever, por sua relevância, o rol das principais
atribuições desse colegiado, no teor seguinte: a) cumprir e fazer cumprir
o Tratado; b) editar as diretrizes fundamentais de administração, o
plano de organização dos serviços básicos, as bases de prestação dos
serviços de eletricidade; c) decidir sobre atos que importem alienação
do patrimônio, reavaliações do ativo e passivo, obrigações e
empréstimos e orçamento; e, finalmente, examinar o Relatório Anual, o
Balanço Geral e a Demonstração da Conta de Resultados, elaborados
pela Diretoria Executiva e apresentá-los, com seu parecer, à Eletrobrás
e à Ande (IX).15
O jurista se vale da análise de Bandeira de Mello para concluir que a participação nas
decisões no quadro administrativo da empresa de controles internos e externos, sendo que o
Conselho Administrativo estaria incumbido do controle inerente à estrutura da empresa, em
que os Governos participariam indiretamente através da escolha dos membros integrantes do
Conselho. O controle externo, segundo o jurista, de ordem econômico-financeira é exercido
pela ELETROBRAS e ANDE após “apreciação e decisão” sobre os Relatórios Anuais da
empresa.
Ainda que a empresa supere o nível de um Estado único na condução da empresa, as
configurações do exercício das decisões em Itaipu tornam claro o valor político no nível dos
governos estatais sobre as tomadas de decisão na Entidade Binacional.
Por isso, sob o regime correspondente à sua origem e constituição, a
entidade binacional, como empresa juridicamente internacional
delimitada por sua natureza e âmbito de atuação, não é redutível, lógica
ou juridicamente, a qualquer tipo de entidade, estatal ou paraestatal, de
administração direta ou indireta, pertinente ao direito interno.16
Em que se confere à empresa:
15
Disponível em:
https://www.itaipu.gov.br/sites/default/files/anexos_fckeditor/institucional/pt/empresa_juridicamente.doc 16
Considerações sobre a natureza jurídica de Itaipu, por Miguel Reale. Disponível em:
https://www.itaipu.gov.br/sites/default/files/anexos_fckeditor/institucional/pt/empresa_juridicamente.doc
40
A sua existência e forma têm fonte no âmbito internacional, enquanto
resultado da vontade expressa e concorde de sujeitos de direito público
internacional, agindo como tais. Logo, é uma pessoa jurídica emergente
no campo do direito internacional público, primeira significação da
locução entidade binacional, em que binacional é qualificativo da
dualidade de vontades originantes, mas ao mesmo tempo espécie do
gênero internacional. Nessa condição jurídica, a entidade é recebida e
reconhecida no ordenamento interno, como automática decorrência de
ratificação do Tratado, autorizada a, nele, atuar, nos limites da sua
aptidão e finalidades, independente de submissão às normas da lei
nacional conferidoras de existência e personalidade jurídicas.17
Do ponto de vista normativo do Direito Internacional a leitura do Tratado de Itaipu e
de seus Anexos por juristas brasileiros tende a enfatizar a cooperação binacional por Itaipu e a
coerência na proporcionalidade e igualdade do regime. Entretanto, aos olhares paraguaios o
deslocamento da leitura sai da igualdade dos custos e recai sobre o cumprimento do Tratado
tendo por fim a tentativa de reduzir as enormes assimetrias entre as partes.
Se o Estado paraguaio reivindica a sua soberania sobre o uso da água na forma da
geração de hidroeletricidade o que está posto é o conflito pelo uso da água e pelo
compartilhamento das beneficies que o lado brasileiro controla. Torna-se evidente que o
conflito pela água na escala interestatal depende de soluções entre os membros dos órgãos de
Relações Exteriores dos Estados, pode-se dizer que assim o conflito sofre um deslocamento
conforme indicam MIRUMACHI e ALLAN (2010):
A cosequence of moving relations and negotiations over water
resources into the remit of Ministtry of Foreign Affairs is that the issues
and priorities on the agenda change from the possibilities of
hydrological and economic mutuality and compensation to sovereignty
(p. 22).
Voltando às definições da natureza jurídica da Itaipu Binacional alguns juristas
concordam em definir a empresa como um “organismo de gestão, de tipo industrial,
correspondente a sua condição de concessionário de serviço público internacional vinculado à
17
Idem.
41
exploração de energia elétrica em rio internacional sob condomínio dos dois países” e que por
isso se constitui em “organismo internacional de gestão”. Abrindo precedente para os
mecanismos de gestão de água instaurados pela Itaipu Binacional apresentados a seguir.
3.4 ITAIPU E A APROXIMAÇÃO COM VETORES ALÉM DA PRODUÇÃO DE
ENERGIA
O programa de gestão da água foi implantado em junho de 2013 denominado
Cultivando Água Boa que é definido pelo Relatório de Resultados Socioambientais de Itaipu
em 2003 como: “um enorme guarda-chuva que intercala suas ações com as de outros
programas e que abriga mais de 60 projetos e subprojetos voltados à preservação da água, da
flora e da fauna regional e ao desenvolvimento sustentável das comunidades ribeirinhas.”
(ITAIPU, 2004, p. 33). No período de 2003 até 2012 foram 10 anos de programa e houve
intensificação das atividades e renovações pertinentes. Seguindo as diretrizes de gestão por
bacia definida pela lei nº 9.433/97, a área de atuação do programa é a da Bacia Hidrográfica
do Paraná III, que abrange 26 munícipios do estado do Paraná.
Nos informativos sobre o programa, Itaipu ressalta os benefícios da gestão por bacia:
“A Gestão por Bacias Hidrográficas só apresenta vantagens. Permite o controle da
sedimentação e da erosão, o aumento da produtividade agrícola, a preservação da
biodiversidade, a conservação das matas ciliares, a produção de peixes e a manutenção da
qualidade da água” (ITAIPU, 2007, p. 26).
Os benefícios da gestão por bacia só serão totalizados quando ambas as margens do
Rio Paraná estiverem sobre a mesma visão (DUDA & UITTO, 2002), uma vez que as ações
de cooperação em bacias transfronteiriças são interdependentes.
Na margem esquerda a experiência de gestão das águas, denominado “Carapa Ypoti”
ainda está em fase piloto e outras medidas de proteção ambiental apoiadas por Itaipu como o
“Biodiversidade Paraguay” ainda em incipiente de aplicação. Os principais desafios para o
programa do lado paraguaio é solução de conflitos ruralistas da região que vem expandindo a
fronteira agrícola e se valendo de “defensivos agrícolas” e de invasões às áreas de
preservação, que resultam em uma série de problemas ambientais como, exemplo
desmatamento, assoreamento dos rios e contaminação das águas. (WWF, 2012; ITAIPU,
2013).
42
Itaipu, seguindo a sua nova missão, seu plano estratégico e o código de ética, tem,
portanto, planos de ação ambiental em território brasileiro e paraguaio, direcionando a gestão
da água na escala da área da bacia que foi atingida pelos impactos da construção da barragem.
Embora isso, o programa não foi implantado na margem direita, território paraguaio. Fato
curioso é que o mapa que está localizado na seção “Onde agir” no site do programa
Cultivando Água Boa, evidencia a discrepância entre o espaço que se age e o espaço que o
programa deve agir.
Atenta aos conflitos socioambientais na bacia, em 2007 na cidade de Foz do Iguaçu
foi realizado que contou com a organização inclusive da Itaipu Binacional. O 1º Encontro
Trinacional de Gestão de Água Fronteiriça e Transfronteiça em Foz do Iguaçu. O documento
de apresentação do encontro assinado em conjunto pelo Diretor Geral Brasileiro da Itaipu e
pelo Secretário do Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Paraná deixa claro o interesse na
gestão compartilhada na Bacia do Alto Paraná e Paraná III:
Na região em que o Brasil possui recursos hídricos transfronteiriços
com o Paraguai existem iniciativas de gestão integrada no âmbito da
Bacia do Alto Paraguai, mais precisamente na bacia hidrográfica do Rio
Apa. Entretanto, na parte do Rio Paraná que divide águas com o
Paraguai na formação do Lago Itaipu, poderiam ser geradas novas
iniciativas que contribuam para a gestão dos recursos hídricos.
Com este propósito, a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos
Hídricos do Paraná – SEMA juntamente com a ITAIPU Binacional
entendem que a da Bacia do Paraná III deveria ser selecionada para
implementar e fortalecer ações integradas, uma vez que na região
existem projetos pioneiros, a exemplo do Cultivando Água Boa e a
existência do Comitê de Bacia Hidrográfica do Paraná III. (PRIMEITO
ENCONTRO TRINACIONAL DE GESTÃO DE ÁGUAS
FRONTEIRIÇAS E TRANSFRONTEIRIÇAS, 2007, p. 5-6)
Mesmo com estes esforços políticos, a segunda edição do encontro sequer ocorreu.
3.4.1 O Programa Cultivando Água Boa
O programa tem recebido importantes premiações nacionais e internacionais por suas
atividades na margem brasileira, em visita recente à Entidade Itaipu Binacional, o secretário-
43
geral da ONU, Ban Ki Moon, enalteceu a liderança em gestão da água e em março/2015
recebeu o prêmio de “Water for Life”, prêmio de boas práticas de manejo18
.
As ações do programa e subprogramas incluem: monitoramento participativo das
microbacias, seleção de microbacia, encontros com os líderes comunitários para informar
sobre o programa e sensibilizar à cooperação, formação de comitê gestor da microbacia. Os
comitês tem como atividades mais importantes: Elaboração do Diagnóstico Ambiental da
Microbacia, apontando as necessidades quanto às ações coletivas (práticas mecânicas de
conservação de solos, isolamento das áreas de matas ciliares, medidas de saneamento rural) e
específicas (correção de passivos ambientais em propriedades rurais); elaboração dos Planos
de Controle Ambiental (PCAs) para as propriedades rurais das microbacias; diagnóstico dos
sistemas de produção; elaboração dos Planos de Desenvolvimento Sustentável da unidade
familiar; elaboração dos instrumentos legais para a execução física e financeira das
atividades; execução das ações coletivas; prospecção de recursos para a execução das ações
específicas19
O programa identificou 5 principais ameaças à qualidade da água na Bacia do Paraná
III, as quais são: Assoreamento: o depósito de sedimentos na entrada principal do
reservatório, em Guaíra, tem atingido a média de 6 a 7 milhões de toneladas por ano. Somam-
se a isso as milhares de toneladas de terra lançadas nos rios da bacia, que desembocam
também no reservatório. A erosão do solo é a principal causadora desse processo;
Eutrofização: juntamente com o solo, acabam sendo carregados também para as águas do
reservatório fertilizantes e matéria orgânica provenientes da agropecuária, suinocultura,
avicultura e dejetos das populações urbanas da região. Isso acaba por provocar a proliferação
de algas e plantas aquáticas, algumas inclusive tóxicas, que degradam o ambiente do
reservatório, impactando nos seus ecossistemas; Mexilhão dourado: essa espécie exótica de
molusco veio da Ásia grudada nos cascos dos navios. Por ser uma espécie invasora, não tem
predadores naturais e, portanto, prolifera rapidamente. Isso também acaba por impactar nos
ecossistemas naturais do reservatório; Agrotóxicos: o uso abusivo e irresponsável desses
produtos pela atividade agropecuária é um dos principais fatores de deterioração da água e do
solo da Bacia do Paraná 3; Desmatamento: a erosão do solo e o enfraquecimento da
18
Disponível em: http://www.un.org/waterforlifedecade/waterforlifeaward.shtml 19
Disponível em: http://www.cultivandoaguaboa.com.br/acao/nivel-2/atividades-2
44
biodiversidade são as principais consequências que o desmatamento desenfreado trouxe à
região.20
Em geral, esses problemas causam situações críticas identificados no Plano de Gestão
da Bacia, em especial cheias e estiagens. As cheias ocorrem, sobretudo em áreas urbanas
devido a impermeabilização do solo e assoreamento e depósito de resíduos sólidos nos rios.
30% das áreas urbanas tem risco de erosão, as periferias das cidades ocupam, via de regra, as
margens dos rios da bacia, desenvolvendo assim maiores riscos de contaminação da água e
sendo as áreas mais propensas aos alagamentos e enchentes. Na zona rural, o desmatamento
das encostas colabora com os fenômenos de erosão do solo e a consequente deposição de terra
nos rios. (UNIOESTE, 2011).
As estiagens, segundo o Plano da Bacia do Paraná III, podem acontecer em toda a
bacia, mas especialmente na área mais próxima à barragem de Itaipu, denominada BP3-3, ali,
68% da área tem risco de estiagem. Nas outras áreas da bacia, os riscos concentram-se em
municípios com maiores taxas de urbanização, e que sediam agroindústrias, como Toledo e
Cascavel. (UNIOESTE, 2011).
O programa Cultivando Água boa desenvolve além da organização da gestão das
microbacias, programas socioambientais que visam:
...a manutenção da mata em torno das nascentes e dos cursos dos rios; a
adoção das melhores práticas agrícolas, como o terraceamento, o tratamento
dos dejetos, o plantio direto de qualidade, a redução da dependência de
insumos químicos; o correto tratamento dos esgotos e águas servidas; a
destinação adequada do lixo; o reuso da água da chuva. (FRIEDRICH, 2011)21
As preocupações com as comunidades tradicionais também transparecem através deste
programa, desde o primeiro ano de funcionamento há o subprograma “Mais peixes em nossas
20
Disponível em: http://www.cultivandoaguaboa.com.br/o-programa/cenario-local-a-bacia-
do-parana-3
21 Artigo de Nelton Friedrich, Diretor de Coordenação e Meio Ambiente da Itaipu, no advento
do Dia Mundial da Água, em 2011. Disponível em http://www.itaipu.gov.br/sala-de-
imprensa/positionpapers/agua-questao-de-dialogo-e-parceria
45
águas” que proporciona aos pescadores profissionais do lago de Itaipu acompanhamento
técnico e na época do defeso há produção de peixes no tanques-rede, uma técnica de
aquicultura, doados pelo programa e que através desta técnica foram produzidos e
comercializados 19.800kg em 2009, este projeto é uma “ação de apoio à aquicultura regional,
que fomenta a geração de renda, o desenvolvimento técnico voltado à atividade e difundindo a
produção e consumo de proteína animal de alta qualidade nas comunidades da BP3”
(ITAIPU, 2010).
Os tanques-redes também estão a disposição das comunidades indígenas
acompanhadas e auxiliadas por Itaipu na Bacia do Paraná III, sua produção é inteiramente
destinada a alimentação da própria comunidade indígena. Além dos tanques-rede, em 2007,
algumas comunidades indígenas que estavam em situação de risco após negociações
receberam uma área de 242 ha (UNIOESTE, 2011).
Coleta Solidária é como se chama um dos subprogramas do Cultivando Água Boa que
buscam diminuir a quantidade de resíduo sólido depositado nos rios da bacia devido o
potencial assoreamento dos rios contribuindo com os processos de eutrofização e queda na
qualidade da água nos rios da bacia. O programa
incentiva a organização e profissionalização de coletores de materiais
recicláveis (...) o programa, aliado à preocupação ambiental, tem um
papel muito importante de reconhecimento dos trabalhadores pela
sociedade e na elevação da sua auto estima e renda (ITAIPU, 2008, p.
111)
especialmente nas áreas urbanas pois produzem maior quantidade de resíduos.
Com o intuito de diminuir o uso de “defensores agrícolas” são promovidas captação e
assistência técnica aos agricultores, em geral, há incentivo à produção orgânica. Até 2012
foram beneficiadas aproximadamente 1100 famílias entre assentadas, indígenas, quilombolas
e vilas rurais (ITAIPU, 2013).
4. O PAR CONFLITO E COOPERAÇÃO E SUAS NUANÇAS NO PLANO
TEÓRICO: DIÁLOGO ENTRE GEOGRAFIA POLÍTICA E RELAÇÕES
INTERNACIONAIS SOBRE A ÁGUA COMPARTILHADA
46
O par dialético conflito e cooperação aqui enunciados compõem o cenário das
decisões políticas sobre acesso e uso da água tranfronteiriça. Em diálogo com a justiça
espacial alçada por Gottmann (1952), com os conflitos distributivos em Harvey (1973) e
Ribeiro (2001), a elaboração de respostas às assimetrias se realiza de modo também dialético
em que, por vezes, os instrumentos de cooperação aparecem como modos de reafirmação do
poder de uma das partes integrantes (PAQUEROT, 2005; RIBEIRO, 2009). Isto significa
dizer que o tensionamento da cooperação pode intensificar os conflitos.
Sobre o movimento conflito e cooperação as conclusões após revisão de literatura
sobre o tema encaminham justamente para a compreensão dos fenômenos como movimento
em constante evolução, ignorando as influências da história em suas transformações de
conjuntura econômica, social e política nas relações sociais nas diversas escalas. Desta forma
os autores indicam que coexistam simultaneamente conflitos e cooperação pela água
transfronteiriça e ao analisar os eventos nas bacias compartilhadas de maneira dicotômica as
dimensões políticas e suas intensidades tornam-se encobertas (ZEITOUM e MIRUMACHI
apud SANT’ANNA, 2013).
As ciências parcelares que se pretendem dedicar à compreensão dos processos
políticos e, portanto, sociais sobre os recursos naturais que permeiam as fronteiras e os
territórios dos Estados direcionam seus esforços analítico sobre as disputas ou sobre a
cooperação política sobre a matéria em suas diversas características que originalmente está
contida na natureza e simultaneamente no território de mais de um Estado.
Geografia Política e Relações Internacionais adotam diferentes percepções das práticas
sociais, mas que no limiar teórico metodológico não são excludentes, ao contrário disto, são
capazes de contribuir ao desafio proposto na pesquisa fornecendo noções, conceitos e
categorias de análise que na aparência são em seus sentidos opostos, mas que se
interseccionam na complexidade da coexistência dos interesses e práticas políticas e se
complementam através de uma percepção multiescalar dos fenômenos. Os casos da água
compartilhada são alguns dos modos de aferição da complexidade do comportamento dos
agentes em função da multiplicidade de interesses que o uso e distribuição da água enquanto
recurso tem, ao mesmo tempo em que se observa a relevância estratégica da bacia
compartilhada na geopolítica dos países ribeirinhos. Isto significa dizer que ainda sob um
regime de cooperação internacional institucionalizado podem haver conflitos na articulação
das escalas.
47
A Geografia Política se propõe a compreensão, em termos resumidos, do poder no
espaço como seu objeto, ainda que com todas as dificuldades de definições destas categorias.
A Geografia Política contemporânea compreende a dupla dimensão política: “...a dimensão
institucional, expressa na própria questão do porquê da existência do governo que se coloca a
ciência política, e a dimensão do conflito de interesses como fundamento da sociedade civil,
inscrita na sua própria natureza” (CASTRO, 2005, p. 92-93). E que por esse sentido o espaço
político se elucida por ser: “delimitado pelas regras e estratégias da política, é um espaço dos
interesses e dos conflitos, da lei, do controle e da coerção legítima.” (CASTRO, 2005, p. 93).
Como já visto, o território é a categoria de definição do espaço político utilizada pela
disciplina e se coloca sobretudo como espaço de base absoluta e material de processos
políticos relativos e relacionais. Assim, a
Geografia Política analisa como os fenômenos políticos se
territorializam e recortam espaços significativos das relações sociais,
dos seus interesses, solidariedades, conflitos, controle, dominação e
poder. (...) Para a análise desses espaços, o recurso ao artifício
metodológico da escala tem sido uma perspectiva adequada porque
identifica o significado das escalas de ação institucional e os recortes
territoriais produzidos por esta ação (CASTRO, 2005, p. 53).
Derivado destas características a Geografia Política quando se defronta com a
problemática das águas transfronteiriças abrange a perspectiva de análise entre cooperação e
conflito. O que se diferencia da percepção das teorias das Relações Internacionais é a visão
multiescalar, em que a escala não é apenas a dimensão absoluta e quantificável em unidades
de medida, mas principalmente a escala dos processos de origem social e política,
compreendendo as interações da política em sua dimensão institucional e na dimensão da
sociedade civil, sobre o território.
Os recursos naturais para as Relações Internacionais também são estudados no plano
de cooperação e conflito, ao passo que,
... a análise do conflito por recursos escassos e outra que parte da
cooperação para gestão destes recursos e do meio ambiente. A partir da
análise sobre os conflitos por recursos entre Estados e grupos sociais
tem origem as preocupações que levaram à análise da segurança
ambiental. Já as análises derivadas das teorias sobre cooperação e da
teoria dos jogos, tem se dedicado aos temas dos regimes internacionais,
da governança ambiental e das instituições (SANT’ANNA, 2013, p,
34).
48
A noção de segurança ambiental impõe às práticas interestatais sobre os recursos
naturais transfronteiriços o problema de que as fronteiras políticas não são capazes de
interferir na circulação dos efeitos sobre o meio ambiente, divergindo desta maneira daquilo
que está subordinado a práticas sociais, como as práticas de segurança militar (DYER, 1996
apud SANT’ANNA, 2013).
A proposta de Lorraine Elliot para o tema da segurança avança na enfatização de
relevância à manutenção da vida humana ao remover o enfoque da noção dos termos do
Estado e realocar como fator integrante de segurança humana. (ELLIOT, 2004).
A definição de segurança adotada pela literatura é a trabalhada por Waever e Buzan e
por Davidsen, para os quais o léxico segurança confere a um determinado assunto a noção da
ameaça, sendo assim, a segurança humana serviria ao combate de ameaças à sobrevivência da
humanidade, ao ponto que sua urgência seja tão significativa que em caso de displicência
pode-se extinguir a humanidade:
The distinguishing feature of securitization is a specif rhetorical
structure including such issues as survival, priority of action and
urgency, because ‘if the problem is not handle it will be too late, and we
will not exist to remedy our failure’ (DAVIDSEN, 2010, p. 75).
Diversos autores conferem aos recursos naturais a potencialidade de eclosão de
conflitos internacionais pelo acesso e uso de formas mais agressivas, nesta perspectiva a
questão das águas compartilhadas se intensificariam em disputas (LE PRESTRE, 2000;
WOLF, 2009) e ao mesmo tempo na necessidade de um regime internacional efetivo
(RIBEIRO, 2008). O risco de conflitos mais acirrados entre Estados é uma das ameaças ao
recurso hídrico compartilhado que em caso de conflitos com uso da força pode ser
intensamente afetado (RIBEIRO, 2008). Isto compõe o quadro da necessidade dos acordos
regulatórios de uso e acesso à água.
Especificamente aos recursos hídricos, este debate também se realiza como segurança
hídrica, no agrupamento da segurança ambiental e, portanto, da segurança humana.
Outro conceito elaborado para as práticas sobre as águas transfronteiriças é o de
Complexo Hidropolítico, que emerge em relações de interdependência do recurso hídrico
compartilhado pelos Estados em casos de cooperação (TURTON, 2008).
49
Este movimento teórico é essencial na compreensão da complexidade dos conflitos no
paradigma que a água compartilhada está inserida, pois revela articulações desde o nível
internacional de um conflito interestatal passando pelo nível da manutenção e reprodução da
vida humana chegando até o nível da própria sobrevivência humana enquanto espécie.
4.1 Governança dos Recursos Hídricos e a dimensão multiescalar
Ao final do século XX, o neoinstitucionalismo, apoiado na teoria dos regimes, surge
buscando explicar cooperação ambiental e a criação de instituições internacionais sobre o
meio ambiente (YOUNG, 1994). As instituições mitigam os custos das ações de cooperação.
A teoria dos regimes é definida por Krasner como
um conjunto de princípios, normas, regras e de procedimentos de decisão,
implícitos ou explícitos, em torno dos quais as expectativas dos atores
convergem em um domínio específico (KRASNER apud SMOUTS, 2004, p.
139).
e foi na teoria neoinstitucionalista que o conceito de governança foi alavancado (SMOUTS,
2004). Governança e governo são definidos e distinguem-se, por que:
Os dois conceitos referem-se a um comportamento visando a um objetivo, a
atividades orientadas para metas, a sistemas de ordenação; no entanto, governo
sugere atividades sustentadas por uma autoridade formal, pelo poder de polícia
que garante a implementação das políticas devidamente instituídas, enquanto
governança refere-se a atividades apoiadas em objetivos comuns, que podem
ou não derivar de responsabilidades legais e formalmente prescritas e não
dependem, necessariamente, do poder de polícia para que sejam aceitas e
vençam resistências. (ROSNEAU, 2000, p. 15).
A governança seria um modelo de gestão que pode evitar conflitos a partir da
confluência dos interesses entre os diversos agentes, entre eles as instituições formais e os
50
agentes não-governamentais, ou seja, é um meio facilitador para a cooperação e pode ser
empregada em diversas escalas (RIBEIRO, 2009).
A cooperação internacional em prol de interesses comuns pode, então, ser
compreendida como uma limitação ao princípio da soberania porque, sobretudo, exige um
controle das atividades e adaptação às demandas de outros Estados (KRASNER, 1999;
BECKER, 2006). Contrário a isto, o argumento construtivista considera a soberania não como
atributo intrínseco aos Estados, mas sim como um produto das construções sociais nas
práticas dos Estados, isto quer dizer que, a soberania passa a ser encarada como atributo
mutável (WENDT, 1992) e que o sistema anárquico baseado na igualdade de soberania é
igualmente produzido pelas interações estatais e está sujeito a sua própria historicidade, que
deixa de ser anárquico ao passo que os Estados mais poderosos tem poder de influenciar as
decisões internacionais e outros apenas barganham pelos seus interesses (MYAMOTO, 1992).
“Self-help is an institution, not a constitutive feature of anarchy.” (WENDT, 1992, p. 402).
Para os recursos hídricos transfronteiriços, esse contexto nas teorias das relações
internacionais impulsionam a criação de instituições internacionais para gerir o
comportamento dos agentes (NORTH, 1996). As instituições podem ser acordos e
convenções, hábitos dos Estados, mas também organizações internacionais. (SANT’ANNA,
2009).
Com a finalidade de garantir qualidade da água evitando degradação, concebe-se
idealmente a gestão dos recursos hídricos por bacia mesmo quando elas estão em territórios
diferentes. Segundo Giordano e Wolf, são necessárias para a gestão de recurso comum num
regime de cooperação interestatal: estruturas degestão flexíveis e adaptáveis, reservas
flexíveis e claros critérios para gestão da qualidade de água, distribuição equitativa do uso dos
recursos hídricos, mecanismos concretos que obriguem os países a cumprir os acordos e
detalhados mecanismos de resolução de conflitos (RIBEIRO & SANT’ANNA, 2014)
No limiar dos interesses divergentes existem as conferências internacionais sobre o
meio ambiente e sobre água, incluindo águas transfronteiriças. Em 1997 realizou-se a
Convenção sobre Direito relativo à Utilização dos Cursos de Água Internacionais para Fins
Distintos de Navegação, em Nova York, promovida pela ONU a conferência representa o
único instrumento legitimado globalmente para a gestão das águas doces compartilhadas
51
(ECKSTEIN, 2005). A demora de 17 anos para que o 35º Estado ratificasse a convenção22
exprimiu a complexidade do debate e a existência de entraves internacionais para os recursos
hídricos. Ribeiro identificou a dificuldade de ratificação devido a obrigatoriedade de boa
convivência e da soberania compartilhada o que implicaria na fragilidade do documento, pois
...uma convenção idealista que encontre dificuldades em ser ratificada
mantém o problema sem solução. Enquanto isso perdurar, as práticas
políticas e ambientais de países que compartilham recursos hídricos
serão baseadas na sua capacidade de intervenção militar, impondo o
realismo político clássico e, o que é pior, o uso desigual dos recursos
hídricos na escala mundial. (RIBEIRO, 2008, p. 99).
Frente aos diversos impasses é que a governança das águas transfronteiriças se
apresenta como alternativa por meio da cooperação internacional e modelo de gestão de bacia
hidrográfica de maneira que a participação dos diversos agentes seja a maior possível, com a
finalidade de que seja uma gestão legitima e possa atender, na medida do possível, as
demandas de qualquer agente da bacia independente da expressão econômica (PAQUEROT,
2005).
As preocupações da governança de recursos hídricos compartilhados incluem a
dinâmica dos conflitos entre os agentes nas múltiplas escalas:
A proliferação de regras, papéis e práticas de governança da água tem
influenciado decisões políticas, além de inúmeras lutas sociais em todo
o mundo. Constitui-se em iniciativas que surgem em diferentes escalas
e contam com a participação de atores variados. São tanto resultado de
lutas locais de comunidades tradicionais, como também da sociedade
civil organizada em diversos municípios, e bacias hidrográficas,
incluindo movimentos transnacionais em bacias transfronteiriças e
também, na escala internacional, de instituições para cooperação e
gestão de bacias transfronteiriças... (SANT’ANNA, 2013, p. 53)
22
Ver : https://treaties.un.org/doc/Publication/CN/2014/CN.271.2014-Eng.pdf
52
A questão das águas transfronteiriças exige um estudo nas suas relações multiescalares
diante das complexidades em dimensões da abrangência das práticas sociais, das
características físicas da bacia e da potencialidade de conflitos e de cooperação a abordagem
da geografia política deve, sobretudo em questões de justiça ambiental, considerar que
diversas situações coexistem, se sobrepõem e também se interseccionam.
Alguns autores vem recentemente assumindo que análises em escalas muito
reducionistas ou holísticas demais exprimem limitações no exercício de compreensão dos
fenômenos políticos atuais (AGNEW, 2002; SMITH, 1997, 2004), assim torna-se, segundo
John Agnew, em evidencia a categoria da escala espacial como perspectiva analítica e
metodológica mais adequada para a Geografia Política (AGNEW apud CASTRO, 2005).
Segundo Castro (2005), o Estado enquanto agente institucional e os demais agentes
não governamentais realizam suas ações em diversas escalas:
Ultrapassar os limites de modelos explicativos estruturais abrangentes
impõe à geografia retomar o que tem sido pouco pensado na disciplina:
o Estado, ator institucional, e os atores sociais. Ambos definem escalas
dos fenômenos políticos que recortam o espaço de forma diferenciada e
impõem uma realidade complexa que não pode ser compreendida a
partir de uma escala apenas (CASTRO, 2005, p. 79).
Desta forma as escalas podem ser compreendidas na dimensão de ação dos agentes no
território. A escala toma, portanto, a dimensão das práticas sociais no espaço. Ao considerar a
escala nestes termos as outras compreensões não são exterminadas da categoria, segundo o
geografo David Harvey (2012) em artigo intitulado “O espaço como palavra-chave”, devem-
se manter as categorias, mas em tensão dialética.
A importância da escala é a da representação espacial de processos sociais de controle
e dominação. Sobre esse tema Swyngedouw afirmou:
Struggling to command a particular scale in a given sociospatial
conjuncture can be of eminente importance. Spatial scales are never
fixed, but are perpetually redefined, contested and restructured in terms
53
of their extend, content, relative importance and interrelations. The
continuous reshuffling and reorganization of spatial scales are integral
to social strategies and an arena for struggles for control and
empowerment (SWYNGEDOUW, 2004 apud SANT’ANNA, 2013).
Trazendo ao caso estudado, as práticas que se realizam na escala subnacional através
das técnicas de reprodução de setores da sociedade certamente acarretarão, a curto, médio ou
longo prazo, em conflitos na escala local ou da bacia podendo envolver outros agentes na
escala nacional ou supranacional, por exemplo, o setor agropecuário de produção intensiva
que utiliza de defensivos agrícolas que são absorvidos pelo solo e contaminam o lençol
freático ou os pescadores que mantém suas práticas nas épocas de reprodução de espécies e
diminuem drasticamente a população de peixes em rio transfronteiriço.
O tratamento dado aos conflitos pela água transfronteiriça elaborados por Wolf e Delli
Priscoli (2009) estão majoritariamente concentrados no nível da escala internacional dos
conflitos. O agrupamento dos seus dados voltam-se apenas às representações da distribuição
das bacias compartilhadas entre Estados e nos possíveis desdobramentos políticos que
incorporam cenários que tanto gerar ou intensificar litígios a ponto de culminar em intensivas
ações militares quanto gerar ou intensificar contexto de cooperação e integração entre os
Estados ribeirinhos.
Segundo Trottier (2003), ao enfatizar a escala internacional nos estudos sobres
conflitos sobre águas compartilhadas, processos de disputa e competição entre agentes nas
diversas escalas de ação são encobertos, enveredando a análise para o campo estrutural em
que a ação e o engajamento de agentes que detém menor poder de barganha são ainda mais
suprimidos nos processos de tomada de decisão. E devido a essas relações de poder que a
proposição de governança para os recursos hídricos “não existe uma hierarquia entre
instâncias internacionais, nacionais e regionais. A internalização de uma convenção
internacional, por exemplo, deve ser feita diante de diretrizes gerais, mas salvaguarda as leis
nacionais.” (RIBEIRO, 2009, p, 116)
4.2 Instituição de Governança da Água Internacional: O Comitê Intergovernamental
Coordenador dos Países da Bacia do Prata, FONPLATA e o Programa Marco
54
O CIC foi criado através da assinatura da Declaração Conjunta de Buenos Aires, no
ano de 1967 e preconizava “o estudo conjunto e integral da Bacia do Prata com vistas à
execução de um programam de obras multilaterais, bilaterais e nacionais úteis ao progresso da
região”.
O Tratado da Bacia do Prata (1969), resgatou a Declaração Conjunta de Buenos Aires
e a Ata de Santa Cruz de la Sierra para consolidar a cooperação entre os países da Bacia. O
Tratado da Bacia do Prata reconhece o CIC como:
o órgão permanente da Bacia, encarregado de promover, coordenar e
acompanhar o andamento das ações multinacionais, que tenham por
objetivo o desenvolvimento integrado da Bacia do Prata, e da
assistência técnica e financeira que promova com o apoio dos
organismo internacionais que estime conveninete, bem como de
executar as decisões que adotem os Ministros das Relações Exteriores
(art. III do Tratado da Bacia do Prata, 1969).
O CIC é composto por representantes dos 5 Estados que compartilham a Bacia:
Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai.
No ano de 2001, o Estatuto foi revisto pelos Estados, sem prejuízo em sua relevância à
cooperação e integração dos países membro. O artigo 3º do Estatuto reformado trata das
atribuições que do Comitê:
3.1. Coordinar el funcionamiento del Sistema de la Cuenca del Plata,
efectuando el seguimiento de las acciones encomendadas por los
Cancilleres a los órganos del Sistema, manteniendo la vinculación
permanente entre ellos.
3.2. Considerar, aprobar e implementar proyectos, planes de estudio e
investigación referidos al Parágrafo Único del Artículo I del Tratado de
la Cuenca del Plata y especialmente los relacionados con el Programa
de Acciones Concretas, determinando sus prioridades.
3.3. Actualizar y reformular el Programa de Acciones Concretas.
3.4. Convocar, con mandato específico, a reuniones de Contrapartes
Técnicas o Grupos de Trabajo; preparar su agenda; considerar los
55
informes y recomendaciones que surjan de estas reuniones, y adoptar
las medidas necesarias para su avance, cumplimiento o ejecución.
3.5. Gestionar, negociar, aceptar y suscribir con anuencia previa de las
autoridades nacionales pertinentes de cada país, los acuerdos de
cooperación técnica para la realización de proyectos, estudios e
investigaciones de acuerdo a las finalidades señaladas en el presente
Estatuto, cuando sean financiados con fondos no reembolsables, así
como transmitir a los Gobiernos los ofrecimientos que los organismos
nacionales e internacionales formulen de conformidad a sus programas.
3.6. Solicitar la participación de Representantes del FONPLATA en las
reuniones de Contrapartes Técnicas y en todas aquellas en que se
generen propuestas de acciones concretas, y coordinar con dicho
organismo las bases de asistencia financiera para su ejecución, como así
también su actuación como agente financiero del Sistema.
3.7. Solicitar la realización de estudios de carácter técnico o
institucional a organismos nacionales o internacionales competentes.
3.8. Promover y organizar cursos, seminarios o conferencias de
empresarios, especialistas o profesionales cuya actividad sea de
relevancia para la integración regional.
3.9. Promover la publicación y distribución de textos que considere
relevantes para la divulgación de los temas vinculados con el desarrollo
de la Cuenca del Plata.
3.10. Convocar las Reuniones de Cancilleres de los Países de la Cuenca
del Plata y preparar, en coordinación con otros órganos del Sistema, su
agenda provisoria.
3.11. Dictar su Reglamento Interno, el de la Secretaría General, el
Reglamento de Personal y toda otra normativa que sea necesaria para el
funcionamiento del CIC, y modificarlos cuando lo considere necesario.
(Estatuto del CIC, 2001).
No artigo II, da composição do CIC, o parágrafo 1 concede a cada país dois membros
titulares, sendo que um dos indicados representará os interesses políticos e o outro deverá ser
“especialista em projetos”. Os suplentes também deverão ser sujeitos a essa disposição.
O CIC desenvolve inúmeros projetos e estudos técnicos de grande importância em
toda a bacia desde o início das atividades que permitiu melhor aproveitamento do potencial
energético e de transporte da Bacia.
56
Atualmente o CIC, em parceria com o financiamento do GEF, execução regional do
OEA e a agência de implementação foi a PNUMA, desenvolve o Programam Marco para a
Gestão Sustentável dos Recursos Hídricos da Bacia do Prata, considerando os efeitos
hidrológicos decorrentes da variabilidade e mudança do clima” (PMAE). Devido a essas
ações, o CIC, segundo Villar, é um importante agente na “promoção da gestão integrada dos
recursos hídricos” (VILLAR, 2013, p. 146).
O programa é resultado de articulações do CIC com demais instituições internacionais.
É importante ressaltar que o PMAE surgiu com bases na IV Diálogo Interamericano de
Gestão das Águas, em 2001, na cidade de Foz do Iguaçu. E o objetivo, conforme publicação
do CIC de 2011 sobre PMAE é:
Fortalecer a cooperação transfronteiriça entre os governos de Argentina,
Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai para garantir a gestão de recursos
hídricos compartilhados da Bacia de maneira integrada e sustentável, no
contexto da variabilidade e mudança do clima, e gerar oportunidades
para o desenvolvimento (CIC, 2011, p. 34)
Atualmente o PMAE está em fase de estudos da bacia com base em seus objetivos,,
mas de acordo com seu planejamento, avançou e contribuiu para a compreensão do quadro
social, ambiental e político da região através da Macro-Análise Diagnóstico Transfronteiriço
(Macro-ADT). Foram identificados diversos temas críticos na bacia que permeiam os níveis
do ambiental, social e político.
Retomando ao CIC, na VI Reunião de Chanceleres, no ano de 1974, foi criado o
Convênio Constitutivo do Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata, a
FONPLATA tornou-se operacional em 1977. O órgão financeiro do Tratado tem por objetivo
a “realização de estudos, projetos, programas e obras tendentes a promover o
desenvolvimento harmônico e a integração física da Bacia do Prata” (artigo IIIº do Convênio
Constitutivo).
Em 2011, o FONPLATA, teve seu modelo de gestão institucional reformado e
instaurou-se o cargo e a eleição para Presidente Executivo. O Fundo se aplica às obras de
infraestruturas aos países, segundo informativo, em 2014 o fundo atingiu 1,7 bilhões de
dólares, viabilizado pela revisão da estrutura organizacional a ampliação do capital. Segundo
o informativo os financiamentos se destinam a infraestrutura física em áreas mais vulneráveis
57
da região, com ênfase em zonas fronteiriças. A organização da instituição é composta pelos
Ministros de Economia, Fazendo e/ou Planejamento de cada um dos países que são
representados por Diretoria Executiva. A vigência do mandato do Presidente Executivo é de 5
anos e exerce direção geral e administrativa.23
4.3 Comitê Bacia Hidrográfica no Brasil e o CBH da BP-3
Em que pese os esforços de Itaipu no desenvolvimento de pesquisas técnicas na Bacia
do Alto Paraná, na margem paraguaia não existe uma legislação específica para gestão de
recursos hídricos, de modo que existe relativa defasagem com relação as estruturas de gestão
e de, ao menos, divulgação de dados técnicos sobre as bacias.
No entanto, no Brasil, A Política Nacional de Recursos Hídricos foi instituída pela Lei
Federal nº 9.433, de 8/1/1997, cujo principal objetivo é a integração da gestão de Recursos
Hídricos com a Gestão Ambiental e a articulação do planejamento dos Recursos Hídricos com
os setores usuários e com os planejamentos regional, estadual e nacional (artigo 3º, inciso III e
IV), através de Planos de Recursos Hídricos, a outorga dos direitos de uso de água e a
cobrança pelo uso (artigo 5º, inciso I, III e IV).
Aos Comitês Bacia Hidrográfica compostos por representantes da União, do Estado,
dos Municípios, dos usuários das águas e entidades ou organizações civis (artigo 39),
compete, no âmbito da sua área de atuação (artigo 38):
I - promover debates das questões relacionadas aos Recursos Hídricos e
articular a atuação das entidades intervenientes;
II - arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos
relacionados à água;
III - aprovar o Plano de Recursos Hídricos da Bacia - PLBH,
IV - acompanhar a execução do PLBH e sugerir providências para
atingir suas metas;
IX - estabelecer critérios e promover o rateio de custo das obras de uso
múltiplo, de interesse comum e coletivo.
§ único - das decisões dos Comitê Bacia Hídrica caberá recurso ao
CERH ou ao CNRH, de acordo com a esfera de competência.
(BRASIL, 2007 apud VALÉRIO; MARANHÃO, 2010, p.92)
23
Disponível em: http://fonplata.org/index.php/comunicaciones/publicaciones/item/1427-breve-presentacion-
de-fonplata-en-ingles
58
Os PLRH devem partir de unidades territoriais cuja unidade é a Bacia Hidrográfica e
por ação do Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos (SNGRH), com gestão
descentralizada e contando com a participação do poder público, dos usuários e das
comunidades (artigo 1º, inciso V, VI).
Este quadro institucionalizado de políticas para gestão das bacias hidrográficas no
Brasil estão no campo da visão que o conceito de governança abarca, ao conferir aos comitês
de bacia a conjugação dos diversos agentes, incluindo os marginalizados como indígenas,
trabalhadores rurais e moradores em áreas de vulnerabilidade socioambiental. Esta inclusão
nos termos legislativos é um grande avanço ao permitir a participação popular através de
representantes de seus interesses em CBHs. Segundo Ribeiro a adoção da gestão por bacia
hidrográfica merece destaque uma vez que ao delimitar a bacia hidrográfica como unidade de
gerenciamento e vincular a gestão descentralizada do recurso hídrico com a participação
social buscou-se um movimento de integração básico da governança, entretanto, indica o
autor, alguns dos CBHs não são incorporados à escala da bacia e as demais práticas sociais ao
longo do fluxo de um rio podem se tornar um fator inviabilizador de ações concretas que
permitam seu gerenciamento adequado (RIBEIRO, 2009).
Além disso, a complexidade dos usos da água e do solo na escala da bacia hidrográfica
acresce em complexidade política a tomada de decisão, segundo o autor: “Como o uso do solo
é socialmente definido, não há como fugir à dimensão política e envolver os diversos sujeitos
que atuam na bacia sob pena de surgirem conflitos socioambientais caso não seja
implementado um sistema participativo que acomode as diferenças de pontos de vista sobre o
uso da água.” (RIBEIRO, 2009, p. 127).
Por fim, o autor aponta que mesmo com os empecilhos ao funcionamento correto de
experiências de governança dos recursos hídricos, os CBHs são importantes instrumentos que
“possibilitam o contato entre diversos segmentos sociais, mas refletem a estrutura de poder
dos governos estaduais e municipais” (RIBEIRO, 2009, p. 130).
Na Bacia do Paraná III, o Comitê da Bacia foi criado apenas em 2004 e realizou, até
junho de 2015, 15 reuniões. Inicialmente eram previstos 3 encontros anuais, porém nos anos
de 2009, 2011 e 2012 foi realizada apenas uma reunião anual e nos anos 2006 e 2010 não foi
realizada nenhuma reunião. Outro problema além da frequência das reuniões são as atas que
não indicam o andamento dos assuntos debatidos, um dos únicos assuntos que reincidem ao
longo das atas é a cobrança de outorga de direito de uso de recurso hídrico, porém não são
59
expostos os posicionamentos dos participantes24
, além disso, algumas das reuniões realizadas
não tiveram suas respectivas atas disponibilizadas no site, dificultando o acompanhamento da
discussão.
No ano de 2007, na VI reunião, o CBH comunicou sobre a iniciativa de Itaipu em
elaborar junto com a UNIOESTE o Plano de Gestão da Bacia; em 2008, na VII reunião, foi
exposta a necessidade da criação de uma Câmara Técnica de Acompanhamento de Elaboração
do Plano (CTPLAN), ao qual seriam submetidas versões do Plano de Gestão para apreciação.
Câmara Técnica foi formada por dois membros de cada setor: Poder Público: Instituto das
Águas do Paraná (IPA), Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural
(EMATER); Usuários: Companhia de Saneamento do Paraná (SANEPAR), Cooperativa
Agroindustrial LAR; Sociedade Civil: Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UFTPR)
e Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Toledo.
Na Ata da XV reunião, realizada em 2014 e última ata disponibilizada, os
participantes eram ou os membros do CTPLAN, ou essencialmente representantes do setor
usuário da bacia e pelo setor público, a esfera da sociedade civil esteve à margem da reunião.
Em artigo de 2009, Ribeiro discute a legitimidade das decisões dos CBH a partir da
representatividade dos setores da sociedade: “... a assimetria se explicita ao se comparar a
presença e a demanda dos setores menos favorecidos da sociedade” (RIBEIRO, 2009, p. 129).
4.4 Características do uso da água nas bacias na margem paraguaia e na bacia na
margem brasileira: Indicadores socioeconômicos.
O Paraguai tem significativa fragilidade socioeconômica. Segundo os últimos
levantamentos estatísticos divulgados, sua economia é dependente das exportações da
produção agrária, em especial carne bovina, soja e milho. A participação deste setor no PIB
paraguaio variou entre 25 e 30% no período de 2007 e 201025
. Os distritos de Alto Paraná e
24
Atas das reuniões do CBH do Paraná III disponíveis em:
http://www.aguasparana.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=216
25Fonte: Banco Central del Paraguay. Disponível em:
http://www.mag.gov.py/dgp/dgp/ACTUALIDAD%20AGROPECUARIA%20PY%202012.pd
f
60
Canindeyú são os maiores produtores de soja e milho paraguaio, ao qual 99% da produção é
destinada à importação, e únicos integrantes da Bacia do Paraná Alto (DGEEC, 2007)26
. Os
gráficos ajudam a demonstrar o crescimento da atividade agrícola nestes distritos entre 2009 e
2013, período que compreende que demonstra especialização técnica na produção e, portanto,
maior desenvolvimento do setor simultaneamente à intensificação do programa Cultivando
Água Boa na margem brasileira.
Gráfico 1 Evolução da produção (ton) e da área (ha) do cultivo de soja no distrito de
Canindeyu - Paraguai
Elaborado por Paulo Inacio Junior. Fonte: DGEEC - Compendio Ambiental 201227
E nos dados
Ministerio Agricultura y Ganadería - Zonificación Agroecologica de Rubros Agropecuarios del
Paraguay zafra 201328
26 Disponível em:
http://www.dgeec.gov.py/Publicaciones/Biblioteca/Compendio_Ambiental/Compendio%20E
stadistico%20Ambiental.pdf
27 Disponível em:
http://www.dgeec.gov.py/Publicaciones/Biblioteca/ambiental2012/compendio%20ambiental
%202012.pdf
28 Disponível em:
http://www.mag.gov.py/dgp/2015/Zonificacion%20Agroecologica%202015_Ver_18_03_2015.pdf
442.507 508.496 534.083 555.887
666.300
1.241.484 1.478.538
1.646.867
861.101
1.978.912
2009 2010 2011 2012 2013
Evolução da Produção (ton) e Área (ha) da Soja em Canindeyu
Área (ha) Produção (ton)
61
Gráfico 2 Evolução da produção (ton) e da área (ha) do cultivo de milho no distrito de
Canindeyu - Paraguai
Elaborado por Paulo Inacio Junior. Fonte: DGEEC - Compendio Ambiental 201229
E nos dados
Ministerio Agricultura y Ganadería - Zonificación Agroecologica de Rubros Agropecuarios del
Paraguay zafra 201330
29
Disponível em:
http://www.dgeec.gov.py/Publicaciones/Biblioteca/ambiental2012/compendio%20ambiental
%202012.pdf
30 Disponível em:
http://www.mag.gov.py/dgp/2015/Zonificacion%20Agroecologica%202015_Ver_18_03_2015.pdf
189.700 193.699 208.228 242.724 195.154
459.074
753.491 810.947 756.390 775.590
2009 2010 2011 2012 2013
Evolução da Produção (ton) e da Área (ha) do Milho em Canindeyu
Área (ha) Produção (ton)
62
Gráfico 3 Evolução da produção (ton) e da área (ha) do cultivo de soja no distrito de Parana
Alto - Paraguai
Elaborado por Paulo Inacio Junior. Fonte: DGEEC - Compendio Ambiental 201231
E nos dados
Ministerio Agricultura y Ganadería - Zonificación Agroecologica de Rubros Agropecuarios del
Paraguay zafra 2013
31
Disponível em:
http://www.dgeec.gov.py/Publicaciones/Biblioteca/ambiental2012/compendio%20ambiental
%202012.pdf
761.455 756.086 794.135 823.052 987.000
1.974.840 2.207.770
2.459.121
1.280.031
2.941.260
2009 2010 2011 2012 2013
Evolução da Produção (ton) e da Área (ha) da Soja em Parana Alto
Área (ha) Produção (ton)
63
Gráfico 4 Evolução da produção (ton) e da área (ha) do cultivo de milho no distrito de Parana
Alto - Paraguai
Elaborado por Paulo Inacio Junior. Fonte: DGEEC - Compendio Ambiental 201232
E nos dados
Ministerio Agricultura y Ganadería - Zonificación Agroecologica de Rubros Agropecuarios del
Paraguay zafra 2013
As grandes variações na produção desses produtos, tanto para mais como para menos,
foram acompanhadas por grandes variações no PIB paraguaio.33
Além disso, nesses distritos há grandes desafios socioambientais, como por exemplo, a
porcentagem da população com acesso a saneamento básico no Alto Paraná é de 11,4% e
35,6% em Canindeyú34
, Agravante dessa situação é o índice de pobreza que em 2014 foi de
32
Disponível em:
http://www.dgeec.gov.py/Publicaciones/Biblioteca/ambiental2012/compendio%20ambiental
%202012.pdf
33 Fonte: Banco Central del Paraguay. Disponível em:
http://www.mag.gov.py/dgp/dgp/ACTUALIDAD%20AGROPECUARIA%20PY%202012.pd
f
34 Fonte: DGEEC. Disponível em: Disponível em:
http://www.dgeec.gov.py/Publicaciones/Biblioteca/ambiental2012/compendio%20ambiental
%202012.pdf
191.544 196.319 211.044
246.006
197.793
494.837
834.354 897.976
826.492 858.826
2009 2010 2011 2012 2013
Evolução da Produção (ton) e da Área (ha) de Milho em Parana Alto
Área (ha) Produção (ton)
64
32% e de 19,2% da população em pobreza extrema entre os moradores das zonas rurais
paraguaias35
.
Localmente, os dados sócio-econômicos das bacias do Alto Paraná e do Paraná III,
revelam um ambiente de intenso uso de água nas atividades agrícolas, segundo dados da
FAO, 70% da água doce extraída no planeta é destinada à agricultura36
, especialmente à
irrigação de lavouras de monocultura. Portanto, a atividade econômica nestas bacias tem
demanda hídrica extremamente alta, além disso, o uso de pesticidas, fertilizantes e outros
insumos químicos contaminam os solos e os rios através das chuvas. O uso agrário da água e
a proximidade à barragem da maior hidrelétrica em produção de energia no planeta, podem
corroborar com a grande porcentagem de risco de estiagem hídrica na Bacia do Paraná III,
visto que o a questão do acesso à água é uma relação política (RIBEIRO, 2003).
O baixíssimo índice de população abastecida e com saneamento básico na Bacia do
Alto Paraná é preocupante dentro da perspectiva socioambiental, pois torna aquele ambiente
favorável ao contágio de doenças e pode aumentar processos de eutrofização das águas
Do lado brasileiro, as monoculturas de soja e milho também são os principais produtos
agrícolas, mas dividem o protagonismo no setor agrário com suinocultura e avicultura. A
Bacia do Paraná III,sedia três grandes indústrias de alimentos congelados: Sadia, Frimesa e
Coopavel. O conjunto dessas empresas, além de toda a cadeia produtiva que envolve a criação
de suínos e aves, são grandes demandantes de água da bacia e fontes poluidoras que merecem
atenção quanto ao impacto na qualidade da água, principalmente quando se pensa nos dejetos
produzidos pelos suínos na região.
Segundo dados do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social -
IPARDES, em 2004, foram despejados na Bacia do Paraná III, 17.801 kg/dia de lixo orgânico
da pecuária, além de 16.540 kg/dia provenientes de esgoto.37
.
35 Fonte: DGEEC. Encuesta Permanente de Hogares 2014
36Disponível em:
http://www.fao.org/ag/againfo/programmes/pt/lead/toolbox/Indust/DFreWat.htm
37 Fonte: IPARDES. Síntese de Indicadores Ambientais por Bacia Hidrográfica no Paraná.
Disponível em:
http://www.ipardes.gov.br/pdf/mapas/base_ambiental/indicadores_ambientais.pdf
65
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, em 2012, divulgou a evolução
das taxas de pobreza e água encanada por Estado no período de 2002 a 2009. A porcentagem
de pessoas em situação de extrema pobreza na zona rural do estado do Paraná foi de 4,3% e
92,6% da população era atendida por água encanada.38
.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A teoria da interdependência pode auxiliar na compreensão das relações de
cooperação entre Estados sem perder de vista as soberanias e os interesses próprios, visto que
um acordo que conduz a um intenso desequilibrio de custos relativos pode contribuir para
uma interdependência que assevere as assimetrias no tempoe no espaço através da redução
gradativa de autonomia da parte que tem maiores custos e menores benefícios. A autonomia é
parte integrante da soberania, é o elemento que garante a implantação de medidas do poder
legislativo e do executivo sobre o território (RIBEIRO, 2012).
A relação de interdependência que se desenvolve em uma situação de vulnerabilidade
é identificável em relação que se torna demasiadamente prejudicial ao Estado que detém
menos poder e que diante da assimetria vê-se sem alternativa a não ser pleitear com o Estado
maior a diminuição de sua vulnerabilidade. Nesta perspectiva as negociações forçadas pelo
Paraguai em 2009 pelo reajuste dos preços pagos pela energia produzida por Itaipu tinham em
seu horizonte a diminuição de sua vulnerabilidade.
A cooperação instituída pelos dos países, por intermédio da Entidade Itaipu
Binacional, revela a interdependência dos recursos hídricos uma vez que a produção da
hidrelétrica depende do nível da água, assim a cooperação pode colocar-se em contraposição à
soberania clássica e a exploração de recursos hídricos em determinado território (VOGLER,
1996). Neste contexto, o neoinstitucionalismo como aplicação de medidas de descentralização
da gestão é uma alternativa necessária para a cooperação internacional de recursos ambientais
(VOGLER, 1996) e a governança de bacias compartilhadas são as melhores alternativas de
gestão, onde se está diretamente relacionadas às bacias internacionais e subbacias nacionais
(RIBEIRO 2009; GIORDANO, WOLF, 2003).
38
Fonte: IBGE. PNAD. Dados organizados pelo IPEA.
66
Nas análises das políticas territoriais brasileiras na América do Sul, observa-se a
concentração de equipamentos, acordos, infraestruturas de distribuição de energia, rede de
transporte multimodal, cooperação técnica na gestão de fronteiras, etc., na porção sul do
Brasil, que aparecem, sobretudo, no lado brasileiro da tríplice fronteira, na cidade de Foz do
Iguaçu.
Articula-se na análise do espaço político a relação permeada pelos processos sociais
dentro da lógica econômica neoliberal, em que o território manifesta investimentos e usos
desiguais e diferenciados, sendo assim, ocorre no território o desenvolvimento de espaços que
por razões sociais detém em si significativa concentração de aparelhos, instituições e políticas
territoriais (SANTOS & SILVEIRA, 2001), que demonstram um processo simultâneo de
inclusão e de exclusão no campo das políticas públicas dos Estados (BECKER, 1995). Nesta
perspectiva do espaço político dos Estados com forças de atração desiguais e de políticas
territoriais direcionadas à integração, o geógrafo Roseira afirma que “Os tratados entre os
países, especialmente os do Cone Sul, veem uma alternativa à superação das assimetrias
territoriais.” (ROSEIRA, 2007, p.95).
A relevância das políticas territoriais compreende dimensões intrínsecas aos interesses
dos Estados em sua faceta de manutenção de seu regime. Se a contribuição de Ratzel confere
ao Estado um caráter biológico – em que pese a fragilidade da aproximação de uma
instituição socialmente produzida ao discurso naturalista, invocam-se aqui os pressupostos de
desenvolvimento e manutenção de suas condições de existência – os interesses das políticas
públicas estão na consolidação e expansão de suas estruturas como processos simultâneos de
seu desenvolvimento. As políticas do Estado teriam, portanto, o caráter de subsidiar seus
interesses. Considerando-se a relevância do espaço ao desenvolvimento de forças produtivas e
o caráter do Estado neoliberal, o Estado aparelharia o espaço conforme seus interesses e os do
jogo de poder envolvendo outros agentes, incluindo aí o interesse em parcerias entre as
esferas públicas e privadas.
A gestão do território é conceituada por Becker como prática estratégica, científico-
tecnológica do poder no espaço-tempo (BECKER, 1988), assim, são as formas que os poderes
econômicos e políticos se apropriam do território e utilizam os recursos naturais e/ou
humanos.
A combinação das políticas territoriais, as de gestão do território e de integração
regional contribuem na compreensão dos movimentos realizados pelo Estado brasileiro na
67
porção de Itaipu, na elaboração de um projeto de gestão socioambiental destacado pelo
secretário geral da ONU, Ban Ki Moon como “liderança mundial em sustentabilidade”39
, na
criação da UNILA e do Parque Tecnológico Itaipu. Estas instituições centralizadas e
formadoras de certa centralidade são a forma da espacialização de lógicas articuladas com
outros espaços, além disso, são a materialização na dimensão brasileira dos conflitos no plano
do Poder e do poder na América do Sul.
Este processo além de ser multidimensional é multiescalar desde a escala
supranacional à regional local. (RUCKERT, 2010).
Nos termos do acordo de construção e operação da Entidade Binacional Itaipu, o
Brasil recebeu críticas diretas de um posicionamento de imperialismo frente ao Estado menor,
mas em 2009 concordou em ceder em alguns pontos, os quais o Paraguai reivindicava serem
termos mais justos diante das suas condições socioeconômicas históricas.
Os conflitos em Itaipu se dão na escala internacional, enquanto influenciada por
Estados distintos que tem interesses distintos para regulação e uso das águas em seu
condomínio. Mas ocorrem também em escalas subnacionais também pelo uso da água, mas
também pelas atividades de mitigação aos possíveis danos que a apropriação humana na
região podem causar.
O Programa Cultivando Água Boa, com as políticas de gestão de água tem mostrado
resultados da gestão participativa e buscado instrumentos de mitigação dos impactos na bacia.
Quanto ao Paraguai, o projeto em fase de implantação na subbacia do Rio Carapa segue
modelo de governança da água, mas ainda em aspectos muito incipientes. O acompanhamento
de projetos não é disponibilizado digitalmente.
Os recentes investimentos da Entidade Binacional Itaipu no campo ambiental
demonstram uma superação das tradicionais práticas dilapidadoras dos recursos naturais, com
vistas à manutenção da qualidade e quantidade da água e através da contenção de ameaças
subnacionais na BP-3
Em contrapartida, a baixa incidência de atividades concentradas em meio-ambiente e
conservação das águas no Paraguai, demonstra que a cooperação internacional é marcada
pelos interesses internos (PAQUEROT, 2005). No caso paraguaio, os indícios são de que
39
Disponível em: https://www.itaipu.gov.br/sala-de-imprensa/noticia/para-ban-ki-moon-itaipu-e-
lideranca-mundial-em-sustentabilidade?page=161
68
devido à relevância das atividades agrícolas na bacia do Paraná Alto para a economia
nacional, neste sentido alguns eventos mitigadores da degradação ambiental podem não
receber apoio.
No Brasil a implantação de mecanismos de gestão participativa da água, como os
CBHs, são importantes meios de se atingir um gestão descentralizada da água, com fins de
realizar uma estrutura que as práticas sejam menos conflitivas e decididas no plano político
em conjunto.
Os Comitês de Bacia nasceram com os objetivos de incorporar a pluralidade de
interesses na gestão, elaborar projetos e controlar a eficácia e aplicação dos recursos
financeiros. Baseado na governança de recursos hídricos, a funcionalidade dos Comitês
dependem de atividades que promovam o diálogo entre os diferentes atores evitando ações
contrárias e contraditórias. (MACHADO apud PILLAR 2013).
O bom funcionamento de um processo democrático no processo de tomada de
decisões que vão afetar os usuários da bacia, governança com participação efetiva depende da
participação de todos atores envolvidos na bacia, independentemente do ramo de atividade e
Estado e de apoios além da instituição de gestão (RICHARD, 2009). É imprescindível,
portanto, que nas Bacias do Alto Paraná e Paraná III, os processos de tomada de decisão e as
ações passem a integrar todos atores para que os esforços não sejam anulados ao longo da
bacia.
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72
ANEXOS
ANEXO A - Tratado de Itaipu
ANEXO B - Ata de Iguaçu
ANEXO C - Tratado da Bacia do Prata
ANEXO D – Estatuto do CIC
73
Anexo A
TRATADO DE ITAIPU (Brasília, 26.4.1973)
Tratado entre a República Federativa do Brasil e a República do Paraguai para o
Aproveitamento Hidrelétrico dos Recursos Hídricos do Rio Paraná, pertencentes em
Condomínio aos dois Países, desde e inclusive o Salto Grande de Sete Quedas ou Salto de
Guaíra até a Foz do Rio Iguaçu.
O Presidente da República Federativa do Brasil, General-de-Exército Emílio Garrastazu
Médici, e o Presidente da República do Paraguai, General-de-Exército Alfredo Stroessner;
Considerando o espírito de cordialidade existente entre os dois países e os laços de fraternal
amizade que os unem;
O interesse comum em realizar o aproveitamento hidrelétrico dos recursos hídricos do Rio
Paraná, pertencentes em Condomínio aos dois Países, desde e inclusive o Salto Grande de
Sete Quedas ou Salto de Guaíra até a Foz do Rio Iguaçu;
O disposto na Ata Final firmada em Foz do Iguaçu, em 22 de junho de 1966, quanto à divisão
em partes iguais, entre os dois países, da energia elétrica eventualmente produzida pelos
desníveis do Rio Paraná no trecho acima referido;
O disposto no Artigo VI do Tratado da Bacia do Prata; O estabelecido na Declaração de
Assunção sobre o aproveitamento de rios internacionais, de 3 de junho de 1971;
Os estudos da Comissão Mista Técnica Brasileiro-Paraguaia constituída em 12 de fevereiro de
1967;
A tradicional identidade de posições dos dois países em relação à livre navegação dos rios
internacionais da Bacia do Prata, resolveram celebrar um Tratado e, para este fim, designaram
seus Plenipotenciários, a saber:
- O Presidente da República Federativa do Brasil ao Senhor Ministro de Estado das Relações
Exteriores, Embaixador Mário Gibson Barboza;
- O Presidente da República do Paraguai ao Senhor Ministro das Relações Exteriores, Doutor
Raúl Sapena Pastor;
Os quais, tendo trocado seus Plenos Poderes, achados em boa e devida forma, convieram no
seguinte:
Artigo I
As Altas Partes Contratantes convêm em realizar, em comum e de acordo com o previsto no
presente Tratado e seus Anexos, o aproveitamento hidrelétrico dos recursos hídricos do Rio
74
Paraná, pertencentes em condomínio aos dois países, desde e inclusive o Salto Grande de Sete
Quedas ou Salto de Guaíra até a Foz do Rio Iguaçu.
Artigo II
Para os efeitos do presente Tratado entender-se-á por: a) Brasil, a República Federativa do
Brasil;
b) Paraguai, a República do Paraguai;
c) Comissão, a Comissão Mista Técnica Brasileiro-Paraguaia, constituída em 12 de fevereiro
de 1967;
d) ELETROBRÁS, a Centrais Elétricas Brasileiras S.A. - ELETROBRÁS, do Brasil, ou o
ente jurídico que a suceda;
e) ANDE, a Administración Nacional de Eletricidad, do Paraguai, ou o ente jurídico que a
suceda;
f) ITAIPU, a entidade binacional criada pelo presente Tratado.
Artigo III
As Altas Partes Contratantes criam, em igualdade de direitos e obrigações, uma entidade
binacional denominada ITAIPU, com a finalidade de realizar o aproveitamento hidrelétrico a
que se refere o Artigo I.
Parágrafo 1º - A ITAIPU será constituída pela ELETROBRÁS e pela ANDE, com igual
participação no capital, e reger-se-á pelas normas estabelecidas no presente Tratado, no
Estatuto que constitui seu Anexo A e nos demais Anexos.
Parágrafo 2º - O Estatuto e os demais Anexos, poderão ser modificados de comum acordo
pelos dois Governos.
Artigo IV
A ITAIPU terá sedes em Brasília, Capital da República Federativa do Brasil, e em Assunção,
Capital da República do Paraguai.
Parágrafo 1º - A ITAIPU será administrada por um Conselho de Administração e uma
Diretoria Executiva integrados por igual número de nacionais de ambos países.
Parágrafo 2º - As atas, resoluções, relatórios ou outros documentos oficiais dos órgãos de
administração da ITAIPU serão redigidos nos idiomas português e espanhol.
Artigo V
As Altas Partes Contratantes outorgam concessão à ITAIPU para realizar, durante a vigência
do presente Tratado, o aproveitamento hidrelétrico do trecho do Rio Paraná referido no Artigo
I.
75
Artigo VI
Formam parte do presente Tratado:
a) o Estatuto da entidade binacional denominada ITAIPU (Anexo A);
b) a descrição geral das instalações destinadas à produção de energia elétrica e das obras
auxiliares, com as eventuais modificações que se façam necessárias (Anexo B);
c) as bases financeiras e de prestação dos serviços de eletricidade da ITAIPU (Anexo C).
Artigo VII
As instalações destinadas à produção de energia elétrica e obras auxiliares não produzirão
variação alguma nos limites entre os dois países estabelecidos nos Tratados vigentes.
Parágrafo 1º - As instalações e obras realizadas em cumprimento do presente Tratado não
conferirão, a nenhuma das Altas Partes Contratantes, direito de propriedade ou de jurisdição
sobre qualquer parte do território da outra.
Parágrafo 2º - As autoridades declaradas respectivamente competentes pelas Altas Partes
Contratantes estabelecerão, quando for o caso e pelo processo que julgarem adequado, a
sinalização conveniente, nas obras a serem construídas, para os efeitos práticos do exercício
de jurisdição e controle.
Artigo VIII
Os recursos necessários à integralização do capital da ITAIPU serão supridos, à
ELETROBRÁS e à ANDE, respectivamente, pelo Tesouro brasileiro e pelo Tesouro
paraguaio ou pelos organismos financiadores, que os Governos indicarem.
Parágrafo Único - Qualquer das Altas Partes Contratantes poderá, com o consentimento da
outra, adiantar-lhe os recursos para a integralização do capital, nas condições estabelecidas de
comum acordo.
Artigo IX
Os recursos complementares aos mencionados no Artigo VIII, necessários aos estudos,
construção e operação da central elétrica e das obras e instalações auxiliares, serão supridos
pelas Altas Partes Contratantes ou obtidos pela ITAIPU mediante operações de crédito.
Artigo X
As Altas Partes Contratantes, conjunta ou separadamente, direta ou indiretamente, na forma
que acordarem, darão à ITAIPU, por solicitação desta, garantia para as operações de crédito
que realizar. Assegurarão, da mesma forma, a conversão cambial necessária ao pagamento das
obrigações assumidas pela ITAIPU.
Artigo XI
76
Na medida do possível e em condições comparáveis, a mão-de-obra, especializada ou não, os
equipamentos e materiais, disponíveis nos dois países, serão utilizados de forma eqüitativa.
Parágrafo 1º - As Altas Partes Contratantes adotarão todas as medidas necessárias para que
seus nacionais possam empregar-se, indistintamente, em trabalhos efetuados no território de
uma ou de outra, relacionados com o objetivo do presente Tratado.
Parágrafo 2º - O disposto neste Artigo não se aplicará às condições acordadas com
organismos financiadores, no que se refira à contratação de pessoal especializado ou à
aquisição de equipamentos ou materiais. Tampouco se aplicará o disposto neste Artigo se
necessidades tecnológicas assim o exigirem.
Artigo XII
As Altas Partes Contratantes adotarão, quanto à tribuição, as seguintes normas:
a) não aplicarão impostos, taxas e empréstimos compulsórios, de qualquer natureza, à ITAIPU
e aos serviços de eletricidade por ela prestados;
b) não aplicarão impostos, taxas e empréstimos compulsórios, de qualquer natureza, sobre os
materiais e equipamentos que a ITAIPU adquira em qualquer dos dois países ou importe de
um terceiro país, para utilizá-los nos trabalhos de construção da central elétrica, seus
acessórios e obras complementares, ou para incorporá-los à central elétrica, seus acessórios e
obras complementares. Da mesma forma, não aplicarão impostos, taxas e empréstimos
compulsórios, de qualquer natureza, que incidam sobre as operações relativas a esses
materiais e equipamentos, nas quais a ITAIPU seja parte;
c) não aplicarão impostos, taxas e empréstimos compulsórios, de qualquer natureza, sobre os
lucros da ITAIPU e sobre os pagamentos e remessas por ela efetuados a qualquer pessoa
física ou jurídica, sempre que os pagamentos de tais impostos, taxas e empréstimos
compulsórios sejam de responsabilidade legal da ITAIPU;
d) não porão nenhum entrave e não aplicarão nenhuma imposição fiscal ao movimento de
fundos da ITAIPU que resultar da execução do presente Tratado;
e) Não aplicarão restrições de qualquer natureza ao trânsito ou depósito dos materiais e
equipamentos aludidos no item b deste Artigo;
f) serão admitidos nos territórios dos dois países os materiais e equipamentos aludidos no item
b deste Artigo.
Artigo XIII
A energia produzida pelo aproveitamento hidrelétrico a que se refere o Artigo I será dividida
em partes iguais entre os dois países, sendo reconhecido a cada um deles o direito de
aquisição, na forma estabelecida no da energia que não seja utilizada pelo outro país para seu
próprio consumo.
77
Parágrafo Único - As Altas Partes Contratantes se comprometem a adquirir, conjunta ou
separadamente na forma que acordarem, o total de potência instalada.
Artigo XIV
A aquisição dos serviços de eletricidade da ITAIPU será realizada pela ELETROBRÁS e
pela ANDE, que também poderão fazê-la por intermédio das empresas ou entidades
brasileiras ou paraguaias que indicarem.
Artigo XV
O Anexo C contém as bases financeiras e de prestação dos serviços de eletricidade da
ITAIPU.
Parágrafo 1º - A ITAIPU pagará às Altas Partes Contratantes, em montantes iguais,
"royalties" em razão da utilização do potencial hidráulico.
Parágrafo 2º - A ITAIPU incluirá, no seu custo de serviço, o montante necessário ao
pagamento de rendimentos sobre o capital.
Parágrafo 3º - A ITAIPU incluirá, outrossim no seu custo de serviço, o montante necessário
para remunerar a Alta Parte Contratante que ceder energia à outra.
Parágrafo 4º - O valor real da quantidade de dólares dos Estados Unidos da América,
destinada ao pagamento dos "royalties", dos rendimentos sobre o capital e da remuneração,
estabelecida no Anexo C, será mantido constante, para o que a dita quantidade acompanhará
as flutuações do dólar dos Estados Unidos da América, referido ao seu padrão de peso e título,
em ouro, vigente na data da troca dos Instrumentos de Ratificação do presente Tratado.
Parágrafo 5º - Este valor com relação ao peso e título em ouro do dólar dos Estados Unidos da
América poderá ser substituído, no caso em que a mencionada moeda deixa de ter referida sua
paridade oficial em relação ao ouro.
Artigo XVI
As Altas Partes Contratantes manifestam seu empenho em estabelecer todas as condições para
que a entrada em serviço da primeira unidade geradora ocorra dentro do prazo de oito anos
após a ratificação do presente Tratado.
Artigo XVII
As Altas Partes Contratantes se obrigam a declarar de utilidade pública as áreas necessárias à
instalação do aproveitamento hidrelétrico, obras auxiliares e sua exploração, bem como a
praticar, nas áreas de suas respectivas soberanias, todos os atos administrativos ou judiciais
tendentes a desapropriar terrenos e suas benfeitorias ou a constituir servidão sobre os mesmos.
Parágrafo 1º - A delimitação de tais áreas estará a cargo da ITAIPU, ad referendum das Altas
Partes Contratantes.
78
Parágrafo 2º - Será de responsabilidade da ITAIPU o pagamento das desapropriações das
áreas delimitadas.
Parágrafo 3º - Nas áreas delimitadas será livre o trânsito de pessoas que estejam prestando
serviço à ITAIPU, assim como o de bens destinados à mesma ou a pessoas físicas ou jurídicas
por ela contratadas.
Artigo XVIII
As Altas Partes Contratantes, através de protocolos adicionais ou de atos unilaterais, adotarão
todas as medidas necessárias ao cumprimento do presente Tratado, especialmente as que
digam respeito a aspectos:
a) diplomáticos e consulares;
b) administrativos e financeiros;
c) de trabalho e previdência social;
d) fiscais e aduaneiros;
e) de trânsito através da fronteira internacional;
f) urbanos e habitacionais;
g) de polícia e de segurança;
h) de controle do acesso às áreas que se delimitem em conformidade com o Art. XVII.
Artigo XIX
O foro da ITAIPU, relativamente às pessoas físicas ou jurídicas domiciliadas ou com sede no
Brasil ou no Paraguai, será, respectivamente, o de Brasília e o de Assunção. Para tanto, cada
Alta Parte Contratante aplicará sua própria legislação, tendo em conta as disposições do
presente Tratado e de seus Anexos.
Parágrafo Único - Em se tratando de pessoas físicas ou jurídicas, domiciliadas ou com sede
fora do Brasil ou do Paraguai, a ITAIPU acordará as cláusulas que regerão as relações
contratuais de obras e fornecimentos.
Artigo XX
As Altas Partes Contratantes adotarão, por meio de um protocolo adicional, a ser firmado
dentro de noventa dias contados a partir da data da troca dos instrumentos de ratificação do
presente Tratado, as normas jurídicas aplicáveis às relações de trabalho e previdência social
dos trabalhadores contratados pela ITAIPU.
Artigo XXI
79
A responsabilidade civil e/ou penal dos Conselheiros, Diretores, Diretores Adjuntos e demais
empregados brasileiros ou paraguaios da ITAIPU, por atos lesivos aos interesses desta, será
apurada e julgada de conformidade com o disposto nas leis nacionais respectivas.
Parágrafo Único - Para os empregados de terceira nacionalidade proceder-se-á de
conformidade com a legislação nacional brasileira ou paraguaia, segundo tenham a sede de
suas funções no Brasil ou no Paraguai.
Artigo XXII
Em caso de divergência quanto à interpretação ou a aplicação do presente Tratado e seus
Anexos, as Altas Partes Contratantes a resolverão pelos meios diplomáticos usuais, o que não
retardará ou interromperá a construção e/ou a operação do aproveitamento hidrelétrico e de
suas obras e instalações auxiliares.
Artigo XXIII
A Comissão Mista Técnica Brasileiro-Paraguaia, criada em 12 de fevereiro de 1967 com a
finalidade de realizar os estudos aludidos no preâmbulo do presente Tratado, manter-se- á
constituída até entregar às Altas Partes Contratantes o relatório final da missão que lhe foi
confiada.
Artigo XXIV
O presente Tratado será ratificado e os respectivos instrumentos serão trocados, o mais
brevemente possível, na cidade de Assunção.
Artigo XXV
O presente Tratado entrará em vigor na data da troca dos Instrumentos de Ratificação e terá
vigência até que as Altas Partes Contratantes, mediante novo acordo, adotem decisão que
estimem conveniente. Em Fé do Que os Plenipotenciários acima mencionados assinam o
presente Tratado, em dois exemplares, em português e espanhol, ambos os textos igualmente
autênticos. Feito na cidade de Brasília, aos vinte e seis dias do mês de abril do ano de mil
novecentos e setenta e três.
Mario Gibson Barboza Raúl Sapena Pastor
ATOS QUE APROVARAM E PROMULGARAM O TRATADO
1) Decreto Legislativo nº 23, de 30.5.1973 – Aprova o texto do Tratado de 26.4.1973
celebrado entre a República Federativa do Brasil e a República do Paraguai, bem como as
Notas então trocadas entre os Ministros das Relações Exteriores dos dois países. (Publicado
no “Diário do Congresso Nacional” de 1º.6.1973, pág. 1.659.)
2) Decreto nº 72.707, de 28.8.1973 – Promulga o Tratado de 26.4.1973, celebrado entre a
República Federativa do Brasil e a República do Paraguai, bem como as seis Notas trocadas
entre os Ministros das Relações Exteriores dos dois países. (Publicado no “Diário Oficial” de
30.8.1973, págs. 8.642-45.)
80
3) Lei nº 389, de 11.7.1973 (Paraguai) – Aprova e ratifica o Tratado entre a República do
Paraguai e a República Federativa do Brasil e as Notas trocadas entre os Ministros das
Relações Exteriores dos dois países.
Anexo "A" do Tratado de ITAIPU
(ESTATUTO)
CAPÍTULO I DENOMINAÇÃO E OBJETO
ARTIGO 1º - A ITAIPU é uma entidade binacional criada pelo Artigo III do Tratado
assinado pelo Brasil e Paraguai, em 26 de abril de 1973, e tem como partes:
a) a Centrais Elétricas Brasileiras S.A. - ELETROBRÁS, sociedade anônima de economia
mista brasileira;
b) a Administración Nacional de Eletricidad - ANDE, entidade autárquica paraguaia.
ARTIGO 2º - O objeto da ITAIPU é o aproveitamento hidrelétrico dos recursos hídricos do
Rio Paraná, pertencentes em condomínio aos dois países, desde e inclusive o Salto Grande de
Sete Quedas ou Salto de Guaíra até a foz do Rio Iguaçu.
ARTIGO 3º - A ITAIPU reger-se-á pelas normas estabelecidas no Tratado de 26 de abril de
1973, no presente Estatuto e nos demais Anexos.
ARTIGO 4º - A ITAIPU terá, de acordo com o que dispõem o Tratado e seus Anexos,
capacidade jurídica, financeira e administrativa, e também responsabilidade técnica, para
estudar, projetar, dirigir e executar as obras que tem como objeto, colocá-las em
funcionamento e explorá-las, podendo, para tais efeitos, adquirir direitos e contrair
obrigações.
ARTIGO 5º - A ITAIPU terá sedes em Brasília, Capital da República Federativa do Brasil, e
em Assunção, Capital da República do Paraguai.
CAPÍTULO II CAPITAL
ARTIGO 6º - O capital da ITAIPU será equivalente a US$ 100.000.000,00 (cem milhões de
dólares dos Estados Unidos da América), pertencente à ELETROBRÁS e à ANDE em partes
iguais e intransferíveis.
Parágrafo Único - O capital manter-se-á com valor constante de acordo com disposto no
parágrafo 4º do Artigo 15 do Tratado.
CAPÍTULO III ADMINISTRAÇÃO
81
ARTIGO 7º - São órgãos da administração da ITAIPU o Conselho de Administração e a
Diretoria Executiva. 2 de 6
ARTIGO 8º - O Conselho de Administração compor-se-á de doze Conselheiros nomeados:
a) seis pelo Governo brasileiro, dos quais um será indicado pelo Ministério das Relações
Exteriores e dois pela ELETROBRÁS;
b) seis pelo Governo paraguaio, dos quais um será indicado pelo Ministério de Relações
Exteriores e dois pela ANDE.
Parágrafo 1º - O Diretor-Geral Brasileiro e o Diretor-Geral Paraguaio, previstos no Artigo
12º, também integrarão o Conselho, com voz e sem voto.
Parágrafo 2º - As reuniões do Conselho serão presididas, alternadamente, por um Conselheiro
de nacionalidade brasileira ou paraguaia e, rotativamente, por todos os membros do Conselho.
Parágrafo 3º - O Conselho nomeará dois Secretários, um brasileiro e outro paraguaio, que
terão a seu cargo, entre outras atribuições, a de certificar os documentos da ITAIPU em
português e em espanhol, respectivamente.
ARTIGO 9º - Compete ao Conselho de Administração cumprir e fazer cumprir o Tratado e
seus Anexos e decidir sobre:
a) as diretrizes fundamentais de administração da ITAIPU;
b) o Regimento Interno;
c) o plano de organização dos serviços básicos;
d) os atos que importem em alienação do patrimônio da ITAIPU, com prévio parecer da
ELETROBRÁS e da ANDE;
e) as reavaliações de ativo e passivo, com prévio parecer da ELETROBRÁS e da ANDE,
tendo em conta o disposto no parágrafo 4º do Artigo 15º do Tratado;
f) as bases de prestação dos serviços de eletricidade;
g) as propostas da Diretoria Executiva referentes a obrigações e empréstimos;
h) a proposta de orçamento para cada exercício e suas revisões, apresentadas pela Diretoria
Executiva.
Parágrafo 1º - O Conselho de Administração examinará o Relatório Anual, o Balanço Geral e
a demonstração da Conta de Resultados, elaborados pela Diretoria Executiva, e os apresentará
com seu parecer à ELETROBRÁS e à ANDE, conforme o disposto no Artigo 24º deste
Estatuto.
Parágrafo 2º - O Conselho de Administração tomará conhecimento do curso dos assuntos da
ITAIPU através das exposições que serão feitas habitualmente pelo Diretor Geral Brasileiro
82
e/ou pelo Diretor Geral Paraguaio ou de outras que o Conselho solicite por intermédio deles. 3
de 6
ARTIGO 10º - O Conselho de Administração se reunirá, ordinariamente, cada dois meses e,
extraordinariamente, quando convocado, por intermédio dos Secretários, pelo Diretor Geral
Brasileiro e/ou pelo Diretor Geral Paraguaio, ou pela metade menos um dos Conselheiros.
Parágrafo Único - O Conselho de Administração só poderá decidir validamente com a
presença da maioria dos Conselheiros de cada país e com paridade de votos igual à menor
representação nacional presente.
ARTIGO 11º - Os Conselheiros exercerão suas funções por um período de quatro anos,
podendo ser reconduzidos.
Parágrafo 1º - A qualquer momento os Governos poderão substituir os Conselheiros que
houverem nomeado.
Parágrafo 2º - Ao ocorrer vacância definitiva de um cargo de Conselheiro, o respectivo
Governo nomeará substituto que exercerá o mandato pelo prazo remanescente.
ARTIGO 12º - A Diretoria Executiva, constituída por Membros nacionais de ambos os países,
em igual número e com a mesma capacidade e igual hierarquia, compor-se-á do Diretor Geral
Brasileiro, do Diretor Geral Paraguaio, dos Diretores Executivos: Técnico, Jurídico,
Administrativo, Financeiro e de Coordenação, e dos Diretores: Técnico, Jurídico,
Administrativo, Financeiro e de Coordenação, todos com voz e voto.
Parágrafo 1º - A cada Diretor Executivo, brasileiro ou paraguaio, corresponderá um Diretor da
outra nacionalidade.
Parágrafo 2º - Os membros da Diretoria Executiva serão nomeados pelos respectivos
Governos, por proposta da ELETROBRÁS ou da ANDE, conforme o caso.
Parágrafo 3º - Os membros da Diretoria Executiva exercerão suas funções por um período de
cinco anos, podendo ser reconduzidos.
Parágrafo 4º - A qualquer momento os Governos poderão substituir os Membros da Diretoria
Executiva que houverem nomeado.
Parágrafo 5º - Em caso de ausência ou impedimento temporário de um Membro da Diretoria
Executiva, a ELETROBRÁS ou a ANDE, conforme o caso, designará o substituto dentre os
demais Membros, que terá também direito ao voto do Membro substituído.
Parágrafo 6º - Ao ocorrer vacância definitiva de um cargo de Membro da Diretoria Executiva,
a ELETROBRÁS ou a ANDE, conforme o caso, indicará o substituto que, uma vez nomeado,
exercerá o mandato pelo prazo remanescente.
ARTIGO 13º - São atribuições e deveres da Diretoria Executiva:
a) dar cumprimento ao Tratado e seus Anexos e às decisões do Conselho de Administração;
83
b) cumprir e fazer cumprir o Regimento Interno; 4 de 6
c) praticar os atos de administração necessários à condução dos assuntos da Entidade;
d) propor ao Conselho de Administração as diretrizes fundamentais de administração;
e) propor ao Conselho de Administração normas de administração do pessoal;
f) elaborar e submeter ao Conselho de Administração, em cada exercício, a proposta de
orçamento para o exercício seguinte e suas eventuais revisões;
g) elaborar e submeter ao Conselho de Administração o Relatório Anual, o Balanço Geral e a
demonstração da Conta de Resultados do exercício anterior;
h) pôr em execução as normas e as bases para prestação dos serviços de eletricidade;
i) criar e instalar os escritórios técnicos e/ou administrativos que julgar necessários, onde for
conveniente;
j) aprovar o plano global de classificação de cargos, de lotação e de salários e benefícios dos
empregados.
ARTIGO 14º - A Diretoria Executiva reunir-se-á, ordinariamente, pelo menos duas vezes ao
mês e, extraordinariamente, quando convocada por um dos Diretores-Gerais.
Parágrafo 1º - As resoluções da Diretoria Executiva serão adotadas por maioria de votos.
Parágrafo 2º - A Diretoria Executiva instalar-se-á no local que julgar mais adequado ao
exercício de suas funções.
ARTIGO 15º - A ITAIPU somente poderá assumir obrigações ou constituir procuradores
mediante a assinatura conjunta dos dois Diretores-Gerais.
ARTIGO 16º - Os honorários dos Conselheiros e dos Membros da Diretoria Executiva serão
fixados pela ELETROBRÁS e pela ANDE, de comum acordo.
ARTIGO 17º - Os dois Diretores-Gerais são responsáveis, solidariamente, pela coordenação,
organização e direção das atividades da ITAIPU e a representarão em juízo ou fora dele,
competindo-lhes praticar todos os atos de administração ordinária necessários ao
funcionamento da Entidade, com exclusão dos atribuídos ao Conselho de Administração e à
Diretoria Executiva. Cabem-lhes, ademais, os atos de admissão e demissão de pessoal em
seus respectivos países.
ARTIGO 18º - O Diretor Técnico Executivo é o responsável pela condução do projeto e
construção das obras e operação das instalações.
ARTIGO 19º - O Diretor Jurídico Executivo é o responsável pela condução dos assuntos
jurídicos da Entidade.
84
ARTIGO 20º - O Diretor Administrativo Executivo é o responsável pela Administração do
pessoal e pela direção dos serviços gerais. 5 de 6
ARTIGO 21º - O Diretor Financeiro Executivo é o responsável pela execução da política
econômico-financeira, de suprimento e de compras.
ARTIGO 22º - O Diretor de Coordenação Executivo é o responsável pelos serviços
relacionados com a preservação das condições ambientais na área do reservatório, a execução
dos projetos e obras portuárias e de navegação, a execução dos projetos e obras de
infraestrutura, das vias de acesso, das vilas residenciais e outros serviços e obras que lhe
forem atribuídas pela Diretoria Executiva fora da área das instalações destinadas à produção
de energia elétrica.
ARTIGO 23º - Os Diretores terão as atribuições executivas específicas que, de comum
acordo, lhes forem delegadas pelos Diretores Executivos das respectivas áreas, com vistas à
perfeita consecução dos objetivos da Entidade Binacional. Parágrafo Único - Os Diretores
manter-se-ão informados dos assuntos das respectivas Diretorias e informarão sobre o
andamento daqueles que lhes forem confiados.
CAPÍTULO IV EXERCÍCIO FINANCEIRO
ARTIGO 24º - O exercício financeiro encerrar-se-á em 31 de dezembro de cada ano.
Parágrafo 1º - A ITAIPU apresentará, até 30 de abril de cada ano, para decisão da
ELETROBRÁS e da ANDE, o Relatório Anual, o Balanço Geral e a demonstração da Conta
de Resultados do exercício anterior.
Parágrafo 2º - A ITAIPU adotará a moeda dos Estados Unidos da América como referência
para a contabilização de suas operações. Esta referência poderá ser substituída por outra,
mediante entendimento entre os dois Governos.
CAPÍTULO V DISPOSIÇÕES GERAIS
ARTIGO 25º - Serão incorporados pela ITAIPU, como integralização de capital por parte da
ELETROBRÁS e da ANDE, os dispêndios realizados pelas referidas empresas, anteriormente
à constituição da Entidade, nos seguintes trabalhos:
a) estudos resultantes do Convênio de Cooperação firmado em 10 de abril de 1970;
b) obras preliminares e serviços relacionados com a construção do aproveitamento
hidrelétrico.
ARTIGO 26º - Os Conselheiros, Membros da Diretoria Executiva e demais empregados não
poderão exercer funções de direção, administração ou consulta em empresas fornecedoras ou
contratantes de quaisquer materiais e serviços utilizados pela ITAIPU. 6 de 6
ARTIGO 27º - Poderão prestar serviços à ITAIPU os funcionários públicos, empregados de
autarquias e os de sociedades de economia mista, brasileiros ou paraguaios, sem perda do
85
vínculo original e dos benefícios de aposentadoria e/ou previdência social, tendo-se em conta
as respectivas legislações nacionais.
ARTIGO 28º - O Regimento Interno da ITAIPU, mencionado no Artigo 9º, será proposto pela
Diretoria Executiva à aprovação do Conselho de Administração e contemplará, entre outros,
os seguintes assuntos: o regime contábil financeiro; o regime para a obtenção de propostas,
adjudicação e contratação de serviços e obras, a aquisição de bens, normas para o exercício
das funções dos integrantes do Conselho de Administração e dos Membros da Diretoria
Executiva.
ARTIGO 29º - Os casos não previstos neste Estatuto, que não puderem ser resolvidos pelo
Conselho de Administração, serão solucionados pelos dois Governos, com prévio parecer da
ELETROBRÁS e da ANDE.
Aprovado em 28 de janeiro de 1986, pela Nota DAM-I/DEM/CAI/01/PAIN LØØEØ5 do
Ministro das Relações Exteriores do Brasil, e pela Nota DM/T/N.R. N° 1 do Ministro de
Relações Exteriores do Paraguai, de idêntico teor e mesma data.
Anexo "B" do Tratado de ITAIPU
I - OBJETIVO
O objetivo do presente Anexo é descrever e identificar, em suas partes principais, o
Projeto do Aproveitamento Hidroelétrico do rio Paraná, no local chamado ITAIPU, daqui por
diante denominado Projeto.
Este Anexo foi redigido com base no "Relatório Preliminar" - submetido pela Comissão
Mista Técnica Brasileiro-Paraguaia aos Governos do Brasil e do Paraguai em 12 de janeiro de
1973.
As obras descritas no presente Anexo poderão sofrer modificações ou adições, inclusive
nas suas cotas e medidas, por exigências técnicas que se verificarem durante sua execução.
Ademais, se por exigência da mesma natureza ficar demonstrada a necessidade de redução
substancial da cota do coroamento da barragem, será considerada a conveniência da execução
adicional de outro aproveitamento hidroelétrico a montante, conforme previsto no "Relatório
Preliminar" supracitado.
86
II - DESCRIÇÃO GERAL
1. Localização - O Projeto estará situado sobre o rio Paraná, aproximadamente 14 km
a montante da ponte internacional que une Foz do Iguaçu, no Brasil, a Porto Presidente
Stroessner, no Paraguai.
2. Disposição Geral - O Projeto estará constituído por uma barragem principal de
gravidade, em concreto, através do Rio Paraná, com uma casa de força ao pé da barragem, e
em barragens laterais de enrocamento de concreto e diques de terra nas margens do rio. A
barragem lateral da margem direita inclui a estrutura do vertedor com as respectivas com-
portas.
As obras do Projeto terão a orientação geral este-oeste, ao longo de um eixo em linha
quebrada, com desenvolvimento total de 7,7 km. O nível d'água máximo normal no
reservatório foi estabelecido em torno da cota 220 m acima do nível do mar. Este reservatório
inundará uma área de aproximadamente 1.400 km2 (800 km
2 no Brasil e 600 km
2 no
Paraguai), e estender-se-á, a montante por cerca de 200 km até e inclusive o Salto Grande de
Sete Quedas ou Salto de Guaíra.
III - COMPONENTES PRINCIPAIS DO PROJETO
Começando pela margem direita, o Projeto inclui as seguintes partes componentes
principais sucessivas:
1. Dique lateral direito - Um dique de terra com coroamento na cota 225 m,
comprimento de 840 m e volume de 300.000 metros cúbicos.
87
2. Vertedor - Um vertedor em concreto, dotado de 14 comportas, com comprimento de
355 m, capaz de verter até 62.000 M³/s com canal de acesso escavado a montante do vertedor.
Uma calha revestida de concreto conduzirá a descarga do vertedor para o rio Paraná, cerca de
1.500 m a jusante da barragem principal.
3. Barragem lateral direita - Uma barragem de concreto aliviado com coroamento na
cota de 225 m, comprimento de 997 m e volume de 704.000 metros cúbicos, ligando o
vertedor à barragem principal.
4. Barragem principal e tomada d'água - A barragem principal será uma estrutura de
gravidade, em concreto aliviado, com coroamento na cota 225 m, comprimento de 884 m e
volume de 5.200.000 metros cúbicos, a ser construída através do rio Paraná e do canal, na
margem esquerda, que será escavado para o desvio provisório do rio. A barragem terá 20
aberturas para tomada d'água, providas de comportas. Cada uma dessas tomadas d'água dará
acesso a uma turbina, na casa de força, por meio de um conduto forçado.
5. Casa de força - A casa de força estará localizada ao pé da barragem principal, com
comprimento de 950 m. Na mesma será instalado um conjunto gerador composto de 18
unidades de 700 megawatts cada uma. Nove destas unidades serão em 50 Hz e nove em 60
Hz. Além disso, a Central poderá contar, utilizando o espaço disponível na casa de força, com
até duas unidades geradoras de reserva, que serão uma de 50 Hz e a outra de 60 Hz. Todas as
unidades de 50 Hz serão instaladas na metade oeste da casa de força e as de 60 Hz na metade
leste. A plataforma superior da casa de força estará na cota 144 m acima do nível do mar.
6. Barragem na margem esquerda - Uma barragem de gravidade em concreto aliviado,
com comprimento de 350 m e volume de 778.000 metros cúbicos.
7. Barragem lateral esquerda - Uma barragem em enrocamento com coroamento na cota
225 m, comprimento de 1.984 m e volume de 11.400.000 metros cúbicos.
8. Dique lateral esquerdo - Um dique de terra com coroamento na cota 225 m,
comprimento de 2.000 m e volume de 2.900.000 metros cúbicos.
9. Dique complementar de Hernandarias - Um dique menor, de terra, a ser localizado na
margem direita, a uma distância de cerca de 4,5 km a oeste da barragem principal, nas
88
proximidades da cidade de Hernandarias. Esse dique se destinará a fechar uma depressão
onde poderia ocorrer extravasamento com o reservatório ao nível máximo de enchente.
10. Subestações seccionadoras - Duas subestações seccionadoras, a serem localizadas
uma em cada margem, a cerca de 600 m a jusante da casa de força.
11. Obras para navegação - O Projeto incluirá as obras que forem necessárias para
atender aos requisitos do tráfego de navegação fluvial, tais como: terminais e conexões
terrestres, eclusas, canais, elevadores, e seus similares.
Redação consolidada em decorrência das modificações introduzidas com a troca de notas de 22.04.75, 30.10.78 e
12.03.79 do Ministro das Relações Exteriores do Brasil e do Ministro de Relações Exteriores do Paraguai, de
idêntico teor e mesma data.
ANEXO “C” AO TRATADO DE ITAIPU
(Brasília, 26.04.1973)
Bases Financeiras e de Prestação dos Serviços de Eletricidade da ITAIPU.
I - Definições
Para os efeitos do presente Anexo entender-se-á por:
I.1 – Entidades: a ELETROBRÁS, a ANDE ou as empresas ou entidades brasileiras ou
paraguaias por elas indicadas, conforme o Artigo XIV do Tratado assinado pelo Brasil e
Paraguai em 26 de abril de 1973.
I.2 – Potência instalada: a soma das potências nominais de placa, expressas em quilowatts,
dos alternadores instalados na central elétrica.
I.3 – Potência contratada: a potência em quilowatts que a ITAIPU colocará,
permanentemente, à disposição da entidade compradora, nos períodos de tempo e nas
condições dos respectivos contratos de compra e venda dos serviços de eletricidade.
I.4 – Encargos financeiros: todos os juros, taxas e comissões pertinentes aos empréstimos
contratados.
89
I.5 – Despesas de exploração: todos os gastos imputáveis à prestação dos serviços de
eletricidade, incluídos os gastos diretos de operação e de manutenção, inclusive as reposições
causadas pelo desgaste normal, gastos de administração e gerais, além dos seguros contra os
riscos dos bens e instalações da ITAIPU.
I.6 – Período de operação e faturamento: o mês calendário.
I.7 – Conta de exploração: o balanço anual entre a receita e o custo do serviço.
II - Condições de Suprimento
II.1 – A divisão em partes iguais da energia estabelecida no Artigo XIII do Tratado, será
efetuada por via de divisão da potência instalada na central elétrica.
II.2 – Cada entidade, no exercício do seu direito à utilização da potência instalada, contratará
com a ITAIPU, por períodos de vinte anos, frações da potência instalada na central elétrica,
em função de um cronograma de utilização que abrangerá este período e indicará, para cada
ano, a potência a ser utilizada.
II.3 – Cada uma das entidades entregará à ITAIPU o cronograma acima referido, dois anos
antes da data prevista para a entrada em operação comercial da primeira unidade geradora da
central elétrica e dois anos antes do término do primeiro e dos subseqüentes contratos de vinte
anos.
II.4 – Cada entidade, tem o direito de utilizar a energia que puder ser produzida pela potência
por ela contratada até o limite que será fixado, para cada período de operação, pela ITAIPU.
Fica entendido que cada entidade poderá utilizar dita potência por ela contratada, durante o
tempo que lhe convier, dentro de cada período de operação, desde que a energia por ela
utilizada, em todo esse período, não exceda o limite acima mencionado.
II.5 – Quando uma entidade decide não utilizar parte da potência contratada ou parte da
energia a esta correspondente, dentro do limite fixado, poderá autorizar a ITAIPU a ceder às
outras entidades a parte que assim se tornar disponível, tanto de potência como de energia, no
período referido em II.4, nas condições estabelecidas em IV.3.
II.6 – A energia produzida pela ITAIPU será entregue às entidades no sistema de barramentos
da central elétrica, nas condições estabelecidas nos contratos de compra e venda.
III - Custo do Serviço de Eletricidade
O custo do serviço de eletricidade será composto das seguintes parcelas anuais:
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III.1 – O montante necessário para o pagamento, às partes que constituem a ITAIPU, de
rendimentos de doze por cento ao ano sobre sua participação no capital integralizado, de
acordo com o Parágrafo 1º do artigo III do Tratado e com o Artigo VI do Estatuto (Anexo A).
III.2 – O montante necessário para o pagamento dos encargos financeiros dos empréstimos
recebidos.
III.3 – O montante necessário para o pagamento da amortização dos empréstimos recebidos.
III.4 – O montante necessário para o pagamento dos "royalties" às Altas Partes Contratantes,
calculado no equivalente de seiscentos e cinqüenta dólares dos Estados Unidos da América
por gigawatt-hora, gerado e medido na central elétrica. Esse montante não poderá ser inferior,
anualmente, a dezoito milhões de dólares dos Estados Unidos da América, à razão da metade
para cada Alta Parte Contratante. O pagamento dos "royalties" se realizará mensalmente, na
moeda disponível pela ITAIPU.
III.5 – O montante necessário para o pagamento à ELETROBRÁS e à ANDE, em partes
iguais, a título de ressarcimento de encargos de administração e supervisão relacionados com
a ITAIPU, calculados no equivalente de cinqüenta dólares dos Estados Unidos da América
por gigawatt-hora gerado e medido na central elétrica.
III.6 – O montante necessário para cobrir as despesas de exploração.
III.7 – O montante do saldo, positivo ou negativo, da conta de exploração do exercício
anterior.
III.8 – O montante necessário à remuneração a uma das Altas Partes Contratantes, equivalente
a trezentos dólares dos Estados Unidos da América, por gigawatt-hora cedido à outra Alta
Parte Contratante. Esta remuneração se realizará mensalmente na moeda disponível pela
ITAIPU.
IV - Receita
IV.1 – A receita anual, decorrente dos contratos de prestação dos serviços de eletricidade,
deverá ser igual, em cada ano, ao custo do serviço estabelecido neste Anexo.
IV.2 – Este custo será distribuído proporcionalmente às potências contratadas pelas entidades
supridas.
IV.3 – Quando se verificar a hipótese prevista em II.5 anterior, o faturamento às entidades
contratantes será feito em função da potência efetivamente utilizada.
91
IV.4 – Quando não se verificar a hipótese prevista em II.5, e tendo-se em vista o disposto no
Artigo XIII do Tratado e em IV.2 acima, a responsabilidade da entidade que contratou a
compra será a da totalidade da potência contratada.
V - Outras Disposições
V.1 – O Conselho de Administração, com prévio parecer da ELETROBRÁS e da ANDE,
regulamentará as normas do presente Anexo, tendo como objetivo a maior eficiência da
ITAIPU.
V.2 – O valor dos rendimentos sobre o capital, dos "royalties" do ressarcimento dos encargos
e da remuneração mencionados, respectivamente, em III.1, III.4, III.5 e III.8, anteriores, será
mantido constante de acordo com o estabelecido no § 4.o do Artigo XV do Tratado.
VI - Revisão
As disposições do presente Anexo serão revistas, após o decurso de um prazo de cinqüenta
anos a partir da entrada em vigor do Tratado, tendo em conta, entre outros aspectos, o grau de
amortização das dívidas contraídas pela ITAIPU para a construção do aproveitamento e a
relação entre as potências contratadas pelas entidades de ambos países.
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Anexo B
Ata de Iguaçu
ATA DE IGUAÇU DE 22.06.1966
BRASIL – PARAGUAI
ATA FINAL
Aos vinte e dois de junho de 1966, o Ministro de Estado das Relações Exteriores dos Estados
Unidos do Brasil, Embaixador Juracy Magalhães e o Ministro das Relações Exteriores do
Paraguai, Doutor Raúl Sapena Pastor assinaram uma Ata Final e trocaram Memorandos.
ATA FINAL
Aos vinte e um e vinte e dois dias do mês de junho de mil novecentos e sessenta e seis,
reuniram-se nas cidades de Foz do Iguaçu e de Porto Presidente Stroessner, o Ministro das
Relações Exteriores dos Estados Unidos do Brasil, Embaixador Juracy Magalhães, e o
Ministro das Relações Exteriores da República do Paraguai, Doutor Raúl Sapena Pastor, com
o objetivo de passar em revista os vários aspectos das relações entre os dois países, inclusive
aqueles pontos em torno dos quais têm surgido ultimamente divergências entre as duas
Chancelarias.
Após terem mantido várias entrevistas de caráter pessoal e outras com a presença de suas
comitivas, os Ministros das Relações Exteriores dos Estados Unidos do Brasil e da República
do Paraguai chegaram às seguintes conclusões, que fazem constar da presente Ata:
I — MANIFESTARAM-SE acordes os dois Chanceleres em reafirmar a tradicional amizade
entre os dois Povos irmãos, amizade fundada no respeito mútuo e que constitui a base
indestrutível das relações entre os dois países;
II — EXPRIMIRAM o vivo desejo de superar, dentro de um mesmo espirito de boa-vontade
e de concórdia, quaisquer dificuldades ou problemas, achando-lhes solução compatível com
os interesses de ambas as Nações;
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III — PROCLAMARAM a disposição de seus respectivos governos de proceder, de comum
acordo, ao estudo e levantamento das possibilidades econômicas, em particular os recursos
hidráulicos pertencentes em condomínio aos dois países, do Salto Grande de Sete Quedas ou
Salto de Guaira;
IV — CONCORDARAM em estabelecer, desde já, que a energia elétrica eventualmente
produzida pelos desníveis do rio Paraná, desde e inclusive o Salto Grande de Sete Quedas ou
Salto do Guaira até a foz do rio Iguaçu, será dividida em partes iguais entre os dois países,
sendo reconhecido a cada um deles o direito de preferência para a aquisição desta mesma
energia a justo preço, que será oportunamente fixado por especialistas dos dois países, de
qualquer quantidade que não venha a ser utilizada para o suprimento das necessidades do
consumo do
outro pais;
V — CONVIERAM, ainda, os Chanceleres em participar da reunião dos Ministros das
Relações Exteriores dos Estados ribeirinhos da Bacia do Prata, a realizar-se em Buenos Aires
a convite do Governo argentino, a fim de estudar os problemas comuns da área, com vistas a
promover o pleno aproveitamento dos recursos naturais da região e o seu desenvolvimento
econômico, em beneficio da prosperidade e bem-estar das populações; bem como a rever e
resolver os problemas jurídicos relativos à navegação, balizamento, dragagem, pilotagem e
praticagem dos rios pertencentes ao sistema hidrográfico do Prata, a exploração do potencial
energético dos mesmos, e à canalização, represamento ou captação de suas águas, quer para
fins de irrigação, quer para os de regularização das respectivas descargas, de proteção das
margens ou facilitação do tráfego fluvial;
VI — CONCORDARAM em que as Marinhas respectivas dos dois países procederão, sem
demora à destruição ou remoção dos cascos soçobrados que oferecem atualmente riscos à
navegação internacional em águas do Rio Paraguai;
VII — EM RELAÇÃO aos trabalhos da Comissão Mista de Limites e Caracterização da
Fronteira Brasil-Paraguai, convieram os dois Chanceleres em que tais trabalhos prosseguirão
na data que ambos os Governos estimarem conveniente;
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VIII — CONGRATULARAM-SE enfim, os dois Chanceleres, pelo espirito construtivo que
prevaleceu durante as conversações e formularam votos pela sempre crescente e fraternal
união entre o Brasil e o Paraguai, comprometendo-se ainda a não poupar esforços para
estreitar cada vez mais os laços de amizade que unem os dois países.
A presente Ata, feita em duas cópias nos idiomas português e espanhol, depois de lida e
aprovada, foi firmada em Foz do Iguaçu, pelos Ministros das Relações Exteriores dos Estados
Unidos do Brasil e da República do Paraguai, em vinte e dois de junho de mil novecentos e
sessenta e seis.
Juracy Magalhães, Ministro de Estado das Relações Exteriores dos Estados Unidos do Brasil,
— Raúl Sapena Pastor, Ministro das Relações Exteriores da República do Paraguai.
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Anexo C
Tratado da Bacia do Prata
El Tratado de la Cuenca del Plata.
Suscripto por los Gobiernos de los cinco países integrantes de la Cuenca del Plata, en Brasilia
el 23 de abril de 1969. Su objetivo es afianzar la institucionalización del sistema de dicha
Cuenca y mancomunar esfuerzos para promover el desarrollo armónico y la integración física
de la misma y sus áreas de influencia directa y ponderable.
Los Gobiernos de las Repúblicas de Argentina, Bolivia, Brasil, Paraguay y Uruguay,
representados en la I Reunión Extraordinaria de Cancilleres de los Países de la Cuenca del
Plata, realizada en Brasilia, el 22 y 23 de abril de 1969;
CONVENCIDOS de la necesidad de aunar esfuerzos para el debido logro de los propósitos
fundamentales señalados en la Declaración Conjunta de Buenos Aires de 27 febrero de 1967
en el Acta de Santa Cruz de la Sierra del 20 de mayo de 1968 y animados de un firme espíritu
de cooperación y solidaridad;
PERSUADIDOS de que la acción mancomunada permitirá el desarrollo armónico y
equilibrado así como el óptimo aprovechamiento de los grandes recursos naturales de la
región y asegurará su preservación para generaciones futuras a través de la utilización racional
de esos recursos;
CONSIDERANDO asimismo que los Cancilleres han aprobado un Estatuto para el Comité
Intergubernamental Coordinador de los Países de la Cuenca del Plata;
DECIDIERON suscribir el presente Tratado para afianzar la institucionalización del Sistema
de la Cuenca del Plata y, a ese fin, designaron sus Plenipotenciarios, que convinieron lo
siguiente:
Artículo I. - Las Partes Contratantes convienen en mancomunar esfuerzos con el objeto de
promover el desarrollo armónico y la integración física de la Cuenca del Plata y de sus áreas
de influencia directa y ponderable.
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Parágrafo Unico: A tal fin, promoverán en el ámbito de la Cuenca, la identificación de áreas
de interés común y la realización de estudios, programas y obras, así como la formulación de
entendimientos operativos e instrumentos jurídicos que estimen necesarios y que propendan a:
a) La facilitación y asistencia en materia de navegación.
b)
La utilización racional del recurso agua, especialmente a través de la regulación
de los cursos de agua y su aprovechamiento múltiple y equitativo.
c) La preservación y el fomento de la vida animal y vegetal.
d)
El perfeccionamiento de las interconexiones viales, ferroviarias, fluviales,
aéreas, eléctricas, y de telecomunicaciones.
e)
La complementación regional mediante la promoción y radicación de industrias
de interés para el desarrollo de la Cuenca.
f) La complementación económica del área limítrofe.
g)
La Cooperación mutua en materia de educación, sanidad y lucha contra las
enfermedades.
h)
La Promoción de otros proyectos de interés común y en especial aquellos que
tengan relación con el inventario, evaluación y el aprovechamiento de los
recursos naturales del área.
i) El conocimiento integral de la Cuenca del Plata.
Artículo II. - Los Ministros de Relaciones Exteriores de los Países de la Cuenca del Plata se
reunirán una vez por año, en fecha que será sugerida por el Comité Intergubernamental
Coordinador, a fin de trazar directivas básicas de política común para el logro de los
propósitos establecidos en este Tratado; apreciar y evaluar los resultados obtenidos; celebrar
consultas sobre la acción de sus respectivos Gobiernos en el ámbito del desarrollo
multinacional integrado de la Cuenca, dirigir la acción del Comité Intergubernamental
Coordinador y, en general, adoptar las providencias necesarias para el cumplimiento del
presente Tratado a través de las realizaciones concretas que él demande.
Parágrafo 1°: Los Ministros de Relaciones Exteriores podrán reunirse en sesión
extraordinaria, previa convocatoria efectuada por el Comité Intergubernamental
Coordinador a solicitud de por lo menos tres de las Partes Contratantes.
Parágrafo 2°: Si excepcionalmente el Ministro de Relaciones Exteriores de una
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de las Partes Contratantes no pudiera concurrir a una reunión ordinaria o
extraordinaria, se hará representar por un Delegado Especial.
Parágrafo 3°: Las decisiones tomadas en reuniones efectuadas de conformidad
con este articulo requerirán siempre el, voto unánime de los cinco países.
Artículo III. - Para los efectos del presente Tratado, el Comité Intergubernamental
Coordinador es reconocido como el órgano permanente de la Cuenca, encargado de
promover, coordinar y seguir la marcha de las acciones multinacionales que tengan por objeto
el desarrollo integrado de la Cuenca del Plata, y de la asistencia técnica y financiera que
organice con el apoyo de los organismos internacionales que estime conveniente, y ejecutar
las decisiones que adopten los Ministros de Relaciones Exteriores.
Parágrafo 1°: El Comité Intergubernamental Coordinador se regirá per el
estatuto aprobado en la Segunda Reunión de Cancilleres de los Países de la
Cuenca del Plata, celebrada en Santa Cruz de la Sierra, Bolivia, del 18 al 20 de
mayo de 1968.
Parágrafo 2°: En reunión extraordinaria, a tal fin especialmente convocada, los
Ministros de Relaciones Exteriores podrán, siempre con el voto unánime de los
cinco países, reformar el Estatuto del Comité Intergubernamental Coordinador .
Artículo IV. - Sin perjuicio de las disposiciones internas de cada país, serán órganos de
cooperación y asesoramiento de los Gobiernos, las Comisiones o Secretarias nacionales
constituidas de acuerdo con la Declaración Conjunta de Buenos Aires. Tales comisiones o
Secretarias podrán establecer contactos bilaterales, obedeciendo siempre a los criterios o
normas de los países interesados, manteniendo debidamente informado, cuando sea el caso, al
Comité Intergubernamental Coordinador.
Articulo V. - La Acción colectiva de los Países Contratantes deberá desarrollarse sin perjuicio
de aquellos proyectos y empresas que decidan ejecutar en sus respectivos territorios, dentro
del respeto al derecho internacional y según la buena práctica entre naciones vecinas y
amigas.
Articulo VI. - Lo establecido en el presente Tratado no inhibirá a las Partes Contratantes para
concluir acuerdos específicos o parciales, bilaterales o multilaterales, encaminados al logro de
los objetivos generales de desarrollo de la Cuenca.
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Articulo VII. - El presente Tratado se denominará Tratado de la Cuenca del Plata y tendrá
duración ilimitada.
Articulo VIII. - El presente Tratado será ratificado por las Partes Contratantes y los
Instrumentos de Ratificación serán depositados ante el Gobierno de la República Federativa
del Brasil.
Parágrafo 1°: El presente Tratado entrará en vigor treinta días después de
depositados los Instrumentos de Ratificación de todas la Partes Contratantes.
Parágrafo 2°: Mientras las Partes Contratantes procedan a la ratificación del
presente Tratado y al deposito de los Instrumentos de Ratificación, en la acción
multinacional emprendida para el el desarrollo de la Cuenca del Plata, se
sujetarán a lo acordado en la Declaración Conjunta de Buenos Aires y en el Acta
de Santa Cruz de la Sierra.
Parágrafo 3°: La intención de denunciar el presente Tratado será comunicada
por una Parte Contratante de las demás Partes Contratantes por lo menos
noventa días antes de la entrega formal del Instrumento de Denuncia al
Gobierno de la República Federativa del Brasil. Formalizada la denuncia, los
efectos del Tratado cesarán para la parte contratante denunciante, en el plazo de
un año.
EN FE DE LO CUAL, los infrascritos Plenipotenciarios, después de haber depositados sus
plenos poderes, que se han encontrado en buena y debida forma, firman el presente Tratado.
HECHO en la ciudad de Brasilia, a los veinte y tres días del mes de abril del año de mil
novecientos sesenta y nueve, en un solo ejemplar, en los idiomas español y portugués, que
quedara depositado en los archivos del Ministerio Relaciones Exteriores del Brasil, el cual
expedirá copias autenticadas a los países signatarios.
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Anexo D
Estatuto do Comite Intergovernamental Coordenador dos Países da Bacia do Prata
Proyecto de RESOLUCION Nº 1 (VI-E)
La VI Reunión Extraordinaria de Cancilleres de los Países de la Cuenca del Plata.
VISTO:
El Parágrafo 2º, Capítulo III del Tratado de la Cuenca del Plata, la Resolución Nº 2 (IV-E) de
1995 de la IV Extraordinaria de Cancilleres; el documento denominado “Reestructuración del
CIC” elaborado por la Comisión de Delegados y aprobado mediante decisión CIC 20/96
(516); el Acta de la reunión de Alto Nivel celebrada en Buenos Aires el 10 de noviembre de
1998; la Declaración Conjunta de Cancilleres de la Cuenca del Plata de 1998 y el punto 1 del
Acta de la Sesión Extraordinaria del CIC del 5-12-01.
CONSIDERANDO:
Que es necesario adecuar los órganos que conforman el Sistema del Tratado de la Cuenca del
Plata a la nueva realidad que presenta el proceso de integración subregional:
RESUELVE:
1. Aprobar el Estatuto del Comité Intergubernamental Coordinador de los Países de la Cuenca
del Plata que consta en anexo a la presente Resolución y forma parte de la misma.
2. Derogar el Estatuto del Comité Intergubernamental Coordinador de los Países de la Cuenca
del Plata aprobado por Resolución Nº 1 (III-E) de 1992.
3. Encomendar al CIC que, dentro de los seis meses presente un informe sobre los objetivos y
el Programa de Acción que permita reformular el Sistema Operativo del Organismo.
ESTATUTO DEL COMITE INTERGUBERNAMENTAL COORDINADOR
DE LOS PAÍSES DE LA CUENCA DEL PLATA (CIC)
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Capitulo I- DE LAS FINALIDADES
• Articulo 1.- El Comité Intergubernamental Coordinador de los Países de la Cuenca del Plata
(en adelante CIC) es el órgano permanente que promueve, coordina y sigue la marcha de las
acciones multinacionales encaminadas al mejor aprovechamiento de los recursos de la Cuenca
del Plata y al desarrollo armónico y equilibrado de la región, para el logro de los objetivos
fijados por el Tratado de la Cuenca del Plata y la ejecución de las Resoluciones de la Reunión
de Cancilleres.
• Parágrafo 1: La ejecución de proyectos específicos y entendimientos operativos podrá estar
a cargo de otros órganos del Sistema del Tratado de la Cuenca del Plata, (en adelante referido
como Sistema de la Cuenca del Plata), manteniéndose entre ellos la debida coordinación.
• Parágrafo 2: Por Sistema de la Cuenca del Plata se entiende el conjunto de los órganos
creados para el cumplimiento de los objetivos del Tratado de la Cuenca del Plata de 1969.
Capitulo II- DE LA COMPOSICION
• Articulo 2. - El CIC está integrado por Representantes de la República Argentina, la
República de Bolivia, la República Federativa del Brasil, la República del Paraguay y la
República Oriental del Uruguay.
• Parágrafo 1: Cada Estado miembro tendrá dos Representantes Titulares y los alternos que
cada país considere necesarios. Uno de los Titulares será el Representante de carácter político
investido de las plenipotencias necesarias por su respectivo Gobierno. El otro Representante
será un especialista en proyectos conforme los objetivos del Sistema de la Cuenca del Plata.
Los alternos tendrán el mismo perfil de los titulares.
• Parágrafo 2: Los Estados miembros designarán por lo menos un Representante Titular y uno
alterno que resida en el país sede para el seguimiento permanente de las actividades de la
Secretaría General.
• Parágrafo 3: Los especialistas a los que se refiere el parágrafo 1 conformarán la Unidad de
Proyectos del Sistema y actuarán como Jefes de las respectivas Delegaciones de las
Contrapartes Técnicas.
101
• Parágrafo 4: Las ContrapartesTécnicas constituyen las instancias de negociación técnica y
deberán adecuarse a los objetivos propuestos. Su gestión dependerá del Comité de la Cuenca
del Plata a través de la Unidad de Proyectos.
Capitulo III- DE LAS ATRIBUCIONES
• Articulo 3. - El CIC, para el cumplimiento de sus fines, tiene las siguientes atribuciones:
3.1. Coordinar el funcionamiento del Sistema de la Cuenca del Plata, efectuando el
seguimiento de las acciones encomendadas por los Cancilleres a los órganos del Sistema,
manteniendo la vinculación permanente entre ellos.
3.2. Considerar, aprobar e implementar proyectos, planes de estudio e investigación referidos
al Parágrafo Único del Artículo I del Tratado de la Cuenca del Plata y especialmente los
relacionados con el Programa de Acciones Concretas, determinando sus prioridades.
3.3. Actualizar y reformular el Programa de Acciones Concretas.
3.4. Convocar, con mandato específico, a reuniones de Contrapartes Técnicas o Grupos de
Trabajo; preparar su agenda; considerar los informes y recomendaciones que surjan de estas
reuniones, y adoptar las medidas necesarias para su avance, cumplimiento o ejecución.
3.5. Gestionar, negociar, aceptar y suscribir con anuencia previa de las autoridades nacionales
pertinentes de cada país, los acuerdos de cooperación técnica para la realización de proyectos,
estudios e investigaciones de acuerdo a las finalidades señaladas en el presente Estatuto,
cuando sean financiados con fondos no reembolsables, así como transmitir a los Gobiernos
los ofrecimientos que los organismos nacionales e internacionales formulen de conformidad a
sus programas.
3.6. Solicitar la participación de Representantes del FONPLATA en las reuniones de
Contrapartes Técnicas y en todas aquellas en que se generen propuestas de acciones
concretas, y coordinar con dicho organismo las bases de asistencia financiera para su
ejecución, como así también su actuación como agente financiero del Sistema.
3.7. Solicitar la realización de estudios de carácter técnico o institucional a organismos
nacionales o internacionales competentes.
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3.8. Promover y organizar cursos, seminarios o conferencias de empresarios, especialistas o
profesionales cuya actividad sea de relevancia para la integración regional.
3.9. Promover la publicación y distribución de textos que considere relevantes para la
divulgación de los temas vinculados con el desarrollo de la Cuenca del Plata.
3.10. Convocar las Reuniones de Cancilleres de los Países de la Cuenca del Plata y preparar,
en coordinación con otros órganos del Sistema, su agenda provisoria.
3.11. Dictar su Reglamento Interno, el de la Secretaría General, el Reglamento de Personal y
toda otra normativa que sea necesaria para el funcionamiento del CIC, y modificarlos cuando
lo considere necesario.
Capitulo IV- DE LA PRESIDENCIA
• Artículo 4.- Los Representantes de los Estados miembros ejercerán la Presidencia del CIC,
en forma rotativa, por el periodo de un año, según el orden alfabético del nombre de los
Estados miembros.
Capitulo V- DE LA SEDE
• Artículo 5.- El CIC tiene su sede en la ciudad de Buenos Aires, República Argentina, según
las condiciones establecidas en el Acuerdo de Sede, suscripto entre el Gobierno de la
República Argentina y el Comité Intergubernamental Coordinador de los Países de la Cuenca
del Plata el 22 de marzo de 1973.
Capitulo VI- DE LA SECRETARIA GENERAL
• Artículo 6.- La Secretaría General funciona en forma permanente en la sede del CIC.
• Parágrafo Único: Además de las funciones que se establecen en el presente Estatuto, la
Secretaría General actuará como secretaría de las Reuniones de Cancilleres.
• Artículo 7.- El cargo de Secretario General deberá ser desempeñado por nacionales de
reconocida idoneidad de los Estados miembros del CIC, quienes serán elegidos por rotación
alfabética.
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• Parágrafo 1: El secretario General será designado a propuesta del Estado miembro que
correspondiera, por voto unánime del CIC y durará en sus funciones dos años, pudiendo ser
reelegido de la misma forma, y por única vez.
• Parágrafo 2: El Secretario General podrá ser relevado de sus funciones, por razones
fundadas, por el voto de por lo menos cuatro Representantes.
• Artículo 8.- El personal de la Secretaría General será nombrado por el CIC, a propuesta del
Secretario General. La Secretaría General podrá estar integrada por personal técnico y/o
administrativo de los Estados miembros, los cuales asumirán las obligaciones financieras que
demanden su designación. Dicho personal tendrá durante el ejercicio de su cargo el carácter
de funcionario internacional.
• Parágrafo 1: Al formular tales propuestas, el Secretario General, en lo posible, tomará en
cuenta una distribución equitativa entre nacionales de los Estados miembros.
• Parágrafo 2: El Secretario General podrá, con autorización del CIC, contratar técnicos para
la ejecución de tareas específicas.
• Artículo 9.- En el cumplimiento de sus funciones, el Secretario General y el personal de la
Secretaría General no solicitarán ni recibirán instrucciones de ningún Gobierno, ni de ninguna
autoridad ajena al CIC, y se abstendrán de actuar en forma incompatible con su condición de
responsable únicamente ante el CIC.
• Artículo 10.- El CIC y sus funcionarios gozarán en el país sede de las exenciones e
inmunidades establecidas en el Acuerdo Sede.
• Parágrafo Unico: El Reglamento Interno del CIC establecerá la categoría de los funcionarios
a quienes se aplicarán las disposiciones del presente artículo.
• Articulo 11.- El Secretario General tiene, además de las precedentemente establecidas, las
siguientes funciones:
11.1. Preparar, en consulta con el Presidente del CIC, la agenda provisoria de las reuniones
del CIC.
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11.2. Efectuar, en consulta con el Presidente del CIC, la convocatoria a las reuniones del CIC,
remitiendo en esa oportunidad la agenda provisoria y la documentación correspondiente.
11.3. Convocar, por lo menos una vez al año, a los Representantes de los órganos integrantes
del Sistema, a fin de Programar y Coordinar actividades.
11.4. Convocar a los Representantes del CIH y del FONPLATA y de otros, órganos del
Sistema a las reuniones del Comité, cuando se traten en ellas temas directamente relacionados
con dichos organismos, con el fin de coordinar sus gestiones.
11.5. Asistir a las reuniones del CIC, informar y proponer acerca de los asuntos de su
competencia.
11.6. Representar al CIC, cuando éste así lo disponga.
11.7. Asistir a las Contrapartes Técnicas y Grupos de Trabajo que el CIC decidiera convocar,
para atender los asuntos que le fueran encomendados.
11.8. Solicitar a los organismos nacionales e internacionales, previa autorización del CIC, la
asignación temporaria de personal técnico para la realización de los estudios y tareas que le
fueran encomendadas.
11.9. Gestionar, en cumplimiento de instrucciones del CIC, las solicitudes de cooperación
técnica y financiera ante los organismos regionales e internacionales, de conformidad al
artículo 3 inciso 6 del presente Estatuto.
11.10. Organizar el sistema de datos e información y mantener un centro de documentación
de la Cuenca del Plata.
11.11. Distribuir a las Representaciones las informaciones y los estudios relativos a la Cuenca
del Plata enviados por los Gobiernos o los organismos nacionales e Internacionales.
11.12. Coordinar la gestión de la Unidad de Proyectos a cargo de los especialistas de los
Estados miembros con las Contrapartes Técnicas.
11.13. Elevar a consideración del CIC, en cada reunión, el informe de lo actuado.
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11.14. Elaborar y elevar a consideración del CIC el proyecto de presupuesto de la Secretaría
General, estados financieros e informe de auditoría, plan de trabajo y cronograma de
actividades.
11.15. Cumplir los demás cometidos que le asigne el CIC.
Capitulo VII- DE LAS SESIONES
• Articulo 12.- El CIC celebrará sus sesiones en la sede. También podrá reunirse
ocasionalmente en cualquier otro lugar que sea conveniente al mejor cumplimiento de sus
funciones.
• Articulo 13.- El CIC celebrará por lo menos dos sesiones anuales a fin de considerar el
presupuesto de la Secretaría General, estados financieros e informe de auditoría, plan de
trabajo, cronograma de actividades y las fechas, agenda provisoria y proyectos de Resolución
de la Reuniones de Cancilleres. También se reunirá:
a) Cuando se haya fijado anteriormente la fecha y agenda de la Reunión, y
b) Cuando sea convocado para tratar temas específicos a solicitud de por lo menos tres
Estados miembros, a través de la Secretaría General.
• Parágrafo Unico: El CIC, cuando lo estime necesario, podrá solicitar la participación de
representantes de otros órganos del Sistema.
• Artículo 14.- Las Decisiones adoptadas en reuniones del CIC requerirán siempre el voto
unánime de los cinco Representantes.
Capitulo VIII- DEL PRESUPUESTO
• Artículo 15.- El Presupuesto de la Secretaría General del CIC está constituido por los
aportes de los Estados miembros, en los porcentajes establecidos en cada presupuesto. y por
toda otra contribución que obtenga la Secretaría General con la aprobación del CIC conforme
al Reglamento interno que se dicte tomando como base el Capítulo VI, Parágrafos c), d), e) y
f) del documento "Reestructuración del CIC" aprobado mediante Decisión CIC N° 20/96. El
año financiero se extiende desde el 1° de enero al 31 de diciembre. Al aprobar el presupuesto
anual, podrá establecer modalidades internas para la distribución de cargas y gastos. Los
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Estados miembros que no contribuyan con sus aportes regulares por un periodo consecutivo
de tres años tendrán suspendido el ejercicio de su derecho a voto.
• Parágrafo 1: El CIC aprobará el presupuesto de la Secretaría General para el año siguiente
antes del 31 de mayo.
• Parágrafo 2: Cada Estado miembro debe efectuar el pago de la contribución que le
corresponda antes del 30 de junio de cada año, pero en casos excepcionales podrá hacerlo en
dos cuotas: la primera en la fecha indicada y la segunda antes del 30 de septiembre.
• Parágrafo 3: El personal técnico y/o administrativo designado por los Estados miembros
para desempeñarse en la Secretaría General, será solventado por sus respectivos Gobiernos.
• Parágrafo 4: En caso de la realización de estudios y proyectos aprobados por el CIC, los
Estados miembros pondrán a disposición de la Secretaría General el personal técnico
necesario para realizar los mismos, debiéndose hacer cargo de sus honorarios y cualquier otro
gasto que demande el cometido de sus servicios.
Capitulo IX- DISPOSICIONES GENERALES
• Artículo 16.- Son idiomas oficiales del CIC el español y el portugués.
• Artículo 17.- El CIC podrá invitar especialistas, entidades o representantes de organismos
internacionales para que le suministren informaciones en el examen de cuestiones de su
competencia.
Capitulo X- DE LA REFORMA DEL ESTATUTO
• Artículo 18.- El presente Estatuto podrá ser modificado según lo establecido en el Artículo
III, Parágrafo 2° del Tratado de la Cuenca del Plata.