28Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
Durante o terceiro perodo do Curso de Histria, surgiu a
primeira matria relacionada monografia, na qual teramos de
escolher nosso tema para pesquisa. No tive dvidas: esta seria
a minha oportunidade para poder pesquisar sobre a Estrada da
Graciosa! No entanto, aps fazer um levantamento sobre os meus
referencias bibliogrficos, e ter adquirido maior conhecimento
sobre o assunto, descobri que a estrada fora um dia apenas um
caminho, e estava diretamente ligada aos centenrios caminhos
que faziam a transposio da Serra do Mar. E aps sua efetiva
construo, quando se tornou Estrada da Graciosa, teve grande
influncia sobre a construo da primeira ferrovia do Paran,
pois o mesmo engenheiro Antnio Rebouas, que teve grande
importncia na sua construo, foi tambm o primeiro engenheiro
a desenvolver o projeto para a construo de uma estrada de
ferro no Paran, que aps alguns anos saiu dos papis e tornou-
se realidade. E todas estas novas transformaes nas vias de
comunicao do Paran ocorreram no Sculo XIX, fazendo assim
com que aumentasse a abrangncia de meu tema, denominando
minha monografia de Caminhos do Paran no Sculo XIX.
Dividi meu tema em trs captulos: no primeiro, trabalhei a
histria dos antigos caminhos, que junto Trilha da Graciosa,
faziam a precria transposio da Serra do Mar paranaense.
Trabalhei, tambm, neste primeiro captulo, o processo de
INTRODUO
A ideia inicial para desenvolver este trabalho originou-se no
decorrer de um domingo ensolarado, quando eu e minha famlia
decidimos almoar em Morretes, tendo como trajeto a PR-410, ou
como amplamente conhecida, a Estrada da Graciosa. Estando j
na antiga estrada, fiquei admirado diante de tal beleza natural, que
em harmonia com o centenrio calamento, exercia sobre ns grande
admirao. Mas alm de sua beleza, tambm me despertou a ateno
toda a historicidade que possivelmente estaria envolta em toda
aquela edificao, pois sabia que havia sido a primeira e nica ligao
rodoviria entre o litoral e Curitiba at meados do sculo XX. Chegando
em casa, fiz uma pequena pesquisa sobre a antiga estrada, ficando
muito decepcionado, pois somente encontrei artigos que enalteciam
apenas sua beleza, no dando nfase alguma a sua histria. Fui ento
Biblioteca Pblica do Paran, e tambm fiz uma prvia pesquisa,
porm encontrei poucos livros que falassem sobre esta estrada,
e, os que foram encontrados, tratavam sobre ela apenas de forma
superficial. Foi ento que, aps algum conhecimento sobre a Estrada
da Graciosa, perguntei-me: Mas por que tanta indiferena, e pouco
destaque a esta estrada que foi, por cerca de cem anos, a nica ligao
rodoviria entre o planalto e o litoral, mesmo tendo grande importncia
para o desenvolvimento cultural e principalmente econmico no Estado
do Paran?
CAMINHOS DO PARAN NO SCULO XIX
Autor: Bruno SchiminskiOrientador: Maria Igns Mancini De Boni
29Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
antes destes novos caminhos e posteriormente a eles. Utilizei
tambm fontes bibliogrficas que retratam a histrias das principais
cidades e vilarejos do litoral paraense que tiveram alguma relao
com estas edificaes. Como referencial terico, utilizei o artigo
Entre Memria e Histria. A problemtica dos lugares de Pirre
Nora, o qual conceitua a importncia dos lugares de memria como
forma de cristalizar e vivificar a memria, pois desde que haja
rastro fsico no estaremos mais na memria e, sim, na histria.
E nestes lugares de memria, que fiz uma relao do passado
como forma de vivificar o presente.
No terceiro captulo, analisei a Estrada da Graciosa e a Estrada
de Ferro Paranagu-Curitiba, sob o aspecto de patrimnio cultural
paranaense. Para tanto, fiz uma retrospectiva sobre o desfecho
que cada um teve ao longo tempo, sendo que a Graciosa tornou-
se parque estadual e a Estrada de Ferro teve suas estaes
ferrovirias tombadas e tornou-se um dos principais pontos
tursticos do Paran. Apresento, tambm, questes sobre o
patrimnio no Brasil, utilizando como referncia bibliogrfica, o
livro Os rituais de tombamento e a escrita da Histria escrito pela
historiadora Mrcia Kersten. Discuti-se tambm o tombamento
da Serra do Mar paraense como patrimnio natural; no entanto,
busco demonstrar que alm de ser um bem natural poderia ser
tambm um patrimnio cultural, pois sua transposio teve estrita
relao com a histria do Paran. Como referencial terico utilizei
o livro da historiadora Franoise Choay Alegoria do Patrimnio
o qual fornece os conceitos necessrios para que determinado
bem torne-se um patrimnio cultural.
Emancipao poltica da quinta comarca de So Paulo, no caso
o Paran, demonstrando que somente aps sua emancipao
ganhou maior poder para resolver suas mazela que impediam seu
desenvolvimento. E um dos grandes problemas que a Provncia
enfrentava era suas precrias vias de comunicao entre o litoral
e o Primeiro Planalto; diante disto, o primeiro presidente da
Provncia, Zacarias de Goes, decide tentar resolver tal problema
inicialmente com a construo de uma boa estrada de rodagem.
assim que entro no processo de construo da Estrada da Graciosa,
e da posterior construo da Estrada de Ferro Paranagu-Curitiba.
Utilizei como fontes bibliogrficas livros que relatam sobre os
antigos caminhos coloniais, e tambm livros comemorativos
do centenrio da Estrada da Graciosa e da Estrada de Ferro
Paranagu-Curitiba. Como fonte primria, utilizei o relatrio do
presidente Zacarias de Goes, que assumiu a Provncia em 1853,
para buscar entender os problemas que enfrentava a Provncia
em decorrncia de suas precrias vias de comunicao. Ainda no
relatrio busquei as perspectivas geradas pela oficializao do
projeto que iniciaria a construo da Estrada da Graciosa.
No segundo captulo, investiguei os reflexos econmicos
gerados pela construo dos novos caminhos, no caso a Estrada
da Graciosa e a Estrada de Ferro Paranagu-Curitiba, analisando
tambm as perspectivas geradas diante destas edificaes. Para
este captulo, utilizei como uma das principiais fontes bibliogrficas
o livro de Pedro Calil Padis Formao de uma Economia Perifrica:
O caso do Paran livro que me insere no contexto da economia
paranaense do sculo XIX, fornecendo suporte para assim fazer
uma reflexo econmica sobre a situao da economia do Paran
30Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
Da impreciso das informaes de quando os caminhos
foram abertos, tem-se o relato de Antnio Vieira Dos Santos que
acreditava ser o Caminho do Arraial o mais antigo, aberto entre
1586 e 1590, e desta primeira abertura, como picada, originou-se
o Caminho do Arraial. Porm, a primeira expedio com objetivo
de alcanar os campos de Curitiba e as nascentes do Rio Iguau,
foi em 1531; no entanto, como nenhum participante da expedio
retornou, ficou impossvel saber qual foi o caminho utilizado. O
Caminho do Arraial foi aberto gradativamente pelos faiscadores de
ouro que subiam a Serra atrs de novas fontes. O nome Arraial
devido existncia do Grande Arraial de mineradores2 que, a partir
de uma trilha, construiriam um caminho para facilitar o acesso do
litoral aos meandros da Serra do Mar, que posteriormente chegou
ao Planalto.
No percurso do Caminho do Arraial existem edificaes que
ressaltam que um dia, no passado, ali estiveram faiscadores de
ouro, pois prximo ao caminho existe um grande buraco murado
com pedras que atingem 10 metros de comprimento e dois metros
de altura, construdos com uma espcie de argamassa que se
encontra em perfeito estado. Esta construo era utilizada para
a lavagem do ouro encontrado na regio. Dos trs caminhos
histricos que faziam a travessia da Serra do Mar, o Arraial foi o
menos utilizado pelos viajantes mercadores, por ser naturalmente
muito difcil e por se encontrar em pssimas condies de
conservao. Em 1827, no Brasil Imprio, foram feitas melhorias
no Caminho do Arraial e juntamente a estas reformas foi instituda
uma barreira que cobrava uma taxa de manuteno para o viajante
que a utilizasse.
1 CAMINHOS DO PARAN
1.1 Caminhos histricos que faziam a ligao de Curitiba ao litoral
Durante o perodo colonial brasileiro, a expanso territorial foi
fundamentalmente estruturada pelo deslocamento humano territrio
adentro. Estes homens eram conhecidos como viandantes1 que,
acompanhados por sua tropa, munida de cavalos, mulas e escravos, saiam
em busca de novas descobertas de metais preciosos ou simplesmente
pela expanso territorial. Por onde estes viandantes passavam, deixavam
rastros denominados como caminhos, que posteriormente tornavam-se
rotas de novos viandantes, fazendo assim com que alguns, pela sua
grande rotatividade, ficassem marcados por geraes.
Alguns caminhos j existiam em nosso territrio, mesmo antes da
colonizao portuguesa devido locomoo do povo indgena que aqui
residia. Alguns deles, devido a sua grande utilizao, atravessaram
sculos, e acabaram tornando-se percursores de grandes e modernas
rodovias as quais ainda hoje utilizamos. E no Paran no foi diferente,
como veremos mais frente. O mais antigo dos caminhos acredita-se
que seja o pr-colombiano, chamado de Caminho do Peabiru que ligava
o Paran com a Bolvia, Paraguai, Peru e possuindo derivaes para
Argentina e Chile. Em Curitiba e regio metropolitana, encontramos
trs caminhos histricos: o Caminho do Arraial, que ligava So Jos
dos Pinhais a Morretes; o Caminho do Itupava que ligava Curitiba
a Porto de Cima e o Caminho da Graciosa o qual ligava Curitiba a
Antonina. Cada qual com sua histria e especificidade, porm com a
mesma finalidade de transpor a Serra do Mar.
31Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
abat-la em Porto de Cima, originando assim o Caminho do Itupava. O
caminho foi o mais utilizado pelos viajantes por aproximadamente 200
anos, pois apesar de ser um caminho de muitas dificuldades no trajeto,
tinha a recompensa de ser o mais rpido entre os demais. A dificuldade
do caminho evidenciada no dirio do viajante francs Auguste de
Saint-Hilaire4:
A estrada vai se tornando cada vez mais difcil; em certos lugares ela cavada na montanha a uma profundidade considervel, tem pequena largura e coberta pela folhagem das rvores, que se entrelaam no alto e privam o viajante da luz do dia. Em outros trechos so os atoleiros que surgem, e com grande dificuldade que os burros se livram deles; finalmente h bruscos desnveis no terreno, que obrigam os animais a dar grandes saltos. Em vrios lugares foram colocadas algumas achas de madeira sobre os atoleiros, mas os animais escorregam ao pisar sobre suas superfcies arredondadas e molhadas, correndo o risco de cair a todo momento.5
O Caminho do Itupava levava apenas dois dias de caminhada para
chegar ao litoral, enquanto o Caminho da Graciosa levava quatro e o
Caminho do Arraial trs. Alguns conhecem o Caminho do Itupava como
trilha dos jesutas, isto porque os jesutas tinham uma grande fazenda na
Borda do Campo que fornecia boa alimentao e descanso aos viajantes
e seus animais, que aps uma exaustiva subida da serra, necessitavam
de descanso e abrigo para posteriormente retomar a viagem.
Aps sua primeira abertura como trilha, o caminho veio
gradativamente no decorrer do tempo a receber melhorias, sendo
algumas de maior relevncia, como em 1772, cento e cinqenta
anos aps sua abertura. Obra que ocorreu devido necessidade do
Tenente Coronel Afonso Botelho de Sampaio e Souza transportar dois
pesados canhes que estavam no Porto de Paranagu, que serviriam
Logo no primeiro semestre, os resultados foram desanimadores,
uma vez que as arrecadaes tarifrias foram baixssimas. Vieira
dos Santos, em 1824, justifica os valores arrecadados:
Passo agora a mostrar a V.S as cauzas primrias de ter havido to pouco rendimento nesta estrada quaes so-1 Por se no ter conertado nella muitos passos que esto intransitveis e impedem a livre passagem das tropas com perigo de morrerem os animais 2 No se achar ao menos descortinada a mesma de muitos mattos e arvoredos que cobrem deixando-a por isso muito humida com agoas estragadas e atoledos. 3Por se haverem encaminhado a maior parte dos tropeiros d aquela freguesia pela Estrada de Coritiba (caminho do Itupava) vindo desta maneira augmentar os rendimentos desta e deminuir o d aquella. 4Por no ter a freguezia de So Jos hua importao de generos commerciaes como como tem a Villa de Coritiba.3
Como no Caminho do Itupava tambm havia um posto de pedgio
prximo de Porto de Cima, possvel comparar a arrecadao dos
dois caminhos. Pelo Arraial, no segundo semestre de 1827, foram
arrecadados 269$800 referentes a passagem de 1.095 tropas com
1.445 animais. J no Itupava as arrecadaes foram de 2.223$450
correspondendo a passagem de 14.763 animais e 2.121 tropas. Apesar
de ser o caminho mais antigo fica evidente que no era o preferido
pelos viajantes. Atualmente, o Caminho do Arraial se encontra quase
que totalmente coberto pela Mata Atlntica. Outro fator que o deturpou
em algumas partes foi a construo de um oleoduto que convergiu com
velho caminho. O Arraial por ser de difcil acesso o menos visitado
pelos turistas que se aventuram na Serra do Mar.
Outro caminho histrico foi o Caminho do Itupava que se acredita,
tenha sido aberto por volta de 1625. Segundo o folclore popular, um
caador da Borda do Campo iniciou uma implacvel perseguio a uma
robusta anta, a qual perseguiu serra a dentro, conseguindo somente
32Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
aproveitavam para reabastecer seus suprimentos para viagem de
volta. Atualmente, o Caminho do Itupava o mais visitado e o mais
conhecido dos antigos caminhos, por estar em melhores condies de
preservao e ser considerado o mais belo.
De igual importncia, foi tambm o Caminho da Graciosa, que
segundo algumas vertentes seria o mais antigo, devido ao fato de no
ter sido nem mesmo desbravado pelos homens oriundos da colonizao
europia, e sim por indgenas que a utilizavam para chegar at o planalto
para colher pinho e outros frutos derivados da mata araucria. Assim,
como no caso do Caminho do Itupava, o Caminho da Graciosa foi ao
longo do tempo recebendo inmeras melhorias, porm nunca teve o
mesmo destaque que o Itupava,
devido ao fato do percurso ser
muito mais longo. O Caminho da
Graciosa, no desenrolar da sua
histria, sempre gerou conflitos
pelo motivo de ser o nico que
desembocava diretamente
no Porto de Antonina e no
em Porto de Cima, que via rio
Nundiaquara desembocava no
porto de Paranagu. A primeira
melhoria veio no ano de 1721,
ordenada pelo Ouvidor Pardinho,
que desejava fazer deste
caminho uma via permanente
de passagem de tropas e
animais. Mais tarde sofreu
para fortalecer uma determinada diviso militar do imprio. As reformas
no agradaram os comandantes da provncia de So Paulo que no
queriam dispender recursos para as melhorias do caminho, pois tinham
medo de que o povo litorneo e o planaltino trocassem informaes e
se aculturassem, gerando assim maior possibilidade de articulaes para
rebelies. No entanto, foi necessrio o melhoramento deste caminho
para possibilitar o transporte. No percurso, havia uma enorme rocha que
causava transtornos na travessia e aproveitando os canhes que estavam
sendo transportados, estas rochas foram transformadas em fragmentos
menores, isto pode ser facilmente visto por quem percorrer o caminho.
At o ano de 1830, o Caminho do Itupava no tinha o revestimento
em pedras que encontramos atualmente,
pois foi em 6 de abril do mesmo ano que o
Presidente da Provncia de So Paulo autorizou
o incio de novas obras. De todas as melhorias
feitas, at ento, nenhuma foi de tamanha
importncia como esta, pois calou boa parte
do trajeto, fazendo com que a travessia
se tornasse menos difcil. Para a obra, foi
necessrio vultuosa mo de obra, composta
por cozinheiros, cabos, soldados e um grande
nmero de escravos, oriundos da Borda do
Campo e Porto de Cima. Em consequncia
da grande utilizao do Caminho do Itupava,
ocorreu o desenvolvimento do vilarejo de Porto
de Cima, povoado que muito se beneficiou por
ser o ponto final dos viajantes que optavam
pelo Itupava, que entre outros negcios
Figura 1: Caminho do Itupava
KOCH,ZIG.[199-]. Caminho do Itupava. 1fotografia
color. 7Cm x 10,8 cm Fonte: www.altamontanha.com.
Acesso em: 21 abr.2009
33Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
1.2 Emancipao poltica da provncia do Paran
Em 1808, com vinda da Famlia real Portuguesa para o Brasil, o rei
Dom Joo VI fundou aqui sua sede provisria at que a situao em seu
pas voltasse ao normal. Dom Joo deparou-se com inmeras mazelas
em sua colnia, e, diante de tantos problemas, mostrou-se interessado
em resolv-los. Com a 5 Comarca de So Paulo no foi diferente, uma
vez que demonstrou interesse sobre os problemas dos parnanguaras e
juntamente a isto efetivou a mais significativa melhoria no Caminho do
Itupava. Diante desta ateno, os parnanguaras comearam a almejar
um sonho maior, no caso, sua emancipao.
A cmara de Paranagu teve pela primeira vez, em 6 de julho
de 1811, a iniciativa de mandar uma representao para o prncipie
regente, solicitando a emancipao da comarca e a criao de uma
nova capitania. O lder deste movimento foi Pedro Joaquim Correia de
S, que com segundas intenes almejava tornar-se, posteriormente,
capito da Capitania de Paranagu. A cmara local deu-lhe total
apoio diante das tentativas, dando a Joaquim Correia at mesmo
uma procurao, a qual o fazia representante de Paranagu diante do
governo. Porm, aps algumas tentativas, Correia j encara de forma
ntida seu fracasso.
Posterior a tentativa de 1811, aconteceu uma nova tentativa em
Paranagu, apesar da mesma j no ser a sede da comarca que agora
era em Curitiba. Em 1822, o povo e as autoridades parnanguaras
iriam jurar em praa pblica fidelidade as bases da constituio do
reino unido de Portugal, na presena do Juiz de Fora Antnio Azevedo
Melo e Carvalho, que no caso representava Portugal. Aproveitando a
mais algumas melhorias, no entanto por conta de particulares, como no
caso do tropeiro Tenente Manuel Teixeira de Carvalho, que fez pela
primeira vez neste caminho a passagem de muares carregados com
destino a Antonina. Porm, com a grande preferncia pelo Caminho
do Itupava, caia vrias vezes em abandono, at que no ano de 1807,
foi definitivamente aberto por obras subsidiadas atravs de taxas
obrigatrias cobradas da populao das Vilas de Antonina e Morretes,
fato este que gerou grande insatisfao, pois os morretenses pagariam
uma obra que somente os iria prejudicar, uma vez que os viajantes
iriam reabastecer-se de suprimentos em Antonina, deixando de lado
Morretes e Porto de Cima, por ficarem fora de trajeto.
Em decorrncia da reforma do Caminho da Graciosa, surgiu o
conflito chamado de guerra dos portos6, conflito este que formou dois
grupos de interesse distintos, um formado por Morretes, Porto de
Cima e Paranagu que ficou excluda das exportaes diante do porto
concorrente, e do outro lado ficou a populao de Antonina. Ocorreu
que os tropeiros desciam pelo Caminho da Graciosa, mesmo sendo mais
longo, pois se encontrava em melhor estado e era muito mais seguro e
voltavam sem suas cargas levemente pelo Itupava por ser o mais rpido.
No desenrolar da chamada guerra dos portos, a Vila de Antonina pedia
e pressionava os governantes para efetuar o fechamento definitivo do
Caminho do Itupava. As Vilas de Morretes e Porto de Cima, aliadas a
Paranagu, pediam a restruturao do Caminho do Itupava e fechamento
da Graciosa. Episdios como este, somente atrasaram a construo
efetiva de uma boa estrada ligando o litoral ao planalto. Porm, a histria
do Caminho da Graciosa no ficou apenas nas reformas de 1807 e o
futuro ainda lhe reservava outra faanha.
34Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
Gomes foi um tropeiro muito rico que detinha grande prestgio poltico
perante os governos do Rio Grande do Sul e So Paulo e na prpria corte
do Rio de Janeiro, era conhecido em geral por ser portador de grande
carter e honestidade, dedicou parte de seu tempo e fortuna em prol da
causa emancipacionista, uma vez que custeava panfletos que defendiam
a causa da emancipao e os distribua pelas cidades. Correia Junior foi
Coronel da Guarda Nacional e por ter grande prestgio buscava na corte
adeptos para a causa paranaense.
Mas o que fez realmente o percurso da histria emancipacionista
tomar novos rumos foi que desde 1835 os liberais do Rio Grande do Sul
se levantaram com armas contra o imprio, movimento esse chamado
de Revoluo Farroupilha8. A situao complicou-se tambm no
Rio de Janeiro, onde o governo imperial estabeleceu novas leis
conservadoras, dentre as quais dissolveu a assembleia eleita, alegando
que a mesma estaria envolvida em vrias fraudes. Inconformados, os
liberais de So Paulo e Minas Gerais se rebelaram contra o imprio,
acontecimento conhecido como Revoluo Liberal de 18429.
O grande medo do imprio de Dom Pedro II era que ocorresse a
unificao dos revoltosos do Sul, no caso os farroupilhas juntamente
com os revoltosos de So Paulo e Minas Gerais, ocasionando assim
um possvel grande levante de frente nica contra o imprio. No
entanto, entre o caminho que iria unificar as frentes do Rio Grande
Sul com So Paulo, estava o Paran, sendo ento de grande valia a
adeso do liberais curitibanos para o sucesso do levante contra Dom
Pedro. Prevendo esta possibilidade, o presidente da Provncia de So
Paulo, o Baro de Monte Alegre, enviou para Curitiba um habilidoso
poltico, Joo da Silva Machado, que conseguiu seduzir os liberais com
a promessa da emancipao caso se portassem fieis ao imprio; quem
ilustre presena do juiz, os defensores da emancipao se uniram e
organizaram a chamada conjura separatista, formada por autoridades
locais, que baseavam sua causa em 5 pilares7. O primeiro se refere
a ignorncia e o despotismo dos comandantes militares da Comarca,
que no preocupavam-se com o bem estar populao; em segundo, a
falta de justia, devido a dificuldade que havia em impetrar recursos
perante as autoridades de So Paulo; em terceiro, o fato da Comarca
fornecer muitos praas de guerra para as milcias portuguesas, sobre
tudo para as entradas que desbravam os nossos sertes do Iguau,
Guarapuava e Tibagi ficando assim muitas famlias na misria; em
quarto, a falta de moeda na comarca devido as grandes somas que
eram enviadas a So Paulo como impostos; e o quinto, o estado de
total abandono que se encontrava a comarca pela administrao de
So Paulo, surda que era diante das queixas populares.
Mas, para clamarem ao juiz sua emancipao, necessitavam de
uma pessoa de forte cunho moral e influncia; convidaram assim o
comandante das milcias o Capito Bento Viana. Sendo, assim, no
dia 15 de julho de 1821 terminada a solenidade do juramento, Bento
Viana se dirigiu ao Juiz de Fora e clamou a formao de um governo
provisrio independente de So Paulo, e que tal fato fosse comunicado
ao Rei Dom Joo. Porm, a resposta do juiz foi que ainda no era a
hora, e que o momento iria chegar.
Mesmo com o fracasso de 1822, a luta emancipacionista continuou
atravs dos vereadores das cmaras de Paranagu, Morretes, Antonina
e Vila da Lapa, que explicavam a causa e os motivos ao imprio, que
agora j era o brasileiro. Houve duas figuras na histria paranaense que
merecem destaque devido a grande luta pela causa emancipacionista:
Francisco Paula e Silva Gomes e Manoel Francisco Correia Jnior. Paula
35Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
1.3 A construo da estrada da Graciosa
Assumindo a presidncia da provncia a 19 de dezembro de 1853,
mal decorreram dois dias para que Zacarias de Goes convocasse
seu Diretor de Obras, Tenente Coronel de Engenheiros Henrique
de Beaurepaire Rohan, o qual foi delegado o reconhecimento dos
caminhos que de Serra acima se dirigissem ao litoral. Beaurepaire,
diante de trs caminhos, estudou-os exaustivamente para poder
chegar a concluso de qual seria o mais adequado para suportar a
transformao em via carrovel. E por motivos de menor inclinao,
menos umidade e tambm menores obstculos naturais, a escolha
recaiu sobre o Caminho da Graciosa. Esta escolha gerou conflitos e
discusses, pois muitos alegavam que o Caminho do Itupava era mais
curto e rpido que o da Graciosa. Esta era mais uma evidncia da velha
rivalidade dos caminhos. Diante da anlise dos caminhos, o Tenente
Beaurepaire justifica sua escolha:
A extenso que apresenta a serra nos dous pontos parece dar preferencia a Ytupava, mas cumpre observar:1 que a quantidade de rocha viva he maior no Ytupava, e portanto mais difficeis ahi os trabalhos de mina:2 que o costo do morro de Me Catira por onde se deve lanar a Estrada da Graciosa tem sobre vantagem do Ytupava estar no lado norte fator que o faz receber sol o ano todo ao contraio do Ytupava que esta no quadrante sueste ficando a primeira exposta ao sol durante todo o dia e em todas as estaes, entretanto que a outra no se encontra no se achando nas mesmas circunstancias, he mais sujeita a humidade: 3 em fim, que o costo da Me Catira exige poucos ziguezagues, e esses mesmos de fcil construo, e que no do Ytupava sero os ziguezagues de mais difcil execuo10
Para a nova Provncia do Paran, a construo da futura Estrada da
Graciosa representava uma forma de redeno para suas mazelas, que
deu crdito a oferta foi o prprio presidente de So Paulo e o chefe
das foras legislativas.
Conclusa a vitria das foras imperiais, Monte Alegre cumpriu a
promessa feita aos curitibanos, pedindo ao primeiro ministro a elevao
da comarca provncia. Porm, foi o prprio presidente de So Paulo
que solicitou oficialmente a separao, alegando que nenhuma outra
parte do territrio brasileiro era to merecedora da emancipao
como o Paran. O projeto foi ento encaminhado ao legislativo onde
grande parte dos deputados paulistas queriam barrar o projeto e at
mesmo elimin-lo da discusso; o receio era perder a fonte lucrativa de
impostos. O Paran, apesar de ser na poca uma economia perifrica,
desde o incio do sculo XIX exportava vultuosas quantias de mate,
fato que gerava grande lucro a So Paulo atravs de seus impostos.
Posteriormente, a inmeros debates evidenciando os prs e os
contras, a Coroa se manifestou favorvel emancipao. E em 1850,
o assunto foi para o senado, quando Batista Oliveira, apoiado por
Carneiro Leo, apresentou a ementa do projeto que criava a Provncia
do Amazonas estendendo a mediada para Curitiba. A pedido do
Visconde de Abranches, foi separado o projeto: um criando a Provncia
do Amazonas e outro a do Paran. Embora aprovados os projetos,
o referente ao Paran voltou a Cmara de deputados, afim de ser
tambm discutido e posteriormente aprovado.
Somente em 1853, foi aprovada a lei N 704 sancionada a 29 de
agosto que determinou oficialmente a criao da Provncia, dando-lhe
limites e estabelecendo Curitiba como capital provisria. As aspiraes
paranaenses foram em fim concretizadas em 19 de dezembro com a
chegada de Zacarias de Goes e Vasconcelos, enviado como primeiro
presidente, e com a funo de instalar e organizar a nova Provncia.
36Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
de Carvalho que assumiu a Provncia posteriormente ao conselheiro
Zacarias. Vaz de Carvalho diante dos poucos resultados aprovou,
juntamente com a assemblia, a lei que passava a construo da
estrada para uma construtora de renome e privilgios, na expectativa
de dar novo ritmo para as obras. Foi nessa poca que perceberam que
houve um grande equvoco no oramento da obra, pois os gastos j
eram exorbitantes e ainda faltava muito para a concluso.
Neste perodo da construo, um viajante de origem alem,
Robert Av Lallemant, em 1858, escreve em seu dirio de viagem
minuciosamente sua passagem pela Estrada da Graciosa, ainda
em construo, que na poca estava aos cuidados de Villalva.
Acompanhemos sua narrativa:
No momento da minha passagem estavam em atividade 170 trabalhadores, entre os quais 54 alemes; cada um recebendo um mil reis e a comida, e com tudo faltam trabalhadores. Falta contudo o pronto pagamento do dinheiro; se no me engano, h meses os trabalhadores tem salrios atrasados a receber.J desde anos esta o distinto e incansvel Villalva na floresta,longe de todas as comodidades da vida, em ranchos precrios e com a esposa doente. Villalva acompanhou-me por um algum tempo para mostrar-me a sua estrada, a menina dos seus olhos. Com admirveis curvas e insignificantes aclives de oito por cento. O leito da estrada, macadamizado com delgada camada de arreia, mede vinte palmos de largura. Tem bordadura de pedra em ambos os lados e no centro um canal de derivao que despeja a agua para fora.13
A partir da narrativa de Av Lallemant, pode-se perceber
vrias informaes, tais como o estado primrio que as obras se
encontravam e seus inmeros problemas, como a falta de mo de obra
e salrios atrasados. Todavia fica evidente a tecnologia empregada
desde seu princpio, como exemplo, o sistema de escoamento da
gua. Nesta poca, foi construdo o primeiro trapiche de Antonina
impediam seu desenvolvimento econmico e social. Seus problemas e
perspectivas ficam evidentes no primeiro relatrio de Zacarias de Goes:
A primeira necessidade desta provncia he, decididamente, o melhoramento de suas vias de comunicao. A lavoura to atrasada, como descrevemos, no pode alar, o comercio no pode desenvolver-se, em quanto as estradas se conservarem como esto, e o anhelo de atrair, aos excelentes terrenos da provncia, colonos europeus em certa escala, encontra certa resistncia na estado deplorvel das actuaes comunicao, onde no se pode rodar um bom carro, e tudo se transporta, mal e mui dispendiosamente em costas de animaes. Sobre tudo, por em fcil comunicao o interior com a marinha, e os municpios de serra abaixo com os de serra a cima, he negocio de to vital interesse, que no sei que utilidade haveria em crear-se esta provncia, se os seos mandatrios no cuidassem em resolver, todo transe, essa questo que a mais de cem anos agita-se sem soluo satisfatria.11
No dia 12 de agosto, de 1854, oito meses depois de instalada a
Provncia, Dom Pedro II autorizou o governo do Paran a dar incio
s obras para a construo da Estrada da Graciosa, entre Curitiba e
Antonina. No dia 20 iniciaram as obras pelo comando do engenheiro
civil Saturnino Francisco de Freitas Villalva. Teve como princpio
o descampamento do trajeto e algumas pequenas execues nas
proximidades da Borda do Campo; no entanto, as obras progrediam de
forma muito vagarosa. Para melhor compreenso de sua construo,
que levou dezenove anos, pode-se utilizar dois perodos: o primeiro, de
1854 a 1864, perodo de poucas melhoras significativas; o segundo, de
1864 a 1873, perodo produtivo, no qual resultou sua concluso.12
O primeiro perodo como um todo, foi marcado por poucos resultados
na construo e inmeros problemas, Contudo, a cada novo presidente
que assumia a Provncia tentavam sucessivamente dar novo ritmo
construo, mas pouco adiantava. Como exemplo, o presidente Vaz
37Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
duas grandes tempestades arrancaram os pilares de algumas pontes,
ocorreu tambm desabamento de terra em vrios pontos da estrada,
juntamente a isto veio a diminuio das verbas enviadas pelo imprio,
devido ao fato de o Brasil estar envolvido na Guerra do Paraguai15.
No ano de 1870, quando a obra completou dezesseis anos,
o presidente da provncia Afonso de Carvalho decidiu acabar
efetivamente, a obra, porm ainda faltava-se muito, pois na regio
em que se bifurcava o caminho, ao trmino da serra, ainda a estrada
encontrava-se em estado inicial. Somente em 1873, sobre o comando
de Monteiro Tourinho, que finalmente foi concluda a Estrada da
Graciosa. Trmino comemorado por todos os paranaenses, que
esperavam diante da nova estrada melhores perspectivas de vida, em
nvel social e econmico. Foi feita uma grande caravana percorrendo
trechos da estrada e houve grandes festas em Curitiba e no litoral.
e estabeleceu-se a linha de navegao entre Antonina e o Porto de
Paranagu.
Quando assume a Provncia, o presidente Cardoso e Gomes em
1860, ficou chocado com a vultuosa dvida gerada pela construo da
estrada, e estarrecido com os poucos resultados diante de tantos gastos.
Cardoso e Gomes afastou ento o Engenheiro Villalva do comando das
obras, e suspendeu temporariamente a construo, mantendo apenas
a manuteno para o que j havia sido construindo. No ano de 1863,
foram retomadas as obras, agora com maior planejamento e objetivo
de concluso. Para tanto, a estrada foi dividida em partes, onde vrios
engenheiros assumiram empreitadas, ficando cada qual com um
pedao de fundamental importncia para a concluso.
Porm, o perodo de maior desenvolvimento ocorreu no governo
de Andr Augusto de Padua Fleury, o qual nomeou como encarregado
o renomado Engenheiro Antnio Rebouas .. Junto a isto, o Governo
Imperial disponibilizou grande soma financeira que permitiu o
calamento da Estrada da Graciosa, da localidade da Borda do Campo
at o final da serra.Tornando-se possvel a abertura efetiva da estrada
que foi a segunda calada no Brasil. Com o calamento j era possvel,
a passagem de carroas carregadas com at 1500 Kg de carga, e a
passagem de diligncias com malas postais.
Antnio Rebouas enquanto no comando mudou um pouco o
trajeto original da estrada, criando ao final da serra uma bifurcao,
sendo que uma iria direto a Antnina e outra para Morretes, fato este
que aumentou ainda mais as despesas e adiou a efetiva concluso.
No ano de 1867, Antnio Rebouas se afastou das obras da estrada
e da lugar ao engenheiro Monteiro Tourinho, para que a conclusse.
No entanto, grandes empecilhos vieram a atrapalhar a concluso,
Figura 2: Estrada da Graciosa
SCHIMINSKI,Bruno.2009.Estrada da Graciosa.
1 fotografia.color. 8cm x 12 cm
38Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
com a futura construo da Estada de Ferro Dona Isabel. Esta pretenso de
Paranagu em construir uma linha frrea antecipada demonstra o receio que
tinham de ficar fora da rota comercial, pois nos moldes de Antnio Tourinho
a estrada passaria somente em Antonina. Alguns historiadores acreditam
que este pequeno percurso construdo em Paranagu foi o real incio da
construo da Estada de Ferro, datado em 2 de dezembro de 1873.
Em meio aos debates sobre a construo da Estrada de Ferro, um
antigo problema voltou tona: a chamada guerra dos portos, na qual
Paranagu e Antonina se digladiavam sobre onde seria o ponto de
partida da construo frrea rumo a Curitiba. Diante do conflito, duas
fortes personalidades destacaram-se: o deputado Correia de S de
Paranagu e o Visconde de Nacar, que queria que o traado partisse
de Antonina para a capital. Os defensores de Antonina utilizavam forte
apelo a memria de Antnio Rebouas, que traou originalmente em
seu projeto Antonina como ponto de partida.
Porm, no dia 1 de maio de 1875, os debates tiveram fim, pois o
governo imperial posicionou-se determinando que o ponto de partida
seria o Porto Dom Pedro II, em Paranagu. No ano de 1879, foram
transferidos todos os direitos da construo frrea para a companhia
estrangeira Compagnie Gnrales de Chemins de Fer Brsiliens,
associada a companhia Societ Anonyme de Travaux Dyle et Bacalan,
empresa de construo de origem Belga. Toda a obra foi regida pela
mesma, e o engenheiro encarregado foi Antonio Ferrucci vindo ao Brasil
no ano de 1880. Ferrucci era de origem italiana, formado em cincias
matemticas, e junto a ele veio toda sua equipe de engenheiros,
arquitetos e desenhistas.
As obras tiveram incio em meados de fevereiro, porm a pedra
fundamental18 somente foi lanada em 5 de junho, pelo imperador
1.4 A construo da estrada de ferro
A construo da Estrada de ferro Paranagu-Curitiba foi um dos
grandes marcos da histria da construo civil do Paran no sc XIX,
juntamente a Estrada da Graciosa. Mas ao contrrio da Graciosa que se
arrastou durante 19 anos, a Estrada de Ferro foi construda em pouco
menos de cinco anos. Sua construo ainda hoje ponto de referncia
como grande marco da engenharia nacional, pois superou obstculos
que antes eram considerados inviveis. Despertou at nos poetas versos
que a reverenciavam, como o de Carlos Klung no aniversario de 100 da
construo: Hoje cem anos decorridos podemos afirmar que, em cada
apito do trem a perder-se nos grotes da Serra do Mar, est um hino de
glria, em louvor ao poder construtivo do homem.16
Os primeiros esboos da idealizao da Estrada de Ferro surgiram
quando Antnio Rebouas estava envolvido na construo da Estrada
da Graciosa. Ele idealizou e projetou a Construo da Estrada entre
1869 e 1870. Com ajuda do Francisco Tourinho e Maurcio Schawatz,
encaminhou ento o projeto da obra para que governo imperial a
estudasse. No ms de janeiro de 1871, o governo deu a concesso dos
direitos para Antnio Rebouas efetuar a construo, que denominou
de Estrada de Ferro Dona Isabel, que ligaria Curitiba ao Porto de
Antonina. No entanto, este projeto nunca saiu do papel, e Rebouas
viu fracassadas suas inmeras tentativas de obter financiamento junto
ao Banco Mau. Antnio Rebouas faleceu, em 1874, vtima de febre
tifide17 e ainda neste ano teve transferido o seu direito da concesso
da ferrovia para o Baro de Mau.
Nesta mesma poca, outra concesso foi concedida, agora para
uma construo frrea de Paranagu a Morretes, que ao final se unificaria
39Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
toda a competncia da engenharia nacional e tambm do engenheiro
Joo Teixeira Soares. A terceira seco foi a mais tranqila, pois
enfrentava apenas declives e curvas leves, algumas pontes e na maior
parte do trajeto grandes retas.
Enfim, com 110 quilmetros de trilhos assentados na largura de
um metro, a ferrovia contaria ao seu final com 420 obras, incluindo
13 tneis, 30 pontes e vrios viadutos, destacando-se o da ponte So
Joo com altura de 55 metros. Para a construo da Estrada de Ferro,
foram utilizados 3.253 metros cbicos de alvenaria e 442 toneladas de
ao e o efetivo de nove mil homens, dentro dos quais, em mdia 3 mil,
se encontravam impossibilitados ao trabalho, devido s pestes e s
doenas. Existia uma grande mescla de operrios como se pode ver na
passagem do livro comemorativo dos 100 anos da rede ferroviria:
Dom Pedro II. A comitiva real desembarcou em Paranagu no dia 18
de maio, e foi recebida pelo presidente da Provncia que apresentou
formalmente a programao de como deveria desenrolar a cronologia
dos festejos da inaugurao das obras, que no caso seria no dia
seguinte. Segundo Ernesto Matoso, jornalista que acompanhava a
comitiva real, o imperador sentiu-se irritado porque ningum o havia
consultado. Diante disso, o Imperador falou que voltaria apenas diante
de 18 dias corridos, pois iria aproveitar a viajem para visitar a capital
da Provncia. Ernesto Matoso conta tambm que para a suposta
inaugurao planejada para o dia 19 de maio haviam preparado um
banquete de fino trato para 200 pessoas, que custou o montante de
30 contos de ris, e que em consequncia do adiamento acabou sendo
servido para os operrios da obra.
Basicamente, a construo foi pautada em trs partes: sendo
a primeira com extenso de 42 Km entre Paranagu e Morretes; a
segunda com 38 Km, ligando Morretes a Roa Nova, e a terceira com
30 Km ligando Roa Nova a Curitiba. As obras no primeiro trecho
foram de grande dificuldade, devido ao fato de no litoral os terrenos
serem em grande parte alagadios, insalubres e com manguezais.
Consequentemente, foram necessrio muitos aterramentos para dar
firmeza ao solo instvel. Foi logo aps a concluso do primeiro estgio
que o encarregado da obra o Engenheiro Antnio Ferrucci deixou seu
cargo e junto a ele o diretor geral Pereira Passos tambm abdicou de
sua vaga. Na segunda parte da construo, considerada a mais difcil,
assumiu Joo Teixeira Soares19.
A segunda seco foi um arrojo a toda prova, pois as curvas
somavam 23 Km e as retas apenas 22 Km, foram necessrios 13 tneis
e a implantao de grandes pontes. Foi nesta seco que foi testada
Figura 3: Estrada de ferro Paranagu-Curitiba
KOCH, ZIG.[199-]. Estrada de Ferro Paranagu-Curitiba. 1Fotografia color.7,5 Cm x 12,6 cm Fonte: www.altamontanha.com. Acesso em: 21 abr.200
40Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
sentidos: material, simblico e funcional. Mesmo um lugar puramente
material como a Estrada da Graciosa e a Estrada de Ferro, so lugares
de memria, pois esto envoltos em uma aura simblica, estreitamente
relacionado ao desenvolvimento socioeconmico paranaense, e sobre
esta relao econmica que irei dialogar a diante.
2.1 Reflexos econmicos da estrada da Graciosa
A segunda metade do sculo XIX foi para o Brasil um perodo de
transformaes polticas, sociais e econmicas. Um dos principais
motivos para tantas mudanas, foi quando em 1844 ficou extinto um
antigo acordo que impossibilitava o livre comrcio do Brasil com os
demais pases; junto a isto, a introduo do trabalho assalariado, e
a gradativa abolio do trabalho escravo22. Para o Paran, o sculo
XIX como um todo, foi um perodo de transformaes, uma vez que
se iniciou com uma economia em estado de passividade, pois havia
tido deixado para trs a economia do ouro que, por mais de um sculo,
havia tanto contribudo para o desenvolvimento das vilas de Paranagu,
Antonina e Curitiba
Havia ainda a economia tropeira, no entanto, restringia-se apenas
Vila de Curitiba, pois com seus grandes campos era parada obrigatria
para que o gado oriundo do Rio Grande do Sul descansassem e
engordassem para posteriormente chegarem s feiras de So Paulo e
Minas Gerais em melhores condies de peso e aparncia23. Descanso
este que era de alguns meses, fazendo com que os tropeiros se
instalassem em Curitiba, ativando assim o comrcio local que muito
se beneficiou e desenvolveu-se com a estada dos viajantes. No caso
de Paranagu, esta localidade dedicava-se em grande parte apenas a
Antonio Viale, ento com puco mais de 32 anos, um homem de estrutura alta e msculos rijos e salientes, foi destacado para o canteiro de obras instalado na encosta do Morro Marumbi. Junto com ele, centenas de trabalhadores, compostos de italianos, alemes, poloneses e um numero reduzido de africanos. Muitos mestres e feitores. A companhia ficou proibida de utilizar trabalho escravo.20
Mesmo com todos os empecilhos de ordem natural e financeira, a
construo foi conclusa e inaugurada em 2 de fevereiro de 1885. Nesta
data, s dez horas de uma tera-feira foi feita a primeira travessia
frrea Paranagu-Curitiba. Na comitiva, encontravam-se autoridades
federais, estaduais, alm de ministros da Blgica, Frana e Rssia que
vieram prestigiar a inaugurao da obra. E no trajeto clamavam vivas
ao imperador, ao Paran, e tambm a quem a idealizou, o Engenheiro
Antnio Rebouas. A chegada da comitiva foi recebida com festejos e
gritos de prosperidade para o Paran.
2 PERSPECTIVAS DE DESENVOLVIMENTO DIANTE DAS NOVAS OBRAS
O terico Pierre Nora em seu artigo Entre Memria e Histria.
A problemtica dos lugares21 destaca a importncia dos lugares
como forma de vivificar e cristalizar a memria, pois desde que haja
rastro fsico, no estaremos mais apenas dentro da memria, e sim
dentro da histria. Ainda, segundo o autor, a memria no uma
fonte confivel, pois esta em constante evoluo e aberta dialtica
da lembrana e do esquecimento, inconsciente de suas deformaes
sucessivas, vulnervel a todos os usos de manipulaes. J a histria,
a reconstruo sempre problematizada e incompleta de um presente
que no existe mais. Os lugares de memria so compostos por trs
41Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
muito contribuiu para o desenvolvimento econmico de Morretes e
Porto de Cima.
A extrao do mate empolgou os parnanguaras, pois era de fcil
extrao e podia ser colhida o ano todo. A descoberta deste novo
comrcio fez com que muitos ociosos entregues a agricultura de
subsistncia subissem pelos caminhos at o primeiro planalto, local onde
se encontrava farta quantia do vegetal silvestre. A erva-mate era colhida
em Curitiba e arredores e transportada em forma bruta, em lombos de
burros pelos caminhos, at chegar em Porto de Cima e Morretes, onde se
encontrava quase a totalidade dos engenhos, que efetuavam o processo
do beneficiamento para posteriormente ser exportado.
J em 1844, os portos de Paranagu e Antonina exportavam
vultuosas quantidades de mate para Argentina e Chile. Com a
emancipao poltica da Provncia, algumas decises foram tomadas
para que a mesma progredisse, e uma das formas para alcanar o
progresso foi com a construo de uma estrada para tornar a economia
mais dinmica. A partir de 1866, quando a estrada j se encontrava
parcialmente construida, os primeiros reflexos econmicos comearam
a despontar na economia paranaense.
Com a nova estrada, criou-se na populao planaltina e parnanguara
grandes perspectivas de um prspero desenvolvimento, pois as
grandes dificuldades naturais de atravessar a Serra do Mar haviam
sido transpostas, ocorrendo os principais reflexos no ramo madeireiro
e principalmente no ervateiro. No entanto, exatamente nesta poca
o mate paranaense vai sofrer um relativo inpacto, pela concorrncia
do produto catarinense. que tambm no final da dcada de 1860,
no Estado de Santa Catarina se construra uma estrada que deu fcil
acesso regio ervateira.
agricultura, e exportava pequenas quantidades de trigo, milho e arroz,
no dispensando a agricultura de subsistncia para complemento
familiar. A erva mate era encontrada em grande abundncia na maior
parte do Paran, no entanto sua produo era voltada apenas para o
consumo interno que era restrito para uma pequena demanda.
Novo rumo para economia paranaense deveu-se ao fato de que o
Paraguai at ento nico pas que exportava erva mate, passou por
grande problemas polticos, entre eles o movimento de independncia
das Provncias Unidas do Prata que, desde 1.800 em diante barrou
a comunicao entre o Paraguai e o Sul pelos rios Paran e Prata,
tornando assim incompossvel a escoao de seus excedentes agrcolas
e extrativistas, no caso a erva mate. Junto a isto o presidente paraguaio
Jos Gaspar Rodrigues que assumiu em 1811, instalou uma poltica
isolacionista, proibindo toda e qualquer relao com pases vizinhos,
independente de ser diplomtica ou comercial, pois alegava que os
problemas internos que enfrentava, eram ocasionados por influncias
de outras nacionalidades.24
Importadores platinos da erva-mate encontraram-se sem seu
antigo fornecedor, fazendo com que a buscassem em outros mercados
j to difundida em seus costumes. Assim, vieram para o Paran
comerciantes argentinos e chilenos em busca do mate na Vila de
Paranagu. Segundo Vieira dos Santos Abriram os olhos aos nossos
ignorantes paranaguaenses comarces, que bem alheios estavam de
possurem no seu solo um dos mais preciosos vegetais que produz a
natureza25. Nesta poca, incio do sculo XIX, a erva-mate paranaense
era exportada apenas cancheada26, foi somente aps alguns anos, que
leis protecionistas proibiram a exportao em forma bruta, permitido
somente a exportao da erva-mate j beneficiada27, fato este que
42Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
beneficiamento da erva mate e no comrcio. A decadncia do vilarejo
de Porto de Cima constatada na carta do padre Joo Antnio
Manoechio enviada ao presidente da Provncia em 1880:
Acabada a dita estrada, o transito dos tropeiros d erva mate, que antigamente se fazia por esta villa, acabou dirijindo-se todos para Curitiba. E paralisando o commercio, muitas famlias retiraram-se para o interior, procurando meios de vida. J no h movimento algum, e tudo inercia e prostrao. E onde no esta a populao, o mais frtil paiz jaze na misria.28
Porto de Cima teve seu perodo ureo por volta de 1832, data
em que possua aproximadamente 50 engenhos, dentre os quais
aproximadamente 30 eram de grande
porte. Contava tambm com um forte
comrcio local, pois sendo rota final do
Caminho do Itupava havia se tornado ponto
de reabastecimento de suprimentos para a
viagem de volta. Chegou at mesmo a contar
com um popular clube literrio denominado
Clube Literrio Porto Cimense, que
possua cerca 1.400 obras literrias. Neste
centro de reunies, familiares realizavam-se
constantes conferncias artsticas, bailes e
soirs ltero musicais que atraia a ateno
de outros moradores do litoral, os quais
compareciam a alguns eventos.29 Contava
tambm com uma igreja matriz situada na
praa central, que foi construda em 1850,
a qual existe at os dias de hoje, sendo
uma das poucas edificaes que resistiram
Em relao ao mate, diversos fatores mudaram diante da nova
estrada, sendo que para alguns representou a redeno aos antigos
problemas, e para outros, como no caso de Porto de Cima o incio de
seu fim. A decadncia de Porto de Cima e a estagnao econmica
de Morretes tiveram incio com a chegada da Estrada da Graciosa
e a posterior construo da Estrada de Ferro, em 1885. O fator que
mudou a histria destes vilarejos foi que at ento, como j comentado
acima, a erva-mate era colhida em Curitiba e regio e levada
cancheada at Porto de Cima e Morretes para passar pelo processo
de beneficiamento
No entanto, com o advento da nova
estrada despertou-se no povo planaltino
a possibilidade de beneficiar a erva-mate
prximos aos ervais, e envi-la j pronta
pela Estrada da Graciosa diretamente ao
Porto de Antonina. Vale destacar que nesta
poca, esse porto muito se beneficiou
com as exportaes, pois era rota final da
nova estrada. Economicamente, era muito
era mais vantajoso beneficiar a erva-
mate serra acima, devido a facilidade de
transport-la pela Estrada da Graciosa que
se encontrava prximo a grande parte dos
ervais. Ocorreu que praticamente todos
os engenhos situados principalmente em
Porto de Cima e Morretes subiram para
o planalto, deixando mngua as Vilas
que se fundamentavam basicamente no
Figura 4: Igreja matriz So Sebastio de Porto de Cima
SCHIMINSKI, Bruno.2009.Igreja Matriz So Sebastio de Porto de Cima. 8 fotografia.color. 8cm x 12 cm
43Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
os homens, assim como velhos como meninos so asados a trabalharem no seu primeiro facilimo processo.31
Mas tanta dedicao ao mate, deixou outros ramos agrcolas
mngua, como por exemplo, o trigo, que era produzido em larga escala,
chegando at mesmo a ser exportado para outros estados. Tambm
foram abandonadas as prticas do plantio de milho, arroz e cevada que
anteriormente ao surto da erva mate constituam parte da produo
agrcola do Paran. O motivo para o abandono da produo agrcola
foi simples, visto outras atividades davam muito mais trabalho e menor
retorno financeiro que o mate. No entanto, esta grande dedicao
ao extrativismo fez do Paran, uma economia sensvel, ou seja, uma
economia que se baseava apenas em um produto. A economia ervateira
era muito instvel, pois se fundamentava de picos e declnios de demanda
de mercado, deixando a Provncia vulnervel a crises repentinas.
Porm, em meados da dcada de 1870, industrias madeireiras em
moldes capitalistas, diante da nova estrada, comearam a se interessar
pelo pinheiro paranaense que assim como o mate encontrava-se
em abundncia em todo planalto. O Paran j exportava madeira
desde o incio do sculo XIX, porm em pequena quantia. A madeira
exportada era a existente nos arredores de Paranagu, pois no havia
possibilidade de transporte para a madeira existente serra acima,
devido precariedade dos caminhos. No entanto, era de conhecimento
geral o grande potencial, para o desenvolvimento das indstrias
madeireiras na regio planaltina. Potencial este que j fica evidente no
relatrio de Zacarias e Goes:
O comercio de madeira h sem duvida que prosperar consideravelmente, no futuro, atenta a imensa copia delas prprias no s para diversas obras, como para construo naval, que existe tanto no litoral como serra acima, onde os olhos dos viajantes
ao tempo e ao declnio econmico que a vila sofreu. Posteriormente,
Estrada da Graciosa, a Estrada de Ferro veio por fim as poucas
esperanas que ainda restavam no vilarejo.
Morretes teve seu auge por volta de 1820, quando o Rei Dom Joo
VI enviou para as fronteiras do Sul uma diviso de 8.000 homens em
decorrncia do cerco a Montevidu. Como faltava comrcio na regio
montevideuense, eram comprados os suprimentos em Morretes e
enviados pelo porto de Paranagu at as guarnies. A maior parte
dos gneros comprados pelo Imprio vinham de serra acima e pelo
fato de Morretes situar-se entre Curitiba e Paranagu foi o local
escolhido para se fazerem as transaes comerciais. Em decorrncia
disto, vrios comerciantes montaram casas de negcios no vilarejo e
enriqueceram, pois vendiam os suprimentos a preos exorbitantes.
Mesmo com o fim da guerra, Morretes ficou marcada como ponto
comercial de suprimentos vindos de serra acima pelos caminhos30. No
entanto, com a nova estrada Morretes ficou fora da rota econmica,
pois j no se situava em local estratgico. E o mate, que era um dos
principais produtos negociados, j tinha suas sacas arrematadas na
sada dos engenhos em Curitiba.
Em 1875, pela Estrada da Graciosa, passavam trs quintas partes
partes do mate consumido em toda Amrica Latina, e foi nesta poca
que a populao de forma macia comeou dedicar-se ao extrativismo
do mate. Era uma produo espontnea e lucrativa que no requeria
conhecimentos e no fazia distino de sexo e idade, como o prprio
conselheiro Zacarias de Ges j havia mencionado em 1854:
O mate pois he um produo espontnea dos immensos hervais silvestres, que cobrem huma dilatada exteno de territrio, esta com eu j disse ao alcance da maior parte da pupulao sem distino de sexo, nem idade, pois tanto as mulheres como
44Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
Em consequncia deste elevado custo para o transporte, a madeira
paranaense chegava mais cara que a importada dos Estados Unidos.
O segundo motivo foi o fato do pinho paranaense ter cado em
descrdito pela m qualidade, devido carncia, sobretudo de cuidados
tcnicos para a extrao, pois no se escolhiam criteriosamente as
rvores a serem abatidas, nem a poca para o corte, o que provocava a
sua rpida deteriorao, ainda com o agravante de ficarem expostas s
intempries do tempo. Tais condies de armazenamento e o fracasso
da empresa ficam evidentes quando em 1880, Dom Pedro II veio ao
Paran para o lanamento das obras da nova ferrovia. Estando em
Paranagu, aproveitou para visitar Curitiba e fazer o reconhecimento da
nova estrada. No percorrer da subida da serra, Dom Pedro II anotava em
seu dirio de viagem tudo o que lhe chamava ateno, e quando cruzou
com a antiga indstria madeireira fez as seguintes observaes:
[...]grande abundancia de araucrias cujos ramos enfileiram-se em planos diferentes, sobretudo por causa da inclinao do terreno, formando degraus de imensa escala. Creio que pertencem a companhia florestal que possui uma rea de 600 braas sobre 150.Tinha visitado antes seu estabelecimento h 5 anos abandonado. Gastaram 300 contos em material. A primeira remessa de tabuas de pinho deu no rio 2$000 mais por duzia que o americano. A segunda por falta de cuidados apodreceu em metade nos lugares onde deixaram no transito. O deposito de 5.000 tabuas est metade podre. pena que no tenham olhado mais o estabelecimento33
Posteriormente aos fracassos da indstria madeireira, o Estado at
mesmo estabeleceu normas para estas atividades, porm a eficcia foi
bastante discutvel; a indstria madeireira somente ressurgiu em 1886,
com a inaugurao da ferrovia.
A Estrada da Graciosa teve tambm relevncia no fator populacional
da cidade de Curitiba, pois diante da nova estrada, como j citei
descortinam matas sem fim de pinheiros, por ora s aproveitadas no limitadssimo consumo desta provncia e que somente esperam para descerem a prover maiores mercados, uma estrada que ao contrario das atuais, permitam conduzi-las a um bom porto de embarque.32
Em 1871, Andr Rebouas, irmo de Antnio Rebouas Filho,
levou o pinho paranaense para a exposio internacional de madeiras
em Viena, onde foi demonstrado, testado e confirmada sua qualidade
como madeira prpria para construo de mobilirio. Na exposio,
Andr Rebouas ganhou diploma de honra por ter apresentado o pinho
paranaense. Na realidade, esta foi uma estratgia da famlia Rebouas
para confirmar a qualidade da madeira paranaense e ter credibilidade
internacional.
Aps a concluso da Estrada da Graciosa, em 1872, instalou-se a
primeira madeireira de grande porte em Curitiba, com capital bastante
elevado, correspondendo a toda receita estadual daquele ano, fundada
por Antnio Pereira Rebouas Filho, com sede no Rio de Janeiro.
Foi a primeira serraria mecnica da Provncia paranaense, instalada
nas proximidades de Curitiba, em localizao privilegiada, prxima
Estrada da Graciosa e dos abundantes pinheirais. Teoricamente,
todas as condies de sucesso estavam asseguradas; no entanto,
poucos anos depois, a empresa encontrava-se em estado de falncia,
produzindo apenas para o comrcio local.
Vrios foram os motivos para o malogro do comrcio madeireiro;
primeiramente alegava-se a dificuldade para o transporte, pois apesar
da nova estrada, estar conclusa, a sua manuteno era precria,
pois vrias vezes ocorriam desabamentos de terra que impediam o
trafego; junto a isto o elevado custo para transportar a madeira at
o porto do Rio de Janeiro, que era o principal mercado comprador.
45Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
necessria vultuosa mo de obra, que se disponibilizou em grande
parte dos vilarejos de Morretes e principalmente de Porto de Cima,
em consequncia da falta de trabalho naquela regio, agravando ainda
mais o estado de absoluto abandono e declnio econmico dessas
povoaes, uma vez que Porto de Cima ainda estava a amargar as
consequncias da Estrada da Graciosa. Entre os principais reflexos
gerados, pela concluso da estrada de ferro Paranagu-Curitiba, est
o sucesso do mercado madeireiro, que somente conseguiu prosperar
diante da construo da ferrovia, e tambm o desfecho de uma antiga
rivalidade porturia entre as cidades de Paranagu e Antonina, alm
de influncias sobre diversos campos extrativistas que necessitavam
transpor a Serra do Mar para chegar aos portos.
O sucesso do mercado madeireiro da dcada de 1880, nada lembrou
os tempos difceis da dcada anterior, na qual vrias firmas decretaram
falncia. No ano de 1886, foi montada uma grande empresa em molde
capitalista, muito desenvolvida para a poca, formada pelo capital de
vrios participantes. Detalhe que despertou ateno foram as benesses
concedidas aos funcionrios, como por exemplo, descanso semanal,
frias remuneradas e participaes em lucros. Vale destacar que
ainda prosperava a escravido e no existiam leis que assegurassem o
direito trabalhista35. A sociedade paranaense ficou estarrecida diante
do sucesso conquistado pela nova empresa, e viu uma nova economia
prosperar e dar lucros ao estado, que por muitos anos se beneficiou
somente da erva-mate. Diante do sucesso das indstrias madeireiras,
vrias outras empresas do ramo se instalaram no Paran, e montaram
firma na busca da mesma prosperidade econmica.
No entanto, para que esta economia madeireira viesse a
prosperar, inmeros foram os fatores que possibilitaram seu sucesso;
anteriormente, parte da populao abandonou seus antigos vilarejos
e instalou-se na capital, na esperana de melhores perspectivas de
vida. No censo demogrfico de 1872, ano em que a estrada teve
sua concluso na ntegra, a populao de Curitiba era de 11.760
habitantes e de Paranagu 11.299 habitantes. J em 1890, o novo
senso apontava Curitiba com 24.553 habitantes enquanto Paranagu
estagnou com 11.794 habitantes34 e desde ento s veio a aumentar a
populao planaltina, principalmente com a posterior vinda de diversos
emigrantes europeus ao Paran.
2.2 Reflexos ecnomicos da estrada ferro Paranagu-Curitiba
Quando recente ainda era a construo da Estrada da Graciosa,
em 1872, muitos j almejavam a construo de uma ferrovia para
transpor a Serra do Mar, pois acreditavam que somente assim
desenvolveriam plenas condies econmicas para tornar-se uma
Provncia de relevncia nacional, como So Paulo e Minas Gerais. Em
1875, quando o Governo Imperial decretou oficialmente a construo
da Estrada de Ferro Paranagu-Curitiba, manchetes ilustraram o Jornal
19 de Dezembro, afirmando que uma nova era de prosperidade social e
econmica chegaria ao Paran, pois com a estrada de ferro estaramos
nos igualando s grandes provncias. A populao paranaense
aguardou ansiosamente com grandes perspectivas econmicas,
at sua concluso em 1885; em sua primeira travessia, chegando a
Curitiba, foi recebida e prestigiada pela urbe com vivas e aclamaes
de prosperidade.
Os primeiros reflexos da ferrovia comearam a despontar mesmo
antes de sua concluso, uma vez que para sua construo fora
46Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
estrada de ferro no estava suportando atender a todas as requisies
para vages, tendo at mesmo algumas industrias a inteno de
recorrer a Estrada da Graciosa; no entanto, esta encontrava-se
em pssimo estado. Desde a inaugurao da ferrovia, o governo
provincial deixou de dar os reparos necessrios para a estrada,
deixando-a abandonada. Na poca, at mesmo surgiram acusaes
contra a concessionria francesa que administrava a estrada de ferro
Paranagu-Curitiba, acusando-a de boicotar a Estrada da Graciosa,
danificando a estrutura de algumas pontes. E junto a isto, alegava-
se que a concessionria pressionava o governo para no efetuar as
reformas necessrias, pois no queria concorrncia com a ferrovia,
posteriormente foi aberto um processo para investigar tais denncias,
no entanto nada foi comprovado.36
Mesmo com o advento da estrada de ferro, grande parte da erva-
mate, ainda era escoado pela Estrada da Graciosa, pois a tarifa cobrada
pela estrada de ferro era mais elevada que o custo do transporte muar,
fato este que fez Almeida Sobrinho ento Presidente da Provncia
em 1888, contestar as tarifas abusivas e tentar baixar os custos,
assim como havia sido feito no ramo madeireiro. Acompanhemos sua
narrativa:
Julgo tambm do meu dever aqui observar que excessivamente elevada a tarifa estabelecida pela estrada de ferro para o transporte da herva-mate.Pelas informaes que essa tarifa excede em mais de um tero ao frete da carga do mesmo artigo conduzido em carroas pela Estrada da Graciosa.Compreende-se perfeitamente que isto uma anomalia que no deve continuar, reclamando por providencias. Tal tarifa opprime o comercio da herva-mate, prejudicando ao estado que paga garantias de juros e prejudicando a prpria companhia francessa, visto que da logar a sustentar-se uma competio absurda e inconveniente, qual a Estrada da Graciosa37
primeiramente a construo da Estrada de Ferro Paranagu-Curitiba,
que tornou possvel a escoao da produo madeireira planaltina.
Tamanha a importncia desta edificao que, segundo os cronistas da
rea econmica, a indstria madeireira esperou at que a construo
estivesse conclusa, para somente ento fazer novos investimentos.
Junto a isto, e de tambm fundamental importncia foi que na
administrao de Faria Sobrinho, no ano de 1886, foi concedida para
as indstrias do ramo madeireiro a iseno dos impostos provinciais
e municipais, alm de a Provncia conseguir tambm juntamente
concessionria da ferrovia, tarifas especiais para o transporte da
madeira pela estrada de ferro.
Diminuiu-se o custo e a madeira paranaense conseguiu chegar
aos mercados consumidores de forma mais atrativa para competir
com as madeiras importadas. E o terceiro, tambm importante fator,
foi que Rio de Janeiro e So Paulo sofreram surtos de urbanizao
e desenvolvimento, devido prspera fase econmica em que se
encontravam e tambm ao grande nmero de imigrantes que chegavam.
Nesta poca, quase a totalidade da exportao madeireira do Paran
era destinada a estes dois Estados, sendo o principal comprador o
Estado do Rio de Janeiro. E o ltimo, e determinante fator foi a poltica
protecionista implantada no pas, quando foram estabelecidas tarifas
alfandegrias aos produtos estrangeiros, fazendo com que seus
produtos ficassem mais caros que os brasileiros. Enfim, as aspiraes
de Zacarias de Goes, que em 1854, vislumbrava a possibilidade de um
dia torna-se possvel a explorao pinho do paranaense com sucesso,
havia se concretizado.
Tamanha era a demanda para a exportao, que as indstrias
madeireiras encontraram dificuldades para o escoamento, pois a
47Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
o mais desenvolvido e requisitado que dcadas depois teve grande
importncia para a escolha da construo do primeiro porto organizado
e estruturado em moldes modernos. Foi por este trapiche escoada a
maior parte da produo madeireira paranaense que, no auge, formou
filas espera de navios para serem embarcadas.
Em 1893, aps muitos esforos da populao antoninense, foi
construdo um ramal de 16 km, de Morretes ao porto de Antonina,
edificao que representou um alento para o porto, pois somente
assim encontrou-se ligado a via econmica mais importante do estado
do Paran. A grande vantagem de Antonina foi que o seu trajeto era
mais curto, pois tinha apenas 81km de distncia contra 110 km de
Paranagu. Nos primeiros meses, houve uma paridade nos valores
cobrados para a travessia da Serra do Mar, todavia aps alguns meses
a concessionria baixou o custo da travessia ao porto de Antonina,
justificando que seu trajeto era menor, e por isso tinha menor custo.
Porm, a vantagem de Antonina durou pouco tempo, logo Paranagu
que sempre teve muita influncia poltica, conseguiu atravs de medidas
governamentais efetuar a equiparao das taxas de transporte e voltar
a ser o porto predileto pelos exportadores.
Aps o Paran ter efetuado melhorias em suas vias de transporte,
encontrava ainda um outro grande empecilho que impedia um pleno
desenvolvimento, no caso seus portos ultrapassados, pois suportavam
poucas atracagens e somente de navios de pequeno e mdio porte. Foi
nesta poca, em meados da dcada de 1910, que o caf timidamente
comeou a chegar pelos trilhos at o porto de Paranagu. Produo
cafeeira que foi estimulada pelo governo estadual, que at mesmo
isentou as taxas porturias em Paranagu, com a inteno de incentivar
o cultivo do caf que tanto enriquecia o estado de So Paulo. No
A partir da narrativa de Almeida Sobrinho, percebemos a grande
insatisfao diante da tarifa cobrada pela concessionria francesa.
Vale observar o modo como Almeida Sobrinho renega o transporte
a muares pela Estrada da Graciosa, demonstrando a grande vontade
de incorporar a estrada de ferro aos diversos campos da economia
paranaense. Tamanhos eram os problemas com as negociaes
tarifrias, e com a insatisfao popular de Antonina que acusava a
concessionria de sabotagem Estrada da Graciosa, que em 1912,
no governo de Carlos Cavalcanti, foi cancelado o contrato com a
concessionria francesa, e junto a isto, foi efetuada uma reforma na
Estrada da Graciosa.
A estrada de ferro Paranagu-Curitiba teve na sua construo e
posterior funcionamento, o legado de definir a hegemonia do porto de
Paranagu, e fazer definhar o seu porto rival e consequentemente a
cidade de Antonina, uma vez que a urbe antoninense tinha toda sua
economia fundamentada no porto. Anteriormente estrada de ferro,
ambos os portos disputavam arduamente quem seria o porto com maior
volume exportador e melhores condies para atracagem de navios.
At 1880, Antonina tinha a vantagem de ser a rota final da Estrada da
Graciosa, e possuir melhores trapiches que o porto de Paranagu.
A situao comeou a complicar-se para Antonina quando o governo
imperial determinou que o ponto de partida da nova ferrovia fosse
Paranagu. E neste contexto para que a construo frrea pudesse
desenvolver-se, foi necessria uma grande demanda de materiais;
tais como toneladas de ao e alvenaria que somente poderiam chegar
se houvesse um bom trapiche. Foi ento que construram o maior e
melhor trapiche do Estado, denominado como Trapiche Paran, que
mesmo posteriormente a construo da ferrovia continuou a ser
48Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
O decreto federal n 12.477 de 23/051917 aprovou o projeto para
a construo de um novo porto e tambm 3 galpes de grande porte
para armazenagem de mercadorias38. No entanto, grandes empecilhos
ainda existiam para o incio efetivo das obras, problemas estes que se
convertiam em alegria para os populares de Antonina, que viam nesta
construo o efetivo fracasso de seu porto. Os reflexos da primeira
guerra mundial chegaram ao Brasil e uma poca de grande recesso
pairava pelo mundo; somente aps alguns anos quando a economia
mundial se fortaleceu novamente, a construo teve incio. As obras
progrediam at quando prximo para concluso, sofre os reflexos
de mais uma crise mundial, no caso a de 1929, na qual o Paran viu
suas verbas federais para a construo do porto serem canceladas. No
entanto, as obras continuaram vagarosamente com verbas estaduais.
Somente em 1935, os parnanguaras puderam comemorar, pois enfim
contavam com um sistema porturio moderno e desenvolvido, o qual
era amparado por uma rodovia e principalmente pela ferrovia.
Com a inaugurao do porto de Paranagu, a maioria dos
exportadores optava por embarcar as mercadorias no novo porto,
pois tinha indiscutivelmente uma melhor infra-estrutura. E o porto
de Antonina, que j se encontrava em precria situao econmica,
teve sua bancarrota, tendo at sua ligao frrea abandonada aps
alguns anos. Com isso, um novo alento surge para o porto de Antonina,
com a implantao dos Moinhos Matarazzo, o qual importava grandes
quantias de trigo da Argentina e o industrializava nos arredores do
porto, para posteriormente ser exportado para outros estados. Os
moinhos Matarazzo tiveram grande importncia econmica para a
cidade de Antonina, no entanto na dcada de 1940, o Paran retomou
o plantio de trigo, e os moinhos Matarazzo que importavam trigo da
entanto, o clima de Curitiba e regio, no era o adequado para a prtica
cafeeira e logo teve o cultivo abandonado, que somente foi retomado
na dcada de trinta com a colonizao do norte paranaense, local onde
se encontrou terra e clima favorvel para a produo.
Chegavam pelos trilhos grandes sacas de mate, ripas madeira
e uma pequena quantia de caf, porm muitas dificuldades eram
encontradas para armazenar tais produtos, at seu embarque.
Nesta poca, o porto de Paranagu j contava com maior suporte de
armazenamento e melhor trapiche, que no caso ainda era o antigo
Trapiche Paran. Assim, em 1917, comeou-se a debater a idia da
construo de um novo porto, que suportasse navios oriundos do
mundo inteiro, independente de seu tamanho. Antonina at mesmo
tentou pleitar ser
a sede do novo
porto, porm foi
Paranagu o porto
escolhido, devido
ao fato de j
possuir um trapiche
de mdio, porte
que permitiria
a descarga dos
materiais para as
novas obras e por
ser o porto mais
utilizado e bem
amparado pela
ferrovia.
Figura 5: Porto de Paranagu
STRINBERG,Fernando.[200-].Porto de Paranagu. 1Fotografia color.8,5 Cm x 13,6 cm Fonte: www.trasportes.gov.br. Acesso em: 8 mai.2009
49Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
da Idade Mdia e Edifcios Religiosos. Neste incio, somente eram
considerados patrimnios histricos os que provinham em essncia, da
arqueologia e da histria da arquitetura erudita. Posteriormente, todas
as formas de construo foram inseridas no conceito de patrimnio,
eruditas e populares, urbanas e rurais, todas as categorias de edifcios
pblicos e privados, santurios e utilitrios, desde que apresentassem
vnculos de relevncia com o passado.
A questo patrimonial no Brasil um assunto de certa forma
recente, pois as primeiras tentativas para se estabelecer normas que
fornecessem condies para a proteo dos patrimnios aconteceu
em 1923, quando foi enviado ao Congresso Nacional um projeto de
lei pedindo que se criasse uma inspetoria de monumentos histricos,
tendo como funo conservar os imveis pblicos ou particulares que
tivessem algum interesse nacional, e tambm proteger as obras de
arte que corressem risco de serem roubadas e sarem facilmente do
Brasil. No entanto, o projeto era um assunto relativamente novo, e
obteve pouca aceitao, e foi barrado. A segunda tentativa foi em
1925, quando tambm foi enviado um projeto para o Congresso
Nacional que visava a criao de um rgo nacional de proteo
ao patrimnio, cuja funo seria de eleger os bens a serem salvos
pelo projeto. Os bens a serem protegidos seriam eleitos atravs do
interesse coletivo, e se tivesse representatividade do passado da
nao brasileira, no entanto esta segunda tentativa tambm no
obteve sucesso.39
As discusses acerca do patrimnio comearam a ganhar maior
relevncia na dcada de 1930, mais especificamente no governo
de Getlio Vargas. Nesta poca, formaram-se diversos grupos que
tinham interesses voltados para as questes sociais e culturais, que
Argentina decretaram falncia, esta indstria era a nica de relevncia
que mantinha o funcionamento do porto. A populao de Antonina
teve que procurar novas formas de sobrevivncia, direcionando-se
lentamente para a agroindstria e para a metalurgia e tambm para as
diversas reas tursticas da Cidade.
Todas estas transformaes, que resultaram da Estrada da Graciosa
e da Estrada de Ferro, deixaram rastros no passado, no somente na
memria da populao, mas tambm, como conceitua Pierre Norra,
ficaram nos lugares de memria, como por exemplo, a Igreja de So
Sebastio de Porto de Cima. Esta sendo um dos poucos remanescentes
que nos remetem ao passado prspero que havia passado o vilarejo de
Porto de Cima, como tambm neste mesmo contexto, as runas dos
antigos galpes do porto Antonina, que pela edificao nos remete a
memorar o passado daquele lugar, que um dia prosperou na condio
de porto. Igualmente, a prpria Estrada da Graciosa, e a Estrada de
Ferro, que quando percorrida pelos seus calcamentos e trilhos, nos
remetem a um passado j adormecido em nossas mentes.
3 OS CAMINHOS COMO PATRIMNIO DO PARAN
3.1 Questes patrimoniais no Brasil, e o tombamento da serra do mar Parananese
As primeiras aes para a preservao dos monumentos histricos
tiveram incio na Frana, quando foi criada a primeira comisso dos
monumentos histricos em 1837, ocasio em que foram criadas trs
categorias de monumento para serem protegidos. Somente eram
considerados de importncia os remanescentes da Antiguidade, castelos
50Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
Estado desapropriar, indenizar, alm de punir quem no respeitasse
as regras de proteo de um bem histrico tombado. O SPHAN era o
rgo regulador responsvel por capacitar um objeto como patrimnio
histrico, e tambm de coordenar as normas burocrticas para um
tombamento. Que hoje so definidas da seguinte forma:
Ato administrativo realizado pelo Poder Pblico com o objetivo de preservar, por intermdio da aplicao de legislao especifica, bens de valor histrico, cultural, arquitetnico, ambiental e tambm de valor efetivo para a populao, impedindo que venham a ser destrudos ou descaracterizados.40
Foram criados quatro livros tombo para classificar os bens
tombados, sendo eles: 1-Livro do Tombo Arqueolgico; 2-Livro do
Tombo Histrico; 3-Livro do Tombo das Belas Artes ; 4-livro do
Tombo das Artes Aplicadas. Comparado ao anteprojeto, o Decreto-
lei era simples e direto, tratando somente de bens mveis e imveis
que tivessem algum significado para a histria do Brasil, protegendo
dessa forma apenas os bens materiais e de instituies basicamente
ligadas ao mbito governamental tais como: igreja, exrcito e prdios
pblicos. No aspecto jurdico, praticamente todas as Constituies
Federais trazem amparo cultura e proteo aos bens naturais, no
entanto a Constituio de 1934 foi a primeira a definir e possibilitar
a interveno do Estado na ordem econmica e com isso ter poderes
sobre os patrimnios que fossem de proprietrios privados.
Os Estados de Minas Gerais, Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco
foram os primeiros onde ocorreram tombamentos. Em seguida, e em
menores propores Paran, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, So
Paulo e Piau. Como a SPHAN dava maior relevncia a alguns Estados
e menos a outros, ficou permitido que as administraes estaduais e
vislumbravam a possibilidade de criar efetivamente uma legislao que
protegesse o patrimnio nacional.
Em meio a estas novas correntes sobre a conscientizao de se
proteger o patrimnio, destaca-se o intelectual modernista Mario
de Andrade, o qual foi responsvel por apresentar o anteprojeto
que futuramente veio a se transformar no decreto-lei 25/1937. Este
anteprojeto previa uma importncia maior para a histria artstica
nacional, por isso definiu que seriam necessrios oito livros tombos para
contemplar os registros, sendo: 1-arte arqueolgica; 2-arte amerndia;
3-artes popular; 4-arte histrica; 5-arte erudita nacional; 6-arte poltica;
7-artes aplicadas nacionais; 8- artes aplicadas estrangeiras.
Em 1935, Mario de Andrade trabalhou no departamento de cultura
do municpio de So Paulo, e um de seus objetivos neste trabalho era
transformar seu anteprojeto em decreto-lei, que tratasse dos assuntos
referentes proteo do patrimnio. Getlio Vargas havia simpatizado
com o anteprojeto de Mario de Andrade em 1936, fato este que
gerou grande expectativa para a oficializao do projeto. No entanto,
este aspecto inovador do anteprojeto causou discusses internas e
gerou conflitos dentro dos grupos polticos que detinham o poder, e
o anteprojeto foi barrado. Todavia, as ideias de Mario de Andrade
haviam gerado grandes perspectivavas em direo a uma legislao
que protegesse os patrimnios nacionais.
Em 1937, Gustavo Capanema, Ministro da Educao e Sade
Pblica escolhido por Getlio Vargas, acompanhado por Rodrigo Melo
Franco de Andrada coordenador do projeto, criaram o SPHAN- Servio
do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional, amparado pelo Decreto-Lei
N. 25/1937 que ordenou uma srie de leis e normas que regularizaram
os tombamentos dos patrimnios nacionais, dando legalidade para o
51Monografias - Universidade Tuiuti do Paran | Histria | 2010
da sociedade e reconhecimento de tal utilidade, faro do bem um
signo para posteridade. Ainda a autora complementa que somente
existe um patrimnio se houver uma identidade, um reconhecimento
da sociedade com o objeto, seja ele material ou imaterial, pois sem
este reconhecimento no h valores suficientes para a contemplao e
proteo de um determinado objeto.
A Serra do Mar paranaense foi tombada em 1986, pela
Coordenadoria de Patrimnio Cultural da Secretria de Estado da
Cultura do Paran, includa no livro tombo de patrimnio natural.43
Diversos foram os ativistas que lutaram por anos consecutivos at
conseguirem atravs do tombamento devida proteo amparada
por leis, para proteg-la de eventuais danos e descasos do homem.
A Serra do Mar foi tombada com os
argumentos de ser a principal rea de mata
atlntica conservada em todo o Continente
Americano, sendo uma da poucas reas em
que se encontra em estado de pleno gozo
de conservao ambiental, alm de toda
historicidade que a envolve.
Apesar deste espao ter sido tombado
como patrimnio natural, encontram-
se diversos fatores que tambm a
fazem um patrimnio cultural, devido
grande importncia que desempenhou
para o desenvolvimento e formao da
nao brasileira, e principalmente para
o desenvolvimento scio-econmico
paranaense. Alm da materialidade da
municipais