PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM CIÊNCIAS
CONTÁBEIS E FINANCEIRAS
EDVALDA ARAÚJO LEAL
ANÁLISE DE CUSTOS NO SETOR HOSPITALAR - UTILIZAÇÃO DA METODOLOGIA ACTIVITY BASED
COSTING – ABC: O Caso das Cirurgias Cardíacas no Hospital Universitário de Uberlândia.
SÃO PAULO 2006
EDVALDA ARAÚJO LEAL
ANÁLISE DE CUSTOS NO SETOR HOSPITALAR - UTILIZAÇÃO DA METODOLOGIA ACTIVITY BASED
COSTING – ABC: O Caso das Cirurgias Cardíacas no Hospital Universitário de Uberlândia.
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial
para obtenção do título de Mestre em Ciências Contábeis e
Financeiras, sob a orientação do Prof. Dr. Roberto Fernandes
dos Santos.
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC/SP
SÃO PAULO 2006
EDVALDA ARAÚJO LEAL
ANÁLISE DE CUSTOS NO SETOR HOSPITALAR - UTILIZAÇÃO DA METODOLOGIA ACTIVITY BASED
COSTING – ABC: o caso das cirurgias cardíacas no Hospital Universitário de Uberlândia.
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial
para obtenção do título de Mestre em Ciências Contábeis e
Financeiras, sob a orientação do Prof. Dr. Roberto Fernandes
dos Santos.
BANCA EXAMINADORA
iv
À minha mãe, Valda de Araújo Pereira e ao meu pai,
Edson Leal Ferreira, in memoriam, que me ensinaram a
superar os desafios da vida, pelo constante incentivo ao
estudo e sempre presentes na minha formação. A meu
esposo Avelino José da Silva Neto e meu filho Emerson
Leal Rocha, por acreditarem na concretização dos meus
sonhos.
v
AGRADECIMENTOS
A Deus pelo dom da vida, da sabedoria, da perseverança e do amor: sem Ele nada seria possível.
A meu esposo, Avelino, pelo grande amor, paciência, compreensão e apoio durante o desenvolvimento deste trabalho.
A meu filho, Emerson, pelas palavras de incentivo e por acreditar nos meus sonhos.
À minha mãe, pelo exemplo de humildade, perseverança e também por todas as suas renúncias a favor de nós, suas filhas.
Ao meu pai: “Cerro os olhos e percebo sua presença, confortante e segura, acompanhando meus passos. Sinto que nunca estive só ... Tenho a certeza que você esta orgulhoso por mais uma etapa vencida. Minha gratidão!”
Às minhas queridas irmãs Edvânia, Juliana, Valdiana e Fabiana pelo amor que me dedicaram e por, também, sempre estarem do meu lado e torcerem por mim.
Ao Professor Dr. Roberto Fernandes dos Santos, que me orientou pautado no profissionalismo e na dedicação. A competência, o brilhantismo e principalmente a compreensão foram qualidades evidentes na forma como me orientou.
O agradecimento sincero também aos professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis e Financeiras da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, pela atenção e dedicação com que transmitiram seus conhecimentos e, em especial à Professora Dra. Neusa Maria Bastos Fernandes e ao Professor Dr. Sérgio Iudícibus pelas palavras de estímulo.
Aos professores Antônio Robles Júnior e Osmar Coronado, pela honra que me concederam ao avaliar o trabalho e pelas sugestões valiosas que contribuíram para a melhoria deste.
Aos colegas do curso, com quem tive o prazer de compartilhar horas de extraordinário aprendizado, que muito contribuíram para o meu desenvolvimento ao longo do curso, especialmente, a minha amiga e companheira Elenice Cácia Bittencourt Teixeira, a que muito me apoiou e a qual aprendi a admirar.
Aos meus amigos que, para não cometer injustiças prefiro não nomear, pela ajuda direta e indireta, e cujas palavras de incentivo sempre me apoiaram, meus sinceros agradecimentos.
Ao Professor e amigo Anastácio Gomes Lamounier, pelo apoio e incentivo a este trabalho.
Aos gestores do Hospital de Clínicas de Uberlândia que disponibilizaram informações para que eu pudesse realizar o estudo em questão e, em especial, ao Prof. Adolar Ferreira de Faria e à Cláudia Duarte Pereira Borges.
À CAPES, pela bolsa de estudo que me concedeu.
À Faculdade Politécnica de Uberlândia pelo apoio financeiro concedido durante o Curso.
À minha amiga Maria Selma Rodrigues e Guedes que, com muito carinho e competência, contribuiu na revisão desse trabalho, meus sinceros agradecimentos.
Enfim, a todos aqueles que de alguma forma ou outra contribuíram para a realização deste trabalho, minha eterna gratidão!
vi
RESUMO
O processo produtivo dos hospitais de ensino é dispendioso, haja vista que incorpora
atividades de ensino, pesquisa e extensão que os tornem um referencial em tecnologia de
ponta, além de necessitarem acompanhar as exigências estabelecidas pelos novos paradigmas
da sociedade. Frente a esse desafio, e considerando a complexidade dessas organizações,
torna-se fundamental o uso de métodos de custos que consigam reduzir o nível de incerteza
dos processos decisórios. Este trabalho apresenta uma análise da viabilidade da aplicação da
metodologia de custeio em atividades nos custos de uma entidade hospitalar de ensino -
delimitado, neste estudo, à especialidade de cirurgias cardíacas. A estratégia de pesquisa
utilizada é o estudo de caso realizado no Centro Cirúrgico do Hospital de Clínicas de
Uberlândia (HCU), no último trimestre de 2005. O desenvolvimento parte da análise dos
processos, identificação dos recursos envolvidos e os direcionadores de custos às atividades
envolvidas. Definidos os recursos e sua participação, a fase seguinte busca verificar em que
medida os recursos são empregados pelas atividades durante o procedimento cirúrgico. A
partir da análise de processos, as atividades são identificadas, e estabelecido um direcionador
de recursos que mensure o uso da atividade durante as cirurgias. Os resultados indicam que o
ABC oferece níveis de detalhamento do processo de prestação de serviço hospitalar mais
elevados do que nos sistemas tradicionais de custos e consegue-se perceber melhor o uso dos
recursos durante o procedimento cirúrgico, em conseqüência, auferindo o custo da cirurgia
por porte com maior precisão.O presente trabalho confirma a viabilidade da metodologia do
custeio ABC no segmento hospitalar, respeitando suas peculiaridades de aplicação, sua
filosofia, princípios e metodologia, analisando os dados específicos do HCU, visando à
mensuração mais adequada dos custos e melhor gerenciamento hospitalar.
Palavras-Chave: custos, atividades, direcionadores, cirurgias, hospitais.
vii
ABSTRACT The productive process in teaching hospitals is expensive due to the fact that it incorporates
teaching activities, research and extension which make thee hospitals a reference for cutting
edge technology. They also need to attend to the requirements established by new paradigms
in society. Considering this challenge and the complexity of these organizations, it is essential
to use cost methods that are able to reduce the level of uncertainty in deciding processes. This
work presents an analysis of feasibility for applying cost activity methodology in the costs of
a teaching hospital entity which is limited, in this study, to the heart surgery specialty. The
research strategy used was the case study accomplished in the Surgical Centre of the Clinical
Hospital of Uberlândia (HCU), in the last trimester of 2005. The development was conducted
based on process analysis, identification of involved resources and the cost directives to the
activities involved. After being defined the resources and their participation, the next phase
tries to verify in which way the resources are used by the activities during the operation. After
the process analysis, the activities are identified and a resource directive, which measures the
activity use during surgeries, is established. The results indicate that the ABC offers detailing
levels of the process of higher hospital services than those in the traditional cost systems. It is
then possible to best perceive the use of resources during an operation and, therefore,
calculate the cost of a major surgery more accurately. This work confirms the feasibility of
the ABC cost methodology in the hospital segment, respecting its peculiarities of application,
its philosophy, principles and methodology, analyzing the specific data of the HCU. The aim
is to be able to measure more precisely the costs and improve hospital management.
Keywords: costs, activities, directives, operation, hospitals.
viii
LISTA DE QUADROS
Quadro 2.1 Comparativo dos métodos de Custeio Absorção e ABC................................. 75
Quadro 4.1 Departamentos do HCU – Hospital de Clínicas de Uberlândia...................... 97
Quadro 4.2 Dicionário de Atividades: Centro Cirúrgico HCU – Cirurgias
Cardíacas..........................................................................................................
107
Quadro 4.3 Lista de Atividades e tarefas............................................................................ 111
Quadro 4.4 Direcionadores de Recursos............................................................................ 114
Quadro 4.5 Direcionadores de Atividades........................................................................ 129
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 2.1 Atribuição dos Custos diretos e Indiretos........................................................ 36
Figura 2.2 Metodologia de Custeio por Absorção ........................................................... 40
Figura 2.3 Razões que motivam o interesse pelo critério ABC........................................ 51
Figura 2.4 A atividade como processamento de uma transação ...................................... 55
Figura 2.5 Modelo do Custeio Baseado em Atividade ..................................................... 63
Figura 4.1 Fluxograma geral das atividades nos procedimentos das cirurgias
cardíacas............................................................................................................
110
x
LISTA DE TABELAS
Tabela 4.1 Cirurgias por Especialidades realizadas pelo HCU, no ano de 2005............... 91
Tabela 4.2 Custos Indiretos identificados para o Centro Cirúrgico/ HCU ........................ 98
Tabela 4.3 Critérios de rateio dos custos indiretos comuns ............................................... 99
Tabela 4.4 Cálculo de rateio do gasto com água ............................................................... 99
Tabela 4.5 Cálculo de rateio do gasto com energia elétrica............................................... 100
Tabela 4.6 Cálculo de rateio do gasto com telefone........................................................... 101
Tabela 4.7 Cálculo de rateio do gasto com o consumo de gás........................................... 102
Tabela 4.8 Custos indiretos do Centro Cirúrgico / HCU................................................... 103
Tabela 4.9 Recursos envolvidos no processo – Set.Out.Nov./05....................................... 104
Tabela 4.10 Cálculo porcentagens dos direcionadores de atividade - mão-de-Obra
técnicos enfermagem.....................................................................................
119
Tabela 4.11 Cálculo porcentagens dos direcionadores de atividade – técnicos em
anestesiologia ..................................................................................................
119
Tabela 4.12 Cálculo porcentagens dos direcionadores de atividade - mão-de-Obra equipe
médica..............................................................................................................
120
Tabela 4.13 Alocação dos recursos às atividades................................................................ 121
Tabela 4.14 Custos consumidos por cada atividade............................................................. 123
Tabela 4.15 Matriz de distribuição de trabalho.................................................................... 124
Tabela 4.16 Atribuição dos custos das atividades secundárias a primária.......................... 125
Tabela 4.17 Lista de atividades – Centro Cirúrgico/ HCU................................................... 129
Tabela 4.18 Tempo dispensado nas atividades de procedimentos cirúrgicos...................... 130
Tabela 4.19 Cálculos das taxas de atividades.................................................................... 131
Tabela 4.20 Atribuição de custos às cirurgias cardíacas ................................................... 133
Tabela 4.21 Cálculo horas consumidas nas atividades realizadas ao mesmo
tempo/Cirurgias cardíacas................................................................................
134
Tabela 4.22 Capacidade instalada Centro Cirúrgico HCU (em horas) ............................... 138
Tabela 4.23 Taxas cirúrgicas unitárias / custos indiretos................................................. 139
xi
SUMÁRIO
LISTA DE QUADROS ..................................................................................................... viii
LISTA DE FIGURAS ....................................................................................................... ix
LISTA DE TABELAS ...................................................................................................... x
INTRODUÇÃO
Antecedentes ao Problema................................................................................................... 01
O Problema.......................................................................................................................... 04
Objetivos Geral e específico............................................................................................... 05
Pressuposto.......................................................................................................................... 06
Método, técnicas e tipo de pesquisa.................................................................................... 07
Delimitação do estudo......................................................................................................... 08
Revisão da Literatura .......................................................................................................... 08
Considerações esperadas .................................................................................................... 13
Estrutura do Trabalho.......................................................................................................... 14
1 O SETOR TERCIÁRIO E A ORGANIZAÇÃO HOSPITALAR
1.1 Histórico da Prestação de Serviços e o Contexto atual.................................... 16
1.2 A Evolução Histórica da Organização Hospitalar no Brasil.......................... 19
1.3 Conceitos e Características das Organizações Hospitalares........................... 22
1.4 Panorama dos Hospitais Universitários no Brasil........................................... 25
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Contabilidade de Custos.................................................................................... 31
2.2 Custos: Uma Visão Geral dos Conceitos e Metodologias................................ 32
2.2.1 Terminologias e Classificações dos custos........................................................... 33
2.2.2 Metodologias de Custos ...................................................................................... 38
2.2.2.1 Método de Custeio por Absorção.......................................................................... 39
xii
2.2.2.2 Método de Custeio Variável ................................................................................ 43
2.3 Sistemas de Custeio Baseado em Atividade – ABC ........................................ 48
2.3.1 Histórico e conceito............................................................................................... 48
2.3.2 Atividades.............................................................................................................. 53
2.3.2.1 Classificação das Atividades ............................................................................... 56
2.3.2.2 Atribuição de Custos às Atividades ..................................................................... 58
2.3.3 Direcionadores de Custos ou de Atividades ......................................................... 60
2.3.4 Passos para Implantação do Método ABC............................................................ 63
2.3.5 Vantagens proporcionadas pelo Custeio ABC ..................................................... 67
2.3.6 Limitações atribuídas ao Custeio ABC................................................................ 69
2.4 O Método ABC e os Conceitos de custos dos Recursos Fornecidos,
Utilizados e os Não Utilizados..........................................................................
71
2.5 Diferenças entre o ABC e o Custeio por Absorção ......................................... 74
3 MÉTODO E TÉCNICAS DE PESQUISA
3.1 Introdução........................................................................................................... 77
3.2 Protocolo para o estudo de caso......................................................................... 79
3.2.1 Visão Geral do projeto do estudo de caso............................................................ 80
3.2.2 Procedimentos de campo para coleta de dados..................................................... 81
3.2.2.1 Procedimentos aplicados para levantamento bibliográfico................................... 83
3.2.2.2 Procedimentos aplicados para a realização das entrevistas .................................. 83
3.2.2.3 Procedimentos aplicados para realização da análise documental ........................ 85
3.2.2.4 Procedimentos aplicados para observação não participante ................................ 85
3.2.2.5 Procedimentos aplicados para análise e interpretação dos dados......................... 86
3.2.3 Questões do estudo de caso .................................................................................. 86
3.2.4 Guia para o relatório do estudo de caso ............................................................... 87
xiii
4 A METODOLOGIA DO CUSTEIO BASEADO EM ATIVIDADES
APLICADA NO CENTRO CIRÚRGICO DE UMA ENTIDADE
HOSPITALAR – UM ESTUDO DE CASO
4.1 Perfil da entidade objeto do estudo de caso...................................................... 88
4.2 Objeto da Pesquisa.............................................................................................. 90
4.3 Modelo da Metodologia de Custeio Adotada pelo HCU.................................. 93
4.3.1 Determinação dos Departamentos Hospitalares.................................................... 97
4.3.2 Custos Indiretos atribuídos ao Centro Cirúrgico-HCU......................................... 98
4.3.2.1 Apropriação dos Custos Indiretos Comuns........................................................... 99
4.3.3 Cálculo do Custo Indireto Total do Centro Cirúrgico .......................................... 102
4.4 Metodologia de Custeio ABC para Custos Hospitalares................................. 104
4.5 Etapas Essenciais para Implantação da Metodologia ABC ........................... 106
4.5.1 Identificação, Definição e Classificação de Atividades........................................ 106
4.5.2 Atribuição dos Recursos Consumidos para as Atividades.................................... 112
4.5.2.1 Identificação dos Recursos ................................................................................... 112
4.5.2.2 Direcionadores de Recursos.................................................................................. 114
4.5.2.3 Critérios para Alocação dos Recursos às Atividades............................................ 115
4.5.2.4 Cálculo dos direcionadores de atividades............................................................. 118
4.5.3 Alocação dos Recursos às Atividades .................................................................. 120
4.5.4 Custos das Atividades Secundárias para Atividades Primárias............................ 125
4.5.5 Objetos de Custos.................................................................................................. 127
4.5.5.1 Seleção dos Direcionadores de Atividades........................................................... 128
4.5.5.2 Taxas de Atividades.............................................................................................. 131
4.5.5.3 Atribuição dos Custos das Atividades aos Serviços.............................................. 132
4.6 Comparativo entre Custeio por Absorção e ABC............................................ 135
xiv
4.7 Considerações sobre a aplicabilidade do Custeio ABC em entidades
hospitalares .....................................................................................................
142
CONSIDERAÇÕES FINAIS E SUGESTÕES................................................................ 146
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................ 152
ANEXOS ............................................................................................................................ 158
1
INTRODUÇÃO
Antecedentes ao problema
Os meios de comunicação têm divulgado, com certa freqüência, as discussões
existentes entre o Sistema Único de Saúde (SUS), de um lado, e os gestores de instituições
públicas de saúde, de outro. Os Hospitais Universitários, doravante HUs, estão integrados ao
SUS e têm em seus recursos a maior parcela de seu financiamento. Estes, dentre outros
argumentos, afirmam que tais recursos não são suficientes para a sustentabilidade da
instituição. O SUS reembolsa os hospitais com base numa tabela de preços única para cada
procedimento. Os hospitais são reembolsados por esses valores, não importando o tempo de
permanência no hospital ou os custos reais incorridos com os pacientes. Esse sistema de
reembolso, teoricamente, não admite ineficiência, exigindo dos HUs um alto grau de eficácia
e eficiência na gestão dos escassos recursos.
Nesse contexto econômico, os hospitais de ensino encontram-se debilitados por
serem mais dispendiosos, dado que incorporam atividades de ensino, pesquisa e extensão que
os tornem um referencial em tecnologia de ponta.
A situação predominante da saúde pública no país é preocupante. Isso pode ser
atestado por qualquer pessoa, e não é preciso recorrer aos hospitais para se ter esta certeza:
todos os dias, os meios de comunicação mostram as filas nos hospitais públicos, pacientes
esperando por socorro que, infelizmente, chega tarde. Também, em alguns casos, ocorre a
presença de pacientes aguardando nos corredores porque faltam leitos para acomodação. Para
determinadas especialidades, as pessoas aguardam meses por uma simples – e rápida, até
mesmo superficial - consulta. Enfim, fala-se de hospitais velhos, mal aparelhados e, muitas
vezes, não dispondo nem mesmo de remédios.
2
Nesse contexto, cresce a exigência do governo e da sociedade pela racionalização
dos gastos e despesas, aumento da produtividade e melhoria da qualidade dos atendimentos
nos HUs; no Brasil, esses são pressionados pela adoção de um Gerenciamento Sustentável
destas instituições, exigindo uma nova organização, com a adesão a conceitos que tornem o
processo produtivo mais voltado ao cliente e possibilitem atingir melhores níveis de
produtividade.
Diante desse cenário, o controle de custos tem aumentado no sistema hospitalar de
modo geral, porém, ainda é limitada a utilização de informações sobre custos para efeito de
tomada de decisão. Pergunta-se, então: ‘Como garantir a sustentabilidade para o hospital
universitário, visto que este não tem total controle sobre seus custos?’. Certamente, trata-se de
um desafio que parece encontrar resposta em uma metodologia de custos que, de acordo com
Kaplan e Cooper ( 1998, p. 15), surgiu na década de oitenta. Trata-se do Custeio Baseado em
Atividades (ABC).
O Activity-Based Costing -ABC, desenvolvido inicialmente para a área industrial,
vem encontrando grande aplicabilidade na área de serviços, pois utiliza a análise de processos
e de valor agregado nas suas fases de implantação, facilitando a compreensão da organização
e de seus inter-relacionamentos. O método do custeio baseado em atividades aprimora a
gestão financeira à medida que permite identificar os gastos com atividades associadas aos
processos executados, servindo como importante ferramenta gerencial, seja como instrumento
interno ou externo de desempenho.
Esse método é uma poderosa ferramenta no processo decisório para gestores
hospitalares, ou seja, aplicável em ambientes que possuem grande diversificação de serviços,
principalmente quanto à alocação de recursos e no redesenho da nova organização hospitalar,
necessária para adaptar-se ao novo cenário.
3
De acordo com a literatura existente sobre o Custeio Baseado em Atividades, e
também alguns trabalhos acadêmicos na área, é possível aplicar a filosofia, o conceito e as
técnicas do Custeio ABC em serviços hospitalares, com o objetivo de gerenciar os custos das
atividades, avaliar o resultado do serviço prestado e assegurar a continuidade da entidade.
Nesse sentido, caso seja comprovada sua aplicabilidade, além de trazer importante
contribuição para o avanço da teoria atual, representará uma valiosa alternativa para a gestão
dos custos das entidades hospitalares.
O Ministério da Saúde reconhece que a crise dos hospitais universitários não é
apenas financeira, é necessário enfrentá-la estruturalmente em todas as suas dimensões. Por
isso, urge uma nova política para os hospitais de ensino que permita aprimorar os mecanismos
de gestão hospitalar e rever a maneira como esses se inserem na rede do SUS. Um desses
mecanismos é o controle dos custos hospitalares nas diversas atividades e procedimentos
desenvolvidos por essas instituições.
Para o enfrentamento desses problemas, o Governo Federal criou o Programa de
Reestruturação dos Hospitais de Ensino no âmbito do SUS. A política de reestruturação
desses hospitais, no entanto, não se resume ao repasse de recursos para superação da crise
financeira que enfrentam. A nova política envolve ações voltadas para o aprimoramento do
papel que essas instituições desempenham em relação ao ensino, à pesquisa em saúde, aos
mecanismos de gestão hospitalar e mudanças na maneira como esses hospitais se inserem na
rede do SUS. O documento que sacramenta essa nova política foi assinado em 15 de abril de
2004 pelos Ministérios da Saúde e Educação: a Portaria Interministerial nº 1000/04. Ela cria
novos requisitos para certificação das instituições como hospitais de ensino. Aquelas que
pretendem obter essa classificação serão avaliadas e certificadas pelos Ministérios da Saúde e
da Educação.
4
Ao todo, são dezessete critérios que deverão ser observados para que uma instituição
possa obter o título de hospital de ensino. Um dos critérios é que os HUs deverão dispor de
estrutura mínima de gestão hospitalar, que inclua rotinas técnicas e operacionais, sistema de
informação e sistema de avaliação de satisfação do usuário, bem como, foco deste trabalho, o
sistema de avaliação de custos.
As mudanças no mercado, com clara influência nos hospitais, aliadas às
necessidades de se alcançarem melhores níveis de desempenho organizacional, não somente
para o bem-estar da própria organização hospitalar, mas principalmente pela importância do
papel desempenhado na sociedade por essas instituições, evidenciam que a gestão hospitalar
deve dispor de instrumentos modernos.
O problema
A fixação dos preços dos serviços hospitalares, com base nos custos, no caso dos
HUs, vem sendo inviabilizada pela imposição dos preços desses serviços pelo Sistema Único
de Saúde. Essa situação pode comprometer a atuação e continuidade dos serviços da entidade.
Diante disso, dados os preços estabelecidos pelo SUS, pode-se facilmente constatar
a necessidade dos HUs de operar, em cada serviço, a um custo que possa garantir o
atendimento à comunidade e gerar serviços de que ela necessita, ou seja, com o menor custo
possível em um nível máximo de qualidade, e garantir, portanto, a continuidade da instituição.
Esse é o foco do problema.
Em resumo, a situação-problema objeto deste trabalho é avaliar aplicabilidade, ou
não, da metodologia do custeio ABC ao setor de prestação de serviços hospitalares.
5
Nesse cenário, surge a motivação para a formulação das seguintes questões de
pesquisa:
1 - a filosofia, os princípios e o processo da metodologia do custeio baseado em atividades
podem ser aplicados, com êxito, em entidades hospitalares?
2 - quais as características próprias dessa metodologia como instrumento gerencial estratégico
quando aplicado às entidades hospitalares?
Objetivos geral e específico
De acordo com Martins (2000, p. 25), na fase de definição dos objetivos, o
pesquisador busca responder á questão: Para que fazer? Assim, tendo em vista a
caracterização do problema e a formulação das questões da pesquisa, desenvolver-se-á a
pesquisa com os seguintes objetivos:
Objetivo geral
O objetivo geral deste trabalho é verificar a viabilidade e identificar as
peculiaridades da aplicação da metodologia de custeio baseado em atividades em uma
entidade hospitalar de ensino (hospital universitário), na especialidade cardiologia, no
procedimento de cirurgia cardíaca.
Objetivos específicos
Para o alcance do objetivo geral, foram estabelecidos os seguintes objetivos
específicos:
6
a) relatar o processo ( etapas essenciais ) de aplicação da metodologia do custeio
ABC em entidades hospitalares, especificamente nos procedimentos de cirurgias
cardíacas;
b) ressaltar aspectos da metodologia de custeio ABC aplicado a entidades
hospitalares correlacionados com a bibliografia estudada; e
c) avaliar a aplicabilidade da metodologia de custeio ABC nos procedimentos de
cirurgias cardíacas em comparação com a do método de custeio por absorção.
Pressuposto
Segundo Trujillo Ferrari (1982, p. 129), “a hipótese é uma proposição antecipadora à
comprovação da realidade existencial. É uma espécie de pressuposição que antecede a
constatação dos fatos.”
De acordo com Goode & Hatt ( 1975, p. 75), uma hipótese: “é uma proposição que
pode ser colocada à prova para determinar sua validade. Pode parecer contrária, ou de acordo
com o senso comum. Pode ser correta ou errada. Em qualquer caso, porém, conduz a uma
verificação empírica.”
Martins (2000, p. 33) lembra que “nem todos os tipos de pesquisa necessitam da
formulação de hipóteses”; a formulação de hipóteses é comum no campo dos estudos
experimentais.
Triviños ( 1992, p.105) afirma que “ os outros tipos de estudo, descritivos e exploratórios,
aceitam, geralmente, questões de pesquisa, perguntas norteadoras.”
7
Portanto, diante do exposto e considerando-se a situação problema, sugere-se um
pressuposto de que a metodologia do custeio baseado em atividades (ABC) se adequa às
atividades de prestação de serviços hospitalares, especificamente, para cirurgias cardíacas.
Método, técnicas e tipo da pesquisa
Esta pesquisa pode ser classificada, em parte, como um estudo de caso de natureza
exploratória, quando se propõe a investigar empiricamente um fenômeno contemporâneo
dentro do contexto em que este ocorre. Triviños (1992, p.109) afirma que “os estudos
exploratórios permitem ao investigador aumentar sua experiência em torno de determinado
problema”. O autor ressalta que o pesquisador prepara o estudo exploratório com a finalidade
de auferir os elementos suficientes que lhe permitam alcançar os resultados que deseja.
Segundo Gil (2002, p. 43), “pesquisas exploratórias são desenvolvidas com o
objetivo de proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato”. A
pesquisa exploratória tem algumas finalidades específicas, como: proporcionar maiores
informações sobre o assunto que se vai investigar; facilitar a delimitação do tema de pesquisa;
orientar a fixação dos objetivos e a formulação das hipóteses; ou descobrir um novo tipo de
enfoque sobre o assunto (ANDRADE, 2002). Nesse tipo de pesquisa, afirma Gil ( 2002, p.
43), “o produto final [...] passa a ser um problema mais esclarecido, passível de investigação
mediante procedimentos mais sistematizados”.
Portanto, considerando-se que o principal objetivo deste estudo é verificar e
demonstrar a aplicabilidade da metodologia do custeio ABC em entidades e produtos
hospitalares, o procedimento adotado para a pesquisa empírica é o estudo de caso único e
holístico, com o propósito de focar uma unidade de análise como um todo. (YIN, 2005)
8
Considerando-se que a avaliação da implementação da metodologia do custeio
baseado em atividades (ABC) implica o envolvimento do pesquisador, gestores e
colaboradores da entidade pesquisada tanto no processo em si como na solução dos problemas
encontrados, outra opção adotada é o método da observação não participante, no contato com
entidade parte integrante deste estudo.
Delimitação do estudo
Este trabalho centra-se na análise da viabilidade da aplicação da metodologia do
custeio baseado em atividade (ABC) em entidades hospitalares. Para tanto, como entidade,
objeto de estudo, escolheu-se o Hospital de Clínicas de Uberlândia-MG (HCU), cujas
características estão descritas, em detalhes, no Capitulo 4. Como produto da pesquisa, as
cirurgias cardíacas, classificadas em pequeno, médio e grande porte. Em relação aos dados,
estes referem-se ao período de setembro a novembro de 2005, correspondem as informações
prestadas pelos responsáveis em cada área de trabalho, envolvido nesta pesquisa, do hospital
objeto deste estudo de caso.
Como delimitação conceitual, destaca-se que esta pesquisa não tem como objetivo
avaliar as atividades envolvidas no processo de cirurgias cardíacas, no sentido de segregar as
atividades que agregam ou não valor ao procedimento cirúrgico; tampouco verificar se o
resultado operacional estabelecido pela entidade é consistente com seus planos estratégicos e
operacionais.
Revisão da Literatura
Nesse estudo, fundamental foram as investigações realizadas com as contribuições
teóricas já produzidas relativas ao tema, constantes nas teses doutoramento defendidas na
Universidade de São Paulo no curso de doutoramento em contabilidade, nas dissertações
9
defendidas na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Escola de Administração de
Empresa de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e na Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, em seus respectivos cursos de
mestrado em contabilidade, e em livros publicados pertinentes ao assunto em questão.
Essa revisão bibliográfica se faz necessária à sustentação teórica da pesquisa e
possibilitará uma investigação do problema. A principal vantagem da pesquisa bibliográfica
está, para Gil (2002, p. 65), “no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de
fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente”.
Pode-se destacar quatro dissertações de mestrado que já trataram o tema custeio
baseado em atividades em entidades hospitalares. Essas dissertações, já realizadas por Ricardo
Baumgartner, Carlos Montenegro de Lima, Hong Yuh Ching e Eraldo da Rocha Pimentel
serviram de base a esta dissertação.
A dissertação de Ricardo Baumgartner, defendida na Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, em 1998, sob o tema “Avaliação da aplicabilidade do custeio ABC – Activity
Based Costing na acurácia de custos na área hospitalar” apresenta uma proposta de avaliação
da aplicabilidade do custeio ABC na unidade de terapia intensiva de um hospital em
Salvaldor-BA e compara seus resultados com o custeio RKW.
Para efeito de comparação do método de custeio RKW e ABC, foram considerados
pelo pesquisador somente os custos de pessoal, salários e encargos. Foram mapeadas as
atividades do processo de atendimento ao paciente dentro da UTI (Unidade de Tratamento
Intensivo) e o respectivo tempo gasto.
10
Os custos das atividades foram agrupados por profissionais envolvidos na recepção,
preparação, avaliação, procedimentos, rotinas médicas, rotinas administrativas, exames
externos e altas.
O pesquisador concluiu que, à medida que o paciente permanece internado por um
período mais longo, a variação fica mais significativa, pois a internação e a alta só acontecem
uma vez e não diariamente; no entanto, seus custos são diluídos no período de internação. A
ocorrência dos custos dar-se-á, somente, nas atividades de rotina diárias. Por outro lado, o
custeio tradicional, representado pelo RKW, considera apenas um valor linear de paciente/dia
multiplicado pelos dias de internação.
A segunda dissertação é a de Carlos Montenegro de Lima, defendida na Escola de
Administração de Empresa de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas, no ano de 1997, sob o
tema “Activity Based Costing para hospitais”, que apresentou os métodos convencionais de
custeio, bem como os utilizados pelos serviços de saúde norte-americanos. Utilizou-se de um
exemplo prático de uma aplicação do custeio baseado em atividades em hospital, com base
em um exemplo demonstrado no livro de Douglas Hicks, Activity based costin for small and
mid sized business: na implementation guide (WILEY, 1992 p. 312 apud LIMA, 1997).
O hospital objeto do estudo é de pequeno porte e oferece serviços clínicos, pediatria,
ginecologia e obstetrícia, além de radiologia e serviços laboratoriais. O pesquisador utilizou a
metodologia do custeio ABC para a Radiologia e Laboratório.
O exemplo do livro, utilizado por Montenegro, proporcionou uma ampliação do
alcance da aplicabilidade do custeio ABC, além de suas aplicações iniciais, a fim de permitir a
atribuição abrangente de gastos e despesas organizacionais a produto e serviços, considerando
as atividades de apoio que foram propagadas e direcionadas para as atividades primárias que
podem ser atribuídas aos seus objetos de custeio.
11
A terceira dissertação é de Hong Yuh Ching, defendida na Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, no ano de 2000, sob o tema “Gestão Baseada em Custeio por
Atividade aplicada no processo de maternidade de uma instituição hospitalar”. Tem por objeto
de pesquisa o estudo de caso realizado com base na implantação do método de custeio
ABC/ABM na maternidade de um hospital de alto padrão localizado em São Paulo, e
objetivou custear os procedimentos de pacotes hospitalares, de parto normal e de cesárea,
ambos incluindo o custo do recém-nascido e, também, aperfeiçoar as funções de controles e
do processo decisório dos gestores hospitalares.
A delimitação da pesquisa enfocou o processo maternidade, que compreende desde a
chegada da parturiente ao hospital, a intervenção cirúrgica no centro obstétrico, a estada do
RN (recém-nascido) no berçário, o retorno da puérpera à ala de internação e sua posterior alta
e do RN.
Os custos das atividades foram agrupados em: atividades relacionadas ao parto
(basicamente atividades dos grupos de profissionais do centro obstétrico), atividades
relacionadas à internação e cuidados com a mãe (atividades dos grupos profissionais da ala de
internação maternidade), atividades relacionadas à internação e cuidados do RN, incluindo os
médicos neonatologistas (atividades dos grupos de profissionais dos berçários).
Para apurar o custo do pacote de parto normal e cesárea, o autor considerou o
protocolo médico, procedimentos que determinam o consumo padrão de medicamentos,
materiais médicos e realização de exames padrão tanto na mãe como no RN, e assumiu
sempre o RN em berçário normal.
O autor fez uma avaliação de todas as atividades do processo maternidade, no
sentido de segregar as atividades que agregam ou não agregam valor ao paciente.
12
Para o autor, a implantação da gestão baseada em atividades representa uma
mudança radical na gestão dos negócios, o que envolve muito trabalho e disposição e que,
como resultado, implica em uma substancial melhoria da gestão dos processos
organizacionais.
A quarta dissertação é de Eraldo da Rocha Pimentel, defendida na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, no ano de 2004, sob o tema “Metodologia de Custeio
Baseado em Atividades: uma aplicação dos custos indiretos no centro cardiológico de um
hospital.”.
A dissertação trata das ferramentas de gestão em organização hospitalar, com ênfase
na metodologia de custeio ABC como instrumento de gestão financeira para mensuração dos
custos indiretos dos serviços prestados e geração de informações para a tomada de decisão. O
objetivo principal foi avaliar a aplicabilidade da metodologia de custeio baseado em
atividades como instrumento de gestão financeira nas organizações hospitalares e comparar
com os resultados proporcionados pelo custeio por absorção.
O objeto de pesquisa para a aplicação prática da metodologia de custeio por
atividade e absorção foi a área cardiológica de um hospital privado, por ser um grande centro
de renda, com uma grande diversidade de especialidades em doenças que são acometidas pelo
coração. O estudo delimitou em aplicar as metodologias de custos para determinar o custo de
enfermagem para os diferentes tipos de pacientes cardiológicos.
O autor observou que, com a utilização das duas metodologias, mesmo sendo
pacientes com mesmo tipo de doença e serem todos dos serviços de enfermagem, a
comparação das taxas dos custos indiretos unitários por atividade e departamento mostra
claramente os efeitos de se usar apenas taxa única para atribuir custos indiretos aos serviços.
A atribuição de custo baseado em atividade reflete melhor o consumo dos custos indiretos e é,
13
portanto, mais precisa, por utilizar várias taxas para atribuir custos aos serviços. O custeio sob
a orientação da metodologia por absorção supercusteia os serviços do departamento de
tratamento normal e subcusteia os dos departamentos de tratamento intermediário e intensivo.
Considerações Esperadas
A pesquisa cientifica contribui para o meio acadêmico, ampliando o grau de
conhecimento de determinada área pesquisada (KOCHE, 2000, p. 122). Assim, espera-se que
este estudo traga as seguintes contribuições aos interessados:
a) proporcionar à Comunidade Acadêmica a possibilidade de avaliar as limitações dos
modelos tradicionais de análise de custos e demonstrar os avanços relacionados com a
estruturação de modelos de avaliação de custos, no sentido de aumentar a sua relevância para
o processo de tomada de decisão.
b) demonstrar a aplicabilidade da metodologia de custeio ABC na área hospitalar,
especificamente no centro cirúrgico; escolhendo como produto da pesquisa, as cirurgias
cardíacas, classificadas em pequeno, médio e grande porte. Obviamente, sem o objetivo de ser
um trabalho conclusivo, no entanto, não deixa de encaminhar uma solução prática para este
setor.
c) contribuir para despertar a atenção dos profissionais da contabilidade e outras áreas
afins para ampliar a pesquisa relacionada à metodologia ABC a entidades hospitalares.
Considerando que atualmente existe, no Brasil, uma enorme carência do serviço de
Administração Hospitalar, detectada nas visitas feitas a estas organizações, busca-se com este
trabalho colaborar para os profissionais da gestão hospitalar possam aprimorar seus controles
de custos.
14
d) Por fim, espera-se que esta pesquisa venha a contribuir com os gestores dos
Hospitais Universitários, para que os mesmos possam avaliar as tendências cada vez mais
significativas no controle rígido dos custos hospitalares, que influenciam diretamente na
sustentabilidade destas instituições. Considera-se que a aplicabilidade da metodologia de
custeio ABC poderá ser relevante para os gestores identificarem as atividades necessárias à
elaboração dos serviços e por procedimentos específicos, com o objetivo de diminuir seus
custos, e também para melhor negociação com o Sistema Único de Saúde (SUS), que
atualmente é a principal financiadora de recursos aos Hospitais Universitários.
Julgamos que esta pesquisa não representa a meta última da gestão de custos em
entidades hospitalares, mas, sim, um passo que se acredita ser apropriado para o avanço da
metodologia de custeio ABC.
Estrutura do Trabalho
A estrutura deste trabalho será apresentada da seguinte forma:
Introdução: serão apresentados os antecedentes ao problema, o problema, os objetivos geral
e específicos, a hipótese, método, técnicas e tipo da pesquisa, delimitação do estudo, revisão
da literatura, contribuições esperadas e a estrutura do trabalho.
Capítulo 1 – O Setor Terciário e a Organização Hospitalar: destina-se a um breve relato
do Setor Terciário e a Organização Hospitalar; descrevendo o histórico da prestação de
serviços e o contexto atual; a evolução histórica da Organização Hospitalar no Brasil;
conceitos e características das Organizações Hospitalares e o Panorama dos Hospitais
Universitários no Brasil.
Capítulo 2 – Referencial Teórico: elaborou-se o referencial teórico abordando os aspectos
da contabilidade de custos; a visão geral dos conceitos e metodologias dos custos, além de
15
demonstrar as terminologias e classificações dos mesmos. Na evidenciação das metodologias
de custos foram abordados os métodos: custeio por absorção, custeio variável e os métodos de
custeio baseado em atividade (ABC), sendo que neste último, demonstrou-se as todas as
peculiaridades e etapas de implementação do método.
Capítulo 3 – Método e Técnicas da Pesquisa: destina-se a exposição pormenorizada do
método e das técnicas utilizadas na pesquisa, considerando o protocolo para o estudo de caso.
Capítulo 4 – A Metodologia do Custeio Baseado em Atividades Aplicada no Centro
Cirúrgico de uma Entidade Hospitalar – Um Estudo de Caso: contém a essência desta
pesquisa, apresentando o estudo de caso no Hospital Universitário, objeto deste estudo, no
qual demonstrou se a aplicabilidade da metodologia do custeio baseado em atividades nos
procedimentos de cirurgias cardíacas pequeno, médio e grande porte e apresentou um
comparativo dos resultados apurados com relação à Metodologia de Custeio por Absorção
adotada atualmente pela entidade hospitalar em estudo.
Considerações finais e sugestões: Será analisado, por ocasião da conclusão e das
recomendações, o alcance dos objetivos inicialmente propostos pelo trabalho e as
recomendações para a realização de estudos futuros.
16
1. O SETOR TERCIÁRIO E A ORGANIZAÇÃO HOSPITALAR
Com o objetivo de melhor esclarecer o processo de reformulação pelo qual o setor
terciário (prestação de serviços) passou nos últimos anos, faz-se aqui um relato dos fatos mais
marcantes de sua história, e neste contexto busca ainda caracterizar as organizações
hospitalares, abordando as principais definições e suas funções encontradas na literatura, bem
como o panorama dos Hospitais Universitários e a importância destas organizações de
serviços no contexto atual.
1.1 Histórico da Prestação de Serviços e o Contexto atual
No decorrer da história de nosso país, os estudos tradicionais da economia enfocavam
as atividades do comércio, da agricultura, da indústria e dos bancos. Foi apenas a partir dos
anos 1930 que se procurou classificar as atividades econômicas em grandes grupos, de acordo
com a natureza do processo de trabalho e dos produtos resultantes. Ou seja, somente no início
do século XX apareceram os primeiros trabalhos que trataram sistematicamente o setor de
serviços como um grupo de atividades aportadas das demais teorias anteriores.
As contribuições iniciais aos estudos sobre o tema foram feitas por Fischer apud Clark
(1940) que propôs dividir as atividades econômicas em primárias, secundárias e terciárias.
Clark retomou a classificação de Fischer, mas utilizou no lugar de “terciário” a expressão
“serviços”, considerada mais adequada. Sem dúvida, a nova nomenclatura procurava
contemplar a crescente diversificação observada na vida econômica das principais cidades
norte-americanas (MELO et al, 1998; MELVIN, 1995), embora essas primeiras iniciativas de
tratar conceitualmente os serviços não fazem mais do que defini-los de modo residual, ou
17
seja, como atividades que não se enquadram nem no setor primário, nem no secundário
(KON, 1999).
A definição atualmente aceita diferencia os serviços de outros bens derivados da
produção industrial e agrícola pelo fato de serem consumidos tal como produzidos e serem
resultantes de um processo em que produção e consumo são coincidentes no tempo e no
espaço. Assim, os serviços caracterizam-se pela circunstância de serem intangíveis,
intransferíveis, não estocáveis e por apresentarem contato direto entre produtores e
consumidores (MELO et al, 1998).
Meirelles (2005) chama a atenção às notáveis transformações das características
fundamentais dos serviços, visto que entre as implicações que tais transformações provocam
sobre a natureza destes, destaca-se a “redução tendencial da intangibilidade, da
simultaneidade, da inestocabilidade e da interatividade pessoal entre prestadores e usuários –
atributos usualmente considerados como típicos de atividades de serviço.” (MEIRELLES,
2005 p. 478).
Segundo Offe (1989), o conceito de trabalho em serviços é de modo geral muito mal
definido na literatura pertinente, além do que “a experiência cotidiana da pesquisa social
confirma também que os indicadores mais eficazes são ao mesmo tempo os menos
encontrados nas estatísticas econômicas e sociais oficiais” (OFFE,1989 p.134).
Não obstante, com o aprimoramento das análises estatísticas sobre o Produto Interno
Bruto - PIB, verificou-se a importância do setor de serviços na economia mundial.
Impulsionados pelo desenvolvimento, pelas transformações tecnológicas e pela expansão
financeira, os serviços cresceram de aproximadamente 40% para 70% do PIB mundial, entre
1950 e 1990 (GRILICHES & MOHR, 1992 apud MELO et al., 1997). Além disso, os
serviços adquiriram uma importância crucial na estrutura de emprego e nas transações
18
econômicas de um modo geral, seja como atividade de uso final, seja como atividade de apoio
à produção manufatureira e agrícola. Por isso, o crescimento das atividades que compõe o
setor é tido como importante fonte de ocupação da mão-de-obra, tanto nos países
desenvolvidos como nas economias periféricas, guardadas as devidas proporções e
peculiaridades.
No que concerne às explicações acerca do dinamismo do setor de serviços em
termos de geração de ocupação e renda, Offe (1989) menciona duas abordagens: por um lado,
deve-se levar em conta o crescimento e diferenciação da demanda e das necessidades; por
outro, a lógica da oferta no mercado de trabalho. Em trabalho posterior, com o intuito de
fornecer uma visão melhor sistematizada, Offe (1991) aponta quatro aspectos sociológicos
tidos como relevantes para entender o problema concernente ao crescimento dos serviços: 1)
demanda sistêmica (frente à necessidade de “gerenciamento” devido à crescente
complexidade); 2) déficits de empregos (absorção do “excesso estrutural” crescente da oferta
superabundante no mercado de trabalho); 3) alterações da demanda (frente às mudanças por
parte dos orçamentos domésticos, tendo em vista o incremento da renda familiar) e 4)
interesses dos ofertantes (frente às alterações de preferências e a autonomia de definição por
parte dos ofertantes de serviços).
Kon (2001) explica o crescimento dos serviços a partir da “desindustrialização” ou
da transição para uma “economia da informação”, no sentido de que as indústrias de serviços
pertencem ao estágio mais avançado de desenvolvimento de uma economia, tendo como
antecedentes: a) estágios anteriores de soberania da agricultura e da manufatura; b)
substituição dos trabalhos manuais pelos de escritório e burocrático; c) tendência à maior
qualificação e promoção da força de trabalho como recurso–chave e d) disponibilidade e
maior acesso à informação como o principal fator de produção em vez da matéria-prima e do
trabalho.
19
Gianesi e Corrêa ( 1996, p. 17) afirmam que:
A importância das atividades de serviços em nossa sociedade pode ser demonstrada, por um lado, pela posição que ocupam na economia, seja através da participação no Produto Interno Bruto seja na geração de empregos, e pela análise das tendências e transformações que a economia mundial está experimentando.
Essa importância pode ser fundamentada com os dados o IBGE – Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística. De acordo com os dados do ano 2003, o setor de serviços
participou em 57% do PIB – Produto Interno Bruto, enquanto as indústrias participaram em
36% e o setor agropecuário com 7%.
Percebe-se, como demonstram os números do IBGE, que um dos setores
econômicos que mais tem crescido nos últimos tempos é o de prestação de serviços, e o
mesmo tem importância fundamental na geração de riqueza do país. A rápida expansão, a
velocidade e o volume de negócios envolvidos exigem dos gestores das empresas tomadas de
decisões cada vez mais rápidas e acertadas.
No setor de serviços, um ramo de atividade que se pode destacar é o das
organizações hospitalares, foco deste estudo. Em seguida, evidencia-se uma análise do
ambiente dessas organizações, abordando o histórico, conceitos, finalidades e características
peculiares das mesmas.
1.2 A Evolução Histórica da Organização Hospitalar no Brasil
As primeiras instituições hospitalares surgiram no Brasil na época do seu
descobrimento pelos portugueses. A idéia do cristianismo, da caridade e do amparo às pessoas
com dificuldades estava presente nos primeiros hospitais brasileiros e, desde então, são
reconhecidos como instituições indispensáveis à comunidade. Segundo Martins Domingos
20
(2002, p. 17), “a forma de assistência utilizada teve origem no movimento iniciado na Idade
Média na Itália e denominada de Misericórdias que tinham como propósito amparar as
pessoas com dificuldades diversas.”
De acordo com Martins Domingos (2002, p.17), a primeira Santa Casa de
Misericórdia do Brasil foi fundada por Braz Cubas na cidade de Santos, no Estado de São
Paulo. A partir daí, espalharam-se por muitas cidades brasileiras dedicando-se ao serviço de
assistência à saúde.
Com a Revolução Industrial, o rápido crescimento das cidades agravou as condições
de vida das classes mais pobres e, sobretudo, os novos desenvolvimentos tecnológicos
exigiam um fluxo mais ordenado do processo produtivo, requerendo mão-de-obra saudável
(STERN, 1983, p. 84).
Paralelamente, a pesquisa e as descobertas no campo do conhecimento científico
alteraram a prática médica. Os processos diagnósticos, terapêuticos e preventivos tornaram
difícil, senão impossível, o desempenho do médico sem os modernos equipamentos e os
recursos humanos gerais e especializados na medicina moderna, concentrados nos hospitais
(SIQUEIRA, 1985, p. 95 ).
Segundo Pereira et al (2005, p. 10):
[...] no início do século XIX, surgiram os primeiros hospitais, em sua maioria ligados a entidades religiosas. Essas instituições eram voltadas às populações pobres e indigentes. Por sua vez, o governo limitava-se a implantar instituições destinadas a abrigar doentes mentais, asilos para tuberculosos ou hansenianos e a desenvolver campanhas sanitárias nacionais. O país não tinha uma política efetiva de saúde pública até os anos 1930. A intervenção do Estado tornou-se mais efetiva quando da implantação da Previdência Social, a partir da década de 1930.
21
A mesma autora afirma que a partir de 1960 o sistema público de saúde começou a
demonstrar insuficiência para atender à população. A crise da saúde fundamentava-se,
naturalmente, em uma crise social ampla e profunda.
Durante os anos 1970, verificou-se um maior investimento de capital privado no
segmento da saúde brasileira. O movimento de introdução do capitalismo nos serviços de
saúde desenvolveu-se, criando o que se convencionou chamar de “complexo médico-
hospitalar”. O rápido processo de assalariamento dos médicos e demais profissionais, o
crescimento dos estabelecimentos privados de caráter lucrativo, a diminuição da importância
dos estabelecimentos filantrópicos e beneficentes dominantes até então, a constituição lenta
de uma ideologia empresarial no setor de saúde foram características que marcaram o período
( PEREIRA et al, 2005, p. 10).
A rede privada vislumbrou uma oportunidade emergente, e muitos empreendedores
passaram a investir em hospitais privados, visando a atender a população que estava sem a
cobertura do Estado.
O hospital com as características observadas nos dias atuais é algo muito recente. Uma organização como instrumento de intervenção terapêutica com o objetivo de alcançar a cura de doentes é uma invenção relativamente nova. A formação médica, que não incluía atividade hospitalar, passou a ser uma atividade rotineira, com visita e evolução hospitalar dos pacientes realizadas por médicos, cujo trabalho era observar o comportamento dos doentes e tentar auxiliar a natureza no processo de cura. Nos últimos 50 anos, o avanço da tecnologia foi brutal. A cada dia, surgem novas técnicas de diagnóstico que podem (a custos altíssimos) identificar problemas que antes permaneciam ocultos. Há novas (e caras) terapias de cura. Novas (e igualmente caras) técnicas cirúrgicas que prolongam a vida dos pacientes que há algum tempo teriam expectativa zero de sobrevivência. A cada dia, os profissionais de saúde tornam-se mais especializados. (MEDICI, 2001, p.149).
Nesse contexto, como se pode notar em seguida, foram analisados os conceitos e
características das Organizações Hospitalares, destacando suas finalidades no sistema de
saúde.
22
1.3 Conceitos e Características das Organizações Hospitalares
Segundo Almeida (1983, p. 205),
[...] hospital é uma instituição destinada ao diagnóstico e tratamento de doentes internos e externos; planejada e construída ou modernizada com orientação técnica; bem organizada e convenientemente administrada consoante padrões e normas estabelecidas, oficial ou particular, com finalidades diversas; grande ou pequena; custosa ou modesta para atender os ricos, os menos afortunados, os indigentes e necessitados, recebendo doentes gratuitos ou contribuintes; servindo ao mesmo tempo para prevenir contra a doença e promover a saúde, a prática, a pesquisa e o ensino da medicina e da cirurgia, da enfermagem e da dietética, e das demais especialidades afins.
Para Cherubin (1997, p.10), os hospitais são:
Parte integrante de um sistema coordenado de saúde cuja função é dispensar à comunidade uma completa assistência à saúde, tanto curativa quanto preventiva, incluindo serviços extensivos à família, em seu domicílio e ainda um centro de formação para os que trabalham no campo de saúde e para as pesquisas biossociais.
Rocchi (1982, p.19) corrobora com o autor acima e apresenta a seguinte definição:
“Os hospitais modernos são estabelecimentos destinados a cumprir cinco funções na área da
saúde: preventiva, de reabilitação, restauradora, de ensino e de pesquisa”.
O mesmo autor faz uma descrição das funções nas áreas de saúde, qual seja: na área
preventiva deve fornecer à comunidade:
Serviços preventivos como educação sanitária, pré-natal e vigilância no parto normal; prevenção da invalidez mental e física; e auxílio nas campanhas de vacinação, organização de cursos e palestras como também distribuição de informativos com a finalidade de incentivar a prevenção de doenças. (ROCCHI, 1982, p. 19).
23
Na área curativa:
Deve manter atividades de diagnóstico; propiciar tratamento curativo de enfermidade; oferecer um serviço de alto nível no desempenho tanto de recursos humanos, quanto materiais; e oferecer assistência aos pacientes em casos de urgência. (ROCCHI, 1982, p. 19).
Na área educativa:
Adaptar cada centro do hospital para garantir um estágio de alta qualidade aos profissionais de saúde; oferecer cursos, seminários e simpósios aos chefes e diretores de unidades administrativas; promover cursos na área da saúde e ampliar o campo de literatura específica aos servidores que trabalham na instituição; e manter um número suficiente de convênios com entidades educacionais para residência e estágios oficiais. (ROCCHI, 1985, p. 19).
Na área de pesquisa Rocchi (1985, p. 19) considera que deverá: “promover e
incentivar pesquisas clínicas e na área administrativa; e procurar manter dados atualizados de
todas as áreas do hospital”.
As descrições acima faz então percebermos o leque de funções desempenhadas por
um hospital; destaca também a idéia de que deve ser dada ao beneficiado (paciente ou cliente)
toda a condição possível para que ele possa ter melhores condições de vida, as quais lhe são
de direito.
O hospital deixa de focalizar apenas a função de prevenir e restaurar a saúde, as quais, por terem características de essenciais, podem ser colocadas como suas primeiras funções, e passa a dar espaço também à capacitação dos profissionais que darão continuidade ao corpo do hospital, assim como às pesquisas que permitem que se estabeleçam métodos de se lidar com casos novos, os quais vêm a tona com a própria sociedade. (MEDICI, 2001, p. 150).
As instituições hospitalares possuem peculiaridades que são perfeitamente
compreendidas quando se atenta para o fato de que:
24
O indivíduo, ao procurar a assistência médica, não o faz por livre vontade, mas sim por necessidade, isto é, por circunstâncias alheias ao seu desejo. Ao ingressar num serviço de saúde, o indivíduo não sabe que tipo de intervenção irá sofrer ou que tipo exame ou medicamento irá consumir. (MEDICI e MARQUES, 1996, p.49).
Atualmente, a organização hospitalar é uma das mais complexas, não apenas pela
nobreza e amplitude da sua missão, mas, sobretudo, por apresentar uma equipe
multidisciplinar com elevado grau de autonomia, para dar assistência à saúde em caráter
preventivo, curativo e realibilitador aos pacientes em regime de internação, em que se utiliza
tecnologia de ponta de rotina e crescentemente (AZEVEDO, 1993).
As organizações hospitalares diferem de outros tipos de organizações, pois suas
atividades possuem características próprias, como:
Serviços de atenção e tratamento personalizado a pacientes individuais; dependência das necessidades e demanda de seus clientes; definição das responsabilidades dos diferentes membros e pouca tolerância a erros; trabalho diversificado e com pouca padronização em que pessoas cuidam de pessoas, participando ativamente do processo de produção; pouco controle sobre seus trabalhadores (principalmente os médicos) e sobre os pacientes; organização não baseada em uma linha única de autoridade, já que o administrador hospitalar detém menos autoridade e poder em relação a outras organizações; organização formal, até certo ponto burocrática e autoritária, cuja operacionalidade repousa no arranjo do trabalho convencionalmente hierarquizado e em regras rígidas e impessoais. É, porém, uma organização altamente especializada, departamentalizada e profissionalizada que não pode funcionar efetivamente sem uma coordenação interna, motivação, autodisciplina e ajustes informais e voluntários de seus membros. (MACHILINE et al, 1983, p. 53-54)
Segundo Bittencort (1999, p.48),
[...] as instituições de saúde são tidas como organizações complexas, visto a sua capacidade única de atuar na prestação de serviços de saúde à sociedade. O autor destaca os recursos humanos e o alto nível de atividades desenvolvidas por um hospital, como: profissionais com alto nível de especialização (como médicos e enfermeiros), atividades com elevada escala de produção (como lavanderia, nutrição e higienização), atividades de uso intensivo de equipamento (como radiologia, laboratório e centro de tratamento intensivo), além das atividades administrativas e de engenharia de apoio.
25
A ascensão do setor hospitalar no país tem sido uma constante; o avanço das
diversas áreas do conhecimento, a política de saúde do governo e as novas necessidades dos
pacientes contribuíram para o seu rápido crescimento. Para a busca da excelência dos serviços
prestados surgem, como conseqüência, a demanda por técnicas organizacionais modernas e a
profissionalização da gestão.
O hospital, por tratar da saúde das pessoas, tem suas peculiaridades, tornando-se
assim um sistema diferente e de certo modo único, e deve ser administrado eficazmente, pois,
para viabilizar a produção de serviços são necessários, além de recursos financeiros, recursos
humanos e recursos de materiais e equipamentos.
Do ponto de vista econômico, financeiro e social, o hospital é uma empresa como as
demais pertencentes a outros setores da economia. Possuem ativos, passivos, despesas e
receitas que precisam ser administrados de forma eficiente para garantir sua sustentabilidade e
continuidade, além de permitir acompanhar os avanços tecnológicos da medicina, e manter ou
ampliar suas instalações.
Em seguida, apresenta-se uma análise do panorama dos Hospitais Universitários no
Brasil, destacando as características destes por incorporarem funções educativas e de
promoção da pesquisa.
1.4 Panorama dos Hospitais Universitários no Brasil
Médici (2001, p.149), considera que o Sistema de Hospitais de ensino é tão antigo
como o conceito de saúde que surgiu com o renascimento. A partir do século XX, tornou-se
obrigatório o vínculo orgânico e dependência institucional destas instituições junto às
Faculdades de Medicina. A maioria dos hospitais universitários são mantidos por verbas
públicas e são caracterizados primeiramente como centros de atendimento de alta
complexidade, e considerados como referência na região onde atuam.
26
O mesmo autor apresenta a análise de hospitais universitários de 22 países feita por
participantes de um seminário organizado pela Organização Mundial de Saúde, em 1995:
[...] mostra que um hospital universitário é entendido, antes de tudo, como um centro de atenção médica de alta complexidade que: (a) tem importante papel no atendimento médico de nível terciário; (b) apresenta forte envolvimento em atividades de ensino e pesquisa relacionada ao tipo de atendimento médico que dispensa; (c) atrai alta concentração de recursos físicos, humanos e financeiros; (d) exerce um papel político importante na comunidade em que está inserido, dada sua escala, dimensionamento e custos. (MEDICI, 2001, p.151).
Segundo Chioro (2004, p. 21), a Associação Brasileira de Hospitais Universitários e
Entidades de Ensino (ABRAHUE) divulgou que os 147 hospitais reconhecidos como de
ensino, dentre eles, 44 HUs ligados a Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), foram
responsáveis em 2004 por cerca de 23% do movimento das internações (39,9 mil leitos) para
o Sistema Único de Saúde (SUS), o equivalente a 10,3 % dos leitos brasileiros.Também
respondem por mais de 12% das internações hospitalares e por cerca de 4,8 mil leitos de UTI
da rede pública de saúde (25,6%). Em 2003, essas unidades de saúde efetuaram 37,6% dos
386 mil procedimentos de alta complexidade realizados no país.
Entretanto, estas instituições foram lançadas, ao longo dos últimos anos, numa
profunda crise. O problema financeiro é o mais evidente. Somente os hospitais vinculados às
instituições públicas federais – que representam um terço do total – acumulam cerca de 380
milhões de reais em dívidas. Os HUs que são públicos não poderiam ter dívidas, mas
acumularam esses débitos por meio de suas fundações de apoio. Boa parte do endividamento
está relacionada com encargos e débitos trabalhistas e com o imposto de renda. No caso dos
hospitais públicos federais, o endividamento se deve, principalmente, ao fato de não terem
sido autorizadas contratações de 1994 a 2002. Ou seja, os serviços aumentaram, os hospitais
perderam servidores - demissões voluntárias, aposentadorias e falecimentos - e não houve
autorização para reposição de pessoal. Com isso, os hospitais públicos federais acumularam
um déficit de 22 mil funcionários, que foram contratados via fundações, com recursos do
27
Sistema Único de Saúde (SUS). Vários hospitais chegaram a comprometer com pessoal mais
de 50% do que recebiam do SUS. Isso acumulou dívidas com aquisição de equipamentos,
contratos de manutenção e gerou atraso no pagamento de fornecedores o que,
conseqüentemente, tem gerado falta de material nos hospitais, provocando o fechamento de
alguns prontos-socorros ou a redução de atendimentos (CHIORO, 2004, p. 29).
O Ministério da Saúde reconhece que a crise dos hospitais universitários não é
apenas financeira, sendo necessária enfrentá-la estruturalmente em todas as suas dimensões.
Por isso, urge uma nova política para os hospitais de ensino que permita aprimorar os
mecanismos de gestão hospitalar e rever a maneira como esses se inserem na rede do SUS.
Um desses mecanismos é o controle dos custos hospitalares nas diversas atividades e
procedimentos desenvolvidas por estas instituições.
Os HUs estão integrados ao Sistema Único de Saúde (SUS) e têm em seus recursos a
maior parcela de seu financiamento. O SUS reembolsa os hospitais com base numa tabela
única de preços para cada procedimento. Os hospitais são reembolsados por esses valores, não
importando o tempo de permanência no hospital ou os custos reais incorridos com os
pacientes. Esse sistema de reembolso, teoricamente, não admite ineficiência, exigindo dos
HUs um alto grau de eficácia e eficiência na gestão dos recursos escassos. O Ministério da
Saúde, através do Fator de Incentivo ao Desenvolvimento de Ensino e Pesquisa em Saúde
(FIDEPS), diferencia o reembolso aos hospitais universitários por incorporarem atividades de
ensino e pesquisa. Segundo Seguridade (2005), este percentual é de aproximadamente 25% a
mais no faturamento global dos hospitais universitários que em outros hospitais públicos.
Para (BARNUM E KUTZIN, 1993; SCHRAMM, 1987; ANTHONY E
GOVINDARAJAN, 2001; MEDICI, 2001; HOSPITAIS, 2003), as organizações de prestação
de serviço de saúde deverão estar preparadas para profundas mudanças que acontecerão
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devido a dois principais fatores: avanço tecnológico e aumento da expectativa de vida da
população. Os autores afirmam que o custo de cada tratamento está aumentando com o
desenvolvimento de novos equipamentos e de novos medicamentos (contrastando com a
experiência normal das indústrias, nas quais um novo equipamento reduz os custos unitários).
Por outro lado, existe uma inevitável tendência a uma redução na oferta de serviços, devido ao
fato de os custos estarem cada vez mais elevados.
A pirâmide populacional brasileira está em pleno processo de alargamento em seus
segmentos superiores. As capitais de estado já têm 8% de seus habitantes, em média, com
mais de 60 anos, chegando a quase 13% no Rio de Janeiro (HOSPITAIS, 2003, p.11).
Essa tendência em muito se acentuará nas próximas décadas devido a um crescimento
populacional ocorrido nos anos 30, 40, 50 e 60 do século passado, e um acentuado aumento
da expectativa de vida a beneficiar precisamente essa geração. Os idosos são a principal
clientela da assistência hospitalar, especialmente, a de alta complexidade. Ao receberem
tratamento eficaz, para inúmeras doenças crônicas e degenerativas, vivem mais, e mais
dependentes de medicamentos e cuidados assistenciais ao longo dos anos. Esses fatores fazem
prever um crescimento explosivo dos custos de assistência pública daqui em diante. A bem
dizer, é algo que já se verifica: o SUS utilizou 7,4 bilhões de reais em 1994 e 14 bilhões em
2001, um aumento próximo a 100% (HOSPITAIS, 2003, p.12).
Os hospitais universitários possuem características que fazem com que seus custos
sejam ainda mais elevados do que o dos hospitais não universitários de alta tecnologia, tais
como: por incorporarem atividades docentes-assistenciais e por prestarem serviços básicos de
saúde quando sua estrutura é constituída para oferecer atividades de alta tecnologia (MEDICI,
2001, p.150).
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Segundo Médici (2001, p.150),
[...] os HUs dificilmente poderiam ser competitivos em um sistema de “reembolso por serviço” e seriam pouco atrativos aos planos de seguro médico. O mesmo, acredita que, a tendência é que se mantenham sendo custeados pelo setor público, com boa parte dos serviços prestados de forma gratuita ou subsidiada.
Marinho (2001 p. 6) acrescenta ainda:
O hospital universitário é uma organização peculiarmente complexa. Sua missão organizacional primordial é recuperar, manter e incrementar os padrões de saúde de seres humanos. Essa missão demanda um conjunto altamente divergente e complexo de atividades, tais como a realização de atendimentos, exames, diagnósticos e tratamentos, o planejamento e a execução de internações e intervenções cirúrgicas, as práticas de ensino e da pesquisa, e a formação de profissionais de saúde.
O Ministério da Educação (2006) define hospitais universitários como:
Importantes centros de formação de recursos e desenvolvimento de tecnologia para a área de saúde. A efetiva prestação de serviços à população possibilita o constante aprimoramento do atendimento, com a formulação de protocolos técnicos para as diversas patologias, o que garante melhores padrões de eficiência e eficácia, colocados á disposição para a rede do Sistema Único de Saúde – SUS.
No entanto, é necessário e de grande importância destacar que, apesar do serviço de
destaque que o hospital universitário desempenha na sociedade, ele ainda é detentor de
inúmeras crises em sua organização, principalmente, o hospital universitário federal.
Percebe-se que tentativas de reversão já estão surgindo, tentativas estas que são
aguçadas principalmente pelo fato de a sociedade ter se conscientizado que é urgente a
necessidade de reversão da visão arcaica de que o setor público não pertence a ninguém; a
sociedade moderna tem buscado ocupar o lugar que a ela pertence, passando a exigir a
prestação de contas do desempenho das atividades econômicas, e exigindo que os recursos
públicos sejam administrados da melhor maneira possível, destacando-se a idéia de
racionalização de recursos.
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Para Pessoa (2001, p. 2), o primeiro passo é dar aos gestores a capacidade de
programar e controlar a entidade, considerando que:
A difusão do conhecimento constituem uma parte do produto social sendo preciso considerar as universidades como unidades de produção, ou seja, como empresas, o que requer, conseqüentemente, uma iniciativa em prover essas organizações de capacidades gerenciais semelhantes às características de empreendimentos empresariais.
Assim, os gestores das entidades públicas poderão buscar as maneiras mais
eficientes de coordenarem tais entidades, dando maior ênfase na qualidade e na utilização da
análise de custos sob a visão da Gestão Estratégica para o gerenciamento de Hospitais
Universitários como instrumento de auxílio para superação dos desafios supracitados e
alcance da eficiência e eficácia operacional.
Vale destacar que alguns aspectos reunidos no trabalho de Abbas (2001, p.12) sobre
a situação atual dos hospitais no Brasil justificam a importância da discussão do tema ‘custos’
em organizações de serviços hospitalares. São eles: os preços cobrados pelos hospitais
brasileiros são altos; as novas tecnologias implementadas nos hospitais deram uma nova cara
ao modo de operar dos mesmos, o que, certamente, alterou sua estrutura de custos; má
administração; custos mal-elaborados ou desconhecidos; os hospitais reclamam que são mal-
remunerados – dentre outros.
Outro aspecto que chama a atenção nas entidades hospitalares é o processo de
mudança por que passam estas entidades em relação à remuneração pelos serviços prestados.
Cada vez mais surgem alterações no funcionamento dos planos de saúde. Também os órgãos
públicos e seus recursos escassos têm pressionado essas organizações a receberem valores
menores (BORINELLI & BEUREN, 2002, p.4).
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2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Contabilidade de Custos
Os estoques de matérias-primas continuaram a ser avaliados com base no preço de
compra. O mesmo não ocorreu com os estoques de produtos em processo e produtos
acabados. Isso se deve ao fato de que seus registros não podem ser feitos pelo preço de
compra dos produtos a que se referem, uma vez que nem os produtos em elaboração e muito
menos os acabados foram adquiridos pela empresa no estado em que estão. A empresa
adquiriu matérias-primas, mão-de-obra e outros recursos de produção, fabricando com eles as
mercadorias.
Consolida-se, assim, a Contabilidade de Custos com o objetivo de definir o valor dos
custos de fabricação dos produtos estocados, todo um sistema de registro, acompanhamento,
apropriação e rateio de gastos, bem como todos os lançamentos contábeis e controles
paralelos.
Os sistemas de custos se desenvolveram a partir de uma crescente necessidade de
aprimorar os métodos de avaliação dos estoques nas empresas industriais, principalmente,
quando um significativo volume de produtos em elaboração exigia uma acurada medição e
conseqüente valorização dos inventários. Com a introdução de novas tecnologias de produção
e de novos processos de fabricação, além do surgimento de materiais artificialmente
elaborados, a investigação dos custos foi se tornando cada vez mais exigível.
Com o crescimento das empresas e o conseqüente aumento na complexidade do
sistema produtivo, constatou-se que as informações fornecidas pela Contabilidade de Custos
eram potencialmente úteis ao auxílio gerencial, função esta tão importante na maioria das
32
empresas, quanto à determinação do resultado do período. Os sistemas de custos podem
ajudar a gerência da empresa basicamente de duas maneiras: auxílio ao controle e às tomadas
de decisões (HORNGREN et al, 2004).
A aplicação da Contabilidade de Custos é vasta, ou seja, ela pode produzir bons
resultados mesmo nas empresas estritamente comerciais ou que prestam serviços como, por
exemplo, hospitais, lojas, serviços de utilidade pública, institutos educacionais, repartições
públicas, etc., levando-se em devida conta, é claro, as peculiaridades de cada organismo
econômico.
A Contabilidade de Custos é considerada o segmento da contabilidade especializado
no gerenciamento de custo e dos preços de vendas dos produtos e serviços oferecidos pelas
empresas.
2.2 Custos: Uma visão Geral dos Conceitos e Metodologias
Segundo Horngren et al, 2004, p.46) “Custo é um sacrifício de recursos (matéria
prima, mão-de-obra, energia elétrica, etc.) necessário para a fabricação de um produto ou
execução de um serviço”.
Assim definindo, parece fácil a tarefa de apurar um custo, pois exige, apenas, a
apuração de todos os recursos consumidos pela empresa e sua distribuição pelos produtos
fabricados. Ao se considerar, porém, a complexidade dos recursos aplicados pela empresa, a
existência de consumos indiretos para suporte (apoio) à produção, entre outros, percebe-se
que essa ação não é nada simples.
Nesse sentido, discutir custos dentro de uma visão sistêmica ou de uma abordagem
holística significa pensar custos como um sistema de custos. Para Guerreiro (1984, p. 24),
sistema de custos é um “conjunto de elementos interdependentes que interagem na
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consecução de um objetivo comum, coletando, processando e gerando informações derivadas
do desempenho das operações”.
Segundo Leone (2000, p. 186), os sistemas de custos destinam-se:
a coletar os dados de custos, direta ou indiretamente, identificados com algum objeto de custos, a organizá-los de forma a que possam contribuir para o desenvolvimento de informações que se destinam ao atendimento de alguma necessidade gerencial diferente.
2.2.1 Terminologias e Classificações dos custos
Martins (2003, p. 24-26) considera que:
A terminologia de custos é absolutamente necessária para melhor entendimento da denominação e conceitos dos termos utilizados na implantação de sistemas de custos. O autor considera, na terminologia de custos, a seguinte nomenclatura: gasto, investimento, custo, despesa, desembolso e perda, assim definidos:
Gasto: “sacrifício financeiro com que a entidade arca para a obtenção de um
produto ou serviço qualquer, sacrifício esse representado por entrega ou promessa de entrega
de ativos (normalmente dinheiro). Conceito extremamente amplo e que se aplica a todos os
bens e serviços adquiridos” (MARTINS, 2003, p. 24).
Investimento: “gasto ati