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LIDIANE GOEDERT
A FORMAO DO PROFESSOR DE BIOLOGIA NA UFSC E O
ENSINO DA EVOLUO BIOLGICA
FLORIANPOLIS (SC)
2004
2
Ata
3
LIDIANE GOEDERT
A FORMAO DO PROFESSOR DE BIOLOGIA NA UFSC E O
ENSINO DA EVOLUO BIOLGICA
Dissertao apresentada Banca Examinadora da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito parcial para a obteno do ttulo de Mestre em Educao Cientfica e Tecnolgica, sob orientao da Prof. Dra. Vivian Leyser da Rosa e co-orientao da Prof. Dra. Nadir Castilho Delizoicov.
Florianpolis, dezembro de 2004.
4
Mestre [Professor] no aquele que tudo ensina, Mestre [Professor] no aquele que tudo ensina, Mestre [Professor] no aquele que tudo ensina, Mestre [Professor] no aquele que tudo ensina,
mas aquele que de repente, aprende.mas aquele que de repente, aprende.mas aquele que de repente, aprende.mas aquele que de repente, aprende.
Guimares RosaGuimares RosaGuimares RosaGuimares Rosa
5
Dedico este trDedico este trDedico este trDedico este trabalho a todos os professores que abalho a todos os professores que abalho a todos os professores que abalho a todos os professores que
acreditam na educao como uma possibilidade de acreditam na educao como uma possibilidade de acreditam na educao como uma possibilidade de acreditam na educao como uma possibilidade de
construir um mundo melhor, mais humano e construir um mundo melhor, mais humano e construir um mundo melhor, mais humano e construir um mundo melhor, mais humano e
democrtico.democrtico.democrtico.democrtico.
6
AGRADECIMENTOS
Durante a realizao deste trabalho contei com o apoio de vrias pessoas,
em diversos espaos e momentos. Algumas contriburam compartilhando suas
experincias e conhecimentos e outras, no menos importantes, com o seu carinho e
compreenso. Portanto, todas elas, cada uma do seu jeito, possibilitaram e
acompanharam a realizao deste estudo.
Por isso, sou imensamente grata:
s orientadoras Vivian Leyser da Rosa e Nadir Castilho Delizoicov, pelos
preciosos ensinamentos, pela compreenso e carinho dispensados em cada fase deste
trabalho.
s professoras Adriana Mohr e Suzani Cassiani de Souza por terem
participado da minha banca de qualificao, especialmente, pela ateno dispensada e
sugestes para o aprimoramento da pesquisa.
professora Leda Scheibe pelas sugestes de leituras e por aceitar fazer
parte da banca de defesa desta dissertao.
Aos professores egressos do curso de Cincias Biolgicas da UFSC,
sujeitos desta pesquisa, por cederem espaos nas suas vidas para que este trabalho
fosse concretizado.
s ex-coordenadoras do Curso de Graduao em Cincias Biolgicas da
UFSC: professoras Leila da Graa Amaral, Elza Costa Netto Muniz e Vanda
7
DAquino Rosa pelos esclarecimentos prestados sobre as reformas curriculares e pelos
materiais sugeridos.
A todos os professores do Programa de Ps-Graduao em Educao
Cientfica e Tecnolgica (PPGECT) pelos conhecimentos compartilhados.
funcionria Sandra Mara Machado Carreiro Gonalves, sempre to
carinhosa e atenciosa nas solicitaes dos alunos do PPGECT.
Coordenadoria do Curso de Graduao em Cincias Biolgicas por
disponibilizar os documentos do curso para que eu pudesse consult-los.
Coordenadoria do Centro de Educao a Distncia da UDESC por
conceder licena das minhas atividades como professora, a fim de concluir a
dissertao.
minha amiga Ana Paula, companheira desde a graduao, pela amizade e
pelos momentos compartilhados durante as disciplinas do mestrado.
s minhas amigas de trabalho e de vida - Flvia, Isabel, Klalter, Mnica,
Dora, Lurdinha e Soeli pela troca de idias, pelo carinho e apoio constantes.
Ao Lawrence, pelo amor, pelo companheirismo em todos os momentos,
bem como, durante essa importante conquista da minha vida.
minha me (Marichinha) pelo exemplo de vida e coragem demonstrado
ao criar, educar e amar com a mesma intensidade seus 14 filhos. Ao meu querido pai
in memoriam (Seu Juquinha), homem trabalhador e humilde, mas eternamente sbio.
A toda minha famlia pelo carinho e unio.
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Aos meus amigos e sobrinhos Janice e Henrique que me presentearam com
mais uma linda flor - Laura. Obrigada pela ateno, mesmo estando
geograficamente to distante.
Enfim, sou grata a todos aqueles que, direta ou indiretamente,
acompanharam e contriburam para que este trabalho se realizasse.
Muito obrigada!
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SUMRIO
RESUMO 11
ABSTRACT 12
LISTA DE TABELAS 13
LISTA DE ANEXOS 14
APRESENTAO 15
CAPTULO 1 - A FORMAO DO PROFESSOR DE BIOLOGIA NA UFSC.21
1.1 Os Cursos de Licenciatura no Brasil: prevalncia da dicotomia entre Teoria e
Prtica .........................................................................................................................21
1.2 O Curso de Graduao em Cincias Biolgicas na UFSC Habilitaes
Licenciatura e Bacharelado .......................................................................................27
1.3 A estrutura curricular durante a dcada de 1990 .............................................37
CAPTULO 2 - EVOLUO BIOLGICA COMO TEMA DE ENSINO .........45 2.1 Evoluo Biolgica como tema da Biologia ........................................................45
2.2 Evoluo Biolgica um tema conflituoso no ensino de Biologia ....................50
2.3 A Evoluo Biolgica no Ensino Mdio ..............................................................56
2.4 A Evoluo Biolgica na estrutura curricular da dcada de 1990 ...................59
10
CAPTULO 3 - ASPECTOS METODOLGICOS.................................................63
3.1 Aspectos metodolgicos da pesquisa....................................................................63
3.1.1 As entrevistas........................................................................................................65
3.2 O perfil acadmico e profissional dos sujeitos da pesquisa...............................69
CAPTULO 4 - A FORMAO DO PROFESSOR DE BIOLOGIA E O ENSINO DA EVOLUO BIOLGICA ...............................................................72
4.1 A Evoluo Biolgica na formao do professor de Biologia ...........................72
4.1.1 Aspectos da Licenciatura .....................................................................................73
4.1.2 A Evoluo Biolgica na formao inicial ..........................................................76
4.1.3 A Evoluo Biolgica na formao continuada ..................................................84
4.2 A Evoluo Biolgica na prtica do professor de Biologia ...............................87
4.2.1 O entendimento dos processos evolutivos ..........................................................88
a) Conflitos com aspectos religiosos ............................................................................89
b) O entendimento da ancestralidade ...........................................................................92
4.2.2 Condies impostas pelo espao escolar .............................................................94
a) A elaborao das aulas .............................................................................................94
b) A abordagem do tema Evoluo Biolgica..............................................................96
CONSIDERAES FINAIS .....................................................................................99
REFERNCIAS ...................................................................................................................104
ANEXOS ...................................................................................................................110
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GOEDERT, Lidiane. A formao do professor de Biologia e o ensino da Evoluo Biolgica. Dissertao (Mestrado em Educao Cientfica e Tecnolgica). Programa de Ps-Graduao em Educao Cientfica e Tecnolgica/Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis, 2004.
RESUMO
O presente trabalho identifica e discute aspectos da formao inicial e da prtica docente, que possam estar contribuindo para o ensino do tema Evoluo Biolgica, a partir de entrevistas semi-estruturadas, realizadas com professores de Biologia egressos do Curso de Graduao em Cincias Biolgicas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A Evoluo Biolgica considerada um tema central e unificador dentro da Biologia, uma vez que sua compreenso se faz necessria para o entendimento de uma srie de conceitos e processos biolgicos. A complexidade e a abrangncia de tal tema so apontadas na literatura como fatores que dificultam seu ensino, em especial, no Ensino Mdio. Os professores entrevistados, todos com experincia neste nvel de ensino, apontaram, como fatores dificultadores da sua atuao em sala de aula: a) deficincias na formao inicial, no que diz respeito conduo da disciplina curricular de Evoluo; b) no-realizao de disciplinas optativas que lhes permitissem ampliar o conhecimento sobre o tema; e c) desarticulao entre as disciplinas, tanto entre as de contedos especficos da Biologia como entre estas e as disciplinas da rea pedaggica. Indicaram, tambm, uma srie de obstculos presentes no cotidiano escolar, tais como: a) o excesso de carga horria que os impedem de buscar oportunidades de ampliar sua formao; b) a carncia de materiais didticos adequados para o ensino de Evoluo Biolgica; e c) tempo escasso durante o ano letivo para abordagem do referido tema. Os dados obtidos apontam para a necessidade de se propor iniciativas tanto para a formao inicial quanto para a formao continuada de professores de Biologia, que contemplem, de forma adequada, a complexidade do tema Evoluo Biolgica. Rever a organizao curricular do curso de Cincias Biolgicas com vistas a proporcionar maior integrao entre as disciplinas e os departamentos um dos aspectos que podem melhorar a qualidade da formao dos futuros professores.
Palavras-chave: Formao de Professores; Licenciaturas; Ensino de Biologia; Ensino de Evoluo Biolgica.
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GOEDERT, Lidiane. The education of Biology teachers and the teaching of Biological Evolution. Masters dissertation. Post-graduation Program in Science and Technological Education/Federal University of Santa Catarina, Florianpolis, 2004.
ABSTRACT
This study aims at identifying and discussing aspects of teachers pre-service education and their in-service teaching practices that may or may not contribute for successful teaching of Evolution. Data was collected from semi-structured interviews, performed with secondary level Biology teachers graduated from Federal University of Santa Catarina (UFSC). Biological Evolution is considered to be a central and unifying theme in Biology, since its understanding is understood to be necessary for learning a number of other biological concepts and processes. Previous research has shown that the complexity and broadness of this theme are factors that prevent its successful teaching, especially at secondary level. During interviews for the present study, teachers expressed their views about some of these difficulties: a) deficiencies in their pre-service education, especially while studying Evolution as part of curriculum; b) lack of opportunities to learn more about Evolution, as elective components of curriculum; c) lack of closer articulation among curriculum disciplines, especially among those related to Biology topics and those aimed at pedagogical discussions. Teachers also identified a number of factors realted to school practices, such as: a) their excessive professional workload, which prevents them from participating in workshops, seminars and other learning opportunities; b) lack of proper and good-quality instructive materials, such as textbooks, for the teaching of Evolution; and c) lack of curriculum time, at secondary level, for the development of complex issues such as Evolution. Data from this study indicate to be necessary to propose changes both at pre-service and in-service teachers education, aimed at exploring the complexity of the theme of Biological Evolution. One of these changes would be a reorganization of Biological Sciences curriculum at graduate level, in order to integrate disciplines and Departments involved with Biology teachers education.
Key words: teachers education; Biology teaching; Biological Evolution teaching
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LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Organizao das disciplinas por blocos no curso de Graduao em
Cincias Biolgicas da UFSC
TABELA 2 Perfil acadmico e profissional dos professores de Biologia
entrevistados egressos do Curso de Licenciatura em Cincias
Biolgicas da UFSC - dcada de 1990
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LISTA DE ANEXOS
ANEXO 1 Perfil do Bilogo
ANEXO 2 Quadro de identificao dos professores
ANEXO 3 Roteiro de entrevista
ANEXO 4 Ementa das disciplinas: Evoluo, Evoluo Humana, Paleobotnica e
Filogenia Animal
ANEXO 5 Entrevista ao Professor P4
ANEXO 6 Proposta Curricular do Curso de Cincias Biolgicas da UFSC resultante das reformas da dcada de 1990
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APRESENTAO
Este trabalho de dissertao resultante de questionamentos e preocupaes
decorrentes da minha trajetria acadmica e profissional. Ao ingressar, em 1996, no
curso de Graduao em Cincias Biolgicas, no qual o Bacharelado obrigatrio e a
Licenciatura opcional, algo indicava, talvez minha intuio, que acabaria tambm
optando por esta ltima. No entanto, no ano de 2000, conclui o curso de Bacharelado,
deixando a Licenciatura, para finalizar posteriormente1.
Mesmo com a formao pedaggica ainda a completar, mas j percebendo
algumas de suas fragilidades, iniciei minha prtica docente como professora do Ensino
Fundamental no ano de 2001, atuando no ensino de Cincias com turmas de 5a, 6a e 7a
sries. Ao concluir o primeiro ano dessa experincia, comecei a trabalhar como tutora
de contedos biolgicos em um Curso de Complementao para Licenciatura em
Biologia2, oferecido pela UFSC aos professores da Rede Estadual de Ensino da Bahia.
Essas duas vivncias foram suficientes para que eu percebesse limitaes
pedaggicas na forma como conduzia minhas aulas e como acompanhava a
aprendizagem dos meus alunos na tutoria. Alm disso, foram determinantes na minha
1 Cabe salientar que no Curso de Graduao em Cincias Biolgicas da UFSC a habilitao Bacharelado obrigatria a todos que nele ingressarem, j a Licenciatura, opcional. Isto explica o fato de t-la deixado incompleta. Recentemente (segundo semestre de 2004) retornei ao Curso para finalizar a Licenciatura.
2 Este curso resultou de uma parceria entre o Laboratrio de Ensino a Distncia da UFSC e o Governo do Estado da Bahia, oferecido na modalidade a Distncia. O curso atendeu professores de Biologia da rede estadual de ensino por meio de uma complementao em Licenciatura. Trabalhei nesse curso durante um ano e seis meses, no acompanhamento da aprendizagem dos professores-alunos dos contedos de Biologia.
16
deciso em estudar mais profundamente o ensino de Cincias, ou mais
especificamente, o ensino de Biologia. Cabe ressaltar que o oferecimento pela UFSC
de um Programa de Ps-Graduao na linha Ensino de Cincias possibilitou que as
minhas inquietaes originassem essa pesquisa de mestrado.
Logo, este estudo reflete, sobremaneira, minha preocupao com os
problemas que persistem nos cursos de Licenciatura no Brasil desde a sua origem,
mais especificamente, com a complexa realidade na formao de professores de
Biologia no Curso de Graduao em Cincias Biolgicas da UFSC, no qual a
habilitao Licenciatura oferecida. Por isso, tomei como principal eixo de anlise,
os aspectos da formao inicial que possam estar relacionados a dificuldades da
prtica docente do licenciado por essa Instituio, mormente aquelas
relacionadas ao ensino do tema Evoluo Biolgica.
A constatao em estudos anteriores sobre a presena de problemas
envolvendo a formao do professor de Biologia pelo curso da UFSC, como por
exemplo, a desarticulao entre as disciplinas de contedos especficos de Biologia e
destas com as da rea pedaggica (FURLANI, 19933), representou um outro ponto de
partida para esta investigao. Este aspecto, somado queles j mencionados,
relacionados minha trajetria acadmica e profissional, constitui o conjunto de
elementos que me levou a perceber a falta de vnculos mais slidos e concisos por
parte do referido curso com a formao do professor, representando o motivo central
do meu interesse em investigar essa problemtica.
3 Jimena Furlani Biloga formada pela UFSC e sua pesquisa de mestrado intitulada A formao do professor de Biologia no curso de Cincias Biolgicas da Universidade Federal de Santa Catarina: uma contribuio reflexo, apresentou como principal eixo de anlise a estrutura do curso e seu enfoque disciplinar, alm do perfil do corpo docente que nele atuava.
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Um dos dilemas que perpassam os cursos de Licenciatura em geral, ou seja,
cursos que formam professores para atuar na educao bsica, hoje representada pelo
Ensino Fundamental e Mdio, diz respeito a pouca integrao desses cursos com o
cotidiano escolar, no qual os professores vo atuar (GATTI, 2000).
O curso de Graduao em Cincias Biolgicas da UFSC habilitaes
Licenciatura e Bacharelado foi criado no incio da dcada de 1970 e, assim, como os
demais cursos de formao docente criados neste perodo, pretendia atender
demanda de formao de professores para trabalhar na educao bsica. No entanto, o
recorte que apresento sobre a formao do professor de Biologia est reservado ao
perodo compreendido entre 1989 e 2000, o qual denominei como dcada de 1990, por
corresponder a um espao de tempo em que a estrutura curricular permaneceu
praticamente inalterada. Alm disso, corresponde a uma dcada posterior referida
pesquisa de Furlani, finalizada em 1993.
Aps essas consideraes iniciais, apresento o problema de pesquisa na
forma do seguinte questionamento: qual a relao entre a formao do licenciado
em Cincias Biolgicas na UFSC com aspectos da sua prtica docente,
especialmente, quanto tarefa pedaggica de abordar um importante e
controverso tema de ensino - a Evoluo Biolgica?
A partir das consideraes apontadas, faz-se necessrio justificar a seleo
dos sujeitos da pesquisa. So professores licenciados em Cincias Biolgicas pela
UFSC, formados na dcada de 1990 e que j viveram a experincia de trabalhar o tema
Evoluo Biolgica nas suas aulas. Estes professores atuam em escolas da rede pblica
(estadual e municipal) e privada das cidades de Florianpolis e So Jos, localizadas
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no Estado de Santa Catarina. Investigar o ensino de Biologia nas escolas de Ensino
Mdio envolve tambm rever alguns aspectos dos cursos de Licenciatura nessa rea.
Por isso, minha investigao perpassou dois momentos da vida do licenciado, ou seja,
a sua formao inicial e a sua prtica docente.
A escolha do tema Evoluo Biolgica est relacionada ao seu carter
integrador no ensino de Biologia. A compreenso dos processos que caracterizam a
Evoluo Biolgica considerada essencial para o entendimento de uma srie de
outros conceitos da Biologia, o que lhe confere um carter unificador dentro dessa
Cincia. Cabe aqui ressaltar que tal carter no se fez presente na minha formao
inicial, uma vez que as disciplinas ocorreram de maneira desintegrada e sem um
enfoque evolutivo.
Estudos sobre o ensino da Evoluo Biolgica como os de Bizzo (1991),
Rosa et al.(2002) e Carneiro (2004), tm demonstrado que equvocos quanto
interpretao dos processos evolutivos tanto so freqentes entre alunos como
professores de Biologia.
Ao entender que a Evoluo Biolgica deve ser efetivamente trabalhada nos
cursos de formao do professor de Biologia bem como nas escolas de ensino bsico,
de forma integrada com os outros conhecimentos biolgicos, despertou-me, ento,
para a relevncia de analisar o tratamento que lhe dado durante o seu ensino nesses
diferentes espaos.
A partir do problema de pesquisa j mencionado, o presente trabalho tem
como objetivo geral contribuir para a melhoria do ensino do tema Evoluo Biolgica,
tanto no Ensino Mdio quanto nos cursos de Licenciatura em Cincias Biolgicas em
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geral e, de modo especial, no curso da UFSC. De maneira mais especfica, visou-se: a)
analisar aspectos da formao inicial do professor de Biologia egresso da UFSC,
durante a dcada de 1990, que possam ter contribudo (ou no) para as dificuldades
que se apresentam ao ensinar o tema Evoluo Biolgica; b) caracterizar a formao
inicial e continuada dos licenciados quanto ao tratamento do tema Evoluo Biolgica;
c) identificar como os licenciados lidam com o ensino da Evoluo Biolgica na sua
prtica escolar; e d) identificar quais as dificuldades que enfrentam no ensino da
Evoluo Biolgica.
O ensino de Biologia tem sido alvo, principalmente nas ltimas dcadas, de
anlises e crticas por aqueles que se preocupam com a qualidade e a importncia de
uma educao que leve em considerao a realidade sociocultural em que os alunos
esto inseridos. nesse sentido que procurei, com este trabalho, contribuir com
reflexes para o enfrentamento de dificuldades relacionadas formao do professor
para atuar no ensino de Biologia, especificamente, no ensino da Evoluo Biolgica,
possivelmente decorrentes de lacunas na formao inicial.
O presente trabalho est estruturado em cinco captulos. No primeiro,
apresento aspectos gerais sobre a relao entre teoria e prtica na formao de
professores, ressaltando a prevalncia do modelo conhecido por esquema 3+1.
Destaco, tambm, elementos referentes ao surgimento e implementao do Curso de
Graduao em Cincias Biolgicas na UFSC Habilitaes Licenciatura e
Bacharelado, relacionando-os a alguns aspectos gerais das Licenciaturas no Brasil. E,
por fim, apresento detalhes referentes estrutura curricular do referido curso, a qual
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passou a ser implantada progressivamente no incio da dcada de 1990, mantendo-se
at hoje.
No segundo captulo, discuto a importncia da Evoluo Biolgica nas
Cincias Biolgicas, alm de aspectos conflituosos relacionados ao ensino do citado
tema nas aulas de Biologia. Apresento, tambm, respectivamente, detalhes
relacionados s orientaes para abordagem da Evoluo Biolgica no Ensino Mdio,
e o modo como a mesma foi tratada durante a formao dos professores entrevistados.
No terceiro captulo, apresento aspectos relacionados metodologia
utilizada para a obteno das informaes, alm do perfil acadmico e profissional dos
sujeitos do presente estudo.
No quarto captulo, analiso e discuto os dados das entrevistas que foram
feitas com professores de Biologia licenciados da UFSC durante a dcada de 1990,
atuantes nas cidades de Florianpolis e So Jos. Esta anlise est dividida em dois
momentos. No primeiro, discuto aspectos relacionados formao recebida no Curso
da UFSC, alm de aspectos relacionados formao continuada. E, no segundo,
analiso alguns elementos referentes prtica pedaggica dos entrevistados,
especialmente quanto ao ensino do tema Evoluo Biolgica.
Na concluso do presente trabalho, teo algumas consideraes finais a
respeito das concluses que a pesquisa possibilitou estabelecer, bem como, sobre as
limitaes enfrentadas durante a sua realizao e sobre possibilidades de avanos na
formao e na prtica do professor de Biologia. Tais consideraes no devem ser
entendidas como estanques, mas como um indicativo de que futuras investigaes
sobre estas questes se fazem necessrias.
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CAPTULO I
FORMAO DE PROFESSORES DE BIOLOGIA NA UFSC
Este captulo tem por objetivo apresentar elementos referentes ao
surgimento e implementao do Curso de Graduao em Cincias Biolgicas na UFSC
Habilitaes Licenciatura e Bacharelado, relacionando-os a alguns aspectos das
Licenciaturas no Brasil. Na seqncia, destaco detalhes referentes estrutura
curricular que passou a ser implantada progressivamente no incio da dcada de 1990,
e que se mantm at hoje. Para essa discusso, referencio pesquisas relacionadas
diretamente rea da Licenciatura em Cincias Biolgicas, alm de estudos que tratam
das Licenciaturas de maneira geral, bem como, documentos relacionados s reformas
curriculares do curso em questo. Entre os trabalhos consultados, destaco os de Tomita
(1990), Furlani (1993), Scheibe (1983; 1998), Pereira (1998; 1999), Brzezinski (1999),
Gatti (2000), Esteban (2001) e Scheibe e Daniel (2002).
1.1 Os Cursos de Licenciatura no Brasil: prevalncia da dicotomia entre Teoria e Prtica
A institucionalizao dos cursos superiores de formao de professores
comeou efetivamente no Brasil na dcada de 1930, apresentando como referencial a
criao da Universidade do Distrito Federal, instituda em 1935 por Ansio Teixeira,
onde se props uma escola de nvel superior para formar todos os professores,
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inclusive aqueles voltados escolarizao inicial. Essa proposta foi extinta em 1939,
tomando espao a formao de professores para o ensino bsico (SCHEIBE; DANIEL,
2002).
As Faculdades de Filosofia, Cincias e Letras surgiram tambm na dcada
de 1930 como conseqncia da preocupao com o preparo de docentes para atuar na
Educao Bsica, atualmente representada pelo Ensino Fundamental e Ensino Mdio.
Essas Faculdades tiveram sua origem em 1931 com a Reforma Francisco Campos4, no
entanto, sua estruturao somente aconteceu em 1939 por fora do Decreto-Lei n
1.190 (SCHEIBE, 1983). Neste mesmo ano foi criada a Faculdade Nacional de
Filosofia da Universidade do Brasil, com a finalidade j mencionada, de formar
professores para atuar no ensino bsico. As demais Faculdades de Filosofia foram
sendo implantadas progressivamente em outros locais no Brasil. No entanto, elas
voltaram-se muito mais para a formao dos bacharis/especialistas do que para o
preparo dos professores. Este direcionamento j indicava uma posio secundria
destinada rea pedaggica na poltica educacional do ensino superior (SCHEIBE;
DANIEL, 2002).
Com o Decreto-Lei n 1.190, os cursos de Licenciatura iniciaram seguindo
o esquema conhecido como 3+1, o qual previa uma seo de Didtica, com durao
de um ano e, no final da formao, destinada a habilitar os licenciados para lecionar no
ensino bsico, correspondendo, hoje, ao Ensino Fundamental e Mdio. Sendo assim, o
diploma de licenciado somente era concedido ao Bacharel que completasse o curso de
Didtica (SCHEIBE, 1983). Com este modelo de formao de professores, dois
4 A Reforma Francisco Campos detalhada na obra de ROMANELLI, Otaza de Oliveira. Histria da Educao no Brasil. Petrpolis: Vozes, 26 ed., 2001.
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universos distintos se constituram, sem que houvesse um mnimo de articulao entre
eles. De um lado estavam os contedos pedaggicos5, e, do outro, os contedos
especficos6 da rea de referncia (SCHEIBE, 1983; NAGLE, 1986).
Pereira (1999) menciona que, no esquema 3+1, a base 3 representa o
espao de trs anos destinados ao desenvolvimento das disciplinas da rea especfica
em que o futuro professor vai ensinar. Quanto base 1, esta representa o perodo de
um ano destinado ao desenvolvimento das disciplinas de natureza pedaggica,
representadas pelo curso de Didtica, necessrias para a obteno do ttulo de
Licenciado. Logo, este modelo imps para a formao do professor um ano de
Didtica, alm do Bacharelado das reas especficas em que o futuro docente atuaria.
Para Brzezinski (1999), esta obrigatoriedade dissociava a teoria e a prtica,
provocando a ruptura entre contedos dos conhecimentos especficos e o mtodo de
ensinar esses contedos. Estabeleceu-se, desse modo, a dicotomia entre contedo e
mtodo, o que, sob o ponto de vista da autora citada, marca a origem da dicotomia
entre teoria e prtica to evidentes ainda nos currculos atuais.
Originalmente, o 3+1 foi o esquema no qual as Licenciaturas se
constituram na dcada de 1930. No entanto, sua influncia ainda pode ser percebida
nestes cursos. Para Pereira (1999), esta maneira de conceber a formao docente
mostra-se consoante com o que denominado, na literatura educacional, de modelo da
racionalidade tcnica. Nesse modelo, o professor visto como um tcnico, um
5 A expresso contedo pedaggico refere-se, neste trabalho, s disciplinas responsveis pela formao pedaggica do futuro professor. Metodologia do Ensino e Prtica do Ensino de Biologia so exemplos de disciplinas de contedo pedaggico, presentes no Curso de Licenciatura em Cincias Biolgicas da UFSC.
6 A expresso contedo especfico refere-se, neste trabalho, s disciplinas especficas da rea de referncia em que o futuro professor ir ensinar. Citogentica, Evoluo e Botnica so exemplos de disciplinas de contedo especfico das Cincias Biolgicas, presentes no referido Curso.
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especialista que aplica com rigor, na sua prtica cotidiana, as regras que derivam do
conhecimento cientfico e do conhecimento pedaggico (PEREIRA, 1999, p. 111).
Nessa viso, as bases para a ao docente esto no conjunto de disciplinas tericas,
vistas como suficientes para a atuao profissional, na qual a prtica assume um papel
secundrio.
Segundo autores como Pereira (1999), os currculos de formao de
professores baseados no modelo da racionalidade tcnica mostram-se inadequados
realidade da prtica profissional docente. As principais crticas atribudas a esse
modelo dizem respeito separao entre teoria e prtica na preparao profissional, a
prioridade dada formao terica em detrimento da formao prtica e a concepo
da prtica como simples espao de aplicao de conhecimentos tericos. Um outro
limite deste modelo consiste em acreditar que o domnio dos contedos especficos
que se vai ensinar suficiente para ser um bom professor. Isso significa, por exemplo,
que, para ser um bom professor de Biologia, basta o domnio dos conhecimentos
especficos dessa rea do conhecimento.
O carter pedaggico da formao do professor ultrapassa a dimenso
tcnica, que considerada insuficiente para responder aos dilemas e ambigidades
presentes no processo educativo, dando relevncia multiplicidade que compe sua
dimenso humana (ESTEBAN, 2001).
Um modelo alternativo de formao de professores que vem conquistando
um espao cada vez maior na literatura especializada o da racionalidade prtica, o
qual se contrape ao modelo da racionalidade tcnica. Segundo Pereira (1999), nesse
modelo o professor considerado um profissional autnomo, que reflete, toma
25
decises e cria durante sua ao pedaggica, a qual entendida como um fenmeno
complexo, singular, instvel e carregado de incertezas e conflitos de valores.
A prtica, segundo o modelo da racionalidade prtica, no apenas locus
da aplicao de um conhecimento cientfico e pedaggico, mas espao de criao e
reflexo, em que novos conhecimentos so, constantemente, gerados e modificados
(PEREIRA, 1999, p. 113). O mesmo autor enfatiza que, por essa via, o contato com a
prtica docente aparece desde os primeiros momentos do curso de formao. Deste
envolvimento com a realidade prtica originam-se problemas e questes que devem
ser levados para discusso nas disciplinas tericas. Os blocos de formao no se
apresentam mais separados e acoplados, como no modelo da racionalidade tcnica,
mas concomitantes e articulados. Porm, o autor alerta para que tambm no ocorra
uma supervalorizao da prtica em detrimento da teoria. Nesse sentido, concordo
com ele quando/afirma que a prtica pedaggica no isenta de conhecimentos
tericos e que estes, por sua vez, ganham novos significados quando diante da
realidade escolar (PEREIRA, 1999, p.114).
possvel perceber, no modelo da racionalidade prtica, que a ao
pedaggica ganha um espao que se destaca muito mais quando comparado ao modelo
anterior, no qual a teoria concebida como o eixo da formao. Enquanto a
racionalidade tcnica valoriza demasiadamente a formao terica da rea especfica
de referncia, acreditando que isso seja suficiente para se formar um bom professor, a
racionalidade prtica prope que a prtica seja o eixo da formao docente. Portanto,
o primeiro modelo mostra-se deficiente por contemplar pouco o contato com a prtica
escolar na formao do professor. J, o segundo, mostra-se mais adequado por
26
entender a prtica escolar como um espao em que os futuros docentes vo vivenciar a
realidade escolar e discuti-la nas disciplinas tericas, visando propor alternativas para
uma melhor ao docente. No entanto, considero que a valorizao de uma em
detrimento da outra no resolve a dicotomia existente nos cursos de Licenciatura em
geral, entre teoria e prtica.
Gatti (2000, p.56) assevera que muito da deficincia que vem sendo
mostrada quanto formao dos professores se deve ausncia, na estrutura e
desenvolvimento dos cursos, de uma concepo da unidade nas relaes entre teoria e
prtica. A autora menciona a necessidade de que os cursos de formao de
professores adotem uma nova postura metodolgica, na qual teoria e prtica
constituam uma unidade. Isto significa que qualquer teoria tem sua origem na prtica
social humana e que nesta esto sempre explcitos pressupostos tericos. Tem-se, a,
portanto, uma relao dialtica entre teoria e prtica, e no mais uma relao
dicotmica.
Segundo Esteban (2001), a relao teoria/prtica fundamental para a
construo da autonomia docente. No entanto, ela considerada como um dos seus
entraves, em especial pelo distanciamento existente entre a reflexo e a ao e pela
dificuldade de colocar em prtica as discusses tericas. A idia de autonomia
apresentada pela autora refere-se capacidade do professor, individual ou
coletivamente, criar alternativas para a sua ao. A construo de uma prtica nova e
de melhor qualidade depende da conquista dessa autonomia.
A apresentao desses aspectos, referentes prevalncia da dicotomia entre
teoria e prtica nos cursos de Licenciatura no Brasil, decorrentes especialmente do
27
esquema de formao 3+1 e do modelo da racionalidade tcnica, so relevantes
para compreendermos quais as influncias que o curso de Graduao em Cincias
Biolgicas da UFSC sofreu (e vem sofrendo) a partir de sua implementao. Portanto,
passo a destacar detalhes referentes ao curso em questo, fazendo algumas associaes
com caractersticas que influenciaram as Licenciaturas em nosso pas.
1.2 O Curso de Graduao em Cincias Biolgicas da UFSC Habilitaes
Licenciatura e Bacharelado
No que diz respeito origem dos cursos de Cincias Biolgicas no Brasil,
Tomita (1990) informa que o seu surgimento est intimamente relacionado ao antigo
curso de Histria Natural criado em 1934 pela Universidade Federal do Rio de Janeiro,
e extinto em 1963. Segundo a autora, a extino da Histria Natural no ensino superior
ocorreu devido ao seu desdobramento em dois cursos independentes: Geologia e
Cincias Biolgicas Licenciatura de 2 Grau. A partir deste desdobramento, foi
criado, em 1967, o curso de Bacharelado em Cincias Biolgicas -Modalidade Mdica
e, em 1974, a criao da Licenciatura em Cincias - Habilitao em Biologia,
resultante da Resoluo 30/74.
Tomita (1990) e Furlani (1993) informam que a Resoluo 30/74 instituiu
as Licenciaturas de curta durao (mnimo de 1800 horas), com grades curriculares
contendo Fsica, Qumica, Biologia, Matemtica e Geologia para a formao de
professores polivalentes em ensino de Cincias, para atuar no 1o Grau. A formao do
28
professor de 2o Grau, conforme esta resoluo, seria feita em complementao, por
habilitao especfica do ncleo comum polivalente.
Segundo Furlani (1993), at o ano de 1973, isto , antes da Resoluo
30/74, eram oferecidos na UFSC somente os cursos de Licenciatura em Matemtica e
Qumica, cujos currculos eram denominados Plenos (de 2o Grau) e fundamentados
nos currculos aprovados pelo Conselho Federal de Educao - CFE, em 1962. No
entanto, conforme a autora, esses cursos tiveram seus currculos modificados para
atender referida Resoluo.
Quanto ao surgimento do curso de Graduao em Cincias Biolgicas na
UFSC, Furlani (1993) informa que a sua criao deu-se em 23 de outubro de 1973,
pela Portaria 218/GR/73, ou seja, dez anos aps o surgimento desta modalidade no
Brasil. Tendo incio em 1974, o curso abrangia a Licenciatura de 1o Grau em Cincias
(5a a 8a srie) com habilitao em Biologia para o 2o Grau. importante ressaltar que o
curso de Cincias Biolgicas da UFSC iniciou atendendo o exposto pela Resoluo
30/74, ou seja, o primeiro currculo adotado oferecia a Licenciatura de curta durao
em Cincias.
Para Tomita (1990), a transformao colocada pela Resoluo 30/74
ocorreu devido emergncia em licenciar um maior nmero de docentes, visando
suprir a falta de professores para atuar, principalmente, no Ensino Fundamental. Este
fato ocorreu devido expanso da escola pblica, que impulsionou o surgimento de
novos cursos de Licenciatura no Brasil. At a dcada de 1970, a iniciativa privada
raramente cogitou a idia de criar o curso de Histria Natural ou Cincias Biolgicas.
No entanto, verificou-se, a partir da Resoluo 30/74, uma intensa criao de novos
29
cursos com Licenciatura em Cincias e com habilitao em Biologia em instituies
privadas, especialmente nas grandes metrpoles. Esse aumento, segundo a mesma
autora, tambm foi verificado na rede pblica de ensino.
Quanto elevada expanso das Licenciaturas, principalmente aps a dcada
de 1970, Scheibe (1993) e Gatti (2000) mencionam problemas de diversas ordens
relacionados s Licenciaturas Curtas, tais como: a concentrao destes cursos, em sua
maior parte, na rede privada de ensino, no perodo noturno, em estabelecimentos
isolados e com altssimos ndices de evaso; a duvidosa qualidade do corpo docente
formador; e problemas de estrutura administrativa e acadmica, por parte das
instituies. Esses fatores contriburam de modo substancial para acentuar a
desarticulao entre as diferentes reas do conhecimento, comprometendo a formao
docente.
Visando verificar a eficincia da Resoluo 30/74 nas Universidades
brasileiras, o Ministrio da Educao e Cultura - MEC criou, em 1978, uma Comisso
de Especialistas em Ensino de Cincias (FURLANI, 1993). Alm disso, Tomita (1990)
informa que vrias entidades cientficas, entre elas a Sociedade Brasileira para o
Progresso da Cincia - SBPC, contestaram severamente tal Resoluo. Como principal
crtica sua aplicao, esta autora salienta a massificao do ensino superior brasileiro
e a falta de preocupao com a qualidade do ensino ministrado.
Ainda sobre a avaliao da eficincia da Resoluo 30/74, Furlani (1993)
informa que a Subsecretaria de Desenvolvimento Acadmico do MEC, de agosto de
1981 a 1982, promoveu uma extensa consulta em todo o pas atravs de aplicao de
questionrios enviados aos estabelecimentos de ensino superior que ministravam
30
cursos de Licenciatura e/ou Bacharelado nas reas de cincias exatas e biolgicas. O
resultado de tais avaliaes demonstrou manifestaes e evidncias contrrias
Resoluo 30/74 por parte das universidades, entre elas a UFSC, resultando no fim da
sua vigncia no ano de 1978 (FURLANI, 1993). Este aspecto contribuiu
substancialmente para que novas mudanas ocorressem nos currculos dos cursos de
Licenciatura em geral e, em particular, no curso de Licenciatura em Cincias
Biolgicas da UFSC.
At o ano de 1978, o curso de Cincias Biolgicas da UFSC funcionou a
partir do modelo proposto pela Resoluo 30/74, ou seja, como Curso de Licenciatura
(de curta durao) em Cincias Habilitao em Biologia. Neste mesmo ano, o Curso
foi reconhecido pelo Decreto 81.533 de 10/04/78, e teve seu currculo alterado. A nova
estrutura passou a apresentar a modalidade Licenciatura de 2o Grau (Plena) em
Cincias Biolgicas (UFSC, 1997). Esta alterao representou o rompimento com a
Licenciatura em Cincias de curta durao.
Segundo Furlani (1993), com a criao do currculo de Licenciatura de 2o
Grau para a Biologia, e tambm para Fsica, Qumica e Matemtica, o vestibular de
1979 j apresentava vagas para a licenciatura nestas reas. No ano seguinte, 1980,
iniciou tambm a modalidade Bacharelado em Ecologia, com ingresso separado da
Licenciatura, a qual foi alterada em 1987 para Bacharelado em Cincias Biolgicas.
Furlani (1993) coloca que, a partir de 1989, o curso de Cincias Biolgicas
passou por nova reestruturao. A Portaria 232/PREG/1989 tornou comum, para as
habilitaes Licenciatura e Bacharelado, o currculo at a terceira fase. Esta Portaria
representou uma primeira sugesto, no entanto, o currculo da dcada de 1990,
31
implantado a partir do primeiro semestre de 1991 (Portaria 124/PREG/91) e adaptado
em 1993/1 (Portaria 381/PREG/93), passou a apresentar um conjunto de quatro fases
(ou blocos) comuns, cursados por todos os alunos que ingressassem, de modo nico,
no Curso da UFSC.
Com o ingresso nico no Curso da UFSC todos os alunos passaram a
receber, obrigatoriamente, o ttulo de Bacharel em Cincias Biolgicas. J a
habilitao em Licenciatura uma opo que o aluno pode fazer enquanto est
cursando o bacharelado, ou seja no possui carter obrigatrio. Este aspecto levanta a
preocupao em torno da formao do licenciado, uma vez que a diferenciao no
currculo ocorre somente a partir da quinta fase, com a insero das disciplinas
responsveis pela formao pedaggica dos futuros professores.
Sobre esse aspecto, Pagotto (1998) aponta a importncia de que os cursos
de Licenciatura abandonem a marca do Bacharelado, que geralmente carregam,
fazendo assim uma crtica aos cursos universitrios em que o ingresso nico, no qual
o aluno opta se faz ou no a Licenciatura. J para Pereira (1999), os cursos de
Licenciatura no qual o ingresso nico, sugerem que a formao docente se d
inspirada em um curso de Bacharelado, no qual o ensino dos contedos especficos da
rea de referncia se sobressai ao de natureza pedaggica, e a formao prtica
assume, por sua vez, um papel secundrio. Alm disso, o autor atribui a presena
desta caracterstica nos cursos de Licenciatura influncia do modelo da
racionalidade tcnica, anteriormente mencionado, por sugerir que a formao terica
tenha um espao privilegiado em detrimento da formao prtica.
32
Mesmo assim, considero que o modelo de formao do professor de
Biologia oferecido pela UFSC apresenta aspectos que podem ser vantajosos. O
principal deles possibilitar que o licenciando tenha uma ampla formao terica da
rea especfica, necessria e importante para sua atuao docente. Alm disso, as
possibilidades de insero no mercado de trabalho se ampliam a partir do momento em
que o licenciado tambm recebe o ttulo de Bacharel. Considerar tais aspectos como
positivos no implica afirmar que o curso de Cincias Biolgicas da UFSC dispense
investigaes e revises em sua estrutura, em especial, quelas voltadas para
alternativas que possibilitem uma maior articulao entre as disciplinas de contedos
especficos da rea de referncia e destas, com as de contedos pedaggicos.
A caracterstica estrutural definida, a partir da dcada de 1990, para o curso
de Cincias Biolgicas da UFSC, na qual as disciplinas especficas ocupam um espao
inicial (principalmente da 1a a 4a fase) e as pedaggicas um espao final (da 5a a 9a
fase), guarda similaridades com o esquema 3+1 e com o modelo da racionalidade
tcnica. Estes modelos de formao docente so vistos por autores como Scheibe
(1993), Pereira (1998; 1999) e Freitas (2002), como modelos que ainda no foram
completamente superados pelos cursos de Licenciatura em geral, uma vez que os
contedos especficos ainda precedem e pouco se articulam com os contedos
pedaggicos. O currculo do curso de Graduao em Cincias Biolgicas, ao destinar
um espao inicial e maior para as disciplinas especficas e reservando para as
disciplinas pedaggicas um espao no final da formao do professor, parece estar
consoante com essas duas maneiras de conceber a formao docente. Esses aspectos
levaram-me a questionar sobre a existncia de articulao entre as disciplinas
33
especficas e pedaggicas na formao do professor de Biologia na UFSC, que, no
meu entendimento, devem estar vinculados desde o incio da formao, sem que haja
priorizao de uma em detrimento da outra. Entendo, tambm, que as disciplinas
especficas, assim como as pedaggicas, devam tambm estar articuladas,
proporcionando um ensino integrador e uma formao mais ampla do futuro professor.
Segundo Freitas (2002), a produo de propostas alternativas, que visam
romper com o modelo 3+1 dos cursos de formao, tem sido uma constante no
interior de vrias Instituies de Ensino Superior (IES), na organizao dos Fruns de
Licenciaturas e de vrias experincias que se orientam pelos princpios da base comum
nacional, construda por este movimento e pela Associao Nacional pela Formao
dos Profissionais da Educao (ANFOPE). A preocupao com a superao desse
modelo em trabalhos recentes como o de Freitas (2002), sugere a permanncia de sua
influncia, ainda hoje, nas organizaes curriculares de instituies universitrias.
Um outro aspecto sobre o curso da UFSC, diz respeito ao fato das
disciplinas pedaggicas ficarem sob a responsabilidade do Departamento de
Metodologia e Prtica de Ensino do Centro de Educao da UFSC, enquanto que as
disciplinas especficas ficam sob a responsabilidade de Departamentos como: Biologia
Celular e Embriologia, Botnica e Ecologia e Zoologia. Enquanto que para Pereira
(1999), o fato dessas disciplinas geralmente ficarem sob responsabilidade apenas das
faculdades ou centros de educao, representa um agravante nos cursos de
Licenciatura em geral. Esta caracterstica vista como algo que contribui para que haja
um distanciamento entre a formao pedaggica e a formao especfica da rea de
referncia em que o futuro professor vai atuar.
34
A separao entre disciplinas de contedos especficos e contedos
pedaggicos nos cursos de Licenciatura, sem a devida articulao entre elas,
entendida por Pereira (1998) e Gatti (2000), como um dos fatores considerados
determinantes de muitos dos problemas relacionados formao de professores para o
ensino bsico. Essa constatao refora a importncia de haver um equilbrio entre a
formao especfica e pedaggica durante a formao do professor, na qual a
interlocuo entre diferentes reas e instituies uma exigncia da prpria profisso.
Ao se centrar a formao de professores nas disciplinas pedaggicas,
estabelece-se uma prtica que determina a dicotomia dessa formao, com fortes
reflexos na profissionalizao dos egressos dos cursos de licenciatura (PAGOTTO,
1998). Essa dicotomia sugere que os cursos no apresentam clareza do tipo de
profissional que esto formando, isto , se um professor ou um pesquisador.
Estudos sobre a formao de professores no Brasil como os de Silva e
Schenetzler (2001) e Pereira (1998), mencionam que existe um consenso entre os
vrios autores, sobre a precria e insatisfatria situao das Licenciaturas em geral.
Entre as principais limitaes, envolvendo a formao de professores, citadas por estes
autores, destacam-se: a) a dicotomia teoria-prtica, decorrente do modelo de formao
profissional pautado na racionalidade tcnica (responsvel pela fragmentao e
sobreposio de conhecimentos); b) o modelo pedaggico usualmente assumido por
muitos professores que concebem o processo de ensino-aprendizagem em termos de
transmisso-recepo de uma elevada quantidade de contedos cientficos,
restringindo a apropriao de conceitos simples transmisso de informaes, tanto
compartimentalizadas como descontextualizadas, em termos histricos e sociais; e c) a
35
concepo empirista-positivista da Cincia, implcita tanto em aulas tericas quanto
nas atividades prticas.
O estudo feito no incio da dcada de 1990, por Furlani (1993), sobre a
formao do professor de Biologia na UFSC, ressalta problemas semelhantes aos
expostos pelos autores at agora mencionados. Este estudo mostrou que as principais
dificuldades encontradas no dia-a-dia da sala de aula pelos licenciados egressos
relacionam-se com a questo estrutural do curso de formao, ou seja, a inexistncia
de relao entre as disciplinas durante o processo de formao, aliadas inadequao
dos contedos das disciplinas universitrias com a realidade do ensino bsico. Esse
estudo demonstrou que a formao do professor de Biologia pela UFSC parece estar
sendo construda desvinculada da realidade da prtica escolar. Conseqentemente,
quando assumem a sala de aula, muitos deles no tm clareza do que, como e quando
trabalhar determinados contedos. Apesar da pesquisa de Furlani (1993) abranger um
perodo que antecede ao que me propus analisar na presente dissertao, h aspectos
problemticos que permanecem indicando a importncia de estudos adicionais sobre a
formao de professores de Biologia na UFSC.
Sobre a existncia dos problemas mencionados, tanto no curso de
Licenciatura em Cincias Biolgicas da UFSC quanto nos cursos de Licenciatura em
geral, concordo com Gatti (2000) quando afirma que a reviso e a mudana das
condies expostas ponto bsico de qualquer ao que venha a objetivar melhor
qualificao nas Licenciaturas, aliada, necessariamente, a uma viso social em que o
ensino seja tomado em sua real importncia.
36
Alm das limitaes enfrentadas no interior dos cursos de Licenciatura, j
expostas, importante tambm mencionar as condies da educao brasileira. Alguns
autores, entre eles Pereira (1999) e Gatti (2000), salientam que so vrios os fatores
externos ao processo pedaggico que vm prejudicando a formao inicial e
continuada dos professores, entre eles, o aviltamento salarial e a precariedade do
trabalho escolar. As ms condies de trabalho encontradas pelos professores, como,
por exemplo, os salrios pouco atraentes, a jornada elevada de trabalho e a ausncia de
planos de carreira, desestimulam os estudantes a optarem pela Licenciatura.
relevante salientar que a influncia do esquema 3+1 e do modelo da
racionalidade tcnica no so os nicos aspectos que influenciaram, e parecem ainda
influenciar, a trajetria das Licenciaturas no Brasil. Scheibe (1983) menciona tambm
a influncia dos fatores de ordem poltica, econmica e cultural na definio de
polticas educacionais e na organizao dos cursos de Licenciaturas em geral7.
A realizao de estudos com a finalidade de identificar os principais
problemas presentes nos cursos de Licenciatura tem sido freqente nas ltimas trs
dcadas dos anos de 1990 (PEREIRA, 1998; 1999) e incio do ano 2000. Scheibe, j
no ano de 1983, e posteriormente Pereira (1998; 1999) e Freitas (2002), mencionam
que antigos problemas na formao de professores ainda se fazem presentes e
constituem um desafio a ser enfrentado e investigado pelos cursos de formao de
professores de modo geral.
Gatti (2000) salienta que so necessrias alteraes na formao do
professor como, por exemplo, mudanas estruturais, visando a superar alguns
37
problemas que tm persistido ao longo do tempo. A autora menciona que propostas
excessivamente pontuais podem ser teis em determinadas situaes. No entanto,
torna-se relevante que a questo seja abordada a fundo, gerando propostas de flego
mais amplo que ajudem construo e absoro de novas formas de conceber a
formao de professores.
Pereira (1999) aponta a importncia de pensar a formao de um professor
que compreenda os fundamentos da Cincia e revele uma viso ampla dos saberes.
Alm disso, destaca ser relevante que os cursos de Licenciatura criem uma cultura de
responsabilidade colaborativa quanto qualidade da formao oferecida. Para isso, o
autor sugere uma familiaridade com os processos e os produtos da pesquisa cientfica8
na formao do professor, possibilitando, aos futuros professores, uma anlise crtica
de suas atividades docentes, contribuindo para ampliar a sua capacidade de inovao e
para fundamentar suas aes.
1.3 A estrutura curricular durante a dcada de 1990
Como mencionado anteriormente, a estrutura curricular do curso de
Cincias Biolgicas da UFSC, durante a dcada de 1990, resultante da reestruturao
promovida a partir de 1989, permanecendo at hoje com poucas modificaes
(FURLANI, 1993). A partir desse perodo, o curso de Cincias Biolgicas passou a
7 A influncia dos aspectos histricos nos cursos de Licenciatura no Brasil pode ser encontrada de maneira mais aprofundada na obra: SCHEIBE, Leda. A formao pedaggica do professor licenciado Contexto Histrico. Perspectiva/CED. Florianpolis: 1 (1), p.31-45, 1983.
8 A importncia da imerso dos futuros professores em ambiente de produo cientfica do conhecimento pode ser encontrada na obra: PEREIRA, Jlio E. D. As licenciaturas e as novas polticas educacionais para a formao docente. Revista Educao e Sociedade, ano XX, n 68, Dezembro/1999, p. 109-125.
38
oferecer duas habilitaes: Licenciatura e Bacharelado em Cincias Biolgicas. A
primeira prepara o profissional para o ensino de Biologia e, a segunda para a pesquisa
em Biologia. relevante mencionar que, com a nova forma de ingresso (nico), h a
obrigatoriedade do bacharelado para todos os alunos, podendo os mesmos optar por
concluir tambm a Licenciatura.
O fato da nova estrutura praticamente no ter sido alterada durante a dcada
de 1990, aliada preocupao com a qualidade da formao dos futuros docentes de
Biologia e as dificuldades que enfrentam ao iniciarem a funo docente, como as
mencionadas por Furlani (1993), levaram-me a investigar aspectos desta formao.
Portanto, procurei investigar fatores do curso de Graduao em Cincias Biolgicas da
UFSC que possam ser indicativos, ou no, de dificuldades que os licenciados egressos
enfrentam no dia-a-dia da sala de aula, especialmente no ensino do tema Evoluo
Biolgica. A justificativa pela escolha deste tema consta do segundo captulo deste
trabalho.
Os depoimentos de trs ex-coordenadoras do Curso da UFSC que
acompanharam as principais reformas curriculares das dcadas de 1980 e 1990
demonstram que a nova estrutura resultante, dentre outros fatores, da mobilizao
dos alunos que exigiam um curso de Licenciatura de melhor qualidade. Elas afirmam
que na estrutura anterior, em que o ingresso no curso era separado por habilitao, foi
visvel um certo preconceito por parte de alguns professores-formadores, bem como,
por parte dos alunos do bacharelado em Cincias Biolgicas em relao
Licenciatura. A partir do momento que essa diferenciao deixou de existir no
39
currculo da dcada de 1990, essa caracterstica foi bastante minimizada e a formao
do professor sofreu significativa valorizao.
Em virtude da regulamentao profissional (Lei 6.684 de 03/09/79 e
Decreto 88.438 de 28/06/83) e de intensas discusses sobre o Currculo, foi
estabelecido, em 1987, o Perfil Profissional do Bilogo (Anexo 1) e, como
conseqncia, a reforma curricular iniciada em 1989 (UFSC, 1997). Portanto, antes de
apresentar outros detalhes referentes organizao curricular da dcada de 1990,
relevante que se tenha claro que profissional esse, ou que tipo de profissional se quer
formar, no curso da UFSC.
O Perfil do Bilogo sugere um profissional capaz de lidar tanto com
situaes envolvendo o ensino, quanto com situaes relacionadas pesquisa em
Biologia. Tambm fica claro o papel social desse profissional, o qual deve estar
comprometido com a manuteno da qualidade de vida em todas as sua formas.
O perfil apresentado serviu como referncia para se pensar os objetivos do
Curso. O captulo I do Regimento, em seu Artigo 1o, institui que o Curso de
Graduao em Cincias Biolgicas da UFSC, com base no Perfil do Bilogo proposto
pelo seu Colegiado, a partir da Legislao que regulamenta a profisso do Bilogo
(Lei 6.684/79), tem por objetivo:
1- fornecer os conhecimentos bsicos necessrios compreenso dos fatos e fenmenos biolgicos, tanto para o embasamento cientfico do Bilogo, como para instrument-lo no exerccio das atividades tcnico-cientificas inerentes profisso. Neste ltimo caso, inclui as disciplinas pedaggicas e de integrao de contedos especficos e pedaggicos, para quem optar tambm pela licenciatura, bem como os estgios curriculares;
40
2- fornecer conhecimentos mais especficos, em reas de livre escolha dos alunos, tanto para completar ou aprofundar conhecimentos cientficos tericos, como para desenvolver atividades tcnicas;
3 - fornecer o embasamento filosfico das cincias, desenvolver uma postura tico-profissional coerente e uma atitude crtica em relao aos conhecimentos biolgicos e suas implicaes.
Os objetivos apresentados pelo Regimento procuram contemplar as duas
habilitaes - Licenciatura e Bacharelado, em funo do qual os licenciados no curso
da UFSC tambm so bilogos, ou seja, tambm so bacharis em Cincias
Biolgicas.
Quanto organizao do curso de Cincias Biolgicas da UFSC, expressa
no captulo II do Regimento, o ano letivo divide-se em dois perodos (semestres)
regulares, cada qual com 108 dias letivos (art.3o). A estrutura curricular formada
pelas seguintes reas: Contedos Bsicos, Gentica, Ecologia, Biologia Vegetal,
Biologia Animal, alm dos estgios Curriculares I e II (art.4o). Estas reas contemplam
as disciplinas instrumentais, disciplinas de contedos bsicos profissionalizantes
(obrigatrias), disciplinas optativas de aprofundamento (de contedo e
profissionalizantes) e disciplinas do contedo sociofilosfico (obrigatrias e
optativas).
Os artigos 5o e 6o do Regimento definem um conjunto de oito fases (ou
semestres), que inclui Estgios Curriculares mais disciplinas optativas para todos os
alunos que ingressarem no curso e lhes d o direito ao diploma de Bacharel. A
concluso das disciplinas obrigatrias da rea didtico-pedaggica, que inclui a Prtica
de Ensino na nona fase, atribui, aos alunos que tambm optarem pela Licenciatura, o
ttulo de Licenciados em Cincias Biolgicas. Esta organizao justifica o porqu de
todo o professor de Biologia formado na UFSC, ser tambm um Bilogo. importante
41
mencionar que o inciso 2o do artigo 6o dispe que o aluno que optar pela
Licenciatura de 2o Grau poder tambm cursar disciplinas optativas (da rea
didtico-pedaggica) que o instrumentaro ao Ensino de Cincias (1o Grau).
De acordo com a estrutura curricular, o contato com a realidade escolar
promovido pela Prtica de Ensino na nona fase representa um contato tardio do futuro
professor com a realidade escolar. Para Pereira (1999), essa caracterstica percebida
em universidades estruturadas com base no modelo da racionalidade tcnica em que a
prtica est reservada para os momentos finais dos cursos, normalmente pouco
integrada com a formao terica prvia. Segundo Brzezinski (1999), os cursos de
Licenciatura continuam formando dicotomicamente o professor, ao dedicar a maior
parte do curso a sua formao terica e apenas o ltimo ano prtica de ensino.
O artigo 8 do regimento, ainda no captulo II, trata da organizao das
disciplinas, na qual as disciplinas se organizam segundo uma certa necessidade de
conhecimentos prvios e conforme a seqncia evolutiva dos seres vivos, estando
estruturadas em blocos9 e pr-requisitos10. A tabela 2 representa a organizao das
disciplinas por blocos.
9 Conforme o Regimento do Curso, entende-se por bloco o conjunto de duas ou mais disciplinas que devero, obrigatoriamente, ser cursadas concomitantemente, uma vez que seus contedos se complementam e so pr-requisitos para contedos de fases subseqentes.
10 Conforme o Regimento do Curso, os pr-requisitos so disciplinas, blocos ou carga horria que devero ser cursadas com aproveitamento para matrcula em nova disciplina ou bloco.
42
Tabela 1
Organizao das disciplinas por blocos no curso de Graduao em Cincias
Biolgicas da UFSC habilitaes Licenciatura e Bacharelado.
BLOCOS CONSTITUIO
Bloco 1 Formado por todas as disciplinas da 1 fase: Biofsica, Exerccios de Ecologia, Fsica p/ Cincias Biolgicas, Geologia Geral, Elementos de Clculo Dif. e Int. e Qumica Geral e Orgnica.
Bloco 2 Formado por trs disciplinas da 2 fase: Bioqumica 2 (Bsica); Biologia Celular e Zoologia de Invertebrados 1.
Bloco 3 Formado por duas disciplinas da 4 fase: Microbiologia Geral e Gentica I.
Bloco 4 Formado por outras duas disciplinas da 4 fase: Zoologia de Invertebrados III e Desenvolvimento Animal I.
Bloco 5 Pertencente rea Didtico: Instrumentao do Ensino de Biologia e Metodologia do Ensino de Biologia.
Fonte: Regimento do Curso de Cincias Biolgicas da UFSC.
No que diz respeito ao Regime Acadmico do Curso, contemplado no
Regimento em seu Captulo III, este define em seus artigos que:
Art. 9o - a durao do Curso para habilitao Bacharelado em Cincias Biolgicas ser de 3.474 horas ou 8 semestres e para a habilitao Licenciatura de 2o Grau de 3.978 horas ou 9 semestres. Art.10 - a carga horria mnima por perodo letivo (semestre), em que o aluno poder se matricular de 16 horas semanais e a carga mxima de 32 horas semanais. Art. 11 - O prazo mnimo para a concluso do curso para o aluno que cursar somente a habilitao Bacharelado ser de 8 semestres e pare aquele que cursar tambm a Licenciatura de 2o Grau ser de 9 semestres. O prazo mximo de concluso de ambos os casos ser de 12 semanas.
Vale ressaltar que, no caso de alunos que optarem tambm pela
Licenciatura, a carga horria mnima por semestre, a partir da 5 fase, de 18 horas
43
semanais e a carga horria mxima de 37 horas semanais. Portanto, maior quando
relacionada opo de fazer somente o Bacharelado.
Quanto aos Estgios Curriculares I e II, tratados com mais especificidade
no captulo IV do Regimento, estes correspondem a duas disciplinas, sendo uma
oferecida na 7 fase e, a outra, na 8 fase do Curso. Na primeira delas, o aluno dever
realizar levantamento bibliogrfico, coleta de dados preliminares e elaborao de um
projeto. J, na segunda, o aluno dever executar o projeto aprovado na primeira
disciplina, com apresentao e defesa do trabalho escrito. O Regimento ainda informa
que os pr-requisitos necessrios para a matrcula Estgio I so: ter cursado no mnimo
2300 horas e a Metodologia de Pesquisa, alm das normas especficas para o mesmo.
Para cursar o Estgio II, que corresponde elaborao do Trabalho de Concluso de
Curso (TCC), faz-se mister a aprovao na disciplina Estgio I e obedecer s normas
especficas dos Estgios Curriculares (artigos 13, 14 e 15 do Regimento do Curso de
Cincias Biolgicas).
Fica evidente que a estrutura curricular da dcada de 1990 representou um
avano significativo na formao do professor de Biologia na UFSC, uma vez que o
curso iniciou com a Licenciatura em Cincias (curta durao). No entanto, a separao
entre disciplinas especficas e pedaggicas, sendo estas ltimas de responsabilidade do
Centro de Educao, sugere uma desarticulao entre as duas instncias, inclusive a
influncia do esquema 3+1, comentado na primeira parte desse captulo.
Saliento que no foi minha pretenso, ao longo desta investigao, verificar
o alcance da formao inicial dos professores de Biologia, mas sim, identificar
aspectos dessa formao que possam estar contribuindo (ou no) para as dificuldades
44
que os licenciados enfrentam na sua tarefa docente, especialmente a de ensinar o tema
Evoluo Biolgica. A escolha por este tema levou-me a privilegiar a sua posio na
organizao curricular da dcada de 1990. Portanto, no prximo captulo, procuro
justificar tal escolha destacando a sua importncia no ensino de Biologia e o espao
por ele ocupado na formao do professor de Biologia pela UFSC.
45
CAPTULO II
EVOLUO BIOLGICA COMO TEMA DE ENSINO
No presente captulo destaco aspectos referentes Evoluo Biolgica
como um elemento unificador dos conhecimentos na Biologia, baseando-me em
autores consagrados na rea como Futuyma (1992; 2002), Ayala (1983), Gould (1997)
e Gayon (2001). Apresento, tambm, aspectos conflituosos envolvendo o ensino do
tema, alm de fatores relacionados s orientaes para sua abordagem no Ensino
Mdio e durante a formao dos professores de Biologia pelo curso da UFSC.
2.1 Evoluo Biolgica como tema na Biologia
Determinados questionamentos, resultantes da curiosidade humana de
entender a natureza, normalmente se fazem presentes no ensino de Biologia. Que
processo responsvel pela extraordinria diversidade de vida no planeta Terra? O que
explica as semelhanas e diferenas entre grupos de organismos? Perguntas como
estas so impossveis de serem respondidas sem que o enfoque evolutivo seja
estabelecido. provvel que a Evoluo Biolgica responda nossas principais
curiosidades sobre a vida, precisamente aquelas relacionadas sua diversidade. No
entanto, Gould (1997) afirma que, de todos os conceitos fundamentais nas cincias da
46
vida, a Evoluo Biolgica considerado o mais importante e tambm o mais mal
compreendido.
Normalmente quando se menciona a importncia da Evoluo Biolgica na
Biologia, bem como no ensino, costumamos lembrar da clebre frase do geneticista
Theodosius Dobzhansky (1973), ao escrever um artigo intitulado Nada faz sentido em
Biologia exceto luz da Evoluo. Essa afirmao atribui Evoluo Biolgica um
carter unificador dentro dessa Cincia, tornando o conhecimento de conceitos e
processos11 que a ela dizem respeito, fundamentais para a compreenso de uma srie
de outros contedos biolgicos, como por exemplo, Ecologia e Gentica. Tidon e
Lewontin (2004) enfatizam, ainda, que o estudo da Evoluo Biolgica (ou Biologia
Evolutiva12, expresso por eles empregada), possibilita a integrao das Cincias
Biolgicas com as reas do conhecimento, como Sociologia, Matemtica, Cincias da
Computao, Geologia e Filosofia.
A Evoluo Biolgica definida por Futuyma (2002, p.3) como o processo
responsvel pela mudana das caractersticas hereditrias de grupos de organismos,
populaes e espcies, ao longo das geraes. Numa perspectiva de longo prazo, ela
definida pelo mesmo autor como descendncia, com modificaes, de diferentes
linhagens a partir de ancestrais comuns. Este aspecto explica a presena de dois
componentes importantes na Histria da Evoluo: a ramificao das linhagens e as
mudanas dentro das linhagens (incluindo a extino). Sendo assim, o conjunto de
11 Na presente pesquisa, quando em referncia Evoluo Biolgica, sempre que o termo processo for
utilizado, estarei me referindo aos mecanismos e fatores evolutivos. 12
A Biologia Evolutiva, na concepo de Futuyma (2002), o estudo da histria da vida e dos processos que levam a sua diversidade. Baseia-se nos princpios da adaptao, no acaso e na histria, procurando explicar todas as caractersticas dos organismos, ocupando, por isso, uma posio central dentro das Cincias Biolgicas.
47
mecanismos que explica os processos causais da Evoluo Biolgica, tais como
mutao, deriva gentica e seleo natural, constitui o que conhecemos hoje por Teoria
Sinttica da Evoluo Biolgica.
Futuyma (1992; 2002) argumenta que a Evoluo Biolgica um conjunto
de afirmaes interligadas sobre seleo natural e outros processos que a causam,
segundo uma gama de evidncias amplamente aceitas. A afirmao de que organismos
descenderam, com modificaes, a partir de ancestrais comuns, um fato. Por isso, o
autor salienta que, quando os bilogos se referem Teoria Sinttica da Evoluo
Biolgica, a palavra teoria utilizada da forma como ela usada em toda a Cincia,
isto , como um conjunto de princpios que descreve os processos causais da Evoluo
Biolgica. Como uma teoria, a Teoria Sinttica da Evoluo Biolgica atualmente a
melhor explicao; no entanto, ela tambm um fato.
A Teoria Sinttica da Evoluo Biolgica considera, conforme Darwin j
havia feito, o processo da seleo natural, construindo a escala de evoluo de
processos evolutivos, mas no o mais importante. Seu principal objeto de estudo a
populao, definida como uma comunidade reprodutora e caracterizada por seu
polimorfismo. O xito individual de cada membro da populao, na produo de uma
descendncia, determinar a transmisso de alelos. Assim sendo, cada gentipo ir
possuir um valor coletivo que modificar em ltima instncia a freqncia dos
diferentes alelos (CARNEIRO, 2004). Portanto, a Evoluo Biolgica apresenta como
objeto de estudo os mecanismos envolvidos na origem e na extino das diferentes
formas de vida, desde o seu incio, h milhes de anos, at os dias atuais.
48
A Evoluo Biolgica um fato to bem documentado quanto qualquer
outro que conhecemos na Cincia, to seguro quanto a nossa convico de que a Terra
gira ao redor do Sol e no o Sol ao redor da Terra. Aceitar algo como um fato,
significa admitir sua existncia a despeito do que sabemos ou compreendemos
(GOULD, 1997; FUTUYMA, 2002). Stebbins (1970) salienta que, mesmo existindo
polmicas cientficas sobre "como" ou "por que" a Evoluo Biolgica ocorreu no
passado e continua a ocorrer no presente, no possvel suprimi-la como um fato.
Segundo Futuyma (1992), nem a seleo natural, nem qualquer outro
processo evolutivo, tais como as mutaes, so providenciais; a seleo natural, por
exemplo, meramente a sobrevivncia e maior reproduo de alguns organismos em
comparao a outros, sob quaisquer condies ambientais que estejam prevalecendo
em um determinado momento. Deste modo, a seleo natural no pode equipar uma
espcie para encarar novas contingncias futuras e tambm no tem propsito ou
direo - nem mesmo a sobrevivncia da espcie. Assim como os ambientes variam,
tambm o fazem os agentes da seleo natural, tais como recombinao e mutao.
Deste modo, Gould (2001) afirma que, embora tendncias possam ser percebidas na
Evoluo Biolgica de certos grupos de organismos, no se pode esperar uma direo
consistente na Evoluo Biolgica de qualquer linhagem, muito menos, uma direo a
causas finais e eficientes.
Para as Cincias Biolgicas, a Evoluo Biolgica representa, na concepo
de Futuyma (1992), um elemento unificador atravs do qual muitos e variados fatores
como as semelhanas anatmicas e fisiolgicas entre diferentes espcies, os
conhecimentos sobre embriologia animal, a diversidade de espcies e os registros
49
fsseis entre outros, so integrados e explicados. por este motivo que Valotta (2000)
considera que a compreenso da Biologia moderna incompleta sem o entendimento
da Evoluo Biolgica.
Gayon (2001) tambm defende o entendimento da Biologia a partir da
Evoluo Biolgica, mas acrescenta que no se poderia colocar uma teoria como esta
como ponto de partida do ensino da Biologia. O seu argumento nesse sentido de que
esta teoria pressupe, de fato, um grande nmero de conhecimentos parciais como
conhecimentos em Gentica, em Ecologia, em Paleontologia. Em compensao, ela
oferece uma elucidao coerente do conjunto das disciplinas biolgicas e, por entender
isso, sugere, citando Theodosius Dobzhansky, que as disciplinas biolgicas devam ser
ensinadas luz da Evoluo Biolgica.
Dessa forma, corroboro com a idia de Oliveira (1995) ao defender que, por
meio da perspectiva evolutiva, possvel analisar e interpretar os mltiplos cenrios
que tm composto a histria da vida na Terra, perpassando todos os tipos de
fenmenos envolvidos na origem e na extino das diferentes formas de vida, desde
seu surgimento h alguns bilhes de anos at os dias atuais. Para a autora, se o estudo
das diferentes disciplinas que integram os currculos dos cursos de Cincias Biolgicas
fosse feito sob a perspectiva da Biologia Evolutiva, o ensino de uma Biologia
classificatria e esttica no tempo seria substitudo pelo ensino de uma Biologia
histrica, que rene e interpreta a dinmica do passado para explicar o presente e vice-
versa, pois traria a dimenso do tempo geolgico para explicar a vida na Terra. A esse
respeito, Futuyma (2002) sustenta que a unidade, a diversidade e as caractersticas
50
adaptativas dos organismos vivos so conseqncias da histria evolutiva e s podem
ser plenamente compreendidas nessa perspectiva.
Apesar de diversos autores reconhecerem a posio central da Biologia
Evolutiva entre as cincias da vida, ela ainda no representa, especialmente nos
currculos educacionais, uma prioridade altura de sua importncia intelectual e de
seu potencial para contribuir com as necessidades da sociedade (CARNEIRO, 2004).
Porm, Futuyma (2002) coloca que as razes disso talvez incluam a percepo errnea
de que todas as questes cientficas importantes referentes Evoluo Biolgica j
foram respondidas, bem como a controvrsia presente, inclusive, na comunidade
cientfica, a respeito da percepo dela como ameaa a certos valores tradicionais da
realidade como, por exemplo, as concepes religiosas.
2.2 Evoluo Biolgica um tema conflituoso no ensino de Biologia
A Evoluo Biolgica, apesar de ser considerada um dos pilares da
Biologia, no tem merecido o mesmo status quando se trata de ensino de Biologia em
nossas escolas onde, quando no suprimida, muito pouco abordada (PACHECO;
OLIVEIRA, 1997).
Os jornalistas Alessandro Piolli e Susana Dias (2004), em reportagem
publicada na revista eletrnica de jornalismo cientfico (ComCincia), informam que,
na maior parte das escolas brasileiras, a Evoluo Biolgica no tem sido abordada
como eixo integrador, seja nas aulas de Cincias ou Biologia, seja nos livros didticos,
51
vestibulares e nos processos de reformulao dos currculos universitrios, sendo esta
trabalhada apenas como mais um tpico no rol de contedos da Biologia.
O ensino desse tema nas escolas, em geral, considerado como um
momento tenso para os professores de Cincias e Biologia, por ser um espao propcio
ao surgimento da polmica entre criacionismo e evolucionismo. Em razo disso,
alguns professores optam por no abordar a polmica e tratam da Evoluo Biolgica
como a nica explicao para a origem das espcies. Enquanto isso, outros professores
apresentam o criacionismo como uma viso que nunca esteve presente na comunidade
cientfica, e que difere do evolucionismo por prever que as espcies foram criadas com
as mesmas caractersticas dos seres atuais (PIOLLI; DIAS, 2004).
A Evoluo Biolgica, bem como muitos outros conceitos importantes da
Biologia, gera controvrsias at mesmo entre pesquisadores. Sobre esse aspecto,
Futuyma (1992) afirma que:
A Evoluo Biolgica afeta, por extenso, quase todos os outros campos do conhecimento e deve ser considerado um dos conceitos mais influentes do pensamento ocidental. Seus princpios tm sido freqentemente mal-interpretados e a cincia objetiva da biologia evolutiva tem sido muitas vezes estendida para o reino subjetivo da tica e, ilegitimamente, utilizada como justificativa tanto para polticas perniciosas quanto humanitrias nos campos social e cientfico (FUTUYMA, 1992, p.16).
Isso significa que a Evoluo Biolgica muitas vezes concebida de forma
equivocada ou impregnada de valores e ideologias que no constituem seu objeto de
estudo. Alm disso, ela percebida por algumas pessoas como sendo incompatvel
com crenas religiosas, especialmente no que diz respeito natureza e s origens
humanas.
52
Para Gould (1997), Evoluo Biolgica foi acrescentado um conjunto de
conceitos e significados que mais representam antigos preconceitos sociais e crenas
psicolgicas, do que uma descrio da realidade natural. Nesse sentido, importante
no conceb-la como o estudo da origem primordial da vida no universo, e muito
menos como um princpio esclarecedor de questes filosficas ou teolgicas. Segundo
este mesmo autor, a Evoluo Biolgica no se ocupa em explicar a origem da vida na
Terra e, portanto, no se contrape viso criacionista que concebe o surgimento da
vida a partir dos atos da criao.
O conflito entre criacionismo o evolucionismo centra-se na viso fixista, ou
seja, na viso de que todas as espcies criadas so imutveis. Carneiro (2004)
menciona que o fato da maioria dos livros didticos, bem como alguns livros
paradidticos, iniciarem a abordagem sobre a Evoluo Biolgica com inferncias s
teorias propostas para explicar a origem da vida na Terra, pode ser um dos fatores que
contribuem para uma percepo equivocada deste tema. como se o leitor, incluindo
alunos e professores, fosse induzido a ver a Evoluo Biolgica a partir do
entendimento da origem da prpria vida na Terra.
Estudos brasileiros sobre o ensino da Evoluo Biolgica, tais como Bizzo
(1991), Santos e Bizzo (2000), Rosa et al. (2002), Santos (2002) e Carneiro (2004),
tm mostrado a presena de uma srie de equvocos decorrentes de posicionamentos
pessoais dos professores, de concepes prvias dos alunos, e de entendimentos
equivocados, possivelmente decorrentes de dificuldades no-resolvidas na formao
inicial dos docentes, entre outras.
53
Santos e Bizzo (2000), em estudo com estudantes do Ensino Mdio,
concluram, entre outros aspectos, que estes normalmente acreditam que as
modificaes no organismo ocorrem sempre em resposta a alguma necessidade,
acreditando que a mudana se d em um organismo, e no na populao. Para os
estudantes, a Evoluo Biolgica significa crescer, desenvolver e melhorar, ou seja, as
modificaes acontecem sempre no sentido de aperfeioamento, do progresso. Os
autores mencionam ainda que os estudantes no percebem a variabilidade existente
entre indivduos da mesma espcie, compreendendo que a mudana se d em nvel de
indivduo. Para os autores, compreender a diversidade da vida como resultado de um
processo aleatrio e ao acaso, parece ser um obstculo epistemolgico para
entendimento da Evoluo Biolgica, pois o estudante entende o ser humano como
algo to perfeito e acredita que na vida sempre estamos nos aperfeioando e
melhorando e tem que ter algum que criou tudo isto. Mesmo fazendo algumas
inferncias importantes sobre a Cincia (como por exemplo, que esta necessita de
provas), para os alunos, a cincia no explica como tudo pode ser to perfeito,
fazendo meno criao por algum especial.
Na formulao de Darwin, a Evoluo Biolgica diz respeito adaptao a
ambientes que mudam, no tendo nenhuma relao com a idia de progresso
universal. Um exemplo apresentado por Gould (1997), que esclarece essa idia, refere-
se aos elefantes que evoluem para uma pelagem mais pesada medida que as placas
de gelo se aproximam (em termos de tempo geolgico), at que se tornem mamutes
peludos. Estes animais no so necessariamente superiores, so apenas mais adaptados
s condies locais de um frio cada vez mais intenso.
54
Entre as controvrsias envolvendo o ensino da Evoluo Biolgica, destaca-
se o conflito gerado entre os opositores do evolucionismo e seus defensores. Segundo
Futuyma (1992, p.16) o criacionismo ressurgiu recentemente nos Estados Unidos e em
outros lugares, no como um fenmeno cientfico, mas como uma questo social,
parte de uma ideologia reacionria mais ampla que constitui uma ameaa real
integridade e qualidade do ensino pblico.
Um dos maiores conflitos gerados entre defensores do criacionisno, os
quais so tambm opositores do evolucionismo, refere-se a um episdio que ocorreu
no Tenesse (EUA) em 1925, em que o professor John Scopes foi condenado por
ensinar a Teoria da Evoluo Biolgica. O ensino dessa teoria estava suspenso nas
escolas americanas desde 1920 e sua incluso novamente nos livros didticos
aconteceu devido interveno de alguns defensores do ensino da Evoluo apenas
nos anos de 1960 (RAZERA; NARDI, 2001).
Ainda hoje, existem estados americanos em que o ensino do Evolucionismo
est suspenso, como o caso do Estado do Kansas, desde 1999 (RAZERA; NARDI,
2001). Esse fato evidencia o quanto as controvrsias envolvendo religio e cincia
ainda se fazem presentes na nossa sociedade, sendo a escola o espao em que elas mais
ocorrem e, conseqentemente, sugerindo que algumas atitudes ticas por parte dos
professores sejam necessrias.
No Brasil, a influncia criacionista no ensino mostra-se menos intensa,
quando comparada ao de alguns estados americanos. No entanto, recentemente,
presenciou-se no pas a retomada dos debates sobre os limites envolvendo cincia e
religio. Segundo os jornalistas Tait (2004) e Menezes (2004), em reportagens citada
55
revista eletrnica, este aspecto est relacionado postura assumida no ano de 2000
pelo ento governador do Estado do Rio de Janeiro, Antony Garotinho, ao sancionar a
lei que determina que o ensino religioso faa parte do currculo das escolas pblicas.
Tal lei foi colocada em prtica em abril do presente ano de 2004, pela atual
governadora, Rosinha Garotinho, sendo que a sua implantao se deu a partir do
segundo semestre, com diviso dos alunos por credos durante o ensino religioso.
Menezes (2004) informa que, segundo determinao da Secretaria de
Educao do Rio de Janeiro, em 2004 as escolas pblicas promoveriam reflexes
sobre a criao do mundo por meio de uma abordagem superficial do criacionismo.
Porm, a autora chama ateno ao fato de no ter sido explicado que metodologia os
professores deveriam utilizar para isso, sendo esta uma das crticas proposta de
ensinar religio nas escolas pblicas do Rio. No entanto, para a maioria dos
educadores, a medida do referido governo contraria o texto da Lei de Diretrizes e
Bases da Educao (Lei 9394/96), segundo a qual a instruo religiosa de matrcula
opcional, parte integrante da formao bsica do cidado e constitui disciplina dos
horrios normais das escolas pblicas do ensino fundamental, contanto que seja
assegurado o respeito diversidade cultural e religiosa, vedadas quaisquer formas de
doutrinao. Para os educadores, dividir alunos de acordo com suas escolhas religiosas
(ou de seus pais) implicaria em ceder espao ao proselitismo de cada grupo. Ou seja, a
diviso de alunos por credos, pelo professor, contribuiria para reforar a no-aceitao
das diferenas.
Para Martins (2004), a deciso do governo do Rio de Janeiro, de impor aos
alunos das escolas estaduais o ensino religioso como sendo equivalente ao discurso
56
cientfico, um procedimento autoritrio, pois tal imposio atinge at mesmo aqueles
que no concordam com ela.
A ausncia de uma compreenso mais profunda e clara dos conceitos e
processos que envolvem o ensino da Evoluo Biolgica pode resultar em idias
distorcidas, capazes de comprometer toda a compreenso sobre esse tema. Portanto,
definir claramente os conceitos cientficos, contrapondo as concepes cotidianas s
cientficas e esclarecendo termos importantes, como adaptao e seleo natural, por
exemplo, imprescindvel no ensino da Evoluo Biolgica (CARNEIRO, 2004), em
todos os nveis de ensino, inclusive na formao de futuros professores de Biologia.
2.3 A Evoluo Biolgica no Ensino Mdio
A Evoluo Biolgica apontada, por Soncini e Castilho Junior (1991),
como um dos contedos a ser trabalhado no ensino de Biologia de forma a desenvolver
nos alunos algumas habilidades, tais como: explicar as diversas teorias existentes;
interpretar a opinio dos cientistas, segundo a poca em que essas teorias foram
levantadas; comparar as diversas teorias em suas semelhanas e diferenas; e julgar, se
possvel, qual delas se aproxima mais do modelo hoje proposto. O ensino da Evoluo
no Ensino Mdio, em funo do seu carter unificador dentro da Biologia,
possibilitaria fazer uma srie de relaes com outros contedos abordados, como por
exemplo, os da Ecologia e da Gentica. Porm, as dificuldades apresentadas tanto por
professores quanto por alunos, na compreenso dos conceitos que envolvem o
57
processo evolutivo, passaram a ser motivo de preocupao de muitos estudiosos, bem
como no prprio espao escolar.
O Ministrio da Educao brasileiro, por meio dos Parmetros e Diretrizes
Curriculares Nacionais, reconhece a importncia da Evoluo Biolgica e sugere sua
insero no ensino como um eixo integrador que envolva todas as reas da Biologia -
Zoologia, Botnica, Ecologia, Gentica, entre outras. Segundo Piolli e Dias (2004),
esta proposta persiste desde a dcada de 50 e teve influncia dos projetos curriculares e
das colees didticas norte-americanas. No entanto,