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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU – ESPECIALIZAÇÃO
DIREITO MILITAR
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO NO FORMULÁRIO DE APURAÇÃO DE TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR NO
ESTADO DO PARANÁ
Renato Moreira do Espírito Santo
2014
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RENATO MOREIRA DO ESPÍRITO SANTO
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO NO FORMULÁRIO DE APURAÇÃO DE TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR NO
ESTADO DO PARANÁ Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito, para a obtenção do grau de especialista em Direito Militar pela Universidade Tuiuti do Paraná.
Orientador: Professora ________________________________________ Lissandra Espinosa de Mello Aguirre
CASCAVEL-PR 2014
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SANTO, Renato Moreira do Espírito. Princípios Constitucionais da Ampla Defesa e do Contraditório no Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar do Estado
do Paraná. Renato Moreira do Espírito Santo. 2014. 34 folhas
Orientadora: Lissandra Espinosa de Mello Aguirre
Trabalho Final de Curso – Universidade Tuiuti do Paraná.
1. Ampla defesa 2. Contraditório 3. Constituição 4. Processo 5. Nulidade.
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RENATO MOREIRA DO ESPÍRITO SANTO
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO NO FORMULÁRIO DE APURAÇÃO DE TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR NO
ESTADO DO PARANÁ
Trabalho Final de Curso apresentado como requisito para a obtenção do grau de especialista em Direito Militar pela Universidade Tuiuti do Paraná.
Obteve o grau_________ Em__________/_________/_________
Professor __________________________________________ Orientador
Professor ____________________________________________ Coordenador
Professor ____________________________________________ Avaliador
5
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho a minha família, que ficou privada de minha
atenção quando em dias de sol e flores os deixei para enriquecer
meus conhecimentos.
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por ter me dado força, confiança e coragem para chegar até o fim de mais esta etapa de minha vida, sem deixar de lembrar das pessoas que caminharam ao meu lado.
7
EPÍGRAFE
"Todos somos iguais perante a lei,
mas não perante os encarregados de
fazê-las cumprir."
S. Jerzy Lec
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RESUMO
Está consagrado no art. 5º, LV da Constituição Federal de 1988, a regra de que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados e, geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes". Inicialmente, a garantia do contraditório e da ampla defesa consagrada da Constituição revogada aplicava-se apenas ao processo penal, sendo, com a promulgação da Constituição de 1988, alargado a todos processos administrativos e judiciais. Clara manifestação do Estado Democrático de Direito, a garantia do contraditório traduz-se na ciência bilateral dos atos e termos do processo, com a possibilidade de contrariedade, ou seja, possibilitando a atuação das partes na formação da convicção do juiz. Ciência esta, que no processo civil é eventual e não necessária, enquanto no processo penal eleva-se ao status de obrigatório e necessário, não existindo, pois um réu sem defensor, posto que no processo-crime encontra-se em jogo o valor indisponível da parte – a liberdade. Este trabalho tem como objetivo analisar os princípios constitucionais da Ampla Defesa e do Contraditório na sua verdadeira essência partindo do pressuposto que os princípios jurídicos têm sua fundamentação básica no direito natural, uma vez que sua vigência, não depende de qualquer documento ou preceito escrito. A ampla defesa é invocada diariamente, por pessoas leigas e por todos os operadores do direito, sempre que uma situação necessite como no caso de acusação a alguém sem que haja oportunidade para sua oitiva.
Palavras Chaves: Ampla Defesa, Contraditório, Constituição, Processo Administrativo,
Nulidade.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 10 2 CAPITULO I PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR 11
2.1 Processos e Procedimentos 11
2.2 Processo Administrativo Militar 11
2.3 Poder Disciplinar 12
2.4 Princípios Constitucionais nos Processos Administrativos Militares 13
3 CAPITULO II PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO
CONTRÁDITÓRIO 15
3.1 Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório no Processo Disciplinar 17
3.2 Tipos de Defesas 19
3.2.1 Auto Defesa 19
3.2.2 Defesa Técnica 19
4 CAPITULO III FORMULÁRIO DE APURAÇÃO DE TRANSGRESSÃO
DISCIPLINAR 21
4.1 Os Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório no Formulário de Apuração
De Transgressão Disciplinar 21
4.2 Nulidades das Punições Disciplinares 28
5.CONCLUSÃO 31
6. REFERÊNCIAS 33
10
1. INTRODUÇÃO
Vivemos hoje num estado de direito, e o princípio da igualdade entre as partes se
realiza através do contraditório no processo, este princípio, consiste na necessidade de ouvir a
pessoa que está sendo processada, garantindo-lhe o pleno direito de defesa e de
pronunciamento durante todo o curso do processo. Este princípio é absoluto, e não admite
exceções, sob pena da nulidade do processo, as conseqüências básicas da quebra deste
principio gerará a nulidade do processo.
Essa oportunidade de realizar o direito de defesa, quer dizer não só sobre falar sobre
as alegações do outro litigante, como também fazer a prova contrária é de condição "sine qua
nom" para o processo, ao negar-se o princípio do contraditório, pode se considerar um
cerceamento de defesa, uma vez que também não se assegura a produção de uma prova ou
contraprova, assim, o juiz determina sua aplicação "a priori", e permite a realização do
contraditório, senão a tutela pretendida poderia ser frustrada.
O principio do contraditório e da contrariedade, constituem espécies do gênero
oposição, que é afirmação e negação do mesmo predicado em relação ao mesmo sujeito, a
contrariedade se exprime em ato, pois o autor e o réu formulam pedidos, que se constituem na
contraposição, o elemento fundamental da contrariedade. Os elementos do pedido são a
proposição e a conclusão, assim, forma-se a proposição da premissa do pretenso direito que é
a lei, e da premissa do pretenso direito objetivo material, que é o fato; e dessas premissas
decorre a conclusão.
A evolução do princípio do contraditório e sua aplicação nos dias atuais, contribui
para que o ideal de justiça seja garantindo na busca do "vero veritatis", do processo, Negar ou
suprimir a oportunidade do contraditório e intervir, é ferir a Constituição Magna do País, e
não será o caso de inteira justiça.
Este trabalho terá como objetivo geral analisar o Princípio Constitucional da Ampla
Defesa e Contraditório no Processo Administrativo Militar, e mais especificamente no FATD,
baseado em pesquisa bibliográfica e nas legislações que amparam o referido princípio. Será
dividido em três capítulos: Processo Administrativo Disciplinar, Formulário de Apuração de
Transgressão Disciplinar e o Princípio da Ampla Defesa e Contraditório.
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2. CAPÍTULO I
PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR
2.1 Processo e Procedimento
É de extrema importância ao trabalho, diferenciar o que muitos confundem e por
vezes usam como sinônimos, que são os vocábulos processo e procedimento.
Processo é o método, a sobreposição temporal de atos sucessivos para se chegar a um
fim, tem o sentido de marcha para frente, progresso, desenvolvimento, ao passo que
procedimento é a maneira como o processo se realiza. Pode-se dizer que o processo é uma
realidade em abstrato enquanto o procedimento é o meio pelo qual se exterioriza o processo.
Para Maria Sylvia Zanella di Pietro (2005) o processo ‘‘(...) existe sempre como
instrumento indispensável para o exercício de função administrativa, tudo o que a
Administração Pública faz, fica documentado em um processo (...)”.
O procedimento é o conjunto de formalidades que devem ser observadas para a
prática de certos atos administrativos; equivale a rito, a forma de proceder; o procedimento se
desenvolve em um processo administrativo’’.
Conforme o Professor José Albuquerque Rocha (2001): Enquanto o processo se define, abstrata e genericamente, como o a atividade que se torna necessário exercer para a produção de um detrminado resultado, o procedimento se define como o conjunto de normas que vão estabelecer quais os sujeitos que devem participar do processo, os atos que se compõem, sequência ou ordem a ser observada entre os diversos atos, a forma desses atos, o lugar onde devem ser realizados, os prazos em que devem ser praticados, a publicidade, etc.
Existem várias espécies de processos, sendo os mais importantes o processo civil o
penal, processo Administrativo Disciplinar e o Tributário ou Fiscal, o que interessa aqui é o
Processo Ddisciplinar Militar.
2 2 Processo Administrativo Disciplinar
O que é importante relatar acerca do processo administrativo são suas finalidades e
as suas várias espécies.
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O processo administrativo disciplinar é usado pela administração pública na
apuração e punição de faltas supostamente cometidas por servidores públicos ocupantes de
cargos efetivos.
Não é um processo de cunho inquisitório tendo definidos por lei os princípios e fases
a serem seguidos para que tenha validade e consequentemente eficácia.
É importante saber que mesmo antes da regulamentação da norma o processo
administrativo disciplinar tem fundamento legal nas Garantias Constitucionais, como assim
preceitua a Carta Magna em seu artigo 41, §1º, II, mostrando desde já um dos princípios que
norteiam tal processo, qual seja o da ampla defesa elencado também no texto Constitucional
no artigo 5º, LV.
É definido por Lei que toda autoridade que tiver conhecimento de infração cometida
por servidor público é obrigada a promover a sua apuração, caso não tenha competência para
tanto deverá encaminhar o caso a autoridade que possa promover tal apuração.
Todavia para chegar à finalidade do processo administrativo é preciso obedecer a
princípios e a norma reguladora do mesmo, não se pode agir indiscriminadamente, pois se
assim fosse possível, menor ainda seria o controle sobre as atrocidades e abusos de poder
cometidos pelos administradores públicos com relação aos servidores.
Principalmente quando o processo é instaurado em razão de desvios de caráter de
servidores que incomodam às autoridades coatoras responsáveis pela administração pública,
ou seja, por pessoas que não agradam ao alto escalão da administração pública.
De acordo com o Professor Hely Lopes Meirelles (2006), processo administrativo é: O que utiliza a Administração Pública, englobando todos os poderes, para o registro de seus atos, controle da conduta de seus agentes e solução de controvérsias dos administrados, utiliza-se de diversificados procedimentos que recebem a denominação comum de processo administrativo.
Ainda segundo o Professor Hely, “O Processo Administrativo é o gênero, que se
parte em várias espécies dentre as quais as mais freqüentes se apresentam no processo
disciplinar e no processo tributário ou fiscal”.
2.3 Poder Disciplinar
O Processo Administrativo Disciplinar fundamenta-se no poder de supremacia
existente entre o Estado e os Agentes Administrativos.
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O constante aperfeiçoamento do serviço público, que hoje é princípio esculpido no
artigo 37 da Constituição Federal (princípio da eficiência), dá fundamento constitucional ao
Processo Administrativo Disciplinar. É, portanto, o processo o meio de que dispõe a
Administração Pública, seja militar ou não, de apurar irregularidades e aplicar sanções a
pessoas adstritas a regimes disciplinares na esfera pública. Goza esse poder retrocitado do
instituto da discricionariedade no que tange à possibilidade de aplicar penas. Por isso é
possível à Administração analisando os fatos, decidir qual punição é adequada, seja a
advertência, repreensão, detenção, prisão, exclusão a bem da disciplina, licenciamento a bem
da disciplina, demissão, reforma... entre outras, conforme a classe de servidores.
Na discricionariedade, porém, não é facultado por livre arbítrio pelo superior a não
aplicação da pena, haja visto seu poder-dever de agir, sujeitando-o inclusive, se for omisso, a
sanções criminais previstas no Código Penal Militar (art.322) e Código Penal (art. 320) , no
que tange à condescendência criminosa, conforme o caso. Observe-se que em transgressões
leves, por analogia e utilizando-se outros institutos processuais e penais pode o superior,
observando que as conseqüências do ato advindas para o transgressor lhe foram tão danosas
que se faz dispensável a aplicação de mais sanções.
2.4 Princípios Constitucionais nos Processos Administrativos Militares
Dentro do Direito, há princípios que são os valores ordenadores do sistema jurídico,
variando conforme o momento histórico, social e político de dada sociedade.
Bittar (1994) ensina que os princípios gerais do Direito, ou princípios ordenadores da
ordem jurídica, são valores inatos da natureza humana, constituem o mínimo que a pauta da
convivência social deve observar para que haja uma convivência pacífica, segura e harmônica
entre os seres personalizados.
Por outro lado, Peres (apud SUNDFELD 1998), ensina que: “(...) os princípios
jurídicos constituem a base do ordenamento jurídico, ‘a parte permanente e eterna do Direito e
também a cambiante e mutável, que determina a evolução jurídica’; são as idéias
fundamentais e informadoras da ordem jurídica da Nação”.
Mello (1993 apud SUNDFELD 1998), da mesma forma afirma que os princípios são
as bases estruturais de qualquer sistema.
Bobbio (1992), ensina que:
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Ao lado dos princípios gerais expressos há os não-expressos, ou seja, aqueles que se podem tirar por abstração de normas específicas ou pelo menos não muito gerais: são princípios, ou normas generalíssimas, formuladas pelo intérprete, que busca colher, comparando normas aparentemente diversas entre si, aquilo a que comumente se chama o espírito do sistema.
Historicamente, os princípios relativos à Administração Pública não faziam parte, de
forma expressa, dos textos constitucionais. Aliás, quase que a totalidade das normas relativas
à Administração Pública encontravam-se na legislação infraconstitucional.
Rocha (1994) explica que esta atitude poderia dever-se a que, uma vez demarcados
os parâmetros do Estado de Direito, a função administrativa aí já se encontrava delineada. E
também, que a função de administrar o Estado não possuía a mesma nobreza e primariedade
que as funções governativas, legislativas e jurisdicionais.
Mas, o constituinte de 1988 inovou, consagrando no texto constitucional que a
Administração Pública, em todos os níveis (federal, estadual e municipal), seja direta ou
indireta, obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade.
Mais recentemente, incorporou-se ao texto constitucional, através da Emenda Constitucional
nº 19/98, o princípio da eficiência.
Claro é que existem outros princípios que devem nortear o atuar da Administração
Pública, implícitos, que são decorrentes do Estado de Direito, e da totalidade do sistema
constitucional.
Cretella Júnior (1992) considera como princípios informadores do Direito
Administrativo - e afirma que: “Todos estes são derivados do Princípio da Legalidade - os
princípios da hierarquia, da auto-executoriedade, da continuidade, da presunção da verdade,
da indisponibilidade, da especialidade, do poder-dever, da igualdade dos administrados, da
tutela administrativa e da auto-tutela”.
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3. CAPÍTULO II
PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO
A Constituição Federal assegura, aos litigantes em geral, tanto na esfera
administrativa quanto judicial, o direito à defesa, com os meios a ela inerentes. Ao falar-se de
princípio da ampla defesa, na verdade está se falando dos meios para isso necessários, dentre
eles, assegurar o acesso aos autos, possibilitar a apresentação de razões e documentos,
produzir provas testemunhais ou periciais e conhecer os fundamentos e a motivação da
decisão proferida.
O direito à ampla defesa impõe à autoridade o dever de fiel observância das normas
processuais e de todos os princípios jurídicos incidentes sobre o processo. Esse princípio
encontra-se hoje expresso na Constituição Federal no seu Art. 5º, inciso LV: “Aos litigantes,
em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;’ e inciso LIV:
“Ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
Sendo um dos mais importantes, até mesmo porque é comum ao processo judicial.
Decorre como todos os outros, do princípio do devido processo legal, já que este só é possível
de materializar-se com respeito às garantias do contraditório. Aplica-se a ampla defesa em
todo processo onde esteja envolvido o poder de sanção do estado sobre as pessoas.
A instrução do processo deve ser contraditória, ou seja, é essencial que ao
interessado ou acusado seja dada à possibilidade de produzir suas próprias razões e provas e,
mais que isso, que lhe seja dada a possibilidade de examinar e contestar argumentos,
fundamentos e elementos probantes que lhe sejam favoráveis.
O princípio do contraditório determina que a parte seja efetivamente ouvida e que
seus argumentos sejam efetivamente considerados no julgamento. Para o exercício do
contraditório é imprescindível o conhecimento dos atos processuais pelo acusado com
conseqüente direito de resposta.
O direito do contraditório não é só de quem sofre processo judicial ou administrativo,
mas também de quem sofre qualquer acusação, mas porém, somente nos processos judiciais e
administrativos que temos a dialética entre acusador e acusado.
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O contraditório tem em sua composição os direitos à informação e participação. Já a
ampla defesa dá o direito à defesa técnica e o direito a prova, que é o direito de se defender
provando. Ela nos garante o direito de ser ouvidos e de presenciar os autos processuais.
Porém essas garantias não são dadas, como por exemplo: no procedimento de
intercepção de comunicações telefônicas, regulada pela lei nº 9.296/96, em que não se pode,
de maneira alguma anunciar previamente ao investigado a sua realização, sob pena não ter
êxito na investigação criminal.
Também é preciso dizer que a ampla defesa no processo penal é o mais legitimo dos
direitos do homem. Pois os direitos a defesa da vida, da honra, e a liberdade são inseparáveis
de seus respectivos objetos.
Percebe-se então que o princípio do contraditório é uma garantia constitucional que
já garante a ampla defesa, proporcionando a este seu direito de defesa. Como diz J.Canuto
Mendes de Almeida (1973): A verdade atingida pela justiça pública não pode e não deve valer em juízo em que haja a oportunidade de defesa do indiciado. É preciso que seja o julgamento procedido de atos inequívocos de comunicação do réu: de que vai o acusado; dos termos precisos dessa acusação; e de seus fundamentos de fato (provas) e de direito. Necessário também é que esta comunicação seja feita a tempo de possibilitar a contrariedade. Nisso este prazo para conhecimento exato dos fundamentos probatórios e legais da imputação e para oposição da contrariedade e seus fundamentos de fato (prova) e de direito.
Julio Fabbrini Mirabete (2000) esclarece que existem duas importantes regras para
que se possa entender o princípio do contraditório: 1º) A igualdade processual e a 2ª) a liberdade processual. Na primeira a parte acusadora e acusada estão no mesmo plano e na segunda o acusado poderá nomear qualquer advogado, apresentar provas lícitas e formular ou não perguntas às testemunhas.
Scarance Fernandes (2004) explica acerca da diferença entre contraditório e
igualdade processual: O contraditório põe uma parte em confronto com a outra. Exigindo que ela tenha ciência dos atos da parte contrária, com possibilidades de contrariá-las. Já o princípio da igualdade põe as duas partes em posição de similitude perante o Estado, e no processo, perante o juiz, não se confunde com o contraditório nem o abrange, apenas se relacionam.
O processo considera sob o prisma da igualdade ambas as partes da lide. Confere-
lhes, pois, iguais poderes e direitos. Com essa preocupação, a assistência judiciária é
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assegurada àqueles que não podem arcar com os gastos do processo, inclusive a remuneração
do advogado.
Mas o principal consectário do tratamento igualitário das partes se realiza através do
contraditório, que consiste na necessidade de ouvir a pessoa perante a qual será proferida a
decisão, garantindo-lhe o pleno direito de defesa e de pronunciamento durante todo o curso do
processo. Não há privilégios, de qualquer sorte.
Embora os princípios processuais possam admitir exceções, o do contraditório é
absoluto, e deve sempre ser observado, sob pena de nulidade do processo. A ele se submete
tanto as partes como o próprio juiz, que haverá de respeitá-lo mesmo naquelas hipóteses em
que procede a exame a deliberação de ofício acerca de certas questões que envolvem matéria
de ordem pública.
O princípio do contraditório reclama, igualmente, que se dê oportunidade à parte não
só de falar sobre as alegações do outro litigante, como também de fazer a prova contrária. A
não ser assim, cair-se-ia no vazio. E, por isso, nega-se o princípio e comete-se cerceamento de
defesa quando se assegura a audiência da parte adversária, mas não se lhe faculta a
contraprova.
Enfim, quando se afirma o caráter absoluto do princípio do contraditório, o que se
pretende dizer é que nenhum processo ou procedimento pode ser disciplinado sem assegurar
às partes a regra de isonomia no exercício das faculdades processuais. Disso não decorre,
porém, a supremacia absoluta e plena do contraditório sobre todos os demais princípios. O
devido processo legal, síntese geral da principiologia da tutela jurisdicional, exige que o
contraditório, às vezes, tenha de ceder momentaneamente a medidas indispensáveis à eficácia
e efetividade da garantia de acesso ao processo justo.
3.1 Princípios do Contraditório e Ampla Defesa no Processo Disciplinar
Não há que se falar em princípios do contraditório e da ampla defesa, sem que seja
instaurado o devido processo legal, entende que a instrução contraditória e o direito à ampla
defesa com os recursos e meios inerentes resultam da concretização do princípio do devido
processo legal.
Na esfera administrativa, o devido processo legal também se realiza, nos termos do
artigo 5º inciso LIV, da Constituição, através da garantia do contraditório e da ampla defesa
aos litigantes e acusados em geral.
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Dessa forma, a aplicação de sanções administrativas para que tenham validade deve
ser assegurada a oportunidade para a manifestação do interessado e a produção de provas por
ele requeridas, desde que promovidas por meios lícitos.
A bilateralidade do processo administrativo disciplinar enseja que ao contrário do
que acontece em processos inquisitórios, a administração nessa vertente de processo
administrativo, não pode estar em posição de supremacia, pois o contraditório enseja diálogo,
e caso a administração pública tenha tal supremacia o acusado será mero interlocutor, não
caracterizando assim o contraditório.
Em razão disso, o servidor colocado em confronto com a administração pública no
exercício de suas funções é o sujeito ativo no processo, sendo analisadas as acusações da
administração pública e as provas produzidas em contrário do acusado, sugerindo assim um
juízo de imparcialidade para que tenha validade o processo de apuração da falta supostamente
cometida.
Não pode a administração ser julgadora e parte ao mesmo tempo, justamente por isso
é instituída uma comissão para apurar os fatos, com profissionais competentes para tanto,
como foi visto no início do estudo.
Portanto o contraditório dentro do processo administrativo disciplinar está previsto
para que possa proteger a capacidade de influência da administração pública na formação do
convencimento da comissão julgadora, para que dessa forma seja expedido um relatório mais
ponderado e conforme a realidade dos fatos.
Sendo que o contraditório é instaurado dentro do processo a partir do momento em
que o acusado é citado e então é comunicado de que poderá promover sua defesa assim
desejando, esse procedimento dentro do processo é primordial para que o mesmo tenha
validade, pois só através dele se tem à formação da relação bilateral.
Da mesma forma é assegurada a ampla defesa no processo administrativo disciplinar,
ensejando o direito do acusado ser ouvido, apresentar razões de convencimento de sua
inocência, produção de provas, desde que sejam lícitas e ainda de impugnar provas produzidas
pela administração pública através da comissão de apuração de faltas graves e ainda o direito
a uma defesa especializada, qual seja a contratação de um profissional da área jurídica para
representá-lo no processo.
Portanto os princípios acima comentados são fundamentais para que se possa apurar
as faltas supostamente cometidas, de acordo com a legislação pertinente a matéria e ainda
com relação às Garantias Constitucionais, pois sem que esses princípios sejam obedecidos,
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caracteriza-se o cerceamento de defesa e consequentemente a nulidade dos atos cometidos daí
por diante.
3.2 Tipos de Defesas
Uma vez chamado a participar do processo e cientificado da acusação, pode o
acusado reagir à acusação, exercendo sua defesa, a qual engloba a autodefesa e a defesa
técnica.
3.2.1 Auto Defesa
A autodefesa, cujo exercício é facultativo, subdivide-se em dois aspectos: direito de
audiência (faculdade de interferir diretamente na convicção do julgador. Ex.: interrogatório e
possibilidade de interposição de recurso pelo próprio acusado) e direito de presença
(faculdade de presenciar todos os atos do processo).
Essa modalidade de defesa constitui direito do acusado, que poderá comparecer em
juízo e exercer pessoalmente o contraditório. Seu comparecimento, contudo, não é
obrigatório, exceto naqueles atos que não podem ser realizados sem sua presença, hipótese em
que poderá ser determinada a condução coercitiva .
Pode o réu, como forma de exercício da autodefesa, permanecer silente,
circunstância que, entretanto, não poderá pesar em seu desfavor, nos termos do art. 5º, LXIII,
da Constituição.
Caso se opere a citação pessoal e ocorra a contumácia (deixar o acusado de
comparecer injustificadamente a qualquer ato do processo), será decretada a revelia, o que
implicará na não-cientificação do réu acerca dos atos processuais posteriores.
3.2.2 Defesa Técnica
A defesa técnica é indispensável e deve ser exercida por pessoa habilitada. O
acusado na defesa técnica terá os seguintes direitos:
a) Direito de não ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada da autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou
de crime propriamente militar, definidos em lei (art. 5º, LXI, da CF);
b) Direito de ver inadmitida a prova obtida por meio ilícito (art. 5º, LVI, da CF);
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c) Direito à presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF);
d) Direito de ter sua prisão comunicada imediatamente ao juiz competente, à sua
família ou à pessoa por ele indicada (art. 5º, LXII, da CF);
e) Direito de, se preso, ser informado sobre seus direitos, ser assistido por familiares
e advogado, bem como de conhecer a identidade dos responsáveis por sua prisão ou por seu
interrogatório policial (art. 5º, LXIII e LXIV, da CF);
f) Direito ao imediato relaxamento da prisão ilegal e a não ser levado ou mantido na
prisão quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança (art. 5º, LXV e LXVI,
da CF).
Concebido assim o direito à defesa como garantia reconhecida à parte nos confrontos
dos poderes atribuídos ao juiz, a sua diversidade conceptual emerge claramente em relação à
garantia da igualdade das armas (e ao princípio do contraditório em particular, estaticamente
e/ou dinamicamente entendido). O qual, de fato, enquanto esta última, na igualdade
constitucional do processo civil, representa o princípio que disciplina as informações entre as
partes, a garantia íntegra da defesa, ao contrário, formula-a como organizadora das relações
que dizem respeito a cada parte, de um lado e o juiz, do outro.
A própria essência do contraditório exige, obviamente, que participem do processo
pelo menos dois sujeitos, são sujeitos distintos do autor do ato, e um juiz para dirimir a lide
forense, as conseqüências que devem unir-se ao princípio da "paridade das armas", tanto na
ordem processual criminal quanto nos processos civis, o juiz é posto em um papel de mero
árbitro do resultado do litígio, substancialmente passivo no desenvolvimento do processo,
sendo imparcial e impessoal.
Finalizando esse raciocínio, todo o procedimento probatório, que sindicância,
inquérito, processo, deve desenvolver-se no pleno do contraditório, no diálogo constante entre
as partes e o juiz; nenhuma iniciativa de instrução, das partes ou do juiz, pode prosseguir sem
que a parte seja ouvida.
21
4. CAPÍTULO III
FORMULÁRIO DE APURAÇÃO DE TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR – FATD
4.1 Os Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório no Formulário de Transgressão
Disciplinar no Estado do Paraná.
A responsabilização pelos ilícitos administrativos cometidos pelo policial militar, no
âmbito da polícia Militar do Paraná, se faz através do processo administrativo denominado
Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar – FATD, em casos de infração de menor
gravidade ou através de processo administrativo propriamente dito, regulada pela Lei nº
16.544 de 14 de julho de 2010, que dispõe que o processo disciplinar, na Polícia Militar do
Estado do Paraná.
De fato, o processo disciplinar regulado pela referida lei “é o instrumento destinado a
apurar responsabilidade de militar estadual, por infração praticada no exercício de suas
atribuições, ou que tenha repercussão ético-moral que afete a honra pessoal, o decoro da
classe ou o pundonor militar, incompatibilizando-o a permanecer no estado efetivo da
PMPR.” (Lei 16.544, art. 3°).
O objetivo do presente trabalho é analisar a ampla defesa e o contraditório no FATD,
somente.
O FATD como pode culminar em punição administrativa deve ser regulado por
normas e princípios que regem a responsabilidade administrativa do servidor, bem como
normas gerais do processo administrativo.
Sobre a responsabilidade administrativa esclarece Di Pietro¹:
O servidor responde administrativamente pelos ilícitos administrativos definidos na
legislação estatutária e que apresentam os mesmos elementos básicos do ilícito civil:
ação ou omissão contrária à lei, culpa ou dolo e dano. Nesse caso, a infração será
apurada pela própria administração, que deverá instaurar procedimento adequado a
esse fim, assegurando o servidor o contraditório e a ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes, nos termos do artigo 5°, inciso LV, da Constituição.
_________________________________________________________________________________________
¹ DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 23 ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 613.
22
Gasparini² complementa:
A responsabilização do servidor acusado do cometimento de infração
funcional depende da apuração desse ilícito pelos meios adequados,
previstos pelo ordenamento jurídico. Os meios adequados à apuração
da falta funcional são os processos administrativos e o judicial – os
únicos que se afeiçoam com o espírito e a letra do disposto no inciso
LV do art. 5° da Constituição da República, que estatui:
(.....). Com efeito, não se tem como observar esse direito ao acusado
se a infração é apurada mediante sindicância ou outro meio sumário,
que pelas suas características são incompatíveis com os institutos do
contraditório e da ampla defesa. Logo é nula a pena, qualquer que seja
ela, aplicada a servidores em que esses direitos não lhes foram
assegurados, mesmo que tenha sido precedida de sindicância, ou
decorra da aplicação dos princípios da verdade sabida ou da
flagrância.
Observe que é compacto o entendimento da doutrina, quanto à necessidade da ampla
defesa e do contraditório na apuração de ilícitos administrativos, não podendo procedimentos
de índole inquisitória dar origem à punição disciplinar.
A sindicância é de índole administrativa onde ainda não há acusado, portanto,
desnecessária a ampla defesa e o contraditório, que somente caberá no efetivo processo
administrativo disciplinar. Nesse sentido: A sindicância, que visa apurar a ocorrência de
infrações administrativas, sem estar dirigida, desde logo, à aplicação de sanção, prescinde da
observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, por se tratar de procedimento
inquisitorial, prévio à acusação e anterior ao processo administrativo disciplinar, ainda sem a
presença obrigatória de acusados. (MS nº 10.828/DF, 3ª Seção, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJ
de 2/10/2006).
A Polícia Militar do Paraná também mantém a sindicância³ na seara dos
procedimentos de natureza inquisitorial. Confira-se:
² GASPARINI, Diognes. Direito Administrativo, 17ª ed. Saraiva: São Paulo, 2012, p. 300. ³ PARANÁ. Portaria do Comando Geral da PMPR n° 338, de 24 de abril de 2006.
23
Art. 1º Sindicância é o instrumento de natureza administrativa e de
caráter inquisitorial que tem por finalidade apurar fato, produzindo
provas e esclarecendo circunstâncias, de forma a subsidiar decisão da
autoridade competente.
§ 1º Quando destinada a averiguar notícia de transgressão disciplinar,
buscará a sindicância aclarar as condições que envolvam a falta
funcional e determinar a sua autoria, antecedendo a adoção de outras
providências.
§ 2º A sindicância deverá ser instaurada para reunir elementos
atinentes à existência de situações constitutivas de direito, de maneira
a permitir o eventual reconhecimento pela autoridade competente,
bem como para comprovar a ocorrência de acidente em serviço.
Assim, observe que não há a necessidade de assegurar ao sindicado a ampla defesa e
o contraditório, institutos de defesa que lhe serão assegurados se houver a instauração do
efetivo processo disciplinar (Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar – FATD;
Auto Disciplinar de Licenciamento – ADL; Conselho de Disciplina – CD; ou Conselho de
Justificação – CJ, conforme o caso).
Deve-se constar que no caso de situações destinadas a reunir elementos atinentes à
existência de situações constitutivas de direito por parte do militar, como concessão de
medalhas de sangue, promoção por ato de bravura, bem como para comprovar a ocorrência de
acidente em serviço, a sindicância deveria prever a ampla defesa e o contraditório, porque
nesses casos não há um efetivo processo posterior.
Como observado, a sindicância é, assim como o inquérito policial, de natureza
inquisitorial, com a seguinte diferença: a sindicância é preparatória de eventual processo
disciplinar; já o inquérito é preparatório de eventual processo judicial penal. Mas, em ambos
os casos, os referidos procedimentos não são condições necessárias para a instauração dos
respectivos processos, podendo, conforme os casos, serem dispensáveis.
Pois bem, uma das soluções que se pode dar na sindicância no âmbito da PMPR é a
“a expedição de Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar, se restar demonstrados
indícios da prática de falta funcional” (Portaria do CG n° 338, Art. 24, II).
Devido à natureza inquisitória da sindicância, não há abertura de vistas ao militar
acusado para exercer a ampla defesa e o contraditório. Tais princípios constitucionais são
24
assegurados no procedimento administrativo denominado de Formulário de Apuração de
Transgressão Disciplinar – FATD4. Nesse sentido:
Art. 1º A autoridade competente, ao presenciar ou tomar
conhecimento da ocorrência de transgressão disciplinar resultante
de apuração em sindicância, ou comunicada por intermédio de
parte disciplinar ou outro expediente, a exemplo de informação,
representação ou requerimento, deverá pessoalmente expedir ou
determinar a um Oficial ou Aspirante-a-Oficial que expeça, ao militar
estadual apontado como autor do fato, Formulário de Apuração de
Transgressão Disciplinar (FATD).
É pacífico o entendimento que, sendo o FATD um processo administrativo destinado
a apurar faltas dos militares estaduais, é indispensável o contraditório e a ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes.
No entanto surgem questionamentos, tendo em vista da possibilidade do militar ser
punido tão-somente com as provas colhidas na sindicância ou em outro documento de origem.
Observe o contido na norma:
Art. 9º O prazo para a apresentação das razões de defesa será de três
dias úteis, a contar da data do ciente do militar estadual apontado
como autor do fato na primeira via do relato do fato imputado.
(Redação dada pela Portaria CG nº 596, de 10 ago.11)
§ 1º (....).
§ 2º Se o militar estadual não desejar apresentar defesa, sua intenção
deverá ser manifestada, de próprio punho, no campo
“JUSTIFICATIVAS/RAZÕES DE DEFESA” do formulário.
§ 3º Decorrido o prazo das razões de defesa e não havendo sua
apresentação, tal circunstância deverá ser certificada pela autoridade
competente ou pelo Oficial ou Aspirante-a-Oficial incumbido da
expedição do FATD, juntamente com duas testemunhas, no campo
“REGISTROS DE FATOS INCIDENTAIS”.
___________________________________________________________________________
4. PARANÁ. Portaria do Comando-Geral da PMPR n° 339, de 27 de abril de 2006
25
§ 4º As razões de defesa constituem-se na oportunidade do militar
estadual indicar e/ou apresentar as provas cuja produção entenda
necessária à sua defesa, inclusive requerer sua ouvida a termo, tendo
acesso em cartório a todas as peças dos autos.”
(Redação dada pela Portaria CG nº 596, de 10 ago. 11).
Art. 10. Entregues as razões de defesa e não havendo necessidade de
produção de provas, quer indicadas pelo militar estadual, querem
consideradas relevantes pela autoridade competente, prolatará esta sua
decisão, considerando procedentes ou não as imputações ou as
justificativas, publicando-a em boletim.
Daí surge o seguinte questionamento: se o militar acusado não requerer diligências,
nem mesmo sua oitiva, pode o encarregado encerrar o FATD com o competente relatório e ser
aplicada a punição disciplinar referente à transgressão disciplinar relatada na acusação inicial
(relato do fato imputado).
A resposta é negativa. Há necessidade da fase de instrução do feito, com a devida
colheita da prova, assegurada ao acusado a ampla defesa e o contraditório, com os meios e
recursos a ela inerentes. Mantendo-se inerte ou questionando apenas teses de direito é
indispensável à nova colheita de prova na fase de instrução do feito, mesmo se tal prova já
tiver sido colhida na fase inquisitorial (sindicância).
Di Pietro5 afirma que “a instrução rege-se pelos princípios da oficialidade e do
contraditório, este último essencial à ampla defesa”.
Nesse sentido a jurisprudência paranaense:
AÇÃO DECLARATÓRIA. POLICIAL MILITAR. FORMULÁRIO
DE APURAÇÃO DE TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR (FATD).
PUNIÇÃO COM BASE, EXCLUSIVAMENTE, EM PROVA
COLHIDA DE FORMA INQUISITORIAL NA SINDICÂNCIA
ANTES INSTAURADA. OFENSA À GARANTIA
CONSTITUCIONAL DO DEVIDO PROCESSO LEGAL
ADMINISTRATIVO, TENDO POR COROLÁRIO O PRINCÍPIO
_______________________________________
5 DI PEITRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 23 ed. São Paulo: Atlas, 2010,
p.639.
26
DO CONTRADITÓRIO. NULIDADE. APELAÇÃO A QUE SE
NEGA PROVIMENTO COM A CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA
RECORRIDA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO. Não se
pode admitir condenação baseada exclusivamente em prova produzida
de forma inquisitorial em sindicância, vale dizer, com base
unicamente naquela que não restou corroborada, sob o crivo do
contraditório, na fase instrutória do processo administrativo
disciplinar.
(TJPR - 5ª C. Cível - ACR - 954377-5 - Foro Central da Comarca da
Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Adalberto Jorge Xisto
Pereira - Unânime - - J. 20.08.2013).
Ademais o Decreto nº 4.346, de 26 de agosto de 2002 – que aprova o Regulamento
Disciplinar do Exército (R-4) e dá outras providências é aplicável a Polícia Militar do Paraná.
De fato, por força do Art. 482 do Decreto nº 7.339 - 08/06/2010 - que aprova o
Regulamento Interno dos Serviços Gerais da PMPR, estabelece:
“Na polícia militar do Estado terá aplicação o regulamento disciplinar
em vigor no exército nacional, com as alterações constantes neste
regulamento”.
Semelhante previsão encontra-se no Artigo 1º, § 4º da Lei Estadual 1.943/54 –
Código da PMPR. Assim o referido decreto n°. 4.346/2002, aplicável à PMPR, prescreve:
Art. 35. O julgamento e a aplicação da punição disciplinar devem ser
feitos com justiça, serenidade e imparcialidade, para que o punido
fique consciente e convicto de que ela se inspira no cumprimento
exclusivo do dever, na preservação da disciplina e que tem em vista o
benefício educativo do punido e da coletividade.
§ 1° Nenhuma punição disciplinar será imposta sem que ao
transgressor sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa,
inclusive o direito de ser ouvido pela autoridade competente para
aplicá-la, e sem estarem os fatos devidamente apurados.
27
§ 2° Para fins de ampla defesa e contraditório, são direitos do militar:
I - ter conhecimento e acompanhar todos os atos de apuração,
julgamento,
aplicação e cumprimento da punição disciplinar, de acordo com os
procedimentos
adequados para cada situação;
II - ser ouvido;
III - produzir provas;
IV - obter cópias de documentos necessários à defesa;
V - ter oportunidade, no momento adequado, de contrapor-se às
acusações que
lhe são imputadas;
VI - utilizar-se dos recursos cabíveis, segundo a legislação;
VII - adotar outras medidas necessárias ao esclarecimento dos fatos; e
VIII - ser informado de decisão que fundamente, de forma objetiva e
direta, o
eventual não-acolhimento de alegações formuladas ou de provas
apresentadas.
§ 3° O militar poderá ser preso disciplinarmente, por prazo que não
ultrapasse setenta e duas horas, se necessário para a preservação do
decoro da classe ou houver necessidade de pronta intervenção.
Dessa forma o direito da ampla defesa e do contraditório é um direito constitucional
e também previsto na legislação pertinente, sendo, portanto, indispensável à existência de uma
fase instrutória, com a efetiva participação do acusado, mesmo que ele não requeira no
momento oportuno.
Como exposto anteriormente o contraditório apresenta, regra geral, duas fases: a
primeira, da informação e do conhecimento e a segunda, da efetiva reação. A primeira fase é
obrigatória ser concedida ao acusado, que poderá ou não produzir as provas de seu interesse.
Mas, de qualquer forma, não se pode punir o militar estadual com base unicamente
nas provas colhidas na sindicância, porque procedimento de índole inquisitorial.
Como não se pode punir o ilícito penal com base exclusivamente nas provas colhidas
no inquérito policial, de forma idêntica não se pode punir o ilícito administrativo, com base
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em provas colhidas de maneira unilateral na sindicância ou outro documento, sem a efetiva
participação do acusado, assegurando-lhe a ampla defesa e o contraditório, como disposto na
Carta da República (CF/88, art. 5°, inciso LV).
4.2. Nulidades das Punições Disciplinares
O direito administrativo disciplinar militar, ramo do direito administrativo, e que tem
por objeto de estudo os atos funcionais praticados pelos integrantes da Forças Armadas
(Exército, Marinha e Aeronáutica) e os integrantes das Forças Auxiliares (Polícias Militares e
Corpos de Bombeiros Militares) no exercício de suas atividades constitucionais definidas
respectivamente nos artigos 142 "caput" e 144, parágrafo 5.o da Constituição Federal, pode
ser divido em duas fases: sendo que a primeira, anterior a Constituição Federal de 1988, e a
segunda, pós Constituição de 1988.
A nova Constituição Federal trouxe várias modificações no campo do direito penal e
administrativo militar, que ainda não foram totalmente incorporadas pelas Organizações
Militares que ainda possuem disposições legais que datam de um tempo onde havia modelos
diversos dos adotados no Estado democrático de direito.
Os praças, soldados e cabos das Forças Armadas e das Forças Auxiliares, que até 05
de outubro de 1988 eram impedidos de votarem passaram a ter acesso ao direito de voto, que
iguala todos os integrantes de uma mesma Corporação, independentemente do grau
hierárquico ou do círculo ao qual o militar pertença.
Além disso, diversos princípios que até então eram assegurados apenas e tão somente
aos acusados em processo judicial foram estendidos aos litigantes em geral, ou seja, àqueles
que respondam à processo administrativo.
Nesse sentido, o que até então era uma exceção no ramo do direito administrativo
militar, qual seja, à aplicação da ampla defesa e do contraditório e o devido processo legal,
passaram a ser a regra sob pena de nulidade da sanção disciplinar aplicada.
Por força de disposição dos regulamentos disciplinares aos quais estão submetidos,
que na maioria das vezes adota o disposto no regulamento disciplinar do Exército, os
militares, federais ou estaduais, ficam sujeitos a punições disciplinares toda vez que no
exercício de suas atividades vierem a praticar o que se denomina de transgressão disciplinar
militar.
29
A transgressão disciplinar militar para um melhor entendimento pode ser comparada
a uma contravenção, uma vez que esta encontra-se abaixo do crime militar, o qual encontra-se
previsto e disciplinado no Código Penal Militar e nas Leis Especiais Militares.
Com o cometimento de uma transgressão disciplinar nasce para a Administração
Militar o direito de punir o transgressor, para que este não volte a quebrar os preceitos
militares decorrentes da hierarquia e da disciplina.
Mas, se ao mesmo tempo a Administração passa a ter o direito de punir o militar
porque este violou em tese algum preceito previsto e disciplinado no Regulamento Castrense,
este também possui o direito de exercer sua defesa, uma vez que a Constituição
expressamente preceitua que ninguém perderá sua liberdade ou os seus bens sem o devido
processo legal.
Ao contrário do que ocorre com o servidor civil, o militar, federal ou estadual,
dependendo do grau da transgressão disciplinar que compreende de leve a grave, poderá ter o
seu "jus libertatis" cerceado por até 30 dias, ficando detido em cela existente na Organização
Militar na qual se encontra subordinado.
Em decorrência dessa importância, ou seja, da relevância do direito a ser tutelado, a
Administração Pública Militar somente poderá apenar seu servidor após assegurar a este a
ampla defesa e o contraditório com todos os recursos a ela inerentes.
Em sua grande maioria, as Administrações Militares já vem observado os preceitos
disciplinados na Constituição Federal, mas em alguns casos isolados observa-se o total
desrespeito aos preceitos constitucionais.
Presidentes de procedimentos administrativos, por falta de conhecimento ou
desrespeito ao texto constitucional, tem cerceado o direito a ampla defesa e ao contraditório
tentando imprimir aos julgamentos uma celeridade incompatível com o devido processo legal.
Advogados regularmente constituídos pelos acusados não são intimados dos atos
processuais a serem realizados no curso dos processos administrativos. Meios diversos as
garantias processuais são utilizados muitas vezes como forma de se limitar o exercício da
ampla defesa.
Em decorrência desses fatos, os Pretórios dentre eles o Supremo Tribunal Federal e o
Superior Tribunal de Justiça têm reconhecido a nulidade das punições administrativas
militares que não asseguram a efetiva aplicação dos preceitos constitucionais.
Deve-se observar que em seus julgamentos, os Pretórios têm se limitado a analisarem
apenas e tão somente o aspecto formal das decisões administrativas, qual seja, o atendimento
30
aos requisitos da competência, finalidade e forma, deixando de lado o motivo e o objeto da
sanção disciplinar.
Portanto, com o advento do novo Texto Constitucional, o militar (federal ou
estadual) em qualquer processo administrativo ao qual seja submetido, deverá ter assegurado
todos os preceitos decorrentes do devido processo legal, sob pena de nulidade da sanção
disciplinar como vem sendo aplicado reiteradamente pelos Pretórios.
31
5. CONCLUSÃO
A Constituição Federal garante que em todo e qualquer processo o acusado tem o
direito de apresentar defesa, porém todos os infratores devem ser punidos, sem exceção,
independentemente do cargo ou posição social.
A lei não deve permitir a impunidade em qualquer área do Direito. As penas, se
necessário, devem ser severas, inclusive com a perda do cargo, posto, patente, graduação,
vantagens, liberdade, bens, prerrogativas, o que for necessário.
A sociedade não aceita que o Estado seja representado por pessoas que não respeitam
a lei e não obedecem as ordens previamente estabelecidas. Mas, a punição efetiva deve ter
como fundamento o respeito aos preceitos constitucionais.
Ao comentar os preceitos constitucionais no processo administrativo militar,
observou-se que, a questão de punições militares não pode ser disciplinada tão somente com
vistas a manter-se sempre a hierarquia e a disciplina, mesmo porque, se estes princípios
militares são normas constitucionais, há duas normas que em verdade são princípios
constitucionais que em qualquer situação devem ser respeitados e atendidos: a "presunção de
inocência" e o "direito ao contraditório e à ampla defesa".
O art. 5 º, da Constituição Federal, norma fundamental, estabeleceu garantias que se
aplicam ao processo judicial e administrativo. O ato processual ou administrativo deve
preencher as formalidades, os requisitos estabelecidos em lei, para a sua validade e a efetiva
aplicação da sanção.
O devido processo legal é uma garantia que fortalece o ato praticado pelo julgador,
cuja decisão no âmbito da administração não faz coisa julgada, que dificilmente terá a sua
decisão revista pelo Poder Judiciário, guardião dos direitos e garantias fundamentais do
cidadão conforme o art. 5 º, inciso XXXV, da Constituição Federal.
O processo administrativo pode ser efetivo, célere, mas com a observância dos
princípios constitucionais, sem que isso signifique a quebra dos poderes outorgados a
administração pública, que deve punir de forma exemplar todos os infratores, inclusive com a
demissão, expulsão, perda do cargo, independentemente da sua posição funcional. Afinal, a
sociedade que de forma democrática escolheu os seus novos mandatários não tolera mais a
corrupção, que vem corroendo as divisas do país, que deve conceder a todos os brasileiros
uma vida digna em atendimento aos princípios enumerados no texto constitucional ao tratar
da República Federativa.
32
Chega-se a conclusão que os princípios, todos eles sem exceção, os constitucionais e
os gerais, são muito importantes para que o processo penal ande sempre para frente, não
permitindo que se retroceda a épocas passadas, onde a violência na área de processo penal e
de penal reinava, onde cada um fazia sua própria vingança e punia sem ao menos dar a esses
delinqüentes o direito a um processo legal, que garanta o que o ser humano tem de mais
importante, seu nome e sua liberdade.
33
6. REFERÊNCIAS ALMEIDA, J. Canuto Mendes. Princípios fundamentais do processo penal. São Paulo: RT, 1973. BITTAR, Carlos Alberto. Curso de Direito Civil. Volume 1. 1. Ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 1994. BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho, 5 reimpressão. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992. BRASIL. Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988. Constituição Federal. Coletânea de Legislação Administrativa. MEDAUAR, Odete (Org.) 5 ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Administrativo. 11. Ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1992. Código Penal. Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (BRASIL, 1940). Código Penal Militar. Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969 (BRASIL, 1969). Decreto 71.500, de 05 de dezembro de 1972 (BRASIL, 1972). DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17ª e 23ª edição. São Paulo.Editora Atlas, 2005/2010. GASPARINI, Diognes. Direito Administrativo, 17ª Ed. Saraiva: São Paulo, 2012. Lei 4.898, de 14 de agosto de 1995 (BRASIL, 1995). Lei 6.880, de 09 de dezembro de 1980 (BRASIL, 1980). Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990 (BRASIL, 1990). Lei 9.296, de 24 de julho de 1996 (BRASIL, 1996). MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 31ª edição atualizada por Eurico de Andrade Azevedo; Délcio Balesteiro Aleixo e José Emmanuel Burle Filho, São Paulo, 2006. MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1993. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. São Paulo: Atlas, 10ª ed., 2000. REIS, Alexandre Cebrian Araújo. Processo Penal – Parte Geral. 3. Ed. Saraiva: 2000.
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