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Universidade Federal de Pernambuco Centro Acadêmico do Agreste Curso de Design Sarah Maria Batista de Lima O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Caruaru, 2018

Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

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Universidade Federal de Pernambuco Centro Acadêmico do Agreste

Curso de Design

Sarah Maria Batista de Lima

O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo.

Caruaru, 2018

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Sarah Maria Batista de Lima

O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo.

Projeto de graduação apresentado

como requisito final para à obtenção

do título de Bacharel do Curso de

graduação em Design, da

Universidade Federal de

Pernambuco, Campos do Agreste.

.

Orientador: Prof. Flávia Zimmerle da Nóbrega Costa

Caruaru, 2018

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Catalogação na fonte: Bibliotecária – Simone Xavier - CRB/4 - 1242

L732b Lima, Sarah Maria Batista de. O brinquedo de vestir: desenvolvimento de produto para crianças com autismo. /

Sarah Maria Batista de Lima. - 2018. 73f.; il. : 30 cm. Orientadora: Flávia Zimmerle da Nóbrega Costa. Monografia (Trabalho de Conclusão de Curso) – Universidade Federal de

Pernambuco, CAA, Design, 2018. Inclui Referências. 1. Autismo. 2. Vestuário. 3. After thomas (Filme). I. Costa, Flávia Zimmerle da

Nóbrega (Orientadora). II. Título.

740 CDD (23. ed.) UFPE (CAA 2018-128)

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO ACADÊMICO DO AGRESTE

NÚCLEO DE DESIGN E COMUNICAÇÃO

PARECER DE COMISSÃO EXAMINADORA DE DEFESA DE PROJETO DE

GRADUAÇÃO EM DESIGN

SARAH MARIA BATISTA DE LIMA

“O brinquedo de vestir: desenvolvimento de produto para criança com autismo”

A comissão examixadora, composta pelos membros abaixo, sob a presidência do

primeiro, considera o(a) aluno(a) SARAH MARIA BATISTA DE LIMA

APROVADO(A)

Caruaru-PE 26 de 06 de 2018.

______________________________________________________________

Profa. Nara Oliveira de Lima Rocha

______________________________________________________________

Profa. Andrea Barbosa Camargo

______________________________________________________________

Profa. Flávia Zimmerle da Nóbrega Costa

Page 5: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

Dedico esta, bem como todas as conquistas da minha vida a esse tesouro precioso

que possuo: Dona Angelina, a minha avó materna que embora possa não ter

consciência disto, ilumina os meus pensamentos e me faz querer ir à busca de

conhecimentos novos a cada dia, além de me impulsionar a ser melhor, inspirada

em suas lutas vividas. Amo-te infinitamente.

Page 6: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

AGRADECIMENTOS

A Deus, pela coragem e força que me manteve firme enquanto a saudade de

casa apertou forte. A minha família, que acredita fielmente em meu potencial, à

vocês devo toda a minha gratidão: Mãe, sem o seu amor, força e parceria, eu jamais

iria conseguir, obrigada por ser sempre o meu ombro amigo; Pai, sem o seu amor

através da insistência e condução ao caminho acadêmico, talvez eu não estivesse

aqui;Mana, sem o seu companheirismo e “puxões de orelha” teria sido bem difícil.

Vocês me fazem uma enorme falta!

Agradeço as componentes da minha banca: professoras Nara Rocha e

Andrea Camargo e aos entrevistados em nossa pesquisa exploratória: os designers

Duarte Júnior e Rocha, e a doutora Lopes pelas valiosas contribuições que deram

ao nosso trabalho. Em especial, por dedicar seu tempo e permitir que eu

observasse, entendesse e que transformasse em empatia a complexidade

contextual que envolve o autista, muito obrigada Dra. Lopes!

A melhor professora que já tive: Flavinha, um exemplo de mestre e pessoa,

pela paciência, conhecimento partilhado, compreensão e amizade, serei para

sempre grata.

Ao meu namorado Rubens, agradeço por todo incentivo e fé em mim.

As amizades construídas por meio da universidade, foram pontes para troca

de conhecimento e vivência de experiências inesquecíveis.

A Lays e Diego que abriram as portas para o conhecimento de mercado e

proporcionaram saberes de grandiosa importância.

A todos que estiveram comigo direta ou indiretamente, o meu eterno

agradecimento!

Page 7: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

RESUMO

Este projeto partiu de uma inquietude que se transformou em empatia: as

necessidades da criança autista. Contudo, devido a condição singular do conjunto

de características próprias a cada indivíduo autista, optamos por realizar um estudo

de caso e, desse modo, não poderíamos ter nesse estudo um problema de design,

que por princípio, desenvolve soluções coletivas. Assim, inspirados no esforço de

inclusão da abordagem de design centrada no usuário que, a depender do pais de

origem, se denomina: Design for All,, Universal Design ou Inclusive Design, esse

estudo se voltou para estabelecer um processo de design. Nos desafiamos a

atender as necessidades de um usuário numa escala de necessidades considerada

complexa, uma vez que as descobertas processuais podem contribuir com melhorias

coletivas, com a prática e o pensamento em design. Nosso processo foi construído

para responder: Como desenvolver uma peça de vestuário que atenda às

necessidades de uma criança com autismo? Para isso, buscamos levantar

informações técnicas relevantes acerca do autismo no contexto infantil, as formas de

intervenção e terapias que são indicadas. Kyle, um garoto autista retratado no filme

“After Thomas” foi o caso de estudo que nos embasando para desenvolver um

produto preocupado com conforto e segurança. Para o processo adotamos uma

metodologia de design,que nos propiciou uma sólida diretriz para o processo criativo,

auxiliando tanto na compreensão do mesmo,como na consideração da multiplicidade

de informações que envolveram esse estudo. Desenvolvemos também uma

metodologia para considerar todas as variáveis relevantes – provenientes do caso e

da literatura - e utilizamos uma matriz decisória que, ao considerá-las num contexto,

nos auxiliou a decidir como atender a cada delas, justificando nosso artefato. O

resultado desse percurso finalizou-se na construção de um casaco, projetado para

promover conforto e segurança. Sendo também um brinquedo, o mesmo redireciona

a atenção do usuário para o mundo exterior, bloqueando os efeitos da estereotipia.

Para além do próprio processo, a contribuição para a área está na metodologia que

permite considerar as variáveis e justificar o artefato.

Palavras-chave: Autismo, Vestuário, AfterThomas.

Page 8: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

Abstract

This project started from a restlessness that has turned into empathy: the

needs of the autistic child. However, due to the singular condition of the set of

characteristics peculiar to each autistic individual, we chose to carry out a case study

and, therefore, we could not have in this study a design problem, which in principle

develops collective solutions. Thus, inspired by the effort to include the user-centered

design approach that, depending on the country of origin, is called: Design for All,

Universal Design or Inclusive Design, this study turned to establish a design process.

We challenge ourselves to meet the needs of a user on a scale of needs considered

complex, since procedural discoveries can contribute to collective improvements,

practice, and design thinking. Our process was built to answer: How to develop a

garment that meets the needs of a child with autism? To this end, we seek to obtain

relevant technical information about autism in the child's context, the forms of

intervention and therapies that are indicated. Kyle, an autistic boy portrayed in the

movie "After Thomas" was the case study that we are working on to develop a

product concerned with comfort and safety. For the process we adopted a design

methodology, which provided us with a solid guideline for the creative process,

assisting both in its comprehension and in the consideration of the multiplicity of

information that involved this study. We also developed a methodology to consider all

the relevant variables - from the case and the literature - and used a decision matrix

that, when considering them in a context, helped us to decide how to meet each of

them, justifying our artifact. The result of this route was finalized in the construction of

a jacket, designed to promote comfort and security. Being also a toy, it redirects the

attention of the user to the outside world, blocking the effects of stereotypy. In

addition to the process itself, the contribution to the area is in the methodology that

allows to consider the variables and justify the artifact

Key words:Autism, Clothing, After Thomas.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Fluxograma das qualidades ergonômicas para a usabilidade do vestuário

Figura 2 - Thomas, o trem falante

Figura 3 - Desenho técnico

Figura 4 - A modelagem no papel

Figura 5 - Modelagem cortada no tecido

Figura 6 - Parte destacável com estampa

Figura 7 - Resultado final: Frente

Figura 8 - Resultado final: Quebra-cabeça

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Etapas metodológicas adotadas para esse estudo

Tabela 2 - Matriz Decisória orientadora da geração de alternativas

Tabela 3 - Tabela de avaliação de materiais e métodos

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 11

1.1 Pergunta de pesquisa 18

1.2 Objetivo Geral 18

1.3 Objetivos específicos 18

1.4 Justificativas 18

1.5 A organização do processo criativo: Adotando um pensamento

projetual 19

2 METODOLOGIA DE MONTEMEZZO: ETAPAS PARA A CONSTRUÇÃO

DO PRODUTO 21

3 PROCESSO CRIATIVO: ANÁLISE E DESCRIÇÃO DOS RESULTADOS 24

3.1 Preparação 24

3.1.1 Entendendo o autismo 25

3.1.1.1 Intervenções e estimulações – Tratamentos possíveis 29

3.1.2 O design: Inovação e criatividade é processo e resultado 31

3.1.2.1 O conforto, o lúdico e a sensação de segurança no vestuário 32

3.1.2.2 Funcionalidade no vestuário infantil 36

3.1.3.1 O contexto da vida de Kyle 37

3.1.4 Kyle: Uma análise de resultados 49

3.2 Geração 45

3.3 Avaliação 50

3.4 Concretização – Descrição dos resultados e processos 53

3.5 Documentação para produção 60

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 62

REFERÊNCIAS 66

ANEXO A – ENTREVISTA COM A TERAPEUTA ESPECIALIZADA EM

AUTISMO

ANEXO B – TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE IMAGEM

ANEXO C – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E

ESCLARECIDO

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1 INTRODUÇÃO

O autismo apresenta-se como um quadro clínico ainda pouco explorado, uma

vez que constitui-se um campo de estudos cheio de incertezas, promovendo um

desafio constante para os pesquisadores interessados na área. Isso ocorre pela

grande diversidade de características que são próprias à esse distúrbio, gerando

combinações particulares em cada pessoa autista1. Kanner em 1943 descreveu pela

primeira vez o que chamou de “Autismo Infantil Precoce” e utilizou esse termo para

tratar de crianças que tinham limitações no relacionamento com pessoas e objetos e

dificuldades em desenvolver a linguagem (GOULLART; ASSIS, 2002).

Apesar do número de pesquisas, livros e estudos sobre o tema ter se ampliado

nas últimas décadas, o autismo ainda é considerado um grande mistério. Em torno

do autismo também foram criados vários mitos pela sociedade, e isso também

dificulta a disseminação de informações que realmente vão contribuir para a área de

pesquisas aprofundadas sobre o distúrbio, pois geralmente quando se fala em

autismo, as pessoas se apóiam em informações equivocadas, tais como,

entendendo que esse é um indivíduo que “não tem sentimentos” ou que “vive em

seu próprio mundo”, o que acarreta/justifica a enorme desconfiança de pessoas para

com os mesmos e suas habilidades. Assim como disseram Carvalho e Pires (2014,

p.58) o interesse sobre o tema gira em torno da dúvida e do fascínio “(...) por

aparentemente rejeitarem relações sociais e contato afetivo, por muito tempo a

sociedade pensou o autista enquanto um não sujeito, que é incapaz de amar ou ter

empatia”.

1Segundo Dra. Lopes, os autistas que preferem ser identificados como "autistas", "pessoa autista" ou "criança autista",Doutora Lopes é graduada em Fonoaudiologia, Especialista em Patologia de Linguagem, Mestre em Letras com foco no autismo, Doutora em Linguística com tema de autismo e comunicação multimodal. Possui Certificação Internacional em Integração Sensorial Terapêutica DIR/Floortime, e éSócia-Diretora da Aprimore-Terapia Integrada.

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Segundo o Manual de Diagnósticos Estatísticos de Transtornos Mentais (DSM-

V) os primeiros sintomas aparecem geralmente quando a criança tem de 12 a 14

meses de vida, podendo também aparecerem antes a depender da gravidade com

que se instaure, tornando de extrema importância a atenção dada pelas pessoas

que convivem com a criança aos seus comportamentos cotidianos. A clareza das

informações facilitariam o diagnóstico dos profissionais.

De acordo com Andrade (2012) o autismo não tem cura, porém, com os

diferentes tipos de tratamento é possível estimular as crianças corporalmente,

imageticamente e por meio de integração sensorial e motora. Esse estímulo é de

grande importância,pois a partir do momento em que a criança passa a responder

aos mesmos, o fará em qualquer ambiente em que estiver inserido.

Os comportamentos repetitivos comprometem grande parte do cotidiano de

crianças autistas. Tais respostas repetitivas são denominadas de estereotipias e se

referem a uma auto estimulação da criança na busca por sensações prazerosas e

por uma regulação sensorial do organismo. Realizá-las é considerada uma

necessidade, haja visto o conforto e alívio promovidos (BATISTA, 2012). Fialho

(2014) analisa que um problema pode estar na alta freqüência com que esses

comportamentos ocorrem, pois ao acontecerem, eles mantém a criança engajada

em responder a estímulos que são internos ao seu corpo e a desconsiderar os

estímulos externos, perdendo inúmeras ocasiões que poderiam ser de interação

social e/ou de aprendizagem. Contudo, a autora salienta a importância de tais

momentos, pois esses são fundamentais para seu desenvolvimento e adaptação ao

ambiente. Para Fialho ensinar habilidades nas áreas do brincar, do comunicar e do

aprender são relevantes para enriquecer o repertório comportamental do autista. A

autora recomenda que se ofereça atividades ou jogos de seu interesse, mas de

preferência aqueles que os faça utilizar a mesma parte do corpo da estereotipia;

assim, sendo incompatível com a mesma (pois não se pode fazer duas coisas ao

mesmo tempo), se bloqueia seus efeitos a partir de um redirecionamento da atenção

para o mundo externo.

Fialho (2014) entende que o mundo externo deve ser apresentado de forma

atrativa e que jogos como os de montar e os quebra-cabeças tornam-se ferramentas

interessantes para essa despertar esse interesse e diminuir o tempo de isolamento

do autista. Por sua vez, Santos, Miranda, Silva, Moura e Freitas (2013) salientam a

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relevância do papel da ludicidade para o âmbito emocional do autista, uma vez que

configura o ambiente como prazeroso e motivador.

Existem terapias que ajudam a diminuir o déficit causado pelo autismo em

habilidades emocionais, cognitivas, motoras, sensoriais e de interação social. Por

exemplo:a Farmacoterapia, a abordagem psicopedagógica, a metodologia ABA

(Análise do comportamento aplicada), o tratamento biomédico, a musicoterapia, a

reorganização neurológica, a ITA (imunoterapia ativada), o programa TEACCH

(utilizada nas APAEs), o programa SONRISE (criado a partir do enredo do filme

“Meu Filho Meu Mundo), a equinoterapia (terapia com cavalos), a sinoterapia

(terapia com cães), entre outros (ANDRADE, 2012, p. 20). Contudo, um modelo

terapêutico considerado promissor é o Modelo DIR (Developmental, Individual

Difference, Relationship-Based), sendo sua principal Abordagem – o Floortime.

Ribeiro e Cardoso (2014)apontam a eficácia dessa intervenção sob a ótica da

terapia ocupacional, e explicam que a mesma:

[...] se caracteriza por uma série de interações espontâneas e

criativas que ocorrem no chão, em que se encoraja a iniciativa

da criança e seu comportamento intencional, buscando

promover as habilidades fundamentais até o nível mais elevado

que a criança consiga chegar por meio da brincadeira

(RIBEIRO; CARDOSO, 2014, p.399)

Casos de usuários como esse, cuja interação com produtos é dada de uma

forma particular, torna-se um tipo de desafio para o design.Na atualidade, a inclusão

socialé tema de pauta de discussões no mundo inteiro. Desde o início dos anos

1990, principalmente frente à constatação das mudanças demográficas causadas

pelo envelhecimento da população, acontece em alguns países um movimento em

prol de se incentivar os designers a considerar o mais amplo grupo de usuários para

o desenvolvimento de produtos (NEWELL, 2003).

Essa agenda é conhecida na Europa como Design for All e nos Estados

Unidos como Universal Design e no Reino Unido como Inclusive Design (I-Design)

(CLARKSON; COLEMAN, 2013; DONG; CLARKSON; CASSIM; KEATES, 2015). Tal

abordagem desafia as tradicionais pois, ao inverso delas, não enxerga o usuário

como um indivíduo deficiente ou incapacitado, mas sim acredita que as pessoas

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possuem suas deficiências ampliadas e até impostas por designs inadequados. Essa

abordagem parte de duas premissas: incialmente não entende como aceitável se

definir o que é normalidade ou capacidade diante da diversidade de capacidades

mental e física presentes na população e variáveis ao longo de suas vidas; num

segundo momento, entende que a deficiência não está inerentemente relacionada

com os níveis de capacidade de pessoas, mas aparece como fruto das interações

dessas com o ambiente, portanto, são passíveis de projetos de intervenções. Como

essa abordagem entende que a vida está cada vez mais moldada pela intervenção

humana, cabe ao design tornar um usuário ativo ou desativá-lo de um papel social

(CLARKSON; COLEMAN, 2013). A filosofia dessa abordagem, portanto, foge da

visão do modelo médico de reabilitação de um paciente, preceitos de onde parte a

Tecnologia Assistiva, mas utiliza esses conhecimentos para atender a um

consumidor-cidadão que deseja e necessita de produtos com moda e estética além

de funcionalidade (NEWELL, 2003).

Outro ponto a destacar se refere as modificações ocorridas na legislação de

vários países. Em defesa da inclusão a mesma vem se moldando e instaurando

mudanças, o que tem ajudado os projetistas a construírem argumentos mais sólidos

para uma ampla adoção do pensamento pertinente a esse tipo de abordagem.

Cassereley e Ormerod (2003) entendem que para o designer essa é uma questão

moral, já que trata-se de promover oportunidades e respeito pelas pessoas.Os

autores defendem que a prática dessa abordagem tenderá a conquistar cada vez

mais consumidores.

Como vemos, nessas últimas décadas enormes mudanças na forma de

pensar se colocam frente à formação e às práticas profissionais, pois empresas e

serviços precisam gerar lucros, a sustentabilidade do planeta precisa ser

considerada e as pessoas incluídas na vida social. Em relação ao design, Jonas

(2007) considera que, para seu fortalecimento social e acadêmico, o campo deva

ampliar sua auto concepção tanto acerca de uma demanda estendida como do

próprio papel que ocupa, reflexão que deverá apoiar novamente à construção

teórica.

O campo do design é reconhecido pela expertise aplicada ao desenvolvimento

de produtos que atendam as questões funcionais, estéticas e simbólicas dos

usuários. De acordo com Lobach (2001) muitas das necessidades do homem são

satisfeitas através de objetos, isso se manifesta através das funções do produto,

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onde no processo de utilização se manifestam como valores de uso. Assim, embora

o design já possua um papel fundamental a desempenhar frente aos desafios da

integração de pessoas por meio das abordagens centradas no usuário (CLARKSON;

COLEMAN, 2013), nos questionamos como atender as necessidades específicas de

um usuário tão singular como o autista, dentro de um campo cujas soluções devem,

por princípio, possuir aplicações coletivas (BORGES, 2002).

A questão nos levou a redirecionar a contribuição inicial da nossa pesquisa.

Antes de nos aprofundar nas características do usuário, pensamos que essa

contribuição estaria numa possível solução em design, mas diante do quadro

levantado em nossa pesquisa exploratória (entrevistas com dois designers e com

uma terapeuta DiIR/Floortime - que acompanhou nosso projeto), voltamos nosso

foco para um processo em design. Seguindo Portugal e Couto (2010), entendemos

que, como o design se envolve com a totalidade material e intelectual da interação

humana, cabe ao designer, na verdade, projetar um conjunto de interações. Isso

porque, para as autoras, design é processo e pode ser entendido tanto por seus

resultados tangíveis como pela atividade projetual em si.

Considerando que, se por um lado Clarkson e Coleman (2013) entendem que

o bom design se constitui por decisões conscientes e bem informadas ao longo de

um processo de design, o que inclui naturalmente ponderar acerca de questões

oriundas de vários campos de conhecimento; e por outro, Portugal e Couto (2010)

defendem que tudo que um indivíduo vivencia é parte de uma experiência

cumulativa que, embora seja ordenada de um modo particular, essa contribui

diretamente para construção do arcabouço de conhecimento desse indivíduo;

podemos entender que um designer necessita construir um repertório por meio da

prática em design, que o habilite a resolver problemas em design.

Körting (2014) corrobora com esse entendimento ao avaliar que o processo

projetual se constitui de valores e da cultura, ou ainda, do repertório cultural dos

designers envolvidos. Para o autor essa é uma condição relevante para a inovação e

a criatividade que estará refletida nos resultados do projeto. Villas-Boas (2009, p.2-3)

trata da formação do que seria uma cultura projetual:

A cultura projetual se desdobra na consciência de

determinados princípios projetuais historicamente determinados

(e no posicionamento do designer perante eles, ao gerar suas

Page 17: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

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alternativas de solução), na adoção de dados procedimentos

metodológicos, na consolidação de um repertório visual

recorrentemente consultado para nortear as soluções de

projeto e na capacidade de identificar referências, influências e

implicações das soluções do projeto em andamento.

Assim, para Villas-Boas, (2009), uma atividade projetual crítica e criativa se dá

a partir de um conjunto de princípios que foram apreendidos pelo estudante e,

exatamente isso, justifica o design como campo específico de conhecimentos.

Desse modo, o repertório é fundamental para criar ideias e imagens durante o

desenvolvimento de produtos visando desenvolver um bom design e, se o mesmo se

conquista pela experiência (aprendizagem em geral) ou prática em design,

acreditamos que podemos contribuir com o campo ao considerar as necessidades

de um autista na projetação de uma peça de vestuário que, ao mesmo tempo,

também seja um brinquedo, já que a ludicidade é um fator importante para estimular

a aprendizagem e as habilidades sociais dos autistas.

Utilizando o ferramental e o processo em design, com o objetivo de atender

as necessidades do autista e lhe propiciar momentos de atenção ao mundo exterior,

buscamos promover conforto e segurança por meio de sua interação com o artefato.

Assim, ao estabelecer o processo criativo a partir de suas necessidades, estaremos

contribuindo com o designer ao apresentar o caminho percorrido e suas descobertas

processuais, essas possíveis de contribuir com melhorias coletivas. O processo

pode ainda sensibilizar outros designers para o caso e, tal como aconteceu conosco,

ao promover empatia se abre espaço para o entendimento profundo dessas

necessidades, como também para soluções mais criativas e eficazes, tal como

apregoa Dong, Clarkson, Cassim e Keates (2015).

Inspirados na filosofia do I-Design, nos desafiamos a atender as

necessidades de um usuário dentro de uma escala de características considerada

complexa, mas o resultado, isto é, artefato em si, pode ser usado por qualquer

criança, tal como indica Clarkson e Coleman (2013). Dessa forma acreditamos que

também adensamos o movimento crescente que se preocupa em integrar cada vez

mais pessoas com deficiência na sociedade.

Diante do que foi apresentado e devido à singularidade dos casos,o presente

estudo tem como objetivo geral a criação e produção de uma peça de roupa com o

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autistaKyle, personagem principal do filme “After Thomas”. Para tanto,foi necessário

o entendimento mais amplo acercado autismo, tais como as dificuldades que se

apresentam e as melhores formas de estimular positivamente as crianças autistas.

Analisamos também como fazer isso por meio do vestuário e suas qualidades

técnicas, como as cores, texturas e acabamentos, buscando gerar conforto e

segurança a esse usuário.

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1.1 Pergunta de pesquisa

Como desenvolver uma peça de vestuário que atenda às necessidades de

uma criança autista?

1.2 Objetivo Geral

Produzir uma peça de roupa que atenda às necessidades de uma

criança com autismo.

1.3 Objetivos Específicos

Levantar informações técnicas sobre o autismo: quais suas

características, como ele se dá em crianças e quais as terapias são

aplicadas a esses indivíduos;

Analisar o caso escolhido buscando entender suas particularidades;

Adotar uma metodologia de design que permita desenvolver uma peça

de vestuário considerando a multiplicidade de informações que

envolvem o estudo de caso;

Considerar a forma, o material têxtil e os acabamentos da peça

visando o conforto e a segurança do usuário;

Produzir a peça final.

1.4 Justificativas

Nosso estudo busca explorar um processo em design cujo objetivo é o

atendimento às necessidades singulares de um usuário (estudo de caso) para então

criar e produzir um produto de vestuário que contemple esses imperativos. Dentre as

várias habilidades que o ato de projetação demanda do designer, a preocupação

com os fatores humanos e suas soluções representa um grande desafio, pois em

meio à complexidade de variáveis de um caso, é preciso entender o usuário em suas

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necessidades, modos de pensar e agir, além do analisar o contexto onde o mesmo

está inserido, envolvendo questões de ordem social e cultural. Desse modo, nosso

processo almeja, ao percorrer tal caminho, contribuir teoricamente por meio da

exploração e articulação de aportes teóricos pertinentes a disciplinas de diferentes

áreas de estudo, reforçando como a atividade de design é necessariamente

interdisciplinar.

Por outro lado, ao aplicar efetivamente o aporte teórico na construção de um

protótipo apoiados numa metodologia de design, entendemos estar apontando um

caminho para a prática do designer, sendo aqui que encontra-se nossa contribuição

prática. A atividade projetual é uma prática em design que auxilia a consolidação de

um repertório,haja visto que as descobertas processuais são sempre relevantes para

a prática, podendo contribuir com o pensamento na área. Ainda, ao apresentar as

necessidades desse usuário, acreditamos poder despertar o interesse dos designers

para a filosofia da abordagem que enxerga o usuário como um consumidor-cidadão,

e acredita que a deficiência de pessoas são ampliadas e até mesmo impostas por

designs inadequados. O pensamento aponta a importância e a responsabilidade do

design no mundo contemporâneo.

1.5 A organização do processo criativo: adotando um pensamento projetual

A nossa pretensão em focar no processo de construir um produto nos leva, a

partir daqui, a tomar uma forma de projeto diferenciada da costumeiramente

desenvolvida para construções teóricas. Isso porque, o processo criativo requer uma

organização sistemática para equacionar todas as variáveis de um estudo de caso,

ao mesmo tempo em que estabelece uma coerência de raciocínio com vistas a

solucionar todos os “parâmetros técnicos, econômicos, mercadológicos e

principalmente, humanos e sociais” que se colocam como necessários ao

desenvolvimento do referido produto (MONTEMEZZO, 2003, p.10).

A escolha metodológica de Montemezzo (2003) deve-se ao fato da mesma ter

proposto diretrizes metodológicas sólidas para o processo projetual de design de

moda na academia, trazendo os princípios de design para estruturar o processo de

criação específicos dessa vertente, o que condiz com nossa proposta estabelecer

um processo criativo para elaboração de um artefato-vestuário com foco no usuário.

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Ao adotarmos uma diretriz, o processo criativo se estrutura sem deixar de

considerar as variáveis, ou ainda, as informações provenientes de áreas diferentes:

(tais comoo entendimento do nosso usuário - características do autismo, terapias

indicadas), a coleta documental que representa as características específicas do

nosso caso de estudo, além dos saberes de execução que são próprios ao produto

em si, que abrangem conhecimento de matérias-primas, das ferramentas e

tecnologias aplicadas à construção de produtos do vestuário.

Assim, nosso capítulo dois, ao invés de tratar da fundamentação teórica,

apresenta o procedimento metodológico adotado para o desenvolvimento de produto

e, no capítulo três (análise dos resultados), nossa fundamentação estará colocada

embasando as diversas fases projetuais, momento em que os dados documentais

coletados são confrontados com aporte teórico utilizado e organizados por meio

dele.

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21

2 METODOLOGIA DE MONTEMEZZO: ETAPAS PARA CONSTRUÇÃO DO

PRODUTO DE MODA/VESTUÁRIO

A moda, sob a ótica de Montemezzo (2003) envolve articulações de fatores

sociais, antropológicos, ecológicos, ergonômicos, tecnológicos e econômicos para

satisfazer os desejos de certo público que vem a consumir tais produtos de moda,

sendo assim, afirma que se encaixa perfeitamente na conduta criativa de resolução

de problemas de design. Esta relação do designer com o consumidor final se faz

importante no processo de moda, já que é necessária a definição do problema de

design antes de especificar o projeto.

Após analisar algumas estruturas de organização de desenvolvimento de

produto de moda/vestuário, Montemezzo (2003) desenvolveu um raciocínio projetual

dividido em cinco etapas, que são: Preparação, geração, avaliação, concretização e

documentação para produção. (MONTEMEZZO, 2003, p.88).

É na etapa da preparação que é feita toda a coleta de informações que

servirá de base para a criação do produto.A partir da detecção das necessidades do

público alvo, o designer irá focar em identificar qual o problema de design e de que

forma ele poderá resolvê-lo, tendo assim uma direção mais assertiva para os

resultados do projeto. É nesta fase também que se define o conceito gerador que irá

delimitar os princípios funcionais e de estilo,sem perder o foco das necessidades do

público-alvo, por fim, sintetizar este conceito gerador em referências visuais.

A próxima etapa se dá pela geração,onde todo o estudo feito nas duas fases

anteriores se tornam em esboços, aqui o designer irá desenvolver croquis/desenhos

e estudo dos modelos que mais se adéquam a proposta, além de realizar uma

pesquisa sobre quais materiais e tecnologias irão se encaixar da melhor forma no

produto, e que atenda às necessidades do público alvo.

A fase de Avaliação faz com que a melhor alternativa dentre as opções feitas

anteriormente seja escolhida, os croquis passam pela fase de avaliação para que a

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opção que tenha mais coerência seja então escolhida de acordo com o conceito

gerador e as especificações do projeto.

Aqui o projeto entra em fase final com a concretização etapa em que serão

feitas as adequações necessárias e detalhamento da configuração do produto

selecionado na fase anterior, com avaliações de caimento, conforto, usabilidade, e

corrigir possíveis erros antes de avançar para a etapa seguinte.

Por fim, o projeto entra em fase final com a documentação para a produção,

onde serão feitas as especificações dos detalhes técnicos e da produção, aqui

também será feita a ficha técnica e confecção da peça.

Em cada uma das cinco etapas a autora se preocupa com micro fases

relativas às necessidades da construção de coleção, abordando temas que para

nosso caso não são pertinentes. Desse modo, o Quadro 1 apresenta em detalhes o

que foi adotado de cada fase para nosso processo criativo.

Tabela1 - Etapas metodológicas adotadas para esse estudo.

Fases do projeto Organização do

pensamento

Ações nesse projeto

Preparação

Identificar problema a ser

resolvido

Identificar comportamentos e

características do TEA que

sinalizem para uma demanda

por produtos do vestuário que

atendam às necessidades

especiais dos mesmos.

Conhecer melhor o problema Coletar dados sobre estes

comportamentos/necessidades

e quais são as formas de

intervenção.

Definir os limites do problema

e os objetivos básicos do

projeto

Identificar as principais

características para delimitar

que o produto irá respeitar tais

características, identificando

assim os objetivos básicos

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deste projeto.

Abastecer a mente com

informações envolvidas na

busca por soluções.

Tendo todas estas informações

em mãos, elaborar diferentes

pesquisas para conhecer

materiais, modelagem,

acabamentos para a busca por

soluções para tal problema.

Definir o caminho para

chegar à solução.

Sintetizar o conceito gerador

em referências visuais.

Geração Usar os canais de expressão

para gerar possibilidades de

solução.

Desenvolver ponderações

necessárias/hipóteses para

compreender de forma técnica

quais os artifícios que serão

utilizados na confecção em

torno das necessidades do

usuário.

Avaliação Avaliar a coerência das

propostas geradas com o

caminho definido.

Selecionar a proposta mais

coerente de acordo com o

caminho definido e os

objetivos delimitados

Avaliar qual das alternativas

geradas está mais coerente ao

público alvo de acordo com

todas as características do

mesmo.

Concretização Elaborar a proposta

detalhando-a e estudando a

sua viabilidade através de

experimentações

Aqui o projeto entra em fase

final onde ocorre o

detalhamento da configuração

da peça escolhida na fase

anterior

Documentação

para produção

Especificar e documentar

detalhes técnicos de

produção.

Por fim, a elaboração da ficha

técnica com todos os detalhes

necessários, e confecção da

peça.

Fonte: Adaptado de Montemezzo (2003, p.88)

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3 PROCESSO CRIATIVO: ANÁLISE E DESCRIÇÃO DOS RESULTADOS

Nesse capítulo seguiremos as etapas da metodologia de Montemezzo (3003),

analisando os dados documentais do nosso estudo de caso à luz do referencial

teórico utilizado, e assim orientando e apresentando o desenvolvimento processual

que nos levou a um produto final. Na medida em que avançamos nas fases,

exatamente quando informações coletadas começarem se mostrar relevantes para

definição de características essenciais do produto, ponderações necessárias são

levantadas.

Numeradas, essas ponderações foram colocadas em uma matriz decisória

(etapa de avaliação) e serviram como guia para tomada de decisão efetuada na

busca de soluções mais efetivas para o artefato, consolidando nosso processo

criativo.

3.1 Preparação

Seguindo Montemezzo (2003), inicialmente nessa etapa devemos identificar a

demanda de usuários e coletar dados acerca dos comportamentos, definindo as

necessidades e os problemas a serem contemplados. Desse modo, iniciamos por

tratar do autismo, suas principais características, bem como as intervenções e as

estimulações que se fazem necessárias para a progressão da criança com relação a

suas habilidades. Avançamos coletando informações teóricas acerca do autismo na

infância, a percepção cognitiva e a integração sensorial dos autistas. Na etapa

seguinte, coletamos referencial teórico indicativo de como o design pode intervir de

forma positiva trazendo mais conforto e adaptando o vestuário da criança com

autismo com base na ergonomia e usabilidade, além de exaltar a importância da

funcionalidade no vestuário deste público.Por fim,levantaremos informações do

nosso caso de estudo, um personagem do filme denominado After Thomas chamado

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Kyle,um menino autista, cujas características deram embasamento a esse estudo,

sendo o ponto de partida para esta pesquisa.

Ainda nessa etapa, devemos “abastecer a mente” para conquistar soluções e

definir um caminho possível para realizá-las. Desse modo, os sub tópicos dessa

seção buscarão nos embasar para essa fase.

3.1.1 Entendendo o Autismo

O autismo se apresenta como um quadro clínico ainda pouco investigado,

pois além apresentar um nível alto de complexidade, parece que quanto mais se

estuda, mais dúvidas aparecem (ANDRADE, 2002).

Segundo Gadia, Tuchman e Rotta(2004), a expressão “autismo” foi designada

inicialmente por Bleuler (1911), que a caracterizou como uma perda de contato com

a realidade responsável por desencadear uma grande dificuldade de comunicação

desses indivíduos. Ainda segundo Gadia, Tuchman e Rotta (2004, p.83), em 1943e

1944, respectivamente, Kanner e Asparger também contribuíram na definição do

autismo, o primeiro fez o uso desta mesma palavra para descrever a situação de 11

crianças que tinham comportamentos semelhantes, caracterizando o autismo como

uma “inabilidade inata para estabelecer contato afetivo e interpessoal e que era uma

síndrome bastante rara, mas, provavelmente, mais frequente do que o esperado”.Os

autores ainda comentam que Aspager em 1944descreveu alguns casos que

apresentavam características semelhantes a estas, apresentando as mesmas

dificuldades na comunicação social.

De acordo com Andrade (2012), mesmo a síndrome do autismo tendo sido

identificada há cerca de 70 anos, ela continua um desafio constante para

pesquisadores da área, devido à complexidade do assunto e às diferentes

características que afloram em cada indivíduo. Gadia, Tuchman e Rotta (2004, p.83)

corroboram com o aprofundamento da explicação, quando definem a síndrome:

Autismo não é uma doença única, mas sim um distúrbio de

desenvolvimento complexo, definido de um ponto de vista

comportamental, com etiologias múltiplas e graus variados de

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severidade. A apresentação fenotípica do autismo pode ser

influenciada por fatores associados que não necessariamente

sejam parte das características principais que definem esse

distúrbio. Um fator muito importante é a habilidade cognitiva.

(GADIA, TUCHMAN E ROTTA, 2004, p.83)

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-V(2014,

p.53) designao autismo como Transtorno do Espectro Autista (TEA), isto por que o

termo “espectro” é usado por causa de que “as manifestações deste transtorno

variam muito dependendo da gravidade da condição autista, do nível de

desenvolvimento e da idade cronológica”, ou seja, o termo reflete a ampla variação

de características únicas possuídas por cada pessoa com TEA. Além disso, segundo

o DSM-V (2014) o TEA é considerado um Transtorno do Neurodesenvolvimento e

tipicamente se manifesta ainda no desenvolvimento da criança no período pré-

escolar, e acarreta em prejuízos no funcionamento social, profissional, pessoal e

acadêmico.

Para Ferreira (2004) as primeiras manifestações dos distúrbios psicomotores

nas crianças, acontecem antes mesmo de terem domínio sobre o seu próprio

corpo.De acordo com a autora, as crianças não dão resposta facial diante da

aproximação de pessoas, além de que, não esboçam nenhuma reação ao ser

tomada no braço por um adulto, apresentando uma falta de adesão corporal.

Desta forma, entende-se que o autismo caracteriza-se por um conjunto de

manifestações comportamentais, em que se observa principalmente a falta de

interação social e a dificuldade de comunicação, que podem aparecer

acompanhadas de comportamentos repetitivos e interesses restritos por atividades

comuns. Tais comportamentos são denominados de estereotipias e, apesar do

necessário conforto e alívio que promovem,comprometem o dia a dia do autista, pois

sua recorrência o faz se concentrar em responder a estímulos internos ao seu corpo,

se desligando de fatores externos que possibilitariam seu processo de interação

social e aprendizagem (BATISTA, 2012; FIALHO, 2014).De acordo com o site da

AMA (Associação de Amigos do Autista)2 o autismo pode ser diagnosticado por

2Disponível em: http://www.ama.org.br

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graus relativos à gravidade com que se instaura no indivíduo, e tal gravidade pode

ser dividida em três níveis, que são:

NÍVEL 1: considerado o mais leve entre os três; porém, para lidar com a

criança com o nível 1 do TEA, é necessário oferecer um certo apoio, pois sem ele, a

comunicação social fica prejudicada, além de ter dificuldade de iniciar uma interação

social e também dificuldade de ter resposta conveniente quando a iniciativa de

interação parte de outras pessoas, demonstrando assim um interesse mínimo à tais

interações sociais. No que se diz respeito aos comportamentos restritos e repetitivos

das crianças com TEA do nível 1, pode-se dizer que eles são inflexíveis, o que

causa uma certa interferência no funcionamento de algumas situações e contextos,

além da dificuldade de trocar de tarefa, problemas com organização e planejamento

dificultam muito no processo de independência da criança.

NÍVEL 2: Neste nível o autista precisa de apoio substancial e ainda assim,

mesmo na presença de apoio,persistem graves problemas na comunicação social

verbal e não verbal. Limitação ao tentar dar início às interações sociais com

respostas mínimas ou anormais quando outras pessoas dão abertura para tais

interações, resultando assim em prejuízos notáveis na interação social das pessoas

que estão no nível 2 do TEA. No que se diz respeito aos comportamentos repetitivos

e restritos das pessoas com TEA pode-se dizer que eles têm uma inflexibilidade nos

comportamentos,apresentam dificuldades em aceitar mudanças e tais

comportamentos repetitivos/restritivos surgem numa frequência que chega a ser

perceptível para qualquer observador, chegando a interferir em diversas situações e

contextos no dia-a-dia, além de terem também uma certa dificuldade/sofrimento em

mudar de foco ou deações.

NÍVEL 3: Neste nível, o autista exige o máximo de apoio substancial, pois, a

sua comunicação verbal é prejudicada já que ele possui déficits graves na

comunicação verbal e não verbal, causando graves prejuízos sociais ao os limitar a

iniciar ou manter uma interação;e ainda, quando esta interação parte de terceiros, a

resposta deles é considerada mínima. De forma geral, os comportamentos

repetitivos/restritos do indivíduo com TEA do nível 3 interferem acentuadamente no

funcionamento em todas as esferas de sua vida, além de ter inflexibilidade de

comportamentos e extrema dificuldade/sofrimento ao lidar com mudanças ou mudar

de foco e ações

Page 29: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

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De acordo com o DSM-V (2014) alguns indivíduos podem ter interesses

altamente limitados que tendem a ser considerados anormais em intensidade ou

foco, como por exemplo, uma criança que tem um extremo apego à uma panela, à

um personagem de desenho, ou a um objeto qualquer.Além de que, certos

encantamentos por rotinas podem estar relacionados a uma hipo ou hiper-

reatividade relacionadas a estímulos sensoriais que se manifestam por meio de

respostas extremas (positivas ou negativas)em relação a sons, formas e texturas

específicas.

Tendo abordado as definições, características e os níveis de gravidade do

TEA, no próximo tópico buscamos aprofundar as propostas de tratamento e suas

intervenções.

3.1.1.1 Intervenções e estimulações – tratamentos possíveis

Existem diversas propostas de intervenção para o tratamento de pessoas com

autismo, condição que infelizmente não tem cura. Porém,os autistas conseguem por

meio de tais intervenções e estimulações, obter avanços significativos, como por

exemplo, a realização de algumas atividades básicas do dia-a-dia, ou melhorias nas

habilidades e coordenação motora.De acordo com Andrade(2012), algumas dessas

intervenções são:

Farmacoterapia, terapia comportamental, abordagem

psicopedagógica, metodologia ABA (Análise do comportamento

aplicada), tratamento biomédico, musicoterapia, reorganização

neurológica, ITA (imunoterapia ativada), programa TEACCH

(utilizada nas APAEs), programa SONRISE (criado a partir do

enredo do filme “Meu Filho Meu Mundo”), equinoterapia

(terapia com cavalos), cinoterapia (terapia com cães), entre

outros(ANDRADE, 2012, p. 20).

Em seu estudo, Reed, Ferrer e Villegas (2012, p.3) sugerem que as

Atividades Assistidas Por Animais e a Terapia Assistida por Animais são eficazes em

diferentes tratamentos, inclusive para crianças com autismo. Segundo os autores, a

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interação com cães incrementa comportamentos positivos, tais como aumento de

sensibilidade e atenção em crianças com dificuldade de interação social. Desta

forma “confirmou-se que a interação regular com cães treinados em terapia aumenta

os comportamentos sociais positivos, tais como a sensibilidade e o foco, e diminui os

comportamentos negativos em crianças com incapacidades”.

A cinoterapia é o método que utiliza o cão como agente facilitador no

processo de desenvolvimento, sendo indicado para pessoas de qualquer idade.Esta

terapia traz benefícios tais como o estímulo ao apoio emocional, proporcionando

alegria, segurança e tranquilidade. Os resultados são satisfatórios principalmente em

pessoas com transtorno global do desenvolvimento, como por exemplo, casos de

autismo, agindo de modo coadjuvante trazendo benefícios como melhor socialização

entre os pacientes. (NASCIMENTO, et al., 2015, p. 3).

O modelo de intervenção Developmental, Individual Difference, Relationship-

Based(DIR) foi desenvolvido por Stanley Greenspan e Serena Wieder, e por meio do

envolvimento do terapeuta e da família, busca fazê-los mergulhar no mundo do

autista e leva-lo para o mundo exterior compartilhado, fundando bases para seu

desenvolvimento social, emocional e intelectual. Assim o DIR tem no D de

desenvolvimento a referência da evolução gradativa que gera capacidades e

relações; o I diz respeito Às diferenças individuais que os regula e faz compreender

as sensações; o R tem por base “os relacionamentos como fonte de aprendizado

das crianças, afetando diretamente sua capacidade de desenvolvimento” (RIBEIRO;

CARDOSO, 2014, P.401). As autoras explicam que:

O DIR tem como visão central as interações interpessoais

precoces, cruciais para o desenvolvimento saudável do cérebro

e, conseqüentemente, das habilidades de processamento

sensorial, planejamento motor e de interações sociais. Ele

entende a criança como um ser único e, na sua individualidade,

busca construir as bases para que a criança possa pensar, se

comunicar e se relacionar, apesar de suas limitações. Nele,

observam-se como aspectos fundamentais: a comunicação

espontânea entreo indivíduo e a criança autista e a nutrição de

relacionamentos alegres e agradáveis (RIBEIRO; CARDOSO,

2014, p.401-402).

Page 31: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

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A abordagem Floortime é considerada a principal estratégia do modelo DIR, e

se volta para a sistematização do brincar com o autista, fazendo-o progredir nas

etapas de desenvolvimento. A abordagem se baseia “[...] na ideia de que a emoção

é fundamental para o crescimento do cérebro e evolução mental e que tal

desenvolvimento é conseguido através de interações(brincadeiras) no chão”

(RIBEIRO; CARDOSO, 2014, p. 402). Assim essa abordagem visa melhorar a

socialização e a linguagem, diminuindo as estereotipias, bem como melhorando o

nível de compreensão das crianças e da família.

Ao identificar a existência de necessidades tão específicas no autismo,

seguimos levantando como é possível se dar a atuação do design na busca de

soluções para atender a tais circunstâncias.

3.1.2 O design: inovação e criatividade é processo e resultado

São muitos os conceitos para o termo design encontrados na bibliografia da

área. Indo direto para a origem da palavra, a mesma “deriva do latim designo e

significa idear, designar, marcar, eleger, destinar, empreender, determinar.”

(MOURA, 2006, p. 69). Assim, o design se presta a idealizar e projetar produtos

destinados para certo público ou usuário, trabalhando sempre com suas

características, necessidade e considerando o futuro, planejando aquilo que virá a

existir após a execução do projeto(LÖBACH, 2001; NORMAN, 2006). Porém design

é processo e pode ser analisado por seus resultados ou pela prática projetual

(PORTUGAL; COUTO, 2010).

Contudo, todo projetista precisa construir um arcabouço de experiências, ou

ainda, fortalecer seu repertório cultural para trabalhar na área, sendo essa uma

condição relevante para seus resultados, principalmente em termos de inovação e

criatividade (KÖRTING, 2014; VILLAS-BOAS, 2009). Isso porque o designer, como

qualquer profissional acumula experiências de vida que compõe um conjunto de

saberes (PORTUGAL; COUTO, 2010) em que estão os valores, a cultura, o

ferramental e os princípios da área de conhecimento. Esse conjunto de saberes

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embasa as decisões conscientes e bem informadas que constituem o que Clarkson

e Coleman (2013) denominam de bom design.

Villas-Boas (2009) analisa que a formação do design precisa consolidar uma

cultura projetual crítica e criativa e, que tal conhecimento, envolve o conhecer tanto

os princípios projetuais e se posicionar frente aos mesmos na sua prática, como

adotar procedimentos metodológicos, consolidar um repertório visual que o norteie

na solução dos projetos e ainda identificar as possíveis implicações ocorridas

durante esse desenvolvimento. Para o autor, além dessa experiência construída

habilitar o designer a resolver problemas de design, é exatamente essa condição

que justifica o design como campo de conhecimento.

É curioso perceber que, mesmo diante do interesse mundial pelo tema da

inclusão, de toda uma adaptação ocorrida na legislação de diversos países, de uma

nova abordagem focada no usuário que vem se consolidando (CLARKSON;

COLEMAN, 2013; DONG; CLARKSON; CASSIM; KEATES, 2015; NEWELL, 2003),

e ainda sendo essa considerada um desafio e uma questão moral para o designer

(CASSERELEY; ORMEROD, 2003), o tema abordado nesta pesquisa ainda seja

muito pouco explorado na área do design. Os autistas, assim como boa parte das

pessoas com necessidades especiais, têm precisões muito específicas e distintas

das de pessoas que não possuem determinada condição de ser ou estar.Adotar uma

percepção acerca desse usuário que fuja aos preceitos do modelo médico de

reabilitação, é também entender que a estética é parte essencial no design

(NEWELL, 2003). A questão abre espaço para considerar a moda como um dos fios

condutores de um projeto e, para além da funcionalidade, certamente teremos

soluções que contemplem o estético e simbólico como aportes para Tecnologia

Assistiva no novo contexto mercadológico.

Autores clássicos tratam do que seriam as bases do design. Quanto aos

desafios,Norman (2006, p.15) afirma que “isto é o que faz o design uma disciplina

tão desafiadora e gratificante: ele enfrenta a necessidade de acomodar exigências

aparentemente conflitantes”.Quando se trata de processo,para Löbach (2001) o

designer tem uma visão diferente e conceitua o termo como “um processo de

resolução de problemas atendendo as relações do homem em seu ambiente técnico”

(LOBACH, 2001, p. 13).E, além disso, também cita que devemos nos preocupar com

a importância que um projeto terá na sociedade, sermos sensatos e analisarmos

pontos positivos e negativos sobre a comunidade já que “a configuração dos

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produtos e aparências do entorno acabam condicionando as formas de vida de uma

sociedade” (LOBACH, 2001, p. 77).

Como nosso foco é apresentar um processo criativo com vistas a contribuir

com a formação do repertório cultural do designer (PORTUGAL; COUTO, 2010), por

considerar que essa é uma parte essencial da cultura projetual crítica e criativa

(KÖRTING,2014; VILLAS-BOAS, 2009), levamos em consideração os princípios

projetuais, adotamos uma metodologia e partimos de um problema. Consideramos

ainda as questões técnicas e objetivas do processo de produção da peça de

vestuário voltada para atender as demandas de uma criança com autismo. Focamos

no quesito conforto e proteção e partimos para escolha de tecidos e materiais,

modelagem, caimento da peça, por considerar que esses são todos pontos

importantes que precisão ser observados e estudados durante todo o processo de

design.

A partir dessa experiência pautada nos aportes teóricos aqui consultados,

podemos afirmar que entendemos melhor porquê “o design é em sua essência um

processo criativo e inovador, provedor de soluções para problemas de importância

fundamental para as esferas produtivas, tecnológicas, econômicas, sociais,

ambientais e culturais”(MOURA, 2006, P.71).

Ao projetar e desenvolver produtos, o design se preocupa com sua

configuração em relação ao dimensionamento humano e às condições de uso que

lhes serão próprias. Tais questões serão abordadas no próximo tópico.

3.1.2.1 – O conforto, o lúdico e a sensação de segurança no vestuário

Como já foi tratado, a estereotipia é característica do autista, e essa o leva a

engajar-se em responder a estímulos internos a seu corpo, desconsiderando os

estímulos do contexto em que está inserdo, comprometendo muitas horas de seu

cotidiano que poderiam ser utilizadas para fortalecer os processos de interação e de

aprendizagem, uma vez que esses são essenciais para o desenvolvimento de suas

habilidades (BATISTA, 2012; FIALHO, 2014).

Devido a diversidade do conjunto de características próprias de um autista,

adotamos por limite de pesquisa trabalhar o conforto e a sensação de segurança,

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33

seguindo as orientações da Terapeuta (Dra. Lopes) que nos guiou para esse

processo. Em entrevista realizada na pesquisa exploratória (Anexo 1), Lopes

afirmou:

Em pessoas com dificuldade em processar e modular os

estímulos sensoriais, as atividades repetitivas se tornam,

facilmente, uma forma de se acalmar diante dos estímulos

externos que fogem ao controle e, consequentemente, são

uma fonte de ansiedade, incerteza e desconforto. Por isso,

uma peça de roupa que proporcione um “lugar de segurança” à

criança autista é, por si só, de grande valia e pode ser usada

pela criança em situações de estresse e insegurança, por

exemplo. Por estes motivos, acredito que a finalidade da peça

de roupa deva ser exatamente a da proposta original – oferecer

à criança conforto e segurança.

O conforto e o caimento numa peça de vestuário estão diretamente ligados ao

bem-estar do usuário (Figura1).

Figura 1 - Fluxograma das qualidades ergonômicas para a usabilidade do

vestuário

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Fonte: SILVEIRA (2009, p.33)

Embora o desenvolvimento de um produto em torno das necessidades de

uma pessoa estejaligado aos estudos ergonômicos (SILVEIRA, 2008), sendo

oconforto um desse fatores, salientamos que nosso foco está no processo e não nos

resultados; além disso, nosso sujeito sequer nos permite os testes necessários à

usabilidade ergonômica do produto.

Como se trata do processo de desenvolvimento de vestuário com vistas a

contribuir com a formação do repertório cultural do designer (PORTUGAL; COUTO,

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2010) e Vianna e Quaresma (2015, p.3) salientam a importância do designer de

moda considerar em seus projetos o conforto para melhor adaptá-los para usuários

com necessidades especiais mas afirma que “o conforto e proteção do vestuário

devem ser analisado a partir das ofertas têxteis apresentadas no mercado”, pois “os

tecidos são fundamentais para promoverem conforto, saúde, proteção, usabilidade e

segurança”, nos deteremos em considerar esse aspecto para essa construção

(qualidades técnicas dos tecidos), aliados às questões de que um autista considera

conforto.

Para Viana e Quaresma (2015), podemos subdividir o conforto no vestuário

em aspectos fundamentais que são: Conforto termo fisiológico - se refere ao

estado térmico apresentado quando o material têxtil mantém-se em contato com a

pele; Conforto sensorial que trata das sensações neurais transmitidas ao usuário

pelo toque do tecido; Conforto ergonômico que acontece quando uma peça

apresenta um bom vestir, lembrando que o conforto durante a vestibilidade está

inteiramente ligado a liberdade de movimentos; E Conforto psico estético que se

refere a oferta de bem estar ao usuário quando existe certa percepção subjetiva de

uma avaliação estética positiva, unindo os sentidos de visão, olfato, tato e

audição.Se, segundo Dra. Lopes, para um autista o conforto está diretamente

relacionado à questão de segurança e, por sua vez, um lugar de segurança é aquele

cujos estímulos não fogem ao controle gerando incerteza e ansiedade, nos detemos

em planejar apenas o conforto sensorial, o termo fisiológico e o psico estético,

especialmente por meio da seleção do material têxtil e seus acabamentos.

No entanto, como se trata do desenvolvimento de produto, devemos ter

atenção em alguns pontos essenciais para um melhor conforto do usuário. Segundo

Silveira (2008) cabe pensar nos cuidados com a modelagem, um processo de

extrema importância para a qualidade técnica do produto. A construção do diagrama

respeitando as medidas do corpo e o planejamento dos acabamentos da peça

promovem o caimento e o conforto da peça.

Para além do conforto e da segura, outro aspecto a ser considerado é a

diversão. Como vimos, o ambiente externo promover estímulos que despertem a

atenção desse usuário, se apresentando como prazeroso e motivador (FIALHO,

2014; SANTOS; MIRANDA; SILVA; MOURA; FREITAS, 2013).Dra. Lopes reitera

esse pensamento quando afirma que: “Considerando que o autista tem desordens

de processamento e de modulação sensorial, uma peça de roupa que proporcione

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conforto, sensação de segurança e, acima de tudo, desperte o seu interesse é de

grande valia”.A questão gera a primeira Ponderação Necessária para o projeto:

PN.01- A roupa deve ser atrativa, deve possuir uma caráter lúdico

Entretanto, quando tratamos da roupa infantil, existem certas características

que precisam ser observadas. A próxima seção tratará desses aspectos em relação

a como se considerada a funcionalidade do vestuário infantil.

3.1.2.2 – Funcionalidade no vestuário infantil

Tendo em vista que o vestuário é “uma segunda pele: tato e percepção que

provocam diversas sensações, prazerosas ou hostis, como carícias ou arrepios”

(SALTZMAN,2006, p.306), a roupa precisa proporcionar a liberdade de movimento e

o consequentemente bem-estar de uma criança, adaptando-se às suas condições

próprias comportamentais, respeitando sua agilidade e a dinamicidade de seus

movimentos cotidianos.

Ao longo da história da moda infantil, este vestuário sofreu grandes e

importantes mudanças. No século XVIII, de acordo com Gonçalves Filho (2008),o

mesmo era tido como agente de controle e disciplinamento, pois fazia com que as

crianças carregassem em suas vestimentas diversas simbologias, tais como a

aparência idêntica aos seus pais,o que limitava seus movimentos.Em algumas obras

de arte daquele período é possível perceber crianças nobres usando rufos,

espartilhos e até salto alto (BARBOSA;QUEDES, 2007).

Podemos dizer quea infância, em sua essência, não era entendida e

respeitada como posteriormente aconteceu,uma vez que as crianças se vestiam

como adultose, portanto, eram tolhidos em sua liberdade, tinham brincadeiras mais

contidas e comportamentos mais reservados. Foi então que no final do século XVIII

para o início do século XIX a infância passou a ser vista de maneira mais

romantizada pelos pensadores daquela época, que acreditavam que as crianças

tinham características próprias nesta fase da vida, sendo bem distintas dasdos

adultos, em pensamentos, atos e sentimentos (BARBOSA; QUEDES, 2007). Foi

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37

durante esse período que o conceito de infância mudou, tendo a moda

acompanhado tais mudanças. De acordo com essa breve explanação histórica,

pode-se entender a importância adquirida pela roupa funcional para as crianças.

Barbosa e Quedes deixam claro em suas palavras as principais características de

um bom vestuário infantil quando se fala em funcionalidade:

O design da roupa infantil requer conforto tanto na modelagem

como nos tecidos utilizados. Criança precisa de liberdade de

movimentos para andar, correr, pular, brincar, e roupas

desconfortáveis dificultam esses movimentos podendo até

acarretar em problemas de saúde, como postura, reações

alérgicas, má circulação causada por roupas apertadas de

transpiração por tecidos com má condutibilidade de calor,

problemas psicológicos pela imposição dos pais ao fazer as

crianças usarem roupas desconfortáveis e inadequadas, entre

outros(BARBOSA; GUEDES, 2007, P.8.).

Considerando o que foi tratado até aqui, no próximo tópico nos

aproximaremos do nosso estudo de caso, o personagem Kyle, um menino autista

retratado no filme After Thomas. Desse modo, aqui buscamos conhecer melhor o

contexto para definir o problema de design a ser solucionado.

3.1.3 After Thomas, o filme: uma análise sobre o personagem Kyle.

O filme After Thomas trata da história de um menino autista. Sendo esse o

objeto de nosso estudo de caso, é de extrema importância conhecer o contexto em

que tal personagem está inserido, entendendo com quem ele convive, os ambientes

que ele frequenta, além de conhecer um pouco da própria história do filme. Num

segundo momento focaremos em Kyle, o personagem para o qual a roupa foi

projetada, conhecendo assim os seus hábitos, seus gostos, a percepção que ele tem

das coisas ao seu redor, identificando o grau de autismo no qual ele se encaixa,

quais as características do seu distúrbio e qual a relação que o mesmo estabelece

Page 39: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

38

com as peças de roupa, para que, só assim o projeto seja executado da melhor

maneira possível.

3.1.3.1 – O contexto da vida de Kyle

O título After Thomas, pode ser traduzido literalmente para o português como:

“Depois de Thomas”, embora o filme tenha sido lançado no Brasil com o título “Um

amigo inesperado”. Tal filme foi escrito por Lindsey Hill, teve como diretor Simon

Shore, e foi produzido por Beryl Vertue e Elaine Cameron, tendo sido lançado no dia

26 de dezembro de 2006.

De acordo com as informações do drama, trata-se de uma história verdadeira,

que se passou no ano 1993, no Reino Unido. O enredo conta a infância do menino

Kyle (interpretado por Andrew Byrne), um garoto autista de aproximadamente 6

anos, que reside com os pais, que são Nic (interpretado por Keeley Hawes) e Rob

(interpretado por Bem Miles).No desenrolar da trama vemos que a condição de vida

de Kyle testa recorrentemente a paciência dos pais, já que ele depende e precisa

constantemente dos cuidados deles.Seu pai, trabalha durante o dia enquanto a sua

mãe permanece em casa para cuidar do garoto. Contudo, a mãe acredita que Kyle

pode vir a ter um progresso futuro, e com isso, insiste em tentar ensiná-lo, sempre o

desafiando a entender as atividades básicas do dia-a-dia, sendo essa uma tarefa

muito difícil para ela. Ao contrário, Rob não acredita num possível progresso de Kyle,

e no decorrer da narrativa chega a tentar convencer a esposa a mandá-lo para um

internato onde iria conviver com outras crianças com as mesmas condições que ele.

Contudo, por resistência de Nic, isso acaba não acontecendo.

Com o passar do tempo, a relação entre Rob e Nic cai numa rotina, em que a

preocupação de Nic acaba gerando um estresse que interfere diretamente sobre a

relação do casal. Percebendo a situação, os pais de Nic se inserem no contexto

oferecendo ajuda para cuidar do garoto. Pat (interpretado por Sheila Hancock),mãe

de Nic,e Jim (interpretado por Duncan Preston) o pai, costumam fazer piquenique

com Kyle e oferecer jantares em sua casa.

Após algumas pesquisas sobre terapias para autistas, Nic encontra a solução

que irá mudar a vida de todos, e principalmente a de Kyle: a terapia com cães. Seu

marido, Rob, se mantém cético e com receio de que o cachorro traga mais um

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39

problema para a família.Porém Nic o convence e eles acabam indo ao encontro de

uma senhora que tem à venda filhotes de Golden Retriever. Kyle logo o nomeia de

Thomas, em homenagem ao seu desenho preferido, no qual fica vidrado na TV e

assiste todos os dias, denominado “Thomas the Thank Engine”.

Com o passar dos dias, na companhia de Thomas, Kyle inicia um

aprendizado acerca das emoções e faz de Thomas o seu melhor amigo. Seus pais

se apóiam nessa situação e passam a falar com ele assumindo um tom de voz

diferente, para que Kyle acredite ser o cão quem esteja falando.A estratégia

assumida pelos pais consegue impedir vários acessos de raiva do filho. Nas cenas

finais do filme, Kyle já está conseguindo demonstrar suas emoções, chega a

reconhecer os pais e a dizer que os ama pela primeira vez, sendo esse um final

muito emocionante.

Antes dos créditos finais, um epílogo indica o que aconteceu com as pessoas

que são retratadas no filme, mostrando que na vida real, Kyle conseguiu

desenvolver e melhorar muito em vários aspectos depois de Thomas. Quando Kyle

já tinha 17 anos, Thomas precisou ser sacrificado, mas ele já cursava a escola de

Desenvolvimento Infantil, e tinha também uma irmã, fruto do amor de seus pais.

No próximo tópico aprofundamos o estudo desse caso, apresentamos uma

análise das características comportamentais de Kyle, para então mapear suas

necessidades e elencar as propriedades necessárias que deve conter uma peça do

vestuário para esse usuário.

3.1.4 Kyle: uma análise de necessidades

Se analisarmos Kyle conforme os critérios da AMA apresentados na Figura 1,

o mesmopode ser diagnosticado com um autismo em nível 3, pois ele possui déficits

agudos na capacidade de comunicação social verbal e não verbal, incapacidade de

interação social e respostas mínimas às interações feitas pelos outros, além de ter

dificuldade em lidar com mudanças. Ele possui a característica de comportamentos

repetitivos, além de ser acometido por constantes manifestações de irritabilidade,

nas quais grita e chora independentemente do local em que esteja. Além disso, um

ponto importante que pode ter total ligação com a roupa utilizada pelo autista é o

fato de que, segundo o DSM-V (2009), o autista pode ter hiper ou hipo-reatividade a

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40

estímulos sensoriais, no qual pode desenvolver grande fascínio por sensações

obtidas através de sons, cores, texturas, ou grande aversão por alguma delas, e isto

pode gerar um grande desconforto. A partir dessa informação, embasamos a

primeira de nossas Ponderações Necessárias que nos auxiliou a conformar o

produto com mais adequação:

PN.02- Respeitar a sensibilidade aos sons.

Por outro lado, em conversas mantidas inicialmente com a Dra. Lopes,

descobrimos que grande parte das crianças com TEA se acalmam quando

colocados em ambientes (tubos de malha) ou vestuário que os envolva, pois isso

lhes dá uma sensação de segurança, conforto e tranqüilidade. Nesse sentido, a dica

também foi incorporada ao projeto, se tornando mais uma de nossas ponderações

para esse projeto de produto:

PN.03 - Levar em conta os necessários momentos de isolamento de Kyle, pela

exposição a ruídos altos e luminosidades bruscas

Existe uma coisa que prende a atenção de Kyle: o desenho “Thomas The

Thank Engine”. Sempre que o desenho passa na TV, Kyle senta-se para assistir, e

permanece até o desenho acabar, fazendo isso todos os dias. Nas cenas, ouve-se a

melodia usada no desenho e tem-se a figura de Thomas, que é um trem falante,

colorido e com rosto, no desenho Thomas vive aventuras com seus amigos. Um fato

curioso é que em uma cena do filme, Kyle fala repetidas vezes a palavra “trem”;na

ocasião, o pai sem saber do que se tratava, o leva até a estação de trem, buscando

que com isso ele se acalmasse e parasse de repetir a palavra. Esta é uma

característica que nos serve de termômetro para indicar a gravidade do caso, já que

ele possui “Interesses fixos e altamente restritos que são anormais em intensidade

ou foco” (DSM-V, 2009, p. 50).

Como, do mesmo modo que seus interesses fixos remetem as questões de

conforto sensorial, o uso de uma peça de roupa, a depender de suas características,

pode representar um gatilho positivo ou negativo em relação a esse

conforto.Mas,segundo Dra. Lopes, os autistas em geral possuem excelente memória

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41

visual. Desse modo, certamente as cores e a grafia presentes no desenho, assim

como a figura de seu cachorro, se tornaram o que a Dra. Lopes denomina de Figura

de Conforto Emocional, ou seja, são um objeto de interesse.

Essas características deram origem a mais uma das Ponderações

Necessárias e norteadoras para o desenvolvimento do produto:

PN.04- Considerara sensibilidade em relação às cores

PN.05- Considerar as figuras de conforto emocional

Um ponto muito importante a ser abordado nesta pesquisa é a relação de

Kyle com a roupa que usa.O filme se inicia quando Kyle está tendo um acesso de

raiva por estar indo até uma loja de sapatos, o fato é que ele odeia sapatos novos, e

por isso ao perceber que está chegando próximo a loja, grita e chora sem parar.

Esta cena se repete duas vezes durante o filme. Em outro momento, Nic percebe

que o casaco que ele usa, está ficando pequeno e apertado, e por esse motivo

precisa comprar outro, logo após aparece surrando o casaco novo no chão, quando

Rob questiona o porquê dessa ação, ela explica que Kyle não gosta de roupas

novas, e por este motivo precisa dar ao novo casaco uma aparência de antigo, para

que eleaceite e use sem reclamações.

A questão nos remonta ao conforto ergonômico do usuário com suas peças

de vestuário.Como vimos, o conforto ergonômico do vestuário possui aspectos

fundamentais, podendo ser termo fisiológico, quando a roupa proporciona um

estado térmico entre a pele e os materiais têxteis, também pode ser conforto

sensorial associado as sensações trazidas quando o tecido entra em contato com a

pele; ainda, pode se ter um conforto ergonômico, quando uma peça tem uma boa

vestibilidade e permite liberdade de movimentos; por fim, tem-se o conforto psico-

estético, que acontece quando se desenvolve uma percepção subjetiva da peça,

junto a uma avaliação estética no conjunto com a visão, o toque, a audição e o olfato

(VIANNA; QUARESMA, 2015).

Parece-nos que a aceitação das peças mais desgastadas por Kyle, tem a ver

com o que Vianna e Quaresma (2015) indicam por conforto sensorial de toque,

Page 43: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

42

diretamente relacionado com a maciez do material, e também parece se relacionar

intimamente ao conforto psico-estético, adquirido pela conformação do produto ao

corpo com o uso e o odor, que tornam-se característicos de peças usadas. A

relevância da questão embasa nossa próxima Ponderação Necessária:

PN.06- Atender a sensibilidade às texturas em relação ao conforto sensorial de

toque

Quando Viana e Quaresma (2015) relataram sobre o conforto subdividindo-o

em aspectos consideráveis para obter o bem-estar, citaram o Conforto termo

fisiológico – que se refere ao estado térmico apresentado quando o material têxtil ou

tecido mantém-se em contato com a pele, desta forma considerando que a criança

em todas suas limitações e necessidades no que se diz respeito a sensibilidade,

sendo assim caminhamos para a quinta ponderação:

PN.07- Respeitar a sensibilidade às texturas em relação ao conforto termo

fisiológico.

Ainda pensando no conforto da criança, segundo Bezerra (2009) foi no século

XVIII que as crianças passaram a ter mais liberdade e leveza em suas vestimentas,

até então eram usadas roupas iguais a dos adultos, que não permitiam que elas

tivessem o conforto necessário de movimento no uso, “fica aparente que se

começou aí a pensar no indivíduo enquanto usuário, considerando suas

necessidades físicas, fisiológicas, e porque não, emocionais (BEZERRA, 2009,

p.23). Assim sendo, consideramos mais uma de nossas ponderações necessárias

em prol do conforto:

PN.08- Considerar o conforto psico-estético de Kyle em relação à conformação

da roupa com seu corpo

Kyle é tão apegado a Thomas que, quando ganha o seu Golden Retriever,

coloca nele o nome do trem em homenagem ao desenho. A partir desse momento a

vida de Kyle muda completamente, pois o cachorro Thomas passa a ajudá-lo a

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43

desenvolver comportamentos jamais obtidos antes. Kyle passa a brincar com

Thomas, e até consegue reconhecer nele as partes do corpo do animal quando

repete apontando com o dedo indicador “olhos, nariz, pescoço, rabo...” para uma

criança com esse nível de autismo, essa representa uma grande conquista. Kyle

também desenvolve uma série de emoções: preocupa-se quando Thomas adoece,

fala que o ama, assim como também expressa o amor pelos pais pela primeira vez

nas cenas finais do filme. Essas características remetem à Ponderação Necessária

de número 5, também norteadora para o desenvolvimento do produto.

Nic foi aconselhada por John, médico de Kyle, a desafiar o garoto com

informações e respostas básicas no dia-a-dia. Porém, embora o garoto não

respondesse aos estímulos, ele demonstrava se irritar com a insistência da mãe,

uma vez que sempre que ela lhe dava uma instrução, fazia a pergunta “está bem?”

ao final da frase.

O garoto frequenta uma escola em que pode interagir com outras crianças

sem necessidades especiais e realizar atividades que todas as outras realizam junto

com as professoras. Contudo, Kyle não interage nem se junta aos colegas e, por

vezes, faz movimentos repetidos levando o tronco para a frente e para trás durante

as aulas, enquanto observa uma imagem.Contudo, já em um segundo momento, ele

mostrou conseguir construir uma casa com pecinhas de madeira de um brinquedo

de montar. Diante do quadro e sabendo do fascínio que Kyle tem pelo desenho

“Thomas The TankEngine” podemos usar as formas e cores que são interessantes

aos olhos do garoto, visando a necessidade de estimular o processo de

aprendizagem por meio de atividades simples do dia-a-dia e com artifícios que sejam

funcionais aos olhos de Kyle. A seguir, a Figura 2 trás a imagem de Thomas, o

desenho que tanto prende a atenção de Kyle:

Figura 2- Thomas, o trem falante

Page 45: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

44

Fonte:Disponível em: <https://www.familyjr.ca> Acesso em: 08-06-2018

Sendo assim,as características do desenho, em termos de cor e grafia,

remetem à Ponderação Necessária de número 5, já tratada.

Os autistas podem ter a sensibilidade aguçada e com isso se incomodarem

com algumas texturas, o que pode dificultar muitas de suas atividades diárias,

inclusive o ato de brincar. O conforto termo fisiológico quando presente também em

brinquedos, pode proporcionar o bem-estar necessário para uma atividade essencial

no desenvolvimento da criança. Considerando que os jogos são considerados

ferramentas interessantes para diminuir o tempo de isolamento do autista, e que

nossa Ponderação Necessária de número 1 prevê a importância de considerar o

lúdico,podemos incluir na roupa um quebra-cabeça. Com isto temos mais uma

ponderação necessária:

PN.09- Verificar o conforto sensorial do toque nas peças do jogo

Ainda considerando no conforto da criança, é necessário pensar-se na

facilidade do uso da roupa, bem como seu vestir e desvestir. Sendo assim, temos a

última Ponderaçãoque embasou o projeto do produto:

PN.10- Considerar a facilidade de vestir e desvestir a peça

Page 46: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

45

Sendo assim, as Ponderações Necessárias que aqui levantamos, nortearam

nosso processo de construção de um artefato, de modo a considerar os aspectos

chaves da necessidade do usuário em relação ao conforto. A próxima etapa é a de

geração de alternativas, onde as principais ideias para a construção da peça serão

avaliadas e selecionadas tendo por base a escolha das melhores soluções para

cada aspecto levantado.

3.2 Geração

Montemezzo (2003) analisa que nessa etapa se deve avaliar a configuração

dos produtos, seus materiais e tecnologias, gerando possibilidades de solução.

Desse modo, nessa fase nos orientamos pela construção da Matriz Decisória (Vide

Quadro 2),que se configurou a partir das pesquisas efetuadas na etapa de

preparação,responsáveis por embasar as Ponderações Necessárias aqui

levantadas. Esses aspectos precisaram ser considerados e contemplados na

configuração do produto.

Page 47: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

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Tabela 2 - Matriz decisória orientadora da geração de alternativas.

Caract. Ponderações

necessárias

Hipótese Possíveis soluções

Kyle

é p

ort

ad

or

da

ca

racte

rística

de

co

mp

ort

am

en

tos r

ep

etitivo

s, a

lém

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e irr

ita

bili

da

de

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rese

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hip

er

ou

hip

o-r

ea

tivid

ad

e a

estí

mu

los

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ria

is, p

ode

ndo

de

se

nvo

lver

gra

nd

e fa

scín

io p

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sen

sa

çõe

s o

btid

as a

travé

s d

e s

on

s,

co

res,

textu

ras, o

u t

er

gra

nde

ave

rsão

po

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um

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ela

s.

No

con

vív

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om

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ach

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o K

yle

de

sen

vo

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ab

ilida

de

s,

che

gan

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mon

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ca

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de

se

r

estim

ula

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pre

nd

iza

do

po

r m

eio

de

im

age

ns d

e c

on

fort

o e

mo

cio

na

l.

PN

.01

A roupa deve ser

atrativa, deve

possuir uma

caráter lúdico

Acreditamos que Kyle

possa ser atraído pela

roupa que também seja

um brinquedo

A peça poderá ser

também um jogo

PN

.02

Respeitar a

sensibilidade aos

sons

Supomos que kyle

desenvolva sensações

positivas se o material

da peça de roupa não

promover ruídos no

atrito de sua superfície

promovido com o

movimento do corpo, tal

como o fazem as peças

confeccionadas em

Tafetá, por exemplo.

A peça de roupa

deverá ser executada

em um material

macio ao toque, de

modo a não

promover ruídos

PN

.03

Levar em conta

os necessários

momentos de

isolamento de

Kyle, pela

exposição a

ruídos altos e

luminosidades

bruscas

A peça deve envolver o

corpo e abrigar a

cabeça da criança, de

modo a se tornar um

refúgio, protegendo a

visão e a audição e

promovendo a

sensação de segurança

e tranquilidade

A peça deve conter

capuz, e mangas

longas para envolver

os braços

Page 48: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

47

PN

.04

Considerara

sensibilidade em

relaçãoàs cores

Nossa hipótese é a de

que Kyle sentirá

conforto se reconhecer

as cores utilizadas na

representação do

Thomas, o desenho.

A peça de roupa

pode utilizar os tons

de vermelho, azul, of

White, amarelo e

cinza, que

representam a

imagem fílmica do

trem.

PN

.05

Considerar as

figuras de

conforto

emocional

Como autistas possuem

boa memória visual,

supomos que Kyle se

sinta confortável com

imagens que criou

vínculo afetivo.Devido

ao seu apego excessivo

pelo desenho de

Thomas, supomos que

podemos também

utilizar a grafia e o

nome para

complementar o jogo de

montar

A peça de roupa

pode conter a

imagem do cãozinho

Thomas, bem como o

nome, e eles se

transformarem num

jogo em que ele

possa destacar

partes delas e formar

novamente as

imagens.

PN

.06

Atender a

sensibilidade às

texturas em

relação ao

conforto sensorial

de toque

Supomos que Kyle se

adapte melhor às

texturas macias, já que

essa é uma

característica de roupas

usadas, uma vez que

rejeita peças novas.

A peça de roupa

deverá ser executada

em um material

macio, tal como o de

uma peça usada.

Page 49: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

48

PN

.07

Respeitar a

sensibilidade às

texturas em

relação ao

conforto termo

fisiológico

Entendemos que Kyle

sentirá conforto se o

material utilizado

promover conforto

térmico

A peça de roupa

deverá ser executada

em tecidos

compostos por fios

100% naturais P

N.0

8

Considerar o

conforto psico-

estético e

ergonômico de

Kyle em relação

à conformação

da roupa com

seu corpo

Julgamos que Kyle

desenvolva sensações

positivas em relação à

peça de roupa se a

mesma se ajustar às

formas de seu corpo e,

em seu uso, não

machucar sua pele.

A roupa deverá

possuir uma

modelagem que não

se ajuste demais ou

fique folgada em

demasia em relação

às medidas do corpo

de Kyle, além de

possuir acabamentos

internos que não

incomodem ao entrar

em contato com a

pele.

PN

.09

Verificar o

conforto sensorial

em todas as

partes que

componham a

peça

Supomos que Kyle se

adapte à texturas

macias

As peças de

montardevem seguir

as mesmas

características de

maciez da roupa

PN

.10

Considerar a

facilidade de

vestir e desvestir

a peça

Como os autistas

quando estimulados

podem desenvolver

habilidades

inesperadas, a peça

deve ser pensada para

facilitar o vestir e o

desvestir, sem

A peça deve conter

fechamentos simples,

tais como zíper e

botões de pressão

Page 50: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

49

promover incômodos

Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

Diante da Matriz decisória, nossa geração de alternativas fica limitada a uma

peça que possua capuz e mangas longas, o que nos leva a pensar em camisas ou

casacos. A figura 3 apresenta três das possibilidades de peças geradas a partir

dessas indicações;

Figura 3 –Geração de alternativas

Peça 1 Peça 2 Peça 3

Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

Na etapa seguinte de avaliação, as ideias geradas serão viabilizadas através

dos materiais e métodos possíveis para serem utilizados.

Page 51: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

50

3.3 Avaliação

Nessa etapa, Montemezzo (2003) mostra que o processo se dá em avaliar as

alternativas que foram geradas na etapa anterior e a viabilidade de cada uma,

selecionando as que melhor se encaixarem segundo o conceito gerador do projeto,

sendo assim, elaboramos uma tabela de avaliação para a escolha final de cada

material e método utilizado como solução para cada hipótese já apresentada.

Tabela 3- Tabela de avaliação de materiais e métodos.

Ponderações |Soluções Amostras | representações

PN

.01

O jogo inserido na peça será

um jogo de montar, assim

como um quebra-cabeça, de

forma convidativa à criança,

por meio da ludicidade.

PN

.02

O tecido escolhido foi

escolhido o moletom 100%

algodão, o tecido tem um

toque macio e que não

produz nenhum ruído de som

que viesse a incomodar.

PN

.03

Além de não produzir ruídos,

a roupa também terá a

intenção de protegê-lo dos

sons externos que podem vir

a incomodá-lo, com o capuz

ajustável o garoto poderá se

sentir mais protegido também

da luminosidade e agitação.

Page 52: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

51

PN

.04

A cor vermelha presente no

nome de chamada do

desenho, assim como na

imagem do trem será usada

como detalhe para que Kyle

relacione ao desenho. A cor

off white, é presente no rosto

do trem, e vem para trazer a

harmonia do vestuário. Dois

tons de marrom vêm para

relacionar as cores do

cãozinho.

PN

.05

A imagem do cãozinho

Thomas será inserida como

estampa e como quebra-

cabeça para que o garoto

possa montar.

PN

.06

O moletom usado tem o

toque felpado no avesso,

transmitindo maciez para a

peça. Além do fato de ser

feita artesanalmente

transmitindo o conforto psico

estético de “peça usada” por

todo o contato durante a

confecção.

PN

.07

O moletom sendo de fibra

natural 100% algodão,

absorve a umidade do corpo,

permitindo que a pele

“respire” melhor e

proporcionando conforto

Page 53: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

52

térmico. P

N.0

8

A modelagem tamanho 6

anos deverá ter folga

necessária para que a

criança exerça movimentos

comuns de correr, pular, sem

que a roupa o impeça.

PN

.09

O material de cada peça será

o próprio moletom, e por

dentro de cada peça será

usado o carpete para manter

a rigidez das peças e para

trazer conforto ao toque.

PN

.10

O fechamento do casaco será

por zíper trator tamanho 50

cm, com puxador

relativamente grande que

facilita a usabilidade. O

fechamento por botão de

pressão feito com latão

também trás facilidade no

vestir e conforto ao toque,

além de que não enferruja.

Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

O próximo tópico se dá pela concretização, e irá apresentar o croqui e a ficha

técnica do casaco e descrição dos processos.

Page 54: Universidade Federal e Pernambuco - UFPE · O brinquedo de vestir: Desenvolvimento de produto para criança com autismo. Projeto de graduação apresentado como requisito final para

53

3.4 Concretização – descrição dos resultados e processo.

Os tópicos descritos até aqui reuniram informações que embasam e deram

corpo ao nosso processo de projeto.Desta forma, a partir de agora o produto entra

em fase final com a concretização.Nessa fase apresentamos o desenho técnico da

peça e os processos elaborados para atingir o resultado esperado.

De acordo com a avaliação das Ponderações Necessárias, decidimos que

dentre as alternativas geradas, a peça final a ser elaborada seria a número 3, um

casaco tamanho 6 anos, cuja modelagem levou em consideração a folga necessária

para a ampla liberdade de movimento do usuário, Toledo e Triska (2016) consideram

a adequação dos produtos de moda às atividades diárias, salientam que a

experiência do usuário com a peça pode provocar diferentes sensações também

através do caimento e modelagem, e por esse motivo, a etapa da modelagem se faz

importante para atender ao conforto que a peça precisa ter. O casaco atendeu

também às necessidades de conforto, pois utilizou como base o tecido “moletinho”

de fibra natural 100% algodão, além de conter um capuz, um fechamento facilitado

pelo uso do zíper e botões de pressão. Para estimular a aprendizagem e as

habilidades cognitivas da criança, o casaco é também um jogo, pois contém o nome

“Thomas” com letras presas à peça por velcro, além de um quebra-cabeça com

partes da cabeça do cachorro.O usuário pode tirar e montar as peças sob orientação

dos pais ou responsáveis.A brincadeira pode ser feita no chão, de acordo com a

abordagem Floortime.

A cor off White foi designada para o tecido (moletinho) e o marrom claro para

a ribana que lhe dá acabamento (malha canelada utilizada em punhos e barras). As

demais cores da cartela são as nuances de marrom claro, em referência às cores do

pelo do cachorro, e o vermelho colocado no nome Thomas, remetendo ao desenho

preferido de Kyle, e também utilizando a mesma tipografia.

Com isso, temos o desenho técnico do “Casaco Kyle” construído com base

em todas as informações levantadas neste projeto(Fig. 3).

Após a construção do desenho técnico, iniciou-se o processo de modelagem

da peça.A base foi construída no tamanho 6 anos, e conteve as partes da frente,

costas, capuz, mangas, punhos, barra e a parte destacável da frente contendo o

desenho. Em cada parte, acrescentamos uma sobra de meio centímetro para as

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costuras, todas feitas na máquina de overloque. As Figuras 4 e 5apresentam a

modelagem sendo feita em papel e a modelagem aplicada ao tecido,

respectivamente.

A peça foi cortada no moletinho e a parte destacável da frente foi cortada

duas vezes e a seguir separada para nela ser aplicado o processo de estampa. Do

mesmo modo foi enviado para estamparia mais dois cortes contendo as partes do

quebra cabeça. A área para a estampa ocupou um espaço quadrado de 21 cm X 21

cm(Vide Fig. 6).

O quebra cabeça foi construído cortando cada peça 2 vezes, unindo as partes

ao enchimento feito de carpete apenas para manter a rigidez de cada peça, por trás

de cada peça foi colocado um velcro responsável por fazer o contato e manter a

peça presa ao tecido

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Figura 3- Desenho técnico.

Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

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Figura 4– A modelagem no papel

Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

Figura 5 - Parte da modelagem cortada no tecido

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Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

Figura 6– Parte destacável com estampa

Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

Com o casaco pronto, o próximo passo foi pregar os botões de pressão na

peça e na parte frontal. Após a peça pronta, uma sessão de fotos foi feita para

apresentação do resultado final (Fig.7, 8 e 9)

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Figura 7– Resultado final: frente

Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

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Figura 8– Resultado final: Quebra-cabeça

Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

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3.5 Documentação para produção

A ficha técnica é considerada o documento descritivo de uma peça de

vestuário, pois gera informações para os diversos setores de uma indústria de

confecções. Seu formato pode variar de acordo com as necessidades da empresa,

mas é aconselhável que contenha o desenho técnico da peça e as informações

acerca dos insumos diretos e indiretos e suas quantidades (TREPTOW, 2003). A

Ficha de nosso produto é apresentada na Figura 8.

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Figura 8- Ficha técnica

Fonte: Elaborada pelo autor (2018)

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4 Considerações finais

Este trabalho objetivou perfazer um processo em design e estimou como

objetivo produzir uma peça de roupa que atenda às necessidades de uma criança

com autismo. Seguindo a condição de formação de uma cultura projetual, para

desenvolvê-lo foi necessário inicialmente adotar uma metodologia que norteasse

nosso caminho e assim selecionamos a metodologia de Montemezzo (2003), pelo

fato da mesma ter sido projetada para viabilizar a organização de processos criativos

em moda na academia. De acordo com ela,seguimos as etapas de preparação,

geração, avaliação, concretização e documentação para produção.

A etapa de Preparação foi de suma importância para esse processo em

design, pois foi nela que a pesquisa sobre o TEA pode ser aprofundada,

esclarecendo suas várias condições e características, tais como os fatos deque

envolveum transtorno global do desenvolvimento, como ele acontece em crianças,

além de apresentar os três níveis existentes e particularidades de cada um.

Apresentamos também as intervenções comumente utilizadas-indicadas para o

tratamento - uma vez que o autismo não tem cura.Tais intervenções auxiliam no

avanço do desenvolvimento de atividades básicas do dia-a-dia que estão

diretamente ligadas a coordenação motora, habilidades, aprendizagem,

sensibilidade.

Foinesta etapa metodológica que também entendemos que o design com foco

no usuário, especialmente a agenda do Design For All, Universal Design ou I-

Design, é uma demanda que vem se consolidando nas sociedades atuais, e que

está sendo justificada inclusive pela legislação em vários países. Sua filosofia parte

do princípio que pessoas possuem suas deficiências ampliadas por designs

inadequados. Mais inclusiva, a mesma carece ainda de metodologias que

contemplem seu objetivo. A partir dela podemos entender a responsabilidade e o

desafio do design como agente de intervenção.

Após o entendimento de todos estes pontos, realizamos um estudo de caso para

levantar as características particulares de um indivíduo. Kyle, personagem do filme

“After Thomas” é um autista nível 3 e em um estudo de suas necessidades nos

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ofereceu ponderações necessárias para elaboração e construção do produto.Nesse

sentido, como resultado de nosso processo, aqui apresentamos uma metodologia

que pode ser adotada para os casos que possuem muitas variáveis. Ponderar sobre

todas as condições e utilizar uma matriz decisória nos ajudou a considerar todas as

variáveis.

Logo após, na etapa de Geração, analisamos tais ponderações e com isso

geramos alternativas de materiais e de processos que pudessem propiciar conforto e

segurança e quiçá, estimular a aprendizagem de Kyle, respeitando a percepção

cognitiva e a sensibilidade dessa criança. Na etapa de Concretização produzimos

um casaco que atendeu as necessidades de sensibilidade no que se diz respeito

aos materiais usados: Tecido, cores, texturas. A colocação do capuz, visou trazer a

sensação de proteção, minimizando os efeitos da luminosidade e dos barulhos

externos.O fechamento por zíper e botões de pressão pretendeu facilitar o vestir e o

desvestir da peça. A modelagem confortável e com liberdade de movimento,

pressupôs um vestir menos incômodo. Pensamos também em buscar atender às

necessidades cognitivas de aprendizado trazendo mais essa funcionalidade à peça,

por meio do Jogo de quebra-cabeça com imagens atrativas aos olhos da criança.

Contudo, nossos resultados foram apresentados a terapeuta especialista em

autismo. Em relação ao aprendizado, a terapeuta Dra. Lopes deixou claro que

atendemos ao conforto e a segurança, mas que faltam ferramentas pedagógicas

para tal:

Será que essa mesma peça de roupa pode ser usada para

estimular a cognição? Acredito que sim, uma vez que o

estímulo da cognição na criança autista se dá, sobretudo, pela

via do interesse e do prazer. Contudo, se pensado para esse

fim, vejo a peça como limitada e que precisaria de uma série de

outras ferramentas pedagógicas, visto que o quebra-cabeça e

a montagem do nome são atividades que não abrem muita

margem para expansão. Se lembrarmos que os autistas são,

em sua grande maioria, pensadores visuais com ótima

memória fotográfica, podemos deduzir que a montagem do

quebra cabeça e do nome Thomas tem muito mais um caráter

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repetitivo de segurança e conforto do que, propriamente, de

aprendizado.

Por fim elaboramos o desenho técnico do produto e, na última etapa de

documentação para produção,construímos também a ficha técnica contendo

informações essenciais para a produção da peça.

Em consonância com os resultados de nosso processo em design, a terapeuta

mesma deu o seguinte depoimento:

Este foi o primeiro trabalho que tenho conhecimento que se

propõe a pensar no conforto e na sensação de bem estar para

uma criança autista através de uma peça de vestuário. Esta

peça, pensada nas particularidades sensoriais de uma criança

autista, pode sim ser aproveitada e generalizada para outras

crianças, usando o mesmo tecido e com as mesmas

características físicas, mas modificando as figuras de conforto

emocional para a criança – no caso específico, a imagem do

cachorro e as letras que formam o nome Thomas, uma vez que

cada criança tem suas próprias figuras de conforto e áreas de

interesse. Pensar em uma peça de vestuário que acomode as

desordens sensoriais da criança e, além disso, ofereça

sensação de conforto e segurança emocional através da figura

e do nome escolhido, foi uma ideia original e respeitosa das

particularidades individuais da criança.

Nesta pesquisa, ficou claro como é possível criar um produto de vestuário

voltado para um usuário com necessidades singulares - em nosso caso,uma criança

com autismo, mas também ficou latente a importância em se adotar uma

metodologia projetual para considerar o conjunto de variáveis pertinente às

necessidades do caso específico. Atender a um usuário não é função do design,

cujas aplicações devem ser coletivas. Mas o processo nos ajuda a enxergar que o

fortalecimento acadêmico e social do campo num momento em que a inclusão é um

valor social, depende da reflexão muitas vezes feita por meio da prática, pois criar é

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um processo individual que sempre traz contribuições para a prática. Segundo Jonas

(2007) toda reflexão deve voltar como apoio à teoria para o crescimento do campo.

Assim, graças à interdisciplinaridade própria ao design, trilhamos um caminho

para solucionar problemas que envolvem a relação entre o usuário e o produto. Tal

caminho poderá ser utilizado por outros designers. Essa pesquisa pode ser base

para o desenvolvimento de futuros trabalhos, por exemplo, realizando a fase de

testes com um usuário e assim analisando a funcionalidade dessa peça de

vestuário.

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ANEXO A – ENTREVISTA REALIZADA COM A TERAPEUTA ESPECIALISTA

EM AUTISMO

1. Embora acreditemos que o caminho do conforto e dos sentidos seja

pertinente para tratar o estudo de caso, nos foi indicado para base desse

trabalho utilizar os aportes teóricos da pedagogia e da cognição, por se tratar

de uma “roupa brinquedo”. Nesse sentido, o foco do autismo na disciplina de

pedagogia nos daria base para responder nossa questão de pesquisa?

Quanto ao processo cognitivo de nosso sujeito de pesquisa, você pode falar

algo sobre isso?

Se o objetivo da peça de roupa é o do conforto e da diversão, me parece

contraditório acrescentar à mesma a função de desenvolvimento pedagógico da

criança. Considerando que o autista tem desordens de processamento e de

modulação sensorial, uma peça de roupa que proporcione conforto, sensação de

segurança e, acima de tudo, desperte o seu interesse é de grande valia. Será que

essa mesma peça de roupa pode ser usada para estimular a cognição? Acredito que

sim, uma vez que o estímulo da cognição na criança autista se dá, sobretudo, pela

via do interesse e do prazer. Contudo, se pensado para esse fim, vejo a peça como

limitada e que precisaria de uma série de outras ferramentas pedagógicas, visto que

o quebra-cabeça e a montagem do nome são atividades que não abrem muita

margem para expansão. Se lembrarmos que os autistas são, em sua grande

maioria, pensadores visuais com ótima memória fotográfica, podemos deduzir que a

montagem do quebra cabeça e do nome Thomas tem muito mais um caráter

repetitivo de segurança e conforto do que, propriamente, de aprendizado.

Em pessoas com dificuldade em processar e modular os estímulos sensoriais, as

atividades repetitivas se tornam, facilmente, uma forma de se acalmar diante dos

estímulos externos que fogem ao controle e, consequentemente, são uma fonte de

ansiedade, incerteza e desconforto. Por isso, uma peça de roupa que proporcione

um “lugar de segurança” à criança autista é, por si só, de grande valia e pode ser

usada pela criança em situações de estresse e insegurança, por exemplo.

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Por estes motivos, acredito que a finalidade da peça de roupa deva ser exatamente

a da proposta original – oferecer à criança conforto e segurança.

2. Um processo de construção de um produto para um usuário tão singular é

sempre bastante rico, portanto acreditamos que o mesmo gere várias

soluções que, quando aplicadas na peça de vestuário, gerem conforto, além

de uma estimulação cognitiva prazerosa. Você acredita ser possível

generalizar alguma dessas descobertas para outros casos?

Este foi o primeiro trabalho que tenho conhecimento que se propõe a pensar no

conforto e na sensação de bem estar para uma criança autista através de uma peça

de vestuário. Esta peça, pensada nas particularidades sensoriais de uma criança

autista, pode sim ser aproveitada e generalizada para outras crianças, usando o

mesmo tecido e com as mesmas características físicas, mas modificando as figuras

de conforto emocional para a criança – no caso específico, a imagem do cachorro e

as letras que formam o nome Thomas, uma vez que cada criança tem suas próprias

figuras de conforto e áreas de interesse.

Pensar em uma peça de vestuário que acomode as desordens sensoriais da criança

e, além disso, ofereça sensação de conforto e segurança emocional através da

figura e do nome escolhido, foi uma ideia original e respeitosa das particularidades

individuais da criança.

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ANEXO B - TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM

Eu,________________________________ CPF____________,

RG_______________, depois de conhecer os objetivos da pesquisa, bem como

estar ciente da necessidade do uso de minha imagem (ou de meu dependente),

AUTORIZO, através do presente termo, os pesquisadoresSarah Maria Batista de

Lima (alunado Curso de Design UFPE | CAA) e Flávia Zimmerle da Nóbrega

Costa(professora orientadora),do projeto de pesquisa intitulado: O brinquedo de

vestir: desenvolvimento de produto para crianças com autismo, a realizar as

fotos que se façam necessárias.

Ao mesmo tempo, libero a utilização destas fotos para fins científicos e de estudos

(livros, artigos, slides e transparências), em favor dos pesquisadores da pesquisa,

acima especificados, obedecendo ao que está previsto nas Leis que resguardam os

direitos das crianças e adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA,

Lei N.º 8.069/ 1990), dos idosos (Estatuto do Idoso, Lei N.° 10.741/2003) e das

pessoas com deficiência (Decreto Nº 3.298/1999, alterado pelo Decreto Nº

5.296/2004).

Caruaru,15 de Junho de 2018

_____________________________ ______________________________

Participante da pesquisa ou responsável Pesquisador

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ANEXO C – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado (a) Senhor (a)

A presente pesquisa é sobre: O brinquedo de vestir: desenvolvimento de

produto para crianças com autismo, e está sendo desenvolvida por Sarah Maria

Batista de Lima (aluna do Curso de Design UFPE | CAA) e Flávia Zimmerle da

Nóbrega Costa (professora orientadora). Seu foco foi o de estabelecer um processo

de design com o objetivo de produzir uma peça de roupa que atendesse às

necessidades de uma criança com autismo.

Considerando sua expertise na área, solicitamos sua valorosa colaboração em

responder a uma entrevista aberta contendo duas questões que nos ajudará tanto a

entender melhor o sujeito dessa pesquisa, como a analisar nosso próprio processo

em andamento, visando atingir os resultadosesperados. Esclarecemos que sua

participação é voluntária.

Considerando que fui informado (a) dos objetivos e relevância da investigação

e que tive acesso a mesma, declaro o meu consentimento em participar dessa

pesquisa, como também concordo que os dados obtidos sejam utilizados para

fins científicos.

Caruaru,15 de Junho de 2018

____________________________________

Participante da pesquisa