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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM MESTRADO EM ENFERMAGEM MARIANA ALBERNAZ PINHEIRO DE CARVALHO CONTRIBUIÇÕES DA TERAPIA COMUNITÁRIA INTEGRATIVA PARA USUÁRIOS E FAMILIARES DE CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS): HISTÓRIA ORAL TEMÁTICA JOÃO PESSOA - PB 2013

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS DA ... · 2013. 146f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Paraíba,

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM

MESTRADO EM ENFERMAGEM

MARIANA ALBERNAZ PINHEIRO DE CARVALHO

CONTRIBUIÇÕES DA TERAPIA COMUNITÁRIA INTEGRATIVA PARA

USUÁRIOS E FAMILIARES DE CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS):

HISTÓRIA ORAL TEMÁTICA

JOÃO PESSOA - PB

2013

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MARIANA ALBERNAZ PINHEIRO DE CARVALHO

CONTRIBUIÇÕES DA TERAPIA COMUNITÁRIA INTEGRATIVA PARA

USUÁRIOS E FAMILIARES DE CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS):

HISTÓRIA ORAL TEMÁTICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

graduação em Enfermagem, nível Mestrado,

do Centro de Ciências da Saúde da

Universidade Federal da Paraíba, na área de

concentração Enfermagem na Atenção à

Saúde, como requisito parcial para a

obtenção do grau de Mestre em Enfermagem.

Linha de pesquisa: Políticas e Práticas em

Saúde e Enfermagem

Orientadora: Profª. Drª. Maria de Oliveira Ferreira Filha

JOÃO PESSOA - PB

2013

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MARIANA ALBERNAZ PINHEIRO DE CARVALHO

CONTRIBUIÇÕES DA TERAPIA COMUNITÁRIA INTEGRATIVA PARA

USUÁRIOS E FAMILIARES DE CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS):

HISTÓRIA ORAL TEMÁTICA

APROVADA EM: ___/___________/___

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________

Profª. Drª. Maria de Oliveira Ferreira Filha - Orientadora

(Universidade Federal da Paraíba - UFPB)

___________________________________________________

Profª. Drª. Maria Djair Dias - Examinadora

(Universidade Federal da Paraíba - UFPB)

___________________________________________________

Prof. Dr. Francisco Arnoldo Nunes de Miranda - Examinador

(Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN)

___________________________________________________

Profª. Drª. Antônia Oliveira Silva – Suplente

(Universidade Federal da Paraíba - UFPB)

___________________________________________________

Profª. Drª. Fábia Barbosa de Andrade – Suplente

(Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN)

JOÃO PESSOA - PB

2013

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Dedico

Aos meus eternos mestres, Edna e Marcus, pais admiráveis que, juntamente com Deus, me agraciaram com o bem mais precioso: a vida.

Amo muito vocês!

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pelo dom da existência e por estar sempre ao meu lado, me ajudando a trilhar o

caminho do bem, principalmente nos momentos de fraquezas e de dúvidas e me fazendo

acreditar em dias melhores. Sempre confiei em seus planos para mim.

Aos meus pais, Edna e Marcus, pessoas fundamentais em minha vida, que sempre se fizeram

presentes nessa trajetória. A vocês, serei eternamente grata. Jamais me esquecerei do zelo e

dos ensinamentos de vocês.

A minha irmãzinha Marília, um anjo que batizei de “minha alma gêmea na versão feminina”.

Obrigada pelo companheirismo.

A minha tia Malrylene, pela dedicação e por sua brilhante participação em meu crescimento

pessoal e profissional.

A Urias, companheiro presente e dedicado, que soube compreender e respeitar meus

momentos de ausência.

A minha eterna orientadora, Maria de Oliveira Ferreira Filha, pelas oportunidades

oferecidas, pela prontidão, pelo aprendizado durante as orientações e pelas palavras de

conforto nos momentos de angústia. Quem a conhece sabe. Pessoas como você merecem ser

eternizadas na história.

À Professora Maria Djair Dias, por suas orientações sempre enriquecedoras e pelas palavras

de carinho e de incentivo.

Ao Professor Francisco Arnoldo, pela disposição e por sua brilhante contribuição.

À Professora Antônia Oliveira, pelo apoio.

À Professora Fábia Barbosa, por sua solicitude.

Ao Professor Rolando Lazarte, pelas ideias e pelos pensamentos socializados.

À amiga Elisângela, pela disposição em ajudar e por todas as aprendizagens possibilitadas.

A todos os profissionais do CAPS Caminhar, pela receptividade e abertura.

Aos amigos Rinaldo e Sílvia, pela acolhida no grupo da Terapia Comunitária do CAPS

Caminhar. Vocês nasceram para ser terapeutas comunitários!

Aos familiares e usuários do CAPS Caminhar, que colaboraram para o desenvolvimento

deste estudo. Obrigada pela confiança e pela entrega. Vocês foram a pedra angular dessa

construção coletiva.

Às amigas que conquistei durante a vida acadêmica e o ingresso no Mestrado: Marina,

Mayra (in memoriam), Renatinha, Camila, Samilla, Danielle, Priscilla, Lawrencita,

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Alynne, Lorena, Vagna, Aralinda, Lucineide, Quézia e Sandra. Obrigada pela parceria e

pelo apoio.

Aos amigos que conheci no Curso de Formação em Terapia Comunitária: Fernandinha,

Severina, Arimatéia, Elaine, Romélia, Alana, Camila e Jeferson. Guardarei com carinho

aqueles momentos maravilhosos vividos em Lagoa Seca. De vocês carrego sempre as

melhores recordações.

Aos funcionários do Mestrado: Seu Ivan, Dona Conceição e Seu Wellington, pela amizade e

pelo empenho.

Enfim, a todos os idealizadores, professores e amigos, pelo apoio e pelo entusiasmo

demonstrados que contribuíram para a concretização desse sonho. A vocês, sinceramente,

Muito obrigada!

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O pote rachado

Havia na Índia um carregador de água que transportava, em ambas as pontas de uma vara que levava atravessada no pescoço, dois potes grandes de barro.

Um dos potes tinha uma rachadura, e o outro era perfeito. O pote perfeito chegava sempre cheio ao final do longo caminho, que ia do poço até à casa do

patrão. Mas o pote rachado chegava apenas com metade da água.

E assim, durante dois anos, o carregador entregou diariamente um pote e meio de água na casa do seu senhor.

O pote perfeito, é claro, estava orgulhoso do seu trabalho. O pote rachado, porém, estava envergonhado da sua imperfeição. Sentia-se miserável por apenas ser

capaz de realizar metade da tarefa a que estava destinado. Depois de perceber que, ao longo de dois anos, não tinha passado de uma amarga desilusão, o pote

disse ao homem, à beira do poço: - Estou envergonhado e quero pedir-te desculpa. Durante esses dois anos, só entreguei

metade da minha carga, porque a minha rachadura faz com que a água se vá derramando ao longo do caminho. Por causa do meu defeito, tu fazes o teu trabalho e não ganhas todo o salário que os

teus esforços mereciam. O homem ficou triste com o sentimento do velho pote e disse-lhe com compaixão:

- Quando voltarmos para a casa do meu senhor, quero que repares nas flores que se encontram à beira do caminho.

De fato, à medida que iam subindo a montanha, o pote rachado reparou que havia muitas flores selvagens à beira do caminho e ficou mais animado.

Mas no final do percurso, tendo-se vazado mais uma vez metade da água, o pote sentiu-se mal de novo e voltou a pedir desculpa ao homem pela sua falha.

Então, o homem disse ao pote: - Reparaste em que, ao longo do caminho, só havia flores do teu lado? Reparaste também em

que, quando vínhamos do poço, todos os dias, tu ias regando essas flores? Ao longo de dois anos, eu pude colher flores para ornamentar a mesa do meu senhor. Se tu não fosses assim como és, ele não

poderia ter essa beleza para dar graça à sua casa. (Autor desconhecido)

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CARVALHO, M. A. P. de. Contribuições da Terapia Comunitária Integrativa para

usuários e familiares de Centro de Atenção Psicossocial (CAPS): história oral temática.

2013. 146f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Centro de Ciências da Saúde,

Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa.

R E S U M O

A assistência em saúde mental vem se orientando para o redimensionamento de seus serviços

e ações, do âmbito institucional para o psicossocial, comunitário e regionalizado, para garantir

a inclusão e a reinserção social das pessoas em sofrimento psíquico. Um exemplo de prática

que vem se fortalecendo e se expandindo, progressivamente, nesses espaços, é a Terapia

Comunitária Integrativa (TCI), como uma tecnologia potencialmente rica para se trabalhar

com sentimentos relacionados à emoção e às necessidades subjetivas do cotidiano das pessoas

em sofrimento psíquico. Esta pesquisa teve como objetivo analisar as contribuições da TCI

considerando as mudanças de comportamento, as estratégias aprendidas e a importância que

ela representa na vida de usuários e familiares de um CAPS. Trata-se de uma pesquisa

compreensivo-interpretativa de abordagem qualitativa, para cujo estudo se utilizou a História

Oral Temática, a fim de nortear sua operacionalização. O cenário da investigação foi o Centro

de Atenção Psicossocial Caminhar, localizado na cidade de João Pessoa. Esse serviço

desenvolve rodas de Terapia Comunitária há, aproximadamente, cinco anos. O material

empírico foi produzido por meio de entrevistas realizadas com doze colaboradores, e o

produto desse material foi discutido com base na análise temática proposta por Minayo, que

subsidiou a construção de um grande eixo temático e três subeixos, conforme seguem

respectivamente: a TCI como práxis libertadora; mudanças que fazem a diferença; um espaço

terapêutico de fala, de escuta e de aprendizagem e a TCI como fortalecedora de vínculos e

fomentadora do empoderamento. As histórias dos colaboradores revelaram que ocorreram

mudanças significativas nos campos pessoal, profissional e comunitário, a partir da inserção

deles nas rodas de TCI, pois se verificou que tal estratégia promoveu a recuperação dos

processos de socialização natural que constituem a vida humana, o que repercutiu,

diretamente, em processos de inclusão e reabilitação social das pessoas que participavam das

rodas de TCI. Nos discursos, os colaboradores revelaram, ainda, que houve mudanças

pessoais e que isso contribuiu para promover melhoras no processo terapêutico, visto que, na

TCI, os participantes eram encorajados a ressignificar seus sofrimentos, o que potencializa o

resgate da cidadania e da autonomia. Em se tratando de indivíduos em sofrimento mental,

também se trabalhou a conscientização para o tratamento. Tanto os usuários do CAPS quanto

os familiares revelaram que, durante as rodas de TCI, tiveram a oportunidade de refletir sobre

suas vidas, com mudanças em seu cotidiano que representaram melhorias em suas vidas.

Ficou claro que o uso da TCI está diretamente relacionado a propostas de inclusão e

reabilitação psicossocial de seus participantes, uma vez que, nesse encontro terapêutico, as

informações emanadas compõem um saber que leva à resiliência, à autonomia e ao

empoderamento individual e coletivo.

Palavras-chave: Serviços de saúde mental. Apoio social. Relações familiares. Terapia.

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CARVALHO, M. A. P. de. Contributions of therapy integrative community for users and

family members of psychosocial care center (CAPS): thematic oral history. 2013. 146f.

Dissertation (Masters in Nursing) – Health Sciences Center, Universidade Federal da Paraíba,

João Pessoa.

A B S T R A C T

The mental health care has been directing for the resizing of its services and actions of the

institutional framework for the psychosocial, community and regionalized, seeking to ensure

the inclusion and social reintegration of people in mental suffering. Therapy Community

Integrative (TCI) and caring practice that have been strengthening and expanding

progressively in the space community. It is a technology potentially rich front the need to

work with feelings related to the emotion and the subjective needs of daily life of people in

mental suffering. By means of this research was to analyze the contributions of TCI whereas

the changes in behavior, the strategies learned is the importance which it represents in the life

of users and family members of a CAPS. It is a comprehensive research-interpretative

qualitative approach, where if you used the Thematic Oral History to guide the

operationalization of the study. The scenario of research was the Psychosocial Care Center

Walk, located in the city of Joao Pessoa, a service that develops circles Community Therapy

for approximately five years. The empirical material has been produced from interviews with

twelve employees, and the product of this material was discussed on the basis of the thematic

analysis proposed by Minayo, which subsidized the construction of a large thematic axis and

three programs as follow respectively: TCI as liberating praxis; changes that make a

difference; a therapeutic space speech, listening and learning and the TCI while strengthens

ties and motivator of empowerment. The stories of employees revealed that significant

changes have occurred in the fields personal, professional and community, from the insertion

of them in the circles of TCI, we found that this strategy promoted the recovery of

socialization processes natural that constitute the human life, directly reflecting in processes

of inclusion and social rehabilitation of people who participated on the circles of TCI. In the

discourses, employees also revealed that there were changes in personnel and this has

contributed to promote improvements in the therapeutic process, since in TCI participants

were encouraged to (re) facing its sufferings, potentiating the ransom of citizenship and

autonomy, and in the case of individuals in mental suffering, also worked to increase

awareness for the treatment. Both the users of the CAPS, as family members, have revealed

that during the circles of TCI had the opportunity to reflect on their lives, allowing changes in

their daily lives that accounted for improvements in the quality of their lives. It was clear that

the use of ICT is directly related to proposals for inclusion and psychosocial rehabilitation of

their participants, since in this therapeutic encounter, the information emanating from

compose a knowledge that leads to resiliency, autonomy and individual empowerment and

collective.

Keywords: Mental Health Services. Social Support. Family relationships. Therapy.

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CARVALHO, M. A. P. de. Las contribuciones de terapia integradoras comunidad para

los usuarios y a los miembros de la familia del centro de atención psicosocial (CAPS):

temáticas historia oral. 2013. 146f. Disertación (Máster em Enfermería) – Centro de

Ciências da Saúde, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa.

R E S U M E N

La atención de la salud mental ha sido dirigir para el ajuste del tamaño de sus servicios y

acciones del marco institucional para la psicosocial, de la comunidad y regionalizada, tratando

de garantizar la inclusión y la reintegración social de las personas con sufrimiento mental. La

Comunidad Terapia Integrativa (TCI) y un cuidado práctica que ha sido fortalecer y ampliar

progresivamente en la comunidad espacial. Se trata de una tecnología potencialmente rico

frente la necesidad de trabajar con sentimientos relacionados con la emoción y las necesidades

subjetivas de la vida cotidiana de las personas con sufrimiento mental. Por medio de este

estudio fue analizar los aportes de TCI mientras que los cambios en el comportamiento, las

estrategias aprendidas es la importancia que representa en la vida de los usuarios y los

miembros de la familia de un CAPS. Se trata de una amplia investigación-interpretativa

enfoque cualitativo, donde si se ha utilizado la Historia Oral Temï guía para la puesta en

marcha del estudio. El escenario de la investigación fue el Centro de Atención Psicosocial a

pie, ubicado en la ciudad de Joao Pessoa, un servicio que desarrolla las ruedas terapia

comunitaria de aproximadamente cinco años. El material empírico se ha producido a partir de

entrevistas con doce empleados, y el producto de este material ha sido debatido en la base del

análisis temático propuesto por Minayo, que subvencionan la construcción de un gran eje

temático y tres de los programas de seguimiento respectivamente: TCI como praxis

liberadora; cambios que hacen que una diferencia; un espacio terapéutico discurso, escuchar y

aprender y las islas mientras que fortalece los lazos y motivador de la habilitación. Las

historias de los trabajadores ha revelado que se han producido importantes cambios en el

ámbito personal, profesional y de la comunidad, de la inserción de ellos en las ruedas del TCI,

descubrimos que esta estrategia que promueve la recuperación de los procesos de

socialización naturales que constituyen la vida humana, que reflejan directamente en los

procesos de inclusión social y rehabilitación de las personas que participaron en las ruedas del

TCI. En los discursos, los empleados también reveló que hubo cambios en el personal y esto

ha contribuido a promover mejoras en el proceso terapéutico, ya que en TCI se alentó a los

participantes a (re) frente a sus sufrimientos, potenciando el rescate de la ciudadanía y la

autonomía, y en el caso de las personas en sufrimiento mental, trabajó también para aumentar

la conciencia para el tratamiento. Tanto los usuarios de las tapas, como miembros de la

familia, han revelado que durante las ruedas de TCI han tenido la oportunidad de reflexionar

sobre sus vidas, lo que permite que los cambios en sus vidas cotidianas que representaban las

mejoras en la calidad de sus vidas. Es evidente que el uso de las TIC está directamente

relacionado con las propuestas para la inclusión y la rehabilitación psicosocial de sus

participantes, ya que en este encuentro terapéutico, la información procedente de componer

un conocimiento que lleva a flexibilidad, autonomía y empoderamiento para la salud

individual y colectiva.

Palabras clave: Los Servicios de Salud Mental. Apoyo Social. Las relaciones familiares.

Terapia.

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LISTA DE FOTOGRAFIAS

Foto 1 – Josué. Fonte: Arquivo da Internet, 2012....................................................................55

Foto 2 – Maria José. Fonte: Arquivo da autora, 2012.............................................................57

Foto 3 – Ivanildo. Fonte: Arquivo da Internet, 2012...............................................................59

Foto 4 – Josineide. Fonte: Arquivo da autora, 2012................................................................61

Foto 5 – Allan. Fonte: Arquivo da autora, 2012......................................................................63

Foto 6 – Janete. Fonte: Arquivo da autora, 2012....................................................................65

Foto 7 – Rosiane. Fonte: Arquivo da autora, 2012..................................................................68

Foto 8 – Maria do Socorro. Fonte: Arquivo da autora, 2012.................................................70

Foto 9 – Maria Emília. Fonte: Arquivo da autora, 2012.........................................................73

Foto 10 – Rita de Cássia. Fonte: Arquivo da Internet, 2012...................................................75

Foto 11 – Maria Laurizete. Fonte: Arquivo da autora, 2012.................................................77

Foto 12 – Rita Ângela. Fonte: Arquivo da autora, 2012.........................................................79

Foto 13 – Grupo de usuários na TCI – CAPS Caminhar. Fonte: Arquivo da autora,

2012.........................................................................................................................................122

Foto 14 – Grupo de familiares na TCI – CAPS Caminhar. Fonte: Arquivo da autora,

2012.........................................................................................................................................122

Foto 15 – Roda de TCI com os familiares – CAPS Caminhar. Fonte: Arquivo da autora,

2012.........................................................................................................................................122

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LISTA DE SIGLAS

CAAE: Certificado de Apresentação para Apreciação Ética

CAPS: Centro de Atenção Psicossocial

CCS: Centro de Ciências da Saúde

CNS: Conferência Nacional de Saúde

CNSM: Conferência Nacional de Saúde Mental

CE: Ceará

CEBES: Centro Brasileiro de Estudos de Saúde

CEDMEX: Centro Especializado de Dispensação de Medicamentos Excepcionais

CNS: Conselho Nacional de Saúde

CRAS: Centro de Referência da Assistência Social

DINSAM: Divisão Nacional de Saúde Mental

ESF: Estratégia Saúde da Família

GEPSMEC: Grupo de Estudo e Pesquisa em Saúde Mental Comunitária

HO: História Oral

IBDPH: Instituto Brasileiro de Desenvolvimento da Pessoa Humana

MTSM: Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental

NAPS: Núcleo de Atenção Psicossocial

PAIAD: Programa de Atendimento Integral ao Alcoolista e outros Dependentes químicos

PASM: Pronto Atendimento em Saúde Mental

PIBIC: Programa Institucional de Bolsas para Iniciação Científica

PPGEnf: Programa de Pós-graduação em Enfermagem

REME: Movimento de Renovação Médica

RS: Reforma Sanitária

RP: Reforma Psiquiátrica

SAMU: Serviço de Atendimento Móvel de Urgência

SMS/JP: Secretaria Municipal de Saúde de João Pessoa

SEDES: Secretaria do Desenvolvimento Social

SRT: Serviço de Residência Terapêutica

SUS: Sistema Único de Saúde

TCI: Terapia Comunitária Integrativa

TCLE: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TOC: Transtorno obsessivo-compulsivo

UBS: Unidade Básica de Saúde

USF: Unidade de Saúde da Família

UFPB: Universidade Federal da Paraíba

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 14

1.1Contextualizando a problemática ............................................................................................ 15

1.2 O despertar para o objeto de estudo........................................................................................ 19

1.3 Objetivos ................................................................................................................................. 20

2 REFERENCIAL TEÓRICO ...................................................................................................... 22

2.1 Reforma Psiquiátrica Brasileira: surgimento e implicações para a saúde mental .................. 23

2.2 Do modelo hospitalocêntrico à desinstitucionalização: perpassando espaços institucionais . 27

2.3 Os Centros de Atenção Psicossocial e o redimensionamento da abordagem em saúde mental .... 30

2.4 Origem e aplicabilidade da Terapia Comunitária Integrativa ....................................................... 35

3 PERCURSO METODOLÓGICO ............................................................................................. 44

3.1 Justificando e descrevendo o paradigma adotado................................................................... 45

4 APRESENTAÇÃO DO MATERIAL EMPÍRICO ................................................................... 54

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DO MATERIAL EMPÍRICO ....................................................... 81

5.1 A TCI como práxis libertadora ............................................................................................... 82

5.1.1 Mudanças que fazem a diferença......................................................................................... 85

5.1.2 Um espaço terapêutico de fala, de escuta e de aprendizagem ............................................. 98

5.1.3 A TCI como fortalecedora de vínculos e fomentadora do empoderamento ........................ 106

6 REFLEXÕES FINAIS ............................................................................................................... 123

REFERÊNCIAS ........................................................................................................................... 128

APÊNDICES ................................................................................................................................ 138

ANEXOS ...................................................................................................................................... 144

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11 IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO

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1.1 CONTEXTUALIZANDO A PROBLEMÁTICA

No Brasil, o manejo da saúde mental é um tema complexo, permeado por desafios e

conquistas que ocorreram ao longo de décadas impulsionados por movimentos de crítica à

instituição psiquiátrica e ao tratamento dispensado às pessoas em sofrimento psíquico. Tais

movimentos contribuíram sobremaneira para a criação do cenário que hoje se apresenta, por

meio de lutas que transpusessem o olhar destinado à doença mental, o qual cristalizava o

caráter hospitalocêntrico como modo de “filtrar” pessoas consideradas “impuras” que

pudessem contaminar ou oferecer riscos à sociedade, excluindo-as de seu convívio social.

Nesse sentido, a carência de programas e de ações voltados para esse público evocava, na

sociedade, uma série de mudanças que estimulassem reflexões acerca dessa problemática.

Na década de 1970, impulsionado pelo movimento sanitário, no Brasil, o processo de

Reforma Psiquiátrica começa a ganhar força e notoriedade, sobretudo na década de 1990,

quando passa a ser estimulado por movimentos sociais e pelo anseio de mudanças nas práticas

de saúde vigentes, principalmente no que tange à prática assistencialista centrada no modelo

hospitalocêntrico. Ainda na década de 1990, impulsionados pelo Projeto de Lei Paulo

Delgado, os movimentos sociais passam a alcançar importantes conquistas e foram aprovadas,

em diversos estados do Brasil, as primeiras medidas oficiais de substituição progressiva de

leitos psiquiátricos por uma rede articulada de atenção em saúde mental, o que contribuiu para

a efetivação da Reforma Psiquiátrica no país. Ainda nesse período, com a assinatura da

Declaração de Caracas e com a II Conferência Nacional de Saúde Mental, surgem as

primeiras normas regulamentadoras de serviços de atenção diária, como os Centros de

Atenção Psicossocial (CAPS), Núcleos de Apoio Psicossocial (NAPS) e Hospitais-dia, além

de normas para classificar e fiscalizar os hospitais psiquiátricos (BRASIL, 2005).

Nesse contexto, surge a necessidade de se criarem propostas para se reestruturar a

atenção orientada para as pessoas em adoecimento psíquico com vistas a integrá-las em seu

convívio de maneira saudável e positiva, na intenção de que o cuidado voltado para esses

indivíduos pudesse contemplá-los numa perspectiva de reinserção pessoal, social e familiar.

Com as mudanças no modelo de assistência preconizado pelo SUS, ganha destaque a

atenção no campo da saúde mental, por se tratar de um segmento que tem sido desafiado na

contemporaneidade, face à vulnerabilidade em que a sociedade atual vem se expondo, seja em

suas questões culturais, familiares e afetivas. Isso significa que o “homem moderno” vem se

tornando cada vez mais frágil e escravo de conflitos internos e contribui para tornar pessoas e

comunidades susceptíveis aos transtornos mentais. Compreende-se que a maioria desses

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transtornos é de natureza prevenível e que merecem ser encarados como prioridade política

com vistas a reduzir o impacto social que tal problemática pode trazer para a vida dessas

pessoas. Isso justifica a importância de se criarem estratégias institucionais por meio das quais

se incorporem ações de inclusão e de participação social (OPS/OMS, 2009).

Para que o paradigma da atenção psicossocial se efetive com resolutividade, devem-se

criar dispositivos diferenciados que possam inovar o plano terapêutico oferecido aos seus

usuários, que dispõe de características plurais de forma a garantir elementos vitais para a

prática da transformação psicossocial, contemplando aspectos latentes e “esquecidos” da vida

dessas pessoas.

A prática assistencialista, biologicista e hospitalocêntrica que ainda se encontra na

práxis em saúde mental deve avançar no sentido da prevenção e do enfoque integralizado que

contemple as dimensões biopsicossociais do indivíduo, ao considerá-lo a partir de suas

especificidades. Nesse sentido, a base para um processo de mudanças extrapola o rompimento

da causalidade linear doença-cura, problema-solução e crise-estabilização. Convém enfatizar

que as novas práticas e estratégias institucionais devem ser capazes de intervir no binômio

existência-sofrimento e mediar a reestruturação do indivíduo como sujeito partícipe de seu

plano terapêutico (ROTELLI, 2001).

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) são considerados como uma das

iniciativas mais relevantes que já houve. Trata-se de uma estratégia inteligente que não foram

criados apenas para atender a pessoas em adoecimento mental, porquanto suas ações também

incluem a participação e a colaboração dos familiares, dos amigos e dos cuidadores dos

usuários que os frequentam como atores integrantes do processo. A criação desses

dispositivos transpõe os limites estabelecidos para o manejo clínico dos transtornos psíquicos,

pois incorpora, em suas práxis, ferramentas de construção e participação coletiva voltadas

para reinserir o usuário na sociedade e garante acesso resolutivo e menos excludente, que

ajuda os pacientes a superarem os desafios corriqueiros na vida das pessoas com transtornos

mentais.

Ao trabalhar em articulação com a rede de serviços de saúde do município onde está

inserido, os CAPS devem desenvolver suas ações em parceria com os diversos setores sociais

e viabilizar a continuidade do cuidado, ao possibilitar que o usuário retorne diariamente à sua

residência para o convívio social e abolir, definitivamente, o estigma da exclusão e do

isolamento que, durante muito tempo, permeou o cenário da assistência em saúde mental.

Para tanto, é fundamental que as práticas e os projetos fomentados nesses centros contemplem

os aspectos subjetivos e particulares a cada indivíduo, de forma a compreendê-los no contexto

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onde se inserem (BRASIL, 2005). Portanto, a assistência em saúde mental vem se orientando

para redimensionar seus serviços e ações, do âmbito institucional para o psicossocial,

comunitário e regionalizado, seja para garantir a inclusão e a reinserção social das pessoas em

sofrimento psíquico, seja para fortalecer a autoestima e a autonomia desses sujeitos como

protagonistas de uma sociedade inclusiva.

Um exemplo de prática que vem se fortalecendo e se expandindo, progressivamente,

nesses espaços, é a Terapia Comunitária Integrativa (TCI) - uma ferramenta de construção de

redes sociais solidárias criada em 1987, no município de Fortaleza/CE, pelo psiquiatra e

antropólogo Professor Doutor Adalberto de Paula Barreto. É uma alternativa para se trabalhar

com grupos distintos e característicos de maneira dinâmica, participativa e reflexiva, que abre

espaço para que os participantes exponham seus problemas e suas inquietações, que

repercutem no diálogo em favor da busca de soluções para os conflitos emanados. A TCI,

além de ser um espaço aberto para a troca de experiências, cria vínculos e resgata a autonomia

dos indivíduos, por facilitar a transformação de carências em competências que os tornarão

capazes de ressignificar momentos de dores e perdas com a sabedoria ali adquirida

(BARRETO, 2008). Como é uma ferramenta facilitadora do processo de participação social, a

TCI, progressivamente, vem sendo incluída no corpo das atividades desenvolvidas nos

Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e na Estratégia Saúde da Família (ESF) como uma

tecnologia potencialmente rica, considerando que é preciso trabalhar com sentimentos

relacionados à emoção e às necessidades subjetivas do cotidiano das pessoas em sofrimento

psíquico (BARRETO, 2008).

Em estudo desenvolvido anteriormente, produto de pesquisa do Programa de Iniciação

Científica (PIBIC), constatou-se que a TCI tem repercutido positivamente no cotidiano dos

usuários de CAPS, principalmente na perspectiva do resgate da autoestima e da reinserção

social e familiar, porém ainda há muito a ser desvelado sobre essa ferramenta de cuidado no

contexto dos serviços substitutivos, sobretudo nos CAPS, porquanto não existem respostas

que esclareçam a amplitude do potencial transformador dessa estratégia no cotidiano de seus

participantes. Portanto, o desenvolvimento da pesquisa mencionada mostrou que a TCI

sensibiliza seus participantes para que eles sejam responsabilizados por seu próprio processo

de tratamento e enfrentamento dos desafios da vida. Isso se constitui como uma teia de

relações e de vínculos a partir da qual o indivíduo consegue se reinserir na comunidade, o que

facilita seu processo de reabilitação psicossocial.

No que diz respeito à criação e ao fortalecimento de vínculos, a TCI desempenha um

papel importante na vida dos usuários, ao colocar em evidência atores sociais que participam

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ativamente dela e expõe, através de experiências próprias, momentos de superação que geram

autosatisfação e crescimento na medida em que se estabelece uma relação de empatia e de

identificação para com o próximo. Por isso se deve enfatizar a importância dessa ferramenta

de cuidado na perspectiva de um olhar humanístico, que resgate as habilidades sociais desses

sujeitos.

Outro aspecto peculiar da TCI é sua extensão e abertura a qualquer participante

envolvido no processo de recuperação. Intenciona-se oferecer espaços de escuta e de

compreensão de conflitos que rotineiramente inexistem nas relações. Nesse sentido, o

processo de reabilitação psicossocial do indivíduo em adoecimento mental exige que se

entenda o seu contexto em parceria com os demais sujeitos nele envolvidos - familiares,

cônjuges ou amigos – com o objetivo de envolvê-los como aliados conscientes e preparados

para enfrentar a situação com desprendimento e sabedoria.

A TCI, ao oportunizar vivências sociais de troca, evoca reflexões decorrentes de um

novo comportamento e consolida, em seus participantes, o poder de autonomia e de superação

que é característico de todo ser humano, enfatizando o poder presente nas relações e as

diversas possibilidades de se lidar com o transtorno psíquico de forma a minimizar conflitos

interiores, considerando aspectos singulares que devem ser contemplados no processo de

recuperação e reabilitação psicossocial (BARRETO, 2008).

Com base nesses pressupostos, conclui-se que é preciso ir além do plano superficial

presente nessas relações para desvendar o potencial transformador da TCI e, estimulados pela

inquietação do conhecimento gerado a partir das experiências que ela proporciona, consolida-

se a atração pela temática no sentido de investigá-la frente aos benefícios já evidenciados em

outros estudos desenvolvidos, como, por exemplo, as pesquisas de Carício (2010), Morais

(2010), Andrade e Ferreira Filha (2009), Braga (2009), Sobreira (2009), Sá (2012), dentre

outras, que reafirmam a TCI como um dispositivo transformador.

Assim, vislumbrando a ideia de que o tema a ser pesquisado, por sua natureza

complexa, não se constitui num exercício de fácil tratamento, devido a sua abordagem

multidisciplinar e suas diversas facetas, e por ser a TCI um instrumento de cuidado inovador,

porém rico em potencial, percebe-se que é necessário trazer a ciência para perto da vida,

pensar sobre seus objetivos, procurar conhecer a sua dimensão, sem esquecer o lado real, e os

vieses fragilizados que permeiam o cotidiano das políticas de saúde, sobretudo no campo da

saúde mental.

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1.2 O DESPERTAR PARA O OBJETO DE ESTUDO

Falar da Terapia Comunitária, para mim, é algo prazeroso e que entusiasma. Meu

primeiro contato com essa ferramenta de cuidado foi durante a graduação na disciplina de

Enfermagem Obstétrica, quando, em dado momento, a professora entendeu que era preciso

desenvolver uma roda de TCI com a turma. Desde então, fui “contaminada” e fascinei-me por

aquele trabalho.

A partir de então, procurei conhecer melhor a maneira como funcionava e de que

modo poderia me articular com ações que a envolvessem. Nessa busca, tive a oportunidade de

me inserir no Grupo de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental Comunitária da Universidade

Federal da Paraíba (GEPSMEC/UFPB), que explorava, sobretudo, a TCI como instrumento

de cuidado e, concomitante à minha inserção no grupo, fui contemplada com uma vaga no

Programa de Iniciação Científica (PIBIC), que investigava a temática da TCI nos Centros de

Atenção Psicossocial (CAPS).

Confesso que, a partir daquele momento, um misto de expectativa e de curiosidade

habitou meus pensamentos. A inexperiência e a imaturidade não me afligiram; algo me

sinalizava que, naquele caminho, encontraria propósitos de vida que me conduziriam a

transformações e a realizações pessoais e profissionais. Nesse sentido, os caminhos foram

sendo trilhados: meu período de vigência no Programa foi encerrado, “finalizei” minha

pesquisa, mas o encantamento pelo tema e a identificação com ele perpassaram todos os

prazos, incitando em mim o desejo de avançar e mergulhar cada vez mais profundo no oceano

polissêmico e polimórfico da TCI. Assim, visualizei no trabalho de conclusão de curso outro

grande momento para dar seguimento às minhas interpelações. Tendo em vista a possibilidade

de dar continuidade ao estudo, direcionei esforços e me aprofundei na investigação,

elucidando novos desdobramentos para o estudo já impulsionado anteriormente.

Seguindo a ordem natural dos acontecimentos, concluí a graduação, e a TCI me

acompanhou, pois a inquietação em querer trazer à tona e publicizar a efetividade dessa

abordagem terapêutica me intrigavam constantemente. Diante disso, como avançar? Sabendo

que a identificação pela temática e a crença no potencial revelador e transformador da TCI

não me deixavam estagnar, vislumbrei o Mestrado na área, trazendo-a como objeto de estudo,

porém sob outra perspectiva: a TCI no contexto de pessoas em adoecimento mental e no

contexto de seus familiares. Assim aconteceu.

Nessa conjuntura, minha inclinação para a TCI despertava também meu anseio pelo

processo de formação para que um dia eu fosse uma terapeuta comunitária, de maneira que

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pudesse continuar me aprofundando na temática e mergulhar cada vez mais profundo em um

processo de autoconhecimento. Assim, durante o Mestrado, fui agraciada com a oportunidade

de participar da formação e posso dizer, com propriedade, que a TCI foi um divisor de águas

em minha vida. Hoje me encontro comigo mesma e reflito sobre tudo o que me aconteceu ao

longo desses meus vinte e cinco anos e vejo que nada foi por acaso, porquanto tudo o que me

fez sofrer e tudo o que me fez sorrir contribuiu para me reinventar e construir a pessoa que

hoje sou: um ser inacabado e uma eterna aprendiz.

Ao longo de todos esses anos em que convivi e cresci com a TCI, resgatei valores e

potencialidades adormecidas que nem eu mesma julgava que tinha, e isso me despertou para

uma dinâmica de reflexão e aprendizado que não tem finitude, mas que se redescobre dia após

dia. Aprendi que as experiências da vida só fazem sentido e nos engrandecem quando

compartilhadas e desfrutadas no coletivo, com respeito às diferenças e com um olhar positivo

diante das incoerências e das vicissitudes sociais.

Assim, compreendendo a força da TCI e tendo acompanhado e testemunhado os

benefícios trazidos por essa abordagem, o desenvolvimento deste estudo foi norteado por

algumas nuances, conforme se verifica nas indagações abaixo:

Que mudanças ocorreram no comportamento de usuários e de seus familiares a

partir da inserção deles nas rodas de TCI?

O que usuários e familiares de CAPS aprenderam nas rodas de TCI que passaram

a utilizar como estratégia para lidar com as situações estressantes presentes em

seu dia a dia?

Qual a importância que usuários e familiares de CAPS atribuem à TCI

considerando o processo de reabilitação e inclusão social?

Na tentativa de elucidar tais indagações, foram traçados os seguintes objetivos:

1.3 GERAL

Analisar as contribuições da TCI considerando as mudanças de comportamentos,

as estratégias aprendidas e a importância que ela representa na vida de usuários e

de familiares de um CAPS.

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1.4 ESPECÍFICOS:

Identificar as mudanças de comportamento mais significativas que ocorreram na

vida de usuários e de familiares durante sua participação nas rodas de TCI;

Evidenciar as estratégias mais utilizadas por usuários e familiares para lidarem

com situações estressantes presentes no convívio entre eles;

Avaliar a importância da TCI, sob o ponto de vista dos usuários e dos familiares,

considerando o processo de reabilitação e inclusão social.

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2.1 REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA: SURGIMENTO E IMPLICAÇÕES PARA

A SAÚDE MENTAL

No Brasil, a Reforma Psiquiátrica (RP) inicia-se em meados da década de setenta, com

o movimento pela redemocratização na política. Sua reivindicação principal foi a luta em

favor dos direitos de pacientes internados em hospitais psiquiátricos, com o objetivo de

romper com o paradigma asilar, por ser um modelo que não mais satisfazia às expectativas

sociais. Durante esse período, eclodem inúmeras críticas e denúncias em se tratando do

regime político de saúde mental no Brasil frente à lógica de privatização da assistência

psiquiátrica e à precarização das condições assistenciais dispensadas à população

(MESQUITA; NOVELINO; CAVALCANTI, 2010).

Esse movimento de Reforma Psiquiátrica Brasileira origina-se do esforço dos

profissionais de saúde frente à severidade imposta pela ditadura militar. O Centro Brasileiro

de Estudos de Saúde (CEBES) e o Movimento de Renovação Médica (REME) surgem como

grandes pioneiros no processo de desenvolvimento do debate acerca das ‘práticas críticas’,

estimulando o redimensionamento na configuração do cuidar, do pensar e do agir perante a

saúde da população. O REME atuou, ainda, para garantir a ocupação dos sindicatos e das

instituições de classe que se encontravam sob o domínio, sobretudo, da classe de gestores e do

patronato (AMARANTE, 2009).

O REME também incentivou os sindicalistas, que passaram a considerar

fundamentalmente tais reivindicações como questões de cunho corporativo, assumindo uma

função importante diante do processo de reestruturação da saúde no Brasil e desempenhando

papéis de expressividade no âmbito da 8ª Conferência Nacional de Saúde e da legalização do

SUS na Constituição de 1988 (OLIVEIRA, W.F.; PADILHA; OLIVEIRA, C.M., 2011). Com

o CEBES e o REME voltados para o combate ditatorial, o campo da saúde passava a se

mobilizar com base em acusações e expressões de dissabores. Nessa perspectiva, surgiu, em

1978, a primeira manifestação categórica do movimento de RP, ou seja, o Movimento dos

Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM) (AMARANTE, 2010), sustentado por denúncias de

maus-tratos e impetuosidade direcionados aos usuários dos hospitais psiquiátricos que

compunham o corpo institucional da Divisão Nacional de Saúde Mental (DINSAM), do

Ministério da Saúde. Nesse mesmo contexto, vários profissionais do Centro Psiquiátrico

Pedro II, apreciado, na época, como o complexo hospitalar de maior importância da América

Latina, situado no Rio de Janeiro, foram demitidos. Essa expulsão desencadeou a primeira

greve na esfera pública desde o período de ditadura militar. Frente a isso, o MTSM se

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fortaleceu nacionalmente, por meio do desenvolvimento de núcleos sindicalistas em

associações comunitárias, centros acadêmicos, no REME e no CEBES (OLIVEIRA, W.F.;

PADILHA; OLIVEIRA, C.M., 2011).

No ano de 1979, ocorreu o I Congresso Nacional dos Trabalhadores em Saúde Mental,

no Instituto Sedes Sapientiae, na cidade de São Paulo. A versão final do relatório extraído

desse acontecimento reafirma o combate em favor de mudanças na saúde mental e passa a ser

um documento integrado às mobilizações sociais. No mesmo ano, o CEBES exibiu, no I

Simpósio de Saúde da Câmara dos Deputados, duas demonstrações marcantes para o setor

saúde no Brasil. A primeira tinha como conteúdo principal ‘A questão democrática na área da

saúde’, que contemplava, primariamente, a ideia de um Sistema Único de Saúde a ser

debatido nas instâncias políticas e nacionais. A segunda trazia como essência ‘A assistência

psiquiátrica no Brasil: setores público e privado’, criada pela Comissão de Saúde Mental do

CEBES do Rio de Janeiro, que denunciava as atrocidades da abordagem psiquiátrica num

contexto de grande impacto social e político (CEBES, 1980).

Ferreira de Oliveira, Padilha e Molina de Oliveira (2011, p. 589) afirmam que, nesse

contexto,

o movimento da Reforma Psiquiátrica começava a sair do campo exclusivo

da comunidade técnica e, com ele, a questão da loucura e da instituição asilar

seguiram a mesma trajetória: o debate sobre a loucura começava a sair do

interior dos hospícios e congressos profissionais para o domínio público. A

loucura e a psiquiatria deixavam gradativamente de ser objeto de interesse e

discussão exclusiva dos técnicos e alcançavam os diversos foros da

sociedade civil. A grande imprensa noticiava, com destaque e

ininterruptamente, as condições dos hospitais psiquiátricos e as distorções da

política nacional de assistência psiquiátrica. A ‘questão psiquiátrica’

tornava-se uma questão política e social.

Com o descortinar da democracia nos anos 1980, as circunstâncias políticas da

Reforma Sanitária (RS) e Psiquiátrica (RP) e suas expectativas de transformação passavam a

ser incutidas na esfera estatal. Nesse período, diante do fenômeno de mudanças que o

arraigavam, ocorreram as primeiras eleições municipais pós-ditadura, estabelecendo a

implantação constitucional de sistemas de gestão democráticos e populares, com o objetivo de

estabelecer e capilarizar propostas para a saúde mental, fundamentadas nos ideais da luta

antimanicomial e de desinstitucionalização (OLIVEIRA, 2009).

Nesse mesmo cenário, foi também admitida a 8ª Conferência Nacional de Saúde

(CNS) que, em oposição às conferências já realizadas, contou com uma representativa

participação popular e com membros de diversas entidades civis e sociais. Posterior a tal

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evento, contraiu-se, no Brasil, uma filosofia de saúde como dever do Estado e direito de todo

cidadão, que atribuía ao Estado o papel de veículo fomentador de ações e de políticas públicas

visando a melhorias na qualidade de vida da população brasileira (OLIVEIRA, 2009).

Em 1987, foi realizada a I Conferência Nacional de Saúde Mental (CNSM), cujas

propostas deveriam estar permeadas nos pressupostos regentes da 8ª CNS. A participação do

MTSM nessa conferência foi resoluta. Por consequência de inúmeros incidentes que

envolveram o Ministério da Saúde, a I CNSM avançava na perspectiva de um evento

fundamentalmente técnico e científico, negligenciando a natureza de um debate social que

discutisse os moldes da assistência psiquiátrica vigente. Entretanto, considerando a grande

representatividade de membros e defensores do MTSM, a CNSM aconteceu ancorada nos

preceitos participativos sociais e políticos (AMARANTE, 2009).

Nesse sentido, houve diversos acontecimentos, o que contribuiu para consolidar, no

Brasil, de maneira implacável, a RP. Um importante marco desse processo foi a difusão do

Projeto de Lei 3.657/89, de autoria do Deputado Paulo Delgado, que buscava redimensionar o

paradigma da assistência em saúde mental, ao propor a extinção progressiva dos manicômios

e sua substituição por instituições que funcionassem em consonância com novas práticas

assistenciais (OLIVEIRA, W.F.; PADILHA; OLIVEIRA, C.M., 2011).

Avançando ao longo dos anos, acontece, em Caracas, no ano de 1990, a Conferência

Regional para a Reestruturação da Atenção Psiquiátrica na América Latina, que deu início a

esse processo de transformação no continente sul-americano, constituindo um marco histórico

no setor de saúde mental, ao oportunizar mudanças em instâncias superiores, como o

Ministério da Saúde, por exemplo. Na ocasião, foi promulgado o documento oficial intitulado

Declaração de Caracas, que estabelecia que os países da América Latina, sobretudo o Brasil,

deveriam comprometer-se em reorganizar a assistência psiquiátrica, repensar o caráter

hegemônico dessas instituições, resguardar os direitos civis e humanos e a dignidade pessoal

ao garantir a permanência do doente mental na sociedade (OPS/OMS, 2009).

Em 1992, houve a II Conferência Nacional de Saúde Mental em Brasília. Acredita-se

que, de todos os eventos realizados até lá, aproximadamente, 20.000 cidadãos demonstraram

envolvimento com a causa. Essa conferência fixou, a partir daquele momento, a luta pela

saúde mental como uma promessa que deveria ser efetivamente inserida no planejamento das

ações governamentais. Esse trajeto de repercussão nacional culminou na publicação da Lei

10.216/01, também designada como lei da Reforma Psiquiátrica, alvo de polêmicas por ter

sido abolida de seu texto a ideia da progressiva extinção manicomial (OLIVEIRA, 2009).

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Em 2005, a Declaração de Caracas é retomada por meio de um documento nomeado

de “Princípios Orientadores para o Desenvolvimento da Atenção em Saúde Mental nas

Américas”, que intencionava avaliar conquistas e resultados alcançados desde 1990

(BRASIL, 2005).

Posteriormente à avaliação, constatou-se a existência de inúmeros avanços, assim

como a de grandes dificuldades, no entanto se reconheceu a validade dos princípios

constantes na Declaração de Caracas, no que dizia respeito à proteção dos direitos humanos,

da dignidade e da cidadania dos portadores de transtornos mentais, além da grande

necessidade de se investir em redes de serviços substitutivos aos hospitais psiquiátricos.

Nesse documento, conhecido como a “Carta de Brasília”, os organizadores advertem, ainda,

para a crescente vulnerabilidade psicossocial e para as distintas formas de violência,

convocando os diversos autores envolvidos a implementarem os preceitos éticos, políticos,

técnicos e assistenciais contemplados na Declaração de Caracas (BRASIL, 2005).

Em se tratando das primeiras experiências de reorganização do modelo assistencial no

âmbito da saúde mental brasileira, Nicácio (1994, p.86) enuncia:

Como marcos práticos de reversão do modelo manicomial, cabe citar a

intervenção na Casa de Saúde Anchieta, em Santos, o Centro de Atenção

Psicossocial Dr. Luís da Rocha Cerqueira, ambos localizados em São Paulo,

e o Centro Comunitário de Saúde Mental de São Lourenço do Sul, Rio

Grande do Sul, conhecido como "Nossa Casa". A intervenção na Casa de

Saúde Anchieta, em Santos, em 1989, é considerada um marco na história da

psiquiatria brasileira, por se tratar de uma experiência inovadora, em que

ocorreu uma intervenção médico-legal num asilo. Essa pode ser considerada

a primeira experiência concreta de desconstrução do aparato manicomial no

Brasil, e de construção de estruturas substitutivas.

Esse marco influenciou sobremaneira a criação dos serviços substitutivos aos hospitais

psiquiátricos, como, por exemplo, as redes de atenção em saúde mental, os Centros de

Atenção Psicossocial (CAPS), as oficinas terapêuticas, a inserção de leitos psiquiátricos em

hospitais gerais, as residências terapêuticas e outros programas que deveriam dispor de

serviços adequados às necessidades de cada local. Uma série de ações passou a ser facilitada

pelas portarias ministeriais, no sentido de ressarcir a gestão dos municípios por meio da

alocação de recursos para modalidades alternativas à internação psiquiátrica, sincronizando os

serviços em saúde mental em consonância com o modelo assistencial (HIRDES, 2009).

Verifica-se, portanto, que a RP, no Brasil, estruturou-se basicamente em duas fases: a

primeira, de 1978 a 1991, constituiu uma crítica ao modelo hospitalocêntrico, enquanto a

segunda, de 1992, à contemporaneidade, afirmando-se pela implantação de uma rede de

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serviços extra-hospitalares. Esse movimento foi estimulado pelos pensamentos do médico

italiano Franco Basaglia, que assumia postura crítica frente à psiquiatria convencional e

hospitalar e se opunha ao regime de isolamento do “alienado”, porquanto defendia que o

indivíduo em adoecimento mental deveria voltar ao seu convívio social e familiar. Devido a

isso, surgiram discussões que tratavam da humanização e da desinstitucionalização desses

sujeitos em favor da reinserção social (MESQUITA; NOVELINO; CAVALCANTI, 2010).

Nessa perspectiva, um cenário ideal para o progresso da atenção em saúde mental foi

impulsionado pela aquisição do sentido de desinstitucionalização e pelos desdobramentos que

vêm tomando as práticas que permeiam sua implementação. A compreensão desse conceito é

complexa, devido à existência objetiva e subjetiva de impeditivos impostos à sua adequação.

Portanto, é fundamental repensar os modos pelos quais tal concepção vem sendo trabalhada e

interpretada, para que, de fato, esse conceito possa ser aplicado a partir de sua capacidade real

e potencial, com vistas a consolidá-lo como uma importante práxis em saúde mental

(OLIVEIRA, W.F.; PADILHA; OLIVEIRA, C.M., 2011).

2.2 DO MODELO HOSPITALOCÊNTRICO À DESINSTITUCIONALIZAÇÃO:

PERPASSANDO ESPAÇOS INSTITUCIONAIS

O termo desinstitucionalização, segundo Venturini (2010), é de origem anglo-saxã e,

normalmente, pressupõe a superação de “instituições totais”, definidas por Goffman (1987)

como instituições fechadas que trabalhavam com internações, onde um grupo de pessoas

numericamente representativo vivia internado em tempo integral.

Em 1975, o National Institute of Mental Health apresenta os parâmetros de

reconhecimento desse processo de desinstitucionalização e, em 1979, na Medline da National

Library of Medicine de Bethesda, nasce um dos mais creditados conceitos: cuidar de pessoas

no território, em vez de em um espaço institucional. No início, a atenção fica centralizada

apenas na transposição da instituição do manicômio, mas, posteriormente, amplia-se para

todas as práticas que se articulam a esse movimento (PIRELLA, 1999).

Trata-se de uma nova maneira de compreender a saúde e a doença, que ancora suas

origens na luta pelos direitos civis dos anos 1960-70, apoia-se em um rico passado científico e

filosófico e encontra significativa fundamentação em determinadas experiências

internacionais. Tais experiências desestruturam radicalmente a noção de cronicidade e de

irrecuperabilidade do paciente psiquiátrico, impondo força e exigência em favor de mudanças

que envolvem curador e curado (PIRELLA, 1999).

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Para Venturini (2010), a desinstitucionalização não representa a reforma psiquiátrica

(nem a italiana, nem a brasileira), embora a reforma abra precedentes para muitas

características nela envolvidas; a desinstitucionalização distingue-se verdadeiramente da

desospitalização; não se trata de reabilitação psicossocial nem se resume à antipsiquiatria.

Extrapolando uma ideia ou uma adaptação, a desinstitucionalização define-se como algo que

está inserido no crescimento de um ser como pessoa.

Na real proposta de desinstitucionalização, o paciente é, efetivamente, o protagonista

da cura: contempla os pontos de força e de fraqueza particulares, as vivências e as

experiências traumáticas de sua vida pessoal; mobiliza estratégias importantes para sua vida,

até mesmo em redes de sentido fragilizadas e temporárias. Em geral, proporciona-se ao

paciente o valor da competência adquirida com base na própria experiência (VENTURINI,

2010).

A desinstitucionalização proporciona a “retomada subjetiva” da pessoa (fala-se da

pessoa, e não, do “paciente”, nem do “cliente”, nem do “usuário”), constrói dialeticamente a

definição de doença, rompendo a tradicional dicotomia entre o olhar do paciente e do médico;

retifica o narcisismo e as experiências pedagógicas atreladas ao ato de cuidar, minimiza

julgamentos profissionais frente ao tratamento; representa um redimensionamento das

finalidades de cura, não mais como reabilitação ou redução do dano, mas como bem-estar e

satisfação para as pessoas, e redireciona o conceito de responsabilidade, visto que, em

Psiquiatria, a responsabilidade é voltada somente para o médico, enquanto que, na “retomada

subjetiva”, é do próprio usuário a responsabilidade por si mesmo (VENTURINI, 2009).

Venturini (2010, p. 143) destaca que,

Tradicionalmente, a cura é considerada apenas a partir da utilidade que ela

oferece. Seu valor se reduz à produção de um resultado. Mas o sofrimento e

a doença provocam uma alteração tão profunda que não é suficiente intervir

com um simples ato técnico-reparador: é necessário encontrar um novo

equilíbrio para a existência. Como consequência, o verdadeiro significado da

cura – o “primeiro dever do médico” - se funda na capacidade do curador de

aderir a uma experiência global, se baseia na sua disponibilidade para

participar, com intensidade profissional e emocional, do evento existencial

que investe o paciente.

Nesse contexto, a cura se torna um “diálogo” entre os sujeitos, cujas palavras não

referenciam um saber acadêmico e institucional ou uma metalinguagem, mas um saber prático

inerente à subjetividade das pessoas. O cuidado frente ao sintoma, componente revelador de

como e onde se orientar na linguagem da saúde, é, sobretudo, o cenário onde se deve

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acontecer o diálogo. A cura, mais do que um despertar para a consciência, é uma investigação

que se fundamenta na prática de um poder social oferecido ao sujeito e experimentado

concretamente em seu cotidiano. Nas palavras de Agostino Pirella (1999), é exatamente na

passagem do “perceber-se” do paciente (através do pensamento) para seu “realizar-se”

(através da ação) que se constitui o fundamento da desinstitucionalização cumprida

(VENTURINI, 2009).

Com base no exposto, visualiza-se que, no Brasil o processo de RP vigente encontra-

se ancorado fundamentalmente nesse processo de desinstitucionalização, o qual descortina

distintas práticas e abordagens para com a atenção em saúde mental.

Amarante (2010, p. 94) afirma que

os projetos de reforma não são homogêneos e o que efetivamente demarca

uma real distinção entre os projetos de reforma, é a forma do lidar prático e

teórico da desinstitucionalização, conceito esse que sofre metamorfose

substancial e que abre novas possibilidades para o campo da reforma.

Amorim e Dimenstein (2009) tratam o processo de desinstitucionalização como um

“desmanche” de concepções e práticas psiquiátricas que cristalizam o movimento de RP e a

política de saúde mental no Brasil, influenciadas por ideias trazidas da Psiquiatria democrática

italiana. Nessa perspectiva, o trabalho da RP brasileira é impulsionado pela quebra da

realidade manicomial e transpõe obstáculos no sentido físico, com a consolidação de novas

realidades apoiadas em bases epistemológicas, sociais e políticas, de modo a facilitar

mudanças em um regime cultural que reforça a violência, o preconceito, a discriminação e o

isolamento da loucura (AMORIM; DIMENSTEIN, 2009).

Assim, evoca-se a necessidade de desconstruir os moldes psiquiátricos vigentes que,

para Rotelli, Leonardis e Mauri (2001), “separavam um objeto científico, a doença, da

existência global complexa e concreta dos pacientes e do corpo social”. Para o mesmo autor, a

primeira medida a ser adotada consistiria no desvio da busca pela cura, direcionando tal

processo para estabelecer uma “reprodução social do paciente”, por meio da utilização dos

espaços coletivos de convivência livre.

Para Hirdes (2009), a desinstitucionalização vai além de limites estruturais e físicos,

pois assume uma conotação muito mais abrangente que apenas transferir o foco da atenção do

hospital do manicômio para a sociedade. Enquanto esse existir como realidade concreta,

espera-se que as ações o perpassem e o extingam, porém apenas isso não é suficiente. Rotelli

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et al. (1992) entendem que é o conjunto, o todo que é necessário desmontar

(desinstitucionalizar), para que haja o contato efetivo com o paciente na sua dimensão doente.

A desinstitucionalização deve ser visualizada como um trabalho prático de mudanças

que caminhem na perspectiva de romper com o modelo clínico, de reconstruir a possibilidade-

probabilidade, de transferir a atenção do processo de “cura” para a “invenção de saúde”, de

construir e de implantar uma nova realidade política em saúde mental, de dar ênfase ao

trabalho terapêutico, de implementar estruturas e serviços alheios à internação manicomial, de

fixar um modelo dinâmico e transformador e de promover mudanças nas relações de poder,

envolvendo instituição e sujeito e, sobretudo, de investir menos em recursos materiais e

insumos e mais nas pessoas (HIRDES, 2009). Nesse sentido, a atenção em saúde mental passa

a adquirir um novo formato, aquele que extrapola o princípio biológico, hospitalocêntrico e

regulador e que se fortalece à medida que seus sujeitos passam a contar com espaços

socializadores e inclusivos.

Desinstitucionalizar, portanto, transpõe os limites da desospitalização, pois incorpora

em seus objetivos não apenas a construção e a implantação de serviços extra-hospitalares e a

extinção da estrutura manicomial, mas intenciona expandir e consolidar uma rede de serviços

adaptados às distintas realidades territoriais, compostas por dispositivos inovadores de

cuidado, como, por exemplo, as Unidades Básicas de Saúde (UBS), os Centros de Atenção

Psicossocial (CAPS), os serviços de pronto-atendimento, os serviços de residências

terapêuticas (SRT), os postos de saúde, dentre outros.

2.3 OS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS) E O

REDIMENSIONAMENTO DA ABORDAGEM EM SAÚDE MENTAL

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) surgem no sentido de destinar outro olhar

para a pessoa em sofrimento psíquico, incorporar o paradigma da reabilitação psicossocial e

compreendê-lo com uma visão ampliada de saúde que considera o indivíduo em seus âmbitos

pessoal, social e familiar, ao trabalhar na perspectiva de reinserir o sujeito na sociedade.

O primeiro CAPS do Brasil foi o Centro de Atenção Psicossocial Professor Luiz da

Rocha Cerqueira, conhecido como CAPS Itapeva, criado em março de 1987, no município de

São Paulo, e representa a efetiva implementação de um novo modelo de atenção em saúde

mental devido à expressiva fração de doentes mentais (psicóticos e neuróticos graves)

atendidos na rede pública. É constituído por propostas que visam superar os limites

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evidenciados pelo binômio ambulatório/hospital psiquiátrico, no processo de tratamento e

reabilitação de sua clientela (ONOCKO-CAMPOS, 2006).

Contemplado no contexto político da redemocratização do país e nas lutas pelo

redimensionamento dos marcos conceituais, das formas de atenção e de financiamento das

ações que se fortaleceram a partir do final da década de 1980 na América Latina e no Brasil, o

CAPS Luiz da Rocha Cerqueira, em conjunto com os Núcleos de Atenção Psicossocial

(NAPS), inaugurados no ano de 1989, em Santos, era a referência definitiva para a criação

dos serviços substitutivos ao manicômio no Brasil (ONOCKO-CAMPOS, 2006).

O compromisso desses serviços e de cada cidadão é o de libertar a loucura do

enclausuramento e do isolamento em que vivem. Parte-se do princípio de perceber que a

"loucura" não está só no outro e que, à medida que é negada, são excluídas do convívio social

as pessoas que dela sofrem (MALAVAZI, 2010).

Para o Ministério da Saúde (BRASIL, 2005, p. 27),

os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), entre todos os dispositivos de

atenção à saúde mental, têm valor estratégico para a RP brasileira. É o

surgimento desses serviços que passa a demonstrar a possibilidade de

organização de uma rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico no país. É

função dos CAPS prestar atendimento clínico em regime de atenção diária,

evitando assim as internações em hospitais psiquiátricos; promover a

inserção social das pessoas com transtornos mentais através de ações

intersetoriais; regular a porta de entrada da rede de assistência em saúde

mental na sua área de atuação e dar suporte à atenção à saúde mental na rede

básica.

O processo de implantação dos CAPS vem sendo estimulado pelo Ministério da

Saúde, haja vista que o quantitativo desses centros mais que dobrou nos últimos anos e foram

criadas portarias para regulamentar as ações de financiamento e qualificar a assistência,

conforme seguem (BRASIL, 2007):

Portaria nº 224 (1992): Regulamenta todos os serviços de saúde mental;

Portaria nº 336 (2002): Estabelece CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPS i II e

CAPS ad II;

Portaria nº 251 (2002): Estabelece diretrizes e normas para a assistência hospitalar

em Psiquiatria, reclassifica os hospitais psiquiátricos, define a estrutura, a porta de

entrada para as internações psiquiátricas na rede do SUS e dá outras providências;

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Portaria nº 052 (2004): Institui o Programa Anual de Reestruturação da

Assistência Psiquiátrica Hospitalar no SUS;

Portaria nº 245 (2005): Destina incentivo financeiro para a implantação de

Centros de Atenção Psicossocial e dá outras providências.

Os CAPS destinam-se ao atendimento de pessoas com transtornos mentais severos e

persistentes e atuam na perspectiva da territorialidade, ao trabalharem características, saberes

e particularidades reais da comunidade, que propõem ações, apresentam demandas e podem

participar ativamente do processo de construção de objetivos comuns. Tais serviços

encontram-se regulamentados pela Portaria Ministerial GM nº 336, de 19 de fevereiro de

2002, e vêm crescendo progressivamente em termos numéricos, de modo que, em

levantamento realizado pelo Ministério da Saúde, até dezembro de 2009, o Brasil contava

com um total de 1.326 CAPS, distribuídos por todo o país, e o estado da Paraíba foi o

primeiro estado no ranking nacional em número de CAPS, a cada 100.000 habitantes

(CAPS/100.000 habitantes), e que dispõe de 68 serviços que integram ações voltadas para

clientelas específicas (CONFERÊNCIA..., 2010).

Inseridos no contexto de saúde mental e no âmbito da coletividade, os CAPS devem

oferecer acesso integral e resolutivo na assistência prestada, incorporar os diversos níveis de

atenção (primário, secundário e terciário) em um único corpo e impulsionar reflexões acerca

do modelo assistencial e clínico, apresentando associações entre intersubjetividade, formação

profissional, gerenciamento e clínica (ONOCKO-CAMPOS, 2006).

De maneira geral, eles se caracterizam pela utilização intensiva de um conjunto amplo

e complexo de tecnologias terapêuticas e práticas psicossociais dirigidas para manter o sujeito

em adoecimento mental na comunidade. Todavia, cabe pontuar que é uma vivência permeada

por obstáculos, dificuldades, incertezas e sofrimentos (PIMENTA; ROMAGNOLI, 2008).

Existem cinco diferentes tipos de CAPS, que variam de acordo com sua clientela, a

densidade populacional e o horário de funcionamento (BRASIL, 2002):

1. CAPS I - Funciona como um serviço aberto para atendimento diário. Trata-se de

um equipamento importante para municípios de pequeno porte, ou seja, com

população entre 20.000 e 70.000 mil habitantes, e devem oferecer assistência a

todas as pessoas com transtornos mentais severos durante o dia;

2. CAPS II - Funciona como um serviço aberto para atendimento diário de adultos

com transtornos mentais severos e persistentes. Trata-se de um equipamento

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importante para municípios com população de 70.000 e 200.000 mil habitantes e

atendem durante o dia;

3. CAPS III – É um serviço aberto para atendimento diário e noturno, que funciona

vinte e quatro horas, durante os sete dias da semana, e oferece assistência a adultos

com transtornos mentais severos e persistentes. Trata-se de um equipamento

importante em cidades com mais de 200.000 habitantes;

4. CAPS i – É um serviço voltado para o atendimento de crianças e adolescentes com

transtornos mentais, em municípios de médio porte, que funciona apenas durante o

dia. Constitui-se como referência para cidades com população de aproximadamente

200.000 habitantes ou outros critérios, a depender de decisões administrativas;

5. CAPS ad – Funciona como um centro voltado para usuários de álcool e outras

drogas, para atendimento diário à população com transtornos decorrentes do uso de

substâncias psicoativas. Localizados geralmente em cidades de médio porte, apenas

durante o dia. Apresentam capacidade operacional para atuar em municípios com

população superior a 70.000 habitantes.

Os CAPS contam com o apoio de equipes multiprofissionais, com diversas atividades,

e oferecem atendimentos grupais e individuais, atividades físicas, oficinas terapêuticas,

atividades lúdicas (peças teatrais, artesanatos, entre outros), além da terapêutica

medicamentosa. Cabe enfatizar, ainda, a participação da família nesses espaços como

componente fundamental do plano terapêutico, oferecendo aos familiares livre acesso ao

serviço (MIELKE et al., 2009).

Os CAPS, ao oferecer um leque de atividades voltadas para os usuários e seus

familiares, garantem o atendimento, o tratamento e o acompanhamento com vistas à inclusão

social e ao resgate da cidadania. Alves (2006) enfatiza que a diversificação de programas é

essencial para realizar o acolhimento dos usuários de forma integral e que, com ofertas

variadas e diversificadas de possibilidades, reduz-se consideravelmente a tentativa de

selecionar as atividades.

Rauter (2000, p. 268) assevera que

os CAPS devem produzir territórios existenciais que possibilitem reinventar

a vida em seus aspectos mais cotidianos, pois, é do cotidiano,

principalmente, que se encontram privados os chamados doentes mentais.

Deseja-se que as atividades possam funcionar como catalisadores de

territórios existenciais nos quais os usuários possam reconquistar ou

conquistar o seu cotidiano.

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Em estudo recente realizado por Kantorksi (2011), constatou-se a importância do

aparato terapêutico disposto nos CAPS, por meio de atividades de ensino, oficinas de

alfabetização, trabalhos manuais (tricô, crochê, pintura em tecido, desenho em pintura e

bordados), grupos de conversas, entre outras atividades grupais. O estudo constatou que a

inserção dos portadores de transtorno psíquico na escola mostra-se efetiva como uma das

estratégias em favor da transformação assistencial atual, uma vez que os usuários dos serviços

passam a ser encarados como indivíduos que têm potencialidades e capacidades para uma

vida autônoma, restabelecendo sua saúde mediante a (re)inclusão social.

O trabalho fora do CAPS, que envolve a comunidade e a família do usuário,

desenvolve ações, como passear com os usuários, ir ao cinema, participar de festas, portanto,

é fundamental para reduzir o estigma em relação às pessoas em sofrimento psíquico. A

elaboração, a organização e a busca de recursos necessários para a realização de eventos,

passeios e festas geram um espaço rico de participação de todos, voltados para a mesma

tarefa, colocando profissionais, usuários e familiares lado a lado (KANTORSKI, 2011).

Dessa forma, as oficinas e os grupos terapêuticos contribuem para o propósito da

inclusão social por serem consideradas atividades que oportunizam o encontro de portadores

de sofrimento psíquico, promovendo o exercício da cidadania, a expressão de liberdade e a

convivência com diferentes espaços e estratégias terapêuticas de tratamento. As oficinas e as

atividades grupais são constituídas por princípios específicos, ou seja, a partir da reinserção

social das pessoas em sofrimento psíquico em seu meio social, respeitando-se a singularidade

de cada um, suas peculiaridades e regionalidades (LAPPANN-BOTTI, 2004).

Assim, salienta-se que a assistência em saúde mental está orientada pela mudança do

paradigma asilar para o modo psicossocial, em que a concepção do trabalho na área requer

acolhimento, escuta terapêutica, projetos terapêuticos individualizados, reabilitação

psicossocial e interdisciplinaridade nos serviços substitutivos que têm, entre suas metas, a

desospitalização, a desmedicalização e a implicação subjetiva e sociocultural do indivíduo,

que é entendido no seu grupo familiar e em seu território (COSTA-ROSA, 2000).

Nessa perspectiva, insere-se a Terapia Comunitária Integrativa (TCI), como uma

estratégia inovadora a ser utilizada nesses espaços, que coincide com um modelo de atenção à

saúde de base comunitária, em que se prioriza a prevenção do adoecimento ao oferecer

espaços de diálogo, de resgate da autonomia e da dignidade humana. Nesse sentido, a TCI

tem se mostrado como uma tecnologia de cuidado que propõe medidas de promoção de saúde,

de prevenção ao adoecimento psíquico e que forma redes sociais importantes para o

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enfrentamento de problemas que acometem diretamente a saúde mental individual e coletiva

(FERREIRA FILHA; CARVALHO, 2010).

Diante do exposto, parte-se da premissa de que a TCI traz, em seu contexto,

informações sobre a relação dialética e a possibilidade que as pessoas com transtornos

mentais têm de se apropriar de competências que, até então, estão ocultas, obscurecidas pela

cultura forjadora de representações preconceituosas e dualistas do “ser x doença”.

2.4 ORIGEM E APLICABILIDADE DA TERAPIA COMUNITÁRIA INTEGRATIVA

(TCI)

Barreto (2008) apresenta o significado do termo terapia como uma palavra de origem

grega - therapeia – que significa acolher, ser caloroso, servir e atender. Enquanto que o termo

comunidade é pensado como um conjunto formado por diferentes pessoas, que mantém uma

organização informal, com a existência de contatos diretos e com uma predominância de

interesses comuns.

Na perspectiva do presente estudo, a palavra comunitária, segundo Barreto (2008),

designa pessoas que têm características em comum: exclusão, sofrimento e apoio recíproco.

Tais pessoas trazem consigo histórias de sofrimentos e de luta para superá-los.

A TCI nasceu no ano de 1987, na comunidade do Pirambu, em Fortaleza/CE, e foi

criada pelo Prof. Dr. Adalberto Barreto, docente do Curso de Medicina Social da

Universidade Federal do Ceará, psiquiatra, teólogo e antropólogo, com a intenção de

solucionar, a princípio, as necessidades de saúde daquela comunidade (BARRETO, 2008).

Na Paraíba, a TCI aparece no ano de 2004, a partir de um Projeto de Extensão

desenvolvido no Bairro de Mangabeira, especificamente na USF Ambulantes, sob a

coordenação de docentes do Programa de Pós-graduação em Enfermagem (PPGEnf) e do

Departamento de Enfermagem de Saúde Pública e Psiquiatria (DESPP), da Universidade

Federal da Paraíba (UFPB). Ela contribuiu para reforçar a criação e o fortalecimento de

vínculos entre os profissionais da equipe de saúde e entre profissionais e comunidade. Esse

processo de implementação das rodas de TCI repercutiu positivamente sendo essa

posteriormente reconhecida como estratégia exitosa e conferiu ao município de João Pessoa a

honra de dispor de um polo formador em TCI (SÁ, 2012).

Nessa conjuntura, na gestão compreendida entre os anos de 2005 a 2008, a TCI se

consolidou como uma tecnologia leve de cuidado, que coopera para fortalecer uma rede de

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serviços integralizada e de qualidade, com vistas a promover uma interface entre atenção

primária e saúde mental (CARÍCIO, 2010).

A partir de então, o plano político-estratégico, intitulado “A Construção do Cuidado na

Saúde em João Pessoa/PB (2005-2010)”, executado pela gestão municipal, passou a

institucionalizar a TCI como um instrumento a ser utilizado, sobretudo por profissionais da

rede de saúde do município, que primam pela capacitação de gestores da SMS/JP,

profissionais dos CAPS e da ESF, com o objetivo de proporcionar novas abordagens para a

práxis em saúde (SECRETARIA..., 2010).

Esse processo de institucionalização da TCI se deu a partir de uma parceria

estabelecida entre o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Humano (IBDH), a Universidade

Federal da Paraíba (UFPB) e a Secretaria Municipal Saúde (SMS) de João Pessoa - PB. A

turma pioneira de terapeutas comunitários de João Pessoa formou-se no ano de 2007 e

representou um quantitativo de sessenta e três trabalhadores. Já no ano de 2008, por meio de

financiamentos oriundos do Projeto de Educação Permanente em Saúde do Ministério da

Saúde, mais quarenta e sete profissionais participaram do curso de formação em TCI

(SECRETARIA..., 2010). Ainda no ano de 2008, a TCI foi alvo de discussões por parte do

Ministério da Saúde, que aprovou, na IV Conferência Nacional de Saúde Mental Intersetorial,

realizada em 2010, a TCI como estratégia incorporada às Práticas Integrativas e

Complementares inseridas na atenção primária em saúde (CONFERÊNCIA..., 2010).

Naquele contexto, a abordagem em saúde mental comunitária, desenvolvida,

inicialmente, no estado do Ceará (considerado o precursor da TCI), passou a se difundir de

forma progressiva para outros estados brasileiros e foi oficialmente incorporada, no ano de

2008, pelo Ministério da Saúde como uma estratégia de promoção da saúde e de prevenção do

adoecimento, para os serviços da rede primaria, sobretudo, para a ESF (FERREIRA FILHA et

al, 2009).

A TCI apresenta distintos modos de aplicabilidade e atua como instrumento de atenção

primária que trabalha a prevenção e o agravo de problemas, além de se mostrar útil na

abordagem de situações-problemas já instaladas, razão por que seu desenvolvimento é

estimulado em grupos específicos, sobretudo, nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS),

tendo em vista o processo de reabilitação e de inclusão social dos usuários em sofrimento

psíquico como uma questão fundamental, em que a TCI se apoia nesse tipo de instituição.

Pode-se dizer que essa abordagem é uma metodologia facilitadora da autonomia, porquanto

potencializa os recursos individuais e coletivos, na medida em que se apropria das qualidades

e das forças existentes em potência nas relações sociais. Assim, pretende ser um instrumento

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de construção de redes de apoio social. É considerada uma estratégia de apoio social ao passo

que as pessoas tendem a adoecer menos ao saber que contam com um suporte emocional

contínuo, uma vez que se reúnem, socializam seus problemas, são valorizados em suas

particularidades e contam com a sensibilização do grupo (GRANDESSO, 2007).

Na TCI, partilham-se experiências de vida e saberes, por meio da escuta de histórias

que ali são relatadas, onde todos se tornam corresponsáveis por buscar soluções e superar os

desafios do cotidiano, acolher e ressignificar o sofrimento, o que dá origem a uma nova leitura

que o transforme em crescimento. Nesse sentido, busca-se também o resgate da autoestima

(MARCHETTI, 2003).

Cabe enfatizar que a TCI, como proposta de cuidado, oportuniza o contato entre

pessoas de modo não hierarquizado, ou seja, todos são igualmente importantes e responsáveis

como sujeitos inseridos naquele contexto, no sentido de buscar soluções possíveis e coletivas

em consonância com as crenças, as experiências e as competências de cada participante, além

de favorecer o cuidado com a autoestima e valorizar questões culturais da família e da

comunidade, já que seus participantes compartilham sentimentos e emoções de forma a não

serem julgados. Essa prerrogativa é fundamental, ao se compreender que as pessoas, quando

se sentem repreendidas e censuradas, podem desenvolver quadros psíquicos e somatizações

prejudiciais (BARRETO, 2008).

Considerando, portanto, o desenvolvimento metodológico da TCI, Barreto (2008)

assegura que ela apoia-se em uma sequência de passos que são adotados ao longo da

operacionalização das rodas de TCI, de modo que aquele momento aconteça da forma mais

organizada e harmônica possível, respeitando as seguintes fases:

A do acolhimento, em que o terapeuta acomoda os participantes em um grande

círculo, para que todos possam olhar para a pessoa que está falando. É iniciada a

terapia com o clima de companheirismo. Em seguida, são informadas as regras da

terapia: fazer silêncio, falar da própria experiência, não dar conselhos nem julgar,

sugerir uma música, piada, poesia ou conto que tenha alguma ligação com o tema;

A da escolha do tema, quando o terapeuta estimula os participantes a falarem

sobre aquilo que os está fazendo sofrer. Logo depois, é feita uma síntese dos

problemas apresentados para que o grupo escolha o tema a ser aprofundado;

A da contextualização, em que são obtidas mais informações sobre o assunto

escolhido. Para facilitar a compreensão, é permitido lançar perguntas para

esclarecer o problema, a fim de que seja compreendido em seu contexto. Essas

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perguntas ajudam a pessoa que está falando do seu problema a refletir sobre a

situação vivida;

A da problematização, em que o terapeuta comunitário apresenta o MOTE - a

pergunta-chave que leva o grupo a refletir, e a pessoa que expôs o problema fica

em silêncio. As pessoas que vivenciaram situações que tem a ver com o tema do

mote passam a refletir sobre a experiência vivida e como superou tal situação.

Esse é o momento em que emergem as estratégias de enfrentamento utilizadas

pelas pessoas e se evidencia o processo resiliente, e o participante que teve seu

problema escolhido elege as estratégias mais adequadas a serem aplicadas na

resolução de seu problema;

A da conclusão/encerramento, quando todos dão as mãos em um grande círculo,

com rituais próprios, como cantos religiosos ou populares, orações, abraços e o

relato de cada um sobre a experiência adquirida naquele encontro. Essa fase é

considerada um momento sagrado, visto que se constroem e se solidificam as

redes sociais, a teia que une cada indivíduo da comunidade. O término da sessão é

o começo para a utilização dos recursos de que as pessoas e a comunidade

dispõem para resolver seus problemas.

A TCI, como ferramenta de cuidado, está fundamentada também em cinco pilares

norteadores: Pensamento Sistêmico, Pragmática da Comunicação de Watzlawick,

Antropologia Cultural, Pedagogia de Paulo Freire e Resiliência (BARRETO, 2008).

O Pensamento Sistêmico destaca a questão de que as crises e os problemas

individuais só serão solucionados se compreendidos como inseridos em um contexto maior,

que contemple o biológico, o psicológico e a sociedade. Isso implica dizer que o indivíduo é

parte integrante do problema e responsável por sua solução, pois, de acordo com Barreto

(2008), tudo está relacionado, cada aspecto articula-se com outro, as pessoas representam um

todo. Para enfrentar a vida com prazer e buscar soluções para os problemas pessoais,

familiares, comunitários e sociais, é necessário que os sujeitos sejam conscientes de que

fazem parte globalmente do problema.

Fritjof Capra (1995), em seu livro O Ponto de Mutação, mostra como as teorias da

Física moderna anunciaram uma série de transformações nas ciências e uma revolução nas

concepções de mundo, princípios e valores existentes nos contextos sociais. O autor afirma

que “qualquer sistema de assistência à saúde, incluindo a medicina ocidental moderna, é um

produto de sua história e existe dentro de um contexto ambiental e cultural” (p. 299).

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Essa afirmação assinala que os seres humanos não são visualizados exclusivamente

como pessoas isoladas, visto que suas experiências de vida e interações sociais, inclusive as

vulnerabilidade físicas e psíquicas, são produtos de comunicações pertencentes a uma

dinâmica de integração, e distingue, em sua obra, dois gêneros de holismo: a) no primeiro, os

indivíduos são tidos como sistemas vivos, onde os elementos que o compõem encontram-se

interligados e interdependentes e b) no segundo, as pessoas são componentes de sistemas

ainda maiores e interagem constantemente com o meio ambiente físico e social,

continuamente influenciadas, mas também podem atuar sobre ele e modificá-lo (CAPRA,

1995). Nesse sentido, a TCI comunica-se com as ideias de Capra (1995), porque consideram

as circunstâncias e as problemáticas sociais como componentes de uma rede concebida por

meio de comportamentos e de decisões que se conectam em um ciclo de interdependência.

A Pragmática da Comunicação de Watzlawick enfatiza a comunicação como o

elemento que une os indivíduos socialmente e que todo comportamento é determinado por

uma comunicação, que pode se processar de forma verbal e não verbal, extrapolando as

palavras ou simplesmente os sinais emitidos. Watzlawick et al. (1993, p.13) enfatizam que “a

comunicação é uma condição sine qua non da vida humana e da ordem social, tratando-se de

um processo de transmissão de informação, seja numa dimensão biológica, tecnológica ou

social, que integra diferentes contextos, realidades e sociedades/culturas”.

Todo comportamento tem um valor de comunicação. Quando as pessoas falam,

oferecem de si uma definição, um conceito, ou seja, evidenciam a forma como se veem. Nesse

processo de comunicação, tanto o emissor quanto o receptor assumem lugar de importância.

Portanto, a base da comunicação consiste em momentos relacionais e interacionais

(BARRETO, 2008).

A comunicação também é compreendida como uma atividade educativa, visto que é

capaz de se adequar à disposição mental dos que se comunicam. Como as pessoas necessitam

estar constantemente se relacionando com o mundo, com as informações e com as notícias,

dispõem da comunicação como facilitadora da interação e da construção social. Nessa

perspectiva, a Pragmática da Comunicação é necessária na TCI, porque é através dela que se

estabelecem os contatos entre as pessoas e, por conseguinte, a formação dos vínculos. Por isso

é preciso se desenvolver uma comunicação num contato face a face, isento de julgamentos de

qualquer natureza (BRAGA et al, 2009).

A Antropologia Cultural, segundo Hoebel e Frost (2006, p. 7) é o “ramo da

Antropologia que trata das características do comportamento civilizado nas sociedades

humanas passadas, presentes e futuras”. Essa abordagem chama a atenção para as diferentes

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culturas existentes e é um elemento de referência fundamental na identidade individual e

coletiva. É a partir dessa referência que os indivíduos se encontram, aceitam-se e assumem

sua identidade.

Ruth Benedict, em seu livro O crisântemo e a espada (2002), traz a metáfora da

cultura, comparando-a com uma lente utilizada pelos seres humanos como um instrumento

que viabiliza sua visão de mundo. Sujeitos de diferentes culturas possuem e utilizam lentes

distintas e, portanto, têm noções divergentes das circunstâncias com as quais se deparam. A

maneira de enxergar o mundo, as observâncias morais e valorativas, os inúmeros

desempenhos sociais e os comportamentos corporais são constructos de uma herança cultural,

ou seja, o produto da intervenção de determinada cultura.

Laraia (2009) chama a atenção para o fato de que a herança cultural das pessoas é

construída durante o avançar das gerações, e que essa mesma herança é responsável por

condicionar os indivíduos a se comportarem de maneira depreciativa frente às atitudes de

pessoas que agem diferentemente dos padrões aceitos por grande parte da comunidade e por

aprovar/aceitar determinadas atitudes humanas, em que a cultura é um elemento que constrói

e solidifica as relações existentes entre pessoas e comunidades.

Hoebel e Frost (2006, p. 27) trazem a seguinte definição de cultura:

A cultura ideal consta dos padrões de comportamento de um povo expressos

verbalmente, os quais podem ou não ser traduzidos em comportamento

normal. As normas ideais são geralmente selecionadas e expressas em

termos do bem-estar do grupo, e são frequentemente violadas quando o

egoísmo do indivíduo leva a outra ação ou, mesmo, quando valores ocultos

ou dissimulados estimulam um comportamento contraditório.

A Antropologia Cultural é um aspecto fundamental na TCI, pois representa uma

característica que demonstra ser isenta de hierarquias, visto que é construída pelas vivências e

pelas histórias particulares a cada pessoa. Barreto (2008, p. 235) afirma que, “na TCI, a cura

passa pelo resgate das raízes e dos valores culturais que despertam no homem o valor e o

sentido da pertença.” Ele chama a atenção para o valor da cultura como um elemento em que

cada integrante do grupo se baseia e retira sua habilidade para pensar, refletir, discernir

valores e decidir suas opções no cotidiano, assumindo o controle sobre sua própria vida.

A Pedagogia de Paulo Freire, como eixo norteador da TCI, parte do princípio de que

todas as pessoas têm conteúdos e experiências a trocar, aprendendo e ensinando em sinergia

constante. Barreto (2008, p. 290) entende que, como a pedagogia freiriana, “a TCI busca a

constituição do indivíduo como sujeito de seu tempo e de seu espaço e como membro de uma

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totalidade de que pode e deve ser voz ativa”. Fundamenta-se na luta de combate ao narcisismo

individualista e ao neocolonialismo, utilizando a mediação e o diálogo como ferramentas de

apoio coletivo para a construção de uma consciência crítica e reflexiva (BARRETO, 2008).

Na pedagogia de Paulo Freire, o homem aprende a desenvolver seu potencial

libertador. Essa ideia trabalha na perspectiva de que a educação funciona como uma prática

libertadora, que se utiliza da opressão e da fragilidade dos indivíduos para estimular a

reflexão, o comprometimento e o interesse na luta por sua libertação e na práxis que

pressupõe a ação e a reflexão das pessoas a fim de que possam intervir no mundo,

modificando-o, ou seja, trata-se de conscientizar o homem para ser protagonista de sua

própria vida e assumir o controle de suas decisões (FREIRE, 2005).

Assim, a TCI depara-se com uma necessidade constante de valorizar e apreciar os

saberes, as experiências e os valores de cada participante, o que se coaduna diretamente com

as concepções de Paulo Freire. Seu método libertador representa um estímulo coletivo para

que os indivíduos sejam encorajados a criar e a recriar, construindo e reconstruindo suas vidas

com base na ação/reflexão. Ao descobrirem novos caminhos e conhecimentos, os indivíduos

se tornam capacitados para intervir no contexto onde vivem e se tornam membros ativos e

partícipes do processo, e não, meros coadjuvantes. Nesse ciclo, o conhecimento e as

estratégias de enfrentamento emanadas da TCI são construídos coletivamente, graças à

participação de cada membro da roda (BARRETO, 2008).

A Resiliência, segundo Barreto (2008), é o ato de se superar uma dor profunda e de

transformá-la em sabedoria e em força para lidar com várias formas de sofrimento,

transformando-o em crescimento. É um termo originado da Física e faz referência ao poder

que determinados materiais têm de, quando expostos a algum tipo de agente estressor, retomar

sua configuração inicial após a eliminação daquele agente. Tal conceito foi projetado da

Física e passou a ser utilizado na Psicologia, com o intuito de se compreender bem mais o

potencial que os indivíduos têm para enfrentar conflitos, dores e inúmeras situações adversas,

aprendendo, crescendo e superando aquela circunstância, sobretudo em se tratando de sujeitos

que vivenciaram grandes catástrofes e experiências de fracasso e de sofrimento (WALSH,

2004).

No sentido etimológico da palavra, resiliência é um termo derivado do latim, que

significa voltar para trás, recuar sabiamente. Do ponto de vista semântico, resiliência é a

capacidade que as pessoas têm de se desenvolver diante das dificuldades. Desse modo, a TCI

trabalha fundamentalmente o potencial resiliente presente nas pessoas, pois fomenta o

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despertar para o lado positivo, que deve ser extraído de experiências traumatizantes, que

fortalece o ser humano para viver com sabedoria e amadurecimento.

Nesse contexto, considerando o impacto trazido pela TCI, nos estudos de Horta e de

Caldeira (2011), assegura-se que a realização dessa tecnologia de cuidado favorece espaços de

troca de experiências, de escuta e encontro para a construção e o fortalecimento de vínculos,

mediando o cuidado das pessoas e da comunidade, pois a TCI mostrou-se como um

instrumento facilitador na busca de autonomia e independência do indivíduo pautado na

corresponsabilidade e no empoderamento.

O conceito de empoderamento, segundo alguns autores (WALLERSTEIN, 1992 apud

PEREIRA, 2009; VASCONCELOS, 2004 apud BECKER et al., 2004), corresponde à

ampliação da capacidade de decisão e de controle entre as pessoas e os grupos sociais,

apresentando-lhes estratégias para que assumam o comando de todas as esferas de suas vidas,

potencializando o poder crítico e analítico dos indivíduos, sobretudo para aqueles vítimas de

discriminações e tiranias sociais. Já em se tratando de vínculos, Pichon Riviére (2005) os

definem como “uma estrutura complexa, que inclui um sujeito, um objeto e sua mútua inter-

relação com processos de comunicação e aprendizagem”.

Isso posto, além do empoderamento e do reforço identificados nos vínculos sociais, o

estudo de Horta e de Caldeira (2011) evidenciou que os participantes da TCI compreenderam

que, além de não serem sujeitos isolados, são dotados de histórias, vivências, crenças, valores

e culturas familiares, o que é importante tanto para entenderem o que está acontecendo quanto

para mobilizarem ações a serem empregadas na resolução de seus problemas.

Horta e Caldeira (2011, p. 170) também enfatizam que

a solução para os desafios não pode ser uma ação exclusiva de um sujeito,

como vários profissionais de saúde se posicionam quando cuidam de seus

clientes, ressaltando cada vez mais a questão: "quem tem problema, tem

solução e quem tem problema faz parte do problema". Acredita-se que,

quando a solução dos problemas vem da própria comunidade, do próprio

indivíduo, há um reforço na autoconfiança. Esses aspectos reforçam o olhar

para um cuidado integral e facilitador do empoderamento pessoal, da

resiliência e da busca de estratégias criadas com as pessoas que vivenciam

seus problemas, considerando o contexto e o momento de vida,

possibilidades de mudança e a comunicação, aspectos esses trabalhados

brilhantemente na perspectiva da TCI.

Verifica-se, portanto, que a TCI é um espaço onde se valorizam os diversos saberes

populares, o que faz renascer a esperança em uma atenção à saúde mental de forma

sensibilizadora e dedicada às aflições e às inquietações dos indivíduos, sobretudo das pessoas

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em sofrimento psíquico. A disposição das pessoas em círculo, a oportunidade democrática

que todos têm de se pronunciar e de ser escutados, a presença de um facilitador do processo

grupal e a diversidade de participantes criam uma teia de relações sociais que potencializam a

partilha de experiências, o resgate das habilidades e a superação das adversidades baseada na

formação de recursos socioemocionais, com vistas a conquistar um poder individual e

coletivo.

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33 MMÉÉTTOODDOO

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3.1 JUSTIFICANDO E DESCREVENDO O PARADIGMA ADOTADO

Com o objetivo de compreender as contribuições da TCI na vida de usuários e de

familiares, no contexto do CAPS, escolheu-se para este estudo a abordagem qualitativa,

devido ao interesse de compreender aspectos relacionados às experiências de vida e seus

significados frente à dimensão subjetiva dos colaboradores.

A presente investigação caracteriza-se também como uma pesquisa compreensivo-

interpretativa. Turato (2003, p. 195) refere que os estudos de abordagem qualitativa devem

receber tal designação, “uma vez que seu objeto são as significações ou os sentidos dos

comportamentos, das práticas e das instituições realizadas ou produzidas pelos seres

humanos.” Para Minayo (2004), a abordagem qualitativa busca aprofundar o caráter social, os

atos e as relações que envolvem construções humanas, que se encontram no plano subjetivo.

Por esse motivo, escolheu-se tal abordagem, visto que, através dela, pode-se explorar o

universo de significados, aspirações e concepções de pessoas em adoecimento mental e de

seus familiares.

Para valorizar aspectos qualitativos, o percurso metodológico foi orientado pelo

método da História Oral (HO), sob o enfoque de Meihy, mais especificamente, a História Oral

Temática. Bom Meihy e Ribeiro (2011) classificam a HO em quatro modalidades: História

Oral de Vida, Tradição Oral, História Oral Temática e História Oral Testemunhal. A HO tem

como base de sua existência a narrativa gravada. Todas as modalidades se relacionam às

entrevistas realizadas com indivíduos em condição mental estável, que narram suas histórias

de forma voluntária, independentemente de benefícios.

Segundo Bom Meihy e Holanda (2007, p.12),

alguns pressupostos regem a ação de uma história oral que se pretende

instruída e capaz de motivar, mais que sua justificação, mudanças nas formas

de ver o mundo e nela o papel de seus agentes. Por se considerar moderna e

coerente com os avanços do mundo eletrônico e com as linhas da

globalização, àqueles que optam pela história oral como algo mais do que

simples entrevistas é dado pensar a estruturação de procedimentos capazes

de dignificá-la além do possível valor informativo que possa conter.

Os autores (2007) acrescentam que a HO é um processo dinâmico, que envolve a

utilização de narrativas transformadas do oral para o escrito e norteiam processos sociais ao

favorecer investigações no âmbito da memória cultural e individual. Nessa perspectiva, surge

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a necessidade de se estabelecer uma relação dialógica que requer a existência de, pelo menos,

duas pessoas para compor o diálogo. Porém não consiste em uma conversa, mas em um

encontro programado e destinado, sobretudo, à gravação. Assim, definir HO é algo complexo,

porque tal prática acompanha e avança concomitantemente aos avanços tecnológicos e

científicos, estruturando ações dinâmicas e inovadoras.

A escolha da modalidade História Oral Temática se justifica por causa da

possibilidade de elucidar histórias e fenômenos marcantes para os entrevistados, aqui

definidos como colaboradores, por se entender que o trabalho da entrevista demanda dois

lados pessoais e humanos integrados e pela existência de um tema específico delimitado

previamente. No caso deste estudo, a natureza motivadora foi o interesse em investigar as

contribuições da TCI no contexto de pessoas em adoecimento mental e de seus familiares.

A HO se inicia com a elaboração de um projeto, instrumento norteador que ajuda a

planejar o trabalho de pesquisa, o delineamento da proposta a ser desenvolvida, sua

fundamentação teórica e justificativa, a entrevista em colaboração e a passagem do código

oral para o escrito. Do projeto, devem emergir perguntas como de quem, como e por que, e a

partir disso, devem-se levar em conta fatores como a relevância social da pesquisa, a

exequibilidade na abrangência das entrevistas, o local e o tempo, o diálogo com a comunidade

que gerou as entrevistas e a responsabilidade na finalização e na devolução do trabalho (BOM

MEIHY; HOLANDA, 2007).

O desenvolvimento do projeto prevê uma comunidade de destino que são pessoas que

partilham uma identidade; uma colônia, como um grupo menor inserido na comunidade mais

ampla e marcado por relações de gênero, classe, gerações, entre outras; e as redes, uma

subdivisão formada pelas pessoas que serão entrevistadas, por critérios de pertencimento ou

diferenças de discursos (BOM MEIHY; HOLANDA, 2007).

A comunidade de destino desta pesquisa foi constituída por frequentadores do CAPS

que participavam da TCI, representados por usuários e familiares. Identificada a comunidade

de destino, definiram-se a colônia e a formação da rede. Bom Meihy e Holanda (2007)

definem a colônia de acordo com elementos gerais que caracterizam a cultura do grupo a ser

estudado, em consonância com a proposta da investigação. A rede compõe a subdivisão da

colônia com vistas a definir critérios decisivos sobre quem entrevistar e quem não entrevistar.

Bom Meihy e Holanda (2007, p.53 e 54) asseveram que

a colônia é a parte dividida para possibilitar o entendimento do todo e visa

organizar a condução do estudo fazendo-o viável, enquanto que a rede é uma

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subdivisão da colônia, devendo ser plural, porque nas diferenças internas aos

diversos grupos, residem as disputas ou olhares diferentes que justificam

comportamentos variados dentro de um mesmo plano.

Inicialmente, o CAPS, cenário da pesquisa, oferecia apenas uma roda de TCI, aberta à

participação de usuários e familiares. No entanto, passados aproximadamente três meses, a

equipe identificou a necessidade de desmembrar essa roda, para atender aos pedidos dos

próprios familiares, que argumentavam sobre a carência de um momento só para eles, devido

ao perfil diferenciado de participantes, o que dificultava a operacionalização dos encontros

como instrumento terapêutico, levando à criação de duas rodas de TCI distintas: uma voltada

para a participação dos usuários, e outra, para a participação dos familiares.

Tendo em vista o desenvolvimento de duas rodas de TCI naquela instituição,

vislumbrou-se a perspectiva de investigar concomitantemente suas repercussões na vida de

usuários e seus familiares que também estavam inseridos naquela estratégia terapêutica,

revelando as problemáticas pertencentes às duas faces de uma mesma moeda (usuários e

familiares) – o convívio com o sofrimento psíquico. No entanto, ao longo da inserção no

campo de pesquisa, verificou-se que os familiares participantes das rodas de TCI não

mantinham grau de parentesco com os usuários que também participavam, porém em outro

dia, seja por incompatibilidade de horários ou por motivos de regime terapêutico do usuário, o

que inviabilizou a proposta inicial da investigação. Entretanto, durante um período de imersão

nas rodas de TCI, evidenciou-se que a participação desses familiares repercutia,

substancialmente, não apenas em melhorias para suas vidas, mas também em maneiras

positivas de lidar com a realidade do adoecimento psíquico de seus parentes, no ambiente

domiciliar e no convívio social, ainda que eles não estivessem participando das rodas de TCI,

o que justifica a intenção de se sustentar a pesquisa no enfoque de usuários e de familiares.

Nesse contexto, destaca-se a presença de duas colônias e apenas uma rede, pois, de

acordo com Bom Meihy e Holanda (2007), a rede precisa ser plural, mas deve revelar, sob um

mesmo motivo central – nesse caso, lidar com o adoecimento psíquico – a fertilidade das

razões que trazem a convergência entre os sujeitos, comprovando a existência de uma única

rede, porque, embora representassem públicos distintos (usuários e familiares), todos

buscavam a TCI por uma mesma razão: amenizar as tensões geradas pelo convívio com o

sofrimento mental.

Foram incluídos no estudo os indivíduos maiores de dezoito anos, que participavam

das rodas de TCI assiduamente há, pelo menos, quatro meses, incluindo familiares e usuários,

especialmente aqueles sujeitos com histórias de superação, de apoio e de mudanças

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comportamentais e relacionais facilitadas pela TCI e que aceitaram participar voluntariamente da

pesquisa. Foram excluídos da investigação os sujeitos com idade inferior a dezoito anos, que

participavam das rodas de TCI por um tempo menor que quatro meses, e os com baixa

assiduidade. Assim, a primeira colônia constituiu-se de usuários que participavam das rodas de

TCI há, pelo menos, quatro meses; a segunda foi composta por familiares de usuários do CAPS

que também frequentavam as rodas há um período mínimo de quatro meses. A rede foi composta

de doze participantes da TCI que aceitaram participar do estudo, incluindo usuários e familiares.

O limite no quantitativo de entrevistas se deu quando se visualizou efetivamente o atendimento

aos objetivos propostos pelo estudo. O veredicto referente ao número de colaboradores esteve

relacionado à leitura e ao julgamento feito pela própria pesquisadora.

A pesquisa de campo foi desenvolvida no CAPS Caminhar, classificado como CAPS

III, situado no Bairro Cidade Universitária, no município de João Pessoa/PB. Esse serviço foi

criado no ano de 2005, no Bairro de Valentina, para garantir atendimento aos portadores de

transtornos psíquicos da zona sul da cidade de João Pessoa/PB, e oferecer, a priori, assistência

a 256 pessoas, das quais, quase 70% eram mulheres (JOÃO PESSOA, 2011). Em março de

2010, o referido CAPS foi transferido para um novo prédio situado no Bairro Jardim Cidade

Universitária, devido a uma necessidade identificada pelos próprios usuários do serviço que

buscavam melhores condições, sobretudo físicas, para usufruir dos atendimentos, das oficinas

e das terapias com mais conforto e comodidade. Esse serviço dispõe de uma equipe

multiprofissional, composta por psiquiatras, psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais,

farmacêuticos, educador físico, entre outras categorias profissionais, e atende a,

aproximadamente, 500 usuários por mês, trabalhando com tratamento medicamentoso,

atendimentos aos familiares, terapias individuais e comunitárias, oficinas culturais, além da

recente inserção da tecnologia digital por meio do uso de computadores e da internet (JOÃO

PESSOA, 2011).

A TCI foi introduzida no CAPS Caminhar há, aproximadamente, cinco anos, onde é

desenvolvida duas vezes por semana. As rodas de TCI são conduzidas por dois terapeutas

comunitários (um técnico de Enfermagem e uma assistente social) devidamente capacitados

pelo Polo do Movimento Integrado de Saúde Comunitária do Ceará (MISC/CE) e passaram a

desenvolver as rodas no serviço após um período de sensibilização e negociação com a

equipe. A proposta em relação à operacionalização desta pesquisa de campo remeteu,

inicialmente, à realização um levantamento bibliográfico em livros, dissertações e periódicos

indexados, preferencialmente, nos últimos sete anos, para se obter fundamentação acerca da

temática. Em seguida, manteve-se contato com a direção do CAPS Caminhar para apresentar

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detalhadamente o projeto, seus objetivos e para receber autorização da instituição com a

assinatura da Carta de Anuência (Anexo B) pela diretora do serviço.

Para a construção do corpus documental desta investigação, foram seguidos diferentes

passos, a começar pela pré-entrevista, seguida da entrevista e da pós-entrevista. Segundo Bom

Meihy e Holanda (2007), a pré-entrevista é a etapa de preparação para o encontro com o

entrevistado. É nessa fase em que se processa o primeiro contato do pesquisador com o

colaborador da pesquisa, quando são fornecidas informações a respeito da existência do

trabalho e da sua possível participação e esclarecidos os objetivos da pesquisa a fim de situá-

lo na natureza do estudo.

A fase da pré-entrevista iniciou-se com a participação nas rodas de TCI, como

estratégia de pesquisa para criar um espaço de pertencimento e de diálogo. A participação nas

rodas de TCI se deu ao longo de seis meses de imersão (fevereiro a julho de 2012), nos

encontros com os usuários, que ocorriam nas segundas-feiras, e com os familiares, nas sextas-

feiras. Foram, aproximadamente, 22 rodas por grupo. Em seguida, após a familiarização com

as experiências da TCI, prosseguiu-se com a escolha da rede, com o objetivo de realizar as

entrevistas propriamente ditas. Nesse momento, foi feito o convite aos possíveis

colaboradores, explicando os objetivos do estudo esclarecendo-os acerca de seus direitos,

inclusive, o de não aceitar e desistir de participar se julgassem conveniente.

Previamente às entrevistas, foi apresentado aos colaboradores o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), conforme resolução 196/96, e coletadas suas

assinaturas, com as quais autorizavam sua participação no estudo, explicando-lhes, ainda,

sobre a utilização de um guia composto por perguntas de corte (Apêndices A e B) e a

apresentação da carta de cessão (Apêndice D) como documento final de legitimação do

material. Os participantes foram informados de que suas entrevistas seriam mantidas no

anonimato e que seriam tratados por nomes fictícios. No entanto, todos optaram por

demonstrar com satisfação a sua verdadeira identidade civil e se deixaram fotografar.

Selecionou-se, então, o colaborador para realizar a entrevista considerada ponto zero,

representado pelo participante que frequentava os encontros de TCI há mais tempo –

aproximadamente cinco anos - e o mais antigo conhecedor daquela estratégia no CAPS.

Posteriormente, a rede foi sendo construída a partir das indicações feitas por esse colaborador.

Tais entrevistas foram previamente agendadas, considerando-se o melhor momento e o

melhor local para os colaboradores, de modo que eles pudessem sentir-se à vontade para

partilhar suas experiências. As entrevistas foram registradas por meio de anotações no

caderno de campo e de um gravador eletrônico. Embora tivessem total liberdade de escolher o

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melhor ambiente, todos os colaboradores preferiram contribuir com suas entrevistas no

próprio CAPS.

Meihy e Holanda (2007) afirmam que o caderno de campo representa um instrumento

importante para que o pesquisador registre suas impressões sobre o avanço do projeto e das

entrevistas. Também se deverá estabelecer um tempo médio para cada entrevista, por questões

de organização, porém será respeitada a dinâmica do encontro, lançando mão da flexibilidade

para que não haja interrupção do raciocínio com a “quebra” da narrativa.

Dando seguimento às etapas do estudo, tem-se a pós-entrevista, que Bom Meihy e

Ribeiro (2011) definem como a etapa que se segue à realização das entrevistas. Serve para

manter a continuidade do processo, estabelecendo o contato do pesquisador com o

entrevistado, depois de concluída a entrevista. Nesse momento, os colaboradores receberam

esclarecimentos pertinentes ao tratamento e à destinação de suas contribuições; foram

informados de que elas passariam por uma sequência de passos, definidos a seguir, de modo a

receberem um formato verdadeiramente didático.

Segundo Simpson et al (2007), na pós-entrevista, organizam-se as ideias para

transformar o relato oral em texto, mantendo o sentido intencional dado pelo narrador, o que

demanda tempo e um trabalho relativamente longo. Para produzir o material empírico em HO,

Bom Meihy e Holanda (2007) defendem que é fundamental estabelecer um grupo de regras que

visam orientar os passos para determinada pesquisa, em que se utiliza a entrevista como

ferramenta para nortear a investigação face aos resultados pretendidos. Na História Oral Temática,

utiliza-se uma ficha técnica composta por questões de corte fundamentais para trazer à tona

aspectos pretendidos, de forma que podem ser diretos e indutivos ou indiretos e dedutivos.

Nesse sentido, buscando responder aos objetivos propostos, elaboraram-se as

seguintes questões de corte para usuários e familiares respectivamente:

Usuários:

Me conte o que aconteceu em sua vida a partir de sua participação nas rodas de

TCI?

O que você tem aprendido na TCI que tem levado para utilizar em sua vida?

Qual a contribuição da TCI em seu tratamento?

Familiares:

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Me conte o que aconteceu em seu convívio familiar, principalmente na relação

com o parente que é acompanhado pelo CAPS, a partir de sua participação nas

rodas de TCI?

O que você tem aprendido na TCI que tem levado para aplicar no dia a dia com

seu familiar?

Para você, o que significa participar da TCI?

Produzido o corpus documental desta investigação, iniciou-se a etapa de análise e de

interpretação dos achados. Finalizadas as fases de contato com os colaboradores para a

conclusão das entrevistas, o material oral foi trabalhado detalhadamente, para que se

construísse o corpus documental de acordo com as fases preconizadas pela HO: a

transcrição, fase de transformação da gravação oral para o escrito; a textualização, definição

de palavras-chave para mostrar a incidência das ênfases dadas em determinados momentos,

que representam o tom vital das narrativas; a transcriação, com o desfecho do texto, a sua

versão final, e a conferência, momento em que, depois de todo trabalhado, o texto é entregue

aos colaboradores para que seja ratificada ou não a sua conformidade, conferindo

confiabilidade ao material e à pesquisa em si (BOM MEIHY; RIBEIRO, 2011).

Primeiramente, as entrevistas foram escutadas por inúmeras vezes, de modo a não

suprimir nenhuma informação importante. Na fase de transcrição, foi dado ao material das

entrevistas gravadas o formato escrito. Para isso, removeram-se os vícios de linguagem, as

palavras e as frases repetidas e composições sem semântica, preservando a essência textual de

identificação de cada colaborador (BOM MEIHY; RIBEIRO, 2011).

Na fase de textualização, foram retiradas as questões de corte, atribuindo ao texto um

corpo estético e singular; depois, foi identificado o tom vital, de modo a utilizá-lo como guia

para a análise e a discussão do material. Dias (2007) chama a atenção para o fato de que o tom

vital é considerado a passagem do texto de maior força, que agrega em sua essência todos os

elementos expressivos da entrevista e contribui para que se entenda a melodia presente na

narrativa de cada colaborador.

Na transcriação, foram desempenhadas intervenções textuais com base nos registros

constantes no caderno de campo, de modo a enriquecer a construção do produto final das

entrevistas, atribuindo um sentido especial àquelas informações (BOM MEIHY; RIBEIRO,

2011).

A última etapa, a de conferência, foi realizada individualmente com cada colaborador.

Todos preferiram que a leitura do material fosse feita pela própria pesquisadora,

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representando episódios marcantes nesse processo de construção, visto que muitos desses

momentos aconteceram permeados de emoções e de sentimentos. Os colaboradores sentiram-

se orgulhosos durante o contato com suas contribuições. Todos solicitaram e receberam uma

cópia do texto e ficaram entusiasmados para exibi-lo aos amigos e familiares, concordando

com o resultado final de suas entrevistas e validando-as para uso e publicação (BOM MEIHY;

RIBEIRO, 2011).

Para a discussão do material empírico, utilizou-se a análise temática proposta por

Minayo (2004, p.209), que “consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem uma

comunicação, ou seja, qualitativamente falando, a presença de determinados temas denota os

valores de referência e os modelos de comportamento presentes no discurso”, conduzindo a

construção de um grande eixo temático - A TCI como práxis libertadora - seguido de três

subeixos - Mudanças que fazem a diferença; Um espaço terapêutico de fala, escuta e

aprendizagem; A TCI como fortalecedora de vínculos e fomentadora do empoderamento -

direcionando à apreciação e à análise do corpus documental.

Inicialmente, identificou-se o tom vital presente nas entrevistas de cada colaborador,

ou seja, as ideias mais significativas, paralelamente à linha condutora da pesquisa. Com base

nesse enfoque, foram construídos e elencados os principais eixos temáticos, com base no que

se propunha o estudo, na tentativa de melhor conduzir o confronto entre o referencial teórico

proposto. A guarda e o arquivamento do material gravado foram feitos com a criação de uma

pasta eletrônica particular e de um dispositivo de armazenamento do tipo CD-ROM sob a

responsabilidade da pesquisadora. Os dados encontram-se disponíveis no acervo de produção

em HO do Programa de Pós-graduação em Enfermagem (PPGEnf) da UFPB.

Este estudo atendeu aos requisitos propostos pela Resolução 196/96, de 10 de outubro

de 1996, do Conselho Nacional de Saúde (CNS, 2002), que dispõe sobre as normas e as

diretrizes regulamentadoras da pesquisa com seres humanos. A pesquisa iniciou-se depois que

o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde

(CCS/UFPB), com o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº.

01143012.8.0000.5188 (Anexo A), e que os colaboradores aceitaram participar

voluntariamente e assinar o TCLE (Apêndice C). Ao final, foi apresentada aos colaboradores

a carta de cessão (Apêndice D) - um documento que faz alusão à concordância dos

colaboradores com o produto final das entrevistas e seu uso para publicações de cunho

científico.

O capítulo a seguir é o resultado dos processos de transcrição, textualização,

transcriação e conferência das entrevistas realizadas com usuários e familiares frequentadores

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do CAPS Caminhar. A ordem de apresentação das entrevistas adotada é a mesma seguida

sequencialmente durante a constituição da rede impulsionada pelo ponto zero.

Todos os colaboradores foram identificados por seus nomes civis, a partir de um livre

processo de escolha, e aceitaram contribuir espontaneamente com o estudo, narrando suas

histórias durante as rodas de TCI.

Os depoimentos estão dispostos na íntegra. Na apresentação inicial de cada entrevista,

trazem uma mensagem que caracteriza, de forma sutil, a personalidade e os traços pessoais

singulares de cada colaborador identificados pela pesquisadora, seguidos de uma frase-guia,

denominada de tom vital, que compõe a ideia central das entrevistas e que convida o leitor a

adentrar o universo das narrativas.

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44 AASS NNAARRRRAATTIIVVAASS DDOOSS

CCOOLLAABBOORRAADDOORREESS

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Josué é um homem dedicado e responsável. É usuário do CAPS Caminhar e participa

ativamente dos encontros de TCI, há cinco anos, como um dos maiores veteranos do grupo.

Demonstra ser um pai e um esposo apegado à família, fala com orgulho da importância da

Terapia Comunitária e dos terapeutas comunitários em sua vida. É enfático ao afirmar seu

anseio pela ampliação no número de encontros da Terapia Comunitária a seu favor e em favor

dos usuários do serviço (CAPS).

Tom vital: Agora enfrento meus medos!

A Terapia Comunitária é a atividade do CAPS que mais gosto de participar. Ela vai dentro do

problema da pessoa, trabalha os problemas profundamente. Os terapeutas comunitários nos

estimulam a falar, nos perguntam o que mais está nos incomodando naquele momento e a gente vai

falando o que tem pra falar. Eles explicam as regras antes de iniciar, explicam que precisamos

respeitar a história do outro, falar de nós mesmos, não dar conselhos [...] e isso tudo é muito bom!

Normalmente as pessoas falam de um problema familiar, de um desprezo, da desigualdade, do

preconceito e assim a gente vai colocando os problemas pra fora. A Terapia Comunitária significa

muita coisa pra nossa mente [...] ela desenvolve e estimula nosso pensamento e nós saímos daqui

mais leves. Como os terapeutas comunitários nos estimulam a falar [...] a gente põe nossos problemas

para fora e isso é uma forma de desabafo [...] porque muitas vezes você vem amargurado de casa [...]

seja com um filho, uma filha, um telefonema que você recebeu e quando chega na Terapia, você fala

disso e se sente aliviado.

Em 2002, fui internado na Colônia Juliano Moreira e, desde essa época, venho sendo

acompanhado por psiquiatras. Quando minha filha veio morar em João Pessoa, eu vim embora de

Bayeux pra cá me tratar nesse CAPS. Fazia três anos que eu tomava a mesma medicação e não

apresentava melhora nenhuma [...] cheguei até a passar um tempo sem enxergar por conta do

medicamento [...] até que minha filha ligou pro oftalmologista e ele me orientou a deixar o remédio e

procurar o médico. Foi quando eu suspendi o medicamento e vim me tratar nesse CAPS [...] passando

a conhecer e a participar da Terapia Comunitária. Me tratei também em um CAPS no Rio de Janeiro.

Passei dez meses sendo acompanhando lá [...] mas meu problema não era trabalhado como é aqui na

Terapia. As pessoas só perguntavam o que eu tinha, anotavam no papel e entregavam ao médico,

Josué

“Você ganha força, coragem e

confiança através de cada experiência

em que você realmente para e encara o

medo de frente”. (Eleanor Roosevelt)

Foto 1: Josué

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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então preferi me tratar aqui. A Terapia Comunitária com os terapeutas comunitários desse CAPS é

muito boa! Gosto da forma como ela funciona e das coisas que as pessoas falam [...] muitas vezes

essas coisas se encaixam perfeitamente no meu problema, então passo a aceitar e entender melhor

aquilo que estou passando.

A Terapia Comunitária me ajuda muito porque antes eu não tinha envolvimento com ninguém.

Não gosto de muita intimidade com as pessoas, é de mim mesmo. Às vezes estou sentado na calçada

da minha casa e chega um amigo pra conversar e eu já começo a me agitar então digo logo que

preciso ir ao banheiro e entro em casa. Depois vou melhorando e quando saio novamente, ele não

está mais lá fora. Quando precisava ir ao Centro com minha esposa, pegar algum medicamento no

CEDMEX (Centro Especializado de Dispensação de Medicamentos Excepcional) pegava o ônibus

direto e só parava quando chegava no hospital de Jaguaribe, depois pegava o remédio e tentava

voltar logo para casa, porque tinha medo de uma moto que passava perto de mim, de uma bicicleta

[...] tinha medo até do ônibus [...] e a Terapia Comunitária tem me ajudado muito nisso, porque

agora enfrento meus medos, melhorei nesse sentido. Na Terapia Comunitária também aprendo muitas

coisas [...] inclusive semana passada, o terapeuta comunitário veio conversar comigo e me perguntou

se eu me achava preparado para voltar a trabalhar novamente a partir da melhora que ele tem

percebido em mim desde que comecei a participar da Terapia Comunitária. Eu disse que ainda não,

porque, um dia, estou bem, outro dia, já estou mal, então me sinto inseguro para voltar a trabalhar

agora, mas não gosto de ficar parado, sem fazer nada [...] isso piora minha situação.

Melhorei muito depois que comecei a participar da Terapia Comunitária, não digo que foi

uma melhora de cem por cento, mas frente à minha situação de antes, melhorei muito. Tem dias que

venho pra Terapia Comunitária muito mal, desestimulado, triste e saio muito melhor [...] converso

com o pessoal, converso com os terapeutas comunitários [...] e isso me ajuda muito. Não gosto de

participar das outras Terapias, porque elas não trabalham a mente [...] não existe conversa [...] e a

Terapia Comunitária vai em cima do problema, vai em cima do sofrimento [...] age numa amargura,

num desprezo familiar, num problema financeiro, numa crise, na sua incapacidade de trabalhar e

ouvindo as histórias das outras pessoas a gente aprende e leva pras nossas vidas.

Eu queria na verdade que a Terapia Comunitária acontecesse pelo menos três vezes na

semana [...] Segunda, Quarta e Sexta [...] e queria poder vir todas às vezes, mas como não acontece e

como não tenho condições, fica como está. Sinto que meu tratamento precisa disso [...] que eu

participe mais vezes da Terapia Comunitária [...] porque um dia estou bem, outro dia estou mal,

agoniado com tudo [...] fico dentro de casa, deito no sofá, vou no quintal, vou no portão, ando para

lá, ando para cá, me sento na calçada, me deito na cama, fico inquieto [...] às vezes minha esposa

prepara um chá de romã para mim e fico nisso o dia inteiro até me acalmar. Mas da Terapia

Comunitária, gosto muito de participar! Se você escutar a história de Maria José, você vai ver

também como a Terapia Comunitária ajuda a gente. Ela mudou muito depois que começou a

participar [...] e essas coisas ajudam a gente a querer vir mais.

Com a Terapia Comunitária melhorei também porque eu era uma pessoa calada, não sorria

para os outros desde que tive esse meu problema de depressão. Antes eu brincava muito com meus

filhos, minha esposa e depois da depressão tiveram dias que eu nem falava com ela [...] e a Terapia

Comunitária me ajudou a falar mais, a conversar mais com eles e com as pessoas, mas digo sempre

[...] que se a Terapia Comunitária acontecesse mais vezes eu iria melhorar mais ainda, porque ela

significa muito pra mim!

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Maria José é usuária do CAPS Caminhar. Uma mulher forte e perseverante, que

participa, com satisfação, da Terapia Comunitária há um ano. Atualmente, retomou sua rotina

de trabalho com a venda de cosméticos e de bijuterias que ela mesma produz. Embora afirme

que a Terapia Comunitária tem transformado sua vida, destaca, entristecida, que sente na pele

o peso do preconceito. Confiante em Deus, afirma que um de seus maiores anseios é ser

inserida e “aceita” com respeito e dignidade no mercado formal de trabalho e sonha em abrir

seu próprio salão de beleza.

Tom vital: Hoje sou outra pessoa!

O meu problema (esquizofrenia) começou a aparecer quando tive depressão pós-parto. O pai

do meu filho me largou no meio da gravidez e pra piorar tudo, minha família ainda me abandonou

quando perceberam que eu estava ficando cada vez mais doente. Depois disso fiquei só, não tive o

apoio de ninguém. Nem paciência com “meu inocente” eu tive! Jesus Cristo há de me perdoar por

minhas agressões contra meu filho. Mas não tinha culpa, as coisas que eu fazia eram fruto da minha

mente, confusão da minha mente muitas vezes. Eu dava remédio de verme a ele, a criancinha ficava

entrando em crise de desmaio, mas por quê? Não estou culpando minha família, mas hoje vejo que

eles deveriam ter me ajudado. Por que eles não me levaram a um hospital antes? Pra me cuidar? E

podiam até levar meu filho também já que eles não queriam cuidar dele [...] eles não cuidaram da

minha criancinha direito. Meu único filho é um homem, mas eu não podia cuidar dele, minha família

não deixava. E quando me lembro de tudo, rezo o pai-nosso, santo anjo do senhor, entrego ele ao anjo

da guarda e pronto! É o que eu posso fazer.

A única coisa que minha família fazia era impedir que eu tocasse no meu filho [...] eu era

muito maltratada [...] me chamavam de “louca”, diziam que eu ia matar a criança, não me deixavam

comer. Eles me rejeitaram muito. Hoje moro com minha irmã e sinto que ela não me quer dentro de

casa, mas como ainda não estou trabalhando fora, numa empresa [...] não posso ter meu cantinho.

Quando era mais nova, minha família me colocava para trabalhar na casa dos amigos como faxineira

[...] e nessas casas eu não era tratada como deveria [...] as pessoas debochavam de mim [...] então eu

entrava e saia das crises sem contar com a ajuda de ninguém, só de Jesus mesmo! E antes de

Maria José

“Você nunca sabe a força que tem.

Até que a sua única alternativa é ser

forte”. (Johnny Depp)

Foto 2: Maria José

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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participar da Terapia Comunitária eu não tinha ajuda de ninguém [...] muitas vezes saía correndo

nas pistas desesperada, chorando e agoniada [...] mas depois que comecei a tomar meus

medicamentos certinho e comecei a participar da Terapia Comunitária, me sinto realizada! Estou

muito feliz!

Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária percebi que melhorei muito [...]

porque antes eu andava de rua em rua, tomava muito remédio pra dormir, não queria nem viver!

Melhorei porque só vivia andando pelo meio do mundo [...] saía de cinco horas da manhã pra ir pra

casa dos outros [...] e agora não. Fico dentro de casa, tomo meu café, faço minhas coisinhas, procuro

ir ao colégio direitinho à noite. Estou completamente mudada! Eu gosto muito da Terapia

Comunitária e adoro o CAPS! Queria ter conhecido a Terapia antes pra eu ter adquirido minha saúde

de volta há mais tempo.

A Terapia Comunitária significa uma melhoria na minha vida [...] uma forma de me

comunicar com as pessoas e de ouvir respostas certas para os meus problemas e aprender através das

falas das outras pessoas [...] e isso eu não tinha [...] não tinha respostas para os meus problemas [...]

não tinha com quem conversar, porque as pessoas não querem conversa com pessoas “doentes” e

pensam que não sei de nada. Elas dizem que não sabem do que estou falando porque não passam pelo

que eu passo [...] então eu não tinha chance de receber respostas nem orientação, e agora estou

recebendo e me sentindo feliz, realizada!

Com a Terapia Comunitária, aprendi a ter mais paciência com minha irmã, sou mais meiga

[...] apesar de muitas vezes ela ter tentado me dar surras e me internar no Juliano Moreira. Minha

vida era um sacrifício. Muitas vezes, eu saía correndo no meio da rua pedindo socorro e não tinha

ninguém pra me ajudar. Já sofri muito! E nesse grupo da Terapia Comunitária tenho todo o apoio e

força que preciso pra viver que não tenho e não encontro em nenhum outro lugar.

A Terapia Comunitária é importante pra mim, porque, através dela, a gente explica nosso

sofrimento, as pessoas fazem perguntas e dão as respostas [...] e com ela aprendi a entender melhor

as pessoas, me tornei muito paciente. Não preciso ser agressiva com as pessoas [...] sou até muito

“mole”! Com a Terapia criei coragem para trabalhar e estudar que antes eu não tinha, passava o

dia todo dentro de casa, sem fazer nada, só de pensar em sair para procurar emprego já tremia toda,

chorava muito de medo [...] e sinto que agora estou podendo. Já deixei meu currículo em um

supermercado, em escolas e em algumas lojas. Saía de casa para entregar meu currículo nas

agências, mas não tinha coragem nem de falar. Tinha medo de ir pra longe [...] só entregava em

lugares perto de minha casa, mas minha vontade maior é de ter meu salão de beleza, trabalhar

fazendo unha, maquiagem e arrumando cabelo.

Hoje faço bijuterias para vender e vendo também lingeries e cosméticos de revistas. Depois

da Terapia Comunitária criei mais coragem pra enfrentar o preconceito das pessoas [...] fiz até um

curso de beleza, mas ainda tenho um pouco de medo de mexer no cabelo dos outros, tenho medo de

fazer besteira [...] mas quando abrir meu salão de beleza vou ficar responsável por fazer prancha,

escova, sobrancelha, manicure, pedicure e maquiagem [...] quem vai pintar e aplicar as químicas será

outra pessoa.

Hoje sou outra pessoa [...] estudo, faço meus cursos, compro minhas coisinhas pra usar nos

cursos [...] e antes não tinha paciência, a minha vida era chorar e dizer a todo mundo que eu era

“doente”. As pessoas me discriminavam e não gostavam daquilo. Eu era tão fraca que pedia

desculpas às pessoas por ser daquele jeito [...] e elas me mandavam ir embora, me diziam pra ir pro

Juliano Moreira porque eu era acompanhada no CAPS. As pessoas me viam como alguém que fingia

ser louca. Era muito perturbada e agora eu não aperreio ninguém, é só de casa pro CAPS. E vou

trabalhar na rua, se Deus quiser! Já me sinto pronta, melhor! Antes eu nem pensava nisso [...] e a

Terapia Comunitária me ajudou a criar essa força. Hoje melhorei [...] o povo até fala lá na rua:

“Maria José como você está diferente! Nem parece aquela de antes”.

Gosto muito da Terapia Comunitária porque lá as pessoas entendem a gente [...] os

terapeutas comunitários e os participantes nos dão o apoio que não temos lá fora. Gosto muito dos

terapeutas comunitários! Não quero faltar nunca!

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Alegre e sorridente, Ivanildo está sempre bem-humorado e antenado nos encontros de

TCI. Embora demonstre uma grande timidez, relaciona-se bem com os usuários e com a

equipe e se esforça para interagir com os demais. Participante da Terapia Comunitária há,

aproximadamente, um ano, fala com objetividade sobre as mudanças ocorridas em sua vida a

partir de sua inserção nas rodas.

Tom vital: Nunca mais entrei em crise!

Participar da Terapia Comunitária tem sido muito bom pra mim. Antes eu só fazia dormir e

comer [...] às vezes nem acordava pra tomar meu remédio, passava direto e não me importava [...] e

depois que comecei a participar das rodas, estou me sentindo muito melhor, eu gosto muito de

participar, é muito bom! (Silêncio) Eu era muito calado, não conversava muito [...] em casa não dava

atenção à minha mãe [...] hoje eu já dou mais carinho a ela e a toda minha família, sem falar das

amizades que fiz na Terapia Comunitária e antes não tinha nenhuma, era todo fechado, muito tímido

[...] mas depois me soltei mais.

A Terapia Comunitária me ajudou a fazer amizades [...] eu não tinha nenhum amigo. Na

minha rua, falava com as pessoas, mas não ficava conversando, não queria saber de ninguém. Hoje

não! Hoje já converso. Só falava com os vizinhos por educação e não queria conversar, queria logo

entrar em casa pra dormir ou ficar trancado no quarto [...] e se minha mãe fosse me acordar, brigava

com ela. Agora já tenho amizades principalmente aqui no CAPS, na minha rua [...] e ouvindo minha

amiga Josineide que também é usuária do CAPS e que sempre vem pra Terapia Comunitária, comecei

a dar mais importância a essa roda e a mudar minha vida. Quando minha mãe pedia pra eu fazer

alguma coisa, não fazia [...] e hoje faço. Aprendi a nunca mais parar de tomar o remédio [...] acho

que isso foi importante também [...] e a dar mais atenção à minha mãe e a meu pai, isso foi o que eu

aprendi de mais importante na Terapia Comunitária que levo pra minha vida. Passei seis anos sem

tomar meus medicamentos, então tive umas três crises e precisei voltar a tomar à força e faz quatro

anos que entrei na Terapia Comunitária e não parei mais e nem quero parar! Junto com a Terapia

Comunitária, os remédios têm me ajudado e nunca mais entrei em crise [...] porque antes eu via umas

coisas que não existiam, ouvia vozes, e só fazia chorar. Minha mãe também tem me ajudado muito me

Foto 3: Ivanildo

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

Ivanildo

“O verdadeiro homem mede sua força,

quando se defronta com o obstáculo”.

(Antoine de Saint-Exupéry)

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mandando tomar o remédio [...] porque eu não queria, nem ligava [...] e agora criei mais

responsabilidade.

Aqui no CAPS, eu só participo da Terapia Comunitária, e quando não tem [...] não gosto de

participar das outras oficinas, vou logo deitar. Gosto porque tem muita conversa e as outras

atividades não têm. Na Terapia a gente conversa, escuta as histórias das pessoas e usa na nossa vida.

Outra coisa muito importante que aconteceu na minha vida é que voltei a estudar. Ano

passado tinha parado, não estava querendo nada com a vida. E agora me senti estimulado [...] voltei

pra escola e estou gostando muito. Já com minha família a Terapia Comunitária me ajudou a ter mais

atenção com minha mãe, que eu não dava [...] e hoje dou. Converso com ela, e antes isso não

acontecia, como eu era calado, não conversava nada, era muito fechado, não tomava o remédio, não

ia mais pra escola [...] e também era muito briguento dentro de casa [...] discutia muito com minha

mãe, com meu pai [...] porque ele deixou minha mãe pra ficar com outra mulher, mas hoje parei [...]

não brigo porque estou mais paciente. Respeito meu pai como ele é e me orgulho da educação que

minha mãe me deu. Já tomo meus remédios direitinho e venho sozinho ao CAPS. Antes eu tinha medo

de tudo, até mesmo de sair de casa e hoje ando sozinho pra todos os lugares, sem medo [...] melhorei

muito graças a Deus! Acho muito importante a Terapia Comunitária, porque como sempre tem muita

gente, é como se fosse um debate [...] gosto porque a gente tem um espaço pra falar dos nossos

problemas e muitas vezes os problemas são até iguais [...] gosto também do terapeuta comunitário,

ele é muito bom, os outros terapeutas são bons também, mas nas outras oficinas a gente não faz uma

atividade de conversa, não escuta os outros, não fala nada [...] e aqui não, a gente conversa e tem

espaço pra falar daquilo que a gente está sentindo no momento.

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Mulher introvertida e companheira, Josineide é usuária do CAPS Caminhar e participa

da TCI há seis meses. Transmite paz e serenidade em seu olhar. Como uma grande

espectadora e ouvinte, costuma falar pouco de sua vida. Na Terapia Comunitária, está sempre

cabisbaixa, porém atenta, escutando as histórias trazidas pelos demais participantes. Olhar

para ela durante as rodas significa perceber que viaja em um mundo de resgate de memórias e

de reflexões.

Tom vital: Antes eu era “trancada”, agora não!

Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária, mudei muito. Onde mais mudei foi

com a compreensão. Hoje faço trabalho em casa, lavo louça, varro, arrumo [...] tudo devagarzinho,

porque não aguento, não tenho muita energia [...] e antes não fazia nada, não ajudava minha mãe e

agora tenho mais iniciativas. Também criei até vontade de voltar a estudar, mas não posso, é um

negócio que me faz esquecer tudo, causa esquecimento, então não adianta [...] porque mesmo que eu

fique repetindo, repetindo, não consigo compreender, não consigo de jeito nenhum! Já fiz duas ou

foram três tentativas, mas não aprendi, então desisti. Minha mãe tem uma vendinha que é onde ajudo

também, procuro não ficar parada. Ela me chama sempre pra ir pra lá e vou, mas gosto mais de vir

pra Terapia Comunitária porque aqui tenho expressão, posso falar da minha pessoa, do que estou

sentindo naquele momento [...] se estou alegre, se estou triste, se está tudo direitinho, o que gosto é

disso: é da expressão que a Terapia Comunitária dá pra gente falar tudo, desabafar [...] e em casa

não posso fazer isso, não tenho esse espaço. Agora o problema que há em estudar é que não tenho

mais paciência, porque não consigo aprender e não tenho mais vontade de ficar na sala de aula, mas

procuro levar uma vida normal.

Meu pai sempre me pergunta por que não faço aquele Telecurso do 2º grau, e tenho vontade,

mas não consigo aprender mais [...] então é perdido fazer, embora eu queira, mas vejo que tenho essa

limitação e que esse problema não me deixa aprender e respondo que não adianta gastar se vejo que

não vou acompanhar. Tenho vontade também de trabalhar fora de casa [...] agora coragem, coragem

Josineide

“A menos que modifiquemos a nossa

maneira de pensar, não seremos

capazes de resolver os problemas

causados pela forma como nos

acostumamos a ver o mundo”. (Albert

Einstein)

Foto 4: Josineide

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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mesmo, criei de uns tempos pra cá que foi quando melhorei da depressão e depois que vim pra

Terapia Comunitária.

Venho pro CAPS nas segundas e quartas, mas gosto mais é da Terapia Comunitária por

causa dos temas que saem de lá, que são sempre temas diferentes [...] cada um traz seu problema,

cada um conta a sua dificuldade (pausa pensativa), seu sofrimento, eu gosto! Mas o que mais me

preocupa é minha mãe e meu pai, porque eles querem que eu venha e fique boa logo, de uma hora pra

outra [...] então devagarzinho eu vou ficando, mas eles querem mais ligeireza de minha parte, não

têm paciência [...] e queriam até que eu parasse de tomar meu remédio, mas não posso parar porque

é controlado. Como tenho esse problema na cabeça, eles ficam perguntando se vou tomar esse

remédio o resto da vida ou se é até quando terminar minha depressão, mas o médico deu o laudo que

é pro resto da vida. Enquanto eu estiver vivendo, vou ter que tomar o medicamento. Meus familiares

ficam sempre perguntando como estou aqui no CAPS, porque só querem ver minha melhora, querem

só ver o resultado, mas ninguém quer se envolver com meu problema [...] então quando venho pra

Terapia Comunitária e falo das minhas tristezas saio leve, saio melhor!

A Terapia Comunitária me ajudou também porque era difícil demais eu sair de casa, não saía

com ninguém, só queria ficar deitada [...] e agora saio, converso com as pessoas, com os amigos e

com minha família. Antes eu era “trancada”. Agora não! Sei que preciso vir pra Terapia

Comunitária, reconheço isso, porque ela me ajudou principalmente a tomar meus remédios. Antes não

tomava [...] ficava mal, sentia uma angústia, ficava querendo me matar. Não dava importância ao

principal de tudo. Agora não! Agora eu tomo os remédios! Tomo tudo certinho e nunca mais me

internei.

Acho muito bom participar da Terapia Comunitária porque não fico em casa sozinha e como

não quero ficar sem fazer nada, venho para a Terapia porque é sempre bom ficar escutando os

problemas de várias pessoas, já que a gente sabe que problemas todo mundo tem, então fico mais

confortada. Quando penso em não vir lembro do que aprendo aqui, lembro que vou escutar Fulano,

Cicrano e em casa não vou escutar ninguém, então é melhor vir, porque se eu ficar ataca mais ainda

minha depressão. Gosto também porque perco mais a minha tristeza, pois quando penso em ficar só

me dá aquela angústia, aquele mal-estar.

Ouvindo as histórias das outras pessoas na Terapia Comunitária aprendi que o importante “é

você ser você mesmo”, além de fazer amizades porque as pessoas lá fora quando descobrem que

fazemos tratamento no CAPS, que a gente é do jeito que é, que somos doentes mentais, não querem

“se chegar muito”. Por conta disso tudo, minhas amizades são poucas. Minha amizade maior é com

esse grupo da Terapia. O que aprendi também foi a obediência que devo ter com meus pais [...]

porque sempre meu pai fica falando da minha doença, fica cobrando porque sou usuária de

medicamento controlado, então eu ficava muito chateada [...] e hoje já aceito melhor isso e tenho

dado mais atenção aos conselhos deles. Sei também aguentar o preconceito das pessoas, eu nem ligo

[...] conto pra todo mundo que tomo remédio controlado, conto tudinho! E muita gente tem

preconceito, mas não ligo! (expressão de pouco-caso). Me aceito assim e me orgulho de quem sou!

Não dou importância [...] eu ficando boa, é o que importa!

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Paraibano guerreiro, Allan é um homem sábio e muito eloquente. É psicopedagogo e

participa da Terapia Comunitária há mais de três anos. Gosta de falar nas rodas e está sempre

perguntando a opinião dos terapeutas comunitários sobre os problemas apresentados e as

problemáticas sociais. Usuário engajado, tem se mostrado parceiro na luta pela melhoria do

cuidado no CAPS.

Tom vital: Melhorei de forma espetacular!

Minha vinda pra Terapia Comunitária me ajudou muito. Antes de participar, eu tinha muita

oscilação de humor, tinha palpitações, ia ao hospital todos os dias [...] e depois que passei a vir pra

Terapia, junto com a medicação, tudo mudou [...] porque se trata de uma junção [...] é a Terapia

Comunitária, o medicamento e a participação da família que vejo como o fator principal dentro desse

processo [...] então é um conjunto, é a minha participação na Terapia Comunitária, a parte

medicamentosa com o psiquiatra, o acompanhamento com os outros terapeutas e com a participação

de minha esposa sempre que é chamada pra participar das reuniões com a família e diante desse

trabalho, tive uma melhora significativa. Antes de vir pra Terapia Comunitária eu era muito

agressivo, brigava muito dentro de casa, só falava gritando [...] e depois que vim pra cá, acabou-se a

agressividade, estou bem mais estável, melhorei de forma espetacular!

Na Terapia Comunitária aprendi que é importante que a família participe, porque na verdade

quem vai lidar com o usuário em casa é ela [...] então eles precisam entender o problema da gente.

Acho que a família precisa estar presente e se a participação dela não é efetiva, fica muito

complicado [...] tenho dito sempre ao terapeuta comunitário pra ele conversar com a equipe pra que

eles valorizem essa questão. É importante ter uma equipe pra visitar algumas casas em casos mais

graves [...] não necessariamente só o assistente social, mas uma equipe multiprofissional, que tenha

uma enfermeira junto com uma assistente social, junto com uma psicóloga, junto com uma terapeuta,

junto com o terapeuta comunitário [...] então tenho aprendido muita coisa a partir de minha

participação na Terapia Comunitária.

Percebo que a Terapia Comunitária é importante não apenas para mim, mas para os outros

usuários também [...] e assim ela tem me ajudado. Como tenho vinte e três anos de serviço na

prefeitura do município e sou psicopedagogo, tenho uma vasta experiência com essas questões

sociais, então os problemas que escuto na Terapia Comunitária não me surpreendem, tenho que ser

sincero. Como já sou uma pessoa muito vivida, amadurecida e por meu trabalho sempre ter sido

Allan

“O homem é uma vontade, uma

força e um conhecimento que

tendem para o infinito”.

(Giambattista Vico)

Foto 5: Allan

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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escutando pessoas que também têm problemas e famílias em situação de vulnerabilidade social, já me

acostumei com essas problemáticas que são comuns no mundo.

Já trabalhei no CRAS (Centro de Referência da Assistência Social), no Conselho Tutelar e

dentro das falas que escuto na Terapia Comunitária, percebo que há uma troca de experiências e isso

contribui muito pra mim enquanto usuário e enquanto técnico desses serviços, porque ela ajudou na

minha melhora como pessoa e no trabalho. Depois que comecei a participar, passei a enxergar coisas

que não enxergava e a levantar questões importantes.

Quando comecei a vir pro CAPS e participar da Terapia Comunitária, fui discriminado pela

Secretaria de Desenvolvimento Social (SEDES). O Conselho Tutelar onde eu trabalhava me tinha

como um dos melhores técnicos da casa. Depois que comecei a dizer aos poucos que fazia tratamento

em um CAPS, passaram a me ver como uma pessoa incapaz de exercer a função e tiraram o meu

contrato. E como entrei em 1988, ou seja, antes da lei que exigia um concurso público, então a

Secretaria de Desenvolvimento Social me discriminou muito e percebi que era por causa da minha

condição de saúde. Agora o que não entendo é porque os conselheiros fizeram uma declaração

mostrando minha honestidade, compromisso, competência e mandaram pro colegiado, mandaram pro

secretário e nada foi respeitado, ou seja, existe uma disputa entre o secretário do Desenvolvimento

Social e os conselheiros [...] caí dentro de um circuito na verdade que me prejudicou.

A Terapia Comunitária me trouxe melhorias, me trouxe benefícios sociais e trabalhistas,

porque dentro dela pude me trabalhar mais a partir desses problemas e passei a aceitar melhor essa

situação. Agora ela contribuiu também porque despertou em mim a vontade de lutar por meus

direitos, a compreender melhor o outro, me ajudou por esse lado [...] a conviver melhor com as

pessoas. Tudo que tenho escutado, tudo que tenho aprendido, tem me ajudado muito [...] porque tenho

jogado algumas coisas pra fora, e na Terapia Comunitária, pela experiência que tenho [...] porque já

fui coordenador de oficinas de arte e cultura, então pela minha experiência, vejo a Terapia

Comunitária aqui no CAPS como a terapia mais atuante. Os terapeutas comunitários estimulam o

usuário a falar, jogar tudo pra fora, falar do seu sofrimento, ou seja, a dinâmica de funcionamento da

Terapia incentiva muito pra que o usuário fale do seu problema e a partir do que você põe pra fora o

terapeuta faz um apanhado pra discutir aquilo com a equipe, e isso é pra mim é muito interessante e

importante! Acho uma pena que as demais oficinas não funcionem dessa forma, igual à Terapia

Comunitária.

Depois da Terapia Comunitária, aprendi a me expressar melhor. Estou aqui pensando em

mim, mas também quero contribuir com o progresso do CAPS dentro de uma linha democrática. E a

Terapia Comunitária tem demonstrado ser uma Terapia democrática, aberta a ouvir, a acolher a

expectativa do grupo [...] e em cima dessa expectativa, procuro sempre levantar propostas que podem

ser adotadas na relação com os usuários [...] e isso tem contribuído como um todo, eu acredito!

Sempre falo na Terapia Comunitária que é importante colocar a família como parte importante

dentro do processo de tratamento, até porque se não for trabalhada a importância da família, fica

difícil para o CAPS fazer alguma coisa e é muito importante para o usuário continuar participando

das atividades que o serviço oferece.

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Janete é uma mulher articulada e envolvida com as causas sociais. Usuária do CAPS

Caminhar, participa das rodas de TCI há cinco meses. Atualmente, é diretora da Associação

Caminhando, grupo voltado para reivindicar e defender os direitos de pessoas com transtornos

mentais. Inteligente e atualizada, está presente nas rodas de Terapia Comunitária como

multiplicadora de informações, que são compartilhadas antes do início das rodas, e reconhece

a importância que a Terapia Comunitária tem para a sua vida e para os demais. Perseverante,

não mede esforços para conscientizar os usuários sobre a luta por seus direitos, estimulando-

os a participarem ativamente dos movimentos encabeçados pela Associação Caminhando.

Tom vital: Estou mais equilibrada, mais controlada [...]

Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária, o meu comportamento mudou

muito. Hoje estou mais calma, mais compensada [...] e o tratamento tem me ajudado muito. Na

Terapia a gente põe pra fora muita coisa que não pomos nas outras oficinas terapêuticas. O terapeuta

incentiva muito para que a gente conte nossa história e assim ele consegue muita coisa e isso é muito

bom. Durante a Terapia percebo que fico menos agressiva. Eu era mais agressiva mesmo quando não

estava em crise e a Terapia tem me ajudado muito a diminuir essa agressividade. Estou mais

equilibrada e mais controlada.

Eu gosto muito de participar da Terapia Comunitária porque já fiz um curso de recursos

humanos e nele vi um pouco de psicologia [...] achei que ele me ajudou muito junto com a Terapia

Comunitária [...] e esse pouco que aprendi, tenho procurado utilizar com as pessoas. A Terapia

Comunitária é diferente das outras terapias que acontecem aqui no CAPS, ela é mais profunda que as

outras. Na Terapia Comunitária sempre tem um tema, embora nem sempre é o que a gente sugere, às

vezes é o tema de outra pessoa que foi mais votado e aí a gente fica pra trás, não que isso incomode

[...] muitas vezes eu sugeri temas que não foi escolhido, mas em outras vezes o povo concordou

porque o que eu sugeri era o tema que eles também queriam ouvir e discutir. Em outras vezes o

terapeuta sugere o tema, é o que ele está querendo ouvir então eu vou contribuir para que ele seja

ouvido, não é? Geralmente os temas dessas Terapias é TOC (transtorno obsessivo compulsivo),

transtorno bipolar [...] e nessas Terapias, o tema fica mais explicado, mas quando o tema é escolhido

Foto 6: Janete

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

Janete

“A árvore não prova a doçura dos

frutos; o rio não bebe suas próprias

ondas; as nuvens não despejam águas

sobre si mesmas. A força dos bons

deve ser usada para benefício de

todos”. (Provérbio Chinês)

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no grupo, a gente se conhece mais porque a partir do momento que ouvimos a dificuldade da outra

pessoa a gente passa a ter um conhecimento mais profundo dos problemas. A gente ouve da pessoa a

explicação de porque isso, porque aquilo, porque esse comportamento tal, tal e tal [...] então a gente

passa a se conhecer melhor.

Posso dizer que a Terapia Comunitária tem me ajudado muito no meu ambiente familiar

porque tenho convivido melhor principalmente com a minha irmã minha, pode entrevistar ela, pois

ela sempre vem pra Terapia Comunitária também [...] seu nome é Rosiane. Melhorei essa minha

agressividade, mas ela é bem mais agressiva comigo. Então eu não conseguia me entender e nem me

conciliar com ela, mas tenho tentado [...] às vezes dou um desprezo e sinto que ela tem vontade de se

reaproximar, mas não tenho nenhum tipo de ódio, rancor ou mágoa [...] mesmo sabendo que ela já

gritou no meio da rua me chamando de louca, dizendo que tenho “macho”, que tenho isso, que tenho

aquilo, quando na verdade não tenho. Pode até ser que um dia eu tenha, mas atualmente estou mais

voltada para o meu tratamento e minha melhora, mesmo sabendo que minha doença não tem cura e

que vou tomar remédio pelo resto de minha vida. Pode até ser que um dia eu pare de tomar, como

muitas pessoas já pararam e hoje estão aí super bem, mas o momento requer tratamento

medicamentoso, terapias e tratamento em casa. Digo tratamento em casa porque a gente precisar dar

continuidade ao que somos no ambiente de terapia e no ambiente familiar.

Já sofri muito com minha irmã [...] ela também já tomou remédio controlado, mas parou por

conta própria. A gente só não interna ela porque seu problema é na perna devido a um acidente que

sofreu, mas mesmo assim, ela sempre se “enxotava” comigo, mas depois do acidente ela ficou mais

leve, mais maleável [...] agora já está voltando ao normal e me agredindo novamente, então eu tenho

silenciado, tenho seguido os conselhos de minha mãe que fala que o desprezo é o melhor remédio [...]

e é mesmo! Porque ela fala e eu não respondo [...] então ela sente na pele que é melhor ela agir

diferente comigo. Esse tal desprezo que minha mãe fala que eu dê, não gosto de dar, mas também

estou sentindo na pele que foi o melhor remédio, apesar da palavra não ser muito agradável [...] a

palavra “desprezo” é muito forte pra você dar a alguém que é do seu sangue [...] eu não gosto dessa

palavra, nem da forma como a gente pode agir pra chegar até esse patamar, mas acredito que está

dando certo [...] ultimamente ela pergunta, eu respondo e sinto que ela está mais calma e educada

comigo.

Eu nunca tentei trazê-la pra cá porque ela não quer nem ouvir falar em CAPS [...] fica

dizendo que não é “louca” pra estar aqui. E se ela frequentasse CAPS, deveria participar do CAPS

ad, porque já foi usuária de drogas e acredito piamente que não deixou de ser [...] já que ela está

saindo, passando três, quatro dias fora e a pessoa que usou uma vez, pode voltar a usar [...] ainda

mais ela que não recebeu nenhum tipo de tratamento, então acredito que ela voltou a usar drogas

ilícitas e “pesadas”, mas como ela não chega com os olhos vermelhos em casa, acredito que não [...]

mas estou com o pé atrás. Posso dizer que a Terapia Comunitária tem me ajudado a lidar com essa

situação [...] até participei um tempo do PAIAD (Programa de Atendimento Integral ao Alcoolista e

outros Dependentes Químicos), porque nessa época minha irmã estava usando muita droga, então

através de uma amiga do bairro passei a frequentar esse Programa, mas infelizmente ele acabou por

falta de pessoas, então a gente deixou de ir.

Considero minha participação na Terapia Comunitária muito importante, porque se você vier

pro CAPS e ficar só na medicação, andando e fumando por aí [...] você não está fazendo o tratamento

completo, você tem que participar das terapias, porque nelas as coisas fluem de verdade e cada

terapia tem a sua metodologia [...] aqui no CAPS não nos falta nada. Se a gente tem um CAPS na

nossa vida, a gente tem tudo! Se não fosse esse espaço talvez eu nem estivesse aqui com você, talvez

estivesse dentro do Juliano Moreira.

Por enquanto estou aqui no CAPS todos os dias, mas estou querendo mudar e a médica pediu

que eu permanecesse, porque eles precisam de mim [...] disse que é porque sei articular bem, porque

estou sempre falando no acolhimento do “Bom dia” e do “Boa tarde”, trazendo informações pra eles,

mas não estou vendo muito resultado nisso. Sempre convido eles pra irem na associação, digo que o

espaço é deles [...] que a gente precisa de uma mensalidade e que não temos fins lucrativos, mas é

muito difícil. Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária, as pessoas me colocaram

para ser diretora da associação Caminhando, porque diziam que eu sou muito preparada, mas estou

sofrendo na pele o que o antigo diretor sofreu no ano passado. As pessoas dizem que tenho

capacidade [...] e sei que tenho, mas quando você está dentro do processo é que você vê o quanto é

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difícil [...] até um carro pra você dirigir é difícil, o que dirá dirigir uma associação de portadores de

transtornos mentais? É muito difícil [...] e eu estou precisando de muitas forças para isso, as forças

boas do além.

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Mulher inteligente e emotiva, Rosiane é irmã da usuária Janete. Participante da TCI há

seis meses, nunca perde o entusiasmo pela vida. Escutá-la é poder enxergar que, apesar das

dores da vida, não teme os desafios que encontra. Desde a última crise de sua irmã, tem

frequentado as rodas de Terapia com assiduidade e contentamento, pois, para ela, esse espaço

representa uma ”válvula de escape”. A colaboradora expressou muita emoção em sua fala,

narrando pausadamente ao aproveitar o intervalo de suas lágrimas.

Tom vital: Chego sobrecarregada e saio relaxada!

A Terapia Comunitária serve para mim como uma válvula de escape. Chego aqui

sobrecarregada e saio relaxada, coloco as emoções pra fora [...] eu me cuido nesse espaço, porque a

gente já passa por tantos problemas [...] e esse momento é meu, serve pra eu olhar para mim, pra

desabafar e aliviar meu sofrimento. Gosto muito daqui! Aqui na Terapia Comunitária aprendi muitas

coisas. Antes eu não sabia como lidar com a situação de Janete [...] às vezes eu era grossa com ela,

não tinha paciência [...] (lágrimas e silêncio). Agora eu não brigo mais, porque a Terapia me ajudou

a conviver melhor com ela. Hoje eu aceito ela do jeito que é, procuro não discutir. E antes, se ela

dissesse alguma coisa que me desagradasse a gente já começava a discutir. Hoje melhorou até com

minha família mesmo, porque agora, eu oriento eles a também se comportarem como eu, mas têm

pessoas lá em casa que não ajudam, não entendem o lado dela. Só ficam dizendo que ela dorme muito

e que é preguiçosa. Já eu não, procuro amenizar todo tipo de conflito, digo a eles que se a gente bater

de frente termina desencadeando uma crise, muitas vezes por conta de uma palavra dita, que poderia

ter sido evitada [...] e isso já faz com que ela fique toda agitada. Então a gente tem que procurar

entender o lado dela e assim conviver melhor.

Antes eu achava que tudo que ela fazia era de propósito, não me acostumava de jeito nenhum

[...] achava que era fingimento. E hoje até a convivência lá em casa melhorou, porque agora eu fico

mediando. Só tem uma pessoa lá em casa que é problemática. É uma outra irmã minha, mas não é só

com a que se trata aqui no CAPS, é com todo mundo, ela é a ovelha negra. Dá muito mais trabalho e

preocupação do que a que tem “problema mental”, então os conflitos lá de casa nem tem mais a ver

com a coitada, tem a ver mais com as coisas que essa minha outra irmã vem fazendo, porque ela

Rosiane

“A bondade é silenciosa como a

semente, mas contém a força da

transformação”. (Sônia Rinaldi)

Foto 7: Rosiane

Fonte: Arquivo da autora, 2012

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pensa que vive só no mundo. Não convive com a gente, vive no mundo sozinha [...] é desagradável

com todos dentro de casa e antes eu pensava que toda discussão e briga era por conta da que tem

“problema mental”, mas hoje já percebo que o problema é na outra [...] ela sim precisa de um

acompanhamento psicológico, mas é aquele tipo de pessoa que não aceita. Se alguém disser que ela é

doente, já briga. Inclusive acho também que ela é alcoólatra, porque sai exclusivamente para beber.

Sai de casa em um dia e só volta no outro de manhã. E a gente não sabe o que ela faz [...] porque sai

cedo da noite e só volta de manhã. Então é uma pessoa que precisa de tratamento também, mas não

admite. Já a que tem “problema mental” é muito mais consciente e tem evoluído muito bem e como eu

sou uma pessoa que não gosta de falar muito [...] até dentro de casa não sou de conversar, evito

atritos com ela [...] mas com minha irmã que tem “problema mental” tenho procurado falar

direitinho, não desapontar, não discutir e procurar sempre fazer alguma coisa pra trazê-la pro nosso

meio de forma bem harmônica.

Depois que comecei a participar desse grupo de Terapia Comunitária, tenho feito de tudo por

minha irmã, porque eu fui a única lá de casa que acordei pra tentar melhorar e agora eu sou

responsável por todo o cuidado com ela, inclusive os exames, tudo sou eu que vou fazer e não me

importo não! Ela é minha irmã e eu tenho que gostar e amá-la assim como ela é (lágrimas). Hoje eu

me responsabilizo por tudo e o que eu puder fazer, eu faço! E esse grupo da Terapia Comunitária

abriu minha cabeça pra enxergar as coisas além do que via, que culpava injustamente minha irmã

doente por todos os conflitos que aconteciam lá em casa e hoje vejo o quanto fui injusta. Meu

ambiente familiar agora está mais pacífico, melhorou muito [...] porque muitas vezes qualquer coisa

que essa minha irmã alcoólatra fazia já me desorientava e eu terminava descontando na outra e

contribuindo pra que ela entrasse em crise. Hoje procuro não dar tanta importância às coisas que ela

faz, eu me seguro!

A Terapia Comunitária fez eu me sentir fortalecida pra ajudar principalmente minha irmã

Janete que tem “problema mental” porque qualquer coisa dentro de casa já altera o seu emocional e

como faço de tudo pra não ter desarmonia, ela fica muito melhor. Inclusive ela fica sempre

estimulando a minha vida pra esse grupo e também as amigas que fiz aqui me incentivam muito,

quando escuto a história de Socorro aqui na roda, vejo o quanto é importante participar da Terapia e

o quanto serviu pra ela ser forte como é hoje. Quando é no meio da semana Janete já fala: “Olha,

Sexta-feira tem Terapia, não deixe de ir” e eu venho porque essa turma me ajuda e assim posso ser

mais forte pra ajudar e cuidar dela, pois a amo muito e sei que é uma pessoa esforçada, inteligente e

que gosta de falar [...] se você der um microfone a ela, pode esperar que é o dia todinho falando,

então sei que minha vinda pra esse grupo

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Maria do Socorro é uma mulher jovem e cuidadosa. Irmã dedicada e satisfeita,

empenha-se com carinho à família, sobretudo aos cuidados com o irmão que é usuário do

CAPS Caminhar. Observadora e participativa, frequenta a TCI há mais de seis meses e tem

uma bela história de força e bondade a partir de sua participação no grupo. A Terapia

Comunitária, para ela, representa uma importante aliada ao processo de aceitação da doença

do irmão.

Tom vital: Aprendi a ser firme!

Gosto muito de participar da Terapia Comunitária [...] ela me deu uma força grande [...] e

também me ajudou a esclarecer muitas dúvidas. Tem contribuído também para o conforto da gente

enquanto família [...] contribui através dos esclarecimentos, porque como nós trocamos muitas

informações, experiências de vida [...] então isso ajuda muito. O que faço por meu irmão [...] o que o

outro fez que deu certo, eu escuto e tento fazer também, então nós vamos compartilhando as histórias

e isso ajuda outras famílias, mas no que ela mais tem me ajudado é na aceitação da doença do meu

irmão, na paciência [...] porque antes tinha muita dificuldade pra ter paciência e faz uns dois anos

que me responsabilizei por cuidar dele, então no início sofri um pouco, mas a partir do momento que

vim participar da Terapia Comunitária, fui aprendendo mais, passei a receber orientações com as

histórias das outras pessoas [...] e aprendi a lidar melhor com a situação dele.

A Terapia Comunitária me ajudou muito na aceitação da doença do meu irmão e na

paciência [...] porque antes eu não aceitava e não queria saber de nada. E hoje não! Me envolvi com

a situação e consegui mudar algumas coisas nele a partir do meu entendimento sobre o problema que

ele tem [...] porque ele levava uma vida muito liberal, fazia o que queria [...] trocava de roupa a cada

cinco minutos, tomava água de qualquer jeito, abria a geladeira de trinta a quarenta vezes por dia e

hoje comecei a organizar isso [...] e ele tem se controlado mais. Sem falar do cigarro [...] que fumava

quatro carteiras por dia, e hoje ele fuma cinco cigarros em um dia. Tem o banho também que ele não

gostava de tomar e hoje briga com a gente para tomar. Não sei como, mas com a minha participação

na Terapia Comunitária criei mais força de vontade e disciplina, aprendi também a ser firme, a ter

pulso [...] e assim consegui mudar muita coisa nele. Hoje ele já toma os remédios certinho, ajuda nas

tarefas de casa [...] a gente coloca ele pra se ocupar. Agora por exemplo, estamos em reforma, então

colocamos ele pra ajudar, jogar o lixo fora, carregar uns tijolos, areias. Outra questão importante

que mudou muito foi a desobediência [...] agora ele é bem mais compreensivo e já me pergunta:

Maria do Socorro

“Amar é uma decisão, não é um

sentimento. Amar é dedicação e

entrega. Amar é um verbo, e o

fruto dessa ação é o Amor”.

(Provérbio chinês)

Foto 8: Maria do Socorro

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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“Minha irmã, eu estou errado? E eu digo: “Você está errado, você tem que mudar isso, não é bom

fazer isso, você tem que obedecer a sua mãe, a sua irmã que cuida de você, que faz tudo por você”.

Então ele está bem mais compreensivo, porque ele não queria entender, então com a minha

participação na Terapia Comunitária tenho melhorado isso e tenho ajudado ele também. Leio muita

coisa sobre a doença dele na Internet, então a gente vai aprendendo. Procuro aprender não só aqui,

na Terapia Comunitária, mas fora também, então a gente vai aprendendo e vai usando com ele pra

melhorar tanto o dia-a-dia dele como o nosso também! Porque é estressante [...] às vezes ele tem

algumas crises, mas a gente sempre controla com um pouco de pulso, com atenção, com carinho [...]

conversando também, porque a gente conversa muito, minha mãe conversa também quando ele fica

um pouco rebelde, então nós vamos contornando todos os dias.

A Terapia Comunitária é boa porque um contribui junto ao outro com suas histórias, e vejo

isso com a importância do apoio que o familiar recebe aqui. A gente esclarece muitos problemas,

muitas vezes você aprende como lidar em várias situações e nós passamos a reconhecer melhor o

papel do familiar no tratamento da pessoa que tem doença mental [...] e percebo que com isso ele tem

melhorado bastante com a gente lá de casa, pois moramos eu, meu esposo, meu filho, ele e minha mãe

e nós estamos conseguindo, graças a Deus, ter um relacionamento familiar muito bom. Agora tenho

outras irmãs e elas não dão muita importância, não ligam pra ele, não dão atenção, não dão carinho,

nem procuram saber se ele está bem. Minha mãe também tem aceitado muito melhor, porque ela o

protegia muito [...] não gostava que ninguém chamasse a atenção dele, não entendia que era pra

mudar o comportamento, pra fazer dele uma pessoa melhor, porque fumava toda hora [...] queria

fumar dentro de casa, queria fumar deitado na cama, então eu dizia a ela do mal que aquilo fazia

tanto pra ele quanto pra gente [...] toda aquela fumaça [...] porque tem o fumante ativo e o passivo e

nós somos os passivos [...] aqueles que recebem toda a fumaça e explicava que juntas podíamos

tentar melhorar a situação, então ela passou a contribuir e realmente melhorou muito.

Tudo que tenho feito por ele hoje é graças à paciência que aprendi a partir daqui [...] da

Terapia Comunitária porque eu era muito alvoroçada com ele, era muito bruta. Passei a perceber que

a paciência ia contribuir muito na forma de falar com ele, de conversar [...] porque se tudo fosse

resolvido na ignorância, eu o deixaria muito mais estressado e talvez até o medicamento nem fizesse

efeito. Ele ficaria agitado, sem conseguir dormir, como muitas vezes já ficou [...] então depois que a

gente teve mais calma, passou a conversar com paciência e quando ele fazia alguma coisa de errado,

a gente não discutia, nem brigava com ele [...] simplesmente a gente tirava as coisas que ele mais

gostava, como por exemplo: ele gostava muito de passear no Mercado Central, ele sempre teve essa

atividade, então eu dizia: “Olhe, a gente não vai mais brigar com você, não vai ficar reclamando,

tudo que você fizer de errado que a gente vê que não foi resolvido na conversa, a gente vai tirar o seu

gosto, não vai mais deixar você ir passear”. Era muito melhor fazer isso que entrar em conflito. Então

ele começou a aceitar mais, percebeu que estava perdendo aquilo que gostava, e foi melhorando [...]

embora a gente saiba que ele é uma pessoa que tem problemas, que tem crises, fica nervoso,

perturbado, mas ele melhorou muito! Melhorou uns noventa por cento, só não digo que foi cem por

cento, porque os dez por cento são alguns defeitinhos que ele tem, mas ele melhorou em tudo!

Percebo que vem muito da minha melhoria, a melhoria que eu busco aqui no grupo de

Terapia Comunitária e do meu esforço pra tentar mudá-lo a partir do momento que comecei a cuidar

dele [...] porque minha mãe cuidava, mas era de forma desregrada, sem limites [...] então ele não

tinha hora pra dormir, não tinha hora pra comer e hoje ele tem uma disciplina maior [...] tem hora

pra lanchar, tem hora pra comer, tem hora pra dormir, tem hora pra tudo. Ele tem se adaptado bem e

em dois anos, muita gente tem ficado de boca aberta com a mudança dele e principalmente com o meu

esforço. Geralmente tem um churrasquinho, uma reunião de família, e no início, quando eu o levava,

ele não conseguia ficar, não tinha contato com ninguém, era um estresse! Hoje não [...] ele vai,

conversa com todo mundo, come o que a gente come, senta na mesa, coloca sozinho o churrasco no

prato e come normal. Então todos estão impressionados [...] porque ele tem transtorno bipolar desde

os catorze anos, faz mais de vinte anos que ele é assim. Meu irmão sempre teve esse estilo de vida e

acho que nesses dois anos consegui muita coisa [...] consegui ajudá-lo a mudar [...] porque ele

fumava deitado pra você ter ideia, a gente ficava morrendo de medo de incêndio. Quando eu ia

arrumar a casa [...] ajudar minha mãe [...] quando afastava a cama dele, tinha muita cinza de cigarro

embaixo porque ele fumava e jogava tudo no chão. E hoje não faz mais isso, quando ele quer fumar já

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vai pra fora de casa pra não prejudicar a gente [...] então ele está mais consciente, entende muita

coisa que eu achava que nunca fosse entender.

Pra mim tudo isso aconteceu graças a meu esforço e graças à ajuda daqui, da Terapia

Comunitária, tudo isso contribuiu! Esse grupo é ótimo, quando não venho fico meio triste, porque

gosto de estar junto ao pessoal [...] gosto de ficar conversando, gosto de aprender com as outras

pessoas e um conforta o outro, é ótimo [...] a gente se ajuda! (Risos) E tem também a amizade que a

gente constrói com as outras pessoas.

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Maria Emília é paraibana, mulher guerreira e sempre alegre. Uma mãe dedicada e

orgulhosa da vida, que vive para sua casa e para os cuidados com a filha, que é usuária do

CAPS Caminhar. Participante assídua da TCI há mais de cinco anos, é uma grande

incentivadora do grupo. A Terapia Comunitária, para ela, representa um momento de

autocuidado e de reflexão para a vida. Transmite uma energia contagiante, ao partilhar suas

experiências, e veste, literalmente, a “camisa” da Terapia Comunitária.

Tom vital: Aprendi a cuidar mais de mim!

Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária, eu melhorei meu jeito de ser. Vi

que tenho me tornado mais tranquila e disciplinada comigo mesma, com minha filha e com meu filho.

No início, quem participava da Terapia Comunitária era o meu marido, porque, na época, eu

trabalhava, mas ele já faleceu, então, depois disso, passei a participar das rodas e a cuidar mais da

minha filha [...] mas, graças a Deus, aqui na Terapia Comunitária, foi onde encontrei muito apoio.

A Terapia Comunitária tem me tornado mais tranquila e isso tem me dado apoio pra cuidar

de mim e da minha filha. Tenho aprendido também muitas coisas sobre o amor [...], a disciplina e o

respeito que devo ter com ela [...] e graças a Deus é uma filha que amo de coração e tudo que puder

fazer por ela, eu faço! Principalmente depois que vim pra Terapia Comunitária, porque antes minha

segunda casa era meu trabalho e hoje é o CAPS. Tenho sempre a preocupação de dar o medicamento

na hora certa, sem falar do carinho que tenho por ela durante todo o tempo. Então dou muita

importância a esse espaço da Terapia Comunitária, porque aqui a gente recebe carinho [...], atenção

e eu faço de tudo para não faltar! Chego até a fazer meu almoço um dia antes, pra no outro dia poder

vir e quando saio da Terapia pra pegar meu neto na escola, já saio com o pensamento de que vou pra

casa sorrindo!

A Terapia Comunitária me ajudou porque no início do tratamento minha filha era uma pessoa

que não queria conversar com ninguém [...] chorava muito e sempre foi muito trancada, e como eu

tinha muita dificuldade pra aceitar isso, só vivia dentro de casa. Mas depois da Terapia passei a me

cuidar mais, ela viu e passou a me acompanhar, a conversar [...] e na Terapia Comunitária eu

aprendi a lidar com isso [...] porque agora faço de tudo pra minha melhora e ao mesmo tempo, pra

dela também! Aprendi também a cuidar mais de mim, porque antes eu só pensava nela e o terapeuta

comunitário sempre fala que é preciso cuidar da gente pra gente aprender a cuidar dos outros [...]

então tenho saído mais de casa e assim cuido dela e de mim também!

Maria Emília

“Construí amigos, enfrentei

derrotas, venci obstáculos, bati

na porta da vida e disse-lhe: Não

tenho medo de vivê-la”.

(Augusto Cury)

Foto 9: Maria Emília

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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Com a minha participação na Terapia Comunitária, mudei meu comportamento. Eu não era

grossa, nunca fui graças a Deus, porque ela pra mim é minha filha mais velha, minha filha do

coração, mas eu mudei porque antes não saía com ela [...] não tinha tempo pra sair, só tinha pra

trabalhar [...] e isso ajudou a melhorar na sua tranquilidade, porque ela era uma pessoa muito tímida

[...] não falava, não conversava, ficava quieta na dela e agora já conversa comigo. Antes eu só ia pra

igreja, não ia a uma festinha, um aniversário, na casa de uma colega [...] não tinha tempo para mim

nem para ela e hoje saio bastante [...] hoje vou à casa de minhas colegas, à uma praia, à piscina e

sempre com ela de lado. Eu a chamo pra sair, então ela me pergunta pra onde [...] e digo que vou à

praia, na escola do meu neto, numa festinha, no aniversário da minha vizinha e ela vai [...] e antes

isso não acontecia, porque eu me apegava muito ao serviço e deixava tudo pra meu marido fazer, ele

que cuidava mais dela, mas mãe é mãe e eu pensava sempre em como ela ficaria quando eu morrer,

dizia muito isso ao terapeuta comunitário e ele me falava pra pensar no dia de hoje que do amanhã

Deus toma conta, então comecei a refletir sobe isso e ouvindo as histórias de gente que tem mais

problemas que eu, achava que o meu era o mínimo!

Hoje sou uma pessoa realizada, tenho orgulho de quem sou [...] enfrento tudo e não tenho

mais problema nenhum na minha vida [...] em comparação a quem eu era [...] uma pessoa trancada,

que só vivia ali de casa pro trabalho, hoje sou uma pessoa livre! No dia que você ouvir que faltei a

Terapia Comunitária, pode ter certeza que alguma coisa muito séria aconteceu [...] ou foi uma

doença muito séria que não me deixou, mas até aqui nada me amarrou pra eu não vir, porque lá em

casa só vive eu, minha filha e meu neto, então sempre dou o meu jeitinho para estar aqui, mas na

Sexta-feira já é certo eu ter a passagem de ônibus pra vir [...] porque à Terapia Comunitária não

posso perder. A Terapia Comunitária faz de tudo, parece que ela me chamou [...] parece que abriu

meu coração e acabou com a minha “cegueira”! (risos) Ela faz com que a gente participe mesmo e

estou sempre conversando com as mães pra elas não perderem porque é bom, é muito bom pra gente!

Fico incentivando [...] hoje mesmo vou telefonar pra minha amiga Rita de Cássia e saber o motivo

pelo qual ela não veio, acho que foi porque ela estava com um filho no hospital, mas só pode ter sido

alguma coisa muito séria porque ela também não falta por besteira!

O terapeuta comunitário nos incentiva muito com as mensagens e com a palavra amiga e essa

palavra amiga é o nosso maior presente dentro da Terapia Comunitária [...] o terapeuta comunitário

é como um cristal pra gente! Então gosto muito da Terapia Comunitária, gosto de tudo! Antes,

quando eu vivia afastada do grupo até podia criticar alguma coisa porque achava que nada pudesse

ser resolvido aqui, mas quando a gente fica dentro daquele grupo, vai percebendo que as coisas vão

melhorando, cada dia mais!

As palavras que levo daqui da Terapia Comunitária melhoram muito a minha vida [...]

porque levo pra usar com minha filha e dão muito certo! Às vezes pensava ser uma sofredora,

fracassada [...] e com as histórias que escuto aqui, vejo que existem pessoas que têm problemas

maiores que o meu e que conseguem superar, por quê eu também não vou conseguir? Então fico me

sentindo sempre bem melhor [...] e hoje é diferente, me orgulho de quem sou!

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Rita de Cássia é uma morena alegre e guerreira. Mãe de uma usuária do CAPS

Caminhar, vive para a família e se dedica, com empenho, à criação dos filhos e ao marido.

Participante da TCI há mais de cinco meses, orgulha-se de sua participação no grupo. Ouvi-la

narrar é identificar o real sentido de dedicação e sabedoria que uma mãe carrega consigo. Ao

participar assiduamente do grupo, tem construído significativos laços de amizade e afeto com

os demais membros.

Tom vital: Hoje estou mais forte!

Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária, tenho percebido muitas mudanças

na minha vida que tenho levado pra minha família. Adquiri muita paciência, tenho dialogado mais,

converso mais com minha filha, agora compreendo melhor a situação dela, que não é fácil [...] e

tenho tentado não entrar em conflito com meu marido e meus outros filhos pra buscar diminuir a

dificuldade de convivência. Quando algum problema ou confusão acontece lá em casa, tento desviar a

atenção dela pra outra coisa [...] pra não causar mais tumulto [...] porque acaba que por causa de

um, todos terminam ficando nervosos [...] principalmente ela e isso não dá certo!

A Terapia Comunitária me ajudou porque tenho compreendido melhor a minha filha. Antes eu

era muito intolerante, evitava contato e chegava muitas vezes a bater nela por não entender a

situação. Muitas vezes ela ficava repetindo o que eu dizia [...] e isso me tirava a paciência, me fazia

perder a cabeça, mas agora a gente conversa e ela não faz mais de jeito nenhum. Quando ela insiste

em me aborrecer, saio de perto, deixo-a quietinha [...] e quando ela percebe que não está me

incomodando mais com aquilo, já para [...] porque não insisto mais como insistia antes [...] que eu

ficava reclamando e sempre piorava o quadro, mas depois da Terapia Comunitária me tornei mais

tolerante, fui me trabalhando, conversando e hoje isso não acontece mais.

Agora, outra coisa muito importante que também aprendi foi a receber, porque antes eu só

dava! Dava bastante mesmo, fazia de tudo por todos! Irmãs, sobrinhos [...] eu fazia mais por eles que

por mim. E quando chegava minha vez, que eu precisava, ficava no canto. Ninguém chegava pra

dizer: “Eu vou te ajudar”, “Vou passar o dia aí com sua filha” ou “Vou levar ela pra algum lugar”,

isso aí eu não tinha e com a Terapia Comunitária aprendi que não é só dar, estou buscando receber

também. Antes bastava alguém telefonar pra mim que ia correndo ajudar, queria resolver todos os

problemas da minha família [...] era só ter um tempinho que corria pra casa deles achando que

Rita de Cássia

“Não há nada que não se

consiga quando existe força de

vontade, bondade e,

principalmente, amor”. (Marcus

Cícero)

Foto 10: Rita de Cássia

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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quando chegasse, tudo se resolveria [...] e muitas vezes eu complicava mais ainda a situação, então a

conversa ia se prolongando, me aborrecia e terminava me afastando da minha família. E hoje parei

com isso graças à ajuda que recebo na Terapia Comunitária. Tudo que acontece na vida dos meus

filhos e da minha família, como sou a filha mais velha de onze irmãos, elas acham que tenho que

resolver [...] mas ninguém enxerga que também tenho os meus problemas, então digo pra cada um

tomar conta e resolver os problemas de sua casa, depois parei!

E diante de tudo isso, ficava muito estressada [...] queria solucionar os problemas dos meus

filhos, da minha filha e então ficava muito irritada, nervosa e chorava bastante porque sempre ia na

intenção de resolver e nem sempre conseguia e isso fazia com que eu perdesse a cabeça

principalmente dentro de casa e com minha filha [...] e depois da Terapia Comunitária nem chorar

mais choro! Quando começava a conversar com as pessoas sobre os meus problemas, já caía no

choro e hoje estou mais forte. A Terapia Comunitária é muito importante porque ela faz com que a

gente se reúna aqui com outras pessoas que têm praticamente a mesma história, as mesmas dores [...]

sem falar do amor que a gente recebe aqui, o carinho [...] que a gente fica passando um pro outro e a

atenção também, que às vezes a pessoa não tem dentro de casa, às vezes nem do próprio marido.

E com a minha filha tenho aprendido a lidar melhor com o ciúme [...] porque ela tem ciúmes

do pai, dos dois irmãos [...] então fico toda vez conversando com eles, pedindo pra entenderem, pra

não se abraçarem nem se beijarem com suas esposas [...] porque ela fica querendo fazer a mesma

coisa, diz que vai arrumar um namorado também pra se “agarrar” e se beijar igual aos irmãos [...]

peço também pra que eles não discutam com as esposas na frente dela [...] converso com meu esposo,

porque às vezes ele chega do trabalho estressado e vem descontar em mim, então já peço pra ele

baixar o tom porque depois ela vai copiar e fazer a mesma coisa comigo. Mas é muito ruim, eu me

sobrecarrego porque só me dedico a minha filha e ninguém aqui de casa me ajuda! Fico sempre

apaziguando [...] conversando com um, conversando com outro [...] e quando estamos só eu e ela em

casa, é uma maravilha, deixo ela no canto lendo uma revista, descansando um pouco e fica aquele

silêncio profundo [...] agora quando chega o final de semana já fico nervosa e ela também [...]

porque tenho que estar ali, controlando tudo pra minha filha não entrar em crise, fico no pé dela. Às

vezes ela quer fazer alguma coisa, então deixo [...] depois a chamo, mas quando ela não vem, não fico

alterada como ficava antes [...] porque tanto ficava eu, como ela também.

Aprendi também na Terapia Comunitária a cuidar dos meus outros filhos [...] porque não é só

ela que precisa, tudo bem que ela precisa de uma atenção maior, mas os outros também precisam de

mim, até mesmo porque eles me dão mais preocupação que ela [...] já que ela está sempre comigo, sei

o que está fazendo, já os outros quando saem de casa, eu não sei mais de nada, fico muito angustiada

e como na Terapia Comunitária os problemas que as pessoas colocam são muito parecidos com os

meus, aprendi a ter paciência, a confiar mais em Deus. Gosto desse grupo porque me sinto mais

calma, mais tranquila, tenho me curado junto com minha filha e minhas amigas daqui [...] dona Rita

Ângela, Laurizete, Maria Emilia e isso tem sido muito importante pra mim.

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Maria Laurizete é uma pessoa admirável. Mulher de fibra e tranquilidade, é mãe de um

usuário do CAPS Caminhar e participante veterana do grupo de TCI. Preocupada com as

palavras que pronunciava, transmitiu introspecção e objetividade em sua fala que, embora

sucinta, foi forte e significativa. Como mãe e dona de casa exemplar, mostra ser uma

mediadora em potencial, que usa sua sabedoria para amenizar os conflitos familiares em favor

da condição de saúde do filho.

Tom vital: Aprendi a ser mais tolerante e paciente.

Faz um ano que venho pra Terapia Comunitária aqui no CAPS, antes eu já participava, mas

em outro CAPS [...] onde meu filho fazia tratamento desde os dezesseis anos. Ele nunca foi de falar,

não tinha intimidade com ninguém, era muito agressivo, não participava de nada em grupo [...] nada,

nada [...] só ficava olhando pra baixo, às vezes chorando, não gostava de ir pra lá [...] às vezes ficava

de um ou dois meses sem querer ir. Os profissionais do CAPS iam na minha casa conversar com ele e

nada, mas depois de muita luta minha e quando ele me via indo pro CAPS, pra Terapia Comunitária,

começou a me acompanhar e voltou [...] começou a participar das brincadeiras e até teatro fez! E

começou a conversar com todo mundo, porque antes ele não conversava [...] e você vê como ele é

hoje? Não deixa ninguém quieto, não para de falar um minuto e sente saudade de todo mundo daqui.

Antes ele não queria, não gostava [...] e no final começou a gostar das pessoas, da professora de

teatro, passou a conversar e foi quando ele mudou-se pra esse CAPS onde se trata atualmente.

O grupo de Terapia Comunitária representa muita coisa pra mim, porque a gente aprende a

cada dia que passa. Aqui aprendi que é importante sempre escutar a história de cada um e escutando

a história da outra pessoa a gente aprende mais, ensina mais e ajuda mais. Aqui na Terapia aprendi a

ser mais tolerante, mais paciente e a reagir menos às agressividades do meu filho. Aprendi que

quando ele começar a ficar agressivo, não devo levar muito em conta o que ele fala e relevar,

evitando os conflitos [...] porque se for escutar o que ele diz e brigar, é pior [...] e aprendi isso aqui

na Terapia Comunitária, porque tem muitas histórias parecidas com a minha.

Tento também fazer as coisas que meu filho quer, claro que não tanto [...] faço quando vejo

que dá pra fazer. Converso muito com ele [...] principalmente quando está em crise e vem com mil

agressões pro nosso lado e fica agredindo com palavras, então converso com ele e depois vai

passando. Sempre tive paciência, mas o pai não tinha, então conversava com meu marido que é muito

Maria Laurizete

“Descobre-se que Amar é,

sobretudo, Dedicação e

Paciência”. (André Luiz

Ribeiro)

Foto 11: Maria Laurizete

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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impaciente pra tentar entender a situação do nosso filho [...] já que o problema dele é ter uma pessoa

que escute o que tem pra falar [...] se deixar é o dia todinho a pessoa escutando as besteiras dele [...]

porque ele chega e começa a contar daqui do CAPS, diz que toda menina daqui é sua namorada, diz

que já trocou de namorada [...] e a gente diz: “Tá certo, tá bom”, digo que estou escutando e pronto.

Às vezes quando estou fazendo o jantar, ele vem e começa a falar, falar, falar [...] então vê que estou

escutando e vai se aquietando [...] e o pai dele também que antes não tinha paciência, hoje nem briga

mais [...] isso porque converso muito com ele sobre o que aprendo aqui e porque às vezes ele também

vem comigo à Terapia Comunitária.

Depois da minha participação na Terapia Comunitária percebi que a convivência com meu

filho melhorou, porque escuto as histórias das pessoas e penso que meu problema nem é tão grande

assim [...] mesmo quando ele me agride e começa a chamar palavrão comigo e com o pai, então a

gente sempre brigava, reclamava e ele ficava mais agressivo (suspiro). Meu filho não precisou mais

nem ser internado e com meia hora já volta ao normal, mas se a gente for discutir, ele enlouquece e

fica pior [...] e antes a gente chamava logo o SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e o

levava pro PASM (Pronto Atendimento em Saúde Mental), a gente não aguentava! Agora a gente

deixa ele quieto, não discute mais [...] deixo ele conversar o que quiser e não presto muita atenção.

Esse grupo da Terapia Comunitária tem me ajudado e muito. Acho até que já tenho o dom do

cuidado, porque primeiro foi o meu marido que sofreu de depressão [...] e melhorou, depois veio meu

filho, mas o caso dele, os médicos disseram que é de nascença, não tem cura [...] mas com essa turma

da Terapia Comunitária criei muita coragem e força, porque às vezes você chega triste, e na

conversa, na roda, em tudo [...] a gente sai outra pessoa. Gosto de ouvir um e outro, o que acontece

com a família das outras pessoas [...] escuto a história deles e chego em casa melhor, porque a

pessoa sempre vem com um “peso” pra cá e sai mais leve, por isso gosto muito da Terapia

Comunitária! Saio melhor até pra cuidar do meu filho em casa. Gosto muito desse grupo [...] tanto

das pessoas, como do terapeuta comunitário. Gosto muito de participar! Pelo menos já sei que uma

vez na semana preciso sair e vir pra cá.

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Rita Ângela é uma mulher guerreira e participa da TCI há, aproximadamente, um ano.

Mãe conservadora e cuidadosa, exibe um olhar carente de apoio quando fala de sua trajetória

com a filha, que é usuária do CAPS Caminhar. Esclarecida e determinada, está presente em

todas as rodas de TCI e reforça sempre, em suas falas, a importância da adesão dos familiares

ao processo terapêutico de seus entes.

Tom vital: Aprendi a fazer a minha parte!

A Terapia Comunitária me ajudou muito porque aprendi a conviver melhor com a situação de

minha filha, tenho convivido bem, convivido melhor [...], mas sinto que poderia trazer mais benefícios

se meus outros filhos também participassem junto comigo, porque só quem participa sou eu. O que eu

queria realmente era que a família toda participasse, porque não posso obrigar os outros familiares a

virem. Os filhos dela, por exemplo, seria muito bom que eles viessem pra Terapia Comunitária

também, mas não tenho como trazê-los, nem posso obrigá-los [...] queria que esses dois filhos que já

são de maior viessem participar junto a mim [...] pra me darem mais força e apoio pra lidar com ela,

mas eles são omissos diante do problema [...] queria poder contar com eles pra trazê-la, buscá-la,

providenciar o medicamento e pra saberem tomar uma iniciativa [...] quer dizer, são isentos disso [...]

e não é porque eu isento, é porque eles realmente não querem.

A Terapia Comunitária contribuiu pra minha vida porque aqui escuto as histórias das pessoas

que também têm problemas e que são um pouco mais diferentes [...] são pessoas que geralmente têm

problemas mais difíceis [...] e isso ajuda porque penso que estou sofrendo, mas vejo que têm pessoas

que sofrem muito mais que eu. Agora sinto que poderia estar ajudando muito mais, porque como sou

sozinha pra cuidar dela, pra fazer tudo [...] e ainda tenho outra filha que tem um déficit mental bem

parecido com o caso dela, então duas pessoas doentes pra uma pessoa que tem a idade que tenho,

além de toda essa responsabilidade, não é fácil! (Suspiro profundo) É como digo sempre [...] eu

queria, se possível, trazer a família também pra participar da Terapia Comunitária. Com certeza isso

ajudaria bastante [...] e como você vai escutando as pessoas falar de problemas mais graves, você vai

ouvindo e aquilo vai te ajudando a suportar melhor o seu e depois que comecei a participar, tenho me

comportado da melhor maneira possível [...] evitando contrariá-la [...] porque tem vezes que você

não quer, mas têm situações que são tão graves que você termina se envolvendo num conflito, mas já

Rita Ângela

“Lute mesmo sem forças. Lute

com garra, lute com

determinação. Não é preciso

ganhar a luta. Pelo simples

fato de estar lutando, já és um

campeão”. (Débora Destefani)

Foto 12: Rita Ângela

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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sabendo que têm as estratégias que você pode fazer para evitar isso tudo, eu vou fazendo [...] porque

quanto mais você se entrega ao problema, pior fica a situação [...] então faço a minha parte, mas de

qualquer maneira, só posso falar por mim [...] dos outros, já não posso esperar o mesmo. Tenho

procurado também não levar muito em conta o que ela fala, tem coisas que não preciso levar muito

em consideração [...] então procuro sair com ela, tenho relevado mais.

Com a Terapia Comunitária aprendi muitas estratégias pra lidar com minha filha [...] tenho

utilizado muitas, mas não depende só de você, depende de toda a família que também deve estar

envolvida [...] porque se a pessoa quer, bem [...] mas se não quer, fica meio complicado. Então tenho

feito de tudo dentro do possível. Por exemplo, agora mesmo tenho utilizado uma estratégia que é não

dormir mais em casa, porque se eu dormir com ela, o povo lá não respeita [...] canta, grita, deixa o

computador ligado [...] então pra não acontecer nada e pra ela ficar bem, preferi alugar outra casa

[...] aluguei e fui dormir com ela, só que é um negócio muito difícil! Mas é uma tentativa até pra mim

também, porque não posso ficar sem dormir, então assim tenho buscado fugir dessa luta [...] porque

ela ficava em casa oprimida, sofrendo no meio dessa discussão [...] mesmo eu pedindo a colaboração

deles, mas não adiantava e depois que passei a me unir com o pessoal da Terapia Comunitária,

quando passei a escutar as histórias que eles traziam, passei a gostar mais ainda das rodas e fiz

muitas amizades [...] não posso nem dizer que é só pelo terapeuta comunitário que conduz o trabalho,

mas é porque você vai escutando, vai tomando os exemplos pra você e pensa que se aquela pessoa

conseguiu, porque eu também não vou? Você vai se fortalecendo, embora não deixe de ser difícil!

A minha principal alternativa era pensar no que fazer pra amenizar um pouco a situação, os

conflitos [...] mas eu já melhorei, já tomei essa decisão [...] tem várias decisões a serem tomadas

ainda, não sei se é covardia ou medo, mas tenho que ir tomando a decisão aos poucos [...] e assim

vou sobrevivendo.

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55 AANNÁÁLLIISSEE EE DDIISSCCUUSSSSÃÃOO DDOO

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5. 1 A TCI COMO PRÁXIS LIBERTADORA

“Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta

sozinho: os homens se libertam em comunhão.” (Paulo

Freire, 1987).

A pedagogia libertadora de Paulo Freire e a TCI carregam em suas essências aspectos

que convergem para princípios comuns que se relacionam significativamente uns com os

outros: a autonomia do sujeito, a horizontalidade do saber, a educação como prática

libertadora e a incompletude do ser humano. Assim, de acordo com as ideias de Paulo Freire e

as nuances trabalhadas na TCI, as pessoas são dotadas de recursos pessoais, sociais e culturais

úteis que direcionam os indivíduos ao encontro de soluções para os problemas

experimentados cotidianamente (LAZARTE, 2012).

A autonomia, como característica comum na TCI e na pedagogia freireana, aponta

para a ideia de que todas as pessoas têm poderes reais e/ou potenciais que podem subsidiar

transformações em suas próprias vidas, ou seja, os sujeitos detêm uma força que os

impulsiona para a descoberta e estimula-os a serem responsáveis por adotar posturas de

proatividade e assumir o gerenciamento de suas experiências.

Com a TCI melhorei de forma espetacular! Ela contribui também

porque despertou em mim a vontade de lutar por meus direitos, a

compreender melhor o outro e a conviver melhor com as pessoas

(Allan).

A TCI me transformou em outra pessoa! (Maria José)

Nos tons vitais acima, verifica-se que a TCI descortinou o mundo desses sujeitos ao

desabrochar forças e trazer nitidez para suas vidas na perspectiva de uma conscientização que

estimula o ouvir, o refletir e o agir. Com as entrevistas, visualizou-se que os participantes da

TCI se apropriaram de sua realidade e passaram a refletir sobre ela, a desconstruir concepções

acerca de suas vidas e a desenvolver capacidades de desprendimento e de discernimento que

criaram e transformaram circunstâncias desafiadoras e severas.

De acordo com o que preceitua a TCI, compreende-se, em meio a uma horizontalidade

do saber, que todas as pessoas são aprendizes inacabados, construtoras de saberes e de visões

de mundo que não se sobressaem umas às outras, mas que contribuem igualmente, e que,

como os participantes se encontram no mesmo patamar de igualdade, são fundamentalmente

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importantes em um processo de escuta e de aprendizagem, de modo que as pessoas aprendem

e refletem por meio das histórias ali trazidas e, em sinergia, também ensinam ao compartilhar

suas histórias de vida por meio de um espaço dialógico de respeito e de reciprocidade

(LAZARTE, 2011).

Nesse sentido, Freire (2005) destaca que o diálogo “é uma necessidade existencial. É o

encontro entre os homens, mediatizados pelo mundo, onde a reflexão e a ação orientam-se

para o mundo que é preciso transformar e humanizar. É necessário amor, humildade,

criticidade e esperança". Frente a isso, a TCI se lança no contexto de seus participantes e

impulsiona-os a tomarem posse de sua realidade e de transformá-la por meio de ações

conscientes que transcendam a vitimização, mas também reconheçam e estimulem processos

de descobertas e reinvenções edificadas coletivamente.

A educação, como estratégia promotora da liberdade, opõe-se à existência de sujeitos

isolados e desconectados do mundo, além do mundo como um contexto que subsiste afastado

do ser humano. Assim, o que se torna autêntica é a relação estabelecida entre os homens e o

mundo. “Relações em que consciência e mundo se dão simultaneamente. Não há uma

consciência antes e um mundo depois e vice-versa” (FREIRE, 1967). “A consciência e o

mundo, diz Sartre (1965, p.25), se dão ao mesmo tempo: exterior por essência à consciência,

o mundo é, por essência, relativo a ela.”

Nessa perspectiva, enquanto os homens passam a refletir sobre si e sobre o mundo,

ampliam seu território perceptivo e direcionam seus alvos a focos até então ignorados, de tal

modo que, ao longo de todo esse processo, vão identificando sentidos e refletindo sobre deles.

E o que antes já se mostrava presente com objetividade, mas que não era considerado em sua

essência maior ou até mesmo negligenciado, passa a estar em evidência e a representar um

desafio a ser considerado e superado. A partir de então, o evidenciado torna-se importante,

transformando-se em um centro de ação e de conhecimento humano.

Como na TCI os fatos são vistos em cadeia, semelhantes a um processo, os

participantes se veem inseridos num contexto de dissensos que, indubitavelmente, compõe a

vida. Dessa maneira, o importante na TCI é que ela desperta as pessoas para se enxergarem

num ambiente de relações que estimula a autoanálise e a heteroanálise, a partir das vivências

inerentes a cada indivíduo. Elas se reconhecem como responsáveis por compor o ambiente

onde vivem e lutam e podem construir relações vivenciais e olhares de mundo que tiranizam e

afligem, mas que também empoderam e libertam (LAZARTE, 2012).

A pedagogia libertadora de Paulo Freire sustenta-se em uma perspectiva de criticidade

e criatividade. Não basta conhecer ou saber sobre determinada questão, é necessário discernir

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e ponderar em função de objetivos que são criados e que devem ser alvo de reflexões. Nesse

sentido, essa pedagogia emancipatória desenvolve o senso sociopolítico das pessoas sob um

ponto de vista revolucionário e essencial, uma vez que a liberdade é um elemento básico da

própria democracia.

Freire (1967) destaca que a luta pela libertação das pessoas é inatingível enquanto são

alienadas ou se mantêm assim. A liberdade verdadeiramente implica um processo de

humanização, representa um esquema de construção coletiva que envolve a participação de

todos e não apenas o depósito unilateral de palavras “vazias” e “míticas”. Corresponde a uma

práxis que avança no sentido da ação e da reflexão humana no mundo e sobre o mundo para

transformá-lo.

Freire (1967, p. 73) enfatiza, ainda, que

quanto mais se problematizam as pessoas, como seres no mundo e com o

mundo, tanto mais se sentirão desafiados. Tão mais desafiados, quanto mais

obrigados a responder ao desafio. Desafiados, compreendem o desafio na

própria ação de captá-lo. Mas, precisamente porque captam o desafio como

um problema em suas conexões com outros, num plano de totalidade e não

como algo petrificado, a compreensão resultante tende a tornar-se

crescentemente crítica, por isto, cada vez mais desalienada. Através dela,

que vão surgindo no processo da resposta, se vão conhecendo, mais e mais,

como compromisso. Assim é que se dá o reconhecimento que engaja.

A perspectiva libertadora que a TCI compactua com a prática educativa freiriana

remete à ideia de que as pessoas se tornam livres não pelo simples fato de agregarem

conhecimentos científicos, mas por se apropriarem, gradativamente, de suas histórias de vida,

seus valores e suas experiências e os aceitarem. Portanto, conhecer tais elementos contribui

sobremaneira para que aceitem sua condição de sujeitos partícipes que assumem o comando

da própria vida, e não, de culpabilização frente à figura de alguém superior ou dominador.

Essa nova leitura, esse processo de construção ilimitado e dinâmico, opõe-se à acomodação

que oprime e segrega, mas avança no sentido de um posicionamento que inclui e liberta

continuamente (LAZARTE, 2012).

E é nesse ciclo que a TCI se fortalece, contornando as circunstâncias que foram e

poderiam ser ainda mais negativas para as pessoas, fazendo emergir uma nova consciência, ou

seja, uma consciência que oportuniza descobertas, transformações e libertação consolidadas

na práxis libertadora de Paulo Freire. Confirmam essas ideias as seguintes falas:

Esse grupo da Terapia Comunitária abriu minha cabeça pra enxergar

as coisas além do que eu via (Rosiane).

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Com a Terapia Comunitária criei força de vontade e aprendi a ser

firme! (Maria do Socorro).

A Terapia Comunitária faz de tudo, parece que ela me chamou [...]

parece que abriu meu coração e acabou com a minha “cegueira”

(risos)! (Maria Emília).

Constata-se, portanto, que a TCI despertou seus participantes para um processo de

libertação, um poder de escolhas e de decisões sobre o próprio destino, encorajando-as e

estimulando-as a tomarem posse das configurações sociais e suas (in)coerências e as

compreenderem de maneira a modificá-las deliberadamente.

5.1.1 Mudanças que fazem a diferença

A abordagem dos transtornos mentais constitui um desafio, visto que, desde a

antiguidade, o indivíduo em adoecimento mental já era estereotipado como entidade negativa

ou como incômodo para a sociedade vigente e qualificado como ser desprezível, estranho e

que fugia às regras do convencionalismo, de modo a ser excluído, e padrão de comportamento

determinava aqueles que eram adequados ou não e fazia emergirem os preconceitos e os

estigmas (MACIEL et al, 2008).

Antes do movimento de Reforma Psiquiátrica, os sujeitos considerados como loucos

viviam à margem da sociedade. Na ocasião de seu primeiro surto, o doente era segregado em

manicômios por árduos anos e, muitas vezes, até sua finitude. Nesse instante histórico, o

portador de transtorno mental era retirado do convívio ou indício de uma vida frutífera, ficava

recluso, esquecido e distante da família (PIMENTA, 2008). Dessa maneira, era afastado do

componente familiar como uma proposta de tratamento. Para justificar tal intervenção,

advogava-se que a família estaria sob ameaça de contaminação pela loucura e que, por causa

disso, precisava de proteção, visto que o louco era considerado uma figura nociva à estrutura

familiar, porque se supunha que poderia perverter os membros mais fragilizados, e isso era

um exemplo negativo, passível de imitações. No entanto, mesmo que a família fosse

resguardada do seu membro doente, tal núcleo era também acusado de ocasionar a loucura,

haja vista a existência de um discurso que defendia a alienação como um desvio proveniente

da estrutura familiar e dos conflitos que ocorriam naquela relação (PIMENTA, 2008).

Ackerman (1986, p. 6) refere que a instituição familiar

representa a mais antiga associação já existente, formada desde os

primórdios por convivência tribal e posteriormente por indicações familiares

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ligadas a posses ou ligações financeiras entre grupos dominantes. A família é

uma entidade paradoxal e indefinível. Pode-se defini-la de maneira

particular, uma vez que está relacionada a aspectos históricos, geográficos e

culturais, que acompanham cada pessoa. Não se pode pensar a pessoa sem

pensar no grupo onde ela vive, que relações ela estabelece, qual é seu espaço

e papel dentro desse grupo familiar e social. Há uma intensa troca entre a

pessoa e seu meio, sendo difícil dizer ou delimitar o que é interno,

relacionado ao “eu” de cada um, ou o que é externo, referente ao ambiente

em que vive. A maneira como interagem esses aspectos, influencia no

desenvolvimento da personalidade de cada um.

A exclusão do indivíduo em adoecimento mental se eternizou no tempo, de tal modo

que, na contemporaneidade, não raras vezes, o tratamento é permeado pela rotulação, pelo

simples controle dos sintomas, à base da terapêutica medicamentosa, e pela conservação do

indivíduo em instituições psiquiátricas, retirando-o do ambiente familiar, do espaço laboral e

dos vínculos sociais, ou seja, excluindo-o da vida em sociedade (MACIEL et al, 2008),

conforme reforçam as falas dos usuários abaixo:

Depois que comecei a dizer aos poucos que fazia tratamento em um

CAPS, passaram a me ver como uma pessoa incapaz de exercer a

função e tiraram o meu contrato no emprego [...] (Allan).

[...] as pessoas não querem conversa com pessoas “doentes” e

pensam que não sei de nada. Elas dizem que não sabem do que estou

falando porque não passam pelo que eu passo [...] (Maria José).

Tais constatações demonstram que a estigmatização do transtorno mental faz com que

o indivíduo perca os direitos de exercer sua cidadania, seja segregado socialmente e vítima de

preconceitos. Hoje se sabe que o transtorno mental, explicado por variáveis sociais, biológicas

e psicológicas, carece de assistência apropriada, com vistas à sociabilidade e ao suporte

adequado para ele e para a família. Conviver socialmente não é fácil, pois a doença mental,

em dadas circunstâncias, ainda é julgada como transgressão de normas e padrões sociais, não

é tolerada e contribui sobremaneira para a exclusão de pessoas em sofrimento mental e para o

desgaste nas relações familiares.

Antes do início da RP no mundo, a relação da família com o sujeito em sofrimento

mental era manejada por agentes médicos e por agências estatais, responsáveis pela cura, pela

custódia e pela assistência a esse público. À família cabia apenas o direito de detectar a

loucura e encaminhar para o manicômio, oferecer dados relevantes, visitá-lo em determinadas

ocasiões e aguardar, pacientemente, pela recuperação que, majoritariamente, não ocorria, e

isso dificultava o regresso do louco ao contexto familiar. Em muitos casos, esses sujeitos

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chegavam a óbito ou padeciam nas ruas, discriminados pela família e longe de qualquer

espécie de vínculo social (BARROS, 2004). Esses fatos se conservaram por muitos anos. E

frente a essa situação, várias práticas emergiram com vistas a melhorar a assistência,

estimulando ações críticas a partir do que se tinha, no sentido de realizar um

redimensionamento teórico-prático, ou seja, uma ruptura do paradigma existente (LUZ,

2004).

Pimenta (2008) enuncia que a RP brasileira nasceu trazendo em seu corpo de

reinvindicações a possibilidade de levar a loucura para o seio familiar, para que o usuário

fosse reintegrado ao convívio social e que não fosse mais segregado em manicômios. Essa foi,

portanto, uma grande transformação. Se antes, o louco era recluso da família por representar

um risco, agora, é incorporado a esse grupo, por meio do qual pode adquirir apoio para

usufruto de uma vida em sociedade. Com esse redimensionamento, surgem as dificuldades

suscitadas nos familiares diante dessa nova incumbência: conviver com a loucura de forma

tão íntima e ainda ser um componente indispensável na luta contra a exclusão social da pessoa

em sofrimento mental.

Bader (2002) afirma que a exclusão sofrida por doentes mentais é decorrente de um

processo sócio-histórico determinado por sua repercussão em todos os aspectos da vida social,

mas que prevalece como necessidade do eu, como significados, sentimentos e ações

subjetivas. Defende, também, que existem inúmeras vertentes da exclusão - como o viés

objetivo da desigualdade social, o viés ético da injustiça e o viés subjetivo do sofrimento - e

que o processo de naturalização da exclusão social, demonstrado pela aceitação do próprio

excluído e da sociedade, cria uma atmosfera social de conformismo e de concordância e

interpreta o lugar de exclusão como catastrófico, conforme demonstram as seguintes falas:

[...] as pessoas me discriminavam. Eu era tão fraca que pedia

desculpas por ser daquele jeito [...] (Maria José).

[...] as pessoas lá fora quando descobrem que somos doentes mentais,

não querem “se chegar muito” (Josineide).

Para Wanderley (2002), esse processo de exclusão, embora repercuta no sujeito e na

sua subjetividade, não deve ser compreendido como algo individual de culpabilização da

pessoa, mas numa perspectiva mais abrangente, que contemple as diversas formas de relações

sociais, políticas, econômicas e culturais da sociedade. Não abrange somente a pobreza, mas

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também a subalternidade, a discriminação, a desigualdade, a inacessibilidade e a falta de

representação pública desses sujeitos, sobretudo quando se referem à representação familiar.

Segundo Oliveira e Loyola (2004), a sociedade sempre idealiza a família.

Convencionalmente, espera-se que o núcleo familiar seja capaz de proporcionar cuidado,

afeto, aprendizado, proteção, construção de identidades e vínculos relacionais de

pertencimento suficientes para propiciar uma vida bem melhor. Entretanto, a realidade

visualizada é diferente, pois nem toda família é condicionada para o cuidado.

Parte-se do pressuposto de que os familiares que lidam com a condição da doença

mental enfrentam dificuldades, como a falta de acesso a informações, o preconceito e o

estigma a despeito do adoecimento psíquico, por exemplo. Os familiares, despreparados para

esse enfrentamento, acabam se esquivando nos próprios temores e nas inseguranças, marcados

por uma concepção que, frequentemente, sinaliza modelos de pensamentos asilares,

caracterizados pela discriminação do indivíduo (OLIVEIRA; LOYOLA, 2004). Para

confirmar tais pressupostos, vejam-se estas falas dos familiares que colaboraram com o estudo

sobre as dificuldades de lidar com o parente em adoecimento mental:

[...] não depende só de você, depende de toda a família que também

deve estar envolvida no cuidado [...] porque se a pessoa quer, bem

[...] mas se não quer, fica meio complicado. Então tenho feito de tudo

dentro do possível, só que é um negócio muito difícil! (Rita Ângela)

[...] é muito ruim, eu me sobrecarrego porque só me dedico a minha

filha e ninguém aqui de casa me ajuda! Fico sempre apaziguando [...]

conversando com um, conversando com outro e quando estamos só eu

e ela em casa, é uma maravilha [...] (Rita de Cássia).

Com o objetivo de solucionar os problemas relacionados ao transtorno mental, os

membros da família passam a viver em função do convívio com a doença mental. As maiores

dificuldades para lidar com essa realidade é encontrada nas famílias que mais se cercam da

doença mental e que menos suportam as alterações provenientes do surgimento desse

transtorno (PIMENTA, 2008). Lino (2006) entende que lidar com a doença, física ou

psiquiátrica, é algo complexo e aterrorizante para a família, o que é exacerbado quando a

doença se mostra presente naquele meio por muito tempo, quando apresenta recidivas de

manifestações agudas e, sobretudo, quando é encarada como incapacitante e estigmatizadora.

Isso pode ser observado nas relações estabelecidas no próprio ambiente doméstico do usuário.

Quando a família tem um membro em adoecimento mental, manifesta várias

dificuldades e grandes conflitos em suas relações cotidianas, particularmente, em se tratando

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do domicílio. Esses sujeitos são reduzidos em seu próprio espaço, identificados, rotulados e,

muitas vezes, desassistidos. Isso representa retratos da realidade de uma pessoa em

adoecimento mental, que prossegue sobrevivendo às próprias limitações frente às barreiras e

às alterações conjunturais a eles impostos pela realidade familiar, sociocultural e histórica

(LINO, 2006).

Nesse contexto, a perspectiva da Reforma Psiquiátrica busca ressignificar todas essas

concepções sociais. A doença, antigo foco do cuidado, abre oportunidades para a saúde,

compreendida de maneira processual, que transforma os traços da vida humana em dada

sociedade, e representa as diferentes qualidades da condição vital e as inúmeras

potencialidades dos indivíduos para lidar com conflitos, desafios, mudanças sociais e

agressões (JORGE; BEZERRA, 2004).

Entende-se, então, que corpo e mente se incorporam mutuamente para manifestar a

saúde ou a doença. O propósito é de desarticular a dicotomia sedimentada culturalmente na

sociedade, onde o adoecimento mental era fragmentado dos estados biológicos e subjetivos do

sujeito. A pessoa passa a ser considerada em sua integralidade, não apenas como objeto

material que constitui um depósito para uma enfermidade orgânica, sem compreender o

processo de adoecimento ou a mente como componente dissociado das situações de produção

da existência (JORGE; BEZERRA, 2004).

Nesse sentido, dispara-se um debate acerca de novas possibilidades terapêuticas. O

estigma associado aos transtornos mentais passa a ser reconsiderado, visto que as antigas

concepções determinaram possibilidades que extrapolavam o adoecer, numa relação em que a

doença representava a identidade social do indivíduo que vive e a do que sofre do mal.

Remanesciam as classificações reducionistas dos códigos da loucura, criando alarmantes

problemas de ordem socioeconômica ao passo que os tratamentos não viabilizavam

possibilidades de reabilitação, e as pessoas em adoecimento mental deixavam de lado a

importância de viver suas vidas com discernimento e autonomia e passavam a viver

prisioneiras de sua condição de saúde (DESVIAT, 2011).

Moreno (2009) enfatiza a importância de se proporcionarem condições básicas de

tratamento não apenas para o indivíduo em sofrimento mental, mas também para a entidade

familiar. Se o núcleo familiar não puder dispor de uma rede de serviços e recursos que

ofereçam atendimento ao paciente, o desfecho irá avançar rumo às internações sucessivas. Os

recursos assistenciais necessitam criar e executar abordagens que contemplem as necessidades

da família, em função do primeiro episódio de transtorno mental ou daqueles pacientes que

convivem, há muito tempo, com determinado sofrimento.

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É sobremaneira importante incluir e oferecer ao núcleo familiar a possibilidade do

cuidado nos momentos em que a família se depara com a crise, além de um suporte emocional

contínuo. Atualmente, a família é convidada a cuidar de seus membros, razão por que vem se

inserindo e participando dos movimentos de Reforma Psiquiátrica por meio das associações

de familiares, de grupos e de outras estratégias inclusivas (MORENO, 2009).

Nessa perspectiva, o transtorno mental surge como uma situação inesperada, que

influencia e produz efeitos desestruturantes na configuração do grupo doméstico. Esse embate

se apresenta como algo temido, e os desdobramentos que se tem a partir dele são relativizados

de um grupo familiar a outro, por consequência de sua posição na conjuntura social e de sua

especificidade, pelo fato de que a família compõe a primeira organização que referencia e

reúne a proteção e a socialização do ser humano, independentemente do polimorfismo e dos

contornos que ela assume, pois é nela que se inaugura o aprendizado dos afetos e das relações

sociais (CARVALHO, 2004).

Waidman (2004) enfatiza que o desgaste que a família experimenta na convivência

com o parente em adoecimento mental, principalmente no momento da alta hospitalar, remete

a ações de incompreensão familiar e até de discriminação, fomentadoras de reintegrações

consecutivas vivenciadas com sofrimento e fracasso ou, em alguns casos, determinando

internações permanentes. Em uma leitura atual, quando o quantitativo de internações decaiu

sobremaneira, essa sobrecarga passou a permear o cotidiano dos familiares frequentemente.

Diante disso, é fundamental que não somente os indivíduos em adoecimento mental, mas

também a família disponha de apoio profissional e, sobretudo, emocional.

Com base no exposto e nas vicissitudes da família do portador de transtorno mental

em seu papel de provedor de cuidados, a família é um recurso singular e crucial para que a

atenção à saúde mental viabilize sua proposta de cuidado centrada na pessoa doente em

detrimento do foco na doença. Nesse sentido, a unidade familiar ocupa uma função essencial

no cuidado e na ressocialização dos sujeitos que sofrem de enfermidade mental. Para tanto, é

fundamental que se conheça a atmosfera familiar e de que forma seus membros recebem e

manejam o sofrimento psíquico (WAIDMAN, 2004).

Verifica-se, portanto, que são inúmeras as dificuldades experimentadas pela família

que vivencia o transtorno mental. E por todas as razões explanadas, é nítida a importância de

a família participar da assistência e do tratamento destinado ao sujeito em adoecimento

mental. É necessário que ela seja aliada no planejamento terapêutico daquele parente que

sofre, uma vez que está presente, grande parte do tempo, em sua vida, mas que também carece

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de assistência para que lhe seja possível resistir às intempéries, ocasionadas pelo transtorno

mental de seu familiar.

Buscando transpor as dificuldades atribuídas ao convívio com pessoas em

adoecimento mental, a lógica do tratamento deve centrar-se no contexto e na reabilitação

psicossocial como elemento primordial, a partir de propostas que explorem a autonomia e a

cidadania de todos os sujeitos que estão inseridos no planejamento terapêutico, para

desconstruir os rótulos conferidos à doença mental e viabilizar a aceitação social e individual

por parte daqueles que sofrem. E é nessa abordagem psicossocial que a TCI consolida-se

como instrumento terapêutico (DALLALANA, 2010).

A seguir, identificam-se as mudanças que, verdadeiramente, fizeram a

diferença na vida de usuários do CAPS e de seus familiares, considerando a inserção de

ambos nas rodas de TCI.

Usuários: do isolamento para a sociabilidade

A iniciativa de desenvolver a TCI como um instrumento voltado para usuários do

CAPS visa oferecer oportunidades de redimensionar o sofrimento desses sujeitos e contribuir

para efetuar mudanças com vistas à sociabilidade e ao alívio da sobrecarga experimentada por

aqueles que convivem com a realidade do sofrimento psíquico e que carecem de práticas

efetivas capazes de operar benefícios na vida dessas pessoas, como mostram as falas dos

seguintes usuários:

A Terapia Comunitária me ajudou porque era difícil demais eu sair

de casa, não saía com ninguém, só queria ficar deitada [...] e agora

saio, converso com as pessoas, com os amigos e com minha família.

Antes eu era “trancada”. Agora não! (Josineide)

Depois da Terapia Comunitária percebi que melhorei muito [...]

porque antes eu não queria nem viver! E agora não. Fico dentro de

casa, tomo meu café, faço minhas coisinhas, procuro ir ao colégio

direitinho à noite. Estou completamente mudada! (Maria José).

Para Giffoni (2008), a TCI proporciona uma mudança de atitude quando cria um

espaço de diálogo que não existia na vida de seus participantes, um mundo comum de

argumentação sobremaneira particular. E quer existam ou não, lá fora, espaços a serem

compartilhados, a TCI oferece oportunidades para que as pessoas façam parte de um espaço

público, e esse mecanismo demonstra que elas são dotadas de direitos, ao vivenciarem

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manifestações de aprendizado e inclusão social que são comuns a todos os membros das

rodas.

O termo “direito” aqui abordado remete ao fato de que o momento experimentado nas

rodas de TCI tem como condição sine qua non a igualdade de qualquer pessoa que partilha

seu sofrimento, e isso faz com que aquele que, muitas vezes, também sofria sozinha, nesse

instante de partilha, pertença a um mesmo patamar comunitário, ou seja, uma mesma esfera

da comunidade já reconhecida, já descoberta. E é nesse sentido que a TCI conduz mudanças

na vida de seus participantes a partir do desenvolvimento do ser político e da busca da

cidadania (GIFFONI, 2008).

Para Guimarães e Ferreira Filha (2006), identificar transformações na vida dos

participantes das rodas de TCI tem uma considerável importância, o que se leva a inferir que a

TCI, como tecnologia de cuidado, vem contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das

pessoas a partir do encorajamento e da sociabilidade para que eles se tornem protagonistas de

suas próprias vidas. Sobre isso, os colaboradores revelam:

Hoje faço bijuterias para vender e vendo também lingeries e

cosméticos de revistas. Depois da Terapia Comunitária criei mais

coragem pra enfrentar o preconceito das pessoas [...] fiz até um curso

de beleza [...] e antes eu não fazia nada (Maria José).

Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária, as pessoas

me colocaram para ser diretora da associação Caminhando, porque

dizem que eu sou muito preparada. Sempre convido eles pra irem na

associação, digo que o espaço é deles [...] (Janete).

Usuários reconhecem o espaço da TCI como um universo utilizado para socializar os

sentimentos do cotidiano e o intercâmbio de experiências. Por meio das falas, sinalizam

melhorias no estilo de vida e modificações em seus hábitos que contribuíram para a

sociabilidade e para novas leituras acerca do lidar com o adoecimento mental em sua

convivência social e familiar.

Entende-se que a TCI promove a recuperação dos processos de socialização natural

que constituem a vida humana. Nessa perspectiva, buscam-se a desalienação e o refazer do ser

em si para si. Isso acontece na convivência com outros indivíduos, que auxilia no

reconhecimento dos outros como cooperadores. O sujeito passa a se reconhecer como um

semelhante-diferente, ou seja, como uma pessoa que tem inúmeras diferenças, mas que,

simultaneamente, é um ser semelhante a outro na medida em que vivencia situações

parecidas, embora diferentes quando visualizadas em contextos distintos. Esse movimento de

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resgatar a identidade na sua semelhança-diferença reinventa a identidade grupal em um novo

alicerce (LAZARTE, 2012).

Em seus discursos, os colaboradores revelam que ocorreram mudanças pessoais e que

isso contribuiu para promover melhoras no processo terapêutico, visto que, na TCI, as pessoas

são encorajadas a refletir sobre o seu verdadeiro “eu” de modo a ressignificar seus

sofrimentos e a potencializar o resgate da cidadania e da autonomia, e em se tratando de

indivíduos em sofrimento mental, trabalha também a conscientização para o tratamento.

Durante as rodas de TC, os colaboradores têm a oportunidade de refletir sobre suas vidas, o

que propicia mudanças em seus cotidianos. Estas falas confirmam essa assertiva:

Passei seis anos sem tomar meus medicamentos, e faz quatro anos que

entrei na Terapia Comunitária e não parei mais e nem quero parar!

Junto com a Terapia Comunitária, os remédios têm me ajudado e

nunca mais entrei em crise [...] (Ivanildo).

Durante a Terapia percebo que fico menos agressiva. Eu era mais

agressiva mesmo quando não estava em crise e a Terapia

Comunitária tem me ajudado muito a diminuir essa agressividade.

Estou mais equilibrada e mais controlada. (Janete).

Antes eu era “trancada”, agora não! (Josineide).

Nessas falas, sobretudo no tom vital de Josineide, a TCI amplia o olhar de seus

participantes e os motiva para novas posturas e novas formas de conduzir suas vidas,

auxiliando-os na busca de respostas para suas necessidades subjetivas e remetendo-os a outras

compreensões acerca do seu modo de viver e lidar com o adoecimento mental.

Eu era muito calado, não conversava muito [...] em casa não dava

atenção à minha mãe [...] hoje eu já dou mais carinho a ela e a toda

minha família, sem falar das amizades que fiz na Terapia

Comunitária e antes não tinha nenhuma (Ivanildo).

Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária mudei

muito. Hoje faço trabalho em casa, lavo louça, varro, arrumo [...] e

antes não fazia nada, não ajudava minha mãe e agora tenho mais

iniciativas (Josineide).

Esse processo de busca de autonomia se inicia no momento em que o significado do

problema começa a ser compreendido, e o sofrimento passa a ser visto sob novo ângulo,

graças à abordagem utilizada na TCI. Se, de um lado, no modelo biomédico, o binômio

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saúde/doença caminha para a subordinação ao esquema biológico dos profissionais e das

terapêuticas tradicionais, do outro, por ocasião das rodas, as principais nuances que

impulsionam o crescimento são o saber ouvir e a partilha da dor que orienta para a sabedoria e

para a maturidade relacional que conduz à responsabilização, à inclusão social e ao

gerenciamento de sua própria vida.

[...] Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária percebi

que melhorei muito [...] antes eu andava de rua em rua, tomava muito

remédio pra dormir, não queria nem viver! E agora não! Queria ter

conhecido a Terapia Comunitária antes, pra eu ter adquirido minha

saúde de volta há mais tempo. Hoje sou outra pessoa! (Maria José).

Melhorei de forma espetacular! (Allan).

Os tons vitais acima reforçam claramente que a participação desses usuários na TCI é

determinante para suas vidas, pois eles se sentem estimulados e responsáveis por buscarem

alternativas existenciais eficazes e capazes de desconstruir concepções acerca do adoecimento

mental, que os incentivam a perseverar com sabedoria diante dos obstáculos encontrados.

Para Giffoni (2008), a TCI constitui-se como um contexto de interação, um local onde

a subjetividade e a opinião de cada membro da roda são respeitadas. As falas ali pronunciadas

representam uma ação política que dá vez e voz às pessoas que partilham suas experiências.

Nesse sentido, propõe-se um intercâmbio entre diferentes atores, de modo a suscitar

transformações. E esse processo de troca é o que verdadeiramente inclui e valoriza

socialmente as pessoas como sujeitos potencialmente importantes para si e para os outros e os

encoraja para a sociabilidade e para o enfrentamento dos desafios experimentados.

[...] Antes da Terapia Comunitária eu não tinha envolvimento com

ninguém. Tinha medo até do ônibus que passava perto de mim [...] e

agora enfrento meus medos [...] (Josué).

[...] Eu não tinha nenhum amigo, não queria saber de ninguém. Hoje

não! Depois da Terapia Comunitária passei a conversar e agora já

tenho muitas amizades [...] (Ivanildo).

Verifica-se, portanto, que os participantes citam significativamente os benefícios da

TCI como um instrumento facilitador de mudanças. A TCI pode trazer clareza às situações,

ser uma ocasião para desabafar emoções e sentimentos e que, ao oportunizar a fala, faz com

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que as pessoas sintam-se melhores e mais capacitadas para enfrentarem os desafios de lidar

com o sofrimento psíquico e seus desdobramentos sociais.

Familiares: da intolerância ao jogo da convivência

De acordo com Leal (2007), para que as mudanças aconteçam verdadeiramente, é

crucial ter sensibilidade para compreender cada atitude, cada ação destinada à reflexão, ao

pensar que propulsiona a procura por esquemas teóricos e práticos, que permeiem o diálogo

existencial genuíno e ativo. Nas rodas de TCI, cria-se um momento encantador observado na

arte do encontro, das diferenças, e tem-se como pressuposto primordial o saber escutar, visto

que a escuta demanda um esvaziamento do ser, de valores, de sentidos para, então,

desenvolver-se uma relação de amorosidade consigo mesmo e com o outro.

Diante das experiências vivenciadas pelos familiares, por meio das rodas de TCI,

compreende-se que adotaram uma nova forma de agir, que fizeram toda a diferença diante dos

desafios do cotidiano, transformando positivamente suas próprias vidas e a de seus parentes

em adoecimento mental. Além disso, a TCI é uma abordagem mediadora do despertar para a

existência humana, em que se dispara a edificação de novas posturas, na medida em que,

nesse espaço de inclusão social, contemplam-se momentos de partilha e de escuta que

desenvolvem e reforçam a empatia como característica primordial para se compreenderem o

sofrimento e a condição do parente que sofre. As falas abaixo reforçam essa assertiva:

Antes tinha muita dificuldade pra ter paciência com meu irmão, então

no início sofri um pouco, mas a partir do momento que vim participar

da Terapia Comunitária, fui aprendendo mais, e aprendi a lidar

melhor com a situação dele (Maria do Socorro).

Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária, adquiri

muita paciência, tenho dialogado mais, converso mais com minha

filha, agora compreendo melhor a situação dela, que não é fácil [...]

(Rita de Cássia).

Ressalta-se, com base no exposto, que os conflitos interpessoais, provenientes das

tensões de um ambiente social ameaçador, têm como principal consequência a desintegração e

a contaminação negativa das relações psicoafetivas e desencadeiam a discriminação, as

suspeitas e a perversidade entre os sujeitos. Tais desgastes põem em perigo o controle mental

das pessoas e se expressam, geralmente, por meio de agressividade, indiferença, preocupação

relacionada aos riscos e do distanciamento (DEJOURS; ABDOUCHELI; JAYET, 2011). Para

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se defender, muitos familiares assumem uma postura de alienação, não tomam iniciativas nem

assumem responsabilidades. Assim, distanciam-se dos problemas e deixam de interagir com a

pessoa doente, o que gera uma atmosfera de repúdio e de insegurança nas relações em

domicílio. Então, rompem-se os vínculos para evitar conflitos (DEJOURS; ABDOUCHELI;

JAYET, 2011).

Nas entrevistas, alguns sujeitos apresentavam vínculos fragilizados e, até,

interrompidos, sobretudo em se tratando do ambiente familiar na perspectiva do convívio com

o adoecimento mental. Entretanto, essas mesmas pessoas revelaram que, ao se inserir no

grupo de TCI e interagir com ele, despertaram para seu papel agente de transformação e

compreenderam que são dotados de características próprias, devido às quais podem reinventar

o espaço familiar, construir novos laços de amizades e consolidar vínculos familiares,

conforme enfatizam as falas abaixo:

A Terapia Comunitária me ajudou muito na aceitação da doença do

meu irmão e na paciência [...] porque antes eu não queria saber de

nada. E hoje não! Me envolvi com a situação e consegui mudar muita

coisa (Maria do Socorro).

Antes eu achava que tudo que minha irmã fazia era de propósito, não

me acostumava de jeito nenhum [...] achava que era fingimento. E

hoje até a convivência lá em casa melhorou, porque agora eu fico

mediando (Rosiane).

Agora lá em casa eu fico sempre apaziguando [...] conversando com

um, conversando com outro [...] (Rita de Cássia).

Em relação aos familiares dos usuários, antes da TCI, experimentavam dificuldades

para desempenhar seu papel de cuidadores e companheiros, que impediam o estabelecimento

de vínculos sociais e familiares, devido à impotência deles frente ao manejo da condição do

parente em adoecimento mental, de modo que a TCI subsidiou reflexões que estabeleceram

melhores condições para que o familiar pudesse conviver com o parente, acompanhado pelo

CAPS:

A Terapia Comunitária me ajudou porque tenho compreendido

melhor a minha filha. Antes eu era muito intolerante, evitava contato

e chegava muitas vezes a bater nela por não entender a situação, mas

agora a gente conversa (Rita de Cássia).

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Antes eu não sabia como lidar com a situação de minha irmã. Hoje eu

aceito ela do jeito que é, procuro não discutir. E antes, se ela dissesse

alguma coisa que me desagradasse, a gente já começava a discutir

(Rosiane).

Nesses aspectos, os relatos supracitados enfatizaram mudanças para comportamentos

mais harmoniosos na convivência familiar. Eles reconheceram suas debilidades e despertaram

para novas fortalezas diante daquelas situações e se sensibilizaram para adotar atitudes mais

positivas e responsáveis. Na TCI, o clima de companheirismo e de inclusão social e a

experiência de cada indivíduo valorizada abrem precedentes para que as pessoas assumam o

controle sobre suas próprias atitudes, determinando novos comportamentos com base nos

sentimentos de cooperação e de solidariedade.

Os familiares entrevistados ressaltaram que, com a palavra partilhada, sentiram-se

fortalecidos, passaram a refletir sobre sua vida pessoal e experimentaram sentimentos de

coragem, paciência e tolerância:

Depois da minha participação na Terapia Comunitária percebi que a

convivência com meu filho melhorou. Porque antes, quando ele se

descontrolava a gente chamava logo o SAMU e o levava para o

PASM. Agora a gente deixa ele quieto, não discute mais [...]

(Laurizete).

Depois da Terapia Comunitária passei a conviver melhor com a

situação de minha filha. Aprendi a fazer a minha parte! (Rita Ângela)

No tom vital acima, percebe-se que o familiar despertou para um novo mundo de

possibilidades, dando sua contribuição e assumindo-se como agente corresponsável na adoção

de hábitos saudáveis de convivência. O estabelecimento de relações permeadas por tolerância,

compreensão e pelo fortalecimento da autonomia dos familiares que se beneficiaram da TCI

possibilitou a aquisição de estímulos para se cultivarem investimentos afetivos mais

harmoniosos, como asseguram as falas abaixo:

Tenho procurado também não levar muito em conta o que ela fala,

tem coisas que não preciso levar muito em consideração [...] então

procuro sair com ela, tenho relevado mais e convivido melhor (Rita

Ângela).

Com a minha participação na Terapia Comunitária mudei meu

comportamento, porque antes eu não tinha tempo pra mim nem pra

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minha filha. Hoje vou à casa de minhas colegas, a uma praia, à

piscina e sempre com ela de lado (Maria José).

Percebe-se, então, que os familiares conseguiram ampliar seus olhares frente à relação

mantida com o parente em adoecimento mental, o que facilitou o entendimento e a adequação

de ações e de comportamentos sobre a ideia de que são responsáveis por influenciar e sofrer

influências desse processo, reconhecendo suas distintas funções como sujeitos inseridos no

contexto e no momento de vida daquele familiar em sofrimento mental, o que contribui para

modificá-lo de maneira saudável.

5.1.2 Um espaço terapêutico de fala, de escuta e de aprendizagem

A Terapia Comunitária Integrativa surge como um ambiente terapêutico para trabalhar

o sofrimento psíquico de modo que seus participantes encontrem um espaço de pertencimento

junto ao cotidiano de pessoas, famílias e comunidades. Para isso, a TCI beneficia-se com

todos os seus meios para resolver os problemas e suas habilidades potencialmente inovadoras

de construção de novas estratégias, com vistas a buscar sentidos para a convivência com os

problemas do dia a dia (DALLALANA, 2010). Os trechos seguintes confirmam essas

afirmativas:

[...] a Terapia Comunitária me deu uma força grande [...] e também

me ajudou a esclarecer muitas dúvidas, porque como nós trocamos

muitas informações e experiências de vida [...] então isso ajuda muito

(Maria do Socorro).

Chego aqui sobrecarregada e saio relaxada, coloco as emoções pra

fora [...] e esse momento é meu, serve pra eu olhar para mim, pra

desabafar e aliviar meu sofrimento. Gosto muito daqui! (Rosiane).

Nessa conjuntura, a TCI representa um instrumento importante para abordar a

problemática de usuários e familiares que lidam com o adoecimento mental, sobretudo no

cuidado à família, seja na resolução de conflitos ou nas possibilidades de enfrentamento dos

problemas, pois demonstra ser um espaço de partilha e de aprendizagem. Representa uma

oportunidade para as pessoas buscarem e encontrarem uma rede de apoio independente da

natureza de seus problemas, do status financeiro e/ou social ocupado por aquele indivíduo, do

grau de escolaridade, enfim, representa um ensejo para as pessoas encontrarem um grupo

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social de acolhimento. Partindo dessa ideia, Dessen e Braz (2000, p. 221) definem rede social

como “um sistema composto por sujeitos que oferecem apoio instrumental, ou seja, ajuda

material, como também apoio emocional, através de carinho, atenção e ações que levem a um

sentimento de pertença contínuo”.

Com base nessa definição de rede social apresentada, entende-se que a TCI se insere

nesse contexto, no sentido de desenvolver e estimular momentos de afeição, empatia e o

sentimento de abrigar-se naquele grupo. As vivências terapêuticas da TCI são baseadas em

partilhar emoções inerentes à vida de todo ser humano, nesse caso, o convívio e a realidade de

um parente em sofrimento mental. Muitas vezes, uma pessoa pode apoiar outra por ter

vivenciado e encontrado solução para os mesmos problemas e pode ser ajudado

simultaneamente, pois o problema do outro pode ser semelhante ao seu. Tais colocações

podem ser ratificadas nos seguintes recortes:

Tem dias que venho pra Terapia Comunitária muito mal,

desestimulado, triste e saio muito melhor [...] converso com o pessoal,

converso com os terapeutas comunitários [...] e isso me ajuda muito

(Josué).

A Terapia Comunitária é muito importante porque ela faz com que a

gente se reúna aqui com outras pessoas que têm praticamente a

mesma história, as mesmas dores [...] sem falar do amor que a gente

recebe aqui, [...] (Rita de Cássia).

Constata-se que, nas rodas de TCI, as pessoas estreiam uma trama de relações sociais e

constroem um espaço de ajuda mútua. A solidariedade é o principal instrumento que

proporciona efervescência às relações humanas, estabelecendo correlação e reciprocidade

entre as pessoas. Assim, a TCI se revela como um espaço de expressão e de alívio das cargas

cotidianas. Após esse momento, tanto usuários quanto familiares referem que se sentem mais

leves para lidar com a problemática do sofrimento mental e prosseguir na luta diária, visto que

ela se configura como uma prática que alivia as tensões psíquicas armazenadas.

A TCI se constituiu também como um espaço de apoio, pois os participantes, ao

partilhar seus sentimentos, podem se identificar não somente com as pessoas, mas também

com o grupo todo como rede de apoio. Nessa perspectiva, a partir da participação nas rodas de

TCI, eles referem ter suas dores minimizadas, conforme asseguram as falas abaixo:

[...] com essa turma da Terapia Comunitária criei muita coragem e

força, porque às vezes você chega triste, e na conversa, na roda, em

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tudo [...] a gente sai outra pessoa, porque você sempre vem com um

“peso” pra cá e sai mais leve [...] (Maria Laurizete).

Muitas vezes eu saía correndo no meio da rua, pedindo socorro e não

tinha ninguém pra me ajudar. Hoje, depois da Terapia Comunitária,

estou completamente mudada! E nesse grupo tenho apoio e força

(Maria José).

A construção e a consolidação de redes sociais de apoio na TCI são relevantes como

uma oportunidade para se combinarem novas ações sociais, integrando os indivíduos e

revelando estratégias de apoio e de amizade e são espaços de cuidado, onde as pessoas se

apoiam sinergicamente em uma realidade individualista. Para que essa rede seja tecida, é

fundamental que o grupo se fortaleça com base na confiança e na capacidade de perceber o

outro e incluí-lo em seu universo de referência. Essa integração envolve a sutil atitude de

reconhecer no outro suas habilidades e conhecimentos, desenvolvendo-lhe o senso perceptivo.

Quanto mais as pessoas se relacionam com as demais, mais elas estarão capacitadas a

reconhecer comportamentos, intenções e valores que compõem seu meio (ROCHA, 2009).

A TCI trabalha, ainda, em sua metodologia, a externalização e a apreciação da

competência e da resiliência de seus participantes. Esse processo inter-relacional tem grande

valia terapêutica porque remove as pessoas da prisão ideológica estimulada pelo paradigma

hegemônico da cura voltado para o uso de medicamentos (LAZARTE, 2012). A TCI, ao

garantir um espaço aberto para o diálogo, faz com que tanto o indivíduo em sofrimento

mental quanto os seus familiares sintam-se valorizados e acolhidos em sua singularidade. Os

relatos abaixo simbolizam a importância desse momento:

Na TCI a gente põe nossos problemas para fora e isso é uma forma de

desabafo [...] porque muitas vezes você vem amargurado de casa [...]

e quando chega na Terapia, você fala disso e se sente aliviado

(Josué).

Acho muito importante a Terapia Comunitária, porque como sempre

tem muita gente, é como se fosse um debate [...] gosto porque a gente

tem um espaço pra falar dos nossos problemas (Ivanildo).

No Brasil, a proposta da RP é reforçada na TCI na medida em que essa abordagem

também busca colocar o sofrimento entre parênteses e combater a questão do perigo da

acomodação social, colocando o sujeito em evidência em seu processo terapêutico. Entender

as problemáticas por meio da perspectiva técnica e teórica remove da vida das pessoas em

adoecimento mental as relações lideradas pelo preconceito imposto pelo diagnóstico

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estabelecido a partir do preceito linear concretizado graças ao modelo tradicional, voltado

para o segmento da saúde mental (AMARANTE, 2009). Assim, esses entendimentos também

são trabalhados na TCI como uma proposta para se estimular o encontro das pessoas com a

capacidade de superar momentos adversos, beneficiando o contexto de suas próprias vidas.

Esses pensamentos se coadunam com as ideias da RP brasileira discutidas por Amarante

(2009), ao destacar a importância do comportamento reflexivo e da valorização das falas dos

sujeitos no enfrentamento de seus sofrimentos. Essa oportunidade de fala promove o

engrandecimento das atitudes individuais, familiares e comunitárias. A medida diagnóstica,

nesse modelo, transpõe a ideia de se mostrar como refém da discriminação e da imposição de

identidades, visto que se torna um diálogo mais complexo, mais ético e mais harmonioso que

é construído no coletivo.

O material extraído das entrevistas revelou histórias vivenciadas pelos colaboradores,

por ocasião das rodas, quando compartilharam suas angústias, e o grupo se mobilizou para

apoiar, construindo redes solidárias. Assim, com os encontros de TCI, a sobrecarga física e

emocional dos indivíduos que necessitam de amparo foi atenuada, e isso propiciou melhoria

na qualidade de vida dos familiares que participam dos encontros e promoveu mudanças

extensivas, sobretudo no parente em adoecimento mental, conforme se verifica nos discursos

abaixo:

[...] eu mudei porque antes não saía com minha filha, não tinha tempo

pra sair, só tinha pra trabalhar [...] e isso ajudou a melhorar na sua

tranquilidade, porque ela era uma pessoa muito tímida [...] não

falava, não conversava e agora já conversa comigo (Maria Emília).

[...] e como na Terapia Comunitária você vai escutando as pessoas

falar de problemas mais graves, aquilo vai te ajudando a suportar

melhor o seu e depois que comecei a participar, tenho me comportado

da melhor maneira possível com minha filha [...] evitando contrariá-

la (Rita Ângela).

Nesse sentido, a TCI, como um espaço de aprendizagem, almeja melhorar as relações

sociais dentro da família e da comunidade, através do compartilhamento de ideias entre

pessoas que têm valores, interesses e objetivos em comum. Portanto a participação dos

familiares nas rodas tem estimulado reflexões acerca de seus comportamentos e subsidiado

um novo entendimento de cuidado frente à condição do parente em sofrimento mental.

Quando os participantes descrevem suas inquietações e temores, aquele movimento de

externalização cria uma dinâmica de esfera pública. Isso significa que a maneira pela qual

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reconhece e percebe a sua condição passa a ser um estado compartilhado, que pode, inclusive,

ser alterado por meio da história de vida e da visão de mundo dos demais participantes. Essa

relação que acontece facilitada pela fala e pelo silêncio feito nas horas certas faz da TCI um

elemento terapêutico-político que conduz a mudanças na autopercepção e no comportamento

dos sujeitos, pois, no momento em que a pessoa fala e desempenha seu espaço de

pertencimento nas rodas, é como se também estivesse se incluindo em uma realidade social

(GIFFONI, 2008).

Compreende-se que, na TCI, a possibilidade de permanecer em silêncio, ouvindo o

problema do outro, e, através de uma quietude interna, comunicar-se consigo mesmo e com

seus próprios entraves, promove a construção de novas subjetividades, reafirma competências

e constrói aprendizagens no grupo. Essa metodologia dinâmica e terapêutica aciona

competências e resiliências pouco utilizadas pela contínua memorização do sofrimento de

experiências dolorosas. Assim, frequentemente, as diferenças passam a ser estratégias para a

resolução de inúmeros problemas. Demandas simples, como convivência, afeto partilhado e

situações do cotidiano, na TCI, surgem como pontuações de grande importância para os

participantes. Esse modelo trabalha com base em um diálogo polissêmico e dinâmico, a

especificidade do sofrimento individual, e faz com que ele possa ser ressignificado com a

troca de experiências e a produção de sentidos no coletivo (BARRETO, 2008).

Dessa forma, os sujeitos deixam de acreditar em ações universais e generalizadoras

acerca de sua experiência e retomam sua liberdade de expressão e sua complexidade de

significações. Assim, passam “de um modelo que gera dependência para um modelo que é

nutrido pela autonomia” (BARRETO, 2008, p. 58). A frase “A liberdade é terapêutica”,

proposta por Franco Basaglia (1985), precisa ser destacada e trabalhada no cotidiano de

pessoas que lidam com o sofrimento mental. Essa liberdade de expressão também está

associada ao ganho de poder dos sujeitos que experimentam fragilidades psíquicas no

gerenciamento de suas próprias relações sociais, culturais, psíquicas, espirituais e

comunitárias.

[...] o que gosto é disso: é da expressão que a Terapia Comunitária

dá pra gente falar tudo, desabafar [...] e em casa não posso fazer isso,

não tenho esse espaço (Josineide).

Na Terapia a gente põe pra fora muita coisa que não pomos nas

outras oficinas terapêuticas [...] (Janete).

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A TCI fomenta a oferta de um novo sentido no entendimento da experiência de vida, e

ouvir o outro estimula uma escuta voltada para dentro de si. Dessa forma, cria-se uma

aprendizagem nova sobre os significados de existência de cada um, e ela passa a funcionar

por meio da sensibilização, num momento de escuta partilhada, que faz emergir uma

oportunidade para aliviar a dor subjetiva e ressignificar a história dos seus participantes. A

característica principal compõe a construção de uma rede de apoio onde essa ação é vista na

externalização da experiência de superação das dificuldades vivenciadas. Na transição do

sofrer sozinho para o sofrer partilhado, a expressão do problema alivia nas pessoas essa

segunda circunstância (DALLALANA, 2010).

[...] depois que passei a me unir com o pessoal da Terapia

Comunitária, quando passei a escutar as histórias que eles traziam,

passei a gostar mais ainda das rodas e fiz muitas amizades [...] você

vai escutando, vai tomando os exemplos pra você e pensa que se

aquela pessoa conseguiu, porque eu também não vou? (Rita Ângela).

Às vezes pensava ser uma sofredora, fracassada [...] e com as

histórias que escuto aqui, vejo que têm pessoas que têm problemas

maiores que o meu e que conseguem superar, por que eu também não

vou conseguir? (Maria José).

Muitas das dificuldades experimentadas pelo indivíduo em sofrimento mental e seus

familiares advêm de sua não conscientização sobre suas capacidades e potencialidades. Freire

(1987) afirma que a opressão causada pelas circunstâncias ambientais construídas em nossa

sociedade, como, por exemplo, a pobreza, a violência, o preconceito, as doenças e a

segregação, desenvolve nas pessoas um difícil contato com o processo crítico da

conscientização.

Freire (1987, p. 57) enuncia que

a conscientização é, nesse sentido, um teste de realidade. Quanto mais

conscientização, mais se “desvela” a realidade, mais se penetra na essência

fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-lo. Por

essa mesma razão, a conscientização não consiste em “estar frente à

realidade” assumindo uma posição falsamente intelectual. A conscientização

não pode existir fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato ação – reflexão. Essa

unidade dialética constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de

transformar o mundo que caracteriza os homens. Por isso mesmo, a

conscientização é um compromisso histórico. É também consciência

histórica: é inserção crítica na história, implica que os homens assumam o

papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo. Exige que os homens criem

sua existência com um material que a vida lhes oferece.

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Nessa perspectiva, dentro da TCI, o valor da dor é ressignificado visto que, ao final,

todos percebem que não existe diferença entre o sofrimento, porque ele é semelhante no valor

e no tamanho para todos. Essa é uma maneira de desconstruir a relação existente em

abordagens centradas apenas na cura e no tratamento de doenças e de se propor o estímulo à

história dos indivíduos a partir da conscientização e da diversidade subjetiva evidenciada e

captada durante o encontro.

[...] na Terapia Comunitária a gente tem um espaço pra falar dos

nossos problemas e muitas vezes os problemas são até iguais [...]

(Ivanildo).

[...] muitas vezes essas coisas se encaixam perfeitamente no meu

problema, então passo a aceitar e entender melhor aquilo que estou

passando (Josué).

Esses relatos expressam o quanto os participantes da TCI valorizam a oportunidade de

falar sobre seus problemas e reconhecem a participação na TCI como uma proposta de

melhoria para suas dificuldades, sobretudo no âmbito da relação com o indivíduo em

adoecimento mental e na dinâmica familiar. A TCI pressupõe um espaço onde se pode usar da

palavra como remédio, para expressar sentimentos e contribuir para melhorar relacionamentos

e conflitos (SOARES, 2008). Barreto (2008) ressalta que, na TCI, o remédio é a palavra e que

sua proposta inicial perpassa a criação de um espaço de palavra; que é terapêutica para os que

falam e os que ouvem, e isso possibilita uma troca de experiências, cria vínculos e promove o

respeito mútuo.

A posição respeitosa frente aos que falam e aos seus sentimentos e a valorização

associada à experiência de vida dos participantes da TCI proporcionam um ambiente de

aceitação, tolerância e afetividade. Nesse ambiente, os participantes se sentem confiantes e

com liberdade para compartilhar seus sentimentos sem o risco de serem criticados, de modo

que as rodas representam também espaços de aprendizagem. Os seguintes recortes confirmam

essa assertiva:

Aqui aprendi que é importante sempre escutar a história de cada um e

escutando a história da outra pessoa a gente aprende mais, ensina

mais e ajuda mais (Maria Laurizete).

A Terapia Comunitária significa uma melhoria na minha vida [...]

uma forma de me comunicar com as pessoas e de ouvir respostas

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certas para os meus problemas e aprender através das falas das

outras pessoas [...] e isso eu não tinha [...] (Maria José).

Aprendi a ser mais tolerante e paciente com meu filho (Laurizete).

A partir do tom vital de Laurizete, evidencia-se que a TCI é sobremaneira importante

para melhorar a qualidade de vida dos familiares e que existem implicações positivas na vida

de usuários em adoecimento mental facilitadas por processos de comunicação eficazes que

são trabalhados na TCI.

No contexto da TCI, muitos só reconhecem seus problemas, de fato, quando escutam

outras pessoas externando e se indignando com situações semelhantes que elas entendem

como problemas para os quais buscam soluções. No que diz respeito à escuta do outro,

Barreto (2008) ressalta que “só se reconhece o que já se conhece”. O sofrimento do outro ecoa

produzindo ressonâncias naquele que vivencia dores semelhantes e assume a posição de um

ser em processo de anestesia, ou seja, o indivíduo apenas se coloca espontaneamente em

movimento e luta se, verdadeiramente, deseja sair do seu lugar e visualizar caminhos

possíveis.

O que acontece na TCI é a construção de uma rede de conversações que é organizada a

partir de uma riqueza de sentidos construída em torno do sofrimento humano e que se

constitui como um contexto em que cada pessoa pode ser reconhecida como um ser pleno,

independente de suas raízes e circunstâncias (GRANDESSO, 2007).

Nessa perspectiva, Soares (2008, p.74) enfatiza:

Essa rede de conversações gerada na TCI promove o engrandecimento da

experiência de vida e trabalha a força latente dos participantes da TCI, que

passam a se reconhecer como agentes de mudanças, utilizando da palavra

para expressar seus sentimentos, pois falar na roda de terapia passa a ter um

sentido terapêutico. A TCI não parte da ideia de se resolver problemas,

muitas das questões apresentadas não têm solução, mas é um local onde

podem falar de seus problemas. A TCI não tem como proposta dar soluções

prontas para as situações apresentadas. Sua intenção é proporcionar o

compartilhar de várias estratégias vivenciadas pelos participantes e que

alcançaram um resultado positivo. Assim, a pessoa que vivencia um

problema e o traz para o grupo, possa ter a oportunidade, após a terapia, de

escolher um caminho dentre várias situações que deram certo, estimulando a

reflexão e o aprendizado para a vida.

Da mesma forma, ao escutar as estratégias de enfrentamento que o outro emprega

diante de situações semelhantes, ou, muitas vezes, tidas pela pessoa como mais graves que as

suas, cada um pode admitir suas próprias potencialidades, geralmente, nem reconhecidas

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como tal. Olhar para a própria experiência de maneira reflexiva viabiliza a transformação do

que foi experimentado em recursos para determinados fins, disponíveis para uso deliberado,

consciente e responsável. Assim, a TCI favorece a autonomia ao criar um contexto reflexivo

de reconhecimento de competências (GRANDESSO, 2007).

Nos relatos a seguir, constata-se que a TCI despertou não apenas nos usuários do

CAPS, mas também nos familiares o amor pela vida e o cuidado consigo mesmos, visto que

muitos se sentiam sobrecarregados com a condição do parente em sofrimento mental,

negligenciando suas próprias vidas, de modo que muitos se abstinham diante da situação.

Nesse sentido, a TCI incitou a vontade de viver e o olhar para si, ensinando-os ainda a receber

e não apenas a dar, como expressam as falas abaixo:

Agora, outra coisa muito importante que aprendi foi a receber,

porque antes eu só dava! Dava bastante mesmo, fazia de tudo por

todos! E quando chegava minha vez, ficava no canto [...] e com a

Terapia Comunitária aprendi que não é só dar, estou buscando

receber também (Rita de Cássia).

Hoje sou uma pessoa realizada, enfrento tudo e não tenho mais

problema nenhum na minha vida [...] em comparação a quem eu era

[...] uma pessoa trancada, que só vivia ali de casa pro trabalho, hoje

sou uma pessoa livre! (Maria Emília).

Com base no exposto, verifica-se um processo de autoconhecimento mais encorajado e

estimulado continuamente, pois, através desse espaço de fala e de escuta, as pessoas passam a

compreender as transformações que acontecem em suas vidas a partir das situações contadas

pelos outros participantes como agentes de suas dores e pelas atitudes que são relatadas em

seus contextos.

Tais prerrogativas contribuem para elucidar o desenvolvimento e o fortalecimento da

identidade do indivíduo, na perspectiva de recuperar, compreender e de conhecer bem mais a

si mesmo. Esses reconhecimentos remetem a sentimentos de capacitação e de crescimento

pessoal e diminuem, gradativamente, o sofrimento, com vistas a novas possibilidades a partir

de uma vida mais aberta para a construção de significações e aprendizagens mediadas por

processos de fala, escuta e aprendizagem (DALLALANA, 2010).

5.1.3 A TCI como fortalecedora de vínculos e fomentadora do empoderamento

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Na sociedade contemporânea, frequentemente as pessoas têm se confrontado com

situações de desgaste e de conflitos, que fragmentam, de forma arrebatadora, as relações

familiares, afetivas e comunitárias e imergem, cada vez mais, os seres humanos em planos

relacionais isolados e descompromissados. Por isso, os sujeitos devem recorrer aos seus

antepassados pessoais, familiares, grupais e sociais, para que encontrem verdadeiramente a

solidariedade, o apoio e o aprendizado mútuo, no sentido de avançar com expressividade,

igualdade e responsabilidade (FRANCO JÚNIOR et al, 2008).

A esse respeito, Franco Júnior et al (2008, p. 13) destacam:

Assim como o corpo humano necessita de cérebro permitindo o intelecto e o

conhecimento, os músculos gerando força, o estômago e intestinos levando

nutrição e o coração e pulmões transportando energia, é necessário algo mais

para esse corpo ter vida. É preciso algo que determine a diferença entre a

máquina e seu criador: o ser humano. Essa diferença é o que nos motiva a

pensar, a comer, a andar, a respirar e a viver. É algo superior que existe

dentro de nós. É a nossa alma. Alma que faz com que se exteriorize a nossa

humanidade, através da solidariedade, da escuta, do cuidado, da ajuda e do

amor. Essa exteriorização ocorre devido ao outro, caracterizando o vínculo

que é formado e conquistado entre pessoas, com alma, para se produzir laços

afetivos com responsabilidade.

Assim, observa-se que os conflitos internos e psicológicos que envolvem o

acometimento psíquico, geralmente, são oriundos de trajetórias e experiências vivenciadas

que fomentaram rupturas na vida em coletividade. Dentre essas rupturas, destacam-se o

rompimento de laços afetivos, o desprezo vivido na infância, a violência e a decomposição

familiar (BRÊDA; AUGUSTO, 2003). Essas experiências podem levar pessoas e

comunidades a desenvolverem atitudes de isolamento e de desconfiança, com dificuldades

para construir novos vínculos e manter os já existentes, tornando-as susceptíveis ao

adoecimento mental.

Com base nessas problemáticas, é fundamental investigar, entre os usuários e os

familiares colaboradores desta pesquisa, quais os vínculos que se criaram e se fortaleceram

com a inserção e a participação deles nas rodas de TCI. É importante compreender como os

vínculos são construídos e potencializados dentro da dinâmica familiar e nas relações

interpessoais, para que, efetivamente, as relações humanas sejam fortalecidas, impedindo que

as adversidades decorrentes da existência humana desintegrem laços significativos. De acordo

com Grandesso (2003), todo ser humano carece de criar vínculos, manifestações de amizade,

de convivência respeitosa e de atitudes afetivas. Na Psicologia Social, mesmo que o vínculo

se ordene envolvendo duas pessoas, comporá, nessa conjuntura, um vínculo social.

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Vínculo é tudo o que une as pessoas entre si e as pessoas a terra, às suas crenças, aos

seus princípios e à sua cultura. O vínculo propõe identidade, autenticidade, concordância e

inclusão. Existem três modalidades de vínculo: os saudáveis – que são os que agregam os

sujeitos de maneira positiva, deixando-os satisfeitos e seguros, porque fortalecem a identidade

pessoal e cultural, consolidam a inclusão social e estimulam o sentimento de pertença em

determinado grupo; os frágeis – que oferecem desconfortos e descontentamentos; e os de risco

– que acarretam sensações incômodas e desagradáveis e podem trazer perdas para as pessoas,

separando relacionamentos e prejudicando a saúde (BARRETO, 2008).

Para Pichon-Rivière (2005), o vínculo surge como uma composição de relação

especial, que se origina com base em um modelo próprio de relações e se configura de

maneira dinâmica. Esse esquema multíplice envolve seres humanos e suas representações,

com métodos de comunicação e aprendizagem. Nesse processo de construção de vínculos, a

relação dialógica e dialética torna-se importante. Freire (1987) entende que, ao se ancorar no

amor, na sensibilidade e na crença dos homens, o diálogo se apresenta a partir de uma posição

horizontal, em que a confiança de um sujeito no outro se faz como consequência nítida, que

torna as pessoas dialógicas frente às suas leituras de mundo. Enfatiza, ainda, que os seres

humanos desprovidos de humildade não podem se integrar ao povo, sem assumir a condição

de parceiros na construção social, visto que, nesse encontro, não há ignorantes nem sábios

absolutos, mas pessoas que, em sinergia, almejam saber mais.

Considerando esse processo de construção coletiva, compreende-se que os vínculos

oportunizam a criação e o fortalecimento de uma rede solidária. A institucionalização dessa

rede refere-se a um padrão de interdependência e de cooperação, em que os sujeitos,

partícipes do processo, desempenham obras estruturadas no coletivo e, deliberadamente,

planejadas em busca de objetivos comuns. A implementação dessa rede resulta em capacidade

de transformação social, cujos membros envolvidos conseguem operar mudanças nos padrões

de identidade humana (TEIXEIRA; FLEURY, 2007).

Nessa perspectiva, a TCI é um instrumento que propicia o desenvolvimento de

relações solidárias, para construir vínculos entre os participantes e mobilizar recursos pessoais

e culturais, de modo a melhorar a qualidade de vida, na medida em que se estimula também a

inclusão social. As transformações facilitadas pela TCI mostram fortalecimento e renovação

de vínculos promotores de saúde, seja no âmbito familiar ou no comunitário, e permitem que

sejam construídos novos vínculos de amizade, de comunidade e sociais.

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[...] já com minha família a Terapia Comunitária me ajudou a ter

mais atenção com minha mãe, que eu não dava [...] e hoje dou.

Converso com ela, e antes isso não acontecia, eu era calado, não

conversava nada, era muito fechado, não tomava o remédio, não ia

mais pra escola (Ivanildo).

Posso dizer que a Terapia Comunitária tem me ajudado muito no meu

ambiente familiar porque tenho convivido melhor principalmente com

a minha irmã (Janete).

Constata-se que os participantes da TCI redimensionam e ampliam seus olhares frente

às problemáticas da vida, pois são estimulados a refletir evocando não apenas sensibilidade e

afetividade, mas dando um salto qualitativo no âmbito das relações ao adquirir subsídios para

consolidar a criação e a sustentação de vínculos.

Em várias passagens deste estudo, compreende-se que a TCI atende às necessidades de

pessoas que clamam por espaços acolhedores, ou seja, a TCI desenvolve um trabalho que se

adequa à realidade desses atores, com base em suas experiências e nas competências. Nessa

perspectiva, é importante que os vínculos criados na comunidade sejam cultivados no

quotidiano daquelas pessoas, de forma consistente e perene. Tal característica é observada nos

encontros de TCI e constrói laços solidários e redes de apoio social, como asseguram os

seguintes recortes:

Esse grupo é ótimo, quando não venho fico meio triste, porque gosto

de estar junto ao pessoal [...] gosto de ficar conversando, gosto de

aprender com as outras pessoas e um conforta o outro, é ótimo [...] a

gente se ajuda! (Risos) (Maria do Socorro).

Esse grupo da Terapia Comunitária tem me ajudado e muito [...] com

essa turma criei muita coragem e força (Laurizete).

Minha amizade maior é com esse grupo da Terapia Comunitária

(Josineide).

É importante enfatizar que esse vínculo é essencial, não apenas por promover e realçar

a adesão do grupo, a articulação e a participação dos sujeitos nos encontros de TCI, mas por

instrumentar a edificação de relações mais solidárias (SÁ, 2012). Cabe enfatizar, também,

que, na TCI, o indivíduo é ressignificado e ressignifica o outro na medida em que ensina

quando fala e aprende quando escuta, em uma via de mão dupla. As dores são atenuadas com

base na dor do outro; os participantes começam a ter consigo a complacência e a tolerância

que inexistiam no convívio com o adoecimento mental e, diante do próprio sofrimento,

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reafirmam suas competências, ao conhecerem e se identificarem com o sofrimento e a

superação do outro (ZAGO, 2011).

Também percebem o quanto podem ser fortes e o quanto podem resistir às

adversidades, retomando a alegria de viver e a esperança na vida, estabelecendo processos

relacionais de convivência mais harmoniosos e saudáveis, conforme asseguram os recortes

abaixo:

Depois que comecei a participar da Terapia Comunitária eu melhorei

meu jeito de ser. Vi que tenho me tornado mais tranquila e

disciplinada comigo mesma, com minha filha e com meu filho (Maria

Emília).

Antes de vir pra Terapia Comunitária eu era muito agressivo, brigava

muito dentro de casa, só falava gritando [...] e depois que vim pra cá,

acabou-se a agressividade, estou bem mais estável, melhorei de forma

espetacular! (Allan).

Nos encontros de TCI, as pessoas falam de suas inquietações e perturbações do dia a

dia e são estimuladas a expressar algo que ainda não foi verbalizado, para que possam

compreender bem mais o sofrimento, e o processo de intercâmbio que acontece nas rodas é

fundamental.

De acordo com Holanda, Dias e Ferreira Filha (2007), os conflitos humanos se

originam na falta de comunicação ou em uma comunicação ineficaz, e como na TCI as

pessoas se comunicam e podem trabalhar o tema escolhido de forma clara, isso facilita o

entendimento dos problemas a partir de seu contexto, fazendo evocar em seus participantes

novos posicionamentos frente às dores experimentadas e oportunizando melhorias nos

processos de convivência.

A TCI atua como uma estratégia que minimiza o sofrimento de seus participantes,

porquanto revigora e constrói redes sociais, com a recomposição do potencial existente em

pessoas e comunidades, a partir de uma redescoberta com a história e com os valores de cada

um. Esses aspectos são responsáveis por dar sentido à existência individual e social, repõem,

revitalizam e recriam a sociabilidade inata e genuína de cada ser humano (LAZARTE, 2011).

Para Carmello (2006), os indivíduos se adéquam às situações de adversidade e as

superam, visto que param para refletir acerca de suas experiências, demonstrando

competências, como a autoconfiança, a autoestima e a nitidez de propósitos, e se aceitam

diante das possíveis mudanças vivenciadas. Essa qualidade que o indivíduo tem para vencer

situações adversas se manifesta em sua capacidade de resiliência. Pinheiro (2004) entende que

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a resiliência é um desafio premente do novo milênio, dentro de uma realidade moderna, na

qual as transformações surgem cada vez mais avassaladoras e profundas e exigem adaptações

incessantes.

Nessa perspectiva, a TCI opera como um instrumento transformador. Para Barreto

(2008), os eventos e os comportamentos da natureza, para serem criados, sofrem um processo

de desmanche e modificação. Ele enfatiza que, na TCI os entraves, as carências e os traumas

quando vencidos transformam-se em sensibilidade e competência, levando à adoção de ações

eficazes para o enfrentamento de outros sofrimentos.

Segundo Lazarte (2012), outro aspecto de fundamental importância na TCI é que ela

oportuniza um gradual retorno da pessoa a si mesma, um progressivo resgate para que a

pessoa possa se enxergar intimamente. Isso implica uma circunstância em que o indivíduo

deixa de ser uma pessoa para outrem e passa a ser uma pessoa para si, um ser em si. Nessa

perspectiva, se, primeiramente, a pessoa norteava sua vida com base no atendimento às

expectativas que lhes eram introjetadas através de imposições e cobranças, agora passa a

sinalizar que suas atitudes e decisões serão produtos de escolhas particulares e próprias. E a

grande escolha é a de ser ela mesma, completa e satisfeita, independentemente de ser aceita

ou não pela sociedade.

Esse resgate liberta a pessoa do aprisionamento que causa dependência, da

preocupação em não desapontar terceiros, de opiniões avessas, enfim, preocupações que

passam a constituir exigências para uma vida plena e feliz. Isso não implica dizer que o

indivíduo viva sem regras ou referências, mas que ele viva uma vida gerenciada por si

mesmo, trilhando seu próprio caminho em detrimento de uma vida refém de valores e limites

impostos, que representam o que Paulo Freire chama de “o opressor interno” (LAZARTE,

2012).

Ao longo de todo esse processo, que se inicia com a integração da pessoa ao grupo de

TCI, o indivíduo passa a fazer parte de uma identidade coletiva, pertencendo a um grupo, e

passa a ser visualizado como uma referência coletiva de apoio para os demais participantes.

Essa característica representa um aspecto fundamental para o resgate da identidade de cada

um. Os discursos abaixo ratificam essa ideia:

Ouvindo as histórias das outras pessoas aprendi que o importante “é

você ser você mesmo” [...] e minha amizade maior é com esse grupo

da Terapia Comunitária (Josineide).

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Já sofri muito! E nesse grupo da Terapia Comunitária tenho todo o

apoio e força que preciso pra viver que não tenho e não encontro em

nenhum outro lugar (Maria José).

De acordo com Câmara et al (1999), a maioria das atividades cotidianas executadas

pelos seres humanos é desenvolvida em grupos que, muitas vezes, direcionam o rumo que as

pessoas dão às suas vidas. Por meio do grupo, os indivíduos têm a oportunidade de

desenvolver potencialidades nas relações sociais, aprender sobre seus comportamentos inatos

e modificá-los, propor e receber apoio. Dentro dos grupos, frequentemente se encontra um

clima de companheirismo e de solidariedade, e essa característica peculiar pode oferecer aos

integrantes uma situação de confiança e de conforto e promover a coesão do grupo.

Munari e Rodrigues (1997) asseveram que o convívio com um grupo, que reúne

pessoas com problemas semelhantes, proporciona uma experiência que pode desenvolver e

estimular um clima amistoso de grande valor terapêutico. Essa oportunidade auxilia usuários e

familiares a transporem barreiras, com base nos relatos exitosos de outros participantes que

vivenciaram os mesmos problemas, adotando atitudes que caracterizavam ações de

empoderamento. Desse modo, a TCI possibilita a seus participantes o acesso à resiliência e à

autonomia e reforça a importância do elo existente nas relações.

Barreto (2008) afirma que as rodas de TCI ofertam um “banquete” de estratégias

resolutivas e respostas criativas frente às problemáticas expostas, e é nessa multiplicidade de

alternativas que reside a riqueza do coletivo. Valorizar essa diversidade é incentivar a

apropriação, por parte dos próprios membros do grupo, respeitando as diferenças e

considerando-as não como características discriminatórias, mas como valores inclusivos. Isso

não significa cristalizar uma condição de vida que é produto de uma prática e estrutura social

preconceituosas, mas reconhecer o modo criativo e heterogêneo com que esses sujeitos se

constroem, com vistas a se conviver melhor em sociedade.

Para Bogado (2010), a TCI oferece um espaço para a expressão da fala e da escuta dos

sujeitos como forma de acolher o sofrimento de maneira que ele possa ser transformado e

reconhecido pelos demais membros do grupo, por meio de um movimento seguramente

afetivo que torna aquela atmosfera propícia para o fortalecimento da autoestima na

(re)construção da identidade. Portanto, para Lazarte (2011), o que poderia se caracterizar

como exclusivo de pequenos grupos, agora, com a TCI, está à disposição de seus

participantes, com uma resolutividade que não abre precedentes para dúvidas. As pessoas

rompem com a autoimagem de vítima e reconhecem suas habilidades particulares e culturais,

desvendando perspectivas instigadoras, em substituição à inércia e à acomodação.

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A TCI também promove a mobilização social, uma vez que nela colaboram,

sinergicamente, pessoas dos mais diversos níveis culturais, com o intuito de superarem,

juntas, os problemas afetivos e relacionais da vida cotidiana. Dessa maneira, a TCI transpõe

barreiras que distanciam e reduzem pessoas a subgrupos e dificultam os relacionamentos

sociais, contribuindo para amplificar as chances de crescimento mútuo e a consolidação de

uma sociedade fortalecida pela complementação graças às diferenças próprias de cada sujeito

e subgrupo social (LAZARTE, 2012).

Para se compreender bem mais o conceito de mobilização social, segue a definição

dada por Lazarte (2012, p.71):

É um processo pelo qual as pessoas ultrapassam as fronteiras ou as

delimitações dos seus grupos sociais de pertencimento. Nesse sentido,

mobilização social é igual à livre circulação e inserção de pessoas na

sociedade como um todo, ou em alguma das suas sub-sociedades (famílias,

bairros, comunidades e movimentos).

Do ponto de vista da participação dos usuários do CAPS e seus familiares, verifica-se

que houve, efetivamente, a mobilização social desses sujeitos, pois ocorreram mudanças

significativas nos campos pessoal, profissional e comunitário, a partir da inserção deles nas

rodas de TCI. As falas a seguir constatam essa afirmação:

[...] outra coisa muito importante que aconteceu na minha vida

depois da Terapia Comunitária é que voltei a estudar [...] agora me

senti estimulado [...] voltei pra escola e estou gostando muito

(Ivanildo).

Com a Terapia Comunitária criei coragem para trabalhar e estudar

que antes eu não tinha, passava o dia todo dentro de casa [...] e sinto

que agora estou podendo! Já deixei meu currículo em um

supermercado, em escolas e em algumas lojas (Maria José).

Lazarte (2012) enfatiza que, na TCI, busca-se o retorno do indivíduo a si mesmo. E

esse regresso da pessoa a si mesmo, essa desalienação, acontece em parte, pela pedagogia

emancipatória de Paulo Freire, que devolve aos sujeitos para o seu lugar na sociedade,

reestabelecendo sua autonomia e sua autoestima. Usuários e familiares passam a se trabalhar

por meio de um reencontro consigo mesmo, que é estimulado nas rodas de TCI, como

componente da rede social. Essa desalienação é viabilizada pela devolução da pessoa a si

mesma, independentemente das circunstâncias que lhe afligem e o inquietam. Tais colocações

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são reiteradas pelas atitudes, pelos comportamentos, pela conscientização de si e do poder de

cada um que passa a eclodir quando a pessoa se integra à TCI.

Para Weiss (1998), “torna-se cada vez mais difícil voltarmos para dentro de nós

mesmos, tentando iluminar o nosso íntimo e visualizar a causa de nossas angústias, porque as

demandas do cotidiano tumultuam nossa mente”. Entretanto, nas rodas de TCI, cada

componente do grupo é considerado um ser inacabado, repleto de conhecimentos e de

sentimentos, e o diálogo é aberto e reflexivo, de modo que esse processo coletivo, norteado

também pelas ideias de Paulo Freire, estimula os participantes a interagirem e a trocarem

saberes para transformar suas vidas.

Esse movimento dinâmico de ação e de reflexão que é estimulado nas rodas de TCI

possibilita uma aprendizagem libertadora. A reflexão ocupa um papel fundamental e provoca

mudanças nas ações dos indivíduos. Nessa perspectiva, a TCI propicia momentos reflexivos,

para que os participantes analisem a realidade dos fatos, ponderando suas atitudes e decisões a

partir de um processo de autoconhecimento. Essas características viabilizam a construção de

um ambiente de aprendizagem contínua e de transformações positivas. Entretanto, Giffoni

(2008) enfatiza que não é de sempre que a TCI vem sendo verdadeiramente reconhecida como

é, pois, quando surgiu, ainda com passos curtos, ela parecia produzir apenas simples estalidos.

Na concepção de líderes políticos, econômicos e intelectuais, tal ferramenta não representava

um modelo terapêutico, não se aplicava a espaços acadêmicos, nem simbolizava nenhuma

fração de poder, porque grandes confusões cerceavam o verdadeiro objetivo da TCI sob o

ponto de vista da elite dominante.

Naturalmente deturpada como estratégia reservada à paisagem da periferia, e

identificada com a aridez social dos mais necessitados, a TCI era tão discriminada quanto

pessoas de comunidades carentes e era apreciada, sobretudo, por pessoas mais simples, no

contexto do Pirambu (comunidade berço da TCI, localizada em Fortaleza/CE), em busca de

um lugar de escuta para expressar o verdadeiro significado de suas dores (GIFFONI, 2008).

Para Giffoni (2008), as pessoas passaram a perceber que o momento da crise, na TCI,

é manancial de transformação e que as dificuldades retratam os percursos rumo a grandes

descobertas que simbolizam o sentido da própria realidade individual e coletiva. Assim,

homens e mulheres começam a perceber que têm o poder de ressignificar suas histórias de

vida, redescobrindo força em suas raízes, utilizando a força da fé e edificando um elo com

outros sujeitos, reconstruções, ou seja, as pessoas deparam-se com a política e passam a

construir política, gerenciando as próprias vidas.

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A partir dessa dimensão e da percepção política dos indivíduos acerca da proposta da

TCI, ela conquistou seu espaço e se expandiu, através de uma forte rede construída com amor

e respeito, em que a fala e a experiência de vida representam grandes ferramentas terapêuticas

e de transformação como elementos de poder, cujo verdadeiro apoio se alcança pela

colaboração mútua.

Barreto (2008) refere que a TCI é um instrumento de cuidado que considera o sujeito

um ser multíplice e singular ao mesmo tempo, pois sua trajetória de crescimento contempla a

interação de diversos elementos que vão desde os constituintes físicos, o núcleo familiar, o

plano socioeconômico, a escolaridade, as crenças e os valores que se incorporam no decorrer

de um gradativo e detalhado sistema, em que o indivíduo avança de um nível de puerilidade

psicoafetiva rumo a um ser amadurecido socialmente.

Ao longo desse percurso, o homem se esbarra com obstáculos e potencialidades

provenientes das circunstâncias inerentes à vida. É o embate do adoecer que, quase sempre,

direciona os indivíduos à TCI, de modo que demandas das mais diversas naturezas se fazem

presentes nas rodas e vão desde condições pré-clínicas, em que existe apenas a sensação

subjetiva de determinado dano, até condições patológicas bem delimitadas, como quadros já

alojados e experiências de sofrimentos, como o adoecimento mental, por exemplo

(BARRETO, 2008).

Foucault (1980) assegura que situações opressoras do cotidiano, quando

negligenciadas e introjetadas, podem desenvolver uma passividade frente ao próprio

sofrimento e, em alguns casos, desencadear violência, visto que as pessoas “com a própria

vida tão agredida e desvalorizada” (p.25) não conseguem zelar a vida dos outros. Nesse

sentido, a TCI reconhece que as dores da existência humana que são oriundas de fragilidades

decorrentes dos desajustes sociais que afligem a dignidade das pessoas, destruindo seus

direitos, ocasionam o que se chama de “patologia social”.

A ideia mencionada remete a Paulo Freire (1987), quando frisa que os opressores, em

consequência de seu poder, não conseguem desencarcerar os oprimidos, e que as experiências

de minimizar as circunstâncias da dominação, majoritariamente, manifestam-se por meio de

uma pseudobenevolência. Na perspectiva freiriana, a transformação precisa advir de uma luta

acionada pelos próprios oprimidos:

Só o poder que nasça da debilidade dos oprimidos será suficientemente forte

para libertar a ambos. Por isto é que aí está a grande tarefa humanista e

histórica dos oprimidos - libertar a si e aos opressores. [...] e essa luta só tem

sentido quando os oprimidos, ao buscarem recuperar sua humanidade, que é

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uma forma de criá-la, não se sentem idealisticamente opressores, nem se

torna de fato, opressores dos opressores, mas restauradores da humanidade

de ambos (FREIRE, 1987, p. 30).

Projetando tais ideias para este estudo, verifica-se que os opressores correspondem às

pessoas, às instituições e à sociedade, que discriminam e excluem os indivíduos que

convivem com a realidade do sofrimento mental; já os oprimidos representam os sujeitos em

adoecimento psíquico e seus familiares, ambos vitimizados pela exclusão e pela opressão,

decorrentes do preconceito e do estigma que permeiam o contexto dos transtornos psíquicos.

A TCI funciona como uma exímia abordagem para o tipo de amargura que evoca da

injustiça, do descaso com o sofrimento, da discriminação e da indiferença frente à miséria

afetiva e segregante. Esse espaço é visto como uma estratégia que se volta contra a cultura

controladora e dominante, por ouvir aquilo que se pretende falar e respeitar as diferenças,

estabelecendo um lugar de aprendizagem, onde as pessoas são capazes de se empoderar,

sobretudo, diante da própria dor. Essa ferramenta de cuidado subsidia momentos de escuta, no

momento da partilha, ao passo que o participante pode falar aos seus pares, aqueles com os

quais se tem determinado nível de identificação. Ela representa essa esfera pública, onde

sentimentos e pensamentos podem ser divididos na perspectiva de se avançar rumo ao

empoderamento (GIFFONI, 2008).

De acordo com Guimarães e Ferreira Filha (2006), a definição de “empowerment”

(empoderamento) evoca a ideia de poder e de controle, de forma positiva, focado no ser

humano, para beneficiar sua qualidade de vida. A inexistência desse vocábulo, na língua

portuguesa, remete a uma tradução que pode ser utilizada em vários sentidos, como, por

exemplo, o verbo “emancipar”, que significa ‘tornar livre, independente’. O empoderamento

obtido na TCI se evidencia em decisões e atitudes mais assertivas para a manutenção da saúde

e da qualidade de vida, conforme se observa nas falas abaixo:

Aprendi também a cuidar mais de mim, porque antes eu só pensava

na minha filha e aprendi que é preciso cuidar da gente pra aprender a

cuidar dos outros [...] então tenho saído mais de casa e assim cuido

dela e de mim também! (Maria Emília)

Hoje sou outra pessoa [...] estudo, faço meus cursos, compro minhas

coisinhas pra usar nos cursos [...] e vou trabalhar na rua, se Deus

quiser! Já me sinto pronta! (Maria José).

Carvalho (2004) enfatiza que o empowerment contempla as dimensões psicológica,

intersubjetiva, familiar, comunitária e étnico-cultural e requer a mediação de coletivos e

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grupos sociais. O empoderamento alcançado na TCI não advém de um plano individual, mas

acontece graças a uma relação dinâmica dos vários elementos que envolvem uma vida em

comunidade, em que merece destaque o aperfeiçoamento pessoal para a criação de uma

identidade pautada na autoconfiança, na autopercepção positiva, na aquisição de senso de

pertencimento ao grupo e formação de redes de solidariedade.

Dentre as dimensões do empowerment supracitadas, Carvalho (2004, p.1090) define a

psicológica como

um sentimento de maior controle sobre a própria vida, que os indivíduos

experimentam através do pertencimento a distintos grupos, e que pode

ocorrer sem que haja necessidade de que as pessoas participem de ações

políticas coletivas. Partindo dessa formulação, encontra-se uma perspectiva

individualista que tende a ignorar a influência dos fatores sociais e

estruturais; uma visão que fragmenta a condição humana no momento em

que desconecta, artificialmente, o comportamento dos homens do contexto

sociopolítico em que eles se encontram inseridos.

Nesse sentido, o empoderamento é considerado um processo dinâmico, que fortifica a

autoconfiança de pessoas e de grupos, habilitando-os para que possam articular seus interesses

e fazer parte de uma comunidade, ao promover o contato com os recursos disponíveis e a

competência sobre eles. Portanto, o empoderamento está fundamentado na autonomia, no

fortalecimento de poder, na autodeterminação, na auto-organização, assim como na

participação e na corresponsabilidade das ações (HOLANDA; DIAS; FERREIRA FILHA,

2007).

O empoderamento se desenvolve por meio das várias arenas sociais que o indivíduo

percorre, desde a família, até o contexto social mais amplo, que contempla a escola, os

relacionamentos na comunidade e o ambiente laboral. Na medida em que esses aspectos se

incorporam entre si, é mais natural que o sujeito enxergue a vida como um bem harmônico,

transpondo as intempéries que se estabelecem em seu caminho. A conexão entre os diversos

contextos onde a pessoa vive potencializa a formação de um circuito de relações que

conferem sentido à sua vida (GIFFONI, 2008). Isso não implica dizer que apenas a

participação na TCI, com a melhora da autoestima e com a partilha de experiências é o

suficiente para desenvolver o empoderamento na vida de seus participantes. É sobremaneira

importante que o sujeito traga para o seu enfoque relacional todo o aprendizado adquirido na

TCI e implemente-o em suas relações cotidianas, na família e na comunidade onde vive. E se

encarar o desafio de mediar sua realidade, ele fica capacitado a constatar seu grau de

empoderamento, reproduzindo as repercussões da TCI no contexto em que convive.

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Para Barreto (2008), o empoderamento do ser humano acontece quando ele admite ser

um sujeito ativo e dinâmico, passa a extrair lições de sua história e não mais se envergonha de

sua realidade, de suas origens étnicas e dos seus valores culturais construídos pelos seus

ancestrais. Essa perspectiva é evidenciada nos seguintes trechos:

[...] e com as histórias que escuto aqui, vejo que existem pessoas que

têm problemas maiores que o meu e que conseguem superar, por quê

eu também não vou conseguir? Então fico me sentindo sempre bem

melhor [...] e hoje é diferente, me orgulho de quem sou! (Maria José).

Depois da Terapia Comunitária eu nem ligo pro preconceito das

pessoas [...] conto pra todo mundo que tomo remédio controlado,

conto tudinho! E muita gente tem preconceito, mas não ligo! Me

aceito assim e me orgulho de mim! Não dou importância [...] eu

ficando boa, é o que importa! (Josineide).

A procura por abordagens acolhedoras, como a TCI, por exemplo, é uma condição

indispensável para que o ser humano se adapte ao contexto da sociedade atual, que se

caracteriza por mudanças rápidas nas estruturas tradicionais e nas funções das instituições

sociais que vêm sofrendo rupturas ou se transformando. A fragilidade nos vínculos sociais, o

desemprego, a exclusão e o preconceito fazem com que pareçam cada vez menos harmônicas

as relações humanas.

Assim, a capacidade de superar as intempéries cotidianas precisa ser estimulada em

contextos como a TCI. Diante disso, Rutter (1987) e Antonovsky (1978) propõem que essa

capacidade, definida como resiliência, seja pautada no “senso de coerência”, uma

potencialidade a ser desenvolvida, quando o mundo não mais coopera para isso. Tais autores

conceituaram de “modelo salutogênico” por reduzir os riscos de estresse, pela coerência na

atitude e no uso de elementos diversificados, que devem ser flexíveis e aplicáveis a distintas

situações.

É preciso que as pessoas sejam apoiadas com sabedoria, humildade e reconhecimento.

A persistência e a repetição de situações de resiliência demonstram a possibilidade de

crescimento, mesmo diante de fortes adversidades. Isso implica dizer que a TCI representa

uma forma de transformar a vida das pessoas, estimulando-as a vencerem as tragédias

transgeracionais e redimensionando os recursos da circunstância imposta pelo ambiente

(POLETTI; DOBBS, 2007). Essa assertiva é comprovada na seguinte fala:

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O meu problema (esquizofrenia) começou a aparecer quando tive

depressão pós-parto. Depois disso fiquei só, não tive o apoio de

ninguém. Com a Terapia Comunitária criei coragem para trabalhar e

estudar que antes eu não tinha (Maria José).

Hoje sou uma pessoa realizada, enfrento tudo e não tenho mais

problema nenhum na minha vida [...] em comparação a quem eu era

[...] hoje sou uma pessoa livre! (Maria Emília).

Hoje estou mais forte! (Rita de Cássia).

De acordo com o tom vital de Rita de Cássia, compreende-se que a TCI funciona

como um contexto propício ao desenvolvimento da resiliência, por meio do fortalecimento da

autoestima, da ressignificação do processo saúde/doença, da formação de vínculos e da

construção de redes de apoio social. Para Holanda, Dias e Ferreira Filha (2007), o despertar

da resiliência na TCI contribui para o empoderamento, já que torna seus participantes capazes

de motivar potencialidades e recursos para adquirir controle sobre sua vida e elevar a

autoconfiança.

Giffoni (2008, p. 186) defende que a TCI aumenta o grau de resiliência por diversos

mecanismos:

Primeiro ampliando a quantidade de recursos tanto internos, pela reflexão e

questionamento da autoimagem negativa, quanto externos, por meio da troca

de experiências; em segundo lugar, promovendo o uso adequado desses

recursos estimulando o exercício da escolha e a autonomia na tomada de

decisões. Além disso, ela treina a resiliência, à medida que, a cada sessão, o

participante aprende algo e coloca em prática, no seu viver cotidiano. A

terapia amplia a resiliência auxiliando o sujeito a formar uma visão mais

positiva de si, a ponto de poder construir e gerenciar um novo projeto de

vida.

Nessa perspectiva, muitos indivíduos, famílias e grupos sociais impressionam pela

inclinação para resistir às atrocidades e aos dissabores do dia a dia. Barreto (2008 p. 171)

afirma que o indivíduo “consegue proteger sua integridade, mesmo sob forte pressão, e

constrói uma vida digna apesar das circunstancias difíceis”. Isso significa que as pessoas

menos favorecidas socialmente têm mais capacidade de se convalescer de uma dificuldade e

retornar ao seu estado original.

Portanto, pode-se afirmar que todo problema estimula a geração de sua própria decisão

e desfecho, não de maneira espontânea, mas com firmeza e força para mudar e sobrepujar os

contratempos impostos, contraindo dúvidas que irão propulsionar novas leituras situacionais.

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Por isso é importante que o indivíduo permita-se sentir dor, recuando e, às vezes, até

enfraquecendo para, em seguida, retornar à integridade inicial. Esses são movimentos para

desenvolver a autonomia e a capacidade resiliente dos seres humanos (RIECKEN, 2006).

Aprender a ouvir é requisito fundamental para todo e qualquer esquema de

aprendizado. Para isso, é preciso remeter-se às contribuições da abordagem pedagógica da

TCI, tal como afirma Barreto (2008, p. 286):

A TCI enquanto espaço de promoção de encontros interpessoais e

intercomunitários, objetiva a valorização das histórias de vida dos

participantes, o resgate da identidade, a restauração da autoestima e da

confiança em si, a ampliação da percepção dos problemas e possibilidades

de encontrar opções para a resolução das situações-problema em decorrência

do processo de aprendizagem vivenciado coletivamente (BARRETO, 2008,

p. 286).

Na visão desse autor (2008), uma palavra ou um gesto de apoio podem repercutir

fortemente na vida dos que sucumbem e dos que triunfam. Assim, na TCI, à medida que o

indivíduo vai partilhando seu sofrimento com o grupo, vai modificando suas dores e

possibilitando uma ressignificação dos fatos traumáticos, reconstruindo-se e tecendo laços

sociais que geram um sentimento de pertença a um dado grupo familiar, escolar, terapêutico e

de laços de amizades.

As pesquisas de Berkman e de Syme (1979) apontam que o apoio social e as relações

interpessoais satisfatórias influenciam diretamente no sistema imunológico, fortalecem as

defesas e melhoram a qualidade de vida. A sensação de pertencer a uma rede de apoio mútuo,

segundo os autores, gera um sentimento de ser reconhecido, amado e apreciado, que resulta na

melhora da autoestima e na percepção de bem-estar, fundamental para a instalação do

processo de autocuidado e de valorização da vida.

Nessa perspectiva, os colaboradores revelaram mudanças significativas em suas vidas

e demonstraram sentimentos de bem-estar, a partir da ideia de pertencimento ao grupo de

TCI, como se percebe nas narrativas que seguem:

A Terapia Comunitária significa muita coisa pra nossa mente [...] ela

desenvolve e estimula nosso pensamento e nós saímos daqui mais

leves (Josué).

[...] dentro das falas que escuto na Terapia Comunitária, percebo que

há uma troca de experiências e isso contribui muito pra mim

enquanto usuário e enquanto profissional. Depois que comecei a

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participar, passei a enxergar coisas que não enxergava e a levantar

questões importantes (Allan).

Gosto desse grupo da Terapia Comunitária porque me sinto mais

calma, mais tranquila, tenho me curado junto com minha filha e

minhas amigas daqui [...] (Rita Ângela).

Nas narrativas apresentadas, os colaboradores expressaram claramente mudanças em

suas vidas e destacaram a importância de aprender a ouvir, reportando-se à riqueza da escuta

como um instrumento promotor de mudanças e de empoderamento. Tais descobertas

repercutiram positivamente no âmbito pessoal, profissional e familiar dos participantes. Para

eles, participar da TCI simboliza momentos de aprendizado e, na perspectiva do adoecimento

mental, representa uma estratégia determinante do êxito terapêutico, visto que são estimulados

a desenvolver novas leituras de suas inquietações e a se assumirem como sujeitos partícipes

responsáveis por liderar o rumo da própria vida e, sobretudo, aderir ao tratamento em seu

continuum.

Na página seguinte, apresentam-se algumas fotografias que representam momentos

das rodas de TCI realizadas com usuários e familiares respectivamente.

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Foto 14: Grupo de familiares na TCI – CAPS Caminhar Foto 15: Roda de TCI com os familiares

Fonte: Arquivo da autora, 2012. Fonte: Arquivo da autora, 2012.

Foto 13: Grupo de usuários na TCI – CAPS Caminhar

Fonte: Arquivo da autora, 2012.

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A nossa maior glória não reside no fato de nunca

cairmos, mas sim, em levantarmo-nos sempre depois de

cada queda.

(Confúcio)

A mensagem de Confúcio apresentada na epígrafe acima remete a todas as histórias

aqui mostradas e estimula o refletir acerca das experiências de dor, sofrimento e angústia

vivenciados pelos colaboradores desta pesquisa. Experiências não apenas desestruturantes e

negativas, mas que influenciaram outras possibilidades de encarar a vida, corroboram o que a

mensagem expressa: a capacidade humana de superar e de crescer diante das dificuldades.

Essas características se mostraram brilhantemente nas contribuições trazidas pelos

participantes do estudo.

Ao longo desta investigação, foi possível analisar os rumos da atenção em saúde

mental no Brasil e compreender que muito se avançou, mas que ainda é fundamental

estabelecer estratégias que redimensionem o foco de atenção da doença para o indivíduo, na

perspectiva de causalidade do adoecimento como um eixo composto por variáveis

multifacetadas e integradas que, quando desestabilizadas, repercutem, diretamente, na saúde

das pessoas e das comunidades.

Verificou-se que, durante as rodas de TCI, usuários e familiares não apenas recebiam e

se constituíam, mas também criavam, inovavam e se transformavam, ou seja, eram sujeitos

ativos, que participavam e intervinham em seus diferentes contextos sociais, de modo que os

problemas e as dificuldades, somatizadas através do sofrimento e das doenças, foram

compreendidos como produtos de uma interação multidimensional. É oportuno lembrar que

tanto os usuários do CAPS quanto seus familiares, mesmo experimentando situações

cotidianas árduas, apresentaram expectativas e sonhos em comum, delineados pelo anseio de

um melhor convívio social, tanto em se tratando do ambiente familiar quanto do território

comunitário.

O CAPS, cenário da pesquisa, em parceria com a abordagem utilizada na TCI,

expressa, em seu cotidiano, um objetivo que está para além de si mesmo. Dá expressão local a

um movimento nacional que valoriza a integração social de usuários em adoecimento mental

e seus familiares em contextos dos mais variados aspectos, fortalecendo seu propósito de

trabalho e existência. Nesse sentido, a TCI alia-se às propostas do CAPS como um campo

aberto à participação de todos, tensionados pela necessidade de aproximar e incluir pessoas,

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construir vínculos e despertar a autonomia e a cidadania de seus participantes, para que eles

mesmos possam buscar e encontrar condições relacionais e de vida mais dignas.

É imprescindível que as práticas em saúde mental adquiram nuances construtivistas,

inclusivas e de apoio social. Nesse enfoque, a TCI mostrou verdadeiramente a que veio,

dando respostas condizentes com o modelo de cuidado defendido pela Reforma Psiquiátrica,

sob o ponto de vista de pessoas em sofrimento mental e seus familiares, agregando em seu

corpo a importância do contato e da articulação entre usuário e família a partir do cenário

institucional do CAPS.

Com o material empírico trabalhado, foi possível reconhecer, efetivamente, a

importância da TCI no contexto de usuários do CAPS, visto que, a partir dessa tecnologia de

cuidado, essas pessoas adotaram novos comportamentos e novas posturas de lidar com o

sofrimento mental, que têm contribuído sobremaneira para sua condição de saúde. Essas

atitudes são extensivas, inclusive, ao ambiente familiar.

Os usuários do CAPS que participavam da TCI mostraram-se como pessoas que têm

buscado reorganizar suas vidas, tanto através do trabalho, do emprego, do espaço familiar, de

amizades, quanto de qualquer outra estratégia que o inclua no convívio social e o engrandeça

como cidadão capaz, reforçando a TCI como dispositivo de inclusão. Compreende-se que a

TCI encorajou os usuários a transformarem as próprias vidas com autonomia, liberdade e

responsabilidade.

A pesquisa demonstrou, também, que os usuários não frequentavam as rodas de TCI

apenas para buscar alívio dos sintomas de seu sofrimento psíquico, embora essa característica

permeasse a realidade dos encontros, nem para trabalhar formas mais adequadas de conviver

com o sofrimento, mas, sobretudo, tentavam reorganizar suas vidas no sentido de se libertar

de suas angústias e sofrimentos.

Em se tratando do enfoque domiciliar, com a participação dos familiares nas rodas de

TCI, verificou-se que essas pessoas desenvolveram novas leituras sobre o adoecimento

psíquico, e isso desencadeou mais investimentos afetivos, mais dedicação e sensibilização

para o cuidado e uma aceitação consciente e responsável do parente em adoecimento mental.

É válido destacar, ainda, o quanto os familiares valorizam a TCI como um momento

terapêutico em que podem cuidar de si mesmos e em que são fortalecidos para cuidar do

parente no convívio familiar. A TCI representa, portanto, um diferencial na vida dessas

pessoas, pois, concomitante à participação delas, visualizou-se o quanto se esforçaram e se

empenharam para compreender bem mais a problemática do adoecimento mental vivenciada

no âmbito doméstico, uma percepção que não existia nesse contexto.

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Ressalte-se, no entanto, que alguns desafios foram encontrados no decorrer desta

investigação, principalmente no que se refere à escolha dos colaboradores, porquanto quase

todos apresentavam histórico de transformações qualitativas em suas vidas após o

envolvimento e a participação nas rodas de TCI. Entretanto, após eleito o colaborador que

contribuiu com a entrevista designada como a ponto zero, a rede de colaboradores originou-se

naturalmente.

Outro aspecto curioso, não identificado como um fator limitante para o estudo, mas de

considerável importância, foi o fato de que vários participantes da TCI manifestaram interesse

em também contribuir com suas experiências pessoais a partir de sua inserção nas rodas,

apesar de não perfazerem os critérios de inclusão determinados, uma vez que os

colaboradores compartilhavam, com satisfação e honradez, a experiência das entrevistas.

Contudo, tais fatos apenas reafirmam a expressividade da TCI na vida de seus participantes,

sustentando-a como proposta terapêutica na atenção à saúde mental.

Com base nesse enfoque, percebeu-se, durante a execução deste trabalho, o quanto é

importante dar seguimento à TCI e fortalecê-la, efetivamente, não apenas no CAPS em

estudo, mas em distintas realidades institucionais, visto o impacto positivo trazido por essa

tecnologia de cuidado para a vida de pessoas que clamam por um espaço de acolhida, de

valorização de experiências e de atenção, para atuar como peça-chave no processo de

promoção da saúde mental e prevenção do adoecimento psíquico. Nessa perspectiva, o estudo

evidenciou que a TCI é uma criação multidimensional complexa, que promove a interação

entre seus participantes, através da fala, não como gemido ou artifício para lamentações, mas

como um grito que ecoa positivamente em todas as esferas de vida do indivíduo.

O desenvolvimento deste estudo foi bastante enriquecedor, visto que, a partir do

envolvimento com a TCI, adquiriu-se grande proximidade e aprofundamento na temática,

visualizando intimamente o salto qualitativo dado pela práxis em saúde mental mediante a

incorporação da TCI em seu elenco de abordagens. Este estudo contribuiu, ainda, para retratar

substancialmente as colaborações fomentadas pela TCI como estratégia que confere aos seus

participantes a capacidade de se autogovernar e protagonizar as próprias vidas.

Ficou claro que o uso da TCI está diretamente relacionado a propostas de inclusão e de

reabilitação psicossocial dos usuários e à apropriação de conhecimentos compartilhados no

grupo através da mediação de saberes e experiências de cada um. Nesses encontros

terapêuticos, as informações emanadas dos participantes compõem um saber que leva à

resiliência, à autonomia e ao empoderamento individual e coletivo. Nesse sentido, tentar dar

um “desfecho” a longos meses de trabalho e de dedicação é algo complexo. Acredita-se que

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uma pesquisa não se inicia configurada para ser concluída, ela representa o disparar de uma

ideia emanada que possa iluminar inúmeras investigações. Este é o verdadeiro sentido do

conhecimento: trazer à tona descobertas que possam ser refutadas e/ou aperfeiçoadas

continuamente em uma realidade que se renova de maneira cada vez mais célere.

Assim, o presente estudo atingiu os objetivos propostos, portanto, espera-se que ele

não apenas represente uma linha de chegada, mas também revele um ponto de partida para

outras investigações, tomando-se por base as contribuições desse apreciável instrumento de

cuidado que é a TCI, e que impulsione novos desdobramentos investigativos, com vistas a

consolidar, cada vez mais, a TCI como uma tecnologia de cuidado valiosa.

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138

AAPPÊÊNNDDIICCEESS

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Apêndice A

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM

NÍVEL - MESTRADO ACADÊMICO

FICHA TÉCNICA – USUÁRIOS DO CAPS

I – IDENTIFICAÇÃO

1. Idade:_________________________

2. Estado civil:____________________

3. Escolaridade:___________________

4. Formação/ocupação:______________

5. Religião:_______________________

6. Há quanto tempo participa das rodas de TCI do CAPS Caminhar?_________________

II – QUESTÕES DE CORTE

Me conte o que aconteceu em sua vida a partir de sua participação nas rodas de TCI?

O que você tem aprendido na TCI que tem levado para utilizar em sua vida?

Qual a contribuição da TCI em seu tratamento?

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Apêndice B

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM

NÍVEL - MESTRADO ACADÊMICO

FICHA TÉCNICA – FAMILIARES

I – IDENTIFICAÇÃO

7. Idade:_________________________

8. Estado civil:____________________

9. Escolaridade:___________________

10. Formação/ocupação:______________

11. Religião:_______________________

12. Há quanto tempo participa das rodas de TCI do CAPS Caminhar?________________

II – QUESTÕES DE CORTE

Me conte o que aconteceu em seu convívio familiar, principalmente na relação com o

parente que é acompanhado pelo CAPS a partir de sua participação nas rodas de TCI?

O que você tem aprendido na TCI que tem levado para aplicar no dia a dia com seu

familiar?

Para você, o que significa participar da TCI?

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141

Apêndice C

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado (a) Senhor (a),

Esta pesquisa é sobre A Terapia Comunitária Integrativa (TCI) nos Centros de

Atenção Psicossocial (CAPS) e foi desenvolvida por Mariana Albernaz Pinheiro de Carvalho,

mestranda do Programa de Pós-graduação em Enfermagem, da Universidade Federal da

Paraíba (PPGEnf), sob a orientação da Profª. Drª. Maria de Oliveira Ferreira Filha.

Os objetivos do estudo são: a) Analisar as contribuições da TCI, considerando as

mudanças de comportamentos, as estratégias aprendidas e a importância que ela representa na

vida de usuários e de familiares de um CAPS; b) Identificar as mudanças de comportamento

mais significativas que ocorreram na vida de usuários e de sues familiares, ao longo de sua

participação nas rodas de TCI; c) Evidenciar as estratégias mais utilizadas por usuários e

familiares para lidar com situações estressantes presentes no convívio entre eles e d) Avaliar a

importância da TCI sob o ponto de vista dos usuários e dos familiares, considerando o

processo de reabilitação e inclusão social.

A finalidade deste trabalho é de contribuir para fortalecer uma prática que vem se

consolidando progressivamente como uma estratégia de cuidado com a saúde mental no nível

comunitário, visando expandir o conhecimento acerca da TCI, ao subsidiar e fundamentar seu

desenvolvimento em outras instituições e campos de estudo.

Solicitamos a sua colaboração para contribuir com as entrevistas, como também sua

autorização para apresentar os resultados do estudo, em eventos da área de saúde, e publicar

em revista científica. Por ocasião da publicação dos resultados, seu nome será mantido em

sigilo. Informamos que esta pesquisa não oferece riscos previsíveis, para a sua saúde.

Esclarecemos que sua participação no estudo é voluntária e, portanto, o(a) senhor(a)

não é obrigado(a) a fornecer as informações e/ou colaborar com as atividades solicitadas pelo

pesquisador(a). Caso decida não participar do estudo, ou resolver, a qualquer momento,

desistir dele, não sofrerá nenhum dano, nem haverá modificação na assistência que vem

recebendo na Instituição.

Os pesquisadores estarão a sua disposição para qualquer esclarecimento que considere

necessário em qualquer etapa da pesquisa.

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Diante do exposto, declaro que fui devidamente esclarecido(a) e dou o meu

consentimento para participar da pesquisa e para publicação dos resultados. Estou ciente de

que receberei uma cópia desse documento.

______________________________________

Assinatura do participante da pesquisa

ou responsável legal

____________________________________

Assinatura da testemunha

Contato com o (a) pesquisador (a) responsável: (83)3216-7109

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o (a)

pesquisador (a): (83)8719-3134.

E-mail do (a) pesquisador (a): [email protected]

Endereço (setor de trabalho): Programa de Pós-graduação em Enfermagem/Universidade

Federal da Paraíba (PPGEnf/UFPB), S/N – Castelo Branco - Jardim Cidade Universitária.

Telefone: (83)3216-7109

Atenciosamente,

___________________________________________

Assinatura do pesquisador responsável

___________________________________________

Assinatura do pesquisador participante

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Apêndice D

CARTA DE CESSÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM

NÍVEL - MESTRADO ACADÊMICO

João Pessoa, ___ de ______________ 2012.

Colaborador(a):______________________________________________________________.

Eu, _______________________________________________________________________.

Estado civil _______________ documento de identidade nº __________________________.

Declaro, para os devidos fins, que cedo os direitos de minha entrevista, transcrita e

autorizada, para leitura na data ______________ para a pesquisadora Mariana Albernaz

Pinheiro de Carvalho, podendo ser usada integralmente ou em partes, sem restrições de prazos

e citações, desde a presente data, em favor da realização da sua dissertação de Mestrado,

denominada: Contribuições da Terapia Comunitária Integrativa para usuários e

familiares de um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS): história oral temática.

Da mesma forma, autorizo a sua audição, o uso de fotografias e o uso das citações a

terceiros, ficando vinculado o controle à referida pesquisadora.

Abdicando direitos meus e de meus descendentes, subscrevo a presente.

_________________________________________

Assinatura do (a) colaborador(a) da pesquisa

________________________________________

Assinatura da pesquisadora responsável

________________________________________

Assinatura da testemunha

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AANNEEXXOOSS

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ANEXO A – Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa

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ANEXO B – Carta de Anuência