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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO ALESSANDRA APARECIDA BRANCATI MAISTRO PLANEJAMENTO COMO INSTRUMENTO DE TRANSFORMAÇÃO CAMPINAS 2005

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE … · ambiente onde a escrita tinha um sentido. Foi na escola que aprendi a decodificar a escrita, mas em casa com a minha família,

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ALESSANDRA APARECIDA BRANCATI MAISTRO

PLANEJAMENTO COMO INSTRUMENTO DE

TRANSFORMAÇÃO

CAMPINAS 2005

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ALESSANDRA APARECIDA BRANCATI MAISTRO

PLANEJAMENTO COMO INSTRUMENTO DE

TRANSFORMAÇÃO

Memorial apresentado no Curso de

Pedagogia – Programa Especial de

Formação de Professores em Exercício nos

Municípios da Região Metropolitana de

Campinas, da Faculdade de Educação da

Universidade Estadual de Campinas, como

um dos pré­requisitos para conclusão da

Licenciatura em Pedagogia.

CAMPINAS 2005

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO................................................................................................2

1. A FORMAÇÃO PESSOAL E A ESCOLHA PROFISSIONAL...........................4

1.1 Profissão: professora – o início .......................................................................9

1.2 O Curso de Pedagogia.................................................................................17

2. PLANEJAMENTO .........................................................................................24

2.1 A concepção de currículo..............................................................................25

2.2 Alguns conceitos sobre planejamento...........................................................28

2.3 Planejamento global e planejamento de sala de aula ..................................34

2.4 Gestão ..........................................................................................................40

3. CONCLUSÃO................................................................................................43

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................45

ANEXOS.............................................................................................................46

“Não somos pescadores domingueiros, esperando o peixe.

Somos agricultores, esperando a colheita, porque a queremos

muito, porque conhecemos as sementes, a terra, os ventos e a

chuva, porque avaliamos as circunstâncias e porque

trabalhamos seriamente.”

Danilo Gandin

Dedico este trabalho aos meus pais e ao meu marido, pela

paciência e por sempre acreditarem em mim. Dedico também a

Deus, que me capacitou e me ajudou nesta jornada.

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APRESENTAÇÃO

Confesso que a proposta de escrever este memorial de formação foi um

desafio, afinal analisar criticamente a própria prática já não é um exercício fácil e

escrever sobre isso torna­se ainda mais difícil. Porém, o curso de pedagogia

proporcionou um exercício de reflexão que resultou na re­significação dessa prática,

e esse processo de desconstrução e construção de conhecimentos merece ser

registrado.

Antes de continuar falando sobre este trabalho, creio que é preciso apresentar­

me. Sou aluna do sexto semestre do Proesf (Programa Especial de Formação de

Professores em Exercício nos Municípios da Região Metropolitana de Campinas)

oferecido pela UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas) no pólo de

Americana e trabalho na rede municipal de educação da cidade de Piracicaba, como

professora de ensino fundamental, atualmente numa primeira série.

Trabalho como professora há seis anos, um curto período de tempo, mas

extenso nas vivências e aprendizados e é isso que você, leitor, encontrará neste

texto, uma reflexão desse rico processo de formação pessoal e profissional.

Depois de ler o início desta apresentação, você deve estar se perguntando: o

que uma professora em exercício há apenas seis anos tem a escrever? Digo­lhe que

não importa o quanto se faz, mas como se faz. A vontade de aprender, o curso de

pedagogia e a reflexão da prática pedagógica me transformaram numa profissional

que acredita no que faz e que as escolhas na educação devem ser bem feitas, pois

podem ser definitivas e irreparáveis.

Não pretendo descrever uma forma correta de se planejar, mas fazer uma

reflexão sobre a falta de sentido do planejamento para os professores e suas

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causas, a concepção que se tem do processo educativo, a importância do trabalho

coletivo e as influências do currículo e da gestão.

Esse trabalho traz um exercício de reflexão sobre o ato de planejar em

educação, considerando seus aspectos teóricos e a prática educativa. Decidi

escrever sobre esse tema por sua presença, ora indiferente, ora significativa em

minha formação profissional e pelas escolhas que se faz ao planejar a ação

educativa.

O planejamento educacional é de grande importância justamente por tratar da

formação do ser humano e exatamente por isso não deve ser apenas uma questão

burocrática, mas um instrumento de trabalho do professor comprometido com a

aprendizagem de seus alunos.

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1. A FORMAÇÃO PESSOAL E A ESCOLHA PROFISSIONAL

“O valor das coisas não está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis.”

Fernando Pessoa

Acredito que, por sermos sujeitos históricos, os momentos que vivemos e que

formaram a pessoa que somos hoje têm grande influência em nossas escolhas,

tanto pessoais quanto profissionais, por isso inicio este trabalho relatando alguns

acontecimentos da minha vida pessoal que influenciaram na escolha profissional

como professora.

Desde muito pequena via meu pai com livros e cadernos, pois ele só

conseguiu concluir o colegial depois de casado e com três filhos. Enquanto meu pai

estava na escola, minha mãe reunia os filhos em sua cama e lia histórias ou cânticos

dos livrinhos de novena (sempre fomos uma família muito religiosa).

O tempo passou e finalmente entrei na escola, era meu pai quem me levava,

pois o escritório no qual trabalhava ficava a apenas um quarteirão de distância.

Quando saía da escola ficava no escritório esperando o horário de almoço do meu

pai para que ele pudesse me levar para casa e seus amigos me paparicavam

oferecendo papéis, canetas, calculadoras, revistas e a máquina de escrever que eu

tanto adorava. Nos próximos anos meus irmãos também entraram na escola e essa

rotina continuou: brincávamos em meio aquela papelada.

As noites em nossa casa não eram invadidas pela televisão. Nos sentávamos

na sala juntos, meu pai sempre lia algum livro (gostava muito de enciclopédias e

livros com descobertas científicas) e quando encontrava algo interessante nos

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contava. Eu e meus irmãos fazíamos as lições de casa e depois nos divertíamos

com os livros também.

Em meio a esse ambiente sentia­me muito estimulada e aprendi a ler já na

pré­escola. Fiquei tão feliz que ensinava tudo aos meus irmãos e os dois iniciaram

na escola sabendo ler.

Lembro­me aqui das aulas de português no curso de pedagogia em que a

professora Cristina enfatizava a importância do uso social da escrita. Meu pai

estudou até o terceiro ano do ensino médio e minha mãe somente até a quarta série

do primário e é claro que não sabiam como se dá o processo de alfabetização, nem

mesmo a diferença entre decodificação e letramento, porém me proporcionaram um

ambiente onde a escrita tinha um sentido. Foi na escola que aprendi a decodificar a

escrita, mas em casa com a minha família, aprendi a gostar da leitura.

Não tenho muitas lembranças da pré­escola e da primeira série, me recordo

apenas que as professoras eram um pouco severas. Já na segunda série foi bem

diferente, a professora chamava os alunos à sua mesa colocando­os no colo para

corrigir os cadernos. Ela não fazia isso somente comigo que era uma ótima aluna,

mas com todos os alunos (não fazia distinção alguma) e foram esses momentos que

guardaram um lugarzinho especial para a “tia Zelinda” em minhas recordações.

A relação professor­aluno é de essencial importância no processo de ensino­

aprendizagem. Enquanto os professores autoritários são lembrados pela sua

intolerância, os que apresentaram alguma forma de afetividade com os alunos são

lembrados pela aprendizagem que proporcionaram. O professor não precisa

carregar os alunos ou colocá­los em seu colo como relatei, o fato de tratá­los com

respeito, não discriminando e não tendo atitudes preconceituosas, colocando as

relações pessoais em primeiro lugar e trabalhando com as emoções que permeiam

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a sala de aula, já demonstram um caráter de afetividade. A postura do professor e a

ênfase que dá às relações na sala de aula determinam um processo educativo

significativo ou não.

Nunca fui líder ou bem sucedida em esportes na escola, não participava das

“turmas”, porém, dentro da sala de aula me destacava e todos sabiam quem eu era.

Isso fez com que, valorizando a minha facilidade de aprender e as habilidades em

ensinar, conseguisse construir minha identidade na escola. Como nunca tive

dificuldades de aprendizagem e todos os anos havia colegas em minha sala que

necessitavam de auxílio, eles iam até em casa para estudarmos juntos e o meu

gosto por ensinar foi aumentando.

Terminei a oitava série e chegou o momento da escolha: optei pelo

magistério. Meus pais ficaram muito felizes, diziam que eu tinha “dom” para isso,

meu avô contava para quem quisesse ouvir que sua neta ia ser professora e até

hoje ele conta isso com muito orgulho. Atualmente, meu avô participa de um

programa de rádio em Piracicaba e todo dia lembra os ouvintes que sua neta

professora está ensinando seus alunos naquele momento.

Iniciou­se o curso do magistério e a expectativa era muito grande. No primeiro

ano estudei no período da manhã, mas a partir do segundo ano mudei para o

período noturno, afinal sempre fomos uma família humilde e estava na hora de

ajudar meu pai nos gastos da casa. Procurei emprego em várias escolas particulares

de educação infantil, mas pagavam muito pouco para auxiliares, então precisei

mudar de área.

Comecei a trabalhar como auxiliar num consultório dentário especializado em

ortodontia. Trabalhava o dia todo e ia direto para o curso de magistério, jantava ali

mesmo na cantina da escola e chegava atrasada todos os dias na aula. Depois de

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toda a correria do dia sentava­me na sala para assistir as aulas, mas não conseguia

ouvir o que as professoras liam nas apostilas, era tudo muito distante. Eu só havia

estado numa sala de aula como aluna, nunca do “outro lado” e esperava que

dissessem como agir, o que falar, como fazer para que todos os alunos se

interessem pela aula e aprendam. Se as professoras não conseguiam nem prender

a minha atenção nas aulas (eu que sempre fui uma ótima aluna), como poderiam

então responder às minhas expectativas? Fui me desinteressando cada vez mais

pelo curso.

... o futuro professor tem, como aluno, aulas onde o conhecimento é tratado como algo acabado, como um pacote de saberes que deve ser apropriado por ele. Não há em geral, qualquer espaço para a discussão crítica dos processos que tornaram estes conhecimentos legítimos e objeto de estudo por parte de alunos (futuros professores, neste caso). Assim, o professor é formado, em geral, para ser uma espécie de trabalhador manual da educação, ou seja, aquele que apenas transmite informações a seus alunos. (Gandin, 1999, p. 128).

Quando se iniciaram os estágios acreditei que tudo mudaria, finalmente ia

compreender como as coisas funcionavam, ia participar. Mais uma decepção: ou as

estagiárias ficavam olhando para que nenhum aluno falasse ou levantasse enquanto

as professoras das salas faziam reunião pedagógica e tomavam cafezinho, ou

sentavam no fundo da sala para observar as crianças copiarem a lição da lousa,

tomando o cuidado para não conversar com nenhum aluno, pois isso podia

atrapalhar a professora da sala. As reclamações com a professora do magistério

responsável pelos estágios eram sempre respondidas da mesma forma: “Dêem

graças a Deus delas fazerem o favor de aceitar vocês dentro de suas salas”.

A formação de professores deixa muito a desejar: são passadas tantas teorias

para jovens totalmente inexperientes que não sabem o que fazer com aquilo (na sala

do meu primeiro ano de magistério a média de idade era entre 15 e 17 anos). A

maioria dos professores que fazem essa formação já está há muito tempo distante

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do contato com as crianças, desconhece a realidade atual das escolas e dessa

forma não consegue relacionar a teoria à prática, dar uma significação à mesma.

Resultado: só se aprende fazendo, quando se entra no mercado de trabalho, quando

se vê com trinta crianças numa sala esperando algo de você.

No curso de pedagogia, numa aula magna com o grupo de pesquisa ALE

(alfabetização, leitura e escrita) o professor Ezequiel nos questionou: o que é dar

aulas? Um sacrifício, torcendo para que os minutos passem rápido? O momento de

domar os aprendizes com centenas de exercícios e disciplina? O juizado supremo

para aprovar ou desaprovar? Ou transcrever um livro didático na lousa para cópia?

Quando cursava o magistério não saberia responder a nenhuma dessas questões.

Os modelos que tinha responderiam sim a todas, mas eu não concordava com isso

apesar de ainda não saber definir uma resposta para a primeira pergunta: o que é

dar aulas? Era tudo o que eu queria saber e que o curso de magistério não

conseguiu responder. O professor Ezequiel continuou dizendo que a construção do

conhecimento do aluno é um compromisso do professor, mas que para ensinar bem

o professor precisa aprender bem.

Ao terminar o curso de magistério, desanimada, nem pensei em exercer

minha profissão, pensei mesmo é em mudar. Aprendi a gostar do que fazia no

consultório dentário e, influenciada pelos dentistas de lá, já me imaginava cursando

odontologia na FOP­UNICAMP, aliás, meu patrão era professor doutor nessa

faculdade. Muitas vezes eu me pegava planejando como seria estar estudando

numa faculdade como aquela, mas voltava à realidade, precisava trabalhar, não

podia estudar o dia todo.

Depois de quatro anos trabalhando nesse consultório, já em 1.999, a

Prefeitura Municipal de Piracicaba iniciou o processo de municipalização do ensino

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de primeira a quarta série com as escolas rurais e algumas construídas na periferia

da cidade. Abriu­se um concurso público para a contratação de professores e o

edital caiu em minhas mãos. A dúvida surgiu: não sabia se fazia a prova, mas devido

a pressão do meu noivo e dos meus pais que não se conformavam por não estar

exercendo minha profissão, decidi fazer. Se eu passasse resolveria o que fazer

depois.

Saiu o resultado, passei na prova e entraria logo na primeira chamada.

Iniciou­se então um processo de reflexão e muitos conflitos. Era muito cômodo

continuar naquele emprego no consultório, afinal já havia me decepcionado no

magistério, mas os meus sonhos, a minha escolha, seriam simplesmente guardados

numa gavetinha de recordações. Entretanto, havia também o medo de entrar numa

sala de aula e não saber o que fazer. Foi isso o que mais pesou em minha decisão,

não era possível saber como seria se eu não tentasse, então decidi assumir meu

novo cargo: professora de ensino fundamental. Começa uma nova fase em minha

vida e eu nem imaginava quantos outros conflitos encontraria.

1.1 Profissão: professora – o início

No dia de atribuição de classes, fui uma das últimas a escolher, juntamente

com uma colega do magistério que encontrei lá. Combinamos de escolher sala na

mesma escola, pois assim uma ajudaria a outra. Ela foi chamada primeiro e

escolheu uma quarta série, em seguida foi a minha vez e escolhi a outra quarta série

da mesma escola, que ficava na periferia da cidade. A supervisora que estava

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atribuindo olhou bem para mim e disse: “Com essa sua carinha, você vai apanhar

todos os dias dos alunos dessa sala, é melhor pegar essa primeira série na escola

rural”. Argumentei que gostaria de trabalhar com minha colega e não saberia

alfabetizar a primeira série, mas ela chamou duas outras pessoas para que

reforçassem o que havia me dito. Na verdade, depois de tudo isso, não tive muita

escolha.

Como na prefeitura é tudo para agora, no outro dia deveríamos estar na sala

de aula, não deu tempo nem de procurar uma amiga que estivesse trabalhando em

alguma escola estadual ou particular para me orientar melhor.

A escola onde iria trabalhar ficava mesmo num bairro rural, era longe de tudo

e de todos, não havia nem ônibus circular que passava por lá. Uma perua da

prefeitura nos levava, demorávamos uma hora para chegar à escola e eu chegava

todo dia enjoada devido às curvas da estrada.

Nas primeiras semanas as aulas foram no salão da igreja, pois a escola

estava sendo arrumada. Era um salão enorme e para dividir as turmas foi preciso

fazer círculos com cadeiras. O que uma professora falava num canto do salão dava

para ouvir do outro devido ao eco e como eram quatro professoras, logo se deduz

que não dava para entender o que ninguém falava, como no dito popular: “Se não

fosse trágico seria cômico”. As pessoas que passavam na rua paravam na porta do

salão para ver o que estava acontecendo, algumas entravam para utilizar o

banheiro, outras para tomar água ou dar um recado a alguma criança, era

impossível focar a atenção numa única coisa.

Nem é preciso contar que o primeiro dia foi inesquecível, eram quatro

professoras que se encontravam pela primeira vez e não conheciam o lugar, duas já

haviam trabalhado na rede estadual, mas eu e mais uma nunca havíamos entrado

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numa sala de aula como professora. Não havia nem diretora. Cada uma pegou seus

alunos e fez o que achou que deveria. Sentei­me com os meus e perguntei quem já

havia estado na escola, não sabia que não tinha pré­escola naquele bairro. Pedi

então para que pegassem o lápis e o caderno porque iria escrever algo na lousa

para saber se conseguiam copiar, mas nem imaginava que nem sabiam pegar no

lápis. Eles me olhavam com tantas expectativas! Com certeza, sabiam o que esperar

de mim, mas eu não sabia o que fazer com eles. Naquela semana comecei a pensar

o que faria com meus alunos, precisavam trabalhar com treinos, afinal sem

coordenação motora, como poderiam aprender outras coisas? Quando estudava

comecei assim.

Na semana seguinte chegou a diretora com muitas novidades vindas da

Secretaria Municipal de Educação: todas diziam não, não pode silabar, não pode

mostrar as letras para as crianças, não pode dar atividades de coordenação motora,

não pode dar nenhuma atividade tida como tradicional e as regras eram para todas

as escolas independentemente da comunidade e da realidade em que estava

inserida. Todas as atividades deveriam ser planejadas e registradas num caderno

que se chamaria semanário e todos que não concordassem e não se adequassem

poderiam procurar outro emprego, isso era deixado bem claro. Bem, agora eu já

tinha uma lista de tudo o que não podia fazer e sabia que poderia ser mandada

embora a qualquer momento, só faltava saber o que podia fazer por aquelas

crianças.

Hoje tenho clareza do que é uma alfabetização significativa, da importância

do letramento e da mediação do professor e que o aluno não precisa ficar fazendo

treinos, pois é preciso trabalhar com uma alfabetização crítica. Mesmo que o aluno

ainda não saiba decodificar a escrita o professor deve trabalhar textos com sentido e

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com a oralidade. Os alunos não precisam ser preparados para aprender, se

desenvolvem quando entram em contato com o objeto do conhecimento e são

mediados pelo professor. Mas no momento de minha iniciação profissional, não

tinha nem idéia disso, achava que deveria reproduzir o modelo pelo qual fui

alfabetizada e que, segundo a Secretaria da Educação, não poderia ser feito

também.

Tivemos nosso primeiro horário de trabalho pedagógico coletivo, o famoso

H.T.P.C. (horário de trabalho pedagógico coletivo) e nos foi passado que

deveríamos fazer o planejamento de curso. Como havia uma professora de cada

série, cada uma faria o seu. E eu, que não sabia nem o que fazer na sala de aula?

Mas tudo bem, vamos fazer o que é preciso. Uma colega que estava com a quarta

série me orientou e emprestou alguns livros que ajudaram a escrever o tal

planejamento de curso, entreguei para a diretora e nunca mais o vi, também não

senti falta, era tudo copiado, não fazia sentido algum.

Iniciaram­se muitos cursos na Secretaria de Educação para que

aprendêssemos a dar aulas como eles (da atual administração) queriam. Fiz todos

afim de saber o que poderia fazer (pois eu já tinha a lista do que não podia) e tornei

minha sala de aula um laboratório de testes, pois ainda não tinha a habilidade de

selecionar as informações que recebia. Tornei­me meio popular: além de estar

quase todos os dias na Secretaria de Educação, sabia repetir exatamente o que era

falado nos cursos e mais, aplicava tudo com meus alunos. Nesses cursos havia de

tudo, textos que não clarearam em nada minhas dúvidas, receitinhas prontas, folhas

com atividades para serem reproduzidas, reflexões, discussões... Não posso dizer

que não aprendi nada, afinal essa formação me embasou principalmente durante

aquele ano, o que o curso de magistério não havia feito. Porém, analisando esse

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período com a formação e experiência que tenho atualmente, é possível constatar

falhas e erros que não conseguia ver antes, devido à falta de um olhar mais crítico

sobre os conhecimentos que me eram passados e sobre a minha prática

pedagógica.

Meu primeiro ano de trabalho como professora foi bem frustrante, eu tinha

vontade de aprender, mas não havia com quem dividir as preocupações e a

ansiedade. A diretora pouco ficava na escola e quando aparecia era para tratar das

questões burocráticas. Como só havia uma sala de cada série, a única primeira série

era minha, portanto não havia outra professora com quem trocar atividades,

informações, dúvidas, frustrações... Nos cursos também não havia troca, todas

tinham medo de expor seus problemas, serem tidas como más professoras e

perderem o emprego (como se os problemas não fizessem parte da vida de

qualquer profissional). É incômodo olhar para o passado e ver o quanto meus alunos

deixaram de aprender por minha causa, na ocasião acreditei que a culpa era

somente minha.

Aqui se faz legítima a importância da reflexão sobre a prática pedagógica,

pois é analisando os erros passados que planejamos um presente e um futuro

melhor. Mas é preciso analisar criticamente e reconhecer o erro, mesmo que feito na

tentativa de acertar ou a reflexão servirá somente para confirmá­lo e repeti­lo.

O tempo passou e no próximo ano fui trabalhar em outra escola, bem mais

próxima da minha casa, aquela que eu já havia escolhido na primeira atribuição,

mas fui convencida a mudar. A diretora dessa escola sempre me encontrava nos

cursos na Secretaria de Educação e conhecia minha constante busca, minha

vontade de aprender, por isso me convidou para fazer parte do seu grupo, suas

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palavras me deram novas esperanças: “Não sei tudo, por isso não posso te dar

certezas, mas poderemos buscá­las juntas”.

Precisei me adaptar às mudanças, era uma escola maior e localizada num

bairro bem carente da cidade. Mesmo assim eu estava muito feliz, pois este ano

trabalharia também com uma primeira série, mas havia mais três professoras que

trabalhariam com a mesma série e elas eram bem mais experientes que eu. Decidi

que durante o ano de 2000 seria observadora, pois isso me ensinaria muito e foi o

que fiz.

Novamente chegou o período do planejamento, que seria feito para o ano

todo. Sentamos em grupos por série para planejarmos juntas. Minhas novas colegas

abriram os Parâmetros Curriculares Nacionais (seguido como uma bíblia no início da

educação municipal em nossa cidade) e me disseram que devíamos copiar todas as

palavras bonitas que havia lá e nosso planejamento estaria “lindo”. Ajudei­as a

procurar, copiamos e estava pronto, agora era só entregar o planejamento para a

coordenadora pedagógica. Esta, por sua vez, fez a leitura do mesmo e entregou

uma cópia para cada professora, peguei minha cópia e guardei na gaveta do

armário, quando precisasse estaria ali.

Esse ano foi muito melhor para trabalhar, posso dizer que aprendi muita coisa

que ajudou a formar a profissional que sou hoje. Eu tinha com quem conversar e

tirar minhas dúvidas, a coordenadora pedagógica estava sempre presente e a

diretora também, acredito que aprendemos juntas, fazendo. Desde o ano de 2000

permaneço nesta escola e tudo o que for relatado nas próximas páginas diz respeito

ao meu trabalho na mesma.

Voltando ao planejamento que estava guardado na gaveta do armário, até me

esqueci, pois só precisei dele no início do ano seguinte para olhar e copiar algumas

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coisas (na verdade a maioria). Observando isso hoje, nem eu mesma sei como

consegui fazer do planejamento apenas um papel para ficar um ano guardado na

gaveta sem sequer ser reavaliado. O planejamento não tinha função alguma, era

elaborado para fins burocráticos e não era executado da forma que deveria.

Durante o ano de 2001 uma empresa multinacional, localizada em Piracicaba,

fez uma parceria com a Prefeitura a fim de proporcionar a quatro escolas da rede

municipal um ensino de melhor qualidade. A escola na qual trabalho fica numa das

comunidades mais carentes e difíceis de trabalhar da cidade, por isso, foi escolhida

para participar desse programa. O grupo aceitou bem, na verdade, não tínhamos

escolha.

Um grupo do CENPEC (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação,

Cultura e Ação Comunitária) foi escolhido para trabalhar nessas escolas e a

Secretaria de Educação definiu que o eixo principal seria o projeto político

pedagógico (PPP), pois todas as escolas deveriam ter o seu, mas não sabiam como

fazê­lo. Foi um trabalho muito interessante que fez com que o grupo­escola se

fortalecesse mais e compreendesse melhor sua função, além disso fez também com

que eu voltasse a me interessar por estudar, por isso descreverei algumas situações

ocorridas durante esse trabalho.

Fizemos leituras, estudos de textos e de situações concretas que aconteciam

em nossas aulas. O diagnóstico feito com a comunidade permitiu que

conhecêssemos suas expectativas e dessa forma, foi possível nos organizar,

planejar melhor nossas atividades. Já era de nosso conhecimento que a participação

da comunidade é importante, mas era difícil fazer essa parceria, essa aproximação e

conhecendo seus anseios esse trabalho poderia ser mais efetivo. O projeto político

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pedagógico começou a ser escrito e embora tenha participado de sua elaboração,

só compreendi sua real importância mais tarde.

De certa forma, essas atividades me ajudaram a questionar algumas

situações ocorridas no dia a dia da escola (as verdades eternas). Comecei a refletir,

mas sentia falta de um estudo mais profundo, queria conhecer melhor “esses

homens que tanto falam em educação”, mesmo porque a Prefeitura só oferece

cursos diretamente ligados à sua filosofia, proporcionando um conhecimento

específico, não havendo espaço para a diversidade.

A oportunidade surgiu em 2002, quando a UNICAMP (Universidade Estadual

de Campinas) fez uma parceria com as prefeituras da região metropolitana de

Campinas dando origem ao PROESF (Programa Especial de Formação de

Professores em Exercício). Fiz a inscrição para o vestibular no último instante, mas

não tinha muita esperança de passar na prova.

Na época era recém casada e meu marido não gostou muito da idéia, mas

combinamos que se eu passasse na prova voltaríamos a conversar sobre o assunto.

Bem, passei no vestibular e chegou o momento da matrícula, meus pais vibraram,

afinal sua filha iria fazer a tão sonhada faculdade (que gostariam de ter me

proporcionado antes) e na UNICAMP, uma das universidades mais bem

conceituadas. Já meu marido não vibrou tanto, pois ficaria sozinho todas as noites

por três anos e teríamos que adiar alguns de nossos planos. Porém, ele jamais se

colocaria como um obstáculo diante dessa oportunidade e mostrou­se disposto a me

ajudar durante o período do curso. Seria difícil para nós dois, mas acreditando que a

determinação diminui os obstáculos, iniciei o curso de graduação em pedagogia.

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1.2 O curso de Pedagogia

O primeiro dia de aula do curso de pedagogia foi muito interessante!

Estávamos as quarenta alunas sentadas na sala de aula e entrou a professora

propondo uma apresentação para nos conhecermos. Cada uma de nós com suas

angústias, seus medos, sua ansiedade, sua história e um grande aperto no coração.

A sala, de repente, foi tomada por sentimentos de alegria, tristeza e culpa. Todas

estavam felizes pela oportunidade de estar ali naquele momento, mas sofriam em

deixar para trás marido e filhos, além disso, era a nossa terceira jornada (para

algumas até a quarta). Nós, mulheres, nos desdobramos para dar conta das tantas

tarefas que nos são atribuídas diariamente e sempre sentimos culpa por ter deixado

algo mal resolvido, acreditando que seria possível um melhor resultado.

Ouvindo aquelas histórias, percebi que havia muitas piores que a minha e as

angústias em meu coração se minimizaram frente aos problemas que as minhas

recentes colegas desabafavam naquele momento. Não ia ser fácil para ninguém,

mas era preciso parar de se lamentar, lágrimas e melancolia só teriam espaço

quando sobrasse tempo (e mais tarde vi que tempo realmente é “precioso”). Agora

era preciso aproveitar tudo o que aquele curso nos proporcionasse, afinal éramos

alunas de uma universidade muito conceituada e isso é um privilégio.

As primeiras aulas assustaram, devido ao volume de textos, não estava

habituada com aqueles tipos de leituras e com a freqüência das mesmas, mas logo

compreendi que a prática (bem ou mal) todas nós já tínhamos, era o momento da

teoria, de fazer essa relação da prática com a teoria, do que vivemos e do que “se

pensa” em educação.

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...a teoria em si... não transforma o mundo. Pode contribuir para sua transformação, mas para isso tem que sair de si mesma, e, em primeiro lugar, tem que ser assimilada pelos que vão ocasionar com seus atos reais, efetivos, tal transformação. Entre a teoria e a atividade prática transformadora se insere um trabalho de educação das consciências, de organização dos meios materiais e planos concretos de ação. (Vasquez, 1977, p. 206).

É muito interessante observar esse movimento entre a teoria e a prática,

acredito que se freqüentasse um curso normal de pedagogia e ainda não estivesse

diariamente ministrando aulas, fazer esse exercício de observação e reflexão não

seria tão significativo. Como disse anteriormente, eu já sentia falta da teoria e agora

estava compreendendo sua importância para o dia a dia do professor e sua prática

na sala de aula.

Já no primeiro semestre tivemos a disciplina Teoria Pedagógica e Produção

em Português e era fascinante conhecer alguns grandes pensadores em educação e

que contribuíram com estudos em relação à aquisição da escrita (como Piaget e

Vigotski). Ao fazer a leitura dos textos ia recordando situações ocorridas com meus

alunos, pois estava trabalhando com uma sala de primeira série e era possível

observar as etapas de desenvolvimento na aquisição da escrita.

Muito do que era discutido nas aulas eu já fazia com meus alunos, mas agora

compreendia melhor como essas atividades interferiam no processo de

alfabetização e letramento, assim pude avaliar seus objetivos e refletir sobre a

metodologia utilizada. Se o professor não tem o hábito de refletir, acaba dando

respostas prontas, deixando de desenvolver a reflexão também em seus alunos.

Numa das aulas magnas, o professor Sérgio Leite disse que as concepções

que temos do que é ensinar e aprender norteiam a nossa ideologia que, por sua vez,

direcionará as ações. Por meio dos estudos, estava descobrindo quais eram as

minhas concepções, no que realmente acreditava e se minhas ações concretizavam

isso.

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Somente o fato de estar com um grupo que tem as mesmas expectativas

(melhorar o trabalho em sala de aula) e busca um aperfeiçoamento já ajuda

bastante, mas os encaminhamentos dados promoviam discussões que enriqueciam

muito, eram vários pontos de vista sobre um mesmo ponto: educação.

Hoje, no sexto semestre, posso dizer que todas as disciplinas feitas durante o

curso de Pedagogia foram importantíssimas para uma mudança na postura

pedagógica, pois para que esta aconteça é necessário antes mudar a forma de

pensar.

Todos os cursos dos quais participei desde o início da minha formação

profissional eram direcionados segundo a filosofia de educação de seus

organizadores, e como a maioria foi oferecido pela Secretaria Municipal de

Educação era sua a filosofia passada, afinal queriam que todas as escolas da rede

organizassem sua proposta pedagógica a partir dela.

A partir do momento que comecei a graduação conheci várias maneiras de se

pensar educação, estudei vários autores e participei de discussões que não

apontavam uma teoria como sendo a única correta, mas era possível analisar cada

uma delas e ver que não há certo e errado, estamos a todo momento sendo

influenciados por diversas teorias e filosofias e cabe a nós selecionarmos as que

melhor se adequarem ao que acreditamos e à realidade que vivemos.

Foi importantíssimo estar em contato com esta diversidade de pensamentos e

perceber que a escolha diz respeito a cada um de nós, mas é preciso conhecer para

optar. Quando não temos o conhecimento não somos capazes de criticar e

argumentar, acabamos por aceitar tudo o que nos é imposto e mesmo não

acreditando no que nos é passado não temos o poder da argumentação, pois falta o

embasamento. É necessário também muita cautela ao criticar, críticas é o que mais

20

se ouve, mas são na sua grande maioria pejorativas e não levam a nada além do

desapontamento e do desânimo. Já as críticas construtivas fazem parte de um

processo de desenvolvimento, apontam novas propostas, permitem uma reflexão e

até mesmo um redirecionamento do trabalho.

Falando sobre críticas, me recordei de uma situação que vivenciei no início da

minha profissão. Estava com vários problemas com meus alunos, tanto de

aprendizagem como de comportamento. Estava ciente de que precisava de ajuda,

mas apesar de estar pedindo­a a todo o momento parece que as pessoas não me

ouviam e isso durou o ano todo. No último bimestre a diretora achou que os

números da minha turma não estavam bons, pediu a presença da supervisora e me

chamou. Quando estávamos as três na sua sala ela fechou a porta e começaram as

críticas. As duas falavam sem parar, apontaram todos os meus erros (parece até

que nunca houve acertos) e eu nem tive a chance de me defender, pois eram duas

contra uma. Falavam como se eu nunca tivesse deixado claro que precisava de

ajuda por realmente estar com problemas. Saí daquela sala me sentindo a pior

profissional do mundo, pensei até em nunca mais voltar para aquela ou qualquer

outra escola. Se elas tivessem o mínimo de ética e profissionalismo teriam sim me

chamado para conversar, mas já quando começaram a aparecer os problemas,

dessa forma as críticas seriam construtivas, me ajudariam a resolvê­los enquanto

aconteciam. Naquela época eu não sabia argumentar em minha defesa, mas se

fosse hoje a situação teria ocorrido de forma bem diferente.

Atualmente essa mesma supervisora participa dos horários de trabalho

pedagógico coletivo na escola em que trabalho, ela mudou um pouco sua forma de

pensar e atuar, afinal mudou a administração municipal e ela precisa se adaptar às

novas concepções ou perderá seu cargo. Mas eu mudei muito, não tenho mais

21

receio que ela assista às minhas aulas ou me chame para conversar “numa sala

fechada”, já sei me defender, porém, tenho certeza de que ela não fará mais isso,

pois sabe que não estará mais falando com a “menininha” de outrora e sim com uma

profissional que acredita e defende o que faz.

O conhecimento e o poder de argumentação aprimorados durante o curso de

pedagogia tiveram grande impacto no trabalho pedagógico e na minha pessoa como

integrante do grupo­escola. Até mesmo a visão das pessoas a meu respeito mudou:

durante os horários de trabalho pedagógico coletivo já não sou mais vista como a

professorinha, que por nada saber, tudo acata e consente. Sou mais respeitada e

esse respeito foi conquistado a partir do momento em que comecei a participar das

discussões, a saber criticar, a expor a minha opinião, a argumentar em defesa do

que acredito e a ajudar o grupo a refletir e encontrar soluções. Agora sou uma

participante do grupo­escola e não apenas mais uma integrante.

Eu me sentia bem insegura nas reuniões de pais, tinha receio que alguém me

perguntasse algo que não soubesse explicar, que questionassem o meu trabalho.

Hoje não falo somente por mim, estou pautada na fala de estudiosos, sei colocar

para os pais as concepções nas quais acredito e tenho conhecimento para

argumentar em sua defesa. É possível observar como os pais dos alunos passaram

a acreditar mais no meu trabalho, sentiram maior segurança no meu discurso e

também na ação pedagógica. Não tenho somente certezas e nem acredito em

verdades absolutas, mas já consigo direcionar melhor o meu trabalho.

Dando continuidade a esse processo de mudança provocado pelo curso de

pedagogia, é possível destacar não somente o que mudou na minha pessoa, mas o

que isso ocasionou também com o grupo­escola.

22

Na escola em que trabalho há mais duas colegas que estão no curso comigo

e isso ajudou muito no momento de sermos multiplicadoras dos conhecimentos que

adquirimos. Se eu falasse sozinha, talvez minhas idéias sofressem maior resistência,

mas como eram três vozes acredito que tivemos um êxito maior.

É importante também destacar que se eu guardasse todo o conhecimento

para mim, fechasse a porta da minha sala de aula e pensasse “cada um com seus

problemas”, de nada adiantaria e a proposta do curso não seria válida. É essencial

compartilhar os conhecimentos que temos e saber ouvir as pessoas, pois educação

se faz através de debates, discussões, estudos e colaboração, afinal é um trabalho

coletivo.

Muitas pessoas se fecham em sua sala de aula e desenvolvem um ótimo

trabalho com seus alunos, sendo elogiadas pela direção e coordenação, mas

acredito que um bom trabalho não fica preso em quatro paredes, é muito mais amplo

e para ser realmente bom não pode atingir somente uma pequena parte dos alunos

da escola. É claro que mudança se faz aos poucos, as ações são como grãos de

areia, mas um verdadeiro transformador multiplica o seu saber em futuros

multiplicadores. “... Propondo que o educando seja sujeito de seu desenvolvimento

está propondo a existência do grupo, da participação e, como conseqüência, a

conscientização que gera a transformação.” (Gandin, 1993, p. 99).

Fazendo parte de um grupo, preciso trabalhar com o mesmo. Se neste ano

estou com uma primeira série e faço um trabalho diferenciado com uma proposta de

letramento, criticidade, raciocínio, cooperação e descoberta, preciso pensar que no

outro ano estarão na segunda série e seria ótimo continuar esse trabalho, mas pode

ser que a futura professora não tenha conhecimento para desenvolvê­lo ou, muitas

vezes, nem sinta vontade de fazê­lo. Se esses alunos passarem um ano sentados

23

numa sala copiando a lição que é passada na lousa sendo impossibilitados de falar

ou se expressar de outra forma, perderão muito do que foi desenvolvido no ano

anterior e será fácil “enquadrá­los” também nos próximos anos. É por esse motivo

que precisamos atingir não somente nossos alunos, mas também o grupo­escola,

para que a filosofia e o currículo da escola possam ser repensados, para que as

pessoas possam pensar como grupo, participando realmente do que acontece e

tendo objetivos em comum; ou não daremos um passo após o outro, mas, ao

contrário, daremos um passo e voltaremos outro para trás.

Como diz Gandin (1993, p. 16) “... um grupo (sujeitos em interação) na

dinâmica da ação­reflexão, buscando a verdade e tendendo à transformação e ao

crescimento: eis a educação que deve estar em tudo...”. A educação precisa de

pessoas que briguem por ela e é isso que pretendo continuar fazendo, é preciso

incomodar, pois as pessoas quando incomodadas são obrigadas a mudar de

posição, de postura.

Acredito que seja esse o objetivo do curso de pedagogia: formar profissionais

que, além de re­significar sua prática, atuem como multiplicadores em seu grupo­

escola “... porque educar de verdade é motivar o novo mestre, não repetir

discípulos.” (Demo, 1996, p. 41)

24

2. PLANEJAMENTO

“Planejar não é fazer alguma coisa antes de agir. Planejar é

agir de um determinado modo para um determinado fim.”

Danilo Gandin, 1993

Escolhi falar sobre esse tema, planejamento, devido ao papel que

desempenhou em meu histórico de formação profissional, cercado de desencontros

e frustrações. Como já relatei, não me importava muito com isso antes das

discussões feitas nas aulas do curso de pedagogia, somente a partir daí comecei a

analisar minha prática e esse assunto começou a me incomodar.

Esse tema foi abordado praticamente em todas as disciplinas, pois para tudo

é necessário planejamento. Nas disciplinas de teoria pedagógica e produção essa

questão era ainda mais forte: estudamos suas concepções (de português,

matemática, história, ciências...) e em todas tivemos que elaborar projetos e planos

de aula (ver Projeto Identidade elaborado para a disciplina de Temas Transversais –

anexo 1). Já na disciplina de gestão escolar conversamos muito sobre o

planejamento do projeto político pedagógico.

Como já detalhei em exemplos neste texto, planejar nunca teve significado

para mim. Não entendia o porquê de sentar com as colegas de trabalho para

planejar se, depois, cada uma entrava em sua sala e fazia o que queria, na maioria

das vezes, muito diferente do que foi escrito. Era apenas mais um trabalho

burocrático sem função.

25

O planejamento não acontecia de forma correta, não tinha como objetivo sua

elaboração e execução e ficava apenas no papel (como muitas coisas na educação).

Mas eu também não tinha clareza sobre o que estava fazendo, acreditava que o

planejamento estava limitado às paredes da sala de aula. Não compreendia que o

seu resultado se dá, muitas vezes, na sala de aula, mas inicia­se muito antes e não

depende somente do professor, envolve conceitos sociais e culturais.

Ao planejar, tanto o projeto da escola quanto as aulas propriamente ditas,

fazemos escolhas e, como trabalhamos com a formação do ser humano, precisamos

ter claro a importância desse ato. Devido a isso, acreditei que seria interessante

aprofundar meu estudo nesse sentido afim de re­significar alguns conceitos.

2.1 A concepção de currículo

Antes até mesmo de conceituar o que é o planejamento acredito que seja

importante analisar o significado do currículo, pois este possibilita que a escola

cumpra seu papel na sociedade, por meio da sua filosofia que envolve uma ideologia

de homem, de sociedade e de educação que é transmitida no planejamento.

Segundo Sacristán (2000, p.17):

Os currículos são a expressão do equilíbrio de interesses e forças que gravitam sobre o sistema educativo num dado momento... em seu conteúdo e nas formas através das quais se nos apresenta aos professores e aos alunos, é uma opção historicamente configurada, que se sedimentou dentro de uma trama cultural, política, social e escolar...

Se a escola tem um currículo, o planejamento deve ser feito de acordo com o

mesmo, porém nem sempre os professores participaram da elaboração ou

26

concordam com esse currículo, mas mesmo assim reproduzem­no. É a velha

acomodação pelo conformismo.

Os conceitos de homem, sociedade e educação que embasam o currículo

determinarão o tipo de cidadão que se quer e a escola ajudará a formar. Se esses

conceitos são os da ideologia dominante, então a escola reproduzirá as

necessidades e valores do mercado de trabalho e do capital, direcionando seu

planejamento para isso e “... nesta escola não pode haver a construção de cidadãos,

pois só há espaço para a constituição do consumidor e do futuro colaborador das

empresas. Nesta escola não há espaço para as questões ligadas à política (para as

perguntas: por quê? Para quê? Para quem?), apenas as questões técnicas (para a

pergunta: como?)...” (Gandin, 1999, p. 65).

Nós, professores, queremos formar cidadãos críticos adotando atitudes que

os enquadram cada dia melhor no mercado de trabalho, pois mudamos até a forma

de pensar, mas continuamos a agir como antes. Pretendemos formar sujeitos, mas

continuamos agindo como objetos.

A escola acaba reproduzindo a classificação e exclusão social e racial.

Exatamente por esse motivo é preciso repensar o currículo e seus conceitos, discutir

se a escola tem por obrigação atender ao mercado e à sociedade atual ou, ao

contrário, lutar pela sua transformação, pela igualdade e justiça. Segundo Gramsci

(1978), é através da superestrutura que se pode mudar algo e essa é a ideologia, a

cultura. A hegemonia cultural é ditada pelo capital, pelos dominadores, mas as

instituições escolares podem mudar isso trabalhando contra a hegemonia cultural,

mudando a visão de mundo para que deixe de ser folclórica e torne­se científica

(citação feita pela professora Conceição, numa das aulas da disciplina de Gestão

Escolar). Porém, isso não se faz sozinho, é essencial a real participação do grupo

27

com diferentes idéias, discussões e estudos. É necessário redirecionar o olhar,

quebrar velhos conceitos e construir outros.

Quando falamos em participação dentro de um grupo é preciso ter claro qual

o tipo de participação que queremos. Ela não pode ser concedida ou apenas

pronunciada, precisa ser vivida, como afirma Bordenave (1994. p. 74)

... A participação não é um conteúdo que se possa transmitir, mas uma mentalidade e um comportamento com ela coerente. Também não é uma destreza que se possa adquirir pelo mero treinamento. A participação é uma vivência coletiva e não individual, de modo que somente se pode aprender na práxis grupal. Parece que só se aprende a participar, participando.

É comum conhecermos uma escola em que o grupo se apresenta como

participativo, mas será que isso realmente acontece? Participar não é tão simples

assim e nem se aprende de um dia para o outro. Bater papo, trocar receitas e evitar

brigas não garante que o grupo se conheça o suficiente para realmente exercer uma

participação. É preciso conhecer, tomar parte, se envolver, querer participar.

Na escola em que trabalho mesmo, muitas vezes estamos tão envolvidas com

um assunto que há até discussões, o que é normal num grupo. Não é importante

que todos pensem da mesma forma, mas que respeitem outras opiniões e quando

necessário, cheguem a um consenso. “... A prova de fogo da participação não é o

quanto se toma parte mas como se toma parte.” (Bordenave, 1994, p. 23). Algo que

incomoda demais é o distanciamento, o “pouco causo” de algumas pessoas diante

das situações, não se envolvem, não se sentem parte do grupo e de nada que

aconteça com o mesmo. Já outras pessoas gritam, brigam, criam uma situação que

aparenta estarem envolvidas, mas tudo não passa de uma cena teatral, pois no

momento de agir, de mostrar seu interesse, simplesmente abandonam, esquecem.

Segundo Bordenave (1994), os currículos, seus conteúdos, a grade curricular

em si, são elaborados por profissionais de classe média urbana (funcionários do

Ministério da Educação) e carregados de valores e noções dessa classe sendo

28

aplicados em todas as escolas uniformemente. Se os professores e os pais dos

alunos participarem da elaboração do projeto político pedagógico da escola poderão,

senão mudar, adaptar esse currículo tornando­o mais adequado às suas

necessidades e interesses.

É possível, sim, reorganizar o currículo por meio do PPP, pois nele estarão

expressos os valores de uma sociedade que deverão ser adquiridos pelos alunos e

esses valores dependerão da visão de sociedade e de homem que a escola tem. Se

nesta visão o homem é um ser capaz de refletir e atuar como agente transformador

numa sociedade que necessita de transformações, a fim de ser mais igualitária e

justa, o currículo permitirá uma ação educativa nesse sentido. Porém, se a escola

pretende continuar mantendo a cultura dominante, terá a visão de um homem que

precisa ser moldado para ser liderado numa sociedade que já tem líderes e não

necessita de mudanças e seu processo educativo se dará dessa forma.

2.2 Alguns conceitos sobre planejamento

Infelizmente, o planejamento tornou­se algo imposto pela burocracia que

envolve a escola e, na maioria das vezes, é feito somente por esse motivo, perdeu

seu real sentido.

Vasconcellos (2000), aponta três elementos ao explicar o desgaste do

planejamento junto aos professores:

­ Idealismo – o planejamento cumpre o papel ideológico, sendo a expressão

de tantas boas intenções, de coisas que gostaríamos de fazer, mas que não tem

29

nada a ver com a realidade. O professor acredita que, através do planejamento,

pode mudar, transformar, mas depois as coisas não acontecem, pois estão muito

longe da realidade.

­ Formalismo – a escola “de papel” dá ênfase ao planejamento de uma forma

muito burocrática, por meio de formulários e prazos. Quando esse planejamento é

entregue ao coordenador ou diretor torna­se mais um papel para mostrar a

seriedade da escola, porém tem sua execução comprometida, aumentando o

descrédito dos professores.

­ Não participação – o planejamento pode ser usado como meio de

dominação, apenas alguns planejam e outros executam, nesse sentido a

participação ocorre somente na execução. Essa participação pode também ser

parcial, o professor pode interferir apenas em pequenos segmentos, até certo nível,

mas não no plano global.

É possível observar esses três elementos apontados pelo autor no cotidiano

das escolas. Os professores perdem o interesse em planejar porque acreditam que

este ato não tem sentido e não é necessário.

Quantas vezes me peguei planejando coisas maravilhosas, entretanto a

euforia pela novidade me fazia planejar atividades que estavam bem longe da

realidade na qual estava trabalhando. O planejamento estava ótimo, mas quando

era executado não funcionava e eu acabava me frustrando.

Eu achava que tudo que aprendia de novo e que estava dando certo em

outras realidades iria dar certo comigo também. Fiquei tanto tempo perdida, sem

saber como planejar, que quando aprendi acreditei que poderia mudar tudo por meio

desse ato. Mas logo me dei conta que de nada adianta um planejamento

maravilhoso se estiver distante da realidade na qual será executado.

30

Vi muitas colegas, vindas de outras escolas, utilizarem o antigo planejamento

(de anos e escolas anteriores), numa nova escola, para outros tipos de alunos,

simplesmente porque deu certo anteriormente. Quando verificam que desta vez ele

não funcionou, não têm a postura de refletir, de adaptar seu planejamento à nova

realidade. Alegam que com esses alunos não é possível trabalhar direito, ou que os

alunos não se interessam por nada, ou ainda que são muito fraquinhos. “A idéia é

fundamental no processo de transformação, mas uma idéia articulada à realidade e

por ela fertilizada...” (Vasconcellos, 2000, p. 32).

É preciso re­significar o conceito sobre o planejamento, mas só isso não

basta. Antes é necessário re­significar o conceito de educação e da função do

professor. O planejamento não é nada sem um professor comprometido.

Muitos professores não vêem sentido no planejamento porque já não

encontram sentido também na sua profissão. Diante da crescente desvalorização do

magistério, alguns professores deixam de acreditar em si e passam a agir de forma

alienada, desvalorizando seu próprio trabalho.

Por alienação estamos entendendo aquele estado em que as pessoas tornan­se estranhas a si mesmas e ao mundo que as rodeia, não podendo interferir na sua organização, nem sabendo justificar os motivos últimos de suas ações, pensamentos, emoções. É a situação mais ou menos acentuada de perda de sentido, de desorientação, de falta de compreensão e de domínio das várias manifestações da existência. (Vasconcellos, 2000, p. 24).

O professor acomodado, alienado, não sente necessidade de mudar, portanto

não há também sentido de planejar. Planejar para que, se não há mais

expectativas?

Vasconcellos (2000), coloca que não há planejamento bom para um professor

não comprometido e que é ilusão considerar que um planejamento bem elaborado é

garantia de um bom trabalho.

31

Em qualquer escola há algum tipo de planejamento, afinal esta é uma questão

burocrática. Alguns são feitos de acordo com projetos e anseios da direção e

coordenação da escola e/ou da Secretaria da Educação e ficam maravilhosos “no

papel”, mas não serão vivenciados, ficarão apenas no plano das idéias. O professor,

muitas vezes segue esse planejamento, mas não acredita no que está fazendo ou

simplesmente faz algo que lhe foi imposto e acaba até se acostumando com isso. É

comum, no início do ano, professores pedirem o planejamento para o coordenador

pedagógico, acreditando que este já o elaborou.

Outro tipo de planejamento é a reprodução do livro didático. Copiam­se os

objetivos e conteúdos que o mesmo propõe para aquela determinada série sem a

mínima reflexão sobre os mesmos. É muito fácil planejar assim: é só copiar, entregar

para a direção para fins burocráticos e seguir a seqüência do livro, porém,

geralmente esses conteúdos não estão coerentes com a realidade da escola e da

comunidade na qual está inserida, gerando desinteresse por parte dos alunos.

Copiar o planejamento dos anos anteriores é outra forma que também perde

o seu sentido (ainda que trabalhando na mesma escola), pois a cada ano temos

uma realidade na sala de aula e as necessidades mudam, portanto devemos

também mudar a forma de planejar. O desinteresse causado pelo ato de planejar se

dá pelo fato deste acontecer porque a escola quer e não pela necessidade do

professor.

... antes de mais nada, fazer planejamento é refletir sobre os desafios da realidade da escola e da sala de aula, perceber as necessidades, re­ significar o trabalho, buscar formas de enfrentamento e comprometer­se com a transformação da prática. Se isto vai para um registro escrito depois, é um detalhe!. (Vasconcellos, 2000, p. 133)

O ato de planejar está presente em qualquer instituição empresarial ou

governamental e é uma forma de organizar o que se quer fazer, na escola também

deve ser assim. De que adiantam as idéias se forem arquivadas numa gaveta? De

32

que adiantam os papéis, se nestes não há idéias legítimas? De que adianta planejar,

se não há credibilidade neste ato?

Em muitos campos da ação, mas sobretudo em educação, sempre foram –e são­ importantes as idéias. Mas idéias não realizadas na prática, isto é, não transformadas em ação, servem apenas para o prazer do debate e da compreensão. Por isso são igualmente necessárias ferramentas para transformar idéias em prática. E se a educação, sobretudo a escolar, não trabalha com igualdade de importância nestas duas dimensões (a produção de idéias e a organização de ferramentas para torná­las realidade) não acontecerão as transformações necessárias. (Gandin, 1999, p. 14).

A partir do momento que o professor acredita que é sujeito (e não objeto) e

pode atuar de forma a transformar a realidade, tendo o planejamento como um

instrumento para orientar sua ação, há uma re­significação da função do planejar.

Gandin (1993), faz uma definição de planejamento da educação, onde

planejar é:

• elaborar – decidir que tipo de sociedade e de homem se quer e que tipo

de ação educativa é necessário para isso, verificar a distância do se

propõe e até que ponto pode­se contribuir para diminuir essa distância e

se aproximar do resultado final estabelecido.

• executar – agir de acordo com o que foi elaborado.

• avaliar – revisar sempre cada um dos momentos e das ações.

Na elaboração do planejamento é preciso ter claro que este não pode ser

neutro, indiferente, mas sim provocar mudanças, ou seja, a partir de sua execução

algo deve ser mudado.

... o ato de educar não é neutro, ele é crítico, político e filosófico e da mesma maneira que as diferentes relações de uma sociedade influenciam a educação, por ela é possível formar cidadãos políticos, conhecedores do processo histórico, científico, econômico, cultural e social, capazes de, munidos dos conhecimentos universais, transformarem a sociedade de acordo com os seus interesses e suas necessidades. (Queiroz, 2003, p. 129).

O professor precisa estar consciente de que um planejamento que mantém a

visão de que o processo educativo é nada mais do que transmissão de

33

conhecimentos da herança cultural de um povo, apenas mantém o que já existe, não

tem o poder de transformar. O processo educativo deve ser valorizado por sua

capacidade de transformar uma situação por meio da reflexão e atuação.

A avaliação é essencial no desenvolvimento do planejamento, pois só assim

teremos certeza de que realmente estamos agindo da forma que propomos e que, o

que foi proposto é algo possível de se executar. A avaliação deve ser feita em todos

os momentos a fim de que o plano possa ser revisto e talvez mudado, pois é preciso

haver certa flexibilidade.

Segundo Gandin (1994), é necessário ter cautela ao se falar de flexibilidade,

pois ela pode ser entendida como uma forma de se mudar qualquer coisa a qualquer

hora e o que foi elaborado no planejamento já não é mais aquilo que foi pensado

porque pode ser mudado, “é flexível”. Não que o plano escrito não pode mais ser

mudado, mas se foi elaborado de forma coerente e consciente representa um

compromisso e não simples páginas escritas que não têm um significado e podem

facilmente ser trocadas. É preciso tomar cuidado para que a flexibilidade não mude

a direção do que se deseja e para que o plano foi elaborado.

Ao planejar é preciso estar consciente de que a escola é, naturalmente, um

espaço político, nela juntam­se os vários conflitos da sociedade e que têm que ser

resolvidos de alguma forma. Porém é necessário ter cuidado com o direcionamento

que se dá a essa politização que pode ter por objetivo acostumar os alunos a, desde

cedo, abaixar a cabeça tendo um posicionamento incapaz de decidir e sentindo­se

impotentes e fracassados, mantendo assim, o processo de dominação exercido por

uma minoria privilegiada. Ou proporcionar um ambiente de democracia, onde o

aluno participa efetivamente do seu próprio processo de ensino, contribuindo para

34

que seja significativo, onde se sinta capaz de transformar e aprenda a decidir,

sabendo agir individual ou coletivamente.

Por meio do planejamento, o professor decide que postura será predominante

em sua sala de aula e qual será a sua relação com o aluno, preparando, dessa

forma, o cidadão para uma certa sociedade.

2.3 Planejamento global e planejamento na sala de aula

Até o dado momento falei sobre o ato de planejar e as questões que o

envolvem, mas não me especifiquei quanto ao tipo de planejamento a ser feito.

Quando digo planejamento global me refiro ao que é realizado a fim de

determinar as idéias e ações da escola em geral, o projeto político pedagógico é a

ilustração desse planejamento. “... ele é global porque compreende o todo da

instituição...” (Gandin, 1994, p. 126).

A construção do projeto político pedagógico envolve vários elementos já

citados neste trabalho. Há uma concepção de mundo, de sociedade, de homem e de

educação que determinarão a elaboração das idéias e ações planejadas no mesmo.

Como diz a diretora da escola onde trabalho “o P.P.P. é a cara que damos à escola”.

Exatamente pela sua seriedade deve ser planejado de forma participativa,

envolvendo funcionários, professores e a comunidade, pois todos são responsáveis

pelo processo educativo na escola.

Algo que sempre discutimos na escola em que trabalho é que os funcionários

precisam participar e ajudar a elaborar as idéias, pois também as executarão. Não

35

adianta a escola optar por uma postura democrática e pelo diálogo para resolver os

conflitos entre alunos na sala de aula, se essa não for também a realidade no

intervalo e na entrada. Todos os funcionários estão em contato direto com os alunos,

portanto merendeiras, vigias, faxineiras, orientadores e secretários devem ter a

mesma postura para que as crianças não fiquem confusas: na sala a professora

conversa e lá fora mandam, há gritos e autoritarismo, o que respeitar?

A comunidade tem papel fundamental nesse planejamento, já que está em

contato direto com a realidade e suas necessidades. Sua participação permite que

possa partilhar suas idéias e expectativas com as dos professores e funcionários e

trabalhar para que sejam devidamente elaboradas transformando­se em ações. O

coordenador do grupo deve tomar o cuidado de acolher e reunir todas as idéias para

que as pessoas continuem participando e para que esse processo seja realmente

significativo.

O projeto político pedagógico é um instrumento para a intervenção e mudança

da realidade e por este motivo, deve ser bem planejado, lembrando para ter o

cuidado de não ficar só nas idéias ou não terá significado.

Nas aulas do curso de pedagogia discutimos problemas encontrados pelos

professores quanto à inclusão de alunos com necessidades especiais, a dificuldade

de aprendizagem de algumas crianças e do trabalho de acordo com a realidade da

escola e da comunidade, considerando que a Secretaria de Educação “despeja”

projetos prontos a serem executados pelas escolas. Em todos os debates os

professores (A.Ps. – assistentes pedagógicos) deixaram bem claro que de nada

adianta que o grupo escola fique idealizando como gostaria de trabalhar, é

necessário que tudo esteja garantido no projeto político pedagógico e fundamentado

teoricamente.

36

Vivenciei essa situação em meu trabalho quando, no ano passado, a

Secretaria de Educação tentou impor vários projetos em nossa escola (como fez

com as outras da rede), mas conseguimos negá­los argumentando que nossa

proposta de trabalho, planejada no projeto político pedagógico, era diferenciada e os

projetos em questão não estavam coerentes com a mesma. Afinal nossas idéias não

ficariam arquivadas numa gaveta, mas seriam executadas da forma que planejamos.

Se não acontecer dessa forma, de que adiantará a participação do grupo

escola e da comunidade se as expectativas atendidas serão somente as da

Secretaria da Educação? É obvio que muitas coisas somos obrigados a cumprir,

mas devemos fazer valer nosso projeto ou todo o seu processo de planejamento

terá sido em vão.

Vasconcellos (2000), diz que é preciso atentar­se para que o projeto não se

torne algo tão bem elaborado com o que há de melhor nas ciências pedagógicas,

sociológicas e psicológicas, que não consegue ser um referencial para a caminhada

porque a comunidade não se identifica e não o reconhece como tal, por isso é

necessário que participem da sua elaboração. “... Mais que um texto bonito, o que se

espera é um processo bonito. As palavras bonitas podem encher os nossos ouvidos,

mas nos deixar de mãos vazias em termos de compromisso e de instrumentos de

transformação da realidade...” (p. 179).

Muitas vezes, os professores e a direção estão tão preocupados com os

problemas do dia a dia da escola (disciplina, aprendizagem, o cumprimento do

programa, números eficientes), que acreditam que o projeto é algo a mais para

preocupar­se. Pelo contrário, ele deve ser visto como um instrumento para organizar

as idéias, refletir sobre se o que está sendo praticado no momento é suficiente e

propor novas ações para que esses problemas sejam resolvidos da melhor forma

37

possível (deixando o imediatismo de lado), com o compromisso de todos os

envolvidos em sua elaboração.

O planejamento das aulas é mais constante no trabalho do professor, pois

não há como entrar numa sala de aula e improvisar todos os dias.

Falando sobre improvisar, certa vez fiz uma substituição de três meses numa

turma de terceira e quarta série na educação de jovens e adultos. Quando fui

chamada não tinha a mínima idéia do que se trabalhava com eles, pois só havia

dado aulas para crianças (e nem com elas tinha tanta experiência). Pedi então um

planejamento para a coordenadora do núcleo, um plano qualquer para que pudesse

me situar. Ela me entregou o diário de classe (a presença dos alunos é importante

para a continuidade do núcleo) e disse para que “me virasse”, fizesse qualquer

coisa, afinal eram somente três meses e já estávamos no final do ano. Resultado:

inexperiente, “improvisei” da melhor forma que pude.

Recentemente, uma colega me disse que estará apresentando uma proposta

para ser coordenadora pedagógica do EJA (educação de jovens e adultos). Ela

trabalha como professora desde o início desse programa e uma das suas maiores

preocupações é esse descaso, essa falta de um objetivo maior. Por isso, suas

principais propostas são a elaboração de um plano global do projeto e um trabalho

de orientação e conscientização dos professores quanto ao planejamento de suas

aulas.

O plano de aula só terá um significado maior se elaborado de acordo com o

plano global da escola. Acredito que se o professor participou da elaboração do

projeto político pedagógico e se sente comprometido com sua execução, com

certeza transporá isso em seu plano de curso e no plano de aula.

38

Sobre o plano de curso, Vasconcellos (2000), diz que é importante definir pelo

menos um esboço do mesmo para que seja como um fio condutor e que,

posteriormente, possa ser melhor detalhado. Afirma também que “... a prática de

replanejar periodicamente (p. ex. bimestralmente) é interessante, desde que haja

esse fio condutor, pois do contrário, corre­se o risco de fragmentar o trabalho, ao

invés de dar­lhe maior unidade.” (p. 137).

Na escola em que trabalho optamos por fazer esse planejamento

bimestralmente porque chegamos à conclusão que, dessa forma, podemos avaliar

melhor nossa prática. Nesse trabalho há objetivos e conteúdos que serão

trabalhados especificamente naquele período (bimestre) e os projetos de trabalho

que abrangem um período maior (quatro meses, um semestre ou até mesmo o curso

todo). Porém, acredito que precisamos estudar melhor isso, refletir e observar se o

trabalho não está ficando fragmentado.

Agora que já compreendo a importância de um bom planejamento, seja ele

global ou específico, fico pensando na realidade que vivencio. Adoro quando o

horário de trabalho pedagógico coletivo é destinado ao planejamento bimestral,

porém, há tantos recados que não sobra muito tempo para o que considero

essencial: discutir com as colegas que trabalho desenvolveremos naquele período e

como, porque e para que o faremos.

Outra coisa que me incomoda é ter consciência de que preciso planejar

melhor as minhas aulas, mas não conseguir fazê­lo adequadamente. Tenho que

preencher o Diário de classe e o semanário, onde descrevo e avalio o que trabalhei

no dia e isso tudo é feito em casa, pois o H.T.P.C. é destinado a outras coisas e na

sala de aula é impossível ficar preenchendo papéis, já que tenho mais de trinta

alunos em fase de alfabetização e priorizo a mediação durante o desenvolvimento

39

das atividades. Mas é também em casa que preparo as atividades que serão

trabalhadas com os alunos, isso sem contar os afazeres domésticos, a atenção à

família e os trabalhos do curso de Pedagogia, realmente a parte de planejar as aulas

fica para depois.

Já conversei várias vezes com a coordenadora pedagógica, pois acredito que

seja muito mais importante planejar o que vai ser trabalhado na aula do que ficar

descrevendo no semanário o que já aconteceu. Ela argumenta enfatizando a

importância do registro, concordo, mas esse registro deve ter um sentido, um

significado e o semanário, como é feito, não tem sentido algum para mim, é mais

uma obrigação. Compreendi que de nada adianta ficar indignada ou desanimada,

embora me incomode essa situação de não concordar com algo e ser obrigada a

faze­lo por se tratar de normas da Secretaria da Educação, ou mesmo de não

encontrar tempo para fazer as coisas como realmente devem por ter que cumprir

outras obrigações. Sei que devagar e com muito diálogo e trabalho algumas coisas

poderão ser mudadas.

Depois de escrever esse trabalho fica uma sensação ainda maior de que

preciso rever muitas coisas em minha prática pedagógica, principalmente nesse

ponto de não deixar que as idéias fiquem por si só, não transformando­se em ações

concretas.

Acredito que a melhor forma de se fazer qualquer trabalho de planejamento

em educação é em conjunto, pois cada professor tem um histórico e uma concepção

do processo educativo. Planejando juntos trocam experiências e idéias, articulando

melhor as estratégias de trabalho. São as diferenças que enriquecem o processo.

Minhas vivências nesses grupos permitiram que fizesse algumas

observações, notei que os professores que lecionam há mais tempo têm uma

40

concepção do processo educativo mais conservadora, mas já vivenciaram inúmeras

situações em sala de aula, são muito experientes. Enquanto os que estão acabando

de se formar, têm uma concepção mais abrangente do processo educativo, mas

muitas vezes, não vivenciaram as situações de sala de aula, ficando com uma visão

distante e até utópica da realidade. É esse encontro que proporcionará o

enriquecimento na formação desses profissionais, haverá discordâncias, debates,

reflexões e a re­significação do planejamento e da prática pedagógica.

2.4 Gestão

A revisão do currículo, a formação e participação do grupo e o próprio

planejamento, para acontecerem, dependem muito do tipo de gestão que se

encontra na escola. Uma gestão autoritária não se preocupará com a participação,

ela simplesmente determinará a formação de um grupo que fará o planejamento de

acordo com o currículo, seja qual for ele.

Trabalhei numa escola em que a diretora pouco estava presente e nós, as

professoras, tínhamos que resolver os problemas que aconteciam em sua ausência.

Isso fez com que nos uníssemos num grupo muito forte, mas ela ficou de fora, pois

não participava de nada. Essa diretora não gostou nem um pouquinho e quando

estava presente na escola queria impor o seu poder, não admitia que podíamos

resolver as situações mesmo sem a sua importante pessoa. Ela “vestiu” o seu cargo

com todo o poder que lhe é conferido e sem querer nos ensinou como se dá uma

41

gestão democrática e participativa, embora tenhamos aprendido da pior forma:

sofrendo.

Ao gestor da escola são atribuídos muitos poderes, mas se ele optar por uma

gestão democrática, compartilhará esses poderes com o grupo juntamente com os

problemas que o acompanham. Paro (1987), diz que muitas vezes, o diretor ouve

não diante de suas reinvidicações porque as faz sozinho, é apenas uma pessoa,

mas se essas reinvidicações forem feitas por um grupo que “esteja

instrumentalizado pela conscientização que a sua própria organização propicia”,

será mais difícil ouvir um não.

Daí a importância de uma gestão democrática e participativa que envolva o

grupo escolar (professores, funcionários e alunos) e a comunidade na qual a escola

está inserida. Trabalhando junto com a comunidade a escola torna­se mais forte

frente à burocracia que a cerca e passa a cumprir melhor sua função junto desta.

Num artigo escrito para a disciplina de gestão escolar (PROESF), citamos a

forma como a escola em que trabalhamos (o artigo foi escrito em conjunto com a

minha colega de pedagogia e de trabalho Edilaine Corrêa) iniciou esse tipo de

gestão e o que a levou a optar por esse trabalho. Houve a necessidade de um

trabalho participativo ou não se conseguiria trabalhar de forma adequada. Todos os

conflitos da comunidade estavam dentro da escola e precisavam ser resolvidos de

alguma forma. A participação da comunidade na escola e da escola na comunidade

fez com que esses conflitos pudessem ser trabalhados em conjunto, o que

proporcionou uma melhora significativa e a escola passou a ter uma função social

naquela comunidade.

Quando o artigo foi escrito a diretora em questão já procurava exercer uma

gestão participativa e democrática há seis anos e tinha uma grande aprovação da

42

comunidade e do grupo escolar. Recentemente houve um processo de mudança na

administração da escola e a comunidade esteve presente, deixando bem claro para

a nova diretora, já na primeira reunião, que “só fica nesta escola quem tem vontade

de trabalhar e esse trabalho não diz respeito somente ao interior dos muros da

mesma”. (ver anexo 2).

Não há como falar em planejamento sem considerar a importância que o

diretor e o coordenador pedagógico têm nesse processo, já que tudo o que foi

escrito neste trabalho até agora está diretamente ligado a “essas pessoas”. Por isso

é necessário que o professor que deseja o cargo de gestor esteja consciente de que

será um líder e muitas pessoas estarão diretamente ligadas às decisões que tomará

(professores, alunos, comunidade), porém não se pode confundir liderança com

autoritarismo. Autoridade cabe a quem manda, a quem define e comanda uma ação,

já um líder participa com seu grupo tanto da elaboração quanto da execução de um

projeto de trabalho.

Numa gestão autoritária, o projeto político pedagógico será mais um papel a

habitar as gavetas empoeiradas das escolas. Por outro lado, numa gestão

participativa e democrática ele será um instrumento de trabalho para a

transformação da realidade, um pensar e fazer coletivos.

43

3. CONCLUSÃO

Este trabalho, como disse na apresentação, foi um desafio, porém muito

importante para que eu pudesse parar e analisar minha prática pedagógica. Muitas

vezes, devido a sua extensa jornada de trabalho, o professor deixa de fazer essa

pausa para reflexão, tornando seu trabalho repetitivo e sem significado.

Antes de fazer o Curso de Pedagogia eu já sabia que o planejamento tinha a

sua importância, mas não conhecia a diversidade de conceitos que o envolvem. Na

verdade, quis registrar nesse memorial como meus conceitos e minha postura como

professora mudaram, para melhor é claro.

Como disse para o professor Sérgio Leite, numa das aulas sobre o memorial

quando ele me perguntou que eixo escolheria para o meu trabalho, não acreditava

no projeto político pedagógico e nem no plano de curso, tinha minhas dúvidas até

mesmo quanto ao plano de aula, porém depois dos conceitos construídos nas aulas

do curso de Pedagogia, comecei a mudar esse pensamento. O planejamento deixou

de ser uma escrita burocrática para tornar­se um instrumento de trabalho.

Essa mudança de olhar e de postura não acontecem de uma hora para outra,

é uma aprendizagem, um processo. Foi preciso desconstruir muitas verdades,

quebrar paradigmas e isso não se conclui com este trabalho que, na verdade, é o

início de uma caminhada. Tenho poucos anos de experiência como professora e sei

que ainda encontrarei muitos conflitos, alguns conceitos mudarão, outros terão que

ser defendidos e a reflexão será indispensável durante esse processo.

Meu objetivo, com este trabalho, não foi escrever sobre a parte prática do

planejamento como definir conteúdos, diagnóstico, estratégias e objetivos. Acredito

que o “como se faz” é importante, porém o “para que” e o “por que” são essenciais

44

para o trabalho pedagógico, por isso busquei conhecer as causas do desgaste do

planejamento junto ao professor e a importância do mesmo para uma aprendizagem

mais efetiva e significativa tanto dos alunos quanto de todas as pessoas envolvidas

em sua elaboração e execução (professores, funcionários e comunidade).

No processo educativo trabalhamos com a formação do ser humano e o

planejamento contém conceitos que direcionam essa formação, por esse motivo

deve ser re­significado e cumprir sua função na escola, não dando conta do

programa como pensam alguns, mas sendo um instrumento de transformação da

realidade.

Se queremos formar cidadãos críticos, conscientes e atuantes na sociedade,

nós professores, devemos nos atentar se também somos capazes de desenvolver

esses adjetivos. Participar “realmente” do planejamento (elaboração e execução) do

projeto político pedagógico da escola, direcionando melhor o plano de curso e

conseqüentemente o plano de aula já é um grande passo.

45

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BORDENAVE, Juan E. Diaz. O que é participação. 8ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.

DEMO, Pedro. Política social, educação e cidadania. 2ª ed. Campinas: ed. Papirus. p. 13­42. 1996.

GANDIN, Danilo. Planejamento como Prática Educativa. 7ª ed. São Paulo: ed. Loyola, 1993.

GANDIN, Danilo; GANDIN, Luiz Armando. Temas para um Projeto Político Pedagógico. 4ª ed. RJ: ed. Vozes, 1999.

GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. 2ª ed. Rio de Janeiro: ed. Civilização Brasileira, 1978.

PARO, Vitor H. Série Idéias ­ Participação da Comunidade na Gestão Democrática da Escola Pública. São Paulo. FDE. nº 12, . 38p­47, 1992.

QUEIROZ, Maria Teresa Sokolowski. Desafios à educação num mundo globalizado. RBPAE, v. 19, nº 1, p. 119­129, jan./jun., 2003.

SACRISTÁN, J. Gimeno. O Currículo: uma reflexão sobre a prática. 3ª ed. Porto Alegre, RS: ArtMed, 2000.

SAVIANI, Demerval. Escola e Democracia: Teorias da Educação, Curvatura da Vara, onze teses sobre educação e política. 10ª ed. São Paulo: Cortez: Autores Associados, coleção Polêmicas do nosso tempo, v. 5, p. 14­45, 1986.

VASCONCELLOS, Celso dos S. Planejamento: Projeto de ensino­aprendizagem e Projeto Político­Pedagógico – elementos metodológicos para elaboração e realização. 8ª ed. SP: Cadernos Pedagógicos do Libertad, v. 1, 2000.

VÁSQUEZ, A. Sánchez. Filosofia da práxis. 2ª ed. Rio de Janeiro: ed. Paz e terra, p. 192­241, 1977.

46

ANEXOS

Anexo 1 – Projeto Identidade

Anexo 2 – Artigo: Gestão Democrática – a participação da comunidade

47

ANEXO 1

Projeto Identidade

Justificativa

O projeto será desenvolvido nas primeiras séries de uma escola municipal de

ensino fundamental com a finalidade de valorizar o ser humano, conhecendo e

respeitando as diferenças e resgatando as virtudes que devem ser adotadas para

com o próximo.

Serão organizadas atividades com os nomes dos alunos, ou seja, o primeiro

registro de qualquer pessoa, a primeira marca, a partir do qual cada um se conhece

como singular, único, constituindo sua história, sua identidade, pelo reconhecimento

do outro, o que lhe confere um estatuto de pertencimento e representatividade que,

antes da sua inserção no mundo da leitura e da escrita dá­se no âmbito familiar.

Assim, através do resgate de sua história, o aluno estará interagindo com o grupo,

diversificando seu convívio, conhecendo e respeitando as diferenças culturais

existentes no mesmo e também reconhecendo que faz parte e constrói história,

observando as mudanças ocorridas em seu corpo e no tempo.

Avaliação

A avaliação se dará num processo contínuo e gradativo, feita a partir dos

objetivos propostos, permitirá verificar as atitudes e habilidades básicas do aluno,

desenvolvidas durante o projeto.

48

A execução das atividades, os trabalhos individuais e de grupo, a participação

em sala de aula em conversas, jogos e debates, evidenciarão o desenvolvimento do

aluno quanto aos objetivos propostos.

A avaliação servirá também como parâmetro para os próximos passos do

professor em questão de planejamento e elaboração de novas atividades que

possam atender as curiosidades que forem aparecendo durante a execução do

projeto. O professor deverá acrescentar à rede, durante esse processo de avaliação,

novos conteúdos, perguntas e disciplinas que completarão o projeto em andamento.

Disciplina: Português

Pergunta: Por que não somos todos iguais?

Conteúdo: ­ leitura

­ interpretação

­ produção

Objetivos:

­ Relate acontecimentos e exponha sua opinião sobre o tema estudado

acolhendo e respeitando as diferentes opiniões dos colegas.

­ Conheça e interprete diferentes portadores de texto como: poesia, música,

narrativa (literatura infantil).

­ Produza um texto escrito (mesmo que dentro de sua hipótese de escrita) e

saiba argumentar sobre o mesmo.

Metodologia:

­ Leitura e interpretação da poesia “Nome da gente” (Pedro Bandeira).

­ Cruzadinha com foto das crianças da sala para que, observando as

mesmas, escrevam os nomes dos colegas.

49

­ Bingo de nomes e com as letras do nome.

­ Música “Cada um é como é” (CD canção dos direitos das crianças).

­ Leitura do livro “Menina bonita do laço de fita” (Ana Maria Machado). . Após

a leitura os alunos serão divididos em duplas, onde um desenhará o outro

observando suas características (não deverão mostrar o desenho ao colega),

somente depois que terminarem o desenho deverão mostrá­lo ao colega e conversar

sobre suas semelhanças e diferenças, produzindo juntos um pequeno texto.

Disciplina: História

Pergunta: A que grupo pertenço?

Conteúdo: Grupos sociais – família

Objetivos:

­ Resgatar sua história estabelecendo relações entre presente e passado.

­ Conhecer e respeitar as diferenças culturais.

­ Identificar as pessoas que fazem parte da sua família, adotando atitudes de

respeito tanto com a sua família quanto com a formação das famílias dos colegas.

Metodologia:

­ Leitura do livro “Guilherme Augusto Araújo Fernandes” (Mem Fox)

­ Linha do tempo com fotos dos alunos.

­ Pesquisa para ser realizada com os pais: Quem escolheu seu nome? Por

que escolheu esse nome? O seu sobrenome vem da sua mãe ou do seu pai? Você

tem apelido? Qual? Quem colocou?

­ Conversa sobre a pesquisa.

­ Pedir para que tragam uma foto da família. Cada criança apresentará sua

família através da foto e faremos um mural para exposição das mesmas.

50

­ Conversa sobre a formação das famílias (diferenças e semelhanças na sua

constituição).

Disciplina: Geografia

Pergunta: A que grupo pertenço?

Conteúdo: Localidade de nascimento dos alunos.

Objetivos:

­ Identifique o lugar onde nasceu relacionando a distância do mesmo com a

localização da escola.

­ Inicie a leitura de mapas reconhecendo­os como fonte de informação e

localização.

­ Reconheça que objetos podem ser símbolos que identificam lugares.

Metodologia:

­ Pesquisa sobre o lugar onde as crianças nasceram.

­ Localização no mapa, com a ajuda da professora, do local onde nasceram

(cidades diferentes).

­ Conversa sobre quem nasceu mais distante da cidade (ou bairro) em que se

situa a escola.

­ Pedir para que as crianças tragam fotos ou objetos que lembrem o local de

nascimento, depois haverá uma socialização onde cada um explicará porque trouxe

esse objeto.

Disciplina: Matemática

Pergunta: A que grupo pertenço?

51

Conteúdo: Tratamento da informação – gráfico de barras.

Objetivos:

­ Utilize gráficos de barras para leitura e interpretação de dados.

­ Construa gráficos de barras a fim de comunicar informações.

Metodologia:

­ Resgatar os dados trazidos pelos alunos sobre o local em que nasceram.

­ Montar o gráfico com os alunos com caixinhas de fósforo.

­ Fazer interpretação oral dos dados obtidos no gráfico.

­ Representar o gráfico feito de caixinhas no papel quadriculado, observando

assim as diferentes formas de se montar um gráfico.

Disciplina: Ciências

Pergunta: Como é meu corpo e quais cuidados devo ter com ele?

Conteúdo:

­ Partes do corpo

­ Higiene pessoal

Objetivos:

­ Observe e identifique algumas características do corpo humano adotando

hábitos de auto cuidado e respeitando as possibilidades e limites do próprio corpo.

­ Valorize e adote atitudes e comportamentos favoráveis a saúde em relação

à alimentação e a higiene pessoal, desenvolvendo a responsabilidade no cuidado

com o próprio corpo e com os espaços em que habitar.

Metodologia:

52

­ Dividir a sala em cinco grupos, cada grupo deverá desenhar o contorno do

corpo humano de um colega em um cartaz, depois deverão completar o desenho

com as partes que estão faltando.

­ Observar quantos são os meninos e quantos são as meninas e identificar

com as crianças as diferenças entre um e outro.

­ Leitura da coleção “Cuidando do corpo” (Gina Borges) ­ leitura de um livro

por dia e interpretação do mesmo.

­ Conversa sobre as atitudes de higiene que devemos tomar e sua

importância para nossa saúde.

Disciplina: Arte

Pergunta: Por que os meninos e meninas se comportam de maneiras

diferentes?

Conteúdo:

­ Teatro com fantoches.

Objetivo:

­ Expressar através da linguagem teatral o comportamento de meninos e

meninas.

Metodologia:

­ Os alunos confeccionarão fantoches com papel crepom vestindo­os e

enfeitando­os da forma que escolherem. Depois apresentarão um teatro no qual

expressarão o comportamento de meninos e meninas na atualidade.

Disciplina: Educação Física

53

Pergunta: Por que os meninos e meninas se comportam de maneiras

diferentes?

Conteúdo:

­ Respeito pelo próprio corpo e com os colegas.

Objetivos:

­ Respeite as regras do grupo sem discriminar os colegas pelo seu

desempenho ou por razões culturais, sexuais, físicas ou sociais.

­ Participe de diferentes atividades corporais procurando adotar uma atitude

cooperativa e solidária.

Metodologia:

­ Conversar sobre as brincadeiras preferidas dos meninos e das meninas.

­ Combinar que numa aula as meninas escolherão e prepararão uma

atividade junto com a professora e os meninos deverão participar das mesmas. Na

próxima aula os papéis se inverterão, os meninos prepararão a atividade e as

meninas participarão, sempre conversando sobre a importância do respeito mútuo.

­ Fazer jogos cooperativos como: rede­viva; pega­pega em dupla ou em

corrente; cego, etc.

54

Considerações finais

O trabalho com a rede possibilitou um estudo mais aprofundado do tema, uma

relação entre presente e passado, pois é abordado em todas as disciplinas,

quebrando o modelo cartesiano e a fragmentação do saber e possibilitando a

compreensão dos fatos, já que nos constituímos histórica e socialmente.

A participação dos alunos ao elaborar as questões demonstra uma motivação

maior nas aulas e as estratégias utilizadas pelo professor são de fundamental

importância para a construção do conhecimento.

Neste tipo de planejamento os alunos participam de seu processo educativo,

tanto na elaboração das idéias quanto na execução das ações.

Bibliografia

­ ARAÚJO, Ulisses F. Temas transversais e a estratégia de projetos.

Moderna. 2004.

­ BANDEIRA, Pedro. Cavalgando o arco­íris. Ed. Moderna.

­ BORGES, Gina. Cuidando do corpo (coleção infantil). Ed. Fapi. MG. 2002.

­ FOX, Mem. Guilherme Augusto Araújo Fernandes. Ed. Brinque book. 1995.

­ MACHADO, Ana. M. Menina bonita do laço de fita. 7ª ed. Ática. SP. 2004.

­ MATTAR, Maurício. Cada um é como é. In: Toquinho e Convidados – CD

Canção dos direitos das crianças. Grav. Movieplay. 1997.

­ MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Parâmetros Curriculares

Nacionais. Brasília. 1975.

55

ANEXO 2

Artigo ­ Gestão Democrática: a participação da comunidade

Resumo: Para melhor compreensão da participação da comunidade numa gestão

democrática relatamos neste artigo algumas formas de proporcionar o envolvimento da comunidade

na escola, assim como alguns conceitos teóricos e do cotidiano que pudessem esclarecer as

possibilidades dessa participação e sua importância para o desenvolvimento da escola.

Palavras chave: gestão, democracia, participação, comunidade.

O histórico de uma EMEF do Município de Piracicaba mostra a importância de

uma gestão participativa e democrática para melhor organização e relacionamento

com a comunidade, atingindo assim um bem comum que é a aprendizagem e

desenvolvimento dos alunos. Para compreender isso relatamos o histórico dessa

escola.

O bairro onde se localiza a escola começou a existir em conseqüência da

remoção de famílias que moravam em área de risco (favelas à margem de ribeirões).

Neste mesmo ano iniciou­se a construção da EMEF. Os moradores do bairro

mostraram­se, desde o início, muito revoltados devido a essa remoção, o novo

bairro apenas tinha as instalações de saneamento básico e energia elétrica, faltava

escola, creche, asfalto, posto de saúde, transporte, etc. Houve então um movimento

de escolha de líderes que reunissem esses moradores para lutar por seus direitos.

Quando a EMEF foi inaugurada, esses conflitos passaram a fazer parte da

mesma, havendo grande dificuldade em trabalhar com as crianças. Os professores

56

constantemente pediam remoção (e até demissão) e o grupo não conseguia se

fortalecer. Funcionários da escola, professores, alunos e comunidade podiam até ter

o mesmo objetivo, mas não havia diálogo. Houve então a necessidade de lideranças

que auxiliassem a organização da comunidade local e conseqüentemente da escola.

A diretora de escola percebeu que não podia perder o seu grupo e que

sozinha seria difícil encontrar soluções. Sentiu então a necessidade de buscar

parceiros que agissem na comunidade, entre eles o assistente social e a presidente

da associação de moradores que passaram a participar das reuniões pedagógicas

da escola, pois dessa forma, conheciam os problemas que esta passava e

compartilhavam os problemas enfrentados pelas famílias da comunidade.

Conhecendo melhor a comunidade, suas lutas, necessidades e dificuldades, a

escola pôde melhorar o seu trabalho, flexibilizando o seu currículo e tentando trazer

a comunidade para buscar soluções aos problemas.

Neste caso, exercendo o diretor uma gestão autoritária perderia a força do seu

grupo e faria um trabalho totalmente desvinculado dos anseios da comunidade,

afastando a possibilidade de sua participação.

... Se a escola não participa da comunidade, por que irá a comunidade participar da escola? Isto deveria alertar­nos para a necessidade de a escola se aproximar da comunidade, procurando auscultar seus reais problemas e interesses. A falta dessa aproximação, dessa postura de ouvir o outro, parece explicar em grande parte o fracasso de iniciativas paternalistas de gestão colegiada e de participação que, por mais bem intenciodas que sejam, procuram agir “em nome da comunidade”, sem antes ouvir as pessoas e os grupos pretensamente favorecidos com o processo e sem dar­lhes acesso ao questionamento da própria forma de participação. (Paro, 1992, p.27).

Na EMEF citada acima foi essencial a mudança de postura da direção, que

reconheceu a necessidade de um trabalho coletivo e conseqüentemente da

participação da comunidade da qual a escola é integrante. Esse trabalho deve ser

mais estudado para seu melhor desenvolvimento, havendo vários meios para que

isso aconteça.

57

O projeto político pedagógico da escola como o próprio nome diz deve contar

não só com os envolvidos na parte pedagógica, mas com todos os outros

segmentos aos quais diz respeito como, por exemplo, os outros funcionários da

escola e representantes da comunidade, pois dessa forma, os problemas e

prioridades serão eleitos coletivamente e as sugestões serão em maior número, já

que contam com a diversidade de visões do grupo. Todos conscientes disso será

mais fácil trabalhar nas ações para resolvê­los.

O conselho de escola tem importante papel na gestão participativa, pois ajuda

tomar decisões e conta com representantes de vários setores envolvidos com a

educação dos alunos: diretor, coordenador pedagógico, professores, pais, alunos,

representantes das várias categorias de servidores da escola e representantes da

comunidade, que podem ou não ter filhos na escola. Todos se sentem co­

responsáveis pelas decisões tomadas e pelos avanços obtidos. Para que o conselho

de escola funcione é necessária uma organização da escola, informando

antecipadamente a data e o assunto que será discutido nas reuniões, pois dessa

forma, as pessoas poderão organizar­se em seus compromissos tendo uma

participação efetiva e a oportunidade de pensar sobre o assunto antecipadamente

formulando opiniões que serão colocadas nas reuniões.

A participação não é um conteúdo que se possa transmitir, mas uma mentalidade e um comportamento com ela coerente. Também não é uma destreza que se possa adquirir pelo mero treinamento. A participação é uma vivência coletiva e não individual, de modo que somente se pode aprender na práxis grupal. Parece que só se aprende a participar, participando. (Bordenave, 1994, p.74).

Para que isso ocorra o aluno deve vivenciar a participação dentro da escola.

Uma das formas que a EMEF encontrou para promover essa participação foi

fazendo a eleição para escolher representantes de sala e chamando­os para

reuniões nas quais eram colocados alguns problemas que estavam acontecendo (e

58

que eles estavam envolvidos), como por exemplo, o recreio, a utilização dos

banheiros, o comportamento nas salas de aula e o relacionamento com os colegas.

Esses problemas eram levados pelos representantes de sala e discutidos na sala de

aula com os colegas, que procuravam meios para solucioná­los. Essas sugestões

eram colocadas pelos representantes em outra reunião na qual seriam discutidas

soluções e alternativas para os problemas. As devolutivas dessas discussões eram

levadas para os colegas pelos representantes de sala. Nessas reuniões

participavam os representantes de sala, a direção, a coordenação e pessoas que

estivessem envolvidas com o problema que seria discutido, por exemplo, se o

problema fosse a má utilização dos banheiros seria necessária a participação de

pessoas dos serviços gerais. Com isso os alunos sentem­se importantes em opinar

e participar de certas organizações da escola, aprendendo ouvir, respeitar opiniões e

sentir­se parte integrante da escola tendo a oportunidade de agir.

A reunião de pais é uma grande aliada na participação, mas deve­se tomar o

cuidado para não afastá­los das reuniões. Os pais geralmente são chamados à

escola para serem informados sobre as notas e o comportamento dos seus filhos na

sala de aula, assunto que muitas vezes afasta­os. Estes problemas também devem

ser discutidos com os pais, mas devem ser colocados de tal forma que este se

sintam apoiados pela escola para resolver os problemas em questão e não como os

únicos culpados dos mesmos. Nessas reuniões deveriam ser abordados os

objetivos, os problemas, os projetos e as questões pedagógicas da escola, é

importante que a escola informe às famílias sobre o trabalho desenvolvido ou estas

podem ficar desmotivadas, não participando por desconhecerem a dinâmica da

mesma. Os professores devem dar oportunidade para os pais se expressarem e

59

avaliarem seu trabalho pedagógico e questioná­los sobre os assuntos e temas que

consideram relevantes a serem abordados nas reuniões.

Parece haver por um lado, uma incapacidade de compreensão por parte dos pais a respeito daquilo que é transmitido na escola. Por outro lado, há uma falta de habilidade dos professores em promover essa comunicação. (Paro, 1992).

Geralmente, os pais ficam inseguros em colocar sua opinião durante as

reuniões, pois se sentem “inferiores” diante do professor. Devido a isso a escola

deve encontrar outras formas de ter essas informações. Uma forma encontrada pela

EMEF de Piracicaba foi enviar por meio dos alunos e das reuniões de pais questões

relacionadas ao trabalho que é desenvolvido na escola para que os pais possam

expor suas opiniões e dar sugestões (até mesmo de forma anônima, se preferirem).

Essa pesquisa é tabulada em forma de gráficos e serve de estudo nas reuniões

pedagógicas, onde todos os segmentos da escola podem observar e discutir sobre

os resultados, apontando ações e soluções.

Os gráficos apresentados a seguir são apenas exemplos desse trabalho

desenvolvido pela escola. A EMEF disponibilizou apenas os gráficos do ano de

2002, pois está atualizando o seu projeto político pedagógico e reorganizando seus

dados.

60

235

107

238 238

176

0

50

100

150

200

250

Ensino

Escola aberta

aos pais

Tratam

ento com

as

crianças e a com

unidade

Com

prom

etimen

to,

Organização, A

mizade,

Funcionários

Trabalho Realizado

com valores

O que os pais gostam na escola I

Média de pais: 450 Ano: 2002

131

54

24

74

56

12

85 85

34

0

20

40

60

80

100

120

140

Alunos

uniform

izados

Melhorar a

saída

dos alunos

Tirar a

sopa do

cardápio

nos dias de calor

Mais pesquisas

para os alunos

Mais esporte

e

aulas de arte

Acompanhante

no ônibus escolar

Ensino de 1ª a 8ª

Quadra coberta

Mais espaço

Sugestões

Média de pais: 450

61

A escola deve buscar e conquistar parcerias principalmente com segmentos

sociais instalados na comunidade como: cooperativas, assistência social, programas

de saúde, instituições que dão assistência durante o tempo que as crianças não

estão na escola, tirando­as das ruas (igrejas, voluntários e cursos artesanais).

Na EMEF citada neste artigo essas parcerias ocorrem de forma integrada, um

exemplo disso é a forma como foi trabalhada a questão do piolho, um problema que

estava afetando demais os alunos. Os professores trabalhavam na sala de aula

apresentando suas conseqüências para a saúde e a higiene como forma de

prevenção, o PSF (Programa de Saúde Familiar) ministrou palestras para os alunos

e para os pais conscientizando­os e fornecendo remédios. Essas palestras foram

realizadas na escola e estenderam­se na comunidade. Foi realizada também uma

passeata com alunos, funcionários da escola, o PSF, o assistente social e pessoas

da comunidade, alertando os moradores do bairro sobre as conseqüências

causadas pelos piolhos e as formas de prevenção.

O trabalho realizado com essas parcerias torna mais fácil a integração da

escola com a comunidade. “O envolvimento da comunidade, desde a construção da

escola até os dias atuais, passando por todo processo de adaptação, integração e

conquistas do grupo, é fator de destaque em nosso histórico”, diz a diretora da

EMEF.

É importante termos a visão de que somente uma ação não garante a

participação da comunidade na escola e que essa participação não se dá somente

com os pais, a escola deve buscar todas as alternativas possíveis para promover a

participação da comunidade e só conseguirá isso com um trabalho coletivo, em

grupo, que saiba antes de tudo ouvir.

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A gestão democrática e participativa não acontece por acaso é produto de um

longo e trabalhoso processo, no qual se está sempre aprendendo uns com os

outros.

A participação da comunidade é algo a ser conquistado, trabalhado, pois só

assim terá uma ação positiva. Participando, a comunidade passa a conhecer os

problemas e prioridades da escola e pode decidir, junto com os educadores,

compreendendo melhor a ação da escola.

A escola precisa sentir­se parte da comunidade e a comunidade sentir­se

parte da escola. É preciso também se conscientizar do tipo de participação que é

feita e a que se deseja. Há vários tipos de participação, em algumas há indução e

manipulação, em outras a pessoa torna­se apenas ouvinte, há também a por

obrigação, imposição da participação. A participação da comunidade na escola não

pode espelhar­se em nenhuma destas.

... A democracia participativa seria então aquela em que aos cidadãos sentem que, por “fazerem parte” da nação, “têm parte” real na sua condução e por isso “tomam parte” – cada qual em seu ambiente ­ na construção de uma nova sociedade da qual se “sentem parte. ( Bordenave, 1994, p.23).

O que se deseja e pelo que se trabalha é que a escola seja o local onde se

inicie uma verdadeira democracia e que esse sentimento manifeste­se

posteriormente em outros segmentos da sociedade. O sentimento de pertencimento

desenvolvido na escola permite uma participação efetiva, onde se tomam decisões

porque elas dizem respeito também à vida e às relações de seus integrantes. Esse

sentimento deve desenvolver­se também em relação à sociedade.

Nos exemplos colocados pela EMEF de Piracicaba vê­se uma grande busca

pela gestão democrática e participativa e a importância que se dá à participação da

comunidade. É isso que deve acontecer em todas as escolas, a vontade de agir

supera as dificuldades e com ajuda torna­se muito mais fácil.

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Referências bibliográficas

­BORDENAVE, J. E. D. O que é participação. 8ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.

­PARO, V. F. Série Idéias ­ Participação da Comunidade na Gestão Democrática da Escola Pública. São Paulo. FDE. nº 12, p. 38­47, 1992.

­PÁTIO, Revista Pedagógica ANO 3 nº 10 Agosto/ Outubro 1999. Comunidade e Escola – A Integração necessária: Artmed.

­PÁTIO, Revista Pedagógica ANO 1 nº 3 Novembro 1997. Para que Serve a Escola: Artmed.

­RAÍZES E ASAS. Qualidade Para Todos – O caminho de cada escola. 4ª ed. Ao Paulo: Cenpec, 1994.

­REVISTA NOVA ESCOLA – A escola de todos nós. FERDINANDDO CASAGRANDE, LUCIANA ZENTI. P.13­ 19. Julho 2000: Abril.

­REVISTA NOVA ESCOLA – Como atrair os pais para a escola. ROBERTA BENCINI. P. 38 –39. Outubro 2003: Abril.

­VEIGA, I. P. A. Projeto político Pedagógico da Escola – Uma construção possível. 12ª ed. São Paulo: Papirus, 1995.