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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
EMOÇÕES E SAÚDE:
O TRATAMENTO DE DOENÇAS PSICOSSOMÁTICAS ATRAVÉS
DA MITOLOGIA NA ARTETERAPIA
Por: Alice Silva Lodi
Orientador
Profª. Geni Lima
Niterói - RJ
2009
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
EMOÇÕES E SAÚDE:
O TRATAMENTO DE DOENÇAS PSICOSSOMÁTICAS ATRAVÉS
DA MITOLOGIA NA ARTETERAPIA
Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do
Mestre – Universidade Candido Mendes como
requisito parcial para obtenção do grau de
especialista em Arteterapia em Educação e Saúde.
Por: Alice Silva Lodi
3
AGRADECIMENTOS
À orientadora e a todos os professores
do curso com os quais tive a
oportunidade de aprender, por
compartilharem seu conhecimento e
dedicação. Aos colegas de turma por
tornarem o curso ainda mais prazeroso.
4
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, Nilson e Denise, por todo
o apoio.
5
RESUMO
Em nossa cultura separamos corpo e mente como se fossem coisas diferentes.
Apesar de sabermos cientificamente que nosso corpo responde à atividade de
nosso cérebro, quando é necessário falar sobre as emoções parece que sua
origem permanece um lugar desconhecido. A psicossomática tem como
premissa a visão de corpo e mente como algo único, inseparável, nos
mostrando que nossas emoções fazem parte de nosso corpo, influenciam suas
reações e por isso podem também transparecer como doenças físicas. A
arteterapia, tendo como foco trabalhar as emoções do indivíduo auxiliando-o a
identificar seus sentimentos e explorá-los através do material simbólico
expresso em suas manifestações artísticas, facilita a observação da doença em
seu âmbito físico e emocional. Através do simbolismo que a doença representa
é possível reconhecer a causa de um conflito emocional não identificado pelo
indivíduo. Como um meio eficiente de se trabalhar a identificação das emoções
na arteterapia há a mitologia que proporciona o conhecimento dessas histórias
tão ricas em desafios, aceitações, decisões e sentimentos vividos pelos
personagens. A projeção de si mesmo nesses contos permite a conexão com
os personagens e a correspondências de ambas as histórias: de si mesmo e
dos mitos. Isto nos proporciona autoconhecimento e o caminho da cura através
do processo de individuação.
6
METODOLOGIA
Baseando-se em pesquisa bibliográfica foram citados os conceitos de
psicossomática e também arteterapia. Como o objetivo estava em justificar,
através de conhecimentos da área científica, a dinâmica do nosso organismo
compreendida por sua relação mente-corpo, foi essencial utilizar a opinião e a
teoria de neurologistas, destacando o livro de uso acadêmico “Neuroanatomia
funcional”, de autoria de Angelo Machado. Carl Gustav Jung é a grande
referência para ajudar a compreender a arteterapia e o estudo psicológico de
um indivíduo por seus estudos que definem simbolismo, arquétipo e a
importância de nosso inconsciente, além da relevância que dava aos
conhecimentos em mitologia. Além dele, as práticas da Dra. Nise da Silveira
são grandes exemplos para esse estudo, e Liomar Quinto de Andrade e Maria
Cristina Urrutigaray colaboram para os conhecimentos mais atuais dessa
prática. O estudo da psicanálise de contos e mitos de Bruno Bettelheim auxiliou
na compreensão da influência destes nos indivíduos, e o artigo acadêmico de
Narjara Torrel Telöken, estudante de Naturologia Aplicada, colaborou
amplamente para a observação dos resultados alcançados com a mitologia em
arteterapia através de sua demonstração de um estudo de caso.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - A relação corpo e mente 09
na psicossomática
CAPÍTULO II - A descoberta das emoções 18
na arteterapia CAPÍTULO III – Os arquétipos na mitologia: 29
autoconhecimento e cura CONCLUSÃO 44
BIBLIOGRAFIA 45
ÍNDICE 48
FOLHA DE AVALIAÇÃO 50
8
INTRODUÇÃO
Quando a Dra. Nise da Silveira trabalhou as diversas expressões da
arte com os internos do Centro Psiquiátrico Nacional de Engenho de Dentro,
ajudando-os a se voltarem para sua vida íntima e suas emoções e vivências
pessoais, sua experiência abriu as portas para a arteterapia no Brasil. Ainda
pouco conhecida, essa técnica terapêutica mostra na prática seus resultados
renovadores na vida emocional do indivíduo e em seu caminho para a
autocompreensão. Nosso inconsciente, coletivo e pessoal, está repleto de
imagens simbólicas que se originam em nossas vivências cotidianas, em nosso
relacionamento com as pessoas e com nós mesmos. Mesmo o que
gostaríamos de esquecer se mantém vivo em nosso inconsciente e encontra
na arteterapia uma oportunidade de se libertar e se fazer presente.
Esse foco em nossa vida emocional é de grande importância para
compreendermos as doenças psicossomáticas. Através de um ponto de vista
científico torna-se claro como nosso corpo e nossa mente estão inteiramente
conectados. Nosso cérebro e nossos complexos sistemas responsáveis por
nos manter vivos e sensíveis aos estímulos internos não deveriam ser vistos
em separado, apenas ambos juntos compõem um corpo, uma unicidade.
Portanto, como pensar que uma doença é apenas resultado, por exemplo, de
uma descarga de substâncias químicas que resultam em estresse, e não
pensar em que sentimentos e emoções geraram o estresse em primeiro lugar?
Dentre suas várias técnicas e materiais de possível utilização em
arteterapia ressalta-se a importante função da mitologia, conhecimento
encorajado por Carl Jung, no processo de autoconhecimento do indivíduo. A
identificação com os personagens míticos se apresenta como um caminho
facilitador para o reconhecimento de nossos próprios conflitos emocionais e a
conscientização de nossa unidade psicossomática, sendo a emoção possível
razão de uma doença que traduz um significado simbólico.
9
CAPÍTULO I
A RELAÇÃO CORPO E MENTE NA PSICOSSOMÁTICA “O homem não tem um corpo separado da alma. Aquilo que chamamos de corpo é a parte da alma que se distingue pelos seus cinco sentidos.” William Blake
A ciência está sempre se desenvolvendo e fazendo novas descobertas
no campo da medicina, sejam elas explicações para doenças ou até mesmo
suas curas. Nos últimos anos, por exemplo, o genoma humano foi seqüenciado
e houve grande evolução no tratamento do câncer e do mal de Alzheimer1,
assim como, há 60 anos atrás, foram descobertas as conexões do cérebro
humano com as emoções. Essa evolução da ciência nos permite compreender
ainda mais o funcionamento do corpo e sua relação com as doenças,
facilitando a busca e a conservação da saúde.
O ser humano não é formado apenas por sistemas e órgãos, as
emoções também estão sempre presentes influenciando humores e atitudes,
mas também atingindo esses sistemas de maneira muito mais rotineira e
agressiva do que muitos imaginam. Há ainda um pouco de preconceito em
relação a idéia de que sentimentos possam estar na raiz de sintomas físicos e
isso se dá porque, com o próprio evoluir da medicina e das ciências, as
doenças passaram a ter mais importância do que o próprio corpo no qual elas
estão, são consideradas autônomas e estudadas separadamente e, assim, o
corpo e a mente do paciente também passaram a ser tratados individualmente.
A psicossomática – psico, derivada da palavra grega psyché, que
significa alma; somática, do grego soma, corpo – coloca em evidência o fato de
que mente e corpo são uma coisa só, formam um todo, apenas com ambos
juntos se tem um ser humano completo e, portanto, não deveriam ser tratados
separadamente.
1 “Ano 2000: Importantes Fatos da Medicina”
http://boasaude.uol.com.br/lib/showdoc.cfm?LibCatID=-1&Search=2000&LibDocID=3945 (Acessado em 18 de abril de 2009, às 18:15hrs)
10
Embora a noção de que somos essa unidade Mente-Corpo já esteja
presente em algum grau nas pesquisas científicas, a nossa prática,
enquanto profissionais da área da saúde, freqüentemente se
distancia dessa realidade. É comum ver médicos separarem doenças
ditas psicossomáticas de outras, como se fosse possível a alguma
doença não ser a expressão da totalidade. (MENEZES, 2005, p.7).
Vejamos, então, um pouco do histórico da psicossomática para entender como
a relação mente-corpo foi vista de diferentes maneiras ao longo do tempo.
1.1 – História e evolução da psicossomática
A forma como a saúde é vista e tratada mudou com o tempo. As
doenças já foram atribuídas aos deuses como castigos por eles enviados, e
hoje essa visão já se tornou muito mais científica. Na época de 480 A.C.,
Hipócrates, conhecido como “Pai da Medicina”, desenvolveu os conhecimentos
médicos através da observação clínica, de maneira racional, como continua
sendo até hoje, e marcou o fim dessa ciência como uma manifestação mágica
ou divina. Neste mesmo momento, na Grécia, o pensamento de Sócrates e
seus discípulos se disseminava através de muitos filósofos também médicos.
Gradualmente, surgiu a idéia de que o homem seria constituído não
apenas de um substrato material, o corpo e suas funções, mas,
também, de uma essência imaterial, vinculada aos sentimentos e à
atividade do pensamento, a alma. A tentativa de compreender as
relações entre essas dimensões, corpo e alma, constitui-se como um
dos principais veios do pensamento filosófico e das ciências que dele
herdaram o espírito de investigação. No âmbito da medicina, essa
discussão determinou, ao longo da história, diferentes vertentes na
compreensão da doença, da natureza humana e da função
terapêutica. (VOLICH, 2000, p.23).
O contexto da época se refletia na visão humanista de Hipócrates que
incluía em sua investigação clínica não apenas os hábitos, o regime alimentar,
11
o clima, como também os pensamentos do doente, seu sono, seus sonhos,
esperanças e preocupações. Por isso, Volich sustenta ainda que nessa
investigação estão os princípios que orientam a psicossomática ainda hoje, já
que Hipócrates enxergou que as manifestações emocionais do paciente eram
tão importantes quanto as orgânicas para seu diagnóstico e tratamento.
O termo psicossomática foi citado pela primeira vez pelo psiquiatra
alemão J.C. Heinroth, em 1818, quando estudava a influência das emoções em
certas doenças como câncer e epilepsia. Talvez por isso, ao longo dos anos, o
termo tenha se associado à doenças específicas, como úlcera péptica, artrite
reumatóide e hipertireodismo que têm o fator psicológico como causa
proeminente. A visão atual é muito mais ampla do que esta pois não restringe o
conceito de psicossomática à apenas algumas doenças, mas abre caminho
para a necessidade de um olhar holístico sobre as mesmas, já que fatores
emocionais se traduzem tanto em reações somáticas como psicológicas e
ambas fazem parte de um mesmo organismo. Sobre seus fatores cita-se “as
motivações, frustrações e seqüelas emocionais” que resultam na “conversão do
distúrbio psíquico em manifestação ou lesão orgânica ou conversão de
angústia para os diferentes órgãos do sómato (Congresso Mundial de
Psiquiatria de Londres)” (Dicionário de Clínica Médica, 1970).
No entanto, até a aproximação das idéias atuais, outras questões foram
levantadas acerca desse tema e autores diferentes pensaram o assunto de sua
própria maneira. Inicialmente, estudou-se a origem inconsciente das doenças e
muitos estudos da psicanálise foram aí aproveitados. Os estudos de Freud
sobre as neuroses afirmavam que a expressão simbólica de um conflito
inconsciente poderia se dar através de um órgão no que ele chamou de
“complacência somática”. Com isso, verifica-se que as noções de
psicopatologia contribuem bastante para a teoria de psicossomática.
Na década de 1930, na Escola de Chicago, os autores Alexander e
Dunbar se destacam ao estudar a influência de perfis psicológicos e situações
significativas da vida na predisposição a certas doenças. No fim dos anos
12
1950, em Paris, outros autores, dos quais se destaca P. Marty, expandem
esses conceitos ao dar maior importância ao ouvir o paciente para tentar
compreender o que ocorre na mente dele para que sua resposta aos conflitos
seja a somatização. Suas conclusões evidenciam a maneira particular de se
lidar com as emoções, caracterizada pela dificuldade de fantasiar, fazer
associações subjetivas e de reagir afetivamente diante de conflitos.
Outros teóricos estudaram a psicossomática apenas como uma resposta
do corpo ao estresse. Evidentemente, o organismo exerce um papel importante
na expressão da doença por meio de sintomas físicos, ainda que esta não seja
sua única causa. Como foi dito até aqui, as doenças psicossomáticas se
caracterizam por uma combinação dos fatores psíquicos e somáticos, então
vamos, portanto, abordar também um pouco das explicações biológicas e
neurológicas do assunto estudado.
1.2 - Algumas noções básicas sobre o sistema nervoso
Primeiramente, é preciso ter algumas noções básicas de como está
organizado nosso sistema nervoso para que depois se compreenda melhor as
áreas do cérebro especificamente relacionadas com as emoções. Com uma
função didática, é costume classificar o sistema nervoso usando diferentes
nomenclaturas através de categorias para facilitar o entendimento de suas
várias áreas. É importante lembrar que o sistema nervoso é um só, essas
divisões são feitas apenas na teoria para facilitar a localização das muitas
funções compreendidas pelo nosso cérebro. Uma dessas categorias é a
divisão com base em critérios anatômicos e as nomenclaturas utilizadas são
sistema nervoso central e periférico, sendo:
o sistema nervoso central responsável pelo processamento de
informações que chegam a ele e, depois de processá-las, ele é também
o responsável por enviar as respostas;
13
o sistema nervoso periférico é quem conduz e recepta as informações
do sistema nervoso central. Essa condução e receptação é feita através
dos nervos que são cordões que unem o sistema nervoso central aos
órgãos periféricos.
Já com base em critérios funcionais, o sistema nervoso é dividido em
somático e visceral:
o sistema nervoso somático relaciona o organismo com o meio ambiente
conduzindo impulsos nervosos de controle consciente e gerando ações
motoras voluntárias. Isso quer dizer que quando se encosta a mão em
uma superfície quente, por exemplo, os nervos presentes na mão
(correspondentes ao sistema nervoso periférico) enviam ao sistema
nervoso somático essa sensação, ele então traduz e responde àquele
nervo para que se tire a mão de tal superfície;
o sistema nervoso visceral, ao contrário do controle voluntário e
consciente do sistema nervoso somático, corresponde ao controle da
vida vegetativa. Ele é também subdividido no que diz respeito às suas
funções, sendo a que interessa a esse estudo chamada de sistema
nervoso autônomo, que controla funções como a respiração, circulação
do sangue, temperatura e digestão.
Resumidamente, o sistema somático está associado ao consciente,
voluntário e que pode ser controlado. Está também associado à relação do
organismo com o ambiente e, apesar da mensagem enviada para os nervos
seja a de retirar a mão da superfície quente pode-se escolher não fazê-lo, mas
sabendo conscientemente que se queimará. Já o visceral é involuntário e
inconsciente e diz respeito à relação do organismo consigo mesmo. O controle
da temperatura corporal, por exemplo, é feito pelo próprio organismo sem que
se perceba ou escolha sentir frio ou calor, mas sempre manter a temperatura
ideal para o funcionamento dos órgãos. Para isso, o organismo
14
involuntariamente sua quando é necessário diminuir a temperatura e contrai os
músculos para tremer e gerar calor quando está frio.
As áreas ligadas ao comportamento emocional também controlam o
sistema nervoso autônomo. A descoberta das áreas do cérebro responsáveis
pelo comportamento emocional foi feita pelo Nobel de Medicina Walter
Rudolph Hess em parceria com Antônio Egas Moniz, em 1949. Hess viu que
algumas das áreas mais importantes para os processos emocionais eram o
hipotálamo e o sistema límbico que estão relacionadas especialmente com os
processos motivacionais primários ligados às necessidades e desejos
essenciais do indivíduo como fome, sede ou sexo. Esses processos podem ser
tanto viscerais como também somáticos, mas é interessante notar que, ao
regular as atividades viscerais através do sistema autônomo, os impulsos
nervosos ativam partes responsáveis pelas várias manifestações emocionais
como choro, sudorese, salivação ou ritmo cardíaco. Ou seja, o ritmo cardíaco é
uma atividade visceral, portanto inconsciente e involuntária, mas está
comumente associada à emoções e sentimentos. Sentir medo, por exemplo,
acelera o ritmo cardíaco e a sudorese sem que possamos controlá-los. Mas o
que é responsável, em nosso cérebro, por despertar esse medo, essa
emoção?
1.2.1 As funções do sistema límbico
O sistema límbico tem vários componentes e há muito ainda para se
descobrir sobre suas funções, mas já há evidências de sua grande importância
no mecanismo das emoções e também da memória. Isso se dá porque ele está
conectado com diversos setores do sistema nervoso central e este, quando
recebe variadas informações sensoriais – visuais, auditivas, olfatórias etc – as
repassa como uma mensagem para o sistema límbico, transformando essa
informação em uma reação emocional. Essa reação é expressa através da
conexão do sistema límbico com o sistema autônomo que permite a tradução
da emoção em uma expressão física. Por exemplo, se ouvimos uma explosão,
15
sentimos cheiro de fumaça e vemos fogo, o sistema nervoso entende todas
essas informações como um sinal de perigo; quando essa mensagem é
enviada para o sistema límbico ela se transforma em uma reação emocional –
medo; por estar conectado com o sistema autônomo, regulador das atividades
viscerais, o medo se traduz em expressão física como, choro, sudorese,
dilatação da pupila e aumento do ritmo cardíaco. Esta conexão com o sistema
nervoso autônomo é muito importante para a compreensão das manifestações
físicas das doenças de fundo emocional já que, como dito anteriormente, ele é
o responsável por várias funções inconscientes e autônomas do corpo, como
exemplifica Angelo Machado, autor do livro “Neuroanatomia funcional”:
O fato de que as mesmas áreas encefálicas que regulam o
comportamento emocional também regulam o sistema nervoso
autônomo se torna mais significativo se considerarmos que as
emoções se expressam em grande parte através de manifestações
viscerais (choro no homem, aumento de salivação e eriçar dos pêlos
em um gato com raiva) e são geralmente acompanhadas de
alterações da pressão arterial, do ritmo cardíaco ou do ritmo
respiratório. Torna-se mais fácil entender, também, que muitos
distúrbios emocionais resultam em afecções viscerais, sendo um
exemplo clássico o caso das úlceras gástricas e duodenais.
(MACHADO, 2005, p.284).
Outro fator importante é a relação do sistema límbico com uma grande
diversidade de substâncias químicas associadas ao comportamento e
afetividade como noradrenalina, dopamina e serotonina. No caso do estresse,
por exemplo, a substância em questão é a adrenalina que se traduz
diretamente em reações físicas, pois quando “você fica estressado ou até
emocionado, seu coração responde na hora.(...) A sua pressão arterial
aumenta, mas junto com isso vem uma verdadeira cascata química com
substâncias inflamatórias"2, explica o cardiologista Carlos Alberto Pastore, do
Incor. Essas substâncias são importantes para a regulação de processos
2 “Impacto da emoção na saúde não tem idade”
http://g1.globo.com/globoreporter/0,,LS0-16627-70134,00.html (Acessado em 17 de abril de 2009, às 22:16hrs)
16
motivacionais e emocionais e também estão presentes no hipotálamo que, em
parte, compõe o sistema límbico e é uma das áreas mais relevantes para a
coordenação e integração desses processos.
1.2.2 O importante papel do hipotálamo
Apesar de ser uma área muito pequena do cérebro o hipotálamo é uma
das áreas mais importantes do sistema nervoso. Ele tem papel relevante na
regulação das funções do corpo (chamada homeostase). Por controlar o
sistema nervoso autônomo ele é responsável pelo peristaltismo
gastrointestinal, constrição da pupila e diminuição do ritmo cardíaco e da
pressão sanguínea. Por regular a temperatura corporal ele é responsável pela
sudorese e pelo calafrio (tremores musculares). O hipotálamo regula ainda a
ingestão de alimentos, de água e a liberação de hormônios (citados no sistema
límbico). É interessante observar que todos essas funções citadas costumam
ter alguma relação com certas emoções e suas expressões físicas. Mais
especificamente, ele tem papel preponderante na coordenação de suas
manifestações periféricas. Um ponto também relevante é que, através de
experiências com estimulações do hipotálamo, foi descoberto que algumas de
suas áreas despertam sensação de prazer, um componente subjetivo da
emoção.
O foco deste estudo não é comprovar cientificamente a psicossomática,
mas entender que esse fenômeno corpo-mente é natural e há maneiras de
lidar com isso a fim de que estejamos mais conscientes de suas
manifestações. Assim, essas explicações baseadas em neurologia nos
permitem compreender como nossas emoções podem sim influenciar bastante
nossa saúde física.
A dor é um sinal do corpo, as doenças psicossomáticas são como um
alerta, “o corpo está recebendo uma mensagem do cérebro de que as coisas
17
não estão bem, e você tem que resolver"3, explica Vanner Boere Souza, mestre
em neurociência e psicobiologia pela Universidade de Brasília (UnB). Isso quer
dizer que é fundamental estar consciente e atento para as sensações e
emoções, pois elas podem se desenvolver para algo mais sério. Por mais que
os remédios aliviem a dor esta é uma solução apenas temporária, é preciso
identificar e alcançar a origem do problema, ou seja, as emoções causadoras
daquela doença. Para isso é necessário se autoconhecer, buscar e reconhecer
em si mesmo seus limites, conflitos, o que lhe estressa e o que lhe dá prazer a
fim de aprender sempre um pouco mais sobre si próprio e poder se aprofundar
nessas questões pessoais. Ainda segundo Vanner Boere Souza, descobrir o
que há de errado consigo e enxergar uma possível solução “está em uma frase
muito antiga: conhece-te a ti mesmo. Se você sabe quem você é, você vai
conseguir localizar esse problema e vai ter o instrumento fundamental para
resolvê-lo”.
Um caminho possível para o autoconhecimento é a arteterapia. Através
da expressão artística é possível entrar em contato com as emoções mais
profundas, explorá-las e, aos poucos, encontrar as respostas para os conflitos
internos. Como é possível a arte curar é o que discutiremos no capítulo a
seguir.
3 “Machas na pele podem resultar de choques emocionais” http://g1.globo.com/globoreporter/0,,LS0-16627-70134,00.html (Acessado em 17 de abril de 2009, às 22:54hrs)
18
CAPÍTULO II
A DESCOBERTA DAS EMOÇÕES NA ARTETERAPIA “A ciência descreve as coisas como são; a arte como são sentidas, como se sente que são.” Fernando Pessoa
A arte começou a se associar às pesquisas da área psicológica e
psiquiátrica ainda em 1876 quando o médico psiquiatra Max Simon pesquisou
os trabalhos artísticos de doentes mentais e fez uma classificação das
patologias através dessas produções. Apenas dez anos após a publicação de
seu estudo, o advogado criminalista Lombroso segue este mesmo interesse
fazendo suas próprias pesquisas e acreditando no valor diagnóstico de sua
utilização. Já em 1906, Mohr fez uma comparação entre as manifestações
artísticas de doentes mentais, pessoas sem qualquer patologia e grandes
artistas, e começou a encontrar nesses trabalhos a presença de histórias de
vida e conflitos pessoais. Pensou que os desenhos, então, poderiam ser
utilizados como testes de personalidade, influenciando Rorschach, entre
outros, a criar o seu próprio teste. Na Alemanha, em 1922, o psiquiatra
Prinzhorn faz um estudo em que verifica a importância da arte no tratamento
de doentes mentais, mas seu estudo se torna ainda mais completo, pois
compara os desenhos dos doentes com impressionistas, expressionistas,
surrealistas etc e também observa as psicopatologias nas expressões artísticas
de pessoas normais. Prinzhorn se distingue dos demais já que começa a ver a
importância da arte não apenas como diagnóstico, mas como tratamento. Além
disso, não se limita apenas à doentes mentais mas à todas as pessoas.
Ainda nesta época, Freud, ao estudar obras de artistas famosos como
Leonardo da Vinci e Michelangelo a luz da psicanálise, percebe que o
“inconsciente se manifesta através de imagens, sendo uma comunicação
simbólica” e que essas imagens “escapavam da censura da mente com mais
facilidade que as palavras, podendo transmitir mais diretamente seus
significados” (Liomar Quinto de Andrade, 2000). Ainda assim, Freud enxergava
a arte como um objeto de uso diagnóstico útil para o que chamava de “livre
19
associação”, pois, para ele, o mais importante era a palavra: a descrição do
paciente e a interpretação do analista. Através da livre associação o paciente
era encorajado a falar livremente sobre as imagens e pensamentos de seus
sonhos, por exemplo, e o médico poderia então interpretar os comentários do
paciente levando-o a perceber o significado inconsciente daquelas imagens.
Talvez por isso ele se utilizasse mais da observação da arte do que fazer arte.
Veremos mais adiante que, na arteterapia, é preciso fazer arte e falar sobre ela
já que um sem o outro não se considera terapêutico; e, mais importante, é o
autor quem a interpreta.
2.1 Conceitos importantes a partir de Jung
Para Jung, além da palavra, era também de grande importância para o
tratamento a arte e os sonhos. Durante algum tempo, Jung e Freud estudaram
juntos e compartilharam das mesmas idéias, mas a utilização do sonho para
Freud como um objeto de livre associação não satisfazia Jung. Ele acreditava
que o sonho, como expressão específica do inconsciente, tinha uma
importância maior e abria oportunidade para muitas outras interpretações
pessoais relacionadas às referências do próprio paciente. O sonho, para ele,
era um material fundamental para investigar a faculdade humana de produzir
símbolos. É também importante reconhecer que o inconsciente pode tanto
ocultar imagens, pensamentos e impressões que já foram conscientes como
também fazer emergir conteúdos que nunca foram conscientes.
A descoberta de que o inconsciente não é apenas um simples
depósito do passado, mas que está também cheio de germes de
idéias e de situações psíquicas futuras levou-me a uma atitude nova
e pessoal em relação à psicologia. (...) além de memórias de um
passado consciente longínquo, também pensamentos inteiramente
novos e idéias criadoras podem surgir do inconsciente – idéias e
pensamentos que nunca foram conscientes. Como um lótus, nascem
das escuras profundezas da mente para formar uma importante parte
da nossa psique subliminar. (JUNG, 2008, p.41).
20
A manifestação artística é a concretização da vida psíquica através de
símbolos, a maneira que o homem encontra para expressar suas sensações de
conflito interno e as emoções que o impressionam. “O criar e o produto de
criação podem se tornar porta-voz desse ensaio de resolução de conflitos”,
pois através do ato de criação o paciente pode dar-se conta do que realmente
sente e, ao longo do processo, “fazer algo que assim o represente e a ele faça
sentido.” (Liomar Quinto de Andrade, 2000).
Jung começa a utilizar desenhos que representassem imagens de
sonhos, fantasias e visões do paciente para auxiliar no seu tratamento,
observando as imagens que surgiam, mas também facilitando a interação
verbal. A principal função da arte, portanto, é propiciar ao paciente o contato
com os símbolos e imagens em seu inconsciente e trazê-los para o consciente,
materializá-los através do material plástico – desenho, pintura, escultura etc – e
tornar possível a visualização e interpretação desses conteúdos antes
inconscientes. A utilização terapêutica da arte, para Jung, está na função
estruturante do pensamento, pois a criatividade, como função natural da mente
humana, assim como a atividade artística, podem ser usadas como elementos
auxiliares da cura possibilitando ao homem organizar seu caos interior.
A arte como função terapêutica não tem como objetivo se prender a
aspectos estéticos e formais, mas dar às pessoas os instrumentos para
“dinamizar sua condição inata de organizar suas percepções, sentimentos e
sensações, ou seja, os conteúdos internos de sua vida psíquica vertidos em
imagens e símbolos” (Liomar Quinto de Andrade, 2000). Maria Cristina
Urrutigaray (2008) sustenta também esse argumento, baseando-se em Jung e
Nise da Silveira, de que o paciente não é visto como artista, já que isso
desviaria a arteterapia de sua função inicial. A finalidade da arte, nesse âmbito,
não é se adequar a padrões estéticos ou ser julgada de acordo com questões
formais. Ainda que muitos trabalhos possam ser considerados verdadeiras
obras de arte a realização dos mesmos tem como objetivo representar nossas
imagens internas e trazê-las a uma dimensão que facilite compreendê-las.
21
2.2 A cura através das imagens
Entende-se por imagens internas símbolos que “exercem a função de
mediar as realidades consciente e inconsciente” (Mônica Perri Kohl Greghi,
2003) e funcionam como guias ou orientações internas do homem sendo
condutoras no processo de individuação. Em estudo que objetivava a utilização
das imagens internas como uma forma de acesso à dimensão global do
homem (psico-física ou psicossomática) Mônica Greghi verificou as técnicas
psicoterápicas de Gerald Epstein e Carl Simonton, além das técnicas de Jung
em relação às imagens oníricas e na expressão artística. Esse foco da
psicologia nas imagens partiu de Freud que ressaltou a importância da
interpretação das imagens oníricas como sendo fundamental para o
autoconhecimento. Mônica Greghi destaca a diferença do trabalho de Freud
que era feito a partir das imagens, utilizando apenas as imagens que surgiam
espontaneamente nos sonhos, para o trabalho dos autores em seu estudo que
é feito com as imagens, isto é, estimulando o inconsciente a produzi-las. Em
meados do século XX, as propostas de tratamento com imagens mentais,
desses principais autores entre outros, começam a ser utilizadas como
curativas em psicoterapia e isso abre espaço para que elas sejam trabalhadas
no tratamento de doenças orgânicas, abrindo o campo para além das
psicopatologias.
No estudo de Mônica Greghi, verifica-se que, na concepção de Carl
Simonton, “a imagem mostra as condições emocionais do indivíduo”. Ele
estabelecia em suas pesquisas as relações de emoção e doenças físicas,
sendo o estresse e a mágoa co-responsáveis pela queda de nossas defesas
imunológicas. As imagens, portanto, eram uma fonte de cura pessoal que cada
um possuía dentro de si.
Para Jung, as imagens representam a psique e é importante trazer para
o consciente as imagens por trás das emoções, pois a cura parte da
assimilação dos processos inconscientes. “As imagens do inconsciente nos
chegam através de formas criativas – arte, sonhos, experiência religiosa – ou
22
sintomáticas” e a personificação dessas imagens contribui para a
conscientização de nossas emoções.
A imagem, portanto, é capaz de revelar várias emoções e sentimentos
mais interiorizados e, por isso, é uma fonte importante de significados
pessoais. Na arteterapia, ela serve para que o autor se coloque perante elas e
se veja nelas. Assim, as emoções que vão surgir lhe darão um significado.
Essas imagens são símbolos para seu autor e só ele poderá dar-lhes sentido.
2.2.1 Símbolos e arquétipos
O conceito de símbolo é importante para que possamos entender melhor
porque cada imagem tem um significado diferente para cada pessoa.
Símbolos são diferentes de signos e sinais, sendo estes últimos
baseados em convenções arbitrárias. Eles têm sentidos prontos, iguais para
todas as pessoas de uma mesma cultura, como um padrão. O significante –
objeto – e o significado – a idéia que se tem do objeto – estão totalmente
associados. Já o símbolo desfaz essa associação, o significante passa a ter
vários significados porque temos idéias pessoais sobre o mesmo objeto.
O símbolo é, portanto, muito mais do que um simples signo ou sinal;
transcende o significado e depende da interpretação que, por sua
vez, depende de certa predisposição. Está carregado de afetividade e
de dinamismo. (...) Afeta estruturas mentais. Por isso é comparado a
esquemas afetivos, funcionais e motores, com a finalidade de
demonstrar que, de certa maneira, mobiliza a totalidade do
psiquismo. (...) Isso não quer dizer que a imagem simbólica não
provoque nenhuma atividade intelectual; permanece, contudo, como
centro ao redor do qual gravita todo o psiquismo que ela põe em
movimento. Quando o desenho de uma roda num boné indica que a
pessoa é um empregado de ferrovias, a roda não passa de um signo
ou sinal; quando usada, porém, em relação ao Sol, aos ciclos
cósmicos, aos encadeamentos do destino, às casas do Zodíaco, ao
mito do eterno retorno, é uma coisa completamente diferente, pois
23
adquire o valor de símbolo. Mas, ao afastar-se do significado
convencional, abre caminho à interpretação subjetiva. (CHEVALIER;
GHEERBRANT, 1990, p.XVIII).
Jung, em seus estudos acerca das imagens oníricas, adicionou a
psicologia símbolos especiais de grande importância para a arteterapia e
intimamente associados aos mitos aos quais deu o nome de arquétipos.
Freud já havia observado que muitos sonhos possuíam algo além das
referências pessoais do indivíduo, elementos que não faziam parte da
experiência de vida do paciente as quais identificou como formas primitivas e
inatas do espírito humano, chamando-as de “resíduos arcaicos”.
Esse fato chamou a atenção de Jung. Sua explicação para esses
elementos é a de que, além de nossa história pessoal e nossas memórias
individuais que inclui nossas referências e tradições culturais, também
possuímos uma memória relacionada à história de nosso desenvolvimento
humano. Assim como o corpo humano sofreu mudanças ao longo de sua
evolução e mantém resquícios desse desenvolvimento biológico, o mesmo
acontece com a mente. A psique humana também possui uma base na qual foi
formada, assim como nosso corpo conserva as características de um molde
original. Mas isso não quer dizer que os arquétipos são imagens herdadas,
transmitidas hereditariamente, elas são diversificadas representações de um
mesmo motivo, e essas representações variam de pessoa para pessoa.
Os arquétipos têm em si uma “tendência instintiva, tão marcada como o
impulso das aves para fazer seu ninho e o das formigas para organizarem suas
colônias” (Carl G. Jung, 2008) já que essas “imagens primordiais” surgem nas
mais variadas pessoas de qualquer instrução, em qualquer época e lugar do
mundo. O arquétipo é, portanto, um motivo que contém uma configuração
original, mas que pode ter representações diferentes com os mais variados
detalhes, e por isso ele é um símbolo tão importante. Ele é uma forma que faz
24
parte do inconsciente coletivo e é preenchida com os conteúdos da experiência
consciente do indivíduo.
Para explicar esses símbolos e o significado deles, é vital
estabelecermos se as suas representações acham-se ligadas a
experiências puramente pessoais ou se foram particularmente
escolhidas pelo sonho de uma reserva de conhecimentos gerais
inconscientes. Tomamos como exemplo um sonho em que figure o
número 13. A primeira questão é saber se quem sonhou acredita no
caráter agourento do número ou se o sonho refere-se apenas a
pessoas que ainda têm essa superstição. (...) Esse exemplo mostra a
maneira pela qual os arquétipos aparecem na experiência prática:
são ao mesmo tempo imagem e emoção; e só podemos nos referir a
arquétipos quando esses dois aspectos se apresentam
simultaneamente. Quando existe apenas a imagem, ela equivale a
uma descrição de pouca importância. Mas quando carregada de
emoção, a imagem ganha numinosidade (ou energia psíquica) e
torna-se dinâmica, acarretando várias conseqüências. (JUNG, 2008,
p.121,122).
A relação entre imagem e emoção, portanto, é muito significativa para
que compreendamos melhor o significado dos símbolos que surgem em
nossos sonhos e, da mesma maneira, nos símbolos que produzimos em
nossas manifestações artísticas. Essa compreensão nos permite reconhecer e
descobrir emoções antes inconscientes, tomando consciência de suas origens
e conseqüências a fim de buscar o autoconhecimento para a cura de sintomas
ou dores tanto físicas como emocionais.
2.3 Dra. Nise da Silveira
Dra. Nise da Silveira foi uma importante personalidade para o
surgimento e desenvolvimento da arteterapia no Brasil. Médica psiquiátrica do
Centro Psiquiátrico Nacional de Engenho de Dentro, a Dra. Nise não se
conformava com o tratamento dispensado aos internos na década de 1940.
Com métodos agressivos, os hospitais psiquiátricos da época, antes da
25
Reforma Psiquiátrica no Brasil, se ocupavam de isolar os pacientes com
transtornos mentais, deixando-os longe da sociedade e cada vez mais
distantes de si mesmos, utilizando eletrochoque e coma insulínico. A
dificuldade de comunicação dos pacientes era muito grande, especialmente os
esquizofrênicos, e a Dra. Nise se interessa por utilizar a Terapia Ocupacional
com os internos através de um ateliê em que eles poderiam se expressar por
meios não-verbais. Os pacientes, mergulhados no inconsciente, tinham ali uma
oportunidade de se comunicar e se expressar livremente através de materiais
plásticos, dança, modelagem, música, considerados hoje terapias expressivas.
Nas criações artísticas do ateliê são observados especialmente temas
mitológicos e mandalas nas produções dos pacientes, tendo estas últimas
chamado a atenção de Jung, em carta enviada pela própria Dra. Nise, para o
fato de que a mente, mesmo estando desorientada, tem em si um potencial
organizador e curativo, sendo capaz de criar espontaneamente formas
circulares, complexas e harmoniosas. É Jung também quem a incentiva a
estudar a mitologia a fim de entender melhor o que seus pacientes
expressavam através dos mais variados desenhos e pinturas que faziam. E
com razão isto lhe foi muito útil, pois logo em seguida começou a observar a
presença de mitos nos trabalhos dos pacientes. Como exemplo, há o caso da
paciente Adelina Gomes, uma mulher do interior do Estado do Rio de Janeiro
extremamente submissa à mãe. Ela se interessa já aos 18 anos por um rapaz
o qual a mãe não aprova, então despreza sua própria vontade e se sujeita à
vontade da mãe. Mas a pressão sentida em toda essa submissão que não a
permite amadurecer e passar à vida adulta faz com que desenvolva um quadro
de doença mental. A paciente se expressa verbalmente com a seguinte frase:
“Eu queria ser flor.” Começa, então, a produzir desenhos em que a mulher se
mistura a plantas e vegetais, não mais fazendo parte do reino animal. Dra. Nise
reconhece o mito de Dafne, uma ninfa, filha da Mãe Terra, por quem Apolo se
apaixona. A ninfa se esquiva de Apolo que continua a persegui-la até que ela
busca o refúgio em sua Mãe que transforma Dafne em um loureiro. Nesse mito
e nos trabalhos artísticos que se seguiram, Adelina representa o arquétipo mãe
de várias maneiras. É interessante observar que nem Adelina nem seus pais,
26
lavradores de origem pobre e pouco estudo, poderiam ter conhecimento ou
acesso a cultura e mitologia greco-romana.
O trabalho da Dra. Nise no ateliê de terapêutica ocupacional incentiva a
livre expressão através do diálogo, escrita, dramatização e qualquer material
plástico “partindo de uma imagem de sonho, ou fantasia, relatados livremente
pelo paciente” (Liomar Quinto de Andrade, 2000). Visando dissolver os
conflitos interpessoais e internos dos pacientes, observa o desenvolvimento do
processo de individuação, conceito essencial da psicologia analítica de Jung.
Com os trabalhos produzidos no ateliê, que foram inclusive de grande
interesse para a pesquisa científica, psiquiatras e críticos de arte, fundou em
1952 o Museu de Imagens do Inconsciente e o Centro Psiquiátrico hoje se
chama Instituto Municipal Nise da Silveira. A Dra. Nise introduziu a psicologia
analítica de Jung no Brasil e estabeleceu bases para a arteterapia que se
mostram eficientes até hoje sendo o principal método terapêutico utilizado na
Casa das Palmeiras, clínica de reabilitação por ela criada para os pacientes em
regime de externato.
2.4 Técnicas e materiais em arteterapia
O trabalho em arteterapia mantém suas bases, mas cada vez se
organiza mais a fim de estabelecer uma maior confiança nessa técnica
terapêutica ainda em crescimento e reconhecimento no Brasil. Define-se que a
expressão artística em arteterapia é uma atividade terapêutica eficaz porque:
a) a expressão “artística” revela a interioridade do homem, fala do
modo de ser e visão de cada um e seu mundo. Este ato revela um
suposto sentido e, cada teoria e método em arte terapia e terapia
expressiva se apodera deste ato diferentemente. b) por intermédio
desse “fazer arte”, expressar-se, o terapeuta pode estabelecer um
contato com o cliente possibilitando a este último o auto
27
conhecimento, a resolução de conflitos pessoais e de relacionamento
e o desenvolvimento geral da personalidade. (ANDRADE, 2000, p.18)
Mas para desenvolver um ateliê terapêutico é necessário colocar em
prática essa organização que muitos arteterapeutas se esforçaram para
conceituar a aplicar, o que consiste em sempre definir: um tema, uma técnica e
material principal a ser trabalhado, todos os materiais que serão utilizados,
uma consigna ou objetivo, a descrição do desenvolvimento da atividade e o
retorno teórico. Esses elementos são importantes para que o arteterapeuta
tenha bem definido os seus objetivos com a atividade e o que é preciso para
que ela seja realizada, além de um embasamento teórico. O trabalho pode ser
feito individualmente ou em grupo e é interessante que comece com um
relaxamento para que as pessoas se tornem atentas para aquele momento.
As técnicas e materiais são de grande importância para o resultado
terapêutico, pois cada um atende a um objetivo específico. Por exemplo:
modelagem, pintura, escultura, desenho, colagem são técnicas; e a técnica de
desenho pode trabalhar com os materiais lápis B, canetas hidrográficas, lápis
de cor, carvão etc. São muitas as opções e é preciso adequar a técnica e o
material ao que o paciente precisa no momento, sendo o resultado uma
combinação de ambos. No caso do desenho, a utilização de materiais secos e
firmes dá a sensação de controle e segurança ao paciente, ainda que muito do
seu estado emocional possa ser visto através da espessura da linha ou da
pressão que faz com os materiais no papel. Na técnica do desenho podem ser
usadas as canetas hidrográficas que permitem esse controle do material seco,
mas também liberam afetos, pois possuem água, já se aproximando do efeito
das tintas, e possui cores vibrantes. “Aqui o material possibilita que projeções
possam ser liberadas sem restrições, por ser um material que flui”, mas
também permite “dar-lhes contornos definidos, assim como também escondê-
los usando cores mais fortes sobre fracas, ou de produzir efeitos caóticos”
(Maria Cristina Urrutigaray, 2008) e todas essas informações formais do
trabalho do paciente ajudam a visualizar, literalmente, seu estado emocional.
Apesar de muitas terapias expressivas – música, dança etc – serem utilizadas
28
para sensibilização inicial do trabalho, a materialização através do material
plástico é fundamental para a visualização e expressão verbal do paciente.
Com isso podemos ver como o conhecimento do arteterapeuta não se
restringe a psicologia e aos mitos como já foi dito, mas é de grande importância
para ele que saiba utilizar os materiais com que trabalha, sendo necessário o
conhecimento em arte e história da arte, abrangendo o uso dos materiais e as
técnicas na prática. Na experimentação dos recursos disponíveis é que se
descobrem seus usos, benefícios e também dificuldades de manuseio.
A arteterapia não precisa ser utilizada somente como um tratamento, ela
pode ser vista também de uma maneira profilática, pois se torna uma
ferramenta muito útil no processo de autoconhecimento e de individuação
29
CAPÍTULO III
OS ARQUÉTIPOS NA MITOLOGIA:
AUTOCONHECIMENTO E CURA “Conhece-te a ti mesmo.” Inscrição no Oráculo de Delfos
Na época em que Jung descobriu a importância do estudo de
significados das imagens oníricas e de criação artística, e em que sugeriu à
Dra. Nise da Silveira que estudasse mitologia para melhor compreender os
trabalhos dos internos, o que hoje conhecemos como Arteterapia ainda não
existia, mas dava seus primeiros passos para seu reconhecimento no Brasil
sendo denominada por ela de “emoção de lidar”. Esse nome, derivado de uma
descrição do trabalho terapêutico feita por um dos pacientes, dizia respeito ao
manuseio dos materiais, o tempo e a liberdade que possuíam de escolher com
que objetos queriam trabalhar e o que fazer com eles: uma escultura, um
desenho, uma pintura ou talvez dançar. O importante é que, naquele momento
propício, lidar com tudo aquilo os deixava totalmente abertos para sentir e
manifestar suas emoções e sentimentos.
3.1 Mitos, arquétipos e história pessoal
O que é interessante observar é como os temas relacionados à mitologia
greco-romana apareceram freqüente e espontaneamente nos trabalhos dos
internos sendo muito improvável que eles tivessem conhecimento daquelas
histórias que desenhavam e pintavam.
Entende-se por mito uma narrativa tradicional de natureza simbólica
sobre uma pessoa ou lugar, podendo conter uma mensagem ou moral. No
dicionário Houaiss define-se “1. relato fantástico protagonizado por seres de
caráter divino ou heróico que encarnam seres da natureza ou aspectos gerais
da condição humana; lenda, fábula 2. crença ou tradição popular que surge
em torno de algo ou alguém”. Ou seja, a mitologia greco-romana é a mais
30
comumente estudada e difundida, mas há ainda a mitologia egípcia, celta ou o
mito do herói e da Grande Mãe. A importância dos mitos está em seu papel
como arquétipo, não reduzindo-os a sua origem ou época.
Temas dessa categoria também foram encontrados por Jung em sonhos
de uma menina de apenas oito anos de idade, o que apenas lhe proveu maior
material para justificar suas teorias dos arquétipos e do inconsciente coletivo.
Os sonhos, uma série de doze, foram dados pela menina ao pai, em um
caderno manuscrito, como presente de Natal. Em um dos sonhos um
camundongo é invadido por vermes, serpentes, peixes e seres humanos, o que
o faz tornar-se humano; em outro uma gota d’água é observada como num
microscópio e depois a menina vê que a gota está cheia de galhos de árvore.
Jung observa que os sonhos falam das etapas de origem da humanidade e
também do mundo. “Foi a série de sonhos mais fantástica que já vi (...) Apesar
de infantis, os desenhos tinham algo de sobrenatural”, disse ele.
Nove dos doze sonhos estavam influenciados pelo tema de
destruição e restauração. E nenhum deles revela qualquer traço de
uma educação ou de uma influência especificamente cristã. Ao
contrário, estão mais relacionados com mitos primitivos. Essa relação
se confirma em um outro motivo – o mito cosmogônico (a criação do
mundo e do homem), que aparece no quarto e quinto sonhos.
(JUNG, 2008, p.89,90).
Isso apenas reforça a existência do inconsciente coletivo e dos mitos
como arquétipos devido à idade da criança e dos temas tão complexos e
inusitados por ela sonhados. Jung completa que “a produção de arquétipos por
crianças é especialmente importante porque, algumas vezes, podemos ter
certeza de que a criança não teve nenhum acesso direto à tradição em
questão.” Nesse caso, o significado dos sonhos, que demonstravam de várias
maneiras esse mito cosmogônico e as temáticas de criação e destruição,
determinavam o processo de transformação da criança que se aproximava da
fase da adolescência e também de sua morte que aconteceu apenas um ano
depois de ter dado os sonhos ao pai. Não é relevante para este estudo se
31
aprofundar no fator premonitório destes sonhos e como isso se dá4, mas com
certeza é de grande importância observar os arquétipos surgidos nesse
momento de transformação da vida da menina. As imagens e símbolos
surgidos em seus sonhos poderiam também se manifestar através de meios
artísticos, o importante é o significado de seus arquétipos.
Esse exemplo também nos mostra como os arquétipos exercem um
certo fascínio, pois a menina julgou seus sonhos importantes o suficientes para
serem presenteados ao pai na noite de Natal, e o pai também se sentiu
intrigado o bastante para levá-los a um especialista em psicologia analítica a
fim de tentar entender seus significados, algo que não pôde fazer sozinho pois
não conseguia de qualquer maneira relacioná-los a vida da filha. Essa aura
fantástica, para Jung, é o que nos faz perceber esses símbolos como
arquétipos, há uma energia específica que os rodeia. Por isso também os
associa aos complexos pessoais, temas emocionais reprimidos que
escolhemos conscientemente esquecer, mas que ainda estão vivos em nossa
inconsciência e nos surpreendem quando vêm à tona. Isso porque ambos
possuem uma história individual, não são meras idéias avulsas sem começo
nem fim, há um histórico por trás delas, mas “enquanto os complexos pessoais
individuais não produzem mais do que singularidades pessoais, os arquétipos
criam mitos, religiões e filosofias que influenciam e caracterizam nações e
épocas inteiras.” (Carl G. Jung, 2008). Um exemplo disso é como o mito do
herói é tão utilizado nas religiões, exaltando os feitos de um indivíduo através
de narrativas e cânticos com rituais e cultos que destaquem sua coragem e sua
vitória ao vencer o mal, que pode ser um dragão, um minotauro ou um
demônio. Hitler também soube usar o fascínio desse mito universal
encontrando espaço na mitologia teutônica (Alemanha e Escandinávia)
enquanto seu chefe de propaganda trabalhava sua imagem para o povo
através de cartazes com armaduras, por exemplo. Talvez ele tenha se
inspirado no mito teutônico do Rei Hadding que foi criado longe de seu trono e
um dia resolve lutar em uma batalha sangrenta por seu suposto legítimo lugar.
4 Essa questão foi atentamente observada e avaliada por Jung em JUNG, Carl G. O homem
e seus símbolos. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.
32
3.2 Similaridades e diferenças entre mitos e contos de fada
O fascínio exercido pelos arquétipos é exatamente o que caracteriza o
mito e os contos de fada. Basta voltarmos mais uma vez aos sonhos da menina
de oito anos, quando Jung ressalta que “cada sonho começa com as
tradicionais palavras dos contos de fadas „Era uma vez...‟. Com isso, a
menininha sugere que cada sonho é uma espécie de conto de fadas, que ela
quer contar ao pai como presente de Natal.” Suas histórias fantásticas trazem
conteúdos comuns a todos, o que são considerados problemas humanos
universais e suas soluções aceitáveis, e por isso são recontados e sobrevivem
ao tempo.
Nossos conteúdos psicológicos recebem corpo, são materializados por
formas simbólicas através dos personagens e situações presentes nos mitos e
contos. “Os psicanalistas jungianos frisam, em acréscimo, que as figuras e os
acontecimentos dessas estórias estão de acordo com (e por conseguinte
representam) fenômenos psicológicos arquetípicos” (Bruno Bettelheim, 1980).
Apesar dos personagens e situações serem muito diferentes em ambos, os
arquétipos e conteúdos psicológicos são muito parecidos.
Essa é a grande diferença entre ambos, a forma como esses conteúdos
são comunicados. Enquanto os mitos envolvem tragédias, deuses e situações
muito improváveis para um mortal, os contos de fada costumam falar de
pessoas comuns e situações cotidianas. Apesar de ter príncipes e princesas,
há também meninas, velhinhas, bolos feitos em casa e passeios na floresta. Os
personagens nunca têm nome próprio sendo caracterizados por sua natureza
ou costumes, se chamando “chapeuzinho vermelho” ou “soldadinho de
chumbo”. Essa forma de contar as histórias, afirma Bruno Bettelheim, facilita o
envolvimento e identificação, pois por mais que envolvam situações fantásticas
estas são descritas como se fosse possível acontecer a qualquer um de nós
em um passeio na floresta.
33
Já a mitologia conta casos muito singulares, únicos, de situações
grandiosas. A admiração que as situações descritas exercem são
extremamente voltadas para acessar nosso superego, responsável por nossa
consciência moral. Os mitos costumam deixar claro sua moral, o certo e o
errado, enquanto os contos de fada relativizam esse aspecto. Enquanto os
deuses são testados e julgados segundo suas escolhas, os personagens de
contos às vezes trazem soluções inovadoras e admiráveis, mesmo que não
pareçam tão corretas do ponto de vista moral, mas do tipo que qualquer um de
nós poderia escolhê-las.
Bruno Bettelheim diz que ambos têm apelo “simultâneo à nossa mente
consciente e inconsciente, a todos os seus três aspectos – id, ego e superego
– e à nossa necessidade de ideais de ego também. Por isso é muito eficaz”, já
que invoca sentimentos que despertam, ao mesmo tempo, todos esses três
lados responsáveis por nosso comportamento e decisões.
O ego é o responsável pelo confronto com a realidade, envolve nosso
controle e decisão dos instintos a serem satisfeitos, é o princípio da realidade.
Ele precisa intermediar dois lados muito diferentes: id e superego. O id é a
fonte de energia psíquica na sua forma mais primitiva, são nossos desejos e
instintos antes de sofrerem qualquer influência de limites e moral, e por isso
mesmo podem acabar se tornando sentimentos recalcados e reprimidos
quando se deparam com a realidade e as regras do superego. Este último
caracteriza-se por suas forças restritivas e inibidoras dos nossos instintos
básicos como fome, sexo e agressividade, e que formam uma consciência
moral do que é ou não permitido controlando os impulsos do id.
A exaltação do superego no mito confirma seu importante papel
arquetípico. Na descrição acima podemos perceber que a exacerbação de
suas características não é saudável para ninguém, estando inclusive
relacionadas a neuroses. “Por mais arduamente que tentemos, não podemos
viver integralmente de acordo com o que o superego, como representado nos
34
mitos pelos deuses, parece solicitar-nos. Quanto mais tentamos agradá-lo,
tanto mais implacáveis são suas solicitações.” (Bruno Bettelheim, 1980). Suas
normas e limites não são parâmetros para serem vivenciados, e podem estar
descritos de forma um pouco exagerada na mitologia, mas simbolizam
situações difíceis e definitivas, verdadeiros conflitos que podem estar
relacionados com nossas vidas.
O mito de Édipo, particularmente quando bem desempenhado no
palco, desperta poderosas reações intelectuais e emocionais no
adulto – de tal forma que pode provocar uma catarse, como ensinou
Aristóteles sobre o que uma tragédia faz. Depois de ver Édipo, um
espectador pode-se espantar quanto à razão de estar tão
profundamente comovido; e respondendo ao que observa como sua
reação emocional, ruminando sobre os eventos míticos e sobre o que
estes significam para uma pessoa poder chegar a tornar claros seus
pensamentos e sentimentos. Com isto, certas tensões internas, que
são a conseqüência de situações passadas há muito, podem ser
aliviadas; um material previamente inconsciente pode então entrar na
consciência da pessoa e tornar-se acessível a uma elaboração
consciente. Isto pode acontecer se o observador é profundamente
mobilizado emocionalmente pelo mito, e ao mesmo tempo está
motivado intelectualmente de modo intenso para entendê-lo.
(BETTELHEIM, 1980, p.48).
Nesse trecho vemos uma maneira de como uma pessoa pode se
conectar com a história de um determinado mito: através do teatro. Na
arteterapia esta pode ser realmente uma opção para que a pessoa conheça o
mito e se identifique com ele. A mitologia e os contos de fada são comumente
trabalhados em arteterapia com o mesmo objetivo em ambos de acessar seus
arquétipos, a diferença está apenas no público, sendo a mitologia pouco
comum de ser trabalhada com crianças, pois os contos de fada se aproximam
mais de sua realidade e, como já foi dito, facilitam sua projeção e identificação.
Uma maneira usualmente utilizada de trabalhar esses contos é contando-os ao
paciente/cliente e pedindo que, ao fim da história, desenhe, modele ou pinte o
personagem ou situação com que se identificou. O importante é que seja
possível a ele reconhecer o simbolismo de sua imagem criada e acessar suas
35
memórias e sentimentos a fim de devidamente senti-los e descobrir seu
significado. Algumas vezes essas imagens mitológicas podem surgir
espontaneamente através da atividade artística, já que seus arquétipos fazem
parte do nosso inconsciente coletivo, como no caso descrito no capítulo
anterior. Quando a Dra. Nise da Silveira se deparou com as imagens
fantásticas dos internos como uma mulher transfigurada em flor poderia ter
apenas admirado a criatividade da paciente, mas ela pode reconhecer naquela
imagem o mito de Dafne e ali identificar a história pessoal de Adelina,
auxiliando-a a seguir no caminho do seu processo de individuação.
3.3 O processo de individuação
Saber identificar essas imagens, seu simbolismo e seu significado
pessoal é de extrema importância para o que Jung chamou de processo de
individuação, porque se deixamos passar a informação perdemos a
oportunidade de crescer com ela.
As palavras tornam-se fúteis quando não se sabe o que representam,
e isso se aplica especialmente à psicologia, onde se fala tanto de
arquétipos como a anima e o animus, o homem sábio, a Mãe Grande
etc. Pode-se saber tudo a respeito de santos, de sábios, de profetas,
de todos os homens-deuses e de todas as mães-deuses adoradas
mundo afora. Mas se são meras imagens, cujo poder numinoso
nunca experimentamos, será o mesmo que falar como num sonho,
pois não se sabe do que se fala. As próprias palavras que usamos
serão vazias e destituídas de valor. Elas só ganham sentido e vida
quando se tenta levar em conta a sua numinosidade – isto é, a sua
relação com o indivíduo vivo. Apenas então começa-se a
compreender que todos aqueles nomes significam muito pouco –
tudo o que importa é a maneira como estão relacionados conosco.
(JUNG, 2008, p.122).
Ou seja, ter conhecimento da existência desses arquétipos e dos mitos
é, na verdade, uma grande oportunidade de encontrarmos uma imagem em
36
que nos reconheçamos, um símbolo que faça sentido para nossa vida e nosso
desenvolvimento emocional. Jung lembra que, através dos sonhos, às vezes
temas muito parecidos se repetem, somem e tornam a aparecer e, se
observarmos com atenção, eles se diferenciam sutilmente ao longo do tempo e
então percebemos “uma espécie de tendência reguladora ou direcional oculta,
gerando um processo lento e imperceptível de crescimento psíquico – o
processo de individuação.” (Carl G. Jung, 2008).
Essa ação organizadora vem do que Jung chamou de self, a totalidade
absoluta da psique e ao mesmo tempo seu núcleo e centro organizador. O ego,
por exemplo, é apenas uma pequena parte dele, mas é exatamente o ego
quem precisa tomar consciência do potencial da psique. O processo de
individuação – “a harmonização do consciente com o nosso próprio centro
interior (o núcleo psíquico) ou self” – é um processo de crescimento, de
desenvolvimento do ser humano, mas o que o diferencia de nosso
desenvolvimento natural e automático é que estamos consciente dele, do que
acontece nesse caminho, e nos percebemos em direção a uma plenitude. “A
totalidade inata, mas escondida, da psique, não é a mesma coisa que uma
totalidade plenamente realizada e vivida. (...) E a realização dessa unicidade no
indivíduo é o objetivo do processo de individuação.” (Carl G. Jung, 2008).
Devemos, então, seguir nosso instinto de realização.
Mas isso não é mesmo fácil. A verdade é que esse importante processo
da vida do indivíduo normalmente inicia-se por uma crise, um choque inicial
que funciona como uma maneira de se chamar a atenção para a questão, um
sofrimento que destaca o vazio íntimo do indivíduo mesmo que tudo pareça
bem externamente. Torna-se urgente individuar-se, ou seja, encontrar e
realizar nossas particularidades individuais. Esse choque inicial pode não ser
facilmente identificado conscientemente, mas nas figuras inconscientes dos
sonhos e das imagens simbólicas que surgem em nossas fantasias e desenhos
podemos percebê-lo. Simbolicamente, esse processo pode surgir em nossa
mente inconsciente representado por uma doença. E de forma inversa, mas
com o mesmo significado, nossas doenças também surgem para nos alertar
37
que algo está errado ou incompleto em nosso íntimo (como foi dito pelo mestre
em neurociência Vanner Boere Souza, no primeiro capítulo) e muitas vezes
são imagens simbólicas do conflito ou desordem em nossa vida emocional.
Esse simbolismo também surge com freqüência nos mitos e contos de fada já
que, por exemplo, “descrevem simbolicamente esse estágio inicial do processo
de individuação, quando contam histórias de um rei que ficou doente e
envelheceu. Outras histórias características são a do rei e rainha estéreis.”
(Carl G. Jung, 2008). O choque inicial surge como algo que está fora de nosso
controle para que possamos iniciar então esse processo. O sentido do
processo de individuação está em tomar consciência de si mesmo para
sabermos lidar com o que nos for ocasionado.
Pelo que já ficou dito, é fácil compreender por que Jung decidiu
chamar de individuação esse tipo de autocompreensão. Pela
confrontação dos arquétipos e pela relativa liberação da sua
compulsão, tornamo-nos cada vez mais capazes de responder à vida
de maneira individual. Como vimos, o comportamento dos que têm
pouca percepção dos arquétipos é predeterminado por forças
invisíveis. (...) Mas quando um ser humano adquire determinado grau
de autopercepção, é capaz de fazer escolhas diferentes das da
multidão e de expressar-se de um jeito só seu. Tendo contato com o
seu próprio e verdadeiro eu, já não será presa da tagarelice de outros
eus, interiores e exteriores. O que “eles” estão fazendo e dizendo
influirá menos na sua vida. Será capaz de examinar costumes sociais
e idéias correntes e adotá-los ou não, como bem entender. Estará
livre para agir conforme as necessidades mais profundas e o mais
verdadeiro eu. (NICHOLS, 1997, p.34).
3.4 A utilização do mito na arteterapia
Citando mais uma vez como exemplo o caso dos internos que
trabalhavam a “emoção de lidar” com a ajuda da Dra. Nise vemos a
importância de se tomar consciência do que estava acontecendo naquele
momento. As imagens que ali surgiam podiam estar descritas e ilustradas em
38
muitos outros livros, de mitologia especificamente, mas a carga emocional era
específica e individual para aqueles pacientes. Eles podiam, com a ajuda da
arteterapia, se conectar com suas histórias e conflitos pessoais reconhecendo-
os nos mitos. Podiam dar início ao processo de individuação, caminhando para
seu autoconhecimento e cura ou alívio de seus sintomas tão arraigados. Isso
porque eles podiam começar a compreender o porquê daquela doença, o
significado simbólico e as origens emocionais da mesma.
Em um trabalho realizado pelas psicólogas Ana Luisa Baptista e Maria
de Lourdes de Campos Ribeiro com o objetivo de mostrar seus resultados com
a união da mitologia e da arteterapia, destaca-se de que maneira ambas as
áreas do conhecimento contribuem uma com a outra:
A clínica junguiana se utiliza da amplificação do símbolo para facilitar
o entendimento deste pelo cliente. Como ferramenta para tal, a
Mitologia contribui com diversas imagens e a Arteterapia, com
variados instrumentos que facilitam a expressão dessas imagens
num plano concreto (gestual, figurativo, sonoro etc.). Ambas são
profundamente esclarecedoras e terapêuticas, possibilitando a
compreensão do símbolo pelo Ego. (...) Os mitos, assim como a
criatividade, são oriundos de uma mesma fonte – o inconsciente
coletivo. Ao entrarmos em contato com diversos tipos de imagens
concretizadas e, tornando-nos cientes de suas mensagens,
“automaticamente” somos religados com a origem de nossa própria
consciência. Aquilo a que chamamos, e reconhecemos como sendo
“eu” é ampliado. Demos mais um passo no processo de individuação
– meta do fazer analítico na ótica junguiana. (BAPTISTA; RIBEIRO,
2001, p.22,24).
As vivências por elas realizadas partiam de personagens da mitologia
que se associassem ao aspecto que desejavam ressaltar. A estrutura das
vivências foi assim organizada, mas o mito em si só era descrito ao final,
depois que os participantes já tinham criado suas imagens, suas manifestações
artísticas para que depois fizessem a conexão com a história do mito em
questão.
39
Em um dos encontros as autoras destacam a interessante história de
uma participante que já há muitos anos fazia um tratamento psicanalítico e, há
três semanas, trabalhava em sua análise problemas freqüentes que atingiam
seu pés – lesões, contusões – e para os quais ainda não havia encontrado
solução. Trabalhando o mito do deus Hefesto, que representa a criança
abandonada e mutilada, “esta mulher pode tornar-se consciente de sua
péssima relação com a figura materna, e o quanto isso tinha afetado „suas
bases‟ ” (Ana Luisa Baptista e Maria de Lourdes de Campos Ribeiro, 2001).
O mito de Hefestos conta a história de uma criança, filho de Zeus e
Hera. Em uma versão, Zeus o joga do Olimpo por ser apenas filho de Hera,
gerado por partogênese, que significa “sem contribuição paterna”, e ele torna-
se coxo. Em outra versão, Hera vê que seu filho já nasceu coxo e,
inconformada com o defeito, o joga do Olimpo. Em ambas as versões o
significado simbólico é de abandono e o resultado é um defeito nas pernas da
criança. Nossos pés são nossas bases que nos mantém em pé fisicamente,
mas nossos pais, nossa primeira família, são nossas bases que nos sustentam
emocionalmente. Com isso podemos entender a identificação da mulher com o
mito de Hefesto e como isso se tornou uma doença de fundo emocional e
significado simbólico em seu corpo. Esse conhecimento acerca do mito e sua
identificação permitem ao paciente saber “que a sua energia o está levando a
constelar um determinado tipo de atitude [arquetípica] na vida, concretamente”
(Ana Luisa Baptista e Maria de Lourdes de Campos Ribeiro, 2001) e que ele
tem oportunidade de corrigir seu caminho ou seguir por ele, mas agora faz uma
escolha consciente do que acha melhor para si mesmo, pois já reconhece seu
conflito e suas emoções no mito e têm consciência do seu simbolismo pessoal.
3.4.1 Um caso completo
Em outro exemplo, em estudo realizado por Narjara Torrel Telöken,
acadêmica da 9ª fase de Naturologia Aplicada da UNISUL, a fim de demonstrar
40
os resultados da Naturologia (abordagem da qualidade de vida do homem
integrando as esferas física, emocional e mental) no tratamento de uma
paciente, amplia-se a linguagem simbólica da doença através de Hidroterapia,
Florais de Bach, Aromaterapia, Reflexologia e Arteterapia. Todas essas áreas
do conhecimento foram utilizadas em conjunto com o objetivo de ajudar a
paciente a tomar consciência do significado dos seus sintomas apresentados.
A doença é vista como um símbolo codificado e a arteterapia é um instrumento
para acessar os conteúdos mais interiorizados para que os símbolos e
conteúdos arquetípicos fossem mais facilmente compreendidos, “permitindo à
mesma o resgate da sua individualidade e a expressão de uma nova forma de
ver, pensar, sentir e agir” como desenrolar do seu processo de individuação.
Telöken destaca que nossos materiais reprimidos pelo ego passam a
fazer parte de nosso inconsciente pessoal e que tais “conteúdos são
carregados de energia e tentarão emergir a consciência, porque representam
polaridades não vivenciadas pelo indivíduo, mas necessárias ao seu
desenvolvimento, podendo emergir através de um sintoma no corpo físico.”
Seu estudo pretende acessar esses conteúdos psicoemocionais e suas
características simbólicas e arquetípicas para que a paciente possa conhecer
seus significados. Esperava-se que fisicamente fosse observada uma
desintoxicação em seu organismo e os resultados foram acompanhados
através de Irisdiagnose5.
A paciente em questão tinha como queixas alguns sintomas e problemas
físicos: ovário policístico e dificuldade para engravidar, sua principal queixa,
além de rinite alérgica e má circulação sangüínea. Emocionalmente, tinha
problemas com as desavenças dos pais e a submissão da mãe identificando-
se desde pequena com seu pai, sendo inclusive a filha preferida dele. Sua
postura em casa era defensiva, forte e independente. Essa imagem que tinha
do casamento e da maternidade a fizeram desenvolver um grande medo de
engravidar. Esse medo foi reforçado quando sua confiança foi traída pelo
5 Esse método diagnóstico baseia-se na seguinte referência em seu artigo: BATELLO, C.
Iridologia e irisdiagnose: o que os olhos podem revelar. 2 ed. São Paulo: Ground, 1999.
41
namorado, o que a fez lembrar a relação dos pais. O namorado tornou-se seu
marido com quem tem atualmente uma relação saudável, mas ainda mantém o
medo de entregar-se totalmente à relação.
Através das várias práticas naturais a paciente pôde entrar em contato
com características simbólicas dos elementos, baseando-se nos significados
descritos no Dicionário de Símbolos (Chevalier e Gheerbrant, 1990). Na
hidroterapia o contato com a água e sua relação com a infância, fluidez e
limpeza; na reflexologia, ao pisar em uma pasta de argila vermelha, o contato
com a terra e sua relação com a firmeza, o centramento, chão. A arteterapia foi
utilizada para auxiliá-la a elaborar e visualizar seus conteúdos simbólicos ao
longo do tratamento, e como sua maior queixa estava na sua relação com o
lado feminino e materno, com sua própria mãe e com seu medo de tornar-se
mãe, foram utilizadas narrativas que a conectassem com as faces do feminino.
Os mitos de Hera, Deméter e Ártemis foram trabalhados em arteterapia
utilizando-se dos materiais: aquarela – relacionado ao elemento água e a livre
expressão das emoções – e argila – importante para o trabalho com as mãos
“como propulsoras de imagens e experiências mais fortes, mais viscerais, que
usualmente encontram-se dificultadas na sua expressão, verbalização, devido
a interferência da consciência do ego.” (Maria Cristina Urrutigaray, 2008). Para
compreendermos a relação desses mitos com a vida da paciente precisamos
conhecer um pouco de suas histórias.
Hera é conhecida como a deusa protetora e guardiã do casamento. Ela
se casou com o poderoso Zeus ocupando o trono no Olimpo ao seu lado e sua
realização está no seu casamento. Ciumenta e fiel a Zeus, perseguia suas
amantes e seus filhos adulterinos. Um trecho de sua história também foi
contada quando citamos Hefesto, filho de Hera abandonado por ela.
Deméter é deusa e mãe da terra cultivada, da fartura e da fertilidade,
representa a capacidade de gerar e dar vida. Teve uma filha com Zeus
chamada Perséfone que foi raptada por Hades mostrando a possibilidade de
sentir rancor e ódio em caso de uma perda. O mito de Deméter contém rapto,
42
procura, maternidade e sua luta para não se submeter ao elemento masculino.
O rapto de sua filha a fez ver que seu cultivo não deveria se restringir aos
planos materiais, mas também aos espirituais.
Este aspecto do mito sinaliza a conjunção corpo-mente-espírito na
realização plena da vida. É o foco de uma concepção psicossomática
que vem desde a antiguidade, mesmo que colocada em segundo
plano em alguns períodos do conhecimento humano. Deméter
simbolizava o arquétipo materno que zelava e cuidava da nutrição
física, psicológica ou espiritual. (OLIVEIRA; OLIVEIRA, 2009, p.143).
Ártemis é a deusa da caça e da lua, símbolos tão diferentes que juntos
traduzem, em resumo a toda sua história, a independência do espírito feminino
e a busca pelo equilíbrio interior da energia masculina e feminina. Depois de
muitas lutas ela se retira para as montanhas onde mantém sua independência,
autonomia e liberdade.
Podemos ver nos três mitos a presença de elementos que geravam
conflitos para a paciente e com os quais ela precisava aprender a lidar. O
abandono e também perda de um filho, em Hera e Deméter, a fizeram encarar
seu medo de engravidar, o que resultava naquele momento na complicação de
uma doença física que não lhe permitia a realização da maternidade; já a
realização através do casamento e a necessidade de impor sua força
masculina de autonomia e independência, vistos em Hera e Ártemis,
descreviam uma pessoa com medo da submissão.
Na conclusão de Telöken ela observou que os estímulos sensoriais
utilizados nos vários processos “de origem tátil, térmica, elétrica, olfativa e
visual podem invocar memórias, emoções e padrões comportamentais,
provocando efeitos psicogênicos no indivíduo através do sistema de
transmissão sensorial e motora do Sistema Nervoso.” A importância do mito na
arteterapia, especificamente, está na sua interpretação e compreensão de sua
individualidade resultando em autoconhecimento.
43
A interagente se conectou a linguagem do corpo físico e fez uma
leitura da mensagem que o quadro de ovário policístico trouxe a ela:
uma armadura que a impedia de expressar seu verdadeiro “Eu”
(feminilidade, criatividade e potencial vocacional) por mecanismo de
proteção contra o medo de sofrer. O processo de desintoxicação
vivenciado finalizou com descamação da pele, o que mostra a
libertação dessa armadura, indicando que mesmo sem a eliminação
do sintoma físico, resultado também observado na última análise
iridológica que apontou não ter ocorrido alteração na área dos
ovários, houve uma mudança no nível psíquico e que esse é o
princípio da cura, (...) a presença da doença física é um símbolo
emitido pelo Self ou Si-Mesmo que pode dar início a um processo de
individuação, através do qual o indivíduo torna-se consciente de sua
identidade profunda como ser único e autêntico. (TELÖKEN, 2006,
p.14).
Com este exemplo podemos observar como os sintomas físicos podem
ser um símbolo de um conflito interno que pode ser acessado através de nossa
identificação com uma história mitológica profusa em arquétipos. A cura está
na nossa consciência do problema e em aceitarmos seu potencial de nos levar
pelo caminho do autoconhecimento através do processo de individuação.
44
CONCLUSÃO
Por mais que seja difícil para algumas pessoas aceitar o significado
simbólico de uma doença ou seu tratamento através da livre expressão
artística, temos aqui um exemplo a caminho do sucesso. A primeira idéia a que
devemos estar abertos a compreender é a da unicidade de nosso corpo e
mente, como suas relações e dinâmicas compõem um só organismo e, por
isso, nossas emoções podem se alojar em qualquer lugar. Elas podem afetar
nossos pés nos causando lesões recorrentes para nos avisar de que nossas
bases não estão muito firmes. Podem também afetar nosso sistema reprodutor
impedindo que realizemos o sonho de gerar um filho porque, em nosso
inconsciente, sabemos que não estamos preparadas para isso.
Como a emoção é um conceito abstrato já que não podemos descrever
o que o outro está sentindo, muitas vezes nem o que nós mesmos sentimos, há
uma distância a percorrer quando é preciso associar sentimentos e corpo
físico. Mas se a química de nosso cérebro traz, comprovadamente, muitas
conseqüências para todo o nosso corpo, podemos também aceitar que uma
emoção, que pode ser descrita puramente como estresse para os mais céticos,
pode ser a desencadeadora desta química.
A doença pode ser um símbolo codificado que nos alerta para um
conflito emocional existente. E para se curar é preciso descobrir qual é este
conflito, esta emoção, é necessário reconhecer o que se está sentindo e se
aventurar no processo de individuação. O autoconhecimento é compreensão e
aceitação de si mesmo. E a identificação das histórias pessoais dos
pacientes/clientes em arteterapia com as histórias míticas se mostrou muito
eficiente para que os indivíduos se conectassem com os sentimentos e
situações descritos na mitologia. Apesar dos personagens míticos participarem
de histórias fantásticas, seu simbolismo e arquétipos se encaixam
perfeitamente em nossos conteúdos inconscientes que encontram nos mitos
uma oportunidade de se revelar ao indivíduo trazendo para a consciência a
origem emocional de nossos conflitos e também doenças.
45
BIBLIOGRAFIA
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educação, terapia-artística. São Paulo: Editora Vetor, 2000.
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Transformação. Rio de Janeiro: Editora Clínica Pomar, n 8, v 8, 2001.
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sonhos, costumes, gestos, formas, figuras, cores, números. Editora Rio de
Janeiro: José Olympio, 1990.
GARBOGGINI, Humberto de Oliveira. Dicionário de clínica médica. São
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47
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(Acessado em 17 de abril de 2009, às 22:16hrs)
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(Acessado em 18 de abril de 2009, às 18:15hrs)
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http://www.ccs.saude.gov.br/nise_da_silveira
(Acessado em 21 de maio de 2009, às 14:55.)
48
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A RELAÇÃO CORPO E MENTE NA PSICOSSOMÁTICA 9
1.1 – História e evolução da psicossomática 10
1.2 – Algumas noções básicas sobre o sistema nervoso 12
1.2.1 – As funções do sistema límbico 14
1.2.2 – O importante papel do hipotálamo 16
CAPÍTULO II
A DESCOBERTA DAS EMOÇÕES NA ARTETERAPIA 18
2.1 – Conceitos importantes a partir de Jung 19
2.2 – A cura através das imagens 21
2.2.1 – Símbolos e arquétipos 22
2.3 – Dra. Nise da Silveira 24
2.4 – Técnicas e materiais em arteterapia 26
CAPÍTULO III
OS ARQUÉTIPOS NA MITOLOGIA: AUTOCONHECIMENTO E CURA 29
3.1 – Mitos, arquétipos e história pessoal 29
3.2 – Similaridades e diferenças entre mitos e contos de fada 32
3.3 – O processo de individuação 35
3.4 – A utilização do mito na arteterapia 37
3.4.1 – Um caso completo 39
49
CONCLUSÃO 44
BIBLIOGRAFIA 45
WEBGRAFIA 47
ÍNDICE 48
50
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Instituto A Vez do Mestre – Universidade Candido
Mendes
Título da Monografia: Emoções e saúde: o tratamento de doenças
psicossomáticas através da mitologia na arteterapia
Autor: Alice Silva Lodi
Data da entrega: 29 de julho de 2009
Avaliado por: Conceito: