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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
AVM – FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
O CÉREBRO E O DESENVOLVIMENTO DA APRENDIZAGEM DE ALUNO COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA EM
UMA ESCOLA PARTICULAR: UM ESTUDO DE CASO
Thaís de Souza Sant’Ana
ORIENTADOR:
Profª. Marta Relvas Pires
Rio de Janeiro 2016
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EITO A
UTORAL
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
AVM – FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Neurociência Pedagógica. Por: Thaís de Souza Sant’Ana
O CÉREBRO E O DESENVOLVIMENTO DA APRENDIZAGEM DE ALUNO COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA EM
UMA ESCOLA PARTICULAR: UM ESTUDO DE CASO
Rio de Janeiro 2016
AGRADECIMENTOS
Dedico este estudo à Deus e aos grandes amigos que a
vida me deu e que em meio tantas dificuldades estiveram ao
meu lado, me encorajando sempre a nunca desistir de meus
ideais.
DEDICATÓRIA
Dedico a meu querido avô Jair, que durante o tempo em
que convivemos juntos me ensinou a conquistar o mundo
com bravura e humildade; a minha mãe por ter me dado à
vida e aos grandes amigos que a vida me deu, que
acabam tornando nossa jornada um pouco mais fácil.
RESUMO
Décadas se passaram após o início dos estudos sobre o autismo, e
ainda não se sabe ao certo porque ele ocorre, quais são as possíveis causas,
que parte do cérebro ele atinge e o que pode ser feito para uma real inclusão.
O Autismo e outras síndromes são diagnosticados em uma família
de transtornos de neurodesenvolvimento os quais comprometem funções do
encéfalo que são altamente sofisticadas nos seres humanos e que interferem
nos processos fundamentais de consciência social, comunicação e
aprendizado. Esses transtornos são coletivamente conhecidos como
transtornos invasivos de desenvolvimento. Esse grupo está entre os
transtornos de desenvolvimento mais comuns, afetando um número maior de
crianças a cada ano.
Dados dos últimos estudos apontam um forte componente genético
nos transtornos de desenvolvimento, com riscos de recorrência entre familiares
da ordem de 20%, isso se for adotada uma definição mais ampla de critério
diagnóstico. É possível que múltiplas etiologias sejam descobertas, algumas
somente genéticas e outras que dependam de fatores genéticos associados a
fatores ambientais de risco, e algumas somente de causa ambiental.
Sua manifestação precoce, por volta dos seis meses de idade pós-
natal, conforme relatos de pais, com o passar do tempo mostra mecanismos
biológicos fundamentais relacionados a sua adaptação social.
Avanços nas pesquisas trazem uma nova perspectiva da
neurociência, ao estudar os processos típicos de socialização e as causas da
inclusão, no desenvolvimento particular de cada aluno autista.
Para educandos autistas, diagnosticados ou não, há uma carência
de estudos e pesquisas em sala de aula para que se possa entender como é o
processo de aprendizagem, como a Neuroplasticidade age, quais são os
caminhos e como se interioriza no cérebro desses sujeitos que estão em
processo de inclusão e adaptação.
A presente pesquisa é uma tentativa de salientar o processo de
adaptação e aprendizagem de um aluno de dois anos e dois meses de idade
com diagnóstico fechado (leve a moderado – nível sete) de autismo, sendo
incluído em uma escola regular particular da zona sul do Rio de Janeiro.
Palavras chave: Neurociências; Autismo; Inclusão; Desenvolvimento
Infantil; Neurodesenvolvimento; cérebro; TEA.
METODOLOGIA
A metodologia usada nesta monografia pretende mostrar o
funcionamento do cérebro apoiado nos benefícios da precoce investigação de
possíveis sinais do Transtorno do Espectro Autista, tanto quanto a importância
da inclusão quando ela é feita por pedagogos especializados em Neurociência
Pedagógica em escolas de educação infantil de ensino regular.
O aprofundamento nesse tema surgiu da necessidade de
desempenhar, como educadora, um papel consciente e responsável sobre
quais caminhos seguir para uma maior contribuição ao desenvolvimento, à
adaptação e à inclusão das crianças com Transtornos de desenvolvimento e de
comunicação, síndromes e outras questões do comportamento atípico.
Com base em Relvas, Kandel, Cancino, Orrú, Lent, pesquisas e
estudos de outros autores atuais, serão explicadas as principais funções do
cérebro, o que acontece com o cérebro no pré-natal e pós-natal e o que os
últimos estudos mostram sobre a organização do cérebro das crianças com
autismo.
Após o esclarecimento desses itens, considerar-se-ão livros,
revistas, documentários e publicações sobre o Transtorno do Espectro Autista,
finalizando o trabalho com a evolução do educando durante os primeiros
meses de sua adaptação na escola.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 09
CAPÍTULO I
ABORDANDO IMPORTANTES FUNÇOES DO CÉREBRO 11
CAPÍTULO II
TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) E A NEUROPLASTICIDADE
34
CAPÍTULO III O TRABALHO EMPÍRICO: CONDIÇÕES DA INCLUSÃO E ADAPTAÇÃO
EM UMA ESCOLA PARTICULAR DO RIO DE JANEIRO 50
CONCLUSÃO 65
BIBLIOGRAFIA 67
WEBGRAFIA 70
ÍNDICE 72
ÍNDICE DE FIGURAS 74
9
INTRODUÇÃO
O cérebro conta com um emaranhado de nervos para processar e
transmitir as informações. Em pessoas com autismo – um
distúrbio do desenvolvimento de origem orgânica (lesão
encefálica), cuja causa é inespecífica, de componente genético –
esses nervos têm defeitos, causando falha de comunicação entre
as células do cérebro e as irregularidades nas próprias estruturas
do cérebro, como no corpo caloso, que facilita a comunicação
entre dois hemisférios do cérebro; na amígdala, que afeta o
comportamento social e emocional; e no cerebelo, que está
envolvido com as atividades motoras o equilíbrio e a coordenação.
A credita-se que essas anormalidades ocorrem durante o
desenvolvimento pré-natal e se caracteriza pela tríade (DMS-IV,
CID 10): alterações na interação social, linguagem e
comportamento. (RELVAS, 2014 p. 26).
Incluir crianças com necessidades especiais em escolas regulares
tornou-se um desafio. As dificuldades vão desde remodelar os espaços físicos,
para melhor atender as necessidades de cada um, à capacitação dos professores
e funcionários da escola. Dentre essas capacitações, todo educador deveria
conhecer os aspectos neuropsicológicos e neurofisiológicos e as abordagens
apoiadas nesses aspectos, com a intenção de melhor auxiliar o desenvolvimento
de cada aluno.
A Neurociência Pedagógica estuda como essa criança chega à escola,
como é o processo de aprendizagem e como armazena o que vivencia, sendo o
cérebro o impulsor desse aprendizado.
10
A seguinte monografia pretende avaliar o quão é importante o
diagnóstico precoce e o estímulo diversificado em alunos que se enquadram em
alguns espectros do desenvolvimento infantil. Estão expostos em três capítulos:
No primeiro, são abordadas as principais funções do cérebro. A
aprendizagem e a memória “são o suporte para todo o nosso conhecimento,
habilidades e planejamento” (RELVAS, 2009 p. 71). O que é usado de uma forma
geral e como nosso corpo está preparado para receber diferentes estímulos
externos e internos para que ocorra a aprendizagem concreta.
O aprendizado específico sobre determinada situação exposta provoca
mudanças que variam de acordo com a motivação, interação e estratégias de
aprendizagem de cada ser humano. Assim, a forma com que cada um aprende
diferencia-se de pessoa para pessoa.
No segundo, a caracterização do autismo com seus componentes
genéticos, anormalidades neurológicas e cognitivas e a definição de
Neuroplasticidade.
E por último no terceiro capítulo o trabalho empírico do estudo de caso.
11
CAPÍTULO I
ABORDANDO IMPORTANTES FUNÇOES DO CÉREBRO
Os processos cognitivos básicos são um conjunto de capacidades do
sistema nervoso, que especialmente decodificam as muitas informações que são
usadas para processar as informações aferentes e originar as representações, as
condutas e os aspectos básicos da aprendizagem. A aprendizagem ocorre com
mais intensidade em razão do desenvolvimento cerebral e por consequência uma
maior capacidade intelectual e cognitiva permite que se tenha consciência do que
acontece ao redor de cada um, das atitudes e da comunidade a que se faz parte.
Sendo assim, esses processos são chamados de básicos porque constituem a
base para as operações mentais ou cognitivas. (LENT, 2010)
Desde a vida intrauterina, o corpo já sofre alterações com a
influência do meio externo e atua sobre ele em um processo constante e
indissociável entre o biológico, o psicológico e o social. Desse processo, resultam
o aprendizado e a conduta ou manifestação comportamental. E em decorrência
disso, resultam modificações neuro-estruturais e alterações químicas e elétricas
que ocorrem no cérebro. Os fatores emocionais, fisiológicos, sociais e culturais
terão grande reflexos estruturais, químicos e elétricos sobre um cérebro altamente
mutável. (CANCINO, 2013)
Esses processos dependem do correto funcionamento do cérebro e de
grande parte do sistema nervoso diante das situações que precisam de um
trabalho coordenado e eficiente das diversas estruturas sensórias, motoras e de
coordenação de funções corticais. (CANCINO, 2013, pg 41)
Durante séculos de muitas descobertas e estudos de importantes
médicos como Galeno, Camilo Golgi (observação de neurônios), Ramón y Cajal
(células do sistema nervoso), Luigi Galvani, Emil du Bois-Reymond, Johannes
Muller, e Hermann von Helmholtz (eletricidade neuronal) e Charles Darwin
(evolução da espécie), muito foi questionado sobre o funcionamento do cérebro.
12
No final do século XVIII Frans Joseph Gall, médico e anatomista
alemão, iniciou um estudo para compreender os mecanismos neurais das funções
mentais superiores, fazendo conexão entre a psicologia e neurobiologia. Ele
propôs ideias radicais sobre tais funções mentais no encéfalo: a generalização da
ideia de Galeno que o cérebro não só controla os movimentos do corpo, como é
também o responsável por todos os comportamentos do sujeito; o cérebro pode
ser dividido em 35 áreas, cada uma responsável pelo controle de um
comportamento específico. (Fig.1); e cada região do cérebro pode “crescer” com o
uso, tal como um músculo. (KANDEL, 2015).
Fig.1 Divisão de comportamentos humanos por regiões cerebrais baseados por Franz Joseph Gall
retirada do site www.edumed.org.br/cursos/neurociencia/01/Artigos/aula03/frenmap0.gif
Essa divisão de comportamentos humanos, por regiões cerebrais, de
acordo com a proposta de Franz J. Gall é incorreta, porém conduziu a
investigações no caminho certo. Em meados do século XIX, neurologistas clínicos
como Pierre Flourens e J. Hughlings Jackson estudando lesões encefálicas em
13
necropsia para investigar onde certas funções estavam localizadas, tiveram
outras percepções sobre o novo modelo do funcionamento do cérebro, começou
então a se desenvolver e a se adquirir, cada vez mais, evidências experimentais:
• Os neurônios estão organizados em estruturas bem definidas e cada
uma é responsável por uma função específica;
• Cada grupo de neurônios, ao invés de ser responsável por um
comportamento, é antes responsável por uma função.
A maioria dos nossos comportamentos usa, em simultâneo, múltiplas
áreas do cérebro. Além disso, quando uma área cerebral sofre algum tipo de
dano, outras podem compensar de forma parcial. Assim, é natural que Flourens
tenha tirado conclusões erradas dos seus estudos.
Em Paris, no ano de 1964, em uma sessão científica da Societé
Anatomique, o neurologista Pierre-Paul Broca (1824-1880), surpreendeu a todos
com sua polemica declaração: “Nous parlons avec l’hemisphère gauche! Nós
falamos com o hemisfério esquerdo!” sendo o primeiro neurologista a conseguir
localizar uma função específica numa área particular do cérebro. Apresentou
casos de pacientes que haviam perdido a capacidade de falar sem qualquer
paralisia dos músculos da face, alguns já haviam morrido, e foi possível estudar
seus cérebros necropsiados. Mais tarde, após a constatação, essa área levou seu
nome e hoje é conhecida como “Área de Broca” (localizada no lobo frontal do
hemisfério esquerdo). (LENT, 2010)
Na década seguinte, Karl Wernicke estudou pacientes com uma
deficiência “oposta” àquela que Paul Broca tinha estudado: os pacientes
conseguiam se comunicar, mas eram incapazes de compreender a linguagem.
Surpreendentemente, Wernicke encontrou uma lesão numa área diferente do
cérebro que levaria também o seu nome “Área de Wernicke”.
14
Com base nesta descoberta, Wernicke propôs que a generalização do
processamento de diferentes funções cerebrais seria feito de forma distribuída
pelo cérebro. (LENT, 2010)
Hoje, com base em novas observações, os neurologistas
desenvolveram um novo modelo de Wernicke para a base neural da linguagem.
Esse modelo revisado recebeu o nome de Wernicke-Geschwind e propôs que a
função da área Wernicke fosse analisar os sinais acústicos que formam as
palavras e a área de Broca organizar a articulação da fala.
Novas abordagens têm contribuído para uma melhor definição dos
sistemas neurais responsáveis pela linguagem. As funções dessas áreas
expandiram-se, o fascículo arqueado interconecta áreas maiores do córtex
sensorial com áreas pré-frontais e pré-motoras.
O processamento da linguagem requer uma rede bem maior de áreas
cerebrais do que foi citado anteriormente. Hanna e Damásio falam sobre
evidências mais novas, que indicam três grandes sistemas: o sistema de
implementação, sistema de mediação e sistema conceitual) que interagem,
conectando a recepção e a produção de linguagem com o conhecimento
conceitual (significado). (KUHL; DAMÁSIO, apud Kandel 2015)
Fig.2 Mapeamento de funções mentais no cérebro de acordo com o conhecimento vigente. Retirada do blog https://sophiaofnature.wordpress.com/2014/12/13/a-historia-do-cerebro/
15
As funções motoras e sensoriais ocupam menos da metade do
córtex cerebral em seres humanos. O resto do córtex é ocupado
pelas áreas de associação, que coordenam eventos que surgem
nos centros sensórios e motores. (KUHL; DAMASIO, apud
KANDEL 2014, p 1177).
1.1 A Comunicação e a Linguagem
A intenção comunicativa é o que fazemos para chamara atenção
de alguém, para que outra pessoa nos evite ou se aproxime de
nós, faça alguma coisa para nós ou, simplesmente, compartilhe
uma ação, um objeto ou uma saudação informal [...] (CANCINO,
2013 p 25).
A necessidade de falar é frequente, necessária, inevitável e unicamente
humana, mas a comunicação entre indivíduos não é uma vantagem só nossa na
natureza. Muitos animais se comunicam, e de diversas formas. Foi nos seres
humanos, entretanto, que a capacidade de comunicação vocal se desenvolveu,
tornando-nos mestres na arte da comunicação e de viver por ela. Ao menor
movimento ou ação intencional, expressões faciais, ou uma simples mensagem
não respondida, nos faz criar muitas hipóteses tentando descobrir o que pode
estar acontecendo. Possuímos habilidades particularmente bem desenvolvidas
para inferir estados mentais (desejos, intenções, crenças, conhecimentos) de
outros indivíduos, de uma maneira intuitiva totalmente automática, ficando atento
a tudo o que acontece ao nosso redor no meio social, procurando
permanentemente sinais que nos permitam entender as condutas dos outros.
(CANCINO, 2013)
Cancino (2013) ainda questiona: - “Por que é tão difícil precisar as
intenções comunicativas de nossos filhos quando são pequenos ou quando têm
dificuldade para se comunicar?” (p.25). Mas as mães, convivendo com seus
bebes recém-nascidos desenvolvem uma comunicação bastante eficiente, que é
capaz de identificar quando choram e o que, possivelmente, pode estar
16
ocorrendo. Então o choro acaba sendo o canal mais importante de comunicação
entre mãe e bebê.
De modo geral, Cancino (2013) ainda afirma que “toda criança comunica-
se muito antes de entender sequer as palavras ou falar alguma” (p. 28). Ao final
do primeiro ano, olhares e gestos são suficientes para que os adultos sejam
capazes de saber sobre gostos, recusas e desagrados, e usam de muitos
artifícios para manipular e conseguirem o que realmente querem sem ao menos
pronunciar palavras para serem compreendidos.
A linguagem é possivelmente a maior habilidade e a maior conquista dos
seres humanos. Localiza-se no lobo frontal esquerdo, apesar de sua
complexidade toda criança em seu desenvolvimento típico a domina em torno dos
três anos de idade. Os bebes aprendem a linguagem bem antes de produzirem
suas primeiras palavras. Ouvir os padrões de sons da unidade fonética, as
palavras e a estrutura de frases da língua altera o encéfalo de forma permanente.
Novas descobertas conduziram uma nova visão de linguagem que abrange seu
desenvolvimento, estado de maturidade e dissolução na afazia (distúrbios de
linguagem falada).
Cancino (2013) acrescenta-se também um complexo sistema que
trabalham juntos e cada nível tem sua importante função:
• Nível fonológico: Representações mentais de sons combinadas em
sílabas primeiramente que evoluem para palavras que irão desencadear a
linguagem humana sendo armazenados;
• Nível fonético: Os sons que são armazenados e podem ser
acessados e reconhecidos devem ser pronunciados para podermos nos
comunicar, sendo necessário um trabalho em conjunto dos movimentos faciais,
da língua, da faringe, da laringe e músculos da respiração, se relacionam com as
estruturas ósseas e musculares propiciando a fala;
17
• Nível morfossintático: Acesso e a combinação de sílabas para
formar palavras, palavras para formar frases e etc., podendo formar unidades
maiores como discursos, textos e conversação;
• Nível semântico: Os significados culturais ou pessoais sendo
expressos em palavras, quanto mais experiências se tem mais significados serão
concebidos;
• Nível pragmático: As habilidades e capacidades comunicativas que
permitem mostrar intenções, sentimentos, nos adaptar, ser empáticos, nos
expressar com qualidade, inferir, prestar atenção, sendo a base da construção da
comunicação.
Portanto, a capacidade de pronunciar depende não somente de
como processamos e compreendemos os sons da fala, mas
também de como somos capazes de coordenar os movimentos de
língua, lábios, boca, faringe, laringe e tórax. Junto com isso,
devemos ser capazes de processar as diversas sensações ao
tocar tais órgãos e músculos, sentir o fluxo do ar pela garganta,
pela boca e nariz, sentir as vibrações dos sons na boca, na faringe
e rosto, e por último, escutar os sons que estamos produzindo e
verificar se correspondem ao que planejamos e devemos falar
(CANCINO, 2013, p. 31 e 32).
E Cancino ainda cita sobre os passos e processos cerebrais da fala:
[...] precisamos de áreas cerebrais que permitam programar os
diferentes movimentos para a fala (principalmente lóbulo frontal
esquerdo em coordenação com o lóbulo temporal esquerdo e
áreas do cerebelo), coordenar a sequência dos movimentos
(áreas pré-frontais de ambos os lados do cérebro), coordenar as
sensações corporais das ações (lóbulos parietais), coordenar o
18
tono muscular e a velocidade dos movimentos (cerebelo),
comparar o que produzimos com as imagens auditivas que temos
na memória (lóbulo temporal esquerdo em conjuntos com áreas
frontais) e determinar se precisa ou não ser corrigido (lóbulo
frontal esquerdo). (CANCINO, 2013, p. 32)
De todos os níveis o Pragmático é o primeiro a se desenvolver, o
mais complexo de todos, ele se origina na comunicação que acaba influenciando
todos os demais níveis. A troca de emoções, interações e estímulos, no começo
da vida, torna-se permanente e com passar dos anos ela vai se aprimorando e
construindo uma bagagem pessoalmente cultural. (CANCINO, 2013).
1.2 Os Sentidos do Corpo e a Percepção
O organismo atua constantemente sobre o meio ambiente (no
princípio foram as ações), de modo a poder propiciar as
interações necessárias à sobrevivência. Mas, para evitar o perigo
e procurar de forma eficiente alimento, sexo e abrigo, é necessário
sentir o meio ambiente (cheirar, saborear, tocar, ouvir e ver) para
que se possam formular respostas adequadas ao que foi sentido.
A percepção é tanto atuar sobre o meio ambiente com de ele
receber sinais. (DAMÁSIO, 1996 p. 256)
1.2.1 Sistema Somestésico
Hoje em dia é impossível falar das percepções sensórias do corpo
humano sem falar sobre a Somestesia. Somestesia origina-se do latim soma, que
quer dizer corpo, e aesthesia, que significa sensibilidade. Capacidade que as
pessoas e os animais possuem de receber informações constantes de diferentes
partes do seu corpo. É uma modalidade sensorial que é formada por muitas
19
submodalidades como: o tato (fino e preciso e outro grosso e impreciso), a
propriocepção (equilíbrio, deslocamento, velocidade, coordenação e etc.)
termossensibilidade (frio, calor e pressão), a dor e outras (ardência, coceira e
etc.).
Quem desempenha essa árdua tarefa é o Sistema Somestésico, uma
cadeia sequencial de neurônios, fibras nervosas e sinapses que, traduz, codifica,
modifica informações (estímulos ambientais que atinge o corpo) e conduz a
regiões cerebrais para que haja a transformação da percepção em emoção. São
eventualmente utilizadas na modulação do comportamento.
[...] o complexo somatossensorial do cérebro, em
especial o do hemisfério direito nos seres humanos, representa
nossa estrutura orgânica tento por referência um esquema
corporal donde existem partes intermediárias (tronco, cabeça),
partes apendiculares (membros) e uma delimitação do corpo.
(DAMÁSIO, 1996 p. 262).
Sistema Somestésico é dividido por Lent (2010) em três subsistemas:
• Exteroceptivo (Tato): discrimina e detalha as representações
espaciais da superfície corporal;
• Proprioceptivo (Sistema motor): informa ao cérebro sobre os
músculos e articulações;
• Interoceptivo (dor, termossensibilidade, metabolismo): noção
funcional do corpo, ou seja, sensação de bem-estar e de mal-estar.
A Propriocepção foi um termo criado por Charles Sherrington,
(neurofisiologista e patologista britânico que ganhou o Nobel de Fisiologia/
Medicina de 1932), para indicar a “percepção de posição do nosso corpo”. Mesmo
de olhos fechados sabemos identificar exatamente as diversas partes do nosso
corpo, perceber movimentos dos nossos membros. Esse termo não é ideal, mas é
20
útil, pois reúne os receptores situados nos músculos e nas articulações com
conexões diretas do SNC até o córtex cerebral, tendo componentes conscientes e
inconscientes que fazem parte dos sistemas de controle da motricidade. (LENT,
2010)
Falando sobre a dor Lent explica:
De todas as submodalidades somestésicas, a dor é a mais
importante e especialmente elaborada, pois possibilita o controle
das transmissões sinápticas para a proteção e a sobrevivência
dos indivíduos. (LENT, 2010, p. 228)
Fig.3 Homúnculo imagem mítica – neurocirurgião Wilder Penfield (1891-1976).
Retirado do site criandocondicoesaliberdade.blogspot.com.br/2012/01/o-homunculo-de-
penfield.html
1.2.2 Os Sentidos Especiais e os Sentidos Químicos
Diferente dos animais aquáticos que são expostos a moléculas que são
dissolvidas na água e ás que circulam dentro de seu próprio corpo, os animais
terrestres ficam expostos, externamente, às moléculas voláteis, que são
21
encontradas suspensas ou dissolvidas no ar e, internamente, ás que circulam no
sangue, nos líquidos corporais ou estão no meio extracelular.
Do mesmo modo que a maioria não se dá conta de que constituindo
um sofisticado sistema de sinalização, muitas moléculas respondem a circuitos
neurais especializados. Estes sinais moleculares são utilizados pelo organismo
para motivar comportamentos de sobrevivência como se alimentar, procriar e se
defender. [...] “quando vemos, ouvimos, tocamos, saboreamos ou cheiramos o
corpo e o cérebro participam na interação com o meio ambiente.” (DAMÁSIO,
1996 p. 255)
Para o perfeito funcionamento do corpo os sinais moleculares são
emitidos pelo próprio organismo e analisados pelo SNC sem que nossa
consciência se aperceba deles, possibilitando a regulação automática de nossas
funções vitais. (LENT, 2010)
Mesmo que o ser humano, de certo modo, ter uma capacidade
discriminativa limitada assim comparada aos animais, químicos calculam que o
sistema olfatório humano possa ser capaz de detectar mais de 10 mil substâncias
químicas voláteis diferentes:
Por meio dos sentidos do olfato e da gustação, uma pessoa é capaz de
detectar um impressionante número e uma grande variedade de
substâncias químicas no mundo externo. Esses sentidos químicos
informam acerca da disponibilidade de alimentos e de seu potencial
prazer ou perigo. O aroma e o sabor também iniciam alterações
fisiológicas necessárias para a utilização alimento. Em muitos animais, o
sistema olfatório também é utilizado para uma importante função social,
detectando feromônios que determinam respostas inatas
comportamentais ou fisiológicas. (BUCK, BARGMANN, apud KANDEL,
2014, p.619).
22
1.2.2.1 Sistema Auditivo
O Sistema auditivo é um conjunto formado por receptores, vias
ascendentes, núcleos e áreas corticais relacionadas com a audição que realiza a
transdução dos estímulos sonoros em importantes receptores. Os receptores
auditivos são as células esterociliadas, e estão localizados dentro da orelha
interna, na cóclea, que transmitem a informação sonora traduzida para neurônios
de segunda ordem encarregados de realizar a codificação. (LENT, 2010)
SILVEIRA no capítulo 7 do livro Neurociências da Mente e do
Comportamento organizado por LENT identifica o córtex auditivo:
O córtex auditivo primário está localizado é circundado em parte
pela área 42 de Brodmann, no giro temporal superior, e esta é
circundada pela área 22 de Brodmann, no giro temporal superior e
médio, nos quais o processamento da informação auditiva atinge
níveis mais complexos. A área 22 de Brodmann, ou de Área de
Wernicke, é fundamental para a interpretação dos aspectos
abstratos da fala, no hemisfério dominante, assim como do
conteúdo emocional da fala, no hemisfério contra lateral. Está
conectada pelo feixe arqueado, o qual cursa, na substância
branca dos lobos temporais, parietal e frontal, com a área 44 de
Brodmann ou área de Broca, no opérculo frontal, responsável
pelos padrões neuronais da fala. (SILVEIRA, apud LENT, 2015,
p.158)
“Devido ao seu papel na compreensão e na produção da fala, a
percepção auditiva é uma das modalidades sensoriais mais importantes para os
seres humanos”. (OERTEL, 2013). A audição é a modalidade sensorial que
permite que os animais e o homem percebam os sons. Podendo dividir a orelha
em três partes funcionais: Orelha externa (Aurícula e Meato Auditivo Externo),
Orelha média (Tímpano, Martelo, Bigorna e Estribo, Cavidade e a Tuba de
23
Eustáquio), Orelha interna (Cóclea).
A percepção auditiva consiste em uma fase analítica inicial, em que os
primeiros estágios do processamento neural extraem cada uma das diferentes
características do som (tom, intensidade, timbre e localização).
Experiência humana é enriquecida pela capacidade de distinguir
uma série notável de sons – da intimidade de um sussurro até o
calor de uma conversa, da complexidade de uma sinfonia até o
rugir de um estádio. A audição começa quando a cóclea, o órgão
receptor em forma de caracol da orelha interna, traduz energia
sonora em sinais elétricos e os envia para o encéfalo.
(HUSDSPETH AJ, apud KANDEL 2014, p.568).
A capacidade de perceber os sons e diferenciá-los está muito
desenvolvida fazendo com que o feto reaja a vozes conhecidas:
O bebê recém-nascido traz consigo uma memória auditiva de pelo
menos quatro meses. Esses sons vêm pelo fluído, mas são
verdadeiros sinais auditivos. O fluxo sanguíneo nos grandes vasos
da mãe, as batidas de seu coração, seus movimentos intestinais,
sua voz, uma música e até ruídos compõem muitos dos sons.
(LINDNER, 1999, p. 4)
Antes do nascimento, na vida intrauterina, com a finalização da
formação da cóclea os estímulos auditivos começam a ser absorvidos, criando
conexões neurais a partir da 23ª semana. Muitos pesquisadores atribuem a essa
estimulação auditiva ao posterior desenvolvimento cognitivo e social. Sendo as
infecções pré-natais ou perinatais especialmente pelas condições genéticas que
afetam uma em cada mil, a surdez pode ser devastadora:
As crianças com frequência são privadas do desenvolvimento
normal da fala e, por essa razão, também da leitura e da escrita
24
[...] Muitas crianças consideradas inicialmente deficientes
cognitivos são, posteriormente, diagnosticadas como deficientes
auditivos, e seu desenvolvimento intelectual retoma o curso
normal quando esse problema é sanado. (HUSDSPETH AJ, apud
KADEL 2014, p. 568).
1.2.2.2 Sistema Visual
O sistema visual humano começa com o olho que contém muitas
partes que focam a luz, a córnea e o cristalino do olho. A luz é recolhida através
da retina, o que altera a sua forma focando a através da ação das células do
músculo ciliar especializado. A luz na retina é gravada por um conjunto de células
sensíveis, especializadas chamadas fotorreceptoras, que convertem a energia
luminosa em atividade neuronal.
A retina faz o processamento de imagem e é responsável por transmitir
o sinal de imagem para o nervo ótico. O globo ocular em si é capaz de rodar em
torno graças aos músculos dos nervos oculomotores, há circuitos bastante
avançado no cérebro para mover automaticamente o olho para estabilizar a
imagem, ajustando as diferenças na iluminação, controlando diâmetro da pupila,
sendo capaz de limpar-se através da produção de lágrimas e piscando, e pode
até mesmo reparar-se em caso de danos modesto para sua óptica.
Uma vez detectada, a luz é transmitido sinapticamente e processadas
por uma série de interneurônios, incluindo as células bipolares e outras
transmitidas sinapticamente para as células ganglionares da retina, que atuam
como detectores de características. Em cada etapa sináptica, as células de
ligação lateralmente, chamadas as células horizontais e amácrinas, que permitem
a sincronização e algumas integrações do sinal de entrada. Curiosamente,
enquanto há apenas um punhado de diferentes tipos de fotorreceptores, foram
identificados mais de 50 tipos diferentes de interneurônios e mais de 30 tipos
diferentes de células ganglionares da retina. Isto permite uma diferenciação muito
detalhada e integração da informação visual. Axônios das células ganglionares da
25
retina são então agrupadas em nervos ópticos, que distribuem a informação visual
na forma de potenciais de ação paralelos, que são códigos para cada elemento
visual detectado. Esses recursos são enviados para várias regiões profundas do
cérebro que são altamente especializados para o sistema visual. (HARVAD –
vídeo aula – Visão- 2016).
A Via Retino-Genículo-Estriada, sendo a ela atribuído o
carreamento da informação necessária para as funções visuais
conscientes de forma, cor e movimento. A partir da área estriada
os sinais originados nas retinas são distribuídos para uma série de
cerca de 30 áreas corticais visuais diferentes, situadas nas áreas
18 e 19 de Brodmann no lobo occipital, assim como em regiões
vizinhas dos lobos parietal e temporal, ricamente interconectadas
e associadas em canais de processamentos de informação com
um alto grau de especificidade, seja para a visão de forma
estática, movimento, forma dinâmica e cores, ou ainda para a
percepção e a ação. (SILVEIRA, apud LENT 2015, p.143).
Segundo Del Giudice, M – Professor Assistente do Departamento de
Psicologia da Universidade do Novo México – 2010, no artigo Alone in the Dark?
Modeling the Conditions for Visual Experience in Human Fetuses, é possível
haver experiência visual fetal na gestação humana. Dados empíricos sobre as
características de transmissão de luz de vários tecidos são utilizados para
modelar a quantidade de luz que atinge o feto no final da gestação. O modelo
indica que, num intervalo de condições plausíveis, o interior do útero recebe
iluminação suficiente para permitir a visão fetal. Este resultado tem implicações
fascinantes para o estudo do início visuo-motora desenvolvimento, e pode
fornecer informações na origem de diferenças individuais no comportamento
infantil.
O sistema visual amadurece relativamente tarde na gestação,
especialmente se comparado com o tátil, olfativo e sistema
auditivo. Por volta das 20º à 22º semanas as pálpebras podem se
abrir em alguns fetos, e a retina (especialmente o sistema de
26
varetas) já está parcialmente funcionando a partir de 12º à 17º
(FULFORD et al, 2003; LECANUET & SCHALL, 1996 apud
GIUDICE, 2010, p. 214).
1.2.2.3 Sistema Olfatório
As substancias que vêm pelo ar, cheiros ou odores são chamadas de
experiências perceptuais, que são detectadas pelo sistema olfatório, constituindo
a modalidade sensorial olfação. O nariz é o órgão receptor específico onde são
encontradas paredes que estão cobertas por uma mucosa que tem uma camada
celular composta por neurônios quimiorreceptores olfatórios, células de suporte
(gliócitos e células basais que são percursoras de novos neurônios receptores) e
suas fibras que executam o mecanismo neural responsável por uma cadeia de
neurônios.
O neurônio sensorial olfatório é uma célula nervosa bipolar. Um
único dendrito estende-se a partir da extremidade apical para a
superfície do epitélio, onde origina numerosos cílios finos que se
projetam para dentro do muco que reveste a cavidade nasal.
(BUCK; BARGMANN, apud KADEL 2014, p. 620).
A mucosa contém um muco que é secretado pelas glândulas e também
pelas células epiteliais. Este muco é viscoso, formado principalmente por
mucopolissacarídeos e contém enzimas e anticorpos que protegem o organismo
contra moléculas nocivas e microrganismos que entram pela cavidade nasal.
(LENT, 2010)
O muco tem grande importância funcional para olfação, pois é
nele que se dissolvem as moléculas odorantes, antes de entrar
em contato com a membrana dos neurônios receptores.
Recentemente se descobriu que o muco contém também
proteínas ligadoras de odorantes, especialmente produzidas pela
mucosa nasal, cuja função é capturar os odorantes lipossolúveis
(que se dissolvem com dificuldade no meio aquoso de muco),
27
facilitando o seu contato com a membrana dos quimiorreceptores.
(LENT, 2010, p 344)
Conforme Lent (2010) pode-se delimitar no SNC as estruturas
envolvidas com o olfato: Bulbo olfatório, Córtex Piriforme, a Amígdala e outras
estruturas.
O sistema olfatório é responsável por traduzir a estimulação dos
odorantes em padrões de impulsos que sejam reconhecidos pelas regiões
corticais apropriadas. Cada neurônio olfatório tem um receptor molecular
específico, sendo capaz de reconhecer cada odorante em particular. Nos seres
humanos existem 400 genes vivos para os receptores olfativos. (LENT, 2010)
A sistematização combinatória de substancias odorífera aumenta
significativamente o poder de diferenciação do sistema olfatório. Estudos têm
demonstrado que a informação olfatória sofre muitas transformações espaciais à
medida que viaja do epitélio olfatório para o bulbo olfatório e, então para o córtex
olfatório. A experiência olfatória vai organizando informações ao longo do tempo
(BUCK, apud KANDEL, 2014).
“O código neural para uma substância odorífera no encéfalo é mantido
ao longo do tempo, assegurando que uma dada substância odorífera encontrada
previamente possa ser reconhecida anos mais tarde”. (BUCK, apud KANDEL,
2014 p. 624).
Considerando o desenvolvimento do sistema olfatório ainda no útero,
muitos autores creditam ao olfato o papel modulador essencial nas interações
materno-filiais, referindo a influência do mecanismo neuroendócrino no sistema
olfativo que atua como mediadores desse comportamento. Além do papel da
ocitocina como desencadeador deste processo, reconhecem-se a presença de
comunicação química e o aprendizado olfatório pré-natal como ferramentas
coadjuvantes no estabelecimento do vínculo materno-filial (Gonzalez-Mariscal &
Poidron, 2002; Lévy et al., 2004).
28
Um fator que pode influenciar o ambiente químio-sensorial pré-natal é a
dieta materna (Hepper & Wells, 2006). Durante o estágio embrionário e fetal, o
ambiente uterino reúne informações químio-sensoriais eficazes para o
desenvolvimento neurológico e, portanto, influencia o comportamento do recém-
nascido (Schaal et al., 2000).
Vários estudos têm demonstrado que as preferências olfatórias pós-
natal são influenciadas por exposição pré-natal a estímulos químio-sensoriais
oriundos da dieta da mãe (Hepper, 1988; Semke et al., 1995; Schaal et al., 2000).
Esta rota de exposição olfatória e de aprendizado é de interesse porque promove
um modo natural por meio do qual os indivíduos adquirem alguma informação
acerca de suas mães e do ambiente ao qual será exposto após o nascimento
(Hepper & Wells, 2006).
1.2.2.4 Sistema Gustatório
A principal função do sistema gustatório é nutricional,
frequentemente pensado como sinônimo para o paladar. Mas, no entanto,
estritamente se refere ás cinco qualidades codificadas pelo sistema gustatório. O
paladar por sua vez com suas qualidades ricas e variadas se origina na
combinação da entrada de sinais dos sistemas gustatório, olfatório e
somatossensorial. (Kandel, 2014)
O sistema sensorial gustativo desempenha papel fundamental na
alimentação. Graças à informação transmitida das células
gustativas para o cérebro, são atribuídos sabores às diferentes
substâncias químicas presentes nos alimentos. [...] Os seres
humanos podem detectar e discriminar entre pelo menos cinco
classes de sabores, os quais estão associados substâncias
pertencentes, grosso modo, a grupos químicos distintos: doce
(açúcares), amargo (alcaloides e outras substâncias), umami ou
delicioso (aminoácidos), salgado (sais) e azedo (ácidos).
29
(SILVEIRA apud KANDEL 2015, p. 148).
É correto considerar que a cavidade orofaríngea é o órgão da
gustação. Nela a estrutura mais importante é a língua, que é o maior receptor da
gustação, possuindo grande número de papilas gustatórias de tipos diferentes
onde são encontrados a maior parte dos quimiorreceptores gustatórios.
Entretanto, também podemos encontrar receptores na mucosa oral, na faringe, na
laringe e também nas porções superiores do esôfago.
A quimiotransdução gustativa processa-se em estruturas
especializadas chamadas corpúsculos gustativos, os quais estão
presentes nas papilas linguais ou na mucosa do palato, da faringe,
da epiglote e do esôfago proximal. Esses corpúsculos são
formados por cerca de 50 a 100 células quimiorreceptivas
gustativas e células-tronco basais. As células gustativas
compreendem três classes morfológicas: escuras, intermediárias e
claras. (SILVEIRA apud KANDEL 2015, p 148)
As células primárias do sistema gustatório são os quimiorreceptores de
origem epitelial. Eles estão reunidos em grupos de 50 a 150, formando em forma
de alho, esférulas chamadas botões gustatórios que em suas extremidades forma
uma espécie de poro ou depressão na superfície. Temos cerca de cinco mil
botões gustatórios, e boa parte deles se encontra na língua, e nela se encontra as
papilas gustatórias (fungiformes, foliáceas e as circunvaladas). As células de
segunda ordem são neurônios genuínos, bipolares.
É correto identificar através de microscópio dois tipos de celulares de
botões gustatórios: Os quimiorreceptores e as Células basais: se encarregam da
reposição dos quimiorreceptores à medida que eles vão degenerando e morrendo
a cada duas semanas. (LENT, 2010)
Ainda no útero o sistema gustatório está formado e amadurece
rapidamente na oitava semana de gestação. Compostos químio-sensoriais
eficazes presentes no líquido amniótico estimulam receptores gustativos do feto,
30
pois ele começa a engolir em torno da 12ª semana de gestação (MANELLA,
1996). Os estímulos são recebidos pelo sistema gustativo e são transmitidos para
vários núcleos do tronco cerebral, onde induzem entre outras coisas os reflexos
relacionados com o fluxo salivar e movimentos da língua. (HAUBRICH, 2006).
A composição do líquido amniótico muda durante o desenvolvimento
fetal, especialmente quando se começa a urinar. Todos os dias feto engole entre
200 e 760 ml de líquido amniótico, dependendo do estágio de desenvolvimento, é
exposto a um grande número de componentes de sabores incluindo vários
açúcares (Glicose, frutose), ácidos graxos, aminoácidos, proteínas e sais. Os
sabores da dieta materna atingem o líquido amniótico. Sendo assim, os bebês já
experimentam padrões gustativos muito antes de ter contato direto com alimentos
corretamente. (MENELLA, 2001)
Durante os dias 26 e 28ª semana de gravidez pode ser detectadas
relações entre os receptores gustativos estimulantes e mudanças que se
assemelham reflexões da expressão facial do feto, especialmente evidente com
estímulos sabor amargo. Às 32 semanas de gestação, o feto responde a uma
mudança no gosto do líquido amniótico, modificando a forma beber. (HAUBRICH,
2006). Se o sabor do referido fluido é doce ou amarga, o feto ajusta o seu padrão
de deglutição, respectivamente, aumentando ou diminuindo a frequência com que
engole. (MANELLA, 1996).
1.3 Aprendizagem e a Memória
A memória é a base de todo o saber e, também, de toda a
existência humana, desde o nascimento. Todo o nosso cérebro
funciona por meio da memória; comemos, andamos, falamos
porque nos lembramos de como fazê-lo. A memória determina
nossa individualidade como pessoas e como povos. (RELVAS,
2009, p.56)
31
“A memória é uma das funções mais importantes do cérebro, está
ligada ao aprendizado e à capacidade de repetir acertos e evitar erros”, (RELVAS,
2009. p.56) sendo também a capacidade de planejar, abstrair, elaborar críticas e
manter a atenção focada. Hormônios ou neurotransmissores são secretados pelo
cérebro quando há situações alegres ou tristes, situações perigosas ou
prazerosas sendo facilmente acessados e memorizados em função de estímulos
de neuroquímicos. (RELVAS, 2009).
O armazenamento da memória envolve muitas partes diferentes do
encéfalo havendo vários tipos distintos, sendo algumas regiões mais importantes
para o armazenamento do que para outras.
A cada minuto selecionamos uma pequena parte do que
vivenciamos para armazenar na memória [...] a memória é o
processo de arquivamento seletivos de informações pelo qual
podemos evoca-las sempre que desejarmos, consciente ou
inconscientemente. (LENT, 2010 p 647).
Conforme Lent (2010) os processos mnemônicos são divididos em:
Aquisição (entrada de qualquer evento nos sistemas neurais ligados a memória),
seleção (armazenamento dos eventos mais relevantes para cognição, mais
marcantes para emoção, mais focalizados pela nossa atenção, mais fortes
sensorialmente, ou simplesmente priorizados por critérios desconhecidos),
retenção (armazenamento de eventos por algum tempo, ás vezes por muitos anos
ou ás vezes não mais que alguns segundos), esquecimento (amnésia e
hipermnésia), consolidação (memória armazenada durante um tempo maior ou
permanentemente), evocação ou lembrança (acesso as informações
armazenadas ).
É correto classificar a memória em duas dimensões: Pelo curso
temporal do armazenamento (Memória de curto prazo (memória de trabalho) e
Memória de Longo prazo (implícita ou explícita)) e pela natureza da informação
32
armazenada.
Acredita-se que o ensaio (a repetição mental) da
informação espacial e relativa a objetos envolva a modulação de
tais representações nos córtices parietal, temporal inferior e
occipital extraestriatal pelos córtices frontais e pré-motor.
(SCHACTER; WAGNER, apud KANDEL 2014, p.1257).
Examinando alguns indivíduos normais dois psicólogos cognitivos,
Peter Graf e Daniel Schacter, descobriram dois tipos de memória de longa
duração que se diferenciavam pelo fato de envolverem ou não percepção
consciente para a evocação: Memória implícita (memória não declarativa ou
memória de procedimentos) e Memória explícita (memória declarativa).
A aprendizagem “é o processo de aquisição das novas informações
que vão ser retiradas da memória” (LENT, 2010, p.650), “que resulta na mudança
de um comportamento por meio da experiência e exige, como pré-requisitos, a
aquisição de conhecimentos e a capacidade de armazená-los (memória)” (VALLE,
2014, p 19).
Ainda no processo embrionário, inicia-se uma cadeia de
processos que levam à diferenciação e especialização das células
[...] A experiência e o aprendizado desempenham um papel
fundamental para a integração das regiões celulares e podem
promover alterações estruturais celulares [...] Alimentar as células
com informações e atividades eleva a capacidade de fazer novas
conexões entre as células nervosas, aumentando a agilidade
mental e, portanto, a capacidade de aprender. (VALLE, 2014,
p.20)
É através dele que se cria capacidades para orientar o comportamento
e o pensamento podendo “ser vista como um conjunto de comportamentos que
viabilizam os processos neurobiológicos e neuropsicológicos da memória”. (LENT,
2010, p 650).
33
O aprendizado pode ser considerado de dois tipos:
• Não associativo: são as tarefas repetitivas que se confundem com
os subtipos de memória implícita (habituação, sensibilização, imitação);
• Associativo: condicionamento clássico, condicionamento operante
ou instrumental.
“A aprendizagem, em uma visão cognitivista, é um processo
caracterizado pela aquisição de conceitos ou habilidades pelo uso da experiência”
(HONDERICH, 1995, apud VALLE, 2014, p. 20) resultando em reestruturações
internas que leva ao conhecimento, podendo ocorrendo de duas formas: por meio
de percepções e movimentos relacionados (sensório-motora); e por
representações mentais e abstratas não necessariamente ligadas à ação ou ao
objeto (conceitual). O processo de aprender pode ser Informal (vivendo e
experimentando), Formal (experiências sistematizadas), Tutorial (recursos
monitorados). (VALLE, 2014).
O processo de aprendizagem é acompanhado por sentimentos,
envolvendo o domínio de conhecimento na forma de fatos, figuras
e pensamentos. A emoção ativa a atenção (o componente
primário e mais vital de qualquer ato de aprendizagem ou
processamento da informação), que depois desencadeia a
memória de curto prazo e longo prazo e, eventualmente, torna o
processo de aprendizagem possível. Para se ter aprendizagem é
preciso que ocorra excitação emocional. (RELVAS, 2014, p.38).
34
CAPÍTULO II
TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) E A NEUROPLASTICIDADE
2.1 Transtorno do Espectro Autista (TEA)
Em 2013, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(DSM-5), que reúne todos os transtornos psiquiátricos e é referência nessa área,
juntou todas as condições semelhantes do quadro autista nessa única
classificação.
De acordo com Vieira (2015) “Espectro significa amplitude, ou seja, os
indivíduos têm algumas características em comum, mas são muito diferentes
entre si”. Os graus são bem variados, mas se trata de um transtorno único.
No passado crianças eram vistas como excêntricas, em sua maioria
considerada como deficientes mentais, sendo deixadas em clínicas psiquiátricas,
largadas a própria sorte nas mãos dos psiquiatras da época, que faziam o uso de
métodos evasivos e de danos neurológicos permanentes. “O termo “retardo
mental” foi amplamente utilizado para rotular alterações cognitivas associadas a
anormalidades encefálicas, oriundas do período pré-natal ou por volta do período
pós-natal.” (FRITH et al 1996, apud KANDEL 2014, p. 1242).
O autismo, depois de sua identificação e nomeação em 1943, pelo
psiquiatra infantil, Leo Kanner, da John Hopkins University, seguido por Hans
Asperger em 1944, passou por décadas de práticas desumanas em clínicas
psiquiátricas e casas (normalmente eram desenvolvidas pelos próprios
35
psiquiatras), que acolhiam essas crianças e adolescentes. Em todas essas
experiências elas eram afastadas do convívio familiar e social.
Por um lado essas práticas acabaram contribuindo para futuras
pesquisas, que por meio da observação, muito foi percebido. Por outro lado,
condenavam essas crianças e adolescentes que se fechavam ainda mais em seu
mundo particular.
Ainda no século XX nos Estados Unidos, na década de 60 houve
grandes avanços nas pesquisas. Em 1966 Eric Schopler e sua equipe da
Universidade de Chapel Hill - Carolina do Norte que questionava a prática clínica
de sua época desenvolvem um programa de reeducação. “Considerado um
programa educacional e clínico com uma prática psicopedagógica que observa os
comportamentos de crianças autistas em distintas situações, de acordo com
vários estímulos.” (ORRÚ, 2012, p. 60) chamado TEACCH – Treatment and
Education of Autistic and related Communication Hadicapped Children /
Tratamento e educação para Autistas e Crianças com Deficits (estímulo -
resposta) que incluía os pais ao máximo no tratamento de reeducação. Esse
método acabou sendo uma verdadeira reviravolta nesse sistema, pouco a pouco
as crianças autistas saiam do silêncio.
Na mesma época um psiquiatra americano Ivar Lovaas com outro
método ABA - Applied behavior analysis / Análise Aplicada do Comportamento
(recompensa - punição), que hoje em dia é muito usado em vários países na
reeducação de autistas. (Le Cerveau d'Hugo (O cérebro de Hugo), 2012,
SophieRévil)
Este transtorno compromete as funções de diferentes regiões
encefálicas (em seres humanos são muito sofisticadas (consciência social e
comunicação)), reunindo características de vários transtornos psiquiátricos e
afetando o curso temporal do desenvolvimento da estrutura e conectividade do
encéfalo: “[...] existe uma grande variabilidade na gravidade dos sintomas, uma
36
notável heterogeneidade nas comorbidades e nenhuma indicação clara sobre a
neuropatologia.” (FRITH 1996 et al 2014, apud KANDEL 2014, p. 1242).
2.1.1 Comportamentos Característicos
O autismo é considerado como uma classe de muitos transtornos com
diferentes etiologias, incluindo fatores genéticos e fatores ambientais, sendo
considerado um espectro de transtornos que envolvem três características:
prejuízo na interação social, prejuízo na comunicação verbal e não verbal, e
interesses restritos com comportamento estereotipados. A síndrome de Asperger
costuma usada para identificar os casos de autismo com alta capacidade verbal
que não demonstram atraso na aquisição da linguagem. (KANDEL, 2014).
Não se tem ainda uma progressão na quantidade de casos, pois ainda
não está categorizado, isso reflete sobre uma melhor compreensão e identificação
da gama de transtornos que realmente pertence a essa categoria, ou se
realmente é o aumento de novos casos.
Na última estimativa chegou 1 % da população, mas conforme os
estudos e pesquisas estão sendo desenvolvidas, novos dados e porcentagens
vão sendo atualizadas.
Alguns estudos dizem que a idade avançada dos pais,
consequentemente do material genético também, pode contribuir para o
aparecimento do autismo. (KANDEL, 2014).
Não existe país, condição socioeconômica ou costumes culturais, ele
ocorrer em todos os lugares e nações. A frequência em meninos é maior do que
em meninas e embora o autismo possa ser detectado em crianças com o QI alto,
a incidência maior ainda é nas crianças com o QI abaixo de 70, e sua maior
identificação geralmente é alarmada pela falta de comunicação com os pais e
família por volta dos 2 a 3 anos. (KANDEL, 2014)
37
Embora seja um transtorno que claramente afeta o encéfalo, não
existe marcadores biológicos e, por conseguinte, o diagnóstico
tem como base critérios comportamentais. Uma vez que o
comportamento é altamente variável durante o desenvolvimento e
depende de uma série de fatores, incluindo idade, ambiente,
contexto social, disponibilidade e duração de medidas
terapêuticas, não há um comportamento único que possa definir o
diagnóstico. (FRITH 1996 et al 2014, apud KANDEL, p. 1242).
Há relatos de alguns pais que percebem que algo não está normal por
volta do segundo ano de vida, quando regridem no desenvolvimento. Quando são
questionados e comparam seu filho com outros bebes percebem que havia sinais
desde cedo. Alguns estudos, sobretudo com famílias de risco genético,
analisaram o desenvolvimento de irmãos com idades diferentes e as diferenças
ficam mais significativas por volta de um ano completo.
Os principais sinais são: se virar na direção da voz de quem chama
pelo seu nome, a falta de conexão afetiva com os pais em comparação com
brinquedos e etc., brincadeiras repetitivas, ordenação sistemática de objetos,
estimulação visual incomum nas mais diferentes situações com os mais diferentes
objetos. (KANDEL, 2014).
Perto de dois anos completos essas crianças já deixam sinais mais
evidentes: não direcionam atenção para a pessoa ou objetos que no momento é
foco de outras pessoas; não conseguem direcionar atenção ou até mesmo
apontar para expressar algo; não jogam jogos de faz de conta. Um pouco mais
tarde fica evidente o atraso do desenvolvimento da linguagem e na maneira
repetitiva de se comunicar (ecolalia). Aos três anos de idade o diagnóstico pode
ser feito com mais segurança baseados na variedade dos prejuízos na
comunicação, na interação social com a família e com o meio em que essa
criança está inserida, interesses restritos e comportamento estereotipado.
(KANDEL, 2014)
38
Assim como outros transtornos do desenvolvimento, o autismo
ocorre ao logo de toda vida. Entretanto, ele não é progressivo. Ao
contrário, programas de ensino especial e suporte profissional
promovem, muitas vezes, uma melhora marcante no
comportamento com a idade. A compreensão e o uso da
linguagem por pessoas com autismo são bastante variáveis.
Mesmo em indivíduos com alta capacidade, a linguagem
permanece literal, com perda de habilidades na conversação,
evidenciadas pela dificuldade de retomada da palavra durante um
diálogo, bem como pouca compreensão da ironia. A maioria das
pessoas com autismo segue tendo dificuldades em diferentes
contextos sociais, o que prejudica sua capacidade de fazer
amigos e manter relacionamentos duradouros. A preferência por
rotina e por padrões de comportamento restritos permanecem ao
logo da vida, embora a natureza das obsessões e os interesses
possam sofrer profundas alterações. (FRITH 1996 et al 2015,
apud KANDEL, p. 1243).
De fato quando ainda é falado sobre as aversões e as fortes
preferências, é percebido que a hipersensibilidade ao toque, ao gosto, ao som e a
visão são sempre citadas como comportamentos restritos.
[...] ainda não existem informações neurobiológicas para essas
alterações de função sensorial. As pessoas com autismos
costumam ser suscetíveis a uma variedade de comorbidades
psiquiátricas associadas, em especial a ansiedade e depressão.
Ainda assim, é possível melhorar adaptação quando o ambiente é
estável e altamente estruturado. (FRITH 1996 et al 2015, apud
KANDEL, p. 1243).
2.1.2 Componentes Genéticos
Alguns estudos de mapeamento genético do autismo, quando a
suspeita se concretiza, são feitos com irmãos. Podendo ser gêmeos
39
(monozigóticos (genes idênticos) e dizigóticos) ou com irmãos de crianças com
autismo. Os dados convencem de que o autismo tem um forte componente
genético. Esses estudos que consideram apenas as formas mais graves de
autismo mostram que 60 a 90 % de concordância no autismo quando são gêmeos
monozigóticos e de 10 a 30 % quando são dizigóticos. Quando uma família tem
um filho autista a chance de terem um segundo filho, e se esse bebe for menino é
de 20 % dessa criança ter autismo também. (Kandel, 2014).
Esses estudos em família indicam que o autismo em geral não é
resultado de mutações em um único gene, mas sim a variação de
muitos genes, dando origem a um padrão complexo de herança.
[...] é provável que os genes responsáveis não sejam os mesmos
em todos os indivíduos, mas que diferentes combinações possam
ser extraídas a partir de um conjunto maior de genes que
determinem uma predisposição. (AMARAL 2011 et al 2015, apud
KANDEL, p. 1244).
A propósito as regiões genômicas têm sido incluídas no estudo de
vários cromossomos. Por exemplo: dois casais de irmãos com autismo e
Síndrome de Asperger, as mutações ocorrem em dois genes do cromossomo X.
“Esses genes codificam neuroliginas, proteínas de adesão celular pós-sináptica
importante na formação da sinapse” (AMARAL 2011 et al 2015, apud KANDEL, p.
1244). Essas considerações podem explicar a predominância do autismo em
meninos, pois, trata-se de genes ligados ao cromossomo X.
Na variação sobre a mutação convencional em genes específicos é
relevante o surgimento de um mecanismo genético potencialmente no autismo,
que observado o número de cópias dos genes alega deleções genômicas e
duplicações de porções de um cromossomo que envolve até cem genes
decorrentes. (KANDEL, 2014).
40
[...] 10% dos pacientes com autismo é portador de um número de
cópias que nenhum dos pais possui (uma nova mutação,
portanto). Essas mutações não são causadas por mutações
convencionais comuns de genes específicos, e sim por mutações
esporádicas da estrutura genômica na linha de células
germinativas que dão origem a espermatozoides e óvulos.
(AMARAL 2011 et al 2015, apud KANDEL, p. 1244).
Somando, os fatores ambientais exercem atribuições importantes,
embora os fatores ambientais específicos não tenham sido mencionados de forma
estabelecida. Infecções virais como Rubéola, Sarampo, Gripe, Herpes e
Citomegalovírus, podem influenciar a etiologia do autismo, que podem vir a
caracterizar pistas ambientais. (KANDEL, 2014)
Há evidências substanciais de que mediadores das funções do
sistema imunitário, como citosinas e quimiocinas, também possam
desempenhar um papel importante no desenvolvimento
encefálico, incluindo a sinaptogênese. [...] é provável que múltiplas
etiologias sejam descobertas, algumas puramente genéticas,
outras que dependam de fatores genéticos associados a fatores
ambientais de risco, e algumas somente de causa ambiental.
(AMARAL 2011 et al 2015, apud KANDEL, p. 1244).
2.1.3 Anormalidades Neurológicas e Cognitivas
A hipótese de que o autismo seja um transtorno do
neurodesenvolvimento, quais porções do sistema nervoso seriam mais afetadas?
Ainda não há uma visão universal sobre a neuropatologia do autismo, mas análise
quantitativa mais especifica sinalizaram fortes alterações no tamanho e no curso
temporal da evolução de regiões encefálicas estabelecidas.
A propósito, essas análises foram feitas usando imagem por
ressonância magnética (RM) no inicia dos primeiros estudos na década de 80.
41
Algumas regiões encefálicas como: córtex cerebral, lobo temporal medial,
amígdala, hipocampo e o corpo caloso foram encontrados alterações nos autistas.
Fig. 4 Áreas encefálicas afetadas pelo autismo. Retirada do livro “Princípios de Neurociências”,
FRITH 1996 apud Kandel 2014 p.1245.
Algumas pesquisas sobre alterações microscópicas observaram
defeitos na migração de células para o córtex cerebral, “[...] como as ectopias,
representadas por conjuntos de células presentes na substância branca que não
conseguiram chegar ao córtex cerebral.” (FRITH 1996 et al 2014, apud KANDEL,
p. 1246).
A organização colunar cortical também se apresenta anormal, ou
ainda, alguns estudos post-mortem que encontraram um número menor de
neurônios na amigdala, indicam ser esse um componente real da neuropatologia
do autismo. Há probabilidade de que o autismo possa ter componentes
neurodegenerativo em sua patologia, como disse Kandel (2014) na última edição
do livro Princípios de Neurociências “que esses achados intrigantes necessitam
ainda de confirmação por meio de estudos mais amplos envolvendo estratégias
quantitativas.” (p. 1246).
42
O autista não consegue inferir estados mentais (desejos, intenções,
crenças, conhecimentos) de outros indivíduos, mesmo que essa maneira seja
intuitiva ou automática, pode ser chamado de Cegueira Mental caracterizando a
perda da capacidade de mentalização. Não conseguindo prever ações baseando-
se em situações prévias observadas que acabam prejudicando a comunicação
social.
Essa habilidade da mente parece ter uma base biológica
identificável e depender de um mecanismo encefálico particular.
Além disso, postula-se que esse mecanismo de mentalização
esteja alterado no autismo, com efeitos profundos no
desenvolvimento social. (FRITH 1996 et al 2015, apud KANDEL,
p. 1246).
Em situações que evocam mentalização alguns estudos revelam uma
rede específica de quatro centros encefálicos estão envolvidos, que no autismo,
essa rede apresenta menor ativação e conectividade com anormalidades
encefálicas. Dentre esses componentes as redes são: o córtex pré-frontal medial
(inspeção do próprio pensamento), temporoparietal do lobo temporal superior
(fixação do olhar e movimento biológico), amígdala (informações sociais e não
sociais de perigo) e temporal inferior (leitura de faces).
A cegueira mental acaba atribuindo todos os déficits de comunicação
social e a falta da leitura dos estados mentais de outras pessoas, surgindo daí
uma gama de sintomas comportamentais, anormalidade anatômica ou
neurofisiológica em redes encefálicas distintas.
Assim que os primeiros sinais precoces possam ser observados na
resposta a estímulos sociais e a atenção recíproca, podem ser evidenciados
problemas de diferentes ordens, preferindo sempre prestar atenção em algo que
responde a outros estímulos, sendo assim, é possível ocorrer uma incapacidade
de interagir socialmente. Um estudo recente observou que indivíduos com
43
autismo prendem sua atenção na boca das pessoas ao invés de preferência típica
pelos olhos. (KANDEL, 2015).
[...] pessoas com autismo apresentam percepção atípica
relacionada com movimentos dos olhos, expressões faciais,
gestos corporais e ações. Essas evidências envolvem a região do
sulco temporal superior [...] sistemas encefálicos de atenção
frontal e parietal, os quais facilitam a orientação ao estímulo
social, parecem exercer menos controle descende no autismo.
(FRITH 1996 et al 2015, apud KANDEL, p. 1249).
A falta de flexibilidade do pensamento está relacionada com a falta de
flexibilidade do comportamento. Problemas com planejamento, na organização e
na aceitação de mudanças.
O comportamento repetitivo e inflexível no autismo pode refletir
alterações nas funções executivas do lobo frontal, uma ampla
variedade de processos cognitivos superiores, incluindo a
capacidade de liberar-se de determinada tarefa a fim de inibir
respostas inadequadas, planejar e gerenciar sequências de ações
enquanto realizando tarefas na memória de trabalho, monitorando
a desempenho e desviando a atenção de ima tarefa para outra.
(FRITH 1996 et al 2015, apud KANDEL, p. 1249).
2.2 Neuroplasticidade
Segundo Robert Lent (2015) se define neuroplasticidade “[...] como a
propriedade do sistema nervoso de alterar a sua função ou a sua estrutura em
resposta às influências ambientais que o atingem”. (p.112).
44
As influencias ambientais e as alterações plásticas podem variar de
muito intensas a leves. Lesões traumáticas causadas por cirurgia ou lesões
congênitas no cérebro podem ocasionar mudanças de posição de setores
funcionais, redirecionando os circuitos neuronais; Um simples acontecimento ou
fato novo podem alterar sinapses moleculares, possibilitando memorização do
novo acontecimento ou fato pelo resto da vida. (LENT, 2015).
Também no desenvolvimento embrionário o sistema nervoso é
caracterizado seguindo regras básicas que estão expressas pelo genoma de cada
espécie, ao mesmo tempo passivo a modulações ambientais.
Lent (2015) ainda define a Plasticidade ontogenética como a “interação
entre informações do genoma e as informações do ambiente [...] talvez a fonte
mais importante de variabilidade individual nos animais, extremamente
significativa para espécie humana.” (p.112).
Além disso, a fase de maior capacidade para receber estímulos do
ambiente que descreve o sistema nervoso imaturo é chamada de período crítico,
mas para algumas condutas que são inatas o período crítico não existe. Pode-se
usar como exemplo o comportamento exibido pelos filhotes de aves no momento
do nascimento quando quebram a casca do ovo. Apresentando curtos períodos
críticos, que se estabilizam rapidamente igual aos circuitos neurais subjacentes.
Isso também ocorre com o fenômeno que foi descoberto pelo etologista suíço
Konrad Lorenz (1903-1989) chamado Imprinting “[...] pelo qual os filhotes das
aves reconhecem como sua “mãe” o primeiro “objeto” móvel de grande porte que
percebem ao eclodir.” (LENT, 2015 p. 112). Um exemplo de períodos críticos mais
prolongados é citado a aquisição da linguagem nos seres humanos, que se
estende até a adolescência. (LENT, 2015).
A plasticidade adulta é diferente da plasticidade ontogênica, pois
tem um caráter mais celular e molecular, incidindo sobre a
sinapse, região em que ocorrem a transmissão e o processamento
das informações com que o sistema nervoso lida a todo o
45
momento, codificadas em impulsos nervosos. A plasticidade
sináptica é a base da memória e, portanto, da capacidade
cognitiva que os cérebros propiciam.” (LENT, 2015 p. 112, 113).
Fig. 5 Foto do etologista Konrad Lorenz seguido por gansos que o “reconhecem” como “mãe”. (Foto de H. Kacher, reproduzida de Purves et al, [2004]. Neuroscience, 3ª ed., p.558. Sunderland, EUA: Sinauer Associates apud LENT, 2015, p.112)
Conforme Lent (2010) existem três formas em que a neuroplasticidade
se manifesta: morfológica (nas alterações do axônio, dendritos e nas sinapses),
funcional (nas alterações na fisiologia neuronal e sináptica), comportamental (nas
alterações relacionadas com os fenômenos de aprendizagem e memória).
2.2.1 Regeneração do Sistema Nervoso
No sistema embrionário as fases iniciais caracterizam-se por uma forte
proliferação de precursores neuronais e glias que progressivamente vão formando
as diferentes áreas do sistema nervoso central dentro do útero, sendo controlado
pelo genoma. “[...] assim, a neurogênese ontogenética representa um mecanismo
do desenvolvimento, mas não uma forma de neuroplasticidade.” (LENT, 2015. p.
114).
46
A Neurogênese é a sucessão de etapas que dão origem a mitose da
célula mãe produzindo duas células filhas, exercício do ciclo total pela célula
nervosa.
Logo após o nascimento a neurogênese embrionária estende-se em
algumas regiões durante a vida adulta: no giro denteado do hipocampo, na zona
subependimária e no hipotálamo.
Em cada sistema no organismo humano funciona de forma diferente
para regenerar regiões que sofrem lesões, traumatismos ou cirurgias. No SNP
quando uma fibra nervosa periférica é seccionada em muito pouco tempo ela
volta acrescer e reconstrói o circuito interrompido. Ela possui uma capacidade
plástica que faz a verdadeira regeneração. Exemplificando podemos citar cortes
superficiais e hematomas.
Já no SNC trabalha com um sistema de regeneração diferente do
SNP, o estímulo é enviado para reativar a expressão gênica, mas não são
encontradas condições favoráveis para o descolamento dos procedimentos de
regeneração, ocorrendo uma gliose reativa (cicatriz, queloides, etc.) que são
moléculas que inibem o desenvolvimento do prolongamento neural bloqueando
a regeneração. Exemplificando podemos citar as lesões dos axônios centrais
como o nervo óptico, lesão no feixe piramidal. (LENT, 2015).
2.2.2– Neuroplasticidade Morfológica
Lent (2015) separa a neuroplasticidade morfológica:
• Plasticidade Axônica: é a forma com que o sistema nervoso
(axônio) usa para aprimorar os circuitos neurais conforme os estímulos
ambientais. Exemplo: Disgenesias do corpo caloso;
• Plasticidade Dendrítica: durante a fase ontogenética de
diferenciação, por conseguinte a migração neuronal. Nessa etapa em resposta
47
aos estímulos ambientais os dendritos são mais suscetíveis a modificações,
sendo fixada durante o desenvolvimento. Então, uma vez acabada, aceita pouca
influência do ambiente, e quando aceita é especificadamente nas ramificações
mais finas e terminais;
• Plasticidade Espinhas dendríticas: são pequenas protrusões
instáveis e móveis que nascem dos troncos dendríticos, formadas por um talo
fino com extremidades esferoides, refletindo assim na plasticidade sináptica por
meio de sinapses assimétricas (estimulatórias).
2.2.3– Neuroplasticidade Funcional
A neuroplasticidade funcional é marcada por vários fenômenos
plásticos que se diferenciam principalmente pelo momento inicial do estímulo
externo. Alguns estudos indicam que é na neuroplasticidade ontogenética que
ocorre a distribuição, aumento e alta atividade nos hemisférios específicos,
principalmente quando a aprendizagem ocorre precocemente na primeira
infância.
A aprendizagem de instrumentos musicais na infância que envolve
áreas corticais motoras, somestésicas e auditivas, e que acabam se
desenvolvendo, possibilitando, assim, uma maior ativação de neurônios, do que
nas pessoas adultas que nunca tocaram nenhum instrumento.
Há diferentes formas em que o cérebro se desenvolve em indivíduos
cegos precoces ou congênitos e cegos tardios. Nos cegos congênitos
apresentam envolvimento de áreas que indica uma remodelação das regiões
associativas de processamento mais elaborado fazendo com que o córtex visual
adquira novas funções de processamento da informação tátil.
A Síndrome do membro fantasma ocorre que, mesmo perdendo os
membros continuam por um tempo sentido os movimentos e dor no local
48
especifica a partir de determinadas ações. O cientista indiano Ramachandran
confirmando com experimentos em animais confirma que isso ocorre pela
Plasticidade Funcional. (LENT, 2015).
[...] a neuroplasticidade não é necessariamente uma propriedade
de natureza “compensatória”, ou seja, que resulta em benefício
do paciente pelo alívio de sintomas. Ao contrário, nessas
situações a plasticidade é maladaptativa, ou seja, resulta ela
própria em sintomas. (LENT, 2015 p. 125).
Além disso, beneficiando mais crianças e jovens do que adultos a
plasticidade compensatória é maior e consegue restaurar apenas parte das
funções perdidas por uma lesão central. “[...] ocorrendo um processo
ontogenético substitutivo em que a lateralidade funciona, por exemplo, ainda
indefinida em indivíduos jovens [...]” (LENT, 2015 p. 126).
2.2.4 Plasticidade da Sinapse
Em forma de potencial de ação as informações percorrem o sistema
nervoso. A força e quantidade de estímulos nos olhos (luminosos), orelha
(sonoros), pele e órgãos (mecânicos, térmicos e químicos) e estímulos químicos
nas papilas gustativas e mucosas olfatórias. “Quanto maior a intensidade, maior
a frequência dos potenciais de ação que percorrem os nervos correspondentes
em direção ao Sistema Nervoso Central”. (LENT, 2015 p. 126). Essa
plasticidade sináptica é a forma mais existente no cérebro adulto que é
decorrente das capacidades sensacionais que o nosso cérebro tem.
Roberto Lent descreve em seu livro “Neurociências da Mente e do
Comportamento” sobre os estímulos ambientais:
Ao chegar às sinapses centrais, entretanto, essa
informação codificada não passa intacta para os neurônios
seguintes: é processada, ou seja, modificada de acordo com
49
outras informações que estejam chegando simultaneamente a
esses neurônios, provenientes de regiões ligadas à percepção, à
atenção, à cognição, à emoção e a muitas outras funções. (Lent,
2015 p. 126).
Também esses estímulos externos quando entram são dirigidos a
distintas regiões do sistema nervoso e, em cada uma delas ocorre uma
adaptação com utilidade especifica.
Assim quando armazenamento nos caminhos sinápticos parte
dessa informação se torna múltipla durante esse processo, se transformando em
memória. Ainda podemos citar outras formar de plasticidade sináptica:
habituação (comportamento) e a sensibilização (estímulos). (LENT, 2015).
50
CAPÍTULO III
O TRABALHO EMPÍRICO: CONDIÇÕES DA INCLUSÃO E
ADPTAÇÃO EM UMA ESCOLA PARTICULAR DO RIO DE
JANEIRO
Neste capítulo serão apresentadas as características da escola
particular onde foi realizada a pesquisa de campo, descrevendo abordagens e
procedimentos usados para a adaptação, estímulos em geral, socialização e
inclusão. E em vista a política de inclusão e como ela está se concretizando
nessa instituição escolar.
A escolha em realizar a pesquisa de campo nesta instituição particular
de educação infantil, se deu pelo fato de ser o local de trabalho da observadora,
de 2012 a 2015, na função de professora mediadora na parte da manhã e
professora regente na parte da tarde. Porém houve um grande interesse em
pesquisar sobre a adaptação, desenvolvimento da aprendizagem e inclusão de
um aluno com TEA de diagnóstico fechado, precocemente aos dois anos de
idade, e também de alguma forma mostrar a importância do diagnóstico e
estimulo precoce em conjunto (casa, escola, equipe médica e terapêutica).
3.1 Delineamento do trabalho empírico
Com formação em pedagogia com interesse grande em inclusão de
crianças com autismo em escola regular, inúmeros cursos, jornadas e congressos
sobre o assunto, com abordagens neuropsicológicas e sobre o método ABA,
foram frequentados. Sendo assim como professora inclusiva pode-se saber
exatamente como lidar com os alunos atípicos que recebemos. E foi baseado em
curiosidade e com toda essa informação que surgiu o interesse em neurociência
51
pedagógica para entender os caminhos que percorrem a aprendizagem,
principalmente com alunos atípicos.
Esse trabalho foi realizado com base em uma pesquisa qualitativa. O
pesquisador em tal pesquisa tem uma aproximação direta com os sujeitos e o
objetivo de sua pesquisa, permitindo-se um estudo pormenorizado das
observações ao mesmo tempo da intervenção. A pesquisa qualitativa é uma
atividade centrada onde no processo o pesquisador se encontra no universo do
sua rotina de trabalho diário. Que confere visibilidade ao mundo em uma cadeia
de aspectos, incluindo suas impressões diárias sobre a evolução e os retrocessos
do aluno. Levando em consideração que não foi utilizado nenhum método
especifico nos momentos de inclusão e adaptação do mesmo.
Existem vários tipos de abordagem qualitativa para se realizar uma
pesquisa. O que foi utilizado nesta investigação foi o estudo de caso. O estudo de
caso é um nível de investigação que engloba o estudo ativo e planejado de uma
instituição bem definida; é uma metodologia de observação intensa e que, em
regra se prolonga no tempo.
O estudo de caso se caracteriza como um tipo de
pesquisa cujo objetivo é uma unidade que se analise
profundamente. Visa ao exame detalhado de um ambiente de um
simples sujeito ou de uma situação particular. (GODOY, 1995
p.06).
O estudo de caso é um procedimento técnico, metodológico e
epistemológico o qual possibilita fazer uma reflexão a respeito das questões
investigadas nesta pesquisa.
3.2 Caracterização dos elementos da pesquisa
A observação é um dos instrumentos utilizados em que tem como
abordagem o estudo de caso de cunho qualitativo. Tal técnica de coleta de dados
52
é utilizada para conseguir informações e, além disso. Utiliza os sentidos na
obtenção de determinado aspecto da realidade. A participação se constituiu na
intervenção do comportamento atípico.
A observação tem um papel essencial no estudo de caso. Quando
observamos, estamos procurando apreender aparências, eventos
e/ou comportamentos. A observação pode ter caráter participante
ou não participante. (GODOY, 1995 p. 08).
A observação, a conversa informal com a mãe e os registros diários
das informações foram as formas utilizadas para a obtenção da concepção total
do contexto pesquisado, além disso, buscar apreender o mesmo teor: descrever e
analisar a importância da inclusão em escola regular de aluno com TEA, a
necessidade da conscientização dos pais para com o comportamento atípico de
seus filhos, o diagnóstico precoce para fazer as atuações necessárias e a prática
da escola em relação à inclusão de alunos com deficiência intelectual.
Como instrumento de coleta de dados, foram realizados dois
procedimentos: observação do comportamento social e intervenção a
comportamentos atípicos.
A observação foi realizada nos espaços lúdicos da escola e em sala de
aula regular de uma turma de maternal ou berçário de dois anos.
Como em qualquer outra escola de educação infantil logo que se
recebe um aluno novo típico, a família e o aluno passam por um processo de
adaptação que é seguido de horário especifico na companhia da mãe. Com o
passar dos dias, as horas vão aumentando e a presença da mãe e retirada aos
poucos.
A observação foi iniciada logo no primeiro dia letivo de 2015 e se
estendeu até 31 de outubro de 2015. O processo foi divido em: adaptação,
53
apresentação, inclusão e socialização, na parte da manhã das 8 horas as 11h30
minutos todos os dias.
3.3 O local
A escola em que aconteceu o estudo de caso é particular, fundada em
1980, fica situada em um bairro de classe alta na zona sul do Rio de Janeiro. A
maioria dos alunos é oriunda do mesmo bairro e mesma classe social. A
instituição é caracterizada como inclusiva, pois atende alunos com necessidades
especiais, embora não conte com adaptações físicas ou pedagógicas para tal.
Atualmente, nesta unidade a escola dispõem somente de educação infantil, do
maternal 1 (1 ano e meio) ao Pré 2 (5 anos completos) com a opção de horário
estendido. O nome do colégio não será revelado, assim como o verdadeiro nome
do aluno com TEA, por uma questão de ética e preservação da privacidade e
identidade das pessoas envolvidas na pesquisa.
Algumas reformas foram realizadas para adequar a casa onde se
localiza a escola, o espaço foi moderadamente ampliado, mas ainda é restrito.
Possui dois pátios, um com adaptações de segurança para bebes com um tanque
pequeno de areia e outro maior com brinquedos para a faixa etária. No andar de
baixo possui 4 salas, incluindo a sala de artes. No andar de cima seis salas, um
banheiro (não adaptado) e a sala da direção. O andar de baixo é ligado por uma
escada (não adaptadas).
Em relação aos números de alunos a escola possui aproximadamente
250 alunos nos dois turnos (educação infantil).
A linha filosófica do colégio desempenha-se no movimento educacional
denominado Escola Nova surgiu no início do século, em consequência da
democratização e universalização do ensino, assim como do desenvolvimento
das ciências auxiliares. Em sua fundamentação dois pontos se fazem ressaltar: a
54
preparação do homem para a indagação e resolução de seus problemas e uma
nova visão de como a criança aprende-agindo, experimentando e vivenciando.
A proposta pedagógica da escola visa colocar-se um professor como
agente facilitador do desenvolvimento global da criança, buscando proporcionar-
lhe estímulo adequado a um crescimento intelectual, motor e afetivo harmonioso.
Para isso, pretende mobilizar recursos e materiais que permitam à criança ampliar
seu mundo de experiências com seu corpo, objetos e pessoas, e se desenvolver
como cidadão atuante na sociedade.
Os objetivos institucionais da escola perante a proposta pedagógica
são: proporcionar estímulos adequados para o crescimento harmonioso, afetivo e
intelectual do aluno. Mobilizar recursos e materiais que possibilitem a criança
ampliar seu mundo (corpo, espaço e o outro) para a vida como um ser social.
Os aspectos epistemológicos da escola são caracterizados pela visão
da criança como ser diferente do adulto, surgindo daí a compreensão das
possibilidades e interesses diferentes de cada faixa etária, assim como da
importância da atividade da criança, como meio básico da aprendizagem.
Buscando atingir seus objetivos educacionais utilizando recursos que refletem o
momento pedagógico atual, mas incorporar a eles as contribuições que se
mostravam válidas no tempo.
Em relação aos fundamentos pedagógicos a proposta da escola
procura dar condições para que o conhecimento se desenvolva através de
situações reais e concretas, e que a curiosidade se amplie pela oportunidade de
estar com o objeto de estudo, de observá-lo, compará-lo e utilizá-lo criativamente.
Os educadores desta instituição conforme designa a proposta
pedagógica devem perceber que os alunos têm capacidades, interesses e
motivações diferentes, onde os mesmos devem interagir com os educandos numa
comunicação autêntica; acolher cada aluno em sua diversidade; acompanhar
55
cada um no seu processo de maturação como pessoa e ajudá-lo a ser uma
pessoa feliz, realizada.
Como essa pesquisa é centrada na educação infantil,
especificadamente, maternal II, é possível destacar os princípios que a escola
investiga, valoriza e executa. A educação infantil dá ênfase ás situações de jogo
individual e grupal, pois acredita que o brincar favorece o enriquecimento da
personalidade no plano motor, afetivo e social. Brincando a criança tem
oportunidade de estar em contato com o outro, descobrindo-o como fonte de
colaboração e prazer, mas também como aquele que vai impor a percepção de
seus próprios limites.
Na proposta pedagógica da escola não há modificações que dizem
respeito à educação especial e inclusão de alunos com deficiência, porém, a
instituição em seu regimento enfatiza como concebe a educação especial. O
regimento escolar é um documento administrativo e normativo, registrado em
cartório e fundamenta nos propósitos, princípios e diretrizes definidas na proposta
pedagógica da escola, na legislação geral do país e, especificadamente, na
legislação educacional.
No espaço físico da escola não existem adaptações para os alunos
com deficiência física precisando ainda de adequação para beneficiar os
cadeirantes e alunos com algumas limitações. No momento não possui nenhum
aluno com esses tipos de deficiência.
3.4 Participantes
Os participantes foram as duas professoras da sala 2 (professora
regente e auxiliar) e a autora desta monografia como professora mediadora. A
coordenação e a direção não concordaram em participar da pesquisa por não
entenderem a neurociências como parte dos procedimentos educacionais e rotina
diária de sala de aula.
56
O participante sobre o qual a pesquisa foi realizada, o aluno com TEA.
Será tratado como João, um nome fictício.
João tem dois anos e dois meses de idade, foi matriculado no maternal
II no turno da manhã. Entrou na escola pesquisada no início do ano letivo de
2015.
A família de João é formada por seu pai e sua mãe. Avós e tios fazem
visitas esporádicas. João foi uma criança muito desejada por seus pais, que o
tiveram (ambos) já depois dos 40 anos. Sua mãe é dona de casa e seu pai,
engenheiro.
Na maioria dos casos de TEA diagnosticados podemos observar que:
[...] produzidos por mutações no material genético por meio de
muitas gerações e muitas vezes têm de resultar da combinação
de genes recessivos de ambos os pais. A estas condições
genéticas próprias, agregam-se os efeitos do ambiente, seja
durante a gravidez (como proteção e cuidado, ou com traumas ou
hábitos nocivos como tabagismo, álcool ou drogas), a nutrição
essencial para o desenvolvimento corporal (aportes necessários
de vitaminas, minerais, gorduras e proteínas ou uma ruim
alimentação) e a estimulação geral (afetividade, linguagem,
desafios cognitivos ou abandono e negligencia no cuidado
infantil). Qualquer elemento nocivo ou trauma (vírus, tóxicos,
acidentes) durante a gravidez ou nos primeiros anos pode
ocasionar danos importantes e até irreversíveis no aspecto
biológico que vão dificultar ou impedir um desenvolvimento
adequado ou na forma que se espera. (CANCINO, 2013 p. 135-
136).
No momento, da matrícula a escola não fora informada sobre sua
condição, que muito intrigou quando adaptação começou. Quando alguma
57
aproximação era ensaiada para se tentar determinada abordagem, ele se
escondia atrás da mãe ou pedia colo e de lá não saia mais. Nos primeiros dias, foi
quase impossível que João se afastasse de sua mãe. A agressividade (em alguns
momentos agredia a mãe com o que estivesse nas mãos) e a “birra” / teimosia
eram constantes.
[...] outras que fazem birras monumentais diante das mínimas
dificuldades, agredindo e destruindo as coisas ou se batendo de
modo brutal, causando ansiedade e dor no grupo familiar que não
consegue compreender o motivo da conduta nem a forma de
controlá-la ou de como reagir. (CANCINO, 2015 p.127)
Houve necessidade de conversar sobre algumas questões com a mãe.
Mas por ética a coordenação resolveu tomar essa abordagem, limitando a
comunicação entre a mãe e as professoras.
Então em algumas conversas informais sobre João com sua mãe e a
babá aconteceram, a mãe relatou sobre o seu primeiro ano de vida e quando as
desconfianças começaram a bater na porta.
[...] o mais comum é que um transtorno como o TEA (que não
apresenta sinais físicos evidentes) seja diagnosticado o mais cedo
entre os 18 e os 24 meses de idade, quando se espera que as
crianças desenvolvam as condutas comunicativas mais evidentes
intencionais de pedir, apontar e compartilhar atividades e
emoções, mesmo que não falem palavra alguma. (CANCINO,
2015 p. 131)
Por volta de um ano, João começou a falar algumas palavras e de uma
hora para outra parou. Passava o dia todo na companhia de sua mãe (uma
pessoa pacata, muito educada e bem passiva) sem algum estimulo ou companhia
de outras crianças. Notaram que algo não se desenvolvia normalmente quando as
58
fala retrocedeu, as crises de choro aumentaram, sair com ele de casa estava se
tornando tarefa impossível. Então eles procuraram uma equipe (neuropediatra,
neuropsiquiatria, psicólogo) que logo baseado em vários exames de imagem,
escalas e questionários (ADI-R, CARS, ABC ou ICA, ASQ ou SCQ, ADOS, PEP-R
e M-CHAT), perto dos 24 meses diagnosticou-o com Transtorno do Espectro
Autista, nível sete (leve a moderado) com fortes chances de diminuir os
espectros, sendo aconselhado imediatamente que João fosse matriculado a uma
escola de educação infantil.
Nos relatórios das famílias de crianças com TEA, encontramos
mostras precoces de rigidez comportamental já nesta etapa.
Aparecem as estereotipias que podem passar inadvertidas ao se
apresentarem em conjuntos com birras ou sustos de risadas.
Também aparece a recuso de qualquer mudança no ambiente
físico, social ou das rotinas. Muitos casos começam a mostrar
fobia a certos estímulos (sons, roupas, comidas) ou preferencias
excessivas por outros (escutar uma música o dia inteiro, botar
somente uma roupa ou comer um tipo de comida). (CANCINO,
2015 p.130)
Durantes os meses que se seguiram todas as práticas que foram
testadas, umas incorporadas e outras abandonadas, eram passadas para os pais
e, que aconselhados pela Terapeuta Ocupacional, executassem as mesmas
atividades comportamentais e de estimulo constantes, extraclasse e consultório.
3.4.1 João e suas particularidades
Em suas primeiras semanas pode-se observar que João retribuía
olhares, mas sempre que estimulado a fazer algo que estava fora de sua rotina
ele respondia com gritos e choros.
59
Na companhia de sua mãe se afastava um pouco mais a cada dia para
explorar os espaços em que sua turma ocupava. Fizemos algumas tentativas de
tirar a mãe como de costume na adaptação de novos alunos e sempre ele reagia
com choro compulsivo e muita agressividade. Quando sua mãe retornava,
demonstrava descontentamento agredindo-a com o que estivesse nas mãos,
como se quisesse puni-la por ter o deixado.
Sua comunicação era bem restrita, praticamente podemos resumir a
gritos, choros e agressões.
Para os dois anos, somado aos atrasos nas áreas da
motricidade, da comunicação e da interação social e lúdica,
é mais difícil se comunicar com essas crianças e controlar o
seu comportamento ansioso, temeroso ou de raiva e
agressão. (CANCINO, 2015 p. 133).
Durante o primeiro mês João explorou todos os ambientes em que era
colocado. De longe sempre observava se a mãe continuava por perto, usava o
olhar de canto de olho na maioria das vezes. Aos poucos aumentava a distância.
Foi constatado que ele fazia estimulação visual com a sombra de seu
reflexo nas paredes e a sombra que fazia entre a grade de segurança do
parquinho dos bebes. Este espectro era contido com o desvio da atenção para
outra coisa que a turma estivesse fazendo no momento.
Após um mês de muitas tentativas de tira-lo da mãe todas foram
fracassadas. Em conversa com as professoras da sala, resolveu-se questionar se
haveria alguém a mais que pudesse trazê-lo a escola. Então, a partir do dia
seguinte, até os últimos dias da observação, a empregada da casa de João se
encarregou de levá-lo e a mãe de buscá-lo.
60
Ocorrendo essa troca, acabou o processo de adaptação e foi iniciado
um longo caminho de experimentação e estímulos sensoriais (visão, audição,
tato).
Participando de interações simples e básicas, possibilitamos o
desenvolvimento cognitivo a partir da estimulação da atenção, da
memória, da percepção e da motivação. Todos esses processos
desenvolvem-se em resposta às atividades em que são
requeridas e com apoio do adulto que controla o espaço e o ritmo
de interação, faz a escolha dos materiais e modela as ações ao
alcance de cada criança. (CANCINO, 2013 p. 152).
A escola possui um espaço lúdico com aulas dinâmicas e estimulantes.
João foi se soltando e aos poucos participando das atividades. Já estava
familiarizado com a escola. Seus espaços e brincadeiras preferidas foram se
delimitando, e aos poucos, dentro de suas limitações de comunicação, se abrindo
para o mundo que lhe foi apresentado.
Detectar qualquer alteração comportamental precoce, antes dos três
anos de idade, é imprescindível para melhorar o prognóstico e as possibilidades
de sucesso da estimulação, principalmente no controle do impacto das mudanças
(conduta e metabolismo) e no apoio no desenvolvimento particular de cada
criança assistida. (CANCINO, 2013).
Hoje sabemos que o sistema nervoso é muito plástico e possível
de ser modificado por meio da interação com o meio ambiente,
mesmo em presença de transtornos importantes. Apesar de existir
limites para o que cada organismo pode fazer e aprender, um
começo e uma variedade de estímulos e desafios permitem
61
aperfeiçoar as possibilidades para desenvolver o real potencial de
cada indivíduo. (CANCINO, 2013 p. 134).
Aos poucos foi desenvolvendo a atuação compartilhada. Estimulado
pelas outras crianças ao seu redor, por meio da observação, começou a copiar as
ações de outras crianças, como subir e balançar no cavalinho do pátio.
Subir no escorrega foi uma vitória a parte. O escorrega do pátio é
dentro do tanque de areia, o que ocasionou uma vitória a cada dia, pois João
inicialmente não gostava de ficar descalço e ser estimulado nos pés. Primeiro
ficou descalço, depois pisou na areia, e depois de observar os amigos que subiam
e desciam conseguiu sozinho subir e descer.
A coordenação motora de João é relativamente boa, o possibilitava
observar e executar. Ele corria normalmente e pulava de degraus, ação que
também aprendeu observando os outros alunos.
A plasticidade não significa que cada sujeito vai ser normalizado
porque depende do potencial genético de cada caso, mas sempre
implica a possibilidade de obter melhora no comportamento, na
comunicação ou na cognição. (CANCINO, 2013 p.134)
Com muito estimulo intencionado, aos poucos foi aceitando usar
materiais que nunca antes havia usado como: tinta guache (só com pincéis, não
aceitava pintar com dedos ou as mãos) e giz de cera.
Ao final de todos esses meses juntos João falou suas primeiras
palavras intencionadas, sabia identificar os amigos apontando quando era
verbalizado o nome de algum específico. Tocava e se deixava tocar pelas
professoras. Cantava a sua maneira as canções da rotina diária da sala e das
aulas de música. Sabia exatamente a hora de ir embora, se despedia de todos e
recebia a sua mãe com muita felicidade.
62
Ao longo dos meses João sofreu muito com uma alergia respiratória
constante. Tinha febres e muco. Passava uma semana inteira sem ir à aula, mas
nunca retrocedia. Sua alimentação era muito restrita, nunca aceitava alimentos
diferentes.
É muito importante considerar a atender a qualquer mudança no
comportamento associada com mudanças de alimentação,
infecções respiratórias [...] já que há relatos de eventos que
ativam doenças metabólicas (como o caso da fenilcetonuria que
consiste em uma falta de processamento da fenilanamina e
começa a aparecer os sintomas quando as crianças incorporam
esse aminoácido na dieta) e alterações comportamentais quando
muda a dieta de algumas crianças. (CANCINO, 2013 p. 130).
As “birras” / mal comportamento se tornaram quase inexistentes e
aconteciam ocasionalmente. No início, quando ele era contrariado chorava muito
e em algumas vezes chegou a se auto agredir batendo com a cabeça de costas
no chão. Quando isso ocorria ele era acalmado com muito carinho e colo. Em
outros momentos, quando era guardado o carrinho, ocorriam birras, mas em sua
maioria, era um comportamento típico, e se agia com ele igualmente, pois na
inclusão João era tratado como todas as crianças, tendo que respeitar horários e
combinados de sala.
Cancino (2013) afirma que as crianças com TEA “apresentam as
mesmas tendências de ficar frustradas que as crianças normais, todavia fazem de
um jeito mais espetacular que causa muita impressão nos pais e adultos que
observam tais comportamentos aparentemente incompreensíveis.” (p. 212).
Podendo citar alguns motivos que possivelmente desencadeiam esses
comportamentos: algum objeto de seu interesse que não encontra (caso do João);
frustração de não conseguir se comunicar para dizer algo que quer; requerer
atenção de alguém específico (caso do João); receio a estímulos desagradáveis
ocasionando medo; sobrecarga de estímulos (barulho, luzes, pessoas, objetos);
63
fadiga causada por exaustão; aversão a alguns alimentos, atividades, materiais
(caso do João);
Para desenvolver a comunicação foi trabalhada a atuação
compartilhada que nada mais é do que “a capacidade de fazer coisas simples,
com objetos conhecidos, em um espaço limitado, com outra pessoa, por um
período determinado de tempo” (CANCINO, 2013 p.162) obedecendo a
combinados pré-determinados pela professora da sala em conjunto com todos da
turma.
Cancino (2013) sugere que podemos separe-las em:
• Formatos de ação: esse formato possibilita evidenciar a atenção
nos objetos, nos seus movimentos que irão criar uma memória de atuações
compartilhadas, sons, palavras ouvidas e a mediação da manipulação de objetos.
Sendo assim um elemento substancial da comunicação entre o adulto e a criança;
• Intenção comunicativa: motivação de realizar atividades com
outras pessoas e tentar reter atenção dos outros para ganhar o que se quer ou
precisa. Sendo assim estabelecem o arquivamento dos resultados de sua atitude
comunicativa, desfrutando assim de contato físico, beijos, manifestações afetivas;
• Princípio de flexibilidade: quando a criança aprende a realizar uma
mesma atividade com diferentes objetos e usar um mesmo objeto de diversas
formas, quando ela também aprende a entregar generalizando, independente de
que objeto está sendo pedido.
Acolhido por um ambiente comunicativo, João desenvolveu uma
compreensão do resultado social das suas ações comunicativas e também novas
e mais complexas intenções. Já não somente pedia, mas também mostrava
objetos para que as pessoas olhassem e começava a vocalizar apontando o que
era de seu interesse.
64
Oito meses depois, logo após uma consulta com a equipe medica que
o acompanha, foi atestada sua evolução. Do nível 7 havia caído para o nível 1, e
que com muito estímulo ele poderia vir a se desenvolver normalmente.
Foi realizada uma reunião dos pais com a coordenação e resolveram
retirar a mediação.
65
CONCLUSÃO
Ter interesse pelo estudo de uma área consideravelmente complexa
como a Neurociência é um caminho sem volta. Se especializar sobre o
funcionamento do cérebro é um conhecimento que todos profissionais que lidam
com ensino e aprendizagem deveriam se interessar.
Continuar investindo em conhecimento é de responsabilidade de
qualquer pessoa que opte por seguir o caminho da educação. Como é de
responsabilidade do professor e de extrema urgência que ele saiba exatamente
como funcionam os caminhos neurais da aprendizagem e memória e
principalmente todos os mecanismos especialistas que estão envolvidos.
Quando se recebe um aluno atípico com limitações e necessidades
especiais, saber como proceder com as rotinas que serão instaladas, é muito
importantes para a contribuição. Tem-se observado nas escolas que maioria das
pessoas responsáveis por auxiliar nas rotinas diárias desses alunos, normalmente
não fazem a menor ideia do que é necessário ser feito.
Existe também um segundo plano que ocorre fora dos limites da
escola, no meio sociocultural que essa criança está inserida: os pais,
desinformados sobre os reais sintomas, causas, limitações e necessidades
especiais, um mundo totalmente despreparado para lidar com as dificuldades e
aceitar as deficiências.
Mas na grande maioria dos casos, encontra-se muito preconceito, falta
de aceitação. Em um momento crucial, onde tentar criar pontes ou uma conexão
com o mundo das crianças com TEA é de extrema necessidade.
Estudos dizem que quanto mais cedo essas crianças receberem os
estímulos meticulosamente necessários e planejados, poderão vir a melhorar
muito a qualidade de vida social.
66
E como é importante tecer em torno dessa criança um mundo de
possibilidades a serem alcançadas. Que elas terão um ritmo particular para
aprender e avançar a cada etapa vencida.
O que essa pesquisa quis evidenciar baseada na literatura atual, foi a
importância do diagnóstico e a intervenção precoce; Professores e coordenadores
informados para poderem de uma maneira responsável, contribuir. O trabalho de
uma equipe médica e terapêutica que falem a mesma língua e se engajem com o
mesmo objetivo, é essencial para que haja progressão.
A proposta foi mostrar o quanto é importante incluir o estudo sobre os
aspectos neuropsicológicos e neurofisiológicos nos cursos de pedagogia,
mostrando quais os caminhos para chegar à educação de qualidade para todos
os educandos, principalmente, os com necessidades especiais, deficiências
intelectuais, dificuldades de aprendizagem, tempo diferente de aprendizagem,
distúrbios de linguagem e leitura.
67
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https://www.youtube.com/watch?v=PKhS4WlG234 03/09
72
INDICE
FOLHA DE ROSTO 01 AGRADECIMENTOS 03 DEDICATÓRIA 04 RESUMO 05 METODOLOGIA 07 SUMÁRIO 08 INTRODUÇÃO 09
CAPÍTULO I - ABORDANDO IMPORTANTES FUNÇOES DO CÉREBRO 11
1.1 A COMUNICAÇÃO E A LINGUAGEM 15
1.2 OS SENTIDOS DO CORPO E A PERCEPÇÃO 18
1.2.1 SISTEMA SOMESTÉSICO 18
1.2.2 OS SENTIDOS ESPECIAIS E OS SENTIDOS QUÍMICOS 20
1.2.2.1 SISTEMA AUDITIVO 22
1.2.2.2 SISTEMA VISUAL 24
1.2.2.3 SISTEMA OLFATÓRIO 26
1.2.2.4 SISTEMA GUSTATÓRIO 28
1.3 APRENDIZAGEM E A MEMÓRIA 30
CAPÍTULO II - TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) E A NEUROPLASTICIDADE 34
2.1 TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA 34
2.1.1 COMPORTAMENTOS CARACTERÍSTICOS 36
2.1.2 COMPONENTES GENÉTICOS
2.1.3 ARNOMALIDADES NEUROLÓGICAS E COGNITIVAS 38
2.2 NEUROPLASTICIDADE 43
2.2.1 REGENERAÇÃO DO SISTEMA NERVOSO 45
2.2.2 NEUROPLASTICIDADE MORFOLÓGICA 46
2.2.3 NEUROPLASTICIDADE FUNCIONAL 47
2.2.4 PLASTICIDADE DA SINÁPSE 48
73
CAPÍTULO III – O TRABALHO EMPÍRICO: CONDIÇÕES DA INCLUSÃO E ADAPTAÇÃO EM UMA ESCOLA PARTICULAR DO RIO DE JANEIRO 50
3.1 DELINEAMENTO DO TRABALHO EMPÍRICO 50
3.2 CARACTERIZAÇÃO DOS ELEMENTOS DE PESQUISA 51
3.3 O LOCAL 52
3.4 PARTICIPANTES 55
3.4.1 JOÃO E SUAS PARTICULARIEDADES 58
CONCLUSÃO 65 BIBLIOGRAFIA 67 WEBGRAFIA 70 ÍNDICE 72 ÍNDICE DE FIGURAS 74
74
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1 – Divisão de comportamentos humanos por regiões cerebrais 12
Figura 2 – Mapeamento de funções mentais no cérebro 15
Figura 3 – Homúnculo 20
Figura 4 – Áreas encefálicas afetadas pelo autismo 41
Figura 5 - Foto de H. Kacher 45