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UNIDADE 3: CINÉTICA DE REAÇÕES CATALISADAS POR ENZIMAS 3.1 Cinética enzimática Nas unidades anteriores aprendemos que a célula está constituída de centenas de compostos químicos. Para entender melhor a complexidade das transformações químicas que acontecem nos seres vivos é imprescindível conhecer a essência do processo catalítico altamente específico, controlado e eficiente que se desenvolve a temperaturas amenas nas células. Nesta unidade serão estudados os princípios catalíticos básicos que regem as reações químicas nas células. 3.2 As enzimas como catalisadores De um modo geral, enzimas são definidas como sendo estruturas protéicas, formadas por seqüências de aminoácidos e que têm a função de catalisar reações bioquímicas. O aprofundamento no estudo de enzimas ocorreu em 1897 quando, pela primeira vez, Büchner extraiu enzimas ativas de células vivas. Seu trabalho proporcionou duas grandes contribuições: 1. Mostrou que a catálise por meio de organismos vivos poderia funcionar independentemente de qualquer processo vivo; 2. Iniciou esforços em isolar e purificar enzimas individuais. O número de enzimas conhecidas tem aumentado rapidamente nos últimos 100 anos e, atualmente, o total excede 2.000. Muitas enzimas novas ainda serão identificadas e caracterizadas no futuro. Na maioria dos casos, a nomenclatura enzimática é feita adicionando-se o sufixo -ase ao nome do substrato, por exemplo, urease é a enzima que catalisa a decomposição da uréia. No entanto, existem exceções a esta nomenclatura, como as enzimas pepsina e tripsina presentes no trato digestivo humano. Embora esta terminologia tenha simplificado a nomenclatura enzimática, a grande quantidade de enzimas novas conhecidas levou à criação de um sistema de divisão de diferentes tipos de enzimas. As enzimas dividem-se em seis classes principais, de acordo com o tipo de reacção química que catalisam A nomenclatura das enzimas foi definida por uma comissão especializada, a Comissão de Enzima (Enzyme Commission - EC), que pertence à União Internacional de Bioquímica e Biologia Molecular (IUBMB). Cada enzima recebe então um nome baseado numa nomenclatura no formato EC X.Y.W.Z. A Comissão de Nomenclatura (NC) da IUBMB é responsável actualmente pela nomenclatura de moléculas e processos relacionados à Bioquímica (e à Biologia Molecular).

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UNIDADE 3: CINÉTICA DE REAÇÕES CATALISADAS POR ENZIMAS

3.1 Cinética enzimática

Nas unidades anteriores aprendemos que a célula está constituída de centenas de

compostos químicos. Para entender melhor a complexidade das transformações

químicas que acontecem nos seres vivos é imprescindível conhecer a essência do

processo catalítico altamente específico, controlado e eficiente que se desenvolve a

temperaturas amenas nas células. Nesta unidade serão estudados os princípios

catalíticos básicos que regem as reações químicas nas células.

3.2 As enzimas como catalisadores

De um modo geral, enzimas são definidas como sendo estruturas protéicas, formadas

por seqüências de aminoácidos e que têm a função de catalisar reações bioquímicas.

O aprofundamento no estudo de enzimas ocorreu em 1897 quando, pela primeira vez,

Büchner extraiu enzimas ativas de células vivas. Seu trabalho proporcionou duas

grandes contribuições:

1. Mostrou que a catálise por meio de organismos vivos poderia funcionar independentemente de qualquer processo vivo;

2. Iniciou esforços em isolar e purificar enzimas individuais.

O número de enzimas conhecidas tem aumentado rapidamente nos últimos 100 anos

e, atualmente, o total excede 2.000. Muitas enzimas novas ainda serão identificadas e

caracterizadas no futuro. Na maioria dos casos, a nomenclatura enzimática é feita

adicionando-se o sufixo -ase ao nome do substrato, por exemplo, urease é a enzima

que catalisa a decomposição da uréia. No entanto, existem exceções a esta

nomenclatura, como as enzimas pepsina e tripsina presentes no trato digestivo

humano.

Embora esta terminologia tenha simplificado a nomenclatura enzimática, a grande

quantidade de enzimas novas conhecidas levou à criação de um sistema de divisão de

diferentes tipos de enzimas. As enzimas dividem-se em seis classes principais, de

acordo com o tipo de reacção química que catalisam

A nomenclatura das enzimas foi definida por uma comissão especializada, a Comissão

de Enzima (Enzyme Commission - EC), que pertence à União Internacional de

Bioquímica e Biologia Molecular (IUBMB). Cada enzima recebe então um nome

baseado numa nomenclatura no formato EC X.Y.W.Z. A Comissão de Nomenclatura

(NC) da IUBMB é responsável actualmente pela nomenclatura de moléculas e

processos relacionados à Bioquímica (e à Biologia Molecular).

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TABELA 3.1: Sistema de classificação de enzimas segundo a Comissão de Enzima

(EC).

1. Oxido-redutases (reações de oxidação-redução ou

transferência de elétrons)

Desidrogenases e Oxidases)

1.1.atuando em CH-OH

1.2.atuando em C=O

1.3.atuando em C=O-

1.4.atuando em CH-NH2

1.5.atuando em CH-NH-

1.6.atuando em NADH, NADPH

2.Transferases (transferem grupos funcionais como

amina, fosfato, acil, carboxil – Quinases e

Transaminases)

2.1.grupos com um carbono

2.2.grupos aldeído ou cetona

2.3.grupos acil

2.4.grupos glicosil

2.7.grupos fosfatos

2.8.grupos contendo enxôfre

3.Hidrolases (reações de hidrólise de ligação covalente -

Peptidases)

3.1.ésteres

3.2.ligações glicosídicas

3.4.ligações peptídicas

3.5.outras ligações C-N

3.6.anidridos ácidos

4.Liases (catalisam a quebra de ligações covalentes e a

remoção de moléculas de água, amônia e gás carbônico

– Dehidratases e Descarboxilases)

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4.1. =C=C=

4.2. =C=O

4.3. =C=N-

5.Isomerases (reações de interconversão entre isômeros

óticos ou geométricos - Epimerases)

5.1.racemases

6.Ligases (catalisam reações de formação de novas

moléculas a partir da ligação entre duas pré-existentes,

sempre às custas de energia - Sintetases)

6.1. C-O

6.2. C-S

6.3. C-N

6.4. C-C

Cada classe divide-se, por sua vez, em subclasses, também numeradas. As subclasses definem em que tipo de grupo as enzimas actuam. Por exemplo, um determinado grupo de enzimas pode pertencer à subclasse EC 2.1, que engloba "enzimas que transferem grupos contendo um carbono". As subclasses dividem-se ainda em sub-subclasses; continuando com o mesmo exemplo, existe a classe EC 2.1.1, que engloba as metiltransferases, ou seja, enzimas que transferem um grupo metila. Finalmente, cada enzima recebe um quarto dígito específico à reacção que catalisa.

Lembrando o conceito de catalisador definido como substância que aumenta a

velocidade das reações químicas sem passar por mudanças químicas permanentes.

Enquanto um catalisador influencia a velocidade de reações químicas, ele não afeta o

equilíbrio da reação (veja Figura 1). Concentrações de equilíbrio podem ser calculadas

usando somente propriedades termodinâmicas de reagentes e produtos.

Para projetar e analisar sistemas reativos de forma racionalisada, deve-se

dispor de uma equação matemática que relacione a velocidade das reações

em termos de composição, temperatura e pressão da mistura reacional.

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FIGURA 3.1: Através da diminuição da energia de ativação (Ea) , um

catalisador pode tornar possível a reação de um substrato com moléculas de

pouca energia interna para reagir enquanto o ∆G é mantido constante.

As semelhanças entre catalisadores sintéticos e enzimas vão além do uso de

técnicas comuns para a modelagem das expressões cinéticas. As expressões

de velocidade de reação obtidas para os dois tipos são muito similares e, em

alguns casos, idênticas. Isto acontece porque, em ambos os casos, as

moléculas de reagente formam uma espécie de complexo com o catalisador,

seja ele sintético ou biológico (enzima).

É importante lembrar as diferenças entre enzimas e catalisadores sintéticos. A

maioria dos catalisadores sintéticos não é específico, podendo catalisar

reações similares envolvendo diferentes tipos de reagentes. Apesar de

algumas enzimas não serem muito específicas, a maioria delas catalisa

somente uma reação envolvendo um substrato determinado. Geralmente, o

grau de especificidade de uma enzima está relacionado à sua função biológica.

Outra característica peculiar das enzimas é que, com freqüência, elas

necessitam de cofatores. Um cofator é um composto não-protéico que se

combina com proteínas inativas (apoenzimas) para formar um complexo

cataliticamente ativo. Existem duas variedades distintas de cofatores: os mais

simples são os íons metálicos e as coenzimas. Estas normalmente são

moléculas orgânicas complexas como NAD, FAD, CoA.

Como exemplo ilustrativo da participação de cofator pode-se citar o caso da

enzima glicose isomerase do Bacillus coagulans que requer o cofator cobalto

para sua atividade máxima na isomerização de glicose em frutose. Já a glicose

isomerase de outros organismos podem catalisar essa mesma reação sem a

presença de Co2+ (vide Tabela 3.2). É importante citar que enzimas com o

mesmo nome, mas obtidas de diferentes microrganismos têm, freqüentemente,

diferentes seqüências de aminoácidos (estrutura primária) e apresentam

propriedades e atividades catalíticas diferentes.

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TABELA 3.2: Algumas enzimas que contém ou requerem íons metálicos como

cofatores.

____________________________________________

É muito freqüente observar-se que as enzimas são mais ativas que os

catalisadores não-biológicos. Na temperatura ambiente, onde as enzimas

possuem maior atividade, elas são capazes de catalisar reações mais rápido

do que a maioria dos catalisadores artificiais. Quando a temperatura da reação

é aumentada, no entanto, catalisadores sintéticos podem se tornar tão ativos

quanto as enzimas. A temperaturas maiores ou iguais a 50° C a maioria das

enzimas apresenta uma atividade baixa ou nula.

3.3 Complexo enzima-substrato e mecanismos de reação

A existência de um complexo enzima-substrato durante uma reação enzimática

tem sido convincentemente demonstrada através de investigações científicas

experimentais envolvendo técnicas analíticas sofisticadas como cristalografia

de raios-X, espectroscopia, entre outras. A molécula de substrato se liga a uma

região específica da molécula de enzima denominada de sítio ativo, onde,

através de interações moleculares complexas, a molécula de substrato com

baixa energia de ativação consegue se transformar em produto (vide Figura

3.2).

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Para explicar de forma simplificada o mecanismo de reação pode-se utilizar o

exemplo doméstico da chave-fechadura, ou seja, cada chave é destinada por

conveniência a abrir uma única fechadura. Essa especificidade também é

importante numa reação enzimática. O complexo é formado quando o substrato

(chave) se encaixa corretamente no sitio ativo da enzima (fechadura). Na

maioria dos casos pontes de hidrogênio são formadas entre o substrato e

grupos amplamente separados na cadeia de aminoácidos da enzima. Os

grupos reativos comumente encontrados em enzimas incluem o grupo R, Asp,

Cys, Glu, His, Lys, Met, Ser, Thr e as funções terminais amino e carboxil.

FIGURA 3.2: Uma representação apenas da região do sítio ativo da enzima

acetilcolinesterase representada pela linha irregular contínua. O substrato (acetilcolina)

interage com o sitio ativo para formar o complexo enzima-substrato e, a seguir, os

produtos colina e acetato.

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3.4 Cinética enzimática simples com um substrato.

Partindo-se da reação: S P , a velocidade da reação v é definida por:

v = -dS/dt = dP/dt (1)

A dimensão de v é, conseqüentemente, moles por unidade de volume por

unidade de tempo. A velocidade da reação é uma quantidade intensiva,

definida em cada ponto da mistura. Conseqüentemente, a velocidade irá variar

com a posição na mistura se a concentração ou outras variáveis intensivas

mudarem de ponto a ponto. Por essa razão, os estudos experimentais de

cinética enzimática normalmente são realizados em reatores bem misturados

visando uma concentração uniforme de substrato, enzima e produto durante a

reação.

Um experimento típico para medir a cinética enzimática pode ser o seguinte: no

tempo zero, soluções do substrato e de uma enzima pura apropriada são

misturados em um reator agitado, fechado e isotérmico contendo uma solução

tampão para controlar o pH. O substrato e/ou a concentração dos produtos são

monitorados em vários intervalos de tempo. Comumente, na obtenção de

dados de cinética enzimática utiliza-se medidas de “velocidade inicial de

reação”. Isto significa que, uma vez conhecidas as condições da reação,

incluindo as concentrações de enzima e substrato no tempo zero (t=0), a

inclinação inicial (ou velocidade inicial) da curva de concentração de substrato

ou produto em função do tempo é estimada pelos dados:

reaçãodeinicialVelocidadevdt

dS

dt

dPt

tt

0

00

(2)

Onde E = Eo , S = So , P = 0

Na geração de dados cinéticos, normalmente a quantidade de catalisador

enzimático é dada em termos de “unidades de atividade catalítica” e não como

massa ou moles. Unidades de atividade representam a quantidade de enzima

que dá certa quantidade de atividade catalítica sob uma série de condições

padronizadas (temperatura, pH, força iônica, etc.) de uma enzima em

particular. Como exemplo, tem-se a hidrólise do amido, onde uma unidade da

enzima glicoamilase é definida como a quantidade de enzima que produz

1mol de glicose por minuto numa solução com 4% de amido a pH 4,5 e 60C.

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3.4.1 A Cinética de Michaelis-Menten

Imagine-se como um engenheiro precisando de informações cinéticas de uma

reação enzimática para poder projetar um sistema de tratamento de um

efluente industrial contendo componentes (substratos) que podem ser

degradados por enzimas disponíveis comercialmente a custos baixos. As

informações cinéticas, como comumente acontece na prática, estariam dadas

como se mostra na Figura 3.3. Quais seriam suas primeiras deduções com

relação a:

1. Velocidade de reação (Vo) a baixas concentrações de substrato. Vo

aumenta quase linearmente com o aumento de S?

2. Velocidade de reação (Vo) a altas concentrações de substrato. Vo

aumenta com S ou é aproximadamente constante?

3. Como varia a velocidade com o aumento da concentração de enzima.

Vo é constante ou aumenta proporcionalmente.

Perguntas típicas como essas foram respondidas por Henri, em 1902,

propondo a seguinte equação para a velocidade:

SK

Svv

m

max onde vmax = .Eo (3)

Embora Henri tenha dado uma explicação teórica usando mecanismos

hipotéticos de reação, Michaelis e Menten propuseram outra equação para a

velocidade de uma reação enzimática. Como ponto de partida, assumiu-se que

a enzima E e o substrato S se combinavam para formar o complexo ES, que se

dissociava a seguir para formar um produto P e liberar a enzima E:

Henri, Michaelis e Menten assumiram que a primeira reação é um equilíbrio

que, em conjunto com a lei de ação das massas para a cinética de eventos

moleculares dá:

][

][][

1

1

ES

ES

k

kKm

Constante de dissociação (4)

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onde S, E, ES são as concentrações de substrato, enzima e complexo

respectivamente.

A decomposição do complexo ES para produzir enzima livre é assumida

ser irreversível:

v = dP/dt = k2 ES (5)

Temos que: Eo = E + ES, onde: Eo = conc. total de enzima (inicial)

E - enzima livre

ES - enzima complexada

Ao mesmo tempo em que a equação de Michaelis-Menten descreve com

sucesso a cinética de muitas reações catalisadas por enzimas, ela não é

universalmente válida.

Briggs e Haldane derivaram a equação de Henri. Para a reação em um

recipiente fechado, pode-se escrever o balanço de massa para o substrato e o

complexo ES.

v = -dS/dt = k1.S.E - k-1ES

(6)

d(ES)/dt = k1.S.E - (k-1 + k2)ES

(7)

Usando a equação Eo = E + ES, temos duas equações diferenciais ordinárias e

duas incógnitas: S e ES. As condições iniciais apropriadas são: S(0) = So

ES(0) = 0

Estas equações não podem ser resolvidas analiticamente, mas sim por um

computador para achar as concentrações de S, E, ES e P como funções do

tempo.

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FIGURA 3.3: Dados cinéticos para reações catalisadas por enzimas. (a) A

concentração de enzima é tomada como constante quando se estuda a

dependência da concentração de substrato. (b) A conversão é mantida

constante para investigação na influência da concentração de enzima.

Pelo gráfico, vemos que d(ES)/dt = 0. Isto é válido para os casos de reações

catalisadas por enzimas em sistemas fechados que Eo/So é muito pequeno.

Partindo de d(ES)/dt = 0 é possível usar a equação:

E0 = E + ES para eliminar E e ES do problema:

vdS

dt

k E S

k k k S

2 0

1 2 1/ (8)

Consequentemente, o resultado da forma de Michaelis-Menten é:

vmax = k2Eo e Km = (k-1 + k2)/k1 (9)

FIGURA 3.4: Andamento da reação indicada ao longo do tempo.

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Com a expressão da velocidade de Michaelis-Menten, o tempo de reação pode

agora ser determinado analiticamente por integração de:

SK

Sv

dt

dS

m

max com S(0) = So (10)

para se obter: vmáx . t = So - S + Km . ln(So/S) (11)

Situações onde a concentração de enzimas é muito grande pode ocorrer

em alguns casos. Neste caso, a concentração de enzimas é comparável com a

de So e então, Eo/So é grande. Então, estas simplificações não podem ser

utilizadas para se obter a velocidade da reação. Veja na Fig. 3.5 como os erros

podem ser grandes.

A cinética de Michaelis-Menten pode ser, também, usada para

expressões de velocidade de muitas reações catalisadas por sólidos.

FIGURA 3.5: Hidrólise em batelada do éter Acetil L-fenilalanina pela

quimotripsina. Discrepâncias consideráveis entre a solução exata e a solução

através do estado quase estacionário surgem quando E0/S0 (=) não é

suficientemente pequeno.

3.4.2 Avaliação de Parâmetros da Equação de Michaelis-Menten

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A equação de Michaelis-Menten na sua forma original não é muito apropriada

para estimar os parâmetros cinéticos vmax e Km.

Pelo rearranjo da equação (3), pode-se ter:

Sv

K

vv

m 111

maxmax

(12)

Svv

K

v

S m 11

maxmax

(13)

S

vKvv m max (14)

Cada equação sugere uma representação linear apropriada. Plotando a

equação (12) como 1/v em função de 1/S nitidamente se separam as variáveis

dependentes e independentes (linearização de Lineweaver-Burk; (vide Figura

3.6). Os valores mais conhecidos de velocidade, próximos da vmax, tenderão a

se agrupar próximos da origem enquanto que os outros valores estarão

afastados, o que dificulta a determinação da inclinação Km/vmax.

A equação (13) tende a espalhar os dados para pontos de altos valores de v

para que a inclinação 1/vmax possa ser determinada exatamente. A interseção

freqüentemente ocorre muito perto da origem, e a medida exata de Km por este

método está submetida a grandes erros. O terceiro método (Eadie-Hofstee)

representa v em função de v/S. Ambas as coordenadas contém medidas da

variável v, que estão sujeitas aos maiores erros.

Estas considerações sugerem a seguinte estratégia para a avaliação de vmáx e

Km: determinar vmáx do gráfico de (12) ou (13). Então, retornar para o gráfico de

v em função de S e achar S1/2, a concentração do substrato onde v é igual a

vmáx / 2. Segundo a equação (3) e os métodos para avaliação desses

parâmetros, percebe-se que Km e S1/2 são idênticos em magnitude e dimensão.

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FIGURA 3.6: (a) Representação de Lineweaver-Burk de dados experimentais

para a Pepsina. (b) Método de Eadie-Hofstee para dados de hidrólise do metil-

hidrocinamato pela Quimotripsina.

3.4.3) Outros tipos de dependência da concentração de substrato

Nem todas as velocidades de reações catalisadas por enzimas seguem a

cinética de Michaelis-Menten. Pode ocorrer que mais de uma molécula de

substrato se ligue a enzima e, também, o substrato pode ser uma mistura de

diferentes espécies reagentes com propriedades cinéticas diferentes.

3.4.3.1) Ativação e Inibição pelodo substrato.

Algumas vezes quando uma grande quantidade de substrato está presente, a

velocidade da reação catalisada por enzima diminui pelo excesso de substrato.

Este fenômeno é chamado inibição pelo substrato. Nesse caso, a velocidade

da reação v atinge um máximo quando a concentração de substrato é

aumentada até certo valor, e diminui quando a concentração de substrato

ultrapassa esse valor (Figura 3.7).

Por outro lado, a dependência sigmoidal da velocidade da reação na

concentração do substrato exibida por algumas enzimas como mostra a Figura

3.8 é evidência de um tipo de efeito de ativação. A baixas concentrações de

substrato, a ligação de uma molécula de substrato aumenta a ligação da

próxima molécula. Este comportamento pode ser modelado assumindo uma

transição ajustada das subunidades da proteína: assume-se que a enzima, que

é provavelmente oligomérica, possui múltiplos sítios de ligação para o substrato

e que a primeira molécula de substrato ligada a enzima altera a estrutura

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enzimática, para que os sítios remanescentes tenham uma forte afinidade pelo

substrato.

A relação quantitativa entre a concentração do substrato e a velocidade da

reação para substratos inibidores de reação pode ser modelada usando a

aproximação de Michaelis-Menten. Assume-se que uma segunda molécula de

substrato pode se ligar a enzima; quando o substrato S encontra com o

complexo ES, obtém-se um intermediário não reativo ES2.

FIGURA 3.7: Evidências experimentais da inibição pelo substrato.

FIGURA 3.8: (a) Ativação pelo substrato. (b) Inibição pelo substrato.

Reações no equilíbrio:

(c)

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E + S ESk1

k-1

K1

ES + S ES2 K2 (d)

Etapa lenta: ES E + P k (e)

Quando as duas relações de dissociação-equilíbrio e o balanço enzimático são

usadas, uma manipulação algébrica direta resulta em:

2

1

0

1K

S

S

K

Ekv

(15)

21 KKSmáx (16)

A partir de dados experimentais, não é difícil deduzir os parâmetros

necessários nessa equação. Primeiro, k pode ser estimado variando-se E0.

Depois, plotando 1/v em função de S, uma reta com inclinação 1/K2.E0 é obtida

com altas concentrações de substrato (Figura 3.9). Finalmente, obtém-se K1

através da equação (16), onde Smáx satisfaz dv/dS = 0 na equação (15).

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FIGURA 3.9: K2 pode ser determinado através da inclinação da reta de um

gráfico de 1/v em função de S. Os dados apresentados são da hidrólise do etil

butirato através da enzima carboxicolesterase obtida de carneiro.

3.5 Modulação e regulagem da atividade enzimática

Outras espécies químicas além do substrato podem se combinar com

enzimas para alterar ou ajustar sua atividade catalítica. Estas substâncias,

chamadas moduladores ou efetivadores, podem ser constituintes normais da

célula. Em outros casos, eles encontram-se no ambiente celular ou agem em

enzimas isoladas.

A combinação de uma enzima com um efetivador é uma reação química de

fato e pode, conseqüentemente, ser totalmente reversível, parcialmente

reversível ou essencialmente irreversível. Exemplos conhecidos de inibidores

irreversíveis incluem “venenos”, tais como íons cianeto, que desativam a

xantina-oxidase. Se o inibidor age irreversivelmente, a cinética de Michaelis-

Menten, que se assemelha à cinética influenciada pelo inibidor, não pode ser

usada, visto que este método assume equilíbrio entre as formas livre e

complexa.

A modulação reversível da atividade enzimática é um mecanismo de controle

empregado pela célula para conseguir uso eficiente dos nutrientes. Um

exemplo de regulagem enzimática envolve cadeias interconectadas de reações

com vários laços de controle, tais como mostrado na Figura 3.10. Neste

exemplo, a regulagem da seqüência é conseguida através de uma inibição

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retroativa: o produto final, L-isoleucina, inibe a atividade da primeira enzima da

seqüência. Assim, quando a concentração do produto atinge um valor

satisfatório, o processo de biossíntese cessa.

Visto que as reações catalisadas pelas enzimas E2 até E5 estão

essencialmente em equilíbrio e a primeira reação é “irreversível” sob condições

celulares, a resposta para este esquema de controle é especialmente rápida.

Por exemplo, se L-isoleucina é esgotada por seu uso em síntese de proteínas,

a inibição da enzima E1 deveria ser rapidamente relaxada de maneira que o

estoque requerido do aminoácido seja renovado.

FIGURA 3.10: Neste sistema de inibição retroativa, a atividade da enzima E1

(L-treonina deaminase) é reduzida pela presença do produto final, L-isoleucina.

Os inibidores podem ser classificados por sua influência nos parâmetros vmáx e

Km da equação de Michaelis-Menten:

1. Competitivos: sua presença aumenta o valor de Km mas não altera vmáx. O

efeito de tais inibidores pode ser revertido pelo aumento da concentração do

substrato.

2. Não-competitivos: Diminui o valor do vmáx mas não altera o valor de Km,

devolvendo a atividade à enzima ou ao complexo enzima-substrato inativos.

Inibidores não-competitivos comuns são íons de metais pesados, os quais

se combinam reversivelmente com o grupo sulfídrico (-SH) dos resíduos de

cisteína.

Tabela 3.3: Classificação simplificada de inibidores reversíveis

Tipo

Descrição Resultado

Ia Totalmente Inibidor adsorve no sítio de Aumento no

valor aparente

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competitivo ligação do substrato de Km

B Parcialmente

competitivo

Inibidor e substrato

combinam com diferentes

grupos; ligação do inibidor

afeta ligação do substrato.

Aumento no

valor aparente

de Km

IIa Não-competitivo Ligação do inibidor não afeta

a afinidade ES, mas o

complexo ternário EIS não se

decompõe em produtos.

Não muda Km,

diminui vmáx

B Não-competitivo O mesmo que IIa, exceto que

EIS se decompõe em produto

a uma velocidade finita

diferente de ES

Não muda Km,

diminui vmáx

III Inibidor misto Afeta Km e vmáx

3.5.1) Mecanismos de Modulação Enzimática Reversível

Muitos inibidores competitivos conhecidos, chamados substratos análogos,

carregam afinidades aos substratos normais. Deste modo, pensa-se que estes

inibidores têm a chave para se encaixar dentro do sítio ativo da enzima, ou

fechadura, mas que a chave não é completamente correta de modo que a

fechadura não trabalha, isto é, não resulta em reação química. Por exemplo,

considere a inibição da desidrogenação do ácido succínico pelo ácido

malônico:

O ácido malônico pode complexar com desidrogenase succínica, mas

não reage.

Um outro mecanismo, chamado controle alostérico, revela ação típica de

inibição não-competitiva e pensa-se ser o mecanismo dominante para a

ativação e a inibição não-competitivas. O nome alostérico (outra forma) foi

originalmente inventado para este mecanismo porque muitos efetivadores da

atividade enzimática têm estruturas muito diferentes do substrato.

Deste fato tem sido concluído que efetivadores trabalham por ligação a

sítios regulatórios específicos distintos dos sítios que catalisam reações no

substrato. Uma enzima possuidora de sítios que modulam tão bem quanto

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catalisam é chamada, conseqüentemente, de enzima alostérica. Como mostra

a Figura 3.11 o controle alostérico pode também inibir ou ativar a habilidade

catalítica da enzima.

Estudos experimentais de uma enzima alostérica oligomérica, aspartil

transcarbamoilase (ATCase), têm fornecido evidências para a conclusão em

apoio à teoria alostérica do controle da atividade enzimática. A enzima foi

fisicamente separada em duas subunidades. Foi encontrado que a maior

subunidade, cataliticamente ativa, não é influenciada pelo CTP (citidina

trifosfato), um inibidor da enzima ATCase intacta. A menor subunidade, no

entanto, não tem atividade catalítica, mas liga-se ao CTP.

FIGURA 3.11: Na simetria do modelo para controle alostérico da atividade da

enzima, a ligação de um ativador A e substrato S resulta numa enzima

cataliticamente ativa de configuração R. Por outro lado, a ligação de um inibidor

muda as subunidades na proteína oligomérica para uma configuração T inativa.

3.5.2) Análise do efeito modulador reversível em cinética enzimática.

Uma grande contribuição da aproximação de Michaelis-Menten para a cinética

enzimática é a contagem quantitativa da influência dos moduladores. Para

começar a análise, devemos assumir que a seqüência seguinte aproxima-se

razoavelmente das interações de um inibidor competitivo e de um substrato

com a enzima. Aqui E e S têm o significado usual e I denota o inibidor. Além

disso, EI é um complexo enzima-inibidor.

Etapas da reação em equilíbrio:

(f)

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E + S ES KS

E + I EI Ki (g)

Etapa lenta: ES E +P k

(h)

Neste caso, as ligações do substrato e do inibidor à enzima são mutuamente

exclusivas. Pela razão de que uma parte da enzima é limitada no complexo EI,

nem toda a enzima está disponível para a conversão catalisando o substrato,

de modo que a velocidade da reação é diminuída pelo inibidor.

Usando o equilíbrio indicado na eq.(h) e um balanço global de massa para a

enzima, temos:

E + (ES) + (EI) = Eo (17)

Podemos escrever a velocidade da reação em termos da concentração total de

enzima (E0) e das concentrações do substrato e do inibidor livres (S e I,

respectivamente):

is KIKS

SEkv

1

0 (18)

Comparando isto com a forma original de Michaelis-Menten, mostra-se que vmáx

não é afetado, mas a constante aparente de Michaelis ( Km

app ) é aumentada pela

presença do inibidor competitivo:

i

s

app

mK

IKK 1

(19)

Em diferentes termos, a redução da velocidade causada por um inibidor

competitivo pode ser completamente compensada por aumento suficiente da

concentração do substrato; a máxima velocidade possível da reação não é

afetada pelo inibidor competitivo.

Podemos obter um modelo útil para a inibição (totalmente) não-

competitiva pela adição das seguintes etapas de equilíbrio na seqüência de

reações dada nas equações (f), (g) e (h):

EI + S EIS Ks

(i)

ES + I EIS Ki

(j)

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Nesta situação, inibidor e substrato podem simultaneamente ligar-se à enzima

formando um complexo ternário designado EIS. Assumimos que a ligação do

inibidor ou do substrato não influencia a afinidade de quaisquer espécies para

complexar com a enzima.

Consequentemente, Ks e Ki são idênticos às constantes de dissociação

correspondentes na equação (f). Além disso, assume-se que o complexo EIS

não reage para dar o produto P.

Usando o procedimento de escrever as concentrações em termos de Eo,

S e I, obtemos a seguinte expressão de velocidade:

s

i

KS

KIEkSv

10 inibição não competitiva

(20)

A constante de Michaelis não é afetada, mas a velocidade de reação

máxima que pode ser obtida é reduzida a:

i

app

KI

Ekv

1max (21)

Na presença de um inibidor não-competitivo, nenhuma quantidade do

substrato adicionado à mistura reacional pode dar a velocidade máxima de

reação que é possível sem o inibidor.

Mencionadas na Tabela 3 são as possibilidades dos efeitos de outro inibidor na

cinética enzimática. Em inibição parcialmente competitiva, o inibidor e o

substrato combinam diferentes grupos da enzima, e o inibidor afeta a afinidade

enzimática do substrato. Este caso pode ser descrito pela adição à seqüência

de reação nas equações (f), (g) e (h) das seguintes reações que são assumidas

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FIGURA 3.12: Inibição competitiva (-dextrina) e não-competitiva (maltose,

dextrina limite) para enzima -amilase

Em estado de equilíbrio:

(k)

EI + S EIS K is

ES + I EIS Ksi

(l)

Etapa lenta: EIS EI + P k

(m)

Em outra situação de inibição não-competitiva (caso IIb), o exemplo acima é

alterado para obter o valor da formação do produto pelo complexo EIS:

EIS EI + P k i (n)

Um modelo de inibidor misto que combina inibição competitiva pura com

parcialmente competitiva é obtida pelo cancelamento da reação anterior do

modelo de competição parcial acima. O resultado de todos estes casos pode ser

escrito na forma de Michaelis-Menten:

app

m

app

KS

Svv

max (22)

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com parâmetros aparentes vmax

app e Kmax

app que dependem da concentração do

inibidor, dos diferentes equilíbrios e dos parâmetros de velocidade da reação.

TABELA 3.4: Intersecções obtidas pela representação de Lineweaver-Burk na

presença de um inibidor.

FIGURA 3.13: Efeitos de vários tipos de inibição em diferentes gráficos de

velocidade de reação.

Um exemplo de ativação enzimática por um efetivador pode ser descrita no

caso IIb, no qual Ki é maior do que K. Fisicamente, isto indica que o substrato

complexado EI reage para formar produtos mais rapidamente que o complexo

ES. Assim, a espécie I serve para ativar a enzima.

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3.6 Influências de outros fatores na atividade enzimática

Muitos outros fatores podem influenciar a atividade catalítica das enzimas,

provavelmente por afetarem o estado estrutural ou químico da enzima. Como

fatores mais importantes estão:

1. pH; 2. Temperatura; 3. Forças no fluido (forças hidrodinâmicas, pressão hidrostática e tensão

superficial); 4. Agentes químicos (tais como álcool, uréia e peróxido de hidrogênio); 5. Irradiação (luz, som e radiação ionizante).

Devido à maior importância, somente serão comentados os itens 1 e 2.

3.6.1 O efeito do pH

As proteínas, como já foi visto, são construídas a partir de aminoácidos. Estas

unidades bioquímicas possuem grupos básicos, neutros e ácidos.

Conseqüentemente, a enzima intacta pode conter ambos os grupos carregados

positiva ou negativamente a um dado pH. Deste modo, grupos ionizáveis são,

aparentemente, muitas vezes parte do sítio ativo visto que a ação catalítica de

ácidos e bases está ligada a vários mecanismos enzimáticos. Além disso,

variações do pH podem alterar a estrutura tridimensional das enzimas.

Por essas razões, as enzimas são ativas somente dentro de uma certa faixa de

pH. O pH do meio pode afetar a velocidade máxima da reação, Km, e a

estabilidade da enzima. Em alguns casos, o substrato pode conter grupos

iônicos, e o pH do meio influi na afinidade do substrato com a enzima.

O esquema seguinte pode ser usado para descrever a dependência do pH em

uma reação enzimática:

Onde: Km’ = [EH].[S] / [EHS]

)(o

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K1 = [EH].[H+] / [EH2+]

K2 = [E-].[H+] / [EH]

[E0] = [E-] + [EH] + [EH2+] + [EHS]

v = k2.[EHS]

Podemos, assim, obter a seguinte expressão para a velocidade da reação:

][][

][1.'

][.

1

2S

K

H

H

KK

Svv

m

m

(23)

ou

]['

][.

SK

Svv

appm

m

(24)

Onde 1

2 ][

][1'

K

H

H

KK app

m

Como resultado deste comportamento, o pH ótimo de reação da enzima situa-se

entre pK1 e pK2. No entanto, a previsão do pH ótimo de uma enzima requer o

conhecimento das características dos seus sítios ativos, o que é muito difícil de

se obter. Assim, a determinação do pH ótimo é feita de maneira experimental

(Figura 3.14)

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FIGURA 3.14: Dependência entre atividade e pH para duas enzimas: (A)

Tripsina. (B) Colinesterase.

3.6.2 O efeito da temperatura

A velocidade das reações catalisadas por enzimas cresce até um certo limite.

Acima de uma determinada temperatura, a atividade da enzima diminui devido à

sua desnaturação. A Figura 3.15 mostra a variação da atividade de uma enzima

com a temperatura, mostrando um ponto ótimo de operação. A parte

ascendente da curva é conhecida como ativação pela temperatura, ou ativação

térmica. Nesta região, a velocidade da reação varia de acordo com a equação

de Arrhenius:

v = k2 . [E] (25 a)

k2 = A . e-Ea/RT (25 b)

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Onde Ea é a energia de ativação (kcal/mol), A é o fator de freqüência e R é a

cte. dos gases. Um gráfico de ln v em função de 1/T resulta numa reta de

inclinação –Ea/R.

FIGURA 3.15: Efeito da temperatura na atividade de uma enzima. Assumiu-se

valor de Ea=11 kcal/mol e Ed=70 kcal/mol. A parte descendente da curva é

devido a desnaturação e foi calculada assumindo um tempo de exposição de 10

minutos à temperatura.

A parte descendente da curva da Figura 3.15 é conhecida como desativação

pela temperatura ou desnaturação térmica. A cinética da desnaturação térmica

pode ser expressa por:

][.][

Ekdt

Edd (26 a)

ou

tkdeEE .0 .][][ (26 b)

Onde kd é a constante de desnaturação pela temperatura. kd também varia com

a temperatura de acordo com a equação de Arrhenius:

kd = Ad . e-Ed/RT (27)

Ed = energia de desativação (kcal/mol)

Consequentemente:

v = A.e-Ea/RT . E0.e-kd.t (28)

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As energias de ativação de reações catalisadas por enzimas situam-se,

geralmente, entre 4 a 20 kcal/mol. As energias de desativação Ed variam entre

40 e 130 kcal/mol (a maioria ao redor de 70 kcal/mol). Ou seja, a desnaturação

de uma enzima pela temperatura é muito mais rápida que sua ativação; uma

aumento na temperatura de 30 até 40 ºC resulta num aumento de 1,8 x na

atividade da enzima, mas também num aumento de 41 x em sua desnaturação.

3.7 Estratégias para estabilização das enzimas.

Além de tentar identificar enzimas que são mais estáveis, há muitos métodos

disponíveis para o melhoramento da estabilidade da enzima:

Adicionando compostos estabilizantes para a armazenagem; Modificação química da proteína solúvel; Imobilização da proteína fora ou dentro de um sólido insolúvel ou matriz.

Aditivos químicos que podem estabilizar as proteínas em alguns casos incluem

substratos, solventes orgânicos e sais. Desde que o sítio ativo de uma enzima

possa ser ao menos sua região estável, a presença do substrato pode

estabilizar a enzima “segurando” algumas das proteínas na forma de complexos

enzima-substrato.

Modificação química de proteínas, uma importante ferramenta em bioquímica

protéica, também tem sido aplicada com algum sucesso para melhorar a

estabilidade da enzima. Uma classe de estratégias de modificação química

envolve a adição ou modificação de grupos R de certos resíduos de

aminoácidos.

3.8 Imobilização de enzimas

A restrição da mobilidade de uma enzima a um espaço fixo é denominada

imobilização. Este processo oferece muitas vantagens do ponto de vista

técnico-econômico, tais como a reutilização da enzima e eliminação dos

processos de recuperação e purificação da mesma. Além disso, pode oferecer

um ambiente mais adequado à atividade da enzima. Pelo fato das enzimas

serem relativamente caras, a reutilização delas pode ser crítica em muitos

processos.

Os principais métodos de imobilização de enzimas serão descritos a seguir; na

Figura 3.16 é encontrada uma representação de cada tipo de imobilização. A

escolha de um ou outro método depende basicamente do processo e suas

condições de operação, estrutura da enzima e custos.

3.8.1 Imobilização por aprisionamento

Consiste em confinar fisicamente a enzima num pequeno espaço. O

aprisionamento em matrizes ou em membranas, incluindo o

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microencapsulamento, são dois exemplos desse método. Para isso, utilizam-se

geralmente materiais poliméricos, tais como alginato de cálcio, ágar,

poliacrilamida e colágeno. Entretanto, algumas matrizes sólidas como carvão

ativado, cerâmicas porosas e terras diatomáceas também podem ser usadas

para esse fim.

3.8.2 Adsorção

Consiste na retenção das enzimas sobre uma superfície de um suporte através

de forças relativamente fracas, tais como as forças de van der Waals. Os sítios

ativos da enzima são muito pouco afetados e, portanto, a enzima imobilizada

por esse método apresenta atividade praticamente igual à enzima livre.

Entretanto, a dessorção da enzima é um problema freqüente, principalmente na

presença de forças mecânicas externas (agitação principalmente)

Geralmente, empregam-se suportes inorgânicos como adsorventes, entre eles

alumina, sílica, cerâmicas, bentonitas, etc. Também são utilizados suportes

orgânicos, como celulose, carvão ativado e resinas de troca iônica. As

superfícies dos suportes, sejam eles orgânicos ou inorgânicos, devem ser

tratadas adequadamente antes da imobilização.

3.8.3 Ligação covalente

Este método caracteriza-se pela retenção da enzima em um suporte através da

formação de ligações covalentes (fortes). As enzimas prendem-se aos suportes

através de certos grupos funcionais de sua estrutura, e.g. grupo amino,

carboxil, hidroxil e sulfídrico; estes grupos, por sua vez, não podem estar

localizados nos sítios ativos da enzima. Os grupos funcionais dos suportes

geralmente são pré-ativados com agentes químicos (brometo de cianogênio,

carbodiimida, glutaraldeído).

Nesse tipo de imobilização, o escape de enzima é reduzido. Entretanto, sua

atividade é diminuída em relação à forma livre.

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FIGURA 3.16: Representação dos principais métodos de imobilização de

enzimas.

1.9 Considerações finais

Esta unidade permitiu o entendimento das enzimas como catalisadores

biológicos. Verificou-se sua estrutura molecular e como isto se reflete no seu

desempenho como catalisadores eficientes, específicos e versáteis. Também

foi possível estabelecer contato com os conceitos básicos de cinética

enzimática obtendo-se a expressão de Michaelis-Menten e outras influenciadas

por inibidores reversíveis. Identificaram-se também os fatores (temperatura,

pH, forças de fluidos, etc.) mais importantes a serem considerados para

conseguir uma atividade catalítica otimizada. Com esses estudos criam-se as

bases para que o engenheiro ambiental possa ser capaz de como proceder

para uma utilização prática racionalizada desses catalisadores seja na forma

solúvel, ou na forma imobilizada.

3.10 Estudos complementares

Para leitura adicional, consultar:

1. Bailey, J. E. e Ollis, D. F., Biochemical Engineering Fundamentals, 2a ed., McGraw-Hill, New York, 1986.

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2. Shuler, M. L. e Kargi, F. Bioprocess Engineering, Prentice Hall, Englewood Cliffs, 1992.

Para exercícios didáticos e visualização de imagens:

http://www.biology.arizona.edu/