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UMA ANÁLISE DAS TRAJETÓRIAS DE APRENDIZAGEM DE ALUNOS DE UM CURSO DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA SOBRE O CONCEITO DE FUNÇÃO AN ANALYSIS OF THE LEARNING TRAJECTORIES OF SOME MATHEMATICS UNDERGRADUTE STUDENTS ON THE CONCEPT OF FUNCTION Vânia Bolzan Denardi Universidade Franciscana Brasil [email protected] Eleni Bisognin Universidade Franciscana Brasil [email protected] RESUMO Este artigo é resultado parcial de uma pesquisa que teve como propósito analisar as trajetórias de aprendizagem de um grupo de alunos de Licenciatura em Matemática para construção do conceito de função. Para tanto, adotaram-se os pressupostos teóricos dos Registros de Representação Semiótica de Duval. A pesquisa de caráter qualitativo contou com a participação de um grupo formado por três alunos de uma universidade pública localizada no interior do estado do Rio Grande do Sul. O instrumento de coleta de dados constou do protocolo de cinco atividades que levam em consideração os três elementos constitutivos das funções: regra, domínio e contradomínio; além de suas múltiplas representações. Os resultados apontam para a superação de diversas dificuldades, sendo possível afirmar que ocorreu um avanço significativo na compreensão do conceito de função, ou seja, uma “progressão na aprendizagem” dos alunos. PALAVRAS-CHAVE: TRAJETÓRIAS DE APRENDIZAGEM; FUNÇÕES; REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA. ABSTRACT This article is the partial result of a research effort to analyze the learning trajectories of a group of Mathematics academic students for the construction of the concept of function. We have adopted the theoretical assumptions of Duval's Semiotic Representation Registers (2009, 2013a, 2013b). The subjects of this qualitative research were three students of a public university in Rio Grande do Sul State. The data collection instrument consisted of the protocol of five activities that take in the three constituent elements of functions: rule, domain and counter-domain, in

UMA ANÁLISE DAS TRAJETÓRIAS DE APRENDIZAGEM DE …

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UMA ANÁLISE DAS TRAJETÓRIAS DE APRENDIZAGEM DE ALUNOS DE

UM CURSO DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA SOBRE O CONCEITO

DE FUNÇÃO

AN ANALYSIS OF THE LEARNING TRAJECTORIES OF SOME

MATHEMATICS UNDERGRADUTE STUDENTS ON THE CONCEPT OF

FUNCTION

Vânia Bolzan Denardi

Universidade Franciscana – Brasil

[email protected]

Eleni Bisognin

Universidade Franciscana – Brasil

[email protected]

RESUMO

Este artigo é resultado parcial de uma pesquisa que teve como propósito analisar as trajetórias de

aprendizagem de um grupo de alunos de Licenciatura em Matemática para construção do conceito

de função. Para tanto, adotaram-se os pressupostos teóricos dos Registros de Representação

Semiótica de Duval. A pesquisa de caráter qualitativo contou com a participação de um grupo

formado por três alunos de uma universidade pública localizada no interior do estado do Rio

Grande do Sul. O instrumento de coleta de dados constou do protocolo de cinco atividades que

levam em consideração os três elementos constitutivos das funções: regra, domínio e

contradomínio; além de suas múltiplas representações. Os resultados apontam para a superação

de diversas dificuldades, sendo possível afirmar que ocorreu um avanço significativo na

compreensão do conceito de função, ou seja, uma “progressão na aprendizagem” dos alunos.

PALAVRAS-CHAVE: TRAJETÓRIAS DE APRENDIZAGEM; FUNÇÕES; REGISTROS DE

REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA.

ABSTRACT

This article is the partial result of a research effort to analyze the learning trajectories of a group

of Mathematics academic students for the construction of the concept of function. We have

adopted the theoretical assumptions of Duval's Semiotic Representation Registers (2009, 2013a,

2013b). The subjects of this qualitative research were three students of a public university in Rio

Grande do Sul State. The data collection instrument consisted of the protocol of five activities

that take in the three constituent elements of functions: rule, domain and counter-domain, in

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addition to their multiple representations. The results point to the overcoming of several

difficulties and the conclusion that there was a significant advance in the understanding of the

concept of function, that is, the students effectively learned.

KEYWORDS: LEARNING TRAJECTORIES; FUNCTIONS; SEMIOTIC

REPRESENTATION REGISTERS.

INTRODUÇÃO

A disciplina de Cálculo Diferencial e Integral I (CDI-I) abrange o estudo de funções

reais ligadas aos processos de limite. Por essa razão, a compreensão do conceito de

função é de fundamental importância na aprendizagem das noções e técnicas abordadas

nos cursos de CDI. Tal importância é evidenciada, particularmente, quando dificuldades

na aprendizagem dos conceitos do Cálculo surgem associadas a uma compreensão fraca

ou limitada do conceito de função.

Em razão disso, discussões acerca das dificuldades na aprendizagem do Cálculo,

relacionadas à incompreensão do conceito de função, são frequentes nas pesquisas em

Educação Matemática. Entre elas, cita-se o estudo realizado por Pedroso e Búrigo (2007)

junto a estudantes com pelo menos duas reprovações na disciplina de CDI-I. Com os

dados coletados a partir da resolução de exercícios que envolveram o cálculo de limite,

as assíntotas, a determinação da reta tangente a uma curva, entre outros, as pesquisadoras

observam que compreensões fragmentadas ou dificuldades de coordenação dos

componentes das funções configuram-se frequentemente em embaraços durante o

desempenho de tarefas propostas na disciplina de Cálculo.

Essa problemática também surge no trabalho realizado por Olímpio (2007), que

aborda o conceito de derivabilidade. Segundo o autor, o CDI-I “materializa o primeiro

contato formal do aluno com conceitos ‘escorregadios’, como os de limite ou de derivada,

cujas dinâmicas demandam uma compreensão mais sólida, ampla e refinada sobre um

outro conceito fundamental: o conceito de função” (p. 40). O autor destaca, ainda, que a

compreensão do conceito de função tem sido investigada em duas linhas predominantes:

uma abordando sua natureza como processo e objeto mental e outra abordando as

múltiplas representações.

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Neste artigo, adota-se essa última linha, ou seja, exploram-se as múltiplas

representações do objeto matemático função, com o intuito de possibilitar a construção

desse conceito por alunos de um curso de Licenciatura em Matemática. Nesse contexto,

destaca-se como relevante o referencial teórico dos Registros de Representação Semiótica

de Raymond Duval (2009, 2013a, 2013b) para análise das trajetórias de aprendizagem de

três alunos do curso de Licenciatura em Matemática.

QUADRO TEÓRICO

Quando se planeja o ensino de um tópico, tomam-se algumas decisões, tais como:

o que priorizar, quais atividades propor, como articulá-las, quais os recursos a utilizar,

entre outras. Essas ações refletem a visão que se tem sobre a forma como os alunos

aprendem aquele tópico, dadas as condições do momento. De certo modo, idealiza-se uma

trajetória para a aprendizagem dos alunos. O desenvolvimento dessa ideia por

pesquisadores deu origem ao conceito de trajetória hipotética de aprendizagem.

Brunheira (2017), com base nos estudos de Clements e Sarama (2004), salienta

que uma trajetória hipotética de aprendizagem compreende três aspectos: um objetivo de

aprendizagem; uma base teórica que possibilite ao aluno superar suas dificuldades e,

assim, progredir na aprendizagem de um certo domínio, e uma sequência de tarefas. A

pesquisadora destaca, ainda, que

A trajetória baseia-se num modelo de aprendizagem que é suficientemente

explícito para descrever os processos envolvidos na persecução dos objetivos

a atingir e concretiza-se através de uma sequência de tarefas que pretende

desencadear a atividade matemática que, hipoteticamente, conduzirá à

progressão das crianças (BRUNEIRA, 2017, p. 34).

De acordo com a autora supracitada, há três componentes de uma trajetória de

aprendizagem: o objetivo de aprendizagem, nesta pesquisa, o conceito de função; o

referencial teórico, que, neste estudo, é a teoria dos Registros de Representação

Semiótica; uma sequência de tarefas, aqui elaboradas levando em consideração os três

elementos constitutivos das funções: regra, domínio e contradomínio, além de suas

múltiplas representações.

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Acredita-se que a identificação desses elementos e o estabelecimento de relações

entre eles, por meio de distintos registros de representação, em uma trajetória de

aprendizagem, é uma maneira de caracterizar uma “progressão na aprendizagem” do

conceito em questão.

Os registros de representação, anteriormente citados, fazem parte do referencial

teórico que foi utilizado na análise de dados e estão relacionados com as atividades de

apreensão conceitual, de raciocínio e de compreensão de enunciados. Atividades estas

inerentes ao funcionamento cognitivo do pensamento humano na aprendizagem

matemática.

Segundo Duval (2013a), um sistema semiótico é um conjunto de signos que

apresentam relações internas que permitem identificar os objetos representados, ou seja,

é um sistema que desempenha a função de comunicação, já que é capaz de produzir e

transmitir informações. Nesse contexto, o teórico define um registro de representação

como um sistema semiótico que cumpre, além da função de comunicação, as funções

cognitivas de objetivação (entendimento para si) e tratamento, fazendo referência a quatro

tipos de registros de representações semióticas utilizados na Matemática: a língua natural,

os sistemas de escrita (numérico, algébrico, simbólico e tabular), os gráficos cartesianos

e as figuras geométricas.

No Quadro 1, apresentam-se alguns registros de representação semiótica

mobilizados no ensino de função:

Quadro 1 – Diferentes registros de representação mobilizados no ensino de funções. Registro na Língua Natural (RLN)

Um indivíduo dispõe de uma folha de

papelão em formato retangular com

lados medindo 20 cm e 12 cm. Sua

intenção é cortar quatro quadrados de

mesmo lado, um em cada canto da

folha de papelão, de modo que possa

usar o papelão para construir uma

caixa (sem tampa). Ele deseja

descobrir qual a medida do lado dos

quadrados que devem ser cortados a

fim de que o volume da caixa seja o

maior possível.

Registro Geométrico (RGe)

Registro Algébrico (RAl)

:f + +→

( ) ( )( )20 2 12 2f x x x x= − −

( ) 3 24 64 240f x x x x= − +

Registro Gráfico (RGr)

Registro Tabular (RTb)

0 0

1 180

2 256

3 252

... ...

Fonte: Autoras

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Na visão de Duval (2013b), os diferentes sistemas semióticos permitem uma

diversificação de representações de um mesmo objeto, aumentando as capacidades

cognitivas dos sujeitos e, portanto, suas representações mentais. Cabe ressaltar, no

entanto, que o fato de um aluno saber resolver uma atividade envolvendo a função em

qualquer uma das representações (semiósis) não garante que ele apresente o conceito de

função (noésis).

Nessa direção, o autor destaca que, para compreender como ocorre a aquisição

conceitual por meio da mobilização e coordenação dos registros de representação, é

necessário entender duas atividades cognitivas próprias da atividade matemática: o

tratamento e a conversão.

O tratamento é uma transformação de representações que ocorre no mesmo

sistema de representação. Por exemplo, resolver uma equação. Sendo assim, os

tratamentos não estão relacionados ao conteúdo do objeto e sim à forma.

Por outro lado, a conversão de uma representação é uma transformação que ocorre

entre registros diferentes. A partir do Quadro 1, é possível exemplificar algumas

conversões: passar da representação algébrica para a gráfica (RAl→RGr) ou o contrário

(RGr→RAl); da tabular para a gráfica (RTb→RGr), entre outras. Observa-se que, nessa

atividade, conserva-se a referência, mas não o sentido, ou seja, as mesmas propriedades

do objeto. Por esse motivo, a conversão permite compreender diferentes aspectos de um

mesmo objeto, conduzindo à compreensão.

Com base nesse referencial, foi elaborada e proposta uma sequência de atividades

que abordam, entre outros, o conteúdo de função. Essa sequência de atividades é um dos

aspectos que compõem uma trajetória de aprendizagem, conforme Brunheira (2017).

Com os dados coletados, buscou-se verificar se a realização das atividades possibilitou

uma “progressão na aprendizagem” dos conceitos envolvidos.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

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Os dados aqui apresentados são parte de uma pesquisa de doutorado, que está

sendo desenvolvida pela primeira autora, da qual participaram alunos ingressantes em um

curso de Licenciatura em Matemática de uma universidade pública do Rio Grande do Sul.

O estudo foi composto de duas fases principais: uma fase inicial de diagnóstico, em que

foi realizada uma avaliação, que teve como objetivo identificar as dificuldades trazidas

do ensino médio pelos licenciandos; e uma fase posterior de intervenção pedagógica, na

qual foi aplicada uma sequência didática composta por 20 atividades, as quais foram

elaboradas a partir da análise do diagnóstico e abordaram vários conteúdos de matemática

básica, entre eles, o conceito de função. Nelas, foram explorados os diversos registros de

representação, o tratamento e a conversão, buscando a construção dos conceitos.

A implementação dessa sequência ocorreu nos meses de agosto a dezembro de

2017 e contou com a participação de 24 alunos. As atividades foram desenvolvidas em

duplas ou trios, no período regular de aula da disciplina de Matemática Elementar.

Neste artigo, constam os dados referentes a cinco atividades que exploram a

construção do conceito de função, produzidos por um dos grupos, o qual será denominado

Grupo 1. Nessa análise, buscaram-se elementos para afirmar se a compreensão desse

grupo em relação ao conceito de função evoluiu ou não durante a realização das

atividades. Entende-se que sejam verificações de superações de dificuldades que

permitem constatar se houve uma evolução, ou seja, uma “progressão na aprendizagem”

do grupo.

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

A trajetória aqui apresentada visou à construção do conceito de função. Contudo

é importante destacar que, além da definição, desejou-se propiciar o desenvolvimento das

capacidades de raciocínio, de análise, de visualização e de justificação. Para isso, a

trajetória foi constituída num ensino exploratório, em que coube ao aluno uma parte

importante do trabalho de descoberta e construção do conhecimento, e numa dinâmica na

qual foram intercalados momentos de discussões entre a resolução das atividades.

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As atividades, como já mencionado, exploram as múltiplas representações das

funções, pois, segundo Duval (2009), a compreensão conceitual de um objeto matemático

ocorre pelo desenvolvimento de um trabalho que contemple as diversas representações

do objeto. Após a realização de cada atividade, realizou-se uma discussão em que as

respostas dadas foram socializadas, e as dúvidas existentes esclarecidas.

A seguir, apresentam-se as atividades, juntamente com suas análises.

Quadro 2 – Atividades propostas aos alunos.

Atividade 1

No pedaço de cartolina que você recebeu, desenhe um quadrado 𝐴𝐵𝐶𝐷 de 20 cm de lado. Nele, desenhe

uma região triangular IMN de modo que o vértice 𝐼 coincida com o ponto médio do segmento 𝐴𝐵,

os vértices M e N estejam nos segmentos AD e CD , respectivamente, e tal que 𝐴𝑀 = 𝐷𝑁. Denomine

pôr x a medida do segmento AM .

a) No contexto deste problema, quais são as variáveis envolvidas? Qual é a variável dependente e a

independente?

b) No seu desenho, qual é o valor de x ? E qual é o valor da medida da área do triângulo IMN ?

c) Agora troque de desenho com outro grupo. No desenho deste grupo, qual é o valor de x ? Este valor

é igual ao do seu grupo? E o valor da medida da área do triângulo é igual ao valor da medida da

área do seu triângulo?

d) Existem triângulos IMN para 0x = e 20x cm= ? E para 5x = , 18,5x = e 22x cm= ? Justifique

sua resposta.

e) Como é a variação de x ?

f) Valores diferentes para x podem produzir triângulos de mesma medida de área? Justifique.

g) Um único valor para x pode determinar triângulos de diferentes medidas de áreas? Justifique. h) É possível afirmar que a medida da área do triângulo IMN é uma função de x ? Justifique sua

resposta. Atividade1 2

Um fazendeiro planta macieiras em uma região quadrada. Para protegê-las contra o vento, ele planta

coníferas ao redor do pomar. O diagrama abaixo mostra essa situação, na qual se pode ver as macieiras

e as coníferas, para um número ( )n de filas de macieiras.

a) Escreva a expressão que relaciona o número de macieiras M com o número n de filas de macieiras.

Essa relação é uma função? Justifique sua resposta e, em caso afirmativo, indique o domínio.

b) Escreva a expressão que relaciona o número de coníferas C com o número n de filas de macieiras.

Essa relação é uma função? Justifique sua resposta e, em caso afirmativo, indique seu domínio.

c) Determine o valor de n para o qual o número de macieiras é igual ao número de coníferas, utilizando

as expressões encontradas acima.

1 Adaptada do PISA - Programa da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

(OCDE) para Avaliação Internacional de Alunos.

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d) Suponha que o fazendeiro queira fazer um pomar muito maior. À medida que o fazendeiro aumenta

o pomar, o que crescerá mais rápido: o número de macieiras ou o número de coníferas? Explique

sua resposta. Atividade 3

Um ciclista percorre o trajeto mostrado abaixo:

a) Se quiséssemos determinar a localização desse ciclista, em relação ao tempo, essa localização seria

uma função do tempo? Explique.

b) E o tempo, pode ser descrito como uma função da localização? Explique sua resposta.

Atividade 4

A tabela fornece a população, em uma área montanhosa, de uma certa espécie animal, em milhões,

durante seis anos consecutivos. A informação referente ao ano de 2005 foi apagada por engano.

2000 2001 2002 2003 2004 2005

4 4,8 5,76 6,91 8,29

a) Com os dados da tabela, é possível estimar a informação que foi apagada? Explique sua resposta.

b) Assumindo que a forma de crescimento desta população se mantem, é possível encontrar um modelo

para estimar o número de habitantes que havia no ano de 2010 e para predizer a população de tal

espécie em 2020 ? Mostre como chegou a sua resposta.

c) A tabela representa uma função? Justifique sua resposta e, em caso afirmativo, determine o domínio

e o contradomínio, assim como a variável dependente e independente.

Atividade 5

O gráfico representa a resposta do crescimento de uma planta (em cm) à adição de uma quantidade de

fertilizante (g/ha).

a) Quais são as variáveis relacionadas no gráfico? Qual é a variável dependente e a independente?

b) Considerando a função h , que relaciona à altura da planta, em cm , com a quantidade de fertilizante,

em /g ha , indique o valor de (0)h e ( )20h . Explique o significado desses valores.

c) Qual é o domínio dessa função? Qual o seu significado no contexto da questão?

d) Qual é a imagem dessa função? Qual o seu significado no contexto da questão?

e) O que acontecerá com a planta se colocarmos uma quantidade muito grande de fertilizante?

Fonte: Autora

O objetivo da primeira atividade foi construir o conceito de função explorando os

aspectos intuitivos de variação e dependência, a correspondência unívoca entre as

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variáveis e a restrição quanto ao domínio da função. Além disso, buscou-se verificar se

os alunos realizam as conversões, RLN→ RGe e RGe→RAl e tratamentos. Da análise

da implementação e do protocolo produzido nessa atividade, destaca-se que o Grupo 1:

• Realizou corretamente a conversão RLN→RGe e identificou as variáveis dependente

e independente, afirmando que “quem está variando nesse problema é a medida da

área do triângulo em função de x , que se move sobre o lado do quadrado”;

• Apresentou dificuldades para calcular a medida da área do triângulo IMN , sendo

necessário uma intervenção para que pudessem dar continuidade à resolução;

• Teve dúvidas ao responder o item d), particularmente, quando precisou verificar a

existência de triângulos para 0x = e 20x cm= . Porém a representação geométrica

com lápis e papel, sugerida pela pesquisadora, possibilitou a superação das

dificuldades, uma vez que, com o desenho, o grupo notou que era possível construir

triângulos com aqueles valores; além de perceber como era a variação de x ;

• Afirmou corretamente que valores diferentes de x podem produzir triângulos de

mesma medida de área, “pois se alterarmos os valores de x como 0x = e 10x =

formamos dois triângulos, um terá base 10 e altura 20 e o outro base 20 e altura

10”;

• Cometeu um equívoco ao afirmar que “um único valor de x , pode determinar

triângulos de mesma medida de área, pois quando x assume um valor entre 0 e

20cm haverá sempre a formação de dois ou três triângulos cujas medidas de áreas

sempre serão diferentes”.

• Justificou que “a medida da área do triângulo é uma função de x , pois conforme há

uma variação dos valores de x , sempre haverá um correspondente em y ”.

Assim, foi possível perceber que a representação geométrica, que permitiu aos

alunos testarem várias possibilidades, fazendo o desenho de diferentes triângulos, foi

fundamental na resolução dessa atividade. Por outro lado, constataram-se compreensões

limitadas em relação ao conceito de função, uma vez que o grupo cometeu equívocos,

como não perceber a correspondência unívoca entre as variáveis x e A (medida da área),

já que não é possível um triângulo com uma determinada dimensão ter duas medidas de

áreas diferentes.

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Na atividade 2, a intenção foi trabalhar a generalização de padrões, a resolução de

equações e a ideia de variável discreta. Para isso, foi solicitada a conversão RFg→RAl e

de tratamentos no RAl.

Da análise do protocolo dessa atividade, constatou-se que os participantes do

Grupo 1, após realizarem a contagem do número de coníferas e de macieiras em cada

figura, identificaram facilmente o padrão utilizado. Assim, nos itens a) e b), não tiveram

dificuldades de encontrar as expressões solicitadas, bem como de informar que tais

expressões representam funções, pois “para cada n existe apenas uma quantidade de

coníferas e macieiras”. Aqui, notou-se que o grupo parece ter compreendido a

necessidade de uma correspondência unívoca entre a variável independente e dependente;

contudo, cometeu um equívoco ao informar que o domínio das funções é o conjunto dos

reais positivos. Acredita-se que isso aconteceu porque as grandezas discretas são

raramente tratadas no estudo de funções, vindo a ser exploradas somente no estudo das

progressões aritmética e geométrica que, muitas vezes, ocorre sem o estabelecimento de

relações com as funções. Apesar desse equívoco, o grupo resolveu corretamente o item

c), ou seja, a equação 2 8n n= informando que “ 8n = é a única solução possível, já que

0n = não é uma resposta aceitável nesta situação”. O último item também foi resolvido

de forma correta.

O objetivo da atividade 3 foi verificar se o aluno era capaz identificar se o trajeto

exposto representa uma função e informar qual é variável dependente e independente. No

protocolo do Grupo 1 foi encontrada no item a) a seguinte resposta: “Não é função, pois

o ciclista passa no mesmo lugar duas vezes”. Já no item b), o grupo escreveu: “Não é

uma função, pois não dá para estabelecer uma lei”. Com isso, percebe-se que este grupo

teve dificuldade de reconhecer uma função dada no RFg e de distinguir, nesse registro, a

variável dependente da independente. Além do mais, ficou evidente que o grupo associou

função a uma representação algébrica. Segundo Olímpio (2007), isso acontece porque os

exercícios e as práticas com funções omitem as componentes domínio e contradomínio,

colocando a componente “regra” na posição de destaque.

Oportunizar ao aluno a possibilidade de construir o conceito de função a partir dos

dados de uma tabela foi o objetivo da atividade 4. Da análise da implementação e do

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protocolo dessa atividade, constata-se que o Grupo 1, em pouco tempo, percebeu que a

população de 2005 poderia ser estimada multiplicando a população de 2004 por 1,2.

Apesar disso, demorou a encontrar o modelo que expressa os dados da tabela, uma vez

que tentou, inicialmente, modelar os dados por uma função afim e, depois, por uma

função quadrática. Encontrado o modelo, o grupo não teve dificuldades em responder o

restante da atividade. Assim, percebe-se que o grupo identificou os três elementos que

constituem uma função e reconheceu a relação que existe entre eles, o que se traduz em

um amadurecimento matemático.

A atividade 5 teve por objetivo descrever, a partir da interpretação do gráfico, a

variável dependente e independente, os valores da função h explorados no problema e a

identificação dos conjuntos domínio e imagem, além de abordar a noção intuitiva de

limite. Aqui, o Grupo 1 respondeu todos os itens corretamente. Contudo, no item d),

observou-se que, num primeiro momento, a imagem havia sido descrita como sendo

“todos os reais não negativos, pois a altura da planta não pode ser negativa”. Esse erro

foi corrigido após a resolução do item e), no qual era preciso explicar o que iria acontecer

com a planta se colocássemos uma quantidade muito grande de fertilizante. Nesse

momento, observando o gráfico, o grupo percebeu que a altura da planta seria inferior a

20cm e, assim, alterou a resposta do item anterior. Dessa forma, percebe-se que a

visualização do gráfico foi fundamental para a correta resolução dos dois últimos itens,

particularmente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve como objetivo analisar a construção do conceito de função,

por alunos de um curso de Licenciatura em Matemática, a partir de atividades que

exploram seus componentes e suas múltiplas representações. Esses alunos, apesar de

estarem no ensino superior, tiveram dificuldades em uma avaliação diagnóstica,

associadas a uma compreensão limitada desse conceito.

Diante das análises, o estudo revelou que diversas dificuldades foram superadas

ao longo da implementação das atividades. Acredita-se que o enfrentamento das tarefas

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e as aprendizagens daí decorrentes foram favorecidos pelo trabalho em grupo, pelo

diálogo com colegas e professora/pesquisadora, pela prática da justificação, pela

transferência entre os registros de representação, pela socialização das respostas e pelas

discussões realizadas após cada atividade.

Assim, entende-se que a superação de dificuldades, ocorrida no contexto dessa

trajetória de aprendizagem, permite afirmar que houve um avanço na compreensão do

conceito de função, ou seja, uma “progressão na aprendizagem” dos sujeitos da pesquisa.

REFERÊNCIAS

BRUNHEIRA, L. Uma trajetória de aprendizagem para a classificação e definição de

quadriláteros. In: Educação e Matemática, Revista da Associação de Professores de

Matemática, Lisboa, Edição 145, p. 33-37, 2017. Disponível em: <

http://www.apm.pt/files/_Uma_trajetoria_5a786c9608c12.pdf>. Acesso em 30 abr., 2018.

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Trad. Lênio Fernandes Levy e Marisa Rosâni Abreu Silveira. São Paulo: Livraria da Física,

2009.

______, R. Registros de Representações Semióticas e Funcionamento cognitivo da

compreensão em Matemática. (2013a). In: MACHADO, S. D. A. Aprendizagem Em Matemática:

Registros de Representação Semiótica. Campinas, SP: Papirus, 2013.

______, R. Entrevista: Raymond Duval e a Teoria dos Registros de Representações Semióticas.

(2013b). In: Revista Paranaense de Educação Matemática, Campo Mourão, v.2, nº 3, jul-dez

2013. Entrevista concedida a José Luiz Magalhães de Freitas e Veridiana Rezende.

OLIMPIO, A. A. Primeiro Ano num Curso de Matemática: a definição de função e a dualidade

local/global em conceitos de Cálculo. Revista BOLEMA: Boletim de Educação Matemática, Rio

Claro, v. 20, nº 28, p. 39 – 67, 2007. Disponível em: <

http://www.periodicos.rc.biblioteca.unesp.br/index.php/bolema/issue/view/735>. Acesso em 28

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PEDROSO, L. W.; BÚRIGO, E. Z. A construção do conceito de função por estudantes de

Cálculo. In: ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA. EDUCAÇÃO

MATEMÁTICA, 2007, Belo Horizonte/MG. Anais... Belo Horizonte, 2007. Disponível em:

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abr., 2018.