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SEMINÁRIO MARTIN BUCER-BRASIL
CURSO DE TEOLOGIA INTEGRAL
UMA ANÁLISE DO FEDERALISMO BATISTA DE 1689 À
LUZ A POSSE DA TERRA E RENOVAÇÃO DA ALIANÇA
NO LIVRO DE JOSUÉ
LUIS HENRIQUE PEREIRA DE PAULA
SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, SP
2014
2
LUIS HENRIQUE PEREIRA DE PAULA
UMA ANÁLISE DO FEDERALISMO BATISTA DE 1689 À
LUZ A POSSE DA TERRA E RENOVAÇÃO DA ALIANÇA
NO LIVRO DE JOSUÉ
Trabalho apresentado na forma de ensaio ao Curso de
Teologia Integral do Seminário Martin Bucer-Brasil para a
disciplina Exposição Bíblica [Históricos] - Josué.
Professor: Ms.Litt. Joel Theodoro da Fonseca Junior
SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, SP
2014
3
RESUMO
O presente trabalho visa introduzir o tema do aliancismo batista reforma contido nas
Confissões de Fé Batistas Calvinistas do século XVII (em especial a Segunda Confissão
de Fé Batista de Londres de 1677/1689), ligando seus principais conceitos distinções
acerca da Teologia do Pacto reformada em geral e relacionando suas peculiaridades à
conclusão do livro de Josué na passagem de posse da terra. Além de apresentar
brevemente os pressupostos que definem tal teologia e sua posição na herança
reformada, seus desenvolvimentos posteriores e atuais, analisaremos a passagens do
livro de Josué que apresentam posse da terra e a reafirmação da aliança Sinaítica.
4
ABSTRACT
This present work wants to introduce the theme of Reformed Baptist Covenantalism
contained in the Calvinist Baptist Confession of Faith from XVII century (specially the
Second LCF 1677/89), linking his main concepts and distinctiveness from the Reformed
Covenant Theology in general, and relating its peculiarities to the conclusion of the
book of Joshua. Beyond presenting briefly the presuppositions which defines Baptist
Covenant Theology and his position at reformed inheritance, his posteriors
developments and recent modifications, we would analyze texts from the Book of
Joshua that describes the Land’s possession and reaffirmation of the Sinaitic Covenant.
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 6
1. UMA BREVE REVISÃO HISTÓRICA DA VISÃO ALIANCISTA DE 1689 E SEU
DESENVOLVIMENTO ................................................................................................... 8
2. DISTINÇÕES TEOLÓGICAS: REVELAÇÃO PROGRESSIVA E CONCLUSÃO
DAS PROMESSAS ........................................................................................................ 12
3. JOSUÉ A POSSE DA TERRA E A RENOVAÇÃO DO PACTO: SINAIS
CARACTERÍSTICOS DA ANTIGA ALIANÇA. ......................................................... 15
CONCLUSÃO ................................................................................................................ 19
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 21
6
INTRODUÇÃO
Uma das dificuldades da teologia bíblica e sistemática é unificar os temas da
Escritura de maneira não apenas coerente e que respeite a analogia fidei, mas também
atentando para o desenvolvimento progressivo do plano divino por meio de promessas e
alianças que culminam no pleno cumprimento da Nova Aliança em Cristo. Uma
estrutura teológica não-bíblica pode levar a uma compreensão equivocada do avanço ou
cumprimento de promessas específicas limitadas ao contexto histórico-bíblico
específico1.
As ideias iniciais acerca deste trabalho surgiram do comentário bíblico do livro
de Josué de Richard Hess2, em especial ao analisar o tema teológico da promessa nas
Escrituras e a dificuldade que encontramos na passagem de Js 24 ao lidar com a ideia de
que temos ali uma administração do pacto da graça. Como o tópico é relevante para
preservar tanto a teologia bíblica como a autoridade das Escrituras é interessante
abordá-lo.
Neste sentido, buscando compreender o padrão geral do desenvolvimento da
promessa e seu cumprimento nas narrativas do AT e o avanço do plano redentivo por
meio de sucessivas alianças, tomei como base o framework da Teologia da Aliança
Batista de 1689 (doravante TA 1689), em especial sua exposição contida no livro The
Distinctiveness of Baptist Covenant Theology (2013), de Pacaul Denault, que compara o
federalismo dos batistas particulares e pedobatistas do século XVII e também em
Covenant Theology - From Adam to Crist (2005) de Nehemiah Coxe e John Owen.
Aliando tais fontes ao conteúdo do livro Kingdom Through Covenant (2012) de Peter
Gentry e Stephen Wellum, dois importantes teólogos batistas calvinistas da atualidade,
foi possível reconhecer no texto de Josué um cumprimento temporal e tipológico da
realidade espiritual contida na promessa à Abraão. Tal promessa apresentava, como
veremos, além da realidade espiritual acerca da posteridade que abençoaria as nações –
i.e. o Messias -, uma promessa temporal, não rigidamente definida e de caráter
transitório, apontando para uma expansão progressiva do reino, tipificando o
1 Podemos reconhecer tal dificuldade no dispensacionalismo clássico, por exemplo, e sua expectativa da restauração escatológica do Israel nacional enquanto semente de Abraão. 2 Richard Hess. Josué: Introdução e Comentário. Vida Nova, 2006.
7
reestabelecimento na nova criação do Reino e da Aliança que foram transpassados pelo
primeiro Adão.
Na abordagem final do texto, seguimos a breve explanação de Augustos
Nicodemus Lopes, em seu artigo “Lendo Josué como Escritura Sagrada”; é possível
perceber a concordância de pensamento quando à posse da terra como argumentado por
Gentry e Wellum: a indefinição da extensão da própria terra nos textos que a definem e
o sentido duplo da promessa dada no pacto Abraãmico estabelecem esta tensão
progressiva, apresentam o seu significado tipológico e também ilustram perfeitamente a
tensão presente na igreja hoje, reconhecendo o triunfo de Cristo e sua soberania (o
poder canaanita, assim como o domínio/poder do mal/pecado, já foram sobrepujados),
mas ainda há terra a ser ocupada, mesmo já estando sob o direito legal e domínio
Israelita.
8
1. UMA BREVE REVISÃO HISTÓRICA DA VISÃO ALIANCISTA
DE 1689 E SEU DESENVOLVIMENTO
A título de introdução e preparação para o que será desenvolvido no presente
artigo, é importante esclarecer os pressupostos teológicos, assim como sua justificação
bíblica, que orientam as análises e conclusões aqui apresentadas. Como já dito
anteriormente, o Federalismo Batista Reformado3 (especialmente apresentado na 2ª
CFBL 1677/89) será o framework básico para a compreensão do texto de Josué. Vale
ressaltar que, como apresentado, o livro Kingdom through Covenant será um auxiliar na
expansão de conceitos em comum do Aliancismo Batista clássico do século XVII, não
significando que o livro seja de fato uma exposição unívoca desta teologia4. Num
primeiro momento cabe ressaltar a retomada recente das pesquisas e publicações
relacionadas ao Federalismo de 1689.
1.1 A RETOMADA DE UMA TEOLOGIA DO SÉCULO XVII
Deve-se notar que as pesquisar e publicações explorando o tema da teologia da
Aliança conforme o desenvolvimento dado pelos primeiros batistas é recente, e aparece
na última década. A obra capital para esta retomada é o livro Covenant Theolgy – From
Adam to Christ, uma republicação e reedição dos livros A Discourse of the Covenants
that God made with Men before the Law (1681) de Nehemiah Coxe, um dos
protagonistas da teologia dos batistas particulares do século XVII5; e An Exposition of
Hebrews 8:6-13 de John Owen, eminente teólogo inglês, que por seu vigor intelectual,
acadêmico e peso de sua obra recebeu os epítetos de “Príncipe dos Puritanos” e
“Calvino da Inglaterra”. Entre os editores desta reedição das duas obras está o Dr. James
M. Renihan, Deão do “Institute of Reformed Baptist Studies” no Westiminster
3 Deve-se notar que o termo aliancismo e federalismo são intercambiáveis, uma vez que a palavra foedus, de origem latina, significa pacto, aliança. 4 De fato, a teologia de Wellum e Gentry é categorizada por muitos como “Aliancismo Progressivo”, uma revisão mais atual da chamada “Teologia da Nova Aliança”, uma via média surgida no meio batista calvinista americano (e grupos afins) situando-se entre o Federalismo Reformado e o Dispensacionalismo. Cabe ainda ressaltar que os defensores do Federalismo Batista de 1689 distinguem-se de tal posição, por suas reformulações de alguns pontos importantes do Aliancismo Clássico (como o pacto das obras, que no livro de Wellum e Gentry é substituído pelo Pacto da Criação, e em outros contextos é totalmente rejeitado). Mesmo assim, há pontos em comum (e até mesmo idênticos) que são válidos e produtivos para a análise teológica, principalmente por sua expansão e clarificação de temas chaves e suas implicações. 5 Cf. Nehemiah Coxe; Christian Classics Ethereal Library, Biography. <https://www.ccel.org/creeds/bcf/bionc.htm> Acessado em 06 de Junho de 2014.
9
Seminary in California (Escondido, CA), um centro de referência para as pesquisas na
área. Não cabe ao presente artigo, nem é nosso objetivo sumariar as obras relacionadas
ao tema, mas basta acrescentar que o livro Distinctiveness of Baptist Covenant Theology
de Pacaul Denault apresenta um sumário da teologia esposada no livro de Coxe e Owen,
contrastando-a com o aliancismo reformado clássico (em especial, aquele com origem
nos pedobatistas puritanos do século XVII).
Tal retomada está ligada intimamente as tendências teológicas surgidas no meio
batista, em especial a “New Covenant Theology”6, que ressaltou a importância do debate
acerca das alianças nas confissões reformadas, e a relação de
continuidade/descontinuidade entre o Antigo e o Novo Testamento, e em especial a
disputa sobre Lei e Graça, que foi acentuada nas últimas décadas por movimentos
recentes da teologia presbiteriana, em especial a Teonomia e a Visão Federal.
1.2 A RESSURGÊNCIA DA TEOLOGIA BATISTA REFORMADA -
NEHEMIAH COXE E JOHN OWEN
Reagindo as novas tendências, a visão dos primeiros batistas particulares acerca
da aliança foi apresentada como um contraponto à visão comum de muitos batistas (e
também de muitos reformados) atualmente, de que o credobatismo não encontra espaço
na teologia da aliança reformada, e por uma série de implicações, isto colocaria todo o
movimento batista alheio ou distinto do termo “reformado”. À frente desta ressurgência,
que se opõe à tal tendência, encontram-se eminentes teólogos, como Richard Barcellos,
Fred Malone, Samuel Waldron, James White, Thomas Ascol e o supracitado James
Reniham; e ainda o historiador batista Michael Haykin.
O livro Covenant Theology de Coxe e Owen trata de descaracterizar a falsa
acusação de que há uma cisão entre o movimento batista inicial e sua participação na
herança reformada. O pensamento frequente é que a revisão batista do capítulo VII do
texto da Confissão de Fé de Westminster, em especial com relação ao pacto da graça,
esteja ligada a uma busca por originalidade. Soma-se a isto a concepção de que os
6 Para uma introdução crítica ao assunto, suas origens tendências e formulações, cf. VLACH, Michael J., “New covenant theology Compared with Covenantalism”, disponível em <http://www.tms.edu/tmsj/tmsj18i.pdf>, acessado em 6 de junho de 2014. Uma resenha positiva sobre um livro do “movimento”(New Covenant Theology: Description, Definition, Defense), de Thomas R. Schreiner, cf. <http://www.sbts.edu/documents/tschreiner/review_WellsZaspel.pdf>. De fato, os debates começam na década de 1980, envolvem teólogos eminentes como D. A. Carson e Douglas Moo, sendo os dois amplamente citados, e o último postula sua posição visão sobre lei e graça como “Ponto de Vista Luterano Modificado”.
10
batistas não vinculavam sua prática do batismo com a Teologia da Aliança, como
sustentam muitos pedobatistas, rejeitando assim uma parte fundante do pensamento
reformado que estava ligado diretamente ao federalismo pedobatista, e por
consequência refere-se à teologia bíblica como um todo, a visão sobre o batismo e sua
eclesiologia (neste último caso, excetua-se as similaridades entre batistas e
congregacionais pedobatistas).
Isto posto, cabe ainda ressaltar que a união de Nehemiah Coxe (um batista) e
John Owen (em ex-presbiteriano e congregacional) para sustentar o federalismo batista,
não é uma contradição, antes é uma unificação da mesma posição, como assegurado
pelo próprio Coxe no prefácio de seu livro.
Accordingly, I designed to give a further account of it in a discourse
of the covenant made with Israel in the wilderness and the state of the
church under the law. But when I had finished this and provided some
materials also for what was to follow, I found my labor for the
clearing and asserting of that point happily prevented by the coming
out of Dr. Owen’s third volume on Hebrews (COXE e OWEN, p. 30).
Em resumo, a posição tardia de Owen7 em seu comentário de Hebreus
sustentava a mesma visão esposada pelos batistas particulares anteriormente.
1.3 UM OSTRACISMO HISTÓRICO
Ressaltamos também hipóteses, também apresentadas por Denault (2013), para o
ostracismo histórico à que ficou submetido o federalismo dos batistas particulares. Dois
grupos sectários, pelo menos, aparecem com teologias espúrias que criaram
impedimentos para uma compreensão mais aberta das posições batistas reformadas.
Os anabatistas em geral não vinculavam sua prática à alguma visão particular da
teologia da aliança; antes, ao serem perseguidos e mortos pelos reformadores rejeitaram
completamente a teologia reformada.
Já os socinianos foram outro grupo que dificultou a compreensão da visão
batista reformada acerca do pacto da graça identificado com o evangelho, revelado e
cumprido por Cristo no Novo Testamento. Uma vez que a visão deste grupo herético
defendia uma rejeição completa do Antigo em favor do Novo, promovendo uma cisão
7 Em períodos anteriores, enquanto presbiteriano, John Owen seguia a mesma distinção comum à tradição federalista reformada “uma substância/duas administrações” para explicar a antiga a e velha aliança. Ele rompe com sua posição anterior na exposição de Hebreus.
11
completa em ambos os testamentos, eles eram os “hiper-dispensacionalistas” de seu
tempo (cf. Denault, 2013, p. 36-39).
Ao lidar com os dois grupos fazia-se necessário esclarecer as distinções e
afirmar com cautela e precisão sua própria posição dentro da ortodoxia. Mas em todo
caso a associação generalista pode ter contribuído para o ostracismo da Teologia
Federal Batista com o passar dos anos.
O fato é que especialmente a associação direta que se fazia entre o pensamento
anabatista e teologia sociniana (que se opôs fortemente ao pensamento reformado) com
a teologia dos batistas particulares, sua leitura da teologia do pacto registrada nas
confissões de fé e em vários livros acabou negligenciada em períodos posteriores8.
8 Entretanto é possível notar nos batistas particulares do século XVII uma frequente rejeição da doutrina dos anabatistas e uma constante defesa da sua unidade doutrinária com a ortodoxia reformada. Antes da segunda confissão londrina em 1677/1689, a primeira, de 1643, já trazia no título tal reivindicação, afirmando que as igrejas que a subscreviam era aquelas “falsamente chamadas anabatistas”. Quanto a rejeição dos socinianos, o próprio Owen foi uma dos seus mais vigoroso oponentes.
12
2. DISTINÇÕES TEOLÓGICAS: REVELAÇÃO PROGRESSIVA E
CONCLUSÃO DAS PROMESSAS
2.1 PONTOS EM COMUM
Podemos reconhecer como pontos em comum entre a visão presbiteriana e
batista reformada acerca do pacto pelo menos dois itens importantes: o Pacto da Obras
com Adão, e o Pacto da Graça como elemento unificador dos dois testamentos. Assim
ambos os sistemas creem que há somente dois cabeças federais diante de Deus: Adão ou
Cristo. Em Adão, a humanidade naturalmente nasce sob condenação e corrupção em
virtude da queda. Em Cristo, o segundo Adão, temos acesso ao pacto da graça, que logo
após a queda teve seus benefícios ofertados na promessa de Gênesis 3.15. Ambas as
posições reconhecem a presença da graça atuando nos dois testamentos das Escrituras, e
que todos os indivíduos salvos, mesmo no Antigo testamento, só o são por meio de
Cristo.
A identificação entre batistas e pedobatistas do escopo da Antiga Aliança
também é a mesma, como apresenta Herman Witsius: “We begin the economy of the
Old Testament immediately upon the fall, and the first promise of grace, and end in
Christ” (apud DENAULT, 2013, p. 100).
2.2 DISTINÇÕES DO FEDERALISMO BATISTA
2.2.1 O pacto da graça: revelação e conclusão
Como claramente apresentado por Denault (2013), uma das principais
características do aliancismo batista reformado é o rompimento como a visão tradicional
do pacto da graça como sendo a mesma substância da Antiga e da Nova Aliança (i.e
“mesma substância/duas administrações”), em favor da visão de revelação progressiva
por meio de promessas que se cumpriram na Nova Aliança. Assim, o Pacto da Graça é
relacionado diretamente à revelação do evangelho no Novo Testamento, e esta nova
aliança ao ser consumada por Cristo completou as promessas que foram entregues desde
queda.
2.2.2 Não apenas administrações, mas substâncias diferentes
John Owen em sua exposição de Hebreus, afirma a distinção da Antiga e Nova
Aliança em substância, não apenas em forma ou administração. Este ponto pode
13
facilmente ser mal compreendido quando suspeita-se que haja aqui uma cisão entre o
Antigo e o Novo Testamento. Porém, ao afirmar que o Pacto da Obras foi reapresentado
na Velha Aliança por meio de sucessivos pactos não significa negar a operação da graça
neste período. Antes significa entender que esta Antiga aliança tinha um propósito
específico, especialmente finalidades temporais acerca de uma descendência física e de
uma terra a ser possuída, como afirmado na exposição de John Owen:
This covenant thus made [the Old Covenant], with these ends and
promises, did never save nor condemn any man eternally. All that
lived under the administration of it did attain eternal life, or perished
forever, but not by the virtue of this covenant as formally such. It did,
indeed, revive the command power and sanction of the first covenant
of works; and in that respect, as the apostle speaks, was “the ministry
of condemnation,” 2 Cor. 3:9; for “by the deeds of the law can no
flesh be justified.” And on the other hand, it directed also to the
promise, which was the instrument of life and salvation to all that did
believe. But as to what it had of its own, it was confined to things
temporal. Believers were saved under it, but not by virtue of it.
Sinners perished eternally under it, but by the curse of the original law
of works (OWEN, p. 85).
Portanto, como uma aliança tipológica, figurativa, terrena e condicional, a
Antiga Aliança e suas administrações visava conduzir à Cristo. Percebe-se, que
especialmente no Pacto Sinaítico existe uma relação com uma semente física (a semente
física prometida no pacto com Abraão, i.e, Israel) e a possessão de uma terra específica
(i.e. Canaã). Como aponta Owen (idem, p. 87), a salvação não dependia da substância
destes pactos, mas de fé nas promessas e nos tipos e figuras da Antiga Aliança,
começando em gênesis, depois da queda. Tal dualidade é mais explícita no pacto
Abraãmico, que abordaremos agora.
2.2.3 As duas sementes de Abraão
No cerne da teologia da Aliança pedobatista existe também a justificação para o
batismo infantil. A ideia de que apenas formalmente houveram mudanças sucessivas na
administração do pacto da graça justifica, por exemplo, uma comunidade mista tanto em
Israel quanto na Igreja hoje, a saber: tanto os descendentes de Abraão deveriam ser
circuncidados e formalmente aceitos como Israelitas, quanto os filhos de crentes hoje
devem ser batizados e aceitos como membros da igreja. Por haver uma associação direta
com o Pacto da Graça em todos os pactos da antiga aliança, isto acaba levando a duas
14
conclusões óbvias: ou há regeneração presumida, ou o Pacto da Graça pode ser violado
e é condicional. A primeira situação é formulada, por exe,plo, pelo Dr. Gary Crampton,
ex-presbiteriano, que mesmo aderindo e publicando a partir de uma visão pedobatista,
afirma que lutou por mais de 25 anos com tal problema9.
Neste caso, seguindo visão do NT sobre a inviolabilidade e incondicionalidade
do Pacto da Graça, e de que todas as promessas relacionadas à Nova Aliança nos
profetas (cf. Jr 31, Ez 36) apresentam uma nova comunidade dentro o povo de Deus de
indivíduos regenerados, há uma revisão significativa na teologia da aliança batista.
Either way, the opposition between their federalism manifested itself
concretely and fundamentally around the Abrahamic Covenant. The
aforementioned presents a dualism between the promises of and
earthly nature and those of heavenly nature. The paedobatists mixed
the two in one same covenant of grace of mixed nature, while the
Baptists strictly separated these two types of promises. The Baptists
justified this separation based on the fact that Abraham had two
heterogeneous posterities10 and that each of them inherited a covenant
with different promises11. His natural posterity received an earthly
inheritance and was kept under the old Covenant. His spiritual
posterity received a heavenly inheritance through the New Covenant
which, until its accomplishment12, was in the state of a promise
(revealed/concluded). Both of Abraham’s posterities were, however,
interwined until the accomplishment of the promise which was
temporarily placed under the protection of the Law (Gal 3.23)
(DENAULT, 2013, p. 142).
Deste modo, finalizamos esta breve apresentação das distinções existentes entre
o federalismo pedobatista e o federalismo batista do século XVII, deixando a análise de
suas implicações para o próximo capítulo, no qual abordaremos o texto de Josué,
observando quais insights são possíveis a partir do framework até aqui apresentado. Ou
seja, nos focaremos no texto como um alvo para a análise da hipótese teológica
levantada até o presente momento, buscando sua abrangente intepretação e
enquadramento dentro um uma teologia bíblica e reformada, que respeite a analogia
fidei.
9 Cf. CRAMPTON, Gary W. From Paedobaptism to Credobaptism. Wensboro, KY: Reformed Baptist Academic Press, 2010. 10 Cf. Rm 9.6-8; 2.28-29; 11; Jo 8.39; Mt 3.9; Gl 3.29; 4.22-31; 1 Tm 2.15-16 11 Esta é a analogia que o apóstolo Paulo faz em Gálatas 4.22-31 12 Ou seja, a morte de Cristo no NT e a conclusão da Aliança prometida.
15
3. JOSUÉ A POSSE DA TERRA E A RENOVAÇÃO DO PACTO:
SINAIS CARACTERÍSTICOS DA ANTIGA ALIANÇA.
Tendo os padrões teológicos que orientam nossa pesquisa muito bem definidos,
partamos para alguns textos básicos do livro de Josué que reforçam e demonstram como
alguns temas e passagem do livro se enquadram no federalismo batista. Por uma questão
de limitação de escopo, abordaremos apenas os desdobramentos da antiga aliança
relacionados à posse da terra e dupla semente de Abraão.
3.1 A DUPLA DESCENDÊNCIA DE ABRAÃO
O capítulo de Josué 24 aparece como uma renovação da aliança Sinaítica, tendo
uma resposta positiva do povo à sua estrutura condicional. Em análise estrutural, vemos
dos versos 2 ao 12, Josué apresenta ao povo um prólogo, relembrando os feitos do
Senhor em seu favor. No verso 13 há uma citação direta de Deuteronômio 6.10-12, dos
benefícios recebidos na terra em resposta obediente àquilo que o Senhor havia
ordenado. A partir do verso 15 até o 27, Josué entra em um diálogo com o povo
exigindo uma resposta verdadeira diante das exigências da lei e das maldições
associadas à desobediência. Os Israelitas são tratados como herdeiros diretos tanto de
Abraão quanto da geração anterior e Josué faz referência a idolatria e as peregrinações
de seus antepassados.
Para nossa interpretação, precisamos relembrar que a promessa dada ao patriarca
Abraão envolve duas partes: uma semente física e outra espiritual (cf. Rm 9.6-8; Gl
4.22-31). O discurso de Josué ao final, como reconhece Lopes (1999), demonstra que a
prática idolátrica estava presente junto ao mesmo povo que havia adentrado a terra, a
ponto de Josué repreendê-los e obriga-los a uma confissão de fé que fosse coerente com
sua realidade. Após obter mais uma afirmação de que obedeceriam ao Senhor, Josué
lhes responde: “Agora, então, joguem fora os deuses estrangeiros que estão com vocês e
voltem-se de coração para o Senhor, o Deus de Israel” (Js. 24.23).
Acertadamente GENTRY e WELLUM (2012, p. 686) apresentam uma mudança
estrutural e de natureza na comunidade da nova aliança que é prefigurada no Antigo
Testamento. Em contraste com a promessa de Jeremias 31.32, que fala sobre uma
aliança em que todos conheceriam ao Senhor e teriam sua lei escrita nos corações (que é
outra maneira de dizer “circuncisão no coração” ou regeneração; cf. Dt. 10:16; 30:6; Jr.
16
4:4; 9:25) aqui vemos uma comunidade mista, de outra natureza e estrutura. Sendo que
a maior parte do povo estava usufruindo dos benefícios de serem descendência física de
Abraão, e de haverem adentrado na terra de Canaã, vemos que se trata de um
cumprimento temporário do pacto mosaico e abraamico, e não do próprio pacto da
graça. É possível identificar, por exemplo, a herança espiritual de Abraão no próprio
Josué, enquanto de maneira geral todo o povo, mesmo sendo herdeiro físico/biológico,
não estava com seu coração inclinado para servir ao Senhor. O tema do remanescente
que é salvo, e se desenvolve ao longo das Escrituras, e demonstra com clareza aquilo
que é sustentado na Teologia da Aliança Batista e fica patente nesta passagem: os
herdeiros espirituais e físicos de Abraão caminharam lado a lado na Antiga Aliança, até
vir o cumprimento da promessa da Nova Aliança em Cristo do surgimento de uma nova
comunidade. Uma implicação prática para a igreja hoje, que surge da ideia de tornar o
Pacto Abraamico uma administração do Pacto da Graça, é perder de vista a distinção
entre as várias sementes de Abraão:
The covenant argument for infant baptism requires us to view the
genealogical principle of the Abrahamic covenant (Gn 17:7) in
physical/biological terms as it is applied in the church. However there
are two problems with this approach. First, it fails to distinguish the
different senses of the “seed of Abraham” both within the Abrahamic
covenant and throughout the Canon. So, for example, Abraham’s seed
is certainly biological (e.g., Ihsmael, Isaac, sons of Keturah), but it is
also biological/special (e.g. Isaac, Israel), typological (e.g., Christ; Gal
3:16), and applied to al believers, spiritual (Gal. 3:26-29). In the first
two cases, all of Abraham’s seed was marked by the covenant sign of
circumcision but it did not necessarily signify anything more than that
they were biologically related to Abraham, hence the basis for the
“mixed” community of Israel. In the Old testament era, Israel was
both a nation and the people of God; they had a special relationship to
God; they were redeemed people, but not necessarily in the same way
that church (spiritual seed f Abraham) is redeemed (since not all os
them were redeemed salvifically). As the covenants unfold, the
typological nature of Abraham’s seed reaches its fulfilment in Christ,
which brings with it significant changes in how we understand the
relationship between Chist and his people. Christ’s people are viewed
as Abraham’s spiritual seed, but this is not dependent on
circumcision, Torah, or even ethnic lineage, but is through
regeneration and faith union with Christ. All this is to say that we
must not equate too quickly the Abrahamic covenant with the new
covenant without noting its diverse aspects in its immediate context
and how those aspects find their fulfilment in Christ. (GENTRY e
WELLUM, 2012, p. 696-697)
17
3.2 A POSSE DA TERRA
Como salienta LOPES (1999, p. 8) a posse da terra é condicional, e a
permanência de Israel depende de sua obediência, como apresentado no início do livro
(Js 1.6-8). É possível perceber aqui uma relação entre a promessa dada à Abraão e a
aliança estabelecida com ele unida à ampliação que o tema recebe no pacto mosaico. É
importante notar que há um desdobramento continuo da aliança com Abraão, e do
dualismo presente nela (DENAULT, 2013, p. 117).
Abordando um conceito dualista semelhante, que diz respeito à posse da terra,
GENTRY e WELLUM (2012, p. 708), tratam da imprecisão dos limites da terra
prometida, em que vários textos relacionados ao território da terra aparecem de forma
imprecisa e pouco consistente (Gen. 15:18-21; Ex. 23.31ss; Dt. 1.7; 11:24; Js 1.2-4),
nos quais a extensão da terra não é igual. Os autores então sustentam que a ambiguidade
textual diz respeito ao fato implícito de que a terra prometida não pode ser reduzida
meramente a um pedaço de território particular, antes, abriga um ideal de que se tornará
muito maior, e a promessa não se cumprirá até que semente de Abraão ocupe todo o
mundo. Assumindo isto, o texto de Paulo em Romanos 4.13 (“...Abraão e a sua
descendência receberam a promessa de que ele seria o herdeiro do mundo”) também
mostra que Paulo reconhece que a terra prometida não se refere somente a um local
geográfico específico, antes abrange toda a ordem criada, e isto aponta para a herança
espiritual prometida na Nova Aliança. A partir desta interpretação, é possível ver, como
apontam os autores, que a terra é um padrão ou tipo para toda a criação. Isso explicaria
por exemplo, os múltiplos cumprimentos de posse da terra por exemplo em Js 21:43-45
e 1 Rs 4:20-21 no período de Salomão. Nota-se que a imprecisão da promessa e o
cumprimento aparentemente parcial da ocupação envolvem o domínio factual do povo
de Israel ao eliminar o domínio canaanita, enquanto ainda existem áreas a serem
ocupadas. Observando as duas realidades da promessa à Abraão, vemos que a semente
física já ocupa e domina a terra de Canaã, após haver neutralizado todo poderio inimigo.
Há de fato o cumprimento e recebimento dos termos da aliança Sinaítica, porém, tal
cumprimento é temporário e ainda falho quanto ao domínio posterior da terra, a pureza
étnica e cultica, que refletirá a natureza temporal da Antiga aliança nas sucessivas
passagens do livro de Juízes, dos reis davídicos, e do cativeiro. É inclusive no cativeiro,
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sob a profecia de Jeremias e Ezequiel que temos os principais textos que apontam para
uma nova aliança, incorruptível e permanente. Logo, fica patente em toda a estrutura do
texto de Josué, inclusive das conquistas da nação, que a posteridade física de Abraão e
sua ocupação da terra de Canaã eram parte da Velha Aliança de natureza temporal e
transitória. A tensão entre a natureza mista dos herdeiros de Abraão (espirituais e
físicos) e a terra a ser dominada (Canaã e todo o mundo), refletem tal transitoriedade a
que estava submetida a igreja de Cristo sob os desdobramentos progressivos da Antiga
Aliança em direção à superioridade da nova. Como afirma DENAULT (2013, p. 130):
The goal of the covenant with the physical posterity of Abraham (i.e.
The Old Covenant of the Law) was not futile since it consisted in
leading to Christ. This end was accomplished in at least three ways,
according to the seventeenth-century Baptist authors’ understanding:
(1) by preserving both the messianic lineage and the Covenant of
Grace; (2) by pointing typologically towards Christ; (3) by
imprisoning everything under sin in order that the only means to
obtain the promised inheritance was through faith in Christ.
(1) God promised Abraham that the accomplishment of his promise by
which all nations would be blessed, would fulfil itself by his posterity,
that is, Christ (Gl 3.16). Consequently, the Abrahamic lineage until
the Messiah had to be preserved by a covenant with the natural
posterity of Abraham (Rm 9.4-5).
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CONCLUSÃO
Ao final desta abordagem do livro de Josué, em especial dois temas associados a
possa da terra e a renovação da aliança, podemos reconhecer padrões relacionados a
Teologia da Aliança Batista de 1689 dentro das tensões existentes no próprio texto.
Apensar de ser este um trabalho superficial, devemos registrar que o teste é válido para
um uma estrutura tão ampla como a Teologia do Pacto (seja ela batista ou pedobatista),
que precisa ser sempre avaliada à luz dos textos das Escrituras, reconhecendo sua
coerência e capacidade de enquadrar e não contradizer o todo e as partes em sua síntese
teológica.
Além de considerar o exercício comparativo válido, a teologia da aliança, ou
federalismo Batista de 1689 fornece um padrão normativo para unir os dois testamentos
sem trazer prejuízo para a clara noção de continuidade/descontinuidade presente em
vários textos das Escrituras, sem que haja uma unidade coerente sob o pacto da graça e
seu efeito retroativo mediante promessas, figuras e tipos no Antigo testamento, assim
como sua diversidade das sucessivas administrações do pacto das obras no Antigo
testamento que portavam tais promessas até a vinda de Cristo.
Muitos outros aspectos mereceriam ser tratados, tanto na apresentação teológica,
quando na exposição do texto em análise; mas para o presente momento, cumprindo
com a proposta inicial e dentro da brevidade deste artigo, finalizamos o presente estudo
com a recomendação e suplica de Charles Spurgeon:
É dito que aquele que compreende os dois Pactos é um teólogo, e isto
é, sem dúvida, verdadeiro. Posso também afirmar que o homem
conhecedor das posições relativas da Lei e do Evangelho possui as
chaves da situação no que diz respeito à doutrina. O relacionamento
da Lei comigo e como ela me condena; o relacionamento do
Evangelho comigo e como ele, se sou um crente, me justifica – são
dois pontos que todo cristão deveria entender com clareza. Neste
aspecto, ele não deve enxergar “homens andando como árvores”,
senão poderá causar a si mesmo grande angústia e cair em erros
dolorosos ao seu coração e prejudiciais à sua vida. Fazer confusão
entre a Lei e o Evangelho é ensinar algo que não é Lei nem
Evangelho, mas o oposto de ambos. Que o Espírito de Deus seja o
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nosso mestre e Sua Palavra nosso livro de lições, e assim não nos
enganaremos.13
Soli Deo Gloria!
13 SPURGEON, Charles. A Perpetuidade da Lei de Deus. Disponível em </http://www.projetospurgeon.com.br/2013/06/a-perpetuidade-da-lei-de-deus/>. Acessado em 7 de Junho de 2014.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Palmdale, CA: Reformed Baptist Academic Press, 2010.
DENAULT, Pascal. Distinctiveness of Baptist Covenant Theology: A comparison
between seventeenth-century Particular Baptist and Paedobaptist federalism. Vestalia
Hill, AL: Solid Ground Christian Books, 2013, 167p.
GENTRY, Peter e WELLUM, Stephen. Kingdom Through Covenant: A Biblical-
Theological Understanding of the Covenants. Wheaton: Crossway, 2012, p. 591-796.
LOPES, A. N. (1999). Lendo Josué como Escritura Sagrada: mensagem e lugar do
livro na história sagrada. Fides Reformata , IV (2), s.d. Disponível em
<http://goo.gl/qze15>. Acessado dia 4 de Junho de 2014.
OWEN, John. Exposition Of The Epistle To The Hebrews: With Preliminary
Exercitations. Goold edition of The Works of John Owen, Vol. 13. Edinburgh: T&T
Clark, 1862.
SCHREINER, Thomas R. Review: ‘New Covenant Theology: Description, Definition,
Defense by John Wells e Fred Zaspel’, Disponível em
<http://www.sbts.edu/documents/tschreiner/review_WellsZaspel.pdf>. Acessado dia 6
de junho de 2014.
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</http://www.projetospurgeon.com.br/2013/06/a-perpetuidade-da-lei-de-deus/>.
Acessado em 7 de Junho de 2014.
VLACH, Michael J. New covenant theology Compared with Covenantalism.
Disponível em <http://www.tms.edu/tmsj/tmsj18i.pdf>, acessado em 6 de junho de
2014.