Trabalho Centros Espiritas

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Victor de Carvalho RamonRA:105757

HZ460 Pesquisa AntropolgicaProf. Omar Ribeiro Thomaz

O Espiritismo em Campinas. Visitas a dois Centros Espiritas e planejamento de pesquisa.

O Espiritismo Kardecista uma doutrina religiosa, filosfica e moral, baseado em, alm de uma diferente interpretao da Bblia, nas obras de Allan Kardec, como "O Livro dos Espritos" e "O Evangelho Segundo o Espiritismo". Essa doutrina tem origem ainda na Frana do sculo XIX, onde influenciado pelas novas idias que assolavam a Europa, como o socialismo de Karl Marx, o evolucionismo de Charles Darwin e o utilitarismo dos economistas neoclssicos, Allan Kardec procura investigar acontecimentos sobrenaturais atravs de princpios racionais.

Ento, comum em diversos momentos, a doutrina procurar fazer um paralelo entre os seus ensinamentos religiosos e morais com as descobertas cientficas. Allan Kardec destaca que a doutrina, alm de fazer um paralelo com a cincia, tem ela mesma base na prpria cincia. Essa ideia no para em Kardec, o presidente da Federao Esprita Brasileira, Nelson Massotti, explicou que: Razo e f no esto em plos opostos. Cremos em algo lgico, no mstico. Seria difcil seguir uma religio que no estimula a discusso e o conhecimento.

Assim, a doutrina, apesar de ter como base a existncia de Deus, procura meios racionais e cientficos para continuar seus preceitos. Para Allan Kardec, o mundo seria dividido em duas coisas bsicas: a matria e os espritos, alm do fluido vital, necessrio para juntar ambos. Assim, explica ele, que a matria que estamos habituados a estudar na cincia, como o oxignio, so provenientes da mesma matria que forma o homem, uma matria mais simples, indivisvel: "O oxignio, o hidrognio, o azoto, o carbono e todos os corpos que consideramos simples so meras modificaes de uma substncia primitiva. " (O Livro dos Espritos, pg. 62). Depois, explica que todo ser animado aquele que possui esprito, ou seja, a matria que possui junto de si um esprito e que s podem ficar juntos atravs do fludo vital. A morte dos seres, ento, seria o esgotamento do fludo vital.

Alm disso, Allan Kardec procura em suas obras tambm justificar tamanho avano tecnolgico e poltico que ocorria na poca, com as revolues industrial e francesa, respectivamente. Assim, continua ele, que esses espritos que do vida a matria, vm ao mundo para seu prprio aperfeioadamente, assim como o aperfeioamento da sociedade. O Espiritismo, ento, passa a pregar a revoluo moral dos espritos - para Allan Kardec, para o esprito chegar ao estado de perfeio, era necessrio seguir determinada moral. Alm disso, era imprescindvel ao homem evoluir suas tcnicas, assim, segundo esta doutrina, o homem estava predestinado a revoluo tcnica (nesse sentido, ele tenta justificar a Revoluo Industrial).

O espiritismo atual continua notavelmente influenciado pelas obras de Allan Kardec, a hierarquia implcita nos centros, como j reconheceu Bernando Lewgoy (2004), , tambm, muito dependente do conhecimento das obras de Kardec, e por vezes de Chico Xavier. Alm disso, o espiritismo atual d muito valor revoluo moral e, mais precisamente, busca pela revoluo moral: imprescindvel, antes da predestinao da revoluo moral, que a pessoa seja de "bom esprito", que queria ser melhor, para assim chegar no seu estado de perfeio, j destacado por Allan Kardec.

Justificativa

O Espiritismo, no Brasil, atualmente uma das religies com maior nmero de praticantes, muito embora em nmeros bastante inferiores que outras religies, como as Catlica e Evanglica. Isso, na realidade, no se caracteriza como um problema para a doutrina, uma vez que os Centros Espritas so normalmente bastante frequentados. comum pessoas de outras religies, ou sem religio definida, frequentarem os Centros, principalmente no ritual de passe e em palestras.

Em Campinas, se comparado com o nmero de Igrejas Catlicas e a proporo geral de praticantes das duas religies, h nmero grande de Centros Espritas. Esses centros so bastante conhecidos pela populao: esto presentes nos bairros mais conhecidos da cidade e, em especial, no Centro da cidade, onde o movimento intenso, alm de ser reconhecido tambm o trabalho dos Centros Espritas para com diversas partes da sociedade.

Esses trabalhos so caracterizados, primeiramente, pela ajuda espiritual atravs dos passes. muito comum pessoas de diversas religies, frequentes ou no em Centros Espritas, terem certos conhecimentos sobre o ritual do passe: sabem, normalmente que este se constitu em uma passagem de energia do passista para a pessoa que toma passe e, em algumas vezes, sabem tambm, de forma aproximada como o passe dado, alm de parte das pessoas j terem tomado o passe, o que constitui na ajuda espiritual propriamente dita.

Alm disso, os Centros Espritas da cidade fazem diversos trabalhos voluntrios com a arrecadao de recursos atravs de bazares e as pequenas lojas nos Centros Espritas. Estes recursos so, ou passados na forma de dinheiro para centros de caridade, ou em forma de outros recursos. O Centro Esprita Allan Kardec, ajuda de forma monetria um centro de apoio a gestante - este, na realidade, est ligado de forma direta ao centro. Alm disso, enviam merenda a uma escola prxima ao Centro. J a Casa do Bom Jesus, ajuda uma favela prxima ao Centro, no apenas atravs de recursos monetrios e materiais, mas tambm atravs de servios prestados essa comunidade. Por exemplo, possvel se inscrever, na Casa do Bom Jesus, ao voluntariado sendo motorista: os voluntrios levam as pessoas da favela aos seus compromissos mais longes.

A relevncia do estudo em Centros Espritas no para em seus trabalhos para a comunidade. notvel reconhecer, como fez Bernardo Lewgoy (2004), que as relaes humanas em Centros Espritas podem ser caracterizadas como um microcosmo da sociedade brasileira: a tentativa ao mesmo tempo de ordem, progresso e igualdade escondem as tradies clientelsticas da sociedade brasileira, onde a igualdade relativizada atravs de hierarquias. Essas hierarquias, entretanto, como muitos aspectos da sociedade brasileira, implcita.

Objetivos e Metodologia

Este presente trabalho tem o objetivo de observar as relaes inter-humanas em dois Centros Espritas de Campinas. Um situa-se no centro de Campinas, de nome Centro Esprita Allan Kardec e, um dos Centros Espritas mais frequentados da cidade, devido a sua localizao. O outro Centro Esprita se chama Casa do Bom Jesus e, embora no seja longe do Centro de Campinas, este Centro Esprita bem menos frequentado, at porque seu tamanho menor que o Allan Kardec.

O Centro Esprita Allan Kardec possui dois andares: o primeiro situa-se apenas a entrada, com um segurana, enquanto o segundo tem, logo no seu incio uma loja de livros espritas, depois um corredor com vrias salas, onde acontecem as reunies de estudo e tambm as entrevistas (na realidade, estas entrevistas so conversas entre as pessoas que vo ao Centro e as pessoas que trabalham l; uma espcie de aconselhamento), alm dos passes. Depois do corredor, h uma grande sala, onde acontecem as prelees (pequenas palestras que buscam elevao espiritual antes do passe), alm das prprias palestras que o Centro d. Neste Centro, a pesquisa acontecer em dias que acontecem o ritual de passe: antes do passe h a preleo, e depois possvel passar pelas entrevistas.

Na Casa do Bom Jesus, a observao tambm se dar em dias de passe. L, entretanto, no h entrevistas (na realidade, h apenas uma entrevistadora, que sobretudo, no apenas aconselha, mas se assemelha a uma espcie de coordenadora do Centro); alm disso, existe neste Centro uma sala de reflexo, uma banca que vende livros do Espiritismo e duas salas de passe. Na sala onde se espera pelo passe, h uma mesa com uma cesta no centro, em que depois dos passes, as pessoas podem colocar um pedido escrito. Alm disso, esta sala possue duas estantes com livros espritas. Neste Centro no h preleo.

importante notar que em ambos os Centros, h passe em seis dias da semana, por isso seria invivel fazer um trabalho de campo em dias que no ocorressem os passes. Entretanto, as relaes que os Centros oferecem para a observao no param nos passes: alm das entrevistas e prelees, os Centros oferecem cursos para jovens se tornarem espritas, grupos de estudo sobre as obras de Allan Kardec e cursos sobre mediunidade, alm das palestras.

Desta forma, esta pesquisa pretender observar o passe em ambas as casas, mostrando as semelhanas e diferenas entre os rituais nestes dois Centros Espritas. Procurar tambm entender como o Espiritismo capaz de modificar as pessoas que trabalham nos Centros, que praticam toda a sua doutrina. Para tanto, imprescindvel que haja, alm da observao do ritual do passe, conversas com as entrevistadoras do Centro. Assim, ser importante notar o efeito que os rituais espiritas tm nas pessoas dos Centros, tanto como reafirmao de uma doutrina moral e filosfica, como a doao de energia no passe e o contato com espritos desencarnados nas reunies medinicas. Vale ressaltar que a observao poder ser feita apenas no ritual de passe, uma vez que as reunies medinicas passaram a ser proibida para a visitao do pblico que no tivesse o estudo adequado para tal prtica, j que poderia causar grande impacto nas pessoas, assustando-as. Assim, as reunies medinicas sero retratadas da mesma forma que o ritual particular foi tratado na obra de x, atravs do relato de terceiros.

Reviso bibliogrfica

Para se comear a discutir a religio Esprita, imprescindvel que se tenha acesso as obras de Allan Kardec. Essas obras so a base da religio e, de forma didtica, conseguem explicar a sua doutrina. Allan Kardec lana, por exemplo, o Livro dos Espritos que, na forma de perguntas e respostas, consegue esclarecer grande parte de suas premissas.Obviamente, o Espiritismo nao para nas obras de Allan Kardec, uma religio que tem como caracterstica bsica a busca pelo avano e pela inovao.

Assim, atravs do contexto histrico em que as obras foram lanadas, fica mais fcil compreender certos aspectos da religio. Atualmente, possve, tambm de forma bastante didtica, se ter acesso as caractersticas do Espiritismo. Isso porque, alm das obras de Allan Kardec, tanto a FEB (Federao Esprita Brasileira), como a Usesp (Unio das Sociedades Espritas de So Paulo) lanam artigos que explicam aspectos da doutrina. Em seus sites possvel tambm ter acesso a diversos materias da religio. Recentemente, foram lanados alguns filmes sobre o Espiritismo baseados nas obras de Chico Xavier, como o Nosso Lar.

Tambm existem considerveis trabalhos etnogrficos brasileiros sobre o Espiritismo, os Centros Espritas, as linguagens utilizadas em Centros e tambm o Espiritismo sob uma tica histrica. possvel ver no trabalho de Bernardo Lewgoy (2004) diversos aspectos marcantes em reunies de estudo em Centros Espritas, capazes de reafirmar grande parte da doutrina; atravs do trabalho de Maria Cavalcantti (1983), possvel se ter idia geral da religio: essa autora d nfase em todas as partes do Espiritismo, j que detm grande trabalho de campo sobre tal assunto; no trabalho de X, fica mais claro certas premissas do Espiritismo sob seu contexto histrico. possvel tambm fazer um paralelo entre o Espiritismo e pesquisas sobre religies indgenas: por exemplo, o ritual do Tor, descrito por x e y, se assemelham em diversos aspectos a religio esprita, tanto no que se diz sobre os aspectos prticos e religiosos dos rituais, como na reafirmao de identidade de um grupo atravs de seus prprios rituais.

Quadro Terico

Para o conhecimento do Espiritismo sob o objetivo desta pesquisa, preciso passar a entender a religio atravs de dois tipos de bibliogrfia: um tipo, j citado, so as obras de Allan Kardec, o outro so etnografias que dem conta de explicar como o o Espiritismo foi fundado em seu contexto da Frana do sculo XIX. Para isso, til a obra de X: essa pesquisa etnogrfica passa pelas principais influncias de Allan Kardec. Consegue explicar, que a Frana, lugar onde Allan Kardec residia, passava por turbulentas mudanas que procuravam ser explicadas sob diversas ticas.

Na economia, autores neo-clssicos davam origem a nova teoria do utilitarismo e se aproveitavam de idias de Ricardo e Smith, onde ressaltavam as Leis Naturais da Economia; na poltica, alm do socialismo de Karl Marx, que incitava a ditadura do proletariado, privilegiando a classe dos trabalhadores, a revoulao francesa deixava a sociedade poltica ainda instvel; na biologia, ficou bastante conhecido o trabalho de Charles Darwin que, sobretudo, destacava a forma como as espcies evoluam (evolucionismo); alm da filosofia positivista de Auguste Comte. Desta forma, alm do prprio positivismo, a sociedade francesa era regida por idias de progresso sem freio, empirismo para a comprovao de fatos, ao lado do cientificismo. Foi assim, que Allan Kardec criou sua doutrina filosfica, moral e religiosa, que procurava explicao para tudo sob a lei da causa e efeito, exceto para a existncia de Deus.

Depois de conhecer as bases do Espiritismo, vlido passar pelas obras de Maria Luara Cavalcanti. A autora realizou seu trabalho de campo atravs de um Centro Esprita, uma instituio esprita cultural e a literatura esprita. De forma geral, ela foi capaz de mostrar uma viso antropolgica do Espiritismo, analisando diversos aspectos da religio, tanto nos referidos lugares, como em casas de pessoas. Ela chama ateno, por exemplo, que o termo "casa esprita" desgina Centro Esprita, porque ocorriam e ainda ocorrem rituais de mesas medinicas em casas de praticantes da religio, o que muitas vezes davam origem a novos Centros Espritas. A autora tambm consegue demonstrar aspectos representativos nos rituais espritas, bem como caractersticas gerais da populao que trabalha nos Centros Espritas.

Para as caractersticas dos espritas que trabalham nos Centros, vlido passar pela obra de Bernardo Lewgoy. O autor, que fez trabalho de campo em um Centro Esprita de Porto Alegre, consegue destacar diversos aspectos relevantes do Espiritismo atual que, entretanto, no fazem parte da doutrina inicial. Ele ressalta como os espritas do Centro so valor para qualidades como a pontualidade e a hierarquia - esta, intrsceca nas relaes humanas do Centro. Alm disso, mostra como o Espiritismo pode ser entendido como um microcosmo da sociedade brasileira, destacando o aspecto familiarizado e clientelizado do Centro.

Por fim, vlido fazer um paralelo entre a religio Esprita e a religiosidade dos kiriri e, mais propriamente dito, identificar as relaes dos rituais de ambas as religies. Nos kiriri, h a prtica do tor, que busca no s a cura individual, como tambm a coletiva, uma espcie de dana que pode ser acompnhado por pessoas de fora, assim como o passe no Espiritismo pode ser tomado por qualquer pessoa, embora tenha carater individual. Entretanto, nos kriri, h o ritual particular, onde apenas os "mais entendidos" entram em contato com espritos, assim como no Espiritismo, h reunies medinicas, onde apenas os mdiuns treinados (aqui, vale ressaltar que para Allan Kardec, todas as pessoas possuem mediunicidade) podem ter contato com espritos desencarnados.

Cronograma

Nos Centros Espritas, muito indicado o conhecimento das obras de Allan Kardec, entretanto, aconselhvel tambm que sempre se continue estudando. Por isso, meu cronograma deve ser feito semelhantemente aos estudos das pessoas dos Centros Espritas: desde o comeo at o final do meu trabalho de campo, irei estudar as obras de Allan Kardec, alm das etnografias Espritas. Realizarei meu trabalho de campo a partir de aproximadamente dia 15/09/2011, onde j terei conhecimento de algumas das premissas Espritas.

http://www.febnet.org.br/site/index.php

http://www.usesp.org.br/site/home/

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-71832004000200011

http://www.lauracavalcanti.com.br/publicacoes.asp?codigo_area=1#

http://www.ecsbdefesa.com.br/defesa/fts/CPCE.pdf