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Meteorologia Geral 2011 Cláudio Paulo & Gilberto Mahumane Página 1 TEMA 3 TEMPERATURA E TERMODINÂMICA DA ATMOSFERA 3.1 Temperatura A temperatura da superfície é determinada pelo balanço de energia, isto é: o balanço entre as quantidades de energia recebida (por radiação, transporte de calor), de energia perdida (por radiação, transporte de calor sensível e calor latente), e de energia armazenada (da forma de calor). Isso também vale para camadas da atmosfera que podem no caso trocar energia entre elas. Diferenças entre absorção e perda de energia podem determinar transportes horizontais, que actuam no sentido de procurar anular essas diferenças. Um exemplo disso, é o transporte de calor através dos ventos meridionais (com componentes na direcção norte-sul) e zonais (com componentes na direcção leste- oeste), e também movimentos verticais e correntes marítimas. Assim, medidas de temperatura são importantes para ajudar a diagnosticar movimentos na atmosfera. A medida da temperatura e sua distribuição horizontal e vertical também serve para identificar massas de ar cujo movimento determina fenómenos meteorológicos, como as frentes frias e quentes, regimes de precipitação, taxas de evaporação, geadas, etc. 3.1.1 Variação Diária e Sazonal da Temperatura A temperatura varia durante o dia de acordo com o balanço energético. Quando o ganho de energia é menor que a perda ou é nulo, a temperatura decresce (Vide a Figura 3.1).

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TEMA 3

TEMPERATURA E TERMODINÂMICA DA ATMOSFERA

3.1 Temperatura

A temperatura da superfície é determinada pelo balanço de energia, isto é: o

balanço entre as quantidades de energia recebida (por radiação, transporte de

calor), de energia perdida (por radiação, transporte de calor sensível e calor latente),

e de energia armazenada (da forma de calor). Isso também vale para camadas da

atmosfera que podem no caso trocar energia entre elas.

Diferenças entre absorção e perda de energia podem determinar transportes

horizontais, que actuam no sentido de procurar anular essas diferenças. Um

exemplo disso, é o transporte de calor através dos ventos meridionais (com

componentes na direcção norte-sul) e zonais (com componentes na direcção leste-

oeste), e também movimentos verticais e correntes marítimas.

Assim, medidas de temperatura são importantes para ajudar a diagnosticar

movimentos na atmosfera. A medida da temperatura e sua distribuição horizontal e

vertical também serve para identificar massas de ar cujo movimento determina

fenómenos meteorológicos, como as frentes frias e quentes, regimes de

precipitação, taxas de evaporação, geadas, etc.

3.1.1 Variação Diária e Sazonal da Temperatura

A temperatura varia durante o dia de acordo com o balanço energético. Quando o

ganho de energia é menor que a perda ou é nulo, a temperatura decresce (Vide a

Figura 3.1).

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Figura 1: The daily variation in air temperature is controlled by incoming energy (primarily from the sun) and outgoing energy from the earth's surface. Where incoming energy exceeds outgoing energy (orange shade), the air temperature rises. Where outgoing energy exceeds incoming energy (blue shade), the air temperature falls.

Naturalmente, esse balanço é diferente cada dia, podendo até haver uma

diminuição de temperatura num período de sol alto, por exemplo, com a passagem

de uma frente fria. Portanto, é preciso considerar todas as frentes e sorvedouros de

energia antes de se prever a temperatura.

No caso de variação sazonal, o factor importante é a altura do sol ao meio dia

chamada “declinação”, que é o ângulo zenital mínimo, representado pela letra grega

delta ( ). A declinação varia com as estações, sendo maior no inverno e menor no

verão, quando os raios do sol estão mais próximos da vertical ao meio dia.

3.1.2 Distribuição Horizontal da Temperatura

Se a Terra fosse homogénea, sem variações na distribuição de mares e terras, e

sem movimentos de rotação, a superfície seria em média mais quente próximo do

equador e mais fria nos pólos, sendo as linhas isotérmicas (ou isotermas) todas

paralelas ao equador, reflectindo o fato de que pontos de mesma latitude recebem a

mesma quantidade de energia do sol.

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Apesar de a Terra não ser uniforme, ainda se pode notar nas Figuras 2 e 3, que

sobre o mar, longe dos continentes, as isotermas se orientam zonalmente. Veja-se,

por exemplo, o hemisfério sul, onde há mais mares que terra, e portanto é mais

homogénea (Figura 3.2 e 3.3).

Figure 3.2: Average air temperature near sea level in January (°F). Isotherms – lines connecting places that have the same temperature.

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Figure 3.3: Average air temperature near sea level in July (°F).

Além disso, essas Figuras (3.2 e 3.3) representam uma média de muitos anos.

Existem Variações diária que surgem devido à rotação da Terra e que são

disfarçadas pelas médias.

As mesmas Figuras (3.2 e 3.3) mostram outras características interessantes que

serão descritas a seguir:

o A inclinação das isotermas próximo às costas é devido ao aquecimento

desigual entre a Terra e a água e também devido às correntes marítimas e ao

fenómeno da ressurgência. O aquecimento diferencial entre Terra e água é

devido ás diferentes características térmicas e ópticas. A luz do sol penetra

na água, sendo sua energia distribuída aos primeiros 5 a 10 metros,

enquanto a luz não penetra nos solos, sendo sua energia limitada a uma

camada fina superficial de poucos centímetros. Além disso, o calor específico

da água é maior que o do solo. Essa diferença faz com que a Terra se

aqueça mais rapidamente que a água e também se resfrie mais rapidamente

ao perder calor. Isso faz com que a diferença entre temperaturas médias do

verão e inverno seja maior em Terra do que no mar ou em regiões próximas

do mar.

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3.2 Termodinâmica

A termodinâmica tem um papel importante no estudo da Meteorologia. Sua

aplicação vai desde os processos microfísicos para a formação das nuvens até

processos relacionados com a circulação geral da atmosfera.

3.2.1 Leis dos Gases

As variáveis P (Pressão), V (Volume) e T (Temperatura) de um gás podem ser

relacionados através de uma equação de estado.

Todos os gases obedecem aproximadamente a uma equação chamada “equação

de estado do gás ideal”, para certos intervalos dos valores das variáveis envolvidas.

Existem pequenos desvios que no entanto são desprezíveis para os propósitos da

meteorologia.

A equação do gás ideal pode ser escrita como TnRPV . Onde: P - Pressão, V -

Volume, n - Número de moles, T - Temperatura, e R - É a constante universal dos

gases e vale molkJ8,314 0 . O número de moles pode ser escrito como M

mn ,

onde m = Massa do gás e M = Massa molecular em gramas (moléculas-gramas).

Assim, M

TmRPV ou TM

R

V

mP

. Nesta equação, α

V

m onde ρ =

Densidade e α = Volume específico. A quantidade RM

R

é chamada “constante

do gás” e varia para cada gás, pois depende da massa molecular M .

O ar seco é uma mistura de 2N , 2O , Ar e 2CO e a sua massa molecular média é

28,97M d . O mol de ar pesa 0,02897kg28,97g e a constante de gás do ar vale:

kgk

J287

0,02897

8,314

M

RR

0

d

d

.

Com essas expressões, a equação de estado para o ar seco fica: TρRP d ou

TRPα d .

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Geralmente são medidas a Temperatura e a Pressão, podendo-se calcular a

Densidade por essas expressões.

Exemplo: Calcular a Densidade e o Volume Específico do ar sabendo-se que a

Pressão é 25

mN 101,025 e a Temperatura é C23,70 .

K 296,8 273,1 23,7 T 0

TRρP d ou 35

d

mkg1,20 296,8287

101,025

TR

kgm0,83 1,20

1

ρ

1α 3

3.2.2 Ar Húmido

Se houver vapor de água no ar, podemos considerar uma mistura de dois gases: ar

seco e vapor de água. Cada um age como um gás ideal. Para o vapor de água:

TRρe VV . Onde: V

VM

RR

e VM é a massa molecular da água, igual a 18,016 g

ou kg1018,016 3 . Assim, KkgJ461 1018,016

8,314R 0

3V

. (Este valor será

usado adiante no estudo da humidade na atmosfera).

3.2.3 Unidades de Pressão

A unidade de pressão no sistema universal é o 2m

N, também chamada Pascal e

abreviada Pa . Normalmente se usa uma outra unidade derivada que é o

hectopascal ou seja, 100 Pa1 hPa . Isso se faz porque as pressões atmosféricas

são da ordem de Pa105 , mas a precisão das medidas é da ordem de 10 Pa .

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Usando-se hpa , normalmente o valor da medida terá uma casa decimal. Exemplo:

987,3 hPap .

Antigamente, e ainda em umas poucas publicações, essa unidade era chamada

milibar ( mb ), que era um submúltiplo do bar (b ), que vale Pa105 .

Publicações técnicas normalmente exigem o uso do hectopascal, recomendado pela

Organização Meteorológica Mundial (OMM).

3.2.4 Equação Hidrostática

A atmosfera está em constante movimento, mas as acelerações na direcção vertical

são muito pequenas, ou muito localizadas no tempo e no espaço. Por isso, se usa

uma aproximação chamada “aproximação hidrostática”, onde se supõe que haja

equilíbrio na vertical entre as forças devidas á variação da pressão na vertical e o

peso.

A expressão matemática desse equilíbrio é a equação do balanço hidrostático ou

equação hidrostática.

Considere-se uma coluna de ar com secção horizontal de área S e espessura y

(Vide Figura 3.4). O volume é δySδV e a massa é δySρδVρδVρδM .

Sendo assim, o seu peso será δySgρPδ

.

Figura 4: Coluna de ar com secção horizontal de área S e espessura y .

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Essa mesma coluna de ar sofre a acção da pressão em ambas as faces horizontais.

Chamando de p a pressão na face inferior e δppp a pressão na face superior,

o acréscimo de pressão δp é negativo, pois a pressão diminui com a altura. As

forças devidas à pressão serão: SpFA

e SδppFg

. Equilibrando essas

forças com o peso da camada teremos:

0PδFF Ag

0δySgρ.Sδppp.S

ou

0δygρδp

e

δygρδp

Supondo que δy seja infinitesimal e substituindo y por Z e p por P teremos:

dZgρdP , que é a equação hidrostática na forma diferencial. Ela pode ser

integrada para fornecer a variação da pressão com a altura:

2

1

2

1

Z

Z

P

P

dZgρdP

ou

2

1

Z

Z

12 dZgρPPPP

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3.2.5 Altura Geopotencial

Por outro lado, a equação hidrostática pode ser usada para determinar a espessura

de uma camada em função das pressões da seguinte maneira: gdPdZ . Como

não é directamente medido, e sim a temperatura e a pressão, faz-se uso da

equação de estado para se obter: TRP d e PgdPTRdZ d . Supondo-se

teconsgg tan0 , teremos: 2

1

2

1

012

P

P

d

Z

Z

PdPTgRdZZZ .

Essa equação é aproximada porque na verdade g varia com a altura. Porém, o

desvio introduzido no cálculo de Z é muito pequeno e essa equação é usada

universalmente para a determinação de alturas em função da pressão. Na prática se

considera uma temperatura média (T

) da camada entre 1Z e 2Z e assim a equação

fica: 2

1

2

1

ln0012

P

P

P

Pdd PgTRPdPgTRZZ ou

)ln()ln( 21012012 PPgTRPPgTRZZ dd que é uma expressão mais simples e

mais usada, chamada “equação hipsométrica”.

3.2.6 Superfícies Isobáricas

As rádios sondas medem a pressão atmosférica, a temperatura e a humidade do ar

em diferentes níveis na vertical. A altura não é medida directamente, mas pode ser

obtida através da equação hipsométrica.

Desde que se conheça a pressão na superfície, pode-se calcular as espessuras das

camadas consecutivas a partir da superfície, somando-se para obter as alturas de

cada nível.

Se unirmos os pontos de mesma pressão de várias sondagens atmosféricas de uma

mesma região, estes formarão uma superfície isobárica (isso = mesma, bárica =

relativo a pressão). Por exemplo: uma superfície isobárica de 500 hPa.

Cada ponto tem uma altura diferente e um “desenho” dessa superfície pode parecer

um lençol ondulante, com partes altas e baixas e depressões ou montes circulares.

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Se se fizesse um corte vertical de várias superfícies isobáricas com diferentes

pressões, teríamos uma Figura semelhante a Figura 3.5.

Figura 3.5: Ilustração de uma Superfície Isobárica.

As superfícies isobáricas não se cruzam nem se tocam e, onde o espaçamento é

maior a equação hipsométrica indica que a temperatura também é maior. Regiões

perto da ALTA são chamadas “cavados” ou “depressões”. Regiões perto da BAIXA

são chamadas “cristas”.

Essa observação é importante porque o ar tem a tendência de se movimentar das

regiões de maior pressão para as de menor pressão, isto é, ele tende a “entrar” nos

cavados e a sair das “cristas”.

3.2.7 Cartas Isobáricas

Assim como a topografia de uma montanha ou de um vale pode ser representada

por curvas de nível, também uma superfície isobárica pode ser representada por

linhas de alturas iguais, ou isolinhas de altura geopotencial.

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Para a atmosfera semelhante a Figura 3.5, se se efectuassem vários cortes

horizontais e se projectassem num plano horizontal, teríamos uma Figura

semelhante a Figura 3.6.

Figura 3.6: Ilustração de uma Carta Isobárica.

A região denotada pela letra B corresponde a uma região de baixa pressão e

contém pontos com pressão menor que os vizinhos. O ponto A se encontra numa

região em que os pontos vizinhos têm pressão menor, caracterizando uma região de

pressão mais alta, ou crista.

Se na região de A e B as linhas forem fechadas, termos centros de alta e baixa

pressão. O que dão-nos a indicação de Bom e Mau Tempo respectivamente.

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3.2.8 Cartas de Pressão

Alternativamente, poder-se-ia cortar as superfícies isobáricas por um único plano

horizontal. As intersecções seriam linhas de mesma pressão (isóbaras).

Normalmente essas cartas são feitas apenas para um plano no nível do mar, ao

qual designamos altura zero. Essas cartas são chamadas de “cartas de superfície”.

Nestas cartas também podemos localizar cavados e cristas e centros de baixa e alta

pressão. Um exemplo disso é a carta apresentada na Figura 3.6.

3.2.9 Redução da Pressão ao nível do Mar

Pressões ao nível do mar só podem ser medidas no mar e em pouquíssimas

estações em Terra, uma vez que a maioria delas se localiza acima do nível do mar.

Por isso, foi necessário projectar um método para determinar a pressão que seria

medida se a estação estivesse no nível do mar. O método corrente supõe que sob

uma estação à altura H exista uma camada de ar em que a temperatura varia

segundo o perfil médio de temperatura da atmosfera, ou seja,

KmCdZdT 05,6 .

A temperatura média pode ser calculada como 2)( 0TTT s ou HTT 0 ou

HTT s 0 e 22)( HTHTTT sss .

Usando a equação hipsométrica: )ln( 000 sds PPgTRHZZ donde se obtém

0P : )exp( 00 TRHgPP ds . Supõe-se que esta seria a pressão ao nível do mar se

não houvesse a montanha.

Esse tipo de redução da pressão também é usado para medidas de altura simples

entre o avião e o solo.

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3.2.10 Teoria Cinética dos Gases

É útil rever os conceitos do comportamento microscópio dos gases, que ajudam a

compreender conceitos macroscópicos como os de pressão, temperatura,

evaporação, difusão, etc.

Um gás é considerado ideal quando:

O número de moléculas é grande o suficiente para podermos considerar

como comportamento macroscópico uma média estatística do

comportamento individual das moléculas.

As moléculas se movem caoticamente em todas as direcções e sentidos,

com diferentes velocidades, de modo que nenhuma direcção é privilegiada,

isto é, o gás é isotrópico.

Os choques entre moléculas, e com as paredes do recipiente que as

contenha, são inelásticos, isto é, a energia cinética das moléculas é

conservada.

A única forma de energia das moléculas é a energia cinética de translação e de

rotação, isto é, as moléculas só interagem por contacto nas colisões e não à

distância. O volume próprio das moléculas é desprezível.

3.2.11 A pressão exercida pelo gás

Suponhamos que o gás está encerrado em um recipiente, tal como é mostrado na

Figura 3.7. O recipiente dispõe de um êmbolo móvel de área A. Para manter fixo o

êmbolo é necessário exercer uma força F, perpendicular à superfície do êmbolo. O

valor da força F é igual ao produto da pressão exercida pelo gás pela área do

êmbolo (F=PA).

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Figura 3.7: I gás está encerrado em um recipiente. F=PA.

As moléculas do gás chocam elasticamente com o êmbolo, de modo que a

componente X da velocidade muda de sentido. Por tanto, a variação no momento

linear de cada molécula é Dp=2mvx.

Se o número total de moléculas que chocam com o êmbolo no intervalo de tempo

compreendido entre t e t+Dt é Nx, a variação de momento linear será 2mvxNx.

Podemos calcular Nx considerando que somente a metade das moléculas, em

média, tem o sentido da velocidade para a parte positiva do eixo X, logo, se dirigem

para o êmbolo.

Se supormos que as moléculas que chocam com o êmbolo tem o mesmo valor da

componente X da velocidade, cruzarão a área A no tempo Dt todas as partículas

contidas no volume AvxDt. Se n é o número de partículas por unidade de volume Nx

valerá então, nAvxDt/2.

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A variação de momento linear Dp no intervalo de tempo compreendido entre t e t+Dt

é mvx nAvxDt.

A força sobre o êmbolo é o quociente entre a variação do momento linear e o tempo

que gasta para efectuar esta variação.

e por tanto, a pressão exercida pelo gás vale P=n(mv2x).

Todas as moléculas não tem o mesmo valor vx de velocidade, e sim que a

distribuição de velocidades é tal que seu valor médio quadrático é <v2x>. Por tanto,

na expressão da pressão P, temos de substituir v2x por <v2

x>. Já que <v2x> = <v2>/3,

teremos:

O último termo que aparece na fórmula é o valor médio da energia cinética.

3.2.12 Primeira lei da Termodinâmica

A primeira lei da termodinâmica é uma expressão da conservação da energia que

relaciona as possíveis trocas de energia entre um sistema e o seu ambiente ou

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vizinhança. Ela é útil para determinar o comportamento do ar. Por exemplo, quando

sujeito a diferentes formas de transporte de energia, seja mecanicamente ou

termicamente.

Para isso considera-se como sistema um elemento de volume de gás de massa

unitária (m) e volume (V).

Em meteorologia, como não é prático considerar como sistema toda a massa de ar,

os cálculos são feitos para sistemas de massa e volume infinitesimais e expressos

por unidades de massa.

3.2.12.1 Trabalho Realizado por um Gás

Quando um gás se expande, ele deve vencer a força de pressão do ambiente ( AP )

que age sobre ele. Isso quer dizer que ele realiza um trabalho ( W ) contra o

ambiente igual a essa força vezes o deslocamento ( S ).

SAPW

Se S é muito pequeno, VSA é a variação do volume da parcela, sendo A a

área da superfície externa da parcela. Portanto:

VPW

Esta é uma forma simples de escrever o trabalho realizado. Esse trabalho pode ser

positivo ou negativo, se o volume aumentar ( 0V ) ou diminuir ( 0V ),

respectivamente. O trabalho realizado por unidade de massa será:

PdmdVPdWmdW

Onde se considerou 0V

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3.2.12.2 Calor Fornecido a um Gás

O calor fornecido a um gás ( dQ ) pode produzir mudanças no estado desse gás.

Seu volume variou, trabalho foi realizado pelo gás ou contra o gás. Pode haver

também aumento ou diminuição da temperatura.

Em qualquer caso, se for fornecido calor (energia) a um gás, este será transformado

em trabalho mecânico e/ou empregado no armazenamento de energia interna do

gás.

Essa afirmação pode ser expressa na forma da equação da conservação de

energia, ou Primeira Lei da Termodinâmica:

dudwdq

Onde dq é o calor fornecido por unidade de massa do gás.

Note-se que a equação pode ser escrita alternativamente:

dudqdw ou dwdqdu

Na primeira equação pode-se supor que o trabalho fornecido a um gás pode

provocar uma transferência de calor entre o gás e um outro sistema e uma variação

de energia interna do gás.

Na segunda, mostra-se que a variação da energia interna é causada pela

transferência de energia para dentro ou para fora do gás e pela realização de

trabalho.

As quantidades du , dq e dw podem ser positivas ou negativas, mas sempre

obedecendo a equação de conservação da energia.

3.2.12.3 Casos Particulares

Embora a Primeira Lei da Termodinâmica seja válida para qualquer transformação,

algumas transformações particulares são de interesse.

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1) Transformação Isovolumétrica

É a transformação a volume constante. Neste caso, como não há

movimentos das fronteiras, não se realiza trabalho ( 0Pdαdw ). Então:

dqdu ou seja, todo calor fornecido é armazenado pelo gás, aumentando

sua energia interna. Se o calor for perdido, a energia interna será diminuída

da mesma quantidade.

Verifica-se que, nas transformações isovolumétricas, o calor trocado

(recebido ou perdido) é proporcional á variação da temperatura:

dTCdq V

Onde: VC - Calor específico a volume constante.

Para uma massa m de gás, ter-se-ia: dTmCdQ V que é uma expressão

conhecida.

Voltando a Primeira Lei: dTCdu V . Como se sabe da teoria cinética dos

gases, a energia interna é proporcional a temperatura. Então, a expressão

acima faz concluir que a energia por unidade de massa pode ser escrita

como: TCu V . Para o ar seco kkgJCV

0717 e a expressão dTCdu V

pode ser usada para qualquer transformação, mesmo não sendo a

Isovolumétrica.

Assim, uma nova forma para a expressão da Primeira Lei da Termodinâmica

seria:

PdαdTCdq V .

2. Transformação Isobárica

É a transformação á pressão constante ( 0dp ). No caso da atmosfera

corresponde a transformação que ocorrem em parcelas de ar que

permanecem paradas por algum tempo ou que se movimentam sobre

uma superfície isobárica, ou em trajectórias curtas na horizontal. Usando

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a equação de estado dTRαdPPdαPα d T RPα dd , a

equação da primeira lei da termodinâmica fica: αdPdTRdTCdq dV ou

αdPdTRCdq dV .

A segunda parcela do segundo termo é nula para transformação

isobárica, então: dTRCdq dV . Costuma-se chamar a soma entre

parêntesis de PC , o calor especifico a pressão constante: VdP CRC .

Para o ar seco, kkg

J1004CP

.

A primeira lei da termodinâmica toma então a forma alternativa:

αdPdTCdq P

3. Transformação Isotérmica

É a transformação á temperatura constante ( 0dT ). Neste caso a

energia interna não varia e todo o calor fornecido é todo transformado em

trabalho: Pdαdq

4. Transformação Adiabática

É a transformação que ocorre sem troca de calor ( 0dq ), portanto o

trabalho é realizado às custas da variação da energia interna: 0dwdu

ou 0PdαdTCV , ou ainda, usando a equação alternativa,

0αdPdTCP .

Lembrando-se que, pela equação de estado P

TRα d ,

0P

dPTRdTC dP ou

P

dP

C

R

T

dT

P

d

, que pode ser integrada entre um

estado inicial ( 0T , 0P ) e um estado final (T , P ) teremos:

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P

d

0 0

C

R

00

0P

d

0

T

T

P

PP

d

P

P

T

T

P

Pln

C

R

T

Tln

P

dP

C

R

T

dT

Esta equação é chamada equação de Poisson e mostra a variação da

pressão com a temperatura numa transformação adiabática. A razão P

d

C

R

é comummente chamada κ (Kapa) e vale, para o ar seco: 0,285C

P

d .

De modo que a equação de Poisson pode ser escrita:

K

00 P

P

T

T

Costuma-se definir uma “temperatura potencial”, indicada pela letra grega

θ (teta), como sendo a temperatura que uma parcela de ar teria se fosse

transportada adiabaticamente ao nível em que se encontra até o nível

padrão de 1000 hPa , o que corresponde na expressão acima fazer θT0

e 1000P0 .

κ

1000

PTθ

A equação de Poisson também pode ser escrita como:

κ

100

κ 1000θCConstantePTPT

Usando-se a equação de estado podem-se obter outras equações de

Poisson equivalentes:

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κ1

2

κ1

CConstanteTα

CConstantePα

No caso da atmosfera as transformações adiabáticas estão

constantemente presentes.

Para transformações que ocorrem num intervalo de tempo muito curto,

pode-se considerar que o calor trocado é desprezível, pois esse tipo de

transporte de energia é muito lento.

Se se tomar a equação da transformação adiabática na forma diferencial

e a dividir por dZ :

0dZ

dPα

dZ

dTCP

E lembrando a equação hidrostática:

PC

gdP

Essa equação diz que a taxa de variação da temperatura com a altura,

para uma parcela sofrendo uma transformação adiabática enquanto

arrastada na vertical é constante.

Essa constante, denominada “Perfil adiabático” é comummente

representada pela notação - dΓ .

km

C9.8

C

0

P

d , assim:

d

adiab

ΓdZ

dT

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3.2.13 Estabilidade Atmosférica

Os processos de estabilidade atmosférica recorrem ao equilíbrio de suas camadas.

Na Física, o equilíbrio de um corpo pode ser caracterizado em 3 situações: estável,

neutro ou instável. Quando todas as forças que actuam sobre um corpo se

equivalem, dizemos que o mesmo está em repouso.

Como comparamos o equilíbrio de um corpo em relação à superfície da Terra,

dizemos que, se não houverem forças, ele está em repouso. Vejamos as definições

de equilíbrio pela Física, fazendo uma analogia com as parcelas de ar atmosférico:

Estável: equilíbrio estável é aquele em que um corpo, perturbado por uma força,

voltará à sua posição original imediatamente após a actuação da força. Na

atmosfera, quando uma parcela é impulsionada por uma força, tenderá a retornar a

sua posição original. Este caso caracteriza a estabilidade do ar, dificultando ou

amortecendo os movimentos verticais.

Neutro: Equilíbrio neutro ou indiferente é aquele em que um corpo, perturbado por

uma força, permanecerá no mesmo equilíbrio na nova posição, após a actuação da

força. Na atmosfera, quando uma parcela é impulsionada por uma força, tenderá a

se mover só durante a actuação da força. Quando ela cessar, a parcela estaciona,

permanecendo no lugar, não tendendo a voltar para a posição original, nem

tampouco seguir adiante, mas poderá estar com um potencial maior, ou menor,

conforme foi seu deslocamento.

Instável: Equilíbrio instável é aquele em que um corpo, perturbado por uma força,

tenderá a se afastar cada vez mais da sua posição original, mesmo após a actuação

da força. Na atmosfera, quando uma parcela é impulsionada por uma força, tenderá

a se afastar cada vez mais da sua posição original. Este caso caracteriza a

instabilidade do ar, auxiliando os movimentos verticais e acelerando as parcelas.

Dependendo da taxa de resfriamento do ambiente (Lapse Rate), as parcelas de ar

que estão subindo podem adquirir tendências de estabilidade absoluta, estabilidade

condicional ou instabilidade absoluta. A definição da tendência da parcela levará em

conta a sua temperatura interna, quando esta é comparada à temperatura do ar ao

seu redor (do ambiente) no mesmo nível. Com isto, temos três casos distintos:

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E como vimos anteriormente, a parcela poderá subir (ou descer) contendo vapor

d’água em seu interior. Neste caso, a energia ainda permanece armazenada em

forma de calor latente e é definido como processo Adiabático Seco. Quando o calor

é liberado (ou solicitado) para a mudança de fase da água, o processo é chamado

Adiabático Húmido. Na prática, Adiabático Seco é o processo no qual a temperatura

da parcela de ar varia como se fosse um ar seco, conforme sobe / desce, na taxa de

1ºC /100m, e Adiabático Úmido é o processo no qual a temperatura da parcela de ar

varia como se fosse um ar saturado, conforme sobe /desce, na taxa de 0,6ºC/100m.

Os exemplos a seguir são bem ilustrativos, pois mostram a aplicação dos dois

conceitos. Lembre-se que, enquanto a parcela se eleva sem condensar seu vapor

d’água interno, o processo é adiabático seco. A partir do NCL, se a parcela

continuar a subir, o processo será adiabático húmido. Neste último, a parcela recebe

o calor latente liberado do vapor que está se condensando.

Exemplo de Estabilidade Absoluta: Dizemos que as parcelas estão em estabilidade

absoluta quando, a partir da elevação inicial por uma forçante, as parcelas se

resfriam a uma taxa maior que o gradiente térmico do ar ambiente (Lapse Rate).

Note que a estabilidade permanece tanto na razão da adiabática seca, quanto na

razão da adiabática húmida, quando a parcela atingiu o NCC e inicia-se a

condensação. Percebe-se que a liberação de calor latente após o NCC não

contribuiu em nada para o fomento da convecção de forma cumulativa.

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Nestes casos, a nebulosidade é estratiforme. Exemplo de Instabilidade Condicional:

Este tipo de estabilidade ocorre sempre quando o gradiente térmico do ar ambiente

estiver no intermédio entre os valores da razão adiabática seca e da razão

adiabática húmida, ou seja, o equilíbrio será estável enquanto o ar for seco,

passando para instável, quando o ar for saturado. Um exemplo clássico é o

resfriamento pelo gradiente térmico de 0,8ºC /100m, visto a seguir:

Nestes casos, a nebulosidade é estratiforme durante a ascensão estável fria,

passando para cumuliforme quando a ascensão torna-se instável e quente. Exemplo

de Instabilidade Absoluta: Dizemos que as parcelas estão em instabilidade absoluta

quando, a partir da elevação inicial por uma forçante, as parcelas se resfriam a uma

taxa menor que o gradiente térmico do ar ambiente. Note que a instabilidade

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permanece tanto na razão da adiabática seca, quanto na razão da adiabática

húmida, quando a parcela atingiu o NCC e inicia-se a condensação. Este tipo de

instabilidade ocorre quando há fortes gradientes térmicos do ar ambiente, ou seja,

dias muito aquecidos em superfície, típicos de verão.