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UNIVERSIDADE DA REGIÃO DE JOINVILLE – UNIVILLE CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA O LIAME ESTRUTURAL DO INGRESSO NO PROCESSO DE EXECUÇÃO ADVINDO DE UM PROCESSO COGNITIVO DE, ACORDO COM A LEI 11.232/05. ANDRÉ DE SOUZA MAFRA Orientador: Prof. MSc Cláudio Melquiades Medeiros Joinville (SC), outubro de 2007.

TCC André de Souza Mafra-5 A

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UNIVERSIDADE DA REGIO DE JOINVILLE UNIVILLECURSO DE DIREITO NCLEO DE PRTICA JURDICA COORDENAO DE MONOGRAFIA

O LIAME ESTRUTURAL DO INGRESSO NO PROCESSO DE EXECUO ADVINDO DE UM PROCESSO COGNITIVO DE, ACORDO COM A LEI 11.232/05.

ANDR DE SOUZA MAFRA

Orientador: Prof. MSc Cludio Melquiades Medeiros

Joinville (SC), outubro de 2007.

UNIVERSIDADE DA REGIO DE JOINVILLE UNIVILLECURSO DE DIREITO NCLEO DE PRTICA JURDICA COORDENAO DE MONOGRAFIA

O LIAME ESTRUTURAL DO INGRESSO NO PROCESSO DE EXECUO ADVINDO DE UM PROCESSO COGNITIVO DE, ACORDO COM A LEI 11.232/05.

ANDR DE SOUZA MAFRA

Monografia submetida Universidade da Regio de Joinville UNIVILLE, como requisito parcial obteno do ttulo de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. MSc Cludio Melquiades Medeiros

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Joinville (SC), outubro de 2007.

Meus agradecimentos:

Deus, servir de acalento nas horas difceis e sempre servir de guia espiritual. Ao meu orientador, Professor Cludio Melquiades Medeiros, por ter me auxiliado no presente trabalho, sempre se apresentando prontamente para ajudar e ensinar. Aos Professores desta instituio, por terem me ajudado a desvendar os caminhos do Direito.

Dedico esta obra:

Aos meus amigos e minha famlia; Em especial ao meu pai Wilson Jos Mafra e minha me Maria de Souza Mafra, aos quais admiro muito, por serem meus exemplos de carter e conhecimento e sempre servirem de orientao nos momentos mais difceis e conturbados.

, pois, a nosso ver, hora de se pensar em maior profundidade, para atravs de medidas aparentemente singelas, penetrar na prpria estrutura do nosso sistema processual, dele extirpando reminiscncias de romantismos anacrnico, que no correspondem, evidentemente, aos atuais anseios de maior valorizao e mais presteza da atuao jurisdicional Humberto Theodoro Jnior.

PGINA DE APROVAO

A presente monografia de concluso de Curso de Direito da Universidade da Regio de Joinville UNIVILLE, elaborada pelo(a) graduando(a) ANDRDE

SOUZA MAFRA, sob o ttulo O liame estrutural da entrada no processo foi submetida obtendo em _____de a __________de mdia tendo 2007 final sido Banca _____ considerada

de execuo advindo de um processo de cognio, de acordo com a Lei 11.232/05, Examinadora, aprovada.

(______________________________________),

Joinville, _____ de _________________ de 2007.

_________________ Prof.

__________________ Prof.

___________________ Prof.

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DECLARAO DE ISENO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideolgico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade da Regio de Joinville UNIVILLE, a Coordenao do Curso de Direito, a Banca Examinadora, o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Joinville (SC), _____ de _________________ de 2007.

ANDR DE SOUZA MAFRA GRADUANDO

AUTORIZAO DE PUBLICAO PARA FINS CIENTFICOS

Autorizo a publicao do presente trabalho, para fins unicamente cientficos, na rede mundial de computadores, stio da Universidade da Regio de Joinville UNIVILLE, sem quaisquer nus a esta. Declaro, ainda, ter sido informado(a) de que a presente autorizao no me foi colocada de forma obrigatria e que a aprovao do presente contedo perante a Banca Examinadora no depende daquela.

Joinville (SC), _____ de _____________ de 2007.

ANDR DE SOUZA MAFRA GRADUANDO

SUMRIO

RESUMO............................................................................................xiINTRODUO...................................................................................................1 Captulo 1............................................................................................................................3 DA AUTONOMIA, EVOLUO E O SINCRETISMO PROCESSUAL ALIADO LEI 11.232/05.............................................................................................................3 1.1. A AUTONOMIA DO DIREITO PROCESSUAL E SUA EVOLUO.........3 1.2. A EVOLUO LEGISLATIVA COMO FORMA DE ATENDER OS ANSEIOS SOCIAIS...................................................................................................7 1.3. A HISTRIA DO PROCESSO DE EXECUO.............................................9 1.4. O SINCRETISMO PROCESSUAL EVOLUTIVO E ATUAL ......................13 1.5. O PONTO CULMINANTE: A LEI 11.232/05................................................19 Captulo 2..........................................................................................................................23 Da nova liquidao de sentena...................................................................................23 2.1. DO NOVO CONCEITO DE SENTENA.......................................................23 2.2. DA LIQUIDAO DE SENTENA..............................................................26 2.2.1. Do art. 475-A do CPC................................................................................28 2.2.2. DO ART. 475-B do CPC...........................................................................31 2.2.3. Do art. 475-C do CPC................................................................................37 2.2.4 Do art. 475-D do CPC.................................................................................39 2.2.5 Do art. 475-E do CPC.................................................................................41 2.2.6 Do art. 475-F do CPC.................................................................................42 2.2.7 Do art. 475-G do CPC.................................................................................43 2.2.8 Do art. 475-H do CPC.................................................................................44 Captulo 3..........................................................................................................................46 Do cumprimento da sentena.......................................................................................46 3.1. DO ART. 475-I DO CPC..............................................................................46 3.2. DO ART. 475-J ............................................................................................48 3.3. DO ART. 475-L DO CPC ............................................................................59 3.4. DO ART. 475-M DO CPC ...............................................................................67 3.5. DO ART. 475-N DO CPC ...............................................................................71 3.6. DO ART. 475-O DO CPC ...............................................................................79 3.7. DO ART. 475-P DO CPC ................................................................................84 3.8. DO ART. 475-Q DO CPC ...............................................................................87 3.9. DO ART. 475-R ...............................................................................................90 CONSIDERAES FINAIS.......................................................................................92 REFERNCIAS DAS FONTES CITADAS...............................................................93 referncias legislativas..................................................................................................96

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RESUMO

A presente pesquisa est direcionada a uma anlise das vrias correntes e entendimentos criados com relao Lei n. 11.232/05. A Lei em anlise passa a ser um marco na esfera processual civil, uma vez que implementa o sincretismo como regra e no mais exceo aplicada somente em certos casos quando preenchidos certos requisitos. A nova Lei vem o intuito de tornar efetivo o pronunciamento jurisdicional, tornando mais clere o tramite da execuo, alterando a estrutura do processo, fazendo com que tanto a demanda de conhecimento, como a de execuo, se integralizem, criando-se somente fases como divisria entre ambas, sem necessidade de se ajuizar nova demanda ou nova relao processual aps uma sentena condenatria. Desta forma, analisam-se os artigos inovadores da nova Lei, fazendo um choque entre pensamentos e posicionamentos, alertando para as possveis omisses, divergncias, abrangncias e suposies, sempre se levando em conta o sincretismo entre demandas.

INTRODUO

O objeto deste Trabalho de Concluso de Curso a investigao acerca da nova Lei n 11.232, de 22 de dezembro de 2005, considerando sua necessidade, seu propsito e seus pontos controvertidos . O seu objetivo institucional a produo de Monografia para Joinville - UNIVILLE. O objetivo geral do trabalho mostrar aos leitores a adequao da Lei n. 11.232 de 2005 ao ordenamento processual civil nacional e os objetivos especficos so: as linhas histricas da execuo, demonstrar a necessidade da criao da Lei 11.232/05, o sincretismo processual interligando o processo de conhecimento e de execuo situar a nova Lei ao ordenamento ptrio, analisando seus artigos e pontos mais inovadores e obscuros. Desta forma, os objetivos especficos desta pesquisa esto diretamente relacionados aos anseios nocionais e o advento de novas leis como forma de viabilizar o processo e o direito como um todo, aflorando os preceitos de justia ao lado da celeridade e da efetividade, de forma linear e paralela. Adotou-se o mtodo qualitativo, operacionalizado com as tcnicas da pesquisa bibliogrfica, fichamentos e pesquisa de campo, dividindo-se o trabalho em trs captulos. O primeiro captulo tratar da autonomia do processo, saindo este de mero veculo para se tornar instrumento efetivo, das evolues legislativas implementadas nos ltimos anos, da histria do processo de execuo, do sincretismo unificador dos processos de conhecimento e de execuo, visualizando a entrega do bem da vida de maneira concreta e a Lei 11.232/05, sob seus aspectos de criao e de seus propsitos. Na segunda parte ser abordada o incio da Lei em si, comeado pela anlise do novo conceito de sentena e da liquidao em uma primeira fase. Posteriormente passa-se ao art. 475-A, terminado no art. 475-H, todos includos pela Lei 11.232/05 ao Cdigo de Processo Civil. a obteno de ttulo de Bacharel em Direito pela Universidade da Regio de

2 J no Captulo 3 passar-se- a anlise e discusso do restante dos artigos adicionados ao Cdigo de Proceso Civil, comeando em seu art. 475-I e acabando no art. 475-R, todos acrescidos pela Lei 11.232/05. Findando o contedo investigatrio, nas consideraes finais ser apurado o que se concluiu da presente pesquisa.

Captulo 1 DA AUTONOMIA, EVOLUO E O SINCRETISMO PROCESSUAL ALIADO LEI 11.232/05

1.1. A AUTONOMIA DO DIREITO PROCESSUAL E SUA EVOLUO

Com a formao do Estado Moderno no final da Idade Mdia, nascem novas concepes acerca de Justia, e em torno das instituies processuais. As vises aristocratas e autoritrias a partir do sculo XIII (Magna Carta promulgada na Inglaterra) passaram a dar abertura para um entendimento democrtico, humanista e republicano dos Estados. Os direitos fundamentais passam a ser amplamente positivados (Declarao de Virgnia nos Estados Unidos no ano de 1776, Declarao dos Direitos do Homem e do Cidado na Frana no ano de 1789, Declarao Universal dos Direitos do Homem elaborada pelas Naes Unidas em 1948, dentre outras) e vistos sob olhos de garantias aplicveis, vendo o cidado como objetivo fim do Estado, sabendo-se que este nasce e serve para quele e no vice-versa. Nas palavras de Humberto Theodoro Jnior: Os direitos dos cidados, em nosso tempo, saram do mbito das meras declaraes solenes para entrar no campo das misses prticas que ao Estado cumpre implementar1. Implementam-se princpios estruturais para uma justia que d a confiana necessria para o cidado. O Estado como detentor do monoplio da jurisdio, passa a tentar disponibilizar uma tutela confivel, independente e imparcial. Formas especficas passam a ser adotadas, no intuito de dar segurana aos pareceres jurisdicionais, delimitando poderes, faculdades e1

THEODORO JNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da prestao jurisdicional. Insuficincia da reforma das leis processuais, p. 20.

4 deveres dos sujeitos processuais. Institui-se ento o processo aliado ao formalismo, contendo este nas palavras de Carlos A. de Oliveira, a prpria idia de processo como organizao da desordem, emprestando previsibilidade a todo o procedimento 2. Assim, o processo criado para a adequada aplicabilidade da tarefa jurisdicional do Estado, ditando seus limites e formas de atuao, colando-se em patamar de nivelar as partes litigantes, salvo excees previamente previstas no ordenamento legal. Nesta conjuntura, o direito processual civil o meio/instrumento, ligado ao direito pblico, pelo qual o Estado efetiva a aplicao do Poder Jurisdicional e as partes exercem o direito ao contraditrio e a ampla defesa. Em meados do Sculo XX, o processo ganhou autonomia cientfica, tendo como mola propulsora, as doutrinas italiana e alem, criando-se assim seus primeiros conceitos, seu fim e sua atuao propriamente dita. O processo sai da esfera de mero emaranhado de formas e rotinas. Segundo Humberto Theodoro Jnior, neste diapaso, o direito processual deixa de ser simplesmente repositrio de formas e praxes de pleitos jurdicos e assume a qualidade de estatuto funcional de um dos poderes soberanos do Estado Democrtico3. Atualmente, a idia de processo ultrapassa o conceito inicial de mero veculo dotado de formas e mtodos, sendo ele, o efetivo instrumento garantidor ao acesso justia, garantia do devido processo legal, entre outros preceitos inerentes aos Estados Democrticos de Direito. Sabe-se que funo jurisdicional tem seu aperfeioamento com a entrega da prestao pleiteada, sendo esta o escopo da ao. A partir de um processo de conhecimento, no qual o autor busca a efetivao de uma demanda por parte do Estado-Juiz, este deve satisfazer a pretenso querida de forma clere e efetiva, sem que ocorra um detrimento do direito por no se conseguir uma tutela limpa e gil. As leis, num modo geral, devem ser condizentes com as necessidades sociais, visando com que a sociedade de forma uniforme, alcance um desenvolvimento amplo.2 3

OLIVEIRA, Carlos Alberto lvaro de. Do formalismo no processo civil, p. 07. THEODORO JNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da prestao jurisdicional. Insuficincia da reforma das leis processuais, p. 20.

5 Atualmente, tem-se visto que o processo no est atingindo seu fim (entregar efetivamente o bem pretendido ao litigante), uma vez que no se d a soluo querida s pretenses expostas ao poder jurisdicional, uma vez que a morosidade, impera contra a satisfao. Figueira Jnior.(...) o processo de conhecimento tal como idealizado pela doutrina clssica, que se baseia na insubsistente classificao ternria das aes e no ultrapassado modelo da ordinariedade, no consegue fazer com que o instrumento, em termos prticos, se torne efetivo4.

Acerca do tema leciona Joel Dias

certo que o processo judicial emana tempo, sendo que este elemento no pode ser afastado por uma serie de questes, porm o tempo dispndio na demanda, nunca pode ir contra a sua efetividade, posto que assim o processo atuaria contra o direito, de forma contraria e antagnica, frustrando expectativas. Bem assevera Rudolf von Jhering: O direito existe para se realizar. A realizao a vida e a verdade do direito, o prprio direito5. Complementando tal ensinamento, leciona Carlos Alberto A. de Oliveira: Assim porque, sobretudo no direito como entidade prtica, a determinao da essncia no comprova a existncia: o direito no direito sem se manifestar na prtica e como prtica6. Cabe ressalvar que a busca cega pela celeridade no denota efetividade, sendo que a procura pela real efetividade, no pode seguir desatenta aos princpios normativos. No se pode abrir mo de valores importantes do processo que refletem o verdadeiro fim colimado; a justia. Assim, imparcialidade, independncia dos rgos jurisdicionais, publicidade dos atos, ampla defesa, acesso justia, contraditrio, direito produo de provas e outras garantias institucionais, salvo rarssimas excees, nunca havero de ser sacrificadas seja qual for o objetivo, sob pena de queda do valor de justia, espelho e finalidade jurdica do processo. Ou seja, busca pela4 5

FIGUEIRA JNIOR, Joel Dias. Comentrios novssima reforma do CPC, p. 08. JHERING, Rudolf von. Geist ds romischen Rechts auf dens verschiedenen Stulfen seiner Entwicklung, p 232. Apud do livro de Carlos Alberto lvaro de Oliveira, p. 244. 6 OLIVEIRA, Carlos Alberto lvaro de. Do formalismo no processo civil. p. 244.

6 celeridade e o seu reflexo na efetividade, extirpando formalismos desnecessrios e usando-se mtodos mais efmeros, no denotam perca de valores intrnsecos necessrios. Sendo assim, em meados dos anos 80, surge uma perspectiva nova, com relao a tutela jurisdicional, na qual o legislador cobia adequar a celeridade e efetividade ao processo, entendendo que o processo no estava atingindo seu fim na sociedade moderna, criando-se at jarges leigos perante esta, como o conhecido ganhou mais no levou. lvaro Couri Antunes Souza, ensina que:Importa aos processualistas a questo da efetividade do processo como meio adequado e til de tutela dos direitos violados, pois, consoante Vicenzo Vigoriti o binmio custodurao representa o mal contemporneo do processo. Da a imperiosa urgncia de se obter uma prestao jurisdicional em tempo razovel, atravs de um processo sem dilaes, o que tem conduzido os estudiosos a uma observao fundamental, qual seja, a de que o processo no pode ser tido como um fim em si mesmo, mas deve constituir-se sim em instrumento eficaz de realizao do direito material7.

Estudos do Supremo Tribunal Federal (STF)8 demonstram que a taxa de congestionamento da justia alcana a porcentagem de 59,26%. Desta forma, arredondando para uma taxa de 60%, a cada 100 demandas protocoladas, 40 teriam seu deslinde no transcurso de um ano, ao passo que 60 passariam a abarrotar o judicirio no ano seguinte. Imagine-se esses 60 processos de 100 acumulados por 10, 20, 30 anos. Os dados anteriores se referem ao ano de 2003, ao passo que em 2005 j existem estudos9 de que a morosidade da justia estadual alcana 80, 51% de congestionamento. A morosidade inevitvel nos atuais moldes, tendo em vista o volume de demandas e o poder de julgamento e conseqente extino dos7

SOUSA, lvaro Couri Antunes. Juizados Especiais Federais Cveis: aspectos relevantes e o sistema recursal da lei n. 10.259/01, p 132. 8 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Justia em nmeros: indicadores estatsticos do poder judicirio, publicado em maio de 2003. Disponvel em 9 BRASL. Conselho Nacional de Justia. Justia em nmeros: indicadores estatsticos do poder judicirio, relatrio anual de 2005. Disponvel em < http://www.stf.gov.br/imprensa/pdf/JusticaEmNumeros2004.pdf>

7 processos pelo judicirio nacional, no havendo fuga para o abarrotamento judicial na conjuntura atual.

1.2. A EVOLUO LEGISLATIVA COMO FORMA DE ATENDER OS ANSEIOS SOCIAIS

A legislao comeou a se ater para tal problemtica, criando preceitos condizentes com a efetividade e celeridade. Exemplo disso so os arts. 125, II e 130 do Cdigo de Processo Civil10, onde determina-se que o juiz considere a rpida soluo do litgio e evite diligncias inteis ou meramente protelatrias e atualmente o art. 5, LXXVIII, da Constituio Federal 11, que assegura a todos a razovel durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao. At meados dos anos 90, por mais que os operadores do direito quisessem dar celeridade processual aos litgios, instrumentos lhes faltavam, uma vez que as leis no estavam seguindo as mudanas e novas concepes sociais. O marco inicial infraconstitucional para uma mudana estrutural foi dado com a promulgao da Lei n. 8.95212, que criou mecanismos mais efetivos ao aplicador do direito. Intentava o legislador dar maior agilidade ao processo, concedendo ao juiz mecanismos complementares para abolir eventuais resistncias ao no cumprimento das sentenas relativas s obrigaes de fazer e no fazer, bem como, evitar eventual perecimento de direitos, no que concerne s tutelas de urgncia. Alterou-se assim o art. 461 do CPC, e o art. 273 do referido Diploma Legal. Desta forma, utilizando-se do art. 461, poderia o magistrado tomar as medidas cabveis para a obteno da tutela pleiteada, sem a necessidade de se utilizar das vias executivas, tudo de acordo com o Livro I do CPC. Da mesma forma procedeu-se com o art. 273, onde sob pena de perecimento de direitos e veto de eventuais defesas procrastinatrias, deu-se10

BRASIL. Cdigo de Processo Civil. Lei n. 5.869 de 11 de janeiro de 1973. Institui o cdigo de processo civil. 11 BRASIL. Constituio (1988). Constituio da Repblica Federativa do Brasil. 12 BRASIL. Lei n. 8.952 de 13 de dezembro de 1994. Altera dispositivos do Cdigo de Processo Civil sobre o processo de conhecimento e o processo cautelar.

8 instrumento para o magistrado antecipar os efeitos da sentena, dando azo para a aplicao imediata de medidas executivas dentro de um processo cognitivo. Em que pese a possibilidade de revogao, uma vez julgados procedentes todos os pedidos do autor, no mais haver o que se executar, tendo em vista a antecipada obteno dos efeitos queridos. Dessa forma, ter-se- apenas uma sentena confirmando a situao j existente, sem nenhuma outra execuo posterior. Comeou ento uma tmida e singela tentativa de aproximao mais real (posto que outras medidas executivas latu sensu j existiam) entre o processo de cognio e execuo, quebrando o muro que separava ambos. A tentativa restou exitosa, demonstrando a desnecessidade de se enfrentar dois processos autnomos, levando-se em conta a possibilidade do magistrado utilizar-se da faculdade lhe conferida pelos art. 461 e 273 do CPC. Como a Lei 8.952/94 conseguiu atingir seus objetivos, restando bem sucedida, o legislador passou a seguir com as reformas tentando cada vez mais acabar com a dicotomia conhecimento/execuo. Assim, em um segundo passo, se cria-se a Lei n. 10.44413, estendendo o mtodo recm inaugurado para as obrigaes de entrega de coisa, adicionando-se o art. 461-A ao CPC. Acerca do tema leciona Carlos Alberto Carmona:Inaugurou-se assim uma nova fase em nosso processo civil, em que certos ttulos executivos judiciais no dariam mais margem ao processo de execuo. Explico: as sentenas condenatrias (art. 584, I) nem sempre abriam as portas ao processo executivo, eis que tais ttulos, quando determinassem um fazer ou um no fazer, ou ento a entrega de coisa certa ou incerta, ensejariam o prosseguimento da atividade jurisdicional, sem necessidade de instaurao de execuo, para que fossem implementadas as determinaes constantes das 14 sentenas .

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BRASIL. Lei n. 10.444 de 7 de maio de 2002. Altera a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 Cdigo de Processo Civil. 14 ALBERTO CARMONA, Carlos. Novidades sobre a execuo civil: observaes sobre a Lei 11.232/05, p. 57-58.

9 Nessa ideologia inovadora e revolucionria, no ano de 2005, o legislador infraconstitucional, criou-se a Lei 11.23215, que de forma substancial alterou os moldes da execuo de ttulo judicial no CPC. O paradigma cognio/execuo, alterou-se de uma vez por todas, instalando-se o sincretismo concreto entre ambos (tema a ser estudado no item 1.5).

1.3. A HISTRIA DO PROCESSO DE EXECUO A execuo Romana, oriunda das Leis das XII Tbuas, era privada e penal. Privada pois sua efetivao se dava pelo prprio credor, no pelo Estado ou pelo Juiz o representando. Penal porque impunha ao devedor ofensas fsicas e morais, tais quais esquartejamento, perda de liberdade, exposio em mercado pblico como devedor e etc. Na Roma mais antiga as partes compareciam ao pretor, autoridade pblica da poca, onde expunham a causa e escolhiam um ou mais rbitros privados, os denominados iudex. A este ou estes rbitros cabiam a instruo e o julgamento da causa16. Havendo a condenao ou confessado o dbito, tinha o devedor o prazo de 30 dias para saldar a dvida, sobe pena de lhe ser imposta a manus iniectio esto, que consistia em uma apresentao perante o juiz que autorizava a apropriao temporria do devedor por parte do credor por 60 dias. Nesse interregno, o devedor ficava preso na casa do credor, esperando eventual quitao da dvida por parentes, amigos ou pelo prprio devedor. Para dar publicidade da priso, o devedor era levado trs vezes ao mercado municipal e l exposto. Transcorrido o prazo sem pagamento, o credor dispunha dele como escravo, podendo vend-lo e at mat-lo, se assim quisesse. Depois da morte que se poderia chegar aos bens do devedor.O inadimplemento de uma obrigao resultante de sentena ou confisso era uma ofensa, que tinha de ser punida com a15

BRASIL. Lei n. 11.232 de 22 de dezembro de 2005. Altera a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 Cdigo de Processo Civil, para estabelecer a fase de cumprimento das sentenas no processo de conhecimento e revogar dispositivos relativos execuo fundada em ttulo judicial, e d outras providncias. 16 THEODORO JNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 08.

10marca da infmia, da humilhao, consistente na manus injectio, uma das mais antigas aes da lei (legis actiones) atravs da qual o devedor era privado da sua liberdade e exposto publicamente at que a dvida fosse paga17.

Levava-se em conta nessa poca a indisponibilidade do patrimnio da pessoa at ltimo caso, predominando o direito pessoal sobre o real. No se concebia que algum pudesse atingir os bens do outro, porm o acesso a integridade fsica era facilitada. Em meados do ano 326 a.C, introduziu-se a Lex Poetelia, uma forma menos grotesca de obteno de crditos devidos. O credor no dispunha totalmente do devedor. A priso se dava como forma de coero ao adimplemento da dvida, devendo o credor alimentar e no maltratar o credor. Quitada a dvida por quem que fosse ou mesmo com o trabalho do devedor, libertado seria o credor. Evoluindo-se para a vedao da priso, a dvida passa a recair sobre os bens do devedor, instaurando-se a pignoris capio. A pignoris capio, era disponibilizada inicialmente para certas obrigaes, atingiu seu mxime com a pignus ex causa judicati captum18, semente da moderna execuo. Por este modo de execuo ocorria a apreenso sobre quantos bens fossem necessrios para adimplir a obrigao, atravs do apparitor (espcie de Oficial de Justia), respeitando-se uma ordem de bens (mveis, imveis e crditos). Sobre estes constitua-se a pignus (penhor) em favor do credor. Aguardava-se dois meses para o adimplemento, que no ocorrendo, dava ensejo venda dos bens pelos apparitores (espcie de leiloeiros do juiz). Destitui-se desta forma o rigor previsto na Lei das XII Tbuas passando a vigorar a Lex Poetelia. O carter penal foi abolido, sendo a execuo totalmente patrimonial e sempre assistida pelos magistrados da poca. Assim, a actio iudicati passou a vigorar, destituindo-se pouco a pouco, at extinguir a manus injectio. A forma de execuo dessa poca se assemelhou a at ento utilizada hoje em dia. Somente aps o iudex proferir a sentena (res uidicata) que atravs de outra ao (actio uidicati) que se poderia intrometer-se no patrimnio do devedor. A via executiva e a via cognitiva erram totalmente17 18

GRECO, Leonardo. O processo de execuo, p. 12. GRECO, Leonardo. O processo de execuo, p. 24.

11 separadas, tendendo o credor que primeiro se sujeitar ao julgamento do iudex para dispor de interesse de agir para enfrentar a ao executiva (actiu uidicati). Em um ltimo estgio de evoluo, destituiu-se o papel do iudex, passando a vigorar o aspecto pblico da jurisdio, ficando esta submetida ao encargo somente do praetor e seus auxiliares. A atividade jurisdicional se torna totalmente pblica, ante que o iudex, nada mais era que um rbitro privado. O imprio Romano tem sua queda no Sculo V d.C, dando a abertura necessria para o domnio brbaro. Difundi-se o direito dos povos germnicos pela Europa, alterando-se a base estrutural do nascituro processo de execuo. A execuo privada passa a prevalecer, tendo em vista a fragilidade do poder pblico estatal germnico. A cultura germnica no se prestava para formalismo algum, adentrando de pronto no patrimnio do devedor sem menores percalos. Ao devedor que se vendo injustiado era a quem cabia procurar o judicirio em carter incidental. A penhora privada era o incio da execuo. Havia uma inverso de concepes, onde primeiro se executava para depois se discutir a pretenso. A penhora privada no se lastreava em ttulo prvio algum, bastando mera afirmao. No havia obste algum para que o credor conseguisse a satisfao sem interveno alguma do pouco vigoroso poder judicirio. O domnio brbaro, como passou a ser conhecida a ascenso germnica, no ps termo ao Direito Romano. Este persistiu na igreja e nas regies no totalmente dominadas. Surge assim uma miscigenao entre ambos.Dois princpios se puseram em confronto; o romano, pelo qual somente se concedia a execuo depois de verificao do direito substancial, em ao de cognio;o germnico, pelo qual, o credor age com penhora, e se o devedor quiser se defender, deve propor ao indireta19.

Assim, nesse choque de ordenamentos, ocorre uma mescla entre ambos. No processo contencioso a execuo passa a no ser mais uma ao distinta, cabendo ao juiz, proceder a execuo ex officio suo. Nasceu assim a executio parata, no relacionando-se mais o contraditrio e a morosidade19

CASTRO VELLAR, Walard de. Processo de execuo, p. 23.

12 necessria a actiu iudicati. Aps prolatar a sentena caberia ao juiz de ofcio, as necessrias providncias para dar o cumprimento de sua deciso, procedendo de executio per officium iudicis. Abolia-se assim duas demandas diferentes no intuito de satisfazer um mesmo direito, cabendo ao prprio juiz proceder a execuo como uma segunda fase em busca da pretenso do vencedor. Com a difuso do comrcio romano, surge a necessidade de um ttulo de fora executiva, porm, no atrelado aos formalismos e as morosidades de uma anterior ao de conhecimento. Desta forma so criados os ttulos executivos, denominados instrumenta guarentigiata20. Tais ttulos consistiam como verdadeiras confisses de dvidas, equiparando-se s sentenas de forma semelhante porm no idntica. Restaura-se a consistente actiu iudicati, sob forma de concentrar num processo nico de execuo a ampla defesa necessria, um cognio sumria e uma sentena.Uma vez que aos ttulos de crdito se atribua a mesma fora da sentena, mas como no existia a seu respeito um anterior processo que lhe pudesse das sustentao, a actio iudicati foi a grande descoberta. Sem a preexistncia de um processo judicial, o documento portado pelo credor permitialhe inaugurar a relao processual j na fase executiva21.

A sentena aps a cognio fazia coisa julgada, no cabendo defesa alguma praticamente ao devedor no momento da executio per officium. J a actio iudicata por no ter uma prvia ao de conhecimento e por no antevir de coisa julgada, dava ensejo a uma breve cognio e a defesa do executado22. Ambas execues coexistiram at o incio do Sculo XIX, quando o Cdigo de Napoleo resolveu unificar a execuo. Um dos modelos seria usado como padro e regra, e tendo as execues de ttulo de crdito maior nmero, optou-se por esta forma23.Assim, depois de sculos de informalidade no cumprimento das sentenas, voltava este a submeter-se velharia ultrapassada e injustificvel da actio uidicati. Tal como h20 21

GRECO, Leonardo. O processo de execuo, p. 30. THEODORO JNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 10. 22 THEODORO JNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 10. 23 THEODORO JNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 10.

13quase dois mil anos antes, a parte voltou a submeter-se inexplicvel obrigao de propor, sucessivamente, duas aes, para alcanar um nico objetivo: a realizao do crdito inadimplido pelo ru; ou seja, uma ao cognitiva, que terminava pela sentena; e outra executiva, que comeava depois da sentena e nela se fundava24.

Volta-se dessa forma antiguidade remanescente dos tempos romanos, pelo simples intuito de uniformizar-se as formas de execuo da poca de Napoleo, ao passo que, essa reestruturao com base em tempos passados, refletiu substancialmente nos tempos modernos, emaranhando o processo e estruturando-o obsoleta para a atualidade.

1.4. O SINCRETISMO PROCESSUAL EVOLUTIVO E ATUAL Conforme j explicitado, a efetividade atrelada ao processo, como meio de satisfao e como forma de uma tutela sadia, passaram a ser as determinantes no campo legislativo. A sistemtica processual fundada em prvia cognio e ps-execuo autnoma, passa a no atender as expectativas da sociedade. A sistemtica impe um lapso longo e penoso para o vencedor, que depois de anos de litgio, dever buscar uma nova relao jurdico-processual para sua satisfao Sob esse prisma, as sentenas condenatrias por no serem efetivas e no concretas passam a ser tidas como um ato de exortao e, portanto, desprovida de ius imperii25. Assim, condenando o juiz no daria efetivamente o bem da vida almejado, somente declarando o melhor direito. Nesses termos, ensina Joel Dias Figueira Jnior:Significa dizer que o juiz que condena no ordena; se assim , a condenao no passar da rbita de uma exaltao ao cumprimento da parte dispositiva do julgado, aqui transformada e equiparada sempre a uma singela24 25

THEODORO JNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, p. 10. FIGUEIRA JNIOR, Joel Dias. Comentrios a novssima reforma do CPC, p. 06. Designa o autor ius imperri como a forma histrica do direito romano em que o juiz meramente diz o direito, no se inclinando a dar fora imperativa de cumprimento do sentenciado, ficando este ao talante do ru.

14declarao de obrigao que, se no cumprida espontaneamente pelo condenado, gerar, necessariamente, um novo processo, desta feita execucional26.

Partindo do mesmo princpio angular entende Jos Miguel Garcia Medina, ser discrepante a razo de ser da sentena condenatria no sistema processual brasileiro uma vez que esta no se presta como instrumento de tutela jurdica do direito material. Uma vez proferida uma sentena condenatria, entende o referido autor, a sano ali determinada no se presta para a concretizao da satisfao da pretenso27. Tem-se sob este aspecto a sentena condenatria como funo meramente processual, aplicadora de uma sano prevista na norma jurdica. Tendo descumprido uma obrigao, surge para o ru a necessidade de se sujeitar a jurisdio pois atingiu preceito anteriormente previsto em lei. No se cria obrigao ante inexistente, pois a obrigao existe a partir do momento da infrao pessoal da norma, com a sentena condenatria, apenas se delimita sua conseqncia no mundo jurdico. Na sentena condenatria, a atuao da sano realizao dos atos executivos (materiais) no se realiza na sentena; a executividade da decorrente efeito seu, sendo que a atuao da sano (= execuo, no caso) no ocorre na sentena28. Assim, a condenao assumiria o espectro de um incidente no curso da atuao do direito29, uma vez que aps a sentena condenatria, o plano jurisdicional da satisficidade comea a se iniciar e realmente se inicia com a execuo do preceito pr-determinado propriamente dito.Sob esse prisma, a sentena condenatria sequer poderia ser arrolada dentre os instrumentos de tutela jurdica do direito material, porque no se tutela qualquer direito material com a sentena condenatria. Da a necessidade de se ajuizar outra ao (de execuo) para se tutelar o direito reconhecido (ou declarado) pela sentena condenatria como violado30.26 27

FIGUEIRA JNIOR, Joel Dias. Comentrios a novssima reforma do CPC, p.07. GARCIA MEDINA, Jos Miguel. Execuo civil, p. 222. 28 GARCIA MEDINA, Jos Miguel. Execuo civil, p. 222 29 Concepo de Giuseppe Chiovenda in Instituies de direito processual civil, p. 230. 30 GARCIA MEDINA, Jos Miguel. Execuo civil, p. 222.

15

A sentena condenatria, como parte da doutrina entende, em uma concepo mais valorativa da execuo e menos da cognio, existiria para a execuo, sendo que sem a execuo, a sentena condenatria no teria eficcia, ao passo que a sentena sem a execuo seria como um sino sem badalo ou o trovo sem chuva31. Uma concepo temerosa, visto a amplitude de ambos processos e seus princpios prprios intrnsecos e correlatos. Entende Jos Miguel Garcia Medina, que a execuo se presta como uma fase complementar da execuo32. Unindo-se ambos processos (cognio e execuo) em uma nica relao jurdico-processual, aceita-se a ao em sua concepo una, considerando-se que a tutela jurisdicional se d com a entrega do bem da vida pleiteado. A concretude da entrega da pretenso passa a assumir relevncia mxima, principalmente levando-se em conta aplicabilidade da sentena condenatria que antes no passava de mera declarao a ser futuramente aplicada. De maneira simplista e breve, tem-se sincretismo como unio, emaranhamento, fuso. O sincretismo processual se mostra como, em uma nica relao jurdico-processual, se desenvolvam tutelas de carter executivo e de conhecimento. No h dicotomia estrutural entre cognio e execuo, ambas se desenvolvem simultaneamente na busca do fim colimado, seguindo de uma ao outra, sem a prvia necessidade de novo processo.(...) tem-se o sincretismo de uma ao que , ao mesmo tempo, o poder de exigir o julgamento da pretenso e a satisfao do direito reconhecido nesse julgamento. Julgada procedente a pretenso, o mesmo processo vai prosseguir e, naturalmente, sem que nova demanda seja proposta ou citao efetuada, ter-se-o os atos executivos adequados. O processo um s e uma s ao, ambos partilhando da natureza cognitivo-executiva33.

A

luta

contra

o

sincretismo

vem

de

preceitos

histricos

desembocando at pouco tempo atrs no princpio da nulla executio sine titulo,31 32

REZENDE FILHO, Gabriel Jos Rodrigues de. Curso de direito processual civil, p. 169. GARCIA MEDINA, Jos Miguel. Execuo civil, p. 103. 33 DINAMARCO, Cndido Rangel. Execuo civil, p. 132-133.

16 tendo como somente vlida a execuo advinda de um ttulo executivo que foi concebido sob as vestes da cognio exaurida. O prprio cdigo atual determina a diviso em livros diferentes, dando a entender que cada qual tem seu lugar determinado e isolado. Assim, o muro divisrio entre a cognio e a execuo se mostra na autonomia fantasiosa entre um e outro, entendendo-se que no poderiam atuar juntos. Exemplo dessa autonomia ficta, podemos citar a possibilidade do credor executar ou no o provimento jurisdicional, dispensando posterior processo de execuo, o ingresso irrestrito via executiva sem prvia demanda de conhecimento (ttulos executivos), a concepo de que certas demandas no daro ensejo a posterior execuo (aes declaratrias e constitutivas) dentre outros. Ao aspecto de autonomia dos processos passou-se a ver o juiz no processo de execuo, como mero executor, visto a natureza pura e intransponvel entre execuo e cognio. Uma denota atividade lgica enquanto outra atividades materiais. Nessa linha, o pensamento de Ovdio A. Baptista Silva:A avassaladora ideologia que se oculta sob a afirmao, hoje incontroversa em doutrina, da inconcialibilidade entre cognio e execuo, pode ser vislumbrada nesta passagem de LIEBMAN, em que ele procura mostrar que a atividade judicial, no processo de conhecimento prevalentemente de carter lgico, ao passo que, no processo de execuo, tem ela o carter de operaes prticas, tentes a efetivar a regra jurdica sancionadora, indicada pela sentena34.

Equivocada a concepo de que na cognio no se faz execuo e vice e versa, denotando incomunicabilidade de ambas e suas respectivas autonomias absolutas. Exemplo disso seria o recebimento da pea inicial de execuo pelo juiz, a verificao se aquele ttulo lhe apresentado visto pelo ordenamento como ttulo executivo, o indeferimento da pea inicial da execuo, a execuo provisria, onde ainda no se deu a cognio plena e exauriente, a inspeo dos atos da execuo pelo juiz como penhora, adjudicao e etc. Nas34

SILVA, Ovdio A. Baptista. Curso de direito processual civil, p. 157.

17 palavras de Kazuo Watanabe, inexiste ao em que o juiz no exera qualquer espcie de cognio35. Complementando e na mesma senda, ensina Jos Miguel Medina: Sucede, apenas, que o objeto da percepo do sujeito cognocente, no caso do processo de execuo, diverso daquele que lhe exposto no processo de conhecimento36.O equvoco fundamental da doutrina da separao entre conhecimento e execuo ter exagerado tanto ao pressupor que, no processo cognitivo o magistrado nada possa fazer, porque tudo lhe desconhecido e sobre todas as questes existem controvrsias, de modo que faltem elementos de convico para prover, mesmo provisoriamente, no curso da demanda; quanto o ter exagerado, tambm, ao supor que o ttulo executivo seja a expresso inequvoca do direito de crdito que ele, num dado momento representou37.

O mesmo pode-se asseverar acerca da execuo dentro do processo de conhecimento. As aes mandamentais, executivas latu sensu, a antecipao de tutela, a sistemtica do art. 461/461-A do CPC, seriam reflexo disso. Nas respectivas aes, ao passo que vai conhecendo, mesmo que sumariamente, vai o juiz determinando a execuo, havendo uma mescla entre execuo e cognio. A autonomia dos processos no h de ser concebida, nem sequer pactuada. A atividade jurisdicional no se implementa com uma sentena condenatria, pois no mundo ftico mesmo que condenando, no se pode dizer que a pretenso querida se alcanou. A concretude e efetividade do preceito condenatrio devem ser o norte da emanao do poder jurisdicionando do Estado. Sob essa celeuma, a agilidade da sacies do direito posto sentena deve ser plena, sob pena de descredo na atividade jurisdicional e impacincia social. A legislao se remenda dia a dia, e a gama de procedimentos e leis especiais se avolumam no intuito de dar essa efetividade ao processo. Processos especiais sumrios so criados sob essa viso, no se percebendo que este remdio frgil no ir saciar as reais vontades sociais. A absoluta autonomia35 36

WATANABE, Kazuo. Da cognio no processo civil, p. 37. MEDINA, Jos Miguel. Execuo civil, p. 193. 37 SILVA, Ovdio A. Baptista. Curso de direito processual civil, p. 158

18 intransponvel atualmente a negao do direito, quando quem ganha tem que atravessar novo avassalador processo, com nova citao e etc. A autonomia dos processos e sua incomunicabilidade demonstram obstruo e denegao do direito.E razo no h para persistir na manuteno de uma autonomia da execuo de sentena que no se justifica, nem no plano lgico, nem no jurdico e muito menos no econmico. (...) a) a pretenso que justifica a falsa dissociao em pretenso de condenar e pretenso de executar. Na realidade, s h uma pretenso: a de compelir o devedor prestao sob inadimplncia; b) se a lide real no se compe apenas com a sentena condenatria, tem o rgo judicial, para atingir o desiderato da pacificao social, que prosseguir atravs de atos que tornem efetiva a restaurao da ordem jurdica violada; c) se a condenao no basta para pacificar a lide, e necessria ainda se faz a atuao executiva, razo no h para encerrar-se a funo jurisdicional com a sentena de mrito e exigir que o credor proponha outra ao para levar o rgo judicial a executar sua prpria ordem de condenao; (...) d) na verdade, a execuo, como processo autnomo e completo, s se justifica na cobrana dos ttulos extrajudiciais, porque equiparados sentena, dispensam a fase de cognio e j autorizam o incio da atividade jurisdicional no estgio da realizao prtica do direito do credor, em perder tempo com a sua definio ou acertamento38.

Os legisladores parecem ter acordado para a relevncia do sincretismo e o ordenamento nacional parece caminhar para torn-lo regra e no exceo. Demonstra-se, pela quantidade de fenmenos relacionados ao sincretismo entre cognio e execuo, a fecundidade deste princpio, que, hoje, no pode ser reconhecido apenas como mera exceo ao princpio da autonomia, mas, sim, como efetivo princpio jurdico39. Um fenmeno que antes se via como incompatvel com o ordenamento ptrio aos pouco virou exceo e hoje pode se dizer que, com a Lei38

THEODORO JNIOR, Humberto. A execuo de sentena e a garantia do devido processo legal, p. 253. 39 MEDINA, Jos Miguel. Execuo civil, p. 221.

19 11.232/05 regra, tudo considerando as necessidades atuais atreladas a efetividade e celeridade, sabendo-se que quem pleiteia pretende sacies e no mera declarao ou nova expectativa de direito a ser executada. sincretismo entre cognio e execuo40. Pode-se afirmar, agora, que a Lei 11.232/05 a ultima dose para concretizar de vez o

1.5. O PONTO CULMINANTE: A LEI 11.232/05. Historicamente tinha-se se que a tutela jurisdicional se dava concebida com a entrega da sentena aps o processo de conhecimento, repudiando-se a jurisdicionalidade da tutela executiva. Nas palavras de Graziela Santos da Cunha e Wanessa de Cssia Franolin: A tutela jurisdicional, da forma como foi historicamente conceituada, exclui os atos da execuo, levando-nos a concluso que os atos posteriores a sentena no constituem atos de jurisdio41. A velha idia de restringir a jurisdio ao processo de conhecimento inaplicvel na modernidade. A ao em si una, o autor se dirige ao judicirio na busca de uma satisfao de seu direito, a tripartio ento criada (conhecimento, execuo e cautelar) mera abstrao jurdica, com intuito de se chegar satisfao de forma rpida, correta e vivel. A satisfao do direito no se d com a mera sentena, mais sim com a efetiva entrega do bem da vida. Desta forma, tanto execuo quanto cognio assumem papis relevantes e prprios na ao, no estando a execuo mais subjacente ao conhecimento, assumindo total relevncia na ao at mesmo como um direito fundamental execuo. Conforme Marcelo de Lima Guerra:(...) o que se denomina direito fundamental tutela executiva corresponde, precisamente, peculiar manifestao do postulado da mxima coincidncia possvel no mbito da tutela executiva. No que diz com a prestao40

CUNHA, Graziela Santos da; principais alteraes feitas pela lei e execuo, p. 133. 41 CUNHA, Graziela Santos da; principais alteraes feitas pela lei e execuo, p. 135.

FRANOLIN, Wanessa de Cssia. Consideraes sobre as 11.232/2005 para a generalizao do sincretismo entre cognio FRANOLIN, Wanessa de Cssia. Consideraes sobre as 11.232/2005 para a generalizao do sincretismo entre cognio

20de tutela executiva, a mxima coincidncia traduz-se na exigncia de que existam meios executivos capazes de proporcionar a satisfao integral de qualquer direito consagrado no ttulo executivo. essa exigncia, portanto, que se pretende idividualizar, no mbito daqueles valores constitucionais englobados no due process, denominando-a direito fundamental tutela executiva e que consiste, repitase, na exigncia de um sistema completo de tutela executiva, no qual existam meios executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfao a qualquer direito merecedor de tutela executiva42.

Nessa linha de pensamento, a garantia de uma tutela justa, considerando-se agora efetividade como sinnimo de satisfao - ultrapassa o conceito de processo e atinge a efetiva garantia do acesso justia. A demanda no se presta para declarar direitos, mais sim para dar o bem da vida ao demandante, sendo que a denegao eivada pela morosidade excessiva deste quele, denota o tolhimento ao acesso justia. De nada vale uma tutela justa, se no for gil, pois ao seu fim no se prestar, sabendo-se que no se buscam meras declaraes, mais a materializao destas como j dito.A celeridade passa a ser um direito constitucional, fundamental, inerente prpria realizao da Justia, pois uma deciso sobre um litgio, por mais que seja justa e correta, se no vier em tempo razovel, no cumprir com seu papel, e afetar as expectativas da sociedade em relao aos mecanismos formais de resoluo de litgios43.

Colocando-se

em

mesmo

plano

a

cognio

e

execuo, no dando prioridades, sabendo-se que ambos fazem parte da jurisdio, extingui-se a paralisao medieval entre a entrega da cognio e o inicio da execuo. Aps a sentena no processo cognitivo mantinha-se um lapso obsoleto e desnecessrio entre o fim da demanda de conhecimento e o incio da execuo da sentena. Devia o autor vencedor, de forma incongruente, iniciar

42

GUERRA, Marcelo de Lima. Direitos fundamentais e a proteo do credor na execuo civil, p. 102. 43 TAMM RENALT, Srgio Rabelo; BOTTINI, Perpaolo Cruz. O contexto da reforma processual civil, p 4.

21 nova demanda, diferindo da anterior meramente por agora se tratar de execuo do que lhe foi deferido. O intuito da Lei 11.232/05 o mesmo das referidas leis anteriores: o de agilizar a marcha processual, atingindo seu fim almejado, diminuindo formalismos e dando mais mobilidade aos juzes, possibilitando estes a prestao de uma jurisdio mais clere e conseqentemente mais eficiente. A recente lei veio justamente para dar um novo colorido ao processo de execuo, concedendo meios para atingir os anseios sociais por uma Justia mais eficiente44. Altera-se a concepo de um processo autnomo de execuo, criando-se uma fase de cumprimento da sentena, dentro do prprio processo de cognio. lgico que ainda se trata de uma execuo, com seus preceitos e princpios inerentes, porm a maleabilidade e efetividade tornam-se carro chefe da executio, desvencilhando-a em uma mera fase. Tiram-se as amarras do processo de execuo, que muitas vezes engessavam a parte final e primordial da demanda: a entrega do bem pleiteado. Assim, d-se maior efetividade demanda, principalmente mitigando o processo de execuo, tornando-o mais gil e clere. A satisfao assume carter primordial, deixando-se de lado formalismos tecnicistas e desnecessrios, aliados a princpios tericos retrocessos. A execuo vista como calcanhar de Aquiles45 do processo, uma verdadeira odissia, aventura Kafkaniana46, se volta para as necessidades contemporneas, dando prioridade para a presteza, celeridade e efetividade processual. A esttica no pode prevalecer sobre a essncia. No pode a forma sobrepor-se ao contedo47. A concepo hodierna de processo se amolda aos anseios do jurista Humberto Theodoro Jnior, que lecionou:, pois, a nosso ver, hora de se pensar em maior profundidade, para atravs de medidas aparentemente44

ROHR, Joaquim Pedro. A nova lei de execuo: uma vitria da efetividade processual? Disponvel em: < www.jusnavegnadi.com.br> 45 Termo usado pelo Ministro da Justia Marcio Tomaz Bastos, em suas Exposies de Motivos ao projeto da Lei 11.232/05. 46 MORELO, Augusto M. Liquidaciones judiciales, p. 09. Designa o autor os referidos sinnimos numa forma de demonstrar a dificuldade e os meandros da execuo de sentena antiga. 47 CALMON, Petrnio. Sentena e ttulos executivos judiciais. p. 101.

22singelas, penetrar na prpria estrutura do nosso sistema processual, dele extirpando reminiscncias de romantismos anacrnico, que no correspondem, evidentemente, aos atuais anseios de maior valorizao e mais presteza da atuao jurisdicional48.

Desta forma, sai-se da ideologia retrograda de uma repartio para, com o intuito de atender as novas necessidades sociais, fazer-se uma unio entre a cognio e a execuo. Os critrios e restries da antiguidade no so mais aplicveis e concebveis na atualidade, tendo em vista o excesso de demanda do judicirio e a necessidade de se computar isso em tempo e forma vivel.

48

THEODORO JNIOR, Humberto. A execuo de sentena e a garantia do devido processo legal, p. 253-254.

Captulo 2 DA NOVA LIQUIDAO DE SENTENA

2.1. DO NOVO CONCEITO DE SENTENA Sabe-se que a Lei n. 11.232/0549 alterou significativos artigos no atual CPC, dentre estes o conceito de sentena. Hoje, dispe o inovado art. 162, 1, do CPC:Sentena o ato do juiz que implica alguma das situaes previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei.

Assim, sai o codex de processo civil atual do antigo conceito de que sentena punha fim ao processo, para elucidar que sentena o ato que implica em uma das situaes elencadas nos artigos 267 e 269 do CPC. O conceito inovador se amolda com a nova concepo de processo sincrtico, pois hoje a execuo da sentena se mostra como mera fase ulterior ao processo de cognio, no podendo pelo ato de sentenciar o magistrado por fim ao processo. Essa concepo j era indiretamente compreendida, pois em vrias hipteses o juiz no colocava fim ao processo com a sentena, a exemplo podese citar as sentenas de obrigaes de fazer e no fazer (art. 461), onde j no ano de 1994, o julgador aps proferir a sentena poderia implementar as medidas necessrias para o cumprimento do comando; as sentenas executivas lato sensu, dentre outras. Desta forma, j se entendia que a extino do processo no se dava com a sentena, mais sim com o esgotamento total das vias recursais50.49

BRASIL. Lei n. 11.232 de 22 de dezembro de 2005. Altera a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 Cdigo de Processo Civil, para estabelecer a fase de cumprimento das sentenas no processo de conhecimento e revogar dispositivos relativos execuo fundada em ttulo judicial, e d outras providncias. 50 ARAKEN, de Assis. Manual do processo de execuo, p. 433.

24 O conceito de sentena delimita funes prticas dentro do processo e no meramente acadmicas ou cientficas. Sabe-se que as sentenas so atacveis por apelao e as decises interlocutrias por agravos, e sobre o conceito de sentena que se baseia o sistema recursal processual. Ao novo conceito de sentena deve se fazer uma anlise de cunho prtico. Sendo ato do juiz que implica em uma das situaes do art. 267 ou 269 do CPC, caberia mais de uma apelao em um mesmo processo? Exemplificando-se, teria-se uma ao de cobrana de cheques em que constatando que um cheque est prescrito e que a cobrana como ttulo extrajudicial no se presta, o Juiz declara prescrita uma crtula, continuando o processo com relao s demais at o julgamento final do mrito. Ou ento a excluso de um dos autores do plo ativo, entendendo no ser parte legitima este, continuando os demais at o deslinde do litgio. Nesses casos, ter-se-ia mais de uma sentena. No primeiro caso, a excluso de um ttulo executivo, daria ensejo a uma sentena com relao quele, ao passo que ao final da lide, se teria outra sentena. No segundo caso, tambm se teriam duas sentenas, uma de excluso de um dos autores e outra ao final, julgando o objeto total da lide. Sabe-se que em vrios casos o magistrado pode dar uma sentena parcial, no chegando ao deslinde total da demanda. Seriam como que sentenas incidentais, resolvendo parte do objeto ao transcurso do processo, mais no resolvendo totalmente o objeto. Percebe-se que a presente Lei visou celeridade como ponto culminante, no se podendo contar com pensamentos retrgrados e no efetivos. A apelao, advinda de uma sentena, no sistema recursal brasileiro, como regra gera a paralisao do processo (suspenso do processo). Assim, entende-se que a sentena que d ensejo a uma apelao a que julga totalmente o objeto 51, no cabendo apelaes atrs de apelaes ao longo do litgio, em que pese uma leitura simples do art. 162, 1 do CPC dar por vivel a possibilidade de vrias sentenas ao longo do processo. Tal entendimento tambm pactuado por Luiz Rodrigues Wambier, Tereza Arruda Alvim Wambier e Jos Miguel Garcia Medina, que ensinam:

51

CARMONA, Carlos Alberto. Novidades sobre a execuo civil: observaes sobre Lei 11.232/05, p. 61.

25Somente se considerar sentena, o pronunciamento que resolver a lide (CPC, art. 269) ou declarar que isso no possvel (CPC, art. 267) em relao integralidade das aes ajuizadas ou daquelas que remanesceram, depois que parte delas tiver sido julgada, no mesmo processo. (...) Assim, mesmo nos casos em que o pronunciamento judicial tem contedo encartvel em uma das hipteses referidas nos arts. 267 ou no art. 269 do CPC, no ser cabvel apelao se parte do objeto do processo ainda depender de julgamento52.

Entende a doutrina majoritria que em tais casos o recurso cabvel ser o de agravo, pois as sentenas com fulcro nos arts. 267 e 269 do CPC, nestes casos devem ser vistas como decises interlocutrias, pois no julgam a totalidade do objeto do litgio. Nestes termos entendem os referidos autores acima, bem como Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, lecionando:No se pode falar que esse ato seja sentena somente por que contm matria do CPC 267 e 269, como pretende indicar a mera interpretao literal do CPC 162 1, porque podem existir e serem praticados outros atos que tambm contenham matria do CPC 267 ou 269, e, por no extinguirem o processo, so caracterizados como deciso interlocutria, desafiando impugnao por meio de recurso de agravo53.

Outros dois pontos interessantes na referida mudana so relativos a sucumbncia de acordo com o art. 267 do CPC e a execuo de acrdos, que so bem lembrados por Araken de Assis. Sintetiza seu pensamento o referido autor:Como quer que seja, a soluo final do processo idnea a ensejar execuo ou cumprimento (art. 475-I) abrange tanto a sentena, quanto o acrdo, quer no captulo principal, quer no capitulo acessrio da sucumbncia. Este ltimo captulo tambm nas hipteses em que o juiz extingue o52

WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; MEDINA, Jos Miguel Garcia. Breves comentrios nova sistemtica processual civil, p. 37. 53 NERY JNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo de processo civil comentado, p. 374.

26processo sem julgamento do mrito (art. 267). Por tal motivo, a interpretao do art. 475-N, I (sentena condenatria) desconsidera a origem do ato (primeiro ou segundo grau)54.

Desta forma, melhor explicando, entende Araken de Assis, que, a incidncia do art. 267, extinguindo o processo sem resoluo do mrito, no reflete necessariamente uma extino da demanda conforme dispe o referido artigo. Sobreviver uma execuo das verbas sucumbentes, a favor do ru vencedor. Assim, proceder-se- seguintes do CPC. Com relao a execuo de acrdos ensina o doutrinador que, nem sempre, se dar execuo sobre a sentena, no podendo-se engessar o preceito contido no art. 475-N, I do CPC. Dispe o referido artigo, que so ttulos executivos a sentena condenatria, pois em que pese tal disposio, no se pode levar de forma taxativa o preceito sentena (julgamento em primeiro grau), uma vez, que se sabe que acrdos tambm podem ser executados, ao passo que os acrdos podem substituir o provimento de primeiro grau em vrios casos, e seriam esses na verdade executados. Assim, a topologia que divide sentena e acrdo de forma absoluta, como faz o cdigo de processo cvel, deve ser tida com ressalvas (art. 163 do CPC, que taxativamente designa como acrdo o ato do tribunal, fazendo a ntida diviso entre acrdo e sentenas). Nesta linha, pode-se afirmar, que o art. 475-N, I, auto aplicvel aos acrdos em sua maioria, podendo estes seguir as disposies do art. 475-A e seguintes do CPC. a execuo nos moldes do art. 475-A e

2.2. DA LIQUIDAO DE SENTENA A liquidao de sentena consiste em delimitar o quantum debeatur, dando liquidez ao ttulo, integrando assim o trinmio de "tributos de representao do direito no ttulo55. esse o "ato ou fato jurdico do qual resulta a aplicao da sano executiva56. Desta forma, para se configurar hgido o ttulo judicial, preenchendo seus requisitos e dando azo a uma execuo, deve estar54 55

ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 22. WAMBIER, Luiz Rodrigues (Coord.). Curso avanado de processo civil, p. 68. 56 MARCATO, Antonio Carlos. Da liquidao de sentena, p. 112.

27 presente neste a certeza, liquidez e exigibilidade. Assim, para se proceder a execuo e se entrar na esfera patrimonial do executado eventualmente, deve-se previamente se delimitar o campo exato em que a dvida ir incidir, determinando de forma exata o monte. A liquidao de sentena at a entrada em vigor da Lei n. 11.232/05, era uma ao de natureza de conhecimento, autnoma e independente. Hoje, pode-se dizer que h uma mera fase procedimental, dentro da ao de conhecimento de onde ela adveio. Esse o entendimento de Luiz Rodrigues Wambier e Tereza Arruda Alvim Wambier e Jos Miguel Garcia Medina que dispe: "A Lei 11.232/2005 alterou a natureza da liquidao. Tornou-a uma simples fase, um incidente, do prprio processo em que a sentena foi proferida - fase essa posterior prolao da sentena e anterior fase de 'cumprimento da sentena'57. O entendimento pactuado por Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery58 e Araken de Assis59, aviventando os referidos autores que, em que pese ter se tornado um incidente, no perdeu sua concepo de ao e mais especificamente de ao de cognio, ao passo que perdendo sua autonomia e independncia, hoje se desenvolve em um nico processo, com aes sucessivas. Bem elucida Araken de Assis:Como quer que seja, na liquidao por arbitramento e por artigos avultam as alegaes das partes e as operaes intelectuais do rgo judicirio, denotando sua funo predominante. Tem, por isso, natureza cognitiva. E isso parece suficiente para eliminar do incidente respectivo qualquer laivos da autntica atividade executiva60.

Assim, se trataria de uma ao de cognio no autnoma e atrelada ao processo como um todo, em que pese sua natureza, se assemelhar mais com a natureza da fase cognitiva a executiva.

57 58

WAMBIER, Luiz Rodrigues (Coord.). Curso avanado de processo civil, p. 89. NERY JNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo de processo civil comentado, p. 629. 59 ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 106. 60 ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 107.

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2.2.1. Do art. 475-A do CPCArt. 475-A. Quando a sentena no determinar o valor devido, procede-se sua liquidao. 1o Do requerimento de liquidao de sentena ser a parte intimada, na pessoa de seu advogado. 2o A liquidao poder ser requerida na pendncia de recurso, processando-se em autos apartados, no juzo de origem, cumprindo ao liquidante instruir o pedido com cpias das peas processuais pertinentes. 3o Nos processos sob procedimento comum sumrio, referidos no art. 275, inciso II, alneas d e e desta Lei, defesa a sentena ilquida, cumprindo ao juiz, se for o caso, fixar de plano, a seu prudente critrio, o valor devido.

O incidente de liquidao s ter lugar nas sentenas ilquidas por motivos bvios. Sabe-se que sentenciando, o juiz cumpre sua funo jurisdicional s podendo alter-la nos termos do art. 463 do CPC. Assim, proferida sentena liquida e no contente com a delimitao da dvida, surge o direito to somente de apelar, no podendo, de outra forma, rediscutir a liquidao, sob pena de quebra da autoridade da coisa julgada. Cabe ao liquidante apresentar simples pedido de liquidao, sem a necessidade de preencher os requisitos do art. 282 do CPC61. Com relao competncia para liquidao, a Nova Lei foi omissa a esse respeito. Porm, coube ao art. 475-P do CPC, delimitar a competncia para o "cumprimento da sentena". Em que pese o artigo referido fazer ntida meno ao "cumprimento de sentena", motivos para a sua no aplicao liquidao de sentena no existem (neste sentido Araken de Assis62, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery63). Por motivos de efetividade, a liquidao se amolda ao preceito do inovador artigo, dando armas ao credor de seleo da competncia tanto na fase de liquidao de sentena quanto no seu cumprimento. A Nova lei, no visou a proteo mxima do patrimnio do executado, mais sim a61

NERY JNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo de processo civil comentado, p. 631. 62 ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 114. 63 NERY JNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo de processo civil comentado, p. 630.

29 disponibilidade deste, em prol da satisfao da dvida e de sua submisso ao direito do credor. Assim, a mxima de que a competncia para liquidar segue o juzo de origem da condenao, no se coaduna atualmente, pois h uma liberdade de escolha dentre as opes legais (art. 475-P). Por ser atualmente mero incidente processual, condicionada a demanda anterior e a esta se vinculando, na liquidao de sentena, no haver mais a necessidade de proceder a citao da outra parte como antigamente. Por no constituir processo autnomo, hoje, harmonizando-se com o escopo de celeridade da nova sistemtica, proceder-se- a simples intimao do demandado, na pessoa de seu advogado, por meio de dirio da justia ou outro mais vivel. Outra relevante inovao se deu no , 2 do artigo em estudo. Refere-se o dispositivo que, mesmo na pendncia de recurso, cabe a liquidao de sentena. Aufere-se, que a Lei deixa in albis o efeito em que o recurso foi recebido, no se podendo saber-se h a possibilidade de efetuar a liquidao na pendncia de recurso recebido to somente no efeito devolutivo ou se cabe tambm s apelaes recebidas no duplo efeito, ou seja, devolutivo e suspensivo. A questo no resta unssona na doutrina nacional, havendo posicionamentos para ambos os lados. Entende parte da doutrina (Luiz Rodrigues Wambier, Tereza Arruda Alvim Wambier e Jos Miguel Garcia Medina64, Graziela Santos da Cunha e Wanessa de Cssia Francolin65) que,o dispositivo instituiu uma "liquidao provisria66", e desta forma, somente poder se proceder a liquidao, quando o recurso for recebido to somente no efeito devolutivo. J a parte majoritria (Araken de Assis67, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery68, Jos Maria Rosa Tesheiner69,64

J.E. Carreira Alvin e

WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; MEDINA, Jos Miguel Garcia. Breves comentrios nova sistemtica processual civil, p. 103. 65 CUNHA, Graziela Santos da; FRANOLIN, Wanessa de Cssia. Consideraes sobre as principais alteraes feitas pela lei 11.232/2005 para a generalizao do sincretismo entre cognio e execuo, p. 141. 66 CUNHA, Graziela Santos da; FRANOLIN, Wanessa de Cssia. Consideraes sobre as principais alteraes feitas pela lei 11.232/2005 para a generalizao do sincretismo entre cognio e execuo, p. 141. 67 ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 108-109. 68 NERY JNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo de processo civil comentado, p. 631. 69 TESHEINER, Jos Maria Rosa. Execuo de sentena regime introduzido pela Lei 11.232/05, p. 343.

30 Luciana G. C. Alvim Cabral70, Antonio Carlos Marcato) da doutrina, entende que em ambos os efeitos poder se requerer desde j a liquidao da sentena. Leciona Antonio Carlos Marcato:No silncio da lei, lcito concluir que essa atividade preparatria, porque provisria, possa ser realizada mesmo na pendncia de efeito suspensivo. E isto porque, sendo provido o apelo do devedor, com a eventual cassao da sentena, a liquidao nenhum prejuzo acarretar a qualquer das partes; confirmando o decreto judicial de primeira instncia, bastar ao credor proceder nos moldes do art. 475-B71.

Em especial Araken de Assis entende da mesma forma, porm diverge quanto a natureza provisria da liquidao, entendendo que est ser definitiva, e no provisria como entende a maioria da doutrina. Dispe o referido autor:A liquidao em si, no provisria, mais definitiva. Liquidase na expectativa de que no sobrevenha o provimento do recurso pendente, no todo ou em parte, impondo o retorno ao estado anterior, na execuo provisria (art. 475-O, II), ou delimitando o direito expectado; porm, a liquidao estabelecer o quantum debatur exato da prestao72.

Ainda se refere o referido dispositivo que caber parte instituir a liquidao com as cpias necessrias. A disposio pertinente tendo em vista que os autos principais ficaro indisponveis pois estaro tramitando na esfera de segundo grau. Assim, como se uma antiga carta de sentena fosse, cabe a parte extrair o rol de documentos pertinentes para o sadio tramite da liquidao. Podese usar o art. 475-O, 3, como rol exemplificativo, porm nada obsta que a parte selecione outros documentos se entender necessrio, conforme se refere no prprio pargrafo. No obstante, deve-se respeitar o preceito do art. 475-G, com relao documentos novos73.70 71

ALVIM, J. E. Carreira; CABRAL, Luciana G. C. Alvim. Cumprimento da sentena, p. 36. MARCATO, Antonio Carlos. Da liquidao de sentena, p. 114. 72 ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 108-109. 73 WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; MEDINA, Jos Miguel Garcia. Breves comentrios nova sistemtica processual civil, p. 101.

31 O 3 dispe taxativamente que nos casos do art. 275, II, d e e do CPC, no se poder, ou seja, ser defeso ao juiz que julga a ao de conhecimento, sentenciar de maneira ilquida. A disposio tem sua raiz nos art. 38 e 52 da Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95). Vale tanto para o pedido genrico quando para o determinado, devendo o magistrado moldar a sentena para que esta no seja ilquida. Fica a indagao de uma eventual sentena ilquida, como se dever proceder? Fazendo-se uma analogia Lei dos Juizado Especiais, ensina Felippe Borring Rocha: "A sentena condenatria nos juizados especiais necessariamente lquida, por isso no h procedimentos de liquidao de sentena. A sentena ilquida, em primeiro ou segundo grau, desafia recurso de embargos de declarao (art. 48)74. Desta forma, tem-se que o mais cabvel o manejo de embargos de declarao, no intuito de sanar a omisso que se deu na sentena, pois a liquidao item obrigatrio em se tratando de Juizados Especiais e hoje nos termos do art. 475-A, 3, da Lei 11.232/05. H posicionamento que dita que a sentena uma vez no proferida liquida, e sendo a essa necessria, nula. Esse foi o entendimento da Turma de Recursos do Tribunal de Santa Catarina, que se pode analogicamente se amoldar ao pargrafo em estudo:JUIZADO ESPECIAL. AO DE COBRANA. SENTENA ILIQIDA. DECISO ANULADA EX OFFICIO. Em sede de Juizado Especial, "as sentenas sero necessariamente lquidas", da porque "no se admitir sentena condenatria por quantia ilquida, ainda que genrico o pedido" (artigos 52, I e 38, pargrafo nico, da Lei n. 9.099/95). No obedecidos os ditames legais, merece anulao o decreto ilquido75.

2.2.2. DO ART. 475-B do CPCArt. 475-B. Quando a determinao do valor da condenao depender apenas de clculo aritmtico, o credor requerer o74 75

ROCHA, Felipe Borring. Juizados Especiais Cveis, Aspectos Polmicos, p. 106. SANTA CATARINA. Tribunal de Justia. Apelao Cvel n. 1.957, Rel. Des. Edir Josias Silveira Beck, j. 7 dez. 2005.

32cumprimento da sentena, na forma do art. 475-J desta Lei, instruindo o pedido com a memria discriminada e atualizada do clculo. 1o Quando a elaborao da memria do clculo depender de dados existentes em poder do devedor ou de terceiro, o juiz, a requerimento do credor, poder requisit-los, fixando prazo de at trinta dias para o cumprimento da diligncia. 2o Se os dados no forem, injustificadamente, apresentados pelo devedor, reputar-se-o corretos os clculos apresentados pelo credor, e, se no o forem pelo terceiro, configurar-se- a situao prevista no art. 362. 3o Poder o juiz valer-se do contador do juzo, quando a memria apresentada pelo credor aparentemente exceder os limites da deciso exeqenda e, ainda, nos casos de assistncia judiciria. 4o Se o credor no concordar com os clculos feitos nos termos do 3o deste artigo, far-se- a execuo pelo valor originariamente pretendido, mas a penhora ter por base o valor encontrado pelo contador.

O dispositivo gira em torno da antiga liquidao por clculos, j extinta desde a Lei 8.898/04. Pode-se dizer que no existe uma liquidao por clculos, posto que os clculos somente acompanham o requerimento do cumprimento da sentena, no se prestando se quer como incidente vinculado ao processo principal. A sentena nesse caso no propriamente ilquida, pois apesar de no estar expresso na sentena, o valor apurvel meramente por clculos aritmticos76. O memorial que acompanha o pedido de cumprimento de sentena, deve ser o mais completo possvel, podendo o devedor apurar os ndices de correo monetria, juros aplicados, poca de incidncia e etc. Reflete desta forma o direito de defesa do devedor, dando possibilidade a este de impugnar os valores apresentados diretamente, sem novos clculos ou estudos intrnsecos complexos. Havendo omisses, dever se abrir oportunidade para emenda ao demonstrativo. Cabe tal liquidao somente com relao s obrigaes pecunirias e quanto a elas o objeto da prestao individualizado atravs do clculo aritmtico77.76 77

WAMBIER, Luiz Rodrigues (Coord.). Curso avanado de processo civil, p. 92. ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 115.

33 A regra de que o clculo apresentado pelo credor vlido, tendo presuno juris et de jure. Passando desapercebida matria relativa a um eventual excesso a execuo, pode o executado se valer das defesas do art. 475L. Nos termos do 1, estando documentos necessrios no poder do devedor, dever o juiz requisitar que este os apresente no prazo de 30 dias. Desta forma, atribui-se s normas subsidirias dos arts. 14, V e 601 do CPC, com relao ao devedor, podendo-se at, se substantiva e vital a informao, ocorrer a busca e apreenso78, quando no ocorrer justificativa plausvel ( 2). Esses casos se apresentam na imprescindibilidade das informaes para a execuo, ao passo que, podendo o credor reputar valores execuo, e no apresentados os documentos pelo devedor, reputar-se-o verdadeiros os clculos apresentados pelo credor. Com relao ao terceiro, o dispositivo faz meno expressa a exibio de documento e coisa de terceiros, devendo-se proceder de acordo com o art. 362 do CPC. O 3 abre a disponibilidade do magistrado requisitar auxilio da contadoria judicial. Cuida-se de arbtrio do juiz, ficando somente ao seu alvitre a remessa ou no contadoria judicial. A regra aplica-se tanto quando se verificar excesso em desconformidade com a sentena, quanto quando a parte for beneficiria da assistncia judiciria. Remetidos os autos a contadoria, tem-se a possibilidade de apurar valor menor, maior que o apresentado pelo credor ou concordncia ao clculo apresentado pelo credor. Havendo discordncia por parte do credor, dever a execuo transcorrer pelo valor originrio atribudo pelo credor, porm a penhora recair sobre o valor calculado pelo contador. Cabe ao credor impugnar os clculos do contador, devendo o juiz por meio de deciso interlocutria, julgar a discordncia. Dessa deciso, caber agravo de instrumento. A penhora pelo valor encontrado pelo contador, s ocorrer aps ultrapassadas todas essas fases (impugnao ao clculo + manifestao do juiz), sob pena de quebra da ampla defesa e do contraditrio. Acerca do tema ensina Nelson Nery Jnior e Rosa M. de A. Nery:78

WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; MEDINA, Jos Miguel Garcia. Breves comentrios nova sistemtica processual civil, p. 110.

34

Essa providncia s poder ser tomada depois de o credor haver exercido seu direito constitucional de contraditrio e ampla defesa. No se pode dar a conseqncia automtica de a penhora realizar-se pelo valor encontrado pelo contador, sem que tenha sido efetivamente exercido o contraditrio, deve-se interpretar a norma conforme a CF79.

Ao devedor no imputada a quebra do contraditrio e da ampla defesa, pois haver momento oportuno para se manifestar (art. 475-L,V). Assim, no momento oportuno, caber ao devedor levantar as desconformidades e eventuais injustias na execuo, no cabendo impugnar no momento do 475-B, o eventual clculo apresentado pelo contador judicial. Objetivou o legislador um rito no truncado e sem meandros, porm como a lei omissa com relao manifestao do credor quando se v prejudicado pelos clculos do contador, cabe no momento de manifestao a estes, fazer a impugnao, sob pena de eiva de inconstitucionalidade a norma apresentada. Conforme os referidos autores, no cabe ao juiz ex officio, alterar o valor da execuo, somente podendo faz-lo nos casos em que o credor impugnou. Ou seja, retornando o clculo do contador e ficando evidente erro material no clculo do credor - uma soma, uma multiplicao - no poderia o juiz alterar o clculo por si s, sem o impulso do credor. Esse o entendimento de Nelson Nery Jnior. e Rosa Maria de Andrade. Nery 80, bem como de Araken de Assis81 De forma contrria, entende Antonio Carlos Marcato, explicitando seu entendimento da seguinte forma:(...) ao valor encontrado pelo contador, nada impede ao contrrio, tudo autoriza a concluso de que, constatando o juiz que a discrepncia entre os valores resulta de erro material cometido pelo credor, deva desde logo corrigi-lo, a

79

NERY JNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo de processo civil comentado, p. 633. 80 NERY JNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo de processo civil comentado, p. 633. 81 ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 123.

35respectiva deciso comportando impugnao por meio de agravo de instrumento82.

Sendo magistrado o guardio da justia e o tutor do processo, em um primeiro momento, parece vivel o posicionamento de que cabe ao juiz por si s providenciar as devidas correes. Porm, em consonncia com o 4, abrem-se trs possibilidades: a) apresentar contador clculo menor que o auferido pelo credor; b) maior e c) o clculo apresentado estar correto, confirmado pelo contador. No aceitando o credor, o clculo apresentado pelo contador, a execuo proceder-se- pela primeira pretenso do credor, porm a penhora ser sobre o valor obtida pelo contador. Posto isto, volta-se anlise da correo ex officio do magistrado. Parece que a lei, no atribuiu essa liberdade de maneira implcita. Ora, sendo o valor em desconformidade, tanto valor excessivo ou a menor, dispe o 4, que se levar em conta o primeiro valor apresentado, respeitando este, porm, a penhora ir se proceder pelo valor encontrado pelo contador. Fica visvel que no cabe ao magistrado intervir no valor apresentado pelo credor, por atribuir a Lei o respeito ao valor apresentado pelo credor, determinando que a execuo seguir pelo valor apresentado pelo credor, porm a penhora no. O julgamento desta discrepncia, ir caber ao julgador na fase de impugnao (475-L). De todo modo, a idia de Antonio Carlos Marcato, acima inserida, aplica a erros materiais, como o prprio autor escreve. Ento, cr-se que no se pode usar o dispositivo de forma imalevel. O posicionamento dos autores acima se coadunam de certa forma. Buscando celeridade e efetividade, evidenciando um erro meramente material, como um clculo equivocado, uma soma errada, um multiplicao a mais crassa, vivel que o magistrado corrija de ofcio o erro, devendo-se dar azo a uma eventual impugnao do credor por meio de agravo de instrumento. J, ocorrendo outro tipo de excesso, uma viso digamos diferente do monte, por parte do credor, no caber ao magistrado intervir, devendo proceder conforme o 4, e querendo na poca do art. 475-L, impugnar o devedor e julgar o magistrado.

82

MARCATO, Antonio Carlos. Da liquidao de sentena, p. 116.

36 Continuando-se na anlise do 4. Levanta o pargrafo em estudo, a possibilidade de a execuo prosseguir com o valor a mais que o encontrado pelo contador, ou a menos. Concordando o credor, com o apresentado pela contadoria, a controvrsia acaba, e ter prosseguimento a execuo por este novo valor apresentado. No havendo concordncia, aps a impugnao conforme j dito, e no sendo esta acolhida, a penhora recair sobre o valor encontrado pelo contador, enquanto e execuo em si, transcorrer pelo valor apresentado pelo credor. Nada mais justo, pois a penhora o efetivo ato que atinge o patrimnio do devedor, no tendo o valor pelo qual segue a execuo, reflexos para o devedor, nesse momento. O contador no caso, ser pessoa neutra, que no participa da relao jurdico processual, no apresentando interesses pessoais causa, e assim, quem ditar o nmero exato de bens, do devedor, a serem bloqueados. Essa diferena entre penhora e valor com que prossegue a execuo, ter fim no julgamento de uma eventual impugnao do devedor execuo (art. 475-L). Nesta fase, havendo valor a mais, pode o juiz liberar parcela de bens do devedor, ou a menos, determinar o reforo penhora. No apresentada impugnao, o valor ser o determinado pelo credor. Humberto Theodoro Jnior cr que a soluo dada pela a Lei no foi a melhor, demonstrando outra possibilidade:Melhor soluo para a hiptese aventada pelo novo 4 do art. 475-B seria, diante da aparncia de excesso facilmente perceptvel, permitir que o devedor suscitasse a exceo de pr-executividade e pudesse, assim, sem os inconvenientes da penhora, reduzir a execuo a seus devidos limites, antes da iniciada a agresso ao seu patrimnio83.

A sugesto aviventada pelo doutrinador protegeria em tese uma eventual agresso desnecessria ao patrimnio do devedor. Porm, conforme j explicitado, a penhora nesses casos, recair sobre o valor encontrado pelo contador, e sabe-se que este, quem possui melhores condies no momento de83

THEODORO JNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: processo de execuo e cumprimento da sentena: processo cautelar e tutela de urgncia, p. 106.

37 dar o valor sobre o qual se dar a penhora. Em que pese uma possvel soma divida, essa no ser exorbitante, pois o contador no ir apurar valor totalmente discrepante. Caberia ao magistrado tambm a anlise discricionria, acerca dessa aparncia de excesso facilmente perceptvel, o que demandaria tempo e mais uma anlise incidental, tendo em vista, essa j vir prevista no art. 475-L da Lei.

2.2.3. Do art. 475-C do CPCArt. 475-C. Far-se- a liquidao por arbitramento quando: I determinado pela sentena ou convencionado pelas partes; II o exigir a natureza do objeto da liquidao.

Trata o artigo da liquidao sob a forma de arbitramento. Segundo Luiz Rodrigues Wambier, Tereza Arruda Alvim Wambier e Jos Miguel Garcia Medina, a liquidao por arbitramento: Trata-se de trabalho tcnico, normalmente entregue aos cuidados de profissional especializado em determinada rea do conhecimento cientfico, pelo qual se vai determinar a extenso ou o valor da obrigao constituda pela sentena ilquida84. Por contar obrigatoriamente com trabalho do expert, aplica-se a essa modalidade as normas subsidirias concernentes prova pericial (arts. 420 e ss. do CPC), quando estas no se chocarem com o artigo em estudo. Diferentemente do procedimento de clculos apresentados pelo credor, caber tanto nas obrigaes de quantia certa, quanto nas de entrega de coisa, como nas de fazer85. A Lei determina trs possibilidades de liquidar-se o monte pela forma de arbitramento. A primeira quando assim determinar a sentena condenatria, a segunda quando convencionarem as partes e a terceira quando o objeto a ser liquidado assim exigir. Dispondo o juiz da condenao que caber a liquidao por arbitramento, no cabe a discricionariedade do juiz da execuo, devendo este84 85

WAMBIER, Luiz Rodrigues (Coord.). Curso avanado de processo civil, p. 92. THEODORO JNIOR., Humberto. Curso de direito processual civil: processo de execuo e cumprimento da sentena: processo cautelar e tutela de urgncia, p. 107.

38 proceder conforme o determinado86. O ensinamento do ilustre doutrinador no pode ser visto de maneira imutvel. Em posicionamento vivel, entendem Luiz Rodrigues Wambier e Tereza Arruda Alvim Wambier e Jos Miguel Garcia Medina87, que iniciada a liquidao e verificada a apurao de fato novo, no haveria impedimento alterao da liquidao de arbitramento para a forma de artigos, sob pena de inviabilidade da liquidao e a no obteno do fim almejado. Desta forma, a intocabilidade da forma de liquidao por arbitramento designada na sentena condenatria, intransponvel quando no ocorrer o prejuzo para as partes. Verificado fato novo, a liquidao por arbitramento demonstra dano as partes, devendo-se reverter o provimento para liquidao por artigos. A liquidao por arbitramento deve ser utilizada com cautela, tendo em vista a regra ser de que cabe ao magistrado a prolao de sentenas Ilquidas sempre que possvel. Assim, somente quando houver realmente a necessidade de apurao por perito especializado, que dever determinar o juiz a liquidao por esta modalidade. Convencionado pelas partes, ocorrer a restrio a essa modalidade tambm. Gize-se, essa liberdade das partes, s compatvel quando o objeto da liquidao for possvel se apurar por meio de percia88. Assim, o provimento do juiz que nega essa modalidade de percia vivel, tendo em vista a incompatibilidade do instituto com o objeto a ser liquidado. A terceira designao da Lei no se trata de uma liberdade. Segundo J. E. Carreira Alvim e Luciana G. C. Alvim, citando Srgio Sahione Fadel, tal hiptese se daria nas (...) hipteses em que a fixao do quantum dependa do juzo especial de tcnicos, como a aferio da reduo da capacidade laborativa do acidentado, o clculo dos danos causados por ato ilcito e etc (...)89. Decorrendo da natureza do objeto, atrela este a liquidao sob a forma de arbitramento, designando assim essa a modalidade cabvel.

86 87

ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 124. WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; MEDINA, Jos Miguel Garcia. Breves comentrios nova sistemtica processual civil, p. 117. 88 NERY JNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo de processo civil comentado, p. 634. 89 ALVIM, J. E. Carreira; CABRAL, Luciana G. C. Alvim. Cumprimento da sentena, p. 45.

39 2.2.4 Do art. 475-D do CPCArt. 475-D. Requerida a liquidao por arbitramento, o juiz nomear o perito e fixar o prazo para a entrega do laudo. Pargrafo nico. Apresentado o laudo, sobre o qual podero as partes manifestar-se no prazo de dez dias, o juiz proferir deciso ou designar, se necessrio, audincia

O artigo trata do procedimento em que se deve seguir quando a modalidade encartada for a de liquidao por arbitramento. Uma vez requerida ou iniciada a liquidao por arbitramento, no incio desta, a parte dever ser intimada, conforme se colhe do art. 475-A, 1 do CPC, devendo o juiz, desde j, nomear perito e fixar prazo para a formulao do laudo. A intimao se dar na pessoa que no requisitou a liquidao, no sendo necessariamente o intimado o devedor, pois detm esse tambm legitimidade para requerer a liquidao, pois se apresenta como interessado na lide. Muitas vezes o devedor se convence com a sentena condenatria e passa a querer quitar a dvida. Dependendo do ttulo executivo, poder a parte no ser intimada, mais sim citada (art. 475-N, pargrafo nico). Desta forma quanto os ttulos contemplados no art. 475-N, II, IV e VI, por no advirem de um prvio processo de conhecimento, a citao nesse momento ser inevitvel. No perodo entre a intimao acerca da liquidao e da nomeao do perito, acredita Araken de Assis que caberia a parte contestar a modalidade de liquidao, devendo o juiz resolver o incidente e aps nomear o perito, caso favorvel o provimento ao liquidante. Escreve o doutrinador: perfeitamente cabvel a contestao pretenso, alegando a inadmissibilidade do arbitramento. Resolvida a questo favorvel ao liquidante, o juiz nomear perito e fixar o prazo para a entrega do laudo (art. 475-D, caput, parte final); na hiptese contrria, subentende-se que o juiz rejeitar o incidente. Desse ato, cabe agravo de instrumento (art. 475-h)90.

90

ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 157.

40 No parece ser a opo encapada pela Lei. O prazo entre a intimao e a nomeao do perito parece ser nfima. Ou seja, nada obsta que o juiz, no mesmo despacho, determine a intimao para cientificar a outra parte acerca da liquidao, bem como j designe o perito e o prazo para entrega do laudo. Assim, o prazo para essa contestao designada pelo doutrinador, praticamente inexistente, tendo em vista que ele a coloca entre a intimao acerca da liquidao e a nomeao do perito. A Lei amarrou os atos para que ocorressem de maneira rpida, j dando a oportunidade de depois de apresentado o laudo, as partes se manifestarem (art. 475-D, pargrafo nico). Assim, no h impossibilidade da parte quando se manifestar acerca do laudo, j impugnar o tipo de liquidao. Entre a entrega da intimao e a entrega do laudo, a Lei omite acerca da formulao de quesitos e a indicao de assistentes tcnicos. Acerca do tema, bem assevera Nelson Nery Jnior e Rosa Maria de Andrade Nery:Nada impede, contudo, que as partes formulem quesitos ao perito e, ainda, que indiquem assistente tcnico para lhes auxiliar. O que importante salientar que a reforma da L 11232/05 teve por escopo facilitar e agilizar o processo de liquidao, de modo que essas faculdades (formulao de quesitos e indicao de assistente tcnico) tm de ocorrer dentro do prazo que o juiz tiver assinado para o perito apresentar o laudo91.

Da mesma forma, entendem Humberto Theodoro Jnior92, J. E. Carreira Alvim e Luciana G. C. Alvin Cabral 93, Luiz Rodrigues Wambier, Tereza Arruda Alvim Wambier e Jos Miguel Garcia Medina94 e Araken de Assis95. Acreditam Humberto Theodoro Jnior, Luiz Rodrigues Wambier, Tereza Arruda Alvim Wambier e Jos Miguel Garcia Medina, que as partes tem o prazo de 05 (cinco) dias da intimao da liquidao, para apresentar quesitos e nomear os assistentes tcnicos. Seguem nessa linha de pensamento, por91

NERY JNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Cdigo de processo civil comentado, p. 635. 92 THEODORO JNIOR., Humberto. Curso de direito processual civil: processo de execuo e cumprimento da sentena : processo cautelar e tutela de urgncia, p. 107. 93 ALVIM, J. E. Carreira; CABRAL, Luciana G. C. Alvim. Cumprimento da sentena, p. 47. 94 WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; MEDINA, Jos Miguel Garcia. Breves comentrios nova sistemtica processual civil, p. 119. 95 ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentena, p. 126.

41 entender que, aplicam-se subsidiariamente o disposto no art. 421 e seguintes do CPC. A apresentao de assistentes e quesitos sustentvel, analisandose a Lei sob a tica constitucional e reconhecendo-se assim o princpio do contraditrio e da ampla defesa. Em que pese a Lei ter nascido com o intuito de celeridade na busca do provimento jurisdicional, os princpios constitucionais no podero ser afastados. Apresentado o laudo as partes tm o direito se manifestarem em 10 (dez) dias, podendo o juiz proferir sentena ou ainda designar audincia para oitiva do perito. Nesse prazo de manifestao, as partes devero apresentar s