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8/2/2019 SEMEDO, Alice e FERREIRA, Ins (2011) Museus e Museologia, REVISTA SOCIOLOGIA , UP
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Museus e Museologia: desafios para a construo de
territrios colaborativos1
Alice Semedo2
Ins Ferreira3
Resumo: Este artigo apresenta as principais orientaes e contextos de um
projecto de investigao em curso, projecto que se refere natureza
do impacto social e funes museolgicas num contexto profundamente colaborativo.
Comea por apresentar os contextos e os desafios do projecto, considerando,
igualmente, as suas opes metodolgicas e propondo uma discusso dos conceitos
principais implicados. Partindo das tradies da investigao-aco e participao
interactiva, este projecto tem como campo de aco os museus da cidade do Porto e
como actores centrais, particularmente, os profissionais vocacionados para o trabalho
de mediao com os pblicos. Prope-se promover a colaborao sustentvel entre
profissionais dos museus; ou seja, a proposta implica, sobretudo, o desenvolvimentode um espao colaborativo e de uma comunidade de prtica que potencie mudanas a
partir de reflexes crticas e criativas.
Palavras-chave: Museu; Mediao; Pblicos; Colaborao; Impactos sociais.
Introduo
1 Este projecto foi j tema de vrias comunicaes e artigos: II Seminrio de Investigao em
Museologia dos Pases de Lngua Portuguesa e Espanhola (Buenos Aires, 27-30 de Setembro 2010),
organizado pelo ICOFOM-ICOM, onde se enunciavam os princpios do projecto de investigao,
apresentando-o brevemente e de duas outras apresentaes que se baseiam neste artigo, uma na ACSIS
Conference 2011: Current Issues in European Cultural Studies, organizada pela Advanced Cultural
Studies Institute of Sweden (ACSIS), na Linkping University, 15-17 Junho 2011, the Louis de Geer
Hall, Norrkping, Sucia, e uma segunda apresentao na CECA Annual Conference 2011, Internacional
Council of Museums, Zagreb, Crocia.2
Departamento de Cincias e Tcnicas do Patrimnio da Faculdade de Letras da Universidade do Porto.3 Cmara Municipal do Porto.
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O ttulo deste artigo reflecte, desde logo, a nossa convico de que os museus
vivem uma revoluo conceptual (Hein, 2000: viii), revoluo que questiona as
premissas fundamentais nas quais o museu (e o nosso trabalho enquanto profissionais e
com os profissionais de museus e em museus) se alicera e que se relaciona com o seu
valor intrnseco e indiscutvel. Metamorfoses em estruturas sociais, alianas culturais e
identidades pessoais aliam-se a mudanas na natureza, controle e funes do
conhecimento; transformaes que tm apoiado a investigao sobre as misses dos
museus e dos lugares que, quer os seus fazedores, quer objectos e pblicos, ocupam
enquanto elementos discursivos.
Iniciaremos este artigo com uma incurso pelos contextos e valores que
condicionaram a razo de ser do projecto de investigao em construo a que aqui nos
referiremos. Mais do que descrever metodologias de trabalho, o que agora se procura
partilhar so, sobretudo, alguns dos contextos que tm orientado este momento de
reflexo e desenvolvimento do projecto. Resta dizer, que este trabalho , assumidamente
traado a vrias mos e que as inquietaes de que aqui falaremos nos tm, igualmente,
remetido constantemente, quer para questes da prpria identidade profissional e
museolgica / revises curriculares, quer para os prprios fundamentos conceptuais que
se encontram permanentemente em discusso no campo dos estudos sobre museus e da
museologia. Iniciaremos, pois, a nossa incurso por esses mesmos contextos /
inquietaes, esboando, num segundo momento, os objectivos e directrizes do projecto
em apresentao.
1. Dias extraordinrios: reposicionamentosEm termos internacionais, e no contexto de uma exploso de museus, temos
vivido dias extraordinrios. No incio dos anos 90 do sculo passado vivamos (e temos
vivido) um momento de reflexo particular que conduziu ao prprio questionamento da
natureza do museu. Se j nos anos 60-70 tnhamos assistido a uma primeira fase de
auto-avaliao (e forte crtica externa) no mundo dos museus essencialmente
relacionada com o activismo poltico e social , o final dos anos 80 mas sobretudo os
anos 90 foram essenciais para este reposicionamento dos museus em relao
sociedade (ver, por exemplo, os excelentes volumes de: Karp e Lavine, 1991; Karp,
Kreamer e Lavine, 1992). Esta uma reinveno em curso e que deve ser, ainda,compreendida em relao crescente exigncia por parte de diferentes sectores em
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participar activamente na reconstruo / reproduo destas prticas de significao.
Reinveno que tem pressionando os museus para se responsabilizarem no s pelos
recursos sua guarda, mas tambm pelos resultados conseguidos atravs desses
recursos. Os museus deixaram de ser meramente avaliados pelos seus recursos (ex.
coleces, investigao sobre as coleces) para serem cada vez mais avaliados pela sua
utilizao programtica, capacidade de captao e fidelizao de pblicos e
diversificao dos seus produtos; pelos seus servios e qualidade destes servios.
Embora o estudo, documentao e preservao sejam mais do que nunca uma
preocupao fundamental e condio bsica para o desenvolvimento de qualquer
projecto museolgico, a ateno concentra-se mais noutros aspectos, expressando a sua
ansiedade em demonstrar uma conscincia social e talvez mesmo a amadurecimento da
profisso (ver, por exemplo: Weil, 1995; Department of Culture Media and Sport,
2000). Por outro lado, os papis que os museus desempenham no desenvolvimento da
sociedade (ver, por exemplo, Gurian, 2006) e a relao, mais ou menos bvia, com o
desempenho do seu papel educacional e de aprendizagem em museus, tem sido um dos
temas dominantes desta reflexo (Falk e Dierking, 1995, 2000; Falk et al, 2006; Hein,
1998, 2000; Hooper-Greenhill, 1992, 1996).
A viso do museu enquanto lugar de aprendizagem descrita, frequentemente,
enquanto ambiente de aprendizagem de livre escolha utilizado por pblicos
diversificados (Falk e Dierking, 2000). Atravs dos objectos e do conhecimento os
visitantes criam novas relaes, significados e aprendem (Hein, 1998). Os museus
competem, porm, com outras experincias de aprendizagem e formas de lazer (Falk e
Dierking, 2000; Kelly, 2004) no que tem sido denominado de economia da experincia,
na qual as pessoas se envolvem em experincias valiosas em contextos diversificados
(Pines e Gilmore, 1999). Os museus sempre reivindicaram para si mesmos um papel
vincadamente educacional e desde o seu incio que se fundaram tendo em conta essaspremissas. Actualmente, os investigadores apontam a necessidade tendencial de uma
mudana conceptual dos museus que se transformam de lugares de educao em
lugares de aprendizagem respondendo, assim, s necessidades e interesses daqueles que
os visitam e utilizam os seus servios (Weil, 1995; Bradburne, 1998; Falk e Dierking,
2000). Os museus aspiram a deixar de ser repositrios de conhecimento e de objectos
para serem lugares de maravilhamento, de encontro, de reflexo, de criatividade e de
aprendizagem fazendo, simultaneamente, parte de outras formas de aprendizagem epromovendo-se enquanto parte integral das infra-estruturas de aprendizagem.
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Porm, ao abrir-se s polticas da experincia, os museus afastam-se
gradualmente de outras instituies com quem partilham paradigmas de conhecimento e
reencontrado outras, que no s os complementam mas criam, eventualmente, novos
tipos de museus. Assim, os museus da nossa contemporaneidade tentam abrir-se ao
incorporado e vivencial, reconhecendo o valor do conhecimento incorporado (memria
e experincia) prprio de um modelo que, seguindo os conceitos de pedagogia e
performatividade de Homi Bhabha (2004), tem sido apelidado de democracia
performativa, em contraposio a uma verso mais pedaggica que privilegia outro tipo
de abordagens e conceptualizaes (Chakrabarty, 2002). Na verdade, este tipo de
abordagem promove quer experincia, quer conhecimento abstracto e exactamente
este tipo de abordagens museolgicas que, provavelmente, melhor reequilibra o debate
sobre as funes e misses destas instituies.
Se verdade que nos dias de hoje os museus esto sujeitos a muitas exigncias
que os obrigam a desempenhar outras funes, tambm ser verdade que estes mesmos
desafios lhes permitem actuar em novos mundos. Estes so, contudo, mundos onde os
valores indiscutveis anteriores so permanentemente questionados e nos quais os
museus, ao procurarem demonstrar a sua visibilidade e assumir a democracia,
encontram tenses profundas internas que tm conduzido a um apaixonado debate quer
no meio profissional, quer nos media. De qualquer forma, acredita-se que esta
reinveno tem tido consequncias significativas. Especialmente em relao ao
distanciamento da centralidade dos objectos em direco a uma nfase na promoo da
experincia, conduzindo, por vezes, a uma desvalorizao das coleces do museu
como fonte de verdadeiro significado e valor e a uma subordinao em torno da
experincia museolgica (Hein, 2000: viii); nfase que revela novos horizontes ticos,
epistemolgicos e estticos. Todavia tambm evidente no mundo dos museus um
retorno ao mundo das coleces e do papel central da investigao das coleces,produzindo materializaes museolgicas que, de qualquer forma, no se centram
apenas na experincia cognitiva mas favorecem, identicamente, a experincia vivencial
e sensvel dos visitantes e dos prprios curadores / investigadores / connaisseurs
falando, abertamente, sobre e discutindo; abrindo espaos de visibilidade no discurso,
por exemplo, aos processos situados de investigao e de coleccionar enquanto
experincia e histria. Desta forma, a procura de relevncia fora dos seus contextos
habituais um dos eixos centrais desta transformao museolgica, confirmando ainvestigao museolgica como espao de questionamento no delimitador mas de
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contornos cada vez mais defronteira no qual e de acordo com a preposio de
Corynne McSherry um objecto de fronteira "tem significados diferentes em diferentes
mundos sociais e no entanto est impregnado de significado partilhado suficiente para
facilitar a sua traduo entre esses mundos" (trad. A.S., McSherry, 2001: 69, citada em
Strathern, 2004: 45; cf. com Message, 2009)
Esta relevncia procurada nos diversos nveis da esfera pblica: ou seja no
macro-meso espao e no micro-espao pblico; espao que provavelmente mais aqui
nos interessa pois , sobretudo, neste nvel que melhor podemos apreciar o
envolvimento da coordenao de comunicao e de espaos de participao cvica. Por
outro lado, esta demanda de relevncia em museus associa-se construo de novas
formas de dilogo pblico e participao cvica, exigindo no s reciprocidade, mas
tambm continuidade e ao nvel local que, provavelmente, estas parcerias com a
comunidade melhor funcionam e se tornam sustentveis. J no se trata agora de fazer
museus e comunidade s entre os museus. Trata-se de criar relevncia atravs da
constituio de redes que funcionem como recursos crticos dos lugares que os museus
querem habitar; disponibilizando no s os seus recursos (coleces, espaos,
investigao) mas actuando tambm como fruns e, eventualmente, desenvolvendo
formas inovadoras de enderear questes caractersticas do espao pblico e da
contemporaneidade. Questes, nem sempre fceis como, de resto, o debate recente tem
demonstrado (ver, por exemplo:Knell et al., 2007; Cameron e Kelly, 2010).Falamos de
actores do terceiro espao (Soja, 2000) que participam activamente nas polticas urbanas
e que intervm na construo do espao pblico e da democracia (Kirchberg, 2003);
falamos, pois, de lugares performativos; lugares de aco comunicativa que, de
alguma forma, materializam os valores da utopia racionalizada de que fala Bourdieu
(1998: 128); lugares assumidamente polticos e de aco, portanto.
Estas reflexes no so, porm, novidade alguma e tm sido profusamentedivulgadas em cursos universitrios, conferncias e na bibliografia assinada por muitos
autores geralmente associados quer nova museologia, quer museologia crtica e
fazem, agora, parte dos conhecimentos a adquirir pelos profissionais aspirantes. Na
verdade, a produo de um importante corpo de bibliografia relacionado com os estudos
de museus, bem como o desenvolvimento de uma srie de programas de acreditao e
avaliao de museus constituem-se como elementos vitais do aprofundamento desta
reflexo. Estes estudos aceitaram os desafios propostos pela nova museologia e pelamuseologia crtica
i para, neste segundo momento de avaliao, alargarem o mbito das
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suas questes, expandindo e aprofundando as suas abordagens metodolgicas e base
emprica. Eilean Hooper-Greenhill escrevia no incio dos anos 90 do sculo passado que
o museu, enquanto objecto de estudo, continuava praticamente invisvel e que para a
grande maioria dos investigadores se mantinha como que coberto por um manto de
silncio crtico (Hooper-Greenhill, 1992: 3). A leitura rpida de qualquer listagem de
uma editora internacional como a Routledge, por exemplo, demonstra que decorridos
vinte anos os museus se tornaram sexysii e que um grupo cada vez maior de
investigadores de diversos campos investiga e escreve sobre este artefacto social. No
entanto, a dissonncia entre estas discusses e o desenvolvimento de prticas reflexivas
e colaborativas continua pelo menos em Portugal a ser evidente.
O Curso de Museologia da Universidade do Porto iniciou a sua viagem
justamente numa altura em que se assistia a um crescimento editorial sem precedentes
sobre este tema. Livros sobre os mais diversos assuntos, antologias, actas de
conferncias acerca de museus, proliferam desde ento no contexto do fenmeno
museolgico, como lhe chamou Gordon Fyfe (2006: 40), e que podemos relacionar
com os processos que tm sido caracterizados como ps-industriais, ps-capitalistas,
modernidade tardia ou ps-modernos a que normalmente se aliam, entre outras,
motivaes e ansiedades relacionadas com a amnsia social; procura de autenticidade e
antdotos em relao sociedade de consumo; tentativas de lidar com a fragmentao da
identidade e individualizao; desejos de aprendizagem ao longo da vida e de
aprendizagem vivencial. Mas como j tem sido referido, este era e tem sido um
momento de particular fragmentao e profundo questionamento deste mundo.
Diferentes estudos em Portugal, Frana, Estados Unidos e Reino Unido referem, por
exemplo, tenses e crises de identidade no modelo profissional dos conservadores (por
exemplo: Octobre, 2001; Semedo, 2003; Zolberg, 1986). Com base no modelo
tradicional de museus, a profisso de conservadorsurge dividida entre a lealdade paracom as funes em torno do estudo e preservao das coleces e as transformaes em
relao sua misso e valores pblicos de acessibilidade e democracia. Fragmentao
que evoca a revoluo conceptual de que vm falando vrios autores (ver, por exemplo,
Hein, 2000).
Assim, o enquadramento terico da museologia ps-crtica parece-nos aqui
fundamental enquanto modelo conceptual e terico deste projecto de investigao que
procura, essencialmente, construir com o grupo de profissionais dos museus do Portouma cultura de reflexividade, de aco colaborativa e profundamente crtica. Uma
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museologia plural, sem manifestos exclusivos mas que assume o museu enquanto
espao profundamente democrtico e que prope, por exemplo, a imaginao crtica e o
reconhecimento dos visitantes e dos fazedores de museus, enquanto comunidades
interpretativas, como condies fundamentais da pesquisa.
2. Outros encadeamentos: a cidade, os museus e o Curso de MuseologiaA dcada de 90 do sculo passado foi tambm para Portugal de verdadeira
exploso museolgica, assumindo os museus e o patrimnio, no seu sentido mais lato,
uma visibilidade extraordinria nos meios de comunicao. No caso dos museus
portugueses, no seu todo, viviam-se problemas essenciais por resolver e lutava-se com
dificuldades e constrangimentos diversos, nomeadamente os relacionados com a
qualificao e incremento do nmero de tcnicos especializados, em particular em reas
como a conservao e restauro. Ao sector faltava ainda um trabalho de interpretao /
mediao dos espaos mais intenso e generalizado, considerado como factor essencial
de captao e fidelizao de pblicos; programas educacionais inclusivos; a publicao
de material informativo de qualidade promovendo a disseminao generalizada e acesso
ao conhecimento; a investigao generalizada quer sobre as coleces, quer sobre todas
as outras funes do museu. Apesar dos desenvolvimentos e melhoramentos que todos
reconhecemos no sector, muitos destes problemas ainda esto por resolver. A cidade do
Porto e os seus museus no fogem a esta realidade: salvo, uma ou outra excepo, a
maior parte dos museus da cidade necessita de um investimento urgente e sustentado
nas suas polticas de comunicao / interpretao e de repensar a relao que tem
construdo com os pblicos, particularmente em termos de comunidades prximas. Por
outro lado, a dissonncia entre as discusses e reflexes sobre o lugar museu
promovidas pela nova museologia e o desenvolvimento de prticas reflexivas e
colaborativas continua pelo menos em Portugal a ser evidente. Ainda que todos osmuseus reconheam o valor das suas coleces para a educao e aprendizagem e a sua
contribuio para o desenvolvimento da sociedade e se comprometam a cumprir este
mandato pblico, poucos so os que demonstram ter capacidades e competncias para
(se) expor/narrar/avaliaro seu trabalho publicamente (account-abbility).
O campo de aco deste projecto de investigao ser pois o dos museus da
cidade do Porto. A tese de mestrado de Ana Brbara Barros apresentada recentemente e
que estudou as narrativas dos profissionais de educao em museus da cidade (2008)refora o facto de o Porto ter um nmero significativo de museus, com caractersticas
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bem diferenciadas, tais como a natureza das coleces, o tipo de tutela e os seus
estatutos jurdicos, empregando um grupo heterogneo de pessoas que, embora de
forma plural, partilham no s espaos mas tambm algumas representaes e valores.
No mbito desta dissertao foram considerados vinte e quatro os museus existentes no
Porto (verAnexo 1), sendo catorze os que pertencem Rede Portuguesa de Museus. H
porm, um nmero importante de registos a considerar e que se auto-representam
enquanto museus ou ncleos museolgicos, reforando o nmero elevado deste tipo de
organizaes no Porto, constatao que, alis, corresponde aos dados do relatrio
Inqurito aos Museus em Portugal (Instituto Portugus dos Museus, 2000) que refere
que o Norte do pas apresenta uma grande concentrao de museus. Relativamente s
coleces, destaca-se o nmero de museus com coleces de artes decorativas, cincia e
tecnologia, arte sacra e histria social e a maior parte destes museus distinguindo-se,
claramente, o Museu Nacional Soares dos Reis e o Museu de Arte Contempornea de
Serralves so de dimenso local e assumidamente territoriais. Este estudo aponta para
o facto de os pblicos nos museus do Porto serem maioritariamente escolares (90%) e
essencialmente dos 1, 2, 3 ciclos do ensino bsico e secundrio. Ainda que o Porto
seja um destino turstico reconhecido (Instituto de Turismo, 2007; Pent, 2007), o
nmero de visitantes estrangeiros no muito representativo e so cada vez mais os
programas e os estudos que visam integrar pblicos perifricos (Costa, 2006; Marques,
2005). Os profissionais de educao do sector apontam como pblicos com
necessidades especiais, os portadores de deficincia, imigrantes, toxicodependentes,
reclusos, crianas e jovens institucionalizados, vtimas de maus-tratos e, ainda, como
um pblico especial os seniores (Barros, 2008).
Nesta pesquisa, Ana Brbara Barros (2008) trabalhou com catorze profissionais
de educao que representam bem a diversidade museolgica da cidade. Esta
investigadora plenamente implicada (a investigao partiu das suas prprias narrativas /identidade feminina enquanto profissional de educao em museus), para alm de
analisar as clivagens existentes (relacionadas, por exemplo, com a natureza das
coleces e da prpria tutela), acentua a dedicao destes profissionais ao trabalho na
expresso que abre a sua dissertao alma e corao e que expressa bem algumas
das representaes nodais deste grupo de profissionais em relao, por exemplo,
vocao, formas de trabalhar e de compensao, aos papis (profissionais / museus) que
desempenham em relao sociedade. So quatro as funes que consideram ter emcomum: concepo de projectos e actividades interpretativas (executadas ou no pelo
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prprio); divulgao; estudo e pesquisa de coleces; captao de parcerias. A
transdisciplinaridade e a cooperao sopalavras de ordem deste vocabulrio partilhado
e apesar das dificuldades a experincia j demonstrou que os profissionais dos museus
do Porto, quando desafiados a trabalhar em cooperao, trabalhar juntos produzindo
trabalho relevante (ver, por exemplo, Ferreira, 2003).
Por outro lado, apesar de existirem alguns projectos de grande interesse social no
mbito do trabalho com comunidades (Costa, 2006), a verdade que no tem sido
desenvolvido um trabalho sistemtico e estruturado de avaliao do impacto destas
prticas, que possa apoiar futuras polticas de actuao e programao, orientar
decises, e abrir caminho a outras prticas e investigao que possam verdadeiramente
integrar as polticas urbanas e afirmar estes espaos enquanto democrticos, criativos,
colaborativos (representaes que encontramos amide no grupo). Ana Brbara Barros
(2008) relata, por exemplo, que os estudos qualitativos so prticas quase inexistentes
nestes museus, enumerando como factores determinantes para este problema: a ausncia
de formao sobre os processos de investigao e avaliao, a falta de tempo para os
profissionais se dedicarem a esta tarefa morosa e, enfim, pela falta de investimento das
instituies na contratao de tcnicos especficos para realizar avaliao.
Acrescentamos a estas suposies, a ausncia quase total de uma cultura de avaliao no
sector cultural em geral em Portugal e nos museus especificamente , constituindo-se
como uma das marcas da dissonncia que antes referimos. Por outro lado, pouco tem
sido feito para divulgar junto destes profissionais os prprios projectos desenvolvidos,
partilhando e celebrando sucessos e reflectindo sobre as suas estratgias e metodologias
de acoiii.
Se o Curso de Museologia da Universidade do Porto tem vivido a sua viagem
nestes contextos de profunda transformao do tecido museolgico tambm verdade
que tem sido visivelmente influenciado por outros contextos mais amplos do foroacadmico e profissional, tais como, a viso da Universidade enquanto rede
colaborativa ao servio da sociedade, a relao entre esta viso e a noo de
profissionalismo activoe agncia crtica, a compreenso do valor das organizaes /
comunidades de aprendizagem em museus, a noo de objecto discursivo, os prprios
contextos contemporneos, entre outros. E precisamente neste contexto que tem
proposto e desenvolvido alguns trabalhos de investigao em colaborao com alguns
museus da cidade. O Curso (e claro que aqui quando falamos, quer nos museus, quer noCurso, no estamos a pensar em nenhuma entidade abstracta mas sim no grupo dos
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seus profissionais) para alm de estabelecer parcerias de trabalho e investigao com
universidades e outras instituies de ensino e investigao nacionais e estrangeiras,
rev-se no seu territrio prximo com tudo o que isso implica em termos de
profissionalismo activo e de agncia crtica. Este conceito de profissionalismo activo e
que interessa aqui introduzir porque se tem constitudo como valor essencial de
trabalho, reformula os papis polticos e profissionais tambm dos docentes-
investigadores, reconhecendo as responsabilidades especficas destes membros do
grupo e apelando para o seu envolvimento e, fundamentalmente, para uma
responsabilidade colectiva. Por outro lado, esta abordagem de ensino tem tambm
procurado ter em conta as contingncias das prticas museolgicas do dia-a-dia,
tentando ultrapassar a produo de lugares de tenso entre universidade e os museus
(teoria e prtica) e, ao mesmo tempo, assumir um lugar enquanto protagonista essencial
do crculo de cultura (Hall, 1997) do grupo. Judyth Sachs (2000: 81), invocando o
trabalho de Giddens, aplica a noo de confiana activa ao trabalho partilhado pelo
grupo, noo que aqui tambm se aplica. Esta confiana activa no incondicional mas
uma caracterstica de relaes profissionais negociadas nas quais um grupo partilhado
de valores, princpios e estratgias debatido e negociado. Um segundo conceito
fundamental de Giddens relevante para este contexto adoptado por esta investigadora
no desenvolvimento dos seus pontos de vista acerca do profissional activista o de
uma poltica produtiva / geradora que intervm no domnio pblico no qual opera.
Desta poltica produtiva espera-se que seja orgnica; ou seja, que se desenvolva
directamente a partir das necessidades locais e globais. pois, e como se disse
anteriormente, a partir destas necessidades globais e locais e deste entendimento
produtivo e implicado da investigao que surge este projecto.
3. Vises, objectivos e metodologias de trabalhoO desafio reside na construo de zonas de contacto entre a produo do
conhecimento sobre museus e os diferentes actores que trabalham no terreno. As teorias
e metodologias interactivas de investigao-aco desenvolvidas nos pases nrdicos
sobre o envolvimento em termos mais igualitrios de participantes e outros actores fora
dos circuitos tradicionais de investigao so um potencial inexplorado (Ghaye, 2008)
para esta construo. Na investigao-aco interactiva, o papel dos profissionais
praticantes e dos profissionais acadmicos partilhado entre todos os participantes (emesmo outros actores considerados relevantes para o processo de investigao
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conjunta). Esta abordagem compreendida como um meio para atingir um maior
"vigor social da cincia" (Novotny e Gibbons, 2001). Por outro lado, a tradio da
abordagem da investigao-aco participante resulta de situaes onde as pessoas
querem fazer mudanas a partir de reflexes, ou seja, aps uma reflexo crtica que
surge quando os participantes querem pensar sobre os seus posicionamentos,
estratgias, caminhos percorridos e a partir destas reflexes pensar em como
podero transformar as suas prticas (Denzin e Lincoln, 2000: 573).
Assim, o projecto aqui apresentado centra-se no desenvolvimento de processos
de trabalho e de mtodos inovadores, a partir das tradies de investigao-aco e
participao interactiva, promovendo a colaborao sustentvel e aspirando a participar
na construo de culturas inovadoras com potencial de mudana em museus. O projecto
inspira-se nas orientaes de investigao PAAR / Participatory Appreciative Action
Research (Ghaye, 2008). Orientao que nos parece interessante neste contexto, tendo
em conta algumas das suas premissas fundamentaisiv. Pretendemos, pois, comear por
um reenquadramento dos contextos de trabalho a partir de questes positivas
promovendo processos de reflexo que partem de experincias que so caracterizadoras
de uma cultura de trabalho apreciativa. Esta abordagem metodolgica tem demonstrado
ser frtil, quer ao nvel individual, quer de grupos e mesmo organizacional (Ghaye,
2008).
Por outro lado, o projecto visa enfatizar a participao e influncia de no-
acadmicos no processo de criao de conhecimento (Israel et al., 1998), posicionando-
os como co-investigadores, alicerando-se na comunidade de prtica, apoiando os seus
interesses e encorajando os membros do grupo a participarem em diferentes nveis da
pesquisa. Assim, o envolvimento activo dos membros do grupo e a sua influncia em
alguns aspectos da investigao considerado essencial. Envolvimento que implica
participao e que assenta quer na construo de relaes de confiana, quer no dilogoe na capacidade do grupo construir um espao colaborativo com vista mudana social
(Stoecker, 2005). A pesquisa colaborativa um processo de investigao no qual os
participantes tm uma voz activa e esto includos em todas as suas fases, afastando-se
da perspectiva tradicional no que diz respeito sua participao. Tendo em conta a
experincia de todos os envolvidos neste processo, qualquer um dos participantes
considerado especialista pois a diversidade dos seus conhecimentos e dos seus pontos
de vista que dar uma maior profundidade investigao. Esta abordagem tem sidotambm descrita como sendo colaborativa, participativa, empowering e constituindo-se
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enquanto processo transformador do prprio grupo/ comunidade / espaos pblicos
(Hills e Mullett, 2000). Na perspectiva da investigao-aco, o argumento que as
relaes de igualdade entre participantes e investigadores podem, atravs de uma
articulao entre a aprendizagem e prticas, gerar conhecimentos qualitativamente
diferentes e mais democrticos que, idealmente, promovem processos de empowerment
das pessoas envolvidas e colaboraes sustentveis no espao e no tempo. Os conceitos
de empowerment, justia social e transformao so, alis, marcantes neste tipo de
investigao e deste projecto em particular , sublinhando o facto de que todos tm
algo a ganhar ao trabalhar juntos e, como tal, espera-se que as parcerias construdas
persistam mesmo aps a concluso formal do trabalho.
Epistemologicamente este tipo de investigao consistente com paradigmas e
teorias crticas construtivistas e enfatiza a natureza socialmente construda do
conhecimento (Israel et al, 1998). Reconhece, igualmente, o valor das formas mltiplas
de conhecimento e o valor das contribuies individuais. Da que um princpio claro
deste tipo de abordagem seja a sua crtica de abordagens positivistas de recolha de
dados que enfatizam a objectividade e tendem a ver os participantes enquanto objectos a
serem estudados em vez de actores do processo de investigao. Do ponto de vista
terico compreende a teoria como qualquer coisa desconhecida, como sendo criada
atravs das iteraes de aco e reflexo que conduzem praxis e gera evidncia para
prticas futuras. De facto, ao nvel axiolgico e em relao teoria de valor, esta
investigao avaliao em termos da diferena que pretende construir na
transformao da comunidade de prtica. Consequentemente concebe a capacidade de
construo como valiosa, quer ao nvel individual, quer do grupo (Hills e Mullett,
2000). Neste tipo de investigao ressalta tambm o princpio das parcerias de trabalho
que visam integrar o conhecimento e produzir benefcios para todos os participantes
envolvidos. Finalmente, apoia-se no princpio de empowerment construindo pontosfortes e recursos na comunidade de prtica e promovendo processos de co-
aprendizagem. Hills e Mullett (2000) enunciam seis princpios de aprendizagem no tipo
de investigao em comunidade que podero ser tambm aqui adoptados. Estes
princpios incluem o planeamento sistemtico, a relevncia para o grupo, o
envolvimento do grupo, a resoluo de problemas, a mudana social e a
sustentabilidade. Israel et al. (1998) tambm discutem alguns princpios deste tipo de
investigao, tais como, unidade de identidade, construo de foras na comunidade,promoo de parcerias, integrao de conhecimentos valiosos para os envolvidos,
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empowermente disseminao de conhecimentos. Tendo em conta, porm, a perspectiva
Participatory Appreciative Action Research (Ghaye, 2008) que pretendemos introduzir
e que assenta os seus pressupostos numa viso que, embora no se aliene dos
problemas, se concentra, sobretudo, nas realizaes positivas do grupo, o princpio de
resoluo de problemas s ser desenvolvido se o grupo assim o enunciar. O mtodo
PAAR tem as suas razes na investigao-aco participativa que tambm enfatiza a
melhoria das prticas atravs do envolvimento e participao. A contribuio da
abordagem do PAAR , como se disse j, a acentuao das caractersticas positivas, o
que significa, por exemplo, trabalhar juntos e partilhar as melhores prticas, apreciando
as competncias de cada um. PAAR pode ser compreendido como o oposto da resoluo
de problemas, porque incide sobre o sucesso e no quefunciona, em vez de se centrar em
problemas. Os principais conceitos em PAAR so o reenquadramento, as questes
positivas, a participao e o presente positivo. PAAR oferece uma oportunidade para
colocar perguntas positivas e transform-las em aces positivas. Essa perspectiva pode
tambm ser usada quando pretendemos construir um ambiente de aprendizagem que
incentive a cooperao e a partilha e que viabilize uma cultura psicossocial positiva que
realce os processos de aprendizagem. Claramente, estes princpios podem ser aplicados
a este modelo mas esta lista no ser exaustiva e depender do contexto de investigao
e das organizaes envolvidas e a nfase em aces interactivas faz com que seja fcil
combinar esta abordagem com uma perspectiva interactiva da investigao-aco
(Aagaard e Svensson, 2006). De igual forma, o conhecimento aqui entendido como
tendo as suas razes materiais nas prticas quotidianas, quer dos participantes, quer dos
investigadores. No que diz respeito s razes do conhecimento h pois fortes
semelhanas entre as duas tradies. Convm ainda sublinhar que este modelo pode ser
compreendido, quer como modelo terico, quer como plataforma conjunta interactiva
para os investigadores e actores (os participantes das instituies) para partilharemexperincias, conversar e reflectir, actuar como espao que desenvolva os processos de
aprendizagem e transformao. Em termos de metodologia os mtodos adoptados fazem
parte de qualquer abordagem deste tipo e no so predeterminados mas, em vez disso,
emergem dos princpios seleccionados do projecto e das questes de investigao. Os
mtodos enfatizam a anlise, a responsabilizao dos actores e os processos de
reflexividade e co-aprendizagem. Tendo em conta os contextos deste projecto de
investigao e da necessidade de criar um clima de confiana profundamentecolaborativo, pareceu-nos que esta seria uma abordagem mais apropriada.
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Espera-se que os parceiros envolvidos ganhem conhecimento sobre os prprios
processos de investigao desenvolvendo uma apreciao do valor da mesma e que esta
participao possa desenvolver novas relaes sociais entre os membros, relaes de
confiana e de eficcia social (Schlove et al., 1998). Aspira-se, ainda, a promover o
conhecimento destas configuraes locais que conduzam a fluxos de informaes e
colaboraes mais significantes. De facto, este tipo de investigao tem sido discutido
como levando a melhores prticas de parceria em rede, envolvendo a construo de
contactos e, como resultado, a consolidao de redes sociais, enquanto estruturas de
oportunidade que facilitam o acesso a diferentes tipos de recursos e desenvolvem
relaes, permitindo aos participantes descobrir e aceder a oportunidades positivas. Por
outro lado, espera-se que o envolvimento dos membros do grupo quer na construo,
quer na disseminao da investigao, promova uma melhor aceitao e utilizao dos
resultados (Ayers, 1987) pelos participantes e tutelas. A disseminao activa das
concluses e reflexes do projecto essencial para que a investigao tenha um
verdadeiro impacto e precisa circular para que entre no domnio pblico.
Neste modelo os participantes e co-investigadores aprendem com cada um, ao
partilharem histrias pessoais e experincias, reunindo e documentando as suas histrias
(Papineau e Kiely, 1996). Esperamos, ainda, que este envolvimento contribua para o seu
desenvolvimento pessoal atravs da aprendizagem de competncias especficas, tais
como a utilizao de novas tecnologias, competncias de planeamento, etc. Por outro
lado, o envolvimento em processos de investigao desenvolve competncias de
liderana e lideres potenciais a diferentes nveis, expressando diversas competncias e
funes. Assim, este projecto pretende criar melhorias sustentveis nesta comunidade de
corpo e alma, ao realar as posies, competncias e conhecimentos dos seus membros
localizados nos processos de investigao. Logicamente, o projecto centra-se numa
agenda mais local, reflectindo sobre questes e prticas especficas que envolvem ogrupo, promovendo, nomeadamente, a mudana de centralidade da avaliao:
centralidade na qualidade e nos impactos em vez de uma centralidade nos produtos e na
mera quantificao. Os problemas de desequilbrios internos de poder no grupo e com
os investigadores (Taylor, 2000); o estabelecimento de confiana e a da gesto do tempo
so, por exemplo, algumas das reas que consideraremos com a maior ateno.
Esta perspectiva apoia os mtodos a propor e que so essencialmente
qualitativos. A recolha de dados ocorrer durante um perodo de vinte meses econstituir, por exemplo, em entrevistas semi-estruturadas com cada participante,
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dirios-de-campo / bordo, sesses de workshops / grupos focais, participao em blog /
ou wiki / ou rede social, mapas de ideias. Na interaco com os participantes, prev-se a
utilizao de diferentes mtodos interactivos, por exemplo, a criao de uma pgina do
projecto (em formato de wiki, blog ou rede social, essa ser uma das decises a tomar
no mbito dos processos de desenvolvimento do prprio projecto), proporcionando um
constante dilogo e interaco entre os envolvidos e que apoiar a construo de um
arquivo-recurso comum. A nossa razo para propor os dirios de campo / bordo como
um instrumento central de pesquisa do projecto de investigao, relaciona-se com a
experincia de ensino de uma das autoras deste artigo que tem tentado implementar esta
metodologia enquanto processo de ensino e forma de avaliaov. Esta abordagem
pretende incentivar e desenvolver a aprendizagem vivencial como , alis, defendido
por Klob (1984). Ao utilizar os dirios de campovi / bordo, por exemplo, esperamos
desafiar os participantes a questionar, teorizar e colocar hipteses sobre as reflexes e
trabalhos propostos pelos diferentes workshops; e assim esperamos desenvolver uma
conscincia de como o conhecimento construdo, ou seja, o pensamento crtico e uma
conscincia de si mesmos enquanto profissionais crticos, sujeitos crticos. Por outro
lado, os dirios podem ser um instrumento precioso para cartografar as experincias e
viagens pessoais, acentuando a nfase que colocamos no processo de identificao e de
uma prtica reflexiva. A subjectividade, a experincia dos museus e dos contextos
histricos ser enfatizada atravs de trabalho em equipas, questes especficas, e escrita
reflexiva (nomeadamente os dirios). Simultaneamente, pretendemos que a experincia
da interaco dos workshops seja tambm utilizada para promover a aprendizagem da
reflexo, da discusso, da profundidade, da construo colaborativa. A fim de construir
uma relao mais inclusiva e, sobretudo, mais participante, reflexiva e de confiana,
diferentes actores sero ouvidos durante as diferentes fases do processo de planeamento
do projecto, permitindo a sua reviso e assegurando a credibilidade do estudo tendo emconta os parmetros enunciados anteriormente.
Concluses
Apesar dos princpios da nova museologia enunciados no incio deste artigo
fazerem desde h anos parte do vocabulrio incontestado da maior parte dosprofissionais de museus, a verdade que existe uma dissonncia profunda entre o que se
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diz e o que se faz. Por outro lado, embora no se negue aqui, de forma alguma, que a
natureza diferenciada dos museus requer diferentes abordagens e mesmo definies
em termos do que possam ser eventuais impactos sociais ou, indiscutivelmente, da sua
misso , h um vocabulrio que seria til fosse colaborativamente construdo. Nessa
construo pretendemos envolver no s outras ferramentas mas cumprir outros
objectivos maiores de que mais adiante falaremos.
No nos podemos esquecer que os museus tambm so contextos de
aprendizagem para os prprios profissionais e este projecto parte do princpio que s
quando as prprias organizaes (os seus profissionais) interiorizarem os valores e
reposicionamentos a que nos comemos por referir notoriamente o de procura de
relevncia, profissionalismo activo, agncia crtica, polticas geradoras, etc. podem,
em realidade, as prticas dos museus serem transformadas.
O trabalho de Peter Senge (1990) sobre as organizaes de aprendizagem foi j
h alguns anos e de forma bastante interessante adaptado por Lynne Teather, Peter
van Mensch e Sara Faulkner-Fayle (1999) ao mundo dos museus. As prticas que este
projecto procurar desenvolver inserem-se, amplamente, neste contexto. Senge
apresenta as organizaes como sendo lugares onde as pessoas ampliam
continuamente as suas capacidades para criar os resultados que verdadeiramente
desejam, onde novas e formas abertas de pensar so alimentadas, onde a aspirao
colectiva libertada e onde as pessoas esto continuamente a aprender como aprender
em conjunto (Senge, 1990: 484, traduo A.S.).
Ao implementarmos estas parcerias colaborativas entre os museus da cidade do
Portovii esperamos realar verdadeiras formas de aprendizagem que enfatizem a
natureza dinmica e dialgica destes processos e, assim, comprometer os parceiros
envolvidos na sua prpria governana e agncia (Giddens, 1996). Esta abordagem
inclui na formao e na discusso destes processos de estudo a prpria comunidade deprofissionais-praticantes. Desta forma, esta conceptualizao do projecto de
investigao permitir integrar as vozes dos diferentes profissionais quer como
indivduos, quer como instituies e no apenas como meras concepes /
representaes, estabelecendo verdadeiras (espera-se!) relaes sustentveis ao longo
desta rede / tempo. Por outro lado esperamos tambm ultrapassar uma srie de barreiras
e esteretipos que existem e circulam no grupo acerca da forma de trabalhar de cada
equipa.
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O objectivo principal de uma rede deste tipo , ento, proporcionar valor
acrescentado aos diferentes actores envolvidos. A criao de valor assenta,
fundamentalmente, nos conhecimentos de todos os actores envolvidos e na forma como
associam esses conhecimentos (eventualmente com os prprios processos de
aprendizagem mtua, a transformao destes recursos de conhecimento e a criao de
novos recursos). Basicamente, a partilha de conhecimentos e o desenvolvimento de
recursos constituem-se como o resultado das interaces entre os diferentes parceiros.
Todas as relaes que se estabelecem, formal e informalmente, ensinam-lhe algo e
tornam-se parte dele. Consideramos os museus (e a Universidade / o Curso) como
fazendo parte de uma densa rede de relaes e isso significa que temos em conta outros
possveis actores com os quais os museus (a Universidade / o Curso) e os prprios
museus / actores se relacionam permanentemente (ou seja, outros alunos, pblicos, etc.).
Os museus (Curso) no so compreendidos num mundo atomizado e neutro, mas
professando-em-aco , intervindo, participando na esfera pblica e na arena cultural de
que, afinal, fazem parte; no seu territrio natural que tambm a sua regio;
considerando os seus prprios recursos que se tornam mais ricos com cada parceria. O
objectivo , ento, criar espaos, organizaes colaborativas / criativas de aprendizagem
mtua, espaos de reflexividade no qual se estabeleam relaes de credibilidade e
confiana, re-negociando, espaos e operando tambm a partir do ponto de vista de
todos os actores envolvidos e ultrapassando, por vezes, fronteiras pr-estabelecidas (por
exemplo, a definio do que uma coleco). Espera-se que estes espaos colaborativos
/ criativos (espaos de co-curadoria universidades-museus-comunidades, porque no?
no permitir esta abordagem, afinal, ultrapassar algumas dicotomias e focos de
tenso mais ou menos estreis ainda existentes no campo?) funcionem tambm como
espaos reflexivos.
As vises, valores e prticas dos profissionais do sector sero pois o ponto departida deste estudo; um ponto de partida que se pretende seja tambm uma reflexo
sobre prticas de programao que tenham em conta objectivos mltiplos; um ponto de
partida a partir do interior, do capital cultural j existente, ou seja, dos seus recursos,
dos seus actores e das suas prprias representaes sobre o que entendem ser no s
impactos sociais, mas a prpria natureza do museu e do seu trabalho. Reflectindo sobre
o seu prprio trabalho, repensando construtivamente, criativamente misses e espaos
de aco e proximidade na comunidade. Envolvendo-os, desde logo, na re-definiodesta abordagem para o sector e ouvindo as suas prprias expectativas e valores
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orientadores. Esperamos que este diagnstico possa actuar como um instrumento
fundamental para se pensar de um modo mais estruturado e fundamentado a aco dos
museus do Porto com e nas comunidades; criar um enquadramento vlido e sustentvel
para o valor dos impactos sociais dos museus no indivduo, comunidade e sociedade
para este contexto museolgico; desenvolver processos de avaliao sobre o valor dos
museus enquanto servio pblico; promover espaos de debate entre museus e outras
instituies / actores culturais / educativos / sociais sobre a sua funo social e o seu
papel como servio pblico; testar opes de um enquadramento de valor e de impactos
com profissionais do sector.
Uma das necessidades deste projecto , por isso mesmo, fazer um levantamento
dos projectos existentes, do tipo de impactos que os museus pensam ter (Scott, 2004),
definir tipologias de impactos sociais, estruturar as definies para poder, de um modo
mais sistemtico e integrado, desenvolver a investigao e actuar no territrio. O
diagnstico feito no final dos vinte meses de durao do projecto possibilitar que,
numa segunda fase do projecto, se proponha uma aco concertada a nvel de projectos
de investigao em museus, de avaliao dos seus impactos sociais e de apoio ao
desenvolvimento de uma comunidade de prtica. A formao em parceria com as
diferentes instituies envolvidas e divulgao dos contedos dos relatrios (e
sobretudo do relatrio final) far, igualmente, parte de todo este processo construtivo /
criativo (e de profunda reflexo).
Este projecto tem, como ponto de partida, o modelo de investigao-aco
participativa e interactiva que parte do paradigma qualitativo. A abordagem qualitativa
foi eleita tendo em conta que a centralidade deste estudo a anlise de como os
profissionais de educao em museus compreendem a natureza destas instituies e do
seu trabalho com os pblicos, relacionando estas compreenses compoticas epolticas
incorporadas. Assim, nesta primeira fase do projecto de investigao, pretende-se,sobretudo, iniciar uma discusso alargada junto dos profissionais de museus e de outras
instituies culturais da cidade do Porto sobre o papel que desempenham na
comunidade enquanto agentes catalisadores de desenvolvimento social. Esperamos que
este estudo possa apresentar uma discusso sobre conceitos fundamentais, tais como, os
de incluso, funo social, comunidade, e a sua viso sobre o que consideram ser os
diversos impactos dos seus programas, identificando, por exemplo, reas-chave de
interveno. A relao com a natureza do museu e do seu prprio trabalho parece-nosaqui ser evidente. Esperamos, igualmente, poder identificar contextos e metodologias de
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trabalho de cada instituio, fase de trabalho que certamente apoiar a auto-reflexo no
grupo de profissionais-praticantes e investigadores envolvidos que este projecto
pretende imprimir a todo o processo. A definio de indicadores que permitam a sua
avaliao poder, eventualmente, fazer parte integrante deste projecto-piloto.
Este estudo ser tambm, e de certa forma, um estudo diagnstico dos impactos
sociais que os profissionais dos museus traam para os seus projectos, abrindo caminho
para uma segunda fase de trabalho / investigao com as prprias comunidades. Os
workshops desenvolvidos no final da primeira fase sero determinantes para a reflexo
comum. Numa segunda fase, tendo desenvolvido vises e valores sobre os impactos
sociais, ser relevante fazer um levantamento mais exaustivo das necessidades e
expectativas das comunidades do Porto, das suas utilizaes dos museus e cruzar esse
levantamento e o seu prprio desenvolvimento de indicadores de avaliao com a viso
mais institucional deste estudo. O desenvolvimento de outros estudos de pblicos da
cultura e de museus, no mbito de doutoramentos e mestrados da Faculdade de Letras
da Universidade do Porto, sero, certamente, indispensveis para apoiar este estudo. Os
parceiros envolvidos no projecto no tm qualquer dvida que qualquer noo de
impacto ou qualquer indicador deve muito provavelmente ser negociada com os
utilizadores do servio (neste caso, os pblicos destinatrios) e que, um segundo
andamento do projecto, dever ter em conta esse desenvolvimento. Este projecto
assume, porm, o espao interno dos produtores como um espao-chave essencial de
construo de prticas e, talvez mesmo, de necessidade prioritria e urgente de reflexo
e formao e da ser o locus primeiro desta aco de investigao e aco para a
transformao e reflexo sobre o espao-museu.
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Dimaggio (ed.), Nonprofit enterprise in the arts: Studies in mission and constraint, New
York, Oxford University Press, pp. 184-198.
Abstract: In this article we present the main structural guidelines and contexts for an ongoing
research project being carried out by the authors and which deals with the nature of social
impact and museum functions in a collaborative background. We begin by briefly presenting themain contexts and challenges the project attempts to address while also considering
methodological options. A discussion of the underlying concepts is also offered at this point.
Drawing from the action-research and interactive-participation traditions, the field of action of
this research project deals with Portos museums and, particularly, with professionals, as social
actors, devoted to the work of mediation. It aims to promote sustainable collaboration within
museum professionals, that is, the proposal involves mainly the development of a collaborative
space and a community of practice that supports critical and creative thinking, promoting
change.Keywords: Museum; Mediation; Audiences; Collaboration; Social impacts.
Rsum: Cet article prsente les grandes orientations et les contextes d'un projet de recherche
en cours, un projet qui fait rfrence la nature de l'impact social et les fonctions du muse dans
un contexte profondment de collaboration. Il commence par prsenter le contexte et les enjeux
du projet, tenant compte galement des options mthodologiques et propose une discussion sur
les concepts cls. Puisant dans les traditions de recherche-action et de la
participation interactive, ce projet pour champ d'action les muses de Porto et comme desacteurs cls, en particulier, les professionnels qui se consacrent aux travaux de la mdiation avec
8/2/2019 SEMEDO, Alice e FERREIRA, Ins (2011) Museus e Museologia, REVISTA SOCIOLOGIA , UP
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le public. Vise promouvoir une collaboration durable entre les professionnels de muses;
savoir, la proposition concerne principalement le dveloppement d'un espace collaboratif et
une communaut de pratique qui permet des changements de la pense critique et crative.
Mots-cls: Muse; Mdiation; Audiences; Collaboration; Impacts sociaux.
i Para uma discusso dos termos ver, por exemplo: Davis, 1999; Martinez, 2006; Lorente, 2003.ii Como afirmou Scott Lash durante a sua interveno no Porto, no Colquio Museus, Discursos e
Representaes em 2004.
iii Embora muitas Conferncias e Colquios apresentem muitos casos de sucesso (que funcionam no
grupo de profissionais como boas-prticas) na maior parte destes eventos o tempo de reflexo, debate e
aprendizagem extremamente limitado e s excepcionalmente oferecem espaos mais individualizados e
acolhedores que favoream o exerccio da imaginao crtica dos membros do grupo.
iv PAAR Esta abordagem parte do que funciona e no os seus pontos negativos, centrando-se, por isso
mesmo, mais nos sucessos do grupo que nos seus problemas.
v Mestrado e Doutoramento em Museologia (2 e 3 Ciclos), Faculdade de Letras da Universidade do
Porto (http://sigarra.up.pt/flup/cursos_geral.FormView?P_CUR_SIGLA=MMUS).
vi Talvez de bordo porque gostaramos que se tratasse de uma viagem
vii
Neste momento o projecto incluir profissionais da maioria das instituies que constam do quadro emanexo, com caractersticas bem diferenciadas, tais como, a natureza de coleces, tutela e localizao na
cidade.