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O gato que atravessa as paredes Este gato é extraordinário em tudo. Primeiramente ele não nasceu como os outros gatos. Ele simplesmente apareceu dentro de casa quando todas as portas e janelas estavam fechadas. Eu sei que os gatos conseguem fazer coisas estranhas, mas durante muito tempo não consegui explicar como é que ele apareceu. Quando surgiu e começou a olhar fixamente para mim senti-me um pouco assustado pois eu era ainda um menino. Mas como ele não miou, não bufou, nem se mexeu, eu comecei a ficar relaxado e a admirar o belo exemplar de animal. Em segundo lugar, reparei que ele trazia uma coleira com um nome escrito: Schrodinger. Quando vi aquilo pensei quem seria o maluco que deu um nome desses a um gato. Depois achei que era um nome nobre e que ficava bem àquele animal de porte altivo e aparência elegante Sempre desejei ter um gato e acho que Deus sentiu o meu desejo e enviou-me o gato mais lindo do mundo. Era grande e tinha um pêlo brilhante e bem cuidado. Possuía uns grandes bigodes e tinha uns olhos inteligentes como os das pessoas. Fiquei logo apaixonado por aquele gato. Corri para ele para lhe pegar e estranhamente ele não fugiu e deixou que o agarrasse como se me conhecesse desde sempre. Mostrei-lhe o quarto e falei-lhe enquanto lhe apresentava as minhas coisas: os meus brinquedos, as minhas mascotes, os meus livros, a minha consola. Ele prestava atenção ao que eu dizia como se estivesse a entender tudo. Quando senti a minha mãe no hall corri para ela a abraça-la e disse-lhe; “que lindo gato que me deste!” A minha mãe respondeu-me espantada : “Que gato?” Eu apontei para o quarto onde o Schrodinger estava majestosamente sentado na minha cama e disse: “Anda ver! Aquele!” A minha mãe disse ;“Deve ser algum gato vadio que entrou em casa sem ninguém notar” Eu retorqui: “Não pode ser vadio. Tem nome escrito na coleira é o Schrodinger”. A minha mãe deitou mais um balde de gelo no meu entusiasmo: “ Então já deve ter dono! È com certeza o gato de algum vizinho que entrou por alguma janela aberta . Temos de o devolver. Enxota-o para fora de casa!“, Eu choraminguei: “ Mas ele gosta de mim até deixou que eu o pegasse ao colo. Deixa-o ficar cá em casa que eu vou perguntar aos vizinhos se alguém conhece o dono deste gato Scrodinger” . A minha mãe concordou e eu chamei o gato que estranhamente me seguiu como um cão e juntos saímos para a rua. Durante horas percorremos juntos todas as ruas da vizinhança onde eu perguntei em todas as casas se aquele gato lhes pertencia Cansado mas feliz regressei a casa sempre com o gato ao sempre ao meu lado e triunfante disse à minha mãe: “Ninguém o conhece. Por isso é meu ! Andava perdido e fui eu que o achei.” A minha mãe arrefeceu novamente o meu entusiasmo quando me disse que tinha de pedir autorização ao meu pai para poder ficar com ele. O meu pai observou o bicho comentou sobre o facto de ele estar bem cuidado e sobre a coleira com o estranho nome . Disse na altura “Esta coleira parece de ouro amarelo e de ouro branco!” Mas aceitou que eu ficasse com ele em casa at é aparecer o dono Resolvemos colocar um anúncio no jornal com a foto, o nome do gato e a frase : “entrega-se a quem provar que lhe pertence” . Publicamos o anúncio todos os fins de semana durante um mês mas para minha felicidade ninguém reclamou o bichano. Assim fui ficando com ele em casa. Bem ficar é uma força de expressão pois o Schrodinger desaparecia sem deixar rasto e voltava a aparecer no meu quarto sem que ninguém desse pela sua entrada. O meu estranho gato foi sempre um poço de surpresas estranhas. Se eu disser que o meu gato fala ninguém vai acreditar e vão pensar que eu estou doido. Mas a verdade é que ele fala comigo. Bem, falar é uma forma de dizer, na realidade eu sinto as palavras dele como se fossem os meus pensamentos. A primeira vez que isso me aconteceu achei que estava a ficar maluco. O gato estava a falar para mim mas da sua boca não saia nenhum som, nem sequer um pelo do seu bigode se mexia. Isso aconteceu quando eu estava no meu quarto a tentar resolver um puzzle difícil e não conseguia. Então “ouvi” alguém dizer-me: -”Aí serve a peça verde e castanha”. Assustado olhei em volta e só vi o Schrodinger a olhar fixamente para mim, que como de costume tinha aparecido vindo do nada. Eu tinha fechado a porta e as janelas e estas continuavam fechadas. O gato continuava quieto mas a voz martelava-me os ouvidos “Então não vês que aí serve a peça verde e castanha?”. Coloquei a peça no lugar e serviu. Espantado vi-me a perguntar ao gato: “ Schrodinger

Scrodinger 1

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  • O gato que atravessa as paredes Este gato extraordinrio em tudo. Primeiramente ele no nasceu como os outros gatos. Ele

    simplesmente apareceu dentro de casa quando todas as portas e janelas estavam fechadas. Eu sei

    que os gatos conseguem fazer coisas estranhas, mas durante muito tempo no consegui explicar

    como que ele apareceu.

    Quando surgiu e comeou a olhar fixamente para mim senti-me um pouco assustado pois eu era

    ainda um menino. Mas como ele no miou, no bufou, nem se mexeu, eu comecei a ficar relaxado

    e a admirar o belo exemplar de animal.

    Em segundo lugar, reparei que ele trazia uma coleira com um nome escrito: Schrodinger. Quando

    vi aquilo pensei quem seria o maluco que deu um nome desses a um gato. Depois achei que era um

    nome nobre e que ficava bem quele animal de porte altivo e aparncia elegante

    Sempre desejei ter um gato e acho que Deus sentiu o meu desejo e enviou-me o gato mais lindo do

    mundo. Era grande e tinha um plo brilhante e bem cuidado. Possua uns grandes bigodes e tinha

    uns olhos inteligentes como os das pessoas. Fiquei logo apaixonado por aquele gato. Corri para ele

    para lhe pegar e estranhamente ele no fugiu e deixou que o agarrasse como se me conhecesse

    desde sempre. Mostrei-lhe o quarto e falei-lhe enquanto lhe apresentava as minhas coisas: os meus

    brinquedos, as minhas mascotes, os meus livros, a minha consola. Ele prestava ateno ao que eu

    dizia como se estivesse a entender tudo. Quando senti a minha me no hall corri para ela a abraa-la

    e disse-lhe; que lindo gato que me deste! A minha me respondeu-me espantada : Que gato?

    Eu apontei para o quarto onde o Schrodinger estava majestosamente sentado na minha cama e disse:

    Anda ver! Aquele! A minha me disse ;Deve ser algum gato vadio que entrou em casa sem

    ningum notar

    Eu retorqui: No pode ser vadio. Tem nome escrito na coleira o Schrodinger. A minha me

    deitou mais um balde de gelo no meu entusiasmo: Ento j deve ter dono! com certeza o gato de

    algum vizinho que entrou por alguma janela aberta . Temos de o devolver. Enxota-o para fora de

    casa!, Eu choraminguei: Mas ele gosta de mim at deixou que eu o pegasse ao colo. Deixa-o

    ficar c em casa que eu vou perguntar aos vizinhos se algum conhece o dono deste gato

    Scrodinger . A minha me concordou e eu chamei o gato que estranhamente me seguiu como um

    co e juntos samos para a rua. Durante horas percorremos juntos todas as ruas da vizinhana onde

    eu perguntei em todas as casas se aquele gato lhes pertencia

    Cansado mas feliz regressei a casa sempre com o gato ao sempre ao meu lado e triunfante disse

    minha me: Ningum o conhece. Por isso meu ! Andava perdido e fui eu que o achei. A minha

    me arrefeceu novamente o meu entusiasmo quando me disse que tinha de pedir autorizao ao meu

    pai para poder ficar com ele. O meu pai observou o bicho comentou sobre o facto de ele estar bem

    cuidado e sobre a coleira com o estranho nome . Disse na altura Esta coleira parece de ouro

    amarelo e de ouro branco! Mas aceitou que eu ficasse com ele em casa at aparecer o dono

    Resolvemos colocar um anncio no jornal com a foto, o nome do gato e a frase : entrega-se a quem

    provar que lhe pertence . Publicamos o anncio todos os fins de semana durante um ms mas para

    minha felicidade ningum reclamou o bichano. Assim fui ficando com ele em casa. Bem ficar

    uma fora de expresso pois o Schrodinger desaparecia sem deixar rasto e voltava a aparecer no

    meu quarto sem que ningum desse pela sua entrada.

    O meu estranho gato foi sempre um poo de surpresas estranhas. Se eu disser que o meu gato fala

    ningum vai acreditar e vo pensar que eu estou doido. Mas a verdade que ele fala comigo. Bem,

    falar uma forma de dizer, na realidade eu sinto as palavras dele como se fossem os meus

    pensamentos. A primeira vez que isso me aconteceu achei que estava a ficar maluco. O gato estava

    a falar para mim mas da sua boca no saia nenhum som, nem sequer um pelo do seu bigode se

    mexia. Isso aconteceu quando eu estava no meu quarto a tentar resolver um puzzle difcil e no

    conseguia. Ento ouvi algum dizer-me: -A serve a pea verde e castanha. Assustado olhei

    em volta e s vi o Schrodinger a olhar fixamente para mim, que como de costume tinha aparecido

    vindo do nada. Eu tinha fechado a porta e as janelas e estas continuavam fechadas. O gato

    continuava quieto mas a voz martelava-me os ouvidos Ento no vs que a serve a pea verde e

    castanha?. Coloquei a pea no lugar e serviu. Espantado vi-me a perguntar ao gato: Schrodinger

  • tu falas e sabes resolver puzzles? . Sim! respondeu a mesma voz e o gato saltou para a mesa e

    para meu espanto comeou a colocar no seu devido lugar todas as peas do puzzle.

    Desde esse dia habituei-me a falar com o meu gato. Mas isso era s quando ele queria. A maior

    parte das vezes ignorava os meus pedidos e comportava-se como se fosse mais estpido do que os

    gatos normais. Uma vez a minha me apanhou-me no quarto a falar com ele em voz alta como eu

    fazia e quando ela abriu a porta, perguntou : Com quem estavas a falar? Eu respondi sem pensar

    Com o Schrodinger! .Qual Scrodinger? No vejo aqui nenhum gato! perguntou-me a minha me.

    S ento me dei conta que no havia nenhum gato no quarto e disse-lhe Deve ter sado quando

    abriste a porta. Os gatos so muito rpidos.. Aquele gato com a minha famlia at entrava e saa

    pela porta. Comportava-se sempre como um gatinho bem comportado. O que certo que

    passados alguns dias a minha levou-me a um mdico muito chato que me fez muitas perguntas

    estpidas sobre as minhas brincadeiras sobre se eu ouvia vozes sem ver as pessoas e se via coisas

    que no existiam. Eu disse-lhe que no gozasse comigo que eu j era bem crescidinho para saber

    que no existem fantasmas, mas confirmei-lhe que falava com o meu gato porque ele falava

    comigo. Disse-lhe que o Scrodinger resolvia puzzles e tinha conversas mais inteligentes do que a

    maioria dos adultos. Tambm lhe disse que o meu gato nunca me fez perguntas to parvas como as

    dele. Bem o homem deve ter ficado muito zangado com a minha irreverncia e deve ter dito isso

    aos meu pais, porque fiquei de castigo sem ver televiso nem jogar na minha consola muitos meses.

    E tambm fui proibido de brincar com o gato. O bicho deve ter-se apercebido de que no era bem

    vindo l em casa porque passou vrios meses sem aparecer.

    Ainda no falei dos meus amigos. Eu sempre tive muitos amigos alm do gato claro. No meu grupo

    ramos nove amigos todos conheciam o meu gato pois quando iam l a casa encontravam-no muitas

    vezes no meu quarto. Ouviam as minhas histrias com ceticismo pois o gato nunca foi mais do que

    gato quando eles estavam presentes. s vezes quando eu no conseguia safar-me nalgum jogo da

    consola eles gozavam comigo: Porque no pedes ajuda ao Schrodinger ? De certeza que ele

    capaz! Eu amuava sempre com essas piadas e o meu gato muito compreensivo saltava para o meu

    colo a confortar-me. Transmitia-me um sentimento de compreenso e conforto sem falar e ento

    passado pouco tempo passava-me o amuo e continuava a brincadeira. Quando tinha dez anos na

    vspera de do Dia de po por Deus (festa do Halloween) aconteceu uma grande desgraa o Hugo

    Caldeira adoeceu de sbito e foi para o hospital. Eu ouvi os meus pais dizerem que ele ia morrer.

    Logo naquele dia que tnhamos combinado ir juntos pelas portas pedir: Doce ou travessura! Fui

    para o meu quarto chorar e o Schrodinger como sempre apareceu de repente. Como sentiu que eu

    estava triste saltou para o meu colo e perguntou : O que tens? Eu respondi: O Hugo est no

    hospital e vai morrer! Tu que s um gato mgico, podias cura-lo. Schrodinger disse: Se tu me

    deres dez anos da tua vida eu dou-os ao Hugo e ele vive at aos vinte. Mas vai morrer to cedo na

    mesma? disse eu. Se cada menino do vosso grupo oferecer dez anos da sua vida ao Hugo todos vs

    ides viver juntos at aos noventa. Achas que os outros concordam? disse o gato . Respondi : Acho

    que sim, vou cham-los? Telefonei aos meus amigos e em menos de meia hora estvamos todos no

    meu quarto onde eu lhes expus o plano do gato. Acharam que era mais uma das minhas maluqueiras

    e o gato dava-lhes razo. Estava placidamente a observar-nos. De repente a voz do Schrodinger

    gritou na minha cabea; O corao do Hugo parou! Eu gritei O Hugo est a morrer! Nesse

    momento as paredes do quarto ficaram transparentes e ns estavamos a ver o Hugo na cama do

    hospital ligado a muitos aparelhos estranhos a apitar e os mdicos e enfermeiras a correr para ele.

    Eu disse para o Schrodinger: Eu dou metade da minha vida. Faz qualquer coisa! Os outros ainda

    abismados com o que viam disseram todos em coro Ns tambm! Schrodinger salva o Hugo! . O

    Gato falou para todos ns Vou tirar dez anos da vida de cada um e vou d-los ao Hugo! Sois bons

    meninos ides viver todos at aos noventa! As paredes tornaram-se outra vez opacas e ns

    comeamos todos a pular e a gritar Salvamos o Hugo! Salvamos o Hugo! Alarmada com aquela

    algazarra a minha me bateu porta e disse Que se passa? Abram a porta? O Schrodinger disse-

    nos: Ide visitar o Hugo! e vista de todos saltou atravs da parede e desapareceu.

    Quando a minha me entrou eu disse-lhe o que o Schrodinger curou o Hugo e perante o espanto da

    minha me samos todos a correr para a paragem do autocarro que passa no Hospital. Quando l

  • chegamos pedimos para visitar o Hugo Caldeira mas os rececionistas no queriam deixar-nos entrar

    at que apareceu um mdico e disse So vocs os amigos do Hugo? Ele est vossa espera!

    ponham a mscara, vistam a bata e calcem as sabrinas, para entrar nos cuidados intensivos. Fizemos

    isso num pice, subimos de elevador e entramos na sala onde havia muitos mdicos espantados.

    Aquele que nos acompanhou desde a receo disse para os outros: So estes os meninos que o

    Hugo diz que lhe emprestaram dez anos da vida de cada um. Parece inacreditvel mas depois da

    crise, ele est milagrosamente curado. Acho que no fim do dia podemos mand-lo para casa. Podem

    ir todos mendigar os bolinhos do Halloween

    No tnhamos a certeza de como que o Hugo sabia o que tinha acontecido, mas desconfiavamos.